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Comitê Cidadnnio Pará AÇÃO = [iR5l,0üpota a Campanha da Fome '^ I I m Educar pr eidadaitui porMMkeOtte Teologia do Sacríf por Jutt^ Iff o Stitig I ANO IV N" 12 DEZEMBRO/94 mm .- ., 1[.._Jiiic;. **. ,A, Entrevisto Caio Fábio

Comitê Cidadnnio Pará AÇÃO '^ I · da democracia e da cidadania, foi a da Agência Emaús, que já comprometeu os seus profissionais de comunicação com a produção do próximo

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Comitê Cidadnnio Pará

AÇÃO

= [iR5l,0üpota a Campanha da Fome

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Educar pr eidadaitui porMMkeOtte

Teologia do Sacríf por Jutt^ Iff o Stitig

I

ANO IV N" 12 DEZEMBRO/94

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Entrevisto Caio Fábio

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/xxlkff £ jbad&z.

PROGRAMA DE FORMAÇÃO MIJftBl^^l «Curso de Iniciação «Curso Básico de Formação •Seminário sobre Protestantismo IIÍIJPI K IH W Teatral Sócío-Político e Pentecostalismo mmmmmmmL^^m. de 06 a 23 de 06/03 a 09/06 de 17 a 18

•Oficina de Expressão Corporal de 17 a 28

•Seminário sobre Iniciação Ecumênica de 15 a 19

•Oficina de Expressão Oral de 19 a 30

AGOSTO •Curso de Planejamento:

O Cotidiano da Ação Educativa de 04 a 29

de 05 a 16 UNH Oficina: Jogos de Integração de Grupos

de 21 a 25

•Mini-curso Os Evangelhos

de 11 a 22 IB Sc ¥ EMBRv OUTUBRO | •Oficina:

"Análise de Conjuntura' de 16 a 27

•Mini-curso Bíblia e Meio Ambiente

de 16 a 20 biente

•Mini-curso: Jesus e as Relações: Homem e Mulher, Adulto e Criança

de 20/11 a 01/12 mm W li CIVII

Demandas e parcerias

•cursos • mlni-cursos • oficinas • seminários • assessoría pedagógica • reciclagem didática

• planejamento estratégico • integração de grupos • arte-educaçâo • organização de eventos

Entre em contato conosco

Av. Senador Lemos, 557 • Umarizal • Belém • Pará • CEP 66050 - OOO

Fone: (091) 224-9074/220-0141 • Fax (091) 225-1668

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Revista CUIRA é uma publicação bimestral do Instituto Universidade Popular

(UNIPOP), de caráter formativo e informativo.que busca o debate teórico e político sobre as

questões de interesse da cidadania e dos movimentos sociais propondo-se como

instrumento de luta por uma sociedade democrática, sem explorações, opressões,

injustiças e discriminações. As matérias assinadas não representam necessariamente

as posições da entidade.

Edição João Cláudio Arroyo

Jornalista responsável José Maria Píteira(Reg.888/MTb)

Capa Dina de Oliveira

Ilustração Paulo Emmanuel

Fotografia Arquivo Unipop/colaboradores

Projeto gráfico e editoração Karina Coraini

Jacylene Ayres (assistente) Fone:(091) 241-5819/224-2494

Fax: 250-3297

Impressão BelGraff/(091) 241-5128

Fax:(091)223-3986 Rua Tíradentes, 200

Instituto Universidade Popular Av. Senador Lemos, 557 Telégrafo

Fone: (091) 224-9074 Fax:(091)225-1668

cx postal 1098 CEP 66050-000 - Belém

Pará - Brasil

COLETIVO DE EDUCADORES Aldalice Otterloo Cristina Alcântara

Elias Araújo João Cláudio Arroyo

Olinda Charone Rosa Marga Rothe

CONSELHO DE REPRESENTANTES CUT, CBB, FETAGRI, CPB, IECLB, IPAR, IGREJA

ANGLICANA, SDDH, FASE, CIPES,CENTRO 19 DE JULHO, CAMPOS, CPT, NAEA, PROEX/UFPA, MOVIMENTO REPÚBLICA DE EMAUS, IGREJA

METODISTA E CEDENPA.

10 Do Pará a BeijirVÇS Maria Eunice F. Guedes

Ong^: Desenvolvimento sustentável é viável ■ ^ José Maria Pitelra

Esquerda (re)volver João Claudt

Em busca da Pedagogia da esperança Danilo Streeck t

20

26 ■

A sociedade reage contra a fome e a miséria

Elias Araújo

E preciso abandonar a Oft teologia do sacrifício fcO Jung Mo Sung ' 1 I

Aborto: A polêmica tinua. A hipocrisia

f A também Sandra Ribeiro

Caio Fábio 35 L9.Í ChristianAid ®ICCO 40 Educar para a cidadania

Aldalice Otterloo

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r

vas potencialidades. A

do governo FHC, e de

Wcoloca lado a lado: velhos

m grande habilidade em se

ipresentados por partidos

ovo segmento que chega ao

i$, técnicos e intelectuais com

érias e significativa sensibíli-

social - representados pelo

O Brasil que inicia 95, traz

natureza da composíçã

Almir Gabriel no Par

setores das elites que possu

perpetuar no governo - r

como PFL e PTB - e, um

poder composto por polític

trajetórias quase sempre

dade para a problemátic

PSDB.

É muito provável qu

promissos de cada projet

qüéncia e que este govern

menos que um se submeta

Tomando-se a prime

provável, o desafio que se co

consolidação da democracia e

sociedade, é o de aproveitar os

com o máximo de eficácia, no senti

agenda cada vez mais comprometida

populares. É um tempo que muito pouco

turismo e que necessita, mais do que nunc

dade do diálogo.

a disparidade entre os com-

se choquem com certa fre-

seja um cabo de guerra, a

; outro.

>a hipótese como a mais

tia para os que lutam pela

a cidadania em nossa

^espaços que surgirão

•L de estabelecer uma

pm as aspirações

ferece ao sec-

Vda radicali-

C P V

23 MAR 1995

<"■ de Documenlaç

NOVA U I

A patir deste número a UNIPOP resolveu ampliar a circulação da

revista. A Cuíra vinha circulando exclusivamente entre assinantes, agora

com nova e profissionalizada estrutura, a Cuira passa a ser bimestral e

chega às principais bancas e livrarias de Belém e, em breve, das mais

importantes cidades do interior do Estado do Pará. Cuira permanece sem

fins lucrativos, procurando atender, da melhor forma possivel, a necessi-

dade que os leitores mais atentos sentem de matérias isentas e infor-

mações sérias.

O projeto editorial de Cuíra também deve mudar. Sem abandonar os

artigos dos nossos colaboradores, a partir do próximo número, traremos

reportagens que deverão tornar a leitura mais dinâmica e mais informativa,

na linha do jornalismo investigativo enfatizando o caráter analítico da pu-

blicação, tratando com profundidade os assuntos abordados o que não é tão

freqüente nas publicações de grande circulação.

Outra novidade é que Cuíra passa a ser produzida em parceria, e

não mais apenas pela UNIPOP. A primeira grande adesão ao projeto de se

criar uma nova mídia, politicamente plural e identificada com a construção

da democracia e da cidadania, foi a da Agência Emaús, que já comprometeu

os seus profissionais de comunicação com a produção do próximo número.

Também manifestaram adesão e apoio, já participando da composição da

pauta e da promoção da revista: Comitê Cidadania Pará, Fase, Cepepo,

Fetagri, Ipar, Fecma e TV Juventude. A idéia é que esta relação, construída

no trabalho efetivo entre os atuais e futuros parceiros, amadureça a com-

posição de um Conselho Editorial representativo dos seguimentos de nossa

sociedade mais comprometidos com a cidadania.

Cuíra é a única revista do gênero no Pará e na Amazônia, dedicada

a você que está aí para o que acontece a sua volta.

Leia e apoie, Cuíra é mais que uma revista. Cuíra também é

cidadania.

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E D I T O B A UNIVERSITÁRIA U F P A

»l.Alsf CENDUAUS

FEUIU.ES DE RDUTE SUD-AMÉR1CAINES

T- ■■■

FOLHAS DE VlAtiEM SUL-AMERCANAS

(P—mmJ

CanJisias/daAnta2âniü

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARA

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Livro fala do mundo de meninos e meninas

Um relato científico da condição de vida das crianças e adolescentes da região Amazônica. Esse é o tema principal do livro "Correndo atrás da

vida", da jornalista Ana Diniz. Lançado em iulho deste ano, o livro aborda o mundo dos meninos e meninas da Amazônia sobre vários aspectos, desde a questão familiar até a de moradia.

0 livro de Ana Diniz - que contou com o apoio do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR) - é fruto de uma pesquisa iniciada em 1991 pela entidade, intitulada "Crianças e Adolescentes no Interior da Amazônia", visando estabelecer os contornos da situação infanto-junvenil na região. Foram ouvidas 600 pessoas, das quais 335 eram crianças e adolescentes espalhados por cidades e outros locais distantes da Amazônia: de Laranjal do Jarí (AP) ao Bico do Papagaio (sul do Pará), de Plácido de Castro (AC) a Alta Floresta (MT), passando por garimpos de Rondônia e Itaituba, além de Presidente Figueiredo (AM) e Breves (PA).

Segundo a autora, o resultado "consiste numa tentativa de aproximação da realidade da cri- ança e do adolescentes, no locais onde se sente o maior ritmo das transformações, fornecendo, ao mesmo tempo, indicações e pistas para o tratamento de outras realidades."(Agência Emaús)

Eleito o primeiro Conselho Tutelar da

criança e do Adolescente Na luta pelo respeito aos direitos da criança e do adolescente, mais uma etapa importantíssima foi

cumprida no último dia 27 de novembro, quando foram eleitos os cinco membros do primeiro Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente. Entre os candidatos, foram eleitas cinco mulheres. As eleitas e os votos por cada uma conquistados são: Eunice Ramos da Silva (1.631), Keila Miranda (1.344), Maria Enilda Castro (1.324), Ivete Ferreira (1.278) e Maria Tavares da Trindade (1.170). Para o pleito foram convocados cerca de 80 mil eleitores ■ alunos e pais de alunos - dos bairros do Guamá, Jurunas, Terra Firme, Canudos, Condor, Cremação e São Braz. Mas, sendo a eleição facultativa, apenas 4 mil eleitores compareceram às urnas para escolher cinco entre os candidatos que disputaram o pleito. Eleitas para um mandato de três anos, as cinco membros do Conselho Tutelar serão empossadas no dia 2 de janeiro de 1995. Para melhor entender o papel do Conselho Tutelar e as tarefas que terão pela frente, as conselheiras passarão por um intenso treinamento durante o mês de dezembro, sob a coordenação do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (Condac), que também coordenou a eleição do dia 27.

De acordo com o Art. 131 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a principal finalidade do Conselho Tutelar é o de lutar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente.

CuíraJ

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Tráfico de bebês denunciado

Bebês de mães solteiras podem estar sendo traficados em Porto Velho (RO). A polícia está investigando a denúncia a partir do

caso de uma mãe solteira de 15 anos. A menor deixou seu filho recém nascido com a porteira Zulmira Barbosa, numa casa na periferia da cidade, que o entregou a um casal de classe média. A delegada Elza de Castro, que investiga a denúncia, informou que a criança foi loca- lizada e depois devolvida à mãe. (Agência Emaús)

ONG's vão discutir a educação pública

Fazer um diagnóstico do ensino público no Estado do Pará e identificar as possibilidades e os limites de ação das organizações não-governamentais (0NG's) na construção de uma educação pública de

qualidade para todos. Esse é o obietivo maior do Encontro "Educação para todos e as 0NG's", que será realizado no período de 23 a 25 de janeiro de 1995, em Belém, promovido pela Unipop, Comitê Cidadania - Pará, Abong ■ Regional e pelo Unicef. Dirigido a representantes de 0NG's de todo o Estado, o encontro deverá promover uma discussão profunda sobre a política educacional do país (Constituição Federal, a nova Lei de Diretrizes de Base da Educação, o Plano Decenal de Educação) e do Estado (Constituição Estadual, Estatuto do Magistério, Plano Estadual de Educação e Plano Municipal de Educação), além de debater e aprovar propostas alternativas que visem a construção de uma educação pública e de qualidade para todos. Ao final do encontro, os participantes vão aprovar um documento propositivo sobre o tema e organizar uma frente em defesa da educação pública no Estado.

Oficial da PM implicado na morte de bebês

O coronel PM Raimundo Nonato Barbosa, ex-presidente da extinta Fbesp (Fundação do Bem Estar Social), poderá ser convocado pelo Ministério Público de Ananindeua para depor no processo sobre a

morte de oito bebês, em 1993, no Espaço de Acolhimento Provisário Infantil (EAPI). Isso é o que quer o promotor Edson Cardoso, depois que soube que o relatório de técnicos do governo estadual sobre as mortes sugeriu o "afastamente definitivo" do militar. 0 relatório pediu também o afastamento de dois dire- tores do órgão, da gerente e de um assessor. No processo movido pelo MP, a gerente Ana Chama e a médica Helena Vieira são denunciadas por homicídio culposo. Elas ainda continuam nos cargos.

As crianças morreram nos meses de junho e agosto de 1993, apresentando um quadro las- timável de saúde: alto grau de desnutrição e maus tratos. Após as mortes das crianças, o EAPI foi inter- ditado durante um ano. No relatório dos técnicos do Estado, a insalubridade e a falta de capacitação profissional dos servidores da unidade foram apontadas como os principais problemas da instituição. Mais: no período das mortes, 32% dos servidores estavam de férias ou de licença. (Agência Emaús)

Cuíra

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Protesto no PAAR contra problemas de transporte i

Um ônibus queimado, 16 outros depredados, um carro dos bombeiros interditado e 48 pessoas presas. Esse foi o resultado do protesto dos moradores do conjunto PAAR, em

Ananindeua, no dia 1g de setembro, contra a Prefeitura Municipal, o governo do Estado e a Viação Forte. A manifestação teve a participação de quase-dois mil moradores do conjunto, que protestaram contra o descaso das autoridades e da empresa Viação Forte com os trans- portes coletivos que serviam o conjunto.

0 fato aconteceu cerca de seis meses depois que a empresa suspendeu o tráfego dos ônibus que percorriam o interior do conjunto, alegando que as ruas estavam em péssimas condições. A decisão da empresa prejudicou quase todos os moradores do PAAR, pois o fim da linha do ônibus que antes servia o conjunto passou para o fim da linha do ônibus "Cidade Nova VI", distante 3km da parada final anterior. Naquele dia, os moradores se reuniram na sede da Associação dos

Moradores do conjunto e aguardaram o prefeito de Ananindeua, um representante da Ctbel e outro da empresa de transporte, que com eles discutiriam os soluções para o fim do problema. Mas eles não apare- ceram. Revoltados, os moradores foram em passeata ao fim da linha do ônibus "Cidade Nova VI" e fi-zeram o quebra-quebra. Quatro dias após o protesto, a Prefeitura de Ananindeua mandou máquinas para asfaltar as ruas do conjunto por onde os ônibus pas- sam. (Agência Emaús)

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"Ninguém engana todos todo o tempo"

Um espetáculo que fica sete anos consecutiuos

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Vai realizar-se em setembro de 1995, na cidade de Pequim, a IV Conferência Mundial da Mulher, promovida pelas Nações Unidas (ONU), com o ob|etivo de

reunir representantes de governos de todo o mundo para discutir estratégias de "Ação para a Igualdade, Desenvolvimento e Paz." A cada dez anos, uma conferência desse nível é realizada, em busca de mecanismos que garantam os "Direitos da Mulher e eliminem todas as formas de discriminação das quais são vítimas" (".

Fruto de movimentação no cenário mundial e brasileiro do movimento feminista, as mulheres, na década de 70, passaram a se cons- tituir interlocutoras do definição de políticas públi- cas e a ocupar espaços institucionais. Segundo José Augusto Alves, chefe da Divisão das Nações Unidas do Ministério das Relações Exteriores, "a situação da mulher passou a adquirir espaço pri- oritário nas atividades das Nações Unidas" S).

*Maria Eunice F. Guedes é professora do Deparfamenfo de Psicologia Social e Escolar da UFPA

1 OCuíra

Do Pará a Beijin % Um olhar feminino/feminista através da história

da ação dos movimentos de mulheres, rumo a

IV Conferência Mundial da Mulher. Maria Eunice F. Guedes *

Esta posição das mulheres a nível mundial foi reforçada pelas três conferências anteriores, rea- lizadas no México (1975), em Compenhague (1980) e em Nairobi (1985).

Foi em 1972 que a ONU instituiu o ano de 1975 como o "Ano Internacional da Mulher." Essa definição objetiva intensificou ações para assegurar a eqüidade, que era, e ainda é hoje, bastante ameaçada, tanto por parte de ações políticas públicas oficiais em relação à mulher, como pelo nível das relações entre os gêneros, no âmbito determinado pelo privado. Podemos situar, por exemplo, a luta contra a vio- lência doméstica e sexual, que tem sido objeto de ação dos movimentos feministas/femininos desde o início dos anos 80, quando se consti- tuíram, no Brasil, vários grupos denominados SOS Mulher. Assim, questões como direitos repro- dutivos, direitos trabalhistas, prostituição, direitos humanos, tráfico de mulheres, cultura e lazer foram objeto de reflexão, no Brasil, por parte de mulheres em coletivos feministas, grupos de mu- lheres, centrais sindicais, conselhos da mulher, encontros latino-americanos feministas, a partir dos anos 70,80 e agora nos anos 90.

E dentro desse quadro que vai se realizar a IV Conferência Mundial da Mulher. Paro esse evento, as mulheres brasileiras vão levar ao Fórum Não-Governamental, que vai acontecer conjuntamente com o fórum oficial dos represen- tantes dos governos, um documento que vai mostrar a ação das mulheres e dos movimentos feministas/femininos no País, nessas duas últi- mas décadas. É a nossa historio que vai servir de base para esse verdadeiro IManifesto das Mulheres Brasileiras."

0 movimento das mulheres

brasileiras tem história

No Brasil, a mobilização das mulheres por igualdades sociais tem como ponto de partida o movimento pelo voto feminino, no fim do sécu- lo passado e início deste, mas não se restrigiu à luta pelos direitos políticos. As operárias inseriram diversas reivindicações nas pautas de diversas campanhas salariais, como fizeram as tecelõs e costureiras. A nível organizativo, foram incentiva-

dos os departamentos femininos e a criação da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, em 1922. Em 1934, é criada a União Feminina, li- gada à Aliança Libertadora Nacional, e as mul- heres ligados ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) fundaram associações regionais e o jornal "Movimento Feminino" (3>. Em 1949, foi funda- da a Federação das Mulheres do Brasil, dezessete anos depois da conquista do direito de voto, que ocorreu em 24 de fevereiro de 1932 (4>. Em abril de 1963, 415 delegadas de todo o país, reunidas na I Conferência Nacional da Mulher Trabalhadora, discutiram temas como condições de trabalho, o papel da mulher na sociedade e lutas sindicais. 0 movimento ditatorial pôs fim, em 1964, a essa movimentação dos diversos setores femininos do país. <5'

Os anos 70 trouxeram para todas nós diversas questões. Primeiramente, gestava-se no país diversas fontes de resistência ao regime dita- torial. São famosas as movimentações do ABCD paulista nessa época. Na área rural, tem-se as primeiras paralizações na 7ona da Mato pernam- bucana, em 1979. Conjuntamente com a retoma- da das mobilizações, refletiu-se em alguns seg- mentos sobre as "formas, práticas dos diversos movimentos."

0 movimento de mulheres - até nesse momento não tínhamos um movimento feminista no país - retoma também um espaço nesse cenário. Datam daí os Congressos de Mulheres Metalúrgicas de São Bernardo (SP) e Contagem (MG), entre outros encontros que proliferaram no país. Surgem jornais dedicados à questão femi- nista, como "Nós Mulheres", "Brasil Mulher" e, mais recentemente, "Mulherio". Nesse meio, por outro lado, brotava o "germe do específico". Afinal, o que era essa especificidade, que era can- tada e decantada por umas iluminadas vindas do exílio? Qual a necessidade de algumas mulheres se organizarem em entidades autônomas, sem organizações centralizadas e hierarquizadas e lutar por bandeiras, como o direito de ter ou não filhos, a consciência da sexualidade, o trabalho doméstico, a educação mutilada, o cidadania de segunda classe, os profissões subalternas, a estética imposta, a participação política secundária, a violência doméstica e sexual? Qual a importância de politicar o espaço privado, vivido quase que exclusivamente pelas mulheres, com seus ônus e bônus?

0 privado também

é político

Se, nesse momento de retomada dos diversos movimentos sociais, as mulheres, através das entidades gerais e, na maioria das vezes, brigando contra essas organizações, bus- cavam um espaço de inserção - daí a luta pelos departamentos femininos a nível urbano e pela sindicalização na área rural - os anos 80 trazem, por outro lado, a necessidade de politizar o priva- do, de buscar a construção de grupos de reflexão sobre a condição feminina.

Alguns fatores precipitaram de certa forma essa ação. Um dos fatores foram as inúmeras mortes de mulheres em todo o país. Questionava-se, assim, a impunidade dos assassi- nos, as leis retrógradas baseadas na defesa da propriedade feminina, que se articulava ao ditado não explícito de "legítima defesa da honra". Em cima desse dito, muitas mulheres foram assassi- nadas, como são até hoje. À reflexão grupai, jun- tou-se a luta institucional. Assim ocorreu na bata- lha pela implantação das delegacias especia- lizadas de mulheres, na luta pela implantação dos conselhos municipais, estaduais e nacional de mulheres e na luta pela implantação do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher - PAISM. Outro fator foi a politização e explicitação das especificidades, que permitiu visualizar dife- renças e singularidades, que não podiam se somar ao geral dos movimentos como um todo.

A reflexão sobre a condição feminina possibilitou a redefinição de conceitos, como política, cidadania, articulação entre teoria e práti- ca política. Na verdade, dissolvia-se, como diz Beth Lobo, as fronteiras entre o pessoal, o políti- co, o teórico e a prática. Os vários fragmentos feminino e masculino, privado e público, casa e trabalho, geral e específico foram teorizados, questionados pelo movimento de mulheres (6>. Nessa redefinição, outro fator fundamental foi a concepção do "feminismo" enquanto problemati- zador da condição em que se encontravam as mulheres no Brasil. Se as lutas das mulheres se restringiram, tanto no início do século quanto no recomeço dos movimentos sociais, na década de 70, a questionar a opressão feminina enquanto reflexo da opressão de classe, ou então que a

Cuíra 11

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"Se a luta das mulheres se restringia a Questionar a

opressão feminina enquanto reflexo da opressão de

classe, o feminismo trouxe à baila a sujeição da sexu-

desigualdade entre homens e mulheres se funda- va no acesso ao trabalho assalariado ou na questão organizativa (departamentos femininos, associações, clubes de mães, etc), o feminismo trouxe à baila a sujeição da sexualidade feminina à maternidade, a questão da opressão das mu- lheres enquanto um fator cultural, milenar, ou seja, de Gênero.

Nesse transcorrer, os movimentos femininos se encontravam com os pressupostos feministas. Não é à toa que os encontros nacionais feministas têm uma presença cada vez mais massiva de mulheres dos diversos movimen- tos/segmentos populares. Isso foi verdadeiro tanto no 9g Encontro de Guaranhuns quanta no de Betioga, no ano seguinte. Outro fator de con- tribuição foi a própria academia, pois muitas mu- lheres ingressaram na carreira acadêmica e realizaram pesquisas, estudos e deram assesso- rias a diversos movimentos de mulheres, visibi- lizando a nível de conhecimento e dando estatuto de cientificidade ao sujeito Mulher. Mais uma vez, as fronteiras entre pessoal, profissional e político se dissolviam. Na medida que estu- diosas(os) elegiam a categoria Mulher como sujeito de conhecimento, permitia-se a interli- gação com a atividade/prática dos movimentos de mulheres feministas.

No entanto, mesmo após a instalação pela ONU, em 1975, da década da mulher (1975-1985), e mesmo com todos os movimen- tos e lutas que existem hoje, ainda surge uma questão sobre a opressão feminina, que a mili- tante Emma Goldman já colocava no século pas- sado: "nem todo o direito ao voto, nem a igual- dade do trabalho são suficientes para modificar a situação das mulheres na sociedade, se não for rompida pelas mulheres a relação de submissão, de opressão, eas práticas sociais de mulheres e homens...".'7) É esse o desafio do nossa momen- to atual: possibilitar que a opressão às mulheres se torne um fato social e seja desarticulado a par- tir da reflexão das práticas sociais de homens e mulheres.

Entendo com isso que o todo se par- ticulariza e a particularidade se totaliza, numa sociedade em que os padrões culturais se inter- nalizam, tanto na nossa prática cotidiana - ape- sar de tentarmos ser grandes articuladoras(es) políticas (os) - quanto na nossa afetividade, na nossa psique. Assim, a discussão de Gênero, novo

12Cuíra

nomento de reflexão atual da questão feminina, pode possibilitar um novo tempo de redefinição das relações entre homens e mulheres, tanto a nível de prática quanto a nível de conhecimento, contribuindo com uma nova História e uma nova leitura dos movimentos sociais, a partir da inserção, nos "palcos da vida, da academia, das organizações", do sujeito Mulher.

No Pará, um caminho

em construção

0 movimento das mulheres paraenses acompanhou a trajetória dos movimenos de mu- lheres a nível nacional. A reflexão sobre a neces- sidade de discutir a especificidade feminina já estava presente na década de 80: "É se o trabal- ho com mulheres era em 83 na área rural... em 82 começou o trabalho na cidade, nos bairros e foi convocado um encontro para discutir a Federação de Mulheres e teve um congresso onde houve um racho... a Federação foi eleita e viveu até às eleições de Jóder..." (V

0 cerne desse conflito dentro do movi- mento de mulheres era a problemática entre o econômico e o específico, em relação às priori- dades a serem enfrentadas pelo movimento. Essa reflexão, que vem ocorrendo no país desde os anos 70, tem atravessado o movimento de aca- demia, na medida que foram-se constituindo vários grupos autônomos de mulheres e vários estudos sobre a identidade feminina, sobre o tra- balho das mulheres nas fábricas de Belém e Manaus, sobre trabalhadoras rurais e prostitutas, entre outras que começam a ser realizados por pesquisadoras das universidades do Pará. ">

Durante o período 82-87, ocorre a formação do Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade (MMCC), da União de Mulheres e, em 1986, quando foi criado o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (CMDM), os movimentos organizados de mulheres passam a ter um "canal institucional com o Poder Público", pois o objetivo da formação do CMDM era "fazer a ponte entre os movimentos autônomos de mu- lheres e o Estado." co) Necessário se faz registrar que já se realizava anteriormente um trabalho com as prostitutas da cidade de Belém, através da Ação Cristã Feminina (ACF) e, posteriormente.

pelo Movimento de Promoção da Mulher (Moprom).

A décado de 80 trouxe a discussão sobre a implantação das delegacias especia- lizadas de mulheres, sendo que a primeira foi implantada na capital do Estado, i11) As primeiras tentativas de discutir o específico, no entanto, se deram quando da realização do I Congresso de Mulheres do Campo e da Cidade, em 1985, quando se discutiu temas como o aborto e a se- xualidade ('2>, e quando das tentativas de algu- mas feministas de Belém de criarem, em 1986, o Coletivo Feminista Disperso de Mulheres. <13' Mas é no final da década de 80 que começam a se desenvolver e se organizar grupos de mulheres nas área urbanas e rurais do Pará, como o das operárias das fábricas de castanha, em Belém, e os grupos de mulheres rurais em sindicatos de trabalhadores rurais da região Sudeste do Pará. Não podemos também esquecer o Movimento de Mulheres de Nova Timboteua e outros, que deram forma aos movimentos surgidos no final da década de 80 e início dos anos 90. <14)

A década de 90 traz à luz inúmeros movimentos de mulheres e organizações regio- nais. Assim, na região Sudeste do Estado, foi cria- da a Coordenação das Mulheres do Sudeste do Pará, atualmente Movimento de Mulheres do Sudeste do Pará; na região da Transamazônica, o Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Altamira (MMTA); na região do Baixo Amazonas, o Movimento das Domésticas, a Associação das Organizações das Mulheres Trabalhadoras do Baixo Amazonas (A0TM-BAM) e grupos de mu- lheres espalhadas por mais de treze municípios da região. Na região Nordeste, Guajarina e Baixo Tocantins, outros sem número de grupos pas- saram a se organizar, como em Barcarena, São Francisco e Abaetetuba, entre alguns dos que se iniciram nos anos 90. Em 1990, também foi cria- do o Grupo de Prostitutas da Área Central de Belém (Gempac) e outras entidades mistas, orga- nizações não-governamentais (0NG's), centrais sindicais, partidos políticos, centros de formação (como a Unipop), o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR), a Escola Sindical do Norte e Igrejas, que começam a realizar palestras, pesquisas, cursos, seminários e grupos de reflexão sobre a problemática da mu- lher e, atualmente, sobre o Gênero.

Não pretendemos com este simples

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olidade feminina ã maternidacle, a

questão da opressão da mulher

enquanto um fator cultural"

resumo esgotar toda a história dos movimentos de mulheres do Pará, mas apenas salientar que as mulheres têm uma história de reflexão política sobre a condição feminina no Estado, o qual muitas das vezes não é levado em consideração pelos (as) estudiosos (as) da temática Mulher e/ou Gênero, ou pelos poderes públicos. Essas organiza- ções são as responsáveis pela definição de políticas de interesse de mais da metade da população paraense, composta pelas mulheres. (,5)

Manifesto das

mulheres paraenses

A tragetório dos movimentos de mu- lheres/feministas tem trazido à bailo inúmeras discussões que têm se refletido nos grupos de mulheres do Pará. Assim, questões como a vio- lência doméstica e sexual, a prostituição de mu- lheres, meninas e adolescentes, o tráfico e o cárcere privado de mulheres, a não efetivação do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher no âmbito do Sistema Único de Saúde

(SUS)"6>, a esterelização massiva de mulheres, a educação diferenciada colocada pela família, pela escola e pela sociedade; a situação das mu- lheres no trabalho, o não acesso à educação, a dupla opressão da mulher negra, etc, têm desafiado as mulheres a redimensionar suas dis- cussões.

Às dificuldades territoriais do Pará, soma-se as dificuldades organizativas, as demandas por capacitação e formação por parte da maioria dos movimentos de mulheres do Estado. Vive-se, neste momento em que se articula a preparação de mais uma Conferência Mundial sobre a Mulher, uma possibilidade de construção da história de uma forma diferente, ou seja, à partir da avaliação de mais de duas décadas da mulher no Pará, construindo o rosto e reconstruindo o processo organizativo dos movimentos de mulheres. Tem-se a certeza de que se gesta, em 1994, novas possbili- dades de construção da identidade do movi- mento feminista/feminino.

0 seminário realizado, em Belém, sobre "Prostituição e Tráfico de Mulheres"!1", deu algumas pistas para essa construção.

Restam, ainda, muitas lacunas nessa avali- ação da ação das mulheres paraenses. E necessário pensar sobre temáticas como tra- balho, direitos reprodutivos, violência domésti- ca e sexual, direitos humanos, prostituição, educação e lazer para as mulheres. É, igual- mente, fundamental reivindicar a efetivação de políticas sociais para as mulheres, específi- cas por Gênero.

Do Pará para Beijin/95, pressupõe- se enfrentar desafios e construir articulações entre mulheres, 0NG's, centros de formação, igreias e outras instituições, de maneira a pos- sibilitar a construção do Manifesto das Mulheres Paraenses, para ser encaminhado à IV Conferência Mundial da Mulher. ■

Bibliografia

(1) - Jornal Pequim/95: Conferência Mundial sobre a Mulher. CEFEMEA/UNIFEM,

moio/94.no01;

(2) ■ Idem;

(3) - Conselho Nacional dos Direitos da Mulher. "Estos somos nós". Brasília, Centro de

Memória Sindicol;

(4)-Idem;

(5)-Idem;

(6) - 0 Movimento Feminista contribuiu com diversos trabalhos a nível de vídeos, cartilhas,

livros e outros materiais, poro problemotizar diversas temáticas, como saúde, identidade,

política, cidadania. Muitas dessa reflexões também foram feitas por mulheres acadêmicas.

Ver o texto de Elizabeth Lobo sobre a questão da mulher e trabalho, denominado "Do

desenvolvimento à divisão sexual do trabalho - Estudos sobre os trabalhos das mulheres",

apresentado na III Conferência Mundial de Noirabi (1985).

(7) - Op. Cit Conselho Nacional... "Estas somos...";

(8) - Conforme depoimento de participante de Movimento de Mulheres do Estado do Pará,

em dezembro de 1991;

(9) - Ver GUEDES, Maria Eunice Figueiredo. "0 xote das meninas, o Instituto de

Investigação que move..." Belém, Projeto de Dissertação de Mestrado em Política e

Trabalho no Brasil,! 993;

(10) ■ Ver GUEDES, Maria Eunice Figueiredo. Op. cit.;

(11) - Existem atualmente, no Estado, três delegados, em Belém, Santarém e Marabá;

(12) ■ Conforme relatórios e textos do Congresso do MMCC, 1985;

(13) - Este grupo reuniu, por um período curto, mulheres que se intitularam "Coletivo

Feminista". No pós-70, no Pará, foi o único grupo que se demoninou feminista. 0 grupo

ainda existe com algumas mulheres espalhadas na cidade de Belém;

(14) ■ Os movimentos de mulheres no Pará, segundo depoimentos de participantes destes e

estudiosas, começaram, no início do década de 80, a pedido dos maridos, que participavam

de diversos movimentos sociais no Estado;

(15) • 0 presente trabalho é apenas a colocação de algumas observações e dados iniciais,

estando sujeitos a modificoções no transcorrer da realização de seminários que estão sendo

organizados pela orticulação Beijin do Pará em 1994/95;

(16) • GOMARIZ, Enrique; PITANGUY, Jaqueline; VIADES, Tereza (coordenadoras). Mulheres

latincwmericanos em dados - Brasil. FUSCO/CEPIA, 1993;

(17) ■ Ver Jornal Pequim/95 - Conferência Mundial sobre a Mulher. Brasília,

CFEMEA/UNIFEM, moio/94, n- 2. A "Carta de Belém" oriundo do seminário "Prostituição

e Tráfico de Mulheres", ocorrido em maio de 1994, em Belém.

Cuíra 13

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Representantes de 45 organizações não-go- vernamentais do Brasil e de outros países participaram, no período de 13 a 16 de junho passado, no Hotel Sagres, em Belém,

do Encontro Internacional de Trabalho sobre Diversidade Eco-social e de Cooperação entre ONGís na Amazônia. Organizado pela Federação de órgãos para a Assistência Social e Educacional (Fase) e pelo Fórum da Amazônia Oriental (Faor), o encontro discutiu temas como a biodiversidade, o zoneamento ecológico-econômico e os programas multilaterais financiados pelo Banco Mundial. Na plenária final do encontro, os participantes aprovaram um documento ande defendem a adoção de um novo modelo de desenvolvimento sustentável para a Amazônia e clamam pela preservação da diversidade ecológica e social da região. Este é o documento final do encontro:

Garantir a diversidade ecológica e social

da Amazônia

/l ecologia, além de tratar do flora, da fauna e demais recursos naturais, está articulada é temática social, relativa à ocupação dos espaços naturais pelo homem amazônida em sua dimensão históricoiconômica e cultural.

Considerando essa visão, o Encontro Internacional trabalhou três pontos básicos necessários ò construção de um novo modelo de desenvolvimento sustentável, tanto social quanto ambientalmente, paro a Amazônia: o) 0 loneamento Ecolágico-Econômico (IEE), apresen- tando como instrumento importante para o planejamento estratégico na região; b) A biodi- versidade, particularmente no que tange oo

ON Desenvolvimento sustentável

da Amazônia é viável José Maria Piteira'*

*José Maria Piteira é iornalista

patenteamento dos seres vivos e biotecnologias, como alerta a uma situação que pode causar pre- juízo de longo alcance à Soberania Nacional e ao desenvolvimento da Amazônia; e c) A apreciação crítica de grandes projetos ambientais do gover- no, financiados por bancos multilaterais, no que diz respeito à participação da sociedade em sua efetivação.

O lonemaneto Ecolágico-Econômico é um instrumento de governo que pretende organi- zar o processo de ocupação do território. No entan- to, no seu desenvolvimento pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), tem-se revelado um processo burocrático que não leva em conta nem a ampla participação da sociedade civil nem a necessária articulação entre zoneamentos que já vêm sendo desenvolvidos em diversos níveis de governo. Nesse processo, também não se tem bus- cado a articulação com as diversos políticas públi- cas, tais como a fundiária eade unidades de con- servação, entre outras. Tais deficiências, associadas à pressa com que são encaminhadas, sugerem que o objetivo do governo limita-se à obtenção de recursos em fontes de financiamento que colocam o zoneamento como pré-requisito.

A diversidade de formas de vida vege- tal e animal é essencial para a sobrevivência de ecossistemas naturais e dos povos que deles vivem e há séculos os conservam. 0 desconheci- mento dessa problemática, tanto por parte do sociedade quanto das próprias instituições de

pesquisa, e a omissão do governo têm permitido a chamada "garimpagem genética." Esta consiste em processos de apropriação gratuita de recursos genéticos nacionais como matéria-prima para as nascentes indústrias de biotecnologia que, no futuro, nos fornecerão produtos industrializados de alto custo, tais como medicamentos, cosméti- cos, entre outros. 0 projeto de lei em tramitação no Congresso, que visa o patenteamento de biotecnologias e de seres vivos no país, é, na ver- dade, uma ameaça à Soberania Nacional sobre os recursos genéticos, bem como às amplas potencialidade de desenvolvimento sustentável e autônomo da Amazônia.

Os grandes projetos ambientais do go- verno brasileiro, com apoio do Banco Mundial e BID, como Planafloro (RO), o Prodeagro (MJ), o Programa Piloto (Amazônia) e o de Macrodrenagem (Belém), apontam que, apesar de propalarem a preservação, o diálogo com o sociedade e a valorização das comunidades atingi- das, têm, no prática, dificultado a participação da sociedade, negado informações às entidades e estabelecendo relações que, contraditoriamente, continuam sacrificando o meio ambiente e as popu- lações localizadas nas áreas desses projetos. 0 pro- jeto de Macrodrenagem, por exemplo, não impede que a especulação imobiliária empurre as popu- lações atingidas para a periferias mais remotas. Em Rondônia, o conjunto de percalços do Planafloro levaram a que o fórum das entidades da

1 4Cuíra

"0 desconhecimento sobre a biodiversi-

dade da Amazônia e a omissão do governo

têm permitido a chamada "garimpagem

genética", que é a apropriação gratuita

de recursos genéticos da região como

matéria-prima para as nascentes indús-

trias de biotecnologias."

sociedade civil daquele Estado solicitasse ao Banco Mundial a suspensão do financiamento daquele programa, até que os problemas sejam superados.

Ante o exposto, as entidades pre- sentes ao encontro afirmam a suo convicção de que só um modelo alternativo de desenvolvimen- to poderá preservar a diversidade sócio-cultural e ecológica da Amazônia. Poro tanto, é urgente a democratização do processo de zoneamento Ecolágico-Econômico da região, com a ampla dis- seminação de informações e a participação da sociedade civil na formulação de todas as políti- cas públicas de ordenamento do território. Essa participação é essencial para a preservação da biodivesidade como recursos estratégicos para o desenvolvimento autônomo do sociedade brasileira. Será igualmente indispensável a for- mulação de uma política nacional de biodiveresi- dade, que impeça a exportação de seres vivos e biotecnologias propugnado pelas transnacionais, articulados com a garantia da segurança alimen- tar e uma político de reformo agrária e agrícola.

A participação de representantes da sociedade civil em instâncias de acompanhamento e coordenação de projetos financiados por bancos multilaterais abre novas oportunidades para o debate sobre alternativas de desenvolvimento para a Amazônia. As dificuldades evidenciadas por essas experinências mostram que só o aprofundamento da participação democrática pode recolher, nestes programas, elementos para o modelo de desenvolvi- mento democrático, fundado na diversidade sócio- cultural e ecológica da região amazônica. ■

Greenpeace na Amazônia causa polêmica

Em nova campanha pelo mundo, desta vez em defesa das florestas da terra, o navio MV* chegou a Belém no dia 6 de outubro, iniciando a expe- dição pela Amazônia. Aqui, como em todos os lugares do mundo onde realiza protestos contra o destruição da natureza, os iniciativas do

Greenpeace provocaram polêmicas. Dia 25 de outubro, em Santarém, onde impediu, ainda que momentaneamente, o embarque de 27.000 m3 de madeira para o Ásia, o comandante do navio foi notificado pela Polícia Federal de que deveria deixar o país, sob a alegação de que estari- am interferindo em assun- tos internos do Brasil. Um habeas-corpus, no entanto, suspendeu a decisão da PF. Além de Santarém, os ativistas do Greenpeace visitaram a reserva do Cajari (AP), Parintins, Itacoatiara, Anavilhas e Manaus (AM). No dia 2 de novembro, já de volta a Belém, realizaram mais um protesto contra o corte predatório de madeira. No ato, que aconteceu no porto da Companhia das Docas do Pará, eles estenderam faixas de protesto entre os guindastes do porto e picharam várias pilhas de madeira prontas para exportação, grafando palavras de ordem contra a destruição das florestas. Na noite do dia 2 de novembro, o navio da Greenpeace deixou Belém.

As grandes ameaças à Amazônia

Antes de partir, no entanto, a engenheira florestal Ana Fanzeres, coordenadora da Campanha Florestas Tropicais no Brasil, conversou com a reportagem da revista Cuíra. Segundo o diagnóstico feito pelos ecologistas do Greenpeace, são seis as grandes ameaças que hoje pairam sobre a Amazônia:

Pesca predatória - Último saída econômica para boa parte do popu- lação ribeirinha da região, a pesco ortesanal da Amazônia vem sendo ameaçada pela pesca predatória e industrial. As geleiras, grandes barcos pesqueiros, inva- dem cada vez mais os rios e lagos, utilizando a técnica dos arrastões, instalando ^.

*Novio MV Greenpeace

Cuíra 15

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Continuação do box

uma competição desigual pelos recursos pesqueiros. Esta situação tem gerado inúmeros confrontos diretos, muitas vezes com violência e mortes. A exploração predatória do pescado, que já ameaça os estoques naturais da região, destina-se, principalmente, às grandes capitais brasileiras e ao mercado externo. Além disso, o aproveitamento concentrado de poucas espécies de valor comercial provoca grandes desperdícios: em cada 300 toneladas produzidas, 20 toneladas (ou 20%) são descartadas em forma de lixo.

Hidrelétricas - Os grandes projetos hidrelétricos instalados na Amazônia têm causado gigantescos desastres sociais e ambientais. Os exemplos dão as usinas de Tucuruí (PA) e de Balbina (AM), que inundaram extensas áreas de florestas e expulsaram populações inteiras de suas terras. Os danos ambientais incluem a sedimen- tação dos rios - com a redução de oxigênio de suas águas - e a propagação de doenças causadas por insetos. Quase que toda a energia produzida nessas usinas é vendida para os projetos minerais a preços subsidiados, quando as populações mais próximas não têm sequer eletrificação. 0 plano 2015 da Eletrobrás, que prevê a construção de uma nova série de hidrelétricas na região, ainda não foi apresentado de forma transparente para a sociedade e seus impactos são imprevisíveis.

Exploração madeireira - O ritmo de retirada predatória e clandestina de madeira na Amazônia nunca esteve tão acelerado. Para se ter uma idéia, a rota de exploração da virola (espécie

natural das várzeas, de alto valor no mercado externo) subiu, em menos de dez anos, o curso do Rio Amazonas e já se encontra acima de Manaus. Além da virola, outras espécies de várzea, como o jatobá e a samaúma, podem ter o mesmo destino do pau-rosa, cuja comercialização internacional foi proibida, por estar em vias de extinção. Em terra firme, o caso do mogno é, hoje, um dos mais alar- mantes. Após a exploração exaustiva no sul do Pará, as empresas madeireiras estão partindo para o centro-norte do Estado e para o Acre, onde estão as últimas reservas da espécie. Para a busca desenfreada da madeira nobre, já foram abertos na floresta Amazônica milhares de quilômetros de estradas, por onde vêm penetrando, desordenada- mente, pecuaristas, grileiros e outros agentes da devastação.

Queimadas - Cerca de 83% da destruição da Eloresta Amazônia foram, até hoje, provocadas pelas queimadas. Em 20 anos, o fogo consumiu 320 mil quilômetros de florestas para dar lugar, principalmente, a intermináveis pastos, que apresentam baixíssimos níveis de empregos e produ- tividade. Essa prática arrasadora foi permitida até 1992 por incentivos fiscais do governo federal, na maior demonstração de irresponsa-

bilidade que orientou a ocupação da Amazônia. As queimadas continuam ardendo na região, sobretudo nos Estados do Pará, Rondônia e Mato Grosso, a uma taxa aproximada de 11 mil quilômetros quadrados por ano. Atualmente, um projeto de lei enviado ao Congresso Nacional prevê a retomada dos incentivos fiscais para a formação de pastos na Amazônia, o que poderá liquidar os esforços recentes de se reverter a destruição da floresta.

Monoculturas de eucalipto - As monoculturas de eucalipto não são florestas. São desertos verdes onde praticamente não existe. Além disso, podem comprometer o solo em seus sucessivos ciclos de plantio, corte e uso intensivo de agrotóxicos. A substituição da vegetação nativa, rica em biodiversidade, por essas monoculturas é inaceitável. É o caso do projeto Jari, do Grupo Caemi, na região limítrofe entre o Pará e o Amapá, onde 200 mil hectares de floresta nativa deram lugar à monoculturas de eucalipto, pinus e gmeli- na. Essa substituição continua acontecendo. Ao longo da Ferrovia Carajás, o Projeto Pólos Florestais, idealizado pela Companhia Vale do Rio Doce, prevê o plantio de 1 milhão de hectares de eucaliptos para a produção de papel celulose - uma atividade altamente poluente - e outros fins industriais. No Maranhão, a Celmar já iniciou a plantação de um grande projeto de celulose para exportação, que vai destruir babaçuais nativos, dos quais dependem várias comunidades locais.

Mercúrio - A devastação causada pelos garimpes na Amazônia vem atingindo dramatica- mente o meio ambiente, principalmente através da poluição das águas pelo mercúrio utilizado para o ouro entre os sedimentos. Estima-se que cerca de 100 toneladas de mercúrio são despejadas anual- mente nos rios da Amazônia, entrando na cadeia alimentar, principalmente através dos peixes. O problema vem se alastrando e está fora do con- trole governamental. Para o homem, os riscos são enormes: a contaminação pelo mercúrio pode causar modificações no sistema nervoso, levando à morte, e provocar o nascimento de filhos defeitu- osos. Na região do Rio Tapajós (PA), jó foram re- gistrados vários casos da doença de Minamata - mesmo mal que vem lesando e matando milhares de japoneses, após o vazamento de mercúrio na Baía de Minamata, nos anos 50.B

1 ÓCuíra

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u isi-ru te

Feitos os balanços das eleições 94, podemos observar que duas conclusões percorreram boa parte das análises a despeito de suas matrizes político-ideológi-

cas: o desconforto estratégico dos setores mais conservadores e o impasse, também estratégico, que tomou força na esquerda, principalmente no PT, sobre como ser governo, como ser oposição, ou seia, como fazer e conviver com aliados, ou ainda, como compatibilizar utopia e resultados.

Estes dois pontos indicam que, no geral, o quadro político tende ao equilíbrio e que a democracia - com problemas, é claro - amadurece: o espectro político nacional está mais plural.

0 desconforto dos conservadores evi- dencia-se com a percepção de que, pela primeira vez na história do Brasil, não conseguiram dis-

REWOLVER "Não ter percebido o plano real como linguagem, foi fatal"

João Claudia Arroyo*

putar a presidência com um de seus próprios quadros. É preciso deixar de lado os exageros retóricos da disputa eleitoral e admitir que Fernando Henrique Cardoso não é exatamente um coronel e guarda muitas diferenças de Fernando Collor, ainda que por opção política, venha fazendo concessões sistemáticas aos con- servadores. 0 neoliberalismo sob um governo do tipo Fernando Henrique é bem diferente do que seria sob um governo tipo Antônio Carlos Magalhães. FHC transige, ACM transgride. Isto indica que há tensões importantes a serem explo- radas entre os que se hospedarão no poder a par- tir de 95. 0 novo governo exigirá dos segmentos progressistas muito mais inteligência e menos intransigência, mais resultados e menos retórica.

Os números das eleições também *João Cláudio Arroyo é educador da Unipop sõ0 demonstrativos do desconforto dos COnser-

vadores. Pela tradição das posturas dos partidos.

poderíamos dizer que existem três blocos de afinidades - o que não significa dizer que traba- lhem sempre juntos - o conservador(PFL, PPR, PTB, PL, PP etc), o de centr(Konservador(PMDB, PSDB, etc) e o progressista(PT, PDT, PSB, PPS, PCdoB, etc). Considerando estes três blocos, constatamos que, tanto no Senado quanto na Câmara Federal, pela primeira vez, os progres- sistas deixarão de constituir uma bancada deco- rativa, apenas com peso político, para adquirir peso efetivo nas votações em função do número de cadeiras que conquistaram. No Senado, con- quistaram 13, enquanto os conservadores obtiveram 35, e os de centro, 33. Na Câmara, 110, enquanto os conservadores ficaram com 228, e os de centro, 174. Como podemos ver, apesar da tendência ao equilíbrio, o contingente conservador permanece com grande vantagem, porém sem a despreocupação que tinha antes, e isso faz muita diferença.

A nível dos governos estaduais podemos observar que progressistas e conser- vadores empatam com seis Estados cada, enquanto o centro levou 15 Estados, dentre estes os mais importantes, como SP, RJ e MG,que ficaram com o PSDB.

Além da composição do Congresso Nacional, se considerarmos que a atuação do presidente determinará sobre a dos gover- nadores e parlamentares, podemos concluir que deveremos ter algum deslocamento do centro político do país da direita para o centro, tanto no que se refere à linguagem quanto às práticas de administração e negociação. Este movimento deixará espaços e abrirá flancos que serão obje- tos de disputa. Quem tiver maior aptidão ao poder e competência política certamente ocupará os pontos mais importantes.

Já o impasse na esquerda, que começou a aflorar para a opinião pública a partir do momento em que Lula caiu nas pesquisas, reside exatamente em perceber os meandros e detalhes do novo governo. 0 desafio começa com a polêmica em torno das alianças: ou muda a postura com relação aos aliados, ou continua se recusando a enxergar diferenças positivas, tratan- do os diversos segmentos como se fossem iguais.

Cuíra 17

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Mapa Geopolítico do Brasil Governes Estaduais

AM Amazenine

PPR

PA Gabriel

PSDB

AC Carmeli

PPR

P A R A Apurados 92,47% Almir Gabriel 825.050 Jarbas Passarinho 482.969 Brancos 13.715 NutaflHH 139.660 Comparecímento 1.461.394 Abstenção 1.112.185 Aptos totalizados 2.573.579 Aptas-PA 2.783.131

RO Raupi PMDB

TO

MT Dante

PDT

MS Martins PMDB

PPR

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Maguito PMDB.

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Esquerda x Cidadania

Não ter percebido o plano Real como linguagem, limitando-se a vê-lo cartesianamente como instrumento econômico e político, foi fatal. Ao não dialogar na mesma sintonia, ao não se solidarizar com a esperança e não oferecer os resultados concretos obtidos em suas adminis- trações, a esquerda assumiu a postura "do con- tra" e desconstítuiu toda a imagem do compro- misso popular de Lula erguida com a linguagem das caravanas.

Mas tudo isso já passou. Agora, o que interessa é aprofundar a reflexão sobre as mudanças necessárias. Antes mesmo do segun- do turno. Lula já se manifestava favorável às alianças que, de fato, ocorreram, e se disse pes- soalmente empenhado em traduzir para a estru- tura partidária a expressão das urnas, quando.

mais uma vez, os moderados, como são chama- dos pela imprensa, tiveram grande vatagem sobre os representantes das correntes radicais.

Uma outra maneira de abordar esta polêmica é perguntar como os partidos progres- sistas podem compatibilizar utopia e resultados. Ou seio, nunca estar tão longe dos princípios que possa comprometê-los e desfigurar-se, mas tam- bém nunca tão perto, que lhe impeça enxergar caminhos pragmáticos de obtenção de resultados que sirva de linguagem junto à opinião pública na construção de uma mentalidade democrática e humanista.

No Pará, as circunstâncias da eleição de Almir Gabriel confirmaram as tendências nacionais. A não eleição de figuras como Passarinho e Alacid Nunes, a vantagem nada fol- gada de Jáder em sua eleição ao Senado e o desempenho de Valdir Ganzer, candidato do PT ao governo, ratificam o movimento ao centro.

Contudo, o quadro da Assembléia Legislativa, onde permaneceu quase inalterada a hegemonia conservadora no Estado, coloca à esquerda o alerta de que o descompasso entre a tendência nacional e o desempenho regional impõe uma revisão de posturas e projetos. Posturas que vão desde o tratamento equivocado dado aos alia- dos, marcadamente pelo PT, até à priorização dos interesses particulares das tendências sobre os dos coletivos dos partidos.

Se o PT tivesse uma outra história de alianças que não a que empurrou o partido ao isolamento em que caiu nestas eleições, provavelmente teria disputado o segundo turno. Os movimentos para a sucessão na prefeitura de Belém já começaram, e só terá chance quem souber costurar alianças por dentro do jogo políti- co, contornando princípios e resultados, identi- dade e pluralidade, convicção e tolerância, enfim, a democracia.H

1 SCuíra

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BANCADA DO PARA SENADORES Wilmor Freire (PMDB)

Antônio Armando (PMDB)

Martinho Carmona (PSDB)

17.623

Coutinho Jorge e Jáder Barbalho (PMDB) 17.432

15.367 Ademir Andrade (PSB)

ZenoVeloso(PPR) 14.894

Isane Monteiro (PMDB) 14.495

DEPUTADOS Antenor Bararu (PPR) 13.779

FEDERAIS Ronaldo Passarinho (PPR) 13.212

Aloísio Lopes Chaves (PMDB) 13.027 Elcione Barbalho (PMDB) 153.906 Nivaldo Soares Pereira (PPR) 13.009 Raimundo Santos (PPR) 49.393 Fernando Bahia (PPR) 12.441 AnivaldoVale(PPR) 40.898 Herundino Moreira (PMDB) 12.355 Benedito Guimarães (PPR) 34.728 José Nassar Neto (PMDB) 12.235

Elza Abussafi Miranda (PP) 12.180 Paulo Rocha (PT) 33.188 Rosa Hage (PMDB) 11.940 Gérson Peres (PPR) 32.660 Antônio Racha (PMDB) 11.931 José Priante (PMDB) 31.923 André Dias (PFL) 11.634 Ana Júlio Carepa (PT) 31.108 José Carlos Lima (PT) 11.400 Paulo Titan (PMDB) 26.487 Manoel Carlos Antunes (PMDB) 11.012 Hilário Coimbra (PTB) 25.494 Joaquim de Lira Maia (PFL) 10.945 Antônio Brasil (PMDB) 24.704 ClécioWiteck(PDT) 10.819 Nicias Ribeiro (PMDB) 24.441 Zenaldo Coutinho (PTB) 10.753

22.249 João Batista Araújo (PT) 10.527 Vic Pires Franco (PFL) 21.507 Luiz Otávio Campos (PFL) 10.502 Olávio Rocha (PMDB) 21.381 Cipriano Sabino (PPR) 10.184 Ubaldo Corrêa (PMDB) 20.477 Haroldo Tavares (PPR) 10.079

José Geraldo Torres (PT) 10.028

DEPUTADOS Duciomar Casta (PP) 10.001

ESTADUAIS Maria de Lourdes Lima (PSDB) 9.703 Naé Polheto (PTB) 9 546

José Neto (PPR) 27.717 Raimundo Luiz Araújo (PT) 8.866

Bira Barbosa (PMDB) 19.534 José Marcelo Bonatto (PL) 8.755

LuizSefer(PL) 18.823 Matildo Dias da Silva (PDT) 8.655

Mário Couto (PMDB) 18.808 Mário Aparecido Moreira (PDT) 8.647

Edilson Abreu (PMDB) 18.584 Gedeão Chaves(PP) 7.813

Gervásio Bandeira (PMDB) 17.715 Nadir Neves (PL) 5.935

CONGRESSO NACIONAL SENADO CÂMARA

PMDB - 22 PP-5 PMDB-107 PP-37 PFL-17 PSB-1 PFL-89 PSB-16 PSDB-11 PPS-1 PSDB-63 PL-13 PPR-7 PL-1 PPR-51 PC do B-10 PDT-6

PT-5

PTB-5

Obs; A eleição 94

recompôs 2/3 do Senado, os outros 1/3 só em 98.

PDT-33 Pr-49

PTB-31

PMN-4

PPSePSC-2

PRN,PRPePV-l

EVANGÉLICOS MULHERES

Senadores - 4

Deputados - 22

Obs.: 6 ligados ao Bispo

Edir Macedo

Governadora -1 (Roseana Sorney, primeira

mulher eleita para o executivo)

1990 - 28 deputadas e 3 senadoras

1994 - 32 deputadas e 5 senadoras

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Em busca da pedagogia da esperança Desafios pedagógicos diante do neoliberalismo

Danilo Streeck*

*0anilo Streeck, educador e pastor da Igreja Luterano

Devido às circunstâncias do crescimento do neoliberalismo, devemos abordar a questão da modernidade, pós-moder- nidade e até as utopias. Recentemente,

tentei trabalhar a questão "educação e utopia", isso numa época que alguns procla- mam o fim das utopias. Temos que enfrentar estes desafios, se quisermos chegar a algumas conclusões.

A dominação, que se encontra com uma nova cara, veio a tona com o massacre da Candelária, e é um sintoma da nossa reali- dade. Por muitas pessoas, o massacre foi encarado como um fato que tinha que aconte- cer, onde ninguém poderia fazer nada, e, além

de tudo, foi visto como uma saída para elimi- nação de menores, supostamente infratores.

A violência não chega a tanto nos demais países da América Latina, mas essa reali- dade não é tão diferente em países que são mostrados para nós como exemplo de uma sociedade ideal. Como exemplo, podemos destacar a Bolívia, festejada como um modelo do neoliberalismo, que passa por um processo parecido com a nosso. A última vez que estive em La Paz, estava acontecendo uma greve de professores que já durava um bom tempo, a polícia preparava-se para invadir um prédio onde estavam professoras fazendo greve de fome, e isto provocou uma discussão para saber se era permitido ou não a invasão dos policiais, já que esta não é uma atitude dos neoliberais. Mas não era apenas esta manifestação que estava acon- tecendo no país: os estudantes também faziam suas reivindicações.

Um outra dado é que, na Bolívia, 88% do comércio é informal, o que não fica dis- tante da nossa situação. A verdade é que as informações que chegam até nós desses países penetram no Brasil trabalhadas para mostrar uma realidade que não existe. Isto foi observa- do também no Chile, e, se nos fossem forneci- das as informações precisas do que está aconte- cendo lá, teríamos certeza que o povo chileno passa por situações parecidas com as do povo brasileiro. A realidade educacional apresenta estes mesmos dados, tanto com relação ao anal- fabetismo quanto ao fracasso ou exclusão de escolas.

Isso tudo serve para analisarmos os tipos de imagens que se encaixam para carac-

*C'

terizar o fenômeno do neoliberalismo. Juntei algumas imagens que fogem a definições, e elas parecem até imprecisas como características próprias do neoliberalismo, que se apresenta sem deixar claro quem é amigo ou inimigo, mas ajuda a compreender o imaginário contido nesta doutrina.

A imagem da exclusão

0 extremo desta imagem é natural- mente a eliminação física - a chacina, por exemplo. Mas há análises que mostram a questão da opressão como se o seu conceito fosse transferido para a idéia de exclusão, mar- ginalização, para caracterizar o momento.

0 neoliberalismo é julgado por alguns como um gigante de barro, que tem os seus dias contados, que não exerce o seu domínio, o

seu tempo. Por isso, seria melhor esperar por sua auto-solução. Outra imagem forte, e até de mal gosto, usada para caracterizar o neoliberalis- mo é a imagem do cavalo e do pardal. Os paí- ses ricos do primeiro mundo são os cavalos, que passam comendo os pastos bons, enquanto os pardais vem atrás e se contentam com o que sobra dos excrementos dos cavalos. Com isso, tentam caracterizar a situação em que vivemos. Esta é uma análise da preponderância dos capi- tais estrangeiros dos países ricos diante dos paí- ses pobres.

Deve-se fazer uma profunda crítica da questão do neoliberalismo, da modernidade e pós-modernidade. Tanto a liberalismo quanto a proposta socialista são frutos da modernidade. 0 que acontece é que este tipo de racionalidade que caracterizava a modernidade se esgota. A pós-modernidade é qualitativamente diferente da

modernidade, porém poucos sabem o que é ou como é.

Neoliberalismo e educação

A análise que comumente se tem da educação está baseada na teoria da dependência do Terceiro Mundo em relação ao primeiro. A maioria usou este tipo de referencial, mas, depois, produziu-se pouco em termo de reflexão. Há a necessidade de se fazer uma nova leitura educacional. Se olharmos Paulo Freire na "Pedagogia do Oprimido" e na recente "Pedagogia da Esperança", vemos que, na ten- tativa de fazer uma releitura do período e passar para outro e fazer uma leitura diferente, Paulo Freire faz uma crítica aberta aos intelectuais que se deixaram domesticar pela sonoridade de cer- tos discursos do neoliberalismo, discurso da com- ►

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20Cuíra

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petência, da qualidade total, de competitivi- dade, entre outros, que ele não vê como o cami- nho. Ao mesmo tempo, ele diz que é preciso fazer uma releitura da"Pedagogia do Oprimido", que se deve educar a esperança, e não educar para a esperança. Diz que se trata de uma questão antológica de ser homem ou mulher. Esperança a gente tem e pronto, mas ela pode ser frágil, desviada e por isso deve ser educada.

Certamente, isso muda a tipo de análise que ele faz do processo educativo. Freire lança um discurso mais irado, uma ira justa de contestação, confronto, para, na verdade, pu- blicar uma tese que é muito mais curativa para dentro da sociedade, porque, segundo ele, este é um momento também de cuidar das feridas, isto é muito forte no discurso de Paulo Freire e na sua releitura.

Com este exemplo, o que muda em termos educacionais em nossa situação? Como resposta, podemos dizer que, a nível estrutural, diminui a necessidade da educação generalizada enquanto simples preparação de força de traba- lho para fazer as máquinas produzirem - even- tualmente, um número limitado de escolas pode até produzir operários treinados e mais capacita- dos para fazer as máquinas funcionarem. No entanto, a preocupação não é mais com a for- mação de exército de reserva, mas com a afir- mação daqueles que são literalmente massas sobrantes dentro da economia, tanto como con- sumidores quanto como produtores. A nossa situ- ação no Brasil é acompanhada no campo político pelo enfraquecimento do sistema de ensino público, e essa é a realidade de toda América Latina. É o desmantelamento do sistema de ensino público. Não se trata de levantar a questão da eficiência ou ineficiência das escolas públicas. 0 problema que se coloca, e que acon- tece em todo o mundo, até nos países ricos,é que a educação pública de fato gerenciada pelo

Estado tem sido muito importante para a consti- tuição da prápria nacionalidade e da cidadania.

A política neoliberal pode representar mais uma dificuldade para os países latina ame- ricanos, que sempre tiveram uma independência precária e uma nacionalidade inconcluída, isto é, nás não admitimos os povos da América Latina enquanto povos. A questão é que o sistema edu- cacional tem que ter uma eficiência em termos produtivos e econômicos. Por exemplo, uma revista americana, fazendo uma análise da situ- ação do mercado de trabalho, disse que, em dez anos, o profissional está com sua formação defasada, ou seja, a cada dez anos há uma mudança que o torna obsoleto. A reportagem mostra, como exemplo, uma fábrica da Toyota altamente informatizada e com idéias de fazer carros personalizados, mas ainda sem o pessoal qualificado. A partir da informatização, os japoneses tiveram uma base educacional que os levaram a outro campo de trabalho, possibilitan- do à sociedade ter uma infra-estrutura econômi- ca capaz de agilizar outro tipo de sobrevivência para essas pessoas.

Diante disso, temos que assumir o desafio de fornecer a base educacional necessária para a nossa população.

O conhecimento mediado pela experiência

0 liberalismo clássico se associa aos nomes mais importantes da tradição pedagógi- ca, como John Lacke e Rosseau. E isso nos leva a ver como a política está associada a isso.

John Lui analisa o que significava liberdade na original tradição liberal. A tradição liberal americana e inglesa põe o conceito de liberdade ligada à individualidade, e a tradição liberal européia está associada mais à nacionali- dade: "São livres aqueles que são governados

pela razão." Essas maneiras de conceber a liber- dade têm suas implicações na organização da vida da sociedade.

Na primeira versão, legitima-se o direito de um indivíduo dominar o outro, acen- tuando o sentido de individualidade. No princípio jurídico formal, não leva em conta se as condições presentes proporcionam uma liberdade de fato ou se o contrato é estabelecido por força. É mais ou menos uma liberdade formal, mas que submete pele força uma das partes no contrato social. Por esse motivo, Lui falava da necessidade de controle, mesmo confessando ser um liberal. Ele parte do princípio de que quem foi revolucionário em um século pode ser hoje muito reacionário.

Na segunda versão de liberdade (européia), que enfatiza a nacionalidade, facil- mente se chega a legitimar o Estado totalitário, que representa e incorpora a vontade de todos os indivíduos. Lui faz essa crítica em cima do Nazismo: para ele, não tem ditadura mais deslavada do que aquela que se auto-proclama representante da vontade de um povo. 0 impor- tante é o fato dele indicar essas duas tendências e remeter às fontes, como Rosseau e Locke, cujas idéias seriam desvirtuadas pelo liberalismo. Há, nesses autores, idéias que de uma forma ou de outra foram importantes na tradição pedagó- gica e que ainda hoje podem nos ajudar.

Em Locke, uma das idéias centrais é o desenvolvimento da capacidade de pensa- mento autônomo. Até o título do texto dele "De como conduzir um pensamento para chegar à conclusão verdadeira" serve para a gente superar o nível de opiniões. Locke começa negando a existência de idéias inatas, mas não negou que houvesse a estrutura do pensamento. 0 conhecimento, segundo Locke, é mediado pela experiência. A explicação da teoria do conhecimento na política e na religião

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é a luta de Locke em favor da tolerância. Por este princípio, ele é capaz de condenar uma igreja hierárquica, porque não existe uma ver- dade de cima para baixo, pró-determinada, se não existem verdades inatas. Por isso, politica- mente, também não se justifica a dominação de uns sobre os outros.

Segundo Rosseau, a natureza cria os homens iguais, as diferenças são produtos da sociedade e o ser humano possui sempre uma pró-disposição natural positiva. Independente disso, da visão positiva ou nega- tiva, o importante é que vejamos que de qual- quer forma os homens nascem iguais e, por isso, se compreende porque Rosseau foi conde- nado na sua época. Hoje, as idéias desses autores são levantadas para justificar uma posição liberal, de liberdade total da domi- nação de um sobre o outro.

Nesse sentido, deve-se dar importân- cia para esse fato histórico, já que suas teses são de uma época marcante da evolução humana, a Revolução Francesa, o lluminismo, entre outros acontecimentos que firmaram a idéia de cidadania. É importante resgatarmos essas idéias, porque participamos da mo-

dernidade e fazemos parte dessa história, mesmo que seja sofrida e com conseqüências desagradáveis.

A questão mais técnica, episte- mológica, do conhecimento se tornou impor- tante para nós porque, partir dela, pedagogica- mente, podemos atuar politicamente, dando a noção de conhecimento. 0 conhecimento está no centro do processo educativo, em qualquer circunstância: o conhecimento enquanto saber acumulado na história, enquanto processo de idéias. Quando se fala de conhecimento, a questão pedagógica e educacional estão muito próximas uma da outra. A idéia de liberdade é, no fundo, associada à idéia de conhecimento, é a chave para o processo educativo. Não se sabe que conseqüências o desmantelamento do sistema do ensino público tem para os países da América Latina.

Não há uma proposta para a edu- cação diante do quadro neoliberal. 0 que há é um desafio de pesquisa e de estudo. Olhando a partir da nossa sociedade, tanto os sujeitos tradicionais quanto os sujeitos sociais emer- gentes precisam construir uma proposta de edu- cação básica de fato, fundamentalmente para

a sociedade brasileira. Temos que olhar o co- nhecimento já produzido, vendo que teorias epistemológicas estão por três dele. Nós temos a tarefa de recuperar a história, e - insisto nisso - ela pode nos ajudar a avançar rumo a essas propostas.

Olhando a atuação de Paulo Freire, vemos que ele está em busca dessa releitura histórica. Em "Pedagogia da Esperança", ele, no fundo, está acertando de novo em uma veia importante, assim como acertou em Pedagogia do Oprimido. "Pedagogia da Esperança" é um momento em que aparecem paradigmas novos, modelos novos, ou então novas propostas que estão na mesa. A obra de Paulo Freire é uma tentativa de se reintegrar num novo momento, mesmo que ele não tenha uma proposta revolu- cionária. A diferença mais clara entre tais publi- cações é que, enquanto a "Pedagogia do Oprimido" está dentro de um contexto de mais certezas, a "Pedagogia da Esperança" está num contexto de busca dentro de uma realidade que se apresenta diferente, não apenas quantitativa- mente, mas também qualitativamente. Dialeticamente, a força da educação está exata- mente na fraqueza dela.B

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Mobilização e solidariedade:

A sociedade reage contra fome e a miséria a

Elias Araújo *

Tudo começou com reações contra a corrupção e a impunidade, somou-se à indig- nação geral contra a miséria que atingia milhões de excluídos e transformou-se em um movimen- to nacional que mistura solidariedade e exigên- cias de políticas concretas que combatam as causas conjuturais e estruturais da fome e da miséria. No início de 1993, o Movimento pela Ética

na Política - que havia se firmado na luta contra a corrupção e pelo impeoch- menfdeCollor, em 1992-decidiu, com

base nos dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) que apontavam a existência de 32 milhões de pessoas abaixo da linha de pobreza no Brasil, instituir a Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e pela Vida. 0 movimento surgiu destinado a sensibilizar, mobilizar e comprometer pessoas e instituições para o combate à fome e à miséria, dando a esta questão um tratamento de prioridade nacional e desenvolvendo ações de caráter emer- gencial e de combate às suas causas estruturais.

A proposta da Ação da Cidadania difundiu^ em Belém através de várias iniciativas, como as promovidas por ONGs paraenses, como a Fase (Federação de órgãos para a Assistência Social e Educacional) e a Unipop (Universidade Popular), ambas filiadas à Abong (Associação Brasileira de ONGs), que, em maio de 1993, realizaram reuniões para discutir a proposta e ado- tar medidas para difundi-la. Um mês depois dessas primeiras articulações, foi realizado em Belém o Seminário Fome de Belém, coordenado pela vice-Prefeitura de Belém, que reuniu cerca de

26Cuíra

300 pessoas e resolveu constituir um fórum pa- ritário integrado por 28 instituições da sociedade civil e dos poderes públicos. Tal fórum, entretan- to, não chegou a se firmar, desestruturando-se ainda em 1993.

Apesar do fracasso inicial desse primeiro esforço conjunto com o Poder Público, as entidades civis não desistiram da idéia de levar adiante a proposta. E, a partir de articu- lações promovidas pela Fase e Unipop, foi cons- tituído, em Belém, o primeiro Comitê Cidadania, composto exclusivamente por entidades e orga- nizações da sociedade civil com tradição no movimentos sociais, a exemplo de CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), CUT (Central Única dos Trabalhadores), OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), CBB (Comissão dos Bairros de Belém), Movimento Nacional do Meninos e Meninas de Rua, CEPEPO, Espaço Cultural Nossa Biblioteca, CRB (Conselho dos Religiosos do Brasil) e APC (Associação Popular de Consumo), além da Unipop e Fase. Da proposição à ação, o comitê não perdeu tempo, e logo uma primeira atividade foi desenvolvida: um levantamento sobre a Fome nas áreas pe-riféricas de Belém, como os bair- ros do Guamá, Jurunas, Terra Firme, Benguí, Vila da Barca, Curió, Cabanagem, Brasília, etc. A mobilização em torno dessa atividade provocou a criação de novos comitês cidada- nia em alguns desses bairros.

Ainda em 1993, no mês de setembro, apoiando iniciativa da Missão Baixo-Amazonas da Igreja Adventista do 75 Dia, o Comitê Cidadania de Belém participou da promoção Kilo do Amor,

que mobilizou milhares de pessoas durante 15 dias, terminando com uma grande concentração evangélica que reuniu cerca de 40 mil pessoas no Estádio Mangueirão. Nesse ato, foram arrecadadas 36 toneladas de alimentos, que foram distribuídos em cestas básicas a famílias previamente cadastradas pelos comitês.

Animados com os resultados extrema- mente positivos dessa mobilização nacional contra a fome e a miséria, outras entidades e até empre- sas resolveram participar com novas iniciativas. Foi o que fizeram o Dieese-PA e o Sistema Rômulo Maiorana de Comunicações, que pro- moveram o Show da Vida, que teve a partici- pação de dezenas de artistas locais e arrecadou várias toneladas de alimentos e dinheiro para pro- jetos de combate à miséria (oficinas, hortas comu- nitárias e marcenaria), desenvolvidos em parceria com entidades e empresas, como a República de Emaús, Igreja Luterana e Petrobrás.

A partir daí, os atos e eventos volta- dos ao combate à fome e à miséria aconteciam à medida que novos segmentos sociais organiza- dos aderiam ao movimento. No dia 17 de novembro, o Comitê Cidadania, com apoio da CUT e CBB, realizou o Grito da Cidadania em

Belém, quando foram entreguem às secretarias estaduais e à Prefeitura Municipal propostas para o combate à fome e à miséria e para a melhoria da qualidade de vida da população da cidade. Até março deste ano, várias reuniões acontece- ram entre o comitê e representantes do Poder Público com esse objetivo. Ainda no final de novembro do ano passado, dois representantes do Comitê Cidadania participaram da primeira reunião preparatória da Conferência Nacional de Segurança Alimentar, que aconteceu, em Brasília, em julho de 1994. Confirmando o crescimento da mobilização local, alguns comitês

"A luta pela cidadania conseguiu mobilizar

pessoas e instituições que jamais haviam

participado de eventos semelliantes,

destinados a estabelecer prioridades de

políticas públicas para a sociedade e para os

governos. A experiência de se trabalhar com a

diversidade de convicções políticas,

religiosas e culturais foi

inovadora para a democracia."

cidadania de bairro e de estatais (Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal) organizaram, em dezembro, a programação Natal sem Fome.

A partir de janeiro de 1994, todas os esforços do Comitê Cidadania se voltaram para divulgar a proposta e sensibilizar as entidades e instituições sobre a 1 Conferência Nacional de Segurança Alimentar (CNSA). No dia 22 de fevereiro, na sede da OAB, com a participação de 70 representantes de instituições, foi convocada a 1 Conferência Estadual de Segurança Alimentar. Ainda naquele mês, numa segunda plenária na OAB, à recém constituída Comissão Estadual de Segurança Alimentar - Coesa veio se somar a organização das conferências municipais e estad- ual, constituindo-se, a partir daí, junto com o Comitê Cidadania, o Comitê Coordenador das Conferências de Segurança Alimentar no Pará.

0 processo de convocação, organiza- ção e realização das conferências municipais conseguiu mobilizar pessoas e instituições que jamais haviam participado de um evento político semelhante, destinado a estabelecer prioridades

de políticas públicas para a sociedade e para os governos. A experiência de se trabalhar com a diversidade de convicções políticas, religiosas e culturais foi, e continua sendo, inovadora para a democracia, uma das maiores conquistas da I CNSA. Entretanto, é preciso destacar que algu- mas entidades gerais jamais chegaram a com- preender o sentido estratégico da Ação da Cidadania e da I CNSA. 0 máximo que con- seguiram foi se fazer representar no Comitê Cidadania, sem, todavia, envolver-se e dar priori- dade a esta questão. Muitos se perderam em longas e estéreis discussões sobre o "emergen- cial" e o "estrutural". Outros nunca compreen- deram a diferença entre uma ação solidária e cidadã e o assistencialismo.

Dada a dimensão do Estado do Pará, priorizou-se a realização de conferências nos municípios maiores e mais populosos. Ao todo, foram realizadas 30 conferências municipais, abrangendo todas as regiões administrativas do Estado. A conferência estadual foi realizada com 200 pessoas, incluindo delegados e represen- tantes de instituições civis e públicas. Neste processo, o Comitê Cidadania firmou-se como Comitê Estadual. 0 Pará participou da I CNSA com 70 delegados e convidados. Das conferên- cias municipais e da estadual saíram as pro- postas da Ação Cidadania Pará, que agora estão sendo encaminhadas e cuja implementação depende do emprenho de cada comitê e pessoa. Constitui, certamente, o conjunto abrangente de proposições para políticas públicas, o mais repre- sentativo possível da sociedade e das organiza- ções públicas do Estado do Pará. ■

* Elias de Paula de Araújo é membro da Executiva Estadual do Comitê Cidadania

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Se Jesus estava certo quando disse "Seja feliz convosco", podemos interpretado como uma pessoa realista. Mas isso é dentro do que existe na tradução do Novo Testamento.

0 Código da Aliança, o Antigo Testamento, diz que, enquanto existir empobrecimento, é sinal que não há aliança perfeita entre Javé (Deus) e o povo, devido ao consumo que não agrada. Esse é um conceito relativo que faz existir um pobre em relação ao complemento de um rico. Quando Jesus disse "Seja feliz convosco", quis dizer que não é possível acabar com os problemas na vida. Ou seio, a impossibilidade de construir a plenitude e o paraí- so a partir de você.

A economia está na linguagem rele- vante da Teologia. Na Igreja, fala-se da salvação eterna, enquanto na economia se fala que é pre- ciso fazer sacrifício, como condição para se chegar ao bem comum. Pelo esquema mental comum, para se chegar à salvação eterna, temos que passar pelo sacrifício. Mas, por que temos que passar por sacrifícios para chegar ao paraíso? Isso é meio esquisito, e o pior é que as pessoas aceitam isso sem questionar, porque já aprenderam desde cri- ança que, para chegar a um lugar bom, é preciso sofrer. Diante disso, a teologia da retribuição conclui a questão: quem está bem de vida é porque já pas- sou por sacrifícios.

Esse espírito sacrificialista também tem presença nas esquerdas: a luta não vale a pena em si, mas vale pelo que se vai ganhar, mesmo que seja com sofrimento - o que vale a pena, porque se ganha. Essa visão sacrificial faz a gente ter a vitória certa para o sofrimento que a gente está passando, porque fazemos um sacrifí- cio para contar vitória, ainda que não se possa gozá-la. Isso é muito comum na esquerda. Por exemplo, o pessoal da esquerda não vai a um bom restaurante com medo de que o agricultor o veja. Isso é um sacrifício da esquerda, que, no entanto, não deixa de ser uma atitude superficia- lista. A verdade é que a esquerda quer mostrar que está bem porque está sofrendo e quer que outros saibam do seu sofrimento. Por exemplo, na década de 70, havia um grupo de mulheres operárias e estudantes da universidade e, nas reuniões, nós poderíamos ver claramente quem

*lung Mo Sung, coreano naturalizado brasileiro, é mestre em Teologia Moral e doutor em Ciências da Religião

28Cuíra

era operária e quem era estudante: a primeira estava bem vestida, enquanto que a segunda estava mal vestida. As operárias não podiam andar todo tempo bem vestidas, por causa da grana e também porque o trabalho não permitia, mas as estudantes, que tinham o conceito de que para ser revolucionários teriam que se travestir de feio, andavam mal vestidas.

O sacrifício e o paraíso

Tudo que foi dito até aqui faz parte da cultura do sacrifício, que está presente na cultura da teologia capitalista, que diz ser preciso passar

estão bem, que, logicamente, se chama bem comum, o qual constrói o amor ao próximo. Então, o paraíso é nada mais que amor ao próxi- mo, que é o bem comum, que tem como camin- ho a concorrência, ou seja, o egoísmo.

Um bispo anglicano disse que "0 problema da humanidade foi ensinar as pessoas amar ao próximo para que a comunidade pudesse viver bem. Amar ao próximo é muito difícil e a gente estava fazendo as pessoas amarem ao próximo para a comunidade viver no bem comum." Diante disso, resolveu-se um problema, porque a solução não é pedir que as pessoas amem ao próximo, o que é difícil, e sim

andonar É preciso ai

a teologia do sacrifício Jung Mo Sung4

pelo sacrifício para chegar ao paraíso. Isso é a sus- tentação da igreja ocidental e em algumas facções esquerdistas. 0 sacrifício faz parte da tradição ocidental grega, que, há séculos atrás, usava a ovelha para o sacrifício. Ensinaram-nos que o sacrifício é necessário porque está ligado a uma lei: você não quer, mas precisa, e o que obriga é essa lei. Em relação a isso, os economis- tas dizem o seguinte: "São as leis do mercado". E o mercado que nos pede esse sacrifício, que acontece no campo da promessa, porque quem leva ao paraíso é o mercado.

Siga esse raciocínio: a concorrência é uma relação onde cada um busca o seu inte- resse próprio, que se chama egoísmo. Quem é solidário não tem noção de concorrência. Portanto, não é egoísta. Paraíso é onde todos

pedir para que sejam egoístas, mas desde que na área do mercado, que se resume no "cada um por si e Deus para todos."

Quando se diz que o mercado é mão invisível é porque pega o egoísmo e o transfor- ma em amor ao próximo. Este fato se chama providência divina, que lembra a teologia da providência, que pensou isso no conceito de mão invisível. Esta é a teologia fundamental no sis- tema de mercado. Isso não quer dizer que seja teologia, mas, para quem entende de teologia, isto é teologia, porque o mercado está acima dos seres humanos e pede sacrifício a você para poder chegar ao paraíso. É capaz de transformar egoísmo em amor.

Marx diz que isso não funciona porque o ser humano deixa de ser condutor da

história, conduzindo-se a partir do mercado. Assim, as pessoas passam a existir em função do mercado, que passa a dirigir a vida das pes- soas, mas isso não as leva ao paraíso.

E o que leva ao paraíso? Aí é que vem a proposta socialista. Há duas teorias da re- volução dentro da fonte marxista, que é impor- tante para entender a dinâmica das ONGs e das pastorais sociais das igrejas cristãs. Marx disse que o modo de produção, a dinâmica da história, divide-se em duas partes: forças produtivas (tec- nologia, mão-de-obra e natureza) e relações soci- ais de produção. Isso funciona da seguinte forma: as relações sociais de produção - senhor e escravos, capitalistas e operários - têm que ser estáticas, porque em nenhum momento os se- nhores querem perder o seu privilégio, mas, nessa história, as forças produtivas tendem a ser dinâmicas e, quando chega um certo momento, elas causam ruptura. Marx dizia que a revolução social altruísta só se daria nos países capitalistas avançados, onde as relações sociais não contam mais. 0 primeiro, dizia ele, seria a Inglaterra e o último, o Rússia. Partindo dessa lógica, Lenin deu ênfase às relações sociais de produção. Verifica- se, com isso, que a ênfase de Marx é na econo- mia e a de Lenin, na política. Quando se coloca capitalistas X operários, vê-se estes sem consciên- cia de classe, mas quando os trabalhadores descobrem que seus interesses não estão no capi- talismo, e sim no socialismo, eles transformam a "consciência em si" para "consciência para si." Descobrindo os seus interesses, eles vão se orga- nizar e tomar o poder dos capitalistas e do Estado, controlando as forças produtivas e desen- volvendo-se rumo ao socialismo.

O conhecimento como negócio

Os seres humanos têm hábitos e necessidades que são mais ou menos cons- tantes. Mas não apenas necessidades: também têm desejos. No sistema de mercado, diz-se que quem tem dinheiro quer comprar, diferente do sistema socialista planificado, que é mais levado à ação política. Por exemplo, em Cuba, aconteceu a insatisfação do desejo não realiza- do, porque o ser humano não é só saúde - estômago - saúde. Isso é um problema estru- tural, de um modelo socialista que se implan-

tou, que é o de não dar para planificar a satis- fação do desejo, porque é muito lento e os desejos mudam rapidamente.

Não dá para acabar com a autono- mia do mercado e das empresas privadas. 0 ser humano vive em função de fantasias, de dese- jos. Portanto, sempre haverá um grupo que tem autonomia de decidir o que fazer, seja tendo lucro ou prejuízo. Se não tem autonomia, ninguém decide e, se não tem possibilidade de ganhar, ninguém vai arriscar, e assim por diante. Não dó para existir uma sociedade cultural mo- derna sem Estado e sem mercado. Hoje, o importante não é ter bens materiais, mas ter conhecimento, porque a forma de ganhar di- nheiro é transformando o conhecimento em negó- cio. Na abertura do seminário, foi colocado com orgulho o lançamento do Caderno de Formação NQ17. Isso é conhecimento, porque se aprendeu a trabalhar com programação sofisticada, e o padrão de normalidade subiu muito em termos gráficos. Isso é conhecimento. 0 modelo soviético ruiu porque não conseguiu acompanhar o desen- volvimento tecnológico do ocidente.

Partindo daí, o mercado não é divino e nem satânico: foi o caráter idolátrico que o divinizou. Ele é uma instituição humana, e assim tem de ser visto. Errado é os neoliberais que- rerem divinizar o mercado, e igual erro comete quem quer satanizá-lo.

A palavra socialização é, hoje, tão vazia. Não dá para planificar ou estatizar tudo. Isso não funciona mais. Não dá para milhões de pessoas decidirem numa empresa. Essa autono- mia de decisão caberá sempre a alguém. Dentro da perspectiva que o mundo moderno tem, gostamos de ser progressistas. 0 mercado nos leva ao paraíso, as idéias de vanguarda nos levam ao paraíso. 0 que o Estado tem de fazer, se nós construímos o reino de Deus? É por isso que pastores têm dificuldades de falar de Deus na modernidade. 0 povo reclama por não se falar de Deus e a gente assumiu uma lógica histórica de pensar em Deus. Antes, tudo depen- dia de Deus. Hoje, depende de nós. Mas, se não dá certo, a culpa é minha?

"Vocação" agrícola do Brasil

A história econômica brasileira passa em três marcos: 1945,1973 e 1982.0 proces-

so de industrialização começa no século passa- do, ganha um pouco mais de impulso na I Guerra e se intensifica mais tarde com a II Guerra. Antes disso, o modelo econômico era o agro-exportador, como dos demais países latino- americanos, onde a exportação de matéria-prima era a principal fonte econômica. 0 Brasil era exportador de café no início do século, passando pela fase do açúcar e da borracha. A lei dessa época era que os países coloniais exportavam produtos agrícolas e importavam máquinas. Nesse período, fazia-se uma idéia bem religiosa dessa atividade: o Brasil tinha "vocação" agríco- la. Se, por "vocação", estávamos destinados à exportação de produtos agrícolas, isso significava que cabia aos outros países a "vocação" industri- al, que nos forneceriam bens industrializados. Na dinâmica de mercado, como na produção agrícola, permanece o controle da elite, e é ela que decide importar os bens que deseja, porque a elite tem como desejo imitar o consumo da elite do Primeiro Mundo. 0 desejo de imitação do Primeiro Mundo é a marca fundamental do planejamento econômico.

No período que antecede a II Guerra Mundial, essa dinâmica é ameaçada ao se desco- brir a possibilidade desse modelo agro-industrial crescer no país, o que leva à adoção de um mode- lo de substituição de importação. A ideologia que norteia a substituição da importação ficou conheci- da por "desenvolvimentismo". 0 mito do desen- volvimento alimentava a crença na possibilidade dos países subdesenvolvidos ficarem industrializa- dos, todos os países terão o mesmo padrão de consumo. Esse era o otimismo que movimentava o país. 0 caminho para isso era a industrialização. Então, a América Latina continuou a exportar pro- dutos agrícolas e a importar máquinas, e não ape- nas bens de consumo.

Há dois tipos de máquinas: aquelas que fabricam máquinas e aquelas que fabricam bens de consumo. As primeiras possibilitam mais autonomia, mas mais suma vez a prerrogativa de decidir caberia às elites, que continuam querendo imitar o Primeiro Mundo. Mas havia um problema estrutural: o mercado consumidor interno era pequeno, produzia-se em quantidade pequena, pois os produtos eram fabricados para a elite. Nesse circuito de produzir pouco para vender pouco, a economia não crescia no tama- nho esperado. A economia do Primeiro Mundo é

Cuíra29

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dinâmica, e instensifica-se ainda mais com o aumento da tecnologia. E as nossas elites querem acompanhar a tecnologia porque isso é novidade de consumo. Então, importa-se máquinas com mais tecnologia, capazes de pro- duzir o avanço, mas que provocam um mercado de trabalho restrito, afetando a vida do homem no meio social.

Como era preciso trazer máquinas e matérias-primas que não existiam no Brasil, era cada vez maior a necessidade de exportar produ- tos agrícolas e também fazer dinheiro para essas aquisições. Com isso, tem-se a seguinte dinâmi- ca: com o aumento da exportação de produtos agrícolas, surge o processo de tecnificação do campo, possibilitando uma mentalidade industri- al na cidade que é exportada para o campo e provoca inúmeras conseqüências sociais desagradáveis, como o êxodo rural e o baratea- mento da mão-de-obra, aumentando ainda móis o poder da elite. Com esse modelo, dizia-se que o Brasil ia exportar para todo o mundo, mas o resultado foi a transformação do país em um bolsão do Primeiro Mundo e a concentração do poder na mõo dos ricos. Daí se considerar que os golpes militares são, na verdade, um resultado "natural" da dinâmica contraditória que se implantou na América Latina.

Crescimento controlado

Com o advento da crise do petráleo (1973), um grupo de empresários pediu ao MIT - Instituto Tecnológico de Massachussetts que fizesse um diagnóstico da situação da economia munidal. 0 documento denominado "Os limites do crescimento" foi o resultado desse estudo, e mostrou que, se o padrão de consumo do Primeiro Mundo, que era imitado no Terceiro Mundo, se espalhasse para todos os continentes, o mundo teria um grave problema ecológico e sofreria a falta de recursos não renováveis. Assim, com esse documento, quebra-se o mito do desenvolvimento, que fez com que os grandes países ricos investissem em novas tec- nologias, novas fontes de energia, para diminuir a utilização de matérias-primas.

0 ganhador do prêmio Nobel da Economia, Frederico Raye, um dos pais do neoliberalismo, não pôde lançar nas décadas de 30 e 40 o seu livro porque todos diziam que ele era louco. Com isso, quero ilustrar uma mudança na mentalidade dos pessoas que afe- tou também no mundo do economia. Em 1982, estoura a crise da dívida externa, mudam os

SOCuíra

I "0 mercado não é divino

nem satânico. Ele é uma

instituição humana, e assim

tem de ser visto. Se é

verdade que os neoliberais

erraram ao divinizar o

mercado, o mesmo erro

comete quem quer

ialaniza-io."

.

fotos e a palavra chave deixou de ser "desen- volvimento" e passou a ser "ajuste", não mais "desenvolvimentismo", e sim "neoliberalis- mo." Por "ajuste" entenda-se diminuir o pro- blema econômico, cabendo ao FMI o gerencia- mento desse problema. A partir daí, a lei passo a ser "não gastar mais do que pode." Para ajustar a economia, é preciso diminuir a demanda. Todos - Estado, empresas e consu- midores finais - deveriam gastar menos. Mas empresas investem para aumentar a produção e vender mais. Então, se o sistema não con- segue proibir as empresas de investirir, o Estado e o consumidor final podem controlá-las com a diminuição do consumo. Menor consumo significa menor produção.

0 consumo do Estado pode ser dimi- nuído em três áreas: infra-estrutura econômica, máquina burocrática e investimento sociais. Uma conseqüência comum no ajuste é o achatamento do salário, que afeta consequentemente no poder de consumo, diminuindo o poder de importação e exportação. Então, a reação das pessoas é querer saber de quem é a culpa para esses problemas: do Estado?, do mercado? e assim sucessivamente.

0 discurso mais puro do mercado é do neoliberalismo, e Haye choma a atenção para o "pretensão do conhecimento": "A causa dos nossos problemas econômicos deve ser procura- do na pretensão dos economistas e políticos de conhecer a lei do mercado, de intervir na lei do mercado, para gerar um crescimento econômico artificial". 0 que quer dizer que a causa funda- mental do sofrimento das pessoas (a crise) é a pretensão de conhecer, que lembra muito a teologia do pecado original, que é o pecado de

querer conhecer. A saída, então, é a humildade diante do mercado. Não podemos ir contra a lei do mercado, porque ela nos castiga com a crise, já que o mercado está além das nossas forças e capacidade de entender. A dinâmica do mercado é a concorrência e a sobrevivência do mais forte, voltando assim ao discurso do sacrifício.

Se você diz que vai ficar todo mundo bem, intencionalmente ou não, você está dando a idéia da solidariedade, que é querer controlar a lei do mercado. Portanto, as pessoas que querem ser solidárias são pessoas que provocam crise econômica, são inimigas do mercado. A ideologia neoliberal coloca que o Estado é o maior culpado pela crise do país, e esso idéia penetrou em todas as camadas da população. Se afirmamos que o Estado é o grande inimigo, então o discurso neoliberal já penetrou fundo em nós.

Revolução tecnológica

Vivemos hoje a revolução tecnológi- ca, sustentada pela descoberta e aplicação de novas tecnologias. A primeira revolução foi a agrícola, que aconteceu há dez mil anos A.C. e vem até 1700 D.C. e que fez o sociedade per- manecer igual por quase dois mil anos. Mas com a segunda revolução, a industrial, esse fato histórico foi mudado, transformando-se ainda mais a partir de 1970, com a terceira revolução, iniciada com o aparecimento da informática. Para alguns, a revolução tecnológica acontece dentro da revolução industrial. Essa terceiro re- volução se dá em três áreas: informática e micro-eletrônica, biotecnologia e novos materi- ais. Esta revolução muda a noção de espaço e tempo, gera um novo tipo de trabalhador, que precisa de três características para trabalhar na área da informática: conhecimento da sua língua natal, conhecimento básico de álgebra e geome- tria e raciocínio lógico.

A palavra chave de economia hoje é "conhecimento." Só para se ter uma idéia, a pes- soa mais rica dos Estados Unidos, hoje, é dona da Microsoft. 0 mundo econômico está sendo gostado em três pólos econômicos: Europa (Alemanha), América (USA) e Ásia (Japão). Hoje, a interação não se dá mais entre as pes- soas: dá-se com produtos e equipamentos, com máquinas. Isso mostra o nível de concorrência e tecnologia no mercado. Por isso que o principal meio paro ganhar dinheiro é o conhecimento. As nossas análises, seja no campo do igreja ou no campo social, são sempre análises estruturais.

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que não chegam a enfocar como as pessoas reagem diante dessa situação, que, querendo ou não, antes de existir uma consciência de classe, de coletividade, existe a consciência individual. Diante disso, a abordagem antropológica mostra que o mercado funciona por ser um lugar de troca, na medida que você tem uma mercadoria para trocar, que pode ser por dinheiro ou traba- lho. Mas, o problema de tudo isso é que as pes- soas estão atrás ou abaixo da mercadoria, já que elas só entram na relação do mercado após entrarem as suas mercadorias. Hoje, até para paquerar, as pessoas têm de estar em relação com o mercado. Quando nós vamos a uma praça, dificilmente encontramos pessoas tentan- do conquistar umas às outras, porque o ponto agora são os bares que estão ao redor da praça, um ponto de consumo. Partindo daí, podemos concluir que você é gente na medida que se rela- ciona com gente, mas você só é gente na medi- da que tem dinheiro, mercadoria, ou seja, na medida que se relaciona com o mercado.

Após tudo isso, temos a idéia que a fonte da humanidade está na mercadoria. 0 que se coloca na religião é que o espaço sagrado, o templo, é o lugar onde se prega a humanidade e onde as pessoas encontram a sua humanidade, ou seja, a sua pureza. Mas deve-se ressaltar que isso acontece com a classe baixa, porque, hoje, as classes média ou alta, quando estão deprimi- das, procuram o shopping center, quando, há tempos atrás, iam à igreja. Mas a classe baixa procura hoje as igrejas pentecostais, porque "é o lugar certo, que resgata a humanidade." É essa espiritualidade que se faz no mercado. Quanto às igrejas pentecostais, elas ajudam os pobres a se defenderem da anulação do ser humano que não vive em relação com o mercado. Enquanto se vive a ilusão de que a saída está nas coisas e na maior sofisticação da mercadoria, as pessoas vão sempre achar que a solução está no merca- do, e que, portanto, o sacrifício é necessário, porque é isso que os fará chegar ao paraíso.

A questão da mais-valia na relação de mercado, no ponto de vista de Marx, já se encontra ultrapassada. Há uma visão religiosa em torno de Marx, por se achar que a visão marxista era a única certa e verdadeira. Agora, ao se descobriu seus erros, diz-se que não serve mais para nada. Mas, gostaria de destacar um ponto dentro da questão da mais-valia, que se refere à área pedagógica, já que neste setor tenta-se refletir e centrar o conceito marxista da mais-valia. Para mim, é um grande erro pedagógico, porque a mais-valia é um conceito

abstrato de Marx, e não se pode começar um trabalho popular abstrato, porque ninguém vende mais-valia: vende-se preço, salário. Mais- valia não é preço, nem lucro. Se mais-valia fosse lucro, a empresa que tem prejuízo na adminis- tração financeira não teria exploração da mais- valia. Se criticamos o capitalismo por causa da mais-valia, então no socialismo ela não pode e- xistir. Com isso vem uma questão: é possível não haver mais-valia? A resposta é não, porque o valor que eu produza é conhecimento, e isso não se mede, o que se mede é o preço do mer- cado. Por isso, a busca o conceito de mais-valia para explicar o lucro da acumulação de capital, que não se mede por ser um conceito abstrato, não faz sentido, principalmente porque mais- valia não é um conceito privado, é estatal.

Existe um otimismo de se achar que estamos indo bem e que os países do Primeiro Mundo não precisam mais da gente. Isso é bom em parte, porque na verdade eles, do Primeiro Mundo, não precisam mais da gente. Mas, em compensação, nós é que precisamos deles. Só para se ter uma idéia. Cuba está pedindo "pelo amor de Oeus" para entrar no mercado interna-

cional e até agora não conseguiu. Mas, quero voltar à questão do sacri-

fício. Temos conceitos diferentes de sacrifício. Um é o sacrifício de dom de si, doação, onde a pessoa ajuda outra por causa de um movimento interno (causa interna). Ela faz algo porque tem sentido, o que é um gesto de amor e liberdade. Mas há o outro tipo de sacrifício, aquele que nasce da lei, da imposição de força externa, que precisa ser abandonado. A produção sacrificial no ocidente é sempre uma coisa ruim, mas que você tem que fazer porque Deus manda e será recompensado com o paraíso. Esta visão não tem como ser defendida, nem mesmo do ponto de vista bíblico. Ela tem que ser abandonada. De acordo com os profetas e com os ensinamentos de Jesus, a gente encontra suporte para romper com esse sacrifício imposto de fora e abrir espaço para a atitude de doação. Na definição grega, "Deus não é poder. Deus é amor." A lógi- ca fundamental é que Deus é liberdade.

Diante de tudo isso, não podemos esperar do sistema de mercado a salvação daqueles que formam a classe excluída, já que é ele que o exclui no meio social.H

lida, ^&cOU$ue& Sou&ei

Rua Sen. Manoel Barata, n" 718 Ed. Infante de Sagres, sala 507

Fone: (091) 225-2872 • Comércio CEP. 66019-000 • Belém-PA

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Aborto:

A polêmica continua,

a hipocrisia também!

"/l constituição que boje vige integra o aborto no amplo espectro da saúde reprodutiva. Estabelece nítido confronto com a realidade. 0 bem estar social é tornar realidade a Constituição". (Norma Kikiakos. Confronto com a realidade. Folba de S. Paulo).

"Na Constituição de 1988, o máximo que se conseguiu propor foi o planejamento familiar para casais. Como se a sexualidade esperasse pelo casamento para se manifestar". (Eva

Folha de S.Paulo, 28/09/93).

erromper o processi Wle." (Sandra Cavalcai

ção, para mim, é uma violência intolerável. Éuma condenação Condenação à morte. Folba de S. Paulo).

Sandra Ribeiro • com que o aborto deil

: adultas, mães de fo orna de governo? Im

de ser um crime significa, antes de tudo, salvar a vida das lia e, sobretudo, de adolescentes." (Eva B/o/, f o aborto

S. Paulo)

dade que desrespeita a \ ) princípio que acaba autoí

ma?" (Luciano M. de Almeia

|ef/ uma menina que engrm <ca absolutamente nada dii erá salva?"(lvone Gebara.

pe/o referência à natureza 1 sexualidade, a vida conjugai | Folba de S. Paulo, 25/0$

i (jwestóo que diz respeita f/e ser impedida por creá 93)

indefesa e inocente introduz no seu inconsciente cole- ndo todo tipo de violência. Afinal, que vale a vida

A questão ética central. Folba de S. Paulo, 02.07.94)

de seu práprio pai aos 14 anos. Nesse contexto, não que a vida está sendo salva ao evitar o aborto. Que

mrtonão épecado. Veja, 06.10.93)

portanto, ao Criador que podemos entender a dignidade procriação. "(Luciano M. de Almeida. A Conferência do

sociedade civil. A legalização do aborto é necessária e religiosos."(lvone Gebara. Aborto não é pecado. Veja,

rto é violento, muito v'n fia. Mas uma violênck mo é pecado. Veja,

É sempre uma opção traumática, jamais um caminbo existe e como tal deve ser legislada." (Ivone Gebara.

í 10.93)

dade cotidiana de milbães de brasileiras que recorrem ao ões, bá um abismo que o falso moralismo reinante mal con-

' bode São Paulo, 17.06.94)

ente seus cidadãos, se não no primeiro mês, ao longo da vida." épecado. Veja, 06.10.93)

Bto e mo mk matai

ssivel em qualquer circunstância. Só Deus é o senbor da vida. Nem as seus filhotes f só nós, homens e mulheres." (Felipe Rinaldo Queiroz de

S.Paulo, 20.06.93)

Sandra Ribeira é arte educadora "Os pais abortam os filhos com palavras." (Ivone Gebara. Aborto não é pecado. Veja, 06.10.93)

No Brasil, falar em aborto, hoje, é colocar em cena posições controvertidas que susci- tam diferentes argumentações. Nesse jogo

argumentativo, muitas vozes se intercalam na tessitura dos escritos: a da medicina, da religiõo, da polftica, a da cidadania, a da lei, a feminina, a masculina, a da imprensa, a do jovem, tudo na tentativa de dar um tom que produza um efeito nos interlocutores: fazer com que, a partir das diferentes falas, aquele que ouve/lê seja motivado a refletir sobre o assunto em questão, o aborto no Brasil.

A questão médica - 0 sistema de saúde que se tem no Brasil é basicamente subjugado a inte- resses políticos e financeiros. É, portanto, elitista e privilegiador daqueles que, de alguma forma, detém o poder.

No que se refere aos abortamentos, o sistema nõo foge à regra. Tem-se a prática de "um comércio sujo e ilegal" (PINOTTI, José), cujas consciências são, além dos danos psi- cológicos e emocionais causados à mulher, os altos índices de mortalidade (55 causa de morte materna) e morbidade, que atingem principal- mente as mulheres de baixo nível sócio- econômico, que têm acesso limitado - quando têm - aos serviços de saúde e aos métodos anticoncepcionais.

Como se não bastasse o alto custo em sofrimento humano, o aborto ilegal é um grande peso para os serviços de saúde. "Calcula-se que, por ano, ocorram 2 milhões de abortos, suas seqüelas levam a internação de 400 mil mulheres" (DIMENSTEIN, Gilberto). Ouve-se muita história em leito hospitalar com pacientes que, quando não perdem a vida, padecem das conseqüências de um aborto mal realizado.

"A hipocrisia é generalizada. A ética médica e a lei condenam o aborto. Porém, mi- lhares são praticados ao arrepio de leis, normas éticas e sem nenhuma punição" (PINOTTI, José Aristodermo).

A questão da mortalidade - Sandra Cavalcante coloca que o aborto é crime, sim, pois "não se pode sair por aí matando crianças inocentes." Luciano Mendes de Almeida (A questão ética central) diz que "interromper dire- tamente a gravidez é eliminar a vida da nova

pessoa humana..." Em contraposição a esses argumentos, cabe a pergunta: se o aborto consti- tui assassinato, "condenação à morte", "holo- causto de inocentes", como ficam as adoles- centes ("que está no começo, no início", "de pouco tempo, novo", segundo o Aurélio) que são hoje as maiores vítimas do aborto? "0 dado mais alarmante talvez seja o da mortalidade de meninas adolescentes: em cada cinco mortes, uma é decorrente de aborto mal feito" (BLAY, Eva). "Segundo dados oficiais, a segunda causa de morte entre adolescentes é o aborto" (DIMENSTEIN, Gilberto).

Afinal, de que "condenação à morte" estamos falando?

A questão jurídica - A lei que vigora no Brasil é datada de 1940, quando foi publicado o Código Penal. Nele, aborto (interrupção do processo de gravidez), quando provocado artifi- cialmente, é considerado crime pelos artigos 124 a 127. As únicas hipóteses de aborto per- mitidas pela legislação brasileira são quando existe risco de vida para a gestante ou quando a gravidez resulta de estupro.

Paralela a essa lei, temos a promul- gação da Constituição, em outubro de 1985, que em seu Capítulo VII, art. 226, parágrafo 78, diz: "Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educa- cionais e científicos para o exercício desse direi- to, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas."

Que legislações são essas, que con- tinuam a ser rígidas, anacrônicas e - por não dizer - autoritárias, pois a mulher, quando não é condenada a um ou três anos de prisão, só tem os seus direitos reprodutivos "assegura- dos" pelo Estado mediante a regulamentação da família? Que Estado é esse que regula a sexualidade e ainda fala que se fundamenta nos princípios da dignidade humana? Cabe bem o que disse Eva Blay em seu artigo intitu- lado Criminosa é a lei, quando acentua que o desenvolvimento da sexualidade se faz progres- sivamente desde a infância e não apenas quan- do pessoas resolvem casar.

A questão religiosa - Ao longo do tempo.

muitas têm sido as discussões dentro de dife- rentes segmentos religiosos no que concerne à temática do aborto. Rose Murara evidencia isso em seu artigo Uma história das idéias sobre o aborto, quando constai um discurso elucidativo, cuja base de sustentação está na abordagem histórica, onde mostra as diversas concepções das igrejas e suscita a hipótese de que "o abor- to parece ser mais um problema de poder do que de teologia."

Ivone Gebara, que é religiosa da Congregação Irmãs de Nossa Senhora, tece sua argumentação na condição de mulher que fala de dentro da instituição religiosa, mas fora do núcleo do poder. Ela afirma que a Igreja se estru- tura sobre a base de uma hierarquia masculina celibatória, onde a mulher não tem voz nem vez, e, por assim ser, constitui-se numa institui- ção que não consegue integrar as mulheres na sua totalidade de direitos. Como pode, então, a Igreja admitir que as mulheres tenham controle sobre a sexualidade e regulem, por opção pes- soal, a sua capacidade reprodutiva?

A questão da cidadania - Apesar das fre- qüentes lutas e conquistas feniminas obtidas ao longo da história, a mulher ainda hoje se encon- tra numa condição de sujeição: sujeição à lei, à religião, à ética médica, à condução masculina, onde a livre opção quase sempre inexiste e, quando existe, é condicionada por uma ética social opressora e totalitária, que lhe impõe uma culpabilidade. "Há angústias e incertezas diante da traumática decisão de se realizar o aborto sob a ilegalidade, sobretudo para as camadas sociais mais carentes. A decisão é sofrida e ne- nhuma mulher engravida pelo prazer de abortar. 0 preconceito social coloca-a em situação melin- drosa". (PINOTTI, José Aristodermo).

Mediante essas questões, onde fica consciência da sociedade em relação ao processo de discriminação da mulher? É preciso que questões delicadas, como a descriminalização do aborto, acompanhado do respeito à consciência de cada um, ou o planejamento familiar efi- ciente e acompanhado do respeito às diferentes religiões e princípios éticos, sejam de fato tratadas com a seriedade e compromisso que exigem. Talvez assim possamos, em última análise, evitar o aborto da cidadania de toda e qualquer nação fêmea.H

Cuíra33

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Nao entre numa fria!

Venha para a Sol

Dr. Moraes, 584

^ 224-3355 I/UFORMATICA

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"Entre os evangélicos, há aqueles que são parte do

desmoronamento da cidadania, parte da falta de

étíea, que fazem parte desse processo de corrupção,

de fisiologismo. Mas há um outro grupo comprometi-

do com posturas claras e inequívocas de uma ética

cristã que transcenda a preocupação exclusivamente

religiosa, que lute pela cidadania".

Presidente da Associação Evangélica Brasileira ■ AEVB, Caio Fábio de Araújo Filho foi hippie e experimentou drogas diversas até os 19 anos de idade, quando se converteu. Segundo ele, uma conversão profunda, que o levou às ruas no dia seguinte para pregar a Palavra. Hoje pastor evangéli-

co, ele fala, nesta entrevista à Cufra, sobre o novo ecumenismo que renasce no Brasil, afirma que falta carisma aos protestantes históri- cos e compromisso ótico aos pentecostais e carismáticos. Ele critica a Igreja que se confunde com o Estado ou que se tomou numa nova religião, o que se contrapõe aos próprios ensinamentos de Cristo. Caio, hoje pastor honorário da Catedral da Igreja Presbiteriana do Rio de janeiro, reconhece que, entre os evangéli- cos, há grupos de pessoas, ainda que minoritários, que fazem parte desse processo de corrupção e de fisiologismo que domina o país. Mas também há aqueles sinceramente comprometidos com a luta pela cidadania, pelo fim da impunidade. Veja aqui as partes mais importantes da entrevista:

Cuíra: Você experimentou uma conversão profunda de hippie para evangélico. Quais as descontinuidades mais mar- cante nessa conversão?

Caio: Houve descontinuidades profundas em vários aspectos. A primeira delas foi a do desespero existencial que eu sen- tia: quando Jesus entrou na minha vida iniciou um processo novo, de

encontro comigo mesmo, com meu Deus, com meu próximo e de harmonização e paz inte- rior. Houve também descon- tinuaçâo em relação ao meu comportamento, que era belig- erante, depois de um certo tempo se tornou muito agressi- vo, era de uma irreverência negativa demais e, no míni- mo, absolutamente amoral. Eu tinha um amigo, filho de um senador, que me dizia: "Olha, o relacionamento com o fulano é bom porque ele é um bom caráter, com o sicrano é bom porque ele é um mal caráter, a gente sabe o que esperar dele. Mas você é horrível, porque você é sem caráter, não sei o que eu espero de você. Eu já vi você passar por criança na rua e chorar, e já vi você chutar a cara de um homem que estava de joelho no meio

Cuira35

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de uma briga de rua dizendo "pelo amor de Deus, não chuta a minha cara", e você meter a mão e o pé no meio dos dentes dele, quebrar a boca dele. Então eu não sei o que posso esperar de você. Você me deixa inseguro. Você é um macunaíma". Issgfoi descontin- uado, e quando Jesus entrou na minha vida ele criou um processo novo, de formar caráter, conteúdo, princípios, valores dentro de mim.

Cuíra: Você experimentou drogas? Caio: Eu não conheci algum hippie que não tenha

usado drogas. Isso era parte da vida, como beber água, comer pão, tomar café. E eu fazia isso com a regularidade de quem vai ao ban- heiro, ou até com mais freqüência, porque, no início, eu comecei com anfetaminas, depois passei à maconha, à cocaína, aos ácidos, depois fiz mistura de tudo isso com cachaça e outras bebidas alcoóli- cas, todo dia, num processo de degradação completo.

Cuíra: Adquiriu dependência? Caio: Eu diria que, num certo sentido, sim, mas que

a grande dependência era existencial, porque, depois que Jesus entrou na minha vida, no dia seguinte eu parei com isso tudo. Eu não parei de fumar cigarro - o cigarro eu demorei mais quatro a cinco meses para parar: era Continental sem filtro e Hollywood, três a quatro maços por dia. Mas maconha, cocaína, bebedeira, anfetaminas, maluquices, tudo isso acabou no dia seguinte. Eu não fazia aquilo só por fazer, aquilo não era um fim em si mesmo, eu achava que aquilo era um meio, que poderia me aju- dar a encontrar algo além daquilo. E eu descobri que o que eu procurava a vida inteira era Deus, e quando Jesus trouxe Deus para a minha vida eu me senti tranqüilo.

Cuíra: Há psicólogos que sustentam que naquilo que de mais negativo uma pessoa possa fazer sempre há um fundo positivo, que é aquilo que ele busca de melhor. 0 que, então, que houve de continuidade na sua conversão?

Caio: De continuidade, primeiro, eu não sou um esquizofrênico, eu não divido a minha existência em duas partes, a minha existência é uma só. Eu encontrei alguém que salvou a minha existência das desgraças particulares que se produziam no meio de mim e me entregou para mim mesmo, para aquilo que eu podia ser na vida. Mas isso não é um corte esquizofrênico. Houve descontinuidade em muitas coisas negativas e continuidade em muitas outras. No meio das coisas, por exemplo, que continuam, há uma certa maneira informal de ver a vida que eu conservo desde aqueles dias, que nunca diminuiu dentro de mim. Há muitas coisas que eu enxergo na Bíblia, hoje, que eu só consi- go por causa daquele background (experiên- cia). Eu vejo pessoas que não tiveram as min- has peregrinações, eles passam por cima daqui- lo e não conseguem viver e nem construir pontes entre as Escrituras e a vida das pessoas, porque elas nunca se angustiaram existencial- mente com alguma daquelas questões que hoje me ajudam profundamente a fazer uma leitura próxima da alma humana. Outra coisa: há uma determinada irreverência na minha maneira de pensar as instituições, pensar o Estado, as hier- arquias, as tentativas de militarização da vida.

Os homens

fizeram

da igreja uma

religião, mas

Jesus não

queria isso!

que são daquele tempo. Como eu disse, havia uma irreverência neg- ativa, agressiva, beligerante dentro de mim, mas ficou uma outra que eu não quero que desapareça, que eu acho que ela tem muita proximidade com o Evangelho, com essa coisa de entrar no Templo e virar as mesas, de soltar os pombos na rua...

Cuíra: Então você é um iconoclasta também? Caio: Eu fujo dessas designações porque elas são

muito confinantes e diminutivas. Eu costumo dizer que o meu desespero diuturno nessa luta insana é para ser cristão. Como cristão, você tem manifestações das mais diferentes, você tem a dimensão às vezes de um sagrado que chega próximo da formali- dade, que ajoelha, senta, quieta, ou repete uma frase de um ritual ou de uma oração, ou vai para extremo de fazer tudo em praça pública, deixando a sua alma vazar todos os espontaneismos mais radicais que existem dentro de você. Então, conciliar essas difer- enças é parte do meu exercício cotidiano e da tensão na qual eu me obrigo a viver.

Cuíra: É possível viver o Evangelho sem ser evangélico?

Caio: É possível! Eu costumo dizer que eu sou evangélico mas Deus não é. Se Deus fosse evangélico ele tinha começado a agir no mundo só há 200 anos atrás. 0 movimento pvangélico é um movimento recente, que saiu de dentro do protes- tantismo histórico. Quando este se pentecostalizou, se carismati- zou e se pragmatizou nas suas ações evangelísticas e de aproxi- mação das massas populares, ele se transformou num movimento evangélico. Então, eu acho que Santo Agostinho tinha razão quan- do afirmava que Deus tem muitos aos quais a Igreja nunca viu, e que a Igreja tem muitos aos quais Deus nunca conheceu. Então, aqueles que tentam confinar a experiência de vivência do Evangelho aos movimentos de visibilização da fé deviam sempre ouvir a advertência de Jesus: "Nem todo aquele que me diz 'Senhor, senhor, entrará no Reino dos Céus, mas aquele que faz a vontade do meu Pai que está nos Céus. Porque naquele dia muitos me dirão 'Senhor, em teu nome nós fizemos milagres, expul- samos demônios ou profetizamos'. Eu todavia lhes direi, explicita- mente: 'Apartai-vos de mim os que praticais a iniqüidade: eu nunca vos conheci". Então, esse pessoal as vezes é conhecido daqueles que chamam, numa certa visibilidade histórica, de "povo de Deus", porque eles aparentemente o são, mas eles na prática não estão vivendo o Evangelho. A Igreja os conhece, mas Deus nunca os viu. Por outro lado, Jesus diz aos judeus, que achavam

que eles confinavam a manifestação toda do Reino: "Naquele dia, virão muitos do oriente, do ocidente, do norte, do sul, vão tomar à mesa o lugar com Abraão, Isaac e Jacó, enquanto vocês, que se dizem filhos do Reino, vão ficar do lado de fora". 0 que Jesus disse aos judeus, ele diz hoje aos católicos, aos evangélicos, aos protestantes históricos, porque senta à mesa do Reino de Deus quem deixou Jesus sentar no trono do coração.

Cuíra: Hoje (31 de outubro), você fez uma pregação em que relativiza o papel da religião, priorizando o compromisso com a palavra de Jesus, com a prática oriunda dessa palavra. Você não receia

36Cuíra

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que alguns entendam isso como um discurso contra a religião, contra a Igreja?

Caio: Olha, Jesus não teve a menor intenção de trans- formar a Igreja numa religião. Os homens é que fizeram da Igreja uma religião. A Igreja que Jesus criou é uma comunhão de discípu- los, que se encontram em torno da Palavra e que celebram a vitória de Jesus sobre o pecado e sobre a morte, e a afirmação da vida conforme Deus a criou, paro ser vivida em beleza, em santidade, em alegria. Mas isso é a Igreja, essa comunhão dos que chamam a Jesus de Senhor, que chamam ao pai de Jesus Cristo de Pai Nosso. Essa Igreja não tem estrutura militar, não tem estrutura governa- mental, hierarquizada, essa Igreja tem de diferir da religião do Estado e do exército e de todas as formas associativas tirânicas. Jesus diz o seguinte: "Porque no meio de vós, quem quiser ser o maior, seja o menor, seja esse que vos sirva, porque no meio das autoridades, dos reis dos povos, o maior é que é servido, mas eu, o Filho do Homem, eu vim para ser vida vivida". Então, se a Igreja fica igual ao Estado, ao exército, ela tem que ser confrontada. A Igreja tem que ser outra coisa. Então, se alguém entende que uma mensagem ilessa confronta esse tipo de Igreja, entendeu certo. Mas ela não confronta a Igreja de Jesus, não confronta o Igreja dos Apóstolos, que é essencialmente voltada para a Palavra, e o grande absoluto é a Palavra, os homens são relativos e são passageiros.

Cuíra: Como você comunga o seu trabalho de pas- tor com as suas responsabilidades com a AEVB?

Caio: Eu fui pastor por 11 ou 12 anos de uma igreja local. Nos últimos dez anos, eu sou pastor emérito dessa Igreja e honorório da Igreja Presbiteriana Betânia e da Catedral Presbiteriana do Rio de Janeiro. Mas o meu trabalho interdenomi- nacional literalmente com todas as igrejas. Há muitos anos que a minha atividade é interdenominacional, e isso, nos últimos anos, impossibilitou-me de estar localmente atendendo a uma igreja, porque os meus compromissos no país inteiro acontecem todas as semanas, duas ou três vezes. Então, eu tenho relações comu- nitárias, mas eu não sou mais o pastor responsável por uma comu- nidade local. As minhas funções são muito mais honoríficas, de relacionamentos com a Igreja, do que pragmáticas na adminis- tração dela. Eu sou presidente da AEVB e da Vinde - Visão Nacional de Evangelização, que é uma ONG cristã que presta serviço às igre- jas e à sociedade, especialmente em áreas sociais. A nossa ação de relação com a sociedade é cada vez mais intensa.

Cuíra: Apesar de confessarem crer no mesmo Deus e seguir os seus ensinamentos, muitas das igrejas cristãs têm práticas evangelizadoras e princípios doutrinários diferentes. Como é a reforma religiosa que seria necessária hoje?

Caio: A reforma que eu vejo essencial, hoje, seria aquela que desse carisma aos protestantes históricos e profundo compromisso ótico aos pentecostais e carismáticos. Acho que essa coisa está desencontrada no nosso meio. Os protestantes históricos são, eticamente falando, muito cuidadosos, preocupados, mode- lares, mas sem carisma, sem dons, sem festa, sem euforia do Espírito Santo, e os pentecostais e carismáticos são, em geral, salti- tantes, jubilantes, esfuziantes e alegres, mas falta muita reflexão ética, falta uma ética que não seja só no tamanho do cabelo, no tamanho ou na cor da roupa, no uso da barba ou não, mas uma

ética na profissão e no trabalho, no uso do dinheiro, uma ética no voto, ética na relação comunitária, na administração pública, ética nos vínculos sociais, uma coisa que sobro nos históricos.

Cuira: Quando foi fundada a AEVB e como é composta? Caio: Foi fundada há quatro anos, é composta de

sócios individuais e sócios institucionais. Os associados individuais são milhares, os associados institucionais são cerca de 230: denominações evangélicas, convenções estaduais, missões de fé e organizações desse tipo.

Cuira: Qual o principal objetivo da associação? Caio: Ela tem quatro objetivos, que são todos princi-

pais. Um é ser plataforma de unidade de todos os grupos evangélicos, outro é ser plataforma para ações comuns, o terceiro objetivo é ser uma interlocutora junto aos governos federal, estu- dais, municipais, à sociedade civil e à mídia. 0 quarto objetivo da AEVB é ser ela uma fomentadora de uma ética cristã que leve em consideração a necessidade dos carismas estarem presentes e pro- fundamente associados ao caráter e ao comportamento cristão, que não seja só individualista, mas que tenha compromissos com a sociedade.

Cuíra: Você falou em compromisso ético e inter- locuçâo com a sociedade. A AEVB pretende fiscalizar a ação dos parlamentares evangélicos?

Caio: Fiscalizar é uma palavra muito feia, porque pressupõe algo que a AEVB não existe para fazer, que é o patru- ihamento. A AEVB acompanha, se pronuncia a respeito. Nós fize- mos isso pela primeira vez no impeachment do presidente Collor: demos uma visitada assim muito séria àqueles parlamentares todos, conversando sobre ética cristã, nos pronunciamos a favor do impeachment com muita clareza, antes da CNBB, inclusive. Agora, nós estamos mapeando todos os candidatos que foram eleitos deputados estaduais, federais, senadores e governadores, e vamos ter uma reunião com eles, no mês de março, para discu- tir uma agenda, discutir temas que sejam relevantes, para que o parlamentar evangélico deixe de ser um despachante de igreja e assuma um pouco mais uma atitude de estadista, de um ser humano moior que a religião, que se preocupa com a sociedade. Acho que o parlamentar evangélico devia ir para o Congresso ouvindo a palavra de Jesus que, em Marcos, quando os discípulos dele entraram nos trigais e foram repreendidos pelas autoridades do Templo por estarem invadindo os trigais em dia de Sábado e comendo, Jesus disse: "Davi fez isso, o sacerdote no Templo tra- balha no sábado e não comete falta alguma por fazer isso, e eu estou aqui, e eu sou maior que o Templo". Então, chegou a hora de nós, cristãos, nos tornarmos maiores que a religião, maiores que o Templo, e irmos para o Congresso não apenas preocupados com politicazinhas que beneficiam apenas as igrejas, mas preocu- pados com a cidadania como um todo. É isso que a gente vai estar conversando com eles.

Cuíra: 0 Comitê de Combate à Fome e à Miséria realizou conferências de segurança alimentar pelo país inteiro, inclu- sive uma nacional, e tirou um programa. A idéia agora do comitê é participar desse programa de combate à fome e à miséria junto ao presidente, governadores, etc. A AEVB participa disso?

Caio: Essa conferência nacional foi promovida pelo

Cuíra37

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Consea - Conselho Nacional de Segurança Alimentar. 0 Consea tem um presidente e vinte conselheiros, e eu sou um desses conselheiros desde o início. Ainda esta semana (final de outubro) eu tive uma reunião com Dom Mauro Morelli, o Betinho e mais dez conselheiros, no Rio de Janeiro, quando conversamos sobre o futuro do Consea. Não sabemos se o presidente eleito Fernando Henrique Cardoso vai continuar com o Consea. Ele está dando sinais de que talvez ache o Consea muito independente para gosto dele, e talvez queira criar uma coisa que fique mais debaixo da mão dele. 0 Consea não assumiria esse compromisso, porque ele não é governo, ele é sociedade civil, aconselhando o governo e quer continuar indepen- dente. Se o presidente eleito aceitar essa independência, nós vamos continuar. Se ele quiser segurar isso controlado por ele, nós vamos pedir que ele nomeie outros conselheiros, porque nós não queremos ser governo, nós queremos ser apenas sociedade civil contribuinte. A AEVB participa não apenas através da minha pessoa, mas também através de muitos de nossos diretórios estaduais - o presidente da campanha no Nordeste inteiro é o presidente do diretório da AEVB em Pernambuco, o Rev. Silas Menezes. De maneira que, no Nordeste, no Espírito Santo, no Rio de Janeiro, em São Paulo, a AEVB tem estado ativíssima no processo.

Cuíra: Floresce, hoje, no Brasil um ecumenismo que se diferencia daquele cultivado pelas igrejas há décadas atrás. 0 que há de novo nesse movimento?

Caio: 0 que nós experimentamos hoje no Brasil, em ter- mos de relações ecumênicas, é realmente diferente do que aconteceu no movimento ecumênico da década de 60. Naquela época, era um movimento patrocinado pela Igreja Católica, inspirada no clima de abertura do Concilio Vaticano II, que abriu profundamente as relações da Igreja Católico, e ela procurou vínculos com grupos protestantes, especialmente com as igrejas pobres. Mas esse movimento ecumênico perdeu bastante o impacto que ele teve no passado: ele se tornou um movimento confinado a algumas elites teológicas e nunca conseguiu criar um apelo popular muito grande, ele se restringiu aos círculos pen- santes e reflexivos. 0 que nós observamos hoje, no Brasil, é um pouco diferente do movimento ecumênico do passado: a ênfase de hoje não é institucional, ela é carismática, é a ênfase nos encontros dos agracia; dos, no encontro dos que foram objetos da graça e da ação de Deus. É uma convocação à unidade, à descoberta de autofertencimento e de vínculos com diferentes em função da cruz de Cristo. E esse movimen- to é essencialmente carismático, ele não passa muito, primeiro, pela reflexão teológica e ecumênica e nem passa muito pelo formalismo das tradições históricas: ele tem tudo a ver com a informalidade de vín- culos fraternos. E esse movimento atual é essencialmente entre

rsi evangélicos, que vai das tradições protestantes mais históricas aos gru- pos pentecostais independentes. Com relação à Igreja Católica, diminuiu a tendência da relação ecumênica formal e manteve-se um relacionamento de diálogo, com relações a temas apenas sociais, de cidadania, mas quase que se interrompeu completamente o chamado ecumenismo como expressão litúrgica. E surgiu em vários grupos evangélicos um ecumenismo espontâneo em relação aos grupos católi- cos carismáticos, que hoje estão bastante presentes em movimentos e grupos de oração que acontecem nos grandes centros urbanos, no meio da classe média. Há uma grande fusão entre evangélicos caris- máticos da classe média e católicos carismáticos. Nesse nível, tem havido muita troca.

Cuíra: E em relação ao empenho dos evangélicos na luta pela cidadania, na moralização do país?

Caio: Bom, esse não é um empenho que a gente pode atribuir aos evangélicos como um todo. Tem um lado daquilo que a gente chama de evangélicos que são essencialmente parte do desmoronamento da cidadania, parte da falta de ética, tem parte nesse processo de corrupção, de fisiologismo, tem a parte expressiva doente, especialmente lideranças viciadas e que prati- cam políticas fisiológicas e extremamente conservadoras. Alguns desses são parte do que há de pior no programa a ser vencido, a ser enfrentado. Agora, há outro grupo, que não é pequeno, que é expressivo, que está profundamente comprometido, primeiro, com o enfrentamento desse estado de coisas dentro das igrejas evangélicas; segundo, com a necessidade de propor posturas claras e inequívocas de ética cristã que transcendam o preocupação exclu- sivamente religiosa e se torne uma ética ampla, de cidadania. E, nesse sentido, a Associação Evangélica Brasileira tem manifestado compromissos muito claros, porque uma das razões pelas quais a AEVB foi criada é a de trabalhar essa questão da construção de pontes entre a fé evangélica e a sociedade, a cidadania, e a con- strução de uma ética cristã que seja relevante nos segmentos mais diversos da vida. E eu noto essa tendência crescer. Não acho que vai ser fácil enfrentar a outra banda, que não é escrupulosa e que é perigoso, mas eu tenho a certeza que, no mínimo, vai acontecer o seguinte: a sociedade vai conseguir fazer a diferença. Se pelo menos a sociedade conseguir diferenciar uma coisa da outra, nós já nos daremos por contentes. 0 ideal seria que prevalecesse essa visão ética, que chegasse ao ponto de englobar a Igreja como um todo, mas, mesmo que nós não tenhamos arroubos de esperança nesse sentido, nós já vimos com clareza que as nossas posturas claras e objetivas tem determinado um corte nas áreas, e a sociedade secular começa a discernir essa diferenciacão.B

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//As

fln

s transformações econômicas que laqui se processaram nas duas últi- imas décadas alteraram profunda-

mente o quadro social e demográfico da Amazônia. Neste sentido, num certo período, a concentração urbana, com todos os problemas sociais que evidencia, atingiu níveis expressiva- mente notáveis. São, certamente, nos centros urbanos de médio e grande porte, onde mais se avolumam indicadores sociais de toda espé- cie que denunciam o mais extremo estado de miséria, ignorância e má qualidade de vida, que aflige a população regional".(l)

Educar para a cidadania Uma política de educação alternativa para meninos e adolescentes

"í/m desafio está posto a nós:

implantar a educação para a

cidadania, construir a

escola-cidadã, que deve ser

estatal quanto ao

financiamento, pública

enquanto clientela,

comunitária enquanto gestão".

*Aldalice Otterloo é educadora, diretora geral da Unipop

40Cuíra

Aldalice Otterloo*

Uma das características do processo de implantação de grandes projetos na Amazônia tem sido a de não considerar o fato destes serem pólos de atração para grandes con- tingentes populacionais na busca de emprego e renda, que se aglomeram ao redor desses proje- tos, os quais não oferecem nenhuma infra-estru- tura social, econômica e política que garanta a essas pessoas condições mínimas de qualidade de vida. (vide Tucuruí, Parauapebas, etc.)

Assistemáticas informações per- mitem inferir a gravidade que tem atingido, especialmente, a situação das crianças e adoles- centes nesses contextos, não apenas em relação às dramáticas condições de saúde, educação, nutrição, etc, mas também os diversos meios de violência física e exploração do trabalho aos quais crianças e adolescentes são submetidos.

As formas de resistência que muitas dessas crianças e adolescentes têm encontrado são a formação de gangues, grupos de pichadores, drogas e prostituição infantil (tanto a nível de Belém como em outros municípios do Estado e do país). As sociedades brasileira e amazônica são conscientes da existência cres-

cente de meninos/meninas que fazem da rua seu espaço de vida e morte.

Se, para nós amazônidas, o modelo de desenvolvimento caracterizado aqui pela implantação de grandes projetos econômicos, como Albrás, Carajás, Tucuruí, causou problemas profundos na área social, proporcionalmente maior do que o ganho econômico obtido para a região, podemos imaginar como será o futuro próximo quando se estabelecer a hegemonia do projeto neo-liberal a nível internacional, nacional e regional. 0 conflito vivido nas últimas eleições, evidenciado por duas propostas antagônicas - de um lado, uma proposta de desenvolvimento que estabelece a prioridade para as políticas públicas, tomando como ponto de partida as necessidades sociais, representada por Luís Inácio Lula da Silva, e, de outro lado, a proposta de desenvolvimento que estabeleceu a priori- dade para a política econômica regulada pelo mercado, representada por Fernando Henrique Cardoso - indica que, para nós, preocupados com o problema das crianças e adolescentes, os desafios serão ainda maiores do que os da reali- dade atual.

Entretanto, dialeticamente, há alguns indicadores positivos:

1- Nessas duas últimas décadas, contrapondo-se ao desenvolvimento econômico com um enorme débito social, a organização da sociedade civil conquistou espaços importantes na busca de garantia dos direitos de cidadania para crianças e adolescentes em situação de risco, como, por exemplo, a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente, contesta- do pelas forças conservadoras da sociedade; a mobilização da comunidade e de alguns movi- mentos organizados no trabalho com crianças e adolescentes de instituições governamentais e não-governamentais para implantação dos con- selhos de direito, tanto a nível estadual como municipal. Embora não tão tranqüilamente como gostaríamos, essa relação entre sociedade civil e Estado é importante para viabilizar essas políti- cas, inclusive a política educacional;

2- A vitória da proposta representa- da por Lula na Região Metropolitana de Belém e no centro urbano de Abaetetuba poderá sig- nificar o registro de um grande contigente de cidadãos convencidos de que um modelo de desenvolvimento que não parte do social

acabará ampliando esses problemas para os quais, hoje, buscamos alternativas de solução;

3- Mesmo no contexto geral adver- so, está presente no seio da sociedade amazôni- ca um núcleo forte de movimentos sociais - negros, mulheres, homossexuais, meninos e meninas de rua, etc. e organizações não-gover- namentais - capaz de desenvolver um trabalho consistente que vise recriar o nosso processo de desenvolvimento, de tal forma que não precise- mos mais tratar de modo emergencial e separa- do a questão da criança e do adolescente.

O caos impera no ensino público

Entretanto, no que se refere à questões específicas da educação, a realidade atual revela uma situação caótica, decorrência da opção política por um modelo de desenvolvi- mento concentrador de renda e excludente de grandes parcelas da população.

Há muitas décadas, os governos brasileiros vêm repetindo o discurso da educação como investimento, educação como sinônimo de desenvolvimento, educação como direito de todos. Sucedem-se Planos de Metas, Plano Decenal de Educação e outros, mas, na prática, as estratégias e prioridades por eles adotadas inviabi- lizam um investimento que reverta o processo de aprofundamento da degradação do sistema edu- cacional, repetindo-se os velhos indicadores:

• falta de vagas na escola básica (no Pará, são 300 mil crianças na faixa etária de 7 a 14 anos que permanecem sem oportunidade de acesso à escola básica);

• a oferta de vagas que o Estado oferece também é muito limitada: dos 11.200 prédios escolares existentes no Estado, 85% ficam na zona rural, dos quais apenas 2% ofe- recem ensino fundamental completo e o restante somente até a 45 série do 19 grau. Ressalte-se, ainda, que 50% dos prédios esco- lares da zona rural possuem apenas uma sala de aula. Nas zonas urbanas, apenas 43% das escolas oferecem o ensino fundamental com- pleto (1Q a 8Q séries);

• 40 a 50% dos prédios escolares do ensino fundamental são inadequados a uma aprendizagem de qualidade: instalações, equipamentos, infra-estrutura e instalações san-

itárias precárias, grande número de escolas sem abastecimento de água da rede pública nem eletricidade, além de grande parte dos prédios não oferecer condições de segurança;

• distribuição inadequada da rede escolar; • falta de uma política de capaci-

tação docente e valorização do Magistério: do total de 40.793 docentes, 35% são leigos, ou seja, 15.590 possuem apenas o l5 grau com- pleto ou incompleto, o que justifica para muitos governantes os baixos salários. Um exemplo claro é o do município de Soure, onde os profes- sores recebem R$ 10,00 por mês;

• a dispersão e ineficiência na alocação e gestão dos recursos destinados à educação;

• a dicotomia dos conteúdos curricu- lares e da estrutura administrativa das escolas com a prática e a realidade social dos alunos;

• a falta da educação sexual nas escolas, que contribui para o grande número de adolescentes-mães ou correndo perigo de vida pelos abortos praticados;

• a baixa produtividade do sistema e baixo nível de desempenho escolar.

Se analisarmos os indicadores de pro- dutividade, observa-se que, do total de 386.336 alunos matriculados na lg série, em 1989, somente 33,19% chegaram à 45 série, em 93. No 1g grau maior, de 55 a 8' séries, as taxas médias de rendimento dos alunos por disciplina revelaram que mais de 60% dos alunos não con- seguem atingir 50% do aproveitamento em Português e Matemática. Quanto às taxas de evasão e repetência, o MEC confirma a persistên- cia de números elevados na 18 e na 5g séries do 19 grau, com uma taxa de 20 a 30% ao ano.

A continuidade do turno intermediário no Estado também tem contribuído para essa inefi- ciência do sistema, considerando que, se de um lado, amplia-se o número de vagas, por outro, reduz o tempo de permanência da criança na esco- la para 3 horas, atingindo principalmente crianças e adolescentes da população de baixa renda.

Mas a baixa produtividade não é con- seqüência apenas dos problemas estruturais e políticos descritos acima, mas também de um problema metodológico. Pesquisa recente feita nos Estados Unidos sobre como o aluno aprende e como o professor ensina revela que 70% dos alunos demonstraram aprender melhor pelo esti- lo cognitivo, que prioriza o sensitivo (cor, som.

música, movimento, etc), e apenas 3% pelo estilo reflexivo. Já o resultado encontrado na pesquisa com os professores revela que 65% deles priorizam o ensino pelo método reflexivo e apenas 7% pelo sensitivo. Esse conflito entre estilos cognitivos de ensino-aprendizagem difer- enciados pode ser uma boa causa da dispersão, desmotivação, reprovação e evasão dos alunos da escola. Aqueles que conseguem superar os obstáculos e concluir o 2Q grau terão feito cursos incompletos no conteúdo, insatisfatórios nos métodos, interrompidos longa e sucessivamente por greves de professores desmotivados pelos baixos salários e pelo pouco reconhecimento social que recebem. Some-se a tudo isso a defi- ciente estrutura de sistematização e elaboração de diagnósticos mais precisos, que inviabiliza programas mais coerentes com as necessidades concretas da comunidade.

É preciso formar cidadãos solidários

e competentes

Quanto à educação informal, é importante destacar que uma parcela significati- va da grande massa de crianças e adolescentes excluídos da educação formal - seja porque não consegue vaga seja porque foram expulsos pelo modelo educacional vigente - consegue partici- par dos projetos educacionais desenvolvidos pelas organizações governamentais ou não-gov- ernamentais e outros movimentos de crianças e adolescentes, que reduz a violência para alguns mas não elimina as causas que colocam nas ruas mais crianças e adolescentes em situação de risco, gerando insegurança e o fortalecimento de reações contrárias ao Estatuto da Criança e mobi- lizando os adeptos dos esquadrões da morte.

As experiências pedagógicas desen- volvidas com crianças e adolescentes, mesmo em condições materiais e financeiras desfa- voráveis, têm se revelado importantes, como um laboratório, no sentido positivo, de novas metodologias alternativas para crianças e adoles- centes marginalizados, exigindo cada vez mais dos educadores uma formação mais sólida tanto do ponto de vista pedagógico quanto político (vide Movimento República de Emaús, Centro de Defesa do Menor, MNMMR, Centro de Formação de Educadores, AEC, Igrejas, etc.)

Cuíra41

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Entretanto, a mudança desse quadro não virá apenas com a ampliação dessas exper- iências, ou pela implantação definitiva a nível estadual e municipal dos conselhos de direitos, o que já seria de grande apoio. As mudanças virão com a mobilização permanente da sociedade civil, pela inversão das prioridades no plano político e suas profundas conseqüências no edu- cação, principalmente quanto às exigências da construção de uma nova Ética, que estabeleça novos compromissos para o sistema educacional formal e informal, que requeira novos valores e padrões de conduta exigidos para democratiza- ção da sociedade. Isso nos desafia a criar novos processos educativos acompanhados de novas metodologias e modos de relacionamento capazes de formar o cidadão que venha a con- tribuir para a construção de uma sociedade socialmente iusta, economicamente equilibrada, culturalmente diversa e politicamente plural.

Para isso, é necessário considerar para a educação formal dois pontos essenciais: primeiro, horário integral em todos as escolas públicas de educação básica (no mínimo 6 horas diárias) e, segundo, uma escola de qualidade. Em um país que tem 1/3 de crianças ao nível da pobreza absoluta e onde 2/3 são pobres, o ensino integral não é apenas uma questão pedagógico, mas uma necessidade. E a escola de qualidade exige professores e admin- istradores competentes e motivados com a recu- peração da dignidade da função do magistério, o que passa por quatro instrumentos: número sufi- ciente de professores, salários decentes, for- mação e capacitação permanente e avaliação de desempenho.

No que se refere à educação infor- mal, é importante considerar a articulação per- manente do Movimento de Crianças e Adolescentes com os demais movimentos sociais e o fortalecimento e permanente avaliação da

produtividade das experiências pedagógicas até então desenvolvidas. É importante dizer, para concluir, que estamos diante de um grande desafio educacional, que implica:

1 - na articulação de todos os movi- mentos sociais visando a democratização da sociedade e a inversão das prioridades, possibili- tando a construção de um outro modelo de desenvolvimento;

2- no fortalecimento dos conselhos de direitos como pólo aglutinador da organiza- ção da sociedade na elaboração e fiscalização das políticas públicas, entre as quais, encontra-se a da educação;

3- na defesa intransigente do ensino público, gratuito e com qualidade e valorização do magistério. É fundamental a implantação do educação para a cidadania, do escolo-cidadã de qualidade para todos, que deve ser estatal quan- to ao financiamento, pública enquanto clientela e comunitária enquanto gestão;

4- uma educação de massa e mobi- lização da sociedade para tirar do obscurantismo do analfabetismo mais de um milhão de adul- tos, só no Estado, impedidos de reivindicar o direito básico de serem cidadãos, limitados no acesso de leitura e escrita de sua própria língua;

5- no incentivo e fortalecimento da educação informal ou da educação popular na perspectiva da qualidade e da produtividade como educação de ponta e não de segunda cate- goria, para que possa incentivar mudanças estruturais nos sistemas oficiais de ensino, trazendo para dentro do escola pública princípios e métodos da educação popular;

6- assumir, como princípio básico que deve nortear todas as experiências pedagóg- icas nos campos da educação formal e informal, a formação de cidadãos solidários, responsáveis, competentes e eficientes na superação das difi- culdades e na elaboração e execução de projetos

de desenvolvimento compatíveis com as necessi- dades sociais.

Para finalizar, quero dizer que estou consciente que, para um país do tamanho do Brasil, com problemas estruturais e conjunturais complexos, e para um Estado como o nosso, isto significa um investimento extremamente alto e que, sem dúvida, exigirá uma opção política de inversão das prioridades em termos do Orçamento da União e do Estado e o fiscalização da sociedade civil para sua aplicação.

Infelizmente não podemos ser otimistas em relação a essa questão. Os dados anteriormente citados nos levaram, no decorrer dos últimos 20 anos a um certo cansaço por tantas vezes repetidos e sem constatar nenhu- ma alteração significativa. 0 mesmo cansaço nos atinge quando, nas sucessivos campanhas eleitorais nas últimas décadas, educação e saúde aparecem como prioridades absolutas, mas, quando são apresentadas as propostas, nado é executado ou os recursos reduzidos ou desviados para outros setores.

Por isso, insistimos que o ponto mais importante para elaboração de uma políti- ca de educação, onde crianças e adolescentes sejam prioridades, é a mobilização da sociedade civil organizada, mesmo que para isso ela tenha que enfrentar seus próprios vícios do corporativismo, fiscalizar a reformo constitu- cional em 95 e defender, de forma intransi- gente, as conquistas já feitas e, se possível, acrescentar outras.■

Consulta bibliográfica:

(D- BUARQUE, Cristóvam. A Revolução nas Prioridades.

Brasílio, INED, 1993.

(2)- GADOTTI, Moacir. Uma só escola para todos. S. Paulo,

Cortez, 1990.

(3)- Plano Decenal de Educação do Estado do Pará. SEDUC,

1994.

Promova sua entidade usando brindes. Uma alternativa para qualquer época do ano.

A CRIAÇÕES

VH/I MELHOR OPÇÃO

Camisas, bonés, adesivos, flaneIas e mochilas

Trav. 14 de Abrü, 1711 ( entre Gentü e Conselheiro) * ^ 249-11 74

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HUMOR

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Passarim quis pousar, não deu, voou Porque o liro partiu mas não pe^ou Passariulu) me «'outa então me diz Mtí dijía porque ou não fui feliz Me diz o que eu faço da paixão Que me devora o coração Que me devora o coração Que me maltrata o coração Que me maltrata o coração E o maio que é bom, o fojjo queimou Cadê o fogo, a á^ua apagou I - cadê a água, o lioí bebeu (!adê o amor, o galo comeu E a cinza se espalhou E a chuva carregou Cadê meu amor que o venlo levou Passarim quis pousar, não deu, voou Passarim quis pousar, não deu, voou Porque o liro feriu mas não inalou Passariubo me conta então me diz Porque eu lambem não fui feliz Cadê meu amor mlnba canção Que me alegrava o coração Que me alegrava o coração Que iluminava o coração Que ilmuinava a escuridão Cadê meu caminho, a água levou Cadê meu raslro, a cbuva apagou E a minba casa, o rio carregovi E o meu amor me abandonou Voou, voou, voou Voou, voou, voou E passou o tempo e o venlo levou

Passarim quis pousar, não deu, voou Passarim quis pousar, não deu, voou Porque o liro feriu mas não inalou Passarinho me conta enlão me diz Porque que eu lambem não fui feliz Cadê meu amor minba canção Que me alegrava o coração Que me alegrava o coração Que iluminava a escuridão E a luz da manbã, o dia queimou Cadê o dia, envelheceu E a larde caiu e o sol morreu E de repenle escureceu E a lua enlão brilhou Depois sumiu no breu E ficou lão frio que amanheceu Passarim quis pousar não deu voou. Voou, voou,voou,voou

Música e lelra: A.C. Jobim