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Como bem se diz na decisão impugnada, o erro a · vir a traduzir-se, ao fim e ao cabo, na usurpação de uma propaganda já feita por terceiro, e a frequência com que na indústria

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Cópias do acórdão da Relação de Lisboa e da sentença do 9.° juízo cível da comarca de Lisboa proferidos no processo de marca nacional n.° 113 727.

Supersumos, L.da, sociedade industrial portuguesa, com sede em Cabo Ruivo, da cidade de Lisboa, re- quereu e obteve da Direcção-Geral do Comércio, Re- partição da Propriedade Industrial, por despacho de 20 de Fevereiro de 1964, o registo n.° 113 727, da marca consistente na denominação Totocola, destinada a bebidas refrigerantes. The Coca-Cola Company, sociedade americana, com

sede em Wilmington, do estado de Delaware, que já perante a referida Repartição se havia oposto à con- cessão de tal registo a pretexto de que a dita marca se confundia com a marca Coca-Cola de que era titulaif pelo anterior registo n.° 106 338, destinado a cobrir os mesmos produtos, recorreu daquele despacho para d juízo de direito, nos termos dos artigos 203.° e seguintes do Código da Propriedade Industrial. Seguindo o processo os seus normais trâmites, veio

a ser proferida a sentença de fl. 74, que, pelos funda- mentos que nela constam, deu provimento ao recurso, revogando o mencionado despacho, pelo que, em con- sequência, se teve por recusado o aludido registo n.° 113 727 da pretensão da Supersumos, L.da É desta decisão que vem, por parte de Supersumos,

L.da, a apelação ora em apreço, fundada, conforme as conclusões da sua minuta de fl. 200, no seguinte : a) O princípio basilar da legislação sobre a pro-

priedade industrial é o da liberdade de concorrência, desde que seja leal; b) A aplicação das regras que têm em vista essa

lealdade não podem ser desvirtuadas de forma a que o proprietário da marca passe a deter o monopólio do produto em relação ao qual fez registar a marca; c) A expressão «cola» tem carácter genérico e não

é por ela que se pode concluir pela confusão com outra marca em que a mesma seja usada; d) Nem que assim não seja, Totocola distingue-se

perfeitamente de Coca-Cola, não havendo possibilidade de confusão entre ambas as marcas; e) Há numerosas marcas registadas e concedidas em

cuja composição entra a palavra «cola»; f) Dada a forma como a marca da recorrida é usada,

verifica-se que se procurou lançar um produto que alcançasse larga popularidade por fazer recordar as apostas mútuas desportivas conhecidas por «Totobolu»; g) Jamais tentou, por isso, com o seu registo, con-

fundir a marca que lhe foi concedida com a de Coca- -Cola usada pela recorrida.

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E, alegando deste modo, pede o provimento do recurso. Contra-alegando, sustenta a recorrida a manutenção

da decisão. O Ex.mo Procurador da República, emitindo o seu

douto parecer, salienta a importância que tinha saber se as palavras «coca» e «cola» são evocativas de subs- tancias empregadas, ainda que em percentagens infi- nitesimais, na composição de refrigerantes. Porque, diz, se a cocaína e a cafeína entrarem na sua composição, então a marca Coca-Cola enfermaria, na nossa legislação, de nulidade, por ofensiva do § 1.° do artigo 79.° do Código da Propriedade IndustriaL. E como ilegal não mereceria, ao menos no aspecto moral, uma protecção tal que impedisse a designação de fantasia «Toto» para produtos idênticos, já que no aspecto jurídico talvez o argumento não tenha a mesma força, uma vez que, embora viciada, a marca continua a produzir os seus efeitos enquanto não for anulado o respectivo registo. E m qualquer caso, argumento a ponderar, se for

válido o pressuposto. Não o sendo, afigura-se-me então de valia o argu-

mento que foi decisivo para a sentença apelada : a pos- sibilidade de, através de marcas com semelhanças fo- néticas manifestas, se fazer concorrência desleal. O que tudo visto e ponderado : No estado em que se encontra e com os elementos

que os autos fornecem, a questão resume-se a saber se a marca Totocola, de que a apelante Supersumos, L.dª, conseguiu o registo n.° 113 727 para os refri- gerantes que fabrica, é ou não susceptível de se con- fundir com a marca Coca-Cola já anteriormente registada pela sociedade The Coca-Cola Company para os mesmos produtos da sua indústria, já que, no caso de tal acon- tecer, haverá imitação que a torna recusável ao registo. É o artigo 4.° do Código da Propriedade Industrial

que nos fornece o conceito jurídico de imitação. Segundo esse preceito, considera-se imitada ou usur-

pada, no todo ou em parte, a marca destinada a objectos ou produtos inscritos no repertório sob o mesmo número, ou sob números diferentes, mas de afinidade manifesta, que tenha tal semelhança gráfica, figurativa ou fonética com outra já registada que induza facilmente em erro ou confusão o consumidor, não podendo este distin- guir as duas senão depois de exame atento ou confronto. Às marcas assim imitadas ou usurpadas manda o

artigo 93.°, n.° 12.°, do mesmo diploma que se recuse o registo. Do confronto dos dois preceitos resulta, pois, que o

registo da marca deve ser negado sempre que a marca contenha a reprodução de algum dos elementos carac- terísticos de outra já registada para os mesmos pro- dutos ou produtos afins e apresente com ela tal seme- lhança gráfica, figurativa ou fonética que só o confronto entre as duas ou um exame atento permita distingui-las. São, por isso, requisitos legais da imitação a seme-

Ihança que induza facilmente em erro ou confusão o consumidor, tornando necessário, para a distinção, o exame atento ou confronto, e o destinarem-se as marcas aos mesmos produtos ou a produtos similares. Sobre o segundo não há aqui a mínima controvérsia:

tanto a marca Totocola, que a apelante registou com o n.° 113 727, como a marca Cora-Cola, de que a apelada é titular pelo registo n.° 106 338, se destinam, como uma e outra reconhecem, aos refrigerantes que fabricam. O desentendimento recai apenas sobre o primeiro,

que a apelante pretende se não verifica. Sem razão, todavia.

Como bem se diz na decisão impugnada, o erro a que o citado artigo 94.° se refere não é aquele a que pode estar sujeito o consumidor cuidadoso e atento, mas sim aquele de que pode ser vítima o consumidor descuidado ou desprevenido, donde resulta que, para haver imitação relevante, se não mostra necessária uma apurada ou perfeita semelhança entre as marcas, mas apenas uma semelhança que comporte a possibilidade de um engano ou confusão para o consumidor incauto. Ora, nas marcas que as partes adoptaram - Coca-

-Cola e Totocola -, ambas, sem dúvida, denominações de fantasia, há um elemento comum - o da desi- nência «cola» - e há ainda, para além disso, na com- binação dos dois termos de que se compõem, o mesmo número de letras (8) e de sílabas (4), com a mesma acentuação sobre a primeira e igual vogal de cada um deles (Có e Tó), o que torna as duas expressões, pelo menos no seu aspecto fonético, manifestamente seme- lhantes. O facto de o elemento comum «cola» poder ter carácter genérico, por se referir à planta de que se extrai a cafeína, nada significa contra a tese da sen- tença, nem a favor da que a apelante defende, já que não é ele, isoladamente, que está em causa, mas a sua associação a outro num conjunto que o faz parecido com o conjunto que a apelada já muito antes havia feito registar para a individualização do seu refrige- rante mundialmente conhecido. Nada impedirá, por isso, que um ou mais elementos

de carácter genérico possam entrar na composição de uma marca, se da originalidade da sua combinação vier a resultar uma denominação de pura fantasia. Ponto é que por essa combinação se não estabeleça confusão com outra, quiçá também imaginativa, já existente, pois, como observa Bédarribe, citado por Pouillet (vejam-se Lições de Direito Comercial do Prof. Pinto Coelho, vol. I p. 400), é pela semelhança do conjunto dos elementos que constituem a marca, e não pelas dissemelhanças que possam oferecer os diversos pormenores considerados isolada e separada- mente, que a questão da imitação deve ser apreciada. Sempre, portanto, que no conjunto da marca se

possa ver uma semelhança susceptível de a fazer con- fundir com outra já existente para os mesmos ou si- milares produtos, deve ela considerar-se imitada e ser, por isso, recusada. É o que acontece com a da apelante. Sem relevo visual em relação à da apelada, por muito

se aproximarem os seus respectivos dizeres, também o não tem auditivamente. Na sua pronúncia é até por onde menos se distin-

guem, e tudo isso, como é óbvio, havia de fazer com que, na concorrência, viesse a apelante a aproveitar-se do prestígio comercial que já a apelada conseguiu da sua, através de uma volumosa e cara propaganda de muitos anos, o que não seria moral, nem legal. É certo que é a liberdade de concorrência uma lei

fundamental económica e sociológica, que, no essencial, visa até à constante melhoria da qualidade e do preço dos produtos em favor do consumidor. Só que -não é igualmente de esquecer-, tem ela

fronteiras, sendo a principal a da lealdade, e, como se consigna no artigo 212.°, n.° 1.°, do Código da Pro- priedade Industrial, são desleais todos os actos suscep- tíveis de criarem confusão com o estabelecimento, os produtos, os serviços ou o crédito dos concorrentes, qualquer que seja o mais empregado. Não seria, por isso, legítimo, também pelo lado do

produtor, que se consentisse no registo de um dis- tintivo que, pela sua semelhança com outro, pudesse

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vir a traduzir-se, ao fim e ao cabo, na usurpação de uma propaganda já feita por terceiro, e a frequência com que na indústria e no comércio se procuram, em vez de marcas originais, as que possam ter afinidades com outras já largamente conhecidas e acreditadas faz pensar, na verdade, que é isso, como regra, que se tem em vista. Ora a concorrência desleal, ou só até a simples pos-

sibilidade dela, mesmo sem a intenção de se querer fazê-la, é também fundamento de recusa de registo (citado código, artigo 187.°, n.° 4.0). Não modifica, por esse motivo, o critério legal a

invocada circunstância de, pelo arranjo apresentado (Totocola), se ter tido especialmente em vista fazer re- cordar, por via da popularidade que já alcançaram entre nós, as apostas mútuas desportivas, mais conhe- cidas por Totobola, se pelo mesmo arranjo também se não afecta a possibilidade de ele facilmente se confun- dir, no público em geral, com o da marca Coca-Cola, da apelada. Concluindo desse modo, a sentença recorrida res-

peitou, como se impunha, as disposições dos artigos 93.°, n.° 12.°, 94.°, 187.°, n.° 4.°, e 242.°, n.° 1.°, do Código da Propriedade Industrial, que, segundo a alegação da apelante, se tiveram por violadas. Termos em que, por improcedência das conclusões

que formulou, se nega provimento ao recurso e intei- ramente se confirma a dita sentença, com custas pela apelante.

Lisboa, 7 de Janeiro de 1966. - Manuel dos Santos Vítor - José Garcia da Fonseca - Américo de Vascon- celos Botelho de Sousa.

O Escrivão de Direito, António Alexandre Pinto.

The Coca-Cola Company, sociedade norte-americana, domiciliada em Wilmington, estado de Delaware, Es- tados Unidos da América, recorre, nos termos dos artigos 203.° e seguintes do Código da Propriedade Industrial, do despacho de 20 de Fevereiro de 1964 do Ex.mo Director-Geral do Comércio que concedeu o pedido de registo da marca n.° 113 727, consistente na denominação Totocola, destinada a bebidas refrigerantes e apresentada pela sociedade portuguesa Supersumos, L.da Alega que tal registo não devia ser concedido, por-

quanto aquela marca, quer gráfica, quer foneticamente, se confunde com a de que ela, recorrente, é titular - Cora-Cola - destinando-se ambas a cobrir os mes- mos produtos. Citou várias decisões favoráveis à sua tese e juntou

certidões. Ordenado o cumprimento do disposto no artigo 206.°

do já citado código, deu a Direcção-Geral do Comércio - ao fazer a remessa do processo administrativo - a sua resposta, a fls. 55 e 56, nos termos do § 2.° do mencionado artigo. Aí, a referida repartição pronuncia-se abertamente

no sentido do provimento do recurso, dizendo que o ponto de vista defendido pela recorrente - além de dominante na jurisprudência - tem também sido per- filhado pela Direcção-Geral do Comércio, e que só o facto de o respectivo despacho, no processo burocrático, não ter sido dado pelo titular da mesma Direcção- -Geral é que originou que a marca em causa fosse concedida.

A concessionária da marca - Supersumos, L. da - veio, depois, a fls. 60 e seguintes, opor-se à pretensão da recorrente, alegando que a sua marca - Totocola - se distingue perfeitamente de Coca-Cola, não havendo possibilidade de confusão entre ambas, já que aquela logo faz recordar as apostas mútuas desportivas e é composta de uma só palavra - enquanto a segunda o é de duas, com um hífen a separá-las -, já porque o único elemento comum é o termo «Cola», que é uma expressão genérica e que, por isso, não pode constituir elemento exclusivo de uma marca. A apoiar a sua tese citou também várias decisões,

quer de carácter administrativo, quer jurisprudencial. Tudo visto, cumpre decidir: Nenhumas dúvidas se levantam quanto à tempes-

tividade do recurso. Legítimas também são as partes e nada vejo que

obste ao conhecimento do fundo da questão. O caso, como se mostra da explanação que se fez,

é simples, e tudo se resume a saber se haverá ou não possibilidade de erro ou de confusão entre as duas referidas marcas, que, ambas, se destinam a bebidas refrigerantes. Dispõe o artigo 93.° do Código da Propriedade In-

dustrial que:

Será recusado o registo das marcas que ... em todos ou alguns dos seus elementos, contenham:

12.° Reprodução ou imitação total ou parcial de marca anteriormente registada por outrem, para o mesmo produto ou produto semelhante, que possa induzir em erro ou confusão no mercado.

A marca da recorrente, Coca-Cola - e isto também se não põe em dúvida -, está registada em Portugal sob o n.° 106 338, para bebidas refrigerantes e xaropes para o fabrico de tais bebidas. O erro ou confusão a que aquele preceito se refere

é - conforme se tem entendido - aquele a que pode estar sujeito um consumidor menos atento ou preve- nido (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Março de 1962, no Boletim do Ministério da Jus- tiça n.° 115, p. 531, e de 30 de Janeiro de 1962, no mesmo Boletim n.° 113, p. 420). Posto isto, vejamos: Ambas as marcas - embora uma formada de uma

só palavra (Totocola) e outra de duas, separadas por um hífen (Gaca-Cola) - têm o mesmo número de síla- bas (4) e de letras (8) e uma desinência comum (Cola). É certo que esta desinência comum - Cola - re-

presenta uma designação genérica, mas o que não é menos certo é que não é contra a apropriação, em si, dessa desinência que a recorrente se queixa. Do que ela se queixa é contra a apropriação, no

conjunto, da marca no seu todo, da conjugação dos termos Coca-Cola, que já é algo de característico e constitui expressão de fantasia. Diz a recorrente - e isto parece ter-se como certo,

dada a sua notoriedade em geral - que, graças ao largo trabalho e prolongada propaganda que empreen- deu, com o investimento de vultosos capitais, con- seguiu para a sua marca um renome de fama mundial E que o público, ao ouvir esse nome - Coca-Cola - imediatamente a liga às bebidas que ela fábrica. Ora, na realidade, assim é. E a expressão Totocola, pronunciada desprevenida-

mente, também estamos em crer que induz facilmente o público consumidor em confusão com aquela outra

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marca, levando-o a tomar por ela os produtos a que a mesma respeita. Entendemos, por isso, que se verifica aqui a possibi-

lidade de erro ou de confusão entre as duas marcas. E daí, até, a possibilidade de concorrência desleal,

mesmo sem intenção - o que igualmente constitui fun- damento de recusa de registo, nos termos do artigo 187.°, n.° 4.°, do citado Código da Propriedade Industrial. Nestes termos, dando provimento ao recurso, revo-

gamos o já referido despacho do Ex. mo Director-Geral do Comércio de 20 de Fevereiro de 1964, ficando assim negado o registo da marca n.° 113 727, pretendido pela sociedade Supersumos, L.da E, porque esta decaiu na oposição que fez, condeno-a

nas custas deste recurso, fixando o imposto em um sexto. Valor: o indicado na petição. Oportunamente, cumpra-se o disposto no artigo 210.°

do Código da Propriedade Industrial. Registe-se e notifique-se.

Lisboa, 19 de Março de 1965. - (Ilegível).