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COMPARAÇÃO DE ESTRATÉGIAS DE CONTROLE APLICADAS A UM REGENERADOR DE ALTO FORNO EM ESCALA PILOTO ROBERTO DALMASO, CELSO J. MUNARO DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA ELÉTRICA, UFES VITÓRIA, ES, BRASIL E-MAIL: DALMASO@UCL.BR, MUNARO@ELE.UFES.BR Abstract The control of temperature and flow in regenerators used in blast furnaces is a problem of great interest in the metal- lurgical industry. The good performance of these control loops contributes to the correct operation of the blast furnace and the reduction in energy required to melt the raw materials. Two control strategies are implemented in a regenerator and compared in pilot scale. They obey the usual constraints in this type of plant. The first strategy is the usual and does not take into account the coupling between control loops. The second one establishes a linear relationship between the cold air and hot air blown out and the temperature of the regenerator. Constraints in implementing this strategy generate a coupling between control signal of tem- perature loop and the flow signal, which is compensated via estimation of this coupling. The model parameters are estimated, and the controllers and uncouplers are designed and tested in the pilot plant during the exchange of regenerators, which cause consid- erable disturbances in these control loops. Keywords modeling, blast furnace, process control Resumo O controle de temperatura e vazão em regeneradores usados em altos-fornos é um problema de grande interesse na indústria metalúrgica. O bom desempenho destas malhas de controle contribui para a correta operação do alto-forno e a redução no consumo de energia necessário para fundir as matérias primas. Duas estratégias de controle são implementadas e comparadas em um regenerador em escala piloto. Elas obedecem as restrições usuais neste tipo de planta. A primeira estratégia é a usual e não leva em consideração o acoplamento entre malhas. A segunda estabelece uma relação linear entre o ar frio e ar quente sopra- dos e a temperatura da saída do regenerador. Restrições na implementação desta estratégia geram um acoplamento do sinal de controle da malha de temperatura com a vazão, que é compensado a partir da estimação deste acoplamento. Os modelos são es- timados, e os controladores e desacopladores projetados e testados na planta piloto durante a troca de regeneradores, que causa distúrbios consideráveis nestas malhas de controle. Palavras-chave Modelagem, alto-forno, controle de processos. 1 Introdução Esse artigo apresenta os resultados obtidos da utilização de diferentes estratégias de controle, e uma comparação entre seus desempenhos, quando aplica- das a um piloto de regenerador de alto-forno. Discute também como a escolha de diferentes atuadores pre- sentes no piloto, afeta o acoplamento entre suas ma- lhas. A implementação das técnicas e a construção do piloto levam em consideração as principais caracte- rísticas da planta real, como os atuadores e sensores utilizados, para aumentar a compatibilidade entre os resultados obtidos no piloto e uma possível implanta- ção na planta real. Para o entendimento do trabalho, somente uma ideia conceitual do piloto, mínima, é utilizada. A construção do piloto, com todos seus detalhes construtivos, é apresentada em Munaro et. al (2011) e também em Dalmaso et. al (2013), onde uma revisão de vários aspectos do piloto foi efetuada. O artigo está organizado da seguinte forma: a Seção seguinte apresenta uma revisão bibliográfica e des- creve o piloto utilizado nos ensaios, sua instrumenta- ção e as estratégias aplicadas. Na Seção 3 são mos- trados os sinais aplicados no piloto, os modelos, controladores e compensadores obtidos e os testes em malha fechada. As conclusões são apresentadas na Seção 4. 2 Controle de vazão e temperatura em altos- fornos O alto-forno é um reator metalúrgico, que trans- forma matérias primas (sínter, minérios, pelotas, fundentes, coque e outros) em gusa líquido, para a partir dele produzir o aço. A fonte de calor usada no mesmo é proveniente do ar pré-aquecido nos regene- radores. Além de fornecer ar aquecido com tempera- tura e vazão especificadas, estes equipamentos de- vem operar otimizando o uso da energia, que necessi- tam em grandes quantidades. Como apresentado em Ming et al. (2012), uma variação de 100°C em tal temperatura pode implicar em uma diferença de 15 a 20 kg de coque consumido por tonelada de gusa produzido, tornando o estudo de controladores para tal aplicação um assunto de grande interesse para a indústria. Em Jinsheng et al. (2007) técnicas de inteligência computacional são aplicadas enquanto controladores preditivos baseados em modelos são utilizados em Muske et. al (2000,b), Zhang et al. (2008) e Flen et al. (2011). O equipamento responsável pela geração do ar quen- te no processo de fabricação de gusa é o regenerador (Figura 1). Ele consiste de uma torre cilíndrica reves- tida internamente de tijolos refratários com o objeti- vo de manter o calor gerado através da queima de gases, feita na câmara de mistura, e posteriormente Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014 4052

COMPARAÇÃO DE ESTRATÉGIAS DE CONTROLE … · Modelagem, alto-forno, controle de processos. 1 Introdução . Esse artigo apresenta os resultados obtidos da utilização de diferentes

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COMPARAÇÃO DE ESTRATÉGIAS DE CONTROLE APLICADAS A UM REGENERADOR DE ALTO FORNO EM ESCALA

PILOTO

ROBERTO DALMASO, CELSO J. MUNARO

DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA ELÉTRICA, UFES

VITÓRIA, ES, BRASIL

E-MAIL: [email protected], [email protected]

Abstract The control of temperature and flow in regenerators used in blast furnaces is a problem of great interest in the metal-

lurgical industry. The good performance of these control loops contributes to the correct operation of the blast furnace and the

reduction in energy required to melt the raw materials. Two control strategies are implemented in a regenerator and compared in pilot scale. They obey the usual constraints in this type of plant. The first strategy is the usual and does not take into account the

coupling between control loops. The second one establishes a linear relationship between the cold air and hot air blown out and

the temperature of the regenerator. Constraints in implementing this strategy generate a coupling between control signal of tem-perature loop and the flow signal, which is compensated via estimation of this coupling. The model parameters are estimated, and

the controllers and uncouplers are designed and tested in the pilot plant during the exchange of regenerators, which cause consid-

erable disturbances in these control loops.

Keywords modeling, blast furnace, process control

Resumo O controle de temperatura e vazão em regeneradores usados em altos-fornos é um problema de grande interesse na

indústria metalúrgica. O bom desempenho destas malhas de controle contribui para a correta operação do alto-forno e a redução no consumo de energia necessário para fundir as matérias primas. Duas estratégias de controle são implementadas e comparadas

em um regenerador em escala piloto. Elas obedecem as restrições usuais neste tipo de planta. A primeira estratégia é a usual e

não leva em consideração o acoplamento entre malhas. A segunda estabelece uma relação linear entre o ar frio e ar quente sopra-dos e a temperatura da saída do regenerador. Restrições na implementação desta estratégia geram um acoplamento do sinal de

controle da malha de temperatura com a vazão, que é compensado a partir da estimação deste acoplamento. Os modelos são es-

timados, e os controladores e desacopladores projetados e testados na planta piloto durante a troca de regeneradores, que causa distúrbios consideráveis nestas malhas de controle.

Palavras-chave Modelagem, alto-forno, controle de processos.

1 Introdução

Esse artigo apresenta os resultados obtidos da

utilização de diferentes estratégias de controle, e uma

comparação entre seus desempenhos, quando aplica-

das a um piloto de regenerador de alto-forno. Discute

também como a escolha de diferentes atuadores pre-

sentes no piloto, afeta o acoplamento entre suas ma-

lhas. A implementação das técnicas e a construção do

piloto levam em consideração as principais caracte-

rísticas da planta real, como os atuadores e sensores

utilizados, para aumentar a compatibilidade entre os

resultados obtidos no piloto e uma possível implanta-

ção na planta real. Para o entendimento do trabalho,

somente uma ideia conceitual do piloto, mínima, é

utilizada. A construção do piloto, com todos seus

detalhes construtivos, é apresentada em Munaro et. al

(2011) e também em Dalmaso et. al (2013), onde

uma revisão de vários aspectos do piloto foi efetuada.

O artigo está organizado da seguinte forma: a Seção

seguinte apresenta uma revisão bibliográfica e des-

creve o piloto utilizado nos ensaios, sua instrumenta-

ção e as estratégias aplicadas. Na Seção 3 são mos-

trados os sinais aplicados no piloto, os modelos,

controladores e compensadores obtidos e os testes

em malha fechada. As conclusões são apresentadas

na Seção 4.

2 Controle de vazão e temperatura em altos-

fornos

O alto-forno é um reator metalúrgico, que trans-

forma matérias primas (sínter, minérios, pelotas,

fundentes, coque e outros) em gusa líquido, para a

partir dele produzir o aço. A fonte de calor usada no

mesmo é proveniente do ar pré-aquecido nos regene-

radores. Além de fornecer ar aquecido com tempera-

tura e vazão especificadas, estes equipamentos de-

vem operar otimizando o uso da energia, que necessi-

tam em grandes quantidades. Como apresentado em

Ming et al. (2012), uma variação de 100°C em tal

temperatura pode implicar em uma diferença de 15 a

20 kg de coque consumido por tonelada de gusa

produzido, tornando o estudo de controladores para

tal aplicação um assunto de grande interesse para a

indústria. Em Jinsheng et al. (2007) técnicas de

inteligência computacional são aplicadas enquanto

controladores preditivos baseados em modelos são

utilizados em Muske et. al (2000,b), Zhang et al.

(2008) e Flen et al. (2011).

O equipamento responsável pela geração do ar quen-

te no processo de fabricação de gusa é o regenerador

(Figura 1). Ele consiste de uma torre cilíndrica reves-

tida internamente de tijolos refratários com o objeti-

vo de manter o calor gerado através da queima de

gases, feita na câmara de mistura, e posteriormente

Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014

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Page 2: COMPARAÇÃO DE ESTRATÉGIAS DE CONTROLE … · Modelagem, alto-forno, controle de processos. 1 Introdução . Esse artigo apresenta os resultados obtidos da utilização de diferentes

conduzida por entre os refratários de suas paredes.

Um alto-forno, dependendo de seu volume e geome-

tria do regenerador, pode apresentar três ou quatro

regeneradores, os quais trabalham sempre alternando

entre ciclos absorção de calor (aquecimento) e forne-

cimento de calor, ou seja, enquanto um (ou dois, no

caso do emprego de quatro regeneradores) regenera-

dor é aquecido os outros fornecem calor para o ar

que será insuflado no alto-forno. O momento da

alternância entre um ciclo e outro é comumente cha-

mado de troca de regeneradores. A troca de regene-

radores é um dos momentos mais críticos dentro do

processo de geração do ar quente. Um estudo quanto

aos vários aspectos de segurança operacional e pro-

blemas potenciais que podem ocorrer durante as

trocas foi apresentado em Nieckle et al. (2006).

Figura 1 - Regenerador. a) Aquecimento b) Ventilação

A temperatura de saída do ar do processo é muito

alta (superior a 1000oC), tornando sua medição e a

condução de experimentos aplicados diretamente às

instalações do processo, como feito em Jinsheng et

al. (2008) e Choi et al. (2006), algo muito perigoso e

custoso. Por isto, pilotos são utilizados para análises

e testes sempre que possível, como em Ming et al.

(2012), Munaro et al. (2011) e Dalmaso et al. (2013).

Os principais fenômenos físicos envolvidos nesse

processo estão relacionados às trocas de calor entre o

fluído e as paredes de refratário e vice-versa, forne-

cendo diferentes modelos para aquecimento e arrefe-

cimento como mostrado em Zhang et al. (2008). Os

modelos são tipicamente não-lineares, podendo ne-

cessitar de estratégias mais elaboradas para um bom

desempenho em seu controle (Raul et al., 2013). O

foco deste trabalho é usar técnicas de menor comple-

xidade, tanto para o projeto quanto para a implanta-

ção. Os sensores e atuadores utilizados do piloto

produzem informações muito próximas da planta

real, gerando bons resultados e que podem ser facil-

mente utilizados em sistemas de controle usados em

altos-fornos. O ar quente soprado no alto-forno é

responsável por reduzir a matéria prima carregada

em seu interior a ferro gusa. Para isso, o ar deve ser

aquecido a uma temperatura que é calculada de acor-

do com o ritmo de produção que se deseja; tal ritmo

controla também a taxa de adição de matérias primas.

Uma elevação dessa temperatura gera um desbalan-

ceamento, fazendo com que o material seja reduzido

mais rápido, o que produz uma elevação na tempera-

tura do gás gerado, causando sua expansão, o que,

por consequência, aumenta a pressão interna do for-

no, podendo gerar caminhos preferenciais de ar so-

prado passando direto pela carga (“efeito chaminé”).

As válvulas de segurança do topo do forno podem ser

abertas neste caso. Por outro lado, caso a temperatura

do ar soprado seja fornecida abaixo do valor calcula-

do, irá faltar energia para a combustão dos combustí-

veis por unidade de tempo, causando assim uma

queda do nível térmico do forno, pois não será obtida

uma temperatura de chama suficiente para queimar

todo o combustível. Esta perda de energia pode

culminar na queda da temperatura do gusa, o que se

persistir por um tempo muito longo pode causar o

esfriamento do forno (“marcha fria”). Igualmente

importante é o controle da relação pressão/vazão do

ar soprado, que pode levar a efeitos similares aos

gerados pela variação da temperatura. Para que seja

insuflado dentro do forno, o ar necessita estar com

uma pressão superior a do interior do mesmo. Uma

pressão muito alta pode causar também o efeito cha-

miné já explicado.

2.1 Constituição do piloto de regenerador

Dada a importância do controle da vazão e tempera-

tura no processo de produção do ferro gusa, um pilo-

to de regenerador foi utilizado para avaliar diferentes

estratégias de controle visando melhorar o desempe-

nho das malhas de controle principalmente durante a

troca de regenerador, por ser este um momento que

causa distúrbios consideráveis. O diagrama do piloto

é mostrado na Figura 2 e na Tabela 1 é listada a no-

menclatura utilizada. A medição da vazão mássica

( ) é feita por medidor com efeito de dispersão

térmica. A temperatura do ar de saída da planta ( ) e

dos regeneradores ( e ) é feita através de

termorresistências do tipo PT1000. Um ventilador

axial é usado para geração do fluxo de ar sendo con-

trolado por um motor CC acionado via PWM. Os

dois regeneradores são equipados com resistências

elétricas acionadas por meio de tiristores. Válvulas

de controle são usadas nas linhas de ar quente (VHS1

e VHS2) e frio (VF) para controlar a mistura de ar que

vai para as câmaras de mistura de ar quente (CQ) e de

ar frio (CF). Para minimizar as perdas térmicas por

condução e convecção, tubos de maiores diâmetros,

com seus interiores recobertos por tinta refratária,

foram usados nas linhas de transporte do ar quente.

HS1

TE

HS2

M

ω1

TEFT

TE

VHS1 VHS2

VF

CF

CQ

Figura 2 – Diagrama de instrumentação do piloto de regenerador

Anais do XX Congresso Brasileiro de Automática Belo Horizonte, MG, 20 a 24 de Setembro de 2014

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Tabela 1. Nomenclatura utilizada

Válvula da linha de ar do regenerador 1

Válvula da linha de ar do regenerador 2

Válvula da linha de ar frio

Regenerador 1

Regenerador 2

Câmara de mistura do ar quente

Câmara de mistura do ar quente e ar frio

Posição da válvula de ar do regenerador 1

Posição da válvula de ar do regenerador 2

Posição da válvula de ar frio

Vazão mássica de ar quente

Vazão mássica de ar frio

Temperatura do ar do regenerador 1

Temperatura do ar do regenerador 2

Temperatura ambiente

Temperatura do ar de saída da planta

Vazão mássica do ar de saída da planta

2.2 Modelagem da câmara de mistura de ar

O piloto apresenta vários fenômenos físicos em suas

diversas partes, em sua maioria processos de troca

térmica, e dentre eles o mais importante é o ocorrido

na câmara de mistura de ar quente e frio. Esta câmara

é responsável por definir a temperatura e a vazão de

saída da planta e por isso será estudada em maior

detalhe. Não representaremos a variável tempo nas

equações para maior simplicidade da notação.

Dada uma câmara de mistura com duas entradas e

uma saída, a equação do fluxo de energia em estado

estacionário é dada por:

( ) (1)

onde é a vazão mássica de saída, e , são

as vazões mássicas das entradas, e , e são

respectivamente as entalpias dos fluídos de saída e

das entradas 1 e 2.

Considerando-se a conservação de massa através da

câmara, tem-se que:

(2)

transformando assim (1) em:

( ) ( ) (3)

Como a câmara de mistura tem um isolamento térmi-

co adequado, pode ser tratada como adiabática, redu-

zindo (3) a

( ) ( )

(4)

A variação da entalpia em uma câmara com pressão

constante pode ser calculada pela expressão:

(5)

sendo o calor específico a pressão constante e a

temperatura no interior da câmara. Aplicando-se (5)

em (4) e considerando-se as entradas 1 e 2 como

entradas de ar frio e quente, respectivamente, a tem-

peratura do fluído de saída será dada por:

(6)

Considerando que as diferenças entre os calores

específicos dentro da faixa de temperatura de traba-

lho utilizada sejam desprezíveis ( ), a

temperatura do fluído de saída (6) pode ser descrita

por:

(7)

Definindo-se como a razão entre as vazões de ar

quente e a de saída:

(8)

e considerando-se a conservação das massas na câ-

mara de mistura (2), temos que:

( )

(9)

Pode-se então, a partir de (8) e (9) reescrever a tem-

peratura de saída em função de :

( ) (10)

2.3 Estratégias para o controle das malhas

Várias formas e pontos de atuação são possíveis para

realização do controle das malhas de vazão e tempe-

ratura. Dentre elas, duas diferentes estratégias foram

estudadas: a primeira é uma versão mais simples de

ser implementada considerando as duas malhas inde-

pendentes, porém sujeita a desvios maiores devido ao

projeto dos controladores desconsiderar a interação

entre as malhas. Já a segunda, utiliza um desacopla-

dor para diminuir o efeito da malha de temperatura

sobre a vazão e uma expressão para linearizar a ação

da válvula fria sobre a temperatura de saída e reduzir

o efeito que a velocidade do soprador tem sobre ela.

2.4 Controle da vazão e temperatura sem o contro-

lador desacoplador

Consiste na implementação mais simples, e aplicada

na indústria, utilizando dois controladores PID inde-

pendentes para o controle das malhas de vazão e

temperatura (Figura 3). O controlador de temperatura

atua sobre a posição da válvula de ar frio, e o contro-

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lador de vazão pode atuar sobre a velocidade do

soprador ou sobre a posição da válvula de ar quente.

A estabilidade do sistema em malha fechada ocorre

devido ao modo cooperativo entre as ações de con-

trole das malhas. Um aumento na vazão de ar frio

gera um aumento da vazão de saída o que deve ser

corrigido pelo controlador de vazão, o qual diminui a

vazão de ar quente, reduzindo assim a temperatura de

saída. Essa estratégia não leva em consideração a não

linearidade causada pelo uso isolado da posição da

válvula de ar frio ( ) no controle da temperatura.

+-

C1 G1

+-

C2 G2

XVF

1

G4

G3

++

++

Figura 3 - Estratégia com controladores independentes

2.5 Controle da temperatura por ação da relação

entre as válvulas de ar frio e quente

Uma possível implementação para (10) é a manipu-

lação da posição da válvula de ar quente segun-

do , e da posição da válvula de ar frio segundo

( ). Dessa forma, um desacoplamento natural

entre as malhas de vazão e temperatura seria gerado,

já que, ao se mudar o valor de , alterações de mes-

ma magnitude e diferentes direções seriam promovi-

das nas posições das válvulas de ar quente e frio,

mantendo-se assim a vazão de saída inalterada. De

forma similar, ao se alterar a velocidade do soprador

teríamos um acréscimo linear em ambas as vazões, o

que manteria o valor de e, por consequência, a

temperatura de saída inalterados. Porém, é comum

que as válvulas responsáveis pelo fluxo de ar quente

em plantas reais de regeneradores sejam do tipo on-

off, dado o custo de aquisição e manutenção de uma

válvula de controle de tal porte, não permitindo as-

sim a realização dessa estratégia de controle sem o

investimento financeiro adequado. Para contornar

esta restrição, tal válvula é mantida totalmente aberta

durante os ciclos de troca, como faria uma válvula do

tipo on-off, enquanto a válvula de ar frio é manipula-

da. Para se obter a relação imposta por mantendo-

se totalmente aberta, considerando que

e , tem-se que:

( )

(11)

Sendo assim, variando-se entre 0,5 e 1,0, seria

alterada de acordo com (11), obtendo-se então uma

variação linear da temperatura de saída , conforme

apresentado na Figura 4. Considera-se para esse

exemplo, uma temperatura de ar frio de 25 e uma

temperatura de ar quente de 75 , com o sistema em

regime estacionário.

Figura 4 – Variação de e x

Entretanto, tal proposta gera um acoplamento entre a

malha de temperatura e a malha de vazão, já que

alterar mantendo-se constante, causa uma

variação na vazão de saída gerada, o que pode ser

compensado através do uso de um controlador

desacoplador ( ), como apresentado na Figura 5.

+-

C1 G1

G3

+-

C2 G2

XVF

1 ++

А

++

Co1

(1 Α)

Α× 1

++

G4

Figura 5 – Estratégia de controle com o controlador desacoplador

3 Aplicação e Resultados

Escolhendo-se a segunda estratégia como refe-

rência, para possibilitar o projeto dos controladores

( ) e ( ) e do compensador ( ) é necessá-

rio identificar as funções de transferência ( ), ( ), ( ) e ( ). Para isso, dois tipos de expe-

rimentos foram realizados repetidamente, um para a

obtenção de ( ) e ( ), e outro para a obter-se

( ) e ( ). Os parâmetros das FTs foram obtidos

por mínimos quadrados usando a ferramenta ident do

Matlab. Cada teste foi repetido por três vezes para

verificação de sua repetibilidade, consistindo da

aplicação de degraus as entradas, fazendo com que as

saídas da planta fiquem próximas da região em que

devem operar.

3.1 Obtenção das funções de transferência ( ) e

( )

Nos experimentos para determinação de ( ) e

( ), a válvula de ar quente foi mantida aberta

a 100% e a resistência de aquecimento do regenera-

dor a 15% de sua potência durante todo o teste. Fo-

ram aplicados então três degraus na posição da vál-

vula de ar frio, segundo a relação determinada por

(11), enquanto a vazão e temperatura eram registra-

das a cada 200ms. Como mostrado em (10), a tempe-

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ratura de saída sofre influência tanto de quanto de

e . Como tais temperaturas nas aplicações reais

sofrem alterações normais durante o processo de

trabalho, serão modeladas como um distúrbio de

entrada do processo. Portanto, a identificação deste

modelo teve como entrada , e como saída . A

Figura 6 apresenta as três curvas de temperatura de

saída obtidas (linhas sólidas apresentadas em oC) e as

variações impostas a (linha tracejada). A Figura 7

apresenta os dados relativos a vazão mássica da saída

(linhas sólidas apresentadas em SLPM), , e da

posição da válvula fria, (apresentada em %),

obtida através da aplicação dos valores de em (11)

de acordo com o diagrama apresentado na Figura 5.

Figura 6 - Obtenção de ( ) -

Figura 7 - Obtenção de ( ) –

A partir dos dados coletados três modelos de primei-

ra ordem foram encontrados para ( ) e outros três

para ( ). Para a utilização no projeto dos controla-

dores e simulação, foi considerado o modelo resul-

tante da média dos parâmetros obtidos nos três en-

saios, gerando as seguintes funções de transferência:

( ) ( )

( )

( ) ( )

( )

A Tabela 2 apresenta a média e o desvio padrão dos

diversos parâmetros obtidos para os modelos de

( ) e ( ), e as Figuras 8 e 9 mostram a adequa-

ção dos modelos encontrados (linha sólida) aos dados

coletados (linhas pontilhadas).

Tabela 2 - Parâmetros obtidos para as funções de transferência

( ) e ( )

FT

Ganho Constante de tem-

po

Média Desvio

padrão Média

Desvio

padrão

( ) 61,6 6,6 15,5 1,8

( ) 0,26 0,009 0,15 0,07

Figura 8 - Teste do modelo resultante de ( )

Figura 9 - Teste do modelo resultante de ( )

3.2 Obtenção das funções de transferência ( ) e

( )

De forma análoga à obtenção dos modelos anteriores,

o modelo ( ) foi obtido. Três experimentos foram

feitos aplicando-se três degraus cada na velocidade

do soprador ( ). Os resultados são apresentados na

Figura 10: as linhas sólidas correspondem à vazão

mássica de saída medida em SLPM, e a curva trace-

jada apresenta a velocidade do soprador, em percen-

tual de sua velocidade máxima.

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Figura 10 – Experimentos para obtenção de ( )

A partir dos dados coletados três modelos de primei-

ra ordem foram obtidos da mesma forma como foi

conduzido para as funções de transferência anterio-

res. A média dos parâmetros dos modelos obtidos foi

calculada e a função de transferência resultante en-

contrada é:

( ) ( )

( )

A Tabela 3 apresenta a média e o desvio padrão dos

três modelos obtidos para ( ). A Figura 11 mostra

uma comparação entre os dados coletados e o mode-

lo resultante.

Tabela 3 - Parâmetros obtidos da função de transferência ( )

FT

Ganho Constante de tem-

po

Média Desvio

padrão Média

Desvio

padrão

( ) 1,01 0,08 0,57 0,11

Figura 11 – Teste do modelo obtido de ( )

Para verificar a influência de e de na tempe-

ratura de saída da planta, foram aplicados degraus a

esta variável e medido seu efeito e de sobre ,

resultando em

( ) ( ) ( ) ( ) ( )

( )

( )

Os dados do experimento são mostrados na Figura

12. Os ganhos de ( ) e de ( ) demonstram o

efeito desprezível de como esperado, quando

compara-se o ganho destas FTs com o ganho de

( ). Portanto, nenhum compensador de desaco-

plamento é projetado de ( ) para ( ).

Figura 12 – Experimentos para obtenção de ( )

3.3 Projeto do controlador desacoplador

Dado o acoplamento significativo entre o sinal de

controle da malha de temperatura e a vazão, um

compensador dinâmico foi calculado (Seborg et

al.,2004) para diminuir o efeito devido a ( ):

( ) ( )

( )

3.4 Projeto dos controladores

Como todos os modelos encontrados foram de pri-

meira ordem, controladores do tipo P+I foram proje-

tados para que as funções de transferência de malha

fechada se comportassem como processos de segun-

da ordem. Como critério para o projeto do controla-

dor foram definidos um fator de amortecimento uni-

tário, evitando-se assim ultrapassagem, e, constantes

de tempo, em malha fechada, de 10s e 2s para as

malhas de temperatura e vazão, respectivamente. A

escolha dos valores foi feita de modo a diminuir a

constante de tempo resultante da malha de tempera-

tura, para obtenção de uma resposta mais rápida, e

manter a constante de tempo da malha de vazão,

visto tal malha já apresentar uma constante de tempo

relativamente pequena (Seborg et al.,2004). Os com-

pensadores obtidos foram:

( )

( )

3.5 Teste das estratégias de controle

Na Figura 13 é mostrado o diagrama que representa o

sistema modelado e a segunda estratégia de controle

com os controladores e compensadores projetados. A

função de transferência ( ) foi suprimida por ser

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considerada desprezível. Este diagrama é apenas

ilustrativo e não é usado para simulação, uma vez

que as estratégias de controle são aplicadas direta-

mente na planta piloto, o que permite a realização de

qualquer teste, com resultados mais representativos

do se fossem utilizados os modelos.

Figura 13 – Diagrama de malha fechada

Para testar o desempenho da planta com os controla-

dores e compensador projetados, os controladores

foram implementados em computador pessoal, auxi-

liado por uma placa de interface / condicionamento

de sinais, projetada especificamente para o piloto,

com tempos de amostragem de 100 milissegundos,

colocando os regeneradores em operação contínua,

funcionando da seguinte forma:

1. HS1 aquecendo por 120 segundos;

2. HS1 soprando e HS2 aquecendo por 120 se-

gundos;

3. HS1 e HS2 soprando juntos por 10 segun-

dos;

4. HS2 soprando e HS1 aquecendo por 120 se-

gundos;

5. HS1 e HS2 soprando juntos por 10 segun-

dos;

6. Repete a partir de 2.

O resultado aplicado ao piloto em operação contínua

segundo as duas estratégias é mostrado nas Figuras

14 e 15. As medições são mostradas sem filtragem.

As referências da temperatura, 50°C, e de vazão, 40

SLPM, são apresentadas de forma tracejada. É mos-

trado o período que compreende uma troca completa.

A troca de regenerador acontece no intervalo entre

50 e 60 segundos. A comparação entre o desempenho

das duas estratégias é apresentada na Tabela 4.

Figura 14 – Resposta da planta em operação contínua com um

controlador desacoplador

Figura 15 - Resposta da planta em operação contínua sem o con-

trolador desacoplador

Tabela 4 - Comparação dos resultados

Estratégia

Malha de vazão

[SLPM]

Malha de temperatura

[°C]

IAE Ultrapas-

sagem IAE

Ultrapas-

sagem

PI +

desaco-

plador

81,6 6,6 18,5 1,2

PI 110,5 17,0 73,1 3,9

Considerando que ambas estratégias utilizam os

mesmos equipamentos, fica claro como o uso do

controlador desacoplador projetado através dos mo-

delos levantados e, a escolha das variáveis manipula-

das feita de forma a minimizar um acoplamento

adicional e não linearidades, contribuiu para a me-

lhoria de desempenho das malhas. A ultrapassagem

máxima foi reduzida na malha de vazão de 43 para

17% e na malha de temperatura de 8 para 2%, en-

quanto o IAE foi reduzido em 26% para a malha de

vazão e 75% para a malha de temperatura. Essa nova

estratégia permite melhorar o desempenho nas trocas

de regeneradores, bem como reduzir o consumo de

energia e a probabilidade de acidentes operacionais,

mantendo a vazão de ar quente e a temperatura nos

valores desejados. Embora este estratégia seja mais

complexa por requerer a identificação de uma FT

adicional e a relação entre temperatura e posição das

válvulas de ar quente e ar frio, a complexidade não

ocorre na implementação, dado o uso de funções

comuns em sistemas de controle de altos-fornos.

4 Conclusão

O problema de controle e temperatura de vazão

de ar quente produzido por regeneradores de alto-

forno foi aqui considerado. Os modelos de vazão e

temperatura com os respectivos acoplamentos foram

identificados a partir de respostas ao degrau. Usando

uma nova estratégia de controle, com variáveis

manipuladas escolhidas para reduzir o acoplamento

e, levando em consideração as limitações da planta

real, dois controladores PI e um controlador

desacoplador foram projetados e asseguraram o

seguimento de referências de temperatura e vazão. O

método proposto foi comparado com a estratégia

usual de usar controladores independentes, e o

desempenho durante a troca de regeneradores

mostrou melhorias significativas. A implementação

de ambos métodos pode ser feita em sistemas de

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controle usuais, não requerendo funções especiais.

Técnicas mais sofisticadas podem ser futuramente

testadas, verificando se o desempenho obtido

aumenta a ponto de justificar sua implantação.

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