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COMPORTAMENTO DOS MANACÁS-DA-SERRA (TIBOUCHINA SP) SEMEADOS POR VIA AÉREA EM CUBATÃO RESUMO Este trabalho contém uma avaliação do comporta- mento dos manacás-da-serra (Tibouchina pulchra e Tibouchina mutabilis) semeados, por via aérea, em trecho da Mata Atlântica degradada pela poluição at- mosférica, em Cubatão, estado de São Paulo. Estas espécies arbóreas são nativas da região, pioneiras e resistentes à poluição, tendo sido semeadas em 70 ha de manchas desprovidas de vegetação arbórea e escorregamentos, dispersos em 15 krn-de escarpas da Serra do Mar. A análise de dados de sobrevivência, densidade e crescimento demonstra que o aumento artificial do aporte de sementes para as áreas degrada- das, através da semeadura aérea, promove um incre- mento significativo na regeneração do manacá-da-ser- ra, quando comparada à regeneração natural. Palavras-chave: recuperação de áreas degradadas, Mata Atlântica, Cubatão, Tibouchina, semeadura aérea. 1 INTRODUÇÃO A recuperação de comunidades vegetais em ecos- sistemas tropicais tem sido, em geral, realizada através do plantio de mudas de espécies arbóreas, produzidas em viveiros, sem critérios ecológicos definidos. Mais recentemente, têm surgido modelos de reflorestamento em áreas degradadas baseados na dinâmica de popula- ções florestais, utilizando-se o plantio simultâneo de mudas de espécies pertencentes a diferentes grupos ecológicos de sucessão (KAGEYAMA et alii, 1986; 1990; GANDOLFI et alii, 1990; SANTARELLI, 1990). Neste sentido, o uso de espécies pioneiras tem sido preconizado pois "possuem grande potencial de coloni- . zação e rápido crescimento", aumentando a viabilidade econômica da recuperação (VIANA, 1987). Em 1989, foi realizada uma experiência inédita utilizando-se a semeadura direta de espécies arbustivas e arbóreas, por via aérea, em áreas da Serra do Mar, degradadas pela poluição atmosférica de Cubatão, no estado de São Paulo (POMPÉIA etalii, 1989). A primeira fase do modelo adotado neste trabalho (FIGURA 1) baseou-se no emprego de espécies pioneiras típicas (1) Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental- CETESB. Sérgio Luís POMPÉIAJ Dione Zangelmi Abrahão PRADELLA1 Kátia Maria DlNIZ1 Roney Perez dos SANTOS1 ABSTRACT This work has the performance evaluation of the pioneer tree species of manacás-da-serra (Tibouchina pulchre and T. mutabilis) planted by aerial sowing in approximatelly 70 ha on degraded areas by air pollution, in Serra do Mar, Cubatão, São Paulo. The results of survival, density and growing of the seedlines shows that the added quantity of seeds by aerial sowing promoted a significant increase on regeneration of these species. Key words: reconstitution of degraded areas, Mata Atlântica, Cubatão, Tibouchina, aerial sowing. das capoeiras da Mata Atlântica, que representam de forma genérica a sucessão secundária deste complexo ecossistema. Com a formação de capoeiras por regene- ração natural e através da semeadura aérea espera-se restabelecer o papel hidrológico da floresta e criar condi- ções apropriadas ao prosseguimento da colonização por plantas mais exigentes, após o controle da poluição (POMPÉIA, 1990). Dentre as 33 espécies de árvores e arbustos utiliza- das, destacam-se a Tibouchina pulchra Cogn. e Tibouchina mutabilis Cogn., conhecidas vulgarmente por manacá-da-serra, como as mais importantes para a recuperação das áreas degradadas da MataAtlântica em Cubatão, por suas características ecológicas e pela grande produção de sementes. Ambas as espécies são arbóreas de rápido crescimento, tipicamente pioneiras, altamente resistentes à poluição atmosférica de Cubatão e apresentam como principal estratégia de regeneração a chuva de sementes (POMPÉIA et alii, 1989). A seme- lhança entre as duas espécies quanto aos aspectos vegetativos, reprodutivos e ecofisiológicos levou a tratá- Ias em conjunto neste trabalho sob a mesma denomina- ção de manacá-da-serra. Anais - 2º Congresso Nacional sobre Essências Nativas - 29/3/92-3/4/92 506

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COMPORTAMENTO DOS MANACÁS-DA-SERRA (TIBOUCHINA SP)SEMEADOS POR VIA AÉREA EM CUBATÃO

RESUMO

Este trabalho contém uma avaliação do comporta-mento dos manacás-da-serra (Tibouchina pulchra eTibouchina mutabilis) semeados, por via aérea, emtrecho da Mata Atlântica degradada pela poluição at-mosférica, em Cubatão, estado de São Paulo. Estasespécies arbóreas são nativas da região, pioneiras eresistentes à poluição, tendo sido semeadas em 70 hade manchas desprovidas de vegetação arbórea eescorregamentos, dispersos em 15 krn-de escarpas daSerra do Mar. A análise de dados de sobrevivência,densidade e crescimento demonstra que o aumentoartificial do aporte de sementes para as áreas degrada-das, através da semeadura aérea, promove um incre-mento significativo na regeneração do manacá-da-ser-ra, quando comparada à regeneração natural.

Palavras-chave: recuperação de áreas degradadas,Mata Atlântica, Cubatão, Tibouchina,semeadura aérea.

1 INTRODUÇÃO

A recuperação de comunidades vegetais em ecos-sistemas tropicais tem sido, em geral, realizada atravésdo plantio de mudas de espécies arbóreas, produzidasem viveiros, sem critérios ecológicos definidos. Maisrecentemente, têm surgido modelos de reflorestamentoem áreas degradadas baseados na dinâmica de popula-ções florestais, utilizando-se o plantio simultâneo demudas de espécies pertencentes a diferentes gruposecológicos de sucessão (KAGEYAMA et alii, 1986;1990; GANDOLFI et alii, 1990; SANTARELLI, 1990).Neste sentido, o uso de espécies pioneiras tem sidopreconizado pois "possuem grande potencial de coloni-

. zação e rápido crescimento", aumentando a viabilidadeeconômica da recuperação (VIANA, 1987).

Em 1989, foi realizada uma experiência inéditautilizando-se a semeadura direta de espécies arbustivase arbóreas, por via aérea, em áreas da Serra do Mar,degradadas pela poluição atmosférica de Cubatão, noestado de São Paulo (POMPÉIA etalii, 1989). A primeirafase do modelo adotado neste trabalho (FIGURA 1)baseou-se no emprego de espécies pioneiras típicas

(1) Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental- CETESB.

Sérgio Luís POMPÉIAJDione Zangelmi Abrahão PRADELLA1Kátia Maria DlNIZ1Roney Perez dos SANTOS1

ABSTRACT

This work has the performance evaluation of thepioneer tree species of manacás-da-serra (Tibouchinapulchre and T. mutabilis) planted by aerial sowing inapproximatelly 70 ha on degraded areas by air pollution,in Serra do Mar, Cubatão, São Paulo. The results ofsurvival, density and growing of the seedlines shows thatthe added quantity of seeds by aerial sowing promoted asignificant increase on regeneration of these species.

Key words: reconstitution of degraded areas, MataAtlântica, Cubatão, Tibouchina, aerialsowing.

das capoeiras da Mata Atlântica, que representam deforma genérica a sucessão secundária deste complexoecossistema. Com a formação de capoeiras por regene-ração natural e através da semeadura aérea espera-serestabelecer o papel hidrológico da floresta e criar condi-ções apropriadas ao prosseguimento da colonização porplantas mais exigentes, após o controle da poluição(POMPÉIA, 1990).

Dentre as 33 espécies de árvores e arbustos utiliza-das, destacam-se a Tibouchina pulchra Cogn. eTibouchina mutabilis Cogn., conhecidas vulgarmente pormanacá-da-serra, como as mais importantes para arecuperação das áreas degradadas da MataAtlântica emCubatão, por suas características ecológicas e pelagrande produção de sementes. Ambas as espécies sãoarbóreas de rápido crescimento, tipicamente pioneiras,altamente resistentes à poluição atmosférica de Cubatãoe apresentam como principal estratégia de regeneraçãoa chuva de sementes (POMPÉIA et alii, 1989). A seme-lhança entre as duas espécies quanto aos aspectosvegetativos, reprodutivos e ecofisiológicos levou a tratá-Ias em conjunto neste trabalho sob a mesma denomina-ção de manacá-da-serra.

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,GRUPO ECOLOGICO

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TRATÉGICOS DA SERRA

FIGURA 1 - Modelo da recuperação da vegetação da Serra do Mar em Cubatão

A adoção do método de semeadura aérea parareplantio de encostas, utilizado com sucesso no Japãodesde 1961 (AKIYAMA, 1990), resultou da conjugaçãodas dificuldades de acesso aos locais de plantio na Serrado Mar com as características biológicas de dispersãodas espécies escolhidas. Para contornar as limitaçõesadvindas do reduzido peso das sementes de manacá (daordem de 0,02 mg) e evitar sua dispersão pelo vento e aretenção pela vegetação herbácea e arbustiva existente,desenvolveu-se uma técnica de peletização de semen-tes em gel hidrofílico (PRADELLA et alii, 1992) que,através do aumento do peso e volume, permitiu seulançamento por via aérea.

Este trabalho contém uma avaliação do comporta-mento dos manacás-da-serra semeados por via aéreano início de 1989, na Serra do Mar em Cubatão, comoindicador da eficiência do plantio realizado, baseada nainterpretação de dados de densidade, sobrevivência ecrescimento destas espécies.

2 MATERIAL E MÉTODOS

No período de setembro de 1988 a março de 1989,procedeu-se a coleta de sementes das espéciesselecionadas, numa área de aproximadamente 1700 hade matas secundárias e capoeiras existentes nos valesdos rios Moji, Quilombo, Jurubatuba, Perequê, Cubatãoe Pilões e em outros locais da Baixada Santista e doplanalto, distribu ídas numa extensão aproximada de 300km2•

Os frutos de Tibouchina foram secos ao ar, sobreuma lona plástica, soltando naturalmente as sementes.Estas foram submetidas a peneiramento mecânico, paraeliminação das impurezas, sendo selecionadas as se-mentes retidas entre as peneiras de malhas 0,29 e 0,50mm.

O procedimento de peletização das sementes foifeito segundo a patente requerida pela CETESB e IPT(Instituto de Pesquisas Tecnológicas), utilizando-se oalginato de sódio como matéria-prima (PRADELLA etalii,1992).

No período chuvoso de 1988/89, foi realizada asemeadura aérea em áreas degradadas da Serra do Marespalhadas por aproximadamente 15 krn", consideradoscomo de maior risco de escorregamentos, de acordocom estudos geotécnicos elaborados pelo IPT (MACEDOet alii, 1986).

A área efetivamente semeada em 1989 foi deaproximadamente 70 ha, sendo 59 ha de capoeirasfortemente degradadas, com baixo potencial de regene-ração natural de espécies arbóreas, e 11 ha representa-dos por 103 escorregamentos, sendo 53 em solo nu, 5com braquiária e 46 com vegetação de porte herbáceoem regeneração. Na FIGURA 2 estão representados osalvos de plantio bem como a área beneficiada.

A semeadura aérea foi realizada em duas campa-nhas. Na primeira, com a duração total de 10 horas devôo, nos dias 15 e 16 de fevereiro, utilizou-se helicópte-ros tipo Esquilo, da FAB - Força Aérea Brasileira. Nasegunda campanha, com duração de 20 horas, nos dias13, 14 e 18 de abril, foi utilizado um avião agrícolaIpanema, equipado com semeador TETRAER.

Durante os plantios foi lançado um total estimadode 383 milhões de sementes viáveis de manacás-da-serra, em "pellets"gelatinosos, numa densidade médiade 550 sementes/m", Foram adicionados fertilizanteslíquidos com macro e micronutrientes aos "pellets", nomomento do plantio.

Com o intuito de avaliar a eficiência da semeaduraaérea de 1989, foram estabelecidas 21 parcelas demonitoramento em diversos alvos de plantio, localizadosno anfiteatro do Caminho do Mar e nos vales dos rioPerequê e Moji. As parcelas foram delimitadas de formaa abranger uma superfície de terreno homogêneo quan-to ao solo, declividade e cobertura vegetal. O tamanhodas parcelas não excedeu 20 rn", para possibilitar oacompanhamento de cada planta, desde o lançamentodas sementes até dois anos após o plantio.

O poder germinativo das sementes "in natura" epelletizadas foi testado em laboratório, com o intuito dese avaliar o efeito da peletização sobre as sementesutilizadas no plantio. As sementes foram incubadas em

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352 354

LEGENDA.766

~ CAPOEIRA FORTEMENTE OEGRADAOA

T366 _._ ÁREA DE RECUPERAÇÃO

• ESCORREGAMENTOS EM INíCIO DEREGENERAÇÃO

ESCORREGAMENTOS COM SOLO NU

ESCORREGAMENTOS COM••

50'

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FIGURA 2 - Alvos da semeadura aérea da Serra do Mar - 1989

germinador FANEM modelo 348 EB a temperaturas de20°C (noturna) e 30°C (diurna), fotoperíodo de 12 horase umidade relativa do ar superior a 90%.

O acompanhamento das plântulas semeadas foirealizado em campo durante os dois primeiros anos doplantio. A marcação das plântulas recém-germinadas foirealizada utilizando-se bandeiras coloridas com haste demadeira (30 cm) e tecido plástico. Após 6 meses deplantio, as bandeirinhas foram retiradas e as plântulassobreviventes foram marcadas com lacres plásticosnumerados. A partir desta marcação, foram realizadascontagens e medições de altura das plantas jovens em10 parcelas estudadas, em períodos sucessivos deaproximadamente 3 meses.

356 358

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A declinaçõo maonétlcacresce -7' anualmeut.

LOCALIZAÇÃO DA FOLHANO ESTADO

SANTOS -1984

Os parâmetros analisados abrangeram a sobrevi-vência das plantas da população semeada e a densidademédia e alturas das plantas nascidas emescorregamentos (base e área central) e em áreas nãoescorregadas.

3 RESULTADOS E DISCUSSAO

As sementes peletizadas, em comparação com assementes "in natura", sofreram uma perda de 15 a24 % nopoder germinativo para T.mutabilis e T.pulchra, respec-tivamente (TABELA 1). A redução observada no podergerminativo é largamente compensada pelo ga-nho qua-litativo que as sementes peletizadas apresentam em ter-

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mos de uma dispersão desprezível pelo vento, uma me-lhor fixação no solo e melhores condições para o desen-volvimento inicial das plântulas, proporcionados pelo gele nutrientes adicionados (POMPÉIA et alii, 1989).

TABELA 1 - Comparação do podergerminativo (plântulasf9 de sementes) "in natura" e peletizadas emgel hidrofílico, de 2 espécies de manacá-da-serra

TRATAMENTOESPÉCIE

"IN PELETI- VARIA-NATURA" TIZADA çÃO

T. pu/chra 17.120 12.978 -24%T. mutabi/is 9.600 8.118 -15%

Os "pellets" coletados em campo após o plantioapresentaram, no período de45dip,s, umamédiade 0,72plântulas por "pellet", o que corresponde, para o manacá-da-serra, uma sobrevivência estimada em 13%, nesteperíodo inicial.

O monitoramento, realizado em 21 parcelas distri-buídas pelas diversas tipologias de alvos semeados,indicou que o estabelecimento de plântulas de manacás-da-serra oscilou, ao final de 6 meses, entre 0,1 indiví-duo/rn" (em áreas com braquiária ou densamente ocu-padas por samambaias do gênero Nephro/epis) e 2,6indivlduos/rn" (base de escorregamento). Em duas par-celas, uma densamente coberta por braquiária e outrapor arbustos de Tetrapterys sp, existentes sob as linhasde alta tensão, não houve o estabelecimento de plântulasde manacá. No primeiro caso, foi observada a germina-ção e a posterior morte das plântulas em sua fase inicialde desenvolvimento, possivelmente pela competiçãoexercida pelas gramíneas existentes. No segundo caso,não foram observadas sementes germinando de nenhu-ma das espécies semeadas, nem de outras espécies daregeneração natural. Tal fato pode estar relacionado aalgum processo alelopático como o observado por LANG(in GOMEZ-POMPA et alii, 1976) para Piper spp emflorestas tropicais do México ou, ainda, ao manejo dadoàs áreas sob linhas de alta tensão que, não raras vezes,envolve o uso de herbicidas.

Após 180 dias de plantio, a sobrevivência observa-da em campo para as plântulas semeadas foi da ordemde 0,1% em relação ao número de sementes lançadas.No período de 6 meses a 2 anos do plantio, ocorreu umataxa média de mortalidade de apenas 20% das plantasde manacá marcadas nas diversas parcelas.

O comportamento destas espécies quanto à sobre-vivência dos indivíduos nos 2 primeiros anos de vidaencontra-se representada na FIGURA 3. Comparando-se estes dados com medidas obtidas por outros autores(SILVERTOWN, 1987) para espécies arbóreas tempe-radas (FIG URA 4), verifica-se que o comportamento dosmanacás é similar ao da espécie Shorea parviflora,significativamente superior ao de Pinus sy/vestris einferior ao de Acer saccharum. Entretanto, verifica-se

que estas espécies apresentam taxas de mortalidadesuperiores às dos manacás-da-serra no período entre 6meses e 2 anos após o plantio. Tal fato indica que, apósa fase mais crítica do estabelecimento das plântulas deTibouchina no solo, estas apresentam índices de morta-lidade inferiores aos das outras 3 espécies. A fase críticadeve-se, possivelmente, a dois fatores: as sementes deTibouchina apresentam uma biomassa extremamentereduzida, não havendo material de reserva disponívelpara a manutenção autônoma da plântula pós-germina-da; e o período de estabelecimento das plantas no solo;na região de Cubatão, corresponde exatamente ao perí-odo climático mais crítico, ou seja, ao período de inverno.

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FIGURA 3 - Curva de sobrevivência de manacás-da-serra

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FIG URA 4 - Curva de sobrevivência de 3 espécies arbó-reas temperadas (SILVERTOWN, 1987).

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o pequeno desenvolvimento das plântulas nosprimeiros 6 meses e as densidades inicialmente obser-vadas descartam a hipótese de competição intra-espe-cífica como fator determinante da mortalidade nestafase, embora tenham sido observados casos isolados de2 ou 3 plântulas germinadas num mesmo "pellet" ecompetindo pelos mesmos recursos. Por outro lado, emáreas com vegetação residual a mortalidade é maisacentuada, devido à competição com plantas arbustivase herbáceas já estabelecidas. Este é o caso típico dasáreas com braquiária, onde a agressividade desta espé-cie reduziu drasticamente o estabelecimento das plantassemeadas.

Observando-se o comportamento da densidade domanacá-da-serra em escorregamentos, sopé deescorregamento e áreas não escorregadas (FIGURA 5),verifica-se que a mortalidade a partir do sexto mês variade acordo com o local de plantio.

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1989DEZ JUL'

1991DEZJUL

1990

FIGURAS -Comportamento da densidade de manacás-da-serra semeados na Serra do Mar

Em áreas degradadas mas não escorregadas, adensidade de plântulas após 6 meses oscilou entre 0,2e 2,0 plântulas/rn", sendo, em média 0,61 plântula/rn'',Do 6º ao 24º mês de plantio, este valor caiu para 0,49plântula/rn" indicando uma mortalidade em torno de20%.

Nas áreas centrais dos escorregamentosmonitorados, verificou-se uma densidade, aos 6 meses,de 0,52 plântula de rnanacá/m", reduzindo-se para 0,42lndividuo/rn" durante os 18 meses restantes, com umataxa de mortalidade em torno de 19%. A baixa densidadeobservada nos escorregamentos, durante o períodoinicial, deve-se às condições adversas para o estabele-cimento de plântulas nas áreas de solo nu, sujeitas àerosão pelas chuvas.

O mesmo não se observa nos sopés dos escor-regamentos, onde, devido ao acúmulo de sementes e àscondições favoráveis quanto ao suprimento de água enutrientes, ocorre uma alta densidade inicial de plântulas,girando em torno de 2,6 indivlduos/m", O rápido cresci-mento nos meses seguintes levou à morte diversos

indivíduos, devido à competição intra e interespecífica,reduzindo a densidade média a níveis de 1,0 plântula demanacá/m". Nesta área também foram observados si-nais de herbivoria, raros em outros locais.

O comportamento de crescimento dos manacás-da-serra, durante os dois primeiros anos (FIGURA 6),também reproduz as condições dos locais de plantio.Nos escorregamentos, observa-se um crescimento sig-nificativamente inferior quando comparado ao das plan-tas na base do escorregamento e em áreas nãoescorregadas. A interação água-solo-planta parece sero principal condicionante do crescimento vegetal nascicatrizes do escorregamento. Nas áreas de transporte,o solo residual, por sua estrutura e declividade, estásujeito a uma menor infiltração de água, bem como auma exposição maior à insolação e ventos, o que aumen-ta a evaporação. Já nas áreas de deposição, ao sopé dosescorregamentos, ocorre o inverso: uma maior infiltra-ção e menores perdas por evaporação. A fertilidade dosolo que, sem dúvida, é mais alta na base dosescorregamentos, foi considerada um fator secundáriono crescimento vegetal. PRADELLA et alii (1989) estu-dando em laboratório o crescimento de plântulas demanacá e outras espécies pioneiras em solo residual deescorregamento e em solo não escorregado, verificounão haver diferenças significativas no crescimento inicialdestas plantas, consideradas como adaptadas às condi-ções de solos ácidos, pobres e com baixos teores dematéria orgânica. Diversos autores indicam ser umacaracterística das espécies pioneiras e baixa exigêncianutricional (GOMEZ-POMPA & VASQUEZ-YANES inGOMEZ-POMPA et alii, 1976)

As plantas nascidas em áreas não escorregadasapresentaram uma grande variabilidade no crescimentoem altura (FIGURA 6) decorrente da diversidade desituações de solo, exposição e declividade das vertentes

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FIGURA 6 - Curvas de crescimento em altura de mana-cás-da-serra semeados na Serra do Mar

Anais - 2!l Congresso Nacional sobre Essências Nativas - 29{3{92-3{4{92 510

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PARÂMETRO DISPERSÃO NATURAL

TABELA 2 - Quadro comparativo entre dispersão natural de sementes e a semeadura aérea.

SEMEADURA AÉREA

Influência da topografiaFontes de sementesAgentes de dispersãoFluxo de sementesQuantidade de sementesQualidade das sementes

limitada por barreiras e pela altitudepredominantemente localirregularirregular e dispersavariável e dispersavariável

não afetadapredominantemente regionalregularregular e direcionadaconstante e concentradacontrolada

e vegetação existente. Entretanto, os valores encontra-dos (de 0,50 a 2,40 m após 2 anos) podem ser conside-rados semelhantes aos de outras espécies de início desucessão, plantadas através de mudas. MARTI NS et alii(1990), por exemplo, trabalhando com o enriquecimentode florestas no Paraná, observaram que de 8 espéciesde grupos ecológicos distintos, plantadas através demudas, a canafístula (Peltophorum dubium) que é umaespécie pertencente aos estadios iniciais de sucessão,sobressaiu-se pela maior altura (1 ,87 m) após 2 anos deplantio.

SILVA FILHO (1991) estudou detalhadamente aregeneração natural em cinco escorregamentos e res-pectivas áreas circunvizinhas na Serra do Mar emCubatão, através de amostragem da vegetação existen-te em 128 pontos de 1 m2, sendo 64 na região central dosescorregamentos e 64 em torno destes (áreas nãoescorregadas). O estudo foi realizado em ravinas recu-peradas através do plantio manual da braquiária e espé-cies herbáceas nativas, realizado no final de 1985.

Após 4 anos e meio de realização do plantio, o autorobservou intensa regeneração natural das ravinas plan-tadas, especialmente por espécies herbáceas earbustivas. Nas amostragens realizadas em torno dasravinas, O autor observou a ocorrência de apenas doisindivíduos de Tibouchina pulchra, sendo que, no interiordos escorregamentos, apesar das medidas tomadaspara a contenção da erosão, não foi assinalada a ocor-rência desta espécie arbórea. Estes dados indicam quenesta área, que não foi semeada em 1989, o rnanacá-da-serra em torno dos escorregamentos ocorre numa den-sidade da ordem de 0,03 individuo/m", sendo este núme-ro ainda menor para as áreas no interior dosescorregamentos.

A densidade média de plantas de manacá-da-serraapós dois anos de semeadura aérea da Serra do Mar foide 0,48 individuos/m". Confrontando-se estes dadoscom aqueles apresentados por SILVA FILHO (1991),verifica-se um efetivo aumento do potencial de regene-ração dos manacás-da-serra em decorrência do aumen-to artificial da chuva de sementes destas espécies,realizado através da semeadura aérea. Os resultadosobtidos vêm confirmar as observações de VIANA (1987)de que, em áreas de escorregamento, a regeneração"será tanto maior quanto mais intensa for a chuva desementes". Comparando-se o processo de regeneraçãonatural com o plantio artificial por semeadura aérea foipossível levantar diversas hipóteses para o incremento

da regeneração dos manacás-da-serra provocado peloaumento artificial da chuva de sementes (TABELA 2).

Pelos resultados obtidos nestes trabalho, verificou-se que o incremento artificial na disponibilidade desementes, resultante da semeadura aérea, induz umaumento na regeneração dos manacás-da-serra, nasáreas degradadas da Serra do Mar. Este aumento édrasticamente reduzido em escorregamentos antigosplantados artificialmente com braquiária, sendo que estagramínea, embora não impeça a regeneração natural,provoca um atraso no processo de sucessão secundá-ria.

4 AGRADECIMENTOS

À PqC. Silvia A C. Chiea, do Instituto de Botânica,pela identificação de matrizes e plântulas. Ao EngQ AgrQ

Ricardo Cardoso dos Santos e ao Biólogo RodrigoCoelho Fialho pela condução da coleta, beneficiamentode sementes e auxílio no monitoramento. À Marisa Cury,José Bezerra de Sousa e ao EngQ AgrQ Antonio SérgioMenon Filho pelo auxílio na elaboração do texto final.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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