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Comunicação: políticas e estratégias para área da saúde 1 Maria Rosana Ferrari Nassar2 Pontifícia Universidade Católica de Campinas Resumo A Comunicação excelente, a partir das mudanças no ambiente das organizações, constitui-se no diferencial na gestão eficiente das instituições de saúde. O hospital, em razão da complexidade de sua estrutura, é o ambiente que elegemos para a reflexão sobre a importância da comunicação na área da saúde, especialmente as contribuições das Relações Públicas, nos relacionamentos com todos os segmentos estratégicos. Palavras-chave Comunicação; Saúde; Políticas, Estratégias; Hospitais. Introdução
As organizações, assim como o Estado, a família, a escola, o trabalho encontram-se
em crise. A sociedade está em crise e o sentimento geral é de que não sabemos o que
esperar desse novo mundo que se descortina: vive-se a era da informação, os eventos são
transmitidos em tempo real. Vive-se sob a égide da globalização, o que implica em uma
submissão à cultura dominante e determinada, que provoca mudanças nas relações sociais,
colocando em xeque os pilares sob os quais a vida social se assentava. Vive-se a crise dos
paradigmas da modernidade, que aponta para a pós-modernidade, conforme assinala
SANTOS. 3 Ou apenas o liberalismo em nova roupagem (agora, neoliberalismo), quando se
constata que o sistema de mercado até hoje não foi capaz de garantir a distribuição da
riqueza, nem tampouco conseguem fazê-lo com a informação e o conhecimento. O fato é
que todas as modificações estão sendo debitadas junto à globalização, conforme assinala
IANNI (1995), “o atual ambiente de mudanças é marcado pelo fenômeno da globalização,
composto por uma série de transformações tecnológicas, políticas e comerciais que se
acumulam, e é tudo como novo paradigma para as ciências sociais.” 4
1 Trabalho apresentado ao NP – Relações Públicas e Comunicação Organizacional. 2 Mestre e Doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Professora e Diretora da Faculdade de Relações Públicas da Pontifícia Universidade Católica de Campinas – SP. Assessora de Comunicação na área da Saúde. Endereço eletrônico: [email protected]. 3 SANTOS, Boaventura de Sousa. Um Discurso sobre as Ciências. 7ª. Ed. Portugal: Edições Afrontamento, 1995. 4 IANNI, Octavio. Teorias da Globalização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995.
2
O neoliberalismo trouxe consigo uma característica significativa. Para o liberalismo,
dinheiro é poder. Para o neoliberalismo, a informação e o conhecimento também são. 5
A diferença entre a informação e dados, constitui-se no fato de que, enquanto os segundos
são simples registros de acontecimento, a primeira remete ao que interessa e se vincula as
nossas inquietudes.6 ECHEVERRIA (2002) pondera sobre a distinção entre dados e
informação, afirmando que a informação é constituída pelos dados que nos interessam. E
ressalta que “todo sistema social gera mecanismos de compilação, armazenamento, acesso,
transmissão e processamento de informação. A invenção da escrita foi um progresso
tecnológico fundamental, pois afetou, precisamente, esses mecanismos”. O surgimento da
escrita transformou profundamente a sociedade e a revolução digital representa uma nova
era.7 Contudo, hoje não basta o acesso à informação, mas sim a competência para
identificar a informação relevante e a habilidade em fazê-la trabalhar a seu favor, ou seja,
saber discernir e utilizar as informações e “isso desloca o tema da informação para o tema
do conhecimento”.8
Compreendida como um sistema social, as organizações vivem essa nova realidade.
Todas essas mudanças afetam a estrutura organizacional, uma vez que a comunicação
permeia todos os níveis da organização, além de ser “um paralelo próximo às hierarquias de
autoridade.” 9 É a partir da comunicação que se desenvolvem os demais processos
organizacionais, pois está diretamente relacionada à ordenação do trabalho, permitindo a
realização de seus objetivos.10 Nesse cenário, o ambiente das organizações apresenta-se
cada vez mais desafiador. A mudança invariavelmente atinge os três níveis organizacionais,
de acordo com o que propõe BARTLETT e GHOSHAL (1992): o nível de estrutura e
responsabilidade formais (anatomia); o nível dos relacionamentos e processos interpessoais
(fisiologia); e o nível das atitudes e mentalidades dos indivíduos (psicologia). E é a
comunicação que permite o trânsito e a interação entre esses níveis. 11
5 ECHEVERRIA, Rafael. Confiança, viga mestra da empresa do futuro. Reflexão. Instituto Ethos, ano 3, nº. 7, julho 2002. 6 ECHEVERRIA assinala, ainda, que: “(...) Não surpreende, portanto, a relação que se estabelece entre as tecnologias da informação e a aceleração das mudanças. Não é à toa que elas são consideradas as tecnologias da transformação.” Id. Ibid, p. 15. 7 Id, Ibid., p. 15. 8 Id., Ibid., p. 15. 9 CHAMPION, D.J. Sociologia das Organizações. São Paulo: Saraiva, 1985. 10 Id.,Ibid.. 11 BARTLETT, Christopher A. & GHOSHAL, Sumantra. Managing across Borders: New Organizational Response. Sloan Management Review. Fall, 1987.
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A comunicação, que encontra sua abrangência no ambiente organizacional
(comunicação organizacional ou empresarial), as políticas e estratégias que podem torná-la
eficiente é o tema deste trabalho, proposto a partir da perspectiva histórica, analisado por
meio da pesquisa bibliográfica e documental. Nas organizações, a comunicação pode ser
considerada em sua perspectiva funcionalista, decorrente de seu caráter produtivo e
integrador, e na perspectiva interpretativa, como mediadora das construções sociais12, por
isso neste trabalho refletimos sobre a mudança no ambiente das organizações hospitalares e
o papel desempenhado pela comunicação (a importância da comunicação na área da saúde),
sua influência na estrutura e cultura organizacional, partindo do pressuposto de que a
“estrutura, extensão e o âmbito da organização são quase inteiramente determinados pelas
técnicas de comunicação”, a partir das perspectivas funcionalista e interpretativa, pois serve
adequadamente a abrangência que lhe é própria. 13 Focaremos a análise nas atividades de
Relações Públicas no ambiente organizacional do hospital, em particular, e para a área da
saúde em termos mais gerais, considerando que as organizações, sistemas sociais que
representam um conjunto de valores e objetivos, dependem da comunicação para seu
funcionamento, tanto que a causa dos mais variados problemas é sempre atribuída a falta de
comunicação, pois sua formação atende à necessidade da visão ampla dos processos, das
implicações, repercussões e das relações entre as pessoais envolvidas no dia a dia da
organização.14
A modificação estrutural nas organizações deu ao profissional de Relações Públicas
uma nova responsabilidade na comunicação empresarial, conforme assevera BUENO
(2002):
Nos dias atuais, a Comunicação Empresarial se prepara para ascender a um novo patamar, tornando-se um elemento importante do processo de inteligência empresarial. Ela se estrutura para usufruir das potencialidades das novas tecnologias, respaldar-se em bancos de dados inteligentes, explorar a emergência de novas mídias e, sobretudo,maximizar a interface entre as empresa, ou entidades, e a sociedade. Nesse cenário, passa a integrar o moderno processo de gestão e partilha do conhecimento, incorporando sua prática e sua filosofia ao chamado “capital intelectual” das organizações.15
12 GIROUX, Nicole. La Communication Interne: une definition e evolution. Communication et Organization. Nº 5, Maio, 1994. 13 HALL, Richard. Organizações: Estrutura e Processo. Rio de Janeiro: Prentice - Hall do Brasil, 1984, pg. 132. 14 CHAMPION, D. J. Op. , cit. 15 BUENO, Wilson da Costa. Comunicação Empresarial: teoria e pesquisa. São Paulo: Manole, 2002, p.8.
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A área da saúde necessita das atividades de Relações Públicas não apenas em razão
do seu potencial para atender às necessidades de todas as instituições que pretendem maior
visibilidade, mas também pelas deficiências e problemas específicos do setor. Com efeito, a
atividade médica e também as instituições que prestam atendimento e assistência à saúde
convivem com muitas críticas, algumas pouco louváveis, referindo-se a desumanidade e a
predominância da visão do lucro. Consideramos que existe uma relação direta entre a
habilidade de administrar e de comunicar. Especialista em harmonizar interesses, o
profissional de Relações Públicas, direciona as informações de modo adequado, na forma e
tempo apropriados, garantindo transparência e visibilidade para as organizações.
A partir da década de 90 conhecemos inúmeras transformações marcadas por
contradições econômicas e sociais, a revisão do papel do Estado, a estabilidade da moeda,
modernização da economia. Contudo, num país com problemas sociais históricos, onde
uma parcela considerável da população se vê alijada de qualquer possibilidade de acesso
aos direitos fundamentais como educação, trabalho e saúde, esse processo de mudança
ocorre num contexto mais complexo. O sistema de saúde brasileiro é um exemplo.
Um sistema médico possui dois aspectos inter-relacionados: o cultural, que inclui conceitos básicos, teorias e práticas normativas e o social, com papéis específicos, tais como médico e paciente, além de ambientes específicos, consultórios e hospitais. O sistema dominante de tratamento de saúde, em qualquer sociedade, não pode ser estudado à parte de outros aspectos daquela sociedade, pois o sistema médico – o setor profissional de assistência à saúde – não existe num vácuo cultural e social; conforme a ideologia dominante (...).16
A saúde brasileira convive com problemas históricos e, por isso, devemos
considerar todos os aspectos que interferem em sua estruturação. Em outras palavras, os
aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais devem ser o pano de fundo de nossa
análise. O sistema de saúde brasileiro necessita ser repensado em termos de estrutura macro
sobre a qual se assentam todas as organizações de saúde, precisa ser visto enquanto política
pública, em relação à administração e ao planejamento do setor. A realidade do setor
público e privado de saúde demonstra, por si só, a urgência de mudanças que engendram o
caminho da comunicação eficiente com os segmentos envolvidos. Com efeito, o setor
público de saúde vive em constante crise, decorrente da má administração, do sucateamento
da rede de atendimento, da falta de recursos técnicos e humanos. Para além desses
16 MARTINS, Dinorah Gióia. Relação Médico – Paciente em Hospital Público: implicações psicológicas quanto à variável obesidade . Psicologia: Teoria e Prática, 1999, p. 81.
5
problemas, ainda, há que se considerar como agravantes a questão da fome, da falta de
saneamento básico, moradia, trabalho, segurança e educação que faz aumentar o número de
doenças e de doentes. No segmento da saúde privada, o mesmo Poder Público, que se
mostrou incapaz de modificar os níveis precários de vida de considerável contingente da
população, interfere de tal forma ao regulamentar o oferecimento de planos e seguros de
saúde, causando grande desconforto e descontentamento no setor: operadoras, seguradoras,
médicos e seus conselhos representativos, sem contar os usuários, realizando a proeza de
descontentar a todos. É nesse o cenário que hospitais, clínicas e centros de saúde
desenvolvem suas atividades, lidando com os conflitos externos e internos e realizando sua
função essencial, prestar assistência à saúde. E onde os pacientes são recepcionados,
atendidos e incompreendidos.
A prestação de serviços médicos exige estrutura específica e diversificada, implica
em espaço físico apropriado, pessoal de apoio, de outros profissionais. No rol de
organizações de saúde o hospital é, sem dúvida, o mais complexo de todos, devido à
extensa rede de atividades e serviços que encampa: é hotel, é lavanderia, serve alimentos,
mantém centros cirúrgicos, dentre outros. Administrá-lo eficientemente, portanto, envolve
idéias modernas de gestão, o que significa, inclusive, planejar estratégias de comunicação
para a variedade de públicos com os quais tem que lidar no dia-a-dia e como forma de
facilitar ou possibilitar a implantação eficiente das ações, que devem refletir a missão, a
filosofia e os objetivos e serem assumidas por todos os que ali trabalham.
As mudanças nas relações sociais desenharam um novo modelo de instituição, que
necessita ter consciência de sua atuação na sociedade, precisa fixar sua imagem e conceito
perante a comunidade e conhecer e se afinar com o novo perfil de consumidor, mais
consciente e exigente, buscando consolidar seus direitos de cidadão.17 Direitos esses que se
encontram consignados em instrumentos legais sistematizados como o Código de Defesa
do Consumidor e o Código de Ética Médica, que funcionam como balizas para a
administração eficiente.
17 BERNARDO apud ZOBOLI assinala “que cada dia é mais vigente uma conceituação antropológica de empresa, que parte do entendimento da pessoa humana como autora, centro e fim de toda atividade econômico-social. Esta conceituação concebe a empresa como um grupo social constituído por pessoas livres que organizadas, hierárquica e profissionalmente, cooperam de diversas formas como sujeitos de direitos com base em contratos livremente tratados e com a finalidade comum de produzir bens ou serviços para intercâmbio econômico.” ZOBOLI, Elma Lourdes Campos Pavone. A ética nas organizações. Revista Reflexão. Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social. Ano 2, nº 4, março 2001.
6
Conceito de Hospital
Os primeiros hospitais foram criados como locais de isolamento onde se exercia a
caridade cristã. A tecnologia médica disponível era suficiente apenas para minorar o
sofrimento. Os avanços tecnológicos e o aparecimento da medicina científica nos fins do
século XIX e início do século XX revolucionaram o papel e as funções do hospital que se
transformou na mais importante instituição para o tratamento das enfermidades, oferecendo
condições de infraestrutura que não podiam ser deslocadas até a residência do paciente. No
século XX, o papel do hospital se ampliou, tornando-se o caminho institucionalizado da
prestação de assistência à saúde, conforme apresentado na definição consolidada pela
Organização Pan – Americana da Saúde (OPAS):
São todos os estabelecimentos com pelos menos 5 leitos, para internação de pacientes, que garantem um atendimento básico de diagnóstico e tratamento, com equipe clínica organizada e com prova de admissão e assistência permanente prestada por médicos. Além disso, considera-se a existência de serviço de enfermagem e atendimento terapêutico direto ao paciente, durante 24 horas, com disponibilidade de serviços de laboratório e radiologia, serviço de cirurgia e/ou parto, bem como registros médicos organizados para a rápida observação e acompanhamento dos casos.18
No contexto de sistema local de saúde, os hospitais desempenham função social
relevante, que compreende: oferecer assistência médica continuada e integrada; concentrar
grande quantidade de recursos de diagnóstico e tratamento para, no menor tempo possível,
reintegrar o paciente ao seu meio; constituir um nível intermediário dentro de uma rede de
serviços de complexidade crescente; promover a saúde e prevenir as doenças e avaliar os
resultados de suas ações sobre a população. E é justamente essa função social que dá o tom
da complexidade desse tipo de organização. Complexa e completa, pois segundo
TEIXEIRA (1983) “incorpora o avanço constante dos conhecimentos, das aptidões, da
tecnologia médica e dos aspectos finais desta tecnologia representados pelas instalações e
equipamentos”. 19
O autor destaca que o hospital emprega grande número de profissionais
especializados e serviços do mesmo nível; que comportam uma divisão de trabalho
extremamente acentuada, o que exigi habilidades diversificadas, o que torna complexa a
coordenação de suas atividades. Assinala, ainda, que o hospital moderno tem inúmeras
18 Citada no Manual Brasileiro de Acreditação Hospitalar publicado pelo Ministério da Saúde. 2ª edição. Brasília, 1999. 19 TEIXEIRA, José Manuel de C. O Hospital e a Visão Administrativa Contemporânea. Claude Machille et all (coord) Ernesto Lima Gonçalves, São Paulo: Pioneira, 1983, p. 20.
7
finalidades: a assistência ao doente, o ensino e a pesquisa, contribuindo para o progresso da
medicina. 20 Essa estrutura deve trabalhar de forma integrada dentro de um sistema
coordenado de unidades médicas que se relacionam uma com as outras para garantir, como
um verdadeiro mecanismo social, a atenção à saúde da coletividade.
Organizações Hospitalares: a prestação de serviços de saúde
O principal objetivo do hospital é proporcionar atenção aos pacientes, mesmo, às
vezes, limitado pelos conhecimentos médicos, pelos recursos humanos, econômicos e
tecnológicos. Como toda organização, possui departamentos com especialistas que realizam
suas funções com a colaboração do pessoal de apoio e serviços auxiliares disponíveis todo
o tempo. Para TEIXEIRA (1983):
O trabalho no hospital é mutuamente suplementar e interdependente, e esta situação determina que as funções especializadas e as atividades de muitos departamentos sejam suficientemente coordenadas, para que a instituição funcione eficientemente e atenda seus objetivos, permitindo continuidade nas operações organizacionais. Desta forma, o hospital necessita de um sistema muito aperfeiçoado de coordenação interna, que não pode se ater aos mecanismos padrões, em função do fluxo de trabalho muito variável e irregular que existe nessa organização.21
A preocupação fundamental é o paciente. Desse modo, a organização hospitalar
depende de ajustes diários, impossíveis de serem detalhados pelas regras formais de uma
organização. O paciente não pode ser considerado uma peça em linha de montagem, uma
vez que depende muito da interação das pessoas, responsáveis por cuidar dele, seja numa
consulta de rotina ou enquanto durar a internação, sempre evitando erros. Constituindo uma
organização humanitária, o hospital tem necessidade de uma coordenação adequada na sua
divisão de trabalho, procurando sempre dar a seus pacientes um serviço personalizado. O
hospital deve trabalhar integrado e as especialidades médicas necessitam interagir. De fato,
toda unidade precisa integrar-se, mas na realidade essa interação encontra alguns obstáculos
oriundos, muitas vezes, da própria complexidade da atividade e das relações de poder que
enseja, ou que se constroem e que podem interferir na gestão. Segundo TEIXEIRA (1983):
O hospital tem quatro centros de poder, a diretoria superior, os médicos, a administração e os demais profissionais, entre os quais se destaca a enfermagem. No hospital a autoridade não emana de uma única linha de poder, não flui ao longo de uma única linha de comando como em muitas organizações formais. A
20 TEIXEIRA, José Manuel de C., op. cit. , p. 20. 21 TEIXEIRA, José Manuel de C., op. cit. , p. 23.
8
organização formal do hospital mostra que a direção superior tem toda a autoridade e a responsabilidade pela instituição. A diretoria delega ao administrador a gerência do dia -a dia do hospital, o qual delega às chefias dos serviços sua autoridade de comando. 22
O corpo clínico do hospital pode estar subordinado ao diretor e/ou administrador.
Contudo, a própria natureza da atividade faz com que os médicos tenham grande autonomia
no seu trabalho e autoridade profissional sobre outros. Embora, esse processo sofra
variações entre os hospitais, a falta de uma mesma linha de comando interfere nos
problemas administrativos e operacionais da organização. TEIXEIRA (1983), ainda,
assinala algumas outras características que atuam como elemento desafiador na
administração do hospital: 1) serviços de atenção e tratamento personalizados a pacientes
individuais, em vez de uniforme. O valor econômico é secundário ao valor social
humanístico; 2) depende das necessidades e demanda das pessoas da comunidade. As
necessidades dos pacientes são sempre importantes. 3) atua em situações de emergência e
tem definidas as responsabilidades de seus diferentes membros e pouca tolerância a erros;
4) O trabalho é diversificado e com pouca padronização, pessoas cuidando de pessoas,
participando ativamente do processo de produção; 5) tem pouco controle sobre seus
trabalhadores (principalmente os médicos) e sobre os pacientes; 6) o administrador tem
menos autoridade e poder que em outras organizações, não pode ser organizado com base
em uma linha única de autoridade, o que gera inúmeros de problemas administrativos; 7) é
uma organização formal até certo ponto burocrática e autoritária, cuja operacionalidade
repousa no arranjo do trabalho convencionalmente hierarquizado e em regras rígidas e
impessoais. Porém, é altamente especializada, departamentizada e profissionalizada e não
pode funcionar efetivamente sem coordenação interna, motivação, autodisciplina e ajustes
informais e voluntários de seus membros. A coordenação de esforços e atividades é
importante pela interdependência do trabalho que deve ser realizado; 8) demonstra sua
eficiência e desempenho na efetividade (benefício social); 9) a relevância social de sua
atividade fim. A tecnologia incorporada e a confiança da população aumentam e
determinam a busca de melhor qualidade. 23
O desenvolvimento da tecnologia e suas aplicações na medicina, a expansão dos
conhecimentos das ciências, a ampliação progressiva do campo de atuação dos agentes de
22 TEIXEIRA, José Manuel de C., op. cit. , p. 25. 23 TEIXEIRA, José Manuel de C., op. cit. , p. 26 - 27.
9
saúde, a acentuada diversificação das especialidades médicas fazem do hospital uma
instituição bastante dinâmica. A utilização do hospital, como campo de aprimoramento
técnico de profissionais de pesquisa de novos conhecimentos científicos, torna-o de grande
interesse na formação de recursos humanos da área da saúde. A existência de acentuado
número de pessoal técnico, distribuídos numa hierarquia sócio-econômico e profissional,
caracterizado por motivações, objetivos e interesses diversos, faz do hospital um ambiente
psicossocial delicado. A clientela a ser atendida, com suas exigências quantitativas e
qualitativas da assistência médico–hospitalares; os técnicos da saúde, com suas exigências
de recursos materiais modernos e sofisticados; a indústria da medicina, exigindo a
aquisição de seus produtos cada vez mais inovadores, provoca a necessidade de realizar a
avaliação do custo – benefício. Além disso, há, ainda, o aspecto social a ser considerado. A
participação do hospital no sistema de saúde, ocupando uma posição de destaque pelos
serviços prestados, define a sua relevância para a sociedade.
Funções do Hospital
As funções de qualquer instituição são definidas a partir de seus conceitos e
principais objetivos. GONÇALVES (1983) refere-se às funções básicas do hospital,
baseado no posicionamento da Organização Mundial de Saúde, como sendo: prestar de
atendimento médico e complementar aos doentes em regime de internação; desenvolver
atividades de natureza preventiva; participar de programas de natureza comunitária e
integrar o sistema de saúde. 24 O autor destaca, ainda, outras funções importantes que se
relacionam com a vida interna da instituição hospitalar: participação na formação de
recursos humanos para a área de saúde, buscando não só ampliar a capacidade de seus
próprios profissionais de todos os níveis e categorias, mas também contribuir para a
formação de integrantes das equipes de saúde; a segunda função reporta-se ao fato de
representar o palco dinâmico em que se desenrola a atividade profissional das pessoas que
nele trabalham e cuja motivação precisa ser preservada e estimulada. No campo hospitalar,
essa ausência ou baixa de motivação contribui seguramente para o sacrifício da qualidade
24 GONÇALVES, Ernesto, op. cit., p. 6-8.
10
dos atendimentos de todo tipo. E, finalmente, a participação no desenvolvimento de
pesquisas em todos os terrenos de sua atividade. 25
Comunicação e Saúde
Esta reflexão tem como pressuposto que saúde é o estar bem física, psicológica e
espiritualmente. É direito de todo cidadão, o que dá ao hospital a relevância social que
desfruta no sistema de saúde e donde decorre sua vocação humanitária. Nesse sentido,
WEBER (1995) assinala que “No campo da saúde, os serviços prestados à comunidade
determinam sua responsabilidade e este seu potencial de visibilidade (...).” 26
Por seu turno, comunicação é um processo social dinâmico, contínuo e complexo.
MENEGHETTI (2001) assevera que este processo pressupõe “uma linguagem que faça
sentido” entre os interlocutores, ou seja, “um repertório comum” com códigos conhecidos.
Caso contrário, tem-se apenas informação.27 Enquanto, POLISTCHUCK & TRINTA
(2003) assinalam que é por meio da comunicação que as relações humanas se estabelecem e
que se desenvolve a personalidade e a postura coletiva do indivíduo.28 A idéia da
complexidade é tratada com propriedade pelos mesmos autores quando afirmam que:
A comunicação tem sido objeto de reflexões teóricas, análises empíricas e críticas filosóficas por parte de domínios científicos como a sociologia, a lingüística, a história, a psicologia, a pedagogia, a antropologia, a ciência política e a psicanálise. Apesar disso, mais do que uma “interciência”, o campo de estudos da comunicação se oferece como território de busca multidisciplinar, isto é, um terreno para o fértil intercâmbio teórico metodológico, que, longe de o descaracterizar, reproduz, por sua existência e sua assiduidade, a movência própria à Comunicação.29
A comunicação é essencial para o desenvolvimento e vida das organizações, de
modo geral, considerando que são constituídas por pessoas e representam valores e
objetivos, que necessitam ser transmitidos aos demais.
FREITAS (1997) assinala sobre o papel da comunicação nas organizações que “o
relacionamento da organização no âmbito externo será o reflexo do tratamento da
25 GONÇALVES, Ernesto, op. cit., p. 10-14. 26 WEBER, Maria Helena. Comunicação: estratégia vital para a saúde . In: Saúde e Comunicação: Visibilidades e silêncios, op. cit., p. 152. 27 MENEGHETTI, Sylvia Bojunga. Comunicação e Marketing: fazendo a diferença no dia a dia de organizações da sociedade civil. Coleção Gestão e Sustentabilidade. São Paulo: Global, 2001, p.23. 28 POLISTCHUCK, Ilana & TRINTA, Aluízio Ramos. Teorias da Comunicação: o pensamento e a prática da comunicação social. Rio de Janeiro: Campus, 2003. 29 Id., ibid., p. 62 – 65.
11
comunicação em âmbito interno, facilitando seus negócios. Assim, a comunicação adquire
papel estratégico (...)”.30 A relação entre comunicação e as organizações de saúde é,
portanto, evidente. Contudo, a comunicação precisa estar sustentada em alguns princípios
fundamentais: planejamento, ética e transparência. O hospital há que observar essas
diretrizes na realização da comunicação excelente. Desse modo, crucial é a questão do
planejamento na comunicação. São atitudes que antecipam os bons resultados. É
necessário, primeiramente, que os dirigentes dos hospitais entendam e incluam a
comunicação como parte estratégica de projetos institucionais e administrativos,
estabelecendo políticas claras. As ações devem ser planejadas, pois não irão longe
tentativas fragmentadas de implementação de projetos que não leve em conta a organização
como um todo, bem como ações voltadas apenas para um tipo de público ou de
comunicação, estarão fadadas ao desencanto, principalmente diante das novas tecnologias,
que ampliaram e diversificaram os instrumentos. Não basta estabelecer canais de
comunicação, precisam ser específicos e eficazes. O planejamento de comunicação
pressupõe, portanto, o conhecimento do hospital por inteiro. É a análise do ambiente
externo e interno que permitirá identificar o perfil econômico, social e político da
organização, identificando seus pontos fortes e fracos. Esse diagnóstico fornecerá os dados
para a definição das estratégias, políticas e objetivos. Nesse sentido, a comunicação
constitui-se num dos elementos a serem administrados.
Hoje as organizações têm outro posicionamento perante a sociedade, têm que zelar
ou construir sua imagem institucional, com a consciência de que são também atores sociais
e, por isso, precisam estabelecer canais de comunicação com os mais variados segmentos
e, principalmente, mantê-los eficientemente abertos. É isso que se denomina administração
estratégica de comunicação, conforme bem assinala KUNSCH (1997), inclusive,
destacando a importância da atividade de Relações Públicas nesse contexto:
As organizações modernas assumem novas posturas na sociedade atual. A velocidade das mudanças que ocorrem em todos os campos impele as organizações a um novo comportamento institucional perante a opinião pública. Elas passam a se preocupar mais com as relações sociais, com os acontecimentos políticos e com os fatos econômicos mundiais. E, nesse contexto, a atuação de relações públicas será fundamental, pois caberá a essa
30 FREITAS, Sidinéia Gomes. Cultura Organizacional e Comunicação. In: Obtendo resultados com Relações Públicas..., São Paulo: Pioneira, 1997, p. 42.
12
atividade a função de abrir canais de diálogo com os diferentes segmentos da sociedade, administrando estrategicamente a comunicação.31
Administrar estrategicamente a comunicação implica em considerar os diferentes
públicos em um projeto amplo, na definição de políticas claras, das quais resultarão os
planos, os programas e as ações a serem implementadas no sentido de se atingir a
excelência. Desse modo, em razão do que representa no contexto da organização, o
planejamento da comunicação deve ser concebido à luz do planejamento estratégico do
hospital, pois deve refletir sua missão, objetivos e valores.
As organizações podem ser compreendidas como um conjunto de pessoas e dos
valores que expressam. As relações interpessoais, portanto, são fundamentais na sua
estrutura. Assim, administrar é relacionar-se com pessoas, por meio da comunicação, tanto
que IANHEZ (1997), afirma: “A administração das organizações é, na sua essência, uma
ampla gama de relações entre as pessoas, o que significa comunicação. Na organização, a
comunicação é a essência da administração. Ela é a busca da compreensão. A necessidade
de compreender o que os outros querem e de fazer saber aos outros o que queremos ...” 32
Desse modo, o envolvimento de todas as pessoas é imprescindível para seu sucesso
e desenvolvimento. Assim, o planejamento estratégico necessita da comunicação para
repercutir junto ao público interno, buscando o comprometimento necessário e essencial,
facilitando a cooperação, a credibilidade e o comprometimento e o envolvimento com
valores. A conjugação de esforços nesse sentido é realizada pelo planejamento estratégico,
que representa a somatória dos planos de ação de cada departamento/setor da organização,
a ser desenvolvido e preparado de forma consciente pela administração, juntamente com os
públicos envolvidos. É o que se impõe como necessidade urgente para os hospitais.
Conclusão
As mudanças ocorridas refletiram basicamente nas relações com os diversos
públicos e na cultura da organização. De tal forma, que é fundamental entender quem são
esses públicos e sua importância, aprofundando-se no processo das relações, pois as
organizações interagem com eles: influencia e é influenciada. Identificar quem são,
conhecer e analisar o poder que exercem, aprofundar-se na dinâmica dessas relações é 31 KUNSCH, Margarida Maria K. Op. cit., p. 27. 32 IANHEZ, João Alberto. Relações Públicas nas organizações. In: Obtendo resultados com Relações Públicas... , op., cit., p. 155.
13
tarefa a ser desenvolvida pela comunicação contínua e eficiente com esses públicos.
Contudo, de modo geral, a área da saúde tem uma visão restrita da comunicação, limitada à
atividade de assessoria de imprensa.33
Os hospitais são organizações complexas em razão dos inúmeros serviços
complementares que acolhe em sua estrutura para realizar sua atividade fim: prestar
assistência à saúde. O hospital é hotel, lavanderia, cozinha, enfermaria, farmácia, etc. Além
disso, a própria natureza de sua atividade implica numa organização hierárquica peculiar,
onde, por exemplo, os médicos têm grande autonomia, decorrente de sua autoridade
profissional. Há médicos de várias especialidades e essa segmentação do conhecimento tão
própria desses novos tempos torna as relações de poder muito mais delicadas e vulneráveis.
Administrar esse ambiente complexo, influenciado pelas necessidades de mudanças, exige
planejamento estratégico, que não será eficiente se não acolher um plano de comunicação
com seus públicos, responsáveis pelo sucesso ou insucesso da organização. As Relações
Públicas assumem, então, papel importante nas organizações modernas abrindo canais de
comunicação, ouvindo-os e fazendo repercutir suas opiniões. Em razão da função social
que o hospital desempenha, qualquer erro pode significar altos riscos, danos irreparáveis à
imagem, além do comprometimento financeiro. Para um hospital é importante ter
equipamentos de última geração, prestar serviços de qualidade, ter em seu quadro
profissionais renomados, ser reconhecido como referência em pesquisa médica, mas não
menos essencial é sua capacidade de estabelecer comunicação aberta, contínua e eficiente
com seus públicos. Em outras palavras: qualidade em serviços e tão importante como a
qualidade dos relacionamentos construídos. Por isso, devem revelar em suas práticas os
valores que orientam sua existência, respeitando os usuários/consumidores, atuando
eticamente (com honestidade e transparência) em seus relacionamentos. Devem oferecer
serviços de qualidade, demonstrando à sociedade sua preocupação com as questões sociais,
adotando a transparência como diretriz administrativa. É, portanto, estratégico o papel da
comunicação e das Relações Públicas, pois essas práticas, baseadas em valores, necessitam
ser comunicadas a todos os públicos. Afinal, boas intenções não bastam. É preciso
disseminar valores, fazer com que as pessoas sintam-se enredadas no processo, integrem-se, 33 Essa foi uma das conclusões a que chegamos na pesquisa aplicada junto a hospitais de Campinas – SP, no ano passado, como parte da tese de doutorado, defendida naquele mesmo ano e também apresentada integralmente no Intercom do mesmo ano. Princípios de Comunicação Excelente para o Bom Relacionamento Médico – Paciente . Escola de Comunicação e Artes. USP, 2003.
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construindo a identidade organizacional. Isso somente é possível com a comunicação
eficiente e contínua. Administrar a comunicação é função Relações Públicas, especialista
em estabelecer reciprocidades; harmonizar interesses; identificar e interpretar as aspirações
de cada segmento estratégico do hospital, construindo/consolidando a imagem positiva, a
credibilidade social e contribuindo para a humanização do relacionamento entre a
instituição, o médico e o paciente. A conjungação dessas condições, antecipa bons
resultados. Enfim, o profissional de Relações Públicas representa a possibilidade de
utilização adequada da comunicação junto aos públicos na estrutura organizacional, pois
tem o perfil necessário, a visão institucional necessária para apoiar, orientar e assessorar a
administração nas formas de se aproximar das pessoas, conhecer o que esperam,
conscientizá-las e conseguir o comprometimento com a missão, objetivos e valores da
organização.
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