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PESQUISA-AÇÃO E AGÊNCIA EM SALA DE AULA Laís LEMOS, Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) Jadson BORGES, Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) Orientador: Dr. Rodrigo Camargo Aragão ([email protected]) RESUMO Argumenta-se nesse estudo a importância da pesquisa-ação como uma possibilidade de agência dos participantes de uma sala de aula. Embasado nas considerações da linguística crítica, cuja postura visa transformações para uma prática crítico - reflexiva e problematizadora, procura-se pensar as contribuições da convergência entre pesquisa e ensino para a transformação dos envolvidos em atividades de sala de aula de inglês. Procura-se observar a partir de referencial teórico como a prática de pesquisa-ação no campo da linguística aplicada pode propiciar o agenciamento dos seus participantes. Pretende-se lançar luz à importância da pesquisa-ação como uma estratégia de conhecer pautado no viver e assim voltado para as transformações. Para tanto, aporta-se nos estudos sobre a Biologia do Conhecer (MATURANA, 1998; 2001), as Emoções (ARAGÃO, 2005; 2007; 2008; 2014) nos estudos sobre a prática de pesquisa-ação (ADORNO, 2012; BALDISSERA, 2001; ENGEL, 2000; TELLES, 2002). Destaca-se a importância das convergências entre teoria e prática (PENNYCOOK, 2001), bem como entre ensino e pesquisa (JORDÃO, 2010; LEFFA, 2003), o que é um ponto de ação do grupo de pesquisa FORTE- Formação, Tecnologia e Ensino, da Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC, em que esse estudo se situa. A percepção a ser fundamentada advém de uma reflexão sobre a abordagem metodológica da pesquisa-ação, que integra nossos projetos no processo de mestrado, fazendo parte do nosso campo de pesquisa. Justificamos nosso interesse na temática pela crença de que o papel do ensino e da pesquisa não pode ser negligenciado na sala de aula e que as emoções que se estendem no processo de ensino/aprendizagem devem ser cuidadosamente consideradas como possibilidades de agenciamento. Neste processo, a reflexão de estudantes e professores, a consciência de si mesmo e a responsabilidade nas possibilidades de transformação na convivência (ARAGÃO, 2005; 2007; 2008; 2014), devem ser consideradas nos processos de posicionamentos de voz e afirmação de identidades. Palavras-chave: Pesquisa-ação; Ensino/aprendizagem; Agência.

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PESQUISA-AÇÃO E AGÊNCIA EM SALA DE AULA

Laís LEMOS, Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC)Jadson BORGES, Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC)

Orientador: Dr. Rodrigo Camargo Aragão ([email protected])

RESUMO

Argumenta-se nesse estudo a importância da pesquisa-ação como uma possibilidade de agência dos participantes de uma sala de aula. Embasado nas considerações da linguística crítica, cuja postura visa transformações para uma prática crítico - reflexiva e problematizadora, procura-se pensar as contribuições da convergência entre pesquisa e ensino para a transformação dos envolvidos em atividades de sala de aula de inglês. Procura-se observar a partir de referencial teórico como a prática de pesquisa-ação no campo da linguística aplicada pode propiciar o agenciamento dos seus participantes. Pretende-se lançar luz à importância da pesquisa-ação como uma estratégia de conhecer pautado no viver e assim voltado para as transformações. Para tanto, aporta-se nos estudos sobre a Biologia do Conhecer (MATURANA, 1998; 2001), as Emoções (ARAGÃO, 2005; 2007; 2008; 2014) nos estudos sobre a prática de pesquisa-ação (ADORNO, 2012; BALDISSERA, 2001; ENGEL, 2000; TELLES, 2002). Destaca-se a importância das convergências entre teoria e prática (PENNYCOOK, 2001), bem como entre ensino e pesquisa (JORDÃO, 2010; LEFFA, 2003), o que é um ponto de ação do grupo de pesquisa FORTE- Formação, Tecnologia e Ensino, da Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC, em que esse estudo se situa. A percepção a ser fundamentada advém de uma reflexão sobre a abordagem metodológica da pesquisa-ação, que integra nossos projetos no processo de mestrado, fazendo parte do nosso campo de pesquisa. Justificamos nosso interesse na temática pela crença de que o papel do ensino e da pesquisa não pode ser negligenciado na sala de aula e que as emoções que se estendem no processo de ensino/aprendizagem devem ser cuidadosamente consideradas como possibilidades de agenciamento. Neste processo, a reflexão de estudantes e professores, a consciência de si mesmo e a responsabilidade nas possibilidades de transformação na convivência (ARAGÃO, 2005; 2007; 2008; 2014), devem ser consideradas nos processos de posicionamentos de voz e afirmação de identidades.

Palavras-chave: Pesquisa-ação; Ensino/aprendizagem; Agência.

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CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A sala de aula de inglês tem sido marcada pela identidade híbrida do professor

de língua estrangeira, a qual interpola identidade da língua/cultura nativa com esses

mesmos aspectos da língua inglesa, refletindo algumas heranças de concepções pós-

coloniais. Em acréscimo, a heterogeneidade e a diferença na construção dos saberes

caracterizam o público para o qual essa formação de professores se destina, os alunos.

Esses estudantes têm apresentado resistência aos modelos de ensino de inglês, que nos

parece não atender nem a necessidade dos aprendizes, nem dos professores (JORDÃO,

2010).

Ao pensarmos essas (des) identificações (JORDÃO, 2010) dos participantes de

sala de aula de inglês com os modelos de ensino postos, acreditamos na pesquisa-ação

(ADORNO, 2012; BALDISSERA, 2001; ENGEL, 2000; TELLES, 2002), uma

metodologia de pesquisa que procura soluções para problemas situacionais em

colaboração com os participantes desse contexto, como uma forma de construir sentidos

para o ensino/aprendizagem de inglês, possibilitando a agência de professores e alunos

junto à universidade, refletindo a importância das convergências entre teoria e a prática,

ensino e pesquisa, a fim de promover a responsabilidade e consciência de si pelos

participantes (ARAGÃO, 2008).

Acreditamos que por meio da pesquisa-ação, ao envolver alunos e professores na

investigação sobre o ensino/aprendizagem de inglês, pensando a realidade deles, suas

identidades e formas de construção de saber, podemos promover um letramento crítico

em concordância com o papel educativo de ensino de uma língua estrangeira, que vai

muito além de ensinar a língua viabilizada por modelos pré - estabelecidos como

soluções universais (BRASIL, 2006; JORDÃO, 2010). Importa para isso, conceber a

amplitude que o ensino de uma língua estrangeira tem no mundo, bem como

compreender algumas variáveis que interferem nesse aprendizado.

Por isso, fazemos esse estudo pautado nas considerações do movimento da

linguística aplicada crítica (PENNYCOOK, 2001) que considera a política das

diferenças no ensino/aprendizagem de inglês, bem como nos aportamos na Biologia do

Conhecer (MATURANA, 1998; 2001), que argumenta a interferência das emoções

(ARAGÃO, 2005, 2007, 2008, 2014), como disposições biológicas do ser humano

nesse processo.

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Nossas percepções, a serem fundamentadas, são uma reflexão sobre a

metodologia de pesquisa-ação que integra nossos projetos em desenvolvimento no

mestrado, que estão voltados para a compreensão do ensino/aprendizagem de inglês na

sala de aula em colaboração com seus participantes. Esses estudos estão inseridos no

grupo de pesquisa FORTE – Formação, Tecnologia e Ensino, da Universidade Estadual

de Santa Cruz – UESC, no tocante a uma de suas temáticas centrais, que é o ensino/

aprendizagem de línguas. A equipe tem como objetivo aprofundar-se nesse tema,

ampliando e estabelecendo ponte entre a UESC e as escolas públicas da região sul da

Bahia. O grupo FORTE trabalha com a escola e a formação de professores, em busca de

transformações e intervenções positivas nessa realidade.

Nessa empreitada, realizamos um levantamento sobre a pesquisa-ação, de modo

a pensá-la como uma possibilidade de agência dos participantes de sala de aula de

inglês, levando em consideração a postura da linguística aplicada critica e as emoções

no ensino/aprendizado de inglês, estimulando a convergência entre teoria e prática,

pesquisa e ensino, a fim de promover a reflexão de estudantes e professores, a

consciência de si e a responsabilidade nas possibilidades de transformação na

convivência (ARAGÃO, 2003, 2005, 2007, 2014) no ambiente de sala de aula,

propiciando seus posicionamentos de voz e afirmação de identidades.

1. PESQUISA-AÇÃO

No âmbito da Linguística Aplicada (LA), a importância de um olhar atento para

os procedimentos éticos na pesquisa voltada para o ensino/aprendizagem de línguas tem

evidenciado a necessidade do equilíbrio das relações de poder entre os participantes e a

responsabilidade social da pesquisa (CAVALCANTI, 1986; CELANI, 2005; PAIVA,

2005; TELLES, 2002). A postura da LA crítica (PENNYCOOK, 2001) tem destacado a

relevância da compreensão da diferença dos valores culturais e situacionais no

desenvolvimento da pesquisa, considerando a interferência de variáveis especificas de

cada contexto no ensino/aprendizagem de línguas. Neste sentido, estudos têm apontado

para a demanda de práticas de pesquisa que pensem essas questões da diversidade

cultural, subjetiva e atentas para tais procedimentos éticos (ARAGÃO, 2005, 2008).

Diante dessas considerações, argumentamos a relevância da pesquisa-ação para estudos

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no campo da LA voltados para o ensino/aprendizagem e nessa finalidade, realizamos

um levantamento sobre essa metodologia de pesquisa.

Conforme Baldissera (2001), a pesquisa-ação é oriunda das ciências sociais e no

Brasil foi introduzida na educação pelo sociólogo João Bosco Pinto. Tal pesquisa,

segundo a autora, surge como nova proposta metodológica, reflexo de um contexto

marcado por preocupações teóricas e práticas que advêm da busca por novas formas de

intervenção e investigação, privilegiando a participação em vista da transformação da

realidade. De acordo com Thiollent (1985, apud BALDISSERA, 2001, p.6), esse tipo

de pesquisa objetiva ampliar o conhecimento dos pesquisadores sobre um fenômeno e o

conhecimento e/ou conscientização dos sujeitos envolvidos no fenômeno, contribuindo

para discussões. Para Bosco (1989, apud BALDISSERA, 2001, p.7), uma proposta de

pesquisa-ação implica em promover acesso ao conhecimento técnico-científico,

possibilitando a participação e “desvelamento” da realidade e efetiva transformação pela

ação; propiciar que o sujeito/agente atue na sua mudança; e incentivar a criatividade,

gerando novas formas de participação.

Baldissera (2001, p.8-10) argumenta que o modo de fazer a pesquisa-ação, o

conhecimento da realidade já é a ação, inclusive de sensibilização e conscientização.

Esse tipo de estudo, nas palavras da autora, é participativo e deve democratizar o saber,

refletindo “intercambio, socialização de experiências e conhecimentos”. Esse tipo de

estudo, ao ser desenvolvido pela troca de saberes e experiências, traz contribuições reais

e significativas para todos os participantes da pesquisa, pois “a pesquisa-ação como

metodologia de pesquisa e de ação cria espaços onde as pessoas participam do projeto

de atuação organicamente estabelecido”. Ainda segundo Baldissera (2001), a pesquisa-

ação revela-se como um estudo em que o conhecer é construído pelas ações coletivas

dos participantes. A autora define a pesquisa-ação como uma metodologia do conhecer

e do agir coletivo, em que o conhecer e o agir acontecem de forma simultânea numa

relação dialética dobre a realidade social, e ao privilegiar a participação visa a

transformação desse contexto.

Engel (2000, p.182) define a pesquisa-ação como “um tipo de pesquisa

participante engajada, em oposição à pesquisa tradicional, que é considerada como

‘independente’, ‘não-reativa’ e ‘objetiva’.” O autor aponta para o modelo tradicional de

pesquisa, ressaltando que uma das principais diferenças da pesquisa-ação em relação a

ela é a junção da pesquisa à ação ou à prática, uma necessidade que a pesquisa-ação

deseja superar desde o seu surgimento, conforme pode ser percebido na apresentação

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das características essenciais da pesquisa-ação e as suas fases, que começam com a

definição de um problema, seguida de uma pesquisa preliminar, formulação de hipótese,

desenvolvimento e implementação de um plano de ação, coleta de dados para avaliação

dos efeitos da implementação do plano, avaliação do plano de intervenção e

comunicação dos resultados.

Engel (2000, p.182) acrescenta que umas das características deste modelo de

pesquisa é que “através dela se procura intervir na prática de modo inovador já no

decorrer do próprio processo de pesquisa e não apenas como possível consequência de

uma recomendação na etapa final do projeto”. Essa intervenção é inovadora porque,

além de fugir do padrão tradicional de apresentar ou dar a solução (como se o

pesquisador finalmente descobrisse a verdade ao final da pesquisa), ela não tem a

pretensão de apresentar verdades científicas absolutas, mas, pelo contrário, tem o

objetivo de dialogar crenças e práticas com os participantes da pesquisa, o que, segundo

o autor, “pode levar a um resultado específico imediato, no contexto do ensino-

aprendizagem” (ENGEL, 2000, p.183). O autor afirma que a pesquisa-ação “pode ser

aplicada em qualquer ambiente de interação social que se caracterize por um problema,

no qual estão envolvidos pessoas, tarefas e procedimentos” (ENGEL, 2000, p.183).

A abordagem utilizada neste tipo de pesquisa normalmente é de cunho

qualitativo, o que consoante Telles (2002, p. 102) “pode contemplar a dimensão

humana, a pluralidade e interdependência dos fenômenos educacionais”. Os

participantes atuam de forma determinante no movimento da pesquisa, interferindo

ativamente na direção do estudo. Alunos e professores tem acesso à teoria e constroem a

pesquisa com as intervenções da prática real. O pesquisador por sua vez, se insere no

contexto para a compreensão do fenômeno, que é analisado junto com os participantes,

nesse tipo de pesquisa “a construção dos significados é feita pelo pesquisador e pelos

participantes, em negociações [...] os “sujeitos” passam a ser participantes, parceiros”

(CELANI, 2005, p.109). Nesse tipo de investigação, pesquisador e docentes trabalham

em conjunto, procurando compreender a prática do cotidiano escolar (TELLES, 2002).

Isso possibilita uma contextualização mais próxima da realidade de sala de aula, visto

que se desenvolve a partir de preocupações e interesses dos participantes cotidianos

desse cenário, acontecendo “de dentro para fora”, consoante Nunan (1993, apud

ENGEL, 2000, p. 183).

Com referência a pesquisa-ação, Oliveira (2012, p.58-9) argumenta que essa

modalidade de pesquisa se destina à promoção de ações dialógicas, cujo diálogo entre

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os participantes pode promover a emancipação dessas pessoas, na construção de

sentidos no mundo. Oliveira (2012) relaciona a pesquisa-ação colaborativa com a

prática de ensino localmente situada, considerando o papel desse tipo de pesquisa na

formação docente crítica. Oliveira, na fala de Jorge (2005), afirma que “essa

modalidade de pesquisa destina-se à promoção de ações dialógicas entre formadores de

professores e professores em formação” (OLIVEIRA, 2012, p.58). A autora baseia-se

nos trabalhos de Freire (1982, 1997) e de Kumaravadivelu (2003), sendo que o segundo

teórico também se fundamenta no primeiro. Assim, Oliveira (2012) aborda a pedagogia

do pós-método (postmethod pedagogy), proposta por Kumaravadivelu (2001), que

apresenta três dimensões principais de sua pedagogia: particularidade, praticabilidade e

possibilidade. A autora aborda a coerência dessas dimensões com a formação crítica e

com a pesquisa-ação colaborativa, sugerindo a importância da construção de saberes

localmente situados. Para a autora, a ação pode levar à reflexão crítica, possibilitando

movimentos de mudança, devendo a ação pedagógica empoderar os participantes ao

atuarem de forma engajada na pesquisa.

Diante dessas considerações sobre a metodologia da pesquisa-ação, podemos

inferir que tal metodologia propicia “o estudo de uma situação social com vistas a

melhorar a qualidade da ação dentro dela”, conforme define Elliott (1991, apud Tripp,

2005, p. 463), pois na construção colaborativa do saber, alunos, professores (e também

pesquisador) são expostos a reflexões que favorecem a consciência de si, podendo

transformar a conduta dessas pessoas em relação ao ensino/aprendizagem (ARAGÃO,

2008). A ação da pesquisa contribui para uma reflexão crítica e teoricamente informada

em busca de movimentos concretos de mudança, favorecendo a capacidade de agência

dos envolvidos no processo, ao convergir ensino e pesquisa, abrindo espaço para

professores e alunos produzirem pesquisa, deixando de ser apenas consumidores

(JORDÃO, 2010; LEFFA, 2003; OLIVEIRA, 2012).

A pesquisa-ação reforça a crença na importância da integração entre

Universidade e Escola na construção de saberes a partir da convergência entre teoria e

prática, na práxis (LEFFA, 2003; PENNYCOOK, 2001). Bem como reconhece a

necessidade de intervenções de pesquisa que tenha como fundamento relações de

simetria de poder entre os participantes, visando à responsabilidade social (CELANI,

2005, p. 109), a real contribuição para a as partes (TELLES, 2002, p.101),

possibilitando o agenciamento e autonomia dos sujeitos envolvidos (JORDÃO, 2010),

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priorizando o caráter ético, imprescindível a uma pesquisa (CELANI, 2005; PAIVA,

2005).

Desse modo, acreditamos ser importante para a área da linguística aplicada

voltada para o ensino-aprendizagem de línguas, a ponte entre escola e universidade,

fortalecendo o processo a partir da práxis. Portanto, refletimos nesse estudo a prática de

pesquisa-ação como um espaço para o agenciamento de professores e alunos em sala de

aula, processo no qual os sujeitos colaboradores, passam de consumidores para co-

produtores, atuando na construção de sentidos no mundo, abandonando as verdades

tidas como universais e oportunizando a criação de propostas universalizantes

(JORDÃO, 2010, p. 433-439).

2. A IMPORTÂNCIA DA AGÊNCIA DOS SUJEITOS EM SALA DE AULA

A sala de aula de inglês tem refletido as identidades híbridas dos professores de

língua estrangeira e a visão conflitante sobre o papel do ensino de línguas na educação

pública. As crenças dos professores e dos alunos têm sido influenciadas por heranças do

pós-colonialismo, que pressupõe um imperialismo cultural e econômico sobre as nações

em desenvolvimento, neste caso, no Brasil. A reprodução de modelos de

ensino/aprendizagem internacionais, a dicotomia valorativa entre nativo e não-nativo, a

compreensão do inglês como um produto no mundo, reforçam esse conflito (JORDÃO,

2010). Em face disso, as Orientações Curriculares para o Ensino Médio – OCEMs de

Línguas Estrangeiras (BRASIL, 2006) discutem a prática da noção de ensino de línguas

voltada para questões de inclusão e cidadania, em oposição a um ensino que vise apenas

o objetivo linguístico, repercutindo uma perspectiva imperialista e excludente de ensino

de língua. Nesse sentido, as OCEMs argumentam que:

Com essas disciplinas, busca-se a formação de indivíduos, o que inclui o desenvolvimento de consciência social, criatividade, mente aberta para conhecimentos novos, enfim uma nova reforma na maneira de pensar e ver o mundo (BRASIL, 2006, p.90).

As OCEMs atentam para um ensino de línguas que propicie o desenvolvimento

da cidadania do aluno, promovendo uma compreensão dele sobre seu lugar na

sociedade. As Orientações defendem que “o valor educacional da aprendizagem de uma

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língua estrangeira vai muito além de meramente capacitar o aprendiz a usar uma

determinada língua estrangeira para fins comunicativos” (BRASIL, 2006, p.92). As

OCEMs (BRASIL, 2006, p.96) argumentam que esse ensino não deve apenas estar

voltado a uma demanda do mercado no contexto da globalização, mas também, na fala

de Maturana (1999), “criar possibilidades de o cidadão dialogar com outras culturas sem

que haja a necessidade de abrir mão de seus valores”.

Do mesmo modo, Jordão (2010) aponta a resistência dos alunos e professores

aos modelos de ensino em função das crenças pós-coloniais e a frustração deles quando

inseridos numa prática restrita a objetivos puramente linguísticos. A autora defende que

a identidade do professor de língua inglesa no Brasil é marcada pelo processo em fluxo

de representações simbólicas, construído discursivamente, abrindo espaço para a

construção de sentidos e o acontecimento de resistência e agência. A resistência para

Jordão (2010, p.431) trata-se de uma “consequência do posicionamento do sujeito num

local de fronteira, na margem do processo [...]”. Esse espaço é híbrido e nele há o

desafio das narrativas totalizadoras, em que há a percepção do caráter conflitante das

representações. Já a agência, trata-se de uma “forma de intervir no processo discursivo

de construção de sentidos e representação de mundo” (JORDÃO, 2010, p. 432). Na

agência, discursos de formas de representação distintas se interpõem e transformam-se.

Sentidos são construídos em ação edificada no processo discursivo, em que pessoas,

ideia, conhecimento e modos de conhecer definem-se.

Essa concepção de agência, como maneira de representação e transformação, em

função da construção de sentidos num processo reflexivo nos interessa, pois

acreditamos que a pesquisa-ação ao pensar sobre o ensino/aprendizagem de língua

inglesa no contexto da sala de aula junto com alunos e professores, possibilita esse

espaço e pode transformar essa realidade por meio da consciência de si mesmo. Nessa

compreensão de que o que está posto como universal pode não contemplar a diferença,

a heterogeneidade e a complexidade de uma sala de aula de inglês, ressaltamos a

importância da agência dos sujeitos desse contexto de forma responsável. A articulação

entre escola e universidade, pode desta forma, contribuir para a reflexão desses sujeitos,

promovendo práticas situadas e significativas para eles. Essa integração favorece tanto à

pesquisa como ao ensino, pois as contribuições podem trazer ganhos para ambos ao

pensarem em colaboração uma prática de ensino/aprendizagem condizente com

demanda global e local (ARAGÃO, 2008; JORDÃO, 2010; LEFFA, 2003).

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Nesse sentido, Jordão (2010) propõe que a escola deveria almejar sujeitos

críticos, os quais pudessem desenvolver suas potencialidades de agência, ou seja, de

agir discursivamente sobre os discursos que o constituem. Por isso, a autora, na fala de

Maturana, argumenta que a escola deve atentar para a produção de entendimentos no

campo das “emoções”, enquanto um “determinante do domínio de racionalidade por

meio do qual construímos nossos argumentos”. (MATURANA, 2001 apud HALU,

2010, p.18). Essas emoções, que Jordão (2010) atenta ser importante para o

ensino/aprendizagem, são apresentadas na Biologia do Conhecer (1998; 2001) como

“disposições corporais que determinam ou especificam domínios de ações”

(MATURANA, 1998, p. 16) e ao determinar as ações humanas, interferem na própria

razão. Assim todo agir do homem é modulado pelas emoções, as quais estão imbricadas

com conhecimento e linguagem (ARAGÃO, 2005). Neste sentido, Jordão (2010, p.435)

defende que o objetivo principal da escola deveria ser permitir que os sujeitos que dela

participam, sejam capazes de desenvolver e construir possibilidades de agência

(racional e emocional) sobre as práticas sociais e seus posicionamentos na sociedade.

Em consonância com a abordagem de ensino/aprendizagem de língua estrangeira (LE)

proposta pelas OCEM (BRASIL, 2006), Jordão argumenta:

O potencial que uma LE tem de transformar nossos procedimentos interpretativos e as maneiras como nos relacionamos com diferentes conhecimentos e formas de conhecer, [...] de nos levar a perceber o mundo de outras maneiras, de vislumbrar formas alternativas de significar e de construir nossas identificações e desidentificações, nosso engajamento com o mundo (JORDÃO, 2010, p.434).

Por isso, a autora ressalta a importância da conscientização no processo e de um

letramento crítico pautado numa perspectiva pós-estruturalista, que busque alternativa

para narrativas universalizantes e não um letramento crítico, que seja visto como um

caminho da libertação, enquanto uma alternativa universal. Jordão (2010, p.435)

defende um letramento que forme sujeitos críticos propiciando a eles “desenvolver suas

potencialidades de agir discursivamente sobre os discursos que os constituem, sobre as

relações e práticas sociais [...]”, construindo conhecimento, sem desconsiderar o papel

das emoções nesse processo.

Jordão (2010) aponta a importância da escola como um espaço de agência, que

envolva razão e emoção, sobre as posições e funcionamentos sociais, como uma

maneira de legitimar as diferentes visões de mundo, valorizando as formas heterogêneas

do saber. Esse agenciamento dos sujeitos da sala de aula de língua estrangeira rompe

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com a formação hierárquica do conhecimento, pautando-se na compreensão de que o

conhecer é um produto cultural, que envolve distintas maneiras de perceber e construir

sentidos e tal proposta coaduna-se com as concepções da metodologia da pesquisa-ação.

Pois, essa se aporta no entendimento da importância da voz desses sujeitos, que atuam

como participantes na construção do conhecimento, ao pensar que um estudo sobre o

contexto dinâmico de sala de aula só pode ser legitimado se desenvolvido em

colaboração com aqueles que vivenciam esse conhecer no cotidiano.

3. ENSINO E PESQUISA: UMA CONVERGÊNCIA NECESSÁRIA

Na lógica da ciência moderna as dicotomias têm encontrado guarita. As relações

dicotômicas parecem representar o alívio de ter uma resposta. O perigo, porém, é

quando este alívio torna-se uma espécie de conforto perpétuo, pressupondo-se uma

verdade alcançada. Contra este risco, Leffa (2003) propõe a valorização das

convergências face às dicotomias, argumentando que é o que se vislumbra para o futuro,

“um processo generalizado de convergência, fundindo tecnologias, métodos e teorias.”

(LEFFA, 2003, p.232). O autor discute, então, quatro convergências para o futuro do

ensino do inglês: ensino e pesquisa, inteligência e emoção, global e local, real e virtual.

A primeira convergência que ele sugere é a do ensino e pesquisa, em que ele

defende a possibilidade do professor pesquisar e não simplesmente, nas palavras do

autor, “aceitar a verdade dos outros” (LEFFA, 2003, p.234). Para ele, o professor não

deve apenas consumir pesquisa, mas também produzir, dentro de sua própria realidade,

pois “o trabalho de pesquisa é imprescindível, inseparável do ensino” (LEFFA, 2003,

p.234). O autor expõe a sua concepção de pesquisa-ação e sobre a contextualização do

ensino:

Entendo que a pesquisa-ação, vista aqui como uma investigação feita pelo professor para resolver um problema de sua sala de aula, pode tornar a pesquisa muito local, sem possibilidade de ser generalizada; o que é verdade em uma aula de inglês em Juiz de Fora pode não ser verdade numa aula de inglês em Nova York, o que é verdade hoje pode não ser mais verdade amanhã. Seria uma verdade extremamente contextualizada, válida apenas para um determinado local, numa determinada hora (LEFFA, 2003, p.234).

Leffa (2003) concebe a pesquisa-ação como um instrumento de investigação

local, que não pode ser generalizado, porque não inclui as variações dos diferentes

contextos. Daí a importância do professor ser ele mesmo um pesquisador, que identifica

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os problemas locais e propõe soluções de acordo a realidade local, que enxerga a sala de

aula como espaço para produção e não somente para recepção.

Por outro lado, Jordão (2010) aborda a importância do professor-pesquisador sob

os aspectos do agenciamento, hibridismo e consciência de si. Este último implica,

segundo a autora, que o professor e o aluno conheçam o seu posicionamento para agir

sobre o processo de construção de sentidos e tem um papel essencial na relação entre

ensino e pesquisa.

A autora define a agência como “a interpolação discursiva de diferentes formas

de representação (de si mesmo e dos outros) e sua transformação [...], uma forma de

intervir no processo discursivo de construção de sentidos e representações do mundo”

(JORDÃO, 2010, p.432). Agenciamento aqui é colocado como o oposto à resistência e

ressalta o caráter híbrido de cada indivíduo na participação do processo de construção

de sentidos na sala de aula.

O pressuposto do agenciamento aqui é o mesmo que encontramos em Leffa

(2003), embora sem essa terminologia, que o papel do professor não é simplesmente o

de “passar conhecimento para os alunos, mas também gerar o conhecimento necessário

para uma melhor aprendizagem da língua” (LEFFA, 2003, p.235). Sendo assim, a

consciência de si vem antes do agenciamento e os dois são interdependentes, uma vez

que não se pode conceber um espaço de compartilhamento de conhecimento se a

consciência das práticas individuais não tiver prioridade. Jordão (2010) conclui

ressaltando que a noção freireana de práxis está atrelada ao conceito de agência:

Para Freire (1998; 1999) existe uma profunda interação entre teoria e prática, tanto que chega a borrar a distinção entre as duas, e a trazer à tona a noção de teoria como uma forma de prática. Isso significa que discussões teóricas e as alternativas que tais discussões possibilitam são práticas em si mesmas, e como tal constituem modos de saber e construir realidades. Outra implicação da noção freireana de práxis é a reconceituação de agência em discurso, numa compreensão de agência como uma prática reflexiva que desafia constantemente, em vários campos ideológicos, seus próprios pressupostos e desdobramentos, enfocando a transformação e constante reavaliação de procedimentos interpretativos de construção de sentidos, e os conhecimentos por eles produzidos (JORDÃO, 2010, p.438).

Essa prática reflexiva que a autora chama de agência em discurso pode também

ser vista como um dos frutos da convergência ensino e pesquisa, que é defendida pelos

autores que ora apresentamos. Observa-se que ao tratar da convergência entre ensino e

pesquisa indica-se outra convergência, que é entre teoria e prática.

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4. TEORIA E PRÁTICA: PRÁXIS

Ao propor a convergência entre ensino e pesquisa, Leffa (2003) relaciona,

consequentemente, teoria e prática, sendo esta uma dicotomia há muitos séculos, difícil

de destituir. Sobre as teorias, o autor assume a postura de Diderot e retoma-o quando

declara que diante de diversas teorias “a verdade é uma prostituta: dorme com todos e

não é fiel a ninguém” (LEFFA, 2003, p.232). O autor ainda declara que “diante de uma

teoria é melhor ser promíscuo do que fiel. A história não caminha se as teorias não

forem traídas” (LEFFA, 2003, p.233).

Sobre essa relação entre teoria e prática, Pennycook (2001) aponta para duas

tendências problemáticas na linguística aplicada: a primeira, que diz que aplicações

pedagógicas não estão baseadas em contextos específicos de prática; e a segunda, que

rejeita a teoria da linguística aplicada, como se ela não tratasse do mundo real. O autor

rejeita as duas posturas e prefere ver a linguística aplicada “em todo o seu contexto

como relações recíprocas constantes entre teoria e prática1” (PENNYCOOK, 2001, p.3).

Citando Simon (1992, apud PENNYCOOK, 2001, p. 3), o autor acrescenta que prefere

vê-la como “aquela contínua integração reflexiva de pensamento, desejo e ação algumas

vezes chamada de práxis”. Assim, ele prefere evitar a postura de teoria na prática e

propõe que elas são inter-relacionadas de forma mais complexa.

Pennycook (2001, p.4) afirma que “pensamento crítico é usado para descrever

uma maneira de trazer uma análise mais rigorosa para a solução de um problema ou

compreensão textual”2. Assim, ele aponta para a importância de ser crítico para a

problematização e desenvolvimento de determinada prática. O autor ainda ressalta o

cuidado na condução desse pensamento crítico para não incorrer numa prática em

“contextos descontextualizados” (decontextualized contexts). Por isso, deve-se atentar

para as relações micro e macro, ou seja, as relações globais e locais; e ele sugere que se

faça isso através de um mapeamento dessas relações, que possam relevar a maneira de

pensar local para que a prática possa ser contextualizada:

1 Tradução livre do trecho: “I want to resist both versions of applied linguistics and instead look at applied linguistics in all its contexts as a constant reciprocal relation between theory and practice, or preferably, as ‘that continuous reflexive integration of thought, desire and action sometimes referred as Praxis’ (Simon, 1992, p.49).”2 Tradução livre do trecho: “Critical thinking is used to describe a way of bringing more rigorous analysis to problem solving or textual understanding.”

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Um elemento central da linguística aplicada crítica, portanto, é uma maneira de explorar a língua em contextos sociais que vão além de meras correlações entre língua e sociedade, levantando mais questões críticas relacionadas a acesso, poder, disparidade, desejo, diferença e resistência3 (PENNYCOOK, 2001, p. 6).

Deste modo, Pennycook (2001) defende que uma teoria crítica deve tomar a

desigualdade social e a transformação social como trabalho, a fim de fundamentar uma

prática contextualizada e não simplesmente fazer conexões entre as micro relações da

língua em contexto com as macro relações de questões sociais. É neste pressuposto que

a pesquisa-ação revela a sua importância e o seu papel na urgência desta convergência

entre teoria e prática.

5. EMOÇÕES, REFLEXÃO E CONSCIENCIA DE SI

Diante das considerações sobre o papel educativo do ensino/aprendizagem de

línguas estrangeira, inglês, norteado pelas OCEMs (BRASIL, 2006) e defendido por

Jordão (2010), bem como da importância da agência dos sujeitos em sala de aula, da

práxis e da convergência entre ensino e pesquisa, argumentamos que as emoções que

participam do processo devem ser cuidadosamente apreciadas como possibilidade de

agenciamento. Isto porque, consoante a BC (1998), as nossas ações são moduladas pelas

emoções, que nos possibilitam operar de determinado modo, e como tal devem ser

consideradas como variáveis fundamentais no ensino/aprendizagem. Estudos na área da

linguística aplicada têm demonstrado a importância das emoções como variáveis

envolvidas no complexo processo de ensino/aprendizagem de línguas em sala de aula

(ARAGÃO, 2005, 2007, 2008, 2011, 2014).

Aragão (2005) argumenta a inter-relação entre linguagem, conhecimento e

emoção como fundamental para a compreensão do contexto de sala de aula, mostrando-

nos que as emoções são variáveis envolvidas no complexo processo de

ensino/aprendizagem, evidenciando a necessidade de “práticas de pesquisa que sejam

sensíveis às diferenças e às variações individuais e contextuais e que evidenciem a

mutualidade entre teoria e prática [...]” (ARAGÃO, 2005, p. 102).

3 Tradução livre do trecho: “A central element of critical applied linguistics, therefore, is a way of exploring language in social contexts that goes beyond mere correlations between language and society and instead raises more critical questions to do with access, power, disparity, desire, difference, and resistance.”

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Aragão (2007) em seus estudos de doutorado investigou as emoções nas mais

diversas áreas e à luz da Biologia do Conhecer, indicou como as emoções interferiam no

ensino/aprendizagem de quatro graduandos em Letras-Inglês ao desempenharem

habilidades orais. O autor evidencia nessa pesquisa, a importância da reflexão sobre as

histórias de aprendizagem e conscientização das emoções como uma possibilidade de

transformação dos sujeitos.

Aragão (2008) explora a relevância das emoções na pesquisa narrativa como

elementos de transformação de aprendizagem, se estiverem atreladas como reflexão e

ação responsiva dos sujeitos, que agem de forma responsável, transformando seu

processo de aprender. O autor reforça a importância de oportunizar espaços para a

reflexão acerca da aprendizagem em sala de aula e considera a influência da pesquisa na

mudança de experiências de aprendizagem. Aragão destaca o valor da legitimação do

outro na pesquisa, como fomento de emoções que possam abrir espaço para o erro e

para a reflexão, de modo que o aprendiz possa agir de forma responsável sobre sua

aprendizagem e ter a capacidade de transformá-la.

Aragão (2011) reitera “a relevância das emoções no ensino/aprendizagem de

línguas, na reflexão sobre a ação e na responsabilidade pela consciência de nossas

emoções na convivência com alunos e professores de línguas” (ARAGÃO, 2011, p.

163). O autor considera o valor das emoções e da reflexão nesse processo, bem como a

correlação entre emoção, reflexão, engajamento responsável para a transformação no

ensino/aprendizagem.

Aragão (2014) argumenta a relação entre reflexão, identidade e emoção na

aprendizagem de inglês, evidenciando a reflexão enquanto um dar-se conta de si e das

emoções e identidades, fatores que interferem no processo. O autor nos mostra que a

postura consciente de emoções sobre a aprendizagem, de forma responsável, pode abrir

espaço para uma agir reflexivo gerador de mudanças no ensino/aprendizagem.

Diante das contribuições de Aragão, à luz da Biologia do Conhecer, podemos

perceber a importância de atentarmos para as emoções em sala de aula, bem como a

relação das emoções com a reflexão e consciência de si, de forma responsável,

possibilitando transformações no ensino/aprendizagem. Argumentamos que as emoções

devem ser cuidadosamente consideradas como formas de agenciamento, pois as mesmas

interferem diretamente no processo de ensino/aprendizagem de línguas e a tomada de

conhecimento dessas emoções pode promover reflexão, consciência de si, favorecendo a

uma transformação.

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Segundo Aragão (2008, pp. 315 e 316), “quando refletimos, vivemos uma

transformação em nossa conduta e podemos observar e agir de uma forma que antes não

podíamos” e “é na reflexão sobre nossa experiência que tomamos consciência do mundo

em que vivemos e no qual queremos viver”. Por isso, a necessidade de pesquisas

sensíveis a essas variáveis (ARAGÃO, 2005), como tem se mostrado a pesquisa-ação de

forma útil e coerente com essa demanda, conforme corrobora Oliveira (2012, p. 58-9)

ao dizer que esse tipo de pesquisa propicia o empoderamento dos participantes,

contribuindo para o desenvolvimento de resultados a partir do conhecimento vivenciado

por eles, propiciando uma contínua construção identitária, favorecida pela auto-reflexão

e consciência de si.

Ao dar si conta de si, professores, alunos (e também pesquisador) abrem espaço

para a agência, pautada na reflexão e conhecimento das emoções, possibilitando

transformações no ensino/aprendizagem de inglês. Nesse processo, a reflexão de

estudantes e professores, a consciência de si mesmo e a responsabilidade nas

possibilidades de transformação na convivência devem ser consideradas nos processos

de posicionamentos de voz e afirmação de identidades dos participantes do contexto de

sala de aula.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto, argumentamos que a pesquisa-ação pode favorecer a agência

dos sujeitos em sala de aula, quando eles assumem o papel de colaboradores da

investigação, podendo trazer, contribuições frente a um objeto de estudo complexo que

é a sala de aula. Acreditamos na importância das convergências entre o ensino e a

pesquisa, teoria e prática, pensando a LA de forma crítica, de modo a considerar

relações globais/locais, micro/macro, bem como variáveis tais as emoções, como

elementos que interferem no processo de ensino/aprendizagem de línguas. Por isso,

procuramos fomentar reflexões na área da LA, acerca desse processo colaborativo

propiciado pelas práticas de pesquisa-ação, no intuito de fortalecer as pesquisas na área

e ao mesmo tempo oportunizar uma conscientização e reflexão de si pelos participantes,

possibilitando-lhes a construção de sentidos no mundo de maneira contextualizada e

autêntica.

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