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s s Comunidades quilombolas de Minas Gerais no séc. XXI História e resistência Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva CEDEFES

Comunidades quilombolas de Minas Gerais no séc. XXI - História e resistência

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Page 1: Comunidades quilombolas de Minas Gerais no séc. XXI - História e resistência

sApoio

sA palavra “quilombo” ou “calham-

bo” é de origem banto e significa“acampamento” ou “fortaleza”. Foiusada pelos portugueses para denomi-nar as povoações construídas porescravos fugidos. O termo tambémpode ser atribuído a "casa" ou "refú-gio". Minas Gerais tem um grande con-tingente da população afro-brasileira, enesse contexto há um número signi-ficativo de comunidades quilombolas.Elas se formaram no movimento deresistência, mas, muitas vezes, eramtoleradas pelo regime dominante, poisse tornaram locais onde funcionavampostos comerciais ou de oferta demão-de-obra escrava ou barata.

A maioria das comunidades quilom-bolas de Minas Gerais se formou poste-riormente ao decreto de Abolição daEscravatura em 1888. Quando o decre-to foi expedido, grande parte dosnegros não tinha mais onde ficar, nãohavia trabalho e não havia perspectivade integração à sociedade brasileira.

Assim, muitas famílias migrarampara os grotões, para as terras desabi-tadas ou para as margens das fazendas.Algumas poucas famílias receberamterras como doações dos antigos se-nhores e ali constituíram comunidades.Outras famílias negras conseguiramcomprar pequenas terras nas fazendasonde trabalhavam.

Esses grupos vivem à margem deseus direitos fundamentais, principal-mente o direito ao seu território tradi-cional. Hoje, essas comunidades estãoorganizadas para reivindicar sua cidada-nia e dignidade para um futuro que con-temple a promoção da igualdade raciale a valorização da diferença étnica.

Perseguidos, condenados, escondidos – essa foi a vida dos negrosem nosso país. Para escaparem da escravidão e da marginalização sub-seqüente, sofridas ao longo de cinco séculos, os negros do Brasil bus-caram locais e formas próprias de sobrevivência, em uma sociedadeem que quase tudo lhes era negado. Construíram – antes e depois daLei Áurea – comunidades próprias onde viveram e, até hoje, vivem ereproduzem suas famílias, seus modos de ser e de fazer, além da reli-giosidade, da arte e da cultura que secularmente foram criando,recriando e passando às novas gerações.

Com a Constituição de 1988, essas comunidades obtiveram o reco-nhecimento de seus direitos sobre seu o território e a sua cultura.Somente a partir desse momento os quilombolas começaram a sair da"invisibilidade" social a que foram relegados nesses 500 anos.

Este livro é uma fonte básica de consulta para todos aqueles quequerem conhecer o que foi e o que ainda representa essa extraor-dinária luta pela vida, pela dignidade, pela terra e pela alegria dosquilombolas em Minas Gerais.

www.autenticaeditora.com.br

0800 2831322

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ISBN 978-85-7526-274-0

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CEDEFES

Fundado em 1985, o CEDEFES é umaorganização não governamental, sem finslucrativos, filantrópica, de caráter científico,cultural e comunitário, de âmbito estadual,com sede e foro em Belo Horizonte, MinasGerais, que se define como um centro de do-cumentação popular.

Nossa missão é contribuir para a inserçãosocial e política dos brasileiros, em especialdos grupos sociais afetados por questões ter-ritoriais, como os povos indígenas, os traba-lhadores rurais e os remanescentes de quilom-bos. Por meio de ações voltadas para sua for-mação cultural e política, a documentação, apesquisa e a divulgação, buscamos valorizar amemória social e contribuir para que os direi-tos dessas comunidades sejam efetivados.

O Projeto Quilombos Gerais, do CEDEFES,apoiado pela Misereor, busca dar maior visi-bilidade às comunidades quilombolas deMinas Gerais por meio da identificação, do-cumentação, divulgação e articulação socialentre as lideranças das comunidades e omundo institucional, público e privado.

Conheça outros títulos da coleção CULTURA NEGRA E IDENTIDADES

• Afirmando direitos – Acesso e permanêcia dejovens negros na universidadeNilma Lino Gomes e Aracy Martins (Orgs.)

• Afro-descendência em Cadernos Negros e Jornal doMNU – Florentina da Silva Souza

• Bantos, malês e identidade negra – Nei Braz Lopes

• Diversidade, espaço e relações étnico-raciais –O Negro na Geografia do BrasilRenato Emerson dos Santos (Org.)

• O drama racial de crianças brasileiras – Socia-lização entre pares e preconceitoRita de Cássia Fazzi

• Experiências étnico-culturais para a formação deprofessores – Nilma Lino Gomes, PetronilhaBeatriz Gonçalves e Silva (Orgs.)

• Os filhos da África em Portugal – Antropologia,multiculturalidade e educaçãoNeusa Maria Mendes de Gusmão

• O jogo das diferenças – O multiculturalismo eseus contextos – Luiz Alberto Oliveira Gonçalves,Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva

• Rediscutindo a mestiçagem no Brasil – Identidadenacional VERSUS Identidade negraKabengele Munanga

• Sem perder a raiz – Corpo e cabelo como símbo-los da identidade negra – Nilma Lino Gomes

• Um olhar além das fronteiras – Educação e relações raciais – Nilma Lino Gomes (Org.)

Realização

Comunidades quilombolas deMinas Gerais no séc. XXIHistória e resistência

Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva – CEDEFES

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CEDEFESCentro de Documentação Eloy Ferreira da Silva

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E L A B O R A Ç Ã O :

Maria Elisabete Gontijo dos Santos e Pablo Matos Camargo

A S S I S T E N T E D E P E S Q U I S A :

Pablo Matos Camargo e Marielle Brasil

C O L A B O R A R A M N E S T A E D I Ç Ã O :

Alberto Pelliccione, Adriana Rocha, Ana Paula Lima, Ana Paula de Oliveira, Benedito LuizDomingos, Heloisa Helena Nogueira Chaves, José Fernandes Pacheco, Leda Maria Benevellode Castro e Maria Regina Mata Machado Coelho

F O T O S :

Pablo Matos Camargo, Marielle Brasil e Maria Elisabete Gontijo dos Santos

C O L A B O R A R A M C O M F O T O S :

Adriana Rocha, Alberto Peliccione, Alexandre Sampaio, Ana Paula Lima, Ricardo Alvares,Felisa Anaya, Renata Santos, João Bosco Oliveira e Daniel Vieira Chaves

M A P A S :

Marcelo Ferreira de Castro, Marielle Brasil (apoio) e Pablo Matos Camargo (apoio)

C O O R D E N A Ç Ã O D O P R O J E T O :

Maria Elisabete Gontijo dos Santos

BISCHÖFLICHES HILFSWERK MISEREOR E. V.Monzartstrabe – 52064 AachenPostfach 10 15 4552015 Aachen – Alemanha

SECRETARIA ESPECIAL DE POLÍTICAS DE PROMOÇÃO DA IGUALDADERACIAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA – SEPPIR-PR

APOIO

CEDEFES – CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO ELOY FERREIRA DA SILVARua Padre Marinho, 455, 3º andar, sala 34 . Santa Efigênia30140-040 . Belo Horizonte . MGTelefax: (31) 3224 76 59CNPJ: 19.696.160/0001-45e-mail: [email protected]ítio: www.cedefes.org.br

REALIZAÇÃO

O CEDEFES agradece a comunicação de falhas ou omissões verificadas nesta obra, bem como sugestõese críticas sobre o trabalho, por meio do website www.cedefes.org.br ou pelo telefone (31) 3224-7659.

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Maria Elisabete Gontijo dos Santos

Pablo Matos Camargo

Coleção Cultura Negra e Identidades

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COPYRIGHT © 2008 BY CEDEFES

C O O R D E N A D O R A D A C O L E Ç Ã O : Nilma Lino Gomes

C O N S E L H O E D I T O R I A L : Marta Araújo – Universidade de Coimbra; Petronilha BeatrizGonçalves e Silva – UFSCAR; Renato Emerson dos Santos – UERJ; Maria Nazareth Soares

Fonseca – PUC Minas; Kabengele Munanga – USP;

P R O J E T O G R Á F I C O E C A P A : Patrícia De Michelis sobre imagem de Marielle Brasil

E D I T O R A Ç Ã O E L E T R Ô N I C A : Carolina Rocha, Waldênia Alvarenga e Conrado Esteves

R E V I S Ã O: Cecília Martins

B E L O H O R I Z O N T ERua Aimorés, 981, 8º andar . Funcionários30140-071 . Belo Horizonte . MGTel: (55 31) 3222 68 19TELEVENDAS: 0800 283 13 22www.autenticaeditora.com.bre-mail: [email protected]

S Ã O P A U L OTel.: 0800 283 13 22e-mail: [email protected]

Todos os direitos reservados pela Autêntica Editora.Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida,seja por meios mecânicos, eletrônicos, seja via cópiaxerográfica sem a autorização prévia da editora.

Ficha catalográfica elaborada por Rinaldo de Moura Faria – CRB6-1006

Comunidades quilombolas de Minas Gerais no século XXI – História e resistência/ organizado por Centro de Documentação Elóy Ferreira da Silva. – Belo Horizonte :Autêntica/CEDEFES, 2008.

392 p.

ISBN: 978-85-7526-274-0 (Cultura negra e identidades)

1.Minas Gerais-História. 2.Cultura negra 3. Quilombo-Minas Gerais. I.Título. II.Série

C972

CDU 981.51572.9(815.1)

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SuSuSuSuSummmmmáráráráráriiiiiooooo

O CEDEFES – uma apresentação.................................................................

Introdução........................................................................................................................

Terras de quilombo: direito territorial etnicamentediferenciado, reparação histórica e reformaagrária – José Augusto Laranjeiras Sampaio......................................

As formações quilombolas em Minas

Gerais – João Batista de Almeida Costa....................................................

PRIMEIRA PARTE

OS QUILOMBOS EM MINAS GERAIS NO SÉCULO XXI

Um primeiro olhar: os estudos e a busca pelos quilombolas.....

Onde estão? O mapeamento das comunidades..............................

Os direitos distantes: situação das terrasde quilombo em 2007.........................................................................................

Como vivem? ..........................................................................................................

As heranças dos antepassados: culturae religiosidade nas comunidades quilombolas.....................................

O difícil convívio: tensões e conflitos da atualidade..........................

Uns começos: organização das comunidadese a Federação N’Golo..........................................................................................

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SEGUNDA PARTE

SAINDO DA INVISIBILIDADE:OS QUILOMBOS MINEIROS SE APRESENTAM

Introdução.......................................................................................................................

Campo das Vertentes...........................................................................................

Central Mineira............................................................................................................

Jequitinhonha.......................................................................................................................

Metropolitana Belo Horizonte............................................................................

Noroeste de Minas.................................................................................................

Norte de Minas.........................................................................................................

Oeste de Minas.........................................................................................................

Sul de Minas...............................................................................................................

Triângulo e Alto Paranaíba.................................................................................

Vale do Mucuri...........................................................................................................

Vale do Rio Doce......................................................................................................

Zona da Mata............................................................................................................

Relação geral das comunidadesquilombolas em Minas Gerais – 2007......................................................

Referências..................................................................................................................

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O Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES) éuma organização sem fins lucrativos, de caráter científico, cultural ecomunitário, de âmbito estadual, fundada em 1985, na cidade de Con-tagem, e, desde 2003, funciona na cidade de Belo Horizonte, capitaldo Estado de Minas Gerais.

O nome do Centro, escolhido em 1985, é uma homenagem a EloyFerreira da Silva, trabalhador rural e sindicalista, assassinado em 16de dezembro de 1984, no Vale do São Francisco, Minas Gerais.

O CEDEFES tem por missão contribuir para a inserção social epolítica na sociedade brasileira dos povos indígenas e das populaçõesrurais pobres, em especial trabalhadores e trabalhadoras rurais, semterra, agricultores e agricultoras familiares, quilombolas para que pos-sam participar do processo histórico de construção, em nosso país, deuma sociedade plural, solidária, sustentável e democrática, valorizan-do a memória social e a construção da cidadania, desenvolvendo, paratanto, ações voltadas para a documentação, a pesquisa, a divulgação ea formação cultural e política.

O CEDEFES atua junto a um público diversificado, com especialatenção para os segmentos excluídos do campo no Estado de MinasGerais.

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Nossos principais objetivos são:

1. Promover a informação e a formação cultural, pedagógica e po-lítica, dos atores sociais, sobretudo os que constituem nosso pú-blico-alvo, visando a um projeto de desenvolvimento popular,democrático e sustentável;

2. Documentar, arquivar, pesquisar e publicar temas do interessepopular;

3. Apoiar as lutas e estimular as organizações populares, favore-cendo a construção da cidadania;

4. Incentivar o registro e a valorização da memória histórica e daidentidade cultural como instrumentos no cotidiano da ação dosmovimentos sociais.

A gestão da entidade é de responsabilidade política e estatutária daDiretoria e do Conselho Fiscal, escolhidos em Assembléia entre ossócios. O CEDEFES conta com um quadro de associados com ex-periência nos movimentos populares ou especialistas nos eixos te-máticos priorizados, o que possibilita não apenas uma gestão demo-crática como também, uma troca de experiências e aprofundamentodas discussões.

O CEDEFES tem tido ativa presença nas principais articulações efrentes de luta em prol dos excluídos do campo em Minas Gerais,como as lutas dos atingidos por barragens, dos movimentos pela re-forma agrária, das iniciativas da agricultura familiar, das lutas das co-munidades quilombolas, entre outros. Usamos o trabalho de campo(como reuniões, entrevistas, encontros) em projetos de assentamen-tos, em comunidades rurais atingidas pela ação de grandes projetos,públicos ou privados, e em comunidades quilombolas para reunir in-formações e documentação de primeira mão sobre a situação dessesgrupos específicos, editá-las e divulgá-las, dando voz aos excluídos,fazendo da documentação instrumento da luta social.

As atividades de documentação e divulgação são vistas como for-ma de participação ativa junto aos segmentos sociais que trabalhampela construção de uma sociedade mais justa e democrática em MinasGerais e no Brasil. Nossa documentação é construída com o sentido

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básico de educação e formação social e política do nosso público.Para nós, a produção de informação e documentação é uma tarefasocialmente engajada e politicamente comprometida. Por isto enten-demos que o sentido maior da nossa ação é produzir ferramentas paraas lutas sociais conduzidas pelos movimentos organizados.

Esta publicação se insere na tradição social e política do CEDEFESe no seu trabalho de mais de 20 anos, pelos segmentos sociais ex-cluídos da cidadania, como as comunidades quilombolas de MinasGerais.

Equipe do CEDEFES, Belo Horizonte, outubro de 2007.

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As comunidades quilombolas podem ser consideradas como umdos segmentos sociais mais pobres, esquecidos e desconhecidos danossa sociedade. No início dos anos 2000, pouco se sabia sobre quan-tas eram, como viviam e onde se encontravam. No mês de novembrodesse mesmo ano, o CEDEFES organizou uma série seminários so-bre a temática dos 500 anos do Brasil, sob a ótica dos indígenas, dostrabalhadores rurais e dos negros. Durante a realização do semináriosobre a questão negra, intitulado “500 Anos de Resistência Negra noBrasil: os Remanescentes de Quilombo e Outras Experiências”, re-presentantes do movimento negro presentes ao evento solicitaram acolaboração do CEDEFES na tarefa de identificar e localizar as co-munidades remanescentes de quilombos existentes no Estado. Talauxílio foi solicitado tendo em vista a extrema precariedade das infor-mações a esse respeito existentes à época.

De fato, no início de nossos estudos, verificamos que entidadesprivadas, organizações não governamentais e órgãos públicos relacio-nados às questões da população negra no Estado não dispunham demuito conhecimento sobre quem eram e onde se achavam os chama-dos “remanescentes de quilombos”.

Até aquela época havia alguns estudos relevantes sobre comunida-des específicas, como a dos Arturos, Amaros, Brejo dos Crioulos, Es-pinho, Quartel do Indaiá, Tabatinga, entre outras. Mas informações dis-poníveis sobre a existência e a localização das comunidades

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quilombolas no Estado resumiam-se a uma publicação da FundaçãoCultural Palmares, de 2000, em que eram listados os 743 quilombospresumivelmente existentes no País e identificados pelo Governo Fe-deral, distribuídos segundo os Estados e municípios. Segundo essarelação, em Minas Gerais, havia 66 comunidades.

As informações contidas na lista da Fundação Palmares limitavam aapenas dois tipos de dados: o nome e o município onde se localiza. Essalista também apresentava problemas. Das 66 citações, em 19 não havia onome da comunidade, mas apenas o município onde poderia ser encon-trada. E, em outras 8 citações, o nome estava indicado, mas faltava aidentificação do município onde se localizava. Nomes incompletos ougenéricos e incorreções, como uma comunidade com o nome de Vale doJequitinhonha, em Nanuque, também foram observados. Apesar dessasdificuldades, foi com base nessa lista que o CEDEFES deu início àexecução de um projeto próprio voltado para a questão quilombola.

De todas as comunidades listadas pela Fundação Cultural Palma-res, somente uma, a comunidade de Porto Corís, no município deLeme do Prado, tinha obtido o seu título de terra, de acordo com odisposto constitucional. A ausência desses títulos mostrou-nos quemuito havia por se fazer na questão quilombola. Nesse aspecto, pode-mos dizer que a situação até mesmo piorou de lá até hoje, pois, com aconstrução da barragem de Irapé, essa comunidade perdeu o territó-rio que ocupava, de forma que no Estado, hoje, não há nenhuma co-munidade titulada.

Outro aspecto que nos chamava atenção no início de nossos estudosera o fato de que essas comunidades se encontravam politicamente desor-ganizadas. Afora algumas associações locais, elas não possuíam umaentidade organizada em âmbito regional ou estadual que pudesse re-presentá-las na defesa dos seus direitos, não apenas como trabalhado-res, mas também como grupos sociais culturalmente diferenciados.

Constatamos ainda, à época, como hoje, durante as visitas locais,que muitas comunidades não se reconheciam no termo “quilombo” esequer tinham ouvido falar da existência de seus direitos constitucio-nais estabelecidos em 1988, em especial aqueles contidos nos artigos216 e 217, que tratam de seus direitos culturais, e no artigo 68 do Ato

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das Disposições Constitucionais Transitórias, que trata da titulação desuas terras,

Dessa forma, a equipe do CEDEFES verificou que era urgente nãoapenas o trabalho de identificação das comunidades, mas também ode mobilização política, de forma a dar visibilidade à questão quilom-bola no Estado.

O PROJETO QUILOMBOS GERAIS

Em execução desde 2003, o Projeto Quilombos Gerais é uma iniciati-va que conta com o apoio financeiro da Misereor, entidade alemã deapoio internacional ligada à igreja católica. Voltado para a promoçãodas comunidades quilombolas de Minas Gerais, o projeto, por meio devárias iniciativas, busca dar, primordialmente, visibilidade às deman-das sociais e políticas desses grupos sociais e apoio às suas lutas, deforma que tenham condições de atuarem politicamente, enquanto ato-res independentes, na defesa de seus interesses. As atividades desenvol-vidas pelo Projeto valorizam sua cultura etnicamente diferenciada e pro-movem a melhoria da auto-estima dos quilombolas por meio do trabalhode pesquisa e divulgação, entre os próprios quilombolas e à sociedadeem geral, de sua história, arte, religiosidade, tensões, conflitos e anseios.

Restrito ao Estado de Minas Gerais, o Projeto efetua o pré-mapea-mento e a identificação das comunidades negras de origem quilom-bola; desenvolve ações voltadas para promoção da visibilidade sociale política desse grupo e promove encontros, seminários e debates di-rigidos à formação das lideranças quilombolas e melhoria de suas re-lações com o mundo institucional público e privado. O Projeto asses-sora, ainda, as comunidades que escolherem a luta social para seureconhecimento oficial como de origem quilombola e a conseqüentelegalização de suas terras, nos termos da garantia constitucional.

PRINCIPAIS RESULTADOS

Entre os principais resultados obtidos até o momento, podemoscitar a ampliação do número de comunidades quilombolas conheci-das até 2000, que era de 66, para 436 pré-identificadas até junho de2007. Dessas, temos dados com tratamento estatístico para cerca de180, sendo que 70 já receberam a visita de técnicos do Projeto. Há

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ainda um considerável acervo de fotos, gravações e outros documen-tos para a maioria das comunidades incluídas em nossa lista.

Nessa linha de ação referente à divulgação da questão quilombolano estado, o Projeto, em 2005, elaborou e publicou 10 mil exemplaresda cartilha O direito à terra é um direito quilombola, que foram distribuí-dos em comunidades, escolas, sindicatos, ONGs, órgãos do governo eoutros interessados. Neste ano, publicou um livro paradidático intitu-lado Zezé e os tambores, serão lançados ainda um documentário e umCD-ROM sobre as comunidades quilombolas de Minas Gerais. Alémdisso, veicula matérias de interesse do movimento quilombola na Agen-da popular, informativo impresso mensal do CEDEFES, e no sítiowww.cedefes.org.br.

Por essas iniciativas, o CEDEFES é hoje um centro de referênciaem informações sobre as comunidades quilombolas de Minas Geraise, por isso, recebe consultas de diversos órgãos públicos, pesquisado-res, estudantes, imprensa e público em geral. Essas atividades vêmcontribuindo para uma sensível melhoria na visibilidade social e polí-tica dos quilombolas e uma melhor adequação de políticas públicasvoltadas para essas comunidades.

No âmbito da articulação social, o Projeto trabalha solidariamentecom outras entidades e instituições públicas e privadas, não apenascom o objetivo de ganhar apoiadores para a causa, mas também naperspectiva de que as comunidades quilombolas obtenham sua auto-representação perante o Estado e a sociedade. Nessa perspectiva, apóiae assessora lideranças quilombolas, auxilia as comunidades em suasdemandas frente aos órgãos públicos e realiza encontros e semináriosvoltados para a articulação do movimento.

Em novembro de 2004, o CEDEFES foi uma das entidades apoia-doras do I Encontro de Comunidades Negras e Quilombolas, realiza-do em Belo Horizonte. Nesse evento, ocorreu a primeira articulaçãode suas lideranças no estado, que resultou na criação, em 2005, daFederação das Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Ge-rais (N´Golo). A diretoria da Federação vem recebendo, desde então,o apoio integral do Projeto, em suas atividades de articulação e conta-tos com comunidades do interior, entidades do movimento no País

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e órgãos públicos. Em março de 2007, o Projeto promoveu o II En-contro, no município de São João da Ponte, que apresentou, entreoutros resultados, uma carta aberta dirigida ao presidente da Repúbli-ca com as principais demandas do movimento no Estado.

Essa linha de ação é a síntese do projeto. Pois, desde o início, o quese pretendeu foi promover a causa quilombola, dar visibilidade àssuas questões e apoiar suas lideranças, de forma que eles e elas pos-sam se fazer representar por si mesmos, no alcance dos seus objetivossociais e políticos.

Como uma das etapas do Projeto, esta publicação pretende trans-mitir a todos os interessados em conhecer a história de luta e resistên-cia das comunidades quilombolas de Minas Gerais e as informações eos resultados das pesquisas por nós realizadas nos últimos anos quatroanos. Na Primeira Parte, “Os quilombos em Minas Gerais no séculoXXI”, encontram-se as definições conceituais e metodológicas que nor-tearam o trabalho da pesquisa; o mapeamento de comunidades, obtidoaté junho de 2007, com indicação dos municípios em que se encon-tram, de acordo com a definição do IBGE das 12 regiões do Estado; asituação da titulação das terras de quilombo em Minas Gerais, confor-me dados do INCRA, em junho de 2007, e informes sobre o processode cadastramento do auto-reconhecimento das comunidades pela Fun-dação Cultural Palmares, também com dados relativos a junho de 2007.

Temas como infra-estrutura disponível nas comunidades, o acessoa bens públicos, as condições de subsistência das comunidades, entreoutros, foram objeto de análises estatísticas a partir do banco de dadosconstruído até 2006. Esses resultados estão apresentados no Capítulo4 da Primeira Parte. Um estudo descritivo sobre os principais aspec-tos culturais observados nas comunidades visitadas encontra-se no Ca-pítulo 5.

Questões relacionadas às tensões e aos conflitos vividos pelas co-munidades na atualidade, em especial aqueles relacionados à posse eao uso de seus territórios históricos, são apresentadas no Capítulo 6.O último capítulo da Primeira Parte relata um pouco da história daformação da primeira entidade representativa dos quilombolas no Es-tado, a Federação N’Golo.

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Na Segunda parte, “Saindo da invisibilidade: as comunidades qui-lombolas se apresentam”, o leitor encontrará, apresentadas por or-dem alfabética, cada uma das comunidades existentes no Estado paraas quais já existem informações organizadas, como localização, infra-estrutura, história, cultura, entre outras.

Finalmente, na Terceira Parte, encontra-se uma relação completade todas as comunidades sobre as quais obtivemos alguma informa-ção até junho de 2007. Nela estão incluídas tanto aquelas já relaciona-das anteriormente como aquelas que ainda se encontram em processode pré-mapeamento e identificação, que continuará em andamentoaté, presumivelmente, 2009.

Para compor o prefácio, convidamos os professores, pesquisadores dotema e amigos do CEDEFES, José Augusto Laranjeira Sampaio e JoãoBatista de Almeida Costa, que muito gentilmente contribuíram para estapublicação com dois textos sobre a atualidade da questão quilombola noPaís e em Minas Gerais. A eles os nossos sinceros agradecimentos.

Para a realização da pesquisa, contamos com a colaboração deMarielle Brasil, nossa companheira de viagens e trabalhos, a quemmanifestamos nosso agradecimento pelo apoio.

O trabalho desenvolvido pelo Projeto Quilombos Gerais ao longodesses anos somente foi possível dada a contribuição entusiasmada eamiga da equipe técnica do CEDEFES: Luís, Ana Paula, Adriana ePaulinha, de sua coordenadora, Leda Benevello, e de seu presidente, oquerido Pacheco. Sócios, colaboradores e amigos do CEDEFES tam-bém nos ajudaram em diversos momentos e fases do trabalho, a todoseles nossos sinceros agradecimentos.

Maria Elisabete Gontijo dos Santos

Pablo Matos Camargo

Quilombo 180208.pmd 27/08/2009, 11:1516

Page 18: Comunidades quilombolas de Minas Gerais no séc. XXI - História e resistência

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