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Condução de Casos Graves com Suspeita de Febre
Amarela
Vandack Alencar Nobre Júnior
Coordenador do Centro de Terapia Intensiva do HC-UFMG
Professor Associado da UFMG
Quando suspeitar?
Febre +
Cefaléia, mialgia, artralgia, prostração, hiporexia, náuseas, vômitos, icterícia, insuficiência renal (oligúria),
arritmias ou manifestações hemorrágicas
+
Reside ou viajou (últimos 14 dias) para áreas com casos suspeitos de febre amarela e/ou morte de primatas não
humanos; e esquema vacinal incompleto ou desconhecido para febre amarela
FONTE: Nota Técnica 03/2017 – CIEVS/GEEPI/GVSI
Observações importantes
- Quadro agudo (< 7 dias)
- Sintomas costumam iniciar-se subitamente
- A cefaleia costuma ser intensa
- A artralgia predomina nos joelhos
- Dor nas costas marca o quadro
- Incubação: 3-6 dias (média 4,3)
Prognóstico
- Letalidade geral: 5-10%
- Casos com icterícia: 20%
- Formas graves: mortalidade ~ 50%
- Óbito ocorre entre 7-10 dias da fase toxêmica
- Maior risco de óbito: crianças e > 50 anos
Fases da febre amarela
A - Fase prodrômica ou de infecção
B - Fase de remissão
C - Fase toxêmica
1 2 3 4 5 6 7
A B
C
Dias
Temp 40
Viremia Sorologia positiva (IgM)
Período de infecção (prodrômico)
Exame físico: hiperemia de mucosas, vermelhidão
cutânea, desconforto epigástrico, fígado palpável,
língua enantematosa na periferia e brancacenta no
centro, sinal de Faget (desproporção temperatura / FC)
Sintomas descritos associados a:
Período de infecção (prodrômico)
Exame físico: hiperemia de mucosas, vermelhidão cutânea,
desconforto epigástrico, fígado palpável, língua enantematosa na
periferia e brancacenta no centro, sinal de Faget (desproporção
temperatura / FC)
Laboratório: leucopenia (1.500 to 2.500 cls/microL)
com neutropenia, linfocitose, elevação AST e ALT (48-
72h), seguida de elevação das bilirrubinas (quanto
mais precoce, pior o prognóstico)
Sintomas descritos associados a:
- Forma leve Inespecífica, com febre, cefaleia e mialgia. Pode haver lombalgia, mal-estar, tonteiras e náuseas. Autolimitada
- Forma moderada Sinais e sintomas mais floridos, hemorragia leve, icterícia, aumento AST / ALT, sem disfunção orgânica
Período de remissão
- Dura até 48h
- Melhora da febre e dos demais sintomas
- Maioria melhora progressivamente
- 10-20% dos pacientes evoluem para a fase
toxêmica da doença
Período toxêmico (3º- 6º dia)
Retorno dos sintomas, que se tornam intensos (febre, vômitos, astenia)
Dor epigástrica
Icterícia mais pronunciada
- Forma grave
Período toxêmico (3º- 6º dia)
Retorno dos sintomas, que se tornam intensos (febre, vômitos, astenia)
Dor epigástrica
Icterícia mais pronunciada
- Forma grave
- Forma maligna
Disfunção orgânica múltipla
Síndrome inflamatória grave - SEPSE VIRAL)
Alteração sensório: confusão mental, coma: inflamação, insuficiência hepática, uremia, choque, hemorragia, edema
Alterações pulmonares: congestão, SARA, pneumonia bacteriana
Alterações cardíacas: arritmias, congestão pulmonar, choque
Insuficiência hepática: dano direto, choque, inflamação. Consequências: hemorragias, encefalopatia, SHR, etc
Disfunção renal: choque, SHR, hipovolemia, inflamação, dano direto, proteinúria
Outras complicações
Hemorragia CIVD, plaquetopenia, consumo fatores de coagulação, insuficiência hepática
Choque hemorragia, perda volêmica (febre, sudorese, taquipneia, vômitos), insuficiência cardíaca, vasoplegia (síndrome de resposta inflamatória sistêmica)
Disfunção orgânica - atentar para:
- Neurológico
- Respiratório
- Hepático
- Renal
- Coagulação
- Cardiovascular
- Metabólico
Outras complicações
- Atenção para infecção bacteriana: pneumonia, infecção associada a catéteres vasculares.
- Infecção bacteriana grave (sepse bacteriana) também constitui diagnóstico diferencial
- Na dúvida, colher culturas e iniciar ATB
- Pode ocorrer morte tardia por alterações cardíacas (arritmia, miocardite, insuficiência cardíaca)
Como identificar precocemente que um caso pode ser grave?
- Aminotransferases (AST e ALT) em elevação
- Icterícia (sobretudo, se precoce e intensa)
- Hemorragias de pequena monta
- Plaquetas em queda
- Redução da diurese, urina concentrada, escura
- Qualquer alteração mental nova
- Tendência à hipotensão, taquicardia, taquipneia...
Como identificar gravidade instalada (disfunção orgânica)?
- Aminotransferases > 1.000
- Ureia > 100
- Bb > 5-10
- Bicarbonato < 18, hipoglicemia, plaquetas < 50 mil
- Hemorragias de maior monta*
- Oligúria persistente (> 6 horas)
- Hipotensão, choque
- Sonolência, confusão mental
- Dispneia
Laboratório nas formas graves - outros achados
- Leucopenia leucocitose
- Prolongamento PTTa e do TP (RNI)
- Redução do fibrinogênio (CIVD)
- Elevação do hematócrito anemia
proporcional à gravidade / hemorragia
- Proteinúria, hematúria
Que exames solicitar nos casos graves?
- Hemograma completo
- Íons
- Coagulograma (TP/AP, RNI e PTTa)
- Perfil hepático (AST, ALT, FA, bilirrubinas)
- Glicemia
- Função renal (ureia e creatinina)
- Urina (elementos anormais e sedimentoscopia)
- Proteína C reativa
- Gasometria arterial e lactato
Que exames solicitar nos casos graves?
- Hemocultura
- Radiografia simples de tórax
- Eletrocardiograma
- Tomografia crânio
- Protocolo febre hemorrágica
Manejo da febre amarela
- Todo caso suspeito deve ser hospitalizado
- Não há tratamento específico para febre amarela
- Evitar anti-inflamatórios (diclofenaco,
cetoprofeno, naproxeno) e AAS!
- Atenção para paracetamol
Manejo da febre amarela
- Forma leve (grupo A)
- Forma moderada (grupo B)
- Forma grave
- Forma toxêmica / maligna
Manejo da febre amarela
- Forma leve (grupo A)
- Forma moderada (grupo B)
- Forma grave
- Forma toxêmica / maligna
(grupo C)
Se intolerância VO, Fazer EV, 30 ml/Kg
VO, se tolerar. Se desidratado, bolus de 20 ml/Kg de cristaloide. IV ~ 30 ml/Kg/dia
Manejo de casos graves / toxêmicos
- Identificação precoce da gravidade
- Idealmente em unidade de terapia intensiva
- Para transferência, sempre estabilizar o paciente
Avaliar intubação orotraqueal
Avaliar condição hemodinâmica
Manejo de casos graves / toxêmicos
- Oxigênio suplementar conforme demanda
- Ventilação não invasiva (?)
- Intubação orotraqueal
Manejo de casos graves / toxêmicos
Hipoperfusão / choque
- Fisiopatologia da febre amarela é diferente da dengue
- Na febre amarela: vasoplegia, extravasamento capilar
(não é tão intenso), vômitos, febre, hemorragia,
acometimento cardíaco
- Atualmente aceita-se PAM ≥ 65 mmHg como
suficiente (atenção para hipertensos, idosos)
Reposição volêmica
Cristaloides (soro fisiológico, ringer lactato)
~ 30 ml/Kg primeiras 3h
Reavaliar
História de doença renal ou cardíaca
PA, FC, ausculta pulmonar, diurese
Lactato
Ultrassom pulmonar
Reposição volêmica na sepse
- Acesso venoso calibroso / central*
- “Menos é mais”
- Pacientes com maior ganho de peso nas
primeiras 48h têm pior prognóstico
- O volume deve ser administrado com vigor,
porém o que faz a diferença é a presteza do
tratamento
Choque não responsivo a volume
Vasopressores Noradrenalina (primeira escolha!) - 0.01 to 5 µg/kg/min
Dopamina (taquicardia, arritmias) - 10-20 µg/kg/min
Adrenalina (casos refratários) - 1-4 mg/min
Inotrópicos Dobutamina - 5 to 12 µg/k/min
Se história de IC (sistólica) grave
Se evidências de IC aguda (eco, # CO2 venoso - CO2 arterial > 6, SVO2 < 70%)
Se possível, monitorar pressão intra-arterial
Hemocomponentes / derivados
Concentrado de hemácias (eleva Hb ~1,0 se estável)
< 7 g/dL
> 7 se hemorragia grave em curso com choque
Plaquetas (1 U / 7-10 Kg) < 10.000
< 20.000 (sangramento, febre, procedimento invasivo)
Manter > 50 mil (digestivo, hemoptise) ou 100.000 (retiniano, SNC) se hemorragia grave
Hemocomponentes / derivados
Crioprecipitado (1 U / 5-10Kg) Fibrinogênio < 100, sobretudo se sangramento
Plasma fresco congelado (10-20 ml/Kg) Hemorragia com alterações PTTa e/ou RNI > 1,5
Procedimentos invasivos com alterações (idem)
Transfusão de hemácias maciça (idem)
Encefalopatia hepática
Lactulose - Via oral ou por SNE (20-40 ml 8/8)
- Clister com lactulose a 20%
- Não restringir proteínas da dieta
- Evitar medicamentos que possam piorar o quadro
- Vitamina K (IV é mais seguro)
Critérios para disfunção renal (KDIGO)
- Aumento da Cr ≥ 0,3mg/dL em 48 horas
- Aumento da Cr ≥ 1,5 vezes o valor basal, em 3-7 dias
- Diurese < 0,5 mL/kg/h durante 6 horas
Critérios para disfunção renal (KDIGO)
- Aumento da Cr ≥ 0,3mg/dL em 48 horas
- Aumento da Cr ≥ 1,5 vezes o valor basal, em 3-7 dias
- Diurese < 0,5 mL/kg/h durante 6 horas
- Detecção precoce
- Evitar insulto adicional (medicamentos,
hipovolemia)
- Reposição volêmica adequada
- Terapia substitutiva (hemodiálise)
Disfunção renal
Indicação de hemodiálise
Discutir com o nefrologista ou com intensivista experiente
- Hipervolemia refratária
- Oligúria prolongada (<0,3 ml/Kg/24h)
- Hipernatremia e progressivo de ureia inviab. diurético
- Hipercalemia refratária ou grave (K+> 6,5)
- Acidose metabólica grave (pH < 7,3 , Bic < 15)
- Azotemia (ureia > 200, creatinina > 4,0 , mas pode ser menos!)
Outros aspectos do tratamento
Nutrição precoce (VO, SNE ou raramente parenteral)
Vômitos, estase
Aguardar uma semana para parenteral
Prevenção de eventos tromboembólicos (?) Avaliar risco/benefício cuidadosamente
Evitar de plaquetas em queda (<50.000), hemorragias, outros distúrbios coagulação
Outros aspectos do tratamento
Proteção gástrica Ranitidina ou omeprazol (IV)
Jejum, distúrbios coagulação, choque, ventilação mecânica, insuficiência renal aguda
Controle glicêmico < 180-200 mg%
Atenção para hipoglicemia na febre amarela!
Controvérsias
Corticoides
Medida heroica choque refratário?
Não há benefício demonstrado
Antivirais (ribavirina)
Não há evidências de benefício na literatura
Globulina hiperimune
Pós-exposição (ex.: acidente laboratório)
Critérios de alta hospitalar
- Observar idealmente por uma semana
- Afebril há pelo menos 72h
- Melhora clínica e laboratorial (coagulograma
normal, AST < 1000)
- Orientar retorno se necessário
Diagnóstico diferencial
- Hepatite aguda (fulminante)
- Dengue
- Malária
- Leptospirose
- Sepse bacteriana
- Febre tifoide
Prevenção
Evitar exposição dos doentes aos vetores
durante viremia (primeiros 5 dias)
Repelentes, roupas longas, roupas
impregnadas com repelente, telas, cortinados,
evitar perfumes, ambientes fechados, ar
condicionado
Medidas gerais
Prevenção
Vacina - Moradores ou pessoas que viajarão para área
endêmica, com idade entre 9 meses e 60 anos
(surtos: 6 meses - extra)
- Desde que não estejam imunossuprimidos, não
sejam gestantes ou mulheres em lactação e que
não tenham doença no timo
- Avaliar risco-benefício durante surtos
- Duas doses são suficientes