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CONSIDERAÇÕES SOBRE A SEGURANÇA DAS ESTRUTURAS DE CONCRETO EM SITUAÇÃO DE INCÊNDIO. COSTA, Carla Neves (1) ; SILVA, Valdir Pignatta (2) . (1) Engª Civil, M.Sc., Doutoranda – e-mail: [email protected]; (2) Professor Doutor – e-mail: [email protected] - Departamento de Engenharia de Estruturas e Fundações da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - Av. Prof. Almeida Prado, Trav. 2, n° 271, Ed. Paula Souza [Eng. Civil] – CEP 05508-900 – Cidade Universitária – São Paulo – S.P. – Tel.: +55 +11 3091-5542 / 5562. Fax: +55 +11 3091-5181. RESUMO As estruturas de concreto armado são, tradicionalmente, consideradas mais resistentes à ação térmica, por serem menos esbeltas (mais “robustas”) quando comparadas às estruturas metálicas. O concreto armado é um material heterogêneo, mas comporta-se como material homogêneo à temperatura ambiente. Em altas temperaturas a heterogeneidade “adormecida” é realçada e a reação ao calor diferenciada de cada constituinte contribui na degeneração progressiva do material. A reação de desestruturação físico-química do concreto durante o incêndio está associada às características de dosagem e aos tipos de esforços suportados pelos elementos estruturais. Entidades internacionais científicas e de normatização têm buscado soluções práticas para previsão do desempenho do elemento estrutural de concreto, levando em conta a influência dos fatores tecnológicos e mecânicos mais comuns nos edifícios usuais de múltiplos-andares, a fim de garantir a proteção à vida por meio da segurança estrutural. Neste trabalho são descritos o comportamento do concreto armado endurecido e as prescrições das principais normas internacionais (Eurocode 2 Part 1.2 (2002) e ACI 216R (1989)) para o dimensionamento estrutural seguro. A divulgação de informações científicas sobre o comportamento do concreto armado em altas temperaturas e as soluções atuais para evitar uma eventual falência precipitada de algum elemento estrutural é importante para a manutenção da qualidade das estruturas correntes. Palavras-chave: altas temperaturas, concreto armado, resistência ao fogo, sustentabilidade em incêndio. ABSTRACT The reinforced concrete structures are considered more resistant to the thermal action, then the steel structures because they are not so slender (more robust) as much as the steel frames. The reinforced concrete is a heterogeneous material; however it behaves as a homogeneous material at the room temperature. This “asleep heterogeneity” is enhanced in high temperatures and the differentiated reaction to heat of each constituent (paste, aggregates, steel and water) contributes to the progressive deterioration of the reinforced concrete. The reaction of physical-chemical degradation of concrete is related to the characteristics and the kinds of efforts supported for the structural elements. Scientific international council and standardization associations have attempted to adopt practical solutions to evaluate the performance of the structural elements and to take into account the influence of technological and mechanical factors more common in the usual multi-storey buildings, in order to assurance the life protection by means of structural safety. The behavior of the hardener concrete and the prescriptions of main international codes (Eurocode 2 Part 1.2 (2002) e ACI 216R (1989)) are described in this paper for the safe structural design. The scientific information publishing about the behavior of reinforced concrete in high temperatures and the current solutions to prevent a possible early failure of some structural element are important to keep the quality of usual building. Keywords: high temperature, reinforced concrete, fire resistance, sustainability in fire.

CONSIDERAÇÕES SOBRE A SEGURANÇA DAS … · O colapso progressivo de edifícios altos em situação de incêndio ganhou destaque no meio técnico-científico após os atentados

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CONSIDERAÇÕES SOBRE A SEGURANÇA DAS ESTRUTURAS DE CONCRETO EM SITUAÇÃO DE INCÊNDIO.

COSTA, Carla Neves(1); SILVA, Valdir Pignatta(2). (1)Engª Civil, M.Sc., Doutoranda – e-mail: [email protected]; (2)Professor Doutor – e-mail: [email protected] -

Departamento de Engenharia de Estruturas e Fundações da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - Av. Prof. Almeida Prado, Trav. 2, n° 271, Ed. Paula Souza [Eng. Civil] – CEP 05508-900 – Cidade Universitária – São

Paulo – S.P. – Tel.: +55 +11 3091-5542 / 5562. Fax: +55 +11 3091-5181.

RESUMO

As estruturas de concreto armado são, tradicionalmente, consideradas mais resistentes à ação térmica, por serem menos esbeltas (mais “robustas”) quando comparadas às estruturas metálicas.

O concreto armado é um material heterogêneo, mas comporta-se como material homogêneo à temperatura ambiente. Em altas temperaturas a heterogeneidade “adormecida” é realçada e a reação ao calor diferenciada de cada constituinte contribui na degeneração progressiva do material. A reação de desestruturação físico-química do concreto durante o incêndio está associada às características de dosagem e aos tipos de esforços suportados pelos elementos estruturais.

Entidades internacionais científicas e de normatização têm buscado soluções práticas para previsão do desempenho do elemento estrutural de concreto, levando em conta a influência dos fatores tecnológicos e mecânicos mais comuns nos edifícios usuais de múltiplos-andares, a fim de garantir a proteção à vida por meio da segurança estrutural.

Neste trabalho são descritos o comportamento do concreto armado endurecido e as prescrições das principais normas internacionais (Eurocode 2 Part 1.2 (2002) e ACI 216R (1989)) para o dimensionamento estrutural seguro.

A divulgação de informações científicas sobre o comportamento do concreto armado em altas temperaturas e as soluções atuais para evitar uma eventual falência precipitada de algum elemento estrutural é importante para a manutenção da qualidade das estruturas correntes.

Palavras-chave: altas temperaturas, concreto armado, resistência ao fogo, sustentabilidade em incêndio.

ABSTRACT

The reinforced concrete structures are considered more resistant to the thermal action, then the steel structures because they are not so slender (more robust) as much as the steel frames.

The reinforced concrete is a heterogeneous material; however it behaves as a homogeneous material at the room temperature. This “asleep heterogeneity” is enhanced in high temperatures and the differentiated reaction to heat of each constituent (paste, aggregates, steel and water) contributes to the progressive deterioration of the reinforced concrete. The reaction of physical-chemical degradation of concrete is related to the characteristics and the kinds of efforts supported for the structural elements.

Scientific international council and standardization associations have attempted to adopt practical solutions to evaluate the performance of the structural elements and to take into account the influence of technological and mechanical factors more common in the usual multi-storey buildings, in order to assurance the life protection by means of structural safety.

The behavior of the hardener concrete and the prescriptions of main international codes (Eurocode 2 Part 1.2 (2002) e ACI 216R (1989)) are described in this paper for the safe structural design.

The scientific information publishing about the behavior of reinforced concrete in high temperatures and the current solutions to prevent a possible early failure of some structural element are important to keep the quality of usual building.

Keywords: high temperature, reinforced concrete, fire resistance, sustainability in fire.

1 INTRODUÇÃO

A ação térmica produz o aumento da temperatura nos elementos estruturais. A variação térmica para níveis de temperatura sucessivamente elevados causa alterações no comportamento atômico das moléculas do material que constitui esses elementos estruturais.

No concreto endurecido, as alterações físico-químicas influenciam sobremaneira as propriedades mecânicas do concreto, tais como: módulo de elasticidade, resistências à tração e à compressão. Há alongamento excessivo e o aparecimento de esforços solicitantes adicionais nas estruturas hiperestáticas.

A ação térmica é descrita pelos fluxos de calor radiativo e convectivo. O primeiro é gerado pelas chamas e pela superfície aquecida dos elementos estruturais e de compartimentação. O segundo, pela diferença de densidade entre os gases do ambiente em chamas: os gases quentes são menos densos e tendem a ocupar a atmosfera superior, enquanto os gases frios, de densidade menor, tendem a se movimentarem para a atmosfera inferior do ambiente (SILVA (2001)).

Para fins de projeto estrutural, o incêndio é caracterizado pela relação temperatura x tempo, representando a variação da temperatura no compartimento durante o período de duração do incêndio.

A relação temperatura x tempo é representada pelas “curvas temperatura-tempo” ou “curvas de incêndio”, as quais podem ser padronizadas (curva-padrão) ou parametrizadas pelas características do cenário do incêndio (curvas naturais). A partir dessas curvas é possível calcular a máxima temperatura atingida pelas peças estruturais e a sua correspondente resistência (COSTA & SILVA (2003)).

2 AÇÃO TÉRMICA NAS ESTRUTURAS DE CONCRETO

2.1 Efeito do calor nos constituintes do concreto endurecido

Como em qualquer outro material, o concreto sofre alterações no arranjo interatômico das moléculas; devido à elevação de temperatura há variação na intensidade das forças de ligação interatômicas em sua microestrutura, a qual levam à formação e propagação de fissuras na microestrutura e produz deformações (elásticas e plásticas) na macroestrutura (CALLISTER Jr. (2002)).

A pasta de cimento Portland desestrutura-se quimicamente por desidratação, enfraquecendo o concreto endurecido. A água livre presente na pasta evapora-se à medida que a temperatura se eleva. Nos concretos usuais saturados e nos concretos de baixa porosidade, a pressão de vapor desenvolvida pode-se elevar a tal ponto, ultrapassando a capacidade de liberação dos vapores através dos poros, aumentando o risco de “spalling” (lascamentos).

Além da pressão interna de vapor, COSTA et al. (2002a) descreveram outras possíveis causas do “spalling”. O “spalling” pode ser controlado ao adicionar fibras poliméricas à mistura. NINCE et al. (2003) investigaram o desempenho das misturas submetidas a temperaturas elevadas, em função do teor e tipo de fibras plásticas para dosagens típicas do Brasil.

Agregados graníticos se expandem subitamente a temperaturas elevadas, devido às transformações mineralógicas. A expansão volumétrica contribui no aparecimento de “pop outs” (pipocamentos) localizados, expondo partes da armadura ao calor (COSTA et al. (2002b)).

2.2 Efeito do calor nas estruturas de concreto armado

A heterogeneidade dos materiais constituintes do concreto (pasta, água, agregados, aço) conduz à degradação do concreto armado; a reação da macroestrutura do material por meio de “pop outs” (pipocamentos) e “spalling” (lascamentos) expõe as armaduras à ação direta do fogo. Com o “spalling” há perda de uma porção considerável de material da estrutura, expondo também as camadas do interior do concreto à ação direta do fogo, promovendo o enfraquecimento progressivo das camadas do concreto.

O calor se propaga mais rapidamente no aço, do que no concreto. A temperatura se uniformiza rapidamente ao longo das ferragens; elas dilatam mais do que o concreto, flambam e comprimem a zona de aderência aço-concreto. Por essa razão, pode haver perda de aderência e ancoragem (COSTA & SILVA (2002)).

Devido à temperatura elevada, as transformações físico-químicas do concreto e do aço manifestam-se por meio da redução das propriedades mecânicas de ambos materiais. Do ponto de vista da Mecânica das Estruturas, a reação do concreto armado ao calor assume a forma de redução da capacidade resistente dos elementos estruturais.

O colapso progressivo de edifícios altos em situação de incêndio ganhou destaque no meio técnico-científico após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001. Contudo, o colapso estrutural total ou parcial de edifícios altos de concreto causado pelo incêndio não é incomum.

COSTA & SILVA (2003) citam alguns edifícios de múltiplos andares em concreto armado que tiveram colapso progressivo parcial ou total, com vítimas fatais:

� Sede I e Sede II da CESP em São Paulo (1987) (Figura 3.1);

� “Condomínio Edifício Cacique” em Porto Alegre (1996) (Figura 3.2);

� Edifício industrial de 6 pavimentos, fábrica de roupas em Alexandria – Egito (2000) (Figura 3.3) e

� Edifício residencial de 9 pavimentos, em São Petersburgo – Rússia (2002) (Figura 3.4).

Figura 3.1: Incêndio no edifício da CESP em São Paulo (Revista Incêndio (2000) apud COSTA & SILVA (2003)).

Figura 3.2: Danos nos pilares do Edifício Cacique em Porto Alegre (KLEIN et al. (2000)).

Figura 3.3: Desabamento de fábrica de roupas em Alexandria – Egito (BBC News (2000) apud COSTA & SILVA (2003)).

Figura 3.4: Desabamento de edifício em São Petersburgo – Rússia (O Estado de São Paulo (2002) apud COSTA & SILVA (2003)).

O incêndio levou outros edifícios de concreto na Europa, ao colapso parcial ou totalmente:

� “Minin works” em Surrey – Reino Unido, 1969 (THE INSTITUTE OF STRUCTURAL ENGINEERS (1975) apud BAILEY (2001));

� fábrica Linde na Alemanha, 1971 (MALHOTRA (1978) apud BAILEY (2001));

� loja de departamentos “Katrantzos Sport” em Atenas – Grécia, 1980 (PAPAIOANNOU (1986) apud BEITEL & IWANKIW (2002));

� biblioteca de Linköping na Suécia, 1996 (Van ACKER (2001) apud BAILEY (2001)).

Na América do Norte há relatos da mesma natureza:

� edifício comercial “One New York Plaza” em New York – U.S.A., 1970 (BEITEL & IWANKIW (2002));

� “Military Personnel Record Center”1 em Overland – U.S.A., 1973 (SHARRY et al. (1974) apud BEITEL & IWANKIW (2002), GRAUERS et al. (1994));

� edifício residencial “Jackson Street Apartment” em Hamilton – Canadá, 2002 (BEITEL & IWANKIW (2002)).

3 MÉTODOS DE DIMENSIONAMENTO DE ESTRUTURAS DE CONCRETO EM SITUAÇÃO DE INCÊNDIO

3.1 Normatização internacional

O dimensionamento das estruturas de concreto em incêndio depende de vários fatores, sendo os mais importantes: a taxa de carregamento da peça, a temperatura no interior do concreto e da armadura e a propriedades térmicas do concreto em altas temperaturas.

Os códigos de projeto estrutural dos principais continentes (ACI 216R (1989), NBCC2 (1990) apud HARMATHY (1993), FIP-CEB Bulletin N° 208 (1991), prEN 1992-1-2 (2002), BS 8110-2 (1985), NZS 3101 Part 1 (1995), AS 3600 (2001)) apresentam métodos de dimensionamento simples, admitindo que a temperatura do incêndio de materiais celulósicos obedece à curva-padrão.

A curva-padrão (ISO-834 (1975) apud ISO (1990)) não representa um incêndio real, mas é internacionalmente recomendada por meio de normas e procedimentos de ensaios por questões práticas3. As curvas naturais de incêndio são recomendadas para os métodos avançados de projeto, conduzidos por uma análise estrutural refinada, com o objetivo de avaliar o desempenho da estrutura (SILVA (1999)).

A temperatura do ambiente em chamas, a ser considerada seguindo a curva-padrão está associada a um tempo preestabelecido pela legislação vigente, em função do risco da edificação. COSTA & SILVA (2003) descrevem com detalhes a determinação desse “tempo”, conhecido como TRRF – tempo requerido de resistência ao fogo.

A NBR 14432 (2000) – “Exigências de Resistência ao Fogo de Elementos Construtivos das Edificações” e a Instrução Técnica IT 08/01 (CB-PMESP (2001)) apresentam os tempos requeridos de resistência ao fogo (TRRF’s), recomendáveis para diversos tipos de edificações brasileiras. Na Europa, os “hot Eurocodes” – Eurocodes para o dimensionamento de estruturas em incêndio – oferecem duas opções para a base de cálculo do projeto estrutural (

Figura 3.5): exigências prescritivas e exigências de desempenho.

As exigências prescritivas fundamentam-se em uma característica-limite, por exemplo, um tempo-limite (os TRRF’s) ou uma temperatura-limite (a chamada “temperatura crítica”) da estrutura que garante a “segurança”. Ultrapassando-se esses limites, o elemento estrutural é considerado incapaz de cumprir a sua função de suportar as ações térmicas e mecânicas, independente de outras variantes, por exemplo, o arranjo estrutural e a eficiência da proteção ativa.

As exigências de desempenho fundamentam-se na análise ponderada dos elementos em jogo, durante o sinistro: cenário de incêndio, arranjo estrutural, eficiência da proteção ativa, dentre outros (VILA REAL (2004)). O desenvolvimento tecnológico atualmente permite adotar novos materiais e sistemas construtivos, novas alternativas e soluções técnicas de papel importante no comportamento estrutural em incêndio. Os procedimentos de cálculo estrutural para segurança contra-incêndio recomendados pelos “hot Eurocodes” (

1Edifício de 6 andares e área de piso 200 x 85 m² em concreto armado. 2Supplement to the National Building Code of Canada (Associate Committee on the National Building Code 1990). 3A representação de incêndios por modelos realísticos é particularmente difícil em virtude da grande variedade e variabilidade das

características do cenário de incêndio para cada situação de incêndio (SILVA (2001), COSTA & SILVA (2003), VILA REAL (2004)).

Figura 3.5) apresentam 3 níveis de solução (COSTA (2002)):

� nível 1: soluções práticas de projeto, de aplicação imediata adotando-se métodos gráficos e tabulares para elementos estruturais;

� nível 2: métodos simplificados de dimensionamento para elementos estruturais específicos;

� nível 3: modelos gerais de cálculo para simular o comportamento global da estrutura, tais como: análise do efeito do conjunto, de partes da estrutura ou de um elemento estrutural isolado.

As soluções de níveis 1 e 2 não requerem mão-de-obra especializada para operar programas de computador complexos, enquanto as soluções de nível 3 são dispendiosas por necessitar de grandes investimentos em hardwares e softwares e treinamento intensivo de pessoal. Os ensaios em laboratórios são o “último recurso” para as situações que não se enquadrem nesses 3 níveis (COSTA (2002)). Ao adotar as soluções de nível 1, a verificação da estrutura em situação de incêndio não é necessária.

Métodos tabulares Métodos simplificados(modelos simples de cálculo)

Métodos de cálculoavançados

Determinação das açõesde origem mecânica

condições de contorno

Análise de elementosisolados

Métodos simplificados(modelos simples de cálculo,

se existirem)

Métodos de cálculoavançados

Determinação das açõesde origem mecânica econdições de contorno

Análise departes da estrutura

Métodos de cálculoavançados

Seleção dasações mecânicas

Análise globalda estrutura

Recomendações prescritivas(ações térmicas - curvas padronizadas)

Métodos simplificado(modelos simples de cálculo,

se existirem)

Determinação das açõesmecânicas e condições

de contorno

Análise de elementosisolados

Métodos de cálculoavançados

Determinação das açõesmecânicas e condições

de contorno

Análise de partes daestrutura

Métodos de cálculoavançados

Seleção dasações mecânicas

Análise globalda estrutura

Escolha de modelos de incêndiossimples ou avançados

Recomendações baseadas nodesempenho

(com base nas ações térmicas)

Procedimentos de cálculo(projeto)

Figura 3.5: Procedimentos de cálculo estrutural para segurança contra-incêndio recomendado pelo Eurocode 1 Part 1.2 (prEN 1991-1-2 (2002)).

3.1.1 Métodos gráficos

Os métodos gráficos são constituídos por nomogramas ou diagramas, os quais permitem determinar as características geométricas dos elementos estruturais, adequadas em função do TRRF.

A norma americana ACI 216R (1989) apresenta ábacos para o dimensionamento de lajes que correlacionam a espessura ao TRRF considerando o tipo de agregado (Figura 3.6). As normas oceânicas (AS-3600 (2001) e NZS 3101 Part 1 (1985)) apresentam diagramas para dimensionamento de vigas e pilares, relacionando as dimensões mínimas ao TRRF (Figura 3.7).

Nota: admite-se a temperatura máxima de 139

°C (250 °C) para superfície não-exposta ao fogo.

vigas contínuas pilares

Figura 3.6: Correlação entre a espessura mínima da laje e o TRRF, considerando o tipo de agregado (ACI 216R (1989)).

Figura 3.7: Dimensões de largura “bmin” e o cobrimento das armaduras “cmín” distância “a” entre o centro geométrico da armadura principal e a face exposta ao fogo (AS-3600 (2001), NZS 3101 Part 1 (1985)).

3.1.2 Métodos tabulares

Os métodos tabulares são métodos de dimensionamento com base em dados organizados em tabelas, as quais fornecem dados correlacionando as dimensões mínimas dos elementos ao TRRF. Esses métodos são encontrados nas normas internacionais pesquisadas (ACI 216R (1989), NBCC2 (1990) apud HARMATHY (1993), FIP-CEB Bulletin N° 208 (1991), Eurocode 2 (prEN 1992-1-2 (2002)), BS 8110-2 (1985), NZS 3101 Part 1 (1995), AS 3600 (2001)). Como exemplos, a Tabela 3.1 e Tabela 3.2 fornecem, respectivamente, os valores mínimos de espessura e cobrimento de armaduras recomendados pelo Supplement to the National Building Code of Canada (NBCC2 (1990) apud HARMATHY (1993)) para alguns elementos estruturais.

Em face das inovações tecnológicas, as versões mais recentes das normas internacionais apresentam-se mais rigorosas nas exigências de segurança contra-incêndio. Por exemplo, o método tabular do Eurocode 2 (prEN 1992-1-2 (2002)) apresenta as dimensões mínimas em função do TRRF, considerando a estanqueidade, a esbeltez, as condições de vínculo e as taxas de armadura e de carregamento (Tabela 3.3).

O Eurocode 2 (prEN 1992-1-2 (2002)) ainda recomenda certos limites para as características tecnológicas do concreto, como o teor de umidade livre e fator água/cimento. Tais medidas têm o objetivo de prevenir o “spalling” instantâneo e alguma conseqüente falência estrutural.

Tabela 3.1: Espessura mínima recomendada para lajes e vigas de concreto, em função do TRRF (NBCC2 (1990) apud HARMATHY (1993)).

Espessura mínima (mm) de lajes de concreto armado ou protendido e paredes de concreto

TRRF (min) Tipo de

agregado 30 45 60 90 120 180 240

silicoso 60 77 90 112 130 158 180

calcáreo 59 74 87 108 124 150 171

leve 49 62 72 89 103 124 140

COSTA & SILVA (2003) compararam os valores obtidos pelos métodos tabulares de várias normas internacionais, inclusive algumas antigas, já canceladas, a fim de avaliar a evolução das normas de projeto de segurança contra-incêndio. Nessa referência podemos encontrar os valores mínimos recomendados para lajes, vigas e pilares de edifícios usuais.

Tabela 3.2: Cobrimento mínimo em mm das armaduras para lajes e vigas de concreto armado e protendido, em função do TRRF (NBCC2 (1990) apud HARMATHY (1993)).

Cobrimento mínimo das armaduras (mm)

TRRF (min) Elemento estrutural Tipo de agregado

†A = Área da seção transversal

em m² 30 45 60 90 120 180 240

lajes

(cobertura e piso) silicoso, calcáreo

e leve — 20 20 20 20 25 32 39

Con

cret

o ar

mad

o

vigas silicoso, calcáreo e leve — 20 20 20 25 25 39 50

lajes

(cobertura e piso) silicoso, calcáreo

e leve — 20 25 25 32 39 50 64

0,026 < A ≤ 0,097 25 39 50 64 – – –

0,097 < A ≤ 0,194 25 26 39 45 64 – – silicoso e calcáreo

A > 0,194 25 26 39 39 50 77 102

‡ Conc

reto

pro

tend

ido

vigas

leve A > 0,097 25 25 25 39 50 77 102 †As lajes devem atender às espessuras mínimas recomendadas na Tabela 3.1. ‡Para lajes e vigas com vários cabos protendidos em profundidades diferentes, a espessura dada deve ser interpretada como a média dos cobrimentos desses cabos, obedecendo aos valores mínimos recomendados, a saber: o cobrimento sobre cada camada não pode ser menor que a metade do valor recomendado nesta tabela ou menos que 20 (25) mm.

Tabela 3.3: Dimensões mínimas para pilares de seções retangular e circular sujeitos à flexão composta (valores moderados para momentos de 1ª ordem: excentricidade e = 0,5.b ≤ 200 mm) com taxa mecânica de armadura ω = 1 (prEN 1992-1-2 (2002)).

Dimensões mínimas (mm) para a largura do pilar “bmin” e distância

“a” do eixo da armadura ηηηη = 0,15 ηηηη = 0,3 ηηηη = 0,5 ηηηη = 0,7

TRRF (min)

índice de esbeltez

λ bmin a bmin a bmin a bmin a

30 150 25* 150 25* 200 300

30 25*

500 550

30 25

40 150 25* 150 25* 250 450

30 25*

500 600

40 30

50 150 25* 150 200

30 25*

300 500

35 25* 550 35

60 150 25* 200 250

30 25*

350 500

40 25* 550 50

70 150 25* 200 300

30 25*

450 550

50 25* (1)

30

80 150 25* 250 350

30 25*

500 600

35 30 (1)

30 150 25* 200 450

35 25*

350 600

40 30

550 600

45 40

40 150 200

30 25*

200 500

40 25*

450 500

50 35 600 40

50 150 250

35 25*

250 550

40 25*

500 600

40 35 600 60

60 200 350

30 25*

300 600

40 25*

500 600

50 40 (1)

70 250 450

30 25*

350 600

40 30

550 600

50 45 (1)

60

80 250 500

55 25*

450 500

40 35* 600 70 (1)

30 200 300

35 25*

250 550

50 25*

500 600

50 40 600 70

40 200 450

40 25*

300 600

50 30

500 600

55 45 (1)

50 200 500

45 25*

350 600

50 35 550 50 (1)

60 200 550

50 25*

450 600

50 40 600 60 (1)

70 250 600

45 30

500 600

50 45 600 80 (1)

90

80 250 500

50 35

500 600

55 45 (1) (1)

30 200 450

50 25*

450 600

45 25*

550 600

55 50 (1)

40 250 500

50 25*

500 600

40 30 600 65 (1)

50 300 550

40 25*

500 600

50 35 (1) (1)

60 350 550

45 25*

500 600

60 40 (1) (1)

70 450 600

40 30

550 600

60 50 (1) (1)

120

80 450 600

45 30 600 65 (1) (1)

* Normalmente o cobrimento recomendado em situação normal é suficiente.

( )ydscdc

Ed,0

fAfAN

⋅+⋅=η , onde N0,Ed é o carregamento de 1ª ordem aplicado ao pilar.

cdc

yds

fAfA

⋅⋅

(1) É necessária largura maior que 600 mm. Uma avaliação particular da flambagem é requerida.

3.1.3 Métodos simplificados

Além dos métodos gráficos e tabulares, alguns códigos internacionais apresentam, adicionalmente, os chamados “métodos simplificados” para avaliação analítica da capacidade de suporte dos elementos. Tais métodos fundamentam-se na Teoria das Estruturas ou são semi-empíricos, envolvendo extrapolações de resultados experimentais com base na curva-padrão.

Nos modelos simplificados, a segurança contra-incêndio é verificada pelo dimensionamento à flexão, considerando os efeitos da temperatura sobre os materiais. Quando dimensionados adequadamente à temperatura ambiente, os elementos estruturais de concreto raramente sofrem ruptura por cisalhamento em incêndio (GUSTAFERRO (1986) e LIN et al. (1988) apud HARMATHY (1993), BUCHANAN (2001)).

ALMAND et al. (1992) citam CULVER et al. (1973), OSSENBRUGGEN et al. (1973) e UDDIN & CULVER (1975) como os primeiros pesquisadores a difundir princípios de dimensionamento em situação de incêndio, com base nos mesmos modelos de cálculo utilizados para projetos à temperatura ambiente.

Eles introduziram coeficientes de redução de resistência dos materiais aos modelos de cálculo, para simular o efeito da temperatura elevada sobre o aço e o concreto, diferenciando assim, o projeto à temperatura ambiente do projeto em situação de incêndio.

A redução da resistência do concreto endurecido, em função da temperatura é estimada por meio do coeficiente redutor κc,θ (expressão 3.1 e Figura 3.8). O valor característico da resistência em função da temperatura θ (°C) é apresentado na expressão 3.1 e o valor de cálculo dessa resistência, na expressão 3.2.

ck,c,ck ff ⋅= θθ κ [3.1]

onde: fck,θ = resistência característica do concreto à compressão à temperatura elevada θ (°C) [MPa];

κc,θ = coeficiente de redução da resistência à compressão do concreto em função da temperatura θ (°C) [adimensional];

fck = resistência característica do concreto à compressão à temperatura ambiente [MPa].

c

ck,c,cd

ff

γκ θθ ⋅=

[3.2]

onde: fcd,θ = resistência de cálculo do concreto à compressão à temperatura elevada θ (°C) [MPa];

κc,θ = coeficiente de redução da resistência à compressão do concreto em função da temperatura θ (°C) [adimensional];

fck = resistência característica do concreto à compressão em temperatura ambiente [MPa].

γc = coeficiente de minoração da resistência característica do concreto à compressão em situação excepcional [adimensional], inferior ao normalmente utilizado à temperatura ambiente.

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

0 200 400 600 800 1000 1200

Temperatura θ (°C)

κ c,θ

= f c

k,θ/f

ck

agregados silicosos (granito, quartzito, ...)agregados calcáreosagregados leves (vermiculita, argila expandida, ...)

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

0 200 400 600 800 1000 1200

Temperatura θ (°C)

κ cE,θ =

E c,θ/E

c

DTU (1974)HERTZ (1980) apud HERTZ (1999)BOUTIN (1983)DIEDERICHS et al. (1988) apud PHAN (1996)JUMPANNEN (1989) apud TÓMMASSON (1998)MORITA et al. (1992) apud PHAN (1996)FURUMURA et al. (1995) apud PHAN (1996)BUCHANAN (2001)prEN 1992-1-2 2nd Draft (2001)

κsE,θ = Es,θ/Es

módulo de elasticidade do aço laminado(para comparação)

Figura 3.8: Coeficiente de redução da resistência do concreto à compressão, em função da temperatura (prEN 1991-1-2 (2002)).

Figura 3.9: Coeficiente de redução do módulo de elasticidade do concreto, em função da temperatura (COSTA (2002)).

A redução do módulo de elasticidade do concreto, em função da temperatura elevada é considerada por meio do coeficiente redutor κcE,θ (expressão 3.3). A Figura 3.9 apresenta alguns resultados experimentais.

ck,cE,c EE ⋅= θθ κ [3.3]

onde: Ec,θ = módulo de elasticidade do concreto à temperatura elevada θ (°C) [GPa];

κcE,θ = coeficiente de redução do módulo de elasticidade em função da temperatura θ (°C) [adimensional];

Ec = módulo de elasticidade do concreto à temperatura ambiente [GPa].

De forma análoga ao concreto, a redução da resistência aço em função da temperatura elevada é determinada por meio do coeficiente redutor κs,θ da Figura 3.10. O valor característico da resistência em função da temperatura θ (°C) é apresentada na expressão 3.4 e o valor de cálculo, na expressão 3.5:

yk,s,yk ff ⋅= θθ κ [3.4]

onde: fyk,θ = resistência característica do aço à temperatura θ (°C) [MPa];

κs,θ = coeficiente de redução da resistência do aço em função da temperatura θ (°C) [adimensional];

fyk = resistência característica do aço à temperatura ambiente [MPa].

yk,ss

yk,s,yd f

ff ⋅=⋅= θθθ κ

γκ

[3.5]

onde: fyd,θ = resistência de cálculo do aço em situação de incêndio, à temperatura elevada θ (°C) [MPa];

κs,θ = fator de redução da resistência do aço em função da temperatura θ (°C) [adimensional];

fyd = resistência de cálculo do aço à temperatura ambiente [MPa];

fyk = resistência característica do aço à temperatura ambiente [MPa];

γs = coeficiente de minoração da resistência característica do aço em situação excepcional [adimensional], inferior ao normalmente utilizado à temperatura ambiente.

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

0 200 400 600 800 1000 1200

Temperatura θ (°C)

κ s,θ =

f yk,θ/f

yk

laminados a quente (CA)trabalhados a frio (CA)trabalhados a frio (CP)

κs,θ = fyk,θ/fyk

κp,θ = fpk,θ/fpk

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

0 200 400 600 800 1000 1200

Temperatura θ (°C)

κ sE,θ

= E s

,θ/E

s

aços laminados a quente (CA)aços trabalhados a frio (CA)aços trabalhados a frio (CP)

κpE,θ = Ep,θ/Ep

(módulo de elasticidade do aço trabalhado à frio para armadura protendida)

Figura 3.10: Coeficiente de redução da resistência convencional ao escoamento do aço, em função da temperatura (prEN 1991-1-2 (2002)).

Figura 3.11: Coeficiente de redução do módulo de elasticidade dos aços para concreto armado e protendido (prEN 1992-1-2 (2002)).

Semelhante ao concreto, o decréscimo do módulo de elasticidade do aço em função da temperatura elevada é considerado por meio do fator de redução κsE,θ (Figura 3.11). A determinação do módulo de elasticidade em função da temperatura elevada θ (°C) é apresentada na expressão [3.6]:

s,sE,s EE ⋅= θθ κ [3.6]

onde: Es,θ = módulo de elasticidade do aço à temperatura elevada θ (°C) [GPa];

κsE,θ = Coeficiente de redução do módulo de elasticidade em função da temperatura θ (°C) [adimensional];

Es = resistência característica do concreto à compressão à temperatura ambiente [GPa].

Os procedimentos de cálculo de CULVER et al. (1973), OSSENBRUGGEN et al. (1973) e UDDIN & CULVER (1975) apud ALMAND et al. (1992) foram rudimentos dos métodos simplificados posteriores.

Algumas normas americanas (ACI 216R (1989) e NBCC2 (1990) apud HARMATHY (1993)) e britânica (BS 8110-2 (1985)) indicam os princípios de CULVER et al. (1973), OSSENBRUGGEN et al. (1973) e UDDIN & CULVER (1975) apud ALMAND et al. (1992) na íntegra para o projeto de elementos de concreto e, eventualmente, impõem temperaturas-limite aos materiais.

Em face da baixa condutividade térmica do material e das grandes seções dos elementos, os elementos de concreto possuem elevados gradientes térmicos em situação de incêndio, sendo difícil estimar uma temperatura uniforme equivalente, representativa para o cálculo da resistência real do concreto.

Por isso, os métodos simplificados indicados nas versões mais recentes de normas e handbooks são consideram a redução da resistência do concreto, por meio da redução de área da seção do elemento. São eles: o método de Hertz, idealizado pelo dinamarquês HERTZ (1985) apud PURKISS (1996) e, o “método dos 500 °C”, idealizado pelo sueco ANDERBERG (1978) apud RIGBERTH (2000).

O Eurocode 2 (prEN 1992-1-2 (2002)) indica ambos os métodos; o FIP-CEB Bulletin N° 208 (1991) e a BKR-99 (1999) apud RIGBERTH (2000), apenas o “método dos 500 °C”. Os procedimentos básicos de cálculo para ambos os métodos são similares, diferenciando apenas a forma de reduzir a seção de concreto:

1° determinar a distribuição de temperatura na seção transversal do elemento de concreto, em função do TRRF (tempo requerido de resistência ao fogo);

2° reduzir a seção transversal, correspondente à região periférica do elemento, formada pelas camadas

superficiais de concreto danificadas pelo calor;

3° determinar a temperatura das barras da armadura;

4° determinar a redução das características mecânicas do aço em função da temperatura elevada;

5° estimar a resistência da peça com as propriedades mecânicas e a seção transversal reduzidas, por meio do equilíbrio de esforços da seção transversal análogo ao modelo de cálculo utilizado no projeto à temperatura ambiente;

6° comparar o valor de cálculo do esforço resistente em temperatura elevada ao valor de cálculo do esforço atuante em situação excepcional.

COSTA et al. (2004) aplicaram os princípios do “método dos 500 °C” ao modelo de cálculo utilizado à temperatura ambiente, para o dimensionamento à flexão composta normal em pilares de concreto armado. A iniciativa tem o objetivo de fornecer subsídios para o dimensionamento de elementos comprimidos em situação de incêndio, com base nos mesmos procedimentos de cálculos adotados no projeto à temperatura ambiente.

Algumas normas (NBCC2 (1990) apud HARMATHY (1993), AS 3600 (2001)) apresentam expressões empíricas que permitem determinar o tempo de resistência ao fogo da estrutura em função de suas características geométricas, da resistência do concreto e do carregamento axial aplicado, este último, no caso de pilares. A origem dessas expressões está nos estudos canadenses desenvolvidos por LIE & ALLEN (1972) apud ALMAND et al. (1992), ALLEN & LIE (1974) apud HARMATHY (1993), LIE et al. (1984) apud ALMAND et al. (1992), LIE & WALLERTON (1988) apud WADE et al. (1997) e LIE & IRWIN (1990) apud HARMATHY (1993).

A simplicidade dessas expressões esconde exaustivas simulações numéricas, baseadas em ensaios. Por exemplo, a expressão [3.7] indicada pela AS 3600 (2001), para o cálculo do tempo de resistência ao fogo (TRF) de pilares de concreto armado requereu ao todo, 792 simulações numéricas com base em 18 ensaios realizados pelo National Research Council of Canada (LIE & WOOLLERTON (1988) apud WADE et al. (1997)).

As simulações foram divididas entre grupos caracterizados pelas resistências dos materiais, cobrimento das

armaduras, esbeltez e relação entre as dimensões dos pilares

pilar

pilar

bh . A aplicação da expressão [3.7] é restrita à

relação entre as dimensões 8bh

1pilar

pilar ≤≤ , aos cobrimentos 20 mm ≤ cobrimento ≤ 40 mm, às resistências do

concreto 20 MPa ≤ fck ≤ 50 MPa e ao comprimento do pilar ℓpilar ≥ 5.hpilar.

��

���

<=

⋅≥

⋅⋅⋅⋅⋅

=

2,5% se 7,1

2,5% se 5,1

N4,0N

N10hbf

TRF

Rdd

pilard5

8,1pilar

3,3pilar

3,1ck

ρ

ρκ

κ

[3.7]

onde: TRF = tempo de resistência ao fogo do pilar [min];

κ = constante que depende da taxa de armadura;

fck = resistência característica à compressão do concreto [MPa];

bpilar = menor dimensão do pilar [mm];

hpilar = maior dimensão do pilar [mm];

Nd = valor de cálculo do esforço axial atuante, em situação excepcional [kN];

NRd = valor de cálculo do esforço axial resistente [kN];

ℓpilar = comprimento efetivo do pilar [mm];

ρ = taxa de armadura da seção.

3.2 Normatização nacional

Atualmente não há qualquer norma brasileira que permita o meio técnico respeitar a legislação vigente (NBR 14432 (2000), IT-08 (2001) em São Paulo).

No Brasil já houve uma norma exclusiva para estruturas de concreto em situação de incêndio – a NBR 5627 (1980) – cancelada em 2001 e substituída pelo Anexo B do texto de revisão da NBR 6118, versão de 2001. Posteriormente, esse anexo foi suprimido na versão final de 2002 do referido texto de revisão. O Anexo B fornecia as dimensões mínimas a serem consideradas em projeto em função do TRRF e os fatores de redução das características mecânicas do concreto e do aço em função da temperatura.

Na ausência de normatização brasileira para o dimensionamento de estruturas de concreto em situação de incêndio, o projetista de estruturas precisará recorrer a normas estrangeiras para elaborar um projeto estrutural em consonância com a legislação em vigor.

Ressalta-se que o engenheiro projetista estrutural tem responsabilidade civil sobre o seu projeto. Portanto, os prejuízos do sinistro podem ser contestados, se comprovada negligência ou erro de projeto.

A publicação da nova norma de dimensionamento de estruturas de concreto NBR 6118 (2003) levará à concepção de elementos de concreto, com resistências ao fogo, ligeiramente superiores àqueles projetados de acordo com as normas antigas. A NBR 6118 (2003) recomenda aumentar cobrimentos e dimensões mínimas das peças de concreto visando a durabilidade das estruturas de concreto. Assim, indiretamente aumenta também a sua resistência ao fogo. Entretanto, edificações de maior risco (em função da área, altura, tipo de uso) ainda estarão aquém das exigências internacionais.

Elementos pré-moldados típicos do Brasil ainda estão sem solução, pela falta de infra-estrutura técnica (laboratórios de ensaio de resistência ao fogo, fomento à pesquisa da área) no país, a fim de avaliar o real comportamento dessas estruturas.

4 A ENGENHARIA SUSTENTÁVEL E O INCÊNDIO

Nos últimos anos, a preocupação ambiental na concepção e execução de edifícios em zonas urbanas atravessou todo o processo de construção, desde as fases iniciais da concepção, passando pela construção e continuando na fase de utilização até ao fim da vida útil do edifício, incluindo a sua demolição.

Durante a Conferência “ECO’92”, realizada em 1992 no Rio de Janeiro, governos e instituições da sociedade civil de 179 países aprovaram a Agenda 21. Trata-se de um documento de 40 capítulos que contém compromissos para um novo padrão de desenvolvimento, conciliando métodos de proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica para o século XXI (UNCED (1992)).

Desde que a Agenda 21 foi formulada, o Congresso Mundial da Construção promovido pelo CIB (International Council for Research and Innovation in Building and Construction) em 1998, estimulou a criação de uma Agenda internacionalmente aceita sobre Construção Sustentável, publicada em julho de 1999 (CIB (1999)).

De acordo com CIB (1999), o desafio da Engenharia Sustentável consiste em projetar, construir e manter edifícios utilizando o mínimo de energia não-renovável, mas que forneçam conforto, saúde e a segurança às pessoas que vivem ou trabalhem neles. Esses edifícios – “green buildings” – devem atender aos quesitos de qualidade e segurança para o fim os quais foram projetados durante todo o período de vida útil.

Em outras palavras, os edifícios devem suportar durante um tempo de resistência a ação sinistra, por exemplo, de um incêndio, dentre outras ações excepcionais, durante o período de vida útil da estrutura. É admitido no projeto estrutural, a ocorrência de pelo menos uma vez, a cada 50 anos, uma ação excepcional extrema, durante a vida útil dos edifícios.

O CEB (1997) apud ISAIA (2002) define o conceito de durabilidade das construções de concreto como “a capacidade de uma estrutura apresentar o desempenho requerido durante o período de serviço pretendido, sob a influência dos fatores de degradação incidentes”.

A durabilidade de uma estrutura de concreto tem sido avaliada deterministicamente, estabelecendo parâmetros como cobrimento mínimo, relação água/aglomerante máxima, tipos de cimento e de aditivo, etc. Esses parâmetros são resultados de pesquisas laboratoriais, de campo ou empíricos; eles são afetados pelas condições reais do ambiente e do concreto usado nas peças estruturais. Dessa forma, a durabilidade obtida, mesmo satisfatória, apresenta variações significativas (CEB (1997) apud ISAIA (2002)). Por isso, o desempenho do

concreto endurecido pode ser insatisfatório “in loco”, quando o elemento de concreto é sujeito a situações especiais.

Em face dos avanços tecnológicos, a Engenharia Estrutural restringiu-se ao aprimoramento de métodos computacionais para analisar a estrutura. Da mesma forma, a Engenharia de Materiais: enquanto muitos tecnologistas possuem noções insuficientes do comportamento mecânico de uma estrutura e das inovações computacionais, muitos projetistas de estruturas desconhecem o comportamento dos materiais do concreto armado e métodos construtivos (NEVILLE (2000) apud ISAIA (2002)). Estendendo a questão para ações excepcionais, a situação de ignorância é mais crítica em ambas as áreas, associada à “síndrome do menor custo”, eliminando-se do projeto qualquer medida “supérflua” que implique em aumentar o custo do projeto (a curto prazo) com ações incomuns.

O desempenho de um elemento estrutural em situação de incêndio está associado às medidas de prevenção integradas – projeto estrutural, dosagem e controle rigoroso do concreto fresco. Os elementos estruturais devem resistir, dentre outras ações excepcionais, a um incêndio por um período de tempo predeterminado, pelo menos uma vez ao longo da vida útil da edificação, a fim de atender às exigências legais e de sustentabilidade da construção civil.

5 CONCLUSÕES

O concreto armado, como qualquer outro material, sofre os efeitos da ação térmica, comprometendo a sua capacidade mecânica e de compartimentação. As reações ao calor da microestrutura do concreto são traduzidas pela redução das propriedades mecânicas. Na macroestrutura, as reações ao calor assumem a forma de deformações térmicas e fissurações excessivas dos elementos.

Na normatização internacional são encontradas prescrições sobre controle tecnológico e dimensões mínimas dos elementos de concreto, a fim de assegurar a resistência estrutural durante um tempo mínimo preestabelecido pela legislação.

Nas principais normas da América, Europa e Oceania também são encontrados métodos de dimensionamentos com base em modelos simples de cálculo. Os métodos sugeridos, contudo, não são detalhados para todos os tipos de elementos estruturais pela literatura pesquisada.

Dentre outras diretrizes da Engenharia Sustentável, oferecer ambientes sadios e seguros aos usuários e reduzir custos de operação e manutenção são aquelas relacionadas diretamente à sustentabilidade funcional de edifícios (necessidades funcionais, qualidade ambiental interior, desempenho técnico, durabilidade de materiais e componentes da construção, etc.), durante toda a vida útil da construção.

Os elementos estruturais devem resistir, dentre outras ações excepcionais, a um incêndio por um período de tempo predeterminado, pelo menos uma vez ao longo da vida útil da edificação, a fim de atender às exigências de segurança e, indiretamente, às exigências de sustentabilidade da construção civil.

O meio técnico brasileiro ainda não se conscientizou da importância de seguir-se padrões internacionais para o dimensionamento das estruturas de concreto em situação de incêndio, visando a qualidade do desempenho da construção.

6 AGRADECIMENTOS

Agradecemos à CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), pelo apoio dado a esta pesquisa.

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elementos construtivos das edificações. NBR 14432. Rio de Janeiro: ABNT, 2000. [5] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Exigências particulares das obras de

concreto armado e protendido em relação à resistência ao fogo. NBR 5627. Rio de Janeiro: ABNT, 1980. [cancelada em 2001]

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