Constitucionalismo Moderno (1)

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DIREITOS HUMANOS

O constitucionalismo contemporneo e a instrumentalizao para a eficcia dos direitos fundamentaisCrmen Lcia Antunes Rocha

RESUMO O artigo trata do Direito Constitucional como um dos ramos do Direito de maior relevncia no mbito dos direitos humanos, tendo em vista que ele se encontra diretamente ligado s transformaes do homem e do mundo. Enfoca diversas reflexes acerca da eficcia social das normas constitucionais de direitos fundamentais, desde o surgimento dos mesmos no Brasil at a atualidade. So propostas medidas na rea dos direitos humanos, objetivando uma cidadania mais nova e mais comprometida com esses direitos, principalmente nos planos educacional e jurisdicional. H, ainda, a sugesto da criao de um "Ouvidor de Direitos Humanos", responsvel pelo recebimento de reclamaes e denncias referentes violao dos direitos fundamentais. Finalmente, a aprovao do Tribunal Internacional de Direitos Humanos deveria ser uma prioridade do governo brasileiro para a garantia dos Direitos Humanos, j que a violao dos mesmos tem sido uma constante nos tempos atuais.

Este tempo de partido, Tempo de homens partidos. Em vo percorremos volumes, Viajamos e nos colorimos. A hora pressentida esmigalha-se em p na rua, Os homens pedem carne. Fogo. Sapatos. As leis no bastam. Os lrios no nascem

da lei. Meu nome tumulto e escreve-se na pedra. Carlos Drummond de Andrade "Nosso Tempo" Estas notas so dedicadas a Zuzu Angel, Antgona Moderna de um Estado destes tristes trpicos, onde Creonte bate a nossa porta a cada manh fazendo-nos buscar, alm da vida, como uma luta permanente, a garantia da morte abenoada. E onde mesmo Herodes mostra-se eterno em cada mo estendida com que o pivete esfomeado nos assalta mais a conscincia que a bolsa. INTRODUO No acredito no "final dos tempos"; menos ainda no "fim da histria". Mas acho que se pode crer estar-se no "final de um tempo" na travessia deste final de ano, final de dcada, final de sculo, final de milnio. Mais, no entanto, que no "final de qualquer coisa" acredito firmemente no "comeo de um novo tempo", comeo de um novo sculo, comeo de um milnio novo, que traga o novo, que se faa novo para o homem de sempre, mas que continua querendo, desde sempre, o novo. O Direito no se pe longe nem do que se acaba, como modelo ultrapassado ou em fase de traspasse, nem do que desponta como paradigmas novos que se anunciam ou, pelo

menos, se prenunciam, ainda num vu que mal deixa vislumbrar com nitidez os contornos do que se pe a nascer. Nenhum ramo do Direito se ressente mais depressa das mudanas que o mundo e o homem no mundo atravessam que o Constitucional. O Direito Constitucional o direito do homem no seu tempo, no tempo de sua vida, no tempo presente, em qualquer tempo que se apresente, na hora presente, no mundo presente. Como o mundo muda, o constitucionalismo estreita e alarga o seu caminho para se encostar nas transformaes havidas. No vivemos num tempo de reaes, mas, principalmente, de criaes. No vivemos num tempo apenas de revolues, mas de mutaes. Se for certo que a modernidade j acabou e o ps-moderno precisa ser extrado da turbulncia em que se converteram as relaes humanas nestes ltimos anos do sculo XX, de se encarecer que o homem no acabou, que as necessidades humanas fundamentais, os direitos humanos to necessariamente fundamentais, os desejos humanos tambm tidos como fundamentais no se apagaram. Sequer se transformaram em sua essncia, vez que a eterna busca de liberdade incita realizao da igualdade jurdica e social de todos para assegurar que as desigualdades criadoras e criativas da individualidade no sejam anuladas numa totalizao do poder sobre todos, degradador e degradante, a dispensar o homem para o outro. A busca plena de liberdade individual e social tambm e ainda conduz, como antes, dignidade da pessoa humana, que se precisa assegurar e somente ser obtida pela juridicizao eficaz do princpio poltico da solidariedade social.

O Direito Constitucional contemporneo pe-se no turbilho das mutaes, oferece-se ao destino das transformaes dos homens, desde que no se perca o seu centro e a sua razo maior: o valor homem e os valores dos homens, leal aos quais se persiste a busc-los no traado dos novos caminhos, seguindo-se as novas vertentes. Talvez se devesse questionar se, sendo a sociedade dinmica como dinmica a prpria vida no seria o Direito um processo de mutao permanente. E tanto se pe reflexo pela circunstncia de o Direito conter em si mesmo a idia de movimento que se traduz pelo menos na possibilidade de "ser em transformao permanente". Assim se chegaria, ento, a vislumbrar, preambularmente, o motivo de, no momento histrico atual, estar-se a considerar a experincia humana na sociedade e, paralela e necessariamente, o Direito nela adotado como uma fase demonstrativa de uma crise. O movimento na poltica como no Direito, cujo modelo adotado a estratificao da escolha afeita naquela primeira instncia constri-se conduzindo e reconduzindo padres sociais, formando e reformando idias, passos e compassos histricos, conciliando e reconciliando mudanas, cujos paradigmas essenciais, contudo, mantm-se ntegros e aplicados em sua fundamentalidade. Diversamente desse movimento permanente equilibrado conquanto permeado de continuidades e descontinuidades histricas o que se pe mostra, ainda de forma pouco definida, uma ruptura de modelos ou de sistemas at aqui adotados e a sua substituio por outros, cujos paradigmas no guardam mais identidade de significado com aqueles que

informaram os figurinos jurdicos e polticos que se tinham como certos at aqui. A "ps-modernidade" constitucional, expresso empregada no discurso jurdico, no se distancia demasiado, aqui, do sentido a ela outorgado na obra de Lyotard1, quem se referia a uma mudana dos paradigmas culturais, determinada e determinante de uma transformao social. num contexto jurdico, pois, onde o constitucionalismo contemporneo no tem sequer uma expresso definida, tido ora como o moderno, ora como o da ps-modernidade, mais perdido que encontrado nas incertezas e ambigidades do momento que se atravessa, ou que nos atravessa, que se repensa o seu norte e o seu trao pelo menos em relao ao que tem sido a sua alma no modelo embasado na valorao kantiana da racionalidade, da dignidade da pessoa humana e do respeito liberdade de cada um e de todos no espao poltico: os direitos fundamentais do homem. Convivendo com os perigos e os riscos havidos nessa dimenso rotulada de "ps-moderna", busca-se encarecer a funo constitucional na sociedade contempornea e a sua contextualizao nos processos de mutao scio-polticos observados. Essa "psmodernidade" propagada traz em si o germe negador (ou mesmo destruidor nos sistemas) dos valores fundamentais e dos princpios determinantes da organizao social e poltica voltada para o homem, para a eficcia universal dos direitos que lhe so assegurados pelos sistemas baseados na tica e na conjugao dos elementos retirados dela para a legitimao do Direito e, mesmo, da poltica.2Direito no o que se nega, mas o que se afirma. Direito Constitucional nada mais que a afirmao do homem no seu tempo. Um tempo

de homens de todos os tempos, de todos os mundos e para todos os homens. I O CONSTITUCIONALISMO CONTEMPORNEO E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS 1 O constitucionalismo reflete o profundo debate sobre todos os aspectos da vida poltica, social e econmica que domina as relaes na atualidade. Mais que respostas, este um final de sculo de muitas e tormentosas indagaes. O Direito no foge a essa contingncia. Mas a sua funo especialmente na seara do Direito Constitucional impe a oferta de alternativas, mesmo depois de experimentadas algumas precisem ser superadas e outras aperfeioadas. Nada mais que o processo histrico da experincia humana, o qual prova, comprova ou reprova, aprova ou desaprova e recomea com uma outra proposta. O Direito Constitucional v-se s voltas com a sua funo de positivar sistemas os quais confiram segurana num mundo onde a insegurana no est nos sistemas, mas no prprio homem, incerto quanto ao que quer, e, principalmente, como quer para si cada coisa. A Constituio muda a sua forma, o seu contedo, que se adensa no curso dos ltimos dois sculos em seu texto e em seu contexto, mas segue sendo como antes uma Lei, que alicera e preside o processo de juridicizao de um projeto poltico eleito como realizador da idia de Justia prevalente em determinada sociedade estatal e dada, ento, concretizao pela organizao e dinmica estatais. A Constituio tem alma de Direito e forma de Lei, formulando-se como seu corao rgo dominante e diretor de suas aes os direitos fundamentais do homem. Direitos fundamentais em duplo sentido jurdico: de um lado, so eles

essenciais aos homens em sua vivncia com os outros, fundando-se neles, em seu respeito e acatamento, as relaes de uns com os outros homens e com o prprio Estado; de outro lado, eles fornecem os fundamentos da organizao estatal, dando as bases sobre as quais as aes da entidade estatal se desenvolvem, em cujos limites se legitimam (determinantes de limites negativos) e para a concretizao dos quais se determinam comportamentos positivos do Estado (determinantes positivos). O constitucionalismo moderno afirma-se na garantia a que ele se entrega quanto aos direitos humanos. Da a dico do art. 16, da Declarao dos Direitos do Homem e do Cidado, de 1789, segundo a qual toute societ dans laquelle la garantie des droits nest pas assure, ni la sparation des pouvoirs determine na point de constitution. O prprio constitucionalismo trazia, em si, o signo da garantia dos direitos como identificador de sua existncia. Instrumento limitador do exerccio do poder estatal, a Constituio cumpria, assim, na garantia dos princpios assecuratrios dos direitos fundamentais e da separao de poderes o condo de reformular o Estado: estava criado o Estado de Direito. Se a sociedade realizava ou tinha concretizados os direitos fundamentais constitucionalmente declarados e garantidos, isso seria objeto de outras indagaes, que conduziriam a outras fases histricas do constitucionalismo. 2 O reconhecimento e a positivao jurdica dos direitos humanos conquistam-se, historicamente, por movimentos circundantes projetados em puras desdobradas, conexas e coordenadas. As conquistas histricas dos direitos dos homens, como a conquista cadenciada e sucessiva que o ser

humano realiza em sua prpria aventura de viver, aperfeioam-se nas denominadas "geraes de direitos fundamentais". O germe de todos os direitos assenta-se, em algumas de suas manifestaes, na identidade que dignifica o homem: a sua busca de mais e mais liberdade (ou de alguma quando ela lhe foi retirada em sua inteireza) vem de sempre, desde o comeo da vida com o outro, quando os espaos se fizeram restringir e se soube que viver exigia conviver. A convivncia exigiu o conhecimento e a prtica do sentido da liberdade. A solido no quer, no requer, no sabe, nem desconhece a liberdade. A liberdade faz-se no encontro. O reconhecimento da natureza de direitos havidos na fundamentalidade de um processo poltico histrico especfico pe-se a ser em declarao contida em norma formulada sob os auspcios das idias iluministas, que se geraram e se fizeram aceitas no Estado Moderno. Esse criou a Constituio escrita, impressa e democraticamente divulgada entre os cidados (pela primeira vez na Histria, a impresso do texto constitucional adensava-se na experincia poltica como fator de democratizao efetiva, pois o Direito dava-se a conhecer a todos e, nesse sentido, fazia-se indita a condio constitucional de norma divulgada e de cincia do grupo, ultrapassando a reserva de poder que a deteno da informao resguarda). Com a criao da Lei Constitucional, com o modelo adotado universalmente ainda hoje, teve-se uma mudana de contedo dos direitos. O constitucionalismo assim formulado e formalizado deu os contornos do Estado de Direito. O homem criou o Estado de Direito. Os burgueses o fizeram liberal. Como a esses autores liberalizantes do modelo

interessava o individualismo, foi com essa conotao que os direitos humanos se entronizaram nos sistemas constitucionais modernos. Essa nova concepo de Direito, que a frmula do constitucionalismo moderno consagrou, teve em seu polo central a entronizao dos direitos fundamentais como o grande diferencial de tudo quanto at ento se concebera e se positivara como ordem jurdica. que os direitos humanos (direitos da pessoa humana) concebem-se gemeamente com a dupla marca que se mescla e se torna um novo e nico signo: o homem e o direito, diversos em si, passam a integrar uma unidade dotada de vida prpria, alterando-se os dois elementos que se tornam uma realidade a se fazer centro no apenas da prtica de idias, mas do esprito que deve dominar todas as prticas. O homem tem o sentido do absoluto na experincia de vida no planeta: tudo se pensa, realiza-se e se pe a partir dele e a se voltar para ele. O direito tem o sentido relativo que a experincia histrica lhe vota. Por isso alguns referem-se ao sentido absoluto dos direitos humanos, afirmando a sua condio de dado da natureza (e fazendo-se a sua ligao com o direito natural), porque se enfatiza a condio do homem. Outros, diversamente, preferem salientar o sentido relativo que a historicidade desses direitos projeta e afirma nos diversos sistemas adotados nas variadas fases da experincia humana. O significado do homem para o Direito absoluto. O sentido do Direito para o homem relativo. Mas como se pensar relativo e histrico o cabedal de direitos denominados "humanos", quando h, na Antigidade, a tragdia de Sfocles, na qual se pe Antgona a lutar para ter o direito "eterno", de que se acha titular, de dar enterro

digno a seu irmo Polinice e se depara, vinte e cinco sculos depois, com uma outra mulher, Zuzu Angel, a lutar contra o Creonte de ocasio, para dar enterro digno a seu filho morto e sem direito ao caixo, alegando esta, tal como a primeira, que a luta se fazia em nome de leis eternas ainda que contra aquelas postas pelo Estado? Como se ter como relativos os direitos humanos, quando Scrates volta a viver e a morrer, sob o manto de uma igual e mesma tragdia, em Herzog, em Rubens de Paiva, em milhares de homens sem o apangio da sabedoria e sem o ttulo daquele sbio? Mas como no se pensar na relatividade dos direitos humanos, quando se tem por certo ser prprio do Direito a historicidade dos elementos que o compem e, ainda, que os sistemas jurdicos no guardam o condo de absolutos? 3 Os direitos fundamentais concebem-se, antes, nas idias, nas lutas, nos movimentos sociais, nos atos hericos individuais, nas tenses polticas e sociais que antecedem as mudanas, como o ar pesado que prev a tempestade. Os direitos humanos foram, primeiro, crimes ditos polticos pelos quais muitas cabeas rolaram. S depois vem o Direito. Muito depois vm os direitos. A humanidade caminha a passos largos. O direito a conquist-la arrasta-se em cadncia muito mais lenta. 3.1 Coube aos fautores da Declarao de Independncia dos Estados Unidos da Amrica, em 1776, a expresso primeira dos direitos, posteriormente (j no sculo XX) divulgados com a alcunha de "direitos humanos". E aos revolucionrios franceses, com o carter cosmopolita dominante dos seus atos polticos, a proclamao desses direitos em elenco que se divulgou e se fez fonte de sua adoo nos sistemas jurdicos e

nas organizaes polticas que a partir de ento se estabeleceram. Algumas observaes cabem, aqui, quanto a essas primeiras declaraes de direitos fundamentais: preliminarmente, de se relevar serem elas documentos de valor normativo, impositivo portanto, mas externos s Constituies (tanto os artigos da Confederao, dos norte-americanos, que continham as normas da organizao fundamental dos Estados Unidos, quanto a Constituio Francesa, de 1791, no incluam aquele rol de direitos declarados em seus textos, conquanto o considerassem de cumprimento obrigatrio e, inclusive, de valor supraconstitucional); em segundo lugar, de se salientar que os direitos declarados traziam a conotao (ou se divulgava com o sentido) de "direitos naturais" dos homens, no expressando, assim, a idia que hoje domina e que historiciza e engaja tais direitos realidade da experincia poltica e jurdica do homem na sociedade estatal; um terceiro ponto que tais direitos ainda se concebiam como privilgios (tais como os seus antecedentes, havidos, por exemplo, em documentos como a Carta Magna adotada, na Inglaterra, em 1215, por Joo Sem Terra); nem tinham eles carter universal em sua aplicao, nem a preocupao dominante das concepes burguesas colocava-os a salvo das investidas no apenas do poder estatal, mas dos poderes particularistas havidos na sociedade de uns contra outros homens; em quarto lugar, de se atentar que os direitos declarados tisna-se pela conotao individualista, como acima lembrado, porque o Estado ento estruturado era "Liberal de Direito", pelo que os interesses individuais e o individualismo predominavam sobre todas as formas de organizao e o

Direito no se ausentava desta natureza com que se geravam as idias, as instituies e as suas prticas; em quinto lugar, acentue-se que esses direitos, referentes vida, liberdade individual, segurana, igualdade e propriedade so, j ento no curso deste sculo XX, denominados "de primeira gerao". Constituio do Imprio do Brasil de 1824 coube ser a primeira a introduzir a declarao de direitos fundamentais individuais no corpo permanente de suas normas, como parte nuclear do sistema nela positivado.3 Em explanaes sobre o texto constitucional imperial, lecionava Pimenta Bueno que os principais direitos individuais so, como o art. 179, da Constituio e seus pargrafos reconhecem, os de liberdade, igualdade, propriedade e segurana, mas no s cada um deles se divide em diversos ramos, mas tambm eles se combinam entre si, e formam outros direitos igualmente essenciais.4Referindo-se aquele eminente constitucionalista por exemplo liberdade de trabalho como um dos direitos fundamentais que se extraa do subsistema constitucional a eles relativos, transpunha-se ele para um momento futuro, no qual a expresso que iriam traduzir numa nova gerao de direitos. 3.2 Como o homem um ser que se torna, se estende e se amplia em sua dimenso pessoal, tambm os direitos, uma de suas principais projees, dota-se de igual natureza: a formalizao daqueles direitos no estancou a febre que estimula conquista do novo e traduz maior e melhor possibilidade de realizao dos homens. A constatao de que a dico jurdica declaratria dos direitos fundamentais era necessria, conquanto no suficiente, e de que o prprio

elenco daqueles que se haviam declarado ampliava-se nas novas conquistas sociais, conduziu a outros movimentos que conduziram a novas formulaes jurdicas: surgem os direitos sociais, culturais e econmicos, havidos como os de "segunda gerao", a se acrescerem e mesmo a redimensionarem o sentido daqueles que compunham os de "primeira gerao". As declaraes cresceram e viram-se a tocar um homem antes no contemplado: encontra-se na fbrica, no trabalho, no parque, na praa, come, dorme e sonha o mesmo sonho de todos sem perder-se de seus prprios e nicos devaneios. Mas no apenas os direitos foram acrescidos nas declaraes que projetaram e expressaram os direitos fundamentais ditos de "segunda gerao", seno as normas que os contemplaram traziam mensagens jurdicas novas para o Estado e para os outros homens, de tal maneira que a sociedade estatal passou a ser concebida com um diferente fundamento e uma forma indita: os direitos sociais reconheceram o homem em sua dimenso criadora de trabalhos, projetos juntamente com os outros: a praa fez-se Direito e o Estado fez-se Social de Direito. Os direitos sociais fecundaram a Justia social e o bem estar fez-se nome prprio do Estado. Superou-se o homem isolado em seu individualismo egosta, vigiado policialesca e timidamente pelo Estado Liberal. O homem fezse tambm o outro. O Estado fez-se a sociedade incontida, diversa, colorida espalhada na festa, no fisco, na f. Faz-se mister, aqui, encarecerem-se alguns dados de relevo imperioso, especialmente no momento atual quanto ao constitucionalismo e aos direitos fundamentais do homem. Tem-se afirmado ser a passagem dos direitos fundamentais de primeira para os de segunda gerao uma substituio, o

que no corresponde natureza do processo. Os direitos ampliam-se, estendem-se, adicionam-se, adensam-se nos que se seguem e que se pem como plus em relao ao que se tinha anteriormente. No h antinomia entre eles, mas uma relao de complementariedade. Assim, a igualdade jurdica aprofundada na lista dos direitos sociais, culturais e econmicos adquiridos no curso dos ltimos anos do sculo XIX e no curso deste sculo que se esvai, rebaliza a concepo constitucional da igualdade pensada nos albores do Estado Moderno, sob o influxo do individualismo exacerbado. A liberdade que antes somente se pensava no plano individual projeta-se no espao pblico e a participao poltica efetiva e eficaz recompe o seu contedo e refaz todos os sinais balizadores do constitucionalismo. No h, assim, a superao de uma por outra "gerao de direitos", mas sim uma soma de liberdades conquistadas e que se amalgamam compondo um novo subsistema constitucional de direitos fundamentais e um novo sistema jurdico informado por eles, que lhe so o embasamento essencial. De outra parte, mesmo quando se assevera que os direitos fundamentais de "primeira gerao" eram formais e que o Estado organizado sob tal base individualista no se dotava de instrumentos suficientes para lhes dar eficcia, de se atentar a que a dico jurdico-normativa no se fazia, ento como, de resto, no se faz hoje , desnecessria, sequer que haja contrariedade ou alternatividade entre a retrica jurdico-normativa e a prtica que se impe para a concretizao dos direitos fundamentais. Se no houver a expresso jurdico-constitucional dos direitos fundamentais, a sua busca, concretamente e em caso de violao, faz-se difcil

e, no poucas vezes, quase impossvel. Os instrumentos jurdicos e mesmo a instrumentalizao social que lhes assegura a eficcia pem-se a partir da expresso normativa, pelo que se no suficiente a sua elaborao normativa, ela imprescindvel. Se, a partir dos anos 30, principalmente, e com as feridas abertas pelos horrores da Segunda Guerra Mundial, os homens souberam certo definir os direitos sociais de segunda gerao em documentos jurdico-normativos, no certo que se lhes tenham conferido, com igual presteza e desembarao, a normatividade, sem a qual a sua eficcia resultava comprometida. Cunhou-se, ento, a teoria da "norma programtica", espcie de limbo constitucional, no qual permaneciam as normas contenedoras de expresses de direitos para as quais a impositividade do cumprimento ficava a depender de providncias supervenientes, sem limite temporal para a sua adoo e sem sano especfica para o seu no-cumprimento. Cassava-se, por aquela teoria, a palavra de ordem pela conquista de direitos fundamentais: contemplados, tinha-se-os como conquistados, cessada, pois, a luta; sem eficcia plena, tinha-se-os como inaplicveis at que se adotassem as medidas em cujos termos se conteriam a sua eficcia: estas, contudo, no vinham. Os direitos sociais de segunda gerao passam a ser instrumentalizados constitucionalmente e tornam-se justiciveis com as novas Constituies, adotadas em perodos mais recentes (e quase trs quartos daquelas que hoje vigoram no mundo datam do perodo ps-68), fase considerada como uma etapa complementar necessria de sua conquista efetiva.

3.3 Se a liberdade (especialmente a individual) marcou o primeiro momento histrico moderno da conquista dos direitos fundamentais (dominando a prpria concepo dos direitos de primeira gerao) e a igualdade jurdica fecundou a segunda etapa (direitos de segunda gerao), coube ao terceiro mote da trilogia revolucionria setecentista, refeito e rebatizado, assinalar a conquista dos direitos denominados de "terceira gerao": a solidariedade social juridicamente concebida e exigida colore o constitucionalismo e tinge com novas tintas o princpio da dignidade humana. Agora, no mais apenas o homem e o Estado, ou o homem e o outro, mas, principalmente, o homem com o outro. Como direitos fundamentais da solidariedade social constitucionalmente positivada foram reconhecidos o direito ao desenvolvimento, paz, ao meio ambiente saudvel, informao e comunicao e ao patrimnio comum da humanidade. Reivindicados sob o influxo de uma nova ordem mundial, na qual pobres e ricos, homens ou Estados, possam ter acesso e gozo aos direitos fundamentais que lhes assegurem a condio mnima qual j chegaram algumas sociedades, muitas vezes s custas dos bens jurdicos de outras, foram aqueles direitos contemplados, inicialmente, na Carta de Banjul, nos termos seguintes: Art. 22.1 1. Todos os povos tm direito ao desenvolvimento econmico, social e cultural, compatvel com o respeito adequado de sua liberdade e de sua identidade, assim como a uma participao igual no patrimnio comum da humanidade. 2. Os Estados so obrigados a garantir, individual ou coletivamente, o exerccio do direito ao desenvolvimento. Art. 23.1 Todos os povos tm direito paz nacional e internacional. As relaes entre os Estados so presididos

pelos princpios da solidariedade e amizade que foram afirmados implicitamente pela Carta da ONU. Art. 24 Todos os povos tm direito a um meio ambiente que seja ao mesmo tempo satisfatrio e favorvel para o seu desenvolvimento.5

O surgimento desses direitos fundamentais de terceira gerao pe-se em geral como o fruto de uma reivindicao social para a justia social universal e no uma condio jurdica privilegiadora de alguns povos e de algumas poucas sociedades e pessoas e como uma resposta ao fenmeno da liberties pollution referida pela teoria anglo-saxnica como a eroso e degradao que atinge os direitos fundamentais ante determinados usos das novas tecnologias.6

No Brasil, Paulo Bonavides faz, hoje, a defesa da existncia de uma quarta gerao de direitos, que compreenderia, segundo ele, o direito democracia, o direito informao e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretizao da sociedade aberta do futuro, em sua dimenso de mxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relaes de convivncia.7 4 Constitucionalismo, globalizao, neoliberalismo e direitos humanos Toma ares de verdade ou de uma ideologia sem ideais e com poucas idias que no a do lucro a qualquer custo uma onda que se propaga sob o ttulo de "globalizao" e de "neoliberalismo", a dominar comportamentos estatais e a propor modelos de governos e de atuaes governamentais e sociais muito pouco afeitas e quase nada asseguradoras dos direitos cujas conquistas se fizeram ao longo do ltimo sculo e meio.

Nem a globalizao, nem o neoliberalismo tm algo de neo. A globalizao o mesmo imperialismo que desde os romanos intentam as sociedades dotados de maior poder de insero e domnio sobre os outros, dos quais se pretendem aproveitar para o seu prprio e exclusivo benefcio. O imperialismo colonizou, matou, trucidou e cometeu genocdio de ndios nos continentes ditos "colonizados", e mata agora com novas armas. O selvagem de ontem o excludo social de hoje. O liberalismo mais no pretende que retomar a frmula velha e que se acreditava superada do laissez faire, laissez passer... O mundo, j se viu antes, no vai por ele mesmo. Os mais frgeis, especialmente os mais fracos economicamente, tornam-se os neoescravos, sem direitos e sem razes que a razo do mais forte no possa comprar segundo a percentagem de lucro que lhe aprouver. Na base de todo esse movimento tem-se o momento de um mundo sem ideologias que se contritam para da fazer nascer um consenso baseado num mnimo de alteridade e de interesses que atendam os dois lados. O mundo hoje tem apenas um lado: o do capital, o do lucro, o do ganho. O utilitarismo lucrativo passou a ser a nica "tica" prezada e reverenciada. De escravo a servo, de servo a sdito, de sdito a cidado, de cidado a ... consumidor. Quem no consome no tem direitos, porque deixa de ser til a um sistema em que a utilidade voltada ao lucro, e nenhuma outra coisa, o critrio "moral" aceitvel. O no-consumidor um excludo. E o excludo tem direitos? Se ele est fora da sociedade a excluso apelida-se "social" e o direito , essencialmente, um conjunto de normas que se pe para a vida em sociedade, quem dela se ausenta do direito se aparta? Quer-se inaugurar

(ou j se iniciou) um processo de escravizao branca de populaes inteiras s quais se nega mesmo o direito de existir na sociedade, pois a esta no seria til. As legies que perambulam desempregadas, famintas e envergonhadas de sua no-utilidade trazem o estigma dos que no se respeitam porque o respeito prprio do homem digno e a sua condio os projeta em situao de indignidade e de carncia de qualquer direito. Minguam-se os servios que competiam at h pouco aos Estados exatamente para que as condies materiais de todos os homens fossem obedecidas: fala-se em Estado Mnimo. A desregulamentao o slogando momento. A desconstitucionalizao dos direitos fundamentais, um de seus consectrios necessrios. A desumanizao das relaes sociais, uma de suas conseqncias inafastveis. A "desjusticializao" uma de suas mais nefastas concluses. O Estado do Bem-Estar e da Justia Social fez-se intervencionista na sociedade e na economia nela praticada para que os direitos sociais e coletivos fossem universalmente assegurados. O Estado fez-se empresrio no perodo do psguerra. Nestas ltimas duas dcadas, tem-se a revanche do empresrio contra o Estado. Do Estado absentesta ao Estado empresrio pretendem, muitos, agora, passar do "Estado empresrio" ao "Empresrio Estado". Afinal, os governantes dependem dele para o financiamento de suas campanhas: o resgate desta nota promissria paga em empregos retirados e a tecnologia no mais permitir retornar. Mas como o trabalho esteve na base das conquistas dos direitos fundamentais de segunda gerao e a sua ausncia no atinge a categoria daqueles que elaboram e positivam as

normas jurdicas, o trabalho continua a ser pensado como algo que voltar em outra onda, mesmo se o seu objeto se perdeu e se sabe bem, como referido por Eric Hobsbawn, que se est a conhecer um perodo de atividades que deixaram de ser trabalho dos homens e os empregos nos quais eles eram desenvolvidos no mais voltaro. E os direitos dos desempregados-excludos sociais voltaro? E o Estado que se pretende "moderno e modesto" prestar algum dia, verdadeiramente, ateno queles que vivem nas sombras dos viadutos como nas sombras dos direitos? A quem interessa, nesta perversa colocao de uma globalizao de ganhos e de um liberalismo to velho e desumano, o retorno a sociedades dessas hordas humanas para as quais os direitos humanos deixaram de valer, at porque rebaixados no desnvel dos que no so humanos teis e lucrativos? E se as sombras que escondem os vos das pontes e os guetos das favelas no se mostram, e se de tanto no se ver, nem se pensar estas massas desaparecerem com o amanhecer como as prprias sombras que os contm? E se a insensibilidade banaliza a crueldade da situao social dessas pessoas desvestidas no apenas de roupas mas, principalmente, de direitos, como considerar a Constituio a lei que permite a libertao de todos pela garantia das liberdades? E como produzir um constitucionalismo que obrigue o holofote projetado sob os pilares soturnos nos quais no mais se recolhem ratos, mas homens? Apenas a adeso plena dos cidados de todos os cantos, recantos, encantos e desencantos do mundo ser capaz de assegurar que a Constituio faa-se viva nos povos e os direitos humanos ativos para todos os homens.

Da porque o constitucionalismo contribui decisivamente para a universalizao dos direitos fundamentais para tanto contando com a internacionalizao do direito que contemple e garanta os direitos humanos. A integrao entre os sistemas constitucionais e o direito internacional faz-se inexorvel nessa fase, particularmente para o aperfeioamento e garantia eficaz e eficiente dos direitos fundamentais. A nica universalizao possvel de ser pensada e posta conquista, a nica mundializao buscada como tica e necessria no atual estgio da humanidade no , primeiramente, a econmica, que produz novos feudos e velhos vassalos, novos senhores para os mesmos e velhos escravos, mas a dos direitos fundamentais, que produz a solidariedade jurdica e faz espraiar a humanidade sobre todos os pontos do planeta. Todos os sinos repicam por ti. No perguntes por quem eles dobram... De outra parte, a "tica" do lucro e do abandono humano no tica, imoralidade de luxo; no direito, arbtrio emoldurado pelo discurso estril de uma razo sem humanidade. Por isso, no apenas se deseja que as conquistas se projetem no Direito Internacional para que estes alicercem, fortaleam e protejam os direitos humanos nos diferentes Estados, mas, igualmente, deseja-se que as conquistas cujos povos dos diferentes Estados realizem no espao regional reflitam-se no cenrio internacional, de tal modo que haja uma conjugao de valores, princpios e experincias jurdicas que se complementem e se aprofundem para a melhoria do ser humano em qualquer parte do planeta.

II O CONSTITUCIONALISMO E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO BRASIL O Brasil tem to boa tradio de textos constitucionais de qualidade elevada e de retrica avanada quanto nenhuma tradio de prticas constitucionais coerentes com o quanto posto nas normas jurdicas. Primeiro Estado a inserir em seu corpo permanente de normas uma declarao de direitos individuais, como antes lembrado, foi um dos ltimos Estados do mundo a extinguir de sua prtica a terrvel experincia da escravido. A liberdade preconizada e garantida no caputdo art. 179, da Carta de Lei de 25 de maro de 1824, no era universal e nem se baseava na natureza, a despeito do quanto sobre o dispositivo se expendia. Fosse tanto verdade e no seria possvel haver lgica na manuteno de escravos, a sustentarem uma economia que se baseava exatamente em sua fora de trabalho. Todavia, o texto constitucional imperial ento adotado no Brasil chegava a conter normas que no eram prprias do modelo liberal, seno que prenunciavam e mesmo antecipavam o que somente um sculo depois voltaria a freqentar os direitos fundamentais constitucionais assegurados sob o ttulo de direitos sociais de segunda gerao, a saber, os direitos sociais especialmente aqueles relativos educao.8 A Constituio Republicana de 1891 estabeleceu, em ttulo relativo aos "cidados brasileiros", uma "declarao de direitos", que estendia por trinta e um incisos a garantia da "inviolabilidade dos direitos concernentes liberdade, segurana individual e propriedade".

No tratamento oferecido matria em 1891, estendem-se os direitos fundamentais quanto aos sujeitos: enquanto na Carta Imperial a inviolabilidade dos direitos civis e polticos dos cidados brasileirosera declarada e assegurada, na Constituio Republicana a declarao de direitos assegurava a brasileiros e estrangeiros residentes no pas aquela mesma inviolabilidade. Mas enquanto a primeira referia-se, no ttulo, expressamente s garantias dos direitos civis e polticos dos cidados brasileiros, esta mencionava apenas direitos. Nesse rol de direitos, a igualdade "perante a lei" foi contemplada e os demais direitos, mesmo aqueles que se continham no rol da Carta Monrquica decada com o advento da nova forma de governo e da nova etapa constitucional, foram reelaborados, sob a tica com que os vislumbrava o grande Rui Barbosa. Mas foi o maior advogado brasileiro de todos os tempos o principal esteio na luta pela sua eficcia, pois menos de um ano aps a promulgao da Lei Magna de 1891 reinstalava-se no Brasil o autoritarismo, inimigo de todas as liberdades e desafeto de todos os direitos, mormente aqueles rotulados de "fundamentais" e que asseguram as expresses de divergncias e de anteparo ao arbitrria do Poder. Dos questionados atos do Marechal Deodoro, ainda em novembro de 1891, ditadura de Floriano Peixoto, da campanha civilista de Rui, em 1910, at o quatrinio em estado de stio determinado por Arthur Bernardes, a primeira fase constitucional (ou muito pouco constitucional e quase nada republicana) da nomeada Repblica brasileira viu-se o coronelismo florescer, as eleies se viciarem sob o cabresto

dos donos dos votos antecipados e cerceados, a corrupo prevalecer e as liberdades pblicas depauperarem. A revoluo de 30 fez-se em nome da reconstitucionalizao do Estado brasileiro. A chegada de Vargas ao poder teve como saldo imediato quatro anos de desconstitucionalizao do pas, o que prevaleceu pelo perodo de quatro anos. O advento da Constituio de 1934 aps uma Revoluo que teve o ttulo de "constitucionalista" (a de 1932) trouxe um novo fundamento e um novo desenho constitucional na matria dos direitos fundamentais: o ttulo III "Da Declarao de Direitos" separava o captulo I, "Dos Direitos Polticos", do captulo II, "Dos Direitos e Garantias Individuais". A distino entre "direitos" e "garantias" que Rui Barbosa elaborara, ainda sob a gide da Constituio que se elaborara sob a sua inspirao e com o seu trabalho, passava, ento, a titular o captulo especfico da matria.9 O art. 113 desdobra-se em 38 incisos, acrescentando-se, assim, muitos queles inicialmente concebidos quando do advento da primeira Carta Magna brasileira, a do Imprio Monrquico. Naquele art. 113, da Constituio de 1934, a igualdade jurdica sobrepunha-se, na topografia constitucional, definio da juridicidade, nico princpio legitimador da obrigao restritiva da liberdade. A propriedade passa a ser um direito garantido desde que no seja exercido contra o interesse social ou coletivo, na forma que a lei determinar(art. 113, inciso 17). Criam-se novas garantias constitucionais, das quais a mais celebrada e a que melhor se converte em instrumento dotado

de confiana e, portanto, de efetividade social a do mandado de segurana. Mais ainda, o art. 114 desse documento fundamental expressa que a especificao dos direitos e garantias expressos nesta Constituio no exclui outros, resultantes do regime dos princpios que ela adota. A Constituio de 1934 guarda a condio de ter sido a primeira a cuidar de direitos sociais: os direitos dos trabalhadores, dos servidores pblicos (trabalhadores do setor pblico) e a sua situao em face de uma ordem econmica definida vem traada em termos especficos (Ttulo IV "Da Ordem Econmica e social", Ttulo V "Da Famlia, da Educao e da Cultura" e Ttulo VII "Dos Funcionrios Pblicos"). Uma Constituio assim democrtica e protetora de direitos fundamentais no encontrou guarida nos palcios, acostumados a escrever em papel sem pauta, como afirmou expressamente Getlio Vargas ao receber o primeiro exemplar das mos de Oswaldo Aranha, presidente da Assemblia Constituinte. Em 1936 se anunciava a morte dessa Constituio, que foi enterrada, formalmente, em 10 de novembro de 1937, com o golpe de Vargas e a implantao do Estado Novo. Outorgada nessa data uma nova Carta, a ela no se dedica qualquer palavra porque ditadura no rima com direito, menos ainda com Constituio. Os direitos fundamentais teriam de ser ento conhecidos a partir das Memrias de Crcerede Gracialiano Ramos, no em livros de Teoria do Direito, porque at a teoria podia acabar em priso naquele perodo.

A Constituio de 1946 busca o resgate do constitucionalismo perdido em 37, tentando recompor, no que concerne aos direitos fundamentais, o modelo de subsistema acolhido na Constituio de 1934. Sob a gide desta Lei Fundamental, o Brasil viveu talvez um de seus nicos perodos de ensaio de uma democracia. Mesmo com as turbulncias sociais, polticas e econmicas que dominaram a dcada de 50, a sociedade floresceu cultural, social e juridicamente nessa fase. O golpe de estado de 1964 veio liquidar a fase constitucional estabelecida naquela ocasio e determinar o comprometimento gravssimo dos direitos humanos. Os direitos fundamentais no gozavam desta condio que os nomeia sequer no texto, pois o advento de documentos normativos como os Atos Institucionais, fica na memria o de n. 5, que suspende os direitos e garantias individuais e torna todos vulnerveis ao do Estado, o Decreto n. 477, que faz com estudantes armados de suas idias possam ser considerados subversivos, o processo um luxo e a vida um desafio dirio para cada um e uma peleja sem garantia para todos, no se h de falar em Estado de Direito, menos ainda de Democracia, muito menos de Constituio e direitos fundamentais. A Constituio de 1988 inaugura nova fase do constituiconalismo brasileiro e no apenas nova como "mais uma", mas principalmente uma fase que no encontra paralelo no quanto anteriormente experimentado social e politicamente. Como acentuado por Ulysses Guimares, diferentemente das sete Constituies anteriores, comea com o homem. Graficamente testemunha a primazia do homem, que foi

escrita para o homem, que o homem seu fim e sua esperana. a Constituio Cidad. ... O homem o problema da sociedade brasileira: sem salrio, analfabeto, sem casa, portanto sem cidadania. Os direitos e garantias fundamentais compem o ttulo II da Constituio da Repblica brasileira de 1988, subseqente apenas ao ttulo que traa os princpios fundamentais do prprio Estado. Esse ttulo divide-se em cinco captulos, dos quais apenas o ltimo, a tratar dos partidos polticos, no se refere diretamente ao homem, mas a um dos caminhos a ser por ele utilizado para o exerccio de sua cidadania. O captulo I daquele ttulo tambm inova o constitucionalismo brasileiro ao cuidar dos direitos e deveres individuais e coletivos. Crescem esses direitos e deveres, fundamento da organizao social e estrutura do Estado brasileiro, e inova-se a matria referente s garantias constitucionais fundamentais, renovando-se o mandado de segurana, introduzindo-se o habeas data e o mandado de injuno, reestruturando-se a ao popular e reforando-se o direito de petio aos poderes pblicos. A Constituio tem um captulo especfico sobre os "direitos sociais" definidos como a educao, a sade, o trabalho, o lazer, a segurana, a previdncia social, a proteo maternidade e infncia, a assistncia aos desamparados, tudo em forma estabelecida pela prpria Lei Fundamental (art. 6 e seguintes). Com um documento fundamental do Direito estabelecendo um sistema to completo de direitos e garantias do homem e do cidado de se perguntar como vo esses direitos fundamentais no Brasil.

No vo bem. Nada a ver, contudo, com a Constituio. Afinal, Constituio no faz milagres, j repeti antes. Lei alguma os faz. Milagre faz o cidado ativo e participativo a torn-la viva e respeitada. O Brasil no carece de Constituio, mas tem enorme carncia de cidadania. O poder no Brasil sempre se estruturou margem do cidado. Na verdade, no que o povo seja marginal ao poder estatal brasileiro. Esse que nunca quis "se misturar" com o povo e faz a sua prpria histria margem daquele. Planos, projetos, rgos estatais, nada funciona em termos de direitos fundamentais enquanto a adeso do povo ao projeto poltico cidado, respeitador e respeitante aos direitos fundamentais dos brasileiros, de todos os brasileiros. O poder pblico no Brasil tem sido, tradicional e infelizmente, muito pouco pblico, muito pouco do povo. Ele exercido no pelo povo ou em seu nome e interesse, mas por uns poucos grupos que o dominam desde os primrdios, em seu nome e em seu prprio e nico interesse. Desde o "descobrimento" de um Brasil que no estava, alis, "encoberto", mas colonizado por um poder exercido no interesse do colonizador, cujo grupo compunha o ncleo do comando que os portes dos palcios no sabem daqueles que no tem teto. Quem joga caviar fora no pode imaginar a fome dos que no tm sequer um naco de po velho para se alimentar. Quem pisa em tapetes persas custa a saber da inglria dos que lutam por um pedao de cho onde pisar sem medo e sem se esconder. O fantstico descompasso entre uma Constituio contra a qual alguns insurgem ao argumento exatamente de que "reconhece e assegura" direitos "demais" e uma sociedade na qual se reconhecem violaes constantes e gravssimas dos

direitos humanos tem causas diversas e uma histria comum: a histria de um Estado no qual o autoritarismo dominou e continua a porejar nas mais diferentes estruturas do poder. Do "guarda da esquina" ao ocupante do mais alto cargo poltico da organizao, a distncia do cidado comum e a condio de um poder sem controle e acima de tudo inclusive do Direito todos os quadrantes da organizao social e poltica brasileira so tocados por um arbtrio que no conhece ou faz por desconhecer os limites negativos e positivos que os direitos fundamentais do homem impem. Mudam-se as leis, mas quem as cumprem tm nas veias de seu prprio corpo e dos corpos e rgos de que participam o mesmo sangue com que se alimentavam antes do seu advento. As estruturas autoritrias no mudam. Sem o conhecimento e a certeza de seus direitos, as pessoas especialmente aquelas de classes sociais mais pobres desconfiam mais que confiam nos seus direitos fundamentais, os quais, alis, consideram mais favor quando se lhes reconhecem que prerrogativas que lhes so devidas. A lerdeza das instituies e dos institutos em assegurar ao cidado punio dos que ameaam ou violam direitos torna-o perigosamente cmplice pelo silncio com que prefere se haver quanto atingido. Nos ltimos dez anos, algumas iniciativas governamentais deflagraram movimentos e adotaram medidas voltadas para a tutela e garantia dos direitos fundamentais. As Organizaes No-Governamentais ONGs voltadas aos direitos humanos tm contribudo para a tomada de conscincia de direitos. No entanto, a insegurana que domina a sociedade brasileira quanto ao que lhe fundamental em termos de direitos faz

refletir mais e mais sobre o diagnstico e a busca de um prognstico para os gravssimos problemas que atolam os homens desta sociedade numa desigualdade de direitos e em direitos e numa carncia de dignidade que o pe abaixo da linha dos direitos de primeira gerao. Em So Paulo, nos ltimos anos, h uma mdia de quinze homicdios por ms praticados, em grande parte, pelo prprio aparato policial, organizado para proteger e no para matar. O Carandiru no est enterrado. Chico Mendes ainda no foi suficientemente velado. A Candelria rf de suas crianas reza pelo presente e pelo passado. Cumpre lutar por um outro futuro. Quase meio milho de crianas brasileiras (entre cinco e nove anos de idade) so expostas ao trabalho escravo, enquanto seus pais sequer encontram trabalho e persistam escravos de um sistema sem leis a ampar-los e sem que aquelas que existem lhes garanta a dignidade que afirmam. A Constituio precisa ser promulgada todos os dias em todos os pontos do pas. Ela apenas comeou no dia 05 de outubro de 1988, mas compete a cada cidado faz-la vigorar cada dia de cada ano para que os direitos sejam conquistados todos os minutos. Cultivar o direito especialmente aqueles considerados fundamentais aos homens como cultivar a prpria natureza: qualquer descaso ou negligncia pode ser fatal. III A EFICCIA JURDICA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS DE DIREITOS FUNDAMENTAIS As normas constitucionais de direitos fundamentais so, nos expressos termos do Direito positivo constitucional brasileiro, de aplicao imediata. O que poderia, entretanto, ensejar a certeza de que so eficazes em sua plenitude no pode ser to singelamente posto, em face dos ditames do prprio texto

constitucional brasileiro por conta da formulao em que se tm esses direitos. Anote-se, pois, primeiramente, que a aplicao imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais, expressa no pargrafo 1do art. 5, da Constituio da Repblica do Brasil, significa que a sua exigibilidade no pode diferir por alegaes de condicionamentos a situaes adotveis apenas mediatamente. Todavia, a produo dos efeitos prprios e plenos das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais pode apresentar dificuldades em razo da dependncia de esclarecimento ou integrao da mesma por norma infraconstitucional assim avocada pelo prprio constituinte (so mltiplos os exemplos havidos nesse modelo no texto constitucional, especialmente no que se refere aos direitos fundamentais sociais cf. nesse sentido o art. 7,da Constituio). A soluo parece vir, independentemente de qualquer indagao ou argumentao filosfica ou terica, no prprio texto constitucional, no qual se incluiu uma nova garantia processual fundamental, qual seja, o mandado de injuno. Esse instrumento processual constitucional tem como objeto a falta de norma regulamentadora (que) torne invivel o exerccio dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes nacionalidade, soberania e cidadania (art. 5,inciso LXXI). A Constituio lei e lei feita para se aplicar, para se respeitar, para se cumprir, imponha ela uma absteno ou um comportamento comissivo do Estado ou mesmo de outra pessoa. Constituio no sugere, determina, e o que ela

ordena para se cumprir, mais ainda no que se refere a condutas das quais dependam a viabilidade do exerccio de direitos fundamentais por ela declarados e assegurados. Como a sua aplicao imediata, inexistente lei infraconstitucional pela qual aguarde o titular do direito garantido constitucionalmente sem que ela seja elaborada e trace os termos integradores do direito assegurado, impe-se o uso do instrumento constitucional criado exatamente para que os direitos e liberdades constitucionais e as prerrogativas inerentes nacionalidade, soberania e cidadania no fiquem baldos de certeza e viabilidade. Assim, a soluo para que os direitos e liberdades constitucionais e as prerrogativas arroladas acima tenham eficcia plena oferecida pela prpria Constituio. No se quer, por certo, que o juiz competente para conhecer e julgar o mandado de injuno substitua o legislador. O que se quer, evidncia, que o cidado no tenha frustrado o seu direito por ardil institucional havido na inrcia de rgos pblicos competentes para agir e que, no o fazendo, falseiam e agridem a Constituio. O legislador no ter, por fora de mandado de injuno impetrado e concedido, minguada ou comprometida a sua competncia, que se mantm ntegra e de exerccio obrigatrio. Mas nem por isso se elimina o direito constitucionalmente assegurado a seu titular, enquanto o dever que nela se contm no atendido a contento para a produo dos efeitos prprios e plenos da norma constitucional. Nem se poderia pensar de outra forma, especialmente se o objetivo do Direito resolver as questes que nascem na sociedade, mormente em razo de sua aplicao. Teorias no garantem por si s os direitos. Teorias que induzem a no-

aplicao da Constituio (ou de qualquer norma jurdica), mais atrapalham que ajudam o alcance dos fins que nele se hospedam. O constituinte brasileiro deu a soluo justa e equilibrada para a questo da eficcia jurdica dos direitos fundamentais. Aos poderes constitudos incumbe cumpri-la e, se for o caso, propor o seu aperfeioamento. Julgar a norma constitucional ou indispor de vontade poltica para faz-lo adversar a prpria Constituio, pelo que se deve singelamente responsabilizar quem o fizer. Note-se que sendo o Estado um dos maiores agressores aos direitos fundamentais, haveria uma antinomia em deixar que apenas ele definisse quando e como cumprir as normas constitucionais nas quais eles so declarados e segundo as quais tm de ser assegurados. Vem, ento, a plo cuidar-se de um dos pontos proeminentes da eficcia jurdica das normas constitucionais de direitos fundamentais: o papel que desempenha nesse tema o Poder Judicirio como "guarda da Constituio". Os sistemas constitucionais deste final de sculo encarecem o papel do Poder Judicirio como aquele que se dota de melhores condies para assegurar a eficcia jurdica dos direitos fundamentais, especialmente quando se apresentar quadro de ameaa ou violao dos mesmos. A jurisdio , em si, um direito fundamental expresso tanto no plano internacional (art. 10, da Declarao dos Direitos do Homem, da ONU, de 1948) quanto no plano interno dos diferentes Estados (art. 5,inciso XXXV, da Constituio da Repblica do Brasil). Se no houver jurisdio constitucional eficiente e mesmo, e cada vez mais, jurisdio internacional efetiva, todos os

outros direitos fundamentais tornam-se vulnerveis e, grandemente, dependentes das eventuais condies das sociedades, dos governos e dos governantes. Ento no se tero direitos fundamentais garantidos, mas eventuais situaes polticas experimentadas. O Poder Judicirio passou a desempenhar um papel relevantssimo na garantia efetiva e eficiente dos direitos fundamentais, pois esses diversamente de outros que so havidos nos diferentes sistemas aos particulares no se pe a ressarcimento posterior ou reparao, mas so indisponveis e inadiveis em seu exerccio: garante-se o direito vida ou nada haver, um dia vindouro, a se garantir; garante-se a liberdade, porque se tal segurana no se impuser de pronto estar ela perdida naquele momento e no se lhe poder repor; garante-se a segurana ou a insegurana j se ter instalado no futuro e reparao no reposio de direitos fundamentais. Ao Poder Judicirio cabe, no constitucionalismo contemporneo, a tarefa mais elevada de impedir afrontas e desfazer, com eficcia e eficincia imprescindveis, os desmandos que acometem, ameaam e agridem os direitos fundamentais. Por isso compete a ele fazer-se pronto na dimenso dessa competncia, sem o exerccio da qual os direitos fundamentais so atingidos irremediavelmente e as agresses lesam todo o sistema jurdico, colocando abaixo a prpria jurisdio como um direito. No exerccio dessa competncia, ademais, compete ao Poder Judicirio fazer-se alerta para interpretar os direitos fundamentais considerando o texto e o contexto constitucional, a sede e a afluncia dos direitos sobre os quais

se questionam, estender-se to amplamente quanto seja necessrio e possvel para que ele realize uma tarefa de Justia social e no de injustias menores. Ao Judicirio cabe a tarefa de oferecer respostas concretas e engajadas s questes que lhe so postas em condies histricas definidas e experimentadas. No h de prender-se mais s elaboraes filosficas e retricas que s situaes determinadas e determinantes ocorridas num contexto social especfico e apurvel pelos juzes que vivem o seu tempo de Direito com o Direito do seu tempo. IV A INSTRUMENTALIZAO PARA A EFICCIA JURDICA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS DE DIREITOS FUNDAMENTAIS A Constituio inclui em seu sistema instrumentos garantidores das instituies que conduzem ao aperfeioamento dos direitos que so por ela declarados, constitudos e cuja inviolabilidade ela assegura. As normas garantidoras de uma Constituio estendem-se por todo o sistema normativo e nem sempre assim se rotulam, porque, muitas vezes, elas se contm na prpria base da organizao e em seus princpios que se expressam ou ficam implcitos no ordenamento. As garantias constitucionais dos direitos fundamentais esto, pois, a) no conjunto de instituies concebidas no sistema para realizar as condies scio-econmicas e polticas aptas ao exerccio daqueles direitos; b) no conjunto de instituies que ordenam o poder e definem o seu limite a fim de que eles sejam resguardados de desbordamentos praticados pelos detentores dos cargos que o compe; ou c) no conjunto de procedimentos e institutos concebidos para que, em casos especficos, violaes por absteno ou por cometimento

ocorridas contra aqueles direitos tenham os seus titulares vias prprias, constitucionalmente estabelecidas, para a pronta restaurao do seu respeito.10 a) As garantias constitucionais dos direitos fundamentais contidas nas instituies que conformam a organizao scio-econmica, poltica e cultural so postas quer nos princpios formulados constitucionalmente (arts. 1, 3, 4, 170, dentre outros, da Constituio da Repblica Brasileira), quer nos princpios que organizam o prprio poder e assim conformam uma sociedade democrtica e o modelo de democracia social. b) As garantias constitucionais dos direitos fundamentais que ordenam o poder e definem os limites do seu exerccio para a realizao dos princpios democrticos so as que se contm, no sistema positivo brasileiro, por exemplo, no pargrafo nico do art. 1, no art. 2, no art. 37, nos arts. 85, 93 e segs., dentre outros. c) As garantias constitucionais contidas em procedimentos especficos e institutos concebidos para assegurar, em casos concretos e quando houver ameaa ou leso aos direitos fundamentais, que se restabeleam,

plena e eficazmente, os direitos comprometidos. So dessa natureza o princpio da juridicidade que informa, limita e legitima todos os atos do Estado; o da jurisdio, ele mesmo um dos direitos fundamentais por excelncia, pelo exerccio garantido do qual se manifestam outros como o princpio da segurana jurdica e de cuja eficincia depende, grandemente, o da garantia das liberdades, os que processualizam institutos voltados garantia especfica dos direitos fundamentais, tais como, o habeas corpus, o mandado de segurana e o mandado de injuno, o habeas data e a ao popular e o direito de petio. Essas garantias so postas como instrumentos especficos, tpicos do sistema constitucional brasileiro, assecuratrios do que apregoado como direito fundamental mesmo no plano universal (o acesso jurisdio imparcial e eficiente tem, no princpio do devido processo legal e nos institutos dos mandados e dos demais instrumentos processuais constitucionais a sua especificao no Direito positivo brasileiro, por exemplo).

Essas garantias instrumentais ou processuais especficas de cada sistema jurdico tm sido reelaboradas para se adensarem no contedo permissivo de preveno mais que ao mero restabelecimento ou restaurao dos direitos violados. que, diversamente do que ocorre com outros direitos ou, principalmente, com outras agresses que ao Direito impende resolver, os direitos fundamentais, pela sua prpria natureza, no podem esperar para um deslinde que somente sobrevenha quando o bem jurdico a vida, a liberdade ou a segurana, por exemplo, seja em suas manifestaes diretas, seja em suas apresentaes mediatas (o trabalhador que no receba o seu salrio e fique sem condies de se alimentar lesado no prprio direito vida digna). Assim, as Constituies, como as normas de Direito Internacional relativas aos direitos fundamentais, enfatizam, na atualidade, a necessidade de se terem resguardados tais direitos no plano mesmo da ameaa. A preveno o melhor cuidado a se tomar, juridicamente, em caso de direitos fundamentais. Quanto mais eficientes forem os sistemas em dotarem os indivduos e as instituies de instrumentos acautelatrios a fim de que ameaas sejam sustadas ou desfeitas antes mesmo da prtica prejudicial aos direitos, tanto melhor atendidos estaro os objetivos dos ordenamentos jurdicos. A Constituio da Repblica brasileira aperfeioou a qualidade dos instrumentos garantidores daqueles direitos ao estabelecer, no art. 5,inciso XXXV, que a lei no poder excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ou ameaa a direitos. A ameaa anteriormente tratamento de nvel infraconstitucional e que se inclua apenas no cuidado legal de alguns institutos passou a compor, no sistema de Direito

positivo brasileiro, o direito jurisdio, que somente pode ser considerada eficiente quando, acionado o Poder Judicirio, no permitir a concretizao da leso de cuja ameaa teve notcia e buscou evitar. Nessa matria deve-se atentar a uma eficincia maior a ser procurada no mbito das instituies internacionais, as quais, at mesmo de maneira justificada, somente podem ser acionadas a posteriori, ou seja, quando as leses aos direitos fundamentais individuais ou coletivos j se concretizaram. Ocorre que, para os lesados, a atuao posterior prtica agressiva j no tem como ser desfeita, mas apenas reparada, o que no o objetivo das garantias aos direitos fundamentais. De outra parte, a universalizao dos direitos fundamentais deve conduzir a uma conjugao melhor das garantias que se adotam nos planos nacionais e internacionais, projetando-se o avano de umas sobre as demais ordens, numa reciprocidade de influncias que deve conduzir a um permanente aperfeioamento em benefcio de todos os sistemas. Importante salientar, contudo, que os sistemas de Direito Constitucional positivo no se podem despojar de garantias constitucionais instrumentalizadoras da atuao jurdica dos indivduos. Os direitos fundamentais pem-se no dia a dia das pessoas e delas no podem, ento, estar distantes aqueles meios pelo uso dos quais adversam e questionam as ameaas e leses. V A INSTRUMENTALIZAO PARA A EFICCIA SOCIAL DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

A efetividade ou a produo de efeitos sociais das normas jurdicas depende, fundamentalmente, da atuao dos cidados. J no h como cuidar de cada gerao de direitos fundamentais isoladamente, porque a certeza e eficcia de uns depende da eficcia dos demais. De uma maneira muito particular, a eficcia social desses direitos depende da atuao dos cidados. A cidadania foi erigida como princpio ao lado da dignidade da pessoa humana (art. 1o, II e III, da Constituio da Repblica brasileira). Mas a cidadania que se irrompe nestes ltimos suspiros de sculo XX no tem o mesmo sentido que ostentou anteriormente. Ela, agora, reporta-se ao princpio da solidariedade e passa a se constituir num direito-dever do homem para si mesmo e para o outro. Sem o conhecimento dos direitos fundamentais pelos cidados e o seu exerccio por eles, a zelar pelo seu patrimnio jurdico e pelo patrimnio de todos, no h como se dotar de eficcia social aquele elenco de direitos. Leciona Luo que slo cuando los derechos humanos se hallan inscritos en la consciencia cvica de los hombres y de los pueblos actun como instancias para la conducta a las que se puede recurir. Las normas, las instituciones y los jueces son condiciones necesarias, pero no suficientes, para el efectivo disfrute de las libertades. Esa necesidad de adhesin social es tambin del todo predicable respecto al constitucionalismo.11 Mais que a "adeso social", incumbe ao cidado o papel de agente promotor da eficcia social dos direitos fundamentais, a fim de que todos possam contar, efetivamente, com eles.

Para tanto, no apenas cada cidado isoladamente, mas a organizao dos cidados na sociedade podem formular propostas novas para o exerccio do princpio da solidariedade social. A f na "comunho dos santos", que ainda me domina, levame a acreditar que duas condies se impem para que a cidadania se exera no egoisticamente, mas solidariamente por e para todos: a partilha poltica do conhecimento dos direitos fundamentais, nessa mesma condio essencial e de faculdade que assegurada a cada um e a todos. Ao cidado deve-se toda a educao, especialmente aquela que concerne ao seu cabedal de bens jurdicos que o dignifica e o faz livre; educado na matria dos direitos fundamentais a ele compete repartir a sua certeza dos direitos e a sua esperana no outro com todos; a organizao social dos cidados domina todas as realizaes efetivas e legtimas, uma vez que daquela organizao podem nascer as grandes transformaes polticas, se ela fizer da participao poltica efetiva um dever consigo mesma e com os outros. Quanto educao, no nova a crena de que esse um direito sem cujo exerccio todos os demais remanescero como se fossem meras concesses ou exerccios acanhados numa sociedade poltica a que aportamos como se fora por favor, e nela nos mantemos como estrangeiros da prpria terra. A Victor Hugo coube o brado de que todos os crimes do homem comeam na vagabundagem da criana. ... O garoto de Paris atual, como antigamente, o povo criana, tendo na frente a ruga do Velho Mundo. uma graa para a nao e, ao mesmo tempo, uma doena; doena que preciso curar. Como? Por meio da luz. A luz d sade. Todas as irradiaes

sociais se projetam da cincia, das letras, das artes e do ensino. Fazei homens, fazei homens! Iluminai-os para que eles vos aqueam. Mais cedo ou mais tarde, estabelecer-se , com a irresistvel autoridade da verdade absoluta, a esplndida questo da instruo universal. Todas as conquistas sublimes so mais ou menos prmios da ousadia. Para que a Revoluo se efetue, no basta que Montesquieu a pressinta, que Diderot a pregue, que Beaumarchais a anuncie, que Condorcet a calcule, que Arouet a prepare, e que Rousseau a premedite; necessrio que Danton a insufle. ... Repitamos o grito: luz! Mas repitamo-lo obstinadamente! Luz! Luz! No so as revolues transfiguraes? Caminhai, filsofos, ensinai, esclarecei, iluminai, pensai alto, falai alto, correi alegres para o sol, confraternizai nas praas pblicas, anunciai as boas novas, prodigalizai o alfabetismo, proclamai os direitos, cantais as Marselhesas. Fazei das idias um turbilho. Essa multido pode ser sublime. Esses ps descalos, esses braos nus, esses farrapos, essas ignorncia, essas abjees e essas trevas podem ser empregados na conquista do ideal. Lanai-a na fornalha, essa vil areia que calcais aos ps, deixai-a fundir a ferver e tornar-se- cristal esplndido: graas a ela que Galileu e Newton descobriram os astros.12 No Brasil, um nico cidado, modelo maior de um santo cvico, traduziu a sua f no homem numa ao cidad e fez do seu gesto de amor ao prximo uma revelao de cidadania a tornar todos e cada um muito mais unido a todos. Betinho deixou de comear o seu dia com o "Padre Nosso" para comear com o "po nosso de cada dia": a sua fome de justia social alimentou milhes de bocas famintas.

At quando ns, profissionais do Direito, permitiremos que a esperana nos direitos e a sua eficcia dependa de leis que no so conhecidas, de discursos que no so ouvidos, especialmente pelos mais necessitados? At quando deixaremos de ser cidados mais comprometidos e devedores sociais que os demais j que dispomos, numa sociedade carente de informaes, de mais dados que os outros? At quando conviveremos conosco sem nos perguntarmos se a nossa dignidade no se casa com a dos outros para ser plena e que, como se descobriu quanto liberdade, somente no encontro com o outro ela se realiza e cada qual se torna mais cidado no enlace das mos? Como a liberdade, que em sua dimenso individual fez-se menos, tambm a dignidade, em sua dimenso particularizada, apequena-se por se esconder do outro, despojado dos outros. No h cidadania sem solidariedade. Mas no h direito da solido e do isolamento. A multiplicao das agresses contra os homens deflagra a mesma multiplicao das reaes. A multiplicao das dores tambm a multiplicao dos sonhos e das esperanas, como lembrado por Paulo Mendes Campos. CONCLUSO Considerando-se a imperiosidade de se adotarem novas medidas para a eficcia dos direitos fundamentais e, ainda, que todas elas devem objetivar uma nova e mais comprometida cidadania, apresento como sugestes para o debate das idias sobre o tema, as seguintes providncias: 1 No plano educacional: a) bsico: a criao de estgios de Direito na rea especfica de Direitos Humanos, subsidiada pela Ordem dos Advogados

do Brasil, pelas suas seces e subseces. Tais estgios seriam desenvolvidos pela participao dos estagirios em servios preventivos (informativos) da comunidade, criandose centros de servios jurdicos de direitos humanos, de atendimento da comunidade, a fim de que essa possa receber o conhecimento sobre os seus direitos para reivindic-los, quando necessrio, bem como a orientao sobre medidas, instrumentos e inclusive formas de se obter, administrativa ou judicialmente, a prestao desses servios. b) graduado: a incluso da disciplina "Direitos Humanos" nos currculos dos Cursos de Direito, em todas as Faculdades de Direito do Brasil, a ser ministrada como disciplina bsica e pr-requisito para o desenvolvimento das disciplinas de formao especfica. c) ps-graduado: a criao da especializao "Direitos Humanos" nos cursos de ps-graduao (mestrado e doutorado), repensando-se a ps-graduao como estudo interdisciplinar, vez que esse tema comporta uma mltipla e necessria abordagem. d) educao assistemtica:a criao de programas na mdia (telecurso etc.), a ser obrigatoriamente prestada por todos os canais de rdio e televiso, em perodo dirio minimamente estabelecido pelo Poder Pblico concedente, de carter informativo sobre direitos humanos. e) elaborao de cartilhas:a elaborao de documentos informativos sobre os direitos fundamentais, os rgos responsveis pela sua promoo e garantia, as formas de acesso a esses rgos e mediante quais instrumentos, tanto para a distribuio populao (especialmente a mais

carente), quanto, num outro nvel mais aprofundado, at mesmo para os estudantes de Direito e de cursos afins. f) Voz do Brasil: no Brasil, o programa produzido pela Radiobrs, "Voz do Brasil", no se faz do povo brasileiro, mas do governo do Brasil. Sem embargo da importncia que atribuo programao (at porque tem carter informativo), penso ser possvel incluir-se, no perodo de durao do mesmo, uma parte dele dedicada voz do povo e para o povo brasileiro, no sentido de dot-lo no apenas de informaes sobre o que tem feito ou vem fazendo ou proclamando aqueles que exercem o poder, mas que se tenha naquela palavra a funo educativa sobre o fundamental ao povo: a educao de sua cidadania pelo conhecimento de seus direitos. Assim, proponho que se estabelea um tempo no programa "Voz do Brasil" para a informao do cidado sobre os seus direitos fundamentais, sendo esse despojado de qualquer propaganda ou promoo, mas to-somente de passagem de dados para o pleno conhecimento daqueles direitos por todos. 2 Especializao da jurisdio: a) Considerando-se a natureza dos Direitos Humanos e as conseqncias gravssimas do seu no-atendimento tempestivo pela jurisdio buscada, sugiro a especializao dos rgos do Poder Judicirio com vistas ao conhecimento e julgamento das aes, nas quais o objeto precpuo seja a alegao de ameaa ou violao dos direitos constitucionais fundamentais. Assim como h rgos de julgamento da Fazenda Pblica, haveria de se ter Varas e Turmas (ou Cmaras) nos tribunais brasileiros, cuja competncia ficaria

adstrita apreciao das causas nas quais se tivesse como objeto de questionamento os direitos fundamentais. b) Ainda nessa matria relativa jurisdio, proponho se inclua nos Regimentos dos Tribunais a preferencialidade da apreciao dos julgamentos das aes nas quais o questionamento seja sobre direitos fundamentais ameaados ou violados. que, nesse caso, o que se busca o pronto restabelecimento do estado de equilbrio jurdico rompido com a ameaa ou leso, no havendo qualquer busca de reparao posterior, que apenas o atestado de que a jurisdio ter falhado e que os direitos tero se comprometido irremediavelmente; afinal, a fome no espera, a falta de sade no engana a morte, a falta de liberdade no se pe em sala de espera. 3 Ouvidor de Direitos Humanos Conquanto j se tenha introduzido em uma ou outra legislao nacional ou local o modelo do ombudsman, certo que o seu desempenho ainda fica aqum da demanda social, vez que os temas so mltiplos e as respostas s indagaes so poucas. Da porque se cogita de criar, no plano nacional, estadual e municipal, a figura do Ouvidor de Direitos Humanos, com competncia especfica para a matria de Direitos Humanos e recebimento das reclamaes e denncias referentes sua violao ou ameaa. Tal figura deveria ser criada como rgo autnomo, vinculado (administrativa, mas no funcionalmente) ao Poder Judicirio, pois qualquer medida repressiva demandaria (como normalmente ocorre) a atuao desse Poder.

Entretanto, a escolha do titular desse rgo (o Ouvidor-geral) teria de ser feita pelo Poder Legislativo, ouvidas as entidades consideradas, pela lei que cuidasse do tema, representativas da sociedade civil e, da lista por elas apresentada, saria, ento, aquele que seria nomeado pelo titular desse Poder, para um mandato certo (definido legalmente) e no renovvel. Como se cuida de rgo, necessrio seria que a titularidade dele fosse unipessoal, sem embargo de se cogitar de um Conselho que atuasse no direcionamento das providncias e condutas a serem observadas no desempenho pleno das atribuies a ele conferidas legalmente. Tal Conselho atuaria, sem qualquer nus financeiro, mas como um munuspblico, por cidados escolhidos pelo Poder Legislativo, e atuaria como auxiliar do Ouvidor de Direitos Humanos. 4 Tribunal Internacional de Direitos Humanos Finalmente, reitero, na esteira de tantos quantos o fizeram antes, a imprescindibilidade de o Estado brasileiro aprovar e participar, efetivamente, do Tribunal Internacional de Direitos Humanos, a fim de que se tenha a eficcia jurdica das garantias desses direitos, para o que se requer o empenho do governo brasileiro. Mais que tudo, e a maior sugesto, que cada um dos mais de cento e cinqenta milhes de brasileiros sejam titulares efetivos dos direitos fundamentais e seja titular comprometido dos deveres fundamentais com os outros. Afinal, no se tem uma primavera para uma nica flor. Se o estio vier ser para todos. NOTAS

1. LYOTARD, Jean Franois. La condition postmoderno. Paris:Minuit, 1972. 2. Nesse sentido a lio de Antonio-Enrique Prez Luo, segundo o qual la posmodernidad constituye un marco convencional de referencia a la irrupcin de un conjunto de signos que entraan una ruptura respecto a los valores culturales de la modernidad. En el mbito jurdico, moral y poltico se repiten com asiduidad las tesis de quienes propugnan abolir los grandes valores ilustrados: racionalidad, universalidad, cosmopolitismo, igualdad, que consideran caducos, y propugnar reemplazarlos por una exaltacin muchas vezes simplificadora y acrtica de la diferencia, la diseminacin, la deconstrucin, as como la vuela a un nacionalismo tribal y excludente. Las normas jurdicas generales y abstractas, corolario de exigencias ticas universales, estn siendo hoy cuestionadas en nombre de las preferencias particularistas fragmentarias; la propia legitimacin tica del Derecho y de la Poltica, basada en principios consensuales universalizables, se considera un ideal vaco y sospechoso. ... Esamos asistiendo, en definitiva, a un nuveno asalto a la teora postuladora de la integracin de la Moral, la Poltica y el Derecho, en la medida en que dicha teora formaba parte del aparato legitimador de los Estados de Derecho. (Derechos Humanos y Constitucionalismo en el tercer milenio. Madrid: Marcial Pons, Ediciones Jurdicas y Sociales, 1996. p. 13) 3. No obstante haja referncia em algumas obras de Direito Constitucional quanto a ter sido a Constituio sua a primeira a integrar-se por normas declaratrias de direitos

fundamentais em seu texto, essa data de 1835, enquanto o texto constitucional do Imprio do Brasil de 1824. 4. BUENO, Jos Antnio Pimenta. Direito Pblico Brasileiro e Anlise da Constituio do Imprio. Rio de Janeiro: Ministrio da Justia e Negcios Interiores, 1958. p. 381. 5. Coube a Karel Vasak, diretor do departamento jurdico da UNESCO para a defesa dos direitos do homem e da paz, a reflexo sobre esses novos princpios, contribuindo para a reflexo sobre essa terceira gerao de direitos. 6. LUO, Antonio-Enrique Prez. Op. cit. p. 14. 7. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. So Paulo: Malheiros, 1996. p. 525. Segundo o mestre brasileiro, os direitos da Quarta gerao no somente culminam a objetividade dos direitos das duas geraes antecedentes, como absorvem sem, todavia, remov-la a subjetividade dos direitos individuais, a saber, os direitos da primeira gerao. Tais direitos sobrevivem, e no apenas sobrevivem, seno que ficam opulentados em sua dimenso principal, objetiva e axiolgica, podendo, doravante, irradiar-se com a mais subida eficcia normativa a todos os direitos da sociedade e do ordenamento jurdico. (Idem, ibidem). 8. Consta do inciso 32, do art. 179 da Carta Imperial, que a instruo primria gratuita a todos os cidados. Somente a Constituio Brasileira de 1988 voltaria a contemplar esse direito social fundamental e a obrigar o Estado com esse dever que lhe conferido pela norma magna (art. 205 da Constituio da Repblica de 1988). Em esclios sobre o tema explanava o grande constitucionalista do Imprio, Jos Antnio Pimenta

Bueno, que a instruo primria uma necessidade, no desta ou daquela classe, sim de todas, ou de todos os indivduos; o operrio, o artfice mais humilde, o pobre que precisa saber ler, escrever, e pelo menos as primeiras operaes aritmticas, alis ele depende de outro, que o acaso lhe ministre, e no oferece a si mesmo a garantia mais indispensvel. A par dessa necessidade tambm essencial que o povo tenha pelo menos as noes fundamentais da moral, e da crena religiosa, para que cada indivduo possua germes de virtude, e idias dos seus deveres como homem e como cidado. pois uma necessidade geral, e conseqentemente uma dvida da sociedade, pois que para as necessidades gerais que se criam e recebem as contribuies pblicas; acresce ainda que a satisfao dessa obrigao reverte em proveito da prpria associao, que por esse meio conseguem lhe tornar mais teis e moralizados os seus membros em geral. (Op. cit. p. 430) 9. Para Rui Barbosa, as normas contenedoras de direitos so meramente declaratrias, enquanto aquelas referentes s garantias so assecuratrias. Estas instrumentalizam a justicialidade quando houver violao de direitos. Cf. BARBOSA, Rui. Repblica: teoria e prtica.Petrpolis:Vozes, 1978. 343 p. p. 124. 10. Jos Afonso da Silva classifica em dois grupos as garantias dos direitos fundamentais: as garantias gerais destinadas a assegurar a existncia e a efetividade (eficcia social)

daqueles direitos, as quais se referem organizao da comunidade poltica e que poderamos chamar condies econmico-sociais, culturais e polticas que favorecem o exerccio dos direitos fundamentaise as garantias constitucionais, que consistem nas instituies, determinaes e procedimentos mediante os quais a prpria Constituio tutela a observncia, em caso de inobservncia, a reintegrao dos direitos fundamentais. (Curso de Direito Constitucional Positivo. So Paulo: Ed. Malheiros, 1997. p. 185) 11. LUO, Antonio-Enrique Prez. Op. cit. p. 45. 12. HUGO, Victor. Os Miserveis. Traduo de Jos Maria Machado. So Paulo: Hemus, 1979. p. 249. Crmem Lcia Antunes Rocha Advogada e Professora da Pontifcia Universidade Catlica de Minas Gerais.Disponvel em: http://www2.cjf.jus.br/ojs2/index.php/cej/article/view/116/159Pgina inicial > V. 1 n. 3 set./dez. 1997 > Rocha