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Construção da Unasul além da integração econômica

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GUILHERME ANTONIO SOARES QUEIROZ

A CONSTRUÇÃO DA UNIÃO DE NAÇÕES SUL-AMERICANAS (UNASUL): ALÉM DA

INTEGRAÇÃO ECONÔMICA E COMERCIAL

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INSTITUTO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DE BRASÍLIA – IESB

GUILHERME ANTONIO SOARES QUEIROZ

A CONSTRUÇÃO DA UNIÃO DE NAÇÕES SUL-AMERICANAS (UNASUL): ALÉM DA

INTEGRAÇÃO ECONÔMICA E COMERCIAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentadoao Curso de Relações Internacionais doInstituto de Educação Superior de Brasília,como requisito parcial para obtenção do graude Bacharel em Relações Internacionais.

Orientador: Prof. Msc. Ricardo MendesPereira.

BRASÍLIA – DF2011 

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GUILHERME ANTONIO SOARES QUEIROZ

A CONSTRUÇÃO DA UNIÃO DE NAÇÕES SUL-AMERICANAS (UNASUL): ALÉM DA

INTEGRAÇÃO ECONÔMICA E COMERCIAL

Trabalho de Conclusão de Curso aprovado  pela Banca Examinadora com vistas àobtenção do título de Bacharel em RelaçõesInternacionais do Instituto de EducaçãoSuperior de BrasíliaBrasília, DF 25 de novembro de 2011.

Banca Examinadora:

Prof. Msc. Ricardo Mendes Pereira

Prof. Dr. Jacques Ibáñez de Novion

Prof. Msc. Creomar Carvalho de Souza

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Torna-te aquilo que és

 F. Nietzsche

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RESUMO 

O presente trabalho de monografia (com uma divisão em três capítulos) busca

mostrar que a União Sul-Americana de Nações (Unasul) tem um caráter primordialmente

 político – fato que a diferencia de outros processos de integração regional, que têm caráter 

essencialmente econômico e comercial – através da análise de seus objetivos e de seu Tratado

Constitutivo, tendo em vista o entendimento de que a definição de uma identidade regional

 para os países membros é um fator fundamental para a criação do bloco. Para tanto, utilizam-

se perspectivas teóricas sobre integração regional, bem como se trata da importância e da

evolução histórica do projeto brasileiro de América do Sul na definição de uma identidade

  para os países da região. Por sua vez, define-se identidade a partir da interação entre as

circunstâncias (fatores momentâneos de ordem histórica, geográfica e sistêmica) e os  predicados (características políticas, econômicas e sociais) dos países, bem como de suas

visões e interesses.

Palavras-chave: Unasul, América do Sul, Integração Regional, Identidade, Política Externa

Brasileira, Caráter Político.

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ABSTRACT 

The present monograph work (divided in three chapters) seeks to show that the

Union of South American Nations (Unasul) has a primarily political nature – a fact the

differentiates it from other regional integration processes which have an essential economic

and commercial nature – through the analysis of its objectives and its Constitutive Treaty,

considering the understanding that the definition of a regional identity for the members is a

key factor in the group’s creation. For this purpose, it is used theoretical perspectives about

regional integration, as well as brings the importance and the historical evolution of the

Brazilian’s South America project in the definition of an identity for the region’s countries. In

its turn, identity will be defined taking into consideration the interaction between the

countries’ circumstances (temporary historical, geographical and systemic factors) and  predicates (political, economic and social characteristics), as well as their visions and

interests.

Key words: Unasul, South America, Regional Integration, Identity, Brazilian Foreign Policy,

Political Nature.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 8 2. TEORIAS DE INTEGRAÇÃO E A QUESTÃO DA IDENTIDADE .......................... 11  2.1 PRIMEIRAS PERSPECTIVAS TEÓRICAS E O FUNCIONALISMO ..................... ..... 11

2.2 NEOFUNCIONALISMO E INTERDEPENDÊNCIA COMPLEXA .............................. 14

2.3 REGIONALISMO ECONÔMICO E REGIONALISMO ABERTO ............................... 15

2.4 A QUESTÃO DA IDENTIDADE E O CONSTRUTIVISMO ........................................ 17

3. AS IDENTIDADES REGIONAIS NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA .......... 21 3.1 AMÉRICA DO SUL COMO IDENTIDADE BRASILEIRA ......................................... 23

3.1.1 O Mercosul como referência regional do Brasil .......................................................... 24

3.1.2 As Reuniões Presidenciais de Cúpula e a criação da CASA......................................... 273.1.3 A institucionalização da América do Sul: o surgimento da Unasul .............................. 31 

4. DEFINIÇÃO DAS IDENTIDADES E OBJETIVOS DA CRIAÇÃO DA UNASUL .. 33 4.1 ESCLARECENDO A IDENTIDADE SUL-AMERICANA ........................................... 33

4.2 O ESFORÇO DO PROJETO BRASILEIRO NA CONSTRUÇÃO DA AMÉRICA DO

SUL ..................................................................................................................................... 36 

4.3 AS INTENÇÕES DA INTEGRAÇÃO SUL-AMERICANA E OS OBJETIVOS DA

UNASUL ............................................................................................................................. 38

4.3.1 Dos objetivos específicos de caráter político e geopolítico .......................................... 39

4.3.2 Dos objetivos específicos de caráter econômico .......................................................... 40

4.4 AS EXPECTATIVAS DA CRIAÇÃO DA UNASUL .................................................... 41

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 44 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 47 

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1. INTRODUÇÃO

Os processos de integração regional se destacam no estudo das Relações

Internacionais por permitirem novas discussões sobre a importância da soberania estatal parao próprio Estado, uma vez que para participar de um processo de tal natureza é necessário que

um país destine parcela da soberania inerente a sua condição política originária. No entanto,

os primeiros e a grande maioria dos blocos regionais são de caráter econômico e comercial, de

forma que a preocupação com interferência política de fato na realidade dos países se

configurava menos importante que a pequena parcela de soberania a ser destinada aos blocos

apenas para os fins econômicos pretendidos. O fato é que a partir dos anos 1980 a

aproximação econômica e comercial em nível regional dos países cresceu, atingindo diversos

  países em várias regiões do mundo. Dessa forma, percebe-se que essa aproximação,consideravelmente motivada pelo contexto de globalização, que tem sua evidente difusão

nessa época, gera uma nova estruturação do Sistema Internacional, onde o peso das relações e

das decisões regionais passa a influenciar as demais relações, além de modificar e acrescentar 

discussões nos estudos de Relações Internacionais.

A criação da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), cuja origem se encontra nas

  primeiras aproximações entre os países sul-americanos e também latino-americanos no

contexto descrito acima, se configura como o bloco de integração regional mais complexo e

avançado nas Américas, sua composição e legitimidade política (promovida pelo arcabouço

legal e institucional concretizado em seu Tratado Constitutivo) conferem aos países do bloco

maior representatividade internacional e maior capacidade de agirem visando seus interesses,

sejam estes políticos, econômicocomerciais ou sociais.

O tratamento desse tema se faz importante na medida em que a política externa

 brasileira volta-se à América do Sul nos últimos anos. Evidenciado este fato, a edificação de

um bloco de integração de grande aspecto como a Unasul, que passa por conotações políticas,

econômicas, sociais, culturais, etc., deve ser tratada com especial atenção, uma vez que o

Sistema Internacional observa a formação de grandes blocos regionais. A definição de um

discurso comum para estabelecimento da Unasul passa pela construção de uma identidade

também comum aos países membros e demonstra as razões de formação do bloco. Pelos

movimentos integracionistas observados internacionalmente e suas inclinações, faz sentido

afirmar que a Unasul teria conotações apenas econômicas, no entanto, partindo de uma

 perspectiva de que os pequenos blocos de integração existentes na América do Sul – Mercado

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Comum do Sul (Mercosul) e Comunidade Andina de Nações (CAN) – não obtiveram o

sucesso de desenvolvimento e crescimento esperado, é válido considerar que as motivações de

construção da UNASUL são de natureza diferente da econômica. Buscar-se-á, portanto,

identificar as motivações e inclinações presentes na criação do bloco em questão.

Tendo em vista o exposto, sugere-se como problema deste trabalho identificar os

aspectos abordados para a formação da Unasul, intenções e objetivos dos Estados membros

com a criação desse bloco e mostrar que esse processo de integração transcende a integração

de caráter unicamente econômico e comercial (como os demais blocos regionais existentes,

com exceção da União Europeia). Dessa forma, a hipótese que aqui se procura verificar reside

na diferença entre o intuito da Unasul e dos demais blocos regionais, tanto sul-americanos,

quanto os demais, isto é, a Unasul é primordialmente pensada e constituída com fins políticos

e não somente econômicos e comerciais, como os demais processos de integração.Assim, o objetivo geral deste trabalho é definir os aspectos da construção da Unasul

a fim de identificar razões e motivações reais de integração que vão além dos objetivos

comerciais. Por sua vez, para que se atinja este objetivo é necessária a discussão e tratamento

de alguns objetivos específicos, a saber: enumerar os processos que levaram ao surgimento da

Unasul; demonstrar a importância e influência do aspecto e da ação regional da Política

Externa Brasileira; e, finalmente, identificar os objetivos da própria Unasul.

Para testar a hipótese lançada e atingir os objetivos expostos, apresentar-se-ão no

  primeiro capítulo algumas perspectivas teóricas que versam sobre integração regional, asaber: Funcionalismo, Neofuncionalismo e Construtivismo; acrescentam-se ainda às

discussões teóricas as visões, que justificam a integração regional, do Regionalismo

Econômico e do Regionalismo Aberto – este conceituado pela Comissão Econômica para a

América Latina e o Caribe (CEPAL). Buscar-se-á encontrar entre essas visões um aspecto que

se considera fundamental para qualquer processo de integração regional, a identidade

regional.

Por sua vez, no segundo capítulo evidenciar-se-á a formação da identidade regional

sul-americana na Política Externa Brasileira (PEB) por meio da evolução histórica dasreferências regionais do Brasil, desde o contexto da Primeira República até o último governo

Lula e a criação da Unasul em 2008. Dedicar-se-á neste capítulo maior atenção à identidade

sul-americana de fato do Brasil, onde o Mercosul desponta, inicialmente, como principal

reflexo dessa identidade. Em um segundo momento, porém, a sul-americanidade do Brasil

ganhará aspirações mais abrangentes e a Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA) se

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destacará nas relações regionais brasileiras. Em um último momento, mostrar-se-á a

concretização do projeto brasileiro de América do Sul com a criação da Unasul.

Por fim, no terceiro capítulo demonstrar-se-á como se deu a formação da identidade

sul-americana para todos os países, motivando-os a se engajarem na criação da Unasul, tendo

em vista os dois capítulos anteriores, bem como o Tratado Constitutivo do bloco. Feito isso,

dedicar-se-á atenção à influência do projeto brasileiro de América do Sul na definição dessa

identidade dos países membros da união. Em seguida, apresentar-se-ão os objetivos da Unasul

expostos no Tratado Constitutivo, como forma de, finalmente, entender quais as expectativas

e intenções dos países membros com a criação do bloco.

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2. TEORIAS DE INTEGRAÇÃO E A QUESTÃO DA

IDENTIDADE

As primeiras perspectivas teóricas a respeito da temática de integração em Relações

Internacionais têm origem com o processo de integração europeu. Entre visões funcionalistas,

neofuncionalistas e também construtivistas, além das perspectivas de caráter econômico,

como o conceito de regionalismo aberto desenvolvido pela Comissão Econômica para a

América Latina e o Caribe (CEPAL), se desenvolve um arcabouço rico e complexo das

  prováveis motivações e interesses que têm os Estados ao iniciarem uma integração. Tais

interesses – entendidos por Celso Lafer como “um problema prático e um exercício diário da

representação da identidade coletiva de um país”1 – permitem também a análise de outro

aspecto fundamental para os países que se engajam em processos de integração regional: a

definição de uma identidade.

A identidade “condiciona os desígnios duradouros da política exterior”2 de um país,

isto é, a ação internacional dos Estados depende da relação de convergência entre seus

interesses e suas visões de mundo, cujo resultado é uma identidade, para uma inserção

regional, ou mesmo global, devidamente orientada. Faz-se imperativo, portanto, que se

dedique atenção à percepção das identidades regionais dentro do aspecto teórico, pois este

vem a orientar o aspecto prático, que é a ação estatal.

2.1 Primeiras perspectivas teóricas e o Funcionalismo

  Neste momento, dar-se-á lugar às perspectivas pioneiras sobre o que vem a ser a

integração regional que surgem juntamente com o processo de integração europeu a partir da

década de 1950. Havia, entre os primeiros teóricos de integração, uma inclinação comum a

entender o deslocamento de lealdade, ou até mesmo de soberania, da instituição nacional (o

Estado) para a unidade supranacional, e isso poder ser visto na definição dada por Ernst Haasà integração: “  process whereby political actors in several distinct national settings are

1 LAFER, Celso. “A identidade Internacional do Brasil e a política externa brasileira: passado, presente efuturo”. In: COUTO, Leandro Freitas. O Horizonte Regional do Brasil: Integração e Construção da América do

Sul. Curitiba: Juruá, 2009. p. 17.2 CERVO, Amado Luiz.  Inserção Internacional: formação dos conceitos brasileiros. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 65.

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 persuaded to shift their loyalties, expectations, and political activities toward a new center,

whose institutions possess or demand jurisdiction over the preexisting national states”3.

É possível perceber, então, que a conotação das primeiras visões sobre integração é

fundamentalmente política. Levando em consideração o contexto bipolar causado pela Guerra

Fria, se afirmam dois aspectos primários que estruturam o ordenamento internacional: valores

comuns (definidos segundo as ideologias, interesses e objetivos) e as relações de poder (em

que a preocupação com a segurança internacional é mais evidente). Desses elementos

originam-se duas vertentes explicativas: uma que afirma o alcance e preservação da coesão

dos sistemas políticos com base em valores e visões comuns dos membros e no consenso

quanto à estrutura do próprio sistema; e outra que defende a coesão de sistemas políticos

graças à aplicação de mecanismos coercitivos4.

Esta última vertente reflete a influência existente da ótica Realista nas primeirasreflexões sobre o tema, onde o temor do cenário anárquico e do constante perigo de guerra

determinaria viável a integração, esta entendida por Karl Deutsch como:

a existência de um sentido de comunidade, de instituições e de práticas capazes deassegurar, ao longo do tempo, expectativas de mudanças pacíficas em umacomunidade política, identificando-a, portanto, com uma situação em que a probabilidade de ocorrência de conflitos é reduzida5.

O mesmo teórico enumera cinco condições que julga essenciais para entender a

criação de sistemas políticos supranacionais no sentido de uma integração, a saber 6:

a)  Valores e Expectativas: é importante que haja compatibilidade dos principaisvalores acreditados pelo estrato político relevante de todas as partes

 participantes, sendo possível a supressão de valores comuns por acordos tácitos

que anulem os valores incompatíveis entre as partes, de forma que possa haver 

alguma expectativa de ganhos no âmbito da relação institucional a ser firmada;

 b)  Capacidades e Processos Comunicativos: o aumento da capacidade política e

administrativa das partes envolvidas é fundamental, pois resulta no crescimento

do Estado em relevância política e econômica, tornando o grupo possivelmente

mais forte; aliado a isso, é essencial um canal de comunicação ativo no interior e

3 PFALTZGRAFF, Robert L. Contenting Theories of International Relations: a comprehensive survey. NewYork: Longman, 2001. 5ed. p. 510.4 VAZ, Alcides Costa. Cooperação, integração e processo negociador: a construção do MERCOSUL. Brasília:Instituto Brasileiro de Relações Internacionais, 2002. p. 27-28. 5 Idem. p. 29.6 DEUTSCH, Karl W. Political Community and the North Atlantic Area: International Organization in the light 

of historial experience. Princeton: Princeton University Press, 1957. p. 46-58.

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no exterior dos Estados, para a manutenção de uma unidade com os objetivos de

crescimento;

c)  Circulação de Pessoas: a livre circulação de pessoas (ao menos das classes

  politicamente relevantes) é também vista como importante por ter sido

observada nas unificações das colônias americanas na formação dos Estados

Unidos, da Alemanha e da Itália, bem como da Inglaterra com País de Gales;

d)  Multiplicidade e Balança de Transações: é importante realizar mudanças que

alcancem uma multiplicidade de setores, tais como serviços, instituições e

  políticas, bem como saber balancear as transações realizadas para essas

mudanças, como balancear os recursos, recompensas e benefícios entre as

 partes;

e) 

Previsibilidade mútua de comportamento: deve haver alguma espécie decomportamento compatível entre as partes, onde possa se encontrar alguma

familiaridade com o modo de ação da outra parte, resultante de uma cultura ou

caráter comuns, que se desenvolveriam dentro do grupo, de forma que as ações

de todas as partes possam ser previstas.

É visível, pois, neste pequeno extrato funcionalista, o reconhecimento da existência

de fatores não apenas políticos e de segurança (onde o foco da retórica realista se concentra,

  bem como da própria definição de Deutsch permite interpretar), mas também de fatores

econômicos e técnicos (circulação de pessoas, processos comunicativos e multiplicidade desetores envolvidos na integração), aspectos considerados, segundo a visão realista, “baixa

  política”. No entanto, para os funcionalistas, estas esferas políticas passam a ter tanta

importância quanto a “alta política” (questões de poder e segurança), ou até mais, a própria

 premissa funcionalista reside na separação das perspectivas sobre poder e dos interesses que

configuram a “baixa política”7.

David Mitrany entende que as questões de “baixa política” cresceram e ganharam,

em meados do século XX, fundamental importância para as Relações Internacionais. Todavia,

  problemas desta ordem não podem ser tratados segundo o paradigma Realista, e sim viacooperação. Na verdade, os funcionalistas veem nas relações institucionais uma forma de

modificar o comportamento dos Estados e diminuir a propensão à guerra via cooperação. O

autor acredita que “by emphasizing cooperation to find solutions according to a specific need 

or function, the basis would be created for a thickening web of cooperation leading to the

7 VAZ, Alcides Costa. Op. Cit. p. 30.

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  formation and strengthening of international regimes and institutions”8. Aliando esta

concepção à definição de Ernst Haas, apresentada no início do capítulo, onde há transferência

de lealdade da unidade nacional à supranacional, chega-se ao conceito funcionalista de  spill 

over , onde a cooperação em uma área determinada se expandiria a outras áreas, ou seja, a

cooperação fortaleceria o processo de integração e não ficaria restrita a uma área apenas, mas

transbordaria a outras também.

2.2 Neofuncionalismo e Interdependência Complexa

Durante as décadas de 1970 e 1980, há uma mudança significativa na visão teórica

do que é integração regional na tentativa de abarcar “forças e processos” presentes nas

dinâmicas entre Estados nas Relações Internacionais, em grande parte de caráter econômico9

.Os Neofuncionalistas, ao reformularem a hipótese do spill over , observando ainda o processo

de integração da Europa, dão mais importância à integração em si por entenderem que esta

  pode levar a algum tipo de união política10. Entretanto, por outra ótica (também de cunho

  Neofuncionalista), a da interdependência e de suas implicações políticas e econômicas, a

integração política não parece tão plausível.

A interdependência – ou interdependência complexa como colocado por Robert

Keohane e Joseph Nye –, que segundo estes autores é crescente entre os Estados a partir da

década de 1970, pode ser caracterizada pela reflexão do processo de spill over das práticas decooperação para diversas áreas das relações interestatais, alcançando uma maior gama de

atores do Sistema Internacional (não apenas governamentais). Tal conceito pode ser melhor 

esclarecido ao se observar as três premissas básicas por eles propostas11:

a)  Existem canais interestatais, transgovernamentais e transnacionais que conectam

as sociedades;

 b)  Há uma multiplicidade de temas na agenda internacional sem uma hierarquia;

c)  Em situações configuradas como de interdependência complexa, não há o

emprego de força militar.

A visão da interdependência demonstra que há de fato a busca pela cooperação

internacional, esta, por outro lado, não resulta necessariamente na integração política,

diferentemente do que propunham as hipóteses funcionalistas e algumas neofuncionalistas,

8 PFALTZGRAFF, Robert L. Op. Cit . p. 512.9 VAZ, Alcides Costa. Op. Cit. p. 32-33.10 PFALTZGRAFF, Robert L. Op. Cit . p. 512-513.11 VAZ, Alcides Costa. Op. Cit. p. 34.

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uma vez que a diversidade de temas e, por conseguinte, de interesses existentes em um

ambiente cooperativo da ordem acima explicada geram apenas uma relação, como indica o

nome da teoria, de interdependência.

2.3 Regionalismo Econômico e Regionalismo Aberto

Até o presente momento, as teorias que buscavam explicar ou entender os processos

de integração regional o faziam considerando o aspecto político e da integração política como

o mais relevante, muito embora tanto o Funcionalismo quanto sua reformulação reconhecesse

a existência e também a importância de aspectos adjuntos nesse tipo de processo, como

diversidade de temas, instituições e atores. No entanto, há, após a queda do sistema Bretton

Woods e a posterior crise do petróleo, uma visível diminuição da importância da integração

regional tanto do ponto de vista dos agentes políticos quanto da academia, apesar do crescente

caráter interdependente entre os Estados.

Essa situação sofre alteração em meados da década de 1980, com o Regionalismo

Econômico, que surge das mudanças de orientação em termos da exploração das

oportunidades presentes nas proximidades geográficas como forma de inserção na política e

economia internacionais12. Mesmo não sendo estritamente econômico por acarretar também

mudanças de ordem política, o Regionalismo Econômico veio a se consagrar como estratégia

adotada por diversos Estados, inclusive pelos Estados Unidos, como se pôde observar com oAcordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA, sigla em inglês).

Assim, a tônica observada dentro da ampliação das perspectivas do Regionalismo

Econômico se dá no âmbito de Blocos Econômicos – países associados por meio de relações

de privilégios econômico e comercial, todavia com redução de parcela da soberania estatal de

escolha, uma vez que os resultados e decisões devem ser adotados por todos aqueles que

queiram fazer parte do grupo – que podem ser divididos em cinco etapas distintas, porém

relacionadas, a saber 13:

a)  Zona de preferência tarifária: bloco ou acordo econômico que garante preferências tarifárias no comércio entre os países membros;

12 Idem. p. 24-25.13 CONGRESSO NACIONAL, Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul. Globalização e Integração.Disponível em <http://www.camara.gov.br/mercosul/blocos/introd.htm>. Acesso em 22/09/2011.

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 b)  Zona de livre comércio: bloco ou acordo econômico que promove a redução ou

eliminação de qualquer tipo de barreiras alfandegárias (tarifárias ou não) no

comércio intrabloco;

c)  União aduaneira: bloco ou acordo econômico onde há abertura comercial entre

os países membros, além de uma regulamentação conjunta do comércio com

 países estrangeiros, bem como da adoção de uma Tarifa Externa Comum, a ser 

aplicada perante todos os produtos provenientes de Estados não pertencentes ao

grupo em questão;

d)  Mercado comum: bloco ou acordo econômico onde há livre circulação de

  pessoas, bens, serviços e capitais, bem como coordenação de políticas

macroeconômicas conjuntas;

e) 

União econômica e monetária: engloba todas as características dos demais tiposde blocos econômicos, porém conta com uma moeda única e uma política

monetária unificada, configura-se como o mais avançado estágio de integração

econômica.

A percepção de um ordenamento econômico mundial, com base em movimentos

regionais, também afeta a América Latina, onde se passa a revigorar as tentativas de

aproximação comercial de âmbito regional, onde o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e a

Comunidade Andina (CAN) despontam como principais grupos.

Por sua vez, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL)afirma que a integração permite o alcance de um modelo de desenvolvimento que visa ao

crescimento e à igualdade por parte dos países (da América Latina, do Caribe e em

desenvolvimento) que venham a se engajar em algum processo desse gênero, por entender ser 

necessária a associação entre esses Estados uma vez observados os blocos econômicos dos

 países desenvolvidos – onde predomina o livre comércio intrabloco, enquanto no comércio

realizado com países de fora do bloco há regras mais rígidas.

Por isso, segundo a visão cepalina, a integração tem sentido “como un mecanismo de

defensa para compensar algunos de los costos de un aislamiento aún mayor, resultante del 

eventual aumento del protecionismo en los países desarrollados”14, tornando-se uma forma

de diminuição das incertezas e riscos da economia internacional. Acrescenta-se, ainda, a tal

argumento, o fato da expansão da globalização econômica e da relativa deficiência do

14 CEPAL. El regionalismo Abierto en América Latina y El Caribe: La integración económica al servicio de la

transformación productiva con equidad . Santiago: Cepal, 1994. p. 11.

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 processo de substituição de importações e tem-se, na integração, uma aberta e clara percepção

do ordenamento da economia internacional, ao menos em nível regional.

Com base nos aspectos acima apresentados, a CEPAL lançou a proposta do

Regionalismo Aberto, que seria a conciliação entre a interdependência presente em diversos

acordos internacionais de comércio de caráter preferencial e o grau de globalização causado

 pela liberalização comercial. O Regionalismo Aberto teria ainda como objetivo a elaboração

de políticas de integração que busquem elevar a competitividade comercial dos países15. A

significativa diferença entre esta nova perspectiva de integração cepalina e a simples abertura

comercial e promoção de exportações é de ordem ideológica e demonstra um caráter 

identitário, pois “comprende un ingrediente preferencial, reflejado en los acuerdos de

integración y reforzado por la cercania geográfica y la afinidad cultural de los países de la

región”16

.

2.4 A questão da identidade e o Construtivismo

Ao longo da evolução dos processos de integração, a preocupação com a explicação

dos mesmos vai além das questões política, de poder e de segurança, abrangendo também os

aspectos econômico e comercial. No entanto, restringir o campo de análise a esses fatores

torna o entendimento do que é integração regional incompleto e falho. Desde o início do

capítulo, encontraram-se menções e destaques importantes às questões de interesses e deidentidade: a transferência de lealdade enunciada por Haas não se dava sem um motivo, mas

sim por haver o interesse por uma maior segurança frente ao ambiente ideológico e,

eventualmente, de fato, hostil da Guerra Fria. Este mesmo motivo é também encontrado na

definição de Deutsch para integração e, ainda, apoiando-se em condições essenciais para tanto

como valores compartilhados pelas partes; por sua vez, a ótica da Interdependência, apesar de

não permitir uma conclusão evidente de que a cooperação entre os países pode levar à

integração de fato, afirma que em uma situação de interdependência complexa há a

representação de uma diversidade de temas e, por consequência, de interesses. Por fim, o

Regionalismo Aberto da CEPAL abarca uma abordagem identitária pelas questões da

“cercania geográfica” e da “afinidad cultural ”.

Contudo, antes de dar uma definição à identidade e dar sequência à discussão aqui

 pretendida, que é a formação da Unasul, vale ressaltar a preocupação de Ronaldo Vieira com

15 Idem. p. 12.16 Idem. p. 13.

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18

a construção de um identidade regional, ele considera que “Estados interessados em formar 

comunidade com outros têm de socializar interesses, valores e objetivos com os demais

Estados-membros do grupo, a um ponto de conhecimento recíproco das identidades e

diferenças”17. Essa socialização se dá via troca de informações e o diálogo entre os países.

Assim, faz-se importante trazer uma contribuição Construtivista – uma vez que à frente

analisar-se-ão extratos do Tratado Constitutivo da Unasul, bem como de discursos políticos –,

  pois esta corrente leva em consideração elementos discursivos e de linguagem enquanto

instrumentos de construção política.

O Construtivismo foca-se na compreensão dos fatos e das questões a eles inerentes,

como identidade, relações de poder e linguagem, por entender que esses fatores são

evidenciados na construção daquilo que é a realidade. A fim de visualizar melhor a retórica

construtivista, é importante observar suas principais premissas18

:a)  Atribuição de sentido às ações e à realidade via a interpretação que se tem dessa;

 b)  Preocupação com as transformações na realidade social causadas pelos

 processos de interação;

c)  Pensar as Relações Internacionais além dos Estados: há fatores internos e

externos a serem considerados.

Essas três premissas se concretizam naquilo que é a realidade ou, segundo o

Construtivismo, naquilo que se interpreta e se entende como realidade. O fato é que esses três

aspectos fundamentais fazem sentido quando observados em contexto a partir dos fatoresanteriormente citados: relações de poder, linguagem e identidade.

As relações de poder, pelas formulações de Nicholas Onuf, refletem as assimetrias

que se encontra em qualquer sistema político, seja ele no âmbito interno ou externo de um

Estado. Essas assimetrias são, na verdade, definidas pelas regras adotadas (que dão parcelas

de poder diferentes a cada membro de determinada organização política); ou seja, toda relação

 política, social e, principalmente, institucional é sustentada por regras que norteiam a ação, a

interação e a visão dos agentes com relação ao que os cerca. Das regras, emanam as

responsabilidades do cumprimento dos compromissos, pois If we fail to do what the rule tells us to, then we can expect consequences that some

rule will bring into effect when other people follow the rule calling for such

consequences. All the ways in which people deal with rules –whether we follow the

rules or break them, whether we make the rules, change them, or get rid of them-

17 VIEIRA, Ronaldo. Foucault em casa: aspectos discursivos da construção da Comunidade Sul-Americana de Nações (2004 – 2006). Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2010. p. 19.18 Idem. p. 30-31.

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19

may be called practices. Even when we do not know what a rule says, we can often

 guess what it is about by looking at people’ practices.19 

Como observado, as regras podem ajudar a entender o comportamento adotado pelos

agentes, elas delimitam a capacidade de ação destes. Mas elas só o fazem por terem sidoacordadas ou escolhidas, uma vez acordadas se configuram como mecanismos sociais: “A

escolha das regras, o compromisso com as regras e a desconsideração das regras indicam o

tipo de identidade que os agentes sociais estão construindo”20.

Aqui entra o fator da linguagem, proposto pelos construtivistas, pelo entendimento

de que a linguagem é uma prática social. É por ela que se torna possível a relação social em si,

que se dá a troca de informações e a identificação dos interesses comuns entre os agentes.

Como coloca Fiedrich Kratochwill, “At the very basic level, language and identity thus

depend on each other. Identity exists through the ‘distinguishing’ function of language. But 

language – directives and comissives in particular – also depends on the identities of self and 

other”21. De fato, segundo essa perspectiva, “falar é sem dúvida a forma mais importante de

fazer o mundo como ele é”22. 

Tendo em vista o exposto sobre a perspectiva Construtivista, pode-se direciona-la à

compreensão da integração regional considerando sua preocupação com a relação quase

simbiótica entre os agentes, as estruturas e o resultado do relacionamento entre os mesmos. A

ação dos agentes se dá na satisfação de seus interesses e na realização de seus objetivos. No

entanto, esta ação é constrangida ou limitada pelas regras. Estas são, por sua vez, definidasinicialmente pelas práticas e, posteriormente, pelo acordo entre os agentes, daquilo que deve

ou não deve e que pode ou não pode ser praticado. Concretizando, assim, as instituições, que

são a regulação legítima das ações que os agentes podem praticar.

Por fim, a identidade se forma historicamente durante todo esse processo apresentado

no parágrafo anterior, culminando na criação das instituições. Sua definição se dá na interação

do agente com outros agentes, com e dentro das instituições.

Dessa forma, – após todas as perspectivas teóricas apresentadas e todas as evidências

da importância dos interesses e das identidades para os processos de integração regional nelas

apresentadas – , define-se aqui a identidade de um país como “um conjunto de circunstâncias e

 predicados que diferenciam a sua visão e seus interesses, como ator no sistema mundial, dos

19 KRATOCHWIL, F. V. “Rules, Norms, and Decisions”. In: Idem. Op. cit . p. 34-35.20 VIEIRA, Ronaldo. Op. Cit . p. 35.21 KRATOCHWIL, F. V. In: Ibidem.22 ONUF, Nicholas. “Constructivism: a user’s manual”. In: GALVÃO, Thiago Gehre. “América do Sul:construção pela reinvenção (2000-2008)”. Revista Brasileira de Política Internacional . Rio de Janeiro: InstitutoBrasileiro de Relações Internacionais, 2009. v. 52. nº 2. p. 69.

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20

que caracterizam os demais países”23, afirmando, portanto, que o aspecto da identidade

configura-se como ponto crucial para as futuras análises neste trabalho.

23 LAFER, Celso. In: COUTO, Leandro Freitas. Op. Cit . p. 17.

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3. AS IDENTIDADES REGIONAIS NA POLÍTICA EXTERNA

BRASILEIRA

O caminho percorrido pela diplomacia brasileira de definição das relações regionais passou por diversas mudanças ao longo dos anos. Definidos os interesses nacionais em cada

governo e em cada época, verifica-se bem a lógica das referências regionais brasileiras.

Observar-se-á, em seguida, um breve histórico das identidades presentes na Política Externa

Brasileira, antes de apresentar-se efetivamente a identidade sul-americana do Brasil e as ações

do país com vistas à integração de fato.

À Proclamação da República em 1889, a política externa brasileira se

“americanizou”. Com o Barão do Rio Branco à frente das relações exteriores tupiniquins, o

Brasil adotou o conceito Pan-americano difundido pelos Estados Unidos e alinhou-seautomaticamente à Washington. De fato, esse alinhamento automático se justificava a

características semelhantes entre os dois países, ambos têm línguas oficiais diferentes dos

demais países da América, assim como populações de origens diferentes. Além disso, o Barão

do Rio Branco via os Estados Unidos emergindo como novo polo de poder; e uma

aproximação com este país poderia aumentar o capital simbólico da diplomacia nacional24.

O período seguinte à gestão diplomática Rio Branco até a chegada de Getúlio Vargas

ao poder foi de pouca atuação internacional brasileira – esta restrita quase totalmente à

exportação de produtos primários e reestruturação das forças armadas, onde a França

despontou como principal parceiro no comércio de armamentos –; de forma que o

alinhamento brasileiro à política externa estadunidense continuou a existir, uma vez que

Estados Unidos tomou a posição inglesa de maior investidor no Brasil. A atuação regional

  brasileira apenas ficou mais evidente nos últimos anos da Primeira República, quando na

gestão de Otávio Mangabeira, enquanto ministro das Relações Exteriores, se delimitou e se

eliminou problemas fronteiriços via a assinatura de tratados e acordos com Argentina,

Bolívia, Colômbia, Paraguai, Venezuela e, também, com a Guiana25.

Por sua vez, a PEB, nos 15 anos do governo Vargas, foi marcada pela barganha

visando aos interesses nacionais de impulso ao desenvolvimento do país, onde se destaca a

dúbia aproximação brasileira: ora aos Estados Unidos, ora à Alemanha de Hitler. Todavia,

existiam, ainda, resquícios do alinhamento a Washington que prevaleceram no final dos anos

24 COUTO, Leandro Freitas. Op. cit . p. 20-26.25 CERVO, Amado Luiz, e BUENO, Clodoaldo.  História da política exterior do Brasil . Brasília: Editora UnB,2008. 3ª ed. p. 219-231.

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22

1930, quando o Brasil participa ao lado dos Aliados na Segunda Guerra Mundial. Aqui, a

inserção regional do país foi mais assertiva que no período anterior, marcada pela assinatura

do Tratado Antibélico de Não Agressão e Conciliação por Argentina, Brasil, Chile, México,

Paraguai e Uruguai. Contudo, a vertente regional da PEB entre 1930 e 1945 estava ainda sob

influência do pan-americanismo dos Estados Unidos e, assim, não houve mudanças

significativas nas relações regionais em termos de aproximação dos países26.

Mesmo com a queda de Getúlio Vargas, o Brasil permaneceu alinhado aos Estados

Unidos. A mudança na identificação regional do Brasil só vem a ser observada nos anos 1960.

Leandro Freitas Couto aponta que no século XX os Estados Unidos passou a ser o único país

representado pelo nome América enquanto os demais países do continente americano foram

definidos como Latinos. Isso somando ao contexto da Guerra Fria – que promoveu uma

diminuição da ação norte-americana nas Américas – permitiram uma mudança na referênciaregional brasileira, a saber: a América Latina – institucionalizada no âmbito da Comissão

Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL)27.

Essa passou a ser a nova identidade regional do Brasil – reforçada ainda com a

Operação Pan-Americana (com o governo de Juscelino Kubitschek, onde o aspecto regional

era buscado como forma de barganha com os Estados Unidos) e mais tarde com a Política

Externa Independente (de Jânio Quadros ao Golpe Militar, cujo cunho regional se dava pela

 busca de acesso mais amplo aos mercados vizinhos) 28. Dessa forma, pode-se afirmar que a

América Latina enquanto referência regional brasileira não se caracterizava como foco principal, mas como recurso estratégico de ação internacional.

Por outro lado, os pouco mais de vinte anos de Regime Militar trouxeram uma

inserção regional variável ao Brasil. Em um primeiro momento, no governo Castello Branco,

há uma clara preferência às diretrizes estadunidenses em termos de integração, entendia-se

aqui que “tanto na esfera econômica quanto política, a integração deveria se dar no âmbito

 pan-americano, e não latino-americano”29, de forma que o Brasil passou a atuar regionalmente

  junto à Organização dos Estados Americanos (OEA). Contudo, com a chegada de Costa e

Silva ao Palácio do Planalto, há um retorno ao caráter latino-americano da PEB, pelo fim da  participação brasileira na OEA, recuperando a autonomia de ação antes existente com a

Política Externa Independente. 

26 Idem. p. 233-237.27 COUTO, Leandro Freitas. Op. cit. p. 27-3128 Ibidem.29 VIZENTINI, Paulo G. Fagundes. “A política externa do regime militar brasileiro: multilateralização,desenvolvimento e construção de uma potência média (1964-1985)”. In: Idem. p. 33.

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23

 Novamente, com o governo Médici, há uma ruptura na visão da ação brasileira em

nível regional por conta do retorno da ideia da importância do poder, uma vez que no

entendimento de Médici cabia ao Brasil uma maior parcela de poder no sistema

internacional30. Tal fato, aliado ao crescimento econômico do país, deu a tônica a busca de

relacionamentos bilaterais, divergindo assim das propostas de inserção regional difundidas

  por Washington ou mesmo pelo Brasil, como anteriormente evidenciado. Por sua vez, no

governo Geisel, a PEB sofre uma alteração considerável – tendo em vista a política do

Pragmatismo Ecumênico e Responsável que “não permitia eleger, teoricamente, áreas

 prioritárias de relações, e sim aceitá-las pelo que de concreto poderiam oferecer”31 – onde se

 passou a verificar uma inclinação universalista, sem alguma preferência definida para com

relações regionais. Finalmente, com Figueiredo à Presidência da República, a PEB retoma sua

identificação latino-americana, ao menos nos discursos políticos isso era evidente32

. Noentanto, o cenário politicamente e economicamente instável da década de 1980, tanto em

âmbito interno quanto externo, viria a mudar e a América Latina não mais seria a tendência

regional do Brasil.

3.1 América do Sul como identidade brasileira

Com a perda de força da América Latina, a influência dos Estados Unidos na região

aumentou novamente e promoveu uma nova aproximação do México e de países da AméricaCentral e do Caribe ao gigante do norte. Criou-se assim, em meados da década de 1980, um

ambiente propício à definição da América do Sul como referência regional do Brasil. Outra

contribuição para tanto foi uma maior aproximação entre Brasil e Argentina durante o mesmo

  período. Tal aproximação se deu, baseada em uma confiança mútua, pela resolução da

questão energética concernente às hidrelétricas de Itaipu e Corpus33 – problema resolvido

 pelos então presidentes de Brasil e Argentina, Sarney e Alfonsin, respectivamente –, por uma

  percepção de que Brasil e Argentina poderiam desempenhar papéis similares aos de

Alemanha e França na Europa, “levando a dimensões cooperativas sem precedentes, não

30 CERVO, Amado Luiz, e BUENO, Clodoaldo. Op. cit . p. 398.31 Idem. p. 406.32 Idem. p. 429-431.33 COUTO, Leandro Freitas. Op. cit . p. 35.

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apenas no aspecto político, mas também, e sobretudo, na esfera econômica”34, e inclusive pelo

 processo de redemocratização decorrente nos dois países àquela época.

De fato, a aproximação do Brasil com a América do Sul será iniciada a partir da

década de 1990 com o fortalecimento do comércio intrarregional – inspirado pela tônica

neoliberal dos governos de Fernando Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso – e com a

  própria construção política da região – ambos os fatores evidenciados por um lado na

Comunidade Andina de Nações (CAN) e por outro no Mercado Comum do Sul (Mercosul).

Este último grupo, até o final do século XX, permaneceu como referência principal do caráter 

sul-americano da identidade regional brasileira.

3.1.1 O Mercosul como referência regional do Brasil

O Mercado Comum do Sul (Mercosul) surgiu, enquanto projeto, em 1991 pela

assinatura do Tratado de Assunção pelos presidentes do Paraguai, Uruguai, Argentina e Brasil

 – o bloco deveria vir a se tornar um mercado comum de fato até 199435. O Mercosul conta

ainda com Bolívia e Chile como países associados à zona de livre comércio36, e mais

recentemente, observa-se a demanda da Venezuela em participar do grupo até o presente

momento restrito ao Cone Sul. O objetivo inicial dos países do bloco é, como se propõe em

seu nome, criar um mercado comum, de forma que estes países pudessem melhorar sua

capacidade de decisão, tendo em vista seus interesses individuais e coletivos, frente o cenárioglobalizado promovido pela adoção de políticas neoliberais em várias partes do mundo. Os

interesses do Brasil exemplificam de forma clara tal motivação, uma vez que eles:

 por um lado, traduziam a percepção da necessidade de uma postura afirmativa, emâmbitos sub-regional e regional, para extrair benefícios econômicos diretos, com aintensificação dos fluxos comerciais, e indiretos, pelos acréscimos em termos decompetitividade externa e de atratividade diante de investidores externos; de outro,refletiam uma postura reativa e defensiva, com a qual se procurava resguardar interesses políticos e econômicos ante as injunções dos cenários regional e global e,mais particularmente, o risco de fragmentação do sistema multilateral de comércio,  posto em perspectiva pelos impasses na Rodada do Uruguai do GATT, o

34 GALVÃO, Thiago Gehre. América do Sul : a construção de uma ideia. 2003. 219 f. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em História: História das Relações Internacionais, Universidade de Brasília,Brasília, 2003. p. 88.35 “Tratado de Assunção, Artigo 1: Os Estados Partes decidem constituir um Mercado Comum, que deverá estar estabelecido a 31 de dezembro de 1994, e que se denominará “Mercado Comum do Sul” (Mercosul).” In:GARCIA, Eugênio Vargas.  Diplomacia Brasileira e Política Externa: documentos históricos (1493-2008). Riode Janeiro: Contraponto, 2008. p. 650.36 MENEZES, Alfredo da Mota. Integração Regional: Blocos econômicos nas Relações Internacionais. Rio deJaneiro: Elsevier, 2006. p. 47-48.

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engajamento dos Estados Unidos em iniciativas de integração econômica regional ehemisférica e o eventual desvio de exportações que o NAFTA produziria37.

Assim, pode-se afirmar que a busca pela integração dos países do Cone Sul, no

âmbito do Mercosul, tem como motivação fundamental criar um ambiente onde se utilizem os

mesmos argumentos no momento em que se tenta inserir e barganhar no comércio

internacional. Para tanto, ao estabelecerem as metas de criação do bloco, Brasil, Argentina,

Uruguai e Paraguai definiram no Tratado de Assunção a intenção de adotar uma política

comercial comum em relação a outros países, além de englobar previsões de livre circulação

de bens, serviços e fatores de produção. Vale salientar que há no mesmo acordo a previsão da

coordenação de políticas macroeconômicas e também a existência de uma tarifaexterna comum para ser aplicada a países não membros. Impostos e taxações,continua o tratado, devem ser os mesmos para todos os produtos provenientes dequalquer um dos países integrados. Não se poderia, portanto, taxar um produto

argentino no Brasil de forma exagerada, com um imposto desproporcional emrelação àquele aplicado ao produto nacional. Não se poderia também realizar acordos paralelos de um só membro com outros países, mesmo da América Latina,que pudessem prejudicar os termos do tratado. Se, por exemplo, houver vantagensem um entendimento entre a Argentina e a Venezuela, isso deverá ser estendidotambém aos demais membros38.

Observando o acima exposto, percebe-se que a dinâmica do Mercosul se direciona

apenas ao comércio, seguindo as perspectivas do Regionalismo Aberto apresentadas no

capítulo anterior, de forma que “interna e externamente, nenhuma estratégia foi concebida

  para além do comércio”39. Não obstante, evidencia-se no Mercosul um caráter político

considerável, Luiz Alberto Moniz Bandeira40 destaca o Mecanismo de Consulta e

Concertação Política (MCCP) do bloco – criado em 1996 a partir da Declaração Presidencial

sobre Diálogo Político –, cujo objetivo reside em organizar as posturas dos países membros

do bloco frente aos tópicos internacionais que interessem de maneira comum aos membros.

De forma geral, desvincular dentro de um processo de integração (ao se considerar o cenário

do final do século XX) o aspecto econômico do político, ou o político do econômico, é

imprudente quando parte-se do entendimento de que esses aspectos são interdependentes no

cerne daquilo que é o Estado – uma ação em nível político pode resultar em consequências

econômicas, e ações econômicas geram consequências políticas. Identificam-se, por 

conseguinte, na agenda do Mercosul, alguns temas de caráter genérico que abrangem tanto o

37 VAZ, Alcides Costa. Op. cit . p. 111.38 MENEZES, Alfredo da Mota. Op. cit . p. 57.39 CERVO, Amado Luiz, e BUENO, Clodoaldo. Op. cit . p. 483.40 BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz.   A integração da América do Sul como espaço geopolítico. In:MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES.   Integração da América do Sul . Brasília: FUNAG, 2010. p.146.

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âmbito econômico quanto o político, a saber 41: a) o complemento dos mecanismos da União

Aduaneira; b) o problema das assimetrias; c) maior grau de institucionalização do bloco; e d)

ampliação do Mercosul.

Com o aspecto econômico como principal argumento de motivação da integração no

Cone Sul, com a evidência da deflagração de diversas crises econômicas na década de 1990

na Ásia com os Tigres Asiáticos e com o Japão e também no México, que vieram a afetar 

tanto Brasil quanto Argentina, é possível perceber como o Mercosul poderia beneficiar os

  países do grupo em termos de capacidade de negociação e representatividade no cenário

internacional. Todavia, apesar de resultados positivos na expansão do comércio, as diretrizes a

serem adotadas pelo grupo dependiam de difíceis negociações políticas, que por sua vez eram

condicionadas por pressões de setores específicos das economias internas de cada país, além

dos próprios interesses dos países independentes de pressões pontuais, o que veio a dificultar o sucesso na integração, gerando um estancamento neste processo. Mesmo assim, Cervo e

Bueno apresentam seis resultados positivos que trouxe o Mercosul42:

a)  melhoria da convivência, nas relações políticas, econômicas, acadêmicas e

sociais entre Brasil e Argentina, onde se pode inclusive evidenciar valores e

interesses comuns;

 b)  criação de um sistema de confiança mútua entre Brasil e Argentina, com base no

fim das políticas de armamentos nucleares (que existiam durante suas

respectivas ditaduras militares) e na elaboração de instrumentos jurídicos;c)  elevação do comércio intrabloco, provocada pela influência do regionalismo

aberto, convertendo o Paraguai no oitavo maior comprador do Brasil;

d)  extensa documentação jurídica que versa sobre diversos temas, como:

integração, solução de controvérsias, certificados de origem, comércio e aduana,

regimentos, justiça, educação, regulamentos técnicos; bem como a elevação do

Mercosul à sujeito de direito internacional a partir do Protocolo de Ouro Preto

em 1994;

e)  imagem positiva do bloco por se caracterizar como o segundo mercado comumdo mundo, o que favoreceu seu poder de barganha;

f)  ampliação da ideia de América do Sul que resultou na proposta de aproximação

entre Mercosul e CAN.

41 ARAÚJO, Ernesto Henrique Fraga. O Mercosul : negociações extra-regionais. Brasília: FUNAG, 2007. p. 71-72.42 CERVO, Amado Luiz, e BUENO, Clodoaldo. Op. cit . p. 483-485.

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Por outro lado, os mesmos autores apontam outros seis pontos que demonstram as

fraquezas do bloco43:

a)    percepções divergentes das diplomacias de Brasil e Argentina dificultaram as

negociações dentro do grupo e as relações entre os membros;

 b)    posturas de negação do sacrifício de parte da soberania nacional impediram a

adoção de políticas macroeconômicas comuns;

c)  adoção de medidas unilaterais para o comércio exterior, fazendo com que a tarifa

externa comum adotada dentro no bloco não fosse colocada em prática;

d)  não se criou formas de minimizar as assimetrias entre os países membros, de

caráter econômico, infraestrutural e social;

e)  diferentes políticas cambiais dos membros, onde Argentina usava a paridade

entre o peso e o dólar, e o Brasil usava taxa de câmbio variável;f)  contradição na estrutura do Mercosul, que mudou de zona de livre comércio para

união aduaneira sem a existência de instituições comunitárias, fato que

enfraqueceu sua capacidade de negociação.

Portanto, as fraquezas acima apresentadas permitem afirmar que o sucesso do

Mercosul se daria com consideráveis complicações, sendo o seu estancamento natural a partir 

da diminuição da credibilidade em resultados mais expressivos – como a própria

concretização do mercado comum – que pudessem vir do bloco. Contudo, a ideia de América

do Sul já estava difundida (como destacam Cervo e Clodoaldo no sexto ponto positivo acimadescrito) e impregnada como identidade regional do Brasil.

3.1.2 As Reuniões Presidenciais de Cúpula e a criação da CASA

Segundo o ex-Secretário Geral do Ministério das Relações Exteriores e diplomata,

Samuel Pinheiro Guimarães, a “América do Sul é a circunstância inevitável, histórica e

geográfica do Estado e da sociedade Brasileira”44. Tendo isso em vista, o Mercosul não foi

apenas importante como primeiro processo de integração de fato no qual o Brasil se engajou,

ele deu início a aspirações mais ambiciosas e abrangentes da diplomacia brasileira que passam

a ser postas em prática na Primeira Reunião dos Presidentes da América do Sul em Brasília no

43 Idem. p. 485-486.44 GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. “Quinhentos anos de periferia”. Rio de Janeiro: Contraponto, 2002. 4ed. In:COUTO, Leandro Freitas. Op. cit . p. 38.

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28

ano 2000, onde começa a “reafirmação da identidade própria da América do Sul como

região”45.

 Nesta reunião de cúpula, dá-se um passo mais concreto em direção à integração da

região ao se criar a Iniciativa para Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana

(IIRSA). Partia-se da ideia de ser fundamental para o processo de integração haver uma

infraestrutura de qualidade e desenvolvida, uma vez que se daria base à integração em outras

áreas como econômica, educacional e política46. Pode-se ainda destacar três vetores que

amparam as metas que viriam a ser buscadas pelos países sul-americanos após a reunião: “a

 proximidade geográfica, a identidade cultural e a consolidação de valores comuns”47.

Houve mais duas reuniões de cúpula dos presidentes da América do Sul, uma em

Guaiaquil (Equador, em 2002) – onde poucos resultados foram observados em termos de

integração de fato, havendo apenas maiores discussões sobre infraestrutura e sobre a IIRSA – e outra em Cusco (Peru, em 2004) – aqui as discussões se centraram na confirmação de uma

identidade comum sul-americana (difundida especialmente pela forte inclinação à América do

Sul presente na PEB quando Luiz Inácio Lula da Silva chegou à Presidência da República) e

geraram aquele que podia ser considerado o resultado mais concreto com vistas à integração

até então, a criação da Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA) pelas Declarações de

Cusco e Ayacucho.

Antes de entrar naquilo que concerne à integração, faz-se importante frisar o papel

fundamental do aspecto regional da PEB, que veio a influenciar decisivamente nos resultadosda Terceira Reunião dos Presidentes da América do Sul, onde surge a CASA. O governo do

ex-Presidente Lula trouxe à identidade sul-americana do Brasil um reforço, a começar pela

revitalização do Mercosul como uma postura prática de construção da região. Já em seu

discurso de posse se evidencia isso:

A grande prioridade da política externa durante o meu Governo será a construção deuma América do Sul politicamente estável, próspera e unida, com base em ideaisdemocráticos e de justiça social. Para isso é essencial uma ação decidida derevitalização do Mercosul, enfraquecido pelas crises de cada um de seus membros e  por visões muitas vezes estreitas e egoístas do significado da integração. O

Mercosul, assim como a integração da América do Sul em seu conjunto, é sobretudoum projeto político. Mas esse projeto repousa em alicerces econômicocomerciaisque precisam ser urgentemente reparados e reforçados. Cuidaremos também dasdimensões social, cultural e científico-tecnológica do processo de integração.Estimularemos empreendimentos conjuntos e fomentaremos um vivo intercâmbio

45 CARDOSO, Fernando Henrique. “O Brasil e uma nova América do Sul”. Valor Econômico, 30/08/2000. In:Idem. p. 39.46 COSTA, Darc. “Infraestrutura e Integração na América do Sul”. In: REUNIÃO DE CHEFES DE ESTADODA COMUNIDADE SUL-AMERICANA DE NAÇÕES. América do Sul: Primeira Reunião dos Chefes de Estado da Comunidade Sul-Americana de Nações. Brasília: FUNAG, 2005. p. 31-41.47 GEHRE, Thiago. América do Sul: a ideia brasileira em marcha. Curitiba: Juruá, 2009. p. 108.

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intelectual e artístico entre os países sulamericanos. Apoiaremos os arranjosinstitucionais necessários, para que possa florescer uma verdadeira identidade doMercosul e da América do Sul. Vários dos nossos vizinhos vivem hoje situaçõesdifíceis. Contribuiremos, desde que chamados e na medida de nossas possibilidades, para encontrar soluções pacíficas para tais crises, com base no diálogo, nos preceitosdemocráticos e nas normas constitucionais de cada país48.

O simples observar deste estrato do discurso de posse do ex-Presidente Lula permite

se elaborar algumas assertivas com relação aos processos de integração nos quais o Brasil

  passou a se engajar desde então. A integração nessa nova perspectiva de inserção regional

tentaria transcender o caráter econômico, posto que uma identidade e interesses comuns

seriam condições   sine qua non para o estabelecimento de instituições supranacionais de

âmbito regional. Outrossim, tal discurso não significa que o foco da PEB para a América do

Sul seria apenas o Mercosul, pôde-se observar ao longo dos oito anos de governo Lula que o

Mercosul, uma vez reavivado, se configurou como meio para uma integração de prospectomais amplo por sua aproximação com a CAN: a CASA, criada em 2004 pelas Declarações de

Cusco e Ayacucho, como mostrado anteriormente, englobando Argentina, Bolívia, Brasil,

Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela.

  Na Declaração de Cusco49, encontram-se referências à história compartilhada dos

 países do bloco (por terem enfrentado dificuldades semelhantes e terem estado numa relação

de dependência com suas respectivas metrópoles enquanto eram colônias), à convergência dos

interesses, valores e aspirações de desenvolvimento do ambiente sul-americano (que deve ser 

integrado politica, social, econômica e infraestruturalmente) para fortalecer a própria América

do Sul; referências essas que fomentaram os campos de ação a serem trabalhados e discutidos

 pelos países membros. Vale ainda ressaltar o destaque dado à convergência entre Mercosul,

CAN, Chile, Guiana e Suriname, estes últimos que até então pouco tinham se engajado em

algum processo de integração regional. No entanto, “as reuniões de Cusco e Ayacucho

representaram, nas palavras do Chanceler Celso Amorim, ‘o marco zero, e não o ponto de

chegada’ da integração sul-americana”50.

Seguindo a lógica das reuniões presidenciais prévias como forma de facilitar o

diálogo dos países membros do grupo, também são realizados novos encontros entre os chefes

48 SILVA, Luiz Inácio Lula da. “Discurso na Sessão de Posse, no Congresso Nacional”. In: BRASIL. Presidente. Discursos selecionados do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Brasília: FUNAG, 2008. p. 14-15.49 “Declaração de Cusco sobre a Comunidade Sul-Americana de Nações”. In: REUNIÃO DE CHEFES DEESTADO DA COMUNIDADE SUL-AMERICANA DE NAÇÕES. Op. cit . p. 13-18.50 TAUNAY FILHO, Jorge d’Escragnolle. “Comunidade Sul-Americana de Nações – CASA”. In:CONFERÊNCIA NACIONAL DE POLÍTICA EXTERNA E POLÍTICA INTERNACIONAL.   II Conferência Nacional de Política Externa e Política Internacional: Seminário América do Sul . Brasília: FUNAG, 2008. p.22.

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de Estado dos doze países que compõem a CASA. Na Primeira Reunião de Chefes de Estado

e de Governo da CASA (Brasília, em 2005), estabeleceu-se uma série de documentos sobre

diversos temas. Salientam-se dois por criarem uma estrutura básica de organização das ações

no âmbito da CASA, a saber: “Declaração Presidencial e Agenda Prioritária” e “Programa de

Ação” 51. Destacam-se, também, os seguintes pontos como prioritários para as ações a serem

realizadas, a partir da reunião em questão: “diálogo político; integração física; meio ambiente;

integração energética; mecanismos financeiros sul-americanos; assimetrias; promoção da

coesão social, da inclusão social e da justiça social; e telecomunicações”52.

O Brasil, a cargo da Presidência Pro Tempore da CASA entre os anos de 2005 e

2006 e na tentativa de exercer sua vocação sul-americana, teve o papel de organizar as

 posteriores reuniões demandadas na cúpula de Brasília (acima mostrada) por diversos setores.

Teve grande relevância a Terceira Reunião de Chanceleres da CASA (2006), porque secelebrou o primeiro tratado sob a égide da CASA: “Acordo entre os Estados Membros da

Comunidade Sul-americana de Nações sobre Dispensa da Exigência de Visto de Turista e

Habilitação de Documentos de Identidade para Ingresso e Trânsito em Seus Territórios”. A

importância desse acordo reside na tentativa de se criar uma cidadania sul-americana,

 beneficiando não apenas os Estados, mas também o povo da América do Sul53.

Por sua vez, a Segunda Reunião de Chefes de Estado e de Governo da CASA

(Cochabamba, em 2006) teve como resultado a Declaração de Cochabamba. Aqui,

reconhecem-se as assimetrias entre os países da região e reitera-se a necessidade de buscar alternativas para alcançar o desenvolvimento dos países membros. Tal busca se daria pela

integração calcada em uma “identidade própria, pluralista, em meio à diversidade e das

diferenças, reconhecendo as distintas concepções políticas e ideológicas, que correspondem à

  pluralidade democrática de nossos países”54.  Dessa forma, percebe-se que a CASA veio

organizar as relações entre os países da América do Sul, com uma melhor definição dos

objetivos, interesses e ações compartilhados pelos membros do grupo; contudo, uma

51 Demais documentos aprovados na I Reunião dos Chefes de Estado e de Governo da CASA: Declaração sobrea Convergência dos Processos de Integração da América do Sul, Declaração sobre Integração na Área deInfraestrutura, Decisão sobre Propostas Apresentadas Durante o Diálogo Presidencial, Decisão sobrePropostas dos Presidentes do Uruguai e da Venezuela, Declaração sobre a Cúpula CASA – União Africana,Declaração Conjunta sobre a Colômbia, Declaração de Caracas no âmbito da I Reunião de Ministros daEnergia da CASA e, finalmente, Declaração de Segurança Cidadã na América do Sul. In: FUNDAÇÃOALEXANDRE DE GUSMÃO. Comunidade Sul-Americana de Nações: documentos. Brasília: FUNAG,2005.

52 TAUNAY FILHO, Jorge d’Escragnolle. In: CONFERÊNCIA NACIONAL DE POLÍTICA EXTERNA EPOLÍTICA INTERNACIONAL. Op. cit . p. 23.53 Idem. p. 24.54 “Declaração de Cochabamba”. In: COUTO, Leandro Freitas. Op. cit . p. 59.

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institucionalização de fato da região, como a observada na Europa, ainda estava por vir e foi

realizada no retorno da reunião de cúpula dos chefes de Estado da CASA à Brasília em 2008.

3.1.3 A institucionalização da América do Sul: o surgimento da Unasul

Finalmente, na Terceira Reunião dos Chefes de Estado e de Governo da CASA

(novamente em Brasília, em 2008), se concretiza institucionalmente a América do Sul: é

assinado o Tratado Constitutivo da União das Nações Sul-Americanas (Unasul). Fato este

que, além de transformar a CASA em Unasul, confere à instituição personalidade jurídica,

transformando-a em um agente político reconhecido no Sistema Internacional. O tratado,

 porém, só veio a entrar em vigor em março de 2011, quando ratificado foi por nove dos doze

 países signatários.Amado Cervo e Clodoaldo Bueno refletem sobre a estrutura da Unasul e os

interesses brasileiros enquanto membro do grupo e afirmam que “a Unasul não exerce apenas

o papel de mediador entre interesses brasileiros e objetivos globais da política exterior. O polo

de poder recém-criado, o ente América do Sul, se adquirir operacionalidade, realiza

diretamente interesses brasileiros”55. De forma que se observa pelo tratado constitutivo do

  bloco a existência de objetivos políticos, econômicos e sociais (nos quais os interesses

 brasileiros viriam a se realizar), como apontado no seu Artigo 2:

A União de Nações Sul-americanas tem como objetivo construir, de maneira  participativa e consensuada, um espaço de integração e união no âmbito cultural,social, econômico e político entre seus povos, priorizando o diálogo político, as políticas sociais, a educação, a energia, a infraestrutura, o financiamento e o meioambiente, entre outros, com vistas a eliminar a desigualdade socioeconômica,alcançar a inclusão social e a participação cidadã, fortalecer a democracia e reduzir as assimetrias no marco do fortalecimento da soberania e independência dosEstados56.

De fato, o projeto brasileiro de inserção regional, após definir a América do Sul

como sua referência regional, ganhou proporções positivas, tendo em vista o engajamento dos

outros onze países deste subcontinente, e foi fundamental para o afunilamento dos processosde integração sul-americanos em apenas um. A concretização de uma instituição política sul-

americana não se daria sem a presença brasileira, uma vez que foi necessária uma

aproximação dos diversos interesses e identidades presentes na região, e o Brasil conseguiu

estimular essa aproximação. Hoje, a Unasul, ainda que sem resultados significativos, se

55 CERVO, Amado Luiz, e BUENO, Clodoaldo. Op. cit . p. 514.56 “Tratado Constitutivo da Unasul”. In: GARCIA, Eugênio Vargas. Op. cit . p. 732.

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configura como um dos poucos grandes blocos regionais de fato e com força no Cenário

Internacional, aspecto que poderá trazer não só ao Brasil, mas a todos os países membros,

maior impulsão e representatividade nas suas respectivas relações internacionais individuais e

em grupos.

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4. DEFINIÇÃO DAS IDENTIDADES E OBJETIVOS DA

CRIAÇÃO DA UNASUL

 No capítulo anterior, observou-se o caminho percorrido pela PEB para se definir a

América do Sul como o vetor regional das relações internacionais do Brasil, vetor este

institucionalizado no âmbito da Unasul. Todavia, a concretização da Unasul enquanto agente

 político internacional não dependeu unicamente da adoção de uma identidade sul-americana

  por parte do Brasil, foi preciso que os demais países membros da união desenvolvessem

também sua identidade sul-americana – esta convergente entre todos aqueles que vieram a

adotar a Unasul como a instituição representante de sua identidade regional. Pretende-se,

assim, neste capítulo, demonstrar a primazia de intenções políticas e geopolíticas (em

detrimento das econômicas e comerciais), presentes nos objetivos da Unasul e do próprio

 bloco em si. Para tanto, ter-se-ão como base os fatores e interesses que levaram a definição e a

adoção de uma identidade similar entre os países constituintes da Unasul, bem como a análise

do Tratado Constitutivo do bloco, face às perspectivas teóricas apresentadas no primeiro

capítulo e a influência da inclinação assertiva da PEB para a América do Sul mostrada no

segundo capítulo.

4.1 Esclarecendo a identidade sul-americana

Retornando à definição dada à identidade no primeiro capítulo, tem-se que a

formação de uma identidade depende de dois pilares: as circunstâncias nas quais se encontram

os países (fatores momentâneos de ordem histórica, geográfica e sistêmica); e os predicados

de cada um destes Estados (características políticas, econômicas e sociais). A junção desses

fatores, além de definir a identidade de um país ou de um grupo, permite definir também suas

visões e interesses. Destarte, é válido explanar maiores considerações sobre esses pilares na

identidade sul-americana institucionalizada no âmbito da Unasul, bem como os interesses queemanam dela.

Primeiramente, as circunstâncias de criação de uma identidade sul-americana para os

 países desse subcontinente são duas, a saber: a globalização e a localização geográfica. Pela

 primeira circunstância, tem-se que

 por um lado, a globalização exerce função de convergência entre as nações, à basedo capitalismo como ordem, do liberalismo como ideologia e da superioridade

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estratégica norte-americana como segurança; por outro, a formação de blocos denações limita o alcance global dessa convergência em curso57.

Pode-se afirmar, assim, que a motivação inicial de integração na América do Sul é o

contexto atual de globalização, sendo a Unasul alternativa e meio pelo qual os países sul-

americanos buscarão agir com vistas a seus objetivos e a seu espaço, evitando a convergência

da globalização em termos de ordem, ideologia e segurança. Todavia, a Unasul apenas se

configura como tal pela segunda circunstância anteriormente apresentada que é – ou deveria

ser por sua natureza – o caráter imediato das Relações Internacionais de qualquer país: o

aspecto da localização; onde, no caso dos sul-americanos, “a noção de identificação regional

está atrelada a um conjunto de elementos etnográficos, geofísicos e geopolíticos, na

caracterização das fronteiras definidoras de lugares na paisagem sul-americana”58.

É importante, pois, destacar que as duas circunstâncias se complementaram e  permitiram que a aproximação dos países na América do Sul se concretizasse, pelo

entendimento de que um bloco regional ajuda a atuação da própria região no Sistema

Internacional, uma vez que

  Num mundo de grandes blocos e que cada vez mais se organiza em regiões,devemos fortalecer a integração da América do Sul. A assinatura este ano doTratado Constitutivo da UNASUL amplia nossa perspectiva integracionista,conferindo maior equilíbrio aos vários processos associativos na região. Resgata  parte de uma longa história de desconhecimento recíproco entre os países sul-americanos59.

Em um segundo momento, pode-se dividir o pilar dos predicados também em dois: ahistória compartilhada dos países da região e os valores dos mesmos. A história

compartilhada entre os países se configura aqui como predicado, e não como circunstância,

  por se tratar de um fator que gerou as características desses países, ao invés de um fator 

momentâneo. Reconhece-se, assim, que essa história compartilhada é forjada pelas

características “multiétnicas, plurilíngues e multiculturais” das nações em questão, “que

lutaram pela emancipação e unidade sul-americanas”60.

Um aspecto a se considerar neste momento, por também fazer parte dessa história

compartilhada, são as assimetrias entre os países membros da Unasul. No entanto, as

assimetrias se diferem das outras características da história compartilhada na medida em que

57 CERVO, Amado Luiz. Op. cit. p. 152.58 GALVÃO, Thiago Gehre. “América do Sul: construção pela reinvenção (2000-2008)”.  Revista Brasileira de

 Política Internacional . Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais, 2009. v. 52. nº 2. p. 69.59 AMORIM, Celso. “Discurso na XII Sessão Ordinária do Parlamento do Mercosul – Montevidéu, 18 de agostode 2008”. In: BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Secretaria de Planejamento Diplomático. Repertóriode Política Externa: Posições do Brasil (2008-2009). Brasília: FUNAG, 2010. p. 30.60 “Tratado Constitutivo da Unasul”. In: GARCIA, Eugênio Vargas. Op. cit . p. 731.

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criam um desequilíbrio na região. “A América do Sul está longe de ser uma região

homogênea. As assimetrias assumem conotações estruturais na base das relações regionais”61.

De forma que essas assimetrias se configuram em diferentes proporções, de país para país;

  porém evidencia-se o Brasil com um potencial econômico e infraestrutural maior que os

demais. Não obstante, “a diplomacia brasileira busca uma reciprocidade verdadeira como

contraponto às assimetrias de poder e riqueza nas relações internacionais”62 e isso teve

reflexos na criação da Unasul, sendo possível observar a preocupação com a redução das

assimetrias no Artigo 2 de seu Tratado Constitutivo63.

Por sua vez, os valores, ainda que aspectos subjetivos, uma vez compartilhados

fundamentam as regras que venham a ser estabelecidas – estas, como visto no primeiro

capítulo pela perspectiva Construtivista, indicam o tipo de identidade que os agentes

constroem quando interagem com outros. A Unasul tem, então, como valores os princípios da“igualdade soberana, da inclusão e do progresso” que levam em consideração a

“inviolabilidade e integridade territoriais”64 por serem aspectos garantidores de uma

autodeterminação dos países do grupo, uma vez que estes perderam parcelas de sua soberania

 por entrarem em um processo de integração.

Outro fator a se avaliar enquanto valor comum para os países sul-americanos, e não

menos importante que os demais, é a democracia. Levando em consideração que as discussões

democráticas na América do Sul datam do século passado (por conta de um fato histórico

também compartilhado por considerável parcela dos países em questão, que foram suasrespectivas ditaduras militares), a preocupação com a estruturação democrática nos países sul-

americanos é ainda anterior aos próprios processos de integração regional, de forma que “o

aperfeiçoamento institucional e o fortalecimento do Estado de Direito são imperativos para

61 COUTO, Leandro Freitas. “Política Externa Brasileira para a América do Sul: As diferenças entre Cardoso eLula”. Civitas. Porto Alegre: PUCRS, 2010. v. 10. nº 1. p. 30.62 AMORIM, Celso. “Por uma nova arquitetura internacional – Palestra no Seminário Diplomático do Ministériodos Negócios Estrangeiros de Portugal. Lisboa, 05/01/2009”. In: BRASIL. Ministério das Relações Exteriores.Secretaria de Planejamento Diplomático. Op. cit . p. 18.63 “Tratado Constitutivo da Unasul: Artigo 2. Objetivo: A União de Nações Sul-americanas tem como objetivo

construir, de maneira participativa e consensuada, um espaço de integração e união no âmbito cultural, social,econômico e político entre seus povos, priorizando o diálogo político, as políticas sociais, a educação, aenergia, a infraestrutura, o financiamento e o meio ambiente, entre outros, com vistas a eliminar adesigualdade socioeconômica, alcançar a inclusão social e a participação cidadã, fortalecer a democracia ereduzir as assimetrias no marco do fortalecimento da soberania e independência dos Estados”. In: GARCIA,Eugênio Vargas. Op. cit . p. 732.

64 GEHRE, Thiago. Op. cit . p. 115.

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todos os países, e sua realização se vê favorecida pela consolidação, em nossa região, de

mecanismos de solidariedade democrática”65.

Portanto, pela concatenação dos dois pilares apresentados, tem-se uma identidade

definida (aqui instituída no âmbito da Unasul), da qual emanam visões e interesses – que se

configuram como reflexos das próprias circunstâncias e predicados – comuns aos países

membros do grupo a partir do momento que proclamados em documentos (como o Tratado

Constitutivo), nos quais, de acordo com a perspectiva do Construtivismo, se demonstra a

identidade construída pela interação dos agentes em concomitância com a criação de regras e

da instituição sul-americana.

De fato, a observação de visões e de interesses comuns demonstra um caráter 

homogêneo daquilo que esperam e procuram os países sul-americanos enquanto bloco, cuja

consequência é a criação dos objetivos da Unasul – frutos da vontade política orquestrada pelainteração dos países que a compõem. No entanto, antes de interpretar os objetivos da Unasul e

de seus membros e sua natureza, é fundamental entender o papel do projeto brasileiro para a

organização dos países sul-americanos em torno de uma identidade regional comum e com

objetivos convergentes.

4.2 O esforço do projeto brasileiro na construção da América do Sul

 No capítulo anterior, elucidou-se como ocorreu a mudança das diretrizes regionaisdas relações internacionais do Brasil. Em um primeiro momento, houve uma participação

regional alinhada aos Estados Unidos; em um segundo, apresentou-se uma vertente voltada

 para a América Latina; e, finalmente, definiu-se a América do Sul como referência de uma

inserção regional mais assertiva. Definida, então, sua vocação e sua identidade regional, o

Brasil passa a agir, a priori, com vistas a difundir essa identidade e, a posteriori, com a

tentativa de institucionalizar a região, tendo em vista que “a institucionalização da ideia de

América do Sul passa por um processo histórico de incremento dos diálogos diplomáticos e

construção de um edifício integrativo, como um esforço genuíno de transformar identidades

egoístas em uma identidade coletiva”66.

65 CARDOSO, Fernando Henrique. “O Brasil e uma nova América do Sul”. Entrevista ao jornal Valor Econômico, 30/08/2000. In: Idem. p. 154-155.66 GALVÃO, Thiago Gehre. In: Op. cit . p. 75.

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Contudo, a aceitação do projeto brasileiro de integração não se deu facilmente – 

 porém não foi impossível –, o contexto regional proporciona diversas visões e interesses que

divergem uns dos outros, de forma que

Se existe uma América do Sul política, feita em sua grande maioria de governos de

esquerda que criam ambiente regional favorável ao reforço do polo de poder,existem duas Américas do Sul econômicas, uma liberal e primária, que busca oacordo de livre-comércio com os Estados Unidos, outra industrial edesenvolvimentista, que se volta ao aprofundamento da integração entre os vizinhos.Chile, Colômbia e Equador de um lado, Argentina, Brasil e Venezuela de outro. São  parcelas desproporcionais a embalar as relações internacionais e os modelosregionais67.

Por outro lado, vale ressaltar que, baseando-se em uma ótica Construtivista, os

discursos e os atos de fala são motivadores importantes das mudanças na ordem existente,

assim

a sistemática utilização do conceito de América do Sul nos discursos oficiais e asmodificações estruturais iniciadas no ano 2000 na gestão Cardoso, e continuadas  pelo governo Lula, no sentido da integração e aprofundamento do quadroinstitucional regional, revalidam a tradição da ideia de América do Sul, não apenas  para a política exterior do Brasil, como também para seus vizinhos. Da mesmaforma, a complexidade do mosaico regional torna-se inteligível à luz da sul-americanidade nas noções de identidade e identificação, pelo discurso diplomático ecomo conceito paradigmático de política exterior 68.

 Nessa perspectiva, a ação brasileira passa a ser pautada pelos discursos políticos e

diplomáticos, estes passando a deflagrar e a consolidar o conceito de uma América do Sul

integrada e como esfera privilegiada dos esforços de uma política externa regional69.

Entretanto, os países vizinhos do Brasil o viam ainda com uma imagem hegemônica

 proveniente de seu crescimento econômico e de suas dimensões geográficas, bem como de

sua inserção mais assertiva que os demais. A chancelaria brasileira demonstra, porém, não

uma postura hegemônica, mas cooperativa ao afirmar que

 Nossa política ativa de integração sul-americana parte da compreensão de que umavizinhança próspera e pacífica é boa para o nosso desenvolvimento e propicia umamelhor inserção internacional para o Brasil. Mas a integração é de interesse de todosos países sulamericanos. Aumenta as oportunidades de desenvolvimento e bem-estar na região70.

Há, assim, uma mudança na imagem que o Brasil inspira no ambiente sul-americano.

E, à medida que o avanço da integração neste subcontinente se aproxima de sua concretização

67 CERVO, Amado Luiz. Op. cit . p. 203.68 GALVÃO, Thiago Gehre. In: Op. cit . p. 69.69 GEHRE, Thiago. Op. cit . p. 158-159.70 AMORIM, Celso. “Por uma nova arquitetura internacional – Palestra no Seminário Diplomático do Ministériodos Negócios Estrangeiros de Portugal. Lisboa, 05/01/2009”. In: BRASIL. Ministério das Relações Exteriores.Secretaria de Planejamento Diplomático. Op. cit . p. 28.

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na Unasul, passa-se a evidenciar “a imagem de uma liderança regional brasileira na América

do Sul”71 e não de um hegemon. Três tendências, descritas na PEB a partir do ano 2000,

contribuíram, também, para um novo olhar sobre o Brasil na região72:

a)  expansão a agenda internacional (com acréscimo de temas como tecnologia,

comércio, infraestrutura, democracia, tráfico de drogas e crime organizado);

 b)  realizar os trabalhos dessa agenda ampla em conjunto com os demais países da

América do Sul (onde se observa o surgimento das reuniões entre os Presidentes

dos países da região, a criação da CASA e, também, da Unasul);

c)  consolidar propagar a ideia da integração regional.

Portanto, é clara a importância do projeto brasileiro de integração da América do Sul,

difundido pela diplomacia e pelas visões políticas favoráveis a essa região após o ano 2000,

 pelo fato de buscar, via a concertação política, a convergência dos interesses dos países sul-americanos, na tentativa de difundir uma identidade regional comum que tornasse possível a

institucionalização desta; criando assim uma entidade (a Unasul) com capacidade de

  promover uma inserção internacional desses países de forma mais consistente, coesa e

coerente com os objetivos que emanam dessa união entre os países em questão.

4.3 As intenções da integração sul-americana e os objetivos da Unasul

A análise do Tratado constitutivo da Unasul permite afirmar que este bloco tem umaagenda extensa e complexa, além de contar com uma ambição considerável em termos de

esferas de ação. De modo que “dois traços caracterizam esse processo sul-americano de

integração: sua originalidade relativamente a outras experiências e o fato de se iniciar com a

integração política e geopolítica em vez da econômica, como ocorreu com o processo

europeu”73.

A despeito de se destacar a busca pela integração política e geopolítica, a Unasul

surge também com objetivos econômicos. Por conseguinte, dedica-se, neste momento, uma

atenção especial aos objetivos, gerais e específicos, tanto políticos e geopolíticos, quanto

econômicos, acordados pelos países sul-americanos ao criarem a Unasul.

Inicialmente, é importante traçar um breve comentário sobre o objetivo geral da

Unasul presente no Artigo 2 de seu Tratado Constitutivo, acima apresentado. Tal objetivo,

71 GALVÃO, Thiago Gehre. In: Op. cit . p. 74.72 GEHRE, Thiago. Op. cit . p. 143-145.73 CERVO, Amado Luiz, e BUENO, Clodoaldo. Op. cit . p. 514.

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ainda que abrangente, permite visualizar o prospecto de ação pretendido pelo grupo, pois faz

referências à integração em âmbito cultural, social, econômico e político, dando-se prioridade

a aspectos políticos, sociais, educacionais, infraestruturais, ambientais e financeiros, visando à

eliminação das desigualdades e assimetrias entre os Estados sul-americanos e suas

 populações.

4.3.1 Dos objetivos específicos de caráter político e geopolítico

 No contexto dos objetivos específicos (Artigo 3 do mesmo Tratado), percebe-se a

amplitude do que busca a Unasul, em que se destacam quatro objetivos claramente políticos.

O primeiro (Artigo 3, inciso “a”) versa sobre o fortalecimento do diálogo político dos Estados

Membros dentro da Unasul, com vistas a dar força à integração sul-americana e à participaçãodo bloco no Sistema Internacional74. Este objetivo é, posteriormente, reforçado no Artigo 1275 

  – com o destaque da importância do consenso para toda e qualquer decisão no âmbito da

Unasul – e no Artigo 1476 – com a afirmação da importância do diálogo político na união.

O segundo objetivo específico (Artigo 3, inciso “i”) aponta que o alcance de uma

cidadania sul-americana deve se dar via “a consolidação de uma identidade sul-americana

através do reconhecimento progressivo de direitos a nacionais de um Estado Membro

residente em qualquer outro Estado Membro”77. Já o terceiro (Artigo 3, inciso “k”), ainda com

relação aos cidadãos, estabelece que buscar-se-á, a partir do respeito aos direitos humanos etrabalhistas, uma cooperação em questões migratórias78.

Por fim, o quarto objetivo específico (Artigo 3, inciso “p”), de caráter 

fundamentalmente político, visa “a participação cidadã, por meio de mecanismos de interação

e diálogo entre a Unasul e os diversos atores sociais na formulação de políticas de integração

sul-americana”79. Este objetivo vem a ser reforçado pelo Artigo 18, sobre a participação

cidadã. Nele, há o entendimento de que a participação cidadã será respaldada por mecanismos

74 “Tratado Constitutivo da Unasul”. In: GARCIA, Eugênio Vargas. Op. cit . p. 733.75 “Tratado Constitutivo da Unasul: Artigo 12. Aprovação da normativa: Toda normativa será adotada por 

consenso”. In: Idem. p. 739.76 “Tratado Constitutivo da Unasul: Artigo 14. Diálogo político: A concertação política entre os Estados

Membros da Unasul será um fator de harmonia e respeito mútuo que afiance a estabilidade regional esustente a preservação dos valores democráticos e a promoção dos direitos humanos. Os Estados Membrosreforçarão a prática de construção de consensos no que se refere aos temas centrais da agenda internacional e  promoverão iniciativas que afirmem a identidade da região como um fator dinâmico nas relaçõesinternacionais”. In: Idem. p. 740-741.

77 “Tratado Constitutivo da Unasul”. In: Idem. p. 733.78 Ibidem.79 Idem. p. 734.

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gerados pelos países membros, de incentivo à discussão de temas diversos, de forma

democrática e transparente80.

Seria imprudente, já que se fala de objetivos políticos, não dar a devida atenção a

mais dois artigos do Tratado Constitutivo da Unasul, uma vez que ambos tratam de temas

essencialmente políticos, além de se configurarem como condições   sine qua non para o

sucesso de um processo de integração. O primeiro é o Artigo 1781, nele se encontra a previsão

da criação, no porvir, de um Parlamento Sul-Americano, a se situar em Cochabamba

(Bolívia); o segundo é o artigo 2182, onde se prevê instâncias de solução de eventuais

controvérsias que venham surgir entre os Estados Membros: inicialmente as controvérsias se

resolveriam por negociação direta entre os países; caso não resolvidas, passa-se a sugestão de

solução do Conselho de Delegadas e Delegados; e, se ainda não houver uma solução, o caso é

levado ao Conselho de Ministras e Ministros das Relações Exteriores dos países membros.Com relação a objetivo de caráter geopolítico, destaca-se um apenas, o Artigo 3,

inciso “s”, onde se declara a expectativa do “intercâmbio de informação e de experiências em

matéria de defesa”83. A despeito de existir somente um objetivo específico geopolítico, há na

Unasul uma considerável “ênfase à segurança regional, cujos contenciosos são resolvidos pela

ação diplomática”84, de onde pode-se apontar a Decisão de Bariloche, resultado de uma

reunião extraordinária dos Chefes de Estado e de Governo da Unasul em 2009, que visa:

Fortalecer a América do Sul como zona de paz, comprometendo-nos a estabelecer um mecanismo de confiança mútua em matéria de defesa e segurança, sustentando

nossa decisão de abster-nos de recorrer à ameaça ou ao uso da força contra aintegridade territorial de outro Estado da UNASUL.85 

4.3.2 Dos objetivos específicos de caráter econômico

Como mostrado no início dessa seção, poucos são os objetivos específicos de caráter 

econômico; especulativamente, pode-se dizer que a razão disso seria que o Mercosul e a CAN

“continuam negociando”86, sendo a integração econômica no âmbito da Unasul improvável.

80 Idem. p. 741-742.81 Idem. p. 741.82 Idem. p. 742-743.83 Idem. p. 734.84 CERVO, Amado Luiz, e BUENO, Clodoaldo. Op. cit . p. 514.85 “Decisão de Bariloche – Reunião Extraordinária dos Chefes de Estado e de Governo da Unasul”. Disponívelem: <http://www.itamaraty.gov.br/temas/america-do-sul-e-integracao-regional/unasul/bariloche>. Acesso em:19/09/2011.86 CERVO, Amado Luiz, e BUENO, Clodoaldo. Op. cit . p. 514.

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Contudo, é importante que se dedique um espaço para tratar de três objetivos de caráter 

fundamentalmente econômicos, que se encontram no texto do Tratado Constitutivo da Unasul.

O primeiro (Artigo 3, inciso “f”) reflete as dinâmicas da globalização em termos de

finanças, buscando promover “a integração financeira mediante adoção de mecanismos

compatíveis com as políticas econômicas e fiscais dos Estados Membros”87. O segundo

(Artigo 3, inciso “l”)88 é mais amplo, havendo uma preocupação com aspectos sociais; ele

dependerá, em grande parte, de vontade política por sua abrangência, bem como da

convergência entre os processos já realizados nas esferas do Mercosul e CAN.

O último (Artigo 3, inciso “m”)89 visa à integração industrial e produtiva, onde

deverá haver espaço para empresas de pequeno porte, bem como de outras formas de

organização produtiva. É válido mencionar o objetivo específico do inciso “e”, sua utilidade

 para o objetivo econômico anterior e para os demais apresentados é grande, uma vez que eleretoma a importância do “desenvolvimento de uma infra-estrutura para a interconexão da

região e de nossos povos”90; ou seja, retorna-se à preocupação que levou à criação da IIRSA,

 pois “não há outro caminho para tornar a América do Sul uma unidade econômica que passe à

margem dos projetos de infraestrutura e da integração produtiva”91.

Há, portanto, dúvidas com relação à aplicabilidade e posteriores resultados dos

objetivos econômicos, uma vez que o Mercosul, por exemplo, já existe há dez anos e ainda

não alcançou status de efetivo mercado comum. “Uma análise dos fluxos regionais de

comércio, investimentos e de pessoas, revela que ainda há um caminho longo a percorrer paraque se possa alcançar um grau elevado e constante nos fluxos intrarregionais”92. O fato é que

a América do Sul (ou mesmo seus blocos sub-regionais) não se configura como uma região

economicamente consolidada.

4.4 As expectativas da criação da Unasul

87 “Tratado Constitutivo da Unasul”. In: GARCIA, Eugênio Vargas. Op. cit . p. 733.88 “Tratado Constitutivo da Unasul: Artigo 3, inciso l) a cooperação econômica e comercial para avançar e

consolidar um processo inovador, dinâmico, transparente, equitativo e equilibrado que contemple um acessoefetivo, promovendo o crescimento e o desenvolvimento econômico que supere as assimetrias mediante acomplementação das economias dos países da América do Sul, assim como a promoção do bem-estar detodos os setores da população e a redução da pobreza”. In: Idem. p. 733.

89 “Tratado Constitutivo da Unasul”. In: Ibidem.90 Ibidem.91 CERVO, Amado Luiz. Entrevista à Revista Oikos. Revista Oikos, Rio de Janeiro, vol. 7, nº 1, 2008. p. 205. 92 COUTO, Leandro Freitas. In: Op. cit . p. 31.

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A observação de parte dos diversos objetivos específicos da Unasul permite afirmar 

que o bloco nasce com grandes expectativas de resultados. A amplitude dos campos de ação e

toda sua complexidade institucional – construída com base em três órgãos menores: Conselho

de Chefes de Estado, Conselho de Ministros de Relações Exteriores e Conselho de

Delegados93 – possibilitam vislumbrar na região um grau de integração inédito na América do

Sul, comparável ao da União Europeia, sendo a diferença principal o foco inicial do processo

de integração – a União Europeia começou como uma comunidade econômica –, enquanto na

Unasul evidenciam-se intenções ambiciosas de caráter político que se ocupam:

a)  da construção do consenso como regra de promoção do diálogo entre osEstados-parte e nas relações com terceiros;

 b)  da criação de um Parlamento sul-americano, com sede na cidade deCochabamba;

c)  do incentivo à participação cidadã como nível máximo da pluralidade edemocratização institucional94.

Face ao que até aqui foi exposto, afirma-se que a Unasul se construiu por meio de um

longo processo de identificação regional por parte de seus países membros, resultado do

entendimento de que o cenário político e econômico de globalização do Sistema Internacional

requisitava e requisita, ainda, uma ação pautada na representatividade das posições dos países

e em suas capacidades de agir com vistas a seus interesses e de que a ação internacional em

 bloco permite uma inserção mais assertiva, além de garantir maior representatividade da voz

dos países. Outrossim, a institucionalização só foi possível por conta do projeto brasileiro para

a América do Sul, que promoveu a convergência dos interesses diversos de cada país em um

conjunto consensuado de interesses e visões que permitiram o avanço das negociações em

 prol de uma sul-americanidade forte e arraigada na política externa dos Estados membros da

Unasul.

De fato, os objetivos presentes no Tratado Constitutivo da Unasul são audaciosos. A

região não tinha visto até então tal mobilização em torno de intenções comuns. Os aspectos do

consenso político e da participação cidadã nas decisões a serem tomadas demonstram uma

harmonia nas relações entre os países sul-americanos, onde rivalidades históricas e problemas

  políticos parecem terem sido resolvidos como forma de se caminhar rumo a melhorias

individuais e coletivas.

Portanto, é válido afirmar que a Unasul se configura como um processo de

integração regional ambicioso, apesar de não apresentar resultados concretos – o que pode se

 justificar pela recente entrada em vigor de seu acordo originário, como mostrado no capítulo

93 CERVO, Amado Luiz, e BUENO, Clodoaldo. Op. cit . p. 514.94 GEHRE, Thiago. Op. cit . p. 115-116.

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anterior –, mas com expectativas positivas de resultados significativos para o

desenvolvimento e crescimento dos países membros do bloco.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi possível, com este trabalho, ampliar o entendimento sobre os fatores e sobre os

contextos que levam os países a formarem um bloco regional. É possível, então, afirmar que aconstrução de uma entidade supranacional demanda vontade política e engajamento de todas

as partes envolvidas no processo. Faz-se importante destacar o aspecto identitário como

 principal motivador da integração. Contudo, o aspecto identitário também pode significar a

durabilidade incerta de um processo de integração regional, uma vez que a identidade é

mutável, e sua definição depende dos pilares apresentados no último capítulo; ou seja, se as

circunstâncias e/ou os predicados dos países ou de um país mudam, não se pode afirmar que a

estrutura, ou mesmo a existência, do bloco manter-se-á intacta. Um exemplo disso é a

diferença que o Brasil faz na Unasul e fez em sua criação – o projeto de América do Sul provém da diplomacia brasileira, assim como é o Brasil o país em melhor situação econômica

e estrutural do bloco – de forma que a ausência brasileira, possivelmente, desestabilizaria a

institucionalidade atual da América do Sul.

A Unasul, ainda que sem resultados concretos consideráveis, algo que se explica pela

recente entrada em vigor de seu Tratado Constitutivo, se promove como um dos blocos mais

representativos do Sistema Internacional, uma vez que abrange uma grande extensão

territorial e um considerável número de pessoas. Tal fato demonstra como as relações

internacionais, no contexto pós-Guerra Fria, têm se modificado, revelando-se a aproximação

de interesses e de vontades uma alternativa pacífica e recorrente na concertação internacional,

de forma que este trabalho se torna relevante nos contextos político, geopolítico, econômico e

de segurança, bem como o estudo da integração regional se torna relevante dentro das

Relações Internacionais.

Consoante ao problema proposto, conclui-se que a criação da Unasul foi motivada

 pela definição da identidade sul-americana de cada um dos países membros, bem como pela

aproximação entre os blocos previamente existentes neste subcontinente (Mercosul e CAN);

também é possível afirmar que a Unasul transcende o aspecto econômico e comercial

tradicional em outros processos de integração pela observação de seu objetivo geral de

eliminação das desigualdades e assimetrias entre os Estados membros via a integração

cultural, social, política e, inclusive, econômica.

De fato, foi possível perceber que a Unasul começa com a integração política. Ao se

comparar, simplesmente, a forma como ela surgiu e seu Tratado Constitutivo com os

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conceitos dos estágios de integração econômica, pode-se concluir que a Unasul não se

configura como um bloco econômico ou comercial (não há referência alguma à redução

tarifária, tarifa externa comum ou união monetária no Tratado Constitutivo); atentando-se,

assim, para o Mercosul, um grupo menor que a Unasul, que não conseguiu atingir seu

objetivo primordial de tornar-se um mercado comum, não faria sentido que a Unasul buscasse

a integração econômica com os 12 países do bloco sendo que um bloco de menor amplitude

não foi capaz de fazê-lo. Confirma-se, dessa forma, a hipótese inicial deste trabalho de que a

Unasul é primordialmente pensada e construída com fins políticos.

O objetivo principal proposto foi alcançado, pois se observou que os aspectos da

construção da Unasul são: a) a identidade – calcada pelas circunstâncias dos países da região

(uma delas é a globalização, sendo a integração alternativa de uma inserção mais assertiva e

representativa; e a outra, a situação geográfica dos países sul-americanos) e por seus predicados (um deles é sua história compartilhada, baseada em suas características sociais,

culturais, políticas e econômicas; e o outro são os valores comuns a esses países); e b) a

influência do projeto brasileiro para a América do Sul, que por meio dos esforços políticos e

diplomáticos rompeu a visão que se tinha de um Brasil hegemônico e difundiu a sul-

americanidade na região.

Por sua vez os objetivos específicos também foram atingidos, de forma que o

segundo aspecto que levou à construção da Unasul responde a um dos objetivos específicos – 

demonstrar a influência da PEB na região para a criação do bloco –; já os fatores que levaramà criação da Unasul também foram evidenciados (insucesso da América Latina enquanto

região a se integrar, aproximação entre Mercosul e CAN e surgimento da CASA); por último,

identificou-se também os objetivos da Unasul já constituída, sendo estes de caráter 

 primordialmente políticos e geopolíticos.

Portanto, há atualmente na América do Sul três blocos de integração regional, dois de

caráter, principalmente, econômico e comercial (Mercosul e CAN) e um de caráter 

essencialmente político (Unasul). A Unasul se configura mais representativa em termos de

abrangência numérica e, por isso, se mostra com mais peso no Sistema Internacional. Assimque os trabalhos no âmbito da Unasul começarem a surtir efeito e seus objetivos forem se

tornando ações de fato, em algum momento haverá projetos e resultados também econômicos,

uma vez que há objetivos dessa natureza como visto no capítulo anterior. De forma que é

válido levantar o questionamento de uma eventual sobreposição, ou de uma maior atenção à

Unasul com relação à Mercosul e à CAN.

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Ainda é cedo para fazer uma afirmação mais clara nesse sentido, tendo em vista

também que a Unasul está apenas no começo de seus trabalhos e, como dito antes, até o

momento não produziu resultados concretos. No entanto, as expectativas com relação ao que a

Unasul pode promover são grandes e, mesmo que resultados significativos não venham a

acontecer, é possível afirmar que a Unasul é uma conquista para os países da região, porque

rivalidades históricas foram aparentemente superadas (ou ao menos amenizadas), os países

sul-americanos revelaram capacidade de dialogarem e buscarem soluções em conjunto,

surpreendendo por sua organização e pela abrangência até agora observada, o que demonstra

que, nas relações internacionais, é possível resolver os problemas, contenciosos e

desentendimentos, pacificamente.

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