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Construções Sustentáveis 1ª Edição Deborah Munhoz & Fernanda Coelho Belo Horizonte Edição das Autoras 2009

Construções Sustentáveis -Livro Versão Demonstrativa

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É possível morar e viver diferente nas cidades? Para compartilhar nossas aprendizagens e reflexões sobre o tema, escrevemos durante 2 anos para a antiga Revista Obras Online, (referência em Minas e São Paulo). Essa é uma publicação experimental e contém os primeiros textos elaborados em parceria com a arquiteta Fernanda Coelho e ilustrado pelo grande Guilherme Caldas (Bolha). Leia e deixe suas idéias, críticas e melhorias. Diga-nos se está usando o livro para algum trabalho e se ele inspirou novas idéias. Vamos seguir trabalhando na finalização do livro.Um abraço!Deborah

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Construções Sustentáveis

1ª EdiçãoDeborah Munhoz & Fernanda Coelho

Belo HorizonteEdição das Autoras 2009

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Esse livro contém os artigos publicados na Revista Obras Online no período de dezembro de 2008 a julho de 2009. Seu conteúdo está licenciado sobre Creative Commons. Você pode copiar e distribuir, dando os créditos às autoras. Você não pode fazer uso comercial ou criar obras derivativas. Para mais informações acesse:

Parceiros:

VERSÃO DEMONSTRATIVA

http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/2.5/br/

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Quem somos

Sustentabilidade e Construção Civil

Arquitetura Essencial

Águas e áreas verdes

Edifícios Enfermos e Qualidade de Vida

Certificações: transição para uma nova zona de conforto

O Sol e o redesign das cidades

SustenRentabilidade

O 4º Tripé da Sustentabilidade – 1ª Parte

O 4º tripé da sustentabilidade – 2ª parte

Pag 5

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Indice

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Os atuais problemas urbanos são o resultadoDe um design e de um estilo de vida do passado.

O que nós estamos projetando agora?

O futuro ainda não é, ele pode vir a ser O que nos estamos sonhando agora?

Mais do que construir, morar, trabalhar, Deslocar de forma diferente,

Precisamos ocupar o planeta de forma diferentePrecisamos de um outro tipo de mente

Precisamos de um projeto diferente

Projeto e design estão na menteO design atual

Está na arte de projetarNa era das Redes

A mente dá formaA mente projeta e ocupa os espaços

Uma mente diferente projeta de forma diferente, Ocupa espaços, se movimenta

Interage com a natureza, materiaisE formas em um design diferente.

Uma mente diferente enxergaRelações visíveis e invisíveis

Que estão entre e nas Partículas

EspaçosFormas

MateriaisPessoas.

Uma mente diferenteDesenha para a vida, Constrói relações prósperas, Não se apropria: USUFRUI De espaços e formas,Constrói espaços que Inspiram, motivam, transcendemConstrói espaços que não degradam o seu entornoErgue cidades harmônicas que proporcionam verdadeiramente Um futuro de infinitas possibilidades na Terra

A mudança da cultura das empresas demandaMudança de cultura de profissionais, Investidores, consumidores: PESSOAS

Alinhamento entre pensar, projetar e comercializarDentro de um novo paradigma, um novo conceitoChamado de sustentabilidade Que exige um construir sem destruir.

Como? Eis a questão!Precisamos de parcerias que nos ajudem A buscar soluções dentro de umPensar global e agir local.

Precisamos construir sem destruirDeborah Munhoz

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Deborah Munhoz, MSc [email protected]ólio: www.deborahmunhoz.wordpress.com

Mineira, nascida em Belo Horizonte e com muitas horas de vôo e estrada pelo Brasil. Palestrante, consultora e coach em Gestão da Qualidade de Vida & Sustentabilidade * Química e Mestre em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos (UFMG). Formada em Permacultura & Design e Bioconstrução pelo Ecocentro IPEC. Trabalhou como técnica da Gerência de Meio Ambiente da FIEMG onde formou-se como consultora de Produção Mais Limpa pelo CNTL/SENAI/RS. Coordenou o projeto de cooperação Brasil-Alemanha Horizonte 21 que visou a inserção da educação ambiental na educação profissional do SENAI. Atuou como consultora do Núcleo de P+L de Minas Gerais e trabalhou na construção da Agenda 21 Brasileira como representante do segmento empresarial. Professora do MBA do IETEC em Belo Horizonte* Foi bolsista da embaixada dos Países Baixos no curso de Ecologia do Carbono do IEB, a partir do qual passou a se interessar pela redução à vulnerabilidade das populações às mudanças climáticas. Busca aplicar o conhecimento adquirido ao longo de sua experiência profissional no desenvolvimento de novos profissionais de engenharia e arquitetura para o século XXI visando a sustentabilidade das cidades. Articulista da Revista Obras Online. Criadora da comunidade: cidadesustentavel.ning.com. Integra o movimento Nossa BH. Apoia a ONG 4 Cantos do Mundo e a AIESEC BH – maior rede de lideranças jovens do mundo fundada após a 2ª Guerra Mundial para promover a colaboração entre diferentes nações e promover a cultura de paz.

Fernanda [email protected]

Mineira, nascida em Belo Horizonte, com muitas horas de vôo pelo exterior. Arquiteta e Urbanista formada pelo Izabela Hendrix. Especialista em Conforto e Edificações Sustentáveis e em Engenharia Ambiental Integrada. Trabalha como gerente de projetos da WSDG Brasil – empresa referência mundial em acústica arquitetônica. Idealizadora do WSDG GREEN – proposta de implantar os conceitos de sustentabilidade dentro da acústica, buscando materiais menos agressivos a natureza e a saúde. Colabora com os projetos sociais da WSDG Brasil desenvolvidos junto ao Centro Cultural “A Fábrica”, na Lagoinha, Zona Noroeste de Belo Horizonte Possui participações em projetos em Angola, México e Estados Unidos. Busca aplicar o conhecimento adquirido ao longo de sua extensa formação na área de Arquitetura Bioclimática, Permacultura (IPEC), Arquitetura de Terra, Tintas Ecológicas (IDHEA), às práticas de arquitetura e urbanismo. Articulista da Revista Obras Online.

Gabriel de Almeida – [email protected] Caldas – [email protected] Thomé – [email protected]ção e Editoração

Mineiros, nascidos em Belo Horizonte. Gabriel, graduado em Publicidade e Propaganda e pós-graduando em MBA em Gestão Estratégica de Marketing; Guilherme, estudante de Design Gráfico; e Lucas, graduado em Publicidade e Propaganda.Todos eles são membros na AIESEC em Belo Horizonte, a maior organização jovem do mundo, presente em mais de 100 países, e que promove a descoberta e o desenvolvimento do potencial de liderança de seus membros para que impactem positivamente na sociedade. A AIESEC possibilita aos jovens uma experiência integrada que desenvolve competências pessoais e profissionais a partir do trabalho na organização, da vivência internacional, troca de conhecimentos, valorização da diversidade e gestão de equipes.Devido à experiência adquirida na AIESEC, Gabriel, Guilherme e Lucas estão em processo de desenvolvimento da TBL Comunicação Sustentável, uma agência de comunicação mais responsável, social e ambientalmente.

Quem somos

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Recentemente, a Câmara da Indústria da Construção em Minas Gerais lançou o “GUIA DE SUSTENTABILIDADE NA CONSTRUÇÃO”, o que marcou a entrada do setor na busca por formas mais equilibradas de empreender. Segundo o Prof. Vanderley M. John, do Depto. de Engenharia Civil da USP, a Construção Civil consome cerca de 70% dos recursos naturais extraídos da Terra, sendo uma das atividades menos sustentáveis do planeta.

Para compreender esse conceito é necessário conhecer as relações estabelecidas em um ecossistema segundo os chamados princípios ecológicos. A sustentabilidade significa a capacidade de um ecossistema natural se manter ao longo do tempo. É uma propriedade que emerge a partir da complexa interação de diversos seres vivos entre si e com o ar, solo, água e energia, em um planeta de recursos finitos. A cidade é considerada um ecossistema incompleto e caracterizada por elementos que se relacionam e evoluem conjuntamente ao longo do tempo, consumindo enormes quantidades de matérias primas e energia dos demais ecossistemas naturais. Toda edificação de uma cidade faz parte de uma teia, de um contexto, de uma história. Todo produto usado na sua construção tem um ciclo de vida específico, relacionado a outros. Uma edificação nunca está só. Ela está impactando e sendo impactada pelo ambiente social, cultural, econômico e interagindo com as forças da natureza. Sendo assim, não é possível que uma construção, sozinha, seja sustentável.

SUSTENTABILIDADE

E CONSTRUÇÃO CIVIL

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As edificações de uma época refletem os valores predominantes de sua cultura. O espaço construído é marcado por relações de interdependência entre diferentes elos de sua cadeia produtiva distribuídos em diferentes localidades. Nesse contexto, a cultura de consumidores que priorizam a estética tem grande influência sobre a demanda de projetos construtivos que não adotam a sustentabilidade como valor essencial. Podemos citar o uso excessivo do vidro em fachadas, como alternativa estética, desconsiderando seu mau desempenho como isolante térmico, o que gera altas demandas energéticas devido ao constante uso de ar condicionado. Alguns profissionais procuram, através de inovação, resgatar a harmonia entre estética, conforto (térmico, lumínico, acústico, ergonômico) e as questões climáticas, cada vez mais críticas no ambiente urbano. Encontram, porém, grande dificuldade na aceitação destes projetos. A ilusão de uma economia em curto prazo tem maior apelo do que as perdas econômicas e de qualidade de vida em médio e longo prazo.

Considerando os desafios ambientais deste novo século e ainda os fortes problemas sociais do Brasil, o país necessita de iniciativas como o BED ZED (Beddington Zero Energy Development), localizado em Wallignton, ao sul de Londres. O bairro ecológico, desenvolvido pelo arquiteto Bill Dunster, proporciona um modo de vida sustentável, sem sacrificar o estilo urbano. A integração das unidades habitacionais com áreas de trabalho no mesmo empreendimento, a proximidade do transporte público e o clube de compartilhamento de carros oferece aos residentes a oportunidade de reduzir o seu uso. Além disso, a adoção de sistemas passivos de climatização e iluminação, a geração de energia a partir de painéis fotovoltaicos, o tratamento e reaproveitamento das águas e o desenho em harmonia com o clima e entorno garantem a máxima eficiência na utilização dos recursos energéticos e materiais. Além disso, combinam atração e conforto superiores, com custo operacional mais baixo.

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De acordo com o físico Fritoj Capra, a sustentabilidade das comunidades humanas surge como conseqüência da nossa capacidade de entender os princípios ecológicos e viver em conformidade com eles. Dentro do universo da construção civil, implica na adoção de projetos e produtos arquitetônicos que levem à concepção de cidades sustentáveis. Uma mudança qualitativa dos novos empreendimentos deve surgir em função de iniciativas como a “etiquetagem” dos edifícios. O Brasil lançou em 2007 a “Regulamentação para Etiquetagem Voluntária do Nível de Eficiência Energética de Edifícios Comerciais, de Serviços e Públicos”, uma iniciativa do Programa Procel EDIFICA em convênio formado com a Eletrobrás. Atualmente voluntária, passará a ser obrigatória até 2012. Também se faz estratégica a educação dos compradores (empresas ou pessoas), uma vez que, através de suas escolhas e preferências, são co-responsáveis pelas características da construção. Nesse novo cenário, consumidores devem saber que, conforme sua escolha, sua edificação pode ser um passivo ou um ativo ambiental.

Imagem: Fernanda CoelhoInstalação temporária na forma de caixões feita por Yoko Ono realizada em 2005 na Cidade das Artes e das Ciências , em Valência/Espanha. A exposição foi feita com a intenção de chamar a atenção das pessoas para o ciclo da vida e de onde nos todos viemos: Terra

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ARQUITETURA

ESSENCIAL

Nada mais confortável do que sentir-se em casa, mas quantas pessoas hoje podem realmente se sentir bem no ambiente onde moram? Muitas pessoas buscam a resposta mudando-se para condomínios residenciais com áreas verdes. A qualidade de vida, no entanto, envolve muitos outros fatores como a saúde, a interação com o ambiente, a interação de cada pessoa consigo mesma, as relações sociais, a vida afetiva, situação financeira, entre outras. O resultado da complexa interação desses fatores com nossos desejos mais internos pode proporcionar ou não uma experiência de vida com qualidade. O planejamento de uma edificação considerando critérios básicos de sustentabilidade contribui com todos os fatores acima descritos.

A inserção dos elementos básicos de conforto proporciona a conexão das pessoas com suas casas e destas, com o local onde são construídas. E o conforto nada mais é do que a sensação de bem estar do ser humano em relação ao seu ambiente, a ausência de estresse de natureza física, térmica, visual, sonora e emocional.

A arquitetura é uma linguagem não verbal capaz de comunicar, de provocar experiências sensoriais e estados emocionais. De inspirar ou não bons pensamentos. O bem viver e o bom conviver transcende a felicidade baseada no ter e na aparência de elementos construtivos meramente decorativos. Em épocas de profundas transformações da natureza, quando nossa capacidade de continuar a existir é colocada em cheque, torna-se vital uma

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transição da Arquitetura da Aparência para uma Arquitetura da Essência. É preciso criar a consciência de que cada material utilizado em uma edificação possui uma bagagem ecológica. Veio da natureza, passou por um processo industrial, consumiu energia, gerou resíduos.

A qualidade de vida que essencialmente buscamos como seres humanos está além da complexidade da tecnologia artificial e muito mais próxima da tecnologia natural. Uma edificação que tenha iluminação e ventilação naturais, paredes porosas capazes de promover trocas gasosas entre os ambientes internos e externos, cores adequadas ao perfil de seus habitantes e um desenho criativo e belo, certamente favorecerá a saúde de seus ocupantes.

Ao construir com a natureza e não contra ela, chega-se a uma edificação de baixo impacto ambiental e baixo custo de manutenção. Dentro deste conceito, podemos citar os trabalhos de arquitetos como o espanhol Luiz de Garrido e os colombianos Luis Carlos Rios e Simon Vélez. O conceito de construir para a felicidade dos usuários baseia-se na experiência humana de habitar um lugar que seja “religado” com a natureza.

A complexidade desse século exige a formação de equipes interdisciplinares para a criação de espaços aliados a princípios ecológicos que proporcionem qualidade de vida a seus usuários, não como uma experiência efêmera, mas de uma arquitetura essencial.

Imagem: Luiz de GarridoLa Casa mariposa - Projeto do arquiteto espanhol Luis de Garrido

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ÁGUAS E ÁREAS VERDES:

Adaptação das cidades ao novo cenário climático

A entrada de 2009 levou a cidade de Belo Horizonte a olhar novamente para uma questão que é reincidente nas cidades brasileiras: a má relação entre planejamento urbano, água e as áreas verdes. Tendo em vista que eventos climáticos extremos, como os que atingiram a cidade no réveillon vieram para ficar e tendem a se intensificar, como adaptar as cidades brasileiras ao novo cenário climático do século XXI? O relatório sobre Mudanças Climáticas de 2007 elaborado pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas - IPCC e amplamente divulgado pela imprensa, deixou bem claro que, além da elevação da temperatura, haverá aumento da incidência de temporais e chuvas de granizo acompanhados de ventos de alta velocidade.

Em 2008, a capital mineira sentiu uma pequena parcela dos eventos climáticos previstos pelo relatório. Em setembro, a cidade foi surpreendida por uma intensa chuva de granizo e ventos que chegaram a mais de 50 Km/h em algumas regiões. Cerca de 800 casas foram destelhadas, muitas pessoas ficaram feridas e milhares de carros foram amassados, dentre outros prejuízos. Após 30 anos sem problemas, o Rio Arrudas voltou a transbordar. Inúmeras residências e lojas foram destruídas. Muito além dos prejuízos econômicos das famílias, comerciantes e contribuintes, está o passivo ambiental e emocional deixado pelos estragos de uma enchente nessas proporções. Algo que poderia ter sido evitado caso a água seguisse o seu ciclo natural: infiltrar e abastecer o lençol freático.

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O padrão das edificações e intervenções urbanas em desarmonia com o meio natural criou um ecossistema artificial, caracterizado pela baixa presença de vegetação, alta concentração de poluentes na atmosfera e uma elevada demanda energética e de recursos naturais. Estas características associadas ao tipo de material utilizado nas construções acabam por reduzir o conforto e a qualidade de vida nas cidades. Esses aspectos estão intimamente ligados à cobertura vegetal que, a cada dia que passa, perde espaço para uma infra-estrutura na qual predominam o concreto, o vidro e o asfalto. Muitas vezes, a Lei de Uso e Ocupação do solo não é respeitada. Após a aprovação dos projetos e obtenção do Habite-se, as áreas permeáveis exigidas por lei, tais como jardins e pisos drenantes são substituídas por pavimentos que impermeabilizam o solo, ou dão lugar a construções anexas (os famosos puxadinhos). Desta forma, a própria sociedade torna-se co-responsável pelas inundações que vem ocorrendo com tanta freqüência. Além da necessidade de fiscalização e punição, também é importante a conscientização dos cidadãos sobre a conseqüência e a repercussão de seus atos além da escala de sua moradia.

Imagem: Deborah Munhoz

Telhado destruído pelo granizo em Belo Horizont

Pressão da cidade sobre Parque Lagoa do Nado, próximo à Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte. A redução das áreas de recarga do lençol

freático reduzem a água das nascentes

da lagoa. Detalhe da

ortofotocarta de BH, Folha No 6.

EMBRAFOTO

Fonte: MUNHOZ, 1996

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A baixa permeabilidade do solo urbano afeta consideravelmente o movimento natural da água. Impedida de infiltrar no solo e abastecer o lençol freático, ela escoa pelas ruas e avenidas em alta velocidade, atingindo rapidamente os rios e redes de esgoto, provocando inundações.

A mesma lógica de impermeabilização ocorre nos condomínios residenciais horizontais. Apesar do baixo fluxo de veículos, muitos adotam o asfaltamento das vias e pavimentação quase completa das calçadas. Tanto árvores como a vegetação rasteira são importantes para a recarga do lençol freático e para a higiene e saúde das cidades.

É urgente e estratégico incentivar a ampliação, construção e manutenção de áreas verdes em locais públicos e privados. A implantação de “Calçadas Verdes”, a exemplo do que vem acontecendo no bairro Pompéia, na zona oeste da cidade de São Paulo, pode servir como modelo para novos projetos. A iniciativa, bancada por uma construtora local, foi apresentada no Ecobuilding 2008. A implantação de projetos que contemplem telhados verdes e a captação de água de chuva é fundamental para garantir maior conforto nas cidades e mitigar os efeitos negativos dos extremos climáticos. O aproveitamento da água de chuva leva à economia da conta de água e reduz o consumo de insumo durante o processo de tratamento pelas empresas de abastecimento

e esgoto. Também evita que as águas pluviais sejam levadas diretamente para o sistema de esgoto. Os telhados verdes são uma alternativa para compensar a cobertura vegetal tomada pelo ambiente construído e para melhorar o conforto interno das edificações e do micro clima local. Além de reintegrar a água ao espaço urbano e valorizar a paisagem, as áreas verdes promovem a melhoria microclimática através do sombreamento e da elevação da umidade relativa do ar, limpam a atmosfera, funcionam como anteparo às correntes de vento e barreiras para diminuição de ruídos, preservam a fauna e flora urbana e ainda, asseguram espaços de aproximação dos habitantes da cidade com a natureza.

Em época de aquecimento global, as construções devem estar cada vez mais preparadas para o agravamento das adversidades do clima. Então, vale ressaltar que toda área verde colabora com o tão famoso “seqüestro de carbono” que nada mais é do que o simples fenômeno de fotossíntese. Com tantas funções nobres, por que não dar a elas destaque nos conceitos projetuais? Cidades secas e áridas tornam as pessoas igualmente secas e áridas. Sendo a arquitetura uma linguagem não verbal, conceber edificações em harmonia com a água e com a riqueza da flora brasilera contribue, no fundo, para reaproximar o ser humano de si mesmo. Cidades mais verdes alem de mais humanas, são também mais belas. E como dizia Vinícius de Moraes, beleza é fundamental.

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Na era da velocidade, a construção de uma edificação passou a ser vista como um processo semelhante a uma linha de montagem. O produto, que deveria se transformar em um lugar de bem viver, muitas vezes, está longe de proporcionar saúde e bem estar a seus usuários, mesmo quando construídos em áreas verdes. O adoecimento de pessoas em edificações passou a chamar a atenção a partir da década de 80. Em 1984, um relatório da Organização Mundial de Saúde estimou que 30% dos edifícios novos ou remodelados apresentavam alto índice de reclamações relacionadas à qualidade do ar. O termo Síndrome do Edifício Enfermo (SEE) passou a ser usado para descrever situações em que pelo menos 20% dos ocupantes relatem desconforto ou que tenham a saúde afetada devido à permanência nesses edifícios.

A SEE está relacionada, principalmente, à falta de ventilação natural e à impossibilidade das edificações de dispersar poluentes presentes em seu interior. Os filtros dos aparelhos de ar condicionado, geralmente não recebem a devida manutenção, servindo de poderoso meio de cultura para fungos e bactérias. Desta forma, os usuários ficam expostos a um ar viciado e contaminado e apresentam sintomas como alergias, náuseas, dores de cabeça, secura ocular, dificuldade de concentração, entre outros. Além da má ventilação, estas ocorrências estão relacionadas ao desconforto térmico, formação de cargas iônicas no ar do interior da edificação, partículas em suspensão, exposição ao amianto e fibra de vidro, gases e vapores provenientes dos materiais utilizados e outros agentes.

EDIFÍCIOS ENFERMOS

E QUALIDADE DE VIDA

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em maior benefício social, dentro dos limites da viabilidade econômica.

A luz solar, por exemplo, pode ser devidamente explorada com a utilização de elementos que protejam as aberturas da insolação direta, mas permitam a entrada de luminosidade. A iluminação natural, além de evitar as manchas na pelo por exposição, traz sensação de bem estar para os usuários, melhorando sua disposição e produtividade.

É fundamental que construtores, engenheiros e arquitetos informem-se também sobre as propriedades dos materiais, avaliando o seu comportamento térmico, além de sua toxicidade. Um trabalho de conscientização também precisa ser feito junto ao mercado consumidor, para que esse faça escolhas conscientes em relação à sua salubridade e à qualidade de vida que terá no local onde escolheu habitar e trabalhar.

O desenvolvimento da química de materiais para a construção civil disponibilizou no mercado, uma variedade de tintas, pigmentos a base de metais pesados, colas, vernizes, solventes derivados de petróleo e uma infinidade de plásticos e fibras sintéticas presentes em materiais como forros e carpetes. Esses materiais não foram criados dentro de princípios de biocompatibilidade, mas somente dentro de uma lógica econômica, funcional e estética. Os usuários também estão expostos a ruídos, vibrações, emissões eletromagnéticas ou ionizantes produzidas por linhas de média e baixa tensão, televisores, microondas, fotocopiadoras, ar condicionado e outros equipamentos eletrônicos.

Um exemplo de Síndrome do Edifício Enfermo ocorreu na recém inaugurada sede da Companhia de Gás de Barcelona. Em fevereiro de 2007, aproximadamente cento e cinquenta trabalhadores apresentaram vermelhidão cutânea na região das pernas. Mil trabalhadores foram afastados do edifício pelo período de dois dias para medidas corretivas. Estudos considerados conservadores da Agência de Proteção Ambiental Americana, estimam que as perdas de produtividade relacionadas à SEE e à falta de conforto nos edifícios chegam a 70 bilhões de dólares por ano.

O problema vem se perpetuando através de um hábito comum dos arquitetos. Na fase de projeto, em um país como o Brasil, eles privilegiam o uso do ar condicionado e a iluminação artificial, em detrimento ao aproveitamento da iluminação e ventilação naturais, principalmente em prédios comerciais. Estudos realizados em edifícios europeus apontam que 46% dos problemas estão localizados na fase de projeto (BENIN, 1988). É exatamente durante a fase mais barata do processo, que a preocupação com a qualidade de vida dos moradores e a redução do impacto ambiental de uma edificação precisa ser incorporada. Uma construção mais sustentável depende da seleção correta de materiais e componentes, combinada com o detalhamento adequado do projeto. Isso resulta em impactos menores e

Referência Bibliográfica:

BONIN, L.C. Manutenção de edifícios: uma revisão conceitual. In: Seminário sobre manutenção de edifícios, Porto Alegre. Anais – v. I. Porto Alegre: URFGS, 1988. p. 1-31.

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Vários sistemas de certificação foram desenvolvidos ao redor do mundo. Alguns de caráter privado, outros de iniciativa pública. Cada sistema estabelece parâmetros de desempenho que devem ser alcançados pelos projetos ou construções, para receber determinada classificação. Dentre eles podemos citar: BREEAM – Building Research Establishment Environmental Assessment Method, no Reino Unido; CASBEE – Comprehensive Assessment System for Building Environmental Efficiency, no Japão; HQE – Haute Qualité Environnementale dês Batiments, na França; GREEN STAR, na Austrália e o LEED – Leadership in Energy and Environmental Design, nos Estados Unidos. Todos estes sistemas são membros do World Green Building Council e foram concebidos dentro de uma realidade socioeconômica, cultural, tecnológica e ambiental de seus países de origem.

Em 2007, o Brasil lançou a Regulamentação para Etiquetagem Voluntária do Nível de Eficiência Energética de Edifícios Comerciais, de Serviços e Públicos, com área útil total mínima de 500m2. Inicialmente voluntária, passará a ser obrigatória a partir de 2012. O documento foi elaborado pelo Laboratório de Eficiência Energética em Edificações do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Santa Catarina no âmbito do Programa PROCEL EDIFICA. A regulamentação contempla três fases do edifício: projeto, edificação concluída e reforma. Além disso, classifica o nível de eficiência de três diferentes quesitos: envoltória, sistema de iluminação e sistema de condicionamento de ar. Esses

CERTIFICAÇÕES:

transição para uma nova zona de conforto

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recebem classificação do nível de eficiência de A (mais eficiente) a E (menos eficiente). A regulamentação também inclui incentivos para implementação de sistemas como energia fotovoltaica ou cogeração. Espera-se agora a ampliação da regulamentação existente para a tipologia residencial, assim como para edificações com área inferior a 500m2.

Enquanto a iniciativa nacional começa a se difundir, a utilização de parâmetros estrangeiros para certificação de edificações brasileiras tem recebido críticas, devido às especificidades do contexto social e climático do nosso país. Apesar disso, a adoção de tais procedimentos dentro da prática projetual tem ajudado a mobilizar o setor da Construção Civil e a retirar seus profissionais da zona de conforto, acelerando o processo de transição de uma arquitetura focada apenas no lucro para uma arquitetura também focada no lucro. Grande parte dos profissionais, no entanto, não está preparada para conceber edifícios que interajam de forma mais harmônica com a natureza.

Os edifícios geram impactos ambientais ao longo de seu ciclo de vida nas fases de projeto, extração de matéria-prima, fabricação de materiais, construção, utilização e demolição. Esses impactos ganharam proporção a partir da revolução industrial. O paradigma da produção industrial tem em suas bases a utilização dos recursos energéticos de fontes não renováveis e dos materiais como se esses

fossem infinitos e de perpétua renovação. A produção industrial considera o processo de extração, produção e distribuição como um sistema aberto e linear. Desconsidera, portanto, que todas as etapas do processo de produção de uma edificação se dão em um mesmo lugar: o planeta Terra. Esta lógica foi levada ao setor da Construção Civil a partir da utilização de soluções arquitetônicas estandardizadas, descontextualizadas, desconsiderando fatores como clima, relevo, oferta de materiais locais, cultura e outros.

A arquitetura tem como um de seus princípios nos proteger dos extremos climáticos. Hoje chegamos a construir edifícios com menos conforto do que os primeiros abrigos pré-históricos. Independente dos sistemas de certificação deveria ser implícito a arquitetura sustentável ou bioclimática. Uma edificação com melhor performance ambiental será também uma edificação mais econômica, terá maior valor agregado para quem compra e menor impacto sobre os recursos naturais. Vale lembrar que economia e ecologia derivam da mesma palavra grega: “oikos”. Pela sobrevivência dos negócios e pela nossa própria sobrevivência, precisamos adotar estratégias oikosnômicas e não meramente econômicas nas soluções projetuais. gases e vapores provenientes dos materiais utilizados e outros agentes.

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A escritora Marina Colasanti, em seu texto ”Eu sei, mas não devia” diz:“A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.”

No processo de construção e crescimento das cidades, o sol passou a entrar cada vez menos nas habitações, nas ruas e consequentemente, na vida das pessoas. O sombreamento causado pelo pouco espaço entre uma construção e outra foi deixando os lares e escritórios cinza, taciturnos. A falta de vista provocada pelo cercamento do olhar também empobreceu a capacidade das pessoas de olhar além, olhar para fora, de bem viver e bem conviver.

O SOL E O

REDESIGN DAS CIDADES

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Além do aspecto psicológico, a falta de iluminação natural tem um reflexo direto sobre o consumo energético das habitações. Associada ao uso do ar condicionado, equipamentos eletrônicos de baixa eficiência energética e fiações elétricas antigas, aumenta cada vez mais o custo de energia para os consumidores. O risco do “apagão” e a elevação das tarifas de energia elétrica contribuíram para que a energia solar fosse mais ponderada nos projetos arquitetônicos, principalmente para o aquecimento de água. O sol, no entanto, deve ser considerado, de forma mais ampla, como um item fundamental para a saúde das pessoas, das habitações e da cidade. O direito a ele deve ser fator determinante para a escolha da posição da construção em um terreno, das formas das edificações, assim como do projeto de aberturas e vãos.

O estudo e aplicação das cartas solares são fundamentais para a execução de bons projetos. Loteamentos e construções, planejadas apenas para maximizarem os lucros em detrimento do bem estar de seus usuários, geram custos maiores diante das mudanças climáticas, adoecimento da população e dos conflitos sociais emergentes. A depressão instalada nas grandes cidades, a elevação das alergias respiratórias ou o baixo potencial criativo nos ambientes de trabalho são alguns reflexos da cultura da edificação de cidades gris. Para planejar cidades no novo cenário climático planetário é preciso um novo perfil de investidores e uma nova geração de profissionais do setor da construção civil, capazes de elevar os olhos além das pranchetas e do AUTOCAD.

O setor da construção civil necessita repensar questões como a sua responsabilidade social. Ele deve aprender a impactar positivamente e a gerar externalidades positivas, que não se limitem à geração de empregos, mas que permitam o nascimento das verdadeiras cidades solares com uma população e cultura mais iluminada.

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SUSTENRENTABILIDADE

É possível equilibrar o uso de recursos naturais de forma racional, criando ambientes construídos que possam gerar impactos positivos, promovendo a saúde e a qualidade de vida de seus moradores e, ainda assim, serem lucrativos? Existem profissionais, institutos e empresários que acreditam que sim. O instituto Rocky Mountain, no Colorado, EUA, faz parte desse time. Com o novo conceito de relação, ele tem ajudado empresas a conceber edifícios comerciais que garantam maior conforto, economia de energia e melhoria na produtividade, sem aumentar os custos com a construção. É bom para a empresa, para os funcionários e para a natureza. Esse constitui um dos muitos exemplos citados por Paul Hawken, Amory Lovins e L. Hunter Lovins, no livro “Capitalismo Natural”. Para que o setor da construção civil transcenda o medo de arriscar em empreendimentos que incorporem verdadeiramente o conceito de sustentabilidade, ele precisa quebrar paradigmas.

Nesse artigo, vamos brincar um pouco com as palavras e chamar essa visão explícita da ganha- ganha de SustenRentabilidade. Muitas vezes, percebemos que empreendimentos caros chegam a ter espaços tão ou mais desvitalizantes quanto ambientes construídos sem o auxilio dos “designers”. Espaços desvitalizados podem ser destrutivos do ponto de vista das relações humanas, servindo de cenário para violência, doenças e baixa produtividade, como pode ser facilmente percebido em grandes centros urbanos. As estruturas urbanas,

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assim como os edifícios, expressam a lógica do sistema econômico em que estão inseridos. O capitalismo industrial não reconhece a interdependência entre a produção e uso do capital com o consumo e conservação do capital natural.

O “Capital Natural” é constituído dos recursos naturais, sistemas vivos e os serviços do ecossistema (produção de água limpa, polinização de flores, etc.). Ao contrário das nossas edificações, dos sistemas urbanos ou de qualquer outro sistema industrial construído pelo ser humano, o capital natural garante a manutenção da vida no planeta, assim com dá suporte às atividades industriais. Atualmente, o sistema capitalista liquida os sistemas naturais para gerar somente lucro e a Construção Civil, assim como as diversas profissões ligadas ao setor, está operando dentro deste velho paradigma. A verdade inconveniente é que sem capital natural não há como sustentar nenhuma cadeia produtiva, para atender às necessidades humanas. Então como fazer a SustenRentabilidade reverberar no setor da construção civil? Concordamos com Paul Hawken, Amory e L. H Lovins, que é preciso repensar projetos que ganhem pela eficiência e não pela ineficiência. As estruturas urbanas e os edifícios refletem a lógica de um sistema que reduz o capital natural e subestima o capital humano. No inicio da revolução industrial havia escassez de mão-de-obra e abundância de recursos naturais. Máquinas e sistemas foram projetados para usar os recursos como se eles fossem infinitos. Dentro desse pensamento, era aceitável que seu desempenho fosse ineficiente. Hoje, temos outro cenário: as pessoas e o conhecimento são abundantes e os recursos naturais, escassos. É preciso projetar, portanto, dentro de outra lógica.

O surgimento de inovações nos projetos arquitetônicos é lento e desestimulado devido à baixa remuneração do Design (planejamento), o que deixa pouca abertura e tempo para a criatividade. É pratica comum no mercado, a remuneração/comissão dos profissionais em função do preço final da edificação que estão concebendo, ou seja, do que é gasto e não do que economizam em função de seus usuários e da natureza. Desta forma, o produto final não precisa ser ecoeficiente, gerar saúde, qualidade de vida e economia, mas ser o mais lucrativo para a cadeia imobiliária. Como produção e consumo são dois lados da mesma moeda, do outro lado do problema estão os consumidores que desejam uma edificação para ostentação. A demanda vai além do abrigo e se torna símbolo de status. É a cultura do “morar para o outro” que influencia na composição do preço final do produto.

Dentro desta lógica, estão inseridos os produtos da Arquitetura Espetáculo, das edificações Outdoors. Muitos desses espaços, embora caros, são desvitalizantes. Temos conhecimento suficiente para entender a relação dos componentes materiais e imateriais que compõe os espaços das cidades e de suas construções, com o comportamento, saúde, bem estar e preservação de ecossistemas. É exatamente na habilidade de incorporar tal conhecimento que está a chave para a SustenRentabilidade de uma construção. É urgente planejar e implementar um processo de transição estratégico, tanto do ponto de vista da sobrevivência do negócio, quanto da própria espécie humana. É preciso repensar as formas de elaborar propostas, de remunerar profissionais, estabelecer tabelas de honorários e as prioridades do design.

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A expressão “Triple botton line” ou “Tripé da Sustentabilidade” usada para se referir aos aspectos econômicos, sociais e ambientais da sustentabilidade, vem se tornando comum no discurso de pessoas e empresas. O questionamento que fazemos é se um negócio apoiado somente nesse tripé sobreviverá às demandas desse novo século. Pensamos que não. Tudo depende de um contexto cultural favorável. A cultura pode ser entendida como um jeito de pensar e de fazer as coisas, portanto, pode ser considerada como um quarto tripé da sustentabilidade. Empresas que entram nesse paradigma dependem de consumidores e de políticas públicas que apóiem iniciativas sustentáveis, conforme citado na Agenda 21 – documento gerado pela Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Rio-92). Elas necessitam de um mercado educado e disposto a pagar.

Fomos educados em uma cultura que nos faz perceber e abordar os desafios atuais, de forma fragmentada, como se o mundo fosse uma coleção de objetos, quando ele não é. O cenário atual exige que desloquemos nossa atenção dos objetos isolados para as relações entre eles e seu contexto. Vários edifícios “sustentáveis” não fazem uma cidade sustentável. Aliás, não existe um edifício sustentável (Revista Obras Online, Ano 5, No 58, dez/08). Nesse início de século, a forma predominante de pensar e de fazer construções sustentáveis no

O 4º TRIPÉ DA SUSTENTABILIDADE

PARTE 1

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Brasil ocorre de maneira fragmentada. Seja na escala humana, do edifício ou das cidades, é necessária a intervenção de pessoas com visão sistêmica, capazes de perceber as interrelações entre os elementos que compõe o ecossistema urbano e de tomar decisões, planejar a partir delas.

Os atuais problemas urbanos são consequência de um design do passado, concebido a partir de um paradigma que não deu certo. E o que estamos projetando agora? Não basta investir em tecnologias e processos, pois o fator humano interfere e a cultura influencia. São as pessoas que sonham, planejam, executam, votam e compram imóveis. Também são as pessoas que devem dar respostas para a resolução dos problemas urbanos. Para exemplificar, citaremos modelos de abordagem sistêmica nas escalas urbana e do edifício, que objetivaram a melhoria da qualidade de vida de todos e não só de uma camada especifica da população. Na escala urbana, vale lembrar as experiências latino-americanas de Curitiba e Bogotá, assim como a de Londres e, recentemente, de Manhattan. Jaime Lerner e Enrique Peñalosa,

prefeitos das duas primeiras cidades citadas, respectivamente, demonstraram que a limitação do tráfego de veículos e a criação de grandes calçadas para pedestres transformam positivamente as cidades. A medida trouxe benefícios econômicos para todas as partes interessadas. Em Londres, podemos citar a taxação de veículos para circulação no centro. Recentemente, o prefeito de Manhattan deu início à criação experimental de ilhas para pedestres. Isso mostra uma tendência a priorizar as pessoas e o transporte público, visando à redução significativa da poluição, do dióxido de carbono e dos engarrafamentos. Um exemplo de política pública que, entre outros benefícios, provoca a redução dos custos de manutenção das edificações, danificadas pela poluição atmosférica, e dos custos relacionados ao adoecimento da população e limpeza doméstica. Na escala do edifício, ressaltamos novamente a experiência da BED ZED em Londres, que provou que o setor privado, além de constituir um grande agente de mudanças, também pode se beneficiar com empreendimentos que promovam estilos de vida mais sustentáveis.

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Por mais que as tecnologias evoluam, a melhoria do ambiente urbano ocorre de forma lenta, quando acontece. Já existe um grande número de técnicas, tecnologias e experiências de referências, em vários lugares do mundo. Iniciativas isoladas, no entanto, pouco contribuem para uma mudança sistêmica e das relações estabelecidas no tecido urbano. Assim como apenas a aplicação de indicadores de sustentabilidade aos aspectos construtivos de um edifício também não são suficientes.

A sustentabilidade deve ser inserida desde o aspecto conceitual de uma edificação, passando por todas as fases de projeto, até as relações da edificação com seu entorno. A crença na tecnologia como solução dos problemas urbanos nos parece tão limitada quanto à crença de que o crescimento econômico em si resolveria grande parte das mazelas sociais. É preciso ousadia e coragem para mudar efetivamente o paradigma das cidades latino americanas. Assim demonstraram Jaime Lerner, ao transformar Curitiba, e Enrique Peñalosa, ao fazer emergir uma nova Bogotá. Na visão do ex-prefeito colombiano, ações que geram mudanças mais profundas dependem muito pouco de questões técnicas, mas de uma compreensão de quem serão os reais beneficiários de determinada atitude.

O 4º TRIPÉ DA SUSTENTABILIDADE

PARTE 2

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Enquanto o planeta esquenta e a maior parte da população das cidades nos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos se estabelece em favelas, vários fóruns e artigos são desenvolvidos a respeito da sustentabilidade na construção civil, com o foco predominante na cidade formal. A onda da sustentabilidade nas edificações estará contribuindo para manter as desigualdades sociais em nosso país? Pequenas construtoras poderão disponibilizar edificações sustentáveis no mercado? Quem poderá adquirir tais imóveis? Podemos falar de sustentabilidade sem uma cultura de inclusão social?

Falar de sustentabilidade no contexto das nossas cidades significa ter consciência de que os limites sociais já foram atingidos, antes mesmo dos ambientais. Resolver os problemas da sustentabilidade na construção civil significa resolver também todos os problemas urbanos. Significa que o setor precisa exercer sua responsabilidade social e contemplar todos os atores, ricos e pobres, com o objetivo de promover a equidade no acesso aos serviços urbanos básicos como lazer (áreas verdes), saneamento e transporte público, adotando a sustentabilidade como um valor.

Luiz de Garrido, eleito como o arquiteto do ano, em 2008, pela Associação Internacional de Arquitetura Modular Metálica (ISBA), propõe como um critério de construção sustentável a diminuição do preço de construção e dos custos de manutenção. Isso democratiza o acesso ao bem construído. A sustentabilidade, portanto, não se apóia somente na mudança cultural da sociedade com poder aquisitivo para comprar produtos sustentáveis. Ela detém um forte alicerce em uma nova cultura de fazer negócios para as atuais e futuras gerações de todos os setores da construção civil.