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1 UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO USO DE UM JOGO DIDÁTICO LEARCINO DOS SANTOS LUIZ Monografia final de Pós-graduação em Educação Matemática

CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO USO DE UM JOGO DIDÁTICO

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO

USO DE UM JOGO DIDÁTICO

LEARCINO DOS SANTOS LUIZ

Monografia final de Pós-graduação em Educação Matemática

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Turma 2005

Araranguá –2007

LEARCINO DOS SANTOS LUIZ

CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO USO DE UM JOGO DIDÁTICO

Orientador: Profª. Adriana Mendonça Destro

Monografia apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito para obtenção do título de Especialista em Educação Matemática

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Araranguá – 2007

LEARCINO DOS SANTOS LUIZ

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A Banca Examinadora composta pelos professores abaixo, sob a presidência do primeiro, submeteu o candidato à análise da Monografia em nível de Especialização e a julgou nos seguintes termos:

Monografia apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito para obtenção do título de Especialista em Educação Matemática

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Tubarão-SC, ..........de Agosto de 2007

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O Senhor DEUS me deu uma língua erudita, para que eu saiba dizer a seu tempo uma boa palavra ao que está cansado. Ele desperta-me todas as manhãs, desperta-me o ouvido para que ouça,

como aqueles que aprendem. O Senhor DEUS me abriu os ouvidos, e eu não fui rebelde; não me retirei para trás.

(Isaías 50: 4-5)

AGRADECIMENTOS

A Deus, agradeço a oportunidade de estudar em uma Universidade de Qualidade

tal como a UNISUL. Certamente meu currículo ficará grandemente enriquecido com a

marca dessa Universidade.

A Deus, agradeço pela companhia de todos os colegas que participaram e

compartilharam momentos de dificuldades, alegrias, conquistas, brincadeiras, enfim,

pelos bons momentos que vivemos nesse curso.

A Deus, agradeço pela vida de todos os professores que direta ou indiretamente

participaram deste curso, nos possibilitando crescimento intelectual e profissional.

Principalmente, agradeço pela vida do Professor José Humberto Dias, que sempre

atencioso e compreensivo, soube orientar-nos em nossas dúvidas e angústias, como

também, à Professora Adriana Mendonça Destra, que aceitou orientar-me neste trabalho.

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A Cellen, minha Esposa. Com o amor e carinho que tem me dado, tem tornado os

meus dias os mais felizes de toda a minha vida.

A Nancy minha mãe pelo amor incondicional e apoio em todos os momentos.

A Alana minha filha pelo companheirismo, carinho e afeto que tanto me faz bem.

Finalmente agradeço ao Deus todo-poderoso de Israel que tem me guardado e

sustentado durante toda a minha vida. Senhor Deus, tu és meu refúgio, minha fortaleza,

meu consolo e minha salvação. Em ti está minha esperança.

RESUMO

O Presente trabalho trata da pesquisa do uso de jogos didático no ensino de matemática.

Através de pesquisa bibliográfica busquei relatar referenciais teóricos que pudessem embasar

meu trabalho. As idéias de Jean Piaget e David Ausubel, que tratam, respectivamente, do

Construtivismo e da Aprendizagem significativa, nortearam significativamente este estudo. O uso

de jogos na educação é defendido aqui como uma alternativa ao Ensino Tradicional. Após

fundamentar teoricamente meu trabalho, busquei relatar a aplicação de uma seqüência didática,

onde relatei as atitudes, ações e reflexões de uma turma de alunos diante de uma situação de um

Jogo planejado para ser usado na construção do conceito de Coordenadas Cartesianas.

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SUMÁRIO

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1 INTRODUÇÃO

Este trabalho faz parte da conclusão do curso de Pós-Graduação em Educação

Matemática da UNISUL. A escolha do tema “Jogos no Ensino da Matemática” tem uma ligação

direta com a minha caminhada acadêmica e profissional, já que venho lecionando matemática

para o ensino fundamental há alguns anos. Esta experiência de estudante e professor, lidando com

o entusiasmo de “iniciante”, e com a vivência cotidiana da prática em relação à teoria,

impulsionou-me de maneira significativa às reflexões presentes neste trabalho. A escolha do tema

ligado às novas metodologias do ensino de matemática também foi influenciada pela forte

tendência inovadora do curso de Pós-Graduação em Educação Matemática da UNISUL.

Durante o tempo em que estive atuando como professor de matemática, diversas

dúvidas acompanharam minha trajetória. A principal delas, e talvez a geradora de todas as outras,

sempre foi a questão de como aproximar aos meus alunos os conhecimentos e conceitos

matemáticos apreendidos na Universidade.

Desse modo, o presente trabalho representa uma batalha individual no sentido de se

libertar dos paradigmas do ensino tradicional e tentar, através da pesquisa e estudo de novas

metodologias, buscar outras maneiras de desenvolver o ensino de matemática. Maneiras essas

que permitam maior participação do aluno em sala de aula e também uma aprendizagem

significativa, ou seja, uma aprendizagem com significado para o aluno.

Este trabalho apresenta-se dividido em três capítulos. No primeiro capítulo,

intitulado “O velho e o novo no Ensino de Matemática”, procuro mostrar as concepções e falhas

do ensino tradicional no que diz respeito ao ensino/aprendizagem de Matemática. Situo ainda as

novas metodologias para o ensino de matemática dentro de uma abordagem construtivista.

Também neste capítulo busquei fazer uma breve discussão sobre a teoria da Aprendizagem

Significativa, tendo como ponto de referência a teoria de David Ausubel. Penso que essa Teoria é

indispensável para entendermos as possibilidades de aprendizagem de metodologias inovadoras

para o ensino de matemática.

Ainda nesse primeiro capítulo discuto as várias definições para o “jogo”, visto que

este é um termo com muitos significados. Tendo adotado um destes sentidos, procuro situar o

jogo no processo educacional, ou seja, descrever as principais formas como o jogo tem sido

[C1] Comentário:

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utilizado no ensino em geral. Finalizando esse capítulo descrevo as regras e indicações de

aplicação do jogo intitulado “Caça ao Tesouro”. Este jogo tem por finalidade possibilitar ao aluno

a construção do conceito de coordenadas cartesianas.

No segundo capítulo descrevo a metodologia de intervenção utilizada na observação

da aplicação da atividade. O objetivo geral da intervenção é o de perceber como os alunos de uma

turma de 6ª série comportam-se diante ante uma situação problema baseada em um jogo de

regras. Na intervenção, baseada na aplicação de um jogo de regras, os alunos foram colocados em

situações onde, para obterem sucesso na atividade (ganhar o jogo), teriam que invariavelmente

construir registros muito semelhantes aos da representação cartesiana. Objetivamos também

mostrar que alunos de idade média de 12 anos (alunos de 6ª série) já são capazes de construir este

conceito.

Deste modo, basicamente, o problema central deste trabalho é responder ás seguintes

perguntas:

- Podem alunos de 6ª série (idade média de 12 anos) construírem por si só o conceito

de coordenadas cartesianas?

- Como construir este conceito usando um jogo didático?

Baseei meu trabalho em referenciais teóricos construtivistas de Jean Piaget e nos

trabalhos sobre a Aprendizagem Significativa de Ausubel. As Pesquisas da Professora Julia Borin

do CAEM (Centro de aperfeiçoamento do ensino de Matemática) – USP, também alicerçaram

significativamente o referencial teórico deste trabalho no que tange ao uso de jogos no Ensino de

matemática.

No último capítulo descrevo a aplicação do jogo com uma turma de 6ª série da qual

sou professor. Procurei descrever a atividade nos mínimos detalhes procurando observar as

estratégias de soluções dos problemas envolvidos no jogo e as possíveis reflexões oriundas das

atitudes dos alunos, que poderão ajudar o leitor a melhor compreender o significado matemático e

pedagógico do jogo.

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Feliz é o homem que acha sabedoria, e o homem

que adquire entendimento. (Provérbios 3:13)

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 O VELHO E O NOVO NO ENSINO DE MATEMÁTICA

2.1.1 O Ensino Tradicional

As referências sobre algo novo trazem sempre a pressuposição da existência de algo

anterior, diferente ou velho. Pensando nos significados e no peso atribuído às novas propostas

metodológicas para o ensino de matemática, uma reflexão sobre a forma com que o ensino

tradicional vê e trabalha esta disciplina torna-se aqui, imprescindível. “Uma análise das

concepções e, principalmente, dos limites do ensino tradicional seria uma tentativa de melhor

situar as novas propostas de ensino/aprendizagem da matemática que têm surgido nas últimas

décadas” (FIORENTINI, 1994). O estudo do uso de jogos didáticos como um recurso

metodológico para o ensino e aprendizagem de matemática no ensino fundamental, objeto deste

trabalho, se situa no contexto destas novas propostas.

O ensino tradicional vigente na maioria das escolas brasileiras aproxima-se do aluno

através de uma aula expositiva em que o professor passa para o quadro de giz aquilo que julga

importante. O aluno, por sua vez, copia do quadro para o seu caderno e, em seguida procura fazer

exercícios de aplicação, que nada mais são do que uma repetição da aplicação de um modelo de

solução apresentado pelo professor.

Existem variações: ao invés do quadro de giz, pode-se usar retro-projetores ou

projeções multimídias, ou até mesmo outros recursos. No entanto, o que importa não são os

recursos e sim o método que acaba preso a uma única concepção: transferência de informações.

Um processo bastante linear e hierárquico, onde o aluno ocupa o lugar daquele que não sabe, e o

professor seria o detentor do conhecimento.

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Este tipo de ensino é baseado numa concepção de conhecimento conhecida como

empirismo. O Empirismo neste sentido, Segundo Becker (1994, p.12), é a doutrina segundo a

qual todo o conhecimento tem sua origem no domínio sensorial, na experiência.

Esta teoria considera que a mente do aluno acaba sendo reduzida a uma “tabula rasa”

(uma tábua que ainda não recebeu inscrições), ou seja, nada contém e, portanto, é passiva e

receptiva. O conhecimento, nessa concepção, viria do objeto, e o aluno apenas o recebe

passivamente através das sensações ou experiências.

Aqui, faz-se necessário discutir as diferenças entre três termos que serão muito

citados neste trabalho: informação, conhecimento e saber. Para Micotti (1999, p. 154),

informação, conhecimento e saber são distintos, apesar de serem inter-relacionados, e o

entendimento entre essas diferenças ajudam a compreender melhor as diversas concepções de

ensino e aprendizagem, ajudando assim a identificar alguns problemas pedagógicos.

A informação é um elemento presente no mundo objetivo, exterior ao indivíduo. A

informação é todo dado inteligível de qualquer natureza. Ela possui um suporte e uma semântica.

A semântica é conduzida pelo suporte até um sistema de tratamento, por exemplo, o corpo

humano, e assim é submetida a uma série de tratamentos pelo individuo. Para chegar até o corpo

humano, a informação pode passar por dois canais diferentes: ótico e/ou acústico.

Conhecimento é algo pessoal, subjetivo e não lingüístico em sua origem, e é o

resultado de uma experiência pessoal do indivíduo com a informação. Ele nasce das experiências

e atividades individuais de cada pessoa em relação ao objeto de conhecimento. Desse modo,

podemos afirmar que conhecimento é o tratamento dado à informação, pelo individuo, sendo que

este tem uma experiência interior, e, portanto, uma interpretação individual.

Assim, conhecimento e informação são coisas distintas. A informação pode estar

presente no meio ambiente, armazenada em livros, revistas, computadores e em muitas outras

formas. No entanto, se o sujeito não interagir com ela, ou ainda, se esta informação não for

significativa para este individuo, ela não se transformará em conhecimento. Desse modo, dizemos

que não houve aprendizagem por parte do sujeito.

Já o saber compreende informação e conhecimento num aspecto social. É um produto

e resultado da produção intelectual e coletiva humana através dos tempos. O saber é um conjunto

de informações e conhecimentos que passaram por processos coletivos de produção, organização

e difusão.

Excluído: ,

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Desse modo, uma das funções fundamentais da educação escolar é a de assegurar a

propagação do saber, ou seja, é papel da escola propiciar a seus alunos uma relação com os

saberes, o que chamamos de cultura. Essa cultura é geralmente organizada na escola através das

disciplinas, e cabe ao professor fazer um elo de ligação entre o aluno e a cultura, propiciando a

apropriação, por parte do aluno, dos saberes correspondentes a cada área de conhecimento.

Nesse sentido, o ensino tradicional acentua a transmissão de conhecimento já

construídos, e estruturados pelo professor. Nesse caso, a aprendizagem é vista como uma

impressão, na mente dos alunos, de informações apresentados nas aulas. Para Micotti (1999, p.

156), “O trabalho didático escolhe um caminho” simples “transferir para o aprendiz os elementos

extraídos do saber criado e sistematizado, ao longo da história das ciências, fruto do trabalho de

pesquisadores”. Do ponto de vista do ensino tradicional, basta que o professor tenha o domínio

dos conteúdos a serem ensinados para ensinar bem. E ainda, as falhas no processo de

aprendizagem são, na maioria das vezes, justificadas pela pouca atenção, capacidade ou interesse

do aluno.

Para Larsen (2000), esse ponto de vista vê as mentes dos estudantes como recipientes

nos quais as informações relevantes — os conteúdos - devem ser depositados, e por isso a

abordagem implícita do ensino tradicional, na maioria das vezes, é simplista porque não faz

qualquer distinção entre informação e conhecimento. Pressupõem que transferir informação para

os alunos é idêntico a proporcionar-lhes conhecimento. A partir desta perspectiva, as

preocupações educacionais acabam se reduzindo a questões do tipo: como elaborar bons

materiais didáticos; como desenvolver e aperfeiçoar os métodos de transmissão; como elaborar

material auxiliar a fim de que os professores possam, de modo preciso, levar informações

relevantes aos recipientes, neste caso, os alunos.

De acordo com D’Ambrósio (1989. p.1), algumas conseqüências dessa prática

educacional tem sido debatidas pela comunidade de pesquisadores em Educação Matemática.

Primeiro, observa-se que os alunos passam a acreditar que a aprendizagem da matemática dá-se

através de um acúmulo de fórmulas e algoritmos. Cria-se a idéia de que fazer matemática é seguir

a aplicação de regras que foram transmitidas pelo professor, desvinculando-se assim a

matemática dos problemas do dia-a-dia.

Segundo, os alunos passam a considerar que a matemática é um corpo de conceitos

verdadeiros e estáticos, do qual não se duvida ou questiona, nem mesmo há a preocupação em

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compreender por que funcionam. E ainda, de maneira geral, existe o senso comum de que esses

conceitos foram descobertos ou criados por gênios. Estes fatos fazem com que o aluno,

acreditando e super valorizando o potencial da matemática formal, acabe desvinculando o

conhecimento matemático de situações reais. Assim, por falta de oportunidades para elaborarem

e manifestarem sua compreensão sobre os conteúdos, os alunos perdem sua autoconfiança e seu

bom senso matemático.

Estes problemas são criados por uma série de crenças, por parte de professores, sobre

o ensino e aprendizagem da matemática. Essas “crenças” são geradas por interpretações

equivocadas sobre o ensino, pela falta de uma formação profissional qualificada, por restrições

ligadas às condições de trabalho, ou, ainda, pela precariedade das políticas educacionais em

nosso país.

Um exemplo de uma dessas crenças, que faz parte do senso comum, é a idéia de que

os conteúdos matemáticos devem ser ensinados somente pela sua utilidade futura. Desta forma,

os professores tentam convencer os alunos que eles terão que estudar certo conteúdo, pois

precisarão dele no próximo bimestre, ano ou grau de estudo. Mas esse tipo de motivação é pouco

convincente para o aluno, que acaba sentindo-se desmotivado para estudar e, não raramente,

ouvimos de algum aluno a seguinte pergunta: Onde eu vou usar isto em minha vida? Essa

desmotivação é ainda maior num país como o Brasil, onde somente uma pequena parte dos

alunos que iniciam seus estudos chega ao ensino médio.

Nota-se que há uma preocupação demasiada em relação à quantidade de conteúdo a

ser trabalhado. Na concepção de muitos professores, a melhor forma do aluno aprender

matemática é resolver uma grande quantidade de exercícios. Nesta perspectiva, o conteúdo

trabalhado é a prioridade de sua ação pedagógica, ao invés da aprendizagem do aluno. Neste

sentido, D’Ambrósio (1989, p. 15) completa:

[...] É difícil o professor que consegue se convencer de que o objetivo principal do processo educacional é que os alunos tenham o maior aproveitamento possível, e que esse objetivo fica longe de ser atingido quando a meta do professor passa a ser cobrir a maior quantidade possível de matéria em aula.

Nesta concepção de ensino tradicional, em nenhum momento no processo de ensino/

aprendizagem de matemática é dada ao aluno a oportunidade de ser criativo, ou que ele seja

motivado a solucionar um problema. Em geral, na matemática escolar, os alunos não vivenciam

situações onde se possa explorar investigar e lançar hipóteses sobre algum conceito matemático.

Observa-se também que os professores, em geral, mostram a matemática como um corpo de

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conhecimentos acabado e polido. Deste modo, cabe ao aluno ser um mero “recipiente” de

informações. Concepção que além de não oferecer oportunidades ao aluno para compreender e

participar do processo de construção do conhecimento o exclui de qualquer tentativa de

questionar este mesmo conhecimento, ou sua possível aplicabilidade em sua vida cotidiana.

Para Rosseto (1999), o principal problema deste método de ensino viria do fato de

que tanto o conhecimento matemático quanto seu aprendizado se tornam excluídos de uma

perspectiva maior de transformação pedagógica e política. Tratar-se-ia, portanto, de uma

abordagem ideologicamente construída, que concebe o conhecimento matemático como objetivo,

universal, científico e despolitizado; que ignora completamente que a Matemática é um corpo de

conhecimentos, que foi construído social, política e historicamente através dos tempos. Esta

perspectiva que exclui qualquer possibilidade de uma Educação matemática que trabalhe a favor

da construção da cidadania.

Com a complexificação das relações econômicas e sociais e conseqüentemente do

saber, que gera tecnologia, o gerenciamento do saber foi tornando-se, cada vez mais, um

instrumento de poder e dominação. Nas sociedades contemporâneas, com o saber universalizado

via meios de comunicação, o poder e o sucesso não estão mais vinculados ao conhecimento em

si. O que está em jogo em nossos dias é o que podemos fazer com esse saber, como selecionar

informações úteis para concretizarmos nossos objetivos, sejam eles em nível individual ou

coletivo. Para tanto, o que pode ser relativizado não é o conhecimento, mas sim o tratamento que

se dá a ele. Neste sentido, busca transformar o ensinar, entendido tradicionalmente como

transmissão de conhecimentos, numa relação de construção dos saberes.

Parece relevante estudarmos novas formas de tratar o processo de

ensino/aprendizagem da matemática que não privilegiem simplesmente a transmissão de

conhecimento, e verificaremos o que estas metodologias trazem de significativo para este

processo e para o desenvolvimento cognitivo do aluno.

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2.1.2. Novas Propostas Metodológicas Para O Ensino De Matemática

A concepção tradicional que aborda os aspectos relativos ao que é matemática

escolar, como ela pode ser abordada, assim como sua aprendizagem tem sido alvo de estudos e

também de intensas críticas. E é dentro desse panorama que novas propostas e reivindicações

vêm sendo encaminhadas pela comunidade internacional de Educação Matemática. Na opinião de

Moura (1999, p.74), os Congressos de Educação Matemática contribuíram para uma visão

desarticulada dos problemas do ensino de matemática. Para esse autor, outras discussões

(UBIRATAN D’AMBRÔSIO, 1986), (J. M. MATOS, 1 989), e (FIORENTINI, 1994) sobre a

evolução do conceito de educação matemática, mostram que os problemas de ensino desta

disciplina, até meados dos anos 70, foram estudados tomando apenas aspectos isolados de

elementos que constituem este ensino.

Nesta perspectiva, o “fracasso da matemática” era invariavelmente procurado, ora nos

objetivos, ora nos métodos, ora nos conteúdos. Essas discussões têm mostrado, principalmente,

que o ensino da Matemática requer contribuições de outras áreas de conhecimento, como a

Psicologia, ou da Antropologia e, sobretudo, a consideração de que o processo educativo é em si

mesmo multifacetado. Isto é, estas tendências indicam a necessidade de reflexões sobre novas

propostas de ensino, para que venhamos a considerar os múltiplos e variados elementos presentes

na ação pedagógica do professor, seja ele da área da Matemática ou não.

No ensino de matemática, alguns pesquisadores já vêm dando exemplos das muitas

possibilidades de trabalhar os conceitos dessa disciplina levando em consideração outras

propostas de trabalho. Nesse processo, o ensino revela-se como uma experiência onde o aluno

torna o centro do processo educacional. A resolução de problemas como uma proposta

metodológica, assim como a abordagem Etnomatemática, o uso de tecnologias, a modelagem

matemática e o uso de jogos matemáticos no ensino constituem abordagens que também acabam

valorizando o aluno como um ser ativo, participando do próprio processo de construção do

conhecimento matemático.

Neste ponto, fica claro que as propostas citadas no parágrafo anterior têm em comum

a negação da idéia de transmissão de conhecimento e da ênfase nas habilidades de memorização e

reprodução, sem que se evidencie um verdadeiro entendimento. Estas propostas estão em

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consonância com urna concepção de aprendizagem numa abordagem construtivista, que vincula o

conceito de aprendizagem ao de saber, relacionando a questão da aprendizagem ao nível de

funcionamento cognitivo do aprendiz, mais que aos seus produtos e resultados.

Numa abordagem construtivista do ensino, baseada na teoria do desenvolvimento

cognitivo de Jean Piaget (1974), a aprendizagem depende fundamentalmente de ações

coordenadas do sujeito, quer sejam de caráter concreto ou abstrato. E, ainda, de acordo com

esta teoria, o conhecimento é construído a partir de percepções e ações do sujeito,

constantemente mediadas por estruturas mentais já construídas ou que vão se construindo ao

longo do processo.

Os estudos de Piaget (1974) evidenciam já nos primeiros anos de vida os primórdios

dessas habilidades. Sua teoria procura explicar o complexo processo através do qual se dá o

desenvolvimento das funções cognitivas da inteligência. Através de suas cuidadosas observações

e entrevistas clínicas, procurou os diversos estágios deste processo, mostrando a contínua

evolução das estruturas mentais, e cujo estado mais avançado se caracteriza pelo pensamento

formal abstrato.

Para melhor entendimento do processo evolutivo das estruturas cognitivas, Piaget

(1974) destacou três estágios básicos. Na construção dos primeiros esquemas de natureza lógico-

matemático, as crianças se apóiam em ações sensório-motoras sobre objetos materiais e, através

de exercícios de repetição espontânea, chegam ao domínio e generalização da ação (estágio pré-

operatório). O segundo estágio caracteriza-se pelo aparecimento das operações, as ações em

pensamento; mas nesta fase as crianças ainda dependem dos objetos concretos para que as ações

se constituam em conceitos (estágio operatório concreto). E, finalmente, atingem o estágio das

operações sobre objetos abstratos, já não dependendo mais de ações concretas ou de objetos

concretos: é a constituição do pensamento puramente abstrato.

O que quer destacar é o quanto o processo de aprendizagem se baseia na ação do

sujeito: inicialmente, as ações concretas sobre objetos concretos respondem pela constituição dos

esquemas, e no último estágio, as ações abstratas (operações) sobre os objetos abstratos é que

respondem pela constituição dos conceitos. Neste sentido:

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[...] só falaríamos de aprendizagem na medida em que um resultado (conhecimento ou atuação) é adquirido em função da experiência, essa experiência podendo ser do tipo físico ou do tipo lógico ou os dois.”( PIAGET, 1974, p.37)

Os desequilíbrios entre experiência e estruturas mentais é que fazem o sujeito avançar

no seu desenvolvimento cognitivo. O novo objeto de conhecimento é assimilado pelo sujeito

através das estruturas já constituídas. O ‘novo’ produz conflitos internos, que são superados pela

acomodação das estruturas cognitivas, e o objeto passa a ser percebido de outra forma. E é neste

processo dialético que seria construído o conhecimento.

Na formação matemática dos alunos, além de pretender-se a construção de uma sólida

base de conhecimento na área, deve-se estar atento para a riqueza intelectual que decorre do

constante desenvolvimento cognitivo do sujeito quando a ele propicia-se imersão no processo do

‘fazer matemática’, que nada mais é do que o processo dinâmico ‘assimilação versus

acomodação’ de construção simultânea de conhecimento matemático e de estruturas mentais.

Para Micotti (1999, p.158), as atuais propostas pedagógicas, ao invés de transferência

de conteúdos prontos, acentuam a interação do aluno com o objeto de estudo, a pesquisa, a

construção dos conhecimentos para o acesso ao saber. As aulas são consideradas como situações

de aprendizagem, onde são valorizados o trabalho dos alunos (pessoal e coletivo) na apropriação

do conhecimento e a orientação do professor para o acesso ao saber.

Estas propostas requerem novas atitudes por parte tanto dos alunos, como dos

professores, ou seja, devemos repensar a relação do aluno com o conhecimento, a sua

participação em sala de aula, o papel do professor no processo de ensino/aprendizagem e o

enfoque dado à matemática.

A revista Nova Escola (2001), em um de seus artigos, descreve experiências

positivas do ensino da Matemática no qual os alunos são o centro do processo educacional e

com isso conseguem obter melhores níveis de aprendizagem. Nesse artigo está bastante

explícita a postura do professor em sala de aula, ou seja, seu dever em participar do

aprendizado e não apenas apresentar conteúdos. Assim, numa aula de matemática onde o

professor pretenda romper com os paradigmas impostos pelo ensino tradicional e adotar uma

proposta de uma aprendizagem ativa da Matemática, esse mesmo professor deverá tentar

desenvolver as seguintes habilidades:

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a) Ser um mediador: promover em sala de aula debates sobre os procedimentos adotados e

as diferenças encontradas; orientar reformulações e valorizar as soluções mais adequadas.

b) Ser um facilitador: fornecer informações (textos e material didático) que o aluno não

tenha condições de obter sozinho.

c) Ser um avaliador: estar sempre atento à aprendizagem dos alunos e observando se os

objetivos estão sendo atingidos ou se é necessário reorganizar a atividade pedagógica para

que isso aconteça.

d) Ser um organizador: conhecer quem são seus alunos (as condições socioculturais, as

expectativas e o nível de conhecimento deles) e escolher problemas, atividades e novas

metodologias que possibilitem atingir os objetivos no decorrer das atividades.

Neste ponto de vista, não basta ao professor ter o total domínio dos conteúdos

matemáticos, mas sim, além disso, ter um profundo conhecimento daquele a quem deseja

transmitir o saber e ter o domínio das várias possibilidades metodológicas de transpor tal saber ao

aluno. Nesse sentido:

[...] A renovação do ensino não consiste, apenas, em mudança de atitude do professor diante do saber científico, mas, ainda e especialmente, diante do conhecimento do aluno: é preciso compreender como ele compreende, constrói e organiza o conhecimento. (MICOTTI ,1999, p. 164)

Deste modo, penso que o uso de jogos no ensino de matemática, objeto de estudos

dos próximos capítulos, pode possibilitar ao aluno uma atividade exploratória onde ele será o

centro do processo educativo, podendo se envolver com os conceitos matemáticos de uma forma

mais agradável e desafiadora. Neste ambiente de exploração, cria-se a oportunidade do professor

analisar, conhecer e avaliar seus alunos de uma maneira mais eficaz e abrangente.

Excluído: ;

Excluído: ¶

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... O fator isolado mais importante influenciando a

aprendizagem é aquilo que o aluno já sabe;

determine isso e ensine-o de acordo.

David Ausubel

2.2 A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA

Sabemos ser indispensável associar a aprendizagem de conceitos matemáticos a

contextos e situações problemas que colocam o estudante frente a desafios e questões

matemáticas desafiadoras. São estes contextos e situações problemas que mobilizam a atenção do

aprendiz e que justificam o esforço intelectual necessário para o estabelecimento de relações e a

construção de modelos explicativos de maior abrangência e complexidade.

Contextos significativos são aqueles que nos causam estranheza e que exigem novas

formulações e explicações, ou ainda, que constituem problemas para a humanidade e que, de

alguma maneira, fazem parte de nossa vida.

Essa concepção de aprendizagem é contrária àquela usada pelo ensino Tradicional, já

comentada no capítulo 1, que concebe a aprendizagem como a transferência de informações do

professor para o aluno. Como uma conseqüência dessa concepção epistemológica empirista na

prática educativa, situamos aquela que Paulo Freire denomina de “educação bancária”, segundo

a qual o ato educativo reduz-se, simplesmente, à: [...] um ato de depositar, de transferir, de

transmitir valores e conhecimentos “(FREIRE, 1970, p. 59). Nesta educação o conhecimento é

concebido como acumulação ou soma em vez de síntese. A mente dos alunos é tida como um

arquivo que acumula informações vindas de fora, prevalecendo a:

[...] concepção da mente-caixa registradora” segundo a qual, na relação cognitiva, o sujeito comporta-se de forma passiva, receptiva, contemplativa e cujo papel restringe-se a registrar, através de seu aparelho perceptivo, os estímulos vindos do exterior.

Para a “concepção da mente-caixa registradora” o professor é identificado com sua

voz, isto é, com os sons que emite através da fala e os alunos reduzem-se a um conjunto de olhos

e ouvidos. Ensinar é sinônimo de usar a palavra e aprender sinônimo de ver e ouvir. As palavras

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22

mágicas que estão na base do êxito das escolas são: associação, repetição e memorização

(MIGUEL, 1994, p. 54).

Uma aprendizagem significativa é aquela em que o aluno, sendo o centro do

processo de ensino-aprendizagem, é um agente ativo da construção do seu conhecimento.

Libâneo (1998, p.9) esclarece:

[...] A escola tem, pois o compromisso de reduzir a distância entre a ciência cada vez mais complexa e a cultura de base produzida no cotidiano, e a provida pela escolarização. Junto a isso tem, também, o compromisso de ajudar os alunos a tornarem-se sujeitos pensantes, capazes de construir elementos categoriais de compreensão e apropriação crítica da realidade.

Portanto, o valor da aprendizagem escolar está na possibilidade de levar os alunos a

atribuírem significados pessoais à cultura e à ciência, através de mediações cognitivas e

internacionais providas pelo professor no processo de ensino-aprendizagem. O grau de

individualidade da aprendizagem é determinado pelo envolvimento de sentimentos, emoções,

valores familiares e culturais trazidos pelos alunos e que interferem no significado do aprendido.

2.2.1 Teoria da Aprendizagem Significativa Segundo Ausubel

Quando discutimos a aprendizagem significativa não podemos deixar de nos remeter

a Ausubel1. A idéia central de sua teoria é a de que o fator isolado mais importante que

influencia a aprendizagem é o que o aluno já sabe. Essa idéia é bastante simples, entretanto como

e por que ocorre é mais complexo. Para Ausubel (1982, pg.07), “a aprendizagem significativa é

um processo pelo qual uma nova informação se relaciona com um aspecto relevante da estrutura

de conhecimento do indivíduo”. Portanto, a aprendizagem ocorre quando a nova informação

ancora-se em conceitos relevantes preexistentes (subsunçores), interagindo na estrutura cognitiva

de quem aprende.

Falar de aprendizagem significativa equivale a colocar em destaque o processo de

construção de significados como elemento principal do processo de ensino/aprendizagem.

Segundo Coll (1994, pg.148)

O aluno aprende um conteúdo qualquer - um conceito, uma explicação de um fenômeno físico ou social, um procedimento para resolver determinado tipo de problemas, uma

1 David Paul Ausubel (1918-1997) Psicólogo americano.

Excluído: ¶

Excluído: 2

Excluído: D

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norma de comportamento, um valor a respeitar, etc - quando é capaz de atribuir-lhe um significado.

A significância da aprendizagem é uma questão de grau, varia de acordo com quem

ensina, o que se ensina e quem aprende. O que se pretende é que a aprendizagem seja, o mais

possível e, significativa. A maior ou menor riqueza de significados dependerá da riqueza e da

complexidade de relações que pudermos estabelecer com o material a ser aprendido.

Ausubel e seus colaboradores colocam algumas exigências para que a aprendizagem

significativa ocorra:

a) O conteúdo deve possuir um significado em si mesmo, deve ter uma lógica intrínseca

(significância lógica).

b) O aluno deve poder relacionar o conteúdo a ser aprendido com o que já conhece, isto é, o

conteúdo deve ser potencialmente significativo (significância psicológica).

c) Esses dois fatores, selecionados pelo professor, entretanto, não são suficientes para que

aluno construa significados. É necessário que ele tenha uma atitude favorável, isto é,

tenha a intenção de aprender significativamente. A intencionalidade do aluno é pouco

discutida, entretanto, como protagonista de sua aprendizagem é também responsável por

ela. Cabe ao professor despertar no aluno essa motivação. Desta forma, a

intencionalidade docente/discente é fator decisivo na aprendizagem.

Verifica-se, assim, uma intencionalidade bilateral, que, através da interação social,

redundará em mudanças comportamentais tanto docentes quanto discentes, porque produto da

resignificação de conteúdos na construção do conhecimento, para Coll , somente a aprendizagem

que tem para o aluno um valor funcional, uma utilidade, é capaz de gerar novos significados .

Segundo Wittrock (apud Coll, 1994, pg 152), além do conhecimento prévio

mencionado por Ausubel e seus colaboradores, “... existem outros aspectos ou processos

psicológicos que agem como mediadores entre o ensino e os resultados da aprendizagem: a

percepção que o aluno tem da escola, do professor e das suas atuações; as suas expectativas

perante o ensino; as suas motivações, crenças, atitudes e atribuições; as estratégias de

aprendizagem que é capaz de utilizar”.

Pode-se concluir que ao mesmo tempo em que o aluno constrói significações, isto é,

que resignifica o construído, ele atribui um sentido ao que aprende em virtude dos elementos

mediadores presentes ao processo de ensino-aprendizagem, ou seja, conhecimentos anteriores

dotados de sentido. As intenções, os objetivos e motivações do professor e do aluno são em geral

Formatados: Marcadores enumeração

Excluído: 1.

Excluído: O

Excluído: ;

Excluído: 2. O

Excluído: ;

Excluído: 3. Esses

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diferentes. Assim, a intencionalidade bilateral resultará diferentemente no comportamento dos

envolvidos e na construção de conhecimento.

Portanto, uma mesma tarefa apresentada a alunos com intenções e enfoques

diferentes resultará em aprendizagens significativamente distintas de um aluno para outro. Da

mesma forma, um mesmo aluno terá diante de cada tarefa enfoque diferente de aprendizagem,

conforme sua intenção ao executá-la. Concluímos, portanto, que, na aprendizagem, os

significados variarão em profundidade e amplitude.

Deve-se destacar que o aluno constrói o seu conhecimento e é responsável por ele,

atribuindo sentido e significados aos conteúdos do ensino, entretanto, o faz através da interação

com o professor que determina, com sua atuação, de que atividades o aluno deve participar para

que obtenha um grau maior de amplitude e profundidade dos significados a serem construídos.

Cabe ao professor a responsabilidade de orientar essa construção numa determinada direção.

Portanto, evidencia-se que a intencionalidade está presente como fator decisivo na atuação do

docente e do discente no processo de ensino-aprendizagem.

Como o processo de construção do conhecimento deve ser situado num contexto

relacional e de comunicação interpessoal em virtude da própria natureza do ato de ensinar,

concluímos que a aprendizagem significativa proposta por Ausubel altera-se, enriquece-se,

quando Coll afirma que a construção do conhecimento é resultado de interações que interferem

na atribuição de sentidos e na construção de significados, não apenas no âmbito escolar.

Desse modo, entende-se que a aprendizagem é significativa quando os estudantes

conseguem “estabelecer relações substantivas e não-arbitrárias entre os conteúdos escolares e os conhecimentos previamente construídos por eles, num processo de articulação de novos significados” (PCN, 1997, pg 52). Isto está de acordo com o que escreve Machado (1995, p

138), ao afirmar que “compreender é apreender o significado” e que “apreender o significado de um objeto ou acontecimento é vê-lo em suas relações com outros objetos ou acontecimentos”.

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[...] suponhamos que, de repente, nossas crianças

parem de brincar, que os pátios de nossas escolas

fiquem silenciosas que não tivéssemos mais perto

de nós este mundo infantil que faz a nossa alegria

e o nosso tormento, mas um mundo triste de

pigmeus desajeitados e silenciosos, sem

inteligência e sem alma. Pigmeus que poderiam

crescer, mas que conservariam por toda a sua

existência a mentalidade de pigmeus, de seres

primitivos. Pois é pelo jogo, pelo brinquedo, que

crescem a alma e a inteligência. Uma criança que

não sabe brincar, uma miniatura de velho, será um

adulto que não saberá pensar. (JEAN CHATEAU)

2.3 O JOGO E A EDUCAÇÃO

Antes de entrarmos na discussão sobre o uso de jogos no ensino de matemática, é

interessante fazermos uma reflexão sobre os significados do termo “jogo” de uma maneira geral e

sobre sua utilização na educação. O que é jogo? Qual a diferença entre jogo e brinquedo? Por que

atividades tão diversas são chamadas de jogo? A intenção de um jogador ante a um determinado

jogo é sempre a mesma, ou depende das circunstâncias em que o jogador se encontra e de sua

cultura? Essas são algumas indagações a serem analisadas em um primeiro momento.

Tentar achar uma definição para o jogo não é tarefa fácil. A palavra jogo pode ter

diversos significados e interpretações, e está longe de ser um termo claro e transparente. Para

Brougére (1998, p.14), ao falar do termo jogo, estamos lidando com uma noção aberta,

polissêmica e às vezes ambígua.

Existem várias atividades que se utilizam do vocábulo "jogo” como definição: jogo

de xadrez, jogo político, jogos de azar, jogo de futebol, de dominó, de amarelinha e muitas outras

formas de jogo. Se compararmos, por exemplo, o jogo de xadrez e o jogo político, veremos que

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são atividades completamente diferentes. Enquanto a primeira é reconhecida de forma direta

como jogo, ou seja, há duas pessoas realizando ações baseadas em um sistema de regras, a

segunda possui uma identidade metafórica. Mesmo assim, ambas compartilham do mesmo

vocábulo.

Cada atividade que é caracterizada pela palavra “jogo” tem suas especificidades

características próprias. Por exemplo, no futebol, temos a paixão da torcida como característica

motivadora desse tipo de jogo; no jogo político, a relação de poder e a astúcia dos políticos que

negociam vantagens para conseguir seus objetivos; no jogo de xadrez, as regras padronizadas

e as estratégias do jogador; nos jogos de azar, a probabilidade que um jogador tem de fazer uma

boa ou má jogada.

Além disso, se formos analisar uma só dessas atividades, veremos que mesmo assim

ela poderá, ou não, ser considerada como jogo, ou ainda, poderá haver uma diferenciação na

atitude de seus jogadores diante desse jogo, conforme a maneira que ele é praticado (profissional,

amadora, educacional, etc.) e a cultura no qual este jogo está inserido. Por exemplo, há uma

diferença significativa no que diz respeito à atitude dos jogadores, quando comparamos um jogo

de futebol de várzea com o profissional. Enquanto na várzea o jogo é realizado só pelo prazer dos

jogadores, no futebol profissional nem sempre é assim, ou seja, os jogadores são motivados por

outros fatores como o trabalho e a competição.

Da mesma forma, um tabuleiro de damas não teria a mesma finalidade e seus

jogadores não teriam a mesma atitude perante este jogo, se ele fosse usado como um simples

brinquedo ou como um material didático destinado ao ensino de matemática.

Observamos também que um determinado jogo pode ser considerado como tal, ou

não, dependendo da cultura em que ele está inserido. Um exemplo é o ábaco, que em nossas

escolas muitas vezes é usado como brinquedo e material didático, mas que no Japão é usado

como uma ferramenta de trabalho, longe de ser um jogo ou brinquedo.

Deste modo, para “dissecarmos” o sentido da palavra jogo, precisamos analisar as

características de cada atividade que recebe este termo e questionar seus diferentes sentidos, ou

seja, tentar descobrir por que atividades tão diferentes foram, em nossa língua e em outras,

designadas pelo mesmo termo.

No caso do jogo aplicado à educação, teremos que ter uma definição clara e concisa

do tipo de jogo que iremos trabalhar. Em seu trabalho sobre o jogo e a educação infantil,

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Kishimoto (1999, p.16) apresenta uma definição sobre o jogo e aponta diferenças entre jogo e

brinquedo. A partir de estudos de GILLES BROUGÉRE e JACQUES FLENRIOT realizados no

Laboratório de Pesquisa sobre Jogo e Brinquedo, da Universidade de Paris, a autora traz a

consideração de três níveis de diferenciação entre o que é jogo e o que é brinquedo. Nessa

perspectiva, o jogo é visto como:

a) O resultado de um sistema lingüístico que funciona dentro de um contexto social.

b) Um sistema de regras.

c) Um objeto.

O funcionamento lingüístico do jogo parte do entendimento de que a noção de jogo

não remete à língua ou à ordem particular de uma ciência, mas sim a um uso cotidiano e

especifico. Dessa forma, precisa-se considerar o funcionamento da linguagem, ou seja, as formas

pelas quais um determinado grupo expressa e dá significado às palavras, a maneira como ela é

utilizada e projetada socialmente. Assim, dependendo do lugar e da época os jogos assumem

significados diferentes.

Um sistema de regras caracteriza um jogo quando há uma estrutura seqüencial que

especifica uma modalidade, e junto com a realização dessa seqüência de regras há,

simultaneamente, uma atividade lúdica sendo realizada.

Por fim, o jogo toma o sentido de um objeto. Por exemplo, o jogo de damas, que

tanto pode ser confeccionado de papel, plástico ou madeira, representa o objeto usado na

atividade lúdica de jogar damas. O brinquedo diferencia-se do jogo, simplesmente por haver uma

indeterminação quanto ao seu uso, ou seja, um brinquedo é desprovido de uma seqüência de

regras que organizam sua utilização. Dessa forma, crianças que não conhecem as regras do

dominó e simplesmente manipulam suas peças para construir uma casa estarão interagindo com

um brinquedo. De outra maneira, crianças que conhecem as regras e realizam toda a seqüência

conhecida e necessária para atingir os objetivos dessa atividade lúdica estarão jogando o “jogo de

dominó”.

Ainda, segundo Macedo (1992, p.128), há três pontos sempre presentes em qualquer

jogo:

a) Um objetivo ou uma situação-problema.

b) Um resultado, em função desse objetivo.

Excluído: ;

Excluído: ;

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c) Um conjunto de regras determinando os limites dentro dos quais os aspectos 1 e 2 são

considerados.

Estes aspectos servem para clamar nossa compreensão do jogo, permitindo-nos

diferenciar os significados atribuídos por culturas, regras e objetos que o caracterizam. Neste

trabalho serão estudados os jogos que são caracterizados por um sistema de regras, onde

necessariamente o jogador usará algum conceito matemático para alcançar seu objetivo no jogo.

Em educação, as primeiras ações de professores apoiadas em teorias construtivistas

foram no sentido de tornar os ambientes de ensino ricos em quantidade e variedade de jogos, para

que o aluno pudesse descobrir conceitos inerentes às estruturas dos jogos por meio de sua

manipulação. Na opinião de Moura (1999, p.76-77), essa concepção tem levado a práticas

espontaneístas da utilização dos jogos na escola. Ou seja, práticas onde são colocadas apenas no

sujeito as possibilidades de aprender, desconsiderando elementos externos como possibilitadores

de aprendizagem, e que sugerem que qualquer intenção do professor em transmitir um

conhecimento estruturado está descartada.

Assim, as situações de jogo são consideradas como parte das atividades pedagógicas

porque são elementos estimuladores do desenvolvimento, isto é, o jogo é elemento do ensino

apenas como um possibilitador que coloca em ação um pensamento que ruma para uma nova

estrutura.

Foi decorrente dessa concepção que materiais estruturados, como os blocos lógicos,

material dourado, Cuisenaire2, entre outros, passaram a ser veiculado nas escolas. Deste modo,

estes materiais, incluindo aí os jogos, deveriam ser usados obedecendo a certos níveis de

conhecimento dos alunos, devendo ter uma estruturação tal que lhes permita dar um salto na

compreensão dos conceitos a serem estudados.

Esse tipo de uso dos jogos e materiais concretos é uma prática pedagógica apriorista.

Segundo Becker (1994, p.12), aprioristas são todos aqueles que pensam que as condições de

possibilidade do conhecimento são dadas na bagagem hereditária: de forma inata ou submetidas

ao processo maturacional, mas, de qualquer forma, predeterminadas ou formadas “apriori”.

2Material Pedagógico que tem esse nome devido ao seu criador: Emile Georges Cuisenaire (1891-1980). Cuisenaire era professor de Matemática na Bélgica, e ao se impressionar com uma cena de um aluno desesperado, em uma de suas aula, decidiu criar um material que ajudasse no ensino dos conceitos básicos de Matemática. Então cortou algumas réguas de madeira em 10 tamanhos diferentes e pintou cada peça de uma cor; e foi assim que surgiu a Escala de Cuisinaire.

Excluído:

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Penso que quando os jogos são usados dessa maneira, não trazem consigo todo o seu potencial,

pois não permitem ao aluno uma reflexão dos seus atos no jogo.

Tal como a concepção relatada anteriormente, as contribuições da psicologia de

cunho sóciointeracionista também vêm estabelecer novos paradigmas para a utilização do jogo

na escola. De acordo com Moura (1999, p.77), teóricos como VYGOSTSKY, LEONTIEV e

ELKONIN destacam a importância do jogo na produção de conhecimentos, diferenciando da

concepção anterior, por considerarem o jogo como impregnado de conteúdos culturais e que os

sujeitos, ao tomarem contato com eles, fazem-no através de conhecimentos adquiridos

socialmente.

Nesse sentido, as concepções sócio-interacionistas partem do pressuposto de que a

criança aprende e desenvolve suas estruturas cognitivas ao lidar com o jogo de regras. Desse

modo, o jogo promove o desenvolvimento porque está impregnado de aprendizagem e, ao jogar,

os sujeitos passam a lidar com regras que lhes permitem a compreensão do conjunto de

conhecimentos veiculados socialmente, fornecendo-lhes novos elementos para apreender os

conhecimentos futuros.

Emerique (1999, p.190), partindo das premissas sócio-interacionistas, resume os

ganhos decorrentes do jogo dos pontos de vista:

a) Afetivo: como regular o ciúme, a inveja, a frustração, adiar o prazer imediato, subordinar-

se a regras, abrir-se para o outro, para o imprevisível;

b) Social: a necessidade da linguagem, de códigos, da cooperação, da solidariedade, das

relações interpessoais;

c) Cognitivo: necessidade e possibilidade de construção de novos conhecimentos e

procedimentos, de descobrir erros e de imaginar formas de superá-los.

Assim, o jogo como promotor da aprendizagem e do desenvolvimento passa a ser

considerado como importante aliado para o ensino de diversas disciplinas, pois, ao colocar, o

aluno diante de situações de jogo, estamos aproximando-o dos conteúdos culturais a serem

veiculados na escola, além de poder estar promovendo o desenvolvimento de novas estruturas

cognitivas.

Neste trabalho busco mostrar que os jogos, quando usados no ensino de matemática,

podem trazer melhores resultados quando trabalhados de acordo com a concepção interacionista,

pois esta concebe o jogo como um elemento externo possibilitador de aprendizagem.

Page 30: CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO USO DE UM JOGO DIDÁTICO

30

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31

O primeiro objeto de qualquer ato de aprendizagem, acima e

além do prazer que nos possa dar, é o de que deverá servir-

nos no presente e valer-nos no futuro. Bruner

2.4 O JOGO NO ENSINO DE MATEMÁTICA

Numa sala de aula, o professor depara-se com uma série de desafios, que acabam

servindo para que o mesmo siga em frente ou o desestimule até mesmo a iniciar algo novo.

Infelizmente, esses desafios, que vão desde as condições de estrutura da escola, passando pela

escassez de recursos didáticos e até mesmo pela própria falta de continuidade de um trabalho,

imposto pela diferenciação das categorias funcionais na escola, têm causado uma certa falta de

estímulo e perspectiva aos profissionais da educação.

Na minha experiência como professor de Matemática tenho observado que, além

desses desafios, existem também aqueles que giram em torno da resistência dos alunos em

relação ao próprio conteúdo. Essa resistência acaba aparecendo na própria dificuldade alimentada

em torno da disciplina que tem contado, na prática, com poucos recursos didáticos para despertar

no aluno o gosto, o prazer em se estudar a matemática.

O primeiro contato deste pesquisador com os jogos como recursos didáticos na

matemática surgiram a partir da minha experiência de trabalho, quando atuando enquanto

estagiário nas oficinas promovidas pela “Sala de Ciências” descobri os jogos na prática. A partir

deste momento, passei também a trabalhar com os jogos em sala de aula, não apenas como uma

distração, ou seja, uma pausa tipo “relax” para depois voltar ao “árduo” ensino da matemática.

Ao contrário, passei a utilizá-los como um recurso didático no processo de ensino dos conceitos

matemáticos.

No entanto, tenho percebido que, mesmo após uma série de publicações e estudos

acerca do uso do jogo como recurso didático, ele segue sendo visto por uma grande maioria dos

profissionais da educação somente como alternativa, ou seja, uma “aula diferente”.

Certamente, uma aula com o uso de jogo será uma aula diferente, pois seu uso abre

inúmeras possibilidades, espaços onde os alunos poderão brincar e interagir com seus colegas.

Contudo, sem tirar a importância da ludicidade e da interação que este tipo de atividade

Excluído: ¶

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32

proporciona, convém prestar atenção aos limites implicados quando se percebe os jogos no

ensino da matemática apenas dessa forma.

Nesse sentido, penso que o jogo pode e deve ser pensado - acima de tudo - como um

exercício de aprendizagem ativa da matemática. O jogo possibilita simulações de situações-

problema que provocam e exigem soluções imediatas. Nesse processo, há o estimulo à

criatividade do aluno implicando na elaboração de estratégias de resolução, planejamento de

ações, busca de soluções e avaliação da eficácia dos resultados obtidos.

Sob essa perspectiva, Borim (1998, p.8) afirma que a atividade de jogar desempenha

um importante papel no desenvolvimento de habilidades de raciocínio, tais como a organização,

concentração e atenção, além do desenvolvimento da linguagem, criatividade e raciocínio

dedutivo, exigidos na escolha de uma jogada e na argumentação necessária durante a troca de

informações.

Os jogos contribuem também, de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais

(1998, p.48), para a formação de atitudes positivas diante do erro, pois, jogando, o aluno estará,

ao mesmo tempo, enfrentando desafios, lançando-se à busca de soluções, desenvolvendo o seu

senso crítico, sua intuição, e criando estratégias que podem ser alteradas a qualquer momento.

Desse modo, como as situações sucedem-se rapidamente e podem ser corrigidas de forma natural,

no decorrer da ação, o erro passa a ser visto como uma medida de qualidade para a estratégia

seguida, e, desta forma, não deixa marcas negativas.

Borim (1998, p. 9) ainda compara o comportamento e a atividade mental de um

jogador disposto a ganhar e de um cientista em busca de uma solução para um problema. Ambos,

inicialmente, partem para uma experimentação sem muita ordem ou direção, para conhecerem o

que defrontam. Após essa fase, coletam dados que servirão para formular hipóteses e, de posse

destas, partem para a experimentação ou jogada e observam o que acontece. A cada tentativa

podem reformular as hipóteses através das conclusões obtidas e dos erros cometidos até

certificarem-se da resposta precisa para o problema original, que no caso do jogo, significa ter

uma boa estratégia para vencer. Neste sentido, esta mesma autora completa: “todas as habilidades

envolvidas nesse processo, que exigem tentar, observar, analisar, conjecturar, verificar, compõem

o que chamamos de raciocínio lógico, que é uma das metas prioritárias do ensino de Matemática

e característica primordial do fazer ciência” (BORIM, 1998, p.9).

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Neste mesmo sentido, Moura (1999) afirma que a relevância do jogo está nas

possibilidades de aproximar o aluno do conhecimento científico, levando-o a vivenciar situações

de soluções de problema que o aproximem daquelas que o homem realmente enfrenta ou

enfrentou.

Carrasco (1992, p.22), no trabalho no qual analisou jogos versus realidade,

identificou pontos comuns entre o raciocínio utilizado nos jogos e o raciocínio útil na produção

de matemática. Segundo ela, proporcionar prazer e diversão, representar um desafio e provocar o

pensamento reflexivo do aluno seriam razões suficientes para defender o jogo na educação, sem

a pretensão de que a educação se reduza a um jogo.

Outro ponto importante nesse tipo de metodologia é o fato de que ao jogarem os

alunos estão desenvolvendo, além de seu raciocínio lógico, habilidades tais como a observação,

concentração e generalização, essenciais para o desenvolvimento do raciocínio indutivo, que

utilizamos para formular hipóteses gerais a partir da observação de alguns casos particulares.

Por se tratar de jogo essa metodologia deve basear-se em um trabalho em grupo,

cabendo a cada um discutir as regras do jogo e questionar as soluções propostas pelos

participantes. A quantidade de participantes deve variar com o tipo de jogo, variando entre dois e

quatro participantes por grupo. Deste modo o jogo terá uma alternância de momentos coletivos e

individuais, pois cada participante, na sua vez de jogar, deve resolver o problema criado pelo

momento do jogo e, sozinho, tomar uma decisão apropriada às regras do jogo e às possibilidades

dos outros participantes. Enquanto isso, os outros observam para ver se as regras são respeitadas

e também para elaborar suas estratégias de jogo com base na jogada que está sendo feita pelo

amigo.

Neste sentido:

[...] Propondo jogos para os alunos reunidos em grupos, o professor possibilita situações

que favorecem a construção social do conhecimento, ajudando o desenvolvimento

individual por sua substituição progressiva do egocentrismo pela reciprocidade feita

pela criança”(AZEVEDO, 1999, p. 133).

A atividade em grupo, nesta metodologia, me parece imprescindível, pois para

construirmos um espaço onde haja reflexão a partir da observação e da análise cuidadosa, é

essencial a troca de opiniões e a oportunidade de argumentar com o outro, de modo organizado.

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Mas, como observa Borim (1998, p.11), o professor pode se frustar com tal atividade,

pois a criança, sendo naturalmente centrada em si mesma, se exacerba em situação de jogo

quando, evidentemente, o que ela deseja é vencer. Ou seja, quando trabalhamos com jogos em

sala de aula, o barulho é inevitável, pois somente através de discussões é possível chegar a

resultados convincentes. Desta forma é preciso encarar este barulho de forma construtiva, pois

sem ele, dificilmente, há clima ou motivação para o jogo.

No planejamento deste tipo de atividade é interessante que o professor reserve um

espaço de tempo para uma discussão e avaliação do jogo, tentando com isso resgatar com os

alunos as questões mais significativas que foram objeto de discussão durante o jogo. Deste modo,

o professor terá uma melhor visão sobre os “erros” e “acertos” dos alunos, e com isso poderá

buscar o aprimoramento do seu trabalho pedagógico.

Ainda de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais as atividades com jogos

permitem ao professor avaliar ainda os seguintes aspectos:

a) Compreensão: facilidade para entender o processo do jogo assim como o autocontrole e o

respeito a si próprio.

b) Facilidade: possibilidade de construir uma estratégia vencedora.

c) Possibilidade de descrição: capacidade de comunicar o procedimento seguido e da

maneira de atuar.

d) Estratégia utilizada: capacidade de comparar as estratégias com as previsões ou hipóteses.

É importante observar que a aprendizagem não se encontra no jogo, assim como

não se encontram em nenhum material didático ou metodologia de ensino, mas sim decorre

das reflexões que o aluno elabora e dos significados que ele estabelece a partir do que já

conhece. Conseqüentemente, o sucesso de uma metodologia, ou do uso de um material, está na

confiança e no conhecimento que o professor tem sobre o potencial dos mesmos e isso só

ocorrerá, no caso dos jogos, se o professor se dispuser a jogar e conhecer o jogo no qual irá

aplicar. Só dessa maneira o professor irá conhecer as dificuldades que seus alunos irão

encontrar durante o jogo e com isto poderá orientá-los de uma forma mais abrangente.

Page 35: CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO USO DE UM JOGO DIDÁTICO

35

2.5 MODELO DE UM JOGO: JOGO DA CAÇA AO TESORO (OU JOGO DAS

COORDENADAS CARTESIANAS)3

A estratégia didática que constitui esse modelo é a de envolvimento dos alunos em

um jogo que pretende levá-los à construção de representações simbólicas que identifiquem

posições de pontos numa superfície plana. Para essa atividade, a escola deve dispor de um pátio

razoavelmente plano, de dimensões adequadas (tipo quadra de areia usada para futebol suíço), na

qual possam enterrar pequenos objetos (por exemplo, cilindros de 5cm de comprimento e 2cm de

diâmetro). Calcula-se que dimensões do pátio de 6m por 8m sejam suficientes para turmas

pequenas de alunos (em torno de 16 alunos), mas essa limitação deve ser verificada pelo

professor previamente.

Para acontecer o jogo, os alunos devem ser distribuídos em equipes de até quatro

pessoas. Cada equipe deverá escolher um símbolo, que pode ser uma cor escolhida de um

conjunto de cores, por exemplo. O jogo é constituído de quatro etapas descritas a seguir.

1ª Etapa

Para início dessa etapa é fixado no centro da quadra uma corda colorida que divide a mesma em duas partes iguais. Na posição central dessa corda4 é fixada uma pequena estaca conforme ilustram as figuras abaixo (ilustração 1 e fotografia 1):

Ilustração 1: esquematização da quadra para a primeira etapa do jogo

Fonte: Arquivo pessoal do autor

3 Esta atividade é de criação minha e do Professor Luis Alberto Brettas que a descreveu em sua tese de doutorado (ver referência bibliográfica). Ela é adaptação de um jogo infantil chamado caça ao tesouro. O jogo original não trabalha com coordenadas cartesianas 4Recomenda-se usar cordas de varal.

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36

Fotografia 1 : fotografia da quadra usada para a realização da 1a etapa do jogo da caça ao tesouro Fonte: Arquivo pessoal do autor

Um aluno representante de cada equipe (ou dois alunos de cada equipe, caso cada uma delas tenha quatro membros) vai até o

pátio da escola com o professor, enquanto seus colegas ficam em sala de aula participando de outra atividade não necessariamente relacionada ao jogo.

No pátio, o professor esconde enterrado um pino (ou outro objeto similar) que

represente o símbolo da equipe (caso os símbolos sejam cores, o pino será da cor correspondente

para cada equipe) em algum lugar desse pátio. Cada representante da equipe observa onde está o

pino de sua equipe, e representará esta posição usando um papel onde está escrito algo análogo ao

quadro a seguir (Ilustração 2):

1ª Etapa

Nome da Equipe:

Nome do representante:

Ação: representar, no espaço abaixo, o local onde se

encontra o símbolo da equipe

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Ilustração 2: modelo para representação de posição em superfície plana na etapa 1. Fonte: Arquivo pessoal do autor

O professor deixará disponíveis fita métrica (ou “metros” de marceneiro) em número suficiente de um para cada equipe.

Nessa primeira etapa, cada representante poderá representar, no papel que o professor

lhe forneceu, a posição do símbolo de sua equipe como bem lhe aprouver (desenhos, escritos,

etc.) Espera-se que, nessa etapa, os estudantes representem mapas descritos dos locais onde se

encontram os objetos de suas equipes.

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Fotografia 2: Alunos medindo a distância do “objeto” (em amarelo) de sua equipe em relação à corda.

Fonte: Arquivo pessoal do autor

Esse papel será entregue ao(s) membro(s) da equipe que ficou (aram) na sala de aula. Além disso, não pode haver outro tipo de comunicação entre o(s) aluno(s) que ficou (aram) na sala de aula e o representante que estava no pátio. De posse da descrição gráfica feita pelo colega, o(s) novo(s) representante(s) da equipe a ir (em) para o pátio tentará (ão) descobrir em que local está o símbolo da sua equipe. Esse(s) aluno(s) terá (ao), também disponível, uma fita métrica. Enquanto isso, cada aluno que fez a primeira representação da posição de onde está o símbolo deve ficar em sala de aula, incomunicável aos colegas que procuram o objeto. Os alunos que procuram seus símbolos indicam, usando uma bandeira com a cor da equipe, quando acharem que estão certos, o local onde acreditam que está o símbolo da equipe.

Fotografia 3: Alunos da equipe vermelha, após analisarem o mapa feito pelos seu colegas indicaram com sua bandeira a possível posição do objeto de sua equipe

Fonte: Arquivo pessoal do autor

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São, então, medidas as distâncias entre os lugares marcados pelas equipes e a posição onde realmente os objetos respectivos encontram-se enterrados. Essas distâncias são registradas num quadro para posterior conferência e pontuação das equipes.

Ainda nesta etapa, trocam-se os alunos que representarão as equipes e elaborarão uma

representação gráfica do local onde está escondido o símbolo da equipe. O professor esconderá os

objetos, novamente, para esse novo grupo de alunos. Nessa ocasião, ocorrem tantas fases do jogo

quantos elementos que cada equipe tem. Essa etapa termina quando cada um dos alunos tiver

participado da elaboração de uma representação gráfica para a equipe.

2ª Etapa

Nessa etapa usa-se, ao invés de uma quadra de areia, um espaço tal como um pátio

coberto de uma escola, que tenha o piso coberto por azulejos quadrados (Ilustração 3 e fotografia

4). Nesse espaço, que tanto pode ser de forma quadrangular como quadrado, estendem-se duas

cordas que se interceptam ortogonalmente, sugerindo um par de eixos cartesianos.

Ilustraçao 3: Esquematização da quadra para a etapa 2 Fonte: Arquivo pessoal do autor

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Fotografia 4: Quadra de piso cerâmico com cordas imitando eixos cartesianos usada na 2a etapa do jogo.

Fonte: Arquivo pessoal do autor

Agora, o “objeto da equipe” ficará escondido em um ponto de encontro de duas linhas

transversais formadas pelas “frestas” dos azulejos. Para isso usa-se fita adesiva colada a um

pedaço de papel cartão preto, onde será escondido o símbolo da equipe, que neste caso será um

quadradinho menor de papel da mesma cor da equipe.

Fotografia 5: Esquema usado para “esconder” o símbolo de cada equipe na etapa 2

Fonte: Arquivo pessoal do autor

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Nesta etapa, repete-se o mesmo procedimento da etapa anterior, porém, não mais

usando as fitas métricas, visto que agora se pode usar os azulejos como unidade de medida, e

agora com a restrição de que cada aluno poderá utilizar na descrição do mapa somente

segmentos de retas e números (Ilustração 4).

Ilustração 4: modelo para representação de posição em superfície plana na etapa 2. A idéia dessa etapa é fazer com que os alunos utilizem algum ponto de referência e

indicações de direção, além das medidas de distância. Atentamos para o fato de que nessa fase o

papel usado para a representação do mapa contém pontos de referência devido ao fato de que o

construtor não poderá escrever no mapa que construiu.

3ª Etapa

Novamente, repetem-se os procedimentos da etapa anterior, exceto pelas limitações

referentes ao que os alunos podem usar nas representações gráficas.

O papel de que cada representante da equipe dispõe para representar o local onde se

encontra o símbolo de sua equipe (Ilustração 5).Erro!

2ª Etapa – 1ª fase

Nome da Equipe:

Nome do representante:

Ação: representar, no espaço abaixo, usando, para isso,

somente segmentos de retas e números, o local onde se

encontra o símbolo da equipe.

coordenação

direção

quadra

3ª Etapa

Nome da Equipe:

Nome do representante:

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42

Ilustração 5: modelo para representação de posição em superfície plana na etapa 3. Fonte: Arquivo pessoal do autor

Também nessa etapa muda-se a configuração da quadra. No mesmo

espaço da etapa 2 (quadra quadriculada de piso cerâmico) será afixada uma

numeração nas cordas, imitando um plano cartesiano com eixos verticais e

horizontais e números inteiros positivos e negativos (Ilustração 6 e Fotografia 6).

Ilustração 6: Esquematização da quadra para a etapa 3 Fonte: Arquivo pessoal do autor

Page 43: CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO USO DE UM JOGO DIDÁTICO

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Fotografia 6: Esquematização do espaço usado para a etapa 3 do jogo Fonte: Arquivo pessoal do autor

Nesta etapa os alunos terão, não mais que desenhar um mapa com retas e números,

mas representar o “lugar” onde está o símbolo da equipe usando somente dois números.

Embora, como pré-requisito a essa atividade, entenda-se que os alunos já tenham

construído a representação de posições relativas numa reta representando os Números Inteiros (e,

portanto, com posições negativas e também identificadas), o objetivo, ainda nessa etapa, é a

percepção da referência ortogonal e a identificação de apenas dois números para representá-la.

Depois disso, novamente ficam no pátio somente os representantes das equipes,

ficando os membros restantes na sala de aula. O professor fixa o símbolo de cada equipe

(mantendo o referencial de cordas fixas no pátio). Como provocação à reflexão, é interessante

que o professor coloque os símbolos das equipes em algumas das posições seguintes: Posição

para a qual uma das coordenadas é negativa e a outra positiva; posição para a qual uma das

coordenadas seja nulas e a outra não (sob um dos segmentos).

Page 44: CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO USO DE UM JOGO DIDÁTICO

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Ainda nesta terceira etapa continua valendo a mesma regra de pontuação e somente

acaba quando todos os alunos fizeram sua própria representação. A troca de alunos representantes

segue a mesma orientação anterior.

Até o fim desta etapa, entende-se que os alunos já terão construído o conceito de

representação cartesiana e já conseguirão representar, em pares ordenados, pontos identificados

num plano a partir de um sistema de eixos ortogonais construídos por eles próprios ou a partir de

um sistema previamente esboçado. Acredita-se, também, que esses alunos terão condições de

identificar pontos em um sistema de eixos ortogonais num plano a partir de representações de

pares ordenados.

Em atividades de aulas subseqüentes às desse modelo, o professor pode provocar

os alunos a tentarem estabelecer regras para identificar conjuntos discretos de pontos do plano,

como, por exemplo, os que pertençam a uma reta passando pela origem. Acredita-se, também,

que, depois das atividades previstas nesse modelo, os alunos terão condições de estabelecer essas

regra

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3 METODOLOGIA DE INTERVENÇÃO

Conforme descrito nos capítulos anteriores, acredito que o uso de jogos no ensino de

Matemática, quando bem planejados, pode servir de importante ferramenta na construção de

conceitos matemáticos, e, deste modo, ser um instrumento para se obter uma aprendizagem

significativa.

Para efetivação deste trabalho, tentei mostrar que através de um jogo de regras

poderíamos levar os alunos a construírem por eles próprios um dado conceito matemático, neste

caso, o conceito de Coordenadas Cartesianas. Esse conceito é estudado nas escolas, na maioria

das vezes, de forma mecânica e expositiva, sem significado algum para o aluno. Não obstante,

mesmo sendo um conceito simples, muitos alunos, já em séries mais avançadas, ainda

apresentam dificuldades em atividades envolvendo tal assunto.

Neste caso, a atividade (jogo) intitulada “Caça ao Tesouro”, descrita no capítulo 2.5

deste trabalho, tem como objetivo propor situações lúdico-pedagógicas onde os alunos, através de

3 etapas do jogo, irão gradativamente construindo o conceito de Coordenadas Cartesianas.

Para o planejamento da atividade e da pesquisa relativa a tal, baseei-me na

metodologia da “Engenharia Didática”. Para Pais (2001, pg.99), a idéia da Engenharia Didática

faz uma analogia entre o trabalho do engenheiro e o trabalho do pesquisador em didática, no que

diz respeito à concepção, planejamento e execução de um projeto. Ou seja, a Engenharia Didática

se constitui em uma forma de sistematizar a aplicação de um determinado método na pesquisa

didática.

No planejamento de uma pesquisa baseada na Engenharia Didática

executaremos quatro fases consecutivas: análises preliminares; concepção e análise

a priori; aplicação da seqüência didática e a análise a posteriori.

Na análise preliminar são levantadas constatações empíricas, destacam-se concepções dos

sujeitos envolvidos e tenta-se compreender as condições da realidade sobre a qual a experiência

será realizada.

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A fase da concepção e análise a priori consiste na definição de um certo número de

variáveis de comando do sistema de ensino que supostamente interferem na constituição do

fenômeno.

A aplicação da seqüência didática é formada por um certo número de aulas planejadas e

analisadas previamente com a finalidade de observar situações de aprendizagem, envolvendo os

conceitos previstos na pesquisa didática.

Na fase de análise a posteriori refere-se ao tratamento das informações obtidas por

ocasião da aplicação da seqüência didática, que é a parte efetivamente experimental da pesquisa.

Estes dados podem ser obtidos diretamente pelo pesquisador e devem ser devidamente

registrados, de forma efetiva, nos protocolos da experiência.

No caso da pesquisa baseada em uma engenharia didática, a validação dos resultados é

obtida pela confrontação entre os dados obtidos na análise a priori e a posteriori, verificando

hipóteses feitas no início da pesquisa.

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4 RESULTADOS

4.1 DESCRIÇÃO DA INTERVENÇÃO

4.1.1 Análise preliminar

A intervenção foi realizada com a turma 6a série B do Colégio de Aplicação da

UFSC. As atividades foram realizadas em 3 etapas subseqüentes de duas aulas cada, durante o

período de 30/04/2007 à 11/05/2007.

O interventor, que é o autor desta monografia, é também o próprio professor de

matemática dessa turma, que teve o primeiro contato pedagógico com ela no início do mês de

abril.

Os alunos possuem idades entre 11 e 13 anos. Dos 25 alunos da turma, 2 são

repetentes. Do total de 25 alunos, 8 são meninas e 17 são meninos.

Até o início da atividade, os alunos já haviam estudado uma introdução sobre o

conceito de números inteiros, compreendendo o significado de números positivos e negativos, e

conseguiam localizar facilmente um número inteiro na reta numérica.

Também pôde-se conferir no planejamento de aulas desta mesma turma na 5a série,

que eles nunca haviam estudado formalmente o conceito de coordenadas cartesianas. Os dois

alunos repetentes também não haviam estudado esse conceito no ano anterior quando cursaram a

6a série.

O Colégio de Aplicação da UFSC possui em sua definição um caráter experimental,

por ser campo de estágio e pesquisa dos estudantes dos cursos de Pedagogia da UFSC. Porém, ao

conversar com alguns professores, pudemos verificar que a metodologia usada para ensinar

matemática é a tradicional, sendo muito pouco usadas atividades e práticas que fogem do

esquema sala de aula e quadro de giz.

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4.1.2 Concepção E Análise A Priori

O conceito de coordenadas cartesianas é relatado tem seu estudo iniciado, na maioria dos

livros didáticos e manuais de estudo, na 7a série do ensino fundamental.

Mesmo sendo um conceito extremamente simples, verificamos, por experiência própria,

que muitos alunos de 8a série e ensino médio, possuem dificuldades na sua assimilação. Levanto

a hipótese de que tal dificuldade se dá pelo fato de que este conceito é estudado de forma

mecânica pelo aluno, não possibilitando a assimilação interna deste conceito, não havendo assim

uma aprendizagem significativa.

Creio, também, levantando uma outra hipótese, que o conceito de coordenadas cartesianas

pode ser estudado já na sexta série do ensino fundamental. Em outras palavras, podemos ainda

dizer que alunos em idade escolar de 12 anos já possuem desenvolvimento cognitivo suficiente

para construir esse conceito.

A questão de que os alunos não estão acostumados com um tipo de atividade

“construtiva” e lúdica supostamente poderá interferir na constituição do fenômeno de construção

do conceito de Coordenadas Cartesianas.

4.1.3 A aplicação da seqüência didática

Neste item, relatam-se as atividades realizadas com base no modelo descrito no item 4.1.1

As atividades foram realizadas em três etapas subseqüentes de duas aulas

cada. Para a realização do “jogo” intitulado “Caça ao Tesouro”, a turma foi

dividida em quatro equipes que receberam os nomes: Vermelha, Azul, Amarela e

Verde. Cada aluno ganhou um crachá com a cor de sua equipe. O professor elegeu

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um líder para cada equipe e lhe deu a incumbência de cuidar de sua “bandeira” e de

uma prancheta usada para o desenho do mapa.

Essa experiência foi realizada com uma turma de 6ª série (ver iten 4.1.2.1). Primeiro

organizou-se os alunos em três equipes de seis e uma equipe de sete alunos. Cada membro

recebeu um crachá com a cor de seu grupo. O professor explicou as regras do jogo e cada equipe

escolheu, à sua maneira, dois representantes para acompanhar o professor até o “campinho” para

o início da primeira etapa do jogo.

Na ilustração 7, apresenta-se um croqui, representando a quadra de areia onde foi

realizada a atividade.

Ilustração 7 : Croqui representando o prédio e o pátio da escola onde se realizou a experiência Fonte: Arquivo pessoal do Autor

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Apresenta-se, a seguir, resumo do que aconteceu em cada uma das etapas do

jogo. Observa-se que, em cada etapa, ocorrem duas fases, cada uma com dois dos

representantes de cada equipe.

Etapa 1 Foram realizadas duas fases dessa etapa. Na quadra de areia, estavam os oitos

representantes das equipes (dois representantes por equipe). Os demais alunos esperavam em sala

de aula. Foram colocados em pequenos buracos escavados na areia, na frente deles, em posições

variadas, os objetos de cada equipe. Esses objetos eram pequenos cubos de madeira pintados com

a cor da equipe. Esses objetos foram deixados visíveis para que os alunos pudessem desenhar os

respectivos mapas com a localização correspondente.

Fotografia 7: Aluno da Equipe Vermelha medindo a distância do seu objeto (em vermelho) até a corda na 1a etapa do

jogo Fonte: Arquivo pessoal do autor

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Fotografia 8: Alunos da equipe Verde medindo a distância do seu objeto (em verde) até a corda na 1a etapa do jogo

Fonte: Arquivo pessoal do autor

Depois de todos terem construído seus mapas, os objetos foram enterrados e o terreno

foi devidamente “disfarçado”, para que não parecesse óbvio o local onde encontrava-se o objeto.

A primeira estratégia das equipes Amarela e Azul foi a de descrever pontos de

referência da quadra, e usar segmentos de retas no sentido diagonal em relação às linhas de limite

da quadra. Podemos comprovar tal fato observando a Fotografia 9 e ilustrações 9 e 10:

Fotografia 9: Aluno (à direita) fazendo medição do seu objeto em linha diagonal

Fonte: Arquivo pessoal do autor

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Ilustração 8: Estratégia de representação da equipe amarela na 1a fase da 1a etapa do jogo Fonte: Arquivo pessoal do autor

Ilustração 9: Estratégia de representação da equipe azul na 1a fase da 1a etapa do jogo

Fonte: Arquivo pessoal do autor

Essa estratégia não obteve muito sucesso, pois nenhuma equipe conseguiu chegar a uma

distância mínima do objeto.

Nessa mesma fase as equipes Verde e Vermelha já usaram segmentos de retas paralelos e

ortogonais à linha de referência (corda azul esticada no centro da quadra). Podemos observar

através dos desenhos (Ilustrações 10 e 11) dos alunos destas equipes estas estratégias:

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Ilustração 10: Estratégia de representação da equipe Verde na 1a fase da 1a etapa do jogo Fonte: Arquivo pessoal do autor

Ilustração 11 Estratégia de representação da equipe Vermelha na 1a fase da 1a etapa do jogo

Fonte: Arquivo pessoal do autor

A diferença entre as duas representações está no fato de que o desenho da Equipe

Vermelha (ilustração 11) baseou-se em uma estaca que estava fixada na extremidade da quadra

(ver detalhe em vermelho), enquanto que a Equipe Verde utilizou a estaca central.

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Também podemos notar que no “mapa” da Equipe Vermelha (ilustração 11) não há

pontos de referência tal como no “mapa” da Equipe Verde (ilustração 10), que usou referências

como parquinho, ginásio, mato e prédio direção para a melhor localização das posições.

Destacamos na ilustração 10 a fala do aluno que descreveu o mapa da equipe Verde: “Da

estaca do meio ande 90 cm na linha azul. Onde parar andem 2,84 cm.” Notamos expressamente

o uso de coordenadas ortogonais para a representação do ponto em questão.

Ao término da construção dos mapas por cada equipe, os alunos que desenharam foram

separados e os outros participantes que se encontravam na sala foram chamados para fazer a

leitura dos mapas e tentar descobrir a posição exata, ou mais próxima possível, do “tesouro”

da equipe. Conforme relatado no item 2.5, cada equipe tem posse de uma pequena bandeira

com a cor de sua equipe, que deverá ser fixada no local onde os “leitores” do mapa acharem

que está de acordo com a descrição.

Fotografia 10 Aluno (à direita) lendo o mapa construído por sua equipe e estimando o local onde está escondido o “tesouro” de sua equipe.

Fonte: Arquivo pessoal do autor

Após todas as equipes fixarem suas estacas nos locais onde estimaram a possível posição

do objeto de sua equipe, o professor, juntamente com todos os alunos, desenterrou os objetos e

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fez as devidas medições dos erros de cada equipe. A tabela 1 mostra a pontuação de cada equipe

nesta primeira fase da 1a etapa do jogo:

ETAPAS / RODADAS

1 2 3

EQUIPES 1a

rodada 2a

rodada 1a

rodada 2a

rodada 3a

rodada 4a

rodada 1a

rodada 2a

rodada

AMARELA

23cm

8cm

VERMELHA

80cm

80cm

AZUL

32cm

50cm

VERDE

1cm

12cm

Tabela 1: Pontuação por equipe após a 2a etapa do jogo.

Na segunda fase trocaram-se os participantes, e notou-se que todas as equipes usavam

representações ortogonais. Notou-se que a má grafia de algumas palavras e números no mapa

dificultou em alguns casos a leitura por parte dos outros alunos, levando a má interpretação do

mesmo. Também a falta de pontos de referência confundia os “leitores” do mapa que não sabiam

corretamente em que lado da quadra deveriam estar.

As ilustrações a seguir mostram os mapas construídos por cada equipe na 2a fase da 1a

etapa do jogo:

Ilustração 12: Estratégia de representação da equipe Azul na 2a fase da 1a etapa do jogo

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Fonte: Arquivo pessoal do autor

Ilustração 13: Estratégia de representação da equipe Amarela na 2a fase da 1a etapa do jogo

Fonte: Arquivo pessoal do autor

Ilustração 14: Estratégia de representação da equipe Vermelha na 2a fase da 1a etapa do jogo

Fonte: Arquivo pessoal do autor

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Ilustração 15: Estratégia de representação da equipe Vermelha na 2a fase da 1a etapa do jogo

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Nota-se nessa etapa que alguns alunos já haviam percebido, e usaram com precisão, o

conceito de coordenadas ortogonais, chegando à conclusão que segmentos diagonais levavam a

um problema de interpretação do mapa.

Fotografia 11: Alunos da equipe Amarela usando medições ortogonais na representação de seu mapa.

Fonte: Arquivo pessoal do autor

2ª Etapa

A 2a etapa do jogo foi realizado em um pátio coberto da escola que possuía piso formado

com lajotas cerâmicas de formato quadrangular. Conforme relatado no item 2.5, foi afixado no

piso deste espaço uma composição de duas cordas imitando um plano cartesiano (fotografia 11).

Nesta etapa não se usou mais fitas métricas para medir distâncias, mas utilizou-se as lajotas como

unidade de medida.

Nesta etapa do jogo, o objeto da equipe passou a ser um quadradinho de cartolina da

mesma cor da equipe que ficava escondido embaixo de um quadrado maior de papel da cor preta

afixado no piso por uma fita adesiva (fotografia 13).

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Fotografia 12: Alunos da equipe Amarela estimando a localização do objeto da equipe na 2a etapa do jogo.

Fonte: Arquivo pessoal do autor

Fotografia 13: Alunos da equipe Amarela estimando a localização do objeto da equipe na 2a etapa do jogo.

Fonte: Arquivo pessoal do autor

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Neste momento do jogo observou-se que a maioria dos alunos usou coordenadas

cartesianas para a representação da posição do objeto. Porém não foi de imediato que todos

perceberam a não necessidade do uso da fita métrica para a estimativa da posição do objeto.

Foram realizadas quatro rodadas nessa etapa, fazendo com que os participantes pudessem

construir o mapa e também a leitura do mesmo. Somente duas equipes erraram nesta etapa, sendo

que estes erros aconteceram na 1a rodada da etapa. Estes erros possivelmente foram causados

pela não aquisição de um ponto de referência adequado para o início da representação. A

ilustração 16 mostra a estratégia usada pela equipe Amarela para a sua representação:

Ilustração 16: Estratégia de representação da equipe Amarela na 2a etapa do jogo Fonte: Arquivo pessoal do autor

Notamos que os construtores do mapa não indicaram a que distância do centro do plano

seus colegas deveriam começar a contar as lajotas indicadas no mapa. A equipe amarela errou a

posição do seu objeto nesta fase.

A Equipe Vermelha também não obteve sucesso na 1a fase dessa etapa. Mesmo com sua

representação estar definida com segmentos ortogonais, e tendo como ponto de referência o

centro do plano, os leitores iniciaram a contagem do “6” a partir da segunda lajota, e não da

primeira.

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Ilustração 17: Estratégia de representação da equipe Vermelha na 2a etapa do jogo Fonte: Arquivo pessoal do autor

As equipes Azul e Verde obtiveram sucesso nas suas representações e leituras e seus

mapas construídos na primeira fase pode ser visto nas ilustrações a seguir (ilustrações 17 e 18):

Ilustração 18: Estratégia de representação da equipe Azul na 2a etapa do jogo Fonte: Arquivo pessoal do autor

Page 62: CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO USO DE UM JOGO DIDÁTICO

Ilustração 19: Estratégia de representação da equipe Verde na 2a etapa do jogo

Fonte: Arquivo pessoal do autor

Nas fases subseqüentes dessa 2a etapa todos os alunos conseguiram com sucesso

representar e indicar o local onde se encontrava o símbolo de sua equipe. Todos os mapas

usaram coordenadas ortogonais e iniciaram sua representação pelo centro do plano. As

representações destas fases podem ser conferidas no anexo no final desse trabalho.

3a Etapa

Na 3a etapa do jogo, conforme descrito no item 2.5, usou-se o mesmo espaço da 2a

etapa, porém agora as cordas encontravam-se numeradas (ilustração 14). Também nesta etapa,

conforme papel dado para cada equipe construir seu mapas (ver ilustração 5 capitulo 2.5),

não se poderia desenhar nenhum tipo de reta ou escrever palavras. Somente poderia ser

usados dois números inteiros.

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Fotografia 14: Esquematização do espaço usado para a 3a etapa do jogo

Fonte: Arquivo pessoal do autor

Essa nova regra causou alguma confusão entre os alunos que estavam a construir os

mapas, pois, ao depararem com a posição de seu objeto, não sabiam que número escrever

primeiramente. Por exemplo, ao terem que descrever a posição cartesiana (-2 ,+3), ficavam

em dúvida se escreviam os números nessa ordem ou ao contrário.

Da mesma forma, na hora de fazer a leitura dos mapas e tentar encontrar o objeto, os

alunos “leitores” também ficaram muito confusos, pois havia “dois” “-2”, e não sabiam para

que lado teriam que ir.

Essa confusão, que levou a uma certa exaltação por parte dos alunos visto que neste

ponto havia um clima de disputa entre as equipes, que estavam empenhadas em obter o 1o

lugar no jogo, já era esperada e fazia parte do aspecto pedagógico do jogo. Queríamos com

isso levar os alunos à construção de estratégias para a resolução desse problema e ainda que

percebessem a importância de se estabelecer um padrão na escrita e leitura do mapa, para que

não houvesse mais esse tipo de confusão.

Na 1a fase dessa etapa as equipes Amarela, Azul e Vermelha erraram e somente a

Equipe Verde acertou a posição de sua equipe. A tabela a seguir mostra a posição exata onde

se encontrava o objeto e a posição indicada pela equipe:

Equipe Posição exata Posição estimada

Page 64: CONSTRUINDO O CONCEITO DE COORDENADAS CARTESIANAS ATRAVÉS DO USO DE UM JOGO DIDÁTICO

Amarela (-2,-3) (+2,+3)

Azul (+2, -3) (-3,+2)

Vermelha (+1,-2) (-2,+1)

Verde (-1,-4) (-1,-4)

Tabela 2: Posições registradas nos mapas na 1a fase da 2a etapa do jogo

Notou-se que a Equipe Verde acertou nesta rodada valendo-se mais da capacidade de

observação dos alunos do que pela avaliação das coordenadas. Os leitores do mapa

observaram que nos pontos (+1,+4), (+4,+1), (-1,+4), (+4,-1), (-4, +1), (+1, -4) e (-4,-1), ou

seja, todos os outros pontos que envolviam os números inteiros –1, +1, -4 e +4, estavam

descobertos e que deste modo só restaria o ponto que foi indicado pela equipe. Essa estratégia

foi usada por outros alunos no decorrer do jogo. Certamente este é um ponto falho do jogo

que deve ser corrigido em futuras intervenções.

Passada a 1a fase dessa etapa foi dado aos alunos um breve momento para que cada

equipe pudesse conversar e estabelecer estratégias para que não houvesse mais a confusão

ocorrida na primeira fase.

Foram realizadas mais três fases do jogo e observou-se que todas as equipes

conseguiram obter sucesso em suas representações e leituras do mapa, ou seja, conseguiram

traçar uma estratégia para que o “construtor” do mapa pudesse comunicar-se com sucesso

com o “leitor” do mesmo. A estratégia escolhida foi a mesma usada em todas as equipes:

“primeiro número ande sobre uma determinada direção; segundo número sobre a outra

direção”.

Como não houveram estabelecido direções (horizontal e vertical) para as retas e as

cordas eram de tamanhos diferentes, usaram como referencial o tamanho das cordas:

“primeiro número ande sobre a corda maior, para a direita ou esquerda; segundo número,

mude de direção e ande para cima ou para baixo.” Coincidentemente, ou não, todos os

alunos usaram a corda maior como referência para o primeiro número a ser representado no

mapa.

Depois da última fase dessa etapa, foi contabilizado os pontos de cada equipe e a

vencedora foi a Equipe Verde

4.1.4 Análise a posteriori

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Nas aulas subseqüentes foram discutidos com os alunos, em sala de aula, todas as

etapas do jogo e mostrados em transparências os principais erros e acertos de cada equipe.

Também foi aberto espaço para que cada aluno pudesse fazer algum comentário sobre o jogo.

Alguns alunos relataram possíveis fraudes de outras equipes e pediram a anulação dos

pontos. Grande discussão se formou, pois as equipes acusadas não aceitavam tais acusações.

De fato, no ímpeto de ganhar a competição, alguns alunos são levados a burlar as

regras do jogo e a tentar conseguir vantagens com isso. Cabe ao interventor impor regras e

punições para quem burlar as regras. Também é interessante que o professor que aplicar esta

atividade tenha ajuda de uma outra pessoa adulta que ajudará na fiscalização e organização da

atividade.

Depois de discutido os “acontecimentos” do jogo em si, foi estabelecido uma relação

entre o jogo e o conteúdo de coordenadas cartesianas. Estabeleceu-se os princípios da

representação cartesiana e a importância deste conceito. Após estudarem material preparado

pelo professor, foi proposto a resolução de uma lista de exercícios relativo a este conteúdo.

Pude perceber a grande facilidade com que os alunos tratavam os exercícios com

“pontos” e “coordenadas” e sempre faziam relação destes com o “tesouro” que haviam

“brincado” nas aulas passadas. O conceito foi construído e internalizado pelo próprio aluno.

CONCLUSÃO

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Trabalho com educação dede 1997. Nesse tempo atuei na rede pública e

privada de ensino, bem como trabalhei com turmas de ensino fundamental médio e

superior. Foi pensando e buscando uma alternativa ao que estava me deparando nas escolas

que acabei chegando aos jogos e realizando este trabalho.

Escolhi os jogos como tema deste trabalho por considerá-lo, dentre as

metodologias para o ensino de matemática, o mais acessível para o trabalho do professor. É

acessível pelo fato de não estar preso a uma tecnologia cara, como é o uso de computadores, e

nem dependendo de estudo mais aprofundado, como é a metodologia de resolução de

problemas. Isto é, podemos trabalhar com os jogos em sala de aula usando materiais bastante

simples e de fácil acesso aos professores.

Não tenho a pretensão de dizer que o uso de jogos acabaria com as dificuldades

no ensino e aprendizagem da matemática, no entanto, acredito que mesmo uma pequena

tentativa de olhar o ensino de modo geral de maneira diferente, mais dinâmica, democrática,

plural, em qualquer ambiente escolar, talvez já valha alguma coisa e, quem sabe, a longo

prazo mude mesmo, e para melhor, o ensino de matemática.

No que diz respeito ao uso de jogos nas aulas de matemática, concordo com

Borim (1998, p.79), quando ela afirma que neste caso o importante é o professor observar

que:

- deve questionar sempre: quando, por que e para que está propondo o uso dos jogos;

- não deve cair no exagero de querer transformar tudo em jogo, pois o seu objetivo não é

ensinar os alunos a jogarem, mas mantê-los mentalmente ativos, para que possam

construir o seu conhecimento através do pensamento lógico- matemático;

- precisa ver o jogo como uma das muitas estratégias de ensino e não como uma fórmula mágica capaz de resolver ou amenizar todos os problemas existentes na aprendizagem de matemática. O jogo é mais uma ferramenta de que podemos dispor de acordo com a ocasião, como são os livros didáticos, os computadores, os artigos de jornais e revistas etc.

A conclusão principal deste trabalho é a percepção do fato de que a aprendizagem

não se encontra nas metodologias de ensino, mas sim que ela decorre das reflexões que o

aluno elabora e dos significados que ele estabelece a partir do que já conhece, e que o sucesso

de uma metodologia depende da confiança e do conhecimento que o professor tem sobre a

mesma, sendo que estes fatores, só serão alcançados com muita pesquisa, estudo e prática.

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