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CONTEÚDOS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA COM ABORDAGENS … · bibliográfica, nos conteúdos dos livros didáticos do Ensino Médio e na observação ... o Descobrimento do Brasil, as

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A ESCOLA A FAVOR DA DIVERSIDADE: ESTRATÉGIAS PARA TRABALHAR

CONTEÚDOS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA COM ABORDAGENS TEMÁTICAS

SOBRE AS RELIGIÕES.

Autor: Noeli Zanatta Milani1

Orientadora: Cerize Nascimento Gomes2

RESUMO

O presente artigo pretende possibilitar estudos e reflexões com bases históricas

abordando a intolerância religiosa, no intuito de promover o respeito às diferenças,

propondo formas alternativas para trabalhar conteúdos didáticos com abordagens

temáticas sobre essa diversidade. O método empregado estará pautado na pesquisa

bibliográfica, nos conteúdos dos livros didáticos do Ensino Médio e na observação

direta dos alunos, servindo como referência para a pesquisa e os debates sobre a

diversidade e intolerância religiosa no meio escolar. Durante o desenvolvimento das

ações pedagógicas percebeu-se que a intolerância religiosa encontra-se mascarada

no ambiente escolar. No momento em que os alunos são incitados aos debates

sobre o assunto, desvela-se de forma clara o preconceito e a falta de conhecimento

sobre o surgimento das várias crenças religiosas. Este artigo aponta a necessidade

da abordagem dessa temática no âmbito da escola, a partir dos contextos históricos.

Palavras-chave: intolerância religiosa; estratégicas pedagógicas; respeito às

diferenças; aulas de História.

1 Graduada em História pela FAFI/Palmas-PR, pós-graduada em Interdisciplinaridade na Escola pela

IBPEX/Ctba/PR e Mestre em Educação pela UNOESC/SC. Atualmente é Professora de História do Colégio Estadual Agostinho Pereira-EFM em Pato Branco/PR. 2 Orientadora, mestre e professora da UNICENTRO.

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal do nosso país assegura o direito de culto e determina que

nenhum indivíduo pode sofrer descriminação por nenhum motivo, incluso aí o de

religião. Ampara-nos, portanto, no direito de exercer com liberdade nossa crença

religiosa, seja ela qual for.

Dos Direitos e Garantias Fundamentais CAPÍTULO I DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, os termos seguintes: VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias. (BRASIL, 1988).

A diversidade e a intolerância religiosa são temas tão importantes que exigem

reflexões e debates também no âmbito da escola, a partir dos contextos históricos.

O não tratamento dessa temática em sala de aula ou a ausência da escola em

relação a este debate pode ser interpretado como o resultado de uma falta de

relação entre os eventos históricos e a realidade social, bem como pela adoção de

metodologias tradicionais ou ultrapassadas.

De acordo com as DCEs de História, devemos:

Entender que as relações de poder são exercidas nas diversas instâncias sócio-históricas (...) permite ao aluno perceber que tais relações estão no seu cotidiano. Assim, ele poderá identificar onde estão os espaços decisórios, porque determinada decisão foi tomada, de que forma foi executada ou implementada, e como, quando e onde reagir a ela. (DCEs, 2008, p.66 a 67).

O maior desafio da humanidade neste século XXI é aprender a conviver com

as diferenças. Na escola podemos colaborar para que isso ocorra. Em nossas ações

pedagógicas, a intolerância religiosa poderá ser trabalhada. Não podemos ficar

indiferentes a essa questão. A intolerância religiosa existe e se manifesta também

no cotidiano escolar. Segundo ITANI

Pode-se mesmo afirmar que o preconceito faz parte de nosso comportamento cotidiano. (...). A sala de aula não escapa disso (...). Para trabalhar os conflitos decorrentes da intolerância é preciso compreendê-las, saber como se manifestam e em que bases são expressas, notadamente se levarmos em conta que elas não podem ser analisadas fora de seus contextos. (ITANI, 1998, p.119).

Ou seja, justamente porque o preconceito é um forte componente no nosso

imaginário social, muitas vezes até de maneira inconsciente, necessariamente deve

ser debatido.

Em nossa prática como educadora, defrontamo-nos com várias situações que

deixam transparecer a resistência ao diferente. O momento de maior embate entre

alunos e professores é quando abordamos conteúdo como a Reforma Religiosa,

ocorrida no início da modernidade. O abuso de poder por parte da Igreja Católica e o

uso de instrumentos intimidadores aos hereges. Da mesma forma quando

abordamos sobre as Cruzadas, o Descobrimento do Brasil, as crenças indígenas e o

Catolicismo e o Renascimento. Esses temas provocam debates que demonstram

como a diversidade religiosa revela a intolerância. São nessas aulas que o professor

poderá realizar um trabalho efetivo de conscientização para que o respeito pelo

diferente seja garantido no ambiente escolar.

Espera-se com o desenvolvimento deste trabalho tornar os alunos e a

comunidade escolar do Colégio Estadual Agostinho pereira-EFM, mais sensíveis e

abertos às diversidades religiosas, demonstrando maior compreensão e respeito;

provocar algumas mudanças na mentalidade e atitudes de alunos no cotidiano

escolar em relação às diferenças religiosas.

A questão religiosa aparece não apenas como pano de fundo para grandes

guerras e inúmeros conflitos sociais, mas também exerce intervenção sobre o

comportamento social das massas, com estreita relação com nossa vida familiar,

escolar, social e até mesmo política. A partir desse enfoque pretendemos justificar

teoricamente nossa opção pela pesquisa sobre a necessidade da escola se envolver

na luta contra a intolerância religiosa por meio de um intenso trabalho com os

conteúdos que permitam o debate e a reflexão sobre a diversidade de religiões

existentes em nosso mundo nos mais diferentes contextos históricos e nações da

Terra.

1- A INFLUÊNCIA RELIGIOSA NO COTIDIANO DA HUMANIDADE

A intervenção das religiões sobre a sociedade desde as mais remotas eras

históricas até os dias atuais sempre foi um tema que nos chamou a atenção, desde

o início do Curso de História. Notadamente em todas as disciplinas, nossas

professoras e nossos professores faziam articulações sobre a influência que tal

doutrina ou tal moral religiosa exercia sobre o mundo social, a tal ponto que grandes

guerras e revoluções ocorreram e continuam ocorrendo, na maioria dos casos, a

partir de pontos de vista religiosos.

Pesquisadores que estudam a religião como um fenômeno, defendem a ideia

de que a religião esteve sempre presente entre os seres humanos e em todas as

épocas. Dados paleontropológicos mais recentes indicam que:

O “Homo sapiens” antigo, e provavelmente o “Homo erectus” produziam bifaciais e objetos com incisões de caráter simbólico, os quais poderiam ter significado cultural e mágico-religioso. Depois, a partir dos neandertalianos e especialmente do “Homo sapiens sapiens”, as expressões do simbolismo religioso tornaram-se explícitas. Práticas funerárias, culto dos ossos, culto dos animais agressivos, ritos de passagem e ritos propiciatórios, são sinais indicadores da esperança dos primeiros homens na vida além da morte e da crença em um mundo sobrenatural. Especialmente as práticas funerárias, implicando a fé naquilo que sobrevive à morte. (MARTELLI, 1995, p.137-138)

Portanto, o homem religioso não é um fato recente da Pré-história. O sagrado

já tinha significado, ou seja, o reconhecimento de seres superiores e transcendentais

já ocorria desde o período em que os hominídeos se diferenciavam dos animais. No

entanto, como surgiram as experiências religiosas entre diferentes culturas e em

diferentes épocas é ainda uma incógnita para os paleantropólogos.

A experiência religiosa consiste em experimentar a presença do sagrado. Trata-se de um evento que constitui o específico da Religião. Contudo toda religião histórica o descreve recorrendo a expressões que são culturalmente condicionadas. Portanto, no plano histórico, revelam-se concepções diferentes da divindade, assim como formas rituais e sistemas de crenças profundamente diversos. (Idem, p.139-140).

Para entendermos como essas experiências religiosas foram

institucionalizadas não devemos estudá-las somente a partir de variáveis internas à

Religião. Ela está diretamente relacionada ao contexto da sociedade. De acordo

com Alves:

No processo histórico ao longo do qual nossa civilização se formou, recebemos uma herança simbólica-religiosa, a partir de duas vertentes. De um lado, os hebreus e os cristãos. Do outro, as tradições culturais dos gregos e dos romanos. Com esses símbolos, vieram visões do mundo totalmente distintas, mas elas se amalgamaram, transformando-se mutuamente, e vieram a florescer em meio às condições materiais de vida dos povos que os receberam. E foi daí que surgiu aquele período de nossa história batizado como Idade Média. (ALVES, 1999, p.41).

Foi no período Medieval que os símbolos sagrados se tornaram mais intensos e concretos. Tudo aquilo que se realizava e se pensava tinha que estar relacionado com o sagrado. O teocentrismo imperava e quem questionava era considerado herege e condenado à morte.

Tudo girava em torno de uma temática que unificava todas as coisas: o drama da salvação, o perigo do inferno, a caridade de Deus levando aos céus as almas puras. E é perfeitamente compreensível que tal drama tenha exigido e estabelecida uma geografia que localizava com precisão o lugar das moradas do demônio e as coordenadas das mansões dos bem-aventurados. (Idem, p.42).

O historiador Oliver Thomson, do Trinity College, em Cambridge, é

especialista em clássicos e dedica-se à pesquisa sobre as relações entre história,

moral e mídia. Na obra, A assustadora história da maldade ele analisa a influência

das religiões para o surgimento dos códigos morais que tinham com o objetivo

regular ou controlar a vida em sociedade. Os princípios morais religiosos partiam

sempre do pressuposto que sem a existência de códigos de conduta os homens

seriam condenados a um estado de selvageria que tornaria impossível a vida em

sociedade. Sobre essa intervenção social da religião, Thomson escreve:

Embora fundamentalistas de muitas religiões ainda possam afirmar que seus códigos resultam de decretos divinos, provavelmente é correto dizer que agora a maioria das pessoas reconhece que os códigos morais são inventados pelo homem: trata-se de regras de comportamento elaboradas por grupos de pessoas ou indivíduos para tornar a existência mais agradável para a maioria. Essa artificialidade não significa que a moralidade seja antinatural ou que o homem sem código moral seja necessariamente mau. (THOMSON, 2002 p. 21).

Sobre o desdobramento histórico dos códigos ou padrões morais impostos pelas

mais antigas religiões, o autor observa que:

O que é incontestável é que a maioria das sociedades precisou de alguma forma de um código moral como base da vida em comunidade, e, portanto, a criou. Talvez nem todos concordem com as regras escolhidas ou as considerem particularmente morais, mas um padrão de controle comportamental parece sempre surgir, mesmo se em certas ocasiões em nível aparentemente mais baixo que em outras. Em sociedades maiores também encontramos toda uma série de subsistemas morais, códigos distintos para guerreiros, sacerdotes, mães e inúmeros grupos pequenos. Numa comunidade moderna, não existem apenas padrões gerais para toda uma nação ou grupo de nações, mas há códigos no comércio, em hospitais, escolas, no exército, em sindicatos, nos esportes e até mesmo entre criminosos (THOMSON. 2002 p.21).

Sobre o desdobramento histórico dos códigos ou padrões morais impostos

pelas mais antigas religiões, o autor observa que:

O que é incontestável é que a maioria das sociedades precisou de alguma forma de um código moral como base da vida em comunidade, e, portanto, a criou. Talvez nem todos concordem com as regras escolhidas ou as considerem particularmente morais, mas um padrão de controle comportamental parece sempre surgir, mesmo se em certas ocasiões em nível aparentemente mais baixo que em outras. Em sociedades maiores também encontramos toda uma série de subsistemas morais, códigos distintos para guerreiros, sacerdotes, mães e inúmeros grupos pequenos. Numa comunidade moderna, não existem apenas padrões gerais para toda uma nação ou grupo de nações, mas há códigos no comércio, em hospitais, escolas, no exército, em sindicatos, nos esportes e até mesmo entre criminosos (THOMSON. 2002 p.21).

Observando que as moralidades religiosas diante das pressões econômicas e

psicológicas dos processos históricos foram transformadas em condicionadores

sociais mantenedores de preconceitos e de tradições transmitidas entre gerações

para difundir ideias particulares sobre classe, raça, nação e credo, Thompson

classificaria os códigos morais por seus objetivos principais que seriam os de

garantir além do decoro religioso, a sobrevivência de um governo, o sucesso na

agressão militar e a estabilidade econômica:

Um código moral pode ser definido, portanto, como um sistema de padrões éticos pelos quais uma dada sociedade controla o comportamento de seus membros, motivando-os para que atinjam os objetivos dela. É um processo de controle psicológico de grupo que geralmente proporciona uma estrutura bem mais ampla de manipulação do que a corporificada apenas no código legal dessa sociedade. Em tal sociedade, quem se rebelar contra o código será considerado uma pessoa imoral, mesmo que mais tarde pesquisadores julguem que o rebelde estava certo e a sociedade errada (THOMSON, 2002, p.33).

Em sua obra pioneira em estudos sobre o imaginário religioso da América

Portuguesa a autora traça um panorama sobre a mistura de crenças entre os povos

indígenas, africanos e europeus. Ela realiza um trabalho magistral onde aparece

também a evidência de que os primeiros processos do Brasil foram inquisitoriais,

movidos pelo Tribunal do Santo Ofício em suas três visitações à Colônia, quando

foram acusadas, presas ou depois levadas à morte, pessoas acusadas de heresia,

feitiçaria ou magia, ou seja, a prática de rituais contrários à Igreja Católica. A

pesquisa da historiadora confirmou que por intolerância religiosa foram mortos índios

e negros das mais diversas tribos, bem como europeus acusados de pacto com

praticantes de rituais indígenas ou africanos proibidos pela Igreja Católica.

Gilberto Freyre (2001), no clássico sobre história colonial, Casa Grande &

Senzala, também aborda a religiosidade dos escravos e a persistência dos povos

negros em manter suas crenças religiosas, mesmo que por elas tivessem que pagar

com a própria vida.

Os autores trabalhados servem como referência para afirmar, que em muitos

casos, a sociedade aceitava e justificava a violência feita pela Igreja e pelo Estado e,

além disso, implementava o seu uso pelos chefes de família. Thomson, em a

assustadora história da maldade, pondera que a religião consentia com o direito dos

pais de punir os filhos, as esposas e os empregados, sempre que considerasse

necessário (2002, p.51).

No Antigo Testamento, em vários momentos da Bíblia podem ser encontradas

alusões ao sacrifício de morte dos filhos, a expulsão dos filhos errantes da casa dos

pais, a venda dos filhos como escravos e até mesmo a morte dos mesmos. Quanto

às mulheres, elas são penalizadas religiosamente, não apenas em textos da Bíblia

judaica, católica ou protestante, mas também nas páginas do Alcorão, o livro

sagrado do Islamismo. Para as mulheres a intolerância é completa em todas as

religiões elas são punidas com a morte por adultério no Mundo Antigo, são as

principais vítimas da Inquisição religiosa na Idade Média e até hoje são vitimadas

pelos extremistas islâmicos que continuam punindo o adultério com a morte.

O controle do homem sobre o espaço doméstico favoreceu conflitos familiares

e disseminou ao longo do tempo os chamados conflitos de gerações, estimulando

crises juvenis que levaram primeiramente ao consumo de álcool, ópio e de tabaco, e

mais recentemente ao hábito de abusar de drogas pesadas, consideradas pelo

autor:

O uso de drogas é um vício escapista que, aparentemente, exceto entre grupos pequenos, tende a se exaurir em pouco tempo e, seguindo exemplos de epidemias ocorridas no passado, parece que sempre se esgotava. Novas drogas como heroína, cocaína e crack pertencem a uma era moderna e se revelam ainda mais perniciosas, mas não há nada de novo em relação ao conceito, apenas ao grau de dependência (THOMSON, 2002, p.55).

Nos dias atuais percebe-se também que a religião está sendo praticada como uma

forma de minimizar o sofrimento causado pelo cotidiano capitalista. Trabalhadores

desenvolvem suas atividades em péssimas condições de trabalho e salários,

desempregados excluídos da produção de riquezas, pobres e oprimidos que

atribuem à Deus a sua própria miséria. Seus sofrimentos parecem diminuir quando

encontram argumentos ilusórios capazes de melhorar suas condições de vida

através de sua crença religiosa.

As palavras que brotam do sofrimento se transformam, elas mesmas, no bálsamo provisório para uma dor que ele é impotente para curar. É por isso que o ópio, “felicidade ilusória do povo”, que deve ser abolida como condição de sua verdadeira felicidade. Mas o abandono das ilusões não se consegue por meio de uma atividade intelectual. As pessoas não podem ser convencidas a abandonar suas ideias religiosas. Ideias são ecos, fumaça, sintomas... Se elas têm tais ideias é porque sua situação as exige. É necessário, então, que sua situação seja mudada, as feridas curadas, para que as ilusões desapareçam. (ALVES, 1999. p.80).

A partir dessa vertente Marx defende a ideia de que enquanto houver

alienação haverá religião. No momento em que desaparecer essa alienação e as

sociedades conseguirem conquistar sua liberdade e autonomia não haverá mais

opressores. Será nesse momento que a religião desaparecerá. “A exigência de que

se abandonem as ilusões sobre determinada situação é a exigência de que se

abandone uma situação que necessita de ilusões”. (MARX, apud. ALVES, 1999,

p.80).

Contestando a ideia de Marx, Wilson afirma:

A religião, embora reduzida a um papel marginal, continuará a persistir na

sociedade moderna, exatamente porque o sistema social não pode dar respostas a

todas as necessidades humanas (...). A Religião tem a mínima importância para o

funcionamento da ordem social... O sistema social funciona sem legitimação

religiosa; uma grande parte da população procura na religião somente um apoio

ocasional, e talvez, nem mesmo isso. Contudo, é claro que as coisas não vão nada

bem na sociedade contemporânea. (WILSON, apud. MARTELLI, 1995, p.297).

Essa mesma religião que é capaz de tornar as injustiças mais suportáveis é

também utilizada pelos donos do capital para que gere certo conformismo diante das

precárias condições de vida e trabalho. Diante de sua fraqueza, os oprimidos

preferem acreditar que sua situação foi gerada por Deus e que sua contestação

poderá ser condenada e levá-los ao mundo das trevas. Tal argumento foi utilizado

também pelos colonizadores. Esse pretexto utilizado serviu para que a dominação

ocorresse de forma mais pacífica. Houve a exploração em nome da Religião. Alves

descreve com clareza essa situação e suas consequências para os primitivos

durante a colonização.

Os poderosos usam as mesmas palavras sagradas e invocam os poderes da divindade como cúmplices da guerra e da rapina. Os habitantes originais desse continente e suas civilizações foram massacrados em nome da cruz, e a expansão colonial levou consigo para a África e a Ásia o Deus dos brancos, e constituições se escreve invocando a vontade de Deus, e um representante de Deus vão ao lado daquele que foi condenado a morrer (...). Nada se altera nada se transforma, mas sobre todas as coisas dos homens se espalha o perfume do incenso (...) (ALVES, 1999, p.79).

Podemos perceber que as religiões por meio de códigos de conduta, padrões

morais e condicionamentos psicológicos, exerceram ao longo dos mais diversos

processos históricos, uma profunda influência sobre as sociedades, desde as mais

primitivas até as atuais. Essa intervenção pode ser vista de diversas formas a partir

do momento em que tentamos estabelecer o debate sobre o tema. No caso do

aumento do uso de drogas pelos jovens e as doenças causadas pela dependência

de novas drogas, existe no Brasil, uma relação com o crescimento das igrejas

protestantes.

A partir de dados divulgados pelo pesquisador Ricardo Mariano, no artigo A

expansão pentecostal no Brasil: Os casos Igreja Universal, constantes do livro

Dossiê Religiões no Brasil, do Instituto de Estudos Avançados de Universidade de

São Paulo - no qual o pesquisador relata que em todas as vertentes das igrejas

pentecostais permanece a interdição, o combate e o tratamento ao consumo de

álcool, tabaco e drogas (MARIANO, 2004, p.124).

A expansão pentecostal não é recente nem episódica. Ocorre de modo constante já há meio século, o que permitiu que o pentecostalismo se tornasse o segundo maior grupo religioso do país. Mas seu avanço não é expressivo apenas nos planos religioso e demográfico. Estende-se pelos campos midiático, político partidário, assistencial, editorial e de produtos religiosos. Seus adeptos não se restringem mais somente aos estratos pobres da população, encontrando-se também nas classes médias, incluindo empresários, profissionais liberais, atletas e artistas. Ao lado e por meio disso, o pentecostalismo vem conquistando crescente visibilidade pública, legitimidade e reconhecimento social e deitando e aprofundando raízes nos mais diversos estratos e áreas da sociedade brasileira. (MARIANO, 2004, p.120).

Para o autor, os dados do IBGE, desde 2001, comprovam que as igrejas

pentecostais reconheceram e usaram em seu benefício os contextos sociais,

econômicos, culturais e político que surgiram como resultado de um processo

histórico brasileiro, e utilizaram à demanda de fiéis existente a partir de crises sociais

ou econômicas que aumentaram o desemprego, a miséria, o uso de drogas e a

criminalidade.

Os perfis socioeconômicos e demográficos de pentecostais e protestantes são bastante distintos. Dados do último Censo revelam que a maioria dos pentecostais apresenta renda e escolaridade inferiores à média da população brasileira. Grande parte deles recebe até três salários mínimos e ocupa empregos domésticos, em geral modestos e precários, numa proporção bastante acima da média nacional. Em contraste, os protestantes históricos apresentam renda e escolaridade elevadas, ambas bem superiores à média brasileira, estando distribuídos mais nos níveis escolares de segundo grau, graduação e pós-graduação e nas faixas de renda entre seis e vinte salários mínimos. Pentecostais e protestantes são majoritariamente urbanos e apresentam maior proporção de mulheres que de homens. Quanto à cor dos fiéis, os primeiros sobressaem pela presença de pretos e pardos, superior à média da população, enquanto os últimos pela maior proporção de brancos. Os pentecostais abrigam mais crianças e adolescentes do que adultos, enquanto os protestantes mais adultos e idosos do que jovens diferenças de perfil etário e de taxas de natalidade que, tal como ocorre nas comparações anteriores, refletem suas distinções de classe social (MARIANO, 2004, p.124).

Mariano explica que para sensibilizar e absorver esses quadros, os

movimentos neopentecostais, usaram além de projetos religiosos e sociais um

intenso planejamento midiático com objetivo de ocupar o mesmo espaço da Igreja

Católica junto aos meios de comunicação de massa. O efeito desse investimento na

mídia teve como resultado o aparecimento de lideranças não apenas religiosas, mas

também políticas interessadas no uso da mídia e nos votos dos eleitores

evangélicos, estimados em 15 milhões de pessoas espalhadas por todo o Brasil. O

autor demonstra a influencia política da religião da seguinte forma:

A Universal elegeu um deputado federal em 1986, quatro em 1990, seis em 1994, catorze em 1998 e 22 em 2002, ano em que também conquistou uma vaga no Senado, com Marcelo Crivella (PL-RJ), que se candidatou à prefeitura do Rio de Janeiro em 2004. Além de contar com dezenas de vereadores e deputados estaduais espalhados pelo país, tornou-se um importante interlocutor político, cortejado pelos mais diversos partidos, sobretudo porque tem por hábito atuar nas eleições majoritárias, conclamando seu rebanho religioso e eleitoral a apoiar certos candidatos e a desprezar outros. No segundo turno das eleições presidenciais de 2002, surpreendeu ao apoiar o candidato do Partido dos Trabalhadores, após a derrota, no primeiro turno, do evangélico Garotinho. (MARIANO, 2004, p.124).

Cremos ter exposto o poder que as religiões exercem sobre as sociedades e

o fato de quanto à intolerância às práticas religiosas diferentes, pode ser causa de

conflitos e guerras mundiais, bem como de tragédias familiares e sociais. Nesse

sentido, acreditamos na importância da atuação dos professores de história contra a

intolerância religiosa, por meio de uma reflexão constante sobre essa temática

sempre que os conteúdos didáticos possibilitem o debate e o envolvimento dos

estudantes.

2- A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA NA ESCOLA

Trabalhar a intolerância na sala de aula é difícil para muitos professores. Foi o

que constatei no momento em que socializei o projeto na escola em que atuo como

docente. Confessaram que não possuíam formação, estrutura e nem conhecimento

para explorar o tema com os alunos. Sentiam-se inseguros e sem preparo. Fui

denominada de “corajosa” por meus colegas professores por estar desenvolvendo

tal projeto.

Nesta vertente OLIVEIRA afirma:

A escola é o espaço onde se encontra a maior diversidade cultural e também é o local mais discriminador (...). Trabalhar as diferenças é um desafio para o professor (...). Esses educadores não receberam uma formação adequada para lidar com as questões da diversidade e com os preconceitos na sala de aula e no espaço escolar (...). Se o professor for detentor de um saber crítico, poderá questionar esses valores da classe dominante e saberá extrair desse conhecimento o que ele tem de valor universal. (OLIVEIRA, 2001).

Se pretendermos erigir um ambiente de tolerância na Escola, será importante

considerar algumas posturas:

a) Conhecer as religiões como fenômeno sempre presente nas múltiplas culturas

em todo percurso histórico. Cada crença conserva características próprias de

sua civilização;

b) Conhecer as diversas religiões sempre relacionando em que contexto

histórico elas surgiram. Dessa forma o aluno terá oportunidade de arrolar sua

crença religiosa com as demais existentes e não menos importantes.

c) Motivar a sintaxe de um convívio afetuoso por meio de colóquios ecumênicos

e inter-religioso, proporcionando aos alunos e toda comunidade escolar, um

momento de reflexão a respeito das diferenças religiosas. A postura ética e

moral poderão ser resgatadas.

As salas de aula precisam se tornar um espaço de compreensão desvelada do mundo em que os sujeitos sociais estão integrados, a fim de que estes possam “compreender bem quais são as diferentes concepções de mundo que se ocultam sob cada uma delas e os principais problemas da sociedade a que pertence”. “Na sala de aula, o professor pode até estimular entre as diferenças, com o objetivo de ajudar os alunos a manter uma convivência saudável”. (AQUINO, 2003).

Quando a escola proporciona um ambiente democrático, receptivo, aberto,

em que diferenças de religião e outras diferenças são encaradas como naturais o

respeito surge também de modo instintivo. Esse procedimento deverá ser adotado

não somente com alunos, mas com toda comunidade escolar em que a instituição

educacional está inserida.

Portanto, se a educação é um dos meios mais apropriados de se precaver a

intolerância, Von nos sugere algumas ações exequíveis e eficientes que poderão ser

feitas pela escola na construção de um ambiente de consideração ao não igual.

Ensinar quais os direitos e as liberdades a serem respeitados; combater as influências que conduzem ao temor e a exclusão dos demais; formar docentes abertos a outras culturas, capazes de apreciar as diferenças e evitar conflitos ou resolvê-los de forma pacífica; promover atividades com a participação das famílias, incluindo todas as faixas etárias (até mesmo os avós). (VON, 2003, p.40).

Da mesma forma a autora acima deixa sua contribuição aos professores.

Acreditando que as mesmas servirão de suporte aos docentes que se sentem

inseguros e não preparados para trabalhar a intolerância na escola, citamo-las

abaixo:

Procurar colegas que pensam de modo semelhante para formar um grupo de apoio; não acreditar que são os únicos a se ocupar com esses temas; examinar seus próprios conceitos e atitudes ocupando-se de um autoexame constante; procurar ser modelo de respeito e tolerância; indicar livros, filmes, revistas relacionados à tolerância e a causas nobres; criar um grupo de relações de conflitos com a participação dos estudantes; desenvolver um calendário escolar que respeita a diversidade religiosa; expor os alunos a outras culturas; apresentar pontos de vista equilibrados, especialmente nas aulas de história, evitando julgamentos; praticar respostas apropriadas para neutralizar comentários preconceituosos. (Ibid.).

Para comprovar que o tema deve ser abordado nas instituições escolares

fizemos um levantamento de casos de intolerância ocorridos nas escolas brasileiras.

Foi lançado um documento na Marcha Nacional pela Liberdade Religiosa no

Rio de Janeiro no dia 19 de outubro de 2011. Este documento tem por finalidade

divulgar casos de intolerância religiosa nas escolas e creches do Rio de Janeiro.

Os relatos informaram a ocorrências de casos de violência física (socos e até

apedrejamento) contra estudantes; demissão ou afastamento de profissionais de

educação adeptos de religiões de matriz africana ou que abordaram conteúdos

dessas religiões em classe; proibição de uso de livros e do ensino da capoeira em

espaço escolar; desigualdade no acesso a dependências escolares por parte de

lideranças religiosas, em prejuízo das vinculadas a matriz africana; omissão diante

da discriminação ou abuso de atribuições por parte de professores/as e diretores/as

etc. Em São Paulo, o processo de colher informações está em andamento.

Para Denise Carreira, coordenadora do programa Diversidade, Raça e

Participação, da Ação Educativa e Relatora Nacional pelo Direito à Educação, a

discriminação e a violência históricas contra pessoas de religiões de matriz africana

sofrem de profunda invisibilidade no debate educacional e as denúncias apontam

que ela vem aumentando em decorrência do crescimento de determinados grupos

neopentecostais nas periferias das cidades e de seu poder midiático; da

ambiguidade das políticas educacionais com relação à defesa explicita da laicidade

do Estado e do insuficiente investimento na implementação da lei 10.639/2003 que

tornou obrigatório o ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira em toda

a educação básica.

De acordo com a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância

(DECRADI), há casos de explícita agressão física e moral a pessoas de diferentes

religiões, levando até mesmo a homicídios. Entretanto, muitas vezes o preconceito

não é mostrado com nitidez. É comum o agressor não reconhecer seu próprio

preconceito e ato discriminatório. Todavia, é de fundamental importância a vítima

identificar o problema e denunciá-lo.

O agressor costuma fazer uso de palavras ofensivas ao se referir ao grupo

religioso atacado e aos elementos, deuses e hábitos da religião em questão. Há

também casos em que o agressor desmoraliza símbolos religiosos, queimando

bandeiras, imagens, roupas típicas e etc. Em situações extremas, a intolerância

religiosa pode se tornar uma perseguição que visa o extermínio de um grupo com

certas crenças, levando a assassinatos, torturas e enorme repressão.

Crianças são vítimas de intolerância religiosa na escola. Foi entregue ao

desembargador Siro Darlan, presidente do Conselho Estadual da Criança e do

Adolescente (CEDCA), no dia 27 de janeiro de 2009, um dossiê-denúncia de

crianças discriminadas por orientação religiosa em escolas. A Comissão de Combate

à Intolerância Religiosa constatou que o caso mais grave é de um menino de treze

anos que passou sete meses sendo alvo de intolerância religiosa pela própria

professora nas dependências da FAETEC. O menino está em tratamento

psicológico. O caso foi registrado na 28 DP. Além deste, outros casos de intolerância

estão sendo acompanhados pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa.

Gualberto fez um mapeamento dos casos de intolerância no Brasil com o

objetivo de sistematizar a problemática do desrespeito e da descriminação religiosa

em nosso país nos últimos dez anos. Não é um trabalho científico, mas tem por

finalidade detectar casos de intolerância também nas escolas e denunciá-las. O

autor deste trabalho afirma que as punições ainda não se concretizam de forma

efetiva, sendo um fato que só faz aumentar os casos de intolerância religiosa e que

continuam sendo impunes.

Rio - As aulas de Literatura Brasileira sobre o livro ‘Lendas de Exu’, de Adilson Martins, se transformaram em batalha religiosa, travada dentro de uma escola pública. A professora Maria Cristina Marques, 48 anos, conta que foi proibida de dar aulas após usar a obra, recomendada pelo Ministério da Educação (MEC). Ela entrou com notícia-crime no Ministério Público, por se sentir vítima de intolerância religiosa. Maria é umbandista e a diretora da escola, evangélica. (GUALBERTO, 2011, p.136).

No blog a voz da negritude consta a seguinte denúncia: preconceito e

intolerância religiosa na escola Batista em Codó impede alunos de exporem objetos

de cultura afra codoense em projeto pedagógico.

Um grupo de alunos da Escola Batista de Codó-MA, foram impedidos de expor objetos da cultura afro-codoense em um projeto pedagógico da escola que tratava da diversidade cultural do município, segundo os alunos a direção da escola não permitiu a exposição das roupas e dos instrumentos musicais de origem africana que haviam conseguido junto à Secretaria Municipal de Cultura e Igualdade Racial e ONG AFROVERMELHO para o desenvolvimento do projeto, sob a alegação de que estes objetos pertenciam a macumba e não seriam permitido dentro da escola, que a escola tinha os seus preceitos a sua doutrina e que os alunos haviam assinado um contrato que previam estas condições. O caso causou um grande constrangimento aos alunos envolvidos no projeto e ao professor de história orientador da turma que há dez anos presta serviço na instituição, e principalmente às instituições que tratam da temática no município. (SERRA, 2012).

Através do observatório da educação, no dia 24 de agosto de 2010, Denise

Carreira relata denúncias de agressões e outros casos de intolerância religiosa

relatados pelo Direito Humano à Educação em Salvador.

Escolas públicas sendo usadas para cultos, crianças que se iniciam em determinadas religiões vítimas de agressão e de isolamento em sala de aula, professores que dão aulas de ensino religioso de acordo com a sua fé. (...). Denise conta que os problemas ocorrem principalmente devido a profissionais de educação, ligados a grupos religiosos evangélicos, que discriminam, na maioria das vezes, estudantes de religiões de matriz africana. “Quando se iniciam na umbanda, crianças ficam sem cabelo e usando contas. Professores, muitas vezes ligados às igrejas pentecostais, “demonizam” as crianças, falam para a sala que elas fazem pacto com o diabo, entre outras coisas”. (CARREIRA, 2010).

No site lei e ordem Raphael Vieira relata mais um caso de intolerância

religiosa ocorrida na Fundação de Apoio à Escola técnica (Faetec), em Quintino no

subúrbio do Rio de Janeiro.

O fato ocorreu em junho de 2008, quando Felipe Gonçalves Pereira, de 13 anos, foi expulso da sala de aula por uma professora e chamado de “filho do demônio” por usar no pescoço um colar de contas típico dos adeptos de religiões de origem africana. O caso foi parar na delegacia, mas só agora, em janeiro, foi instaurado um inquérito. (VIEIRA, 2009).

No site rede afro foi Publicado por Babá Obátundè em 20 maio de 2012 mais

relatos sobre intolerância religiosa nas escolas. Esse fenômeno é marcante no Brasil

e afeta principalmente pessoas ligadas às crenças de origem africana, revela uma

pesquisa da Relatoria Nacional de Educação. Segundo relatório esta situação começa

desde cedo nas escolas. Humilhações na sala de aula, segregação e isolamento são

alguns dos tipos de preconceito que sofrem os alunos, de acordo com a relatora

nacional da educação. Denise Carreira diz que há casos de professores que foram

demitidos por abordarem conteúdos sobre essas religiões como parte da cultura

brasileira. E também há casos de crianças que foram apedrejadas por serem

adeptas de religiões de matriz africana.

Estas são algumas ocorrências relatadas, diante de inúmeros casos nem

sempre divulgados e denunciados pelas vítimas. Fica então comprovado que a

escola pode e deve combater a intolerância com medidas preventivas e educativas.

Os agressores deverão ser sempre punidos. As novas gerações devem ser

orientadas e educadas, pois a ignorância e a intolerância são fenômenos que

ameaçam e comprometem uma sociedade democrática.

3- IMPLEMENTAÇÃO DA PROPOSTA DE INTERVENÇÃO NA ESCOLA

O projeto foi implementado com os alunos da 1ª Série do Ensino Médio do

Colégio Estadual Prof. Agostinho Pereira-EFM no município de Pato Branco,

pertencente ao NRE de Pato Branco.

A primeira ação foi apresentar uma cópia do projeto a ser desenvolvido para a

direção do colégio e para a equipe pedagógica. Após houve uma conversa expondo

os objetivos e ações pretendidas no desenvolvimento do projeto. Recebemos total

apoio e estímulo desses profissionais da Educação.

Em sala de aula, o primeiro momento foi também de apresentação do projeto

para os alunos do 1º ano do Ensino Médio, utilizando a TV pendrive disponível na

sala de aula.

O próximo passo foi instigar os alunos a opinarem sobre o tema a ser

desenvolvido: intolerância religiosa e sobre o que já sabiam sobre as diversas

religiões. Nesta avaliação diagnóstica percebemos que a maioria dos alunos não

dominava o tema. Indagados se eram intolerantes responderam que não. Mas não

conseguiam argumentar por que. Entretanto quando interrogados se havia

intolerância na escola ou em sala de aula, todos concordaram que havia sim.

Citaram casos de intolerância racial, social e de gênero. Quando indaguei se havia

intolerância religiosa um silêncio se abateu na sala. Os alunos se olhavam e nada

diziam.

No próximo encontro induzidos a falar após minha explanação sobre diferentes

religiões e conflitos causados sobre a intolerância religiosa, começaram se

manifestar, surgindo os seguintes relatos:

Aluno A. “No projeto de Educação Física em que a professora trabalha vários tipos de ritmos ocorreu algo estranho. Ela não permitiu que alguns alunos dançassem músicas islâmicas argumentando que a maioria dos alunos era da religião católica e que a direção da escola impediria a apresentação da dança para os demais alunos”.

Fica explícito nesse depoimento que a falta de conhecimento e a intolerância

se desvela nos procedimentos cotidianos dos professores. O professor que pesquisa

vários assuntos, incluindo religião, sente mais segurança em trabalhar diante das

avalanches de ideias existentes sobre as diferentes crenças religiosas e evita

situações semelhantes ao relato do aluno.

Aluno B. “Meu irmão está pensando em sair do emprego porque sofre muita pressão por parte do patrão dele e da maioria dos seus colegas. Pressionam todos os dias para mudar de religião. Ele falou que prefere mudar de emprego ou ficar sem emprego do que mudar sua religião por outra”.

Nessa fala podemos constatar que a intolerância está presente no cotidiano

das pessoas. Ela influencia de forma negativa a vida dos cidadãos. Neste caso está

provocando um clima de tensão que poderá resultar em violência e o não respeito

entre os de diferentes credos.

Aluno C. “Minha mãe não quer mais falar com nossa vizinha e nem tomar mais chimarrão na casa dela, pois cada vez que se encontram ela fica tentando convencer minha mãe de que a religião dela é que salva as pessoas. Um dia depois de ela insistir para minha mãe ir à Igreja dela, a mãe foi. Ela não gostou do culto e não vai mais. Disse que quer continuar com a religião que ela segue desde que nasceu”.

A evidência dessa situação relatada está nas pessoas acharem que somente

a religião que seguem leva à salvação. É um exemplo de intolerância por falta de

conhecimento. As pessoas envolvidas neste fato nunca exercitaram a tolerância

pelos não iguais. Mas casos semelhantes á esse é que alimenta um clima de tensão

e que poderá ser o estopim para conflitos religiosos.

Aluno D.“A colega que está faltando na aula hoje é evangélica. Nós a tratamos normalmente, mas ela se fecha. Nos trabalhos em grupo ela não se integra e acaba trabalhando sozinha. A gente até convida ela pra fazer parte do grupo e ela nunca aceita. Fica isolada o tempo todo”.

Essa fala nos leva a várias reflexões. Teria essa aluna sofrido humilhações no

decorrer de sua vida escolar? Teve oportunidades em sala para se manifestar e se

sentir a vontade para falar sobre suas crenças? Pode ser também que maioria

sendo de outra religião a perturba causando inibição e insegurança. Que ações a

escola planejou oportunizando para que todos pudessem entender os diversos

credos e criar um clima mais afetuoso?

Aluna E. “Professora, eu não sou intolerante com as pessoas que seguem outra religião. Respeito à forma deles pensar. Mas eu não admito que ninguém julgue ou critique minha religião. Eu tolero e espero que eu também seja tolerada”.

Este é um caso perfeito de intolerância camuflada. Existem pessoas que se

mostram indiferentes com as pessoas que seguem religiões diferentes. Mas no

momento que ouvirem uma crítica ou comentários maldosos sobre sua crença, se

tornam agressivos e capazes de atos violentos.

Após constatarmos que a intolerância está presente em todos os ambientes,

os alunos foram pesquisar sobre a influência da religião na humanidade desde a

antiguidade. A apresentação e os debates sobre o assunto superaram nossas

expectativas. Motivados os alunos usaram vários recursos tecnológicos resultando

momentos de reflexões e conhecimentos.

Também foram trabalhados textos sobre o Judaísmo, Cristianismo e

Islamismo, sobre crenças afrodescendentes, fundamentalismo e casos de

intolerância religiosa. Como atividade complementar os alunos trabalharam na

construção de textos, estabelecendo semelhanças e diferenças nos diversos tipos

de crenças, que expostos nos murais do colégio.

Trabalhamos também alguns trechos do filme: uma estranha entre nós. Os

debates foi relacionar o conteúdo explorado com as cenas do filme.

Os alunos compuseram paródias com o tema tolerância e respeito ao

diferente. Foram apresentadas às demais turmas do Ensino Médio.

Outra atividade desenvolvida com os alunos foi à confecção de cartazes,

repudiando a intolerância e fomentando a tolerância. Foram fixados em todos os

ambientes escolares.

Durante toda a implementação do projeto houve uma participação efetiva por

parte dos alunos. Percebeu-se que foi um momento em que puderam expor suas

angústias sobre o tema. As pesquisas foram profundas. Quanto mais eles

pesquisavam mais eram instigados a pesquisar. Foi na apresentação que se

detectou o domínio do tema e argumentações sistemáticas por parte dos alunos. No

final do trabalho os alunos demonstraram e sugeriram mais oportunidades como

aquela.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tema pesquisado, explorado e refletido nos comprovou de que a intolerância

religiosa está presente no ambiente escolar de forma camuflada e pouco trabalhada.

A preocupação da escola deverá ser de elaborar seu currículo que oportunize

debates e reflexões sobre as diversidades, ou seja, que permita problematizar a

realidade. A não tolerância aos desiguais só não ocorre quando as pessoas têm

acesso ao conhecimento sobre o tema.

Percebe-se que a intolerância religiosa influencia e muito a vida das pessoas e

dela resulta clima de tensão que poderá originar conflitos, ameaçando a democracia

social.

Acreditamos numa escola igual para todos e numa escola em que reconheça a

proveniência de alunos com diferentes culturas. Um clima de respeito faz com que

todos se sintam pertencentes ao processo educacional, evitando a exclusão escolar.

A intolerância poderá ser abordada constantemente na escola se o professor

conhecer e reconhecer que seus alunos são diferentes e que deverão ser

respeitadas e trabalhadas essas diferenças. Este trabalho terá êxito se os

educadores acreditarem e defenderem a escola como sendo um espaço para todos.

Isso pressupõe a garantia de liberdade religiosa.

Pressupõe-se que os casos de intolerância levantados neste trabalho tenderão a

ser minimizados se toda comunidade escolar estiver integrada e consciente para

enfrentar esse fenômeno.

Dessa forma, a função da escola seria formar pensadores sensatos,

conciliadores, e para tanto é preciso que os professores se desprendam de seus

próprios preconceitos, e que sejam capazes de estabelecer estratégias

pedagógicas, para conviver com as diversidades. Fazer das diferenças momentos

para enriquecer suas ações pedagógicas e proporcionar entendimento e respeito às

diversas crenças religiosas.

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