19
AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010 CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA FÍSICA 1 Contributions of french mathematicians to the development of Physics José Maria Filardo Bassalo 2 RESUMO Este artigo procura mostrar como os trabalhos de alguns matemáticos franceses foram importantes para o desenvolvimento da Física, em praticamente todos os seus ramos. Palavras-chave: Matemáticos Franceses; Física ABSTRACT In this article we show how the works of the french mathematicians were important to the development of Physics, in almost all of its branches. Keywords: French Mathematicians; Physics ÓPTICA, GRAVITAÇÃO E DINÂMICA Desde a Antiguidade, quando foram observados os primeiros fenômenos da refração da luz (desvio da luz ao passar na superfície de separação de dois meios refringentes), procurou-se explicar esse desvio por intermédio de uma expressão matemática. Depois de várias tentativas em busca dessa expressão, [1] somente em 1637, o filósofo e matemático francês René du Perron Descartes (1596-1650) em seu La Dioptrique (“A Dióptrica”), escrito como suplemento de seu famoso Discours sur la Méthode 1 Este artigo Homenageia a Memória do escritor brasileiro Machado Coelho (1909-2001), um dos Fundadores da Aliança Francesa de Belém, detentor da Cruz de Cavaleiro da Ordem das “Palmas Acadêmicas Francesas”, e Cavaleiro da “Ordem Nacional da Legião de Honra Francesa” e Anti-Homenageia o famigerado ex-Serviço Nacional de Investigação (SNI) do Brasil, por haver-me impedido de realizar na França: Mestrado, Doutorado e Pós-Doutorado em Física. 2 Doutor em Física pela Universidade de São Paulo, Brasil (1975). Professor Titular da Universidade Federal do Pará, Brasil. www.bassalo.com.br.

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

  • Upload
    others

  • View
    0

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

DESENVOLVIMENTO DA FÍSICA1

Contributions of french mathematicians to the development of Physics

José Maria Filardo Bassalo2

RESUMO

Este artigo procura mostrar como os trabalhos de alguns matemáticos franceses foram

importantes para o desenvolvimento da Física, em praticamente todos os seus ramos.

Palavras-chave: Matemáticos Franceses; Física

ABSTRACT

In this article we show how the works of the french mathematicians were important to the

development of Physics, in almost all of its branches.

Keywords: French Mathematicians; Physics

ÓPTICA, GRAVITAÇÃO E DINÂMICA

Desde a Antiguidade, quando foram observados os primeiros fenômenos

da refração da luz (desvio da luz ao passar na superfície de separação de dois meios

refringentes), procurou-se explicar esse desvio por intermédio de uma expressão matemática.

Depois de várias tentativas em busca dessa expressão, [1] somente em 1637, o filósofo e

matemático francês René du Perron Descartes (1596-1650) em seu La Dioptrique (“A

Dióptrica”), escrito como suplemento de seu famoso Discours sur la Méthode

1 Este artigo Homenageia a Memória do escritor brasileiro Machado Coelho (1909-2001), um dos Fundadores da Aliança Francesa de

Belém, detentor da Cruz de Cavaleiro da Ordem das “Palmas Acadêmicas Francesas”, e Cavaleiro da “Ordem Nacional da Legião de

Honra Francesa” e Anti-Homenageia o famigerado ex-Serviço Nacional de Investigação (SNI) do Brasil, por haver-me impedido de

realizar na França: Mestrado, Doutorado e Pós-Doutorado em Física.

2 Doutor em Física pela Universidade de São Paulo, Brasil (1975). Professor Titular da Universidade Federal do Pará, Brasil.

www.bassalo.com.br.

Page 2: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

22 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

(“Discurso sobre o Método”), apresentou o tratamento matemático correto daquele desvio.

Nesse trabalho, demonstrou que as semicordas do dobro dos ângulos de incidência (i) e de

refração (r) permanecem constantes quando a luz atravessa a superfície de separação de dois

meios transparentes. Usando a teoria corpuscular da luz, concluiu que a velocidade da luz é

maior nos meios mais refringentes (densos). Na linguagem moderna, esse resultado,

conhecido como Lei da Refração da Luz, é traduzido pela expressão:

sen i/sen r = n2/n1,

com n1 e n2 representando, respectivamente, os índices de refração dos meios

incidente e refratário. [2]

É também de Descartes, uma primeira tentativa de explicar o problema do

movimento dos corpos próximos da Terra e dos astros no céu, problema esse conhecido desde

a Antiguidade, e hoje chamado de gravitação. Vejamos como Descartes lidou com essa

questão. Em 1644, publicou o livro intitulado Principia Philosophiae (“Princípios de

Filosofia”), no qual formulou sua Teoria dos Vórtices para explicar a gravitação. Para a

formulação de sua Teoria da Gravitação, Descartes considerou que a matéria, embora toda da

mesma espécie, fosse constituída dos “elementos gregos” [1] que variavam de tamanhos: as

maiores compunham a terra, as médias, o ar, e as menores, o fogo. Todos esses elementos

eram agrupados em vórtices, em cujo centro ficavam as partículas de fogo, que eram rápidas.

Ainda para Descartes, no centro de cada vórtice formava-se uma estrela. As estrelas, contudo,

tinham a tendência a se cobrir com matéria grossa para se constituir em um planeta; se,

contudo, este tivesse uma excessiva massa que o fizesse vaguear de um vórtice para o outro,

ele tornar-se-ia um cometa. Por fim, nesse modelo cartesiano, os planetas eram capturados e

arrastados por vórtices (redemoinhos, turbilhões) de partículas de éter cartesiano (diferente do

éter aristotélico), em cujo centro estava o Sol; por sua vez, os satélites planetários eram

velhos planetas formados há muito tempo. Segundo esse modelo turbilhonar cartesiano, a

Terra seria um elipsóide, alongado no sentido de seu eixo polar.

Por seu lado, em 1687, o físico e matemático inglês Sir Isaac Newton

(1642-1727) publicou o tratado intitulado Philosophiae Naturalis Principia

Mathematica (“Princípios Matemáticos da Filosofia Natural”), composto de três livros.

[3] No Livro I, Newton trata do movimento dos corpos no vácuo, inclusive dos movimentos

orbitais elíptico, parabólico e hiperbólico, devido a forças centrais, ocasião em que

demonstrou as Leis de Kepler. Ainda nesse Livro I, e logo em seu começo, há a formulação

das famosas três Leis de Newton: 1ª.) Lei da Inércia; 2ª.) Lei da Força ( amF

); e 3ª.) Lei

da Ação e Reação. No Livro III, Newton apresentou a Lei da Gravitação Universal – A

gravidade opera proporcionalmente à quantidade de matéria e propaga sua virtude para

todos os lados a distâncias imensas, decrescendo sempre como o inverso do quadrado da

distância. Com essa lei, encontrou a “estrutura do sistema do mundo” e, dentre as proposições

demonstradas no Livro III, encontra-se o cálculo da forma da Terra: achatada nos pólos e

alongada no equador, justamente o oposto do modelo cartesiano.

Essa polêmica sobre a forma da Terra só foi resolvida quando se mediu o

meridiano terrestre e, para sua medição, houve a contribuição de matemáticos franceses. Com

efeito, em 1736, Pierre Louis Moureau de Maupertuis (1698-1759), com auxílio de Aléxis

Claude Clairaut (1713-1765), também astrônomo, confirmou o modelo newtoniano, ao medir

o grau de arco de meridiano entre Tornea, no golfo de Botnia, e Kittis, situado no mesmo

meridiano, além do círculo polar. O resultado dessa expedição foi publicado por Maupertuis,

Page 3: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

23 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

em 1737, no trabalho intitulado: Relation du Voyage au Cercle Polaire (“Relação

da Viagem ao Círculo Polar”). Registre-se que essa medição, confirmou o resultado obtido,

no ano anterior (1735), pelos franceses, o geógrafo Charles Marie de la Condamine (1701-

1744) e o físico Pierre Bouguer (1698-1758), ao medirem o grau de arco do meridiano que

passa em Quito, no Equador.

É interessante destacar que a Segunda Lei de Newton foi generalizada, em

1743, por Clairaut ao estudar o movimento de corpos em referenciais não-inerciais e

demonstrar que: Um corpo visto de um referencial em rotação (não-inercial) experimenta

uma força aparente por unidade de massa, igual e de sentido contrário à aceleração que esse

referencial tem em relação a um referencial inercial. Esse estudo de Clairaut foi completado

pelo físico francês Gustave Gaspard Coriolis (1792-1843), em 1829, ao obter a Segunda Lei

de Newton para sistemas não-inerciais girantes [

(t)]:

rdtdmvmrmFamamF

)/(2)()( ,

onde o segundo e o terceiro termo representam a expressão geral, respectivamente, da

força centrífuga [conceituada por Newton e calculada pelo físico e astrônomo holandês

Christiaan Huygens (1629-1695)] e da força de Coriolis.

É oportuno destacar que o matemático francês Pierre Charles François

Dupin (1784-1873), em 1817 (Annales de Chimie et de Physique 5, p. 85), generalizou o

Teorema demonstrado pelo físico francês Étienne Louis Malus (1775-1812), em 1808

(Journal de l´École Polytechnique 7, p. 1), Teorema esse que foi importante para o

desenvolvimento da Óptica Geométrica, principalmente no que se relaciona com a construção

de imagens ópticas: - Um grupo de ondas preserva sua congruência normal, após qualquer

número de reflexões e refrações. Registre-se que há congruência normal, se cada raio do

grupo é cortado ortogonalmente por esferas centradas no ponto de intersecção desses raios.

Em vista disso, esse Teorema passou a ser conhecido como Teorema de Malus-Dupin.

PRINCÍPIO VARIACIONAL: ÓPTICO E MECÂNICO

Outro tema importante para o desenvolvimento da Física relaciona-se com

a proposta de um Princípio Mínimo, para o qual houve, também, a participação de matemáticos

franceses. No começo da Era Cristã (d.C.), o matemático e inventor grego Heron de

Alexandria (c.20 d.C.- ? ) publicou o livro intitulado Catóptrica, onde formulou o seguinte

princípio: [4] - É mínimo o trajeto descrito por um raio luminoso. Muito mais tarde, o físico e

matemático iraquiano Abu-´Ali Al-Hasan ibn al-Haytham (al-Hazen) (c.965-1038) publicou,

por volta de 1038, o livro Kitab Al-Manazer (“Tesouro da Óptica”), no qual redescobriu a

“lei do trajeto mínimo da luz” de Heron. Contudo, foi somente em 1657 [em uma carta

(Epistolae 42) a Monsieur Cureau de la Chambre], que o matemático francês Pierre Fermat

(1601-1665) apresentou sua formulação matemática, por intermédio do Princípio do Tempo Mínimo: - A Natureza sempre escolhe os menores caminhos, segundo o qual a luz, ao se

Page 4: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

24 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

propagar entre dois pontos de sua trajetória, escolhe um caminho cujo tempo de percurso seja

mínimo. Em notação atual, esse princípio significa dizer que:

2

1

t

tdt =

2

1

/P

Pvds = mínimo,

quando a luz viaja com a velocidade v entre os pontos P1 e P2 de sua trajetória.

Registre-se que, em 1661, Fermat utilizou aquele seu Princípio para demonstrar a lei da

refração cartesiana. Para realizar essa demonstração, formulou a hipótese de que as

resistências (inverso da velocidade da luz) dos meios mais densos eram maiores que as dos

meios menos densos; tal hipótese significava dizer que a velocidade da luz no meio mais

denso (v2) é menor do que no meio menos denso (v1): v2 < v1, em frontal desacordo com a

hipótese cartesiana referida acima. [5, 6] Note-se que essa hipótese de Fermat foi confirmada

pelo físico e astrônomo holandês Christiaan Huygens (1629-1695), em seu famoso Traité

de la Lumière (“Tratado da Luz”), publicado em Paris, em 1690, com a hipótese de que a

luz é uma onda. [7]

Ainda relacionado com um Princípio Mínimo, vejamos o que trata da

seguinte questão: quando um corpo, com uma determinada velocidade, se desloca entre dois

pontos de sua trajetória, qual o caminho que ele escolhe?. Para responder a essa pergunta, em

1744 (Mémoires de l´Academie des Sciences de Paris, p. 417), Maupertuis apresentou o

conceito de ação (m v s), onde m é massa de um corpo que se desloca com velocidade v e

percorrendo o espaço s, e que satisfaz o Princípio de Mínima Ação, traduzido pela expressão:

m v s = mínimo. Registre-se que, ainda em 1744, no livro intitulado Methodus

Inveniendi Lineas Curvas Maximi Minimae Proprietate Gaudentes sive Solutio Problematis Isoperimetrici Latissimo Sensu Accepti (“Um Método

de Descobrir Linhas Curvas que Apresentam a Propriedade de Máximo ou Mínimo ou a

Solução do Problema Isoperimétrico Tomado em seu Sentido mais Amplo”), o físico e

matemático suíço Leonhard Euler (1707-1783) apresentou o Princípio de Maupertuis por

intermédio da expressão (m v s = m v v t = m v2 t, com m constante) (na notação atual):

vds = dtv 2 = 0,

expressão essa que indica que a ação de Maupertuis era mínima para movimento de

partículas ao longo de curvas planas. É interessante ressaltar que, além de razões físicas,

Maupertuis e Euler alegavam razões teológicas para o seu Princípio, já que achavam que as

leis do comportamento da natureza possuem a perfeição digna da Criação de DEUS. [8]

Os trabalhos de Euler sobre o problema variacional atraíram a atenção do

matemático franco-italiano Joseph Louis, Conde de Lagrange (1736-1813), em 1750, quando

era um jovem professor da Escola de Artilharia, em Turim, na Itália. Depois de ler esses

trabalhos, principalmente o Methodus, Lagrange descartou os argumentos geométricos

usados por Euler e pelos irmãos Bernoulli, os matemáticos suíços John (Johann, Jean) (1667-

1748) e James (Jakob, Jacques) (1654-1705), quando pesquisaram esse problema, [9, 10] e

começou a estudá-lo sob o ponto de vista puramente analítico. Desse modo, em trabalhos

realizados no período 1760-1761, nos quais apresentou seu “método das variações” [11], com

Page 5: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

25 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

o qual se calcula o mínimo de uma função integral, Lagrange obteve o Princípio de

Maupertuis-Euler por intermédio da força viva leibnitziana (T = m v2) de um corpo de massa

m e velocidade v (em notação atual):

2

1

t

tTdt = 0.

Mais tarde, em 1788, Lagrange publicou o livro Mécanique

Analytique (“Mecânica Analítica”), no qual usou seu “método variacional”, acima

referido, e demonstrou a equação (hoje conhecida como Equação de Euler-Lagrange):

0///)/( iii qVqTqTdtd ,

onde T ( iq ) é a energia cinética, V ( iq ) é a energia potencial de um sistema de n

partículas, e ( iq , iq ) são as coordenadas generalizadas (posição e velocidade) conceituadas

por Lagrange, em 1782. Também nesse livro, Lagrange estudou o movimento espacial das

partículas constituintes de um fluido, por intermédio de suas trajetórias, estudo esse hoje

conhecido como descrição lagrangeana.

Registre-se que a Equação de Euler-Lagrange recebeu uma nova

formulação, em 1809 (Journal de l´École Polytechnique 8, p. 266), pelo matemático francês

Siméon Denis Poisson (1781-1840), ao definir a função lagrangeana: L = T ( iq )– V ( iq ).

Dessa maneira, ele escreveu que:

0/// ii qLqLdtd ,

também conhecida como Equação de Euler-Lagrange-Poisson. [12]

MECÂNICA DOS FLUIDOS E GRAVITAÇÃO

Ainda no Século 18, novas contribuições de matemáticos franceses foram

dadas para o entendimento da Física. Vejamos quais. Em 1743, o matemático francês Jean le

Rond d´Alembert (1717-1783) publicou seu famoso livro Traité de Dynamique

(“Tratado de Dinâmica”), no qual resolveu a controvérsia entre os conceitos de quantidade de movimento cartesiano (mv) (efeito de uma força no tempo) e força viva leibnitziana

(m v2) (efeito de uma força no espaço). Com efeito, como um corpo sob a ação de certa força

leva determinado tempo para percorrer uma distância, d´Alembert mostrou que a ação dessa

força poderia ser calculada por seu efeito no tempo ou no espaço. No primeiro caso (tempo), a

medida da força se faz por intermédio de mv e, no segundo caso (espaço), por intermédio de

mv2. [13]

Page 6: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

26 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

Ainda naquele livro, d´Alembert usou o princípio da velocidade

(deslocamento) virtual ou princípio das acelerações reversas [14] para estudar problemas da

Dinâmica, por intermédio da Estática, usando para isso a força de inércia (- m a

), ou seja,

ele escreveu a Segunda Lei de Newton na forma: F

– m a = 0. Desse modo, o corpo em

movimento é então levado ao repouso por intermédio das acelerações reversas. Em vista

disso, esse princípio ficou conhecido como Princípio de d´Alembert. Note-se que, para

d´Alembert, os princípios da Dinâmica deveriam ser obtidos pelos efeitos da força e não da

força em si, já que está jamais é vista.

É ainda de d´Alembert uma contribuição importante para o entendimento

do problema da corda vibrante. [15] Com efeito, em 1746, ele escreveu dois artigos

intitulados Recherches sur la courbe que forme une corde tendue mise en vibration (“Pesquisas sobre a forma de uma corda tensa colocada em vibração”) e Suite

des Recherches sur la courbe que forme une corde tendue em vibration (“Continuação das Pesquisas sobre a forma de uma corda tensa colocada em vibração”),

apresentados à Academia de Ciências e Letras de Berlim, em 1747, nos quais deduziu a

equação parcial diferencial da corda vibrante:

0/),()/1(/),( 22222 ttxyaxtxy ),( txy = 0,

com a2 = T/ , sendo T a tensão na corda (de comprimento ), sua massa por

unidade de comprimento, y (x, t) a altura da corda na posição x e no instante t e é o hoje

conhecido operador d´alembertiano. Para essa equação, d´Alembert encontrou uma solução

da forma:

y(x, t) = (1/2) [f(x + at) – f(x-at)],

com f(x) [= y(x, 0)] uma “função arbitrária”, representando a posição inicial (t = 0)

da corda.

A polêmica que se seguiu a essa solução foi a de saber se toda a posição

inicial da corda poderia ser descrita pela “função” f(x). É oportuno destacar que, até o Século

18, o conceito de função ainda não estava bem entendido. Nessa época, o conceito de função

referia-se a fórmulas, isto é, que uma relação entre y e x só podia ser chamada de função se

pudesse ser expressa por uma fórmula. Desse modo, não estava claro se qualquer posição

inicial da corda poderia ser descrita por uma dada fórmula. Essa polêmica começou a ser

resolvida quando Euler escreveu um artigo, apresentado à Academia de Ciências e Letras de

Berlim, em 1748, no qual demonstrou que se a forma inicial da corda fosse periódica, dada

por (em notação atual):

)/()0,( xnsenAxy n ,

Então, a solução geral da corda vibrante seria dada por (também em notação atual)

)/cos()/(),( atnxnsenAtxy n ,

Page 7: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

27 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

com An constantes. No entanto, nessa solução, Euler não informou se o somatório ( )

envolvia um número finito ou infinito de termos, apesar de ele já considerar a ideia da

superposição de modos vibracionais da corda. Essa questão foi resolvida por d´Alembert, em

trabalho apresentado, em 1753, à Academia de Ciências e Letras de Berlim, [16] no qual

mostrou que o somatório envolvia um número infinito de termos, ou seja, o n do somatório

variava de 1 até .[17]

As soluções encontradas por Euler e d´Alembert, vistas acima,

apresentavam um impasse uma vez que, enquanto Euler admitia que a posição da corda

poderia ser não-analítica, d´Alembert só a considerava como analítica. Esse impasse foi

contornado por Lagrange, em trabalhos publicados em 1759 (Miscellanea Philosophica-

Mathematica Societatis Privatae Taurinensis 13) e 1762 (Miscellanea Philosophica-

Mathematica Societatis Privatae Taurinensis 22), nos quais resolveu a equação diferencial da

corda vibrante usando alguns artifícios matemáticos. Assim, multiplicando essa equação por

uma função desconhecida, Lagrange transformou-a em duas equações diferenciais ordinárias,

e ao resolvê-las obteve a solução final da equação da corda vibrante dada pela seguinte

equação (em notação atual):

tx tx

dxxgdxxgatxfatxftxy0 0

)()()()()2/1(),( ,

onde f(x) = y(x,0) e g(x) = 0)/( tty . Desse modo, conforme o próprio Lagrange

observou, essa solução concordava com a de d´Alembert. [18]

Também no Século 18, uma nova contribuição de matemáticos franceses

foi importante para o entendimento da gravitação newtoniana. Com efeito, em uma série de

três pesquisas realizadas em 1772, 1773 e 1775, o matemático e astrônomo francês Pierre

Simon, Marquês de Laplace (1749-1827) calculou a força de atração gravitacional exercida

pelos corpos de revolução (esferóides, por exemplo), porém, nesses cálculos, trabalhou

apenas com os componentes dessa força, sem usar o potencial gravitacional V. [19] Esse tipo

de cálculo também foi objeto de pesquisa por parte do matemático francês Adrien Marie

Legendre (1752-1833), em 1782 [Mémoires de Mathématique et de Physique Présentés à

l´Academie Royale des Sciences, par Divers Sçavans, e Lus dans ses Assemblées 10 (1782),

p. 411, publicado em 1785], no trabalho intitulado Recherches sur l´attraction des sphéroides (“Pesquisas sobre a atração dos esferóides”), no qual demonstrou o importante

Teorema: - Se a atração de um sólido de revolução é conhecida em cada ponto externo do

prolongamento de seu eixo, então ela será conhecida em qualquer ponto externo. Ainda nesse

trabalho, Legendre calculou o componente da força de atração gravitacional exercida por um

esferóide de massa (m), por intermédio do Polinômio de Legendre (Pn), solução de sua

famosa Equação de Legendre:

(1 – x2) y” – 2 x y’ + n (n + 1) y = 0. (n = 0, 1, 2, ....)

Page 8: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

28 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

Registre-se que, em 1784 [Histoire de l´Academie Royale avec les Mémoires de

Mathématique et de Physique, Paris (1782), p. 370, publicado em 1787] e em 1789 (Histoire

de l´Academie Royale avec les Mémoires de Mathématique et de Physique, Paris (1789), p.

372, publicado em 1793), Legendre demonstrou as relações de ortogonalidade de seus

polinômios. Registre-se, também, que no artigo de 1789, Legendre trabalhou com a hoje

conhecida Equação Associada de Legendre:

(1 – x2) y” – 2 x y’ + [n (n + 1) – m

2/(1 – x

2) y = 0, (n, m = 0, 1, 2, ....)

cuja solução é o Polinômio Associado de Legendre ( m

nP ). [20]

O trabalho de Lagrange de 1782 inspirou Laplace a escrever, ainda em

1782 [Histoire de l´Academie Royale avec les Mémoires de Mathématique et de Physique,

Paris (1782), p. 113, publicado em 1785], seu famoso artigo intitulado Théorie des

Attractions des Sphéroides et de la Figure des Planètes (“Teoria das Atrações

dos Esferóides e da Forma dos Planetas”), no qual estudou o problema da força de atração

gravitacional entre esferóides por intermédio do potencial gravitacional tridimensional [

),,( rV ], encontrando a seguinte equação diferencial (em notação atual):

0/)(/)]1/(1[]/)1)[(/( 222222 rrVrVV . ( cos )

Ainda nesse mesmo artigo, ao considerar que: ),,( rV = U0/r+U1/r2+U2/r3 +

...,

onde Un( , ), Laplace demonstrou que (também em linguagem atual): [21]

0)1(/)]1/(1[]/)1)[(/( 2222 UnnUU nn . ( cos )

Também em 1782, Lagrange estudou sistemas de massas pontuais, ocasião

em que propôs, conforme registramos acima, o conceito de coordenadas generalizadas

(posição e velocidade: ii qq , ), como qualquer conjunto de coordenadas que pode, sem

ambiguidade, definir a configuração desses sistemas. Mais tarde, em 1787, Laplace

demonstrou que a função potencial V (x, y, z) deve satisfazer a hoje famosa Equação de Laplace (em notação atual):

0/// 222222 xVyVxV 0V ,

onde é o operador laplaciano. Registre-se que Euler, em trabalhos sobre a Mecânica

dos Fluidos, realizados entre 1752-1755, chegou a trabalhar com uma equação desse tipo.

Registre-se, também, que em seu trabalho de 1787, Laplace cometeu um erro ao afirmar que

sua equação valia também para pontos interiores ao corpo gerador do potencial V. Contudo,

esse erro foi corrigido por Poisson, em 1813 (Nouveau Bulletin de la Societé Philomatique de

Page 9: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

29 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

Paris 3, p. 388), quando mostrou que a solução para o potencial gravitacional (V) no interior

de corpos com densidade , é dada por (na linguagem de hoje): V = - 4 .

ESTÁTICA

Vejamos agora a contribuição dos matemáticos franceses para novos

entendimentos da Física, no Século 19, além dos já tratados neste artigo. Logo em 1803, o

matemático francês Louis Poinsot (1777-1859) publicou o livro Eléments de Statique

(“Elementos de Estática”) no qual introduziu o conceito de binário ou conjugado (“couple”),

que é um conjunto de duas forças de mesma intensidade, paralelas e de sentidos contrários,

cujos pontos de aplicação situam-se em pontos distintos. Ainda nesse livro, demonstrou o

importante Teorema para o estudo da Estática: Um corpo estará em equilíbrio sob a ação de

um sistema de forças se a sua resultante for nula, e seu conjugado resultante também for nulo

ao mesmo tempo. Em notação atual, esse Teorema é representado por:

F

i iF 0

e Ni iN

= 0 ,

onde F

e FrN

representam respectivamente, a força e o torque totais externos

que atuam em um corpo rígido. [22, 23]

MECÂNICA DO CONTÍNUO

Tratemos, agora, da contribuição dos matemáticos franceses ao estudo do

movimento de um sistema contínuo (p.e.: fluidos). Este foi iniciado por Newton no Livro II

de seu famoso Principia (1687), quando se interessou em saber a forma de uma superfície

de revolução, movendo-se em um fluido perfeito ideal com velocidade constante na direção

de seu eixo, sob uma pressão perpendicular a essa superfície e proporcional ao quadrado da

velocidade na direção da normal a essa mesma superfície. No Século 18, aquele estudo foi

continuado por Euler, d´Alembert e Daniel Bernoulli, conforme vimos anteriormente. Tal

estudo recebeu, no Século 19, importantes contribuições de matemáticos franceses, sobretudo

no que trata do movimento de fluidos reais, considerando o atrito: interno (entre suas

partículas constituintes) e externo (com as paredes dos tubos). Assim, em 1821, o matemático

francês Claude Louis Marie Henri Navier (1785-1836) estudou o movimento dos fluidos

ideais levando em consideração a sua viscosidade, hoje conhecidos como fluidos viscosos.

[24] Logo depois, em 1822, o matemático francês Barão Augustin Louis Cauchy (1789-1857)

considerou o aspecto real (anisotrópico) dos fluidos. Inicialmente, ele postulou o caráter

tensorial da tensão, ao observar que toda deformação em um corpo pode ser interpretada

localmente como o produto de uma deformação pura por uma rotação, da qual deriva o

princípio de transformações lineares não singulares em uma composição de transformações

canônicas. Desse modo, ficou consagrado o conceito de tensor de tensões (Tij). Assim, ao

Page 10: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

30 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

estabelecer esse conceito, Cauchy obteve a equação geral do movimento de um sistema

contínuo real (em notação atual):

jjiji jii fvTvv )()( 0 ,

onde vi (vj) é a velocidade do contínuo de densidade , sujeito a uma força externa

fj, e i e 0 significam, respectivamente, a derivada parcial em relação às variáveis espaciais

(x, y, z), e temporal (t). Registre-se que, quando o sistema contínuo é um fluido perfeito, isto

é, a tensão é uma grandeza escalar, a Equação de Cauchy se transforma na Equação de Euler, e

neste caso o fluido é chamado euleriano. [25]

FÍSICA-MATEMÁTICA

Ainda no Século 19, um passo importante para a futura Revolução

Quântica que aconteceria no Século 20, foi dado por matemáticos franceses ao desenvolverem

a hoje conhecida Física-Matemática, que trata da solução de equações em derivadas parciais

usando sistemas de coordenadas diferentes das tradicionais ortogonais retilíneas. Com efeito,

em 1833 (Journal de l´Ecole Polytechnique 14, p. 194), o também engenheiro Gabriel Lamé

(1795-1870) introduziu novos sistemas de coordenadas curvilíneas (hoje, conhecidas como

sistema elipsoidal e hiperboloidal de uma e duas folhas) para resolver a equação do calor de

Fourier (1822). Ao estudar o caso estacionário (temperatura independente do tempo), Lamé

demonstrou que poderia resolver a equação do calor correspondente (tipo equação do

potencial gravitacional), usando a técnica da separação de variáveis [26] e, com isso, reduziu-

a para três equações diferenciais ordinárias. Em 1837 (Journal de Mathématiques Pures et

Appliquées 2, p. 147) e 1839 (Journal de Mathématiques Pures et Appliquées 4, p. 126; 351),

Lamé introduziu um novo sistema de coordenadas (esferoconal: uma superfície esférica e

duas cônicas) para também resolver a equação geral do calor. Por fim, em 1859, ele escreveu

o livro intitulado Leçons sur les Coordonnées Curvilignes et leurs Diverses Applicationes (“Lições sobre as Coordenadas Curvilíneas e suas Diversas Aplicações”),

no qual estendeu seu trabalho em Teoria do Calor e aplicou-o na solução de vários problemas

de natureza física, tal como a refração dupla na teoria da propagação da luz nos cristais e as

condições de equilíbrio de uma casca esférica sob uma dada distribuição de cargas, na Teoria

da Elasticidade.

Novos aspectos da Física-Matemática relacionados com a solução de

equações diferenciais ordinárias, por intermédio de suas autofunções e correspondentes

autovalores, foram apresentados pelos matemáticos franceses Charles François Sturm (1803-

1855) e Joseph Liouville (1809-1892). Com efeito, em 1833, [27] Sturm chegou a essa

solução estudando o fluxo de calor em uma barra de densidade variável. Ao comunicar essa

sua descoberta ao seu amigo Liouville, este também passou a se interessar por esse problema,

chegando, os dois, a publicar três artigos: um em 1836 (Journal de Mathématiques Pures et

Appliquées 1, p. 252) e dois em 1837 (Journal de Mathématiques Pures et Appliquées 2, p.

16; 418), Esse trabalho conjunto desses dois matemáticos é hoje conhecido como o famoso

Page 11: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

31 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

Problema de Sturm-Liouville e sumarizado da seguinte maneira. Dada a equação diferencial

ordinária definida por:

A(x)d2y(x)/dx2 + B(x)dy(x)/dx + [C(x) + D(x)] y(x) = 0

Ay” + By’ + [C + D]y = 0,

Sturm e Liouville mostraram que ela pode ser escrita na forma:

[r(x) y’]’ + [q(x) + p(x)] y(x) = 0 L̂ [y(x)] = - p(x) y(x) ,

r(x) = exp [ dxAB )/( ] , q(x) = (C/A) exp [ dxAB )/( ],

p(x) = ( D/A) exp [ dxAB )/( ],

onde L̂ [r(x) y’]’ + q(x) y(x) é o operador de Sturm-Liouville, p(x) é a função peso,

e o autovalor. A equação diferencial acima é conhecida como Equação de Sturm-Liouville,

que é uma equação de autovalores.

Se, em um dado intervalo fechado (a, b), a função [y(x)] solução dessa

equação satisfaz às condições de contorno:

a1y(a) + a2y’(a) = 0; b1y(b) + b2y’(b) = 0,

com a1, a2, b1, b2 constantes reais dadas, então a Equação de Sturm-Liouville, com as

condições acima – o referido Problema de Sturm-Liouville - apresenta duas soluções: yn(x) e

ym(x), linearmente independentes, conhecidas como autofunções, e com os respectivos

autovalores mne . Se tivermos:

a) mn , então:

b

amn dxxyxyxp 0)()()( ,

b) mn , então:

b

an dxxyxp 2)]()[( ,

Page 12: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

32 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

com sendo uma constante, determinada para cada tipo de equação diferencial.[28]

Nas duas últimas décadas do Século 19, três importantes Problemas de Sturm-Liouville (PE-L) foram pesquisados por matemáticos franceses. O primeiro dos

PE-L deve-se a Legendre, em trabalhos realizados em 1782, 1784 e 1789 (referidos

anteriormente), quando estudava a gravitação de corpos esferóides, nos quais apresentou suas

duas hoje famosas equações. A primeira (Equação de Legendre):

(1 – x2) y” – 2 x y’ + n (n + 1) y = 0 [(1 – x2) y’]’ = - n(n +1) y,

cuja solução são os Polinômios de Legendre [Pn(x)], com q (x) = 0, r(x) = (1 – x2),

p(x) = 1, = [2/(2n + 1)], = n (n + 1), (a, b) = (-1, +1) e n = 0, 1, 2, ... .

A segunda equação (Equação Associada de Legendre) é dada por:

(1 – x2) y” – 2 x y’ + [n (n + 1) – m2/(1 – x2) y = 0, (n, m = 0, 1, 2,

...)

que tem como solução os Polinômios Associados de Legendre:

m

nP (x) = (1-x2)m/2 dm Pn(x)/dxm ,

sendo = [2(n + m)!/(2n + 1) (n - m)!]. Conforme vimos na Nota [20], a solução

angular (x = cos ) da Equação de Schrödinger (1926) para o átomo de hidrogênio (H)

envolve o m

nP .

O segundo dos PE-L surgiu dos trabalhos de Charles Hermite (1822-

1901) na solução de equações diferenciais ordinárias com intervalos infinitos. Assim, em

1864 (Comptes Rendus de l´Academie des Sciences de Paris 58, p. 93; 266), ele apresentou a

hoje conhecida Função de Hermite [u (x)], solução da seguinte equação diferencial:

u”(x) + ( 2 + 1 - x2) u (x) = 0.

Agora, fazendo a mudança de variável: u(x) = exp [- x2/2] y(x), a

equação acima se transforma na hoje conhecida Equação de Hermite:

y” – 2 x y’ + 2 y = 0 [exp (- x2)y’]’ = - 2 exp(- x2) y, ( R)

Page 13: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

33 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

cuja solução é o Polinômio de Hermite (Hn), com q(x) = 0, r(x) = p(x) = exp (- x2),

= 2 , = 2n n! e (a, b) = (- , + ). Destaque-se que a solução da Equação de

Schrödinger (1926) para o oscilador harmônico unidimensional é dada pela Função de

Hermite: (x) = exp [- x2/2] Hn(x).

O terceiro dos PE-L foi encontrado por Edmond Nicolas Laguerre (1834-

1886) ao resolver integral

x

xdxx ]/)[exp( , em 1879 (Bulletin de la Societé

Mathématique de France 7, p. 72), quando trabalhou com suas duas hoje famosas equações.

A primeira (Equação de Laguerre):

x y” + (1 + x) y’ + y = 0 [x exp (- x) y’]’ = - exp(- x) y, (

R)

cuja solução é o Polinômio de Laguerre (Ln), com q(x) = 0, r(x) = x exp (- x),

p(x) = exp (- x), = 1, = e (a, b) = (0, + ).

A segunda equação (Equação Associada de Laguerre) é dada por:

x y” + (m + 1 – x) y’ + (n – m ) y = 0, (n m; n, m I+)

que tem como solução os Polinômios Associados de Laguerre ( m

nL ):

m

nL (x) = dm Ln(x)/dxm.

Destaque-se que a solução radial da Equação de Schrödinger (1926) para o átomo

de hidrogênio envolve Lnm.

RELATIVIDADE E FORMAS DIFERENCIAIS

Na conclusão deste artigo, vejamos as contribuições de dois importantes

matemáticos franceses para o desenvolvimento da Física: o também filósofo Jules Henri

Poincaré (1854-1912) e Éli-Joseph Cartan (1869-1951). Comecemos com os trabalhos de

Poincaré, abordando, principalmente, seu papel na formulação da Teoria da Relatividade

Restrita (TRR). [29]

No final do Século 19, três importantes questões eram discutidas pelos

cientistas no sentido de entender a Dinâmica Newtoniana e a Eletrodinâmica Maxwelliana dos

corpos em movimento, tais como: 1) a simultaneidade de dois eventos separados no espaço,

cujo conceito está relacionado com a Dinâmica Newtoniana, segundo a qual o espaço e o

tempo são postulados como absolutos; 2) a existência do éter luminífero cartesiano,

Page 14: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

34 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

questionada desde a experiência de Michelson-Morley, realizada em 1887; [1] e 3) a

assimetria das Equações de Maxwell (carga elétrica em repouso cria apenas campo elétrico, e

ela em movimento, para quem a observa, cria campo elétrico e magnético) e a sua invariância.

Note-se que essas equações foram apresentadas pelo físico e matemático escocês James Clerk

Maxwell (1831-1879), em seu famoso livro intitulado A Treatise on Electricity and

Magnetism (“Um Tratado sobre Eletricidade e Magnetismo”), publicado em 1873. Esses

três importantes problemas, fundamentais para o desenvolvimento da TRR, foram tratados

por Poincaré. Vejamos como.

Em 1898 (Revue de Métaphysique et de Morale 6, p. 1), Poincaré publicou

um artigo no qual discutiu a simultaneidade de dois eventos separados no espaço, bem como a

igualdade de dois intervalos de tempo. Também nesse artigo, ele questionou o “significado

objetivo da simultaneidade”. [30] Nesse trabalho, Poincaré ainda não havia mencionado

qualquer problema relacionado com o éter e nem com a Eletrodinâmica Maxwelliana.

Contudo, logo depois, em 1900 (Archives Néerlandaise des Sciences Exactes et Naturales 5,

p. 232), ele discutiu a ação do momento eletromagnético (p) sobre o “éter livre” e, com isso,

demonstrou que a energia (E) da radiação eletromagnética que se desloca com a velocidade c,

no vácuo, vale mc2, pois (em notação atual): 2p = mc = E/c E = mc . Ainda nesse artigo

de 1900, Poincaré apresentou uma interpretação física para o conceito de tempo local (t’ = t –

r/v) discutido pelo físico holandês Hendrik Antoon Lorentz (1853-1928; PNF, 1902) em seu

livro intitulado Versuch ein Theorie der eletrischen und optiken Erscheinungen in bewegten Körpen (Brill: Leiden, 1895). Com essa interpretação,

Poincaré deduziu a lei de transformação do campo eletromagnético, considerando as fontes do

mesmo, ou seja: densidade de carga ( ρ ) e de corrente ( J ). Note-se que, para essa

demonstração, Poincaré usou um tipo de transformação que seria mais tarde também utilizada

por Lorentz, em 1904 (Koniklijke Akademie van Wetenschappen te Amsterdam 6, p. 809), em

seu novo modelo para estudar o movimento de um elétron, considerado esférico e que se

contraía quando se deslocava com velocidade constante.

Ainda em 1900 (Rapports présentés au Congress International de

Physique de 1900: Paris 1, p. 1), Poincaré voltou a discutir a existência do éter, com os

argumentos preliminares apresentados nesse Congresso, reproduzidos e mais elaborados no

livro O Valor da Ciência, referido na nota [30]. Em 1904 (Bulletin de la Société

Mathematique de France 28, p. 302), ele tratou novamente do éter, ocasião em que formulou

a seguinte pergunta: Que é o éter, como suas moléculas se arranjam, elas se atraem ou se

repelem?. Além dessa pergunta, Poincaré afirmou nesse artigo que os corpos em movimento

sofrem uma contração uniforme na direção desse movimento.

Em 05 de junho de 1905, Poincaré comunicou à Academia Francesa de

Ciências um trabalho, publicado ainda nesse ano (Comptes Rendus Hebdomadaires des

Séances de l´Académie des Sciences de Paris 140, p. 1504), no qual apresentou a famosa

transformação de Lorentz, cujo nome foi cunhado por ele nessa ocasião, e hoje é

representada pelas expressões:

2x = γ (x - v t) ; y = y; z = z; t = γ (t - v x/c ) ,

onde: 2 2 1/ 2γ = (1 - v / c ) .[31] Também nesse artigo, Poincaré discutiu o problema da

gravitação Newtoniana, afirmando que todas as forças deveriam se transformar da mesma

maneira sob aquela transformação. Afirmou, também, que a Lei da Gravitação Newtoniana

Page 15: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

35 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

deveria ser modificada e, como conseqüência dessa afirmação, escreveu: Deveriam existir

ondas gravitacionais que se propagam com a velocidade da luz!

Muito embora Poincaré haja trabalhado com o que chamou de

transformação de Lorentz (conforme vimos acima) e mostrado como o eletromagnetismo

Maxwelliano se comporta com essa transformação, e ainda demonstrado a famosa relação

massa × energia, conforme também vimos acima, ele não formulou a hoje conhecida TRR,

conforme Einstein o fez, em artigo que enviou para a Annalen der Physik, em 30 de junho de

1905, publicado no Volume 17, p. 891, dessa Revista. Porém, logo em 1906 (Rendiconti del

Circolo Matemático de Palermo 21, p. 129), Poincaré publicou um trabalho no qual usou a

transformação de Lorentz para demonstrar a covariância da Eletrodinâmica Maxwelliana,

que foi importante para o desenvolvimento posterior da TRR e da formulação da Teoria

Relatividade Geral (TGR), por Einstein, em 1915. Foi nesse trabalho que Poincaré

demonstrou a estrutura de grupo daquela transformação e mostrou também que, quando ela

contém uma translação no espaço-tempo, dada por (em linguagem tensorial atual): μ μ μ ν

νx a - Λ x , onde μ

νΛ é a matriz de Lorentz, tem-se um grupo mais amplo do que o

Lorentziano, hoje conhecido como Grupo (Transformação) Local de Poincaré.

Por fim, é oportuno destacar que, até sua morte, em 1912, Poincaré

continuou acreditando no éter luminífero cartesiano, conforme se pode ver no artigo que

escreveu em 1912 (Journal de Physique Théorique et Appliquée 2, p. 347), intitulado Les Rapports de la Matière et de l´Éther (“As Relações da Matéria e do Éter” ), artigo

esse reproduzido em seu último livro de nome Dernières Pensées (“Últimos

Pensamentos”), publicado postumamente, em 1913, em Paris, pela Flammarion.

Por fim, vejamos o trabalho de Cartan. Em 1945, ele desenvolveu o

formalismo das formas exteriores diferenciais, [32] que são quantidades que ocorrem sob o

sinal de integral. Sua importância para a Física deve-se ao seguinte fato. De um modo geral, a

ferramenta matemática usada para tratar as leis físicas tem sido o Cálculo Tensorial,

principalmente quando as mesmas envolvem simetrias. Contudo, existem situações físicas em

que o uso de tensores tem-se mostrado inadequado, uma vez que esses entes matemáticos

dependem de um sistema de coordenadas em relação ao qual se representam as coordenadas

desses entes. Essa inadequação se evidencia na manipulação do labirinto de índices ligados a

esses componentes e, em vista disso, aspectos importantes de certas situações são, às vezes,

perdidos, por exemplo, se uma partícula é obrigada a se deslocar em uma esfera, um único

sistema de coordenadas não pode descrever completamente a posição da mesma, e muito

menos seu espaço de fase ou espaço de estados (espaço de configurações). Portanto, tais

dificuldades são sanadas quando se usa a representação intrínseca (forma) de um tensor e não

o seu componente. Vejamos um exemplo do que acabamos de dizer tomando as Equações de

Maxwell (na forma tensorial e na correspondente forma exterior):

0 FFF dF = 0 (F = B + E dt),

JF dG = j dj = 0 (G = D – H dt; j = Q – J dt) .

Concluindo este artigo, é oportuno registrar que o significado dos tensores

( F ) e formas (F e G) indicadas acima, bem como de outras aplicações das formas podem

ser vistos em vários livros que tratam da hoje conhecida Física Geométrica. [33]

Page 16: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

36 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

NOTAS E REFERÊNCIAS

[1] BASSALO, J. M. F. 2009. www.searadaciencia.ufc.br/curiosidadesdafisica.

[2] Note-se que essa lei havia sido observada, experimentalmente, pelos astrônomos e matemáticos, o

inglês Thomas Harriot (1560-1621), em 1616 (trabalho não publicado), e o holandês Willebrord van

Roijen Snell (1591-1626), em 1621, daí ela ser conhecida, também, como Lei de Harriot-Snell-Descartes.

[3] É oportuno destacar que, ainda em 1687, o matemático francês Pierre Varignon (1654-1722)

apresentou à Academia Francesa de Ciências o trabalho intitulado Projet d´une Nouvelle Mécanique (“Projeto de uma Nova Mecânica”), no qual está enunciado o importante princípio:

Quando um corpo está em equilíbrio sob a ação de forças concorrentes, a resultante dessas forças é

nula. Para chegar a esse princípio, Varignon usou a regra geométrica sobre composição de forças – o célebre paralelograma das forças -, cuja idéia para esse “paralelograma” ele a obteve usando uma

espécie de máquina simples que idealizou e construiu – o funicular. Ainda nesse trabalho,

Varignon apresentou a demonstração do hoje famoso Teorema de Varignon: O momento da

resultante de um sistema de forças é igual à soma dos momentos de suas componentes. É ainda

interessante notar que, também em 1687 e de maneira independente, o Princípio do Paralelograma das Forças, foi formulado pelo matemático francês, o padre Bernard Lami (1640-1715), que o apresentou

em um pequeno apêndice ao seu livro intitulado Traité de Mécanique (“Tratado de Mecânica”), e

por Newton em seu Principia. Registre-se que Varignon reuniu seus trabalhos sobre Estática em um

livro intitulado Nouvelle Mécanique-Statique (“Nova Mecânica-Estática”), publicado

postumamente, em 1725.

[4] D´ABRO, A. 1952. The Rise of New Physics (Dover Publishers).

[5] BORN, M. and WOLF, E. 1970. Principles of Optics (Pergamon Press).

[6] YOURGRAU, W. and MANDELSTAM, S. 1979. Variational Principles in Dynamics and Quantum Theory (Dover).

[7] Somente na primeira metade do Século 19 é que essa polêmica sobre a velocidade da luz em meios

mais densos foi resolvida por intermédio das experiências realizadas pelos físicos franceses Armand Hyppolyte Louis Fizeau (1819-1896), em 1849 (Comptes Rendus Hebdomadaires des Séances de

l´Academie des Sciences de Paris 29, p. 90), e Jean Bernard Léon Foucault (1819-1868), em 1850

(Comptes Rendus Hebdomadaires des Séances de l´Academie des Sciences de Paris 30, p. 551), nas quais determinaram a velocidade da luz na água e mostraram ser ela menor do que no ar. Estava, dessa

maneira, confirmada a hipótese de Fermat.

[8] KLINE, M. 1972. Mathematical Thought from Ancient to Modern Times (Oxford

University Press).

[9] BASSALO, J. M. F. 1998. Crônicas da Física, Tomo 5 (EDUFPA, 1998).

[10] TRUESDELL, C. A. 1968. Essays in the History of Mechanics (Springer-Verlag)

[11] É importante registrar que o nome “método (cálculo) das variações” foi dado por Euler no

trabalho intitulado Elementa Calculi Variationum (“Elemento do Cálculo das Variações”),

apresentado à Academia de Berlim, em 1756, e apresentado no Novi Commentarii Academiae Scientiarum Imperialis Petropolitanae 10 (1764), p. 141, publicado em 1766.

[12] Ainda nesse trabalho de 1809, Poisson apresentou duas definições:

Page 17: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

37 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

1) Momento Canonicamente Conjugado: pi = iqL / ;

2) Parêntesis de Poisson: i iiii pFqGpGqFGF ////, .

[13] Para Descartes, em seu livro Principia Philosophiae (”Princípios de Filosofia”) de 1644, a

quantidade de movimento de um corpo é obtida multiplicando-se a sua massa (m) por sua velocidade

(v), isto é: mv. Por outro lado, o matemático e filósofo alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-

1716), na Acta Eruditorum Lipsiensium, de 1686, afirmou que a quantidade de movimento de um

corpo é calculada pelo produto de sua massa pelo quadrado de sua velocidade (mv2), a qual

denominou de vis viva (“força-viva”). Somente, em 1829, Coriolis mostrou que Leibniz havia se

enganado, já que a vis viva nada mais era do que o dobro da energia cinética (mv2/2). Hoje, as ações

(espacial e temporal) de uma força (F), que atua em um corpo de massa (m), em repouso, e lhe

provoca uma aceleração ( ), faz o mesmo se deslocar com uma velocidade v = t, e percorre o s =

t2/2, são calculadas da seguinte maneira:

Fs = m s = m t2/2 = m( t)2/2 = mv2/2 = energia cinética,

Ft = m t = mv = quantidade de movimento.

[14] O princípio das acelerações reversas já havia sido utilizado pelo matemático suíço James

Bernoulli, em 1686 e 1703, ao desenvolver sua teoria sobre o centro de oscilação dos corpos. [PATY,

M. 1998. D´Alembert (Les Belles Lettres).]

[15] O estudo da corda vibrante foi realizado, pela primeira vez, em 1713, independentemente, pelos

matemáticos, o inglês Brook Taylor (1685-1731) e o francês Joseph Sauveur (1653-1716), conhecido como o criador da Acústica Musical. Mais tarde, em 1716, o matemático suíço Jakob Hermann (1678-

1733) também tratou da corda considerando suas vibrações como sendo as de um oscilador harmônico

simples.

[16] Registre-se que, também em 1753 e nessa mesma Academia Berlinense, o matemático suíço Daniel Bernoulli (1700-1782) mostrou que todos os modos de vibração de uma corda poderiam existir

simultaneamente e, portanto, tanto a posição inicial da corda, quanto as demais posições seriam

representadas por uma série infinita de funções trigonométricas.

[17] É oportuno destacar que as séries infinitas – hoje, Séries de Fourier - foram também usadas pelo matemático e físico francês Jean-Baptiste-Joseph, Barão de Fourier (1768-1830) na solução do

problema da condução do calor em um sólido isotrópico e homogêneo, apresentada em seu célebre

livro intitulado Théorie Analytique de la Chaleur (“Teoria Analítica do Calor”), publicado em

1822.

[18] D´Alembert também deu importantes contribuições para o entendimento da Mecânica do

Contínuo. Por exemplo, em 1744, ele publicou o livro intitulado Traité de l´Equilibre et du Mouvement des Fluides (“Tratado do Equilíbrio e do Movimento dos Fluidos”) no qual usou a “hipótese das secções paralelas”, segundo a qual todas as partículas de um fluido em movimento têm a

mesma velocidade. Destaque-se que essa hipótese já havia sido utilizada por Daniel Bernoulli, em seu

famoso tratado intitulado Hydrodinamica (“Hidrodinâmica”), publicado em 1738. Contudo, como

essa hipótese não considerava as forças exercidas pelos fluidos em movimento no qual há obstáculos a contornar, a Academia de Ciências e Letras de Berlim ofereceu, em 1746, um prêmio a quem

Page 18: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

38 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

resolvesse o problema da resistência ao movimento dos fluidos. Esse prêmio foi ganho por d´Alembert

com o livro intitulado Réflexions sur la Cause Générale des Vents (“Reflexões sobre a Causa

dos Ventos”), publicado em 1747. Aliás, é importante destacar que foi nesse livro que houve, pela

primeira vez, o uso das Equações Diferenciais Parciais na Física-Matemática. Destaque-se, também,

que Euler tratou do movimento dos fluidos em seu manuscrito intitulado Scientia Navalis (“Ciência

Naval”), publicado em 1738.

[19] A ideia de se poder calcular uma força por intermédio de uma “função potencial”, já havia sido

tratada por Daniel Bernoulli em seu livro Hydrodinamica citado na nota anterior. Mais tarde, em

1742, o matemático escocês Colin Maclaurin (1698-1746), em seu livro Treatise of Fluxions (“Tratado das Fluxões”) e, em 1743, Clairaut, no livro Théorie de la Figure de la Terre (“Teoria

da Forma da Terra”), nos quais estudaram a atração entre corpos massivos, mostraram que era possível

calcular a força gravitacional ( F

) entre os mesmos por intermédio de uma função potencial [ )(rV

],

ou seja, em notação atual, seria: )(rVF

, onde é o operador gradiente. (KLINE, op. cit.).

[20] É interessante destacar que a solução angular (x = cos ) da Equação de Schrödinger (1926)

para o átomo de hidrogênio (H) envolve o m

nP .

[21] Essa função Un( , ) foi denominada pelo físico inglês William Thomson (Lord Kelvin de

Largs) (1824-1907), de harmônico esférico [hoje:

mY ( , )]. Destaque-se, também, que se Un( ),

então essa equação obtida por Laplace transforma-se na Equação de Legendre. (KLINE, op. cit.).

[22] Esse trabalho do francês Poinsot completou o estudo da Estática, iniciado pelo também francês

Varignon, conforme vimos na Nota [3].

[23] Como o torque (N) de uma força (F), em módulo, é dado pelo produto de sua intensidade pela

distância (r): N = F r, havia certa confusão entre esta grandeza física e uma outra que também envolvia esse tipo de produto. Pois bem, em 1826, o matemático francês, o General Jean Victor

Poncelet (1788-1867), introduziu o conceito de trabalho ( ) para representar o produto de uma força F

que atua em um corpo, pelo deslocamento s sofrido devido à ação dessa mesma força, isto é: F = s.

Hoje, esses produtos são de natureza matemática completamente diferente: o torque é um vetor (

FrN

) e o trabalho é um escalar ( sF )

[24] Esse tipo de fluido foi também tratado por Poisson, em 1829. Aliás, registre-se que, como em

1845, o matemático inglês Sir George Gabriel Stokes (1819-1903) também estudou esses fluidos, a

equação de trata deles ficou conhecida como Equação de Navier-Stokes. Note-se que, nesse trabalho,

Stokes deduziu a fórmula – fórmula de Stokes - que calcula a força de atrito exercida por um fluido sobre uma esfera.

[25] Os diversos tipos de fluidos dependem da equação constitutiva, ou seja, a equação que relaciona

o tensor tensão e a taxa do tensor deformação. Por exemplo, quando essa relação é linear, o fluido é

dito newtoniano.

[26] A técnica de resolver equações diferenciais usando a separação de variáveis foi inicialmente

apresentada por Leibniz em uma carta escrita, em 1691, para Huygens. Essa técnica foi aprimorada

pelo matemático suíço John (Johann, Jean) Bernoulli (1667-1748), em 1694. [BASSALO (1998), op.

cit.; KLINE, op. cit.].

[27] Esse trabalho de Sturm só foi publicado em 1836, na Revista que foi fundada nesse mesmo ano

por Liouville: Journal de Mathématiques Pures et Appliquées 1, p. 106; 373. Essa Revista também era

citada como Journal de Liouville.

Page 19: CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O

CONTRIBUIÇÕES DE MATEMÁTICOS FRANCESES PARA O DESENVOLVIMENTO DA

FÍSICA

José Maria Filardo Bassalo

39 AMAZÔNIA - Revista de Educação em Ciências e Matemáticas V.6 - n. 11 - jul. 2009/dez. 2009, V. 6 - n. 12 - jan 2010/dez. 2010

[28] Em 1838, Liouville demonstrou o hoje conhecido Teorema de Liouville relacionado com um

movimento de um sistema de partículas:

},{// Htdtd ,

onde representa a densidade de estados desse sistema no espaço de fase – um espaço 2n-

dimensional das variáveis qi e pi (i = 1, 2, ... , n), H = T + V é o hamiltoniano e {} é o parêntesis de

Poisson.

[29] Antes de trabalhar com a TRR, Poincaré já havia dado uma grande contribuição à Física,

particularmente, à Mecânica Estatística, ao demonstrar, em 1890 (Acta Mathematica 13, p. 167), o

famoso Teorema do Retorno de Poincaré: Qualquer sistema de partículas, com forças de interação que

dependem apenas das posições, sempre retorna, depois de certo lapso de tempo t, a uma vizinhança

arbitrariamente próxima das suas condições de partida. Este Teorema foi importante para o

entendimento do célebre Teorema H de Boltzmann, demonstrado pelo físico austríaco Ludwig Edward

Boltzmann (1844-1896), em 1871/1872 (Sitzungsberichte der Kaiserlichen Akademie der

Wissenschaften zu Wien 63; 66). É oportuno registrar que, para demonstrar seu Teorema, Poincaré usou, talvez pela primeira vez, o conceito de conjuntos de “probabilidade” nula em uma questão de

Análise Matemática. Hoje, usa-se o conceito de conjuntos de medida nula. Também é oportuno

registrar que nesse trabalho, no qual Poincaré estudou a estabilidade de um sistema dinâmico (em particular, do sistema planetário), ele tratou do famoso problema de três corpos (cujos trabalhos

iniciais foram de Lagrange, em 1772), examinando a estabilidade da equação diferencial: dy/dx = P (x, y)/ Q (x, y), em torno de uma dado ponto singular (x0, y0). Por essa mesma época, esse tipo de

estabilidade também foi objeto de pesquisa por parte do matemático russo Aleksandr Mikhailovich Lyapunov (1857-1918). No entanto, enquanto Poincaré usou argumentos geométricos e topológicos,

Lyapunov lançou mão de conceitos puramente analíticos. Note-se que esses trabalhos de Poincaré e

Lyapunov foram retomados a partir da década de 1960 quando se desenvolveu a hoje famosa Teoria do Caos e Fractais. [RUELLE, D. 1993. Acaso e Caos (EDUNESP); FIEDLER-FERRARA, N. e

PRADO, C. P. C. do 1994. Caos: Uma Introdução (Edgard Blücher Ltda.); LORENZ, E. N. 1996.

A Essência do Caos (EDUnB); PRIGOGINE, I. 2002. As Leis do Caos (EDUNESP)].

[30] Registre-se que tais discussões foram reproduzidas e ampliadas por Poincaré em seu famoso livro

intitulado La Valeur de la Science/O Valor da Ciência (Flammarion, 1905; Contraponto,

1995).

[31] Essas expressões relacionam as coordenadas ( x, y, z; x ,y ,z ) e os tempos ( t,t ) de dois

sistemas de coordenadas de origem ( O, O ), respectivamente, com o sistema O se deslocando com

velocidade constante ( v ) paralelamente ao eixo dos x, x .

[32] Este formalismo era usado pelo saudoso geofísico brasileiro Luiz Rijo (1942-2009) em suas aulas

e pesquisas, realizadas no Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará (IG/UFPA), e

por isso prestamos uma Homenagem ao amigo Rijo neste texto.

[33] Por exemplo, os textos:

a) FLANDERS, H. 1963. Differential Forms with Applications to the Physical Sciences (Academic Press);

b) ALDROVANDI, R. and PEREIRA, J. G. 1995. An Introduction to Geometrical Physics (World Scientific);

c) SCHUTZ, B. 1995. Geometrical Methods of Mathematical Physics (Cambridge

University Press);

d) GÖCKELER, M. and SCHÜCKER, T. 1995, Differential Geometry, Gauge Theories, and Gravity (Cambridge University Press);

e) BASSALO, J. M. F. e CATTANI, M. S. D. 2009. Cálculo Exterior (Livraria da Física).