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Autores: Profa. Cássia Regina Palermo Moreira Prof. Mário Luiz Miranda Colaboradora: Profa. Vanessa Santhiago Crescimento e Desenvolvimento Humano

Crescimento e Desenvolvimento Humano - UNIP.br

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Autores: Profa. Cássia Regina Palermo Moreira Prof. Mário Luiz MirandaColaboradora: Profa. Vanessa Santhiago

Crescimento e Desenvolvimento Humano

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Professores conteudistas: Cássia Regina Palermo Moreira / Mário Luiz Miranda

Cássia Regina Palermo Moreira

Natural de São Paulo, doutora em Ciências pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP‑USP), com mestrado e bacharelado em Educação Física pela Escola de Educação Física e Esporte da USP (EEFEUSP).

Professora na Universidade Paulista (UNIP) de 2004 a 2011 e de 2014 até o momento no curso de Educação Física e em outros cursos de graduação. Professora pela Uniesp, em 2013. Leciona as disciplinas Aprendizagem e Desenvolvimento Motor, Crescimento e Desenvolvimento Humano, Métodos de Pesquisa, Psicologia Aplicada ao Esporte, entre outras. Membro do Grupo de Estudos da Ação e Intervenção Motora (EEFE‑USP). Bacharela em Direito, desde 2013, pelas Faculdades Integradas de Guarulhos – SP (FIG‑UNIMESP).

Mário Luiz Miranda

Natural de São Paulo, foi atleta de judô e atualmente é árbitro internacional continental dessa modalidade pela Federação Internacional de Judô e Confederação Brasileira de Judô. É mestre em Ciências pela Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFE‑USP), pós‑graduado em Aprendizagem Motora também pela EEFE‑USP e graduado em Educação Física na UNIP, onde atua como coordenador pedagógico e professor, desde 2006, nas disciplinas de Aprendizagem e Desenvolvimento Motor e Lutas: Aspectos Pedagógicos e Aprofundamento, na qual é líder acadêmico. É professor nos cursos de pós‑graduação à distância de Aprendizagem e Desenvolvimento Motor na disciplina de Teorias de Aprendizagem Motora da Universidade Estácio de Sá e Unicsul. Seus principais trabalhos publicados são: A iniciação no Judô: Relação com o Desenvolvimento Infantil; Efeitos do Uso da Instrução Verbal e Demonstração por Vídeo na Aprendizagem de uma Habilidade Motora do Judô; estudos de prática formalizada de kata (rotinas de aprendizagem de golpes da modalidade de judô) com o título Práctica y Caracterización de las Katas por Profesores y Árbitros de Judô Experimentados e o livro Respostas Psicofisiológicas da Arbitragem de Judô: Efeitos da Experiência dos Árbitros e do Nível das Competições.

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

M838c Moreira, Cássia Regina Palermo.

Crescimento e desenvolvimento humano. / Cássia Regina Palermo Moreira, Mario Luiz Miranda. – São Paulo: Editora Sol, 2017.

160 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXIII, n. 2‑016/17, ISSN 1517‑9230.

1. Crescimento. 2. Desenvolvimento humano. 3. Ciclo de vida. I. Miranda, Mario Luiz. II. Título.

CDU 159.922

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Prof. Dr. João Carlos Di GenioReitor

Prof. Fábio Romeu de CarvalhoVice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças

Profa. Melânia Dalla TorreVice-Reitora de Unidades Universitárias

Prof. Dr. Yugo OkidaVice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa

Profa. Dra. Marília Ancona‑LopezVice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy

Prof. Marcelo Souza

Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar

Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial: Dra. Angélica L. Carlini (UNIP) Dra. Divane Alves da Silva (UNIP) Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR) Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT) Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão: Aline Ricciardi Giovanna Oliveira

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SumárioCrescimento e Desenvolvimento Humano

APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................9INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................9

Unidade I

1 VIDA HUMANA: DESENVOLVIMENTO DA ESPÉCIE, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO INDIVÍDUO E POSSIBILIDADES DE RELAÇÕES COM A EDUCAÇÃO FÍSICA .......................................................................................................................................... 112 DESENVOLVIMENTO DA ESPÉCIE .............................................................................................................. 13

2.1 A origem do homem: considerações sobre evolução ............................................................ 142.2 A origem do homem na história do homem ............................................................................ 162.3 Características morfofuncionais do homem moderno (Homo sapiens sapiens) ............... 202.4 Importância do estudo da evolução humana para a Educação Física ........................... 23

3 CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO INDIVÍDUO ..................................................................... 253.1 Ideias equivocadas sobre crescimento e desenvolvimento humano .............................. 253.2 Os fenômenos e os conceitos de crescimento e desenvolvimento humano ............... 263.3 Há limites para o crescimento e para o desenvolvimento ao longo da vida? ............. 283.4 Fatores de influência e variações no processo de crescimento e desenvolvimento de uma pessoa .......................................................................................................... 303.5 Domínios que compõem o desenvolvimento humano ......................................................... 33

3.5.1 Domínio motor ........................................................................................................................................ 353.5.2 Domínio cognitivo .................................................................................................................................. 383.5.3 Domínio emocional ................................................................................................................................ 403.5.4 Domínio moral ......................................................................................................................................... 423.5.5 Domínio social e cultural ..................................................................................................................... 45

3.6 A integração polêmica de dois domínios do desenvolvimento: razão e emoção ...... 474 O CICLO DE VIDA E AS FAIXAS ETÁRIAS ................................................................................................. 50

4.1 Para mais reflexões sobre o ciclo de vida e a atuação profissional ................................. 51

Unidade II

5 INICIANDO A VIDA: CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO NO PERÍODO PRÉ‑NATAL ........ 555.1 Concepção ............................................................................................................................................... 55

5.1.1 Sistemas reprodutivos ........................................................................................................................... 555.1.2 Característica reprodutiva feminina e masculina ...............................................................................58

5.2 Gravidez: o difícil caminho da concepção ................................................................................. 60

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5.3 A saúde da mulher e fatores que podem afetar a gravidez saudável ............................ 615.4 O período pré‑natal ............................................................................................................................. 62

5.4.1 O primeiro mês......................................................................................................................................... 625.4.2 O segundo mês ........................................................................................................................................ 645.4.3 O terceiro mês .......................................................................................................................................... 665.4.4 O quarto mês ............................................................................................................................................ 675.4.5 O quinto mês ............................................................................................................................................ 695.4.6 O sexto mês ............................................................................................................................................... 705.4.7 O sétimo mês ............................................................................................................................................ 725.4.8 O oitavo mês ............................................................................................................................................. 735.4.9 O nono mês ............................................................................................................................................... 74

5.5 O processo de nascimento ou parturição................................................................................... 765.5.1 Parto vaginal ............................................................................................................................................. 765.5.2 Parto cesariano ........................................................................................................................................ 77

6 INFÂNCIA ............................................................................................................................................................ 786.1 Primeira infância .................................................................................................................................. 78

6.1.1 Desenvolvimento físico ........................................................................................................................ 786.1.2 Desenvolvimento sensorial e cognitivo ......................................................................................... 806.1.3 Desenvolvimento motor ...................................................................................................................... 816.1.4 Desenvolvimento emocional e sociocultural ............................................................................... 876.1.5 A grande importância do ato de amamentar – para a mãe e para o bebê..................... 90

6.2 Segunda infância .................................................................................................................................. 926.2.1 Domínio cognitivo e moral ................................................................................................................. 926.2.2 Domínio motor ........................................................................................................................................ 936.2.3 Domínio emocional e sociocultural ..........................................................................................................95

6.3 Terceira infância .................................................................................................................................... 956.3.1 Desenvolvimento cognitivo e moral ............................................................................................... 956.3.2 Desenvolvimento físico e motor ....................................................................................................... 966.3.3 Desenvolvimento emocional e sociocultural ............................................................................... 996.3.4 Interação dos domínios do desenvolvimento: um exemplo de fatos .............................1016.3.5 Para mais reflexões sobre Educação Física na terceira infância e atuação profissional ..................................................................................................................103

6.4 Adolescência .........................................................................................................................................1036.4.1 Domínio físico ........................................................................................................................................1046.4.2 Desenvolvimento cognitivo e moral .............................................................................................1056.4.3 Desenvolvimento motor ....................................................................................................................1076.4.4 Desenvolvimento emocional e sociocultural .............................................................................1096.4.5 Para mais reflexões sobre Educação Física na adolescência e atuação profissional ..111

Unidade III

7 MATURIDADE ETÁRIA ..................................................................................................................................1167.1 IDADE ADULTA .....................................................................................................................................117

7.1.1 Adulto jovem (ou início da idade adulta) – de 20 a 40 anos de idade ........................... 1177.1.2 Adulto de meia idade (ou vida adulta intermediária) – de 40 a 65 anos de idade .. 123

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8 TERCEIRA IDADE ............................................................................................................................................1278.1 Compreendendo a velhice ..............................................................................................................1278.2 Domínio sensorial e cognitivo ......................................................................................................1298.3 Domínio físico e motor ....................................................................................................................1318.4 Domínio emocional e sociocultural ............................................................................................1348.5 A terceira idade é mesmo a “melhor idade”? ..........................................................................1398.6 Para mais reflexões sobre o processo de envelhecimento e atuação profissional ..1408.7 Aproximação do término da vida ................................................................................................143

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APRESENTAÇÃO

O objetivo desta disciplina é apresentar e discutir como o processo de crescimento e desenvolvimento humano vem sendo investigado e compreendido, bem como promover discussões a respeito das relações entre esse processo e a orientação por parte dos professores e profissionais de Educação Física, visando contribuir com uma intervenção profissional comprometida com o bem‑estar do ser humano em todo o ciclo de vida.

Ao final do curso, o estudante deverá estar apto a: a) compreender conceitos e reconhecer as etapas do processo de crescimento e desenvolvimento do ser humano e as principais características inerentes a cada etapa, estabelecendo relações entre elas; b) identificar e relacionar fatores que possam afetar o curso do crescimento e desenvolvimento humano; c) refletir acerca dos cuidados e adequações da prática de atividade física e da futura atuação profissional para as diferentes faixas etárias.

Inicialmente, apresentam‑se conceitos e compreensões teóricas sobre a origem e evolução da espécie humana; o processo de crescimento e desenvolvimento do indivíduo; os domínios do desenvolvimento humano e a divisão do ciclo vital em faixas etárias (da concepção até a velhice), bem como a importância desses conhecimentos para a atuação do professor e do profissional de Educação Física. Depois, trataremos da concepção e do período de gestação, das principais características da infância e da adolescência. Por último, abordaremos o longo período que compreende a idade adulta e posteriormente a velhice (terceira idade), discutindo em especial o processo de envelhecimento. Embora não seja o foco central desta disciplina, são apresentadas algumas considerações acerca de adequações e cuidados com a saúde e bem‑estar da gestante e do bebê na prática de atividade física; também são elaboradas certas questões para reflexão relacionadas à prática de atividade física para diferentes faixas etárias.

INTRODUÇÃO

O ser humano é estudado por muitas áreas de conhecimento, desde a Filosofia, as Ciências Naturais (como Física, Química e Biologia etc.), as Humanidades (como História, Ciências Políticas, Economia etc.) e as diversas religiões. O conhecimento cotidiano também deve ser levado em consideração, pois muitos costumes e tradições são edificados sobre conhecimentos populares, em muitos casos, passados de geração para geração e bastante sujeitos a regionalismos.

A rigor, ao se lançar um olhar mais atento ao ser humano, identifica‑se que vários aspectos em cada um de nós parecem ser realmente “mais naturais e inevitáveis”, como, por exemplo, pensar, sorrir, possuir determinada configuração corporal (cabeça, tronco e membros) e a possibilidade de uma série de ações intelectuais e motoras associadas a essa configuração, ao passo que outra parte parece depender grandemente de influências do ambiente, seja relacionado ao local onde se nasce ou se vive, seja ao que nos é ensinado e assim por diante.

Contudo, convém esclarecer que a presente disciplina está fundamentada em conhecimentos produzidos e interpretados principalmente pela ciência (Ciências Naturais e Humanidades), o que não significa desconsiderar outros “tipos” de conhecimentos, como o filosófico, o religioso e o popular, já

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mencionados. Esses também estarão presentes ao longo desse material, ainda que nem sempre com a mesma ênfase.

É importante observar também que no curso superior (graduação e pós‑graduação) não basta somente descrever os acontecimentos (fenômenos) ou de que modo (método) foram investigados. Em outras palavras, não é suficiente saber o que se vai estudar e como se vai estudar. Além disso, é preciso que uma pergunta esteja no meio acadêmico‑científico: por quê?

A pergunta “Por quê?” deve estar constantemente entre nossas preocupações como estudantes e como futuros profissionais. É uma pergunta muito presente ao longo da infância, especialmente a partir dos cinco anos de idade, aproximadamente, e jamais perde sua importância se o objetivo for compreender, com algum grau de profundidade, o grande desafio que é, mais tarde, estudar e agir como profissionais competentes e éticos.

É nesse sentido que se espera contribuir para que o atual estudante, futuro profissional ou professor de Educação Física – e sempre pesquisador – compreenda adequadamente a vida humana em seus processos de crescimento e desenvolvimento ao longo de todo o seu ciclo (ciclo vital), tendo em vista que todos os seres humanos e cada um dos seres humanos são importantes, desde a vida dentro do útero (ou mesmo “fabricada” em um laboratório) até o momento de sua morte.

Para se proceder de modo coerente em uma disciplina como esta, que lida com características generalizáveis, ora tratando de fenômenos mundiais, ora tratando de eventos nacionais, locais e até mesmo particulares, foi necessário selecionar ou enfatizar certos aspectos ou domínios comportamentais em detrimento de outros, porém não sem critérios de escolha justificáveis.

Basicamente, os critérios foram: características e circunscrições de temas mais importantes e pertinentes para determinadas faixas etárias do que para outras; atualidade do tema escolhido, especialmente quando diz respeito a tendências comportamentais em um futuro próximo; relevância para o exercício profissional na área de Educação Física, seja no âmbito da escola ou em outros espaços e contextos de possibilidade de intervenção.

Na medida do possível, procuramos adequar ao cotidiano brasileiro os dados de pesquisas e as reflexões decorrentes desses dados e de outras fontes de conhecimento, ainda que ciente da imensa diversidade sociocultural que constitui o nosso país. Nesse sentido, constatamos a importância de abordar algum tema de destaque para o processo de desenvolvimento em determinada faixa etária, tema cuja característica e relevância tivessem uma abrangência que se estendesse além das diferenças socioculturais, ou seja, que, apesar das diferenças, atingem parte significativa da população daquele período etário.

A expectativa dos autores é abranger o fenômeno do crescimento e desenvolvimento com perspectivas e questionamentos atualizados, oferecendo segurança ao leitor no que se refere à base de conhecimento própria da disciplina e também da Educação Física e, se possível, de áreas afins, seja nas Ciências Naturais, seja nas Humanidades, contanto que visando à futura qualidade na prestação de serviços e a uma atuação didático‑profissional ética.

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CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO HUMANO

Unidade I1 VIDA HUMANA: DESENVOLVIMENTO DA ESPÉCIE, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO INDIVÍDUO E POSSIBILIDADES DE RELAÇÕES COM A EDUCAÇÃO FÍSICA

Estudar crescimento e desenvolvimento humano tem como finalidade uma compreensão das pessoas e de si mesmo (da própria pessoa que os estuda, pois ela, obviamente, também é um ser humano).

Nesse sentido, para tentar responder questões e elaborar outras tantas sobre esse vasto, inerente e profundo fenômeno que é a vida humana, entende‑se que toda e qualquer informação deve ao menos ser levada em consideração. Por isso, recomenda‑se as seguintes fontes de informação:

• Livros acadêmico‑científicos: trazem conhecimentos consolidados sobre crescimento e desenvolvimento humano. Alguns deles versam somente sobre uma determinada faixa de idade, o que é igualmente válido, sobretudo para quem tem o objetivo aprofundar‑se no respectivo período de vida estudado.

• Periódicos (revistas) científicos(as): têm como propósito apresentar dados de pesquisa mais recentes, que levam à constante atualização de conhecimento, nas mais diversas áreas das Ciências e das Humanidades (Ciências Humanas). É comum que periódicos dessa natureza contenham também indicações e comentários de novos livros a serem lançados.

• Filmes na modalidade documentário: constituem‑se em uma forma bastante dinâmica de obter informações corretas e precisas; e, dependendo da época de produção do filme, atuais. A vantagem desses filmes está especialmente na riqueza de imagens, tanto no que se refere à resolução (qualidade) como no tocante à beleza e proximidade com o evento estudado tal como realmente aconteceu.

• Filmes na modalidade ficção: apesar de os enredos nem sempre se aproximarem de uma história que realmente ocorreu, é comum que tratem de inúmeros fenômenos presentes na vida das mais diferentes pessoas. Ademais, não há qualquer restrição em se imaginar pessoas e situações diversificadas, uma vez que não se pode prever, ao longo da vida, com quais problemas ou demandas cada um de nós pode vir a deparar, seja na área profissional ou na vida em sociedade de forma mais ampla. Temas cotidianos, recorrentes e repetidos, não raro são tratados por diferentes filmes sob perspectivas absolutamente diversas, cujo resultado pode ser sensibilizar diferentes espectadores para um mesmo tema ou, em contrapartida, possibilitar a um mesmo espectador ampliar suas perspectivas, adquirir novas e repensar antigas. Outra vantagem de filmes de ficção é que, em razão de hábitos culturais, há um número expressivo de pessoas que lhes assistem. Além disso, em nosso país em particular, existem muito mais pessoas que apresentam hábito de assistir

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a filmes do que de ler livros, e como consequência, esse é um meio de as pessoas compartilharem experiências comuns.

• Peças teatrais, espetáculos de dança, feiras livres (de gastronomia, de livros, de artesanato): com propósitos semelhantes ao que se pode encontrar nos filmes, essas e tantas outras formas de expressão literária, artística ou cotidiana não são menos importantes para a compreensão de outros seres humanos.

• Visitas a museu: museus contêm uma riqueza imensa de materiais surpreendentes, que retomam e reinterpretam a história humana, em sentido amplo ou estrito, dependendo da temática e propósito do museu, bem como das exposições que nele se encontram, pois vários museus, de tempos em tempos, trocam de coleções (no todo ou em parte). Muitos museus também permitem que se fotografe, tanto em seu interior como em áreas externas que também pertencem ao museu; os locais em que se permite fotografar são rigorosamente determinados pelo próprio museu, mais comumente considerando a delicadeza do material no que se refere a flashs de luz ou outro critério. Em nosso país, a visita a museus é um hábito de parte muito reduzida da população, mesmo em certas capitais, em que a oferta desse tipo de entretenimento é maior do que em localidades menores. Modificar esse hábito é de bastante relevância para uma melhor compreensão da vida humana, pois qualquer produção material do ser humano há de ter sua relevância para percebê‑lo e compreendê‑lo em suas necessidades vitais.

Figura 1 – Museu de Arqueologia de Atenas, Grécia (vista frontal)

Todos esses contatos são imprescindíveis para o estudo do crescimento e desenvolvimento humano, entretanto, para profissionais das áreas de Saúde e Educação, a observação atenta a todas as pessoas em nossa vida diária é igualmente imprescindível. Afinal, não lidamos com as pessoas que estão nesses materiais, mas com as pessoas com as quais deparamos em nosso cotidiano – no exercício da profissão ou não, presencial ou virtualmente.

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CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO HUMANO

Por isso que as instituições de Ensino Superior tendem, cada vez mais, a exigir um número variável (embora pré‑estabelecido) de horas dedicadas a atividades extracurriculares (atividades complementares).

Uma formação no curso superior pressupõe comprometimento com um conhecimento amplo (uma vez que universidade tem sentido de universalidade) e, ao mesmo tempo, específico, no que se refere ao aprofundamento. A Educação Física requer ambos, por isso está legitimada e consolidada no Ensino Superior. Afinal, atividade física e motora está presente na evolução do ser humano, como espécie e como indivíduo.

2 DESENVOLVIMENTO DA ESPÉCIE

Para tratar do desenvolvimento da espécie humana, há que se remeter à origem do ser humano, que se constitui matéria controversa, pois que existem muitas explicações pautadas nas diferentes culturas, as quais apresentam diversos sistemas de crenças e religiões, fundamentadas em suas próprias cosmogonias.

Observação

Cosmogonia é o conjunto de princípios e doutrinas – religiosos, míticos ou científicos – que se ocupam de explicar a origem do universo.

Busca‑se explicar também a origem e o funcionamento de tudo o que se conhece (ou que nós, seres humanos, acreditamos conhecer), em especial, o que chamamos de natureza, e o que chamamos de “nós”, seres humanos.

É curioso que, muitas vezes e em diversas situações, tratamos do universo como se dele não fizéssemos parte, e tratamento semelhante atribuímos à natureza, ou seja, como se não fôssemos formados pelos mesmos elementos químicos que a água (hidrogênio e oxigênio), os gases (hidrogênio, oxigênio, cloro, enxofre, nitrogênio etc.), a terra (cálcio, carbono, sódio, magnésio etc.), as plantas e os outros animais, pois que, no âmbito da Biologia, também somos animais.

Observação

A classificação do homem, de acordo com critérios da Biologia, é: reino: animal; filo: cordado; classe: mamífero; ordem: primata; família: hominídeo; gênero: Homo; espécie: sapiens.

Esse ocasional distanciamento do que se denomina genericamente de natureza deve‑se à nossa capacidade, como seres humanos, de identificar, interpretar e comunicar a respeito de tudo o que está ao nosso redor, bem como de cada um de nós de reconhecer a si mesmo como diferente do outro, ainda que haja muitas semelhanças.

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Unidade I

Para se compreender a origem e o desenvolvimento do ser humano, é totalmente relevante que se levem em conta dois elementos: evolução e história.

2.1 A origem do homem: considerações sobre evolução

Falar em evolução requer compreensão de conceitos e certos cuidados, a fim de que se compreenda que não é uma questão de mera opinião ou preferência de ideias. Discutir a respeito de evolução requer estudo e muito bom senso. É preciso investigar, refletir a até mesmo “desconstruir” certas noções que foram transmitidas popularmente como corretas, porque não foram estudadas tanto quanto necessário. Para estudar evolução, é preciso conhecer um pouco de Biologia.

O pesquisador Charles Darwin (1809‑1882) foi o propositor da teoria da evolução, com a ideia de que há uma continuidade entre todos os seres vivos. Essa continuidade, no entanto, não se refere a uma mera relação linear que se inicia pelo mais simples (um ser de uma única célula) e chega ao mais complexo (estando o homem no topo, no ponto mais elevado), mas sim a uma relação na qual ocorrem ramificações. Essa estrutura ramificada seria como uma “árvore da vida”, ou seja, por analogia, haveria uma única raiz, mas com muitos ramos evolutivos, resultando em muitas espécies diferentes (YAMAMOTO, 2009; MATURANA; VARELA, 2001). Por exemplo, o homem e outros primatas como gorila, chimpanzé etc. possivelmente se originaram de um mesmo ancestral, o que não significa que um chimpanzé tenha “evoluído” até se tornar homem.

Duas obras de Darwin que refletem sua elaboração teórica sobre evolução são: A Origem das Espécies (1859) e A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais (1837).

Saiba mais

O filme a seguir retrata dilemas da vida de Darwin quando estava escrevendo sua obra A Origem das Espécies.

CRIAÇÃO. Dir. Jon Amiel. Reino Unido: Recorded Picture Company (RPC), 2009. 108 minutos.

Yamamoto (2009) explica dois conceitos fundamentais, evolução e raça:

A evolução biológica consiste na mudança de características hereditárias de grupo de organismos ao longo das gerações, através de processos aleatórios, o mais importante deles sendo a seleção natural (p. 2).

Observação

Processos aleatórios são eventos que ocorrem ao acaso, sem algo predeterminado.

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CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO HUMANO

Os organismos que essa autora menciona referem‑se a qualquer ser vivo, seja uma bactéria, um cachorro, uma estrela do mar, uma planta, o ser humano, enfim: qualquer ser vivo.

Não existe um “tipo” ou espécie de ser vivo que seja considerado superior a outro em termos absolutos; o que existem são diferentes espécies que vivem em certos ambientes de forma melhor do que outras espécies naquele mesmo ambiente. Essa “forma melhor” está associada a menos dificuldade de obter alimento, mais chances de acasalamento, melhores condições de proteger a cria, comparativamente a outras espécies, nesse mesmo ambiente. Assim, há os mais bem‑adaptados e os menos bem‑adaptados a um determinado ambiente.

Por outro lado, pode ocorrer alguma modificação nesse ambiente que venha a favorecer uma espécie que era menos adaptada e passar a prejudicar a que, anteriormente, vivia melhor.

Assim, o mais bem‑adaptado é o que vive melhor em um ambiente determinado.

Uma definição de adaptação é a seguinte:

[...] trata‑se de um processo dinâmico de mudança, desenvolvido voluntaria ou involuntariamente, a fim de recolocar um organismo numa posição mais vantajosa em relação ao seu meio interno ou ao ambiente e que supõe a capacidade de aprender” (DORON; PAROT, 1998, p. 30).

Note‑se, portanto, que evolução, em Biologia, não deve ser entendida como um sinônimo de progresso, ou seja, não existe a espécie “mais evoluída” ou “melhor” (YAMAMOTO, 2009), existem apenas espécies “diferentes”.

Observação

“Seleção natural é um processo através no qual os indivíduos mostram sobrevivência e/ou reprodução diferencial” (YAMAMOTO, 2009, p. 1).

Raça é um conceito bastante utilizado popularmente. O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (RAÇA, 2001) elucida 14 significados associados entre si. A primeira definição é: “divisão tradicional e arbitrária dos grupos humanos, determinada pelo conjunto de caracteres físicos hereditários (cor da pele, formato da cabeça, tipo de cabelo etc.)”.

Contudo, o conceito não é mais aceito pela Biologia (YAMAMOTO, 2009) e nem pela Etnologia, que, para Houaiss, é o campo de estudo das diferentes culturas (etnias) mediante fatos e documentos (ETNOLOGIA, 2001).

A justificativa biológica para desconsiderar essa noção – noção que não encontra fundamento científico – é que cor da pele ou qualquer outra variação na aparência não são determinadas por diferenças genéticas significativas; aliás, pesquisas têm mostrado que existem mais variações de genes em uma mesma população do que quando se comparam diferentes populações.

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Unidade I

Em outras palavras: todos nós, humanos, somos da mesma espécie e, portanto, temos a mesma origem. Isso afasta a ideia de eugenia (sinônimo de “bem‑nascido”), ou seja, a ideia de que certas pessoas são melhores do que outras, isto é, de “qualidade superior” àquelas não fossem de mesma origem genética, como se possuíssem em seus genes um favorecimento genético a priori.

A rejeição do conceito de raça pela Etnologia dá‑se porque, embora certos grupos de pessoas possam vir a apresentar bastantes semelhanças entre si quanto a características físicas e biológicas, esses mesmos grupos podem não apresentar ou pouco apresentar características culturais em comum.

Portanto, observa‑se que nem no campo das Ciências Naturais nem no campo das Humanidades o conceito de raça se legitima.

O importante é saber que determinado povo ou determinada etnia não podem ser considerados nem superiores e nem inferiores a outro povo. Isso é muito importante, pois, do contrário, podem passar a ideia errônea de que pessoas de pele branca são de melhor qualidade do que as de pele negra, ou de que pessoas de uma mesma cultura são “mais evoluídas” do que de outra.

No âmbito da vida social humana, o uso desse conceito gera preconceito, e preconceito gera sofrimento.

O estudo sobre crescimento e desenvolvimento humano tem como objetivo preparar o estudante e futuro profissional para exercer a profissão de forma refletida e ética. Com essa fundamentação, nós, autores deste material, corroboramos a não aceitação do conceito de raça.

Lembrete

Não existe superioridade absoluta de uma espécie sobre outra espécie. O que existe é uma espécie mais bem‑adaptada que outra, mas somente em relação às especificidades das condições de determinado ambiente.

2.2 A origem do homem na história do homem

Um primeiro ponto a ser lembrado é a divisão teórica da História humana em dois grandes períodos: a Pré‑História e a História.

É importante considerar que a própria divisão da História e boa parte dos materiais encontrados tiveram como base inicial interpretativa a cultura europeia. É o chamado eurocentrismo, como se a Europa fosse o lugar onde tudo se iniciou: todas as culturas, os meios de produção, os povos e assim por diante. Porém, hoje, mesmo sabendo que não foi assim, a divisão dos períodos históricos permanece do modo apresentado a seguir.

• A Pré-história é o período que abrande desde os primeiros hominídeos até a invenção da escrita, em aproximadamente 4.000 a.C.

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• A História é propriamente reconhecida a partir da invenção da escrita e apresenta a seguinte subdivisão:

— Idade Antiga ou Antiguidade – da invenção da escrita (aproximadamente em 4.000 a.C.) até a queda do Império Romano do Ocidente, 476 d.C.

— Idade Média ou Idade Medieval – de 476 d. C. até a tomada de Constantinopla (sede do Império Romano do Oriente) pelos turco‑otomanos, 1453.

— Idade Moderna ou Modernidade – de 1453 até a Revolução Francesa, 1789.

— Idade Contemporânea ou Contemporaneidade – de 1789 até os dias atuais.

Para as finalidades desta disciplina, essa divisão constitui apenas um referencial para a compreensão de certos valores, organizações e manifestações socioculturais, bem como para delimitar épocas referentes ao desenvolvimento de certas pesquisas e seus autores, assim como para auxiliar na interpretação de determinadas questões, inclusive relacionando‑se com a prática ou escassez de prática de atividade física na Contemporaneidade, principalmente nos dias atuais.

O estudo da História está pautado em alguns materiais fundamentais. De forma simplificada, pode‑se dizer que são: documentos (em especial, documentos escritos); fósseis e outros objetos encontrados nas escavações. As escavações começaram a ser realizadas com mais frequência a partir do século XIX.

Figura 2 – Escavação conservada abaixo da estrutura do Museu da Akropolis (Atenas, Grécia)

De acordo com Rodrigues (2009), com base em análise de DNA (molécula que se encontra no núcleo celular), há estimativas de que a linhagem de primatas não humanos divergiu da linhagem humana há cerca de 6 ou 7 milhões de anos, embora a prova fóssil mais antiga dessa separação seja datada de 4 milhões e 400 mil anos.

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A partir da década de 1960, a África passou a ser considerada o local onde o ser humano atual se originou, apesar de também haver fósseis de outros hominídeos em outros lugares, como Ásia e Europa.

É muito importante compreender que a palavra hominídeo refere‑se aos primatas dos quatro gêneros seguintes: Ardipithecus; Australopitecos; Paranthropus; Homo.

Os três primeiros foram extintos e não necessariamente deram origem ao gênero Homo, que é o gênero do ser humano atual.

Convém observar que ser classificado como Homo (H) não é próprio somente ao homem atual, pois houve outros Homo, porém de espécies que não a sapiens. Foram estes: H. habilis; H. erectus; H. sapiens neanderthalensis.

Note que o H. sapiens neanderthalensis, embora tenha a palavra sapiens, na parte que classifica espécie, tem também a palavra neanderthalensis. Por sua vez, o homem moderno (isto é, nós, seres humanos atualmente vivos e os povos dos quais descendemos) é classificado como Homo sapiens sapiens, ou seja, a palavra sapiens se repete.

Observação

“Homem moderno” difere de “homem arcaico”. Não se trata do homem que viveu na Idade Moderna e nem do homem que apresenta estilo de vida contemporâneo.

Saiba mais

O filme a seguir é uma ficção que aborda a inter‑relação de dois grupos de hominídeos primitivos.

A GUERRA do fogo. Dir. Jean‑Jacques Annaud. Canadá: International Cinema Corporation (ICC). 1976. 100 minutos.

Houve também o Homo sapiens arcaico ou Homo heidelbergensis, que deve ter surgido entre 500 mil e 100 mil anos, cujos fósseis foram encontrados em Zâmbia, Etiópia, França, Grécia e China (RODRIGUES, 2009).

[...] os humanos modernos evoluíram na África há 120 mil anos e a partir de formas arcaicas. Propagaram‑se, rapidamente, para o Oriente Médio e daí para o leste da Ásia. Grupos desses humanos do leste asiático partiram em duas direções: sul (Austrália) e norte (América) (RODRIGUES, 2009, p. 37).

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Segundo essa autora (2009), a agricultura, que surgiu há aproximadamente 10 mil anos, tornou‑se um modo de vida simultâneo para diferentes grupos de pessoas na América Central, no sul da África e no sudeste do Mediterrâneo.

Sabe‑se que esse modo de produção modificou o modo de vida humano: a necessidade de caçar animais e coletar frutos (comportamento caçador‑coletor), cuja consequência era mudar de lugar com certa frequência (modo de vida nômade) foi substituída pelo modo de vida denominado sedentário.

Observação

O modo de vida sedentário significa manter‑se em determinado local para viver; não deve ser confundido com estilo de vida sedentário, que se opõe a estilo de vida ativo.

Na atualidade, atribui‑se o conceito de estilo de vida sedentário quando se faz referência à ausência ou baixa frequência de atividades diárias que envolvam grandes grupos musculares e um razoável gasto energético em razão dessas atividades. Essa é uma marca da sociedade contemporânea, bastante relacionada à utilização de veículos automotores e equipamentos eletrônicos. Em contrapartida, o estilo de vida ativo envolve a prática de atividade física constante e organizada, como, por exemplo, realizar caminhadas de ao menos 30 minutos, três vezes durante a semana e até mesmo optar por subir e descer andares através de escadas em vez de tomar o elevador, realizar caminhos diários a pé ou de bicicleta em vez de usar meios de transporte coletivo, carro ou motocicleta, entre outros hábitos.

Retomando as adaptações relativas ao modo de vida sedentário, é correto afirmar que se estabelecer em determinado local modifica as relações dentro do grupo, como determinar outros parâmetros para divisão territorial (por exemplo, construindo moradias e muros), noção de propriedade, desenvolvimento diferenciado da linguagem e várias outras elaborações culturais.

Bussab e Ribeiro (1998) indicam possibilidades bastante coerentes de como características biológicas e culturais foram se engendrando mutuamente, ao longo de milhares de anos, entre os primeiros hominídeos, até que se constituísse o ser humano como é hoje (o qual será chamado, genericamente, neste texto, de “homem” – incluindo homens e mulheres).

Um conceito absolutamente imprescindível para se compreender ainda melhor a evolução do ser humano é a aprendizagem.

De acordo com Papalia e Feldman (2013, p. 62), aprendizagem refere‑se a “uma mudança duradoura no comportamento baseada na experiência ou adaptação ao ambiente”.

Individualmente, envolve também outros aspectos: repetição de uma informação para que seja armazenada (memória), reprodução (produzir de novo, de modo semelhante) do que aprendeu; e comunicação a respeito do que foi aprendido, modificando alguns aspectos, contanto que sem perder características importantes do que foi ensinado.

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O processo de aprendizado exige também foco de atenção, ou seja, sem prestar atenção é difícil aprender. Pode‑se até memorizar, porém, hoje em dia, aprender não se resume a memorizar e sim a atribuir significado próprio à informação que está sendo ensinada. Aliás, existe a possibilidade de a pessoa aprender sem que outra a ensine: ela observa, experimenta, tenta, testa, repete as tentativas e, muitas vezes, consegue realmente aprender sem ajuda de outrem.

Observa‑se na figura a seguir um macaco realizando uma atividade típica da cultura humana: andar de bicicleta. Esse é apenas um indicador de que o processo de aprendizagem não é exclusivo do ser humano.

Figura 3 – Macaco andando de bicicleta (com rodinhas laterais apoiando)

O fenômeno da aprendizagem no ser humano é muito valorizado, não apenas para a sobrevivência como também para o bom convívio social, uma vez que pessoas com dificuldade de aprendizado tendem a ser menosprezadas – o que, obviamente, deve ser combatido.

Por isso, nota‑se que a aprendizagem tem um valor adaptativo, haja vista, contemporaneamente, o tempo que crianças e adolescentes permanecem na escola e o quanto são cobrados para realizarem, em casa, atividades relativas à escola.

Exemplo de aplicação

Reflita a respeito da seguinte situação: uma pessoa adulta jovem, de 20 anos, que entrou na Educação Infantil com quatro anos de idade, e acabou o Ensino Médio com 17, sem repetir nenhum ano letivo. Quanto do tempo dela foi dedicado à escola e sobre o que será que ela aprendeu? Quanto de todos os conteúdos que ela aprendeu ela conseguiria explicar ou reproduzir?

2.3 Características morfofuncionais do homem moderno (Homo sapiens sapiens)

As características típicas de uma determinada espécie de ser vivo, advindas de suas origens evolutivas, são adjetivadas por “filogenéticas”. Portanto, filogenia (filogênese) é a história evolutiva de uma espécie. E ontogenia (ontogênese) refere‑se a características próprias de um indivíduo.

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Isso não significa, necessariamente, que características típicas de uma espécie sejam exclusivas dessa determinada espécie. Por exemplo, muitos animais são capazes de se manterem em postura bípede e ereta: pinguins, cangurus, suricatos, entre outros; todavia, seus modos de locomoção apresentam padrões de movimento muito diferentes uns dos outros, assim como os do homem.

Observação

Padrões de movimentos são configurações de movimentos específicos inter‑relacionando cabeça, tronco, membros superiores e inferiores, em um espaço e um tempo determinados. Exemplo: o andar da criança apresenta diferentes padrões.

Outro exemplo: esquilos se mantêm em postura ereta e movimentam alimentos em suas patas dianteiras, assim como guaxinins; todavia não dispõem de mãos semelhantes às dos seres humanos, as quais permitem uma quantidade inimaginável de atividades manuais.

O homem pertence à ordem dos primatas, mas há uma divisão entre apes e monkeys, sendo os primeiros chamados de primatas superiores e os segundos de primatas inferiores. Os superiores abarcam o homem, os chimpanzés, os gorilas, os bonobos e os orangotangos. Ausência de cauda, locomoção bípede e estrutura articulada do cotovelo são características morfológicas que os aproximam, além da similaridade do DNA, em especial, com os chimpanzés. A estrutura social de cada um desses primatas também apresenta organização própria com alguma ordem hierárquica, mas diferentes formas de convívio intragrupo.

Na ilustração a seguir, nota‑se a necessidade de o gorila apoiar‑se em uma das mãos para se locomover (além das patas dianteiras). Sua situação, portanto, diferente da que ocorre com o ser humano, em que ambas as mãos ficam livres para carregar ou manipular objetos enquanto se locomovem.

Figura 4 – Gorila locomovendo‑se e alimentando‑se simultaneamente

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Saiba mais

O filme a seguir é uma ficção científica que apresenta processo evolutivo atípico de chimpanzés, assemelhando‑os a humanos, após uma série de experimentos realizados por cientistas, criando ameaças à sociedade humana local.

PLANETA dos macacos: a origem. Dir. Rupert Wyatt. EUA: Twentieth Century Fox Film Corporation, 2011. 106 minutos.

Exemplo de aplicação

Com base no filme Planeta dos Macacos e fundamentando‑se no que foi estudado até este ponto, é de se esperar que seja possível essa proporção de semelhança entre uma espécie e outra? Sugestões: a) pensar na configuração cerebral, no DNA e na história natural (evolutiva) de ambas as espécies; b) escrever seu posicionamento sobre essa situação.

A seguir, apresentam‑se algumas características da morfologia (forma) e da fisiologia (função) típicas do homem e suas respectivas possibilidades e/ou consequências:

Postura ereta e bípede

As consequências da postura ereta e bípede são: mãos livres para tocar em objetos e manipulá‑los, assim como a si mesmos e a outros seres, praticar, por exemplo, atividades relacionadas à higiene, prazer sexual, preparo de alimentos, carinho físico etc.; campo visual acima da altura de alguns predadores naturais, como felinos selvagens de grande porte; facilitação do contato entre olhares (“olhos nos olhos”) por mais tempo, possibilitando aprimoramento das relações sociais; facilitação do desenvolvimento da fala. Outro aspecto que contribui com a fala é o aparelho buco‑nasal, que propicia a “interrupção” entre a respiração e a ingestão de alimento, levando a uma boa coordenação entre essas duas ações.

Observação

Postura ereta refere‑se ao posicionamento em que a coluna vertebral fica estendida verticalmente; bípede é o apoio somente sobre os membros inferiores (patas ou pés).

Morfologia da mão

Há a possibilidade de “movimento de pinça” (oposição entre os dedos polegar e indicador). A consequência é a maior precisão na manipulação de objetos, possibilitando realizar tarefas que exijam muita destreza aliada a certa delicadeza, ou seja, imprimindo pouca força ao objeto.

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A mão é uma região que recebe muitas terminações nervosas e, consequentemente, há muitos impulsos elétricos vindos do cérebro e retornando a ele. Isso implica que as mãos apresentam‑se bastante sensíveis a estímulos ambientais e, por meio do tato, consegue‑se executar movimentos muito precisos, traduzidos em habilidades manuais bem específicas, como costurar, bordar, escrever, realizar cirurgias etc.

Morfologia e funções cerebrais

O tamanho do cérebro é maior, comparativamente a outros hominídeos antes do homem moderno; além disso, há relações mais específicas entre certas regiões do cérebro e outras partes do corpo.

Há ainda o aparecimento e crescimento de determinadas áreas cerebrais, por exemplo, o córtex pré‑frontal, que permitem atividades mais especializadas (específicas), incluindo os lados direito e esquerdo do cérebro, pois cada lado passa a ser responsável, predominantemente, por diferentes funções (MATURANA; VARELA, 2001).

Exemplo de aplicação

Realize a seguinte experiência: em vez da postura ereta em pé, isto é, sobre dois apoios, procure ficar sobre quatro ou seis apoios; peça para alguém íntimo fazer o mesmo. Fiquem de frente um para o outro e procurem olhar reciprocamente um nos olhos do outro e conversar entre si. Há grandes possibilidades de sentir um incômodo muito grande em pouco tempo, pois não há adequação anatômica para realizar essas ações nessa posição de modo confortável para um ser humano, em especial pela pressão intervertebral na região cervical, além da dificuldade de se sustentar por mais do que alguns minutos em quatro ou seis apoios.

2.4 Importância do estudo da evolução humana para a Educação Física

Conhecer essas características da origem da filogênese humana pode ser importante para compreendermos por que o homem atingiu certo nível de desenvolvimento – cognitivo (intelectual), afetivo (emocional), social etc. – comparativamente a outros seres vivos.

Isso ocorreu tanto por meio de um sistema nervoso central bastante diferenciado (especializado) e uma série de outras estruturas e funções como através de arranjos sociais específicos, isto é, atividades organizadas em grupo.

Afirmar que uma característica é causa (motivo) e outra é efeito (consequência) pode ser arriscado. É importante considerar que outros animais são muito mais fortes e ágeis que o homem e, para muitos deles, o homem é uma presa fácil.

Ao que parece, vários eventos do desenvolvimento ocorreram em conjunto, em razão de diferentes demandas ambientais (ambientes e contextos em que ele vivia) que constituíram barreiras para sua

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sobrevivência (isto é, para a continuidade da espécie) e assim o ser humano precisou buscar soluções para ultrapassar essas barreiras.

Não há dúvidas de que as habilidades manuais atribuem uma característica única de destreza e precisão, que deve ter impulsionado muito a cultura de forma ampla, e talvez mais especialmente ainda os trabalhos artesanais domésticos, sobretudo a atividade de tecer.

Nesse sentido, entendendo‑se que atividades lúdicas e “esportivas”, isto é, que envolvessem séria competição e vigor nas capacidades físicas, estavam presentes em grandes civilizações da Antiguidade, fica o seguinte questionamento: seriam essas atividades formas de regulação social, isto é, de criação e aplicação de regras, de estabelecimento de relações hierárquicas entre pessoas e tarefas, ou mesmo uma forma de apaziguar conflitos, além de treinamento para fins bélicos e de lazer?

Exemplo de aplicação

Importante para refletir sobre a evolução do ser humano: “Ao que tudo indica, assim que nossos ancestrais desenvolveram uma dependência da cultura para sobreviver, a seleção natural começou a favorecer genes para o comportamento cultural. [...] tomados alguns cuidados para não simplificar indevidamente o processo, pode‑se dizer que biologia e cultura caminharam juntas” (BUSSAB; RIBEIRO, 1998).

Questão: a biologia e a cultura se influenciaram mutuamente ou a cultura só é possível por causa de características biológicas? Justifique seu posicionamento lendo todo o texto indicado anteriormente indicado.

Saiba mais

BUSSAB, V. S. R; RIBEIRO, F. L. Biologicamente cultural. In: SOUZA, L.; FREITAS, F. Q.; RODRIGUES, M. M. P. Psicologia: reflexões (im)pertinentes. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1998. p. 175‑93. Disponível em:<http://www.ip.usp.br/portal/images/stories/Articles/2004_Bussab_Ribeiro_Otta_biologicamente_cultural.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2017.

Lembrete

Filogênese – desenvolvimento da espécie; ontogênese – desenvolvimento do indivíduo.

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3 CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO INDIVÍDUO

3.1 Ideias equivocadas sobre crescimento e desenvolvimento humano

É muito comum pensar que muitas das características de uma pessoa são absoluta e totalmente dependentes de sua idade (desde a primeira infância até a terceira idade), ou que estejam restritas absolutamente a fatores genéticos, isto é, herdadas de seus pais e outros ascendentes (como avós, bisavós etc.), ou ainda, que ocorram por causa exclusivamente do modo como foram criadas, da educação que receberam.

Outro problema é quando se associa estritamente certas atividades físico‑motoras e até intelectuais como exclusivas do sexo masculino e outras como exclusivas do sexo feminino, sem que se tenha a real noção de que as diferenças entre pessoas de sexos diferentes não são absolutas, mas sim uma mescla, uma interação entre características individuais próprias e possibilidades de escolhas.

A seguir são indicados alguns exemplos dessas ideias equivocadas:

• nós (humanos) descendemos dos macacos;

• a personalidade de uma pessoa nunca muda;

• quanto mais gorda for uma criança, mais forte ela será;

• invariavelmente, todas as garotas crescem até os dezoito anos de idade, e todos rapazes, até os 21;

• se uma pessoa realizar exercícios de alongamento, ela crescerá mais do que as que não os realizam;

• certas atividades físico‑motoras e mesmo intelectuais são adequadas somente para homens, e outras, somente para mulheres;

• cada pessoa nasce com determinados dons, mas desprovida de outros, e sem esse dom, não há como ela aprender;

• uma pessoa que está em processo de envelhecimento mais avançado ou em idade mais avançada não é capaz de aprender.

Esses pensamentos podem acarretar uma série de problemas para os mais variados aspectos da vida das pessoas, comprometendo não apenas o entendimento acerca dos processos de crescimento e desenvolvimento humano por pais, cuidadores, profissionais de áreas de saúde e educação, mas também a felicidade das pessoas, por ameaçar as possibilidades de que realizem seus desejos e inspirações pessoais.

Basta imaginar situações pelas quais passa um profissional ou professor de Educação Física ao exercer sua profissão. Se ele não conseguir interpretar corretamente o que se passa no desenvolvimento de uma criança, adolescente, adulto ou idoso, não apenas poderá aplicar exercícios físicos e motores

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inadequados, como também dificultar o convívio de seu aluno ou cliente com outras pessoas, seja no convívio familiar, em atividades laborais (do trabalho), em grupos sociais maiores e mesmo quando a pessoa desejar se exercitar sozinha.

Não obstante, talvez o pensamento mais equivocado quando se observa, estuda e investiga crescimento e desenvolvimento humano seja estar convicto de que muito já se sabe. Fica a sugestão de que se pense o quanto ainda há por saber.

Saiba mais

O CURIOSO caso de Benjamin Button. Dir. David Fincher. EUA: Warner Bros, 2009. 166 minutos.

Exemplo de aplicação

Algo absolutamente esperado no processo de crescimento e desenvolvimento humano é nascer um bebê e morrer na velhice. O filme indicado no saiba mais anterior mostra esse processo no sentido contrário. Seria possível? Ao final da leitura deste material, espera‑se que o estudante esteja pronto para respondê‑la, fundamentando cientificamente sua justificativa.

3.2 Os fenômenos e os conceitos de crescimento e desenvolvimento humano

O primeiro aspecto a considerar é que a palavra fenômeno, em ciência, não se remete a algo “fora do normal”, extraordinário ou incomum, como usamos popularmente (embora esse uso também esteja correto). Em ciência, fenômeno refere‑se a qualquer evento que pode ser estudado, seja um objeto (uma máquina, um utensílio etc.), um comportamento (exemplos: ansiedade, agressividade; o andar, o escrever; uma decisão tomada, a memória, entre muitos outros), uma manifestação cultural (uma partida de basquetebol, um concerto musical, as guerras etc.), e assim por diante.

Em segundo lugar, conceituar e definir não são o mesmo. Conceito refere‑se a ideias, noções. Por exemplo, quando se ouve a palavra “esporte”, pode‑se pensar em várias pessoas praticando atividade física em equipes, competindo ou, simplesmente, correndo para melhorar as capacidades físicas ou como forma de lazer; assim, é comum que se diga “a pessoa cuida do jardim por esporte”, no sentido de que realiza algo que lhe dá prazer e não necessariamente em troca de remuneração.

Contudo, diferentemente de um conceito, uma definição para esporte será formal, técnica, precisa e certamente envolverá outros elementos e conceitos, como competição e regras. Barbanti (2002, p. 228) indica uma definição de esporte, de acordo com a área de Sociologia do Esporte:

É uma atividade competitiva, institucionalizada, que envolve esforço físico vigoroso ou o uso de habilidades motoras complexas, por indivíduos cuja participação é motivada pela combinação de fatores intrínsecos e extrínsecos.

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Note‑se, portanto, que: a) uma definição requer delimitações e maior precisão do que um conceito; b) para um mesmo fenômeno, pode haver mais de um conceito e mais de uma definição.

Uma vez esclarecidos esses aspectos da linguagem acadêmico‑científica, serão enfocados os fenômenos de crescimento e desenvolvimento como investigados no âmbito da ciência.

Novamente, tomando‑se a dinâmica da linguagem popular, a palavra crescimento é frequentemente empregada em dois sentidos: aumento em quantidade e aumento em qualidade (isto é, melhora de alguma característica). Por exemplo, quando se diz: “Você é muito imaturo; veja se cresce!”, o que a pessoa quer é que o outro modifique suas atitudes para melhor (isto é, torne‑se mais coerente ou mais afetuoso e assim por diante). De acordo com a linguagem da ciência, contudo, o mais adequado seria dizer “[...], veja se você se desenvolve emocionalmente” (ou moralmente). Mas essa frase certamente causaria estranhamento às pessoas no uso corrente.

Visto isso, é fundamental compreender os seguintes conceitos: crescimento, desenvolvimento e maturação, cujas definições são expostas a seguir.

Maturação refere‑se ao “processo de tornar‑se maduro ou o progresso em direção ao estado maduro. Maturação é um processo; maturidade é um estado. Maturação ocorre em todos os tecidos, órgãos e sistemas de órgãos, afetando enzimas, composição química e funções. Maturidade varia, assim, de acordo com o sistema biológico estudado” (MALINA; BOUCHARD; BAR‑OR, 2009, p. 20), por exemplo, maturidade sexual, maturidade esquelética etc. Maturação se refere ao timing (tempo relacionado a um evento) e ao tempo de progressão em direção ao estado biológico maduro.

Observação

Enzimas são substâncias do nosso corpo responsáveis por acelerar reações químicas. Exemplo: lipólise, que é a “quebra” da molécula de lipídeo (“gordura”) tem como enzima a lipase.

Crescimento

[...] é um aumento no tamanho do corpo como um todo ou o tamanho atingido por partes específicas do corpo. Conforme as crianças crescem, elas de tornam mais altas e pesadas, tendo um aumento em tecidos magros (ossos, músculos etc.) e gordos e em seus órgãos (MALINA; BOUCHARD; BAR‑OR, 2009, p. 21).

Desenvolvimento refere‑se a “processos de transformação e estabilidade ao longo do ciclo de vida” (PAPALIA; FELDMAN, 2013, p. 36).

Em outras palavras, fundamentando‑se no conhecimento científico, o crescimento é definido somente como o aumento em quantidade ou em tamanho, e por isso virá associado

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a números e unidades de medidas (metros, centímetros, gramas, litros, centímetros cúbicos etc.). Assim, diz‑se que as estruturas corporais crescem quando aumentam em comprimento e/ou em massa e/ou em volume, sendo todos mensuráveis por determinados equipamentos. Por exemplo: o aumento de estatura (que vai da sola dos pés ao cimo da cabeça), que é o aumento do comprimento total do corpo, é medido em centímetros, ao passo que o aumento de volume de um órgão como o fígado é medido em centímetros cúbicos (cm3). Outro exemplo é o crescimento populacional, quando se trata de aumento da quantidade de seres (em geral, seres humanos) de um determinado local.

O desenvolvimento, em sentido estrito, refere‑se a mudanças e manutenções na qualidade. Um exemplo de modificação e manutenção é o seguinte: uma garota que menstrua pela primeira vez passou por uma mudança em uma característica sexual; por outro lado, por cerca de aproximadamente trinta anos consecutivos, mês a mês, a menstruação deverá ser mantida. Essa pessoa está em um curso natural do processo de desenvolvimento sexual, com mudanças e manutenções, sendo a menstruação um indício de maturação sexual.

Muito importante no conceito de desenvolvimento é que as mudanças e manutenções podem aumentar ou diminuir em qualidade, o que se costuma chamar, respectivamente, de “melhora” e “piora”. Um exemplo é o que acontece com o funcionamento dos mais diversos órgãos: com o avançar da idade adulta, em direção ao envelhecimento, quase todas as funções orgânicas tendem a piorar, diferentemente do que ocorre com pessoas jovens, em que as mesmas funções tendem a melhorar. Ambas as condições, todavia, caracterizam o processo de desenvolvimento, uma vez que não importa, na construção desse conceito, se houve piora ou melhora, mas sim que houve mudanças e manutenções de determinada condição ou característica ao longo do tempo.

De acordo com esse raciocínio, entende‑se que o desenvolvimento humano abrange todo o período de vida, ou seja, desde a concepção de um novo ser no útero materno (ou in vitro) até a morte desse ser.

Algumas pessoas podem permanecer com a seguinte questão: “E após a morte?...”. Bem, após a morte (ou a possibilidade de vida após a morte) é um fenômeno ou tema do qual a ciência não se aventura a tratar, deixando‑o para o âmbito das religiões, da Filosofia e do próprio conhecimento popular. Por outro lado, a Psicologia e a Antropologia, por exemplo, são áreas pautadas em conhecimento científico que estudam (entre outros muitos temas), como as pessoas lidam com a morte de outros entes (seres), em especial de pessoas ou animais que lhes são afetivamente próximos.

3.3 Há limites para o crescimento e para o desenvolvimento ao longo da vida?

Ao se pensar no crescimento longitudinal, isto é, o aumento do comprimento de ossos e músculos que os acompanham, pode‑se afirmar que o crescimento cessa ao final da adolescência para algumas pessoas e, para outras, no meio da adolescência. Em outras palavras, a pessoa não ficará mais alta na idade adulta e nem na terceira idade. Como será mencionado adiante, o crescimento longitudinal inicia‑se na vida intrauterina e para na adolescência.

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Espera‑se que ele aconteça com os demais órgãos do corpo, como fígado, baço, cérebro, coração, pulmão etc. Contudo, por motivos aleatórios no processo de desenvolvimento humano, pode haver um crescimento inesperado de algum órgão mesmo na idade adulta ou terceira idade, em razão de edema (acúmulo anormal de líquido nos tecidos do organismo), proliferação de células anômalas (isto é, que não são típicas da estrutura daquele órgão), entre outros motivos.

Quanto ao desenvolvimento, ele é entendido como um processo que se inicia com a concepção (conforme será visto adiante) e se encerra com a morte. Em outros termos, pode‑se afirmar o seguinte: enquanto existir vida, existirá desenvolvimento.

Portanto, ambos – crescimento e desenvolvimento – são processos finitos e, por conseguinte, limitados no tempo.

Figura 5 – Senhor idoso segurando bebê no colo: encontro de gerações

Lembrete

Crescimento está relacionado a aumento de quantidade. Desenvolvimento está relacionado a modificações e manutenções na qualidade, seja para melhor, seja para pior.

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3.4 Fatores de influência e variações no processo de crescimento e desenvolvimento de uma pessoa

É notório que as pessoas não se desenvolvem todas do mesmo modo ao longo do tempo. No que se refere à produção de movimentos (ações motoras), por exemplo, é comum que os bebês, por volta de um ano de idade, passem do engatinhar para o andar; no entanto, há bebês que não chegam a engatinhar, passando diretamente do rastejar para o andar; assim como alguns andam com cerca de oito meses e outros, com um ano e dois meses de idade e assim por diante. Crianças com Síndrome de Down apresentam o andar ainda posteriormente, às vezes com cerca de dois anos de idade. Outro exemplo: uma mesma criança pode andar quando tem nove meses e depois optar por somente engatinhar por mais um mês, até que volte a andar e não mais queira engatinhar. O que é possível inferir dessas situações?

• Primeiro: a velocidade com que ocorre um evento (no caso do exemplo, o andar) está relacionada à idade, mas a idade em si não é determinante para sua ocorrência.

• Segundo: semelhantemente, a permanência de um evento, isto é, o quanto ele perdura no tempo não é a mesma para todas as pessoas. Das situações mencionadas, é o caso da criança que anda, volta a engatinhar somente e, por fim, torna a andar.

• Terceiro: pode haver condições e características típicas, específicas de determinados indivíduos que não ocorrerão com outros, seja por causa de influências de sua própria constituição, sobretudo associada a fatores genéticos (como o exemplo da Síndrome de Down), seja por causa de influências ambientais, como incentivo dos pais, imitação de irmãos mais velhos etc.

Refletindo sobre essas constatações, é importante compreender certos aspectos fundamentais para estudar os fenômenos de crescimento e desenvolvimento humano.

• Idade: a idade é um parâmetro, um dos mais importantes critérios de aproximação de algumas (ou muitas) características em comum nas mais variadas pessoas, mas os mesmos eventos não ocorrem exatamente em determinada idade para todas as pessoas, como será apresentado adiante.

• Variações interindividuais: cada pessoa tem o crescimento e desenvolvimento diferente das outras, e variações intraindividuais são relativas a certos eventos – há variações que ocorrem em uma mesma pessoa.

• Fatores internos ou intrínsecos: há fatores internos à pessoa, próprios de sua estrutura e de suas funções orgânicas.

• Fatores externos ou extrínsecos: existem fatores externos à pessoa, próprios dos ambientes onde ela se desenvolveu ao longo da vida.

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No que se refere a fatores internos e externos que influenciam o processo de crescimento e desenvolvimento humano, há que se destacar:

• Fatores internos: herança genética, processos maturacionais, inconsciente.

• Fatores externos: alimentação, tempo e local para dormir, uso de medicamentos, uso de drogas ilícitas, (isto é, que a lei não permite, como maconha, cocaína etc.), pais e outros cuidadores, demais membros da família, animais de estimação, certos objetos, meio ambiente (clima, vegetação, relevo, poluição e outros), infraestrutura social (saneamento básico, transporte, moradia etc.), educação formal (escola), entre muitos outros.

Observação

O inconsciente foi estudado originalmente pelo psiquiatra Sigmund Freud (1856‑1939), mediante a denominada perspectiva psicanalítica, cujo método evocava no paciente lembranças antigas, para resolver conflitos emocionais do presente.

Embora possa existir uma lista imensa de fatores externos, é curioso notar que não há uma ordem de importância que seja definida a priori, uma vez que cada pessoa pode se afetar mais por um fator do que por outro. Além disso, se tomarmos o exemplo do número de horas de sono: pode ser que ele esteja atrelado a outros fatores, como excesso de barulhos intensos e frequentes na vizinhança, ou a hábitos familiares, como o de dormir muito tarde, mesmo tendo de acordar muito cedo no dia seguinte. Portanto, vários fatores externos inter‑relacionados podem influenciar o crescimento e desenvolvimento humano.

Note‑se, semelhantemente, que em muitas situações é bastante difícil separar fatores internos e externos. Por exemplo, uma criança que apresenta intolerância à lactose, que pode ser uma característica genética, tem de passar por adaptações em seus hábitos alimentares desde cedo, o que denota uma interação muito forte entre um fator interno e um externo.

Desde a gestação e ao longo de cada uma das faixas etárias, serão realizados comentários e exemplos sobre diferenças interindividuais e intraindividuais, bem como sobre a interação de fatores internos e externos, pois todos esses elementos em conjunto e mutuamente inter‑relacionados é que permitem que se obtenha uma ideia mais aproximada dos fenômenos de crescimento e desenvolvimento humano, ao menos do ponto de vista teórico.

Papalia e Feldman (2013, p. 51‑52) indicam trabalhos de outros pesquisadores que estabeleceram sete princípios básicos do desenvolvimento do ciclo de vida e que abrangem e complementam o que foi apresentado a esse respeito no presente texto. Os princípios são estes:

• O desenvolvimento é vitalício: todos os períodos da vida são importantes e cada um deles é afetado pelo período que o antecedeu.

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• O desenvolvimento é multidimensional: abarca várias dimensões, chamadas também de domínios, ou aspectos, ou esferas, quais sejam: emocional, cognitiva, motora, social, entre outros (como será discutido adiante), cada uma delas podendo se desenvolver em diferentes ritmos e velocidades ao longo de todo o ciclo de vida.

• O desenvolvimento é multidirecional: em outras palavras, ocorre em várias direções. Por exemplo, o aprendizado de línguas é mais facilitado na infância, porém mais dificultado na adolescência, constituindo, portanto, uma característica que em determinado momento apresenta tendência crescente em qualidade, mas, em outro, uma tendência decrescente.

• Influências relativas de mudanças biológicas e culturais sobre o ciclo de vida: as características biológicas esperadas no processo de crescimento e desenvolvimento recebem influência da dinâmica cultural. Como exemplo, crianças que aprendem habilidades motoras complexas quando ainda estão na fase de aprender habilidades motoras básicas, por exemplo, “passistas mirins” de escola de samba, que começam a dançar aproximadamente aos quatro anos de idade: a habilidade culturalmente determinada e chamada popularmente de “sambar no pé”, que a pessoa executa sozinha, requer uma coordenação refinada de apoio dos dedos e da planta dos pés alternadamente sobre o solo, de modo a acompanhar o ritmo e a melodia de uma música de expressiva velocidade. Essa aprendizagem é típica de “subculturas” (pequenas culturas dentro de uma cultura maior), fortemente associadas ao samba carnavalesco, próprio de certas localidades que têm essa tradição como realização identitária (por exemplo, as comunidades do Rio de Janeiro, Brasil).

• O desenvolvimento envolve mudança na alocação de recursos: alguns desses recursos são tempo, energia, dinheiro e apoio social. No início da vida adulta, por exemplo, é comum que se invista mais tempo e energia em trabalho ou em trabalho e estudo; a criança, naturalmente, investe sua energia e seu tempo no brincar e assim por diante.

• O desenvolvimento revela plasticidade: algumas capacidades como memória e força física podem ser aumentadas e aperfeiçoadas, mesmo com o processo de degeneração natural da idade. Contudo, há limites nessa plasticidade, ou seja, é um erro pensar que quanto mais se treina alguma dessas capacidades, mais se consegue obter resultados satisfatórios, como se essa plasticidade fosse infinita.

• O desenvolvimento é influenciado pelo contexto histórico e cultural: cada pessoa é influenciada pelo contexto cultural, social e histórico no qual é criada, os quais podem variar bastante ao longo de sua vida, sobretudo se ela se mudar para outro país ou até mesmo para outra região no mesmo país, bem como se tiver ascendência (pais, avós etc.) de países bastante diferentes, por exemplo, uma avó de procedência asiática e outra do sul da Europa e conviver bastante com ambas.

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3.5 Domínios que compõem o desenvolvimento humano

Os domínios (também chamados de dimensões, aspectos ou esferas) do desenvolvimento do ser humano têm sido investigados por diversas áreas acadêmico‑científicas como Anatomia, Fisiologia, Biologia, Psicologia, Sociologia, Antropologia etc. Em outras palavras, foram construídos vários sistemas de conhecimento teóricos e/ou práticos, a respeito do ser humano, conhecimentos que foram se estabelecendo de modo a priorizar um desses domínios, bem como inter‑relacioná‑los.

Observação

Nesse caso, entendem‑se por conhecimentos práticos, de modo simplificado, aqueles referentes à intervenção profissional.

São domínios do desenvolvimento humano as características relacionadas a: movimento; cognição; emoção; moralidade; estrutura e função; cultura; socialização, entre outros. Esses e outros domínios (como biológico, educacional etc.) servem como base de estudo para compreender e explicar (teórica ou empiricamente) os processos de crescimento e desenvolvimento humano, bem como sua promoção.

Cognição (razão)

Movimento

Socialização e culturalização

Estruturas e funções físicas

Afeto (emoções)

Figura 6 – Integração entre alguns domínios do desenvolvimento humano

Os domínios são:

• Motor: produção de movimentos, de ações motoras.

• Cognitivo (“racional”): pensamentos – raciocínio lógico, imaginação, linguagem, memória, interpretação etc.

• Emocional (afetivo): sentimentos: alegrias, tristezas, angústias, medo, ansiedade, motivação etc.

• Físico: estruturas (como órgãos, por exemplo) e funcionamento.

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• Cultural: elementos e ensinamentos criados pelo ser humano, passados de geração em geração.

• Social: relação de cada pessoa com um grupo bastante grande no qual ela está inserida e que, em geral, é regulado por um líder e/ou por uma organização política e territorial.

Quando se reflete sobre as funções da Educação Física e do Esporte como campos de conhecimento, investigação e áreas de intervenção de profissionais, há necessidade de conhecer esses aspectos e suas inter‑relações, a fim de compreender um pouco a respeito das pessoas praticantes das mais variadas atividades físicas, nos diversos ambientes e contextos, incluindo esportes. Isso porque os profissionais dessas áreas devem estar adequadamente qualificados para lidar com as mais diferentes pessoas em todas as faixas etárias, isto é, ao longo de todo o ciclo de vida (da vida desde dentro do ventre materno até a terceira idade).

Os profissionais que orientam e acompanham essas pessoas podem e devem agir como participantes ativos de um processo de formação em que ambos – o praticante/atleta/cliente/aluno e o profissional/professor – estejam em permanente interação, ainda que cada um tenha suas próprias expectativas, metas, experiências e realizações.

É importante compreender por que muitas pessoas não praticam atividade física sistematica ou mesmo aleatoriamente. Há muitos estudos sobre aderência, não aderência e desistência da prática de atividade física.

Observação

Educador físico é um termo incorreto. O correto é profissional de educação física, conforme a Lei no 9.696 (BRASIL, 1998), que regula a profissão de Educação Física.

Para compreender ainda melhor os processos de crescimento e desenvolvimento, adotou‑se a divisão em faixas etárias, conforme será apresentado adiante. Todavia, tratando‑se das diferentes esferas do desenvolvimento humano já se pode ter noção dessa divisão em faixas de idade e algumas respectivas características.

Antes, porém, é absolutamente importante destacar dois aspectos:

• As características de cada domínio do desenvolvimento humano nem sempre se aplicam a todas as pessoas. O que se considera são ocorrências, em média, na população – ora mundial, ora de algum ou de alguns países, ora de localidades menores.

• Pessoas que têm alguma deficiência física e/ou mental ou doença mental podem apresentar certas características bastante diferenciadas do que as que serão descritas e discutidas ao longo desta disciplina. Todavia, essas pessoas são igualmente importantes. Toda pessoa é importante.

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Contudo, ideal seria que fosse possível abarcar todas as características humanas de que se tem conhecimento. Entretanto, além de descabida pretensão, isso seria também uma ilusão, posto que a “surpresa evolutiva” faz parte do próprio processo de crescimento e desenvolvimento humano, em que filogênese e ontogênese combinam‑se de tal forma que não é possível uma previsibilidade absoluta.

3.5.1 Domínio motor

Como fenômeno, o desenvolvimento do domínio motor abrange a relação entre o sistema nervoso central (SNC) e o sistema musculoesquelético. O bebê passa por muitas e rápidas mudanças no primeiro ano de vida, em razão da maturação do SNC, levando à internalização (“desaparecimento”) de certos reflexos (como os reflexos de sucção, preensão palmar, “de mergulho” entre outros) e, progressivamente, à aquisição de ações motoras, como rolar, girar, engatinhar e, mais adiante, andar, correr, saltar, além das habilidades que envolvem explorar características de objetos e usá‑los para outros fins, como brincar ou se alimentar, por exemplo.

Observação

A respeito dos reflexos, vide também Primeira Infância, adiante no livro‑texto.

Mais especificamente a partir do segundo semestre de vida e desse período em diante, desenvolvem‑se e são aprimoradas as demais habilidades motoras básicas – como arremessar, receber e rebater objetos.

É importante considerar que não apenas a maturação do SNC merece destaque, mas também as experiências. Assim, deve‑se falar em integração entre maturação e experiência, pois só uma ou outra não seria suficiente para que as pessoas aprendessem habilidades motoras, uma vez que o processo de aprendizagem (motora ou não) depende de ambos os aspectos, conforme já discutido.

Portanto, a ampliação e melhora nas habilidades motoras ao longo da vida ocorrem pela interação dos aspectos maturacionais e estimulações ambientais, em uma inter‑relação de três elementos: organismo (indivíduo, pessoa), ambiente (contexto), tarefa (atividade).

O denominado modelo da ampulheta, de David Gallahue, foi proposto em 1982 com a finalidade de explicar o desenvolvimento motor nas diferentes faixas etárias, desde a vida intrauterina até a terceira idade. A seguir, apresentam‑se dois esquemas, adaptados e simplificados referentes ao modelo da ampulheta.

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Quadro 1 – As fases do desenvolvimento motor de acordo com o modelo da ampulheta

Faixas etárias aproximadas de desenvolvimento

Os estágios do desenvolvimento motor

Fase motora especializada

14 anos em diante Estágio de utilização permanente

de 11 a 13 anos Estágio de aplicação

de 7 a 10 anos Estágio transitório

Fase motora fundamental

De 6 a 7 anos Estágio maduro

de 4 a 5 anos Estágio elementar

de 2 a 3 anos Estágio inicial

Fase motora rudimentar

de 1 a 2 anos Estágio de pré‑controle

do nascimento até 1 ano Estágio de inibição de reflexos

Fase motora reflexa

de 4 meses a 1 ano Estágio de decodificação de informações

Dentro do útero até 4 meses de idade

Estágio de codificação de informações

Adaptado de: Gallahue; Ozmun (2005, p. 57).

Quadro 2 – Modelo da ampulheta do adulto jovem à terceira idade

Idoso frágil Acima de 80

Estágio intermediário da velhice 70‑80

Início da velhice 60‑70

Adulto na meia‑idade 40‑60

Adulto jovem 18‑40

Adaptado de: Gallahue; Ozmun (2005, p. 68).

Observe‑se que no quadro anterior não foram atribuídas/denominadas outras fases ao desenvolvimento motor em cada faixa etária, pois o autor considera que a fase motora especializada se prolonga para o restante da vida, abrangendo a aprendizagem de qualquer habilidade motora específica – obviamente respeitando eventuais limites físicos de força, flexibilidade e agilidade das idades mais avançadas.

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Observação

Conforme será apresentado adiante, as idades estabelecidas como início e fim de uma dada faixa etária variam de um autor (pesquisador) para outro.

O desenvolvimento motor é retratado também por outro modelo, semelhante ao modelo da ampulheta, chamado modelo da pirâmide, originário da obra: Educação Física Escolar: Fundamentos de uma Abordagem Desenvolvimentista de Tani et al. Esse modelo, no entanto, traz a novidade da combinação de habilidades motoras básicas (denominadas, nesse modelo, de movimentos fundamentais), que são propostas para serem trabalhadas no Ensino Fundamental I, com a finalidade de preparar as crianças para a aprendizagem de habilidades mais complexas do período seguinte, ou seja, a adolescência. Esse modelo é apresentado, de modo adaptado e simplificado, no quadro a seguir.

Note‑se também que, diferentemente do modelo de Gallahue, o modelo da pirâmide estende‑se somente até o final da adolescência, uma vez que se restringe a uma proposta para a área escolar; portanto, não envolve a idade adulta e nem a terceira idade.

Quadro 3 – As fases do desenvolvimento motor de acordo com o modelo da pirâmide

Idade Estágios

Acima de 12 anos Movimentos determinadosCulturalmente

6/7 a 11/12 anos Combinação de movimentosFundamentais

2 a 6/7 anos Movimentos fundamentais

1 a 2 anos Movimentos rudimentares

intra‑útero a 4 meses Movimentos reflexos

Adaptado de: Tani et al. (1988).

É importante ponderar, ainda que brevemente, acerca da aplicabilidade de qualquer modelo em ciência. Assim, existem muitos modelos explicativos para os vários domínios do desenvolvimento humano, como será brevemente discutido ao longo deste livro‑texto. Essa ponderação não diminui a importância de qualquer modelo ou de qualquer explicação teórica proposta.

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Saiba mais

No artigo a seguir, um dos próprios autores do Modelo da Pirâmide, Edison de Jesus Manoel, discute e crítica sobre a obra e a abordagem em que está presente esse modelo, vinte anos após sua proposição.

MANOEL, E. J. A abordagem desenvolvimentista da Educação Física Escolar – 20 anos depois: uma visão pessoal. Revista da Educação Física, Maringá, v. 19, n. 4, 4. trim., p. 473‑88, 2008.

Tanto o modelo de Gallahue como o de Tani et al. podem ser considerados para orientar o desenvolvimento motor e a aquisição de ações motoras. Ambos os modelos serão, em alguma medida, retomados posteriormente, por estender sua proposição de desenvolvimento motor até o fim da vida, na terceira idade.

3.5.2 Domínio cognitivo

O desenvolvimento cognitivo abrange as operações mentais, como o raciocínio lógico (“razão”), a linguagem (identificação, produção e reprodução de símbolos que permitem comunicação), a memória, o planejamento de ações, a realização de operações matemáticas, entre outros processos de organização do pensamento.

O biólogo suíço Jean Piaget (1896‑1980) foi o proponente da Teoria dos Estágios Cognitivos, elaborando uma associação entre certos comportamentos e as faixas etárias respectivas a esses comportamentos. Ele desenvolveu um método de pesquisa com base em observações minuciosas de bebês, crianças e adolescentes, além de entrevistar seus próprios filhos e discorrer de modo pormenorizado sobre seus comportamentos.

Ele procurou compreender de que forma cada ser humano compreende a si mesmo como diferente de outro ser, e como solucionar problemas (isto é, desafios intelectuais), nas mais diversas atividades de vida diária, como em brincadeiras e no entendimento de grandezas físicas (como noções de forma e volume).

Para esse autor, a criança e o adolescente constroem relações de acordo com quatro parâmetros que se integram: objeto, tempo, espaço e causalidade (relação de causa e efeito).

Piaget estabeleceu que a cada estágio desenvolve‑se um novo modo de pensar e de responder aos estímulos do ambiente. Um estágio é baseado no anterior e constrói as bases para o seguinte. A ordem dos estágios é invariável para todas as pessoas, mas os momentos de transição (“idade”) podem ter alguma variação.

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Assim como os dois modelos de desenvolvimento motor apresentados, o modelo de Piaget para o desenvolvimento cognitivo está fundamentado no princípio de que o desenvolvimento é vitalício.

Observe o quadro a seguir, que será descrito adiante nas respectivas faixas de idade.

Quadro 4 – Estágios do desenvolvimento cognitivo proposto por Piaget

Idade Estágio

Intra‑útero a 4 meses Sensório‑motor (subestágios 1 e 2)

1 a 2 anos Sensório‑motor (subestágios 3 a 6)

2 a 6/7 anos Pré‑operatório

6/7 a 11/12 anos Operatório concreto

Acima de 12 anos Operatório formal

É importante salientar que, além de Piaget, há outros autores bastante importantes no que se refere ao tema sobre a origem e o desenvolvimento do ser humano, sendo dois deles muito expressivos e influentes nessa compreensão, com contribuições relevantes para a área da Psicologia e da Psicologia da Educação: Lev Semenovich Vygotsky e Henry Wallon. Assim como Piaget, eles têm sido adotados também para a Educação Física, principalmente na Educação Física escolar.

Se Piaget, por um lado, atribui à gênese do conhecimento a fase pré‑verbal do desenvolvimento da linguagem (no estágio sensório‑motor), Vygotsky e Wallon atribuem essa importância à fase verbal da linguagem, uma vez que essa segunda fase propicia à criança relações mais complexas com as pessoas e com demais elementos do ambiente. Vygotsky também considera que a linguagem escrita demanda um refinamento intelectual, isto é, pensamentos mais bem‑elaborados.

Vygotsky realça a importância do contexto social e histórico, desenvolvendo a Teoria Sociocultural, ao passo que Wallon reforça a importância do gesto (domínio motor) e da representação (domínio mental), além de atribuir fundamental importância ao desenvolvimento afetivo. Aliás, a rigor, Wallon não destaca o desenvolvimento cognitivo e sim a interação entre cognição, movimento e afeto.

Saiba mais

A obra a seguir (também usada neste tópico) apresenta bibliografia e principais ideias desses três pesquisadores, com a finalidade de discutir aspectos importantes relacionados à gênese (origem) do funcionamento da inteligência e da afetividade no ser humano.

LA TAILLE, Y. de; OLIVEIRA, M. K.; DANTAS, H. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992.

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Mais atualmente, o pesquisador estadunidense Howard Gardner apresentou sua teoria das inteligências múltiplas (GARDNER, 1993), a qual tem sido também bastante aceita. Essa teoria considera que a inteligência não pode ser avaliada por meio de testes de QI (quociente de inteligência), como se certa pontuação determinasse se uma pessoa é mais ou menos inteligente do que outra. Isso porque esse teste e vários outros não envolvem todas as atividades humanas valorizadas em praticamente todas as culturas – como música e esportes, por exemplo.

Assim, essa teoria procura mostrar que as avaliações da inteligência precisam abranger mais do que testes com medidas quantitativas, assim como atividades outras que não somente a linguagem gramatical, a aritmética e os problemas de lógica, pois eles não revelam todas as capacidades humanas que estão relacionadas à inteligência.

No âmbito da Educação, isso tem sido bastante aplicado (talvez nem tanto no Brasil, ainda). Por exemplo, pode‑se incentivar o desenvolvimento da linguagem mediante mímica, em vez da linguagem falada. Nesse sentido, as atividades físicas e expressivas têm sido bastante valorizadas, sendo um exemplo o ensino de conceitos de Física por intermédio da dança.

De acordo com Gardner:

Usamos uma inteligência quando nos esforçamos e solucionamos um problema ou produzimos alguma coisa valorizada pela sociedade. [...] instituir uma prática nova em qualquer área é difícil, e o processo de provocar mudanças fundamentais na prática educacional leva anos (GARDNER, 2001, p. 175).

Deve‑se destacar a importância de prestar atenção a algo muito comum em Ciência e Filosofia: assim como outros pesquisadores e pensadores como Edison de Jesus Manoel (2008), Gardner critica a própria teoria, admitindo a necessidade de diálogo com outros autores, a fim de promover uma correta interpretação de sua teoria e a renovação de seus pressupostos teóricos, conforme explicita em uma obra posterior, de 2001, intitulada Inteligência: um Conceito Reformulado.

Entenda‑se que as ideias de Gardner não substituem as de Piaget e nem têm essa pretensão. Uma das grandes preocupações de Gardner é tratar o conceito de inteligência de forma diferente do que vinha sendo considerado, e por isso enfatiza a necessidade de uma abordagem qualitativa para esse conceito e não puramente quantitativa, como dos testes de QI. Aliás, entender que o desenvolvimento cognitivo deva ser compreendido de modo qualitativo é justamente uma das bases da abordagem de Piaget.

3.5.3 Domínio emocional

Emoções, muito comumente, regulam e afetam nossas atitudes e, desse modo, constituem aspectos fundamentais da nossa formação, pois, ao se expressar, o ser humano provoca reações comportamentais e isso invoca significados que se solidificam em nossa cognição e, além do mais, estimulam afinidades atitudinais isto é, relativas a atitudes relevantes, frente às demandas situacionais e à própria existência, sobretudo quando se exercita a autorreflexão.

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Observação

Atitudes podem ser entendidas como ações imbuídas de valores morais e éticos.

Um conceito fundamental para compreender o domínio emocional é personalidade. Personalidade refere‑se a um conjunto de características psicológicas que tendem a ser estáveis em uma pessoa, por exemplo, ser tímida ou extrovertida, agressiva ou pacífica, e assim por diante. É importante notar que não se trata de algo imutável ao longo da vida e sim, como foi mencionado, tende a ser estável.

A temática das emoções tem sido tratada por diversas correntes e autores da Psicologia. Contudo, pode‑se destacar que o desenvolvimento emocional teve como precursor o médico Sigmund Freud, com a perspectiva psicanalítica, segundo a qual o desenvolvimento (não apenas o emocional) é moldado por forças inconscientes que motivam o comportamento humano.

A personalidade estaria dividida em id, ego e superego. O id está presente no recém‑nascido e representa os impulsos de prazer; o ego seria a razão, que se desenvolve gradualmente a partir do primeiro ano de vida; o superego se desenvolve aproximadamente aos cinco/seis anos de idade, inclui a consciência e a criança passa a incorporar sistemas de valores, em que há deveres e proibições impostos socialmente. O ego seria um intermediário e um mediador entre os desejos do id e as demandas exigentes do superego, podendo levar a sentimentos de culpa e frustração quando os pensamentos, sentimentos e ações da criança não correspondem ao que o superego espera. Fundamentando‑se nas relações conflituosas entre id, ego e superego, Freud atribui cinco estágios ao desenvolvimento psicossexual, nos quais as crianças tentam resolver esses conflitos (PAPALIA; FELDMAN, 2013).

A teoria de Freud é demasiado complexa para que seus outros elementos sejam elencados e discutidos no presente livro‑texto. Todavia, é importante saber que esse autor teve fundamental importância não apenas para elaborar outra “visão” sobre o desenvolvimento humano (baseado na tensão entre necessidades e desejos íntimos versus padrões sociais pré‑determinados), como também incitou uma profunda reflexão filosófica acerca da realização da felicidade individual, do preconceito étnico (posto que ele era de origem judaica e, como tal, sofreu perseguições) e do preconceito de gênero (boa parte de seus pacientes eram mulheres), e ainda revolucionou o tratamento psiquiátrico, dando oportunidade para que o paciente fosse escutado, mediante o método terapêutico que ele desenvolveu: a psicanálise, que se constitui também num diferenciado referencial teórico‑metodológico de pesquisa.

As pesquisas e intervenções profissionais de Freud encorajaram o trabalho e o desenvolvimento de estudos de outros pesquisadores, como Erik Ericsson, que conheceu Freud, modificou e ampliou sua teoria, enfatizando a importância da sociedade no desenvolvimento da personalidade e de que o ego se desenvolve por toda a vida e não somente na infância. Sua teoria é denominada desenvolvimento psicossocial.

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Convém notar que embora esses dois autores tenham sido mencionados nesse tópico sobre desenvolvimento emocional, suas teorias se estendem além desse domínio do desenvolvimento. Por exemplo, em Freud há um “apelo” para a importância de aspectos orgânicos (“biológicos”), ao passo que Ericsson destaca a influência social. Mesmo assim, as construções teóricas de ambos os autores estão presentes neste livro‑texto, ainda que de modo bastante superficial.

Saiba mais

O seguinte filme (em preto e branco) retrata a vida de Freud quando inicia sua abordagem psicanalítica, bem como seus próprios conflitos íntimos, que a impulsionaram.

FREUD – além da alma. Dir. John Huston. EUA: Universal International Pictures, 1962. 139 minutos.

3.5.4 Domínio moral

Em princípio, o domínio moral é considerado um item do desenvolvimento cognitivo, em que é apresentada a integração entre alguns domínios do desenvolvimento humano; todavia, não necessariamente ele precisa ser assim interpretado.

O desenvolvimento moral refere‑se à identificação, imitação, compreensão e elaboração de regras sociais. Está em estreita relação não apenas com o desenvolvimento cognitivo, mas também com o desenvolvimento emocional.

A moral pode ser heterônoma ou autônoma. A moral heterônoma está associada à necessidade de algo ou alguém para determinar uma conduta adequada ou inadequada; a moral autônoma está associada à ausência dessa regulação por outrem, ou seja, a própria pessoa tem condição de decidir por si mesma a forma correta de agir, sem a necessidade de intervenção de outra pessoa ou determinada religião, instituição política, conjunto de leis etc.

No processo de desenvolvimento humano, as pessoas partem da anomia (ausência de moral) e passam a uma moral heterônoma, porém nem sempre atingem autonomia moral, mesmo na idade adulta. Como exemplo, podemos citar uma pessoa que sempre necessita da opinião de um padre para saber como agir “corretamente”, isto é, seguindo padrões considerados morais, ao menos para o contexto em que ela vive.

Os diversos conceitos de justiça e seus diferentes modos de aplicação são estudados no desenvolvimento moral ao longo das faixas etárias. É importante considerar que há grandes divergências entre as mais diferentes culturas em questões bastante polêmicas envolvendo direitos e deveres humanos.

O desenvolvimento moral foi bastante investigado por Piaget. Fundamentando‑se em seus estágios de desenvolvimento cognitivo, Lawrence Kohlberg aperfeiçoou os estudos de Piaget e propôs seis

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estágios de desenvolvimento moral; contudo, esse autor chegou a pensar na possibilidade de um sétimo estágio, em que as pessoas têm uma preocupação com os efeitos de suas ações não apenas sobre outras pessoas, mas sobre todo o universo (por exemplo, pessoas fortemente envolvidas em preservação do meio ambiente).

De acordo com Papalia e Feldman (2013), outra pesquisadora importante nesse tema é Carol Gilligan, que investigou mais especificamente o desenvolvimento moral em mulheres de diferentes idades. Há algumas evidências de que as mulheres tendem a se preocupar mais com o cuidado (responsabilidades) pelos outros, ao passo que os homens preocupam‑se mais com o que é justo ou injusto. Entretanto, esses resultados também não são conclusivos.

O que se tem aceitado atualmente a respeito do desenvolvimento moral é que:

• ambas as teorias (de Kohlberg e de Gilligan) corroboram que o nível mais elevado do desenvolvimento moral é o que envolve a responsabilidade sobre outra pessoa;

• em ambos os sexos manifestam‑se a compaixão, o cuidado e os vínculos com outras pessoas;

• o desenvolvimento moral envolve também e fortemente o aspecto emocional e de relações sociais e não apenas o aspecto cognitivo;

• diferentes culturas apresentam sistemas de valores morais diversos, e que mudam ao longo do tempo.

Saiba mais

A obra a seguir fundamenta parte significativa de todos os temas deste material de estudo:

PAPALIA, D. E.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. 12. ed. Porto Alegre: AMGH, 2013.

Mais especificações a respeito das teorias de Freud e Erickson encontram‑se nas páginas 59 a 62 dessa obra indicada, e os seis estágios do raciocínio moral de Kohlberg, na tabela 11.3 (p. 409 – 410).

Há edições anteriores dessa mesma obra, sendo uma delas a seguinte:

PAPALIA, D. E.; OLDS, S. W.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. 8. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006.

Essa obra é encontrada nas bibliotecas de vários campus da UNIP.

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A ética, tão associada à moral, pode ser definida como:

[...] uma parte da filosofia que se ocupa com os critérios de correção ou incorreção de ações humanas no que se refere especialmente a suas relações com outros humanos, entendendo‑se correção não apenas num sentido técnico ou instrumental, mas como consideração pelos interesses de outros e disposição de agir em consequência, mesmo acarretando dificuldades (CABRERA, 2014, p. 91).

Há inúmeros estudos clássicos e contemporâneos discutindo relações de similaridade ou de divergência entre os conceitos de moral e ética. A palavra Ética grafada com letra inicial maiúscula, na definição, refere‑se a um campo de conhecimento, porém, quando se pensa em atitudes éticas está‑se referindo a ações em que uma pessoa (ou grupo de pessoas) leva em consideração os valores relacionados à dignidade humana, muitas vezes, suplantando regras sociais, a fim de realizar um bem maior para alguém, como direito à vida, à liberdade, ao respeito.

Talvez estudar Ética não seja tarefa tão difícil quanto desenvolver um “fazer ético”, ou seja, realizar intervenções a favor de interesses de outras pessoas e não apenas em benefício próprio.

Um filósofo contemporâneo que desenvolve reflexões sobre ética e alteridade (isto é, a relação do “eu” com “outro”) é Emmanuel Lévinas. Outro pesquisador que se dedica a estudos sobre ética e moral é Yves de La Taille.

Saiba mais

A seguir, fazemos indicações das obras desses autores:

LÉVINAS, E. Entre nós: ensaios sobre alteridade. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2010.

LA TAILLE, Y. de. Vergonha: a ferida moral. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2004.

LA TAILLE, Y de. Formação ética: do tédio ao respeito de si. Porto Alegre: Artmed, 2009.

Em certo sentido, pode‑se dizer que a pessoa com preocupações éticas procura se colocar na situação do outro, na tentativa de compreender um pouco de seus sentimentos, ideias e posicionamentos. Além disso, um fazer ético pressupõe que o outro (seja uma pessoa, outro ser vivo e até mesmo um objeto ou o meio ambiente) jamais deverá ser um meio para que outra pessoa atinja a felicidade, ainda que essa satisfação seja fugaz (isto é, passageira). Um exemplo: uma pessoa convida um amigo para uma festa porque ele tem carro para lhe dar carona e não porque ela gostaria que ele fosse por gostar de sua companhia. Nesse caso, o amigo seria um meio para sua comodidade; e mesmo que ele espontaneamente quisesse ir à festa, chamá‑lo só

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por causa da carona não seria ético, pois para a pessoa, ele continuaria sendo apenas um meio para ela obter vantagem.

No Brasil, por fortes aspectos culturais de subordinação e opressão, é comum as pessoas agirem de forma moral, ou seja, seguindo regras, porém nem sempre de forma ética. Há também muitas pessoas que denotam atitudes imorais.

De modo simplificado, é possível afirmar que o ensinamento atribuído a Jesus Cristo: “Amai ao próximo como a ti mesmo”, é uma noção ética de relação interpessoal (intersubjetiva). Para não causar distorções (outros sentidos) que o verbo amar pode suscitar, um raciocínio semelhante seria substituí‑lo pelo verbo “respeitar”. “Respeite o outro como a você mesmo”, já seria bastante satisfatório e conferiria a preservação do sentimento de dignidade para ambas (ou mais) pessoas, por exemplo.

No âmbito da Educação Física e do Esporte, seria adequado atribuir esse pensamento ao fair play, popularmente traduzido como “jogo limpo”, em que não se usa prejudicar o adversário além do que as regras do jogo (ou esporte) permitam. Aliás, tanto os jogos envolvendo ao menos dois opositores como as várias modalidades esportivas podem e devem ser trabalhados para que as pessoas envolvidas (estudantes, participantes, jogadores, atletas, técnicos, entre outros) entendam que o respeito às regras, além de importante para o equilíbrio da própria diversão, é também uma forma de respeitar o oponente, o parceiro de equipe, o árbitro e assim por diante.

Aspectos do esporte e do jogo serão retomados adiante, na fase da adolescência.

3.5.5 Domínio social e cultural

O psicólogo cultural Ernst Boesch (que estudou com Piaget), definiu o conceito de cultura como segue:

Cultura é um campo de ação, cujos conteúdos variam de objetos feitos e usados pelos seres humanos a instituições, idéias e mitos. Sendo um campo de ação, a cultura oferece possibilidades, mas na mesma medida, estipula condições para a ação; ela circunscreve metas que podem ser atingidas por certos meios, mas também estabelece limites para ações corretas, possíveis e ainda, desviantes. [...] Como campo de ação, a cultura não só induz e controla ação, mas é também continuamente transformada por ela; portanto, cultura é tanto processo quanto estrutura (BOESCH, 1991, p. 29 tradução nossa).

Sociedades mais complexas, isto é, com mais de um modo de produção (agricultura, indústria), bem como aquelas que apresentam amplas relações comerciais e diferentes tipos de organização, não raro apresentam mais de uma cultura ou diferentes subculturas que perfazem uma “cultura maior”, por exemplo, a cultura urbana, que contém hábitos próprios relativos a transporte, alimentação, lendas típicas etc.

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A influência entre cultura e sociedade é recíproca e muito difícil de ser estudada, em razão justamente da complexidade e diversidade de relações. A Sociologia e a Antropologia se ocupam diretamente da compreensão desses dois fenômenos.

Na proposta desta disciplina, é importante ressaltar que tanto cultura como sociedade não são partes acessórias do desenvolvimento humano. Pelo contrário, estudar qualquer outro domínio do desenvolvimento humano sem estabelecer relações de igual importância com os domínios social e cultural não abarca o ser humano com a devida importância de ser, para além de um indivíduo, uma pessoa.

Figura 7 – Pirâmides do Egito

Figura 8 – Livros

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Essas duas figuras representam meios diferentes de preservar a história de culturas e sociedades diversas – da mais suntuosa, a pirâmide egípcia, até a mais simples, porém não menos valiosa: o livro.

Saiba mais

O JULGAMENTO de Nuremberg. Dir. Stanley Kramer. EUA: Roxlom Films Inc. 1961. 186 minutos.

Exemplo de aplicação

O filme anterior expõe todo o dilema ético e moral de um alto membro do exército nazista: um juiz que causou a execução inúmeras pessoas durante a II Guerra Mundial, com mais alguns colegas também juízes, serão agora julgados pro um tribunal estadunidense. O principal julgador desses juízes também vive um conflito ético e moral. Sugere‑se assistir ao filme e refletir a respeito da eugenia e do preconceito étnico contra judeus e outros povos perseguidos pelos alemães e outros simpatizantes do nazismo, causando um fenômeno inédito na história: a tortura e o massacre, em massa, oriundos da ignorância científica sobre a origem do homem e da perseguição insana pelo poder.

3.6 A integração polêmica de dois domínios do desenvolvimento: razão e emoção

É imperioso esclarecer que a complexidade e profundidade dos estudos desses autores apresentados e de muitos outros pesquisadores que buscam a compreensão do desenvolvimento humano, nos seus variados aspectos (domínios), não supõe que um aspecto comportamental se sobreponha a outro em importância: todos são importantes e estão interrelacionados. A Educação Física, em maior ou menor grau, tangencia todos eles e se aprofunda em alguns, a depender do interesse de pesquisa e do encaminhamento da atuação profissional.

Saiba mais

A seguinte coleção de vídeos, em DVD, composta por quatro volumes, aborda fundamentos e proposições práticas a respeito dos conceitos de movimento, ação motora, zona de desenvolvimento proximal (da teoria de Vygotsky) e aspectos da teoria piagetiana, tendo em vista as possibilidades e questões a respeito da aplicabilidade desses conhecimentos na Educação Física escolar e até mesmo em outros contextos escolares e sociais.

MANOEL, E. J.; PROENÇA, J. E. de; FERRAZ, O. L. Educação física na escola. São Paulo: Atta, 2009. 4 CD‑ROM.

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Razão e emoção, embora sendo objetos de investigação em Psicologia, constituem construtos que são estudados por essa área, ora em separadamente, ora relações de causalidade, ora em integração, e de acordo com diversos pressupostos filosóficos, epistemológicos e de procedimentos de pesquisa (SOUZA, 2006).

Observação

Epistemologia refere‑se ao estudo de teorias, postulados e métodos de conhecimento de qualquer área de estudos. Por exemplo, epistemologia da Educação Física, da Matemática etc.

Essas diferenças de posicionamentos nas pesquisas em Psicologia podem trazer implicações importantes para a área de Educação Física que, conforme exposto anteriormente neste trabalho, têm apresentado uma tendência a tratá‑los como instâncias separadas nos estudos sobre prática de atividade física e sobre aprendizagem de movimentos, isto é, ou se investiga a influência de aspectos cognitivos na Educação Física e Esporte, ou de aspectos afetivos; assim, o caráter de complementaridade e dualidade entre cognição e emoção acaba por se fazer pouco presente nas investigações acadêmicas e na atuação pedagógica.

Essa separação não é somente uma escolha metodológica, mas um posicionamento epistemológico, que passa a ser disseminado tanto no meio acadêmico de pesquisa como nos cursos de formação em Educação Física.

E por que conceber afetividade (emoção) e cognição como instâncias comportamentais separadas torna‑se uma preocupação?

O motivo que justifica tomar certo cuidado com essa concepção refere‑se à própria compreensão acerca do desenvolvimento humano (tanto do ponto de vista ontogenético, como filogenético) e, consequentemente, na forma de se lidar com os seres humanos – que, assim como em qualquer outra área de fronteira entre saúde e educação, é o caso da Educação Física.

A formação em Educação Física envolve disciplinas abordando temas como psicologia da aprendizagem e do desenvolvimento, crescimento e desenvolvimento humano, educação física adaptada a pessoas com deficiências e outras necessidades especiais etc., cuja aplicabilidade de trabalho depende de embasamentos teóricos sobre o desenvolvimento do ser humano, que serão retomados em disciplinas de cunho pedagógico no decorrer da graduação e pós‑graduação.

Obviamente, contudo, a preocupação estende‑se além da formação acadêmico‑pedagógica, ou seja, abarca a atuação profissional.

Um indicativo do problema de isolar ora cognição, ora afetividade, pode ser identificado quando se ministram aulas sobre o desenvolvimento cognitivo, por exemplo. É de se esperar que Jean Piaget seja um dos autores abordados para essa finalidade, por ser conhecido como estudioso e proponente de uma teoria

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sobre o desenvolvimento cognitivo, conforme visto há pouco. Entretanto, não é comum associar Piaget à compreensão da afetividade, e essa falta de associação constitui um equívoco.

Segundo Souza (2002; 2006), Piaget considerava a afetividade absolutamente importante para a construção do conhecimento, bem como para o desenvolvimento mental. A autora afirma que, ao estudar relações entre afetividade e cognição, Piaget tinha também o intuito de desfazer a dicotomia razão – emoção, pois, embora concebesse afetividade e cognição como de naturezas diferentes, entendia que elas não apenas são imprescindíveis no desenvolvimento psicológico humano, mas que existe certa correspondência temporal entre as sequências de estágios em que ambas se desenvolvem. Portanto, para Piaget, as relações entre afetividade e cognição não são de causa e efeito, mas de complementaridade (SOUZA, 2006).

Quanto à diferença de naturezas entre afetividade e cognição, essa autora aponta que, na perspectiva piagetiana, “a afetividade é responsável pelos conteúdos da conduta (prazeres e desprazeres; sentimentos de fracasso e sucesso), enquanto a inteligência organiza estruturalmente a mesma conduta [...]” (SOUZA, 2006, p. 58).

De acordo com a autora, a importância conjunta de afetividade e inteligência na construção do conhecimento é notadamente representativa na teoria de Piaget sobre o desenvolvimento moral na criança.

É certo que o presente trabalho não tem como foco contemplar a grandiosidade da teoria de Jean Piaget, mas sim de apontar para a necessidade de estudar cuidadosamente as ideias de autores da Psicologia, notadamente os que estão sempre em pauta na formação em Educação Física, como é o caso de Piaget. Esse cuidado pode auxiliar a dimensionar melhor o alcance do aproveitamento das teorias em Psicologia para a área da Educação Física.

Por exemplo, convém lembrar que Piaget procurou elaborar uma teoria sobre a gênese da construção do conhecimento no sujeito, o qual ele denominou sujeito epistêmico, que é o próprio ser (em sentido amplo, não em cada indivíduo) (SOUZA, 2006). Sob essa perspectiva, desdobra‑se um aspecto muito importante: a questão da generalização, pois, ao entender que essa teoria explica funções psicológicas gerais, pode‑se correr o risco de julgá‑la suficiente para explicar toda e qualquer manifestação ou nuança das funções cognitivas – como, por exemplo, dificuldade na compreensão de conteúdos teóricos, problemas de encadeamento lógico – seja na verbalização, seja na elaboração de textos escritos, etc.

Talvez pela estreita relação com as funções cognitivas, ou pela própria valorização sócio‑histórico‑cultural do intelecto – como já mencionado – a discussão acerca do processo de ensino e aprendizagem em vários níveis de ensino na escola tem atribuído pouca importância à afetividade como objeto de estudo.

É curioso saber que, mesmo na Psicologia, a afetividade custou a ser reconhecida como inerente à natureza humana (VALSINER, 2006; SIMÃO, 2010). Simão (2010, p. 61) chama a atenção para a o entendimento de Valsiner (2001 apud SIMÃO, 2010) sobre a importância da afetividade no processo de desenvolvimento humano, explicitada a seguir:

A vida humana afetiva é a base para todas as condutas. O desenvolvimento da relação afetiva com o mundo é provavelmente a questão mais básica da

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psicologia do desenvolvimento. Não é uma questão de “tempero afetivo” adicionado a processos cognitivos. É a relação afetiva com o mundo que é a base de todos os processos mentais (VALSINER, 2006, p. 159, grifo do autor).

De acordo com esse pensamento, o autor alerta não apenas para a complementaridade entre cognição e afetividade, mas também para mais dois pontos de grande importância: a afetividade como essencial para os processos cognitivos; a relação afetiva da pessoa com o mundo, como indispensável para sua atuação no mundo. É imprescindível destacar que Valsiner não está atribuindo uma supremacia da afetividade sobre a cognição (ou vice‑versa). Assim como qualquer domínio do desenvolvimento humano, a relevância de ambos é recíproca e inegável.

Figura 9 – Objeto (do tipo jarro) retratando uma luta esportiva; à esquerda, o árbitro da luta. (Museu de Arqueologia de Atenas, Grécia)

A luta ilustrada nessa foto retrata uma atividade comum na Grécia Antiga e está sendo usada aqui para representar a integração de alguns domínios do desenvolvimento humano: cognitivo, em razão do raciocínio envolvido na tomada de decisão na escolha da melhor estratégia para vencer o oponente; cultural, pois que era uma atividade típica de homens mais jovens; social, porque além do divertimento, era uma necessidade saber lutar para defender o território; físico, pois a força muscular é bastante importante para a vitória; motor, pela necessidade de equilíbrio e, possivelmente, algumas técnicas de movimento; moral, pois as regras deveriam ser cumpridas e sua efetivação era acompanhada por um árbitro. O domínio emocional, segundo explicitado anteriormente, é indissociável dos demais, ainda que possa não ser prioritário nessa situação.

4 O CICLO DE VIDA E AS FAIXAS ETÁRIAS

Em primeiro lugar, convém ressaltar que essa divisão tem o intuito de situar, isto é, de aproximar a ocorrência de um evento ao longo dos processos de crescimento e desenvolvimento humano e não associar esse evento de forma absoluta à determinada idade. Isso não seria realmente possível em razão das variações que já foram mencionadas. Por isso, determinada idade ou faixa de idade deve ser um critério e não o único critério para a ocorrência de determinado evento, estado ou característica nesses processos.

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O que será apresentado a seguir é uma aproximação de um “modelo” de divisão por faixas etárias e os respectivos nomes desses períodos, mas esse não é o único (PAPALIA; FELDMAN, 2013).

• Período pré‑natal: da concepção ao nascimento.

• Primeira infância– do nascimento aos 3 anos de idade.

• Segunda infância: dos 3 aos 6 anos de idade.

• Terceira infância: dos 6 aos 11 anos de idade.

• Adolescência: dos 11 aos 20 anos de idade.

• Adulto jovem (ou início da idade adulta): de 20 a 45 anos de idade.

• Adulto de meia‑idade (ou vida adulta intermediária): de 40 a 65 anos de idade.

• Terceira idade (ou vida adulta tardia ou velhice): de 65 anos de idade em diante.

É importante saber que:

• Há outras divisões etárias, a depender dos diferentes estudiosos. Por exemplo, Malina, Bouchard e Bar‑Or (2009), dividem a primeira infância do nascimento aos dois anos de idade e dos dois aos seis anos.

• A puberdade corresponde à entrada na adolescência, fazendo parte desse período etário (adolescência) e, em média, corresponde ao período entre 11 e 13 anos de idade.

• A infância é também dividida de outro modo, bastante usado no Brasil, qual seja: primeira infância: de zero a dois anos de idade (“bebê”) e de dois a seis anos de idade; segunda infância: de seis a 11 anos de idade.

• Observa‑se, então, que de acordo com essa outra classificação, a primeira infância englobaria a primeira e a segunda infância do modelo anterior, ao passo que a segunda infância deste modelo corresponderia à terceira infância do modelo anterior. A escolha por uma ou outra divisão vai depender do autor ou da finalidade ou do enfoque de quem estuda cada uma das faixas etárias.

4.1 Para mais reflexões sobre o ciclo de vida e a atuação profissional

Seja durante caminhadas e corridas por parques, ruas, seja praticando esportes ou ginástica, na educação física na escola, clubes e academias, o que salta aos olhos de quem observa alguém em movimento é o corpo – tanto em sua forma como em sua função: do belo desenho das definições musculares ao considerado “inadequado” rascunho do excesso de gordura e celulites; do corpo rápido, novo, compacto, leve e dinâmico (isso é, que tem movimento), ao corpo lento, envelhecido, excedente,

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pesado e estático. Sim, no campo da Educação Física, o movimento é primordial e intimamente relacionado com manifestações culturais como danças, artes marciais, esportes, jogos, brincadeiras. Essas manifestações são ou deveriam ser trabalhadas na educação física escolar – durante não menos do que 11 anos de nossas vidas – bem como valores e atitudes a elas agregados.

E, embora não seja nosso foco discutir a educação física escolar, vale lançar uma questão: o que temos feito “dos corpos” de crianças e adolescentes ao longo desses, no mínimo, 11 anos que eles passam na escola? Estamos atentos às subjetividades dos corpos infantis e adolescentes? Quais os desdobramentos desses corpos na posteridade?

Por que as questões de sexo e gênero continuam tão recorrentes na atuação profissional, bem como o embate competição versus cooperação?

Para os corpos adultos, resta o treinamento individualizado (personal training) – e basta? E para os idosos, fica a promessa da longevidade? Qual é nossa relação com esses corpos, com suas potencialidades, seus alcances e limites? É certo que neste momento ninguém tem competência para responder essas questões, porém está lançada uma “semente de inspiração” para que nos debrucemos sobre elas.

Ainda assim, fica uma sugestão: pensar a atuação profissional, a relação com nossos alunos‑clientes. A reflexão já começou. Ela não se encerra com o processo de desenvolvimento. Ela deve ser constante, diária e perpétua.

Resumo

O estudo do ser humano constitui um grande desafio, pois compreendê‑lo, ao menos parcialmente, requer um exercício de aproximação e afastamento, tanto da pessoa que imaginamos estar estudando, como por causa de nossa tão peculiar característica reflexiva que a todos nós toma: estudar o processo de crescimento e desenvolvimento humano é, antes de tudo e permanentemente, estudar a si mesmo.

Compreender o ser humano em sua totalidade talvez seja impossível, em razão de que dada a complexidade e as surpresas que o constituem, ou seja, do que nem sempre pode ser previsto não necessariamente ele é controlável.

Como primeiro passo para o estudo dessa disciplina, sugeriu‑se uma série de fontes de pesquisa, como livros, periódicos acadêmico‑científicos, visitas a museus, assistir a filmes, peças de teatro, apresentações de dança, frequentar feiras‑livres e quaisquer outros entretenimentos que envolvam pessoas e, tanto quanto possível, pessoas um tanto diferentes, uma vez que a Educação Física se propõe a lidar com toda e qualquer pessoa – e efetivamente é assim que se realiza a atuação profissional. É

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típico do cotidiano o “encontro” com muitas pessoas. É necessário que o estudante/futuro profissional as identifique, observe e estude.

Após essas sugestões de instrumentalização para o estudo do crescimento e desenvolvimento humano, procurou‑se abordar conceitos como evolução e história, assim como a controvérsia sobre a noção de raça, cuja validade não mais é aceita nem pela Biologia, nem pela Etnologia (ramo da Antropologia).

Em seguida, foram apresentados de modo muito simplificado alguns “caminhos” possíveis sobre a evolução do homem, levando em conta a fragilidade dos materiais encontrados, mas que ainda assim fornecem indícios consistentes de que a origem do homem moderno (como é chamado o Homo sapiens sapiens) – ou seja, nós – é resultado de uma interação complexa entre predisposições biológicas ao raciocínio antecipatório, à linguagem e a uma imaturidade ao nascer, “justificando” o longo processo de crescimento e desenvolvimento no exterior do ventre materno. Quanto dessas predisposições favoreceu o lado cultural do ser humano ainda leva a muitas indagações, pois parece que ambas as características – biológica e cultural – teceram‑se simultânea e vagarosamente, ou seja, em interrelação.

Muito importante também é compreender as mudanças estruturais pelas quais passaram os hominídeos, como a locomoção em postura bípede, que conferiu liberdade às mãos, permitindo deslocamento seguro enquanto carrega ou manipula um objeto, o crescimento e desenvolvimento cerebral, com áreas bastante especializadas e conectadas entre si, a destreza manual, cujo desempenho preciso em tarefas das mais variadas se deve à possibilidade do “movimento de pinça”, isto é, à oposição entre os dedos polegar e indicador. Essas são apenas algumas das características filogenéticas, isto é, típicas da espécie humana.

Quanto ao desenvolvimento individual, isto é, de cada pessoa, é denominado ontogenético. Em virtude do entendimento cotidiano, porém pouco fundamentado cientificamente, uma série de equívocos está presente no imaginário popular quando se trata dos fenômenos e dos conceitos de crescimento e desenvolvimento humano. Por isso, procurou‑se esclarecê‑los, atribuindo ao crescimento a noção de um processo de aumento quantitativo de uma ou mais estruturas corporais, e ao desenvolvimento, a noção de mudanças e manutenções em vários aspectos ao longo de um processo que abrange todo o ciclo de vida, ou seja, da concepção à terceira idade.

Há vários “setores” do desenvolvimento humano, chamados de domínios, dimensões, aspectos ou esferas, que são estes: motor, cognitivo, físico, emocional, cultural, social, moral, entre outros.

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A identificação de cada um desses domínios, ou seja, a distinção entre um e outro nem sempre é nítida quando se trata desse fenômeno tão complexo que é o ser humano, motivo pelo qual se discute um pouco da dicotomia razão‑emoção, com certos desdobramentos para a Educação Física.

A divisão do ciclo vital em faixas etárias varia de pesquisador para pesquisador, a depender de qual critério eles considerem mais adequado para a divisão que pretendem elaborar. Em qualquer dos casos, não se deve supor uma “quebra” na continuidade dos processos de crescimento e desenvolvimento humano, mas uma facilitação para a compreensão gradativa desses fenômenos e dos conceitos a eles associados.

Diante de tantos temas importantes próprios dos processos vitais, buscaram‑se algumas especificações e destaques para cada faixa etária.