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A CRÍTICA DA RAZÃO INSTRUMENTAL Seyla Benhabib Os membros e afiliados do Institut für Sozialforschung, Max Horkheimer, Theodor Adorno, Herbert Marcuse, Leo Löwenthal, Friedrich Pollock e Walter Benjamin, desenvolveram sua teoria numa época em que o desencanto com a primeira experiência de socialismo na União Soviética e, em especial, as experiências do fascismo europeu e da destruição das comunidades judaicas da Europa haviam frustrado todas as esperanças de uma transformação revolucionária do capitalismo a partir de dentro. 1 A teoria crítica viu-se confrontada com a tarefa de pensar o "radicalmente outro". Em seu Prefácio de 1971 ao livro de Martin Jay, A imaginação dialética, Horkheimer escreveu: "O apelo a um mundo inteiramente outro [ein ganz Anderes] que não este teve, primordialmente, um impulso sociofilosófico. (...) A esperança de que o terror terrestre não detenha a última palavra é por certo um desejo não científico." 2 Horkheimer traça aí uma distinção entre a verdade filosófica e a científica, e atribui à filosofia a tarefa de pensar "o inteiramente outro". Em resposta à discussão gerada no Zeitschrift für Sozialforschung pelapublicação, em 1937, do ensaio de Horkheimer intitulado "Teoria tradicional e critica", Marcuse formulou essa questão de maneira ainda mais incisiva: Quando a verdade não é realizável dentro da ordem social existente, ela simplesmente assume para esta o caráter de utopia. (...) Tal transcendência não depõe contra, mas a favor da verdade. O componente utópico na filosofia foi, durante muito tempo, o único fator progressista, como a constituição do melhor Estado, do prazer mais intenso, da perfeita felicidade, da paz eterna. (...) Na teoria crítica, a obstinação há de ser mantida como

Critica Norma e Utopia-A Crítica Da Razão Instrumental(1)

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A CRTICA DA RAZO INSTRUMENTAL

Seyla Benhabib

Os membros e afiliados do Institut fr Sozialforschung, Max Horkheimer, Theodor Adorno, Herbert Marcuse, Leo Lwenthal, Friedrich Pollock e Walter Benjamin, desenvolveram sua teoria numa poca em que o desencanto com a primeira experincia de socialismo na Unio Sovitica e, em especial, as experincias do fascismo europeu e da destruio das comunidades judaicas da Europa haviam frustrado todas as esperanas de uma transformao revolucionria do capitalismo a partir de dentro.1A teoria crtica viu-se confrontada com a tarefa de pensar o "radicalmente outro".

Em seu Prefcio de 1971 ao livro de Martin Jay,A imaginao dialtica,Horkheimer escreveu: "O apelo a um mundo inteiramente outro[ein ganz Anderes]que no este teve, primordialmente, um impulso sociofilosfico. (...) A esperana de que o terror terrestre no detenha a ltima palavra por certo um desejo no cientfico."2Horkheimer traa a uma distino entre a verdade filosfica e a cientfica, e atribui filosofia a tarefa de pensar "o inteiramente outro". Em resposta discusso gerada noZeitschrift fr Sozialforschung pelapublicao, em 1937, do ensaio de Horkheimer intitulado "Teoria tradicional e critica", Marcuse formulou essa questo de maneira ainda mais incisiva:

Quando a verdade no realizvel dentro da ordem social existente, ela simplesmente assume para esta o carter de utopia. (...) Tal transcendncia no depe contra, mas a favor da verdade. O componente utpico na filosofia foi, durante muito tempo, o nico fator progressista, como a constituio do melhor Estado, do prazer mais intenso, da perfeita felicidade, da paz eterna. (...) Na teoria crtica, a obstinao h de ser mantida como uma qualidade genuna do pensamento filosfico.3

Nenhuma dessas formulaes capta adequadamente a mescla singular de reflexo filosfica e pesquisa social cientfica conhecida como "teoria crtica", que os membros da Escola de Frankfurt elaboraram na dcada de 1930.4Aplicando o "materialismo histrico a ele mesmo" (Korsch), eles puderam analisar as condies histricas da possibilidade da economia poltica marxista e, desse modo, confrontaram-se com a tarefa de articular uma "teoria crtica da transio" do capitalismo liberal de mercado para uma nova formao social, que denominaram, no sem ambigidade, de "capitalismo de Estado". Seus esforos alteraram o prprio sentido da crtica social marxista e da crtica das ideologias.

[...]

1. DA CRTICA DA ECONOMIA POLTICA CRTICA DA RAZO INSTRUMENTAL

A evoluo do programa de pesquisas do Institut fr Sozialforschung pode ser dividida em trs fases distintas: a fase do "materialismo interdisciplinar" de 1932-37, a abordagem da "teoria crtica" de 1937-40 e a "crtica da razo instrumental" do perodo de 1940 a 1945.5Cada uma dessas mudanas ocorreu na esteira das experincias histricas desse perodo turbulento: as perspectivas do movimento da classe trabalhadora na Repblica de Weimar, a avaliao da estrutura social da Unio Sovitica e a anlise do fascismo deram margem a alteraes fundamentais na teoria. Esses acontecimentos levaram a teoria crtica a reformular a compreenso que tinha de si mesma: redefiniram-se as relaes entre a teoria e a prtica e entre os sujeitos e os destinatrios da teoria, enquanto a interdependncia entre a filosofia e as cincias, a teoria crtica e o marxismo, foi reconceituada.

O ensaio de 1937 sobre a "Teoria tradicional e crtica" foi escrito num perodo em que a derrota do movimento da classe trabalhadora alem e de seus partidos pelo fascismo parecia completa, e em que o terror stalinista e os "expurgos" subseqentes no aparelho de poder sovitico haviam destrudo todas as iluses a respeito dessa primeira experincia de socialismo. Essas experincias refletiram-se numa reformulao da relao teoria/prxis, bem como numa redefinio fundamental dos destinatrios da teoria.

Enquanto, no perodo precedente a 1937, a verdade era definida como "um aspecto da prxis correta",6que mesmo assim tinha que ser distinguido do sucesso poltico imediato, na "Teoria tradicional e crtica" a relao entre a verdade terica e a prxis poltica de grupos sociais especficos comeou a parecer cada vez mais remota. Em 1934, Horkheimer ainda pudera escrever:

O valor de uma teoria determinado por sua relao com as tarefas, que so empreendidas[in Angriff genommenl,em momentos histricos definidos, pelas foras sociais mais progressistas. E esse valor no tem validade imediata para toda a humanidade, mas, a princpio, apenas para o grupo interessado nessa tarefa. O fato de o pensamento, em muitos casos, haver-se realmente alienado das questes da humanidade sofredora justifica, entre outras coisas, a desconfiana em relao aos intelectuais. (...) Portanto, essa acusao contra a intelectualidade aparentemente descompromissada[unbedingte](...) correta nessa medida, j que esse descompromisso [Beziehungslosigkeit]do pensar no significa liberdade de julgamento, mas uma falta de controle do pensamento com respeito a suas prprias motivaes.7

Na "Teoria tradicional e crtica", em contraste, Horkheimer enfatiza, no acomunhode objetivos, mas o possvelconflito"entre os setores avanados da classe e os indivduos que dizem a verdade a respeito dela, bem como o conflito entre os setores mais avanados, com seus teorizadores, e o restante da classe".8A unio das foras sociais que prometem a libertao conflitiva. Em vez de uma aliana com as foras progressistas da sociedade, em relao a cujas tarefas o "valor" da teoria seria determinado, Horkheimer passou a enfatizar o valor da atitude crtica do pensador, cuja relao com essas foras sociais foi vista como sendo de conflito potencial e crtica agressiva.

Essa verdade evidencia-se claramente na pessoa do teorizador: ele exerce uma crtica agressiva contra os apologistas conscientes dostatus quo,mas tambm contra as tendncias perturbadoras, conformistas ou utpicas em sua prpria casa.9

No h nenhuma convergncia necessria entre a teoria da sociedade com um propsito emancipatrio e a conscincia emprica da classe ou grupo social que seria agente da transformao emancipatria.

Em "Filosofia e teoria crtica", redigido em resposta discusso gerada pelo ensaio de Horkheimer, Marcuse expressou a situao existencial que isola o intelectual e o empurra "de volta para si mesmo":

Que acontece quando os progressos esboados pela teoria no ocorrem, quando as foras que deveriam levar transformao so repelidas e parecem derrotadas? A verdade da teoria to pouco contraditada por isso que, ao contrrio, surge sob um novo prisma e esclarece novas facetas e partes de seu objeto. (...) A funo cambiante da teoria, na nova situao, confere-lhe o carter de "teoria crtica", num sentido mais contundente.10

Essa "funo cambiante da teoria" assinala a crescente defasagem entre a verdade crtica do marxismo e a conscincia emprica do proletariado, que, no entanto, a teoria continua a apontar como o agente objetivo da futura transformao da sociedade.

[...]

Horkheimer sustenta que a teoria crtica marxista da sociedade continuou a ser uma disciplina filosfica, mesmo ao se engajar na crtica da economia; ele nomeia os trs aspectos que constituem o "momento filosfico" da crtica da economia poltica. Primeiro, a crtica da economia poltica mostra a "transformao dos conceitos que dominam a economia em seus opostos".11Segundo, a crtica no idntica a seu objeto. A crtica da economia poltica no reifica a economia. Defende "o conceito materialista da sociedade livre e autnoma, preservando do idealismo a convico de que os homens tm outras possibilidades que no abandonar-se aostatus quoou acumular poder e lucro".12Terceiro, a crtica da economia poltica encara as tendncias da sociedade como um todo e retrata "o movimento histrico do perodo que se aproxima do fim".13Horkheimer chama a estes os "momentos filosficos" da crtica da economia poltica, pois cada processo conceitual visa a mais do que compreender empiricamente as leis e estruturas dadas da sociedade, e julga e analisa aquilo que luz de um padro normativo, a saber, a "realizao do livre desenvolvimento dos indivduos" atravs da constituio racional da sociedade. Para Horkheimer, a crtica do dado, em nome de um padro utpico-normativo, que constitui o legado da filosofia.

[...]

1. Com a afirmao de que acrticada economia poltica mostra a "transformao dos conceitos que dominam a economia em seus apostos", Horkheimer chama a ateno para o seguinte aspecto do procedimento de Marx: partindo das definies aceitas das categorias usadas pela economia poltica, Marx mostra como estas se transformam em seus apostos. Ele no justape seus prprios padres aos utilizados pela economia poltica, mas, atravs de uma exposio e aprofundamento internos dos resultados disponveis da economia poltica, mostra que esses conceitos contradizem a si mesmos. Isso significa que, quando suas implicaes lgicas so ponderadas at o fim, esses conceitos no conseguem explicar o modo de produo capitalista. As categorias da economia poltica so avaliadas em relao a seu prprio contedo, isto , ao fenmeno que pretendem explicar, e se mostram inadequadas nesse aspecto. Essa faceta do mtodo de Marx pode ser denominada de "critica categorial" imanente.

2. O propsito dacritica desfetichizante mostrar que a realidade social do capitalismo apresenta-se aos indivduos sob uma forma necessariamente mistificada. A conscincia poltica espontnea, tanto quanto o discurso da economia poltica clssica, parte do pressuposto de que a realidade social uma esfera objetiva, regida por leis e semelhante natureza. Nem as relaes sociais nem as atividades humanas que do origem a essa aparncia de objetividade natural so levadas em conta. "O conceito materialista de uma sociedade livre e autnoma", enfatizado por Horkheimer,14s possvel quando se pressupe que os indivduos so os sujeitosconstituintesde seu mundo social. Em vez de "abandonar-se aostatus quo",eles podem reapropriar-se dessa realidade social e mold-la de maneira a faz-la corresponder aos potenciais humanos. A "convico idealista de que os homens tm essa possibilidade"15 demonstrada, para Horkheimer, pelo mtodo da crtica desfetichizante de Marx. Nesse sentido, a crtica no idntica a seu campo objetal a economia poltica. Analisando a constituio social desse campo objetal e sua transitoriedade, ela tambm traz luz as tendncias contraditrias em seu bojo que apontam para sua transcendncia. A crtica da economia poltica visa a um modo de existncia sociallivre da dominao da economia.

3. A crtica marxista do capitalismo expe as contradies e disfuncionalidades internas do sistema para mostrar como e por que elas do origem a demandas e lutas antagnicas, que no podem ser atendidas pelo presente. A teoria crtica diagnostica as crises sociais de modo a permitir e incentivar a futura transformao social. Como diz Horkheimer: "De importncia central, aqui, menos o que permanece inalterado do que o movimento histrico do perodo que se aproxima do fim."16E acrescenta: "A economia a causa primria da infelicidade, e a crtica terica e prtica deve voltar-se primordialmente para ela."17Contudo, "a transformao histrica no deixa intactas as relaes entre as esferas de cultura. (...) Por conseguinte, dados econmicos isolados no fornecem o padro mediante o qual se deve julgar a comunidade[Gemeinschaft]humana".18

Embora Horkheimer e Marcuse, co-autor do eplogo da "Teoria tradicional e crtica", percebam "a economia como a causa primria da infelicidade", eles tm perfeita conscincia de que a simples teoria das crises econmicas j no suficiente para analisar as contradies do perodo entre as duas guerras mundiais; segundo, como a transformao histrica tem uma dimenso cultural, os fenmenos de crise no so experimentados meramente como disfuncionalidades econmicas, mas tambm como crisesvividas.

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As relaes culturais e psicolgicas j so destacadas como campos em que os indivduosvivenciamas crises geradas pela economia. Apesar de causados pela economia, esses fenmenos no so de natureza econmica. Como mostram seus primeiros esforos para integrar os estudos psicanalticos de Erich Fromm no programa de pesquisas do Instituto, Horkheimer e seus colaboradores tm plena conscincia da necessidade de elaborar uma nova teoria sociocientfica da crise para lidar com os eventos histricos com que se confrontam.19

Essa breve anlise do ensaio de Horkheimer de 1937 e do eplogo de "Teoria tradicional e crtica", redigido em co-autoria com Marcuse, revela a tenso no resolvida dessas formulaes: de um lado, reconhece-se no apenas que no h convergncia entre o ponto de vista do terico e o dos movimentos da classe trabalhadora, mas tambm que, na verdade, h um hiato cada vez maior. Embora a teoria crtica denomine alguns setores da classe trabalhadora de seus "destinatrios", estes so cada vez menos considerados como um grupo social emprico; com crescente freqncia, todos os indivduos que compartilham um "senso crtico" so apontados como destinatrios da teoria. Por Outro lado, Horkheimer agarra-se firmemente critica da economia poltica como modelo de pesquisa e insiste nas influncias emancipatrias inerentes a esse tipo de crtica.

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O precrio equilbrio brilhantemente sustentado por Horkheimer em seu ensaio "Teoria tradicional e crtica" foi perturbado pelos acontecimentos histricos. Em vista das realidades da Segunda Guerra Mundial, todo o modelo marxista da crtica da economia poltica foi questionado. A passagem do modelo da "teoria crtica" para a "crtica da razo instrumental" ocorreu quando essa clivagem crescente entre a teoria e a prtica, entre os temas e os destinatrios potenciais da teoria, levou a um questionamento fundamental da prpria crtica da economia poltica. A transformao da natureza do capitalismo liberal entre as duas guerras mundiais e as conseqncias disso para a crtica marxista da economia poltica foram desenvolvidas por Friedrich Pollock num artigo publicado no ltimo nmero da publicao do Instituto, agora lanada comoEstudos de Filosofia e Cincia Social.

Em "Capitalismo de Estado: suas possibilidades e limitaes", Pollock descreve as transformaes na estrutura da economia poltica ocorridas nas sociedades ocidentais desde o trmino da Segunda Guerra Mundial como "processos transicionais que transformaram o capitalismo privado em capitalismo estatal".20Pollock acrescenta:

A aproximao mais estreita da forma totalitria deste ltimo foi feita na Alemanha nacional-socialista. Teoricamente, a forma totalitria do capitalismo de Estado no o nico resultado possvel da atual forma de transformao. mais fcil, porm, construir um modelo para ela do que para a forma democrtica de capitalismo estatal, para a qual nossa experincia nos fornece poucos indcios.21

O termo "capitalismo de Estado" indica que essa formao "a sucessora do capitalismoprivado,que o Estado assume importantes funes do capitalista privado, que os interesses voltados para o lucro continuam a desempenhar um papel expressivo, e que ela no o socialismo".22

O capitalismo de Estado transforma radicalmente as funes do mercado. Este j no atua como coordenador da produo e da distribuio. Essa funo passa a ser assumida por um sistema de controles diretos. "A liberdade de comrcio, iniciativa e trabalho fica a tal ponto sujeita interferncia governamental que praticamente abolida.Juntamente com o mercado autnomo, as chamadas leis econmicas desaparecem."23Se o livre comrcio, a livre iniciativa e a liberdade de vender a prpria mo-de-obra em suma, o mercado de trocas vo-se transformando em coisa do passado, a crtica da ordem social e poltica emergente j no pode assumir a forma de uma crtica da economia poltica. Primeiro, aestrutura institucionaldessa nova ordem social no mais pode ser definida em relao s leis do mercado e administrao impessoal da norma legal pelo Estado. A crescente estatizao da sociedade e as novas prerrogativas do Estado criam estruturas institucionais cuja importncia sociolgica requer novas categorias de anlise, alm das da economia poltica.24Segundo, se, juntamente com o "mercado autnomo", as chamadas leis econmicas tambm desaparecem, a dinmica e os potenciais de crise da nova ordem social no podem ser apresentados como contradies imanentes apenas ao funcionamento da economia.25No capitalismo de Estado, as crises econmicas so suspensas ou transformadas. Terceiro, se a liberdade de troca no mercado materializou, em certo momento, osideais normativosda sociedade burguesa liberal individualismo, liberdade e igualdade , com o desaparecimento do mercado por trs de um sistema de controles diretos, os ideais normativos do liberalismo tambm desaparecem. A crtica da economia poltica, por si s, j no pode dar acesso estrutura institucional, s ideologias normativas e aos potenciais de crise da nova ordem social.

A crtica marxista da economia poltica foi, ao mesmo tempo, uma crtica da formao social capitalista como um todo. Na fase de capitalismo liberal, era possvel apresentar uma crtica dessa formao social atravs da crtica da economia poltica, por duas razes: primeiro, de acordo com Marx, as relaes sociais de produo definiam a espinha dorsalinstitucionaldo capitalismo liberal, ao legitimarem um certo padro de distribuio de riqueza, poder e autoridade na sociedade. No capitalismo, no s a economia era "desinserida" dos limites do campo social e poltico, como essa "economia desinserida" proporcionava, por sua vez, o mecanismo de redistribuio do poder e privilgio sociais. Segundo, as relaes de troca no mercado capitalista davamlegitimao normativaa essa sociedade, na medida em que os diferenciais resultantes de poder e privilgio sociais eram vistos como conseqncias das atividades de indivduos que negociavam livremente. O "mercado autnomo" incorporava os ideais de liberdade, consentimento e individualismo que deram legitimao a essa ordem social. "Com o desaparecimento do mercado autnomo", como sugerido por Pollock, a crtica da economia poltica j no pode servir de base para uma crtica da nova formao social.

Dito de outra maneira,uma teoria social crtica do capitalismo de Estado no pode ser uma crtica da economia poltica do capitalismo de Estado, por duas razes:com o desaparecimento do mercado autnomo num sistema de controles estatais diretos, a distribuio social de riqueza, poder e autoridade torna-se "politizada". Essa distribuio j no uma conseqncia das leis de mercado, mas das diretrizes polticas. Para analisar a estrutura social do capitalismo de Estado, no se necessita de uma economia poltica, mas de uma sociologia poltica. Com a "politizao" do mercado antes autnomo, os ideais normativos e as bases ideolgicas do capitalismo liberal tambm se transformam. As formas de legitimao, no capitalismo de Estado, precisam ser reanalisadas: com o declnio do mercado autnomo, a "legalidade" tambm declina; o liberalismo transformado em autoritarismo poltico e, eventualmente, em totalitarismo.26

O ncleo do que veio a ser conhecido como "teoria social crtica da Escola de Frankfurt" no mundo de lngua inglesa, desde o final da dcada de 1960, essa anlise da transformao do capitalismo liberal do sculo XIX em democracias de massa, de um lado, e formaes totalitrias do tipo nacional-socialista, de outro. Entre 1939 e 1947, os membros da Escola de Frankfurt dedicaram-se a analisar as conseqncias econmicas, sociais, polticas, psicolgicas e filosficas dessa mudana. Enquanto o trabalho de Pollock concentrou-se na economia poltica, Franz Neumann27e Otto Kirchheimer28concentraram-se na sociologia poltica e na teoria poltica; Horkheimer, Adorno e Marcuse concentraram-se na elaborao das conseqncias sociolgicas, psicolgicas e filosficas dessa transformao.29

[...]

Embora, nesse perodo, haja diferenas entre Marcuse, de um lado, e Horkheimer e Adorno, de outro, no tocante definio poltico-econmica apropriada para o nacional-socialismo,30os dados seguintes descrevem o modelo sociolgico implcito utilizado por todos os trs:

o capitalismo liberal e a livre competio de mercado esto correlacionados com o Estado liberal, a famlia patriarcal burguesa e o tipo de personalidade rebelde, ou superego forte;

o capitalismo de Estado (Adorno e Horkheimer) ou o capitalismo monopolista (Marcuse) correlacionam-se com o Estado fascista, a famlia autoritria e o tipo de personalidade autoritrio;

ou ainda, os mesmos fenmenos econmicos esto correlacionados com as democracias de massa, o desaparecimento da famlia burguesa, o tipo de personalidade submisso e a "automatizao" do superego.

No contexto desse modelo sociolgico, que estabelece relaes funcionais entre o nvel de organizao das foras produtivas, a estrutura institucional da sociedade e as formaes da personalidade, os conceitos de "racionalizao" e "razo instrumental" so usados para descrever osprincpios organizacionaisda formao social, asorientaes de valorda personalidade e asestruturas de sentidoda cultura.

Por "racionalizao social", Adorno, Horkheimer e Marcuse referem-se aos seguintes fenmenos: o aparelho de dominao administrativa e poltica estende-se a todas as esferas da vida social. Essa extenso da dominao realizada atravs das tcnicas organizacionais, cada vez mais eficientes e previsveis, desenvolvidas por instituies como a fbrica, o exrcito, a burocracia, as escolas e a indstria da cultura. A eficincia e previsibilidade dessas novas tcnicas organizacionais so possibilitadas pela aplicao da cincia e da tecnologia, no apenas dominao de natureza externa, mas tambm ao controle das relaes inter-pessoais e manipulao de natureza interna. Esse aparelho de controle, cientfica e tecnologicamente instrumentado, funciona pela fragmentao dos processos de trabalho e produo em unidades homogneas simples; essa fragmentao acompanhada de uma atomizao social dentro e fora da unidade organizacional. Nas organizaes, a cooperao dos indivduos fica sujeita s normas e regulamentos do aparelho; fora da unidade organizacional, a destruio da funo econmica, educacional e psicolgica da famlia deixa o indivduo entregue s foras impessoais da sociedade de massas. O indivduo passa ento a ter que se adaptar ao aparelho para conseguir sobreviver.

O fato de as categorias de "racionalizao" e "razo instrumental" serem ampliadas de forma dbia, para se referirem a processos sociais, dinmica da formao da personalidade e a estruturas de sentido culturais, j indica que Marcuse, Adorno e Horkheimer superpem os dois processos de racionalizao, o societrio e o cultural, que Max Weber havia procurado diferenciar.31Essa fuso por parte deles acarreta um grande problema: embora aceitem o diagnstico weberiano dadinmicada racionalizao social no Ocidente, eles criticam esse processo do ponto de vista de um modelo no instrumental da razo. Mas essa razo no instrumental j no pode ser imanentemente ancorada na realidade e assume um carter cada vez mais utpico. Com esse passo, d-se uma mudana fundamental no prprio conceito de "crtica". Esse modelo terico, conhecido como "crtica da razo instrumental", leva a uma alterao radical dos mtodos da crtica imanente e desfetichizante, enquanto a terceira funo de uma teoria crtica a saber, o diagnstico da crise desaparece.

2. A CRTICA DA RAZO INSTRUMENTAL E SUAS APORIAS

O texto em que esse novo paradigma da teoria crtica mais explicitamente desenvolvido, e que contmin nuceboa parte da postura terica da Escola de Frankfurt depois da Segunda Guerra Mundial, Dialtica do Esclarecimento.Trata-se de um texto de difcil apreenso:32uma parcela substancial dele foi escrita a partir de notas tomadas por Gretel Adorno durante debates entre Adorno e Horkheimer. Concludo em 1944, ele foi publicado em Amsterdam trs anos depois e relanado na Alemanha em 1969. Mais de metade do texto consiste numa exposio do conceito de Esclarecimento, com duas dissertaes em apndice, uma da autoria de Adorno, sobre aOdissia,e outra redigida por Horkheimer, sobre Esclarecimento e moral.33

[...]

EmDialtica do Esclarecimento,Adorno e Horkheimer afirmam que a promessa iluminista de livrar o homem da tutela a que ele mesmo se expe no pode ser cumprida atravs da razo, que um mero instrumento da autopreservao: "A dominao mundial da natureza volta-se contra o prprio sujeito pensante; nada resta dele seno esse eu penso, eternamente idntico a si mesmo, que deve acompanhar todas as minhas representaes."34Para fundamentar essa tese, eles investigam a arqueologia psquica do eu. A histria de Odisseu lhes revela a ndoa obscura na constituio da subjetividade ocidental: o medo que o eu tem do "outro" que eles identificam com a natureza foi superado, no decorrer da civilizao, pela dominao do outro. Mas, como o outro no completamente estranho, e o eu como natureza tambm outro em relao a si mesmo, a dominao da natureza s pode significar a autodominao. O eu homrico, que distingue entre as foras obscuras da natureza e a civilizao, expressa o medo original da humanidade de ser absorvida pela alteridade. O mito, narrando o modo como o heri constitui sua identidade pela represso da variabilidade da natureza, tambm expressa o avesso dessa histria. A humanidade paga pela superao do medo do outro com a internalizao da vtima. Odisseu s escapa ao apelo das sereias submetendo-se voluntariamente a seu torturante encanto. O ato de sacrifcio encena repetidamente a identificao dos seres humanos com as foras obscuras da natureza, a fim de lhes permitir purificar a natureza dentro da prpria humanidade.35Mas, como mostra a regresso da cultura para o barbarismo promovida pelo nacional-socialismo, a astcia[List]de Odisseu, origem daratioocidental, no conseguiu superar o temor original que a humanidade tem do outro. O judeu o outro, o estranho, aquele que a um tempo humano e subumano. Enquanto a astcia de Odisseu consiste na tentativa de aplacar a alteridade atravs de um ato mimtico, tornando-se igual a ela Odisseu oferece sangue humano aos ciclopes para que o bebam, dorme com Circe e escuta as sereias , o fascismo, atravs da projeo, torna o outro idntico a ele mesmo:

Se a mimese torna-se igual ao mundo circundante, a falsa projeo torna o mundo circundante igual a ela mesma. Se, para a primeira, o exterior o modelo do qual o interior tem que se aproximar[sich anschmiegen],se para ela o estranho torna-se conhecido, a segunda transforma prontamente o tenso interior em exterioridade e carimba at o familiar como inimigo.36

A razo ocidental, que se origina no ato mimtico de dominar a alteridade igualando-se a ela, culmina num ato de projeo que, mediante a tecnologia da morte, consegue fazer a alteridade desaparecer. "A razo que suprime a mimese no simplesmente seu oposto; ela mesma mimese at a morte."37

Numa das notas anexadas ao texto, "O interesse pelo corpo", Adorno e Horkheimer escrevem:

Por baixo da histria conhecida da Europa h uma Outra histria subterrnea. Ela consiste no destino dos instintos e paixes humanos, reprimidos e deslocados pela civilizao. Da perspectiva do presente fascista, em que aquilo que estava escondido emergiu luz, a histria manifesta aparece juntamente com seu lado mais tenebroso, omitido tanto pelas lendas do Estado nacional quanto por suas criticas progressistas.38

Esse interesse na histria subterrnea da civilizao ocidental , sem dvida, o princpio norteador metodolgico da histria subterrnea da razo ocidental, que o corpo do texto desvenda. A histria de Odisseu e a do Holocausto, o mito que o Esclarecimento e o Esclarecimento que se transforma em mitologia so marcos da histria ocidental: a gnese da civilizao e sua transformao no barbarismo. Mas o implacvel pessimismo de Adorno e Horkheimer, sua simpatia declarada pelos "autores soturnos da burguesia" (Hobbes, Maquiavel e Mandeville) e por seus crticos niilistas (Nietzsche e Sade), no podem ser explicados apenas pelo carter tenebroso da histria humana naquele momento. Como eles mesmos reconhecem em seu Prefcio de 1969: "J no aderimos a tudo o que foi dito neste livro. Isso seria incompatvel com uma teoria que confere verdade um ncleo temporal, em vez de justap-la como imutvel movimentao da histria."39Mas eles insistem em que a transformao do Esclarecimento em positivismo, "na mitologia do que so os fatos", bem como a rematada identificao do intelecto com uma hostilidade ao esprito, continuam a preponderar maciamente. E concluem dizendo que "o desenvolvimento rumo integrao total, reconhecido neste livro, foi interrompido, mas no terminado".40O conceito de "integrao total" j faz eco ao diagnstico adorniano da "sociedade inteiramente governada" e tese da "unidimensionalidade", de Marcuse.41A crtica do Esclarecimento torna-se to totalizante quanto a falsa totalidade que procura criticar.

Essa "crtica totalizante" do Esclarecimento desencadeou uma ruptura radical com a concepo de teoria crtica de 1937. A histria da relao da humanidade com a natureza no revela uma dinmica emancipatria, como Marx gostaria que acreditssemos. O desenvolvimento das foras produtivas, o domnio crescente da humanidade sobre a natureza, no acompanhado por uma diminuio da dominao interpessoal; ao contrrio, quanto mais racionalizada a dominao da natureza, mais sofisticada e difcil de reconhecer torna-se a dominao social. A atividade de trabalho, ato em que o homem usa a natureza para seus fins, agindo como uma fora da natureza (Marx), de fato um exemplo da astcia humana. Como revela a interpretao de Odisseu, no entanto, esse esforo de dominar a natureza, tornando-se semelhante a ela, pago com a internalizao do sacrifico. O trabalho , efetivamente, a sublimao do desejo; mas o ato de objetivizao em que o desejo se transforma num produto no constitui um ato de auto-efetivao, mas um ato de medo que leva ao controle da natureza dentro de si mesmo. A objetivizao no a auto-efetivao, mas a abnegao disfarada de auto-afirmao.

Consideradas em conjunto, essas duas teses o trabalho como dominao da natureza e como abnegao significam que a viso marxista da humanizao da espcie atravs do trabalho social deve ser rejeitada. O trabalho social, que para Horkheimer, j em 1937, continha um fator emancipatrio e um ncleo de racionalidade, no mais olocusde nenhum dos dois. Tanto a emancipao quanto a razo tm que ser buscadas em outra instncia. O diagnstico totalizante daDialtica do Esclarecimentono nos diz onde. Essa transformao da atividade do trabalho, de atividade de auto-efetivao em atividade de sublimao e represso, cria um vazio na lgica da teoria critica. No fica claro que atividades, se que elas existem, contribuem para a humanizao da espcie no curso de sua evoluo, e alm disso, em nome de que atividades, se que elas existem, fala a prpria crtica.

[...]

Segundo Adorno e Horkheimer, a tarefa da cultura estabelecer a identidade do eu perante a alteridade, e a razo oinstrumentopelo qual isso se realiza.42A razo,ratio, a astcia do eu nomeador. A linguagem separa o objeto e seu conceito, o eu e seu outro, o ego e o mundo. A linguagem domina a exterioridade no, como o trabalho, colocando-a a servio dos seres humanos, mas reduzindo-a a um substrato idntico. Enquanto, na magia, o nome e a coisa nomeada mantm uma relao de "parentesco, no de inteno",43o conceito que substitui o smbolo mgico, no decurso da cultura ocidental, reduz "a afinidade mltipla do ser" relao entre o sujeito doador de sentido e o objeto sem sentido.44O desencanto do mundo, a perda da magia, no , primordialmente, uma conseqncia da transio da pr-modernidade para a modernidade. A transio do smbolo para o conceito j significa um desencanto. Aratioabstrai, procura compreender atravs de conceitos e nomes. A abstrao, que s capaz de apreender o concreto na medida em que consegue reduzi-lo identidade, tambm liquida a alteridade do outro. Com uma retrica implacvel, Adorno e Horkheimer rastreiam a irracionalidade e o racionalismo cultural at suas origens, isto , at a lgica identificatria que a estrutura profunda da razo ocidental:45

Quando se anuncia que a rvore j no simplesmente ela mesma, mas uma testemunha de outra, a sede do mana, a linguagem expressa a contradio que h em algo ser ele mesmo e, simultaneamente, outro alm dele mesmo, idntico e inidntico. (...) O conceito, que se gostaria de definir como a unidade caracterizadora do que englobado por ele, foi, desde o incio, muito mais produto do pensamento dialtico, pelo qual cada um sempre o que , posto que se transforma no que no .46

Aqui, a estrutura aportica de uma teoria crtica da sociedade, tal como concebida por Adorno e Horkheimer, torna-se evidente.Se a promessa do Esclarecimento e da racionalizao cultural revela apenas a culminncia da lgica identificatria, constitutiva da razo, a teoria da dialtica do Esclarecimento, feita com os instrumentos dessa mesmssima razo, perpetua a prpria estrutura de dominao que condena.A crtica ao Esclarecimento afligida pelo mesmo castigo que o prprio Esclarecimento. Essa aporia, reconhecida por Adorno e Horkheimer eles mesmos,47no resolvida, mas redimida pela esperana de que a crtica do Esclarecimento possa, ainda assim, evocar o princpio utpico da lgica no identificatria, que ela tem que negar to logo o articule discursivamente. O fim do Esclarecimento, o fim da "pecaminosidade natural da humanidade", no pode ser afirmado discursivamente. Se o Esclarecimento o auge da lgica identificatria, a superao do Esclarecimento s pode ser uma questo de restituir o direito de ser ao inidntico, ao suprimido e ao dominado. Uma vez que at a prpria linguagem oprimida pela maldio do conceito, que suprime o outro no ato mesmo de nome-lo,48podemos evocar o outro, mas no podemos nome-lo. Tal como o Deus da tradio judaica, que no deve ser nomeado mas evocado, a transcendncia utpica da histria da razo no pode ser nomeada, mas apenas reinvocada na memria do homem.

[...]

A conseqncia mais ampla do projeto denominado de "dialtica do Esclarecimento" a transformao do prprio conceito de crtica. A "dialtica do Esclarecimento" tambm pretende ser uma crtica do Esclarecimento. Quando se afirma, entretanto, que a razo autnoma apenas a razo instrumental a servio da autopreservao, o projeto kantiano de crtica, no sentido de "auto-reflexo da razo sobre as condies de sua possibilidade", radicalmente alterado. Como observam acertadamente Baumeister e Kulenkampff:

A filosofia racionalista clssica praticou a crtica s suposies dogmticas e aos falsos contedos da razo sob a forma de uma reflexo sobre seu prprio conceito puro. Com isso, entretanto, o pensamento filosfico cegou-se para a verdadeira essncia da razo e para a falha oculta no mago de seus fundamentos. Decorre da que a teoria crtica, que permanece fiel a essapretensoda razo, no mais pode assumir a forma de reflexo transcendental e no pode depender das formas existentes de filosofia tradicional. A crtica s possvel de um ponto de vista que permita questionar os componentes do conceito dominante de razo, sobretudo o contraste universal fixo entre a razo e a natureza. O conceito crtico de razo no pode ser obtido da autopreservao da razo, mas apenas da dimenso mais profundamente arraigada de sua gnese a partir da natureza.49

A reflexo da razo sobre as condies de sua possibilidade significa, pois, desvendar agenealogiada razo, descobrindo a histria subterrnea da relao entre razo e autopreservao, autonomia e dominao da natureza. Entretanto, como se supe que a prpria genealogia seja critica, e no um mero exerccio de conhecimento histrico, a questo retorna: qual o ponto de vista de uma teoria crtica que lhe permite empenhar-se numa reflexo genealgica sobre a razo, usando a mesmssima razo cuja histria patolgica ela prpria quer desvendar?50

A transformao da crtica da economia poltica em crtica da razo instrumental marca no apenas uma mudana noobjetoda crtica, porm, o que mais significativo, nalgicada crtica. Os trs aspectos previamente descritos, de crtica imanente, crtica desfetichizante e crtica como diagnstico da crise, so todos postos em questo. A crtica imanente transforma-se na dialtica negativa, a crtica desfetichizante torna-se a crtica da cultura, e o diagnstico da crise convertido numa filosofia retrospectiva da histria, com propsitos utpicos.

A crtica imanente como dialtica negativa

Segundo Adorno, a tarefa da crtica imanente transformar "os conceitos, que ela como que traz de fora, naquilo que o objeto, deixado por sua prpria conta, procura ser, e confront-lo com o que ele . Ela deve dissolver a rigidez do objeto, temporal e espacialmente fixo, num campo de tenso do possvel e do real".51Como Hegel j havia analisado na dialtica da essncia e da aparncia, aquilo que no mera iluso[Schein],mas a manifestao[Erscheinung]da essncia.52A aparncia revela e oculta sua essncia ao mesmo tempo. Se no ocultasse a essncia, ela seria mera iluso, e, se no a revelasse, no seria aparncia. Inversamente, a essncia no um simples alm. Incorpora-se no mundo atravs da aparncia. Ela "a realidade ainda inexistente daquilo que ". Dissolver a rigidez do objeto fixo num campo de tenso do possvel e do real compreender a unidade da essncia e da aparncia como efetividade. A essncia define o campo das possibilidades daquilo que . Quando a realidade da aparncia compreendida luz da essncia, isto , no contexto de suas possibilidades latentes, a realidade transforma-se em efetividade. Ela deixa de, simplesmente, ser; torna-se a atualizao de uma possibilidade, e sua efetividade consiste no fato de que ela sempre pode transformar uma possibilidade no realizada em realidade.53

Sem dvida, a crtica imanente da economia poltica tambm visou a transformar os conceitos que a economia poltica trouxe de fora "naquilo que o objeto, deixado por sua prpria conta, procura ser". Ao revelar como as categorias da economia poltica transformavam-se em seus opostos, Marx tambm estava dissolvendo o existente "num campo de tenso do possvel e do real". Em termos hegelianos, a crtica imanente sempre uma crtica do objeto, bem como do conceito do objeto. Apreender esse objeto como efetividade significa mostrar que falso aquilo que o objeto . Sua verdade que sua facticidade dada uma mera possibilidade, definida por um conjunto de outras possibilidades, que ele no . Negar a facticidade do que equivale a reconhecer que"das Bekannte berhaupt ist darum, weil es bekannt ist, nicht erkannt" "oque de conhecimento geral o por ser notrio, no conhecido".54Isso implica que um modo de conhecer que hipostasia o que no um conhecimento verdadeiro. O verdadeiro conhecimento especulativo, o ponto de vista do conceito, est em apreender a unidade da aparncia e da essncia e em compreender que o real, por ser possvel, tambm necessrio, e por ser necessrio, tambm uma possibilidade.

Adorno transforma a crtica imanente em dialtica negativa, precisamente para minar a identidade especulativa entre conceito e objeto, essncia e aparncia, possibilidade e necessidade, postulada por Hegel.55A dialtica negativa uma interminvel transformao dos conceitos em seus opostos, daquilo que no que poderia ser mas no . Revelar o que poderia ser no significa postular que ele tem que ser. Muito pelo contrrio, a dialtica negativa empenha-se em mostrar que no h nenhum ponto final de reconciliao e de claro discernimento no carter necessrio do possvel. A rigor, a tarefa de Adorno mostrar a superfluidade daquilo que ; mostrar que o objeto desafia seu conceito e que o conceito est fadado ao fracasso em sua busca da essncia. Adorno mina os prprios pressupostos conceituais da crtica imanente que pratica. A dialtica negativa converte-se numa dialtica da negatividade pura, da contestao perptua do real. O discurso da negatividade rejeita precisamente o que Marx ainda era capaz de pressupor: que o discernimento da necessidade do que tambm levaria a uma compreenso do que poderia ser, e que o que poderia ser era algo por que valia a pena lutar. A dialtica negativa, em contraste, nega que haja uma lgica emancipatria que seja imanente ao real.56A negatividade, a no-identidade e a desmistificao da paixo com que o pensamento luta pela identidade no garantem nenhum efeito emancipatrio. Ou ento, para usar as palavras de Adorno, elas garantem que essas conseqncias sero emancipatrias, justamente por se recusarem a garanti-las. Adorno rejeita algicada imanncia, enquanto preserva a crtica imanente. Na medida em que o mtodo da crtica imanente pressupunha um desenvolvimento lgico imanente em direo a uma crescente transparncia ou adequao entre o conceito e a realidade, a crtica transformou-se em dialtica, numa mitologia da inevitabilidade, guiada por uma crena na identidade entre o pensamento e o ser. Adorno insiste namediaoentre o pensamento e o ser, negando suaidentidade:

A totalidade uma categoria de mediao, e no de dominao e subjugao imediatas. (...) A totalidade social no leva uma vida prpria, alm e acima daquilo que ela une e do qual, por sua vez, se compe. Ela se produz e se reproduz atravs de seus momentos individuais.57

A tarefa da dialtica negativa revelar a natureza mediada do imediato, sem por isso cair na iluso de que todo imediato tem que ser mediado. Isso s ocorreria se a totalidade se tornasse totalitria, se todos os elementos de no-identidade, alteridade e individualidade fossem absorvidos no todo.

Com a transformao da economia liberal de mercado no capitalismo organizado, a base econmica do individualismo burgus tambm destruda. O indivduo que, por seus esforos e atividades, realizou sua liberdade e igualdade nas relaes de troca no mercado, passa a ser um anacronismo histrico. A crtica normativa da ideologia burguesa j no pode ser efetuada como uma crtica da economia poltica. O desenvolvimento da sociedade burguesa destruiu seus prprios ideais. A crtica das ideologias j no pode justapor normas dadas realidade; antes, tem que desmistificar uma realidade em vias de obliterar as normas que um dia forneceram sua prpria base de legitimao. A crtica das normas deve ser conduzida como uma crtica da cultura, para desmistificar a cultura e revelar o potencial utpico latente que h nela.58

A crtica desfetichizante como crtica da cultura

Embora a anlise do fetichismo da mercadoria por Marx continue a fornecer o modelo da crtica da cultura, esse paradigma passou por srias revises na obra de Adorno e Horkheimer. A metfora em torno da qual se construiu a anlise do fetichismo da mercadoria a reificao do social e do histrico como o "natural". Uma vez que a troca de mercadorias oculta o processo de produo destas, e j que as leis do mercado escondem o fato de essas leis aparentes se constiturem por atividades e relaes humanas concretas, o discurso desfetichizante justape a produo ao comrcio, o valor de uso ao valor de troca, e a atividade constitutiva dos seres humanos s manifestaes na cultura. O desaparecimento de uma esfera autnoma de relaes de troca modifica a prioridade ontolgica atribuda produo por Marx. A esfera da produo no est para a esfera da circulao como a essncia para a aparncia. Com a crescente racionalizao da esfera produtiva e a crescente integrao da produo e do comrcio, o capitalismo monopolista comea a evoluir para uma realidade social em que todos os contrastes desaparecem, e as alternativas ao presente tornam-se inconcebveis. Horkheimer descreve essa transformao da realidade social, j em 1941, como "a dissoluo semntica da linguagem num sistema de sinais".59O indivduo, segundo Horkheimer,

sem sonhos nem histria, (...) est sempre atento e pronto, sempre almejando um objetivo prtico imediato. (...) Toma a palavra falada apenas como um meio de informao, orientao e ordem.60

Com o declnio do ego e de sua razo reflexiva, as relaes humanas tendem para um ponto em que o domnio da economia sobre todas as relaes pessoais, o controle universal das mercadorias sobre a totalidade da vida, transforma-se numa nova e escancarada forma de comando e obedincia.61

Essa totalizao da dominao, a totalizao de um sistema de sinais em que a linguagem humana desaparece, deixa de se manifestar como uma esfera de quase-naturalidade que nega sua prpria historicidade. Em vez disso, o prprio contraste entre cultura e natureza, entre segunda natureza e natureza primria, comea a desaparecer.62A totalizao da dominao significa a crescente manipulao da prpria natureza. O antagonismo entre a natureza e a cultura transforma-se ento numa vingana da natureza contra a cultura. Enquanto Marx havia desmistificado a naturalizao do histrico, os tericos crticos procuram desmistificar a historicizao do natural. O que o fascismo manipula a revolta da natureza sufocada contra a totalidade da dominao, e a revolta da natureza sufocada que a indstria de massas recircula em imagens de sexo, prazer e falsa felicidade. A represso da natureza interna e externa elevou-se a propores to sem precedentes, que a revolta contra essa prpria represso torna-se objeto de uma nova explorao e manipulao. Nessas circunstncias, o "fetichismo" das mercadorias no distorce a histria, transformando-a em natureza, mas utiliza a revolta da natureza sufocada para mistificar a explorao social da natureza dentro e fora de ns. Na linguagem de Adorno, o valor de troca no mais esconde a produo de valores de uso; muito pelo contrrio, as mercadorias passam a competir entre si para se apresentar no imediatismo dos valores de uso e satisfazer a nostalgia do trabalho feito com as prprias mos, da natureza virgem, da simplicidade e do no-artificialismo. Enquanto, no capitalismo liberal, o valor de uso era portador do valor de troca, no capitalismo organizado o valor de troca s comercializvel na medida em que possa se apresentar como portador de um valor de uso no mediado, para o gozo de cujas qualidades "espontneas" a indstria da propaganda nos seduz. A brutalizao da natureza no fascismo, a explorao sedutora da natureza pelos meios de comunicao de massa e pela indstria da cultura, e a nostalgia do natural e do orgnico, expressas pela crtica conservadora da cultura, tm isto em comum: manipulam a revolta da natureza reprimida, convertendo-a em submisso, esquecimento e pseudofelicidade.63

Odiagnstico da crise como filosofia retrospectiva da histria com um propsito utpico

Se o capitalismo organizado eliminou o mercado autnomo, se a irracionalidade dos capitais individuais em concorrncia foi substituda por um sistema de controles estatais monopolistas, que acontece com as tendncias e os potenciais de crise econmica nessas sociedades? Em seu artigo de 1941, Pollock j havia afirmado que a capacidade do sistema de administrar e controlar as crises era imprevisivelmente grande.64No perodo do aps-guerra, os tericos crticos enfatizaram que o capitalismo organizado havia eliminado os potenciais de crise, sem eliminar as irracionalidades do sistema. As irracionalidades sistemticas do capitalismo deixaram de se articular como crises sociais. No apenas a economia, mas tambm as transformaes da cultura so responsveis por esse fenmeno.

EmEros e civilizao,Marcuse formulou da seguinte maneira a impossibilidade das crises sociais em condies de civilizao industrial-tecnolgica: as prprias condies objetivas que possibilitariam a superao da civilizao industrial-tecnolgica tambm impedem a emergncia das condies subjetivas necessrias a essa transformao.65O paradoxo da racionalizao consiste em que as prprias condies que poderiam levar a uma reverso da perda de liberdade no podem ser percebidas pelos indivduos que esto desencantados. Na civilizao industrial-tecnolgica, a verdadeira possibilidade de pr fim falta de liberdade proporcionada pela transformao da cincia e da tecnologia em foras produtivas, e pela subseqente eliminao da mo-de-obra imediata do processo de trabalho. O trabalho deixa de ser vivenciado pelo indivduo como o penoso emprego da energia orgnica para realizar uma tarefa especfica. O processo de trabalho torna-se impessoal e cada vez mais dependente da organizao e coordenao do esforo humano coletivo. A importncia decrescente da mo-de-obra imediata no processo de trabalho, j analisada por Marx nosGrundrisse,no resulta num declnio correspondente do controle sociocultural sobre o indivduo.

Pelo contrrio, a impessoalizao e a racionalizao das relaes de autoridade trazem consigo uma transformao correspondente da dinmica da formao individual da identidade.66Com o declnio do papel do pai na famlia, a luta contra a autoridade perde seu foco: o eu no consegue atingir a individuao, pois, despojado de figuras pessoais contra as quais lutar, j no vivencia os processos altamente pessoais e idiossincrticos da formao individualizante da identidade. A agresso, que no pode ser descarregada na luta edipiana contra uma figura humana, posteriormente internalizada e gera culpa.67

A conseqncia mais ampla do desaparecimento da personalidade autnoma o enfraquecimento dos "laos vivos entre o indivduo e sua cultura".68A substncia tica desaparece. O desaparecimento da substncia tica na civilizao industrial-tecnolgica seca as fontes culturais de revolta grupal, at ento sustentadas em nome das lembranas de rebelies passadas. A perda da cultura como repositrio da memria coletiva ameaa a prpria dinmica da civilizao: revolta, represso e nova revolta. Quando a cultura deixa de ser uma realidade viva, a lembrana das promessas no cumpridas e tradas, em nome das quais se conduzira a revolta dos reprimidos, deixa de ser uma possibilidade histrica do presente.

A transfigurao da moderna civilizao industrial-tecnolgica deve comear por um ato deErinnerung[lembrana] que liberta os sentidos esquecidos, reprimidos e negados, bem como as esperanas e aspiraes das revoltas passadas. Em vez de uma crtica ontologia e lgica da identidade ocidentais, Marcuse prope-se reconstruir a dimenso utpica latente da ontologia ocidental. Ao revelar as polaridades de Logos e Eros, da interminvel passagem do tempo e do desejo de transcender toda temporalidade, da infinitude ruim do existente[die Seienden]e da perfeio do ser[die Vollkommenheit des Seins], como sendo as estruturas duais em que se desdobra a ontologia ocidental, Marcuse sustenta a funo redentora da memria.69

Mas essa memria redentora no pode ser reativada nocontinuumda histria, justamente porque a histria passa a se desdobrar de tal modo que nega seu prprio passado, sua prpria histria. A sociedade unidimensional criada pelo mundo industrial-tecnolgico oblitera o horizonte ontolgico em que se desenvolveu e no qual se desdobra. Isso significa que a teoria crtica da sociedade, que fala em nome da teoria redentora, est, ela mesma, fora docontinuumhistrico; num esforo para negar a dominao do tempo, ela apela para a lembrana do desejo de pr fim a toda a temporalidade a partir de um ponto externo ao tempo.70Revivendo as polaridades primordiais entre Eros e Logos, Narciso e Orfeu, Marcuse procura revelar o potencial revolucionrio de uma sensualidade[Sinnlichkeit]emancipada. Narciso desponta como o mensageiro de um novo princpio ontolgico.71Para se transformar numa nova moralidade[Sittlichkeit],o potencial subversivo dessa nova sensualidade deve reimergir-se nos tecidos da histria; mas, de acordo com a tese da unidimensionalidade, no pode haver portadores histricos coletivos desse processo.

Mas, se o potencial subversivo da memria redentora, evocada pela teoria, permanece fora docontinuumhistrico, no ter a teoria crtica reconhecido uma aporia fundamental, ou seja, as condies de sua prpria impossibilidade? A teoria crtica social analisa uma sociedade que subsiste do ponto de vista da possvel transformao de sua estrutura bsica, e interpreta as necessidades e conflitos emergentes luz dessa transformao antecipatria. Se exatamente ocontinuumda histria que a crtica tem que rejeitar, a viso da sociedade emancipada, que ela articula, transforma-se num mistrio privilegiado, que no pode ser relacionado com a compreenso imanente das necessidades e conflitos que brotam de dentro docontinuumdo processo histrico. Ou a teoria critica deve rever a tese da unidimensionalidade, ou deve questionar sua prpria possibilidade. Isso foi reconhecido por Claus Offe em 1968: a teoria crtica deve limitar a tese relativa a uma manipulao multiabrangente e admitir a presena de vazamentos no sistema de racionalidade repressiva, ou ento deve renunciar afirmao de ser capaz de explicar as condies de sua prpria possibilidade.72

Essa crtica aplica-se no apenas anlise de Marcuse, mas tambm ao modelo terico definido como "crtica da razo instrumental" em geral. Em se presumindo que a racionalizao societria tenha eliminado as crises e as tendncias ao conflito na estrutura social, e que a racionalizao cultural tenha destrudo o tipo de personalidade autnoma, a teoria crtica deixa de se deslocar no horizonte daperspectivade transformao futura e tem que recuar para a posturaretrospectivada esperana e da rememorao do passado. A teoria crtica torna-se um monlogo retrospectivo do pensador crtico sobre a totalidade desse processo histrico, pois enxerga o presente vivenciado, no pela perspectiva da possvel transformao futura, mas do ponto de vista do passado.

[...]

Pode-se interpretar esse resultado de duas maneiras. Primeiro, possvel afirmar que a crtica social converte-se mais uma vez em mera crtica, no sentido ridicularizado por Marx em seus primeiros trabalhos, e que a teoria crtica da sociedade deve justificar seus compromissos normativos explcitos. Segundo, pode-se argumentar que a teoria crtica no se transforma em mera crtica, pois continua a recorrer a normas e valores imanentes autocompreenso das sociedades capitalistas avanadas, mas que ocontedodas normas a que se recorre foi transformado.

De acordo com a primeira interpretao, a crtica torna-se mera crtica pelas seguintes razes: se as crises e os potenciais de conflito das sociedades capitalistas avanadas foram eliminados, se essa estrutura social destruiu as prprias normas de racionalidade, liberdade e igualdade a que a crtica da economia poltica podia implicitamente recorrer, se, alm disso, as prprias fronteiras entre a histria e a natureza, a cultura e a natureza no humana, tornaram-se irreconhecveis, onde esto os padres normativos para os quais a teoria crtica poderia apelar, e como se h de justific-los? O terico crtico tem que falar em nome de uma viso utpica do futuro a que s ele tem acesso, ou ento desempenhar o papel de memria e conscincia numa cultura que eliminou seu prprio passado. Nem essa viso utpica nem a rememorao retrospectiva baseiam-se em normas e valores decorrentes da autocompreenso dessa cultura e dessa estrutura social. O ponto de vista da crtica transcende o presente e justape ao existente o quedeveriaser ou o quepoderiater sido, se no se houvesse trado o passado. A crtica em si, portanto, uma modalidade de investigao criteriolgica explcita. O comentrio de Marx sobre a mera crtica pode ento ser aplicado postura da prpria Escola de Frankfurt:

A reflexo do sujeito crtico, que acredita haver preservado para si uma vida realmente livre e o futuro histrico sob a forma de um apelo, permanece hipcrita perante todas as situaes; assim, Marx, que j reconhecera esse privilgio como sendo o caso dos irmos Bauer, falou ironicamente da "sagrada famlia".73

Contrariando essa interpretao, que reduz a postura da Escola de Frankfurt da "sagrada famlia", pode-se afirmar que, embora a crtica economia poltica j no sirva de modelo para a Escola de Frankfurt, ainda h normas e valores imanentes cultura das sociedades capitalistas avanadas que tm um contedo emancipatrio. Entretanto, essas normas e valores j no so fornecidos por teorias racionalistas da lei natural, cuja incorporao nas instituies da sociedade liberal-capitalista Marx tomou por certa. J no s normas de uma esfera pblica burguesa, do mercado liberal e do Estado liberal, praticantes da norma legal, que a crtica pode recorrer. Com a transformao da dominao poltica em administrao racional, esvazia-se o contedo racional e emancipatrio da tradio da lei natural. As normas emancipatrias deixam de ser imanentes s estruturas pblicas e institucionais. Em vez disso, tm que ser buscadas na promessa utpica no cumprida da cultura, da arte e da filosofia (Adorno), ou nas estruturas profundas da subjetividade humana que se rebelam contra os sacrifcios exigidos por uma sociedade opressora (Marcuse).

Assim, Adorno, que insistia no potencial utpico no realizado do Esprito absoluto, pde iniciar aDialtica negativacom a seguinte frase: "A filosofia, que em certo momento pareceu ter sido superada, continua viva, pois perdeu-se o momento de sua efetivao."74A filosofia deve empenhar-se numa autocrtica implacvel, j que fracassou sua promessa de ser idntica a uma realidade racional (Hegel), ou de ser uma arma material das massas em vias de efetivar a razo (Marx). Essa autocrtica da filosofia deve reativar a iluso que sustenta a continuidade de sua prpria existncia a saber, a iluso de que a filosofia poderia tornar-se uma realidade. Essa iluso deve ser desmistificada, pois trai a arrogncia do pensamento conceitual que considera seu outro, aquilo que no pensado, como um mero veculo da realizao do pensamento. A realidade no o continente em que o pensamento se esvazia, embora essa luta pela unificao do pensamento e da realidade seja o que confere filosofia suaraison dtre.Essa aporia no deve ser abandonada, mas continuamente praticada e reavivada atravs da dialtica negativa. O prprio Adorno d a essa crtica o nome de "dissonncia". a dissonncia entre o pensamento e a realidade, o conceito e o objeto, a identidade e a no-identidade, que deve ser revelada.75A tarefa do crtico iluminar as rachaduras na totalidade, as brechas na rede social, os fatores de desarmonia e discrepncia atravs dos quais a inverdade do todo se revela e os vislumbres de uma outra vida tornam-se visveis. Num ensaio sobre as possibilidades do conflito social nas sociedades capitalistas avanadas, Adorno pde pois enunciar a afirmao, de outro modo surpreendente, de que os potenciais de conflito da sociedade no devem ser buscados nos protestos e lutas coletivos organizados, mas em gestos cotidianos, como o riso: "Todo riso coletivo brota dessa mentalidade de bode expiatrio, de um compromisso entre o prazer de liberar a prpria agresso e os mecanismos controladores da censura, que no o permitem."76Quando se exige uma definio sociolgica estrita dos conflitos sociais, bloqueia-se o acesso a essas experincias, que so inapreensveis, mas "cujas nuances tambm contm traos de violncia e chaves de uma possvel emancipao".77

Atravs de seu mtodo da dissonncia emancipatria, Adorno torna-se um etnlogo da civilizao avanada, buscando revelar os elementos de resistncia e de sofrimento implcitos, em que se torna manifesto o potencial humano de desafiar o mundo administrado. No fica claro se as "chaves" de uma possvel emancipao, a que Adorno recorre, podem justificar o ponto de vista normativo da teoria crtica. A acusao de que a crtica da razo instrumental articula o discurso privilegiado de uma "sagrada famlia" permanece sem resposta. A transio da crtica economia poltica para a crtica razo instrumental altera no somente o contedo criticado, mas a prpria lgica da crtica social e da crtica s ideologias.

Traduo Vera Ribeiro

Notas

1- Max Horkheimer, prefcio a Martin lay, The Dialectical Imagination: A History of the Frankfurt School and the Institute of Social Research, 1923-1950, Boston, MA, 1973, p. xii.

2- Idem.

3 - Herbert Marcuse, "Philosophie und kritische Theorie", segunda parte de Horkheimer e Marcuse, "Philosophie und kritische Theorie",Zeitschrift fr Sozialforschung,1937, p. 637, traduo minha. A seo de Marcuse desse texto produzido em co-autoria no est includa na traduo inglesa padro da "Teoria tradicional e crtica" de Horkheimer, encontrada emCritical Theory: Selected Essays,trad. M.J.OConnellet al.,Nova York, 1972.

4 - Jay,The Dialectical ImaginationDavid Held,Introduction to Critical Theory,Berkeley e Los Angeles, 1980; Andrew Mato e Eike Gebhardt (orgs.),The Essential Frankfurt School Reader,Nova York, 1978. Held e Arato & Gebhardt fornecem bibliografias teis de obras feitas pela e sobre a Escola de Frankfurt. Nos ltimos anos, surgiram vrios estudos que, com considervel freqncia, foram motivados por impulsos polticos de desacreditar a influncia que a Escola de Frankfurt exerceu nos Estados Unidos. Entre eles, destacam-se por sua equivocao Zoltan Tar,The Frankfurt Schoo!: The Critical Theories of Max Horkheimer and Theodor Adorno,Nova York, 1977; George Freedman,The Political Philosophy of the Frankfurt Schooi,Ithaca, NY, 1981; e Perry Anderson,Considerations on Western Marxism,Atlantic Highlands, NH, 1976. Douglas Kellner e Rick Roderick fornecem um proveitoso panorama geral dessa nova literatura, em seu ensaio de reviso "Recent Literature on Critical Theory",New German Critique,23, primavera-vero de 1981, p. 141-71. Quanto recente literatura alem, ver a nota seguinte.

5 - Helmut Dubiel,Wissenschaftsorganisation und politische Erfahrung: Studien zur frhen materialistischen Sozialwissenschaft,Frankfurt, 1979; Wolfgang BonB,Die Einbung des Tatsachenblicks,Frankfurt, 1982.

6- Max Horkheimer, "Zum Problem der Wahrheit",Zeitschriftfr Sozialforschung,1935, p. 345; traduzido como "The Problem of Truth"inMato e Gebhardt,The Essential Frankfurt School Reader,p. 429. "Die Warheit ist em Moment der richtigen Praxis" vertido, nessa traduo, por "A verdade um impulso [?] para a prxis correta".

7 -Max Horkheimer, "Zum Rationalismusstreit in der gegenwrtngen Philosophie",Zeitschrift fiir Sozialforschung,1934, p. 26-7, traduo minha.

8- Max Horkheimer, "Traditional and Critical Theory",inOConnell,Critical Theory,p. 215; originalmente publicado emZeitschrtft fr Soziaiforschung,1937, p. 269.

9 - Idem.

10- Marcuse, "Philosophie und kritische Theorie", p. 636-7, traduo minha.

11 - Max Horkheimer, "Postcript",inOConnell,Critical Theory,p. 247. Originalmente publicado como a primeira parte de Horkheimer e Marcuse, "Philosophie und kritische Theorie",Zeitschrift fr Sozialforschung,1937, p. 627.

12 - idem, p. 248; Zeitschrift fr Soziaiforschung, p. 628.

13 - ibid., p. 247;Zeitschrzft fr Sozialforschung,p. 627.

14 - lbid., p. 248; Zeitschrift fr Soziaiforshung, p. 628.

15- Ibid.

16- Ibid., p. 247;Zeitschrift fr Sozialforschung,p. 627.

17- lbid., p. 249;Zeitschrift fr Soziaiforschung,p. 628.

18- lbid., p. 249; Zeitschrift fr Sozialforschung, p. 629.

19- Ver Wolfgang Bona e Norbert Schindler, "Kritische Theorie als interdisziplinrer Materialismus",inBonB e A. Honneth (orgs.),Soziaiforschung als Kritik,Frankfurt, 1982 (uma traduo para o ingls ser publicada em S. Benhabib e W. Bona (orgs.),Max Horkheimer:A Retrospective,W. BonB, "Kritische Theorie und empirische Sozialforschung: Anmerkungen zu einem Fallbeispeil", introduo a Erich Fromm,Arbeiter und Angestellte am Vorabend des dritten Reichs: Eine sozialpsychologische Untersuchung,org. W. BonB, Stuttgart, 1980, p. 7ss.

20- Friedrich Pollock, "State Capitalism: Its Possibilities and Limitations",Studies in Phiiosophy and Social Science,1941, p. 200.

21- Idem.

22- lbid., p. 201.

23- lbid.

24- G. Marramao, "Zum Verhltnis von politischer konomie und kritischer Theorie",sthetik und Kommunikation:Beitrge zur politischen Erziehung,4(11), abril de 1973, p. 79-93; A. Arato, "Political Sociology and Critique of Politics",inArato e Gebhardt,The Essential Frankfurt School Reader,p. 3-5.

25- Moishe Postone e Barbara Brick, "Kritische Theorie und die Grenzen des traditionellen Marxismus",inBonB e Honneth,Sozialforschung als Kritik;uma verso abreviada desse artigo foi publicada como "Critical Pessimism and the Limits of Traditional Marxism",Theory and Society,li, 1982, p. 617-58.

26-Em seu controvertido ensaio "Die Juden und Europa", Horkheimer analisa o declnio do liberalismo econmico na Europa e examina o papel do anti-semitismo, de permitir que segmentos da populao expressassem sua frustrao contra o sistema da livre iniciativa, identificando os judeus como representantes dessa esfera(Zeitschrifi fr Sozialforschung,1939-40, p. 115-37). O ensaio indica uma certa cegueira na concepo de Horkheimer sobre a transio do liberalismo para o fascismo. Ele no distingue entre o sistema de livre mercado e livre iniciativa e princpios polticos, como o governo representativo, a separao dos poderes, a constitucionalidade, a legalidade e assim por diante.Essa depreciao do papel do liberalismo poltico um dos aspectos em que a Escola de Frankfurt deu continuidade tradio do marxismo ortodoxo e fundiu, ou melhor, reduziu as estruturas polticas s econmicas. Nesse aspecto, o trabalho de Franz Neumann constitui uma exceo. A anlise de Neumann sobre as contradies e ambivalncias internas do liberalismo poltico, particularmente sua exposio da contradio entre a "legalidade" e a "soberania", continua a ser uma das melhores abordagens da histria do pensamento poltico liberal; ver F. Neumann,Die Herrschaft des Gesetzes,trad. e org. A. Sllner, Frankfurt, 1980, inicialmente submetida como dissertao de doutorado Escola de Economia de Londres, e supervisionada por Harold Laski sob o ttulo de "The Governance of the Rule of Law" (1936). Ver tambm a coletnea de ensaios de Neumann,Wirtschaft, Staat und Demokratie,Frankfurt, 1977.

27-Alm das obras mencionadas na nota anterior, ver Franz Neumann,Behemoth: Structure and Praxis of National Socialism,Londres, 1942; eDemocratic and Authoritarian State,org. 1-1. Marcuse, Glencoe, 1957.

28 - Depois da emigrao, Otto Kirchheimer foi catedrtico de Cincias Polticas na Universidade de Colmbia, at 1965. Suas publicaes mais importantes foramPunishment and Social Structure,com G. Rushe (Nova York, 1939),Political Justice: The Use of Legal Procedure for Poltical Ends(Princeton, NJ, 1961),Politik und Verfassung(Frankfurt, 1964), eFunktionen des Staates unter Verfassung(Frankfurt, 1972).

29- Refiro-me s anlises de Theodor Adorno e Max Horkheimer,Dialektik der Aufklrung(1947); a 7 ed. (Frankfurt, 1980) foi usada aqui; a traduo para o ingls de John Cumming,Dialectic of Enlightenment(Nova York, 1972), no fidedigna e no fao referncia a ela no texto; e Max Horkheimer,The Eclipse of Reason(1947; Nova York, 1974), traduzida para o alemo por A. Schmidt comoKritish der Instrumentellen Vernunft,Frankfurt, 1974. Tambm includos nessa discusso geral esto os ensaios de Horkheimer "Die juden und Europa", "Autoritrer Staat" (1940), traduo para o ingls em Arato e Gebhardt,The Essential Frankfurt School Reader,p. 95-118, reeditado em Helmut Dubiel eAlfons Sllner (orgs.),Wirtschaft, Recht und Staat and Nationalsozialismus,Frankfurt, 1981; "The End of Reason",Studies in Philosophy and Social Science,1941, p. 366-88 (tambm includo em Arato e Gebhardt,The Essential Frankfort School Reader,p. 26-49). Tambm incluo nessa discusso geral o ensaio de Herbert Marcuse "Some Social lmplications of Modero Technology"(Studies in Philosophy and Social Science.1941, p. 4 14-39).

30- Enquanto Neumann, Gurland e Kirchheimer defendiam a continuidade entre a ordem econmica e poltica do nacional-socialismo e o capitalismo monopolista, Pollock, juntamente com Adorno e Horkheimer, defendia o ineditismo da ordem social criada pelo nacional-socialismo. Em seu ensaio "Some Social Implications of Modern Technology", Marcuse concorda, por um lado, com a tese da continuidade de Neumann e Gurland, mas, por outro, introduz um novo conceito, de racionalidade "tcnica ou tecnolgica", para caracterizar a nova forma de dominao emergente no nacional-socialismo; ver p. 4l6 ss.

31- Os processos de "racionalizao societria" podem ser analisados em dois nveis: por um lado,institucionalmente,eles do origem a um processo de diferenciao, em conseqncia do qual a economia e a poltica so separadas e relegadas a esferas independentes: o mercado e a produo, de um lado, o Estado e sua burocracia administrativa e judiciria, de Outro (ver Max Weber,Economy and Society,trad. Gnther Roth e Claus Wittich, Berkeley, 1978, v. 1, p. 375ss). No plano das orientaes da aosocial,Weber analisa a "racionalizao societria" atravs da transio da economia, da administrao estatal e da lei de uma racionalidade substantiva para uma racionalidade formal (verEconomy and Society,v. 1, p. 85, 107, 178-80, 2 17-26; v. I, p. 666 ss, 875-89). esse aspecto da anlise de Weber que Adorno, Horkheimer e Marcuse integram em seu diagnstico do capitalismo de Estado da dcada de 1940. Curiosamente, a interdependncia do capitalismo e da dominao poltica burocraticamente administrada fornece-lhes um modelo para analisar o fascismo e, depois de 1945, as democracias industriais de massa do aps-guerra.Por "racionalizao cultural", Weber refere-se, em primeiro lugar, sistematizaode vrias vises de mundo ("The Social Psychology of World Religions",in From Max Weber: Essays in Sociology, org. e trad. H. H. Gerth e C. W. Mills, Nova York, 1974, p. 293). Ele descreve esse processo como originando-se com a demanda de que "a ordem mundial, em sua totalidade, seja, possa e deva ser, de algum modo, um cosmo significativo" (idem, p. 281). Esses esforos de sistematizao esto presentes em todas as religies do mundo ora resultando no monotesmo, ora no dualismo mstico, ora no misticismo. Em segundo lugar, o trao comum a todos esses esforos de sistematizao, ao longo dos sculos, odeclnio do papel da magia (Entzauberung](ibid., p. 290ss). Weber parece haver analisado esses processos de racionalizao cultural luz de uma distino fundamental: a distino entre as vises de mundo que levam a uma tica de abnegao mundial e as que levam a afirmaes mundiais. Ver Weber, "Religious Rejections of the World and Their Directions",in From Max Weber,p. 233ss; originalmente, "Zwischenbetrachtung" dosGesammelte Aufstze zur Religionssoziologie(1920);W. Schluchter, "Die Paradoxie der Rationalisierung",in Rationalismus und Weitbeherrschung,Frankfort, 1980, p. l9ss.32- Ver, mais recentemente, Jrgen Habermas "The Entwinement of Myth and Enlightenment: Rereading Dialectic of Enlightenment", New German Critique,126, primavera-vero de 1982, p. I3ss.

33- F. Grenz, Adornos Philosophie lo Grundndbegriffen. Auflssung einiger Deutungsprobleme, Frankfurt, 1974, p. 275, nota 26, citado por J. Schmucker, Adorno Logik des Zerfalls, Stuttgart, 1977, p. 17.

34- Adorno e Horkheimer,Dialiektik der Aufklrung,p. 27.

35- Idem, p. 51, 167.

36- Ibid., p. 167.

37- Ibid., p. 37.

38- Ibid., p. 207.

39- Ibid., p. ix.

40- Ibid.

41- Theodor W. Adorno, Mnima Moralia, Londres, 1974, p. 50; Herbert Marcuse, One-Dimensional Man: Studies lo the Ideology of Advanced Industrial Society, Boston, MA, 1964.

42- Adorno e Horkheimer,Dialektik der Aufklrung,p. 62-3.

43- Idem, p. 13.

44 -Ibid.

45- A crtica da lgica da identidade subjacente razo ocidental foi uma preocupao de Adorno desde sua palestra de 1931 sobre "A efetividade da filosofia". Quaisquer que sejam as diferenas existentes entre Adorno e Horkheimer nesse aspecto, a busca de uma lgica no discursiva e no identificatria, seja numa filosofia esotrica da linguagem, no smbolo ou no inconsciente coletivo da espcie, caracteriza tanto aDialektik der AufklrungquantoThe Eclipse of Reason.

46- Adorno e Horkheimer,Dialektik der Aufklrung,p. 17-8.

47- Idem, p. 3.

48- Ibid., p. 16-7; Horkheimer,The Eclipse of Reason,p. 181;Kritik der instrumentellen Vernunft,p. 156.

49- Thomas Baumeister e Jens Kulenkampff, "Geschichts-phiosophie und philosophische Asthetik zu Adornos sthetischer Theorie",Neue Hefte fr Philosophie,6, 1974, p. 80, traduo minha.

50 - Nesse contexto, Habermas distinguiu entre a "crtica tradicional da ideologia" e a "crtica totalizante" praticada por Adorno e Horkheimer: "A critica da ideologia pretende demonstrar que a validade de uma teoria que esteja sob investigao no se libertou do contexto de sua gnese. Ela quer demonstrar que por trs dessa teoria esconde-se uma inadmissveltenso de poder e validadee que, alm disso, a essa tenso que ela deve seu reconhecimento" ("The Entwinement of Myth and Enlightenment", p. 20). A crtica totalizante, em contraste, presume que a razo, "uma vez instrumentalizada, torna-se o assimilado ao poder e, com isso, desiste de seu poder crtico" (idem). Ela forada a renunciar ao "desenvolvimento totalitrio do Esclarecimento com seus prprios meios uma contradio performativa da qual Adorno tinha plena conscincia" (ibid.).

51- Theodor W. Adorno, "Sociology and Empirical Research", loThe Positivist Dispute in German Sociology,trad. Glyn Adey e David Frisby, Londres, 1969, p. 69.

52- G. W. F. Hegel,Wissenschaft der Logik.org. G. Lasson, Hamburgo, 1976, v. 11, p. 11-2, 101-2;Hegels Science of Logic,trad. A. V. Miller, Nova York, 1969, p. 396-7, 479-80.

53- Idem, p. 180-4;Science of Logic,p. 550-3.

54-G. W. F. Hegel,Phnomenologie des Geistes,org. J. Hoffmeister, Hamburgo, 1952;Hegels Phenomenology of Spirit.trad. A. V. MiIler, Oxford, 1977, p. 18.

55-Theodor W. Adorno,Negative Dialektik,Frankfurt, 1973, especialmente p. 32-42.

56- Idem, p. 295-354.

57- Theodor W. Adorno, "On the Logic of the Social Sciences",in The Positivist Dispute in German Socioiogy,p. 107.

58- Theodor W. Adorno, "Kultur und Verwaltung",lo Soziologische Schriften,Frankfurt, 1979, v. 1, p. 131.

59- Max Horkheimer, The End of Resson",Studies in Philosophy and Social Science,p. 377.

60- Idem.

61 - Ibid.,p.379.

62- "A cultura de hoje carimba tudo com a semelhana": Adorno e Horkheimer,Dialektik der Aufklrung,p. 108.

63- "A sociedade perpetua a natureza ameaadora sob a forma da perene compulso organizacional, que se reproduz nos indivduos como uma autopreservao persistente e, com isso, revida o ataque da natureza como dominao social sobre a natureza" (idem, p. 162).

64- Pollock, "State Capitalism",Studies in Philosophy and Social Science,p. 217-21.

65- Herbert Marcuse,Eros and Civilization: A Philosophical Inquiry into Freud,Nova York, 1962, p. 84. Uma vez que esse volume , na verdade, o terceiro dosGesammelte Schriftende Marcuse, usei-o como texto principal na discusso que se segue.

66- Marcuse, Triebstruktur und Gesellschaft: Ein philosophischer Beitrag zu Sigmund Freud, trad. M. von Eckhardt-Jaffe, Frankfurt, 1979, p. 80-1.

67- Idem, p. 88-9.

68 - Ibid., p. 93.

69- Ibid., p. 198-9.

70- "Eros, que se impe conscincia, movido pela memria; com a memria, volta-se contra a ordem da privao; utiliza a memria em seu esforo de superar o tempo num mundo dominado pelo tempo" (ibid., p. 198).

71- Ibid., p. 146-7.

72- Claus Offe, "Technik und Eindimensionalitt: Eine Version der Technokratie these",inHabermas (org.),Antworten auf Herbert Marcuse,Frankfort, 1978, p. 87.

73- Rdiger Bubner, "Was ist kritische Theorie?",in Hermeneutik und Ideologiekritik,Frankfurt, l971,p. 179.

74- Adorno,Negative Dialektik,p. 15.

75- Adorno, "Sptkapitalismus oder Industriegesellschaft",in Sozioiogische Schriften.v. 1, p. 369.

76- Adorno, "Ammerkungen zum sozialen Konflikt heute", loSoziologische Schriften,v. 1, p. 193.

77- Idem.

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