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CURSO ON LINE INTRODUÇÃO À BIOINFORMÁTICA Prof. Dr. Francisco Prosdocimi 2007

Curso de bioinformática

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CURSO ON LINE

INTRODUÇÃO À BIOINFORMÁTICA

Prof. Dr. Francisco Prosdocimi

2007

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ÍNDICE Pág. CAPÍTULO 1 UMA VISÃO GLOBAL DA BIOINFORMÁTICA 3 1.1. O que é a bioinformática? 3 1.2. O surgimento da bioinformática 3 1.3. O que preciso saber para ser um bom bioinformata? 5 1.4. Cursos de pós-graduação em bioinformática no Brasil 6 1.5. Conversando sobre bioinformática – BIOCHAT 6 1.6. Referências Bibliográficas e textos complementares 12 1.7. bRAINsTORM 12 CAPÍTULO 2 GENOMA, BIOLOGIA MOLECULAR E COMPUTAÇÃO 13 2.1. Introdução 13 2.2. Sequenciamento do DNA 13 2.3. Genômica 14 2.4. As ômicas: integrando a bioinformação 15 2.5. O PERL e outras linguagens de programação 15 2.6. Referências Bibliográficas e textos complementares 17 2.7. bRAINsTORM 17 CAPÍTULO 3 ALINHAMENTO DE SEQÜÊNCIAS 18 3.1. Introdução 18 3.2. Alinhamento Global 18 3.3. Alinhamento Local 19 3.4. Alinhamentos ótimos e heurísticos 20 3.5. Alinhamentos simples e múltiplos 21 3.6. Matrizes de comparação 22 3.7. Exemplos reais de alinhamentos 23 3.8. Referências Bibliográficas 28 3.9. bRAINsTORM 28 CAPÍTULO 4 MONTANDO UM GENOMA 29 4.1. Sobre genomas eucarióticos e procarióticos 29 4.2. Base-calling 30 4.3. Cross-match 31 4.4. Agrupamento de seqüências 32 4.5. Sobre a cobertura dos genomas 34 4.6. Referências Bibliográficas 35 4.7. bRAINsTORM 35 CAPÍTULO 5 ANÁLISE DE TRANSCRIPTOMAS 36 5.1. As ESTs 36 5.2. Histórico das ESTs 37 5.3. Agrupamento de ESTs 38 5.4. O genoma e o transcriptoma 39 5.5. SAGE – Serial Analysis of Gene Expression 40 5.6. Microarrays 40 5.7. Referências Bibliográficas 41 5.8. bRAINsTORM 41 CAPÍTULO 6 BANCOS DE DADOS EM BIOLOGIA MOLECULAR 42 6.1. Histórico 42 6.2. Bancos primários e secundários 43 6.3. GenBank e GenPept 43 6.4. RefSeq – O banco de dados de seqüências de referência 44 6.5. SWISSPROT – O maior banco de dados secundário de seqüências de proteínas 45 6.6. Gene Ontology – Sistema de classificação de genes de acordo com suas características 46 6.7. Referências Bibliográficas 46 6.8. bRAINsTORM 47 CAPÍTULO 7 ANOTAÇÃO DE GENOMAS 49 7.1. Introdução 49 7.2. Anotação de Nucleotídeos 49 7.3. Anotação de Proteínas 50 7.4. Anotação de Processos 50 7.5. A realização da Anotação Genômica (Sociologia da Anotação) 51 7.6. Referências Bibliográficas 52 7.7. bRAINsTORM 53 CAPÍTULO 8 BIOINFORMÁTICA EVOLUTIVA E GENOMAS COMPLETOS 54 8.1. Homologia, Ortologia e Paralogia 54 8.2. COG 56 8.3. Trabalhando com genomas completos 56 8.4. Referências Bibliográficas 57 8.5. bRAINsTORM 58 CAPÍTULO 9 BIOINFORMÁTICA ESTRUTURAL 59 9.1. Sobre a estrutura das proteínas 59 9.2. Protein Data Bank: o banco de dados de estruturas de proteínas 60 9.3. Modelagem molecular por homologia 61 9.4. Alguns programas de modelagem molecular 63 9.5. Threading 63 9.6. CASP – Critical Assessment of Structure Prediction 63 9.7. Estrutura de um arquivo no formato PDB 64 9.8. Referências Bibliográficas 67 9.9. bRAINsTORM 68 CAPÍTULO 10 CONCLUSÕES E PENSAMENTOS FILOSÓFICOS SOBRE A BIOINFORMÁTICA 69 10.1. Sobre bioinformática, genoma e ciência 69 10.2. Introdução 69 10.3. Genoma e o método científico 70 10.4. Um conceito de bioinformática 71 10.5. Princípios paradigmáticos em bioinformática 72 10.6. Conclusão 74 10.7. bRAINsTORM 74

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PREFÁCIO

Quando em 2002 realizei, concomitantemente ao meu mestrado em genética pela UFMG, o excelente curso de especialização em Bioinformática do LNCC, ministrado por muitos dos maiores especialistas em genômica e bioinformática de nosso país, tive o privilégio de ser um dos organizadores (e o primeiro autor) de um trabalho entitulado “Bioinformática: manual do usuário” em que todos os cerca de 20 alunos do curso se organizaram com o objetivo de gerar uma publicação básica sobre a área de pesquisa à qual nos estamos aprofundando e formando. Esta publicação foi finalmente publicada na revista Biotecnologia Ciência e Desenvolvimento alguns meses depois. Tendo mantido meu contato com a editora da revista Biotecnologia, enquanto terminava meus estudos de doutoramento em bioinformática, recebi um convite para elaborar um curso on line a ser ministrado através do portal biotecnologia da Internet (http://www.biotecnologia.com.br). Este documento que agora vos apresento gratuitamente pela Internet (http://biotec.icb.ufmg.br/chicopros/Prosdocimi07_Curso Bioinfo.pdf) consiste exatamente neste curso, produzido em 2006 e ministrado em 2007 para uma turma de 40 alunos. Ainda que navegando por problemas técnicos, acredito que o curso foi bastante proveitoso e produtivo, sendo que a grande maioria dos alunos saiu do mesmo tendo adquirido conteúdo e aprendido a compreender muito sobre a lógica e o pensamento em bioinformática. Hoje, passados quase 4 anos que ministrei este curso pela Internet, vejo este documento arquivado entre meus arquivos do período jurássico e tenho pena de deixar este conhecimento perdido nos meandros digitais do meu disco rígido. Assim, contatei recentemente a editora da revista que lendo o contrato que fizemos à época e dizendo serem meus os direitos autorais desta apostila ou “esboço de livro”, informou-me que tenho o direito de publicar o presente documento na Internet para que se torne acessível a qualquer indivíduo interessado em aprender a arte e a ciência da bioinformática. Recomendou-me ainda que eu atualizasse as informações aqui presentes e publicasse um livro de verdade, a ser vendido nas livrarias. Tenho sim planos de fazê-lo, mas sei que precisaria reestruturar boa parte do que está aqui contido e, por falta de tempo para tanto, decido publicar esta versão gratuitamente pela Internet. Assim, caso haja interesse de leitores, estudantes ou editores, estarei disposto a atualizar estas informações e produzir uma segunda edição mais completa e atualizada sobre presentes assuntos. Brasília, numa quarta-feira de cinzas. 17/02/2010 Chico Prosdocimi http://biotec.icb.ufmg.br/chicopros http://chicopros.blogspot.com

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Aos meus pais

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CAPÍTULO 1

Uma visão global da bioinformática

Iniciando nossa Interação Nesta primeiro capítulo apresentaremos uma visão geral da bioinformática,

vamos conversar sobre as necessidades e oportunidades de capacitação para quem deseja atuar nessa área. 1.1. O que é a bioinformática?

Podemos considerar a bioinformática como uma linha de pesquisa que envolve aspectos multidisciplinares e que surgiu a partir do momento em que se iniciou a utilização de ferramentas computacionais para a análise de dados genéticos, bioquímicos e de biologia molecular. A bioinformática envolve a união de diversas linhas de conhecimento – a ciência da computação, a engenharia de softwares, a matemática, a estatística e a biologia molecular – e tem como finalidade principal desvendar a grande quantidade de dados que vem sendo obtida através de seqüências de DNA e proteínas. Para o desenvolvimento de genomas completos, a informática é imprescindível e a biologia molecular moderna não estaria tão avançada hoje, não fossem os recursos computacionais existentes. 1.2. O surgimento da bioinformática

A bioinformática, apesar de ser uma ciência nova e em desenvolvimento, já apresenta uma figura clássica que freqüentemente é mostrada em qualquer palestra ou curso que se vá sobre a área. Essa figura, mostrando o crescimento exponencial do GenBank nos últimos anos, tenta mostrar que, mais do que uma abstração possível, a bioinformática é hoje uma necessidade para a análise de dados em biologia molecular.

Desde que os seqüenciadores capilares de DNA em larga escala surgiram, no fim da década de 90, a quantidade de dados biológicos produzidas simplesmente alcançou níveis que fizeram com que análises manuais de seqüências de DNA se tornassem simplesmente alternativas absurdas para o estudo de dados de genoma e transcriptoma. Dois desenvolvimentos foram importantes para permitir tanto o surgimento da bionformática quanto o rápido desenvolvimento da produção de seqüências de DNA. O primeiro deles foi o sequenciamento capilar. Enquanto no passado as seqüências eram produzidas em placas enormes que deveriam ser corridas de forma uniforme e com um grande cuidado, com o desenvolvimento da tecnologia de sequenciamento capilar, a eletroforese ocorria dentro de tubos com a espessura de um cabelo humano, contendo uma solução polimérica por onde o DNA deveria passar guiado por uma corrente elétrica, como uma eletroforese normal. O outro grande desenvolvimento foi a marcação dos didesoxinucleotídeos necessários para o sequenciamento do DNA com moléculas fluorescentes. Enquanto as reações tradicionais eram realizadas com marcadores radioativos, que tornavam a metodologia um tanto quanto trabalhosa e

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até mesmo perigosa, os marcadores fluorescentes permitiam maior segurança e ainda um novo avanço. Enquanto era preciso correr diferentes reações para cada nucleotídeo na marcação radioativa, a técnica de marcação fluorescente permitia que cada base fosse marcada com um diferente fluorocromo que era capaz de emitir luz em um diferente comprimento de onda se excitado por um laser. Essa luz, lida por um detector, informava ao sistema qual nucleotídeo passava em diferentes momentos da eletroforese. E foi exatamente a reunião desses dois desenvolvimentos num só aparelho que produziu o equipamento que posteriormente ficaria conhecido como “o seqüenciador que criou a bioinformática”. O primeiro desses aparelhos foi produzido pela empresa Applied Biosystems e foi chamado de ABI Prism 3700. Apresentava 96 colunas (ou capilares para a eletroforese) e permitia o sequenciamento de cerca de 550 bases em cada coluna, sendo oito vezes mais rápida do que a melhor concorrente da época e possibilitando o sequenciamento de até 1 milhão de pares de bases por dia. Além de permitir o rápido desenvolvimento da bioinformática, esse seqüenciador ainda geraria brigas políticas sobre quem é que deveria sequenciar todo o genoma humano, uma empresa particular ou o consórcio público, mas isso é outra história.

Figura 1.1. Crescimento do Genbank. Crescimento exponencial do número de seqüências contidas no GenBank ao longo das duas últimas décadas. Obtido em http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Genbank/genbankstats.html. O que importa é que, desde 1998, quando o ABI Prism foi lançado, outras empresas desenvolveram também seus seqüenciadores capilares de larga escala e o custo dessas máquinas – que antes chegava a trezentos mil dólares – foi aos poucos caindo e permitindo que mais e mais laboratórios pudessem ter seus próprios seqüenciadores. Cada vez mais dessas máquinas são vendidas ainda hoje e o número de seqüências de DNA produzidas vem aumentando exponencialmente até o presente momento. Leitura complementar: http://nextisnowbr.blogspot.com/2009/12/next-generation-sequencing-estado-da.html

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1.3. O que preciso saber para ser um bom bioinformata?

O profissional em bioinformática é raro no mercado, já que ele necessita saber e ser familiar a, pelo menos, três áreas distintas do conhecimento: a biologia molecular, a ciência da computação e a bioinformática per se. Além disso, conhecimentos em estatística e matemática são altamente recomendáveis. Imagine um biólogo que não tenha conhecimento de computação: ele será capaz de bolar uma infinidade de possíveis experimentos em bioinformática que gostaria que fossem gerados, mas será incapaz de colocá-los em prática. Do outro lado, um cientista da computação sem conhecimento em biologia e com sua característica ânsia de analisar dados, será capaz de pegar uma infinidade de dados biológicos e fazer uma grande quantidade de análises computacionais sem qualquer propósito, gerando resultados de difícil interpretação, por vezes ininterpretáveis ou sem qualquer sentido biológico. O trabalho em equipe, para a produção de projetos em bioinformática, pode ser interessante, desde que os profissionais trabalhem juntos todo o tempo. Reuniões apenas esporádicas normalmente fazem com que as idéias do trabalho do biólogo e do cientista da computação se afastem dos ideais iniciais da pesquisa. Isso no caso médio. É claro que é possível conseguir bons resultados em casos isolados. Considerando isso, torna-se necessário o desenvolvimento de um novo profissional, o bioinformata. Um biólogo que tenha tido uma formação parcial como cientista da computação ou vice-versa. Além disso, é preciso que tal profissional tenha ainda uma formação em bioinformática e que conheça profundamente as diferenças e as boas e más qualidades dos principais bancos de dados públicos sobre seqüências e estruturas de biomoléculas. Como não temos a intenção de ensinar biologia molecular ou ciência da computação, no presente curso daremos ênfase exatamente a esta última parte, que consiste na formação do bioinformata per si, que deve conhecer pelo menos o básico com relação à análise de genomas e as ferramentas e bancos de dados disponíveis na internet para o estudo dessa nova ciência. Com relação aos requisitos computacionais que serão apresentados apenas de passagem no presente curso, um profissional em bioinformática deve ter um bom conhecimento algum sistema operacional baseado em UNIX, sem qualquer sombra de dúvida. Quase todos os algoritmos utilizados para a pesquisa em bioinformática apresentam código aberto e são, freqüentemente, disponíveis apenas para sistema operacionais como o LINUX e o Solaris. Os programas de código aberto são aqueles nos quais os programadores disponibilizam todo o código fonte do programa para o usuário, que pode alterá-lo de acordo com a sua aplicação de interesse. E esse é também um dos motivos pelos quais os bioinformatas devem ser familiarizados com linguagens de programação. Um bioinformata que não sabe programar em uma linguagem qualquer tem dificuldades para se desenvolver e, portanto, o profissional deve estar ao menos apto a aprender alguma linguagem de programação. Outro conhecimento que gera um salto qualitativo na atividade do bioinformata é o conhecimento de bancos de dados e linguagem SQL. A linguagem SQL é a mais comumente utilizada em uma diversidade de bancos de dados e muitos sites disponibilizam informações armazenas em tabelas e bancos de dados inteiros. Devido à sua gratuidade e eficiência, o banco de dados mais utilizado em bioinformática é o MySQL, mas quaisquer outros podem ser utilizados sem demais inconvenientes. Mas mais importante ainda do que ser capaz de obter os bancos de dados públicos é o bioinformata ser capaz de criar seus próprios bancos de dados, organizando as informações de seu projeto e permitindo tanto um bom armazenamento quanto organização e fácil acesso aos dados. Além disso, o conhecimento de plataformas para disponibilizar dados para os pesquisadores é interessante e o bioinformata deve ter algum conhecimento de linguagem HTML e, de preferência alguma linguagem de

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programação para a internet, como o CGI ou o PHP, sendo que esse último ainda apresenta a vantagem de permitir fácil conexão com bancos de dados. É claro que a gama de conhecimento necessária para exercer bem uma profissão qualquer tende a ser infinita, mas é indispensável ao menos que o bioinformata seja proficiente em uma linguagem de programação e tenha bons conhecimentos de biologia molecular, dos bancos de dados e das ferramentas a serem utilizadas em cada caso. Aqui, iremos passar apenas de leve em programação e biologia molecular na próxima aula e depois passaremos direto para a parte que explica e mostra quais são as principais ferramentas utilizadas em análises genômicas e os principais bancos de dados que devem ser consultados em diferentes aplicações. 1.4. Cursos de pós-graduação em bioinformática no Brasil

Até o presente momento parecem existir apenas três cursos de pós-graduação em bioinformática no Brasil. O primeiro e mais tradicional deles é o curso de pós-graduação Lato Sensu em Bioinformática do LNCC, cuja página oficial pode ser vista em http://www.lncc.br/~biologia/. Três turmas de alunos já graduados de todo o país já foram formadas por esta pós-graduação, inclusive o presente autor desse curso on-line, quem vos escreve. Consiste num ótimo curso de especialização, no qual os maiores expoentes do país na área são chamados para ministrar diferentes aulas nos campos da genômica, transcriptômica e proteômica. Além desse curso de pós-graduação, que dura cerca de três meses e meio, o LNCC também oferece cursos esporádicos com duração entre duas semanas e um mês e recomenda-se visitar a página do LNCC para mais informações (http://www.lncc.br).

Logo a CAPES percebeu a importância de se abrirem cursos nessa área estratégica e propôs um edital para a formação de cursos de doutorado em bioinformática. A partir daí dois novos cursos de doutorado em bioinformática foram criados, um na USP (setembro de 2002) e outro na UFMG (abril de 2003). Para mais informações, visite o site dos programas http://www.ime.usp.br/posbioinfo/ e http://www.bioinfo.dout.ufmg.br/.

1.5. Conversando sobre bioinformática – BIOCHAT

A revista biotecnologia promove esporadicamente o chamado biochat, que consiste em uma conversa com um pesquisador experimente de uma determinada área do conhecimento. Abaixo transcrevo um dos biochats realizado com o autor do presente curso, onde várias dúvidas básicas sobre o assunto podem ser sanadas.

Assunto do Biochat: Conceitos e Paradigmas em Bioinformática Pesquisador entrevistado: Francisco Prosdocimi

Há uma grande confusão com relação ao que seja a bioinformática, sendo que muitos ainda acreditam que qualquer aplicação da computação à biologia possa ser referenciada como "bioinformática". Ao observarmos os trabalhos recentemente publicados na área, podemos dividí-los em três correntes básicas ou princípios paradigmáticos, chamados metaforicamente de "o tijolo", "a peneira" e "a lupa". Tais princípios serão apresentados e discutidos durante o BIOCHAT. Além disso, é interessante discutirmos quais seriam os pré-requisitos básicos para formar um bioinformata, tanto na área computacional quanto na área biológica. Do que, afinal, é feito um bioinformata e o que ele precisa conhecer é tema recorrente entre os curiosos sobre a área.O conceito da bioinformática, seus princípios paradigmáticos e a formação do bioinformata serão, portanto, os temas a serem discutidos neste BIOCHAT.

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Dr. Francisco Prosdocimi

Boa noite a todos! Está aberto nosso biochat sobre bioinformática. Por favor, enviem suas dúvidas para que possamos discutir e trocar idéias a respeito do assunto.

Vanderson: Grande Francisco... Afinal, qual o conceito mais aceito para Bioinformática?

Dr. Francisco Prosdocimi

Olá Vanderson. Fico agradecido pela sua presença. Na verdade existem vários conceitos para bioinformática e muita confusão é feita sobre o tema. Na minha opinião a bioinformática surgiu com o boom dos sequenciadores automáticos de DNA e ainda hoje está ligada a análises de seqüências de biomoléculas.

Adonis: Biologia computadorizada? Ouvi este termo e queria saber qual é a diferença disso para Bioinformática?

Dr. Francisco Prosdocimi

Pois é, meu prezado Adonis. A biologia computacional diz respeito a qualquer aplicação da computação na área biológica, enquanto a bioinformática está freqüentemente associada a analise de seqüências de genoma, transcriptoma e proteoma. Esses conceitos entretanto são bastante maleáveis e modificam-se todos os anos.

Pedro: Boa noite Dr. Francisco. Sou estudante do curso Bacharelado em Bioquímica, na Universidade Federal de Viçosa e tenho direcionado a minha formação acadêmica para me tornar...

Dr. Francisco Prosdocimi

Com relação aos cursos específicos para bioinformática, eles existem no Brasil apenas em nível de pós-graduação. Sendo que um deles é o curso de especialização lato sensu do LNCC, no qual acontece a formação de especialistas em bioinformática. Na USP e na UFMG existem cursos de doutorado em bioinformática, onde tais profissionais são formados. Eu, a propósito, fui aluno do LNCC e fui também o primeiro aluno a defender o doutorado em bioinformática na UFMG.

Francisco: Gostaria que vc respondesse o Pedro Marcus pq eu tenho a mesma dúvida...

Dr. Francisco Prosdocimi

Com relação a cursos de graduação, meu prezado xará, ainda não existem na área e recomendo que vc faça um curso de biologia ou de computação, se pretende seguir carreira em bioinfo.

Adonis: então bioinfo está dentro da biologia computacional?

Dr. Francisco Prosdocimi

Concordo, Adonis. Na minha opinião a bioinformática é, sim, uma parte da biologia computacional, sendo essa última uma área bastante ampla e não necessariamente relacionada com biologia molecular. Embora, repito, esses conceitos são maleáveis e modificam-se com o desenvolver das ciências.

Pedro: Qual a sua experiência com a Bioinformática? O senhor trabalha mais no meio acadêmico ou se relaciona diretamente com o mercado de trabalho?

Dr. Francisco Prosdocimi

Trabalho com bioinformática desde 2000, tendo tido anteriormente uma formação como biólogo molecular em bancada. Fiz minha monografia de bacharelado, minha dissertação de mestrado (em genética) com análises de transcriptomas do verme Schistosoma mansoni e fui o primeiro aluno a defender o doutorado em bioinformática na UFMG trabalhando com análises de qualidade de seqüências de DNA e genômica comparativa. Sempre trabalhei mais voltado para o meio acadêmico, mas já fiz também alguns trabalhos em parceria com uma empresa de Belo Horizonte na área de bioinformática. A empresa se chama vetta technologies.

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Vanderson: Pegando a deixa do Pedro, você acha que há mercado de trabalho para bioinformatas no Brasil... além das instituições públicas e da Alellyx?

Dr. Francisco Prosdocimi

Infelizmente, meu amigo Vanderson, não acredito que haja ainda mercado de trabalho para bioinformática fora das universidades, embora o campo na área de biotecnologia tenha crescido e venha crescendo. A existência de algumas empresas trabalhando em biotecnologia é muito pequena ainda no Brasil e apenas a Alellyx e a Scylla têm alguma representatividade no mercado. Ou seja, a bioinformática ainda é matéria para cientistas financiados pelo governo.

Adonis: Qual seria a dica para trabalhar com bioinfo em um lugar onde não se faça molecular?

Dr. Francisco Prosdocimi

A dica é estar em parceria com pesquisadores que tenham perguntas que só possam ser respondidas através de análise computacional. Eu mesmo tenho várias colaborações com diferentes laboratórios e produzi um software recentemente, o TGFinder, que surgiu como uma necessidade de um pesquisador de encontrar genes controlados por fatores de transcrição. Além disso, o GenBank possui tantas seqüências depositadas e tanta informação a ser mineirada que nem todos os cientistas do mundo seriam capazes de tudo analisar. É claro que a pesquisa de ponta é normalmente aquele onde se produz e se analisa um novo dado em biologia molecular, mas há muito ouro a ser peneirado nos bancos de dados públicos.

Paulo: Olá Dr. mas como é aplicada a computação ou informática, na biologia,neste sequenciadores automáticos de DNA?

Dr. Francisco Prosdocimi

A computação é aplicada, principalmente, na análise e identificação das seqüências de DNA que saem dos sequenciadores automáticos. A seqüência sai de lá como um monte de A, C, T e G... que não querem dizer nada. O que significa para você isso aqui: ACATAGGGACATTACAGAGCATTCAGA? Somente com a bioinformática conseguimos atrelar a informação codificada em informação biológica, associando A, C, T e G a algum nome de gene com alguma função especifica...

Pedro: Aprofundando mais a discussão, a iniciativa privada na bioinformática está...

Dr. Francisco Prosdocimi

O grande problema, Pedro, é que acredito que dificilmente a bioinformática per se pode dar algum lucro. Por exemplo, a empresa Alellyx tem, além de um grande know how em bioinfo, um grande know how em biologia molecular e em genômica. A descoberta de novos genes 'apenas' por bioinfo é muito difícil e é preciso estar sempre sequenciando novos organismos. E um sequenciador de DNA é muito caro para que pequenos empresários possam comprar, o capital inicial de uma empresa de biotecnologia apresentando bioinformática é muito alto.

Marx: E fora do Brasil, como estão as perspectivas?

Dr. Francisco Prosdocimi

Fora do Brasil eu acredito que haja bastante espaço, sim, para bioinformatas. Assino uma lista de jobs em bioinformática e freqüentemente vejo pedidos para profissionais da área... o único problema é que normalmente exige-se grande experiência prévia, o que não temos ainda no Brasil -- profissionais qualificados.

Adonis: Dr. Francisco Prosdocimi, fale um pouco sobre mineração de dados já que esta é o etapa seguinte depois da geração das seqs.

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Dr. Francisco Prosdocimi

Bem, caro Adonis, isso me remete aos princípios paradigmáticos da bioinformática que apresentei no texto introdutório. Acredito que os trabalhos atuais em bioinformática podem ser divididos em três correntes principais, os trabalhos de tijolo -- onde ferramentas de bioinformática são produzidas para construir os edifícios genômicos, os trabalhos de peneira -- onde a mineração da grande massa de dados em genômica são analisados mais especificamente em vários contextos -- e os trabalhos de lupa, onde a genômica encontra a ciência e o método científico de observação, hipótese, experimentação e resultados são novamente retomados. Escrevi um trabalho sobre isso para a revista ciência hoje que foi publicado em 2004.

Pedro:

Trabalho atualmente no BIOAGRO-UFV (Instituto de Biotecnologia Aplicada à Agropecuária) no Laboratório de Bioinformática, desenvolvendo softwares de análise populacionais (genética de populações). Você considera válido esse tipo de iniciativa ou seria melhor eu estar trabalhando mais especificamente com a biologia molecular?

Dr. Francisco Prosdocimi

Considero muito válido seu trabalho. Mas também já tentei produzir algo relacionado a genética de populações e acho muito difícil produzir algo melhor do que os já conhecidos programas PAUP, PHYLIP, MEGA, dentre outros. Boa sorte!

Paulo: Poderíamos ou podemos, descobrir qual a seqüência para uma determinada proteína ou característica. Ou para identificar estes pares, para saber qual proteína ela vai produzir, seria isto?

Dr. Francisco Prosdocimi

Podemos sim, saber qual a seqüência de DNA é relativa a uma determinada proteína e, muitas vezes, uma característica. Existe até mesmo um projeto conhecido como FENOMA, que tenta identificar os genes responsáveis por algum fenótipo (característica). O que acontece, entretanto, é que grande parte das características são geradas através de um grande número de genes que interagem entre si e fazem da análise algo complicadíssimo!

Vanderson: Tenho uma opinião a expressar... Um grande problema que eu percebo na maioria dessas ferramentas de bioinformática é o total descaso com usuários

Dr. Francisco Prosdocimi

Concordo plenamente, Vanderson. Biólogos não estão interessados em utilizar sistemas linux, linhas de comando e outros artifícios computacionais de start-up razoavelmente complexo. Interfaces gráficas e fáceis, de preferência via web e bastante user-friendly são altamente recomendáveis. Mas é preciso dizer que há também programas com manuais completos e simples, mas o usuário parece ter preguiça de lê-los, o que definitivamente é preciso fazer.

Carla: Por acaso já se pode analisar um gene pelo computador?

Dr. Francisco Prosdocimi

É claro, Carla, os genes são formados por seqüências de nucleotídeos que são representadas por A, C, G e T, transformando as seqüências dos genes em letrinhas que são analisadas e comparadas entre diferentes espécies animais.

Adonis: É real a migração de perl para java? ou isso só tá ocorrendo no meio privado? Essa migração seria um preocupação com uma interface mais amigável?

Dr. Francisco Prosdocimi

Caro Adonis, acredito que a migração de PERL para JAVA está relacionada ao fato de que a linguagem JAVA é multiplataforma, além de ser nativamente orientada a objetos, o que facilita a criação de programas mais complexos e de grande porte. Acredito que os scripts

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freqüentemente utilizados em trabalhos de bioinformática devem continuar sendo produzidos em PERL, que é uma linguagem onde a expressão regular é nativa e rápida, sendo mais apropriada para tais trabalhos. Sim, a migração também pode estar relaciona com uma interface mais amigável, já pronta em vários objetos JAVA.

Carla: Como o Brasil está em relação a outros paises, nesse desenvolvimento? O nosso país valoriza a bioinformática?

Dr. Francisco Prosdocimi

O Brasil anda atrás dos países desenvolvidos quando o assunto é bioinformática e, apesar de que recentes iniciativas da CAPES e do CNPq vêm tentando buscar equiparação internacional, a bioinformática brasileira ainda está em seu berço (esplêndido).

Macedo:

Boa noite Dr. Gostaria de saber sobre o cenário de Software Livre x Software Proprietário em bioinformática. O Sr. acredita que a adoção do software livre pode ajudar na redução de gastos em pesquisa e desenvolvimento e que isso possibilitará o estudo de doenças negligenciadas? Ou o segmento acadêmico enxerga o software livre apenas como ª...

Dr. Francisco Prosdocimi

No caso da bioinformática posso assegurar que mais de 95% dos softwares são livres ou de livre acesso (pelo menos para o meio acadêmico) e cerca de 50% são de livre acesso para todos. Por isso, a bioinformática exige um custo inicial para pesquisa bem baixo e esse é mais um dos motivos pelos quais essa ciência deveria ser mais incentivada em nosso país. Com um computador razoável e boas idéias é possível fazer boa bioinformática!!!

Pedro:

Uma empresa privada que prestasse suporte em bioinformática (desenvolvendo softwares sequenciadores para organismos específicos ou que atendessem alguma demanda de determinada pesquisa, com uma interface mais amigável com o usuário final) poderia dar certo?

Dr. Francisco Prosdocimi

Não estou bem certo, Pedro. O problema é que a idéia para elaboração de softwares teria de vir da academia e não sei o pessoal das universidades estaria disposto a dar a idéia para que vc fizesse o software para eles comprarem, entende? Eles prefeririam pedir no departamento de computação para ver se algum outro aluno faria o mesmo software de graça, gerando um trabalho publicável em conjunto. A menos que vcs produzissem um pacote grande, para uma ampla gama de aplicações... aí vc poderia dar certo com sua empresa...

Dani:

Um profissional em bioinformática deve saber tanto trabalhar com os softwares de análises de seqüências quanto desenvolver novos programas? Quais são as linguagens de programação mais utilizadas para este fim?

Dr. Francisco Prosdocimi

Ótima pergunta, Dani. É imprescindível para o profissional de bioinformática, na minha opinião, ter quatro conhecimentos básicos: (1) Ele deve entender bem biologia molecular, (2) saber trabalhar com os bancos de dados disponíveis na internet, (3) saber BEM uma linguagem de programação e (4) saber manipular bancos de dados. Estes, na minha opinião, são os principais requisitos para formar um bioinformata.

Pedro: Você contrataria uma empresa dessa natureza para dar suporte às suas pesquisas ou prefere, você mesmo, desenvolver os aplicativos com que trabalha?

Dr. Francisco Prosdocimi

Depende do quanto de trabalho fosse necessário. Se fosse pouco trabalho, eu mesmo desenvolveria. Se necessitasse de um software

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amplo, talvez preferisse pagar... mas dependeria de financiamento governamental para isso... e o governo não gosta muito do assunto 'comprar softwares de empresas privadas para trabalhos científicos'. No último edital do CNPq para bioinfo, enviamos um projeto tentando comprar um software e o projeto não foi aprovado... possivelmente por este único motivo.

Fabio:

Boa Noite Dr. Francisco, participei da primeira turma de especialização em bioinformática do LNCC, atualmente estou fazendo doutorado em microbiologia na UFRJ. Gostaria de saber na sua opinião quais são as principais diferenças dos cursos de doutorado em Bioinformatica da USP e da UFMG?

Dr. Francisco Prosdocimi

Fala, Fábio. É com receber companheiros por aqui... fui seu sucessor no LNCC, participando da segunda turma. Não posso dizer muito do curso de doutorado na USP, o qual conheço pouco. Mas ao que me parece o curso da USP é muito voltado para as ciências exatas, tendo uma alta carga de disciplinas de matemática e estatística. Aqui na UFMG a carga de disciplinas é bem balanceada e leve, de forma que o aluno possa se preocupar mais com seu projeto de tese.

Pedro: A quantas anda o desenvolvimento das pesquisas em bioinformática aqui no estado de Minas Gerais?

Dr. Francisco Prosdocimi

Aqui em Minas temos alguns grupos de bioinformática montados. Não posso dizer que conheço todos eles, mas aqui na UFMG temos ao menos uns três grupos de bioinformática, trabalhando com genoma de 'Schistosoma mansoni', genômica comparativa e genômica evolutiva, mas as coisas ainda são um pouco precárias e a infra-estrutura não é das melhores.

Dani:

Sou bióloga, especialista em biotecnologia - trabalho com saneamento - área ambiental - - mas tenho grande interesse em bioinformática. Quais são os conhecimentos básicos de informática que um biólogo deve ter para iniciar um mestrado em bioinformática?

Dr. Francisco Prosdocimi

Bem, não conheço nenhum mestrado em bioinformática e acho que -- se houvesse algum -- o aluno deveria conhecer o básico de sistemas linux e linguagens de programação. Mas dependendo, se o mestrado for para biólogos ou para “computólogos”, os conhecimentos a serem exigidos são diferentes. Se for um mestrado para biólogos é possível que não seja necessário nenhum conhecimento de informática e todo o conhecimento pode ser adquirido quando da realização do curso.

Dani: Qual é campo de trabalho para um pós-graduado em bioinformática, além do desenvolvimento de pesquisas em universidades, fundações de pesquisa Federais,Estaduais e a Licenciatura?

Dr. Francisco Prosdocimi

Bem, essa pergunta é um tanto quanto capciosa. Se uma pessoa formou em bioinformática, imagino que ela queira fazer pesquisa ou dar aulas. É claro que ela pode também trabalhar em alguma empresa de biotecnologia ou de bioinformática per si... mas acredito que aí ela teria que ir pra fora do Brasil...

Ricardo: Quais são os trabalhos que vc está fazendo ultimamente na área?

Dr. Francisco Prosdocimi

Olá, Ricardo. Ultimamente tenho trabalhado com análises do software PHRED, com a montagem de um programa para simular a evolução em locos de microsatélites, trabalho também com a diferença na utilização de aminoácidos por proteínas de diferentes organismos, com a origem do código genético, com famílias de proteínas dedos de zinco, dentre diversas outras coisas.

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Pedro: Então, estarei entrando em contato com o senhor (pois estou na organização do evento). Mais uma pergunta, ainda é muito cedo para pensarmos em cursos de graduação em bioinformática no Brasil?

Dr. Francisco Prosdocimi

Ok. Acho que um curso de graduação em bioinformática poderia ser bastante interessante sim, mas acho que é cedo para isso. Ainda não há, só pra vc ter uma idéia, um conceito amplo do que seja bioinformática e é preciso que esta disciplina fique mais madura ao longo dos anos para que esse conceito brote claramente. Acho que os biólogos moleculares atualmente são os principais candidatos a se tornarem bioinformatas e não há nem cursos de graduação em biologia molecular... pelo menos desconheço...

Pedro: A título de informação: foi criada na grade curricular do Bacharelado em Bioquímica-UFV a BQI460 (Bioinformática), onde serão abordados os principais aspectos dessa nova área do conhecimento.

Dr. Francisco Prosdocimi

Bem, aqui na UFMG o prof. Miguel Ortega já ministra à mais de dois anos uma matéria de tópicos em bioquímica e biologia molecular cujo assunto é a bionformática. É bastante interessante que a universidade de Viçosa tenha proposto uma disciplina específica sobre o assunto e mostra como está atualizada com relação aos novos avanços da biologia molecular.

Pedro: O que você considera como maior desafio para a consolidação da Bioinformática no Brasil?

Dr. Francisco Prosdocimi

Considero o maior desafio a formação dos profissionais e a montagem de infra-estrutura adequada e de computadores de alto-desempenho para as análises mais elaboradas na área.

1.6. Referências Bibliográficas e textos complementares 1 Davies, K. (2001). Decifrando o genoma. Companhia das letras. 2. NCBI: A Science Primer - http://www.ncbi.nlm.nih.gov/About/primer/index.html 3. NCBI: A Science Primer – Bioinformatics - http://www.ncbi.nlm.nih.gov/About/primer/bioinformatics.html

4. Chico On Line – Bioinformática - http://www.icb.ufmg.br/~franc/cool 5. GenBank Stats - http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Genbank/genbankstats.html 1.7 Brainstorm 1. Dê sua opinião sobre o que entende por bioinformática e qual a importância da área.

2. Vá ao site do NCBI (National Center for Biotechnology Information, o centro americano para informação biotecnológica, http://www.ncbi.nlm.nih.gov), leia e navegue um pouco. Encontre algum serviço interessante e reporte sua experiência.

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CAPÍTULO 2

Genoma, biologia molecular e computação 2.1. Introdução

Como já foi dito, o presente curso não tem como função explicar genômica, biologia molecular ou computação. Ainda assim, alguns conceitos se tornam importantes para que possamos seguir o curso e neste capítulo estaremos nos dedicando a eles.

2.2. Sequenciamento do DNA

Figura 2.1. O dogma central da biologia molecular. Da análise de DNA temos os projetos genoma, da análise do conteúdo de RNAs mensageiros de uma célula produzimos estudos de transcriptoma e a partir da análise de conteúdo protéico geramos os projetos proteoma.

A bioinformática surgiu a partir da biologia molecular e dela ainda é inseparável

(figura 2.1). No capítulo anterior, aprendemos que a bioinformática se desenvolveu principalmente depois do surgimento dos seqüenciadores de DNA em larga escala, como o ABI Prism 3700. A reação de sequenciamento de DNA consiste basicamente em um processo de amplificação da molécula de DNA de interesse. Entretanto, durante essa amplificação, são utilizados tanto os nucleotídeos normais de DNA, conhecidos como desoxiribonucleotídeos quanto alguns nucleotídeos especiais, conhecidos como di-desoxiribonucleotídeos. A diferença entre eles é que os didesoxinucleotídeos apresentam, como o nome diz, uma molécula de oxigênio a menos, eles não contém uma extremidade 3’OH livre. Assim, se lembrarmos como é formado o esqueleto de uma cadeia de DNA, veremos que os nucleotídeos adjacentes são ligados entre si através de uma ligação com um grupamento fosfato exatamente na posição do carbono 3’. Isso significa que, um nucleotídeo que não apresente um grupamento OH nesta posição (chamado di-desoxiribonucleotídeo ou simplesmente di-desoxinucleotídeo) impede a ligação de um nucleotídeo em seguida, o que interrompe a cadeia de DNA naquela posição. Assim, durante a amplificação em que consiste a reação de sequenciamento do DNA, são produzidas moléculas de diferentes tamanhos, sendo que cada uma delas possui, na sua extremidade, um didesoxinucleotídeo que impede a ligação de outros nucleotídeos a seguir. Além disso, dependendo de qual base ele carrega, cada um desses nucleotídeos sem a extremidade 3’OH livre

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apresenta um pigmento fluorescente diferente adicionado. Após a reação de sequenciamento – que é realizada num termociclador, assim como um PCR --, as moléculas resultantes são submetidas a uma eletroforese. Nesse procedimento, o DNA resultante da amplificação é submetido a um gradiente elétrico dentro de uma matriz de gel, que permite uma mobilidade diferencial das moléculas. As moléculas pequenas de DNA movem mais rapidamente para o pólo positivo durante essa eletroforese. Essas moléculas pequenas foram aquelas que incorporaram didesoxinucleotídeos mais precocemente do que as outras. E assim, elas vão se movendo na matriz gelatinosa mais rapidamente, indo em direção ao pólo positivo. Quando chegam próximo ao pólo, um laser incide sobre essa molécula e, dependendo de qual didesoxinucleotídeo foi incorporado em sua extremidade final, o laser promove a incidência da fluorescência num receptor que capta, afinal, qual foi o comprimento de onda daquele fluoróforo excitado. Assim, conseguimos descobrir qual foi a última base daquela molécula já que diferentes didesoxinucleotídeos -- com diferentes bases nitrogenadas (A, C, G ou T) --, produzem fluorescência diferente a ser captada pelo laser e, dessa forma, sabemos se a última base daquela molécula é uma adenina, uma guanina, uma citosina ou uma timina. E à medida que as moléculas vão passando pelo gel, cada uma contendo a diferença de um único nucleotídeo marcado de acordo com sua base, o computador vai gerando um perfil de fluorescências que posteriormente serão transformadas nas letras que representam a seqüência de bases da molécula original por algoritmos específicos, que trataremos posteriormente neste curso.

Não é tarefa fácil explicar na forma de texto como é realizado o sequenciamento do DNA e, por isso, recomendo aos alunos acessarem o seguinte site para entenderem melhor como o seqüenciamento do DNA é realizado, passo a passo: http://www.dnalc.org/shockwave/cycseq.html. Outras animações interessantes em biologia molecular (como a da técnica de PCR de amplificação do DNA ou técnicas forenses baseadas em DNA) podem ser obtidas no mesmo site. É preciso, entretanto, fazer o download gratuito do programa macromedia shockwave. 2.3. Genômica

Um genoma consiste no conjunto haplóide de informações presentes no DNA de um determinado organismo. O conjunto é haplóide porque, na verdade, um organismo diplóide apresenta uma dupla cópia de um mesmo segmento de DNA, presente nos cromossomos homólogos. Assim, não faz sentido ter essa redundância de informação e, por isso, considera-se o genoma como sendo o conjunto haplóide de informação genética. Para obter uma seqüência genômica devemos pegar as células de um determinado organismo, purificarmos seu DNA e realizarmos a construção da chamada biblioteca de DNA genômico. Para tal, o DNA do organismo deve ser picotado em pequenos pedacinhos e ligado nos chamados vetores de clonagem -- que podem ser plasmídeos, cosmídeos ou vetores que permitem a inserção de segmentos grandes de DNA, como os BACs ou YACs que são, respectivamente, os cromossomos artificiais de bactérias e leveduras. A partir desses vetores é que são, freqüentemente, seqüenciados os segmentos de DNA e cada reação de sequenciamento produz moléculas apresentando algo entre trezentos e mil pares de bases. Como os genomas são muito maiores do que esse tamanho, mostra-se necessária a montagem do genoma utilizando algoritmos de sobreposição de seqüências, que serão apresentados em aula posterior. E se o genoma consiste no sequenciamento da molécula de DNA de uma determinada célula, o transcriptoma consiste no sequenciamento do conteúdo de RNA mensageiro (mRNA) produzido em uma determinada célula sujeita a determinada condição. Enquanto uma célula apresenta apenas um genoma estático e imutável, a

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mesma pode apresentar milhares de diferentes conteúdos de transcriptoma, já que a expressão de genes depende de diversos fatores, como o grau de maturação da célula, a temperatura à qual ela está sujeita, os nutrientes presentes no meio, a presença de algum agente mutagênico específico e mais milhares de outros fatores. Assim, os estudos de transcriptoma podem mostrar a adaptação da célula a determinada condição e podemos estudar os genes que ficam ativos quando dessa condição. Na produção de um projeto transcriptoma (ou de genômica funcional, como também é freqüentemente chamado) deve-se purificar o conteúdo de mRNA da célula da condição desejada. Como o RNA é uma molécula muito instável, realiza-se sua transcrição reversa, transformando este RNA numa molécula conhecida como cDNA, que representa o DNA complementar à seqüência daquele mRNA. Esse cDNA é então clonado em vetores de clonagem para a produção da biblioteca de cDNA que contém uma amostra fiel dos mRNAs que foram produzidos pela célula naquela condição. Vale notar que, enquanto no genoma observa-se normalmente apenas uma cópia de cada gene, nas análises de transcriptoma, cada um dos genes pode estar amostrado dezenas de vezes, pois a célula pode estar precisando do mesmo para realizar algum tipo de processo e ele pode ter sido transcrito centenas de vezes em moléculas de mRNA. 2.4. As ômicas: integrando a bioinformação

Veja o artigo publicado na edição 32 da revista biotecnologia: http://www.biotecnologia.com.br/revista/bio32/omicas_32.pdf. O pesquisador da Embrapa Soja, Eliseu Binneck, apresenta o status atual da

genômica no mundo e ainda vários conceitos importantes de biologia molecular e genômica. Binneck, Eliseu. As ômicas: integrando a bioinformação. Biotec Ci & Des 32: 28-37. http://www.biotecnologia.com.br/revista/bio32/omicas_32.pdf 2.5. O PERL e outras linguagens de programação

No capítulo anterior discutimos sobre os conhecimentos relevantes para um profissional na área de bioinformática. Nesse momento, portanto, gostaria de falar mais um pouco sobre a informática utilizada para a análise de seqüências. É extremamente importante que qualquer pessoa trabalhando na área de bioinformática conheça alguma linguagem de programação. E a principal linguagem utilizada por profissionais da bioinformática é o PERL. O PERL é uma linguagem de script que foi criada em 1987 por um cientista da computação chamado Larry Wall e é uma sigla para Practical Extraction and Report Language ou, em português, Linguagem Prática de Extração e Relatório. Segundo a wikipedia (http://pt.wikipedia.org/), a origem do PERL remonta ao shell scripting, que é a programação em linhas de comando, ao awk, uma outra linguagem bem simples de programação shell e à linguagem C, uma das mais utilizadas pelos programadores. Essa linguagem é disponível para praticamente todos os sistemas operacionais, mas é utilizada mais freqüentemente em sistemas Unix e compatíveis. E o PERL é freqüentemente utilizado pelos bioinformatas porque é uma linguagem montada para trabalhar facilmente com o processamento de cadeias de caracteres (chamadas de strings pelos informatas), permitindo ainda uma fácil manipulação de arquivos texto e a utilização das chamadas expressões regulares, muito úteis para se realizar busca em seqüências de caracteres. Como tanto o DNA

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quanto o RNA e as proteínas podem ser facilmente representados por seqüências de caracteres – nucleotídeos ou aminoácidos, representados por seqüências de uma letra --, o PERL acabou por permitir, intrinsecamente, uma fácil manipulação dos dados de biologia molecular.

Um exemplo simples de programa em PERL é apresentado abaixo para transformar uma seqüência de DNA de entrada em uma nova seqüência de RNA. O programa considera que a fita de DNA de entrada é a fita codificadora e, portanto, o programa apenas transforma as letras T, de timina, do DNA em letras U, de uracila, representando as bases do RNA.

Pequeno script PERL para obter uma fita de RNA a partir de uma fita de DNA. #!/usr/bin/perl

# Seqüência que se deseja utilizar

$meuDNA= “TTCCGAGCCAATTGTATCAGTTGCCAATAG”;

# Faz com que a seqüência de RNA receba a mesma seqüência do DNA

$meuRNA = $meuDNA;

# Troca as bases produzindo a fita complementar

$meuRNA =~ tr/T/U/;

print “Minha seqüência de RNA é: \n $meuRNA”;

A primeira linha é obrigatória e diz ao programa o caminho onde se encontra o

interpretador PERL para que o programa possa encontrá-lo na hora de sua execução. Normalmente o PERL está disponível no diretório /usr/bin das distribuições Unix. Vale notar que, ao contrário da grande maioria das outras linguagens de programação normalmente utilizadas, um programa PERL não é compilado de forma a gerar um executável em linguagem de máquina. O script PERL necessita, portanto, de que exista um interpretador PERL instalado em alguma pasta de trabalho dentro do computador e é exatamente a pasta onde esse interpretador está localizado que deve aparecer nesta primeira linha de código. As linhas do script que se começam com o sinal “#” representam linhas de comentário e servem apenas para facilitar o entendimento do código, não sendo realmente lidas pelo interpretador. Todas as variáveis em programação PERL são precedidas do sinal de dólar “$”, elas não têm um tipo pré-definido (como inteiro, booleano, real, etc.) e não precisam ser declaradas anteriormente, cabe ao programador saber como e em que contexto devem ser utilizadas. Há também as variáveis do tipo array, que são precedidas do sinal de “@” e as variáveis do tipo hash, que devem ser precedidas do sinal de “%”. Todos os comandos terminam sempre com um sinal de ponto-e-vírgula. Neste exemplo, a linha que realmente faz a tradução de uma seqüência de DNA para uma seqüência de RNA é a que apresenta o sinal “=~”. Esse sinal está relacionado à utilização de uma expressão regular que, no caso, faz a tradução de todos as letras T de uma seqüência de caracteres, transformando-as em letras U. No fundo, a bioinformática – e, num sentido mais amplo, todo software -- pode ser desenvolvido utilizando-se qualquer linguagem de programação e há os que ainda preferem utilizar a linguagem C ou Java para produzir qualquer tipo de programa. No fundo, essa é uma opção pessoal e por mais que uma ou outra linguagem seja mais adaptada ou mais rápida para determinado problema, é possível fazer quase qualquer coisa com quase qualquer linguagem. Entretanto, mesmo essa simples tradução que fizemos de DNA para RNA com apenas uma linha de código, pode se tornar mais árdua quando realizada em diferentes linguagens e é exatamente por isso que o PERL é mais utilizado na área; por facilitar a programação. Para sistemas mais complexos, no

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entanto, parece ser consenso que a utilização de uma linguagem de programação multi-plataforma, como é o caso do Java, seja mais adequada. 2.6. Referências Bibliográficas e textos complementares 1. Dolan DNA Learning Center - Biology Animation Library - http://www.dnalc.org/resources/BiologyAnimationLibrary.htm

2. Binneck, Eliseu. As ômicas: integrando a bioinformação. Biotec Ci & Des 32: 28-37. http://www.biotecnologia.com.br/revista/bio32/omicas_32.pdf

3. Perl, Wikipedia. http://pt.wikipedia.org/wiki/Perl 2.7. Brainstorm 1. Você viu a animação sobre como é feito o sequenciamento do DNA, descreva agora as etapas através das quais é realizada esta técnica.

2. Descreva como são feitos projetos genoma e transcriptoma. 3. Perguntas sobre o texto escrito por Binneck.

a. Apesar de apresentarem um número de genes bastante similar a outros organismos, diz-se que os seres humanos apresentam uma diversidade de proteínas muito maior do que eles. A que se deve tal diversidade? b. Qual a porcentagem do genoma humano que é responsável pela produção de genes/proteínas? E o resto, qual seria o motivo – se é que há algum – para haver tanto DNA não codificante no genoma? c. Você acredita que genes que alteram seus padrões de expressão em conjunto possam ter funções parecidas? Por quê? d. Escolha duas das ciências “ômicas” e descreva-as e. Discorra sobre o papel da bioinformática na agregação de dados em biologia

4. Com relação a linguagens de programação, por que o PERL é conhecido como a linguagem dos bioinformatas? Os dados em bioinformática podem ser tratados com outras linguagens de programação? Cite outra linguagem possível.

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CAPÍTULO 3

Alinhamento de Seqüências 3.1. Introdução

O alinhamento de seqüências consiste no processo de comparar duas seqüências (de nucleotídeos ou proteínas) de forma a se observar seu nível de identidade. Essa técnica de comparação de seqüências é implementada segundo um conceito de desenvolvimento de programas conhecido como um algoritmo guloso e é um dos pilares de toda a bioinformática. Existem centenas de aplicações do alinhamento de seqüências, tanto na identificação de genes e proteínas desconhecidas, quanto na comparação da ordem de genes em genomas de organismos proximamente relacionados (sintenia), no mapeamento de seqüências expressas dentro de um genoma para identificação de genes, na montagem de genomas e em diversas outras aplicações.

Por exemplo, podemos alinhar duas seqüências para descobrirmos o grau de similaridade entre as seqüências de forma que possamos inferir (ou não) a uma delas, alguma propriedade já conhecida da outra (Prosdocimi et al., 2003). O alinhamento entre duas seqüências pode ser feito de forma global ou local (Figura 3.1.).

Figura 3.1. Alinhamento global e local. À esquerda vemos um exemplo de como é feito um alinhamento global das seqüências e à direita vemos um exemplo da realização de um alinhamento local. Retirado de Prosdocimi et al., 2003. 3.2. Alinhamento Global

O alinhamento global é feito quando comparamos uma seqüência de aminoácidos ou nucleotídeos com outra, ao longo de toda sua extensão (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/glossary2.html). O algoritmo Needleman-Wunsch é o mais conhecido para realizar esse tipo de alinhamento,

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embora outros programas, como o MULTALIN

(http://prodes.toulouse.inra.fr/multalin/multalin.html) também o façam (Corpet, 1988). Nesse caso são dados valores em uma matriz de comparação para as similaridades (matches), diferenças (mismatches) e falhas (gaps) encontrados durante o alinhamento das seqüências. As somas dos valores do alinhamento, de acordo com essa matriz de comparação, resulta num valor, que é um escore de similaridade entre as seqüências (Figura 3.2.). No MULTALIN não é dado escore de similaridade (já que ele permite o alinhamento de várias seqüências ao mesmo tempo), e a semelhança entre as seqüências deve ser medida através de inspeção visual. 3.3. Alinhamento Local

O alinhamento local acontece quando a comparação entre duas seqüências não é feita ao longo de toda sua extensão, mas sim através de pequenas regiões destas (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/glossary2.html).

O principal programa utilizado para o alinhamento local de seqüências é o BLAST (Basic Local Alignment Search Tool ou Ferramenta Básica de Procura por Alinhamento Local), encontrado em http://www.ncbi.nlm.nih.gov/BLAST/. Esse software compreende um conjunto de algoritmos de comparação de seqüências montado de forma a explorar toda a informação contida em bases de dados de DNA e proteínas (http://www.ncbi.nlm. nih.gov/BLAST/blast_overview.html). Os programas BLAST foram desenvolvidos de modo a aumentar ao máximo a velocidade da busca por similaridade -- já que as bases de dados são grandes e vêm crescendo exponencialmente --, mesmo correndo o risco de perder um pouco na sensibilidade do resultado (Altschul et al., 1997). A rapidez da busca deve-se ao fato de que o programa utiliza uma heurística que quebra as seqüências de entrada e das bases de dados em fragmentos – as palavras (words) – e procura, inicialmente, similaridades entre elas. A busca é então feita com palavras de tamanho W que devem apresentar pelo menos um escore T de alinhamento entre si, dado de acordo com uma matriz de valores. Assim, as palavras que apresentam esse escore T (maior responsável pela velocidade e sensibilidade da busca) (Altschul et al., 1997) são estendidas em ambas as direções para ver se geram um alinhamento com um escore maior do que S. Uma outra vantagem de se utilizar o alinhamento local feito pelo BLAST é que, dessa forma, é possível identificar relações entre seqüências que apresentam apenas regiões isoladas de similaridade (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/similarity.html).

Figura 3.2. Alinhamento de seqüências. O alinhamento de seqüências de DNA é feito através da procura de uma região de similaridade entre duas seqüências utilizando um

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algoritmo guloso. Quando essa região é encontrada são dados pontos para similaridades (match), diferenças (mismatches), abertura de falhas (gap opening) e extensão de falhas (gap extension) que possam ser encontradas no seu alinhamento. A somatória dos pontos desse alinhamento é chamado de escore do alinhamento e, no exemplo mostrado, o escore do alinhamento é 3. Tais escores são contabilizados tanto nos alinhamentos globais quanto locais.

Os resultados do BLAST são então apresentados de acordo com dois parâmetros: o valor do escore (Score bits) e o valor E (e-value). O valor de escore depende do tamanho do alinhamento, do número de matches/mismatches/gaps e da matriz de comparação de seqüências utilizada e é normalizado através de variáveis estatísticas (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/Blast_output.html). Já o valor E representa o número de alinhamentos com escores iguais ou melhores que “S” que seria de se esperar que ocorressem ao acaso numa base de dados do tamanho da utilizada. Assim, quanto menor o valor E, melhor o alinhamento, de forma que (num banco de dados de grandes proporções) um valor de E igual a zero significa que não há chance de que um alinhamento entre as duas seqüências tenha ocorrido por mero acaso (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/glossary2.html).

O BLAST apresenta diferentes subprogramas que devem ser utilizados de acordo com o tipo de seqüência de entrada e os bancos de dados que se deseja pesquisar. A TABELA 3.1 apresenta as possibilidades de entrada, bancos de dados e programa a ser utilizado.

Formato da Seqüência de

Entrada Banco de dados

Formato da seqüência que é comparado

Programa BLAST

adequado Nucleotídeos Nucleotídeos Nucleotídeos BLASTn Proteínas Proteínas Proteínas BLASTp Nucleotídeos Proteínas Proteínas BLASTx Proteínas Nucleotídeos Proteínas TBLASTn Nucleotídeos Nucleotídeos Proteínas TBLASTtx Tabela 3.1: Programas BLAST utilizados de acordo com o formato de entrada de seqüência e banco de dados desejados. Adaptada de http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/query_tutorial.html. 3.4. Alinhamentos ótimos e heurísticos Algo que deve ser levado em consideração sempre que se deseja fazer alinhamentos de seqüências é o fato de que o alinhamento desejado seja o melhor possível de ser obtido através de ferramentas computacionais ou se desejamos apenas uma aproximação válida desse melhor resultado. É evidente que, em condições normais, desejaríamos sempre obter o melhor resultado de alinhamento possível e, portanto, utilizaríamos os algoritmos que produzem resultados ótimos. Entretanto, algumas vezes precisamos obter uma maior rapidez de busca e, portanto, aceitamos que o resultado obtido não seja “o melhor possível” e, assim, utilizamos algoritmos que apresentam algum tipo de heurística. E essa heurística, no caso, normalmente consiste em uma forma qualquer que o programador utiliza para acelerar a produção dos resultados, em detrimento da obtenção do melhor resultado possível. Assim obtém-se um resultado aproximado, mas rápido. A tabela 3.2 apresenta os principais algoritmos utilizados em bioinformática para o alinhamento de seqüências.

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Programa Tipo de Alinhamento

Precisão do Alinhamento

Número de seqüências a serem alinhadas

BLAST2Sequences Local Heurístico 2 SWAT (Smith-Waterman) Local Ótimo 2 ClustalW Global Heurístico N Multalin Global Heurístico N Needleman-Wunsch Global Ótimo 2 Tabela 3.2:Principais programas de alinhamento de seqüências e suas características. As ferramentas de alinhamento ótimo são aquelas que nos dão como resultado o melhor alinhamento possível de acordo com a metodologia algorítmica de comparação de seqüências. Via de regra, a execução desses algoritmos é mais lenta do que a daqueles algoritmos que não geram o resultado perfeito e, como vimos na tabela 4.2., existem ferramentas de alinhamento ótimo locais e globais. O maior problema em utilizar os programas de alinhamento ótimo consiste nos casos onde são alinhadas múltiplas seqüências entre si. Nesses casos, o alinhamento ótimo pode se tornar simplesmente impossível de ser feito, pois gastaria uma quantidade de tempo quase infinita para alinhar otimamente uma quantidade seqüências não muito grande. Nos outros casos, entretanto, deve-se preferir a utilização de algoritmos que produzam o alinhamento ótimo em detrimento dos algoritmos de pesquisa heurística. Algoritmos heurísticos são aqueles que não realizam o alinhamento ótimo entre seqüências. Esses algoritmos freqüentemente utilizam alguma técnica alternativa para acelerar o resultado da busca por seqüências similares, no caso. O BLAST, por exemplo, como vimos no item anterior, parte a seqüência em pedaços para acelerar a busca e outros algoritmos realizam diferentes maneiras de gerar um resultado que seja o mais próximo possível do resultado ótimo. Como já comentado, são principalmente utilizados em alinhamentos múltiplos, onde os algoritmos ótimos demoram um tempo muito grande para gerar os resultados. São freqüentemente utilizados também quando da comparação de seqüências contra grandes bancos de dados, exatamente como faz o BLAST, que procura a similaridade de uma seqüência de entrada contra milhões de outras presentes em seu banco de dados. Muitas vezes, os resultados obtidos com programas heurísticos devem ser confirmados por programas de alinhamento ótimo antes de serem publicados em revistas especializadas. Entretanto algumas vezes tal procedimento não é necessário e tudo vai depender do tipo de trabalho que está sendo realizado. 3.5. Alinhamentos simples e múltiplos Como também já foi comentado na seção anterior, existem dois tipos principais de alinhamentos de seqüências no que concerne ao número de seqüências que são comparadas durante o alinhamento. Quando apenas duas seqüências são comparadas entre si, diz-se que o alinhamento é simples. E, nesses casos, normalmente prefere-se utilizar alinhamentos ótimos para gerarem os resultados, exceto nos casos onde milhares de alinhamentos simples devem ser realizados. De forma contrária, considera-se um alinhamento múltiplo quando três ou mais seqüências devem ser alinhadas entre si. No fundo, o alinhamento múltiplo é montado a partir do alinhamento par a par de cada uma das seqüências com todas as outras, seguido por um outro procedimento que irá gerar o resultado final do alinhamento de todas contra todas. Assim, se 10 seqüências são comparadas entre si, serão necessárias 10! (fatorial de 10) comparações de seqüências, o que representam

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3.628.800 comparações. E é exatamente por isso que os programas heurísticos são preferidos para gerar esse tipo de resultado. 3.6. Matrizes de comparação Outra coisa de suma importância quando da realização de qualquer alinhamento de seqüências é a matriz de substituição que é utilizada. Na figura 3.2. é mostrado um alinhamento e o número de “pontos” dados para coincidências (matches), divergências (mismatches), abertura de gaps (gap opening) e extensão de gaps (gap extension). Entretanto, ao utilizarmos matrizes de substituição podemos dar valores diferentes para coincidências de diferentes nucleotídeos ou aminoácidos. Vale notar que o resultado de um alinhamento de seqüências pode ser completamente diferente dependendo da matriz de substituição utilizada. As matrizes de comparação são principalmente utilizadas durante o alinhamento de seqüências de proteínas e isso se deve ao fato de que existem aminoácidos que são mais (ou menos) parecidos entre si do que outros. Há aminoácidos com cargas polares, apolares ou sem carga e a mudança, em uma proteína, de um aminoácido apresentando uma determinada característica para outro da mesma característica é menos drástica do que uma mudança para um aminoácido apresentando característica diferente. Portanto, as matrizes de substituição são extremamente utilizadas no alinhamento de seqüências protéicas.

Mesmo no caso de seqüências de nucleotídeos são mais comuns as mutações conhecidas como transições do que as transversões. Nas transições, a mutação ocorre entre bases do mesmo tipo, purina para purina (A para G ou G para A) ou pirimidina para pirimidina (C para T ou T para C), enquanto nas transversões ocorre a mudança de uma purina para uma pirimidina ou o contrário. Dessa forma, ao utilizarmos matrizes de substituição, podemos dar mais pesos para as transversões do que para as transições, o que faria com que o resultado fosse mais relevante e pudesse estar mais relacionado com a evolução, por exemplo.

As matrizes de substituição mais comuns para seqüências nucleotídicas são a mat50 e a mat70, enquanto para seqüências protéicas as mais conhecidas são as matrizes PAM e BLOSUM. As matrizes BLOSUM (Blocks Substitution Matrix), por exemplo, são baseadas na observação das freqüências de substituição em blocos de alinhamentos locais de proteínas relacionadas. Existem várias matrizes BLOSUM e elas devem ser utilizadas para comparar proteínas contendo um determinado valor de identidade, por exemplo, a matriz mais utilizada pelos programas é a BLOSUM62, que foi montada para comparar proteínas que apresentem 62% de aminoácidos idênticos. Abaixo vemos as matrizes de substituição de nucleotídeos mat50 e mat70. Podemos perceber que a matriz mat70 apresenta valores menores para algumas substituições. Isso faz com que o valor final do alinhamento entre duas seqüências de DNA seja menor e, portanto, a matriz mat70 gera um resultado de alinhamento local de um menor número de bases do que a matriz mat50, que estende o alinhamento um pouco mais.

Bases A C G T Y R N A 2 -2 0 -2 -2 1 0 C -2 2 -2 0 1 -2 0 G 0 -2 2 -2 -2 1 0 T -2 0 -2 2 1 -2 0 Y -2 1 -2 1 1 -2 0 R 1 -2 1 -2 -2 1 0 N 0 0 0 0 0 0 0

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Tabela 3.3: Matriz de substituição de nucleotídeos mat50. O valor dado para cada troca pode ser visto nas interseções. O Y representa pirimidinas, o R representa purinas e o N representa qualquer nucleotídeo.

Bases A C G T Y R N A 2 -2 -1 -2 -2 0 0 C -2 2 -2 -1 0 -2 0 G -1 -2 2 -2 -2 0 0 T -2 -1 -2 2 0 -2 0 Y -2 0 -2 0 0 -2 0 R 0 -2 0 -2 -2 0 0 N 0 0 0 0 0 0 0

Tabela 3.4: Matriz de substituição de nucleotídeos mat70. O valor dado para cada troca pode ser visto nas interseções. O Y representa pirimidinas, o R representa purinas e o N representa qualquer nucleotídeo. 3.7. Exemplos reais de alinhamentos a) Alinhamento global simples entre seqüências de DNA, usando o algoritmo Needleman-Wunsch. ########################################

# Program: needle

# Rundate: Fri Nov 19 15:57:40 2004

# Align_format: srspair

# Report_file: 1x2.needle

########################################

#=======================================

#

# Aligned_sequences: 2

# 1: Seq1

# 2: Seq2

# Matrix: EDNAFULL

# Gap_penalty: 10.0

# Extend_penalty: 0.5

#

# Length: 736

# Identity: 464/736 (63.0%)

# Similarity: 464/736 (63.0%)

# Gaps: 272/736 (37.0%)

# Score: 2261.0

#

#

#=======================================

Seq1 1 0

Seq2 1 GCACGAGGACTGTGAACCGAATCGGTTCAGTAAAATGTTCAATTGTGCGC 50

Seq1 1 0

Seq2 51 TGGAATCTATTGTGTAGACTATTAACTATGGAATTTTACTTCACATTGAC 100

Seq1 1 CTTTCAAGATGAACG 15

|||||||||||||||

Seq2 101 TAAAAAGCTGAGCAAATATACCTGGAGCGTTCAGACTTTCAAGATGAACG 150

Seq1 16 AACCAACTGGTGTCGGGCCAACATTTGCTGATGCATGCGATGATGGCGAA 65

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

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Seq2 151 AACCAACTGGTGTCGGGCCAACATTTGCTGATGCATGCGATGATGGCGAA 200

Seq1 66 CTTATCAGCATTTGTTGTCTTTGTGGTAAAACGTTTTCAAGTCAGAGTCT 115

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Seq2 201 CTTATCAGCATTTGTTGTCTTTGTGGTAAAACGTTTTCAAGTCAGAGTCT 250

Seq1 116 TCTACACAAACATTTTGAATTGATGCATGAAGGTACGGAAATAGATACTG 165

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Seq2 251 TCTACACAAACATTTTGAATTGATGCATGAAGGTACGGAAATAGATACTG 300

Seq1 166 AACAGTATGATCTAAGTGGATTTGCCGCTATGGGGAATGAACAAGGTCGT 215

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Seq2 301 AACAGTATGATCTAAGTGGATTTGCCGCTATGGGGAATGAACAAGGTCGT 350

Seq1 216 AAAAGTAATGGTGAAGAAGATGCAAATTTCCGAGTTCTGAATTGTGCGTT 265

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Seq2 351 AAAAGTAATGGTGAAGAAGATGCAAATTTCCGAGTTCTGAATTGTGCGTT 400

Seq1 266 TTGCAACAAAGTATTTACTAAACACTGTAATTTAAACACACATATCAAAG 315

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Seq2 401 TTGCAACAAAGTATTTACTAAACACTGTAATTTAAACACACATATCAAAG 450

Seq1 316 CAGTCCATAA---------------------------------------- 325

||||||||||

Seq2 451 CAGTCCATAAAGGTCAGATTCTGTTAATGTAAACAGTTTTTGTATATACA 500

Seq1 326 -------------------------------------------------- 325

Seq2 501 GCGTTCCTATCTTTGTTTTTCTTCAATACTTACCTGTTAGGGTTTTTGGT 550

Seq1 326 ---------AGGTGTAAAACCGTTTGAATGCACTTATTGTTATAAAGGAT 366

|||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Seq2 551 CATTATTTTAGGTGTAAAACCGTTTGAATGCACTTATTGTTATAAAGGAT 600

Seq1 367 TCACTCGAAATTCTGATCTTCATAAGCACATCGACGCTGTTCACAAAGGT 416

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Seq2 601 TCACTCGAAATTCTGATCTTCATAAGCACATCGACGCTGTTCACAAAGGT 650

Seq1 417 CTCAAGCCTTTCGGATGTGAAGTATGCCAGCGAAACTTCTCTCAGAAA 464

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Seq2 651 CTCAAGCCTTTCGGATGTGAAGTATGCCAGCGAAACTTCTCTCAGAAATC 700

Seq1 465 464

Seq2 701 CAGCCTTAAACGACACATAGAAAGCATTCACGAAAG 736

#---------------------------------------

#--------------------------------------- b) Alinhamento local simples entre as mesmas seqüências de DNA, usando o algoritmo BLAST. BLASTN 2.2.8 [Jan-05-2004]

Reference: Altschul, Stephen F., Thomas L. Madden, Alejandro A. Schaffer,

Jinghui Zhang, Zheng Zhang, Webb Miller, and David J. Lipman (1997),

"Gapped BLAST and PSI-BLAST: a new generation of protein database search

programs", Nucleic Acids Res. 25:3389-3402.

Query= Seq1

(464 letters)

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Database: seq2

1 sequences; 736 total letters

Searching.done

Score E

Sequences producing significant alignments: (bits) Value

Seq2 652 0.0

>Seq2

Length = 736

Score = 652 bits (329), Expect = 0.0

Identities = 329/329 (100%)

Strand = Plus / Plus

Query: 1 ctttcaagatgaacgaaccaactggtgtcgggccaacatttgctgatgcatgcgatgatg 60

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Sbjct: 136 ctttcaagatgaacgaaccaactggtgtcgggccaacatttgctgatgcatgcgatgatg 195

Query: 61 gcgaacttatcagcatttgttgtctttgtggtaaaacgttttcaagtcagagtcttctac 120

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Sbjct: 196 gcgaacttatcagcatttgttgtctttgtggtaaaacgttttcaagtcagagtcttctac 255

Query: 121 acaaacattttgaattgatgcatgaaggtacggaaatagatactgaacagtatgatctaa 180

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Sbjct: 256 acaaacattttgaattgatgcatgaaggtacggaaatagatactgaacagtatgatctaa 315

Query: 181 gtggatttgccgctatggggaatgaacaaggtcgtaaaagtaatggtgaagaagatgcaa 240

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Sbjct: 316 gtggatttgccgctatggggaatgaacaaggtcgtaaaagtaatggtgaagaagatgcaa 375

Query: 241 atttccgagttctgaattgtgcgttttgcaacaaagtatttactaaacactgtaatttaa 300

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Sbjct: 376 atttccgagttctgaattgtgcgttttgcaacaaagtatttactaaacactgtaatttaa 435

Query: 301 acacacatatcaaagcagtccataaaggt 329

|||||||||||||||||||||||||||||

Sbjct: 436 acacacatatcaaagcagtccataaaggt 464

Score = 276 bits (139), Expect = 3e-78

Identities = 139/139 (100%)

Strand = Plus / Plus

Query: 326 aggtgtaaaaccgtttgaatgcacttattgttataaaggattcactcgaaattctgatct 385

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Sbjct: 560 aggtgtaaaaccgtttgaatgcacttattgttataaaggattcactcgaaattctgatct 619

Query: 386 tcataagcacatcgacgctgttcacaaaggtctcaagcctttcggatgtgaagtatgcca 445

||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||

Sbjct: 620 tcataagcacatcgacgctgttcacaaaggtctcaagcctttcggatgtgaagtatgcca 679

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Query: 446 gcgaaacttctctcagaaa 464

|||||||||||||||||||

Sbjct: 680 gcgaaacttctctcagaaa 698

Database: seq2

Posted date: Nov 19, 2004 3:58 PM

Number of letters in database: 736

Number of sequences in database: 1

Lambda K H

1.37 0.711 1.31

Gapped

Lambda K H

1.37 0.711 1.31

Matrix: blastn matrix:1 -3

Gap Penalties: Existence: 5, Extension: 2

Number of Hits to DB: 2

Number of Sequences: 1

Number of extensions: 2

Number of successful extensions: 2

Number of sequences better than 10.0: 1

Number of HSP's better than 10.0 without gapping: 1

Number of HSP's successfully gapped in prelim test: 0

Number of HSP's that attempted gapping in prelim test: 0

Number of HSP's gapped (non-prelim): 2

length of query: 464

length of database: 736

effective HSP length: 9

effective length of query: 455

effective length of database: 727

effective search space: 330785

effective search space used: 330785

T: 0

A: 0

X1: 6 (11.9 bits)

X2: 15 (29.7 bits)

S1: 12 (24.3 bits)

S2: 8 (16.4 bits) c) Alinhamento global múltiplo entre as mesmas seqüências de DNA (e outras duas mais), usando o algoritmo CLUSTALW. CLUSTAL W (1.81) multiple sequence alignment

Seq1 ------------------------------------------------------------

Seq4 -GCACGAGGACTGTGA-----ACCGAATCGGTTCAGTAAAATGTTCAATTGTGCGCTGGA

Seq2 ------------------------------GTTCAGTAAAATGTTCAATTGTGCGCTGGA

Seq3 GGCACGAGGGCTACGACTGTGAACGAATCGGTTCAGTAAAATGTTCAATTGTGCGCTGGA

Seq1 ------------------------------------------------------------

Seq4 ATCTATTGTGTAGACTATTAACTATGGAATTTTACTTCACATTGACTAAAAAGCTGAGCA

Seq2 ATCTATTGTGTAGACT-TTAACTATGGAATTTTACTTCACATTGACTAAAAAGCTGAGCA

Seq3 ATCTATTGTGTAGACTATTAACTATGGAATTTTACTTCACATT-ACTAAAAAGCTGAGCA

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Seq1 ---------------------CTTTCAAGATGAACGAACCAACTGGTGTCGGGCCAACAT

Seq4 AATATACCTGGAGCGTTCAGACTTTCAAGATGAACGAACCAACTGGTGTCGGGCCAACAT

Seq2 AATATACCTGGAGCGTTCAGACTTTCAAGATGAACGAACCAACTGGTGTCGGGCCAACAT

Seq3 AATATACCTGGAGCGTTCAGACTTTCAAGATGAACGAACCAACTGGTGTCGGGCCAACAT

***************************************

Seq1 TTGCTGATGCATGCGATGATGGCGAACTTATCAGCATTTGTTGTCTTTGTGGTAAAACGT

Seq4 TTGCTGATGCATGCGATGATGGCGAACTTATCAGCATTTGTTGTCTTTGTGGTAAAACGT

Seq2 TTGCTGATGCATGCGATGATGGCGAACTTATCAGCATTTGTTGTCTTTGTGGTAAAACGT

Seq3 TTGCTGATGCATGCGATGATGGCGAACTTATCAGCATTTGTTGTCTTTGTGGTAAAACGT

************************************************************

Seq1 TTTCAAGTCAGAGTCTTCTACACAAACATTTTGAATTGATGCATGAAGGTACGGAAATAG

Seq4 TTTCAAGTCAGAGTCTTCTACACAAACATTTTGAATTGATGCATGAAGGTACGGAAATAG

Seq2 TTTCAAGTCAGAGTCTTCTACACAAACATTTTGAATTGATGCATGAAGGTACGGAAATAG

Seq3 TTTCAAGTCAGAGTCTTCTACACAAACATTTTGAATTGATGCATGAAGGTACGGAAATAG

************************************************************

Seq1 ATACTGAACAGTATGATCTAAGTGGATTTGCCGCTATGGGGAATGAACAAGGTCGTAAAA

Seq4 ATACTGAACAGTATGATCTAAGTGGATTTGCCGCTATGGGGAATGAACAAGGTCGTAAAA

Seq2 ATACTGAACAGTATGATCTAAGTGGATTTGCCGCTATGGGGAATGAACAAGGTCGTAAAA

Seq3 ATACTGAACAGTATGATCTAAGTGGATTTGCCGCTATGGGGAATGAACAAGGTCGTAAAA

************************************************************

Seq1 GTAATGGTGAAGAAGATGCAAATTTCCGAGTTCTGAATTGTGCGTTTTGCAACAAAGTAT

Seq4 GTAATGGTGAAGAAGATGCAAATTTCCGAGTTCTGAATTGTGCGTTTTGCAACAAAGTAT

Seq2 GTAATGGTGAAGAAGATGCAAATTTCCGAGTTCTGAATTGTGCGTTTTGCAACAAAGTAT

Seq3 GTAATGGTGAAGAAGATGCAAATTTCCGAGTTCTGAATTGTGCGTTTTGCAACAAAGTAT

************************************************************

Seq1 TTACTAAACACTGTAATTTAAACACACATATCAAAGCAGTCCATAAAGGT----------

Seq4 TTACTAAACACTGTAATTTAAACACACATATCAAAGCAGTCCATAAAGGTCAGATTCTGT

Seq2 TTACTAAACACTGTAATTTAAACACACATATCAAAGCAGTCCATAAAGGT----------

Seq3 TTACTAAACACTGTAATTTAAACACACATATCAAAGCAGTCCATAAAGGT----------

**************************************************

Seq1 ------------------------------------------------------------

Seq4 TAATGTAAACAGTTTTTGTATATACAGCGTTCCTATCTTTGTTTTTCTTCAATACTTACC

Seq2 ------------------------------------------------------------

Seq3 ------------------------------------------------------------

Seq1 -----------------------------GTAAAACCGTTTGAATGCACTTATTGTTATA

Seq4 TGTTAGGGTTTTTGGTCATTATTTTAGGTGTAAAACCGTTTGAATGCACTTATTGTTATA

Seq2 -----------------------------GTAAAACCGTTTGAATGCACTTATTGTTATA

Seq3 -----------------------------GTAAAACCGTTTGAATGCACTTATTGTTATA

*******************************

Seq1 AAGGATTCACTCGAAATTCTGATCTTCATAAGCACATCGACGCTGTTCACAAAGGTCTCA

Seq4 AAGGATTCACTCGAAATTCTGATCTTCATAAGCACATCGACGCTGTTCACAAAGGTCTCA

Seq2 AAGGATTCACTCGAAATTCTGATCTTCATAAGCACATCGACGCTGTTCACAAAGGTCTCA

Seq3 AAGGATTCACTCGAAATTCTGATCTTCATAAGCACATCGACGCTGTTCACANAGGTCTCA

*************************************************** ********

Seq1 AGCCTTTC-GGATGTGAAGTATGCCAGCGAAACTTCTCTCAGAAA---------------

Seq4 AGCCTTTC-GGATGTGAAGTATGCCAGCGAAACTTCTCTCAGAAATCCAGCCTTAAACGA

Seq2 AGCCTTTCCGGATGTGAAGTATGCCAGCGAAACTTCTCTCAGAAATCCAGCCTAAAACGA

Seq3 AGCCTTTC-GGATGTGAAGTATGCCAGCGAAACTTCTCTCAGAAATCCAGCCTANAACGA

******** ************************************

Seq1 ------------------------------------------------------------

Seq4 CACATAGAAAGCATTCACGAAAG-------------------------------------

Seq2 CACATAGAAGCAATTCACGAAGATCCTCGGCATCGCTGAAGAGAAACCAGATTGTATAAT

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Seq3 CACATAGAAAGCATTCACGAAGATCCTCGGCATCGCTGAAGAGAAACCAGAT-GTATAAT

Seq1 -------------------------------------------------------

Seq4 -------------------------------------------------------

Seq2 CCTCTCCAATTTTCATATGATTTCATGTTCAAAAATATACATTTATTATTCTTTC

Seq3 CCTCTCCAATTT-CATATGATTNCATGNTCANAA-TATACATTTATTATTCTTTC

3.8. Referências Bibliográficas 1 NCBI Glossário --http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/glossary2.html 2. BLAST -- http://www.ncbi.nlm.nih.gov/BLAST/ 3. BLAST Overview -- http://www.ncbi.nlm.nih.gov/BLAST/blast_overview.html 4. BLAST Guide: Deciphering the Output http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/Blast_output.html

5. BLAST Query Tutorial http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/query_tutorial.html

6. NCBI Similarity Page http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Education/BLASTinfo/similarity.html

7. Prosdocimi F; Cerqueira GC; Binneck E; Silva AF; Reis AN; Junqueira ACM; Santos ACF; Nhani-Júnior A; Wust CI; Camargo-Filho F; Kessedjian JL; Petretski JH; Camargo LP; Ferreira RGM; Lima RP; Pereira RM; Jardim S; Sampaio VS and Folgueras-Flatschart AV. Bioinformática: manual do usuário. Biotec. Ci. Des. 29: 18-31, 2002.

3.9. Brainstorm 1 Cite duas possíveis utilidades do alinhamento de seqüências no campo da bioinformática.

2 Qual a diferença entre alinhamento global e local? Cite o nome de ferramentas que fazer um ou outro alinhamento. Você é capaz de perceber as diferenças entre os resultados do alinhamento de duas seqüências idênticas através de diferentes ferramentas de alinhamento? Explique as diferenças nos resultados mostrados nos itens 4.7. a) e b)

3 É possível realizar alinhamentos utilizando uma seqüência de DNA e outra de proteína? Como você acha que isso poderia ser feito? O BLAST implementa esse tipo de ferramenta? Qual o(s) programa(s) do BLAST fazem isso?

4 Qual a diferença entre alinhamentos simples e múltiplos? Quais são as ferramentas de alinhamento (ótimo ou heurístico) mais indicadas para trabalhar com cada um desses tipos de alinhamento? Por quê?

5 Cite as principais aplicações das ferramentas que utilizam heurística para produzir um alinhamento de seqüências.

6 Entre no site do NCBI, Nucleotide e obtenha as seqüências de número de acesso AF117710 e AF181832 (da mesma forma que na aula anterior). Acesse o site do programa BLAST2Sequences (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/blast/bl2seq/wblast2. cgi). Copie a sequencia do primeiro gene na região apropriada, assim como a sequencia do segundo gene e clique em Align. Classifique o tipo de alinhamento realizado em todos os aspectos que conseguir? Quais foram as posições que mostraram diferenças entre as duas seqüências? Houve diferenças na região que codifica a proteína?

7 O que são as matrizes de substituição e qual a relevância delas no alinhamento de seqüências?

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CAPÍTULO 4

Montando um genoma “Seqüenciar o DNA é agora uma das tarefas mais fáceis de realizar, além de servir hambúrgueres.” Karry Mullis, prêmio Nobel

Iniciando nossa Interação Nos dias de hoje, a arte de seqüenciar um DNA e até mesmo de montar um

genoma de uma bactéria são tarefas relativamente técnicas. É claro, análise deste genoma e o entendimento da relação do genoma com as características e a forma como um organismo vive são tarefas altamente complexas e que exigem um grande esforço cientifico a ser realizado pelos maiores especialistas em todo o mundo. 4.1. Sobre genomas eucarióticos e procarióticos

Nos dias de hoje, a arte de seqüenciar um DNA e até mesmo de montar um genoma de uma bactéria são tarefas relativamente técnicas. É claro, análise deste genoma e o entendimento da relação do genoma com as características e a forma como um organismo vive são tarefas altamente complexas e que exigem um grande esforço cientifico a ser realizado pelos maiores especialistas em todo o mundo.

A montagem de genomas de organismos procariotos (bactérias e arqueobactérias) consiste num trabalho muito mais simples do que a montagem de genomas de organismos eucarióticos (protozoários, fungos, plantas e animais). E isso se deve a várias características freqüentemente comuns aos genomas bacterianos. Estes são comumente pequenos -- apresentado apenas alguns milhões de pares de bases --, circulares e contém uma baixa taxa de seqüências repetitivas. Já os genomas de organismos eucarióticos são grades, normalmente na ordem de bilhões de pares de bases, apresentam disposição do genoma em diversos cromossomos, que devem ser montados separadamente e, ainda, apresentam uma grande quantidade de seqüências repetitivas. Se considerássemos o genoma como um quebra cabeça, os genomas bacterianos teriam apenas poucas peças e todas seriam facilmente encaixáveis. De forma contrária, os genomas eucarióticos poderiam ser considerados um conjunto de diversos quebra-cabeças (representando diferentes cromossomos) com centenas ou milhares de peças, com todas elas embaralhadas entre os quebra-cabeças e onde determinadas peças parecessem muito com outras, tanto dentro de um mesmo quebra-cabeça quanto entre quebra-cabeças diferentes, dificultando de forma drástica a montagem. Por isso, os genomas eucarióticos são montados aos poucos, sendo que primeiramente são identificadas as partes mais fáceis, não repetitivas, e assim é montado um chamado scaffold, ou esqueleto, do genoma. Assim, os genomas eucarióticos normalmente são montados por equipes bem maiores e mais bem equipadas de cientistas, apresentando ainda uma plataforma de bioinformática mais complexa e organizada.

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Dessa forma, são utilizadas diferentes técnicas de seqüenciamento para se obter seqüências de um genoma eucarioto ou procarioto. Em bactérias, normalmente todo o DNA é quebrado em pedacinhos minúsculos em uma técnica conhecida como shotgun ou whole genome shotgun. Esses pequenos pedacinhos de genoma (contendo aproximadamente 2.000 pares de bases) são ligados em vetores de clonagem bacterianos, os plasmídeos. Assim, cada plasmídeo é seqüenciado uma vez a partir de cada uma de suas extremidades (direita e esquerda) e as seqüências de DNA produzidas são posteriormente concatenadas para que o genoma seja montado por inteiro.

Já no caso dos grandes genomas de organismos eucarióticos, os fragmentos genômicos são primeiro divididos em grandes vetores de clonagem como BACs (Bacterial Artifical Chromosome ou, em português, cromossomo artificial de bactéria) ou YACs (Yeast Artificial Chromosome ou cromossomo artificial de levedura), que podem abrigar seqüências de DNA de centenas de milhares de bases. No chamado shotgun hierárquico, essas seqüências presentes nos BACs ou YACs é que são alvo do chamado shotgun onde, agora sim, essas seqüências são quebradas em outras contendo aproximadamente 2.000 pares de bases e ligadas em plasmídeos bacterianos cujas extremidades serão seqüenciadas. Dessa forma, os BACs e YACs são montados separadamente e, posteriormente, é realizada a montagem do genoma através da sobreposição das seqüências destes grandes vetores.

Figura 4.1. a) Na estratégia de shotgun, todo o DNA genômico de um organismo é fragmentado em pequenos pedaços (1), que são clonados em vetores de pequeno porte, como plasmídeos, para o posterior seqüenciamento. b) Na estratégia de shotgun hierárquico, normalmente utilizada para grandes genomas, realizam-se dois passos. (1) Primeiramente fragmenta-se o genoma em grandes pedaços, que são clonados em vetores de grande porte, como BACs ou YACs. (2) Posteriormente realiza-se uma segunda etapa de shotgun, onde as seqüências contidas nesses vetores são fragmentadas em pequenos pedaços e clonadas em vetores de pequeno porte, que serão seqüenciados. Retirado de Prosdocimi et al., 2003. 4.2. Base-calling

Uma frase clássica do meu co-orientador de doutorado, o Prof. Miguel Ortega, é que um mito da genômica é o de que os seqüenciadores de DNA é que seriam responsáveis por gerar a seqüência de bases da molécula desejada. Conforme vimos

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na animação apresentada na segunda aula, o seqüenciador apenas é responsável pela leitura das moléculas marcadas com cada um dos fluoróforos durante a eletroforese. Na verdade, é necessário um programa de computador para pegar esses dados sobre qual fluoróforo passou a cada instante e transformar esse dado num conjunto de letras que represente a seqüência de bases do DNA. E um programa que faça isso é conhecido como um nomeador de bases ou base-caller. Além de gerar a seqüência de bases que representa a molécula de DNA seqüenciada, o base-caller produz também um valor de qualidade associado a cada uma das bases. Assim, é possível saber quais foram as regiões seqüenciadas com maior ou menor qualidade. O algoritmo mais conhecido e utilizado para realizar a nomeação das bases (ou base-calling) é o PHRED. O PHRED utiliza um algoritmo baseado na análise de Fourier para reconhecer os dados brutos gerados pelo seqüenciador e produzir tanto a seqüência de bases quanto a qualidade de cada uma delas. A qualidade das bases é dada com relação à probabilidade logarítmica da base estar incorreta e a fórmula utilizada pelo PHRED para chegar a esta qualidade é dada pela seguinte fórmula:

QUALIDADE PHRED = -10 * log10 (Probabilidade de Erro) Assim, com os dados brutos do seqüenciador, o PHRED atribui a cada base uma chance desta estar incorreta e, utilizando a fórmula acima, associa um valor de qualidade à cada uma delas. Um valor de qualidade de PHRED (ou simplesmente valor de PHRED, valor de qualidade ou qualidade da base) igual a 10, representa que aquela base tem uma chance em dez de estar incorreta (10%). Como o valor está em escala logarítmica, um valor de PHRED 20, significa que aquela base tem uma chance em cem de estar incorreta (1%) e um valor de 30 representa uma chance em mil (0,1%). Freqüentemente, aceita-se que um valor de PHRED igual a 20 é suficiente para aceitar uma base como real ou utiliza-se para aceitar uma região de boa qualidade. Entretanto, trabalhos recentes têm mostrado que podemos confiar em valores relativamente mais baixos (Prosdocimi et al., 2004). Exemplos de arquivos produzidos pelos programas de base-calling: (a) Arquivo de seqüência no formato FASTA e (b) arquivo .QUAL apresentando a qualidade das bases. a) > Seq1

ATCTCGAATTCTCTAACAGAACACGTAATATCAGCACCATCTCGAATCTC

TAACAGAACACGTAATATCAGCACCATCTCGAATTCTCTAACAGAATTCC

b) > Qual1

10 12 15 15 15 18 20 22 25 18 13 8 5 5 8 10 7 12 18

25 30 30 22 13 12 12 12 11 9 9 10 15 20 20 22 6 6 5

4.3. Cross-match

Como foi dito no primeiro item desta aula, as seqüências de DNA geradas em projetos genoma são primeiramente clonadas em moléculas de DNA plasmidial. Dessa forma, algumas vezes pedaços de seqüências dessa molécula bacteriana acabam sendo produzidas em conjunto com as moléculas do DNA que se deseja produzir. Como as moléculas dos vetores de clonagem não representam o genoma que se

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deseja montar, é preciso mascará-las antes de se realizar a montagem do genoma. E, para isso, utiliza-se um software conhecido como Cross-match. O cross-match é basicamente um algoritmo que realiza um alinhamento local entre duas seqüências de nucleotídeos quaisquer e permite a formatação do resultado de diversas maneiras diferentes.

Normalmente, executa-se o cross-match utilizando dois arquivos de entrada e a opção –screen. O primeiro arquivo deve apresentar as seqüências geradas no projeto que se deseja retirar as partes relacionadas às seqüências bacterianas e o segundo arquivo deve conter uma ou mais seqüências de vetores de clonagem (como plasmídeos) que se deseja procurar no primeiro arquivo. Basicamente, o cross-match realiza o alinhamento entre todas as seqüências do primeiro e do segundo arquivo utilizando o algoritmo SWAT (veja aula 4). Ele apresenta ainda um valor limite para considerar o alinhamento entre as seqüências como válido. Se o alinhamento entre uma seqüência do primeiro arquivo e uma outra do segundo arquivo for válido, o programa mascara a região do primeiro arquivo onde ela foi similar com a do segundo, colocando letras Xs no local. Isso evita que essas regiões sejam utilizadas para o agrupamento das seqüências, como será mostrado a seguir. Exemplo de seqüência que apresentava região inicial contendo partes de vetor de clonagem. Uma seqüência desse tipo pode ser encontrada no arquivo –screen, obtido como resultado do algoritmo cross-match: > Seq1.screen

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXAATATCAGCACCATCTCGAATCTC

TAACAGAACACGTAATATCAGCACCATCTCGAATTCTCTAACAGAATTCC

4.4. Agrupamento de seqüências

O agrupamento de seqüências (ou sequence assembly) é o procedimento que gera, realmente, os contigs genômicos e permite a montagem do genoma per si. A montagem do genoma é importante porque ainda não existe nenhuma técnica que permita o seqüenciamento de moléculas de DNA de mais de mil pares de bases. Em uma corrida normal de seqüenciamento, gerada em um seqüenciador em larga escala, é comum que sejam produzidas cerca de 600 bases da seqüência de DNA desejada. Com sorte é possível produzir até mil bases da seqüência, mas um seqüenciamento tão bom não é muito comum. E como as moléculas de DNA genômicas freqüentemente apresentam milhares ou milhões de pares de bases, é preciso montar os fragmentos, de seiscentos em seiscentos, até que seja possível gerar toda a seqüência do genoma.

Portanto podemos fazer uma analogia da montagem de genoma como se o mesmo se constituísse num livro de mil páginas cujas palavras e a ordem delas seja completamente desconhecida. O que os cientistas fazem é pegar uma grande quantidade de livros idênticos, digamos trinta deles e picotarem todos os livros em trechos contendo uma quantidade fixa de palavras -- duas mil, por exemplo -- num processo de shotgun de palavras. Guarde os números e não se perca. Essas palavras acabam tendo que ser inseridas num outro livro -- o plasmídeo --, esse já montado e de frases conhecidas. Então acontece a leitura de seiscentas palavras por vez desse livro-plasmídeo. E são lidas milhares de seqüências de seiscentas palavras inseridas em livros-plasmídeos diferentes. Primeiramente, então, é necessário observar essas palavras lidas dos livros-plasmídeos ligados a uma parte do livro genômico e retirar as frases que sabemos serem do plasmídeo apenas, e não do livro que estamos tentando montar. O cross-match é o programa que faz isso. Ele compara as seqüências lidas com a seqüência do livro-plasmídeo e, onde ele encontrar frases do livro plasmídeo,

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ele troca-as por letras X. Então, depois do cross-match, teremos vários conjuntos de aproximadamente seiscentas palavras que sabemos ser de nosso livro genômico. Agora é preciso montá-lo. Para isso teremos que ir lendo todas os conjuntos de frases e observando onde as frases se sobrepõem para podermos juntá-las e gerar, por exemplo, um capítulo do livro (que poderia ser uma analogia à montagem de um BAC ou de um cromossomo inteiro). Veja o exemplo:

A seguir temos uma Fábula Fabulosa do escritor Millôr Fernandes que foi, assim como um genoma, dividida em partes. Monte as partes e produza a seqüência completa da fábula. > Frase 1 sabedoria e calor que fazem os seres humanos - "mas eu não". MORAL DA HISTÓRIA: NÃO MORRE A PASSARADA QUANDO MORRE UM PÁSSARO. > Frase 2 ela não pôde resistir e exclamou: "Mas, como, seu marido não morreu há cinco anos?" "Sim, é verdade" - respondeu então a outra, cheia daquela compreensão, sabedoria e > Frase 3 Quando a amiga lhe apresentou o garotinho lindo dizendo que era seu filho mais novo, ela não pôde resistir e exclamou: "Mas, como, seu marido não morreu há cinco anos?" > Frase 4 não morreu há cinco anos?" "Sim, é verdade" - respondeu então a outra, cheia daquela compreensão, sabedoria e calor que fazem os seres humanos - "mas eu não". O genoma é montado da mesma maneira que você realizou para montar essa fábula do Millôr chamada “A viúva”. (Para ler mais fábulas do escritor, acesse http://www.millor.com.br.) Várias seqüências representando pedaços de genoma são gerados e observa-se a posição onde elas se sobrepõem. Realizando a sobreposição de vários trechos de seqüência é possível montar todo o genoma. Entretanto, como já foi dito, um genoma apresenta milhões ou bilhões de seqüências de nucleotídeos e, portanto, não é possível realizar esta montagem à mão. Para isso existem algoritmos de montagem de genoma, como o PHRAP, o CAP e o TIGR Assembler. O PHRAP é o algoritmo mais utilizado e funciona mais ou menos da forma mostrada na figura 5.2.

Figura 4.2. O agrupamento de seqüências é baseado no alinhamento e no escore do alinhamento de seqüências.

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A figura 4.2 é idêntica à figura 3.2, mostrada no capítulo anterior. A diferença é basicamente o contexto com o qual ela é mostrada agora. A figura mostra o alinhamento entre duas seqüências de DNA e mostra os escores dados para o alinhamento das seqüências. O escore total desse alinhamento é igual a três, mostrado em alaranjado. E é exatamente baseando-se nesse escore que funciona um programa de montagem de genoma, como o PHRAP. O PHRAP apresenta um parâmetro muito importante chamado de minscore, que representa o valor mínimo do escore do alinhamento que ele utiliza para dizer que duas seqüências são parecidas o suficiente e que podem ser reunidas para gerar uma seqüência maior. Se o alinhamento entre duas seqüências apresenta um escore menor do que o minscore, as seqüências não são agrupadas e considera-se que representam partes distintas de um mesmo genoma. Já se o alinhamento entre duas seqüências apresenta um escore maior do que o minscore, o PHRAP considera que as seqüências estão na mesma posição e produz a chamada seqüência consenso, que consiste na concatenação das duas seqüências entre si, da mesma forma que você fez com a fábula do Millôr. 4.5. Sobre a cobertura dos genomas

Algo que é interessante de ser notado é a cobertura necessária de seqüenciamento para se produzir um genoma. Em nossa analogia do livro, pegamos trinta livros e picotamos todos eles em partes sendo que, posteriormente, lemos várias partes deles para tentarmos montar um livro inteiro novamente. Se nosso livro tivesse, por exemplo, seis mil palavras e nossas partes picotadas tivessem pouco mais de seiscentas palavras cada, teoricamente precisaríamos apenas de cerca de dez partes para montar um livro inteiro, certo? Errado! Como as dez partes são pegas aleatoriamente, é de se esperar que haja uma certa redundância nas frases obtidas. Em nosso exemplo da fábula do Millôr, podemos ver que a frase 2 é totalmente redundante e que conseguiríamos montar toda a fábula mesmo sem ela. Entretanto, qualquer outra combinação de três frases (exceto pelas frases 1, 3 e 4), impediria que a montagem da fábula fosse feita de forma completa, ainda que o número de palavras somadas entre as três frases produza um número maior do que o da fábula completa. Voltando à análise de genomas, isso significa que certas vezes damos o “azar estatístico” de não conseguirmos obter toda a seqüência do genoma e, assim, temos que seqüenciar mais moléculas para conseguirmos fechar nosso genoma. E, considerando o grande tamanho dos genomas, normalmente considera-se necessário produzir um número de bases que seja de 8 a 10 vezes maior do que a seqüência completa do genoma inteiro para que seja possível montar esse genoma completamente! E, ainda assim, muitas vezes é preciso utilizar outras técnicas mais complexas para que o genoma seja efetivamente terminado. E isso se deve ao fato de que algumas regiões do DNA parecem apresentar uma maior dificuldade de serem cortadas em partes ou clonadas nos vetores bacterianos (plasmídeos). Assim, a parte mais complexa de toda a montagem do genoma consiste no fechamento da seqüência completa do mesmo. E, depois de completo, cada uma de suas partes deve ser identificada, no processo de anotação genômica, que será tema do capítulo 7.

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4.6. Referências Bibliográficas 1. PHRED, PHRAP, CONSED -- http://www.phrap.org 2. Ewing B, Hillier L, Wendl MC, Green P. Base-calling of automated sequencer traces using phred. I. Accuracy assessment. Genome Res. 1998 Mar;8(3):175-85.

3. Ewing B, Green P. Base-calling of automated sequencer traces using phred. II. Error probabilities. Genome Res. 1998 Mar;8(3):186-94.

4. CAP3 - http://genome.cs.mtu.edu/cap/cap3.html 5. Prosdocimi F; Cerqueira GC; Binneck E; Silva AF; Reis AN; Junqueira ACM; Santos ACF; Nhani-Júnior A; Wust CI; Camargo-Filho F; Kessedjian JL; Petretski JH; Camargo LP; Ferreira RGM; Lima RP; Pereira RM; Jardim S; Sampaio VS and Folgueras-Flatschart AV. Bioinformática: manual do usuário. Biotec. Ci. Des. 29: 18-31, 2002.

4.7. Brainstorm 1. Por que quando sequenciamos o genoma de um organismo temos que levar em consideração se ele é eucarioto ou procarioto? Quais são as diferentes estratégias de sequenciamento desses genomas?

2. Qual a importância dos algoritmos de base calling? Se uma determinada base tem um valor de qualidade igual a 40, qual a chance dela estar incorreta?

3. Por que o software cross-match é importante na montagem de genomas? 4. Qual o principal parâmetro utilizado pelo programa PHRAP para realizar o agrupamento das seqüências de DNA? Como ele funciona?

5. Apresente a fábula do Millôr totalmente montada. 6. Digamos que o valor de minscore do nosso programa fosse igual a 2 e apresente uma das possíveis seqüências consensos que seria gerada a partir da concatenação das duas seqüências da figura 4.2. O que você faria para escolher qual base estaria no consenso no caso de gaps e mismatches?

7. Por que não é suficiente seqüenciar apenas seis mil bases para montar um genoma deste tamanho (seis mil bases)?

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CAPÍTULO 5

Análise de Transcriptomas

5.1. As ESTs As ESTs (Expressed Sequence Tags, ou Etiquetas de Seqüências Expressas)

correspondem a pedaços de genes expressos, derivados dos RNAs mensageiros, que são utilizados na análise de transcriptomas de organismos. São chamadas etiquetas porque correspondem apenas a pedaços dos genes que um organismo expressa em uma determinada situação. Essas etiquetas, entretanto, permitem que saibamos quais genes estão sendo produzidos por uma célula numa determinada condição e permitem também que estudos comparativos possam ser feitos. Um estudo clássico feito com ESTs está relacionado a células tumorais, onde se compara os genes expressos em uma célula normal e em uma célula cancerosa e, dessa forma, pode-se tentar compreender como o processo tumoral leva à expressão diferenciada de genes.

Figura 5.1. Produção de ESTs e ORESTES. As etiquetas de seqüências expressas (ESTs) são obtidas através, primeiramente, da transcrição reversa de um conjunto de

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mRNAs expressos numa célula, produzindo as fitas de DNA complementar (cDNA). Após esse procedimento, utiliza-se uma RNAse H para digerir as seqüências de RNA inicial e é produzida a segunda fita de DNA, gerando a molécula de cDNA fita dupla. Essa molécula é normalmente ligada em vetores de clonagem (como plasmídeos) e são utilizados iniciadores para o seqüenciamento das extremidades 5’ ou 3’ do cDNA em apenas uma “rodada” de seqüenciamento. As seqüências obtidas são as chamadas ESTs. A técnica de ORESTES é uma alternativa à produção de ESTs onde, ao contrário destas, pega-se preferencialmente a parte central das seqüências gênicas.

5.2. Histórico das ESTs

O seguinte trecho foi adaptado do livro “Desvendando o Genoma” da editora Companhia das Letras, escrito por Kevin Davies (2001, capítulo 3) e apresenta um interessante histórico de como foram redescobertas as seqüências de ESTs e como isso gerou um grande impacto na ciência da época.

Em junho de 1991, o pesquisador J. Craig Venter e colaboradores apresentou um artigo na revista americana Science que revolucionaria as estratégias de sequenciamento de transcriptomas em todo o mundo. O artigo era intitulado “Sequenciamento de DNA Complementar: Etiquetas de Seqüências Expressas e o Projeto Genoma Humano” e identificava a seqüência de mais de 300 novos genes humanos ativos no cérebro, obtidos aleatoriamente a partir de cerca de 600 clones de cDNA. De todas as seqüências produzidas, Venter havia conseguido identificar tanto genes humanos já conhecidos quanto genes novos e outros que apresentavam similaridades com genes identificados de outros organismos; um deles, por exemplo, apresentou uma identidade significativa com o gene NOTCH, uma importante molécula de sinalização intracelular conhecida na mosca-das-frutas. E essa alta similaridade entre genes presentes em espécies separadas há milhões de anos indicava que possivelmente eles apresentavam funções importantes no metabolismo celular, como foi posteriormente comprovado através de estudos experimentais.

O impacto causado na comunidade científica por este artigo que publicava o primeiro estudo de genoma em “larga-escala” foi maior do que a soma de suas partes – através da analse de cada um dos genes identificados. O sequenciamento dessas etiquetas, as ESTs, consistia em algo redundante e tecnicamente sujo, devido a presença de vários erros nas seqüências. Apesar disso, em uma única publicação, Venter havia identificado mais de 10% dos genes que toda a comunidade produzira em quase duas décadas, sendo que o GenBank, à época, possuía menos de 3 mil seqüências de genes humanos. Um novo tipo de diálogo científico, que viria a se tornar comum na era da genômica, anos mais tarde, era inaugurado por aquele artigo revolucionário. Venter havia conseguido bolar uma técnica que possibilitava a produção de centenas de seqüências de cDNAs de uma forma rápida e inteligente e previa que, com esta abordagem, conseguiria sequenciar a maioria dos cDNAs humanos em alguns anos. Além disso, previa também que em breve alguns “melhoramentos nas tecnologias de sequenciamento do DNA tornariam exeqüível o exame essencialmente completo do conjunto de genes expressos de um organismo”.

E essas novidades abalavam as opiniões dos principais responsáveis naquele momento pelo sequenciamento do genoma humano, algo que questiona suas autoridades. O principal argumento destes, no entanto, era o de que a abordagem de sequenciamento de ESTs não considerava as informações do DNA que não eram transcritas em RNA. Assim o ganhador do prêmio Nobel e co-descobrir da estrutura do DNA, James Watson, à época diretor do Projeto Genoma do NIH, sustentava corretamente que a técnica popularizada por Venter não substituía a análise genômica,

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no que este concordava e argumentava que o sequenciamento de ESTs deveria não substituir mas complementar as análises de genoma.

Oito meses depois, Venter publicava um artigo na Nature descrevendo as seqüências parciais de cDNA de mais 2375 genes expressos no cérebro, mostrando que seu grupo de trabalho era capaz de gerar, sozinho, um volume monstruoso de dados de seqüências de ESTs. Em menos de um ano o laboratório de Venter tinha sido capaz de sequenciar duas vezes o total de genes já conhecidos até então. Além disso, seu laboratório continuava gerando cada vez mais seqüências, ininterruptamente. Críticas surgiam sobre as contaminações de algumas seqüências e sobre os erros que estas apresentavam, mas nada que derrubasse o status que Venter já havia alcançado. E, ainda que este pesquisador já tivesse concordado do fato de que o sequenciamento de ESTs não era alternativa para o projeto genoma, o editor da Nature John Maddox ainda ressaltava no editorial da mesma revista onde fora publicado o segundo artigo de Venter: “Na esteira da saída de James Watson do Projeto Genoma Humano dos Estados Unidos, existe o perigo de que a abordagem de cDNA seja apresentada como uma alternativa mais barata para completar o sequenciamento [do genoma], o que ela não é”.

5.3. Agrupamento de ESTs Como as ESTs representam o genoma expresso em uma célula num

determinado momento, é comum haver redundância gênica quando do sequenciamento dessa moléculas. E isso se deve ao fato de que uma célula pode precisar muito da presença de algum gene num determinado momento e, nesse caso, ela irá produzir uma grande quantidade de moléculas de mRNA do gene em questão. Entretanto, quando o pesquisador quer analisar seu transcriptoma, ele deve identificar os genes expressos e, para ele, é melhor identificar os genes apenas uma vez. Para isso é feito o agrupamento ou clustering de ESTs. Da mesma forma como é feita a montagem de genoma, aqui também se utiliza o PHRAP para montar cada um dos genes seqüenciados. Dessa vez, entretanto, não se espera que sejam formadas moléculas muito grandes, os genes geralmente apresentam algo em torno de dois mil pares de bases. E os genes normalmente não apresentam regiões de sobreposição com outros genes, de forma que cada um dos genes aqui é montado separadamente.

Na análise de clustering ou agrupamento de ESTs, as seqüências dessas moléculas do organismo em questão são utilizadas como entrada em um programa. Este deve comparar essas seqüências entre si, de forma a encontrar quais delas são idênticas ou contêm regiões parecidas o suficiente para que sejam reunidas em uma só, assim como na análise genômica. Assim, o programa apresenta uma saída contendo as seqüências que foram agrupadas – chamadas de consensos ou contigs – e as seqüências que não foram reunidas (por não apresentarem similaridade suficiente com nenhuma outra) – chamadas de singlets. Cada uma das seqüências resultantes do agrupamento (seja ela uma singlet ou um contig) é chamada de unique (figura 5.2), que consiste no conjunto não redundante de moléculas. Considerando uma análise ideal, cada uma das seqüências unique deve representar um gene distinto. Entretanto, na prática, a presença de famílias gênicas (apresentando regiões de similaridade dentro dos genes) e de genes duplicados dificulta a obtenção desse resultado ideal e, muitas vezes, a seqüência unique pode representar mais de um gene. Em outras ocasiões, um mesmo gene pode estar representado por mais de um unique, sendo que um dos uniques pode corresponder, por exemplo, à extremidade 5’ de um determinado gene e outro à extremidade 3’ do mesmo.

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Figura 5.2. Agrupamento de seqüências de ESTs. O agrupamento das seqüências produz as seqüências não-redundantes, chamadas de uniques. As uniques são o conjunto das seqüências consenso mais as seqüências singlets.

O agrupamento das seqüências é importante devido, principalmente, aos seguintes fatores: (1) elimina a redundância das seqüências, (2) aumenta o tamanho das seqüências facilitando a anotação por homologia (Oliveira & Johnston 2001), (3) aumenta o nível de confiabilidade de cada seqüência (Miller et al., 1999). Diferentes abordagens têm sido utilizadas para o agrupamento de seqüências de ESTs. O Unigene do NCBI utiliza comparações de seqüências em vários níveis de rigor para agrupar as seqüências em consensos (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/UniGene/build.html) (Schuler 1997). No TIGR, os índices gênicos são formados utilizando um software desenvolvido por eles mesmos, o TIGR Assembler, ou o CAP3 (Liang et al., 2000). Já no projeto genoma humano (HPG) as seqüências são agrupadas utilizando-se o software PHRAP (International Human Genome Sequencing Consortium 2001).

5.4. O genoma e o transcriptoma No final da seção 5.2, vimos que editor da revista Nature, Sir Maddox, dizia que

existia “o perigo de que a abordagem de cDNA seja apresentada como uma alternativa mais barata para completar o sequenciamento [do genoma], o que ela não é”. Vale a pena, portanto, neste momento, discutirmos as diferenças entre as análises de genomas e de transcriptomas. Vale notar primeiramente que nenhuma das duas análises exclui a outra e são estudos que, apesar de relacionados, provém respostas para perguntas diferentes. A molécula de DNA é estática e está presente, com a mesma constituição, em todas as células do organismo. A decifração desse conteúdo estático de DNA é a tarefa da genômica. Já o conteúdo de RNA de uma determinada célula depende do tempo e das condições à qual ela está sendo submetida. O transcriptoma mede a parte do genoma que está sendo utilizada num determinado momento. E essa parte do genoma expresso é diferente para cada tipo celular. Existem genes que são expressos apenas na pele, outros no cérebro e alguns nos testículos. Alguns genes são ainda mais expressos quando a célula está submetida a um choque térmico, à restrição calórica ou à falta de oxigênio. Enquanto o genoma é apenas um, existem vários transcriptomas possíveis para uma mesma espécie.

Algumas perguntas, entretanto, só podem ser obtidas quando se observa o genoma expresso, enquanto outras, apenas quando se observa o genoma estático. Por exemplo, por mais que se obtenha seqüências de ESTs de vários diferentes tecidos de um organismo, nunca é possível dizer que ele não apresenta um determinado gene através de análises transcriptômicas. De forma contrária, quando se obtém toda a seqüência de genoma do organismo é possível saber todo o repertório de genes que ele possui para realizar alguma tarefa metabólica. Ao mesmo tempo, através da análise genômica é impossível saber, por exemplo, qual o repertório gênico que é

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super-expresso numa determinada condição como, por exemplo, quando a célula se torna cancerígena.

Dessa forma, as análises de genoma e transcriptoma são complementares e ambas são importantes para responder perguntas específicas. Existem, entretanto, outras formas de análise do transcriptoma que não sejam através de seqüências de ESTs, como o SAGE e a análise dos microarranjos de DNA (ou microarrays, os chips de DNA).

5.5. SAGE – Serial Analysis of Gene Expression

Enquanto uma EST tem aproximadamente cerca de 600 pares de bases, permitindo uma identificação quase inequívoca do gene expresso, outras técnicas, como o SAGE, permitem uma identificação mais exaustiva porém menos precisa do gene que se deseja obter. Na técnica de SAGE são concatenados fragmentos de quatorze pares de bases de diversos mRNAs diferentes, formando uma longa molécula híbrida contendo vários pedaços de diferentes mRNAs. Assim, uma molécula de cerca de 600 pares de bases é lida no seqüenciador, apresentando uma seqüência ininterrupta das chamadas “SAGE tags”, cada uma contendo quatorze pares de bases. Dessa forma, uma única seqüência de SAGE apresenta informação sobre diversos mRNAs diferentes que podem estar expressos em uma certa célula. Um problema, entretanto, da técnica, é que muitos genes apresentam fragmentos internos comuns e, muitas vezes, fica difícil saber ao certo qual gene foi expresso quando se observa uma etiqueta de SAGE muito comum em diferentes genes. Voltando á analogia do livro, agora seria como se você quisesse descobrir qual página do livro que seu colega está lendo, mas ele te dá apenas três palavras consecutivas para que você encontre a página. É claro que, dependendo do livro, aquela combinação de três palavras vai estar presente em apenas uma página. Mas pode haver livros onde essa combinação possa estar presente em dez páginas diferentes. E, dessa forma, fica difícil identificar precisamente a partir de qual página (ou gene) vieram aquelas palavras (ou a seqüência de quatorze nucleotídeos). Apesar disso, a técnica é bastante utilizada e é útil em vários casos. A grande vantagem da utilização da técnica de SAGE é que ela permite amostrar uma grande quantidade de genes, cerca de quarenta para cada seqüência produzida, e apresenta uma contabilidade eficiente de quantas SAGE tags de um determinado gene foram vistas para cada milhão de etiquetas, permitindo uma análise numérica da expressão gênica diferencial em cada tecido humano. 5.6. Microarrays A técnica de microarray é outra das técnicas de análise de transcriptomas e consiste em na hibridação de ácidos nucléicos, servindo para medir a expressão absoluta ou diferencial de genes submetidos a condições diferentes. Primeiramente deve-se montar a lâmina que vai conter os genes que se deseja estudar. Nessa lâmina são ligados fragmentos de cDNA ou são construídas pequenas seqüências de oligonucleotídeos que ficam ligadas à lâmina. Posteriormente, duas células são tratadas em diferentes condições onde o caso mais comum baseia-se no estudo de células normais contra células tumorais. Assim, os RNAs de cada uma dessas células são marcados com uma determinada fluorescência e colocados para hibridar contra os cDNAs ou oligonucleotídeos presentes no chip (ou lâmina) de DNA. Através da complementaridade de bases, as moléculas de um ou outro tecido vão se ligando às moléculas do chip e, posteriormente, utiliza-se um laser para realizar a leitura das

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fluorescências das moléculas que hibridaram no chip. Assim, conseguimos observar, para cada um dos genes do array, quanto eles se ligaram em seqüências da célula do primeiro tratamento, digamos normal, ou do segundo tratamento, digamos tumoral. A vantagem da técnica é que ela permite a análise de milhares de genes ao mesmo tempo, sendo que o chip é montado por um robô capaz de ligar os cDNAs em posições bem próximas. Entretanto, essa é uma técnica que apresenta uma grande quantidade de ruído e análises computacionais e estatísticas complexas devem ser realizadas para se gerar um resultado satisfatório. 5.7. Referências Bibliográficas 1. Davies, K. (2001). Decifrando o genoma. Companhia das letras. 2. PHRAP -- http://www.phrap.org 3. CAP3 - http://genome.cs.mtu.edu/cap/cap3.html 4. Prosdocimi F; Cerqueira GC; Binneck E; Silva AF; Reis AN; Junqueira ACM; Santos ACF; Nhani-Júnior A; Wust CI; Camargo-Filho F; Kessedjian JL; Petretski JH; Camargo LP; Ferreira RGM; Lima RP; Pereira RM; Jardim S; Sampaio VS and Folgueras-Flatschart AV. Bioinformática: manual do usuário. Biotec. Ci. Des. 29: 18-31, 2002. 5.8. Brainstorm 1. Defina o que é uma seqüência de EST. 2. Por que o trabalho de Venter, em 1991, causou tanto impacto na comunidade científca?

3. Quais são os motivos pelos quais se realiza o sequenciamento de ESTs? 4. O que são singlets, contigs e uniques? 5. Proponha um experimento no qual a resposta seja produzida em um projeto genoma e outro experimento cuja resposta só possa ser gerada através de uma análise de transcriptomas.

6. Em que consiste a técnica de SAGE, qual as suas vantagens e desvantagens? 7. Como é realizado um experimento de microarray? Além da comparação entre células normais e tumorais, qual outra comparação você poderia propor para ser estudada em um experimento como esse?

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CAPÍTULO 6

Bancos de dados em Biologia Molecular

Neste capítulo vamos tratar das bases de dados em biologia molecular. As bases de dados em biologia molecular são importantes principalmente para proporcionar à comunidade científica uma forma de tornar os dados (produzidos em todo o mundo) acessíveis de forma fácil, rápida e inteligente (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/About/primer/bioinformatics.html). 6.1. Histórico

As bases de dados em biologia molecular são importantes principalmente para proporcionar à comunidade científica uma forma de tornar os dados (produzidos em todo o mundo) acessíveis de forma fácil, rápida e inteligente (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/About/primer/bioinformatics.html). A primeira base de dados de biologia molecular parece ter surgido por volta de 1960, quando Dayhoff e colaboradores construíram um catálogo contendo todas as seqüências de proteínas conhecidas até a data. Essas seqüências foram publicadas num livro chamado “Atlas of Protein Sequences and Structure”, de 1965. É interessante notar que o conteúdo dessa base de dados não deveria conter mais de 1 megabyte de informação, se transferida para computadores modernos (Baxevanis & Ouellette 2001).

Com o advento do seqüenciamento do DNA e, principalmente, a partir da década de 1990, do seqüenciamento em larga escala, foi necessária a construção de bancos de dados mais robustos para abrigar a explosão no número de seqüências obtidas pelos pesquisadores (como vimos na primeira aula). O NCBI, por exemplo, foi criado pelo NIH (National Institutes of Health, os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos) em 1988 para abrigar esse tipo de informação (Wheller et al., 2002). Dessa forma, foi criada uma colaboração internacional para montar um banco de dados de seqüências de nucleotídeos, a INSDC (International Nucleotide Sequence Database Colaboration). Essa instituição contém o NCBI, o EMBL (European Molecular Biology Laboratory ou Laboratório Europeu de Biologia Molecular) e o DDBJ (DNA Data Bank of Japan ou Banco de dados de DNA do Japão) (Tateno et al., 2002). Cada um desses centros possibilita a submissão individual de seqüências de DNA e trocam informações entre si diariamente, sendo que todos os três possuem informações atualizadas de todas as seqüências disponíveis para os pesquisadores (Stoesser et al., 2002). Apesar disso, cada centro apresenta os dados de forma particular, apesar de bastante semelhante.

Ultimamente têm surgido uma grande quantidade de novos bancos de dados em biologia molecular. E são tantos que uma das principais revistas da área, a inglesa Nucleic Acids Research (http://nar.oupjournals.org/), tem reservado dois números especiais por ano (os primeiros volumes dos meses de janeiro e julho) apresentando apenas artigos sobre novos bancos de dados ou de atualizações de bancos já consagrados pela comunidade. Sempre vale a pena dar uma olhada nessa revista para descobrirmos se algum novo banco publicado pode ajudar em nossa pesquisa. E, cada vez mais, torna-se impossível fazer pesquisa em biologia sem estar por dentro dessas novas atualizações.

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6.2. Bancos primários e secundários

Existem basicamente dois tipos de bancos de dados disponíveis para utilização e pesquisa de genes e proteínas (Baxevanis & Ouellette 2001). Os bancos de dados primários apresentam resultados de dados experimentais que são publicados com alguma interpretação, mas não há uma análise cuidadosa desses dados com relação aos outros publicados anteriormente. Esse é o caso, por exemplo, do GenBank, EMBL e PDB (Protein Data Bank). Já os secundários são aqueles onde há uma compilação e interpretação dos dados de entrada por um ou mais grupos de cientistas, de forma que podem ser obtidos dados mais representativos e interessantes. Esses são os bancos de dados curados, como o COG, SWISS-PROT e o TrEMBL. 6.3. GenBank e GenPept

O GenBank e o GenPept (a variante do GenBank para seqüências de proteínas) são os principais bancos de dados primários contendo seqüências de biomoléculas existentes no mundo e é muito importante que entendamos o funcionamento de seus principais números identificadores de seqüências: o GI e o AN.

O primeiro identificador de seqüência criado no NCBI foi o LOCUS, que era o único identificador de um registro no GenBank. O nome do loco era – e ainda é – definido como uma seqüência de 10 ou menos letras em caixa alta que apresentam um mnemônico para a função e o organismo de origem da seqüência. Assim o nome HUMHBB era utilizado para representar a região da β-globina humana (Baxevanis & Ouellette 2001). Entretanto, com a descoberta de cada vez mais locos e alelos diferentes, e com o aumento exponencial do número de seqüências no GenBank, ficou impossível a invenção e a atualização dos nomes de forma controlada. Assim os nomes de LOCUS, apesar de ainda aparecerem nos arquivos de formato GenBank, não têm mais nenhuma utilidade prática.

Devido a essas dificuldades de utilização da informação armazenada em LOCUS, o conselho internacional de colaboradores para seqüências de nucleotídeos (NCBI, EMBL e DDBJ) introduziu o conceito de accession number (AN) ou número de acesso. Esse número não carrega, intencionalmente, nenhuma informação biológica, de forma a permanecer estável. Originalmente consistia de uma letra seguida por cinco números, sendo que cada letra corresponderia ao centro (NCBI, EMBL ou DDBJ) no qual a seqüência fora submetida (Baxevanis & Ouellette 2001). Entretanto, logo esse número também começou a apresentar problemas, já que as seqüências eram atualizadas contendo o mesmo AN. No arquivo GenBank há um campo chamado accession, onde há a informação sobre o histórico de uma determinada seqüência; se ela se juntou a outra, se foi atualizada, etc. Apesar desses problemas, o AN é o índice mais controlado e confiável dos registros do NCBI/EMBL/DDBJ. Para melhorar a identificação de seqüências antigas, os membros do INSDC resolveram, em 1999, acrescentar, ao AN, o número de sua versão (Benson et al., 2002). Dessa forma pode-se ver o número de acesso, um ponto, e o número de atualizações feitas em uma determinada seqüência. Por exemplo, o número de acesso A21645.3 é a terceira atualização da seqüência A21645 e as versões mais velhas permanecem armazenas e acessíveis através dos números de submissão A21645.1 e A21645.2. Um código similar de AN.versão é dado também para seqüências de proteínas.

E para criar um índice ainda mais robusto para suas entradas, o NCBI, em 1992, criou um novo identificador, o GenInfo Identifier (GI), um número inteiro simples. Esse é um identificador único para cada seqüência, independente de atualizações ou de qualquer outra coisa que possa acontecer com uma seqüência. Toda

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entrada no NCBI possui um GI único da seqüência que não é alterado de forma alguma, permanecendo na base de dados para o acesso (Benson et al., 2002). Se uma seqüência difere-se da outra por apenas um par de bases, as duas possuirão diferentes GIs, apesar de possuírem, por exemplo, o mesmo AN (com diferentes números de versão). Todos os processos internos do NCBI utilizam o número de GI para sua a execução. 6.4. RefSeq – O banco de dados de seqüências de referência

O RefSeq é um dos bancos de dados secundários mais utilizados por biólogos de todo o mundo. Seu objetivo é produzir um conjunto não redundante de seqüências de DNA genômico, transcritos (cDNA) e de proteínas para diversos organismos. A vantagem de se utilizar o RefSeq é que, ao contrário dos bancos primários de seqüências, ele é não redundante. E isso significa que, para cada gene conhecido de um determinado organismo, o banco possui uma única entrada – ao contrário da infinidade de entradas para um mesmo gene dos bancos primários, como o próprio GenBank e GenPept. Além disso, ele apresenta os dados dos genes e proteínas associados a diversas informações úteis, como sua função, análises de mutação, polimorfismos conhecidos, etc. Ele é produzido pelo NCBI através de curadoria manual, ou seja, cada seqüência é analisada por pesquisadores treinados, uma a uma, e as informações relevantes são adicionadas à entrada RefSeq do banco de dados. O RefSeq apresenta ainda referências cruzadas com outros bancos de dados, permitindo que outras informações adicionais sejam relacionados com uma determinada seqüência de biomolécula. Uma das características mais interessantes do RefSeq é ser capaz ainda de reunir vários dados divergentes em uma plataforma consistente e apresentando um conjunto de padrões e convenções comuns. A primeira versão do RefSeq foi montada em Junho de 2003 e apresentava mais de 785.000 seqüências de proteínas, 210.000 seqüências de RNA e 64.000 seqüências genômicas de mais de 2005 organismos diferentes. As principais características do RefSeq são as seguintes:

• Não redundância; • Apresenta links diretos entre seqüências de nucleotídeos e proteínas; • Realiza atualizações diárias com relação ao conhecimento biológico da literatura sobre as seqüências em questão;

• Apresenta números de acesso precisos e bem definidos; • Possui curadoria especial pelo próprio pessoal do NCBI e colaboradores. Assim como as entradas para o GenBank, os registros do RefSeq apresentam

ainda um número de acesso, um número de versão e um GI associado. Além disso, os números de acesso apresentam prefixos definidos para facilitar sua identificação, veja abaixo:

Prefixo do número de acesso

Molécula

NC Molécula completa de genoma NG Regiao genômica NM MRNA NP Proteína NR RNA NT* Contig Genômico NW* Contig Genômico (WGS**) XM* MRNA XP* Proteína XR* RNA

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NZ Genoma (WGS) ZP Proteína gerada por entrada NZ

* Computed from genome annotation pipeline ** Whole Genome Shotgun Tabela 6.1. Números de acesso do RefSeq e moléculas associadas (Pruitt et al., 2003). 6.5. SWISSPROT – O maior banco de dados secundário de seqüências de proteínas O Swiss-Prot tem sido desenvolvido desde 1986 pelo departamento de bioquímica médica da universidade de Gênova (agora conhecido como Swiss Intitute of Bioinformatics) e pela Biblioteca de dados do EMBL. O Swiss-Prot é um banco de dados secundário que consiste apenas de seqüências de proteínas e apresenta uma padronização de nomenclatura segundo um formato próprio e conciso. Para cada seqüência no banco de dados existem os dados da molécula protéica em questão e a anotação biológica da mesma. A anotação biológica está relacionada ao processo de agregar informação a uma molécula biológica e uma aula específica sobre isso será dada posteriormente. A anotação da proteína no Swiss-Prot é bastante completa e apresenta os seguintes itens: função da proteína, modificações pós-traducionais (como adição de carboidrados, fosforilação, acetilação, etc), domínios conservados (como regiões de ligação a cálcio, sítios de ligação a ATP, dedos de zinco, etc.), estrutura secundária da proteína, estrutura quaternária (homodímero, heterodímero, etc.), similaridades com outras proteínas, associações com doenças ou deficiências, seqüências parecidas, variantes de splicing, etc. A idéia dos curadores é adicionar o maior número possível de informações relativas àquela proteína no Swiss-Prot e, para isso, os curadores se utilizam principalmente de artigos sobre as proteínas e revisões sobre o grupo de proteínas em questão. Além disso, algumas vezes são recrutadas pessoas com maior experiência em determinada proteína para fornecer informações mais precisas sobre as mesmas e enviar comentários e atualizações com relação a grupos mais específicos de proteínas. E assim como o RefSeq, o Swiss-Prot também tem a intenção de produzir a menor redundância possível com relação às entradas de proteínas presentes no banco, tentando, sempre que possível, incorporar todo o dado de uma certa proteína em uma única entrada para cada organismo. Além disso, o Swiss-Prot também apresenta referências cruzadas com cerca de outras sessenta bases de dados de biomoléculas, facilitando a apreensão de informação sobre a seqüência de proteína em questão. Falando de uma forma menos técnica, a grande vantagem de se utilizar o Swiss-Prot reside no fato do banco apresentar uma nomenclatura bem organizada para definir as seqüências de proteínas. Enquanto outros bancos apresentam nomenclaturas um tanto quanto divergentes, mesmo quando tratando de uma mesma molécula em diferentes organismos, o Swiss-Prot apresenta uma nomenclatura fixa para cada molécula de uma determinada proteína e mantém essa nomenclatura mesmo em diferentes espécies, o que facilita e permite uma maior confiança na identificação e anotação por similaridade desse tipo de molécula, como veremos na aula 7. Além disso, ele é o banco que normalmente apresenta um maior número de informações sobre uma molécula de proteína, incluindo modificações pós-traducionais, domínios e outras informações do interesse de um pesquisador que queira trabalhar com aquela molécula.

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6.6. Gene Ontology – Sistema de classificação de genes de acordo com suas características O Gene Ontology em si, não é bem um banco de dados e, por isso, talvez devesse estar em um capítulo à parte. Entretanto, são disponibilizados bancos de dados de ontologias organizadas para determinados organismos e parece interessante abordar esse tópico no presente momento. O Gene Ontology (popularmente conhecido como GO) é um esforço colaborativo em reunir descrições consistentes de produtos gênicos em diferentes bancos de dados. Os participantes do projeto GO desenvolveram três estruturas de vocabulário controlado, chamadas de ontologias, que descrevem os produtos gênicos em termos de sua associação com processos biológicos, componentes celulares e função molecular de maneira não relacionada com qualquer organismo em especial. Basicamente essas três ontologias estão relacionadas às principais perguntas que os pesquisadores têm sobre um determinado gene: (1) em quais processos biológicos o gene está envolvido; (2) qual a sua localização dentro da célula e; (3) como, molecularmente, o gene realiza sua função. Um determinado gene, por exemplo, pode realizar a transdução de sinais em uma célula (processo biológico), estar preso à membrana celular (localização celular) e ter uma função de fosforilar uma outra proteína (função molecular), sendo classificado no GO de acordo com essas três características. Além disso, a utilização de termos precisos de vocabulário do GO ajuda muito na chamada genômica comparativa, pois dessa forma podemos saber se um determinado organismo, por exemplo, apresenta um maior número percentual de genes relacionados a um determinado processo biológico ou não. O mesmo vale pras outras duas ontologias e podemos testar hipóteses, interessantes, como: será que um organismo que vive a altas temperaturas possui mais proteínas de choque térmico?, será que este organismo possui mais proteínas chaperonas, que ajudam no enovelamento de outras?, será que ele apresenta mais proteínas responsáveis pela duplicação de seu DNA? Da mesma forma, a utilização destas ontologias permite que um pesquisador saiba quais são todas as proteínas quinases de um determinado organismo, ou quais são todas as proteínas envolvidas com metabolismo de DNA ou, ainda, quais são todas as proteínas que ficam associadas ao retículo. Outro ponto importante na análise das ontologias é que elas, assim como a realidade biológica, não apresentam uma ordem hierárquica bem definida. E ainda que isso dificulte um pouco a análise, o resultado da ordem e da relação entre as ontologias fica mais fiel ao conhecimento que se tem sobre a biologia dos organismos. Ainda assim, as ontologias obedecem a uma certa hierarquia, não muito rígida, de forma que, por exemplo, a ontologia das “tirosina quinases” é filha da ontologia das “quinases” e o pesquisador pode escolher observar ou obter todas as quinases de um organismo de GO anotado ou apenas as “tirosina quinases”, que são um subgrupo das quinases. 6.7. Referências Bibliográficas 1. Weller DL et al., 2002. Database resources of the National Center for Biotechnology information: 2002 update. Nucleics Acid Reserch 30(1): 13-16. 2. Benson DA et al., 2002. GenBank. Nucleics Acid Reserch 30(1): 17-20. 3. Stoesser G et al., 2002. The EMBL nucleotide sequence database. Nucleics Acid Reserch 30(1): 21-26.

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4. Tateno Y et al., 2002. The DNA Data Bank of Japan (DDBJ) for genome scale research in life sciences. Nucleics Acid Reserch 30(1): 27-30. 5. Westbrook J et al., 2002. The Protein Data Bank: unifying the archive. Nucleics Acid Reserch 30(1): 245-248. 6. Bairoch A & Apweiler R, 2000. The SWISS-PROT protein sequence database and its supplement TrEMBL in 2000. Nucleics Acid Reserch 28(1): 45-48. 7. Baxevanis AD and Ouellette BFF, 2001. Bioinformatics: A practical guide to the analysis of genes and proteins. Ed. Wiley-interscience. 2nd ed. 8. Pruitt K., Tatusova T. and Ostell J. The NCBI handbook (Internet): Chapter 17, The Reference Sequence (RefSeq) Project. Bethesda (MD): National Library of Medicine (US), National Center for Biotechnology Information; 2002. Sites: NCBI Genbank - http://www.ncbi.nih.gov/Genbank/ EMBL Nucleotide Sequence Database - http://www.ebi.ac.uk/embl/ DDJP - DNA Data Bank of Japan - http://www.ddbj.nig.ac.jp/ NCBI Reference Sequences web site - http://www.ncbi.nlm.nih.gov/RefSeq/ The Gene Ontology – http://www.geneontology.org Swissprot – http://us.expasy.org/sprot/ 6.8. Brainstorm 1 - O que é a INSDC e por quais entidades ela é formada? 2 - Qual a diferença entre bancos de dados primários e secundários? Apresente dois exemplos de cada um. 3 - Entre no site do NCBI: http://www.ncbi.nlm.nih.gov. Na aba Search altere o valor para Nucleotide (isso significa que você estará fazendo uma pesquisa por seqüências de nucleotídeos), copie o AN AF117710 no espaço apropriado e clique em Go. Você deve observar um resultado dizendo que esse AN está associado ao gene “Homo sapiens hemoglobin beta chain (HBB) mRNA, complete cds”, clique no link para AF117710. Dessa forma você estará vendo todas as informações disponíveis no Genbank para este gene. Explique o que significa cada um dos seguintes campos LOCUS, DEFINITION, ACCESSION, VERSION, KEYWORDS, SOURCE, ORGANISM, REFERENCE, FEATURES, ORIGIN. Mais informações em http://www.ncbi.nlm.nih.gov/Sitemap/samplerecord.html 4 - Qual a diferença entre o identificador conhecido como GI e o AN? Quais bancos de dados os utilizam? Por que não existe apenas um número identificador de seqüência? 5 - O que é o projeto RefSeq e quais suas características principais? 6 - Entre no site do BLAST: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/BLAST. O BLAST é uma ferramenta de alinhamento local de seqüências de biomoléculas e entenderemos melhor sua função e seu funcionamento na próxima aula. Por ora, apenas entre na página e clique em “Translated query vs. protein database (blastx)”. Uma página irá abrir com vários campos. No campo Search, escreva novamente o número de acesso da seqüência da hemoglobina humana, AF117710 e clique no botão “BLAST!”. Na próxima página que irá se abrir clique em Format! e espere pelo resultado. O resultado mostrará as proteínas do GenPept mais parecidos com a hemoglobina humana, guarde este resultado. Entre novamente na página do BLAST - “Translated query vs. protein database (blastx)”. Nesta página copie novamente o número de

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aceso da hemoglobina AF117710 na aba Search só que, desta vez, clique no nome nr, na opção Choose database. O nr representa o GenPept e é o banco de dados contra o qual o BLAST realiza a busca. Selecione, ao invés de nr, a opção swissprot e então clique no botão “BLAST!”. Espere a próxima página aparecer e clique em Format! Quando a tela de resultados aparecer, compare esses resultados com aqueles obtidos contra o banco nr. Responda: O que você pode observar de diferente? Repare como a nomenclatura utilizada pelo Swissprot é importante e facilita a identificação da proteína. (Se tiver interesse, volte novamente e execute outras buscas BLAST contra diferentes bancos de dados e observe os resultados.) 7 - Em que consiste o Gene Ontology? Quais as principais ontologias existentes nas quais um gene pode ser descrito? Entre no site do http://www.geneontology.org e cole na caixa de texto o seguinte termo de GO:0006259. A qual ontologia esse GO pertence? Qual o nome desta ontologia? Quais são as ontologias imediatamente inferiores a esta?

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CAPÍTULO 7

Anotação de Genomas

7.1. Introdução

As seqüências genômicas são fontes ricas de informações sobre a biologia dos organismos, mas devem ser traduzidas através de análises computacionais e de interpretação biológica para que possamos extrair delas a maior quantidade possível de dados úteis (Lewis et al., 2000). A anotação genômica consiste num processo de vários passos e Stein (2001) divide-a, em três categorias básicas: a anotação de nucleotídeos, de proteínas e de processos (Figura 7.1).

A anotação de nucleotídeos é feita quando existem informações sobre o genoma completo (ou segmentos de DNA) de algum organismo. Assim, procura-se encontrar a localização física (posição cromossômica) de cada parte da seqüência e descobrir onde estão os genes (Rouzé 1999), RNAs, elementos repetitivos, etc. Na anotação de proteínas, que é feita quando existem informações sobre os genes (obtidos por seqüenciamento genômico ou de cDNA) de algum organismo, procura-se identificar os genes já descobertos e descobrir sua função. Assim é possível saber quais são aqueles que determinado organismo possui e quais ele não possui. A anotação de processos procura identificar as vias e processos nos quais diferentes genes interagem, montando uma anotação funcional eficiente.

Figura 7.1. Anotação de genomas completos. Esquema representando as fases e as perguntas que se deseja responder em cada uma das fases da anotação de genomas. Retirado de Prosdocimi et al., 2003. 7.2. Anotação de Nucleotídeos A anotação de nucleotídeos começa com a montagem do genoma, a identificação de onde está cada parte do DNA e qual a relação das partes entre si. Procura-se quais genes estão no mesmo segmento de DNA, no mesmo cromossomo. E depois que o genoma está montado, realiza-se buscas para encontrar as partes que correspondem aos genes expressos, quais partes correspondem a genes de tRNA, quais correspondem aos clusters de genes de rRNA e assim por diante. Assim, identifica-se a posição de cada um dos tRNAs com relação ao aminoácido que ele carrega, identifica-se a posição dos rRNAs e a posição dos genes.

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7.3. Anotação de Proteínas

Nessa etapa da anotação genômica procura-se montar um catálogo das proteínas e genes presentes nos organismos, nomeá-los e associá-los a prováveis funções através, principalmente, de buscas por similaridades (Aubourg & Rouzé 2001).

Várias técnicas recentes têm sido desenvolvidas para identificar automaticamente as proteínas pertencentes a diferentes grupos isofuncionais (chamados erroneamente de grupos de ortologia – Jensen 2001, veja na próxima aula), entretanto muitas dessas técnicas podem gerar classificações ambíguas. Na prática, o que é normalmente feito é a classificação das proteínas preditas com base em domínios funcionais, configurações espaciais e presença de padrões conservados, além de pesquisa ampla de similaridade contra proteínas bem caracterizadas.

Uma forma comum de se realizar a anotação de proteínas é procurar similaridades das seqüências com proteínas presentes em diferentes bancos de dados, utilizando ferramentas de alinhamento local como o BLASTp ou PSI-BLAST (Altschul et al., 1997). As coleções mais valiosas de seqüências de proteínas são os bancos de dados SWISS-PROT e TrEMBL. O primeiro apresenta uma coleção de seqüências de proteínas confirmadas e extensivamente anotadas. Ele contém ainda referências para outros bancos de dados de seqüência e estrutura, referências bibliográficas, identificação da família protéica e descrições sobre a provável função e papel biológico da proteína (Bairoch & Apweiler 2000). Entretanto a velocidade do seqüenciamento genômico é maior que a dos curadores e, por isso, foi criado o banco de dados TrEMBL, que contém uma tradução automática das seqüências codificadoras (cds) submetidas aos bancos de dados de nucleotídeos (Lang 1997, Apweiler 2000).

Uma análise complementar seria a procura de domínios funcionais, sendo que as bases de dados mais utilizadas nesse processo são: PFAM, PRINTS, PROSITE, ProDom, SMART e BLOCKS. Esses vários bancos de dados de padrões são altamente sobreponíveis, mas cada um possui seu próprio sistema de nomenclaturas e método de procura, o que torna difícil a interpretação dos resultados (Stein 2001). Por isso foi desenvolvido, recentemente, um banco integrado de assinaturas de proteínas, conhecido como InterPro, que procura integrar as informações dos bancos anteriormente citados. Cada entrada do InterPro contém uma breve descrição da família ou domínio, uma lista de proteínas do SWISS-PROT ou TrEMBL que o contém, referências bibliográficas e links para cada um dos bancos membros (Apweiler et al., 2001).

O banco InterPro tem sido utilizado para a anotação de diversos genomas, como o de leveduras, vermes, moscas, mostardas e homens. Desses, cerca de 40% a 50% das proteínas preditas possuem pelo menos uma entrada no InterPro, donde se conclui que a outra metade das proteínas eucarióticas pertencem a novas famílias protéicas e que muito ainda precisa ser aprendido (Apweiler et al., 2001). 7.4. Anotação de Processos

A parte mais interessante e desafiadora do processo de anotação gênica é relacionar, finalmente, a genômica com os processos biológicos. Para isso, como já vimos, foi criado um consórcio chamado Gene Ontology (GO), que busca criar um vocabulário padrão para descrever a função dos genes eucarióticos. Só para recordar, o GO consiste em três divisões: função molecular (atividade específica do gene em questão, por exemplo: atividade enzimática), processos biológicos (processo no qual o gene está inserido, como a meiose) e componentes celulares (descreve a estrutura celular na qual o gene está localizado, como organelas ou ribossomos) (The Gene Ontology Consortium 2000).

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Para a anotação de processos é necessário mais do que trabalho computacional. Técnicas biológicas em larga escala, como mutagênese mediada por transposons, análise de expressão em microarrays, RNA interference, identificação de proteínas por espectroscopia de massa, ensaios baseados em green-fluorescent-protein para determinar a localização subcelular e padrões temporais de expressão de proteínas e estudos de duplo-híbrido em leveduras têm sido de fundamental importância para identificar o papel de genes e proteínas nos processos biológicos (Stein 2001). Cada novo experimento adiciona mais informação e permite um melhor entendimento do genoma. Portanto, a anotação de processos é realizada comparando as informações genômicas com os dados atuais da literatura, de forma a tentar compreender ao máximo a biologia do organismo que está sendo estudado. 7.5. A realização da Anotação Genômica (Sociologia da Anotação)

Stein (2001) propõe alguns modelos bastante pertinentes para explicar como é realizada, passo a passo, a anotação genômica. Segundo ele, esses processos de identificação gênica normalmente seguem algum dos seguintes modelos organizacionais: a fábrica, o museu e a festa. Cada modelo é adequado para alguma das fases do trabalho de anotação (Stein 2001).

Durante a primeira fase, quando o principal trabalho é encontrar genes e mapear variações e marcadores, o modelo da fábrica é o mais adequado. Nesse modelo uma rede de computadores trabalha seguindo uma série de programas de anotação. A seqüência de entrada é jogada numa série de programas para predição de genes, procura de similaridades entre seqüências de nucleotídeos e proteínas e procura de domínios funcionais. Isso permite a geração de grandes quantidades de dados sobre o genoma.

Então se inicia a fase de museu, quando a ênfase passa da localização dos dados para a sua interpretação. Nesse modelo um conjunto de curadores deve classificar e catalogar o genoma de forma sistemática, encontrando e corrigindo erros gerados pelos programas na primeira etapa. A maior parte dessa etapa é feita à mão e deve basear-se também na literatura obtida sobre o organismo em questão para uma melhor integração com os dados genômicos.

Figura 7.2. Um exemplo da sociologia da anotação genômica: etapas de fábrica, museu e festa.

Após o tédio da curadoria é hora da festa. Nesse modelo, vários biólogos e bioinformatas são colocados juntos em um mesmo ambiente para discutir, anotar e realizar o fechamento do genoma. Os biólogos procuram associar os dados de genoma

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à biologia do organismo, montando várias hipóteses de trabalho e os bioinformatas e cientistas da computação montam as ferramentas e dão o suporte técnico para ajudar a produzir os resultados desejados. Esse modelo tem sido utilizado com sucesso para a anotação de diversos genomas, dentre eles o da Drosophila (Adams et al., 2000) e do camundongo (The RIKEN Genome Exploration Research Group Phase II Team and the FANTOM Consortium 2001).

É interessante notar que, enquanto o seqüenciamento genômico é uma tarefa bastante especializada, a anotação genômica é algo bastante multidisciplinar, no qual toda a comunidade científica (biológica) pode e deve contribuir. 7.6. Referências Bibliográficas 1. Stein, L., 2001. Genome annotation: from sequence to biology. Nature Reviews 2: 493-505 2. Rouzé P.; Pavy, N. and Rombauts, S. (1999). Genome annotation: which tools do we have for it? Curr Opin Struct Biol 2: 90-95. 3. Lewis, S.; Ashburner, M. and Reese, M. G. (2000). Annotating eukaryote genomes. Curr Opin Struct Biol 10: 349–354. 4. PHRAP -- http://www.phrap.org 5. CAP3 - http://genome.cs.mtu.edu/cap/cap3.html 6. Prosdocimi F; Cerqueira GC; Binneck E; Silva AF; Reis AN; Junqueira ACM; Santos ACF; Nhani-Júnior A; Wust CI; Camargo-Filho F; Kessedjian JL; Petretski JH; Camargo LP; Ferreira RGM; Lima RP; Pereira RM; Jardim S; Sampaio VS and Folgueras-Flatschart AV. Bioinformática: manual do usuário. Biotec. Ci. Des. 29: 18-31, 2002. 7. Aubourg, S. and Rouzé P. (2001). Genome annotation. Plant Physiol Biochem 39: 181-193. 8. Altschul, S. F.; Madden, T. L.; Schaffer, A. A.; Zhang, J.; Zhang, Z.; Miller, W. and Lipman, D. J. (1997). Gapped BLAST and PSI-BLAST: a new generation of protein database search programs. Nucleic Acids Res 25: 3389-3402. 9. Bairoch, A. and Apweiler, R. (2000). The SWISS-PROT protein sequence database and its supplement TrEMBL in 2000. Nucleic Acids Res 28: 45-48. 10. Jensen, R. A. (2001). Orthologs and paralogs – we need to get it right. Genome Biol 2: 1002.1-1002.3. 11. Apweiler, R. (2001). Functional information in SWISS-PROT: The basis for large-scale characterisation of protein sequences. Brief Bioinform 2: 9-18. 12. Apweiler, R.; Attwood, T. K.; Bairoch, A.; Bateman, A.; Birney, E.; Biswas, M.; Bucher, P.; Cerutti, L.; Corpet, F.; Croning, M. D.; Durbin, R.; Falquet, L.; Fleischmann, W.; Gouzy, J.; Hermjakob, H.; Hulo, N.; Jonassen, I.; Kahn, D.; Kanapin, A.; Karavidopoulou, Y.; Lopez, R.; Marx, B.; Mulder, N. J.; Oinn, T. M.; Pagni, M.; Servant, F.; Sigrist, C. J. and Zdobnov, E. M. (2001). The InterPro Database; an integrated documentation resource for protein families; domains and functional sites. Nucleics Acid Res 29: 37-40. 13. Lang, F. (1997). TREMBL. Trends Genet 13: 417. 14. The Gene Ontology Consortium (2000). Gene Ontology: tool for the unification of biology. Nat Genet. 25: 25-29. 15. The RIKEN Genome Exploration Research Group Phase II Team and the FANTOM Consortium (2001). Functional annotation of a full-length mouse cDNA collection. Nature 409: 685-690. 16. Adams, M. D.; Kelley, J. M.; Gocayne, J. D.; Dubnick, M.; Polymeropoulos, M. H.; Xiao, H.; Merril, C. R.; Wu, A.; Olde, B.; Moreno, R. F.; Kerlavage, A. R.; McCombie,

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W. R. and Venter, J. C. (1991). Complementary DNA sequencing: expressed sequence tags and human genome project. Science 252: 1651-6. 7.7. Brainstorm 1. Em que consiste a anotação de genomas? 2. Quais são as principais etapas durante a anotação dos genomas e qual pergunta deseja-se responder em cada uma delas?

3. Quais são os objetivos da anotação de nucleotídeos? 4. Quais são os objetivos da anotação de proteínas? 5. Quais são os objetivos da anotação de processos? 6. Como é realizada a anotação de genomas? Descreva os modelos organizacionais e qual a atividade realizada em cada uma destas etapas.

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CAPÍTULO 8 Bioinformática Evolutiva e Genomas Completos

Iniciando nossa Interação

O conceito de homologia é algo que normalmente é utilizado de forma incorreta por diversos estudantes e pesquisadores. Muitas vezes escuta-se dizer que há diferentes graus de homologia entre genes ou que o gene A é mais homólogo ao gene B do que um terceiro gene C. Este conceito está errado. A homologia está relacionada à ancestralidade de um caráter, gene ou proteína, e é algo que existe ou não existe, não há graus intermediários. Esse será o tema deste capítulo. 8.1. Homologia, Ortologia e Paralogia O conceito de homologia é algo que normalmente é utilizado de forma incorreta por diversos estudantes e pesquisadores. Muitas vezes escuta-se dizer que há diferentes graus de homologia entre genes ou que o gene A é mais homólogo ao gene B do que um terceiro gene C. Este conceito está errado. A homologia está relacionada à ancestralidade de um caráter, gene ou proteína, e é algo que existe ou não existe, não há graus intermediários. Genes ou proteínas homólogas são aquelas que apresentam um ancestral comum recente, assim como caracteres homólogos são derivados de uma mesma estrutura ancestral. As proteínas podem ter mais ou menos similaridade entre si. Quando fazemos, por exemplo, um alinhamento de seqüências de duas proteínas de uma certa espécie contra uma terceira de outra espécie, poderemos descobrir qual das duas é mais similar à terceira. Portanto, a homologia está relacionada à evolução e não apresenta níveis intermediários: ou é ou não é. E existem duas classes distintas de genes/proteínas homólogos, os ortólogos e os parálogos. E de suma importância para o correto estudo da evolução, é a identificação de proteínas ortólogas e parálogas. A evolução deve ser estudada apenas em proteínas ortólogas, ou seja, aquelas que descendem de uma mesma proteína ancestral (e não foram duplicadas dentro de linhagens -- parálogas --, já que as estas últimas normalmente acumulam mutações extras devido ao fato de não haver pressão seletiva para manutenção de sua função) (Jensen, 2001). Já as proteínas ortólogas, que normalmente apresentam o mesmo papel funcional na célula, são importantes para a execução deste papel e, portanto, não devem acumular mutações que alterem sua capacidade funcional. O estudo de evolução em nível molecular baseia-se na comparação entre proteínas ortólogas, derivadas de uma mesma proteína no ancestral comum entre as espécies.

Ultimamente os termos ortologia e paralogia têm sido muito utilizados na biologia genômica para expressar relações funcionais entre genes. Genes ortólogos são considerados aqueles homólogos que apresentam a mesma função em organismos diferentes. Já os genes parálogos são considerados homólogos, presentes num mesmo organismo, que não apresentam a mesma função. Entretanto, de acordo com Walter

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Fitch, que primeiramente utilizou esses termos, eles não apresentam esse significado funcional e sim um significado evolutivo.

Segundo sua definição, a determinação de ortologia ou paralogia está relacionada a eventos de evolução gênica. Genes que tenham sido duplicados dentro de uma mesma linhagem (linhas horizontais) são parálogos, não importando se possuem a mesma função ou não. Já os genes que foram alterados dentro de linhagens específicas, após especiação (aqueles nos quais, se voltarmos à sua origem, chegamos a uma bifurcação ou Y invertido) são os chamados ortólogos.

Figura 8.1. Eventos de paralogia e ortologia. Adaptada de Jensen, 2001

Isso significa dizer que, na figura acima, A1 tem três ortólogos na espécie C, mas somente C1 é ortólogo de B1. Já B2 tem dois ortólogos na espécie C (C2 e C3), onde C2 e C3 são parálogos. Portanto, toda relação de homologia entre genes pode ser classificada como ortologia ou paralogia e deve-se perceber que um dado gene em uma espécie pode ter mais do que um ortólogo em outra. Além disso, podemos detectar também genes parálogos em espécies diferentes. É bom lembrar que existe também uma terceira relação entre genes conhecida como xenologia, que consiste na relação entre genes quando, na sua história evolutiva, pelo um deles surgiu por transferência horizontal, ou seja, o gene em algum momento foi absorvido do meio para dentro do genoma do organismo (através de vírus, por exemplo).

Portanto essa definição de nada tem a ver com a função e sim com a história evolutiva dos genes e é assim que essa nomenclatura foi definida primeiramente. Entretanto, devemos notar que, para definirmos corretamente a relação entre os genes, temos que conhecer detalhes sobre sua rota evolutiva. O problema é que, na grande maioria das vezes, não temos informações suficientes para montar essa rota de forma correta.

É interessante notar que, para os pesquisadores da ciência genômica, é importante saber, principalmente, se dois genes homólogos possuem uma mesma característica funcional. Esse conhecimento permite entender melhor tanto as origens estruturais das funções biológicas como as bases moleculares para a divergência dessas funções, permitindo aos pesquisadores comparar relações sobre a seqüência, estrutura e função de grupos de homólogos.

Assim, considerando que os termos ortologia e paralogia mostram-se inadequados para uso, Gerlt e Babbit sugerem novos termos a serem utilizados na

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pesquisa genômica. Assim, genes isofuncionais seriam aqueles homólogos que apresentam a mesma função; heterofuncionais seriam aqueles que apresentam funções diferentes; isoespecíficos seriam homólogos encontrados na mesma espécie e heteroespecíficos seriam homólogos presentes em espécies diferentes.

Dessa forma, genes homólogos com a mesma função em espécies diferentes seriam heteroespecíficos e isofuncionais, homólogos com funções diferentes no mesmo organismo seriam isoespecíficos e heterofuncionais, homólogos com a mesma função num mesmo organismo seriam isoespecíficos e isofuncionais e homólogos com funções diferentes em diferentes organismos seriam heteroespecíficos e heterofuncionais. 8.2. COG Portanto, como vimos acima, algo que é bastante penoso e questionável em estudos evolutivos é a definição de critérios que possam identificar determinados genes como ortólogos para que sejam realizados estudos evolutivos entre eles (Sonnhammer & Koonin 2002). Não existem metodologias consensuais para identificar ortólogos e cada pesquisador considera-os da forma como acredita ser melhor. Entretanto, o NCBI apresenta um serviço conhecido como COG -- Clusters of Ortologous Groups (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/COG/) -- onde foi realizado um estudo para a definição dos grupos de proteínas ortólogas presentes em organismos de genomas completos (Tatusov et al., 1997). Assim, o COG disponibiliza grupos de proteínas ortólogas classificadas de acordo com sua função biológica em dois serviços, um para organismos procariotos (Tatusov et al., 2001) e outro para eucariotos (Tatusov et al., 2003).

A forma como o COG define proteínas como ortólogas baseia-se no critério conhecido como BeTs. Os BeTs, ou best hits bidirecionais são resultantes de alinhamentos locais entre proteínas de um determinado organismo e o genoma de outro. Para que uma proteína 1, em um organismo 1, seja BeT de uma proteína 2, no organismo 2, o melhor resultado (best hit) de uma busca BLAST (Altschul et al., 1997) entre a proteína 1 contra o genoma do organismo 2 deve encontrar a proteína 2 como best hit da busca, assim como o contrário. Ou seja, ao executarmos o BLAST da proteína 2, contra o genoma do organismo 1, o best hit deve ser a proteína 1. Assim, define-se grupos de proteína BeT (Tatusov et al., 1997). Assim, para a definição de um grupo de proteínas ortólogas em um COG é necessário haver BeT entre pelo menos três diferentes organismos, sendo que as três (ou mais) proteínas devem ser BeT das outras proteínas encontradas nos outros organismos. Assim o KOG, que representa o serviço do COG para organismos eucarióticos, apresenta 4852 grupos de proteínas ortólogas de diversos organismos. Assim, para cada gene conhecido dos organismos existe um número de KOG característico e, se buscarmos em outro organismos os genes de mesmo identificador KOG, pegaremos os genes que provavelmente realizam a mesma função neste organismo. O COG, portanto, facilita o estudo da evolução gênica considerando que ele mesmo já separa para o pesquisador os genes que provavelmente são ortólogos nos diferentes organismos. O serviço COG de procariotos apresenta 66 genomas completos que são disponibilizados no site http://www.ncbi.nlm.nih.gov/COG, enquanto o serviço do KOG de eucariotos atualmente apresenta sete organismos em seu banco de dados. 8.3. Trabalhando com genomas completos Tão importante quanto aprender a trabalhar para montar um genoma, produzindo toda sua seqüência de bases, é saber como podemos utilizar as

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informações de genomas já seqüenciados e disponíveis nos bancos de dados públicos. Na tabela 8.1 abaixo podemos ver quantos genomas de diferentes grupos de organismos já foram seqüenciados até o presente momento (01/2005).

Organism Complete Genomes published

Vírus 2024 Arqueobactérias 21 Bactérias 196 Outros Eucariotos 18

Tabela 8.1. Número de seqüências genômicas já publicadas para diferentes classes de organismos. Obtido em http://www.ncbi.nlm.nih.gov/genomes/static/gpstat.html, a 27/01/2005.

As seqüências genômicas de diversos organismos podem ser obtidas no site do

NCBI http://www.ncbi.nlm.nih.gov, a partir do serviço Entrez Genomes. Os genomas presentes ali geralmente são fornecidos na forma de diversos arquivos de entrada, cada um contendo uma informação específica, que pode ser vista na tabela abaixo:

Arquivo Informação contida no arquivo asn Arquivo no formato GenBank contendo informações de genoma

formatadas em XML faa Seqüências de aminoácidos de todas as proteínas inferidas no formato

FASTA ffn Seqüências de Nucleotídeos de todos os genes inferidos no formato

FASTA, apresentando, no cabeçalho informação sobre sua posição no genoma

fna Contém a informação sobre a seqüência de nucleotídeos do genoma completo do organismo

gbk Contém todo o genoma do organismo anotado segundo padrão GenBank

ptt Apresenta informações sobre localização, fita, tamanho, identificador, nome e código de cada um dos genes, assim como sua categoria funcional segundo o COG

Tabela 8.2. Arquivos disponibilizados pelo NCBI para seqüências de genomas completos de procariotos (ftp://ftp.ncbi.nlm.nih.gov/genomes/Bacteria).

Assim, temos disponível para nosso uso tanto a seqüência do genoma completo do organismo quanto as seqüências de cada um dos seus genes e proteínas. Com essas informações torna-se possível que realizemos vários tipos de estudos de nosso próprio interesse e utilizemos as seqüências dos genomas da forma como nos interessar. 8.4. Referências Bibliográficas 1. Altschul, S. F.; Madden, T. L.; Schaffer, A. A.; Zhang, J.; Zhang, Z.; Miller, W. and Lipman, D. J. (1997). Gapped BLAST and PSI-BLAST: a new generation of protein database search programs. Nucleic Acids Res 25: 3389-3402.

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2. Jensen, RA. Orthologs and paralogs – we need to get it right. Genome Biology 2001 2 (8): 1002.1-1002.3

3. Sonnhammer EL, Koonin EV (2002). Orthology, paralogy and proposed classification for paralog subtypes. Trends Genet. Dec;18(12):619-20.

4. Tatusov RL, Fedorova ND, Jackson JD, Jacobs AR, Kiryutin B, Koonin EV, Krylov DM, Mazumder R, Mekhedov SL, Nikolskaya AN, Rao BS, Smirnov S, Sverdlov AV, Vasudevan S, Wolf YI, Yin JJ, Natale DA (2003). The COG database: an updated version includes eukaryotes. BMC Bioinformatics. Sep 11;4(1):41.

5. Tatusov RL, Natale DA, Garkavtsev IV, Tatusova TA, Shankavaram UT, Rao BS, Kiryutin B, Galperin MY, Fedorova ND, Koonin EV (2001). The COG database: new developments in phylogenetic classification of proteins from complete genomes. Nucleic Acids Res. Jan 1;29(1):22-8.

6. Tatusov RL, Koonin EV, Lipman DJ (1997). A genomic perspective on protein families. Science. Oct 24;278(5338):631-7.

8.5. Brainstorm 1. Qual o conceito de homologia e por que não se diz que dois genes são mais homólogos entre si do que um terceiro?

2. O que são genes parálogos e ortólogos? 3. Como o COG classifica os genes em ortólogos? Discuta sobre a classificação do COG e o conceito de ortologia da resposta anterior.

4. Por que você acredita que os genomas virais são os mais seqüenciados de todos? 5. Que tipo de informação é disponibilizada sobre um organismo quando um genoma está completo?

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CAPÍTULO 9

Bioinformática estrutural

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Como já dissemos a bioinformática consiste principal no estudo de seqüências de biomoléculas. Até agora já conseguimos entender a relevância da bioinformatica com relação a seqüências de DNA (genoma) e RNA (transcriptoma). Portanto é hora de nos voltarmos para as seqüências de proteínas. As proteínas são muitas vezes consideradas as principais moléculas de uma células, já que são elas que realizam as funções celulares, sendo que o DNA e RNA têm principalmente a característica de armazenamento e processamento de informações. Sabe-se bem que as proteínas exercem sua função de acordo com sua estrutura espacial, ou seja, a função da proteína está intrinsecamente ligada a sua conformação tridimensional, à sua estrutura. E é justamente a busca por esta conformação espacial uma das principais áreas da bioinformática, que será discutida no presente capítulo. 9.1. Sobre a estrutura das proteínas A seqüência de aminoácidos que forma uma determinada proteína é conhecida como sua estrutura primária. Já a forma como os aminoácidos se interconectam formando alças, hélices ou folhas consiste na estrutura secundária da proteína. Entretanto, o que realmente importa para a função de uma proteína é sua forma tridimensional no espaço. É através dessa conformação espacial que a proteína encaixa segundo o modelo chave-fechadura nos seus substratos para catalisar uma determinada reação química que dê origem aos produtos da ação enzimática. No caso da estrutura de uma proteína, existem dois ângulos principais de torção entre átomos dos aminoácidos que são responsáveis pela forma final na qual uma proteína se enovela no espaço, esses são os ângulos phi e psi. Eles são formados pela ligação carbono alfa dos aminoácidos e seus grupos amino e ácido carboxílico. Cada aminoácido da proteína apresenta um valor de torção de tais ângulos e, soubéssemos esse valor para cada um deles, conheceríamos perfeitamente a forma como a proteína se enovela para realizar sua função. Ainda hoje é impossível prever teoricamente a estrutura 3D de uma proteína quando conhecemos apenas sua estrutura primária e esse é um dos grandes, senão o maior, desafio da bioinformática nos dias de hoje. Mesmo alguns cientistas célebres dizem que a bioinformática consiste apenas em uma forma de processar a informação de genomas, transcriptomas ou proteomas e que nunca algo realmente de valor pode ser produzido apenas por análises computacionais de seqüências de biomoléculas. Entretanto, acredita-se que a forma como as proteínas se enovelam no espaço seja realmente uma das grandes questões da atualidade e, possivelmente, isso traria daria fama e respeito em toda comunidade científica caso um método teórico de predição de estrutura de proteínas fosse desenvolvido através de ferramentas computacionais. E, na minha opinião, se algo pode dar um Nobel a um bioinformata, essa é a grande pergunta a ser respondida e trabalhada. Bem, mas a vida real é mais dura e, hoje, para descobrirmos a estrutura terciária de uma proteína, que consiste exatamente na sua forma espacial, devemos

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utilizar laboriosos testes experimentais para tal, sendo que os principais métodos utilizados hoje em dia são a difração de raios-X e a ressonância nuclear magnética.

Na difração de raios-X, a primeira dificuldade consiste na produção de um cristal da proteína desejada. E essa dificuldade deve-se ao fato de que a cristalização consiste num processo um tanto quanto caótico e imprevisível, sendo que determinadas proteínas podem ser cristalizadas em poucos dias enquanto outras demoram anos para que possam ser cristalizadas. Esse cristal deve então ser submetido a uma fonte de raios-X e o padrão de difração obtido pela incidência do raio-X no cristal da proteína deve ser então analisado computacionalmente para que seja produzida a estrutura precisa da proteína em questão. Com os dados obtidos no experimento de difração é montado um mapa de densidades eletrônicas onde os aminoácidos são “encaixados” e o quebra cabeça que representa a estrutura da proteína é gerado. Dependendo da resolução obtida pode-se chegar até a descobrir exatamente qual a seqüência de aminoácidos da proteína. Quase 100% das vezes, entretanto, a seqüência primária já é conhecida de antemão.

Ao contrário da técnica de difração de raios-X, a ressonância nuclear magnética ou NMR, da sigla em inglês, permite que a estrutura da proteína seja conhecida sem que haja necessidade da cristalização da mesma (as proteínas são utilizadas em solução) e, portanto, proteínas que não são possíveis de se cristalizar têm sua estrutura 3D resolvida por este método. No fundo esse é um método de minimização de energia que produz um resultado menos preciso e de menor resolução do que os resultados de difração. Freqüentemente os resultados de NMR produzem mais de um resultado que apresente uma energia mínima e, assim, os arquivos de estruturas de proteínas resolvidas por NMR são, na verdade, um conjunto contendo todas as estruturas da proteína que apresentaram menor energia e várias estruturas parecidas são observadas nestes arquivos. 9.2. Protein Data Bank: o banco de dados de estruturas de proteínas O PDB (Protein Data Bank ou Banco de Dados de Proteína) consiste no principal banco de dados de estrutura de proteínas existente no mundo. A figura 9.1 apresenta o crescimento do número de estruturas depositadas desde a criação do PDB, em 1972. Algo interessante a ser notado é que, se nos lembrarmos da primeira aula que tivemos, da primeira figura deste curso, a figura 1.1, perceberemos que, enquanto cerca de 16 milhões de seqüências nucleotídicas são conhecidas, ainda hoje temos conhecimento apenas de cerca de 30 mil estruturas de proteínas. E isso nos mostra como a descoberta das estruturas terciárias das proteínas ainda hoje consiste num método trabalhoso e complicado. Analisando ainda a figura, vemos que com o passar dos anos, cada vez mais estruturas são reveladas (barras vermelhas), mas ainda assim há uma clara e notória diferença entre a informação de seqüência e de estrutura das biomoléculas. O PDB também abriga dados estruturais de pequenos peptídeos, vírus, ácidos nucléicos e carboidratos e, das cerca de 30 mil estruturas presentes no banco cerca de vinte e cinco mil foram resolvidas através de difração de raios-X enquanto cerca de cinco mil foram resolvidas por experimentos de ressonância magnética. Algumas proteínas, entretanto, tiveram suas estruturas resolvidas pelas duas técnicas.

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Figura 9.1. Crescimento do PDB. Crescimento do número de estruturas de proteínas contidas no PDB ao longo das três últimas décadas. Obtido em http://www.rcsb.org/pdb/holdings.html. Outra informação importante sobre o PDB é que ele consiste, assim como o GenBank, em um banco de dados primário de estruturas de proteínas, onde as mesmas não são classificadas ou analisadas de nenhuma forma específica, estando publicadas da mesma forma que o pesquisador que as produziu depositou no banco. 9.3. Modelagem molecular por homologia A modelagem molecular por homologia representa a tentativa de se descobrir a estrutura de uma determinada proteína tendo como base a estrutura de uma outra proteína de seqüência relativamente similar. E a necessidade de se modelar uma estrutura vem do fato de que a informação biológica sobre uma determinada proteína cresce quando se conhece sua estrutura (figura 9.2). Com a informação da estrutura de uma proteína é possível tentar descobrir, por exemplo, outras proteínas que interajam com ela, fármacos que possam ativá-la ou inibi-la ou, simplesmente, permite que entendamos melhor seu mecanismo molecular de ação.

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Figura 9.2. O desafio da modelagem por homologia. A premissa básica na qual se baseia a modelagem por homologia é a de que: se duas proteínas apresentam seqüência primária similar é bem provável que sua estrutura seja também parecida. E essa premissa tem se mostrado real, apesar de que, algumas vezes, mesmo proteínas que apresentam seqüências primárias diferentes podem apresentar conformações tridimensionais parecidas, no que novos programas de threading têm sido desenvolvidos para tentar prever essas estruturas. Voltando à modelagem por homologia, entretanto, é preciso definir bem quais são as situações nas quais a modelagem molecular vale a pena ou não em ser realizada. Basicamente, ela vale ser realizada nos seguintes casos: (1) quando o problema é experimentalmente difícil, por exemplo, quando as proteínas são muito difíceis de serem cristalizadas, como é o caso de proteínas glicosiladas ou de membrana; (2) quando se deseja apenas saber aproximadamente a estrutura da proteína, ou seja, quando o problema não justifica o investimento e o tempo necessários para produzir experimentalmente a estrutura da proteína; ou (3) quando este é o único recurso disponível, no caso, por exemplo de um laboratório que não tenha os equipamentos de dedução experimental ao alcance. Os procedimentos realizados para a modelagem por homologia normalmente consistem nos seguintes passos: (1) identificação das proteínas já modeladas apresentando seqüências primárias similares, normalmente realizada através de alinhamentos locais da proteína desejada contra as seqüências das proteínas do PDB; (2) seleção das proteínas similares que serão utilizadas como modelo; (3) alinhamento global da seqüência desejada com as que serão utilizadas; (4) construção do modelo através de similaridade com os modelos das proteínas escolhidas do PDB utilizando um software de modelagem; (5) avaliação do modelo utilizando diferentes algoritmos de teste. Vale notar que o processo de modelagem por homologia é um processo iterativo, ou seja, que pode apresentar várias iterações ou repetições. No final, avalia-se o modelo obtido e, se o modelo não for satisfatório, tenta-se escolher outras proteínas homólogas, alinhamentos um pouco diferentes ou tenta-se modificar alguns parâmetros do programa de modelagem até que o modelo passe bem nos testes que avaliam os ângulos de torção dos aminoácidos e as propriedades físico-químicas da proteína.

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9.4. Alguns programas de modelagem molecular Existem vários programas que permitem a realização da modelagem molecular. O mais fácil de utilizar é o swiss-model http://swissmodel.expasy.org/SWISS-MODEL.html. Ele consiste num servidor que realiza todos os procedimentos de forma transparente para o usuário, que precisa apenas entrar com a seqüência primária da proteína de interesse. O próprio swiss-model procura as proteínas similares de estrutura conhecida e realiza a montagem do modelo por homologia segundo um algoritmo próprio. Apesar disso, ele permite que o usuário também entre com os identificadores PDB das proteínas que o mesmo deseje utilizar como molde ou definir um valor de cutoff de BLAST para ser utilizado na escolha automática das proteínas pelo sistema. Apesar de simples, o swiss-model é normalmente utilizado apenas para a produção de modelos aproximados ou como recurso didático.

Já o algoritmo Modeller consiste num software mais robusto para a elucidação de estruturas por homologia. O Modeller trabalha através de satisfação de restrições espaciais, apresentando um banco de dados interno que contém alinhamentos de 416 proteínas de 105 diferentes famílias e, para a satisfação de tais restrições, ele ainda calcula as distâncias entre os átomos dos aminoácidos utilizando funções estatísticas de densidade de probabilidade. Apresenta ainda um algoritmo de otimização através de dinâmica molecular, onde as restrições espaciais são otimizadas levando em consideração termos energéticos e de estereoquímica de aminoácidos. O Modeller contém também um banco de dados contendo proteínas representativas de todo o PDB. 9.5. Threading Vimos, portanto, como normalmente é realizada a montagem de modelos teóricos de estruturas protéicas baseados em homologia de seqüência entre diferentes proteínas. Entretanto, o que fazer quando o pesquisador deseja modelar teoricamente uma determinada proteína mas não há outras seqüências similares o suficiente no banco de dados do PDB para realizar essa modelagem? Foi pensando nesse tema e no fato de que algumas proteínas de seqüência bem divergente apresentam estruturas similares, que os algoritmos de threading foram desenvolvidos. Tais programas, como o gene threader, tentam modelar proteínas que não apresentem seqüências primárias similares com estrutura conhecida. Um programa de threading funciona de acordo com a montagem dos chamados modelos descritivos, que são montados para tentar criar um padrão relacionando seqüência e estrutura, mas não de uma forma tão rígida quanto num alinhamento. Esses padrões levam em consideração alguns fatores, como: (1) a distância entre os resíduos de aminoácidos; (2) a estrutura secundária de vários segmentos das proteínas; (3) as características físico-químicas de cada resíduo e sua ordem na cadeia. Dessa forma, esses algoritmos são, por vezes, capazes de gerar estruturas terciárias de proteínas sem que existam outras proteínas já modeladas com seqüência similar. 9.6. CASP – Critical Assessment of Structure Prediction É interessante notar que a cada dois anos é realizada uma espécie de “competição” para tentar descobrir quais são os melhores programas de modelagem molecular existentes no mundo. Essa saudável competição é realizada como um estudo cego onde uma proteína recém modelada experimentalmente tem sua estrutura

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escondida e vários grupos de modelagem em todo o mundo obtêm sua seqüência primária e tentam modelá-la através de diversas técnicas diferentes. Ganha o concurso o grupo que se aproximar mais da estrutura real da proteína, que só é liberada depois que o concurso termina. E a cada biênio os pesquisadores mostram conseguir chegar mais perto da estrutura real da proteína desconhecida. 9.7. Estrutura de um arquivo no formato PDB O arquivo abaixo consiste na parte inicial de um arquivo no formato PDB que representa a estrutura de uma proteína, no caso de uma variante da hemoglobina humana. O arquivo PDB normalmente é estruturado de acordo com as seguintes partes: Informações do arquivo Identificadores da primeira coluna Título TITLE, COMPND, SOURCE, AUTHOR, REMARKS Estrutura primária DBREF, SEQADV, SEQRES, MODRES Heteroátomos HET, HETNAM, HETSYN, FORMUL Estrutura secundária HELIX, SHEET, TURN Ligações químicas SSBOND, HYDBND, SLTBRG, CYSPEP Dados cristalográficos CRIST1, ORIGXn, SCALEn, MTRIXn Coordenadas atômicas MODEL, ATOM, TER, HETATM Tabela 9.1. Informações presentes num arquivo PDB de estrutura de proteína. Exemplo de um arquivo PDB: HEADER OXYGEN TRANSPORT 14-APR-95 1HDB 1HDB 2

COMPND MOL_ID: 1; 1HDB 3

COMPND 2 MOLECULE: HEMOGLOBIN (DEOXY) BETA-V67T; 1HDB 4

COMPND 3 CHAIN: A, B, C, D; 1HDB 5

COMPND 4 SYNONYM: HBV67T; 1HDB 6

COMPND 5 ENGINEERED: YES; 1HDB 7

COMPND 6 MUTATION: CHAIN B, D, V67T; 1HDB 8

COMPND 7 OTHER_DETAILS: ALPHA-BETA-ALPHA-BETA TETRAMER 1HDB 9

SOURCE MOL_ID: 1; 1HDB 10

SOURCE 2 SYNTHETIC: YES; 1HDB 11

SOURCE 3 ORGANISM_SCIENTIFIC: HOMO SAPIENS; 1HDB 12

SOURCE 4 ORGANISM_COMMON: HUMAN; 1HDB 13

SOURCE 5 TISSUE: BLOOD; 1HDB 14

SOURCE 6 CELL: ERYTHROCYTE; 1HDB 15

SOURCE 7 EXPRESSION_SYSTEM: ESCHERICHIA COLI; 1HDB 16

SOURCE 8 EXPRESSION_SYSTEM_STRAIN: AR120; 1HDB 17

SOURCE 9 EXPRESSION_SYSTEM_PLASMID: PJK05 (FRONTICELLI ET AL.,1991); 1HDB 18

SOURCE 10 EXPRESSION_SYSTEM_GENE: BETA-GLOBIN CDNA FUSED TO A 1HDB 19

SOURCE 11 TRUNCATED VIRAL GENE 1HDB 20

KEYWDS HUMAN HEMOGLOBIN, DEOXY-BETA-V67T 1HDB 21

EXPDTA X-RAY DIFFRACTION 1HDB 22

AUTHOR I.PECHIK,X.JI,C.FRONTICELLI,G.L.GILLILAND 1HDB 23

REVDAT 1 03-APR-96 1HDB 0 1HDB 24

JRNL AUTH I.PECHIK,X.JI,J.DILL,K.FIDELIS,J.MOULT, 1HDB 25

JRNL AUTH 2 W.S.BRINIGAR,M.KARAVITIS,C.FRONTICELLI, 1HDB 26

JRNL AUTH 3 G.L.GILLILAND 1HDB 27

JRNL TITL ANALYSIS OF THE CRYSTAL STRUCTURE, MOLECULAR 1HDB 28

JRNL TITL 2 MODELING AND INFRARED SPECTROSCOPY OF THE DISTAL 1HDB 29

JRNL TITL 3 BETA-HEME POCKET VALINE67(E11)-THREONINE MUTATION 1HDB 30

JRNL TITL 4 OF HEMOGLOBIN 1HDB 31

JRNL REF TO BE PUBLISHED 1HDB 32

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JRNL REFN 0353 1HDB 33

REMARK 1 1HDB 34

REMARK 1 REFERENCE 1 1HDB 35

REMARK 1 AUTH C.FRONTICELLI,I.PECHIK,W.S.BRINIGAR,Z.GRYCZYNSKI, 1HDB 36

REMARK 1 AUTH 2 G.L.GILLILAND 1HDB 37

REMARK 1 TITL OXYGEN AFFINITY MODULATION BY THE N-TERMINI OF THE 1HDB 38

REMARK 1 TITL 2 BETA- CHAINS IN HUMAN AND BOVINE HEMOGLOBIN 1HDB 39

REMARK 1 REF J.BIOL.CHEM. V. 269 23965 1994 1HDB 40

REMARK 1 REFN ASTM JBCHA3 US ISSN 0021-9258 0071 1HDB 41

REMARK 2 1HDB 42

REMARK 2 RESOLUTION. 2.2 ANGSTROMS. 1HDB 43

REMARK 3 1HDB 44

REMARK 3 REFINEMENT. 1HDB 45

REMARK 3 PROGRAM GPRLSA 1HDB 46

REMARK 3 AUTHORS FUREY 1HDB 47

REMARK 3 R VALUE 0.149 1HDB 48

REMARK 3 MEAN B VALUE 21.43 ANGSTROMS**2 1HDB 49

REMARK 3 FINAL RMS COORD. SHIFT 0.024 ANGSTROMS 1HDB 50

REMARK 3 1HDB 51

REMARK 3 NUMBER OF REFLECTIONS 21669 1HDB 52

REMARK 3 RESOLUTION RANGE 6.0 - 2.2 ANGSTROMS 1HDB 53

REMARK 3 DATA CUTOFF 2. SIGMA(F) 1HDB 54

REMARK 3 1HDB 55

REMARK 3 DATA COLLECTION. 1HDB 56

REMARK 3 NUMBER OF UNIQUE REFLECTIONS 27163 1HDB 57

REMARK 3 COMPLETENESS OF DATA 84. % 1HDB 58

REMARK 3 REJECTION CRITERIA 0.0 SIGMA(I) 1HDB 59

REMARK 3 1HDB 60

REMARK 3 NUMBER OF ATOMS USED IN REFINEMENT. 1HDB 61

REMARK 3 NUMBER OF PROTEIN ATOMS 4384 1HDB 62

REMARK 3 NUMBER OF NUCLEIC ACID ATOMS 0 1HDB 63

REMARK 3 NUMBER OF HETEROGEN ATOMS 172 1HDB 64

REMARK 3 NUMBER OF SOLVENT ATOMS 444 1HDB 65

REMARK 3 1HDB 66

REMARK 3 RMS DEVIATIONS FROM IDEAL VALUES (THE VALUES OF 1HDB 67

REMARK 3 SIGMA, IN PARENTHESES, ARE THE INPUT ESTIMATED 1HDB 68

REMARK 3 STANDARD DEVIATIONS THAT DETERMINE THE RELATIVE 1HDB 69

REMARK 3 WEIGHTS OF THE CORRESPONDING RESTRAINTS). 1HDB 70

REMARK 3 DISTANCE RESTRAINTS (ANGSTROMS). 1HDB 71

REMARK 3 BOND DISTANCE 0.017(0.025) 1HDB 72

REMARK 3 ANGLE DISTANCE 0.038(0.036) 1HDB 73

REMARK 3 PLANAR 1-4 DISTANCE 0.039(0.040) 1HDB 74

REMARK 3 ANGLE RESTRAINTS (DEGREES). 1HDB 75

REMARK 3 PLANE RESTRAINT (ANGSTROMS) 0.023(0.030) 1HDB 76

REMARK 3 CHIRAL-CENTER RESTRAINT (ANGSTROMS**3) 0.181(0.200) 1HDB 77

REMARK 3 NON-BONDED CONTACT RESTRAINTS (ANGSTROMS). 1HDB 78

REMARK 3 SINGLE TORSION CONTACT 0.186(0.300) 1HDB 79

REMARK 3 MULTIPLE TORSION CONTACT 0.187(0.300) 1HDB 80

REMARK 3 POSSIBLE HYDROGEN BOND 0.174(0.300) 1HDB 81

REMARK 3 CONFORMATIONAL TORSION ANGLE RESTRAINT (DEGREES). 1HDB 82

REMARK 3 PLANAR 3.5(5.0) 1HDB 83

REMARK 3 STAGGERED 17.4(15.0) 1HDB 84

REMARK 3 ORTHONORMAL 31.7(15.0) 1HDB 85

REMARK 3 ISOTROPIC THERMAL FACTOR RESTRAINTS (ANGSTROMS**2). 1HDB 86

REMARK 3 MAIN-CHAIN BOND 0.676(1.000) 1HDB 87

REMARK 3 MAIN-CHAIN ANGLE 1.140(1.500) 1HDB 88

REMARK 3 SIDE-CHAIN BOND 1.279(1.500) 1HDB 89

REMARK 3 SIDE-CHAIN ANGLE 2.031(2.000) 1HDB 90

REMARK 3 1HDB 91

REMARK 3 MAIN-CHAIN BOND 0.676(1.000) 1HDB 92

REMARK 3 MAIN-CHAIN ANGLE 1.140(1.500) 1HDB 93

REMARK 3 SIDE-CHAIN BOND 1.279(1.500) 1HDB 94

REMARK 3 SIDE-CHAIN ANGLE 2.031(2.000) 1HDB 95

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REMARK 18 1HDB 96

REMARK 18 DATE OF DATA COLLECTION : 07-04-94 1HDB 97

REMARK 18 MONOCHROMATIC (Y/N) : Y 1HDB 98

REMARK 18 INTENSITY-INTEGRATION SOFTWARE : XENGEN 1HDB 99

REMARK 18 DATA REDUNDANCY : 2.75 1HDB 100

DBREF 1HDB A 1 141 SWS P01922 HBA_HUMAN 1 141 1HDB 101

DBREF 1HDB B 1 146 SWS P02023 HBB_HUMAN 1 146 1HDB 102

DBREF 1HDB C 1 141 SWS P01922 HBA_HUMAN 1 141 1HDB 103

DBREF 1HDB D 1 146 SWS P02023 HBB_HUMAN 1 146 1HDB 104

SEQADV 1HDB THR B 67 SWS P02023 VAL 67 ENGINEERED 1HDB 105

SEQADV 1HDB THR D 67 SWS P02023 VAL 67 ENGINEERED 1HDB 106

SEQRES 1 A 141 VAL LEU SER PRO ALA ASP LYS THR ASN VAL LYS ALA ALA 1HDB 107

SEQRES 2 A 141 TRP GLY LYS VAL GLY ALA HIS ALA GLY GLU TYR GLY ALA 1HDB 108

SEQRES 3 A 141 GLU ALA LEU GLU ARG MET PHE LEU SER PHE PRO THR THR 1HDB 109

SEQRES 4 A 141 LYS THR TYR PHE PRO HIS PHE ASP LEU SER HIS GLY SER 1HDB 110

SEQRES 5 A 141 ALA GLN VAL LYS GLY HIS GLY LYS LYS VAL ALA ASP ALA 1HDB 111

SEQRES 6 A 141 LEU THR ASN ALA VAL ALA HIS VAL ASP ASP MET PRO ASN 1HDB 112

SEQRES 7 A 141 ALA LEU SER ALA LEU SER ASP LEU HIS ALA HIS LYS LEU 1HDB 113

SEQRES 8 A 141 ARG VAL ASP PRO VAL ASN PHE LYS LEU LEU SER HIS CYS 1HDB 114

SEQRES 9 A 141 LEU LEU VAL THR LEU ALA ALA HIS LEU PRO ALA GLU PHE 1HDB 115

SEQRES 10 A 141 THR PRO ALA VAL HIS ALA SER LEU ASP LYS PHE LEU ALA 1HDB 116

SEQRES 11 A 141 SER VAL SER THR VAL LEU THR SER LYS TYR ARG 1HDB 117

SEQRES 1 B 146 VAL HIS LEU THR PRO GLU GLU LYS SER ALA VAL THR ALA 1HDB 118

SEQRES 2 B 146 LEU TRP GLY LYS VAL ASN VAL ASP GLU VAL GLY GLY GLU 1HDB 119

SEQRES 3 B 146 ALA LEU GLY ARG LEU LEU VAL VAL TYR PRO TRP THR GLN 1HDB 120

SEQRES 4 B 146 ARG PHE PHE GLU SER PHE GLY ASP LEU SER THR PRO ASP 1HDB 121

SEQRES 5 B 146 ALA VAL MET GLY ASN PRO LYS VAL LYS ALA HIS GLY LYS 1HDB 122

SEQRES 6 B 146 LYS THR LEU GLY ALA PHE SER ASP GLY LEU ALA HIS LEU 1HDB 123

SEQRES 7 B 146 ASP ASN LEU LYS GLY THR PHE ALA THR LEU SER GLU LEU 1HDB 124

SEQRES 8 B 146 HIS CYS ASP LYS LEU HIS VAL ASP PRO GLU ASN PHE ARG 1HDB 125

SEQRES 9 B 146 LEU LEU GLY ASN VAL LEU VAL CYS VAL LEU ALA HIS HIS 1HDB 126

SEQRES 10 B 146 PHE GLY LYS GLU PHE THR PRO PRO VAL GLN ALA ALA TYR 1HDB 127

SEQRES 11 B 146 GLN LYS VAL VAL ALA GLY VAL ALA ASN ALA LEU ALA HIS 1HDB 128

SEQRES 12 B 146 LYS TYR HIS 1HDB 129

SEQRES 1 C 141 VAL LEU SER PRO ALA ASP LYS THR ASN VAL LYS ALA ALA 1HDB 130

SEQRES 2 C 141 TRP GLY LYS VAL GLY ALA HIS ALA GLY GLU TYR GLY ALA 1HDB 131

SEQRES 3 C 141 GLU ALA LEU GLU ARG MET PHE LEU SER PHE PRO THR THR 1HDB 132

SEQRES 4 C 141 LYS THR TYR PHE PRO HIS PHE ASP LEU SER HIS GLY SER 1HDB 133

SEQRES 5 C 141 ALA GLN VAL LYS GLY HIS GLY LYS LYS VAL ALA ASP ALA 1HDB 134

SEQRES 6 C 141 LEU THR ASN ALA VAL ALA HIS VAL ASP ASP MET PRO ASN 1HDB 135

SEQRES 7 C 141 ALA LEU SER ALA LEU SER ASP LEU HIS ALA HIS LYS LEU 1HDB 136

SEQRES 8 C 141 ARG VAL ASP PRO VAL ASN PHE LYS LEU LEU SER HIS CYS 1HDB 137

SEQRES 9 C 141 LEU LEU VAL THR LEU ALA ALA HIS LEU PRO ALA GLU PHE 1HDB 138

SEQRES 10 C 141 THR PRO ALA VAL HIS ALA SER LEU ASP LYS PHE LEU ALA 1HDB 139

SEQRES 11 C 141 SER VAL SER THR VAL LEU THR SER LYS TYR ARG 1HDB 140

SEQRES 1 D 146 VAL HIS LEU THR PRO GLU GLU LYS SER ALA VAL THR ALA 1HDB 141

SEQRES 2 D 146 LEU TRP GLY LYS VAL ASN VAL ASP GLU VAL GLY GLY GLU 1HDB 142

SEQRES 3 D 146 ALA LEU GLY ARG LEU LEU VAL VAL TYR PRO TRP THR GLN 1HDB 143

SEQRES 4 D 146 ARG PHE PHE GLU SER PHE GLY ASP LEU SER THR PRO ASP 1HDB 144

SEQRES 5 D 146 ALA VAL MET GLY ASN PRO LYS VAL LYS ALA HIS GLY LYS 1HDB 145

SEQRES 6 D 146 LYS THR LEU GLY ALA PHE SER ASP GLY LEU ALA HIS LEU 1HDB 146

SEQRES 7 D 146 ASP ASN LEU LYS GLY THR PHE ALA THR LEU SER GLU LEU 1HDB 147

SEQRES 8 D 146 HIS CYS ASP LYS LEU HIS VAL ASP PRO GLU ASN PHE ARG 1HDB 148

SEQRES 9 D 146 LEU LEU GLY ASN VAL LEU VAL CYS VAL LEU ALA HIS HIS 1HDB 149

SEQRES 10 D 146 PHE GLY LYS GLU PHE THR PRO PRO VAL GLN ALA ALA TYR 1HDB 150

SEQRES 11 D 146 GLN LYS VAL VAL ALA GLY VAL ALA ASN ALA LEU ALA HIS 1HDB 151

SEQRES 12 D 146 LYS TYR HIS 1HDB 152

HET HEM A 142 43 PROTOPORPHYRIN IX CONTAINS FE(II) 1HDB 153

HET HEM B 147 43 PROTOPORPHYRIN IX CONTAINS FE(II) 1HDB 154

HET HEM C 142 43 PROTOPORPHYRIN IX CONTAINS FE(II) 1HDB 155

HET HEM D 147 43 PROTOPORPHYRIN IX CONTAINS FE(II) 1HDB 156

HET SO4 1 5 SULFATE ION 1HDB 157

HET SO4 2 5 SULFATE ION 1HDB 158

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FORMUL 5 HEM 4(C34 H32 N4 O4 FE1 2+) 1HDB 159

FORMUL 6 SO4 2(O4 S1 2-) 1HDB 160

FORMUL 7 HOH *434(H2 O1) 1HDB 161

HELIX 1 1 PRO A 4 SER A 35 1 1HDB 162

HELIX 2 2 PRO A 37 TYR A 42 5 1HDB 163

HELIX 3 3 ALA A 53 ALA A 71 1 1HDB 164

HELIX 4 4 MET A 76 ALA A 79 1 1HDB 165

HELIX 5 5 SER A 81 HIS A 89 1 1HDB 166

HELIX 6 6 PRO A 95 HIS A 112 5 1HDB 167

HELIX 7 7 PRO A 119 THR A 137 1 1HDB 168

HELIX 8 8 PRO B 5 LYS B 17 1 1HDB 169

HELIX 9 9 VAL B 20 VAL B 34 1 1HDB 170

HELIX 10 10 PRO B 36 PHE B 45 5 1HDB 171

HELIX 11 11 PRO B 51 GLY B 56 1 1HDB 172

HELIX 12 12 PRO B 58 HIS B 77 1 1HDB 173

HELIX 13 13 LEU B 81 ASP B 94 1 1HDB 174

HELIX 14 14 PRO B 100 GLU B 121 5 1HDB 175

HELIX 15 15 PRO B 124 ALA B 142 1 1HDB 176

HELIX 16 16 PRO C 4 SER C 35 1 1HDB 177

HELIX 17 17 PRO C 37 TYR C 42 5 1HDB 178

HELIX 18 18 ALA C 53 ALA C 71 1 1HDB 179

HELIX 19 19 MET C 76 ALA C 79 1 1HDB 180

HELIX 20 20 SER C 81 HIS C 89 1 1HDB 181

HELIX 21 21 PRO C 95 HIS C 112 5 1HDB 182

HELIX 22 22 PRO C 119 LEU C 136 1 1HDB 183

HELIX 23 23 PRO D 5 LYS D 17 1 1HDB 184

HELIX 24 24 VAL D 20 VAL D 34 1 1HDB 185

HELIX 25 25 PRO D 36 PHE D 45 5 1HDB 186

HELIX 26 26 PRO D 51 GLY D 56 1 1HDB 187

HELIX 27 27 PRO D 58 HIS D 77 1 1HDB 188

HELIX 28 28 LEU D 81 ASP D 94 1 1HDB 189

HELIX 29 29 PRO D 100 GLU D 121 5 1HDB 190

HELIX 30 30 PRO D 124 ALA D 142 1 1HDB 191

CRYST1 63.540 83.190 54.020 90.00 99.15 90.00 P 21 4 1HDB 192

ORIGX1 1.000000 0.000000 0.000000 0.00000 1HDB 193

ORIGX2 0.000000 1.000000 0.000000 0.00000 1HDB 194

ORIGX3 0.000000 0.000000 1.000000 0.00000 1HDB 195

SCALE1 0.015738 0.000000 0.002535 0.00000 1HDB 196

SCALE2 0.000000 0.012021 0.000000 0.00000 1HDB 197

SCALE3 0.000000 0.000000 0.018750 0.00000 1HDB 198

ATOM 1 N VAL A 1 19.345 29.258 43.165 1.00 33.80 1HDB 199

ATOM 2 CA VAL A 1 20.198 30.251 42.493 1.00 33.75 1HDB 200

ATOM 3 C VAL A 1 21.681 29.970 42.744 1.00 33.53 1HDB 201

ATOM 4 O VAL A 1 22.004 29.466 43.860 1.00 33.92 1HDB 202

ATOM 5 CB VAL A 1 19.720 31.621 43.026 1.00 33.70 1HDB 203

ATOM 6 CG1 VAL A 1 19.955 31.726 44.529 1.00 33.94 1HDB 204

ATOM 7 CG2 VAL A 1 20.335 32.766 42.236 1.00 34.02 1HDB 205

ATOM 8 N LEU A 2 22.515 30.278 41.750 1.00 32.79 1HDB 206

ATOM 9 CA LEU A 2 23.964 30.010 41.896 1.00 32.05 1HDB 207

ATOM 10 C LEU A 2 24.657 31.119 42.673 1.00 31.36 1HDB 208

Aqui são mostrados apenas os 10 primeiros átomos com suas coordenadas,

mas o arquivo inteiro apresenta mais de 5000 átomos com suas respectivas coordenadas atômicas, que representam sua posição espacial num eixo tridimensional. 9.8. Referências Bibliográficas 1. PDB http://www.rcsb.org/pdb/ Mais famoso e completo banco de dados de estrutura de proteínas.

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2. Protein explorer http://molvis.sdsc.edu/protexpl/ Programa derivado do RasMol para a visualização de estruturas de proteínas.

3. SWISS-PDBviewer http://www.expasy.org/spdbv/ Programa para a visualização e análise da estrutura de proteínas. Permite a realização de mutações, alterações em pontes de hidrogênio, ângulos de torção e distâncias entre átomos.

4. Libra http://www.ddbj.nig.ac.jp/E-mail/libra/LIBRA_I.html Programa on-line que utiliza threading para encontrar uma seqüência de resíduos de aminoácidos que melhor se adequem a uma estrutura terciária conhecida e vice-versa

5. Threader Programa de predição da estrutura terciária através do reconhecimento do enovelamento a partir de bibliotecas alternativas

6. CASP http://predictioncenter.llnl.gov/Center.html Critical Assesment of Structural Prediction. “Competição” que avalia os softwares de predição de estrutura de proteínas

7. SWISS-MODEL Modelagem de proteínas por homologia http://www.expasy.org/swissmod

9.9. Brainstorm 1. Por que o conhecimento sobre a estrutura das proteínas é importante? 2. Descreva brevemente como funcionam as duas principais técnicas experimentais para a descoberta da estrutura terciárias das proteínas.

3. O que é o PDB? Por que há menos estruturas protéicas produzidas do que seqüências gênicas?

4. A modelagem por homologia se baseia em qual premissa? 5. Quais são os casos onde se recomenda realizar a modelagem por homologia? 6. Quais são os passos necessários para se realizar a modelagem por homologia? 7. Em que se baseia a modelagem por threading? Você acha que a modelagem por

threading mostra que a premissa da modelagem por homologia esteja incorreta ou incompleta? Por que?

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CAPÍTULO 10 Conclusões e pensamentos filosóficos sobre a bioinformática

10.1. Sobre bioinformática, genoma e ciência

Abaixo você vai ver o rascunho do artigo que publiquei na Revista Ciência Hoje, de Outubro de 2004, em colaboração com meu orientador de doutorado, o Prof. Fabrício Rodrigues dos Santos. O artigo pretende apresentar a bioinformática, coisa que você já deve estar ciente neste momento, e discutir a relevância da pesquisa de genoma num contexto científico. Além disso, o artigo apresenta alguns paradigmas interessantes da pesquisa em bioinformática. 10.2. Introdução A bioinformática consiste principalmente na análise computacional de seqüências de DNA, RNA e proteínas. Essa nova ciência surgiu na última década devido a uma necessidade urgente pela utilização de ferramentas sofisticadas para a análise de um crescente número de dados que veio a ser produzido em biologia molecular. O GenBank foi um dos primeiros e ainda é o mais popular banco de dados para o depósito de seqüências de DNA. Criado dentro do NCBI -- o centro americano para informação biotecnológica --, é lá onde pesquisadores de todo o mundo depositam as seqüências de A, C, G e Ts que obtêm em seus laboratórios através do sequenciamento do DNA dos mais diversos organismos. No final da década de 90 observou-se um crescimento exponencial do número de seqüências de biomoléculas depositadas no GenBank e a figura 1 já é clássica no âmbito da biologia computacional. Esse assustador crescimento começou a ocorrer após a comercialização dos seqüenciadores de DNA a laser, em 1990. Os seqüenciadores atuais são totalmente automatizados e foram especialmente desenvolvidos para o seqüenciamento de moléculas DNA em larga-escala. Freqüentemente apresentam 96 capilares (tubos minúsculos por onde passam fragmentos de DNA a serem analisados) e conseguem gerar, em média, seqüências de DNA de 600 letras A, C, G e T por capilar em cada análise (o genoma humano é constituído por cerca de 3 bilhões de letras de DNA). Seqüenciadores ainda mais potentes, apresentando 384 capilares, podem produzir mais de um milhão de letras do DNA por dia! No Brasil, existem dezenas de seqüenciadores e grande parte deles foi distribuída entre laboratórios em todo o país quando da implantação do Projeto Genoma FAPESP para o seqüenciamento da bactéria Xylella fastidiosa que ataca a laranja (http://aeg.lbi.ic.unicamp.br/xf/) e do Projeto Genoma Brasileiro (http://www.brgene.lncc.br) durante o qual foram seqüenciadas as bactérias Chromobacterium violaceum e Mycoplasma synoviae.

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Figura 10.1. Crescimento do número de seqüências depositadas no Genbank desde sua criação. A grande maioria dessas seqüências publicadas em bancos de dados internacionais vêm de projetos genoma e transcriptoma (ou genoma funcional). Genomas para cá, genomas para lá, desde o seqüenciamento da primeira bactéria -- o Haemophilus influenzae em meados de 1995 -- hoje o NCBI já apresenta 1274 genomas de vírus seqüenciados, 169 genomas de procariotos (bactérias e arqueobactérias) e 20 genomas de organismos eucarióticos. Estas seqüências de biomoléculas têm gerado uma grande quantidade de informação cuja complexidade é crescente com o estudo das interações entre biomoléculas e das variações observadas entre cada um dos indivíduos de uma certa população. Mas, afinal, que informações cientificamente relevantes o genoma trouxe para os cientistas, para as pessoas e para a sociedade? Enfim, será que projetos genoma são pesquisas meramente descritivas? Qual seria então a relevância da genômica e o papel da bioinformática para consolidação desta ciência? 10.3. Genoma e o método científico À primeira vista parece-nos que os estudos de genoma não são estudos científicos clássicos. Isso se deve ao fato de que o início de um projeto genoma não se baseia em uma hipótese clara e bem elaborada a priori sobre a biologia de um determinado organismo. No máximo, a pergunta que se poderia fazer antes de se seqüenciar um genoma seria: “será que este organismo apresenta algum gene de potencial biotecnológico?”; ou, “o que há no genoma deste organismo que o faz conseguir viver nessa condição, ou gerar uma patologia?” Mas, no fundo, tais perguntas dificilmente serão respondidas diretamente através do seqüenciamento do genoma. Estudos posteriores serão certamente necessários para responder tais perguntas de forma adequada. E mais ainda: é possível que alguma investigação não-genômica mais minuciosa sobre esse ou aquele aspecto em particular possam dar resposta mais direta a tais questões.

Mas não pense que isso tira o mérito dos estudos genômicos. Acreditamos que a ciência vive hoje a era da anatomia molecular. Se voltarmos filosoficamente ao

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século XIX, veremos que, naquela época em que pouco se conhecia -- de forma sistematicamente documentada -- do mundo biológico em geral, os grandes cientistas eram considerados os naturalistas; aqueles que exploravam o mundo em busca de informação taxonômica, encontrando e classificando novos animais e plantas antes desconhecidos. A descrição e a documentação de novas espécies era especialmente necessária naquela época, uma vez que pouco ou nada se conhecia sobre a grande diversidade da vida em nosso planeta. Assim, poucos questionamentos eram feitos a respeito de nossa biodiversidade. Desta forma, como nos estudos dos naturalistas, houve a época onde os anatomistas começaram a surgir, escrevendo seus tratados e mostrando os primeiros detalhes bem documentados sobre a anatomia humana e de diversas outras espécies. Descreviam da melhor maneira possível à época, a localização dos órgãos e tecidos humanos que se tinha conhecimento. Igualmente, se a genômica não pode ser vista classicamente como uma ciência, a taxonomia e a anatomia também não o podem. E isso vem do fato de que tais empreendimentos científicos são principalmente descritivos ao invés de investigativos. Mas, mais uma vez, isso não lhes tira o mérito, muito pelo contrário. Quanto conhecimento científico já não foi construído baseado nas informações geradas pelos naturalistas e anatomistas? Toda uma ciência biomédica foi montada com bases nos conhecimentos descritivos gerados pelos anatomistas e a teoria mais importante e unificadora de toda a biologia -- a Evolução -- surgiu diretamente das observações, documentações e estudos descritivos dos naturalistas Charles Darwin e Alfred Wallace. Bem, e a genômica? O genoma pode ser descrito como a anatomia molecular de uma espécie. E é só agora, neste início de século XXI, que estamos conseguindo desvendar e descrever como as espécies são constituídas em seu nível mais básico; o da informação molecular. A genômica é a “ciência descritiva” dos nossos tempos. E assim como as ciências biomédicas surgiram para trazer o método científico ao estudo da anatomia, a bioinformática surge agora para trazer a cientificidade aos dados genômicos, para casar a genômica ao método científico e para gerar informações relevantes e indispensáveis na incessante busca do conhecimento em que consiste o empreendimento científico. 10.4. Um conceito de bioinformática Nesse momento é importante definirmos bem do que se trata a bioinformática e em que contexto utilizamos este conceito no presente ensaio. Muita confusão é feita nesse ponto e muitos acreditam que a bioinformática consista em qualquer análise computacional de problemas biológicos, o que não se enquadra na origem desta disciplina. A bioinformática clássica surgiu com o seqüenciamento de biomoléculas e destas permanece inseparável. É possível propor uma definição razoavelmente clara do que seja a bioinformática dizendo que esta consista em “todo o tipo de estudo ou de ferramenta que se pode realizar e/ou produzir de forma a organizar ou obter informação biológica a partir de seqüências de biomoléculas”. Se o estudo usa seqüências de biomoléculas (DNA, RNA ou proteínas), direta ou indiretamente, tratamos como bioinformática; do contrário estaremos falando de computação aplicada à biologia, campo extremamente importante em várias disciplinas e presente bem antes de ser iniciado o seqüenciamento de biomoléculas. Uma vez definido o conceito de bioinformática utilizado aqui, podemos perceber que muitos estudos na área podem ser enquadrados em três princípios paradigmáticos, chamadas aqui, metaforicamente, de tijolo, peneira e lupa.

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10.5. Princípios paradigmáticos em bioinformática

Estudos de bioinformática tijolo consistem naqueles relacionados à execução de projetos genoma e normalmente produzem ferramentas para a análise de seqüências e interpretação de genomas. Alguns processos já são clássicos dentre as análises de seqüências de DNA. Dentre eles podemos citar o base-calling, onde as bases do DNA são lidas no seqüenciador a partir dos cromatogramas (perfis de emissão fluorescente que variam entre os nucleotídeos A, C, G e T durante a análise). Neste processo, são gerados os chamados cromatogramas e eles são transformados em uma seqüência e um índice de confiabilidade é associado a cada letra do DNA. Em um processo subseqüente faz-se a análise de seqüências que apresentam uma determinada seqüência de letras em comum para a geração dos “textos” genômicos. Como já comentado, uma seqüência obtida no seqüenciador possui aproximadamente 600 letras de DNA e um genoma consiste normalmente em uma seqüência de milhões ou bilhões de letras. Portanto, na produção de um genoma é preciso alinhar as seqüências geradas uma após a outra, verificando suas regiões de sobreposição, para que seja possível montar o conjunto de toda a informação genética da espécie em estudo. Novas ferramentas para o alinhamento de seqüências, a padronização de processos de base-calling, a montagem de seqüências para se gerar um genoma e a produção de ferramentas para identificação de genes, são alguns exemplos de projetos de bioinformática tijolo, sem as quais é impossível a análise eficiente dos “edifícios genômicos”. Vale notar ainda que as ferramentas de comparação de seqüências de DNA têm permitido um grande avanço no que diz respeito à identificação das funções de genes. Através da comparação entre a seqüência de um novo gene e um banco de dados de genes de função conhecida, pode-se inferir rapidamente a possível função de um gene completamente desconhecido. Caso fosse necessária a realização de testes experimentais para descobrirmos a função de cada um dos genes que vêm sendo descritos, possivelmente teríamos ainda de pesquisar várias décadas antes de publicar um genoma com esta informação. A bioinformática, portanto, permite uma rápida identificação da provável função de um gene seqüenciado pela primeira vez. Como já dissemos, muita informação é descrita durante projetos genoma e é virtualmente impossível a análise de todos esses dados (ou mesmo uma pequena quantidade deles) pelo grupo que gerou a seqüência completa de DNA de um organismo. Assim, são necessários trabalhos posteriores para a análise de pedaços específicos de diferentes genomas, com o objetivo de produzir mais informação sobre um tema específico como, por exemplo, as proteínas para metabolismo de açúcares. Esses trabalhos de mineração de dados genômicos são característicos dos projetos da chamada bioinformática peneira. Como a genômica é essencialmente uma disciplina descritiva, os trabalhos publicados apresentam muitas informações sem qualquer detalhamento, muitas vezes por própria limitação do periódico científico. Na figura 2 vemos um exemplo da informação descritiva freqüentemente presente em artigos de genoma, a divisão em grupos de genes de acordo com sua função biológica. Que informação relevante há de se tirar desse monte de dados?

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Figura 10.2. Típica figura apresentando informação de cunho descritivo que é encontrada em artigos científicos sobre genomas. Aqui é feita a descrição das porcentagens de genes encontrados no genoma que apresentam diferentes funções biológicas.

É interessante observar que há, ao redor do mundo, alguns centros especializados em seqüenciamento de genomas, publicando seqüências e mais seqüências para que outros pesquisadores possam ter informações disponíveis para fazer seus próprios estudos de mineração de dados. Usando peneiras específicas, os cientistas em todo o mundo podem ser capazes de gerar conhecimento mais aprofundado sobre aspectos particulares de seu próprio interesse. A construção de bancos de dados de seqüências de genes com uma ou outra função específica ou de estruturas tridimensionais de proteínas, por exemplo, consistem também em trabalhos montados no âmbito da bioinformática peneira e, todo ano, a primeira edição da revista britânica Nucleic Acids Research traz um resumo dos bancos de dados mais utilizados na área da bioinformática. Por fim, nos trabalhos de bioinformática lupa é onde a ciência se faz presente com maior clareza na área genômica. Vale notar que todos os estudos de genoma e bioinformática descritos até agora são de suma importância para o aumento do conhecimento científico sobre os organismos e sobre suas constituições moleculares. Mas em estudos de bioinformática lupa o método científico é rigorosamente aplicado. Aqui, através das mais variadas ferramentas computacionais é possível gerar metodologias algorítmicas para testar hipóteses e produzir resultados que verifiquem ou refutem suas afirmações quando se observam dados genômicos. O processo investigativo científico é retomado: observam-se os dados, criam-se hipóteses e realizam-se experimentos in silico (dentro do computador) de forma a testá-las através de algoritmos bioinformáticos. Posteriormente, é corroborada ou refutada a hipótese inicial a partir da análise dos resultados obtidos. É interessante notar que estudos dessa categoria não são necessariamente publicados em revistas especializadas em bioinformática. Isso vem do fato de que os algoritmos montados aqui são apenas um detalhe e caracterizam a metodologia de um trabalho que tenta mostrar um resultado biológico mais específico. A bioinformática não é o centro do trabalho, como ocorre nas abordagens de tijolo e peneira. Nos trabalhos classificados como lupa, a hipótese e os resultados são mais importantes do que as ferramentas bioinformáticas utilizadas como meio investigativo. Assim, tais estudos são freqüentemente publicados nas revistas relacionadas com o organismo em que se está estudando, com o fenômeno estudado, ou em revistas específicas de genética, biologia molecular ou bioquímica. Exemplos de estudos de bioinformática lupa são aqueles onde alguma característica biológica de um determinado organismo é explicada a partir

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da observação de seu conjunto de seqüências gênicas ou protéicas e da comparação com seqüências similares em organismos proximamente relacionados. Através desses estudos de genômica comparativa é possível associar aspectos da biologia dos organismos comparados à presença ou a ausência de determinado gene, grupo de genes ou processos metabólicos. 10.6. Conclusão

Dessa forma, a bioinformática, além de outras ciências já bem estabelecidas, como a biologia molecular, a genética e a bioquímica vêm trazer uma abordagem baseada no método científico aos dados gerados em projetos genoma. Vale notar, no âmbito nacional, a iniciativa pioneira da CAPES (Coordenação para o Aperfeiçoamento de Profissionais de Ensino Superior) na indução da criação de cursos de doutorado na área de bioinformática, que resultou em dois cursos implementados recentemente no país (UFMG e USP) que já apresentam dezenas de alunos em processo de formação nessa área estratégica. Conclui-se, a partir do presente ensaio, que os estudos de genomas são importantes para produzir um grande número de informações sobre a anatomia molecular de uma espécie. Informações estas que poderão ser utilizadas como pontos de partida para a produção de novos conhecimentos científicos através de diferentes paradigmas experimentais, utilizando abordagens in vitro, in vivo ou in silico, esta última sendo representada por metodologias baseadas na criação de algoritmos dessa nova e importante ciência do século XXI, a bioinformática.

10.7. Brainstorm 1. Defina bioinformática com suas próprias palavras. 2. Sua visão sobre bioinformática e genoma foi modificada após a realização deste curso? O que você pensava antes e pensa agora?

3. As pesquisas genômicas são científicas? O que você entende por ciência? 4. Como você definiria a expressão “anatomia molecular”? 5. Cite exemplos e discorra sobre a bioinformática tijolo. 6. Cite exemplos e discorra sobre a bioinformática peneira. 7. Cite exemplos e discorra sobre a bioinformática lupa e explique por que os trabalhos de lupa normalmente não são publicados em revistas de bioinformática.

8. Você consegue pensar em mais algum paradigma da bioinformática atual? 9. Qual foi a aula mais interessante, em sua opinião? Por que? 10. Qual foi a aula que você achou mais complicada? Por que? 11. Dê sua apreciação geral sobre o curso realizado.

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SOBRE O AUTOR

Francisco Prosdocimi de Castro Santos nasceu em Belo Horizonte, no ano de 1979, e é atualmente professor e pesquisador da Universidade Católica de Brasília. Ministra disciplinas de Biologia Molecular e Bioinformática para alunos da graduação em Ciências Biológicas e Ciências Biomédicas. Na pós graduação em ciências genômicas, Francisco ministra aulas de bioinformática, análises de genomas e filogenia molecular.

Francisco é biólogo (2001), mestre em Genética (2003) e doutor em Bioinformática (2006) pela UFMG, tendo trabalho como pós-doutor na França durante um ano e meio (2008/2009) e tendo passagens acadêmicas de média ou curta duração pela Inglaterra (2005), Alemanha (2006) e Estados Unidos (2009).

Francisco tem ainda interesse por divulgação científica, história e filosofia da ciência (http://tragodefilosofia.blogspot.com). Isso sem falar em suas modestas habilidades em música e literatura (http://chicopros.blogspot.com) ou seus ideais democráticos, ambientalistas, humanistas e liberais.