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4 CURSO DE DIREITO “O CONTRATO ELETRÔNICO NO CÓDIGO CIVIL E NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR” JULIANA MALUZZA DESTRO RA: 465.4397/7 TURMA: 3209D FONE: 6215-5834 E-MAIL: [email protected] SÃO PAULO 2007

CURSO DE DIREITO “O CONTRATO ELETRÔNICO NO …arquivo.fmu.br/prodisc/direito/jmd.pdf · consumidor, como nome, endereço, local da entrega do produto e o pagamento do bem, que

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CURSO DE DIREITO

“O CONTRATO ELETRÔNICO NO CÓDIGO CIVIL E NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR”

JULIANA MALUZZA DESTRO RA: 465.4397/7

TURMA: 3209D FONE: 6215-5834

E-MAIL: [email protected]

SÃO PAULO 2007

5

BANCA EXAMINADORA:

Professor Orientador: Ronaldo Alves de Andrade

Professor Argüidor:_________________________

Professor Argüidor:_________________________

6

JULIANA MALUZZA DESTRO

Monografia apresentada à Banca Examinadora do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas, como exigência parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito sob a orientação do Professor Ronaldo Alves de Andrade

SÃO PAULO 2007

7

Dedico esse trabalho a minha mãe, Maria

Delcira Maluzza, pelo seu apoio e auxílio, a

qual serei eternamente grata.

8

Ao Professor Ronaldo Alves de Andrade,

minha gratidão pelo seu apoio e

ensinamentos, sem os quais este trabalho

não se realizaria;

A Mel, pela sua companhia, durante a

elaboração deste trabalho;

E a todos os meus amigos, pelo carinho e

apoio nessa jornada.

9

SINOPSE

Neste Trabalho de Conclusão de Curso, será abordado o conceito do

contrato eletrônico, a sua forma e principalmente o momento, o local da sua formação e

a jurisdição aplicável nas lides decorrentes desta nova forma de contratação.

Será analisada a segurança dos contratos que são firmados por meio da

rede de computadores, destacando-se a utilização da criptografia e da assinatura digital

no Brasil e em diversos países, como por exemplo, os Estados Unidos, Alemanha,

Itália, Portugal.

Por fim, será abordado o contrato eletrônico nas relações de consumo,

sendo importante estudar neste item, as publicidades ofertadas ao consumidor, seja por

meio de e-mails, conhecidos como spams ou pelo próprio site do fornecedor, os

devedores do fornecedor e os direitos do consumidor ao realizar uma compra on line,

como por exemplo, o direito de arrependimento.

10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................01

CAPÍTULO 1 – A INTERNET

1.1 Como surgiu a Internet ..........................................................................................03

1.2 A Internet como ferramenta de negócio................................................................05

CAPÍTULO 2 – O CONTRATO ELETRÔNICO

2.1 Conceito.................................................................................................................08

2.2 A formação do Contrato Eletrônico........................................................................10

2.3 O momento em que se forma o Contrato Eletrônico .............................................16

2.4 O lugar da formação do Contrato Eletrônico..........................................................17

2.5 A Jurisdição aplicável ao Contrato Eletrônico........................................................19

CAPÍTULO 3 – OS PRINCÍPIOS JURÍDICOS APLICÁVEIS AOS CONTRATOS

ELETRÔNICOS

3.1 Princípio da Equivalência Funcional ....... ..............................................................21

3.2 Princípio da Neutralidade Tecnológica das disposições reguladoras do comércio

eletrônico......................................................................................................................22

3.3 Princípio da Inalterabilidade do Direito Existente sobre obrigações e contratos ...23

3.4 Princípio da Boa-fé.................................................................................................24

3.5 Princípio da autonomia privada .............................................................................26

CAPÍTULO 4 – A FORMA DO CONTRATO ELETRÔNICO

4.1 Forma legal............................................................................................................28

11 4.2 Documento Eletrônico ...........................................................................................29

4.3 Identificação dos contratantes................................................................................31

4.4 Criptografia.............................................................................................................33

4.5 Assinatura digital....................................................................................................36

4.6 A prova do Contrato Eletrônico..............................................................................40

a) Conceito de Prova.....................................................................................40

b) A validade dos documentos eletrônicos....................................................41

c) A eficácia probatória dos documentos eletrônicos....................................45

CAPÍTULO 5 – O CONTRATO ELETRÔNICO E AS RELAÇÕES DE CONSUMO

5.1 Conceito de consumidor, fornecedor e relação de consumo.................................46

5.2 O Contrato eletrônico e as relações de consumo..................................................48

5.3 A Publicidade e o marketing na Internet face o direito do consumidor..................51

5.4 Deveres do Fornecedor no ambiente eletrônico....................................................56

5.5 O Contrato Eletrônico e o direito de recesso.........................................................58

5.6 O Contrato de adesão, celebrado no meio eletrônico...........................................61

CAPÍTULO 6 – AS MODALIDADES DE CONTRATO ELETRÔNICO

6.1 Contratos Interpessoais.........................................................................................65

6.2 Contratos Interativos..............................................................................................66

6.3 Contratos Intersistêmicos......................................................................................67

6.4 Leilão Virtual ou Pregão Eletrônico.......................................................................68

CONCLUSÃO..............................................................................................................73

ANEXOS - Legislação Estrangeira referente à documentação eletrônica

a) Uncitral .......................................................................................................75

b) CEE.............................................................................................................77

c) Argentina.....................................................................................................78

12

d) Itália.............................................................................................................80

e) Alemanha....................................................................................................82

f) Portugal.......................................................................................................83

g) França.........................................................................................................86

h) Estados Unidos ..........................................................................................88

BIBLIOGRAFIA…………………………………………………………………………..91

13

INTRODUÇÃO

Atualmente a Internet, a rede mundial de computadores, está presente no

cotidiano das pessoas ao redor do mundo, seja visando à diversão, a cultura, a

pesquisa e principalmente a realização de negócios, tendo em vista a globalização e a

facilidade proporcionada por este novo meio, que permite que pessoas de diversas

nacionalidades realizem negócios, de forma ágil, segura e sem que decorram altos

custos.

Desta forma, o contrato eletrônico passou a ser largamente utilizado pela

sociedade mundial, sendo importante estabelecer neste trabalho como o contrato

eletrônico é formado, quando, em qual local e qual será a jurisdição aplicável às lides

decorrentes deste.

Cabe destacar os princípios jurídicos aplicáveis aos contratos eletrônicos e

suas modalidades, como o leilão ou pregão eletrônico, os contratos interpessoais, os

contratos interativos e os intersistêmicos.

Outra questão que será debatida se refere à prova do contrato eletrônico, ou

seja, os contratos firmados por este meio possuem validade jurídica? Podem ser

utilizados como elementos de prova de algum fato? Estas questões serão respondidas

no decorrer deste trabalho, sendo apresentado os requisitos indispensáveis para que o

documento eletrônico possua segurança jurídica.

Por fim, será analisada a utilização dos contratos eletrônicos nas relações de

consumo, como exemplo, podemos citar os contratos de adesão, sendo importante

14 estabelecer em primeiro lugar, quem é o consumidor e o fornecedor, conforme o Código

de Defesa do Consumidor.

Devem ser analisadas também as publicidades que são ofertadas ao

consumidor pela Internet, que nem sempre são lícitas, estabelecendo os deveres do

fornecedor e os direitos do consumidor no ambiente eletrônico.

15

CAPÍTULO 1- A INTERNET

1.1 Como surgiu a Internet A Internet, isto é, a rede mundial de computadores surgiu na década de

1960, como uma estrutura criada pelos militares norte-americanos para a troca de

informações de modo confiável em caso de uma guerra.

Anteriormente denominada de ARPANET (por ser a rede da organização

Advanced Research Projects Agency – Rede da Agência de Projetos de Pesquisa

Avançada), evoluiu por meio das universidades e instituições que, com o passar dos

tempos, foram sentindo necessidade e vislumbrando reduções de custos ao dispor de

uma ligação a ela.1

Em 1974, com o avento do e-mail e dois anos depois, com a invenção do

protocolo de comunicações TCP (Transmission Control Protocol) aliado com o IP

(Internet Protocol) foi formado o padrão da Internet, que possibilitou a troca de

informações entre os computadores baseados em diferentes tecnologias.

Nos início dos anos noventa, a Internet começou a ser utilizada pela maioria

das pessoas em todo o continente, abrindo o mercado comercial virtual e sendo

considerado o meio de comunicação mais importante do mundo, superando todos os

1 MATTE, Mauricio. Internet – Comércio Eletrônico, p.26.

16

outros. Isto porque com a utilização da Internet, à distância entre as pessoas ao redor

do mundo foi eliminada, ou seja, é possível efetuar transações comerciais com pessoas

de diferentes continentes, apenas utilizando o site da empresa ou seu e-mail.

É importante destacar que mesmo antes à difusão em massa da Internet, já

havia sistemas que permitiam a manifestação eletrônica de declarações negociais,

como por exemplo, nas redes interbancárias, aquelas, porém, eram estruturadas de

modo fechado, ficando o seu acesso restrito a determinados operadores, enquanto a

Internet é estruturada de modo aberto, acessível a qualquer um que disponha do

instrumental técnico para fazê-lo.2

Para ter acesso a Internet, é necessário que o cidadão possua um

computador que possa conectar-se à Internet, uma linha de telefone e um contrato com

um provedor de acesso.

Como a Internet é uma rede aberta, ela se caracteriza pela interatividade, ou

seja, o usuário tem a possibilidade de travar relações com qualquer outro usuário, pode

criar dados e navegar nas informações já disponibilizadas na rede.

Pela Internet ocorre também a união de culturas face ao espaço virtual, pois

as pessoas podem se conhecer por meio dos chamados chats ou procurar amigos e

pessoas que possuam as mesmas afinidades, por meio de sites como o Orkut.

Hoje, a Internet possui diversas utilidades. É meio de pesquisa, trabalho e

diversão para muitos ou um misto de tudo isso. Não há mais como se desviar deste

paradigma. Dentro de alguns anos, com a facilidade que iremos obter com sua

2 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p.34 e 35.

17

utilização como meio de comunicação e troca de informações, poderá, quem ignorá-la,

sofrer dentre as diversas formas de exclusão da sociedade, a denominada tecnológica.3

No mesmo sentido, destacamos a lição de Patrícia Peck:

“O fenômeno da marginalização social se dá pela

incapacidade dos indivíduos de conhecer e dominar as novas

tecnologias – não basta saber escrever, é preciso saber enviar um e-

mail. Ao mesmo tempo que a Era Digital abre maiores possibilidades de

inclusão, a exclusão torna-se mais cruel. Aqueles que não tiverem

existência virtual dificilmente sobreviverão também no mundo real, e

esse talvez seja um dos aspectos mais aterradores dos novos tempos”. 4

Os governos tentam disponibilizar a Internet a toda população, estando

disponível o computador em alguns colégios públicos, mas ainda há muitas pessoas

que não tem acesso a esta tecnologia no Brasil, apesar de ser tão importante e

presente em nosso dia a dia.

A prova de que a Internet aproxima-se cada vez mais do nosso cotidiano,

pode ser verificado facilmente, como exemplo, podemos citar os Estados Unidos, em

que os consumidores, após elaborarem a lista do supermercado e escolherem os

produtos via Web, com a ajuda de aparelhos especiais, podem sentir o aroma de

alguns produtos ou ver a sua pizza ou pão sendo preparado.

No Brasil, estes recursos ainda não estão disponíveis, mas esta é a

tendência mundial, sendo cada vez mais comum, as transações comerciais ocorrerem

3 MATTE, Mauricio. Internet – Comércio Eletrônico, p.29. 4 PECK, Patrícia. Direito Digital, p.20.

18

pela Internet, pela facilidade e agilidade que o meio proporciona ao invés dos

estabelecimentos padrões.

1.2 A Internet como ferramenta de negócios Nos primórdios da Internet, as empresas utilizavam os sites apenas para

colocar algumas informações, como, por exemplo, onde estavam localizados as suas

lojas, quais eram os produtos oferecidos e os respectivos preços, mas não havia a

possibilidade de celebração de contratos entre fornecedores e consumidores por este

meio. Caso o consumidor quisesse adquirir algum produto, o meio mais célere era o

telefone e não a Internet.

Atualmente, a Internet permite que se tenha acesso a todo tipo de produto,

fabricado em qualquer parte do globo e, além disso, que esses produtos possam ser

comercializados pelas próprias pessoas que os produzam, sem a interferência de

intermediários ou comerciantes. Dessa forma, as pessoas podem consumir produtos

mais adequados às suas necessidades (até mesmo influindo diretamente na fabricação

deles) sem se preocupar com as barreiras da distância ou da falta de oferta daquilo que

lhe interessa em seu mercado local. 5

Conseqüentemente, as empresas passaram a possuir lojas virtuais, em que

é possível a aquisição de diversos produtos por meio da Internet, sendo geralmente

necessário, apenas o preenchimento de uma ficha com os dados pessoais do

consumidor, como nome, endereço, local da entrega do produto e o pagamento do

bem, que pode ser efetuado por cartões de crédito ou por boleto bancário, o qual será

impresso pelo consumidor em seu domicilio.

5 GONÇALVES, Sérgio Ricardo Marques. Direito Eletrônico, p.226.

19

Independente do tipo de negócios, ainda está sendo definido o modelo para

o comércio eletrônico. Há os que acreditam que os estruturados puramente na web

serão os melhores, e os que discordam, acreditando que os chamados bricks & clicks,

híbrido de lojas tradicionais com o modelo virtual, serão os que se consolidarão no

mercado.6

Porém, com a Internet, todos os fornecedores se encontram em situação de

igualdade, não possuindo o consumidor muitas vezes, segurança nas relações

celebradas por meio virtual, pois não há certeza da idoneidade da empresa, podendo

ocorrer diversos problemas, sendo os mais comuns, em relação à entrega do produto,

ou no que se refere à forma de pagamento e a posterior comprovação de vícios

redibitórios apresentados pelos produtos adquiridos via Web.

Neste contexto, cabe destacar a lição de Sérgio Ricardo Marques Gonçalves,

que afirma:

“O consumidor que deseja ter sucesso em sua investida na

Internet, precisa cercar-se de cuidados jurídicos e também práticos,

como a completa atualização dos dados de sua página para estar

sempre em consonância com as tendências do mercado e com as

particularidades de sua estrutura (atualização de dados de estoque

disponíveis para uma oferta, por exemplo), além de ter uma definição

clara das condições dos negócios que efetua em um site, de modo a

resguardar-se de problemas jurídicos com as ofertas que faz pela

rede”.7

6 MATTE, Mauricio. Internet Comércio Eletrônico, p.31. 7 GONÇALVES. Sérgio Ricardo Marques. Direito Eletrônico, p.226.

20

Cabe destacar que há duas modalidades de comércio eletrônico: o B2C,

também conhecido como Business to Consumer, que é o negócio realizado entre um

fornecedor e o consumidor e o B2B, chamado de Business to Business, é o comércio

efetuado entre as empresas, que utilizam a Internet para aumentar a sua produtividade

e alavancar os seus negócios.

CAPÍTULO 2 - O CONTRATO ELETRÔNICO 2.1 Conceito Segundo lição do professor Luís Wielewick:

“Os contratos eletrônicos podem ser definidos como

instrumentos obrigacionais de veiculação digital. São todas as espécies

de signos eletrônicos transmitidos pela Internet que permitem a

determinação de deveres e obrigação jurídica”.8

Jorge José Lawand define o contrato eletrônico como:

“O negócio jurídico concretizado através da transmissão de

mensagens eletrônicas pela Internet, entre duas ou mais pessoas, a fim

de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza

patrimonial”.9

8 WIELEWICK, Luís. Contratos e Internet, p. 198. 9 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p. 87.

21

Assim o contrato eletrônico é aquele firmado pelas partes por meio

eletrônico, com o objetivo de criar e modificar direitos e obrigações.

É importante ressaltar que há duas formas em que as partes podem firmar o

contrato por meio dos computadores: a contratação informática e a contratação por

meios informáticos.

A contratação informática refere-se a um contrato relacionado ao ambiente

digital, mas não veiculado eletronicamente, tal como o contrato de compra e venda de

domínios da Rede. Já a contratação por meio informático refere-se a qualquer negócio

jurídico, em que a sua realização ocorreu eletronicamente, este é o contrato eletrônico.

Neste contexto, cabe destacar a lição do professor Ronaldo Alves de

Andrade que afirma:

“O contrato eletrônico não tem um perfil ou natureza jurídica

distinta dos contratos em geral. Não se trata de nova espécie tipificada

de contrato. Em verdade, é tão somente um novo e atual meio de se

efetivar um contrato, cujo instrumento pode ser apontada em mídia

eletrônica”.10

Logo, qualquer tipo de contrato pode ser firmado por meio da rede de

computadores, desde que todos os requisitos previstos no Código Civil vigente sejam

respeitados e que a relação jurídica seja originada pela manifestação de vontade das

partes.

Os contratos eletrônicos não podem ser efetuados, nos casos em que a

solenidade é requisito necessário para sua validade. Isto porque o contrato solene não

10 ANDRADE, Ronaldo Alves. Contrato Eletrônico, p. 31.

22

será válido se desobedecer à forma prescrita em lei, que geralmente não prevê a

utilização dos meios eletrônicos para sua realização.

Os contratos eletrônicos também não podem envolver relações de direito de família ou sucessão, por serem normas de ordem pública, que não podem ser afastadas por vontade das partes.

O contrato eletrônico é firmado principalmente no âmbito privado, mas não

há qualquer impedimento em sua utilização pelo Estado.

O regime jurídico aplicável aos contratos eletrônicos será o do contrato nele

representado, podendo ser uma compra e venda, uma aplicação financeira ou outra

movimentação de conta corrente.11

O contrato eletrônico pode ser cumprido total ou parcialmente em um

ambiente digital. Assim, primeiramente pode-se proceder à concretização de um

negócio jurídico em que seu cumprimento dar-se-á virtualmente. Neste primeiro caso

estamos nos referindo às hipóteses nas quais são transferidos objetos digitalizados, e

que podem ser vendidos on-line, como por exemplo, software para computadores.12

Ademais, no tocante a segunda forma de cumprimento, qual seja, aquela em

que os contratos não se perfazem inteiramente através da Web, mas apenas

parcialmente. São os casos de venda de mercadorias e serviços, entregues off-line. 13

11 Ibidem, mesma página. 12 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p. 128. 13 Ibidem, mesma página.

23

2.2 A Formação dos Contratos Eletrônicos

Os contratos eletrônicos são formados pela manifestação de vontade das

partes, ou seja, quando o policitante faz a proposta de contratar e o oblato aceita a

mesma.

A proposta é que inicia os contratos em sua generalidade, não havendo

forma previamente estabelecida, haja vista a nossa legislação não ter adotado o

princípio da formalidade, salvo a convenção das partes ou disposição expressa da lei.

O que se exige é que seja precisa, completa e transparente, e traga em seu conteúdo

todos os requisitos primordiais do negócio jurídico.14

O art. 31 do Projeto de Lei n°4906/2001, que versa sobre o comércio

eletrônico prevê alguns requisitos para a oferta de bens, serviços e informações no

ambiente digital, a saber, in verbis:

“Art.31. A oferta de bens, serviços ou informações por meio eletrônico deve

ser realizada em ambiente seguro, devidamente certificado, e deve conter claras e

inequívocas informações sobre: nome ou razão social do ofertante; número de inscrição

do ofertante no respectivo cadastro geral do Ministério da Fazenda e, em se tratando de

serviço sujeito a regime de profissão regulamentada, o número de inscrição no órgão

fiscalizador ou regulamentador; domicílio ou sede do ofertante; identificação e sede do

provedor de serviços de armazenamento de dados; número de telefone e endereço

eletrônico para contato com o ofertante; tratamento e armazenamento, pelo ofertante,

do contrato ou das informações fornecidas pelo destinatário da oferta; instruções para

arquivamento do contrato eletrônico pelo aceitante, bem como para sua recuperação

em caso de necessidade; e sistemas de segurança empregados na operação”.

14 Ibidem, p. 130.

24

O artigo mencionado contém os mesmos requisitos estabelecidos no art. 5°

da Diretiva da União Européia 2000/31, cujo objetivo é a busca por um ambiente

seguro, com a certificação necessária para que seja possível a realização de uma

oferta em rede, já que esta deve ser inequívoca, séria, completa e obrigatória.

Recentemente e de maneira pioneira em nosso país, uma entidade de direito

privado, a AMI (Associação de Mídia Interativa), que reúne entre seus integrantes

diretores de alguns dos principais provedores do país, lançou um Código de Ética,

contendo desde disposições gerais sobre a oferta (“os anúncios deverão conter uma

apresentação verdadeira do produto oferecido”) até diretrizes sobre bens específicos,

tais como bebidas alcoólicas, produtos alimentícios, produtos de fumo e armas de

fogo.15

Trata-se de uma tendência internacional, merecendo registros semelhantes

códigos morais em países como a Itália – onde foi editado o Códice di

autoregolsmentazione per i servizi Internet – e a Grã – Bretanha – onde vigoram os

British Codes of advertising pratice – competindo a comissões formadas por

representantes das empresas do setor a sua elaboração, bem como a fiscalização

acerca do cumprimento das suas normas, as quais incluem a autovaloração sistemática

dos conteúdos publicados na Internet.16

É notório que a proposta ou oferta pode ser feita a pessoa certa e

determinada ou de forma publica, a pessoas indeterminadas, por exemplo, em

anúncios, exposição em vitrines, máquinas automáticas, sites ou qualquer outro meio

de oferta pública. Quando a oferta é feita a pessoa determinada, a aceitação só pode

ser manifestada pela pessoa a quem ela foi endereçada. Todavia, tratando-se de oferta

15 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de consumo via Internet, p.155. 16 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de consumo via Internet, p.155.

25

publica, qualquer pessoa pode manifestar aceitação e o policitante é obrigado a aceita-

la, devendo firmar contrato com quem primeiro manifestar aceitação.

No mesmo sentido dita o art.25, § 1°, do projeto de Lei n.°4.906/2001, in

verbis:

“§ 1°. A proposta de contrato por meio eletrônico obriga o proponente quando

enviada por ele próprio ou por sistema de informação por ele programada para operar

automaticamente”.

A proposta efetuada obriga o proponente, salvo quando o contrário constar

de seus termos, da natureza do negócio proposto ou das circunstâncias que cercam o

caso concreto, conforme o comando previsto no artigo 427 do Código Civil vigente.17

Portanto, a proposta tem força vinculante, é um ônus imposto ao proponente

que consiste em não revogar a oferta por determinado período, a fim de assegurar a

estabilidade das relações sociais, sob pena de responder por perdas e danos.

O prazo da oferta deve estar nela indicado, mas quando não houver deve

proceder-se imediatamente ou de acordo com os costumes do local. O prazo segundo a

doutrina majoritária, é contado a partir da expedição da proposta, exceto se dela

constar o contrário.

Para Ana Paula Gambogi Carvalho:

“As normas do CDC sobre a oferta aplicam-se naturalmente a todos os

contratos celebrados pela Internet. Em conseqüência disso, qualquer

17 “Art.427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso”.

26

apresentação de produtos e serviços em uma homepage é

considerada, no Direito brasileiro, não apenas uma invitatio ad

offerendum, mas sim uma oferta vinculatória”.18

Assim, aplica-se o art.35 do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe,

in verbis:

“Art.35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à

oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá alternativamente e à sua

escolha: I – exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta,

apresentação ou publicidade; II-aceitar outro produto ou prestação de serviço

equivalente; III-rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente

antecipada, monetariamente atualizada, e as perdas e danos”.

Como exemplificação do tratamento dado à matéria nos países do common

law, deve ser mencionado o caso People v.Lipsitz, julgado em 23 de junho de 1997 pela

Suprema Corte do Estado de New York, no qual o réu, Kenneth Lipsitz, foi condenado

em ação coletiva movida pelo Attorney General, por usar vários nomes falsos,

vendendo assinaturas em revistas, as quais, em alguns casos, jamais foram entregues,

ou, em outros, chegaram ao seu destino com grande atraso, de modo a encurtar o

prazo da assinatura contratada, muitas vezes em relação à metade do que fora pago

pelo consumidor.

A oferta, no caso mencionada, foi formulada por intermédio de e-mails,

contendo depoimentos fictícios de consumidores exaltando não só a qualidade do

serviço prestado pela parte ré, como também os preços vantajosos oferecidos, dirigidos

18 CARVALHO, Ana Paula Gambogi. Contratos, p.68.

27

a pessoas que integravam grupos particulares de discussão ou “listas” na rede, ou seja,

pelo uso não autorizado do correio eletrônico (SPAM) para fins comerciais.

Os réus após serem expulsos de vários provedores de acesso à Internet,

devido às práticas abusivas, trataram de destruir os registros dos negócios efetuados. O

resultado foi à condenação dos réus, no valor de US$ 500 para cada prática de

publicidade e de consumo abusivo, além da importância de US$ 2.000, a título de

custas.

Nos contratos eletrônicos, a aceitação deve ser expressa, salvo os contratos

gratuitos de utilização de software, em que não há qualquer obrigação do oblato. A

resposta à oferta deve ser clara e conclusiva, pois se houver alguma espécie de

condição isto implicará em uma nova proposta.

Logo, a aceitação baseada nos dados constantes da proposta só pode ser

invalidada caso comprovado que o consumidor agiu mediante erro ou dolo, caso os

dados esclarecedores se mostrem deficientes ou tendenciosos.19

Pode ocorrer a revogação da proposta, que está prevista no artigo 428, IV,

do Código Civil vigente, que dita, in verbis:

“Art. 428. Deixa de ser obrigatória à proposta:

IV- se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra

parte a retratação do proponente”.

Guilherme Magalhães Martins, levanta outro problema a ser debatido:

19 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p. 159.

28

“Subsiste ou não a oferta, após a morte do policitante ou a

declaração de sua incapacidade ocorrida antes da aceitação?”20

No direito anglo-saxão, a partir da concepção de que as obrigações somente

surgem a partir do momento em que o contrato se perfaz, prevalece a visão de que a

morte ou incapacidade do ofertante leva à caducidade da oferta, desde que o aceitante

conheça tal circunstância. Caso realizada a aceitação na ignorância escusável de tal

situação, o ato é válido, desde que não se trate de contrato personalíssimo.21

O nosso ordenamento jurídico determina a obrigatoriedade da oferta, pois

sendo constituída uma obrigação, esta é transmitida aos herdeiros do ofertante, o qual

deve ter a vontade suprimida, em caso de incapacidade, por seu representante legal,

podendo apenas ser exercida a retratação, se antes da proposta ou simultaneamente

chegar ao conhecimento da outra parte, a retratação do proponente, conforme o artigo

428, IV, do Código Civil vigente.22

Cabe destacar que para o contrato ser formado, deve existir a certeza de que

a mensagem enviada pelo oblato foi recebida, e vice-versa, não importando somente a

manifestação da concordância do aceitante. E, isto somente ocorrerá a partir do

instante em que for constatada a entrada da informação, contendo a intenção de

contratar, no computador da parte interessada.23

20 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p. 187. 21 Ibidem, mesma página. 22 “Art.428. Deixa de ser obrigatória a proposta: IV- se, antes dela , ou simultaneamente, chegar ao conhecimento da outra parte a retratação do proponente”. 23 BASSO, Maristela. Contratos Internacionais do Comércio, p.110.

29

2.3 O momento da formação dos contratos eletrônicos

Surge uma importante questão a ser debatida: Os contratos eletrônicos são

formados entre presentes ou ausentes?

Em um primeiro momento, considerando o ambiente virtual, em que não

visualizamos as partes, mas somente um emissor e outro receptor de mensagens de

dados em cada uma das extremidades, seria possível afirmar que as contratações

eletrônicas são realizadas entre ausentes.

O Código Civil não traz a definição da ausência, mas a doutrina designa que

os contratos firmados entre ausentes são aqueles em que não há aceitação imediata

pelo oblato, ou seja, decorre um lapso temporal entre a oferta e a aceitação. Já nos

contratos firmados entre os presentes, há o contato de forma imediata entre as partes

ou decorre um curto espaço de tempo entre a proposta elaborada e sua aceitação.

Assim, por analogia, os contratos eletrônicos podem ser equiparados à

contratação efetuada por telefone, em que há uma separação física dos contratantes e

instantaneidade das comunicações, podendo ser considerada uma contratação entre

presentes, conforme o comando inserto no artigo 428, I, do Código Civil vigente, que

determina que a proposta feita entre presentes, é aquela realizada por meio de

comunicação semelhante. 24

Neste sentido, dispõe Erica Brandini Barbagalo:

“Os contratos firmados por partes que estejam, ao mesmo

tempo, conectadas à rede, contanto que possibilitando que a

24 “Art.428. Deixa de ser obrigatória a proposta: I- se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de comunicação semelhante”.

30

declaração de vontade de uma parte seja recebida pela outra no

mesmo momento em que é declarada ou em curto espaço de tempo.

Tais seriam, por exemplo, os contratos firmados por meio de ambiente

de conversação, os chamados chats, ou os contratos que se firmam por

intermédio de videoconferências. Esses contratos têm analogia com os

contratos firmados por telefone em que, embora não estando as partes

fisicamente presentes, a declaração e a recepção da manifestação de

vontade são feitas simultaneamente”.25

Considera - se contratos eletrônicos firmados entre ausentes, as ofertas que

são transmitidas ao solicitado, por e-mail ou “por clique” em uma homepage, hipóteses

em que há um lapso temporal significativo entre a manifestação da oferta e a sua

chegada até a aceitação do oblato.

2.4 O lugar em que se forma o Contrato Eletrônico

O contrato eletrônico será formado no local em que ocorre a prestação de

serviços, ou seja, no lugar em que se desenvolve a atividade econômica. Se existirem

vários estabelecimentos, se determinará aquele onde se presta um serviço concreto ou

onde o prestador tenha seu centro de atividades.26

Portanto, o lugar não está vinculado com a empresa que disponibiliza o Web

site nem onde este pode ser acessado, mas sim onde se desenvolve a atividade

econômica.

25 BARBAGALO, Erica Brandini. Contratos eletrônicos: contratos formados por meio de redes de computadores: peculiaridades jurídicas da formação do vínculo, página 53 e 54. 26LORENZETTI, Ricardo L. Comercio electronico,p.200.

31

Neste sentido, a lei modelo da UNCITRAL (Comissão das Nações Unidas

para o Direito Comercial Internacional) no art.15, determina que o lugar da conclusão

do contrato é aquele no qual o destinatário tenha sua sede principal,

independentemente do lugar de origem do Web site, ou estabelecimento virtual.

Logo, uma mensagem eletrônica se considera expedida do local onde o

remetente tenha seu estabelecimento e recebida no lugar onde o destinatário exerce

sua atividade negocial. Se possuir mais de uma empresa, considerar-se-á aquela que

guarde relação mais estreita com os negócios jurídicos subjacentes. Na ausência

destes, ter-se-á como estabelecimento principal a sua residência habitual.27

Ronaldo Alves de Andrade destaca:

“Que quando o contrato eletrônico for celebrado com a

utilização de um computador situado fora do domicílio do contratante

proponente, este em verdade estará praticando o ato como se estivesse

em seu domicílio, sendo o computador utilizado como mero

instrumento; não podendo por isso ser considerado o local onde está a

máquina situada como o local do contrato, pois os efeitos da relação

jurídica serão produzidos nos domicílios dos respectivos contratantes, e

não necessariamente onde está localizado o computador”.28

2.5 Jurisdição Aplicável ao Contrato Eletrônico

Assim, como nos demais contratos, nos contratos eletrônicos as partes

podem livremente eleger o foro da jurisdição a ser aplicado em eventuais conflitos,

pode ser o foro do domicílio de qualquer deles ou outro completamente diverso.

27LORENZETTI, Ricardo L. Comercio electronico,p.200. 28 ANDRADE, Ronaldo Alves. Contrato Eletrônico, p. 48 e 49.

32

Embora o contrato celebrado por meio eletrônico possa ser formado em

qualquer parte do planeta, em foro diferente do domicílio dos contratantes, inexistindo

avença das partes quanto à jurisdição e não se tratando de relação de consumo, aplica-

se às normas de direito processual civil contida nos artigos 94 e seguintes do Código de

Processo Civil, as quais estabelecem que, em regra, a jurisdição competente é a do

foro do domicílio do demandado.29

Tratando-se de contrato internacional, se não houver eleição da jurisdição, a

solução da lide deve ser dada pela regência dos tratados internacionais existentes entre

os países dos contratantes.

Se inexistir tratado internacional, deve ser aplicada a jurisdição e a lei do

país do policitante, esta é a posição do professor Ronaldo Alves que afirma que esse

posicionamento é adotado por quem faz a oferta em meio virtual eletrônico não

desejará que questões oriundas do contrato que propôs sejam solucionadas por

julgador de país estrangeiro, com a utilização de lei igualmente estrangeira.30

É importante ressaltar que os entendimentos aqui mencionados não se

aplicam ao direito consumerista, sendo abusiva a cláusula contratual eletiva de foro

diversa daquele do consumidor, quando a este causar prejuízo.

Para Patrícia Peck, deve se incluir nos contratos eletrônicos uma cláusula

arbitral, já que a celeridade, expertise, especialidade e sigilo são essenciais na solução

das questões de direito digital.31

29 ANDRADE, Ronaldo Alves. Contrato Eletrônico, p. 50. 30 Ibidem, p. 53. 31 PECK, Patrícia. Direito Digital, p. 150.

33

CAPÍTULO 3 - OS PRINCÍPIOS JURÍDICOS APLICÁVEIS AOS CONTRATOS ELETRÔNICOS

34

Conforme anota Jorge José Lawand, podemos citar os seguintes princípios

que norteiam a contratação eletrônica, tendo em vista a Lei Modelo da UNCITRAL

sobre o comércio eletrônico, que são: o princípio da equivalência funcional dos atos

jurídicos tradicionais; o princípio da neutralidade tecnológica das disposições

reguladoras do comércio eletrônico; o princípio da inalterabilidade do direito existente

sobre obrigações e contratos; o princípio da boa-fé e o princípio da autonomia privada,

também chamado de liberdade convencional.32

3.1 O Princípio da Equivalência Funcional

O princípio da equivalência funcional é o argumento mais genérico e básico

da tecnologia jurídica dos contratos virtuais, pois afirma - se que o suporte eletrônico

cumpre as mesmas funções que o papel. Aceita essa premissa, não há razões para se

considerar inválido ou ineficaz o contrato tão-só pela circunstância de ter sido registrado

em meio magnético.33

As conseqüências deste princípio são: a) A vedação de qualquer espécie de

diferenciação entre os contratos clássicos e os contratos eletrônicos; b) O contrato

eletrônico não pode ser considerado inválido simplesmente por ter sido celebrado por

meio de transmissões eletrônicas de dados; c) Não pode ser imposto às partes

contratantes, condições diferentes daquelas previstas nos contratos, com suporte

escrito, em papel.

A equiparação do contrato eletrônico com o contrato efetuado em papel

significa que a mensagem eletrônica está na categoria das declarações de vontade,

que também pode ser expressa por meios manuais, verbais ou gestos.

32 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.41. 33 COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, p.39.

35

Neste sentido, o artigo 28 e 32 do Projeto de Lei n°4.906/2001 dispõem, in

verbis:

“Art.28. A expedição do documento eletrônico equivale:

I- à remessa, por via postal registrada, se assinado de acordo

com os requisitos da lei, por meio que assegure sua efetiva recepção; e

II- à remessa por via postal registrada e com aviso de

recebimento, se a recepção for comprovada por mensagem de confirmação

dirigida ao remetente e por este recebida”.

“Art.32. Para o cumprimento dos procedimentos e prazos previstos na

legislação de proteção e defesa do consumidor, os adquirentes de bens, serviços, e

informações por meio eletrônico poderão se utilizar a mesma via de comunicação

adotada na contratação para efetivar notificações e intimações extra-judiciais”.

A lei modelo pretende com a adoção deste princípio minimizar possíveis

obstáculos para o desenvolvimento de instrumentos avançados de comunicação. Tem

como escopo um duplo propósito: permitir ou facilitar o emprego do comércio eletrônico

e conceder igualdade de tratamento aos usuários de mensagens produzidas sobre um

suporte informático com aqueles que se utilizam os contratos consignados em papel.34

3.2 O Princípio da Neutralidade Tecnológica das disposições reguladoras do comércio eletrônico A Lei Modelo da UNCITRAL estabelece que as nações ao elaborarem a

legislação que verse sobre o comércio eletrônico não devem utilizar conceitos

34 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.42.

36

tecnológicos atuais, pois em pouco tempo, estes podem estar obsoletos. As leis devem

utilizar uma tecnologia neutra, sendo este conceito chamado de neutralidade

tecnológica.

Assim, dita a lei modelo no item 8, em sua parte final: “Cabe assinalar que,

em princípio, não se exclui nenhuma técnica de comunicação do âmbito da Lei Modelo,

de forma a acolher em seu regime toda eventual inovação técnica neste campo”.

Isto nos revela o fato de que as normas disciplinadoras do comércio

eletrônico abarcarão, não somente a tecnologia existente no momento em que foram

promulgadas, mas também as futuras sem necessidade de ser submetida a alguma

espécie de modificação. 35

Percebe-se que a preocupação deste princípio é evitar que um diploma

normativo torne-se obsoleto. Iremos tomar como exemplo, as questões concernentes à

segurança dos contratos eletrônicos, que é proporcionada por meio do sistema de

criptografia com chave dupla e que nos próximos anos pode não ser mais utilizado, mas

se a legislação for neutra, o ordenamento continuará a ser aplicado, não sendo

necessário realizar qualquer alteração neste.

Os países que adotaram uma lei neutra tecnologicamente são: A República

Tcheca, a Irlanda, a Espanha, os Estados Unidos e os países da União Européia.

3.3 O Princípio da Inalterabilidade do Direito Existente sobre Obrigações e Contratos

35 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.45.

37

Este princípio refere-se ao fato de que as normas jurídicas introduzidas para

disciplinar o comércio eletrônico, não implicarão uma modificação substancial do direito

vigente e disciplinador das obrigações e contratos, tanto formados no âmbito nacional

ou internacional.36

Assim, podemos afirmar que os elementos essenciais do negócio jurídico,

como o consentimento e o objeto, as manifestações e defeitos não sofreram uma

profunda alteração quando os contratos são celebrados por meio eletrônico, não sendo

necessário um novo direito regulamentador.

No mesmo sentido, menciona Ana Paula Gambogi Carvalho, para a qual:

“A Internet não cria um espaço livre, alheio do Direito. Ao

contrário, as normas legais vigentes aplicam-se aos contratos

eletrônicos basicamente da mesma forma que a quaisquer outros

negócios jurídicos. A celebração de contratos via Internet sujeita-se,

portanto, a todos os preceitos pertinentes do Código Civil Brasileiro

(CC). Tratando-se de contratos de consumo, são também aplicáveis às

normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC)”.37

Conclui-se que os contratos eletrônicos apenas diferem-se dos demais

contratos pelo meio que é utilizado, devendo ser aplicado a eles às normas vigentes

que referem se aos contratos.

3.4 O Princípio da Boa - Fé

36 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.47. 37 CARVALHO, Ana Paula Gambogi. Contratos, p.59-60.

38

O princípio da boa-fé foi adotado na lei modelo da UNCITRAL, em seu artigo

31, que dita, in verbis:

“Art.31. Na interpretação desta Lei, levar-se-ão em consideração a sua

origem internacional e a necessidade de promover a uniformidade de sua aplicação e a

observância da boa-fé”.

O princípio da boa-fé se divide em boa-fé subjetiva e boa-fé objetiva.

A boa-fé subjetiva diz respeito ao entendimento equivocado, ao erro

praticado pelo contratante, a ignorância da pessoa relativamente a certos fatos.

Portanto, o contratante tem a consciência de estar agindo conforme as normas jurídicas

vigentes, apesar de ser outra a realidade.

Já, a boa-fé objetiva, classifica-se como a regra de conduta contratual,

segundo a qual as partes devem cumprir com a obrigação imposta, seja a entrega do

bem, o pagamento deste, além de transmitir a parte informações corretas referente ao

produto, garantir a assistência, entre outros.

Segue lição da professora Maria Helena Diniz referente ao princípio da boa-

fé:

“Está intimamente ligado não só à interpretação do contrato -

pois, segundo ele, o sentido literal da linguagem não deverá prevalecer

sobre a intenção inferida da declaração de vontade das partes – mas

também ao interesse social de segurança das relações jurídicas, uma

vez que as partes deverão agir com lealdade e confiança recíprocas,

isto é, proceder com boa fé”.38

38 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, p.36.

39

Portanto, o princípio da boa-fé tem como fundamento o art.112 do Código

Civil vigente, que dispõe, in verbis:

“Art.112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas

consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”.

Conclui-se que o princípio de boa-fé deve nortear a interpretação do

contrato, conforme Carlos Roberto Gonçalves:

“Deve o intérprete presumir que os contratantes procedem

com lealdade e que tanto a proposta como a aceitação foram

formuladas dentro do que podiam e deviam eles entender

razoavelmente, segundo a regra da boa-fé. Esta, portanto, se presume;

a má-fé, ao contrário, deve ser provada”.39

3.5 O Princípio da autonomia Privada

Este princípio se refere à liberdade de contratação que é concedida as

partes, na qual elas podem fixar o conteúdo, a forma do instrumento contratual desde

que não seja contrário ao ordenamento jurídico, aos bons costumes e a ordem pública,

estes são os limites impostos aos contratantes.

Neste sentido, anota César Fiúza, que as partes podem:

“1- contratar ou não contratar, pois ninguém pode ser

obrigado a contratar apesar de ser impossível uma pessoa viver sem

celebrar contratos; 2- com quem e o que contratar, ou seja, as pessoas

devem ser livres para escolher seu parceiro contratual e o objeto do

39 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das Obrigações, p.20 e 21.

40

contrato; 3- estabelecer as cláusulas contratuais, respeitados os limites

da lei; 3- estabelecer as cláusulas contratuais, respeitados os limites da

lei; 4- mobilizar ou não o Poder Judiciário para fazer respeitar o

contrato, que, uma vez celebrado, torna-se fonte formal do Direito”.40

Cabe mencionar que atualmente, há a interferência do Estado nos contratos

firmados no âmbito privado, quando uma das partes for hipossuficiente, com o objetivo

de garantir a igualdade entre as partes contratantes.

A liberdade contratual concedida pelo ordenamento permite que as partes

firmem um contrato típico ou criem uma modalidade de contrato de acordo com as suas

necessidades, o qual será atípico.

O ordenamento jurídico pátrio adota a liberdade da forma na celebração dos

contratos, exceto quando a lei assim exigir, como no caso das matérias referentes ao

direito de família ou sucessão. Portanto, em regra, há liberdade da forma.

Assim, é possível afirmar que os contratos podem ser exteriorizados pela

forma escrita, oral ou por gestos, isto face ao princípio do consensualismo, em que a

soma de vontades das partes forma o vínculo contratual.

40 FIUZA, César. Direito Civil, p.214.

41

CAPÍTULO 4 – A FORMA DO CONTRATO ELETRÔNICO 4.1 Forma legal

A vontade constitui-se no elemento propulsor da formação de uma relação

jurídica contratual, e desde que livre e consciente concede uma validade para o

contrato.41

No âmbito das relações jurídicas operadas na Web, temos que o

consentimento contratual expresso consiste necessariamente em uma declaração de

vontade telemática teclada pelo cliente em seu terminal do computador; é suficiente o

ato (gesto) de expressão da vontade externada através da ordem enter de aceitação do

contrato.42

Assim, a exteriorização da vontade das partes pelo meio eletrônico é válida e

autorizada pelo ordenamento jurídico brasileiro, pois o Código Civil vigente, inspirado

no princípio do consensualismo admite a liberdade da forma para a celebração dos

contratos, conforme o comando previsto no artigo 107, que dispõe, in verbis:

“Art.107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma

especial, senão quando a lei expressamente a exigir”.

41 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos eletrônicos, p.136. 42 Ibidem , p.137.

42

Portanto, os contratos eletrônicos não poderão ser firmados, apenas nos

casos em que a solenidade é requisito necessário para sua validade. Isto porque o

contrato solene não será válido se desobedecer à forma prescrita em lei, que

geralmente não prevê a utilização dos meios eletrônicos para sua utilização.

4.2. Documento eletrônico A palavra documento deriva do latim documentum, de docere (mostrar,

indicar, instruir), na técnica jurídica entende-se o papel escrito, em que se mostra ou se

indica a existência de um ato, de um fato, ou de um negócio.43

Assim, verifica-se que a noção de documento sempre foi associada ao seu

suporte físico, qual seja o papel. Esta assertiva é facilmente comprovada, tendo em

vista que o século XX já foi chamado, por Michel Vasseur, de “O Século do Papel”.

O ordenamento jurídico brasileiro admite a exteriorização da vontade das

partes por vários meios, como por exemplo, a escrita, o oral e até mesmo por gestos,

mas as partes sempre optam pela forma escrita ao celebrar um contrato, pela

segurança emocional que este meio traz, pois as partes permanecem com uma via do

contrato celebrado, em que constam os direitos e deveres da partes, ou seja, há uma

prova palpável do que foi acordado.

Porém, com a globalização e o surgimento da Internet, que possibilitou a

realização de negócios entre pessoas de diversas nacionalidades, o documento em

papel começou a ser substituído pelo eletrônico, tendo em vista principalmente a

rapidez no envio das informações.

43 SILVA, De Plácido. Vocabulário Jurídico, p.287.

43

O Projeto de Lei n°4906, de 2001, no artigo 2°, inciso I, conceitua o

documento eletrônico, ao dispor, in verbis: “Documento eletrônico: a informação gerada,

enviada, recebida, armazenada ou comunicada por meios eletrônicos, ópticos, opto-

eletrônicos ou similares”.

Assim, o documento eletrônico apenas difere do documento em papel, pelo

seu suporte material, pois este será representado por disquetes, circuitos, chips de

memória, redes.

Cabe destacar que o documento em papel possui diversas limitações que se

referem à sua conservação, transmissibilidade e segurança, diferentemente do

documento eletrônico.

Neste sentido, afirma Patrícia Peck:

“Que é ilusão acreditar que o papel é o meio mais seguro.

Sabemos que armazenar dados e imagens em discos rígidos ou fitas é

muito mais seguro que arquivá-los em papel, desde que o processo

seja feito de modo adequado. É obrigação de todos os operadores

digitais esclarecer, explicar e ensinar como adequadamente registrar

operações eletrônicas, e cabe ao Estado determinar qual será o padrão

de conduta para certificação dos documentos, considerando que a

tecnologia permite que isto seja feito automaticamente, sem a

burocracia dos cartórios do mundo real, com o diferencial de ainda

poder ser auditado”.44

Conclui-se que o documento eletrônico está em um suporte material, como

por exemplo, um disquete, cd, que contêm uma mensagem, que está escrita em

44 PECK, Patrícia. Direito Digital, p.85 e 86.

44

linguagem convencional de dígitos binários ou bits, que será traduzida por um

computador. Esta mensagem será atribuída ao autor, por meio da assinatura digital ou

chave eletrônica.

Portanto, as características do documento eletrônico são: - permitir

livremente a inserção de dados ou da descrição de fatos que se quer registrar; - permitir

a identificação das partes intervenientes, de modo inequívoco, a partir de sinal ou sinais

particulares e a não adulteração do documento eletrônico, sem que haja vestígios

localizáveis, pelo menos por meio de procedimentos técnicos sofisticados.45

Surge uma importante questão a ser debatida referente aos documentos

eletrônicos, este pode ser considerado como um documento escrito e utilizado como

meio de prova, tendo em vista o artigo 368, do Código de Processo Civil?

O artigo 368 do diploma mencionado dita, in verbis: “As declarações

constantes do documento particular, escrito e assinado, ou somente assinado,

presumem-se verdadeiras em relação ao signatário”.

O dispositivo mencionado pode ser aplicado aos documentos eletrônicos,

conforme lição do professor Nelson Nery Junior que afirma:

“O documento eletrônico elaborado de acordo com as regras

da Medida Provisória 2200-2/01, produzido por quem esteja na

disposição e administração livre de seus bens, é considerado

documento particular para todos os efeitos legais”.46

45 MARQUES, Antônio Terêncio G.L. A Prova Documental na Internet, p.130. 46 NERY, Nelson Junior e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado, p. 548.

45

Já a lei modelo da UNCITRAL estabelece no artigo 6.1, que onde a lei

estabelecer a forma escrita como requisito de validade também será valida a forma

eletrônica se a informação puder ser acessada posteriormente.

4.3 Identificação dos Contratantes O contrato, como qualquer outro negócio jurídico, exige a capacidade das

partes, ou seja, que o sujeito seja dotado de plena capacidade para administrar seus

bens, sob pena de este ser nulo ou anulável, conforme o artigo 104, inciso I do Código

Civil, que dispõe, in verbis:

Art.104.”A validade do negócio jurídico requer:

I- agente capaz”.

Logo, será nulo o ato praticado pelo absolutamente incapaz, sem a devida

representação, como por exemplo, os menores de dezesseis anos, os portadores de

enfermidade ou deficiência mental que não possuem discernimento para praticar atos

ou negócios jurídicos e os que, por motivo ainda que transitório, não podem exprimir a

sua vontade. Será anulável, o ato praticado pelo relativamente incapaz, sem

assistência, como por exemplo, os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

os ébrios habituais, os viciados em tóxicos e os que por deficiência mental tem o

discernimento reduzido; os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo e os

pródigos.

Portanto, verifica-se que ao celebrar um contrato é necessário que as partes

sejam identificadas e que possuem plena capacidade para realizá-lo sob pena do

contrato ser considerado nulo ou anulável. Neste contexto, questiona-se como

46 identificar as partes no ambiente virtual, já que o contrato eletrônico somente será

válido se as partes forem capazes?

Uma das possibilidades para tentar solucionar o problema apontado, é a

identificação do terminal do computador em que está se realizando o acesso a rede,

mas esta solução não é viável, pois o computador pode não ser da parte contratante,

como por exemplo, no caso dos locais que cedem a utilização dos computadores com

acesso a Internet em troca de determinada quantia em dinheiro.

Outra questão a ser debatida, refere-se a grande possibilidade de ocorrência

de fraudes pela Internet, à medida que ao celebrar os contratos eletrônicos, a parte

contratante apenas preenche uma ficha, com os dados pessoais, como por exemplo, o

nome, o endereço para a entrega do bem, o e-mail e a forma de pagamento. Mas não

há como se verificar se os dados enviados foram preenchidos pelo titular ou por um

fraudador.

No mesmo sentido, Erica Barbagalo afirma que:

“A identificação do usuário da rede de computadores é feita

logicamente pelo endereço do IP, além do endereço de correio

eletrônico ou nome de domínio. Essas identificações lógicas, todavia,

podem ser utilizadas por outra pessoa, que não seu detentor, pra

constituir um vínculo obrigacional pela rede de computadores. Assim, a

parte que recebe a declaração de vontade não tem, a princípio, como

se certificar de que à vontade declarada por meio da identificação lógica

corresponde à verdadeira pessoa que identifica. Existe, portanto,

47

apenas a presunção de que a identificação lógica corresponde a quem

é atribuída”. 47

No entanto com a evolução da tecnologia, atualmente é possível obter a

segurança nas relações celebradas pela Internet, principalmente em relação à

identificação das partes e também quanto à autenticidade da mensagem remetida pela

Internet, tendo em vista a criptografia, a assinatura digital e as certificações digitais.

4.4 Criptografia A palavra criptografia origina-se do grego Kriptós, que significa escondido,

oculto, e grafo, escrever.

A criptografia é uma ferramenta de codificação utilizada para o envio de

mensagens seguras em redes eletrônicas.48 A criptografia associada a outro

mecanismo, como por exemplo, a assinatura digital, possibilita maior segurança nas

relações efetuadas em ambiente virtual, isto porque a criptografia assegura a

confidencialidade das mensagens enviadas pela Internet.

A criptografia possibilita que a mensagem enviada, ou seja, o texto literal

seja transformado em um conjunto de caracteres que somente será decifrado se a outra

parte possuir a chave, que pode ser pública ou privada.

A chave é o padrão criptográfico utilizado para cifrar ou decifrar mensagens.

47 BARBAGALO, Érica Brandini. Contratos eletrônicos, p.41. 48 PECK, Patrícia. Direito Digital, p. 86.

48

A criptografia pode ser simétrica ou assimétrica. Será simétrica ou de chave

privada, quando a mesma chave é utilizada para cifrar e decifrar a mensagem. Neste

caso, o destinatário da mensagem deve conhecer o algoritmo, ou seja, o conceito

matemático utilizado para cifrar a mensagem. Caso contrário, não será possível a sua

leitura.

Os algoritmos tem como função embaralhar os próprios bits do documento

eletrônico.

Por só possuir uma chave para cifrar ou decifrar a mensagem, o sistema

pode se tornar inseguro se houver dúvida quanto à honestidade e integridade de um

dos receptores da chave. Se isto ocorrer, a chave deve ser substituída imediatamente e

entregue somente a receptores confiáveis.

A criptografia simétrica é utilizada geralmente em redes fechadas ou

computadores isolados.

A criptografia assimétrica ou de chave publica, ocorre quando são utilizadas

duas chaves distintas, mas vinculadas matematicamente entre si, uma para cifrar a

mensagem, e outra para decifrá-la, sendo utilizada em redes abertas como a Internet.

Neste caso, as chaves são completamente independentes entre si, mas uma chave

completa a outra.

A criptografia de chave pública funciona a partir de complexos métodos

matemáticos irreversíveis, denominados one-way functions (função uniderecional), que

geram duas chaves diferentes.Uma delas ficará em poder do proprietário do sistema,

que terá exclusividade no seu uso. Esta será a chave privada. A outra poderá ser

49

distribuída a todos aqueles com quem precise manter uma comunicação segura ou

identificável. Essa é a chave pública.49

Tal sistema pode ser comparado a uma moeda fracionada em duas metades,

cuja reunião permite que ambas as partes, emitente e destinatário, se reconheçam de

maneira absolutamente unívoca.Sua segurança decorre do fato de que, se a chave

pública não corresponde àquela secreta, ou se a mensagem foi de qualquer forma

modificada, torna-se o documento indecifrável, tornando manifestas tais formas de

violação.50

Surge uma questão importante que deve ser debatida em relação à

criptografia, que é a utilização deste sistema por organizações criminosas, com a

finalidade da prática de crimes, como a pedofilia, a prostituição e o tráfico de seres

humanos.

Como forma de prevenção, vários países se reuniram para decidir como

seria a exportação da criptografia, já que era necessário um controle mais rígido e que

dificultasse a utilização do sistema por organizações criminosas.

Antigamente a exportação da tecnologia da criptografia era controlada pela

COCOM (Coordinating committee for multilateral), organização internacional que foi

extinta em 1994 e era composta por dezessete Países –membros, destinando-se à

fiscalização mútua de produtos estratégicos e dados tecnológicos, visando impedir,

especialmente, o respectivo envio a certos países considerados de risco, em função

das suas relações amigáveis com organizações terroristas.51

49 MARQUES, Antônio Terêncio G.L. A prova documental na Internet, p.161. 50 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p. 71. 51 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p. 74.

50

Atualmente, o acordo de Wassenaar, o qual foi revisto em 1998, estabelece

que os produtos criptográficos de até 56 bits são de livre exportação, bem como

aqueles que empregam a cifragem para proteger a propriedade intelectual, restando tal

atividade sujeita a uma licença, em quaisquer outras hipóteses.

4.5 Assinatura Digital A assinatura, de forma geral, tem como objetivo a assunção de

responsabilidade pelo conteúdo inserido no documento, pela assunção da paternidade

da declaração de vontade lá contida, vinculando o documento ao seu autor.52

A assinatura pode ser realizada fora dos moldes tradicionais, isto é, a

assinatura não necessariamente precisa ser a cartácea, pode ser digital, que é a

lançada nos documentos eletrônicos. Neste contexto, cabe destacar que a assinatura

digital é reconhecida com a mesma validade da assinatura tradicional.

A assinatura digital é resultado de um processamento eletrônico de dados,

baseado em sistema criptográfico assimétrico, que permite comprovar a autoria e a

integridade de um documento eletrônico cifrado pelo autor com o uso da chave

privada.53

Para Ronaldo Alves de Andrade:

“A assinatura eletrônica, no estado atual da técnica, nada

mais é que um código ou senha formada por símbolos alfanuméricos,

ou seja, por letras, números ou estes e aqueles conjuntamente, de

52 LORENZETTI, Comercio Electronico, p.67. 53 LAWAND, Jorge Jose. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.144.

51

modo a identificar precisamente uma pessoa, na medida em que

somente ela tem conhecimento do seu código ou senha. 54

A diferença fundamental entre a assinatura cartácea e a assinatura digital

reside no fato de que a primeira só pode ser utilizada pelo seu titular, enquanto a

assinatura digital pode ser utilizada por terceiros, desde que este possua a chave.

A função da assinatura digital é conservar o conteúdo da mensagem intacta,

ou seja, a seqüência de bits e identificar com precisão a autenticidade e a

tempestividade, caso a mensagem seja alterada.

Assim, o remetente cria a mensagem, cifra e envia ao destinatário tanto a

mensagem original como a cifrada. Ao receber a mensagem, o destinatário compara o

conteúdo das duas mensagens e certifica-se que não houve alteração em seu

conteúdo.

O documento eletrônico que possui a assinatura digital torna-se mais seguro

que o documento com assinatura cartácea, isto porque ao assinar um contrato

manualmente, a parte não possui a certeza de que as páginas já assinadas não

sofrerão alteração em seu conteúdo. Já no documento eletrônico, se as partes

utilizarem a assinatura digital, terão a certeza de que nenhum byte foi alterado, por

meio da certificação digital.

A Autoridade Certificadora é uma entidade independente e legalmente

habilitada para exercer as funções de distribuidor de chaves e pode ser consultada a

54 ANDRADE, Ronaldo Alves. Contrato Eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p.67.

52

qualquer tempo certificando que determinada pessoa é a titular da assinatura digital, da

chave pública e da correspondente chave privada.55

A entidade certificadora tem a função de divulgar as chaves públicas

certificadoras em diretórios seguros, para serem consultados a qualquer momento e

verificados por qualquer interessado, possibilitando cópias autênticas dessas chaves.

Desta forma, ninguém receberá uma chave pública senão de uma autoridade, esta

medida visa diminuir o risco de fraudes no ambiente digital e na hipótese de ocorrer à

interceptação da mensagem por um terceiro, poderá ser verificado se o conteúdo

inserido no documento é verdadeiro ou não.

A autoridade certificadora pode ser pública ou privada, mas deve possuir as

seguintes características, como ressalta Lilian Mainardi Paesani:

“neutralidade, imparcialidade e confiabilidade. Sua finalidade

é garantir a autenticidade, segurança, publicidade e eficácia, à

semelhança das atribuições que são conferidas ao Tabelião de Notas

ou Notório Público em todo o mundo, a quem o Estado delega fé

pública, estabelecendo, portanto, uma base legal para dirimir disputas à

semelhança das escritas públicas”.56

O certificado digital contém as seguintes informações: i) chave pública do

autor; ii)nome e endereço do e-mail do autor; iii) data da validade da chave pública; iv)

nome da autoridade certificadora que emitiu o certificado digital; v) número de série do

certificado digital e vi) assinatura da autoridade certificadora.57 O certificado pode

55 MARQUES, Antônio Terêncio G.L. A Prova Documental na Internet, p.175. 56 PAESANI, Lilian Mainardi. Direito e Internet: liberdade de informação, privacidade e responsabilidade civil, p.121. 57 MARQUES, Antônio Terêncio G.L. A Prova Documental na Internet, p.175 e 176.

53

possuir informações adicionais, como por exemplo, a data e a hora em que o

documento foi firmado.

As autoridades certificadoras também são responsáveis pela divulgação da

lista de revogação, conhecida como CRLs (Certification Revogation Lists). A revogação

ocorre quando as chaves públicas e privadas ou o certificado perdem a sua validade,

sendo substituídos.

No Brasil, a assinatura digital é regulamentada pela Medida Provisória

n°2.200-2 de 24 de agosto de 2001, que criou a Infra-estrutura de Chaves Públicas

brasileira (ICP-Brasil) como órgão gerenciador do sistema de chaves pública brasileira.

A vantagem da criação da Infra-Estrutura de Chaves Pública (ICP-Brasil) é

que a legislação passa a reconhecer o documento eletrônico, concedendo-lhe

legitimidade.58

A Infra-Estrutura de Chaves Pública será o órgão regulamentador das

empresas de certificação digital, pois um contrato ou um documento somente terá valor

jurídico ao receber o certificado emitido pelas empresas de certificação digital.

É importante esclarecer que se a empresa de certificação digital não for

integrante da ICP – Brasil, o documento firmado entre as partes será válido, mas não

perante terceiros de boa-fé.

O Comitê Gestor do ICP-Brasil publicou inúmeras resoluções que estabelece

qual deve ser o conteúdo dos certificados de autenticidade das chaves públicas, quem

pode exercer funções de autoridade certificadora, como estes organismos deverão

58 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.64.

54

operacionalizar, seus deveres e responsabilidades, que critérios devem ser observados

para emissão, expedição e distribuição do certificado de autenticidade, como se dá a

revogação e o término destes certificados, de que forma é feita a auditoria, como

também quais são os efeitos de uma assinatura digital, para destacar os termos mais

relevantes.59

A Medida Provisória em tela foi muito criticada pelos doutrinadores e pela

Ordem dos Advogados do Brasil, Secção do Estado de São Paulo, que afirmou que o

Brasil está se distanciando das legislações promulgadas em todo mundo ao exigir a

certificação em documentos públicos e privados pelo governo, o que burocratiza e

onera o comércio eletrônico. Além disso, afirma que a medida deveria tratar dos

procedimentos e responsabilidades da certificação e não delegar essas atribuições a

um Comitê Gestor, órgão eminentemente político, ao invés de técnico.

4.6 O contrato eletrônico como elemento de prova a) Conceito de Prova

Etimologicamente o termo prova é oriundo do latim probo, probatio e probus.

Probus significa bom, reto, honrado, sendo possível afirmar que o que resulta provado é

autêntico ou corresponde à verificação ou demonstração de autenticidade. Probatio,

emanado do verbo probare, significa examinar, persuadir, demonstrar.60

59 MARQUES, Antônio Terêncio G.L. A Prova Documental na Internet, p.184. 60 MARQUES, Antônio Terêncio G.L. A prova documental na Internet, p. 52.

55

A prova no processo judicial tem a função de demonstrar que o fato alegado

pela parte existiu e como este ocorreu. Portanto, é o meio utilizado pelo homem para

demonstrar a verdade dos fatos alegados.

Para Carvalho Santos:

“A finalidade da prova não é outra senão convencer o juiz,

nesta qualidade, da verdade dos fatos sobre os quais ela versa”.61

O juiz possui a liberdade de convencimento, mas deve atentar as provas

apresentadas no processo pelas partes.

b) A validade dos documentos eletrônicos

Com o advento da Internet, as transações comerciais passaram a ser

realizadas por meio de computadores e não mais utilizando o suporte cartáceo. Assim,

questiona-se: Os documentos firmados pela Internet, como por exemplo, os contratos

eletrônicos possuem validade jurídica?

O documento digital será considerado válido, desde que contenha os

seguintes requisitos: autenticidade, integridade e perenidade do conteúdo.

Cabe ressaltar que os requisitos mencionados devem estar presentes

também no documento tradicional.

61 SANTOS, Carvalho. Comentários ao Código de Processo, p.161.

56

A autenticidade está relacionada à identidade das partes, ou seja, há certeza

de que a pessoa que se apresenta para realizar um negócio pela Internet é realmente o

seu titular ou trata-se de um fraudador, que possui os seus dados?

Conforme verificamos no item 4.3 do presente trabalho, a maneira mais

segura de se verificar se a parte é realmente o seu titular é por meio da assinatura

digital, a qual possui a função de autenticação. Isto porque a assinatura digital utiliza o

sistema criptográfico, em que só é possível à leitura da mensagem, caso a outra parte

conheça o algoritmo, ou seja, o conceito matemático utilizado para cifrar a mensagem.

Portanto, a assinatura digital equipara-se a assinatura tradicional, no que se

refere à eficácia jurídica.

Neste contexto, cabe destacar a lição de Augusto Tavares Rosa Marcacini:

“Se a assinatura tradicional é única e exclusiva porque

corresponde à escrita manual do signatário, comandada pelos impulsos

nervosos vindo do cérebro, a assinatura eletrônica obtém esta

característica uma vez assegurada a “exclusivitá del mezzo técnico”. Ou

seja, somente o sujeito que estiver de posse da chave privada tem

condições técnicas de gerar uma assinatura como aquela.”62

No que se refere à integridade do documento eletrônico, esta consiste na

não alteração da mensagem, isto porque as partes necessitam de segurança jurídica ao

firmarem os contratos, por meio da Internet.

Portanto, verifica-se que o documento eletrônico não pode ser modificado

após a sua concepção, quando é transmitido do emissor para o receptor ou mesmo

quando está armazenado. Esta segurança é possível por meio da assinatura digital

62 http: // www.advogado.com/internet/zip/tavare.htm.

57

aposta no contrato, pois o sistema utilizado é o criptográfico, que tem a função de

conservar intacto o conteúdo da mensagem, não permitindo alterações no documento

eletrônico.

Além disso, caso a mensagem seja alterada, poderá ser identificado com

precisão à parte que alterou o documento e quando foi realizada a alteração.

Cabe esclarecer que no caso de uma lide, poderão ser utilizados todos os

meios de prova admitidos em direito, para que se comprove a integridade e

autenticidade do documento eletrônico, como por exemplo, o exame pericial e a

inspeção judicial.

No mesmo sentido, se pronuncia Sérgio Ricardo Marques Gonçalves que

afirma:

“Logo, não há óbice legal ao contrato eletrônico, mas será

necessário mostrar a existência de toda uma cadeia lógica de fatos e

ações das partes podendo ser necessário até mesmo uma perícia em

equipamentos e servidores, para comprovar que determinados

documentos, e-mails e outros dados foram trocados entre as partes,

gerando um contrato, ainda que alguns o entendam de fato, merecedor

do amparo legal”.63

Já a tempestividade, se refere à data em que foi produzido o documento

eletrônico.

63 GONÇALVES, Sérgio Ricardo Marques. Direito Eletrônico, p. 234.

58

Por fim, o documento eletrônico deve possuir a perenidade do seu conteúdo,

ou seja, a informação deve ser armazenada ao longo do tempo, podendo ser gravada

em cd rom ou disquete, por exemplo.

Concluímos que o documento eletrônico é válido, desde que seja elaborado

com segurança e utilize, por exemplo, a assinatura digital, a criptografia e a certificação

digital, que assegura a autenticidade, integridade e perenidade do documento

eletrônico.

No mesmo sentido, destacamos o pronunciamento de Ruy Rosado de

Aguiar, Ministro do Superior Tribunal de Justiça, que afirmou:

“O consumidor deve ter conhecimento de que existe um

sistema moderno, já adotado em outros países, denominado

criptografia. Só com ele é possível controlar a autenticidade e a

veracidade das informações contidas nas cláusulas do documento

eletrônico. Do contrário haverá sempre a possibilidade do negócio ser

desfeito, em função da impugnação da outra parte”. 64

No Brasil, a medida provisória n 2.200, de 28 de junho de 2001, instituiu a

Infra- Estrutura de Chaves Pública Brasileira (ICP- Brasil) e estabeleceu que o

documento eletrônico terá valor jurídico ao adquirir o certificado expedido pela empresa

de certificação, sendo importante destacar o Art.10, § 1° e § 2° do referido diploma

legal, que ditam, in verbis:

Art.10. §1° “As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica

produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil

presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do Código Civil”.

64 http://www.anoregbr.org.br.

59

Art 10. §2° “O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de

outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma

eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP- Brasil, desde

que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o

documento“.

c) A eficácia probatória dos documentos eletrônicos Neste item iremos abordar a eficácia probatória dos documentos eletrônicos,

destacando as normas previstas em nosso ordenamento jurídico referente ao tema.

O documento eletrônico pode ser utilizado como meio de prova de algum

fato, conforme o comando inserto no artigo 332 do Código de Processo Civil, que dita,

in verbis:

Art.332. “Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda

que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em

que se funda a ação ou a defesa”.

No Código Civil vigente, também há amparo legal previsto no artigo 225, que

dispõe, in verbis:

Art.225. “As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros

fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de

fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se à parte, contra quem forem exibidos,

não lhes impugnar a exatidão”.

60

Concluímos que o documento eletrônico pode ser utilizado como elemento

de prova pelas partes, pois o ordenamento jurídico brasileiro admite a sua utilização.

CAPÍTULO 5 – O CONTRATO ELETRÔNICO E AS RELAÇÕES DE CONSUMO

5.1 Conceito de consumidor, fornecedor e relação de consumo O Código de Defesa do consumidor tem como objeto à `relação de

consumo`, assim entendida a relação típica entre fornecedor e consumidor e, como

objeto típico, a aquisição de produtos ou utilização de serviços pelo consumidor como

destinatário final.65

O conceito de consumidor é estabelecido pelo Código de Defesa do

Consumidor, no artigo 2°, que dispõe, in verbis:

Art. 2° `Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza

produto ou serviço como destinatário final`.

65 MATTE, Mauricio. Internet.Comércio eletrônico, p.93.

61

Verifica-se que o conceito de consumidor é caracterizado pela destinação

que este dá ao bem ou produto adquirido e não pela quantidade ou valor deste. Dessa

forma, o consumidor é aquele que adquire o produto ou bem e não tem a intenção de

recolocar este no mercado, pois ele é o destinatário final.

Em regra, as normas consumeristas são aplicadas nos contratos firmados

entre o fornecedor e o consumidor não profissional, isto é aquele que atua para o

atendimento de uma atividade própria e não para desenvolver uma atividade negocial,

mas pode ser aplicada também no contrato celebrado entre o fornecedor e o

consumidor profissional se houver o desequilíbrio das partes, ou seja, a vulnerabilidade

do consumidor profissional.

O artigo 2°, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor dita, in

verbis:

Art.2°, parágrafo único.`Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas,

ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo`.

Assim são protegidos pelo Código de Consumidor o conjunto de

consumidores, a sua categoria.

No mesmo diploma legal, o artigo 17 estabelece, in verbis:

Art. 17.`Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas

as vítimas do evento` Entenda-se ´evento danoso` o gerado na responsabilidade por

acidente de consumo;

Portanto, há a proteção das vítimas que sofrem os acidentes de consumo,

estas podem pleitear indenizações decorrentes dos danos patrimonial e

62

extrapatrimonial sofridos. Esses terceiros são conhecidos no direito norte americano

como bystanders, são pessoas que, ainda não tendo utilizado ou adquirido o produto ou

serviço, são tuteladas em função do dever jurídico de fornecer produtos e serviços

seguros.66

Por fim, o artigo 29 do Código de Defesa do Consumidor, dispõe, in verbis:

Art.29 `Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos

consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele

previstas`.

Neste caso, são aplicadas as normas consumeristas aos sujeitos que foram

expostos á publicidade e a pratica comercial, situação em que não há o vínculo

contratual estabelecido entre o consumidor e o fornecedor.

O conceito de fornecedor está previsto no artigo 3° do Código de Defesa do

Consumidor, que estabelece, in verbis:

Art. 3° `Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada,

nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem

atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação,

exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços`.

Logo, são fornecedores todos aqueles que ofertam produtos ou serviços para

os consumidores.

66 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p. 129.

63

O produto também é conceituado pelo mesmo diploma legal, no artigo 3°,

parágrafo único, que dispõe, in verbis: é "qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou

imaterial".

Já a definição de serviço consta no artigo 3°, § 2º, que dita, in verbis:

"qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração,

inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as

decorrentes das relações de caráter trabalhista".

5.2 O contrato eletrônico e as relações de consumo Com o advento da Internet, os consumidores passaram a ter um acesso

irrestrito a bens e serviços, que são ofertados pelo meio eletrônico. Nesta forma de

contratação, os consumidores encontram-se mais expostos a riscos, pois não há

certeza da identificação das partes, não há a possibilidade de discussão das cláusulas

contratuais, o que pode acarretar muitas dúvidas no que se refere ao conteúdo do

contrato, que está sendo firmado entre as partes.

Assim, deve ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor sempre que o

contrato se referir a relações de consumo, seja este firmado em suporte cartáceo ou no

formato eletrônico.

Neste contexto, cabe destacar a norma prevista no artigo 47, do Código de

Defesa do Consumidor, que dita, in verbis:

Art.47. `As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais

favorável ao consumidor`.

64

O diploma legal em tela também prevê que são nulas as cláusulas

contratuais abusivas ao consumidor, tendo em vista o artigo 51.67

Conforme lição de Cláudia Lima Marques:

“Nos contratos de compra e venda celebrados no meio

eletrônico, os problemas mais freqüentes verificados pelos

consumidores são: a não entrega do bem ou a entrega do bem em um

endereço diverso do solicitado, taxas de correio ou de recebimento, que

não foram especificadas, o retardo na entrega, a falta de sanção pelo

retardo na entrega, a falta de garantia para o produto, à impossibilidade

de se executar o direito de arrependimento, as diferenças entre as

fotografias do site e os produtos recebidos, a compra involuntária ao

apertar o ícone e principalmente a falha na segurança com os dados do

consumidor, como por exemplo, o número do seu cartão de crédito”.68

Neste contexto, cabe destacar o caso abaixo, que tramitou na esfera judicial

brasileira e refere-se ao tema exposto.

O autor celebrou com a ré, um contrato de compra e venda eletrônico e

efetuou o pagamento por meio do seu cartão de crédito, recebendo a mercadoria na

data marcada, cumprindo todos os procedimentos exigidos no site.

Porém, ao acessar um site disponível de busca, e ao digitar seu nome,

visualizou todos os seus dados pessoais disponíveis, tais como endereço de e-mail,

endereço residencial completo e informações sobre a compra que havia efetuado.

67 “Artigo 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: “ 68 MARQUES, Cláudia Lima. Confiança no Comércio Eletrônico e a proteção do consumidor, p.207.

65

O autor verificou que após a compra on-line, houve um aumento no número

de ligações telefônicas recebidas de empresas de telemarketing, recebimento de mala

direta pelo correio de empresas desconhecidas, bem como mensagens em seu correio

eletrônico, tornando impossível a sua utilização, obrigando o autor a utilizar endereço

diverso daquele cadastrado junto à ré.

Desta forma, o autor ingressou com ação de indenização por dano moral, já

que houve negligência da ré com os seus dados pessoais, fato que causou danos a sua

segurança e privacidade, pois qualquer pessoa tinha acesso as suas informações.

A ré alegou não ter agido com culpa, pois foi vitima de um hacker, que teve

acesso a todos os dados armazenados, mas que tomou todas as providências para

sanar o problema e, além disso, afirmou que o autor não comprovou ter sofrido

qualquer dano.

A ação foi julgada procedente, com fundamento no artigo 269, I do Código de

Processo Civil, tendo em vista que o réu garantiu ao autor que haveria o sigilo das

informações ao efetuar a compra virtual, mas, houve a divulgação indevida, expondo o

autor e facilitando a ação de pessoas inescrupulosas, que poderiam usar seus dados

para realizar inúmeras operações ilícitas, criando expectativa e preocupação, possuindo

a ré responsabilidade objetiva, por força do artigo 14 do Código de Defesa do

Consumidor.69

69 “Art. 269. Haverá resolução de mérito: I- quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido do autor”. “Art 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.

66

Portanto, concluímos que o ordenamento jurídico brasileiro oferece proteção

legal aos contratos celebrados pelo meio eletrônico, aplicando nas lides decorrentes

deste, as normas previstas no Código de Defesa do Consumidor e no Código Civil.

5.3 A Publicidade e o marketing na Internet face o direito do consumidor Com a utilização crescente do meio eletrônico pelos consumidores, com o

objetivo de adquirir produtos ou serviços, foram criadas novas formas de publicidade e

marketing pelos fornecedores, como por exemplo, o envio de spams, a prática

denominada de metatags ou ainda o cybersquatting, práticas que nem sempre são

lícitas, tendo em vista o ordenamento jurídico pátrio.

No Código de Defesa do Consumidor, a publicidade efetuada obriga o

fornecedor e integra o contrato que vier a ser celebrado pelas partes, como se fosse

uma cláusula extra, não escrita, mas cujo cumprimento poderá ser exigido, inclusive

judicialmente, conforme o artigo 30, do mesmo diploma legal, que dispõe, in verbis:

Art.30. `Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada

por qualquer forma ou meio de comunicação, com relação a produtos e serviços

oferecidos ou apresentados, obrigam o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar

e integra o contrato que vier a ser celebrado`.

Para Guilherme Magalhães Martins:

“Ao igualar a publicidade suficientemente precisa à oferta, o

Código do Consumidor coloca o fornecedor que já veiculou a

publicidade no mesmo estado de sujeição à aceitação que já era

conhecido pelo próprio Código Civil, no caso da proposta contratual

67

aceita, não se contentando com a incidência na espécie das regras civis

sobre a proposta de contrato”.70

A publicidade consiste em toda atividade comercial destinada a estimular o

consumo de bens e serviços, distinguindo-se, porém, segundo a doutrina, da

propaganda, a qual visa obter a adesão a um sistema ou convicção ideológica, política,

social, econômica ou religiosa.71

Conforme o comando inserto no artigo 36 do Código de Defesa do

Consumidor, a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e

imediatamente a identifique como tal. 72

A primeira forma de publicidade utilizada no meio eletrônico a ser analisada é

o uso dos spams, que é a correspondência eletrônica enviada ao consumidor cujo

objeto é a publicidade de um fornecedor.

A licitude desta prática é objeto de divergências doutrinárias, pois para

alguns, seria uma invasão da privacidade do consumidor, tendo em visto a analogia

entre o computador do usuário e o seu domicilio. Para outros doutrinadores seria uma

prática lícita.

No Brasil, em recente decisão sobre o tema, o Juizado Especial de Campo

Grande, em Mato Grosso do Sul, entendeu ser lícito o envio dos spams ao compará-lo

com a correspondência postal que é encaminhada ao consumidor e que não requer

nenhuma autorização.

70 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p.171. 71 Ibidem, p.171 e 172. 72 “Artigo 36. A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal”.

68

Afirmou o magistrado em sua decisão ser `um contra-senso admitir-se que

alguém precisa de uma autorização para nos enviar uma correspondência. Na verdade,

o que se quer é ter mecanismos que reduzam a níveis mínimos o volume de `junk e-

mails (mensagens lixo) em nossas caixas postais eletrônicas. Portanto, não há o que

caracterizar em violação a intimidade, à vida privada, à honra`.

No mesmo sentido, pronuncia-se Armando Álvares Garcia Júnior que afirma:

“Enviar mensagens cujo conteúdo acoplado seja algum

anúncio ou propaganda de oferta pública de bens e/ou serviços não é

ilegal. Trata-se, até mesmo, de um direito assegurado pela Constituição

da República Federativa do Brasil. No entanto, o exercício desse direito

não deve descambar para uma prática abusiva. Se houver abuso,

deverá ser ele reparado. Sempre”.73

O ato abusivo mencionado pelo autor ocorre quando uma empresa ou

alguém envia dezenas ou mesmo centena de propagandas para cada destinatário,

como exemplo, pode citar a Cyber Promotions que enviou a American On Line (AOL)

1,8 milhão de mensagens eletrônicas diariamente.

Onde está o prejuízo? Simples. Se imaginarmos que um internauta demore

15 segundos para detectar a mensagem recebida, verificar sumariamente do que se

trata seu conteúdo e “deletá-la”de sua caixa postal, podemos também imaginar os

gastos de recursos da rede na hipótese absolutamente verídica de milhares ou milhões

de internautas cadastrados em uma Empresa de Acesso à Internet.74

73 GARCIA, Armando Álvares Junior. Contratos via Internet, p. 89 e 90. 74 74 GARCIA, Armando Álvares Junior. Contratos via Internet, p. 89.

69

Neste caso, verifica-se que a rede pode parar ou tornar-se extremamente

lenta, somente para encaminhar o número excessivo de spams.

Nos Estados Unidos, a prática é proibida, sendo aplicada multa a todos que

enviam mensagens não solicitadas.

A União Européia, por meio da Diretiva 97/7/CE estipulou que: `A publicidade

por correio eletrônico não solicitado deve ser identificável como tal de maneira clara e

não equívoca desde sua recepção pelo destinatário`.

Também é imposto um dever de identificação de que se trata de uma

mensagem comercial, para que o consumidor tenha ciência disso antes mesmo de abri-

la. O desrespeito a estas normas dá azo à indenização.75

Outra técnica de publicidade e propaganda utilizada por empresas no meio

eletrônico é chamada de metatags, esta prática constitui-se na associação das páginas

de determinado fornecedor a palavras que geralmente são procuradas pelo usuário da

rede nos buscadores eletrônicos, ou seja, toda vez que o usuário digitar determinada

palavra no buscador, encontrará o site do fornecedor, mesmo que este não possua

relação com a palavra buscada.

Esta prática é proibida, pois se caracteriza como propaganda enganosa,

tendo em vista o artigo 37, do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe, in verbis:

Art.37.”É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de

caráter publicitário, inteira ou parcialmente falso, ou, por qualquer outro modo, mesmo

por omissão, capaz de induzir a erro o consumidor a respeito da natureza,

75 MARQUES, Cláudia Lima. Confiança no Comércio eletrônico e a proteção do consumidor, p. 169.

70

características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros

dados sobre produtos e serviços”.

Cabe ressaltar ainda a prática abusiva que é efetuada no meio eletrônico

chamada de cybersquatting, na qual o fornecedor utiliza-se de nomes semelhantes a

marcas famosas, levando o consumidor a erro.

Os nomes possuem pequenas variações em relação às marcas originais,

sendo geralmente representadas pelos erros de digitação mais comuns.

O cybersquatting prejudica o consumidor e o fornecedor, tendo em vista a

concorrência desleal.

Nos Estados Unidos, foi criado em novembro de 1999, o Anticybersquatting

Consumer Protection Act, que busca evitar esta prática abusiva, facilitando aos

consumidores a identificação do fornecedor.

No Brasil, ainda são poucos os casos que debatem a prática do

cybersquatting.

Por fim, devemos mencionar a chamada publicidade proibida ou restritiva.

Muitos países, inclusive o Brasil, possuem regras sobre restrições a publicidade de

profissões (por exemplo, médicos, farmacêuticos, odontólogos, contadores etc), de

produtos (por exemplo, medicamentos, bebidas alcoólicas, cigarros etc) e de serviços

(por exemplo, a lei grega sobre publicidade de serviços “sexuais” na televisão). 76

76 MARQUES, Cláudia Lima. Confiança no Comércio eletrônico e a proteção do consumidor, p. 173.

71

5.4 Deveres do Fornecedor no ambiente eletrônico O principal dever do fornecedor ao efetuar os contratos no ambiente

eletrônico é passar as informações corretas, claras e precisas ao consumidor,

principalmente no que se refere ao objeto do contrato e o cumprimento deste, tendo em

vista as normas consumeristas. Isto porque na contratação à distância, o consumidor

não tem acesso ao objeto do contrato firmado entre as partes, somente possui as

informações transmitidas pelo fornecedor, por isso é fundamental que as informações

sobre o produto sejam verídicas e que estejam em linguagem acessível ao consumidor,

pois são estes elementos que geram a confiança nos consumidores em celebrarem

contratos por meio da Internet.

Para Cláudia Lira Marques:

“Alcançar maior transparência nas condições gerais

contratuais e nas informações sobre preços parece ser o grande

desafio do comércio eletrônico hoje”.77

O consumidor ao visitar o site do fornecedor, deve ser informado sobre todas

etapas da contratação, que será realizada no meio eletrônico, não podendo ocorrer

nenhuma prática contratual abusiva, como por exemplo, os cookies, que consiste no

envio de um programa escondido ao computador do consumidor, que terá como função

ler os dados deste computador e monitorar as compras que estão sendo realizadas.

O fornecedor deve agir conforme o princípio da boa-fé, ou seja, não deve se

aproveitar do erro do consumidor, como por exemplo, um click efetuado em um local

errado ou manipular a declaração de vontade deste.

77 MARQUES, Cláudia Lima. Confiança no Comércio eletrônico e a proteção do consumidor, p. 141.

72

O fornecedor deve elaborar o seu site, conforme as normas previstas no

Código de Defesa do Consumidor e deve encaminhar ao consumidor uma mensagem

informando sobre a conclusão do contrato, para que este documento seja impresso e

arquivado pelo consumidor.

O comando inserto no artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor

determina, in verbis:

Art.31.”A oferta e a apresentação de produtos ou serviços devem assegurar

informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas

características, qualidade, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade

e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e

segurança dos consumidores”.

Cabe destacar que o mesmo diploma legal considera como propaganda

enganosa por omissão, aquela que deixar de informar algum dado que seja essencial

no produto ou serviço, conforme o artigo 37, § 3°.78

Infelizmente, a maioria dos sites brasileiros não apresentam todas as

informações exigidas pelo ordenamento jurídico, fato que leva muitos consumidores ao

erro, mas muitos problemas podem ser evitados, se o consumidor seguir os

procedimentos mencionados abaixo, conforme ensina Sérgio Ricardo Marques

Gonçalves:79

- Saber para quem se está passando as informações. Este cuidado deve ser utilizado tanto nas compras realizado pelo meio eletrônico como nos estabelecimentos comerciais tradicionais. Na contratação pela Internet, o consumidor deve conferir se o browser contém o símbolo do cadeado ou chave, pois

78 “Art.37, § 3°. Para efeitos deste Código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço”. 79 GONÇALVES, Sérgio Ricardo Marques. A Internet e os Tribunais, p.240.

73

este símbolo representa que a loja virtual trabalha com um servidor com certificado de segurança; - O consumidor pode conferir os dados da empresa, com a qual está contratando

no meio eletrônico, basta fazer uma consulta ao site www.registro.br, em que o Comitê Gestor Internet do Brasil disponibiliza para cadastro de domínios. Por meio do endereço da página acessada, o consumidor pode saber, por exemplo, os dados completos da pessoa que registrou o domínio da página acessada, o CGC da empresa responsável e até o seu endereço;

- O consumidor deve oferecer o mínimo de informações para efetuar uma

transação on-line, apenas o seu nome, endereço para faturamento e entrega, telefone, e-mail, tipo de cartão de crédito, conta-corrente e data de vencimento, mas se for solicitado o número da sua identidade ou outros dados já citados acima, deve ficar atento e ter cautela;

- O consumidor deve utilizar apenas um cartão de crédito para efetuar suas

compras on line, isto porque irá facilitar a conferência do extrato mensal do cartão de crédito. Caso haja algum item que não esteja claro para o consumidor, este deve procurar imediatamente a companhia do cartão de crédito e solicitar um estorno do valor.

5.5 O contrato eletrônico e o direito de recesso

O consumidor ao realizar a compra pela Internet, somente pode consultar as

características do objeto do contrato, tais como a sua função, forma, cor e tamanho, no

site do fornecedor ou por e-mail.

Portanto, trata-se de uma contratação à distância, em que o consumidor

somente verifica se o produto adquirido satisfaz as suas necessidades, após a sua

entrega. Logo, há o risco do produto demonstrado pela Internet não se adequar as

necessidades do consumidor, nesse caso, o consumidor poderá devolver o bem

adquirido, tendo em vista o comando inserto no artigo 49 do Código de Defesa do

Consumidor, que dispõe, in verbis:

74

Art. 49. “O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 07 (sete) dias a

contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a

contratação de fornecimentos de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento

comercial, especialmente por telefone ou a domicílio”.

O direito de recesso é concedido aos consumidores que celebram contratos

à distância, ou seja, via telefone ou por catálogo ou pela Internet, pois o consumidor

não teve o contato com o produto e conseqüentemente tem menos condição de avaliar

o produto que está contratando.

Neste contexto, é importante destacar a lição do professor Nelson Nery

Junior, que afirma:

”A determinação do que seja venda fora do estabelecimento

comercial, sujeita a prazo de arrependimento, decorre do caso

concreto, de modo que, se for dos usos e costumes entre as partes a

celebração do contrato à distância, não há que se falar em

arrependimento; tendo o consumidor relações contínuas com dado

fornecedor, que lhe vende, por exemplo, material de escritório, e o faz

por telefone, já negociando há bastante tempo, sem reclamações, já

sabendo o fornecedor qual a exigência e a preferência do consumidor,

o contrato de consumo se dá nas mesmas bases que os anteriores, não

se podendo falar naquela possibilidade de retratação (a menos que

mudem as condições do contrato, quanto à prestação, preço e demais

especificações)”. 80

80 NERY, Nelson Junior. Código de Defesa do Consumidor, p.70 e 71.

75

Segundo a Consumers International somente 53 % dos sites possuem,

alguma política de devolução de produto e apenas 32% destes, alguma informação

para o consumidor sobre como exercitar este direito.81

O exercício do direito de recesso, também chamado direito de

arrependimento não pode se sujeitar a qualquer formalidade, não podendo implicar,

para o consumidor, qualquer tipo de penalidade, devendo o mesmo tão-somente

suportar os gastos da devolução.82

O prazo estabelecido no Código de Defesa do Consumidor é de sete dias a

contar da assinatura digital, se houver ou do ato de recebimento do produto ou serviço,

para que o contrato seja desfeito.

O consumidor pode enviar um e-mail ao fornecedor ou efetuar um

telefonema, caso possua os dados, desde que no prazo de sete dias.

Neste sentido, destacamos a lição de Cláudia Lima Marques

“Um grande problema, em matéria de exercício de direito de

arrependimento em meio tão fluido como o meio eletrônico, é a prova –

pelo consumidor- de que este se realizou. A jurisprudência brasileira

tem aceitado, neste caso, qualquer telefonema ou alegação sobre o

envio de e-mail, e invertendo o ônus da prova”. 83

O direito de arrependimento é também contemplado pela Diretiva Européia

n° 97-7, que prevê o prazo de sete dias úteis para o arrependimento do consumidor, a

81 MARQUES, Claudia Lima.Confiança no Comércio eletrônico e a proteção do consumidor, p. 278. 82 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p.190. 83 MARQUES, Claudia Lima.Confiança no Comércio eletrônico e a proteção do consumidor, p. 278.

76 partir da prestação do serviço ou entrega da coisa. Mas caso haja o descumprimento

pelo fornecedor dos deveres de informação, o prazo para a rescisão do contrato passa

a ser de três meses.

A Diretiva mencionada, porém estabelece alguns casos em que o direito de

arrependimento não pode ser utilizado, como por exemplo, os contratos relativos a

serviço financeiro, contratos concluídos por meio de distribuidor automático ou local

comercial automatizado, contrato concluído com o operador de telecomunicação

empregando telefone público.

Efetuado a rescisão do contrato, o fornecedor deve devolver os valores

recebidos, sem incidência de qualquer prestação suplementar.

5.6 Os contratos de adesão, celebrados no meio eletrônico Em primeiro lugar cabe esclarecer que o contrato de adesão é uma técnica

de formação de contrato e não um tipo contratual, podendo assim ser aplicado em

qualquer categoria de contrato.

O Código de Defesa do Consumidor define os contratos de adesão no artigo

54, que dispõe, in verbis:

Art.54. “Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas

pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de

produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar

substancialmente seu conteúdo”.

77

O contrato de adesão atualmente é muito utilizado tanto no suporte cartáceo

como no meio eletrônico, principalmente nos contratos de massa, isto porque ele possui

a vantagem da rapidez em sua formação.

No contrato de adesão cabe ao oblato apenas aceitar ou recusar firmar o

contrato com o proponente, isto porque não há a fase negocial, ou seja, não há a

possibilidade de discussão das cláusulas do contrato.

No meio eletrônico, os contratos de adesão são formados pelo simples

preenchimento de um formulário com os dados do oblato e com a sua aceitação, que

geralmente é feita com o click do mouse em um botão aceitar, esta técnica é conhecida

como clickwrap agreements ou point-and-click agreements.

Nos contratos de adesão celebrados pelo meio eletrônico, o fornecedor deve

ter duas precauções, que seguem: O consumidor deve visualizar as cláusulas

contratuais, antes de aceitar realizar o negócio. Assim, o botão de aceito deve estar

após as cláusulas contratuais, obrigando o consumidor a acionar a barra de rolagem

até este ponto.

Em segundo lugar, o fornecedor deve destacar todas as cláusulas que

restrinjam os direitos dos consumidores, tendo em vista o comando inserto no artigo 54,

§ 4°, do Código de Defesa do Consumidor.84

O contrato de adesão se caracteriza por ser uniforme, ou seja, todos os

consumidores que adquirirem o serviço ou produto estarão submetidos às mesmas

regras contratuais.

84 “Art.54 § 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão”.

78

Por um outro lado, o contrato de adesão facilita a inclusão de cláusulas

abusivas, de modo a assegurar vantagens unilaterais e excessivas para o fornecedor

que se vale de tal meio de contratação.85

Mas, o Código Civil vigente estabelece algumas normas a serem

respeitadas, quando houver a celebração de um contrato de adesão, cabendo destacar

os artigos 423 e 424, que ditam, in verbis:

Art.423.”Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou

contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente”.

Art.424. “Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a

renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio”.

Assim, as cláusulas ambíguas ou contraditórias serão interpretadas de modo

a favorecer o consumidor, pois este está em uma situação menos vantajosa que o

proponente, pois somente aceitou as cláusulas que estavam impostas, para adquirir um

produto ou a prestação de um serviço.

Em relação ao artigo 424 do Código Civil, cabe mencionar a lição da

professora Maria Helena Diniz, que afirma:

“As cláusulas contidas em contrato de adesão, que venham

a estipular renúncia antecipada do aderente a direito que advenha da

própria natureza do negócio, serão consideradas nulas, pois a liberdade

de contratar deverá ser exercida dentro dos princípios da função social

do contrato, da probidade e da boa-fé; tais cláusulas, além de serem

85 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p.136.

79

abusivas ou leoninas, geram insegurança e quebram o equilíbrio

contratual”. 86

Concluímos que os contratos de adesão podem ser utilizados no meio

eletrônico, mas devem ser elaborados conforme as normas previstas no Código Civil e

no Código de Defesa do Consumidor, sob pena de serem consideradas nulas as

cláusulas abusivas, além de serem interpretadas sempre a favor do consumidor as

cláusulas contraditórias ou ambíguas.

86 DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado, p. 408.

80

CAPÍTULO 6 – AS MODALIDADES DE CONTRATO ELETRÔNICO

Conforme já mencionado nos capítulos anteriores, nos contratos eletrônicos

as partes utilizam a rede mundial de computadores, a Internet, para criar e modificar

direitos e obrigações. Entretanto, é certo que a Internet reflete apenas uma das formas

da contratação eletrônica, não excluindo outras tecnologias.

Dos instrumentos utilizados, aqueles que têm maior importância ao comércio

eletrônico seriam, sem dúvida alguma, a Internet e o EDI (eletronic data interchange),

haja vista potencializarem as contratações eletrônicas, em especial por representarem

enormes benefícios à contratação, eliminando papéis, diminuindo o tempo das

operações, agilizando pedidos, ampliando mercados e negócios.87

A contratação eletrônica pode ser subdividida em três categorias principais,

as quais: os contratos interpessoais, interativos e intersistêmicos.88

87 JUNQUEIRA, Miriam. Contratos Eletrônicos, p.63. 88 SANTOS, Manoel J. Pereira dos e ROSSI, Mariza Delapieve. Aspectos legais do comércio eletrônico- contratos de adesão, p.105.

81

6.1 Contratos Interpessoais

Os contratos interpessoais são os formados pelo e-mail (eletronic mail),

correspondência eletrônica, que permite ao próprio usuário emitir a sua declaração de

vontade por meio da elaboração da oferta ou aceitação, com seu respectivo envio pelos

meios eletrônicos. Assemelhá-se ao contrato firmado por meio de correspondência,

diferenciando-se quanto ao suporte físico.

Na realidade, os e-mails são cartas virtuais digitadas no computador, e

remetidas através de um programa próprio.89

A oferta e a aceitação podem ser realizadas integralmente por e-mail ou

pode ser combinado com um fax ou discussões verbais.

6.2 Contratos Interativos

As contratações interativas são decorrentes da relação estabelecida entre a

parte contratante e um sistema aplicativo, como um programa de computador.

No direito comparado, são conhecidos como click-throught agreements. São

assim designados, haja vista seus termos serem aceitos através da confirmação digital

na tela do monitor do computador, no mais das vezes utilizando o mouse. Em muitos

casos o operador do web site oferece as mercadorias ou serviços para venda, e o

consumidor adquire completando e transmitindo uma ordem de compra disposta na tela

89 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p. 97.

82

do computador. A partir do momento em que se configura a aceitação, o contrato

considera-se formado. Os produtos e serviços podem ser entregues fisicamente, o

melhor off-line.90

As contratações interativas podem ser comparadas aos contratos de adesão,

pois o contratante não tem a possibilidade de discutir as cláusulas contratuais, apenas

aceita-las ou não.

Nessa esteira, Erica Brandini Barbagalo afirma:

“Os contratos celebrados via Web são, com raras exceções,

caracterizados pela apresentação de cláusulas preestabelecidas pelo

titular do Web site, unilateralmente, sem possibilidade de alteração

dessas cláusulas, pela outra parte, cabendo-lhe apenas aceitar ou

rejeitar as disposições preconcebidas, e em as aceitando, fornecer

informações que faltem, geralmente concernentes à identificação da

própria parte e à especificação do objeto”.91

Verifica-se que não há qualquer espécie de negociação entre as partes,

nesta espécie de contratação.

6.3 Contratos Intersistêmicos

Já as contratações intersistêmicas ocorrem quando o vínculo contratual é

formado por dois sistemas aplicativos previamente programados, que estão em uma

rede fechada, em que o acesso é restrito, sendo necessário uma habilitação prévia e

90 Ibidem, p. 103. 91 BARBAGALO, Erica Brandini. Contratos eletrônicos, p.56.

83

específica. Esta técnica é chamada de EDI, ou seja, intercâmbio eletrônico de dados e

pode ser utilizado tanto no setor público como no privado.

O EDI surgiu há mais de vinte anos e importou em prática utilizada por

empresas para automatizar certas transações comerciais, financeiras e contábeis,

dispensando a figura humana e adquirindo maior rapidez e simplificação de

procedimentos.92

Portanto, dois ou mais computadores previamente estabelecidos comunicam-

se e realizam contratações eletrônicas, como por exemplo, uma reposição de estoque

em uma empresa.

Assim, a natureza das informações que circulam por EDI é essencialmente a

mesma das que até hoje se têm transmitido através do papel. Entre elas, podemos

citar: ordens de compra; notificação de recebimento de ordens de compra; informação

sobre rejeição ou aceitação da ordem; notas de despacho de mercadorias; faturas e

borderôs; memorandos de créditos e débitos, informação sobre o recebimento de

mercadorias; anúncios de promoções; informações sobre pagamentos; pedidos e

respostas de cotações de preços; localização de carregamento em trânsito;

transferências de fundos.93

A EDI foi incorporada por diversos diplomas legais, como: o Modelo Europeu

para contratos realizado por meio de troca eletrônica de dados, aprovado pela

Comissão Européia de 19 de outubro de 1994; a da Câmara de Comércio Internacional

celebrada em Paris, na 51 sessão de 22 de setembro de 1987, que aprovou as regras

de conduta para o intercâmbio eletrônico de dados, conhecidos como regras UNCID; a

92 SANTOS, Manoel J. Pereira dos e ROSSI, Mariza Delapieve. Aspectos legais do comércio eletrônico- contratos de adesão, p.105 93 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.102.

84

UNCITRAL, aprovou em 14 de junho de 1996 um guia para incorporação da Lei Modelo

sobre os aspectos jurídicos do intercâmbio eletrônico de dados e outros meio similares

de comunicação e também o Model Trading Partner Agreement da American Bar

Association (Estados Unidos). O Brasil ainda não possui um instrumento jurídico que

disponha sobre o EDI.

Conclui-se que este sistema permite operar em grande velocidade de

comunicação entre lugares distantes, diminuindo drasticamente os custos

administrativos porque as decisões são automatizadas, melhorando o controle e a

auditoria.94

6.4 Leilão Virtual ou Pregão Eletrônico

Podemos mencionar também como modalidade de contrato eletrônico, o

leilão virtual, no qual encontram-se diversos objetos à venda no site e os interessados

efetuam lances sucessivos, cada um superando o valor proposto anteriormente.

Portanto, os leilões representam uma venda pública, que se perfazem

mediante a realização de pregão aonde a parte interessada que vier a oferecer um

preço maior levará o bem disputado.95

O leilão possui duas modalidades: o judicial, que ocorre por meio de uma

ordem emitida pelo Poder Judiciário para a venda de produtos que se encontrem sob a

administração da justiça ou o particular, que é realizado pelas pessoas que desejam

vender algum bem de sua propriedade.

94 Ibidem, p.103. 95 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.98.

85

O leilão virtual pode ser utilizado tanto no âmbito privado como no público,

como exemplo, podemos mencionar o pregão eletrônico utilizado nas licitações

públicas.

Tendo em vista a utilização do leilão eletrônico no âmbito público, faz-se

necessário mencionar que o artigo 687, § 2° do Código de Processo Civil, autoriza o

juiz a alterar a forma de divulgação do leilão, desde que assegure à hasta pública uma

divulgação mais ampla do que a que resultaria da publicação pela Imprensa.96

Há grande diferença entre o leilão virtual e o leilão, realizado de forma

tradicional. A celebração de um leilão ocorre por meio de um leiloeiro oficial

regularmente matriculado na Junta Comercial, nos moldes da legislação em vigor e

conforme as regras que disciplina essa profissão. Somente poderá ser feito ao vivo e

em data preliminarmente declarada, diante do público e seus interessados. É o leiloeiro

que avalia a origem, qualidade e autenticidade do produto, sendo avalista daquele bem.

Já no leilão eletrônico não se faz necessário à figura do leiloeiro, pois o acesso aos

produtos é aberto a qualquer pessoa e este também não preenche os requisitos

necessários para que seja considerado um leilão oficial, como por exemplo, a

publicação de editais com prazo de antecedência mínima, em todas as praças em que

o leilão ocorrer. Considerando a Internet, a opção ou é por um veículo de mídia

nacional, com cobertura sobre todo o território, ou por um edital on-line publicado na

Internet nos locais de maior acesso de usuários, sendo que um não restringe o outro.97

96 “Art. 687, § 2°. Atendendo ao valor dos bens e às condições da comarca, o juiz poderá alterar a forma e a frequência da publicidade na imprensa, mandar divulgar avisos em emissora local e adotar outras providências tendentes à mais ampla publicidade da alienação”. 97 PECK, Patrícia. Direito Digital, p.100.

86

Conclui-se que o leilão virtual é um site, disponível ao público, no qual

possibilita-se a venda e a aquisição de produtos, sendo o seu objetivo colocar os

agentes interessados em contato.

Segundo Patrícia Peck:

“O leilão virtual pode ser classificado em: (1) Preço Mínimo/

Maior Oferta; (2) Sem Preço Mínimo/ Maior Oferta; (3) Oferta pelo

Comprador; (4) B2B; (5) C2C.98

O Preço Mínimo/Maior Oferta é a modalidade mais próxima do conceito

jurídico de leilão, nesta o vendedor e o comprador interagem diretamente por meio do

site, ou seja, não há a presença do leiloeiro.

Alguns sites cobram comissão por disponibilizar essa interface; outros

preferem lucrar apenas com o volume de visitas a suas páginas, tirando seu

faturamento de eventuais anunciantes. Neste último caso, o site se assemelha mais a

uma vitrina de anúncios classificados, não pesando sobre a empresa nenhuma

responsabilidade quanto à qualidade dos produtos transacionados. 99

Mas, se o site cobrar uma comissão pela venda dos produtos que estão

disponibilizados em sua página, há responsabilidade deste face ao comprador, pois ele

age como um leiloeiro, devendo então avalizar os produtos que estão sendo

negociados.

Neste sentido, cabe destacar a lição de Jorge José Lawand:

98 Ibidem, mesma página. 99 Ibidem, mesma página.

87

“O adquirente de algum bem leiloado, na qualidade de

consumidor poderá fazer uso do Código de Defesa do Consumidor,

quanto a problemas surgidos na prestação dos serviços efetuados pelo

leiloeiro, e, ainda pela ausência de informação. Podemos vislumbrar

várias hipóteses, onde incidirá necessariamente a legislação do

consumidor, dentre as quais: cobrança pela intermediação da venda, na

fase da exposição, controle e recebimento do lance, onde a

responsabilidade estará caracterizada pela prestação de serviço

deficiente, informações imprecisas, desprovidas de clareza e

incompletas com relação aos riscos e condições inerentes a este tipo

de comercialização, bem como quanto à qualidade do serviço e, por

último, quando relegar o cumprimento da oferta imbuída na

publicidade”.100

Analisando a segunda forma do leilão eletrônica, Sem Preço Mínimo/Maior

Oferta, esta é utilizada para a oferta de produtos diferenciados ou exclusivos, como

uma peça de arte ou peças de colecionadores.

Em relação à oferta pelo comprador, mais conhecida como leilão reverso, os

vendedores passam a disputar o preço do comprador. É muito semelhante a um

pregão, em que o desejo de compra passa a ser negociado como uma commodity.101

A modalidade de leilão B2B é utilizada entre empresas, principalmente para

a venda de estoque de mercadorias. Neste caso, não incide as normas do Código de

Defesa do Consumidor.

100 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.99. 101 PECK, Patrícia. Direito Digital, p.102.

88

Já o leilão C2C, é a modalidade realizada diretamente entre os

consumidores nas duas pontas. Logo, o site não se responsabiliza pelo produto vendido

ou por sua entrega. É apenas uma transação entre os consumidores. Mas, se o site

cobrar uma comissão pela venda, assumirá as responsabilidades conforme as normas

consumeristas.102

Por fim, cabe ressaltar que quando o estoque é próprio ou, como costuma se

chamar inhouse, o site do leilão passa a ser considerado legalmente como revendedor,

assumindo responsabilidade objetiva perante os consumidores.

CONCLUSÃO

Com o avanço das novas tecnologias, principalmente da Internet, houve uma

grande transformação do nosso cotidiano, pois simples atos como realizar uma

transferência bancária, comprar um produto ou pesquisar um bom livro, passaram a ser

realizados de forma mais ágil, eficaz e com o menor custo. Esta transformação também

ocorreu no mundo corporativo, com o surgimento dos contratos eletrônicos.

102 PECK, Patrícia. Direito Digital, p.102.

89

O contrato eletrônico não é uma nova figura contratual, mas apenas uma

novo meio de realizar um negócio, podendo ser utilizado em todos os contratos, como

por exemplo, contrato de compra e venda, contrato de locação. A única restrição ao seu

uso ocorre quando a lei exigir uma forma específica ao contrato, que não seja a forma

eletrônica. Portanto, podemos conceituar o contrato eletrônico como o negócio jurídico

firmado pelas partes, através do meio eletrônico, com o objetivo de adquirir, modificar

ou extinguir direitos e obrigações.

O contrato eletrônico é admitido pelo ordenamento jurídico brasileiro, tendo

em vista o princípio da liberdade das formas, previsto no artigo 107 do Código Civil

vigente, mas surge uma questão a ser debatida: este possui validade jurídica, da

mesma forma que o contrato em suporte cartáceo?

O contrato eletrônico possui validade jurídica e pode ser mais seguro que o

contrato realizado em suporte cartáceo, desde que possua os seguintes requisitos:

autenticidade, integridade e perenidade do documento.

A autenticidade se refere à identificação das partes contratantes e conforme

verificamos no decorrer deste trabalho, a forma mais segura para se verificar se a parte

é realmente o seu titular ou seu fraudador é a criptografia, pois este sistema permite

que a mensagem enviada pela parte, ou seja, o texto literal seja transformado em um

conjunto de caracteres e somente será decifrado se a outra parte possuir a chave.

Em relação à integridade do contrato eletrônico, esta consiste na segurança

do contrato, ou seja, que o seu conteúdo não será alterado. Assim, o contrato deve

possuir a assinatura digital das partes, pois a sua função é conservar o conteúdo do

contrato. Logo, com a assinatura digital as partes possuem a certeza de que o conteúdo

90 não será modificado e caso isso ocorra, a assinatura digital por meio da criptografia

identificará a parte que alterou o contrato e quando esta alteração foi efetuada.

Atualmente, a assinatura digital no Brasil é regulamentada pela Medida

Provisória n°2.200-2, de 24 de agosto de 2001, que criou o ICP-Brasil, ou seja, a Infra-

Estrutura Brasileira, que tem como função gerenciar o sistema de assinatura digital, isto

é, coordenar, fiscalizar a atividade das empresas de certificação digital. Assim, se o

contrato eletrônico possuir certificação de uma empresa não integrante do ICP-Brasil,

este será válido perante as partes, mas não em face de terceiros.

O último requisito necessário à validade do contrato eletrônico, é a

perenidade, isto é, a informação deve ser armazenada ao longo do tempo, podendo ser

gravada em um cd rom, por exemplo, ou um disquete.

Outra questão debatida na doutrina referente ao tema estudado consiste em

saber se o contrato eletrônico pode ser considerado como uma prova de algum fato?

Tendo em vista o Código de Processo Civil, que admite como prova todos os meios

legais, concluímos que não há nenhum óbice na sua utilização.

Por fim, cabe esclarecer que são aplicados aos contratos eletrônicos as

normas do Código Civil, do Código de Defesa do Consumidor, quando a relação for de

consumo e as normas do Código de Processo Civil.

ANEXOS - Legislação Estrangeira referente à documentação eletrônica

a) UNCITRAL

91

A ONU (Organização das Nações Unidas), por meio da comissão

denominada de UNCITRAL (Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial

Internacional) propôs um conjunto de regras, que foi chamada de lei Modelo da

UNCITRAL.

A lei modelo tem como objetivo garantir a validade dos documentos

formados eletronicamente e também definir os pressupostos da mensagem eletrônica.

O artigo 1° da lei modelo determina o âmbito de sua aplicação, ao dispor, in

verbis:

Art. 1° ”Esta Lei se aplica a qualquer tipo de informação na forma da

mensagem eletrônica usada no contexto de atividades comerciais”.

Verifica-se que a lei modelo da UNCITRAL tem caráter de

supranacionalidade, ou seja, deve ser aplicada sempre que envolver atos de natureza

comercial, contratuais ou não, como por exemplo, no caso do factoring, leasing ou

qualquer transação de bens ou serviços, atividades bancárias etc.

Mas a lei modelo não deve ser aplicada quando houver normas

consumeristas referente ao assunto, pois a nota 2 referente ao primeiro artigo da lei

dita, in verbis:

“Esta lei não se sobrepõe a nenhuma regra legal que se destine à proteção

do consumidor”.

92

A lei modelo concede aos legisladores a oportunidade de utilizar a lei

nacional e a internacional, esta é como um parâmetro a ser seguido pelos países ao

elaborarem a sua legislação referente à documentação eletrônica.

No mesmo sentido, cabe destacar a lição de Jorge José Lawand:

“A principal legislação de âmbito internacional a respeito

deste segmento é a Lei Modelo sobre comércio eletrônico da

UNCITRAL, que pode ser aplicada por todos os países que pretendam

adotar normas jurídicas referentes ao comércio eletrônico, e assim,

regulamentar os procedimentos no tocante aos contratos, sua

formação, prova, propostas e demais elementos que se fizerem

necessários em prol do princípio da segurança jurídica que deve nortear

todas as relações jurídicas”. 103

A resolução n°.51/162 da Assembléia Geral das Nações Unidas de 16 de

dezembro de 1996, publicada em Nova York em 1997, recomenda que todos os

Estados considerem de maneira favorável a Lei Modelo quando promulgarem ou

revisarem suas leis, tendo em conta a necessidade de promover a uniformidade do

direito aplicável aos métodos de comunicação e armazenamento de informações

substitutivos dos que utilizam papel, além disto, vem sendo verificada uma revisão dos

conceitos jurídicos basilares, haja vista que o comércio eletrônico de alta velocidade

requeira um novo exame das questões contratuais básicas como a oferta e a

aceitação.104

A lei modelo divide-se em duas partes: na primeira regulamenta o comércio

eletrônico e na segunda disciplina a sua utilização em áreas da atividade mercantil.

103 LAWAND, Jorge José. Teoria Geral dos Contratos Eletrônicos, p.66. 104 Ibidem, p.67.

93

Por fim, verifica-se que a lei em tela é uma norma aberta, a qual será

complementada face às inovações tecnológicas.

b) CEE

A União Européia editou a Diretiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do

Conselho, que regula as seguintes matérias: o regime do estabelecimento e de

informação; as comunicações comerciais; os contratos celebrados por meios

eletrônicos; a responsabilidade dos prestadores intermediários de serviços e as formas

de aplicação da legislação comunitária.

Cabe destacar o artigo 4° da Diretiva mencionada, que estabelece que o

prestador de serviços da sociedade da informação não necessita de qualquer

autorização prévia ou qualquer outro requisito de efeito equivalente, exceto no caso das

profissões regulamentadas.

Por fim, a diretiva preocupa-se em garantir o reconhecimento da validade

das mensagens e dos contratos formados pela Internet, exceto nos casos em que os

Estados-membros podem exigir que o contrato seja celebrado em sua forma tradicional,

que são: os contratos que criem ou transfiram direitos sobre bens imóveis, a exceção

de direitos de arrendamento; os contratos que exijam por lei a intervenção de tribunais,

entidades públicas ou profissões que exercem poderes públicos; os contratos de

caução e garantias prestadas por pessoas que agem para fins exteriores à sua

atividade comercial, empresarial ou profissional e os contratos regidos pelo direito de

família ou sucessório.

94

Verifica-se que o objetivo da Diretiva 2000/31/CE é garantir a livre circulação

dos serviços gerados pela Internet entre os Estados-membros.

c) Argentina

O Decreto n° 427/98, de 16 de abril de 1998, editado pelo Poder Executivo,

foi o marco inicial para o reconhecimento da assinatura eletrônica no País, apesar

de ser restrito o âmbito de sua atuação, pois somente era utilizada nos atos do Setor

Público Nacional, ou seja, na Administração centralizada, nas empresas do Estado,

nas sociedades do Estado, nas sociedades anônimas com participação estatal

majoritária, nos bancos e entidades financeiras oficiais e em qualquer outro ente,

desde que o Estado Nacional tivesse participação suficiente para a formação de

suas decisões.

Em 18 de agosto de 1999 foi apresentado ao Congresso Nacional o

anteprojeto de lei referente à assinatura digital, o qual pretendia ampliar o âmbito da

utilização da assinatura digital.

Este anteprojeto transformou-se na Lei 25.206, que foi publicada em 11 de

dezembro de 2001.

A lei em questão afirma que o seu objetivo é o emprego da assinatura digital

dentro do princípio da liberdade de formas, mas opta pelo sistema de criptografia,

seguindo os padrões internacionais, conforme se verifica no artigo 2°, in verbis:

“Art.2°. Assinatura Digital. A assinatura digital é o resultado da transformação

de um documento digital por meio de uma função de código seguro de mensagem, este

último encriptado com a chave privada do subscritor, de forma tal que a pessoa que

95 possua o documento digital inicial, o código encriptado e a chave pública do subscritor

possa determinar, com certeza, que a transformação foi realizada utilizando a chave

privada correspondente à dita chamada chave pública e que o documento digital não

tenha sido modificado desde que se efetuou a transformação.

No procedimento da assinatura digital intervêem:

a) uma chave privada para assinar digitalmente;

b) a correspondente chave pública para verificar dita assinatura digital;

c) o certificado da chave pública que identifica o titular da dita chave;

As assinaturas digitais somente podem ser criadas durante a vigência do

respectivo certificado da chave pública”.

Os certificados devem ser emitidos por um certificador, o qual deve estar

devidamente licenciado pela autoridade competente.

A lei 25.206 equipara o documento eletrônico a um instrumento privado,

desde que seja elaborado conforme o ordenamento jurídico e que o seu conteúdo seja

compreensível. Portanto o documento eletrônico possui validade, força probatória da

mesma forma que os documentos elaborados em forma cartácea.

Em apenas um caso, o documento eletrônico não poderá ser utilizado,

quando a lei ou as partes impor uma forma incompatível com a digital, como por

exemplo, nas questões referentes às disposições testamentárias, aos atos jurídicos

ligados ao Direito de Família e os atos personalíssimos em geral.

Esta lei foi elaborada com base na lei modelo da UNCITRAL e evita

mencionar termos tecnológicos, com o objetivo de não se tornar obsoleta.

96

Por fim, segue lição do professor Newton de Lucca, referente à lei em

questão:

“Se esse anteprojeto tornar-se lei, a Argentina terá,

provavelmente, a disciplina jurídica mais avançada da América do Sul

sobre a matéria de assinaturas digitais”.105

d) Itália

A Lei n° 59, de 15 de março de 1997, regulamentada pelo Decreto

Presidencial n° 513/97, equipara o documento eletrônico ao documento escrito, ao

afirmar que a assinatura digital aposta no documento eletrônico equivale à assinatura

tradicional.

O Decreto presidencial n° 513/97 prevê a autenticação da assinatura

eletrônica, que deve ser realizada por um oficial público, que atestará de que a

assinatura eletrônica foi aposta na presença do titular, sendo verificado a identidade

pessoal, a validade da chave utilizada e o fato de que o documento subscrito decorre

da efetiva vontade da parte e que o mesmo não contraria o ordenamento jurídico.

A certificação da assinatura digital deve ser efetuada por empresas de

certificação inscritas em um elenco público, que devem observar os requisitos previstos

na lei, como por exemplo, a forma de sociedade por ações e o capital social não inferior

àquele necessário ao exercício da atividade bancária, bem como a verificação, por

parte dos representantes legais e administradores, da mesma idoneidade exigível

105 LUCCA, Newton de e SIMÃO, Adalberto Filho, Direito & Internet. Aspectos Jurídicos Relevantes, p. 95.

97

daqueles que ocupam função idêntica no setor bancário e devem ainda assegurar a

qualidade dos processos tecnológicos face aos padrões internacionais.

Guilherme Martins Magalhães critica os requisitos imposta aos certificadores

pela lei n° 513/97, ao afirmar:

“Embora as regras do DPR n° 513/97 visem assegurar um

nível elevado de proteção aos seus usuários, reputa-se excessivo impor

que os certificadores observem os mesmos requisitos exigíveis à

constituição de uma instituição financeira, diante do que tais

disposições tendem a obstaculizar o pleno desenvolvimento da

contratação eletrônica naquele país, ou então a tornar-se letra

morta”.106

Mesmo que o documento eletrônico não possua assinatura eletrônica, este

formará prova plena dos fatos que representa, ou seja, a reprodução por si só, pode se

prestar a formar o convencimento do juiz. Mas, se a outra parte desconhecer o

documento apresentado, caberá àquele que apresentou o documento eletrônico provar

a sua autenticidade.

A lei em tela também se preocupou em descrever os algoritmos que poderão

ser utilizados, as características das chaves criptográficas, a forma de geração da

chave, o formato da assinatura digital, sua geração e formas de verificação.

A lei italiana apesar de ser uma das mais abrangentes no que se refere ao

comércio eletrônico errou ao estabelecer parâmetros tecnológicos na lei 59/97, pois o

ramo da informática é muito dinâmico, suscetível a mudanças tecnológicas, podendo a

lei tornar-se obsoleta, em um pequeno espaço de tempo.

106 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p.99.

98

Em 22 de maio de 1999, o Decreto legislativo n° 185 regulamentou o

contrato eletrônico, estabelecendo proteção específica aos consumidores, conforme a

Diretiva 97/7/CE.

e) Alemanha

A lei federal alemã, de 1 de agosto de 1997, foi o primeiro diploma europeu a

legislar sobre as assinaturas eletrônicas.

A lei preocupou-se em definir a assinatura digital, como aquela que é gerada

por uma chave privada e que tem como função identificar o signatário e garantir o

conteúdo da mensagem.

A lei alemã também definiu as entidades certificadoras e a forma do seu

licenciamento, sendo estabelecida às condições para obtenção da licença.

Desta forma, as entidades certificadoras poderão ser pessoas naturais ou

jurídicas e devem possuir idoneidade e conhecimento técnico para o exercício da

função, sob pena de ser negada a licença, assim como se houver o descumprimento de

outros requisitos previstos na lei.

A lei alemã prevê os delitos informáticos e as penalidades administrativas

relativas ao armazenamento eletrônico de dados. Concede proteção também aos

autores dos programas de computadores, no artigo 7° ao estabelecer a “Lei de direitos

autorais”.

99

Segundo Guilherme Magalhães Martins:

“A principal falha de tal diploma reside na ausência de

qualquer norma que equipare a firma digital à firma manuscrita, bem

como que atribua efeitos jurídicos à firma digital, limitando-se a lei

alemã, tão-somente, a estatuir que o uso dos meios tecnológicos nela

definidos faça com que a assinatura digital seja considerada segura”.107

Neste contexto, é importante esclarecer que o Parlamento alemão aprovou,

em 13 de julho de 2001, uma outra lei, chamada de Formanpassungsgesetz, com a

finalidade de adaptar as exigências de forma previstas no direito privado, modificando

alguns diplomas legislativos, como por exemplo, o Código de Processo Civil e o BGB.

No BGB, no parágrafo 126, foi acrescentada uma alínea, de número 3, que

dita: “A forma escrita poderá ser substituída pela eletrônica, quando a lei não exigir

outra forma”.

f) Portugal

A assinatura digital foi disciplinada em Portugal pelo Decreto-Lei n° 290-

D/99, de 2 de agosto de 1999 e pelo Decreto-Lei n° 375/99, de 18 de setembro de

1999, com a finalidade de assegurar um ambiente seguro para a autenticação

eletrônica e conseqüentemente para o desenvolvimento do comércio eletrônico.

Neste contexto, afirmou Newton De Lucca:

107 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p.101.

100

“Poder-se-ia afirmar, sem receio de equívoco, que a

legislação portuguesa, hoje consubstanciada pelo Decreto-Lei n° 290-

D/99, de 2 de agosto de 1999, e pelo Decreto-Lei n° 375/99, de 18 de

setembro do mesmo ano, representa o que há de mais avançado em

matéria de comércio eletrônico”.108

Cabe esclarecer que o Decreto-lei n° 290-D/99 foi promulgado antes da

aprovação final da Diretiva CEE n° 93/99, mas suas disposições se basearam nas

versões preparatórias da Diretiva.

A assinatura digital baseia-se no sistema criptográfico assimétrico, pois este

sistema possibilita a autenticação e a certeza de que o documento eletrônico não será

alterado. Mas, o Decreto-lei n° 290-D/99 estabeleceu no art 2°, in verbis:

Art. 2° “O regime previsto no presente diploma pode ser tornado aplicável a

outras modalidades de assinatura eletrônica que satisfaçam exigências de segurança

idênticas às da assinatura digital”.

Importante questão disciplinada por esta norma, se refere à prova do

documento eletrônico. Se o documento eletrônico possuir assinatura digital certificada

por entidade credenciada, conforme os requisitos previstos em lei, este terá a mesma

força probatória que o documento particular escrito.

Se o documento eletrônico possuir assinatura digital emitida por autoridade

credenciada, conforme os requisitos legais, mas não for suscetível de reprodução

escrita, fará prova dos fatos que reproduz, desde que a outra parte não impugne a

exatidão do documento apresentado.

108LUCCA, Newton de e SIMÃO, Adalberto Filho. Direito & Internet. Aspectos Jurídicos Relevantes, p. 105.

101

Por fim, se o documento eletrônico não possuir uma assinatura digital

certificada por autoridade credenciada, este não terá em princípio força probatória

plena, devendo o caso ser analisado pelo juiz, observando o princípio do seu livre

convencimento.

Outra questão muito importante abordada pela lei portuguesa se refere às

entidades certificadoras, pois Portugal foi um dos poucos países, que não exigiu a

autorização prévia para a prestação dos serviços de certificação, conforme o artigo 9° e

12° do Decreto- Lei n° 290/99, que ditam, in verbis:

Art. 9°. “Livre acesso à atividade de certificação.

É livre o exercício da atividade da entidade certificadora referida na alínea h

do art. 2°, sendo facultativa a solicitação da credenciação regulada nos arts.11 e

seguintes”.

Art.12° “Credenciação da entidade certificadora

Será concedida a credenciação de entidades certificadoras de assinaturas

digitais, mediante pedido apresentado à autoridade credenciadora, a entidades que

satisfaçam os seguintes requisitos:

a) estejam dotadas de capital e meios financeiros adequados;

b) dêem garantias de absoluta integridade e independência no exercício da

atividade de certificação de assinaturas digitais;

c) disponham de recursos técnicos e humanos que satisfaçam os padrões de

segurança e de eficácia que sejam previstos na regulamentação a que se refere

o art.38.

d) mantenham contrato de seguro válido para cobertura adequada da

responsabilidade civil emergente da atividade de certificação “.

102

Verifica-se que Portugal não optou pela manutenção de um sistema

cartorário para a verificação da autenticidade e integridade dos dados da transmissão e

da assinatura eletrônica.

Por fim, em 2004, foi editado o Decreto-Lei n° 7/2004, destinado a realizar a

transposição da Diretiva n° 2000/31/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8

de junho de 2000.

g) França A primeira lei francesa que disciplinou a criptografia foi a Lei de 29 de

dezembro de 1990, regulamentada pelo Decreto n° 92-1358, de 28 de dezembro de

1992.

Nesta lei, o âmbito de aplicação do sistema da criptografia era muito restrito,

pois o governo francês temia que esse sistema facilitasse a prática de crimes, já que a

mensagem enviada pela criptografia é confidencial.

Desta forma, na França somente era possível utilizar a criptografia após a

autorização concedida por um serviço vinculado ao primeiro-ministro chamado de

Service Central de la Sécurité dês Systèmes d’Information (SCSSI), que posteriormente

foi denominado de Direction Centrale de la Sécurité dês Systèmes d’Information

(DCSSI).

Em 1996, foi editada a Lei de 26 de julho do corrente ano, que permitia a

utilização da criptografia, sem necessidade da autorização do DCSSI em alguns casos,

a saber:

103

a) caso os meios de criptografia empregados não permitam, de maneira plena, uma

garantia da confidencialidade da mensagem;

b) caso a chave de cifragem usada não ultrapasse os 40 bits;

c) caso a chave de cifragem se compreenda entre 40 e 128 bits, desde que o

material seja objeto de uma declaração prévia, por parte de seu produtor,

fornecedor ou importador, no sentido de que se destina tão-somente ao uso

privado de uma pessoa natural;

d) sendo as chaves superiores a 128 bits, sob a condição expressa de que as

chaves, apropriadas para as operações de cifragem e decifragem, sejam

enviadas a um terceiro de confiança, que figura como seu administrador ou

detentor, encontrando-se sob o estrito controle do Poder Público, por meio da

DCSSI.

e) A lei mais recente publicada na França é de 13 de março de 2000, que

incorporou os preceitos estabelecidos pela Diretiva CEE n° 93/99.

Esta lei equipara o documento eletrônico ao documento escrito sob o suporte

de papel, conforme se verifica pelos artigos 1316-1 e 1316-3 do Código Civil francês

que ditam, in verbis:

Art.1316-1 ”O escrito sob a forma eletrônica é admitido como prova com o

mesmo valor que o escrito sob o suporte papel, sob a condição que possa ser

devidamente identificada à pessoa de quem ele promana e que ele seja estabelecido e

conservado nas condições necessárias a garantir a sua integridade”.

Art.1316-3 “O escrito sobre suporte eletrônico tem a mesma força probante

do escrito sob o suporte papel”.

104

Cabe destacar o artigo 1316-4 do Código Civil francês, que faz referência à

assinatura eletrônica, a saber, in verbis:

Art. 1316-4 “Quando tratar-se de assinatura eletrônica, deverá ela emanar de

um procedimento confiável de identificação, garantindo o seu vínculo com o ato ao qual

ela se refere. A confiabilidade de tal procedimento é presumida, até prova em contrário,

quando a assinatura eletrônica for criada, a identidade do signatário assegurada e a

integridade do ato garantida, nas condições fixadas por decreto do Conselho de

Estado”.

h) Estados Unidos

Vários são os Estados que já disciplinaram o documento eletrônico nos

Estados Unidos, sendo importante destacar o Digital Signature Act, que é a

regulamentação editada pelo Estado do Utah, que foi aprovada em 1995 e modificada

em março de 1996.

Segundo o professor Newton de Lucca:

“Esta é provavelmente uma das leis mais completas do

mundo no que se refere à assinatura digital”.109

Os propósitos desta lei são: facilitar as transações mediante mensagens

eletrônicas confiáveis; reduzir ao mínimo a possibilidade de forjar assinaturas digitais e

a ocorrência de fraude nas transações eletrônicas; estabelecer, em coordenação com

diversos Estados, normas uniformes relativas à autenticação e à confiabilidade das

mensagens eletrônicas.

109 LUCCA, Newton de e SIMÃO, Adalberto Filho. Direito & Internet. Aspectos Jurídicos Relevantes, p.99.

105

A lei americana estabelece que é proibida a autoridade de certificação

realizar atividades que possam acarretar um risco considerável de perda aos

subscritores ou as pessoas que depositaram sua confiança nos certificados. Além

disso, as autoridades de certificação devem garantir ao subscritor que o documento não

possui nenhuma informação falsa, sendo confiável o certificado emitido.

As autoridades de certificação devem obedecer aos seguintes requisitos,

para obter o licenciamento: a não contratação de pessoas que não foram condenadas

por crime envolvendo fraude ou falsidade ideológica, devendo ser comprovada a

qualificação profissional dos funcionários; deve comprovar ser detentora de capital

suficiente para o exercício desta atividade e possuir um nível de segurança suficiente à

administração das chaves.

É o Departamento Comercial do Estado de Utah que possui o poder de

credenciar as autoridades certificadoras.

O certificado pode ser revogado se houver o falecimento do subscritor

(pessoa física) ou sua dissolução (pessoa jurídica) ou no caso do certificado se tornar

duvidoso.

A lei também equipara a assinatura eletrônica à assinatura cartácea.

Esta lei foi adotada pelos Estados da Geórgia e de Washington, mas outros

Estados optaram em elaborar a sua própria legislação referente ao assunto, como por

exemplo, a Califórnia.

106

A Califórnia promulgou emenda à seção 17358 do Business and Professions

Code, de modo à explicitamente estender sua regulação acerca dos contratos à

distância, via telefone ou correio, às compras realizadas via Internet, de forma que o

fornecedor deva informar as condições de reembolso e de desfazimento do negócio por

qualquer das partes, bem como o nome legal da empresa e seu endereço completo,

seja na própria Web page, seja por e-mail.110

Por fim, em 30 de junho de 2000, foi publicado o Millenium Digital

Commercial Act (MDCA), que regulamenta a validade e a prova dos contratos

eletrônicos, com a finalidade de incentivar o comércio eletrônico. Neste diploma legal, o

documento eletrônico é equiparado ao documento cartáceo, assim como a assinatura

eletrônica é equivalente à assinatura tradicional, mas os documentos eletrônicos não

poderão ser utilizados nos casos em que a lei exige outra forma para a exteriorização

da vontade das partes, como por exemplo, no ramo de direito de família ou na criação e

execução de testamentos.

110 MARTINS, Guilherme Magalhães. Formação dos Contratos Eletrônicos de Consumo via Internet, p.113.

107

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