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CURSO – DELEGADO DE POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DO PARÁ
DATA – 25/08/2016
DISCIPLINA – DIREITO PENAL – PARTE GERAL
PROFESSOR – FRANCISCO MENEZES
MONITOR – LUCIANA FREITAS
AULA: 01 – PRINCÍPIOS E LEIS PENAIS NO TEMPO
Ementa
Na aula de hoje serão abordados os seguintes pontos:
1. Princípios do Direito Penal
1.1. Quanto à missão do Direito Penal
a) Princípio da intervenção mínima
b) Princípio da subsidiariedade
c) Princípio da fragmentariedade
d) Princípio da insignificância
1.2. Quanto ao agente
a) Princípio da pessoalidade
b) Princípio da responsabilidade penal subjetiva
1.3. Quanto ao fato
a) Princípio da culpabilidade
b) Princípio da lesividade
c) Princípio da alteridade
1.4. Quanto à pena
a) Princípio da individualização da pena
b) Princípio da humanidade das penas
c) Princípio da legalidade
2. Lei penal no tempo
Referência bibliográfica:
- Curso de Direito Penal, Rogério Greco Volume 1, Editora Impetus.
- Tratado de Direito Penal, Cezar Roberto Bitencourt, Volume 1, Editora Saraiva.
Obs.: O livro do Rogerio Greco é um pouco mais acadêmico, já o livro do Bitencourt é mais
completo e complexo.
Outros autores merecem ser citados também e, caso você tenha algum desses livros não
tem problema estudar por ele. Lembrando que os autores ligados à Escola Paulista,
principalmente a USP, adotam uma visão bipartite do conceito de crime, qual seja, crime como
fato típico e ilícito e a culpabilidade como mero pressuposto para aplicação da pena. Essa não é
uma corrente que se pode seguir fora de São Paulo, como estudaremos na teoria do crime.
- Direito Penal Esquematizado, Cleber Masson.
- Fernando Capez.
- Rogério Sanchez, Editora Juspodium.
Em caso de dúvidas o professor disponibilizou seu e-mail:
[email protected], pedindo apenas que especifique no assunto o tema da sua
pergunta e diga em qual turma você está matriculado.
1. PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL
Farei uma divisão didática que alguns autores adotam, dividindo os princípios quanto à
missão do direito penal, quanto ao agente, quanto ao fato e quanto a pena.
1.1. Quanto à missão do Direito Penal
a) Princípio da intervenção mínima
O Direito Penal, por ser mais a gravosa das respostas estatais, deve ter aplicação
subsidiária aos outros ramos do direito e fragmentária quanto ao bem jurídico tutelado.
Esse ramo jurídico é acima de tudo um instrumento de controle social, entretanto a missão
dele em um Estado Democrático de Direito não é servir como um mero instituto simbólico de
vingança privada para aplicar o sentimento de justiça social de uma população.
Observe que o objetivo do Direito Penal é o de tutelar bens jurídicos. A resposta penal é
com certeza a mais gravosa de todas as respostas do Estado e justamente por isso, em um
Estado Democrático de Direito, ela só poderá vir quando extremamente necessária e vinculada à
missão desse ramo jurídico.
Se esse ramo só pode ser aplicado quando necessário e essa necessidade se verifica
quando a aplicação do mesmo é subsidiária aos outros ramos do direito e fragmentária quanto ao
bem jurídico tutelado, percebam, os princípios da subsidiariedade e da fragmentariedade são
corolários do princípio da intervenção mínima.
b) Princípio da subsidiariedade
O Direito Penal é subsidiário a todos os outros ramos do direito, constituindo a ultima ratio
dentre as respostas do Estado. Ou seja, se outro ramo jurídico for suficiente para resolver o
conflito social, o direito penal não será aplicado.
c) Princípio da fragmentariedade
O Direito Penal só deve tutelar os bens jurídicos mais importantes à vida em sociedade
das ofensas mais intoleráveis a esses mesmos bens.
d) Princípio da insignificância
É um corolário do princípio da fragmentariedade. Esse princípio ensina que as condutas
que não ofendem de forma relevante o bem jurídico tutelado pela lei penal serão penalmente
atípicas.
A atipicidade é a consequência da aplicação do princípio da insignificância. Entretanto,
perceba que esse princípio recai sobre uma face específica da atipicidade penal, qual seja a
chamada tipicidade material.
Tipicidade legal ou formal nada mais é do que a forma do crime, o juízo de adequação
entre a conduta e o crime. Ex.: Tício dá um tiro na cabeça de Mévio, matando-o. Existe tipicidade?
Observemos a lei penal: Tício matou alguém, existe a previsão “matar alguém” no art. 121, do
Código Penal então existe tipicidade.
Contudo esse conceito não basta no Direito Penal contemporâneo. Isso, porque perceba
que se Francisco subtrai um pincel do Supremo Concursos, com certeza subtrai coisa alheia
móvel para si (há tipicidade legal), contudo essa subtração não é relevante ao ponto de justificar a
aplicação de uma pena de reclusão, portanto não há tipicidade material.
A tipicidade material nada mais é do que a violação relevante ao bem jurídico tutelado pela
lei penal.
A tipicidade formal, assim como a material, são elementos do fato típico. Não havendo fato
típico não haverá delito, portanto a conduta será um insignificante penal.
O princípio da insignificância, segundo o STF, possui quatro vetores ou requisitos. São
eles:
- Mínima ofensividade da conduta: a conduta criminosa não pode ser por demais ofensiva
ou agressiva aos bens jurídicos tutelados.
Obs.: Não se aplica o princípio da insignificância em crimes com violência ou grave
ameaça à pessoa. Perceba que esse princípio então não será inaplicável a crimes como roubo,
extorsão, extorsão mediante sequestro, etc. Logo, poderia o princípio em questão ser aplicado em
crimes como furto, estelionato, apropriação indébita, etc.
- Ausência de periculosidade social da ação: a conduta não pode ser muito perigosa para a
sociedade.
Obs.1: O entendimento do STF já é pacífico ao dizer que não se aplica o princípio da
insignificância em crimes como o de moeda falsa, do art. 289 do Código Penal, porque este crime
ofende não só o patrimônio que aquela moeda representa como também a fé pública e a
credibilidade de todo o sistema financeiro nacional. Ex.: Se o Tício falsifica uma nota cinquenta
reais, certamente o faz para colocar essa moeda em circulação, nesse momento ele ofende não
só o patrimônio daquela pessoa que será prejudicada com uma moeda falsa, mas principalmente
a credibilidade de todo o sistema financeiro nacional e a fé pública depositada naquele documento
público.
Obs.2: Não se aplica o princípio da insignificância em crimes de perigo abstrato, que são
aqueles nos quais o tipo penal não descreve um dano ao bem jurídico tutelado, mas um mero
perigo, uma probabilidade de lesão ao mesmo. Ex.: Quando alguém vende uma pequena
quantidade de drogas, podemos dizer que aquela venda pode se constituir em um crime
insignificante? NÃO! Porque se o tráfico de drogas é um crime de perigo (perigo para a saúde
pública) e se esse perigo está absolutamente presumido com a prática da conduta, não se pode
aplicar o princípio da insignificância.
- Baixo (reduzido) grau de reprovabilidade do comportamento: o comportamento não pode
ter uma culpabilidade muito intensa e culpabilidade aqui vem no sentido de juízo de reprovação da
conduta.
Obs.: O STF e o STJ estão dizendo, nos últimos meses, que a aplicação do princípio da
insignificância para o reincidente deve ser analisada caso a caso. Vide informativo 793 do STF. O
STF tem dito que quando o indivíduo é criminoso habitual em delitos de determinada natureza, o
princípio da insignificância não deve ser aplicado em respeito ao terceiro requisito, a saber,
reduzido grau de reprovabilidade do comportamento. Agora, contanto que a reincidência não seja
prova da habitualidade criminosa em delitos de determinada natureza, o princípio da bagatela
poderá ser aplicado. Ex.: O indivíduo é reincidente por dois crimes de lesão corporal (uma leve e
outra grave), então pratica um furto de ínfimo valor. Note que ele não é criminoso habitual nesse
delito, portanto não aplicar o princípio da insignificância a esse indivíduo é abraçar um direito
penal do autor e não o direito penal do fato, seria punir alguém pelo que é e não pelo que ele faz.
- Inexpressividade da lesão jurídica: costuma-se verificar se a lesão jurídica é objetiva e
subjetivamente insignificante. Ex.: Um cantor famoso teve o seu disco de ouro furtado (um disco
de ouro que não era literalmente de ouro e que não tinha tanto valor financeiro), entretanto tinha
um valor notável para a vítima. Portanto, não se aplicou o princípio da insignificância justamente
porque a lesão jurídica tinha sido expressiva.
Obs.1: O STJ entende que não é possível a aplicação do princípio da insignificância em
crimes contra a administração pública, tendo em vista que esses tutelam a moralidade
administrativa e a violação a esse bem jurídico nunca é inexpressiva.
Agora, imagine que você é um delegado e tem um celular que pode ser utilizado apenas
para ligações relacionadas à corporação. Seu celular pessoal acaba a bateria, você pede uma
pizza pelo telefone da corporação (desviando a utilização de bem público, de forma a trazer
prejuízo para a administração pública). Isso configura o crime de peculato e pena pode chegar a
doze anos de reclusão. Nesse caso, para o STF a aplicação é possível se os quatro vetores
estiverem presentes e a análise desses vetores deve ser feita caso a caso.
Obs.2: Em crimes contra a ordem tributária (aqueles que violam o erário) o STJ aplica o
princípio da insignificância nos débitos fiscais que não ultrapassam 10 mil reais e o STF naqueles
que não ultrapassem 20 mil reais.
A lei 10.522/02 (diz respeito à execução fiscal) em seu artigo 20 disciplina que na
execução fiscal, quando o débito fiscal não ultrapassa 10 mil reais, o procurador da Fazenda pode
requerer a suspensão dos autos de execução sem baixa na distribuição. Isso, porque custará
mais para o Estado cobrar 10 mil reais do que o dinheiro que ele receberá. Por isso que o STJ
aplica o princípio da insignificância nos débitos fiscais que não ultrapassam 10 mil reais.
Já o STF diverge, porque se baseia em algumas portarias do Ministério da Fazenda
(Portaria 75/12 e 130/12) que elevou esses valores para 20 mil reais e onde a mesma razão
aplica-se o mesmo direito.
Perceba que os três primeiros vetores falam quase a mesma coisa, a saber, do desvalor
da conduta e o último fala do desvalor do resultado.
Agora, faço uma indagação a vocês. Poderia o delegado de polícia aplicar o princípio da
insignificância quando da lavratura do auto de prisão em flagrante? A maior parte da doutrina (e
esse é o entendimento que prevalece) afirma que não! Isso, porque a análise do delegado de
polícia deve se ater à tipicidade formal da conduta. O delegado, portanto, quando da lavratura do
auto de prisão em flagrante analisa sim o fato típico nos seus primeiros elementos (a conduta, o
resultado, o nexo causal e a tipicidade formal), entretanto a análise da tipicidade material (da
ilicitude, da culpabilidade) seria do titular da ação penal e do próprio juiz, quando da formulação
da denúncia e de seu recebimento já no processo penal.
Contudo, cresce (e muito) os doutrinadores (a exemplo de Cleber Masson, Leonardo
Barreto, Nestor Távora, dentre outros) que defendem que o delegado de polícia por ser bacharel
em direito e por exercer função jurídica deve ter sim a prerrogativa de analisar todos os elementos
do crime, salvo eventualmente a imputabilidade com relação a doença mental, tendo em vista que
não teria o conhecimento técnico para tanto. Para esses autores o delegado se coloca hoje como
o primeiro agente das garantias penais, não só como um indivíduo que realiza uma função pública
repressiva, mas que exerce uma função de guardião das garantias penais e constitucionais.
Porém esse entendimento não é o que prevalece, como visto anteriormente.
1.2. Quanto ao agente
a) Princípio da pessoalidade (responsabilidade pessoal/intranscendência)
Esse é um princípio constitucional explícito, previsto no art. 5º, XLV, CR/88.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e
a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra
eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;”
Esse princípio ensina que a pena não passará da pessoa do condenado, podendo a
reparação civil e o perdimento de bens serem executados contra os herdeiros nas forças da
herança. Perceba que a reparação e o perdimento nada têm a ver com a sanção penal, eis que
consequências do efeito extrapenal da condenação. Agora, o perdimento de bens enquanto pena
restritiva de direitos, previsto no rol do art. 43 do Código Penal, esse ainda é impessoal e
intransferível.
“Art. 43. As penas restritivas de direitos são:
I - prestação pecuniária;
II - perda de bens e valores;
III - limitação de fim de semana.
IV - prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;
V - interdição temporária de direitos;
VI - limitação de fim de semana.”
Prevalece que a pena de multa não pode ser transferida aos herdeiros nem mesmo nas
forças da herança, isso porque a multa penal não perde seu caráter de pena.
b) Princípio da responsabilidade penal subjetiva
Não há responsabilidade penal sem dolo ou culpa, conforme inteligência do art. 19, do
Código Penal.
“Art. 19 - Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o houver
causado ao menos culposamente.”
A responsabilidade penal objetiva não existe no Direito Penal contemporâneo brasileiro,
embora alguns autores reflitam nos casos dos crimes de rixa e de embriaguez e enxerguem neles
uma exceção ao princípio da responsabilidade penal subjetiva, prevalece que esse princípio não
tem exceções e que toda responsabilidade penal deve ser analisada a partir do dolo e da culpa.
Lembre-se, a teoria da imputação objetiva nada tem a ver com responsabilidade penal
objetiva. Analisaremos as duas em outras aulas.
1.3. Quanto ao fato
a) Princípio da culpabilidade
Esse é um princípio constitucional implícito que possui dois desdobramentos e pode ser
conceituado de duas formas diferentes.
A primeira faceta desse princípio afirma que não há crime e nem pena sem culpabilidade,
essa, portanto, é pressuposto do próprio crime e da própria pena. O que significa dizer que não há
crime sem os elementos que compõe esse terceiro substrato do conceito, então perceba que não
há crime sem imputabilidade, sem potencial consciência da ilicitude e sem exigibilidade de
conduta diversa.
Em sua segunda face esse princípio estabelece que a culpabilidade não é só pressuposto
do crime, mas é também limite da pena. A culpabilidade como limite da pena não está se referindo
ao terceiro substrato de conceito de crime, mas sim ao juízo de reprovação pessoal (que é
circunstância para dosimetria da pena, prevista no art. 59, do Código Penal).
“Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do
agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da
vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:
I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;
II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;
III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;
IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.”
(Grifo nosso).
Quem contribui mais para o crime deve receber uma pena maior.
Se na prova vier destacado na questão que a responsabilidade penal objetiva é uma
violação ao princípio da culpabilidade, você pode marcar como correto, embora, a doutrina atual
questione essa função do princípio. Isso, porque o dolo e a culpa não estão mais na culpabilidade
(e responsabilidade penal objetiva é aquela sem dolo ou culpa). Costuma-se dizer que o princípio
da culpabilidade destaca esse instituto como pressuposto do crime (uma vez que não há crime
sem os elementos da culpabilidade) e como limite das penas (uma vez que o juízo de reprovação
pessoal, que é também um dos sentidos do termo culpabilidade, deve ser analisado quando da
aplicação da pena para traçar os seus limites).
Agora, no que tange à responsabilidade penal objetiva, embora tenha sido uma das
principais funções do princípio da culpabilidade em um contexto da teoria finalista do delito (que
analisa a conduta e a culpabilidade separando dolo e culpa desta) a função do princípio como
sendo um instituto que evita a responsabilidade penal objetiva não parece ser mais atual.
Um resumo bom desse princípio é que a culpabilidade é o pressuposto do crime e ao
mesmo tempo o limite das penas.
b) Princípio da lesividade (ofensividade)
Esse é um princípio constitucional implícito que ensina que a responsabilidade penal
pressupõe uma ofensa concreta ou um perigo de lesão concreta ao bem jurídico tutelado.
A função desse princípio é afastar a incriminação de meros estados de consciência, de
meras ideologias e atitudes internas. Ninguém poder ser punido pelo que pensa pelo que acredita
ou pelo que defende, a não ser que essas crenças se materializem em uma conduta que viole
concretamente um bem jurídico tutelado ou que o exponha a um perigo de lesão.
Muitos doutrinadores defendem que os crimes de perigo abstrato seriam inconstitucionais
por conta da aplicação desse princípio. Percebam, se o princípio da lesividade afirma que a
responsabilidade criminal pressupõe uma violação concreta ao bem jurídico tutelado ou ao menos
um perigo de lesão concreta ao mesmo, nos crimes de perigo só haveria compatibilidade com a
constituição se o perigo fosse concretamente provado. Isso, porque nos crimes de perigo abstrato,
como vimos em outros blocos, o perigo ou a probabilidade de lesão está absolutamente
presumido com a prática da conduta.
Entretanto hoje, tanto o STJ quanto o STF, afirmam que os crimes de perigo abstrato não
violam a Constituição e nem mesmo o princípio da lesividade, sendo, portanto, compatíveis com
esse princípio. Isso, porque existe sim uma probabilidade de dano, que é absolutamente
presumida e que não deve ser provada concretamente.
Lembrem-se, em questões dissertativas o princípio da lesividade, segundo muitos autores,
viola sim este postulado constitucional implícito e deveriam ser decretados inconstitucionais ou
pelo menos reinterpretados à luz da Constituição.
c) Princípio da alteridade
Alguns autores defendem que esse princípio seria na verdade um mero desdobramento do
princípio da lesividade.
“Altero” vem do grego e quer dizer “outro”. O princípio da alteridade diz que a
responsabilidade penal pressupõe violação ou perigo de lesão ao bem jurídico de terceiro, nunca
aos próprios bens jurídicos do agente (a autolesão não é punida no direito penal).
Perceba que a lei segue estritamente esse princípio, porque até quando parece punir-se a
autolesão, como nos casos de violação do próprio corpo para recebimento de seguro ou na
autolesão para escapar do recrutamento obrigatório, nota-se que não se pune nesses contextos a
autolesão em si, mas sim a violação ao bem jurídico que quer se ofender a partir da autolesão.
1.4. Quanto à pena
a) Princípio da individualização da pena
Pode ser abstraído do art. 5º, XLVI, CR/88.
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;”
Esse princípio ensina que a pena deve ser individualizada o crime ao criminoso, o delito ao
delinquente, a infração ao infrator. Essa individualização deve ser observada tanto na fase da
cominação (fase essa na qual legislador comina determinadas penas a tipos penais) quanto na
fase de aplicação (fase em que o juiz, seguindo o critério trifásico de aplicação da pena, determina
qual a sanção penal adequada para cada infração) quanto também na própria execução (fase que
apesar de seu conteúdo material altamente administrativo é também judicializada no Brasil).
Perceba que quando o legislador diz que o homicídio qualificado merece aplicação de 12 a
30 anos de reclusão, ele está individualizando a pena. Quando o juiz analisa a situação do
homicida, que foi considerado culpado pelo Tribunal do Júri e lhe aplica uma pena conforme o
critério trifásico de fixação da pena, previsto no art. 68 do Código Penal, ele está individualizando
a pena. E quando o juiz da execução observa o pedido deste homicida condenado (que agora
cumpre a pena em regime inicial fechado) de progressão de regime e analisa os critérios objetivos
e subjetivos para concedê-la ele também está individualizando a pena.
O STF tem constantemente decidido que a lei não pode suprimir uma das fases de
individualização, não pode vetar de forma absoluta a individualização da pena em nenhum dos
seus momentos. Existem algumas decisões importantes que precisamos analisar:
- HC 82959: essa decisão considerou inconstitucional o regime integralmente fechado. A
lei dos crimes hediondos previa que os condenados por crimes hediondos ou equiparados
deveriam passar toda a execução penal em regime fechado, retirando das mãos do juiz da
aplicação e do juiz da execução a prerrogativa e o dever de individualizar a pena do crime ao
criminoso. A constituição em seu art. 5º, XLVI diz que a lei vai cuidar da individualização da pena
e não proibir ou vetar. Justamente por isso, o STF decidiu, baseando-se também em outros
princípios, que o regime integral fechado era inconstitucional. Então a lei dos crimes hediondos foi
modificada, para respeitar essa decisão, passando a prever a possibilidade de progressão, mas
determinando que o regime fosse pelo menos inicialmente fechado.
- HC 111840: decidiu o STF que o regime inicial fechado obrigatório também é
inconstitucional. Porque enquanto o regime integralmente fechado proibia a individualização na
execução, o regime inicial fechado obrigatório proíbe a individualização na aplicação da pena.
- HC 97256: analisando a lei de drogas o STF decidiu que algumas vedações da lei
relacionadas à substituição de pena e até mesmo ao SURSIS são inconstitucionais. Não pode a
lei de drogas proibir em absoluto a substituição de pena privativa de liberdade por pena restritiva
de direitos, porque quando o faz veda a individualização na aplicação.
b) Princípio da humanidade das penas
Afirma que a sanção penal não pode ser de todo desumana, cruel, exacerbada a ponto de
retirar a dignidade e a humanidade do condenado, vez que a função fundamental do Direito Penal
não está só na retribuição do mal causado, mas principalmente nos efeitos preventivos gerais e
especiais da sanção penal.
Art. 5º, XLVII, CR/88:
“XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;”
Esse artigo proíbe cinco espécies de pena, não só as de caráter cruel, mas também as
penas de morte, de banimento, de caráter perpétuo e de trabalhos forçados. Falemos de cada
uma delas.
- Pena de morte (pena capital): está proibida pela Constituição, entretanto essa proibição é
excepcionada pelo próprio texto constitucional. Isso, porque em casos de guerra declarada é
possível a aplicação da pena capital aos crimes que possuem essa pena em seu preceito
secundário. Ex.: o Código Penal Militar, ao disciplinar os crimes em tempo de guerra, permite a
pena de morte em diversas sanções.
- Pena de banimento: lembrando que a deportação e extradição são outros institutos.
- Pena de trabalhos forçados: o trabalho do preso é dever na execução penal e não é de
todo incompatível com o princípio da humanidade das penas. Isso, porque o trabalho como
consequência da execução penal é direito do preso para que ele obtenha determinados benefícios
na execução penal. Note-se que não se pode constranger o preso ao trabalho, não se pode forçar
o trabalho de forma direta, entretanto, determinados institutos e benefícios do direito penal (como
a remissão) estão ligados ao trabalho.
- Pena de caráter perpétuo: é com base no art. 5º, XLVII, da CR/88 que a Súmula 527, do
STJ foi redigida. Essa súmula busca trazer um limite para a medida de segurança, que é espécie
de sanção penal. O Código Penal diz que a medida de segurança poderia ser aplicada por
período indeterminado, o que contradiz o texto constitucional e, portanto, a súmula citada
disciplina o tema afirmando que a medida de segurança deve se limitar pela pena máxima
cominada ao crime (em consonância com o princípio da proporcionalidade).
- Pena de caráter cruel: aquela que impõe sofrimento desnecessário ao preso.
c) Princípio da legalidade
Esse princípio é fundamental não só para a missão do direito penal, mas também para o
fato, para o agente e para a pena, apesar de trata-lo nesse momento.
Art. 5º, XXXIX, CR/88:
“XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;”
Art. 1º do Código Penal:
“Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.”
O princípio da legalidade é resumido pela frase “não há crime sem lei anterior que o defina,
não há pena sem prévia cominação legal”.
Os desdobramentos e garantias que esse princípio traz serão traçadas abaixo e
analisadas, porque provavelmente é que o sua prova pedirá. São quatro essas garantias.
Vejamos.
- Lei escrita: somente a lei escrita pode veicular crimes ou penas, vedado o costume
incriminador. O manto da legalidade separa as condutas antiéticas ou imorais das condutas que
são verdadeiramente criminosas.
- Lei estrita: somente a lei em sentido estrito (lei ordinária ou complementar) pode veicular
crimes ou penas, vedada a analogia em desfavor do réu. Ex.: A utilização de arma no crime de
roubo pode majorar a pena, mas a utilização de um brinquedo que se pareça com uma arma de
fogo não poderá.
Ainda, a própria Constituição, em seu art.62, §1º, I, “b”, proíbe medida provisória com
caráter penal, principalmente quando prejudica o réu.
“Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas
provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
§ 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria:
I - relativa a: (...)
(...) b) direito penal, processual penal e processual civil;”
Observe que o STF já se posicionou algumas vezes sobre medidas provisórias que
visavam ampliar os direitos do réu, como por exemplo, no Estatuto do Desarmamento. Na
oportunidade, o art. 30 desse estatuto previa uma abolitio criminis temporária para o crime de
posse de arma de fogo de uso permitido e essa norma foi continuamente prorrogada por meio de
medida provisória e o STF não as reputou inconstitucionais. Isso, porque se a norma está
ampliando uma garantia justifica-se a legitimidade dessa medida provisória.
Em uma questão objetiva, não há espaço para discussão e medidas provisórias com
caráter penal são vedadas. Contudo, em uma questão dissertativa, exponha os dois lados e
lembre-se do Estatuto do Desarmamento que é um bom exemplo.
- Lei prévia: também chamado de princípio da anterioridade, que ensina que a norma penal
incriminadora (que piora a situação do réu, trazendo novos crimes ou novas penas) deve ser
anterior ao fato praticado.
Perceba que o princípio da anterioridade, como corolário da legalidade, só diz respeito
àquela lei penal que piora a situação do réu. Já com relação às normas penais benéficas, essas
devem retroagir para reger as condutas anteriores.
- Lei certa: também chamado de princípio da taxatividade, diz que a lei deve definir de
forma clara a conduta delitiva, o tipo penal. Estão proibidas as incriminações que são abertas,
imprecisas. Ex.: O tipo penal não pode dizer que é crime violar o direito do consumidor no campo
da publicidade. Deve-se especificar qual é a violação que está se incriminando.
2. LEI PENAL NO TEMPO
Trata-se do estudo da sucessão de leis penais no tempo e seus efeitos nos crimes já
praticados.
“Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.”
“Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando
em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos
anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.”
“Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas
as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.”
“Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o
momento do resultado.”
Dois princípios básicos devem ser destacados nesse assunto.
- Princípio da anterioridade: previsto nos arts. 5º, XXXIX, da CR/88 e 1º, do Código Penal.
Esse princípio exige que a lei penal que piora a situação do réu seja anterior ao fato praticado.
Portanto, a lei penal que cria novos delitos (novatio legis incriminadora) ou que aumenta
algumas penas ou facilitam a punibilidade estatal diminuindo um prazo de prescrição ou
decadência (reformatio legis in pejus) deve ser anteriores ao fato praticado.
- Princípio da retroatividade da lei penal benéfica: previsto nos arts. 5º, XL, da CR/88 e 2º,
do CP.
Art. 5º, XL, da Constituição:
“XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;”
Perceba que quando a lei melhora a situação do réu ela será aplicada retroativa a todos os
fatos anteriores. Se a lei retira um crime do ordenamento (abolitio criminis) ou se a lei suaviza uma
pena (reformatio legis in mellius) essa lei possui retroatividade.
A lei penal que beneficia (lex mitior) possui dois atributos:
- retroatividade (sempre é aplicada ás condutas anteriores, para reger as ações e
omissões praticadas antes da sua entrada em vigor);
- ultratividade: isso porque, sempre que uma lex mitior é substituída por uma lei mais grave
a lei mais grave não pode retroagir, o que significa que a lei benéfica do tempo da conduta
continuará regendo aquela ação. Ex.: Ao tempo da conduta a pena era de 12 a 30 anos para
determinado crime. Uma lei então aumentou a pena para 15 a 30. A lei posterior não poderá
retroagir, logo a lei do tempo da conduta terá ultratividade. Se a lei, entretanto, diminuir a pena
para 11 a 30 anos, essa lei que se constitui uma lex mitior possuirá retroatividade e regerá as
condutas anteriores à sua vigência.
Obs.1: A abolitio criminis não apaga os efeitos extrapenais da condenação. Ex.:
perdimento de bens, tornar certo o dever de indenizar continuam aplicáveis mesmo se a conduta
deixou de ser crime.
Obs.2: A abolitio criminis (a lex mitior como um todo) apaga os efeitos penais da
condenação mesmo se já houver trânsito em julgado, conforme art. 2º, §único, do Código Penal.
“Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos
anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.”
Ainda, conforme a Súmula 611 do STF é o próprio juiz da execução que aplica esse
benefício.
“TRANSITADA EM JULGADO A SENTENÇA CONDENATÓRIA, COMPETE AO JUÍZO DAS
EXECUÇÕES A APLICAÇÃO DE LEI MAIS BENIGNA.”
Obs.3: Imagine que você, delegado de polícia, esteja investigando uma organização
criminosa que pratica crime de tráfico de drogas e percebe que a associação mantem há muito
tempo a droga em depósito e que daqui a dois dias entrará em vigor uma nova lei que aumentará
a pena do tráfico de drogas. Você então espera esses dois dias transcorrerem e quando a lei
entra em vigor prende em flagrante (que a mesma permite, conforme art. 303 do CPP, nos crimes
permanentes enquanto durar a permanência). Quando você prender terá garantido que esses
indivíduos recebam a pena da lei nova ou receberão eles a pena da lei vigente ao tempo em que a
droga foi adquirida e deixada em depósito? Nos crimes permanentes aplica-se a última lei que
entra em vigor durante a permanência ou àquela que estava em vigor quando a permanência
começou?
A Súmula 711, do STF diz que nos crimes permanentes aplica-se sempre a última lei que
entra em vigor durante a permanência ou continuidade.
“A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é
anterior à cessação da continuidade ou da permanência.”
Lembre-se que crimes permanentes são aqueles cuja consumação se prolonga no tempo e
é o agente quem controla a permanência. Já a continuidade delitiva (crimes continuados) nada
mais é do que uma regra de aplicação de pena, prevista no art. 71 do Código Penal. Quando
vários crimes, da mesma espécie, são praticados nas mesmas condições de tempo, lugar e modo
o juiz pode aplicar a pena como se o último crime fosse continuação do primeiro e, portanto,
aplica-se somente a pena mais grave aumentada de 1/6 a 2/3.
Art. 71, do Código Penal:
“Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da
mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes,
devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só
dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto
a dois terços.”
Ex.: Um indivíduo praticou vários furtos de carro, sempre da mesma forma, na frente da
mesma faculdade. Ao final do 11º furto ele é preso, o sistema de vigilância confirma que ele foi o
praticante de todos os outros furtos e ele é processado. O juiz aplica a pena mais grave,
aumentando, entretanto percebe que antes dele praticar o 9º furto entrou em vigor uma lei que
aumenta a pena do furto de acessórios de veículo. A última lei será aplicável.
Não confunda crime permanente com crime instantâneo de efeito permanente. Isso,
porque o segundo é aquele que se consuma em um só momento e é de efeito permanente,
quando esse é irreversível pela vontade do agente. Ex.: Crime de homicídio é instantâneo (se
consuma com o fim das atividades encefálicas) e é permanente (porque o agente não reverter a
morte da vítima).
Obs.4: A lei penal temporária e a lei penal excepcional possuem ultratividade maléfica, ou
seja, elas são aplicáveis aos crimes praticados durante a sua vigência mesmo quando cessadas a
situação que a legitima. Ex.: Lei Geral da Copa.
Lei penal temporária é aquela que possui prazo determinado de vigência. Já a lei penal
excepcional é aquela cuja vigência é condicionada a uma situação de anormalidade. Contudo,
ambas possuem autorrevogabilidade.
“Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas
as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.”
Perceba, se um indivíduo pratica um crime durante a vigência de uma lei penal temporária
ele estará submetido a essa lei enquanto o crime não prescrever. Isso, porque se não fosse assim
a lei não teria qualquer eficácia social quando o seu prazo final estivesse se aproximando.
Teremos uma lei penal excepcional quando, por exemplo, o Brasil entrar em guerra com
algum país. Nesse contexto, enquanto o Brasil estiver em guerra algumas condutas serão punidas
com determinadas penas. Se até o final da guerra o crime for praticado, a pena será aplicada.
Muitos autores (como Guilherme de Souza Nucci) defendem que o art. 3º do Código Penal
é inconstitucional, na verdade o mais correto seria dizer que ele não foi recepcionado pela
Constituição de 1988. Supostamente esse artigo não foi recepcionado pela Constituição porque
esta em seu art. 5º, XL diz que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. Quando diz
isso a Constituição estaria, segundo muitos doutrinadores, estabelecendo um mandado de
retroatividade (estabelecendo que é obrigatória a retroatividade da lei penal benéfica) e que
quando a lei penal temporária se esgota em seu prazo a nova situação mais benéfica deve
retroagir alcançando os fatos anteriores.
Notem que, para muitos doutrinadores, o art. 3º do CP não viola a Constituição porque não
temos aqui um conflito de leis penais no tempo, um conflito de duas leis que se revogam. Temos
apenas uma autorrevogação. Se não temos esse conflito não há que se falar em retroatividade
benéfica.
Obs.5: “Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro
seja o momento do resultado.”
Esse artigo define que o momento do crime é o da atividade, independentemente do
momento do resultado.
Ex.: Se Tício tem 17 anos e 11 meses e dispara contra o Mévio, que morre depois de 6
meses, ele não será considerado um maior imputável.
Agora, quanto ao local do crime o código adotou a teoria da ubiquidade (local do crime é
tanto o local da conduta quanto o local do resultado).
“Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou
em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.”
Ex.: Se uma conduta foi praticada no Brasil, a vítima alvejada vai para a Argentina se tratar
e lá ela morre, esse crime se deu tanto no Brasil quanto na Argentina em questão de lugar.
Entretanto, esse crime só se deu no Brasil no que tange ao tempo.
Obs.6: A natureza de uma lei benéfica ou não ao réu deve ser sempre analisada em
concreto, nunca em abstrato. Agora, o juiz não pode combinar leis penais, retroagindo
parcialmente um instituto legal? Duas correntes se destacam, vejamos.
- A jurisprudência diz, atualmente, que a combinação de leis penais não é possível. Isso,
porque essa combinação criaria uma terceira lei (quando o juiz combina a lei A com a lei B, cria a
lei AB e essa não foi constituída devida pelo Poder Legislativo) e o juiz estaria usurpando a função
legislativa. Também afirma não ser possível a combinação porque o art. 5º, XL, da CR/88
determina que a lei não retroagirá salvo para beneficiar o réu. A jurisprudência analisa dizendo
que a retroatividade é da lei e não dos seus institutos, portanto apenas a retroatividade completa é
permitida pela Constituição. Por último, afirma que a combinação não é possível porque se
retroagíssemos parcialmente a lei nova a pena resultante seria apenas de um ano de reclusão e
seria pouco demais para o crime de tráfico (esse último argumento aplica-se ao caso da lei de
drogas).
O STF decidiu, atualmente, que o tráfico privilegiado (art. 33,§4º da Lei 11.343/06) não é
crime equiparado a hediondo.
Ex.: A lei de drogas antiga (Lei 6.368/76) previa em seu art. 12 uma pena de 3 a 15 anos
para o tráfico de drogas. A nova lei, Lei 11.343/06) prevê em seu art. 33 uma pena de 5 a 15 anos.
Nesse primeiro momento, observando apenas a pena base, temos a impressão que a lei antiga é
mais benéfica e por isso a lei nova não poderia retroagir. Contudo, a lei nova possui no §4º do art.
33 um benefício, uma diminuição de 1/6 até 2/3 para o indivíduo que é primário, de bons
antecedentes, não pertence à organização criminosa e não se dedica a atividades criminosas.
Esse benefício de 2/3 aplicado aos cinco anos poderia fazer com que a pena ficasse em um ano e
oito meses aproximadamente, passando a ser mais benéfica do que a lei antiga.
Contudo, não é possível que o juiz aplique a causa de diminuição da lei nova à pena da lei
velha, mesmo que os tipos penais permaneçam os mesmos em seus preceitos primários.
- O segundo posicionamento defende sim a combinação de leis penais dizendo que não se
trata na verdade de uma combinação e criação de uma terceira lei, mas de mera integração do
ordenamento jurídico. Os autores que defendem a possibilidade de retroagir parcialmente alguns
institutos de uma lei penal, afirmam que ao fazer isso o juiz está integralizando o ordenamento. E
essa integração é possibilitada pelo fato de o juiz, ao aplicar determinados institutos de uma lei em
combinação com institutos de outra não cria novas normas, eis que todas as normas estão postas
pelo doutrinador então tudo o que ele faz é consagrar o princípio da retroatividade penal,
aplicando de forma conjunta dois institutos que são separados no tempo, mas que são desta
forma, complementares. E mais, o art. 2º, §único do Código Penal diz que a lei que de qualquer
forma beneficia o réu retroage.
A maior parte da doutrina defende essa possibilidade, como Cezar Roberto Bitencourt,
Rogério Greco, Francisco de Assis Toledo, etc. Já a jurisprudência não, inclusive a Súmula 501 do
STJ fala especificamente sobre a lei de drogas e ela veda a retroatividade.
“É cabível a aplicação retroativa da Lei 11.343/06, desde que o resultado da incidência das suas
disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei 6.368/76,
sendo vedada a combinação de leis.”
Obs.7: A lei penal intermediária (aquela que não estava em vigor no tempo da conduta e
que é revogada antes do final do cumprimento da pena) é aplicável se for benéfica.
Obs.8: A lei processual penal (aquela que diz respeito a procedimentos e não tem reflexos
diretos sobre direito de liberdade ou sobre a punibilidade estatal) é aplicável imediatamente, sem
prejuízo dos atos já praticados em outros procedimentos.