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CURSO – ESCOLA DA DEFENSORIA PÚBLICA Nº31 DATA – 15/09/15 DISCIPLINA – CIVIL (NOITE) PROFESSORA – REYVIANI JABOUR MONITORA – WALKYRIA SILVA E SILVA AULA 02/03
Ementa:
Na aula de hoje serão abordados os seguintes pontos:
Usucapião (continuação)
Formas ordinárias de aquisição da propriedade
Direitos reais
Usucapião (continuação)
Todas as coisas poderão ser adquiridas por usucapião, com exceção dos bens públicos e das
coisas naturalmente fora do comércio, como já vimos.
Imóvel gravado com cláusulas restritivas do direito de propriedade
Se o imóvel estiver gravado com cláusulas de impenhorabilidade, inalienabilidade ou
incomunicabilidade, isso não afasta a possibilidade de ser usucapido, caso se encontre na posse
de uma terceira pessoa.
Ex: Pai doa imóvel para filha, e na doação insere as cláusulas restritivas do direito de
propriedade. Se esse imóvel fruto de doação e gravado ficar na posse de terceiros pelo tempo
suficiente para usucapião o terceiro poderá constituir a seu favor o direito de propriedade,
consolidando a situação de fato em situação de direito. A filha não pode vender o imóvel, mas um
terceiro poderá adquiri-lo por usucapião, já que a usucapião é forma originária de aquisição da
propriedade que tem como fundamento, exclusivamente, a posse de fato, exercida por quem não
tem o direito de exercer, por tempo suficiente.
Coisa em comum
O fato da coisa ser objeto de comunhão e pertencer à uma pluralidade de sujeitos não
inviabiliza um terceiro adquiri-la por usucapião.
Um condômino pode adquirir por usucapião a cota parte do outro? O herdeiro pode adquirir por
usucapião o bem da herança? Um vizinho pode adquirir a vaga de garagem do outro? A situação
jurídica é a mesma, trata-se de coisa em comum.
Quanto à forma, um condomínio pode ser:
- pro diviso: o condomínio existe apenas para o mundo jurídico, já que a parte de cada
condômino já está determinada. A coisa já foi, de fato, dividida.
- pro indiviso: se a coisa não estiver dividida de fato, todos os condôminos usufruem da coisa
em sua integralidade, totalidade. Não confundir com bem indivisível, já que a coisa é passível de
divisão, mas não é porque toda sua extensão está em comum com todos os coproprietários.
Ex: edifício de apartamentos/salas: nas unidades autônomas: o condomínio é pro diviso, cada
proprietário está localizado em uma parte certa; já nas áreas em comum: pilotis, áreas de lazer,
elevador, escadaria, o condomínio é pro indiviso. É composto por partes pro divisas e partes pro
indivisas.
Existem prédios nos quais as vagas de garagem estão identificadas. No entanto, existem
prédios nos quais as garagens funcionam como estacionamento, cada um estaciona o veículo
onde encontrar lugar.
Se o condomínio for pro diviso, é perfeitamente possível que um condômino possa adquirir por
usucapião a cota parte do outro, desde que esteja na posse de fato da cota parte que pertença ao
vizinho.
Se o condomínio for pro indiviso não há possibilidade de um condômino adquirir a cota parte do
outro. Ele pode adquirir a totalidade da coisa, desde que tenha posse exclusiva.
Portanto, sendo as vagas do edifício delimitadas, se porventura o proprietário da vaga A
estiver, de fato, usando a vaga B, ele poderá, com o transcurso do tempo, adquiri-la por
usucapião.
Um vizinho pode adquirir por usucapião a vaga de garagem do outro? Quando a vaga for
identificada, determinada (pro diviso), poderá. Se for área comum, não haverá possibilidade.
O herdeiro pode adquirir por usucapião o bem da herança? Apenas quando o condomínio for
pro diviso. Se o condomínio for pro indiviso não há possibilidade de um condômino adquirir a cota
parte do outro. Ele pode adquirir a totalidade da coisa, desde que tenha posse exclusiva.
Ex: falecido deixa 15 filhos e uma pequena casa. Dos 15 filhos, 1 está bem de vida, 13 estão
levando a vida como podem, e 1 é bem pobre. O que está com a pior situação econômica é
deixado morar da casa.
A pequena casa, que não está dividida em 15 partes iguais, é bem pro indiviso. O irmão que lá
mora, poderá usucapir a casa na qual, de fato, exerce a posse, desde que exclusiva. Os outros
herdeiros quem deverão provar a mera detenção do possuidor. Ou seja, o herdeiro estará
usucapindo a cota parte de todos, e não a de um ou outro herdeiro.
Bens objeto de garantia real poderão ser objetos de usucapião
Ex: Tonhão deu em favor da Caixa Econômica Federal um imóvel em hipoteca para garantir o
pagamento de um financiamento. O imóvel dado em hipoteca pode ser adquirido por usucapião a
terceiro?
Sim, usucapião é forma de aquisição originária que tem como fundamento a posse de fato
prolongada no tempo. Se o terceiro de fato está na posse do imóvel que Tonhão havia hipotecado,
o problema passa a ser também do credor. O credor hipotecário possui a posse indireta do bem e
deveria, também, ter se oposto àquela situação enfrentada por terceiro. Caso não o faça, o direito
não socorre aos que dormem.
Requisito Temporal para fins de Usucapião
O tempo como requisito para usucapião varia de acordo com a modalidade invocada pelo
possuidor. Mas em todas as espécies diferentes de usucapião o tempo se apresenta como
requisito genérico.
A posse mansa, pacifica, com animus domini e exercida sobre coisa hábil deve ser ininterrupta,
se prolongar no tempo.
É possível para preenchimento do requisito temporal a soma de tempos de posse exercidas
por pessoas diferentes. É perfeitamente possível a um sucessor unir o seu tempo de posse ao
tempo de posse do seu antecessor.
A posse pode ser transmitida por:
- ato causa mortis: a posse é transmitida do mesmo modo que se transmite a propriedade
alodial. Os herdeiros do falecido lhe sucederão não só no direito de propriedade, mas como
também, na posse que o falecido de fato estava a exercer. Quando a posse é transmitida por ato
causa mortis é chamada de sucessão. Neste caso, a posse será transmitida aos herdeiros,
necessariamente, com as mesmas características.
- ato inter vivos: chamada de acessão. Faculdade que a lei concede ao sucessor de unir o
tempo de posse do antecessor. O sucessor só valerá desta faculdade se a posse do antecessor
for boa. Se o antecessor tinha posse que não era posse mansa, pacifica, com animus domini, o
sucessor poderá desprezar o tempo anterior, e para fins de usucapião começar a contar seu
próprio tempo de posse.
A posse do locatário não gera usucapião, já que advém de uma relação jurídica pessoal que
confere ao locatário o direito de possuir a coisa.
Sucessão: O contrato de locação findou e o locatário permaneceu na coisa locada, quando
deveria restituir a coisa locada ao locador. A posse, nesse momento, se transformou em injusta.
Posse injusta não gera usucapião. O ex-locatário morre, e seus herdeiros até herdarão a posse
injusta, mas a posse não será passível de usucapião.
Acessão: O locatário tinha que restituir a coisa e não restituiu. Negociou a coisa que de fato
estava com ele com terceiro. O terceiro poderá usucapir, desde que ele conte exclusivamente com
o seu próprio tempo de posse, não se valendo da possibilidade de somar ao seu tempo de posse
a posse do seu antecessor.
Prescrição
A contagem do tempo para fins de usucapião se vale das mesmas regras da prescrição. Ou
seja, os fatores/circunstâncias que impedem, suspendem ou interrompem os prazos
prescricionais, também impedirão, suspenderão ou interromperão a contagem de tempo para fins
de usucapião, conforme artigos 197, 198 e 199 do CC/02.
Art. 197. Não corre a prescrição: I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal; II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar; III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela. Art. 198. Também não corre a prescrição: I - contra os incapazes de que trata o art. 3o; II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios; III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra. Art. 199. Não corre igualmente a prescrição: I - pendendo condição suspensiva; II - não estando vencido o prazo; III - pendendo ação de evicção.
Hipóteses
Se não corre prescrição contra absolutamente incapaz, quer dizer que se a coisa de fato
possuída pertencer a incapaz, não que ela não seja hábil de ser adquirida por usucapião, mas
será insuscetível de ser adquirida desta maneira porque o tempo não correrá contra o proprietário.
Se não corre a prescrição entre ascendentes e descendentes ao longo do poder familiar,
significar que nem o pai poderá adquirir por usucapião o bem do filho menor, nem o filho menor,
poderá adquirir por usucapião do bem do pai.
Atenção: “durante o poder familiar”. Só estão sujeitos ao poder familiar os filhos menores. O
filho maior poderá adquirir bem do pai por usucapião. Convém recordar que só gera usucapião o
ato de posse, e não de detenção. Não induz posse, e sim, mera detenção, os atos de permissão
ou tolerância ou adquiridos de forma violenta ou clandestina.
Nessa linha de abordagem, importante relembrar que já foi apresentada na aula de Direito de
Família a crítica quanto à Usucapião Familiar (artigo 1240-A do CC/02, introduzido pela Lei nº
12.424/11).
Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011) § 1o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. § 2o (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)
Essa modalidade foi criada para permitir que o cônjuge possa usucapir a meação do outro
cônjuge. Quem pede já é proprietário. O que se conquista aqui é a meação do cônjuge
abandonador.
Nesse caso, contaremos os dois anos de posse a partir do abandono, e não do divórcio (já que
após divórcio não há que se falar em abandono), ou seja, na constância da sociedade conjugal
(antes do divórcio). No entanto, não corre prescrição entre cônjuges na constância da sociedade
conjugal. A lei admite que o tempo para fins da usucapião familiar flua em circunstância que não
corre a prescrição. Exceção à regra.
Situação: uma pessoa começou a exercer a posse de um imóvel no ano de 2000. Naquele
imóvel o possuidor manteve a sua moradia habitual, o que lhe permite invocar a seu favor o
usucapião extraordinário, que prevê 10 anos de posse.
No ano de 2010, quando o possuidor preencheu o requisito temporal para usucapião, ele
começou a providenciar os documentos para ajuizar a ação respectiva. Ingressada a ação, a
matrícula do imóvel noticiava a morte do proprietário em 2005. O proprietário deixou herdeiros,
dentre eles, um filho de 6 anos.
O possuidor já teria os requisitos necessários para a usucapião propondo a ação em 2011?
Não.
2000: início da posse.
Possuidor exerce 5 anos de posse.
2005: morte do proprietário, que deixa sucessor absolutamente incapaz (não corre
tempo para fins de usucapião). O tempo permanecerá suspenso até que esse herdeiro
complete 16 anos.
Tempo suspenso.
2011: ingresso da ação de usucapião, mas sem o preenchimento do requisito
temporal (apenas 5 anos de posse).
2015: cessa a suspensão do tempo (cessada a suspensão, o prazo volta a correr
pelo remanescente).
2020: o requisito temporal de 10 anos só será atingido em 2020.
Portanto, sempre que questionados sobre preenchimento dos requisitos para usucapião, é
necessário verificar se, além da posse ser mansa, pacifica, com animus domini e exercida sobre
coisa hábil; se ela, de fato, se prolongou pelo tempo necessário. Para verificar o preenchimento do
critério temporal, imprescindível perquirir se não houve nenhuma hipótese de suspensão,
interrupção ou de impedimento da fluência do tempo.
Espécies de Usucapião
A usucapião pode ser modo de constituição de bens móveis e imóveis.
Espécies de usucapião para bens imóveis: No CC/02 temos sete modalidades de usucapião, e
no Estatuto da Cidade tem-se mais uma modalidade.
1) Usucapião extraordinário: Artigo 1238, caput, do CC/02
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Essa modalidade exige do possuidor tão somente a posse pelo tempo necessário de 15 anos.
É a espécie de usucapião que mais tempo do possuidor é exigido.
2) Usucapião extraordinário qualificado: artigo 1238, parágrafo único, do CC/02
Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
O prazo de 15 anos pode ser reduzido para 10 anos na modalidade de usucapião
extraordinário qualificado.
Nesse caso, além da posse e do tempo de 10 anos, exige-se que o possuidor exerça ali a sua
moradia habitual, ou que tivesse realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
Reduz-se o tempo necessário de posse como forma de premiar o possuidor que
atende/cumpre a função social da propriedade.
3) Usucapião ordinário: artigo 1242 do CC/02
Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.
São requisitos: a posse, o tempo de 10 anos, além da exigência de que o possuidor tenha justo
título e boa fé.
Ou seja, além dos dois requisitos genéricos: pose e tempo, exige-se dois requisitos
específicos. Em que pese serem dois requisitos específicos, basta a comprovação de um deles: o
justo título, pelo qual se presume a boa-fé. Todo possuidor de justo título se presume possuidor de
boa-fé.
Justo título: todo instrumento que, a rigor, permitiria a pessoa adquirir a propriedade de forma
ordinária, ou seja, através do registro, mas que, em virtude de um defeito que esse documento
apresenta, impede o ato registral.
Todo justo título é documento viciado/defeituoso, se fosse perfeito, procederia ao registro.
Ex: escritura pública na qual se apresenta o vendedor como sendo uma pessoa casada que
não obteve a autorização da sua esposa. A falta de autorização de uma pessoa casada para
alienar imóvel, impede o registro.
Escritura pública na qual se apresenta o vendedor um pródigo, que não estava devidamente
assistido por seu curador. Não pode dispor de seu bem sem autorização.
Todo justo título é documento defeituoso, mas que terá o condão de reduzir o tempo
necessário de posse, de 15 para 10 anos.
O usucapião ordinário é forma de regularizar a situação das pessoas que adquiriram a
propriedade de maneira viciada. O negócio jurídico que gerou a aquisição é defeituoso, mas que,
diante da posse que de fato o adquirente exerce, permite regularizar a situação.
4) Usucapião ordinário qualificado: artigo 1242, parágrafo único, do CC/02
Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico.
É espécie de usucapião que permite regularizar a situação de pessoas que adquiriram
onerosamente o imóvel.
Prevê como requisitos: a posse no tempo de apenas 5 anos, para aqueles que adquiriram
onerosamente um imóvel, chegaram a registrá-lo em seu nome, mas esse registro foi
posteriormente cancelado.
Se o adquirente estiver na posse de fato do imóvel o qual adquiriu onerosamente, cumprindo a
sua função social, ou seja, mantendo ali a sua moradia, ou realizando obras ou serviços de
caráter produtivo ou investimentos de interesse social e econômico relevantes, conseguirá
regularizar a sua situação através do usucapião ordinário qualificado.
Ex: João, por escritura pública de compra e venda, vende um imóvel a Pedro. De posse da
escritura pública de compra e venda, Pedro vai ao cartório e registra o imóvel em seu nome.
Ocorre que, Tonhão, na qualidade de credor quirografário de João, propõe contra João e Pedro
uma Ação Pauliana para anular a compra e venda do imóvel, sob fundamento de que essa
operação teria caracterizado fraude contra credores, já que, quando João vendeu o imóvel a
Pedro, ele já estava previamente insolvente, cuja insolvência era notória, ou era de conhecimento
de Pedro.
O juiz, convencido de que a venda foi fraudulenta, julgou procedente o pedido de Tonhão e
anulou o negócio jurídico celebrado por João e Pedro. Com o cancelamento da compra e venda,
cancela-se o registro. A procedência do pedido de anulação do negócio por fraude contra
credores, gera a anulação do registro.
Se Pedro estiver na posse desse imóvel, por mais de 5 anos, atendendo a sua função social
isto é, mantendo nele a sua moradia, ou se já realizara ali investimentos de interesse econômico
ou social relevantes, ele conseguirá regularizar a sua situação mediante o usucapião ordinário
qualificado (posse pelo tempo necessário, aquisição onerosa, registro cancelado, função social).
A posse, nesse caso, é mansa, ou seja, exercida sem oposição? Quando Tonhão promove a
citação de Pedro na Ação Pauliana, a citação do devedor interrompe a contagem do tempo para
fins de usucapião. Para que Pedro preencha os requisitos, é necessário que o tempo (5 anos de
posse) tenha sido exercido antes da citação, ou que preencha os requisitos após a ação.
5) Especial rural: artigo 1239 do CC/02 (que reproduz a redação do artigo 191 da CR/88)
Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade. Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.
Exige a posse pelo tempo de 5 anos, apenas aplicável para área rural que não exceda à 50
hectares, que esteja sendo usada pelo possuidor que mantivera ali a sua moradia, tendo tornado
aquela terra produtiva com o seu trabalho ou com o trabalho de sua família, desde que esse
possuidor não seja proprietário de nenhum outro imóvel, quer esse outro imóvel seja urbano ou
rural.
Essa modalidade de usucapião pela primeira vez limitou a área possuída: não poderá exceder
à 50 hectares. O limite não é para aquisição da propriedade, o limite diz respeito à área possuída
(área total).
Quando o possuidor ingressar com a ação de usucapião deverá instruí-la com o memorial
descritivo e apontar todos os confinantes (afasta a deslealdade processual, viabiliza a visualização
do tamanho da área que se pretende usucapir).
Para fins de comprovação do requisito de não ser o possuidor proprietário de outro imóvel
urbano ou rural: certidão negativa do INCRA que possui um cadastro de amplitude nacional –
certifica que o possuidor não é proprietário de outro imóvel rural.
No que toca a comprovação de não proprietário de imóvel urbano, não se faz viável/crível
requerer certidão de todos os cartórios de imóveis, de todas as comarcas, de todo o território
nacional. A prática forense até exige certidão negativa dos 7 cartórios imobiliários da comarca de
Belo Horizonte, mas é diligência de precaução, já que o possuidor pode ser proprietário de outro
imóvel urbano em qualquer outra cidade.
Mostra-se mais viável que o possuidor declare, nos termos da lei, não ser proprietário de outro
imóvel urbano ou rural, e quem quiser que prove o contrário - efeito da posse que inverte o ônus
da prova.
6) Usucapião especial urbano: artigo 1240 do CC/02
Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2o O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
Os requisitos são praticamente os mesmos da modalidade de usucapião especial rural. Será
necessária a posse pelo mesmo prazo de 5 anos, haverá a limitação da área possuída, mas como
se trata de área urbana, não poderá exceder a 250 m², que esteja sendo usada para moradia do
possuidor. Não há necessidade de que o possuidor torne a área produtiva, já que a área urbana
destinada à moradia já atinge a sua função social. O possuidor também não poderá ser
proprietário de outro imóvel, quer seja ele urbano, quer seja ele rural. Essa espécie de usucapião
só será reconhecida ao mesmo possuidor uma única vez.
Destaca-se como requisito específico: não ter sido o possuidor beneficiado antes por igual
direito (por essa modalidade específica de usucapião). Se o possuidor já adquiriu a propriedade
de imóvel por outra modalidade de usucapião, desde que não seja mais proprietário desse imóvel
urbano ou rural, ele poderá usucapir por esta modalidade.
7) Usucapião familiar: artigo 1240-A
Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011) § 1o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. § 2o (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)
O artigo 1240-A foi introduzido pela lei 12.424/11. É espécie de usucapião urbano.
O usucapião familiar só pode ser invocado pelo ex-cônjuge/companheiro, que tiver sido
abandonado pelo outro, em área urbana, que não exceda à 250m², na qual o abandonado irá
permanecer na posse direta do bem, por 2 anos, mantendo ali a sua moradia, desde que não seja
proprietário de outro imóvel, urbano ou rural, e não seja beneficiado anteriormente por igual direito
(usucapião familiar).
Ao se comparar essa modalidade de usucapião familiar com a espécie usucapião urbano,
temos como diferenças: o tempo, que no caso da usucapião familiar é de apenas 2 anos e a
qualidade específica do possuidor: ser ex-cônjuge/companheiro de quem lhe abandonara.
Essa modalidade foi criada para permitir que o cônjuge possa usucapir a meação do outro
cônjuge. Quem pede já é proprietário. O que se conquista aqui é a meação do cônjuge
abandonador.
O artigo 1240-A do CC/02 sofre várias críticas, vamos a elas:
Posse: o texto do artigo cita a posse direta por mais de 2 anos. Posse direta é aquela que a
pessoa recebe por força de uma relação jurídica real ou pessoal, e não gera a usucapião. A
redação deveria ser “posse” e não “posse direta”. O enunciado nº 502 da V Jornada de Direito
Civil assim dispõe:
502 – O conceito de posse direta referido no art. 1.240-A do Código Civil não coincide com a acepção empregada no art. 1.197 do mesmo Código.
Prescrição: Nesse caso, contaremos os dois anos de posse a partir do abandono, e não do
divórcio (já que, após divórcio, não há que se falar em abandono), ou seja, na constância da
sociedade conjugal (antes do divórcio). No entanto, não corre prescrição entre cônjuges na
constância da sociedade conjugal. A lei admite que o tempo para fins da usucapião familiar flua
em circunstância que não corre a prescrição.
Direito de família: coloca como requisito o abandono, atingindo a liberdade do cônjuge.
Abandono não é culpa, mas aparenta ser nesse caso. Forma de prestigiar o abandonado.
A Lei nº 12.424/11 entrou em vigor na data de sua publicação, ou seja, os dois anos de posse
direta impostos pelo artigo não poderiam ser calculados anterior à Lei.
Logo que publicada a Lei, foi proferida a primeira decisão sobre o tema, por juiz da Vara de
Família, por requerimento da Defensoria Pública, que conferiu a usucapião familiar ao
abandonado. Essa decisão sofreu críticas: os dois anos de posse não poderiam ser contados
antes da lei. O juiz retroagiu, permitiu que a lei fosse aplicada para aproveitar o tempo de posse já
transcorrido. Quando o cônjuge abandonou o lar ele não tinha essa possibilidade de perder a sua
meação pela usucapião – surpreendeu o proprietário. Ademais, a matéria (usucapião familiar)
deverá ser apreciada pela Vara Cível (ou de Registro Público, onde exista) e não Vara de Família.
8) Usucapião coletivo: prevista no Estatuto da Cidade - artigo 10 da Lei nº 10.257/01
Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural. § 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas. § 2o A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis. § 3o Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cada possuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideais diferenciadas. § 4o O condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível de extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços dos condôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição do condomínio.
§ 5o As deliberações relativas à administração do condomínio especial serão tomadas por maioria de votos dos condôminos presentes, obrigando também os demais, discordantes ou ausentes.
Exige-se a posse há mais de 5 anos para área superior a 250 m² que esteja sendo ocupada
para fins de moradia de população de baixa renda que a esteja ocupando em partes/quinhões não
identificados.
Essa modalidade foi introduzida no ordenamento jurídico para regularizar a situação dos
aglomerados/comunidades.
Trata-se de usucapião coletivo porque a sentença declarará a propriedade em nome de toda
população. Os efeitos da sentença de procedência alcançarão toda a população.
Ressalta-se que não se trata de ação coletiva. Ela poderá ser ingressada por um dos
moradores possuidores daquela população, por vários deles em litisconsórcio facultativo, ou pela
associação que represente aquela comunidade, desde que constituída há mais de um ano.
Essa modalidade se vale de várias expressões de uso indeterminado. Como definir
“população”? Quantas pessoas são necessárias para constituir uma população? “População de
baixa renda”; se um dos moradores possuidores não for de baixa renda, inviabilizaria o pedido
apenas para ele ou para caracterização desta modalidade? Caso inviabilize só para o
determinado morador, após excluído, a sua parte acrescerá na dos demais, ou será excluída do
todo?
O juiz ao declarar o usucapião coletivo, constituirá condomínio. Caso haja 100 famílias em uma
extensa área, sendo que uma das famílias não é de baixa renda, o juiz declarará apenas 99% da
área ou 100% da área para 99 famílias?
Desde a vigência da lei, a professora ainda não visualizou caso concreto dessa modalidade.
Atenção: não confundir o usucapião coletivo com o instituto trazido pelo §4º, do artigo 1228, do
CC/02, já que muito similares:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. § 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. § 2o São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem. § 3o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente. § 4o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. § 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.
O artigo 1228, §4º, do CC/02, também disciplina sobre posse há mais de 5 anos exercida por
um número considerável de possuidores que tenham atendido, em uma extensa área, a sua
função social (obras ou serviços de caráter produtivo).
De fato, esse dispositivo não cita população de baixa renda, tampouco ocupação de quinhões
não identificados.
Inicialmente, houve quem defendesse que essa hipótese seria forma de usucapião coletivo,
porém, mais abrangente porque se enquadraria também a hipótese de área rural, e não apenas
urbana.
Esse entendimento foi superado em virtude no disposto no artigo 1228, §5º, do CC/02:
§ 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.
Determina que será devido ao proprietário uma justa indenização. Após pago o valor, a
sentença servirá para que aqueles possuidores pudessem registrar o imóvel em nome deles.
Se para se obter sentença que será levada a registro, há necessidade de pagamento de justa
indenização, então não se cuida de usucapião, que é forma originária de aquisição da
propriedade, que tem como fundamento, apenas a posse prolongada no tempo. Os possuidores,
na usucapião, não se vinculam a nenhum pagamento (nem ITBI) para aquisição da propriedade.
Usucapião não é oneroso.
O artigo 1228, §4º, do CC/02 se aproxima mais de uma desapropriação sui generis, que
poderia se chamar de desapropriação judicial, já que não será determinada por decreto advindo
do Poder Executivo, e sim por uma decisão judicial.
Situação: Reyvani é proprietária de uma extensa área que está, de fato, ocupada por um
número considerável de possuidores que construíram ali suas mansões (os ocupantes não
precisam ser de baixa renda). Como proprietária, Reyvani ingressa ação de reivindicação contra
os ocupantes, para reaver o lote que a pertence.
O §4º, do artigo 1228, do CC/02 traz nova tese defensiva que os ocupantes poderão alegar em
sede de ação reivindicatória, para elidir o pedido do proprietário. Em que pese Reyvani ser
proprietária, os ocupantes alegarão que estão na posse de boa-fé daquela extensa área há mais
de 5 anos, cumprindo a sua função social, já que, construíram estabelecimento comercial e casas
para moradia. O juiz privará o direito de reaver a propriedade de Reyvani, desde que ela receba,
anteriormente, a justa indenização.
O direito de propriedade é privado em favor das pessoas que atenderam a função social da
extensa área reivindicada.
O usucapião pode ser alegado como matéria de defesa, já o §4º, do artigo 1228, do CC/02, traz
tese que só poderá ser alegada em matéria de defesa, em ação reivindicatória (“o proprietário
pode ficar privado do imóvel reivindicado”).
A sentença que privou o proprietário do seu direito, além da comprovação do pagamento da
justa indenização, deverão ser levadas a registro para que o imóvel seja transferido para o nome
dos ocupantes.
A contagem do tempo de posse para essa desapropriação judicial, também se submete às
regras da prescrição.
Conclusões:
Quanto maior o tempo de posse, menor o número de requisitos a ser exigido pelo legislador.
Posse e tempo são requisitos genéricos porque presentes em todas as modalidades de
usucapião.
A sentença que reconhece a usucapião não é requisito para aquisição da propriedade em
nenhuma modalidade. A ação de usucapião não tem natureza constitutiva, e sim puramente
declaratória, pois visa tão somente reconhecer a pré-existência de um direito, gerando efeitos ex
tunc.
Situação: possuidor começou a possuir um imóvel em 1990. Em 1992 o possuidor casou-se
pelo regime da comunhão parcial de bens. Em 2010, o possuidor preencheu os 20 anos que se
faziam necessários para o usucapião extraordinário, sob vigência do CC/161. Em 2011 a vida em
comum tornou-se insuportável, quando o possuidor se divorciou. Em 2012, já divorciado, o
possuidor propôs a ação de usucapião, cuja sentença favorável transitou em julgado em 2015.
Início da posse: 1990.
Casamento: 1992.
Preenchimento do requisito temporal: 2010.
Divórcio: 2011.
Ingresso da ação de usucapião: 2012.
Transito em julgado da sentença favorável: 2015.
A ex-mulher do possuidor tem direito à meação? O bem foi adquirido na constância do
casamento?
Se a sentença fosse de natureza constitutiva, o possuidor seria proprietário em 2015, com o
trânsito em julgado da sentença favorável. Ocorre que, conforme já vimos, a sentença de
usucapião tem natureza declaratória, e como tal, gera efeitos ex tunc, retroativos.
Os efeitos da sentença retroagem a 2010, quando o possuidor preencheu os requisitos para a
usucapião, ou a 1990, quando o possuidor iniciou sua posse?
Se considerarmos que os efeitos da sentença retroagirão a 2010 (20 anos de pose), de 1990
até 2010, o possuidor possuiu coisa que na era dele, e, a depender do estado de boa-fé ou má-fé,
deverá pagar os frutos, terá responsabilidade pelos danos, poderá exigir pagamento pelas
benfeitorias. O próprio poder público preferiria que ele fosse proprietário desde 1990, porque caso
o possuidor pague imposto que incide sobre a propriedade, ele teria direito à repetição, já que só
será proprietário a partir de 2010.
A sentença que declara a usucapião retroagirá seus efeitos ao primeiro dia de posse. O bem foi
adquirido antes do casamento, porque o possuidor começou a possuí-lo antes do casamento,
então e ex-mulher não tem direito á meação.
Situação 2: Divórcio for anterior à 2010, ex-marido iniciou a posse, mas a ex-mulher que se
manteve na posse do imóvel após o divórcio. A posse lhe foi transmitida por ato inter vivos –
acessão na posse. A ex-mulher tem a faculdade de somar ao seu tempo de posse, o tempo de
posse do ex-marido para fins de usucapião.
Situação 3: Se o possuidor havia começado a exercer posse e morreu deixando viúva, a ação
de usucapião deverá ser proposta pela viúva e pelos herdeiros do falecido, porque se a
1 O usucapião extraordinário, na vigência do CC/16, estabelecia o prazo de 20 anos como requisito temporal. O
CC/02 reduziu esse prazo para 15 anos. Se em até 2003 o possuidor tivesse mais da metade do tempo exigido (pelo CC/16), fazia-se necessário que ele
completasse os 20 anos. Apenas quando o possuidor tivesse cumprido menos da metade do prazo estabelecido no CC/16, em 2003, que o prazo reduziria para 15 anos.
propriedade foi adquirida quando ele ainda era vivo, os herdeiros lhe sucederão não apenas na
posse, mas como também na propriedade.
Situação 4: Se o marido e mulher iniciaram na posse do imóvel juntos, caso o marido faleça, a
viúva permanecerá na posse da meação e os herdeiros do falecido lhe sucederão.
O polo ativo da ação de usucapião deverá ser composto pelo possuidor inicial ou seus
sucessores.
Tanto é fato que a sentença que reconhece usucapião tem natureza declaratória que a
usucapião pode ser alegada como matéria de defesa. Mesmo que o possuidor não tenha a
sentença que reconheça sua propriedade em relação ao imóvel, se ele já tiver a posse pelo tempo
suficiente, pode apresentar essa defesa como de mérito indireta para elidir o pedido
reivindicatório.
Formas ordinárias de aquisição da propriedade
Muito embora o direito de propriedade possa ser adquirido por usucapião, a usucapião não é a
forma ordinária de se adquirir bem, ela é forma extraordinária de constituição do direito de
propriedade.
A forma normal se dará com:
Tradição para os bens móveis.
Registro no Cartório de Registro de Imóveis para os bens imóveis.
O simples contrato, por si só, não é suficiente para constituir a propriedade em favor de quem
quer que seja. Quando as partes celebram contratos, na verdade, estarão constituindo
obrigações. Os contatos são negócios jurídicos porque são atos praticados com fim mediatos de
constituir para os contratantes obrigadões de dar, fazer e não fazer alguma cosia.
Quando as partes celebram contratos, uma se torna credora da outra. A cada obrigação que se
constitui para um dos contratantes corresponderá, para o outro, o direito de crédito.
Na celebração do contrato de compra e venda, constituem-se para o comprador e para o
vendedor obrigações: transferir a propriedade de um bem, pagar o valor correspondente do bem.
Na celebração do contrato de doação, constitui-se para o doador a obrigação de transferir para
o donatário a propriedade do bem. A obrigação assumida pelo doador é a mesma assumida pelo
vendedor, só que o vendedor condiciona a transferência da propriedade do bem ao recebimento
do preço correspondente. Por isso compra e venda é contrato oneroso e doação é contrato
gratuito.
Ocorre que, pelo simples contrato de doação ou compra e venda, o comprador e o donatário
não se tornam proprietários daquilo que compraram ou do que lhe foi doado.
Na celebração do contrato apenas se constitui o direito de crédito do comprador e do donatário.
Somente com o cumprimento das obrigações assumidas no contrato é que se constitui para o
contratante o direito real de propriedade.
Se se tratar de bem móvel, cumpre-se a obrigação com a entrega efetiva da coisa (tradição);
em se tratando de imóveis, cumpre-se a obrigação com o registro.
Só se constitui o direito de propriedade imóvel com o registro do ato translativo de propriedade,
que é o contrato de compra e venda, ou contrato de doação.
Situação:
Bem móvel: Tonhão foi em uma concessionária, comprou o carro e pagou à vista. A
concessionária combinou de entregar o veículo no dia seguinte à negociação. Quando Tonhão
chegou na concessionária, no dia e hora marcados, percebeu que a concessionária havia vendido
o seu veículo à terceiro.
Tonhão não poderá ingressar com ação reivindicatória contra terceiro. Ele terá o direito de
reaver o valor que pagou acrescido de perdas e danos. Só com a entrega efetiva que Tonhão se
tornaria proprietário e habilitado a ingressar com ação reivindicatória.
O contato celebrado com a concessionária constituiu um direito de crédito: receber um carro da
concessionária, e não propriedade.
Bem imóvel: ainda que o contrato de compra e venda e de doação seja celebrado por
instrumento público, e que, portanto, seja válido, ele por si só não é suficiente para constituir em
favor do comprador e donatário o direito real de propriedade.
Só se adquire a propriedade quando o contrato de compra e venda ou de doação, celebrado
por escritura pública, for levado ao registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Escritura pública ≠ Registro
Escritura pública: é a forma adequada de se celebrar um contrato que tenha por objeto
bens imóveis de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente no país. A
escritura pública é lavrada no Cartório de Notas e, por si só, não tem o condão de fazer
com que o comprador e donatário se tornem donos dos bens comprados e doados.
Registro: o direito de propriedade se constitui com o registro no cartório imobiliário. O
Brasil adota o sistema Romano no tocante ao registro, pelo qual o registro tem natureza
constitutiva, constitui o direito real de propriedade; e não o sistema Francês, pelo qual o
contrato, por si só, já constitui para o contratante o direito de propriedade, e o registro,
nesse caso, só serve para conferir publicidade.
Enquanto o contrato gera direito pessoal, o cumprimento do contrato gera direito real.
Registro
O registro pode ser concebido em seu sentido amplo ou estrito.
Registro em sentido amplo: são os registros realizados na matrícula de um imóvel. Todo imóvel
registrado necessita de matrícula, caso não haja matrícula anterior. A matrícula do imóvel é feita
no Livro nº 2 do Cartório de Registro de Imóveis. Nesse Livro serão feitos todos os registros e
averbações em uma sequência numérica, observando-se a cadeia dominial. Na matrícula nº ___
será inserida toda a história de um imóvel.
O registro em sentido amplo é gênero do qual são espécies:
Registro em sentido estrito/propriamente dito: serão representados pela
letra “R”, seguido de número. Ocorrerá:
Quando a propriedade do imóvel for transmitida, a qualquer título
de uma pessoa para outra. Os registros que importam na
transmissão da propriedade podem ter:
o Natureza declaratória: o registro apenas confere
publicidade. Ex: sentença proferida em ação de usucapião
(demonstra que a propriedade foi adquirida de forma
originária), formal de partilha expedido nos autos de
inventário ou escritura de partilha quando for
administrativa (demonstra que a propriedade foi
transmitida por ato causa mortis).
o Natureza constitutiva: constituição de direitos. Demonstra
que a propriedade foi transmitida por ato inter vivos:
contrato de compra e venda, contrato de doação, carta de
adjudicação, carta de arrematação. Esse é o registro
como forma ordinária de aquisição do direito de
propriedade imóvel.
Quando a propriedade for gravada com ônus real: hipoteca,
superfície, servidão, usufruto... O registro irá demonstrar que os
poderes dos proprietários não são plenos. Retira-se um ou algum
dos seus poderes, para que eles constituam direitos reais nas
mãos de outras pessoas.
Averbações: serão representados pela letra “Av”, seguido de número.
São feitas para anotações secundárias:
Aquelas que não implicarão na alteração da titularidade.
Não importarão em gravame real.
Ex: alteração do estado civil do proprietário, celebração de
contrato de pacto antenupcial do proprietário, alteração do nome
da rua na qual o imóvel está situado.
Situação: Se esse imóvel, ao ser aberta a matrícula, era de propriedade de João, o Registro nº
1 será feito em nome de João. Se João vendeu a propriedade para José – registro nº 2. Se José
morreu e deixou seu imóvel para seus herdeiros, procede-se a um 3º registro, indicando a
transmissão. Se os herdeiros de José doaram o imóvel para a Santa Casa, será o registro de nº 4.
Se a rua onde o imóvel estava situado mudou de nome, procede-se à averbação indicando a
alteração do nome da rua.
Livro nº 2
Matrícula nº ____
R1: Propriedade de João
R2: João → José
R3: José → Herdeiros
R4: Herdeiros → Santa Casa
Av5: alteração do nome da rua
O legislador na nossa codificação civil estabeleceu que, enquanto o ato translativo da
propriedade não for levado ao registro, o alienante continua sendo o proprietário do imóvel. As
regras que dizem respeito ao registro como forma ordinária de constituição da propriedade estão
no artigo 1245 do CC/02.
Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. § 1o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel. § 2o Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel.
Ou seja, até que se prove o contrário, o proprietário é aquele cujo nome figurar no último
registro que for feito na matrícula do imóvel. Essa presunção, portanto, é relativa/iuris tantum,
admitindo prova em sentido contrário.
Partindo do exemplo acima: se a Santa Casa vendeu o imóvel em questão para Tonhão,
enquanto o Tonhão não registrar, a Santa Casa permanece como proprietária. Agora, se houve o
registro do contrato de compra e venda no cartório imobiliário, o proprietário será Tonhão.
Enquanto não houver o cancelamento do registro, com a eventual invalidade do ato, Tonhão
permanecerá dono.
Livro nº 2
Matrícula nº ____
R1: Propriedade de João
R2: João → José
R3: José → Herdeiros
R4: Herdeiros → Santa Casa
Av5: alteração do nome da rua
R6: Santa Casa → Tonhão
Ônus real só se constitui com o registro.
Sempre que o adquirente, usucapiente ou herdeiros quiser promover o registro para declarar
ou constituir o seu direito de propriedade, ele deverá comparecer no Cartório de Registro de
Imóveis munido da documentação: instrumento (contrato, sentença, formal/escritura de partilha ou
carta de arrematação/adjudicação) e comprovante de pagamento do imposto de transmissão (ITBI
– se foi transmitida onerosamente, ou ITCD – se foi transmitida gratuitamente e por ato causa
mortis). O comprovante de pagamento de imposto será dispensado no caso de aquisição por
usucapião (forma originária).
O oficial procederá, então, à prenotação. Prenotar é lançar no Livro nº 1, do Cartório de
Registro de Imóveis, a solicitação do registro. O Livro nº1 é livro de protocolo que funciona como
uma chave geral de todos os registros. Livro nº1 é de protocolo e o Livro nº2 é de matrícula.
A prenotação é realizada a partir de uma ordem numérica crescente, que tem como função
estabelecer a prioridade no registro. Após a solicitação, o oficial terá 30 dias para promover o
registro, que o fará de acordo com a prioridade.
Se toda a documentação estiver em conformidade com a lei, o oficial procederá ao registro no
Livro nº2, matrícula.
Se a documentação não estiver completa, requererá que a parte diligencie no sentido de
apresentar a documentação faltante, ou poderá promover a “suscitação de dúvida”: informar ao
juiz da Vara de Registros Públicos a situação que se apresenta (ex: interessado solicita que se
proceda ao registro de contrato de compra e venda, mas sem comprovação de pagamento do
respectivo imposto). Caso a dúvida seja julgada procedente, o oficial não registrará até que o
interessado regularize sua situação, se a dúvida for julgada improcede, o oficial procederá ao
registro.
A prenotação possui dupla função: além de estabelecer a prioridade do registro, servirá como
marco inicial de aquisição do direito de propriedade, quando transmitida por ato inter vivos,
conforme artigo 1246 do CC/02:
Art. 1.246. O registro é eficaz desde o momento em que se apresentar o título ao oficial do registro, e este o prenotar no protocolo.
Situação: Tonhão, como proprietário do imóvel que adquiriu da Santa Casa, o vende para
Pedro. Foi lavrada a escritura pública de compra e venda no Cartório de Notas, na data de
fevereiro de 2014. Ocorre que, o mesmo imóvel que Tonhão vendeu a Pedro, ele resolveu doar,
por escritura pública, em março de 2015, para Lucas.
Lucas, de posse da escritura pública de doação, se dirige ao Cartório de Registro de Imóveis e
solicita o registro, em maio de 2015, quando foi feita a prenotação de nº 003.
Quando Pedro tomou ciência da situação, em junho de 2015, se dirigiu ao Cartório e solicitou o
registro da escritura pública de compra e venda, e foi feita a prenotação de nº 004.
O oficial, seguindo a ordem exposta no Livro nº 1, após análise da escritura pública e da
situação das partes, em julho de 2015, procede ao registro (R7) para constituir a propriedade em
favor de Lucas.
Livro nº 2
Matrícula nº ____
R1: Propriedade de João
R2: João → José
R3: José → Herdeiros
R4: Herdeiros → Santa Casa
Av5: alteração do nome da rua
R6: Santa Casa → Tonhão
R7: Tonhão → Lucas
No momento em que o oficial vai proceder à solicitação de Pedro, percebe que o imóvel, por
não mais ser de Tonhão, não poderá ser transmitido a ele.
Ainda que Pedro tenha adquirido onerosamente, e o tenha feito antes de Lucas, a prioridade do
registro foi de Lucas, porque ele prenotou em primeiro lugar (solicitou o registro em primeiro
lugar).
A escritura pública de compra e venda apresentada por Pedro é suficiente para cancelar o
registro em favor de Lucas? Não. Qual o direito de Pedro? Ação de indenização contra Tonhão
por descumprimento contratual, já que Tonhão se obrigou a transferir a ele a propriedade, e a
propriedade do imóvel se dá com o registro. Possui mero direito pessoal (responsabilidade civil
contratual), e não direito real.
A partir de quando Lucas é considerado proprietário do imóvel? Maio de 2015, quando realizou
a prenotação.
Situação:
Lucas deu o imóvel em hipoteca.
Livro nº 2
Matrícula nº ____
R1: Propriedade de João
R2: João → José
R3: José → Herdeiros
R4: Herdeiros → Santa Casa
Av5: alteração do nome da rua
R6: Santa Casa → Tonhão
R7: Tonhão → Lucas
R8: hipoteca conferida para garantia de satisfação do seu credor.
Contrato de promessa de compra e venda
Hipótese nº1: Risco para o vendedor.
Pretendo comprar o imóvel, mas não tenho dinheiro suficiente para quitá-lo. Ao celebrar o
contrato, convenciono que o pagamento então se dará em 30 parcelas: algumas mensais, duas
semestrais e uma anual.
Celebro o contrato de compra e venda com o vendedor. Eu me obrigo a pagar conforme
convencionado. O vendedor se obriga a me transferir a propriedade. Eu levo o contrato de compra
e venda ao registro e me torno proprietária do imóvel antes de quitar o pagamento.
Hipótese nº 2: Risco para o comprador.
Pretendo comprar apartamento que ainda será construído pela construtora. Celebro com a
construtora o contrato de compra e venda, no qual ela assume a obrigação de me transferir a
propriedade. Pago a construtora o valor avençado, mas o imóvel ainda não possui matrícula para
que eu proceda ao registro e constitua, a meu favor, o direito de propriedade.
O contrato de compra e venda me tornou credora da construtora, mas não proprietária.
Hipótese nº 3: Comodidade das partes que não querem ir ao cartório proceder à lavratura do
contrato de compra e venda em Cartório de Notas.
A partir dessas hipóteses, é comum, na prática, as partes, antes de celebrarem o contrato de
compra e venda, celebrarem um contrato particular de promessa de compra e venda. A promessa
de compra e venda é contrato preliminar, por meio do qual os contratantes irão assumir obrigação
de fazer futura, qual seja, lavrar uma escritura definitiva de compra e venda.
Contrato de promessa de compra e venda ≠ contrato de compra e venda
O contrato de compra e venda, quando registrado, constitui para o comprador o direito de
propriedade. O contrato de promessa de compra e venda é preliminar, celebrado anteriormente ao
contrato de compra e venda.
O contrato de promessa de compra e venda, independente do valor do imóvel, poderá ser
celebrado tanto por escritura pública, quanto por escritura particular.
Nessa relação contratual há dois protagonistas:
- promitente comprador: promete, no futuro, comprar o imóvel.
- promitente vendedor: promete, no futuro, vender o imóvel.
Essa promessa de compra e venda constitui para o promitente comprador a mesma obrigação
que se constitui para o comprador: obrigação de pagar o preço.
A obrigação assumida pelo promitente vendedor é diferente da assumida pelo vendedor. O
vendedor assume obrigação de dar: transferir a propriedade com o registro. O promitente
vendedor assume obrigação de fazer: outorgar uma escritura definitiva de compra e venda.
Ou seja, se o vendedor não tem a coisa pronta para entregar, poderá fazê-lo no futuro, e se o
comprador não tem o valor todo para quitar de imediato, poderá fazê-lo no futuro. Se as partes
não querem se dirigir ao cartório para lavrar a escritura pública de compra e venda, poderão fazê-
lo no futuro.
Desde que a promessa de compra e venda seja irretratável, e ela será todas as vezes que o
direito de arrependimento não tiver sido convencionado (não houver cláusula de arrependimento),
tanto o promitente comprador, como o promitente vendedor podem exigir suas respectivas
obrigações.
Direito do promitente comprador
Se a promessa de compra e venda for levada ao registro no Cartório de Registro de Imóveis
(registro em sentido estrito), será conferida à promessa, eficácia real. Portanto, com o registro,
constitui-se em favor do promitente comprador um direito real chamado “direito do promitente
comprador”. Ressalta-se que esse direito não é direito de propriedade, é direito rela que recai
sobre bem alheio, conforme artigo 1225, inciso VII, do CC/02:
Art. 1.225. São direitos reais: (...) VII - o direito do promitente comprador do imóvel;
Direito de adquirir o imóvel que lhe foi prometido, ou seja, exigir a outorga da escritura definitiva
de compra e venda não só do promitente vendedor, mas também de terceiros a quem os direitos
dele forem transferidos. O direito do promitente comprador é direito real, e por isso acompanha a
coisa onde quer que ela esteja, nas mãos de quem quer que ela se encontre.
Nesse caso, do promitente vendedor, o promitente comprador poderá exigir a outorga da
escritura definitiva por força do contrato de promessa de compra e venda, sem necessidade de
registro. A vantagem de se registrar o contrato de promessa de compra e venda, é para permitir
ao promitente comprador que exija a outorga da escritura definitiva de compra e venda de alguém
que nada lhe prometeu.
Situação: Celebrado o contrato de promessa de compra e venda por instrumento particular, de
um apartamento. A promessa foi feita pelo valor de R$1.000.000,00. Ocorre que, quando o
apartamento ficou pronto, em virtude do boom imobiliário, foi avaliado pelo triplo do preço
avençado. A construtora então, vende o apartamento para terceiro por R$3.000.000,00.
Se o contrato de promessa de compra e venda não foi registrado no Cartório de Registro de
Imóveis, só se pode exigir da construtora o direito de indenização (responsabilidade contratual,
por descumprimento da obrigação assumida). Se registrado o contrato, pode-se agir contra
terceiro, exigindo que ele outorgue a escritura definitiva de compra e venda, por força do direito
real.
Havendo recusa de um ou de outro, pode-se requerer ao juiz a adjudicação: sentença que
substitua a escritura definitiva de compra e venda que estão recusando a dar ao promitente
comprador, que servirá como título para registro do imóvel.
Registro do contrato de compra e venda gera propriedade. Registro de contrato de promessa
de compra e venda gera direito do promitente comprador: adquirir o imóvel prometido onde quer
que ele esteja, nas mãos de quem quer que ele foi parar. Artigos 1417 e 1418 do CC/02:
Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel. Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.
A ação de outorga de escritura definitiva de compra e venda: é disponível para o promitente
comprador. Ele poderá manejá-la tanto em face do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem
os direitos do promitente vendedor foram transmitidos, desde que, para se propor contra terceiros,
a promessa tenha sido registrada, e, havendo recusa de algum deles, requerer adjudicação do
imóvel.
Caso a promessa não esteja registrada, não se poderá propor a ação de outorga contra
terceiros.
Quando o imóvel ainda não existe, o registro no Cartório do Registro de Imóveis deverá ser
feito no lote onde o imóvel será construído.
Direito de propriedade
O direito de propriedade é aquele que outorga ao seu titular as prerrogativas de uso, gozo e
disposição, permitindo que ele reaveja a coisa, onde quer que ela esteja, nas mãos de quem quer
que ela vá parar.
A partir dessa definição, detecta-se todos os poderes elementares a ela. Os poderes
elementares podem ser:
Conteúdo positivo: se referem ao domínio que o proprietário tem sobre o bem (uso,
gozo e disposição).
Proteção específica: permite que proprietário reaver a coisa, onde quer que ela esteja,
nas mãos de quem quer que ela vá parar.
Propriedade ≠ domínio
Domínio é o conteúdo positivo que decorre do direito de propriedade. Quem tem domínio é o
possuidor. O proprietário só terá o domínio, se além de proprietário ele também for o possuidor.
Propriedade alodial/plena: é aquela cujos poderes elementares da propriedade estão
concentrados nas mãos do proprietário.
Propriedade plena ≠ Propriedade absoluta
O proprietário não deve esquecer que toda propriedade deve atender a sua função social. O
legislador, embora no caput, do artigo 1228, do CC/02, tenha constituído em favor do proprietário
o domínio sobre aquilo que lhe toca, no decorrer do disposto nos parágrafos desse mesmo artigo,
controla o proprietário para que ele não abuse do seu direito, revelando que a propriedade plena
não é direito absoluto.
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
A propriedade será limitada quando for retirado das mãos do proprietário um ou mais poderes,
fazendo com que eles constituam um direito real autônomo, ou quando ela for resolúvel.
§ 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
O §1º revela o privilégio dos direitos meta individuais em detrimento do direito individual da
propriedade (exclusivamente particular). O domínio que o proprietário exerce sobre o que é seu é
controlado, direcionando a maneira com que ele atua, na direção de preservação das finalidades
econômicas e sociais, e de modo a preservar a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio
ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitando a poluição do ar e das águas.
§ 2o São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.
O proprietário não pode abusar do seu direito. Caso atue de forma desarrazoada, abusará do
seu direito, e quem abusa de direito comete ato ilícito (artigo 187 do CC/02), e, se causar danos a
outrem, ficará obrigado a indenizar.
§ 3o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.
Alerta: o proprietário pode ser privado do seu bem em casos específicos, de interesse maior.
§ 4o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. § 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.
Já estudado. É a chamada desapropriação judicial.
A função social da propriedade confere limitações, encargos e deveres ao proprietário, fazendo
com que ele atue nessa dimensão da sua preservação (função social). Portanto, o direito de
propriedade não é absoluto, a propriedade plena apenas indica que todos os poderes elementares
se reúnem no proprietário.
Propriedade limitada: será quando for gravada de ônus real ou quando for resolúvel.
A) Gravada com ônus real.
Usufruto tem origem na privação do direito de propriedade. É ônus real que pode recair na
propriedade alheia, e quando constituído, retira os poderes de conteúdo positivo de uso e gozo,
fazendo com que eles constituam outros direitos reais nas mãos do usufrutuário.
O bem imóvel, nesse caso, pertence ao nu proprietário (despido de dois dos seus poderes).
B) Propriedade resolúvel: é aquela constituída em favor de alguém, com a presença de
elemento acidental, que se, ou quando verificado, levará a sua extinção. O negócio jurídico
que constitui a propriedade, já apresenta condição ou termo, que se ou quando verificado
leva a sua extinção.
Exemplos de propriedades limitadas porque resolúveis:
1) Cláusula de retrovenda: Contratos de compra e venda que trazem cláusula de retrovenda.
É clausula especial do contrato de compra e venda que assegura ao vendedor o direito de
readquirir o imóvel vendido, no prazo de 3 anos, pelo mesmo preço, acrescido das despesas do
contrato.
Se o vendedor quiser recomprar o imóvel, a propriedade irá se resolver, por implemento de
condição já estabelecida no contrato. O comprador irá perder seu direito de propriedade por
motivo já estabelecido no contrato.
2) Venda feita por condômino a terceiro preterindo direito dos demais proprietários
Quando uma coisa em condomínio for indivisível, um condômino não poderá vender a
terceiros, sem antes dar aos demais coproprietários o direito de prelação, sob pena de, vendendo
ao terceiro a sua cota parte, os outros condôminos preteridos poderem, no prazo de 180 dias,
depositando o preço que o terceiro pagou, reaver a propriedade para eles.
Ou seja, o terceiro que adquire de um condômino cota parte em coisa indivisível adquire
propriedade resolúvel.
3) Fideicomisso
O fiduciário adquire a propriedade da herança, ou seja, os bens serão a ele transmitidos desde
logo da morte do testador. Ocorre que esta propriedade é resolúvel: tende a se extinguir com o
implemento de uma condição ou com o advento de um termo (que se, ou quando verificado,
levará à sua extinção).
Esse tipo de substituição só pode ser feita em favor de concepturo, só pode se nomear a
substituto fideicomissário a prole eventual de alguém (ainda será concebido, não confundir com o
nascituro, que já está concebido).
Segunda a lei, se o fideicomissário já tiver nascido por ocasião da morte do testador, a herança
deixada pelo testador será imediatamente atribuída a ele, e o fiduciário ficará apenas como
usufrutuário dela.
O fideicomisso é tipo de substituição testamentária, na qual se admite que uma pessoa herde
depois de outra. Herda o fiduciário, depois o fideicomissário.
4) Propriedade fiduciária
Direito à propriedade fiduciária ≠ Contrato de Alienação fiduciária
O contrato de alienação fiduciária constitui em favor do credor um direito de propriedade
fiduciária.
Comprador pretende adquirir um carro na concessionária, mas não possui dinheiro suficiente
para quitá-lo. A concessionária só vende à vista.
O comprador contrai um financiamento, para que a financeira pague à concessionária o valor
correspondente do carro que ele pretende adquirir. Como garantia de pagamento do
financiamento, o comprador transfere à financeira a propriedade do bem, mas ele permanece na
posse direta da coisa.
Através do constituto possessório se confere à financeira a posse indireta. A propriedade que o
comprador transfere à financeira, é a chamada propriedade fiduciária. Essa propriedade é
resolúvel, é constituída em favor da financeira mediante condição, tão logo o devedor quite o
débito, a propriedade resolver-se-á a seu favor.
A propriedade fiduciária é propriedade de afetação. Só foi transferida à financeira como
garantia de pagamento. Caso o devedor não pague, a financeira poderá proceder à busca e
apreensão do bem. A busca e apreensão do veículo tem natureza possessória, já que o não
pagamento do financiamento caracteriza esbulho.
Após buscado e apreendido o veículo ele será vendido, judicial ou extrajudicialmente, conforme
previsto no contrato, e, com o produto proveniente da alienação, a financeira receberá o seu
crédito. Eventual valor a mais, será restituído ao comprador/devedor.
Mesmo que a financeira seja proprietária do bem, se o comprador não pagar, ela não poderá
permanecer com a propriedade do bem (propriedade de afetação), já que esse só lhe foi
transferido como garantia de pagamento do crédito.
Ainda que a financeira seja proprietária do bem em fidúcia, esse bem ficará imune à ação de
seus credores, por ser propriedade de afetação.