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Don Carlo Guia Didáctica PROGRAMA EDUCATIVO DO TEATRO NACIONAL DE SÃO CARLOS VERDI Giuseppe Fortunino Francesco Verdi nasceu em Busseto, Itália, a 10 de Outubro de 1813, filho do dono de uma estalagem. A sua família tinha poucos recursos económicos, mas Verdi teve o apoio de seu pai e de alguns mecenas para estudar música. Aos 11 anos já era o organista da sua aldeia. Casa natal de Verdi em Busseto Aos 20 anos parte para Milão, a fim de se matricular no Conservatório de Música, mas a sua admissão é recusada por já ter ultrapassado a idade regulamentar e pelo relatório desfavorável dos examinadores sobre as suas s capacidades artísticas. Mas Verdi não desiste e procura um professor privado para lhe dar lições de música. Anos depois regressou a Busseto onde foi maestro da banda e mestre de capela. O seu amigo e mecenas Barezzi pediu-lhe para dar aulas de música à sua filha Margherita. A 4 de Maio de 1836, Verdi casa com Margherita Barezzi. Estreia-se como compositor dramático em 1839 com a Ópera Oberto”, no Scala de Milão. Retrato de Margherita Barezzi

D. carlo caderno didáctico

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Don Carlo

Guia Didáctica

PROGRAMA EDUCATIVO DO TEATRO NACIONAL DE SÃO CARLOS

VERDI

Giuseppe Fortunino Francesco Verdi nasceu

em Busseto, Itália, a 10 de Outubro de 1813,

filho do dono de uma estalagem.

A sua família tinha poucos recursos

económicos, mas Verdi teve o apoio de seu

pai e de alguns mecenas para estudar música.

Aos 11 anos já era o organista da sua aldeia.

Casa natal de Verdi em Busseto

Aos 20 anos parte para Milão, a fim de se matricular no Conservatório de Música, mas a sua

admissão é recusada por já ter ultrapassado a idade regulamentar e pelo relatório

desfavorável dos examinadores sobre as suas s capacidades artísticas.

Mas Verdi não desiste e procura um professor privado para lhe dar lições de música.

Anos depois regressou a Busseto onde foi maestro da banda e

mestre de capela.

O seu amigo e mecenas Barezzi pediu-lhe para dar aulas de

música à sua filha Margherita. A 4 de Maio de 1836, Verdi casa

com Margherita Barezzi.

Estreia-se como compositor dramático em 1839 com a Ópera

“Oberto”, no Scala de Milão.

Retrato de Margherita Barezzi

Nos anos seguintes escreve várias Óperas dramáticas, de forte cariz patriótico, que

estimulavam os Italianos a lutar pela libertação do domínio austríaco.

Como era a Itália no século XIX? Seria uma nação unida ou um conjunto reinos ou principados?

Tenta descobrir...

Sugestão: projecção de filme “Il Gatoparto” de Lucino Visconti.

Após a morte da sua mulher e seus dois filhos, a sua actividade artística não diminui. Verdi

continua compondo Óperas que sempre revelam um componente de estímulo à

independência nacional.

Passam os anos e por toda a parte se ouve o grito “Viva Verdi!” Este grito não era só um grito

saudação ao compositor, era também uma mensagem em código:

Viva Vittorio Emanuele Rei De Itália!

Quem era Vittorio Emanuele e porque lançavam este grito em código? Tenta descobrir...

Verdi acompanha com felicidade as vitórias de Garibaldi e a constituição, em 1860, do

primeiro parlamento italiano, chegando mesmo a aceitar o cargo de deputado pela sua terra

natal, Busseto.

Em 1867 compõe Don Carlo, baseado no poema Don Carlos, Infant von Spanien de Friedrich

von Schiller, escrito em 1787.

Conheces este poeta? Procura situá-lo no tempo e no espaço.

Friedrich Schiller

Don Carlo estreia no Théâtre Impérial de l'Opéra, Paris, a 11 de Março de 1867 na versão

original com 5 actos e no Teatro alla Scala de Milão, a 10 de Janeiro de 1884, a versão em 4

actos.

Nos anos seguintes Verdi, apoiado pela sua segunda esposa, a cantora

Giuseppina Strepponi, escreve obras que constituem o momento culminante

da carreira deste compositor, como Aida, sua opera-prima, Requiem e

Falstaff, uma Ópera cómica que compõe quase com 80 anos, que assombra

pela sua frescura e filosofia sorridente e humanista.

Verdi morre em Milão, a 27 de Janeiro de 1901.

Giuseppina Strepponi

Palavra de Verdi …

Para um artista que se apresenta em público, é um bem para ele, quando a crítica lhe é

contrária. Assim, o artista encontra-se em uma posição independente e não tem que perder

tempo a agradecer a um e a outro, e a seguir os conselhos de cada um; tem o espírito cheio

de liberdade e o co0ração lhe dirá se pode ou não seguir a carreira.

(in Carta à Condessa Maffei)

Everything in this drama is false. Don Carlos was a fool, a madman. Elizabeth was never in love

with him. Posa is an imaginary figure who could never have existed under Philip's reign. Philip

wasn't as soft-hearted as that. In this drama there is nothing historical, nor is there any

Shakespearean truth or profundity.

(sobre D. Carlo)

D. CARLO

A História por detrás da história

Quem foi D. Carlos? Lançamos aqui algumas pistas para descobrir a figura real de D. Carlos,

sua época e algumas das pessoas que o rodeavam e que aparecem, como personagens,

nesta Ópera.

Carlos Lourenço de Habsburgo nasceu a 08 de Julho de 1545,

filho de Filipe II de Castela e de uma infanta portuguesa.

Quem era esta infanta?

“O príncipe D. Carlos foi, desde criança, um desequilibrado,

irrequieto e turbulento, com frequentes assomos de maus

instintos. Aos 17 anos deu uma queda que lhe agravou o mal

congénito. Como as explosões coléricas se repetiam (...) Filipe

II, seu pai, mandou-o prender e julgar em Janeiro de 1568.”

Fortunato de Almeida, História de Portugal, tomo III, pág. 370

“É verdade que esteve ajustado o casamento de Isabel de Valois com o Príncipe e isso deu

lugar à novela que tanta fortuna alcançou por essa Europa além. Conveniências políticas

fizeram que Filipe II contraísse matrimónio com a Princesa de França, mas de isso a forjar-se

uma contrariedade amorosa entre dois jovens – ele com 13 anos, a princesa com 12 – é

completamente absurdo.”

D. António Ballesteres y Beretta, Historia de España y su Influencia en la Historia Universal, tomo IV, págs. 123 a 127.

Felipe II Rei de Espanha Isabel de Valois

No século XVI Espanha governava parte da Europa, incluindo a região da Holanda e a Bélgica.

Em 1559 o Rei Filipe II casa com a filha do Rei Henrique II da França, Isabel de Valois. Ela tinha 14

anos.

A Igreja católica exercia um forte poder em Espanha através do Santo Ofício, cuja função era

encontrar e converter os hereges, ou seja, todos aqueles que não aderiam à fé católica.

Nesta Ópera, a figura do Inquisidor, cego, aparece como exemplo do dogmatismo e

crueldade da Igreja e Felipe II é retratado como um rei incapaz de colocar o Estado acima da

Igreja.

Que significado terá esta forma de retratar os personagens, por parte dos autores da Ópera, no

século XIX?

Poderá isto ser interpretado como uma crítica dos autores a um tipo de poder?

Porquê?

A Princesa d’Eboli, D. Ana de Mendoza de la Cerda, nasce em 1540 e

aos 15 anos casa com o Príncipe Rui Gomes da Silva, Duque de

Pastrana.

Era cega de um olho, diz-se que vítima de uma brincadeira na sua

infância.

Apesar deste acidente, a Princesa d’Eboli era conhecida pela sua

beleza. Foi mãe de 10 filhos.

Rodrigo, Marquês de Posa, terá existido na realidade?

DON CARLO

A ÓPERA

A acção desta Ópera gira fundamentalmente ao redor de seis personagens:

Don Carlos (Tenor)

Infante de Espanha, apaixonado por Isabel e

atormentado pelo facto de Isabel se tornar mulher de

seu pai.

Isabel de Valois (Soprano)

Filha do rei de França e de Catarina de Médicis, vê-se

obrigada a casar com o rei de Espanha. Sofre pelo amor

que sente por Carlos.

Filipe II (Baixo)

Rei de Espanha, sucessor de Carlo V.

Rodrigo (Barítono)

Grande amigo do príncipe Carlos, Rodrigo está

comprometido com a causa da independência dos

Países Baixos.

Princesa d’Eboli (Mezzo-soprano)

Dama ao serviço de Isabel, na corte espanhola.

Apaixonada por D. Carlos. Manteve relações íntimas com

o rei.

Grande Inquisidor (Baixo)

Monge quase cego, que representa o Santo Ofício.

Proposta Didáctica: os alunos devem ler o resumo de cada Acto e excertos do libreto (em

italiano e em português). Após esta leitura, os alunos devem colocar-se as seguintes questões e

discuti-las em grupo.

O que se passa aqui?

O que move cada personagem?

Como achas que Verdi traduziu esta emoção na música? Que instrumentos se destacam?

Como achas que os solistas cantam/interpretam este personagem, neste momento?

Esta cena será acompanhada pelo coro?

Como o farias tu? Como reagirias nesta situação?

Após discutir estes temas, os alunos escutam o arquivo áudio que corresponde a cada

momento analisado do libreto e assistem a distintas interpretações online. Deste modo,

poderão constatar as semelhanças ou diferenças entre as distintas interpretações bem como

comparar as sugestões dos alunos referentes à intensidade da música e a proposta do próprio

compositor.

Acto I

(original) O primeiro acto da versão original, não é representado na versão que os alunos assistirão no Teatro de São Carlos. No

entanto, para uma melhor compreensão da narrativa, decidimos incluí-lo neste guia didáctico.

Floresta de Fointanebleau

D. Carlos e Isabel encontram-se pela primeira vez na Floresta de Fointanebleau.

Ele revela-lhe que é seu prometido e, apaixonados, celebram a felicidade de ter encontrado o

amor.

Pouco depois, descobrem que afinal Isabel está prometida a Filipe II, pai de Carlos.

Acto I

1.° QUADRO

Convento de Yuste. Túmulo de Carlos V, avô de Don Carlos.

Os frades rezam na capela. Nasce lentamente o dia.

D. Carlos, pálido e aflito, escuta as vozes dos frades. Ouve-se um sino.

D. Carlos, só, dá largas à sua dor. Perdeu a mulher amada, aquela com quem queria

casar, e foi o próprio pai, o rei, que a roubou.

Excerto do poema de Schiller Don Carlos, Infante of Spain (traduzido para inglês por I. Towler)

DON CARLO

Io l'ho perduta! Oh potenza suprema!

Un altro... ed è mio padre...

Un altro... e questi è il Re.

Lei che adoro m'ha rapita!

La sposa a me promessa! Ah! quanto puro

e bello fu il di senza diman, in cui ebbri

Di speme, c'era dato vagar, nell'ombra,

Soli insieme,

Nel dolce suol di Francia,

Nella foresta di Fontainebleau!

Io la vidi e il suo sorriso

Nuovo un ciel apriva a me!

Ahi! per sempre or m'ha diviso

Da quel core un padre, un Re!

Non promette un di felice

Di mia vita il triste albor...

M'hai rubato, incantatrice,

Cor e speme, sogni ed amor!

Vídeo:

http://www.youtube.com/watch?v=EOf9QGD0E-w&feature=related

(a partir do minuto 07:48 a 11:05)

Entra Rodrigo, marquês de Posa, amigo de D. Carlos, que lhe pergunta porque está

pálido, porque sofre. Chegou a hora de provar que ama o povo.

D. Carlos conta-lhe que ama Isabel, sua madrasta, mas o pai não conhece o seu

segredo. Rodrigo aconselha-o a obter do rei a autorização para partir para a Flandres e D.

Carlos promete seguir o conselho do amigo. Chegam o rei e a rainha para rezar sobre o

túmulo de Carlos V.

D. Carlos mal disfarça a sua comoção ao ver Isabel. Ouvem-se as vozes dos frades.

D. Carlos chora a sua desdita, Rodrigo diz-lhe que viverão ou morrerão juntos. Ambos

prometem que o seu último grito será: Liberdade.

DON CARLO E RODRIGO

Dio, che nel'alma infondere

Amor volesti e speme

Desio nei core accendere

Tu déi di liberta;

Giuriamo insiem di vivere

E di moriré insieme;

In térra, in ciel congiungere

Ci puó la tua bontá.

Ah! Dio, che nel’alma infondere…

DON CARLOS E RODRIGO

Deus, que na alma a infundir

Quiseste amor e esperança,

Que no coração acendeste

O desejo de liberdade;

Juramos viver juntos

E morrer juntos;

Na terra e no céu unir-nos

Pode a tua bondade

Ah! Deus, que a alma infundir

Audição da Faixa 6 (completa)

Vídeo:

http://www.youtube.com/watch?v=7WUbjmB4R1w&feature=related

(do minuto 04:43 até 06:09)

Escuta a melodia deste dueto.

Poderá esta melodia traduzir a emoção de uma forte amizade?

Tenta descobrir onde ela se repete, muito subtilmente e depois em euforia até ao final do

vídeo? (no minuto 7:40 e no final)

Este é um dos mais belos duetos da história da Ópera, sobre a exaltação da amizade entre dois

homens.

Na realidade, a música reflecte aqui, para além da intimidade entre os dois amigo, outros dois

sentimentos. Quais?

(A desilusão amorosa de Carlos e o fervor político de Rodrigo)

2.° QUADRO

Um jardim às portas do Convento de Yuste.

Pajens e damas da rainha cantam acompanhados ao alaúde. Isabel sai do convento e

junta-se a estes. Pouco depois chega Rodrigo que lhe entrega uma carta da mãe, ao

mesmo tempo que lhe dá, sem que ninguém veja, um bilhete de D. Carlos em que este

lhe pede para confiar inteiramente em Rodrigo.

Enquanto Isabel diz, para si, que voltar a ver Carlos é morrer, a princesa Eboli julga-se

amada por D. Carlos e afasta-se com Rodrigo, que não desfaz aquele engano.

Chega D. Carlos que vem suplicar a Isabel que obtenha o consentimento do rei para poder

partir para a Flandres.

A condessa d'Aremberg (dama de companhia de Isabel) e outras damas afastam-se e os dois

ficam sós. D. Carlos dá largas à sua imensa paixão e Isabel, que tentou esconder o seu amor,

acaba por confessar que também o ama.

O príncipe, julgando morrer de felicidade, cai desmaiado e quando volta a si ouve, mais uma

vez, palavras cheias de doçura.

Isabel consegue dominar-se e pergunta-lhe se ele quer assassinar o pai e depois, manchado do

sangue de um parricídio, conduzir ao altar a madrasta.

D. Carlos, horrorizado, foge e Isabel agradece a Deus ter velado por ela.

ELISABETTA

Oh! Carlo!

DON CARLO

Sotto il mió pié si dischiuda la terra,

II capo mio sia dal fulmin colpito.

Io t'amo, Elisabetta!

Il mondo è a me sparito!

ELISABETTA (Sostandosi con violenza)

Compi l'opra, a svenar corri il padre

Ed allor del suo sangue macchiato

All'altar puoi menare la madre.

DON CARLO (Retrocedendo atterrito e fuggendo disperato)

Ah! maledetto io son!

ELISABETTA (Cadendo in ginocchio)

Ah! Iddio su noi vegliò!

Signor! Signor!

ISABEL

Oh, Carlos!

DON CARLOS (Envolve-a com os braços)

Sob os meus pés se abra a terra,

Seja a minha cabeça ferida pelo raio.

Amo-te, Isabel!

Não existe o mundo para mim!

ISABEL (separando-se com horror)

Cumpre a tarefa, corre para matar o pai,

E então manchado com o seu sangue,

Podes levar ao altar a tua mãe.

DON CARLO (Foge aterrado)

Ah, maldito sou!

ISABEL (cai de joelhos)

Ah, Deus velou por nós! Senhor, senhor!

Audição da Faixa 8

(do minuto 07:57 – até final)

Vídeo:

http://www.youtube.com/watch?v=QFhvqQZVrJU&feature=related

(do minuto 08:24- até final)

Como acompanha a orquestra a emoção destes personagens?

Que instrumentos se destacam?

Tebaldo, o pajem de Isabel, saindo precipitadamente do convento, anuncia que o rei vai

chegar. Este, vendo Isabel só, chama a condessa d'Aremberg e ordena-lhe que volte para

França. A rainha pede á sua dama que não chore e oferece-lhe um anel para se lembrar

sempre dela.

O rei chama Rodrigo, diz-lhe que gostava de o recompensar pelos seus serviços e sua

fidelidade. Rodrigo não pede nada para si, mas implora piedade do rei para a Flandres, onde

o sangue corre e os gritos dos infelizes não deixam de se ouvir. O rei responde que só com

sangue poderá levar a paz ao mundo e aconselha Rodrigo a defender-se do Grande Inquisidor

e depois revela-lhe um segredo: desconfia que o filho ama a rainha e que é correspondido.

Encarrega Rodrigo de os espiar e aconselha-o novamente a defender-se do Grande Inquisidor.

II ACTO

Iº QUADRO – Os jardins da rainha, em Madrid

D. Carlos lê um bilhete: «á meia-noite, nos jardins da rainha». Cheio de alegria espera Isabel,

supondo serem dela aquelas palavras. Entra uma senhora que traz o rosto velado e a quem D.

Carlos dirige palavras cheias de paixão, ouvindo em troca doces juramentos de amor. A dama

tira o véu e D. Carlos reconhece a princesa de Eboli que, julgando-se amada por ele,

escrevera aquele bilhete. Pela exclamação de D. Carlos, ao ver-lhe o rosto, a princesa

compreende a verdade e jura vingar-se: dirá tudo a Rodrigo, íntimo do rei e ao próprio rei. D.

Carlos julga que o seu confidente o atraiçoou, mas Rodrigo ouve as palavras da princesa,

ameaça-a de morte e diz a D. Carlos que pode confiar nele como até ali. O príncipe, louco de

dor, lança-se nos braços de Rodrigo.

Vídeo:

http://www.youtube.com/watch?v=1p7-sNzvJBk&feature=related

Minuto 07:00, quando tudo se complica; minuto 13:20, quando nasce a suspeita da traição

entre amigos, mas logo se reafirma a confiança; minuto 14:30: Reconhecem esta melodia?

2.° QUADRO - Uma grande praça diante da igreja de Nossa Senhora da Atocha.

Ouvem-se sinos festivos. O povo celebra a grandeza do seu rei. Entram frades que conduzem

os condenados da Inquisição para rezarem e se arrependerem dos seus pecados.

Do palácio sai o cortejo que acompanha a rainha, enquanto o povo mais urna vez louva o

poder e a glória de Filipe II. Abre-se a porta da igreja, vendo-se o rei no meio dos frades.

Chegam seis deputados flamengos, acompanhados de D. Carlos, que se prostram aos pés do

rei suplicando piedade para a Flandres. A rainha e Rodrigo juntam-lhes as suas vozes

implorando também, enquanto o soberano e os frades dizem que os flamengos são infiéis a

Deus e ao rei.

D. Carlos lembra que um dia virá em que a coroa real será colocada na sua cabeça; antes,

precisa de se preparar para ser um bom rei e por isso pede para salvar a Flandres e o seu povo.

Filipe II pergunta se há-de entregar nas mãos do filho a arma que se voltaria contra si.

D. Carlos, desembainhando a espada, diz que não são essas as suas intenções e toma Deus

por testemunha.

Todos comentam o gesto do príncipe e receiam o que possa acontecer. O rei, voltando-se

para os seus homens, ordena que desarmem D. Carlos mas nenhum se atreve. Rodrigo

aproxima-se, pede-lhe a espada e entrega-a a Filipe II, provocando o espanto daqueles que o

sabiam amigo do príncipe. Filipe II, nomeando-o duque, dá ordem para começar a cerimónia.

O povo celebra a glória do rei, os frades falam do castigo para os pecadores e os seis

deputados flamengos dizem que é em nome de Deus que se levanta aquela prece de

punição.

III ACTO

O gabinete do rei, em Madrid

Filipe II, só, chora a infelicidade de não ser amado pela rainha. Ela nunca lhe teve amor e por

isso enquanto viver não encontrará repouso.

FILIPE II

Ela nunca me amou!

Não, esse coração está fechado para mim,

Não tem amor por mim!

Ainda a vejo contemplar com triste rosto

O meu cabelo branco

No dia que veio de França.

Não, não tem amor por mim,

Não tem amor por mim!

Onde estou?... Essa vela

Prestes a consumir-se...

A aurora clareia a minha varanda.

Já desponta o dia. Vejo passar

Os meus lentos os meus dias.

Os sonhos, Deus meu,

Desaparecem dos meus olhos desfalecidos.

Só dormirei no meu manto real

Quando à minha jornada chegar a noite;

Dormirei só por baixo da abóbada negra

Ali, no sepulcro do Escorial.

Audição da Faixa 10

Vídeo:

http://www.youtube.com/watch?v=9cqf__UKIPE&feature=related

Um instrumento caracteriza o personagem de Filipe II. Qual?

(Violoncelo – ver frase do minuto 04:29 da faixa 10)

Qual escolheriam vocês? Porquê?

Recordem que o personagem é representado como queixoso e sombrio.

Onde fica o “Escorial”? Qual a história deste edifício?

Entra o Grande Inquisidor, cego, a quem o rei mandou chamar para saber se, condenando o

filho à morte, poderá ser absolvido. O Inquisidor responde que sim. Também Deus, para remir os

pecados do mundo, sacrificou Jesus Cristo. O rei, para salvar a fé, não deve hesitar em

sacrificar D. Carlos. Filipe II luta ainda entre o amor de pai e aquilo que lhe aconselham como

sendo um dever.

O Grande Inquisidor diz ao rei que Rodrigo é infiel a Deus e pede-lhe que o entregue á

Inquisição, mas Filipe II recusa. Encontrou, responde, um coração leal e não quer perdê-lo.

O Inquisidor diz ao rei que poderia levá-lo diante do supremo tribunal mas que o não fará. Filipe

II pede-lhe que façam as pazes e confessa que mais uma vez o trono tem que se dobrar diante

da igreja.

O Inquisidor sai e chega a rainha que se vem queixar de que lhe roubaram um cofre onde

guardava algumas das suas jóias. O rei entrega-lhe o cofre e diz-lhe que o abra; como Isabel

hesita ele próprio abre o cofre e vê o retrato de D. Carlos. A rainha confessa que sempre amou

o príncipe desde que a sua mão lhe esteve prometida; hoje ainda o ama mas é fiel ao rei. Filipe

II ameaça-a de morte.

Entra Rodrigo e a princesa Eboli. Foi esta que denunciou a rainha, por ciúmes.

Ficando só com Isabel conta-lhe as suas culpas e pede-lhe perdão. A rainha sai e a princesa

amaldiçoa a beleza que o céu lhe concedeu e tantas infelicidades lhe tem causado. Irá para

um convento o resto dos seus dias mas antes há-de salvar D. Carlos da morte que o espera.

EBOLI (Rialzandosi)

Ahimè! Più non vedrò,

No, più mai la Regina!

EBOLI (Sola)

O don fatale, o don crudel

Che in suo furor mi fece il cielo!

Tu che ci fui si vane, altere,

Ti maledico, o mia beltà.

Versar, versar sol posso

il pianto,

Speme non ho, soffrir dovrò;

il mio delitto è orribil tanto

Che cancellar mai non potrò!

O mia regina! Io t'immolai

Al folle error di questo cor.

Solo in chiostro al mondo ormai

Dovrò celar il mio dolor!

O ciel! E Carlo! a morte domani

andar vedrò!

Ah! un di mi resta la speme m'arride.

Sia benedetto il ciel! io salverò!

(Esce precipitosa)

EBOLI

Ah! Não voltarei a ver a rainha!

EBOLI (sozinha)

Oh, dom fatal! Oh, dom cruel!

Que em seu furor me fez o céu!

A ti, que nos fazes tão vãs e altaneiras,

Amaldiçoo-te, beleza minha.

Verter, só posso verter lágrimas,

Esperança não tenho, deverei sofrer!

O meu delito é tão horrível

Que jamais o poderei apagar!

Te maldigo, te maldigo, beleza minha!

Oh, minha rainha, imolei-te

Ao louco erro deste coração.

Só num claustro ao mundo agora

Deverei ocultar minha dor!

Céus! E Carlos? Amanhã para a morte,

Grande Deus, para a morte o verei ir!

Ah, resta-me um dia,

A esperança sorri-me!

Ah, bendito seja o céu! Salvá-lo-ei!

Audição da Faixa 12

Vídeos:

http://www.youtube.com/watch?v=l1mHzX24r00&feature=related

Scala, 1994, Luciana D’Intino - LUCIANA D'INTINO

(0:47 – até ao fim)

http://www.youtube.com/watch?v=aBcLPqpSJ6g

Maria Callas, 1962

http://www.youtube.com/watch?v=ku6CtnsZ6T4&feature=related

Olga Borodina, 2003

http://www.youtube.com/watch?v=I7VYHFBbYcs&feature=related

(a partir do minuto 3: 42) Dolora Zajick, Scala Dezembro 2008

http://www.youtube.com/watch?v=NWYo7cSDwOQ&feature=related

The Nederland Opera, 2004, Violeta Urmana

Reparem no palco. Move-se? Porque será que os encenadores tomaram esta decisão?

http://www.youtube.com/watch?v=-0GAV15KRW8&feature=related

1971 Shirley Verrett

http://www.youtube.com/watch?v=XSGLopkGGvI&feature=related

Shirley Verrett 1986 (com 55 anos).

Notem diferenças na voz, em relação ao vídeo anterior.

Notem as diferenças de cenários, figurinos, vozes e interpretação das solistas.

Não há duas interpretações iguais. De qual gostam mais? Porquê?

Notem também que esta cena tem três momentos: um exaltado e outro melancólico para

terminar como?

Lê o excerto do poema no qual se baseia a cena que precede a “don fatale” (em baixo).

Se o tivesses que adaptar a português e encenar, como escreverias esta cena?

(propõe o diálogo e a encenação)

IV ACTO

1º QUADRO

A prisão de D. Carlos

D. Carlos está só, entregue aos seus tristes pensamentos. Entra Rodrigo que vem despedir-se

dele. O rei está convencido de que Rodrigo foi o grande agitador da Flandres para que assim

Carlos pudesse um dia governar a Espanha.

A vingança de Filipe II, diz Rodrigo, não deve tardar e ele quis ainda despedir-se do príncipe a

quem sempre foi fiel.

Sem que Rodrigo e D. Carlos vejam, aparecem dois homens que os espreitam. Um dele está

vestido com o hábito da Inquisição e o nutro vem armado de um arcabuz.

Ouve-se um tiro que vai atingir Rodrigo, ferindo-o mortalmente. É a vingança do rei. Os dois

amigos abraçam-se ternamente e Rodrigo consegue ainda dizer que morre pelo seu príncipe,

que um dia há-de reinar para felicidade do povo.

RODRIGO

O Carlo, ascolta, la madre t'aspetta

A San Giusto doman; tutto ella sa...

Ah! la terra mi manca... Carlo mio;

A me porgi la man...!

Io morrò, ma lieto in core,

Ché potei cosi serbar

Alla Spagna un salvatore!

Ah! ... di me... non... ti... scordar...!

RODRIGO

Carlos, escuta... A tua mãe espera-te

Em Yuste amanhã; ela sabe de tudo...

Ah, a terra foge-me... Carlos meu caro,

Dá-me a mão!...

Morro com o coração alegre,

Pois assim pude conservar

Para Espanha um salvador.

Ah... não te esqueças...de mim!

Não te esqueças de mim!

Sim, tu devias reinar

E eu morro por ti.

Morro com o coração alegre,

Pois assim pude conservar

Para Espanha um salvador.

Ah, não te esqueças de mim!

Ah, a terra

foge-me... a mão...

Ah, salva a Flandres!

Carlos, adeus!

Audição da Faixa 14

O que acontece no segundo 00:45 da Faixa 14? O que sente o personagens?

Como o revela a música?

(Ao sentir que a terra lhe foge por baixo dos pés, a linha melódica interrompe-se)

Vídeos:

http://www.youtube.com/watch?v=7iOnsDaNXO8&feature=related

(entre minutos 09:14 e 10:40)

Conseguem descobrir o tema da amizade?

(minuto 09:40)

Entra Filipe II que vem entregar a espada ao filho, mas este afasta-se horrorizado, olhando o

cadáver do seu fiel confidente. O rei pede que lhe restituam aquele homem que está morto.

Chega o conde de Lerma, que anuncia a entrada do povo reclamando o príncipe.

Juntamente com os populares vem a princesa Eboli que diz a D. Carlos que fuja.

Aparece o Grande Inquisidor e todos se curvam pedindo o perdão do rei.

2º QUADRO

O claustro do Convento de Yuste

A rainha reza sobre o túmulo de Carlos V. Recorda a sua terra natal, onde viveu feliz e onde

amou D. Carlos. Prometeu a Rodrigo velar pelo príncipe e assim fará. Entra D. Carlos, a quem

Isabel diz que parta para a Flandres, libertando um povo oprimido que sofre injustamente.

Recordam ambos a amizade de Rodrigo. Isabel chora e diz a D. Carlos que a felicidade os

espera no outro mundo, onde ninguém os poderá separar. Despedem-se para sempre. Entra o

rei e, agarrando o braço de Isabel, diz-lhe que exige um duplo sacrifício. Ele fará o seu dever; a

Inquisição que cumpra o que lhe é destinado. Estas palavras são ditas ao Grande Inquisidor,

apontando para D. Carlos. O Grande Inquisidor responde que o Santo Oficio desempenhará a

sua missão. O príncipe foge na direcção do túmulo de Carlos V, cujo espectro aparece e diz.

que a dor do mundo se prolonga para dentro do convento; o coração só encontrará a paz

depois da morte.

Reconhecendo a voz de Carlos V todos recuam apavorados. O espectro arrasta para o

convento o príncipe D. Carlos, assombrado.

Este material foi criado pelo Serviço Educativo do Teatro Nacional de São Carlos

Setembro de 2011