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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Instituto de Medicina Social Especialização em Gênero e Sexualidade Thalles do Amaral de Souza Cruz TRANSFORMANDO OLHARES DOCENTES PARA UMA EDUCAÇÃO DA DIFERENÇA Rio de Janeiro 2011

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Uma Educacao Da Diferenca

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Instituto de Medicina Social

Especialização em Gênero e Sexualidade

Thalles do Amaral de Souza Cruz

TRANSFORMANDO OLHARES DOCENTES PARA UMA EDUCAÇÃO

DA DIFERENÇA

Rio de Janeiro

2011

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Thalles do Amaral de Souza Cruz

TRANSFORMANDO OLHARES DOCENTES PARA UMA EDUCAÇÃO DA

DIFERENÇA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao

curso de Especialização em Gênero e Sexualidade –

EGeS.

Orientador: Profº André Luiz dos Santos Barbosa

Rio de Janeiro

2011

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à todas as pessoas que apesar das inúmeras e variadas formas de

discriminação, preconceitos e violências lutam cotidianamente para garantir um dos direitos

fundamentais dos seres humanos: a liberdade e o respeito à ela.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à professora tutora Cláudia Reis pelo carinho e pela forma como conduziu

os encontros presenciais, aos meus pais Zeny e Paulo, meu irmão Tarso e minha irmã Paula

pelo apoio e incentivo constantes, aos colegas de turma pelas trocas durante o curso nos

fóruns e nos encontros, em especial aos(às) amig@s Marli Alice, Roberta Ferreira e Vinícius,

ao orientador André Luiz dos Santos, e especialmente ao meu companheiro de todas as horas

que muito me incentivou e auxiliou nesta conquista, Aureliano Lopes (Caju).

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SUMÁRIO

1. APRESENTAÇÃO .................................................................................. 06

2. JUSTIFICATIVA E FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA...................... 07

3. OBJETIVO GERAL................................................................................. 14

3.1. Objetivos específicos ................................................................................. 14

4. ESTRATÉGIAS DIDÁTICO-PEDAGÓGICAS .................................. 15

5. AVALIAÇÕES E REGISTRO................................................................ 19

6. REFERÊNCIAS ....................................................................................... 21

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Título: Transformando olhares docentes para uma educação da diversidade

Tema: A orientação sexual na formação de professores.

1. APRESENTAÇÃO

O projeto destina-se a ser trabalhado com os(as) professores(as) do Ensino Médio do

Colégio Pasquale Costantino localizado na Taquara, zona oeste da cidade do Rio de Janeiro.

São dezoito professores(as) de todas as disciplinas1, sendo onze homens e sete mulheres com

no mínimo o ensino superior completo. Destes dezoito, oito também trabalham na rede

pública de ensino, sendo que um trabalha na rede estadual e municipal, seis na rede estadual e

uma na rede federal. Além disso, dezessete trabalham em outros colégios particulares. Todos

pertencem à classe média; um mora na zona sul (Copacabana), cinco na zona norte

(Cachambi, Vista Alegre, Méier, Piedade e Tijuca) e doze na zona oeste (dois em Realengo,

três no Recreio dos Bandeirantes, uma na Vila Valqueire, dois em Sulacap, três na Taquara e

uma em Marechal Hermes). O turno do Ensino Médio tem início às 7h20 da manhã e termina

cada dia em um horário diferente, sendo que às sextas, dia de prova do terceiro ano, vai até às

17:30.

A equipe de professores(as) é a mesma há anos, sendo que dois são ex- alunos do

Colégio. Isso faz com que a equipe seja bastante unida, havendo grande entrosamento entre

todos(as).

Percebo que mesmo a orientação sexual sendo um dos temas que estão presentes nos

PCNs, poucos são os(as) professores(as) que se detêm minimamente sobre o assunto. Desta

forma, ao se depararem com situações em sala de aula onde a orientação sexual se faz

presente, seja através de piadas discriminatórias, com exclusões evidentes, brigas, estigmas,

os(as) professores(as) não sabem como tratar deste assunto. Assim, muitos preferem ignorar,

ou mais grave ainda, contribuem com o preconceito e a discriminação, na repressão aos

comportamentos e atitudes considerados “anormais”, “desviantes”.

1 Também faço parte da equipe de professores(as). Somos 19 no total, mas como o projeto estaria sendo

aplicado por mim, considerei apenas 18 docentes.

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2. JUSTIFICATIVA

As discussões referentes à sexualidade e à orientação sexual vão muito além de

questões puramente pessoais, sendo inclusive, muito mais ligadas às questões políticas,

portanto públicas, que individuais. É importante desde já deixar claro que por mais que sejam

próximas e dialoguem, não estou focando em questões de gênero, e sim, de sexualidade.

Gênero sendo entendido como uma série de expectativas construídas histórica, social e

culturalmente em relação aos traços de comportamentos e práticas que supostamente devem

ser assumidos por sujeitos identificados como sendo do sexo masculino e/ou feminino. As

palavras de Guacira Lopes Louro nos ajudam a definir mais exatamente o que se entende por

este conceito nas Ciências Humanas atualmente. Segundo a autora, Gênero,

(...) não são propriamente as características sexuais, mas é a forma como essas

características são representadas ou valorizadas, aquilo que se diz ou se pensa sobre

elas que vai constituir, efetivamente, o que é feminino ou masculino em uma dada

sociedade e em um dado momento histórico (LOURO, 2011, p.25).

Já a sexualidade está sendo entendida aqui como as várias formas/capacidades de

vivenciar, desejar e sentir a prática sexual, vista como flexível e não linear ao longo de toda a

vida, indo além, portanto, do aspecto meramente biológico. Neste sentido, Jeffrey Weeks

afirma:

(...) embora o corpo biológico seja o local da sexualidade, estabelecendo os limites

daquilo que é sexualmente possível, a sexualidade é mais que simplesmente o corpo.

(...) A sexualidade tem tanto a ver com nossas crenças, ideologias e imaginações

quanto com o nosso corpo físico (WEEKS, 2007, p.38).

Esta noção de sexualidade não compactua, portanto, com a ideia bastante corrente em

círculos mais conservadores, segundo a qual haveria uma espécie de “estratificação sexual”

(RUBIN, 1984), onde haveria uma divisão entre “o bom” e “o mau sexo”. O “bom sexo” seria

aquele que mais se aproxima dos padrões heteronormativos cristãos, visto como “normal” (ou

“natural”). Já o “mau sexo” seriam todas as práticas sexuais que divergem deste padrão e que

podem incluir pessoas de todas as orientações sexuais. Em resposta a ideia de “naturalização”

da sexualidade, compartilho da visão segundo a qual vamos construindo nossos corpos e

identidades ao longo da vida, ainda que sejamos dotados de uma capacidade e aparato

biológicos tidos como naturais.

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Aqui se faz importante uma diferenciação entre “organismo” e “corpo”. O primeiro

sendo um conjunto de órgãos interligados de alguma forma entre si, onde cada um deles

possui uma função fixa determinada. Já o corpo não pode ser entendido apenas pelo aspecto

físico, um conjunto de carnes, vísceras e ossos, mas também como algo que possui

sentimentos, pensa, age e é marcado pela cultura onde está inserido. É nesta direção que

Gayle Rubin afirma:

(...) a sexualidade humana não pode ser compreendida em termos puramente

biológicos. Organismos humanos com cérebros humanos são necessários para

culturas humanas, mas nenhum exame do corpo ou de suas partes pode explicar a

natureza e variedade dos sistemas sociais humanos. A fome do estômago não dá

nenhuma pista para as complexidades da culinária. O corpo, o cérebro, a genitália, e

a capacidade de linguagem são todos necessários para a sexualidade humana. Mas

eles não determinam seu conteúdo, suas experiências, ou suas formas institucionais.

Além disso, nunca nos deparamos com um corpo sem as mediações que as culturas

lhe acrescentam (RUBIN citada por CARRARA ET AL, 2010, p. 21).

A noção de organismo estaria mais ligado ao currículo de uma educação sexual,

voltada sobretudo para a reprodução, gravidez na adolescência (principalmente como evitá-

la), DSTs, não havendo espaço para sexualidades “desviantes” ou mesmo para a

problematização da sexualidade ou das expectativas de gênero hegemônicas. Já a noção de

corpo citada acima, estaria mais ligada a uma educação em sexualidades, onde o desejo,

comportamentos e práticas diferentes da sexualidade hegemônica seriam inseridas também

nas temáticas das aulas. Entendo aqui a sexualidade hegemônica (“padrão”, “normal”,

“natural”) como a que foi, e é, construída a partir da estigmatização, discriminação e até

mesmo criminalização da diversidade sexual. Para que isso ocorra é preciso ocultar o máximo

possível a dimensão política da sexualidade e focar que esta é uma questão meramente

individual onde a pessoa optou por tal prática/vivência.

Há todo um dispositivo da sexualidade (FOUCAULT, 2001), ou seja, um aparato

institucional, debates científicos, religiosos, legislativos debruçados sobre o tema da

sexualidade, o que nos deixa claro, mais uma vez, que este não é um assunto apenas

individual, e sim, assunto público, de Estado. Nas palavras do autor, este dispositivo se refere

à:

(...) uma grande rede da superfície em que a estimulação dos corpos, a intensificação

dos prazeres, a incitação ao discurso, a formação dos conhecimentos, o reforço dos

controles e das resistências, encadeiam-se uns aos outros, segundo algumas grandes

estratégias de saber e poder (FOUCAULT, 2001, p.100).

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Deste modo, a sexualidade e os discursos sobre ela sempre vão estar em disputa pelos

diversos atores sociais inseridos nestas redes de poder e instituições. Sendo assim, baseio-me

na Lei de Diretrizes e Bases, nos PCNs e nos Direitos Humanos, para afirmar que as

abordagens sobre este tema em escolas particulares não confessionais, como é o caso do

Colégio Pasquale Costantino, devem ser laicas e plurais, evitando qualquer interferência

dogmática por parte de professores(as) ao analisar ou intervir em alguma situação referente ao

assunto com a comunidade escolar.

Para trabalhar sexualidade, é preciso também definir o que aqui se entende atualmente

por orientação sexual, tanto na definição expressa no PCN quanto no meio acadêmico, além

de diferenciar este termo de identidade sexual.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), uma política pública criada pelo

Governo Federal em 1997, não visa obrigar escolas ou professores(as) a trabalharem de um

jeito ou de outro sobre qualquer tema, mas sim, a ser um norteador sobre o que os ensinos

infantil, fundamental e médio podem trabalhar para que a educação contribua de forma mais

eficaz na promoção da cidadania e na formação de cidadãos e cidadãs com mentalidades e

práticas plurais e democráticas. Segundo este documento governamental, a escola e sua

equipe pedagógica são legítimos atores sociais a trabalharem sobre o tema da sexualidade e

orientação sexual. Ao abordar estes temas, o(a) professor(a) – que preferencialmente deve

ter uma formação especializada no tema – não tem a obrigação de reforçar a visão familiar

e/ou religiosa do(a) estudante. Isso não significa que deva concorrer ou julgar os valores

familiares/religiosos, mas apresentar outras visões complementares, não como forma de

verdades absolutas, e sim visando expressar as diversas visões e entendimentos sobre os

temas. Na justificativa sobre a inclusão da sexualidade e orientação sexual, os PCNs

apontam uma forte demanda por parte dos pais, que por terem muitas dificuldades em falar

abertamente sobre o assunto com seus/suas filhos(as), gostariam que a escola se

encarregasse sobre esta tarefa. Na ótica dos PCNs, a orientação sexual deve ser trabalhada

respeitando os Direitos Humanos, o que significa que todas as visões sobre a sexualidade

devem ter a liberdade de se expressarem e serem respeitadas. Este documento também

aponta que este tema deve ser trabalhado no currículo como “tema transversal”, ou seja, que

a abordagem deve ser feita a partir de diversos campos de saberes e não apenas sob a ótica

das ciências biológicas como normalmente ocorre. O texto do documento nos deixa bastante

claro, portanto, o porquê trabalhar este tema nas escolas:

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A presente proposta de Orientação Sexual caracteriza-se por trabalhar o

esclarecimento e a problematização de questões que favoreçam a reflexão e a

ressignificação das informações, emoções e valores recebidos e vividos no decorrer

da história de cada um, que tantas vezes prejudicam o desenvolvimento de suas

potencialidades. Ressalta-se a importância de se abordar a sexualidade da criança e

do adolescente não somente no que tange aos aspectos biológicos, mas também e

principalmente aos aspectos sociais, culturais, políticos, econômicos e psíquicos

dessa sexualidade (PCN, 1997, p.87).

Antes de vermos a ótica acadêmica sobre orientação sexual, faz-se importante

distinguir este conceito do de “identidade sexual”. Hoje são identificados três tipos de

orientação sexual: a heterossexualidade, a homossexualidade e a bissexualidade. No entanto,

o fato de alguém ter comportamentos (práticas) tidas como homossexuais, como se relacionar

sexualmente com uma pessoa do mesmo sexo, não o(a) faz ter necessariamente uma

identidade homossexual gay (ou lésbica). Portanto os desejos ou comportamentos sexuais não

necessariamente possuem uma coerência com as identidades sexuais. O trecho abaixo do

Caderno de Atividades do curso Gênero e Diversidade na Escola, elucida tal questão

Quando falamos em “identidade sexual”, nós nos referimos a duas coisas diferentes:

1. ao modo como a pessoa se percebe em termos de orientação sexual; e 2. ao modo

como ela torna pública (ou não) essa percepção de si em determinados ambientes ou

situações (Caderno de Atividades do GDE, 2010, p.105).

É importante ressaltar também que essas categorias de identidades sexuais são

atravessadas por outras como classe, raça, etnia, religião, geração, origem social, etc. As

discriminações e exclusões serão mais ou menos intensificadas de acordo com estes

atravessamentos. Um homem com a identidade sexual gay, branco, nascido e criado em um

bairro nobre da capital paulista, presidente de uma multinacional, católico, provavelmente

será bem menos discriminado socialmente que um homem com a identidade gay, negro,

umbandista, balconista, nascido na periferia da cidade de São Paulo.

Na ótica acadêmica sobre o que se entende por orientação sexual, destacarei três

pontos importantes. O primeiro é considerá-la como sendo composta por três dimensões

(desejo, comportamento e identidade) (GROSSI, 1998) e que estas não necessariamente são

“coerentes”, ou funcionam da forma que o senso comum esperaria. O segundo ponto é a

diferenciação entre “orientação sexual” e “opção sexual”. A primeira sendo entendida como

algo que vai sendo construído cultural, social, histórica e psicologicamente em relações

extremamente complexas. Já opção sexual denota uma ideia de que a pessoa escolheu ter

determinada orientação sexual, além de conter a ideia que se foi algo escolhido, a pessoa pode

escolher outra opção ou no entendimento de alguns, pode se “curar”. O terceiro se refere à

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imensa quantidade de estudos e teorias nas mais diversas áreas para “descobrir a origem” das

orientações sexuais que fogem do “padrão”, o que poderia ser uma tentativa também de se

descobrir “a cura”.

Mas como os comportamentos ditos normais e para muitos “os únicos aceitáveis”,

são construídos? Os sociólogos John Gagnon e William Simon nos ajudam a responder essa

questão. Eles criaram a teoria do “roteiro sexual” que seria uma espécie de esquema

cognitivo que:

• permite reconhecer situações e atos como potencialmente sexuais;

• liga os sentimentos (de desejo e prazer ou de repulsa e incômodo) às atividades

corporais associadas ao contato e sinais físicos de excitação;

• estabelece uma sequência do que deve ser feito, com quem, em que circunstância

ou ocasião, quais os sentimentos e motivações apropriados ao evento;

• contém os elementos de ligação entre vida erótica e social, como um guia

para o que seriam parceiros sexuais apropriados;

• existe não somente como propriedade cognitiva de atores isolados, mas como parte

da estrutura social;

(CARRARA ET AL, 2010, p.31-32, Vol.3).

Ainda de acordo com esta roteirização sexual, este esquema pode ser divido em três

níveis: intrapsíquico, interpessoal e cultural. No nível intrapsíquico, o sujeito seria uma

espécie de dramaturgo, criando um roteiro para lidar com a interação. No interpessoal, ele

visa atender às expectativas alheias e para isso se baseia nas condutas dos outros. Por fim, o

nível cultural onde há certos códigos explícitos ou não sobre como se deve agir sexualmente.

Independente de ser vista como roteiros sexuais construídos socialmente e que por isso

variam histórica e culturalmente, só se busca a origem da sexualidade dita “diferente”,

“desviante”. Afinal, por que não se pesquisa também a origem da heterossexualidade?

Uma resposta para tal indagação é o dispositivo da heteronormatividade, um

importante aspecto da ordem social. As palavras de Guacira Lopes Louro nos ajudam a

entender tal conceito, quando ela afirma que a heteronormatividade se faz bastante nítida

quando

(...) uma forma de sexualidade é generalizada e naturalizada e funciona como

referência para todo o campo e para todos os sujeitos. A heterossexualidade é

concebida como “natural” e também como universal e normal. Aparentemente

supõe-se que todos os sujeitos tenham uma inclinação inata para eleger como objeto

de seu desejo, como parceiro de seus afetos e de seus jogos sexuais alguém do sexo

oposto (2007, p.17).

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A heteronormatividade possui relação estreita com a homofobia, já que ao considerar a

heterossexualidade como algo normal, natural, todas as práticas, desejos e identidades que se

afastarem deste ideal, serão vistas como inferiores, desviantes, pecadoras, sujas. Esta

interpretação sendo hegemônica faz com que a sociedade aceite ou ignore formas e práticas

de preconceito, discriminação e violência contra os “desviantes”.

Aqui, se faz necessário um entendimento sobre o que é homofobia. O termo

homofobia foi criado pelo psicólogo George Weinberg no mesmo período em que a

homossexualidade foi retirada do Manual de Diagnóstico e Estatística (DSM) da Associação

Psiquiátrica Americana, ou seja, o início da década de 1970. Naquele momento houve uma

verdadeira inversão. Se antes era considerado um sujeito portador de uma patologia

psiquiátrica quem apresentava comportamentos e práticas homossexuais, a partir da retirada

da homossexualidade do DSM e da criação do conceito de homofobia – uma aversão

irracional em relação à homossexualidade – quem apresenta tal aversão é que passou a ser

visto como portador de uma patologia psiquiátrica. Atualmente há vários entendimentos sobre

o termo. Roger Raupp Rios (2009), por exemplo, resume a homofobia como “uma forma de

preconceito que pode resultar em discriminação e violência contra homossexuais” (RIOS

citado por CARRARA ET AL, 2010, p.70, Vol.3). Já para o sociólogo Rogério Diniz

Junqueira, a homofobia não se restringe aos homossexuais, se dirigindo a todos(as) que não se

enquadrem no comportamento padrão que faz uma associação fixa entre sexo, gênero e

desejo. Assim, segundo Junqueira, a homofobia pode ser entendida como

Um conjunto de emoções (tais como aversão, desprezo, ódio, desconfiança,

desconforto ou medo), que costumam produzir ou vincular-se a preconceitos e

mecanismos de discriminação e violência contra pessoas homossexuais, bissexuais e

transgêneros (em especial travestis e transexuais) e, mais genericamente contra

pessoas cuja expressão de gênero não se enquadra nos moldes hegemônicos de

masculinidade e feminilidade (JUNQUEIRA, citado por CARRARA ET AL, 2010,

p.70, Vol. 3).

Neste sentido, principalmente o movimento LGBT, tem adotado novos termos como

bifobia (referente à bissexuais), lesbofobia (referente às lésbicas) e transfobia (referente às

travestis e às/aos transexuais) já que o preconceito, a discriminação e as violências diferem

quando se dirigem aos gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais.

A homofobia, portanto, será sempre uma forma de violência, seja simbólica ou física.

Na prática pode ir desde a “zuação” (piadas, apelidos, marcações) comum entre crianças e

jovens até agressões verbais, físicas ou até mesmo assassinatos.

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No espaço escolar, a homofobia geralmente nem é detectada como um problema,

tamanha a naturalidade de comportamentos discriminatórios por parte dos alunos, mas

também dos(as) professores(as), coordenadores(as), funcionários(as), diretores(as) e

responsáveis, em relação à diversidade sexual. Assim, a escola ao invés de promover a paz, a

liberdade e a igualdade, acaba por reproduzir padrões socais que reduzem

à figura do “outro” (considerado “estranho”, “inferior”, “pecador”, “doente”,

“pervertido”, “criminoso” ou “contagioso”) todos aqueles e aquelas que não se

sintonizassem com o único componente valorizado pela heteronormatividade e pelos

arsenais multifariamente a ela ligados – centrados no adulto, masculino, branco,

heterossexual, burguês, física e mentalmente normal” (JUNQUEIRA, 2004, p.14,

grifos no original).

A escola é, para muitos, um local de opressão, discriminação, negação, onde a

população LGBT na maioria das vezes não é bem-vinda, e mais do que isso, apontada como

problema. Guacira Louro assinala que: “Consentida e ensinada na escola, a homofobia

expressa-se pelo desprezo, pelo afastamento, pela imposição do ridículo” (1999, p.29),

acabando por se institucionalizar.

A homofobia sendo institucionalizada e naturalizada no currículo e nas práticas

escolares, faz com que muitos integrantes da comunidade LGBT passem a ver o espaço

escolar como sendo um local de sofrimento, isolamento, violência, gerando um desinteresse

pelos estudos ou mesmo o abandono da vida escolar com conseqüências tão ou mais perversas

na entrada do mercado de trabalho. Medidas têm sido tomadas por ONGs, governos e

organismos internacionais para tentar se não solucionar, ao menos diminuir a freqüência e a

naturalidade que tais violências acontecem. No Brasil, em 2004, foi criado pelo Governo Lula

o programa “Brasil sem Homofobia” visando combater tal prática no âmbito federal, mas

também auxiliar governos municipais e estaduais a criarem suas próprias políticas de

enfretamento da homofobia através de, entre outras medidas, a elaboração de políticas

educacionais realmente inclusivas.

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3. OBJETIVO GERAL

Auxiliar na criação de um espaço onde as noções do senso comum sobre sexualidade

sejam discutidas visando a diminuição das discriminações e preconceitos sofridos por pessoas

da comunidade escolar (alunos(as), professores(as), funcionários(as)).

3.1 - Objetivos Específicos

1) Contribuir na promoção de uma prática docente que não perceba a diversidade sexual como

um problema;

2) Chamar a atenção para a importância de se trabalhar a orientação sexual na perspectiva da

uma educação em sexualidades baseados em um currículo da diferença;

3) Romper com a noção do senso comum segundo a qual todas questões referentes à

sexualidade são “naturais”, “biológicas” ou que são meras escolhas individuais;

4) Contribuir para que o ambiente escolar seja mais acolhedor para todos(as) os (as) seus

(suas) integrantes;

5) Colaborar para que o entendimento de sexualidade e práticas sexuais, explicado

anteriormente, seja utilizado em todas as disciplinas tanto nos conteúdos quanto na prática

docente na sala de aula;

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4. ESTRATÉGIAS

O projeto será realizado em formato de minicurso (ou curso de curta duração) em dois

sábados intercalados por mês durante dois bimestres escolares, totalizando 5 meses ou onze

encontros. Em cada um destes sábados, os encontros durarão três horas, totalizando 33 horas.

Os professores receberão o valor correspondente às suas horas-aulas e aos que concluírem

todo o curso, um certificado ao final comprovando sua participação na capacitação.

Os encontros ocorrerão no próprio colégio, mais especificamente na sala de

multimídia, equipada com DVD, TV, notebook, projetor, um quadro branco, canetas para o

quadro branco, 25 carteiras escolares, ar condicionado e duas persianas para escurecer o

ambiente e facilitar a visualização das imagens do projetor. Além de mim e dos(as) 18

docentes, o inspetor responsável pela abertura e fechamento do colégio também será

convidado a participar.

Proponho dividir o minicurso em cinco momentos:

1º Momento (2 encontros): Sensibilização

* 1º encontro:

- Explicação oral sobre o que tratará o curso, os objetivos e a avaliação (divisão dos grupos de

trabalho em três trios). (40 min)

- Incentivar para que os(as) professores(as) troquem impressões sobre o que entendem ser a

“diversidade sexual”. (20 min)

- sensibilização (curtas e propagandas):

* Exibição do vídeo “Cabo Free contra a homofobia nas escolas”: (4 min. 50 s.)

* Campanha contra homofobia:

http://www.youtube.com/watch?v=JNaOQyJu_uU&feature=related (1min)

* Exibição do comercial português das duas senhoras na praça comentando sobre um casal

gay que passa de mãos dadas: (http://www.youtube.com/watch?v=fjlOeJa75S0) ( 30 s.)

* Exibição do depoimento dado pelo jornalista Oswaldo Braga à novela “Viver a vida” da TV

Globo: http://www.youtube.com/watch?v=wVyHziTlU9A (6 min.)

- Debates sobre os vídeos (1h)

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- Leitura durante o encontro do texto “Entre a vida e a morte, o sexo” de Tânia Navarro

Swain, seguida de debate. (1h .)

2º encontro:

- Exibição do Programa Profissão Repórter da TV Globo sobre como as famílias lidam com

casos de Homossexualidade dentro de suas próprias casas:

http://www.youtube.com/watch?v=jhsb870cFSo&feature=related seguido de debates (2h)

- Elaboração de uma redação em trios sobre as discussões do dia. (1h)

2º momento (4 encontros): Discussões teóricas

- Análise e discussões sobre textos indicados, e filmes exibidos

1º encontro:

- Exibição do vídeo “Muito prazer” sobre travestis e transexuais:

http://www.youtube.com/watch?v=FyIhayHXO2I (30 min)

- Discussão sobre os temas tratados no filme (40 min)

2º encontro:

- Exibição do filme “Patrick 1,5” (1h 40 min)

- Discussões sobre os temas abordados no filme (1h)

3º encontro:

- Os(as) alunos(as) chegarão com o texto “Diversidade sexual na escola” do Alexandre

Bartolini lido e nós o debateremos em 1h 30 min.

- Exibição do curta “Medo de quê?” (25 min).

- Debates sobre o filme (1h)

4º encontro:

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- Este encontro será dedicado a debater o livro “Mitos e tabus da sexualidade humana:

subsídios ao trabalho em educação sexual” da Jimena Furlani. (2h)

- Os(as) alunos(as) elaboraram uma redação em trios sobre as conclusões da leitura e dos

debates. (1h)

3º Momento (2 encontros): O que dizem as leis e as políticas públicas

1º encontro:

* Exibição do vídeo “Não gosto de meninos”: http://www.youtube.com/watch?v=HHA-

WpPSK4s (18min)

- Debates sobre o vídeo (40 min)

- Análise da Legislação (Constituição, ECA e LDB) (1h 20 min)

- Discussão (40 min)

2º encontro:

- Direitos Humanos

- PCN

- Programa Brasil sem Homofobia

- Programa Rio sem homofobia

* As apresentações e discussões sobe estes tópicos acontecerão de forma intercalada ao longo

das 3 horas do encontro.

4º Momento (1 encontro): Arte e diversidade sexual

- Exibição do filme Transamérica (Transexuais)

- Debates sobre os temas tratados no filme

5º Momento (2 encontros): Avaliação

- Apresentação das montagens teatrais. Cada trio terá 40 minutos no máximo para se

apresentar. Ao final de cada apresentação haverá uma discussão com a turma sobre o que

acabou de ser apresentado. O que funcionou e o que não, se faltou aprofundar mais algum

aspecto ou se ficou muito focado em um único aspecto.

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* 1º Momento:

Apresentação das montagens dos três primeiros trios.

* 2º Momento:

Apresentação das montagens dos outros três trios.

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5. AVALIAÇÕES

A avaliação deste minicurso será realizada de diversas formas: a participação nos

debates, as redações elaboradas em grupo, os diários individuais e as apresentações teatrais. A

diversidade nas formas de avaliação visa fazer com que esta etapa do projeto ocorra em um

processo contínuo e não apenas no momento final.

Ao colocar a participação nos debates como uma das etapas da avaliação, busco

incentivar a participação de todos(as) os(as) professores(as), mesmo os mais acanhados em

falar sobre o tema, além de focar em uma prática extremamente democrática que valorize a

troca de opiniões e experiências, mas que tenha um norte, o respeito pelos direitos humanos.

É neste sentido que ocorrerão minhas intervenções, e não no sentido de julgar, dogmatizar ou

hierarquizar qualquer uma das visões expostas.

As redações em trios visam assentar e organizar as ideias, agora com menos

participantes, após os debates. Mas nesta etapa também, os debates continuarão a serem feitos

e apurados, já que será uma redação para cada três pessoas havendo, portanto, a necessidade

de novos debates antes da escrita.

As elaborações dos diários deverão ser iniciadas desde o primeiro dia do minicurso

onde constarão as impressões sobre os temas, aulas, debates, filmes, textos. Estes diários

serão entregues no último dia de aula, mostrando assim a evolução das impressões ao longo

do curso.

Já a escolha pela dramatização como forma de avaliação, foi inspirada nas ideias

sobre a pedagogia e o currículo da diferença. Como afirma Tomaz Tadeu da Silva, “uma

política pedagógica e curricular da identidade e da diferença tem a obrigação de ir além das

benevolentes declarações de boa vontade para com a diferença” (2000, p.100). Além de

questionar a elaboração das identidades e das diferenças, este método busca estimular os(as)

participantes

a explorar as possibilidades de perturbação, transgressão e subversão das identidades

existentes. (...) abrir o campo da identidade para as estratégias que tendem a colocar

seu congelamento e sua estabilidade em xeque (...). Estimular, (...) o impensado, o

arriscado, o inexplorado e o ambíguo (...) (SILVA, 2000, p.100).

Desta forma, busco fazer com que os(as) professores(as) atentem para a constante

elaboração das identidades, inclusive as sexuais, e que estas não são naturais, inatas. Ao

vivenciar, mesmo que em uma ficção, identidades diferentes das suas, e tendo tido toda uma

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gama de discussões sobre os temas da diversidade sexual, especialmente sobre a orientação

sexual, os(as) profissionais poderão alargar suas visões, tendo assim, impactos diretos sobre

suas atuações dentro e fora da sala de aula.

21

6. REFERÊNCIAS

BUTLER, Judith. Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do “sexo”. In: LOURO,

Guacira Lopes (org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte:

Autêntica, 2007.

______. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro:

Civilização Brasileira, 2008.

FOUCAULT, Michel. História da sexualidade, v.1: A vontade de saber. Rio de Janeiro:

Graal, 2001.

GAGNON, John. O uso explícito e implícito da perspectiva da roteirização nas pesquisas

sobre a sexualidade (1991). In: ______. Uma interpretação do desejo: ensaios sobre o estudo

da sexualidade. Rio de Janeiro: Garamond, 2006.

HALL, S. Identidades culturais na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho. Ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo

Horizonte: Autêntica, 2004.

______. Pedagogias da sexualidade. In: LOURO, Guacira Lopes (org.). O corpo educado:

pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.

SILVA, Tomaz Tadeu. Identidade e Diferença. Petrópolis: Vozes, 2000.

SWAIN, Tânia Navarro. Entre a vida e a morte, sexo. Labrys. Estudos Feministas. Brasília,

Montreal, Paris, v. 12, n. julho/dez, 2006.

______. Identidade nômade: heterotopias de mim. In: RAGO, Margareth; ORLANDI, Luis

(Org.). Imagens de Foucault e Deleuze. Rio de janeiro: DP&A, 2002.

Vídeos

Vídeo “Cabo Free contra a homofobia nas escolas”. Disponível para visualização em:

http://www.youtube.com/watch?v=6dxnnI2H-70&feature=fvst (4 min. 50 s.)

22

Vídeo “Campanha contra homofobia”. Disponível para visualização em:

http://www.youtube.com/watch?v=JNaOQyJu_uU&feature=related (1min)

Vídeo comercial português anti-homofobia. Produção: Ilga Portugal. 2010. Disponível para

visualização em: (http://www.youtube.com/watch?v=fjlOeJa75S0) ( 30 s.)

Vídeo “Depoimento do jornalista Oswaldo Braga na novela “Viver a vida” da TV Globo”.

Disponível para visualização em: http://www.youtube.com/watch?v=wVyHziTlU9A (6 min.)

Vídeo “Programa Profissão Repórter da TV Globo: homossexualidade em família. Disponível

para visualização em: http://www.youtube.com/watch?v=jhsb870cFSo&feature=related

Vídeo “Medo de Quê” (produzido pela parceria ECOS – Comunicação em Sexualidade,

Instituto Promundo, Instituto PAPAI e Salud Gênero, 2005). (25 min).

Vídeo “Muito prazer: travestis e transexuais de Juiz de Fora”. Produção Núcleo de Direitos

Humanos e Cidadania LGBT da UFMG -- Nuh/UFMG. Coordenação Geral: Marco Aurélio

Máximo Prado. Belo Horizonte. 2009. (30 min.) Disponível para visualização em:

http://www.youtube.com/watch?v=FyIhayHXO2I

Vídeo “Não gosto de meninos”. (Brasil, 2011,18 min). Direção: Andre Matarazzo e Gustavo

Ferri. Produção: Mirada & Gringo Disponível para visualização em:

http://www.youtube.com/watch?v=HHA-WpPSK4s

PATRICK 1.5 (Suécia, 2008,100 min). Direção: Ella Lemhagen. Produção: Tomas

Michaelsson, Lars Blomgren. Roteiro: Ella Lemhagen Intérpretes: Gustaf Skarsgard; Torkel

Petersson; Tom Ljungman; Annika Hallin; Jacob Erickson; Anette Sevreus. Filmlance

International.

TRANSAMÉRICA (EUA, 2005, 103 min) – Direção de Duncan Tucker. Produzido pelo

estúdio Belladonna Productions LLC.