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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4 Cadernos PDE VOLUME I

DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 file2 1 Introdução A formação de leitor limitou-se, durante muito tempo de magistério, em oferecer aos alunos textos variados de leitura, que

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE

VOLU

ME I

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LINGUAGEM, DISCURSO E SENTIDO: O Cinema na Formação do Leitor

Roseli Aparecida Juliani Moreira1

Ismara Eliane Vidal de Souza Tasso2

Resumo:

Este artigo tem como objetivo demonstrar o funcionamento do discursivo cinematográfico na prática pedagógica de leitura escolar, propondo uma reflexão acerca da utilização do cinema em sala de aula, não apenas como manifestação artística e cultural, mas como um recurso paradidático que auxilia na formação do leitor. Pensando em contribuir com o aprofundamento da questão, propomos um trabalho diferenciado, aos professores de todas as áreas do conhecimento, buscando compreender os efeitos de sentido em cada um dos filmes analisados a partir de suas condições de produção – a representação do sujeito, a identidade e a memória – analisando o “dito e o não dito”, passando pela leitura semiótica e os estudos culturais, orientados, ainda pelo referencial teórico da Análise do Discurso de vertente francesa.

Palavras-chave: Discurso imagético; formação do leitor; cinema.

1 Professora da Rede Estadual de Ensino do Município de Cianorte, licenciada em Letras (Português/Inglês)

pela Fundação Faculdade de Educação Ciências e Letras de Paranavaí (1989). Especialista em Língua Portuguesa – Descrição e Ensino pela Fundação Faculdade de Educação Ciências e Letras de Paranavaí (1992). Professora PDE (2009). 2 Professora da Graduação e Pós-graduação em Letras na Universidade Estadual de Maringá, na área de

concentração de Estudos Linguísticos e na linha de pesquisa Estudos do Texto e do Discurso. Graduada em Letras pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Jandaia do Sul (1975), mestrado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1997) e doutorado em Linguística e Língua Portuguesa pela Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara (2003). Suas pesquisas compreendem os temas: identidade, discurso, mídia, iconografia, sujeito marginalizado, imagem fixa e em movimento, políticas públicas de inclusão social, política linguística indigenista.

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1 Introdução

A formação de leitor limitou-se, durante muito tempo de magistério, em

oferecer aos alunos textos variados de leitura, que eram levados para a sala dentro

de caixas decoradas e nessas aulas, os alunos liam, na maioria das vezes, faziam

uma leitura silenciosa e, em outras, uma leitura em voz alta em que era realizada de

parágrafo em parágrafo. Nesse tipo de leitura, a preocupação girava em torno da

entonação da voz e do respeito à pontuação. Em seguida, o aluno tinha que

responder às questões propostas que consistiam em vocabulário, levantamento de

informações básicas do texto e, posteriormente, exercícios de gramática.

Nesse sentido, a leitura proposta na/pela escola, estava centrada

meramente na decodificação das palavras ou na identificação básica de informações

pontuais do texto. Segundo afirma KLEIMAN (1995, p.37), “a decodificação se

constitui num processo muito diferente da leitura. É certo, ainda, considerar que o

conhecimento sobre a correspondência entre som e letra é necessário para a leitura.

O leitor eficiente não decodifica, ele percebe as palavras globalmente e adivinha

muitas outras, guiado pelo seu conhecimento prévio e por suas hipóteses de leitura”.

Ainda assim, continuamos, por alguns anos, realizando a aula de leitura que

consistia na leitura de um livro literário, de acordo com a faixa etária da classe.

Esses livros faziam parte do acervo escolar.

No entanto, as inquietações que deram origem a esse trabalho dizem

respeito a uma reflexão sobre a própria prática pedagógica. Essa reflexão tornou-se

relevante, pois nesse período ingressamos no PDE, Programa de Desenvolvimento

Educacional, integrado às atividades da formação continuada em Educação do

Estado do Paraná, que é uma política pública que estabelece o diálogo entre os

professores da Educação Superior e os da Educação Básica, através de atividades

teórico-práticas orientadas, tendo como resultado a produção de conhecimento e

mudanças qualitativas na prática escolar da Escola Pública Paranaense.

Nesse momento, o foco da nossa pesquisa foi redimensionado para o

processo de mudança da prática com leitura, visto que no processo de leitura,

também é preciso considerar as linguagens não verbais. Esse enfoque vai ao

encontro da fala apresentada nas Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa da

Rede Pública de Educação Básica do Estado do Paraná (2009). Conforme este

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documento, ler é familiarizar-se com diferentes textos produzidos em diversas

esferas sociais - jornalística, artística, judiciária, científica, didático-pedagógica,

cotidiana, midiática, literária, publicitária, bem como, a leitura de imagens, fotos,

cartazes, propagandas, imagens digitais e virtuais, figuras que povoam com

intensidade crescente nosso universo cotidiano, propiciando o desenvolvimento de

uma atitude crítica que leva o aluno a perceber o sujeito presente nos textos e,

ainda, tomar uma atitude responsiva diante deles. Sob esse ponto de vista, o

professor precisa atuar como mediador, provocando os alunos a realizarem leituras

significativas. Assim, o professor oferece condições para que o aluno atribua

sentidos a sua leitura, visando a um sujeito crítico e atuante nas práticas de

letramento da sociedade. MARTINS (2007, p. 34) nos auxilia com suas

observações:

Criar condições de leitura não implica apenas alfabetizar ou propiciar acesso aos livros. Trata-se, antes, dialogar com o leitor sobre sua leitura, isto é sobre o sentido que ele dá, repito, a algo escrito, um quadro, uma paisagem, a sons, imagens, coisas, ideias, situações reais ou imaginárias. (MARTINS, 2007).

Com a crescente expansão dos meios de comunicação de massa e uma

indústria cultural cada vez mais forte, o processo de aprendizagem torna-se, a cada

dia, menos restrito à escola e passa a envolver uma variedade de circunstâncias e

contextos. É necessário que os professores lancem um olhar sobre suas práticas

escolares que vão se estabelecendo no dia-a-dia e descubram o que muitas vezes

está (in) visibilizado no cotidiano escolar, não sendo percebido por nós, docente, no

exercício de nossas ações.

Dessa forma, é fundamental que o professor - e não só o de Língua

Portuguesa – aproprie-se de seu papel na formação de leitores. Precisa também ter

na leitura fonte de aprimoramento e fruição, de forma que seu discurso não seja

vazio. Para isso, o docente deve ousar fazer diferente, mexer com a imaginação dos

alunos, criar estratégias de motivação, passando rapidamente pelas concepções

clássicas ou mais usuais, focando as possíveis mudanças trazidas pelas novas

tecnologias e inovando sua prática pedagógica.

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Dentro desse contexto, pensamos em contribuir com o aprofundamento da

questão, a partir de uma renovação das práticas pedagógicas dos professores Rede

Pública de Ensino do Estado do Paraná, trazendo orientações e sugestões de

propostas pedagógicas sobre a utilização do cinema em sala de aula.

Ao iniciarmos os nossos estudos, a primeira ação foi propor como

Implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola, momento em que

o professor PDE aplica na escola de origem o seu projeto de pesquisa, sempre

contando com o acompanhamento dos professores orientadores da Instituição de

Ensino Superior, no nosso caso a UEM, um Curso de Extensão intitulado

“Linguagem, Discurso e Sentido: o cinema na Formação do Leitor”, do qual

participaram professores da Rede Estadual de Ensino de todas as áreas do

conhecimento, pois na linha discursiva, leitura é produção de sentidos. A linguagem

é considerada trabalho e o seu uso é um ato social que envolve leitor e autor a partir

de contextos históricos sociais determinados. Como o cinema constitui uma das

linguagens mais importantes do mundo moderno, é relevante considerá-lo no

ambiente escolar, envolvendo todas as disciplinas.

Antes do início do curso de Implementação Pedagógica, tivemos que montar

o material didático, a segunda produção escrita do professor PDE. Optamos por

fazer um OAC (Objeto de Aprendizagem Colaborativa) direcionado a professores,

portanto levado a conhecimento dos cursistas do nosso grupo de estudos. Cabe

destacar que não desejamos, com esse Curso de Extensão, dar receitas prontas

sobre o uso do cinema em sala de aula, mas apenas levantar algumas reflexões,

que nos foram adquiridas através de leituras e pesquisas sobre esse importante

recurso midiático.

Quando o efetivamos, o curso foi planejado da seguinte maneira: 20 horas

de forma presencial, ou seja, quatro sábados das 8 às 12 horas, e 12 horas de forma

não presencial, totalizando 32 horas/aulas de curso. Esclarecemos que o momento

não presencial do curso foi utilizado para leituras e uma pesquisa de campo que os

cursistas realizaram a qual será revelada ao longo desse artigo.

Durante o curso, exibimos o filme que seria o nosso objeto de pesquisa3 – O

contador de histórias - do diretor Luiz Villaça, Warner Bross, Brasil, 2009. O filme foi

analisado dentro dos domínios histórico-discursivos em que nos situamos,

3 A definição do objeto de estudo se deu conjuntamente com a professora orientadora da pesquisa.

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destacando o sujeito marginalizado, representado por Roberto Carlos Ramos,

menino de rua, que é internado por sua mãe em uma instituição para menores

carentes em Belo Horizonte, analisando – o através da identidade e da memória

discursiva. Falamos sobre “O Cinema no século” e “Como usar o cinema na sala de

aula”, bem como a exibição de outros filmes.

Dentro desse contexto, consideramos que a produção fílmica pode abarcar

todas as disciplinas, desde os aspectos composicionais – dos linguísticos aos

estéticos – aos das funções que exerce no campo educacional, social, cultural e

político. A sociedade demanda desenvolver a habilidade dessa modalidade de

leitura, por isso, a escola tem, em função dessa emergência, um papel fundamental

na constituição de sujeitos leitores proficientes. O cinema, seja como recurso

didático-pedagógico, seja como um meio de comunicação, objetiva e subjetiva os

sujeitos; constrói identidades e representações e, sobretudo, propicia a socialização

dos indivíduos.

2 Sobre as Teorias

2.1 Análise do Discurso

Na teoria da Análise do Discurso, doravante AD, o discurso não pertence ao

indivíduo, pois é uma prática social e deve ser analisado no contexto histórico –

social correspondente a sua produção. Com relação ao texto, a AD, entende-o como

uma materialidade simbólica, própria e significativa, não levando em consideração

somente o texto analisado para compreender e identificar os significados presentes

nele. Em outras palavras, não trata da língua e muito menos da gramática, embora

tenha interesse por ambas. Michel Foucault definiu discurso como um conjunto de

enunciados que podem pertencer a campos diferentes, mas que obedecem, apesar

de tudo, a regras de funcionamentos comuns (REVEL, 2002, p. 37). Ele acrescenta,

ainda, que o discurso pode ser elemento de manutenção como de exclusão do

indivíduo, pois são poucos os privilegiados com acesso ao entendimento dos

variados discursos. Portanto todo discurso, pensamento, fala, todo conhecimento de

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uma época é organizado por um grupo pequeno de ideias fundamentais, o

enunciado.

O enunciado é uma espécie de síntese do pensamento intelectual e como o

discurso, muda com o tempo. O exemplo abaixo é bem ilustrativo de como

funcionam o discurso e seus enunciados – o trecho é parte de uma entrevista da

autora do livro Televisão e Educação: Fruir e Pensar a TV (2001), de FISHER:

Talvez fosse melhor dizer: na mídia circulam diferentes discursos que, de alguma forma, subjetivam as pessoas, os indivíduos, os grupos sociais. E subjetivar quer dizer: produzir um tipo de sujeito, um ou vários tipos de relação dos sujeitos consigo mesmos. Meu fundamento teórico aqui está fortemente baseado em Michel Foucault e seus conceitos de poder, saber e sujeito. Tudo isso tem a ver com relações de poder e com estratégias de resistência. Por exemplo: a mídia tem insistido em “educar” os adolescentes, em dizer a eles o que fazer com seus corpos, com sua sexualidade, com sua vida política, e assim por diante. Há um imperativo, para as meninas, de que seus corpos sejam belos, sarados, de que seus cabelos sejam lisos, de que elas sempre estejam prontas a satisfazer o desejo do homem. [...] Portanto, não é só a mídia que produz esses discursos; eles circulam por diferentes lugares, e os meios de comunicação os transformam a seu jeito, produzindo outras enunciações, nas novelas, nos reality shows, etc. Um programa como Big Brother, por exemplo, tem forte apelo entre os mais jovens, e sua palavra de ordem, em termos de vida pública e de convivência, é: “vamos detonar o outro”!

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Assim, cabe ressaltar que certos enunciados nos remetem, imediatamente, a

certas formações discursivas as quais correspondem ao momento em que

relacionamos os diferentes sentidos que se pode ter de uma determinada palavra

com o sujeito que a usa em seu dizer. A definição de formação discursiva foi

concebida por FOUCAULT (1969) e depois utilizada por PECHÊUX (1975), para

determinar o posicionamento ideológico de um discurso, ou seja, quando falamos

em discurso publicitário, econômico, político, feminista, psiquiátrico, médico,

pedagógico e outros, é porque aprendemos a reconhecer em cada um deles o

conjunto de enunciados que são próprios da formação discursiva de cada uma

4 (disponível em http://www.consciencia.net/2004/mes/05/rosafisher.html – último acesso em 04/02/2011).

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destas áreas. Os falantes destas áreas se reconhecem dentro de seus discursos. No

entanto, embora sendo sujeitos de uma mesma formação discursiva, os agentes do

discurso podem não conceber os mesmos conhecimentos, isto porque, é a partir da

posição que se ocupa que se determina a forma do dizer. (BRANDÃO, 2002, p.90) é

mais específica, ainda, ao afirmar que:

Formação ideológica é a constituída por um conjunto complexo de atitudes e representações que não são nem individuais, nem universais, mas dizem respeito mais ou menos diretamente, às posições de classe em conflito umas com as outras. Cada formação ideológica pode compreende várias formações discursivas interligadas. Que é objeto de descaso social e político. (BRANDÃO, 2002, p. 90)

Em síntese, os discursos são interpelados por formações ideológicas como

elemento capaz de intervir como uma força em confronto com outras forças na

conjuntura ideológica de uma formação social em determinado momento.

2.2 Cinema: uma ferramenta educativa

A palavra cinema é a forma reduzida de cinematógrafo, que é composta de

duas palavras de origem grega: cinemato (movimento) e grafo (escrever, registrar).

O cinema foi criado pelos irmãos Lumière, na França, em 1895, para

designar o aparelho que eles tinham inventado. Esse aparelho era capaz de

reproduzir o movimento por meio de uma sequência de fotografias, projetando as

cenas numa tela. Mais tarde, essa palavra passou a ser usada também para

designar o local onde eram feitas as projeções. De 1895 até hoje, o cinema evoluiu

bastante. Atualmente, os cineastas têm à sua disposição uma incrível variedade de

recursos técnicos que lhes permitem gravar filmes de grande impacto visual.

É importante destacar que, embora essa mídia tenha se desenvolvido e

aprimorado e possibilite a exibição em outros ambientes além da sala própria para

esse fim, o cinema não foi projetado como uma ferramenta pedagógica, por isso, a

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utilização dessa modalidade midiática requer adequações de acordo com os fins aos

quais se destina, dentre eles o educacional. Nem tampouco deve servir apenas ao

entretenimento, para controle da indisciplina, para mera ilustração de um conteúdo,

sem contribuições para o conteúdo programático e matéria de conhecimento.

NAPOLITANO (2009, p.11) alerta para o fato de que o trabalho com cinema

na sala de aula é uma maneira de ajudar a escola a reencontrar a cultura ao mesmo

tempo cotidiana e elevada, pois o cinema é o campo, no qual a estética, o lazer, a

ideologia e os valores sociais mais amplos são sintetizados numa mesma obra de

arte. Sendo assim, observamos que escola necessita trilhar diversos caminhos e

linguagens para investir na formação de leitores, um deles, é a incorporação do

cinema na sala de aula, destacando-o como expressão artística, cultural, e política.

Assim, como forma de lazer, de comunicação, de informação, mas, sobretudo, como

uma maneira de aprender e de apreender o saber-poder circunscrito à instância

discursiva.

2.3 A Contribuição da Semiótica

Segundo JOLY (2001, p. 29) a semiótica, uma disciplina recente nas

ciências humana, é a área que busca relação entre o código e a mensagem e entre

signo e discurso. O signo só será considerado signo se o mesmo expressar uma

ideia e se provocar na mente daquele que o perceber uma atitude interpretativa.

Charles Sanders Peirce (1839 – 1914), um dos grandes precursores do estudo dos

signos, divide o signo em objeto, representamen e interpretante. O primeiro termo é

aquilo que é referido pelo signo, já o representamen é aquilo que funciona como

signo e o último termo é o efeito do signo. De acordo com Santaella (1990, p. 13):

O signo é uma coisa que representa uma outra coisa: seu objeto. Ele só pode funcionar como signo se carregar esse poder de representar, substituir uma outra coisa diferente dele. Ora, o signo não é o objeto. Ele apenas está no lugar do objeto. Portanto, ele só pode representar esse objeto de um certo modo e numa certa capacidade. Por exemplo: a palavra casa, a pintura de uma casa, o desenho de uma casa, a fotografia de uma casa, o

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esboço de uma casa, um filme de uma casa, a planta baixa de uma casa, a maquete de uma casa, ou mesmo o seu olhar para uma casa, são todos signos do objeto casa. Não são a própria casa, nem a ideia geral que temos de casa. Substituem-na, apenas, cada um deles de um certo modo que depende da natureza do próprio signo. A natureza de uma fotografia não é a mesma de uma planta baixa. (SANTAELLA, 1990, p.13).

Como podemos notar, a semiótica se preocupa com a construção de

sentidos dos textos verbais e não verbais. A partir deste fato, uma série de

discussões pode ser realizada quanto aos mecanismos presentes no funcionamento

da imagem cinematográfica como signo. A preocupação deste trabalho é, além de

elucidar a questão anterior, aprimorar cultural e intelectualmente a comunidade

escolar, voltando o nosso olhar sobre a educação e a formação do leitor através do

discurso cinematográfico.

3 Desenvolvimento

Ao definirmos o nosso objeto de pesquisa demos início à elaboração do

projeto. No primeiro momento, tivemos que realizar diversas leituras sobre o

referencial teórico para que pudéssemos dirigir para a escrita, propriamente dita, do

projeto. É necessário acrescentarmos que nesse período o professor PDE se

encontra com o afastamento de 100% das suas atividades de sala de aula, mas

possui um calendário extenso com aulas teóricas presenciais, cursos, palestras e

treinamento para o desenvolvimento do GTR (Grupo de Trabalho em Rede), em que

o professor PDE é tutor e deverá estar preparado para desenvolver junto com os

cursistas a temática do seu objeto de estudo.

Foram realizados oito encontros com a professora orientadora na UEM para

a construção do projeto, encontros mensais com o GEDUEM – Grupo de Estudos

em Análise do Discurso da UEM –, além da participação no Colóquio Internacional

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de Análise do Discurso, realizado na Universidade Federal de São Carlos – SP, a

convite da orientadora.

Após várias discussões, optou-se aplicar como Implementação do Projeto

um curso de extensão para os professores da Rede Estadual de Ensino, aos

sábados, intitulado “Linguagem, Discurso e Sentido: o cinema na formação do leitor”.

O primeiro passo para a organização desse grupo foi uma ampla divulgação, pois

pretendíamos atingir o máximo de professores que um curso de extensão comporta,

máximo 15 cursistas. Para nossa surpresa, conseguimos catorze.

Para o primeiro encontro, preparamos um questionário (apêndice A) sobre o

uso do cinema na sala de aula, com oito questões abertas e fechadas. Foram

distribuídas trinta e duas cópias aos cursistas e aplicado aos professores das

diversas áreas do conhecimento da Rede Pública de Ensino.

Nos encontros tivemos o retorno de apenas vinte e três questionários

respondidos, pois alguns cursistas alegaram que não tiveram tempo para realizá-los.

As questões respondidas pelos vinte e três professores e que nortearam o nosso

estudo foram: Há quanto tempo exerce o magistério? Já utilizou filmes em sala de

aula? Qual a metodologia utilizada? Você opta por filmes nacionais ou estrangeiros?

Você trabalha com curtas-metragens na sala de aula? Para se trabalhar com filmes

em sala de aula, o professor precisa... Quais são as suas dificuldades para trabalhar

com filmes? Qual o procedimento que você adota para trabalhar com filmes?

Do total dos questionários respondidos, obtivemos os seguintes resultados:

08 professores exercem a profissão há mais de 20 anos, 05 profissionais estão no

magistério há 15 anos, 05 professores há 10 anos e 5 lecionam há menos de 07

anos.

Em relação à segunda questão, 20 professores responderam que já

utilizaram filmes em sala de aula, 02 responderam que não utilizaram, mas pretende

um dia e apenas 01 respondeu não ter utilizado.

Na terceira questão quanto à metodologia utilizada pelos entrevistados, a

maioria respondeu que relaciona o filme ao conteúdo abordado pela disciplina e

outros acrescentaram, ainda que a linguagem audiovisual é um recurso que

possibilita à análise, o debate e a reflexão sobre diversos olhares como o social, o

histórico, político, ambiental, científico, etc.

Quanto à opção entre filmes nacionais ou estrangeiros, a maioria dos

entrevistados responderam que utilizam tantos filmes nacionais quanto filmes

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estrangeiros, apenas 04 educadores deixaram visível a opção por filmes nacionais.

Com relação à utilização de curtas-metragens na sala de aula, os professores foram

unânimes ao responderem que trabalham muito com esse gênero, pois um longa-

metragem chega a durar aproximadamente 115 min, ultrapassando a hora/aula,

deixando o filme fragmentado ou causando sérios transtornos nas escolas com

mudanças de horário ou atrapalhando a aula de um colega.

Com relação às últimas questões, observamos certa apreensão, porque

alguns alegam que não tem certeza de que utilizam a metodologia adequada, pois

não foram capacitados para o uso do cinema na sala de aula, e, além disso, essa

prática exige um planejamento do professor e esse, às vezes, não tem tempo para

prepará-lo.

Apesar de termos um número pequeno de entrevistados, o retorno desse

questionário, direcionou todo o nosso trabalho, pois a partir daí, tivemos o

conhecimento de todas as angústias quanto ao uso do cinema em sala de aula e

tentamos nos próximos encontros, oferecer a nossa parcela de contribuição e ou

alternativas aos professores da Rede Pública Estadual, sobre a utilização dessa

prática pedagógica inovadora.

Os próximos encontros, por sua vez, foram pensados e organizados com

várias possibilidades metodológicas para trabalhar o filme, pois apesar de

valorizado, o cinema não é visto ainda como um material didático pedagógico.

Alguns alunos o veem apenas como diversão e entretenimento e na sala de aula,

como “enrolação” para “matar aula”, também alguns professores fazem mau uso do

filme tratando-o como recurso de segunda ordem, ou seja, apenas como ilustração,

não valorizando-o como fonte de pesquisa na ação pedagógica.

Assim, exibimos aos cursistas, o filme “O contador de histórias”, como

dissemos anteriormente, o nosso objeto de pesquisa, a fim de esclarecermos que o

filme em sala de aula é muito mais do que uma ilustração de conteúdo ou para

destacar questões éticas e valores humanistas. O filme não pode assumir um papel

secundário. Pretendemos discutir aqui que a película pode ser muito produtiva em

sala de aula e que depende, exclusivamente, da abordagem e do direcionamento do

professor.

Considerando que o discurso de um texto cinematográfico produz efeitos de

sentidos diversos e exerce a função de linguagem ativa, é importante que o sujeito

leitor desenvolva possibilidades de entendimento dos elementos visuais como

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operadores do discurso. Destacamos, ainda, que não trataremos, nesse momento,

sobre a linguagem cinematográfica como, os tipos de plano, as tomadas, os

movimentos da câmera, ângulos de filmagens e outros elementos do texto que

chamamos de linguagem cinematográfica, pois nos prenderemos à análise das

imagens que não estão visíveis, mas apenas sugeridas, observando as diferentes

interpretações do texto cinematográfico em estudo. A partir da exibição do filme,

mapeamos as possibilidades educativas presentes na obra.

Ampliando as possibilidades do uso da Análise do Discurso, podemos

começar a refletir, a forma de construir uma relação teórico-metodológica de uma

obra cinematográfica. Conforme afirma ORLANDI (1999, p. 15) Análise do Discurso

não trata especificamente da língua nem da gramática, mas do discurso, que pode

ser entendido como um movimento, uma “prática de linguagem: com o estudo do

discurso observa-se o homem falando”, as diferentes maneiras de significar,

aparatos ideológicos, intencionalidades.

O filme “O contador de histórias” é baseado na vida do mineiro Roberto

Carlos Ramos. Conta a história de como o afeto pode transformar a realidade.

Caçula entre dez irmãos, Roberto desde cedo demonstra um talento especial para

contar histórias, transformando, com a narrativa, suas próprias experiências de

frustração em fábulas cativantes. Aos seis anos, o menino cheio de imaginação é

deixado pela mãe em uma entidade assistencial recém-criada pelo governo – a

FEBEM (Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor) – A mãe acredita estar, assim,

garantindo um futuro melhor para seu filho. Aos treze anos, após mais de cem fugas,

ele é classificado como “irrecuperável”, nas palavras da diretora da entidade.

Contudo, para a pedagoga francesa Margherit Duvas, que veio ao Brasil para o

desenvolvimento de uma pesquisa, cujo objetivo era conhecer a FEBEM e levar

ideias da instituição para o seu país, Roberto representa um desafio. Determinada a

fazer do menino o objeto de seu estudo, tenta aproximar-se dele. O garoto em

princípio reluta, mas, depois de uma experiência traumática, procura abrigo na casa

de Margherit. O que surge entre os dois é uma relação de amizade e ternura, que

porá em xeque a descrença de Roberto em seu futuro e desafiará Margherit a

manter suas convicções. Apesar dos problemas que enfrentaram, Roberto vai para

França com Margherit, estuda até o Ensino Médio, retorna a Belo Horizonte, procura

sua mãe, faz o curso de Pedagogia. Hoje é conhecido como um dos dez melhores

contadores de histórias do mundo e ministra palestras para professores. É

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importante ressaltar que toda a narração do filme é realizada pelo próprio Roberto

Carlos.

A realidade da instituição retratada no filme é baseada em táticas e

dispositivos punitivos, medidas socioeducativas, que apenas insere o menor em um

local fechado, com horários rígidos e normas que ele deve seguir desde o momento

da sua chegada. A FEBEM servia de instrumento político e de propaganda da

ditadura militar. Desde sua criação em 1970, a instituição apresenta muitas falhas.

As professoras, psicólogas, assistentes sociais eram aquelas que já estavam

cansadas ou com algum problema de saúde e que não davam conta de trabalharem

nas escolas, os bedéis eram policiais que também não tinham uma boa atuação nas

ruas, ou por serem muitos rígidos ou muitos permissivos, já que o período, como

mencionamos, era o da Ditadura Militar. O objetivo da instituição era “acolher” um

filho de cada família, que na época passava por grandes necessidades

socioeconômicas, e dar educação. Nessas condições, o seu papel, até então, não

era o de “recolher” o jovem infrator como atualmente acontece. Para isso,

ironicamente, um comercial de TV apregoava que os jovens internos poderiam sair

dali doutores: (cap. I X - 38:46 min.):

“Para que as crianças tenham futuro, elas precisam de cinco coisas: o F da fé, o E da educação, o B dos bons modos, o E de esperança, e o M da moral”. A mãe de Roberto Carlos Ramos, uma lavadeira com dez filhos para criar, acreditou na propaganda da ditadura e resolveu levar o garoto, o mais novo dentre os irmãos, para uma unidade da FEBEM, em Belo Horizonte. Portanto muito diferente do que se promovia pela propaganda na TV. Roberto, aos poucos, perde a esperança de um futuro digno.

A noção de sujeito em Análise do Discurso é concebida desde suas

primeiras formulações por uma distinção essencial entre indivíduo e sujeito. Para

entendermos essa definição, devemos considerar que sujeito do discurso não se

refere à de indivíduos compreendidos como seres que tem uma existência particular

no mundo, afirmamos que o sujeito discursivo deve ser considerado como um ser

social, apreendido em um espaço coletivo, inserido em uma conjuntura sócio

histórico, cuja voz é constituída por um conjunto de vozes sociais por isso, uma

posição ocupada no discurso. Segundo ( FOUCAULT, 2004, p.107):“ O sujeito não

se reduz a uma entidade empírica, nem a uma entidade psicológica. É, antes de

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tudo, caracterizado como uma posição. O sujeito de um enunciado é uma função

vazia podendo ser exercida por indivíduos, até certo ponto, indiferentes.”

Nesse momento, conduzimos a discussão para a análise das condições de

vida, dentro dos domínios histórico-discursivos, da identidade do sujeito menino de

rua, representado, aqui, por Roberto Carlos Ramos.

Em um país que se furta a priorização de implementação de políticas sociais

dirigidas aos setores mais desfavorecidos, a questão dos meninos de rua é

transformada em um problema social em que esses sujeitos, vivendo à margem da

sociedade, são identificados como objeto de descaso social e político. Há que se

destacarem alguns critérios em relação à identidade do menino de rua, tais como: a

aparência – na maioria das vezes, é pobre, suas vestimentas são precárias e não

possui o mínimo hábito de higiene. Assim

A exclusão consolida-se a partir de condições nas quais um sujeito, que se encontra fora dos parâmetros e das normas que regem as relações socioculturais, políticas e econômicas, busca um espaço, um reconhecimento social, uma identidade, entre outras formas de relações existentes entre sujeitos e instituições. Além desses vínculos, o processo de exclusão pode ser estabelecido pela ordem simbólica, configurada por rupturas no imaginário, do valor imaginário do trabalho, da ascensão social, do vestuário, da alimentação etc. (TASSO, 2006, p.140).

A narrativa do adolescente Roberto evidencia como sua identidade está

sendo construída. Observar seus discursos sobre sua própria vida permite-nos tecer

considerações a respeito do que está incluído ou excluído no conceito por ele

formado, bem como, de sua identidade. Para isso, destacamos a cena do filme

exibida aos 50h55min, que mostra a diretora da FEBEM dizendo para Roberto que

ele mudaria de turma:

Diretora: “Bom, Roberto, você já fez sete anos, então vai ter que mudar pra outra turma, é a turma dos meninos maiores, quem tem de sete a catorze anos tem que ficar lá. À tarde o bedel vai passar e levar você e os outros meninos para lá”. Roberto: “Eu queria ficar aqui”. Diretora: “É, mas não dá mais, Roberto. Mas vai ser bom, lá tem muitas coisas pra fazer, tem outros meninos, tá bom”?

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Ao chegar à instituição, Roberto percebeu que teria que se comportar como

os “maiores” para não se sentir excluído. De acordo com SILVA (2000, p. 82), “a

afirmação da identidade e da diferença implicam, sempre, as operações de incluir e

excluir”. Significa dizer segundo o autor, “o que somos” e o “que não somos”.

Na medida em que, no grupo, ele se socializa e reafirma sua identidade e

onde ela é reconhecida e aceita, é no grupo, também, que se individualiza,

identificando - se com uns e diferenciando-se dos outros, a partir de critérios

bastante contraditórios que vão desde a coragem e o sentido de afetividade até atos

de maior violência. WOODWARD (2000, p. 14-15) afirma que as identidades são

fabricadas por meio da marcação da diferença. Essa marcação da diferença ocorre

tanto por meio de sistemas simbólicos de representação quanto por meio de formas

de exclusão social. A identidade, pois, não é o oposto da diferença: a identidade

depende da diferença. Isso fica claro na cena

em que Roberto, após uma das fugas da FEBEM, é encontrado por Margherit, no

centro da cidade, na praça, tomando banho no chafariz, com seus amigos, isso nos

revela que a identidade do menino de rua se constitui no conflito.

A linguagem humana tem se propagado sob várias formas e várias

estruturas e novos meios de multiplicação desta linguagem têm sido criado. Para

Pierce, “a semiótica tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis,

ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer

fenômeno como fenômeno de produção de significação e de sentido” (apud

SANTAELLA, 1990, p.13). O discurso cinematográfico caracteriza-se como um texto

constituído de diferentes linguagens: o som, a imagem e as mensagens.

Seguindo neste entendimento, achamos interessante fazer análise semiótica

da cena descrita anteriormente, a qual se refere à propaganda da TV sobre a

FEBEM. Para isso, usaremos as três modalidades possíveis de apreensão de todo e

qualquer fenômeno de produção e significação de sentido apontadas por Pierce,

(apud JOLY, 2008), apresentadas a seguir:

Primeiridade – É a primeira apreensão das coisas, incerta, indeterminada.

Na cena, ao ouvir a propaganda da FEBEM, a mãe de Roberto, como não conhecia

a instituição, deduziu que era o melhor, foi a primeira apreensão que teve da

entidade.

16

Secundidade – É a constatação do primeiro fato, o confronto com a

realidade. Na verdade, no filme, quem pode experimentar esse conflito foi o

personagem Roberto, que descobriu a verdadeira realidade da instituição. Isso

também é mostrado através de uma cena em que Roberto relata a Margherit como

era a FEBEM e diz: “Não sei por que fugíamos de lá, se tínhamos comida de

primeira” - no filme mostra uma péssima refeição – “medidas socioeducativas” –

cena em que o bedel bate no seu rosto –” aula de natação” – o bedel “enfia” a sua

cabeça em um tanque de água –” e quarto privativo” - momento em que o menor é

levado para a solitária.

Terceiridade - É quando o primeiro momento se relaciona com o segundo,

ou seja, é a reflexão. A partir da imaginação, do conhecimento representamos e

interpretamos o mundo. No filme, podemos destacar o personagem Roberto, que

após inúmeras fugas, encontra a pedagoga francesa e a partir desse momento,

reconstrói a sua vida, deixando de ser um menino tido como “irrecuperável” para se

tornar um cidadão, destacando-se como um exemplo de superação de vida.

Segundo Pierce, um signo é “algo que está no lugar de uma coisa para

alguém, em alguma relação ou alguma qualidade” (apud JOLY, 2008, p.33)

Consideramos a imagem cinematográfica como um signo, portanto demonstraremos

a interpretação semiótica de quatro cenas do filme, segundo a triangulação proposta

pelo semioticista Pierce, conforme quadro a seguir:

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Objeto

- Referente –

Cenas do filme

Representamento

- Significante -

Significado

- Interpretante -

Roberto e Margherit vão

ao estádio de futebol e o

menor tem medo de ser

revistado pelos policiais

porque é negro, menor de

rua, sente-se, portanto

excluído.

Policiais

Expressão facial

Atitude de Margherit

Memória – FEBEM

Pavor, medo,

sentimento de exclusão.

Elevação da autoestima

de Roberto.

Roberto fica furioso, e

inunda toda a casa de

Margherit. Ele fez isso

porque pensou que

Margherit fosse voltar

para a França e não fosse

levá-lo.

Ódio

Castigo

Representado pela

mistura de sentimento,

rancor, tristeza profunda.

Neste caso, o castigo

está relacionado com as

punições da FEBEM,

mas foi representado

através de um abraço

forte.

Camelô, contador de

histórias na praça,

vendedor de canetas.

Esperteza

Solidariedade

Representada pela

imagem de um homem

lutando pela sua

sobrevivência.

Sentimento concreto

explícito na figura de

Margherit.

Roberto e sua mãe em

uma das poucas vezes

que ela foi a FEBEM.

Rejeição

Frieza de sentimento

Autoafirmação

Demonstrando carência

afetiva.

Representado pela

figura da mãe e seu

discurso.

Asseveração,

reconhecimento perante

o seu grupo.

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É importante destacar que analisamos, no Curso de Extensão, o artigo

intitulado “Igualdade, Solidariedade e Cidadania na Prática discursiva da Mídia

Televisiva” produzido por Tasso (2006), o qual faz a análise do vídeo de uma

campanha publicitária “Sou Brasileiro e não desisto nunca”, veiculada a partir do

final do primeiro semestre de 2004, que tem como protagonista Roberto Carlos

Ramos, o personagem real do filme objeto de estudo desse artigo. A autora optou

por analisar todas as cenas dessa produção videográfica, “demonstrando como os

elementos verbos-visuais se articulam com os sonoros, produzindo efeitos de

sentidos singulares para cada uma das partes que compõem a propaganda” e “de

como a mídia se apropria de discursos já cristalizados relativos a políticas públicas e

que fazem parte do imaginário coletivo” (TASSO, 2006, p.149).

Reconhecemos que a discussão acerca do artigo mencionado acima

esclareceu-nos muitas indagações sobre análise da linguagem não verbal, e sobre o

filme, pontuando, claramente, que hoje Roberto Carlos Ramos, formado em

Pedagogia, é considerado um dos melhores contadores de histórias do mundo.

Depois de formado, voltou à FEBEM, mas como professor. E já adotou mais de vinte

meninos de rua, muitos de início “irrecuperáveis” como ele, foi.

Passamos, então, juntamente com o grupo de professores, a uma reflexão

de SILVA (2007, p.52) “cinema é arte, é diversão, é indústria e, desde o final do

século passado, vem encantando pessoas de todas as idades. Se mergulhar no

universo do cinema é poder viver uma grande emoção, por que não aprender

também? Será que o cinema é apenas diversão sem nenhum valor educativo?” Se a

nossa proposta era a de inovar a prática pedagógica, inserindo a linguagem

cinematográfica no meio educacional como um material didático-pedagógico

contemporâneo, nos encontros seguintes discutimos sobre como usar o cinema na

sala de aula, afirmamos que o uso de filmes como fonte de pesquisa é a capacidade

real de impulsionar os estudantes, tornando-os críticos para interpretar, analisar e

compreender os argumentos e as histórias contadas.

Dessa forma, entendemos que o cinema é uma ferramenta de apoio que tem

a capacidade de envolver várias disciplinas e conteúdos num mesmo momento.

Recorremos a NAPOLITANO (2006, p.12) “a utilização do cinema na escola pode

ser inserida, em linhas gerais, num grande campo de atuação pedagógica”.

Ao abrir espaços para questões relativas à pesquisa a partir do discurso

cinematográfico, ou seja, o cinema não visto apenas como um instrumento ligado à

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ética e aos valores humanísticos, mas também um instrumento fundamental para a

formação do aluno leitor, vale destacar que, em sua maioria, os professores

consideram os textos verbais “para ler”, enquanto, os visuais e audiovisuais como,

por exemplo, o cinema, a fotografia e a pintura “para ver”. E, como pouco se

questiona isso na escola, pouco se discute ou aprimora na sua prática pedagógica,

favorecendo a não exploração das possibilidades (também restritas) oferecidas em

livros didáticos, tampouco, com relação à formação de professores, como também

para professores em formação continuada. Razão de a escola explorar

minimamente a legibilidade dessa imagem, reservando-se à disciplina de História a

utilização dessa modalidade, confirmada pela reflexão de um professor dessa

disciplina: “O chamado filme histórico é um desses recursos, por compor um dos

gêneros mais consagrados na história do cinema mundial”. Para DUARTE (2002,

p.75), “tanto a leitura de obras literárias, filosóficas e de outras, quanto a de filmes é

uma prática social importante no contexto da formação cultural e educacional”.

Diante disso, o presente artigo alerta que o cinema constitui uma prática

social importante, atua na formação geral das pessoas, além de possuir um valor

imprescindível como ferramenta de apoio fundamental na sala de aula.

4 Conclusão

Neste artigo, defendemos o uso do cinema em sala de aula, pois a imagem

em movimento surge como uma das tecnologias que mais influenciam o

pensamento e a formação do indivíduo, permitindo ao espectador vivenciar a

trajetória do outro, além de desenvolver um saber crítico e consciente, tornando-os

sujeitos analíticos e construtores do conhecimento.

Para contribuir com a Formação Continuada dos professores da Rede

Estadual de Ensino, oferecemos como Proposta de Intervenção Pedagógica, um

curso de extensão: “Linguagem, Discurso e Sentido: o cinema na Formação do

Leitor”, o qual teve como finalidade mostrar aos professores que o cinema tem uma

linguagem própria e que pode ser objeto de estudo, de forma a contribuir no/sobre o

processo escolar, enriquecendo a nossa prática pedagógica através do olhar

cinematográfico.

20

Fomentar o interesse nos professores a usar a sétima arte em sala de aula

foi o nosso principal objetivo e para isso fez-se necessário a seleção criteriosa do

filme e de todo o material escolhido que foi trabalhado aos sábados ao longo de

quatro meses como recurso pedagógico, enriquecendo também a nossa prática

pedagógica com a utilização de filmes para uma aprendizagem significativa.

É imprescindível mencionar também, que a escolha do filme “O contador de

histórias”, foi de extrema relevância, pois sua projeção fez com que o grupo de

professores se emocionasse, identificando-se com os personagens ou mesmo com

a própria realidade dos problemas sociais presentes na obra, como, menor de rua,

violência, desigualdade social, enfim, a película é um momento mágico, lúdico e ao

mesmo tempo de reflexão e construção do conhecimento.

Enfim, se queremos formar um leitor que conheça a diversidade de textos

que circulam no mundo, que construa novos significados a partir do contexto, a

experiência com cinema na sala de aula pode ser válida, porque possibilita a análise

e a reflexão, propicia elementos para pensar, amplia o olhar sobre si, sobre o outro e

sobre o mundo. Afinal, como diz Arnaldo Antunes: “O seu olhar, o seu olhar,

melhora, melhora o meu”.

5 Referências

DUARTE, Rosália. (2002) Cinema & educação. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2002.

FISCHER, R.M.B. Televisão e Educação: Fruir e pensar a TV. Autêntica, 2001. In http://www.consciencia.net/2004/mes/05/rosafisher. - (último acesso em 04/02/2011)

JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. Trad. Mariana Appenzeller. 4ª ed. Campinas: Parirus, 2001.

KLEIMAN, Ângela Texto e leitor. 4ª ed. Campinas: Pontes, 1995.

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. 19 ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.

21

NAPOLITANO, Marcos. Como usar o cinema na sala de aula. 2º ed.. São Paulo: Contexto, 2005.

ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos/ Campinas, SP: Pontes, 1999.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares da Rede Pública de Educação Básica do Estado do Paraná. Curitiba: SEED, 2009.

REVEL, Judith. Michel Foucault: Conceitos Essenciais; tradução Maria do Rosário Gregolin, Nilton Milanez, Carlos Piovesani. São Carlos, Clara luz, 2005.

SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 9ª edição, 1990.

SILVA, Roseli P. Cinema e Educação. São Paulo: Cortez, 2007.

SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2000.

TASSO, Ismara Eliane Vidal de Souza. Linguagem não verbal e produção de sentidos no cotidiano escolar in Concepções de linguagem e o ensino de língua portuguesa. Maringá, 2005.

___________________. Mídia televisiva e políticas públicas de inclusão na Pós-Modernidade: Igualdade, Solidariedade e Cidadania in Estudos do texto e do discurso: mapeando conceitos e métodos. Maringá, 2006.

WOODWARD, Kathryn. 2000. “Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual”. In: Identidade e diferença: A perspectiva dos Estudos Culturais. Org. Tomaz Tadeu da Silva. Petrópolis: Vozes.

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APÊNDICE A

1- Nome____________________________________________________________

a - Sexo: ( )M ( )F b - Tempo que leciona: _________________________________________________ c - Disciplinas:________________________________________________________ d - Nome da escola onde você trabalha:____________________________________ e - Nível: ( ) Fundamental ( ) Médio 2 - Já utilizou filmes em sala de aulas? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não, mas pretende um dia ( ) Não e nem pretende. 3 - Você trabalha com filmes hollywoodianos em sala de aula? ( ) Sim. Qual é a metodologia adequada? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ ( ) Não. Por quê? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ 4- Você trabalha com filmes nacionais na sala de aula? ( ) Sim. Qual é a metodologia adequada? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ ( ) Não. Por quê? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ 5- Você trabalha com curta-metragem na sala de aula? ( ) Sim. Qual é a metodologia adequada? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ ( ) Não. Por quê? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ 6- Para se trabalhar com filmes em sala de aula, o professor precisa ______________________________________________________________________________________________________________________________________ 7 - Caso já tenha trabalhado com filmes em sua aula, encontrou alguma dificuldade? Quais?______________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 8 - Qual o procedimento que você adota para trabalhar com filmes? Descrever. ______________________________________________________________________________________________________________________________________