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PARAVENCEROTRAU~ADAMATEMATICADois livros exploram a história damais temida das disciplinas
Jerônimo Teixeira
os números têm má fa-ma. A aula de matemá-tica costuma ser lem-bmda como o momen-
to mais monótono da infância.E, ainda que a matemática for-neça a base para todas as ciên-cias. ela costumava ser a primapobre na literatura de divulga-ção científica. cujos astrosmaiores são astrônomos comoCarl Sagan, físicos como Ste-phen Hawking ou biólogos co-mo Stephen Jay Gould e Ri-chard Dawkins. Nos últimostempos, porém. os números vêmganhando em popularidade (nem queseja pela via de passatempos numéricoscomo o sudoku). Dois lançamentos re-velam o potencial da matemática parafascinar o leigo. O U1liversoe a Xícarade Clrá(tradução de Beth Leal: Record:294 páginas; 40,90 reais), da jornalistaamericana especializada em ciênciaK.c. Cole, promete, em seu subtítulo.explicar a "matemática da verdade e dabeleza" (mas fica a meio caminhO).Ra-zão Áurea (tradução de Marco ShinobuMatsumura; Record: 336 páginas;46.90 reais), do astrofísico israelense(nascido na Romênia) Mario Livio, par-te de um tema em aparência mais limi-tado - o número Fi. uma constantegeométrica - para construir um ensaiosoberbo em que a matemática se conju-ga à história cultural.
O Brasil, é verdade. já contava comum tradicional best-seller matemático- Malba Tahan, pseudônimo do educa-
156 18de outubro.2006 veja
_ dor JúlioCésarde MelloeSouza (1895-1974), autor de
, livros como O Homem quel
i' Calculava. A nova divulgação
, matemática, porém, afasta-se. das finalidades imediatamente
J, pedagógicas de Malba Tahan.
, Colunista do jornal Los AllgelesTimes, K.C. Cole tem preten-
sões mais, digamos, filosófi-cas: revelar a ordem oculta,as simetrias insuspeitas da na-
~
tureza, que só a matemáticaseria capaz de alcançar. A au-
,", tora. porém, não bota tanta fér. assim na beleza dos números,
que quase não aparecem na, obra (talvez pelo temor de quefórmulas e equações espantem o
leitor). O livro nunca decola. O ca-pítulo sobre cálculo de riscos. porexemplo, não avança além da tese ini-cial: os seres humanos não são muitoracionais DOScálculos de risco (o mes-mo princípio é demonstrado na pontado lápis em Freakollomics,de StephenDubner e Steven Leviu, livro que rea-lizou a façanha de colocar a econo-mia. outra ciência reputada como ári-da, na lista de best-sellers). Em suatentativa de trocar conceitos abstratosem miúdos, ela também comete im-precisões e confusões que desacredi-tam a obra.
Chefe da divisão científica res-ponsável pelo telescópio Hubble,Mario Livio não tem pudor de exporcálculos e deduções em Ra;:.ãoÁu-rea (embora as demonstrações mais"técnicas" sejam agrupadas nosapêndices do livro). As vezes, ele
A ENGENHARIADA NATUREZA
Osnúmerosqueorientamasmais variadas formas naturais -do abacaxià ViaLáctea
L-. .RAZAOAUREATambémconhecidocomoProporçãoDivinaou númeroFi(<!»,é um númeroirracional(que não podeserexpressoemtrações)de grandeimportânciana geometria.Comoo Pi (1T),é um númerointerminável-suascasasdecimaissãoinfinitas. Seuvaloré
1,6180339887...- -
~,SEQÜÊNCIADE FlBONACCI
Éumaseqüênciade númerosdescobertapelo matemáticoitalianoLeonardoFibonacci(c. 1170-1240),que a propôscomosoluçãoparaum problemasobreo ritmo dereproduçãodos coelhos.Osnúmerosda seqüênciasão sempreobtidos-a partir doterceiroalgarismo-pelasomados dois númerosanteriores:
1, 1,2,3,5,8, 13,21,34, 55, 89, 144, 233...- - --
,f*'.I
,
-
..
-~....
chega perto de exaurir os neurô-nios do leitor. O esforço com-
pensa: sua obra é um tour ar-rebatador, viajando da fi-
losofia à engenharia demateriais, da arte renas-centista à astro físicamoderna. O fio dameada é o número Fi.Resultado da simplesdivisão de uma retasegundo uma pro-
í' porção específica, ele
) surge modestamentei 'r na obrade matemáti-
cos da Antiguidade- em especial o gre-go Euclides. No meio
do livro, o leitor é apre-sentado também à Se-
qüência de Fibonacci, ou-tra descoberta despreten-
, .~~P"" siosa: apareceu na obra domatemático medieval Leonardo
Fibonacci como resposta a um pro-blema fantasioso envolvendo o ritmode reprodução dos coelhos. À medidaque se avança na seqüência, a razão
- entre dois números su-cessivos começa a se
aproximar de Fi (I ,6l...).Além de uma série de pro-priedades matemáticas sur-preendentes, esses númerosapresentam uma recorrência êadmirável na natureza: a dis- ~posição das pétalas de uma grosa, o padrão de vôo das ~
aves de rapina, a organização ~molecular de certas ligas me- ~~
tálicas remetem ao Fi (mais ~~exemplos no quadro ao lado). ;S
Essa universalidade do número ~~
levou a int~rpreta!ões mística~ (~o- n!II0 a que e sugenda em O COdlgO ê~
,Da Vinci, de Dan Brown - autor g~
que, aliás, assina uma recomenda- ~!ção de Ra:;ão Áurea na contracapa do *~
livro)e a exagerosinterpretativos.Ma- ~~rio Livio contesta várias análises mate- ~~
máticas arbitrárias que "encontram" Fi ;::inas pinturas de Da Vinci ou nas sonatas ~ iii
de Mozart. Seu livro é sóbrio e rigoro- ~~so. Mas é impossível dei;'{á-Iosem um ~~sentimento de assombro: números co- a~mo o Fi permitem um vislumbre na en- ~igenhariadanatureza. . ~~
A Razão Áurea e a Seqüência de Fibonacclpodem ser encontradas na organização das maisvariadas formas naturais. Veja alguns exemplos:
Conchas e galáxias L~.:
o moluscoNautilus constrói suaconcha em um formato conhecido
como espirallogarítmica, que éobtida pela Proporção Áurea.A espiral pode se expandirindefinidamente, sem perdersua forma original. O arranjodas estrelas nas galáxias tambémsegue o mesmo formato
Abacaxi . . ..'
As formas hexagonais que seapresentam na casca do abacaxise organizam em espirais. Amaioria dos frutos tem cinco, oito,treze ou 21 espirais - números daSeqüência de Fibonacci
O.entusiasmo dos
matemáticos pela RazãoÁureaàs vezeséexagerado, ehá quemencontreo númeroem tudo que é lugar. Já sesugeriu, por exemplo, que o Fifoi usado para compor o rostode A Mona Usa, de LeonardoDa Vinci,e para a construçãodas pirâmides do Egito - masas evidências nesse sentidosão arbitrárias .. !!,echodeRazãoÁureaem_
. ~.veja.com:6r
veja 18de outubro,2006 157