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DADOS DE COPYRIGHT · E 1. O sr. Sherlock Holmes 1 O SR. SHERLOCK HOLMES m 1878 formei-me em medicina pela Universidade de Londres e fui para Netley, a fim de fazer o …

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  • DADOS DE COPYRIGHT

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  • Crditosttulos originaisA Study in Scarlet, The Sign of Four, The Adventures of Sherlock Holmes, Memoirs of Sherlock Holmes, The Return ofSherlock Holmes, The Hound of the Baskervilles, The Valley of Fear, His Last Bow e The Case Book of SherlockHolmesCopyright da traduo Agir Editora Ltda.traduoUm estudo em vermelho Louisa IbaezO sinal dos quatro Branca de Villa-FlorAs aventuras de Sherlock Holmes Edna Jansen de MelloMemrias de Sherlock Holmes urea Brito WissenbergA volta de Sherlock Holmes Flvio Mello e SilvaO co dos Baskervilles Arnaldo Viriato MedeirosO vale do medo Luiz Orlando C. LemosOs ltimos casos de Sherlock Holmes Adailton J. ChiaradiaHistrias de Sherlock Holmes Myriam Ribeiro GthrevisoDamio Nascimentoprojeto grfico e capaVictor Burtonproduo editorialLucas Bandeira de Meloconverso para ebookSingular Digital | Mariana Mello e SouzaCIP-Brasil. Catalogao-na-fonte. Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.

    D784s Doyle, Arthur Conan, Sir, 1859-1930Sherlock Holmes: edio completa / Sir Arthur Conan Doyle; [traduo de Louisa Ibaez... et al.].

    Rio de Janeiro: Agir, 2007.ISBN 978-85-220-1177-31. Holmes, Sherlock (Personagem fictcio). 2. Fico policial inglesa. I. Ibaez, Louisa. II. Ttulo.

    CDD: 82307-4242 CDU: 821.111-3

    07 08 09 10 11 8 7 6 5 4 3 2 1

    Todos os direitos reservados AGIR EDITORA LTDA. Uma empresa Ediouro Publicaes S.A.rua Nova Jerusalm, 345 CEP 21042-235 Bonsucesso Rio de Janeiro RJ Tel.: (21) 3882-8200 fax: (21) 3882-8212/8313

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    1. O sr. Sherlock Holmes

    1

    O SR. SHERLOCK HOLMES

    m 1878 formei-me em medicina pela Universidade de Londres e fui para Netley, a fim defazer o curso indicado para os cirurgies do Exrcito. Quando terminei os meus estudos

    ali, fui designado cirurgio assistente do Quinto Regimento de Fuzileiros de Northumberland.Nessa poca, o regimento estava acantonado na ndia e, antes que eu pudesse juntar-me a ele,explodiu a segunda guerra afeg. Ao desembarcar em Bombaim, fui informado de que minhaunidade j avanara pelos desfiladeiros, internando-se profundamente em territrio inimigo.Entretanto, parti com vrios outros oficiais que estavam na mesma situao e conseguimoschegar sos e salvos a Kandahar, onde encontrei meu regimento e assumi imediatamenteminhas novas funes.

    A campanha rendeu honrarias e promoes para muitos, mas para mim s trouxe infortniose desastres. Fui transferido de minha brigada para a de Berkshire, com a qual participei dabatalha fatdica de Maiwand. Ali, fui atingido no ombro pela bala de um mosquete afego queme fraturou o osso e roou a artria subclvia. Eu teria cado em poder dos ferozes ghazis, seno fosse a coragem e a dedicao de meu ordenana, Murray, que me ps atravessado nolombo de um cavalo de carga e conseguiu levar-me em segurana at as linhas britnicas.

    Abatido pela dor e debilitado pelas contnuas privaes a que fora submetido, fui removidopara o hospital da base em Peshawar, em um trem que transportava outros feridos. Ali eu merecuperava, e j melhorara o suficiente para andar pelas enferma- rias, at mesmo tomar umpouco de sol na varanda, quando fui atacado pelo tifo, essa praga de nossas possessesindianas. Fiquei com a vida em perigo durante meses, e quando finalmente voltei a mim eentrei em convalescena, estava to enfraquecido e to magro que uma junta mdicadeterminou a minha volta imediatamente para a Inglaterra. Assim, fui embarcado no navio detransporte de tropas Orontes, e um ms depois desembarcava no cais de Portsmouth, com asade irremediavelmente comprometida, mas tendo a permisso paternal do governo paratentar melhor-la nos nove meses seguintes.

    Eu no tinha conhecidos nem parentes na Inglaterra, de modo que era livre como o ar outo livre como pode ser um homem com uma renda de 11 xelins e 6 pence dirios. Nessascircunstncias, era natural que eu fosse atrado para Londres, a grande cloaca para a qual sodrenados irresistivelmente todos os ociosos e vagabundos do Imprio. Fiquei ali durantealgum tempo, em um hotel retirado no Strand, onde levei uma vida sem conforto e sem sentido,gastando todo o dinheiro que recebia muito mais livremente do que deveria. A situao de

  • minhas finanas tornou-se to alarmante que eu logo percebi que teria de deixar a metrpole eme estabelecer em algum lugar no campo ou modificar completamente o meu estilo de vida.Escolhida a ltima alternativa, resolvi deixar o hotel e instalar-me em moradia menospretensiosa e mais barata.

    No mesmo dia em que cheguei a essa concluso, eu estava no Bar Criterion quando algumbateu no meu ombro. Ao virar-me, reconheci Stamford, um rapaz que fora meu assistente emBart. A viso de um rosto amigo no vasto deserto londrino algo realmente agradvel para umhomem solitrio. Nos velhos tempos, Stamford nunca fora um companheiro mais ntimo, pormeu agora o acolhia com entusiasmo, e ele tambm parecia satisfeito em me ver. Naexuberncia da minha alegria, convidei-o para almoar comigo no Holborn e, juntos, partimosem um cabriol.

    Diabo, o que andou fazendo, Watson? perguntou ele, sem dissimular o espanto,enquanto sacolejvamos pelas ruas apinhadas de Londres.

    Est magro como um sarrafo e queimado como uma castanha.Fiz-lhe um breve relato de minhas aventuras e mal o conclura quando chegamos ao nosso

    destino. Coitado! exclamou, penalizado, aps ter ouvido meus infortnios. O que pretende

    fazer agora? Procurar um lugar para morar respondi. Tento resolver o problema de encontrar cmodos confortveis a um preo razovel. Curioso disse meu companheiro. Hoje voc a segunda pessoa que me diz a mesma

    coisa. E quem foi a primeira? perguntei. Um sujeito que trabalha no laboratrio de qumica do hospital. Lamentava-se, ainda esta

    manh, por no encontrar algum com quem dividir o aluguel dos timos cmodos queencontrara, mas que so caros demais para as suas posses.

    Formidvel! exclamei. Se ele procura mesmo algum para dividir a casa e asdespesas, sou exatamente o homem indicado. melhor ter um companheiro do que morarsozinho.

    Stamford olhou-me de modo estranho por cima do seu copo de vinho. Voc ainda no conhece Sherlock Holmes disse. Talvez no gostasse dele como

    companheiro permanente. Por qu? O que h contra ele? Bem, eu no disse que h alguma coisa que o desabone. Ele tem idias um tanto estranhas

    apaixonado por alguns ramos da cincia. Pelo que sei, uma pessoa bastante correta. Estudante de medicina? perguntei. No, e no tenho a mnima idia a respeito do que ele pretende fazer. Parece entender

    muito de anatomia, alm de ser um qumico de primeira. No entanto, que eu saiba, nunca feznenhum curso regular de medicina. Seus estudos so um tanto desregrados e excntricos, mascom esse sistema irregular ele acumulou uma quantidade de conhecimentos que deixaria seusprofessores surpresos.

    Nunca lhe perguntou o que pretende fazer no futuro? indaguei. No; ele desses que no se abrem em confidncias, embora possa ser bastante

  • comunicativo quando dominado pela imaginao. Eu gostaria de conhec-lo disse. Se vou morar com algum, preferiria um homem que

    aprecie os estudos e tenha hbitos tranqilos. Ainda no me sinto bastante forte para suportarmuito barulho ou agitao. J tive o suficiente de ambos no Afeganisto... o suficiente para oresto da vida. Como poderei entrar em contato com esse seu amigo?

    Ele deve estar no laboratrio respondeu meu companheiro. s vezes ele evita o lugardurante semanas, ou ento trabalha l de manh noite. Se quiser, iremos ao seu encontrodepois do almoo.

    uma boa idia respondi, e nossa conversa passou para outros temas.Quando estvamos a caminho do hospital, depois que samos do Holborn, Stamford

    forneceu-me maiores detalhes sobre o cavalheiro que eu me propunha a aceitar comocompanheiro de moradia.

    No me responsabilize se por acaso voc no se der bem com ele avisou-me. No seinada a seu respeito alm do que fiquei sabendo quando o encontrava ocasionalmente nolaboratrio. Este arranjo foi idia sua, portanto no me culpe por alguma coisa.

    Se no nos dermos bem, ser fcil separarmonos respondi. Est me parecendo,Stamford acrescentei, olhando com firmeza para meu interlocutor , que voc tem algummotivo para lavar as mos em relao a este assunto. O temperamento desse homem toterrvel ou existe algo mais? Vamos, fale sem receio!

    difcil exprimir o inexprimvel respondeuStamford, rindo. Holmes talvez seja cientfico demais para o meu gosto chega a beirar a

    insensibilidade. Posso imagin-lo dando a um amigo uma pitadinha do ltimo alcalidevegetal, no por maldade, compreenda, mas apenas por esprito investigativo, para ter umaidia precisa dos efeitos. Para ser justo, acho que ele prprio tomaria o alcalide com amesma presteza. Parece ter paixo pelo conhecimento definido e exato.

    No vejo nada demais nisso. Concordo, desde que tudo fique dentro de certos limites. Evidentemente, a situao

    assume uma forma bizarra, quando ele chega ao cmulo de dar pauladas em cadveres na salade dissecao.

    Dar pauladas em cadveres? Exatamente, a fim de verificar quanto tempo depois da morte o corpo pode apresentar

    escoriaes. Eu o vi fazendo isso, com meus prprios olhos. E ainda insiste em dizer que ele no estudante de medicina? No . S Deus sabe qual a finalidade de seus estudos. Bem, aqui estamos, e voc

    precisa formar sua prpria opinio sobre ele.Enquanto Stamford falava, dobramos para uma ruela e entramos por uma pequena porta

    lateral, que dava para uma ala do grande hospital. O terreno agora me era familiar e noprecisei ser guiado quando subimos a fria escadaria de pedra e seguimos pelo corredorcomprido, de paredes caiadas e com vrias portas castanho-escuras. Quase no final, umapassagem de arcada baixa levava ao laboratrio de qumica.

    Era uma sala ampla, com paredes cheias de prateleiras entulhadas de incontveis frascos.Havia mesas baixas e largas espalhadas por ali, juncadas de retortas, tubos de ensaios e

  • pequenos bicos de Bunsen, com suas chamas azuis oscilantes. Na sala s vi um estudante,curvado sobre uma mesa afastada, absorvido no seu trabalho. Ao ouvir nossos passos, eleolhou em volta e ergueu-se, com uma exclamao satisfeita.

    Descobri! Descobri! ele gritou para meu acompanhante, correndo para ns com um tubode ensaio na mo. Descobri um reagente que precipitado pela hemoglobina e por nadamais!

    Se ele tivesse descoberto uma mina de ouro, seu rosto no demonstraria uma alegria maior. Dr. Watson, sr. Sherlock Holmes apresentou Stamford. Como vai? disse ele cordialmente, apertando minha mo com uma fora de que eu no o

    julgaria capaz. Vejo que esteve no Afeganisto. Como que sabe? perguntei, espantado. No vem ao caso agora ele respondeu dando uma risadinha para si mesmo. No

    momento, a questo sobre a hemoglobina. Percebe a importncia da minha descoberta, no? Quimicamente interessante, sem dvida respondi , mas na prtica... Como? Meu caro, a descoberta mais prtica da medicina legal dos ltimos anos! No

    percebe que, com isto, teremos um teste infalvel para manchas de sangue? Venha c!Em sua ansiedade, segurou-me pela manga do casaco e me puxou para junto da mesa onde

    estivera trabalhando. Tomemos um pouco de sangue fresco disse, enfiando um comprido estilete no dedo.

    Aparou numa pipeta a gota de sangue que saiu. Agora, adiciono esta pequena quantidade desangue a 1 litro de gua. Perceber que a mistura tem a aparncia de gua pura, pois aproporo do sangue no pode ser maior que um para um milho. Entretanto, no tenho dvidade que obteremos a reao caracterstica.

    Enquanto falava, ele jogou alguns cristais brancos dentro do recipiente, acrescentando emseguida algumas gotas de um fluido transparente. O contedo adquiriu imediatamente umatonalidade escura de mogno, ao mesmo tempo em que um p acastanhado se concentrava nofundo do recipiente de vidro.

    Ah! Ah! exclamou ele, batendo palmas e parecendo to encantado quanto uma crianacom um brinquedo novo. O que acha disto?

    Parece um teste bastante delicado observei. timo! timo! O antigo teste com o guiaco era muito rudimentar e impreciso. O mesmo

    se pode dizer do exame microscpico dos glbulos do sangue. Este ltimo intil se asmanchas j tiverem algumas horas. Isto aqui, no entanto, parece funcionar perfeitamente, seja osangue novo ou antigo. Se este teste j tivesse sido inventado, centenas de homens que agoraandam por a em liberdade estariam pagando por seus crimes h muito tempo.

    mesmo? murmurei. Casos e mais casos criminais esbarram seguidamente neste ponto. Um homem se torna

    suspeito de um crime talvez at meses depois que ele foi cometido. Suas roupas de baixo ou ascalas so examinadas e revelam manchas pardacentas. Sero manchas de sangue, de lama,ferrugem, frutas, de qu? Esta uma questo que tem confundido muitos especialistas. E porqu? Porque no havia um exame de laboratrio confivel. Mas agora temos a reaoSherlock Holmes, de modo que no haver mais dificuldades daqui por diante.

    Seus olhos cintilavam enquanto ele falava e, levando a mo ao peito, fez uma mesura, como

  • se agradecesse a alguma multido gerada por sua imaginao. Aceite os meus parabns falei, bastante surpreso com o seu entusiasmo. Houve o caso de Von Bischoff em Frankfurt, no ano passado. Se este teste j existisse, ele

    certamente teria sido enforcado. Houve tambm o caso Mason em Bradford, o do famigeradoMller, o de Lefvre em Montpellier e o de Samson em Nova Orleans. Enfim, eu poderiaenumerar uma srie de casos em que este teste teria sido decisivo.

    Voc parece um calendrio ambulante de crimes disse Stamford, rindo. Poderialanar um jornal nessa linha. O ttulo seria Noticirio Policial do Passado.

    Sem dvida, seria tambm uma leitura muito interessante observou Sherlock Holmes,colocando um pequeno emplastro no local da espetadela em seu dedo. Preciso ser cauteloso continuou, virando-se para mim com um sorriso , porque estou sempre lidando comvenenos.

    Estendeu as mos enquanto falava e reparei que estavam salpicadas de emplastrossemelhantes, alm de descoradas pela ao de cidos fortes.

    Viemos aqui tratar de negcios disse Stamford, acomodando-se em uma banqueta altade trs pernas e empurrando outra, com um p, na minha direo.

    Este meu amigo anda procura de moradia, e como voc se queixava de no encontrarningum para dividir as despesas, achei que seria interessante p-los em contato.

    Sherlock Holmes pareceu encantado com a idia de dividirmos acomodaes. Estou de olho em um apartamento na Baker Street anunciou que seria perfeito para

    ns. Espero que o cheiro de tabaco forte no o incomode. Costumo fumar tabaco de marinheiro respondi. Muito bem. Em geral, tenho produtos qumicos em casa e, de vez em quando, costumo

    fazer experincias. Isso o incomodaria? De modo algum. Vejamos quais so os meus outros defeitos... Volta e meia fico irritadio e de boca

    fechada dias inteiros. No v pensar que estou zangado quando me comporto dessa maneira.Basta deixar-me em paz e logo tudo voltar ao normal. E voc, o que tem para confessar? muito melhor que dois sujeitos fiquem conhecendo seus piores defeitos antes que comecem amorar juntos.

    Achei graa naquele interrogatrio. Tenho um filhote de buldogue falei e fao objeo a qualquer tipo de barulho, porque

    estou com os nervos abalados. Alm disso, costumo levantar-me em horas imprprias e souterrivelmente preguioso. Ainda tenho outros defeitos quando estou bem de sade, mas, nomomento, estes so os principais.

    Inclui o som do violino em sua categoria de barulhos? ele perguntou ansioso. Depende do executante respondi. Um violino bem tocado um presente para os

    deuses, mas quando acontece o contrrio... Oh, ento est tudo bem! exclamou Holmes, com uma risada satisfeita. Acho que

    podemos considerar o assunto resolvido, isto , se ficar satisfeito com os aposentos. Quando iremos v-los? Venha encontrar-me amanh ao meio-dia e iremos juntos para resolver tudo respondeu

  • ele. Certo ao meio-dia em ponto falei, apertando-lhe a mo.Deixamos que ele voltasse ao trabalho com seus produtos qumicos e, juntos, eu e Stamford

    seguimos para o meu hotel. Por falar nisso soltei de repente, parando e virando-me para meu companheiro , como,

    diabo, ele soube que vim do Afeganisto?Meu companheiro esboou um sorriso enigmtico. Esta justamente a pequena peculiaridade de Holmes disse ele. Muita gente gostaria

    de saber como ele consegue descobrir as coisas. Oh! Ento um mistrio? exclamei, esfregando as mos. Isto muito estimulante!

    Sou-lhe grato por ter feito o contato. Como sabe, o homem o estudo adequado dahumanidade...

    Pois ento, estude-o disse Stamford ao despedir-se. Imagino que Holmes seja umproblema intrincado. Aposto como ele descobrir mais coisas a seu respeito do que vocconseguir descobrir a respeito dele. At breve, Watson.

    At breve respondi, e entrei em meu hotel sentindo um profundo interesse por meu novoconhecido.

  • E

    2. A cincia da deduo

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    A CINCIA DA DEDUO

    ncontramo-nos no dia seguinte, conforme o combinado, e inspecionamos os aposentos daBaker Street, 221 B, sobre os quais havamos falado na vspera. Eram dois dormitrios

    confortveis e uma sala de estar espaosa e arejada, mobiliada com jovialidade e iluminadapor duas amplas janelas. O conjunto era atraente em todos os aspectos, e o preo to mdico,se dividido entre ns, que acertamos tudo ali mesmo e tomamos posse de nossos domnios. Namesma tarde retirei meus pertences do hotel e Sherlock Holmes chegou na manh seguinte,com vrias caixas e maletas. Durante um ou dois dias ficamos em franca atividade, tirandonossas coisas das malas e arrumando-as da melhor maneira possvel. Feito isto, aos poucoscomeamos a nos adaptar ao nosso novo ambiente.

    A convivncia com Holmes no foi nem um pouco difcil. Ele tinha maneiras tranqilas ehbitos regulares. Era raro v-lo de p aps as dez horas da noite, e quando eu me levantavade manh, ele invariavelmente j tomara o breakfast e sara. s vezes, passava o dia nolaboratrio de qumica, outras vezes nas salas de dissecao e, de vez em quando, fazia longascaminhadas, que pareciam conduzi-lo s zonas mais baixas da cidade. Nada parecia super-loem energia quando era dominado por um acesso de atividade; mas volta e meia era acometidopor uma reao, e permanecia durante dias a fio no sof da sala de estar, mal proferindo umapalavra ou movendo um msculo, da manh noite. Nessas ocasies, eu percebia nos olhosdele uma expresso to vaga e sonhadora que poderia ter suspeitado que ele era viciado emalgum narctico, se a temperana e a lisura de sua vida no proibissem uma idia desse tipo.

    medida que as semanas passavam, meu interesse por ele e a curiosidade a respeito deseus objetivos na vida aumentaram e aprofundaram-se aos poucos. Ele prprio e sua aparnciachamavam a ateno do observador mais desatento. Tinha mais de 1,80 metro de altura, mas amagreza excessiva fazia com que parecesse ainda mais alto. Seus olhos eram atentos epenetrantes, exceto durante aqueles intervalos de torpor a que j me referi; e o nariz delgado,aquilino, dava fisionomia um ar de vigilncia e determinao. Tambm o queixo, saliente equadrado, indicava um homem decidido. Suas mos estavam sempre manchadas de tinta e deprodutos qumicos, mas mostravam uma extraordinria delicadeza de toque, como tive ocasiode observar vrias vezes, enquanto ele manipulava seus frgeis instrumentos de alquimista.

    O leitor poder considerar-me um bisbilhoteiro incurvel, quando eu confesso o quantoaquele homem espicaava a minha curiosidade, e com que freqncia tentei descobrir algumacoisa por entre a reticncia que ele mostrava em relao a tudo que lhe dizia respeito. Antes

  • que seja pronunciada a sentena, no entanto, devo lembrar como a minha vida era montona, eque havia pouca coisa que prendesse minha ateno. Meu estado de sade impedia que eu meaventurasse fora de casa, a menos que o tempo estivesse excepcionalmente bom e, por outrolado, eu no tinha amigos que pudessem visitar-me e, assim, romper o tdio daquela existnciadiria. Nessas circunstncias, saudei com avidez o pequeno mistrio que envolvia meucompanheiro e passei boa parte do meu tempo tentando decifr-lo.

    Holmes no estudava medicina. Em resposta a uma pergunta, havia confirmado a opinio deStamford a respeito disso. Tambm no parecia ter feito algum curso regular que lhe desse umttulo cientfico ou lhe garantisse uma via de entrada para o mundo erudito. Entretanto, eranotvel a dedicao que mostrava por determinados ramos do saber e, dentro de limitesincomuns, seu conhecimento era to extraordinariamente vasto e minucioso que eu ficavaabismado com suas observaes. Certamente, nenhum homem trabalharia com tanto afinco ouadquiriria informaes to precisas, se no tivesse um objetivo definido em vista. Leitoressem mtodo raramente se destacam pela exatido de seus conhecimentos. E homem algumsobrecarregaria a mente com questes insignificantes, a menos que tenha bons motivos parafazer isso.

    A ignorncia de Holmes era to surpreendente quanto o seu conhecimento. Ele parecia nosaber quase nada sobre literatura, filosofia e poltica contemporneas. Quando citei ThomasCarlyle certa vez, Holmes, mostrando a mais perfeita ingenuidade, perguntou quem era ele e oque havia feito. Mas minha perplexidade atingiu o auge quando descobri por acaso que eleignorava a Teoria de Coprnico e a composio do sistema solar. Para mim, um ser humanocivilizado do sculo XIX que no soubesse que a Terra girava em torno do sol era algo toextraordinrio que quase me recusava a acreditar.

    Voc parece admirado disse ele, sorrindo da minha expresso de surpresa. Pois agoraque j aprendi isso, farei o possvel para esquec-lo.

    Esquec-lo? Procure entender falou. Para mim, o crebro de um homem, originalmente, como um

    sto vazio, que deve ser entulhado com os mveis que escolhermos. Um tolo o enche comtodos os tipos de quinquilharia que vai encontrando pelo caminho, a ponto de osconhecimentos que lhe seriam teis ficarem soterrados ou, na melhor das hipteses, tomisturados s outras coisas, que ficaria difcil selecion-los. J o trabalhador especializado extremamente cauteloso em relao s coisas que coloca em seu crebro-sto. Depositar lapenas as ferramentas que podero ajud-lo a realizar o seu trabalho, mas, destas, ele ter umvasto sortimento e todas arrumadas na mais perfeita ordem. um engano pensar que essepequeno recinto tem paredes elsticas, que podem ser distendidas indefinidamente.Dependendo disto, chega o momento em que, para cada novo acrscimo de conhecimento,esquecemos algo que j sabamos antes. Portanto, da maior importncia evitar que dadosinteis ocupem o lugar dos teis.

    Certo, mas o sistema solar! protestei. Que importncia tem isso para mim? ele me interrompeu, impaciente. Voc disse que

    giramos em torno do sol. Se girssemos em torno da lua, isto no faria a mnima diferenapara mim ou para o meu trabalho.

    Estive a ponto de perguntar-lhe que trabalho era esse, mas alguma coisa no seu jeito

  • indicava que a curiosidade no teria boa acolhida. Mesmo assim, meditei sobre o nosso curtodilogo e esforcei-me para tirar disso alguma concluso. Ele dissera que no queria adquirirconhecimentos inadequados s suas finalidades. Ento, todos os conhecimentos que possuatinham de ser teis para ele. Mentalmente, enumerei os vrios pontos em que ele se revelaraexcepcionalmente bem-informado. Cheguei a pegar um lpis e a anot-los. No pude deixar desorrir quando conclu o documento. Ficou assim:

    Conhecimentos de Sherlock Holmes1. Literatura: zero.2. Filosofia: zero.3. Astronomia: zero.4. Poltica: fracos.5. Botnica: variveis. Versado nos efeitos de beladona, pio e venenos em geral. No

    sabe nada sobre jardinagem e horticultura.6. Geologia: prticos, mas limitados. primeira vista, sabe reconhecer solos diferentes.

    Quando chega de suas caminhadas, mostra-me manchas e respingos nas calas e, porsua cor e consistncia, me diz em que parte de Londres as recebeu.

    7. Qumica: profundos.8. Anatomia: acurados, mas pouco sistemticos.9. Literatura sensacionalista: imensos. Ele parece conhecer todos os detalhes de cada

    horror perpetrado neste sculo.10. Toca bem violino.11. perito em esgrima e boxe, alm de hbil espadachim.12. Tem um bom conhecimento prtico das leis inglesas.Quando cheguei a este ponto da minha lista, joguei-a no fogo, desanimado.Se eu s posso descobrir o objetivo desse homem conjugando todas estas habilidades e

    encontrando uma profisso que as utilize, disse para mim mesmo, melhor desistir j datentativa.

    Vejo que me referi acima aos seus dotes de violinista. Sem dvida, eram notveis, mas toexcntricos quanto todas as suas outras habilidades. Eu sabia perfeitamente que Holmes eracapaz de executar peas difceis porque, a meu pedido, tocara alguns Lieder de Mendelssohne outras msicas de minha preferncia. Quando entregue a si mesmo, no entanto, ele raramenteinterpretava qualquer msica ou tentava alguma ria identificvel. tardinha, recostado emsua poltrona, fechava os olhos e passava descuidadamente o arco pelas cordas do violino emseus joelhos. Algumas vezes, os acordes eram sonoros e melanclicos, outras, fantsticos ealegres. Refletiam, sem dvida, os pensamentos que invadiam sua mente, mas eu noconseguia determinar se a msica os ajudava ou se o ato de tocar era simplesmente o resultadode um capricho ou fantasia. Eu teria me rebelado contra aqueles solos exasperantes, se ele notivesse o hbito de encerr-los tocando, em rpida sucesso, sries completas de minhaspeas prediletas, como uma pequena compensao por testar minha pacincia.

    Durante a primeira semana ou pouco mais, no tivemos visitas, e eu j comeava a pensarque meu companheiro tambm era um homem sem amigos. Mas, pouco depois, descobri queele tinha muitos conhecidos nas mais variadas classes sociais. Havia um homenzinho plido,

  • com cara de rato e olhos escuros, que me foi apresentado como sr. Lestrade, e que apareceutrs ou quatro vezes na mesma semana. Certa manh foi a vez de uma jovem, elegantementevestida, que se demorou por meia hora ou mais. Naquela mesma tarde, Holmes foi procuradopor um visitante de cabelos grisalhos e ar fatigado, parecendo um negociante judeu, muitoexcitado. Logo em seguida veio uma mulher idosa, desmazelada e com sapatos cambaios. Emoutra ocasio, meu companheiro teve uma entrevista com um cavalheiro de cabelos brancos; enuma outra, recebeu um carregador da estrada de ferro em seu uniforme de belbutina.

    Sempre que surgia algum desses estranhos visitantes, Sherlock Holmes pedia para usar asala de estar, e ento eu me retirava para meu quarto. Ele sempre se desculpava por causar-meeste inconveniente.

    Preciso usar a sala como lugar para tratar de negcios dizia e essas pessoas so meusclientes.

    Mais uma vez, surgia a oportunidade de interrog-lo diretamente e, como antes, a discrioimpedia que eu o forasse a confiar em mim. Na poca, pensei que Holmes devia ter fortesmotivos para evitar o assunto, mas ele logo fez com que eu afastasse essa hiptese, ao abord-lo voluntariamente.

    Estvamos no dia 4 de maro tenho bons motivos para recordar a data e levantei-me umpouco mais cedo que de hbito. Vi que Sherlock Holmes ainda no terminara seu breakfast. Acriada estava to acostumada minha demora em sair da cama que ainda no arrumara meulugar mesa nem preparara o meu caf. Com a petulncia irracional do gnero humano, toqueia sineta e anunciei secamente que estava pronto. Em seguida, peguei uma revista em cima damesa, e tentei matar o tempo com ela, enquanto meu companheiro mastigava silenciosamentesua torrada. Deparei-me com um artigo cujo ttulo fora sublinhado a lpis e, naturalmente,passei os olhos por ele.

    O ttulo um tanto pretensioso era O Livro da Vida, e o artigo se propunha a demonstrar oquanto um homem observador poderia apreender por meio do exame minucioso e sistemticode tudo que lhe casse sob os olhos. Tive a impresso de que aquilo era uma extraordinriamistura de absurdo e sagacidade. A argumentao era compacta e intensa, mas as deduespareciam rebuscadas e exageradas. O autor afirmava que uma expresso momentnea, umrepuxar de msculo ou um movimento dos olhos podiam denunciar os pensamentos maisntimos de um homem. Segundo ele, era impossvel que algum bem-treinado na observao ena anlise fosse iludido em suas dedues. As concluses seriam to infalveis como tantasproposies de Euclides. Para os leigos, esses resultados pareceriam to extraordinrios que,enquanto no aprendessem o mtodo pelo qual haviam sido obtidos, considerariam o homemque chegara a eles uma espcie de adivinho.

    A partir de uma gota dgua, dizia o autor, um pensador lgico poderia inferir apossibilidade de um Atlntico ou de um Nigara, sem jamais ter visto um e outro ou ouvidofalar deles. Assim, toda vida uma grande cadeia, cuja natureza revelada pela simplesapresentao de um nico elo. Como todas as artes, a Cincia da Deduo e da Anlise spode ser adquirida aps um aprendizado demorado e paciente, mas a vida no suficientemente longa para permitir que algum mortal atinja a perfeio mxima nesse campo.Antes de se concentrar nos aspectos morais e mentais do assunto que apresenta as maioresdificuldades, o pesquisador deve comear pelo domnio dos problemas mais elementares. Ao

  • encontrar um semelhante, que ele aprenda, em um relance, a distinguir a histria do homem e oofcio ou profisso que ele exerce. Por mais infantil que esse exerccio possa parecer, eleagua as faculdades de observao, ensinando para onde se deve olhar e o que procurar. Pelasunhas de um indivduo, pela manga do seu palet, seus sapatos, o joelho das calas, ascalosidades do polegar e indicador, pelos punhos da camisa... em cada um destes detalhes, aprofisso de um homem nitidamente revelada. Que tudo isso junto deixe de esclarecer uminvestigador competente quase inconcebvel.

    Quanto disparate! exclamei, jogando a revista sobre a mesa Nunca li tamanha tolicena vida!

    O que ? perguntou Sherlock Holmes. Ora, este artigo disse, apontando-o com a colher ao me sentar para o breakfast. Vejo

    que j o leu, pois est assinalado a lpis. No posso negar que foi escrito com inteligncia,mas ainda assim me irrita. Evidentemente, so as teorias forjadas por algum desocupado, quedesenvolve todos esses pequeninos paradoxos sem sair da poltrona de seu gabinete. Nada tmde prtico. Eu gostaria de v-lo na barulheira de um vago de terceira classe do tremsubterrneo, para ento perguntar-lhe quais eram as profisses de todos os seus companheirosde viagem. Apostaria mil por um contra ele.

    E perderia seu dinheiro observou Holmes calmamente. Quanto ao artigo, fui eu queescrevi.

    Voc? Exatamente. Tenho certa tendncia a observar, a deduzir. Todas as teorias que expus a, e

    que a voc parecem to fantasiosas, na verdade so extremamente prticas to prticas quedependo delas para viver.

    Como? perguntei involuntariamente. Bem, eu trabalho por conta prpria. Imagino que seja o nico no mundo neste ramo. Sou

    um detetive-consultor, se que entende o que isto significa. Aqui em Londres temos punhadosde detetives oficiais e particulares. Quando esto em apuros, eles me procuram, e tentocoloc-los novamente na pista certa. Fornecem-me todos os indcios e, graas ao meuconhecimento da histria do crime, geralmente consigo descobrir e corrigir as falhas. Existeuma grande semelhana entre os delitos, de modo que, se temos todos os detalhes de mil casosna ponta dos dedos, seria estranho no conseguirmos desenredar o milsimo primeiro.Lestrade um detetive conceituado. Recentemente, ficou perdido ao investigar um caso defalsificao, e foi isso que o trouxe aqui.

    E quanto s outras pessoas? Na maioria, so enviadas por agncias particulares de investigao. Todas so pessoas

    com problemas que procuram algum esclarecimento. Ouo as histrias que me contam, elasouvem meus comentrios e depois embolso meus honorrios.

    Est querendo dizer falei que sem sair do quarto voc consegue desatar um ninsolvel para outros homens, embora eles prprios tenham observado todos os detalhespessoalmente?

    Sem tirar nem pr. Tenho uma espcie de intuio nesse sentido. De vez em quandoaparece um caso mais complicado que os outros. Ento, preciso caminhar por a e ver as

  • coisas com meus prprios olhos. Como sabe, tenho uma boa dose de conhecimentos especiaisque, aplicados ao problema, facilitam extraordinariamente as coisas. Aquelas regras dededuo no artigo que provocou o seu desdm so inestimveis no meu trabalho prtico.Observao a minha segunda natureza. Voc pareceu surpreso quando eu lhe disse, no nossoprimeiro encontro, que estava retornando do Afeganisto.

    Algum lhe contou, sem dvida. Absolutamente! Eu sabia que voc vinha do Afeganisto. Devido a um hbito antigo, o

    encadeamento de pensamentos passou pela minha mente com tamanha rapidez que cheguei concluso sem ter conscincia das etapas intermedirias. Mas essas etapas existiram. O meuraciocnio foi o seguinte: Aqui temos um cavalheiro com aparncia de mdico, mas tambmcom modos de militar. Portanto, sem sombra de dvida, um mdico do Exrcito. Acabou dechegar dos trpicos, pois tem o rosto queimado e essa no a cor natural de sua pele, j queos pulsos so claros. Passou por privaes e doenas, como demonstra nitidamente seu rostomacilento. Foi ferido no brao esquerdo, j que o mantm numa posio rgida e pouconatural. Em que lugar dos trpicos um mdico ingls do Exrcito enfrentaria tantas agruras eseria ferido no brao? No Afeganisto, evidentemente. Toda esta fieira de pensamentos nolevou mais de um segundo. Ento, comentei que voc viera do Afeganisto e percebi que ficouespantado.

    Tudo parece muito simples, da maneira como voc explica respondi, sorrindo. Vocme lembra o Dupin de Edgar Allan Poe. Nunca pensei que esse tipo de gente existisse na vidareal.

    Sherlock Holmes levantou-se e acendeu seu cachimbo. Sem dvida, imagina estar me fazendo um elogio, quando me compara a Dupin

    observou. Bem, na minha opinio, Dupin era um tipo bastante inferior. Aquele seu truque deinterromper os pensamentos do amigo com um comentrio oportuno, aps um silncio de 15minutos, alm de espalhafatoso, superficial. No duvido que ele tivesse um certo domanaltico, mas no era de modo algum o fenmeno que Poe parecia imaginar.

    J leu as obras de Gaboriau? perguntei. Lecoq corresponde idia que voc faz deum detetive?

    Sherlock Holmes fungou com ironia. Lecoq era um grande trapalho disse ele, irritado. Sua energia era a sua nica

    qualidade. Esse livro me deixou francamente enojado. A questo consistia em identificar umprisioneiro desconhecido. Eu teria feito isso em 24 horas, enquanto Lecoq levou uns seismeses. Um livro assim poderia ser um manual para os detetives aprenderem o que devemevitar.

    Fiquei bastante indignado ao ver menosprezados dois personagens que eu tanto admirava.Fui at a janela e fiquei olhando a rua movimentada.

    Este sujeito pode ser muito esperto, pensei, mas certamente bastante presunoso. Hoje em dia, no h mais crimes nem criminosos disse ele, em tom de lamento. De

    que adianta a inteligncia em nossa profisso? Sei muito bem que tenho capacidade paratornar meu nome famoso. No h e nunca houve algum que contribusse com tamanha dose deestudo e talento natural para investigao criminal como eu. E qual foi o resultado? No hcrimes a desvendar ou, no mximo, algum delito desajeitado, com um motivo to transparente

  • que at um funcionrio da Scotland Yard consegue resolver.Eu continuava irritado com sua maneira presunosa de falar e achei melhor mudar de

    assunto. O que ser que aquele sujeito est procurando? perguntei.Ao falar, apontei para um indivduo corpulento e vestido com simplicidade, que caminhava

    devagar pela calada oposta, consultando os nmeros das casas com ansiedade. Tinha umgrande envelope azul na mo e, evidentemente, era portador de alguma mensagem.

    Est falando daquele sargento aposentado daMarinha? perguntou Sherlock Holmes.Quanta fanfarronice!, pensei. Ele sabe que no posso confirmar o que disse.O pensamento mal tinha cruzado a minha mente quando o homem que observvamos

    descobriu o nmero de nossa porta e atravessou a rua s pressas. Ouvimos a batida forte, umavoz grave no andar de baixo e, em seguida, o rudo de passos firmes subindo a escada.

    Para o sr. Sherlock Holmes disse ele, entrando na sala e estendendo a carta ao meuamigo.

    Ali estava a minha oportunidade de acabar com sua arrogncia. Ele nem havia pensadonisso quando fez sua observao casual.

    Escute, amigo falei com a voz mais branda possvel , posso perguntar-lhe qual a suaprofisso?

    Mensageiro, senhor respondeu de modo rude. Meu uniforme est sendo consertado. E o que fazia antes? tornei a perguntar, com um malicioso olhar de esguelha para meu

    companheiro. Era sargento, senhor. Da infantaria ligeira da Marinha. Sem resposta, sr. Holmes?

    Perfeitamente, senhor.O homem bateu os calcanhares, ergueu a mo em continncia e saiu.

  • C

    3. O mistrio de Lauriston Gardens

    3

    O MISTRIO DE LAURISTON GARDENS

    onfesso que fiquei absolutamente perplexo com aquela nova prova da natureza prtica dasteorias de meu companheiro. Meu respeito por sua capacidade analtica aumentou de

    maneira considervel. Mesmoassim, eu ainda nutria a secreta desconfiana de que tudo no passasse de um episdio

    previamente combinado com o objetivo de me deixar deslumbrado, embora no pudessecompreender qual a sua inteno ao enganar-me daquele jeito. Quando olhei para Holmes, eleterminara de ler a nota e seus olhos haviam adquirido aquela expresso opaca e distante queindicava abstrao mental.

    Diabo, como conseguiu deduzir aquilo? perguntei. Deduzir o qu? replicou ele, com petulncia. Ora, que o homem era sargento reformado da Marinha. Agora no tenho tempo para futilidades respondeu com rispidez. Depois, acrescentou

    com um sorriso: Desculpe-me o modo rude. Voc interrompeu o fio dos meus pensamentos,mas talvez at seja melhor assim. Ento, no conseguiu perceber que aquele homem era umsargento da Marinha?

    De modo algum. Foi mais fcil descobrir isso do que explicar como eu sei. Se lhe pedirem para provar

    que dois e dois so quatro, voc talvez encontre alguma dificuldade, embora tenha certezadisso. Mesmo quando aquele homem estava do outro lado da rua, pude ver uma grande ncoraazul tatuada no dorso de sua mo. Isso indicava alguma ligao com o mar. Ele tinha umapostura militar e, alm disso, usava as suas prprias da Marinha. Tnhamos, ento, ummarinheiro. Notava-se nele um certo ar de importncia, de quem est acostumado a comandar.Voc deve ter notado o modo como ele movia a cabea e manejava a bengala. Alm disso, seurosto era o de um homem resoluto, respeitvel e maduro... um conjunto de caractersticas queme levou a acreditar que ele fora um sargento da Marinha.

    Incrvel! exclamei. Corriqueiro disse Holmes, embora, pela sua expresso, eu percebesse que ele tinha

    ficado satisfeito com minha visvel surpresa e admirao. Ainda h pouco eu lhe dizia queno h mais criminosos. Tudo indica que eu estava enganado veja isto!

    Estendeu-me a carta que acabara de receber do mensageiro. Oh! exclamei, assim que corri os olhos por ela.

  • Isto terrvel! Parece um tanto fora do comum ele observou calmamente. Poderia l-la para mim em

    voz alta?Esta a carta que li para ele:Prezado sr. Sherlock Holmes,

    Esta noite houve uma grave ocorrncia no no 3 de Lauriston Gardens, nasproximidades da Brixton Road. Por volta de duas da madrugada, nosso policial deronda avistou luz nesse endereo e, como a casa estava vazia, desconfiou que haviaalgo errado. A porta estava aberta e, na sala da frente, sem nenhuma moblia, ele sedeparou com o cadver de um cavalheiro, bem-vestido e tendo em um dos bolsoscartes de visita em nome de Enoch J. Drebber, Cleveland, Ohio, U.S.A. No houveroubo e no h nenhuma pista sobre a maneira como o homem morreu. Existemmarcas de sangue na sala, embora o corpo no apresente nenhum ferimento. Noimaginamos o que ele teria ido fazer naquela casa desabitada; alis, o caso todo umenigma. Se puder ir at l, a qualquer hora antes do meio-dia, ir encontrar-me.Deixei tudo tal como estava, at ter notcias suas. Se no puder vir, enviarei maioresdetalhes e ficarei imensamente grato pela gentileza de sua opinio.

    Cordialmente,Tobias Gregson.

    Gregson o homem mais esperto da Scotland Yard observou o meu amigo. Ele eLestrade so os nicos que tm valor, em meio a um punhado de incompetentes. Ambos sorpidos e decididos, mas convencionais... terrivelmente convencionais. Por outro lado, h umagrande rivalidade entre eles e so ciumentos como duas beldades profissionais. A coisapromete ser divertida, se Gregson e Lestrade forem designados para o caso.

    Era espantosa a calma com que ele murmurava aquilo. Sem dvida, no h um momento a perder! exclamei. Deso e chamo um coche para voc? Ainda no tenho certeza se irei ou no. Sou o sujeito mais incuravelmente preguioso que

    j houve neste mundo... embora possa ser bastante ativo quando estou disposto a isso. Ora, mas esta justamente a oportunidade que esperava! Meu caro amigo, que diferena faz para mim? Supondo-se que eu resolva todo o caso,

    pode ter certeza de que o crdito ser todo de Gregson, Lestrade & Cia. isto que acontece,quando no se um investigador oficial.

    Bem, mas ele pede a sua ajuda. verdade. No fundo, sabe que sou superior a ele e reconhece o fato, mas seria capaz de

    cortar a lngua antes de admiti-lo a mais algum. Enfim, sempre podemos ir e dar uma espiadapor l. Trabalharei minha maneira, sem ajuda. Se no conseguir nada, pelo menos rireideles. Vamos!

    Enfiou o sobretudo e passou a movimentar-se de uma maneira que indicava que a apatia deantes fora substituda por um acesso de energia.

    Pegue o seu chapu disse. Quer que eu v tambm? perguntei.

  • Sim, caso no tenha nada melhor para fazer. Um minuto depois, estvamos em umcabriol, rodando a toda a velocidade para a Brixton Road.

    Fazia uma manh nublada e nevoenta. Um vu acastanhado pairava acima dos telhados,parecendo o reflexo das ruas lamacentas. Meu companheiro estava na melhor disposio denimo, tagarelando sobre violinos de Cremona e a diferena entre um Stradivarius e umAmati. Quanto a mim, permanecia calado, porque o mau tempo e o assunto melanclico emque estvamos envolvidos me deixavam deprimido.

    Voc no me parece nada preocupado com o caso que tem pela frente falei por fim,interrompendo a explanao musical de Holmes.

    Por enquanto, ainda no dispomos de dados ele respondeu. um erro capital formularteorias antes de contarmos com todos os indcios. Pode prejudicar o raciocnio.

    Em pouco tempo ter os seus dados observei, apontando com o dedo. Esta a BrixtonRoad e, se no me engano, aquela a casa.

    Tem razo. Pare, cocheiro, pare!Ainda estvamos a uns 100 metros de distncia, mas ele insistiu em descer ali mesmo, de

    modo que fizemos a p o resto do trajeto.O nmero 3 de Lauriston Gardens tinha uma aparncia agourenta e ameaadora. Era uma

    das quatro casas que ficavam um pouco recuadas da rua, sendo duas ocupadas e duas vazias.A ltima espiava para fora atravs de trs filas de janelas tristes e abandonadas, com umaaparncia vaga e opaca, a no ser pelos cartazes de Aluga-se, que surgiam aqui e ali, comocataratas sobre as vidraas encardidas. Havia um pequeno jardim salpicado de plantasraquticas entre cada uma das casas e a rua, e era cortado por um estreito caminho amarelado,parecendo ser uma mistura de saibro e argila. Tudo ali estava lamacento, por causa da chuvaque cara durante a noite. O jardim era circundado por uma parede de tijolos com mais oumenos um metro de altura, encimada por grades de madeira. Nessa parede, estava recostadoum policial robusto, cercado por um pequeno grupo de desocupados, todos esticando opescoo e aguando os olhos, na v esperana de um vislumbre do que acontecia no interior.

    Imaginei que Sherlock Holmes entraria imediatamente na casa, para atirar-se ao estudo domistrio. Entretanto, nada parecia mais distante de sua inteno. Com ar despreocupado que,em vista das circunstncias, me parecia prximo afetao, ele caminhou de um lado paraoutro pela calada, fitando o cho com expresso absorta, depois o cu, as casas opostas e alinha das grades sobre os muros. Terminada a sua inspeo, ele comeou a andar lentamentepelo caminho do jardim, ou melhor, pelo gramado vizinho, de olhos pregados no cho. Parouduas vezes e eu o vi sorrir uma vez, ouvindo-o tambm soltar uma exclamao satisfeita.Havia muitas marcas de pegadas impressas no terreno molhado e argiloso, mas como ospoliciais j tinham ido e vindo por ali, no pude imaginar como meu companheiro poderiadescobrir uma pista no local. De qualquer modo, j que tivera provas to extraordinrias darapidez de seus dotes perceptivos, acreditava que ele conseguiria distinguir muitas coisas quepara mim eram invisveis.

    entrada da casa, fomos recebidos por um homem alto e claro, de pele alva e cabelosmuito louros, com um caderno de notas na mo, que se precipitou ao encontro de Holmes,apertando-lhe a mo efusivamente.

  • Foi muita gentileza ter vindo disse ele. Nada foi tocado ainda. Exceto aqui fora! replicou meu companheiro, apontando para o caminho no jardim. Se

    uma manada de bfalos tivesse passado por ali, a confuso no seria pior. Mas imagino que jhavia tirado suas concluses, Gregson, antes de permitir que isso acontecesse.

    Fiquei muito ocupado dentro da casa respondeu o detetive, evasivamente. Meucolega, o sr. Lestrade, tambm est aqui. Esperava que ele cuidasse dessa parte.

    Holmes fitou-me de esguelha e ergueu as sobrancelhas sardonicamente. Se dois homens como voc e Lestrade j esto na pista, no resta muita coisa para um

    terceiro fazer disse.Gregson esfregou as mos, satisfeito consigo mesmo. Creio que j fizemos tudo que era necessrio respondeu. De qualquer modo, um

    caso estranho e sei o quanto aprecia o gnero. Veio para c de cabriol? perguntou SherlockHolmes. No. Nem Lestrade? Tambm no. Ento, vamos dar uma espiada na sala.Com esta observao inconseqente, ele entrou na casa em largas passadas, seguido por

    Gregson, cujas feies exprimiam espanto.Um corredor curto, de assoalho nu e empoeirado, levava cozinha e s dependncias de

    servio. Duas portas se abriam para ele, uma direita e outra esquerda. Era evidente queuma delas ficara fechada por muitas semanas. A outra dava para a sala de jantar, o aposentoonde ocorrera o misterioso fato. Holmes entrou e eu o segui, com o corao apertado poraquela sensao que a presena da morte inspira.

    Era uma grande sala quadrada, que parecia ainda maior pela ausncia de mveis. Asparedes estavam forradas com um papel vulgar e espalhafatoso, manchado de bolor em vrioslugares e com enormes tiras rasgadas, aqui e ali, penduradas e expondo o reboco amarelado.Do lado oposto porta havia uma lareira vistosa, com um consolo que imitava mrmorebranco. A um canto desse consolo da lareira via-se um toco de vela vermelha. A nica janelaestava to suja que s deixava penetrar uma claridade opaca e incerta, que emprestava a tudouma tonalidade acinzentada, acentuada pela espessa camada de poeira que cobria todo oaposento.

    Foi mais tarde que notei esses detalhes. Naquele momento, minha ateno concentrava-sena figura imvel e macabra estendida nas tbuas do assoalho, com os olhos abertos e sem vidafitando o teto desbotado. O homem devia ter uns 43 ou 44 anos, era de estatura mediana, tinhaombros largos, cabelos negros e anelados, a barba curta e hirsuta. Trajava fraque e colete detecido grosso e de boa qualidade, calas claras, e tinha punhos e colarinho imaculadamentealvos. No cho, a seu lado, havia uma cartola bem escovada e em bom estado. Ele tinha asmos crispadas e os braos abertos, mas as pernas estavam torcidas, dando a impresso deque sua agonia fora extremamente penosa. Em seu rosto rgido estampava-se uma expresso de

  • horror e tambm de dio, segundo me pareceu como jamais vi em um semblante humano.Aquela contoro malvola e terrvel, juntamente com a testa baixa, o nariz chato e o queixoproeminente, davam ao morto uma singular aparncia simiesca, acentuada pela postura torcidae pouco natural. Eu j vira a morte em formas variadas, porm nunca com um aspecto tomedonho como naquela sala sombria e sinistra, que dava para uma das principais artrias daLondres suburbana.

    Esguio e com seu ar de furo, Lestrade estava parado junto porta e cumprimentou-nos, amim e a meu companheiro.

    Este caso vai dar o que falar observou ele. Supera tudo o que j vi, e note-se que nosou calouro.

    Nenhuma pista? perguntou Gregson. Absolutamente nada respondeu Lestrade. Sherlock Holmes chegou perto do corpo e,

    ajoelhando-se, examinou-o atentamente. Tm certeza de que no h ferimentos? perguntou, apontando para as numerosas gotas e

    salpicos de sangue espalhados em torno. Plena certeza! exclamaram os dois detetives. Sendo assim, evidente que este sangue veio de uma segunda pessoa presumivelmente

    o assassino, se que houve assassinato. Isto me faz lembrar as circunstncias da morte de VanJansen, em Utrecht, em 1834. Lembra-se do caso, Gregson?

    No, senhor. Pois procure ler... realmente, deveria l-lo. No h nada de novo sob o sol. Tudo j

    aconteceu antes.Enquanto falava, seus dedos geis voavam daqui para ali, por todos os cantos, apalpando,

    pressionando, desabotoando e examinando, tendo nos olhos aquela mesma expresso absortaque j mencionei. Conduziu o exame com tal rapidez que dificilmente algum perceberia amincia com que o fazia. Por fim, cheirou os lbios do morto e depois olhou as solas de suasbotas de couro.

    No o removeram do lugar? perguntou. Apenas o suficiente para que o examinssemos. Ento, podem lev-lo agora para o necrotrio disse Holmes. No h mais nada para

    se examinar.Gregson tinha uma padiola e quatro homens ali perto. A um chamado seu, os padioleiros

    entraram na sala e retiraram o morto. Quando o corpo foi erguido, um anel caiu no cho,tilintando, e rolou pelo assoalho. Lestrade apanhou-o e olhou para ele com ar de mistrio.

    Uma mulher esteve aqui! exclamou. Isto uma aliana de mulher!Ao falar, exibiu a aliana na palma da mo. Juntamo-nos em torno dele e fitamos o anel.

    No havia dvida de que aquele aro singelo de ouro j havia adornado o dedo de uma noiva. Isto complica as coisas comentou Gregson. E, sabe Deus como j estavam

    complicadas. Tem certeza de que isto no as simplifica? observou Holmes. Nada descobriremos

    ficando aqui a contemplar a aliana. O que encontrou nos bolsos do homem? Temos tudo aqui disse Gregson, apontando para alguns objetos amontoados, sobre um

  • dos ltimos degraus da escada. Um relgio de ouro, no 97.163, da casa Barraud, de Londres.Uma corrente do relgio, pesada e de ouro macio. Um anel de ouro com o smbolo manico.Um alfinete de gravata de ouro, no formato de uma cabea de buldogue, com olhos de rubis.Uma carteira em couro da Rssia, contendo cartes de visitas de Enoch J. Drebber, deCleveland, correspondentes s iniciais E.J.D. na roupa de baixo. Nenhuma carteira de notas,mas dinheiro trocado nos bolsos, totalizando 7 libras e 13 xelins. Uma edio de bolso doDecameron, de Boccaccio, com o nome de Joseph Stangerson na primeira folha em branco.Duas cartas... uma endereada a E. J. Drebber e outra a Joseph Stangerson.

    Para que endereo? American Exchange, Strand, Londres, para serem entregues quando procuradas pelos

    destinatrios. Ambas foram enviadas pela Guion Steamship Company e falam sobre a partidade seus barcos de Liverpool. evidente que o infeliz estava prestes a voltar para Nova York.

    Investigou o homem chamado Stangerson? Imediatamente, senhor disse Gregson. Fiz publicar anncios em todos os jornais.

    Enviei um de meus homens ao American Exchange, mas ele ainda no voltou. Pediu informaes a Cleveland? Telegrafamos para l esta manh. O que disse? Apenas detalhamos as circunstncias, acrescentando que ficaramos gratos por qualquer

    informao que nos ajudasse. No solicitou detalhes sobre algum ponto especfico, que considerasse importante? Pedi informaes sobre Stangerson. Nada mais? No existe nenhuma circunstncia que sirva de base para este caso? Pretende

    telegrafar novamente? J disse tudo o que tinha a dizer respondeuGregson num tom ofendido.Sherlock Holmes riu para si mesmo, e parecia prestes a fazer algum comentrio, quando

    Lestrade, que ficara na sala da frente enquanto conversvamos no corredor, reapareceu emcena, esfregando as mos de um jeito pomposo e satisfeito.

    Sr. Gregson disse , acabo de fazer uma descoberta da maior importncia, algo quepassaria despercebido se eu no tivesse examinado as paredes cuidadosamente.

    Os olhos do homenzinho cintilavam enquanto ele falava e, evidentemente, mal continha aeuforia por ter lavrado um tento contra o colega.

    Venham ver! chamou, voltando alvoroadamente sala, cuja atmosfera pareciarenovada aps a remoo de seu macabro inquilino. Um momento, fiquem onde esto!

    Riscou um fsforo na bota e o aproximou da parede. Vejam isto! exclamou, triunfante.J mencionei que o papel de parede estava rasgado e com as tiras penduradas em vrios

    lugares. Naquele canto da sala, um bom pedao se rasgara, deixando mostra um quadradoamarelado de reboco spero. Nesse espao descoberto via-se uma nica palavra, garatujadaem letras de sangue:

    RACHE

  • O que me diz disso? perguntou o detetive, com o ar de um mestre-de-cerimniasapresentando o espetculo. Passou despercebido porque ficava no canto mais escuro da salae ningum pensou em examinar aqui. O assassino escreveu isto com o prprio sangue, dele oudela. Notem a mancha que escorreu pela parede! De qualquer modo, afasta a hiptese desuicdio. Por que teria sido escolhido este canto? Eu lhes direi: vejam aquela vela sobre alareira. Estava acesa no momento e, assim, este canto passou a ser a parte mais iluminada dasala.

    E, j que as descobriu, o que significam essas letras? perguntou Gregson num tomdesdenhoso.

    O que significam? Bem, certamente aqui seria escrito o nome Rachel, mas quem oescreveu deve ter sido interrompido antes de termin-lo. Ouam o que digo: quando este casofor esclarecido, vero que uma mulher chamada Rachel est envolvida no assunto. Ria vontade, sr. Sherlock Holmes. Pode ser muito esperto e inteligente, mas depois de tudoencerrado, ver que o velho co de caa se saiu muito melhor.

    Sinceramente, peo que me desculpe! disse meu companheiro, que irritara ohomenzinho com um acesso de riso. Evidentemente, seu o crdito de ser o primeiro adescobrir esse detalhe e, como disse, tudo indica que a palavra foi escrita pelo outroparticipante do mistrio da noite passada. Ainda no tive tempo de examinar esta sala mas,com a sua permisso, o que farei agora.

    Enquanto falava, tirou do bolso uma fita mtrica e uma grande lente de aumento redonda.Munido dos dois instrumentos, passou a caminhar rpida e silenciosamente pela sala, parandode vez em quando, ajoelhando-se algumas vezes e, em uma delas, estirando-se de bruos noassoalho. Estava to absorto em sua atividade que parecia ter esquecido a nossa presena,porque falava baixinho o tempo todo consigo mesmo, soltando uma srie de exclamaes,resmungos, assobios e gritos sufocados de animao e esperana. Enquanto o observava, nopude deixar de compar-lo a um bem-treinado co de caa, quando anda de um lado paraoutro farejando a presa escondida, ganindo de ansiedade, at encontrar o rastro perdido.Holmes prosseguiu em sua pesquisa durante uns bons vinte minutos, medindo, com o maiorcuidado, distncias entre marcas totalmente invisveis para mim e, volta e meia, usando suafita mtrica nas paredes, de modo tambm incompreensvel. Em um ponto, recolheucuidadosamente um montculo de poeira acinzentada do cho, guardando tudo em umenvelope. Por fim, examinou com a lente a palavra escrita na parede, verificando atentamentecada letra. Feito isto, pareceu dar-se por satisfeito, porque guardou a fita mtrica e a lente nobolso.

    Dizem que o gnio consiste em uma capacidade infinita para o trabalho paciente observou com um sorriso. Como definio pssima, embora se aplique ao ofcio dedetetive.

    Gregson e Lestrade tinham observado as manobras de seu colega amador com muitacuriosidade e certo desdm. Evidentemente, no percebiam que os mnimos gestos deSherlock Holmes algo que eu comeava a compreender tinham sempre alguma finalidadeprtica e definida.

    O que acha de tudo isto? perguntaram os dois.

  • Eu estaria lhes roubando os mritos do caso se pretendesse ajud-los observou meuamigo. Conduziram-se to bem at agora que seria lamentvel a interferncia de maisalgum. Havia um mundo de sarcasmo em suas palavras. Se me puserem a par de suasinvestigaes prosseguiu , terei o mximo prazer em ajud-los como for possvel. Nessemeio tempo, eu gostaria de falar com o policial que encontrou o corpo. Poderiam fornecer seunome e endereo?

    Lestrade consultou seu caderno de notas. John Rance disse. Est de folga agora. Poder encontr-lo em Audley Court, 46,

    Kennington Park Gate.Holmes anotou o endereo. Vamos, doutor disse para mim. Vamos falar com Rance. Quero dizer-lhes uma coisa

    que talvez possa ajud-los no caso acrescentou, virando-se para os dois detetives. Aquihouve um homicdio e o assassino era um homem. Tem mais de um e oitenta de altura, relativamente novo, com ps pequenos para sua altura, usa botinas grosseiras, de bicoquadrado, e fumava um charuto Trichinopoly. Chegou aqui com sua vtima em um cabriol dequatro rodas, puxado por um cavalo com trs ferraduras velhas e uma nova, na pata dianteiraesquerda. Com toda probabilidade, o assassino tem o rosto corado e as unhas da mo direitaso bastante compridas. Estes so apenas alguns detalhes, mas que podem ajudar.

    Lestrade e Gregson entreolharam-se com um sorriso de incredulidade. Se o homem foi assassinado, como aconteceu? perguntou o primeiro. Veneno disse Sherlock Holmes, lacnico. Caminhou para a porta. Mais uma coisa,

    Lestrade acrescentou, virando-se antes de sair: Rache quer dizer vingana em alemo;portanto, no perca seu tempo procurando uma senhorita Rachel.

    Aps este ltimo disparo, Holmes afastou-se, deixando para trs os dois rivaisboquiabertos.

  • E

    4. O que John Rance tinha a dizer

    4

    O QUE JOHN RANCE TINHA A DIZER

    ra uma hora da tarde, quando samos do nmero 3 de Lauriston Gardens. Sherlock Holmeslevou-me agncia telegrfica mais prxima, de onde expediu um longo telegrama. Depois

    fez sinal para um cabriol e ordenou ao cocheiro que nos conduzisse ao endereo fornecidopor Lestrade.

    Nada como a prova colhida diretamente na fonte comentou ele. Na verdade, j formeiminha opinio sobre este caso, mas nunca demais sabermos tudo que h para saber.

    Voc me surpreende, Holmes observei. Sem dvida, no tem muita certeza sobre osdetalhes que acabou de fornecer aos detetives.

    No h qualquer margem para erro respondeu ele. Ao chegar l, a primeira coisa queobservei foi que uma carruagem fizera dois sulcos com as rodas perto da esquina. Ora, at anoite passada, tivemos uma semana sem chuva, de modo que aquelas rodas s deixariammarcas to fundas se tivessem sido feitas durante a noite. Havia tambm marcas dos cascos deum cavalo, sendo o contorno de uma delas desenhado com mais nitidez que o das outras trs, oque indicava uma ferradura nova. J que uma carruagem parara ali depois de comear achover, e no tendo parado mais durante a manh (Gregson foi positivo quanto a isto), eladeve ter estado l durante a noite e, por conseguinte, conduziu os dois indivduos at a casa.

    Visto assim, parece bem simples murmurei , mas, e quanto altura do outro homem? Ora, em nove entre dez casos, podemos avaliar a altura de um homem pelo comprimento

    de seus passos. Trata-se de um clculo bem simples, mas no vou entedi-lo com nmeros. Eutinha o comprimento dos passos do indivduo na argila do jardim e na poeira do assoalho dasala. Alm disso, eu tinha outros elementos para confirmar a exatido de meus clculos.Quando um homem escreve em uma parede, o instinto o leva a escrever altura dos olhos.Muito bem, aquela inscrio estava a cerca de 1,80 metro do cho. Foi uma brincadeira decriana.

    E sobre a idade? perguntei. Bem, se um homem consegue dar passadas de 1,20 metro sem o menor esforo, tem que

    estar em plena forma fsica. Era essa a largura de uma poa no jardim. Botinas de verniz acontornaram e biqueiras quadradas a saltaram. Afinal, no h mistrio algum nisso. Estouapenas aplicando vida diria alguns dos preceitos sobre observao e deduo que eurecomendava naquele artigo. H algo mais que o esteja intrigando?

    Aquilo sobre as unhas e o charuto Trichinopoly falei.

  • A inscrio na parede foi feita pelo dedo indicador de um homem, molhado em sangue.Com a lente, pude observar que o reboco havia sido ligeiramente arranhado durante a escrita,o que no aconteceria se ele estivesse com as unhas aparadas. Recolhi um pouco da cinzaespalhada no assoalho. Era de cor escura e em escamas... uma cinza idntica produzida porum Trichinopoly. Fiz um estudo especial sobre cinzas de charuto alis, escrevi umamonografia a respeito. Gabo-me de poder identificar, primeira vista, a cinza de qualquermarca conhecida de charuto ou tabaco. exatamente nesses detalhes que est a diferena entreum detetive especializado e os do tipo que Gregson e Lestrade personificam.

    E quanto ao rosto corado? perguntei. Oh, foi apenas um tiro no escuro, embora eu no tenha dvidas a respeito. No me

    pergunte como, no estgio atual do caso.Passei a mo pela testa. Minha cabea um torvelinho comentei. Quanto mais penso no caso, mais misterioso me parece. Como que os dois homens se

    que foram mesmo dois conseguiram entrar em uma casa vazia? O que aconteceu com ococheiro que os levou at l? Como um homem poderia obrigar outro a tomar veneno? Deonde veio o sangue? Qual o motivo do crime, j que no houve roubo? Como aquela alianade mulher foi parar ali? E, acima de tudo: por que o segundo homem escreveria a palavraalem RACHE antes de dar o fora? Confesso que no vejo nenhuma maneira possvel deconciliar todos estes fatos.

    Meu companheiro sorriu de modo aprovador. Voc resumiu as dificuldades da situao de maneira clara e sucinta disse. Ainda h

    muitos pontos obscuros, embora eu j tenha opinio formada sobre os fatos principais. Quanto descoberta do pobre Lestrade, no passa de um indcio falso, a fim de pr a polcia na pistaerrada ao sugerir que aquilo era obra de socialistas ou de sociedades secretas. Aquilo no foifeito por um alemo. O A, caso tenha percebido, estava impresso mais ou menos segundo aescrita alem. Ora, um verdadeiro alemo invariavelmente usa caracteres latinos para letrasde imprensa. Assim sendo, posso afirmar com segurana que no foi um alemo quem fez ainscrio, mas um imitador grosseiro, que exagerou no seu papel. Foi simplesmente um golpede astcia para despistar a investigao. No vou lhe dizer muito mais sobre o caso, doutor.Como sabe, um mgico perde prestgio quando seu truque desvendado. Se eu lhe explicarmuita coisa sobre o meu mtodo de trabalho, acabar concluindo que, afinal de contas, sou umindivduo bastante comum.

    Eu jamais pensaria uma coisa dessa respondi. Seria impossvel algum aproximar mais a deduo de uma cincia exata do que voc fez.Meu companheiro enrubesceu de prazer ao ouvir minhas palavras e ao perceber o meu tom

    sincero. Eu j notara que ele era to sensvel aos elogios feitos sua arte quanto uma jovem arespeito da prpria beleza.

    Eu lhe direi mais uma coisa acrescentou Holmes. Botinas de verniz e Biqueirasquadradas chegaram no mesmo cabriol e seguiram juntos pelo caminho do jardim do jeitomais amistoso possvel, talvez at de braos dados. Quando entraram na casa, ficaramandando de um lado para o outro na sala ou melhor, Botinas de verniz ficou parado,

  • enquanto Biqueiras quadradas ia e vinha. Pude ler tudo isso na poeira; como li tambm que,quanto mais ele andava, mais excitado ia ficando. Isto foi revelado pela largura cada vezmaior das passadas. Ficou falando o tempo todo e, sem dvida, cada vez ficava maisencolerizado. Ento, ocorreu a tragdia. Contei-lhe tudo o que sei at agora, porque o restono passa de suposies e conjecturas. De qualquer modo, j temos uma boa base paracomear a trabalhar. Precisamos nos apressar, porque pretendo ouvir Norman Neruda estatarde, em um concerto no Halle.

    Esta conversa ocorreu enquanto nosso cabriol abria caminho por uma longa sucesso deruas sujas e becos sombrios. No mais sujo e sombrio de todos, nosso cocheiro parou derepente.

    Audley Court fica ali anunciou, apontando para uma fenda estreita na fileira de tijolosdesbotados. Estarei aqui quando voltarem.

    Audley Court no era um lugar atraente. A passagem estreita nos levou a um ptioquadrado, com piso de lajes e cercado de moradias srdidas. Abrimos caminho por entrebandos de crianas imundas e varais com roupas desbotadas penduradas, at chegarmos aonmero 46. A porta da casa exibia uma pequena placa de lato com o nome Rance gravado.Soubemos que o policial estava na cama e fomos conduzidos a uma saleta, a fim de esper-lo.

    Ele surgiu pouco depois, parecendo um pouco irritado por ter seu repouso interrompido. J apresentei meu relatrio no posto declarou. Holmes tirou meio soberano do bolso e

    brincou pensativamente com a moeda. Pensamos que seria melhor ouvir tudo de sua prpria boca disse. Terei o mximo prazer em ajud-lo no que puder respondeu o policial, de olhos fixos

    na pequena moeda de ouro. Basta que nos conte a seu modo o que aconteceu. Rance sentou-se no sof de crina e

    franziu a testa, como que decidido a no omitir o menor detalhe em seu relato. Contarei desde o incio falou. Minha ronda vai de dez da noite s seis da manh. s

    23 horas, houve uma briga no White Hart mas, fora isso, tudo continuou tranqilo no meusetor. Comeou a chover uma da madrugada e ento encontrei Harry Murcher ele faz aronda em Holland Grove e ficamos conversando na esquina da Henrietta Street. Um poucomais tarde por volta de duas horas, mais ou menos achei que devia dar uma espiada e verse estava tudo calmo na Brixton Road. Estava tudo enlameado e deserto. No vi ningumdurante a minha caminhada, embora um ou dois cabriols passassem por mim. Ia andandodevagar, pensando que uma dose de gim quente me faria bem quando, de repente, uma nesgade luz me chamou a ateno, bem na janela daquela casa. Ora, eu sabia que as duas casas emLauriston Gardens estavam vazias porque o proprietrio no quer mandar limpar os esgotos,embora o ltimo inquilino de uma delas tenha morrido de tifo. Fiquei perplexo ao ver a luz najanela, o que me fez desconfiar de que algo estava errado. Quando cheguei porta...

    Parou e depois voltou at o porto do jardim interrompeu meu companheiro. Por quefez isso?

    Rance teve um sobressalto e fixou os olhos arregalados em Sherlock Holmes, com oespanto estampado no rosto.

    Foi isso mesmo! exclamou. E s Deus sabe como descobriu isso! Bem, quandocheguei porta, estava tudo to quieto e deserto que pensei que era um mau negcio no ter

  • ningum ali comigo. No tenho medo de nada no mundo dos vivos, mas fiquei pensando quebem podia ser o sujeito que morreu de tifo inspecionando os esgotos que o mataram. A idiame deixou apavorado e voltei ao porto para ver se avistava a lanterna de Murcher. Mas nohavia o menor sinal dele nem de mais ningum.

    No viu ningum na rua? Nem uma alma e nem ao menos um cachorro. Ento, tomei coragem, voltei e abri a porta.

    Estava tudo quieto l dentro, de modo que fui at a sala onde a luz estava brilhando. Haviauma vela bruxuleante no consolo da lareira... era uma vela de cera vermelha... e com a suaclaridade, eu vi...

    Sei tudo o que voc viu. Deu vrias voltas pela sala, ajoelhou-se junto ao corpo, depoisfoi at a cozinha, verificou a porta e ento...

    John Rance levantou-se de um salto, com ar amedrontado e um olhar cheio de suspeita. Onde estava escondido para ver tudo isso? exclamou. Est me parecendo que sabe

    muito mais do que deveria.Holmes riu e jogou seu carto de visita sobre a mesa, na direo do policial. No v me prender pelo assassinato disse. Sou um dos ces de caa e no o lobo. Gregson e Lestrade podero confirmar o que digo.

    Muito bem, prossiga. O que fez depois?Rance sentou-se outra vez, mas no perdeu a expresso intrigada. Voltei ao porto e usei meu apito. Isso fez com que Murcher e mais dois viessem ao meu

    encontro. A rua estava vazia nesse momento? Bem, era como se estivesse, no caso de algum que pudesse ser de alguma valia. O que quer dizer?Um sorriso surgiu no rosto do policial. J vi muitos bbados por a explicou , mas nunca um como aquele. Quando cheguei, o

    sujeito estava no porto, encostado s grades, cantando a plenos pulmes a New-fangledBanner, ou algo parecido. Mal conseguia ficar em p, quanto mais ajudar em alguma coisa.

    Que tipo de homem era ele? perguntou Sherlock Holmes.John Rance pareceu um tanto irritado com a digresso. Um beberro dos piores respondeu. Teria sido levado diretamente para o posto

    policial, se no tivssemos coisa mais importante para fazer. O rosto dele, suas roupas... no reparou em nada? perguntou Holmes, impaciente. claro que reparei, j que tive de ergu-lo, com ajuda de Murcher. Era um sujeito alto,

    de rosto muito corado, mas com a parte inferior escondida por uma echarpe que... J basta! exclamou Holmes. O que foi feito dele? No amos ficar cuidando de um bbado justamente naquela hora respondeu o policial

    numa voz ofendida. Imagino que tenha encontrado o caminho de volta para casa. Como estava vestido? Tinha um sobretudo marrom. E um chicote na mo? Chicote? Hum... no.

  • Ento, deve t-lo largado em algum lugar murmurou meu companheiro. Chegou a verou ouvir um cabriol, depois disso?

    No. Aqui tem meio soberano disse meu companheiro, levantando-se e apanhando seu

    chapu. Receio que voc no suba muito na fora policial, Rance. Devia usar tambm acabea, em vez de t-la apenas como enfeite. Na noite passada, poderia ter ganhado suasdivisas de sargento. O homem que teve nas mos o mesmo que possui a chave deste mistrio,aquele que estamos procurando. Agora no adianta discutirmos isto, mas eu lhe garanto que como falei. Vamos, doutor.

    Fomos andando na direo do cabriol, deixando nosso informante incrdulo, masevidentemente perturbado.

    Que grande imbecil! exclamou Holmes, em tom amargo, enquanto voltvamos paracasa. Pensar que teve uma oportunidade de ouro nas mos e no soube aproveit-la!

    Pois eu continuo no escuro disse. verdade que a descrio do homem combina coma idia que voc fez do segundo personagem do mistrio. Mas por que ele voltaria casadepois que saiu? No assim que agem os criminosos.

    A aliana, homem, a aliana! Ele voltou para recuper-la. Enfim, se no tivermos outromeio de captur-lo, sempre podemos atra-lo com a aliana. Vou peg-lo, doutor... aposto doiscontra um como o agarro. Fico-lhe muito grato por tudo. S fui a Lauriston Gardens por suacausa, e se no tivesse ido, teria perdido o estudo mais interessante que j encontrei: umestudo em vermelho, hein? Ora, por que no usarmos um pouco a linguagem artstica? Temos ofio vermelho do crime enredando-se na meada descolorida da vida, e nossa obrigao desentranh-lo, isol-lo, expondo-o em toda a sua extenso. Muito bem, vamos ao nossoalmoo, e depois, a Norman Neruda. Seu ataque e sua execuo musical so esplndidos.Como mesmo aquela pequena pea de Chopin que ela interpreta de modo to magistral? Tra-la-la-li-ra-la...

    Recostado no assento do cabriol, aquele co de caa amador ficou cantarolando comouma cotovia, enquanto eu meditava sobre as muitas facetas da mente humana.

  • A

    5. Nosso anncio atrai um visitante

    5

    NOSSO ANNCIO ATRAI UM VISITANTE

    atividade daquela manh fora excessiva para a minha sade, de modo que, tarde, eu mesentia francamente exausto. Depois que Holmes saiu para o concerto, deitei-me no sof

    disposto a dormir por umas duas horas. Foi uma tentativa intil. Tudo que havia sucedido medeixara to excitado que as mais estranhas fantasias e suposies povoavam minha mente.Toda vez que eu fechava os olhos, via a fisionomia contrada e simiesca do homemassassinado diante de mim. A impresso provocada por aquele rosto fora to sinistra que eradifcil sentir outra coisa alm de gratido pela pessoa que retirara seu dono deste mundo. Seas feies humanas alguma vez j revelaram o vcio em seu aspecto mais malvolo, semdvida eram as de Enoch J. Drebber, de Cleveland. Mesmo assim, eu reconhecia que erapreciso fazer justia, e que a depravao da vtima no constitua atenuante aos olhos da lei.

    Quanto mais eu pensava no caso, mais extraordinria me parecia a hiptese de meucompanheiro, de que o homem fora envenenado. Lembrei-me de que ele cheirara os lbios docadver e tinha certeza de que ele detectara algo que sustentava esta idia. Bem, se no fosseveneno, o que mais poderia ter provocado a morte do indivduo, se ele no apresentavaferimentos nem sinais de estrangulamento? Ao mesmo tempo, de quem seria aquele sangue quemanchara tanto o assoalho? No havia sinais de luta, e a vtima no possua nenhuma armacom a qual pudesse ter ferido o adversrio. Enquanto todas essas perguntas ficassem semresposta, era quase certo que eu e Holmes no conseguiramos conciliar o sono. As maneirascalmas e confiantes de meu companheiro, no entanto, convenciam-me de que ele j haviaformulado alguma teoria que explicasse todos os fatos, embora eu no pudesse imaginar nempor um momento qual seria.

    Holmes voltou muito tarde to tarde que s o concerto no seria capaz de det-lo portanto tempo. O jantar j estava na mesa antes de seu regresso.

    Foi magnfico! ele exclamou ao sentar-se. Lembra-se do que Darwin diz sobre amsica? Segundo ele, a capacidade de produzi-la e apreci-la j existia entre a raa humanamuito antes de existir a faculdade da linguagem. Talvez seja por isso que nos sentimos tosutilmente influenciados por ela. Certamente, nossas almas guardam lembranas vagasdaqueles sculos envoltos em brumas, quando o mundo ainda estava na infncia.

    Trata-se de uma idia um tanto ampla observei. Nossas idias precisam ser to amplas quanto a Natureza, se quisermos interpret-la

    respondeu ele. O que h com voc? No me parece o mesmo. Sem dvida, esse caso da

  • Brixton Road o deixou perturbado. Para ser franco, deixou mesmo falei. Depois de minhas experincias no Afeganisto,

    eu devia estar mais insensvel. Vi meus companheiros serem dizimados na batalha deMaiwand e no perdi a calma.

    Posso compreender. Aqui h um mistrio, excitando a imaginao, e onde no himaginao, no existe horror. J viu o jornal da tarde?

    Ainda no. Faz um relato bastante detalhado do caso, mas no menciona o fato de que uma aliana de

    mulher caiu ao cho quando o corpo foi erguido. Ainda bem! Por qu? Veja este anncio respondeu ele. Mandei public-lo esta manh em todos os jornais,

    logo aps a ocorrncia.Atirou o jornal na minha direo por cima da mesa, e passei os olhos pelo ponto indicado.

    Era o primeiro anncio da coluna de Achados.Foi encontrada esta manh na Brixton Road, dizia o anncio, uma aliana de ouro, no

    trajeto entre a Taberna White Hart e Holland Grove. Procurar o dr. Watson na Baker Street,221 B, entre oito e nove desta noite.

    Desculpe-me por usar seu nome disse ele. Se publicasse o meu, alguns desses idiotaso reconheceriam e se intrometeriam no caso.

    Est tudo bem falei. Mas, se aparecer algum, eu no tenho nenhuma aliana comigo. Oh, claro que tem! ele disse, estendendo-me uma. Esta servir perfeitamente.

    quase idntica outra. E quem voc acha que vir busc-la? Ora, o homem do sobretudo marrom... nosso amigo corado de biqueiras quadradas. Se

    no aparecer em pessoa, enviar um cmplice. Talvez ele ache arriscado demais. De modo nenhum. Se minha opinio estiver correta e tenho todos os motivos para

    acreditar que est , esse homem preferir arriscar qualquer coisa a perder a aliana. Segundoimagino, ele a deixou cair enquanto se debruava sobre o corpo de Drebber e no deu porfalta dela na hora. Ao sair da casa, percebeu que a perdera e voltou rapidamente, mas viu quea polcia j ocupara o lugar por sua prpria culpa, ao deixar a vela acesa. Ento, teve quefingir que estava bbado para afastar as suspeitas que devem ter surgido quando o viram juntoao porto. Agora, ponha-se no lugar dele. Refletindo sobre o assunto, deve ter-lhe ocorridoque poderia ter perdido a aliana na rua, depois de sair da casa. O que fazer ento? Examinaransiosamente os jornais da tarde, na esperana de encontr-la na coluna dos objetos achados.Garanto como os olhos do nosso homem brilharam quando ele viu o meu anncio. Ele deve terficado eufrico. Por que temer uma armadilha? Em sua opinio, no haveria nenhum motivopara se pensar que a aliana encontrada tenha alguma ligao com o crime. Ele vir. Voc over dentro de uma hora.

    E depois? perguntei. Oh, no se preocupe. Eu me incumbirei de lidar com ele. Tem alguma arma? Tenho meu velho revlver regulamentar e alguns cartuchos. Seria conveniente limp-lo e carreg-lo. O homem deve estar desesperado, e embora eu o

  • pegue desprevenido, melhor ficar preparado para uma emergncia.Fui para o meu quarto e segui seu conselho. Quando voltei com o revlver, a mesa j estava

    arrumada e Holmes se entretinha em sua ocupao favorita de arranhar o arco no violino. Os acontecimentos esto se precipitando anunciou quando entrei. Acabo de receber

    resposta ao telegrama que mandei para os Estados Unidos. Minha opinio sobre o caso estavacorreta.

    E qual sua opinio? perguntei, ansioso. Meu violino precisa de cordas novas observou ele. Ponha seu revlver no bolso.

    Quando o sujeito chegar, dirija-se a ele com naturalidade e deixe o resto comigo. No vamedront-lo, encarando-o fixamente.

    So oito horas falei, consultando meu relgio. Exato. Talvez ele esteja aqui dentro de mais alguns minutos. Abra a porta, deixando-a

    apenas encostada. Assim. Agora, deixe a chave do lado de dentro. Obrigado! V? Descobrieste livro antigo e curioso em uma banca, ontem De Jure inter Gentes publicado em latim,em Lige, nos Pases Baixos, em

    1642. Imagine, Carlos I ainda tinha a cabea sobre os ombros quando imprimiram estelivreto de capa marrom...

    Quem o imprimiu? Philippe de Croy. No fao a mnima idia de quem ele era. Na primeira pgina em

    branco est escrito em tinta quase apagada: Ex libris Guliolmi Whyte. Quem teria sidoGuliolmi Whyte? Imagino que algum advogado pragmtico do sculo XVII. Sua letra mostraum trao jurdico na caligrafia. Bem, acho que a vem o nosso homem!

    Enquanto ele falava, tocaram com fora a sineta da entrada. Sherlock Holmes levantou-sesilenciosamente e moveu sua cadeira na direo da porta. Ouvimos a criada passar pelocorredor e depois o estalido seco do trinco sendo aberto.

    O dr. Watson mora aqui? perguntou uma voz clara, embora um pouco spera.No ouvimos a resposta da criada, mas a porta se fechou e algum comeou a subir a

    escada. Os passos eram vacilantes e arrastados. Uma expresso de surpresa passou pelo rostode meu amigo quando os ouviu. Os passos se aproximaram lentamente pelo corredor e ouviu-se uma leve pancada na porta.

    Entre! exclamei.Em vez do homem violento que espervamos, entrou na sala uma mulher bastante idosa e

    enrugada, coxeando. Pareceu ofuscada pela brilhante claridade repentina do aposento e, apsuma mesura, ficou piscando os olhos lacrimosos e remexendo nos bolsos com dedos nervosose trmulos. Olhei de esguelha para meu companheiro e vi seu rosto assumir uma expresso todesconsolada que mal pude manter a seriedade.

    A velha exibiu finalmente um jornal vespertino e apontou para nosso anncio. Foi isto que me trouxe aqui, bondosos cavalheiros disse, fazendo outra mesura , uma

    aliana encontrada na Brixton Road. Pertence minha filha Sally, casada faz apenas um ano.Seu marido camareiro de um navio da Unio e nem sei o que diria se voltasse e aencontrasse sem sua aliana. Em seu estado normal ele no dos mais delicados, e pioramuito quando bebe... Se querem saber, ela ontem foi ao circo com...

  • A aliana esta? perguntei. Deus seja louvado! exclamou a velha. Esta noite, Sally ser uma mulher feliz... Sim,

    ela mesma. Qual o seu endereo? perguntei, pegando um lpis. Duncan Street, 13, em Houndsditch. um bocado longe daqui. A Brixton Road no fica no trajeto entre qualquer circo e Houndsditch observou

    Holmes com rispidez.A velha virou o rosto e o encarou fixamente, com seus olhinhos circundados de vermelho. O cavalheiro perguntou o meu endereo falou. Sally mora em uma penso em

    Mayfield Place, 3. Fica em Peckham. E seu nome ...? Meu sobrenome Sawyer... o dela Dennis, desde que se casou com Tom Dennis. um

    excelente rapaz, muito direito tambm quando est no mar, e nenhum camareiro da companhialhe passa frente. Mas em terra, quando se envolve com mulheres e bebidas...

    Aqui tem a sua aliana, sra. Sawyer interrompi, atendendo a um sinal de meucompanheiro. Est claro que pertence sua filha e fico feliz em poder devolv-la aolegtimo dono.

    Murmurando uma poro de agradecimentos e bnos, a velha guardou a aliana no bolsoe arrastou-se pelos degraus abaixo. Sherlock Holmes levantou-se rapidamente assim que eladesapareceu e precipitou-se para seu quarto. Voltou em poucos segundos, envolto em seuimpermevel e com um cachecol em torno do pescoo.

    Vou segui-la disse, apressado. Ela deve ser uma cmplice e me levar ao homem.Espere por mim.

    Mal a porta do corredor se fechara atrs de nossa visitante e Holmes j descia a escada.Espiando pela janela, pude v-la arrastando-se com dificuldade do outro lado da rua,enquanto seu perseguidor furtivo ia um pouco atrs.

    Se toda a teoria dele no estiver errada, pensei, Holmes est agora sendo levado para ocentro do mistrio.

    No era preciso que ele me pedisse para esper-lo, porque descobri que seria impossveldormir enquanto no soubesse o resultado de sua aventura.

    Holmes sara quase s 21 horas e eu no fazia a mnima idia de quando voltaria, mascontinuei fumando imperturbavelmente o meu cachimbo e folheando as pginas de Vie deBohme, de Henri Murger. Soaram as 22 horas e ouvi os passos rpidos da criada a caminhoda cama. s 23 horas, as passadas mais solenes da senhoria atravessaram o corredor rumo adestino idntico. Era quase meia-noite quando ouvi o rudo seco da chave de Holmes girandona fechadura. Assim que entrou, vi no seu rosto que ele no se sara bem. Divertimento edecepo pareciam debater-se para ver quem levava a melhor e, vencendo o primeiro, eleexplodiu numa gargalhada jovial.

    Por nada no mundo eu gostaria que o pessoal da Scotland Yard soubesse do que houve! exclamou, deixando-se cair na poltrona. J zombei tanto deles que nunca mais esqueceriam omeu fracasso. Mas posso rir agora porque, a longo prazo, eu que levarei a melhor.

    Afinal, o que aconteceu? perguntei.

  • Oh, no me importo de contar uma histria contra mim mesmo. Aquela criatura no tinhaandado muito quando comeou a coxear ainda mais e dar todos os sinais de estar com os psdoloridos. Parou um pouco depois e fez sinal para uma carruagem que passava. Conseguiaproximar-me o suficiente para ouvir o endereo, mas nem precisaria ficar to ansioso,porque ela o anunciou numa voz suficientemente alta para ser ouvida do outro lado da rua: Leve-me Duncan Street, 13, em Houndsditch, cocheiro!

    Pensei que tudo aquilo comeava a parecer autntico e, vendo-a entrar em segurana nacarruagem, encarapitei-me na traseira. Todo detetive deveria ser perito nesta arte. Bem, lfomos ns sacolejando, sem parar uma s vez, at chegarmos rua em questo. Pulei para ocho antes de chegarmos porta e fiz o resto do trajeto a p, caminhando tranqilamente. Vi acarruagem parar. O cocheiro saltou da bolia, abriu a porta e ficou parado, esperando. Masningum saiu l de dentro. Quando me aproximei, ele vasculhava freneticamente o veculovazio, enquanto soltava o mais selecionado repertrio de pragas que jamais ouvi. No havia omenor sinal de sua passageira e, se no me engano, ele ainda levar muito tempo para recebero pagamento pela corrida. Pedindo informaes no nmero 13, ficamos sabendo que a casapertencia a um respeitvel forrador de paredes chamado Keswick, e que ali no conheciamningum com os sobrenomes Sawyer ou Dennis.

    Est querendo dizer falei, perplexo , que aquela velha fraca e capenga foi capaz desaltar da carruagem em movimento sem que voc ou o cocheiro a vissem?

    Velha uma ova! replicou Sherlock Holmes com rispidez. Ns que bancamos duasvelhas tolas. Devia ser um homem novo, alm de gil e excelente ator. Um disfarce perfeito.Sem dvida, percebeu que era seguido e apelou para esse truque, a fim de despistar-me. Istoindica que o homem que procuramos no to solitrio como imaginei, porque tem amigosprontos a arriscar-se por ele. Bem, doutor, vejo que parece esgotado. Se quer um conselho, vdormir!

    Eu me sentia realmente cansado e aceitei o conselho. Deixei Holmes sentado diante dalareira e, j tarde da noite, ouvi os gemidos sufocados e melanclicos de seu violino,indicando que ele ainda analisava o estranho problema que se dispusera a resolver.

  • N

    6. Tobias Gregson mostra o que pode fazer

    6

    TOBIAS GREGSON MOSTRA O QUE PODE FAZER

    o dia seguinte, os jornais estavam cheios daquilo que chamavam de O Mistrio deBrixton. Cada um deles fazia um longo relato do caso e alguns acrescentavam

    comentrios. Havia neles alguns detalhes que eu no conhecia. Em meu lbum de recortesainda guardo vrios deles, e tambm registros relativos ao caso. Aqui vai um resumo dealguns:

    O Daily Telegraph observava que, na histria do crime, raramente se vira uma tragdiacom caractersticas mais estranhas. O nome alemo da vtima, a aparente ausncia de outrosmotivos e a sinistra inscrio na parede, tudo parecia indicar que o homicdio fora perpetradopor refugiados polticos e revolucionrios. Os socialistas tinham vrias ramificaes naAmrica e, sem dvida, o morto infringira suas leis no escritas, e fora ento rastreado poreles. Aps aluses superficiais ao Vehmgericht, gua-tofana,1 aos carbonrios, marquesade Brinvilliers, teoria de Darwin, aos princpios de Malthus e aos assassinatos da RatcliffHighway, o artigo terminava admoestando o governo e defendendo uma vigilncia mais severados estrangeiros na Inglaterra.

    O Standard comentava o fato de que violncias desse tipo costumavam ocorrer quando osliberais estavam no governo. Eram resultado da inquietao popular e do conseqenteenfraquecimento da autoridade em geral. O morto era um cidado americano que estava nametrpole havia algumas semanas. Hospedara-se na penso de Madame Charpentier, naTorquay Terrace, em Camberwell. Em suas viagens, era acompanhado por Joseph Stangerson,seu secretrio particular. Os dois haviam se despedido da dona da penso na tera-feira, dia 4deste ms, partindo para a Euston Station, onde tomariam o expresso de Liverpool. Depoisdisso, tinham sido vistos na plataforma da estao. Nada mais se soubera deles, at que ocorpo do sr. Drebber foi encontrado em uma casa vazia da Brixton Road, a muitos quilmetrosde distncia de Euston. Como chegara at l ou de que maneira encontrara seu trgico destinoeram circunstncias ainda envoltas em mistrio. Nada se sabia ainda sobre o paradeiro deStangerson. Foi com prazer que soubemos, continuava o jornal, que os srs. Lestrade eGregson, da Scotland Yard, esto encarregados das investigaes e, antecipadamente, estamoscertos de que policiais to competentes resolvero prontamente o caso.

    O Daily News observava que, sem dvida, tratava-se de um crime poltico. O despotismodos governos continentais e o dio que votavam ao liberalismo tinham feito com que serefugiasse na Inglaterra um grande nmero de homens que poderiam se tornar excelentes

  • cidados, se no estivessem amargurados pelas lembr