Daniel Sarmento - Neoconstitucionalismo No Brasil

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    O neoconstitucionalismo no Brasil: riscos e possibilidadesDaniel Sarmento

    Palavras-chave: Neoconsti tucional ismo no Brasi l . Neoconsti tucional ismo (conceito).Neoconstitucionalismo (objees).Sumrio: 1 Introduo - 2O que o neoconstitucionalismo? - 3

    A recepo do neoconstitucionalismo no Brasil - 4Trs objees ao neoconstitucionalismo - 5Concluso

    1 Introduo

    O Direito brasileiro vem sofrendo mudanas profundas nos ltimos tempos, relacionadas emergncia de um novo paradigma tanto na teoria jurdica quanto na prtica dos tribunais, quetem sido designado como "neoconstitucionalismo". Estas mudanas, que se desenvolvem sob agide da Constituio de 88, envolvem vrios fenmenos diferentes, mas reciprocamenteimplicados, que podem ser assim sintetizados: (a) reconhecimento da fora normativa dos

    princpios jurdicos e valorizao da sua importncia no processo de aplicao do Direito1 (b )rejeio ao formalismo e recurso mais freqente a mtodos ou "estilos" mais abertos de raciocnio

    jurdico: ponderao, tpica, teorias da argumentao etc.2 (c) constitucionalizao do Direito,com a irradiao das normas e valores constitucionais, sobretudo os relacionados aos direitos

    fundamentais, para todos os ramos do ordenamento3 (d) reaproximao entre o Direito e a Moral,

    com a penetrao cada vez maior da Filosofia nos debates jurdicos4 e (e) judicializao da polticae das relaes sociais, com um significativo deslocamento de poder da esfera do Legislativo e do

    Executivo para o Poder Judicirio.5

    H quem aplauda entusiasticamente estas mudanas, e quem as critique com veemncia. Contudo,no h como negar a magnitude das alteraes que vm se desenrolando por debaixo dos nossosolhos. No presente estudo, tenho duas intenes: em primeiro lugar, pretendo descrever o que seentende por neoconstitucionalismo, abordando a sua recepo no pensamento jurdico brasileiro.Alm disso, tenciono discutir trs questes que o paradigma neoconstitucionalista suscita,especialmente no cenrio brasileiro: os riscos para a democracia de uma judicializao excessivada vida social, os perigos de uma jurisprudncia calcada numa metodologia muito aberta,sobretudo no contexto de uma civilizao que tem no "jeitinho" uma das suas marcas distintivas, eos problemas que podem advir de um possvel excesso na constitucionalizao do Direito para aautonomia pblica do cidado e para a autonomia privada do indivduo.

    2 O que o neoconstitucionalismo?

    A palavra "neoconstitucionalismo" no empregada no debate constitucional norte-americano,nem tampouco no que travado na Alemanha. Trata-se de um conceito formulado sobretudo naEspanha e na Itlia, mas que tem reverberado bastante na doutrina brasileira nos ltimos anos,sobretudo depois da ampla divulgao que teve aqui a importante coletnea intituladaNeoconstitucionalismo (s), organizada pelo jurista mexicano Miguel Carbonell, e publicada na

    Espanha em 2003.6

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    Os adeptos do neoconstitucionalismo buscam embasamento no pensamento de juristas que sefiliam a linhas bastante heterogneas, como Ronald Dorkin, Robert Alexy, Peter Hberle, GustavoZagrebelsky, Luigi Ferrajoli e Carlos Santiago Nino, e nenhum destes se define hoje, ou j se

    definiu, no passado, como neoconstitucionalista.7Tanto dentre os referidos autores, como entreaqueles que se apresentam como neoconstitucionalistas, constata-se uma ampla diversidade de

    posies jusfilosficas e de filosofia poltica: h positivistas e no-positivistas, defensores danecessidade do uso do mtodo na aplicao do Direito8 e ferrenhos opositores do emprego de

    qualquer metodologia na hermenutica jurdica,9adeptos do liberalismo poltico,10comunitaristas11

    e procedimentalistas.12 Neste quadro, no tarefa singela definir o neoconstitucionalismo, talvezporque, como j revela o bem escolhido ttulo da obra organizada por Carbonell, no exista umnico neoconstitucionalismo, que corresponda a uma concepo terica clara e coesa, mas diversasvises sobre o fenmeno jurdico na contemporaneidade, que guardam entre si algunsdenominadores comuns relevantes, o que justifica que sejam agrupadas sob um mesmo rtulo,

    mas compromete a possibilidade de uma conceituao mais precisa.13

    Para compreender melhor o neoconstitucionalismo, vale percorrer, de forma sinttica epanormica, o processo histrico que ensejou o seu advento. Esta trajetria corresponde a

    fenmenos que ocorreram na Europa Ocidental, a partir do segundo ps-guerra,14 e que se

    reproduziram mais tarde, com nuances prprias, em pases do Terceiro Mundo como Colmbia, 15

    Argentina,16Mxico,17 frica do Sul,18ndia 19e o prprio Brasil.

    At a Segunda Guerra Mundial, prevalecia no velho continente uma cultura jurdicaessencialmente legicntrica, que tratava a lei editada pelo parlamento como a fonte principal -

    quase como a fonte exclusiva - do Direito, e no atribua fora normativa s constituies.20

    Estaseram vistas basicamente como programas polticos que deveriam inspirar a atuao do legislador,

    mas que no podiam ser invocados perante o Judicirio, na defesa de direitos.21 Os direitosfundamentais valiam apenas na medida em que fossem protegidos pelas leis, e no envolviam, emgeral, garantias contra o arbtrio ou descaso das maiorias polticas instaladas nos parlamentos.Alis, durante a maior parte do tempo, as maiorias parlamentares nem mesmo representavam todoo povo, j que o sufrgio universal s foi conquistado no curso do sculo XX.

    Depois da Segunda Guerra, na Alemanha22e na Itlia,23e algumas dcadas mais tarde, aps o fimde ditaduras de direita, na Espanha e em Portugal, assistiu-se a uma mudana significativa deste

    quadro. A percepo de que as maiorias polticas podem perpetrar ou acumpliciar-se com abarbrie, como ocorrera no nazismo alemo, levou as novas constituies a criarem oufortalecerem a jurisdio constitucional, instituindo mecanismos potentes de proteo dos direitosfundamentais mesmo em face do legislador. Sob esta perspectiva, a concepo de Constituio naEuropa aproximou-se daquela existente nos Estados Unidos,onde, desde os primrdios doconstitucionalismo, entende-se que a Constituio autntica norma jurdica, que limita o

    exerccio do Poder Legislativo e pode justificar a invalidao de leis. 24 S que com uma diferenaimportante: enquanto a Constituio norte-americana sinttica e se limita a definir os traosbsicos de organizao do Estado e a prever alguns poucos direitos individuais, as cartas europias

    foram, em geral, muito alm disso.

    As constituies europias do 2 ps-guerra no so cartas procedimentais, que quase tudo deixam

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    para as decises das maiorias legislativas, mas sim documentos repletos de normas impregnadasde elevado teor axiolgico, que contm importantes decises substantivas e se debruam sobreuma ampla variedade de temas que outrora no eram tratados pelas constituies, como a

    economia, as relaes de trabalho e a famlia.25 Muitas delas, ao lado dos tradicionais direitosindividuais e polticos, incluem tambm direitos sociais de natureza prestacional. Uma

    interpretao extensiva e abrangente das normas constitucionais pelo Poder Judicirio deu origemao fenmeno de constitucionalizao da ordem jurdica, que ampliou a influncia das constituiessobre todo o ordenamento, levando adoo de novas leituras de normas e institutos nos mais

    variados ramos do Direito.26

    Como boa parcela das normas mais relevantes destas constituies caracteriza-se pela abertura eindeterminao semnticas - so, em grande parte, princpios e no regras - a sua aplicao diretapelo Poder Judicirio importou na adoo de novas tcnicas e estilos hermenuticos, ao lado da

    tradicional subsuno.27 A necessidade de resolver tenses entre princpios constitucionaiscolidentes - freqente em constituies compromissrias, marcadas pela riqueza e pelo pluralismo

    axiolgico - deu espao ao desenvolvimento da tcnica da ponderao,28 e tornou freqente o

    recurso ao princpio da proporcionalidade na esfera judicial.29E a busca de legitimidade para estasdecises, no marco de sociedades plurais e complexas, impulsionou o desenvolvimento de diversas

    teorias da argumentao jurdica,30 que incorporaram ao Direito elementos que o positivismoclssico costumava desprezar, como consideraes de natureza moral, ou relacionadas ao campoemprico subjacente s normas.

    Neste contexto, cresceu muito a importncia poltica do Poder Judicirio. Com freqncia cada vezmaior, questes polmicas e relevantes para a sociedade passaram a ser decididas por

    magistrados, e sobretudo por cortes constitucionais, muitas vezes em razo de aes propostaspelo grupo poltico ou social que fora perdedor na arena legislativa.31De poder quase "nulo", mera"boca que pronuncia as palavras da lei", como lhe chamara Montesquieu, o Poder Judicirio se viualado a uma posio muito mais importante no desenho institucional do Estado contemporneo.

    A principal matria-prima dos estudos que se identificam com o neoconstitucionalismo relaciona-ses mutaes da cultura jurdica acima descritas. Em que pese a heterogeneidade dosposicionamentos jusfilosficos dos autores que se filiam a esta linha, no me parece umasimplificao exagerada dizer que os seus principais pontos de convergncia so o reconhecimento

    destas mudanas e a sua defesa.32

    As teorias neoconstitucionalistas buscam construir novas grades tericas que se compatibilizemcom os fenmenos acima referidos, em substituio quelas do positivismo tradicional,consideradas incompatveis com a nova realidade. Assim, por exemplo, ao invs da insistncia nasubsuno e no si logismo do positivismo formalista, ou no mero reconhecimento dadiscricionariedade poltica do intrprete nos casos difceis, na linha do positivismo mais moderno deKelsen e Hart, o neoconstitucionalismo se dedica discusso de mtodos ou de teorias daargumentao que permitam a procura racional e intersubjetivamente controlvel da melhor

    resposta para os "casos difceis" do Direito.33H, portanto, uma valorizao da razo prtica no

    mbito jurdico. Para o neoconstitucionalismo, no racional apenas aquilo que possa sercomprovado de forma experimental, ou deduzido more geometrico de premissas gerais, comopostulavam algumas correntes do positivismo. Tambm pode ser racional a argumentao

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    empregada na resoluo das questes prticas que o Direito tem de equacionar. 34 A idia deracionalidade jurdica aproxima-se da idia do razovel, e deixa de se identificar lgica formaldas cincias exatas.

    No neoconstitucionalismo, a leitura clssica do princpio da separao de poderes, que impunha

    limites rgidos atuao do Poder Judicirio, cede espao a outras vises mais favorveis aoativismo judicial em defesa dos valores constitucionais.35 No lugar de concepes estritamente

    majoritrias do princpio democrtico, so endossadas teorias de democracia mais substantivas,36

    que legitimam amplas restries aos poderes do legislador em nome dos direitos fundamentais e daproteo das minorias, e possibilitem a sua fiscalizao por juzes no eleitos. E ao invs de umateoria das fontes do Direito focada no cdigo e na lei formal, enfatiza-se a centralidade daConstituio no ordenamento, a ubiqidade da sua influncia na ordem jurdica, e o papel criativoda jurisprudncia.

    Ao reconhecer a fora normativa de princpios revestidos de elevada carga axiolgica, como

    dignidade da pessoa humana, igualdade, Estado Democrtico de Direito e solidariedade social, oneoconstitucionalismo abre as portas do Direito para o debate moral.37 certo que aqui resideuma das maiores divergncias internas nas fileiras do neoconstitucionalismo.

    De um lado, figuram os positivistas, como Luigi Ferrajoli,.38 Luiz Prietro Sanchs,.39 Ricardo

    Guastini .40e Suzana Pozzolo,.41que no aceitam a existncia de uma conexo necessria entreDireito e Moral, mas reconhecem que pode haver uma ligao contingente entre estas esferas,sempre que as autoridades competentes, dentre as quais se inclui o poder constituinte originrio,positivem valores morais, conferindo-lhes fora jurdica. Do outro, alinham-se os no-positivistas,

    como Ronald Dworkin,42Robert Alexy,43 Carlos Santiago Nino44 e seus seguidores, que afirmamque Moral e Direito tm uma conexo necessria, e aderem famosa tese de Gustav Radbruch, deque normas terrivelmente injustas no tm validade jurdica, independentemente do que digam as

    fontes autorizadas do ordenamento.45 Dentre estes autores, h quem insista na idia de que oDireito possui uma "pretenso de correo", pois de alguma maneira da sua essncia aspirar

    realizao da justia.46Contudo, na medida em que as constituies contemporneas entronizamcom prodigalidade os valores morais, este debate terico perde bastante em importncia, poismesmo os neoconstitucionalistas que se afirmam positivistas reconhecem a penetrao da Moral no

    tecido jurdico, sobretudo pela via dos princpios constitucionais.47 Trata-se do chamado

    positivismo inclusivo.48

    Neste quadro, embora me parea exagerado falar em superao da eterna querela entrejusnaturalistas e positivistas pela via do neoconstitucionalismo, no h dvida de que a relevnciaprtica da desavena consideravelmente diminuda. verdade que, para os positivistasinclusivos, o fundamento das normas revestidas de contedo moral ser sempre um ato deautoridade, validado por uma regra de reconhecimento aceita pela prtica da comunidade poltica.No final das contas, eles no se afastam do brocardo hobbesiano de que autoritas non veritas facitlegem. J para os no-positivistas, a vigncia dos princpios morais no decorrer de um "teste depedigree", mas de exigncias da prpria Moral, acessveis razo humana. Porm, para ambas aslinhas os valores morais includos nas constituies so jurdicos e devem produzir efeitos nomundo concreto.

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    No paradigma neoconstitucionalista, a argumentao jurdica, apesar de no se fundir com a Moral,abre um significativo espao para ela. Por isso, se atenua a distino da teoria jurdica clssica

    entre a descrio do Direito como ele , e prescrio sobre como ele deveria ser. 49 Os juzosdescritivo e prescritivo de alguma maneira se sobrepem, pela influncia dos princpios e valoresconstitucionais impregnados de forte contedo moral, que conferem poder ao intrprete para

    buscar, em cada caso difcil, a soluo mais justa, no prprio marco da ordem jurdica. Em outraspalavras, as fronteiras entre Direito e Moral no so abolidas, e a diferenciao entre eles,essencial nas sociedades complexas, permanece em vigor, mas as fronteiras entre os dois domniostornam-se muito mais porosas, na medida em que o prprio ordenamento incorpora, no seupatamar mais elevado, princpios de justia, e a cultura jurdica comea a "lev-los a srio".

    Porm, no h uma posio clara nas fileiras neoconstitucionalistas sobre a forma como devem sercompreendidos e aplicados os valores morais incorporados pela ordem constitucional, que, pela suavagueza e indeterminao, abrem-se a leituras muito diversificadas. No contexto das sociedadesplurais e "desencantadas" que existem no mundo contemporneo, este debate torna-se crucial,

    uma vez que no h mais consensos axiolgicos em torno das questes difceis que o Direito chamado a resolver. Este pluralismo mundivisivo torna invivel, pela falta de legitimidade, o usoda argumentao de cunho jusnaturalista, que apele religio, natureza ou metafsica, para

    equacionar as mais complexas controvrsias jurdicas.50

    Neste cenrio, h espao tanto para vises comunitaristas,51 que buscam na moralidade positiva enas pr-compreenses socialmente vigentes o norte para a hermenutica constitucional,endossando na seara interpretativa os valores e cosmovises hegemnicos na sociedade, como

    para teorias mais prximas ao construtivismo tico,52 que se orientam para uma moralidade

    crtica, cujo contedo seja definido atravs de um debate racional de idias, fundado em certospressupostos normativos, como os de igualdade e liberdade de todos os seus participantes. No hcomo identificar o neoconstitucionalismo com nenhuma destas posies, que marcam o importantedebate entre comunitarismo e liberalismo na filosofia poltica contempornea.

    Outro trao caracterstico do neoconstitucionalismo o seu foco no Poder Judicirio. O grandeprotagonista das teorias neoconstitucionalistas o juiz. O Direito analisado sobretudo a partir deuma perspectiva interna, daquele que participa dos processos que envolvem a sua interpretao eaplicao, relegando-se a um segundo plano a perspectiva externa, do observador. Esta obsessopelo Poder Judicirio leva a uma certa desconsiderao do papel desempenhado por outras

    instituies, como o Poder Legislativo, na interpretao constitucional. 53O juiz concebido como o

    guardio das promessas54 c i v i l i z a t r i a s d o s t e x t o s c o n s t i t u c i o n a i s , o q u e e x p e oneoconstitucionalismo a vrias crticas - que sero analisadas mais frente -, como de que seriaelitista e refratrio ao autogoverno popular.

    Por outro lado, o neoconstitucionalismo alenta um iderio humanista, que aposta na possibilidadede emancipao humana pela via jurdica, atravs de um uso engajado da moderna dogmtica

    constitucional.55 Neste sentido, ele se afasta de algumas linhas tericas da esquerda, como o

    marxismo,56a Critical Legal Studies norte-americana57 e o movimento do Direito Alternativo no

    Brasil,58que denunciavam o Direito como um instrumento de opresso e dominao a servio dosinteresses das classes favorecidas, mesmo quando apresentado sob o manto de uma retrica

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    legitimadora de legalidade e de direitos individuais universais.

    Trata-se, portanto, de uma teoria otimista - ou naive, diriam os seus crticos -, que tambm no se

    compadece com o desencanto ps-moderno,59 profundamente descrente em relao razo.

    Enquanto os ps-modernos criticam as "metanarrativas",60e buscam descontruir as elaboraes

    abstratas sobre as quais se fundou o Direito moderno - direitos humanos, liberdade, igualdade etc -os neoconstitucionalistas insistem no aprofundamento do projeto poltico da Modernidade, deemancipao pelo uso da razo, atravs dos instrumentos do Direito Constitucional, sobretudo osdireitos fundamentais.

    Vejamos, agora, como estas idias foram recebidas no Brasil.

    3 A recepo do neoconstitucionalismo no Brasil

    O processo histrico que se desenrolou na Europa Ocidental a partir do final da Segunda Guerra,no Brasil s teve incio aps a promulgao da Constituio de 88. verdade que j tnhamos

    controle de constitucionalidade desde a proclamao da Repblica. Porm, na cultura jurdicabrasileira de at ento, as constituies no eram vistas como autnticas normas jurdicas, nopassando muitas vezes de meras fachadas. Exemplos disso no faltam: a Constituio de 1824falava em igualdade, e a principal instituio do pas era a escravido negra a de 1891 institura osufrgio universal, mas todas as eleies eram fraudadas a de 1937 disciplinava o processolegislativo, mas enquanto ela vigorou o Congresso esteve fechado e o Presidente legislava pordecretos a de 1969 garantia os direitos liberdade, integridade fsica e vida, mas as prisesilegais, o desaparecimento forado de pessoas e a tortura campeavam nos pores do regimemilitar. Nesta ltima quadra histrica, conviveu-se ainda com o constrangedor paradoxo da

    existncia de duas ordens jurdicas paralelas: a das constituies e a dos atos institucionais, queno buscavam nas primeiras o seu fundamento de validade, mas num suposto poder revolucionrioem que estariam investidas as Foras Armadas.

    At 1988, a lei valia muito mais do que a Constituio no trfico jurdico, e, no Direito Pblico, odecreto e a portaria ainda valiam mais do que a lei. O Poder Judicirio no desempenhava umpapel poltico to importante, e no tinha o mesmo nvel de independncia de que passou a gozarposteriormente. As constituies eram prdigas na consagrao de direitos, mas estes dependiamquase exclusivamente da boa vontade dos governantes de planto para sarem do papel - o quenormalmente no ocorria. Em contextos de crise, as frmulas constitucionais no eram seguidas, e

    os quartis arbitravam boa parte dos conflitos polticos ou institucionais que eclodiam no pas.

    A Assemblia Constituinte de 1987/1988, que coroou o processo de redemocratizao do pas, quisromper com este estado de coisas, e promulgou uma Constituio contendo um amplo e generosoelenco de direitos fundamentais de diversas dimenses - direitos individuais, polticos, sociais edifusos - aos quais conferiu aplicabilidade imediata (art. 5, Pargrafo 1), e protegeu diante doprprio poder de reforma (art. 60, Pargrafo 4, IV). Alm disso, reforou o papel do Judicirio,consagrando a inafastabilidade da tutela judicial (art. 5, XXXV), criando diversos novos remdiosconstitucionais, fortalecendo a independncia da instituio, bem como do Ministrio Pblico, eampliando e robustecendo os mecanismos de controle de constitucionalidade. Neste ltimo tpico,

    ela democratizou o acesso ao controle abstrato de constitucionalidade, ao adotar um vasto elencode legitimados ativos para a propositura de ao direta de inconstitucionalidade (art. 103) e

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    a m p l i o u o e s c o p o d a j u r i s d i o c o n s t i t u c i o n a l , a o i n s t i t u i r n o Br a s i l o c o n t r o l e d ainconstitucionalidade por omisso, tanto atravs de ao direta como do mandado de injuno.

    Esta sistemtica de jurisdio constitucional adotada pelo constituinte favoreceu, em larga medida,o processo de judicializao da poltica, na medida em que conferiu a qualquer partido poltico comrepresentao no Congresso, s representaes nacionais da sociedade civil organizada e s

    principais instituies dos Estados-membros, dentre outras entidades, o poder de provocar o STF.61

    Assim, praticamente impossvel que alguma questo relevante seja resolvida no mbitoparlamentar sem que os perdedores no processo poltico recorram nossa Corte Suprema, paraque d a palavra final controvrsia, com base na sua interpretao da Constituio. E tal modelovem se aprofundando desde 88, com a criao da Ao Declaratria de Constitucionalidade e aregulamentao da Argio de Descumprimento de Preceito Fundamental.

    Alm disso, a Constituio de 88 regulou uma grande quantidade de assuntos - muitos deles deduvidosa dignidade constitucional - subtraindo um vasto nmero de questes do alcance do

    legislador. Ademais, ela hospedou em seu texto inmeros princpios vagos, mas dotados de fortecarga axiolgica e poder de irradiao. Estas caractersticas favoreceram o processo deconstitucionalizao do Direito, que envolve no s a incluso no texto constitucional de temasoutrora ignorados, ou regulados em sede ordinria, como tambm a releitura de toda a ordem

    jurdica a part ir de uma tic a paut ada pelos valore s cons ti tucion ais - a chamada fi ltragem

    constitucional do Direito.62

    Deve-se tambm destacar o papel importante da doutrina brasileira na mudana de paradigma doDireito Constitucional brasileiro Na minha opinio, h dois momentos distintos nesta evoluo: o

    "constitucionalismo brasileiro da efetividade" 63e o ps-positivismo constitucional.

    O primeiro momento vem logo aps a promulgao da Constituio de 88. Alguns autores, como

    Luis Roberto Barroso64 e Clmerson Merlin Clve,65 passam a advogar a tese de que aConstituio, sendo norma jurdica, deveria ser rotineiramente aplicada pelos juzes, o que atento no ocorria. O que hoje parece uma obviedade, era quase revolucionrio numa poca emque a nossa cultura jurdica hegemnica no tratava a Constituio como norma, mas como poucomais do que um repositrio de promessas grandiloqentes, cuja efetivao dependeria quase

    sempre da boa vontade do legislador e dos governantes de planto. 66 Para o constitucionalismo daefetividade, a incidncia direta da Constituio sobre a realidade social, independentemente de

    qualquer mediao legislativa, contribuiria para tirar do papel as proclamaes generosas dedireitos contidas na Carta de 88, promovendo justia, igualdade e liberdade. Se, at ento, odiscurso da esquerda era de desconstruo da dogmtica jurdica, a doutrina da efetividade vaidefender a possibilidade de um uso emancipatrio da dogmtica, tendo como eixo a concretizao

    da Constituio.67

    Na verdade, tratava-se de uma modalidade de "positivismo de combate".68 A d o u t r i n aconstitucional da efetividade no se caracterizava pela abertura do debate jurdico argumentaomoral. O seu foco principal centrava-se nas normas, e era do carter mais ou menos denso do seutexto que o intrprete deveria extrair os respectivos efeitos. Por outro lado, concebia-se a

    jurisdio como o espao privilegiado para a realizao da vontade constitucional. Um dos motes domovimento era afastar o estudo do Direito Constitucional da Teoria do Estado para aproxim-lo do

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    Direito Processual. Por isso, pode-se afirmar que o protagonista desta teoria constitucional era ojuiz.

    Em que pese a falta de efetividade de diversas normas da Constituio, e da eficcia social seletivade outras tantas - que protegem muito bem o includo, mas continuam deixando de fora os priasde sempre (veja-se a diferena da incidncia da inviolabilidade do domiclio nas residnciasburguesas e nas favelas) - pode-se dizer que a doutrina constitucional da efetividade teve xito noBrasil, no sentido de instalar no senso-comum dos operadores do Direito a idia de que aConstituio norma, que pode e deve ser aplicada, independentemente de regulamentao dosseus d isposit ivos pelo legislador ordinr io. Tal doutr ina a inda no corresponde aoneoconstitucionalismo, mas a conquista que dela resultou para a dogmtica constitucionalbrasileira foi um pressuposto para o surgimento deste outro movimento no nosso cenrio.

    O segundo momento importante o da chegada ao Brasil das teorias jurdicas ditas ps-positivistas. Foram marcos relevantes a publicao da 5 edio do Curso de Direito Constitucional,

    de Paulo Bonavides,69

    bem como do livroA Ordem Econmica na Constituio de 1988, de ErosRoberto Grau,70 que divulgaram entre ns a teoria dos princpios de autores como Ronald Dworkine Robert Alexy, e fomentaram as discusses sobre temas importantes, como a ponderao deinteresses, o princpio da proporcionalidade e eficcia dos direitos fundamentais. Tambm deve sersalientada a ampla penetrao, no mbito de algumas ps-graduaes em Direito, a partir demeados dos anos 90, do pensamento de filsofos que se voltaram para o estudo da relao entreDireito, Moral e Poltica, a partir de uma perspectiva ps-metafsica, como John Rawls e Jrgen

    Habermas.71 E ainda merece destaque o aprofundamento no pas dos estudos de hermenuticajurdica, a partir de uma nova matriz terica inspirada pelo giro lingstico na Filosofia, que

    denunciou os equvocos do modelo positivista de interpretao at ento dominante, assentado naseparao cartesiana entre sujeito (o intrprete) e objeto (o texto da norma).72

    Nesta nova fase, a doutrina brasileira passa a enfatizar o carter normativo e a importncia dosprincpios constitucionais, e a estudar as peculiaridades da sua aplicao. Neste contexto, h umaverdadeira febre de trabalhos sobre teoria dos princpios, ponderao de interesses, teorias daargumentao, proporcionalidade e razoabilidade etc. Tambm cresce muito o interesse doutrinriopelos direitos fundamentais, sobretudo os direitos sociais. Se antes estes eram vistospreponderantemente como normas programticas, passa-se a discutir a sua eficcia jurdica apartir de novas bases, que incorporam ao debate a argumentao moral. Neste campo, a nfase na

    anlise dos enunciados normativos, que caracterizava a doutrina da efetividade, substituda poruma discusso marcada pela preocupao com valores e democracia, repleta de novas categorias,importadas sobretudo do Direito germnico, como o "mnimo existencial", a "reserva do possvel" e

    a "proibio do retrocesso".73

    E esta nova racionalidade se espraia para diversos ramos do Direito. No Direito Civil, 74Penal,75

    Administrativo, 76por exemplo, cada vez mais a doutrina emprega normas e valores constitucionaispara reler os institutos tradicionais, colorindo-os com novas tintas. E trata-se no apenas deaplicar diretamente as normas constitucionais especificamente voltadas para cada uma destas

    reas, como tambm de projetar sobre estes campos a influncia dos direitos fundamentais e dosprincpios mais gerais do nosso constitucionalismo, muitas vezes superando antigos dogmas edefinindo novos paradigmas.

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    Neste segundo momento, ocorre ainda uma significativa mudana no enfoque dos estudos sobrejurisdio constitucional no Brasil. Antes, os trabalhos nacionais sobre o tema se limitavambasicamente a discutir questes processuais, mas, a partir do final dos anos 90, diversos estudosincorporam outras perspectivas anlise da questo, dedicando ateno complexa problemtica

    da legitimidade democrtica do controle de constitucionalidade,77 tendo em vista a chamada

    "dificuldade contra-majoritria" do Judicirio.78 Num contexto como o nosso, em que a jurisdioconstitucional est prevista pelo prprio texto magno, o debate relevante do ponto de vista prticono o de t-la ou no, mas sim a forma como deve ser exercida. Dependendo do posicionamentoadotado, pode-se preconizar um maior ou menor grau de ativismo judicial, ou defender o ativismoem algumas reas, mas recus-lo em outras. Nesta nova agenda de discusses sobre a jurisdioconstitucional, a argumentao jurdica se entrelaa inevitavelmente com o debate de FilosofiaPoltica, abrindo espao para posies variadas, como os vrios matizes de procedimentalismo e de

    substancialismo que vm florescendo na doutrina brasileira.79 Dentre estas posies, no hdvida de que a mais identificada ao neoconstitucionalismo a substancialista, que compartilha

    com ele a crena numa ampla legitimidade do ativismo judicial em favor dos valoresconstitucionais.

    Apesar destas mudanas importantes que podem ser associadas ao neoconstitucionalismo, o uso daexpresso no Brasil mais recente, seguindo-se ampla difuso que recebeu na academiabrasileira a j citada obra Neoconstitucionalismo(s) , organizada por Miguel Carbonell e publicadaem 2003. De l para c, muito se tem escrito sobre o tpico e vrios autores nacionais aderiram

    explicitamente corrente, como Luis Roberto Barroso,80Lnio Luiz Streck, 81Antonio Cavalcanti

    Maia,82Ana Paula de Barcellos,83 Diogo de Figueiredo Moreira Neto,84Paulo Ricardo Schier,85

    Eduardo Moreira,86cio Otto Ramos Duarte87e Thomas Rosa de Bustamante.88Outros adotarampostura crtica sobre a nova perspectiva, como Jos Ribas Vieira, Dimitri Dimoulis89 e Humberto

    vila.90E pode-se notar, pela leitura dos trabalhos destes e de outros autores brasileiros, que hum relativo consenso na definio das caractersticas centrais do novo paradigma: valorizao dosprincpios, adoo de mtodos ou estilos mais abertos e flexveis na hermenutica jurdica, comdestaque para a ponderao, abertura da argumentao jurdica Moral, mas sem recair nascategorias metafsicas do jusnaturalismo, reconhecimento e defesa da constitucionalizao doDireito e do papel de destaque do Judicirio na agenda de implementao dos valores daConstituio.

    Estas novas idias j reverberam fortemente na jurisprudncia nacional, sobretudo do SupremoTribunal Federal, que, nos ltimos tempos, tem cada vez mais invocado princpios abertos nos seus

    julgamentos, recorrido ponderao de interesses e ao princpio da proporcionalidade comfreqncia e at se valido de referncias filosficas na fundamentao de decises. Alis, dignade nota a influncia da doutrina constitucional na atuao do Supremo Tribunal Federal. Ofenmeno relativamente recente, uma vez que, logo aps a promulgao da Constituio de 88,havia um profundo hiato entre o campo doutrinrio, que cobrava a efetivao da Constituio pelavia judicial, e a jurisprudncia do STF, tmida e reticente diante dos valores e das inovaes danova Carta - v.g. orientao ento adotada pela Corte em relao ao mandado de injuno e ao

    controle judicial das medidas provisrias. Aquele quadro podia em parte ser debitado duvidosaopo do constituinte originrio de manter no STF os ministros nomeados durante o governomilitar, que no tinham sintonia poltico-ideolgica nem boa vontade diante do novo sistema

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    constitucional, e que por isso se apegavam a vises e interpretaes assentadas durante o regimepretrito, muitas delas francamente incompatveis com a nova ordem. Mas hoje, aps a completarenovao do STF, constata-se um quadro radicalmente diferente: a maioria dos ministros do STF composta por professores de Direito Constitucional, de grande reputao acadmica, que, atpela origem, tm mais contato com a produo intelectual de ponta na rea e so mais suscetveis

    influncia das novas correntes de pensamento.

    Como ressaltado, esta mudana de paradigma se reflete vivamente na jurisprudncia do STF. Soexemplos eloqentes a alterao da posio da Corte em relao aos direitos sociais, antes

    tratados como "normas programticas", e hoje submetidos a uma intensa proteo judicial, 91o

    reconhecimento da eficcia horizontal dos direitos fundamentais,92 a mutao do entendimento do

    Tribunal em relao s potencialidades do mandado de injuno, 93e a progressiva superao daviso clssica kelseniana da jurisdio constitucional, que a equiparava ao "legislador negativo",

    com a admisso de tcnicas decisrias mais heterodoxas,94 c o m o a s d e c l a r a e s d e

    inconstitucionalidade sem pronncia de nulidade e as sentenas aditivas. E para completar oquadro, deve-se acrescentar as mudanas acarretadas por algumas inovaes processuais recentesna nossa jurisdio constitucional, que permitiram a participao dos amici curiae, bem como arealizao de audincias pblicas no mbito do processo constitucional, ampliando a possibilidade

    de atuao da sociedade civil organizada no STF.95

    Naturalmente, a nova postura de ativismo judicial do STF estimula as foras sociais a procur-locom mais freqncia e contribui para uma significativa alterao na agenda da Corte. Atualmente,ao lado das questes mais tradicionais de Direito Pblico, o STF tem se defrontado com novostemas fortemente impregnados de contedo moral, como as discusses sobre a validade de

    pesquisa em clulas-tronco embrionrias,96aborto de feto anencfalo97 e unio entre pessoas domesmo sexo.98 Ademais, o Tribunal passou a intervir de forma muito mais ativa no processopoltico, adotando decises que se refletem de forma direta e profunda sobre a atuao dos demaispoderes do Estado. Para citar apenas alguns casos, pode-se falar da deciso que assentou que a

    mudana de partido implica, salvo determinadas excees, perda de mandato parlamentar99 daque estabeleceu critrios rgidos para a fixao do nmero de vereadores de acordo com a

    respectiva populao,100e da intensificao do controle jurisdicional dos atos das CPIs, bem comodos pressupostos de edio das medidas provisrias.

    Porm, h um componente curioso na recepo deste novo paradigma jurdico pelo Judiciriobrasileiro. Embora ainda no existam estudos empricos a este respeito, tenho a forte intuio deque a penetrao destas novas idias associadas ao neoconstitucionalismo forte na cpula e nabase da hierarquia judicial, mas ainda tmida nos seus escales intermedirios. E as causas no sode difcil compreenso. Em relao cpula - os ministros do STF -, as razes j foram explicadasacima. J no que tange base do Judicirio, boa parte dos juzes de 1 grau teve a sua formaonum ambiente acadmico que j valorizava o Direito Constitucional, e reconhecia a foranormativa dos direitos fundamentais e dos princpios constitucionais. Assim, eles tendem a levarpara a sua prtica profissional esta viso do Direito. Porm, sobretudo na 2 instncia, compostamajoritariamente por magistrados que se formaram e foram socializados no seu meio institucionalsob a gide do paradigma jurdico anterior, muito mais voltado para os cdigos e para a letra da leido que para a Constituio e seus princpios, h maior resistncia incorporao dos novos vetores

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    constitucionais. Contudo, este fenmeno tende a diminuir com o tempo, seja pela consolidao doparadigma constitucional emergente, seja pela promoo de magistrados mais antenados com onovo constitucionalismo, seja at pela influncia do pensamento e das orientaes da cpula doJudicirio sobre todas as suas instncias.

    No cenrio brasileiro, o neoconstitucionalismo tambm impulsionado por outro fenmeno: adescrena geral da populao em relao poltica majoritria, e, em especial, o descrdito no

    Poder Legislativo e nos partidos polticos.101 A percepo geral, alimentada por sucessivosescndalos e pelo discurso de alguns meios de comunicao social, de que a poltica parlamentar epartidria so esferas essencialmente corrompidas, que se movem exclusivamente em torno deinteresses e no de valores, gera em alguns setores a expectativa de que a soluo para os

    problemas nacionais possa vir do Judicirio.102 E este sentimento fortalecido quando a Justiaadota decises em consonncia com a opinio pblica - como ocorreu no recebimento da dennciacriminal no caso do "mensalo", na definio de perda do mandato por infidelidade partidria, e naproibio do nepotismo na Administrao Pblica.

    Por outro lado, a ascenso institucional do Judicirio e a riqueza e importncia prtica ou simblicados temas que ele vem julgando tem provocado um grande aumento no interesse da sociedadepelo Direito Constitucional e pela atuao do Supremo Tribunal Federal. difcil um dia em que osprincipais meios de comunicao no discutam alguma deciso da Corte ou manifestao dequalquer dos seus membros. E este fenmeno potencializado tanto pela "extroverso miditica"de alguns ministros, como tambm pelo fato - sem precedentes em outros pases - dotelevisionamento das sesses do STF. Com tudo isso, as questes constitucionais, que antes eramapenas discutidas dentro de um crculo muito restrito de iniciados, hoje so amplamente debatidasno espao pblico.

    Neste quadro, em que pesem as mltiplas resistncias que sofre, possvel apontar a emergnciade uma nova forma de conceber o Direito e o Estado na sociedade brasileira contempornea, que,se quisermos adotar a terminologia hoje em voga, pode ser chamada de neoconstitucionalismo.

    4 Trs objees ao neoconstitucionalismo

    Nas prximas linhas, abordarei, de maneira breve, trs crticas que podem ser levantadas contra oneoconstitucionalismo: (a) a de que o seu pendor judicialista anti-democrtico (b) a de que asua preferncia por princpios e ponderao, em detrimento de regras e subsuno, perigosa,

    sobretudo no Brasil, em razo de singularidades da nossa cultura e (c) a de que ele pode geraruma panconstitucionalizao do Direito, em detrimento da autonomia pblica do cidado e da

    autonomia privada do indivduo. Outras crticas importantes existem,103 mas por limites de tempoe espao, preferi priorizar aqui estas trs, que so as que geram maior apreenso no cenriobrasileiro.

    a) Neoconstitucionalismo e "judiciocracia"

    Como salientado acima, o neoconstitucionalismo tem um foco muito centrado no Poder Judicirio,no qual deposita enormes expectativas no sentido de concretizao dos ideais emancipatrios

    presentes nas constituies contemporneas. Contudo, este vis judicialista sofre contestaes peloseu suposto carter antidemocrtico, na medida em que os juzes, diferentemente dosparlamentares e chefes do Executivo, no so eleitos e no respondem diretamente perante o

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    povo.104

    Esta crtica democrtica se assenta na idia de que, numa democracia, essencial que as decisespolticas mais importantes sejam tomadas pelo prprio povo ou por seus representantes eleitos eno por sbios ou tecnocratas de toga. verdade que a maior parte dos tericos contemporneos

    da democracia reconhece que ela no se esgota no respeito ao princpio majoritrio, pressupondoantes o acatamento das regras do jogo democrtico, que incluem a garantia de direitos bsicos,visando a viabilizar a participao igualitria do cidado na esfera pblica, bem como alguma

    proteo s minorias.105Porm, temos aqui uma questo de dosagem, pois se a imposio dealguns limites para a deciso das maiorias pode ser justificada em nome da democracia, o exagerotende a revelar-se antidemocrtico, por cercear em demasia a possibilidade do povo de se

    autogovernar.106

    E a questo no apenas de diviso de poder ao longo do tempo. A dificuldade democrtica noest to-somente no fato de as constituies subtrarem do legislador futuro a possibilidade de

    tomar algumas decises.107O cerne do debate est no reconhecimento de que, diante da vaguezae abertura de boa parte das normas constitucionais mais importantes, quem as interpreta tambm

    participa do seu processo de criao.108 Da a crtica de que o vis judicialista subjacente aoneoconstitucionalismo acaba por conferir aos juzes uma espcie de poder constituintepermanente, pois lhes permite moldar a Constituio de acordo com as suas preferncias polticase valorativas, em detrimento daquelas do legislador eleito. Esta viso levou inmeras correntes depensamento ao longo da histria a rejeitarem a jurisdio constitucional, ou pelo menos o ativismo

    judicial no seu exerccio, dos revolucionrios franceses do sculo XVIII,109 passando por Carl

    Schmitt,110na Repblica de Weimar, at os adeptos do constitucionalismo popular nos Estados

    Unidos de hoje.111

    No Brasil, muito comum traar-se um paralelo entre a defesa do ativismo judicial e posiessociais progressistas. Talvez isso se deva ao fato de que, na nossa histria, o Judicirio brasileirotem pecado muito mais por omisso, acumpliciando-se diante dos desmandos dos poderes poltico eeconmico, do que por excesso de ativismo. Neste quadro, quem ousa questionar possveisexageros na judicializao da poltica e da vida social no Brasil de hoje logo tachado deconservador. Porm, o paralelismo em questo no existe. Muitas vezes, o Poder Judicirio podeatuar bloqueando mudanas importantes promovidas pelos outros poderes em favor dos excludos,

    defendendo o statu quo. E esta defesa pode ocorrer inclusive atravs do uso da retrica dosdireitos fundamentais.

    Isso se deu, por exemplo, nos Estados Unidos nas primeiras dcadas do sculo passado, em perodo

    que ficou conhecido como Era de Lochner,112quando a Suprema Corte impediu sistematicamente aedio de legislao trabalhista e de outras medidas que implicavam em interferncia na esferaeconmica em proveito das classes desfavorecidas, com base numa leitura substantiva da clusula

    do devido processo legal. No cenrio contemporneo, Ran Hirshl113 sustenta que o processo dejudicializao da poltica que vem ocorrendo nos ltimos anos em diversos pases do mundo - elefez um atento, ainda que controvertido, estudo dos casos do Canad, Israel, frica do Sul e Nova

    Zelndia -, teria como pano de fundo uma tentativa das elites econmicas e culturais, queperderam espao na poltica majoritria, de manterem o seu poder, reforando no arranjo

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    Estou convencido de que o Poder Judicirio tem um papel essencial na concretizao daConstituio brasileira. Em face do quadro de sistemtica violao de direitos de certos segmentosda populao, do arranjo institucional desenhado pela Carta de 88, e da sria crise derepresentatividade do Poder Legislativo, entendo que o ativismo judicial se justifica no Brasil, pelomenos em certas searas, como a tutela de direitos fundamentais, a proteo das minorias e a

    garantia do funcionamento da prpria democracia. O maior insulamento judicial diante da pressodas maiorias, bem como um certo ethos profissional de valorizao dos direitos humanos, que

    comea a se instalar na nossa magistratura, 121 conferem ao Judicirio uma capacidade

    institucional privilegiada para atuar nestas reas.122

    Mas, em outros campos, pode ser mais recomendvel uma postura de autoconteno judicial, seja

    por respeito s deliberaes majoritrias adotadas no espao poltico,123seja pelo reconhecimentoda falta de expertise do Judicirio para tomar decises que promovam eficientemente os valoresconstitucionais em jogo, em reas que demandem profundos conhecimentos tcnicos fora do

    Direito - como Economia, polticas pblicas e regulao.124Nestes casos, deve-se reconhecer queoutros rgos do Estado esto mais habilitados para assumirem uma posio de protagonismo naimplementao da vontade constitucional.

    Nesta linha, vejo com reticncias a sedimentao, na nossa cultura jurdica, da viso de que o

    grande - seno o nico - intrprete da Constituio seria o Poder Judicirio. 125 Esta leituradescarta a autoconteno judicial bem como tende a desprezar a possibilidade de que sejamtravados construtivos dilogos interinstitucionais entre diversos rgos estatais para a definio da

    melhor interpretao dos ditames constitucionais.126Um bom exemplo127deste desvio ocorreu nojulgamento da constitucionalidade das pesquisas em clulas-tronco embrionrias realizada peloSTF, em que pese o resultado final do julgamento ter sido substancialmente correto. Naquelaocasio, o importante argumento deduzido na tribuna e em memoriais por Luis Roberto Barroso -que advogava para um dos amici curiae favorveis s pesquisas -, de que o Judicirio deveriaadotar posio cautelosa no julgamento da constitucionalidade da lei impugnada, tendo em vista oamplo consenso em torno dela obtido durante o processo legislativo, tanto no Senado como naCmara, foi explicitamente rechaado por alguns ministros, que consideraram o ponto irrelevante.E outros ministros, em votos vencidos, se sentiram confortveis at para defender a imposio denovas normas pelo STF na rea do Biodireito, arvorando-se condio de legisladores num campopara o qual, evidentemente, lhes faltava qualquer expertise.

    Enfim, o neoconstitucionalismo brasileiro tem pecado por excesso, depositando no Judicirioexpectativas que ele nem sempre ter como atender de forma satisfatria. Um dos efeitoscolaterais deste fenmeno a disseminao de um discurso muito perigoso, de que voto e polticano so to importantes, pois relevante mesmo a interpretao dos princpios constitucionaisrealizada pelo STF. Da a dizer que o povo no sabe votar um pulo, e a ditadura de toga podeno ser muito melhor do que a ditadura de farda.

    b) Neoconstitucionalismo, "oba-oba constitucional" e Estado Democrtico de Direito

    Seria uma profunda injustia com a teoria neoconstitucionalista acus-la de promover odecisionismo ou de defender a tomada de decises judiciais puramente emotivas, sem lastro emargumentao racional slida. Pelo contrrio, como foi destacado acima, um dos eixos centrais do

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    pensamento neoconstitucional a reabilitao da racionalidade prtica no mbito jurdico, com aarticulao de complexas teorias da argumentao, que demandam muito dos intrpretes esobretudo dos juzes em matria de fundamentao das suas decises. Porm, a prtica judiciriabrasileira recepcionou apenas parcialmente as teorias jurdicas de corte ps-positivista, e, aqui, avalorizao dos princpios e da ponderao no tem sido muitas vezes acompanhada do necessrio

    cuidado com a justificao das decises.

    Se, at no muito tempo atrs, os princpios no eram tratados como autnticas normas por aqui -s tinha bom direito quem podia invocar uma regra legal clara e precisa em favor da sua pretenso- com a chegada do ps-positivismo e do neoconstitucionalismo, passou-se em poucos anos dagua para o vinho. Hoje, instalou-se um ambiente intelectual no Brasil que aplaude e valoriza asdecises principiolgicas, e no aprecia tanto aquelas calcadas em regras legais, que so vistas

    como burocrticas ou positivistas - e positivismo hoje no pas quase um palavro.128 Nestecontexto, os operadores do Direito so estimulados a invocar sempre princpios muito vagos nassuas decises, mesmo quando isso seja absolutamente desnecessrio, pela existncia de regra

    clara e vlida a reger a hiptese. Os campees tm sido os princpios da dignidade da pessoahumana e da razoabilidade. O primeiro empregado para dar imponncia ao decisionismo judicial,vestindo com linguagem pomposa qualquer deciso tida como politicamente correta, e o segundopara permitir que os juzes substituam livremente as valoraes de outros agentes pblicos pelassuas prprias.

    Este cenrio problemtico porque um sistema jurdico funcional, estvel, e harmnico com osvalores do Estado Democrtico de Direito, precisa tanto da aplicao de regras como de

    princpios.129 As regras so indispensveis, dentre outras razes,130 porque geram maiorprevisibilidade e segurana jurdica para os seus destinatrios diminuem os riscos de erro na suaincidncia, j que no dependem tanto das valoraes do intrprete em cada caso concretoenvolvem um menor custo no seu processo de aplicao, pois podem incidir de forma maismecnica, sem demandarem tanto esforo do intrprete e no implicam, na mesma medida que osprincpios, em uma transferncia de poder decisrio do Legislativo, que eleito, para o Judicirio,que no .

    No pretendo sustentar com isso que se deva retroceder ao tempo em que os princpios no eramaplicados pelos juzes brasileiros. Tambm os princpios so essenciais na ordem jurdica, poisconferem mais plasticidade ao Direito - o que essencial numa sociedade hiper-complexa como a

    nossa - e permitem uma maior abertura da argumentao jurdica Moral e ao mundo empricosubjacente. O importante encontrar uma justa medida, que no torne o processo de aplicao doDireito amarrado demais, como ocorreria num sistema baseado exclusivamente em regras, nemsolto demais, como sucederia com um que se fundasse apenas em princpios. Penso que chegada

    a hora de um retorno do pndulo no Direito brasileiro,131 que, sem descartar a importncia dosprincpios e da ponderao, volte a levar a srio tambm as regras e a subsuno.

    Ademais, naquelas hipteses em que a aplicao de princpios for realmente apropriada, ela devedar-se de forma mais racional e fundamentada. Deve-se adotar a premissa de que quanto maisvaga for a norma a ser aplicada, e mais intenso o componente volitivo envolvido no processo

    decisrio, maior deve ser o nus argumentativo do intrprete, no sentido de mostrar que a soluopor ele adotada a que melhor realiza os valores do ordenamento naquele caso concreto. 132 A

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    tendncia atual de invocao frouxa e no fundamentada de princpios colide com a lgica doEstado Democrtico de Direito, pois amplia as chances de arbtrio judicial, gera insegurana

    jurdica e atropela a diviso funcional de poderes, que tem no iderio democrtico um dos seusfundamentos - a noo bsica de que as decises sobre o que os cidados e o Estado podem e nopodem fazer devem ser tomadas preferencialmente por quem represente o povo e seja por ele

    escolhido.

    E h na sociedade brasileira traos que tornam ainda mais perigosa esta tendncia frouxido e

    emotividade na metodologia jurdica. Nossa cultura caracteriza-se muito mais pelo "jeitinho"133 e

    pelo patrimonialismo134 do que pela valorizao do cumprimento impessoal de regras. O brasileiro

    - j dizia Srgio Buarque de Holanda135 - o "homem cordial", que tende a antepor a lgicaprivada do compadrio e da simpatia racionalidade objetiva das leis. Esta singularidade das nossasrelaes sociais no atua de forma neutra em relao a todos os cidados. Ela implica na adoo deposturas estatais em geral muito benevolentes em relao aos donos do poder e seus apanigados,

    e de posies muito mais duras dirigidas aos grupos excludos e marginalizados.136

    Uns poucosacabam pairando acima das leis, que no os alcanam para limitar a sua conduta ou sancionar osseus desvios, enquanto outros permanecem abaixo dela, sendo atingidos apenas pelo braopunitivo do Estado, pois a violao rotineira dos seus direitos naturalizada, tornando-se invisvel.

    Neste quadro, cabe indagar, sob a perspectiva de uma sociologia da interpretao constitucional,at que ponto a introduo entre ns de uma "dogmtica fluida" - a expresso de Gustavo

    Zagrebelsky,137 um dos cones do neoconstitucionalismo - no pode ter como efeito colateral oagravamento de patologias que marcam as nossas relaes sociais. Ser que o nosso Direitoprecisa de mais rigidez ou de maior maleabilidade? Ao fim e ao cabo, quem tende a se beneficiar

    com a adoo de uma hermenutica jurdica mais flexvel?

    Uma reflexo importante sobre tema correlato foi empreendida por Marcelo Neves,138a partir das

    categorias da teoria sistmica de Niklas Luhman. Para Luhman,139em apertada sntese, o Direito,

    nas hipercomplexas sociedades modernas, seria autopoitico,140pois consistiria num subsistemasocial estruturalmente fechado em relao ao meio envolvente, que operaria de acordo com umcdigo binrio prprio - o lcito/ ilcito. As influncias do meio envolvente sobre o Direito seriamfiltradas atravs deste cdigo, assegurando a autonomia da esfera jurdica diante dos outrossubsistemas sociais, como a Economia, a Poltica, a Religio etc. Contudo, Marcelo Neves sustenta

    que em sociedades perifricas, como o Brasil, no se desenvolveu plenamente este fechamentoestrutural do Direito. Por aqui, fatores como a nossa "constitucionalizao simblica" geraram umainsuficiente diferenciao do Direito em relao a outros subsistemas sociais, permitindo queelementos a princpio estranhos ao cdigo binrio do jurdico - como a questo do poder poltico edo poder econmico - se infiltrem sistematicamente nos processos de aplicao das normas,condicionando o seu resultado. A teoria dos sistemas de Luhman no funcionaria bem entre ns,pois teramos um Direito em boa parte alopoitico.Para tal perspectiva, esta maior abertura doDireito ao meio envolvente no assume o potencial emancipatrio preconizado pela teorianeoconstitucionalista. Ela funciona muito mais como um mecanismo de cristalizao de diferenassociais, mantendo a hiper-incluso de uns, ao preo da excluso de outros.

    Esta reflexo de Marcelo Neves no se dirigiu ao debate metodolgico contemporneo envolvendoprincpios e regras, ponderao e subsuno etc. Porm, entendo que ela pode ter alguma

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    antidemocrtico. Esta ordem de preocupaes levou Ersnt Forsthof, na Alemanha, a criticar asteorias que viam a Constituio como uma espcie de "genoma jurdico (...) do qual tudo deriva, do

    Cdigo Penal at a lei sobre a fabricao de termmetros"144. E a questo torna-se ainda maisdelicada diante da constatao de que, pela abertura semntica dos direitos fundamentais e dosprincpios - principal matria-prima da constitucionalizao do Direito - o seu principal agente

    acaba sendo o Poder Judicirio, ao dar a ltima palavra sobre a interpretao daquelas clusulas.Da porque, o debate sobre a constitucionalizao do Direito se imbrica inexoravelmente com asdiscusses a propsito da judicializao da poltica e do decisionismo, referidas acima.

    Ademais, a constitucionalizao do Direito tambm suscita outra linha de preocupaes,

    relacionada ao perfeccionismo moral145na esfera privada. No Brasil, assim como em muitos outrospases, j se assentou a idia de que os direitos fundamentais no se dirigem apenas contra oEstado, vinculando tambm os particulares. Entre ns tem prevalecido na doutrina a idia, que eu

    mesmo defendi em outro estudo,146 que a eficcia dos direitos fundamentais nas relaes privadas direta e imediata. Em outras palavras entende-se que a prpria Constituio j incide nasrelaes privadas, independentemente de mediaes legislativas, e que pode gerar obrigaespositivas ou negativas para os indivduos e no s para os poderes pblicos, sempre no af deproporcionar uma proteo mais completa dignidade humana. At aqui, nada a contestar.

    Porm, o reconhecimento da vinculao dos particulares Constituio suscita um risco que nopode ser ignorado: o de imposio s pessoas, supostamente em nome de valores constitucionais,de comportamentos e estilos de vida que elas prprias rejeitam, em detrimento da sua liberdadeexistencial. Para dar um exemplo bem tosco, seria terrvel se o Direito, em nome do princpio dasolidariedade social, pudesse impor s pessoas que demonstrassem afetos e sentimentos que elas

    no possuem genuinamente. Ou se, em nome da isonomia, pretendesse interferir nas escolhassubjetivas e emocionais que os indivduos fazem nas suas vidas privadas. A constitucionalizao,neste sentido, poderia converter-se num pretexto para o exerccio de um paternalismo anti-liberal,em que as pessoas seriam foradas a conformarem-se s expectativas sociais forjadas a partir de

    pautas de ao "politicamente corretas", com apoio na Constituio.147

    Nenhuma destas duas questes insupervel. possvel aceitar e aplaudir a constitucionalizaodo Direito - fenmeno em geral positivo, por aproximar a racionalidade emancipatria daConstituio do dia-a-dia das pessoas -, mas defender que ela seja temperada por outraspreocupaes igualmente essenciais no Estado Democrtico de Direito, com a autonomia pblica e

    privada dos cidados. Pode-se reconhecer a legitimidade da constitucionalizao do Direito, masnuma medida em que no sacrifique em excesso liberdade de conformao que, numa

    democracia, deve caber ao legislador para realizar opes polticas em nome do povo.148Pode-se,da mesma forma, afirmar a incidncia direta da Constituio nas relaes privadas, mas seminvadir a esfera das opes existenciais da pessoa - que, de resto, protegida pela prpria

    Constituio das ingerncias perfeccionistas do Estado e da sociedade.149

    5 Concluso

    Ao fim da leitura destas pginas, o leitor pode estar se indagando se eu me alinho ou no ao

    neoconstitucionalismo. A minha resposta : depende da compreenso que se tenha sobre oneoconstitucionalismo. Se entendermos o neoconstitucionalismo de acordo com a conhecida

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    definio de Luis Prietro Sanchs, como uma teoria do Direito que se orienta pelas mximas de"msprincpios que reglas ms ponderacin que subsuncin omnipotencia de la Constitucin en todaslas reas jurdicas y en todos conflictos mnimamente relevantes, en lugar de espacios exentos enfavor de la opcin legislativa o reglamentaria omnipotencia judicial en lugar de autonomia dellegislador ordinrio y, por ultimo, coexistncia de una constelacin plural de valores, a veces

    tendencialmente contradictorios, en lugar de homogeneidad ideolgica",150certamente eu no meconsidero um neoconstitucionalista. De todas as afirmaes do professor espanhol, a nica de queno discordo aquela relacionada ao pluralismo de valores, cujo reconhecimento, alis, est longede ser privilgio dos neoconstitucionalistas.

    Contudo, eu assumo o rtulo, sem constrangimentos, se o neoconstitucionalismo for pensado comouma teoria constitucional que, sem descartar a importncia das regras e da subsuno, abratambm espao para os princpios e para a ponderao, tentando racionalizar o seu uso. Se forvisto como uma concepo que, sem desprezar o papel protagonista das instncias democrticas nadefinio do Direito, reconhea e valorize a irradiao dos valores constitucionais pelo

    ordenamento, bem como a atuao firme e construtiva do Judicirio para proteo e promoo dosdireitos fundamentais e dos pressupostos da democracia. E, acima de tudo, se for concebido como

    uma viso que conecte o Direito com exigncias de justia e moralidade crtica,151 sem enveredarpelas categorias metafsicas do jusnaturalismo.

    Certamente, uma viso equilibrada da Teoria do Direito com tais caractersticas pode contribuirpara o aperfeioamento do Estado Democrtico de Direito no Brasil. O mesmo j no digo deconcepes mais radicais do neoconstitucionalismo, que podem ser muito boas para arrancaraplausos entusiasmados das platias nos seminrios estudantis, mas que no se conciliam comexigncias fundamentais de segurana jurdica, democracia e liberdade, que so alicerces dequalquer bom constitucionalismo - novo ou velho.

    1Sobre a teoria de princpios no Brasil, veja-se, dentre outros, Ana Paula de Barcellos. A eficciajurdica dos princpios constitucionais: o princpio da dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro:Renovar, 2002 Humberto Bergman vila. Teoria dos princpios: da definio aplicao dosprincpios jurdicos. 2. ed. So Paulo: RT, 2005 Jane Reis Gonalves Pereira. Interpretaoconstitucional e direitos fundamentais: uma contribuio ao estudo das restries aos direitosfundamentais na perspectiva da teoria dos princpios. Rio de Janeiro: Renovar, 2006 VirglioAfonso da Silva. O contedo essencial dos direitos fundamentais e a eficcia das normas

    constitucionais. So Paulo. Tese (concurso de Professor Titular de Direito Constitucional da USP).

    2Veja-se, em tons variados, Lnio Luiz Streck. Hermenutica jurdica e(m) crise: uma exploraohermenutica da construo do direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999 Lus RobertoBarroso (Org.). A nova interpretao constitucional:ponderao, direitos fundamentais e relaes

    privadas. Rio de Janeiro: Renovar, 2003 Margarida Maria Lacombe Camargo. Hermenutica eargumentao: uma contribuio ao estudo do direito. Rio de Janeiro: Renovar, 2003 InocncioMrtires Coelho. Interpretao constitucional. 2. ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris. 2003Ana Paula de Barcellos. Ponderao, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro:Renovar, 2005

    3Sobre o fenmeno da constitucionalizao do Direito, confira-se os inmeros artigos quecompem a coletnea organizada por Cludio Pereira de Souza Neto e por mim. A

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    constitucionalizao do direito: fundamentos tericos e aplicaes especficas. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2007.

    4Cfr., na literatura constitucional brasileira, Gisele Guimares Cittadino. Pluralismo, direito ejustia distributiva: elementos de filosofia constitucional contempornea. Rio de Janeiro: Lumen

    Juris, 1998 Oscar Vilhena Vieira. A Constituio e sua reserva de justia: um ensaio sobre oslimites materiais do poder de reforma. So Paulo: Malheiros, 1999 Ricardo Lobo Torres (Org.). Alegitimao dos direitos humanos. Rio de Janeiro: Renovar, 2002 Cludio Pereira de Souza Neto.Teoria constitucional e democracia deliberativa. Rio de Janeiro: Renovar, 2006 Lnio Luiz Streck.Verdade e consenso: Constituio, hermenutica e teorias discursivas. Rio de Janeiro: Lumen Juris,2006 Samantha Chantal Dobrowolski.A constru o social do sentid o da Con stit uio nademocracia contempornea: entre soberania popular e direitos humanos. Rio de Janeiro: LumenJ u r i s , 2 0 0 7 l v a r o R i c a r d o d e S o u z a C r u z . Hermenutica jurdica e(m) debate: oconstitucionalismo brasileiro entre a teoria do discurso e a ontologia existencial. Belo Horizonte:Frum, 2007.

    5Sobre a judicializao da poltica no Brasil, veja-se Luiz Werneck Vianna et al. A judicializao dapo l ti ca e da s rel a e s soc ia is no Br as il. Rio de Janeiro: Revan, 1999 Giselle Cittadino.Judicializao da poltica, constitucionalismo democrtico e separao de poderes. In: Luiz WerneckVianna (Org.).A democracia e os trs poderes no Brasil. Belo Horizonte: UFMG, 2002. p. 17-42Rogrio B. Arantes. Constitucionalism, the expansion of Justice and the Judicialization of Poltics inBrazil. In: Rachel Sieder Line Schjolden Alan Angell. The Judicialization of Politics in Latin

    America. New York: Palgrave Macmillan, 2005. p. 232-262 Luis Roberto Barroso. Judicializao,ativismo judicial e legitimidade democrtica. Texto indito, gentilmente cedido pelo autor.

    Para uma perspectiva comparativa, veja-se Neal C. Tate Tobjorn Vallinder (Ed.). The GlobalExpansion of Judicial Power. New York: New York University Press, 1995 Alec Stone Sweet.Governing with Judges: Constitutional Politics in Europe. Oxford: Oxford Univesity Press, 2000 e,em tom profundamente crtico, Ran Hirschl. Towards Juristocracy: the Origins and Consequences ofthe New Constitucionalism. Cambridge: Harvard University Press, 2004.

    6Miguel Carbonell et al. Neoconstitucionalismo(s) . Madrid: Trotta, 2003. Mais recentemente, oautor publicou nova coletnea tambm dedicada ao estudo do neoconstitucionalismo intituladaTeoria del Neoconstitucionalismo: Ensayos escogidos. Madrid: Trotta, 2007.

    7O jurista argentino Carlos Santiago Nino, por exemplo, faleceu em 1993, quando ainda nem seempregava esta denominao.

    8Cf. Robert Alexy. Teoria da argumentao jurdica: a teoria do discurso racional como teoria dafundamentao jurdica. Traduo de Zilda Hutchinson Schild Silva reviso tcnica da traduo eintroduo edio brasileira Claudia Toledo. 2. ed. So Paulo: Landy, 2005 Luis Roberto Barroso.Curso de direito constitucional contemporneo: os conceitos fundamentais e a construo do novomodelo. Rio de Janeiro: Saraiva, 2008. p. 306-350.

    9

    Cf. Lnio Luiz Streck. Verdade e consenso. Op. cit., p. 197-246.10Ronald Dworkin e Carlos Santiago Nino so, sem sombra de dvida, autores liberais, no no

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    sentido que se atribui ao termo no Brasil - de adeptos de doutrina econmica favorvel ao Estadomnimo e ao mercado - mas sim no sentido corrente na Filosofia Poltica, que associa o liberalismo defesa dos direitos individuais e da neutralidade do Estado em relao s diversas concepessobre a "vida boa" existentes na sociedade. Veja-se, neste sentido, Ronald Dworkin. A Matter ofPrinciple. Cambridge: Harvard University Press, 1985. p. 181-236 Carlos Santiago Nino. La

    constitucin de la Democracia Deliberativa. Barcelona: Gedisa, 1997. p. 70-100.11Lnio Luiz Streck, que se alinha ao neoconstitucionalismo, defende posturas tipicamentecomunitaristas, como o papel da Constituio na definio de modelos de "vida boa" paraorientao da vida social e da ao individual. Cf. Jurisdio constitucional e hermenutica: umanova crtica do direito. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 95-288.

    12Antonio Cavalcanti Maia, um dos mais ardorosos defensores do neoconstitucionalismo no pas, tambm procedimentalista e adepto das teorias jurdicas de Jrgen Habermas. Veja-se, nestesentido, o seu denso texto "Nos vintes anos da carta cidad: do ps-positivismo ao

    neoconstitucionalismo". In: Cludio Pereira de Souza Neto Daniel Sarmento Gustavo Binenbojm(Coord.). Vinte anos da Constituio Federal de 1988. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 117-168, em que esta sua dupla filiao intelectual explicitada.

    13Segundo Miguel Carbonell, o neoconstitucionalismo desdobra-se em trs planos de anlise quese conjugam: o dos textos constitucionais, que se tornaram mais substantivos e incorporaramamplos elencos de direitos fundamentais o das prticas judiciais, que passaram a recorrer aprincpios constitucionais, ponderao e a mtodos mais flexveis de interpretao, sobretudo narea de direitos fundamentais e o dos desenvolvimentos tericos de autores que, com as suasidias, ajudaram no s a compreender os novos modelos constitucionais, mas tambm

    participaram da sua prpria criao. Cf. Miguel Carbonell. Neoconstitucionalismo: elementos parauna definicin. In: Eduardo Ribeiro Moreira Mauricio Pugliesi. 20 anos da Constituio brasileira.So Paulo: Saraiva, 2009. p. 197-208.

    14No mesmo sentido, Luis Roberto Barroso. Neoconstitucionalismo e Constitucionalizao dodireito: o triunfo tardio do direito constitucional do Brasil. In: Cludio Pereira de Souza NetoDaniel Sarmento.A constitucionalizao do direito: fundamentos tericos e aplicaes especficas.Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 203-250.

    15Cf. Carlos Bernal Pulido. El Derecho de los Derechos. Bogot: Universidad Externado deColmbia, 2006 Manoel Jose Cepeda Espinosa.Judicialization of Politics in Colombia: the old andthe new. In: Rachel Sieder, Line Schonjen Alan Angell. The Judicialization of Politics in LatinAmerica. Op. cit., p. 67-104 Rodrigo Uprimmy Maurcio Garcia-Villegas. Tribunal Constitucional eemancipao social na Colmbia. In: Boaventura de Souza Santos. Democratizar a democracia: oscaminhos da democracia participativa. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2002. p. 297-339.

    16Cf. Catalina Smulovitz. Petitioning and Creating Rights: Judicialization in Argentina. In: RachelSieder Line Scjolden Alan Angell. The Judicialization of Politics in Latin America. Op. cit., p. 161-185.

    17Cf. Miguel Carbonell. Los Derechos Fundamentales en Mxico. 2. ed. Mxico: Porra, 2006 PilarDomingo. The Changing Political Role of the Judiciary in Mxico. In: Rachel Sieder Line Scjolden

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    Alan Angell. The Judicialization of Politics in Latin Amrica. Op. cit., p. 21-46.

    18Cf. Heinz Klug. South frica: From Constitucional Promise to Social Transformation. In: JeffreyGoldsworthy. Interpreting Constitutions: A Comparative Study. Oxford: Oxford University Press,2006. p. 266-320.

    19Cf. S. P. Sathe. ndia: From Positivism to Structuralism. In: Jeffrey Goldsworthy. Op. cit., p.215-265.

    20Veja-se, a propsito, Gustavo Zagrebelsky. Il Diritto Mite. Torino: Einaudi, 1992. p. 57-96.

    21Cf. Eduardo Garca de Enterra. La Constitucin como Norma y el Tribunal Constitucional. 3. ed.Madrid: Civitas, 1985. p. 41.

    22Na Alemanha, a mudana ocorreu sob a vigncia da Lei Fundamental, adotada em 1949, e foifortemente impulsionada pela jurisprudncia do Tribunal Constitucional do pas, que construiuteorias importantes, como a da Constituio como uma ordem de valores, em cujo centro situa-seo princpio da dignidade humana, que se irradia por todo o ordenamento. Veja-se, a propsito,Dieter Grimm. Human Rights and Judicial Review in Germany. In: David M. Beatty (Org.). HumanRights and Judicial Review: A Comparative Perspective. Dodrecht: Martin Urjhoff, 1994. p. 267-295.

    23Na Itlia, as mudanas se deram sob a gide da atual Constituio, editada em 1947, mas saps o funcionamento da Corte Constitucional, que se deu em 1956. At ento, a Corte deCassao, composta por juzes recrutados ainda no perodo do fascismo, era provisoriamente

    encarregada da guarda da Constituio, o que fazia de forma muito tmida, no mais das vezesnegando eficcia jurdica s normas constitucionais, sob o argumento de que seriam programticas.Veja-se, a propsito, Ricardo Guastini. "A constitucionalizao do ordenamento jurdico e aexperincia italiana". In: Cludio Pereira de Souza Neto Daniel Sarmento.A constitucionalizaodo direito: fundamentos tericos e aplicaes especficas. Op. cit., p. 271-294.

    24Cf. No modelo do constitucionalismo norte-americano entende-se, desde os primrdios, que aConstituio autntica lei, e que o Judicirio pode invalidar as decises legislativas que acontrariem, apesar do controle de constitucionalidade no estar expressamente previsto no textoconstitucional daquele pas. Esta idia, que j estava assentada no Federalista n. 78, escrito por

    Alexander Hamilton antes da aprovao da Constituio, foi posta em prtica pela primeira vezcontra lei federal no clebre caso Marbury v. Madison, julgado em 1803 pelo juiz Marshall. Veja-se,a propsito, Paul Brest Sanford Levinson Jack Balkin Akhil Reed Amar. Processes ofConstitutional Decisionmaking: Cases and Materials. New York: Aspen Publishers, 2000. p. 79-103.

    A verso mais convencional do modelo constitucional norte-americano enfatiza a importnciacentral do Judicirio na atualizao do sentido da Constituio do pas. Contudo, esta leiturahistrica hoje objeto de intensa disputa. Em sentido contrrio a tal posio, sustentando umamenor relevncia do Judicirio no desenvolvimento histrico do constitucionalismo americano,veja-se, por exemplo, Stephen M. Griffin.American Constitutionalism: From Theory to Politics. New

    Jersey: Princeton University Press, 1996. p. 88-139.

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    25Cf. Luis Prietro Sanchs.Justicia Constitucional y Derechos Fundamentales. Madrid: Trotta, 2003.p. 107-117.

    26Cf. Daniel Sarmento. Ubiqidade constitucional: Os dois lados da moeda. In: Cludio Pereira deSouza Neto Daniel Sarmento (Coord.).A constitucionalizao do direito.... Op. cit., p. 113-148.

    27Na verdade, a reao contra o formalismo jurdico na Europa bem anterior ao advento doconstitucionalismo do 2 ps-guerra, remontando ao final do sculo XIX. Veja-se, a propsito,Constantin M. Stamatis. Argumenter en Droit: Une thorie critique de l'argumentation juridique.Paris: Publisud, 1995. p. 34-50 Antonio Manoel Hespanha. Panorama histrico da cultura jurdicaeuropia. Lisboa: Publicaes Europa-Amrica, 1997. p. 196-235.

    28H vasta literatura sobre a ponderao, mas a obra mais influente sobre o tema certamente olivro de Robert Alexy. Teoria dos direitos fundamentais. Traduo de Virglio Afonso da Silva. SoPaulo: Malheiros, 2008. No cenrio norte-americano, veja-se a anlise densa e crtica de T.

    Alexander Aleinikoff. Constitucional Law in the Age of Balancing. Yale Law Journal, n. 96, p. 943-1005, 1987. No Brasil, cfr. Daniel Sarmento. A ponderao de interesses na Constituio Federal.Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000 Ana Paula de Barcellos. Ponderao, racionalidade e atividade

    jurisdicional. Op. cit.,

    29A bibliografia sobre o princpio da proporcionalidade vastssima. Veja-se, a propsito, as densasanlises de Carlos Bernal Pulido. El Principio de Proporcionalidad y los Derechos Fundamentales.Madrid: Centro de Estdios Constitucionales, 2003, e, no Brasil, de Jane Reis Gonalves Pereira.Interpretaoconstitucional e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 297-382.

    30Cf. Cham Perelman. tica e direito. Traduo de Maria Ermantina Galvo G. Perira. So Paulo:Martins Fontes, 1996. p. 361-684 Robert Alexy. Teoria da argumentao jurdica. Op. citFriedrich Muller. Discours de la Mthode Juridique. Traduo de Olivier Jouanjan. Paris: PUF, 1993Manuel Atienza. Trs la Justicia: Una Introduccin al Derecho y al Razonamiento Jurdico.Barcelona: Ariel, 1995 Neil MacCormick.Argumentao jurdica e teoria do direito. Traduo deWalda Barcellos. So Paulo: Martins Fontes, 2006 Klaus Gnther. Teoria da argumentao nodireito e na moral: justificao e aplicao. Traduo de Cludio Molz. So Paulo: Landy, 2004.

    31Cf. Martin ShapiroAlec Stone Sweet. On Law, Politics and Judicialization. New York: OxfordUniversity Press. p. 136-208.

    32Contudo, deve-se admitir, na linha de Paolo Comanducci, que possvel reconhecer as mudanasem questo, e propor novas teorias que sejam adequadas a elas, sem defend-las. Esta seria, naspalavras do autor i ta l iano, a d i ferena entre o neoconsti tucional ismo "ter ico" e oneoconstitucionalismo "ideolgico", que no apenas constri teorias mais compatveis com os novosfenmenos, mas vai alm, sustentando a sua legitimidade e propugnando pelo seu aprofundamentoe expanso. Veja-se, a propsito, Paulo Comanducci. Formas de neoconstitucionalismo: Un anlisismetaterico. In: Miguel Carbonell (Ed.). Neoconstitucionalismo(s) . Op. cit., p. 75-98. Comoreconhece o prprio autor, tal distino baseia-se em uma semelhante acerca do positivismo,

    formulada por Norberto Bobbio, que fala em positivismo terico, ideolgico e metodolgico. Cf.Norberto Bobbio. O positivismo jurdico: lies de filosofia do direito. Traduo e notas de MarcioPugliesi et al. So Paulo: cone, 1995. p. 233-239.

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    33Cf. Ronald Dworkin. Is Law a Sistem of Rules. In: Ronald Dworkin (Ed.). Philosophy of Law.Oxford: Oxford University Press, 1971 Robert Alexy. Constitucionalismo discursivo. Traduo deLuiz Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

    34Cf. Robert Alexy. Derecho y Razn Prctica. Mxico: Distribuiciones Fontamara, 1993 Aulis

    Aarnio. Lo Racional como Razonable. Traduo de Ernesto Garzn Valds. Madrid: Centro deEstdios Constitucionales, 1991.

    35Cf. Aharon Barak. The Judge in a Democracy. New Jersey: Princeton University Press, 2006, p.213-260 Gustavo Zagrebelsky. Il Diritto Mite. Op. cit., p. 179-217.

    36Confronte-se, com perspectivas diferentes, Luigi Ferrajoli. O Estado de direito entre passado efuturo. In: Pietro Costa Danilo Zolo (Org.). Estado de direito: histria, teoria, crtica. Traduo deCarlo Alberto Dastoli. So Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 419-464 Elias Dias. Estado de Derecho

    y oc e a emocr t ca. a r : aurus, ona wor n. n ro uc on: e ora ea ngand the Majoritarian Premise. In: Freedom's Law: The moral reading of the American Constitution.Cambridge: Harvard University Press, 1996. p. 01-38 Gustavo Zagrebelsky. La Crucifixin y laDemocracia. Barcelona: Ariel, 1996 Cludio Pereira de Souza Neto. Teoria constitucional dademocracia deliberativa. Op. cit.

    37Cf. Ronald Dworkin. Introduction: The Moral Reading and the Majoritarian Premise. Op. cit.

    38Cf. Luigi Ferrajoli. El Garantismo y la Filosofia del Derecho. Bogot: Universidad Externado deColmbia, 2000.

    39Cf. Luis Pietro Sanchis. Sobre el Neoconstitucionalismo y sus Implicaciones. In: JusticiaConstitucional y Derechos Fundamentales. Op. cit., p. 101-135.

    40Cf. Ricardo Guastini. Sur la Validit de la Constitution du Point de Vue du Positivisme Juridique.In: Michel Troper Lucien Jaume (Dir.). 1789 et L'Invention de la Constitution. Paris: L.G.D.J, 1994.p. 216-225.

    41Cf. Suzana Pozzolo. Neoconstituzionalismo e Positivismo Giuridico. Torino: Giapppicheli, 2001.

    42Cf. Ronald Dworkin. Law and Morals. In: Justice in Robes. Cambridge: Harvard University Press,2006. p. 01-35

    43Cf. Robert Alexy. Derecho y Moral. In: La Institucionalizacin de la Justicia, Op. cit., p. 17-30.

    44Cf. Carlos Santiago Nino. tica y Derechos Humanos. 2. ed. Buenos Aires: Astrea, 1989. p. 11-48.

    45Cf. Gustav Radbruch. Cinco minutos de filosofia do direito. In: Filosofia do direito. Traduo de L.Cabral de Moncada. 6. ed. Coimbra: Armnio Amado, 1979. p. 414-418. Para uma densaproblematizao da "frmula de Radbruch", veja-se Thomas da Rosa Bustamante. Ps-Positivismo:o argumento da injustia alm da Frmula de Radbruch. In: Teoria do direito e deciso racional:temas de teoria da argumentao jurdica. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

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    Promesses: Le juge et la democratie. Paris: Odile Jacob, 1996.

    55Neste sentido, o eloqente encerramento do Curso de Direito Constitucional Contemporneo deLuis Roberto Barroso: "...o constitucionalismo democrtico a utopia que nos restou. Uma fracional que ajuda a acreditar no bem e na justia, ainda quando no estejam ao alcance dos

    olhos" (Op. cit., p. 400).56Cf. Nico Poulantzas. State, Power, Socialism. London: new Left Books, 1978 Alan Hunt. MarxistTheory of Law. In: Dennis Patterson (Ed.). A Companion to Philosophy of Law and Legal Theory.Malden: Blackwell Publishers, 1996. p. 355-367.

    57Cf. David Kairys (Ed.). The Politics of Law: A Progressive Critique. New York: Pantheon Books,1982 Roberto Mangabeira Unger. The Critical Legal Studies Movement. Cambridge: HarvardUniversity Press, 1986.

    58

    Cf. Plauto Faraco Azevedo. Crtica dogmtica e hermenutica jurdica. Porto Alegre: SergioAntonio Fabris, 1989 Luiz Fernando Coelho. Teoria crtica do direito. 2. ed. Porto Alegre: SergioAntonio Fabris, 1991.

    59No h como abordar aqui as relaes entre as inmeras correntes do ps-modernismo e oDireito Constitucional. Veja-se, a propsito, Niklas Luhman. La Constituzione como AcquisizioneEvolutiva. In: Gustavo Zagrebelsky Per Paolo Portinaro Jrg Luther. Il Futuro della Costituzione.Torino: Einaudi, 1996. p. 83-128 Jos Joaquim Gomes Canotilho. Civilizao do direitoconstitucional ou constitucionalizao do direito civil?: a eficcia dos direitos fundamentais naordem jurdico-civil no contexto do direito ps-moderno". Cadernos de Direito Constitucional e

    Cincia Poltica, n. 15, p. 07-16, 1996 Eduardo Capellari.A crise da modernidade e a Constituio.Rio de janeiro: Amrica Jurdica, 2004 Daniel Sarmento. Direitos fundamentais e relaes

    privadas. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 36-45.

    60Para Jean-Franois Lyotard., uma das caractersticas centrais do pensamento ps-moderno, deque expoente, a desconfiana em relao s metanarrativas - construes abstratas,grandiosas e totalizadoras, tpicas da Filosofia Moderna, como "direitos humanos", "luta de classes"e "emancipao pelo uso da razo". Cf. Lyotard. A condio ps-moderna. Traduo de RicardoCorra Barbosa. 5. ed. 1998. p.16.

    61Cf. Luiz Werneck Viana. O terceiro poder na carta de 1988 e a tradio republicana: mudana econservao. In: Ruben George Oliven Marcelo Gildo Maral Branda.A Constituio de 1988 navida brasileira. So Paulo: Aderaldo e Rotshild, 2008. p. 91-109.

    62Cf. Paulo Ricardo Schier. Filtragem constitucional. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1999.

    63A expresso foi cunhada por Cludio Pereira de Souza Neto. Fundamento e normatividade dosdireitos fundamentais: uma reconstruo terica luz do princpio democrtico.Arquivos deDireitos Humanos, n. 4, p. 17-61, 2003.

    64Cf. Luis Roberto Barroso. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 3. ed. Rio deJaneiro: Renovar, 1996.

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    65Cf. Clmerson Merlin Clve. A teoria constitucional e o direito alternativo: para uma dogmticaconstitucional emancipatria. In: Uma vida dedicada ao direito: homenagem a Carlos Henrique deCarvalho. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 34-53.

    66Ressalte-se, porm, que antes de 88, alguns juristas j defendiam a fora normativa da

    Constituio, como o Prof. Jos Afonso da Silva. de 1968 a primeira edio da sua obra clssica:A aplicabilidade das normas constitucionais, que adotava claramente esta perspectiva. Todavia, peloclima nada propcio ao constitucionalismo que reinava por aqui at a nossa redemocratizao, alouvvel pregao dele e de outros juristas em prol da efetivao da Constituio no chegou arender maiores frutos.

    67Deve-se assinalar, ainda, a influncia marcante do novo constitucionalismo ibrico nestemovimento, que tambm pugnava pela atribuio de fora normativa s ambiciosas constituiesde Portugal e Espanha, ento recentemente elaboradas, aps o fim de experincias autoritriasnaqueles pases. A ttulo de exemplo, mencione-se a penetrao no pas do pensamento do

    Professor de Coimbra Jos Joaquim Gomes Canotilho, especialmente da sua teoria sobre aConstituio dirigente, que ele posteriormente reviu. (cf. J. J. Gomes Canotilho. Constituiodirigente e vinculao ao legislador: contributo para a compreenso das normas constitucionaisprogramticas. 2. ed. Coimbra: Coimbra, 2001 - especialmente o prefcio desta segunda edio,que d conta da mudana de posicionamento), bem como a difuso das lies do Professor EduardoGarca de Enterra (cf. La Constitucin como Norma y el Tribunal Constitucional. Madrid: Civitas,1981).

    68Segundo a avaliao atual de Luis Roberto Barroso, personagem central do movimento, " opositivismo constitucional, que deu impulso ao movimento, no importava em reduzir o direito norma, mas sim em elev-la a esta condio, pois at ento ele havia sido menos do que norma "(Curso de direito constitucional contemporneo..., Op. cit., p. 224).

    69Paulo Bonavides. Curso de direito constitucional. 5. ed. So Paulo: Malheiros, 1994.

    70Eros Roberto Grau.A ordem econmica na Constituio de 88: interpretao e crtica. So Paulo:Revista dos Tribunais, 1996.

    71No mbito da Ps-Graduo em Direito da UERJ, em que estou inserido desde 1997, primeirocomo aluno, e a partir de 2003 como professor, o Ricardo Lobo Torres teve papel central na difusodo pensamento destes e de outros filsofos entre os estudantes e o prprio corpo docente.

    72Cf. Lnio Luiz Streck. Hermenutica jurdica e(m) crise. Op. cit. Eros Roberto Grau. Ensaio ediscurso sobre a interpretao/aplicao do direito. So Paulo: Malheiros, 2002.

    73Nesta linha, veja-se as obras que compem a coletnea Cludio Pereira de Souza Neto DanielSarmento. Direitos sociais: fundamentos, judicializao e direitos sociais em espcie. Rio deJaneiro: Lumen Juris, 2008 Ricardo Lobo Torres. O mnimo existencial e os direitos fundamentais.Revista de Direito Administrativo, n. 177, p. 20-49, 1989 Ingo Wolfgang Sarlet. A eficcia dos

    direitos fundamentais. 9. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008 Ana Paula de Barcellos. Aeficcia jurdica dos princpios: o princpio