86
1 Boaventura Gune Docente da Faculdade de Direito da UEM Das Obrigações em Moçambique Vol. I Introdução

Das Obrigações Em Moçambique, Vol. I - Introdução

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Direito das obrigações moçambicano

Citation preview

As circunstncias desta obraA produo desta obra ocorreu em determinadas circunstncias e num dado contexto histrico, pelo que tem interesse clarificar, partida, essas circunstncias e esse contexto, bem como a razo justificativa dessa produo.

Na distribuio do servio docente do ano acadmico de 2008, na Faculdade de Direito da Universidade Eduardo Mondlane, foi-nos confiada a regncia da cadeira de Direito das Obrigaes, deixando assim, dali em diante, a da cadeira de Introduo ao Estudo do Direito, que a detnhamos at a, desde 1995.

Porque assumimos esta tarefa de reger o Direito das Obrigaes pela primeira vez nessa altura, isso obrigou-nos a dar pblico testemunho da planificao que seguimos e dos principais elementos de estudo que sugerimos aos nossos estudantes.

Partindo do Plano Temtico que nos foi ento facultado pela chefia do Departamento das Cincias Jurdicas, - rea cientfica em que se situa a cadeira de Direito das Obrigaes -, traamos um programa analtico e colocmo-lo disposio da Direco Pedaggica da Faculdade e tambm dos estudantes, seguindo-o depois, religiosamente, na ministrao das matrias.Nos anos acadmicos subsequentes, fomos aperfeioando esse programa analtico, sempre com o propsito de oferecer mais e melhores subsdios ou elementos de estudo aos nossos estudantes.

Assim, por nos ter parecido a mais acertada didacticamente, em ateno aos objectivos que tnhamos em vista, adoptmos, na explanao das matrias preliminares constantes do referido programa, a sistemtica que se segue.

Primeiro tratamos da denominao da Disciplina e do ramo de Direito de cujo estudo esta se ocupa.

Cuidamos depois e sucessivamente, dos sentidos ou acepes da expresso Direito das Obrigaes, do conceito, da importncia e da razo da insero do Direito das Obrigaes no plano curricular do curso jurdico.Chegados a este ponto, discutimos a problemtica da posio do Direito das Obrigaes nos sistemas em que se insere e no Curricula da nossa Faculdade, a FDUEM.

Resolvida essa parte do posicionamento do Direito das Obrigaes nos sistemas de que parte, desenvolvemos a temtica das suas fontes - as fontes do Direito das Obrigaes -, o que nos permitiu localizar o assento legal e a sistemtica deste ramo de Direito no desenho legislativo moambicano.

S depois de munidos deste manancial de informaes que abordmos a temtica das caractersticas do Direito das Obrigaes e passamos em revista as relaes deste com outros ramos do edifcio jurdico, i. , do Direito.

Concluda essa abordagem, enunciamos e caracterizamos, no todos os seus princpios, mas to s os que reputamos de estruturantes deste ramo de Direito.Com esta abordagem, damos por concluda a introduo ao estudo do Direito das Obrigaes moambicano.Boaventura Gune

Terminologia adoptada

Como dissemos oportunamente, a designao oficial desta nossa disciplina Direito das Obrigaes. Trata-se de uma terminologia consagrada na lei e sedimentada na Doutrina, que, no entanto, no a vamos adoptar, preferindo inovar: em ateno nacionalidade do autor, a designao ser Das Obrigaes em Moambique.

Plano Temtico da obra

0.1. Da denominao da disciplina dogmtica e do ramo de Direito de cujo estudo esta se ocupa.

0.2. Dos sentidos ou acepes da expresso Direito das Obrigaes.

0.3. Do conceito de Direito das Obrigaes.

0.4. Da importncia do Direito das Obrigaes.

0.5. Da razo da insero do Direito das Obrigaes no plano curricular do curso jurdico.

0.6. Da posio do Direito das Obrigaes nos sistemas em que se insere.

0.7. Da posio do Direito das Obrigaes no Curricula da FDUEM.

0.8. Das fontes do Direito das Obrigaes.

0.9. Do assento legal e da sistemtica do Direito das Obrigaes no desenho legislativo moambicano.

0.10. Das caractersticas do Direito das Obrigaes.

0.11. Das relaes do Direito das Obrigaes com outros ramos do Direito.

0.12. Dos princpios estruturantes do Direito das Obrigaes.

Plano Analtico da obraCaptulo I

Do Direito das Obrigaes enquanto Disciplina Dogmtica e enquanto ramo de DireitoSeco I

Da denominao da disciplina dogmtica e do ramo de Direito de cujo estudo se ocupaSeco II

Dos sentidos ou acepes da expresso Direito das ObrigaesSeco III

Do conceito de Direito das ObrigaesSeco IV

Das razes da insero do Direito das Obrigaes no plano curricular do curso jurdico

Seco V

Da posio do Direito das Obrigaes nos sistemas em que se insere

Seco VI

Da posio do Direito das Obrigaes no curricula da FDUEMSeco VII

Das relaes do Direito das Obrigaes com outras disciplinas dogmticas e outros ramos do DireitoCaptulo II

Do Objecto e da Importncia do Direito das ObrigaesSeco I

Do mbito do Direito das Obrigaes como ramo de DireitoSeco II

Da relevncia prtica do Direito das Obrigaes como ramo de Direito

Seco III

Do mbito do Direito das Obrigaes como disciplina dogmtica

Seco IV

Da relevncia do Direito das Obrigaes como disciplina dogmticaCaptulo III

Das Fontes do Direito das ObrigaesSeco I

Das acepes da expresso Fontes do Direito das ObrigaesSeco II

Da tipologia das fontes do Direito das ObrigaesSeco III

Da caracterizao das fontes do Direito das Obrigaes

Subseco I

Da Constituio como fonte do Direito das ObrigaesSubseco II

Do Cdigo Civil como fonte do Direito das ObrigaesSubseco III

Da Legislao Avulsa como fonte do Direito das ObrigaesSubseco IV

Dos Tratados Internacionais como fonte do Direito das ObrigaesSubseco V

Do Costume como fonte do Direito das ObrigaesSubseco VI

Da Jurisprudncia como fonte do Direito das ObrigaesSubseco VII

Da Doutrina como fonte do Direito das ObrigaesSubseco VIII

Dos Princpios Gerais do Direito das ObrigaesSeco IV

Da Hierarquia das fontes do Direito das Obrigaes

Captulo IV

Do Assento Legal e da Sistemtica do Direito das Obrigaes no desenho legislativo moambicanoSeco I

Assento legal do Direito das ObrigaesSeco II

Sistemtica do Direito das ObrigaesCaptulo V

Das Caractersticas do Direito das ObrigaesSeco I

Enunciado geralSeco II

Da explicitao sumria de cada caractersticaSubseco I

Da Integrao no Direito CivilSubseco IIDa Privacidade ou privaticidade

Subseco IIIDa Patrimonialidade tendencialSubseco IVDa Diversidade substancial

Subseco V

Da natureza supletiva do Direito das Obrigaes

Captulo VI

Dos Princpios Estruturantes do Direito das ObrigaesSeco I

Enunciado geralSeco II

Caracterizao de cada princpioSubseco I

Do Princpio da Autonomia PrivadaSubseco II

Do Princpio da Boa F ou da colaborao intersubjectivaSubseco III

Do Princpio da Ressarcibilidade do DanoSubseco IV

Do Princpio da Responsabilidade PatrimonialSubseco V

Do Princpio da Restituio do IndevidoFIM DO VOLUME ICAPTULO IDO DIREITO DAS OBRIGAES ENQUANTO DISCIPLINA DOGMTICA E ENQUANTO RAMO DE DIREITOSeco I

Da denominao da disciplina e do ramo de DireitoO estudo de cada fenmeno natural ou social nas academias levado a cabo, sempre, atravs de uma determinada disciplina dogmtica a que se atribui uma certa designao, que escolhida em ateno ao respectivo objecto de estudo.

No caso vertente, temos logicamente uma disciplina dogmtica que vai ocupar-se de um determinado fenmeno social, as leis que regulam as situaes jurdico-obrigacionais , e essa disciplina tem a sua prpria designao, como bvio, importando agora saber qual , da que a indicmos a seguir.

A designao oficial desta nossa cadeira ou disciplina, segundo o Plano Curricular, Direito das Obrigaes.Porqu esta denominao? Porque o ramo de Direito de cujo estudo ela se ocupa igualmente baptizado pelo legislador do C.C moambicano e tambm por todos os outros dos cdigos civis dos pases do sistema romano-germnico, portanto, onde o Direito est codificado , com este nome de Direito das Obrigaes.

Em face desta denominao, uma questo se suscita, a de saber se no poderia ser outra a denominao a atribuir a esta disciplina e mesmo ao ramo de Direito que a corresponde. A resposta a de que poderia ser sim usar-se outra, uma vez que ao lanarmos o nosso olhar sobre a doutrina jurdica internacional, constatamos que no s esta a designao que se pode usar para nominar tanto o ramo de Direito em abordagem como a prpria disciplina curricular que do seu estudo se ocupa, pois, existe uma outra que adoptvel para o mesmo efeito: a de Direito de Crdito.Ora, sendo certo que poderia usar-se igualmente esta ltima, isso significa que estas expresses tm um aspecto que as une, quer dizer, tm uma zona de interseco. Mas ao que nos parece, embora elas tenham algo que as une, o facto de serem duas designaes , por si s, indicativo da existncia de uma diferena entre elas. Importa ento perguntar qual a sua a zona de intercesso e qual tambm a fronteira ou diferena entre uma e outra.

Ainda na mesma linha de pensamento, de perguntar-se tambm porqu a doutrina e o legislador optaram pela expresso Direito das Obrigaes, no lugar da de Direito de Crdito.

Vejamos de seguida as razes dessa opo.

A expresso Direito das Obrigaes, que foi adoptada pelo legislador do Cdigo Civil moambicano e tambm pelos legisladores de alguns outros cdigos civis dos pases do sistema romano-germnico, exprime o ponto de vista desses legisladores na anlise de uma dada situao jurdica, ponto de vista esse que consiste em evidenciar o lado passivo dessa situao jurdica, consubstanciada na existncia de um vnculo que liga entre si duas pessoas, investidas nas posies de devedor e de credor.

J a expresso Direito de Crdito, que at no tem consagrao legislativa mas uma certa sedimentao doutrinria nos sistemas romansticos, reflecte a lgica contrria adoptada pelo legislador do Cdigo Civil moambicano, nomeadamente a de partir do lado passivo de uma situao jurdica para a anlise dessa mesma situao.

Com efeito, e contrapondo-se expresso Direito das Obrigaes, a expresso Direito de Crdito evidencia o lado activo da situao jurdica, pois, refere-se ao poder que a lei confere ao titular activo da situao jurdica em anlise, o credor , de exigir do sujeito passivo dessa mesma situao, o devedor , a adopo de um determinado comportamento positivo ou negativo, que se traduza na realizao de uma prestao a que esse sujeito passivo est vinculado.

Quer isto dizer que as duas expresses analisam a mesma situao jurdica e, neste sentido, pode dizer-se que so iguais em contedo, porque dizer Direito das Obrigaes equivale, em certa medida, a dizer Direito de Crdito.

Portanto, o contedo destas expresses, que a situao jurdica que constitui seu objecto de anlise, , pois, a zona de interseco entre elas.Mas elas apresentam entre si, realmente, uma certa diferena, que cumpre assinalar. Elas diferem entre si to s em razo do ngulo ou do prisma que adoptam para a anlise de uma mesma situao jurdica, diferem sim quanto ao lado da situao jurdica em que cada uma coloca o acento tnico da sua anlise: a expresso Direito das Obrigaes coloca-o no lado passivo da situao jurdica sub-jdice, por contraposio de Direito de Crdito que o coloca no lado activo dessa mesma situao.

, como se v, no que acabamos de dizer que consiste a distino entre elas.

Face a esta certa destrina, pode perguntar-se qual delas mais acertada para nominar o ramo de Direito em questo e a prpria disciplina curricular que do estudo desse ramo se ocupa. Por outras palavras, justifica-se indagar qual das designaes prefervel, porque mais correcta, para nominar o ramo de Direito e a cincia jurdica que do estudo desse ramo se ocupa.

Sendo certo que do ponto de vista do contedo elas so equivalentes ou iguais, diferindo apenas do prisma de abordagem que cada uma delas adopta na anlise do mesmo fenmeno, julgamos que em nada repugna o uso indiferenciado de uma ou de outra, para se reportar tanto ao ramo de Direito como disciplina que do seu estudo se ocupa.

Entendemos, em consequncia deste posicionamento adoptado , que no existem razes substanciais para afastar nem para preferir qualquer das expresses em anlise, designadamente Direito das Obrigaes e Direito de Crdito, pelo que podem ser usadas de modo indiferenciado ou indistinto.Considerando, no entanto, que o legislador do Cdigo Civil moambicano e mesmo a doutrina dominante tm usado a expresso Direito das Obrigaes por motivos de tradio histrica e no em razo da sua eventual prevalncia sobre a expresso Direito de Crdito, ns tambm usaremos aquela, sem que com isso estejamos a afastar esta ltima.

E usaremo-la em ateno ao facto de a mesma se mostrar mais consolidada na doutrina, quer dizer, mais sedimentada na literatura jurdica e at na jurisprudncia nacional e internacional.

Como esclarece o Prof. Almeida Costa e ns secundamos, a preferncia ou a opo pelo uso da expresso Direito das Obrigaes resulta to s do facto de a mesma estar dotada de uma maior sedimentao doutrinria, associada sua consagrao legislativa, e no de algum outro motivo que se prenda com a sua eventual prevalncia sobre a de Direito de Crdito, seja no plano do contedo, seja no do prisma de anlise.

Assim, e em concluso, podemos afirmar que o uso indiferenciado destas expresses para nominar, quer o ramo de Direito quer a disciplina curricular que do seu estudo se ocupa, no suscita nenhum problema jurdico tanto nos planos legislativo e jurisprudencial como no cientfico ou dogmtico.

Seco II

Dos sentidos ou acepes da expresso Direito das Obrigaes

O facto de a nossa disciplina designar-se Direito das Obrigaes e o ramo de Direito de cujo estudo esta se ocupa tambm designar-se Direito das Obrigaes, significa que esta expresso admite mais de uma acepo, portanto equvoca ou, se quisermos, polissmica.Em ateno a este aspecto, podemos afirmar que a expresso comporta duas acepes, sendo uma ligada ao Direito quando concebido como subsistema normativo e outra igualmente ligada ao Direito mas entendido como cincia jurdica.Propomos designar normativa, objectiva ou tcnico-jurdica a acepo do Direito como subsistema de normas, e acadmica, cientfica ou epistemolgica, a acepo do Direito como cincia jurdica.

Queremos com isto dizer que a expresso Direito das Obrigaes pode ser entendida em dois sentidos, designadamente, o tcnico jurdico, o objectivo ou o normativo por um lado, e o acadmico, o cientfico ou o epistemolgico por outro.

Tomada no sentido normativo ou tcnico-jurdico, a expresso Direito das Obrigaes reporta-se ao ramo do Direito objectivo, mais concretamente, ao sub-ramo do Direito Civil , que tem por objecto de regulao as situaes jurdico-obrigacionais, que tambm se designam por relaes de crdito.Por outras palavras, Direito das Obrigaes, entendido neste sentido objectivo, o segmento normativo integrado no hemisfrio do Direito Privado, que disciplina as relaes de crdito ou relaes obrigacionais. , portanto, a totalidade das leis ou das normas jurdicas que regulam as relaes relativas constituio, modificao, transmisso e extino das obrigaes: este o sentido que a expresso assume quando a tomamos no contexto dos ramos de Direito ou seja, no contexto da sistemtica geral do Direito, bem como no do Direito Civil, visto como ramo autnomo do Direito.

Mas quando tomada na sua acepo epistemolgica, cientfica ou acadmica, a expresso Direito das Obrigaes no tem aquele sentido de segmento normativo ou ramo do Direito objectivo, ela reporta-se j disciplina juscientfica ou seja, ao ramo da cincia jurdica que se ocupa do estudo das tais normas jurdicas reguladoras das situaes jurdico-obrigacionais, que faz a elaborao sistemtica dos elementos ou solues que so facultados por aquelas normas reguladoras das relaes de crdito: este o sentido que a expresso assume no contexto acadmico, no plano curricular ou seja, no plano da cincia jurdica, como disciplina dogmtica.

Desta polissemia da expresso resulta concluir-se que ela no tem em si mesma um sentido prprio, uma significao especfica concreta. Ela ganha essa significao a partir do contexto situacional ou frasal em que estiver inserida. Assim, o seu sentido exacto, em cada caso concreto em que ela empregue, s pode ser extrado do respectivo contexto frasal. Cumpre explicitar este entendimento, ilustrando-o, de seguida, atravs de algumas frases em que a empregamos.

Vejamos.Se por exemplo, nos limitamos a pronunciar as palavras Direito das Obrigaes, sem as fazer anteceder nem posceder por nenhumas outras, no se poder entender se com aquela mesma expresso nos referimos ao ramo de Direito ou ao ramo da cincia jurdica. Assim como a expresso se apresenta, ela neutra, pelo que pode, convencionalmente, ser preenchida com qualquer dos dois significados possveis acima indicados: Direito das Obrigaes como ramo de Direito ou Direito das Obrigaes como ramo da cincia jurdica, isto , como disciplina curricular.

Mas j em contextos como O Livro II do nosso C.C constitui o Direito das Obrigaes, facilmente se entende que a expresso se reporta ao sub-sistema de normas jurdicas que formam o Livro II do Cdigo Civil moambicano, Livro esse que consubstancia um dos sub-ramo do Direito Civil, o denominado Direito das Obrigaes.

De igual modo, no contexto de uma frase como No novo Plano Curricular do nosso curso, o Direito das Obrigaes est no 3 ano e est dividido em dois semestres, o sentido da expresso Direito das Obrigaes, que decorre deste mesmo contexto, j no o de sub-sistema de normas jurdicas que formam o Livro II do Cdigo Civil moambicano, sim o de disciplina ou cadeira do curso de Direito.

Portanto, a expresso a mesma mas o significado que assume indiscutivelmente diferente, numa e noutra frase, em razo do respectivo contexto frasal.

Poderamos, aqui e agora, passar em desfile uma interminvel lista de frases ilustrando a polissemia da expresso, mas julgamos bastantes os exemplos apresentados, para comprovar o seguinte:

A expresso Direito das Obrigaes no tem em si mesma um significado ou sentido prprio.

Ela s ganha esse significado ou sentido no contexto de uma frase concreta, porque s nela que se pode vislumbrar se o seu uso, no caso vertente, se reporta ao ramo de Direito ou correspondente disciplina juscientfica.

Portanto, e em jeito de concluso, podemos dizer que a expresso Direito das Obrigaes de contedo varivel.Seco III

Do conceito de Direito das Obrigaes

A j visualizada polissemia ou ambiguidade desta expresso remete-nos constatao de que pergunta o que o Direito das Obrigaes, no se pode dar uma s resposta, pois, h que conceber esta expresso na sua acepo normativa ou tcnico-jurdica e h que igualmente a tomar na sua acepo epistemolgica, cientfica ou acadmica.

Do prisma de anlise em que ela fr tomada, resultar, em cada caso, um conceito de Direito das Obrigaes conectado com esse ngulo de anlise adoptado.

Teremos assim, por um lado, um Direito das Obrigaes - normas e, por outro, um Direito das Obrigaes - disciplina curricular ou dogmtica, quer dizer, uma cadeira do curso jurdico.

Na acepo normativa ou tcnico-jurdica, Direito das Obrigaes o ramo do Direito Privado ou sub-ramo do Direito Civil que regula as relaes ou situaes jurdico-obrigacionais. Quer dizer, visto nesta perspectiva normativa, objectiva ou tcnico-jurdica, o Direito das Obrigaes nada mais seno o segmento normativo que disciplina o processo da constituio, da modificao, da transmisso e da extino das obrigaes. Portanto, neste plano normativo ou legislativo, o Direito das Obrigaes assume-se como complexo de normas jurdicas reguladoras das relaes de crdito, das relaes obrigacionais ou seja, o ramo de direito objectivo que tem como seu escopo de regulao os direitos de crdito.

Entendido neste sentido de acervo normativo, o Direito das Obrigaes um dos principais instrumentos de regulao das relaes jurdico-privadas.

J na acepo epistemolgica, o Direito das Obrigaes uma cadeira curricular ou seja, uma disciplina juscientfica ou dogmtica que se ocupa do estudo das normas jurdicas reguladoras das relaes obrigacionais ou de crdito, dispondo, de modo sistemtico e em termos de cincia, dos elementos que so facultados por aquelas mesmas normas. Visto nesta perspectiva, o Direito das Obrigaes assume-se como um ramo do conhecimento, um ramo da cincia jurdica que tem a misso de delimitar rigorosamente as relaes creditrias ou obrigacionais a partir do estudo da origem, da evoluo, da aplicao e da eficcia das normas jurdico-obrigacionais, de forma a sistematizar os conceitos do fenmeno obrigacional.

Portanto, visto como disciplina juscientfica ou dogmtica, o Direito das Obrigaes uma rea do conhecimento cientfico e, mais concretamente, uma parte do saber jurdico.

Seco IV

Da razo da insero do Direito das Obrigaes no plano curricular do curso jurdicoPorqu a incluso da cadeira de Direito das Obrigaes no plano curricular do nosso curso? Ter sido casustica essa insero? Ou simplesmente um erro de quem concebeu o Plano do curso?Entendemos que no. Essa insero no foi nem uma obra do acaso nem erro de quem concebeu o plano do curso, existem razes justificativas do facto ou seja, houve e continua a haver pertinncia dessa insero, o que significa que a insero foi intencional porque justificada.Sabido j que h razoes e at pertinncia da insero desta cadeira no plano do curso, afigura-se necessrio saber quais so ento essas razes e qual essa pertinncia.Vejamo-las a seguir.A insero do Direito das Obrigaes no plano curricular do curso jurdico justifica-se, a nosso ver, por determinadas razes materiais e didcticas que cumpre, aqui e agora, apontar.As primeiras, isto , as razes materiais, relacionam-se com o nosso dia-a-dia, com o nosso ser e dever ser, enquanto que as segundas, isto , as didcticas, prendem-se com o nosso interesse de saber, de conhecer, de entender ou de perceber o Direito no seu todo e o Direito das Obrigaes em particular.

Assim, no plano material, portanto, olhando para o Direito das Obrigaes como ramo de Direito, relevam para a sua insero no curricula do nosso curso as seguintes razes:

A existncia no nosso pas de um crescente comrcio jurdico privado que reclama por uma regulao cada vez mais abrangente e moderna.

A existncia, no nosso pas, de um segmento normativo regulador do processo de nascimento, de modificao, de transmisso e de extino das obrigaes, no quadro desse comrcio jurdico privado.

A necessidade e a convenincia de regulao das relaes de crdito decorrentes do aludido comrcio jurdico.

J no plano didctico, portanto, olhando para o Direito das Obrigaes como ramo da cincia jurdica, relevam para essa insero razes como:

A relevncia do Direito das Obrigaes nessa formao, tendo em conta que o ncleo central do conhecimento jurdico, portanto, a sua compreenso condiciona e estimula, em certa medida, a compreenso de muitas das outras reas da cincia jurdica e do Direito objectivo.

A necessidade de formar juristas qualificados para intervir na vida social como Juzes, Procuradores, Advogados, Consultores, Notrios, Docentes e Investigadores, o que exige que os formandos percebam o Direito aplicvel s relaes obrigacionais, relaes estas que so parte integrante do conjunto das relaes sociais que o Direito, no seu todo, visa regular.

A necessidade do ensino desse mesmo Direito para facilitar a sua aplicao a casos concretos.

Chegados aqui, resta-nos dizer que a insero do Direito das Obrigaes no plano curricular do curso plenamente justificvel, em razo da sua utilidade enquanto acervo normativo e enquanto disciplina dogmtica ou cadeira do curso.

Seco V

Da posio do Direito das Obrigaes nos sistemas em que se insereNo quadro do estudo que estamos a fazer, pertinente localizar o Direito das Obrigaes nos sistemas de que parte, de forma a perceber a sua posio nesses sistemas e a identificar a rea da vida social em que ele actua como ramo de Direito, bem como o papel que joga tambm nessa vida social, enquanto cincia

E vimos j que ele tem uma dupla existncia: , por um lado, ramo de Direito, integrado no hemisfrio privado e, por outro, ramo da cincia jurdica.

Ora, enquanto ramo de Direito ou seja, enquanto sub-subsistema de normas jurdicas, o Direito das Obrigaes insere-se num sistema, o sistema normativo ou sistema de Direito. Em razo deste enquadramento, tem uma certa posio dentro do referido sistema.Mas quando apreciado como ramo da cincia jurdica, o Direito das Obrigaes j no se insere no sistema legislativo ou normativo, ele insere-se sim noutro sistema, que o sistema das cincias. Em razo deste novo enquadramento, ele adquire, obviamente, uma outra posio, dentro destoutro sistema.

Identificados j os sistemas em que ele se insere, h que saber qual ento a sua posio num e noutro sistema.Vejamos agora a sua posio no plano normativo ou legislativo, isto , na sistemtica geral do Direito, que o sistema do Direito.

Subseco I

Da posio do Direito das Obrigaes na sistemtica geral do Direito ponto assente na doutrina e na jurisprudncia, pelo menos no quadro da Famlia Jurdica Romano-Germnica, que o Direito desdobra-se, para efeitos do seu estudo e aplicao a casos concretos, em dois grandes hemisfrios, nomeadamente o Direito Pblico e o Direito Privado.

Sendo o objecto de regulao do Direito das Obrigaes o conjunto das relaes jurdico-obrigacionais ou de crdito, as quais se estabelecem entre sujeitos que agem em p de igualdade ou de coordenao, qualquer que seja o critrio empregue para a sua qualificao , ele assume-se como ramo do Direito Privado, quer pela natureza dos interesses que tutela, quer pela posio dos sujeitos nas situaes jurdicas em que ele intervm, quer ainda pela qualidade desses sujeitos intervenientes nessas mesmas situaes jurdico-obrigacionais.

Mas o Direito das Obrigaes no esgota todo o Direito Privado. Dentro deste ltimo, o Direito das Obrigaes um dos segmentos de um dos seus ramos, que precisamente o Direito Civil. Quer isto dizer que o Direito das Obrigaes um sub-ramo do Direito Civil.

Ora, o Direito Civil por sua vez, compreende, para alm do Direito das Obrigaes, outros segmentos ou sub-ramos, como sejam o Direito das Pessoas, o Direito das Coisas, o Direito da Famlia e o Direito das Sucesses.

Cada um destes segmentos tem o seu tipo prprio de relaes que regula, quer dizer, tem o seu objecto de regulao, portanto tem o seu campo de aplicao.

O Direito das obrigaes sub-ramo do Direito Civil porque as relaes que ele regula so de natureza particular, pelo que caiem no mbito deste ramo e no se integram nas matrias que so objecto dos Direitos Privados especiais, nomeadamente do Direito Comercial e do Direito de Trabalho.

Do exposto decorre a ilao de que na sistemtica geral do Direito, o Direito das Obrigaes assume-se como segmento normativo de natureza privada, inserida no Direito Civil como seu sub-ramo. No um ramo do Direito Pblico, mas do Direito Privado, j que as relaes que ele regula estabelecem-se entre particulares: esta a sua posio neste sistema, que o sistema normativo, tambm designado sistemtica geral do Direito ou, to s, sistema do Direito.

Vejamos agora a sua posio no sistema das cincias.

Subseco II

Da posio do Direito das Obrigaes no sistema das cincias

Dissemos j que como ramo do saber jurdico, o Direito das Obrigaes insere-se no sub-sistema da cincia jurdica e, portanto, no sistema das cincias, porque a cincia jurdica , como qualquer outra, parte deste sistema das cincias.

Dentre as diversas classificaes das cincias que existem, vamos adoptar, para o nosso propsito, a que as distingue em naturais, sociais e tcnicas.

A distino entre as cincias naturais, sociais e tcnicas ajuda a perceber o posicionamento do Direito das Obrigaes. Assim, dentro do sistema das cincias, e em ateno a esta classificao adoptada, a cincia do Direito em geral e a do Direito das Obrigaes em particular inserem-se no subsistema das cincias sociais, porque ocupam-se do estudo das normas jurdicas, isto , do estudo das leis e estas so fenmenos sociais, porque so parte da cultura humana, so produtos da sociabilidade humana.

No caso especfico do Direito das Obrigaes, ele ocupa-se do estudo das normas jurdicas reguladoras das relaes obrigacionais ou creditrias e estas normas so tambm, como todas as outras normas jurdicas, um aspecto da cultura humana, pelo que so fenmenos sociais.

Decorre disso a ilao de que no sistema geral das cincias, o Direito das Obrigaes tambm uma cincia social, como sucede com toda a cincia jurdica.

Esta portanto, a posio do Direito das Obrigaes no sistema das cincias.

Seco VI

Da posio do Direito das Obrigaes no Curricula da FDUEM

O Direito das Obrigaes leccionado na maioria das Escolas de Direito do nosso pas, mas o seu posicionamento curricular, em cada uma dessas Escolas e ao longo dos anos, no tem sido uniforme.

No plano curricular da FDUEM, o Direito das Obrigaes situou-se tradicionalmente, ora no 2 ano, ora no 3 ano, mas tendo sempre como antecedente imediato a Teoria Geral do Direito Civil, antecedida por sua vez pela Introduo ao Estudo do Direito.

No Curriculum vigente desde 2004 e que est paulatinamente a cessar essa vigncia, o Direito das Obrigaes esteve no 3 ano do curso.

J no Curriculum introduzido em 2010, que para alm de reduzir a durao do curso para trs anos, estava concebido para ser implementado com base em mtodos participativos ou centrados no estudante, a cadeira de Direito das Obrigaes desdobrou-se em Direito das Obrigaes I, leccionada no 1 semestre do 2 ano, e Direito das Obrigaes II, leccionada no semestre subsequente, continuando em qualquer caso antecedida na mesma pela Teoria Geral do Direito Civil, tambm desdobrada em I e II e leccionada em dois semestres subsequentes ao 1 ano. Neste mbito, o Direito das Obrigaes passou a ser ministrado em regime modular, como sucedeu com todas as outras cadeiras.

A insero desta disciplina no plano curricular e no ano jurdico indicado do curso, justificou-se, como dissemos, por razes de ordem material e outras de natureza didctica que, em sede prpria foram suficientemente expendidas.

Como oportunamente dissemos, quer no antigo plano curricular, quer no novo, o Direito das Obrigaes tem vindo a ser ministrado depois da Teoria Geral do Direito Civil que por sua vez precedeu a Introduo ao Estudo do Direito, em alinhamento ou posicionamento sequencial, pelas relaes de parentesco existentes entre estas trs cadeiras.

que, como se sabe, existe entre a Introduo ao Estudo do Direito, a Teoria Geral do Direito Civil e o Direito das Obrigaes, uma relao de continuidade e outra de contiguidade, nos respectivos objectos de estudo e no prprio estudo.

Esta afirmao que acabamos de fazer carece, naturalmente, de ser explicada, dada a sua complexidade, o que fazemos nos termos que se seguem.

A Introduo ao Estudo do Direito tem uma funo vestibular no curso jurdico, porque fornece aos formandos as noes jurdicas fundamentais pressupostas pelas cadeiras subsequentes e especiais desse mesmo curso, desempenhando por isso o papel de fundao de um edifcio em construo, a formao jurdica , da que ela apresenta em simultneo, uma tripla natureza, nomeadamente o carcter propedutico, o carcter enciclopdico e o carcter epistemolgico.

Entretanto, esta tarefa da Introduo ao Estudo do Direito no se esgota no final do programa desta cadeira leccionado no 1 ano do curso, ela recebida e concluda pela Teoria Geral do Direito Civil, na medida em que esta fornece aos formandos, igualmente, os conceitos fundamentais pressupostos pelas cadeiras especiais do curso que versam sobre o Direito Privado em geral e o Direito Civil em particular.Assim, enquanto que a Introduo ao Estudo do Direito sobrevoa todo o edifcio do Direito portanto, todos os ramos do Direito Pblico e do Direito Privado, bem como os de classificao hbrida para captar e tratar os conceitos fundamentais comuns a todas estas reas, a Teoria Geral do Direito Civil, como disciplina, sobrevoa to s o Direito Civil em particular e o Direito Privado em geral, e deles extrai o acervo conceitual e os princpios de interesse comum a todas as partes especiais do Direito Civil e a todo o Direito Privado, para os fornecer aos formandos.

Este facto tambm confere Teoria Geral do Direito Civil, em certa medida, uma natureza propedutica, enciclopdica e epistemolgica, ao concluir, no contexto especfico do Direito Privado, esta tarefa e a misso da Introduo ao Estudo do Direito.

Mas a Teoria Geral do Direito Civil no fica por aqui, ela vai mais longe, pois, depois de concluir aquela tarefa e a misso comeadas pela Introduo ao Estudo do Direito, ela inicia uma outra tarefa, que a da resoluo de casos concretos ou seja, a da aplicao prtica do Direito, o que lhe confere uma outra caracterstica: a dimenso dogmtica.

Porque propedutica, enciclopdica e epistemolgica por um lado e dogmtica por outro, a Teoria Geral do Direito Civil torna-se, assim, uma disciplina ambivalente.

Porque consideramos muito esclarecedor o pensamento do Prof. Menezes Cordeiro sobre a caracterizao da Teoria Geral do Direito Civil, decidimos o trazer aqui, a ttulo de sustentao do que expendemos.

Escreveu o ILUTRE MESTRE, a dado passo da sua explanao sobre o assunto, o seguinte: A Teoria Geral do Direito Civil uma disciplina de Direito Civil. Nessa medida, ela deveria apresentar-se tal como qualquer outra disciplina, na dupla qualidade de ramo juscientfico e de regulao jurdico-privada.

A presena, na sua designao acadmica, da expresso teoria geral, indicia, no entanto, o estar em jogo mais do que uma simples zona do tecido civil, semelhante s outras reas que compartilham esse sector importante do ordenamento: a Teoria Geral do Direito Civil elevar-se-ia acima das restantes disciplinas especiais, implicando todo um conjunto de tarefas de construo e de generalizao, efectuadas a partir delas.

Pode, pois, anunciar-se partida que a Teoria Geral do Direito Civil se assume - ou tenta assumir - como uma disciplina cientificamente empenhada e, como tal, muito marcada nas suas mais elementares concepes.Enquanto disciplina acadmica, a Teoria Geral do Direito Civil situa-se, no actual plano de estudos da Faculdade de Direito de Lisboa, no 2 ano jurdico. Assim, ela procura assegurar uma transio entre a disciplina propedutica do 1 ano, de Introduo ao Estudo do Direito e as disciplinas dogmticas do 3 ano de Direito das Obrigaes e de Direitos Reais. Fazendo-o, ela apresenta, de algum modo, uma dupla natureza, por um lado, a Teoria Geral do Direito Civil , ainda uma disciplina introdutria, empenhada em ministrar elementos genricos sobre a linguagem jurdica e o correspondente discurso substantivo; por outro, ela surge j como espao dogmtico, apto a proporcionar e a justificar a resoluo de casos concretos.

Como se v, o Direito das Obrigaes e os Direitos Reais recebem da Teoria Geral do Direito Civil esta tarefa da resoluo de casos concretos ou seja, da aplicao prtica dos institutos jurdicos e desenvolvem-na na sua mxima expresso, assumindo eles, plenamente, o carcter dogmtico.

Deste modo, todos os institutos estudados na Teoria Geral do Direito Civil, e outros novos tratados no prprio Direito das Obrigaes, ganham aplicao prtica neste ramo e continuam a ganh-la nos Direitos Reais.

No seguimento da sua articulao dogmtica com as duas cadeiras acima indicadas, o Direito das Obrigaes joga um papel decisivo na cristalizao da formao jurdica, como oportunamente se demonstrou.

esta ligao umbilical entre estas trs cadeiras que nos leva a afirmar que existe entre elas e no seu ensino uma relao de continuidade e outra de contiguidade, relao que lhes confere, conjuntamente, a dignidade de espinha dorsal do curso de Direito, qualificao de que gozam tambm os Direitos Reais, a Teoria Geral do Processo e o Direito Processual Civil.

Seco VII

Das relaes do Direito das Obrigaes com outros ramos

O Direito das Obrigaes, entendido como subsistema normativo, tem relaes com todos os outros subsistemas jurdicos, sejam eles de natureza pblica ou privada, sejam ainda de natureza hbrida. Ainda que assim, ele apresenta relaes mais estreitas com alguns desses ramos ou desses subsistemas.

Do mesmo modo, quando apreciado como ramo da cincia jurdica, o Direito das Obrigaes tem conexes com os ramos da cincia jurdica que se ocupam do estudo dos ramos de Direito com que ele, enquanto subsistema normativo tem conexo.Vejamos primeiro as suas relaes com outros ramos de Direito, tanto pblicos como privados.

Ao nvel do Direito Pblico, entendemos que ele apresenta-se mais conectado com o Direito Constitucional, o Direito Administrativo e o Direito Fiscal e Aduaneiro.Cumpre explicitar.Subseco IDireito PblicoAo nvel do Direito Pblico, o Direito das Obrigaes tem relaes mais estreitas com: Direito Constitucional - a Constituio, como do domnio pblico, a Lei Fundamental do Estado e, como tal, tem fora jurdica mxima.Disso resulta que o Direito das Obrigaes, como conjunto de normas, deve conformar-se com os princpios desta Constituio, condio necessria para a validade e eficcia de cada uma das suas normas em particular e de todas elas em conjunto.Situando-se a Constituio no Direito Constitucional, facilmente se entende que o Direito das Obrigaes esteja conectado com o Direito Constitucional. E a conexo existente entre eles consubstancia-se numa relao de subordinao: o Direito das Obrigaes deve conformar-se com o Direito Constitucional ou seja, subordinar-se a ele, porque a conformidade dessas normas com os princpios constitucionais o pressuposto de validade e de eficcia dessas mesmas normas. Direito Administrativo - no mbito da administrao pblica, os diferentes departamentos do Estado tm celebrado contratos administrativos de que nascem obrigaes para elas. Para alm disso, o Estado tem celebrado contratos com contrapartes, intervindo ele como pessoa colectiva de Direito Privado.

De uns e de outros contratos emergem obrigaes cuja disciplina jurdica a constante do C.C, portanto, a do Direito das Obrigaes.

O Direito Administrativo, que regulador da administrao pblica, acaba conectando-se com o Direito das Obrigaes no quadro da administrao pblica e na actividade privada do Estado.

Direito Fiscal e Aduaneiro - no mbito da administrao fiscal, o Estado tem vindo a cobrar aos diferentes agentes econmicos os impostos devidos pelo exerccio das actividades. Tais impostos constituem obrigaes, pelo que o seu regime jurdico o constante do C.C, portanto, o do Direito das Obrigaes.

Subseco IIDireito Privado

Ao nvel do Direito Privado, o Direito das Obrigaes tem relaes mais estreitas no s com todo o resto do Direito Civil, nomeadamente, o Direito das Pessoas, o Direito das Coisas, o Direito da Famlia, e o Direito das Sucesses, como tambm com todo o Direito Privado especial, designadamente o Direito Comercial, o Direito do Trabalho e o Direito Internacional Privado.

Como sub-ramo do Direito Civil, o Direito das Obrigaes est naturalmente conectado com todos os outros sub-ramos, devido ao facto de ambos assentarem nos mesmos princpios, como sejam:

O princpio da intangibilidade da pessoa humana - traduzido no reconhecimento dessa pessoa e dos seus direitos de personalidade.

O princpio da personificao - traduzido na constituio das pessoas colectivas, imagem e semelhana do Homem. Este princpio consiste no reconhecimento, pelo Estado, a todos os indivduos a partir da sua nascena, de um crculo mais ou menos vasto de direitos de personalidade, consagrados na Constituio, no captulo dos direitos fundamentais, precisamente nos artigos , consagrados tambm nos arts. 70 e ss do C.C, reflectindo a Declarao Universal dos Direitos do Homem.

O princpio da famlia como instituio - que consiste em consagrar a famlia como clula-base da sociedade. Este princpio traduz-se no direito de contrair casamento e, deste modo, constituir a famlia.

O princpio da autonomia privada - traduzido na liberdade de celebrao e de estipulao nos negcios jurdicos. Este princpio ganha a sua manifestao ou concretizao no domnio dos contratos, consistindo na faculdade que s pessoas reconhecida pelo Estado de poder constituir, modificar ou extinguir efeitos jurdicos a partir de actos de vontade.

Consagrado no art. 405 C.C sob a epgrafe liberdade contratual, este princpio representa a aplicao nos contratos, do princpio da liberdade negocial, que tem limitaes gerais nos arts. 280 e 398 do mesmo Cdigo, e limitaes especiais, em cada contrato tpico.

O princpio da boa-f nas relaes negociais - que traduz a ideia de que nas negociaes para celebrar contratos e na execuo de contratos j celebrados, as partes devem ser leais umas s outras, devem colaborar de forma a permitir que cada uma alcance os seus objectivos. O princpio est consagrado no art. 227 do C.C., mas est aflorado em muitos outros preceitos. O princpio da universalidade e da igualdade dos cidados perante a lei - consiste em consagrar na lei que todas as pessoas so iguais perante essa mesma lei. Este princpio contm dentro dele o da igualdade entre homens e mulheres perante a lei, que significa que todos os homens e mulheres so iguais tambm perante essa lei, decorrendo disso que face dela, tm os mesmos direitos e deveres, as mesmas oportunidades e igual tratamento em todas as instituies. Este princpio tem, em Moambique dignidade constitucional.

O princpio da propriedade privada dos meios de produo - que reconhece e tutela a propriedade privada, significa que admitida a propriedade privada dos meios de produo em Moambique, conforme resulta dos arts. 97 al. d) e) e 99 n 3 da Constituio e lhe reservado um papel importante no desenvolvimento da nossa economia, j que esta est embaada no mercado. Mas no se deve, no entanto, entender que este o nico tipo de propriedade admitido, pois, coexiste com a propriedade cooperativa e social, com a propriedade pblica e a propriedade pessoal.

O princpio do fenmeno sucessrio - consiste em admitir a transmisso de bens mortis causa, conforme resulta do art. 83 da Constituio.

Como sucede com todos os outros sub-ramos, o Direito das Obrigaes fundamentado, penetrado e desenvolvido por uma parte destes princpios, que sero objecto de aprofundamento em sede prpria.

Para alm disso, as obrigaes que surgem no mbito das relaes pessoais, reais, familiares e sucessrias so reguladas em certa medida pelo Direito das Obrigaes.

Como dissemos, ao nvel do Direito Privado especial, o Direito das Obrigaes conecta-se com o Direito Comercial, com o Direito de Trabalho e com o Direito Internacional Privado.

Vejamos:

Direito Comercial e Direito das Obrigaes - No quadro das relaes jurdico-comerciais, so celebrados contratos de que emergem obrigaes comerciais, cujo regime jurdico , subsidiariamente o do Direito Civil. Neste sentido, a disciplina das obrigaes mercantis facultada pelo Direito das Obrigaes.

Direito de Trabalho e Direito das Obrigaes - No mbito das relaes jurdico-laborais emergem obrigaes tanto para os empregados como para os empregadores. O regime dessas obrigaes em termos de nascimento, transmisso e extino o do Direito das Obrigaes.

Direito Internacional Privado e Direito das Obrigaes - No mbito das relaes privadas internacionais nascem obrigaes para as partes que so reguladas pelo Direito das Obrigaes, nos termos dos arts. 41 e/ou 42 do C.C.

Subseco IIIRamos de classificao hbrida

Ao nvel dos ramos de classificao hbrida, o Direito das Obrigaes relaciona-se mais estritamente com o Direito Econmico, com o Direito Bancrio, com o Direito dos Seguros e com o Direito Contabilstico e Fiscal.

Vejamos.

Direito Econmico e Direito das Obrigaes - No quadro dos contratos econmicos h tambm obrigaes cujo tratamento jurdico o regime constante do C.C.

Direito Bancrio e Direito das Obrigaes - O Direito das Obrigaes aplica-se s obrigaes contradas no mbito dos contratos bancrios, tanto no que se refere ao regime de constituio, como no de transmisso e de extino.

Direito dos Seguros e Direito das Obrigaes - O Direito das Obrigaes aplica-se s obrigaes contradas no mbito dos contratos de seguros, tanto no que se refere ao regime de constituio, como no de transmisso e de extino.

Direito Contabilstico e Fiscal e Direito das Obrigaes - A escriturao mercantil encerra, para alm de direitos, um conjunto de obrigaes, dentre as quais as obrigaes fiscais. Todas estas obrigaes obedecem ao regime do Direito Civil, enquanto subsidirio do Direito Comercial.

Como dissemos, quando apreciado como ramo da cincia jurdica, o Direito das Obrigaes tem conexes com os ramos da cincia jurdica que se ocupam do estudo dos ramos de Direito com que ele, enquanto subsistema normativo, tem conexo.Seco VIIIDas relaes do Direito das obrigaes com outras cincias jurdicasVejamos agora as suas relaes com os outros ramos da cincia jurdica.

Merecem particular referncia as relaes entre o Direito das Obrigaes e a Introduo ao Estudo do Direito e entre o Direito das Obrigaes e a Teoria Geral do Direito Civil.

O estudo do Direito das Obrigaes tem uma relao de continuidade e de contiguidade com o estudo da Introduo ao Estudo do Direito e da Teoria Geral do Direito Civil.

Assim, enquanto que a Introduo ao Estudo do Direito sobrevoa todo o sistema jurdico e busca os conceitos gerais ou comuns nos hemisfrios pblico e privado, para os fornecer aos interessados.

A Teoria Geral do Direito Civil uma abordagem genrica das quatro partes que segundo a sistematizao germnica formam o Direito Civil, nomeadamente o Direito das Obrigaes, o Direito das Coisas, o Direito da Famlia e o Direito das Sucesses, sem descurar o Direito das Pessoas, localizado no Livro I do C.C.

Portanto, o Direito das Obrigaes busca na Introduo ao Estudo do Direito e na Teoria Geral do Direito Civil o acervo conceitual de que se serve, como por exemplo a estrutura interna e externa da relao jurdica, a teoria geral do negcio, do contrato e os princpios gerais do Direito Civil.

Para alm destas especiais relaes, o Direito das Obrigaes tem, enquanto cincia, conexes com as cincias: do Direito Constitucional, do Direito Administrativo, do Direito Fiscal e Aduaneiro, do Direito das Coisas, do Direito da Famlia, do Direito das Sucesses, do Direito Internacional Privado, do Direito Bancrio, do Direito dos Seguros, do Direito Comercial, do Direito de Trabalho e do Direito Internacional Privado.

CAPTULO IIDO OBJECTO E DA IMPORTNCIA DO DIREITO DAS OBRIGAESSeco I

Do Objecto do Direito das Obrigaes

Seco II

Da importncia do Direito das Obrigaes

Tem interesse demonstrar a importncia do Direito das Obrigaes na nossa vida. Essa importncia grande, tanto no plano normativo ou tcnico-jurdico, como no cientfico ou epistemolgico.

E vamos de seguida demonstrar estas duas perspectivas.

Seco III

Da relevncia prtica do Direito das Obrigaes como ramo de DireitoPensando no Direito das Obrigaes como segmento normativo, como subsistema de normas, a sua importncia ou relevncia pode resumir-se no que nos diz o Prof. Pessoa Jorge. Escreveu o ILUSTRE MESTRE, a este respeito, o seguinte:

O direito das obrigaes constitui, do ponto de vista de aplicao prtica, um dos mais importantes ramos do direito: pode dizer-se que todo o comrcio ou trfico jurdico-privado se faz sob a sua gide.

Com efeito, a circulao jurdica de bens ou servios, que constitui o tecido da vida social quotidiana, desenrola-se quase toda sob o signo de contratualidade.

As pessoas, iguais e livres transmitem entre si esses bens e servios, que vo satisfazer as suas necessidades recprocas, atravs de acordos ou contratos. Ora, a maior parte dos contratos tem efeitos obrigacionais e por isso que, tradicionalmente eles so estudados no Direito das Obrigaes.

O Direito das sucesses considera, restritamente a problemtica suscitada pelas transmisses mortis causa; o direito de famlia regula a constituio desta, as qualidades decorrentes da situao familiar, as relaes que se estabelecem entre os respectivos membros; o direito das coisas disciplina a forma como cada um pode gozar os bens que lhe pertencem e tirar deles as respectivas utilidades. Toda a restante vida jurdico-privada - e, portanto, tudo quanto se refere cooperao ou colaborao entre os homens -, cai quase inteiramente sob a alada do direito das obrigaes.

Resumindo este pensamento do Prof. Pessoa Jorge, podemos dizer que o Direito das Obrigaes importante porque:

a) Regula todo o comrcio jurdico privado, com excepo das matrias reservadas ao Direito Comercial.

b) Disciplina todos os institutos que visam compensar aos lesados por danos ou despesas decorrentes de actos ilcitos.

c) Fixa as sanes civis contra condutas ilcitas dos particulares.

d) o ramo de Direito com mais influncia em quase todos os outros, sejam eles do Direito Pblico, como sucede com o Direito Administrativo e o Direito Fiscal, sejam eles do Direito Privado, como sucede com o Direito Comercial, com o Direito Bancrio e com o Direito dos Seguros, por exemplo.

Seco IV

Da relevncia prtica do Direito das Obrigaes como disciplina dogmticaPensando no Direito das Obrigaes como rea do conhecimento ou do saber jurdico, possvel tambm vislumbrar a sua importncia. E esta sua importncia como cincia jurdica decorre do valor econmico e social dos negcios jurdicos e da responsabilidade civil de que se ocupa, enquanto disciplina jurdica, isto , enquanto ordenamento normativo.Na verdade, desde a antiguidade at hoje, o Direito das Obrigaes recebeu um tratamento cientfico altamente apurado, continuando a exercer hoje grande influncia sobre outros ramos da cincia jurdica.Esse elevado grau de tratamento cientfico e a prpria ndole fortemente lgica deste ramo da cincia do Direito, torna o seu estudo especialmente adequado a uma boa formao jurdica.

Por outras palavras, a apurada tcnica que tem vindo a desenvolver-se desde os juristas romanos at actualidade, torna o Direito das Obrigaes um campo privilegiado para a investigao dogmtica mais avanada, o que o coloca na posio de um dos ramos de Direito que mais influncia exerce sobre todos os outros, quer sejam de Direito Pblico, como sucede com o Direito Administrativo e o Direito Fiscal, quer sejam do Direito Privado, como acontece com o Direito Comercial, Direito Bancrio, Direito dos Seguros, Direito dos Valores Mobilirios.

por isso que o Direito das Obrigaes constitui o ramo da cincia jurdica que mais importncia desempenha na formao jurdica das pessoas que ingressam no curso de Direito.

Explicitando, em jeito de resumo, podemos dizer que o Direito das Obrigaes , enquanto cincia, importante porque:

a) Exerce grande influncia nos outros ramos da cincia jurdica, sejam eles da rea pblica ou privada, em razo da influncia que ele, enquanto ramo de Direito, exerce noutros ramos de Direito correspondentes a essas reas do saber jurdico.

b) Possibilita uma investigao juscientfica ou dogmtica mais avanada porque assenta sobre um ramo de Direito com mais influncia noutros ramos.

c) Em razo e em decorrncia, do exposto, o Direito das Obrigaes constitui o ncleo central da formao jurdica, desempenhando por isso o papel chave na formao do jurista.Chegados aqui, resta-nos dizer que no nos parece difcil distinguir a importncia do Direito das Obrigaes como acervo normativo ou como leis, da sua importncia como ramo da cincia jurdica ou seja, como disciplina.

CAPTULO IIIDAS FONTES DO DIREITO DAS OBRIGAESSeco I

Das acepes da expresso Fontes do Direito das Obrigaes

O ttulo aqui expresso clarifica que a expresso Direito das Obrigaes est empregue no sentido normativo ou tcnico-jurdico, significando portanto, ramo de Direito.

Com a abordagem desta temtica das fontes, pretendemos, pois, saber como se formam as regras jurdicas que integram este ramo de Direito: o Direito das Obrigaes.

Como todos sabemos, ponto assente na doutrina que o Direito nasce de determinados modos dentro da sociedade, modos esses usualmente designados fontes do Direito.

Tambm todos sabemos que a expresso fontes do Direito admite uma pluralidade de sentidos, portanto uma expresso dotada de larga densidade semntica, podendo por isso o seu estudo ser realizado sob uma diversidade de pontos de vista, segundo os objectivos que se perseguem ou que se tm em vista.

evidente que no contexto do Direito das Obrigaes falamos em fontes do Direito das Obrigaes e no de fontes do Direito s. A expresso fontes do Direito das Obrigaes comporta os sentidos filosfico, orgnico ou poltico, sociolgico, histrico ou material, instrumental e formal.

Naturalmente que para os objectivos do nosso estudo, no so chamados colao todos os sentidos que a expresso admite, interessando apenas, dentre todos eles, o seu sentido formal, segundo o qual, fontes do Direito das Obrigaes so os modos de formao e de revelao das regras jurdico-obrigacionais.

Assim, fontes do Direito das Obrigaes so, portanto, as formas de expresso do Direito das Obrigaes, isto , os modos pelos quais o Direito das Obrigaes vem tona da vida, para compor o subsistema jurdico obrigacional.

Com o estudo das fontes do Direito das Obrigaes pretendemos, pois, saber quais os modos de formao e de revelao das regras jurdico-obrigacionais.

Como questo prvia, tem interesse esclarecer que nos sistemas jurdicos anglo-saxnicos, onde, portanto, no existe em regra a codificao do Direito, e este mesmo Direito est extrapolado por decises judiciais que tm uma influncia enorme na sua estratificao , no existe a categoria geral de Direito das Obrigaes, encontrando-se a respectiva matria desdobrada em contratos e responsabilidade civil.

Nestes sistemas, os contratos e a responsabilidade civil surgem, assim, como fontes do Direito das Obrigaes.Deste modo, o estudo que se segue, das fontes do Direito das Obrigaes, circunscreve-se to s aos Direitos ou sistemas jurdicos de base romanstica, como o caso do nosso.

Seco II

Da tipologia das Fontes do Direito das Obrigaes

No elenco das fontes tradicionais do Direito, - que so as comuns a todos os seus ramos -, constam a lei, o costume, a jurisprudncia, a doutrina e os princpios gerais do Direito.

Cumpre explicitar cada uma destas fontes, a comear pela lei.

O termo lei, quando tomado e entendido como fonte do Direito das Obrigaes, significa:

A Constituio de 2004,

O Cdigo Civil de 1966;

A legislao avulsa, complementar ou extravagante;

Os tratados internacionais.Seco III

Da Caracterizao das Fontes Direito das Obrigaes

Subseco I

Da Constituio como fonte do Direito das Obrigaes

O que significa que a Constituio fonte do Direito das Obrigaes?

Ora, como Lei Fundamental do Estado, a Constituio o corao do sistema jurdico, no sentido de que todas as leis ordinrias devem dispor em conformidade com ela, sob pena de inconstitucionalidade, e da consequente invalidade e ineficcia, em caso contrrio.

Deste modo, o subsistema das normas jurdicas que formam o Direito das Obrigaes deve, assim, conformar-se com os princpios polticos e econmicos constitucionais, pressuposto de que decorrer a sua validade e, por conseguinte, a respectiva eficcia.

Portanto, dizer que a Constituio fonte do Direito das Obrigaes significa que o subsistema das normas jurdicas que formam o Direito das Obrigaes deve conformar-se religiosamente com os princpios dessa Constituio, porque essa conformidade que condiciona a sua validade e a sua eficcia. Esta tambm a razo que justifica o facto de a Constituio se situar no topo da pirmide nacional das fontes do Direito das Obrigaes.

Com efeito, da natureza patrimonial privada do Direito das Obrigaes resulta a sua sujeio ao conjunto de normas e princpios que regulam as situaes jurdico-privadas de contedo econmico e que esto contidas na Constituio do respectivo pas.

No nosso caso, a Constituio moambicana de 2004 fonte do nosso Direito das Obrigaes. Porqu? Porque ela consagra os princpios directores do direito patrimonial privado e, desse modo, tambm do Direito das Obrigaes, como sejam:

O princpio da liberdade, consagrado no seu art. 11 al, f);

O princpio da igualdade, consagrado nos seus arts. 11, al. e), 35;

O princpio da propriedade privada, consagrado no seu art. 82, n. 1; O princpio da excepcionalidade das expropriaes, consagrado nos seus arts. 82, n. 2 e 99; O princpio da propriedade do Estado sobre a terra e os efeitos dele decorrentes, princpio esse consagrado nos seus arts. 109, n. 2 e 111.

Em suma, estes princpios formam a constituio patrimonialprivada moambicana e so comuns ao Direito das Obrigaes, aos Direitos Reais, ao Direito Comercial e ao Direito das Sucesses. a estes princpios que as normas jurdico-obrigacionais devem obedincia, sob pena de inconstitucionalidade, invalidade e ineficcia, em caso contrrio.

Como sucedeu com a de 1975 e com a de 1990, esta Constituio de 2004 no autonomiza no seu texto, - no quadro da regulamentao dos direitos econmicos dos particulares -, as diversas formas e tcnicas de tratar as situaes jurdico-patrimoniais privadas, pelo que no existe, no seu articulado, uma referncia especfica s situaes jurdico-obrigacionais.

Mas no se pode com isso concluir que esta Constituio no fonte do Direito das Obrigaes moambicano s porque nela no existe a consagrao expressa das tais situaes obrigacionais.

Ela fonte sim porque a matriz do nosso sistema jurdico ou seja, ela contm os princpios directores do Direito Privado, de que o Direito das Obrigaes segmento , princpios esses que formam a nossa constituio patrimonial privada, isto , a constituio patrimonial privada moambicana.

Para alm da Constituio de 2004, que fonte do Direito das Obrigaes e de qualquer outro ramo do nosso Direito, porque baliza do sistema, existem outras fontes com categoria de leis, como sejam o C.C de 1966, a legislao avulsa que o complementa, e os tratados internacionais.

Subseco II

Do C.C de 1966 como fonte do Direito das Obrigaes

O que significa que o C.C. de 1966 fonte do Direito das Obrigaes, no nosso caso especfico?

Para esclarecer esta questo, precisamos de passar em revista a origem deste nosso C.C e clarificar o processo da sua moambicanizao. Segue-se ento esse desenvolvimento histrico.O movimento de codificao que se afirmou no princpio do sculo XIX na Europa, como produto das revolues liberais, conduziu, no quadro da famlia jurdica romanstica, formao de duas linhas diferentes de tcnicas tambm diferentes de versar o Direito Civil, expressas nos modelos ou matrizes de sistematizao adoptados.

Ei-las:

Por um lado a civilstica francesa, napolenica ou gaulesa, que tomou a obrigao como forma essencial de aquisio da propriedade, da que se centrou em torno do contrato. Partindo ento do binmio pessoa-propriedade como seu conceito-quadro, a Frana construiu a sua linha de codificao estruturando o respectivo C.C em 3 Livros.

Por outro, a civilstica alem ou germnica, tambm designada pandectstica, que desenvolveu como seu conceito-quadro a relao jurdica e concebeu tambm a sua prpria linha de codificao estruturando o seu BGB em 5 Livros, no qual, tomando a obrigao como aspecto essencial da relao jurdico-obrigacional, tratou da relao jurdica desde a sua gnese ou constituio at sua extino, passando obviamente pelo seu contedo, pela sua modificao e pela sua transmisso.

O Cdigo Civil francs de 1804 e o Cdigo Civil alemo de 1896 ou 1900, ambos da Famlia Jurdica Romano-Germnica, so as expresses legislativas mais emblemticas destas duas linhas de codificao.Neste processo de codificao do Direito, Portugal inspirou-se inicialmente na matriz francesa, para a concepo e elaborao do seu C.C de 1867, mas veio depois adoptar o modelo alemo, na concepo e elaborao do C.C de 1966, divorciando-se assim, da matriz gauleza na sistematizao do seu Cdigo.

Em consequncia do seu passado de colnia portuguesa, Moambique adoptou como seu C.C este C.C Portugus de 1966, o qual est, como dissemos, assente na matriz germnica de codificao, que coloca as normas jurdico-obrigacionais em Livro prprio e autnomo, dedicado s obrigaes, diferentemente do que sucede com os Cdigos da linha napolenica, francesa ou gaulesa.

Assim se tornou moambicano o C.C de 1966, assim nasceu o Cdigo Civil moambicano actualmente vigente.

Esclarecida a questo da origem do C.C de 1966 e a da sua moambicanizao, podemos j resolver o problema antes suscitado: o de saber o que significa que o C.C de 1966 fonte do nosso Direito das Obrigaes.

Somos de opinio que, isso significa que as normas jurdico-obrigacionais que constam do referido C.C formam o nosso Direito das Obrigaes.

Mas o C.C de 1966 no fonte do Direito das Obrigaes como o so as outras, ele a fonte principal na medida em que o maior acervo normativo deste ramo de Direito consta do referido C.C, concretamente do seu Livro II, o qual s desta matria se ocupa, - da que o legislador o designou Direito das Obrigaes.

Portanto, o C.C moambicano fonte do nosso Direito das Obrigaes porque contm o principal acervo normativo que regula as relaes jurdico-obrigacionais no pas, ou ainda, porque contm o ncleo normativo mais significativo para a regulao das relaes jurdico-obrigacionais, constitudo pelo seu Livro II.

Subseco III

Da legislao avulsa como fonte do Direito das Obrigaes

O que significa que a legislao avulsa ou complementar fonte do Direito das Obrigaes e qual a legislao que tem esse valor?

Significa que essa legislao contm regras ou normas de contedo obrigacional ou seja, normas jurdico-obrigacionais.

evidente que no toda a legislao extravagante ou avulsa que fonte do Direito das Obrigaes, s aquela que contm dispositivos de contedo obrigacional, como sucede, por exemplo, com a Lei do Consumidor, com a Lei de Trabalho e com a Lei das Instituies de Crdito e Sociedades Financeiras.

Subseco IVDos tratados internacionais como fontes do Direito das Obrigaes

O que significa que os tratados internacionais so fontes do Direito das Obrigaes?

Os tratados internacionais podem ser bilaterais ou multilaterais e, ainda, de carcter regional ou universal. So bilaterais os celebrados entre dois Estados, e multilaterais os celebrados entre mais de dois Estados. So regionais os celebrados por Estados da mesma regio e universais os celebrados por Estados de diferentes partes do mundo.

Uma vez ratificados pelos rgos competentes de cada Estado nos pases signatrios, os tratados internacionais ingressam na ordem jurdica interna de cada um desses Estados e passam a vincular. Neste sentido, tornam-se fontes do Direito e, portanto, do Direito das Obrigaes, se contiverem normas de contedo obrigacional.

Portanto, no caso especfico do Direito das Obrigaes, os tratados internacionais s se tornam sua fonte caso contenham regras ou preceitos que intervm na constituio, modificao, transmisso e extino das obrigaes.

Subseco V

Do costume como fonte do Direito das Obrigaes

Depois da abordagem da lei como fonte do Direito das Obrigaes, deveramos tratar do costume, tambm como fonte do Direito das Obrigaes, de conformidade com a ordem ou sequncia existente na pirmide nacional das fontes do Direito.

Porm, no o fazemos, porque entendemos que o costume no fonte do Direito das Obrigaes.

No caso especfico do Direito das Obrigaes e em ateno ao actual nvel de desenvolvimento das sociedades, no nos parece que do costume possam brotar normas que relevem para constituir, modificar, transmitir ou extinguir obrigaes, entendemos que s a lei escrita, a jurisprudncia, a doutrina e os princpios gerais do Direito que tm essa relevncia.

Assim, no inclumos o costume no conjunto das fontes do Direito das Obrigaes.

Portanto, para alm da lei e excludo o costume da pirmide nacional das fontes do Direito das Obrigaes, pelos argumentos que avanamos , existem outras fontes deste ramo que so a jurisprudncia, a doutrina e os princpios gerais do Direito.

Cumpre explicitar.

Subseco VI

Da jurisprudncia como fonte do Direito das Obrigaes

O que significa que a jurisprudncia fonte do Direito das Obrigaes?

Ora, partamos dos sentidos da palavra, para chegar ao seu conceito.

O termo jurisprudncia pode ser entendido na sua acepo epistemolgica ou seja, de cincia do Direito, mas pode tambm ser entendido como conjunto das decises dos tribunais, conjunto das decises judiciais. neste ltimo sentido que o tomamos, no contexto do estudo que estamos a fazer.

Portanto, por jurisprudncia, entende-se, neste contexto, o conjunto de orientaes seguidas pelos tribunais no julgamento de casos concretos, orientaes essas definidas pelo Tribunal Supremo, ao abrigo do art. 2 do C.C, que fixa o princpio de que nos casos declarados na lei, podem os tribunais fixar doutrina com fora obrigatria geral, que se apresenta sob a forma de assentos.

Isto significa que a jurisprudncia s fonte do Direito enquanto se consubstanciar em assentos, porque s estes tm fora obrigatria geral.

Como dissemos, na nossa Ordem Jurdica a emisso dos assentos cabe ao Tribunal Supremo, reunido em plenrio.

Como doutrina com fora obrigatria geral, vinculando todos os tribunais e todos os membros da comunidade jurdica, os assentos visam superar as dificuldades decorrentes da independncia de cada juiz ou de cada tribunal na aplicao da lei aos casos concretos, dificuldades traduzidas em solues diversas para questes idnticas.

O assento resulta, pois, da simbiose jurdica de dois ou mais Acrdos contraditrios ou diferentes, das Seces do Tribunal Supremo, sobre uma mesma questo de Direito, simbiose que opera no quadro do funcionamento desse mesmo Tribunal Supremo, reunido em plenrio.

Assim, a jurisprudncia no , em regra, fonte do Direito em geral, nem o do Direito das Obrigaes em particular, s o excepcionalmente atravs dos assentos, porque estes tm fora vinculativa que no provm deles prprios mas da lei que os permite, que o C.C moambicano, atravs do seu art. 2.

Quer isso dizer que o Juiz no pode criar ou modificar uma norma jurdica nem fazer cessar a sua eficcia. E porque que no pode? No pode em decorrncia do princpio da separao de poderes, que determina que o julgador seja apenas aplicador da lei, cabendo ao rgo legislativo ou com poder legislativo delegado, criar ou modificar uma norma de Direito, bem como fazer cessar a sua eficcia.

Chegados aqui, resta-nos dizer, em jeito de concluso, que em Direito das Obrigaes, a jurisprudncia torna-se fonte atravs dos assentos nica e exclusivamente nos casos em que estes versam sobre matria obrigacional.

Subseco VII

Da doutrina como fonte do Direito das Obrigaes

O que significa que a doutrina fonte do Direito das Obrigaes?

A doutrina compreende os estudos e os pareceres dos jurisconsultos, expressos em manuais, monografias, revistas jurdicas, teses e outros textos em que eles apresentam, com fundamentao cientfica, as suas investigaes e concluses sobre questes jurdicas.

No Direito romano clssico a doutrina era fonte imediata, vinculando no apenas nos casos concretos para cuja soluo essa doutrina havia sido solicitada em forma de parecer, mas tambm em todos os outros casos similares.

Hoje j no assim, a doutrina no fonte imediata, isto , no vincula nem nos casos concretos para cuja soluo ela foi solicitada como parecer nem em quaisquer outros similares.

Contudo, a sua importncia, em virtude do labor cientfico que a define, pode a tornar vlida no apenas como subsdio ao qual a jurisprudncia recorre para melhor aplicao do jure constituto, como ainda para melhorar a legislao.

Significa isto que a doutrina torna-se fonte do Direito nos casos em que o legislador a acolhe, em razo da sua fora persuasiva, para o seu aproveitamento na produo legislativa.

Chegados aqui, resta-nos, em jeito de concluso, dizer que em Direito das Obrigaes, a doutrina como conjunto de opinies dos jurisconsultos, s fonte quando o legislador a acolhe e a transforma em normas jurdico-obrigacionais.

Subseco VIII

Dos princpios gerais do Direito como fontes do Direito das Obrigaes

O que significa que os Princpios Gerais do Direito so fontes do Direito das Obrigaes?

Tem interesse para o esclarecimento desta questo, delimitar previamente o conceito de Princpio Geral do Direito.

E antes de explicar o que um princpio geral, h que justificar primeiro a sua relevncia.

Assim, importante e necessrio clarificar, partida, que toda e qualquer forma de conhecimento, implica a existncia de princpios, isto , de certos enunciados lgicos admitidos como condio de validade das demais asseres que compem um certo campo do saber.

Estamos aqui a tomar a palavra princpio apenas no seu signficado lgico, sem nos referirmos sua acepo tica.

Ora, entendido o termo neste sentido lgico, podemos dizer que princpios so verdades fundamentais de um sistema de conhecimento, que so admitidas por serem evidentes ou terem sido comprovadas como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da praxis.

Esses princpios ou verdades fundamentais agrupam-se em trs grandes categorias, nomeadamente:

Princpios omnivalentes; Princpios plurivalentes; Princpios monovalentes.

O que so princpios omnivalentes? Designamos por princpios omnivalentes os enunciados lgicos que so vlidos para todas as formas do saber, como o caso dos princpios da identidade e da razo suficiente.

O que so princpios plurivalentes? Diferentemente dos anteriores, os princpios plurivalentes caracterizam-se por serem enunciados lgicos aplicveis a vrios campos do conhecimento mas no extensivos a todos, como o caso do princpio de causalidade, que essencial para as cincias naturais.

O que so princpios monovalentes? Os princpios monovalentes so aqueles enunciados lgicos que s valem no mbito de uma determinada rea do conhecimento ou de uma determinada cincia, como o caso dos princpios gerais do Direito, que s so vlidos para a cincia jurdica.

No nosso Direito positivo, concretamente no C.C de 1966, temos um preceito que coincide com o vigente na maioria dos sistemas jurdicos de matriz romanstica: o art. 10 do C.C, que confere ao juiz, quando a norma jurdica fr omissa , o poder de decidir o caso de acordo com a analogia e, na falta desta, criar ele prprio a norma que criaria, se houvesse de legislar dentro do esprito do sistema.Quer isto dizer que o legislador do C.C moambicano reconhece que o nosso sistema jurdico no cobre e nem podia cobrir todo o campo da experincia humana, por isso, ele deixou muitas situaes no reguladas porque no as podia prever todas no momento da feitura da lei: essas situaes so as chamadas lacunas do sistema, que tm de ser integradas.

Para a integrao destas lacunas, o legislador fixou a regra de que devemos recorrer ao princpio da analogia, e na falta de casos anlogos, aos princpios gerais do Direito.

No se deve, no entanto, entender que aos princpios gerais do Direito s cabe apenas essa tarefa de preencher ou suprir as lacunas, pois, eles tm muito mais do que isso: so enunciaes normativas de valor genrico, que condicionam e orientam a compreenso do ordenamento jurdico, quer para a sua aplicao e integrao, quer para a elaborao de novas normas, o que significa que eles cobrem, deste modo, tanto o campo da pesquisa pura do Direito, como o da actualizao legislativa.

Alguns desses princpios revestem-se de tamanha importncia que o legislador lhes conferiu dignidade constitucional e, portanto, fora de lei, assumindo-se assim, tais princpios, como estruturas de modelos jurdicos.

Situamos neste plano, por exemplo:

O princpio da igualdade de todos perante a lei, previsto no art. 35 da nossa Constituio de 2004; O princpio da no retroactividade da lei para proteco dos direitos adquiridos, previsto no n 2 do art. 60 da referida Constituio.

Para alm destes, existem tantos outros princpios que no constam de textos legais, apenas so modelos doutrinrios ou dogmticos fundamentais que de uma de outra forma influem na vida jurdica.

Como se pode verificar, os princpios gerais do Direito so eficazes independentemente da sua consagrao legislativa, mas quando a lei os consagra, d-lhes maior fora sem lhes alterar a substncia, constituindo um ius prvio e exterior lex.

Por outro lado, os princpios gerais do Direito no tm a mesma amplitude, pois, existem os que se manifestam em todos os ramos de Direito mas existem outros que s se manifestam apenas nalguns deles ou seja, neste ou naquele ramo de Direito, sendo por isso objectos de estudo das respectivas disciplinas dogmticas. por essa razo que falamos em Princpios Gerais do Direito Civil, princpios gerais do Direito Comercial, princpios gerais do Direito Criminal, princpios gerais do Direito do Trabalho, princpios gerais do Direito Administrativo, princpios gerais do Direito Constitucional, princpios gerais do Direito Financeiro ou princpios gerais do Direito Fiscal e Aduaneiro, entre outros.

O Direito das Obrigaes parte do Direito Civil, pelo que os seus princpios so parte dos princpios do Direito Civil.

Os princpios gerais do Direito Civil so os seguintes:

O princpio da intangibilidade da pessoa humana;

O princpio da igualdade do gnero e de todas as pessoas perante a lei;

O princpio da legalidade dos actos das pessoas como condio da sua validade;

O princpio da autonomia privada;

O princpio da boa-f ou colaborao intersubjectiva;

O princpio do no enriquecimento indevido;

O princpio da pontualidade;

O princpio da proibio da onerosidade excessiva nas relaes contratuais;

O princpio da responsabilidade civil ou do ressarcimento de danos;

O princpio da responsabilidade patrimonial.

Os princpios gerais do Direito Civil que relevam para o Direito das Obrigaes como sua fonte so os seguintes:

O princpio da autonomia privada;

O princpio da boa-f ou colaborao intersubjectiva;

O princpio do no enriquecimento indevido;

O princpio da responsabilidade civil ou do ressarcimento de danos;

O princpio da responsabilidade patrimonial.

Em Direito das Obrigaes, estes e outros princpios gerais do Direito no expressamente referidos neste texto so fontes porque so enunciaes normativas de valor genrico, que condicionam e orientam a compreenso do subsistema normativo jurdico-obrigacional, quer para a sua aplicao e integrao, quer para a elaborao de novas normas jurdico-obrigacionais.

Portanto, estes princpios cobrem tanto o campo da pesquisa pura do Direito das Obrigaes como o da sua actualizao legislativa.

Seco IV

Da Hierarquia das fontes do Direito das Obrigaes

De todo o exposto decorre concluir que o Direito das Obrigaes moambicano possui a sua prpria pirmide nacional das fontes, a qual apresenta a seguinte hierarquia:

A Constituio de 2004, enquanto topo da pirmide nacional das fontes do Direito e, portanto, das fontes do Direito das Obrigaes. Isto significa que a Constituio a Lei Fundamental do pas, portanto, a lei que contm os princpios maiores com que as normas jurdico-obrigacionais e no s , se devem conformar, em razo da sua fora jurdica mxima.

O Cdigo Civil de 1966, enquanto ncleo normativo mais significativo do Direito das Obrigaes. Isto significa que o Cdigo Civil de 1966 contm o principal acervo normativo de contedo obrigacional, que o seu Livro II.

A Legislao avulsa, desde que verse sobre matria do Direito Civil e contenha disposies normativas de contedo obrigacional ou seja, que relevem para o Direito das Obrigaes.

Os Tratados Internacionais, desde que ratificados pelos rgos competentes do Estado moambicano, ingressando assim na nossa Ordem Jurdica , e contenham dispositivos de contedo obrigacional. Isto significa que os Tratados Internacionais que tenham ingressado na Ordem Jurdica nacional atravs da ratificao, pelo rgo competente do nosso Estado e contenham tambm normas jurdico-obrigacionais, so fontes do Direito das Obrigaes.

A Jurisprudncia, na sua modalidade de assentos do Tribunal Supremo, enquanto continuar a sua consagrao como doutrina com fora obrigatria geral. Isto significa que a Jurisprudncia, quando se apresenta na forma de assentos de contedo obrigacional, tem valor normativo porque tem fora obrigatria geral, pelo que serve de fonte do Direito das Obrigaes.

A Doutrina, nos casos em que o legislador moambicano a acolhe e a aproveita para a produo legislativa. Isto significa que a doutrina s se torna fonte do Direito das Obrigaes, no nosso pas, quando o legislador assim o admite, isto , no caso em que ele a acolhe para o seu aproveitamento na produo legislativa de novas normas jurdico-obrigacionais.

Os Princpios Gerais do Direito, como enunciaes normativas de valor genrico, que condicionam e orientam a compreenso do subsistema mormativo jurdico-obrigacional, portanto, os pertinentes para esta rea.

Na verdade, os Princpios Gerais do Direito so enunciados lgicos admitidos como condio de validade das demais asseres que compem o campo da cincia jurdica e, como tal, constituem linhas de fora ou coluna vertebral do nosso sistema jurdico, justificando-se, assim, assumirem-se como fontes do Direito das Obrigaes, no caso vertente.CAPTULO IVDO ASSENTO LEGAL E DA SISTEMTICA DO DIREITO DAS OBRIGAES NA LEI MOAMBICANASeco I

Do assento legal do Direito das Obrigaes

Em cada ordem jurdica romanstica, o Direito das Obrigaes tem um assento legal prprio e uma certa sistemtica. Pretendemos agora localizar esse assento e essa sistemtica, no nosso quadro jurdico. Ora, ponto assente na doutrina e na jurisprudncia, que no nosso desenho legislativo, semelhana do que sucede em todos os sistemas jurdicos de matriz romano-germnica, o Direito das Obrigaes situa-se no Direito Civil.

O Direito Civil moambicano encontra-se subsumido no C.C moambicano. E como dissemos, o Cdigo Civil moambicano o C.C portugus de 1966, que se tornou nosso, isto , que se moambicanizou , por fora do princpio da recepo automtica consagrado, primeiro na Constituio de 1975, depois na de 1990 e hoje na de 2004.Este princpio da recepo automtica determinou a converso do Direito colonial vigente em Moambique, data da independncia, em ordem jurdica nacional, no que no fosse conflituante com aquela Constituio.

Como resultado desta converso, o sistema jurdico moambicano de base romanstica, famlia jurdica a que pertence o Direito portugus, de que o nosso historicamente descendente , da que o sistema jurdico moambicano pertena Famlia Jurdica Romano-Germnica.Ainda que assim, o pas possui, como bvio, a sua prpria dignidade, decorrente das suas prprias especificidades.

No quadro desta famlia e em consequncia da recepo de um C.C de matriz germnica, Moambique integra-se na linha de codificao germnica ou alem, pelo que tem o seu C.C estruturado, como dissemos, em 5 livros, a saber:

O Livro I - que compreende a Parte Geral do referido Cdigo, constitudo pelos princpios gerais ou comuns a todos os ramos do Direito Privado em geral e do Direito Civil em particular. Este Livro, que vai do art. 1 ao 396 do C.C, inclui o Direito das Pessoas, na parte dedicada aos Direitos de Personalidade, artigo 70 e ss;

O Livro II - que abrange o acervo normativo do art. 397 ao 1250 e que forma o Direito das Obrigaes, nosso objecto de estudo;

O Livro III - que forma o Direito das Coisas ou Direitos Reais, compreendendo o segmento normativo dos arts. 1251 a 1575 do C.C; O Livro IV - que forma o Direito da Famlia, compreendendo os arts. 1576 a 2023 do C.C;

O Livro V - que forma o Direito das Sucesses, abrangendo os arts. 2024 a 2334 do C.C.

Em resumo:

a) O C.C de 1966 adoptou a sistematizao actualmente predominante na doutrina civilista e que foi acolhida h muito na organizao dos estudos universitrios do Direito: a sistematizao inspirada na classificao germnica do Direito Civil.

b) O C.C de 1966 compreende, como acima indicamos e voltamos a repetir, cinco Livros, nomeadamente:

O Livro I - (arts. 1 a 396) - Parte Geral; O Livro II - (arts. 397 a 1250) - Direito das Obrigaes; O Livro III - (arts. 1251 a 1575) - Direito das Coisas;

O Livro IV - (arts. 1576 a 2023) - Direito da Famlia; O Livro V - (arts. 2024 a 2334) - Direito das Sucesses.

c) Como se v, neste C.C moambicano, o Direito das Obrigaes consta do Livro II: este o seu lugar na sistemtica deste nosso C.C.d) Dedicados especialmente a este ramo de Direito, encontram-se neste Livro nada menos nada mais que 854 artigos, dos quais 477 ocupam-se da teoria geral das obrigaes e 377 dos contratos em especial. , sem dvida, o mais extenso dos cinco livros que compem o nosso C.C, pois, o nmero dos seus artigos excede largamente a tera parte deste Cdigo. este segmento do nosso C.C, i. , o seu Livro II, que constitui o assento legal do nosso Direito das Obrigaes. Do mesmo modo, so estes 854 preceitos deste Livro que formam o ncleo normativo mais significativo do Direito das Obrigaes moambicano.Seco II

Da Sistemtica do Direito das Obrigaes

No que se refere sistemtica do Direito das Obrigaes no nosso C.C, o Livro II deste mesmo Cdigo desdobra-se em dois ttulos, designadamente:

O ttulo primeiro, que compreende os arts. 397 a 873, versa sobre as obrigaes em geral, isto , sobre o regime geral ou comum das obrigaes ou seja, a teoria geral das obrigaes. O ttulo segundo, que compreende os arts. 874 a 1250, versa sobre a regulamentao prpria ou especial dos contratos civis que eram mais frequentes data da elaborao do C.C e que, por isso mesmo, foram nele tipificados, onde encontramos as obrigaes em especial.Por sua vez, o ttulo primeiro ou ttulo I deste Livro II desdobra-se em oito captulos, quais sejam:

1) Captulo I - Este captulo comea com o art. 397 e termina com o art. 404 do C.C, ocupando-se das disposies gerais, as quais reportam-se problemtica da interpretao e aplicao das leis.

2) Captulo II - Este captulo abrange os arts. 405 a 510 do C.C e ocupam-se das fontes das obrigaes, designadamente, os contratos em tese geral, os negcios unilaterais, a gesto de negcios, o enriquecimento sem causa e a responsabilidade civil.

3) Captulo III- Este captulo compreende os arts. 511 a 576 do C.C e trata das modalidades das obrigaes, nomeadamente:

obrigaes de sujeito activo indeterminado - arts. 511 e ss C.C; obrigaes solidrias - arts. 512 e ss C.C;

obrigaes divisveis e indivisveis - arts. 534 e ss C.C;

obrigaes genricas - arts. 539 e ss C.C;

obrigaes alternativas - arts. 453 e ss C.C;

obrigaes pecunirias - arts. 550 e ss C.C;

obrigaes de juros - arts. 559 e ss C.C;

obrigao de indemnizao - arts. 562 e ss C.C;

obrigao de informao e de apresentao coisas ou documentos - arts. 573 e ss C.C.

4) Captulo IV - Este captulo integra os arts. 577 a 600 do C.C e trata dos institutos ligados transmisso de crditos e de dvidas, como sejam a cesso de crditos, a sub-rogao e a transmisso singular de dvidas esta ltima tambm chamada assuno de dvidas.5) Captulo V - Este captulo comea com o art. 601 e termina com o art. 622 do C.C e trata da garantia geral das obrigaes, isto , do patrimnio do devedor e tambm dos respectivos meios de defesa dos credores, face a actos de delapidao deste patrimnio pelo devedor, antes da liquidao das suas dvidas.

6) Captulo VI - Este captulo abrange os arts. 623 a 671 do C.C e trata das garantias especiais das obrigaes, sejam elas pessoais ou reais, designadamente, a prestao de cauo, a fiana, a consignao de rendimentos, o penhor, a hipoteca, o privilgio creditrio e o direito de reteno.

7) Captulo VII - Este captulo comea com o art. 762 e termina com o art. 836 do C.C e trata do cumprimento e incumprimento das obrigaes, bem como das implicaes que decorrem desse mesmo cumprimento, do cumprimento defeituoso, e at mesmo do incumprimento dessas mesmas obrigaes.

8) Captulo VIII - Este captulo comea com o art. 837 e termina com o art. 873 do C.C e ocupa-se das causas ou modos de extino das obrigaes alm do cumprimento, como sejam a dao em pagamento, a consignao em depsito, a compensao, a novao, a remisso e a confuso.

Por sua vez, o ttulo segundo ou ttulo II deste Livro II trata dos contratos em especial e desdobra-se em 16 captulos, a saber:

1) Captulo I, que abrange os arts. 874 a 939do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Compra e Venda.

2) Captulo II, que compreende os arts. 940 a 979 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Doao.

3) Captulo III, que integra os arts. 980 a 1021 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Sociedade.

4) Captulo IV, que abrange os arts. 1022 a 1120 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Locao.

5) Captulo V, que abarca os arts. 1121 a 1128 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Parceria Pecuria.

6) Captulo VI, que integra os arts. 1129 a 1141 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Comodato.

7) Captulo VII, que compreende os arts. 1141 a 1151 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Mtuo.

8) Captulo VIII, que abrange os arts. 1152 a 1153 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Trabalho.9) Captulo IX, que integra os artigos 1154 a 1156 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Prestao de Servios.

10) Captulo X, que preenchido pelos arts. 1157 a 1184 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Mandato.11) Captulo XI, que compreende os arts. 1185 a 1206 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Depsito.12) Captulo XII, que integra os arts. 1207 a 1230 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Empreitada.13) Captulo XIII, que abrange os arts. 1231a 1237 do C.C, fixa o regime do contrato de Renda Perptua.

14) Captulo XIV, que abrange os arts. 1238 a 1244 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato Renda vitalcia.15) Captulo XV, que integra os arts. 1245 a 1247 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Jogo e Aposta.16) Captulo XVI, que preenchido pelos arts. 1248 a 1250 do C.C, fixa o regime jurdico do contrato de Transaco.

Como se v, o Livro II do nosso C.C tratou de fixar primeiro o regime geral das obrigaes e, posteriormente, regular alguns contratos civis que, em razo da sua maior frequncia e importncia aquando da elaborao do referido Cdigo, ficaram assim nele tipificados.

No se deve, pois, entender que estes contratos consagrados no C.C so os nicos admissveis no Direito das Obrigaes, pois, podem ser celebrados tantos outros que no tm nesta lei ou noutra que a complemente expressa consagrao, mas que ela os admite e os acolhe, ao abrigo da autonomia privada e mais concretamente, a liberdade contratual que o prprio Cdigo confere s pessoas.

CAPTULO VDAS CARACTERSTICAS DO DIREITO DAS OBRIGAESSeco I

Enunciao geral

Vamos agora abordar a temtica das caractersticas do Direito das Obrigaes.

O que que se pode entender, afinal, por uma caracterstica de um ramo de Direito e, nessa mesma linha, por uma caracterstica do Direito das Obrigaes?

Ora, ponto assente na doutrina que cada ramo de Direito apresenta particularidades prprias que o distinguem de outros ramos e o conferem dignidade ou identidade prpria: so as suas caractersticas.

Assim, em termos aproximativos, podemos dizer que as caractersticas de um ramo de Direito so as qualidades, os atributos ou os aspectos que traam a sua fisionomia, a sua identidade ou singularidade, os que o distinguem de cada um e de todos os outros ramos do Direito em geral.

No caso do Direito das Obrigaes, as suas caractersticas so as qualidades, os atributos ou os aspectos que traam a sua fisionomia, a sua identidade ou singularidade, os que o distinguem de cada um e de todos os outros ramos do Direito em geral, bem como dos restantes sub-ramos do Direito Civil em particular.Sobre esta problemtica, a doutrina unnime em reconhecer e elencar como caractersticas do Direito das Obrigaes, as cinco que a seguir se indicam, nomeadamente:

a) A integrao no Direito Civil.

b) A privacidade ou privaticidade;

c) A patrimonialidade ou economicidade tendencial e;

d) A diversidade substanciale) A natureza supletiva

Seco II

Da explicitao sumria de cada caractersticaCumpre explicitar cada uma destas caractersticas, a comear pela da integrao no Direito Civil.

Subseco I

Da integrao do Direito das Obrigaes no Direito CivilNa sistemtica do Direito, encontramos dois grandes hemisfrios, nomeadamente o Direito Pblico e o Direito Privado, cada um deles com os seus ramos.

Entre estes dois hemisfrios jurdicos, encontra-se o conjunto dos ramos de Direito de classificao hbrida, em razo da natureza das normas jurdicas neles integradas, que parcialmente pblica e parcialmente privada.

No hemisfrio do Direito privado encontramos filiados o Direito Civil, como Direito privado geral , seguido do Direito Comercial e do Direito Laboral ou de Trabalho, estes dois ltimos posicionados como Direitos privados especiais.Na sua estrutura, o Direito Civil integra sub-ramos como o Direito das