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NA CONTRAMÃO DO TRADICIONAL 1 Século 17 O alpendre, com capela e quarto de hóspedes, isola a área onde fica a família da rua 2 Século 19 Ramos de Azevedo introduz a planta com três zonas: social, íntima e de serviços 3 Século 20 Com a chegada do modernismo, plantas voltam a ter cômodos com uso múltiplo Uma habitação tem um programa de necessidades, de onde surge uma lista de cômodos, hoje com no mínimo 20 itens. “É essa lista que define a planta”, ensina o ar- quiteto Carlos Lemos, professor da pós-graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e conselheiro do Museu da Casa Brasileira. Na casa do índio, as primeiras no Brasil, existem dezenas de su- perposições de funções em um mesmo espaço. “Esse programa foi a base da casa dos bandeiran- tes, que eram mamelucos”, conta. Acrescida de elementos da planta europeia, determinada por regras da Igreja Católica e do Código Ci- vil europeu. “Por exemplo, os bre- ves papais impediam que se exer- cesse qualquer procedimento ca- tólico no âmbito familiar. Os ora- tórios e capelas deveriam ser sepa- rados e com acesso independen- te”, explica. Além disso, usos e cos- tumes de origem árabe segrega- vam a mulher, determinando a se- paração do quarto de hóspedes, para hospedagem dos viajantes, hábito comum. Por isso, surgiu o alpendre central, com a capela à direita e o quarto de hóspedes à esquerda. “A alcova é resultado da moral cristã”, diz o professor. A grosso modo, esse tipo de mo- radia persistiu no Brasil rural até o Império. No século 19, com a en- trada do dinheiro vindo da venda de borracha, cana-de-açúcar e so- bretudo do café, houve uma mo- dernização desse programa. Divisão. “Veio a moda do mo- rar à francesa, introduzido por Ramos de Azevedo, que obede- cia ao programa com três zonas de funções definidas: repouso, social e de serviços, que tem co- mo coração a cozinha.” A planta deveria satisfazer es- se programa e prever uma circu- lação em que se pudesse ir de uma zona a outra sem passar na terceira. Para facilitar, surgiu o vestíbulo (ou hall), um cômodo de passagem com saída para as três zonas. “Esse esquema du- rou até a chegada da arquitetura moderna, que não gosta muito disso. Então até certo ponto, vol- tou a satisfazer o programa anti- go, de áreas superpostas”, conta. A existência de plantas à moda francesa, hoje, segundo o profes- sor, é determinada pelo comodis- mo. “Primeiro tinha os escravos e, depois, as empregadas domésticas, que faziam as tarefas chatas.” No que diz respeito aos hábi- tos, hoje tudo ficou diferente. “A família não se reúne, nem nas re- feições. Os filhos ficam confina- dos nos quartos, onde cada um tem o seu inferninho particu- lar”, diz Lemos. Para evitar con- flitos, tem-se de separar o am- biente de cada um, gerando uma dispersão na família. O professor diz que há tolerân- cia à superposição de funções, di- ferente entre as classes sociais. “As casas autoconstruídas pelas famílias de operários sobrepõe estar e serviço, enquanto a clas- se média alta, aceita a sobreposi- ção do ambiente de repouso com o social.”/L.P. O diretor de economia e presi- dente do conselho consultivo do Sindicato da Indústria da Cons- trução de São Paulo (Sinduscon- SP), Eduardo Zaidan, rebate as críticas dos pesquisadores do Nomads à produção do mercado imobiliário paulistano. “A acade- mia é importante e deve ser con- siderada, porém não obedecida. Ela está muito à frente.” Para Zaidan, essa não é uma questão trivial. “Envolve ques- tões demográficas, econômicas, de comportamento, mercadológi- cas e legais. A resposta de US$ 5 milhões é qual é o produto dos sonhos do cidadão”, diz. Um desejo que segundo Zaidan, varia às vezes entre uma rua e ou- tra. “O brasileiro é conservador. Existem famílias que querem a planta convencional, e ao mesmo tempo, há demandas para arran- jos diferentes. A saída é a flexibili- zação das plantas”, diz. Com relação às varandas, Zaindan não vê problemas. No caso das cozinhas, Zaidan diz que há limita- ções legais. “O código de obras determina regras de iluminação e ventilação diferentes entre os cô- modos e a planta precisa acomo- dar tudo isso em uma área cada vez menor, por conta dos limites da Lei de Zoneamento.” /L.P. Reportagem da capa A HABITAÇÃO NO BRASIL A residência brasileira guarda o índio e o europeu DIVULGAÇÃO DIVULGAÇÃO DIVULGAÇÃO De onde vem a planta da casa em que moramos Para arquitetos, a vida moderna já não ‘cabe’ nos imóveis oferecidos pelo mercado atual DE ABRIGO A ÁREA COM UMA LISTA DE 20 FUNÇÕES, O LAR EVOLUIU NO TEMPO Lilian Primi Por que as plantas são como são? Quem foi que dividiu nossas ca- sas em área social, íntima e de serviço? Dedicados ao estudo da habitação contemporânea, os pesquisadores do Núcleo de Es- tudos de Habitares Interativos (Nomads.usp), da Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo em São Carlos, afir- mam que essa divisão é a mesma usada nas casas dos nobres e da alta burguesia do século 17. “A família nuclear com pai, mãe e filhos já era menos da meta- de em 2005”, afirma o arquiteto Fábio Queiroz, do Nomads. A Síntese dos Indicadores Sociais do Instituto Brasileiro de Geo- grafia e Estatística (IBGE) revela que, entre 1995 e 2005, na Região Sudeste, o porcentual de famí- lias com essa formação caiu de 56,6% para 48,5%. “Tivemos ain- da uma revolução nas relações fa- miliares e nos costumes, enquan- to as plantas continuam obede- cendo ao modelo consolidado na Belle Époque (fim do século 19 até a 1ª Guerra Mundial)”, conta. Esse modelo segue os padrões de comportamento da época: de negação da rua, em que a família e as mulheres viviam isoladas do convívio com estranhos e os em- pregados deveriam cumprir suas tarefas sem incomodar. “A ori- gem da copa vem desse costume. Em francês, se chama ‘office’ e era o cômodo de ligação entre a área da família e a de serviços, cha- mada de área de rejeição”, expli- ca Queiróz. Apenas a dona da ca- sa se dirigia ao local, para dar or- dens ao empregado mais gradua- do, e jamais entrava na área de rejeição – a dos trabalhadores. A posição da copa entre a área de serviço e a sala de estar se man- tém até os nossos dias. “Hoje, já não é mais comum separar a sala de jantar da de estar, mas o dese- nho continua o mesmo. A cozi- nha ou está nos fundos do aparta- mento ou em um corredor e sem- pre termina na área de serviço. Só que hoje, cozinhar não é mais uma atividade cotidiana”, diz. Com a entrada da mulher no mercado de trabalho, o almoço cotidiano acontece cada vez mais na rua e se deixa para cozi- nhar nos finais de semana, como uma forma de convívio com a fa- mília e amigos. “A moda gour- met surge dessa mudança, assim como as cozinhas integradas e as varandas gourmets. Mas essa é uma solução mercadológica, pois a sua localização na planta não muda”, diz. A cozinha integrada, ou de Frankfurt, é resultado de uma re- visão da cozinha ocorrida na Eu- ropa com o movimento moder- no. “É compacta, prática e fica no centro da casa. Inclui quem está cozinhando, que pode con- trolar o movimento da casa.” Marketing. Sobre as varandas gourmets, Queiróz afirma: “Ter um espaço aberto e amplo, equi- pado para receber os amigos, é um dos mais caros desejos da grande maioria dos comprado- res. Nos apartamentos-modelo, essas varandas são decoradas pa- ra seduzir o cliente, mas dificil- mente irão cumprir esse papel”, garante o pesquisador. Segundo Queiróz, a decora- ção em geral usa materiais de aca- bamento e equipamentos de al- tíssimo padrão em unidades vol- tadas para um público, no máxi- mo, de classe média, que não te- rá condições de montá-la daque- la maneira. “Além disso, em São Paulo há o problema da fuligem e do barulho e também da vista, que na maioria das vezes não é agradável”, afirma. O resultado é que o comprador acaba fechan- do a varanda, o que além de ilegal pode criar problemas de ventila- ção, reduzindo a qualidade da moradia. “E aquele desejo per- manece um sonho.” O arquiteto diz que a varanda é uma jogada de marketing por- que a verdadeira razão da sua existência nos projetos moder- nos é uma questão de mercado. “O código de obras de São Paulo não considera a metragem da va- randa como área útil para os cál- culos de aproveitamento do ter- reno. Assim, se ela tem 25 m², a cada dez unidades ganham-se 250 metros quadrados de área possível”, explica. Em prédios com apartamentos de 50 metros quadrados, isso significa quatro unidades a mais. É preciso ressaltar que o fecha- mento desse espaço é ilegal e po- de gerar multas e uma ordem de abri-la novamente, caso o imó- vel seja alvo de vistoria dos técni- cos da Prefeitura. “Só que rara- mente isso acontece e muitos corretores usam essa possibilida- de, de aumentar os espaços fe- chando a varanda, como argu- mento de venda”, conta. Encontrar um desenho que atenda às necessidades atuais da família e se enquadre nas condi- ções do mercado, com restri- ções de custo e de espaço, é o maior desafio da arquitetura, na opinião de Fábio Queiróz, pes- quisador do Nomads.usp. Mudança. “A estrutura oitocen- tista não funciona numa área tão pequena. O quarto hoje tem que abrigar TV, computador, mesa de estudo, além da cama e isso é inviável em seis metros quadra- dos, que é a metragem média dos projetos”, afirma. O mesmo ocorre com o banhei- ro, hoje confinado em 1,5 metro quadrado, insuficiente até mes- mo para a sua função básica. “E as pessoas gostam de se trocar e se arrumar no banheiro, que para isso deve guardar uma série de equipamentos e materiais.” Queiróz propõe a criação de espaços com vários usos, o que pode ser facilitado com a adoção de modernos sistemas de auto- mação. “É possível criar um pro- jeto que proponha o uso de pai- néis móveis, por exemplo, e tes- tar a posição da cozinha. O pro- blema é que o mercado tem resis- tência, pois teme ter dificulda- des na venda”, diz. Segundo o arquiteto, essas ex- periências são mais comuns no ex- terior (algumas delas ilustram es- sa página), inclusive para habita- ções populares. “No Brasil, te- mos apenas experiências de flexi- bilização de plantas, que não mu- da muita coisa, pois o espaço é pe- queno. Não dá para fugir do pa- drão em 70, 50 metros quadra- dos”, diz. A casa dos sonhos ainda permanece um sonho. /L.P. No Japão. Na cidade de Osaka, Osaka Gas - NexT 21 Project propõe um conjunto com diferentes tipos de unidades Construtores rebatem críticas ao mercado Copenhagen. Todos os apartamentos deste prédio têm altura dupla ao norte, e ampla vista panorâmica para o sul. Projeto da VM Houses Amsterdan. Projeto do escritório MVRDV, com sede em Rotterdam e formado pelos arquitetos Winy Maas, Jacob van Rijs e Nathalie de Vries DIVULGAÇÃO Configuração nasceu de hábitos dos nativos submetidos ao código de conduta dos conquistadores Holanda. Edifícios do arquiteto Neutelings Riedijk sobre a linha d’água do lago de Huizen: grandes aberturas para a luz 4 a e i u o Imóveis 1 DOMINGO, 28 DE NOVEMBRO DE 2010 O ESTADO DE S. PAULO CLASSIFICADOS

De onde vem a planta da casa onde moramos?

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histórico das modificações de distribução dos ambientes ao longo do tempo

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NA CONTRAMÃO DO TRADICIONAL

1

Século 17O alpendre, com capela equarto de hóspedes, isola a áreaonde fica a família da rua

2

Século 19Ramos de Azevedo introduz aplanta com três zonas: social,íntima e de serviços

3

Século 20Com a chegada domodernismo, plantas voltam ater cômodos com uso múltiplo

Uma habitação tem um programade necessidades, de onde surgeuma lista de cômodos, hoje comno mínimo 20 itens. “É essa lista

que define a planta”, ensina o ar-quiteto Carlos Lemos, professorda pós-graduação da Faculdadede Arquitetura e Urbanismo daUSP e conselheiro do Museu daCasa Brasileira.

Na casa do índio, as primeirasno Brasil, existem dezenas de su-perposições de funções em ummesmo espaço. “Esse programafoi a base da casa dos bandeiran-tes, que eram mamelucos”, conta.

Acrescida de elementos da plantaeuropeia, determinada por regrasda Igreja Católica e do Código Ci-vileuropeu. “Porexemplo, os bre-ves papais impediam que se exer-cesse qualquer procedimento ca-tólico no âmbito familiar. Os ora-tóriosecapelasdeveriamsersepa-rados e com acesso independen-te”,explica.Alémdisso,usosecos-tumes de origem árabe segrega-vamamulher, determinandoa se-paração do quarto de hóspedes,para hospedagem dos viajantes,hábito comum. Por isso, surgiu oalpendre central, com a capela àdireita e o quarto de hóspedes àesquerda.“A alcovaé resultadoda

moral cristã”, diz o professor.Agrossomodo,essetipodemo-

radia persistiuno Brasil ruralaté oImpério. No século 19, com a en-trada do dinheiro vindo da vendade borracha, cana-de-açúcar e so-bretudo do café, houve uma mo-dernização desse programa.

Divisão. “Veio a moda do mo-rar à francesa, introduzido porRamos de Azevedo, que obede-cia ao programa com três zonasde funções definidas: repouso,social e de serviços, que tem co-mo coração a cozinha.”

A planta deveria satisfazer es-se programa e prever uma circu-

lação em que se pudesse ir deuma zona a outra sem passar naterceira. Para facilitar, surgiu ovestíbulo (ou hall), um cômodode passagem com saída para astrês zonas. “Esse esquema du-rou até a chegada da arquiteturamoderna, que não gosta muitodisso. Então até certo ponto, vol-tou a satisfazer o programa anti-go, de áreas superpostas”, conta.

A existência de plantas à modafrancesa, hoje, segundo o profes-sor, é determinada pelo comodis-mo. “Primeiro tinha os escravos e,depois,as empregadas domésticas,que faziam as tarefas chatas.”

No que diz respeito aos hábi-

tos, hoje tudo ficou diferente. “Afamília não se reúne, nem nas re-feições. Os filhos ficam confina-dos nos quartos, onde cada umtem o seu inferninho particu-lar”, diz Lemos. Para evitar con-flitos, tem-se de separar o am-biente de cada um, gerando umadispersão na família.

O professor diz que há tolerân-cia à superposição de funções, di-ferente entre as classes sociais.“As casas autoconstruídas pelasfamílias de operários sobrepõeestar e serviço, enquanto a clas-se média alta, aceita a sobreposi-ção do ambiente de repousocom o social.”/L.P.

● O diretor de economia e presi-dente do conselho consultivo doSindicato da Indústria da Cons-trução de São Paulo (Sinduscon-SP), Eduardo Zaidan, rebate ascríticas dos pesquisadores doNomads à produção do mercadoimobiliário paulistano. “A acade-mia é importante e deve ser con-siderada, porém não obedecida.Ela está muito à frente.”Para Zaidan, essa não é umaquestão trivial. “Envolve ques-tões demográficas, econômicas,de comportamento, mercadológi-

cas e legais. A resposta de US$ 5milhões é qual é o produto dossonhos do cidadão”, diz.Um desejo que segundo Zaidan,varia às vezes entre uma rua e ou-tra. “O brasileiro é conservador.Existem famílias que querem aplanta convencional, e ao mesmotempo, há demandas para arran-jos diferentes. A saída é a flexibili-zação das plantas”, diz.Com relação às varandas, Zaindannão vê problemas. No caso dascozinhas, Zaidan diz que há limita-ções legais. “O código de obrasdetermina regras de iluminação eventilação diferentes entre os cô-modos e a planta precisa acomo-dar tudo isso em uma área cadavez menor, por conta dos limitesda Lei de Zoneamento.” /L.P.

Reportagem da capa

A HABITAÇÃO NO BRASIL

A residência brasileiraguarda o índio e o europeu

DIVULGAÇÃO DIVULGAÇÃO

DIVULGAÇÃO

De onde vema planta dacasa em quemoramosPara arquitetos, a vida moderna já não ‘cabe’nos imóveis oferecidos pelo mercado atual

DE ABRIGO A ÁREA COM UMALISTA DE 20 FUNÇÕES, OLAR EVOLUIU NO TEMPO

Lilian Primi

Por que as plantas são como são?Quem foi que dividiu nossas ca-sas em área social, íntima e deserviço? Dedicados ao estudo dahabitação contemporânea, ospesquisadores do Núcleo de Es-tudos de Habitares Interativos(Nomads.usp), da Faculdade deArquitetura da Universidade deSão Paulo em São Carlos, afir-mam que essa divisão é a mesmausada nas casas dos nobres e daalta burguesia do século 17.

“A família nuclear com pai,mãe efilhos já era menosda meta-de em 2005”, afirma o arquitetoFábio Queiroz, do Nomads. ASíntese dos Indicadores Sociaisdo Instituto Brasileiro de Geo-grafia e Estatística (IBGE) revelaque, entre 1995 e 2005, na RegiãoSudeste, o porcentual de famí-lias com essa formação caiu de56,6% para 48,5%. “Tivemos ain-da uma revolução nas relações fa-miliares e nos costumes, enquan-to as plantas continuam obede-cendo ao modelo consolidado naBelle Époque (fim do século 19até a 1ª Guerra Mundial)”, conta.

Esse modelo segue os padrõesde comportamento da época: denegação da rua, em que a família eas mulheres viviam isoladas doconvívio com estranhos e os em-pregados deveriam cumprir suastarefas sem incomodar. “A ori-gem da copa vem desse costume.Em francês, se chama ‘office’ eera o cômodo de ligação entre aáreadafamília eadeserviços,cha-mada de área de rejeição”, expli-ca Queiróz. Apenas a dona da ca-sa se dirigia ao local, para dar or-dens ao empregado mais gradua-do, e jamais entrava na área derejeição – a dos trabalhadores.

A posição da copa entre a áreade serviço ea sala de estar se man-tém até os nossos dias. “Hoje, jánão é mais comum separar a salade jantar da de estar, mas o dese-nho continua o mesmo. A cozi-nha ou está nos fundos do aparta-mento ou em um corredor e sem-pre termina na área de serviço. Sóque hoje, cozinhar não é maisuma atividade cotidiana”, diz.

Com a entrada da mulher nomercado de trabalho, o almoçocotidiano acontece cada vezmais na rua e se deixa para cozi-nhar nos finais de semana, comouma forma de convívio com a fa-mília e amigos. “A moda gour-met surge dessa mudança, assimcomo as cozinhas integradas e as

varandas gourmets. Mas essa éuma solução mercadológica,pois a sua localização na plantanão muda”, diz.

A cozinha integrada, ou deFrankfurt, é resultado de uma re-visão da cozinha ocorrida na Eu-ropa com o movimento moder-no. “É compacta, prática e ficano centro da casa. Inclui quemestá cozinhando, que pode con-trolar o movimento da casa.”

Marketing. Sobre as varandasgourmets, Queiróz afirma: “Terum espaço aberto e amplo, equi-pado para receber os amigos, éum dos mais caros desejos dagrande maioria dos comprado-res. Nos apartamentos-modelo,essas varandas são decoradas pa-ra seduzir o cliente, mas dificil-mente irão cumprir esse papel”,garante o pesquisador.

Segundo Queiróz, a decora-ção em geral usa materiais de aca-bamento e equipamentos de al-tíssimo padrão em unidades vol-tadas para um público, no máxi-mo, de classe média, que não te-rá condições de montá-la daque-la maneira. “Além disso, em SãoPaulo há o problema da fuligeme do barulho e também da vista,que na maioria das vezes não éagradável”, afirma. O resultadoé que o comprador acaba fechan-do a varanda, o que além de ilegalpode criar problemas de ventila-ção, reduzindo a qualidade damoradia. “E aquele desejo per-manece um sonho.”

O arquiteto diz que a varandaé uma jogada de marketing por-que a verdadeira razão da suaexistência nos projetos moder-nos é uma questão de mercado.“O código de obras de São Paulonão considera a metragem da va-randa como área útil para os cál-culos de aproveitamento do ter-reno. Assim, se ela tem 25 m², acada dez unidades ganham-se250 metros quadrados de áreapossível”, explica. Em prédioscom apartamentos de 50 metrosquadrados, isso significa quatrounidades a mais.

É preciso ressaltar que o fecha-mento desse espaço é ilegal e po-de gerar multas e uma ordem deabri-la novamente, caso o imó-vel seja alvo de vistoria dos técni-cos da Prefeitura. “Só que rara-mente isso acontece e muitoscorretores usam essa possibilida-de, de aumentar os espaços fe-chando a varanda, como argu-mento de venda”, conta.

Encontrar um desenho queatenda às necessidades atuais dafamília e se enquadre nas condi-ções do mercado, com restri-ções de custo e de espaço, é omaior desafio da arquitetura, naopinião de Fábio Queiróz, pes-quisador do Nomads.usp.

Mudança. “A estrutura oitocen-tista não funciona numa área tãopequena. O quarto hoje tem queabrigar TV, computador, mesade estudo, além da cama e isso éinviável em seis metros quadra-dos, que é a metragem média dosprojetos”, afirma.

Omesmo ocorrecom o banhei-ro, hoje confinado em 1,5 metroquadrado, insuficiente até mes-mo para a sua função básica. “Eas pessoas gostam de se trocar ese arrumar no banheiro, que paraisso deve guardar uma série de

equipamentos e materiais.”Queiróz propõe a criação de

espaços com vários usos, o quepode ser facilitado com a adoçãode modernos sistemas de auto-mação. “É possível criar um pro-jeto que proponha o uso de pai-néis móveis, por exemplo, e tes-tar a posição da cozinha. O pro-blema é que o mercado tem resis-tência, pois teme ter dificulda-des na venda”, diz.

Segundo o arquiteto, essas ex-periênciassãomaiscomunsnoex-terior (algumas delas ilustram es-sa página), inclusive para habita-ções populares. “No Brasil, te-mos apenas experiências de flexi-bilização de plantas, que não mu-da muita coisa, pois o espaço é pe-queno. Não dá para fugir do pa-drão em 70, 50 metros quadra-dos”, diz. A casa dos sonhos aindapermanece um sonho./L.P.

No Japão. Na cidade de Osaka, Osaka Gas - NexT 21 Projectpropõe um conjunto com diferentes tipos de unidades

Construtoresrebatem críticasao mercado

Copenhagen.Todos osapartamentosdeste prédiotêm alturadupla ao norte,e ampla vistapanorâmicapara o sul.Projeto da VMHouses

Amsterdan. Projeto do escritórioMVRDV, com sede em Rotterdam eformado pelos arquitetos Winy Maas,Jacob van Rijs e Nathalie de Vries

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Configuração nasceude hábitos dosnativos submetidosao código de condutados conquistadores

Holanda. Edifícios do arquiteto Neutelings Riedijk sobre a linha d’água do lago de Huizen: grandes aberturas para a luz

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4 a e i uo Imóveis 1 DOMINGO, 28 DE NOVEMBRO DE 2010 O ESTADO DE S. PAULO CLASSIFICADOS