1. DE ONDE VM OS PSICANALISTAS? Rodrigo Santos Barbosa Belo
Horizonte 2006
2. SUMRIO 1 INTRODUO
....................................................................................................................3
2 FUNDAMENTAO TERICA
......................................................................................7
2.1 Breve histrico da questo da anlise leiga
........................................................................7
2.2 Princpios da
Psicanlise......................................................................................................8
2.3 A especificidade da Psicanlise: a anlise como processo de
formao do analista............9 2.4 A lei que regula a Psicanlise:
no se trata de uma regulamentao..................................13
2.5 A insero da Psicanlise no mundo acadmico e
universitrio.........................................17 3
CONSIDERAES FINAIS
.............................................................................................19
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
.................................................................................21
ANEXOS
.................................................................................................................................25
3. 1 INTRODUO A anlise leiga mesmo? Essa indagao ainda mantm a
sua atualidade, apesar de ter sido trabalhada por Freud em 1926 no
ensaio A Questo da Anlise Leiga. Por ter vivenciado algumas
experincias que remetem a essa questo, acabei me sentindo motivado
a trazer tal discusso para a monografia de concluso do curso de Ps-
Graduao em Psicanlise Teoria e Prtica. Isso teve incio h algum
tempo, quando fazia terapia. A psicloga que me atendia informou-me
que, para ser psicanalista, bastava ter o diploma de qualquer curso
superior e fazer um curso de psicanlise de curta durao (cerca de 1
a 2 anos) com analistas. Ela tambm me disse que esse meio, o dos
psicanalistas, era muito fechado. Tal episdio me fez lembrar uma
conversa com uma mdica dermatologista. Ela me disse que o meio dos
dermatologistas em Belo Horizonte tambm muito fechado. E
acrescentou: todo meio fechado. E como falamos mais do que sabemos
que falamos, fica bvio: se existe um meio porque existe algo que o
circunscreve, que faz borda, caso contrrio no haveria o meio.
Parece at que estamos falando de zonas ergenas, de bordas, de gozo,
ao lidar com a sexualidade. E, como diz Freud, que a nossa
civilizao estruturada s expensas da sexualidade; em nossa sociedade
h vrios meios, vrios fechamentos e bordas que, como rituais
(discurso religioso), impem obstculos. E isso, no meio
psicanaltico, pode ser considerado como resistncia do analista. Mas
voltemos a minha questo. O tempo passou e um dia bati porta de um
psicanalista. Depois de algum tempo em anlise, comecei a me deparar
com o desejo de analista. Nessa ocasio, perguntei a meu analista se
a Psicanlise seria uma especialidade da Psicologia. Ele me
respondeu que no. Falo com ele sobre o comentrio que a psicloga que
me atendia havia feito e ele confirmou: ela tinha razo em afirmar
que para ser psicanalista no necessrio ser psiclogo. Tambm tive
minhas resistncias em aceitar isso to rpida ou prontamente. Durante
o meu percurso em anlise, pedi para meu analista a indicao de um
lugar onde eu poderia iniciar meus estudos em Psicanlise, e ele me
indicou: do lugar do leigo mesmo que voc iniciar sua formao. Eu j
no era to leigo assim, pois j estava em anlise, mas no tinha um
conhecimento prvio da teoria psicanaltica. Surgiu ento o
4. segundo obstculo: liguei para a Escola indicada por meu
analista e a pessoa que me atendeu, aps eu ter me identificado como
analisante de um membro dessa Escola, me perguntou com certa
estranheza se eu era psiclogo. Disse que cursava Administrao. Levei
essa conversa ao telefone para a minha anlise, e o analista
comentou que realmente houve essa estranheza por parte da pessoa
que me atendeu. Esta disse ao meu analista ter achado esquisito que
ele tivesse indicado uma Escola de Psicanlise para uma pessoa que
nunca tinha estudado Psicologia. Parece que ela havia esquecido que
eu havia falado que fazia anlise. Meu analista disse que se tratava
de um equvoco. Enfim, passei a frequentar alguns seminrios dessa
Escola. Comecei a participar de um cartel que, no meio
psicanaltico, refere-se a um modo de transmisso da Psicanlise e
tambm a freqentar outras Escolas e espaos destinados transmisso da
Psicanlise. Durante esse percurso, escutei algumas coisas que eram
no mnimo contraditrias. Alis, desde que comecei a frequentar esse
meio, sempre o achei contraditrio. Eram coisas que me incomodavam e
me faziam repensar se realmente eu poderia me tornar um
psicanalista. E eu continuei levando essas questes para a minha
anlise. Decidi fazer uma ps-graduao em Psicanlise e, ao entrar em
contato com a secretaria da ps-graduao de uma instituio de ensino
superior, fui informado de que no poderia fazer a ps-graduao e que
poderia at mesmo ser preso por prtica ilegal da profisso. Pensei:
ilegal? Os coordenadores dessa ps-graduao me falaram que foi uma
informao errada, mas que talvez a burocracia dessa instituio me
impedisse de freqentar as aulas. Insisti com os coordenadores, que
me apoiaram na entrada para essa ps-graduao, porm ainda com uma
ressalva: se o curso se estendesse e houvesse uma parte prtica,
talvez eu no pudesse participar. Mais uma vez devido burocracia,
uma velha inimiga de Freud. Essa questo permaneceu em aberto
durante o curso, at que, a poucas semanas de conclu-lo, num momento
de discusso sobre os estgios, fui informado de que poderia
participar. Diante de tudo isso, eu me pergunto: a anlise leiga
mesmo? E Isso est relacionado formao do psicanalista, um tema
bastante discutido na atualidade. Fala-se muito na regulamentao ou
no desse ofcio. Alguns so contra, outros a favor. O Movimento
Mineiro de Psicanlise (MMP) posiciona-se contra a tentativa dessa
regulamentao e se coloca a trabalho para oficializar a no -
regulamentao da Psicanlise. Esse movimento surgiu em 2000, tendo
como objetivo possibilitar a discusso de questes relativas
Psicanlise por parte de representantes das diversas instituies
mineiras de Psicanlise. Nessa ocasio, o MMP manifestou-se contra a
tentativa de regulamentao da
5. Psicanlise atravs do Projeto de Lei n 3944 de 2000, do ento
deputado federal ber Silva (anexo A). Algumas instituies de
Psicanlise se reuniram e fizeram uma carta manifesto (anexo B), que
recebeu 65 assinaturas institucionais e mais o apoio de 10
instituies no psicanalticas, posicionando-se contra qualquer
tentativa de regulamentao da Psicanlise. Essa carta foi encaminhada
a todos os deputados de comisses envolvidas com a avaliao desse
projeto de lei. Para os componentes do MMP, a regulamentao da
Psicanlise iria restringir o exerccio desse ofcio, pois o que est
em questo a operao do inconsciente, que no algo a ser ensinado,
como ocorre em outros campos de saber. Deve-se ressaltar que Freud
tambm se deparou com a tentativa de criao de uma legislao que
determinasse quem poderia ou no praticar a Psicanlise, tendo se
posicionado contra ela: Se a proibio fosse efetivada, ns nos
encontraramos numa posio na qual grande nmero de pessoas ficariam
impedidos de executar uma atividade que podemos com segurana nos
sentir convictos de que podem efetuar muito bem, ao passo que a
mesma atividade est franqueada a outras pessoas para as quais no h
qualquer garantia semelhante. Essa no precisamente a espcie de
resultado ao qual a legislao deva conduzir (FREUD, 1926, p.265).
Falar da formao do psicanalista nos faz pensar a respeito do
momento da formao a partir do qual algum pode comear a exercer esse
ofcio. J que no h garantias ou provas legais de que algum seja ou
no psicanalista, de onde vem a autorizao para exercer a Psicanlise?
Pretende-se ainda, com este trabalho, discutir a relao da formao do
psicanalista com o meio universitrio, j que se tm tornado cada vez
mais numerosos os espaos destinados Psicanlise dentro das
Universidades, como nas ps-graduaes, mestrados e doutorados. O
objetivo deste trabalho, ento, fazer uma discusso terica sobre o
tema descrito, a fim de que equvocos possam ser evitados, para que
a lmina cortante de Freud no fique cega. Vidal corrobora essa
importncia com a afirmao: Torna-se urgente engajar os analistas na
discusso sobre os efeitos do saber que eles produzem e o modo de
transmiti-los, j que ele no se ensina como qualquer outro saber
(VIDAL, 2003, p.36). Ao estudar a formao do psicanalista neste
trabalho, estamos contribuindo tambm para discutir a especificidade
que marca o campo psicanaltico.
6. A realizao deste trabalho tambm importante por oferecer a
oportunidade de construo de um saber, contrapondo-se atitude de
apenas se dirigir a um texto, em que j existe uma saber construdo,
pois, fazendo uma analogia entre uma formao do inconsciente
Traumarbeit trabalho sonho e a formao do analista: [...] os
leitores caem facilmente no engano de considerar o contedo latente
como o ponto mais importante, negligenciando, precisamente, o que
lhe mais especial: o trabalho (PORTUGAL, 2005, p.4). Trata-se de um
estudo bibliogrfico sobre a formao do psicanalista. Por isso, como
procedimento metodolgico, foi feita uma pesquisa bibliogrfica. Foi
realizada uma seleo prvia de textos sobre o tema. Optou-se por
selecionar o ensaio A questo da anlise leiga, de Freud, como eixo
principal do trabalho, a partir do qual teve incio esta escrita, e
depois foram articulados outros textos da obra freudiana, como
tambm de outros autores: No h, com efeito, uma s balela proferida
na mixrdia inspida que a literatura analtica que no tome o cuidado
de se apoiar numa referncia ao texto de Freud [...] (LACAN, 1957,
p.459). A monografia traz uma discusso terica, dividida em cinco
eixos: (a) Breve histrico da questo da anlise leiga, (b) Princpios
da Psicanlise, (c) A especificidade da Psicanlise: a anlise como
processo de formao do analista, (d) A lei que regula a Psicanlise:
no se trata de uma regulamentao, (e) A insero da Psicanlise no
mundo acadmico e universitrio.
7. 2 FUNDAMENTAO TERICA 2.1 Breve histrico da questo da anlise
leiga Em 1926, em Viena, um psicanalista no-mdico foi acusado de
charlatanismo, por ter violado uma antiga lei austraca que
considerava ilegal uma pessoa que tratasse de pacientes sem ser
mdico. Freud ento prepara o texto A questo da anlise leiga, onde
defende a posio desse psicanalista, Theodor Reik. Freud, nesse
texto, utiliza os termos no-mdico e leigo como sinnimos, para com
isso afirmar que a Psicanlise no uma especialidade acadmica: Mas
objetar-se-, a essa altura, que se a psicanlise, considerada como
cincia, for considerada subdiviso da medicina ou da psicologia,
isto ser uma questo puramente acadmica e de nenhum interesse prtico
(FREUD, 1926, p.288). Nem os analistas leigos que praticam a anlise
em nossos dias so um bando de rebotalhos, mas pessoas de educao
acadmica, doutores em filosofia, educadores, juntamente com algumas
mulheres de grande experincia na vida e marcante personalidade
(FREUD, 1926, p.277). Freud escreve esse texto para discutir se os
leigos, assim como os mdicos, poderiam praticar a Psicanlise. Para
ele, era uma novidade algum estar preocupado com quem poderia ou no
praticar a Psicanlise, pois o habitual era que todos concordassem
que ningum deveria pratic-la. Essa questo de decidir se a prtica da
psicanlise deveria ou no ser uma exclusividade mdica no ocorria em
todos os pases, mas isso no significava que um analista no tivesse
de assumir a responsabilidade sobre seus atos em qualquer que fosse
o lugar onde exercesse esse ofcio. Freud nunca foi a favor de uma
lei que exclusse os leigos da prtica da Psicanlise, muito pelo
contrrio. Ele enfatizou que os leigos contribuem para o
desenvolvimento da Psicanlise: Que os resultados alcanados no
tenham deixado, apesar de tudo, de ser considerveis, deve-se em
parte fertilidade do mtodo analtico, e em parte, circunstncia de
que j existem alguns pesquisadores no-mdicos que fizeram da aplicao
da psicanlise s cincias mentais sua profisso na vida (FREUD, 1914,
p. 47).
8. Desde o incio do texto A questo da anlise leiga, ele deixa
essa posio bem marcada e depois vai construindo uma argumentao para
sustentar tal posio, como se verifica na seguinte passagem: Ainda
assim, h certas complicaes, com as quais a lei no se preocupa, mas
que no obstante exigem considerao. Talvez venha a acontecer que
nesse caso os pacientes no sejam como outros, que os leigos no
sejam realmente leigos, e que os mdicos no tenham exatamente as
mesmas qualidades que se teria o direito de esperar deles e nas
quais suas alegaes devem basear-se (FREUD, 1926, p.210). 2.2
Princpios da psicanlise Para construir essa argumentao, Freud vai
afirmando os princpios da Psicanlise. Por exemplo, ele fala da
regra fundamental da Psicanlise: Convid-lo a ser inteiramente
sincero com seu analista, nada refrear intencionalmente que lhe
venha cabea, e, portanto, pr de lado toda reserva que o possa
impedir de informar sobre certos pensamentos ou lembranas (FREUD,
1926, p.214). Fala de maneira resumida da noo de inconsciente e do
recalque: [...] coisas que algum gosta de ocultar de si prprio e
que por esse motivo interrompe e expulsa de seus pensamentos se,
apesar de tudo, vierem tona. Talvez ela prpria observe que um
problema muito marcante comea a aparecer nessa situao um pensamento
seu sendo mantido em segredo para o seu prprio eu (FREUD, 1926,
p.215). Freud fala tambm que a Psicanlise surgiu da clnica, da
escuta de seus pacientes, e que esse saber no se aprende com a
psicologia acadmica: E o senhor alega que descobriu esse fundamento
comum da vida mental, que foi desprezado por todo psiclogo, a
partir de observaes de pessoas doentes?` A fonte de nossos achados
no me parece priv-los do seu valor. A psicologia acadmica jamais
foi capaz de nos informar qual esse significado. Ela nada pode
inferir dos sonhos (FREUD, 1926, p.219). Freud diz que a psicologia
barra o acesso regio do Isso, pois para ela todos os atos mentais
so conscientes, no se interessando assim pelo inconsciente,
elemento constituinte do sujeito e fundamental para a Psicanlise. O
que Freud nos leva a pensar, segundo Penna (2001), que o
conhecimento consciente no recobre a verdade do sujeito, a verdade
da castrao.
9. Ferenczi, importante colaborador de Freud, diz: A exatido em
psicologia experimental no passa de um engodo, de uma formao
substitutiva (Ersatzbildung), para mascarar a ausncia de contedo
dessa cincia. A psicologia experimental exata, mas nada nos ensina;
a psicanlise inexata, mas revela relaes insuspeitadas e desvenda
camadas do psiquismo que eram inacessveis at agora (FERENCZI, 1991,
p.147). 2.3 A especificidade da Psicanlise: a anlise como processo
de formao do analista Freud defende que a transmisso da Psicanlise
se d principalmente atravs da anlise pessoal, j que, para se
adquirir a convico da existncia do inconsciente, necessrio ser
afetado na prpria carne por essa experincia. essa convico que
orienta posteriormente o trabalho do analista. Isso explicitado na
seguinte passagem do texto de Freud Anlise terminvel e interminvel:
Mas onde e como pode o pobre infeliz adquirir as qualificaes ideais
de que necessitar em sua profisso? A resposta : na anlise de si
mesmo, com a qual comea sua preparao para a futura atividade
(FREUD, 1937, p.282). Freud j havia desenvolvido essa questo no
texto sobre o Homem dos Lobos: sabido que no se encontram meios de
introduzir, de qualquer modo, na reproduo de uma anlise o
sentimento de convico que resulta da prpria anlise. Exaustivos
relatrios textuais dos procedimentos adotados durante as sesses no
teriam certamente qualquer valia; e, de qualquer maneira, a tcnica
do tratamento torna impossvel elabor-los. Assim, anlises como esta
no so publicadas com a finalidade de produzir convico nas mentes
daqueles cuja atitude tenha sido, at ento, de recusa e ceticismo. A
inteno apenas a de apresentar alguns novos fatos a pesquisadores
que j estejam convencidos por suas prprias experincias clnicas
(FREUD, 1914, p.27). Sendo assim, a formao do analista deve ser
desarticulada da pedagogia, ou seja, ela no ocorre via ensino. No
existe um curso para formar analistas, cada um faz seu prprio
percurso. Por isso no h formao do analista e sim formaes do
inconsciente, aforismo lacaniano explicado por Miller: Essa
proposio visa que, na experincia analtica, o nico saber que se
trata de transmitir o saber suposto, ou seja, de verdade. H
portanto, em ltima instncia, reabsoro da formao analtica na prpria
experincia analtica (MILLER, 2003, p. 7).
10. Miller fala desse saber suposto para dizer que ele no
transformvel em conhecimento, no podendo assim dar matria a uma
pedagogia. Isso no quer dizer que o analista deva desconsiderar os
estudos realizados nos espaos destinados transmisso da Psicanlise.
Mas Lacan nos adverte que, mesmo nesses espaos, qualquer dose desse
saber transmitido no tem valor formativo para o analista, pois este
opera em outra dimenso. Deve- se fazer tbula rasa do saber
adquirido: O saber que Lacan recusa de bom grado o que concerne
experincia anterior, ao funcionamento emprico do tratamento
analtico, pois deve-se nada saber previamente sobre aquilo que ir
ocorrer (MILLER, 2003, p.33). A escuta do analista fica
comprometida se ele no passar por sua prpria anlise, pois no ir
escutar pontos da fala de seu paciente que toquem em suas prprias
questes no analisadas. Podemos ver indicaes disso quando Freud fala
que pessoas conciliam as observaes das atividades sexuais das
crianas, julgando-as pecaminosas, com o pensamento de que estas so
puras e no sexuais, bem como na seguinte passagem: E aqui, antes de
tudo, somos levados obrigao do analista de tornar-se capaz, por uma
profunda anlise dele prprio, da recepo sem preconceitos do material
analtico (FREUD, 1926, p.250). Esse comprometimento da escuta do
analista sem uma prvia psicanlise ocorre principalmente em virtude
das questes ligadas sexualidade, o mesmo motivo pelo qual, at hoje,
algumas pessoas tratam a Psicanlise com tanta hostilidade. As
prprias descobertas da sexualidade infantil e do complexo de dipo
causaram descrenas, contradies e ataques Psicanlise, j que, como
marcou Freud, nossa vida civilizada se acha inteiramente
estruturada s expensas da sexualidade. Uma vez que [...] a
civilizao se baseia nos recalcamentos efetuados por geraes
anteriores, e que se exige de cada nova gerao que mantenha essa
civilizao efetuando os mesmos recalcamentos (FREUD, 1914, p. 71),
como ento livrar-se desse legado seno atravs de uma anlise? E a
psicanlise se d na via de uma suposio de saber, sustentando a
transferncia. O que pe o neurtico a trabalhar a relao que se
estabelece entre ele e o analista, uma atitude emocional especial,
e no explicaes sobre a psicanlise. Lavarini explica por que uma
anlise se d via suposio de saber: Freud detectou que o percurso na
construo de uma verdade do sujeito passa pelo campo do Outro, pois
o sujeito julga pertencer a outrem tudo o que persiste obscuro para
si. Nota-se portanto um inconsciente articulado enquanto discurso
do Outro. Esse Outro, reservatrio do saber recalcado, sustenta a
relao do sujeito com o saber sobre o sexual (LAVARINI, 1998,
p.211).
11. interessante notar que Freud revela, na Histria do
movimento psicanaltico (1914), que o saber a que comeou ter acesso
fora-lhe transmitido por trs pessoas Breuer, Charcot e Chrobak mas
que esses trs no possuam esse saber. Aparece aqui a questo da
transmisso em psicanlise e a observao de que falamos mais do que
sabemos que falamos. A transmisso foi possvel porque Freud se
dirigia a essas pessoas com uma transferncia de trabalho. Penna, em
seu livro Psicanlise e Universidade - H transmisso sem clnica?,
sustenta essa mesma posio: E, se, para a cincia e para a
universidade, o saber se transmite pelas frmulas e leis, atravs de
sua exposio, a psicanlise se apia inteiramente na transferncia
sustentada pela suposio de saber, o que requer a dimenso do amor,
da presena e da palavra (PENNA, 2003, p.42, grifos da autora).
Porm, para se tornar um analista, deve-se ir alm da prpria anlise
pessoal. A formao de um psicanalista composta pelo trip: anlise
pessoal, estudos psicanalticos e superviso. essa formao especfica
que prepara o psicanalista para que ele possa exercer seu ofcio, e
no um diploma universitrio: Se a pessoa ou no mdico, a mim me
parece sem importncia (FREUD, 1926, p.265). Vidal adverte que ceder
na questo da anlise leiga ir contra os princpios da Psicanlise,
pois esta no se aprende atravs de livros ou aulas expositivas: A
experincia do inconsciente a de um saber regulado pela resistncia
interna do sujeito. S poder existir um acesso a esse saber se o
sujeito elabora as condies dessa resistncia. O saber est vinculado
ao sexual e a resistncia denota a amarrao do saber ao gozo (VIDAL,
2003, p. 29). Por isso, s podemos avanar na teoria da Psicanlise
medida que conseguimos avanar em nossa prpria anlise. A superviso
tambm muito importante e necessria para a formao de um
psicanalista. um auxlio na construo do saber que o analista obtm
atravs de sua prtica clnica. Porm, o supervisor no dirige o
tratamento do paciente do supervisando e sim tem uma viso singular,
para que o supervisando no saia do lugar de analista de seus
pacientes. Uma superviso, assim como uma anlise, no conta com
normas expressas, e no se trata de grandes discusses tericas,
dando-se maior oportunidade para os casos clnicos e dificuldades do
analista diante deles. O supervisando no deve se autorizar a partir
do supervisor, mas se implicar nas provas que d de seu saber, e o
supervisor no deve agir como um professor que diz passo a
12. passo o que fazer. Isso poderia levar a uma superviso sem
fim. Corroboram isso as seguintes passagens: O supervisor ser o que
interroga o que apalpa a consistncia dessa construo e seus
fundamentos. Tambm ser ele quem extrai ou acompanha a extrao das
conseqncias interpretativas que se deduzem dessa construo. Fica a
cargo do analista o que fazer com essa construo, seus efeitos e
conseqncias, e como a articular sua prtica. (CHAMORRO, 2003, p.62).
O supervisor, presena sutil, produz tanto mais efeitos quanto menos
ondas faz (HARARI; BARRES; SILVA, 2003, p.111). Uma superviso deve
ser sempre algo alm da anlise do supervisando e nunca menos que
ela. A superviso tambm diz respeito ao ponto em que se encontra o
supervisando em relao sua autorizao como psicanalista. Pode-se
interrogar o porqu da demanda da superviso, pois nela aparece a
relao entre a funo de analista e algo de seu gozo, que deve ser
interpretado pelo supervisor. Pode tambm ser colocada em questo a
anlise do supervisando, em virtude de suas dificuldades diante de
seus pacientes: A superviso a sede de uma complexidade que
claramente ultrapassa a leitura de um material e seu comentrio.
Seja isso visvel ou presente de modo sutil (CHAMORRO, 2003, p.61).
A superviso pode at mesmo demandar mais anlise e provocar talvez a
interrupo ou abandono da prtica da psicanlise: Como se v, a
superviso pode ser o lugar de onde se destitui um analista
(CHAMORRO, 2003, p.61). Se desse modo no h garantias para a formao
de um analista, quando algum pode comear a exercer esse ofcio ou se
dizer psicanalista? Lacan responde a essa pergunta quando institui
sua Escola e diz que o analista se autoriza por si mesmo. na
experincia singular de uma anlise que pode surgir o desejo do
analista. Um analista se autoriza com o tempo, de sua anlise, de
sua prtica, e deve sustentar essa autorizao durante o trajeto de
sua formao. Deve, portanto, se responsabilizar por sua enunciao,
atravs da prtica e da superviso. Kruger corrobora isso dizendo: A
lio a extrair deste momento que j no se busca ser reconhecida como
analista, seno que se trata do reconhecimento de seu produto, de um
produto que no s contempla a construo de um caso e sua formalizao,
seno a possibilidade de exp-lo comunidade, de fazer da clnica um
trabalho no interior de nosso espao de trabalho que a Escola.
Porque este percurso pela prtica pessoal tem seu lugar de insero
hoje, na Escola (KRUGER, 2002, p.87). Lacan cria o dispositivo do
passe, para aquele que deseje dar testemunho da travessia de sua
anlise e do surgimento do desejo de analista durante esta. O passe
tambm
13. instaurado para lidar com a nominao de maneira diferente
daquela da Associao Psicanaltica Internacional (IPA), conforme a
qual um pretendente a analista deveria passar por uma anlise
didtica. Desse modo, um analista pode se dirigir a uma Escola,
passando de analista que se autodeclara para Analista da Escola
(AE): Nessa transformao, o que era suposto a partir de uma enunciao
performativa sou analista , se efetiva ainda mais, se corporifica
medida que o analista se expe, e, ..., se faz reconhecer
socialmente por sua prtica [...] (LAIA,2001, p.64). Miller fala da
importncia do passe em uma Escola: Em nossa concepo o passe garante
a Escola que garante seus AMEs (MILLER, 2001, p.9). Mas importante
ressaltar que essa garantia no - toda. 2.4 A lei que regula a
psicanlise: no se trata de uma regulamentao Dessa forma, como vimos
anteriormente, tentar controlar a formao de um psicanalista atravs
de uma lei seria tentar controlar a experincia de uma anlise fora
dela. E isso no possvel, [...] pois, se podemos definir
ironicamente a psicanlise como o tratamento que se espera de um
psicanalista, justamente a primeira, no entanto, que decide sobre a
qualidade do segundo (LACAN, 1956, p.462). E os efeitos que uma
anlise pode ter, incluindo neles o surgimento do desejo do
analista, s a posteriori possvel saber. Portanto, excluir os leigos
da prtica da Psicanlise estaria a servio do recalcamento da questo
da formao do analista, seria uma resistncia daquele de quem
partisse essa tentativa. A lei que a regula a da estrutura do
inconsciente, qual analisante e analista se submetem, na tarefa de
desatar o n do sintoma e restituir a verdade da palavra (VIDAL,
2003, p. 40). Esse tambm o pensamento de Lacan, pois, para ele, o
que habilita o analista a desempenhar seu papel legtimo o lugar que
ele ocupa, lugar do Outro, podendo assim receber a investidura da
transferncia: Qualquer outro lugar, para o analista, o reduz a uma
relao dual que no tem outra sada seno a dialtica do
desconhecimento, denegao e alienao narcsica que, em todos os ecos
de sua obra, Freud martela sendo prpria do eu (LACAN, 1957,
p.456).
14. Mesmo assim, j foram feitas algumas tentativas de
regulamentao da Psicanlise. Em 2000, foi criado o Projeto de Lei n
3944 (anexo A), numa tentativa infundada e mal sucedida de
regulamentar a Psicanlise. A Associao Brasileira de Psicanlise se
posicionou contra essa tentativa, atravs de uma carta - manifesto
(anexo C). Em 2003, foi realizada uma outra tentativa de
regulamentao, tambm mal sucedida. Nessa ocasio, o psicanalista
Paulo Becker fez uma consulta Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),
que lhe respondeu atravs de um estudo embasado juridicamente (anexo
D), no qual se afirma que o exerccio da psicanlise prescinde de
regulamentao pelo Poder Pblico. O prprio Conselho Regional de
Psicologia (CRP), quando consultado em relao ao mesmo assunto,
respondeu, em uma carta (anexo E) endereada ao Aleph - Escola de
Psicanlise, que o problema sai da esfera legal e recai sobre a
esfera tica.. Mesmo assim, por causa da desinformao, ainda comum
encontrarmos pessoas que dizem que quem praticar a psicanlise sem
um diploma universitrio de mdico ou psiclogo estar cometendo um ato
ilegal. Essas pessoas ignoram que, por no haver lei disciplinadora,
o exerccio da psicanlise livre, tanto por fora do permissivo
constitucional como por fora do princpio jurdico basilar de que o
que no proibido, juridicamente permitido: Art. 5 Todos so iguais
perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade
do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos
termos seguintes: [...] II ningum ser obrigado a fazer ou deixar de
fazer alguma coisa seno em virtude de lei; [...] XIII livre o
exerccio de qualquer trabalho, ofcio ou profisso, atendidas as
qualificaes profissionais que a lei estabelecer (Constituio da
Repblica Federativa do Brasil de 5 de Dezembro de 1988). Vimos ento
que equvocos so comuns no que se refere psicanlise. Freud sempre se
preocupou com isso e achou necessria a criao de uma associao
oficial para trocas de idias e apoio mtuo entre os psicanalistas.
Para ele, deveria haver alguma sede cuja funo seria afirmar: todas
essas tolices nada tm que ver com a anlise, isto no psicanlise
(FREUD, 1914, p.57). Porm, Freud nos adverte que mesmo nessas
associaes psicanalticas podemos encontrar equvocos que ele mesmo
queria evitar, pois o mesmo que pode ocorrer com pacientes
renunciar a uma compreenso que alcanou em certa profundidade da
anlise, por causa de uma resistncia pode acontecer tambm com
psicanalistas: [...] e mesmo assim podemos v-lo, sob o domnio da
prpria resistncia seguinte, lanar tudo o que compreendeu
15. s urtigas e ficar na defensiva como o fez nos dias em que
era um principiante despreocupado (FREUD, 1974 [1914], p.62). Isso
ocorreu na Associao Psicanaltica Internacional (IPA), criada por
Freud, com deseres de Adler e Jung. Freud mesmo se perguntou, mais
tarde, se a institucionalizao da Psicanlise seria o melhor caminho,
pois o grupo de analistas reunido comeou a se defrontar com
problemas, como rivalidades numa busca de poder. Diante disso, a
IPA props a unificao das regras tcnicas, a partir da anlise
didtica, segundo as quais apenas alguns analistas poderiam analisar
e supervisionar os futuros pretendentes a analistas. Mas com isso a
Psicanlise ficou engessada em um modelo, um padro, o que no era a
inteno de Freud. Em vez disso, a Psicanlise deve ser reinventada a
cada caso. Lacan rompe com essa unificao da tcnica, cria o tempo
lgico, deixando as sesses de ter um tempo determinado a priori, e
expulso da IPA. Na Escola de Lacan no se trata de imprimir e
difundir uma certa tiragem de analistas a partir de uma matriz que
os chamados didatas foram disciplinados a corporificar (LAIA, 2001,
p.60). Em uma escola de Psicanlise, no deve haver uma hierarquia na
qual declaraes sejam aceitas cegamente, e, sim, haver espao para
que crticas sejam ouvidas, sem vaidades. necessrio no rejeitar o
novo, em nome de um saber prprio, antes de uma reflexo, pois, como
afirmou Ferenczi: [...] a fase auto-ertica atual da vida de
associao seria substituda pela fase mais evoluda de amor objetal,
na qual a satisfao no seria mais buscada pela excitao das zonas
ergenas psquicas (vaidade, ambio) mas nos prprios objetos de nosso
estudo (FERENCZI, 1991, p.151, grifos do autor). Parece que aqui
Ferenczi se inspira em Descartes: [...] E jamais notei tampouco
que, por meio das disputas que se praticam nas escolas, algum
descobrisse alguma verdade at ento ignorada, pois, enquanto cada
qual se empenha em vencer, exercita-se bem mais em fazer valer a
verossimilhana do que em pesar as razes de uma ou outra parte [...]
(DESCARTES, 1983 [1637], p. 67, apud PENNA, 2005, p.3). Na Escola,
lugar de transmisso, o saber no deve ser detido por algum. O saber
da Psicanlise construdo por cada um. Portanto, no cabe Escola
padronizar uma formao como um curso. Utilizar-se dos significantes
da Psicanlise como um saber de mestre gera impotncia, pois o real
escapa mestria. Corroboram isso Miller e Lavarini, salientando
a
16. falta do saber, resto que sempre sobra de uma transmisso da
Psicanlise, como inerente a uma Escola de Psicanlise: Procede-se de
forma totalmente contrria: pela imerso do sujeito em um meio que
agita a falta de saber o que mais lhe importa. A cada um cabe nadar
como pode [...] (MILLER, 2000, p.8). Funda-se a Escola da causa
freudiana para que no falte a falta. Retirar da angstia a fora
motriz para enfrentar a dificuldade de teorizar a experincia
analtica, com seu sujeito evanescente (LAVARINI, 1998, p.199). O
saber da Psicanlise transmitido principalmente pela prxis, primeiro
pela anlise pessoal e posteriormente pela prtica clnica. A prxis na
Psicanlise aponta para a formao contnua do analista. interessante o
que Siefil fala sobre a prxis: A prxis torna-se um movimento da
subjetividade que, ao se exteriorizar, efetiva-se como objeto
tornando-se realidade (Wirklichkeit) e que, mediatamente, ao
voltar-se teoricamente sobre si mesma enquanto realidade
exteriorizada como objeto se reapropria como idia, negada em uma
totalidade que lhe impe novas determinaes essenciais. A prxis
torna-se um movimento que possibilita a compreenso da realidade que
efetivamente contraditria, ao sintetizar no conceito o ser e suas
determinaes histricas essenciais em um processo de totalizao.
justamente isso o que possibilitar a crtica terica das ideologias
que se constroem a partir de representaes (Vorstellung) e no dos
conceitos (Begriff). A prxis torna- se tambm a ao prtica
emancipadora do homem, que lhe abre inmeras possibilidades de
realizao histrica.1 Na obra de Freud, [...] observa-se esse
transbordamento da experincia em relao a uma formulao terica,
resultante da elaborao que havia permitido situar a experincia
(MILLER, 2003, p.6). Miller tambm afirma que Lacan sempre teve a
mesma orientao em relao transmisso da Psicanlise: Ele no
estabeleceu, com a experincia analtica, uma relao que permita fixar
uma teoria. Se falamos, com dileo, de seu ensino, como ele prprio o
fazia, porque a experincia analtica excedeu qualquer teoria que
dela se pretendeu fixar (MILLER, 2003, p. 6). A lio de Lacan o
primado da experincia sobre a teoria (MILLER, 2003, p. 7). Freud
pretendeu, com a institucionalizao da Psicanlise, que os analistas
que ali se agrupassem suportassem um pouco de verdade. Isso obtido
da experincia da anlise pessoal, pois a verdade aqui a irrupo de um
saber inconsciente. 1 www.milenio.com.br/mance/pr%C3%A1xis.htm
17. importante que os analistas se sintam vontade para falar de
casos que para eles sejam de difcil conduo para expor suas questes
tericas, pois o no-saber deve ser tomado como uma forma de
impulsionar o trabalho e no como impedimento a ele. E isso a Escola
deve proporcionar. 2.5 A insero da Psicanlise no mundo acadmico e
universitrio O saber do psicanalista da ordem do particular, e no
de um saber transmitido universalmente como o universitrio, no qual
o conhecimento cientfico tenta fazer um recobrimento do real. A
Psicanlise lida com a realidade psquica, a realidade fantasmtica,
trabalhando com um sujeito dividido, consciente e inconsciente, e
no com uma unidade como na noo de indivduo: Indivduo. 1- indiviso,
Indiviso - no dividido, no divduo (FERREIRA, 1977, p.265). Essa a
principal diferena entre a produo de saber proposto pelo discurso
do analista e o discurso da Universidade. Corroboram isso Vidal e
Penna: O Outro, inconsciente, barrado, o que equivale dizer que
algo do saber est definitivamente perdido sob a barra do recalque
originrio (VIDAL, 2003, p.28). A matria-prima do saber, para a
psicanlise o desejo do sujeito. Desejo este que no pode ser
transmitido pelo modelo padronizado que a universidade adota.
(PENNA, 2003, p.82). Porm, Freud considera que a Psicanlise poderia
trazer contribuies, graas a seu novo discurso, a outras reas do
saber, como medicina, arte, filosofia e cincia em geral. Portanto,
como diz Freud, na Universidade pode acontecer um ensino sobre e a
partir da Psicanlise, mas no a psicanlise propriamente dita. Penna
acrescenta que a Universidade reconhece que o que ensinado pela via
da exposio, nos programas de graduao e ps- graduao, sobre a
Psicanlise deve ter uma complementao se algum deseja ser
psicanalista. J Vidal tem uma viso mais radical em relao incluso da
Psicanlise na Universidade. Para ele, essa incluso pode apenas
ajudar na divulgao da Psicanlise e no na formao de um analista: Nem
cursos nem diplomas, menos ainda artigos e teses que polulam os
nossos dias, numa disputa acirrada de prestgio e de mercado,
correspondem questo crucial da transmisso da psicanlise (VIDAL,
2003, p.29). Ele considera que a
18. Universidade um duplo obstculo Psicanlise, por causa de um
saber j construdo e da suposta garantia de um diploma.
19. 3 CONSIDERAES FINAIS fcil vencer as resistncias que a
Psicanlise enfrenta, sacrificando suas verdades, que foram
conquistadas com tanto trabalho. Portanto, no devemos fugir diante
das dificuldades, que foram previstas por Freud, para que isso no
atrapalhe o exerccio da Psicanlise. No devemos aceitar que ocorra a
interveno de uma lei que no leva em considerao as particularidades
da Psicanlise, para que ela no seja encaixada nos moldes das
cincias universitrias, pois, como disse Freud: Temos de procurar as
represses que foram estabelecidas e instigar o eu a corrigi-los com
nossa ajuda e a lidar com os conflitos melhor do que mediante uma
tentativa de fuga. (FREUD, 1926, p.199). Devemos ainda nos ater ao
que disse Miller: Ou a libido dos psicanalistas vai se deslocar do
confronto entre os movimentos psicanalticos para assumir a
contradio em que a psicanlise est em relao civilizao sobre um certo
nmero de pontos, ou a psicanlise desaparecer no movimento geral da
civilizao (MILLER, 2003, p. 25). O saber psicanaltico transmitido
atravs da anlise pessoal, na qual pode vir a surgir o desejo do
analista, que fora e impulsiona a sua prpria formao, e na qual esta
pode ser iniciada. E aqui fazemos uma analogia entre duas
perguntas: De onde vm os bebs? e De onde vm os psicanalistas?
Sabemos que essas perguntas esto sujeitas a um no querer saber nada
disso: H um saber que se constri numa lgica referida a uma crena
universal: todos tm pnis. As construes da criana vo nesta direo. A
diferena vai sendo adiada, a lgica a do todo (NEME, 1999, p.44).
Freud disse que as crianas, mesmo aps esclarecimentos sobre a
origem dos bebs, continuam se comportando sem fazer uso desse novo
conhecimento, como raas primitivas que tiveram o cristianismo
enfiado nelas, mas que continuam a adorar em segredo seus antigos
dolos (FREUD, 1937, p 269). [...] os esforos do investigador
infantil so habitualmente infrutferos e terminam com uma renncia
que no raro deixa atrs de si um dano permanente sobre a
possibilidade de saber (FREUD, 1905, p. 202). Renunciar, portanto,
a falta que ocorre na transmisso e que prpria da psicanlise
compromete a prpria Psicanlise.
20. Diante disso, podemos nos arriscar a responder, junto com
Freud, que a anlise leiga mesmo, ou seja, um psicanalista s pode
advir de sua prpria anlise. E Isso toca o cerne do aforismo
lacaniano segundo o qual no existe formao do analista e sim formaes
do inconsciente.
21. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS AIPC disponvel em <
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1976. v. XVII. FREUD, Sigmund. Conferncia XXXV - A Questo de Uma
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24. ANEXOS
25. ANEXO A - PROJETO DE LEI N 3.944 DE 2000 (Do Sr. EBER
SILVA) Regulamenta a profisso de Psicanalista PROJETO DE
REGULAMENTAO DA PROFISSO DE PSICANALISTA Captulo I - Da profisso e
suas atribuies Captulo II - Da formao do Psicanalista Captulo III -
Das Sociedades Psicanalticas Captulo IV - Do rgo Nacional de
Fiscalizao da Profisso e sua Constituio Captulo V - Da Fiscalizao
do exrcito da profisso nas Unidades da Federao Captulo VI - das
Disposies gerais e Transitrias Arrazoado geral: CONSIDERANDO a
existncia de fato da Psicanlise como profisso; CONSIDERANDO
tratar-se a Psicanlise de uma profisso de nvel superior;
CONSIDERANDO tratar-se a Psicanlise de uma profisso de carter
clnico; CONSIDERANDO a existncia de vrias correntes de Psicanlise;
CONSIDERANDO a existncia no Brasil de muitas sociedades
psicanalticas e at organismo particulares que as aglomera;
CONSIDERANDO a existncia de riscos s pessoas que procuram
tratamento psicanaltico; CONSIDERANDO a necessidade de
disciplinar-se o processo de formao desses profissionais;
CONSIDERANDO a necessidade de fiscalizao nacional do exrcito desta
profisso; CONSIDERANDO que as sociedades psicanalticas existentes
no Brasil j formam, credenciam em nvel associacional os seus
profissionais;
26. CONSIDERANDO a necessidade de normatizar o exerccio da
psicanlise at por motivos contributivos; CONSIDERANDO a existncia
de conflitos polticos e epistemolgicas intra-sociedades
psicanalticas e at profisses j regulamentadas que se sentem
ameaadas; CONSIDERANDO que o Aviso de "Lei que estatuasse a
respeito", ou seja, que regulamentasse a referida profisso;
CONSIDERANDO que a Portaria 1334, de 21/12/94 que institui a
Classificao Brasileira de //ocupaes, classifica o Psicanalista no
Cdigo 0-79.90, reconhecendo, de fato, a existncia da profisso de
Psicanalista, mas que isso no o bastante, pois no a regulamenta;
CONSIDERANDO que psicanlise no se confunde nem trata de patologias
tributrias de nenhuma outra profisso; CONSIDERANDO que o mtodo
psicanaltico no princpio de nenhuma outra profisso regulamentada;
CONSIDERANDO que a figura do psicanalista mundialmente conhecida e
acatada; CONSIDERANDO que o exerccio da psicanlise tem sido objeto
de Pareceres dos Conselhos profissionais interfacetrios, dando
conta de sua independncia (CFM e CFP); CONSIDERANDO que j existe
Cursos de Ps-Graduao, tanto em nvel de Lato Sensu quanto de
Mestrado, em Teoria Psicanaltca, nas Universidades Federais e
Particulares; CONSIDERANDO que os Cursos de Ps-Graduao no formam
profissionais; CONSIDERANDO que os verbetes sobre psicanlise em
todo os dicionrios, inclusive na Enciclopdia Saraiva de Direito
explicam a mesma em sua independncia. APRESENTAMOS AS SEGUINTES
JUSTIFICATIVAS, APS O QUE SEGUE O PROJETO DE LEI: 1 - Estamos
diante de uma profisso que existe, de fato, no Brasil. A mesma est
entre ns h mais ou menos um sculo, e vem crescendo
significativamente; 2 - A verdade que a formao e a fiscalizao do
exerccio do profissional da psicanlise nunca foram normalizados,
valendo to somente os princpios doutrinrios de cada corrente de
psicanlise, nem sempre acordes e quantas vezes frontais, tornando a
classe dos psicanalistas at suspeita, o que demanda uma urgente
regulamentao que discipline todos os ngulos dessa profisso,
27. socialmente til e legalmente fiscalizvel, acabando com os
partidarismos e com as reais ameaas sade do povo; 3 - Quanto s
sociedades psicanalticas, as mesmas esto a e no podem ser
ignoradas. Historicamente elas vm formando psicanalistas, e, dentro
dos seus particulares princpios, abastecendo o mercado e
sustentando a cincia. Portanto, no h outro meio capaz de preparar
psicanalistas, razo porque esta formao lhes precisa continuar
confiada. Alm do mais, em todos os pases os tais profissionais so
formados por estas sociedades, inexistindo cursos ou processos nos
meios universitrios; 4 - Quanto aos psicanalistas existentes, so os
bandeirantes desta cincia, lutadores honrados e preocupados com o
destino da mesma, razo porque tero que ser reconhecidos com os
pioneiros na profisso, registrados como tais e reconhecida a sua
titulao, j que os mesmos sero os formadores da prxima gerao de
psicanalistas; 5 - Quanto ao processo de formao, essa Lei capacitar
o Conselho Federal de Medicina para registrar os novos
provisionais, fixar o cdigo de tica da seguir com os procedimentos
corporativos pertinentes; 6 - O projeto que ora apresento, no cria
corporativismo nem limita a prtica da psicanlise a uma determinada
corrente, o que seria inconstitucional, mas normatiza sua prtica em
meio a pluralidade de doutrinas; 7 - O projeto que ora apresento,
tambm reconhece as sociedades psicanalticas existentes e
devidamente registradas como sociedades formadoras; 8 - O projeto
oportuno e de vanguarda, como de vanguarda o Brasil e oportunos os
movimentos que culminem com a sua grandeza. Assim, para um Brasil
grande - leis modernas, profisses que atendem a realidade, tanto em
termos de carncia como em termos de proteo sociedade; 9 - O projeto
oportuno, ainda, por abrir, legalmente, uma nova modalidade de
tratamento aos portadores de psicologias, especialmente as de
natureza neurticas, desafogando o sistema de sade, equalizando a
sociedade e diminuindo,
28. significativamente os focos de tenso, maiores causadores de
delitos e infelicidade humana; 10 - Tenho certeza que os colegas
abraaro este projeto, o aprovaro e faro histria na sade mental, no
Brasil e no mundo. Captulo I - Da profisso, do Profissional e suas
atribuies Artigo 1 - reconhecida a profisso de Psicanalista e
designado o ttulo de Psicanalista Clnico que prerrogativa dos
profissionais formados e regularmente registrados de acordo com
esta Lei. Pargrafo nico - Doravante, nesta Lei e normas dela
oriundas, adotar-se- os ttulos de Psicanalista Clnico ou
Psicanalista. Artigo 2 - A profisso de Psicanalista consiste em
tratar dos pacientes portadores de distrbios psquicos de natureza
inconsciente, tais quais as perturbaes caracterolgicas e estados
neurticos, perturbaes sexuais, perturbaes somticos de origem
psquica e psicose de origem funcional, decorrentes de afetamento
inconsciente, tratando, atravs do mtodo da livre associao, as
necessidades, complexos, traumas, represses e recalques e tudo mais
que perturbe o psiquismo, trazendo-os tona da conscincia, a fim de
remov-los, possibilitando o equilbrio emocional do indivduo,
inclusive quando os tais pacientes estiverem sob assistncia de
outro profissional de sade. Artigo 3 - O Psicanalista Clnico o
profissional que obteve o ttulo em processo de formao levado a
efeito por sociedade psicanaltica devidamente registrada nos termos
desta Lei. Artigo 4 - A atividade de Psicanalista Clnico ser
exercida em consultrios, clnicas, hospitais e instituies que atuem
nas rea de sade mental. Captulo II - Da formao do psicanalista
clnico Artigo 5 - A formao do psicanalista clnico ser feita pelas
sociedades psicanalticas devidamente registradas, que tenham
atendido as exigncias e normas adicionais estabelecidas pelo
Ministrio da Educao e Cultura. Pargrafo nico - O Ministrio da
Educao e Cultura estabelecer: a) O tempo mnimo e mximo para a
formao do psicanalista;
29. b) O currculo mnimo para a formao do psicanalista; c) As
matrias complementares para os psicanalistas que se encontram em
processo de formao; d) O estgio a ser cumprido pelo psicanalista em
formao; e) A obrigatoriedade da anlise didtica e sua quantidade
mnima de sesses; f) As exigncias para a formao de docentes em
psicanlise. Artigo 6 - Ser reconhecido como Psicanalista Clnico
quem obtiver a formao em sociedade psicanaltica no exterior, desde
que o Pas da Sociedade formadora garanta reciprocidade aos
psicanalistas no Brasil. Pargrafo nico - Os psicanalistas referidos
no caput sero submetidos a um processo de complementao curricular,
a ser fixado pelo Ministrio da Educao e Cultura, a ser cumprida em
uma saciedade psicanaltica credenciada. Artigo 7 - O Ministrio da
educao e Cultura validar todos os ttulos, nos nveis em que tenham
sido expedidos pelas sociedades, bem como os dos psicanalistas a
serem formados de que trata o Artigo 5, desde que tenham iniciado o
processo de formao antes da publicao desta lei, acrescido do
estabelecimento em seu Pargrafo nico, no que atinge ao contedo
adicional. Pargrafo Primeiro - O Ministrio da Educao e Cultura
norma estabelecendo o prazo para que os psicanalistas em formao,
objeto do previsto no caput deste Artigo, concluam o referido
processo. Pargrafo Segundo - As sociedades psicanalistas tm o prazo
de 90 (noventa) dias a partir da publicao desta Lei, para submeter
ao Ministrio da Educao e cultura a relao dos psicanalistas em
formao, especificando sua qualificao completa, formao cultural
acadmica, incio do processo de formao e tempo provvel para concluso
do referido processo. Artigo 8 - Para ingresso no processo de
formao de psicanalistas clnicos, alm das exigncias feitas pelas
sociedades psicanalticas, indispensvel que o candidato possua
formao superior em nvel de graduao plena ou equivalente. Pargrafo
nico - No caso de candidato com formao em instituio de ensino no
exterior, observar-se- sua equivalncia de acordo com a legislao em
vigor. Captulo III - Das sociedades psicanalticas
30. Artigo 9 - so reconhecidas como sociedade psicanalticas
formadoras de psicanalistas clnicos, todas que tenham sido
registradas de acordo com o cdigo civil Brasileiro antes da vigncia
desta Lei. Pargrafo Primeiro - Para que as sociedades usufruam o
direito de formar psicanalistas clnicos, tero que apresentar ao
Ministrio da Educao e Cultura, em 60 (sessenta) dias, a contar da
publicao desta lei, seus Estatutos, Regimentos Internos e/ou
Acadmicos, normas que tenha sido fixadas, processo de formao
sistematizado e descrito em detalhes, Cdigo de tica, corpo docente
credenciado, relao total dos psicanalistas que constituem os seus
quadros, com qualificao e titulao completas. Pargrafo Segundo - O
Ministrio da Educao e Cultura poder fixar normas determinando
alteraes estatutrias, regimento e demais atos, visando a adequar a
esta Lei, as sociedades psicanalticas. Pargrafo Terceiro - O
Ministrio da Educao e Cultura descredenciar da condio de sociedade
psicanaltica formadora a sociedade que descumprir o estabelecido
nos pargrafos primeiro e segundo. Pargrafo Quarto - As sociedades
psicanalticas, tero o prazo de 60 (sessenta) dias, a partir da
publicao desta lei para submeter ao Ministrio da Educao e Cultura a
relao de seus Psicanalistas Didatas, fixando suas reas de
especializao. Pargrafo Quinto - Fica estabelecida como rea de atuao
das Sociedades Psicanalticas, a Unidade da Federao onde esteja
localizada sua sede e filiais. Pargrafo Sexto - O ttulo conferido
ao psicanalista ser registrado no Ministrio da Educao e Cultura ou
Universidade por ele designada. Pargrafo Stimo - O Ministrio da
Educao e Cultura fixar norma estabelecendo a nomenclatura e titulo
a ser conferido pelas sociedades formadoras. Artigo 10 - O
Ministrio da Educao e Cultura fixar os critrios para credenciamento
de novas sociedades psicanalticas como sociedades formadoras.
Captulo IV - Do rgo nacional de fiscalizao, normatizao e sua
constituio. Artigo 11 - Compete aos Conselhos Federais e Regionais
de Medicina registrar os psicanalistas e fiscalizar o exerccio
desta profisso. Captulo V - Da fiscalizao do exerccio profissional
nas Unidades da Federao ou regies.
31. Artigo 12 - O registro de psicanalista de Medicina, sob a
superviso do Conselho federal de Medicina, mediante comprovao da
condio de psicanalista nos termos desta Lei. Pargrafo nico - O
Conselho Regional de Medicina emitir registro profissional em nome
do Conselho Federal de Medicina, obedecendo s normas estabelecidas
por este Conselho. Artigo 13 - O psicanalista clnico que j exercia
a profisso sem estar vinculado a qualquer sociedade psicanaltica,
ter seus direitos assegurados, nos termos desta lei. Pargrafo nico
- A comprovao da condio de psicanalista clnico de no filiados s
sociedades, obedecer aos seguintes critrios: a - Apresentao de
Certificado, Diploma ou Passe fornecido por uma das sociedades
psicanalticas reconhecidas que comprove a condio de psicanalista,
ou; b - Comprovao de que exerce atividade psicoterpica em documento
emitido pelos Conselhos Regionais de Medicina e Regional de
Psicologia, e de que no se trata de membros dos mesmos, e; c -
Comprovao de exerccio da profisso de Psicanalista atravs de alvar
de funcionamento do consultrio dos ltimos doze meses, ou; d -
Comprovao feita atravs de publicao em revistas, livros e jornais
especializados, na condio de psicanalista, antes da vigncia desta
Lei. Artigo 14 - O profissional que tiver comprovado a condio de
psicanalista clnico nos termos do Artigo 13, ser devidamente
registrado como psicanalista provisionado. Artigo 15 - O Conselho
Federal de Medicina poder fixar normas que se fizerem necessrias,
nos termos desta lei. Artigo 16 - O Conselho Federal de Medicina
fixar o cdigo de tica Psicanaltica, ao qual tero que ser
compatibilizados os cdigos de tica das sociedades credenciadas, no
prazo de 180 dias. Artigo17 - Os Psicanalistas tero, nos Conselhos
Federal e Regionais de Medicina, os mesmos direitos
institucionais.
32. Artigo 18 - Os Conselhos federais e Regionais de Medicinas
criaro, quando e se for o caso, dentro dos seus quadros, uma cmara
de Assuntos Psicanalticos. Artigo 19 - Os casos omissos sero
decididos pelo Conselho Federal de Medicina. Artigo 20 - Revogam-se
as disposies em contrrio. Salas de Sesses, em 13 de dezembro de
2000 Deputado ber Silva
33. ANEXO B - Carta Manifesto de Instituies Psicanalticas e No
Psicanalticas
34. ANEXO C Carta Manifesto da Associao Brasileira de
Psicanlise Manifesto da Associao Brasileira da Psicanlise ABP
Manifesto De Entidades Brasileiras De Psicanlise H cerca de 90 anos
a formao de psicanalistas est baseada em trs atividades
complementares e indissociveis entre si: a anlise pessoal, os
cursos tericos e a superviso dos casos clnicos. Esta trade
configura a formao como um ofcio, e o psicanalista aprende e ganha
qualificao em oficinas - os institutos de formao - onde,
artesanalmente, no contato com outros analistas, desenvolve sua
anlise pessoal, realiza seus seminrios para o aprendizado terico e
tcnico e tem o seu trabalho supervisionado. A formao de cada
psicanalista um processo permanente, que se amplia no seu dilogo
com os textos clssicos e com os produzidos por outros analistas,
confrontados com a sua experincia pessoal na relao com seus
analisandos, mesmo quando j est qualificado como psicanalista. Esta
qualificao, portanto, no se ajusta aos modelos que podem sofrer
algum tipo de certificao por instituies de ensino ou rgos
reguladores pblicos; se existe um indicador, ele ser, certamente, o
de qual a instituio que forma, quem so seus componentes, que padres
so seguidos. Gradualmente este campo se expandiu e surgiram
instituies que se propem a formar analistas, com variaes nos
requisitos e na modelagem do processo de formao, mas mantendo os
princpios gerais como estabelecidos no incio do sculo passado e
ampliando a parcela dos analistas, filiados a vrias outras escolas,
que se dedicam ao estudo e prtica da Psicanlise. Ao longo dos anos
este campo estabeleceu e mantm suas tradies, com uma prtica onde se
preserva o patrimnio da psicanlise e onde se organiza um campo de
assistncia, representado pelo tratamento s pessoas que nos
procuram. As instituies psicanalticas tm a responsabilidade social
de formar psicanalistas competentes, conferir-lhes autonomia para o
exerccio de sua funo, responsabilizando-os quanto tica de seus
atos. Por estes motivos a psicanlise no regulamentada como profisso
no Brasil e em nenhum outro pas. Mesmo entre os psicanalistas
existem muitas controvrsias e discusses, embasadas no processo de
formao e na natureza do exerccio da prtica clnica, sobre as
possibilidades de sua regulamentao. Nos ltimos cinquenta anos vrias
tentativas, geralmente apresentadas por parlamentares, tm sido
feitas para alcanar uma regulamentao que, primeira vista,
protegeria os psicanalistas e a populao que recorre ao tratamento
psicanaltico. Todas foram rejeitadas pela comunidade psicanaltica
brasileira, ou por no atenderem s especificidades intrnsecas
psicanlise ou porque
35. representavam somente interesses particulares de grupos e
no visavam o bem estar da populao. No momento est na ordem do dia
mais uma destas tentativas: o Projeto de Lei n 3.944 de 13 de
dezembro de 2000, de autoria do deputado Eber Silva, do Rio de
Janeiro. Este projeto , no seu todo, inaproveitvel. Parte de
premissas absolutamente equivocadas e estipula procedimentos
incompatveis com a essncia do ofcio e da formao de seus
praticantes, abrindo mo do que consideramos o passo inicial de
qualquer tentativa sria de abordar esta questo - ouvir a comunidade
brasileira de psicanalistas, atravs das Sociedades e entidades que
os formam e representam. A Psicanlise exercida no Brasil desfruta
de um reconhecimento, no pas e no exterior, conquistado pela
seriedade com que preserva e transmite o patrimnio legado por
Freud. Os psicanalistas no reclamam nenhuma regulamentao do estado.
A psicanlise progride h mais de um sculo graas a princpios e mtodos
rigorosos e um corpo terico que tem a proposta de Sigmund Freud
como fundamento. Colegas, Conforme conhecimento de todos, h nesse
momento um Projeto de Lei na Comisso de Trabalho da Cmara dos
Deputados, visando a regulamentao da Psicanlise e apresentado pelo
Deputado e pastor evanglico Eber Silva, do Rio de Janeiro. (Ver o
texto deste projeto) Em face da gravidade desta iniciativa e de
suas deletrias conseqncias para a Psicanlise, propomos o texto
abaixo, a ser apresentado com a mxima urgncia aos parlamentares das
duas casas, e em especial aos membros da Comisso de Trabalho,
visando seu apoio para impedir a tramitao de tal projeto. A adeso
do maior nmero de analistas faz-se necessria para a sensibilizao
dos parlamentares. Este trabalho de acompanhamento e articulao est
sendo feito por um grupo inter- institucional de Braslia, que tem
contado tambm com a imprescindvel assessoria jurdico-parlementar de
um profissional. A Carta enviada: Excelentssimos Senhores Deputados
e Senadores, A comunidade psicanaltica brasileira tomou
conhecimento do Projeto de Lei No. 3.944 de 13 de dezembro de 2000,
de autoria do deputado Eber Silva, que trata da regulamentao da
profisso de psicanalista. Esse projeto merece nosso unnime repdio,
uma vez que se baseia em premissas equivocadas, dentre as quais
consideramos importante ressaltar: 1 - a subordinao da atividade de
psicanalista ao Conselho Federal de Medicina contraria posio j
manifestada pelo prprio Conselho, alm do fato de essa
36. entidade poder arbitrar unicamente sobre a profisso mdica,
enquanto que a psicanlise tambm exercida por profissionais de
outras reas; 2 - o registro no Ministrio da Educao redundante, dado
que todo psicanalista j portador de diploma de curso superior,
devidamente registrado; 3 - o elemento central na formao de um
psicanalista sua anlise pessoal, didtica, articulada a um longo
processo de supervises e seminrios clnicos e tericos, cuja durao e
resultados so impossveis de serem determinados a priori. Lembramos
que desde a sua fundao a Psicanlise tem consolidado sua prtica, sua
tica e projeto de formao do psicanalista atravs das Sociedades de
Psicanlise, sendo que o estabelecimento das condies normativas para
regulamentar a funo de psicanalista tem sido prerrogativa das
referidas Sociedades. Acreditamos que a tradio dessa honorvel Casa
no endossar um projeto que, desde seu incio, prescindiu de uma
consulta comunidade psicanaltica brasileira reconhecida pela sua
qualidade, rigor e competncia a nvel nacional e internacional.
37. ANEXO D Estudo jurdico sobre a questo da anlise leiga feito
pela Ordem dos Advogados do Brasil Rio de Janeiro, 27 de Novembro
de 2003. Ilmo. Dr. Paulo Becker. Prezado doutor, Em relao consulta
que nos foi formulada acerca do projeto de Lei nmero 2.347, de
2003, de autoria do Deputado Federal Simo Sessim, cuja ementa a
seguinte: Ementa: Regulamenta o exerccio da profisso de
psicanalista Antes de iniciarmos o estudo do projeto torna-se
necessrio esclarecimentos de ordem constitucional como
infraconstitucional, a fim de permitir melhor compreenso acerca do
projeto de Lei como qualquer outro que possa vir a ser apresentado,
sobre a mesma matria. Inicialmente, no campo constitucional
representado pela Constituio Federal e os princpios que a norteiam,
os quais encobrem toda a sistemtica judicial, por sermos um Estado
Democrtico de Direito, temos como fundamentos bsicos, dentre
outros, a dignidade da Pessoa Humana e os valores sociais do
trabalho e da livre iniciativa. Tais fundamentos tm como finalidade
assegurar o exerccio dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurana, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade
e a justia como valores do Estado de Direito, portanto, so vetores
de interpretao os quais so utilizados e aplicados a todos os
Poderes da Repblica. A par dos fundamentos que aliceram o Estado
Democrtico, temos os princpios que constituem, em si mesmo, a
prpria razo de ser do Estado, isto , a prevalncia dos Direitos
Humanos, a autodeterminao dos povos e a no interveno, as quais esto
representadas, dentro do texto constitucional, como aqueles quais o
legislador constituinte os elevou a categoria de Direitos e
garantias fundamentais; Para a anlise feita este parecer,
interessa-nos os seguintes: artigo 5:....
38. XIII: livre o exerccio de qualquer trabalho, ofcio ou
profisso, atendidas as qualificaes profissionais que a Lei
estabelecer; XIV: plena a liberdade de Associao para fins lcitos,
vedada a de carter paramilitar; XVIII: A criao de Associaes e, na
forma de Lei, a de cooperativas independem de autorizao, sendo
vedada interferncia estatal em funcionamento. XX: Ningum poder ser
compelido a associar-se ou a permanecer associado. XXI: As
entidades associativas, quando expressamente autorizadas, tem
legitimidade para representar seus filiados judicial ou
extrajudicialmente. 2: Os direitos e garantidas expressos nesta
constituio no excluem outros decorrentes do regime e dos princpios
por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a Repblica
Federativa do Brasil faz parte. DA SADE: Artigo 196: A sade um
direito de todos e dever do Estado, garantido mediante polticas
sociais e econmicas que visem reduo do risco de doena e de outros
agravos e ao acesso universal e igualitrio a aes e servios para a
promoo, proteo e recuperao. Artigo 197: So de relevncia pblica as
aes e servios de sade, cabendo ao Poder Pblico dispor, nos termos
da lei, sobre sua regulamentao, fiscalizao e controle, devendo sua
execuo ser feita diretamente ou atravs de terceiros e, tambm, por
pessoas fsicas ou jurdicas de direito privado. DA EDUCAO: Art. 205:
A educao, direito de todos e dever do Estado e da famlia, ser
promovida e incentivada com a colaborao da sociedade, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da
cidadania e sua qualificao para o trabalho. Art. 214: A Lei
estabelecer o plano nacional de educao plurianual, visando
articulao e ao desenvolvimento do ensino em seus diversos nveis e
integrao das aes do Poder Pblico que conduzam : I: ... II: ... III:
.... IV: formao para o trabalho V: promoo Humanstica, cientfica e
tecnolgica para o trabalho.
39. Dentro da viso constitucional, o paradigma do no
intervencionismo, estmulo a livre iniciativa e o reconhecimento de
Pessoas Jurdicas de Direito Privado com legitimao extraordinria, so
elementos atravs dos quais o prprio legislador constitucional
reconheceu a necessidade, a par de alguns deveres serem
essencialmente do prprio Estado, o de permitir que o Ente-privado
tambm os exera, o que demonstra a necessidade de delegar funes at
ento exclusivas suas e que a partir da Constituio Federal diz-se,
precipuamente, funo do Estado, porm exercida por Pessoa Jurdica de
Direito Privado. A razo desta modificao tem como fato gerador a
Constituio Federal de 1967 e posterior Emenda Constitucional de
1969, uma vez que a caracterstica prevalente era de um Estado
intervencionista, justificando, portanto, que a ruptura para o
Estado Democrtico de Direito, infirmou de uma forma contundente o
no intervencionismo e, consequentemente, o estmulo a livre
iniciativa. Portanto, dentro dos parmetros acima demonstrados,
dever-direito do Estado prestar educao, sade e garantir direitos
fundamentais do Homem, sem, contudo, excluir a iniciativa privada
ou estimular qualquer forma de interferncia, sob pena de assim o
fazendo, violar os fundamentos do Estado de Direito. Desta forma,
todo o ordenamento infraconstitucional, para sua validade e
eficcia, tem que estar compatvel com a Constituio Federal, com seus
fundamentos e com os princpios, sob pena de haver potencial argio
de inconstitucionalidade. Quando afirmamos que o texto
infraconstitucional deve estar compatvel com a Constituio Federal,
a representao desta adequao no se restringe to somente ao texto
legal, ao contrrio, abrange o prembulo, os fundamentos de validade,
os princpios pois este conjunto que nos remete a estrutura orgnica
do Estado e o instrumento utilizado para auferio so os mtodos de
interpretao: Histrico, gramatical, sistemtico, teolgico e
integrativo. Singularmente, a nossa Constituio Federal pode ser
retratada como um todo facetado, cujos prismas constituem freios
aos eventuais abusos que possam virem a ser cometidos contra ela e
contra os cidados, incluindo nesta categoria Pessoa Jurdica de
Direito Privado, sendo que cada prisma representa um princpio,
outro, uma garantia, que chamamos de sistema de freios e
contra-pesos, sendo que todos por serem valores constitucionais,
esto no campo do Direito Natural o qual representado pela moral,
pela tica e so desprovido de sano normativa, muito embora, na
hiptese de serem descumpridos, a sano imposta a sua retirada do
mundo jurdico, atravs de ao prpria e ajuizada por aquelas pessoas
legitimadas constitucionalmente, isto , a CF/88, alterando uma
tradio em nosso direito constitucional, que reservava somente ao
Procurador Geral da Repblica, ampliou a propositura da ao direta de
inconstitucionalidade, transformando-a em legitimao concorrente.
Desta forma, so legitimados: O Presidente da Repblica, a mesa do
Senado Federal, a mesa da Cmara dos Deputados, a mesa da Assemblia
Legislativa ou
40. da Cmara Legislativa do Distrito Federal, o Governador do
Estado ou Distrito Federal, o Procurador Geral da Repblica, o
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partido poltico
com representao no Congresso Nacional e Confederao Sindical ou
Entidade de Classe. A viso bsica que deve ser compreendida, que o
sistema normativo equivale a uma pirmide, estando em seu topo a
Constituio Federal e abaixo dela, todas as demais leis oriundas do
poder competente, sendo que esta pirmide, ainda que esteja sendo
apresentada de uma forma extremamente simples, representa uma dos
mais importantes teorias do Direito, denominada por Teoria Pura do
Direito, por Hans Kelsen. To somente ttulo de ilustrao , porm,
fundamental para demonstrar, dentro do quadro histrico e de
interpretao sistemtica, a Teoria Pura do Direito nasceu em Viena,
no sculo passado, tendo como referncia o ambiente crtico geral da
poca. Sigmund Freud desenvolvia, ento sua psicanlise, surgindo,
paulatinamente, a Escola Neopositivista de Viena. No mesmo
contexto, Kelsen, desenvolvia a Teoria do Direito e procurava
delimitar claramente o objeto de seu conhecimento em duas direes,
uma vez que sua autonomia, atravs do sincretismo metdico, colocada
em perigo. A cincia do direito no deve tornar-se cincia da
natureza, pois o direito deve distinguir-se claramente da natureza.
Mas isso muito difcil, j que o direito ou o que se costuma designar
mais proximamente como tal pelo menos em parte, no mbito da
natureza, parece ter existncia natural. Este estado de coisas
exterior, no decorrer do tempo e do espao, ocorre de modo
perceptvel e, como tal, parte da natureza. Algo digno de ateno era
o fato de que, tanto para Kelsen como para Freud, no existia uma
tendncia relevante com as tendncias cientficas daquela poca. Para o
1 (primeiro) o fato natural prescindia a se tornar fato jurdico,
como elemento limitante e apaziguador social e, para o 2 (segundo),
sem o carter da lei, imposio, o inconsciente humano no conhecia
fatores limitantes e de adequao social. Desta forma, o campo de
intercesso entre ambos reproduzido por Kelsen ao sustentar, in
verbis: O fato, considerado como elemento do sistema da natureza,
no objeto especfico do conhecimento jurdico e, por isso, nada tem
de jurdico. O que converte esse fato em ato jurdico (ou
antijurdico) no a sua faticidade, nem sua certeza de natural, isto
, seu ser casualmente determinado e contido no sistema da natureza,
mas sim o sentido objetivo, ligado a esse ato e ao seu significado.
Seu significado especificamente jurdico, ou seja, o sentido jurdico
peculiar, contm os fatos em questo, atravs de uma norma que se
refere ao seu contedo, que, por sua vez, lhe empresta significado
jurdico, de modo que o ato, conforme essa
41. norma, possa ser interpretado e, se for o caso, aplicado os
atributos da sano e coero (in, Hans Kelsen, 3 edio revista da
traduo de S. Cretella Junior e Agnes Cretella, Editora Revista dos
Tribunais, fls. 52) Pelo texto acima transcrito, h o elemento de
intercesso entre a Teoria Pura do Direito, de Kelsen, com o
desenvolvimento da Psicanlise, por Sigmund Freud, atravs da Escola
Neopositivista do Crculo de Viena que era de tendncia metafsica.
Portanto, aps verificarmos os fundamentos, princpios e valores do
Estado de Direito que esto ora escritos, ora implcitos na
Constituio Federal a qual encontra-se no topo da Pirmide de Kelsen,
seguiremos em escala decrescente para a base da referida pirmide.
Para que haja um regramento social necessrio a norma jurdica a qual
guarda atributos: generalidade (aplicao a todos); coercibilidade,
rgo competente e forma prescrita em Lei. E o que chamamos de
ordenamento infraconstitucional. Dentro do tema que nos cabe
discorrer, h necessidade de no perder de vista a ordem
constitucional e o ordenamento infraconstitucional; portanto,
embora a matria objeto da presente, em tese, seja o projeto de Lei
nmero 2.347, de 2003, de lavra do deputado Dr. Sr. Simo Sessim, o
qual visa a regulamentar o exerccio da profisso de Psicanalista,
entendemos que nosso enfoque deve ser maior, isto , a no
possibilidade de ingerncia do Poder Publico na regulamentao da
profisso de Psicanalista, institucionalizado ou no. Embora o
conceito da Psicanlise, dentro da cincia do dever-ser, deve ser
diverso da sua conceituao, didaticamente, utilizarmos o seu
conceito comum. Psicanlise. [De psic(o)- + anlise.] 1- mtodo de
tratamento criado por Sigmund Freud, das desordens mentais e
emocionais que constituem a estrutura das neuroses e psicoses, por
meio de uma investigao psicolgica profunda dos processos mentais
[F. Red., Nessa acepo: anlise] 2 - O conjunto das teorias de Freud
e de seus discpulos, concernentes vida psquica consciente e
inconsciente. 3 Qualquer terapia por este mtodo. 4 Estudo
psicanaltico de uma obra de arte, de um tema, etc.: Psicanlise das
religies; psicanlise da sociedade contempornea. (in, Novo Dicionrio
Aurlio da Lngua Portuguesa, 2 edio, Editora Nova Fronteira, pgina
1411). Pelo conceito acima, percebe-se com clareza que se trata de
um tema com diversas acepes, portanto, o seu exerccio profissional
est muito mais presente ou prximo de ofcio do que profisso , mesmo
que seja de carter remuneratrio. E porque ofcio? Pela etimologia da
palavra ofcio representa uma ocupao permanente de ordem intelectual
ou no a qual envolve certos deveres e encargos ou um pendor
natural.
42. A importncia do ofcio por ser representado por um pendor
natural, e est elencada no artigo 5, inciso XIII como direitos e
garantias fundamentais, estabelecida a liberdade de seu exerccio.
Este pendor natural que atributo da personalidade humana gera, como
conseqncia, o revestimento de um fundamento constitucional, que a
dignidade da Pessoa Humana. E ainda, dentro do prprio conceito de
psicanlise, com suas diversas acepes, no encontramos, prima facie,
qualquer meno de doena mental que absolutamente diversa do
significado de desordem mental porquanto aquele que estiver no
estado de desorientao, tendo o elemento volitivo preservado, est
apto civilmente para manifestar-se quanto investigao como mtodo de
tratamento e ao entender-se de forma diversa, estaramos violando o
direito do cidado. E mais, o processo psicanaltico teve um
precursor e seguidores, exsurgindo instituies psicanalticas, as
quais so pessoas jurdicas de Direito Privado, cuja natureza jurdica
se assemelham as associaes, sendo por fora constitucional, vedado
interferncia estatal em seu funcionamento art. 5, inciso XVII da
Constituio Federal. Deve ser salientado ainda, no s como argumento
mas, tambm como demonstrao inequvoca da no interferncia no exerccio
da psicanlise, que tanto o Conselho Federal de Medicina, atravs da
Resoluo 1666/2003, no a aloca como especialidade mdica, igualmente
o Conselho Federal de Psicologia, o qual, em 17 de Outubro de 1992,
apresentou ao Ministrio do Trabalho sua contribuio para integrar o
Catlogo Brasileiro de Ocupaes que representa as atribuies
profissionais do psiclogo e dentre essas, no est a psicanlise.
Lanamos mo, exemplificativamente do Conselho Federal de Medicina
como do Conselho Federal de Psicologia porquanto esto mais prximos
do Tema, ora tratado. Os Conselhos, alm do registro profissional,
tem outras atribuies dentre aquelas, o poder de polcia para apurar
infraes cometidas pelos profissionais, aps regular procedimento
salvaguardado o direito de ampla defesa, registro do ttulo de
especialista... Ora, se os prprios Conselhos Profissionais no provm
a hiptese de interveno, embora em relao aos profissionais de seus
quadros representam rgos paraestatais porque lhes falta atribuio e
competncia para tal. Percebe-se que na esfera constitucional no h
como o Poder Pblico intervir, pelas razes j elencadas, como, tambm,
os prprios rgos de classe. Quanto possibilidade da psicanlise
tornar-se um curso em nvel de especializao ou assemelhado?A
Constituio Federal ao disciplinar a questo acerca da educao,
reportou-se lei a ser criada para uniformizar o sistema
educacional. A mencionada lei que estabelece as diretrizes e bases
da Educao Nacional Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, trata de
forma programtica o sistema educacional e suas regras so cogentes
de sorte que a psicanlise no se adequa a
43. nenhuma das hipteses previstas como no h permissivo para
sua insero em grade de Ensino, conforme os artigos,
respectivamente, 16, 17, 18, 21, 39, 40, 41 e 42. salutar
esclarecer que a Psicanlise enquanto posta em grade curricular no
encontra permissivo legal. No entanto, nada impede que a Instituio
de Ensino, Pblica ou Privada, atravs da Secretaria de Educao
Superior do Ministrio da Educao, apresente solicitao para ministrar
cursos e o faa atravs de regular procedimento administrativo, isto
, informando o organograma do curso, carga horria, currculo dos
Professores para avaliao da capacitao de cada, responsvel tcnico e,
aps analisados todos os elementos apresentados, aquele rgo tem
autoridade para emitir portaria autorizando o pedido formulado, de
acordo com a Resoluo CNE/CES n 1/2001. Ainda que o Poder
Legislativo pretenda atribuir competncia ao Ministrio da Educao
para emitir critrios de formao de psicanalistas, fiscalizao ou
condies para o exerccio profissional, ad argumentadum o que
assistiremos uma invaso de poderes porquanto o Ministrio da Educao
pertena ao Poder Executivo e no guarda qualquer subordinao ao Poder
Legislativo. Deste modo, a invaso de um Poder constitudo afeta no
somente ao Estado Democrtico de Direito porem, a prpria soberania
nacional, uma vez que a referida Lei est no patamar de programa
poltico de governo razo pela qual diz-se Lei Programtica. Em relao
Ao Civil Pblica interposta pelo Ministrio Pblico Federal 1 regio
Distrito Federal Processo nmero 2003.34.00.037790-0 em face de
Escola Superior de Psicanlise Clnica do Rio de Janeiro, Sr. Heitor
Antonio da Silva, Ozeas da Rocha Machado, Rmulo Vieira Telles,
Sociedade Psicanaltica Ortodoxa do Brasil SPOB e Sociedade
Universitria Redentor, tendo por objeto da concesso de medida
liminar, uma vez que as mencionadas Instituies incluram, em nvel de
curso de Especializao o denominado curso de Ps-graduao Latu sensu
em teoria psicanaltica e formao clinica e ofereceram ao pblico.
Neste caso, a relao aqui descrita tratada pelo cdigo de defesa do
consumidor porquanto o curso ofertado no se enquadra em nenhuma das
hipteses da Lei de Diretrizes e Bases do Sistema Educacional,
caracterizando, desta forma, tanto o ilcito civil como o ilcito
penal. Pelo Douto Juzo Federal do Distrito Federal foi concedida a
medida pleiteada, o que tambm, dentro do contexto assume papel de
grande relevncia porquanto j reconhecido impossibilidade, ainda que
em sede de concesso de medida liminar, a institucionalizao de
cursos de especializao e/ou assemelhados por instituies de ensino.
Esclareo que j foi expedido carta precatria (instrumento de
comunicao entre os juzos) para que o Juzo Federal da Seo Judiciria
do Rio de Janeiro 2 Regio cite e intime os rus, determinando a
suspenso imediata da oferta do curso mencionado, com a devoluo da
importncia paga sob pena de multa diria. Cabe salientar ainda, que
alm dos diplomas j mencionados, coma vigncia do cdigo civil de
2002, o fundamento e os princpios constitucionais revestiram o
captulo Das Pessoas, deixando a idia de ser to somente sujeito de
direitos e
44. obrigaes na esfera civil para atribuir-lhes o direito de
personalidade cuja abrangncia ampliou a compreenso do homem, isto ,
o ser humano tem natureza psicossomtica. o corpo e a alma so
substncias dependentes (uma da outra), da natureza individual do
homem que tem vida (essncia) e potencias prprias do gnero humano,
capazes de se viabilizarem em atos e de ser revestirem de
propriedades essenciais que lhe so inerentes (in, professor Walter
Moraes, concepo tomista de pessoa- um contributo para a teoria do
direito de personalidade RDpriv 2/187; RT 590/19) Do conceito
atual, percebe-se que o homem no mais sujeito de relaes jurdicas,
passou a reconhecer-lhe o psiquismo, a paz espiritual, a sade e
outros atributos os quais eram objetos de outras cincias. A partir
do momento em que o ordenamento jurdico trouxe como elemento da
personalidade do homem o seu bem estar fsico e psquico, no pode
mais se furtar a enfrentar qualquer matria posta apreciao que
represente qualquer meio potencial de por em risco o homem,
porquanto alm de ser obrigao prpria do Estado-juiz, aquele o bem de
maior valor social. Aps as consideraes acima, passaremos a analisar
no somente o projeto de Lei n 2347, de 2003 como o Projeto de Lei
n. 3944/200, sendo que este ltimo j se encontra arquivado. 1-
Projeto de LEI N. 3944/ 2000 Autor: Eber Silva PDT/RJ Ementa:
Regulamenta a profisso de Psicanalista Indexao: Regulamentao,
profisso, psicanalista, critrios, formao profissional,
Sociedade,Psicanlise, competncia, Conselho Federal, Conselho
Regional, Medicina, Registro Profissional, Fiscalizao, Exerccio
Profissional, Cdigo de tica. A tramitao do projeto de Lei acima se
iniciou em 13 de dezembro de 2000, com a apresentao e sua leitura
pelo Deputado Federal, Eber Silva, que aps o encaminhou segundo as
normas do regimento interno da Cmara dos Deputados, por sua mesa
diretoria, tendo como Presidente o Deputado Federal Freire Jnior,
cujo parecer foi desfavorvel e corroborado pela Comisso de
Seguridade Social e Famlia, tendo como Presidente o Deputado
Federal, Rafael Guerra que, tambm, emitiu parecer desfavorvel, de
sorte que o referido projeto foi rejeitado, tendo a mesa diretora
da Cmara dos Deputados determinado o seu arquivamento em 31 de
janeiro de 2003. 2- Projeto de Lei n. 2347, de 2003 Autor: Deputado
Federal Simo Sessim Ementa: Regulamenta o exerccio da Profisso de
Psicanalista. A 1 (primeira) crtica que deve ser feita quanto
definio conceitual insculpida no artigo 2 uma vez que ao ser
definido qualquer conceito, aquele pode ser limitante como
extravagante. O subjetivismo inerente ao psiquismo humano, via de
regra, prescinde de outras cincias correlatas e a pretenso de
adotar um
45. conceito para a profisso de psicanalista, referendando como
indicativo os tipos que podem ser tratados por aqueles, constitui o
que denominamos tipos fechados ou numerus clausus , o que por si s
contraria a prpria definio adotada pela Constituio Federal e pelo
Cdigo Civil quanto aos direitos de Personalidade do Ser Humano. A 2
(segunda) crtica e desde logo peo escusa em faze-la mas,
inadmissvel que ao ser apresentado um Projeto de Lei, o seu autor
no tenha avaliado a potencial invaso entre os Poderes Constitudos
da Repblica porquanto no cabe ao Poder Legislativo atribuir
competncia a rgo dos demais Poderes, salvo em se tratando de Emenda
Constitucional e de acordo com a excepcionalidade do caso, de sorte
que o Ministrio da Educao, alm de pertencer ao Poder Executivo,
detm de forma exclusiva normas programticas quanto Educao e sua
vinculao esto interligada a metas e programas de Governo, razo pela
qual ao longo do corpo do projeto encontramos, intrinsecamente, em
tese, a inconstitucionalidade pela quebra de independncia dos
Poderes Constitudos. E mais, ainda que tenha passado desapercebido
pelo Nobre Deputado, no h como se adequar em grade curricular curso
de formao em psicanlise pois h matria intransponvel, qual seja, a
Lei de Diretrizes e Bases do Sistema Educacional. Quanto fiscalizao
do exerccio profissional ser feita pelo Ministrio do Trabalho, alm
de totalmente desarrazovel foge ao bom-senso do homem comum uma vez
que eventual fiscalizao do profissional deve ser feita pela
Entidade que pertena. DAS INSTITUIES PSICANALTICAS Quanto as
Sociedades Psicanalticas, independe da corrente que adota, e tal
tema j foi por ns enfocado, porm, dado sua importncia, trataremos
de forma especfica. Embora a nomenclatura seja Sociedade, sua
natureza jurdica a partir da Constituio Federal de 1988 de
ASSOCIAO, o que torna importante reproduzi-la e disseca-la para
evitar qualquer possibilidade de dvidas e aloca-la dentro do
ordenamento jurdico constitucional, uma vez que sua previso legal
est expressa no Ttulo II - Dos Direitos e garantias Fundamentais -
captulo I - Dos Direitos e Deveres individuais e coletivos, assim
descrito: XVII - plena a liberdade de Associao para fins lcitos,
vedada a de carter paramilitar. XVIII - a criao de Associaes e, na
forma da lei, a de cooperativas independentemente de autorizao,
sendo vedada interferncia estatal em seu funcionamento; XIX - As
associaes s podero ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas
atividades suspensas por deciso judicial, exigindo-se, no primeiro
caso, o trnsito
46. em julgado. XX - Ningum poder ser compelido a associar-se
ou a permanecer associado XXI - As entidades associativas, quando
expressamente autorizadas, tem legitimidade para representar seus
filiados judicialmente e extrajudicialmente. Pela importncia do
regime e sistema que a constituio da Repblica representa, no
podemos isolar um Ttulo porquanto aquele estar sempre envolvido nos
chamados princpios de soberania, os quais so, dentre outros, da
dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da
livre iniciativa, garantir o desenvolvimento nacional, prevalncia
dos direitos humanos, o que nos leva a um feixe de relaes que ao
utilizarmos o mecanismo de interpretao sistemtica e teleolgica,
podemos perceber que as instituies Psicanalticas assumem papel
relevante na prtica de assegurar que os mencionados direitos no
sejam lesados, e como garantia h expressa proibio de ingerncia do
Poder Pblico. Dentro deste contexto, o legislador constituinte ao
inserir a associao como Entidade que representa direitos e
garantias, facultando-lhe inclusive legitimidade de estar em Juzo,
em nome prprio, defendendo o direito de seus filiados, pretendeu
gerar uma pessoa de direito privado cujo beneficirio imediato so os
seus filiados e o beneficirio mediato o prprio Estado vez que
qualquer atividade a que venha ser desenvolvida, alcanar um
beneficio social, mesmo que o seu objeto esteja inserido dentro de
uma categoria especfica. A partir da promulgao da Constituio de 5
de outubro de 1988, embora a personalidade jurdica da Associao seja
de direito privado, passamos a trata-Ia como se fosse um terceiro
gnero de pessoa, isto , mantm a integridade dos direitos e
garantias individuais e sociais e, via de regra, desenvolve
atividade prpria do Estado, o qual se v impotente em relao a todos
os seguimentos da manuteno qualitativa na rea de pesquisa, fomento
de cursos, e diversas outras atividades. Deste modo, as sociedades
(ou Instituies Psicanalticas) detm o poder de avaliar
qualitativamente seus membros, atravs do corpo tcnico pertencente
aos seus quadros os quais, pela notria competncia, podem
administrar cursos para a formao em psicanlise, superviso, painis,
cursos intra e extra-murais, jornadas, do mesmo modo que aqueles
que esto no processo de formao fiscalizam a qualidade dos curso
ministrados uma vez que qualquer sociedade existe como, tambm, se
mantm em razo daqueles. Vale ainda destacar, que a figura do
preletor no est destacada da obrigatoriedade, em tese, adotada pela
maioria das sociedades, de que aquele, tambm, faa sua terapia
pessoal. Alm deste fator, toda Sociedade precisa ter seu ato
constitutivo devidamente registrado, ocasio em que se torna uma
Pessoa Jurdica de Direito Privado e como tal sobre ela incide todo
o regramento jurdico, inclusive a Responsabilidade Civil na
qualificao tcnica de seus membros, de sorte que por via transversa,
no s