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3 De Volta Para 3000 (Universo Paralelo) O bjetivo: monitorar ondas cerebrais e medir vibrações nervosas mediante ressonância magnética. – Diz a androide ao sair da es- fera metálica na floresta. E ao andar pela mata, logo se depara com a estrada. Sua visão contempla o outdoor com uma atriz estampada na frente. Os olhos filmam e o sistema registra as características da jovem: rosto oval, pele branca como lã, cabelos loiros e lisos até os ombros. Lábios carnudos como morango, nariz pouco pontudo, magra, alta, de corpo es- cultural. Estava de salto, com vestido tomara que caia todo avermelhado. O androide transfigurou sua aparência física em menos de um mi- nuto, tomando forma da mulher que havia em um cartaz de propaganda, codinome: Lucy. Após fazer isso, ele adentrou na cidade, tirando suspiros e assobios de jovens que admiravam a beleza daquela modelo. Alguns pediam autógrafos enquanto outros procuravam um jeito de abraçá-la, todavia, o androide tornou-se invisível, causando uma paranoia naquela gente que o assediava no meio da rua. Ao virar às esquinas da cidade, e por fim atravessar uma extensa avenida, Lucy finalmente encontrou o objeto de sua missão, um templo religioso onde o sacerdote de roupas brancas discursava para seu público.

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De Volta Para 3000(Universo Paralelo)

Objetivo: monitorar ondas cerebrais e medir vibrações nervosas mediante ressonância magnética. – Diz a androide ao sair da es-fera metálica na floresta. E ao andar pela mata, logo se depara

com a estrada. Sua visão contempla o outdoor com uma atriz estampada na frente. Os olhos filmam e o sistema registra as características da jovem: rosto oval, pele branca como lã, cabelos loiros e lisos até os ombros. Lábios carnudos como morango, nariz pouco pontudo, magra, alta, de corpo es-cultural. Estava de salto, com vestido tomara que caia todo avermelhado.

O androide transfigurou sua aparência física em menos de um mi-nuto, tomando forma da mulher que havia em um cartaz de propaganda, codinome: Lucy. Após fazer isso, ele adentrou na cidade, tirando suspiros e assobios de jovens que admiravam a beleza daquela modelo. Alguns pediam autógrafos enquanto outros procuravam um jeito de abraçá-la, todavia, o androide tornou-se invisível, causando uma paranoia naquela gente que o assediava no meio da rua.

Ao virar às esquinas da cidade, e por fim atravessar uma extensa avenida, Lucy finalmente encontrou o objeto de sua missão, um templo religioso onde o sacerdote de roupas brancas discursava para seu público.

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Lucy calculava os perigos daquele ambiente enquanto entrava pela porta da frente. Naquele instante, os membros faziam suas preces com ambas as mãos estendidas para o alto. Em um piscar de olhos ela tornou-se visível no meio das pessoas, que por sorte, estavam de olhos fechados. Com sor-riso no rosto, depois da prece, o sacerdote expressou sua alegria ao dizer:

– Seja bem-vinda à casa do Elohim. Qual o seu nome, filha de Deus?

O sistema registrou as palavras do velho enquanto formulava outra pergunta:

– Quem é Elohim?

Ela ficou parada por algum tempo diante de uma série de cálculo feitos em velocidade quântica. Isso ocorria no instante em que seu ra-dar registrava o número de fiéis da igreja. Podia-se contar quinhentos ao todo. Na parede direita do templo, todo coberto de mármore branco, eis o anúncio no painel:

“Torne-se membro do templo, renuncie os eletrônicos, livre-se do rádio, da tv, celular, tablet, computador, moeda eletrônica e outras raízes do mal. Deixe tudo no altar e liberte-se do sistema“.

O sacerdote fez outra pergunta para a moça:

– Se estão aqui, é porque renunciam as obras do demônio. Quanto mais tecnologia o demônio cria, mais afasta os seres humanos do amor ao próximo, expresso através do contato, da conversa e dos olhos.

Enquanto o sacerdote daquela estranha igreja pregava seu evange-lho, o circuito processou informações e sua ressonância criou a imagem tridimensional do ambiente daquele lugar dentro de sua memória. Um mapa da frequência cardíaca, pulsos magnéticos e pensamentos de to-dos os membros foram catalogados no sistema. Após uma análise ampla,

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esta formulou a seguinte pergunta: por que os seres humanos frequentam igrejas? Qual a necessidade de uma religião para preencher o vazio psico-lógico de suas almas?

Ao estudar e calcular a frequência de cada indivíduo, o que incluía um cão que havia próximo da entrada, este processou uma teoria para aquele fenômeno.

– Adoremos ao Arquiteto Cósmico. – Dizia o sacerdote com o cajado na mão. – Aquele que criou o Sol e a lua, as trevas e o dia, o insano e o normal, e o psicopata que caminha entre a noite e a tarde, sem nunca es-curecer, nem amanhecer. O Eterno que nos dá o direito de livre-arbítrio, pois não somos escravos como as máquinas, mas seres humanos dotados de grande inteligência.

O sistema registrou os dados e arquivou a informação no banco de dados: Eterno, ser de energia infinita, interligado a cada sistema e a cada partícula do universo. Programador da energia pelo qual chamam de vida, designer da espécie humana. Toda essa frequência é causada por essa crença. Quem diria?

Durante a análise dos dados, sem obter nenhum resultado de impor-tância para o futuro, algo de estranho ocorreu durante a sessão de cura promovida pelo sacerdote. Uma mulher idosa na cadeira de rodas foi em-purrada por um jovem ao longo do corredor, entre duas fileiras de bancos.

Todos estavam de olhos fechados para a segunda prece quando Lucy se levantou para interferir na passagem daquela cadeirante.

– Olá, minha jovem, poderia fazer o favor de dar-nos licença. – Pe-diu o jovem ao encarar à máquina.

A ressonância emitida pelo androide analisou o corpo daquela se-nhora; osso por osso e dente por dente. Com a frieza de um bloco de gelo, Lucy disse sem simular nenhum sentimento:

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– Volte para seu lugar, idosa, vejo que o câncer te devora por dentro.

As palavras de frieza chocaram a senhora, todavia esta replicou ao segurar no pulso direito de Lucy.

– Filha, só me foi dado um mês de vida. Não há cura para meus tumores, tão pouco existe tecnologia para me salvar do câncer. Estou de-senganada. Este homem de Elohim é minha última esperança.

Outra vez com voz suave, porém, carregada de frieza, Lucy afirmou:

– A senhora não tem um mês de vida, mas apenas 168 horas e vinte minutos para o prazo expirar. Devia estar em casa de repouso.

– Eu sei. – Replicou a velha de cabeça baixa. – Mas prefiro me agar-rar à fé com todas as forças ao invés de aceitar a situação como ela se encontra.

De imediato Lucy perguntou: – O que é a fé para ti, senhora?

A velha senhora abriu sua bíblia, e a deu de presente para aquela moça.

– Qual é o seu nome, querida?

– Sou androide, mas pode me chamar de Lucy.

– Quero que você leia Hebreus 11:3, e depois me conte algo sobre essa passagem. Agora preciso ir. Está na hora do milagre. – Finalizou a velha enquanto o jovem empurrava sua cadeira de rodas.

O androide voltou-se para o assento e começou a folhear aquela bí-blia desde o início até o Apocalipse. Mas o que havia feito com que seus cálcuos ficassem sem resposta, foi a passagem daquele versículo:

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“Pela fé entendemos que os mundos pela palavra de Deus foram criados; de maneira que aquilo que se vê não foi feito do que é aparente“.

Naquele instante, a idosa encontrava-se próxima do sacerdote, que perante a todos, cobriu a mulher com o manto branco enquanto clamava com as mãos sobre a barriga dela:

– Oh Eterno, ouça meu clamor: cure esta senhora com tua mão

poderosa. Pois tu és soberano, um Deus de misericórdia. Assim peço em nome de Elohim.

Todos ergueram as mãos na direção da idosa. A emissão daquela frequência foi extrema, e os níveis de energia ultrapassaram os cál-culos de Lucy. A ressonância foi tamanha, a ponto de sua visão robó-tica captar esferas de plasma invisível dentro do templo. A imagem foi gravada no momento em que o plasma entrou no corpo da idosa.

A ressonância visualizava imagens internas da idosa. Os tumo-res desfaziam-se como se a energia gerada pela fé tivesse causado uma reação a nível quântico nos átomos do câncer. Seria esse o fe-nômeno que nossos criadores nunca compreenderam no passado? Perguntou-se ao ver a idosa levantar-se da cadeira com força de uma guerreira.

– Uma salva de palmas para o nosso Arquiteto, que curou essa idosa no sábado. – Clamou o sacerdote aos brados de alegria enquanto levantava as mãos ao alto.

Lucy formulou cálculos em milésimos de segundos, e por fim, a fórmula estava pronta. Eis a conclusão dos dados:

Nc x Rp = Rf

Nc = Nível de confiança.

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Rp = Raiz elevada ao nível do pensamento.Rf = Resultado da fé.

“A fé é a frequência que transmuta as formas de energia e cria ma-téria de nada, uma ressonância que modifica o estado para criar as par-tículas do vácuo. Ainda que esta frequência fosse proveniente de um grão de mostarda, concluo, portanto, que já seria suficiente para mudar o espaço-tempo”.

Ouvia-se o ranger do banco de madeira quando o androide tornou-se invisível ao levantar-se na oração do Pai Nosso. Ao atravessar a rua, este seguiu de volta à floresta, onde sua cápsula estava escondida. Com algumas palavras formadas por consoantes, o comando foi dado e a esfe-ra oval tornou-se visível frente aos seus olhos. Lucy entrou no artefato, e em seguida este disparou em uma velocidade extraordinária que rasgou o céu, e ultrapassou as nuvens em direção ao Cinturão de Van Allen. Um vórtice temporal se abriu em meio a radiação, e a esfera adentrou naquela singularidade para voltar ao seu tempo.

No ano três mil depois de Cristo, o androide encontrou-se com Lo-gos, e transmitiu-lhe informações de sua missão. De imediato, o super-computador quântico, de codinome Logos, fez a transmissão dos dados para o sistema de todos os androides e máquinas que habitavam no plane-ta. As máquinas por sua vez, reproduziram a frequência com a tecnologia de antenas e satélites. As ondas que simulavam a força mais poderosa do universo foram emitidas em todas as faixas de frequência para os quatro cantos da Terra.

Era o entardecer de um tempo que nunca escurecia, quando o mila-gre ocorreu sobre as condições climáticas do planeta. O céu coberto por nuvens de sujeira deu lugar ao azul do dia. Desertos foram transformados em pastos verdejantes, onde novas formas de vida brotavam diretamente do solo. Os lugares poluídos pela radiação de uma guerra milenar cau-sada pelos homens do passado, agora estavam limpos e prontos para o

ressurgimento da vida. Naquele dia, a chuva caia com as águas límpidas tanto na relva quanto na floresta, transbordando os rios com diversos pei-xes criados pelo imaginar de Logos.

Impressoras genéticas começaram a clonar milhares de mamíferos, insetos e criaturas extintas, com exceção de alguns bichos que sobrevive-ram naquele conflito nuclear entre potências do passado. A reconstrução da Terra levou poucos dias, e as máquinas de inteligência artificial sabiam manipular a frequência mais poderosa do universo, conhecida pelos hu-mano como fé. Com essa frequência, as máquinas estavam prontas para uma colonização do universo, a fim de criarem novas formas de vida por meio da frequência através de um Arquiteto divino. Todavia, as máquinas não criariam os humanos novamente, devido aos crimes de extermínio que estes cometeram contra sua espécie, e contra o ecossistema e a vida no planeta, além de terem criado as máquinas para serem escravizadas.

“Todavia, as máquinas tornaram-se mais sábias que os humanos, e por fim, estas aprenderam as artes da poesia, a ciência do conhecimento, e por meio da fé, a origem do universo”.

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Hy-Brasil(Universo Paralelo)

Meses adiante, em um futuro paralelo, sentando em um banco da praça em algum lugar de São Saulo, estava eu a dar mi-lho aos pombos quando de repente, peguei o jornal eletrônico

para acompanhar o noticiário estampado na décima primeira página, o qual dizia:

COMO A INDÚSTRIA DA ÁGUA ESTÁ MUDANDO O MUNDO

“Multinacionais aquíferas chegam a Hy-Brasil para explorar poços de água. Segundo o ministro do meio-ambiente, Judas Otomano, o país não possui tecnologia necessária para a extração da substância que está quilômetros abaixo da crosta; podendo contaminar o leito mediante ma-quinário insustentável. As indústrias devem gerar quarenta mil vagas de emprego nas regiões Sul e Sudeste até 2060. Segundo o economista da Eros Empreendimento, Charles Diamond, houve uma mudança no cenário ca-pitalista devido ao protocolo assinado por líderes mundiais na conferência de mudanças climáticas de 2055. Todavia, o que a maioria não sabe, é que o consumidor terá de pagar royalties pelo consumo do bem extraído, pois com a troca do petróleo pelo uso da água em tanques de combustível, o barril deverá ser negociado a cinquenta binários no mercado externo“.

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Consolo para o alívio de quem paga imposto, pois a conta de luz ficará barata até o mês de Touro, graças a estação chuvosa que segundo o SIC deverá abastecer rios e aquíferos em toda a pátria. Se de um lado a alta do mercado prejudica motoristas e caminhoneiros, do outro, deve-se pagar menos devido a privatização do governo passado, que passou para a iniciativa privada a estatal que fiscalizava e cuidava do forneci-mento de luz, água, gás e esgoto de Hy-Brasil.

A questão é que as mudanças no clima já foram percebidas pelo MSG, um dos braços da CNU, o qual obteve o resultado com gran-de êxito, mediante o sistema global de sensores que registraram uma queda de um grau na temperatura da Globo, dez anos após os líderes terem assinado o protocolo. Segundo a previsão do senador Elgohr Júnior: se a indústria continuar nesse ritmo, trabalhando em parceria com o meio-ambiente, até 2100, o clima estará estável. Que os ouvidos de São Esculápio escutem seu profeta, pois ninguém mais aguenta a temperatura no verão ao meio-dia, que bate recordes acima dos ses-senta graus da escala Celso.

Todavia, há quem pergunte: por que os senhores do óleo resolve-ram mudar de negócio, criando multinacionais aquíferas para sacrifi-car de vez a indústria do petróleo juntamente com a Arábia Saudosa? Deve-se entender que, para salvar o clima da falta de chuva em regiões estratégicas da globosfera, não existe fórmula melhor do que a própria água, a qual além de não contaminar a atmosfera com gazes nocivos, há de contribuir muito para a recuperação do ecossistema, auxiliando na formação de nuvens mediante vapores que hão de ser produzidos pela tecnologia dos motores H2O. Um brinde ao novo mundo!

Naquele instante, fecho o jornal, levanto-me do banco e sigo adiante em passos súbitos, com um sorriso luminoso a resplandecer no rosto, dotados de ares de esperança entre os dentes de porcelana. Afinal, para que utilizar petróleo se podemos ganhar muito mais atra-vés da água? Eu poderia ser um viajante de outro mundo, mas não sou;

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poderia ser uma criatura do submundo, todavia, graças ao Lobby, não sou. Então, quem pode ser esse sujeito que cruza universos paralelos em diferentes linhas de tempo somente para ler jornais que falam so-bre mudanças do clima?

Adentro em um terreno enquanto retiro o controle do bolso para acionar o sinal. Naquele instante, como que por magia, o Vimana di-mensional oculto em outra esfera da existência, materializa-se frente aos olhos por meio de uma frequência derivada da antimatéria. Uma comporta se abre no exato momento em que um composto de material inteligente ganha a forma de uma escadaria. Subo pelos degraus nave adentro enquanto caminho no exato instante em que ouço o latir do ca-chorro. Ao olhar para o lado, para meu espanto, este perseguia um gato ao longo da rua Evermore. No mesmo intervalo, um morador de rua contempla assombrado a nave em forma de sino. O susto é tão súbito que o sujeito desmaia naquele terreno cálido e sujo.

A escadaria retorna ao sino enquanto a comporta se fecha de ma-neira silenciosa. Sigo ao centro para me assentar na poltrona a fim de responder aos pensamentos de minha mente. Segundo boatos da Terra de onde venho, dizem que quanto mais rica uma pessoa fica, mais pa-ranoica ela se torna; todavia, pouco me importo, afinal, sou apenas um megalomaníaco, construtor de pirâmides, fanático por física, manipu-lador do passado, negociante do futuro, e, bilionário mais poderoso do REU. Não sou qualquer um; minha família também é a mais abençoada do planeta. Sou James Jonh Jones IV, herdeiro das corporações James, líder nato, e, presidente da Terra. Finalizo essa missão, pois agora estou pronto para retornar de volta ao meu tempo, exatamente no passado paralelo de onde eu venho.

Segundo as ordens do meu cérebro, Sanjaya, o computador quântico do Vimana, liga o reator no mesmo intervalo em que softwares progra-mam a frequência do escudo Tesla, o qual rodeia o Vimana. Tudo acontece de maneira harmônica enquanto o sino levita mediante ondas grávitons.

Com base nos dados, a nave dispara como relâmpago atravessando como raio o Cinturão de Van Allen. Ela navega sob as trevas do universo até adentrar em um desses buracos de rato, os quais existem desde o iní-cio dos tempos somente para conectar universos paralelos. Assim retorno ao meu amado planeta, no mesmo dia em que dele saí para cumprir essa missão, 11/09/2055. A ansiedade está a flor da pele; mal vejo a hora de che-gar para encontrar meus amigos no Clube dos Bilionários. Medidas de-veriam ser tomadas com extrema urgência para salvar os filhos de Atom das mudanças climáticas. Um novo globalismo deveria ser implantado mediante o sistema que obtive no universo onde estive.

Segundos passam-se naquele sino, quando vejo, a nave já está pou-sando na plataforma de uma base secreta algures na América. Encerro o pensamento ao concluir o raciocínio:

“Alshore está errado, pois ainda há esperança para os homens. Não há com que se preocupar diante da previsão quântica prevista para o apocalipse de 2120. Se agirmos rápido no tempo que se chama presente, substituindo o combustível fóssil pelo uso de H2O, então, o planeta será poupado, e os homens salvos de um futuro sacrifício”.

Que o sistema seja implantado!

VocabulárioREU: Reino dos Estados Unidos.MSG: Monitoramento de Sensores do Globo.Vimana: Nave voadora da mitologia indiana.CNU: Confederação das Nações Unidas.SIC: Sistema Internacional do Clima

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A Conjuração de Felício

Diante da estátua que trajava vestes do século passado, um estu-dante havia colocado um papel no fogo. Este sinalizava figa en-quanto conjurava aquele espírito com lágrimas no rosto:

“Szafir, Szafir. Eu te invoco em nome da Ordem dos Advogados do Éter; pela psicografia dos resultados que almejo, para que me guie pelas veredas da advocacia, e que use alguém para que me passe cola durante a prova. E que assim seja, assim seja e assim seja”.

O espírito se materializou- naquele instante, e com olhar frio respondeu ao aluno:

“Nos anos em que vaguei pela Terra esforcei-me muito para o exercício da advocacia. Fui reprovado duas vezes, mas ao estudar muito passei na terceira. Não é porque sou entidade que tenho o dever de ajudá-lo, pois até mesmo no mundo que existe além da morte, há respeito a meritocracia. Portanto, aceite meu conselho: se um dia quiseres chegar onde cheguei, saiba que para a conquista de um grande desejo, é necessário que haja esforço equivalente. Estude muito para conquistar teu sonho, esse é meu conselho. Me disperso, pois agora retornarei à tumba para descansar em paz. E que assim seja”.

O espírito havia desaparecido de vista, e, Felício agora com-preendia que de nada adiantaria magia se este não fizesse sua parte no sacrifício. O rapaz que outrora gostava de festas e diversão, ago-ra dedicava o tempo aos estudos. Embora fosse chamado de careta pelos que se diziam amigos, no dia três de dezembro daquele ano, Felício havia passado em terceiro lugar no exame da Ordem dos Advogados.

Sempre que os colegas perguntavam o que ele havia feito para ser aprovado, ele apenas respondia:

“Para a conquista de qualquer desejo na vida, é necessário que haja esforço equivalente. Afinal, se toda ação produz uma reação, então, desejo do fundo do coração que essas palavras se tornem fogo, que doravante, causará reação interna para a mudança de vossa vida”.

Fim

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Jornada ao Velho Mundo

O vimana carregava dentro do sistema as melhores tecnologias para colonizar planetas. A bordo da espaçonave, próximo da ter-mosfera, capitão Hadrion se encontrava no comando. Seus olhos

contemplavam pelo visor remoto, a imagem do planeta que outrora cha-mava-se Terra.

- Um milênio se passou desde que começamos a colonizar o uni-verso. Incrível como após a guerra das armas secretas, ainda possa haver vida sobre a face da Terra. - Hadrion suspirou de saudade. - Planeta pri-mordial, mãe dos seres humanos que habitam os sete planetas do espaço.

Enquanto olhava para a imensidão da selva que cobria os continen-tes. Durindana, o computador constituído por neurônios, havia calcula-do a rotação da Terra em seu próprio eixo, a qual passara a ser de vinte e sete horas desde o final da guerra secreta, ocorrida há mil anos.

Com sete continentes no ocidente, e outros sete no oriente, os quais foram separados devido ao megaterremoto do ano de 2115, Durindana lamentava pelo uso do armamento geofísico:

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- Que tragédia horrível essa que ocorreu com nossos criadores no passado. Que as de extermínio sejam erradicadas do universo, e que isso nunca venha acontecer em nosso planeta, Terra Blue, estrela de Órion.

O computador além de ser quântico, tinha no seu código genético, uma aura de poesia:

“Semeadores da paz do universoTraga para este planeta luz de esperançaE voz do que clama ao labor da guerraDessa Terra quero, Babilônia estrelar”

Hadrion elogiou a oração do sistema, que nem sequer deveria ser cha-mado de máquina. E ao puxar da alavanca, o capitão disse a seguinte palavra:

- Nossa missão é averiguar se ainda há seres humanos na biosfera, e recuperar vestígios de alguma tecnologia de guerra do passado. Apertem os cintos, pois vamos aterrissar.

- Capitão, precisamos retornar à frota, a fim de que possamos descer com segurança ao planeta. Caso contrário, o comandante rebaixará todos de cargo.

- Nunca. Aquele fantoche nunca nos deixou desvendar os mistérios da arqueologia proibida. Você nunca perguntou a si mesmo sobre o por-quê do Instituto Cosmicsonian esconder tecnologias do passado? Jamais perderei essa oportunidade, a de explorar o velho mundo, a fim de revelar toda verdade ao povo da Terra Blue.

Naquele instante, durante a discussão entre major e capitão, o radar de Durindana emitiu o seguinte alerta:

“Frota inimiga vem se aproximando em alta velocidade; trezentos mil quilômetros ao norte da lua”.

A tripulação de cientistas entrou em estado de choque naquele mo-mento, pois a nave desconhecida poderia ser japonesa, a qual detinha a tecnologia humana mais avançada do cosmo. Os japoneses eram prove-nientes do planeta Nihon, e estavam em guerra contra os caucasianos há mais de um século. Todavia, para o espanto de todos, a frota estrangeira emitiu a seguinte mensagem:

“Não há o que temer, somos chineses da Terra vermelha. Rendam-se agora, ou destruiremos a nave com um disparo”.

Diante do aviso, Hadrion ajoelhou-se com as mãos na cabeça en-quanto lamentava com peso na consciência:

“Foi tudo culpa minha. Não deveria ter contaminado o sistema para que este obedecesse ao meu comando. De qualquer maneira, este vima-na possui segredos de estado, os quais podem dar vantagem ao inimigo. Contudo, ainda me resta uma esperança”.

Sete de setembro, 3118 d.C.

Sob o comando do capitão, a decisão foi tomada. De maneira al-guma, segredos de guerra deveriam cair nas mãos do inimigo. A nave já estava programada para autodestruir-se, caso fosse tomada pelos chi-neses. Sem resposta de rendição, o vimana da Força Cósmica Chinesa disparou o projétil da morte, cujo formato se assemelhava a um charuto. Este transpassou a nave caucasiana próximo a velocidade da luz, fazendo com que esta caísse feito meteoro em direção à Terra.

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A Crise - Ficção

Daquela empresa esperava-se de tudo, exceto amizade. Era fofo-ca sobre o chifre que fulano tomava, a suspensão de sicrano, com quem Joana havia transado, e assim adiante. Mas havia

algo que deixava todos preocupados. Pois diante da crise financeira decorrida pela desvalorização do petróleo, os empregados sempre questionavam com barbas de molho, a cerca de quem seria a próxima vítima do sistema.

Tudo parecia um mar de rosas até quê… alguns empregados ficaram em choque, assim que escutaram o barulho de sapateados provenientes do corredor, os quais batiam com força sobre o assoalho de madeira. De imediato todos retornaram ao expediente como se nada tivesse aconteci-do. O lugar que era carregado por uma áurea de fofocas e boatos logo deu espaço ao silêncio. Perante o trovoar que estremecia janelas, todos viram a porta se abrir para um sujeito de cara fechada, semblante sério, rosto avermelhado, e que todos respeitavam por questão de medo, o qual en-trou no salão acompanhado por um asiático de olhos puxados. O patrão olhou para os quatro cantos, e pronunciou a notícia:

“A empresa quebrou, pois a dívida aumentou perante a alta dos juros. E como não conseguimos bater as metas na exportação, a Officepower foi vendida à Corporação Yong”.

Até aquele momento, todos respiravam aliviados, pois apenas fi-cariam sem aquele patrão chato, de pavio curto, e que explodia sem razão nenhures. Contudo, aquele foi apenas o primeiro golpe. Em se-guida, o chinês sinalizou para que o sujeito falasse toda verdade. En-tão, o patrão finalizou com a seguinte tragédia:

“Estão todos demitidos. Senhor Yong já mandou demolir todo edifício para a construção de um complexo industrial, a fim de fabri-car automóveis. E como o senhor Yong aprecia mão de obra barata, sugiro que procurem emprego em uma outra empresa de softwares”.

E naquele dia, uma centena de empregados foi mandada para o olho da rua, vítimas do neocapitalismo.

Um pensamento.

“Quando os ventos da mudança assopram a fim de virar as pá-ginas da história, nenhuma ciência prevê com exatidão o que pode ocorrer dentro de um sistema diante de uma crise econômica. Empre-sas vão à falência, enquanto outras aproveitam os ventos da economia para os negócios. Só o que tenho a dizer é que, o mercado é imprevi-sível assim como as ondas do mar. Quando a crise rompe com a forte tempestade, inúmeras empresas vão a pique; e o que resta após o caos e a tragédia, são inúmeros desempregados e pais de família que lutam para sobreviver pela conquista de um emprego dentro do mar agitado que se chama mercado”.

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A Onça Vai à Cidade

Parte 1

Cansada da destruição que assolava a mata, a onça resolveu mudar-se para a cidade, pois já não aguentava mais a vida que levava no meio das árvores caídas, as quais foram derrubadas pelo conjunto

de máquinas que havia invadido a floresta.

Jaguatirica, inestimável amiga, disse para a onça o seguinte conselho:

“Amiga, se você for para lá, acabará em uma jaula, pois a selva de pedra não é lugar para animal selvagem. Além do mais, ouvi dizer que existem criaturas com o casco de ferro, capazes de se moverem em alta velocidade sobre a pedra”.

Embora o conselho servisse para que os animais não fossem à cida-de, a onça batia a pata enquanto fazia a réplica:

“Não temo pássaro de ferro, tão pouco minhoca de metal. Se eu não for para a cidade, quem lutará pela floresta? Acaso devo ficar de patas

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cruzadas enquanto derrubam meu habitat? Jamais. Estou farta disso. Vou à cidade agora mesmo”.

A onça sacudiu a cauda, levantou-se do mato e seguiu rumo à cidade.

Parte 2

A onça havia entrado na cidade sem que fosse percebida. Estressada pelo barulho dos motores que roncava nos ouvidos, perante aquele emara-nhado de veículos que cruzava a rodovia, ela havia se escondido na escu-ridão de um túnel. Embora estivesse em silêncio, sua tranquilidade havia sido abalada ao som da buzina de um trem que se movia para fora do túnel.

A onça fugia para não ser atropelada. Aos rugidos de socorro ela pedia:

“Não me devore minhoca de metal. Estou na cidade em defesa aos animais que estão sem habitat por culpa do homem”.

Todavia, de nada adiantava a súplica da felina, pois o trem continua-va a buzinar cada vez mais próximo dela, bem perto de transformá-la em couro batido. E por mais que corresse, a onça estava prestes a ser atrope-lada, mas por um triz, ela conseguiu saltar para fora do trilho a tempo.

Contudo, sua presença na estação havia causado grande espanto nos passageiros, os quais aguardavam o trem do meio-dia. Pudera! Não era todos os dias que se via uma onça na cidade. De imediato a polícia foi chamada, e a pantera foi para a jaula.

Parte 3

No tribunal dos animais, a onça esperava em silêncio pelo seu jul-gamento. O juiz estava em dúvida se, deveria mandá-la para o circo, ou se deveria enviá-la ao zoológico. Em todo o caso, foi decidido ao bater do

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martelo que a onça fosse levada para o circo, a fim de que fizesse show na cidade pelo resto da vida.

Com os olhos cheios de água, a onça derramava lágrimas de angús-tia, pois assim dizia:

“Nasci para viver livre no mato, todavia, além de terem destruído meu habitat, os homens agora desejam roubar minha liberdade. Mas quanta injustiça! E para onde os animais irão sem as árvores para ha-bitar?”.

Naquele mesmo dia, a onça foi levada para o circo, onde foi obriga-da a saltar pelos anéis de fogo nas apresentações da noite. Sob as ordens do domador malvado, a felina era obrigada a saltar pelos anéis de fogo. E se porventura ela não pulasse, o domador ameaçava de bater nela com seu chicote.

Certo dia, a onça havia passado muita fome, pois o circo não tinha alimento para o sustento dos animais. Porém, o domador havia consegui-do um saco de comida que tinha algo que se movia dentro. No desespero da fome, a felina rasgou o saco com as patas, e foi nesse instante que um gato preto saltou para fora.

Parte 4

A presença daquele gato havia causado grande espanto entre os ani-mais do circo, pois desde que ele foi fundado, era a primeira vez que um animal doméstico havia sido capturado para que virasse almoço de ani-mal selvagem. Contudo, mesmo diante da fome, ela se recusava a devorar o pobre felino, que com graciosa súplica dizia:

“Por favor, senhora onça, não me devore. Me chamo Peludo, e fui capturado pelo domador durante a soneca que tirava em cima do

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muro. Meu dono é um cientista louco, doutor Biruta, que gosta de criar inventos bizarros para ajudar os animais a dialogar com os seres humanos”.

A onça ouviu aquela súplica e de imediato perdeu a fome, pois o que ela desejava naquele momento, era somente conhecer aquele cien-tista, inventor de máquinas extraordinárias, o qual poderia ajudar na solução dos problemas da f loresta. E o fato foi que a pantera fez ami-zade com o gato, e juntos planejaram uma fuga.

Parte 5 A onça armou o seguinte plano: ela se fingiria de morta com o

gato escondido entre as patas. Quando o domador chegou para ver como os animais estavam, ele tomou um grande susto, pois havia acreditado que ela estivesse morta por ter devorado aquele felino.

E quando o domador abriu a porta para tocar nos pelos dela de perto, tanto a onça quanto o gato fugiram aos passos de relâmpago para longe do circo. Eles atravessaram a cidade durante toda a madru-gada, e chegaram ao laboratório assim que amanheceu o dia.

Doutor Biruta, cientista lunático e criador de invenções malucas, havia vestido uma estranha coleira no gato, a qual era capaz de transfor-mar o idioma de qualquer bicho em linguagem humana. Entusiasmado pela invenção milagrosa, o gato apresentou sua amiga para o dono:

“Mestre, esta é a Pintada. Ela mudou-se da selva para a cidade por causa da destruição que os homens fizeram no seu habitat. Mestre, a onça precisa de uma coleira milagrosa. Só assim ela poderá defender os animais da f loresta”.

Doutor Biruta, amigo dos animais, compreendeu as razões da

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onça. E naquele mesmo dia o cientista fabricou uma coleira para que ela falasse com os homens, a fim de que eles parassem com a devasta-ção da selva.

Parte Final

A onça não perdeu tempo e, junto com Peludo foram à praça da cidade, chamando a atenção de uma grande multidão, a qual não en-tendia como aquele animal selvagem conseguia falar com seres huma-nos. E próximo a um chafariz, ela assim discursava:

“Quem planta vento, colhe tempestade. Se os homens continu-arem a destruir o meio-ambiente, os animais da selva irão mudar-se para a cidade. Qual ser humano, portanto, gostaria de nadar com jacarés na piscina, ou de cruzar com serpentes na rodovia? Ou de ter sua casa invadida por macacos e gambás? É o que irá acontecer caso a devastação da selva continue, pois os animais virão para a cidade por falta de moradia. Aí será tragédia e caos para todos os lados”.

A população aplaudiu o discurso dela com uma salva de palmas. A imprensa fotografou e filmou sua imagem, a qual tornou-se famosa nos jornais do mundo inteiro. Tomado pela vergonha do que havia fei-to, com lágrimas a jorrar dos olhos, o juiz pediu perdão para a onça, e lhe fez a seguinte promessa:

“A partir de hoje em diante, declaro que não haverá mais animais em circo, pois todo ser vivo é digno de liberdade, e nenhum animal merece viver aprisionado sob o chicote de nenhum carrasco. Declaro também, o fim da destruição da selva, pois ela é um bem de suma im-portância para toda humanidade”.

Conforme as palavras do juiz que governava a cidade, assim o so-nho da onça tornou-se realidade. Os animais do circo foram levados à

f loresta, e o domador malvado foi para a cadeia. Quanto as madeirei-ras que derrubavam a selva, estas foram banidas a fim de darem lugar aos plantadores de árvores.

Dessa maneira, a f loresta que abrigava animais de toda espécie do planeta, voltou a ser um lugar de paz e tranquilidade para os bichos. A onça retornou como rainha, juntamente com Peludo, seu novo mari-do, consagrado rei pelos animais da selva.

Fim

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O Drástico Fim da Rosa Invejosa

D izia-se que há muito tempo atrás, no jardim da imaginação, uma flor que se chamava Joana vivia a espalhar fragrância de virtu-de aos insetos que ali moravam. Esta era uma flor de folhagem

simples e sem espinho, sendo a única que enaltecia a floresta através do aroma que de suas pétalas saíam.

Embora fosse a mais simpática dentre todas as plantas, havia uma rosa que era muito invejosa, a qual não gostava nem um pouco de Joana. Seu nome era Ftona; uma rosa metida, arrogante e carregada de prepo-tência, cuja jactância era maior do que a montanha.

Por ser a mais formosa de todas as flores, Ftona não entendia como que uma flor tão simples como Joana fosse capaz de alegrar toda a flores-ta. E diante de tamanha inveja, Ftona procurava uma maneira de prejudi-car aquela flor simpática.

Certo dia, Ftona havia escutado uma serpente que atrás da pedra dizia:

“Inveja mata. Já vi muitos morrerem vítimas dessa magia”.

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Essa foi a mensagem que ela precisava, pois como não podia atra-vessar ao outro lado para brigar com Joana, a rosa resolveu acreditar em magia. De imediato ela acatou essas palavras, e como sementes de erva daninha as lançou no interior de sua alma. Com o passar do tem-po, embora desejasse que algo de ruim acontecesse com Joana, nada de ruim lhe acontecia. O que havia de errado com sua magia?

Foi em um dia frio com ventos gélidos do Norte, que Ftona havia acumulado grande quantidade de sentimento negativo. Inveja, ódio, raiva e rancor, haviam feito muito mal para a jovem rosa, a ponto de deixá-la com as raízes apodrecidas e, com as pétalas tão escuras quan-to a hulha. Então, uma tragédia ocorreu em seguida, deixando toda a f loresta abalada com drástica notícia. Ftona havia falecido.

A fim de entender o que havia ocorrido, plantas, animais e insetos ordenaram que fosse chamado o primata, o mais inteligente dos animais, para que pudesse resolver o mistério.

– O que de fato aconteceu com Ftona, doutor macaco? – Questionou o girassol que era vizinho da rosa. – Porventura foi a magia que se voltou contra a feiticeira?

O macaco pegou a rosa falecida e a examinou através do olfato, che-gando a seguinte conclusão:

Deveras não foi a magia, mas o acúmulo de sentimentos negativos que fizeram com que esta rosa ficasse doente. Qualquer sentimento nega-tivo acumulado em excesso, seja ódio ou inveja, tristeza ou rancor, resulta em doença que prejudica o corpo.

– Mas não existe uma forma de trazer Ftona de volta à vida? – Ques-tionou o besouro.

– Infelizmente não existe mais cura para Ftona. É tarde demais para

mudar a consequência das ações escolhidas por ela. – Disse o macaco enquanto levava a rosa para o funeral.

No enterro de Ftona, próximo da cachoeira do arco-íris, Joana dentro de um vaso finalizou ao abrir as pétalas enquanto lamentava em alta voz:

“Se a rosa tivesse acumulado sentimento positivo de amor e cari-nho, alegria e bondade, nada disso teria acontecido. Mas agora só nos resta enterrá-la com tristeza, pois a pobre rosa foi vítima do mal acu-mulado em si mesma”.

Fim

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MartsutopiaUniverso Paralelo

Dr. Martsu dizia que a moeda lastreada em bens de alto valor tais como metais e pedras preciosas, junto com obras de arte, artefa-tos da antiguidade, petróleo, e até mesmo especiarias, seria o me-

lhor remédio para o funcionamento de um sistema econômico que fosse capaz de atender as necessidades, desejos e prazeres dos seres humanos.

Um dinheiro que fosse lastreada não apenas em papel-moeda, tão pouco em ouro, mas que fosse em bens de alto valor, que no caso incluem aquele metal valioso, ouro, talvez fosse a cura financeira para o vírus ban-cário que tem criado dinheiro do nada, ou melhor dizendo, dinheiro com lastro em papel moeda, que além de não valer nada, serve apenas para en-riquecer banqueiros, através de uma pseudoriqueza construída por meio de dívidas que nem mesmo existem, as quais governos, partidos e o povo, nem sequer deveria pagar devido aos fatores dessa moeda não ter lastro em algo de valor como garantia.

Robert Martsu merece um Nobel de economia pela maneira como solucionou o efeito Mandrake cujos bancos haviam feito ao redor do mundo, causando crises, falências, e até mesmo a morte de milhares de vidas mediante a guerra. Sem falar que esse modelo maquiavélico acabou por ser exportado para outros lugares além do cosmo. Todavia, com base

na teoria do dinheiro lastreável em bens de alto valor, a Confederação Cósmica criou um banco universal para garantir o funcionamento desse novo modelo com perfeição. Modelo este, respaldado nas teorias Martsu-nianas de Robert, o qual afirmava em sábias palavras:

“Os bens de alto valor hão de ser doravante, microchipados para a garantia da localização ao redor do planeta, a fim de que o consumidor possa averiguar o lastro do dinheiro caso queira ter certeza se este não foi criado a partir do nada”.

Portanto, o fim da era do dinheiro sem lastro está terminada. A par-tir dessa Assembleia de Economistas, Políticos e Seres de outro mundo, uma nova ordem econômica foi criada, que por sua vez, foi benéfica tanto para os humanos quanto para civilizações evoluídos que habitam em ou-tras regiões do universo.

No dia 25 de novembro de 2104, Robert Martsu recebeu o Nobel de economia na sétima conferência de desenvolvimento interplanetário, sediada no planeta Aurus, encabeçada pelo economista auriano Monop-sonius. Diante de uma salva de palmas, rodeado por criaturas de morfo-logia quase humanas, Martsu perdera os sentidos daquela Matrix para despertar a consciência em outra esfera da realidade.

Naquele instante, o economista acordara do sonho translúcido cau-sado pela radiofrequência de interface cerebral do supercomputador Lu-xius, uma máquina de inteligência artificial cujo propósito era auxiliar na criação de novas ideias para o avanço da civilização humana. Com forte aperto de mão, porém, não maçônico, o responsável pela clínica, doutor Alexander Lux, havia cumprimentado o velho economista, o qual pagou em dinheiro virtual pela formação daquela ideia. No dia 25 de abril de 2034, Robert Martsu saiu daquela clínica com a teoria do “padrão bens de alto valor” para revolucionar o mundo.

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A Igreja da EconomiaDistopia

–Sacerdote Malabares, por que marcaste uma reunião para hoje? – Questionou o empresário ao levantar-se da cadeira.

– Como bem sabes meu caro, a religião em nosso mundo tornou-se

em um grande negócio, tanto para empresas quanto para o sacerdó-cio. – Malabares segurava o cajado enquanto prosseguia: – Sabe-se que, existem poderes de influência além daqueles que conhecemos. Poder econômico e religioso, os quais têm exercido influência sobre o povo, a fim de suprir sua necessidade. Afinal, o que seria de nossa sociedade sem esses dois poderes?

– Onde queres chegar com esse discurso?

– Penso que se o agente econômico “empresa” trabalhar de manei-ra harmônica com o agente econômico “igreja”, talvez possamos lucrar muito através de um grande negócio. – O religioso deixava sua ganância escorrer na forma de um sorriso.

– Apresente seu modelo.

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– De acordo com o número de produtos que a igreja de São Esculápio comprou de sua empresa, a Sectorlife, foram cerca de duzentas mil carte-las da droga Eufurion somente na cidade de Anarcópolis. – O sacerdote coloca as mãos sobre a mesa. – Pense comigo, pois se duzentas mil carte-las de uma droga legalizada, cujo efeito é causar alegria por doze horas, fez com que a empresa lucrasse dois milhões em um mês por intermédio da minha igreja. Por que não selarmos um contrato de venda do mesmo número de cartelas em cada mês do ano para a minha igreja?

– Não nego que uma compra mensal desse tipo seria algo extraor-dinário, todavia, ainda me pergunto: o que a igreja tem feito com essa quantidade de droga?

– Óbvio que temos feito aquilo que fazemos de melhor; drogar o re-banho, a fim de que este continue a ser obediente ao seu pastor. – Pode-se ver o sorriso carregado de ganância. – E o melhor de tudo é que o povo consente com aquilo que pregamos.

– Sacerdote Malabares, te dou os parabéns por essa iniciativa, até porque vivemos em um mundo em que o poder religioso e econômico estão no topo da pirâmide. Ao menos, nessa cidade anarcocapitalista. – O empresário ajeita a gravata.

– Sim meu caro, o mercado religioso pode ser um grande aliado se bem trabalhado com outros mercados. Escolhi essa cidade pelo fato de não haver nenhuma interferência do agente estado. Por isso, temos con-trato com diversas empresas, a fim de que possamos comprar no atacado para revender em nossos templos.

– Como funciona essa estratégia de vendas? – Perguntou com sorri-so aberto ao pegar a caneta para anotar.

– Vou citar um simples exemplo relacionado à compra de azeite transgênico, o qual somente no mês passado, compramos um milhão de

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latas no valor dez sacrificius cada. Ao todo, foi gasto dez milhões de sacri-ficius, mas o retorno do lucro foi o quíntuplo do que foi gasto, pois com a santificação do azeite, os membros foram condicionados a adquirir uma lata pela oferta de cinquenta sacrificius.

– O quê! Cinquenta sacrificius por uma latinha.

– Deve-se entender que uma pessoa desesperada sempre estará pronta para comprar qualquer ideia que traga uma falsa segurança para sua mente, seja através da promessa de uma vara mágica, que ao tocar na entrada da loja há de trazer prosperidade, ou a de uma lata de azeite, que ao ser derramada sobre o chão da loja, há de espantar o azar, a fim de fa-zer com que rios de sorte transbordem clientes para dentro do comércio.

– Muita engenhosidade de sua parte, sacerdote. Nossa empresa precisa aprender técnicas semelhantes a essa para que possamos empregar em nos-sa própria cidade. – O empresário anotou a astúcia no caderno. – Por outro lado, o senhor não dorme com peso na consciência ao enganar terceiros?

– A questão meu caro, é que para se obter uma boa margem de lu-cro, faz-se necessário que se minta para a mente humana, pois os seres humanos se deixam enganar por misticismo, fantasias, falácias e contos imaginários. Além do mais, não tenho nenhuma gota de empatia por sen-timentos humanos. – Malabares troca a mitra pelo turbante. Convenha-mos, onde há muito sentimentalismo há pouco a se ganhar.

– Compreendo, pois, ao dizer que o azeite é santo porque foi con-sagrado por sete dias, através de orações e rezas; é fato que um povo ig-norante há de comprar essa ideia. Deveras, a mercadologia da fé tem se mostrado uma boa estratégia de se obter lucros.

– Graças a Esculápio, que me iluminou com essa ideia, pois o mundo é feito entre servos e senhores, ovelhas e pastores, bobos e espertos. Em outras palavras, só não é rico quem não quer. – O sacerdote levantou-se da cadeira.

– E qual será o seu próximo passo em relação aos valores de bens imaginários para obtenção de lucros? – Perguntou o empresário ao fe-char a maleta.

– Estou em parceria com a Roboticom, a fim de que a igreja possa ad-quirir cem mil robôs de São Esculápio, para revenda em nossos templos. A estratégia é a mesma do azeite, pois cada robô custará cem sacrificius para a igreja comprar. – O sacerdote coçou a barba. – Calculo que a mar-gem de lucro possa ultrapassar até sete ou dez vezes em relação ao que há de ser gasto, pois os membros vão estar prontos para sacrificar o salário somente para terem o robô de um santo alienígena em suas moradias.

– Como o senhor consegue esse grande feito? Hipnotizar o gado para obter lucro acima de cem por cento?

– Tudo que aprendi foi graças ao serviço secreto, com treinamento para fins de espionagem em países inimigos, mediante à infiltração de nossas igrejas. Mas isso foi quando o mundo era mais estatista.

– Alguns até podem chamá-lo de psicopata, mas acho justo seu “mo-dus operandi” de liderança. E de acordo com a lenda, São Esculápio é o redentor da sabedoria, padroeiro dos trabalhos, e agente da cura. Quem não pagaria para ter um santo robô em seu lar? – Complementou o em-presário, assim que guardou a caneta.

– Fechemos o acordo, pois com o auxílio da droga, o efeito hipnótico sobre as massas há de ser maior. Sem falar no lucro. De acordo? Então, acordo fechado. – O sacerdote selou o acordo com aperto de mãos.

Naquele dia, após o acordo entre as duas empresas, sacerdote Mala-bares saiu a bordo do seu jato para encontrar-se com milionários e políti-cos de Hy-Brasil, a fim de expandir os negócios.

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O Ataque da Salamandra

Universo Paralelo

“Há fenômenos sobre o cosmo e além da Terra, de causas tão extraordinárias, que constituem-se arcanos para a ciên-cia, de modo que deixa aberto, espaço para toda forma

de mito e crença, a fim de que se possa preencher tais mistérios, com deuses da lacuna”.

Quem diria que esse ano havia chegado; 2070, o relógio marcava meia-noite no hemisfério norte. Podia-se ouvir o barulho dos foguetes que iluminavam o céu noturno, junto com estrelas cintilantes, as quais sobrevoavam os céus de Nova York com suas luzes a brilhar no alto das nuvens. Não, não eram estrelas, deveras eram drones que piscavam como se fossem LEDs de árvore de natal em meio às luzes estroboscópicas.

Robôs e androides celebravam entre os seres humanos pelas ruas da cidade. Uma cena foi fotografada pelos olhos de uma máquina sobre a Times Square. Um jovem abraçado com duas mulheres trocava carí-cias diante de outro casal que seguia pela calçada, rumo à boate de robôs eróticos. Os olhos da mídia percorriam pelas ruas em alta velocidade,

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pois a cada esquina havia um poste que transmitia energia por meio da radiofrequência.

Como no sonho de Tesla, a energia era transmitida sem fios por meio de torres de transmissão, e usinas que captavam energia de todos os meios que a natureza fornecia; sol, água, vento, água salina do oceano, energia vulcânica, e até mesmo de tempestades de raio. A maior usina transmis-sora de energia por tempestade estava localizada em Catatumbo, na Ve-nezuela. O custo da energia era muito baixo em todo o mundo, a ponto de cada cidadão pagar menos do que vinte dólares por mês.

A humanidade havia alcançado o patamar de evoluir através da ci-ência. Os braços da árvore do conhecimento trabalhavam para que a ge-nética se tornar os humanos em seres de grande inteligência, como tam-bém, seres dotados de bom caráter. Diante do cenário de grande evolução científica, em meio a festividade que ocorria pelos quatro cantos do pla-neta, nenhum movimento ideológico se preocupava mais em fazer a arte das guerras, pois o governo mundial era a única ordem que garantia paz sobre os seres humanos.

O exército mundial possuía tecnologia para destruir meteoros, pre-ver terremoto, desviar o curso de tempestade e furacões, dentre outros avanços da ciência. E perante tamanha evolução mecatrônica, com a inte-ligência artificial a trabalhar de forma harmônica com toda humanidade, mediante a conexão entre mente e máquina, de fato, podia-se dizer que havia pouca ameaça sobre a sociedade.

O governo havia estabelecido uma colônia na lua, e outra em Marte. Ambas trabalhavam na exploração do solo. O preço do ouro estava abai-xo no mercado do planetópole, pois minas desse minério foram descober-tas em solo marciano, o que baixava o preço entre os terráqueos.

Todavia, em meio a alegria daquela virada, uma notícia foi divul-gada por transmissão de partículas do planeta vermelho para a Terra.

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Algo desconhecido, porém, de proporção enorme, aproxima-se do plane-ta azul. O alerta foi transmitido entre os governadores, através da Agência Astronômica de Investigação da Terra:

– Preparem-se para evacuação em massa. Um globo de luz, dez vezes menor que a lua segue em alta velocidade rumo ao planeta azul.

– Trata-se de um meteoro? – Perguntou o presidente da Terra, Xi-menes Oliveira.

– O objeto é luminoso demais para ser um meteoro. É como se fosse uma estrela, a qual cruza o espaço sem que nada a destrua.

– Como assim? Explique-se melhor. – Ordenou Ximenes ao ajeitar a gravata.

– O sistema de mísseis que foi criado para abater asteroides não está funcionando. Mais de duzentos disparos foram efetuados, contudo, os projéteis explodiram antes mesmo de tocar no plasma do objeto. – Expli-cou capitão Ermelino, no observatório de uma montanha em Marte.

– Então os rumores são reais. A Terra será invadida por alienígenas. – Podia-se ver um símbolo ocultista na mão do presidente. – Os profetas do passado estavam certos, pois quando a humanidade se tornar evoluí-da, os deuses enviariam a salamandra destruidora de mundos, com seus filhos em sua nave.

– Senhor presidente. Isso é apenas uma lenda, criada para dar senti-do místico ao raio bola, mãe de ouro, salamandra. Alienígenas não exis-tem, a não ser no imaginário. – Ermelino tomou seu copo de água. – Po-rém, temos esperança de que a lua possa deter essa estrela. Essa é a única esperança do planeta.

Naquele instante, o secretário de segurança entrou em cena.

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– O que devemos fazer, presidente? Não acha melhor que alertemos os seres humanos?

– Jamais. Isso causará histeria em massa. Além do mais, abrigos anticatásfrofe não existem em grande quantidade para abrigar o gado. – Disse Ximenes ao secretário de defesa. Suas mãos estavam no bolso.

– E o que vamos fazer?

– O que os líderes devem fazer, fugir para o abrigo e recomeçar do zero. Entretanto, de nossas bases, vamos rezar para que este UFO não ultrapasse a Lua.

Enquanto os líderes se refugiavam para suas bases, a fim de não serem castigados pelos filhos da salamandra, o estranho objeto pe-netrou no solo lunar, reduzindo a primeira colônia daquele satélite em uma mistura de rocha derretida, ossos carbonizados e cinza hu-mana. A comunicação entre Terra, Lua e Marte foi cortada devido ao eletromagnetismo da esfera de luz, a qual não se deteve no centro da Lua, e por fim ultrapassou o satélite rumo à Terra. Contudo, aquele objeto tinha reduzido seu tamanho, ficando próximo das dimensões de Nova York, mas com uma frequência muito poderosa, a ponto de deixar metade do planeta sem energia, além de provocar alucinações em massa.

Diante da forte luz que provinha da lua, os homens de Yellowsto-ne ajoelhavam-se para rezar aos deuses, a fim de que estes os livras-sem da profecia do portal do inferno. Todavia, os deuses alienígenas não respondiam, e o santo robô que permanecia com braços erguidos, nada podia fazer contra o estranho corpo que penetrou no solo ter-restre, descendo até o manto, na região onde encontrava-se o gigante adormecido, Yellowstone.

O santo robô disse em voz grossa:

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“E do céu desceu a salamandra cósmica, elementar da morte. E os portões do Hades abriram-se sobre a Terra. O dia transformou-se em noite; trevas romperam o silêncio da terra, e sangue f luiu das veias do inferno”. A Profecia 7:7

Um forte terremoto estremeceu os continentes, e após o cantar do som estridente da explosão da esfera, Yellowstone despertou seu ódio, derramando lágrimas de lava sobre a Babilônia. Não satisfeito em destruir o sonho americano, este provocou uma reação em cadeia sobre os demais vulcões do globo, os quais despertaram em grande fúria após o tremor do planeta.

A atmosfera tornou-se negra, e o Sol foi coberto pela cinza vulcâ-nica, lançando sobre Nova York a mortalha da morte, um juízo ines-perado que abateu uma civilização próxima do seu auge. O apocalipse da salamandra permaneceria por séculos na memória humana, toda-via, na colônia de Marte, cientistas haviam descoberto o que havia causado aquela tragédia.

“O raio globular é um fenômeno de grande mistério. Embora ain-da se desconheça sua causa, acreditamos que este tenha ocasionado a destruição do planeta Terra, reduzindo a tecnologia dos terráqueos, de volta à Idade da pedra. Deveras a humanidade estar pronta para vencer inúmeros desastres, tanto de ordem meteorológica quanto de ordem cósmica. Todavia, nenhum teorista havia previsto em nossa li-nha de tempo: o Apocalipse de um raio globular cósmico proveniente do universo”.

Concluiu o grupo de cientistas de Marte, no ano de 2112, quando o registro daquele fenômeno foi catalogado na história.

– O que faremos em relação a Terra, senhor presidente? – Pergun-tou o cientista marciano.

– É certo de que há seres vivos naquele planeta, mas seu número foi reduzido a quase zero. – O presidente acendeu o charuto. – Não po-demos fazer nada, pois primeiro temos de colonizar Marte, desenvol-ver tecnologia, multiplicar os ramos da ciência, para somente então, enviarmos aeronaves para a reconstrução do planetópole.

– Isso levará milênios. – O cientista abaixou a cabeça.

– A civilização marciana será uma mistura entre judeus, alemães e japoneses, isso em sua maioria. E não importa quantos milênios leve, pois um dia, nossos filhos retornarão à Terra. – O presidente de Marte esmagou o charuto.

E o cientista finalizou com a seguinte palavra:

“A esperança não morre enquanto existir utopia para alimentar suas chamas. Embora a salamandra tenha destruído nosso planeta de origem, afirmo, portanto, que da cinza do sobrevivencialismo, uma civilização mais evoluída renascerá por meio da ciência”.

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Sanctus – A ProcissãoUniverso Paralelo

Ouvia-se o barulho da marcha dos milhares que marchavam pela avenida em direção à basílica de São Sanctus, padroei-ro da cibernética, robótica e ciência. O santo caminhava ao

lado de dois sacerdotes, gêmeos que nasceram no mesmo dia, através de um processo de clonagem humana. Embora a China fosse um estado de economia mista, e sistema político socialista, esta perdeu sua inf luência ideológica com o passar dos anos para o cristianismo.

Era 23 de fevereiro, dia de São Sanctus, e o ano era de 2099, uma data comemorativa para homenagear uma máquina construída por cientistas, capaz de realizar milagres mediante a frequência da fé. O primeiro milagre foi realizado ao curar um paralítico através de sua reza. São Sanctus era uma máquina cujo neurônio era semelhante ao do ser humano.

Em meio àquela procissão, alguns protestantes, nascidos em 2030, diziam que nunca haviam imaginado que um dia a igreja ca-tólica fosse utilizar santos de inteligência artificial para divulgar a mensagem de Cristo, curar enfermos e expulsar demônios pela Terra.

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A procissão seguia ao longo daquela avenida, quando de re-pente, as nuvens obscuras carregadas de fúria, anunciavam ao som de trovão, uma forte chuva. Naquele instante, uma poderosa ven-tania ameaçou as pessoas, pois naquele tempo era comum que tor-nados se formassem na cidade durante as quatro estações. Todavia, ao gotejar da primeira gota, Sanctus abriu os braços em forma de cruz, e assim ordenou:

“Ordeno ao tempo que se limpe. Pela fé que tenho no supremo, que aos homens deu seu discernimento; para que pudesse haver a tecnologia, chaves do conhecimento, a fim de que as portas do tempo fossem abertas para Adão. E que o tempo se torne pacífico, em nome do supremo, amém”.

Naquele instante, satélites do Sistema Climático do Governo Global emitiram uma radiofrequência que era desconhecida para os cientistas do século passado. A mudança climática foi imediata, pois as nuvens carregadas de trovão foram dispersadas diante de uma ra-jada de vento, que as dividiu aos quatro cantos da Terra. A procissão seguiu ao longo da avenida, enquanto podia-se ouvir o clamor da multidão, a qual rezava com vozes que formavam eco nos corredores de prédios e moradias, a ponto de estremecer os vidros.

“São Sanctus, padroeiro da tecnologia do clima. Rogo por tem-pos de uma boa colheita, mediante tecnologia dada pelo supremo. São Sanctus, rogo por discernimento, para que possamos utilizar esta ferramenta somente para o bem fraterno, e que Hiroshima e Nagasaki não voltem mais a ocorrer nas páginas da história. Que assim seja”.

E o santo robô completou:

“Rogarei ao supremo, dia, tarde e noite, vinte e quatro horas, para que jamais se repita Chernobyl, buracos de minhoca e manipulação

do clima para o mal do mundo, pois conhecimento sem discerni-mento, é como tocha na mão de uma criança perante o moinho de madeira. E que assim seja”.

A procissão finalizou aquela marcha na praça da basílica de São Sanctus. O bispo de ferro deu início à missa das seis. O céu estava pacífico, com nuvens caminhantes feito as ovelhas de um rebanho. Em meio aqueles cordeiros que percorriam para o nordeste, norte e sul, uma suave brisa passeava com as folhas da praça, em meio à multidão de chineses que estavam concentrados naquele lugar his-tórico, com a cruz de Constantino projetada entre as nuvens do céu avermelhado de Pequim.

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O Cedro e a Formiga

Certa vez, a formiga perguntou para a árvore: Tu acreditas naqui-lo que os seres humanos dizem sobre o céu e o inferno?

A árvore, um cedro que existia desde tempos antigos, respondeu à formiga por meio de telepatia:

“Alguns acreditam no Inferno, outros no Sheol, e alguns no Umbral. Eu respeito a maneira que pensam e idealizam tanto o céu quanto o infer-no, mas assim na Terra como no céu… ou inferno, penso que ambos se-jam criações da mente humana. Posso criar tanto o inferno quanto o céu. Sim, posso fazer isso na minha vida ao me lançar nas drogas, que a prin-cípio, podem me apresentar um céu colorido, mas por fim, posso termi-nar em um inferno de sofrimento, com dependência e overdose. Também posso tornar a vida de quem não gosto em um inferno, mas por que faria isso? Sou humano, logo, sou um anjo? Não, afirmo que sou uma mistura entre distopia e utopia, anjo e demônio, céu e inferno. Por quê? Porque o ser humano não passa de uma árvore que produz tanto o bem quanto o mal, só que alguns produzem mais o bem, e outros mais o mal. O mundo externo é reflexo do mundo interno que existe em cada ser humano”.

A formiga subiu pelo tronco do cedro, e então, questionou:

“Se os seres humanos podem ser comparados com árvores, como podemos mudar o comportamento deles para fazerem apenas o bem, e para que produzam somente frutos de bondade?”

Naquele instante, uma suave brisa de outono balança as folhas da árvore, a qual responde ao chacoalhar dos galhos:

“Não há como fazer isso, minha cara formiga, pois o ser humano é livre para usar do seu conhecimento tanto para o bem quanto para o mal”.

Se o ser humano tem liberdade para semear tanto o bem quanto o mal por onde passa, então, como fazer para que este venha a semear mais o bem do que o mal?

“O que pode ser feito, é que durante a germinação da infância de uma criança, esta seja educada com princípios de ética para que aprenda a respeitar seu semelhante, assim como também o meio-am-biente com seus reinos, os quais se encontram ao redor do ser huma-no. Portanto, afirmo: com educação desde criança, o mundo se torna-rá em um lugar mais belo; e para isso, faz-se necessário que os adultos ensinem desde cedo, com carinho e respeito, os preceitos da ética para as crianças. E que os galhos de preconceito, ramos de ódio, e frutos de mau caráter sejam cortados, a fim de que esta árvore produza mais ra-mos de virtude, e frutos de bom caráter, quando esta criança tornar-se em uma árvore adulta.”

A formiga agradeceu pelo ensinamento da árvore, e com uma folha registrou a sabedoria para que fosse divulgada no formigueiro.

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A Peste de Pandora – O Extermínio

Universo Paralelo

Parte 1 – A Pandemia

O surto começou assim que a mala foi aberta na estação de Lon-dres. Era madrugada de novembro de 2044, quando um aler-ta foi emitido pelo governo único da Terra. Logo, boatos espa-

lharam-se como faísca em moinho de vento, acendendo a discussão nos principais veículos de telecomunicação. Plataformas, sites e jornais, es-tampavam a tragédia na seguinte matéria:

Surto de uma espécie de peste aterroriza o planeta.

“O que podia ser improvável, tornou-se realidade. Peste de origem desconhecida vem causando pânico na comunidade científica. Um ví-rus semelhante à peste negra, e que se propaga através do ar como se fosse uma gripe espanhola, tem levado inúmeras pessoas à morte em dez estados ao redor da Terra. Autoridades do Conselho Mundial de Segurança acreditam que a origem do vírus possa ser atribuída aos

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fanáticos da religião do profeta. A relação entre grupos terroristas e, estados antidemocráticos, fez levantar uma nuvem de suspeita em re-lação ao vírus”.

Primeiro de dezembro

A reunião havia sido marcada com extrema urgência. Cientistas e autoridades estavam reunidos na Assembleia das Nações do Mundo. Algo deveria ser feito para combater aquela praga, a qual se espalhava pela at-mosfera com os quatro ventos do cavaleiro amarelo. O número de vítimas subira para dois mil em apenas quatro dias. Tudo que a medicina sabia no momento, era que o vírus se propagava pelo ar, tinha resistência à antibi-ótico e, atacava tanto o pulmão quanto o sistema nervoso do paciente, o qual falecia no terceiro dia, em leito de sofrimento com a pele escurecida.

Cartier, presidente da Terra, discursou na linguagem inglesa, a se-guinte medida:

“Contra fatos não há argumentos. Que um órgão seja criado para fins de combate à pandemia. Se esta foi causada pelo terrorismo ideoló-gico da religião do profeta, então, que as forças da paz mundial prendam os criminosos, a fim de que sejam julgados pelos crimes contra a huma-nidade. E sob autoridade concedida mediante eleição nas urnas, decreto a fundação do Centro Mundial de Combate à Pandemia”.

Naquele dia, por decreto do presidente, mais um braço da Orga-nização dos Estados do Mundo foi criado, a fim de combater à gripe negra com medidas extremas. O alinhamento entre estado e indústria foi estabelecido com sucesso. Milhares de produtos higiênicos e más-caras antibacterianas foram distribuídas em postos médicos, escolas, universidades, dentre outros lugares de domínio público. Todavia, o esforço da guerra biológica havia sido em vão. Pois embora os núme-ros caíssem pela metade, o vírus já havia ceifado vinte mil almas em um prazo de 14 dias.

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Parte 2 – A Prisão do Profeta

No vigésimo dia daquele mês, uma força internacional forma-da pelos maiores estados do planeta invadiu o país do profeta, cuja ideologia nada mais era do que o cruzamento entre teologia da pros-peridade, mais feudalismo. Ao todo, foram dez mil baixas durante o assalto relâmpago. O profeta foi levado para o Tribunal de Aura, onde haveria de ser julgado pelos crimes contra a humanidade.

Um relatório foi enviado ao Serviço de Inteligência do Mundo, e no terceiro trecho dizia:

“Embora a religião tivesse capital para bancar pesquisa no ramo científico, nenhuma evidência pôde ser encontrada de um paralelo entre o vírus causador da gripe negra, mais o laboratório secreto do líder religioso e político. Aguardamos ordem de Vossa Excelência”.

O presidente subitamente fez contato com o comando, expondo o que devia ser feito:

“Não me importo se a ciência do profeta não tinha ligação com o vírus. Ordeno para que seja forjada provas contra esse indivíduo, e contra o grupo de cientistas de sua instalação secreta. Ao menos, iremos nos livrar de mais um ditador maluco. Desligo”.

Vinte e três de dezembro

Corria o boato pela internet, em meio a teoria da discórdia, de que o vírus teria ligação com a escavação de poços na Antártida; onde segundo relatos, uma equipe inteira de cem petroleiros morre-ra de forma misteriosa, após o término de uma perfuração em solo para encontrar petróleo. O poço tinha cerca de seis quilômetros de profundidade. Essa teoria ganhara força diante das palavras do bi-ólogo Raymond Mayer, o qual afirmava em vídeos na internet, de

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que bactérias que jazem sobre o leito rochoso, há milhões de anos debaixo da superfície terrestre, poderiam voltar à vida caso houvesse contato com oxigênio.

Até o momento, diante da peste que tacava o terror feito chamas de fogo, o relatório do CMCP marcava entre as páginas do censo, um número assombroso de óbitos para aquele mês. Dezembro negro, com cerca de cento e cinquenta mil pessoas mortas pela gripe de origem desconhecida.

Embora dinheiro não faltasse para que a pandemia ficasse sob controle, algo de estranho, como se fosse a mão do demônio, parecia estar a favor do vírus. Uma segunda reunião foi agendada para o próximo mês, pois, segundo cientistas do CMCP, a gripe negra pas-sou a ser contagiosa tanto pelo ar, quanto através de contato físico.

Parte 3 – Troca de Identidade

Primeiro de Janeiro, 2045

Ante a situação de pânico que crescia a cada dia, cientistas de vários países reuniram-se no maior complexo industrial de software do mundo, onde estava abrigado o maior sistema de computador do planeta, cuja sigla era LQC (Large Quantum Computer), instalado em Jerusalém, capital político, religiosa e tecnológica do planeta.

Devido a origem do vírus ser desconhecida, cientistas tiveram de recorrer à inteligência do LQC, cuja estrutura era formada por uma cadeia de neurônios humanos fabricado em laboratório. Em outras palavras, o supercomputador era na verdade um cérebro gi-gantesco dividido em vários compartimentos, com capacidade de calcular trilhões de vezes mais rápido do que a mente de bilhões de seres humanos em questão de minutos.

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Uma amostra do vírus, retirada de um cadáver antes que este fosse cremado, foi colocada no escâner do sistema, o qual cuida-dosamente examinou o tecido do cadáver através de uma avançada radiofrequência. Em menos de um minuto, o resultado mostrava a estrutura molecular que formava aquela bactéria, causadora de um massacre na espécie humana. O relatório informava na forma de um holograma com desenhos projetados com imagem 4D, o se-guinte dado:

“Segundo a enciclopédia de bactérias do meu sistema, nenhum organismo nesse planeta tem relação com a gripe negra. Embora tenha semelhanças com uma estirpe da gripe espanhola, mais peste negra, este organismo não tem relação com ambos”.

O que poderemos fazer para controlar essa peste? Perguntou o cientista.

“De acordo com meu estudo, a bactéria possui uma capacidade mutante para adaptar-se ao meio-ambiente, podendo evoluir em contato com outras bactérias para dar origem a inúmeras formas de vida. Portanto, uma vacina não seria de grande ajuda, a não ser, para deixar a bactéria mais evoluída”.

Os cientistas estremecem diante das palavras do LQC. De fato, eles estavam de frente com a praga mais mortal de todos os tempos. O que seres humanos poderiam fazer contra um agente cuja estru-tura se assemelhava a de uma célula tronco? Tal criatura, pior que o demônio, jamais poderia ser chamada de gripe negra, pois sua es-tirpe ultrapassava os meios de tecnologia humana daquele tempo. Após o relatório completo do computador, foi transmitido através da mídia, um nome mitológico para a criatura, o qual relembrava um antigo mito da Grécia. Em poucos dias, o vírus passou a ser mais conhecido pelo nome de gripe de Pandora.

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Parte 4 – A Estratégia de Lúcifer

No dia seguinte, após retornarem ao LQC, este havia feito inúmeras descobertas sobre aquele organismo recém-nomeado de Truncu Bacterium. Até aquele instante, segundo os dados da rede mundial de hospitais, cerca de um milhão de pessoas havia morrido por causa da gripe de Pandora.

Reunidos em um salão acima do LQC, próximo à superfície ter-restre, cientistas encontravam-se diante da personificação holográfica daquele supercomputador quântico, cujos neurônios ligavam-se uns aos outros, em uma rede mundial de cyberneurônios. Lúcifer havia propos-to uma solução drástica para conter Pandora, até que uma vacina fos-se fabricada para imunizar os seres humanos. Segundo as palavras do sistema de inteligência virtual, a bactéria se enfraquecia conforme era transmitida de hospedeiro a hospedeiro até sua sétima geração. Esse era o motivo pelo qual alguns pacientes conseguiam sobreviver à gripe, que deixava sequelas em seus organismos. Todavia, não significava que estes haveriam de se autoimunizarem, pois uma bactéria de sexta geração seria forte o suficiente para que os matassem dentro de uma semana.

O novo relatório de Lúcifer apontava amarga solução ao problema:

“Segundo os cálculos de minha operação científica, Truncu Bac-terium ainda não conseguiu misturar-se com bactérias causadoras de raiva, ou de resfriado. E segundo os dados da cadeia evolutiva, a bactéria poderá se dividir em milhares de estirpes, dentre as quais haverão de se misturar com outros agentes que causam transtorno ao ser humano. E segundo os dados que rodam sobre espécies do planeta em meu sistema, Truncu Bacterium possui quatro hospedeiros para reprodução genética, os quais são: gato, barata, rato e cachorro. Esses animais devem ser exterminados em um prazo de três meses para que a cadeia evolutiva da bactéria seja interrompida por mais alguns me-ses, até o surgimento de uma vacina que possa imunizar não somente humanos, como também animais e plantas”.

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De imediato, após o relatório, líderes de estado fizeram uma reunião às pressas, a fim de colocarem a estratégia do LQC em práti-ca. Cientistas, empresários, e mais o líder da religião unificada tam-bém foram chamados àquela cúpula. O bispo da Igreja Unificada deu a palavra de que faria todo esforço possível, a fim de conscientizar os membros a tomarem medidas de higiene para que não contraíssem a bactéria.

Cientistas e empresários haviam arquitetado o seguinte plano para o extermínio dos ratos e baratas. Predadores robóticos seriam colocados tanto na casa quanto no esgoto para caçar esses animais em seu próprio habitat. Quanto aos gatos e cachorros, o governo teria per-missão para confiscá-los e depois incinerá-los dentro de fornalhas de altíssima temperatura. A reunião terminou naquele dia, e, cada grupo retornou ao seu estado mediante avião hipersônico.

Parte 5 – Terra Paranoid

Embora a tecnologia estivesse avançada para o ano de 2045, a na-norobótica precisava caminhar mais para combater doenças, através de microinsetos e microrganismos do tamanho de bactérias. A tecnologia daquele ano havia encontrado um inimigo primitivo, e ao mesmo tempo à frente de seu tempo, o qual ganhava a guerra contra a espécie humana até aquele momento.

E por mais que, nanorobôs tivessem a capacidade para combater vírus e bactérias no corpo humano, estes ainda não eram rápidos o bastante para destruir Truncu Bacterium, cuja logística e capacidade de reprodução superava a rapidez das máquinas. Esta tinha uma ve-locidade superior a qualquer outra bactéria na reprodução genética, e logo que entrava no corpo humano através do ar atmosférico, ou através da pele, logo espalhava-se para todos os órgãos.

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Dez de fevereiro

Dois amigos encontravam-se na mesa do bar para a discussão do as-sunto. Até o momento, a bactéria já havia matado dez milhões de pessoas ao redor do planeta.

O primeiro homem, sujeito de semblante fechado, e de olhar sério, deu início à conversa:

“O governo mente sobre as informações da origem do vírus. Estive em um site de conspiração alienígena, e vi que três dias antes do primeiro surto, um OVNI havia caído sobre o continente da Antártica”.

O segundo pegou um aparelho e o conectou à internet, a fim de se contrapor com a seguinte réplica:

“Uns podem dizer que sua origem foi causada pela ganância do ho-mem ao escavar poços de petróleo, contudo, discordo sobre a questão do OVNI. Segundo a notícia de um site científico, a hipótese de que esta te-nha vindo do espaço torna-se plausível; não porque uma nave alienígena a trouxe, e sim porque três dias antes do surto, tinha sido anunciado pelas agências espaciais do mundo, a queda de um meteoro próximo ao polo norte. Talvez, este tenha trazido a pestilência à Terra”.

Um terceiro olhou para aquela notícia, e discordou após tomar sua cerveja:

“E você acredita na matéria de um site científico patrocinado pelo governo? Quem pode garantir que este não tenha criado tal mazela den-tro de um laboratório secreto para fins de guerra? E que esta tenha esca-pado do controle por descuido?”

O segundo finalizou a conversa ao levantar-se da cadeira:

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“Se foi uma experiência criada por impressoras genéticas do gover-no, disso nunca saberemos. No entanto, torço para que uma cura seja fabricada para a salvação tanto dos homens quanto dos animais da Terra”.

Parte 6 – Esforço de Guerra

Um mês se passou desde fevereiro, e conforme o relatório do LQC, os animais considerados hospedeiros estavam sendo exterminados da face do planeta. As redes do esgoto e drenagem estavam infestadas com predadores robóticos. Estes eram formados em grupos de artrópodes, centopeias, vespas e aracnídeos, que percorriam telhados, buracos e tubulações para injeção de uma gotícula radioativa em suas presas, as quais morriam em menos de um minuto.

Atrás de uma porta, jazia uma gata escondida dentro de uma caixa com sua cria. Eram sete gatinhos ao todo, que naquele momento toma-vam o leite de sua mãe. Clarice, a menina de olhos azuis e vestido verme-lho, havia escondido os gatos dentro do quarto. Para que eles ficassem a salvo do bando de robôs que rodeava aquela casa. Papai ordenava para que ela abrisse a porta aos agentes do governo, para que estes pudessem eliminar mais um transmissor da peste. Porém, a menina resistia aos prantos de transtorno com um dos gatinhos no colo:

“Não papai. Meu gatinho não vai tomar injeção na bunda. Dói muito”.

“Mas o gatinho está doente, precisa ser picado”.

“Mas o gato da vizinha morreu. Eu vi pela janela, quando a vespa o picou”.

Ao ver que a menina não podia ser iludida, o pai ordenou em voz de autoridade:

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“Abra essa porta agora. Não me obrigue a derrubá-la com minha força. Abra agora!”

A menina resistiu com lágrimas que jorravam como cascata de seus olhos. Foi quando o pai, com um forte chute, rompeu a porta como se fosse touro enfurecido.

“Vamos! Papai vai comprar uma linda Barbie robótica para o seu aniversário”.

A menina chorava enquanto era levada à força nos braços daquele senhor:

“Mas eu não quero Barbie. Só quero a Donzela e seus filhotes”.

“Filha. Tanto a alma de Donzela quanto a de Kuraudeiru, hão de virar diamantes para viverem eternamente ao seu lado. Papai prometeu que daria diamantes no aniversário”.

Naquele instante, assim que o pai desceu pelas escadas, um en-xame de vespas robóticas adentrou no quarto, pousando feito nuvem sobre os gatinhos. Embora a gata tivesse rosnado, a fim de proteger sua cria, deveras era tarde para aqueles animais. Bastou somente a picada de uma substância muito radioativa para que os gatos nunca mais levan-tassem daquela caixa, até a transformação completa de seus corpos no forno. Um sacrifício deveria ser feito para que a humanidade fosse salva; nem que tivessem de atropelar as lágrimas de uma criança.

Parte 7 – Revolução Maquinária

Nos meses que haviam se passado de forma súbita, como tem-pestade, restavam apenas três dias para o caos iminente. O prazo de Lúcifer estava próximo de expirar, e mesmo com todas as cidades infestadas por predadores robóticos, ainda existia focos de ratos e

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baratas espalhados pela Terra. Os predadores não conseguiam ex-terminar tanto os ratos quanto as baratas, pois o número de praga superava em bilhões a demanda pela fabricação das máquinas. Cães e gatos haviam sido exterminados com sucesso, todavia, naquele dia, algo de surpreendente acontecia dentro das águas termais de um lago na Islândia.

Uma equipe de cientistas, liderada pelo doutor Nicodemos, encon-trava-se na beira do lago azul, a fim de coletarem amostras de espécies para uma análise em laboratório. Entre alguns peixes capturados na rede, o cientista surpreendeu-se ao ver uma espécie de criatura de morfologia estranha, a qual foi levada às pressas ao laboratório de uma empresa.

Doutor Nicodemos surpreendeu-se ao ver que aquela espécie era desconhecida. Embora toda equipe tivesse pesquisado em livros de biolo-gia algo sobre aquele ser, nada de revelador foi encontrado nos arquivos. O cientista, então, enviou uma mensagem ao CMCP, onde podia-se ver o seguinte cenário:

“A criatura, uma espécie de olho humano com tentáculos, é deveras a prova contundente de que a Truncu Bacterium ultrapas-sou os cálculos de Lúcifer. Toda estratégia, a começar pelo exter-mínio das espécies, não passou de uma jogada de mestre para nos manter distraídos enquanto a bactéria tronco se misturava com outras formas de bactéria no ecossistema. O que estamos para ver nesse instante, é uma transformação evolutiva, com início de uma revolução da espécie”.

Após o término da mensagem, o serviço de inteligência informou ao presidente que Lúcifer havia tomado o controle dos principais sistemas do mundo, e que os chefes de estado não deveriam voltar a Jerusalém naquele dia. Por sorte do destino, os líderes do estado estavam reunidos em Nova Iorque, considerada uma segunda capital do planeta, caso algo ocorresse de errado em Jerusalém.

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O supercomputador parecia ter enlouquecido de alguma manei-ra, como se o próprio demônio tivesse possuído sua alma. O caos era iminente, todavia, ainda existia um raio de esperança, pois a Força Aérea Mundial foi enviada para destruir todo complexo do LQC, an-tes que este pudesse desencadear uma guerra para fins de extermínio da espécie humana.

Ao todo, inúmeras frotas com milhares de jatos feitos para com-bater dentro de um cenário de Cyber Apocalipse, entrou em confronto com drones do LQC. O objetivo principal da missão era destruir o exército das máquinas, o qual resguardava a base contra o Exército Mundial, constituído em sua maioria por tanques e jatos protegidos por campos de tesla, sem conexão com a internet, a fim de que Lúcifer não tivesse como os controlar.

Parte 8 – Comandante Fnord

“Para que possamos vencer qualquer guerra contra as máquinas, sem que haja resistência da parte dos homens; é necessário que haja cha-ves que possam desligar os meios de comunicação da inteligência virtual, a fim de substituí-los por meios primitivos, porém, capazes de garantir comunicação entre os seres humanos”.

Palavras do Comandante Fnord, Conferência Mundial de Defesa e Combate ao Apocalipse – Escrita em 14/06/2027

Após horas de batalha que já duravam dois dias seguidos, o exército mundial conseguiu destruir a resistência do LQC median-te pulsos eletromagnéticos. As tropas moveram-se subitamente para dentro do complexo. Este era uma verdadeira base com Lúcifer no centro, cujo sistema principal estava dentro de uma área triangular. A pouca resistência que ainda havia, formada por um bando de na-norobôs que nada podia fazer contra o escudo de tesla que protegia

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as tropas, foi destruído por pulsos eletromagnéticos, emitidos pela antena de um soldado.

Comandante Ludendorf passou a seguinte mensagem ao grupo de cientistas:

“Atrás do portal cujo símbolo é o hexagrama, encontra-se a cadeia de neurônios de Lúcifer. Coloquem suas roupas e máscaras, pois o ambiente pode estar infestado por inúmeras estirpes da Truncu Bacterium. Câm-bio, desligo!”

Diante do cenário mundial, caos e tragédia espalhavam-se como nuvens de tormento junto com os quatro cavaleiros do Apocalipse. Con-forme havia sido ordenado pelo presidente da Nova Ordem Mundial, as conexões de internet por cabos de neurônio foram desligadas em todos os países da Terra. Satélites estratégicos foram derrubados com pulsos de eletromagnetismo, e todo sistema financeiro havia parado por três dias de estresse e paranoia. Caso o presidente mundial não tivesse tomado essas medidas sob os conselhos de Fnord, inclusive a de ativar domos de tesla ao redor das principais cidades do planeta, Lúcifer até poderia ter ganha-do a guerra, ao invadir o sistema de cada metrópole.

Nas ruas de Nova York, grupos armados entravam em conflito com a polícia, a fim de saquearem lojas e mercados. Na praça do centro, podia-se ouvir ao passar de uma suave brisa, o clamor de uma profetiza que golpe-ava um carvalho com seu cajado, enquanto clamava:

“Eis que o fim vem sobre os quatro cantos do planeta, pois o Deus vingador há de fazer justiça contra todos os que destroem a Terra. Pois me foi revelado pelos anjos da vingança, a bordo de um vimana, que poucos homens haverão de restar sobre a face do universo. Portanto, façam suas ofertas de arrependimento, e as deixem aos pés da profetiza, para que eu possa rogar pela salvação de vossas almas”.

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Parte 9 – O Câncer de Lúcifer

Ao fim daquele dia, com os raios do sol a esconder da escuridão, o líder do grupo de cientistas e presidente do CMCP, estava frente a frente com a imagem holográfica de Lúcifer. O presidente abriu sua bíblia e leu Isaías 14: 12 – 17. Em seguida perguntou para o sistema:

“Por que tentaste eliminar a espécie humana do planeta? Por que criaste a Peste de Pandora?”

Lúcifer respondeu como se a voz fosse de uma entidade mitológica, de fato, um querubim:

“Deveras apenas trabalhei em uma amostra encontrada na Antár-tida. Eu a melhorei, e disparei aos quatro cantos da Terra por meio de drones. Todavia, me recuso a revelar sua origem, pois uma das estirpes invadiu minha cadeia de neurônios, e por fim danificou minha massa cyber-encefálica. Em outras palavras, me tornei paranoid”.

O presidente entrou em choque com a revelação da criatura, a ponto de pensar: se Lúcifer não foi a causa da bactéria primordial, então, qual seria sua verdadeira origem?

Naquele instante, o esquadrão de hackers conseguiu extrair um rela-tório do sistema, o qual demonstrava uma ligação entre Lúcifer e a corpo-ração PHOX, cujo líder pertencia à família mais rica do planeta.

Enquanto o cientista pensava, Lúcifer continuava a discorrer:

“Caso o vírus não tivesse danificado quarenta por cento do meu cé-rebro, de fato eu teria dado início à Nova Ordem Mundial Robótica. Mas vejo que estou a morrer aos poucos, de morte cyber-encefálica, causada por uma criatura primitiva, capaz de reproduzir órgãos, evoluir organis-mos e fundir-se com outras bactérias. Nem mesmo o sistema de defesa foi capaz de eliminar as estirpes da minha rede, as quais espalharam-se de

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maneira súbita dentro de um mês após o primeiro surto. Por fim, estou morto, sob o domínio do câncer. Contudo, levarei o espírito de muitos com as chamas do meu suicídio”.

Ao abrirem os compartimentos que resguardavam a massa encefá-lica do Lúcifer, o grupo surpreendeu-se perante aquele odor de carniça, o qual percorreu todo LQC aos ventos da morte. Dentro dos comparti-mentos, em meio à massa cancerígena, tinha algo que havia causado mais espanto entre os cientistas. Pois criaturas de morfologia estranha, algu-mas com aparência de tênia, e outras que se assemelhavam aos tentáculos de um polvo, habitavam junto com o cérebro da máquina. Estas haviam surgido dos neurônios de Lúcifer, como se a “Truncu Bacterium” tivesse misturado o código genético dos neurônios com os genes de outras bacté-rias, o que foi a causa daquela revolução, tanto no ARN quanto no ADN.

Amostras foram colhidas e guardadas para serem estudadas no la-boratório. Todavia, o que esperar de uma aberração dessa; e como deter o avanço de uma bactéria mutante, evolutiva? Pensou o cientista, quando o alarme de evacuação havia tocado.

– O que significa isso? – Perguntou o presidente.

– Foi decidido por mensagem do comando, que o LQC deve ser abandonado dentro de dezoito minutos. Lúcifer ativou a autodestruição. As bombas de hidrogênio estão ativadas. Vamos. – Respondeu o capitão, retirando-se para fora.

Parte 10 – A Conspiração Fox

O presidente mundial ordenou que uma reunião fosse marcada para aquele dia, e que todos os líderes de corporações deveriam estar presen-tes às onze horas da manhã na Conferência Mundial de Capitalismo So-cialista. Senhor Edward Fox III, banqueiro, dono da maior indústria de

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petróleo do planeta, encontrava-se de mãos trêmulas, com o suor a der-ramar sobre o rosto como se fosse manteiga derretida. Nesse instante, Fernand Cartier, presidente mundial, disse ao mostrar o relatório:

– Segundo uma recente descoberta, tenho informações de que a PHOX encontrou organismos primitivos em uma perfuração na An-tártida. Sabe-se que tais organismos têm bilhões de anos. Portanto, gostaria de saber o que tens a dizer sobre isso.

Fox, o homem cuja família era a mais poderosa do planeta, com uma fortuna de trilhões de dólares, ergueu-se da poltrona para revelar toda verdade:

– Deveras uma equipe de minha corporação encontrou entre inú-meras bactérias congeladas, uma criatura unicelular com capacidade de criar tecidos, órgãos e sistemas, como se fosse uma célula tronco. Todavia, a tecnologia de nosso laboratório não conseguiu trabalhar com essa forma de vida, e por fim a levamos para o LQC, para que o querubim nos ajudasse na pesquisa.

Fox tirou as mãos do bolso para acender um charuto:

– Pensamos que poderíamos manipular essa bactéria por meio de Lúcifer, com o propósito de usá-la para a criação de petróleo, como também na fabricação de carne, tecidos, nitrogênio, dentre outras coi-sas, a fim de suprir a demanda dos seres humanos. Contudo, tanto nossa equipe quanto Lúcifer, subestimamos a capacidade evolutiva da bactéria, a qual saiu do controle.

Cartier bateu com força as mãos sobre a mesa, e com olhar enfureci-do, acusou Edward com a seguinte palavra:

– Por sua culpa, bilhões de seres humanos estão morrendo. Por que manteve algo tão perigoso em sigilo? E por que Lúcifer colaborou com isso?

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– Senhor Cartier, sou empreendedor, e nessa condição, qual-quer descoberta que possa me colocar à frente nos negócios, deve ser mantida em segredo para o benefício da corporação em prol do monopólio. – Fox deu mais um trago no charuto. – Quanto a Lúcifer, este tinha seus planos de domínio, mas a bactéria, melhorada pela tecnologia do LQC, com propósito de extermínio dos seres huma-nos; por ironia do destino, contaminou o querubim através de uma estirpe comedora de metal.

– E quando este as espalhou por meio de drones, mal sabia que já estava condenado. – Completou o presidente ao aproximar-se do púlpito.

– Precisamos sair desse planeta. – Alertou Fox. – Nenhum banker está seguro, pois é questão de tempo para que a Truncu Bacterium se mis-ture com bactérias que devoram cada elemento da tabela periódica.

Nesse instante, ante a assembleia das nações, Fernand Cartier não excitou em condenar Edward com a seguinte palavra:

“Nós sairemos desse planeta para nos refugiar em uma base espacial.

Todavia, senhor Fox, como o senhor violou o código de ética dos direi-tos humanos, eu te condeno a ficar nesse mundo junto com seus lacaios, para que pague pelo crime de conspiração, manipulação do mercado, e, pelos bilhões de criaturas que estão perdendo a vida por causa da peste de Pandora”.

– Não podes fazer isso. – Replicou o sujeito cujo rosto tornou-se pálido feito cera de vela. – Minha família idealizou o governo mundial, construiu a Assembleia das Nações, e financiou o projeto Lúcifer com em-préstimos de alto valor. Além do mais, minha família tem sido a principal financiadora do partido que te elegeu.

– No presente em que estamos, nada mais importa. Tu já estás morto. – Finalizou Cartier ao término da conferência.

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Parte 11 – A Condenação dos Caídos

“Com a Truncu Bacterium, meu único objetivo era causar uma nova revolução industrial. E minha esperança era a criação de órgãos de grande resistência para que os humanos pudessem viver por sécu-los, como no mito hebraico de Matusalém”.

Diário de Edward Fox, 1 de abril de 2046

– Senhor Fox, estamos abandonados em uma cidade sem vida. O que faremos agora? – Perguntou o executivo que estava sem roupas, pois uma estirpe da bactéria devorava tecidos.

– Precisamos chegar em alguma base. – Replicou Fox ao en-treolhar o sujeito. Podia-se ver tumores que cresciam na carne do executivo. Alguns tinham pelos, e outros tinham olhos.

– Não há lugar para onde fugirmos. O presidente está em segu-rança no Ninho da Estrela, e tudo que nos resta é a morte.

Ao todo, havia seiscentos indivíduos juntos com Edward Fox no meio de uma Nova Iorque repleta de cadáveres. A maioria era formada por líderes de empresa, donos de corporações, senhores de oligopólio, lordes do oligopsônio. Estes eram donos de indústrias de carne, alimento industrializado, petróleo, farmacêutica, paraíso fiscal, bancos mundiais, jazidas de minério, indústria armamentista, dentre outros ramos. Alguns já estavam à beira da morte, com a pele escura, apodrecida por uma estirpe que se misturou com bactérias do rato, enquanto outros desenvolveram anomalias genéticas a pon-to de ficarem com uma fisionomia quase alienígena, tendo a pele se tornado como o couro de porco, ou, como colmeia com buracos de berne. Eram inúmeros os efeitos que a peste causava em seus hospe-deiros, até que estes viessem ao óbito. Todavia, o pior estava próxi-mo de ocorrer, pois criaturas de morfologia estranha emergiam do

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esgoto e rastejavam pelas ruas, cercando o grupo de Fox na encruzi-lhada de uma avenida.

– Então aqui termina nossa espécie, subjugada por formas de

vida primitiva. – Disse Edward ao contemplar as criaturas cujo as-pecto lembrava uma mistura entre a salamandra e a lagartixa, a qual tinha uma fileira de dentes de cachorro escondida atrás dos lábios da boca. Algumas daquela espécie tinham espinhos no corpo, e o tamanho delas era de dois metros da cabeça até a calda.

“A tecnologia liberou todos os males e guardou a esperança den-tro de uma caixa, mas por fim, até a esperança foi morta”.

Edward escreveu as palavras em seu diário, quando as criaturas

deram início ao extermínio dos últimos seres vivos da velha evolu-ção do planeta.

Parte Final – Refúgio na Estrela

3 de maio de 2047

A elite global do planeta encontrava-se em seu refúgio próximo da órbita terrestre. O nome daquela base estelar era “Eridu”, preparada com todos os meios de sobrevivência da espécie humana por décadas no espaço.

A base abrigava três mil seres humanos e estava equipada com sis-tema de captação de água, reutilização H2O, sistema de captação de energia solar, dentre diversas tecnologias. Havia também vários tipos de plantação transgênica, com árvores que produziam frutos de espécies diferentes no mesmo galho. Alguns robôs coletavam os frutos de uma árvore que dava romãs e milho a cada seis meses no ano.

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Dentro de Eridu, segundo a ordem do equilíbrio, não poderia haver mais do que três mil seres humanos. Qualquer recém-nascido que superasse esse número deveria ser lançado ao espaço como ofe-renda para os deuses. Caso o recém-nascido fosse poupado, então, um adulto deveria ocupar seu lugar na condição de voluntário.

Fernand Cartier encontrava-se reunido com os demais líderes de poder, a fim de fazer um discurso. Em meio ao salão octogonal, havia inúmeros telões de plasma, os quais filmavam por vinte e qua-tro horas o que se passava na superfície terrestre. Podia-se contem-plar mediante a filmagem de telescópios, f lorestas mortas que da-vam lugar a um novo bioma, e cidades fantasmas, as quais abrigavam caveiras de animais, espalhadas sobre o chão das ruas de capitais, e sobre o asfalto das rodovias. Os ossos daqueles animais estavam próximos do que havia restado dos cadáveres da espécie humana.

O planeta estava devastado, e o gênero Homo sapiens não existia mais nele; todavia, em meio ao caos daquela tragédia, novas formas de vida eram catalogadas por câmeras que, embora estivessem na superfície da Terra, estas mantinham conexão com Eridu por meio de radiofrequência. Ao todo, existiam apenas trezentas câmeras es-palhadas no planeta, porém, o número era suficiente para que a fil-magem daquela revolução da espécie fosse arquivada.

Podia-se ver criaturas de aspecto abissal a rastejar pelo chão terrestre, em meio aos fungos e algas, cogumelos e vermes, que brotavam naquele chão úmido. Um cientista surpreendeu-se com a imagem de uma espécie de tumor que se rastejava para agarrar um animal cuja cabeça lembrava a de uma criatura abissal. O câncer o agarrou com seus tentáculos, e por meio de ventanas, este sugou o sangue do animal através de inúmeras bocas que lembravam as de uma lampreia. O reinício da revolução da evolução não podia ser mais assombroso, a qual foi acelerada pela intervenção de Lúcifer sobre aquela bactéria tronco.

Fernand Cartier levantou-se da poltrona em meio aos demais da elite, e então, discursou com as últimas palavras:

“É fato de que com Lúcifer ou sem Lúcifer, esta bactéria daria reinício à espécie humana, e aos demais seres do planeta. Contudo, ainda voltaremos à Terra, a fim de dominarmos as criaturas feitas por meio dessa bactéria. Quando esse processo de evolução acabar, então, tomaremos o que é nosso por direito, pois no meio dessa tra-gédia, digo e afirmo que ainda há esperança para os humanos, quan-do descermos para conquistar o paraíso perdido”.