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Tradução: Bárbara Menezes

Degustacao Miolo Uma Chance Para Recomecar Atep21

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  • Traduo:

    Brbara Menezes

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  • Prlogo

    Querido Papai Noel

    Eu s quero uma coisa este anoUma mePor favor, no esquea que eu moro em Friday Harbor agora.obrigada

    com amorHolly

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    At a morte da irm, Mark Nolan havia tratado a sobrinha Holly com a afeio despreocupada de um tio solteiro. Ele a via em eventuais reunies nos feriados e nunca deixara de lhe comprar um presente no aniversrio e no Natal. Em geral, vale-presentes. Aquele havia sido o limite das suas interaes com Holly, e fora o suficiente.

    Porm, tudo mudou em uma noite de abril chuvosa em Seattle, quando Victoria morreu em um acidente de carro na I-5. Como ela nunca tinha falado em testamento ou se havia traado um plano para o futuro de Holly, Mark no fazia ideia do que aconteceria com sua filha de seis anos. No havia pai na histria. Victoria nunca revelou quem ele era, nem para os amigos mais prximos. Mark tinha quase certeza de que ela nunca havia contado ao pai sobre a existncia de Holly.

    Quando Victoria se mudou para Seattle, ela se juntou a uma turma de bomios, um grupo de msicos e artistas. Assim, teve vrios rela-cionamentos curtos, que proporcionaram toda a loucura artstica pela qual Victoria ansiava. s vezes, no entanto, fora forada a admi-tir que a busca por realizao pessoal precisava ser equilibrada por um salrio regular. Tentou um emprego em uma empresa de softwa-res e acabou conseguindo uma vaga em recursos humanos, com um

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    bom salrio e timos benefcios. Por azar, naquela poca, Victoria descobriu que estava grvida.

    melhor para todo mundo se ele no estiver envolvido disse ela a Mark, quando ele perguntou pelo pai.

    Voc precisa de ajuda protestou Mark. No mnimo, o cara devia cumprir com as suas obrigaes financeiras. Ter um filho no barato.

    Posso lidar com isso sozinha. Vick Ser me solteira no uma coisa que eu deseje para

    ningum. A ideia de ser pai, de qualquer forma, deixava voc louco res-

    pondeu Victoria. O que perfeitamente compreensvel, tendo um passado como o nosso. Mas eu quero este beb. E vou fazer um bom trabalho.

    E tinha feito. Victoria se revelou uma me responsvel, paciente e gentil com sua nica filha; protetora sem ser supercontroladora. S Deus sabia de onde esses talentos maternos haviam surgido. Tinham de ser instintivos, j que com certeza ela no os tinha aprendido com os prprios pais.

    Mark no tinha qualquer dvida de que ele no possua aqueles instintos. E foi por isso que recebeu um choque aps o outro ao desco-brir que no apenas havia acabado de perder uma irm, mas tambm acabava de ganhar uma filha.

    Ser nomeado tutor de Holly no era algo que ele houvesse imagi-nado. Conhecia suas prprias capacidades e sabia o que provavelmente conseguiria fazer em situaes que ainda no havia enfrentado. Mas cuidar de uma criana estava alm das suas possibilidades.

    Se Holly fosse um menino, talvez Mark tivesse uma mnima chance. No era assim to difcil desvendar os meninos. Mas o sexo feminino, por outro lado, era um mistrio. Mark j havia aceitado havia muito tempo que as mulheres eram complicadas. Elas falavam coisas como Se voc ainda no sabe, eu no vou falar. Quando pediam uma opinio

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    sobre qual roupa usar, sempre usavam a que voc no tinha escolhido. Ainda assim, embora Mark nunca fosse dizer que entendia as mulhe-res, ele as adorava: seu jeito elusivo, suas surpresas, suas mudanas complicadas e fascinantes de humor.

    Porm, criar uma... Cus, no! Os riscos eram altos demais. No havia jeito de ele poder dar um bom exemplo. E guiar uma filha pelo clima traioeiro e complicado de uma sociedade que apresentava todo tipo de armadilha... Ele no tinha qualificaes para isso!

    Mark e seus irmos haviam sido criados por pais cuja verso de casa-mento fora uma guerra de atritos na qual os filhos eram usados como pees. Como resultado, os trs irmos Nolan Mark, Sam e Alex seguiram caminhos separados ao chegar idade adulta. Victoria, por outro lado, ansiava pelo tipo de ligao em que sua famlia nunca fora boa. Finalmente, encontrara-a em Holly e, com isso, sentiu que tinha sorte.

    No entanto, uma meia volta errada do volante, um trecho de pista molhado, um movimento fora de controle, e a quantidade de vida determinada para Victoria Nolan fora reduzida com crueldade.

    Ela havia deixado uma carta para Mark, guardada com o testamento.

    No h escolha alm de voc. Holly no conhece nem um pouco o Sam nem o Alex. Escrevo isso esperando que voc nunca tenha de ler, mas, se estiver lendo cuide da minha filha, Mark. Ajude-a. Ela precisa de voc. Eu sei o quanto essa responsabilidade deve parecer enlouquece-dora. Sinto muito. Sei que voc no pediu isso. Mas voc consegue. Vai descobrir como. Comece amando Holly. O resto vir por si.

    Voc vai mesmo ficar com ela? perguntou Sam a Mark no dia do funeral, depois da reunio na casa de Victoria.

    Tinha sido sinistro ver tudo da forma como ela tinha deixado: os livros na estante, um par de sapatos jogados no cho, um brilho labial na pia do banheiro.

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    claro que vou ficar com ela respondeu Mark. O que mais posso fazer?

    Tem o Alex. Ele casado. Por que a Vick no deixou a Holly para ele e a Darcy?

    Mark lhe deu um olhar expressivo. O casamento do irmo mais novo deles era como um computador lotado de vrus: voc no podia abri-lo no modo de segurana, e ele executava programas que pareciam inofensivos, mas realizavam todo tipo de funo mal-intencionada.

    Voc deixaria sua filha para eles? perguntou Mark.Devagar, Sam fez que no com a cabea. Acho que no. Ento, voc e eu somos tudo o que a Holly tem.Sam virou-se para ele com um olhar cuidadoso. Voc que est aceitando isso, no eu. H um motivo para a

    Vick no ter me nomeado tutor. No sou bom com crianas. Voc ainda tio da Holly. Sim, tio. Minhas responsabilidades esto limitadas a fazer piadas

    com funes do corpo e beber muita cerveja nos almoos de famlia. No fao o tipo paterno.

    Nem eu disse Mark, srio. Mas temos de tentar. A menos que voc queira entregar a menina para a adoo.

    Com uma careta, Sam esfregou o rosto com as duas mos. Qual a opinio de Shelby sobre isso?Mark moveu negativamente a cabea meno de sua namorada,

    uma decoradora que havia conhecido quando ela estava trabalhando na casa luxuosa de um amigo em Griffin Bay.

    S estou saindo com ela h alguns meses. Ou ela vai lidar com isso ou vai embora... Fica por conta dela. No vou pedir que ajude. A responsabilidade minha. E sua.

    Talvez eu possa ficar de bab um dia. Mas no conte muito com a minha ajuda; enterrei tudo o que tinha no vinhedo.

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    Exatamente o que eu falei para voc no fazer, gnio.Os olhos de Sam, do mesmo azul-esverdeado dos de Mark, se

    estreitaram. Se eu ouvisse os seus conselhos, estaria cometendo seus erros,

    no os meus.Ele fez uma pausa. Onde a Vick guarda a bebida? Na despensa.Mark foi at um armrio, encontrou dois copos e os encheu de gelo.Sam procurou na despensa. estranho tomar as bebidas dela sendo que ela... se foi. Ela seria a primeira a nos pedir para ficarmos vontade. Voc deve estar certo.Sam foi at a mesa com uma garrafa de usque. Ela tinha seguro de vida?Mark fez que no com a cabea. Ela deixou vencer.Sam lanou para ele um olhar de preocupao. Acho que voc vai colocar a casa venda. Sim. Duvido que eu v conseguir uma boa oferta para ela

    neste mercado.Mark empurrou um copo para ele. No se preocupe disse. Pode deixar.Sam no parou de colocar bebida nos dois copos at eles estarem

    com uma quantidade generosa.Voltaram aos seus lugares um em frente ao outro, erguerem o us-

    que em um brinde silencioso e beberam. Era uma boa bebida. Mark a sentia escorregar suavemente pela garganta, enviando uma onda de fogo para o seu peito.

    Ele encontrou um consolo inesperado na presena do irmo. Parecia que a histria da infncia desagradvel deles as brigas, as

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    pe quenas traies no iria mais atrapalh-los. Eram adultos agora, com um potencial para a amizade que nunca existiu enquanto seus pais ainda viviam.

    Com Alex, no entanto, nunca era possvel se aproximar o bastante para gostar ou no dele. Ele e a esposa, Darcy, tinham ido ao funeral, mas no ficaram mais de quinze minutos e, depois, foram embora sem falar com quase ningum.

    Eles j foram? Mark havia perguntado, sem acreditar, ao no ver mais o casal.

    Se queria que eles ficassem mais disse Sam , devia ter feito a recepo do funeral na Nordstrom.

    Sem dvida, as pessoas se perguntavam como trs irmos podiam morar em uma ilha cuja populao no passava de sete mil pessoas e conviver to pouco. Alex morava com Darcy em Roche Harbor, no lado norte. Quando no estava ocupado com a construo de um con-domnio, estava levando a mulher a eventos sociais em Seattle. Mark, por sua vez, mantinha-se ocupado com um pequeno negcio de torre-fao de caf em Friday Harbor. E Sam, que sempre estava em seu vinhedo, cuidando das vinhas e mimando-as, sentia uma ligao maior com a natureza do que com as pessoas.

    A nica coisa que tinham em comum era seu amor pela ilha de San Juan. Ela fazia parte de um arquiplago que consistia em mais ou menos duzentas ilhas, algumas delas abarcadas pelos condados de Whatcom e Skagit, no territrio continental de Washington. Os Nolan passaram a infncia na sombra das Olympic Mountains, um lugar protegido de grande parte do cinza do resto do noroeste do Pacfico. Cresceram respirando o ar mido do oceano, os ps descal-os constantemente cobertos pelo lodo das mars expostas. Haviam sido abenoados com manhs midas e lilases, dias azuis e secos e o pr do sol mais bonito da Terra. Nada se comparava viso das aves caando as ondas. Ou de guias-carecas disparando para baixo em

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    perseguio de suas presas. Ou a dana das orcas, suas formas lustro-sas mergulhando, erguendo as cabeas para fora da gua e cortando o mar de Salish conforme se alimentavam da rica vibrao dos cardu-mes de salmo.

    Os irmos andavam por toda a ilha, subindo e descendo declives varridos por ventos acima da costa, entre colunas sombrias de flores-tas de madeira e cruzando prados cobertos de grama e flores silvestres com nomes bonitos... lrios-chocolate, estrelas cadentes, ruges do mar. Nenhuma mistura de gua, areia e cu era to perfeitamente proporcional.

    Embora tivessem ido para a faculdade em cidades diferentes e ten-tado viver em outros lugares, a ilha sempre os atrara de volta. At mesmo Alex, com todas as suas ambies irredutveis, havia retorna-do. Era o tipo de vida no qual se conheciam os fazendeiros locais que cultivavam a maioria dos produtos que se comiam ali, e o rapaz que fazia o sabonete com o qual todos se lavavam, e se tratava de maneira informal os proprietrios dos restaurantes aos quais se ia; podia-se pedir carona com segurana, ento os simpticos moradores da ilha levavam uns aos outros de carro quando precisavam.

    Victoria foi a nica da famlia que encontrara algo pelo qual valia a pena deixar a ilha. Ela se apaixonou pelos picos de vidro e vales de cimento de Seattle, a cena urbana de caf e cultura, os restaurantes estilosos e sem exageros que seduziam suas papilas gustativas, o labi-rinto sensorial do Pike Place Market.

    Em resposta a um comentrio de Sam sobre todos falarem e pen-sarem demais na cidade, Victoria respondera que Seattle a deixava mais inteligente.

    Eu no preciso ser mais inteligente havia respondido Sam. Quanto mais inteligente voc , mais motivos tem para ser infeliz.

    Isso explica por que ns, os Nolan, sempre estamos de bom humor disse Mark a Victoria, fazendo-a rir.

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    Mas no o Alex comentou ela, ficando sria depois de um minuto. Acho que o Alex nunca foi feliz um nico dia de sua vida.

    Alex no precisa de felicidade respondera Mark. Ele fica bem com os substitutos.

    Voltando para o presente, Mark se perguntou o que Victoria diria se soubesse que ele criaria Holly na Ilha de San Juan. No percebeu que tinha expressado o pensamento em voz alta at Sam responder.

    Como se ela fosse ficar surpresa. A Vick sabia que voc nunca se mudaria da ilha. Sua empresa de caf fica l, sua casa, seus amigos. Tenho certeza de que ela sabia que voc levaria a Holly para Friday Harbor se alguma coisa acontecesse com ela.

    Mark assentiu, sentindo-se vazio e infeliz. No conseguia pensar por muito tempo na magnitude da perda da menina.

    Ela disse alguma coisa hoje? perguntou Sam. No ouvi a Holly dar um pio.

    Desde que haviam lhe falado da morte da me, Holly se manteve em silncio, respondendo s perguntas com um gesto de cabea. Tinha uma expresso distante e entorpecida, parecendo ter se recolhido num mundo interior que ningum podia invadir. Na noite da morte de Victoria, Mark tinha ido direto do hospital para a casa dela, onde uma bab estava cuidando da menininha. Deu a notcia para a criana pela manh e ficou ao alcance dela desde ento.

    Nada respondeu Mark. Se ela no comear a falar at ama-nh, vou lev-la ao pediatra. Ele soltou um suspiro trmulo antes de acrescentar: Nem sei quem o pediatra dela.

    Tem uma lista na geladeira disse Sam. Tem alguns nme-ros, inclusive o do mdico da Holly. Acho que a Vick deixava a lista ali para o caso de uma bab precisar em uma emergncia.

    Mark foi at a geladeira e destacou um dos lembretes, guardando-o na carteira.

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    timo disse, com sarcasmo. Agora pelo menos eu sei tanto quanto a bab.

    um comeo.Depois de voltar para a mesa, Mark deu um gole longo e lento no

    usque. Tem uma coisa sobre a qual preciso falar com voc. Morar no

    meu apartamento em Friday Harbor no vai dar certo para a Holly e eu. S tem um quarto e no tem quintal para ela brincar.

    Voc vai vender? Alugar, talvez. E depois, para onde voc iria?Mark parou por um longo e cuidadoso momento. Voc tem bastante espao.Os olhos de Sam se arregalaram. No tenho, no.Dois anos antes, Sam havia comprado uma grande propriedade em

    False Bay em busca do antigo sonho de abrir sua prpria vincola. O terreno, com sua areia bem drenada, solo de cascalho e terroir de clima fresco, era perfeito para um vinhedo. Junto com a terra viera uma casa de fazenda vitoriana aos pedaos e cavernosa com uma varanda em toda a volta, vrias janelas imensas, uma grande torre no canto e telhas multicoloridas.

    Precisando de reparos era uma expresso gentil demais para o lugar, com seus rangidos, afundamentos, gotejamentos estranhos e poas sem origem aparente. Os antigos moradores haviam deixado sua marca na casa, instalando banheiros onde eles no haviam sido programados e colocando papel de parede de lascas de madeira, ar-mrios sem profundidade com portas de correr sacolejantes, uma abundncia de prateleiras de cerejeira e molduras com tinta branca barata. Os pisos de madeira originais haviam sido cobertos com lin-leo ou carpetes speros.

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    Porm, a casa tinha trs fatores a seu favor: havia espao mais do que suficiente para dois solteiros e uma criana de seis anos, havia um grande quintal e um pomar, e sua localizao em False Bay era a parte favorita de Mark na ilha.

    No vai rolar disse Sam, sem rodeios. Gosto de morar sozinho. O que voc tem a perder se nos deixar ficar com voc? No tem

    um nico aspecto da sua vida no qual fssemos interferir.Ns. Nos. Pronomes que, aparentemente, iriam substituir o eu na

    maioria das frases de Mark dali em diante. Voc est brincando, n? Sabe como a vida para caras solteiros

    com filhos? Voc perde todas as mulheres gostosas porque nenhuma delas quer bancar a bab, e elas no querem criar o filho de outra pessoa. Mesmo se, por algum milagre, voc conseguir uma mulher gostosa, no consegue ficar com ela. Nada de fins de semana espontneos em Por-tland ou Vancouver, nada de sexo selvagem, nada de dormir tarde, nunca.

    Voc no faz essas coisas agora observou Mark. Passa todo o tempo no vinhedo.

    A questo que isso escolha minha. Mas no h escolha quando voc tem um filho. Enquanto seus amigos esto tomando cer-veja e vendo um jogo, voc est no mercado procurando produtos para tirar manchas e bolachas em forma de peixinhos.

    No para sempre. No, apenas para o resto da minha juventude.Sam baixou a cabea para a mesa como se fosse bater nela e, depois,

    contentou-se em apoiar-se nela. Como voc est definindo sua juventude, Sam? Porque, do meu

    ponto de vista, sua juventude j fez a curva alguns anos atrs.Sam ficou imvel, exceto pelo dedo do meio da mo direita, que

    disparou para cima. Eu tinha planos para os meus trinta anos disse ele, com a voz

    abafada. E nenhum deles inclua crianas.

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    Os meus tambm no. No estou pronto para isso. Eu tambm no. Por isso, preciso da sua ajuda.Mark soltou um suspiro tenso. Sam, quando foi que eu pedi alguma coisa a voc? Nunca. Mas tem de comear agora?Mark deixou seu tom discretamente persuasivo. Pensei nisso desta forma Vamos comear devagar. Vamos ser

    os guias de vida da Holly. Guias de viagem tranquilos, que nunca inventam besteiras como punies razoveis ou porque eu disse que sim. J aceitei o fato de que no vou fazer o melhor trabalho de criao de uma criana... Mas, diferentemente do nosso pai, meus erros vo ser benignos. No vou dar um tapa nela com as costas da mo quando ela no limpar o quarto. No vou fazer com que ela coma aipo se ela no gostar. Nada de manipulao psicolgica. Com sorte, ela vai acabar tendo uma boa viso de mundo e um emprego que pague as suas contas. Deus sabe que, qualquer que seja o jeito como a gente faa isso, ser melhor do que deixar que a menina seja criada por estranhos. Ou, pior, pelos nossos outros parentes.

    Alguns palavres murmurados emergiram do tringulo de mscu-los tensos formado pelos braos de Sam. Como Mark esperava, o senso inato de justia do irmo tinha tomado conta dele.

    Certo.As costas dele subiram e desceram com um suspiro antes de ele

    repetir: Certo. Mas eu vou impor algumas condies. Para comear,

    quero o dinheiro do seu apartamento quando voc o alugar. Combinado. E vou precisar de ajuda para consertar a casa.Mark o encarou com cautela. No sou muito bom com reformas. Posso fazer o bsico, mas...

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    Voc bom nisso. E a viso de ter voc dando um novo acaba-mento para os meus pisos ser um blsamo para a minha alma.

    Agora que Sam prometera o dinheiro do aluguel e o trabalho barato, um pouco da hostilidade dele havia diminudo.

    Vamos tentar por alguns meses. Mas, se no der certo para mim, voc vai ter de levar a menina para outro lugar.

    Seis meses. Quatro. Seis. Tudo bem, droga! Seis meses.Sam serviu mais usque. Cus! murmurou ele. Trs Nolan sob o mesmo teto. Um

    desastre prestes a acontecer. O desastre j aconteceu falou Mark, brevemente, e teria dito

    mais, mas ouviu um barulho suave de ps se arrastando no corredor.Holly chegou entrada da cozinha. Ela havia sado da cama e estava

    ali com uma expresso desnorteada e confusa pelo sono. Uma pequena refugiada, usando pijama rosa, os ps plidos e vulnerveis no cho de ardsia escura.

    O que foi, querida? perguntou Mark com delicadeza, indo at ela.Ele a pegou no colo a menina no pesava mais do que dezoito

    quilos e ela se agarrou a ele como um animalzinho assustado. No consegue dormir?O peso redondo da cabea dela em seu ombro, a massa embaraada

    e macia do seu cabelo loiro, o cheiro de lpis de cera e xampu de morango encheram-no de ternura.

    Ele era tudo o que ela tinha.Comece amando HollyAquela seria a parte fcil. Era com o resto que ele estava preocupado. Vou colocar voc para dormir, abelhinha disse Mark. Voc

    precisa dormir. Temos vrios dias cheios pela frente.

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    Sam os seguiu enquanto Mark carregava Holly de volta para o quar-to. A cama de dossel tinha uma moldura no topo, onde Victoria havia pendurado vrias borboletas de tecido com asas leves e transparentes. Acomodando Holly na cama, Mark puxou as cobertas at o queixo dela e se sentou ao seu lado. Ela estava em silncio e nem mesmo piscava.

    Olhando em seus olhos azuis e melanclicos, Mark arrumou o cabelo dela para trs da testa. Teria feito qualquer coisa por ela. A fora de suas prprias emoes o surpreendeu. Ele no podia com-pensar o que Holly havia perdido. Ele no podia lhe dar a vida que ela teria tido. Porm, iria cuidar dela. No iria abandon-la.

    Todos esses pensamentos, e mais, inundaram sua mente. No entan-to, ele disse apenas:

    Quer que eu conte uma histria para voc dormir?Holly fez que sim com a cabea, seu olhar passando depressa para

    Sam, que ficou encostado no batente da porta. Era uma vez comeou Mark trs ursinhos. Dois tios ursos acrescentou Sam da entrada, parecendo vaga-

    mente resignado e um ursinho beb.Mark deu um sorriso fraco enquanto acariciava o cabelo da menina. E eles moravam em uma grande casa perto do mar...

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