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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO Democracia decretada e participação praticada: desafios e possibilidades da gestão escolar democrática em uma escola municipal de Poços de Caldas - MG MARIO RUELA FILHO Piracicaba, SP 2015

Democracia decretada e participação praticada: desafios e ... · gestão democrática na atual ... na escola no período da ... 2007), Benno Sander (SANDER, 2009; 2005; 1985), Vitor

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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA

FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

Democracia decretada e participação praticada: desafios e possibilidades da gestão escolar democrática em uma escola municipal

de Poços de Caldas - MG

MARIO RUELA FILHO

Piracicaba, SP 2015

Democracia decretada e participação praticada: desafios e possibilidades da gestão escolar democrática em uma escola municipal

de Poços de Caldas - MG

MARIO RUELA FILHO

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Andreza Barbosa

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.

Piracicaba, SP 2015

Banca Examinadora Professora Doutora Andreza Barbosa (UNIMEP) Professora Doutora Selma Borghi Venco (UNICAMP) Professora Doutora Renata Cristina Oliveira Barrichelo Cunha (UNIMEP) Professor Doutor Thiago Borges de Aguiar (UNIMEP) Professora Doutora Tânia Barbosa Martins (UNIMEP)

Aos amigos Isaac Rodrigo Andrian, Clistyani Felizola dos Reis, Afonsina Maria Ferreira, Carlos Henrique Oliveira e Beatriz Monteiro.

Agradecimentos

A concretização deste trabalho se deu graças à dedicação, trabalho e apoio de

pessoas que se fizeram presentes, me estimularam e apoiaram.

A orientação precisa, incisiva e compromissada da Professora Doutora Andreza

Barbosa; o profissionalismo, a serenidade inspiradora da Professora Doutora Selma Borghi

Venco; os ensinamentos e contribuições da Professora Doutora Renata Cristina Oliveira

Barrichelo Cunha - a vocês meus sinceros agradecimentos e respeito: parafraseando meu

grande amigo Monsenhor Trajano Barroco, doravante, “a vida de vocês está escrita em

minha vida”.

Não posso deixar de agradecer às colegas, aos colegas, e às Professoras do Núcleo

de Trabalho docente, formação de professores e políticas educacionais do PPGE-UNIMEP,

companheiros de jornada, de aprendizado, de formação e de partilha de conhecimentos.

Esta pesquisa foi realizada graças ao apoio do Conselho Nacional de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Resumo

Esta dissertação tem por objetivo analisar, na perspectiva de um estudo de caso, como tem ocorrido a gestão escolar democrática em uma escola pública no município de Poços de Caldas-MG, considerando a participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola, a participação das comunidades escolar e local no conselho da escolar e, também, as possibilidades de decisões/ações autônomas que podem ser efetivadas por parte da escola, tendo em vista o contexto burocrático em que a escola está inserida. A metodologia orientou-se pela pesquisa qualitativa, e foram utilizados como procedimentos a análise documental, a observação e a entrevista semiestruturada, considerando como categorias de análise a autonomia da gestão escolar e a participação da comunidade escolar no conselho da escola e nas tomadas de decisões coletivas. Para elaborar a discussão, nos valemos da contribuição teórica de autores como Licínio Carlos Viana da Silva Lima (LIMA, 2013a; 2013b; 2012a; 2012b; 2011a; 2011b; 2007), Benno Sander (SANDER, 2009; 2005; 1985), Vitor Henrique Paro (PARO, 2013; 2007; 2003a; 2003b), Luiz Fernandes Dourado (DOURADO, 2013; 2007), Ângela Maria Martins (MARTINS, 2002), Max Weber (WEBER, 2002), dentre outros que se dedicam a analisar a gestão escolar e as políticas educacionais, além das dissertações (BASTOS, 2012; CARINA, 2003; FURTADO, 2005; KRÜGER, 2012; OLIVEIRA, 2011; PEREIRA, 2012; PEREIRA, 2013; PEREIRA, 2008; SERVILHA, 2008; SILVA, 2011; SOUZA, 2011; WREGE, 2012) e das teses (MORAIS, 2012; TATAGIBA, 2003; VILELA, 1997). Na construção teórica, discutimos a burocracia na formação do Estado Brasileiro, buscando um quadro histórico que permitisse entender, no desenvolvimento do Estado nacional brasileiro, a influência da burocracia nas relações administrativas, principalmente no que tange aos aspectos da centralização político-administrativa e do controle sobre a educação nos tempos atuais e encontramos a gestão democrática limitada por mecanismos burocráticos que centralizam, direcionam e controlam os processos escolares, mecanismos estes que, sob a égide do gerencialismo da nova gestão pública, se potencializam como hiperburocracia e se contrapõem à democratização das estruturas de poder. Discutimos, também, as origens da gestão democrática na atual legislação educacional brasileira e as formas de participação, o conceito de autonomia e a forma de escolha do dirigente escolar, destacando a importância destes três aspectos para o exercício democrático da gestão escolar. Por fim, apresentamos uma análise dos documentos inventariados, das observações das reuniões que ocorreram na escola no período da investigação e das entrevistas de cada um dos sujeitos que participaram da pesquisa. Os resultados indicam que a escola propõe a gestão democrática participativa, tem um conselho de escola atuante que é composto por segmentos da comunidade escolar e todos os segmentos participam da revisão do projeto político pedagógico. No entanto, ainda que predomine entre os segmentos uma participação ativa, com tomadas de decisões coletivas, há indícios de que os mecanismos burocráticos, como a imposição curricular, avaliações externas e a prescrição/controle de recursos financeiros, relativizam e limitam a autonomia escolar nos aspectos administrativos, pedagógicos e financeiros.

Palavras-chave: gestão democrática; burocracia; participação; autonomia.

ABSTRACT

This dissertation aims to analyze, from the perspective of a case study, as has happened to democratic school management in a public school in the municipality of Poços de Caldas (MG), considering the participation of education professionals in the drafting of the pedagogic project of the school, the school and local communities participation in the School Board and, also, the possibilities for autonomous actions/decisions that can be made by the school, given the bureaucratic context in which the school is located. The methodology guided by qualitative research, and shape used as procedures to document analysis, observation and semi-structured interview, considering how the analysis categories the autonomy of school management and the participation of the school community in the School Board and in collective decision-making. To prepare the discussion, we base ourselves on theoretical contributions of authors such as Licínio Carlos Viana da Silva Lima (LIMA, 2013a; 2013b; 2012a; 2012b; 2011a; 2011b; 2007), Benno Sander (SANDER, 2009; 2005; 1985), Vitor Henrique Paro (PARO, 2013; 2007; 2003a; 2003b), Luiz Fernandes Dourado (DOURADO, 2013; 2007), Ângela Maria Martins (MARTINS, 2002), Max Weber (WEBER, 2002), among others who are dedicated to analyze the school management, in addition to the dissertations (BASTOS, 2012; CARINA, 2003; FURTADO, 2005; KRÜGER, 2012; OLIVEIRA, 2011; PEREIRA, 2012; PEREIRA, 2013; PEREIRA, 2008; SERVILHA, 2008; SILVA, 2011; SOUZA, 2011; WREGE, 2012) and theses (MORAIS, 2012; TATAGIBA, 2003; VILELA, 1997). On theoretical construction, discussed the bureaucracy in the formation of the Brazilian State, seeking a historical framework that allows to understand, in the development of the Brazilian national State, the influence of bureaucracy in administrative relations, especially with regard to aspects of the political and administrative centralization and control over education in modern times, and we found the democratic management limited by bureaucratic mechanisms that centralize, direct and control the educational processes, These mechanisms which, under the aegis of managerialism of public administration new, mutually as hiperbureaucracy and oppose democratization of power structures. We discussed the origins of democratic management in the current Brazilian educational legislation and forms of participation, the concept of autonomy and forms of choice of the school leader, highlighting the importance of these three aspects to the exercise of democratic school management. Finally, we present an analysis of inventoried documents, observations of the meetings that took place in the school during the investigation and interviews of the subjects who participated in the research, taking as a basis the theoretical discussion developed. The results indicate that the school proposes the participatory democratic management, has an acting Board School which is composed of segments of the school community and all the threads participating in the review of pedagogical political project. However, even that predominates among the segments an active participation, with collective decision-making, there are indications that the bureaucratic mechanisms, as the imposition of a prescribed curriculum, external evaluations and enforcement prescription/guard financial resources, make relative and limit the autonomy of the school in aspects administrative, financial and pedagogic.

Keywords: democratic management; bureaucracy; participation; autonomy.

Lista de tabelas

Tabela 1 – Caracterização dos entrevistados 25

Tabela 2 – Docentes e Escolas da Educação Básica de Poços de Caldas 28

Tabela 3 – Matrícula Inicial no ano de 2014 – Rede Municipal de Poços Caldas 30

Tabela 4 – IDEB Séries Iniciais – Poços Caldas 30

Tabela 5 – IDEB Séries Finais – Poços Caldas 31

Tabela 6 – Alunos Turno Matutino no ano de 2014. 33

Tabela 7 – Alunos Turno Vespertino no ano de 2014 33

Tabela 8 – Alunos Turno Noturno no ano de 2014 33

Tabela 9 – Média de Alunos por Turma e Segmento no ano de 2014 34

Tabela 10 – IDEB Séries Iniciais – Escola Pesquisada 36

Tabela 11 – IDEB Séries Finais – Escola Pesquisada 36

Lista de Quadros

Quadro 1 – Documentos municipais inventariados 23

Quadro 2 – Documentos escolares inventariados 23

Quadro 3 – Atribuições dos cargos do quadro de magistério 35

Lista de Figuras

Figura 1 – Município de Poços de Caldas e municípios vizinhos 27

Figura 2 – Tipos de participação praticada 79

Figura 3 – Tipos de não participação praticada 80

Lista de Gráficos

Gráfico 1 – Modalidades de provimento ao cargo de dirigente escolar 72

Lista de Siglas

ANPAE Associação Nacional de Política e Administração da Educação

ANPED Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação

BM Banco Mundial

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CEDHAP Centro de Desenvolvimento Humano Aplicado

CEP UNIMEP Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Metodista de

Piracicaba

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

DASP Departamento da Administração do Serviço Público

FMI Fundo Monetário Internacional

FNDE Fundo Nacional para Desenvolvimento da Educação

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

IDHM Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

LC Lei Complementar

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei No. 9394, de 20

de dezembro de 1996

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

PDDE Programa Dinheiro Direto na Escola

PDME Plano Decenal Municipal de Educação

PDRAE Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado

PIB Produto Interno Bruto

PNLD Programa Nacional do Livro Didático

PPP Projeto Político Pedagógico

Sumário

INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 15

CAPÍTULO 1 ....................................................................................................................................... 21

A PESQUISA REALIZADA ............................................................................................................... 21

1.1. O caminho metodológico ....................................................................................................... 21

1.2. O contexto da pesquisa ......................................................................................................... 26

1.2.1. O município .......................................................................................................................... 26

1.2.1. A educação no município ................................................................................................... 28

1.2.2. A escola pesquisada. .......................................................................................................... 31

CAPÍTULO 2 ....................................................................................................................................... 37

“MAIS GESTÃO PARA MENOS DEMOCRACIA”: BUROCRATIZAÇÃO vs

DEMOCRATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL .................................................................... 37

2.1. Administração pública brasileira e a educação: do patrimonialismo à hiperburocracia

gerencialista .................................................................................................................................... 38

CAPÍTULO 3 ....................................................................................................................................... 65

GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO PÚBLICO BRASILEIRO: A PARTICIPAÇÃO E A

AUTONOMIA NA TRAMA DA DESCENTRALIZAÇÃO ............................................................... 65

3.1. As origens da gestão democrática da escola .................................................................... 65

3.2. A eleição como princípio da gestão democrática .............................................................. 70

3.3. A participação .......................................................................................................................... 76

3.4. A autonomia ............................................................................................................................. 83

CAPÍTULO 4 ....................................................................................................................................... 97

A GESTÃO DEMOCRÁTICA PRATICADA NUMA ESCOLA MUNICIPAL DE POÇOS DE

CALDAS - MG ..................................................................................................................................... 97

4.1. Os documentos municipais ................................................................................................... 97

4.2. Os documentos da escola ................................................................................................... 107

4.2.1. O Regimento Escolar ........................................................................................................ 107

4.2.2. O Projeto Político Pedagógico (PPP) ............................................................................. 109

4.2.3 O Estatuto do Conselho da Escola .................................................................................. 115

4.3. As observações das reuniões ............................................................................................. 116

4.4. As entrevistas ........................................................................................................................ 123

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................ 142

REFERÊNCIAS ................................................................................................................................ 146

ANEXOS ............................................................................................................................................ 156

Anexo 1 - Certificação do CEP UNIMEP .................................................................................. 156

APÊNDICES ...................................................................................................................................... 157

Apêndice 1 - Roteiro de observação ......................................................................................... 157

Apêndice 2 - Roteiro das entrevistas ........................................................................................ 158

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INTRODUÇÃO

A gestão democrática foi apresentada como princípio para a gestão do ensino

público no Brasil pela Constituição Federal de 1988 (Constituição de 1988), consagrando-se

como conquista dos movimentos sociais que se dedicaram a restaurar a democracia, desde

o autoritarismo imposto pelos governos militares nos anos de 1960 a 1980, apresentando-

se, portanto, como uma conquista histórica e não como benesse que se ergueu pela

vontade do Estado ou do governo. Assim, a forma de pensar democraticamente as políticas

educacionais e a administração escolar, consagra-se a partir de reinvindicações de

descentralização de poder e de participação popular nas tomadas de decisão que

implicaram nos rumos político-administrativos da educação.

Nesta perspectiva da descentralização de poder, a autonomia e a participação que

dela decorrem passaram a compor o discurso reformista dos anos de 1990: durante a

revisão de literatura, realizada ainda por ocasião da reelaboração do projeto de pesquisa,

buscando melhor entender a gestão democrática, leituras prévias do referencial teórico nos

levaram a considerar a autonomia da gestão escolar democrática como elemento a ser

pesquisado, tal como a participação da comunidade, que está implícita na gestão da escola

pública, não como caráter externo ao processo, mas como efeito das relações produzidas

internamente na escola. Desta forma, elencamos previamente a participação e a autonomia

como categorias para análise.

Contraditoriamente, algumas destas leituras também indicaram que a escola pública

continua envolvida, externamente, por um sistema burocrático e que, neste contexto, as

vivências plenas das práticas características da gestão escolar democrática podem estar

limitadas, apesar do discurso reformista que se opôs às práticas burocráticas da

administração pública.

Nesta perspectiva, intencionando estruturar o processo para rever os estudos já

realizados sobre a gestão democrática, uma revisão bibliográfica foi feita a partir da seleção

em bancos de dissertações e teses, tendo como critério de seleção a correlação entre

participação, autonomia e burocracia e a gestão democrática, dando-se atenção às

palavras-chave registradas nas pesquisas levantadas e aos resumos apresentados pelos

autores.

Inicialmente, foi feita uma consulta ao banco de teses e dissertações da

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), buscando por

pesquisas que abordassem a temática da gestão democrática. Esta busca encontrou cento

e quarenta pesquisas que abordam temas que vão desde a gestão democrática na escola

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até a possibilidade da prática pedagógica democrática no cotidiano acadêmico de cursos de

enfermagem.

Refinando a busca para gestão democrática na escola, observamos que as

pesquisas, também em uma variedade de temas que vão desde a participação da família na

gestão escolar, até a concretização de sistemas municipais de educação, indicam ou

discutem também sobre participação e/ou autonomia, o que reforçou ainda mais nossa

decisão no sentido de estabelecer esses dois elementos como categorias prévias de

análise.

Num segundo momento, dentre as pesquisas levantadas, foi dada maior atenção às

que abordavam a participação e/ou a autonomia, como princípios da gestão democrática, e

abordavam e/ou indicavam também a influência da burocracia sobre as práticas

democráticas propostas para a gestão escolar. Assim, após a seleção de doze dissertações

(BASTOS, 2012; CARINA, 2003; FURTADO, 2005; KRÜGER, 2012; OLIVEIRA, 2011;

PEREIRA, 2012; PEREIRA, 2013; PEREIRA, 2008; SERVILHA, 2008; SILVA, 2011;

SOUZA, 2011; WREGE, 2012) e três teses (MORAIS, 2012; TATAGIBA, 2003; VILELA,

1997), passamos a acessar as bibliotecas digitais em que tais pesquisas estavam

depositadas1.

Desta forma, nos orientamos na revisão bibliográfica no sentido de buscar um melhor

entendimento da gestão democrática, da participação na gestão democrática da escola, da

autonomia da escola nas tomadas de decisão e na influência da burocracia sobre os

processos decorrentes da gestão escolar.

Embasados nesta orientação, submetemos o projeto de pesquisa para avaliação do

Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP).

Após a aprovação deste Comitê, limitamos nosso campo de investigação a uma escola

pública municipal de poços de Caldas – MG e demos andamento à investigação qualitativa,

que buscou dados que possibilitassem uma análise da participação da comunidade escolar

nos processos de tomadas de decisão e da autonomia da escola para tomar decisões.

Nesta busca, observamos que alguns conceitos que permearam a investigação, tais

como conceito de administração, gestão, ensino, educação e o próprio conceito de gestão

democrática requeriam atenção. Considerado aqui como basilar, o conceito de democracia

que, do ponto de vista etimológico, é formado por dois termos do grego antigo: demos, que

1 Algumas dificuldades foram encontradas nesta etapa: bibliotecas digitais que continham somente trabalhos

defendidos a partir dos anos posteriores ao trabalho desejado, disponibilização de e-mail do autor, mas e-mail inválido, a falta de resposta, tanto da biblioteca depositária, como do autor, ou mesmo a impossibilidade de obter a pesquisa diretamente, em virtude de a biblioteca depositária estar em outra região do país.

17

designava os dez distritos que compuseram a cidade de Atenas e, com o tempo, passou a

significar povo ou comunidade de cidadãos, e kratia, que significa governo, poder ou

autoridade. (ARANHA; MARTINS, 2003)

O conceito de democracia está definido como uma forma de governo onde o poder

legítimo é exercido e nasce do consenso e da vontade de uma coletividade (povo ou

comunidade de cidadãos), ou seja, o poder de decidir pertence à coletividade e qualquer

outra forma em que não se verifique esta situação, não é uma forma de governo

democrática. (ARANHA; MARTINS, 2003; VASCONCELOS, 2011)

O poder de decidir as questões comunais pertence ao povo. [...] Decisões provenientes de apenas um indivíduo ou de um grupo podem ser qualquer coisa menos democracia. [...] O que devemos levar em conta é se os cidadãos, especialmente todos que são comuns (despidos de autoridade e chefes públicos), podem opinar, discutir e resolver os assuntos que dizem respeito ao seu destino e ao comportamento social. (VASCONCELOS, 2011, p. 113)

Desta forma, opinar, discutir e resolver os assuntos pertinentes à comunidade se

constituem como ações participativas da coletividade e caracterizam o exercício

democrático: de forma correlata, ao nos referir à gestão escolar democrática, vemos a

participação coletiva em ação, opinando, discutindo e resolvendo os problemas pertinentes

aos processos escolares.

Ao pesquisarmos o conceito de gestão escolar democrática, buscando pela

confirmação deste conceito, encontramos Carina (2003, p. 4) que recorre aos verbetes de

gestão e de democracia, tomando como referência o Dicionário Aurélio, para considerar a

gestão democrática como “uma administração que tem como finalidade a distribuição

equitativa do poder, em que pode ocorrer uma divisão de poderes, ou seja, gestão

democrática é uma gestão participativa”.

No entanto, vemos como pertinente conceituar alguns termos legitimados pela

Constituição de 1988, tais como as palavras gestão e administração, que aparentemente

tidas e usadas como palavras sinônimas, podem, como apontam Muranaka e Minto (2002),

no campo das práticas, designar ações e processos diferentes com relação à política

decisória e às técnicas procedimentais.

Desta forma, concordamos com Barroso (1995), que conceitua administração como

esfera política e gestão como esfera técnica, o que, sistematicamente, implica na

18

administração da educação, como esfera decisória, e na gestão do ensino, como esfera de

gerência dos procedimentos de ensino. Segundo o autor, tal discurso promove a separação

entre os aspectos técnicos e políticos da prática administrativa, o que pode, no prisma da

gestão democrática, ser um fator prejudicial, tendo em vista o papel politizador da

democratização da gestão escolar.

Tais considerações que discutem os termos administração, gestão, educação e

ensino, nos levam a retomar o conceito de gestão democrática oferecido por Carina (2003,

p.4) e admitir tal conceito como sendo a gerência participativa dos procedimentos de ensino,

“que tem como finalidade a distribuição equitativa do poder”, de forma a oferecer e promover

um espaço escolar propício às tomadas de decisões coletivas, onde a comunidade participa

opinando, discutindo e resolvendo os assuntos pertinentes à vida escolar.

Desta mesma forma, ao analisarmos a Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional, Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (LDB), sob o prisma

dos conceitos aqui discutidos, entenderemos a restrição da gestão democrática ao ensino, e

a não pertinência de falarmos em gestão democrática da educação: tanto a Carta Magna

como a LDB consagram, somente, a gestão democrática do ensino público e não fazem

nenhuma menção de democraticidade à administração da educação pública.

Outro aspecto que salientamos se refere à omissão da regulamentação da gestão

democrática da escola pública por parte da Constituição de 1988 e da LDB, e a delegação

desta questão aos sistemas de ensino, em normas complementares, o que possibilita

inúmeras identidades para a gestão democrática, com características diversas e específicas

para cada sistema de ensino, o que nos leva a justificar, metodologicamente, a realização

deste estudo como um estudo de caso.

Assim, a presente dissertação de mestrado pretende analisar, na perspectiva de um

estudo de caso, como tem ocorrido a gestão escolar democrática em uma escola pública no

município de Poços de Caldas-MG, considerando a participação dos profissionais da

educação na elaboração do projeto pedagógico da escola, a participação das comunidades

escolar e local no conselho da escola e, também, as possibilidades de decisões/ações

autônomas que podem ser efetivadas por parte da escola, tendo em vista o contexto

burocrático em que a escola pode estar inserida.

A investigação foi delimitada a uma escola no município de Poços de Caldas-MG,

tendo em vista que tal município, após passar pelo processo de municipalização do ensino

fundamental no final dos anos de 1990, implantou seu sistema por iniciativa de um Fórum

19

Municipal de Educação, em 2005 e, desde então, as escolas têm seus dirigentes eleitos

pela comunidade e têm constituído seus conselhos de escola.

Atentos aos conceitos que decorrem do tema em estudo e tendo em vista a pesquisa

bibliográfica e a pesquisa empírica realizada, esta dissertação foi organizada em quatro

capítulos: o primeiro destina-se a relatar o caminho metodológico percorrido pela pesquisa,

que, orientando-se pela pesquisa qualitativa, utilizou como procedimentos a análise

documental (considerando a necessidade de caracterizar o sistema e a escola, foram

inventariados os documentos do município, em específico, a Lei n. 7947, que trata da

implantação do Sistema Municipal de Poços de Caldas e do Conselho Municipal de

Educação e a Lei n. 8229 que aprova o Plano Decenal Municipal de Educação - PDME; e

também os documentos da escola pesquisada: o Regimento Escolar, o Projeto Político

Pedagógico - PPP e o Estatuto do Conselho da Escola), a observação de reuniões (foram

observadas reuniões do conselho de escola, dos professores e assembleias dos segmentos

com o objetivo de levantar dados sobre a elaboração do PPP, a composição do conselho da

escola, seu funcionamento, a regularidade das suas reuniões, as suas atribuições, a sua

composição, a participação dos vários segmentos das comunidades escolar e local, o

relacionamento da diretora com este conselho e a forma com que as decisões são tomadas)

e as entrevistas semiestruturadas (com a intenção de buscar dados relativos à autonomia

da gestão da escola, as forma de controle local de recursos, a participação da comunidade,

a elaboração do PPP e a forma em que ocorrem as eleições, foram entrevistados a diretora,

uma mãe de aluno, um professor, uma funcionária operacional um aluno e um membro da

comunidade local).

No primeiro capítulo também contextualizamos o locus em que a investigação foi

realizada: caracterizamos o município, o sistema municipal de educação e a escola onde a

pesquisa foi realizada, com vistas a situar os dados apresentados.

Considerando as leituras que sugerem a limitação da gestão democrática da escola

por parte de mecanismos burocráticos estatais que centralizam, direcionam e controlam as

atividades pedagógicas, administrativas e financeiras da escola, pretendemos, no segundo

capítulo, discutir a burocracia na formação do Estado Brasileiro, buscando um quadro

histórico que permita entender, no desenvolvimento do Estado nacional brasileiro, a

influência da burocracia nas relações administrativas, principalmente no que tange aos

aspectos da centralização político-administrativa e do controle sobre a educação nos

tempos atuais.

20

Atendo-nos à gestão democrática da escola pública como princípio consagrado na

Constituição de 1988 e sua posterior confirmação dada pela LDB 9.394 de 1996, a intenção

do terceiro capítulo é discutir as origens da gestão democrática na atual legislação

educacional brasileira e também as formas de participação, o conceito de autonomia e a

forma de escolha do dirigente escolar, destacando a importância destes três aspectos para

o exercício democrático da gestão no cotidiano escolar.

Para elaborar a discussão realizada no segundo e no terceiro capítulos, nos valemos

da contribuição teórica de autores como Licínio Carlos Viana da Silva Lima (LIMA, 2013a;

2013b; 2012a; 2012b; 2011a; 2011b; 2007), Benno Sander (SANDER, 2009; 2005; 1985),

Vitor Henrique Paro (PARO, 2013; 2007; 2003a; 2003b), Luiz Fernandes Dourado

(DOURADO, 2013; 2007), Ângela Maria Martins (MARTINS, 2002), Max Weber (WEBER,

2002), dentre outros cujas obras dedicam-se a analisar a gestão escolar, além da revisão de

dissertações de mestrado e teses de doutorado.

Por fim, no quarto capítulo, apresentamos uma análise dos documentos

inventariados, das observações das reuniões que ocorreram na escola no período da

investigação e das entrevistas com os sujeitos que participaram da pesquisa, tendo como

fundamento a discussão teórica desenvolvida nos capítulos anteriores.

As considerações finais destacam que os mecanismos de regulação, controle e

avaliação, típicos da administração burocrática se contrapõem aos princípios da participação

e da autonomia, limitando e relativizando a gestão democrática.

21

CAPÍTULO 1

A PESQUISA REALIZADA

Neste capítulo descrevemos o caminho metodológico percorrido pela pesquisa, bem

como delinearemos o contexto em que ela se realizou. Mostraremos que a pesquisa se

fundamentou em metodologia qualitativa e foi realizada em uma unidade escolar pública que

integra um sistema municipal de ensino formalizado, fato que nos levou a contextualizar o

município, a educação no município e a unidade escolar pesquisada.

1.1. O caminho metodológico

A pesquisa, embasada em metodologia qualitativa, teve como objetivo analisar, na

perspectiva de um estudo de caso, como tem ocorrido a gestão escolar democrática em

uma escola no município de Poços de Caldas - MG, considerando a participação dos

profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico, a participação das

comunidades escolar e local nos conselhos escolares e, também, as possibilidades de

decisões/ações autônomas que podem ser efetivadas por parte da escola.

Considerando a diversidade em que pode se estabelecer a gestão democrática da

escola pública, pretendeu-se que a investigação se limitasse a uma escola pública municipal

onde o dirigente é escolhido por eleição.

Tal direcionamento está calcado na afirmação de Paro (2003a) e Dourado (2013),

que consideram relevante a forma com que o dirigente é escolhido, tanto no aspecto

político, no que se refere às consequentes relações interpessoais escolares, quanto no

aspecto pedagógico, no que se refere aos processos objetivamente desenvolvidos pela

instituição escolar e que resultam daquelas relações.

Embora saibamos que a escolha do dirigente por meio de eleição, por si só, não

garante o estabelecimento de práticas democráticas de gestão, ao considerarmos a

participação como princípio democrático, justifica-se, no âmbito desta pesquisa, a exclusão

de ambiente escolar que tem seu dirigente nomeado por autoridade governamental ou por

concurso público, pois aqui entendemos que tais modalidades não favorecem as vivências

de relações democráticas, dadas as suas características autoritárias, clientelistas ou que

22

preterem as comunidades escolar e local. (DOURADO, 2013; GADOTTI; ROMÃO, 2004;

HORA, 2004; LIMA, 2013a; PARO, 2003b)

Assim, foi pesquisada uma unidade escolar em Minas Gerais, o Colégio Municipal

Dr. José Vargas de Souza na Cidade de Poços de Caldas – MG, em decorrência de que,

nesta cidade, após a municipalização do ensino fundamental, foi implantado um sistema de

ensino próprio onde se adotou a eleição direta como forma de escolha dos dirigentes

escolares. A seleção também considerou o fato da referida escola ser a maior unidade

escolar do sistema municipal e a única que atende toda a educação básica: pré-escola,

ensino fundamental, ensino médio e pós-médio2. (POÇOS DE CALDAS, 2002).

Consideramos esta pesquisa como estudo de caso, embasando tal consideração em

Lüdke e André (2003), que caracterizam o estudo de caso como sendo aquele em que o

locus da pesquisa está delimitado, o foco está direcionado a uma realidade complexa e

contextualizada (a escola), além de ter características como a ênfase na interpretação do

contexto, a busca por um relato da realidade, permitir o uso de variadas fontes e permitir,

também, a representação de situações conflitantes.

De acordo com projeto de pesquisa protocolado junto ao Comitê de Ética em

Pesquisa da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) e por ele certificado, os

procedimentos de pesquisa empregados neste estudo de caso foram a análise documental,

realizada com base em normas específicas do sistema de ensino, regimento escolar e

proposta político pedagógica da escola, observação de reuniões no interior da escola e,

também, entrevistas semiestruturadas.

A análise documental ocorreu durante a primeira etapa da pesquisa, no período entre

novembro de 2013 e abril de 2014 e visou o levantamento das características do sistema de

ensino e da escola, tanto no que se refere à documentação que configura normativamente o

sistema, quanto no que se refere à documentação identitária da unidade escolar. Para tanto,

foram considerados os documentos relativos à legislação escolar, decretos, normas

educacionais, Projeto Político Pedagógico, Regimento Escolar, tendo sido inventariados

documentos municipais, descritos no Quadro 1, e documentos da escola, descritos no

Quadro 2.

2 O termo pós-médio é usado popularmente para designar o que a LDB considera, em seu Artigo 36, como profissionalização técnica de nível médio.

23

Quadro 1 – Documentos municipais inventariados

Código Documento Descrição Disponibilidade

DM 1 Lei Complementar n. 22

Regulamenta a eleição de diretores e vice diretores das escolas públicas do município de Poços de Caldas, de 09 de novembro de 2001

Câmara Municipal de Poços de Caldas. (*)

DM2 Lei Complementar n. 26

Dispõe sobre o Estatuto do Magistério Público do Município de Poços de Caldas, de 21 de junho de 2002.

Câmara Municipal de Poços de Caldas. (*)

DM 3 Fórum Municipal de Educação de 2003, 37f.

Documento Base do Fórum Municipal de Educação, Prefeitura Municipal de Poços de Caldas, Secretaria Municipal de Educação e Cultura.

Disponibilizado ao autor pela Secretaria Municipal de Educação de Poços de Caldas.

DM 4 Lei Ordinária n. 7.947

Institui o Sistema Municipal de Ensino de Poços de Caldas, cria o Conselho Municipal de Educação e dá outras providências, de 10 de janeiro de 2004.

Câmara Municipal de Poços de Caldas. (*)

DM 5 Lei Ordinária n. 8.229

Aprovada o Plano Municipal de Educação de Poços de Caldas, de 29 de dezembro de 2005.

Câmara Municipal de Poços de Caldas. (*)

DM 6 Edital SEMEC n. 001/2010

Edital da Secretaria Municipal de Educação de Poços de Caldas, que regulamenta o processo eleitoral para os cargos de diretor e vice diretor para o mandato 2011-2014.

Jornal de Poços, de 15 de outubro de 2010.

(*) Disponível em http://pocosdecaldas.mg.leg.br/legislacao/municipal.php

Quadro 2 – Documentos escolares inventariados

Código Descrição Disponibilidade

DE 1 Plano de Ação 2011-2014 das candidatas eleitas em 2010 para a direção e vice direção, 7f.

Secretaria do Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza

DE 2 Regimento Escolar, 60f. Secretaria do Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza

DE 3 Projeto Político Pedagógico (PPP), 47f. Secretaria do Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza

DE 4 Estatuto do Conselho da Escola, 3f. Secretaria do Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza

Após contato com a Secretária Municipal de Educação e com a Diretora da Escola

pesquisa, que autorizaram previamente a pesquisa e as visitas do pesquisador, demos

24

andamento à segunda etapa da investigação que se destinou à observação das reuniões no

interior da escola, em especial as reuniões do conselho da escola e do conselho de classe.

As observações, que foram registradas em um caderno de pesquisa, ocorreram durante os

meses de março, abril, maio e junho de 2014.

O roteiro para as observações, pautado pelo objetivo da pesquisa, além de observar

como ocorre a elaboração do PPP, procurou dados sobre a composição do conselho da

escola, seu funcionamento, a regularidade das suas reuniões, as suas atribuições, a sua

composição e a participação dos vários segmentos3 da comunidade escolar no conselho da

escola, o relacionamento da diretora com este conselho e a forma com que as decisões são

tomadas, principalmente no que tange às decisões que implicam nos aspectos

administrativos do dia a dia da escola, e também aos aspectos pedagógicos e aos

financeiros, procurando, nestes três aspectos, indícios de limitações e autonomias da gestão

escolar.

A observação, que procurou presenciar principalmente as reuniões do conselho da

escola, também foi destinada à coleta de documentos, leitura de atas do conselho da escola

e de reuniões de professores e à observação da rotina dos membros deste conselho. As

visitas de observação ocorreram duas vezes por semana, em turnos alternados, e duraram,

em média, três horas cada visita.

Quanto à observação de reuniões, foram observadas três reuniões do conselho da

escola, duas reuniões de professores e três assembleias4 que reuniram segmentos

específicos da comunidade escolar. Cabe observar que todos na escola, desde a diretora

até os alunos, foram receptivos e acolheram o pesquisador e a proposta de investigação.

Na terceira etapa da pesquisa, entre os meses de maio e junho de 2014, foram

realizadas as entrevistas semiestruturadas que, tendo em vista as relações das vivências

escolares, seguiram um roteiro5 que buscou dados relativos aos pilares em que se assentam

as experiências democráticas no ambiente escolar, tais como a autonomia da gestão da 3 Neste trabalho entenderemos por segmentos da comunidade escolar como sendo o conjunto de pessoas que

atuam no interior da escola, compondo especificamente o grupo de professores, alunos, pais de alunos e/ou responsáveis e funcionários, e como segmento da comunidade local, as pessoas externas à escola e com as quais ela mantém algum tipo de relacionamento.

4 A diretora define assembleia como sendo as reuniões de cada segmento e justificou que, dado o número de alunos atendidos, a escola promove reuniões específicas para cada segmento (“as assembleias”), dividindo: pais de alunos de educação infantil, pais de alunos das séries iniciais do ensino fundamental, pais de alunos das séries finais do ensino fundamental, pais e alunos do ensino médio, professores de educação infantil, professores das séries iniciais do ensino fundamental, professores das séries finais do ensino fundamental, professores do ensino médio, e funcionários.

5 Os roteiros utilizados na observação e nas entrevistas estão disponíveis nos Apêndices desta dissertação.

25

escola, a existência e a forma de controle local de recursos, a participação da comunidade,

a elaboração do PPP e a forma como ocorrem as eleições, tanto para o conselho como para

a direção da escola.

Foram entrevistados cinco membros do conselho da escola: a diretora da unidade,

um professor, um aluno, uma mãe de aluno, um funcionário, e uma pessoa tida como

pertencente à comunidade local. Todos os entrevistados, cujas características estão

descritas na Tabela 1, foram solícitos, receptivos, tomaram ciência do termo de

consentimento livre e esclarecido, assinaram-no e participaram do processo de forma

voluntária.

Tabela 1 – Caracterização dos entrevistados

Entrevistado Sexo Idade Instrução

Diretora F 52 Licenciatura em Letras e especialista em Gestão Escolar

Professor M 54 Licenciatura em Geografia e História

Mãe de aluno F 38 Ensino Médio

Funcionária operacional F 57 Ensino Fundamental

Aluno M 17 Cursando o Ensino Médio

Membro da Comunidade M 57 Ensino Fundamental

Fonte: Tabela elaborada pelo autor a partir das entrevistas realizadas

O professor, o aluno e a mãe de aluno foram sorteados. O critério de sorteio foi

adotado em virtude do conselho da escola possuir mais de um representante destes

segmentos da comunidade escolar. Quanto ao representante da comunidade local, foi

entrevistado um senhor que, apesar de não atuar como representante eleito pela

comunidade local, se faz presente nas atividades da escola e do conselho. Como veremos

na análise, a escola não possui membros eleitos pela comunidade local e considera como

comunidade somente os professores, alunos e os familiares dos alunos, e alega que esta é

a comunidade local que está presente nas atividades e comunga objetivos com a escola.

Não houve necessidade de sorteio para a entrevista do funcionário operacional, pois a

conselheira entrevistada é a única representante do segmento no conselho da escola.

26

Todas as entrevistas ocorreram na sala de projeção de filmes, nas dependências da

própria escola, sendo necessária uma visita do pesquisador para realizar cada uma das

entrevistas, em virtude da disponibilidade de tempo dos entrevistados e o esforço, por parte

do pesquisador, em não provocar incômodos às rotinas dos entrevistados. A diretora, o

professor, o aluno, a funcionária operacional e o membro da comunidade foram

entrevistados no turno matutino e a mãe de aluno foi entrevistada no turno vespertino. Em

média, as entrevistas duraram uma hora e meia e foram transcritas integralmente por nós.

1.2. O contexto da pesquisa

1.2.1. O município

Tendo sido habitada por índios Cataguases, a região em que se situa a cidade

somente foi alvo dos “desbravadores” que buscavam por ouro a partir do século XVIII, no

entanto, a região se valoriza como campo pastoril no final desse século, com a decadência

da era da mineração. Com as contínuas penetrações de aventureiros da época, foram

descobertos os poços de águas quentes e constatado que se tratava de águas medicinais. A

partir desta descoberta, observa-se o crescimento populacional na localidade. A partir de

1886, verifica-se na localidade o funcionamento de uma casa de banhos, a princípio

utilizada para o tratamento de doenças cutâneas, dada as características sulforosas e

termais das fontes. A localidade recebeu seu primeiro visitante ilustre em outubro de 1886:

Dom Pedro II, acompanhado da Imperatriz Dona Tereza Cristina, visitou a localidade para

inaugurar o ramal da Estrada de Ferro Mogiana. Com a estrada de ferro, observa-se o

aumento de veranistas que procuravam por repouso e tratamento, o que deu a localidade o

renome de estância hidroterápica e chamou a atenção do Presidente de Minas Gerais,

Antônio Carlos Ribeiro de Andrada que, em 1888, inicia a construção de um balneário e de

outros melhoramentos, fazendo com que a povoação de Nossa Senhora da Saúde de Poços

de Caldas se tornasse uma reconhecida estância balneária. A estância balneária atraiu os

casinos, o que fez com que um período de prosperidade e luxo se instaurasse: a cidade era

visitada pela elite aristocrática brasileira e por políticos de expressão nacional, como Getúlio

Vargas. Com a proibição dos casinos em 1946, a cidade passa por uma crise econômica e

se reorienta para o turismo de “lua-de-mel” para, finalmente, reorientar seu potencial

hoteleiro para o turismo voltado à classe média e popular, que prevalece até os dias atuais.

(POÇOS DE CALDAS, 2014; IBGE, 2014)

A formação administrativa do município remonta a 6 de dezembro de 1879, quando a

Lei Provincial n. 2.542 elevou o então distrito à categoria de freguesia, integrando-a ao

distrito-sede de Caldas. Em 1888, a Lei n. 3.659 criou a povoação de Nossa Senhora da

27

Saúde de Poços de Caldas. Passada a Proclamação da República, em 1891, a Lei Estadual

n.2, de 14 de setembro, confirmou a criação do distrito-sede do Município de Poços de

Caldas. (POÇOS DE CALDAS, 2014)

Figura 1 – Município de Poços de Caldas e municípios vizinhos

Fonte: IBGE (2014)

Ocupando uma área de 547.260 km², o Município de Poços de Caldas está situado

no sudoeste do Estado de Minas Gerais, na região denominada de Planalto de Poços de

Caldas e tem como vizinhos oito municípios, conforme podemos observar na Figura 1:

Botelhos (MG), Bandeira do Sul (MG), Caldas (MG), Andradas (MG), Águas da Prata (SP),

São Sebastião da Grama (SP), Caconde (SP) e Divinolândia (SP). (POÇOS DE CALDAS,

2014; IBGE, 2014)

A cidade está, por vias rodoviárias, a 450 km distante de Belo Horizonte, a 270 km

de São Paulo, 450 km do Rio de Janeiro e a 1.183 km de Brasília. (POÇOS DE CALDAS,

2014)

Segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),

ferramenta Cidades@6, Poços de Caldas apresentou um crescimento populacional de 38%

(trinta e oito por cento), entre 1991 e 2010, e tem uma população estimada para 2014 de

162.379 (cento e sessenta e dois mil, trezentos e setenta e nove) habitantes, sendo que

95% (noventa e cinco por cento) desta população vivem na zona urbana. (IBGE, 2014)

6 “Cidades@” é uma ferramenta do sítio do IBGE para se obter informações atualizadas sobre os municípios brasileiros.

28

A vocação econômica do município se divide em atividades turísticas, mineração e

indústrias associadas à mineração, indústria de vidros e cristais, cerâmica, refratários, a

agropecuária, com predomínio da cultura do café e a produção de laticínios. Com um

Produto Interno Bruto (PIB) per capita de R$ 26.948,13, o município tem uma economia

predominantemente baseada no setor de serviços: a cidade tem 1.34% de seu PIB

relacionado à agropecuária, 29.7% à indústria e 68.96% aos serviços. (IBGE, 2014)

A cidade apresentou um Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) em

1991 de 0.581, em 2000, de 0.716 e, em 2010, de 0.779, o que a coloca na 141ª. posição no

ranking nacional e na 6ª posição no ranking estadual. (IBGE, 2014)

1.2.1. A educação no município

Avaliado, em 2010, com um Índice de Desenvolvimento Humano Municipal para a

Educação (IDHME) de 0.706, e de acordo com os dados de 2012 do IBGE e do Censo

Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), o município

contava com 3.234 (três mil, duzentos e trinta e quatro) docentes, em 250 (duzentos e

cinquenta) escolas de educação básica, distribuídos conforme descrito na Tabela 2. (IBGE,

2014; INEP, 2014)

Tabela 2 – Docentes e Escolas da Educação Básica de Poços de Caldas - 2012

Nível–Setor Docentes Escolas

Ensino fundamental – total 972 45

Ensino fundamental - escola privada 253 12

Ensino fundamental - escola pública estadual 169 8

Ensino fundamental - escola pública federal Não existente 0

Ensino fundamental - escola pública municipal 550 25

Ensino médio – total 396 17

Ensino médio - escola privada 169 9

Ensino médio - escola pública estadual 194 7

Ensino médio - escola pública federal Não existente 0

Ensino médio - escola pública municipal 33 1

Ensino pré-escolar – total 249 63

Ensino pré-escolar - escola privada 69 18

Ensino pré-escolar - escola pública estadual Não existente 0

Ensino pré-escolar - escola pública federal Não existente 0

Ensino pré-escolar - escola pública municipal 180 45

Fonte: IBGE (2014); INEP (2014)

29

De acordo com os dados apresentados na Tabela 2, o município tem, em sua rede,

23% do total de docentes e 28% do total de escolas de educação básica no município.

Com a aprovação do Plano Nacional de Educação de 2001 e a consequente

obrigatoriedade dos municípios elaborarem seus planos para a educação, a Secretaria

Municipal de Educação criou uma comissão para traçar o perfil da rede municipal de ensino,

atendendo aos anseios dos educadores para repensar a escola de Poços de Caldas, tendo

como objetivos a democratização das relações escolares, a instalação de um sistema de

ensino próprio e a elaboração de um Plano Municipal para a Educação. (POÇOS DE

CALDAS, 2003)

Depois de um intenso período de reuniões em 2001, essa comissão recomendou a

instauração de um Fórum Municipal de Educação para discutir a construção do Plano

Municipal de Educação. Além disso, a comissão recomendou ao Poder Executivo Municipal

a regulamentação da eleição de diretor e vice diretor das unidades escolares do município, o

que ocorreu em 09 de novembro de 2001, com a publicação da Lei Complementar n. 22. No

entanto, a Lei diz respeito somente à eleição de diretores e vice diretores que estão

presentes no quadro do funcionalismo público municipal em escolas que atendem o ensino

fundamental e ensino médio, excluindo, contraditoriamente, os coordenadores pedagógicos

dos centros de educação infantil, que são responsáveis por todo o trabalho desenvolvido

nestas unidades, que continuam sendo concursados e/ou nomeados pela autoridade do

governo municipal.

Reorganizada em 2002, esta comissão prossegue com discussões que resultaram

em programas de capacitação dos professores e indicações para alterações no estatuto do

magistério público municipal. (POÇOS DE CALDAS, 2003)

Em 2003, depois da sintetização das discussões e orientações dessa comissão, foi

instituído o Fórum Municipal de Educação com dois objetivos: discutir e deliberar sobre a

institucionalização do sistema municipal de educação e elaborar o Plano Decenal Municipal

de Educação (PDME). Instituído, portanto, como instância deliberativa, o Fórum teve sua

assembleia composta por três representantes docentes de cada unidade de ensino (sendo

um professor, um especialista e um funcionário operacional), além de um aluno maior de

quatorze anos e um pai de aluno. Presidido pelo titular da Secretaria Municipal de

Educação, também compuseram a assembleia do Fórum membros responsáveis pela

coordenação do evento e que representaram a Câmara de Vereadores, Conselho Municipal

de Educação, Superintendência Regional de Ensino, Ministério Público, Conselho Tutelar,

30

Conselho da Criança e do Adolescente, movimentos populares, sindicato dos servidores

públicos, das universidades instaladas no município, além de um consultor indicado pela

Secretaria Municipal de Educação e representantes dos conselhos de escola das diversas

unidades. (POÇOS DE CALDAS, 2003)

Após um extenso período, que compreendeu atividades desenvolvidas de abril a

outubro de 2003, em novembro deste ano o Fórum encaminhou à Câmara Municipal de

Educação as propostas de projetos de leis para organizar o sistema municipal de educação

e implantar o Plano Municipal de Educação, respectivamente, a Lei n. 7.947, de 10 de

janeiro de 2005 (Lei n. 7947) e a Lei n. 8.229 (Lei n. 8229), de 29 de dezembro de 2005, que

serão analisados no Capítulo 4. (POÇOS DE CALDAS, 2003).

Em 2014, a rede municipal registrou 19.093 (dezenove mil e noventa e três)

matrículas iniciais na educação básica e 5.934 (cinco mil, novecentos e trinta e quatro)

matrículas em outras modalidades, como registrado na Tabela 3.

Tabela 3 – Matrícula Inicial no ano de 2014 – Rede Municipal de Poços Caldas

Educação

Infantil

Ensino

Fundamental

Ensino

Médio

Outras

Modalidades

Creche Pré-Escola Anos

Iniciais

Anos

Finais

Educação Especial e

Mais Educação7

3213 3350 6443 5473 614 5034

Fonte: Tabela elabora pelo autor a partir de dados fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação de Poços de Caldas

A Tabela 4, que segue, mostra que as séries iniciais da rede municipal de Poços de

Caldas têm se mantido ascendente nas duas últimas apurações do Índice de

Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e está acima da meta projetada pelo INEP.

Tabela 4 – IDEB Séries Iniciais - Poços Caldas

Meta Projetada Meta Apurada

2009 2011 2013 2009 2011 2013

5.0 5.4 5.6 5.4 5.7 5.9

Fonte: INEP (2014)

7 O Projeto Mais Educação tem o objetivo de oferecer atividades no contra turno para alunos da educação básica e é considerado pela Secretaria Municipal de Educação como fase inicial para implantação da escola em tempo integral.

31

Já para as séries finas, o IDEB apurado em 2013 mostra que a rede municipal de

Poços de Caldas está abaixo do índice apurado em 2011, apesar de ter atingido a meta

projetada, como vemos na Tabela 5.

Tabela 5 – IDEB Séries Finais - Poços Caldas

Meta Projetada Meta Apurada

2009 2011 2013 2009 2011 2013

4.1 4.4 4.8 4.9 4.9 4.8

Fonte: INEP (2014)

Sobre essa questão, no entanto, vale destacar que, nesta pesquisa, não

consideramos que o IDEB8 seja, de fato, representativo da qualidade (ou da falta dela) por

parte das escolas. Não nos estenderemos na discussão dessa questão, que não é foco

desse trabalho, mas pretendemos esclarecer que só utilizaremos tal índice na

caracterização do município e, também, da escola em virtude desse número ser,

frequentemente, utilizado para justificar mudanças na gestão da escola, como será discutido

oportunamente.

1.2.2. A escola pesquisada.

O Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza pertence à Rede Municipal de Poços

de Caldas e tem seu histórico apresentado pelo Regimento Escolar, que diz que a escola foi

fundada em 1927, com o nome Atheneu Brasiliense, mas no mesmo ano passou a ser

denominado de Lyceu Brasileiro. Em 1929, o atual prédio ocupado pela escola foi construído

por uma “Sociedade Anônima” e, em 1931, passou a denominar-se Colégio Municipal

Mackenzie, mas somente em 1932 a Prefeitura Municipal de Poços de Caldas assumiu sua

administração. Ao adquirir o prédio da escola, em 1934, a Prefeitura Municipal de Poços de

Caldas alterou sua denominação para Ginásio Municipal de Poços de Caldas para, logo em

seguida, em 1935, doar a propriedade e a escola para a Congregação dos Irmãos Maristas,

denominada juridicamente por União Brasileira de Educação e Ensino (UBEE). Em 1936,

8 Para maiores esclarecimentos, recomendamos as seguintes leituras: Cunha, Célio da; SOUSA, José Vieira; SILVA, Maria Abádia da (Orgs.). Avaliação de políticas públicas de

educação. Brasília: Líber Livro, 2012.

FERNANDES, Reynaldo. Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Brasília: Instituto Nacional

de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2007.

GODOY, Daniel. Gestão da educação e controle das performatividades no Brasil: um estudo do caso do

Índice de Desenvolvimento da Educação – IDEB. 229f. Mestrado Acadêmico em Educação. Universidade Federal de Pelotas, 2011.

32

com o Decreto 688, o Governo do Estado de Minas Gerais reconhece oficialmente o

Colégio. (REGIMENTO ESCOLAR, 2008)

Em 1949, a UBEE altera sua denominação para Colégio Municipal de Poços de

Caldas e, em 1971, para Colégio Marista de Poços de Caldas. Cinco anos depois, em 1976,

a Portaria 130 de 1976, da Superintendência Educacional da Secretaria de Estado da

Educação, autoriza a transferência da entidade mantenedora para a Prefeitura Municipal de

Poços de Caldas e, pela mesma portaria, a escola passa a denominar-se Colégio Municipal

de Poços de Caldas. Finalmente, em 1977, a escola passa a denominar-se Colégio

Municipal Dr. José Vargas de Souza. (REGIMENTO ESCOLAR, 2008)

O histórico da escola também registra, de 1978 a 2013, as autorizações de

funcionamento do ensino médio e de habilitações profissionais técnicas de nível médio (pós-

médio) de Agrimensura e Edificações, Desenhista de Arquitetura, Topógrafo de

Agrimensura, Contabilidade, Mineração e Magistério. Encerradas as habilitações técnicas

em 2013, em virtude de transferência dos cursos oferecidos para o Instituto Federal, a

escola continuou a oferecer a educação infantil (pré-escola), o ensino fundamental de 1º ao

9º ano e o ensino médio. (REGIMENTO ESCOLAR, 2008)

Conforme a matrícula inicial de 2014, a escola atende 2.407 (dois mil quatrocentos e

sete) alunos distribuídos entre a educação infantil (pré-escola - quatro e cinco anos), o

ensino fundamental e o ensino médio, totalizando 84 (oitenta e quatro) turmas, sendo 39

(trinta e nove) turmas atendidas no período matutino, 41 (quarenta e uma) turmas no

período vespertino e 04 (quatro) turmas no período noturno. (PPP, 2014)

A Tabela 6 mostra que, para o turno matutino, a escola trabalha com 39 (trinta e

nove) turmas e 1.139 (um mil, centro e trinta e nove) alunos; na Tabela 7, vemos que a

escola trabalha com 41 (quarenta e uma) turmas e 1.180 (um mil cento e oitenta alunos) no

período vespertino; e na Tabela 8, vemos que a escola trabalha com 4 (quatro) turmas e 154

(cento e cinquenta e quatro alunos).

O turno matutino atende a toda educação básica; o vespertino trabalha com a

educação infantil e o ensino fundamental e o período noturno somente com o ensino médio.

33

Tabela 6 – Alunos Turno Matutino no ano de 2014

Série Turmas Alunos

4 anos Educação Infantil 03 56

5 anos Educação Infantil 03 69

1º. Ano Ensino Fundamental 01 25

7º. Ano Ensino Fundamental 06 198

8º. Ano Ensino Fundamental 06 169

9º. Ano Ensino Fundamental 06 174

1ª. Série Ensino Médio 05 177

2ª. Série Ensino Médio 05 150

3ª. Série Ensino Médio 04 121

Subtotal 39 1139

Fonte: PPP 2014 – Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza (PPP, 2014)

Tabela 7 – Alunos Turno Vespertino no ano de 2014

Série Turmas Alunos

4 anos Educação Infantil 03 72

5 anos Educação Infantil 03 72

1º Ano Ensino Fundamental 05 119

2º Ano Ensino Fundamental 06 139

3º Ano Ensino Fundamental 06 167

4º Ano Ensino Fundamental 06 171

5º Ano Ensino Fundamental 06 173

6º Ano Ensino Fundamental 06 195

Subtotal 41 1108

Fonte: PPP 2014 – Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza (PPP, 2014)

Tabela 8 – Alunos Turno Noturno no ano de 2014

Série Turmas Alunos

1ª. Série Ensino Médio 01 48

2ª. Série Ensino Médio 01 45

3ª. Série Ensino Médio 02 61

Subtotal 04 154

Fonte: PPP 2014 – Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza (PPP, 2014)

34

Com esta distribuição, como podemos ver na Tabela 9, a escola apresenta a média

de 28 alunos por turma.

Tabela 9 – Média de Alunos por Turma e Segmento no ano de 2014

Segmento Turmas Alunos Média: alunos por turma

Educação Infantil 12 269 22

Ensino Fundamental (1º. ao 5º ano) 30 794 26

Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) 24 736 30

Ensino Médio 18 602 33

Total 84 2401 28

Fonte: PPP 2014 – Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza (PPP, 2014)

O quadro de trabalhadores docentes da escola conta com a diretora, a vice diretora,

cinco supervisoras pedagógicas, um coordenador pedagógico de educação infantil, três

auxiliares de educação infantil, cento e sete professoras e professores efetivos e três

professoras eventuais, secretário, bibliotecária, vinte funcionários operacionais, dezessete

funcionários administrativos e dois guardas municipais.

De acordo com a legislação municipal que dispõe sobre o estatuto do magistério

municipal, Lei Complementar n. 26, de 21 de junho de 2002 (LC 26), em seu Artigo 7º o

quadro municipal do magistério é constituído por Professor I (professores do 1º ao 5º ano do

ensino fundamental), Professor II (professores do 6º ao 9º ano do ensino fundamental e

ensino médio), Secretário de Unidade Escolar, Diretor de Unidade Escolar, Vice Diretor de

Unidade Escolar, Coordenador Pedagógico, Supervisor Pedagógico, Orientador Educacional

e Técnico de Administração Escolar, no entanto, a escola não dispõe, em seu quadro, de

orientador educacional e de técnico em administração escolar. Em seu Artigo 10, a Lei

descreve as atribuições funcionais de cada cargo, como mostra o Quadro 3.

35

Quadro 3 - Atribuições dos cargos do quadro de magistério

Cargo Atribuições

Professor A regência efetiva de turma, elaboração de programas e planos, controle e avaliação do rendimento escolar, recuperação de alunos, participação em reuniões, promoção de aperfeiçoamento, pesquisa educacional, aprimoramento do processo ensino-aprendizagem e da ação educacional, participação ativa na vida comunitária da unidade escolar.

Supervisor pedagógico Supervisão do processo didático no ensino fundamental e ensino médio, em seu tríplice aspecto: de planejamento, de controle e de avaliação.

Orientador educacional Orientação, aconselhamento e encaminhamento de alunos em sua formação geral, sondagem de suas aptidões e tendências vocacionais e cooperação com atividades docentes.

Diretor Planejamento, coordenação, controle e avaliação do trabalho escolar, representação da escola perante os órgãos da Administração Pública.

Vice diretor Auxiliar e cooperar com o diretor nos desenvolvimento de suas ações.

Secretário Organização e execução de todo o serviço de escrituração escolar.

Técnico de administração escolar

Escrituração, arquivamento e fiscalização de documentos da secretaria da escola.

Coordenador pedagógico Planejamento, coordenação e acompanhamento de todo trabalho desenvolvido na educação infantil.

Fonte: Quadro elaborado pelo autor conforme a LC 26 de 21/06/2002

Como podemos observar, não consta nas atribuições do diretor e do professor

nenhuma referência da LC 26 aos processos necessários ao desenvolvimento e à prática da

gestão democrática.

Reiterando que não pretendemos ressaltar a validade qualitativa, ou não, do IDEB,

mas dada a sua influência no processo operacional da gestão da escola pesquisada, a

investigação procurou averiguar o “desempenho” da escola segundo os indicadores

apurados pelo INEP, em particular o IDEB. Oficialmente, desde a última atualização

publicada pelo INEP, o IDEB da escola pesquisada tem apresentado uma ascendência no

que se refere às séries iniciais (Tabela 10), mas quanto às séries finais o índice não tem

atingido a meta projetada e está em descendência (Tabela 11), apesar de estar maior do

que o apurado para a rede municipal (Tabela 5).

36

Tabela 10 – IDEB Séries Iniciais – Escola Pesquisada

Meta Projetada Meta Apurada

2009 2011 2013 2009 2011 2013

6.2 6.6 6.8 6.4 6.8 7.0

Fonte: INEP (2014)

Tabela 11 – IDEB Séries Finais – Escola Pesquisada

Meta Projetada Meta Apurada

2009 2011 2013 2009 2011 2013

5.7 5.9 6.3 6.1 5.7 5.3

Fonte: INEP (2014)

De acordo com os dados contextualizados neste capítulo, em 2002, o município

realizou um Fórum Municipal com os objetivos de democratizar as relações escolares,

instalar o sistema de ensino próprio e elaborar o plano municipal para a educação, objetivos

estes institucionalizados a partir da promulgação, em 2005, das Leis n. 7947 e n. 8.229, que

serão discutidas no capítulo 4.

Desde 2005, o sistema municipal está instituído e formalizado, possui um Plano

Municipal de Educação, um Conselho Municipal de Educação e também adota a eleição

como forma de provimento aos cargos de diretor e vice diretor das escolas de ensino

fundamental e ensino médio.

A escola pesquisada faz parte da rede municipal desde 1976, é a maior unidade e a

única escola municipal que oferece toda a educação básica (pré-escola – 4 e 5 anos, ensino

fundamental e ensino médio), contando com 2.407 alunos matriculados em 2014, ou 12.6%

dos alunos atendidos pela rede municipal, e 107 professores.

A escola teve sua direção atual eleita pela comunidade em 2010, para um mandato

de 2011 a 2014. O conselho da escola é composto por 12 conselheiros titulares. A escola

dispõe de Regimento Escolar, PPP e Estatuto do Conselho da Escola. Estes documentos

serão discutidos no capítulo 4, que trata da configuração da gestão democrática praticada

na escola pesquisada.

37

CAPÍTULO 2

“MAIS GESTÃO PARA MENOS DEMOCRACIA”: BUROCRATIZAÇÃO vs

DEMOCRATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

A intenção deste capítulo é rever as referências atuais que tratam da burocracia na

formação do Estado Brasileiro, buscando um quadro histórico que permita entender, no

desenvolvimento do Estado nacional brasileiro, a influência da burocracia nas relações

administrativas, principalmente no que tange aos aspectos da centralização político-

administrativa e do controle sobre a educação nos tempos atuais.

Ainda que a legislação educação nacional brasileira faça referência à gestão

democrática como princípio a orientar o oferecimento do ensino público, essa mesma

legislação deixa lacunas e cria mecanismos que cerceiam a participação e a autonomia da

gestão escolar democrática, favorecendo o fortalecimento de mecanismos burocráticos de

gestão. Nesse sentido, esse capítulo pretende explorar as contradições expressas pelos

processos de burocratização e democratização do sistema de ensino no Brasil, resgatando

a origem histórica de tais processos.

Lima (2012a) destaca que, ao contrário do que parece, os elementos burocráticos

estão muito presentes na gestão das escolas atualmente. O autor afirma que a queda da

burocracia foi anunciada prematuramente, assim como também é prematuro o discurso de

que estaríamos vivendo uma forma de organização pós-burocrática. Para este autor, as

escolas vêm, enquanto organizações educativas, convivendo com uma burocracia

potencializada, uma hiperburocracia, proporcionada, sobretudo, pelo aprimoramento das

novas tecnologias que possibilitam uma maior intensidade e alcance dos mecanismos de

controle racional do trabalho desenvolvido nas escolas.

Ao estudar a reforma educativa operada em Portugal no final do século XX, Lima

(2013a) traz elementos importantes para que possamos compreender também a realidade

brasileira. Ele afirma que os discursos de descentralização pautados principalmente no

aumento da necessidade de participação dos sujeitos da escola, bem como da autonomia

dessa instituição, têm servido, na verdade, para encobrir o fato de que as decisões de fundo

permanecem centralizadas e somente as decisões menores, de caráter operacional, são

realizadas pela escola:

38

A gestão democrática das escolas, constitucionalmente consagrada, embora garantindo importantes princípios de democraticidade e de participação, a eleição de certos órgãos e uma gestão escolar de tipo colegial, sobretudo no caso dos professores, não foi, contudo, institucionalizada de forma a permitir uma ruptura com o paradigma de centralização política e administrativa na educação, nem a conferir maior autonomia às escolas. (LIMA, 2013a, p. 177) (grifos do autor)

Contraditoriamente, as reformas da educação empenhadas no final do século XX

que anunciaram o afastamento dos paradigmas burocráticos, que só é possível com uma

reforma do Estado, apontam para a centralidade nas tomadas de decisão, para as

regulamentações que se embasam em orientações técnico-científicas e avaliações de

concepção positivista9 usadas como instrumentos estatais de regulação e metarregulação.

(LIMA, 2012b).

Assim, embora o que observemos na atual legislação educacional brasileira seja o

princípio da gestão escolar democrática, há de se questionar os limites e possibilidades de

efetivação da democratização da gestão das escolas nesse quadro de aparente

hiperburocratização dos sistemas de ensino.

2.1. Administração pública brasileira e a educação: do patrimonialismo à

hiperburocracia gerencialista

Ao estudar a política e a administração da educação no Brasil, notamos tanto a

influência dos interesses econômicos quanto a influência política sobre o desenvolvimento

das nossas práticas ao administrar a “coisa pública”. A correlação desses interesses, a

nosso ver, constroem práticas que podem, de forma mais enraizada, ou não, se consolidar

nas concepções vivenciadas, o que nos leva a considerar a construção de um quadro

histórico no qual possamos observar como se desenvolveu a administração pública da

educação brasileira.

Assim, nos remetemos a Sander (2005), que faz um levantamento histórico de fatos

econômicos e políticos que contribuíram para a formulação dos modelos administrativos que

permearam a organização do campo educacional no Brasil.

9 O autor refere-se às teorias de Taylor, Fayol e Elton Mayo, desenvolvidas a partir do pensamento positivista e

que têm como objetivo a administração “científica” das empresas .

39

O autor faz a seleção de atos e fatos políticos dividindo a trajetória da organização e

da administração educacional brasileira em cinco momentos que analisam desde a

exploração colonial portuguesa e o período imperial brasileiro, até a reconstrução

democrática ocorrida após o autoritarismo da ditadura militar instaurada de 1964 a 1985.

Sander (2005) denomina estes cinco momentos de: o momento da colonização,

incluindo neste momento o período imperial; momento da ordem e progresso, em referência

ao período inicial da república brasileira, ou república velha; o momento dos Pioneiros da

Educação, abrangendo o período de 1930 até o início dos anos de 1960; o momento da

economia da educação, referindo-se ao período da ditadura militar; e o momento da

construção democrática ocorrida após o regime autoritário dos militares.

Para Sander (2005), o momento da colonização (que preferimos chamar de

momento colonial e imperial) é o movimento da transplantação dos valores e das práticas da

cultura da Europa latina nos países dominados, incluindo as práticas e valores educacionais.

Abrucio, Pedroti e Pó (2012) também consideram que é impossível analisar as origens da

administração pública brasileira sem levar em conta as influências deixadas pelo período

colonial.

Para estes autores, o modelo excessivamente regulamentador caracterizou as

atividades da administração da metrópole no Brasil, no entanto, tal modelo centralizador e

regulamentador sofreu influência local do “poderio patrimonialista10 presente nas câmaras

municipais e nas capitanias hereditárias”. (ABRUCIO; PEDROTI; PÓ, 2012, p. 29)

A aliança entre o poder do Estado e as elites econômicas locais caracteriza tanto o

período colonial brasileiro como o período imperial e revela uma administração

patrimonialista onde as funções públicas eram “distribuídas com base na tradição e no

arbítrio” (NOHARA, 2012, p.16) daqueles que detinham o poder. (ABRUCIO; PEDROTI; PÓ,

2012; NOHARA, 2012)

Dada a influência da Igreja Católica e suas relações com os colonizadores

portugueses e espanhóis, o transplante dos valores e das práticas educacionais para o

Brasil resultou em uma educação pública confessional delegada, inicialmente, aos jesuítas.

10 Com base nos estudos de Max Weber, Nohara (2012) refere-se ao patrimonialismo como sistema em que as

funções administrativas são distribuídas com fins políticos segundo a tradição ou o arbítrio de um soberano, sendo os funcionários dependentes de quem detém o poder. Já Abrucio, Pedroti e Pó (2012) referem-se ao patrimonialismo como a não distinção entre o público e o privado, como posse do público pelos detentores dos poderes político e econômico.

40

É importante ressaltar que nos tempos coloniais houve poucos desenvolvimentos teóricos autóctones no campo específico da educação. Somente uma minoria da elite política e do clero tinha acesso à escola e não havia vontade política por parte da Família Real de Portugal no sentido de ampliar as oportunidades educacionais para o povo. [...] na realidade, replicava-se no Brasil colonial, como nas demais colônias ibéricas da América Latina, a política educacional adotada pelas monarquias europeias. (SANDER, 2005, p. 95)

Este autor nos dá a perspectiva da política educacional, no período colonial, estar

atrelada ao atendimento exclusivo e primordial da classe dominante: uma política

educacional, que, na origem da administração pública brasileira, se orienta ao atendimento

das elites. Outro aspecto relevante nesta afirmação de Sander (2005) é o aspecto

centralizador das políticas, que dependiam da vontade da monarquia.

Estes aspectos da educação no momento colonial e imperial nos dão a ideia de que

a educação atendia exclusivamente às necessidades das elites política e econômica e não

era considerada como uma política pública, mas detinha-se como direito patrimonialista.

No entanto, Francisco Filho (2006) observa que a educação jesuíta dada à elite no

período colonial era preparatória e deveria ser completada em estudos na Europa. Para o

autor, além da educação preparatória para os filhos da elite, também eram objetos dos

jesuítas a catequese dos índios e a formação dos mais padres.

Sander (2005) também faz alusão às reformas ensaiadas pelo Marquês de Pombal,

em meados do século XVII, à introdução do ensino superior por ocasião da permanência da

Família Real no Rio de Janeiro e à influência das tradições pedagógicas trazidas pelos

alemães, italianos, suíços e poloneses que imigraram e se fixaram no sul do Brasil, no

século XIX, após a abolição da escravatura.

Este quadro começa a sofrer modificações no Brasil a partir do século XVIII, com a

vinda da família real e, com ela, as instituições que, mais tarde, se tornarão a base do

Estado nacional brasileiro, além das reformas pombalinas:

Na verdade, a inflexão do papel do Estado e da burocracia no Brasil se deveu principalmente às ações do marquês de Pombal, que procurou formar lideranças político-administrativas, particularmente em Coimbra, que pudessem atuar como altos burocratas em todas as colônias. Esse

41

processo gerou uma nova elite de brasileiros, bastante homogênea em seus propósitos. (ABRUCIO; PEDROTI; PÓ, 2012, p. 30)

Para estes autores, desde o final do período colonial até o início do Império

brasileiro, esse grupo ocupou postos de relevância governamental e fez parte de vários

momentos históricos e estratégicos do país, tendo participação no processo de

independência e sendo fundamental para a consolidação do modelo político no Segundo

Reinado.

A época em que a Família Real Portuguesa desembarcou no Brasil coincide com a

decadência do mercantilismo e à difusão do Liberalismo, que estava em evidência e em

franca expansão industrial. Segundo Francisco Filho (2006), a filosofia era alimentada pelo

Iluminismo, admitido e defendido pelos filhos da elite, distantes da realidade popular, uma

vez que ao povo era destinado, no máximo, a aprendizagem profissional no ambiente

familiar.

Já não interessava o trabalho escravo, o monopólio e nem a antiga política de proibições aplicadas desde o início da colonização. Os tempos eram outros as obras citadas pela elite eram de Adam Smith, de Ricardo, de Malthus e de John Stuart Mill. A chamada “Escola Clássica” estava em ascensão e as ideias passavam pelos produtos ingleses desenvolvidos na Revolução Industrial. (FRANCISCO FILHO, 2006, p. 97)

No período do Segundo Reinado, a burocracia passa a se caracterizar de duas

maneiras, uma vinculada ao mérito, mais nobre, ou alta burocracia11, composta por

funcionários que assessoravam o imperador, dada a experiência política que tinham e a

atuação burocrática que tais funcionários vivenciavam, a outra vinculada à patronagem12,

usada para garantir o apoio político através de distribuição de empregos públicos.

(ABRUCIO; PEDROTI; PÓ, 2012)

11 A burocracia é um modelo de administração que se fundamenta na organização racional que, para atingir seus

fins, faz prescrições de normas padronizadas e impõe medidas de controle sobre as atividades de seus colaboradores que devem ser meritocraticamente competentes para o exercício de suas funções. Ao mencionar o termo hiperburocratização, Lima (2012a) se refere à intensificação dos processos de normatização, de padronização e de controle, típicos do modelo da administração burocrático. (LIMA, 2012a, DIGGINS, 1999; WEBER, 2002)

12 A patronagem (ou apadrinhamento) é a seleção e promoção de funcionários públicos tendo como critério os

relacionamentos pessoais ou os interesses do governante por apoio político. (ABRUCIO; PEDROTI; PÓ, 2012; NOHARA, 2012)

42

Sander (2005) ainda destaca a sensibilidade de Dom Pedro II com relação à

educação, durante o Segundo Império, e os esforços de Rui Barbosa que liderou um

movimento que reagiu à ausência de uma tradição pedagógica brasileira e à ausência de

uma política educacional popular.

O momento colonial e imperial não foi expressivo com relação ao desenvolvimento

de uma política educacional efetiva. Nardi (2011), em seus estudos sobre a

descentralização e a municipalização na história da educação brasileira, destaca o Ato

Adicional de 1834 que delegou para as províncias a legislação sobre a instrução pública: na

interpretação do autor, até então, nenhuma outra medida se assemelhou ao Ato Adicional

de 1834, em termos de descentralização do ensino público, mas observa que tal medida não

se materializou tranquilamente, tendo em vista as diversas interpretações que surgiram

sobre as competências das províncias e o caráter concorrencial de tais competências com o

poder central.

Tanto para Francisco Filho (2006) como para Nardi (2011) o Ato Adicional de 1834

trouxe a dualidade: distribuiu os encargos educacionais, imputando o ensino popular sob os

cuidados das províncias e um ensino superior sob a responsabilidade do Governo Central.

Antes disso, afirma Nardi (2011), a relevância histórica está na Lei de 15 de outubro de

1827, que criou as escolas de primeiras letras.

Longe de ser uma política integradora, e em se tratando da primeira medida legal

que descentralizou os encargos educacionais no Brasil, cabe observar que o Ato Adicional

de 1834 não considerou as diferenças e as capacidades das províncias para estruturarem e

organizarem o ensino popular, ficando tal ensino ao sabor dessas diferenças, dos interesses

políticos patrimonialistas e da disponibilidade financeira das províncias.

As novas idéias do século XIX, como o Positivismo, o Marxismo, o Darwinismo etc. não tiveram força suficiente para alterar a relação de desequilíbrio existente entre o ensino superior preparado para a elite aristocrática e o falido ensino elementar para o povo. Todos os recursos eram direcionados à melhoria do ensino superior, que ainda no século XXI é uma preocupação do poder central, no que tange à educação. (FRANCISCO FILHO, 2006, p. 98-99)

No entanto, essencialmente patrimonialista, para Nohara (2012), nesse sistema, a

elite agrária ocupava cargos públicos e influenciava a gestão estatal, configurando um

cenário político que ultrapassa o Segundo Reinado e chega à Primeira República.

43

Quanto ao segundo momento, nomeado por Sander (2005, p. 96) de “momento da

ordem e do progresso”, fazendo referência ao período republicano dos anos de 1889 a 1930

(Primeira República), o autor faz alusão à omissão, por parte da primeira constituição

republicana, no que diz respeito à educação e também menciona a reforma educacional

liderada por Benjamin Constant.

Francisco Filho (2006), também se dirige a Benjamin Constant e se refere às

reformas educacionais dessa época como o rompimento da tradição humanista que

caracterizou a educação brasileira desde o início da colonização, e a implantação de um

modelo de educação enciclopédico, seriado e positivista13, assimilado dos liceus franceses.

No Entanto, Nohara (2012) e Abrucio, Pedroti e Pó (2012) observam que, enquanto o

mundo caminhava para reformas administrativas no sentido burocrático-weberiano, a

Primeira República brasileira, ao adotar um modelo estadualista e oligárquico com maior

autonomia político-administrativa aos estados, fortaleceu os traços de patronagem e

patrimonialismo, enfraquecendo, ao mesmo tempo, o governo central.

Nestes moldes, a Primeira República concebeu e organizou um sistema educacional

que adotou instrumentos de controle centralizados e medidas de uniformização do ensino,

apesar da institucionalização de um federalismo descentralizado. (NARDI, 2011; SANDER,

2005), como podemos observar na citação abaixo:

É assim que as perspectivas iniciais de administração escolar da Primeira República deram origem a modelos dedutivos e a práticas normativas, modelos e práticas que revelaram uma preocupação prioritária com a manutenção da ordem, do respeito e da harmonia na sala de aula, no funcionamento das escolas e na gestão político-institucional dos sistemas de ensino. Ordem, disciplina, controle centralizado e uniformização de comportamentos e práticas eram os requisitos fundamentais das escolas e dos sistemas de ensino e da própria administração pública daquela época. (SANDER, 2005, p. 97)

No contexto do mundo ocidental, as teorias chamadas de gerencialistas se

difundiram e influenciaram as diversas áreas administrativas, inclusive sendo transplantadas

13 O positivismo é uma corrente filosófica iniciada pelo francês Augusto Comte (1798-1857) e propõe a

experimentação científica de dados concretos (positivos). O Positivismo defende que o conhecimento científico é o único conhecimento verdadeiro. As palavras “ordem e progresso”, que aparecem na bandeira da república brasileira, surgiram da máxima “O amor por princípio e a ordem por base; e progresso por fim”, atribuída a Comte. (SILVA, 2004a)

44

da administração empresarial para a administração pública e afetando, portanto, a

educação, entre elas o modelo burocrático de Max Weber e as teorias fundamentadas no

positivismo, como as teorias de Fayol, Taylor e Elton Mayo.

A racionalização14, que desde o princípio está impregnada no desenvolvimento do

capitalismo, se configura como fundamento no ideal dessas teorias, que persistem na busca

da excelência do custo benefício e são transpostas para todos os campos das organizações

sociais. (IANNI, 2007;THRY-CHERQUES, 2009). Neste sentido, Ianni (2007) nos fala da

crescente influência do capitalismo e da burocracia sobre a vida social, como ressaltamos

na citação a seguir.

Com o vaivém, de permeio às mais surpreendentes situações, juntamente com as relações, os processos e as estruturas próprias do capitalismo, ocorre o desenvolvimento de formas racionais de organização das atividades sociais em geral, compreendendo as políticas, as econômicas, as jurídicas, as religiões, as educacionais e outras. Aos poucos, as mais diversas esferas da vida social são burocratizadas, organizadas em termos de calculabilidade, contabilidade eficácia, produtividade, lucratividade. (IANNI, 2007, p. 145)

A burocracia de Max Weber, calcada na racionalidade, impõe mecanismos e

aparelhos de hierarquização, regras, especialização, treinamento e controle do trabalho, e

dissemina “tecnoestruturas destinadas a diagnosticar, planejar e implementar diretrizes

gerais e decisões especiais” (IANNI, 2007, p. 153) que visam os fins, numa lógica

formalizada para os objetivos e para a padronização dos processos operacionais. (THRY-

CHERQUES, 2009; CARDOSO, 2008; IANNI, 2007)

Também em Taylor, além da racionalização do trabalho, encontramos a sugestão de

seleção, treinamento e controle dos trabalhadores, bem como um sistema de incentivos

monetários. Em Fayol, temos a proposta de racionalização da estrutura, classificando as

funções administrativas em planejar, organizar, coordenar, comandar e controlar,

enfatizando o princípio da unidade de comando, da divisão do trabalho, da especialização e

da amplitude de comando. Em Elton Mayo, as ideias que inspiraram a passagem da

administração “científica” para a administração dos recursos humanos, preconizando a ideia

14 A racionalização pode ser vista em sua concepção etimológica, no que se refere à razão, ao racional à racionalidade, no entanto, aqui nos referimos à racionalização enquanto “ração-ação”, à lógica capitalista da eficiência e da eficácia, que visa a otimização do trabalho com fins de produtividade e lucratividade, lógica esta que impregnou as organizações sociais do ocidente a partir da modernidade. Veja mais sobre este tema, em especial, no capítulo 7, A racionalização do mundo, na obra Teorias da globalização, de Octávio Ianni.

45

inicial que considera importante a participação do trabalhador nas decisões que envolvem o

trabalho. (SANDER, 1985; PAGÈS et. al., 1990; MOTTA, 2010)

No caso das teorias de Taylor, Fayol e Weber verificamos em comum a ênfase dada

à centralização do comando, ao controle efetivo e à preponderância de uma dimensão

normativa, o que, segundo Sander (2005), configura um sistema de modelo mecânico,

fechado institucionalmente em seus interesses, seus objetivos, ideias e organização oficiais.

Já em Elton Mayo, passa-se do modelo predominantemente mecânico para um modelo

orgânico, parcialmente aberto com relação às experiências, às manifestações e às

interações funcionais vivenciadas pelos sujeitos no âmbito do sistema. De cunho

sociológico, explica Sander (1985), após a II Guerra Mundial, surge o modelo de sistema

adaptativo que, como proposta de entendimento dos sistemas socioculturais, procura a

reconciliação entre os aspectos institucionais da organização, os pessoais daqueles

envolvidos pelas atividades do sistema e a sociedade, aberto, portanto, às contingências do

ambiente externo. (SANDER, 1985; PAGÈS et. al., 1990; MOTTA, 2010)

A Primeira República não foi exceção diante de tais movimentos da administração

clássica, como Fayol, Taylor e Max Weber: sob a égide do positivismo liberal, tais

movimentos influenciam os sistemas de organização e de administração da educação

brasileira, lançando uma base de administração pública impregnada pelos modelos de

gestão empresarial capitalista, modelos estes que pregaram a eficiência, a produtividade e a

tecnoburocracia como sistema organizacional racional. (SANDER, 2009; 2005)

Apesar da Constituição Republicana de 1891 propor a descentralização política e

administrativa, a República cede poder às oligarquias estaduais, de base ruralista e, na

contramão da Constituição, predomina a centralização e o caráter dualista advindo do

período imperial: a União reservou o direito de criar instituições de ensino superior e

secundário e aos estados ficou reservado ensino primário e o ensino profissional. (NARDI,

2011; SANDER, 2005)

Caracterizado, portanto, como um período onde a força política regional predomina

sobre a força de coordenação do governo federal, a Primeira República, principalmente na

década de 1920, também foi um período rico de agitações políticas e educacionais

protagonizadas por personagens como Fernando de Azevedo e Lourenço Filho, que fizeram

multiplicar os anseios de reformas educacionais e que, mais tarde, nos anos de 1930, ao

lado de Anísio Teixeira e outros, participaram do manifesto intitulado A reconstrução

46

educacional do Brasil – ao povo e ao governo15, que se perpetuou na memória educacional

do Brasil como manifesto dos pioneiros da educação nova. (FREITAS; BICCAS, 2009)

O momento dos Pioneiros da Educação é a terceira etapa a que Sander (2005) faz

alusão. O autor refere-se a esse período da história destacando a década de 1930 como

momento em que se instala no Brasil um movimento nacionalista de reação às teorias

sociais que dominavam o pensamento na Europa e nos Estados Unidos. Segundo Sander

(2005, p.98), tal momento de “progresso social e amadurecimento político” foi a conjunção

de movimentos como o da “Escola Nova”, a Semana de Arte Moderna de 1922, a criação do

Ministério da Educação pelo Presidente Getúlio Vargas, a Lei Francisco de Campos16 que

consagrou a liberdade de ensino e o Manifesto dos Pioneiros da Educação da Educação

que, até hoje, “é referência obrigatória para uma visão de educação pública comprometida

com a promoção e a defesa dos interesses nacionais” (SANDER, 2005, p.98) e de ideais

que apresentaram a democratização do ensino como antídoto ao elitismo que predominou

na educação brasileira desde o período colonial. (FREITAS; BICCAS, 2009; SANDER,

2005)

Neste sentido, notamos que descentralização e democratização não são palavras

recentes nos discursos reformistas, como observa Nardi (2011) na citação que segue.

Em 1932, o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, em um contexto de diversidade teórica e ideológica que caracterizava o grupo que esteve a sua frente, trouxe o discurso da descentralização e a defesa da unidade da educação brasileira, que, por sua vez, não deveria ser confundida com centralização, tampouco com uniformidade. (NARDI, 2011, p. 34)

Considerado por Francisco Filho (2005) como período da estruturação da educação

nacional, aprofundam-se, nesta época, os debates entre os defensores da escola pública e

os que defendiam os interesses da escola privada, bem como os debates entre os Pioneiros

da Educação e os conservadores que defendiam as práticas gerenciais do mundo dos

15 Documento disponível em http://www.pead.faced.ufrgs.br/sites/publico/eixo5/organizacao_gestao/ modulo3/

quero_ saber_mais.pdf 16 Francisco Campos foi nomeado Ministro da Educação e Saúde Pública por Getúlio Vargas, em 1930, e empreendeu a reforma universitária, criando o Estatuto da Universidade Brasileira, além disso, criou o Conselho Nacional de Educação, organizou o ensino secundário e comercial em dois ciclos (um de cinco anos e outro, pré-universitário, de dois anos) e passou a denominar o curso elementar de grupo escolar, com duração de quatro ou cinco anos, dependendo das necessidades locais, e fundou a Universidade do Rio de Janeiro. (FRANCISCO FILHO, 2006; FREITAS; BICCAS, 2009)

47

negócios aplicadas à organização e administração do ensino. (NARDI, 2011; SANDER,

2005; 2009; FRANCISCO FILHO, 2006)

Abrucio, Pedroti e Pó (2012) observam que duas exceções surgiram neste período e

serviram como modelo de administração pública a partir de 1930:

[...] foram as duas burocracias profissionais cujas características mais se aproximaram do projeto de modernização administrativa preconizado pelo Estado vanguardista. Em particular, os diplomatas, com seu modelo de meritocracia para o serviço civil, paradigma que serviu de inspiração para a criação do DASP [...] Mas não se pode esquecer que as Forças Armadas tiveram um papel essencial na pressão política por um Estado nacional mais forte e centralizador [...]. (ABRUCIO; PEDROTI; PÓ, 2012, p. 34-35)

Em um contexto de emergência industrial, o Departamento da Administração do

Serviço Público (DASP), criado pelo Decreto-lei n. 570, de 30 de julho de 1938, e inspirado

no modelo de gestão burocrático, objetivou racionalizar e dar eficiência à máquina

administrativa, a partir de três vertentes: o taylorismo-fordismo e suas técnicas que

enfatizam a organização e o controle, visando a produtividade; a concepção de Woodrow

Wilson de separação entre política e administração; e as teorias de Max Weber sobre a

administração burocrática. (NOHARA, 2012)

Abrucio, Pedroti e Pó (2012) salientam que o modelo burocrático do DASP, com

ênfase à centralização, à hierarquização, às normas e aos procedimentos, espalhou-se mais

do que a prática da meritocracia, fato que Nohara (2012, p.39) classifica de “viés

patrimonialista”, em virtude das frequentes nomeações de “cargos administrativos como

instrumento de barganha política”, o que revela a influência de política partidarista.

Nardi (2011) discute três pontos históricos ocorridos no momento dos Pioneiros da

Educação que implicam na organização e na administração do ensino: o primeiro refere-se à

Carta Constitucional de 1934, que definiu uma política nacional de educação para o Brasil

ao repartir as competências educacionais entre a União e os entes federados, criar o Plano

Nacional de Educação, fixar percentuais para aplicar impostos em educação (nunca menos

de dez por cento para a União e nunca menos de vinte por cento para os estados).

Neste sentido, podemos confirmar a concretização do ideal dos Pioneiros no que se

refere ao país ter uma política nacional para educação, além de observarmos a divisão de

encargos educacionais entre os entres federados, caracterizando uma política de

descentralização, e a preocupação de articular a educação em torno de um plano nacional.

48

O segundo ponto a que se refere Nardi (2011) é a intervenção federal e a

Constituição de 1937 que, caracteristicamente controladora, esfacelou a autonomia de

estados e municípios, e estabeleceu uma administração centralizadora que se estendeu até

1945.

O autor faz menção à minuciosa regulamentação do ensino empreendida pelo

ministro Gustavo Capanema17, em 1942: “Essa regulamentação da organização e do

funcionamento do ensino no país era a expressão clara do caráter centralizador que

assumia a política educacional brasileira”. NARDI (2011, p. 35)

Nos estudos de Nardi (2011), o terceiro ponto que destacamos para o momento dos

Pioneiros da Educação, está na promulgação da Constituição de 1946, que definiu a

educação como direito a ser garantido pelo poder público e devolveu aos estados a

atribuição de constituir seus próprios sistemas de ensino, e na promulgação da primeira Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961, Lei n. 4.024. Para o autor, a Lei n.

4.024 avançou ao eliminar o dualismo administrativo herdado do Império, mas, objetivando a

unidade entre os sistemas de ensino, tratou-se de uma descentralização relativa, “com

considerável margem de autonomia aos estados” (NARDI, 2011, p. 38) e nenhuma

autonomia para os municípios ou escolas.

Neste contexto, mesmo enfraquecido, após a queda do Estado Novo, o modelo

centralizador e controlador daspiano, apesar do autoritarismo imposto por Getúlio Vargas,

tornou-se paradigma burocrático no Brasil, se enraizou e estabeleceu-se por décadas na

administração pública.

A gestão burocrática é o modelo que traz as marcas da concepção de administração escolar predominante nas décadas de 50 e 60, no Brasil, apoiadas no modelo taylorista de administração. Essa concepção embasa-se, eminentemente, no modelo de administração, priorizando e fortalecendo a divisão de tarefas, separando o pensar e o fazer, gerando, assim, a fragmentação do saber e a separação entre o administrativo e o pedagógico no interior da escola. Essa concepção permaneceu enraizada na base da organização do nosso sistema educacional, e, adentrando na sala de aula, sendo ainda evidenciada nos espaços em que esta concepção administrativa for o modelo implementado. Ela caracteriza-se através do autoritarismo e dos mecanismos rígidos de controle do trabalho e das relações de ensino-aprendizagem, pela centralização e verticalização do poder decisório.(KRÜGER, 2013, p.13)

17 O primeiro ciclo do ensino secundário passou a se denominar curso ginasial, com duração de quatro anos, e o

segundo ciclo foi chamado de colegial, com duração de três ou quatro anos, e reformulou o ensino técnico. (FRANCISCO FILHO, 2006)

49

Como “momento da economia da educação”, Sander (2005) se refere ao período da

ditadura militar que ocorreu no cenário brasileiro a partir de 1964. Para o autor é o momento

da lógica econômica, o momento dos economistas na administração e na educação. Na

denominação deste momento da educação, o autor faz alusão aos objetivos

desenvolvimentistas dos militares, que pretendiam acelerar o processo de modernização do

capitalismo brasileiro, no viés do desenvolvimento industrial.

Os governos militares adotaram um movimento político de duplo sentido: ao mesmo tempo em que suprimiam as liberdades democráticas e instituíam instrumentos jurídicos de caráter autoritário e repressivo, levavam à prática os mecanismos de modernização do Estado nacional, no sentido de acelerar o processo de modernização do capitalismo brasileiro. (FERREIRA JUNIOR; BITTAR, 2008, p. 335)

A deposição do governo populista pelo modelo autoritário de governo dos militares,

em 1964, impôs uma nova centralização de poder de decisão por parte da União,

descaracterizando o federalismo. Em 25 de fevereiro de 1967, através do Decreto-Lei n.

200, o governo militar empreendeu a reforma da administração federal através de três

planos básicos de descentralização: descentralização da administração federal,

estabelecendo níveis de hierarquia entre direção e execução; da administração federal para

as unidades federadas, através de convênios; e da administração federal para a iniciativa

privada, através de contratos de concessão. (NARDI, 2011)

Para Nardi (2011) e para Ferreira e Bittar (2008), com o Decreto-Lei n. 200 instaurou-

se um modelo de descentralização, pautado na racionalidade, na eficiência e na eficácia,

que cumpriu função meramente instrumental no regime autoritário e centralizador dos

militares. Para Sander (2009, p. 71), de essência centralizadora, o modelo burocrático

encontra terreno propício nos governos militares: “A orientação centralizadora e

homogeneizadora de gestão técnico-racional do estado planejador assumiu características

de um modelo-máquina, prioritariamente preocupado com a economia, a produtividade e a

eficiência”.

A Constituição Federal de 1967 incorporou as medidas ditadas pelo Decreto-Lei n.

200, mas, num contexto de manifestações contrárias ao regime militar, a Emenda

Constitucional de 1969 assevera a centralização do poder e compromete a autonomia de

estados e municípios. (NARDI, 2011)

50

Ferreira Junior e Bittar (2008) assim descrevem este ato autoritário do regime militar:

No lugar dos políticos, os tecnocratas; no proscênio da política nacional, as eleições controladas e fraudadas; no âmbito do mundo do trabalho, a prevalência do arrojo salarial; na lógica do crescimento econômico, a ausência de distribuição da renda nacional; na demanda oposicionista pela volta do Estado de direito democrático, a atuação sistemática de órgãos de repressão mantidos pelas Forças Armadas; eis como a ditadura militar executou o seu modelo econômico de aceleração modernizadora e autoritária do capitalismo. Foi assim que o Estado, com grande poder de ordenação da sociedade civil, assumiu uma face ideológica fundada no princípio da racionalidade técnica como o único mecanismo político válido [...]. (FERREIRA JUNIOR; BITTAR, 2008, p. 335)

Nessa esteira, em 1968, o regime militar faz a reforma universitária, com a Lei 5.540,

de 1968, e, no mesmo sentido, se empreende a reforma do ensino primário e secundário: a

Lei 5.692, em 1971, creditando atribuições curriculares aos Conselhos Federal e Estadual

de Educação e delegando responsabilidades administrativas aos estados. Deste modo, os

estados protagonizaram o processo, através de legislação supletiva, definindo as

responsabilidades estaduais e municipais quanto ao ensino. (FERREIRA JUNIOR; BITTAR,

2008; NARDI, 2011)

Cabe ressaltar que, no âmbito educacional, as políticas defendidas pelos militares e

seu corpo tecnocrático se embasaram nos pressupostos da teoria do capital humano de

Theodore W. Schultz, que condiciona a educação à lógica do crescimento econômico. Nesta

teoria, a educação é tida como bem de consumo e que os trabalhadores não se tornam

capitalistas pela difusão da propriedade, mas sim pela aquisição de conhecimentos e

competências que podem valorizar o seu trabalho: a educação, assim, “não só alancava a

produtividade econômica como também transfigurava o trabalhador em capitalista, com

base na quantidade e na qualidade de novos conhecimentos que ele agregava à sua própria

formação [...].” (FERREIRA JUNIOR; BITTAR, 2008; p. 344)

Impunha-se, portanto, políticas voltadas à universalização da educação básica

(primária e média), além de planejar e organizar um sistema educacional que atendesse aos

interesses socioeconômicos e que estimulasse a formação técnica e tecnológica do “capital

51

humano”: a influência da Escola Nova é substituída pelo tecnicismo behaviorista18, aliás,

tanto a Lei 5.540 de 1968, com a Lei 5.692 de 1971, defenderam os princípios behavioristas.

Guardadas estas observações para os momentos de opulência capitalista, os anos

de 1970 foram marcados, economicamente, por uma forte crise do capitalismo, motivada

pelo petróleo, que se assenta internacionalmente e conduz a um processo de esgotamento

do modelo taylorista-fordista. (NARDI, 2011)

Este momento da história brasileira, com governos conduzidos por militares, guarda

uma forte ligação com movimentos internacionais de ajuda financeira, agências de

assistência técnica dos países desenvolvidos, organismos intergovenamentais de

cooperação e por organizações multilaterais de crédito, como o Fundo Monetário

Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM). (SHIROMA, 2009; SANDER, 2005)

Nardi (2011) também se refere à política de envolvimento do governo militar

brasileiro com o financiamento de capital internacional, o que gerou o aumento do

endividamento brasileiro e a dependência do Estado em relação aos acordos que

decorreram deste envolvimento:

O período militar, que consolidaria os caminhos para o capital multinacional, respondeu pela assimilação de recomendações vindas de agências internacionais e de relatórios vinculados ao governo americano e ao Ministério da Educação, como o relatório Atcon e o Relatório Meira Mattos, respectivamente. Era a incorporação de compromissos assumidos pelo Brasil na Carta de Punta del Este (1961) e no Plano Decenal de Educação da Aliança para o Progresso - principalmente os derivados de acordos entre o Ministério da Educação (MEC) e a Agência Internacional de Desenvolvimento (AID), conhecidos como Acordos MEC-USAID. (NARDI, 2011, p. 43)

O crescimento sustentado pelo endividamento externo entra em colapso nos anos

1980. No clima de decadência econômica, os liberais conservadores tecem críticas ao

modelo de Estado centralizador, responsabilizando-o pela crise. Paralelamente, os

movimentos de resistência à ditadura militar pressionam e lentamente caminham para a

18 O behaviorismo, ou comportamentalismo, surgiu no começo do século XX como uma proposta para a

Psicologia tomar como seu objetivo de estudo o comportamento em oposição às correntes dominantes de que a Psicologia deveria estudar a mente ou a consciência dos homens. A palavra behaviorismo tem origem no termo Beauvoir, que em inglês significa comportamento ou conduta. São expressões clássicas do behaviorismo nomes como John B. Watson e seus precedentes, Vladimir M. Bechterev e Ivan P. Pavlov. (MATOS, 1995)

52

reabertura democrática: eclode uma efervescência política no Brasil. (SANDER, 2009;

NARDI, 2011)

Extinto em 1986, o DASP deixou como herança uma burocracia insulada pela

doutrina tecnocrática da Ditadura Militar, que se resumia na superioridade da racionalidade

técnica sobre a política, o que isolou a burocracia de qualquer controle público. (ABRUCIO;

PEDROTI; PÓ, 2012; NOHARA, 2012)

Quanto ao insulamento da burocracia, Abrucio, Pedroti e Pó (2012) fazem a seguinte

observação:

[...] a proteção autoritária da tecnocracia não necessariamente afasta o Estado do patrimonialismo, uma vez que os interesses privados relacionam-se nessa arena com a burocracia sem o menor controle público. Isto possibilita o favorecimento de determinados setores econômicos, o tráfico de interesses e, no limite, a corrupção. (ABRUCIO; PEDROTI; PÓ, 2012, p. 51)

Apesar das iniciativas da Ditadura Militar em descentralizar a administração dos

serviços públicos, o que realmente ocorre em 1967 é a centralização política por via

constitucional, conferindo-se amplas competências à União, em relação aos Estados:

apesar do apoio do último presidente militar, João Batista de Oliveira Figueiredo, às

propostas de um plano de desburocratização, a cultura centralizadora da Administração

Pública permaneceu atrelada ao modelo hierarquizado imposto pelos militares. (ABRUCIO;

PEDROTI; PÓ, 2012)

Neste contexto, se inserem as reinvindicações de uma reforma educacional, como

explicita Sander (2009):

[...] A história da gestão da educação se insere nessa efervescência política. Na verdade, ela é parte dessa efervescência, evidenciada pela intervenção crescente da comunidade científica e da sociedade civil organizada nos movimentos de reforma educacional, de defesa da escola pública, de valorização do magistério e de gestão democrática do ensino [...]. (SANDER, 2009, p. 73)

53

No entanto, Nardi (2011, p. 44) observa que, no afã político do fim da ditadura, a

transição democrática dos anos 1980 “revelou a preservação da conciliação conservadora,

notadamente pela estratégia de alianças” entre os progressistas e os liberais.

Quanto ao período pós-ditadura militar, Sander (2005, p. 101) denomina de “o

momento da construção democrática” e o associa à atuação dos movimentos de resistência

da sociedade civil e às renovações políticas por eles protagonizadas.

Vemos, no entanto, que as motivações políticas engendram-se também, nesta

época, às motivações de cunho econômico. Os estudos de Pereira (2013), por exemplo,

apontam as críticas ao modelo centralizador e autoritário vivido pelo Estado brasileiro

durante a ditadura militar e a crise capitalista das décadas de 1970 e 1980 (recessão

econômica, baixas taxas de crescimento e altas taxas de inflação) como pontos que

reforçaram e motivaram a ideia de que o Estado precisava de uma reforma estrutural: no

discurso dos conservadores liberais, ou neoliberais, o Estado era intervencionista e

improdutivo e precisava ser reorganizado para levar a economia a um patamar de

crescimento, reduzindo sua influência e permitindo o livre funcionamento do mercado.

Segundo Orso (2007), a partir dos anos de 1970, toma corpo uma nova versão do

liberalismo, influenciada pelas ideias de Friedrich Hayek e Milton Friedman. Para o autor,

ambos se opuseram às propostas de Estado intervencionista que permearam as crenças

keynisianas e defenderam a mão invisível do livre mercado. No entanto, Hayek e Friedman

reconhecem a necessidade de mudança e reconfiguração do papel do Estado, discutindo os

poderes seus poderes, seus limites e alcance de suas intervenções de forma a garantir o

livre mercado. Tais ideias passam, assim, a partir dos anos de 1970, a compor o ideário do

liberalismo, agora sob a alcunha de neoliberalismo.

Propondo, portanto, o livre mercado, o neoliberalismo retoma a ideia do liberalismo

clássico de Estado mínimo (ou Estado do Laissez-faire, do francês, deixa fazer), e propõe, a

partir da crise econômica dos anos de 1970 e 1980, “um Estado forte, fundamental para a

defesa da propriedade e do capital” (ORSO 2007, p. 177), mas capaz de romper com as

regulamentações econômicas e trabalhistas que o caracterizava como interventor. (ORSO,

2007; GENTILI, 1999; ANDERSON, 1995)

Desta forma, fundamentado nas ideias de Keynes, Hayek e Friedman, enquanto

liberalismo revisitado, o neoliberalismo propôs um modelo de Estado que reduzisse as

tarifas alfandegárias, provendo o comércio internacional; que privatizasse as empresas

estatais, reduzindo sua influência na economia; que equalizasse suas receitas e despesas,

54

racionalizando os gastos com serviços públicos, e adotando, assim, uma disciplina fiscal

para evitar a inflação Neste sentido, o neoliberalismo é a revisão do liberalismo clássico,

como ideologia do capitalismo, que reconhece a importância de um Estado intervencionista,

mas um Estado que deve se orientar pelas necessidades econômicas, em detrimento às

demandas de políticas sociais. (ORSO, 2007; GENTILI, 1999; ANDERSON, 1995)

O neoliberalismo se mostra como revisão dos conceitos clássicos do liberalismo, não

superando tais conceitos, na verdade os sintetiza no bojo de seu ideário. Neste sentido,

Orso (2007, p. 177) destaca:

[...] se não quisermos incorrer em equívocos, não se pode chamar as atuais políticas de neoliberais, mas sim de ultraliberais, pois se trata da superação tanto do liberalismo clássico quanto do intervencionismo; trata-se da incorporação das velhas políticas da ortodoxia liberal conjugadas com a preservação do Estado. Assim, o ultraliberalismo constitui-se na síntese do liberalismo que representa as novas relações.

Concordando com Pereira (2013), Tatagiba (2013, p. 48), em sua tese, aborda tanto

o aspecto econômico quanto o político e assim se refere ao período de crise das décadas de

1970 e 1980 no Brasil:

O amplo aspecto da chamada crise do Estado brasileiro teve duas expressões: a flagrante incapacidade do Estado de continuar apresentando-se como força motriz do desenvolvimento capitalista nacional, por um lado, e as alterações no padrão de relacionamento Estado/sociedade que, naquele momento, explicitavam os limites do modelo cooptação / representação, resultado do recente adensamento da sociedade civil, por outro. A dupla face dessa crise, gestada ainda nos anos 70, se apresentaria com tal vigor durante a segunda metade dos anos 80, que as posições e contraposições assumidas pelos diferentes atores no que respeita às representações da crise e das condições da sua superação demarcariam os distintos campos ético-políticos que passariam, nas décadas seguintes, a pausar o debate não apenas no que diz respeito à reestruturação da administração pública no Brasil, mas ao ritmo e intensidade da redemocratização em curso.

Neste sentido, a autora observa a ênfase dada pelo discurso reformista neoliberal à

participação da sociedade civil nos processos de gestão dos serviços públicos. Tal

estratégia, proposta pelos organismos financeiros internacionais, como o FMI e o BM, altera

o perfil da administração pública e orienta, em consenso com os setores progressistas e

55

democráticos, as reformas estatais ocorridas no final desta década no Brasil. (TATAGIBA,

2003)

No plano educacional, o discurso reivindica a descentralização administrativa e

pedagógica, em oposição à centralização autoritária exercida durante os governos militares,

bem como a democratização dos órgãos públicos do sistema de educação. (NARDI, 2011;

SANDER, 2005; 2009)

Aprovada a Constituição de 1988, congruente ao momento, ficou evidente a

inclinação pela legitimação da democracia e da descentralização, com a participação do

povo e a ampliação da autonomia de estados e municípios. Com tal ampliação, ao invés de

criar um sistema nacional de educação, a opção foi pluralizar os sistemas, com a pretensa

articulação entre eles. (NARDI, 2011)

No entanto, Nardi (2011) e Sander (2005; 2009) observam que, após a aprovação da

Constituição de 1988, se acentuavam pressões dos grupos neoliberais por reformas

administrativas, a favor de um Estado mínimo, desregulamentado e orientado pelo modelo

gerencial.

Em sua dissertação, Silva (2011) descreve essas reformas da administração pública

brasileira, ocorridas no final da dos anos de 1990 e a implementação do modelo gerencial

no setor público. Segundo a autora, o modelo gerencial (ou gerencialismo) teve suas

primeiras experiências no serviço público em 1979, na Grã-Bretanha, durante o governo de

Margareth Thatcher, e nos Estados Unidos da América, em 1980, no governo de Ronald

Reagan.

O gerencialismo se apresenta como sistema aberto e prega a flexibilização da

gestão, mas, além da flexibilização, estão no discurso do modelo gerencialista a

horizontalização das estruturas, a descentralização/delegação de funções e autoridade, a

avaliação e o controle de resultados, a autonomia e a participação. (SILVA, 2011)

No Brasil, a partir de 1995, sob a égide de “nova gestão pública”, o Ministério da

Administração e da Reforma do Estado, capitaneado por Luiz Carlos Bresser-Pereira, passa

a promover tal discurso que, nas palavras do próprio Bresser-Pereira (2002), constitui-se

numa reforma gerencial, pois se inspira nos modelos de gestão das empresas privadas e

56

utiliza a autonomia e a accountability19 como estratégias para dar mais eficiência e qualidade

ao serviço público.

Nestes moldes, desencadeadas a reformas do Estado, novos marcos passam a

consolidar a organização e o modelo de gestão do sistema educativo, constituindo um

modelo de descentralização orientado pela racionalidade econômica, pela eficiência e pela

eficácia: um processo de descentralização que, na verdade, desconcentrou encargos

estatais. (NARDI, 2011; SHIROMA, 2009)

É neste cenário de reformas que a participação nos espaços públicos emergiu como

estratégia dos ideais democráticos de soberania popular, no discurso que prega a

autonomia como princípio e o autogoverno como meio para alcançar políticas públicas mais

eficazes, justas e eficientes em seus resultados. Contudo, Tatagiba (2003) chama a atenção

para o fato de que nem toda participação pode ser capaz de produzir e alcançar tais

resultados, mas apenas aquela participação que promova o efetivo envolvimento dos atores

afetados por tais resultados. (SILVA, 2011; TATABIBA, 2003)

Salientamos, no âmbito deste estudo, o alerta de Tatagiba (2003) para as

possibilidades daquelas reformas promovidas na década 1990 assumirem aspectos que

podem configurar tanto a emancipação, e evidenciar uma participação efetiva, quanto

manter ou reforçar características tradicionais de administração pública: se por um lado as

reformas valorizam a participação e propiciam a democratização da gestão, inserindo novos

atores no processo, por outro lado, as reformas podem significar a desresponsabilização do

Estado, que transfere responsabilidades e encargos operacionais aos atores da sociedade

civil, o que não necessariamente implica em descentralização dos aspectos financeiros e de

controle de resultados, mas sim em intensificação destes.

Entre as medidas tomadas para viabilizar tal reforma, no âmbito educacional,

segundo Pereira (2013), estão alterações no financiamento da educação e os processos de

descentralização, destacando-se a municipalização do ensino fundamental, e configurando-

se, assim, a transferência e a oferta de serviços públicos para as esferas administrativas

locais.

Em síntese, com as reformas de Estado realizadas a partir da Emenda Constitucional

n. 14 de 1996, a reforma educacional reivindicada desde o momento desenvolvimentista

19 A palavra accountability não possui uma tradução para a língua portuguesa, e seu conceito, no que concerne à administração pública, envolve duas partes: a responsabilização do governante para uso dos recursos públicos e transparência, que obriga o governante a prestar contas de sua gestão e do bom uso destes recursos. (AKUTSU; PINHO, 2002)

57

adquiriu contornos de orientações gerencialista: “Tratou-se da emergência do gerencialismo

na educação, em cujo modelo figura a descentralização pautada na racionalidade

econômica e instrumental, operada em favor da propalada modernização do Estado”.

(NARDI, 2011, p. 48). Sander (2009) também se refere a essas reformas de Estado e

também lhe atribui influência do gerencialismo empresarial:

O exame dessas reformas revela uma renovada transposição de conceitos e práticas neofayolistas e neotayloristas do gerencialismo empresarial e comercial para o setor público e para a educação, enfatizando os princípios de eficiência e produtividade, racionalização administrativa e avaliação estandardizada de desempenho, descentralização, privatização e adoção maciça da tecnologia da informação. (SANDER, 2009, p. 75)

Adaptando-se ao receituário dos organismos financeiros internacionais, o Brasil

imprime, a partir dos anos de 1990, a reforma do Estado com o discurso das políticas de

descentralização e da gestão democrática, defendendo o fim da administração pública

burocrática e o advento de uma administração pública gerencial, inspirada na governança e

na responsabilização, referindo-se, respectivamente, à gestão flexível e eficiente voltada ao

cidadão (governance) e à responsabilidade dos governantes de prestar contas dos

resultados obtidos pela administração pública (accountability). (NOHARA, 2012; PDRAE,

1995)

Segundo o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (PDRAE), de 1995, ou

Plano Bresser Pereira, com a reforma o Estado “deixa de ser o responsável direto pelo

desenvolvimento econômico e social pela via de produção de bens e serviços, para

fortalecer-se na função de promotor e regulador desse desenvolvimento”. (PDRAE, 1995,

p.12)

Tal reforma administrativa proposta pelo PDRAE foi possível a partir de 1998, com a

aprovação da Emenda Constitucional n. 19 que foi, segundo Bresser-Pereira (2008, p. 98),

“apoiada pela opinião pública, pelas elites formadoras de opinião, e em particular pela alta

burocracia que esta reforma beneficiava”. Observemos que Bresser-Pereira (2008, p. 98),

ao referir-se à alta burocracia como sendo os “altos administradores públicos existentes no

país dotados de competência técnica e espírito público”, destaca, particularmente, o apoio

da burocracia às propostas de reformas do Estado.

58

Observada essa sugestiva possibilidade de enlace entre as propostas de uma

reforma gerencial do Estado e a burocracia existente, em contradição ao discurso que

pregou o fim da administração burocrática, cabe evocarmos a tradição do modelo

burocrático que cerceia a história da administração pública brasileira e questionarmos, com

base na teoria weberiana, se os pressupostos burocráticos permanecem/permaneceram

latentes na proposta de Estado gerencial do PDRAE.

No modelo burocrático weberiano tais pressupostos caracterizam-se pelo a) caráter

legal das normas e regulamentos, b) racionalidade e divisão do trabalho, c) hierarquia das

autoridades, d) competência técnica e meritocrática, e) especialização profissional, e)

objetividade e controle dos resultados, f) padronização de rotinas e g) impessoalidade das

relações. (WEBER, 2002; NOHARA, 2012)

Neste sentido, considerando especificamente o sistema de educação brasileiro, a

Constituição de 1988, a LDB, a Emenda Constitucional n.19, as normas do Conselho

Nacional de Educação e as normas complementares dos sistemas de ensino, compõem um

corpo legal e normativo que regulamenta o sistema, caracterizando o que Weber (2002, p.

138) denomina de “princípio das áreas de jurisdição fixas e oficiais, ordenadas de acordo

com regulamentos”, considerando ainda, em tal princípio, a “distribuição” das

responsabilidades no Artigo 211 da Constituição e nos Artigos 9º 10, 11, 16, 17 e 18 da

LDB, delimitando legalmente os “deveres oficiais” de cada um dos três entes federados

(União, Estados e Municípios), tal como caracteriza Weber.

De acordo com Weber (2002, p.138), num contexto burocrático, também “Tomam-se

medidas metódicas para a realização regular e contínua desses deveres e para a execução

dos direitos correspondentes [...]”. De forma correlata, a avaliação sistêmica do rendimento

escolar, prevista no Artigo 9º – tendo em vista a educação como dever do Estado, a

avaliação de desempenho prevista no Artigo 67 – considerando a promoção como direito

profissional, teremos essas avaliações como medidas frequentes do sistema para manter

sob controle e em funcionamento as suas funções objetivas.

Para Weber (2002), os regulamentos devem prever as qualificações profissionais e

somente pessoas qualificadas podem ser empregadas. Assim, ao analisar Weber (2002) e o

que diz a LDB, que estabelece as incumbências dos docentes (Artigo 13), a exigência prévia

de qualificação profissional (Artigos 61 a 67), além de estabelecer um plano de carreira,

identificamos os traços característicos do princípio burocrático da formação profissional,

como requisito prévio para admissão do profissional e o desempenho no cargo como

59

indicador para promoção: um avanço diante da tradição patrimonialista, mas um mecanismo

de admissão meritocrático e, portanto, de essência burocrática.

A concentração político-administrativa na União, tendo uma estrutura organizada em

três níveis de poder, conforme observamos nos Artigos 29, 43, 84 87, 211 da Constituição

de 1988 e no Artigo 8º da LDB, define um sistema educacional hierárquico de níveis de

autoridade, caracterizado por Weber (2002, p.138) como “um sistema firmemente ordenado

de mando e subordinação”.

Se considerarmos a estratégia do PDRAE para a administração gerencial do Estado,

ao propor “deslocar a ênfase dos procedimentos (meios) para os resultados (fins)”, além de

“voltar-se (1) para a definição precisa dos objetivos que a administração pública deverá

atingir em sua unidade, (2) para a garantia de autonomia de administrador na gestão dos

recursos humanos, materiais e financeiros que lhe forem colocados à disposição para que

possa atingir os objetivos contratados, e (3) para o controle ou cobrança a posteriori dos

resultados.” (PDRAE, 1995, p.16), notaremos que o discurso da descentralização e redução

da hierarquia não se confirma, ao contrário, lembrando a contribuição de Weber (2002) que,

ao se referir aos meios materiais de administração, nos diz que a burocracia concentra tais

meios nas mãos da autoridade, notaremos a contradição entre o discurso de

descentralização e a proposta estratégica do PDRAE de manter a gestão financeira,

material e de recursos humanos sob a tutela da administração.

Recorrendo a Barroso (1995), que diferencia administração como esfera política e

gestão como esfera técnica, além de nos referenciarmos à escola pública e aos

pressupostos estratégicos do Estado gerencial, notaremos que tal contradição no discurso

do PDRAE se concretiza, face os interesses político-administrativos da educação e os

interesses da gestão do ensino.

A observação de Barroso (1995), que auxilia a compreendermos a subordinação da

gestão escolar à administração pública, tem amparo em Lima (2011a, p. 8) que, ao

considerar o modelo gerencialista como “a emergência de um Estado-avaliador”, caracteriza

tal modelo como “marcado pelo hibridismo e pela contradição” e cita a consagração da

autonomia da escola, atribuindo-lhe, ao mesmo tempo, ”significado instrumental e

operacional, apenas devolvendo certos encargos e responsabilidades de execução das

políticas educativas centralmente definidas em nível federal, estadual ou municipal“: dentre

vários destaques dessas políticas gerencialista, Lima (2011a) cita a centralização das

decisões sobre o currículo e a avaliação.

60

Tais considerações nos levam ao caso brasileiro e à proposta estratégica do PDRAE.

Consagrada pela Constituição de 1988 e pela LDB, a gestão democrática da escola pública,

enquanto modelo de gestão técnica dos problemas do ensino, mostra-se delimitada e

controlada pela administração estatal que concentra a concepção de objetivos e o controle

dos resultados, além de controlar os recursos materiais, financeiros e humanos, o que nos

leva a considerar como coerente à proposta estratégica do PDRAE o termo “graus de

autonomia”, expresso no Artigo 15 da LDB, e não como “autonomia”, na completude do

significado da palavra.

As reformas construídas durante os anos de 1990 pelo governo de Fernando

Henrique Cardoso, e expressas no Plano Diretor das Reformas do Aparelho do Estado

(PDRAE), estão fundadas no modelo inglês de gerencialismo, que se apoia numa

administração pública voltada ao controle e aos resultados, incorporando conceitos como a

busca contínua pela qualidade, a descentralização e a avaliação do serviço público,

procurando se mostrar como modelo flexível, em detrimento às críticas ao modelo rígido e

fechado que caracterizou a administração até então. No entanto, historicamente, o Brasil

vivenciou, na esfera pública, três modelos de administração: o patrimonialismo, a burocracia

e o gerencialismo; e que no caso brasileiro, o gerencialismo tem se configurado como um

hibridismo dos modelos anteriores. (ABRUCIO, 1997; SILVA, 2011)

Neste quadro de autonomia relativa, onde se fundem a política gerencialista e a

estrutura burocrática do Estado, a participação dos profissionais da educação na elaboração

do PPP, tal como a participação da comunidade escolar e local nos conselhos escolares,

também se consagram na LDB (Artigo 14), confirmando a participação como “palavra-

chave” no vocabulário da democratização.

No entanto, Lima (2011a, p. 11), ao analisar as reformas gerencialistas do Estado

sob o prisma da burocracia estudada por Max Weber, observa que tais reformas revelam um

quadro de mais gestão para menos democracia: chamando tal quadro de

“hiperburocratização”, o autor faz alusão à ampliação dos traços burocráticos, reforçados

pelas novas tecnologias da informação e comunicação que “emergem como uma espécie de

nova fonte de controlo centralizado”.

Os estudos de Nohara (2012) também apontam nesse sentido ao afirmar que o

PDRAE admitiu o misto burocrático-gerencial para a administração pública, baseado no

discurso da eficiência, definida pelo próprio PDRAE (1995, p. 43) como sendo “a busca de

uma relação ótima entre qualidade e custo de serviços colocados à disposição do público”.

61

O discurso do gerencialismo fundamenta um modelo de administração que tem como

princípios a descentralização de decisões e funções, as formas flexíveis de gestão, as

estruturas horizontalizadas e os incentivos à criatividade, no entanto, contraditoriamente, tal

discurso não se afasta da receita burocrática que envolve a centralização e a hierarquia:

para Nohara (2012, p. 82), os princípios gerencialistas são perseguidos pelo PDRAE via

estratégias que se concretizam pela “avaliação sistemática, recompensa pelo desempenho

e capacitação permanente, como continuísmo do modelo burocrático [...]”.

Nesse misto burocrático-gerencial, num cenário histórico de centralização, hierarquia

e subordinação, e a pretexto do paradigma da eficiência, a centralização do processo de

elaboração curricular, aliada à centralização dos processos de avaliação sistêmica dos

alunos, aos processos de avaliação de desempenho dos professores e o controle dos

recursos têm se mostrado como estratégias gerenciais e, em contradição ao discurso de

descentralização, autonomia e participação, constituem-se em mecanismos

hiperburocratizados de controle.

Para Lima (2013b), tais processos, que vêm ocorrendo a partir dos anos 1990 e que

defendem mecanismos empresariais aplicados à administração pública, se instauram a

partir da ideia de construção de uma escola eficaz, decentralizando responsabilidades e

encargos, mas dando-lhe uma autonomia meramente instrumental, tendo em vista a

utilização de estratégias de controle, como as avaliações e as prestações de contas,

prescritas nos moldes da gestão empresarial, “ora (re)centralizando certos poderes de

decisão, ora descentralizando outros compatíveis com estratégias de desregulação e de

privatização do setor público na educação [...]”. (LIMA, 2013b, p. 13) (grifos do autor)

Lima (2011a, p. 17) apresenta, ao se referir à intensificação desses processos

centralizados, consequências como “crises de identidade e a perda de referenciais

educativos e pedagógicos, por sua vez contribuindo para a desprofissionalização dos

docentes e, eventualmente, para a alienação do seu trabalho”, no entanto, invocando a

participação docente, o autor alerta que, mesmo consagrada nos textos legais, a

participação, como critério democrático, não se perpetua nos textos, mas na prática. (LIMA,

2013a; LIMA, 2011)

Neste ponto lembramos a LDB que, ao tratar das incumbências dos docentes no

Artigo 13, consagra a participação dos docentes na elaboração do PPP da escola, e nos

dirigimos a Lima (2013b, p. 102), que lembra a necessidade da participação ativa e afirma

que dificilmente os docentes terão voz e atuação efetiva se mantendo isolados e

reproduzindo as orientações burocráticas.

62

Participando, na escola e em seu contexto comunitário, na construção de uma obra própria, e não apenas na pressuposta reprodução de uma obra alheia, ou seja, coconstruindo a escola democrática, produzindo regras e estruturas de autonomia em regime de coautoria diante de políticas, interesses e objetivos de âmbito nacional ou regional. (LIMA, 2013b, p. 102) (grifos do autor)

Nesta direção, fundamentado no pressuposto da gestão democrática, o Artigo 13 da

LDB dá à escola a incumbência de elaborar o PPP com a participação dos professores, o

que nos permite afirmar, conforme Gandin e Gandin (2002) e Nogueira (2009), que a

regulamentação dada pela lei caracteriza o PPP segundo dois conceitos: enquanto

planejamento estratégico que orienta as atividades da escola, entendendo essas atividades

como sendo os instrumentos e procedimentos necessários ao desenvolvimento do ensino,

segundo o ideal de escola desejada e os objetivos por ela almejados; e enquanto

planejamento participativo que pressupõe as tomadas de decisão relativas à elaboração, à

execução e à avaliação do PPP envolvendo os vários segmentos que compõe a

comunidade escolar, tornando a proposta pedagógica da escola uma ferramenta coletiva.

Esta fundamentação dada pela LDB, segundo Gandin e Gandin (2002), ressalta algo

inédito e positivo para a educação:

[...] pela primeira vez o pensamento educacional brasileiro (ele se reflete na lei, não é criado por ela) toma o planejamento como ferramenta mais importante do que o regimento para a implementação de processos pedagógicos. De fato, a obrigação de uma “proposta pedagógica” sobrepõe-se, no texto da lei, à do regimento. (GANDIN; GANDIN, 2002)

Desta forma, o Regimento Escolar, enquanto documento que disciplina as relações

interpessoais no interior da instituição, normatizando-a e organizando-a em seus aspectos

administrativos e pedagógicos, deve ter origem nas propostas coletivas com as quais o PPP

foi elaborado e, portanto, refletir a autonomia e a participação. (GANDIN; GANDIN, 2002;

CALDIERARO, 2006)

No entanto, para Lima (2013b), os problemas da gestão democrática tornam-se mais

complexos para a escola pública, não só pela irrelevância da democratização e da

participação nas políticas, mas por estes processos representarem uma contradição às

estratégias burocrático-gerencialistas: entre o planejamento e a avaliação, que permanecem

63

sob o controle centralizado, a gestão democrática da escola tem a autonomia e a

participação relativizadas aos seus processos pedagógico-operacionais, processos estes

limitados, de um lado, a priori, pela impossibilidade de intervir nos rumos curriculares e, de

outro, a posteriori, pela imposição de avaliações massificadas.

Como afirma Pagès et. al. (1990), a concentração do poder de controle e a

distribuição de atribuições de ensino, descentralizando ou delegando, pode caracterizar a

intenção de imprimir um sistema de administração por meio de normas, onde a autonomia e

o controle contraditoriamente se reforçam.

Nessa contradição que a burocracia pode gerar, temos um sistema de normas que a

protege contra desvios arbitrários, assegurando a manutenção da coerência sistêmica e

imprimindo relações verticais de poder administrativo centralizado, por meio de mecanismos

de controle, em detrimento das relações horizontais características da gestão democrático-

participativa.

Neste sentido, analisando o caso de Marília, no Estado de São Paulo, a pesquisa de

Servilha (2008) aponta problemas que afetam a autonomia da escola, tais como as

condições inadequadas de trabalho, a formação dos professores, a organização dos

segmentos dos atores escolares, a falta de consciência política dos envolvidos, o excesso

de poderes do dirigente escolar, a burocracia e, em suas considerações finais, diz:

O discurso em defesa da democratização do acesso e do ensino de boa qualidade, da participação da comunidade local e escolar quanto à tomada de decisão permeia a legislação oficial desde o período pós-ditadura militar até nossos dias. Porém, o modelo continua centralizador, mesmo quando seus decretos, pareceres, leis dizem o contrário. A gestão continua regulamentada e ordenada de cima para baixo, atendendo ao ideário neoliberal. SERVILHA (2008. P. 129) (grifo nosso)

Quanto à burocracia, além de Servilha (2008), também as pesquisas de Furtado

(2005), Krüger (2012), Morais (2012), Silva (2011) e Oliveira (2011) fazem apontamentos

sobre a influência dos mecanismos aplicados por este modelo de administração pública que,

assimilados do meio empresarial20, cerceiam e limitam as possibilidades da gestão

democrática da escola.

20 Os modelos de administração como o taylorista e o fordista surgiram no meio empresarial para atender às

exigências da burocracia e não são excludentes, ou seja, todos os modelos privilegiam a racionalização para

64

Por sua vez, Krüger (2013), Morais (2012) e Oliveira (2011) discutem as

possibilidades dos mecanismos de regulação, controle e avaliação, característicos da

administração burocrática, conduzirem à efetivação de concepções técnicas e reguladoras

que se contrapõem à democratização das estruturas de poder.

As autoras fazem apontamentos sobre as consequências das relações

hierarquizadas que existem entre os sistemas públicos de administração e as unidades

escolares, bem como a centralização das políticas, elaboradas e impostas verticalmente

pela tradição burocrática e tecnocrática da administração pública brasileira.

O desafio que se coloca, portanto, é como construir formas mais democráticas de

gestão das escolas que, por sua vez, encontram-se situadas em sistemas de ensino que,

por meio do racionalismo gerencial, impõem às escolas modelos de funcionamento

hiperburocratizados?

Dessa forma, parecem ser necessários mais estudos que considerem essa hipótese,

da hiperburocratização das escolas brasileiras, com vistas a compreendermos melhor como

esses fenômenos têm se apresentado no interior dessas instituições:

A hiperburocratização nas organizações educativas merece ser indagada, teórica e empiricamente, perante fenômenos de alta racionalização e informatização, extensão e grande escala, controle e estandartização, compartimentação do trabalho, mensuração, gestão e tratamento de dados, precisão, normatização, conhecimento pericial e regras técnicas detalhadas. (LIMA, 2012a, p. 154).

Diante das possibilidades da burocracia da administração pública contradizerem as

práticas democráticas consagradas na legislação brasileira como gestão democrática da

escola pública, nosso trabalho procura responder tal indagação e propõe analisar a prática

da autogestão da escola. Para tanto, no próximo capítulo, fazemos uma abordagem sobre

as origens da gestão democrática na legislação educacional brasileira e consideramos a

eleição, a autonomia e a participação como princípios democráticos para o exercício da

gestão escolar.

acompanhar os sujeitos no processo de trabalho, tendo em vista a maximização do desempenho e da produtividade, sob o discurso da eficiência e da eficácia. (SILVA, 2011; KRÜGER, 2012; MORAIS, 2012)

65

CAPÍTULO 3

GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO PÚBLICO BRASILEIRO: A

PARTICIPAÇÃO E A AUTONOMIA NA TRAMA DA DESCENTRALIZAÇÃO

Qual a origem da gestão democrática do ensino público? Quais fatos, ideais e

princípios levaram a legislação brasileira a consagrar tal modelo de gestão para a escola

pública?

Apresentada pela Constituição de 1988 como modelo para a gestão do ensino

público, a gestão democrática da escola na verdade é a consagração de uma conquista

histórica e conjuntural oriunda dos “processos de abertura democrática, das lutas sindicais,

dos movimentos sociais e dos influxos neoliberais da nova mundialização da economia”

(SANDER, 2009, p.72), que marcaram a história brasileira desde os anos de 1970 até os

anos de 1990, e que refletiram os anseios da população por formas mais democráticas de

vivência em sociedade. (SANDER, 2009; ARROYO, 1986)

Os questionamentos sobre as origens da gestão democrática nos conduzem à

necessidade de discutir quais princípios permeiam e caracterizam este modelo de gestão:

como já apontamos no decorrer desta dissertação, a autonomia e a participação

compuseram o discurso reformista dos anos de 1990. Também as leituras do referencial

teórico nos levaram a considerar a autonomia e a participação da comunidade (escolar e

local) como princípios para o exercício democrático da gestão escolar, assim como a eleição

do dirigente escolar.

Assim, este capítulo destina-se a discutir conceitos relacionados à gestão

democrática e que estão presentes na legislação educacional, apresentar as origens da

democrática do ensino público na atual legislação educacional brasileira e apresentar como

princípios da gestão democrática da escola pública a eleição do dirigente escolar, a

participação da comunidade nas tomadas de decisão e a autonomia da escola para gerir

seus processos.

3.1. As origens da gestão democrática da escola

A tendência de pensar as políticas educacionais e de exercer a administração

educacional sob o viés democrático não é uma herança que surgiu da divisão de poderes

66

pelo Estado ou governo, ao contrário, é uma construção histórica ocorrida a partir da

atuação dos movimentos sociais que se dedicaram à reconstrução institucional da

democracia, desde a ruptura institucional promovida pela ditadura militar, em 1964.

(SANDER, 2005)

Movimentos políticos, protagonizados por vários segmentos da sociedade brasileira,

se opuseram ao autoritarismo da ditadura militar e levantaram as bandeiras que

reivindicaram a descentralização e a participação popular nos processos de tomada de

decisão político-administrativos. (ARROYO, 1986)

Concordando com Arroyo (1986), Shiroma (2009) destaca a incorporação destas

defesas por parte dos governos que se seguiram à ditadura militar:

Após anos de repressão, autoritarismo, censura, impossibilidade de manifestar discordância e de participar na vida política, o final do governo militar foi marcado pela intensificação dos clamores por anistia política, liberdade de expressão, democracia, descentralização e participação. [...] Muitas das proposições daquela década – bandeiras construídas e defendidas nas lutas travadas pelos movimentos sociais, associações de professores, sindicatos e educadores do campo crítico – formam incorporadas pelos governantes dos anos subsequentes. (SHIROMA, 2009, p. 179)

Bruno (2010) considera, como centro motivador dessas lutas, o fundamento

capitalista que separa, de um lado, os que produzem, mas não controlam e não se

apropriam do que produzem e, de outro lado, estão os que controlam a produção e o tempo

de trabalho alheio, além de se apropriarem da produção:

Aos primeiros é vedada a participação nas decisões relativas ao desenvolvimento das atividades produtivas nos locais de trabalho e, por conseguinte, lhes é também vedada a participação nas decisões que incidem sobre as demais esferas da realidade. Aos segundos, o direito de governar, no sentido amplo, nos locais de trabalho; gerir, comandar, organizar, legislar, interditar e punir seus subordinados [...] (BRUNO, 2010, p.20)

Neste contexto de reinvindicações por democracia, Martins (2002) destaca a pauta

defendida pelos setores progressistas e de esquerda, que consistia na distribuição do poder,

67

descentralização e autonomia de decisão local e Bruno (2010) destaca as lutas dos

trabalhadores da educação, da década de 1970 até meados dos anos de 1980, pela

eliminação da divisão entre gestão do trabalho e realização do trabalho, e a consequente

assimilação da gestão democrática por parte da Constituição de 1988, em seu Artigo 206,

Inciso VI.

Deste ponto de vista, a gestão democrática da escola pública mostra-se, portanto,

como a consagração de um direito reclamado e conquistado pelos que se puseram a favor

da democratização e que protagonizaram a resistência ao modelo burocrático, centralizador

e de gestão tecnocrática dos governos militares. (SANDER, 2009; LIMA, 2013a)

Shiroma (2009) analisa documentos internacionais derivados da Conferência Mundial

de Educação para Todos, bem como documentos dos anos de 1990 do Banco Mundial, do

Banco Interamericano de Desenvolvimento e do Programa de Reforma Educacional da

América Latina, que recomendaram as reformas educacionais na América Latina, e afirma

que tais documentos compuseram um discurso globalizado sobre educação que,

aparentemente, levava os representantes do capital e do trabalho para os mesmos fins,

apesar dos projetos de sociedade serem antagônicos entre eles.

É neste contexto que o discurso neoliberal, como abordado no capítulo anterior, se

apropriou de temas políticos erguidos contra a ditadura militar, como a descentralização, a

autonomia e a participação, e as transformou em slogans nas reformas dos anos de 1990.

Incorporados pelos discursos neoliberais, estes temas enfatizaram-se como vetores

capazes de otimizar os gastos, aumentando a eficiência21 dos serviços públicos. (SHIROMA,

2009, PEREIRA, 2013; TATAGIBA, 2003)

Resultante do confronto entre o paradigma de administração burocrática e o

paradigma de administração como processo democrático, a consagração da gestão

democrática do ensino público pela Constituição de 1988 traduz-se como superação do

modelo de administração tecnocrática pelo paradigma de administração democrática da

educação, ou a superação da tecnocracia pelo processo político. (SANDER, 2009;

ARROYO, 1983; BRUNO, 2002; CURY, 1985)

Nesta perspectiva, a Constituição de 1988, em seu Artigo 206, Inciso VI, estabeleceu

a gestão democrática como um dos princípios para o oferecimento do ensino público no

Brasil, apesar dessa consagração caracterizar um avanço, uma vez se tratar de algo inédito

21 Entendemos aqui a palavra eficiência como composto da lógica capitalista de racionalização.

68

nos textos constitucionais, a Carta Magna delega a regulamentação desse princípio à LDB,

com a redação “na forma da Lei”.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: [...] VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei; [...] (BRASIL, 1988)

Para Bruno (2010), no entanto, tal consagração da gestão democrática na

Constituição de 1988 não representou a concretização das lutas pela democratização da

organização da educação no Brasil, mas teve contornos mais substanciais, uma vez que ela

não se aprofundou e adiou a regulamentação do tema até a promulgação da LDB.

No anseio desta regulamentação, a LDB, em seus Artigos 3º e 14, confirmou a

gestão democrática como princípio para o ensino público, no entanto, eximindo-se também,

tal como a Constituição de 1988, da efetivação de uma regulamentação nacional, e delegou

aos sistemas de ensino a normatização complementar de tal questão. (MURANAKA;

MINTO, 2002)

Art. 3º. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:[...] VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino; [...] Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. (BRASIL, 1996)

Apesar dos apontamentos dos Incisos I e II do Artigo 14 da LDB, que orientam para a

participação dos profissionais da educação na elaboração do PPP da escola e para a

participação das comunidades escolar e local nos conselhos escolares ou equivalentes, ao

verificarmos o Inciso VIII do Artigo 3º e o regime federado brasileiro, não perdendo de vista a

quantidade de Estados e Municípios22 existentes no Brasil, devemos considerar um cenário

com mais de cinco mil e quinhentos sistemas de ensino e a mesma proporção de

22 Segundo dados de 2013 do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), o Brasil tem, em seu regime

federado, 5.570 municípios, distribuídos em 26 Estados, além do Distrito Federal.

69

possibilidades de legislação complementar e de identidades que a gestão democrática pode

vir a ter.

Neste quadro de possibilidades para se tratar a gestão democrática, Bruno (2010)

destaca que a concepção sobre a gestão democrática pode revelar uma multiplicidade de

práticas que se reconheçam nessa concepção, podendo até mesmo serem antagônicas e,

referindo-se aos termos “público”, “privado” e “res publica” 23, a autora ainda ressalta o uso

de termos específicos que não são devidamente explicados, o que induz às várias

possibilidades, interpretação e regulamentação:

Para agravar a confusão, observou-se um procedimento bastante recorrente na literatura sobre o tema, especialmente após a aprovação da LDB e que consiste em utilizar temos oriundos de sociedades completamente distintas desta em que vivemos, sem nenhuma preocupação de especificar para o leitor os diferentes significados desses termos nos vários contextos históricos em que aparecem. (BRUNO, 2010, p. 21)

Assim como os termos público, privado e república (res publica), termos como

gestão, administração, autonomia, participação, colegiado, comunidade escolar e

comunidade local aparecem na legislação, no entanto, não são termos significativamente

esclarecidos de forma a articular as práticas cotidianas da escola com as possíveis

concepções presentes nas regulamentações.

Ao analisar a gestão, a autonomia escolar e os órgãos colegiados nos Anais das

Reuniões Anuais da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação (ANPED) de 2000

a 2008, e nos anais do Simpósio Brasileiro de Política e Administração da Educação da

Associação Nacional de Política e Administração da Educação (ANPAE) de 2001, 2005 e

2007, Souza (2010) observa a escassez de investigações relacionadas à gestão

democrática, especificamente dirigindo-se à temática da autonomia e da participação:

[...] ausência de trabalhos que abordem, por exemplo, concepções presentes nas políticas públicas de educação, sobretudo nas esferas estadual e municipal, ou que problematizem o conceito de formação do gestor/administrador nos paradigmas educacionais que orientem as ações governamentais neste campo, bem como que tratem conceitualmente a

23 O termo “res publica”, de origem latina, traduz-se literalmente como “coisa pública” e refere-se a tudo que não

pode ser propriedade particular, sendo assim qualquer coisa mantida e compartilhada por uma coletividade de sujeitos.

70

gestão/administração educacional, temas ainda caros para essa área, entre outros. (SOUZA, 2010, p. 456)

Entre as possibilidades nessa diversidade, apontamos a normatização para

provimento do cargo ou função de dirigente escolar.

3.2. A eleição como princípio da gestão democrática

Segundo Paro (2003b), mesmo plausíveis de variações, podem ser caracterizadas

três modalidades básicas para a escolha do dirigente escolar: a nomeação por autoridade

governamental, o concurso de títulos e provas e a eleição.

Paro (2003b) salienta que a nomeação do diretor, por agente político ou burocrático,

não se manifesta de forma homogênea e, segundo Dourado (2013), ao dispensar a

participação da comunidade escolar, a livre nomeação do dirigente escolar por parte da

autoridade governamental caracteriza-se como prática autoritária e clientelista, o que nos

leva a considerar tal instrumento como ação contrária e incoerente ao princípio de

participação, no que se refere à gestão democrática da escola pública. (DOURADO, 2013;

LIMA, 2013a; PARO, 2003b)

Neste sentido, a livre nomeação do dirigente escolar por parte da autoridade

governamental, configura o que Lima (2013a) considera como ruptura preocupante, dada a

não participação direta da comunidade escolar na escolha de seu dirigente e a possível

apatia de seus atores, observado o comprometimento original desse dirigente com a

autoridade que o nomeou, o que compromete a legitimação da participação, pois prescinde

do respaldo da comunidade. (LIMA, 2013a; PARO, 2003b)

Quanto à escolha do dirigente escolar por concurso público, Dourado (2013) faz

alusão à defesa do concurso público calcada na argumentação de que tal modalidade de

escolha imputa “objetividade na escolha de méritos intelectuais” (DOURADO, 2013, p. 103),

mas tanto Dourado (2013), como Lima (2013a) e Paro (2003a) entendem que a gestão

escolar não se resume aos aspectos técnicos, configurando-se também como ato político, o

que nos leva a considerar a possibilidade de que, numa gestão que prioriza os méritos

intelectuais para escolha do dirigente, a dimensão técnica fique reduzida às atividades

burocráticas, relegando-se ao segundo plano o processo político-pedagógico, como

podemos observar na seguinte citação de Dourado (2013, p. 103-104): “Assim, acreditamos

que embora o concurso de provas, ou de provas e títulos, deva ser o ponto de partida para o

71

ingresso do educador no sistema de ensino, não se apresenta, no entanto, como forma mais

apropriada para a escolha de dirigentes escolares.”

Apesar desta consideração do autor, cabe observar que a escolha do dirigente

escolar por meio de concurso recebe amparo legal, como se constata no Inciso I do Artigo

67 da LDB:

Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público: I - ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos; (BRASIL, 1996)

Por outro lado, ao considerar a eleição como instrumento da democracia, Dourado

(2013) e Paro (2003b) defendem esta forma de escolha do dirigente escolar, tendo em vista

a relevância política da eleição direta no processo de democratização das instituições

escolares públicas, principalmente no que se refere às tomadas de decisão no contexto das

relações escolares. (DOURADO, 2013; PARO, 2003a)

Em suas pesquisas, Dourado (2013, p. 104) constatou a eleição direta como forma

usual para provimento ao cargo de dirigente escolar, mas observou que o processo de

escolha por meio de eleições apresenta-se de formas variadas, “indo desde a delimitação do

colégio eleitoral [...] até a definição operacional para o andamento e transparência do

processo [...]” ou indicação por meio de listas, caso este em que a comunidade participa no

início do processo, mas acaba por perder ou limitar a participação, uma vez que a

nomeação do diretor cabe ao dirigente governamental, ou ao seu representante.

A pesquisa desenvolvida em 2010 pelo Centro de Desenvolvimento Humano

Aplicado (Cedhap), que teve por objetivo mapear as práticas de seleção e capacitação de

diretores escolares adotadas pelos sistemas estaduais e das capitais, apontou que 67%

(sessenta e seis por cento) dos sistemas estaduais de ensino e 82% (oitenta e dois por

cento) dos sistemas das capitais adotavam a eleição como modalidade de seleção para

provimento ao cargo de dirigente escolar. No entanto, como mostra o Gráfico 1, a pesquisa

mostra que a indicação por instâncias locais, o concurso, a certificação, provas e entrevistas

ainda são modalidades utilizadas, podendo, inclusive, estarem combinadas como prática

dentro de um único sistema de ensino. (LÜCK, 2011)

72

Gráfico 1 – Modalidades para provimento ao cargo de dirigente escolar

Fonte: Lück (2011, p. 187)

No entanto, observamos que a eleição não é fator que garante o exercício de uma

gestão realmente democrática. Apesar dos dados de Lück (2011) mostrarem que há uma

tendência de adotar a eleição como modalidade de provimento do dirigente escolar, por si

só a eleição não assegura o exercício da gestão democrática. Neste sentido, outra

observação de Dourado (2013) diz respeito ao erro de incorrer à eleição do dirigente como

“ação terminal”, pois tanto a forma de escolha quanto o exercício da função devem ser

observados, e afirma que a eleição é somente um dos elementos a ser associado à “luta

pela democratização possível das relações escolares” (DOURADO, 2013, p. 105). Assim, o

autor considera relevante para a democratização da escola a modalidade de escolha, mas

também o exercício da função:

A nosso ver, é fundamental ampliarmos os horizontes da democratização da gestão, enfatizando, conjuntamente, a forma de escolha e o exercício da função, de modo a não incorrermos nos riscos de uma pretensa neutralidade frente à modalidade de escolhas – normalmente autocráticas. (DOURADO, 2013, p. 105)

Assim, verificamos que tanto Paro (2003a) como Dourado (2013) consideram

importante a forma com que o dirigente é escolhido, tanto no aspecto político como no

aspecto técnico, pois “a forma de provimento no cargo pode não definir o tipo de gestão,

mas, certamente, interfere no curso desta”. (DOURADO, 2013, p. 105)

73

Tal consideração vai de encontro à análise de Romão e Padilha (2013), no que se

refere às virtudes técnicas necessárias ao desempenho do cargo de dirigente escolar e ao

seu papel de liderança frente à comunidade, considerando que, no caso de dirigente

concursado, o processo é antidemocrático, uma vez que a comunidade não participa da

escolha; já na via por escolha eleitoral, há o desenvolvimento do diálogo, o favorecimento da

distribuição do poder e o exercício da autonomia, que podem acentuar não só a

competência técnico-pedagógica necessária ao dirigente escolar, mas também o papel

político de sua liderança. (ROMÃO; PADILHA, 2013; HORA, 2004).

Neste mesmo sentido, Sander (2005) alinhava a questão da elegibilidade e a

participação como critérios para o exercício da gestão democrática:

O significado das habilidades pedagógicas no cotidiano da escola está na relevância política e cultural da gestão, que abarca a totalidade das relações que ocorrem no interior das instituições de ensino e entre estas e a sociedade [...] Como a gestão da educação constitui uma função pública, a formação e a eleição de seus atores sugerem participação pública, vale dizer, sugerem participação democrática, mediante um efetivo funcionamento, com poderes de decisão, de colegiados, conselhos escolares e comunitários. (SANDER, 2005, p. 127)

Neste viés, o conselho da escola representa e viabiliza a participação da comunidade

na gestão da escola. Concebido como órgão colegiado, o conselho da escola, enquanto

espaço de discussão e negociação, torna-se a instância decisória da escola. Os

conselheiros, representantes eleitos entre os vários segmentos da comunidade escolar e

local, devem agir coletivamente no sentido de discutir, acompanhar e deliberar sobre as

demandas que se fazem necessárias na escola, inclusive sobre as questões administrativas,

pedagógicas e financeiras. (BASTOS, 2012)

Ao analisar a eleição de diretores escolares em Minas Gerais, Souza (2011) observa

que a não participação de todos os segmentos compromete a gestão democrática da escola

e o processo de democratização do espaço público. A autora aponta, em sua pesquisa, que

a escola tem se mostrado com dificuldades para promover a participação e a construção

coletiva da gestão, dada a situação dos pais que trabalham e não podem comparecer às

reuniões nos horários estipulados, dada a estrutura de funcionamento da própria escola, que

não favorece a flexibilidade de horários, e dado o regime de trabalho dos professores que,

por vezes precarizados e com jornada de trabalho ampliada, muitas vezes trabalhando em

74

mais de uma escola, não dispõem de tempo e não podem se dedicar integralmente à

participação na gestão escolar. (SOUZA, 2011; PARO 2001)

Neste sentido, Barbosa (2011), partindo da expansão e da universalização da escola

pública e das reformas educacionais que ocorreram a partir dos anos de 1990, considera

que o trabalho docente tem assumido tarefas que extrapolam as atividades institucionais,

caracterizando-se por um tempo de trabalho em sala de aula e outro tempo de trabalho

extraclasse.

Carina (2003) também aponta problemas que dificultam a gestão escolar

democrática: a autora aborda sobre a necessidade de formação continuada dos

professores, além da falta de participação dos pais, já apontada por Souza (2011), e Furtado

(2005), ao dissertar sobre as políticas educacionais e a gestão democrática na escola,

indica que o conceito de compartilhamento de decisões, ou a divisão de poderes, ainda não

é uma prática, dada a compreensão da comunidade, que entende que a autoridade escolar

é exercida e está centralizada na figura do diretor, consideração compreensível se

considerarmos que o papel do diretor é conferido, tradicionalmente, pela política pública e

que a autoridade do diretor está subordinada à formalidade do sistema educacional.

Paro (2001) observa que não existe nenhum mecanismo legal que permita e viabilize

a participação dos pais na escola pública, de forma a isentá-los de horas de trabalho em

benefício da educação dos filhos. O autor aborda sobre as dificuldades que a comunidade e

as famílias enfrentam para participar da vida escolar das crianças e nos diz que a presença

dos pais no cotidiano da escola e a participação deles na gestão democrática estão

limitadas por fatores condicionantes externos à escola, como:

1) condicionantes econômico-sociais, ou as reais condições de vida da população e a medida em que tais condições proporcionam tempo, condições materiais e disposição pessoal para participar; 2) condicionantes culturais, ou a visão das pessoas sobre a viabilidade e a possibilidade da participação, movidas por uma visão de mundo e de educação escolar que lhes favoreça a vontade de participar; 3) condicionantes institucionais, ou mecanismos coletivos, institucionalizados ou não, presentes em seu ambiente social mais próximo, dos quais a população pode dispor para encaminhar sua ação participativa. (PARO, 2001, p. 54)

Além dos problemas que envolvem a participação de professores e pais, Furtado

(2005) considera que a comunidade não utiliza o espaço democrático da escola para

participar efetivamente devido à estrutura rígida e hierárquica em que se funda a escola, ao

75

receio do diretor em perder o seu poder e a falta de interesse da própria comunidade em

participar.

Apesar das dificuldades que as escolas enfrentam com relação à participação efetiva

de professores e pais, tanto Souza (2012), como Pereira (2012), tendo este desenvolvido

sua pesquisa no Estado do Pará, dizem que a eleição, tanto para os representantes do

conselho da escola quanto para o dirigente escolar, é o fio condutor da participação, uma

vez que fortalece a gestão democrática e possibilita e conduz os indivíduos envolvidos a

incorporar as práticas de decisão em grupo, além de desenvolver a consciência crítica.

Da mesma forma, Bastos (2012) entende que o conselho da escola proporciona o

exercício democrático e sua efetivação pode evitar a dominação por parte de uma pessoa,

superando a monocracia24 como forma de dirigir a unidade escolar e enfatizando a

participação dos atores dos diversos segmentos que se fazem presentes na escola, o que,

para Villela (1997) também pode ser instrumento de acompanhamento das atividades

pedagógicas e propiciar maior poder decisório aos trabalhadores da escola.

Esta observação nos leva a considerar o conselho da escola como garantia

institucional-legal das deliberações colegiadas, o que implica na participação e na

responsabilização coletiva de professores, funcionários, direção, pais, alunos e

representantes da comunidade local.

O colegiado pode ser entendido, ao mesmo tempo, como canal e instrumento de participação dos vários segmentos da escola. Ele se caracteriza pela igual distribuição de entre seus vários membros, independente de posições hierárquicas que eles tenham na comunidade escolar. Nos colegiados, todos os integrantes possuem os mesmos direitos e deveres nos processos decisórios, pois cada um deles tem igualdade de direito de participação. (BASTOS, 2012, p. 75-76)

Partindo do princípio de que a participação colegiada e a democracia são conceitos

indissociáveis, Servilha (2008), ao dissertar sobre a autonomia e a gestão democrática das

unidades de educação básica de Marília, no Estado de São Paulo, salienta que a

participação é uma diretriz no discurso oficial e acarreta a responsabilização de professores,

funcionários, direção, pais e alunos nas decisões tomadas na escola, e para Pereira (2008,

47), trata-se da “conquista de canais de participação da população nos assuntos que dizem

24 Termo para designar um sistema de governo onde uma só pessoa detém todos os poderes. (BASTOS, 2004)

76

respeito à coisa pública” e que colocou os sujeitos em novas arenas e no interior dos órgãos

públicos, o que oferece maiores possibilidades de negociação com os governos

constituídos.

Assim, considerando que, por si só, a eleição do dirigente escolar e a existência de um

conselho da escola não garantem o exercício de uma gestão democrática, passamos a

discutir sobre a participação, que Lima (2013a, p. 76) considera como “palavra-chave

onipresente nos discursos político, normativo e pedagógico”.

3.3. A participação

Transitando da reinvindicação pelos processos sociais de abertura política, à

consagração pela Constituição de 1988, reafirmada como direito pela LDB, a participação

organizada na escola exige formalmente a existência de uma estrutura e de órgãos abertos

como locus para a atuação dos professores, dos alunos e da comunidade, embasando,

assim, a participação como valor consubstanciado à ideia de gestão democrática: “Participar

é um direito reclamado e conquistado por meio da afirmação de certos valores

(democráticos) e da negação de outros que estiveram na base de uma situação de não

participação forçada, ou imposta”. (LIMA, 2013a, p. 77)

As pesquisas de Tatagiba (2003), Ribeiro (2006), Souza (2011), Pereira (2012) e

Wrege (2012) salientam a importância do exercício de cidadania propiciado pela

participação da família no conselho da escola, bem como pela participação dos demais

segmentos de atores envolvidos pelas atividades da escola.

As autoras observam que a gestão escolar democrática deve valorizar processos

coletivos de participação, principalmente nas tomadas de decisões que envolvam o PPP, o

planejamento dos cursos e disciplinas, o elenco disciplinar e os conteúdos, além das

deliberações que tangem as atividades de professores e alunos, os recursos humanos,

materiais e financeiros e os procedimentos de avaliação.

Focando-se no princípio participativo, para Tatagiba (2003), o modelo democrático

de gestão fundamenta-se no diálogo e requer condições normativas que promovam a

participação, que considerem a igualdade entre os sujeitos como pré-requisito para as

deliberações coletivas, que respeitem as diversidades e as diferenças e que estimulem a

cooperação. Para tanto, a autora aponta a transparência e a publicidade de decisões e

informações como princípios que devem nortear as normas institucionais que se regem pelo

modelo participativo e democrático.

77

No caso brasileiro, dada a omissão dos dispositivos legais e a delegação de

regulamentação da questão da participação aos sistemas municipais e estaduais, devemos

considerar as possibilidades de diversas regulamentações, específicas e consequentes de

cada sistema, como já apontado aqui.

Lima (2013a) aborda as possibilidades de participação praticada e as classifica

segundo quatro aspectos: a democraticidade, a regulamentação, o envolvimento e a não

participação.

Quanto à democraticidade, Lima (2013a) refere-se à possibilidade dos atores

intervirem nos processos de tomadas de decisão diretamente (participação direta) ou

através de participação mediatizada por representantes (participação indireta).

O autor esclarece que tradicionalmente a participação direta nas tomadas de decisão

é realizada sem a intermediação de representantes, através do voto direto em assembleias

gerais e deliberativas. O autor observa que “existe uma tendência para consagrar a

participação direta em níveis intermédios e operacionais e, por vezes, em áreas de

intervenção pretensamente técnicas ou do domínio da execução, dotadas de certa

autonomia.” (LIMA, 2013a, p. 81)

Desta observação podemos considerar a participação direta somente em tomadas de

decisão no âmbito da escola, enquanto locus de execução dos procedimentos pedagógicos,

uma vez que a participação na definição das políticas que organizam a escola assume

caráter representativo.

Já com relação à participação indireta, Lima (2013a) considera as tomadas de

decisão feitas a partir da intermediação de membros representantes que são designados por

meio de eleições. Segundo o autor, as eleições dos representantes podem ocorrer segundo

diferentes critérios: eleição direta por todos da organização, eleição segmentada por

categorias e departamentos, eleição individual ou por listas, etc.

Quanto à regulamentação, Lima (2013a) especifica três maneiras: a) como

participação formal, quando se reproduz a participação decretada pelas regulamentações,

caracterizando-se um caráter normativo, o que implica em um corpo de regras formais e

legais que impõe, orienta e limita a participação; b) a participação não formal, caracterizada

por um bojo de regras com menor grau de estruturação e, geralmente, produzido pelos

atores no âmbito da própria organização e em articulação com os dispositivos legais: neste

caso, o autor considera que a regulamentação não formal representa um grau de

desenvolvimento operacional, uma vez que implica na participação formalmente

78

considerada; e c) a participação informal como sendo aquela realizada por meio de regras

informais e não estruturadas formalmente, mas produzida na própria organização e

partilhadas em pequenos grupos: neste caso, o autor considera que, mesmo fazendo

apontamentos à formalidade ou a não formalidade, na participação informal os atores

“elegem objetivos e interesses específicos, não definidos formalmente, orientam-se, em

certos casos, por oposição a certas regras estabelecidas, ou em complementaridade a

essas regras [...]”. (LIMA, 2013a, p.84)

Para Lima (2013a), uma vez conquistada como princípio, consagrada como direito,

regulamentada por regras formais, não formais ou informais, a participação deve ser

entendida como prática almejada, institucionalmente fundamentada e como instrumento de

realização da democracia (“democraticidade”), neste sentido, deve garantir “a expressão de

diferentes interesses e projetos com circulação na organização e sua concorrência

democrática em termos de influência no processo de tomada de decisões”. (LIMA, 2013a, p.

80).

Quanto ao envolvimento que pode decorrer da participação, Lima (2013a) discrimina

os seguintes tipos de participação: a) participação ativa, com elevado grau de envolvimento,

conhecimento de direitos e deveres, atenção e vigilância aos aspectos de autonomia e

capacidade de influenciar nas tomadas de decisão; b) participação reservada, como sendo a

participação no intermédio entre a atividade e a passividade, a participação reservada se

assemelha à participação de expectador, que não se envolve, mas está aguardando, pronta

a tomar uma posição para proteger ou garantir um interesse; e c) participação passiva,

caracterizada pela falta de interesse, alheia e alienada de certas responsabilidades, se

mostra apática até mesmo diante de possibilidades formais: a participação passiva pode

mostrar-se como estratégia de não envolvimento ou de um envolvimento insignificante.

Referindo-se à participação passiva, Lima (2013a, p. 86) completa:

Não sendo indiferentes aos cursos da ação e ao tipo de políticas e de decisões tomadas, os atores parecem descrer das possibilidades de influenciar as decisões ou recusam o preço que para tal poderiam ser forçados a pagar, preferindo remeter o papel de luta para certas minorias ativistas, para uma vanguarda que ora valorizam e admiram, ora desvalorizam e criticam.

79

Quanto à orientação da participação, Lima (2013a) considera os objetivos

estruturados e desenvolvidos pela organização, e associa a participação de acordo tais

objetivos, classificando a participação convergente e a participação divergente: convergente,

quando os atores pautam suas ações para realizar os objetivos formais aceitos

consensualmente, mesmo que sejam objetivos oficiais; ou divergente, quando contestam, se

opõem e procuram substituir tais objetivos por outros.

A Figura 2, a seguir, ilustra os tipos de participação praticada abordados por Lima

(2013b).

Figura 2 – Tipos de participação praticada

Direta Democraticidade Indireta

Formal Regulamentação Não formal Informal

Participação praticada Ativa Envolvimento Reservada Passiva

Orientação Convergente Divergente

Fonte: Lima (2013b, p.89)

O autor considera que a participação convergente pode assumir formas de grande

empenho e militância e, consequentemente, “ceder lugar à ritualização e ao formalismo,

operando como obstáculo à inovação e à mudança.” (LIMA, 2013a, p. 87), já a participação

divergente pode ser interpretada como boicote ou forma de contestação, embora vise uma

intervenção a favor da renovação, do desenvolvimento e da mudança.

Da mesma forma que aborda a participação, Lima (2013a) refere-se também a não

participação, como vemos na Figura 3, classificando-a de duas maneiras: (a) quanto a não

participação no plano das orientações – ou não participação consagrada nos textos

jurídicos, admitida como omissão, ou a não referência à participação de certos atores, ou

mesmo consagrar e não regulamentar a participação podem ser fatores que afastam os

atores dos processos de democraticidade e, por consequência, dos processos de

80

envolvimento e compromisso com os objetivos institucionais; a não participação decretada,

ou seja, mesmo que consagrada, se a participação não for regulamentada, pode-se

caracterizar a participação limitada a alguns atores, assinalando exceções, ou mesmo não

ser permitida em âmbito genérico; (b) quanto a não participação no plano organizacional,

Lima (2013a) considera a não participação imposta ou forçada, a não participação induzida

e a não participação voluntária.

“[...] a não participação praticada pode teoricamente ser imposta ou forçada, tomando como referência predominante orientações externas e/ou internas; pode ser uma não participação induzida, numa situação organizacional em que, mesmo que a participação esteja decretada, os arranjos organizacionais concretos, as práticas participativas previstas, as condições, os recursos e as possibilidades reais de participação podem conduzir a situações objetivas e subjetivas convidativas e facilitadoras da não participação; ou pode, ainda, ser atualizada predominantemente na base de orientações meramente individuais ou de opções estratégicas de grupos e subgrupos, sem que se descortinem elementos concretos de imposição ou de indução da não participação, a que chamarei não participação voluntária. (LIMA, 2013a, p. 98)

Figura 3 – Tipos de participação praticada

Imposta ou forçada

Não participação praticada Induzida

Voluntária

Fonte: Lima (2013b, p.89)

Considerando a consagração da participação dos professores e das comunidades

escolar e local como princípios da gestão escolar democrática na Constituição de 1988 e na

LDB, tendo em vista a diversidade de características que a participação pode assumir no

contexto normatizado por cada sistema, estadual ou municipal, e o quadro teórico sugerido

por Lima (2013a), teremos a seguinte tipologia possível para a participação praticada e para

a não participação na organização escolar: quanto à democraticidade, a participação nos

processos de tomada de decisão pode ser direta ou indireta; quanto à regulamentação, a

participação pode ser formal, não formal ou informal; quanto ao envolvimento, a participação

pode ser ativa, reservada ou passiva; e quanto à orientação aos objetivos, a participação

pode ser convergente ou divergente.

81

Certamente, podemos considerar que a participação dos professores e dos demais

profissionais da escola está consolidada formalmente pela LDB, em seu Artigo 14, Inciso I,

que regulamenta a elaboração do PPP, no entanto, observamos que a gestão democrática

não se limita na elaboração de tal projeto, e implica em todos os procedimentos

operacionais da escola para pôr em prática, inclusive, os procedimentos que visam atender

os objetivos que ele instituiu.

Da mesma forma, no Inciso II, que regulamenta a participação das comunidades

escolar e local nos conselhos escolares ou equivalentes, a Lei não concebe e não distingue

os termos comunidade, comunidade escolar e comunidade local, nem designa quais atores

pertencem às comunidades escolar e local, o que sugere que os sistemas estaduais e

municipais normatizem tal questão e estabeleçam os critérios de participação.

A importância do tema, como se vê, sugere diversas direções de investigação. A legislação, em nenhum momento define o que considera como comunidade, deixando um vácuo do ponto de vista da concretização, na periferia do sistema de ensino, daquilo que é planejado no seu centro, mas que acaba permitindo a opção por um conceito que melhor representa as concepções educativas de cada grupo. (HORA, 2004, p. 69)

Paro (2013) refere-se à comunidade escolar como sendo os professores e demais

profissionais da escola, alunos e pais dos alunos, e à comunidade local como sendo a

população circunvizinha à escola; já Ciseski e Romão (2012) referem-se à comunidade

interna, especificando como atores internos os pais de alunos, os alunos, o diretor, os

professores, o pessoal administrativo e o pessoal operacional, e à comunidade externa,

nesse caso, não especificando ou segmentando tais atores externos.

Por sua vez, Hora (2004) defende que a concepção de comunidade local (ou

externa) pode ultrapassar o critério de área territorial fixa, de onde vêm os alunos e onde a

escola está inserida para prestar seus serviços, combinando o critério da territorialidade às

implicações de afinidade que derivam dos resultados de contatos sociais mantidos na e pela

escola.

Neste sentido, é relevante, para a participação da comunidade local, considerar não

somente os contatos sociais mantidos subjetivamente, mas também os contatos externos à

escola que derivam de atividades técnicas, pedagógicas e administrativas que podem

extrapolar o critério raso de territorialidade, como exemplos: os relacionamentos imediatos

82

da escola com os prestadores de serviço, com os provedores de suprimentos, com os

órgãos oficiais do sistema educacional, com as entidades de assistência educacional, com

as instituições que garantem os direitos das crianças e adolescentes, com organizações não

governamentais, fundações, etc.

Hora (2004), considera que o Artigo 14 da LDB co-responsabiliza a comunidade,

invoca a sua participação na gestão escolar e congrega tal participação no conselho da

escola (ou equivalente), no entanto, a ausência de formalidade quanto à concepção de

comunidade pode trazer como consequência a não definição de papéis e critérios de

participação relevantes à gestão democrática, o que implica na possibilidade de

regulamentação não formal ou informal que estabeleça a composição do conselho da

escola, os critérios de participação nos processos de tomada de decisão e na formação de

um colégio eleitoral. (HORA, 2004; LIMA, 2013a)

Para Araujo (2007), os Conselhos de Educação25, instituídos como organismos

normativos e supervisores das políticas educacionais, tanto na esfera nacional como nas

esferas estadual e municipal, passam a compor a estrutura da gestão educacional numa

perspectiva democrática, tal como o conselho escola e o processo de eleição para diretor da

escola.

Nesta perspectiva, a participação que deve caracterizar a gestão democrática implica

na existência do conselho da escola, coletivo e deliberativo, composto paritariamente por

todos os segmentos presentes na unidade escolar: professores, alunos, pais e funcionários,

além da comunidade externa à escola, configurando o conselho da escola como instância

coletiva destinada às tomadas de decisão.

Desta forma, a estrutura do conselho da escola, o seu funcionamento, a sua

composição, as suas atribuições e as suas competências devem ser assegurados por

regulamentação. (PARO, 2013; HORA, 2004; ARAÚJO, 2007)

No entanto, Lima (2013a) advoga que o estudo da participação nas organizações

não pode se limitar aos princípios normativos consagrados em textos legais e considera

indispensável o estudo da participação praticada e, da mesma forma, recusar a participação

como fenômeno caracterizável de forma genérica e superficial, e justifica:

25 O conselho de educação é um organismo coletivo de tomada de decisão do sistema de ensino e atua junto à

administração pública com fins consultivos e normativos. O conselho de educação constitui um locus de

discussões e deliberações substancias, tanto para o a organização, como para a manutenção e desenvolvimento da politica educacional, observada as disposições da Constituição de 1988 e da LDB, que atribuem aos estados e aos municípios a incumbência de estabelecer normas complementares para os seus sistemas de ensino, observadas as normas gerais da educação nacional. (PEREIRA, 2008; BRASIL, 1988; BRASIL, 1996)

83

Seja a que nível for, a participação nunca é uma conquista definitiva, apenas dependente da consagração perpetuada pelas palavras e pelos textos, ainda que quase-sagrados, dos regimes democráticos. A participação só existe verdadeiramente como prática, de resto como a democracia, e pelo fato de ter sido formalmente consagrada uma vez, mesmo que ab initio, ela não se transforma num princípio irreversível, eventualmente constitutivo daquilo que alguns autores entendem, estranhamente, por ‘constituição genética’ ou ‘genótipo’ da organização. (LIMA, 2013a, p. 95)

A noção de democracia pressupõe o exercício da soberania popular, ou seja, a

adoção de um regime democrático legitima a participação popular nos processos de tomada

de decisão, o que nos leva a considerar que, na gestão democrática da escola, os atores

envolvidos detêm legitimamente a capacidade de produzir efeitos sobre as atividades

desenvolvidas pela escola, partilhando, coletivamente, o poder de decisão. (LIMA, 2013a;

ARANHA; MARTINS, 2003; VASCONCELOS, 2011)

Servilha (2008) e Pereira (2012) consideram que a gestão democrática da escola

implica em atribuição de poderes ao coletivo de indivíduos que protagonizam a vida escolar,

permitindo-lhes deliberar e agir de forma autônoma: “A gestão democrática da escola

implica atribuir poder aos agentes escolares na tomada de decisões referentes à unidade

escolar, superando mecanismos burocráticos em prol da participação autônoma de pais,

alunos, funcionários, professores”. (SERVILHA, 2008, p. 54)

Vemos, então, uma correlação entre gestão democrática, participação e autonomia,

e consideramos a autonomia como princípio que potencializa a participação dos

protagonistas locais, fazendo deles os atores no percurso da gestão da unidade escolar.

Assim, o terceiro aspecto, considerando a diversidade possível nas regulamentações

da gestão escolar democrática, diz respeito à autonomia da escola quanto às possibilidades

de tomadas de decisão.

3.4. A autonomia

Corroborando com Servilha (2008), para entender o conceito de autonomia,

apontamos a consideração de Silva (2004b, p.14), que considera como autônoma a escola

que tem a capacidade de produzir suas próprias regras:

84

Considerarei como autônoma aquela pessoa ou instituição que é capaz de fixar as normas de sua conduta no âmbito de sua natureza específica. Portanto, escola pública estatal autônoma será capaz de fixar as regras de seu próprio existir e agir, levando em conta seus limites e suas potencialidades. (SILVA, (2004b, p.14)

O autor também faz alusão à liberdade e ao poder como ideias implícitas à noção

de autonomia, tendo em vista a capacidade de escolher alternativas ou criar situações que

ainda não existam e, se referindo à unidade escolar, a autonomia, à liberdade e ao poder, o

autor tece a seguinte observação: “[...] a unidade escolar será autônoma quando tiver poder

para criar e/ou escolher livremente suas normas de conduta. Esse poder de criação e

escolha exerce-se, evidentemente, também pela capacidade de recusa de normas

heterônomas julgadas não-convenientes”. (SILVA, 2004b, p. 59)

Destas considerações de Servilha (2008) e Silva (2004b) podemos dizer que o

conceito de autonomia implica, na unidade escolar, no poder de governar-se a si própria, no

exercício de poder sobre os aspectos administrativos, financeiros e pedagógicos, e está

atrelado à participação no sentido de (re)-organizar o exercício da autoridade no interior da

escola, confirmando poderes político e decisório aos atores presentes na comunidade

escolar.

Mas Servilha (2008), recorrendo a Barroso e Pinhal (1996), observa a autonomia

construída no interior da escola e as relações que resultam desse exercício com as forças

externas, originárias das políticas governamentais, sendo necessário, assim, pensar a

autonomia sob dois aspectos: a autonomia decretada, como sendo aquela legitimada e

imposta pela formalidade do sistema educacional, e a autonomia construída, como sendo

aquela presente nas relações no interior da escola.

Esta observação nos leva a considerar a autonomia escolar segundo os dispositivos

legais e a autonomia exercida na escola para que possamos estabelecer uma análise da

realidade escolar: a LDB é suporte para que os sistemas estaduais e municipais

estabeleçam suas normas para a autonomia das unidades escolares, mas devemos

observar, também, a possibilidade das normas de tais sistemas estabelecerem maior

protagonismo dos órgãos administrativos, em detrimento do protagonismo da comunidade

escolar, o que, para Lima (2013a, p. 178), poderá representar, simplesmente, uma

autonomia regulada, “uma imagem puramente idealizada e apenas retoricamente

reproduzida, uma metáfora enclausurada no universo dos textos e dos discursos sobre

realizações adiadas”.

85

Atualmente, as formas mais livres de organização dos sistemas de educação se

consolidaram nos programas de reforma da educação, segundo a ideia de descentralização

e defesa da autonomia. No entanto, para Martins (2002), a noção de autonomia que vem

sendo construída pelos discursos políticos está esvaziada de significado e “passou a ser

utilizada, de um lado, como sinônimo de descentralização e desconcentração e, de outro,

como a etapa subsequente de processos descentralizadores, a partir dos quais a unidade

escolar estaria finalmente livre para elaborar seu próprio plano de voo.” (MARTINS, 2002, p.

48)

Martins (2002) esclarece que o conceito de autogestão escolar surge na segunda

metade do século XX, em movimentos que, com base na sociologia marxista, refutaram a

hierarquização nas organizações e buscaram formas de romper com a tradição

centralizadora, controladora e antidemocrática da administração burocrática da educação.

Referindo-se aos estudos de Georges Lapassade e de Michel Lobrot e à concepção

de grupo coletivo de gestão escolar, a autora menciona a autonomia da autogestão da

escola onde “o próprio grupo determinaria suas regras, programas, metas, técnicas e

métodos de trabalho, sob a orientação de um especialista e sob permanente auto

avaliação.“ (MARTINS, 2002, p.44)

A autora assim se refere à ideia originária que defende a autonomia na autogestão

escolar:

Há uma nítida influência das lutas autônomas encetadas por trabalhadores e da literatura sociológica marxista sobre construção dessas tendências pedagógicas autogestionárias, sobretudo na França dos anos 1960. Assim, esse contexto histórico promoveu a defesa da autonomia no âmbito da educação, utilizando-a como sinônimo de autogestão, liberdade, autogoverno, autoformação. (MARTINS, 2002, p. 44)

Para Martins (2002), no atual horizonte político, o termo autogestão desapareceu, tal

como desapareceram os eixos centrais conferidos à autonomia (os conselhos gestores e a

auto avaliação institucional) e, no discurso político das reformas dos anos de 1980 a 1990, a

autonomia passa a ser associada aos procedimentos administrativos e financeiros que

ampliam os encargos e responsabilidades das escolas públicas.

Corroborando com Martins (2002), Lima e Afonso (2002) acrescenta que a questão

não pode ser entendida somente em critérios nominalistas e na boa fé em relação ao

86

discurso sobre autonomia na escola, considerando a possível ambiguidade entre o discurso

político e as normas e regulamentações que podem vir a ser produzidas.

Objecto de um processo de ressemantização, a palavra <<autonomia>>pode vir a adquirir como significado essencial o de <<autonomia>> processual e implementativa (despojada de sentido democrático e participativo) ou até de mera delegação política, remetendo para as escolas a gestão de conflitos, em períodos de crise ou de contestação, responsabilizando os seus órgãos pela execução das orientações políticas centralmente produzidas, em total conformidade, sem lhes permitir uma intervenção legítima na formulação dessas políticas e sem admitir que parte delas poderão, e deverão ser assumidas a nível escolar. (LIMA; AFONSO, 2002, p. 72) (grifos dos autores)

Tal como o discurso da participação, que prega o envolvimento dos sujeitos nos

processos no interior da escola, o discurso da autonomia vem em decorrência da

necessidade de descentralizar a administração, transmitindo autoridade e permitindo uma

maior capacidade de adaptação às unidades escolares, no entanto, a ideia de autonomia

deve ser vista nos limites dados pelas normas externas à própria escola e que são

impregnadas por relações de poder que relativizam as possibilidades de decisões em

âmbito local. (BRUNO, 2002; LIMA; AFONSO, 2002; MARTINS, 2002; NARDI, 2011)

Assim, descentralização pode implicar tanto transferência de encargos, ou

responsabilidades, como transferência de poder; mas descentralização como transferência

de encargos não implica, necessariamente, em democratização, uma vez que as tomadas

de decisão requerem autonomia de poderes para que tais decisões procedam. (OLIVEIRA,

2002)

Na análise de Nardi (2011), centralização e descentralização não são conceitos

imediatamente operativos, pois, enquanto conceitos ideais podem, no campo prático,

guardar outras relações resultantes do contexto e das possibilidades das ações político-

administrativas estatais.

Assim, visando entendermos em qual contexto a gestão escolar democrática e a

autonomia da escola estão inseridas, torna-se importante melhor compreender a estrutura

política-administrativa do Estado brasileiro, bem como a organização dos sistemas de

ensino.

87

Essencialmente, para Azambuja (2003), um Estado Federal, Federação ou União é o

Estado composto de Estados-membros. Ao buscarmos a organização política-administrativa

do Estado brasileiro na Constituição de 1988, encontraremos no Artigo 18 a seguinte

definição: “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil

compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos

termos desta Constituição”. (BRASIL, 1988)

No Artigo 18 da Constituição de 1988 encontram-se duas características da

organização política-administrativa do Estado brasileiro: o verbo “compreender” que nos leva

a entender a limitação dos entes federados (União, Estados, Distrito Federal e Municípios),

como abrangidos pelo poder da República; o adjetivo “autônomo”, como faculdade de se

governar por leis próprias, referindo-se aos entes federados, mas, com outras limitações

dadas pela expressão “nos termos desta Constituição”: neste aparente paradoxo entre

autonomia e limitação, o Estado Federal (ou União) detém o poder soberano.

Karling (1997, p. 15) considera a autonomia como “um dos principais princípios de

gestão”, sendo o espaço para o exercício dessa autonomia objeto de concessão que pode

ocorrer “através da delegação e da descentralização”. Assim, Karling (1997) define

autonomia como sendo a capacidade e/ou poder de decidir livremente dentro desse espaço

concedido pela administração e por ela limitado.

A delegação e a descentralização constituem-se, neste contexto, como fatores que

determinam os limites da autonomia dos entes federados, uma vez que acabam por

caracterizar os atos de cada um deles. Ao abordar a delegação, Karling (1997, p.17)

conceitua tal termo como “atribuição de poderes e responsabilidades, no entanto, sem

alteração dos atos constitutivos da organização” e o termo descentralização como

“distribuição vertical da ação administrativa ao longo de sua hierarquia”, criando-se, assim,

“níveis operacionais inferiores, ou níveis de competências, de forma permanente e

institucional”. (KARLING, 1997, p. 17)

Ainda sobre esse termo, Tobar (1991, p. 4) esclarece:

Descentralização implica redistribuição do poder, uma transferência na alocação das decisões. É, portanto, mexer nos interesses dos grupos de poder, enquanto a desconcentração é a delegação de competência sem deslocamento do poder decisório. No contraste de ambos os termos é preciso ter claro que, embora ambos se constituam na práxis como ferramentas legítimas para transformar a ação governamental, há uma notória diferença nas consequências da implementação de uma ou da outra.

88

Considerando que as políticas educacionais que decorreram do discurso da

descentralização constituíram processos que afetaram significativamente a organização

educacional, Shiroma (2009) indaga quais concepções de descentralização estão presentes

nos documentos internacionais que orientaram as reformas educacionais na América Latina

nos anos de 1990 e, considerando a descentralização segundo o grau de transferência de

poder, classifica: a) descentralização como desconcentração, ao referir-se à transferência

de responsabilidades a níveis inferiores da organização, mas mantendo o poder de decisão

limitado; b) descentralização como delegação, ao referir-se à transferência de gestão e

funções a organizações que não pertencem à estrutura burocrática, mas têm autoridade

semi-independente; e c) descentralização como devolução, ao referir-se à “transferência de

responsabilidade de gestão a unidades subnacionais como níveis separados sobre os quais

as autoridades centrais exercem pouco ou nenhum controle direto, com independência para

executar suas tarefas”. (SHIROMA, 2009, p. 181)

No caso brasileiro, para Shiroma (2009), os processos de descentralização se

caracterizaram pela desconcentração de responsabilidade e poder limitado no que se refere

às tomadas de decisão ordinárias, relativas às questões próprias da gestão do cotidiano

escolar: “Em grande medida, trata-se da desconcentração dos aspectos operacionais,

desacompanhada da transferência de real poder para propor e implementar mudanças

significativas.” (SHIROMA, 2009, p. 182)

Ao analisarmos os Artigos 9º, 10 e 11 da LDB, notaremos a regulamentação da

distribuição das responsabilidades entre os entes federados, respectivamente, à União,

Estados e Municípios, e confirmaremos a análise de Shiroma (2009): apesar do termo “em

colaboração”, observamos no Artigo 9º a manutenção de aspectos administrativos

centralizados na União, tais como as responsabilidades pela elaboração do Plano Nacional

de Educação, estabelecer diretrizes curriculares e assegurar o processo nacional de

avaliação do ensino fundamental, médio e superior.

Art. 9º A União incumbir-se-á de: I - elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; II - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais do sistema federal de ensino e o dos Territórios; III - prestar assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o

89

atendimento prioritário à escolaridade obrigatória, exercendo sua função redistributiva e supletiva; IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum; V - coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação; VI - assegurar processo nacional de avaliação do rendimento escolar no ensino fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino; VII - baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação; VIII - assegurar processo nacional de avaliação das instituições de educação superior, com a cooperação dos sistemas que tiverem responsabilidade sobre este nível de ensino; IX - autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino. § 1º. Na estrutura educacional, haverá um Conselho Nacional de Educação, com funções normativas e de supervisão e atividade permanente, criado por lei. § 2º. Para o cumprimento do disposto nos incisos V a IX, a União terá acesso a todos os dados e informações necessários de todos os estabelecimentos e órgãos educacionais. § 3º. As atribuições constantes do inciso IX poderão ser delegadas aos Estados e ao Distrito Federal, desde que mantenham instituições de educação superior. (BRASIL, 1996)

Já com relação às responsabilidades das escolas, a LDB, regulamenta, para os

estabelecimentos de ensino, a atribuição de aspectos relativos aos procedimentos

operacionais do cotidiano pedagógico, como podemos observar no Artigo 12 e seus Incisos.

Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: I - elaborar e executar sua proposta pedagógica; II - administrar seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros; III - assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aula estabelecidas; IV - velar pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente; V - prover meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento; VI - articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola; VII - informar pai e mãe, conviventes ou não com seus filhos, e, se for o caso, os responsáveis legais, sobre a frequência e rendimento dos alunos, bem como sobre a execução da proposta pedagógica da escola; VIII – notificar ao Conselho Tutelar do Município, ao juiz competente da Comarca e ao respectivo representante do Ministério Público a relação dos alunos que apresentem quantidade de faltas acima de cinquenta por cento do percentual permitido em lei. (BRASIL, 1996)

90

Considerando novamente o Inciso VI do Artigo 206 da Constituição de 1988, que diz

"Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: [...] VI – gestão

democrática do ensino público, na forma da lei;” e limitando-nos às palavras educação e

ensino, constataremos a palavra “gestão” relacionada ao “ensino” neste Artigo, e somente

neste Artigo, e exclusivamente à palavra “ensino”, não estando tal palavra relacionada ao

sistema de educação ou ao sistema de ensino, o que nos remete entender que, de acordo

com a Constituição, a gestão democrática é entendida somente no ambiente escolar.

Por sua vez, diferenciando sistema de educação e sistema de ensino, Sander (1985)

define sistema de educação como termo abrangente e amplo, englobando todas as

instituições sociais formais, e não formais, que têm por objetivo a consecução de objetivos

educacionais, enquanto o sistema de ensino abrange somente as instituições que se

dedicam exclusivamente ao ensino.

Ao tratar da organização da educação nacional, no Artigo 8º, Parágrafo 1º, a LDB

atribui à União o encargo de “coordenação da política nacional de educação, articulando os

diferentes níveis e sistemas e exercendo função normativa”. Logo após, no Artigo 9º,

Parágrafo 1º, esta Lei cria o Conselho Nacional de Educação, dando-lhe funções normativas

e supervisoras.

Ao fazermos esta observação e, ao partimos do princípio que Estados-membros e

Municípios são instâncias fixas abrangidas pelo poder da União, teremos configurado um

regime administrativo de autoridade institucional onde os sistemas de ensino dos entes

federados (estados e municípios) estão colocados de forma hierarquicamente subordinada à

política administrativa e às normas elaboradas pela União, o que nos leva a considerar o

caráter formal da organização da educação brasileira, que está definido legitimamente e

institui racionalmente um sistema que foi concebido sob a definição clássica da palavra:

organização social constituída de elementos interdependentes que têm por objetivo comum

proporcionar a educação. (SANDER, 1985; LIBÂNEO, 2012; SAVIANI, 2005).

Tanto no que se refere à política nos dispositivos legais, educação e ensino, bem

como administração e gestão, são termos distintos, associáveis e relacionáveis, mas com

sentidos próprios e específicos, o que nos leva a entender a gestão democrática da escola

com autonomia para tomar somente decisões relativas aos procedimentos ordinários, e

operacionais do cotidiano escolar, estando tal autonomia concedida, mas restrita aos

aspectos relacionados nos Incisos do Artigo 12 da LDB e limitada aos aspectos emanados

do Artigo 9º, no que diz respeito às normas, diretrizes curriculares e avaliações advindas da

União.

91

Assim, as políticas educacionais guardam uma tendência contraditória ao discurso

proclamado de autonomia institucional e local da escola, à medida que se apresentam

associadas à nossa tendência histórica de centralizar e controlar, uma tendência tradicional

de governar a educação. (LIMA, 2007; SANDER, 2005)

Tais políticas, segundo Lima (2007, p. 46), “surgem para concentrar e controlar

centralizadamente os poderes de decisão e de escolha política e de, simultaneamente,

descentralizar em termos meramente funcionais, decisões de tipo dominantemente

instrumental e operacional nos níveis periféricos”.

Neste sentido, Lima (2013a), observa que a autonomia das escolas pode ser

considerada como autonomia relativa, ou tão somente uma forma de articular o centro das

decisões políticas e a periferia da administração escolar, e acrescenta:

Nesse caso, uma orientação política, consubstanciada numa espécie de gerencialismo escolar, admitiria e valorizaria a “autonomia relativa” da escola, descobrindo embora, e maximizando o seu papel regulador através de formas de delegação política e de autonomia funcional que, em última análise, contribuíram para despolitizar e instrumentalizar aquelas margens de autonomia conceptual e, finalmente, para controlá-las e reduzir. (LIMA, 2013a, p. 167)

Esta consideração de Lima (2007) nos leva a entender a submissão da autonomia da

gestão democrática da escola ao planejamento e ao controle que permanecem

centralizados na esfera política, o que, segundo autor, dá a autonomia um caráter

meramente instrumental:

Neste caso, a “autonomia”, de que se fala insistentemente, é percepcionada como um instrumento, como uma técnica de gestão capaz de garantir a articulação entre o centro e as periferias e, deste modo, assegurar níveis mais elevados de performance e de qualidade educativas. Um processo que pode ser designado por recentralização por controlo remoto e por autonomia como delegação política. (LIMA, 2007, p. 46)

Neste sentido, Sander (2005), Lima (2007) e Martins (2002) apontam a consolidação

das avalições externas, padronizadas em larga escala, como fator que dificulta a efetivação

da autonomia da escola. Para essa última autora, tais avaliações assumiram lugar central na

92

implantação de políticas sociais, tendo em vista a efetivação do conceito gerencialista de

accountability a partir dos anos 1990 na administração pública brasileira.

As consequências da accountability para o funcionamento da administração pública

(enquanto conceito que implica na responsabilização do governante para proceder com os

gastos públicos e a transparência com que ele deve agir para prestar contas de sua gestão

e dos gastos dos recursos públicos) atingem a redefinição dos mecanismos de controle e de

avaliação, que passam a incluir dimensões de desempenho como medidas para

averiguação da eficácia das políticas e provocam a expansão do número de controladores.

(AKUTSO; PINHO, 2002; CAMPOS, 1990)

Lembramos nossa abordagem no Capítulo 2 desta dissertação que, ao considerar as

reformas dos anos de 1990, aponta para as possibilidades de aquelas reformas manterem

ou reforçarem as características burocráticas, tradicionais na administração pública. No

discurso da descentralização valoriza-se a participação e a democratização da gestão, no

entanto, no mesmo passo em que a descentralização mostra-se como desresponsabilização

do Estado, que transfere responsabilidades e encargos operacionais aos atores da

sociedade civil, a accountability garante, ao administrador das políticas públicas, a

centralização dos aspectos financeiros e de controle de resultados.

Tais controles, externos à escola, além de objetivarem a construção de apontadores

numéricos de performatividade e qualidade da educação, reforçam-se como mecanismos

centralizados que impõem prescrições de diretrizes curriculares e determinam

procedimentos didáticos, o que pode indicar contradição aos pressupostos de autogestão

institucional e de auto avaliação institucional que permeiam a autenticidade da autonomia

escolar, uma vez que a escola e a sala de aula são remodeladas e procedimentalmente

instrumentalizadas para atender tais políticas externas. (BALL, 2004; LIMA, 2007;

MARTINS, 2002; SANDER, 2005; SANTOS, 2004)

Sander (2005) observa que, à luz das próprias políticas educacionais, novas

propostas de avaliação podem surgir e superar as práticas tradicionais de avaliação, no

entanto, a cooptação pela aceitação de mecanismos centralizados, como as avaliações

externas e as prescrições curriculares, pode colonizar a gestão democrática, orientando as

ações da escola no sentido de desenvolver suas atividades para satisfazer os indicadores

resultantes de tais avaliações. (BALL, 2004; SANDER, 2005; SANTOS, 2004)

Martins (2002) também discute a influência das avaliações externas sobre as sobre

os atores e as práticas escolares, e nos diz:

93

Os impactos da avaliação externa sobre os procedimentos normativos da gestão escolar têm sido (re) significados, no entanto, pela própria rede de escolas, configurando um vetor diferente dos desejos e intenções expressas pelos gestores de plantão. Essas interferências externas são redimensionadas, adquirindo outras conotações, pois a despeito da produção de justificativas oficiais e da implementação de medidas legais sobre o tema, constata-se que os apelos à mudança das práticas escolares e do tratamento tradicional da avaliação sofrem uma (re) significação por parte dos atores envolvidos no processo. (MARTINS, 2002, p. 131-132)

Quanto à autonomia financeira da escola, para Martins (2002), a descentralização é

mais complexa, dada a hierarquia e a concentração de poder que ocorre, historicamente,

nas redes de ensino público. Para a autora, nenhuma escola goza de autonomia financeira,

administrativa ou pedagógica que, tal como os recursos didáticos, os recursos financeiros e

o poder de decisão, sempre estiveram centralizados.

No entanto, Dourado (2007) relativiza a afirmação de Martins (2002) ao analisar o

Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE): concebido para desburocratizar o repasse de

recursos à escola, o PDDE mostrou-se como programa capaz de vencer a rigidez da

administração federal e estabeleceu-se numa relação direta entre a esfera federal e a

unidade escolar. (DOURADO, 2007)

Dourado (2007) observa que o PDDE tem ocupado papel estratégico nas escolas,

tendo em vista que tal programa “acaba por redirecionar espaços de participação e

deliberação, como os conselhos escolares” (DOURADO, 2007, p. 933), apesar das normas

rígidas estabelecidas pelo Fundo Nacional para Desenvolvimento da Educação (FNDE), que

delimitam e restringem a destinação de tal recurso, indicando, assim, uma relativa

autonomia da escola para gerir o dinheiro recebido do PDDE. (ADRIÃO; PERONI, 2007;

FNDE, 2013; DOURADO, 2007)

A Resolução n. 10 do Conselho Deliberativo do FNDE, de 18 de abril de 2013, que

dispõe sobre os critérios de repasse e execução do PDDE, em cumprimento ao disposto na

Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009, esclarece, em seu Artigo 2º, que o programa consiste

na destinação anual de recursos financeiros, de forma suplementar, a escola pública,

visando melhorias em sua infraestrutura física e pedagógica, bem como incentivar a

autogestão escolar e o exercício da cidadania com a participação da comunidade. (FNDE,

2013)

94

Já em seu Artigo 4º, essa Resolução delimita a atuação da autonomia escolar

enquanto especifica a destinação dos recursos do programa para a aquisição de material

permanente e de consumo, realização de pequenos reparos de manutenção e conservação,

na avaliação da aprendizagem, em projetos pedagógicos e no desenvolvimento de

atividades educacionais e veda a aplicação dos recursos do programa em casos

contemplados por outros recursos do FNDE, em gastos com pessoal, com tarifas bancárias

e com tributos de qualquer natureza.

Art. 4º Os recursos do programa destinam-se à cobertura de despesas de custeio, manutenção e pequenos investimentos que concorram para a garantia do funcionamento e melhoria da infraestrutura física e pedagógica dos estabelecimentos de ensino beneficiários, devendo ser empregados: I. na aquisição de material permanente; II. na realização de pequenos reparos, adequações e serviços necessários à manutenção, conservação e melhoria da estrutura física da unidade escolar; III. na aquisição de material de consumo; IV. na avaliação de aprendizagem V. na implementação de projeto pedagógico; e VI. no desenvolvimento de atividades educacionais; § 1º É vedada a aplicação dos recursos do PDDE em: I. implementação de outras ações que estejam sendo objeto de financiamento por outros programas executados pelo FNDE, exceto aquelas executadas sob a égide das normas do PDDE; II. gastos com pessoal; III. pagamento, a qualquer título, a: a) agente público da ativa por serviços prestados, inclusive consultoria, assistência técnica ou assemelhados; e b) empresas privadas que tenham em seu quadro societário servidor público da ativa, ou empregado de empresa pública ou de sociedade de economia mista, por serviços prestados, inclusive consultoria, assistência técnica ou assemelhados; IV. cobertura de despesas com tarifas bancárias; e V. dispêndios com tributos federais, distritais, estaduais e municipais quando não incidentes sobre os bens adquiridos ou produzidos ou sobre os serviços contratados para a consecução dos objetivos do programa. § 2º Os recursos do PDDE, liberados na categoria de custeio, poderão ser utilizados, também, para cobrir despesas cartorárias decorrentes de alterações nos estatutos das Unidades Executoras Próprias (UEx) definidas na forma do inciso II, do art. 5º, bem como as relativas a recomposições de seus membros, devendo tais desembolsos ser registrados nas correspondentes prestações de contas. (FNDE, 2013)

Desta forma, as possibilidades do exercício da autonomia escolar são relativas e

podem ser observadas nos seguintes aspectos: a) autonomia técnico-pedagógica cerceada

pelas diretrizes curriculares nacionais, pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e

pelas avalições externas que, de forma centralizada na esfera do governo federal, são

elaborados sem a participação dos profissionais-atores do ensino; b) autonomia

95

administrativa, grafada pela lei como democrática (na esfera pública)26, requer normas que

efetivem mecanismos de participação de todos, especialmente do conselho da escola, no

entanto, a lei delegou às esferas subordinadas à normatização complementar da questão,

eximindo-se da efetivação dessa premissa; e c) autonomia financeira, condicionada aos

valores definidos pelo governo central e que devem ser gastos com despesas predefinidas.

(MURANAKA; MINTO, 2002; LIMA; AFONSO, 2002)

Não nos esquecendo desta autonomia limitada e relativizada, para encerrar esta

discussão, chamamos a atenção para os aspectos da autonomia escolar, observados

acima, e as incumbências atribuídas legalmente à escola nos Incisos do Artigo 12 da LDB,

especialmente os Incisos I, que diz “elaborar e executar sua proposta pedagógica;”, e VI,

que diz “articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da

sociedade com a escola;”.

É neste contexto de contrassensos que Lima (2013b) remete-se ao projeto

pedagógico da escola considerando-o como sendo necessariamente um documento

construído coletivamente, resultante da discussão coletiva e, enquanto PPP, expressão de

reflexão e questionamento dos “valores e orientações políticas de mais vasto alcance na

sociedade” e, se assim admitido, pode mostrar-se como instrumento “contra visões

atomizadas e despolitizadas de educação e de pedagogia”, constituindo-se como “um

primeiro passo indispensável à compreensão do caráter político da educação e à

repolitização da organização escolar, frequentemente representada como aparelho técnico-

racional, instrumental, desideologizado e politicamente neutro (isto é, domesticado)” (LIMA,

2013b, p. 37) (grifo do autor)

Fruto da participação ativa dos docentes, o PPP é instrumento legítimo da

consciência política dos docentes com relação às suas “práticas pedagógicas, a interação

em sala de aula, a gestão curricular e a programação didática, os modelos de avaliação, a

organização do trabalho pedagógico, os modos de gestão escolar” (LIMA, 2013b, p. 37), e

por essa via, buscando a interação com a comunidade, os docentes podem se firmar como

atores, sem se entregarem “a lógicas meramente adaptativas ou de capitulação em face de

projetos político-educativos inaceitáveis em termos democráticos”. (LIMA, 2013b, p. 37)

Insulados e entrincheirados no universo misto da burocracia gerencial, os docentes e

a escola reproduzem a política centralizadora e cerceiam a participação da comunidade: se

não correr riscos e não se abrirem à comunidade, “a escola dificilmente encontrará aliados

26 O Inciso VI do Artigo 206 da Constituição de 1988 refere-se somente à esfera pública, omitindo a aplicação de

tal premissa à esfera privada.

96

[...] capazes de se envolverem na sua defesa” (LIMA, 2013b, p. 38) e na construção de uma

escola democrática.

Neste sentido, este estudo nos leva a considerar dois pontos relevantes: a admissão

da participação e da autonomia, num cenário escolar, enquanto princípios a serem

observados no exercício democrático, se constituem como categorias de análise da gestão

democrática; e o cenário construído pela burocracia da administração pública, que, ao

manter as relações hierarquizadas e impor políticas elaboradas de forma centralizada, se

contradiz em seu discurso reformador e se afasta da prática de uma gestão realmente

participativa e autônoma.

97

CAPÍTULO 4

A GESTÃO DEMOCRÁTICA PRATICADA NUMA ESCOLA MUNICIPAL DE

POÇOS DE CALDAS - MG

Considerando a participação dos profissionais da educação na elaboração do PPP, a

participação das comunidades escolar e local nos conselhos escolares, as possibilidades de

decisões/ações autônomas que podem ser efetivadas por parte da escola e à luz das

discussões feitas nesta dissertação, este capítulo destina-se a analisar como tem ocorrido a

gestão escolar democrática em uma escola no município de Poços de Caldas - MG.

Para tanto, faremos a análise dos documentos do município, em específico, a Lei n.

7947, que trata da implantação do Sistema Municipal de Poços de Caldas e do Conselho

Municipal de Educação e a Lei n. 8229 que aprova o PDME; e também dos documentos da

escola pesquisada: o Regimento Escolar, o PPP e o Estatuto do Conselho da Escola. O

capítulo também analisa as reuniões observadas na escola pesquisada e as entrevistas

realizadas com membros do conselho da escola (a diretora, o professor, a mãe de aluno,

uma funcionária operacional e um aluno) e um colaborador da comunidade local, que não é

membro formalizado do conselho da escola.

4.1. Os documentos municipais

Quanto à Lei n. 7947, destacamos os princípios que tal dispositivo legal imputa, em

seu Artigo 1º, e que deverão orientar o Sistema Municipal:

Art. 1º- Fica instituído o Sistema Municipal de Ensino de Poços de Caldas, que se orientará pelos seguintes princípios, além dos definidos pela Lei de Diretrizes e Bases da Educacão Nacional e Lei Orgânica Municipal: I- ampla participação dos vários segmentos da sociedade - escolas, comunidade, poder público e organizações sociais - para garantir a democratização das decisões; II- busca permanente da qualidade da educação, traduzida na preocupação com a identidade local e o acesso ao universal para garantir a plena formação do cidadão; III- reconhecimento do direito de todos à educação como elemento fundamental da formação humana; IV- assegurar aos grupos representativos da comunidade o direito de participar da definição das diretrizes da educação no âmbito do Município, concorrendo para elevar a qualidade dos serviços educacionais;

98

V- garantir o acesso e a permanência à educação contínua e de qualidade, sem qualquer discriminação, pela gestão democrática nas escolas de seu sistema de ensino; VI- colocar a escola como espaço da comunidade, democratizando relações, ampliando possibilidades de aprendizagem, estimulando a criatividade e a reflexão; VII- observar a organização da educação escolar adequando-a a realidade de cada comunidade, respeitando suas experiências, sua cultura e garantindo plena participação de todos os cidadãos. (POÇOS DE CALDAS, 2005)

Se considerarmos os processos de democratização e o princípio da gestão

democrática da escola pública, observamos que a lei municipal, através dos Incisos I, IV e

VI, assegura a participação e garante a representação dos segmentos da comunidade nas

tomadas de decisão. Mas, a Lei 7947 não faz menção ao conceito de “comunidade”, o

que nos leva a considerar que tal termo refere-se tanto à comunidade escolar, quanto à

comunidade local.

No entanto, cabe observar que a regulamentação expressa pela Lei 7947 não se

aplica às unidades escolares, atingindo somente o âmbito decisório do sistema de ensino

municipal. Neste sentido, a regulamentação municipal institui a participação decretada,

enquanto corpo de regras formais e legais que impõe, orienta e limita a participação (LIMA,

2013a) no âmbito das decisões políticas da administração educacional.

Atenta à LDB, a Lei 7947 compôs o Sistema Municipal de Ensino com as instituições

de ensino infantil, fundamental e médio mantidas pelo município, as instituições de

educação infantil mantidas pela iniciativa privada e os órgãos municipais de educação, mas

quanto aos “órgãos municipais de educação” a lei não faz nenhuma especificação de quais

são esses órgãos e só se dirige, no decorrer de seu texto, à Secretaria Municipal de

Educação e ao Conselho Municipal de Educação.

Art. 2º Para os efeitos desta Lei o Sistema Municipal de Ensino é composto

por: I- instituições de ensino infantil, fundamental e médio mantidas pelo Poder Público Municipal; II- instituições de educação infantil criadas e mantidas pela iniciativa privada; III- órgãos municipais de educação. (POÇOS DE CALDAS, 2005)

Neste Artigo, considerando a severidade legal, se destaca a diferenciação que este

dispositivo legal faz ao se referir às “instituições de ensino infantil” públicas e às “instituições

99

de educação infantil” privadas: podemos crer que se trata de um engano de redação e não

de uma declaração de intenção, já que para a legislação federal a denominação correta é

educação infantil, tanto para o âmbito público, como para escolas privadas.

Quanto à estruturação do Conselho Municipal de Educação, a Lei 7947, nos seus

Artigos 4º e 5º, dá a este colegiado um caráter deliberativo, normativo e consultivo e

assegura à comunidade o direito de participar da definição das diretrizes da educação no

Município. Na perspectiva de Araujo (2007), estes artigos institucionalizam o Conselho

Municipal de Educação como organismo normativo e supervisor das políticas educacionais e

passa a integrar a estrutura do sistema de ensino municipal.

Para garantir esta participação, no Artigo 6º, a Lei 7947 especifica a composição do

Conselho Municipal de Educação com trinta e oito membros que devem ser eleitos entre

seus pares, e que terão seus nomes homologados por ato do executivo municipal. Tais

membros são discriminados da seguinte forma: três representantes eleitos do Poder Público

Municipal, sendo um do setor Pedagógico, um representante do Setor Administrativo e um

representante do Setor de Cultura da Secretaria Municipal de Educação e Cultura; três

representantes eleitos da 31ª. Superintendência Regional de Ensino do Estado de Minas

Gerais; dois representantes eleitos do Ensino Superior do Município, sendo um de

universidade ou escola pública e outro de universidade ou escola particular; um

representante eleito entre os proprietários da rede particular de educação infantil; um

representante eleito dos professores da rede particular de educação infantil; quatorze

representantes eleitos entre trabalhadores da educação do município, sendo dois diretores,

dois especialistas em educação, dois professores da educação infantil, três professores do

ensino fundamental, sendo um das escolas da zona rural, um do ensino médio, dois

funcionários administrativos e dois funcionários operacionais; um representante eleito do

Sindicato dos Servidores Públicos Municipais; um representante eleito das Instituições

Filantrópicas Comunitárias ou Confessionais; um representante eleito do Conselho

Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente; dois representantes eleitos dos

estudantes maiores de quatorze anos das escolas municipais, sendo um da zona rural; um

representante da Câmara Municipal; dois representantes eleitos dos pais dos alunos; um

representante eleito do Conselho Tutelar; três representantes das escolas de educação

especial do Município, sendo um representante de cada escola; um representante eleito dos

movimentos populares atuantes no Município; um representante eleito das Escolas

Conveniadas.

100

Nesta composição descrita no Artigo 6º da Lei 7947, observamos que a legislação

intencionou e garantiu um amplo quadro participativo para o Conselho Municipal de

Educação com representantes dos segmentos da comunidade escolar, como professores,

alunos, pais, diretores, especialistas, funcionários administrativos e operacionais, e também

segmentos que extrapolam os muros da escola e pertencem, portanto, à comunidade local,

como os representantes do Conselho Tutelar, da Câmara de Vereadores, das Universidades

e dos movimentos populares, consagrando, assim, a participação, no âmbito do Conselho

Municipal de Educação, de atores dos vários segmentos das comunidades escolar e

local.(LIMA, 2013a; PARO, 2013; HORA, 2004; ARAÚJO, 2007)

No que se refere aos aspectos participativos e de autonomia da gestão democrática,

observamos que a Lei 7947, em seu Artigo 10, Inciso V, Alínea d, Inciso XXII, ao atribuir as

incumbências do Conselho Municipal de Educação, lhe privilegiou com a função normativa

da “autonomia e gestão democrática das escolas públicas” (POÇOS DE CALDAS, 2004, p.

5).

Neste ponto, fazemos duas observações: a) consagrada na Constituição de 1988, a

gestão democrática do ensino público tem sua regulamentação delegada aos sistemas de

ensino pela LDB e, no caso do município de Poços de Caldas, tal regulamentação passa a

ser uma incumbência do Conselho Municipal de Educação, o que implica em normatização

via pareceres e resoluções deste conselho; b) neste caso, segundo Lima (2013a), podemos

prever que a participação na gestão democrática, no âmbito da escola, venha a ser a

participação não formal, produzida pelos atores no âmbito da própria organização e em

articulação com os dispositivos legais, o que pode implicar num grau de desenvolvimento

operacional, ou como participação informal, realizada por meio de regras informais e não

estruturadas formalmente, mas produzida na própria organização e partilhadas em

pequenos grupos.

Este pressuposto da legislação municipal garante, na esfera da participação indireta

que fundamenta o Conselho Municipal de Educação, o locus deste colegiado como espaço

para debates e deliberações que são pertinentes à autonomia da escola e à participação

das comunidades escolar e local em questões de políticas educacionais, incluídas aí as

questões relativas à gestão escolar e as peculiaridades das unidades. No entanto,

observamos que, no âmbito desta pesquisa, não foi encontrada nenhuma norma ou

orientação advinda do Conselho Municipal de Educação de Poços de Caldas que se refira à

“autonomia e gestão democrática das escolas públicas” do município.

101

Esta constatação nos remete a Bruno (2002) que, em seus estudos, nos lembra da

gestão democrática consagrada na Constituição de 1988, a não regulamentação na LDB e a

delegação desta aos sistemas de ensino (observando que, no caso em estudo, a questão

também não foi regulamentada pelo Conselho de Educação Municipal). Neste quadro, a

autora considera as possibilidades da concepção de gestão democrática adquirir uma

multiplicidade de práticas, interpretações, regulamentações e não regulamentações que

podem, inclusive, serem antagônicas entre si e manter a escola submissa às políticas

externas.

Neste sentido, a delegação dada pela Lei 7947 ao Conselho Municipal e a não

normatização por parte deste, nos leva a considerar, em virtude da ausência de normas

externas que podem dar limites à autonomia e à participação, que as regras de menor grau

de estruturação podem ser articuladas com dispositivos legais e serem desenvolvidas no

âmbito interno da escola, caracterizando-se, assim, como regras não formais, ou se

constituírem, também no âmbito da escola, por regras informais e não estruturadas. (LIMA,

2013a)

Um ponto controverso da Lei 7947 está no Artigo 12, que condiciona as decisões do

Conselho Municipal de Educação à homologação por parte do Secretário Municipal de

Educação. Tal mecanismo legal restringe a autonomia do Conselho, uma vez que suas

decisões estão subordinadas ao poder político constituído, caracterizando-se, assim, a

autonomia relativa desse organismo colegiado e a estrutura hierarquizada do sistema de

ensino.

Art. 12. Compete ao Secretário Municipal de Educação e Cultura homologar as decisões do Conselho referentes aos incisos V, VIII, IX, XV, XXIV,XXVII, XXVIII e XXIX do artigo anterior desta Lei, no prazo de 30 (trinta) dias.

§ 1º. O Secretário solicitará ao Conselho, no prazo previsto no caput deste

artigo, reexame do ato levado à homologação, sendo arquivada a matéria sobre a qual houver mais de dois pedidos de reexame.

§ 2º. O Secretário, quando se negar a homologar a decisão do Conselho,

devolverá a matéria ao Conselho Municipal de Educação, com as razões de sua recusa.

§ 3º. Na hipótese de o Secretário não se manifestar no prazo previsto no

caput deste artigo, será considerado homologado, tacitamente, o ato decisório. (POÇOS DE CALDAS, 2004) (grifos nossos)

Tal dependência, que condiciona as decisões do Conselho Municipal de Educação à

homologação do Secretário de Educação, nos remete às discussões de Lima (2013a) e ao

conceito de autonomia relativa, estabelecida entre margens funcionais, controlada e

102

reduzida, ou seja, mesmo no âmbito das decisões políticas, o Conselho Municipal de

Educação configurado legalmente, com funções normativas, consultivas, deliberativas e

fiscalizadoras, composto por uma ampla representação indireta dos segmentos

educacionais do município, não é detentor de autonomia plena e submete suas decisões ao

poder centralizado.

A segunda lei que passamos a analisar é a Lei 8229, que aprova o PDME de Poços

de Caldas. Esta lei tem cinco artigos e, como anexo, o PDME.

A lei estabelece uma comissão para avaliar o plano a cada dois anos, além de

especificar que esta deve ser regulamentada pela Secretaria Municipal de Educação e pelo

Conselho Municipal de Educação, tendo este, acento obrigatório na comissão. Neste ponto,

cabe observar que a pesquisa não encontrou, no rol de atos do Conselho Municipal de

Educação, nenhuma regulamentação que trata do tema, o que nos leva a considerar a

possibilidade da não participação direta da comunidade na avalição do PDME como

consequência desta não regulamentação: Lima (2013a) considera que, num quadro de

participação não decretada, mesmo que consagrada, se a participação não for

regulamentada, pode se caracterizar a participação limitada a alguns atores ou mesmo não

ser permitida.

Assim como a Lei 7947, observamos que ela garante a participação da comunidade

no processo de avaliação do PDME através do Conselho Municipal de Educação, no

entanto, por vias da participação duplamente indireta, ou seja, a representação de uma

representação dos segmentos comunitários se fará presente no processo de avaliação, o

que pode indicar uma participação esvaziada de sentido coletivo e distante de um processo

de democraticidade direta (LIMA, 2013a) que pode potencializar a participação cidadã e a

gestão democrática: considerando que cabe a Secretaria Municipal de Educação e ao

Conselho Municipal de Educação regulamentar a comissão de avaliação do PDME,

devemos considerar que, num processo assim configurado, a avalição permanecerá

centralizada na esfera da administração pública, o que manterá a escola e a comunidade

num terceiro, ou quarto, nível de discussão, a posteriori, e num quadro verticalizado de

participação.

O PDME apresenta a seguinte estrutura: 1. Histórico 2003-2004, relatando a

trajetória de constituição do Fórum Municipal, até a apresentação dos projetos de lei para

implantação do sistema municipal e a reorganização do Conselho Municipal de Educação,

como já observado nesta análise; 2. Histórico 2005, relatando o processo de adaptação do

PDME proposto pelo Fórum às disposições e critérios do Plano Decenal Estadual de

103

Educação; 3. Caracterização do Município segundo os aspectos geográficos, demográficos,

educacionais e financeiros; 4. A política de organização e funcionamento do sistema

municipal de ensino; 5. Política de atendimento escolar, especificando o atendimento da

educação infantil, do ensino fundamental; do ensino médio, da educação tecnológica, da

educação de jovens e adultos, da educação superior, da educação especial e do

atendimento da população rural; 6. Política para desenvolvimento da escolarização; 7.

Política de organização da gestão das unidades escolares; 8. Política para desenvolvimento

dos trabalhadores da educação; 9. Política de financiamento da educação municipal; e 10.

Política para o desenvolvimento de projetos e programas especiais.

No âmbito desta análise, e atendendo aos objetivos da pesquisa que a gerou, nos

dirigimos especificamente aos itens 5, 7, 8 e 9, considerando a implicação das políticas

propostas nestes itens para a gestão democrática, a participação e autonomia das unidades

escolares do sistema municipal, salientando que a caracterização socioeconômica do

Município e as políticas de organização e funcionamento do sistema já foram abordadas no

Capítulo 1 desta dissertação.

Quanto ao item 5, que trata da política de atendimento, cabe observar que a escola

pesquisada oferece o ensino médio, mas de acordo com a proposta do PDME, o ensino

médio ficou sob a responsabilização do Estado, devendo o Município desenvolver esforços,

junto à Secretaria de Estado da Educação, para universalizar o atendimento do ensino

médio até 2014. A este respeito, durante as observações, a diretora da escola pesquisada

relatou que, em virtude das escolas estaduais não oferecerem vagas suficientes para o

atendimento da demanda, a comunidade se impôs e não aceitou que o município tomasse

medidas para extinguir o ensino médio na escola pesquisada, o que reforça a afirmação de

Lima (2013b), que nos diz que dificilmente os docentes terão voz e atuação se mantendo

isolados da comunidade e reproduzindo orientações e regras burocráticas.

No que diz respeito à política de organização e gestão das unidades escolares, o

PDME estabelece a democratização como princípio de funcionamento de todas as unidades

escolares do município e aprovou diretrizes que dizem respeito ao conselho da escola, à

eleição da direção de unidades escolares e ao PPP.

Quanto à composição do conselho da escola, as diretrizes do PDME orientam que a

unidade escolar deve estabelecer, em estatuto próprio, “a proporcionalidade de

representação, buscando a participação dos vários segmentos que compõem a comunidade

escolar”. (PDME, 2005, p. 20)

104

As diretrizes eleitorais do PDME se referem ao colégio eleitoral e à comissão eleitoral

que deve conduzir o processo de eleição, definindo-os na lógica da comunidade escolar,

como sendo “todos os integrantes do quadro de magistério, demais servidores, estudantes

com idade mínima de 14 anos e pais ou responsáveis legais de alunos menores de 14 anos,

da respectiva unidade escolar” (PDME, 2005, p. 21). No entanto, as diretrizes não

especificam e não fazem alusão à participação da comunidade local: tendo em vista que a

participação da comunidade local está consagrada na legislação federal, a exclusão desta

comunidade nas diretrizes municipais faz com que consideremos, segundo Lima (2013a), a

não participação decretada, forçada e imposta à comunidade local pela legislação municipal.

Quanto à composição do conselho da escola, observamos que o PDME omite-se

formalmente e delega à escola para que, em estatuto próprio, especifique quais os

segmentos da comunidade comporão o conselho da escola, o que nos leva a considerar,

segundo Lima (2013), na efetivação de uma participação caracteristicamente informal ou

não formal, uma vez que o estatuto será orientado pelos interesses específicos da unidade

escolar.

Tal caracterização, como aponta Lima (2013a), ao contrário do que o senso comum

pode admitir quanto à participação informal ou não formal, tais tipos de participação podem

provocar autonomia para a escola deliberar sobre sua estrutura de gestão, apesar da

possibilidade de, em suas deliberações, a escola excluir segmentos que têm o direito de

participação legitimado. Neste sentido, como já abordado, a exclusão da comunidade local,

por parte das orientações municipais, poderá se refletir no estatuto do conselho da escola,

dado o grau de autonomia que a escola tem para elaborá-lo.

Cabe observar que as diretrizes do PDME consideram o conselho da escola como

órgão consultivo e deliberativo, atribuindo a ele autonomia para resolver os problemas do

ensino na escola e a função de conscientizar a comunidade escolar sobre a importância do

conselho, configurando-se, assim, o caráter formal deste conselho e sua importância para a

gestão democrática da escola, como observam Hora (2004) e Lima (2013a).

Embora a legislação decrete a autonomia do conselho da escola, ela não é clara e,

aparentemente, não especifica que autonomia é essa e nem quais são os problemas de

ensino da escola. Esta não especificação nos remete a Barroso e Pinhal (1996), que

observa que a autonomia é construída pela escola e resulta de suas relações com as forças

externas e internas: a autonomia decretada, como sendo aquela legitimada pelo sistema

educacional, e a autonomia construída, como sendo aquela que resulta das relações no

interior da escola.

105

Ao considerarmos Barroso (1995), que nos diz que administração é a esfera político-

decisória e o ensino é a esfera técnico-operacional, e ao observamos que a legislação

brasileira não faz alusão à gestão democrática da educação, restringindo tal princípio ao

ensino, consideramos que, apesar da não especificação de limites de autonomia por parte

do sistema de ensino municipal, a gestão democrática da escola pública não está isenta das

restrições e limites impostos pelo sistema educacional.

Neste sentido, observamos que, quando a legislação expressa autonomia do

conselho para resolver os problemas da escola, está se referindo aos problemas da escola

enquanto esfera técnica e operacional, sendo, portanto, uma autonomia relativa, limitada,

instrumental e submissa ao planejamento e ao controle que permanecem centralizados na

esfera política do sistema educacional. (LIMA, 2007)

A eleição do dirigente escolar, e de seu vice, constituiu-se como prática nas unidades

escolares do município de Poços de Caldas desde 2002, tendo sido regulamentada pela Lei

Complementar n. 22 (LC 22), publicada em 9 de novembro de 2001. Em 2003, seguindo as

deliberações do Fórum Municipal de Educação de 2003, o PDME consagrou a gestão

democrática ao conceber a continuidade da eleição do diretor e vice diretor como princípio

das relações participativas nas unidades escolares. Lembrando Dourado (2013), no entanto,

não incorramos ao erro de considerar a eleição do dirigente escolar como ação terminal do

processo de democratização da gestão escolar, pois a amplitude da participação da

coletividade na gestão democrática da escola e a autonomia desta gestão também são

aspectos a serem observados.

Uma observação significativa constatada no PDME se refere à coordenação

pedagógica dos centros de educação infantil do município, que exerce o papel de gestor

desses centros, planejando, coordenando e acompanhando todo trabalho desenvolvido na

educação infantil: apesar do plano orientar para a eleição de diretores de escolas e

coordenadores pedagógicos, os cargos de coordenadores permanecem concursados e/ou

nomeados pela autoridade do governo municipal, pois nenhum mecanismo legal

regulamentou tal questão para a função de coordenador pedagógico, prevalecendo a LC 22,

que regulamenta somente a eleição para os cargos de direção e vice direção.

Em consequência, as comunidades escolares dos 45 centros municipais de

educação infantil não fazem a escolha de seus gestores, sendo, portanto, um direito

decretado que atinge somente as 25 escolas de ensino fundamental/médio da rede

municipal.

106

Quanto à elegibilidade de candidatos aos cargos de diretor e vice diretor, o PDME,

proposto e aprovado pelo Fórum Municipal de Educação de Poços de Caldas, restringe a

participação de candidatos a diretor e a vice diretor, exigindo que os candidatos sejam

profissionais graduados em pedagogia, com especialização em administração escolar,

pertençam ao quadro do funcionalismo público municipal pelo menos há cinco anos e com

experiência mínima de dois anos em sala de aula.

Tais restrições, que limitam, caracterizam e qualificam profissionalmente os

candidatos a diretor e a vice diretor, demonstram uma prática burocrática que enfatiza a

competência técnica e meritocrática, além da experiência profissional, mas, em seu

fundamento burocrático, é uma medida que evita ações patrimonialistas e apadrinhamentos

políticos que podem assolar a gestão das escolas públicas.

Quanto ao PPP, o PDME também foi expressão da democratização e considerou

que o PPP deve ser elaborado por toda a comunidade escolar, e orientou para a

necessidade da sua contínua avaliação e reformulação, tendo em vista o cumprimento dos

objetivos propostos.

O PDME também indicou a criação, em cada unidade escolar, de um colegiado

pedagógico, formado por um professor de cada nível ou modalidade de ensino ofertado pela

escola, com a finalidade de acompanhar a elaboração, a implantação e a avaliação do PPP.

Como veremos na análise do estatuto do conselho da escola pesquisa, este “colegiado

pedagógico” constitui-se como uma comissão, dentro do conselho da escola.

No ponto em que o PDME trata das políticas para desenvolvimento dos

trabalhadores da educação, encontramos trinta e uma diretrizes, que vão desde o

estabelecimento de convênios para formação continuada, com programas de bolsa ou

desconto para os docentes do quadro de magistério do município, até o incentivo à parceria

do tipo público-privado, de forma que seja garantida a capacitação e a atualização dos

servidores públicos municipais, mas nenhuma das trinta e uma diretrizes diz respeito ao

incentivo à formação para a gestão democrática da escola pública.

Da mesma forma, ao tratar do aspecto financeiro da educação, o PDME deteve-se

aos aspectos formais e legais do financiamento público da educação e não fez nenhuma

alusão à autonomia financeira, o que nos leva, mais uma vez, a considerar o controle

externo dos aspectos financeiros e a consequente autonomia relativa das unidades

escolares.

107

Assim, os documentos que tratam da configuração do sistema municipal de ensino,

nos mostram que o município pratica a eleição como modalidade de escolha do dirigente

escolar, institui o PPP como projeto coletivo da comunidade escolar e o conselho da escola

como espaço autônomo, consultivo e deliberativo, no entanto, para não incorrermos ao erro

e considerar tais aspectos suficientes para o exercício da gestão democrática (DOURADO,

2013), devemos considerar os conceitos de autonomia e participação presentes nesta

configuração.

Desta forma, devemos observar que: a) quanto ao sistema de ensino, a legislação

municipal garante a democratização das relações, instituindo um amplo quadro de

participação no Conselho Municipal de Educação, mas faz apontamentos restritivos que

fazem com que este conselho atue de forma indireta com relação às políticas públicas,

como na avaliação do PDME, por exemplo, e também tenha uma autonomia relativa, devido

ao fato de suas decisões estarem subordinadas ao crivo da homologação por parte da

Secretaria Municipal de Educação; b) quanto à escola, a legislação municipal delega à cada

unidade a elaboração do estatuto e a composição do conselho da escola, dadas à

participação, portanto, características informais e não formais (LIMA, 2013a). Quanto à

autonomia da gestão democrática da escola pública, observamos que a legislação atribui

autonomia para que o conselho da escola atue de forma consultiva e deliberativa, mas

salientamos que tal autonomia se relativiza, na medida em que se relaciona somente aos

aspectos técnicos e operacionais que instrumentalizam os processos de ensino. (LIMA,

2013a, 2007; BARROSO; PINHAL, 1996, 1995)

4.2. Os documentos da escola

Conforme mencionado no primeiro capítulo deste trabalho, foram inventariados e

analisados o Regimento Escolar, o PPP e o Estatuto do Conselho da Escola.

4.2.1. O Regimento Escolar

O Regimento Escolar admite como princípio e garante, em seus objetivos

específicos, a gestão democrática e participativa na escola, no entanto, tendo em vista que

o PDME estabelece a eleição, em nenhum momento o documento se dirige ao plano

municipal e não aponta a regulamentação das eleições para diretor e vice diretor e nenhuma

outra forma para provimento do cargo ou função de dirigente escolar.

Da mesma forma, não regulamenta o colégio eleitoral previsto pelo PDME e não

apresenta como devem ser as relações estruturais, organizacionais e de trabalho entre o

dirigente escolar e o conselho da escola. Também não regulamenta as eleições para

108

conselheiros de escolha e, ao se referir ao conselho da escola, atribui-lhe estatuto próprio,

anexo ao Regimento Escolar.

Novamente recorremos a Lima (2013a) e observamos que a não participação,

admitida como omissão, ou não referência à participação de determinados atores, ou

mesmo consagrar e não regulamentar a participação, podem ser fatores que afastam os

atores dos processos de democraticidade e, por consequência, dos processos de

envolvimento com os objetivos institucionais, podendo caracterizar a participação limitada a

alguns atores, assinalando exceções, ou mesmo não ser permitida em âmbito genérico.

Por se tratar de documento que rege as relações no interior da escola, inclusive as

relações entre a direção e o conselho da escola, a omissão de mecanismos que regem as

eleições para dirigente e membros do conselho da escola por parte do Regimento Escolar

pode levar a escola a afastar os atores do processo democrático, incorrendo na não

participação e na participação limitada a alguns atores e, consequentemente, numa gestão

democrática esvaziada de sentido coletivo. (LIMA, 2013a)

No documento observamos uma discordância entre a estrutura no Regimento para o

PPP e a apresentada por este. No Regimento Escolar, a estrutura do PPP define: as

finalidades da escola, a estrutura organizacional, as relações de trabalho, a relação

professor-aluno, o processo de decisão, o tempo escolar, a organização dos alunos, os

conteúdos curriculares e os procedimentos didáticos; já no PPP observamos como estrutura

documental o marco referencial, o diagnóstico-histórico, os objetivos da escola, a proposta

de ação e o processo de avaliação dos alunos.

Quanto ao material didático, que observamos ser fornecido à escola pela Secretaria

Municipal de Educação, através do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD)27, o

regimento escolar diz que tal material será fornecido aos professores e aos alunos pelo

Caixa Escolar e/ou pela Secretaria Municipal de Educação.

Em especial, nenhuma outra observação foi notada no regimento, além das citadas

acima. No mais, trata-se de um documento organizado e estruturado para estabelecer

regras disciplinares, atribuições e responsabilidades, tais como direitos e deveres, aos

sujeitos envolvidos pela escola, além de definir os objetivos educacionais para os diversos

níveis de ensino oferecidos pela instituição.

27 O PNLD é um programa do Ministério da Educação que tem como principal objetivo subsidiar o trabalho

pedagógico por meio da distribuição de livros didáticos aos alunos da educação básica.

109

No caso da educação infantil, tais objetivos são correlatos ao que reza o Art. 29 da

LDB28; no caso do ensino fundamental, os objetivos expressos no Regimento Escolar são,

literalmente, aqueles indicados pelos Parâmetros Curriculares Nacionais29 (PCN); já com

relação ao ensino médio, o documento especifica como objetivo o que a LDB, em seu Art.

22, especifica como finalidade da Educação Básica: “assegurar-lhe a formação comum

indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho

e em estudos posteriores”.

Os objetivos educacionais admitidos pela escola pesquisada, traçados de acordo

com o que determina a LDB e com as orientações dos PCN, bem como a sua dependência

em relação ao material didático adquirido através do PNLD, nos revela e confirma um

quadro de autonomia pedagógica relativa, considerando a reprodução de objetivos e o

cerceamento das atividades escolares pelas políticas elaboradas e centralizadas nas

esferas superiores do sistema educacional. (BALL, 2004; LIMA, 2007, 2002; MARTINS,

2002; SANDER, 2005; SANTOS, 2004; MURANAKA; MINTO, 2002)

4.2.2. O Projeto Político Pedagógico (PPP)

A estrutura do documento analisado é composta pelo marco referencial, diagnóstico-

histórico, objetivos da escola, proposta de ação e avaliação, mas como já observamos

anteriormente, esta estrutura não condiz com a estrutura indicada no Regimento Escolar,

como já mencionamos na análise do Regimento Escolar.

Os quarenta objetivos expressos pelo PPP não se referem especificamente aos

objetivos educacionais dos níveis de ensino ofertados pela escola, que estão registrados no

Regimento Escolar, e sim aos objetivos políticos que se configuram como plano de ações

que permearão as ações da escola, as atribuições administrativo-pedagógicas da gestão

escolar e as relações escola-comunidade:

(1) Envolver a comunidade nos projetos escolares, promovendo o comprometimento da família com a formação dos alunos; (2) Melhorar as relações interpessoais; (3) Promover a formação continuada de todos os funcionários da escola, em especial a atualização docente; (4) Estabelecer uma linha pedagógica para a escola;

28Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade. 29 Os Parâmetros Curriculares Nacionais estão disponibilizados pelo Ministério da Educação no sítio http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro081.pdf

110

(5) Integrar, através do planejamento conjunto, o trabalho realizado por todas as séries, visando aos mesmos objetivos; (6) Integrar todos os funcionários no processo educacional; (7) Melhorar a qualidade do ensino, procurando respeitar a diversidade e a ética nas relações; (8) Divulgar e colocar em prática a filosofia da escola; (9) Incentivar e apoiar as ações do Grêmio Estudantil que atendam aos interesses da comunidade escolar; (10) Explorar o potencial dos alunos e formar para o exercício da cidadania; (11) Adequar os horários de reuniões de pais para atingir o maior número de pessoas; (12) Promover palestras para pais e alunos; (13) Buscar alternativas que auxiliem os profissionais da educação no processo de inclusão; (14) Fazer cumprir a lei que trata do número de alunos em sala, principalmente quando a sala possuir aluno com necessidades especiais; (15) Diminuir os índices de repetência; (16) Criar um sistema de recuperação para alunos com dificuldades de aprendizagem; (17) Rever o processo e o sistema de avaliação; (18) Rever o currículo escolar; (19) Promover gincanas culturais incentivando os estudos diários; (20) Incentivar o trabalho de monitoria em sala de aula; (21) Promover e incentivar a leitura e a pesquisa; (22) Criar o laboratório de linguagens; (23) Equipar o laboratório de Ciências; (24) Buscar parcerias para ampliar projetos da escola; (25) Dar continuidade aos projetos extracurriculares; (26) Incentivar e apoiar os professores na organização de atividades fora do ambiente escolar sempre que houver objetivos previamente estabelecidos e pertinentes às respectivas áreas do conhecimento; (27) Firmar convênios com empresas da cidade visando a inserção de alunos no mercado de trabalho, privilegiando os que tiverem melhor desempenho na escola ou aptidão para a função; (28) Organizar o memorial do Colégio, buscando o apoio de empresas e universidades, seguindo critérios técnicos; (29) Aumentar a arrecadação do Caixa Escolar; (30) Comunicar todas as ações da escola aos pais, inclusive calendário de provas, reuniões, etc; (31) Manter e ampliar os cursos técnicos (Pós-Médio); (32) Respeitar o regimento escolar e as normas disciplinares, aplicando sanções educativas aos alunos que não cumpri-las; (33) Reestruturar o recreio do período da tarde através de brincadeiras dirigidas; (34) Aproveitar melhor os espaços físicos da escola e preservá-los; (35) Catalogar todo o material existente para o conhecimento dos professores; (36) Criar uma identificação para que a escola seja resguardada da entrada de pessoas estranhas em suas dependências; (37) Reestruturar a biblioteca através da organização e atualização do acervo; (38) Conscientizar alunos e professores para o uso adequado da biblioteca; (39) Planejar atividades e ações baseadas nos resultados das avaliações externas realizadas; (40) Garantir uma gestão democrática participativa. (PPP, 2014, p. 15-16)

111

Em seu PPP, assim como no Regimento Escolar, a escola pesquisada não faz

referência, em nenhum momento, à legislação municipal que rege seu sistema de ensino e

diz que, fundamentada na LDB, a direção da escola se estabelece segundo os princípios da

democracia e da participação e se auto define como escola cidadã, mas nenhum documento

da escola traz esse conceito. Essa não articulação entre os documentos da escola e a

legislação municipal nos remete à possibilidade da participação e da autonomia escolar se

restringirem aos princípios normativos consagrados nos textos legais, o que implica, para a

escola, em competências não asseguradas por regulamentação. (LIMA, 2013a; PARO,

2013; ARAÚJO, 2007; HORA, 2004)

No marco referencial de PPP, a escola se compromete, junto à comunidade, com um

processo de educação plena, inclusiva e transformadora, e também com a prática de uma

gestão democrática participativa. O documento também declara que a escola não possui

uma linha metodológica única, mas não especifica como desenvolve seus trabalhos.

O Colégio Municipal Dr. José Vargas de Souza, consciente de suas atribuições e responsabilidades junto à comunidade e comprometido com o processo de educação plena, inclusiva e transformadora, terá como filosofia: a prática de uma gestão democrática participativa; a prática docente embasada na competência, ética, sensibilidade, criticidade e solidariedade; a educação emancipadora visando à formação de cidadãos sujeitos de sua própria história; a formação integral do aluno alicerçada nos princípios do aprender a conhecer, fazer, ser e conviver; o respeito à diversidade, a ética nas relações; o diálogo e a reflexão; a busca pela paz; e envolvimento com as questões ambientais. (PPP, 2014, p.8)

A participação ativa dos alunos nas atividades desenvolvidas pela escola é

destacada e, ao mesmo tempo, o PPP diz que a escola tem problemas com a presença e a

participação dos pais: “O Colégio enfrenta problemas quanto à participação das famílias na

vida escolar do aluno. Uma grande parcela só comparece quando o aluno reprova, deixando

de acompanhar a cada bimestre o seu aproveitamento.” (PPP, 2014, p.13)

Esta expressão do PPP nos faz considerar que a família permeia a participação

passiva e a não participação induzida: Lima (2013a) caracteriza como a participação passiva

considerando que, não sendo indiferentes ao curso das decisões tomadas, os atores

parecem descrer na capacidade de influenciar e preferem desempenhar um papel individual

que ora confronta, ora valoriza e admira, ora desvaloriza e critica as decisões tomadas; e a

não participação induzida, que Lima (2013a) caracteriza como sendo aquela em que,

mesmo que a participação esteja decretada e regulamentada, como é que o caso da

112

participação da família, “os arranjos organizacionais concretos, as práticas participativas

previstas, as condições, os recursos e as possibilidades reais de participação podem

conduzir a situações objetivas e subjetivas convidativas e facilitadoras da não participação”.

LIMA (2013a, p.98)

Neste ponto, salientamos a articulação das práticas do cotidiano escolar com a

comunidade e a importância desta articulação para o desenvolvimento da gestão

democrática. No entanto, observamos também que o PPP da escola estabelece objetivos

que se fundamentam nesta articulação e visam garantir a gestão democrática, estimular a

participação da comunidade e da família e adequar os horários de reuniões para que a

escola possa atingir o maior número possível de pais: nas observações da rotina da escola,

notamos que os horários de reuniões são flexibilizados de forma a priorizar a participação da

maioria das famílias, no entanto, a dificuldade que a escola enfrenta para que os pais

participem da vida escolar dos filhos ultrapassa seus muros e é relativizada pelo cotidiano

familiar, que está permeado pelo mundo do trabalho capitalista e, como nos diz Paro (2001),

pela falta de dispositivos legais que estimulem e que possam dar às famílias trabalhadoras

condições de participar da vida escolar de seus filhos, sem que sejam penalizadas em seus

salários.

Além das reuniões com os pais, o documento assinala que a escola também tem

como proposta a realização de reuniões (a escola denomina as reuniões por segmento de

assembleias) por áreas (referindo-se às áreas curriculares: Línguas e Artes, Ciências

Sociais e Matemática), por níveis (referindo-se à educação infantil, aos anos iniciais do

ensino fundamental, anos finais do ensino fundamental e ensino médio), e por segmentos

(professores, funcionários administrativos, funcionários operacionais, especialistas) e

alunos. No caso dos alunos, as assembleias reuniam três grandes grupos, a saber, alunos

de educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental, alunos do 5º, 6º e 7º anos do

ensino fundamental, e o grupo dos alunos do 8º e 9º anos do ensino fundamental e ensino

médio.

Apresentada como forma de facilitar as discussões, tendo em vista o expressivo

número de alunos e, consequentemente, de pais e professores, as observações mostram

que tal estratégia facilita, na verdade, a coordenação e a condução dos trabalhos por parte

da direção e do conselho da escola. Observamos que a estratégia é eficiente para gerar o

diálogo ente os atores, considerando, aqui, a transparência, a publicidade, o diálogo e as

deliberações coletivas como fundamentos que devem permear o princípio participativo da

gestão democrática, como nos diz Lima (2013a), Tatagiba (2003) e Carina (2003).

113

Observamos, também, que estas reuniões (ou assembleias, na visão da escola), que

sempre são presenciadas pelo representante do segmento, servem como campo de

decisões que são levadas para o conselho da escola, onde as deliberações ocorrem

oficialmente: nas palavras da Diretora (2014), “esta estratégia nos serve como meio para

educar os representantes como representantes realmente, e não como representantes que

se firmam em opiniões próprias e individuais”.

O PPP também estabelece a dinâmica para a sua elaboração e/ou revisão a partir de

reuniões que devem ocorrer em dois níveis: primeiro, as reuniões com os grupos específicos

de cada segmento (pais, alunos, professores, funcionários) e a cada reunião, os grupos

discutem e registram suas sugestões, sendo, pois, uma participação direta, considerando o

aspecto da democraticidade (LIMA, 2013a); segundo, as sugestões elaboradas pelos grupos

são levadas à assembleia geral, que terá representantes de todos os segmentos, o que

configura uma participação indireta como critério da democraticidade (LIMA, 2013a).

No entanto, notamos que os alunos de educação infantil e ensino fundamental não

têm sua representação contemplada nessa assembleia, o que configura uma não

participação imposta30 (LIMA, 2013a), o que podemos observar no PPP (2014, p.6):

Composição da assembleia geral: 01 professor da educação infantil; um professor das séries iniciais até 4ª. Série; 01 professor de 5ª. a 8ª. série; 01 professor de ensino médio (manhã); 01 professor de ensino médio (noturno); 01 supervisora; 01 pai de educação infantil; 01 pai das séries iniciais até 4ª. série; 01 pai de 5ª. a 8ª. série; 01 aluno do ensino médio (manhã); 01 aluno do ensino médio (noturno); 02 funcionários operacionais; 01 funcionário da secretaria da escola; 01 funcionário da biblioteca; 01 funcionário da tesouraria, 01 auxiliar de educação infantil (ADI); o Conselho de Escola e a comissão de redação.

Assim, entendemos que a Diretora (2014), ao se referir às assembleias de cada

segmento, diz respeito às reuniões dos grupos específicos que compõem a comunidade

escolar: pais, alunos (exceto alunos da educação infantil e ensino fundamental), professores

e funcionários da escola. Observamos, também, que essa estratégia proposta pelo PPP não

está regulamentada/articulada no Regimento da Escola, o que nos leva a considerar que a

30 A diretora da escola justificou que a exclusão de alunos menores de 14 anos no conselho de escola se dá em virtude de determinação legal, no entanto, não encontramos, no rol da legislação municipal, nenhuma orientação que restringe a participação desses alunos no conselho de escola, mas verificamos que as Leis Complementares n.11 e n. 12, que regulamentam a eleição de diretores e vice diretores das escolas públicas municipais, não permitem que alunos menores de 14 anos votem. O que nos levar a questionar: se o aluno não pode votar e escolher o dirigente da escola, não pode, também, representar ou fazer-se representar no conselho de escola?

114

estratégia das assembleias (enquanto reuniões dos grupos segmentados) produzem uma

participação informal, conduzida por regras sem estruturação e produzidas pelos próprios

grupos. (LIMA, 2013a)

Quanto à execução e avaliação do PPP, salientamos que o documento compromete-

se com a participação de toda comunidade escolar, mas faz menção ao acompanhamento

da Secretaria Municipal de Educação nesses processos, o que nos leva a considerar que a

escola submete-se ao sistema municipal e pode, assim, relativizar sua autonomia para

elaborar, rever e reestruturar seu PPP.

O projeto político-pedagógico terá sua execução acompanhada constantemente por todos os membros da comunidade escolar e pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura e uma vez por ano será avaliado formalmente em reuniões que envolvam todos os interessados, no moldes de sua construção, podendo sofrer alterações conforme a necessidade e a aprovação de todos. (PPP, 2014, p. 21)

O PPP de 2014 apresentou uma ênfase que não ocorria nos PPP anteriores: além de

manter a recuperação de alunos semestralmente, o PPP indicou a recuperação processual

e contínua, de forma a oportunizar ao aluno recuperar conteúdo e nota (aproveitamento);

além disso, indicou o acompanhamento das supervisoras pedagógicas nos processos de

recuperação processual e estabeleceu um simulado, preparatório para as avaliações

externas, com atribuição de nota, a ser integrada no final do ano, na última avaliação

bimestral.

Segundo as observações registradas pelo pesquisador junto à direção e às reuniões

de professores do ensino fundamental, estas alterações ocorreram em virtude do processo

de apuração do IDEB da unidade para as séries finais do ensino fundamental, que devido ao

aumento da taxa de reprovação, teve seu índice de 2013 reduzido, correndo o risco de ficar

abaixo da meta projetada para 2015. Como a apuração do IDEB leva em conta o produto

entre a aprendizagem aferida entre os alunos e o fator de aprovação observado na escola

para obter o resultado final, a escola espera, com a alteração do processo de recuperação

dos alunos, reduzir as reprovações e elevar o índice apurado pelo IDEB.

Esta observação confirma os apontamentos de Sander (2005), Lima (2007) e Martins

(2002) sobre a consolidação das avalições externas que, padronizadas em larga escala,

afetam a efetivação da autonomia da escola. Consideradas por Lima (2011b) como

115

resultantes de mecanismos burocráticos intensificados (ou hiperburacratizados) e

conduzidos como concepções técnicas e reguladoras, tais avaliações se contrapõem à

democratização das estruturas de poder, dado o seu caráter controlador e normativo,

induzem a escola a adotar mudanças instrumentais para atendê-las.

As mudanças no processo didático de recuperação dos alunos, propostas pelo PPP

de 2014 da escola pesquisada, na lógica dos apontadores de desempenho, que são

formalizados por meio de avalições massificadas, constituem, portanto, um processo que

demonstra a submissão da escola aos mecanismos gerencialistas de performatividade e

qualidade da educação, impostos pelo sistema de forma centralizada. (BALL, 2004; LIMA,

2013a; 2011b; 2007; MARTINS, 2002; SANDER, 2005; SANTOS, 2004)

4.2.3 O Estatuto do Conselho da Escola

O estatuto do conselho da escola justifica-se na LDB para fundamentar os princípios

da gestão democrática participativa, como proposta da direção de uma escola cidadã. O

estatuto prevê um conselho da escola composto por representantes da direção (1), dos

especialistas (1), dos funcionários operacionais (1), dos funcionários administrativos (1), dos

professores da educação infantil (1), do ensino fundamental (2) e do ensino médio (1), de

pais de alunos da educação infantil (1) e ensino fundamental (2), e dos alunos do ensino

médio (1), totalizando 12 conselheiros titulares.

Quanto à composição do conselho da escola, as diretrizes do PDME orientam que a

unidade escolar deve estabelecer, em estatuto próprio, “a proporcionalidade de

representação, buscando a participação dos vários segmentos que compõem a comunidade

escolar”. (PDME, 2005, p. 20)

Notamos que o estatuto não contempla a participação de representante da

comunidade local, o que nos leva a considerar, de acordo com Lima (2013a) a não

participação imposta, por omissão do regulamento, a este segmento.

Da mesma forma, observamos que não há acento entre os conselheiros da escola

para alunos do ensino fundamental que, nas palavras da Diretora (2014), são representados

pelos pais, em virtude dos dispositivos legais, que permitem que alunos com mais de 14

anos participem da votação para eleger o diretor e o vice diretor.

O documento dá ao conselho da escola as seguintes atribuições: elaborar seu

estatuto; garantir a gestão democrática; elaborar o regimento escolar; gerir, em parceria com

a direção, os processos pedagógicos, administrativos e financeiros; exercer as funções

116

consultivas, deliberativas e fiscalizadoras, conforme o PDME; fiscalizar o caixa escolar;

conscientizar a comunidade sobre a importância do conselho da escola; trabalhar com ética

e garantir a transparência das decisões do conselho e da direção; e coordenar o processo

eleitoral da direção.

Em particular, ao analisar o Estatuto do Conselho da Escola, observamos que, ao

especificar seus objetivos, o conselho recebe a atribuição de construir para a escola um

PPP capaz de garantir a formação para e pela cidadania. Tal constatação nos leva a

considerar que, de acordo com as normas regimentais da unidade, cabe ao conselho da

escola deliberar sobre a aprovação desse projeto.

O estatuto também divide os conselheiros em três comissões: comissão do caixa

escolar, para controlar a arrecadação e os gastos; comissão pedagógica, para avaliar o

PPP; e a comissão administrativa, para decidir, com a direção, as questões relativas

administrativas operacionais da escola, em seu dia a dia.

Assim, os documentos da escola, ao não regulamentarem as eleições para diretor e

para o conselho da escola, podem levar à participação limitada de alguns atores ou excluir

outros, o que observamos quanto à omissão/exclusão da participação da comunidade local,

que não se apresenta nas regulamentações e tem, portanto, uma não participação imposta.

Os documentos também apontam que as famílias apresentam uma participação que pode

ser caracterizada como não participação induzida e/ou participação passiva (LIMA, 2013a).

Apesar dos documentos enfatizarem a gestão democrática e participativa, através deles não

foi possível caracterizar a participação dos demais atores da comunidade escolar.

Quanto à autonomia, os documentos confirmam o envolvimento da escola pelas

normas e controles burocráticos centralizados: ao reproduzirem as diretrizes curriculares e

ao instrumentalizar mudanças didáticas para atender aos indicadores performáticos,

podemos considerar que a gestão democrática da escola pesquisada se encontra num

quadro de autonomia pedagógica relativa.

4.3. As observações das reuniões

A escola foi observada, em seu dia a dia, nos turnos matutino, vespertino e noturno,

nos meses de março, abril, maio e junho de 2014, em visitas que ocorreram na segunda, na

terça ou na sexta-feira e que duraram, em média, três horas. Neste período foi elaborado

um caderno de campo onde as observações foram anotadas. Tais anotações foram

selecionadas e as observações julgadas como pertinentes para o objetivo da pesquisa

foram registradas nesta análise.

117

Durante as visitas, constatamos manifestações de interação amistosa, tanto entre os

alunos, como entre professores e entre professores e alunos. Neste mesmo clima se davam

as relações entre os funcionários administrativos, operacionais e a direção da escola.

Particularmente, as relações entre os trabalhadores docentes mostraram-se em um grau de

conivência tal que, questionados a respeito, dois professores relataram que todos os

professores, com raras exceções, trabalham naquela unidade há muitos anos, o que os

levou a desenvolver laços de união e de cooperação: “aqui não tem uma pessoa com

autoridade, a autoridade é de todos, então não precisamos ter medo de ninguém”

(DIRETORA).

Correlacionamos tal observação ao princípio participativo que, para Tatagiba (2003),

torna o modelo democrático de gestão fundamentado no diálogo e no respeito à diversidade

entre dos atores como pré-requisitos para as deliberações coletivas e consideramos que a

escola observada atende esses fundamentos.

Neste período de observação, notamos que os pais que compareceram à escola

sempre eram recebidos pela direção ou pela vice direção, já os alunos sempre eram

recebidos e orientados pelas supervisoras pedagógicas.

As observações verificaram que o dia a dia da escola ocorreu sem contratempos e

sem notas dignas de relato: sinais de troca de aula, professores se encaminhando para as

salas de aula, alunos em corredores, recreio em horário comum para alunos e professores.

Já faz parte da rotina, também, reunirem-se todos no pátio central da escola, alunos

professores e funcionários, na quinta-feira, para juntos, cantarem o hino nacional.

Com a finalidade de obter dados expressivos para a pesquisa, o foco de nossas

observações se voltou para as reuniões que pudessem vir a acontecer no ambiente da

escola. Nesse sentido, o locus da pesquisa foi enriquecedor. Foi possível observar que as

assembleias se apresentam enquanto estratégia adotada pela escola para estimular a

participação. Nossas observações revelaram que a diretora considera que tais assembleias

foram instituídas como plano de ação em 2007 para elaborar e avaliar o PPP e se

estenderam, na prática, como arenas para discutir outros assuntos, além do PPP, como a

destinação dos recursos do PDDE, eleição dos membros do colegiado, prestação de contas

do caixa escolar, elaboração do calendário da escola e definição das atividades extraclasse.

Considerando Romão e Padilha (2013), Hora (2013) e Pereira (2008), que dizem que

a prática democrática da escola estimula o opinar, o discutir e o resolver os assuntos

pertinentes à comunidade de forma coletiva, constatamos a intenção da escola pesquisada

de instituir o exercício democrático e confirmamos, como apontam os autores, a

118

possibilidade da gestão democrática servir como canal para a participação da população em

assuntos pertinentes à coisa pública.

Segundo a diretora da escola, as reuniões de professores, alunos e pais são

frequentes e integram as atividades da escola: a primeira assembleia presenciada pelo

pesquisador foi dos alunos dos anos finais do ensino fundamental – a supervisora

pedagógica os reuniu no salão de festas para expor como a recuperação aconteceria a

partir de 2014. A supervisora explicou que a recuperação que sempre aconteceu nos finais

dos semestres ainda continuaria, mas que outra recuperação também passaria a acontecer,

de forma paralela, todos os dias e com todos os professores. Os alunos reagiram bem à

informação, mas questionaram se isso geraria mais trabalhos para casa.

A segunda assembleia observada foi a de pais de alunos dos anos iniciais (1º ao 3º

ano), onde foram eleitos os membros deste segmento para o conselho da escola. Esta

reunião foi coordenada pela presidente do conselho da escola, uma das supervisoras, e teve

a presença da diretora. 379 pais compareceram e 425 alunos estão matriculados nestes

anos. Nesta reunião, a diretora também teve a palavra para orientar os pais no sentido de

acompanhar os filhos no processo escolar, durante todo o ano. Salientou que a importância

deste acompanhamento e pediu para que os pais se esforçassem para comparecer sempre

à escola para se inteirarem sobre o trabalho desenvolvido pela escola e pelo filho. A diretora

também fez observações quanto aos horários e o calendário escolar, bem como sobre o

processo de recuperação doas alunos e a forma de comunicação com os pais, que é feito

através de bilhetes ou memorandos, entregues aos alunos.

A terceira assembleia presenciada ocorreu com o mesmo objetivo, com pais de

alunos dos 4º e 5º anos, e compareceram 304 pais, dos 344 esperados. Com a mesma

proporção de presença, a quarta assembleia foi com pais 6º e 7º anos, no entanto, nesta

ocorreu um fato:

Finalizada a reunião, um grupo de oito pais se dirigiu à diretora para cobrar a entrega do material didático aos alunos. As aulas já haviam iniciado há mais de dois meses e os livros não haviam sido entregues aos alunos. A diretora, constrangida, informou que estava na dependência do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e que a Secretaria Municipal de Educação ainda não tinha recebido o material do Ministério da Educação, e que isso deveria ser regularizado em poucos dias. (CADERNO DE CAMPO)

119

A observação da terceira assembleia nos remete a considerar a dependência da

escola em relação aos órgãos centrais da administração educacional, no que se refere aos

recursos necessários para que ela instrumentalize suas funções, confirmando, assim, um

quadro que Muranaka e Minto (2002) e Lima (2013a) descrevem como sendo de autonomia

relativa. Além disso, essa observação também confirma a dependência administrativa da

gestão democrática em relação a mecanismos burocráticos hierarquizados que controlam e

regulam os recursos destinados à escola pública. (LIMA, 2013a; 2002; MURANAKA;

MINTO, 2002; IANNI, 2007)

Também presenciamos duas reuniões de professores, uma com os professores das

séries iniciais do ensino fundamental e a outra com os professores as séries finais e do

ensino médio. Ambas as reuniões tiveram a mesma finalidade: discutir formas de aplicar a

“recuperação paralela” (recuperação processual e contínua) que foi implementada em

fevereiro de 2014 pelo PPP, visando reduzir a taxa de reprovação, que poderia

comprometer o “desempenho” da escola nas avaliações externas.

A reunião foi aberta pela diretora e as supervisoras conduziram os trabalhos. A

estratégia, discutida e aceita pelos professores, consistia na observação diária do professor,

aluno por aluno.

Ao final de cada semana o professor deveria procurar a supervisão, informar o nome dos alunos que estavam com dificuldade e esclarecer, especificamente, a dificuldade de cada um. Juntos, supervisora e professor indicariam o procedimento de recuperação para cada aluno, que poderia ser através de aulas de reforço, no contra turno, atendimento individualizado, na própria sala de aulas do aluno, segunda oportunidade para fazer provas ou trabalhos, ou até mesmo, se necessário, convidar a família para participar e estabelecer formas específicas. (CADERNO DE CAMPO)

Na reunião com os professores das séries finais do ensino fundamental e do ensino

médio, a discussão foi a mesma, mas também foi discutida a forma com que os professores

elaborariam o simulado preparatório para as avaliações externas. Os professores decidiram

que marcariam uma reunião entre eles após uma revisão que cada professor realizaria das

avalições já aplicadas. Após a reunião, indagada pelo pesquisador se as avaliações

externas comprometem o andamento do currículo, a diretora disse que não, pois o trabalho

era intensificado com os alunos, e isso garantia a qualidade da escola.

Como indicado na análise das propostas do PPP da escola, a observação das

reuniões dos professores confirmou que as avaliações externas, mesmo se contrapondo à

120

democratização, dadas as suas concepções controladoras e reguladoras, influenciam na

efetivação da autonomia da gestão democrática. O comprometimento dos docentes, ao

buscar novos instrumentos didáticos para atender os mecanismos burocráticos, impostos

pelo sistema de forma centralizada, e o envolvimento desses docentes com processos de

mudanças para adequar o trabalho pedagógico aos indicadores performáticos do modelo de

administração gerencialista, demonstram as influências das avaliações externas e a

apropriação desses mecanismos por parte da escola, indicando, neste caso, a

domesticação e a relativização dos aspectos pedagógicos da autonomia da gestão escolar.

(LIMA, 2013a; 2013b; 2011b; 2007; 2002; SANDER, 2005; MARTINS, 2002)

Da mesma forma, a observação da diretora, que considera a garantia da qualidade

da escola decorrente da intensificação do trabalho com os alunos, nos mostra, na realidade,

um cenário de trabalho docente intensificado, numa proposta de mudança que adiciona aos

procedimentos didáticos necessários para o desenvolvimento do currículo escolar,

instrumentos para atender às avaliações externas e melhorar os indicadores que resultam

destas avaliações. Neste sentido, confirmamos capacidade extensiva das avaliações

educacionais, indicadas por Lima (2011b) como hiperburocráticas:

A avaliação educacional hiperburocrática resulta, deste modo, não apenas da não superação dos mais importantes traços da racionalidade técnico-instrumental que caracterizam a constelação de dimensões a que Weber chamou “burocracia”, mas também da burocratização extensiva e em profundidade do processo educacional, na radicalização da sua obsessão pela escolha ótima, da imposição da performance competitiva baseada em resultados quantificáveis, de novas formas de controlo e de escrutínio da ação dos profissionais, frequentemente representados como corporações

conservadoras e resistentes à modernização. (LIMA, 2011b, p. 79)

A primeira reunião do conselho da escola observada foi convocada exclusivamente

para prestação de contas dos gastos referentes à verba do Programa Dinheiro Direto na

Escola (PDDE) de 2013 e contou com dez membros, dos doze titulares (se ausentaram os

representantes dos alunos e dos funcionários). O pesquisador foi apresentado aos

conselheiros presentes pela diretora da unidade, que fez questão de observar que o

conselho da escola não é por ela presidido e que, por praxe, a escola não elegia o diretor

como presidente: atualmente é presidido por uma supervisora. Observamos que esta

“praxe” não está regulamentada nos documentos da escola e que se trata, portanto, de uma

regra informal praticada pela escola.

121

Nesta reunião, a presidente do conselho de escola relacionou tudo o que foi

adquirido com a verba do PDDE: livros, computadores, gramáticas, dicionários,

calculadoras, tinta para as paredes e para as portas, livros de literatura, esquadros,

compassos, mapas, bandeiras, roçadeira, etc., os cinco mil e seiscentos reais foram gastos

em material de consumo e material permanente – meio a meio, tudo que já havia sido

aprovado pelo conselho. Foi apresentada toda a documentação das licitações das compras

realizadas, item a item adquirido.

Os documentos foram distribuídos aos conselheiros que passaram a analisar cada documento e assinar a aprovação. Neste interim, a diretora, mostrou o livro de atas de reuniões do conselho, com assembleias rigorosamente a cada trinta dias. Também explicou que, após cada reunião, é feito um resumo da ata, copiado e entregue a todos os alunos. (CADERNO DE CAMPO)

Esta explicação da diretora nos remeteu à Tatagiba (2003), que aponta a

transparência e a publicidade de decisões e informações como princípios que devem nortear

as normas institucionais que se regem pelo modelo participativo e democrático.

A diretora também mostrou como é a burocracia para prestação de contas do PDDE,

e como esse processo demanda tempo e dedicação da gestão escolar: “Além de ser muito

burocrático para gastar o dinheiro do PDDE, depois de aprovado aqui, ainda vai tudo para a

Secretaria de Educação, que confere de novo” (DIRETORA). Consideramos, aqui, os

aspectos burocráticos que permeiam os gastos com recursos do PDDE: o Artigo 16 da

Resolução n. 10 do Conselho Deliberativo do FNDE adota os procedimentos estabelecidos

pela Lei n. 8.666, de 21 de junho de 1993, que estabelece normas sobre licitações e

contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, compras, alienações e locações no

âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,

subordinando ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos

especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, incluindo, desta

forma, a escola pública e fazendo com que a gestão democrática esteja subordinada e

condicionada ao controle e às normas burocráticas centralizadas, mesmo se tratando de

recursos financeiros oriundos de um programa com proposta desburocratizante, como o

PDDE.

Coincidentemente, a segunda reunião tratou de assunto correlato, mas de outro lado:

a segunda reunião do conselho da escola, observada pelo pesquisador, teve como objetivo

estabelecer as regras para verificar o que seria comprado pelo PDDE de 2014: o conselho

122

estabeleceu que todos os segmentos deveriam fazer as suas assembleias para indicar o

que comprar com o dinheiro do PDDE e sinalizou que não aprovaria a compra de materiais

ou equipamentos que a escola já possuía.

Apesar de o PDDE ter sido concebido para desburocratizar o repasse de recursos à

escola e ter se mostrado como programa capaz de vencer a rigidez da administração

federal, estabelecendo uma relação direta entre a esfera federal e a unidade escolar, como

apontam Dourado (2007) e Adrião e Peroni (2007), a análise do caso em questão nos

mostra que as normas burocráticas cercam, delimitam e restringem a destinação de tais

recursos, confirmando, pois, uma relativa autonomia da escola para gerir o dinheiro recebido

do PDDE, como apontam as discussões de Martins (2002), que nos diz que a escola não

goza de autonomia e que os recursos financeiros e o poder de decisão sempre estiveram

centralizados, apesar da análise também confirma que o PDDE redireciona o conselho da

escola como espaço de participação e deliberação, como indicado por Dourado (2007).

Neste caso, nos parecem convenientes as considerações de Tatagiba (2003) que, ao

analisar as possibilidades daquelas reformas educacionais promovidas nos anos de 1990,

considera que elas evidenciam a transferência de responsabilidades e encargos

operacionais para a escola, o que não implica em descentralização dos aspectos financeiros

e de controle de resultados e resulta na autonomia relativa do conselho da escola para gerir

o dinheiro recebido do PDDE.

A terceira reunião do conselho da escola tratou da organização da festa junina da

escola: depois de um longo debate que envolveu o que vender e por quanto vender, os

conselheiros elaboraram uma tabela de preços, registraram na ata e encerraram a reunião.

Apesar de podermos considerar essa terceira reunião como exemplo de deliberação

do conselho da escola, inclusive em questões extra pedagógicas, o conjunto das reuniões

observadas nos remete às análises feitas por Lima (2011a; 2011b) sobre as reformas

gerencialistas do Estado. O autor observa que tais reformas resultam num quadro de mais

gestão para menos democracia.

Parece ser este o quadro que emana das observações das reuniões de professores

e do conselho da escola: um quadro de discussões sobre a efetivação de atividades para

atender às avaliações externas, articulando-as com o currículo escolar prescrito, e

discussões sobre o que comprar ou não comprar, seguindo normas impostas. Discussões

estas permeadas por traços hiperburocratizados, como as avaliações externas, as normas e

prescrições centralizadas, que limitam o exercício da gestão democrática à

123

operacionalização meramente instrumental. Tais constatações nos levam a concordar com

Lima (2011a; 2011b) e a considerar a autonomia da gestão democrática como ilusória e a

participação, que decide o que se pode ser decidido, caracteriza-se como uma participação

conduzida pelas políticas da administração central.

4.4. As entrevistas

Nesta seção, fazemos a análise das entrevistas e salientamos que todos os

entrevistados foram informados sobre a natureza da pesquisa e assinaram o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido. No caso do aluno, que é menor de dezoito anos, o

Termo foi assinado pela mãe do aluno.

Na entrevista, a diretora relata que a implantação da gestão democrática na escola

se deu a partir de 2007, quando foi eleita como vice diretora. Este ano é marcado pelo início

da gestão escolar, com diretores eleitos, como previsto na LC 22, e com os princípios

democráticos consagrados no primeiro PDME do município, aprovado pela Lei 8.229 de 29

de dezembro de 2005. Em 2010, concorrendo à reeleição, a chapa apresentou como

proposta um plano de ação voltado à consolidação da gestão democrática, participativa,

transparente, fortalecendo o conselho da escola e descentralizando poder (PLANO DE

AÇÃO 2011-2014). Tendo sido reeleita vice diretora, atualmente exerce a direção, em

virtude de a diretora eleita ter se licenciado para ocupar, como titular, a Secretaria Municipal

de Educação.

Em sua entrevista, a atual diretora observa, como dificuldade para implantar a gestão

democrática, o desenvolvimento do hábito de participar das decisões e não assumir de

forma consensual uma decisão coletiva: “a gestão democrática é muito difícil, porque as

pessoas estão muito acostumas a cobrarem e muito pouco acostumadas a participar das

decisões e depois assumir essas decisões.” (DIRETORA)

Esta afirmação nos remete, num primeiro momento, a uma comunidade habituada à

escola fundamentada numa estrutura rígida e hierarquizada, onde as relações se dão com

base na submissão à autoridade do diretor da escola, como aponta Carina (2003). A autora

indica que o conceito de compartilhamento de decisões, ou a divisão de poderes, ainda não

é uma prática, pois a comunidade entende que a autoridade escolar está centralizada e é

exercida pelo diretor, fato compreensível se considerarmos que o papel do diretor é

conferido, pela política pública e que a autoridade do diretor está subordinada à formalidade

do sistema educacional. Ressaltamos, aqui, que a tradição burocrática está impregnada

historicamente na administração pública da educação e produz/produziu relações marcadas

124

pela hierarquização e a subordinação o que, aos olhos da sociedade, com o tempo, atribuiu,

para o dirigente escolar, uma figura de centralização de poder e autoridade.

A constatação de Carina (2003) vai de encontro às orientações da LC 26 (Quadro 3),

que atribui ao diretor da escola as funções relativas ao planejamento, coordenação, controle

e avaliação do trabalho escolar e a representação da escola perante os órgãos da

Administração, não fazendo nenhuma menção ao papel democrático do diretor e aos

conceitos de compartilhamento de decisões e divisão de poderes que permeiam a gestão

participativa e as decisões colegiadas. Numa contextualização destas, a reinvindicação à

autoridade é a forma da comunidade ter seus interesses e direitos atendidos.

Num segundo momento, consideramos a falta de experiência participativa da

comunidade, de interagir e atuar num contexto coletivo de tomadas de decisão: mais do que

um conceito, participar requer prática, e na prática democrática as decisões são coletivas.

Neste sentido, a escola apresenta uma alta taxa de presença dos pais, como confirmamos

nas observações das assembleias com os pais, e ressaltamos o empenho da escola em

manter as assembleias na rotina da escola, como proposta de estratégia de uma gestão

democrática.

A gestão democrática requer o despertar para a partilha de poder, a descentralização

da autoridade, e a valorização da participação que se concretize no envolvimento autônomo

e na consciência de que, participando, pode-se influenciar nas tomadas de decisão. (LIMA,

2013a; ARANHA; MARTINS, 2003; VASCONCELOS, 2011)

Neste sentido, constatamos, pela entrevista, que a direção da escola lidera um

processo que busca a mudança calcada na efetivação do hábito participativo e mantém para

si um papel de guardiã das decisões democráticas:

Então, o que nós fizemos, a partir da instalação efetiva do conselho e desta

gestão colegiada, a gente começou a não tomar decisões sozinhos, em

gabinete, resguardadas aquelas decisões que são da direção da escola,

mas tudo, primeiro, era perguntado para o grupo de professores, pais e de

estudantes, e aí então a gente decidia junto, sempre foi assim. A gente

caminhou bastante. Hoje, as decisões são mais partilhadas. Mas muitas

vezes, a gente ainda tem que fazer valer aquela coisa assim: mas vocês

votaram! E muitas vezes a gente ouve assim: perdi e não quero fazer desse

jeito! (DIRETORA)

125

Apesar da fala da diretora indicar a partilha de decisões, ela ainda resguarda, para si,

as decisões pertinentes ao cargo e as explicita como sendo aquelas assinaladas pela

legislação, como a responsabilidade de representar a escola perante os órgãos oficiais,

presidir o caixa escolar e controlar o trabalho, confirmando, assim, novamente, os

apontamentos de Carina (2003) sobre a prática de uma a autoridade tradicionalmente

burocrática, subordinada à hierarquia do sistema e oficialmente instituída pelas políticas

públicas.

Se considerarmos que a legislação também dá autonomia ao conselho da escola

para deliberar sobre todos os assuntos relativos ao ensino e que essa mesma legislação

omite a responsabilidade do dirigente em relação à gestão democrática, tal discurso da

diretora nos revela uma contradição instituída pela regulamentação que compromete as

relações institucionais da escola e a conduzem para o exercício da autoridade, ainda

latente, como tradição, na legislação educacional.

Por outro lado, quando a diretora fala sobre a não aceitação das decisões por parte

de alguns atores, verificamos a existência de um quadro de participação ao qual Lima

(2013a) se refere como convergente e divergente. Num contexto de decisões coletivas, não

assumir a decisão tomada coletivamente é ato de contestação, de divergência à decisão

tomada, de opor-se às propostas, mas também é uma forma de colocar-se na minoria que

participa de forma divergente e, gerando conflito, enriquece o processo de democratização.

A gestão democrática não pode calcar-se na imposição indiscutível da decisão da

maioria e na admissão consensual de todos: para Lima (2013a), no processo de mudança

de renovação, a participação divergente não é, necessariamente, uma oposição ao

desenvolvimento, ou um sinal de desinteresse à participação. Declarar a divergência é uma

forma de participar. Como diz o autor, uma vez consagrada e decretada a participação, para

a gestão democrática, a não participação é o problema, pois implica numa opção voluntária

de não participar, ou numa não participação induzida, o que não parece ser o caso, dado o

empenho e a proposta da direção de efetivar a participação e descentralizar as decisões da

gestão.

O mecanismo apontado pela diretora para descentralizar as decisões e fortalecer a

participação foi as assembleias de segmentos. A diretora relata que as assembleias foram

instituídas para elaborar o PPP, no entanto, esse mecanismo é usado frequentemente pela

escola sempre que uma decisão que implica o coletivo precisa ser tomada: as observações

revelaram que as assembleias são convocadas para eleger membros do conselho da

escola, para avaliar e mudar o PPP e para discutir a destinação de verbas.

126

Quanto à autonomia, a diretora declara que “Dentro do município a gente tem uma

autonomia até bastante grande: a gente brinca que tudo aquilo que não fere a lei a gente

pode fazer” (DIRETORA), no entanto, se considerarmos Lima (2013a, 2007), e o conceito de

autonomia relativa, que se define na limitação da autonomia da escola por mecanismos

legais, criando margens funcionais que mantêm a escola num quadro de submissão,

consideramos que a entrevistada revela que sua autonomia está limitada ao cotidiano

operacional da escola e às questões instrumentais, típicas das unidades periféricas do

sistema, confirmando, assim, a relativização da autonomia da escola que a análise dos

documentos e das observações já havia nos relevado:

[...] nós temos que cumprir duzentos dias letivos e oitocentas horas, isso

não é discutível, mas eu posso determinar o cumprimento de uma carga

horária num sábado, num determinado tipo de evento, eu tenho autonomia

pra isso! Eu tenho autonomia para gerência de projetos. Eu tenho

autonomia de participação, ou não, em eventos. Nisso tudo a gente tem

autonomia. A gente tem autonomia de gerência de turmas, por exemplo:

que professor vai estar em qual turma. Sempre resguardando a questão

legal, né! O professor é concursado para aquilo e tem tais direitos legais.

Autonomia de mudança de professor de turma, isso é uma gerência da

própria escola. Da necessidade de gerência na mudança, mesmo de um

funcionário operacional: eu preciso dele num determinado horário, ele vem

para trabalhar de manhã, cabe à escola determinar como será o horário de

manhã, de sete a uma e de oito às duas horas, a gente tem essa

autonomia, por exemplo. (DIRETORA)

Ao se referir às decisões colegiadas, a diretora se referiu a todas as decisões que

dizem respeito a gastos de verbas e também às decisões que interferem na vida do aluno e

citou, como exemplos, a organização da festa junina, os gastos das verbas oriundas do

FNDE e o controle do caixa escolar.

A fala da diretora nos remete a Lima (2013a), que considera que a participação

direta, em níveis intermediários e operacionais, tem se tornado uma tendência em áreas

com certa autonomia, mas ressaltamos que esta “certa autonomia” está restrita aos

aspectos pedagógicos, típicos do domínio operacional escolar, como a revisão/alteração do

PPP, no que se refere ao processo de recuperação dos alunos, a aspectos financeiros, no

que se refere à decisão da destinação da verba e à prestação de contas do PDDE, que foi

gasto segundo prescrições e controles externos.

127

Indagada sobre como era a participação, a diretora relatou que, quanto mais novo o

aluno, mais a família participa. Também relatou que os segmentos, assim como o conselho

da escolha, têm reuniões mensais:

Mas geralmente as pessoas são bem participativas. Normalmente, em todas

as reuniões por segmento, sempre tem alguém do colegiado. No bilhete que

a direção manda avisando da assembleia, a gente já avisa o assunto e, se

for o caso, a gente fala que nos assuntos a serem abordados está a eleição

daquele segmento para o colegiado, desta forma as pessoas vêm para a

reunião sabendo que será abordado esse assunto. (DIRETORA)

As reuniões do conselho da escola são à noite porque os pais não podem durante o

dia e a diretora confirma a participação de pais, funcionários administrativos, de funcionários

operacionais, de professores e de alunos, mas observamos, pela entrevista, que os

professores e funcionários não são remunerados por trabalho extra e os alunos que

participam do conselho têm mais de 16 anos e são do ensino médio. Os alunos menores de

16 anos são representados no conselho da escola pelos pais. Quando indagada sobre como

ocorria a participação da comunidade, a diretora se referiu à comunidade escolar e aos pais:

Nossa comunidade é difusa, porque a gente tem alunos da cidade inteira.

Então a gente não tem uma comunidade. Tenho muitos alunos aqui dos

bairros mais próximos, mas temos também alunos da cidade inteira. Então a

comunidade do colégio é uma comunidade de pais de alunos, não é uma

comunidade geográfica, da região da escola, e são esses pais que

participam. (DIRETORA)

Quanto à presidência do conselho da escola, a diretora relata a proposta inicial, com

o plano de trabalho com o qual foi eleita, de descentralizar o poder. No entanto, a prática em

que o diretor não preside o conselho, não se mostra nos regulamentos do sistema e nos

regimentos e estatutos da escola, o que caracteriza tal prática como informal.

Diretor e vice da escola só presidem o caixa escolar, e o caixa escolar é um segmento dentro do conselho. O caixa escolar é de responsabilidade da direção da escola, pois ele é vinculado a uma conta bancária, assim é o diretor que assina cheques, em conjunto com o tesoureiro, e esse não pode ser outra pessoa, a não ser o diretor da escola. Mas o conselho é dirigido por outros. Desde que a gente assumiu essa era uma proposta que agente

128

brincava com os meninos assim: não dá para ser prefeito e presidente da câmara. Então a gente tem que ter o prefeito, mas a câmara tem que ser dirigida por outra pessoa. Assim que a gente ensina para os meninos. A gente é o prefeito, mas o presidente da câmara tem que ser outro. (DIRETORA)

Observamos nesta fala, também, que a metáfora “Assim que a gente ensina para os

meninos. A gente é o prefeito, mas o presidente da câmara tem que ser outro.” (DIRETORA)

pode ter um duplo sentido: ao mesmo tempo em que a diretora enfatiza que o cargo

executor não pode presidir, também, o conselho da escola, enquanto arena deliberativa. A

metáfora mostra a possibilidade dos “meninos” entenderem que existe hierarquia entre eles,

a direção e o conselho da escola, o que pode indicar uma contradição, tendo em vista

Tatagiba (2003), que considera, como pré-requisito para o modelo democrático de gestão, a

igualdade entre os atores.

Ao falar sobre a participação dos professores na elaboração do PPP, a diretora usou

como exemplo as decisões sobre as atividades que seriam desenvolvidas e o calendário

dessas atividades para 2014, e também na revisão feita no PPP, que implicou na

implantação de uma avaliação processual (até então a escola fazia somente recuperação

nos finais de semestres): “[...] hoje eu fiquei muito feliz porque a gente jogou para o grupo a

questão de como resolver o nosso problema de recuperação processual.” (DIRETORA).

A fala também mostra o desencadear da responsabilização provocada pelas

reformas de 1990, confirmando o que diz Tatagiba (2003): as reformas podem significar a

desresponsabilização do Estado, que transfere responsabilidades e encargos operacionais

aos atores da sociedade civil, o que não necessariamente implica em descentralização dos

aspectos financeiros e de controle de resultados. Como diretora, detentora da atribuição de

representar a escola, a diretora transfere para a coletividade a responsabilidade de resolver

problemas operacionais relativos à recuperação dos alunos, visando atender às avaliações

externas. Neste sentido, a entrevista também mostra evidências dos efeitos das avaliações

externas sobre os processos pedagógicos da escola. A diretora relata que os professores

usaram de um tempo destinado a um projeto de estudos, denominado de “Eu estudo, tu

estudas”, para debater sobre a adoção da recuperação processual.

[...] não adianta eu recuperar o aluno de notas, se depois ele vai ser

avaliado de outras formas. O colégio tem um bom desempenho frente às

avaliações externas, mas o que eu tenho que fazer para isso não cair. Às

vezes, é mais difícil manter do que subir. Eu acho que as avaliações

externas são necessárias, são boas, elas não podem ser só o único objetivo

129

da escola, senão a gente vira robô, mas acho que elas são um parâmetro

indispensável para a escola, enquanto gestão, o quê que eu to fazendo

bem, o quê que eu to fazendo mal [...] (DIRETORA)

Nesta afirmação da diretora temos quatro considerações que nos levam a

determinar, segundo Ball (2004) e Sander (2005), um pressuposto de colonização dos

aspectos pedagógicos da escola por parte das avaliações externas: a escola tem um bom

desempenho nas avaliações externas e se preocupa em adotar medidas pedagógicas para

que o desempenho não caia; que estas avaliações não são o único objetivo da escola; que

tais avaliações constituem um parâmetro para avaliar a gestão; e que tais avaliações,

segundo Lima (2011b), adquiriram dimensões hiperburocráticas, de forma extensiva e em

profundidade, a ponto de, no caso em questão, colonizar a fala da diretora e submeter a

escola e os seus procedimentos didáticos, configurando, pois, um cenário que exemplifica a

responsabilização desencadeada pelas reformas de 1990.

A fala da diretora também revela fatores interessantes quanto à autonomia.

Especificamente, quanto à gestão dos recursos humanos, a diretora revela não ter nenhuma

autonomia, dada as características da administração pública. Quanto à autonomia financeira

e as decisões sobre o uso dos recursos da escola, a diretora mostra preocupação com o

destino do dinheiro e o seu uso com materiais desnecessários.

A diretora declarou ter autonomia para gerir os recursos do PDDE, mas fez

observações que se trata de verba com destino predefinido e sob o controle do sistema, o

que nos remete a considerar uma autonomia financeira relativa da escola, com base em

Muranaka e Minto (2002), que afirmam que autonomia financeira está condicionada aos

valores definidos pelo governo central e que devem ser gastos com despesas predefinidas,

mas também em Martins (2002), que nos diz que, na atualidade, a palavra autogestão

desapareceu, tal como desapareceram os eixos centrais conferidos à autonomia (os

conselhos gestores e a auto avaliação institucional) e, no discurso político das reformas dos

anos 1980 a 1990, a autonomia passa a ser associada aos procedimentos administrativos e

financeiros que ampliam os encargos e responsabilidades das escolas públicas; e em Lima

e Afonso (2002), que acrescenta que a questão não pode ser entendida somente em

critérios nominalistas e na boa fé em relação ao discurso sobre autonomia na escola,

considerando a ambiguidade entre o discurso político e as normas e regulamentações.

130

[...] vai vir muito dinheiro. Nós conseguimos desenvolver aqui no colégio o

sentimento de prezar e manter o que tem. A gente vai chegando num ponto

que você fala assim, que eu vou fazer com esse dinheiro, para que ele seja

bem empregado, para que eu não fique simplesmente trocando tecnologia

por trocar e que ele seja mesmo indispensável. Então, como fazer? Nós já

começamos a receber o dinheiro do FNDE, no caso, do Programa Dinheiro

Direto na Escola. Aí a gente começa a pensar. (DIRETORA)

A diretora enfatizou a horizontalização das relações de trabalho, que só foi possível

com o advento da gestão democrática: “Eu brinco dizendo que quando eu comecei a

trabalhar, eu chorei na diretoria e eu era professora concursada. Você vinha achando que

tava fazendo uma coisa boa, a direção não concordava e ela tinha capacidade de te fechar

na sala e te dar bronca, feito criança. Certo! Você não tinha argumento. Não podia

argumentar”.

Observamos que, a horizontalização das relações de trabalho, no interior da escola,

propiciada pela gestão democrática, não sinaliza, com efeito, a redução da hierarquia

existente entre a escola, enquanto unidade, e o sistema, enquanto agente centralizador das

políticas de planejamento, controle e avaliação; no entanto, a horizontalização percebida

pela diretora demonstra a potencialidade da democratização da gestão, no que se refere à

dinamização dos processos de participação coletiva e distribuição da autoridade que,

outrora, estava centralizada na figura do diretor.

Neste sentido, podemos afirmar que, no interior da escola, se confirma a proposta de

horizontalização e de descentralização nas tomadas de decisão, como nos indicam Silva

(2011) e Nohara (2012), mas não por força da política de administração gerencialista, e sim

por efeito da democratização da gestão escolar; já em suas relações externas, como nos diz

Krüger (2012), a escola mantém-se verticalmente submissa à administração pública, de

tradição burocrática e prática centralizadora.

Apesar desta submissão da escola à administração centralizada, o professor

entrevistado mostra uma visão otimista em relação à gestão participativa: o professor

entrevistado atua há 29 anos e ministra aulas de geografia e história. Há 22 anos é

professor na escola pesquisada, tem uma carga horária de 44 aulas semanais, trabalha com

17 turmas e cerca de 530 alunos e, com toda essa carga de trabalho docente, é membro do

conselho da escola e tem uma visão otimista da gestão participativa. Faz a seguinte

avaliação da gestão democrática:

131

Não poderia ser melhor. Quando acontece o envolvimento entre direção,

professores, funcionários e sociedade, tem tudo na escola para melhorar a

qualidade do ensino e o aluno será, também, mais assistido. A gestão

democrática traz a sociedade pra participar, a gente enxerga isso e isso

fortalece a escola. Mas tem uma coisa, se os professores não enxergarem

essa participação, essa chance da escola se fortalecer, tenho certeza que

não aconteceria. Hoje, a escola precisa dessa participação. (PROFESSOR)

Apesar deste otimismo, temos que salientar, de acordo com a análise dos

documentos e das observações, que a escola não regulamenta e não tem a participação da

comunidade local, fato que nos leva a considerar, na fala do professor, somente a

comunidade escolar.

O professor refere-se à gestão democrática como uma forma de participação aberta

e valoriza a liberdade que esta gestão proporciona e o respeito com que os professores são

considerados. Para o professor, o conselho da escola tem poder de interferir em todos os

assuntos da gestão escolar e sempre tem “a palavra final”, propondo e censurando

propostas da direção: “Ele tem e a palavra final é (enfaticamente) do colegiado, senão não

tem porque ele existir, né? Se ele não tiver participação e não tiver voz e, então não tem

porque existir”. (PROFESSOR)

Esta perspectiva do professor vai de encontro à discussão de Bastos (2012) sobre a

existência de um conselho da escola atuante, configurado como instância coletiva destinada

à participação nas tomadas de decisão. Para o autor, o conselho da escola representa e

viabiliza a participação da comunidade na gestão da escola e deve ser concebido como

espaço de discussão, negociação e instância decisória. Neste sentido, enquanto

representantes eleitos, os conselheiros devem agir segundo as determinações de cada

segmento, discutindo, acompanhando e deliberando coletivamente sobre as demandas que

se fazem necessárias na escola.

Quanta a relação entre o colegiado e a direção, o professor se refere a um clima

amigável e de companheirismo, onde há a possibilidade de divergência, mas também há a

preocupação em manter a harmonia: “É uma relação assim: para somar na direção, não é

para dividir”.

Confirma a participação dos segmentos da comunidade escolar (professores, alunos

pais, direção, especialistas, funcionários administrativos e operacionais), mas ao se referir à

132

comunidade local, o professor desconhece a participação de segmentos externos à escola,

confirmando, portanto, a não participação deste segmento.

Quanto à eleição de diretor e a composição do colégio eleitoral, o professor relata

que somente alunos maiores de 14 anos podem votar e nem todos comparecem à votação:

A eleição é livre. O voto não é obrigatório. Professores, todos os

funcionários, alunos, nem todos, é uma representação de alunos, porque só

vota aluno com mais de quatorze anos, e pais de alunos. Ah, quem for votar

tem que se cadastrar no colegiado antes da eleição. Aqui no colégio, foram

mais de mil votos na última eleição de diretor. (PROFESSOR)

Também confirma a eleição dos membros do colegiado pelos segmentos, mas

também aponta a aclamação como forma de escolha dos representantes, e indica que a

aclamação é uma forma “mais interessante”:

Aclamação também acontece. Uma coisa também, Mário, é um se

candidatar... se dois, três se candidatarem, aí sim tem eleição com voto,

senão, se for só um candidato, vai por aclamação. Um só vai por

aclamação. E pra te falar a verdade, a gente até procura combinar que seja

só um candidato, mas nem sempre acontece. Os professores, por exemplo,

são muito unidos, procuramos sempre formar um grupo. Aí combinar por

aclamação é mais interessante. (PROFESSOR)

As reuniões do conselho da escola são no período noturno devido à impossibilidade

dos pais participarem se a reunião for durante o dia. Assim, os professores que fazem parte

do conselho da escola atuam, enquanto conselheiros, de forma voluntária.

Segundo o professor, ele e os demais professores (divididos nas áreas de

comunicação, ciências exatas e ciências humanas) participam da elaboração e da revisão

do PPP e por ser um tema que envolve toda a escola, todos na escola são envolvidos, ao

final de cada ano letivo, nestes processos de elaboração e revisão do PPP.

Se observarmos a fala do professor e o que dizem Tatagiba (2003), Ribeiro (2006),

Souza (2011), Pereira (2012), Wrege (2012) e Lima (2013a), sobre a importância de a

gestão escolar democrática valorizar os processos coletivos de participação, principalmente

nas tomadas de decisões que envolvem o PPP, devemos considerar que a escola atende e

133

pratica este pressuposto, ao envolver tanto os professores quanto os demais segmentos da

comunidade escolar nos processos de elaboração e avaliação do PPP.

Para o professor, o planejamento e a prestação de contas dos gastos dos recursos

financeiros são coordenados pela direção, no entanto, o conselho da escola avalia este

planejamento e fiscaliza a prestação de contas.

Quanto ao valor dos recursos destinados à escola, o professor considera que tais

valores têm sido suficientes, mas observa que tais recursos têm finalidades determinadas, e

dá testemunho de que alguns itens de materiais já foram adquiridos e não são mais

necessários, o que está levando a escola a questionar em que gastar, para não incorrer em

excessos e, ao mesmo tempo, aponta necessidades que não dispõem de recursos:

Tem necessidade de recursos para a manutenção. Nós estamos num prédio

velho que precisa de muita atenção quanto à manutenção. O espaço da

escola é ótimo, mas é um prédio antigo, histórico. Não vem recursos para a

manutenção do patrimônio. Os recursos já são direcionados: ou é material

ou é imaterial, bens duráveis ou não, mas dentro das regras onde se pode

gastar. Eu acho que vai chegar um tempo onde a escola vai ter um excesso

de material, porque é dinheiro que vem para a compra de material que você

não precisaria ter. Mas como o dinheiro tem de ser gasto em determinadas

coisas, até mesmo a diretora tem dificuldade: - o que nós vamos fazer com

esse dinheiro? Já temos todos esses materiais que esse dinheiro é

destinado para comprar, e já temos esse material disponível. E não PODE

(enfático) ser gasto em outro setor. Nós temos coisas novas aqui, dentro de

caixas, sem uso: caixas de som, brinquedos, filmes, computadores, data

show, DVD, tudo novo, disponível, por exemplo. (PROFESSOR)

O depoimento do professor vai de encontro à fala da diretora, e reforça um exercício

relativo de autonomia financeira da escola: são necessários recursos para manutenção, mas

os recursos que chegam à escola são direcionados e não podem ser usados para este fim.

Além disso, o professor, tal qual a diretora, demonstra preocupação com gastos

desnecessários, o que nos mostra que as políticas financeiras controladas externamente,

como a do PDDE, carecem de revisão, de forma a propiciar à escola maior autonomia para

gerir suas reais necessidades.

Desta forma, somos levados a considerar a ideia de autonomia dada segundo os

limites das normas externas, que relativizam as possibilidades de decisões no âmbito da

escola, e a ver a descentralização como mera transferência de responsabilidades e

encargos (OLIVEIRA, 2002) que não implicou em democratização, pois: a) confirmamos o

134

que diz Shiroma (2009), que considera que os processos de descentralização, no caso

brasileiro, se caracterizaram pela desconcentração de responsabilidade e pelo poder

limitado no que se refere às tomadas de decisão ordinárias, relativas às questões próprias

da gestão do cotidiano escolar; b) confirmamos as considerações de Lima e Afonso (2002)

sobre o discurso da descentralização que, na prática, delegou às escolas a gestão dos

conflitos e às responsabilizou pela execução de orientações políticas centralizadas, sem

permitir a legitima participação popular na elaboração dessas políticas e sem admitir que

elas poderiam/deveriam ser assumidas pela escola; e c) confirmamos os aspectos

gerencialistas que centralizam decisões, prescrevem normas e controlam as atividades, tal

como descreve Lima (2013a), caracterizando uma administração burocrática, ou como

hiperburocrática, (LIMA, 2011b), dado o grau de intensificação e a amplitude dos

mecanismos de controle da administração pública.

Apesar desta consideração, a mãe de aluno também mostra uma visão otimista em

relação à gestão democrática: mãe de um aluno de oito anos, a entrevista está no conselho

da escola desde que o filho estava na educação infantil, estando, pois, no segundo mandato

de conselheira. Ao falar da gestão democrática, ressalta como ponto positivo a iniciativa da

gestão da escola quanto à abertura para que todos possam dar opinião: “A escola deixa de

ser segredo, né?”. Segunda a entrevistada todos na escola participam da revisão do PPP

(pais professores, alunos).

Eu acho que o colégio municipal é uma escola democrática. Por exemplo, todos aqui chegam pra... pra conversar, sempre. Pra começar, o projeto da escola, a gente participa, ouve, dá opinião. Eles ouvem todo mundo: professores, pais, alunos. Isso é bom porque a gente fica sabendo como é a escola que o filho da gente tá fazendo. Tem reunião no começo do ano, todo mundo conversa e vê o que tá dando certo, o que pode melhora. A gente dá a opinião da gente. Os funcionários também dá opinião, e isso é bom porque a gente fica conhecendo tudo que acontece na escola. Então é uma escola democrática, sim. Tem abertura pra todo mundo, né. (MÃE DE ALUNO)

Observamos que a fala da mãe mostra o princípio participativo do modelo

democrático que, segundo Tatagiba (2003), fundamenta-se no diálogo entre os sujeitos

como pré-requisito para as deliberações coletivas. Segundo o relato, e calcados em Lima

(2013a), podemos observar que o espaço da gestão democrática é propício ao ouvir e ao

dar opiniões, o que nos revela um grau de envolvimento em relação aos objetivos da escola

e a consciência da possiblidade/capacidade de influenciar nas tomadas de decisão, o que

nos leva a determinar a prática de uma participação ativa por parte da mãe.

135

Em sua entrevista a mãe de aluno confirma que os membros do conselho da escola

são escolhidos por seus pares e que a presidência do conselho não é exercida pela diretora:

“Teve uma época, aqui, no tempo pra trás, que era a diretora. Mas agora, hoje em dia, não é

mais. As últimas duas foi supervisora”. (MÃE DE ALUNO)

Tal como a diretora, a mãe de aluno mostrou uma fala impregnada pelo discurso das

avaliações externas (BALL, 2004; SANDER, 2005) e, ao opinar sobre as avaliações

externas e o desempenho da escola, relatou a preocupação da escola com a queda

observada no indicador do IDEB da unidade, o que implicou em alterações nos processos

de avaliação e de recuperação dos alunos:

Parece que é bão. O povo fala que vai bem. Diz que caiu um pouquin. A gente tava conversando esses dias, ai eles tão preocupado. Tão correndo atrás pra recuperar. Querem mudar o jeito de fazer recuperação, pra ver se melhora. [...] Então. Teve uma reunião com os professores. Parece que eles não querem deixar os alunos perder essa avaliação. Agora tão falando que é melhor pro aluno fazer mais de uma avaliação. Não deixar o aluno fazer só uma prova. Eles chama de processual. Mais ampla, avaliar o aluno sempre. Acho que é assim. Não é pra parar só numa prova escrita. Vai que naquele dia o aluno não tá bem. Então tem que avaliar sempre. (MÃE DE ALUNO)

Também confirmou a atuação do conselho da escola nas decisões sobre os gastos

dos recursos financeiros: “Ah, eles levam pro conselho, passa tudo. A diretora e o tesorero.

O conselho olha, vê tudo ali. Lá no conselho que a gente vê tudo e aprova.” (MÃE DE

ALUNO), no entanto, a entrevista demonstra a limitação da gestão da escola ao dizer que:

[...] eles falam que esse dinheiro não pode usar em reforma do prédio. Eles fala que o conselho decidir fazer uma reforma, não pode. Tem que ser a prefeitura pra fazer. Então já é mais complicado. Porque é eles que tem que fazer. Tem os pequenos lá em cima, ai a gente quer fazer alguma coisa pra eles ficar mais protegido, não pode, né. Tem que esperar a prefeitura. É mais complicado. Então não depende só da gente decidir. (MÂE DE ALUNO)

A entrevista com a mãe de aluno confirma que as funções deliberativas e consultivas

do conselho de escola, regulamentadas formalmente pelos documentos municipais, fazem

parte da prática gestora da escola, no entanto, está formalidade não garante a autonomia da

escola, que se mantém atrelada aos regulamentos que orientam os gastos financeiros.

136

Já a entrevista com a funcionária nos revelou a prática processos informais,

principalmente em relação à eleição de representantes para o conselho de escola. A

funcionária trabalha há quinze anos na escola e é membro do conselho da escola há dois

anos. A entrevistada revela que não foi eleita para o conselho e sim convidada, pois não

havia outra pessoa do segmento interessada em participar. Esta colocação nos leva a

questionar a supressão da eleição e prática de “nomeação-convite” e considerar tal

processo como irregular, tendo em vista a eleição como instrumento da democracia e sua

relevância na democratização das instituições escolares públicas, principalmente no que se

refere às tomadas de decisão no contexto das relações escolares, como defendem Dourado

(2013) e Paro (2003b). Como já apontamos na análise dos documentos, os quais não

regulamentam a participação, ressaltamos que a não regulamentação pode gerar uma

participação limitada a alguns atores, como aponta Lima (2013a).

Em sua entrevista, a funcionária diz que o conselho se reúne regularmente uma vez

ao mês e que todas as decisões são tomadas no conselho e que os conselheiros têm

liberdade para se manifestar. Quando questionada sobre a importância das decisões

tomadas pelo conselho, a entrevistada enfatizou as decisões que implicam nos gastos e

prestações de contas dos recursos financeiros de que a escola dispõe.

Olha, eu vou falar a verdade pra você. Eu sinto assim muito orgulhosa,

porque... eu acho, assim, que tudo, tudo, tudo que eles fazem, tudo, tudo da

gestão deles a gente participa mesmo, certo? Eu principalmente, sou uma

das que mais participa das coisas. Eu acho assim, que é ótimo, que é muito

boa essa gestão. Se continuar assim, do jeito que tá aí, tá bom.

(FUNCIONÁRIA)

Confirmou que o conselho atua na aprovação e fiscalização dos gastos dos recursos

financeiros, mas observou que “leva tamém aquela papelada depois, pra prestar conta. Aí é

mais complicado, porque não entendo daqueles papéis e dos números que eu não sou boa”.

(FUNCIONÁRIA)

A entrevistada também confirma que atua como representante de seus pares e

sempre conversa com eles e os ouve. Quando questionada sobre as eleições para a

direção, ela relata que já participou de duas eleições e que, neste ano, faz parte da

comissão eleitoral, pois é membro do conselho da escola. A funcionária relata que as

eleições são tranquilas, pois todos são muito unidos, e que geralmente não há necessidade

de se fazer campanhas eleitorais “[...] porque a gente já conhece todo mundo, entendeu? E

137

os pais já conhece todo mundo tamém, aí já vota todo mundo mais do mesmo jeito,

entendeu?”. (FUNCIONÁRIA)

Esta afirmação da funcionária vai ao encontro das nossas observações, que

revelaram um grau de participação e convergência dos interesses dos grupos segmentares

em torno das decisões tomadas, no entanto, a análise, até este ponto, mostra que as

decisões estão envolvidas pelos mecanismos hiperburocratizados, como as avaliações

externas, as normas e prescrições centralizadas, condicionando tais decisões ao que é

permitido pela administração central.

Quando foi indagada sobre o PPP, a entrevistada relata que sempre “Eles passam

pra gente. A gente tem reunião todo ano por isso. Principalmente quando tem coisa

importante, eles chama a gente pra passar pra gente... Aqui no colégio a gente não tem

nada pra reclamar, principalmente do diretor, e nem de professor.” (FUNCIONÁRIA), o que

nos remete a confirmar, segundo Tatagiba (2003), que a transparência, enquanto princípio

democrático, é uma prática da gestão da instituição, assim como o chamado à participação.

Esta visão, que salienta a importância de participar na revisão do PPP, não se

evidencia na entrevista do membro da comunidade, que desconhece o esse documento, no

entanto, ressaltamos que o entrevistado não participa do colegiado, como membro efetivo,

porque os horários de reunião são à noite, o que para ele, é horário de descanso, de estar

em casa. Ele se compromete, ajuda, mas de forma espontânea e durante o dia. Por isso,

limita-se a ajudar em pequenas obras e consertos. Às vezes ele é convidado a participar de

reuniões do conselho da escola, e comparece, para orientar sobre a necessidade de

reformas, indicar como fazer e o que comprar, o que nos leva a considerá-lo como

colaborador, mas enquadrado num contexto voluntário de não participação. (LIMA, 2013a)

Lembramos que o PDME delega à unidade escolar a competência de estabelecer a

composição do conselho da escola em seu estatuto, e que o estatuto do conselho da escola

pesquisada não prevê a representação da comunidade local, o que nos leva a considerar,

segundo Lima (2013a), a não participação imposta à comunidade local, além da não

participação voluntária.

Por estar em contato com os processos de manutenção, o membro da comunidade

conhece a rotina da escola no que tange aos recursos e aos gastos, e se refere às

discussões promovidas para orientar os gastos:

138

Eles falam muito isso. Eles fica um tempo discutindo no que vão gastar. Gasta tudo aqui mesmo. Com coisas pros alunos, maquinário eletrônico, livro, essas coisas. Que eu saiba é o que eu já ouvi aqui. Toda vez que eles quer comprar material, isso aquilo, se eles tem, eles não negam. Só que aí, na maior parte das vez, eles fala do dinheiro do caixa da escola. Se tem, vão junto comprar, compra, são preocupado com nota, traz as notas. Tudo muito direitin. A escola tendo o seu dinheirin, facilita, né. Até tenho que falar com a diretora, porque tá faltando lâmpada fluorescente, reator, aí ela vai ter que gastar do caixa da escola, porque se pedir na prefeitura, e se

chegar, vai demorar, aqui tem aula de noite né, não pode ficar no escuro. (MEMBRO DA COMUNIDADE)

Neste ponto, a entrevista demonstra que o “dinheirin” do Caixa Escolar, que é gerido

pela própria escola, propicia certa autonomia para que a gestão possa lidar com pequenos

reparos, no entanto, se considerarmos a escola enquanto patrimônio público, nós devemos

considerar a responsabilidade do erário público e salvaguardar o uso do Caixa Escolar.

O entrevistado mostra conhecer a escola, suas virtudes e necessidades. Ao avaliar a

gestão da escola, ele faz alusão aos elogios que a escola recebe por trabalhar a gestão de

forma participativa, e quanto à eleição de diretor e à atuação do conselho da escola,

comenta:

Ah, pelo menos a pessoa, teno uma visão de administração, é o básico, né. Escola tem que ter, né. E essa aqui é muito grande e dá muita dor de cabeça. Pra uma pessoa só, é muita coisa. Acho que pra uma pessoa só, assimilar tudo, deve dá o que fazer. Então essa história de eleição na escola eu acho bão, porque movimenta, né. E o povo da escola pode escolher o melhor, já que é eles que tá aqui todo dia, né. E é um jeito, tamém, de todo mundo ver o trabalhão que dá administrar uma escola grande dessas, né? [...]Eu acho que, pra ser diretor aqui, ele tem que conviver aqui dentro, né. Não pode vim de fora. Se for daqui fica mais fácil. Assim ele pega o fio das coisas mais fácil. E já conhece todo mundo, né, fica mais fácil de trabalhar. Se fosse alguém de fora, que não conhecesse aqui, seria muito mais difícil, e muito. Não conheceria o colégio, né. (MEMBRO DA COMUNIDADE)

Ao ser questionado especificamente sobre o processo da gestão democrática na

escola, o entrevistado associou este modelo de gestão com eleição, mas observou: “É esse

jeito de eleição, né? [...] Mas não é só eleição não, aqui eles fala que tem que ter eleição,

mas não adianta só a eleição. Já vi muito aqui eles fala que tem que participar. É ajudar, né,

não deixar um só faze as coisas. E é verdade, porque uma escola grande dessa uma

diretora só não dá conta, os outros têm que ajudar tamém, né.” (MEMBRO DA

COMUNIDADE)

139

Quando avalia o seu relacionamento com direção da escola, faz menção sobre

como, nos últimos anos, o relacionamento melhorou, período este que coincide com o início

da gestão com diretores eleitos: “Olha meu filho. Já vi muita coisa ruim nesse mundo. E eu

tenho minhas divergência. E nesses último oito ano, isso aqui tá uma maravilha. Nessas

parte de administração aqui, tem ido muito bem, tem dado certo”. (MEMBRO DA

COMUNIDADE)

Também mostrou conhecer como é o processo para obter recursos e ajuda do poder

público quando a escola, o que nos revela uma dependência da escola em relação ao

sistema. Quando o trabalho ou o serviço “é grande... Ah! Aí eles depende da prefeitura. Aí

você já sabe. Quando eles faz alguma coisa, quando faz (prolongando a fala), heim, demora

mais de um ano, dois anos.” (MEMBRO DA COMUNIDADE)

Caracterizado pela não participação (voluntária e imposta), o membro da

comunidade não é única exceção à participação ativa que predomina entre os demais

segmentos: a entrevista com o aluno nos revela, também, a não participação imposta à

maioria dos alunos, que tem menos de 14 anos.

Mas o aluno, que é representante do segmento no conselho d eescola, nos revela

que nem todos os alunos conseguem ter voz na gestão democrática e atribui esse fato à

quantidade de alunos:

Muitas pessoas que querem dar sua opinião, acho que não conseguem. Aqui tem muito aluno. Nem todo mundo consegue dar sua opinião. Não sei se é porque não querem, ou por medo, mas, não. [...] Muitos alunos, nem todos conseguem falar. Tipo assim, a gente, que já é maior consegue participar. Mas nem todo mundo. Falar com os supervisores, assim, é isso. (ALUNO)

No entanto, analisamos que a legislação municipal não permite a participação de

alunos menores de 14 anos, tanto na eleição de diretor e vice diretor, como no conselho da

escola, o que restringe a atuação destes alunos à representação por seus pais ou à

representação por parte de um aluno (entrevistado) que estes menores não elegeram.

O aluno confirma a atuação do conselho da escola:

Tipo assim: o colegiado organiza tudo, tipo a festa junina. Colegiado controla a divisão do dinheiro. Manda papel pra todo mundo explicando

140

como gasta o dinheiro. É tudo registrado direitinho e o colegiado é que controla tudo. O colegiado ajuda todo mundo ver, todo mundo saber como as coisas tão acontecendo, como tá a organização da escola. (ALUNO)

O aluno dá importância às avaliações externas e também se mostra colonizado pelos

indicadores dessas avaliações, considerando-as necessárias como mecanismo de teste

para a qualidade de ensino ofertada pela escola: “Acho muito boa. Acho ótimo. Acho muito

bom. É pra testar, né. Pra testar os alunos, pra testar o ensino e a escola, eu acho bom por

causa disso” (ALUNO) e, ao avaliar a gestão democrática, considera que a participação é

uma forma de aprendizado: “Eu acho que faz bem. Tipo, no que a escola está envolvida os

alunos também são. Os alunos já vai aprendendo, quem gosta participa, quem não gosta

acaba aprendendo, mesmo assim. Acho muito bom. É uma escola boa, os professores são

bons.” (ALUNO)

Vemos, assim, que a diretora, o professor, a mãe de aluno, a funcionária, o

colaborador da comunidade e o aluno têm consciência da participação e valorizam

positivamente a as tomadas de decisões coletivas.

Na pesquisa em questão, constatamos que, de acordo com Lima (2013a),

democraticidade se caracteriza por vias indiretas, quanto à representatividade que

caracteriza o conselho da escola, e também por vias diretas, que caracterizam a eleição do

diretor e do vice diretor da escola, e também em virtude da adoção da estratégia das

assembleias por segmentos.

Quanto ao critério da regulamentação, descrito pelo autor, observamos que a escola

tem uma participação formal, salvo prática da participação informal da comunidade local,

que não participa das decisões tomadas pelo conselho da escola, por força dos

regulamentos que omitem a participação deste segmento.

Dado o grau de envolvimento dos entrevistados com os objetivos da escola,

podemos dizer também que a participação apurada entre os diversos segmentos tem

orientação convergente. Neste sentido, a análise não apurou nenhum processo de

resistência, ao contrário, as ações foram realizadas em sintonia com os objetivos formais

aceitos consensualmente, mesmo se tratando de objetivos oficiais impostos pelo sistema.

Ainda segundo Lima (2013a), notamos que prevalece, entre os entrevistados, a

participação ativa, caracterizada por um envolvimento significativo, conhecimento de direitos

e deveres, atenção e consciência da capacidade de influenciar nas tomadas de decisão. No

entanto, com relação ao aluno, percebemos a participação reservada, caracterizada como

141

aquela que, apesar de posicionar-se como expectadora, está pronta, a qualquer momento,

para tomar posição e defender seus interesses; já a comunidade local navega entre a não

participação imposta e a não participação voluntária, dada a sua não regulamentação e a

sua própria vontade de não formalizar a participação.

Quanto à autonomia, vimos que os documentos que organizam o funcionamento do

sistema privilegiam a gestão democrática ao estabelecer a eleição do diretor e do vice

diretor das unidades escolares e ao institucionalizar o conselho da escola como instância

que viabiliza a participação da comunidade escolar, estabelecendo, assim as diretrizes da

participação colegiada e da democracia na gestão escolar. (SERVILHA, 2008; PEREIRA,

2008; LIMA, 2013a; 2013b)

No entanto, ao entendermos a autonomia administrativa como possibilidade das

decisões sobre o planejamento, execução e avaliação dos processos serem tomadas no

interior da escola, vemos que o sistema não regulamentou a questão e que, no aspecto

pedagógico, a escola se mantém subordinada ao planejamento e às avaliações

centralizadas, o que se aplica, também, ao aspecto financeiro, que é mantido sob as regras

e o controle externos, limitando-se, assim, a autonomia da gestão escolar democrática e do

conselho da escola, que atua como um mero prestador de contas.

Observamos que os processos de revisão do PPP da escola são exceções: fruto de

uma participação ativa e coletiva, as revisões são produzidas democraticamente. Mas, dada

a capitulação da gestão curricular pelo planejamento centralizado e o cerceamento dos

processos pedagógicos pelas avaliações externas, a lógica da autonomia pedagógica pode

ser entendida meramente como uma ideia de adaptação às normas externas, o que

relativiza as tomadas de decisões pedagógicas no interior “democratizado” e “domesticado”

da gestão escolar. (LIMA, 2013b)

Desta forma, podemos considerar a gestão democrática como instância meramente

operacional e técnica, dada a concentração do poder de controle por parte do sistema de

administração pública. Neste sentido, entendemos a descentralização como

responsabilização da gestão democrática, embasada na operacionalização do ensino

público cerceado por regras e normas centralizadas (LIMA, 2012a; PAGÈS et. al., 1990;

BARROSO; PINHAL, 1996; 1995; TATAGIBA, 2003), o que nos remete à proposta do

gerencialismo burocratizado da “nova gestão pública”, que concentrou, na administração

pública, os papéis de definidor dos objetivos, de cobrador de resultados e de controlador dos

recursos materiais, humanos e financeiros.

142

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa teve como objetivo analisar como tem ocorrido a gestão escolar

democrática em uma escola no município de Poços de Caldas MG, na perspectiva de um

estudo de caso, e buscou dados que possibilitassem uma análise da participação da

comunidade nos processos de tomadas de decisão e da autonomia da escola para tomar

decisões.

Consideramos que a adoção da metodologia qualitativa e a aplicação de diferentes

procedimentos de investigação (estudo documental, observação e entrevistas

semiestruturadas) consolidaram dados significativos para a análise e permitiram atender ao

objetivo proposto pela pesquisa.

O estudo dos documentos que configuram o sistema municipal de ensino mostra que

houve uma preocupação, por parte da legislação, em garantir a democratização das

relações. A legislação municipal regulamenta um amplo quadro de participação decretada

no âmbito do Conselho Municipal de Educação, porém a legislação dá legitimidade a

mecanismos restritivos, como submeter decisões do conselho à aprovação e homologação

por parte do gabinete da Secretaria Municipal de Educação, configurando-se, assim, para

este conselho, uma participação decretada, mas de relativa autonomia.

Apesar de a legislação municipal garantir a eleição como forma de provimento ao

cargo de dirigente escolar, um ponto significativo descortinado pelo estudo dos documentos

municipais foi a delegação, ao Conselho Municipal, da normatização de questões que se

refiram à autonomia e à gestão democrática das escolas públicas municipais. Apesar deste

pressuposto da legislação municipal garantir democraticamente à regulamentação de

questões relevantes à autonomia da escola e à participação das comunidades escolar e

local, observamos que o Conselho Municipal de Educação de Poços de Caldas não

produziu nenhuma norma a respeito.

Vimos que a gestão democrática, consagrada pela Constituição de 1988, teve sua

regulamentação delegada para a LDB que, por sua vez, delegou a regulamentação da

questão aos sistemas de ensino. No caso em estudo, o município delega ao Conselho

Municipal de Educação que, por sua vez, não normatiza as questões relativas à autonomia e

à gestão democrática das escolas. Esta observação nos permite atribuir as seguintes

possibilidades para a gestão democrática praticada na escola: participação consagrada,

mas não regulamentada, o que pode implicar na participação restrita a alguns atores,

decidindo informalmente ou de modo não formal; a não regulamentação da autonomia pode

143

indicar uma convergência da escola em relação às orientações e normas que emanam da

administração pública central, configurando-se, assim, como autonomia relativa.

Constatamos, também, que a legislação municipal delega às escolas a atribuição de

regulamentar a participação dos vários segmentos da comunidade escolar e que, no

estatuto do conselho da escola pesquisada, não existe a participação da comunidade local,

omissão esta que segue a legislação municipal. Além disso, o estatuto da escola e o

Regimento Escolar não regulamentam as eleições (para diretor e para membros do

conselho da escola) e como devem ser as relações entre a direção e o conselho da escola.

O Regimento da Escola reproduz os objetivos educacionais expressos nas normas e

orientações superiores e o PPP manifesta uma preocupação da comunidade escolar com os

indicadores quantitativos das avaliações externas, o que gerou alterações no processo

didático de recuperação como medida para atender a esses indicadores. Tais constatações

nos levam a considerar que a autonomia exercida pela escola é relativa e está envolvida por

normas e controles burocráticos centralizados, como as diretrizes curriculares e as

avaliações externas massificadas.

Este quadro, traçado pela análise dos documentos municipais e da escola, se

confirmou nas observações e nas entrevistas semiestruturadas: podemos considerar a

gestão democrática como instância meramente operacional e técnica, submetida à

concentração do poder de controle nas esferas superiores: a administração pública central

se configura como definidora dos objetivos, cobradora de resultados e controladora dos

recursos materiais, humanos e financeiros, limitando, assim, o exercício da gestão

democrática à operacionalização meramente instrumental.

Ressaltamos que a pesquisa indicou que (a) a escola propõe e procura praticar a

gestão democrática e participativa, (b) tem um conselho da escola atuante e composto por

segmentos da comunidade escolar, (c) todos os segmentos participam da revisão do PPP e

(d) predomina, entre os segmentos, uma participação ativa e, mesmo com apontamentos de

participação reservada ou divergente, (e) as tomadas de decisões são coletivas, mas

observamos que os mecanismos burocráticos (como a imposição curricular, avaliações

massificadas e a prescrição/controle de recursos financeiros) surgem como indícios que

relativizam e limitam a autonomia da escola, que se mostra restrita aos aspectos

pedagógicos, típicos do domínio de execução escolar, por exemplo, como a

revisão/alteração do PPP, no que se refere ao processo de recuperação dos alunos, a

aspectos financeiros, no que se refere à decisão da destinação da verba e à prestação de

contas do PDDE, que foi gasto segundo prescrições e controles externos.

144

Tais indicações e observações nos permitem ressaltar que a escola pesquisada

consegue, mesmo num contexto de hiperburocracia, desenvolver mecanismos de

participação e valorização das funções deliberativas e consultivas do conselho de escola, o

que nos mostra a possibilidade de efetivação de resistência política por parte da escola, no

entanto, as entrevistas nos mostram que as falas dos atores dos vários segmentos estão

colonizadas pelos mecanismos centralizados de regulação, controle e avaliação.

Diante deste quadro, concordamos com Lima (2013a) e consideramos que os

discursos de descentralização, participação e autonomia, na verdade encobriram as

intenções político-administrativas de manter centralizadas as decisões significativas e

somente as decisões de caráter operacional foram delegadas à escola.

A concentração das decisões políticas e administrativas submete/mantém a escola

subordinada a um sistema educacional caracteristicamente hierárquico, onde predominam

os pressupostos gerencialistas: uma administração pública que reproduz a burocracia, agora

sob a égide da “nova gestão pública”, e estabelece um Estado definidor de objetivos,

cobrador de resultados e controlador dos recursos.

Deste ponto de vista, a gestão democrática da escola pública, enquanto direito

reclamado, conquistado e decretado, encontra-se em processo de domesticação e

colonização por meio do racionalismo gerencial e é posta diante do desafio de construir sua

autonomia, de forma a solidificar a participação dos atores internos e tornar sua comunidade

a real agente nas tomadas de decisões, protagonizando a autogestão e superando a

burocracia que persiste, tradicionalmente, como fundamento administrativo nas instâncias

governamentais. Tais considerações nos levam a concordar com Lima (2013a; 2011a;

2011b) e a indicar que, no caso em questão, a gestão democrática se apresenta como

gestão hiperburocratizada, onde predomina a autonomia ilusória e a participação conduzida.

Neste cenário, devemos considerar as possibilidades de tornar a gestão democrática

da escola pública um modelo não só consagrado/decretado na legislação, mas também

possível de ser praticado como autogestão, sem as amarras burocráticas do gerencialismo

que conduz a administração pública: a gestão democrática acarreta a responsabilização e a

escola deve conquistar a prática de suas responsabilidades e gerir de forma autônoma seus

processos, além de garantir e expandir a participação, senão, tal modelo de gestão não

pode ser caracterizado como democrático.

A conquista desta autonomia pode ser concretizada a partir de regulamentações

claras e que não omitam garantias já consagradas pela Constituição e pela LDB. A ausência

145

de regulamentação também compromete e impõe a não participação: como vimos no caso

analisado, a participação da comunidade local não foi prevista pelos regulamentos do

município, omissão esta que a escola reproduziu.

A não participação também foi imposta por regulamentos informais aos alunos

menores de 14 anos, impedindo-os de votar e de atuarem como representantes. Certamente

esta é uma discussão que merece maiores estudos, no entanto, a nosso ver, essa restrição

não tem embasamento legal e carece de regulamentação ou mesmo de uma revisão que

considere o desenvolvimento da consciência democrática e permita a participação desses

alunos na eleição de seus representantes, mesmo que os representantes devam ter mais de

14 anos.

A gestão democrática requer que as decisões sejam tomadas coletivamente, o que

implica numa regulamentação que dê garantias institucionais e legais para que a escola

delibere coletivamente sobre seus processos, o que implica na participação e na

responsabilização coletiva de alunos, representantes da comunidade local, professores,

funcionários, direção e pais.

A participação é uma conquista e uma necessidade para a gestão democrática. Sua

difusão e expansão garantem a formação de uma consciência democrática, mas dificilmente

a escola conseguirá o desenvolvimento dessa consciência se mantendo isolada e

reproduzindo as orientações burocráticas. (LIMA, 2013; PEREIRA, 2008)

146

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ANEXOS

Anexo 1 - Certificação do CEP UNIMEP

157

APÊNDICES

Apêndice 1 - Roteiro de observação

Caracterização da escola: modalidades ofertadas, número de alunos, turmas e turnos de

trabalho.

Número de profissionais que atuam na instituição e caracterização desses profissionais.

Quais recursos estão disponíveis na instituição para as atividades pedagógicas? A escola

tem verbas anuais? Existem outras receitas? Como é a gestão dos recursos financeiros?

Existe controle externo dos recursos financeiros geridos pela escola?

Propostas de atividades de formação continuada para os professores e demais funcionários

da escola?

Existe controle externo dos processos pedagógicos? A escola tem verbas anuais? Existem

outras receitas? Como é a gestão dos recursos financeiros?

Forma de escolha do dirigente escolar e dos membros do conselho da escola.

Como é a participação da comunidade local e escolar (normas e práticas).

Caracterização do conselho da escola (identificação dos participantes, tipo de participação,

regularidade de reuniões e presenças, composição, atribuições, funcionamento, rotinas).

Relacionamento entre o gestor e o conselho da escola.

Como é a gestão dos recursos humanos e materiais?

Existe controle externo dos recursos humanos?

A escola utiliza os programas ofertados pelo FNDE, como o PDDE e o PNLD?

Estudar e compreender os documentos do sistema municipal pertinentes à participação das

comunidades local e escolar e à autonomia da escola (leis, normas, regulamentos,

pareceres).

Estudar e compreender os documentos escolares (regimento escolar, planos, PPP, atas de

reuniões).

158

Apêndice 2 - Roteiro das entrevistas

Comente sobre a gestão escolar democrática.

A escola pode tomar decisões de forma autônoma? Em que tipo de situação a escola tem

autonomia e em quais não tem?

De que forma o conselho da escola participa da gestão escolar?

Como é a participação dos professores, alunos, pais, funcionário e comunidade?

Como é o processo de escolha do diretor (a)?

Como são escolhidos os membros do conselho da escola?

Em que horários acontecem as reuniões do conselho da escola e como são definidos esses

horários?

Quem preside o conselho da escola? Como o presidente do conselho da escola é

escolhido?

Como é elaborado o PPP da escola? Quem participa da elaboração?

Como e quando o PPP e revisto? Quem participa da revisão?

Quem decide como usar os recursos financeiros da escola? Como é a prestação de contas?

Os recursos são suficientes?

A escola tem autonomia para gerir os recursos humanos? Como é o controle dos recursos

humanos?

Quais as condições de trabalho na escola? A quantidade de professores é suficiente? Como

é o número de alunos em sala de aula?

Os professores são remunerados pelas tarefas que não são instrucionais, em que

participam fora da sala de aula?

Faça suas considerações sobre a gestão participativa.