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CÂMARA DOS DEPUTADOS DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REVISÃO DE COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL COMISSÃO ESPECIAL - REFORMAS POLÍTICAS EVENTO: Audiência pública N°: 000563/01 DATA: 19/06/01 INÍCIO: 10:10 TÉRMINO: 14:17 DURAÇÃO: 4:07:00 TEMPO DE GRAVAÇÃO: 4:18 PÁGINAS: 108 QUARTOS: 26 REVISORES: DEBORA, LIA, IRMA, MARLÚCIA, PATRÍCIA MACIEL SUPERVISÃO: DANIEL, ESTEVAM, J. CARLOS, MARIA LUÍZA CONCATENAÇÃO: NEUSINHA DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO NELSON JOBIM – Presidente do Tribunal Superior Eleitoral SUMÁRIO: Reforma da legislação eleitoral. OBSERVAÇÕES

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO … · temos, sobre o problema de fidelidade partidária, coligação partidária, candidatura nata; enfim, alguns temas que têm

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CÂMARA DOS DEPUTADOS

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REVISÃO DE COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

COMISSÃO ESPECIAL - REFORMAS POLÍTICASEVENTO: Audiência pública N°: 000563/01 DATA: 19/06/01INÍCIO: 10:10 TÉRMINO: 14:17 DURAÇÃO: 4:07:00TEMPO DE GRAVAÇÃO: 4:18 PÁGINAS: 108 QUARTOS: 26REVISORES: DEBORA, LIA, IRMA, MARLÚCIA, PATRÍCIA MACIELSUPERVISÃO: DANIEL, ESTEVAM, J. CARLOS, MARIA LUÍZACONCATENAÇÃO: NEUSINHA

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃONELSON JOBIM – Presidente do Tribunal Superior Eleitoral

SUMÁRIO: Reforma da legislação eleitoral.

OBSERVAÇÕES

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CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reformas PolíticasNúmero: 000563/01 Data: 19/06/01

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Bom dia, senhoras e

senhores!

Havendo número regimental, declaro aberto os trabalhos da 5ª reunião

ordinária da Comissão Especial Destinada ao Estudo das Reformas Políticas.

Tendo em vista a distribuição de cópias da ata da reunião anterior a todos os

membros presentes, indago da necessidade de sua leitura. (Pausa.)

Dispensada a leitura.

A ata está em discussão. (Pausa.)

Não havendo quem queira discuti-la, passamos a votação.

Os Deputados que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)

A ata está aprovada.

Comunico que, por indicação do Líder do Bloco PDT/PPS, o Deputado Márcio

Bittar passou a integrar esta Comissão em substituição ao Deputado João Herrmann

Neto.

Ordem do dia:

Na pauta da presente reunião consta audiência pública com o Exmo. Sr.

Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ministro Nelson Jobim.

Antes de iniciarmos a nossa audiência, gostaria de externar ao Exmo. Sr.

Ministro a nossa satisfação em tê-lo nesta Casa, mais especificamente nesta

Comissão, que trata de assuntos sobre os quais V.Exa. é uma autoridade das mais

distintas e respeitadas do País, notadamente agora, como representante maior da

Justiça Eleitoral.

Esclareço que, nos termos regimentais, adotaremos os seguintes critérios: o

convidado disporá de até vinte minutos para fazer a sua exposição inicial, não

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podendo ser aparteado; no período destinado aos debates, os Srs. Deputados que

quiserem interpelar o expositor deverão fazê-lo pelo prazo de até três minutos, tendo

o convidado igual tempo para responder; aos Deputados são facultadas a réplica e a

tréplica, também pelo prazo de até três minutos.

Neste momento, passo a palavra ao Exmo. Sr. Ministro Nelson Jobim.

O SR. NELSON JOBIM – Sr. Presidente, Sr. Relator, Sras. e Srs. Deputados,

foi com satisfação que atendi ao convite feito pelo eminente Presidente desta

Comissão Especial Destinada ao Estudo das Reformas Políticas, Deputado Olavo

Calheiros, que tem como Relator o Deputado João Almeida, para conversar sobre a

temática relativa às eleições.

Eu dividiria esse assunto em dois blocos. No primeiro, faria um exame sobre a

urna eletrônica, sobre a votação eletrônica, informatizada; no segundo, faria uma

análise sobre algumas perspectivas da reforma política propriamente dita. Eu, então,

examinaria alguns temas tópicos sobre o sistema de representação proporcional que

temos, sobre o problema de fidelidade partidária, coligação partidária, candidatura

nata; enfim, alguns temas que têm aparecido no Tribunal e que são vitais na

discussão sobre a reforma política.

Com relação à urna eletrônica, tivemos, no ano de 2000, a realização de

eleições nos 5.561 Municípios do País. Utilizou-se um total de 353.735 urnas

eletrônicas para votação e justificativa eleitoral. O número de votantes foi de

109.823.421 eleitores em aproximadamente 2.500 zonas centrais ou totalizadoras.

Tivemos cerca de 300 mil candidatos, sendo que destes aproximadamente 60 mil,

entre Prefeitos e Vereadores, foram eleitos. Isso tudo determinou o envolvimento da

Justiça Eleitoral no País com 10 mil técnicos e 1.950 mesários, sendo que 650 eram

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técnicos de informática dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Tribunal Superior

Eleitoral.

Alguns problemas ocorreram nas eleições. Tivemos problemas em seis

Municípios. Por exemplo, em alguns deles, os eleitores afirmavam que digitavam o

número de um candidato e aparecia a fotografia de outro. O Tribunal Eleitoral tomou

providências no sentido de comparecer aos locais para verificar tal problema.

Surgiram também situações curiosas, como o de um eleitor digitar o número do

candidato e não reconhecer a fotografia que tinha sido enviada ao Tribunal Eleitoral.

Houve o caso de um padre que se candidatou a prefeito, e ele aparecia na foto de

gravata, cabelo penteado. Ora, na verdade, aquela não era a sua imagem do dia-a-

dia. Então, houve problemas dessa natureza, mas todos eles foram solucionados e

não houve maiores dificuldades.

A questão básica que está sendo discutida em relação à urna eletrônica é a

desconfiança, a suspeição em determinadas situações. O núcleo do problema

estaria na seguinte situação. Digita-se o número do candidato. O sistema da urna

eletrônica é não de conservação do voto, mas de contabilização do voto. Na urna

tradicional, se lançava o voto e, depois, ele era contabilizado. No caso da urna

eletrônica, a contabilização é imediata. O número do candidato é digitado e

imediatamente ele é contabilizado; não fica nenhum vestígio entre a digitação e a

contabilização, só o resultado. Então, não há nenhuma memória na urna eletrônica

entre o digitar e o contabilizar – a contabilização é direta.

Levantou-se a possibilidade — mas não a demonstraram, o caso não ocorreu

— de que o programa que alimenta a urna pudesse ter um delta qualquer que

fizesse com que, por exemplo, quando se digitasse o número 135 o voto seria

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contabilizado para o candidato 153. A questão era saber como isso poderia ser

identificado. Para resolver esse problema, foram oferecidas algumas sugestões.

Tramita no Senado um projeto de lei, do Senador Roberto Requião, que

pretende solucionar esse problema por meio da impressão do voto. Assim, por

exemplo, digita-se o número 135 e, acoplada à urna, haveria uma impressora para

imprimir o voto. Dessa forma, o eleitor compararia o voto impresso com o voto

digitado. Se os dois votos fossem coincidentes, o eleitor apertaria um dispositivo

para contabilizar o voto na urna eletrônica e, ao mesmo tempo, o voto impresso

seria lançado em uma urna tradicional. Terminada a eleição, far-se-ia a apuração.

Assim, em torno de 3% dos casos, seriam apuradas as urnas tradicionais. Em

seguida, seria feita uma comparação entre o resultado da urna tradicional e o da

urna eletrônica. Se houver uma discordância nessa comparação, os votos daquela

urna seriam recontados e teriam que ser apurados mais votos.

Bem, qual é o problema que surge? O projeto inicial apresentava o seguinte

desenho: o voto seria impresso, o eleitor examinaria esse voto de papel, o fecharia e

o depositaria na urna tradicional. Pois bem. Em um debate de que participei no

plenário do Senado, demonstrei que aquela fórmula possibilitaria a volta do “voto

marmita”. De que forma? Ora, se digitaria o voto, esse voto seria impresso e se diria

ao Presidente da Mesa que o voto estava errado. Aí, o eleitor digitaria e imprimiria

de novo o voto, pegaria uma das folhas impressas e levaria consigo, entregando-o

na saída, retomando aquele velho sistema conhecido. Além desse “voto marmita”,

teríamos a possibilidade daquele “voto carreirinha”. Enfim, os senhores conhecem

toda a história. Ou seja, essa possibilidade poderia fazer retornar o sistema

tradicional.

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Em vista disso, o Senador Romeu Tuma elaborou um substitutivo

estabelecendo que o eleitor não teria acesso a esse voto impresso. Seria um

sistema em que o voto seria impresso embaixo de uma placa de vidro e não se teria

a possibilidade de se tocar no voto; ele somente seria encaminhado. O substitutivo

do Senador Romeu Tuma estabelece ainda que, se o eleitor votar no nº 135 e não

coincidir o voto impresso com o voto digitado, ele anula o voto e vota novamente. Se

essa divergência entre o voto impresso e o digitado persistir na segunda tentativa, o

fato é comunicado à Mesa. A Mesa examina, submete a urna a um exame de

técnicos, retoma a votação e as coisas continuariam assim.

O problema que existe em relação a essa fórmula, que é insolúvel dentro do

sistema, é o seguinte: o voto é secreto; ninguém poderá conferir a divergência

informada pelo eleitor. Se o eleitor disser que o voto lançado na urna não coincide

com o voto impresso, essa afirmação não pode ser conferida por ninguém. Nessa

hipótese, teríamos a seguinte situação: qualquer pessoa que desejar implodir o

sistema eleitoral implode; basta haver um eleitor em cada urna, em um conjunto de

sessões eleitorais, que afirme a divergência. Aí sai da eleição a urna eletrônica e

teríamos que retomar a votação tradicional, ou seja, um sistema regressivo. A

proposta conduz a um sistema regressivo e abre um impasse para essa situação.

O que estou sugerindo, e que gostaríamos de já submeter ao Senado

Federal, seria submeter todo o sistema — não a urna propriamente dita, mas todo o

sistema — a um laudo, a um exame técnico de auditoria externa. No caso

específico, poderíamos, tendo em vista a experiência do Senado Federal — e vamos

deixar bem claro que o sistema de votação eletrônica do Senado Federal não tem

nada a ver com o sistema eletrônico eleitoral —, poderíamos convidar a

Universidade de Campinas para fazer uma análise global do sistema, examinar

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determinados aspectos e sugerir eventuais alterações e modificações tendo em vista

a segurança. Teríamos três espaços de segurança: antes da eleição, durante a

eleição e após a eleição. Seriam os três universos de tratamento do tema.

Dentro desse conjunto de universos de tratamento do tema, em relação a

todo esse conjunto, teríamos condições de estabelecer, como providências

anteriores à eleição, a apresentação completa do sistema de votação, do anteprojeto

do sistema, e a discussão desse anteprojeto com os partidos políticos.

Aqui abro um parêntese. Creio que é importante a criação de uma comissão

permanente de acompanhamento do processo eleitoral. Não diria uma comissão

permanente de acompanhamento da eleição, porque seria uma comissão que só

teria trabalho de dois em dois anos.

Na Câmara dos Deputados, há um projeto do Deputado José Dirceu para a

criação de uma comissão de acompanhamento de eleições. Esse projeto

circunscreve essa comissão à composição dos partidos políticos; ou seja, seria uma

comissão composta pelos partidos. A meu ver, no meu sentir, e digo isso para os

senhores examinarem, a inconveniência de uma comissão dessa natureza, que

tivesse uma composição estrita de partidos políticos, é que ela não estaria

enganchada em nada; seria uma comissão que ficaria no ar. Não se tem uma

estrutura dessa comissão. Então, a sugestão que faria, e já transmiti isso ao

Deputado José Dirceu, seria uma Comissão Permanente do Congresso Nacional,

composta de Deputados e Senadores, indicados na forma regimental, que faria o

acompanhamento do processo eleitoral. Qual é a vantagem? A vantagem é que

seria uma Comissão Permanente ancorada na estrutura do Congresso Nacional.

Com uma comissão de partidos políticos, sabemos o que vai acontecer, e a

experiência é clara: alguns partidos participarão efetivamente dessa comissão e

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outros não, porque não se teria uma estrutura mandatória de responsabilização

individual de partidos.

Evidentemente, essa comissão não excluiria o acompanhamento feito

diretamente pelos partidos. Esse é outro problema. Ou seja, além do

acompanhamento dos partidos políticos, que já existe, seria criada uma Comissão

Permanente do Congresso Nacional para este objetivo, composta de Deputados e

Senadores. Essa comissão teria sua estrutura, teria o fundamento técnico, enfim, da

estrutura do Congresso Nacional, com possibilidade de uma interlocução direta com

o Tribunal Eleitoral.

Além do sistema de eleição, teríamos uma série de sugestões a fazer em

relação a lacres, a assinaturas digitais, a formas pelas quais se pode cercar o

sistema de segurança e de transparência.

Quero deixar bem claro que, da minha perspectiva individual, daquilo que

conheço e examinei do sistema, tenho a convicção de que o sistema é seguro. Mas

isso não basta. É preciso que a convicção nasça dos senhores a partir do sistema e

não a partir da confiabilidade que os senhores tenham ou não no Presidente do

Tribunal. Isso é irrelevante. No caso, as pessoas são irrelevantes. Precisamos criar

um mecanismo para estabelecer isso.

Teríamos, então, uma discussão sobre o anteprojeto do sistema de eleição,

uma discussão sobre o sistema e os lacres, a autenticação dos flashcard e da

votação de carga, e ainda teríamos o lacre da urna eletrônica e testes de

amostragem. No dia da eleição, poderíamos ter a extração de um conjunto de urnas,

que seriam escolhidas aleatoriamente pelos partidos, para se fazer um teste, no

sentido de se verificar se todo o sistema que foi produzido no Tribunal Eleitoral e que

foi testado por todos os senhores permanece internamente na urna. Teríamos ainda

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a assinatura digital para impedir a violação dos sistemas que foram inseridos nas

urnas eletrônicas. Como sistema pós-eleição, teríamos ainda uma análise geral de

geradores de mídia. Ou seja, há uma série de providências que podem ser tomadas

para cercar de segurança aquilo que, no meu entender, já é seguro, mas sobre o

qual é necessário ter transparência. Agora, sugeriria que essa discussão se fizesse

exatamente depois de termos o laudo externo sobre o sistema. Com base nesse

laudo externo, agregaríamos a forma de discutir essa transparência, porque é algo

realmente técnico.

O que temos que deixar bem claro é o seguinte: não há possibilidade de

convivência do sistema tradicional com o sistema eletrônico. Esse é o ponto

fundamental.

Outra coisa que também pode ser discutida é o seguinte. Anteriormente

tínhamos o quê? Lançava-se o voto na urna e, depois, apurava-se esse voto. Com a

apuração do voto, remanescia a cédula única e, com a cédula única, se tinha a

memória do voto individual de cada eleitor, não individualizado, mas se sabia que

naquela urna os 250 votos tinham uma composição – digamos, alianças feitas pelo

eleitor na elaboração do voto. Tínhamos essa memória, mas isso desapareceu

porque, com a contabilização direta, o que se tem no final é o boletim de urna com o

resultado geral do voto de cada um; e não se sabe quais foram as montagens que

os eleitores fizeram. É possível estabelecer um sistema, no programa da urna

eletrônica, em que fique esta memória, ou seja, que, ao final da eleição, além do

boletim de urna, se tenha a possibilidade de obter a informação de como o

eleitorado daquela urna compôs os votos.

Lembro-me de que, depois de todas as eleições de que participei, uma das

coisas que fazia era verificar exatamente as articulações feitas pelo eleitor na

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composição do voto. Principalmente quando o voto era para Deputado Federal e

Deputado Estadual, verificava que tipo de aliança o eleitor estava fazendo em

determinadas regiões. Tinha-se, então, o comportamento do eleitor na composição

de voto. Isso pode ser feito e é uma questão a ser examinada.

Então quero dizer aos senhores que, sobre a urna eletrônica, temos esta

situação: ou queremos um sistema eletrônico ou não queremos. Se queremos um

sistema eletrônico, precisamos decidir quais os requisitos de confiabilidade,

transparência e segurança desse sistema. Agora, ao tentar aferir o sistema

eletrônico com o sistema tradicional, só teremos problemas e nenhuma solução.

Essa é uma questão que cabe ao Congresso Nacional decidir: se se retorna ao

sistema primitivo ou não. Qualquer comparação que se quiser fazer entre a

impressão do voto e sua digitação vai gerar um problema insolúvel, salvo se os

senhores, reformando a Constituição, estabelecerem que não será secreto o voto

quando o eleitor manifestar uma divergência entre o voto impresso e o voto digitado.

Daí, então, rompe-se o segredo do voto para esse efeito e se impede a implosão do

processo eleitoral.

Há alguns outros temas que temos de discutir com os senhores, partidos e

Congresso, especificamente com relação à eleição de 2002, quando vamos ter o

seguinte quadro.

Tivemos 109.821.136 eleitores no ano 2000. As projeções do Tribunal

Superior Eleitoral indicam um aumento do eleitorado da ordem de 4,5%,

considerando o comportamento dos anos anteriores. Poderá haver ainda um

incremento no tocante à qualificação de menores de 18 e maiores de 16 anos, que é

o voto facultativo. Se houver esse incremento, ele percentual poderá aumentar. Mas

a variação da curva dos anos anteriores estabelece uma base de 4,5%. Então,

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teríamos um total de 114.723.308 eleitores, divididos por esse universo de 5.561

Municípios brasileiros.

Quais são os problemas que teremos nessa votação? Temos dois temas para

votação do ano de 2002.

Primeiro, quero lembrar aos senhores que a legislação estabeleceu que, na

formulação do voto na urna eletrônica, primeiro vota-se nos candidatos

proporcionais e, depois, nos candidatos majoritários. A legislação não estabeleceu

uma ordem de votação interna dos proporcionais e dos majoritários. Só diz que os

proporcionais antecederão os majoritários. Ficou, portanto, para o Tribunal Superior

Eleitoral decidir qual a ordem que se estabeleceria entre eles.

Na eleição de 2002, vamos ter um problema a ser resolvido com o

Congresso, que é o voto para Senadores. Teremos dois votos para Senador. Na

eleição de 1998, não houve uma informatização global – somente nas capitais e em

algumas cidades do País. Na de 2002 vamos ter uma ampliação global.

Enfim, o que vamos ter? Em primeiro lugar, o voto dos dois Senadores terá

que ser um voto simultâneo. O que significa isso? Não pode o eleitor votar, lançar o

primeiro voto de Senador, confirmar esse voto e, depois, lançar o segundo voto. E

por quê? Porque a urna tem que comparar o primeiro lançamento com o segundo, já

que não pode permitir que o eleitor vote duas vezes em um mesmo Senador. Então,

quais são as idéias? Vamos nos reunir com os partidos políticos e apresentar as

várias alternativas técnicas. Uma delas seria, terminada a votação para Deputado

Federal, ao se passar para a votação para Senador, a tela abre-se em dois espaços:

um para o primeiro voto e outro para o segundo voto. O eleitor digita o primeiro voto,

e a máquina passa imediatamente para o segundo voto. Se ele repetir no segundo

voto o primeiro, a urna rejeita. Se o eleitor confirmar o segundo voto igual ao

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primeiro, esse segundo voto será considerado nulo, que era o sistema anterior. Se

ele digita corretamente, confirma o voto, este será computado.

Então, há necessidade de termos essa fórmula, que vou submeter aos

partidos, para discutir as melhores técnicas. Há uma série de técnicas.

Outra situação também é saber o seguinte. Na eleição majoritária, quem será

votado primeiro? Os Senadores, o Governador ou o Presidente da República? O

Senador fica por último? O Senador antecede? Qual é a conveniência? Nas eleições

anteriores, o Senador ficava por último, mas era um Senador só. É recomendável

que, quando chegarmos no momento da votação majoritária, tenhamos a votação de

Senador antecedendo a votação do Governador e do Presidente? E depois do

Senador, vota-se em quem? No Presidente ou no Governador?

Essas decisões eram tomadas pelo Tribunal Eleitoral a partir de perspectivas

exclusivamente técnicas, mas entendo que essa é uma escolha política. Sendo uma

escolha política, quero discutir essa matéria com os partidos e com o Congresso,

para os senhores escolherem, politicamente, o que é mais conveniente. O que

compete a nós, do Tribunal Superior Eleitoral, é mostrar as alternativas técnicas

possíveis. A escolha entre as alternativas é uma questão política.

Lembro-me de que, quando se discutiu a ordem de votação, o Deputado João

Almeida, Relator na época, colocou-se a favor da votação dos proporcionais antes

dos majoritários porque, na verdade, na campanha eleitoral, o grande objetivo, a

grande perspectiva partidária é a votação majoritária e não a proporcional, e poderia

haver um abandono, um desleixo de votos em relação aos proporcionais. Daí por

que os proporcionais antecederam. E essa lógica aplicar-se-ia também na relação

majoritária: Senadores, Governador e Presidente?! Os senhores é que têm de

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resolver o problema e o Tribunal, então, estabelecerá, a partir do entendimento que

for estabelecido pelos partidos políticos, qual a melhor ordem.

Essa não é uma questão técnica, repito; é uma questão política de

conveniência. Não cabe, portanto, ao Tribunal emitir um juízo político de

conveniência. Compete aos senhores, e nós obedeceremos.

O segundo problema existente é que teríamos seis votos nessa eleição de

2002: para Deputado Estadual, Deputado Federal, dois Senadores, Governador e

Presidente. A partir da experiência e do levantamento estatístico das últimas

eleições, o tempo de votação para seis votos estaria em torno de 75 segundos. Se

tivermos 75 segundos entre abrir a urna e concluir o voto, nas sessões eleitorais

com mais de quinhentos eleitores, não teríamos condições de terminar a eleição às

17h, porque o tempo não permite — e 75 segundos é o tempo entre abrir a urna e

fechar o voto; não está computado aqui o tempo de identificação do eleitor etc.

Uma solução alternativa que vamos propor, e sobre a qual já estamos

trabalhando tecnicamente, é procurar fazer aquilo que se fazia nas urnas antigas.

Ou seja, quando existia um grande número de eleitores, havia duas ou três cabines

indevassáveis e apenas uma urna. No caso, teríamos dois terminais: o terminal da

urna propriamente dita e um terminal alimentador da urna, que seria um terminal

secundário, o que viabilizaria que dois eleitores pudessem votar ao mesmo tempo.

Não há problema técnico; é o que chamamos de “terminal burro”, porque a sua única

função seria alimentar a base de dados do terminal principal. Assim se resolveria o

problema. Com isso, temos um outro problema, que vamos resolver: teremos de

aumentar o número de urnas. Serão necessárias 405 mil urnas, não as 353 mil

urnas de que dispomos, para os terminais secundários.

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Como serão seis votos, não é conveniente a justificativa de voto, ou seja, a

justificação do eleitor na própria seção eleitoral, para evitar o conflito de filas. Então,

vamos criar postos específicos para a justificação. Com isso, se retira da seção

eleitoral os eleitores que estariam lá apenas para isso, diminuindo o afluxo de

pessoas.

Quero lembrar, e os senhores sabem disso, que a lógica da presença do

eleitor na seção eleitoral é diversa, completamente diversa, considerando-se a

localização das cidades e das regiões do País. Há determinados Estados em que a

concentração de eleitores se dá pela manhã; em outros, a concentração de eleitores

se dá à tarde; e, em outros, a concentração se dá ao meio-dia. Portanto, não adianta

se pensar num fluxo regular durante todo o período, porque temos concentrações

diversas. Eu determinei o levantamento dessas concentrações, cujo resultado é o

que estabelecerá a lógica da distribuição dos terminais secundários. Daí por que o

Tribunal ter necessidade da fabricação e aquisição de mais de 51 mil urnas para

atender à demanda de 2002.

Há outro problema que os senhores terão que resolver, uma questão legal

que precisa ser discutida. O que temos hoje? O eleitor comparece à sua seção,

apresenta seu título de eleitor, o Presidente da Mesa digita o número do eleitor no

terminal de abertura, e a urna é aberta. O que há na mesa? Na folha de votação

constam os nomes do eleitores que podem votar naquela urna e os números dos

seus títulos. O que se passa? Se o cidadão aparece sem o título, mas se identifica e

é identificado pela Mesa, ele pode votar, porque os dados necessários à abertura da

urna estão com o Presidente, que digita o número do título e abre a urna. O

problema que os senhores terão de examinar é que, se é possível alguém sem título

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de eleitor votar, é possível também que o Presidente da Mesa vote por aqueles que

não comparecerem.

Vamos admitir a seguinte hipótese. Num determinado momento da tarde, às

16h, o Deputado Vivaldo Barbosa comparece e verifica que, numa determinada

seção eleitoral, ainda não votaram 50 eleitores. O Deputado Vivaldo Barbosa sai

naquela sua visita tradicional, de beija-mão para o eleitor, que todos nós já fizemos

— é claro que se faz! —, depois ele vai àquela seção e verifica que, das 16h30min

às 16h45min, votaram 50 eleitores. O que pode ter acontecido? O Presidente da

urna, em conluio com os membros e fiscais da Mesa — e é claro que, nesse caso, é

preciso haver conluio —, poderá abrir a urna e votar pelos cinqüenta que não se

apresentaram, porque ele tem os dados necessários para abrir a urna.

Alguém pode perguntar: e quando chega o eleitor? O Presidente da Mesa é

esperto. Como ele faz? Se ele tem um crédito de 30 votos, ele vota por 25. Quando

o Haroldo Lima chega para votar, já votaram por ele, mas como ele não vai conferir

a abertura da urna, eles abrem com o número do título de um eleitor qualquer que

não tenha comparecido. Assim, o Haroldo vota no lugar dele, e está resolvido o

problema!

Qual é a solução? Há uma única solução, e ela tem preço. Nenhuma solução

que se dê para um problema não tem preço, e esta tem um preço. A solução

possível seria que, na folha de votação, não constasse a totalidade dos números do

título de eleitor. Se são dez ou oito números, na folha constariam os quatro últimos

números; os outros quatro estariam no título. Resultado: só se abre a urna com o

título, ou o seu número. No caso, nós estaríamos dificultando o acesso ao número,

que só seria possível com a apresentação do título.

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Nesse caso, teríamos a seguinte situação: quem não tem título, não vota.

Nessa hipótese, se o cidadão comparece à sua seção eleitoral sem o título, mas

apresenta um documento, ele pode justificar o voto para evitar o problema da multa.

Então, seria criado um sistema de justificação da presença do eleitor. Ele teria

certificado da sua presença, assinaria a folha de eleição, mas não votaria. Isso

significa que só vota quem tem título.

A questão é saber: os senhores desejam isso ou não? Quem tem que decidir

isso são os senhores. Se quem não tem título puder votar, nós precisamos ter um

mecanismo de ciência da Mesa para poder abrir a urna. O risco existe, que é aquele

já citado. Essa é também uma opção política, de conveniência, e vou submeter aos

senhores as alternativas possíveis, lembrando bem que a opção para evitar o

acesso à urna pela Mesa tem um preço, que é: não vota quem não apresentar o

título. Agora, se a opção for outra, teremos que encontrar mecanismos, e

mecanismos externos, de reforço de fiscalização, para manter essa inviolabilidade.

Em relação à urna eletrônica, essa é uma temática que, volto a repetir, nós

discutiremos longamente tão logo tenhamos esse laudo. Porém, sugeriria que,

desde logo, os senhores analisassem algo que é externo ao problema do sistema de

segurança da urna, que é a criação dessa comissão de acompanhamento das

eleições. Mas, insisto, não seguindo o modelo do projeto do Deputado José Dirceu.

Que haja, sim, a criação de uma comissão encravada no Congresso Nacional,

organizada por Deputados e Senadores, com a participação dos partidos. A forma

da sua composição é uma questão a ser discutida, mas seria uma Comissão

Permanente que seria a interface do Tribunal Superior Eleitoral com o Congresso

Nacional e com os partidos.

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Por que estou sugerindo isso? Volto a repetir: sugiro a criação de uma

comissão dentro do Congresso porque ela estaria ancorada numa instituição

permanente. Se fizermos uma comissão exclusivamente de partidos políticos, sem

uma âncora no Congresso Nacional, teremos algo sem interlocução, sem local nem

estrutura para a sua manutenção. É claro que isso não exclui a fiscalização e a

participação dos partidos já existentes, mas agregar-se-ia essa comissão

permanente de acompanhamento.

Eu enfrentaria agora, rapidamente, alguns temas específicos que os senhores

terão que examinar em relação à reforma eleitoral. Iniciaria examinando o problema

da representação proporcional, e vou abordá-lo a partir de experiência própria.

Nosso sistema eleitoral é um sistema de voto uninominal, e isto veio do

Império. Examinando toda a legislação eleitoral e todos os sistemas eleitorais

conhecidos no Brasil, o primeiro que tivemos foi em 1921, com a votação para os

Deputados brasileiros às Cortes portuguesas. A votação era em três turnos: os

cidadãos ativos elegiam os eleitores de paróquias; estes elegiam os eleitores das

Províncias; e o Colégio de Províncias elegia os Deputados. Foi assim até chegarmos

a 1881, com o voto direto, da Lei Saraiva. Mas este era um sistema majoritário, com

distritos eleitorais, consideradas as Províncias. Em 1855, tivemos um sistema

distrital majoritário, instituído pelo Marquês de Paraná. Hermeto Carneiro Leão

alterou o sistema, mas o voto era sempre uninominal.

Quero chamar a atenção dos senhores para um ponto importante. Os

senhores sabem muito bem que o 15 de Novembro republicano foi um golpe de

Estado, não uma revolução. Foi um golpe de Estado em que o Marechal Deodoro e

o Exército pretendiam derrubar o gabinete liberal do Visconde de Ouro Preto. Eles

não queriam derrubar o Imperador; a queda do Imperador veio no processo político

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do 15 de Novembro. Deve-se isso, fundamentalmente, a Silveira Martins e a Lopes

Trovão, que fizeram uma campanha na Câmara Municipal do Rio de Janeiro.

O que aconteceu? Os republicanos receberam a República de presente do

golpe militar. Houve intrigas feitas por Benjamin Constant ao Marechal Deodoro; o

Marechal Deodoro recebe uma informação falsa de que o Imperador nomearia como

Presidente do Gabinete Silveira Martins, enquanto ele, Deodoro, queria o Saraiva

porque este era interessante ao Exército. Enfim, complicações de bastidores do Rio

de Janeiro. Isso deu na queda do Império.

A República não tinha apoio popular. Havia uma disputa entre as elites

republicanas, que se organizaram em partidos políticos em 1890. Aí, o que

acontece? Eles tinham que convocar uma assembléia nacional constituinte

republicana. Mas como eles iam fazer isso baseados em um sistema eleitoral a partir

do qual, seguramente, seriam vitoriosos os monarquistas? O que fizeram? Como sói

acontecer, a velha família mineira das Barbacenas, que circulava pelo País há

duzentos anos... Em 1890, discute-se entre os republicanos a organização do

processo eleitoral para a convocação da assembléia republicana. O que fazem os

republicanos? Eles abandonam o sistema eleitoral uninominal, pelo qual o eleitor

votava em um candidato, e criam o sistema de listas partidárias, isso para conseguir

a consistência do Partido Republicano. Assim, em 1890, o eleitor deixou de votar

nos candidatos uninominalmente, o que vinha da tradição, e passaram a votar em

listas de partidos, para assegurar a consistência da representação republicana na

assembléia constituinte — Regulamento Alvim, de 1890.

Pois bem. Essa eleição pelo sistema de listas fortaleceu enormemente o

Partido Republicano, reduzindo as estruturas dos Partidos Liberal e Monarquista,

que não tinham estruturas partidárias propriamente ditas – eram reuniões em torno

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de pessoas. Portanto, como o eleitor deixou de votar em pessoas e passou a votar

em listas partidárias, fortaleceu-se o Partido Republicano, que ganhou as eleições e

fez a Constituição Republicana de 1891. Só que não era possível manter esse

sistema, porque era um processo de exclusão, e os Partidos Monarquista e Liberal

tinham que se organizar em torno dessa situação.

Estoura a Revolução Federalista de 1891, liderada por Silveira Martins contra

Júlio de Castilhos, e aí se convoca a eleição com a Lei nº 35, voltando-se ao sistema

uninominal. E por quê? Para assegurar a inclusão, no processo republicano, dos ex-

monarquistas.

Vejam o seguinte, e dou esta informação entre parênteses: foi Campos

Salles, Ministro da Justiça de Deodoro da Fonseca, quem sugeriu que, por lei, se

atribuísse ao Supremo Tribunal Federal o controle da constitucionalidade das leis,

porque havia a possibilidade, depois da Constituição Republicana de 1891, de criar-

se, pelo resultado eleitoral com base no voto uninominal que retornou, um maioria

congressual monarquista votando legislação infraconstitucional. Portanto, ter-se-ia

um conflito entre a Constituição Republicana e um Congresso com maioria de

monarquistas, ou seja, um conflito entre a legislação infraconstitucional e a

Constituição Republicana. O que fizeram, inteligentemente, os republicanos?

Entregaram o controle da constitucionalidade das leis para os tribunais, porque

estes, para assegurarem a manutenção do espírito republicano, declaravam

inconstitucionais as leis produzidas por maiorias monarquistas. Esse foi, digamos, o

processo político-histórico.

Em 1932, Silveira Martins e Assis Brasil elaboram o projeto do código eleitoral

instituindo o sistema proporcional, mas não abandona o voto uninominal.

Estabelece-se o sistema proporcional e, num primeiro momento — e vejam a

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curiosidade, para entendermos o processo de transição —, o Código Assis Brasil

estabelece o quociente eleitoral, que sabemos bem o que é. Porém, o quociente

eleitoral poderia ser alcançado por candidatos individualmente considerados

independentemente dos partidos. Se um candidato tivesse uma votação igual ou

superior ao quociente, estava eleito, independentemente de o partido não ter

conquistado vagas. Aí foi criada uma figura chamada eleição de dois turnos. Não

vou examinar o sistema eleitoral, mas vou dizer o seguinte: na transição do sistema

majoritário da Primeira República para o sistema proporcional, manteve-se o voto

uninominal como forma de ligação entre um sistema e outro e não se entrou num

sistema de listas partidárias.

Agora, qual é a situação hoje? Minha exposição não tem o objetivo de ofender

ninguém, é uma exposição meramente analítica de uma realidade política,

independentemente daquilo que Marco Maciel chamaria de “fulanização”. O que

temos hoje? Temos a apuração do quociente eleitoral, em que se somam os votos

válidos e estes são divididos pelos lugares a preencher – os senhores sabem disso.

Vamos admitir a hipótese de que esta divisão... Vou tentar rememorar a minha

eleição, em 1986, em que o quociente eleitoral no Rio Grande do Sul era de 160 mil

votos. Dividiu-se o total de eleitores que compareceram à eleição — naquela época

ainda se incluíam os votos em branco; hoje não mais —, dividiu-se pelos lugares a

preencher no Rio Grande do Sul, 31 vagas; portanto, 160 mil votos eram o quociente

eleitoral. Depois, toma-se o número de votos válidos dados aos candidatos do

partido, divide-se esse número pelo quociente eleitoral e temos o quociente

partidário. Se os candidatos do partido fizeram 1 milhão e 600 mil votos, divididos

pelos 160 mil, o partido conseguiu, das 31 vagas, 10 vagas. Quem são os eleitos?

Os 10 mais votados da legenda.

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Qual é a lógica desse sistema? O que a lógica desse sistema induz? Primeira

afirmação: um partido, para ganhar a eleição proporcional, precisa conquistar o

maior número de vagas; para conquistar o maior número de vagas, precisa ter o

maior número de votos válidos na sua legenda; para ter o maior número de votos

válidos na sua legenda, precisa ter um número de candidatos que produzam

individualmente votos, já que o eleitor vota no candidato.

Lembrem-se de que isso é um orgulho para o eleitorado; lembrem-se de que

esta é uma permuta que se faz ao eleitor: você vota em que partido? Ele responde:

eu não voto em partido, eu voto em homens e em mulheres. E diz isso com orgulho.

Não é verdade? Isso significa que o eleitor está votando no candidato, o partido

sabe disso. Então, o partido vai buscar os candidatos que produzam votos.

Fiz uma tipologia há alguns anos, a partir das experiência que tive, a qual se

dividia da seguinte forma: primeiro, examina-se os virtuais candidatos do partido

num Estado federado; faz-se uma análise e verifica-se a consistência dos virtuais

candidatos da sua legenda com as categorias profissionais organizadas no Estado.

No Rio Grande do Sul, os partidos, sabendo, por exemplo, que a Polícia Militar

gaúcha, a Brigada Militar, tem uma organização, uma capilaridade, um conjunto de

pretensões em termos de representação, saem atrás de candidatos que possam

capitalizar e cooptar os votos daquela categoria profissional para si, que serão

somados aos dos demais candidatos. Então, lá temos candidatos das polícias

militares e civis. Houve uma época que tínhamos os candidatos dos fiscais de renda.

Houve um momento, na década de 70, em que os auditores de renda tinham uma

organização capilar muito forte, assim como os presidentes dos sindicatos dos

professores etc., e esses eram chamados pelos partidos para obterem os votos e

representarem as respectivas categorias profissionais.

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Depois de examinado o conjunto de categorias profissionais organizadas no

Estado, não na União, tem-se um outro tipo de candidato, chamado por mim de

“candidato de aparelho”. São aqueles que têm acesso ao eleitor, têm uma

comunicação com o eleitor pela mídia eletrônica, mas não eram todos os candidatos

os escolhidos. Na época tínhamos o futebol, a Copa do Mundo... Quando o Brasil

estava em alta no futebol, quem foram os candidatos mais escolhidos?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Ministro Jobim, queria

pedir licença a V.Exa. para saudar a chegada do Senador Roberto Requião a esta

Comissão e convidá-lo para fazer parte da nossa Mesa.

Informo, ainda, que o Senador Roberto Requião é Presidente da

Subcomissão de Reforma Política do Senado Federal.

O SR. NELSON JOBIM – Continuando, teríamos um segundo conjunto de

candidatos, que seriam os candidatos da mídia eletrônica. Houve uma época em

que os cronistas esportivos no Rio Grande do Sul eram candidatos; alguns deram

certo e abandonaram a crônica esportiva, outros, não, e voltaram à crônica

esportiva. Lembro do exemplo de Ibsen Pinheiro, que veio da crônica esportiva.

Outro candidato de mídia foi o Deputado Antonio Britto, que veio em outra

circunstância. Tivemos o Deputado Adroaldo Streck, que veio do rádio, o Deputado

Mendes Ribeiro, enfim. Mendes Ribeiro e outros não vieram da crônica esportiva;

vieram de um outro tipo de aparelho, que também é considerado mídia eletrônica,

mas posterior – ou seja, são os candidatos que vieram de programas

assistencialistas e os candidatos de programas de segurança pública, tendo em

vista os problemas que a população enfrentava.

Tivemos, ainda na década de 70, os partidos atrás dos pastores evangélicos

como candidatos. Os pastores evangélicos tinham tribuna, organização e

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capilaridade. Hoje os pastores evangélicos mudaram os critérios, se consolidaram

inclusive com o próprio partido político que estão assumindo. Ou seja, houve uma

mudança de perspectiva do perfil. Estou falando do perfil inicial.

O terceiro tipo de candidato, além dos candidatos de categorias e os

candidatos de aparelho, são os candidatos regionais, que são aqueles eleitos para

resolver problemas da região, como construção de escolas, asfaltamento de rua, de

estrada; enfim, candidatos que têm uma destinação básica: levar verbas públicas

para investimento na sua região eleitoral.

O quarto tipo de candidato é o candidato do partido político propriamente

ditos, que, para se eleger, depende da capacidade desses outros candidatos de

levantarem a legenda.

Ora, isso nos leva, em primeiro lugar, à pergunta: um candidato que é

escolhido pelo partido porque ele é líder de uma categoria profissional, e a categoria

profissional vota nele, é fiel a quem? A sua fidelidade é ao partido que lhe deu

legenda ou à categoria profissional que o elegeu? O candidato de aparelho, o

candidato que se elege através desses aparelhos a que eu referi, é fiel a quem? Fiel

a sua personalidade, que lhe produz votos, ou ao partido? No caso do Rio Grande

do Sul, em 1986, eu tenho ciência própria de um candidato (o qual inclusive

viabilizou a minha eleição, já que à época eu fui o 16.º da legenda do PMDB), que foi

convidado a ser candidato e que recebeu uma carta do presidente do partido

autorizando-o a ter posições próprias, independentes do partido. O Deputado

Mendes Ribeiro Filho sabe bem a que meu refiro. Foi o caso do seu pai, do

Deputado Mendes Ribeiro, que fez 330 mil votos à época, e eu inclusive me elegi

exatamente por essa circunstância.

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Os senhores observem bem que temos que examinar essa questão da

representação partidária levando em conta que o nosso sistema eleitoral, no quadro

em que está montado, faz com que os partidos dependam dos candidatos e não os

candidatos dos partidos. E mais: a disputa eleitoral é uma disputa interna do partido:

quem pode me derrotar é o meu colega de partido, e não o candidato de outro

partido.

Eu não tinha problema nenhum nas eleições de que participei em ter relações

extraordinariamente tranqüilas, em Santa Maria da Boca do Monte, com Tarso

Genro, com Paulo Paim, porque eles não tinham problema comigo. Agora, eu tinha

problemas com Antonio Britto, com Ibsen Pinheiro, com todos os candidatos do meu

partido, porque eles me derrotariam. Lembrem-se do horror que era comparecer

num comício eleitoral em um Município qualquer e o diretório municipal dizer: “Você

não sobe no palanque, você não fala”, e arrancavam a propaganda eleitoral que

eventualmente você tivesse colocado em algum local da cidade. Não era assim?!

Porque a disputa é interna. É ele quem vai me derrotar e não o outro.

Ora, isso mostra que nós temos um sistema eleitoral que tem que ser posto

sobre a mesa para se saber se ele não induz a organizações e massas partidárias

corretas.

Observem bem: os partidos acabam estabelecendo situações curiosíssimas e

técnicas distintas. Há um partido que os senhores conhecem que resolve o problema

das divergências internas pela criação de tendências partidárias. Se estabeleceu um

guarda-chuva onde convivem as tendências, que têm voz interna. Há outros que não

têm esse mecanismo, e as pessoas circulam de um partido para outro, levando

consigo seus votos. O candidato que representa uma categoria profissional que se

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desloca de um partido para outro leva os seus votos, já que o eleitor não vota no

candidato.

Os senhores precisam examinar esse problema para saber se querem ter

indivíduos que representem a Nação ou se querem ter partidos organizados. Isso

passa pelo seguinte problema – e encaixo esse tema na questão da fidelidade

partidária: como é que os senhores vão enfrentar o problema da fidelidade partidária

em relação a essa questão? Como é que se faz isso? Como vão tentar resolver esse

problema da fidelidade? Vão estabelecer externamente uma fidelidade partidária,

tendo em vista um sistema que induz uma fidelidade ao eleitor e não ao partido?

Como é que faz? Ou seja, se não resolverem esse problema, os senhores vão,

digamos, agravar um sistema que tem distorções.

A questão é saber: interessam os indivíduos? E por que é assim? Porque,

evidentemente, nós temos um problema. Nas eleições majoritárias, que são eleições

plebiscitárias, os candidatos é que produzem votos; as eleições proporcionais são

vistas como trânsito para as eleições majoritárias. Portanto, esse problema os

senhores terão que examinar.

Eu quero dizer claramente que, em relação à fidelidade partidária, que é um

tema que tocaria rapidamente, nós temos as questões que os senhores estão

enfrentando, como o problema da filiação partidária.

Se os senhores quiserem, no caso da representação proporcional... Quero

dizer que sou proporcionalista radical, e disso não abro mão. Poderia pensar,

eventualmente, em sistemas distritais mistos, mas sempre com o cálculo de

proporcionalidade na conquista dos votos, que é o sistema correto. O sistema

majoritário é um sistema excludente: exclui os derrotados. Ou seja, quem perde,

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perde tudo, e quem ganha, leva tudo. No caso, temos que estabelecer o sistema

proporcional.

Agora, o sistema para fortalecer partidos é o sistema de lista. Qual é o preço?

O preço é que se desloca a disputa eleitoral para dentro do partido; ou seja, a

disputa é na ordem de colocação da lista do partido. Se a votação for por lista

fechada, a disputa vai ser interna, e aí vai surgir um conflito que também decorre do

processo da individualidade, que é o conflito entre a nomenclatura do partido e os

políticos do partido, que às vezes não controlam a nomenclatura do partido. A

nomenclatura é controlada por um conjunto de personagens que não representa o

conjunto dos candidatos ou dos Parlamentares.

Essa é uma opção que os senhores terão que fazer. Agora, mantido o voto

uninominal, os senhores vão ficar sempre dependendo dos partidos dos candidatos

e não os candidatos dos partidos. Para fortalecer, teriam que ser encontrados

mecanismos alternativos dessa natureza.

Querem ver uma coisa? É claro, nítido e posto em jogo o conflito entre a

máquina partidária, a nomenclatura partidária e os candidatos decorrentes do voto

nominal. É a velha a discussão no Brasil sobre a candidatura nata. Os senhores

acham que a candidatura nata é filha do quê? Ela é decorrente do voto uninominal,

da individualidade dos personagens eleitos, e da máquina partidária que pretende

submeter o indivíduo ao princípio partidário. Como o cidadão não depende do

partido mas dos seus eleitores, ele estabelece a sua individualidade e conflita com a

máquina partidária. Aí, o que surge? As várias soluções, que começaram em mil e

novecentos e tanto, em relação às candidaturas natas. A experiência da candidatura

nata no Brasil começou em 1974, quando os Parlamentares eleitos são candidatos

natos do partido.

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Eu quero advertir os senhores em relação rapidamente a esse assunto: a lei

anterior – e aqui vem o ponto fundamental na análise desse tema -, de 1993, a Lei

n.º 8.713, previa a candidatura nata, mas com a seguinte redação:

(...) aos que na data da publicação desta lei forem

detetores de mandato Deputado Federal, Estadual ou

Distrital...

Não estão incluídos os Senadores. Os majoritários não estão incluídos na

candidatura nata.

...é assegurado o registro para o mesmo cargo pelo

partido a que sejam filiados na data da convenção

independentemente de escolha nesta, salvo deliberação

em contrário do órgão de ligação nacional do partido.”

Esta era a redação da Lei nº 8.713, de 1993. A lei atual excluiu a última parte.

A Lei 9.504 diz o seguinte:

“Art. 8.º

.............................

§ 1.º (...) é assegurado o registro de candidatura

para o mesmo cargo pelo partido a que estejam filiados.

Na lei anterior havia o veto do partido, ou seja, se invertia o ônus. O Deputado

ia à convenção para ser vetado, para ser derrubado. O partido derrubava. Não tinha

candidatura nata, dependendo da confirmação. No caso, ele tem candidatura nata

direta.

Quero dizer aos senhores que a manutenção da regra da candidatura nata

sem a possibilidade de passar pelo crivo de partidos apresenta problemas, por uma

razão simples. Em 1994, o Partido Liberal entrou com a Ação Direta de

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Inconstitucionalidade nº 1.068 contra a lei da época, a Lei nº 8.713, de 1993, e o

Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, entendeu que a lei não era

inconstitucional, porque assegurava ao partido a possibilidade de negar a

candidatura ao candidato nato. A lei de 1988 suprimiu esse texto. O Supremo

Tribunal Federal não teve oportunidade de examinar esse problema em relação à

nova lei. Impetraram recurso extraordinário num conflito ocorrido na Paraíba, e, ao

final, antes do julgamento, houve um acordo e desistiram do recurso em que seria

examinado o problema.

Do meu ponto de vista pessoal, há graves defeitos em relação a esse texto,

porque a Constituição Federal assegura autonomia aos partidos políticos e a lei lhes

retira essa autonomia na escolha dos candidatos. No sistema anterior havia uma

preferência do Parlamentar, mas o partido podia negar. Pelo sistema atual o partido

não pode negar, é imposta ao partido uma candidatura. Isso mostra um conflito entre

o indivíduo que tem voto próprio, que independe do partido, com a máquina

partidária. A candidatura nata é um produto espúrio dessa situação. Os senhores

teriam de examinar isso, porque haverá problemas. No momento em que surgirem,

tenho sérias dúvidas sobre a constitucionalidade desse texto.

Coligações partidárias. O Projeto de Lei nº 1.562, do Senado, proíbe as

coligações partidárias proporcionais e mantém as coligações partidárias majoritárias.

Em 1987/88, quando se discutiu o problema na Constituinte, as coligações

partidárias eram absolutamente necessárias porque representavam a saída de um

processo de bipartidarismo imperial determinado pelos militares – ARENA e MDB,

que abrigavam várias tendências. Esgotado o processo militar, começaram a se

formar legendas partidárias, cuja afirmação dependia das coligações. Logo, as

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coligações eram rigorosamente bem-vindas. Depois, os partidos começaram a se

consolidar, e, hoje as coligações partidárias são colocadas em dúvida.

Quero dizer, com toda tranqüilidade, que em matéria eleitoral não temos

princípios absolutos, mas conveniências históricas. Agora se discute a extinção das

coligações proporcionais. Por quê? Por uma razão simples: alguns partidos menores

coligam-se com partidos maiores, lançam um só candidato, concentram os votos do

candidato e aproveitam o coeficiente partidário da coligação para eleger seu

candidato, e, depois, a coligação desaparece porque é uma estritamente eleitoral. E

temos de lembrar que as coligações partidárias, nas eleições majoritárias, são

celebradas para fazer eleição, não para fazer governo. A experiência que temos é a

distinção fundamental entre coligações para dar eleição e coligações para dar

administração. Terminada a eleição, começa-se a discussão sobre qual é a

coligação que dará administração, que não é necessariamente a que deu eleição.

Isso nas eleições majoritárias. Nas proporcionais, é a manutenção de determinados

partidos que, para obterem o coeficiente eleitoral, mantém situações dessa forma.

V.Exas. têm de resolver se o pluripartidarismo brasileiro se mantém com essa

estruturação, ou não. A forma estabelecida pelo Senado é a extinção pura das

coligações. A extinção pura das coligações sacrificará uma série de legendas

partidárias hoje existentes, não tenho dúvida disso. Se os senhores querem

estabelecer um mecanismo de transição para assegurar maior tempo para que

essas pequenas organizações partidárias tenham consistência — estou me referindo

às organizações partidárias com perfil histórico, não às que surgiram pelas

circunstâncias —, poderiam estabelecer técnicas, que certa feita discuti com o

Deputado Haroldo Lima, de frentes ou federação de partidos. Outra fórmula seria a

que o Senador Roberto Freire discutiu há muito tempo: a possibilidade da

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participação dos partidos que não atingiram o coeficiente eleitoral nas sobras. Outra

forma de abrir um espaço. Hoje V.Exas. sabem que, preenchidas as vagas, as

sobras são ocupadas pelos partidos que atingiram coeficiente eleitoral. Podem

pensar, fazer uma série de especulações, examinar a possibilidade de partir por

essa linha.

Outra situação para a qual chamo a atenção de V.Exas. é tormentosa e diz

respeito ao financiamento de campanhas. O Projeto de Lei nº 353, do Senado,

estabelece uma dotação orçamentária de R$7 por eleitor. Desses valores,

considerando o eleitorado de 2000, que é 110 milhões, em números redondos,

resultariam uma dotação orçamentária para financiamento dos partidos políticos de

R$769 milhões. No ano 2002, para um eleitorado de 114 milhões, teríamos uma

dotação orçamentária da ordem de R$804 milhões. A divisão estabelecida no projeto

do Senado é de 1% para todos os partidos, independentemente de qualquer tipo de

situação. E então se cria um problema: se V.Exas. aprovarem esse sistema de

participação de 1%, temos absoluta certeza de que serão criados partidos para

recebimento de dotação orçamentária, e nada mais. Hoje, criam-se partidos por

causa do fundo partidário e para negociar o tempo de eleição. Isso precisa ser

colocado na mesa, com clareza, para se discutir o problema. Pode haver estímulo à

criação de legendas partidárias somente para se usufruir dos resultados

orçamentários, ou V.Exas. acham que não?!

Noventa e nove por cento para os partidos com representação na proporção

das bancadas. V.Exa. têm de prestar atenção na proporção das bancadas existentes

no Congresso e criarem uma fórmula de cálculo. A questão é saber o seguinte: com

isso, está se aceitando o quê? Excluir o financiamento que não o público das

campanhas eleitorais? Se é verdade essa situação, quais os mecanismos de

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impedimento do financiamento individual de campanhas? E vamos discutir outra

coisa. Participei de eleição, assim como V.Exas., e sabemos que o financiamento

oficial de campanha de partido político, no mais das vezes, centraliza-se na eleição

majoritária. Os Deputados é que têm de encontrar financiamentos para suas

próprias campanhas. Não é verdade?! É evidente. Precisamos ser transparentes.

Nunca vi, com a minha experiência, partido financiar eleição de Deputado ou de

Vereador; vi partido financiar eleição de Senador, Presidente, Governador e Prefeito.

E o que acontece? Os Deputados ficam atirados a sair em busca de financiamentos,

através dos mecanismos que conhecemos. A questão é saber se isso impede ou

fortalece a nomenclatura do partido.

Imaginem que a distribuição se dará pela representação partidária. A

pergunta é: representação partidária à época da campanha, quando da eleição, da

abertura da sessão legislativa, da legislatura ou da diplomação dos candidatos? Se

quando da diplomação dos candidatos, V.Exas. estarão impedindo que o

Parlamentar, com o deslocamento de um partido para outro, leve consigo a cota que

representaria na divisão do orçamento. Contudo, admitamos a seguinte hipótese. Ao

término de uma legislatura, um partido tem apenas um Deputado, devido a uma

série de problemas internos, apesar de ter elegido cem Deputados. Ele vai ter

financiamento de campanha eleitoral com base nos cem candidatos ou em um

candidato que não tem mais representação no Congresso?

Lembrem-se de que, no sistema de fidelidade partidária que V.Exas. estão

pretendendo lançar, em que se discute a questão da fidelidade, temos várias

fórmulas que nos levam a uma situação curiosa. O cálculo considerava a bancada

do partido até determinado momento antes da eleição; depois, antecipou-se isso

para a instalação da legislatura, inclusive para a formação das Comissões. O que

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aconteceu? Os deslocamentos partidários se deram entre a diplomação e a posse.

Reduzido o tempo, hoje os deslocamentos partidários mais sensíveis, digamos, se

dão entre a diplomação do eleito e a posse, pois esse tempo não está abrangido no

problema relativo ao cômputo, porque o candidato se desloca do partido para outra

situação.

Para encerrar, quero chamar a atenção de V.Exas. para algumas questões

claramente pontuais, as quais V.Exas. devem examinar.

Foi muito ovacionada a lei de iniciativa popular que criou o art. 41-A, que

introduziu a figura da captação do sufrágio para efeito da não-diplomação ou para a

cassação de registro ou diploma de candidato. Para que V.Exas. se lembrem, passo

a ler o texto da lei:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus

incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta

lei, o candidato que doar, oferecer, prometer ou entregar

ao eleitor, com fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem

pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou

função pública, desde o registro da candidatura até o fim

da eleição.

Como está, esse texto viabiliza o abuso do poder econômico e faz

desaparecer do Tribunal Eleitoral um problema em relação ao abuso do poder

econômico e político, porque a legislação sobre tal abuso sempre fazia depender de

que este tivesse influenciado o resultado da eleição. O que acontecia?

Recentemente, após as eleições gerais, fiz uma análise sobre o resultado de uma

eleição em que teria havido abuso real, mostrando que não havia possibilidade de

aquele abuso ter repercutido no resultado da eleição. Com isso, abria-se o espaço

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para a legitimação do abuso, desde que não houvesse influência na eleição. A

previsão da captação de sufrágio derruba essa possibilidade, porque a lei diz o

seguinte: “(...) doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, com o fim de obter-lhe

o voto (...)”. Trata-se de obter o voto do eleitor, ainda que esse voto não tenha sido

relevante para a eleição do candidato; considera-se a obtenção do voto.

Contudo, há um erro técnico exatamente decorrente do desconhecimento dos

elaboradores da lei. Quando é vedada a captação do voto? Desde o registro da

candidatura até o dia da eleição; ou seja, toda captação de votos que se tenha

realizado desde o momento da escolha da candidatura na convenção até o registro

não é captação de sufrágio. E o que uma mente de má-fé faria? Levaria o registro do

candidato, alguém impugnaria esse registro, que só se legitimaria depois da eleição.

Logo, ele poderia captar sufrágio durante toda a eleição.

O Tribunal Eleitoral já examinou esse problema, já discutimos o assunto.

Neste caso, deu-se a seguinte interpretação no Tribunal Eleitoral: quando se diz

“desde o registro da candidatura”, não se quer dizer “desde o deferimento do

registro”, mas “desde o pedido do registro”. O pedido do registro, pela lei, deve ser

feito no dia 5 de julho, antes da eleição, e a data de escolha na convenção, entre 10

e 30 de junho. Entretanto, ainda teríamos um período entre a escolha do candidato e

o pedido de registro mínimo de 35 dias em que o candidato poderia captar sufrágio.

V.Exas. têm que examinar se querem ou não que a captação do sufrágio seja

algo eficaz. Para tanto, V.Exas. teriam que mudar essa data, fixando-a a partir da

escolha na convenção, que me parece a data mais consistente, ou, no mínimo, a

partir da formulação do pedido de registro. Deixar constar “desde o registro da

candidatura” significa transferir para a Justiça Eleitoral a possibilidade de ter que dar

uma interpretação, como fizemos, forçada: desde o pedido do registro.

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Caso contrário, o que se poderia fazer? Por exemplo, eu lançaria o pedido de

registro, o Deputado Virgílio Guimarães impugnaria a minha candidatura e eu

prolongaria a decisão, porque poderia candidatar-me não obstante estar sendo

discutido o meu registro. Durante toda a eleição eu captaria sufrágio à vontade, e o

registro só seria definido depois da eleição. Isso é uma maluquice!

(Intervenção inaudível.)

O SR. NELSON JOBIM – Também se pode estabelecer dessa forma,

determinando que o substituído contamina o substituto. Mas aí surge um problema:

caso se casse o registro antes da eleição, há a possibilidade de se indicar outro

candidato. Ter-se-ia que examinar caso a caso.

Há outra situação que eu gostaria de que os senhores examinassem, que diz

respeito à dupla filiação. Na Justiça Eleitoral está havendo uma confusão imensa

quanto a divergências em relação à dupla filiação.

O art. 22 da Lei dos Partidos Políticos estabelece que quem se filiar a outro

partido deve fazer a comunicação ao partido e ao juiz da sua respectiva zona

eleitoral para cancelar sua anterior filiação. Se não o fizer no dia imediato ao da

nova filiação, fica configurada a dupla filiação, sendo ambas consideradas nulas.

Vamos deixar bem claro a seguinte hipótese: a eleição se realiza, perde-se a

eleição. O que faz o partido político que perde a eleição? Prorroga a disputa eleitoral

na Justiça Eleitoral. Ele chama os seus advogados e pergunta: “Onde podemos

impugnar a candidatura desse cidadão?” O Deputado José Antonio Almeida sabe

disso, pois vive na Justiça Eleitoral. O âmbito da Justiça Eleitoral é um

prolongamento, com tapete, da disputa eleitoral, com ou sem razão. Lá se

encontram ações de qualquer tipo, porque tudo aquilo se prolonga na Justiça

Eleitoral.

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Com relação à dupla filiação, as eleições para Prefeito e Vereador foram

curiosas. O que aconteceu? Havia divergência. Observem que a lei, no art. 19, § 1º,

estabelece que o partido político tem que enviar, na primeira semana dos meses de

maio e dezembro de cada ano, aos juízes eleitorais, para arquivo, publicação e

cumprimento dos prazos de filiação partidária, e para efeito de candidatura a cargos

eletivos, a relação dos nomes. Portanto, o partido político manda a relação dos

filiados para a Justiça Eleitoral. Essa obrigação se dá nos meses de maio e

dezembro. Diz o § 1º do art. 19 o seguinte:

Se a relação não é remetida nos prazos

mencionados neste artigo, permanece inalterada a filiação

de todos os eleitores, constante da relação remetida

anteriormente.

Para a Justiça Eleitoral, quem são os candidatos filiados, se não for remetida

a lista? Os candidatos da lista anterior. O outro artigo considera dupla filiação a

pessoa que não comunicar em vinte e quatro horas. Portanto, o que aconteceu

várias vezes? Alguns partidos de boa-fé e outros de má-fé mandavam a lista — e

desorganizadamente, porque não há como se exigir que um partido num Município

tenha uma organização para tirar da lista alguém que comunicou a desfiliação —

dizendo quem é filiado ao partido. Depois, outro partido também manda uma lista

dizendo que aquele cidadão é filiado àquele outro partido. O resultado é a

impugnação por duplo registro. E essa impugnação só se dá, evidentemente, se ele

for eleito, caso contrário isso não interessa, porque é uma forma de se ganhar a

eleição pelo “tapete”.

Alguns tribunais passaram a entender ser relevante a lista do partido, e não a

comunicação no dia subseqüente. Por quê? Porque às vezes o sujeito se filiou em

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1980 ao MDB, depois, resolveu filiar-se ao PSDB ou ao PDT e não se lembra mais

da existência dessa filiação antiga no antigo MDB, porque o PMDB herdou os

registros de filiação do PMDB, e surge imensa confusão. É fundamental que V. Exa.

a resolvam. O parágrafo único do art. 22 quer acabar com a saída de partido. Ou

seja, se o filiado sai, tem de comunicar com 24 horas de antecedência. Busca-se

criar dificuldade para evitar a troca de partido. Mas ficou um buraco no art. 19, que

abriu a possibilidade desse registro. E o que vai acontecer ? A Justiça Eleitoral de

cada Estado decidindo de forma diferente, cada Tribunal Eleitoral, dependendo da

composição, decidindo de um jeito e os Ministros, de outro, porque os dois

argumentos são legítimos.

Então, quero deixar bem claro a V.Exas. o seguinte: as questões eleitorais

não podem ser submetidas à decisão interpretativa final de juiz. Porque a decisão do

juiz é depois do jogo jogado, depois da urna apurada, depois da eleição definida e

da festa cantada. E, aí, como pode a Justiça Eleitoral cassar o registro de

candidatura de um Prefeito que se elegeu com 75% dos votos? E, às vezes, o que

acontece? Recebemos o recurso, verificamos que o candidato recebeu 75% ou

80% dos votos, mas há uma coisa formal na lei que impede o registro. E temos de

retirá-lo, julgá-lo e fazer nova eleição. Nessa nova eleição, o candidato vai

candidatar-se de novo e aí o eleitorado vai lhe dar 95% dos votos. Custa dinheiro

para o partido, custa dinheiro para todos, e o resultado é o mesmo.

Portanto, precisamos que essas regras sejam absolutamente claras, para que

isso não fique na idiossincrasia interpretativa dos Tribunais. Se tivermos de

interpretar, interpretaremos, não há problema. Repito, interpretaremos. Agora, como

se faz isso? Temos casos complicados, decisões recentes complicadas, que têm

gerado problemas. V.Exas. se referiram a problemas ocorridos nos Estados de

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Goiás, Espírito Santo, Rio de Janeiro com candidatos que fizeram 75% dos votos e

acabaram tendo os diplomas cassados, por circunstâncias de disputas

interpretativas inclusive.

Portanto, as coisas precisam ficar claras. Ou seja, a responsabilidade da

Justiça Eleitoral é muito pela conseqüência. E não se pode confundir essa decisão

com decisão política e transferi-la para um Tribunal não-político, Judiciário e

magistrado.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, perdoem-me essa exposição confusa,

problemática, em que misturei experiências legislativa, eleitoral, advocatícia, do

Poder Executivo, de juiz para exatamente tentar debater essas questões eleitorais.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. DEPUTADO NEIVA MOREIRA – Sr. Presidente, peço a palavra pela

ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO NEIVA MOREIRA – Sr. Presidente, a dissertação do Sr.

Ministro Nelson Jobim encerra valiosa contribuição sobre o rol dos problemas que

devemos nos defrontar daqui para o futuro, se quisermos uma lei eleitoral

democrática e transparente.

Sr. Presidente, seria muito interessante que V.Exa. distribuísse aos membros

desta Comissão essa parte de enumeração de problemas, de dúvidas, de

questionamentos. Abreviaria muito nosso trabalho, quando tivermos de analisar o

conjunto desse emaranhado de legislação eleitoral para fazermos um código que

possa realmente atender às necessidades e também às conveniências políticas do

País.

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O SR. NELSON AZEVEDO JOBIM – Nobre Deputado Neiva Moreira, tomei a

providência de fazer isso por tópicos. Farei chegar esses tópicos aos gabinetes dos

membros da Comissão e do Relator. Quero deixar bem claro que são tópicos em

que se estabelecem os problemas, a legislação e as situações que daí emergem.

O SR. DEPUTADO NEIVA MOREIRA – Sr. Presidente, muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Quero dizer ao nobre

Deputado Neiva Moreira que a nossa Comissão tem se empenhado nesse sentido e,

sem dúvida nenhuma, esta Presidência fará chegar ao gabinete de S.Exa. os

assuntos que aqui forem tratados.

Quero dizer ao Ministro Nelson Azevedo Jobim que, utilizando-se de toda sua

experiência, S.Exa. fez brilhante exposição.

Passo a palavra ao nobre Relator, Deputado José Antonio Almeida.

O SR. DEPUTADO JOSÉ ANTONIO ALMEIDA – Sr. Presidente, neste

primeiro momento, quero apenas cumprimentar o Sr. Ministro Nelson Azevedo Jobim

pela importante contribuição que trouxe à Comissão. Já sabíamos que ia ser assim,

pela extraordinária experiência de S. Exa., Parlamentar que foi nesta Casa sempre

dedicado, com interesse e foco nas questões eleitorais e partidárias. V.Exa., Sr.

Ministro, também viveu experiência no Poder Executivo, no Ministério da Justiça,

para onde também resvalam essas questões, com as demandas vindas da base. E

vive hoje experiências no Supremo Tribunal Federal e no Tribunal Superior Eleitoral.

De modo que, sem dúvida nenhuma, reúne as melhores condições para dar valiosa

contribuição e fazer um trabalho colaborativo com esta Comissão.

Sr. Presidente, vou fazer minhas considerações no final. Sei que os nobres

Deputados estão ansiosos por terem a oportunidade de trocar algumas idéias com o

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Sr. Ministro. Portanto, limitar-me-ei a comentar o que os membros desta Comissão

não abordarem durante suas intervenções.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Obrigado, Sr. Relator.

Sr. Deputados, vamos passar à lista de inscrição. (Pausa.)

Quero comunicar a esta Comissão que se o Senador Roberto Requião

entender usar da palavra será para nós grande contribuição.

Indago ao Sr. Senador Roberto Requião se gostaria de usar a palavra neste

momento?

O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO – Sr. Presidente, estou

simplesmente aqui como espectador de todo esse processo.

Temos muita coisa para mudar na legislação eleitoral. Hoje, a impressão que

tenho é a de que, a partir do momento em que alguém se registra como candidato,

passa a ser tratado como um contraventor. fundamentalmente em função de a

legislação ser muito pouca definidora dos tipos delituosos. Uma legislação indefinida

deixa ao sabor do Juiz a possibilidade de flexibilizar para um lado ou para o outro o

julgamento. Esses problemas se magnificam, principalmente quando há atrito entre

um partido político ou um candidato ao Governo e a Justiça Eleitoral. É o caso do

Estado do Paraná. Por exemplo: este ano o PMDB do nosso Estado teve suspensas

suas inserções no rádio e na televisão, no primeiro e no segundo semestre, por

motivo absolutamente injustificado.

Outros problemas comuns são as infrações eleitorais de propaganda

indevida. Quando alguém dá uma entrevista numa rádio, o radialista pergunta se é

candidato; se a pessoa disser que não é, está saindo do jogo; se disser que é, surge

a famosa multa de 20 mil UFIRs, uma multa inflexível. Por menos ouvintes que a

rádio tenha ou mais insignificante que ela seja. É um absurdo total. No caso do

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Estado do Paraná, com determinada composição do Tribunal Regional Eleitoral,

todas essas multas caíram.

No meu caso pessoal, tive, em conseqüência de entrevistas que dei a rádios,

136 denúncias. Umas 120 foram arquivadas liminarmente, em função de

determinada composição do Tribunal Regional Eleitoral. E as denúncias eram muitos

engenhosas: não se tratava mais de dizer que eu era candidato, mas considerar a

crítica ao Governo do Estado como o início de campanha eleitoral. Como a

propaganda se divide em duas partes, a tese era a seguinte: primeiro, desqualifica-

se o adversário; depois, faz-se a divulgação das próprias propostas. Quando o

Tribunal mudou a composição e passou a aceitar essa tese da propaganda negativa,

as denúncias deixaram de subir para o Tribunal Superior Eleitoral, porque o TSE só

examina divergências jurisprudencial e infração constitucional. O Sr. Ministro Costa

Leite, em determinado momento, ultrapassou esses limites, dado o absurdo da

medida. Mas o Tribunal acabou consagrando o entendimento de que não se

examinava a matéria de prova provavelmente porque o número de agravos que

subiriam seria fantástico. Pessoalmente, tenho oito condenações, porque critiquei o

Governo do Estado, sem falar em candidatura Elas se esgotaram no Tribunal do

Paraná, que tinha um conflito comigo em razão de uma negativa de conceder

aumento salarial aos juízes. Ora, quem abriu essa possibilidade? Fomos nós, ao

estabelecer um texto legal extraordinariamente pouco definido, não fechando os

tipos delituosos.

Apreciei muito o Ministro Jobim ter deixado claro que se não fecharmos, no

tipo delituoso, exatamente o que queremos dizer, isso vai dar azo a uma série de

interpretações de juízes singulares e de Tribunais, cada uma diferente da outra. E,

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às vezes, como no caso do Paraná, no mesmo Tribunal, bastando que em

determinado momento sua composição seja modificada.

O Senado tem discutido muito esses assuntos. Estamos trabalhando com o

TSE e com a Câmara Federal também. Tenho mantido contatos com o Deputado

João Almeida sobre a questão da votação eletrônica. A propósito, apresentei projeto

de lei propondo a comprovação do voto através da sua impressão, idéia hoje

seguida por diversos Estados americanos. O Ministro Jobim não concorda comigo.

Mas o problema é resolvermos a discordância por aquilo que der melhor qualidade e

credibilidade ao processo eleitoral. Pessoalmente sustei a votação desse projeto,

pedindo sua volta à Comissão de Constituição e Justiça, para que pudéssemos

discuti-lo em profundidade. Estou convencido da procedência projeto. A objeção do

Ministro Jobim é a seguinte: S.Exa. diz que, em determinadas circunstâncias, um

cidadão poderia fazer um ataque destrutivo à urna. Ou seja, digita o voto, o voto

aparece impresso no visor e ele diz o voto que eu digitou não é o que está impresso.

Como o voto é secreto, ninguém poderia conferir se ele está de fato fazendo uma

afirmação correta ou se pretende apenas tumultuar o sistema.

Ocorre, no entanto, que o atual processo eleitoral permite essa mesma

prática. Eu posso digitar o voto e dizer ao Presidente da Mesa que o que apareceu

na tela não foi o que eu digitei. E como o Presidente da Mesa não pode conferir,

temos aí idêntico impasse. Mas estamos discutindo o assunto, e acordamos, no

Senado, com a participação do Ministro, que tentaríamos, nessa primeira eleição,

introduzir algumas modificações que talvez não fossem as definitivas — aquilo que

nós no Senado, por unanimidade, estamos desejando, que é a impressão do voto, e

uma série de outras medidas que tornariam a eleição mais clara.

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A crítica básica é que não podemos fazer com que o eleitor se adapte à

máquina; temos de fazer a máquina se adaptar ao eleitor. E o eleitor médio brasileiro

não é especialista em informática. O voto garante a soberania do povo. Mas se o

eleitor não tem confiança de que o voto que digitou foi o voto que a máquina

contabilizou; se ele não pode proceder a uma auditoria posterior desse voto —

auditoria que está prevista na legislação eleitoral, pois a conferência, a segunda

apuração, pode ser solicitada ao juiz, o que a máquina praticamente impede — não

temos um voto confiável para o eleitor, mas apenas um voto confiável para o grupo

de técnicos do Tribunal e dos partidos que jamais terão uma assessoria técnica para

fazer uma auditoria consistente em 350 mil máquinas de votar. Mas penso que

estamos em bom caminho. As Comissões da Câmara dos Deputados e do Senado e

o TSE estão solicitando, em conjunto, uma auditoria à UNICAMP. Queremos fazer

isso juntos para não dispersar esforços.

Por outro lado, providências urgem quanto à legislação eleitoral. Há uma

proposta de minha autoria, aprovada por unanimidade no Senado, que resolve, de

certa forma, o problema da fidelidade partidária à moda do nosso velho Guerreiro

Ramos, na sua famosa obra “Redução Sociológica”. Não se muda um sistema

abruptamente, porque a confusão é muito grande e jamais teremos resultado

satisfatório. O Senado está propondo listas duplas. Uma lista fechada, hierarquizada

pela convenção partidária, e outra, que elegeria 50% dos candidatos, aberta, eleita

também pela convenção partidária. Os votos seriam contabilizados, para fim de

eleição e de totalização de coeficiente eleitoral, na lista fechada. Isso impediria que

candidatos fizessem uma campanha paralelamente à do partido, porque a vaga que

eles pretendem vai depender da consistência do voto na legenda.

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Ao mesmo tempo, rejeitamos, na discussão dessa proposta, o voto distrital,

que consagraria, de uma vez por todas, a meu ver, o sistema cubano, transformando

as Assembléias e o Congresso Nacional em uma espécie de convenção nacional de

presidentes de associações de bairro, despolitizando e tirando a conotação

ideológica do processo. Teríamos só os Deputados de resultados, que se

comprometeriam com a obtenção de alguns benefícios para sua comunidade e

deixariam completamente de lado as questões nacionais. Privatização do setor

energia elétrica, o que se faz com a PETROBRAS, com o Banco do Brasil, a política

do Banco Central, tudo isso passaria a ser negociado com uma verba orçamentária

para uma creche ou para a construção de uma escola técnica. Não seria bom para o

País a despolitização.

O fundamental, no entanto, é resolvermos de uma vez por todas, em uma ou

duas etapas, a questão da votação eletrônica. Ou temos a comprovação ou temos

um sistema que nos dê mais segurança, e deixamos uma fórmula definitiva, não

para esta, mas para a outra eleição. E a discriminação da atividade do parlamentar.

É realmente terrível que, em determinado momento, uma crítica feita ao Governo do

Estado possa ser contabilizada como propaganda eleitoral e implique multa, que se

transforma em uma multa irrevogável, porque o TSE, que fica mais longe das

questões provincianas, não examina a fundo o processo, simplesmente porque não

o caso não configura divergência jurisprudência de Tribunais ou tema de natureza

constitucional.

Esse dispositivo que permite esse tipo de avaliação e tantos outros que

criminalizam a participação do candidato no processo eleitoral devem ser varridos do

processo.

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Essas medidas já foram aprovadas pelo Senado e têm como Relator, na

Câmara dos Deputados, o Deputado Osmar Serraglio, do Paraná — a

descriminação do processo eleitoral e a criação das duas listas de votação. Isso

seria o fundamental para o curto prazo.

A outra panacéia com que se acena, aprovada por unanimidade no Senado

— se pudesse fazer uma recomendação a V.Exas. seria no sentido de revogá-la —,

é essa bobagem monumental do financiamento público de campanha, na forma em

que foi proposto.

O SR. DEPUTADO BONIFÁCIO DE ANDRADA - Senador, como são as duas

listas?

O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO - Uma lista é hierarquizada pelo

partido, na convenção, fechada. Vota-se no partido e elege pela ordem. E a

segunda, uma lista aberta, da qual os candidatos participam pela ordem da sua

própria votação.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES - O eleitor dá dois votos?

O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO - Dois votos.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES - Pode ser em lista de partidos

diferente ou do mesmo partido?

O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO - Do mesmo partido.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Senhores, é um prazer

muito grande para esta Comissão ouvir a experiência do Senador Roberto Requião.

Entretanto, não vamos permitir apartes, porque prolongaria demais a exposição.

Temos uma lista enorme de inscritos para participar desse debate e devemos seguir

a ordem de inscrição.

Volto a palavra Ao Senador Roberto Requião.

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O SR. SENADOR ROBERTO REQUIÃO – Concluindo, o fundamental é

examinarmos, também com cuidado, essa história do financiamento público de

campanha. Se o financiamento público fosse uma espécie de INSS eleitoral,

garantindo para cada candidato uma enfermaria política, ou seja, o mínimo para que

ele disputasse, seria razoável.

Mas, quando elaboramos uma lei que vai de encontro aos costumes, o

resultado é terrível! É como a famosa Lei Seca nos Estados Unidos, proibindo o

consumo da bebida, que criou as máfias, e a Lei Seca na Rússia, que criou as

organizações criminosas que sobreviveram ao fim da própria lei.

Como está posta a questão, um Vereador, em São Paulo teria, vamos dizer

dois mil reais para fazer a sua campanha. É algo absoluta e rigorosamente

insuficiente para uma campanha eleitoral em São Paulo. Esgotado o recurso público

de dois mil reais, se a mulher dele colocar uma faixa na frente de casa dizendo:

"Vote no Chico Fonseca para Vereador de São Paulo", ela estará colocando o

Vereador sob o crivo da legislação e do juiz por crime de propaganda irregular. Isso

é uma coisa absolutamente doida. E, por outro lado, aumentaria a força dos órgãos

de comunicação, porque um jornal nacional promove ou liquida um Deputado, um

candidato a Deputado, a Governador ou a Presidente, sem que isso se configure

propaganda eleitoral.

Então, ao tempo em que estaríamos tirando a possibilidade da iniciativa

pessoal na arrecadação de recursos à engenhosidade na campanha, nós

estaríamos magnificando a influência da mídia organizada, do monopólio da

comunicação. Mas isso passou no Senado como essas legislações de pânico, muito

mais, me perdoem os Senadores, pelo desejo de fazer uma demagogia para a

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opinião pública, do que de raciocinar com profundidade sobre as conseqüências de

um financiamento insuficiente e absurdo.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Agradecemos a

participação de V.Exa., como sempre produtiva, em nossa reunião.

Tendo em vista o adiantado da hora e a enorme lista de inscrição, peço que

as interpelações sejam feitas em bloco, para que possamos agilizar o nosso trabalho

e ganhar tempo. Estão inscritos para falar no primeiro bloco os Deputados José

Antonio Almeida, Mauro Benevides e Geraldo Magela.

Portanto, passo a palavra ao Deputado José Antonio Almeida.

O SR. DEPUTADO JOSÉ ANTONIO ALMEIDA – Sr. Presidente, Sr. Relator,

Sr. Senador Roberto Requião, eminente Ministro Nelson Jobim. V.Exa., como já foi

dito nesta Casa, sempre transmite luz quando traz informações para as Comissões

da Casa, e não poderia ser diferente neste momento. V.Exa. aliou a experiência

parlamentar, a experiência de advogado, de Ministro da Justiça e de Juiz que está

vivendo agora e trouxe informações concretas e preciosas para o nosso debate.

Vou abordar de maneira objetiva — até como advogado costumo cumprir os

prazos e vou cumprir este de três minutos —, em primeiro lugar, a questão da urna

eletrônica e, depois, a questão da reforma eleitoral propriamente dita.

Quanto à urna eletrônica, existe uma solução que já constou do texto legal, da

Lei nº 9.100, que regulou a eleição municipal de 1996, quando se utilizou pela

primeira vez a urna eletrônica nos Municípios com mais de 100 mil eleitores. Essa

regra está no art. 18 da Lei nº 9.100, § 7º, que diz: "A máquina de votar" — o termo

não era urna eletrônica, era máquina de votar — "imprimirá cada voto, assegurado o

sigilo e a possibilidade de conferência posterior para efeito de recontagem." Ou seja,

não é preciso haver, por parte do eleitor, a verificação se aquilo que ele está

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colocando lá corresponde ao que está impresso, até porque ele não toma

conhecimento; mas a recontagem é possível naqueles casos em que houver — e a

lei atual estabelece quais são os casos, e a lei anterior já estabelecia — a chamada

recontagem obrigatória – art. 88 da lei. É aquela questão dos totais destoantes, e

coisa semelhante, que faz com que haja a possibilidade de recontagem.

Essa recontagem hoje só é possível com o sistema tradicional, onde a

votação for tradicional. No momento em que se universaliza a urna eletrônica, não

há mais essa possibilidade. Então, se votarmos isto na norma, haveria a

possibilidade de se ter efetivamente a impressão.

O que acontecia em 1996? Acontecia o seguinte: a pessoa digitava o voto e

havia uma urna de plástico acoplada à urna eletrônica onde se recebia a impressão

dos votos. Os votos ficavam lá registados, e aí era possível, perfeitamente, naqueles

casos em que a lei permitia a recontagem, se fazer a recontagem. Acho que isso

resolveria essa questão da segurança, sem prejuízo das demais colocações. Acho

muito adequada a perícia que o Ministro está sugerindo juntamente com o Senado.

Com relação à reforma eleitoral, saúdo a posição do Ministro. Para mim,

todos os sistemas que estão sendo propostos, inclusive o do Senador Roberto

Requião, o de listas fechada e aberta, não são uma solução melhor do que o

sistema proporcional. O sistema proporcional permite a participação das minorias, na

sua própria gênese. Ele surgiu para permitir que a maioria representasse a maioria,

mas não representasse o todo.

Portanto, a maioria representa a maioria, não o todo. Existem votos que são

da minoria e que devem ter representação proporcional à própria minoria.

Então, acho que esse sistema proporcional ainda é melhor, com todas as

distorções que existem. Como o Ministro abordou muito bem, temos um sistema que

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privilegia indivíduos e não partidos. Mas, com todas essas distorções, parece-me

que ele é preferível.

Eu apenas adotaria um aperfeiçoamento do sistema proporcional, no sentido

— e o Ministro até falou nisso — de não se excluir das sobras aqueles que não

atingirem o quociente eleitoral. Isso é uma distorção do próprio sistema proporcional.

Porque, na realidade, pelo objetivo de dar participação às minorias, haveria, com a

participação daqueles que não atingiram o quociente eleitoral, a possibilidade de

participarem no momento de definição das sobras. Isso seria um aperfeiçoamento

do sistema proporcional.

O financiamento público tem vantagens e desvantagens, como tudo que se

fizer aqui, mas não se pode desconhecer que a situação do financiamento como

está hoje é também de discussão. O artigo no jornal Folha de S.Paulo de hoje, do

sociólogo Emir Sader, com o titulo “Corrupção Nova e Velha”, fala da corrupção

nova a partir do financiamento eleitoral de interesses que estariam de acordo com a

lei, mas privilegiando no governo interesses privados.

Quanto às coligações proporcionais e majoritárias, não me parece que

tenhamos que acabar com uma e manter outras. Ou se acaba com as duas, ou se

mantém as duas. Porque assim como há coalizão para governar — embora o

Ministro diga que não, existe coalizão para governar, existem governos que dividem

suas funções em razão daqueles que participaram da eleição e também atende aos

que não participaram —, existe também a figura dos blocos parlamentares, que

temos na Casa, que permite perfeitamente a situação relacionada com a

possibilidade de manutenção de partidos que tenham posições comuns, com relação

a uma situação anterior.

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Então, o que quero dizer é que se poderia chegar a uma alternativa — até

apresentei projeto de lei nesse sentido —, alternativa que está na Lei nº 9.100, art.

6º, que só admitia as coligações se estas fossem ao mesmo tempo celebradas para

eleições majoritárias e proporcionais; ou seja, haveria a possibilidade de, com isso,

reduzir uma coligação proporcional, a chamada coligação sem cabeça, que a lei hoje

permite e que é realmente uma distorção.

Eram estas as considerações que queria fazer.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Concedo a palavra ao Sr.

Deputado Mauro Benevides.

O SR. DEPUTADO MAURO BENEVIDES – Sr. Ministro Nelson Jobim,

praticamente irei enfocar aqueles itens que, constando da exposição de V.Exa.,

foram abordados sob outra ótica pelo Deputado José Antonio Almeida. Aliás, S.Exa.,

representante do Maranhão, ainda nesse impacto dos chamados apagões, disse

que V.Exa. chegava, e o fez com muita justeza, e trazia luz a este debate

extremamente importante para o Congresso Nacional.

No que diz respeito às urnas eletrônicas, as alterações sugeridas em relação

à escolha de dois Senadores, pergunto: as modificações dessa sistemática vão

depender de diploma legal ou podem ser feitas pelo TSE, utilizando o poder

normativo atribuído àquela Corte? Se for através de lei, estamos diante de um prazo

inexorável para aprovação dessa matéria, o espaço de um ano. Essas alterações

emanariam do poder normativo do TSE, ou teria que ser através do diploma legal?

O tema coligações partidárias, também abordado pelo Deputado José Antonio

Almeida na última reunião nesta Comissão, foi exatamente aquele que despertou um

debate mais acirrado, com a brilhante participação do Líder do PCdoB, Deputado

Haroldo Lima.

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Naquela ocasião, mesmo superficialmente, indagamos a S.Exa. e aos

Parlamentares presentes se a alternativa da Federação dos Partidos, emanação do

Direito uruguaio, não garantiria a preservação dos pequenos partidos.

No que diz respeito ao financiamento público de campanha, o Tribunal

Superior Eleitoral, no caso de prevalecer esse diploma legal, já estaria se

preparando para instrumentalizar as Corregedorias Regionais nos TREs para uma

fiscalização na aplicação desses recursos, a fim de que os candidatos não

demandassem novamente aquelas fontes tradicionais que tinham sua base na

iniciativa privada?

São essas as três indagações.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Com a palavra o

Deputado Geraldo Magela.

O SR. DEPUTADO GERALDO MAGELA – Sr. Ministro Nelson Jobim, quero

reiterar a saudação à presença de V.Exa. bem como reconhecer as contribuições

que tem trazido a esta Comissão.

Gostaria de fazer uma observação muito rápida e uma pergunta apenas, já

que quanto a muitas as questões V.Exa. já respondeu.

Fui um dos maiores entusiastas da urna eletrônica. Como Presidente da

Câmara Legislativa do Distrito Federal, quando se começou a debater este assunto,

de fato, apoiei todas as iniciativas que o TSE fazia naquele momento para a

instalação das urnas eletrônicas. Confesso a V.Exa. que hoje sou um dos que tem

mais dúvida sobre a segurança da urna eletrônica. Parece-me, pelas eleições em

que essa urna foi usada, que é possível perceber que diminuiu sensivelmente a

possibilidade da fraude; mas temos ainda muitas dúvidas sobre a segurança. Há um

estudo sendo feito por uma associação dos funcionários das Assembléias

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Legislativas, e o pessoal da área de informática tem muitas críticas quanto à

segurança da urna eletrônica. Como o Ministro está pedindo auditoria à UNICAMP,

sugiro a V.Exa. que também ouça outros técnicos, especialmente da referida

associação, que considero da maior importância, pois podem nos ajudar e ao TSE

nessa reflexão.

Ministro Nelson Jobim, V.Exa., enquanto Parlamentar, foi Relator da reforma

constitucional, na qual se debateu a instituição do voto facultativo no Brasil. Sou

defensor do voto facultativo. Apresentei uma emenda constitucional e estou

convencido de que, por emenda constitucional, não teremos o instituto do voto

facultativo, pelo menos nos próximos anos. Estou propondo a realização de um

plebiscito para a decisão soberana da população sobre este tema. Gostaria de ouvir

a opinião de V.Exa. sobre o assunto.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Concedo a palavra ao Sr.

Ministro Nelson Jobim.

O SR. NELSON JOBIM – Sr. Presidente, agradeço as considerações dos Srs.

Deputados.

Passarei ao exame do problema.

Deputado José Antonio Almeida, a questão da fórmula de 1996 não resolve o

problema do Senador Requião, porque era para conferir só o resultado. O Senador

Requião desconfia que poderia digitar 135 e ser contabilizado 140 ou não sei o quê.

Então, não resolve, porque era só para conferir o resultado.

O problema da urna é mais ou menos o que aconteceu com todos nós – e o

Deputado Geraldo Magela, ex-bancário, sabe muito bem disso. Quando se

introduziram as máquinas de somar (salvo as bancárias, havia até aquelas

máquinas Olivetti que se puxava), o que acontecia? Somava-se tudo, lançavam-se

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as parcelas somadas, depois arrancava-se o pedaço de papel, conferiam-se as

parcelas. Não se colocava em dúvida o resultado da soma; conferia-se o lançamento

das parcelas. Quando esse tipo de máquina de digitar foi substituída pelas digitais,

não se tinha mais a memória das parcelas, só o resultado final, porque era a

contabilização direta sem a conservação das parcelas. O que fazíamos?

Somávamos duas, três vezes para conferir o resultado. O problema é discutirmos

mecanismos de transparência em relação a isso. A dúvida apresentada pelo

Senador Requião é de que poderia haver uma alteração do programa individual na

urna em que a digitação 135 desse 153, por exemplo. Esse é o problema que a urna

de 1996 não resolve, porque não era a contabilização, mas o lançamento da

parcela. É o que queremos discutir para estabelecer.

Deputado Geraldo Magela, a dúvida está exatamente nisso. Tivemos apenas

seis casos, nas eleições municipais, de problemas em relação à urna, porque ela

tem um problema. O resultado da urna eletrônica tem um problema psicológico que

induz ao conflito. Quando tínhamos apuração tradicional, o gato subia para o

telhado, começava apurar, ia chegando e fazíamos o discurso da vitória e o da

derrota; o Virgílio já se preparava para a derrota e o outro, para a vitória. Alguns já

davam a derrota antes e todo mundo abandonava a apuração, ia para a praia – isso

em 1982. A urna é morte súbita! Apurou, e em cinco minutos se tem o resultado. E

aí vem a reação, como aconteceu principalmente no Pará, onde havia pretensões de

eleitorais de resultado positivo: houve invasão de urna, quebraram urna. Temos de

conviver com isso.

Pessoalmente, na análise que fiz, tenho segurança em relação à questão da

ONU. Quero também a visualização que almeja o Deputado Geraldo Magela. As

coisas têm de ser ditas. Daí por que estou pedindo ao TSE que nos visite para

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entender in loco como funciona o esquema e, a partir daí, estabelecer mecanismos

suplementares de segurança, decorrentes dessa auditoria que faríamos.

O Deputado José Antônio pergunta sobre o sistema proporcional. Há uma

confusão quando se fala no sistema distrital misto e no proporcional. O sistema

distrital misto é proporcional — é o sistema alemão. Nele o número de vagas

conquistadas leva em conta o primeiro voto do eleitor.

A fórmula a que se referiu o Senador Requião é de transição mista. Esta além

de manter o voto de lista, também mantém o voto nominal e divide as vagas. Só não

as divide em distritos eleitorais.

Temos o sistema distrital representado pelos Estados. Os Estados são o

distrito eleitoral brasileiro. Tanto é verdade que os partidos nacionais, na maioria das

vezes, são confederações de partidos regionais. Os grandes partidos nacionais têm

idiossincrasias locais que influenciam na decisão nacional. Por quê? Porque no local

eleitoral não há voto nacional, mas regional. Temos de discutir muito o assunto.

Esse negócio de fazer reforma eleitoral a partir da academia não dá certo. Devemos

partir da realidade concreta de V.Exas. por uma razão simples: ninguém vai votar

um sistema eleitoral que represente suicídio para si mesmo. Se não tivermos clara a

regra de que ninguém ou partido algum vai aceitar alteração que importe na sua

destruição, temos de ter presente a necessidade de uma grande composição e um

enorme entendimento por meio da lucidez do Congresso Nacional. Este deve

produzir alterações progressivas dentro de um processo de atualização que lhe

conduza à consistência dos partidos. Proponho as coligações.

Já discuti o assunto há alguns anos com o Deputado Haroldo Lima. A frente

partidária é um mecanismo de transição de um sistema de proibição de coligação.

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Sabemos perfeitamente que a proibição de coligação não interessa, por exemplo, ao

PCdoB.

Se V.Exas. compararem os votos do PCdoB com os resultados eleitorais vão

identificar que parte de suas vagas são conquistadas por meio das coligações. Em

1987, o Partido dos Trabalhadores não queria a extinção de coligações. Hoje, o

discurso é diferente. A consolidação do partido é outra. Não há princípios absolutos

em questão eleitoral, mas conveniências em termos do procedimento e da situação

política que se tem no momento.

Vou responder ao questionamento do Deputado Geraldo Magela sobre o voto

facultativo. Não discuto o voto facultativo ou o voto obrigatório a partir de critérios

que não os históricos. Não tenho preconceitos históricos em relação a voto

facultativo ou obrigatório. Alguns dirão que a instituição do voto facultativo

viabilizaria o acesso do eleitor à massa dos militantes e não à do grande público que

não quer votar, vota por obrigação. Devemos examinar se queremos a participação

obrigatória de toda a população. Hoje o índice de abstenção é muito baixo, da ordem

9%, sem levarmos em conta os não computados por falta de comunicação, de

morte, por exemplo. Continuo teoricamente favorável ao voto facultativo. Sou

contrário à sua instituição agora. V.Exa. vai cobrar num plebiscito a opção pelo voto

facultativo no sistema obrigatório. Ou seja, o cidadão vai ser obrigado a votar no

plebiscito que lhe vai perguntar se ele está dispensado de votar. Veja que é uma

situação curiosa.

O Deputado Mauro Benevides perguntou-me sobre o financiamento público

de campanha. O Tribunal Superior Eleitoral tem condições de estabelecer os

mecanismos de distribuição. O mecanismo terá de ser autofiscalizado por intermédio

dos partidos políticos. É necessário haver prestação de contas. Temos infra-

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estrutura para prestá-la. Com a fiscalização poderemos saber o destino da quantia

distribuída para tal partido. O partido deverá dizer onde investiu o dinheiro. A

questão, contudo, não é essa. Temos de saber se vão continuar existindo os

acessos a mecanismos externos de financiamento público de campanha.

Creio ter respondido os questionamentos dos Srs. Parlamentares.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Pois não, Sr. Ministro.

Com a palavra o Deputado Haroldo Lima.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Sr. Presidente, V.Exa. pode

anunciar qual é o meu bloco, por favor?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – É o dos Deputados

Custódio Mattos e José Dirceu.

Com a palavra o Deputado Haroldo Lima.

O SR. DEPUTADO HAROLDO LIMA – Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.

Ministro Nelson Jobim, é sempre positivo e proveitoso ouvi-lo. O Deputado José

Antonio Almeida já formulou ao Ministro uma pergunta e V.Exa. já a respondeu.

Mostrou-nos inclusive sua visão a respeito de diversas questões que contribuíram

para o debate ora em curso.

Na minha opinião são muito positivas as opiniões de V.Exa., em especial a

que acabou de expor. Segundo V.Exa., não há princípios absolutos em termos de

reação eleitoral, mas conveniências e necessidades.

Estou de pleno acordo com o que disse V.Exa. A sua opinião remete-nos a

questões concretas que devem ser analisadas não à luz de supostos princípios

absolutos, verdades estabelecidas, mas particularmente à luz do ângulo histórico

com o qual começou a expor suas idéias. Falou V.Exa. da trajetória histórica que

estamos seguindo no Brasil. Estamos construindo uma Nação nova a partir de

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diversas situações anteriores que criaram raízes e debilidades. Estas precisam ser

superadas no curso do processo, sem haver resistências ou receios de enfrentar os

problemas e de mudá-los, mas também sem haver a pretensão de truncá-los e de

assim pretensamente caminharmos para soluções artificiais.

Nesse sentido pareceu-me importante a apreciação que fez sobre a

excludência artificial de partidos políticos. Esta decorreria da adaptação ou da

absorção de alguns supostos princípios. Segundo V.Exa., Ministro, o sistema distrital

é, por sua natureza, excludente. Ponderou V.Exa. — fazendo uma formulação muito

própria, mas que tem parentesco com uma interessante feita por Tancredo Neves —

que fizéssemos uma espécie de congresso eleito pelo voto distrital. E sugeriu ainda

uma associação nacional de presidentes de associações de bairros, ou coisa

semelhante.

Tancredo Neves, ainda falando sobre isso, disse que iríamos ter uma porção

de coletores, chefes de cartórios e vigários eleitos para o Congresso Nacional. Isso

diminuiria o significado político, a visão de conjunto dos problemas nacionais que o

Congresso Nacional precisa efetivamente ter.

Gostaria de ouvir a opinião de V.Exa. sobre a cláusula de barreira, ou

cláusula de desempenho, ou seja qual o nome que se use para isso. Fizemos

também uma adaptação com ela e assumimos a cláusula de barreira de 5%. Fiz um

estudo sobre o assunto e constatei que diversos países do mundo já observam a

cláusula de barreira, mas de tipos diferenciados: na Alemanha, 5%; no México, 2%;

na Bolívia, 3%; na Itália, 4%.

O SR. NELSON JOBIM – Quando houve a reunificação alemã, a Suprema

Corte daquele país estabeleceu que para os partidos originários da Alemanha

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Oriental as cláusulas de barreira tinham de ser mais baixas — isso para sua

consolidação.

O SR. DEPUTADO HAROLDO LIMA – É, exatamente, uma certa transição.

Como vê V.Exa o fato de termos no Brasil uma cláusula de barreira de transição

inferior a 5%, a maior existente no mundo? Nós, que não tínhamos cláusula de

barreira, já começamos por cima. Por que não 2%, 3%? Tenho projeto de lei

estabelecendo cláusula de barreira de 2%, a despeito de achar que ela seria

discutível. O próprio quociente eleitoral já seria uma cláusula de barreira

suficientemente onerosa para os partidos menores.

Vejo que o financiamento público cria, além do que expôs V.Exa., um outro

problema quase político perante o povo brasileiro. Este trabalha com a idéia

simplista — às vezes equivocada — de que estão querendo levar dinheiro do

contribuinte ou do Governo. Os brasileiros não vêem o financiamento público das

campanhas eleitorais como a arma de que a democracia dispõe para se prevenir

dos financiamentos privados das campanhas eleitorais. O financiamento público

seria uma maneira de retirar as eleições do negócio privado. Estas então passariam

a ser um negócio público. Para isso, é preciso haver salvaguardas, para que o

próprio povo entenda que não é uma negociata a mais que se está pretendendo

fazer.

Como V.Exa. examinaria a hipótese de determinado partido receber um

financiamento à luz do número de votos ou de Deputados eleitos nas eleições

passadas? Vamos supor que a data fosse a da eleição passada e não a do período

pré-eleitoral. Um partido que elegeu cem Deputados nas eleições passadas

receberia uma quota correspondente a esse número. Vamos supor que esse partido

vá às eleições e só eleja cinqüenta Deputados. Não seria o caso de o partido

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devolver o financiamento correspondente aos cinqüenta que ele não elegeu? Outro

exemplo: um partido recebe um financiamento em decorrência dos cinqüenta

Deputados que tinha, ou, no caso do PCdoB, em decorrência dos dez Deputados

que elegeu na eleição passada, vamos supor que eleja agora vinte Deputados, não

seria ocaso de receber uma compensação pelos dez a mais que elegeu, sem que

tenha tido financiamento?

Sr. Ministro, nesse estudo que fiz do projeto de lei em curso, introduzi um

artigo que prevê isso. Imagino ter retirado essa cláusula de alguma experiência

internacional. Lamentavelmente não estou conseguindo lembrar qual era, mas acho

que já existem experiências internacionais nesse sentido.

Está em curso a criação de frentes de partidos, inclusive levando em conta

outras opiniões. Na época da elaboração dessa proposta, incorporei algumas

sugestões do nobre Ministro. Apresentamos uma proposta de projeto de lei que está

em tramitação nesta Comissão, assinada não apenas por mim, mas também pelos

Deputados Bonifácio de Andrada, José Genoíno, Miro Teixeira, Luiza Erundina,

Valdemar Costa Neto, Aldo Rebelo e Zaire Rezende. Refiro-me à proposta da

formação de frentes de partidos.

. O SR. NELSON JOBIM – Qual era o número do PL?

O SR. DEPUTADO HAROLDO LIMA - É o PL nº 1.203.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Deputado Custódio

Mattos, tem V.Exa. a palavra por três minutos.

O SR. DEPUTADO CUSTÓDIO MATTOS – Cumprimento o Ministro pelo

brilho da exposição. Fico perplexo — deve haver alguma coisa errada no meu modo

de pensar — ao ver a leniência com que o Parlamento e as lideranças nacionais

vêem a reforma política. Abstraídos os grandes problemas conjunturais, não vejo

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nada tão impeditivo ao desenvolvimento do Brasil como Nação do que nosso

anacrônico, obsoleto e irracional sistema partidário e eleitoral.

Minha experiência Parlamentar levou-me à conclusão de que nosso sistema

não é bom. Os Parlamentares são injustamente desmoralizados pela sociedade

brasileira. A visão distorcida que a maioria dos cidadãos têm do Parlamento deve-se

à fragilidade e à irracionalidade do sistema eleitoral e partidário.

Nosso sistema de eleição parlamentar proporcional é baseado na culminação

da estupidez com a vaidade. No passado havia esse mesmo sistema, mas também

existia outro muito mais permissivo de administração. Ele permitia que os candidatos

entrassem com baixíssima probabilidade de eleição, mas tivessem alguma

participação posterior no sistema, por intermédio de pequenos empregos e de

participação na gestão pública. Hoje, pelas correções por que esse sistema passou,

ganhando mais impessoalidade e profissionalismo, não é mais possível que tal

participação posterior aconteça. Então, temos um sistema em que entram numa

eleição sessenta, setenta pessoas, quando a probabilidade, numa Câmara de

Vereadores, numa bancada, é a da eleição de dois ou três. Quer dizer, desses

setenta, oitenta que entram, sessenta, cinqüenta não têm nenhuma possibilidade de

se eleger. É zero essa probabilidade. E, como não têm vida partidária intensa,

também por ideologia normalmente essas pessoas entram.

Vou dar prova cabal disso. Se pegarmos o meu partido, o PSDB, em Minas

Gerais, na última eleição tínhamos o Governador do Estado, candidato à reeleição, e

tivemos, em campanha para Deputado Federal, 21 candidatos. Não conseguimos

candidatos, tal o nível de deterioração dessa regra, da irracionalidade dessa regra,

adicionada aos fatos que o Ministro e outras pessoas mencionam, da

desmoralização dos partidos, da competição interna a que ela induz etc.

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Então, o que me deixa perplexo é como não se vê a urgência, a absoluta

necessidade de se fazer um esforço para questionar essa situação. O Parlamento,

isoladamente, pouco pode fazer, pelas razões que o Ministro mencionou de todos

termos sido eleitos num sistema — e a contestação desse sistema de certa forma

significar uma ameaça —, de não haver movimento na sociedade e, inclusive, de o

Executivo não se dispor a fazer um programa de reestruturação da sociedade

brasileira. O Governo Federal não dá mais importância a essa questão da reforma

política, e sou extremamente cético quanto ao fato de que consigamos fazer algum

progresso significativo nessa área, nesta Legislatura. Baseado nessa premissa,

solicito ao Ministro que se pronuncie a respeito.

É verdade que há extrema improbabilidade de fazermos reformas

fundamentais no sistema político brasileiro? À luz de sua experiência parlamentar,

jurídica e de Ministro, além da inteligência de V.Exa., qual é a reforma mais viável,

que pode introduzir algo mais significativo para corrigir esses defeitos que

mencionei?

Como num passe de mágica, nesses últimos dias ressuscitou-se uma

discussão, que considero extremamente interessante. Querem propor, ainda nesta

Legislatura, que o próximo Congresso Nacional tenha o poder revisional da

Constituição Federal limitado a determinados temas. Salvo engano, a proposta

original é do Deputado Miro Teixeira, mas alguns disseram que foi apoiada pelos

partidos do Governo. Essa seria uma solução prática para resolvermos o impasse

das reformas política e tributária. Talvez essa fosse a forma brasileira de superar

esse impasse. Peço ao Ministro que fale sobre a análise constitucional e jurídica

dessa proposta. Quais as complicações institucionais e jurídicas da proposta?

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Deputada Nair Xavier

Lobo, V.Exa. tem a palavra por três minutos.

A SRA. DEPUTADA NAIR XAVIER LOBO - Sr. Presidente, Sr. Relator, Sr.

Ministro, parabenizo o Ministro Jobim pela sempre brilhante intervenção e pela

inteligência que sempre demonstra nos momentos em que freqüenta o debate nesta

Casa.

Infelizmente não pude ouvir toda a exposição de V.Exa., Ministro, porque

cheguei quase ao final da sua intervenção. Contudo, estou aqui a tempo de

cumprimentá-lo. Concordo com o colega que me antecedeu. Estamos vivendo um

momento histórico no qual a sociedade tem plena consciência de que o Brasil

evoluiu muito economicamente, mas não evoluiu social e politicamente.

Para haver financiamento de campanha tem de haver amadurecimento

político. Para a sociedade é muito importante a ética e a transparência do processo

político. Portanto, esta Casa discute com muita preocupação o financiamento público

da campanha. Os escândalos que acontecem na classe política, na maioria das

vezes, têm relação com o financiamento de campanha, com o dinheiro nela usado.

Sr. Ministro, o financiamento público de campanha é muito bem vindo para a

sociedade. Contudo, ele não pode representar um engodo. Outro dia ouvi aqui —

não me lembro de quem, se do Relator ou de algum outro Parlamentar da Comissão

— que ele sempre receberia acréscimo do dinheiro dos candidatos, no caso dos

ricos empresários ou de seus parceiros.

Gostaria de saber o que V.Exa. pensa a respeito disso. Qual o modelo mais

próximo do ideal? Somos falíveis, afinal somos seres humanos. Estamos neste

momento lutando por um modelo que satisfaça a sociedade.

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Poderíamos adotar um modelo misto, no qual cada candidato pudesse

receber recursos dos segmentos da sociedade e mostrá-los ao seu eleitor. Enfim,

queremos um processo muito transparente.

Ouvi dizer certa vez que há três tipos de Parlamentares nesta Casa. O

primeiro deles é o despachante, que cuida de levar recursos às suas bases — e o

faz com grande avidez para sustentar os pleitos dos seus Prefeitos, levando para lá

as creches, as fontes, enfim, os recursos do Governo Federal de que eles

necessitam tanto, o que é legítimo. Outra classe de Parlamentares é formada por

aqueles que a sociedade manda para cá para representar seus segmentos — igreja,

polícia, empresários e até bandidos, que nós cuidamos de expurgar. Esses são os

chamados representantes dos diversos segmentos. Quem deu esse conceito definiu

a terceira categoria como a dos nacionalistas, composta pelo chamado alto clero.

São eles que decidem as questões nacionais, participam dos debates, das

mudanças estruturais e da questão conceitual.

O eleitor pode preferir a sua categoria de representante. É bom que sejam

aqui representados os segmentos, a Maioria, as Minorias, mas o eleitor deve ter o

direito de saber, ao definir seu voto, de onde vem o dinheiro daquele que ele escolhe

como seu representante.

Cito como exemplo um fato da minha campanha política. Sou considerada a

madrinha da Polícia Rodoviária Federal no País. É legítimo que receba dinheiro, na

minha campanha, dos policiais rodoviários federais, porque os defendo.

O SR. DEPUTADO NELSON MARCHEZAN – E eles têm?

A SRA. DEPUTADA NAIR XAVIER LOBO – Sim, se juntarem, têm. Na minha

campanha, Deputado, recebi deles uma contribuição imensamente significativa, que

eles entenderam ser uma propaganda política eficiente: colocaram o slogan da

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minha campanha numa caixa de fósforo e distribuíram nas estradas. É legítimo isso.

Sinto-me imensamente orgulhosa de ter recebido recursos da Polícia Rodoviária

Federal para a minha campanha. Defendo-os, brigo pela GOE, como briguei para

que eles tivessem um plano de carreira, hoje justo e legítimo, afinal eles são os

guardiões das nossas estradas.

Entre os que fazem campanha política há os que, num primeiro momento,

participam do pleito, apresentando seu nome para representar o País e têm dentro

do seu partido os recursos públicos de campanha e ainda não têm nenhum

segmento colaborando com sua entrada na política. Há aqueles que podem

sobressair-se, porque têm prestígio dentro do próprio partido e, por isso, contam

com partes e com quotas de recursos públicos, o que seria imensamente

transparente, amealhando mais recursos para aqueles que para cá querem mandá-

los. Este é o caso de uma contribuição como a que citei.

Quero ouvir a opinião do Ministro. Queremos contar com a lucidez, a

experiência e o brilhantismo de V.Exa. Precisamos saber qual é o modelo ideal para

o atual momento da política brasileira, que contemple a sociedade com a ética e a

transparência dos financiamentos de campanha.

Não ouvi toda a palestra de V.Exa., que pode, porventura, ter tratado desse

modelo. Se isso tiver acontecido, peço desculpas ao Sr. Relator e aos colegas.

Gostaria muito de ouvir de V.Exa. qual é o modelo ideal de financiamento de

campanha. Para mim, é este o ponto mais importante.

O que V.Exa. pensa a respeito da morte dos pequenos partidos? O fim das

coligações é a morte dos pequenos partidos. O Brasil pode conviver neste momento

com cinco, seis partidos políticos? Isso é bom para a evolução e a maturidade

política do País? Trata-se da questão do fim das coligações ou da sobrevivência das

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coligações e da permissão da existência de muitos partidos que às vezes são

chamados partidos de aluguel, são mal-entendidos ou interpretados erradamente. E,

como existe uma celeuma muito grande, queria entender na essência o pensamento

de V.Exa. sobre a morte dos pequenos partidos.

Parabenizo o Presidente e o Relator desta Comissão e meus colegas pelo

trabalho. Esta Comissão cuida de um dos momentos mais importantes nesta casa: a

evolução política, o melhor modelo que providencia ética e transparência na política

do Brasil.

Era o que tinha a dizer.

O SR. NELSON JOBIM – Em 1987, a Assembléia Nacional Constituinte

discutia a cláusula de barreira. Votou contra ela o Senador Virgílio Távora. Lembra-

se? Aquele velho coronel do Ceará, ligado ao sistema anterior do Governador — o

que chamaríamos de elite nordestina oligárquica —, disse-me que não era possível

estabelecermos uma guilhotina imediata em termos de partidos. Referia-se

exatamente ao PCdoB e ao PT. Era um momento de consolidação.

É necessário falarmos em cláusula de desempenho para evitar — e nossa

experiência nos mostra isso — os chamados partidos de aluguel.

Precisamos de transições. Não podemos ser maximalistas no processo de

reforma. Reformas políticas viáveis são minimalistas. Elas vão nos empurrando para

um caminho que vai sendo corrigido e ajustado. O problema básico é que, às vezes,

chamamos grandes cientistas políticos para analisar o assunto. Eles, às vezes

analisam-no de maneira distorcida, desvinculado-o do real processo político. Por que

fazem assim? Porque não conviveram dentro dele, não estiveram no Município, no

comitê eleitoral e nas discussões.

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Por que sou favorável à cláusula de barreira? Temos duas escolhas: quanto

mais representativo for o Parlamento, no sentido de ter o maior número possível de

representantes dos diversos segmentos, proporcionalmente considerada a

sociedade, menos capacidade decisória terá ele. Quanto mais representativo, mais

extraordinariamente difícil é a formação de vontades majoritárias para a aprovação

de legislação. Quando existe um Parlamento fortemente representativo, com todo

tipo de segmento, há dificuldade de se formar a vontade majoritária para definir

determinado texto legal. E aí o que acontece? O preço do alto nível de

representatividade é um baixo nível de poder decisório. E o nível de poder decisório

leva a quê? Leva àquilo a que o Senador Roberto Requião se referiu, leva à

ambigüidade do texto legal.

Reunimo-nos várias vezes nesta Casa com o Dr. Ulysses Guimarães.

Perguntava sempre a S.Exa. qual era o texto razoável. De posse dele, examinava-o.

A partir daquele exame, eu trabalhava no sentido de deixar o texto mais ambíguo.

Meu objetivo era viabilizar a aprovação da norma. Com isso, transfere-se para o

aplicador da regra o preenchimento daquilo que o Congresso Nacional não soube

definir.

É o que disse o Senador Roberto Requião. A ambigüidade do texto da

campanha eleitoral leva por exemplo alguém que está sendo entrevistado na rádio a

se atrapalhar. Julguei lá do Tribunal Eleitoral, por exemplo, o caso da candidata à

Prefeitura de Fortaleza, Deputada Estadual Patrícia Gomes.

Ela havia sido entrevistada na rádio antes do início da campanha eleitoral e

lhe perguntaram: “É candidata?” Ela respondeu que sim. O Tribunal aplicou-lhe uma

multa, por isso. Entenderam o problema da definição das regras?

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Deputado Haroldo Lima, lembro-me, na Assembléia Nacional Constituinte,

daquela discussão sobre repouso semanal remunerado. A Esquerda queria repouso

semanal remunerado obrigatoriamente aos domingos. Era ícone para os sindicatos a

palavra domingo. V.Exa. lembra-se disso, não é? Na época, o Centrão queria como

redação repouso semanal remunerado na forma de convenção coletiva de trabalho.

Tanto a Esquerda quanto o Centrão não tinham votos para aprovar nem um texto

nem outro. Tentamos votar, mas não conseguíamos. Seria ridículo se o texto do art.

7º não tivesse repouso semanal remunerado. Aí entrei na negociação política.

Resultado: tornamos ambíguo o texto que acabou sendo aprovado: “repouso

remunerado preferencialmente aos domingos”. Ficou “domingo”, que era ícone da

Esquerda, e também “preferencialmente”, que é um advérbio de modo que

utilizávamos muito para efeito de reduzir a força obrigatória do texto.

Produzi esse texto num acordo que fizemos em 1987. Depois, o Supremo

Tribunal Federal julgou-o inconstitucional. Estávamos discutindo o negócio dos

comerciários. V.Exa. lembra-se disso, não é? Eu disse o seguinte: “Olha, pode ser

aos domingos, mas tem de haver uma regra em que se assegure a preferência do

domingo”. E foi o que se produziu. Ou seja, o processo político é de negociação, não

de exclusão. Só se exclui quem não é necessário para o processo decisório.

Fui favorável à cláusula de barreira por causa da questão de se ter

capacidade decisória. Esse é o preço do voto universal. O sufrágio universal e o

âmbito da participação eleitoral determinou maior representatividade do Parlamento.

Maior representatividade significa menos capacidade decisória. É fundamental a

cláusula de barreira. Agora, concordo plenamente com V.Exa. no sentido de que tem

de ser uma cláusula de transição. Não vejo nenhuma dificuldade em se começar

com 2%, contanto que a própria lei estabeleça um horizonte histórico.

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Vamos deixar clara a situação para o Deputado Haroldo Lima. Se não

estabelecermos um horizonte histórico, o partido não vai ter condutas partidárias que

lhe possam assegurar o cumprimento de uma barreira futura. Ele vai continuar

sempre isolado, eventualmente na sua inviabilização histórica. Se houver um

horizonte histórico estabelecendo, suponhamos, dois anos, até chegar a cinco, um

partido que quiser permanecer vai ter de adotar comportamento de alianças, de

formação de frentes — e aí a frente se casa com esse problema —, para lá adiante,

quando se chegar aos 5%, na necessidade de 5%, avaliar que tipo de estruturação

partidária há. Se não houver essa perspectiva histórica, ele vai continuar sempre

negando a cláusula de barreira.

Os senhores têm de decidir: querem um Parlamento com um mínimo de

capacidade decisória ou uma estrutura representativa plenária sem ela? A transição

que propus é razoável e necessária: ter no próprio texto um espectro de decisão,

porque assim, por exemplo, o PCdoB concorreria, fazendo 2%. E aí terá de ser

examinado todo o trabalho dos quatro anos anteriores à próxima eleição,

exatamente para assegurar que fosse alcançado o percentual estabelecido.

Isso não existe atualmente, porque não há necessidade. Hoje, qual é a

solução? É a coligação. Uma coligação em que nos atrelamos ao resultado eleitoral

de legenda do partido coligado. Não é essa a técnica? Sabemos perfeitamente que

é assim.

Respondo agora a pergunta feita pela Deputada Nair Xavier Lobo. S.Exa.

quer saber sobre o financiamento público de campanha. Trata-se de assunto

complicado. A idéia de S.Exa. é a seguinte: no sistema de restituição, se o partido

tem 50 Deputados nesta Legislatura, na eleição de 2000 recebe o correspondente a

50, disputa a eleição e reduz o número em 25. Ele teria de restituir 25. Essa

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restituição de 25 seria transferível ao eventual partido que tinha 25 e fez 50. Seria

esse o sistema de compensação. A questão é saber como cobrar esse valor

consumido no partido, já que este não tem patrimônio. Executa-se a bandeira do

PCdoB? Executa-se a sede do partido? Ou cobra-se dos velhos históricos do

partido? Trata-se de assunto complicado. E vai criar uma cizânia de crédito entre

partidos. Isso vai dar uma confusão muito grande. Não excluo isso. Os mecanismos

— não é tanto a tese — são complicados. Terminada a eleição, pressupõe-se que

se gastou tudo. O que fazer? Cobra-se de quem? E aí vai acontecer o seguinte: o

partido, pressionado, vai sair atrás de quê? De dinheiro privado para pagar a dívida

— aí complicou tudo. E qual a pena que terá para o partido que não pagou? Se o

partido que elegeu 25 e tinha recebido por 50 não restituiu nada, na próxima eleição

será descontado o valor? Se desconta do valor, para onde está sendo empurrando o

partido? Para as mãos do financiamento privado. Ou V.Exas. acham que eles vão

fazer campanha sem financiamento? Vão fazer com financiamento. Temos de ter

técnica para empurrar os partidos para a lucidez e a transparência e não para a

ilegalidade. As técnicas radicais acabam guiando os partidos e os candidatos para a

ilegalidade. É isso que justifica, por exemplo, as regras do estado de sítio na

Constituição. Por que ele se encontra dentro da Constituição? Porque, havendo

situações que o explicavam, e não estando ele previsto, os executivos o

decretavam. Então, ele foi regularizado, regulamentado, para evitar que as pessoas

fossem jogadas na ilegalidade.

O financiamento misto resolve o problema dos candidatos proporcionais. Os

candidatos majoritários seriam atendidos, ao que tudo indica, pelo financiamento

público. O problema estaria nos candidatos proporcionais a que a Deputada se

referiu. Continuaria esse problema, talvez como mecanismo de transição para

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entender como isso se viabilizaria. Mas o que aconteceria? Continuaríamos tendo,

em relação aos financiamentos privados, aquilo que temos hoje. Tem-se um

financiamento privado transparente e um que não aparece, o caixa dois. O problema

não é esse. O problema é saber como se evitar o caixa dois. O que se está

querendo é que tudo seja financiado por dotações orçamentárias para excluí-lo. O

financiamento por dotações orçamentárias não vai excluir o caixa dois. Tem de

haver outra fórmula técnica para não haver a exclusão. Um partido recebe 5 milhões

de reais. O que ele vai fazer com esse dinheiro? Vai aplicar na candidatura para

Prefeito, Governador e Presidente da República. Quem financiará os Deputados?

Ou V.Exas. acham que eles vão fazer campanha sem financiamento? Proibindo a

doação, não estaremos empurrando o Deputado para a ilegalidade?

A SRA. DEPUTADA NAIR XAVIER LOBO - E qual seria a sugestão de

V.Exa.?

O SR. NELSON JOBIM – Não tenho. Podíamos discutir essa matéria, mas

não tem nada de absoluto no processo. Mecanismo de transição devem ser

estabelecidos.

O SR. DEPUTADO NELSON MARCHEZAN – V.Exa. disse que o

financiamento público não exclui o privado?

O SR. NELSON JOBIM – Claro que não. O PSDB do Rio Grande do Sul

recebe seus recursos, vai fazer campanha em Santa Maria. Recebeu mil reais para

fazer campanha em Santa Maria. Se alguém resolve ajudá-lo, vai recusar?

O SR. DEPUTADO NELSON MARCHEZAN – Como V.Exa. não diria...

O SR. NELSON JOBIM – Claro. Por quê? Porque vai ter de fazer campanha.

Então, não é assim que se resolve o problema achando que uma guilhotina vai

resolver. Não vai resolve nada. Querem ver uma coisa?

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Em relação à questão levantada pelo Deputado Custódio Mattos, quero

lembrar o seguinte: havia substancial mudança no desenho do Estado brasileiro. O

critério, a redução do tamanho do Estado brasileiro de 1988 até 2000 é

impressionante. Os levantamentos que andei fazendo me dão conta, por exemplo,

que nossas empresas públicas, que eram o universo do clientelismo, do emprego da

máquina partidária, foram reduzidas entre 1991 e 1988 para 121, sendo 97 não-

financeiras. Em 1991, tivemos um gasto, em relação ao gasto público de pessoal no

setor empresarial do Estado, de 19,7%. A despesa com empresa pública hoje

representa 8,9%. Tenho um levantamento curioso. Havia emendas ao Orçamento

que eram mecanismos para atender os chamados Deputados regionais. As

emendas ao Orçamento, de 1988 para hoje, que eram de 11 bilhões, foram

reduzidas para 4 bilhões. Houve uma redução de 40% para 14%. O curioso de tudo

é que a maior parte das emendas orçamentárias no levantamento que estou

terminando — ainda não o terminei — são destinadas aos Municípios. Por quê?

Porque de 1988 para cá houve enorme descentralização para as ações municipais

com uma redução dos espaços nos Governos dos Estados.

Não é menor o número de emendas de dotações orçamentárias para os

Governos Estaduais em relação aos Municipais. Por que isso? Porque começa a

aparecer na distorção do sistema eleitoral brasileiro, como grande eleitor, o Prefeito

Municipal, e não mais o Governador, tendo em vista essa mudança de espectro em

relação à transferência. Se V.Exas. examinarem as transferências da União, em

termos de transferências do IPI, dos Fundos de Participação, enfim, de Imposto de

Renda, podem observar — e isso é o mais curioso — que nessas transferências

tivemos uma redução de 73% em relação à evolução. O crescimento foi dos

Municípios. Por quê? Por causa da descentralização. O crescimento aparece numa

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redução dos quadros da União. O número de funcionários dos quadros da União foi

reduzido e o número de funcionários municipais aumentou. Por quê? Por causa do

SUS, etc. houve um deslocamento, o que dá um perfil diferente para o Parlamentar

que aqui vem para o atendimento regional.

E, por último, Deputado Custódio Mattos, vou falar sobre o problema da

Constituinte restrita sustentada pelo Deputado Miro Teixeira e outros, para tentar

enfrentar a reforma tributária, um problema curioso. Se fizermos um levantamento

sem emoções, poderemos verificar que, historicamente, o Centro, o Sul e o Sudeste

tributaram as poupanças consumidas do Norte e Nordeste desde o Império. Houve

uma brutal transferência de renda dos Estados do Norte e do Nordeste para os

Estados do Sul e do Sudeste. O Centro-Oeste estaria na parte intermediária. O que

era isso? É a grande discussão sobre o problema dos impostos sobre consumo. O

ICM foi instituído no Brasil como imposto sobre a produção e não sobre o consumo.

O Estado da produção arrecada o tributo e não o Estado do destino. Tentou-se

estabelecer em 1988 uma tentativa de assegurar rendas dos Estados consumidores

para os Estados produtores, que é a diferença de alíquota na circulação intra-

estadual norte e sul. Hoje a alíquota norte e sul está na base de 12% — a média é

17%. Isso consegue assegurar aos Estados do Norte e do Nordeste a aquisição de

bens de consumo do Sul e do Sudeste.

Toda vez que se tentou fazer reforma tributária no sentido de estabelecer que

quem recebe o tributo é o Estado que produz a riqueza consumida, tivemos uma

objeção do Sul e do Sudeste. Os senhores examinem o orçamento do Estado de

São Paulo e o do Rio Grande do Sul e verifiquem quanto representa o ICMS na

arrecadação das operações interestaduais.

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E o que acontece? Essa diferenciação de alíquota estabeleceu mecanismos

de falsificação de notas, em que há trânsito de notas. E aí temos claramente a

guerra fiscal. Os senhores, saindo do Distrito Federal e chegando a Goiás, vão

verificar logo em seguida que há enormes depósitos de óleo e de combustíveis,

tendo em vista a alíquota zero na circulação interestadual de gasolina. As grandes

empresas consumidoras acabam comprando de outros Estados, mas não são

compras reais, porque compram aqui.

Não vai ser por intermédio de miniconstituintes que se vai tentar fazer a

reforma. O problema da miniconstituinte está vinculado a uma coisa curiosa no País,

que é aquela distinção jurídica entre Poder Constituinte Originário e Poder

Constituinte Derivado, com a qual a história política brasileira não se ajusta.

Vejam bem: o Imperador D. Pedro, antes da Independência, convoca uma

Assembléia Constituinte Geral do Brasil, reino unido com Portugal. Em 7 de

setembro, declara a Independência, instala a Assembléia Constituinte em 1822.

Depois vem a luta com os Andradas — Antônio Carlos, José Bonifácio e Martim

Francisco. Conflito com o Imperador. O Imperador dissolve a Assembléia

Constituinte e cria uma Assembléia própria, com a Constituição de 1824.

Vem a República em 1891. Elegem-se Deputados Federais e Senadores,

fazem a Constituição e se os mantêm como Deputados e Senadores. Em 1934, a

mesma coisa. Em 1946, quem fez a Constituição? Foram os Deputados e

Senadores eleitos na convocação feita por Getúlio Vargas em fevereiro de 1945.

Antes do golpe que o derrubou, em outubro de 1945, Getúlio já tinha decidido

convocar eleições gerais para instalação do Congresso, para elaborar nova

Constituição. Elegem-se os Deputados, assume como Presidente da República o

Presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares, e ele outorga por ato

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próprio poderes constituintes ao Congresso eleito com base nos textos eleitorais de

1945. Faz-se a Constituição de 1946.

Em 1967, o Congresso Nacional recebe uma mensagem do Governo Castello

Branco para votar uma Constituição, em sessão bicameral, em trinta dias. O que

aconteceu? Próximo à meia-noite, o Senador Áureo de Moura Andrade mandou

desligar o relógio. Desligou-se o relógio do Congresso Nacional, votou-se até às 4h

da manhã. Quando ele determinou ao Paulo Afonso mandar ligar o relógio, este

disse que não seria possível porque o ponteiro iria pular. Então, fecharam a sessão

e foram embora. No dia seguinte, o Paulo Afonso e o Diretor-Geral da Câmara à

época ligaram o relógio, que deu um pulo e foi para o horário certo.

Eleições de 1986: os Deputados e Senadores foram convocados para votar a

Assembléia Constituinte de 1987? Os Deputados e Senadores foram convocados

para essa função pelos Deputados e Senadores de 1982, presentes os Senadores

de 1978. Ou seja, a Assembléia Constituinte “Originária”, entre aspas, de 1986 foi

convocada pelo Poder Constituinte Derivado de 1985, que votou a emenda

constitucional convocatória.

Essa distinção jurídica entre Poder Constituinte Originário e Poder

Constituinte Derivado surgiu com a Revolução Francesa, com a palavra do abade

Sieyés, exatamente quando, fracassada a conciliação de Lafayette, foi iniciado o

terror com os jacobinos de Robespierre, Marat, Danton, Camille Demoulins. Neste

caso, surgiu um fenômeno histórico para justificá-lo, mas não temos esse fenômeno

histórico.

Não vejo problemas jurídicos em relação a isso, embora nossos juristas vão

dizer que há problemas jurídicos em relação às convocações da Assembléia

Constituinte, nada mais, nada menos do que se fez em 1985. Em 1985, houve

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exatamente isso. E lembrem-se de que Flávio Bierrembach era o Relator da

Comissão Especial para convocação da Assembléia Constituinte e a queria

exclusiva, que era o projeto da OAB. Lembram-se disso? Foi derrotado por

Tancredo Neves. O Dr. Tancredo, que se movimentou junto com o Dr. Ulysses e

com o Presidente Sarney para estabelecer uma convocação de uma Assembléia

Constituinte que fosse congressual. Isso foi uma decisão política vitoriosa na época.

É difícil raciocinar, Deputado Custódio Mattos, com categorias político-

históricas que se transformaram em categorias jurídicas oriundas de outros Estados,

cujo processo histórico é outro. Não tivemos ruptura. O nosso processo sempre foi

de conciliação. No momento em que chegávamos à ruptura, era feita uma

negociação. Isso aconteceu com Getúlio Vargas.

Em 1945, cai Getúlio; vem o regime constitucional. Quem é o Presidente da

República? O Ministro da Guerra do antigo ditador. Quem foram os Governadores

dos Estados? Os antigos interventores, como Benedito Valadores. No Rio Grande

do Sul, foi meu avô, que era oposição ao Getúlio, mas tinha uma conciliação com ele

no processo eleitoral, apoiado pelo Partido Comunista.

Esse processo, Deputado Custódio, dá-nos a seguinte noção: vamos

trabalhar a partir da história que temos, e não da história que importamos. Se você

disser isso na Academia, vão ficar horrorizados porque nosso processo histórico

julga dessa forma.

Agora, quando, em 1986, discutimos a elaboração da Constituição, o que

tínhamos? Uma grande discussão que passava pelo entendimento. Conseguiram-se

avanços extraordinários na Constituição de 1988 sobre direitos e garantias

individuais e sobre modelagem. No que diz respeito ao modelo de Estado,

reproduzimos basicamente o modelo anterior. Não houve grandes modificações em

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relação ao modelo anterior. As discussões que se estabeleceram foram aquelas

velhas discussões que não foram resolvidas: a das pretensões dos Estados do Sul e

do Sudeste no sentido de aumentar a representação em relação dos Estados do

Norte e do Nordeste. O acordo feito para a criação de Tocantins foi algo

curiosíssimo.

Goiás concordou com a criação daquele Estado, desde que não fosse

reduzida a bancada de Tocantins. V.Exa. lembra-se disto. Concordamos que se

fizesse isso, desde que a União não tivesse de pagar por isso, já que o antigo

Governador, Íris Rezende, queria cobrar de Tocantins os ônus e os investimentos lá

feitos — e cobrar do contribuinte brasileiro. Isso tudo se resolveu. Agora, a

convocação de uma Assembléia restrita ou não é um problema a ser decidido. O

processo histórico nós temos, modelos históricos também.

Por último, quanto à reforma mais viável, digo que essa coisa de reforma mais

viável ou menos viável é o tipo da pergunta a posteriori, e não a priori. A priori,

seria — diria de uma forma muito clara — o achismo. Cansei de achar. Já estou um

pouco mais velho para isso. Já achei muito que se tinha de fazer isso ou aquilo.

Vamos fazer o que é possível, porque este é o débito da nossa geração. Acontece

que, às vezes, queremos ser o herói da nossa geração. Sendo heróis da nossa

geração, só queremos marcar posições e não queremos mudar.

Se os senhores quiserem marcar posições, façam os discursos mais radicais

no sentido da mudança. Não vai acontecer nada, mas ficará registrado nas suas

biografias o fato de terem feito o discurso, sem o compromisso histórico com o

avanço. O compromisso histórico com o avanço está manifesto inclusive numa

posição moderna do Deputado Haroldo Lima, que está concedendo algo que, em

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1986, era impensável para o Partido Comunista do Brasil: a discussão da cláusula

de barreira.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – O próximo bloco será

composto pelos Deputados Saulo Pedrosa, Vivaldo Barbosa e Virgílio Guimarães.

Com a palavra o Deputado Saulo Pedrosa.

O SR. DEPUTADO SAULO PEDROSA – Louvo a atitude do Presidente desta

Comissão de convidar o Ministro Nelson Jobim para aqui transmitir sua experiência,

especialmente passando-nos a impressão de advogado do diabo quando suscita

uma série de questões para nossa reflexão na reforma política. Gostaria de me ater

à questão da ordem dos candidatos na votação eletrônica, para ouvir de S.Exa. a

procedência ou não da minha observação, uma vez que essa ordem, ao que me

parece, é mais uma vaidade do legislador e não corresponde à noção de

importância que o eleitor tem da ordem dos candidatos.

Digo isso porque, na eleição de 1998, quis até divulgar propaganda no meu

Município mostrando para o eleitor, visualmente, como seria a votação eletrônica, a

fim de que, quando se defrontasse com os eletrônicos, sentisse que tudo estava

mais ou menos de acordo com a propaganda política. Primeiro, estava o nome do

Deputado Estadual, depois o do Deputado Federal, e assim sucessivamente. Na

época, o Prefeito não permitiu que se fizesse essa propaganda. Foi preciso fazer

propaganda de muro, colocando-se primeiro o Presidente, depois o Governador, em

seguida o Deputado Federal e por último o Deputado Estadual. Isso, no meu

entendimento, gerou transtorno para o eleitor e causou alguns problemas,

apontados no resultado da votação eletrônica.

Sob a ótica do eleitor, ele primeiro quer votar no candidato mais importante.

Em Barreiras, na eleição municipal, por exemplo, o eleitor vai votar no candidato de

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nº 45, que é do meu partido. Ele vota primeiro no de nº 45, pensando que vai votar

no Prefeito. O que acontece? Anula o voto do Vereador, e isso conta para a legenda.

Por isso, o resultado final, na minha avaliação, foi um grande voto de legenda, com

diminuição dos votos para candidatos a Vereadores ou mesmo a Deputados.

Gostaria de ouvir o comentário do Ministro sobre a procedência ou não dessa

minha avaliação.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Deputado Vivaldo

Barbosa, tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Sr. Presidente, Srs. Deputados,

Sr. Ministro Nelson Jobim, é evidente que o convívio e a luta comum, que geraram

amizade muito intensa, fazem com que o diálogo não se torne ortodoxo, do ponto de

vista da relação Poder Judiciário/Poder Legislativo.

Gostaria muito de poder comentar as diversas questões que V.Exa., com o

brilho da sua exposição, nos trouxe hoje. Registro apenas a coincidência de

algumas lutas antigas comuns e da apreciação crítica do processo político eleitoral

brasileiro. Quero, apesar de não ter tempo, polemizar um pouco em relação a essa

última questão, do poder constituinte brasileiro e da miniconstituinte.

É evidente, Ministro, que a independência, qualquer que tenha sido a forma

da Constituição daí derivada, tem o poder constituinte. A República teve um poder

constituinte, não importando qual tenha sido a forma de elaboração da Constituição.

A Revolução de 1930 também carregou um poder constituinte, bem como o próprio

término do Estado Novo e o Golpe de 1964. A nossa Constituição — trabalhamos

nela na nossa Constituinte também —, que pôs fim ao regime militar e autoritário,

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carregou um poder constituinte iniludível, embora as formas não tivessem esse corte

categórico cristalino que V.Exa. invocou.

Quero exatamente aproveitar a presença do Ministro para discutir o problema

da urna eletrônica. Aqui, infelizmente, não encontrei as coincidências encontradas

nas outras questões eleitorais. Primeiramente, o Ministro trouxe-nos certo terror, que

paira sobre nós. Assim como o Senador Roberto Requião esteve aqui hoje, fui ao

debate de V.Exa. no Senado. Fiquei um pouco impressionado, no diálogo com o

Senador sobre a questão da urna eletrônica, quando se propôs uma conversa no

Tribunal Superior Eleitoral, ao ver V.Exa. dirigir-se a ele e dizer: “Eu o receberei

amavelmente, vamos tomar um cafezinho, mas leve os técnicos. Quem vai decidir as

questões são os técnicos". Realmente fiquei muito chocado com isso. A

Magistratura, o Congresso e o partido político não têm mais a ver com a lisura do

processo eleitoral. São os técnicos que vão discutir a questão.

Ministro, V.Exa., em entrevista que deu outro dia — e trouxe hoje sua

proposta de fazer isso em conjunto com o Senado —, disse que a questão da urna

eletrônica, diante desse rumoroso caso do Senado, ia ser resolvida por um laudo

dos técnicos da UNICAMP. A Magistratura e os partidos estão de fora. Os técnicos

da UNICAMP vão sacramentar o processo eleitoral brasileiro, e nós vamos nos

curvar ao seu gênio. Eles governarão um pouco a democracia.

Apelo a V.Exa. para que dialogue com os partidos sobre todos os impasses,

os problemas e deixe os técnicos tomando cafezinho. Depois eles poderão

implementar as decisões que venhamos a tomar.

V.Exa. também desconsiderou o rumoroso caso do Senado. Uma coisa nada

tem a ver com a outra. V.Exa. disse que o que aconteceu no Senado não tem a ver

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com a urna eletrônica. De acordo com o parecer dos técnicos da UNICAMP sobre o

painel do Senado, ele é suscetível a violação e adulteração.

O chefe do Serviço de Informática do TSE — não sei se ainda é o mesmo —,

que no ano passado esteve na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e

Informática, disse-nos clara e textualmente: “O fato sobre a impressão do voto que

estava ali não significa nada. Posso mostrar o João, imprimir o voto para o João e

registrar o voto para a Maria”. Em matéria de informática, ele diz: “Um voto dado a

João pode ser computado como dado a Maria”. É evidente que sabemos disso, mas

trememos com isso.

Uma das razões da Revolução de 1930 — é um tema muito caro para aquela

região de onde procede V.Exa. — foi o fato de não mais se poder deixar os mapas

eleitorais nas mãos das oligarquias daquele período. O Brasil não se consolidaria

como república avançada com aquele processo eleitoral chamado bico-de-pena.

Agora, é o bico-da-técnica. Vamos acatar essa decisão e nos submeter a ela?

O regime militar já nos tirou a cabine indevassável. Realmente, Ministro,

nunca me conformei com isso. No mundo inteiro há aquela cortininha, e o TSE

justifica que não tem dinheiro para colocá-la, isolando o cidadão naquela hora, mas

tem milhões para as urnas eletrônicas. Não conseguimos restabelecer a cabine

indevassável, necessária para a reflexão do eleitor, e agora temos o voto invisível.

Não se vê o voto, não se sabe o que acontece com ele. Apura-se rapidamente — é

a apuração mais rápida do mundo, mais eletrônica do mundo —, e em poucas horas

temos o resultado. Acabou tudo, ficou tudo invisível, não há nem mais Magistratura

para mostrar as provas. Não há prova, aquilo desapareceu por completo.

As regras que a lei atual determina para a urna eletrônica são muito singelas.

O art. 59 tem três parágrafos; os arts. 60, 61, 62, um parágrafo único. V.Exa. fez um

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clamor hoje: “Por favor, dêem-nos regras jurídicas. Não deixem os juízes decidirem,

porque eles decidem depois do jogo jogado”.

É preciso que estabeleçamos regras jurídicas para funcionamento da urna

eletrônica. Nesse caso, infelizmente, não serão os juizes, mas os técnicos que

preencherão esse vazio. O juiz já seria, como V.Exa. disse, o menos indicado. Veja

como a Suprema Corte americana arbitrou a eleição americana — a maior potência

do país —, depois do jogo jogado. Os técnicos é que preencherão o imenso vazio

legislativo, e isso não podemos tolerar.

Deixo um apelo a V.Exa. no sentido de que possamos dialogar com os

partidos políticos. Depois, vamos criar as regras e as ordens para serem executadas

pelos técnicos. Vamos tentar fazer disso um processo passível de fiscalização, de

transparência, com regras definidas, e procurar manter o voto vivo, uma coisa

espetacular, emocionante. Ainda mais quando votamos em nós mesmos, fazemos

isso com muita emoção. Aliás, é especial sempre, desde o primeiro voto que damos.

É emocionante colocar um voto na urna. Vamos manter a urna eletrônica, mas

também a visibilidade do voto, para que possa haver conferência e provas, Ministro,

a fim de que a Magistratura possa decidir em cima de análise concreta, factual. Do

jeito que está, desaparece tudo, fica tudo invisível, e a verdade eleitoral ficará

efetivamente questionada. A questão do painel eletrônico do Senado Federal foi

uma advertência séria para nós. Lá, também o voto era invisível. Lá também

desaparecia tudo, não haveria problema algum, até que ele aconteceu.

Peço a V.Exa. que reflita sobre o assunto. Há propostas que fizemos a esse

respeito. Talvez V.Exa. diga que eu sou o único dos interventores a levantar essa

questão. A Oposição não está unida na próxima eleição, nem na urna eletrônica.

Estamos muitos separados. Um Deputado do PT chegou aqui e realmente fez a

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glorificação da urna eletrônica. Estamos separados em relação a isso. Mas,

especialmente agora em que temos oportunidade de inaugurar regras que nos dêem

tranqüilidade e a felicidade de contar com V.Exa. exercendo essa função, temos

condição de aperfeiçoar o processo eleitoral, em memória dos nossos

antepassados, porque valeu a pena fazer uma revolução para defender a lisura do

processo eleitoral.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Obrigado Deputado

Vivaldo Barbosa.

Concedo a palavra ao nobre Deputado Virgílio Guimarães por três minutos.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Sr. Presidente, Ministro Nelson

Jobim, até me inscrevi para discutir outro assunto, mas, diante da provocação do

Deputado Vivaldo Barbosa, não deixarei de falar sobre a questão da urna, mesmo

porque há algumas propostas em relação a isso.

A urna eletrônica veio para ficar, porque é um enorme avanço em todos os

sentidos. Ela é vulnerável? Claro que pode ser. Mas temos de lembrar que o voto no

papel era muito mais vulnerável, até no que se refere à possibilidade ou não de

haver a verificação, porque o partido que não estivesse ao lado da urna durante o

fechamento, em cada uma das milhares e milhares de seções existentes no Estado,

perdia a oportunidade. Já vivi isso. Já perdi uma eleição estadual por 0,26% de

votos e constatei que, entre quatorze candidatos, havia sete que faziam campanha,

que só colocavam aqueles video home, que havia na época, em 1994. Mas nos

Municípios em que não havia fiscalização, fiquei em último lugar — décimo quarto,

décimo terceiro. E não pude fiscalizar, porque só quando saiu o relatório é que vi

que isso havia acontecido.

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No que se refere ao que o Deputado Vivaldo Barbosa aponta como defeito,

desvantagem da urna eletrônica, não se tem garantia também em relação à cédula,

a menos que se tenha um fiscal ao lado de cada mesa apuradora. Senão, perde-se

o prazo para impugnar aquela urna determinada.

Então, quais os aperfeiçoamentos que temos de fazer, Ministro Jobim? V.Exa.

lembrou bem. Aquela fitinha que saía da máquina de somar podia sair também como

relatório do tribunal, a respeito das urnas eletrônicas. Temos o relatório emitido

pelas mesas, mas depois só temos a totalização. Se na totalização apresentada pelo

TSE viesse o resultado, urna por urna, já haveria possibilidade dessa conferência.

Nos lugares em que ocorresse dúvida, jogar-se-ia o relatório que deu "seção tal,

tantos votos", com o boleto que sai ao final da apuração, que é o chamado Boletim

de Urna — BU. A ausência desse relatório dá-nos uma insegurança muito grande.

Até porque, acredito que, caso haja dúvida, esta não será sobre o voto. Ela pode ser

verificada na perícia feita na urna eletrônica, no programa que está ali embutido.

Isso pode ser feito. E se for o caso, impugna-se uma urna que porventura apresentar

problemas na sua programação.

Então, esse aperfeiçoamento parece-me importante, como talvez a inversão

da ordem de votação — votar primeiro nos candidatos ao Executivo. É uma

experiência que podemos fazer. Enfim, sou entusiasta da urna eletrônica e acho que

deveríamos trabalhar para o seu aperfeiçoamento, porque problemas faziam parte

também do voto no papel.

Gastei três minutos nessa questão, porque fui provocado, de certa maneira,

pelo nosso Presidente da Frente Parlamentar de Defesa do Brasil, Deputado Vivaldo

Barbosa. Permita-me discordar de S.Exa. na forma e concordar na essência; ou

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seja, é necessário procurar aperfeiçoamentos e resgatar, dentro do novo modelo,

até a possibilidade de conferência.

Na verdade, Ministro Jobim, quero discutir a questão central da sua

exposição, que é o voto no nosso sistema eleitoral. V.Exa. falou das inconveniências

do voto nominal, e eu poderia acrescentar várias outras. No afã de constituir massa

de votos, coeficiente eleitoral, os partidos procuram inclusive aceitar a inscrição de

muitas pessoas, de qualquer tipo de gente que possa trazer voto, até para completar

a lista. E isso, às vezes, causa uma imagem terrível aos políticos, porque existem

coisas as mais absurdas. E o partido é constrangido a isso.

Outras vezes, o partido é importante, mas não consegue chapa porque

alguém que analisa diz: “Bom, a competição é difícil para mim, procure outro”. Ou

seja, a fidelidade ao partido não existe na hora da inscrição. O eleitor não consegue

verificar o desempenho individual, até porque a maioria dos eleitores não votou em

alguém eleito. Fiz essa conta na Assembléia Legislativa de Minas Gerais e percebi

que pouco mais de 30% dos eleitores mineiros votaram em algum Deputado

Estadual eleito; os outros dois terços votaram em branco, ou em legenda, ou em

alguém que foi derrotado. Então, como fiscalizar alguém que você elegeu, se a

maioria sequer o elegeu? Um ano depois, a metade já esqueceu. Cai a fiscalização.

A proposta que trago, para tentar superar também os inconvenientes do voto

em lista fechada, que é a hipertrofia da burocracia partidária, da nomenclatura, como

bem denominou V.Exa, é uma espécie de voto duplo, mas que não caminha na

direção da mesma proposta do Senador Roberto Requião. Devíamos trazer a

verdade eleitoral. O eleitor, na verdade, dá dois votos: um voto para o partido ou

coligação — saiba disso ou não, seu voto é computado — e um voto para a pessoa.

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Acho que isso devia ser explicitado. O eleitor dá dois votos. Um voto seria para o

partido, na legenda ou na coligação, e que iria definir a composição, a distribuição

proporcional. Então, todos seriam obrigados a fazer campanha do partido.

O SR. NELSON JOBIM – Vinculado esse voto?

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Não. Sem vinculação.

O SR. NELSON JOBIM – Quer dizer, vota na legenda e pode votar em um

outro candidato.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – De acordo com o sistema

americano, em que qualquer eleitor pode interferir na escolha dos candidatos do

partido republicano e do partido democrata. Na maior parte dos Estados é assim.

Não haveria vinculação, Ministro, nessa minha proposta. O eleitor escolheria

o partido cuja representação quer ver e depois participaria da convenção, digamos

assim, escolhendo a ordem de cada partido. Mas aí o que ocorreria na

desvinculação? Ninguém faria campanha isolada. Até porque, se ficasse muito

isolado, fazendo a campanha individualmente, correria o risco de ver a sua legenda

fazer poucas vagas. Então, a pessoa teria necessariamente de ser mais partidária

na hora da campanha.

Inclusive, Ministro, isso poderia resolver a questão da cláusula de barreira. O

que todos querem na verdade? Preservar os partidos ideológicos, os que têm

proposição, que têm história, e evitar os partidos de aluguel. Só que o partido de

aluguel quase que tem mais força do que o ideológico, porque é uma atração muito

grande. É atraente compor uma chapa, ter um caudilho municipal, fazer uma

distribuição por várias chapas e eleger dois em uma, dois em outra. Mas se o eleitor

tiver de votar no partido, se esse tipo de partido de aluguel que hoje faz legenda,

porque faz uma chapa razoável, tiver de se credenciar através de um ação

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consciente do eleitor de votar naquele partido, ele corre o risco de ter uma boa

chapa, mas não fazer o quociente. Então, por esse lado, conseguiríamos também

separar o partido de aluguel do partido com base ideológica ou programática, que

procura consolidar-se enquanto legenda real. O de aluguel teria de consolidar-se na

consciência da cultura política daquele Município, daquele Estado, para angariar os

votos.

Seria uma solução também, Ministro, para a questão do financiamento de

campanha. Poderíamos ter o financiamento público exclusivo, sem qualquer tipo de

concessão para os candidatos majoritários e para as campanhas partidárias, e

chamaria o voto para a composição das bancadas. A disputa interna ficaria livre, ou

seja, o partido é que iria fiscalizar se alguém está praticando abuso para passar na

frente do outro. Poderia haver algumas normas também, mas a captação individual

só afetaria nesse caso a disputa pela classificação interna na lista de cada partido.

Essa é a minha sugestão. Peço-lhes que reflitam sobre isso, para não ferir

inclusive a cultura política brasileira, que é ter esse misto entre o voto nominal e a

distribuição proporcional.

Sr. Presidente, finalizando, já vejo que V.Exa. tem toda razão de levar a sério

a tarefa que lhe cabe: fiscalizar os que se excedem, sem perder a paciência.

Teria outras questões, mas não vou abordá-las. Creio que talvez esse seja o

caminho, a solução. O único inconveniente que vejo é que é difícil mudar o sistema

eleitoral. Em princípio, quem vota é quem está aqui; e quem está aqui foi eleito pelo

sistema atual. Mas ele não muda tanto, aperfeiçoa-se.

Esse gesto de desprendimento do Parlamento será uma contribuição

histórica, porque, de fato, o sistema urge mudanças. E o sistema eletrônico já

viabiliza com muito mais facilidade esses sistemas mistos do que o sistema de

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cédulas. Portanto, creio que até o sistema eletrônico, hoje, viabiliza a implantação de

um avanço como esse que ofereço à consideração de V.Exas.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Com a palavra o

Deputado Jairo Carneiro.

S.Exa. dispõe de três minutos.

O SR. DEPUTADO JAIRO CARNEIRO – Sr. Presidente, nobre Relator,

prezado Ministro, reafirmo o meu apreço e a minha admiração por V.Exa..

Vou abordar questões pontuais, sem prefixação de uma posição pessoal.

V.Exa. fez um diagnóstico provocativo muito feliz, e nessa linha de raciocínio

também quero levantar algumas questões. V.Exa., com suas interrogações, oferece

a esta Casa e a esta Comissão Especial a sua contribuição, mesmo que não sejam

as teses ou as verdades definitivas e absolutas. Mas será enriquecedor para o

trabalho da Comissão.

Há muitas interrogações sobre fidelidade partidária e tantos outros itens que

foram elencados por V.Exa. E também, se não nesta reunião, em outra

oportunidade, houve manifestações acerca de imunidade e reeleição, dois temas

que, creio, também fazem parte das discussões desta Comissão — é o que

presumo, não sendo membro dela.

Falou-se aqui sobre sistema eleitoral, sistema partidário. Creio, mesmo sem

convicção formada, que não temos no País nem sistema eleitoral, nem sistema

partidário, dentro de uma configuração conceitual que mereça respeito. Muitos

dizem — o que a mídia explora e distorce — que aqui se faz qualquer negócio. E

esse é um dos pontos negativos na visualização do julgamento da classe política,

acarretando perda de prestígio e de credibilidade e desmoralização, às vezes

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intencional, de setores que são contrários ao amadurecimento e ao fortalecimento

da democracia. Não faço coro a essas pessoas, mas precisamos ter estrutura,

arcabouço de uma legislação que deva ser permanente, para que não estejamos

fazendo uma lei a cada véspera de eleição.

Quanto à fidelidade partidária, à cláusula de barreira, ao financiamento de

campanha e a tantos outros pontos, penso que deva haver uma legislação com

princípios e regras duradouras, num país que se proponha a amadurecer e a

respeitar o jogo político na democracia.

Então, espero que as contribuições de V.Exa. e a lucidez do nobre Relator,

Deputado João Almeida, que está colhendo todos os subsídios, possam trazer a

esta Casa e ao Congresso Nacional, de modo geral, uma luz diferente da que temos

até agora, particularmente no que se refere às disputas eleitorais. Não será a

conveniência que irá decidir que a regra para a eleição de amanhã será a “a” e para

a eleição de dois anos após será a “b”. A conveniência deve acontecer dentro de um

mínimo de ética, de um pragmatismo que seja sadio. Não devemos ser joguetes

para atender ao partido que hoje é pequeno e se torna maior na eleição e que, a

partir daí, vai querer que as regras atendam ao seu interesse ou ao interesse das

forças coligadas.

Vejo com certa tristeza situações que vivemos no dia-a-dia da nossa lide

política. Na campanha para Prefeito de uma cidade temos uma coligação dos

partidos “a”, “b” e “c”. Na disputa para a Prefeitura do Município vizinho, distante

apenas 30 quilômetros, a coligação já é outra, completamente diferente. Aqueles

partidos “a”, “b” e “c”, que na primeira cidade se dizem amigos e irmãos, na segunda

cidade são inimigos, rivais. Isso é um desapreço para a atividade político-partidária.

Acho que a instância superior de deliberação de um partido, em âmbito nacional,

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tem de fixar as regras. Se elas não forem fixadas em lei, que venham nas decisões

das instâncias superiores, nacionalmente, ditando quais são os princípios que

norteiam a formação, a celebração de alianças e de coligações. O PT e o PFL não

podem fazer aliança em uma cidade e ser rivais frontais em outra. E isso acontece

no Brasil. Citei o PT por citar, mas poderia ser qualquer partido deste País. Isso,

para mim, é um desapreço para a nossa atividade. Que juízo o cidadão comum e a

mídia fazem dos políticos e dos partidos? Não existem os partidos.

As conveniências das pessoas meramente ditam que a aliança aqui vai ser de

tal modo. O partido faz uma coligação para a eleição para Governador, e o Prefeito

diz: "Sou do PTB, estou em coligação apoiando o candidato a Governador do PL,

mas vou votar no candidato do PSDB, na minha cidade, para o Governo do Estado".

Isso é uma vergonha! Precisamos de uma legislação com caráter, com padrões

básicos, que seja a espinha dorsal de um sistema.

Levantei esse ponto, mas poderia ter levantado tantos outros para a

apreciação do nobre Ministro, que muito respeito. Precisamos de um mínimo de

ética na convivência da vida pública. A meu ver, estão faltando 100% nessa

referência que faço e submeto à consideração de V.Exa., Sr. Ministro.

Sobre a candidatura nata, é preciso saber quem vai decidir se o cidadão que

hoje é Vereador, Deputado Estadual ou Federal vai poder ter a sua candidatura

assegurada ou não. Se será ao arbítrio do detentor momentâneo do domínio do

partido ou haverá motivação, fundamentação, instituindo a lei quais serão os

requisitos para que alguém seja afastado da disputa, sem evitar ou impedir a

apreciação do Poder Judiciário — se ele está sendo alvo de alguma vindita, se é um

desafeto e está sendo vitimado, penalizado, porque não faz parte do coro de quem

domina o partido naquela região. A lei tem de resguardar e defender os interesses

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legítimos do cidadão, mesmo que na atividade política não seja esse um direito

individual.

Quanto à questão de financiamento de campanhas, foi citado pelo Deputado

Vivaldo Barbosa, embora S.Exa. não tenha exteriorizado isso da tribuna, que os

percentuais devem ser assegurados na lei para as candidaturas proporcionais, se

aceito o financiamento público, não deixando também à discrição de quem comanda

o partido em um determinado Estado o destino do recurso, que pode ir apenas para

a campanha do Governador e do Senador.

Há vários caminhos, e a contribuição de V.Exa. será fundamental. Por isso,

levanto essa questão, mas lhe peço que encaminhe essas contribuições, tendo em

vista sua experiência e seu talento.

Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Com a palavra o último

orador inscrito, Deputado Antônio Joaquim Araújo.

S.Exa. dispõe de três minutos.

O SR. DEPUTADO ANTÔNIO JOAQUIM ARAÚJO – Sr. Presidente, Sr.

Relator. Sr. Ministro Nelson Jobim, quando se organiza uma Comissão é porque se

quer aprimorá-la, e todos estamos aqui com esse objetivo. A vinda de V.Exa. a esta

Comissão, como ocorreu também no Senado, demonstra o interesse em se

aprimorar o sistema político brasileiro.

Peço até desculpas por ter chegado atrasado. Meu vôo atrasou e não pude

chegar a tempo.

Quero tratar especificamente de um assunto comum no meu Estado, o

Maranhão. Trata-se do problema do título eleitoral. Tenho certeza de que vamos

chegar a um ponto, no futuro, em que o eleitor poderá até votar como hoje se vota

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na Câmara dos Deputados, com a impressão digital, para que não haja fraude. Mas,

hoje, o título eleitoral não assegura que quem está votando é o dono desse título.

Esses casos têm sido detectados com muita freqüência. É comum pessoas votarem

no lugar de outras que são analfabetas. Votam colocando a sua impressão digital no

lugar da do analfabeto, porque a mesa receptora não tem como averiguar se

realmente aquela impressão digital é a do dono do título.

Sr. Ministro, desejo acrescentar essas questões às suas preocupações.

Tenho percebido que V.Exa. possui uma memória fenomenal. Hoje, todo brasileiro

sabe usar o cartão magnético. Alguns aposentados até já possuem cartão

magnético. Essa seria a oportunidade de implantá-lo, pelo menos num primeiro

momento. Nessa reforma política, como ela é muito importante, há assuntos que vão

ser discutidos com maior profundidade, há situações que vão ser abordadas como

fatos transitórios. Vamos instituir aqui leis que serão usadas transitoriamente, como

foi aqui sugerido. Precisamos implantar outras leis imediatamente.

Apenas para ilustrar, quero citar que há pouco tempo não havia fotografia na

carteira de habilitação, porque ela foi retirada. Depois de uma avaliação, foi

detectado o grande erro de ela haver sido retirada, e voltou a ser estampada na

carteira, que passou a ser mais completa, até contendo outras informações. Se

inserirmos a fotografia em um cartão magnético, o presidente da mesa não precisará

estar abrindo o sistema para que possamos votar. Agora, o eleitor não sabe se ele

abriu ou não, se votou ou não, porque não tem como avaliar essa situação. Talvez o

cartão magnético pudesse ser o instrumento para proceder à abertura da urna

eletrônica.

A urna eletrônica foi uma avanço fenomenal. Estamos aqui para aprimorá-la.

Minha contribuição será no sentido de verificar se, pelo menos num primeiro

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momento, é possível introduzirmos no cartão magnético a fotografia, para que a

mesa possa detectar que aquele que está votando é realmente o dono do título.

Era essa a minha contribuição.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Passo a palavra ao nobre

Relator, Deputado João Almeida. Em seguida, ouviremos as considerações finais do

Ministro Nelson Jobim.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA – Sr. Presidente, optei por me expressar

ao final, e o tempo já se foi. Mas foi bom. Todos os companheiros contribuíram.

Afinal, o papel do Relator é o de ter sensibilidade para organizar a maioria. Não é o

de ficar aqui questionando, debatendo com as pessoas. Mas há alguns pontos que

não posso deixar de registrar.

Assim sendo, peço ao Ministro Jobim que se estabeleça ainda — para

tranqüilizar todos os membros da Comissão — um cronograma, que possamos

perseguir, em relação a essa decisão que tomamos conjuntamente de promover a

auditoria do sistema eleitoral por urnas eletrônicas, o sistema de recepção de votos

através de urnas eletrônicas.

Temos três etapas. A primeira é a de auditagem, que será feita pela

UNICAMP. A segunda é a da discussão dos resultados — e acho que o Deputado

Vivaldo Barbosa laborou um pouco em equívoco aí — desses relatórios e dessas

opiniões, que faremos aqui um dia, talvez, com a participação de Deputados,

Senadores, representantes dos partidos políticos e técnicos que queiram participar.

Vamos ouvir a apresentação do relatório e discuti-lo, perquiri-lo, propondo

alterações. E a terceira etapa é a da elaboração da norma legal, que pode ser

eventualmente por lei ou por resolução do Tribunal, com nossa plena aquiescência,

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depois de discutirmos. Veremos o problema processual. Então, desejo saber se

podemos, desde logo, estabelecer essas questões.

Quero prestar duas informações. O assunto de cláusula de barreira tem sido

discutido com a visão distorcida. A maioria dos países usa a cláusula de barreira

para eleição. Estamos aqui tratando de cláusula de desempenho para o

funcionamento parlamentar. É em outra etapa. Então, não podemos comparar uma

coisa com a outra.

Sobre o valor de 5%, 3% ou 4%, poderíamos ter adotado o processo de

evolução de 2% para 3% para 5%, no horizonte. Há quase dez anos, decidimos que

fixaríamos um horizonte para que as coisas acontecessem, os partidos se

acomodassem à nova realidade constitucional e democrática que estamos vivendo

no País. Naquele momento, então, estabeleceu-se o quociente de 5%. Perseguimos

esses passos por outro caminho, e aqui também não seria demais nem exótico dizer

que oito partidos superaram os 5% na eleição de 1990. Na eleição de 1994, oito

partidos superaram os 5%. Na eleição de 1998, sete partidos superaram os 5%. E

com uma qualidade: partidos que numa eleição superaram, em outras não

superaram; partidos como o PT, que antes disso não atingiram esse percentual de

forma nenhuma, tiveram a capacidade de se enraizar na população de tal forma que

conseguiram depois, seguidamente, os 5%. Partidos como o PTB, que nessa nova

versão é um partido novo, conseguiram os 5%.

Então, haveremos de distinguir sempre entre partidos que conseguem

mobilizar a população e partidos que não conseguem. E a proposta que se discute

hoje é muito nesses termos, não é em termos ideológicos, nem de grande ou de

pequeno, dos que são capazes de obter apoio popular e dos que não têm

capacidade de obtê-lo. O avanço em passos também foi testado aqui. Triste

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resultado! É da nossa cultura, Ministro. Por isso, estabelecemos esse horizonte para

chegar lá com esse valor.

O sistema de coligações foi evoluindo em dois momentos, sistematizando as

coligações, que eram aquela aberração. Depois, com a mudança dos membros da

Comissão e do Ministério, nós retrocedemos. Já estávamos num sistema de

coligação que vinculava partido coligado em âmbito nacional, podendo repetir,

vinculando a candidatura majoritária, como alguém falou aqui. Na última eleição,

mudaram o Relator — a cada eleição mudam — o Presidente, a composição,

voltando-se à esbórnia de sempre.

Como relatou o Deputado Jairo Carneiro, fala-se mal de um candidato em um

Município e se viaja dez minutos de carro até o Município vizinho para dar glórias ao

companheiro de chapa, ilustre e glorioso Deputado combatente, que foi desgraçado

no comício anterior, no Município vizinho.

Então, isso também não funcionou. Quer dizer, são coisas da nossa cultura,

que precisamos ter sempre presente quando tratamos da legislação eleitoral e

partidária.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Ministro, V.Exa. tem a

palavra.

O SR. NELSON JOBIM – Começo pelas considerações do Deputado Saulo

Pedrosa, que mostraram dissonância entre a campanha eleitoral e a ordem de

votação na urna. Na campanha eleitoral aparece como privilegiado o candidato

majoritário; depois, menos privilegiado, o candidato a Senador; em seguida, o

candidato a Deputado Federal; e menos privilegiado ainda, o candidato a Deputado

Estadual. Na urna eletrônica, dá-se o contrário: começa-se pelo Deputado Estadual

para se chegar ao Governador.

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Ora, eu não diria que é por vaidade do legislador, conforme afirmou o

Deputado, mas por uma questão técnica. Se é verdade que o eleitor pretende votar

na eleição majoritária, se seu objetivo é ela, a legislação eleitoral estabelece que

para chegar lá tem de votar na proporcional. Se votar na majoritária antes, poderá

não votar na proporcional, ou votar em branco.

São duas lógicas distintas: uma, a de produzir o voto, que é a campanha para

a majoritária; a outra, a de assegurar a votação na proporcional. É uma opção que

os senhores fizeram. Acho que é tecnicamente ajustada a essa pretensão brasileira

do voto presidencialista, ou seja, do voto plebiscitário ao candidato majoritário.

Observem bem: pelo menos parte da lógica da escolha de candidatos está

na circunstância de que o candidato majoritário é uma locomotiva em relação aos

votos proporcionais. Tanto é verdade que, nas coligações majoritárias, sempre a

disputa é em cima do partido que terá o candidato a Governador, ou a Presidente,

ou a Prefeito. Por quê? Porque eles acham — e a lógica e a história mostram isto —

que o partido que tem o candidato majoritário na coligação acaba sendo o vitorioso,

eventualmente, na coligação proporcional. Esta é a realidade. Para mudá-la,

teríamos de alterar a lógica do sistema presidencial, o que não é o caso. Dentro do

sistema presidencialista, a eleição é basicamente plebiscitária. E aí se atrela, em

cima da lógica do sistema plebiscitário, na majoritária, levando à proporcional.

Deputado Saulo Pedrosa, V.Exa. gostaria que a propaganda fosse

mostrando primeiro os candidatos proporcionais e depois o majoritário. Isso nunca

será possível, porque a propaganda visa obter votos. O que a urna eletrônica quer

assegurar, com essa ordem, é que o eleitor vote na proporcional, não importando

em quem irá votar. No outro caso o que se quer é que ele vote no candidato à

majoritária. Então, são pretensões, objetivos distintos, e essa dissonância vai existir

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sempre. Se V.Exa. inverter a ordem, pode dar o resultado contrário, ou seja, não ter

votos na proporcional, se votar depois. O eleitor vai embora ligeirinho, depois de

votar no Governador.

O Deputado Vivaldo Barbosa fez referência a um dado importante, que eu

gostaria de mencionar: a cabine indevassável. Hoje, com a urna de papelão, todo

mundo fica olhando. Além das alegações de que ficam os mesários tentando

adivinhar qual foi o voto dado — se o sujeito mexeu ou não com o braço; se votou

no nº 11, no nº 23, no nº 20; se mexeu com o braço para a direita ou para a

esquerda —, há o problema do constrangimento. Ao sentir que está sendo

observada, a pessoa erra, depois erra de novo. Outro fica inquieto na fila. Então,

cria, digamos, uma pressão psicológica externa. Temos de retomar realmente a

questão da chamada urna indevassável, a fim de que ninguém fique olhando para o

eleitor, e ele possa ter a tranqüilidade de votar, sem se sentir pressionado por

alguém que está na fila e que precisa pegar o ônibus para pescar no fim de semana

ou coisas do gênero.

Quero fazer-lhe uma confissão, Deputado Vivaldo Barbosa. V.Exa. fica cada

vez mais parecido com um grande líder do Partido Republicano Rio-Grandense.

Quando V.Exa. começa a falar em voto de bico-de-pena, em voto real, lembro-me

dos velhos líderes do Partido Republicano Rio-Grandense que ainda têm herdeiros

por todo o País. Quero dizer o seguinte, Deputado Vivaldo: sempre divergimos, mas

nos tratamos muito bem. A nossa divergência diz respeito a uma decisão que tem de

ser tomada politicamente pelos Parlamentares: ou temos voto eletrônico ou não.

Tentar estabelecer um casamento acaba não funcionando.

O Deputado Virgílio Guimarães referiu-se a um problema. Temos duas coisas

distintas na votação eletrônica: uma é o voto em si, outra é a apuração do voto. O

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que a urna eletrônica não enfrenta e não resolve é a formação da vontade do eleitor.

A formação da vontade do eleitor é problema da campanha eleitoral, que antecede a

votação eletrônica. As distorções decorrentes da campanha eleitoral, o abuso do

poder econômico etc. mexem na liberdade individual de opção do eleitor,

conduzindo-o a votar equivocadamente. Enfim, são situações provocadas por

motivos espúrios. Isso está fora do voto eletrônico, porque é problema relacionado à

formação da vontade do eleitor. Diz respeito à campanha eleitoral, às

inelegibilidades, à fidelidade e a um conjunto de situações.

Já com a urna eletrônica, temos o ato de votar e de apurar. Não tivemos, nas

eleições de 2000, problemas com a apuração. Houve, sim, reações momentâneas

referentes à morte súbita, decorrente do sistema imediato de resultado. É aquilo de

que já falei. Durante o processo antigo de apuração, o gato subia no telhado, e o

Virgílio e o Nelson já preparavam o discurso da derrota. Começavam a se justificar.

Quando vinha o resultado, já tinham o discurso pronto e o jogo jogado. E alguns

abandonavam antes, como no caso de 1982, que é a crítica que se faz. Mas a

apuração resolveu “n” problemas, como o do mapismo. Lembram-se daquele

problema que V.Exas. abordaram, da divergência de linhas? A linha começava aqui

e caía, porque o mapa era muito grande. O sujeito punha o voto em cima e

apontava para baixo, que era a média. Então, íamos discutir a média do voto. Havia

urnas com média de votos destoantes, o que autorizava o problema da recontagem.

O Deputado Virgílio Guimarães fez referência ao problema do protesto, qual

seja, na urna tradicional e também na urna eletrônica, eventualmente, teria de haver

uma fiscalização. Se o protesto não é feito na hora do voto ou da apuração, já exclui

a possibilidade de discutir a reeleição, o problema da recontagem.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Eletrônica, não...

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O SR. NELSON JOBIM – Não, não.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Na hora em que eu pego no

terminal, já acende o meu sinal vermelho. “Êpa, espere aí, vamos verificar o que

houve”.

O SR. NELSON JOBIM – Não, lógico, evidente.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Lá no terminal eu já sei o que

aconteceu no grotão.

O SR. NELSON JOBIM – Não, evidente. Então, V.Exa. tem elementos para

isso. A divergência com o Deputado Vivaldo Barbosa é exatamente uma divergência

básica. O paradigma do Deputado Vivaldo Barbosa é o voto vivo. A expressão é

sua; aliás, era a expressão de Maurício Cardoso, em 1937, quando se discutiu essa

questão.

Quero lembrar que a Constituinte de 1934 não se deveu propriamente à

Revolução de 1930, mas à de 1932. Foi a Revolução de 1932 que provocou a

Constituição de 1934. Na projeção de 1930 poderia ir mais longe a manutenção do

Estado excepcional.

Pois bem. Em relação a essas pressões feitas pelo Deputado Vivaldo

Barbosa, o que o Tribunal Eleitoral pretende não é fazer com que os técnicos

decidam, não é nada disso, mas ter uma visão, através dessa leitura, dessa análise

de todo o sistema. Uma auditoria externa — no caso, da Universidade de Campinas

— deve fazer a análise de todo o sistema e demonstrar o que há no sistema e o que

podemos agregar de confiabilidade a ele. Serão postas as alternativas técnicas, mas

a decisão tem de ser dadas pelos partidos.

Quero dizer a V.Exa., a propósito, que falei com o Presidente do seu partido

recentemente. E aguardo a recuperação do eminente engenheiro para termos um

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diálogo no Rio de Janeiro — já agendei com ele — e discutir com os partidos,

colocar as cartas na mesa, por uma simples razão: a Justiça Eleitoral tem dois eixos.

Um é o jurisdicional, em que nós decidimos o conflito ocorrido na eleição — e lá

estará o Deputado José Antonio, fazendo as sustentações aos seus clientes,

partidários ou não. Ali vamos decidir como juízes, no sentido de aplicar a lei que

V.Exas. fizeram, bem ou mal. Outra coisa é a Justiça Eleitoral como agência

realizadora de eleições. Não podemos aplicar, dentro dessa agência reguladora de

eleições, o critério decisório jurisdicional. Aqui se trata de ação administrativa. Daí

porque tenho dito claramente que, quando estou discutindo esses assuntos, não é a

partir da perspectiva jurisdicional. Às vezes, é verdade, alguns colegas juízes, que

não fazem essa distinção, acabam tratando a administração da eleição como se

fosse um processo jurisdicional, e aí dá problema .

Então, quero dizer ao Deputado Vivaldo Barbosa que teremos uma longa

discussão com os partidos, com o Congresso. Insisto em que essa Comissão a que

me refiro seja do Congresso e não uma Comissão exclusiva dos partidos políticos,

porque falta ancoramento institucional para termos essa Comissão de

acompanhamento. E aí trabalharíamos no sentido de tentar dar ao processo de

2002, à eleição de 2002 a segurança e a transparência que possam assegurar um

grau de confiabilidade. E poderemos, lateralmente, discutir também o paradigma. A

discussão do Deputado Vivaldo Barbosa já é sobre o paradigma, ou seja, que

modelo de urna, que modelo de sistema. Também queremos discutir isso, mas não

posso fazê-lo, Deputado Vivaldo, para 2002. Para 2002, tenho de trabalhar em cima

do que temos no sistema, agregando a ele mecanismos de transparência e

segurança. Mas quero discutir também o paradigma. Não tenho a mínima dúvida

em relação à necessidade dessa discussão. Haverá o diálogo dos partidos.

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Disse que a urna eletrônica e o painel do Senado são distintos por uma

simples razão: na urna eletrônica, o sistema é de contabilização; no sistema do

Senado, é de memorização. Tanto é que, no voto secreto, ficou a possibilidade de

se fazerem listas, obter o resultado da lista. São sistemas distintos. Há um sistema

de contabilização, que é o sistema da urna, em que se digita e se vai direto à

contabilização; não há nenhum intermediário. E no sistema de votação do Senado

há sempre uma memória intermediária em relação aos votos dados. Foi o que

aconteceu na violação do sistema. Houve violação do conhecimento do voto secreto,

não necessariamente violação dos votos produzidos. Não foi isso que se discutiu.

Quero dizer que, sobre esse sistema, temos condições, Deputado Vivaldo

Barbosa, de discutir amplamente com os partidos, com absoluta transparência,

porque o Tribunal Eleitoral e a Justiça Eleitoral não são donos do sistema. O

sistema é para a Nação. Ela é a consumidora. Nós somos apenas gerentes na

administração desse agenciamento de eleições e como tal temos de nos comportar.

Nossa responsabilidade é advertir V.Exas. sobre as conveniências e

inconveniências. Porém, se V.Exas. decidirem que querem voltar para a urna

tradicional, nós voltaremos, e não vamos fazer nada em relação a isso, embora

pense que temos de avançar. E avançaremos, temos espaços para isso. O que não

podemos é tratar esse tema partidariamente, dizendo, por exemplo, que o PDT e o

PT, das Oposições, não estão unidos nessa questão. Não se trata de problema

partidário, mas da Nação. Ele não se define por linhas partidárias, mas sim por

linhas de procedimentos. É uma questão de processo, não é uma questão de

Oposição e Situação. É mais transparente. Por isso, estou dizendo que o Deputado

Vivaldo Barbosa é um lídimo representante do Partido Republicano Rio-Grandense.

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Deputado Virgílio Guimarães, gostaria de discutir esse sistema duplo. Tenho

algumas experiência e alguns estudos longos a respeito do tema. Há muito tempo

mexo com os sistemas eleitorais. Na verdade, hoje, talvez o maior especialista do

mundo em sistemas eleitorais seja um professor da Universidade de Heildeberg,

com quem tive vários debates durante esses dez anos. E no mundo há todas as

experiências possíveis em relação a isso. Não há grandes invenções a fazer.

Há vários problemas a serem examinados, e não podemos trabalhar em cima

da descrição do sistema. Temos de jogar o sistema para fazer projeções e

prospecções.

Quero colocar o Tribunal Eleitoral à sua disposição. Vamos nos sentar à

mesa, pegar esse sistema e jogar em cima de eleições anteriores, através de

projeções feitas por um programa de computação, e ver o que ocorre, para

sabermos onde é que estamos nos enfiando. Na verdade, os sistemas são

escolhidos não pela consistência de princípios, mas sim pelos resultados.

Gostaria de discutir muito esse tema do voto duplo. É uma caminho de

transição. V.Exa. está produzindo uma transição. Não cai na ditadura da

nomenclatura, mas habilita as individualidades dentro do partido. Essa é exatamente

a discussão que se estabelece na Espanha. Numa discussão na Universidade de

Madri, tratamos exatamente disso.

Naquele momento, eles estavam discutindo a saída do voto de lista para a

entrada do voto proporcional. Por quê? Porque o voto de lista havia dado uma brutal

autoridade à nomenclatura do partido. Os personagens que viviam o processo

eleitoral queriam derrubá-lo e voltar para o voto nominal. Aí eu mostro as nossas

divergências. Então, temos de caminhar para um ajustamento.

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Por último, Deputados Jairo Carneiro, não tenha dúvidas de que todas as

suas observações são corretas. Sabemos que as coligações nas eleições municipais

eram um desastre para nós. Lembro-me, quando Deputado Federal, que precisava

ter cuidado ao sair de um Município para outro, a fim de fazer comício para

candidato a Prefeito. Tínhamos de receber uma lista para saber de quem é que

tínhamos de falar mal. Naquele Município não se podia falar mal do partido “a”,

apenas do outro, porque as disputas eram diferentes. Às vezes, trocávamos o papel

e era um desastre absoluto. Aconteceu comigo. Troquei a folha, e foi uma confusão

infernal. Por quê? Porque as coligações são feitas para a eleição. Coliga-se tendo

em vista a eleição, não o Governo. Essa é a lógica.

Quando termina a eleição, vejam o que acontece: elege-se o Prefeito —

vamos falar no Prefeito, que é menor — , naquele imensidade de disputas e ajustes.

Aí, o Prefeito senta na cadeira. O Presidente do partido chega lá e diz: “Vamos

discutir o secretariado”. E começa a necessidade da contratação da máquina

partidária para dentro do Governo. Aí, o Prefeito, que tem responsabilidades com o

Governo, começa a romper com a coligação e com o próprio partido. Por quê?

Porque o indicado que o partido quer para a Secretaria tal, que resolve uma questão

político-partidária, não resolve o problema administrativo que ele tem de enfrentar.

Imaginem agora, com a Lei da Responsabilidade Fiscal, como é que se faz isso. Ou

seja, esse tipo de modelo está morto. Em face da transparência, em face das

condições de investimento público que temos, está morto o modelo. E, na verdade,

precisamos discutir a questão de coligações. Mas as coligações se estabelecem

dentro da lógica do sistema eleitoral que temos. Não adianta romper o sistema de

coligações sem romper o sistema que deu origem à necessidade da coligação. É a

mesma coisa que introduzir externamente uma fidelidade partidária.

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Na exposição inicial que fiz, citei que o candidato eleito no Rio Grande do Sul

pela Polícia Militar gaúcha vai ser leal à Polícia Militar gaúcha, evidentemente. E isso

aconteceu. Cria-se a fidelidade partidária autorizando que aquele candidato não seja

expulso do partido e perca o mandato, porque descumpriu diretriz do partido. Mas

não foi o partido que o elegeu, foi a categoria. O que fazer? Há uma dissonância

entre um sistema e outro. Ou seja, isso só se resolve no conjunto. Vejam, a

fidelidade não é algo externo e artificial. Tem de nascer do processo e não através

de ameaça externa, porque vai haver formas pelas quais isso seja burlado, não

tenham dúvida.

Quanto à questão da candidatura nata, Deputado Jairo Carneiro, ela é

produto do conflito da individualidade com a nomenclatura. Ou seja, explica-se a

candidatura nata pelo personagem que tem controle do voto e não do partido. Ele

assegura a sua candidatura nata e a impõe.

Lembro a V.Exas. o exemplo do Estado do Paraná. Um ex-Deputado, colega

nosso da Constituinte, era do PDS, inimigo absoluto do Senador Roberto Requião,

e, na época, do ex-Governador do PMDB, José Richa. Ele foi à sede do PMDB

regional e pediu a filiação no PMDB, mas, como era inimigo político clássico, o

PMDB regional a negou. Imediatamente, dirigiu-se a um Município do chamado

norte histórico do Paraná e registrou sua candidatura. Na convenção, então, aparece

sua filiação partidária. Ou seja, filiou-se ao partido nesse Município e teve de entrar

na lista do partido, porque era candidato nato, foi Deputado anteriormente.

O problema da candidatura nata é o conflito da individualidade. Onde é que

se produz essa individualidade? No sistema, logicamente. Convido o cidadão para

ser candidato a Deputado Federal, porque ele tem voto próprio, e depois não

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asseguro sua candidatura, porque ele tem de obedecer a mim, que não tenho voto e

sou chefe do partido? Vejam as distorções! A candidatura nata tem essa origem.

Advirto que o sistema, hoje, tem problemas de constitucionalidade. Afinal, não

assegura ao partido a possibilidade do veto ao candidato nato; e se está entrando na

autonomia interna dos partidos, o que é um problema constitucional.

O SR. DEPUTADO JAIRO CARNEIRO – Sr. Ministro, desculpe-me, mas eu

só levantei o ponto de que não deve haver poder absoluto do partido.

O SR. NELSON JOBIM – No caso, o partido teria maioria, para efeito de

negar o candidato nato. Desapareceria o problema, se nós estabelecêssemos

mecanismos que enviassem à individualidade.

Deputado Antonio Joaquim Araújo, sobre a questão do título eleitoral, não

tenha dúvida de que o caminho será esse. Ou seja, no futuro, vamos caminhar para

um sistema de identificação do eleitor compatível, se o Deputado Vivaldo Barbosa

admitir ainda a urna eletrônica. Senão, o cartão magnético não vai funcionar e

teremos de voltar ao velho título de eleitor. No entanto, creio que vamos caminhar

para essa solução.

Quando no título de eleitor deixou de constar a fotografia, isso não foi gratuito.

Tirou-se a fotografia porque, através dela, maquinava-se ou jogava-se o velho

sistema de curral, já que a fotografia era financiada pelo candidato. Ele se dirigia ao

eleitor para oferecer-lhe a fotografia. Foi por essa razão que a fotografia caiu. A

exigência da fotografia era o mecanismo pelo qual se retomava o curral, através das

ações feitas individualmente para tirar a fotografia. Qual foi o preço que se pagou? A

possibilidade teórica de alguém utilizar o título.

Lembro, por exemplo, os grandes problemas que normalmente existem na

Bahia, especificamente em Camaçari. A confusão naquela cidade, com o problema

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de eleitor que vem e que volta, é histórica. É um tema que temos de enfrentar.

Através das disponibilidades orçamentárias, vamos acabar em um sistema que

tenha a identificação absoluta do eleitor.

O último problema não resolvido seria o da formação da vontade do eleitor

estar vinculada à campanha eleitoral.

O SR. DEPUTADO ANTONIO JOAQUIM ARAÚJO – Permite-me um aparte,

Sr. Ministro?

O SR. NELSON JOBIM – Pois não.

O SR. DEPUTADO ANTONIO JOAQUIM ARAÚJO – Inclusive eu dizia ao

Deputado José Antônio que há um Município do Maranhão em que o Prefeito que se

elegeu contratou uma equipe de pessoas fora do Estado. Praticou um ato

inteligente. Como no título não consta a idade e a Mesa não pode indagar a filiação

do eleitor, ou seja, quem é o seu pai ou a sua mãe, aquelas pessoas contratadas

foram lá e votaram em nome dos eleitores. Os títulos eleitorais foram recolhidos dos

seus titulares para serem utilizados por outras pessoas na votação. No caso, não há

como provar que o título é de determinada pessoa. Isso é algo complicado.

O SR. NELSON JOBIM – Vamos tentar resolver o problema.

Também há outro assunto que mencionei no início, ou seja, a Mesa ter o

número de abertura da urna. Deve-se restringir, mas isso tem preço, como o caso da

fotografia. No momento em que se exige a presença do título, só vota quem tem

título. Se comparecer sem o título, não poderá substitui-lo pela mera identidade.

Poderá votar no sistema. Até chegarmos a um sistema de abertura de impressão

digital, que seria o momento posterior a isso, e resolvermos esse problema.

Desapareceria o título de eleitor, ficaria meramente a inscrição.

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Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, espero ter trazido algumas

informações a V.Exas. Porém, antes de encerrar minhas palavras, proponho ao Sr.

Relator e ao Sr. Presidente que nosso diálogo não se esgote nesta audiência

pública, que possamos dialogar pontualmente e sem conversa teórica. Ou seja,

vamos pontuar as questões para ver como as coisas se resolvem em cima do que

temos e não em cima de conversas acadêmicas, para tentar, então, estabelecer

fórmulas com as quais poderemos avançar não só naquilo que eu quero fazer —

vamos institucionalizar —, no que diz respeito à urna eletrônica.

Teremos de montar um cronograma imediatamente após o contato com a

universidade. Inclusive, já combinei com o Senador Roberto Requião que

trataríamos essa questão da urna eletrônica na Subcomissão Especial da Comissão

de Constituição e Justiça e de Redação, presidida pelo Deputado Osmar Serraglio.

Nós envolveríamos todo esse conjunto para fazer um exame mais apurado.

Paralelamente a isso, trarei a V.Exas. proposições pontuais viáveis. Por

exemplo, a questão da memória do voto, referida pelo Deputado Virgílio Guimarães,

já é possível.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – A intenção é fazer isso

imediatamente?

O SR. NELSON JOBIM – Sim. Inclusive já mandei fazer um estudo. Não

teríamos só a impressão do Boletim de Urna — BU, que é, nada mais, nada menos

que o resultado final, o total da urna. Quando se encerra a votação, determina-se a

apuração. O Boletim de Urna é entregue aos partidos, de forma tal que, depois, há

condições de fiscalizar a soma geral, porque o disquete vai para a central

totalizadora. Também haveria possibilidade de imprimir a composição do voto, feita

na própria urna, como se nós estivéssemos mantendo dentro da urna a composição

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do voto feito pela cédula única. Aí, teríamos condição de saber qual foi o

comportamento do eleitorado naquela urna. Haveria a memória do sistema, ou seja,

o extrato da votação e o Boletim de Urna. O boletim seria para a totalização e o

extrato para a verificação. Poder-se-ia, então, fazer uma espécie de conta dimensão.

. O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Desculpe-me. O relatório sairia

depois por urna?

O SR. NELSON JOBIM – Sim. Seria o mesmo que o do Boletim de Urna.

Seria o Boletim de Urna tal, da urna tal, e teria a composição do extrato da

movimentação.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Teríamos: Município tal,

resultado tal, da urna tal, urna por urna?

O SR. NELSON JOBIM – Lógico.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Porque é o que permite o

cruzamento.

O SR. NELSON JOBIM – Lógico.

O SR. DEPUTADO VIRGÍLIO GUIMARÃES – Do jeito que saiu agora, tem-se

o BU, mas não há como conferir.

O SR. NELSON JOBIM – Exatamente. Confere-se o BU individualmente.

Assim, haveria condições técnicas de se fazer isso, através do acompanhamento.

Proponho ao nobre Deputado Relator uma conversa para fixar o cronograma.

Isso depende, evidentemente, do tempo necessário para fazer a avaliação do

sistema. Discutiremos as questões pontuais em relação a isso. Gostaria de fazer

isso sempre em articulação com o Senado Federal, para termos um diálogo

exclusivo. Também pretendo manter diálogo com os partidos, individualmente. Eu

não acredito muito em uma conversa plenária com os partidos políticos. Grande

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parte das conversas plenárias viram proselitismo. Por isso, pretendo conversar

individualmente com cada partido, examinando os problemas. E todo esse processo

será agora, nesse período, com as direções nacionais dos partidos.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Sr. Ministro, gostaria de fazer

apenas uma observação final. V.Exa. relembrou muitas situações vividas, em que

sempre foi chamado para buscar uma solução de meio-termo. Ainda ficou aquilo que

chamei, no início, de terror: ou é a urna eletrônica ou é o processo antigo. E V.Exa.

está afastando a idéia de compatibilizar uma coisa com a outra. Invocaria a

consideração de que é possível examinar os processos.

O SR. NELSON JOBIM – Posso examinar. Só que acho difícil.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Inclusive já tivemos na urna

eletrônica uma fase em que ela tinha a emissão de uma cédula. Só que ela ainda

não era satisfatória. Ia de uma maneira oculta. A urna podia não ser a mesma

utilizada na votação por aquele eleitor.

O SR. NELSON JOBIM – Perfeito.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – É preciso também considerar a

proposta, que está no nosso projeto, ou seja, fazer a apuração da urna aberta, pelo

menos 3% em cada zona eleitoral, para conferir no dia seguinte ou depois de

proclamado o resultado...

O SR. NELSON AZEVEDO JOBIM – Quero discutir um pouco isso. Não

tenho nenhum parti pris.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Exatamente.

O SR. NELSON JOBIM – O Deputado Vivaldo Barbosa deve apresentar um

sistema consistente. O erro da consistência é seu, não meu.

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O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Sr. Ministro, pode não alcançar,

mas fazemos força. Mas há proposta. Desejava essa abertura, no sentido de dar

uma convergência...

O SR. NELSON JOBIM – Não há dúvida nenhuma. E o nosso interesse é

exatamente estabelecer a transparência e a segurança do sistema, para que os

consumidores, que são V.Exas., tenham absoluta tranqüilidade no processo. Se

temos tranqüilidade no sistema, é preciso que seja compartilhada com todos.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – Então, é possível ter um meio

caminho, como aquelas redações, quanto às soluções. A nossa Constituição é

sábia...

O SR. NELSON JOBIM – Deputado Vivaldo Barbosa, quando V.Exa. se

refere a esse binarismo lógico, formal entre uma coisa e outra, estou preocupado

com o que tem de ser posto na mesa. E a resposta de ser uma ou outra depende do

que é posto na mesa. Vamos discutir em termos de coisas reais e não da nossa

divergência de linguagem.

O SR. DEPUTADO VIVALDO BARBOSA – O brilho de V.Exa. sempre

apontará o caminho.

O SR. NELSON AZEVEDO JOBIM – Obrigado a V.Exa.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, agradeço a todos a oportunidade.

Peço escusas pelo tempo que tomei. Estou inteiramente à disposição para o

debate.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Olavo Calheiros) – Agradeço ao Sr. Ministro

Nelson Jobim por, mais uma vez, ter contribuído na discussão de temas tão

importantes para a democracia brasileira.

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Não havendo mais nada a tratar, vou encerrar a presente reunião, antes,

porém, convoco reunião para o dia 26 de junho, terça-feira, com pauta a ser

definida.

Declaro encerrada a reunião.