Depressão e seus sub-titulos

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  • 7/22/2019 Depresso e seus sub-titulos

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    DEPRESSO E SEUS SUBTIPOS

    Dra. Alexandrina Maria Augusto da Silva Meleiro

    Objetivos do aprendizado

    Classificar a depresso em subtipos para discriminar

    populaes que possam ter comportamentos diferenciados quanto ao

    curso, intensidade, evoluo, prognstico e respostas diferentes ao

    tratamento.

    Pontos-chaves

    Distino entre Depresso Unipolar e Bipolar

    Transtorno Depressivo maior e Distimia

    Depresso melanclica, atpica ou reativa

    Depresso ps-parto e depresso psictica

    Evoluo histrica

    A aluso ao fato de a depresso tratar-se de um mal dos novos tempos muito

    frequente, inclusive nos meios de comunicao. Na ltima dcada do sculo

    XX foi chamada de doena do sculo, e continua como se fosse doena da

    moda. Entretanto, a depresso, o sofrimento do homem pela dor que dilacera a

    alma, tem origem remota. Na Bblia, h a histria do rei de Israel, Saul, que na

    luta com os Filisteus deu as costas para Deus, passou a ficar muito triste e a

    ser atormentado, sem ver qualquer sada. A melancolia do rei Saul melhorou

    quando Davi passou a tocar sua harpa. Anos depois, Saul, angustiado e sem

    esperanas, derrotado no campo de batalha, suicida-se com a prpria espada.

    Na Antiguidade, para os gregos, hebreus, egpcios, babilnicos e persas, a

    loucura era a inveja que os deuses tinham do sucesso dos homens. No era

    questionado qual seria o rgo doente, pois a doena era atribuda aos

    caprichos dos deuses que puniam at enlouquecer (Cords, 2002).

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    Encontraram-se diversos textos sobre melancolia escritos na China, no sculo

    VIIl a.C. Diferente de Aristteles, que considerava o corao o centro das

    emoes, o pai da Medicina, Hipcrates (460 a.C. - 370 a.C.), elegeu o crebro

    como o centro das funes mentais e suas molstias. A sade estava baseadano equilbrio dos quatro fluidos essenciais: bile, flegma, sangue e bile negra. H

    uma troca da superstio pela biologia e o modelo de observao clnica. A

    teoria hormonal da bile negra tem maior nfase com Galeno, conforme

    representado no Quadro 1:

    Quadro 1: Equilbrio dos quatro fluidos essenciais*

    Humor Elemento Qualidades Personalidade

    Sanguneo Ar Quente, mido Otimista, falante, irresponsvel

    Colrico Fogo Quente, seco Explosivo, ambicioso, magro

    Flegmtico gua Frio, mido Lento, corpulento, preguioso

    Melanclico Terra Frio, seco Introspectivo, pessimista, magro

    *De Cords, 2002

    Na Idade Mdia, perodo obscuro no entendimento e tratamento das doenas

    mentais, a bruxaria, a demonologia, a possesso, o pecado e o castigo eram o

    centro das discusses sobre as doenas.Uma reviso erudita de dois milnios de conhecimento mdico foi realizada por

    Roberto Burton, em 1621, em A Anatomia da Melancolia. Ele listou as causas

    da melancolia: idade avanada, temperamento, hereditariedade e at a

    possibilidade de ser causada secundariamente por afeces de outras partes

    do corpo, agindo no crebro. Entretanto, Burton incluiu causas sobrenaturais:

    Deus, diabo, bruxas e astrologia, entre as possibilidades etiolgicas, isto ,

    utilizou o princpio da complementaridade: causa dupla, e o tratamento dividido

    entre o clrigo e o mdico. Esse dualismo ficou presente no discurso cientfico

    por muito tempo.

    Para Willian Cullen, mdico escocs do sc. XVIII, na melancolia ocorria uma

    alterao da funo nervosa com excitao e colapso em diferentes partes do

    crebro. A instabilidade funcional levava incapacidade de associao de

    ideias e perda da faculdade de julgar a realidade de modo adequado, com

    sintomas secundrios: alterao de apetite, distrbios da sensopercepo e

    alteraes afetivas. O tratamento proposto por Cullen para a melancolia inclua

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    dietas, sangrias, vomitrios, restrio para diminuir a excitao e banhos-

    surpresas (banhos quentes para os agitados e gelados para os apticos).

    H uma depurao do conceito de melancolia, no sculo XIX, e surge o termo

    depresso. Psiquiatras europeus como Kraepelin, Morel, Griesinger eMaudsley observaram que os transtornos do humor concentravam-se mais em

    determinadas famlias, o que revelou a existncia de um componente gentico

    para as depresses. A palavra depresso deriva do latim depremeree significa

    pressionar para baixo. Aplicada como depresso mental, indica o rebaixamento

    do estado de esprito de pessoas padecendo de alguma doena.

    Em 1950, Cerletti refinou a indicao da corrente eltrica como forma de

    tratamento, a eletroconvulsoterapia (ECT), e reforou o uso desta na

    melancolia. No livro Histria da Psiquiatria(1966), os autores Franz Alexander

    e Selesnick escreveram que o tratamento de choque produzia alvio dos

    sintomas, e s a psicoterapia alcanava a origem da doena, isto ,

    remontaram Antiguidade com a ideia de dividir a depresso em um subtipo

    orgnico e outro causado por uma situao existencial. Andrey Lewis (1944) foi

    defensor da viso unidimensional, variou apenas no eixo da gravidade. Adolfo

    Meyer criou o termo psicobiologia para enfatizar fatores psicolgicos e

    biolgicos, atribuiu especial importncia histria pessoal e eventos de vida na

    depresso.

    O leitor deve reportar-se ao Modulo I - Depresso: Bases biolgicas e

    neuroanatomia.

    Com a ascenso da cincia e tecnologia houve avanos na compreenso

    etiopatognica da depresso, com mudanas conceituais. A ausncia de um

    modelo alternativo amplamente aceito favoreceu a adoo de classificaes

    baseadas em critrios operacionais. As repercusses podem ser vistas na

    diferenciao entre transtorno depressivo e transtorno de ajustamento com

    afeto depressivo nos critrios diagnsticos dos DSMs (Diagnostic and

    Statistical Manual of Mental Disorders), desde 1980, e da dcima edio da

    Classificao Internacional de Doenas (CID-10), da Organizao Mundial da

    Sade (OMS), em 1992.

    Diferena entre tristeza e depresso

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    Na linguagem corrente, a palavra depresso usada como sinnimo de

    tristeza, o que contribui muito para a dificuldade das pessoas, sejam pacientes,

    familiares, mdia ou inclusive profissionais de sade, de entenderem a

    depresso como doena e no como algo normal na vida. fundamentaldiferenciar tristeza de depresso.

    As emoes normais de tristeza e alegria fazem parte da vida cotidiana, e

    devem ser diferenciadas de transtorno depressivo e de mania. A tristeza

    uma resposta humana normal e universal a derrotas, decepes e outras

    adversidades. A resposta pode ser adaptativa, em sentido evolutivo, permitindo

    uma retirada para a conservao de recursos internos, ou sinalizar a

    necessidade do suporte de outras pessoas. Isso no doena, uma reao

    natural. O luto normal ocorre em resposta a separaes e perdas significativas

    como morte, divrcio, desiluses amorosas, partida de ambiente familiar,

    migrao forada e catstrofes civis. As reaes de luto caracterizam-se pelo

    predomnio de excitao simptica e inquietao, como mecanismos

    fisiolgicos e comportamentais para facilitar a busca pelo objeto perdido. A

    tristeza e o luto no parecem causar transtorno depressivo, exceto naquelas

    pessoas predispostas ao transtorno do humor, nas quais se aventa a hiptese

    de a perda ter desencadeado ou agravado distrbio, cuja durao excede os

    seis meses.

    As pessoas enlutadas exibem muitos sintomas depressivos durante o primeiro

    ou os dois primeiros anos aps a perda. Como identificar os 5% de enlutados

    que evoluem para um transtorno depressivo? Citamos alguns pontos nos quais

    essas pessoas diferem:

    1. As pessoas enlutadas e seus parentes percebem o luto como uma reao

    normal, enquanto as com transtorno depressivo frequentemente veem a si

    mesmas como doentes e muitas realmente acreditam que esto ficando loucas;

    2. Diferentemente do paciente melanclico, a pessoa enlutada reage ao

    ambiente e tende a mostrar um espectro de afetos positivos;

    3. O acentuado retardo psicomotor no observado no luto normal;

    4. As pessoas enlutadas ocasionalmente sentem-se culpadas por no terem

    feito certas coisas que poderiam ter salvado a vida do falecido, elas tipicamente

    no experimentam culpa por terem causado a morte, e as deprimidas sim;

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    5. Delrios de indignidade ou pecado e experincias psicticas em geral

    apontam para o transtorno do humor;

    6. A ideao suicida rara no luto, mas comum no transtorno depressivo

    maior;7. A mumificao, ou seja, manter os pertences da pessoa falecida exatamente

    como estavam antes de sua morte, indicativa de psicopatologia;

    8. Reaes severas de aniversrio devem alertar os observadores para a

    possibilidade de psicopatologia.

    Em outra forma de depresso relacionada ao luto, o paciente simplesmente

    desiste de viver, incapaz de continuar sem a pessoa falecida, geralmente o

    cnjuge. Essas pessoas tm realmente uma sria condio mdica. Sua

    funo imune est comprometida e seu estado cardiovascular precrio. A

    morte pode ocorrer em alguns meses, especialmente em homens idosos.

    Essas consideraes sugerem que seria clinicamente insensato no

    administrar antidepressivos em certas pessoas que vivenciam uma forma

    intensamente dolorosa de luto.

    No que se refere depresso, para a diferenciao com tristeza importante

    considerar trs planos diferentes:

    1. Sintoma: alterao funcional, com significado de tristeza, presente em

    grande parte da vida como manifestao de reao a conflitos ou perdas.

    Sntese de afetos e sentimentos no momento considerado;

    2. Sndrome: conjunto coerente de sinais e sintomas. Primeiro nvel operacional

    do diagnstico. Incio de interveno teraputica. inespecfica e pode ser

    decorrente de vrias etiologias;

    3. Doena (patologia ou entidade nosolgica): quadro clnico conhecido, com

    etiologia presumida ou confirmada, com opes teraputicas.

    Diagnstico de depresso maior

    No meio mdico, diagnstico (palavra de origem grega que significa

    reconhecimento) o procedimento de reconhecer uma enfermidade por meio

    de seus sinais, sintomas, curso, evoluo e, quando necessrio, realizao de

    exames complementares. O diagnstico correto fundamental para

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    estabelecer a conduta mdica adequada. Alguns pacientes no percebem os

    sintomas depressivos ou resistem a procurar um psiquiatra por preconceito e

    medo do estigma da doena mental. Infelizmente dedica-se pouca ateno aos

    sintomas psquicos do paciente, seja em decorrncia da restrio deinformao e formao sobre transtornos mentais, seja pela limitao de tempo

    disponvel na consulta.

    Quadro 5: Transtorno depressivo maior tratado e no tratado

    Angst et al., JAD, 2002

    0

    5

    10

    15

    20

    25

    30

    35

    40

    Neoplasia Cerebro-vascular

    Acidentes Suicdio Outros Todas ascausas

    p

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    categorias diagnsticas. Isso pode dificultar ainda mais o diagnstico correto. A

    depresso no tem apresentao clnica especfica, apenas humor deprimido

    e/ou perda de interesse so os nicos critrios presentes em todos os casos,

    seus limites so difceis de predizer na esfera individual (Quadro 4).Geralmente a causa e a resposta ao tratamento encontram-se mais

    relacionadas ao indivduo do que condio clnica em si (Kendell, Jablensky,

    2003).

    Quadro 4: Dimenso das alteraes patolgicas da depresso maior

    HUMOR

    Depressivo

    Anedonia

    Disforia

    Desesperana

    Culpa excessiva

    Suicidalidade

    CIRCADIANO

    Baixa energia

    Iniciativa diminui

    Alterao do apetite

    Alterao no sono

    Prejuzo na libido

    COGNITIVO

    Apatia

    Ateno diminuda

    Dificuldade de concentrao

    Perda de memria de curtoprazo

    Dficit de funo executiva

    Ruminao

    MOTOR Lentificao

    Inquietao

    Agitao

    As classificaes diagnsticas categricas, segundo Lacerda et al. (2009),

    resultaram em avanos significativos em quatro domnios da psiquiatria:

    1. Concordncia diagnstica (confiabilidade) e comunicao entre profissionais

    da rea;

    2. Critrios mais precisos (e instrumentos baseados neles);

    3. Treinamento baseado em uma referncia internacional, o que propicia uma

    linguagem comum;

    4. Acesso pblico a definies diagnsticas, o que melhora a comunicao com

    os pacientes, os familiares e a sociedade como um todo.

    As dimenses diagnsticas mostram-se mais apropriadas para o entendimento

    das relaes entre variveis biolgicas e psicossociais na avaliao da eficcia

    do tratamento em curso, em especial nas patologias em que a remisso no

    a regra.

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    A importncia de classificar a depresso em subtipos consiste na tentativa de

    discriminar populaes mais homogneas que possam ter comportamentos

    diferenciados quanto ao curso, intensidade, evoluo, prognstico e respostas

    diferentes ao tratamento. A conduta mdica vai depender de decisescategricas: se inicia o tratamento, o tipo de tratamento mais adequado, a

    necessidade de internao e de licena mdica, com base em dados clnicos.

    A combinao de diversos sintomas e sinais depressivos origina os subtipos

    que esto mencionados a seguir.

    Depresso maior

    a denominao utilizada para a sndrome do humor deprimido nas

    classificaes norte-americanas (DSMs em diversas edies) dos transtornos

    do humor; caracterizada pelo episdio depressivo maior, do transtorno

    depressivo maior, episdio nico ou recorrente. equivalente s categorias

    F32 Episdio depressivo e F33 Transtorno depressivo recorrente da CID-

    10. uma depresso primria. No decorrente etiologicamente de uma

    condio clnica ou de efeito de substncia, nem surge em resposta a situao

    estressante.

    A depresso pode ser classificada quanto intensidade como:

    1. Leve: no atrapalha tanto o dia a dia do paciente. Suas atividades no lhe

    trazem tanto prazer ou satisfao, entretanto, com um pouco de determinao

    e sacrifcio, ele consegue manter de forma razovel suas atividades habituais;

    2. Moderada: traz dificuldades na manuteno da vida diria. O paciente

    precisa empenhar-se mais para manter suas atividades. No consegue manter-

    se bem e tem pouca satisfao com eventos anteriormente agradveis;

    3. Grave: em grau maior limita muito o paciente, impedimentos so maiores,

    leva incapacitao, pode tornar-se permanente. Pode chegar condio de

    estupor depressivo. Cerca de 15% a 20% dos pacientes podem apresentar

    comportamento suicida.

    Depresso unipolar x bipolar

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    Recentemente tem-se dado mais nfase ciclicidade da doena do que

    bipolaridade, isto , mais nfase frequncia da recorrncia do que aos

    polos. A depresso uma doena crnica que evolui em fases. Alguns

    pacientes podem levar anos para ter o primeiro episdio de hipomania oumania. fundamental uma excelente anamnese, histria de familiares com

    transtorno de humor bipolar, abuso de drogas e lcool e anlise da

    personalidade.

    A depresso bipolar ocorre em pacientes portadores de transtorno bipolar do

    humor, no qual se alternam episdios depressivos, mistos e manacos ou

    hipomanacos. O nico critrio reconhecido para diferenciar episdios bipolares

    e unipolares a histria de episdio hipomanaco (TAB tipo II) ou manaco

    (TAB tipo I).

    Em deprimidos bipolares, observam-se mais retardo psicomotor, sintomas

    atpicos (anergia, hipersonia e hiperfagia), sintomas psicticos e, menos

    frequentemente, ansiedade e insnia inicial.

    Quadro 10: Transtorno afetivo bipolar

    TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR - TAB

    CICLICIDADE

    EUTIMIA

    BIPOLARIDADE

    EUFORIA (Mania)

    Depresso BipolarDepresso Unipolar

    Todo o campo da loucura peridica e circular, a mania simples e, por outro

    lado, a maior parte dos estados patolgicos que se designam com o nome de

    melancolia

    Os quadros bipolares so caracterizados por incio mais precoce, maior

    nmero de episdios e maior probabilidade de abuso de substncias ao longo

    da vida. O risco de suicdio maior nos deprimidos bipolares do que nos

    unipolares, sobretudo no TAB tipo II, o mais frequentemente confundido com

    depresso unipolar. Esses sintomas podem ser utilizados como indicadores, se

    houver dvidas quanto polaridade do episdio depressivo, orientando, assim,

    a escolha teraputica. Sempre associar um estabilizador de humor, alm do

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    Um histrico familiar tipicamente repleto de transtornos bipolares e

    depressivos, revelando uma ligao robusta com transtorno primrio do humor,

    transtornos esses que se beneficiam com tratamento medicamentoso. O

    transtorno distmico compatvel com um funcionamento social relativamenteestvel, embora precrio. Muitos pacientes investem a energia que tm no

    trabalho, nada sobrando para o prazer e as atividades familiares ou sociais, o

    que favorece atrito conjugal caracterstico. A dedicao ao trabalho por parte

    dos portadores de transtorno distmico pode representar uma

    supercompensao, constituindo uma defesa em sua batalha com a

    desorganizao e a inrcia. Kraepelin descreveu esses indivduos: A vida, com

    sua atividade, um fardo que eles habitualmente carregam com resignao

    submissa, sem serem compensados pelos prazeres da existncia.Kretschmer

    sugeriu que esses seriam a espinha dorsal da sociedade, dedicando sua vida a

    trabalhos que exigem confiabilidade e grande ateno a detalhes.

    Estudos epidemiolgicos demonstraram que muitas pessoas com queixas

    distmicas prolongadas, com durao de anos, nunca apresentaram episdios

    depressivos definidos. Geralmente buscam um aconselhamento e psicoterapia

    para problemas existenciais, com sentimento de vazio e de ausncia de

    qualquer prazer na vida fora do trabalho. Outros buscam ajuda por causa de

    uma intensificao disfrica, na forma de um transtorno depressivo maior, que

    denominamos de depresso dupla, conforme ser apontado mais frente.

    O quadro clnico da distimia semelhante ao episdio depressivo maior, mas

    difere dele devido tendncia a um predomnio dos sintomas sobre os sinais,

    isto , uma depresso mais subjetiva que objetiva. So sintomas comuns

    letargia, inrcia, pior pela manh, anedonia, dificuldade de concentrao,

    sentimentos de inadequao e baixa autoestima, porm com sintomatologia

    atenuada e durao de pelo menos dois anos, revelando a caracterstica

    crnica da depresso.No se destacam as alteraes acentuadas do apetite e

    da libido, nem agitao ou retardo psicomotor, traduzindo uma depresso

    atenuada, porm crnica. Os estudos apontam para o benefcio de medicao

    antidepressiva para esses pacientes.

    Depresso dupla

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    suicida. Quinze por cento dos deprimidos sem tratamento ou inadequadamente

    tratados cometem suicdio.

    No DSM-IV (APA, 1994), esses sintomas de alterao do ritmo circadiano

    denominam-se de caractersticas melanclicas de episdio depressivo. NaCID-10 (WHO, 1993) so designados de sintomas somticos, exceto

    sentimento de culpa.

    Depresso ansiosa

    Os transtornos de ansiedade so os mais comuns entre os deprimidos. A

    comorbidade nesses casos a regra e no a exceo. As taxas de

    comorbidades situam-se entre 50% e 60% e ambas as condies so

    prevalentes ao longo da vida com taxas de 10% a 30%.

    A incluso dos estados depressivos mistos em um apndice do DSM-IV

    reconhece a ocorrncia simultnea de cognio ansiosa, isto , a ameaa que

    a perda representa, e cognio depressiva, o sofrimento da perda, diante de

    uma situao da vida importante e aversiva.

    Quadro 8: Interseco de depresso e ansiedade (OMS)

    DEPRESSO E ANSIEDADEsimultneas no estudo WHO

    5,6% 4,6% 7,5%

    Pacientes com

    ansiedade

    Pacientes com

    depresso

    Ansiedade (total): 10,2% Depresso (total): 12,1%

    O misto implica que a psicopatologia progride da ansiedade para a depresso,

    que o estado mental do paciente ainda flui e que a dinmica em curso explica,

    em parte, a natureza subaguda ou crnica do transtorno. A depresso ansiosa

    aponta para a presena comum de ansiedade nos estados depressivos e,

    especialmente, sua maior visibilidade quando a depresso menos saliente.

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    Afirma-se que os pacientes com esse tipo de quadro so mais comuns em

    contextos mdicos gerais.

    Quadro 9: Comorbidade entre depresso e ansiedade

    Comorbidades entre

    depresso e ansiedadePrevalncia, ao longo da vida, das comorbidades entre depresso

    e alguns dos transtornos de ansiedade

    1 Kessler RC et al., 1995; 2 DSM-IV; 3 Brawman-Mintzer O et al., 1993;4 Rasmussen SA et al., 1992; 5 Stein MB et al., 2000; 6 Van Ameringen M et al., 1991

    TEPT TP

    TOC

    Depresso

    48% dos pacientes tem

    transtorno de estresse

    ps traumtico1

    Mais de 65% de pacientes

    tem transtorno do pnico 2

    67% dos pacientes tem

    transtorno obsessivo

    compulsivo 3

    TAGTFS

    42% dos pacientes

    tem ansiedade

    generalizada 534% a 70%

    dos pacientes tem

    transtorno de fobia

    social 4,6

    Depresso reativa

    a denominao utilizada para os quadros de humor deprimido surgidos em

    resposta a estressor psicossocial. A CID-10 inclui esses quadros na categoria

    de transtorno de ajustamento, com os subtipos F43.20 Reao depressiva

    breve e F43.21 Reao depressiva prolongada. Entretanto, a depresso

    reativa tambm pode ser includa nas categorias F32 e F33, desde que

    corresponda s caractersticas do episdio depressivo.

    Classicamente, essa depresso definida como resultante de um evento vital

    especfico. Em termos ideais, a depresso no ocorreria na ausncia do

    evento, por exemplo, perda de um amor ao qual constitui uma reao;

    continuaria pelo tempo em que o evento estivesse presente e cessaria com a

    reverso do evento (o retorno do par romntico). Depresses que exibem todas

    essas caractersticas quase nunca so vistas na prtica clnica. Com o devido

    suporte interpessoal, a maioria das pessoas capaz de enfrentar tais eventos,

    o que explica por que a depresso reativa tende a ter durao limitada.

    Portanto, transtorno de ajustamento seria o diagnstico mais apropriado na

    maioria dos casos de depresso reativa.

    Teoricamente, possvel imaginar situaes de vida cronicamente

    insatisfatrias que poderiam levar desmoralizao crnica. Entretanto, essa

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    condio, que pediria pela designao de depresso reativa crnica, uma

    contradio em termos. A questo frequentemente levantada : por que uma

    pessoa continuaria nessa situao? s vezes, o conceito de masoquismo

    invocado por autores psicodinmicos para explicar por que certas pessoas soincapazes de se liberar de situaes dolorosas, insinuando que elas

    contribuem de algum modo para sua manuteno.

    Pensa-se que muitos desses supostos traos autodestrutivos, considerados

    como indicadores de masoquismo, sejam mais especficos da situao do que

    se acreditava anteriormente, e que poderiam resolver-se com a eliminao da

    situao. Os ditos aspectos autodestrutivos so, portanto, mais bem

    compreendidos como mecanismos psicodinmicos, em vez de serem

    indicadores de uma personalidade especfica. O tratamento de ajustamento

    crnico, aparentemente uma contradio em termos, poderia descrever a

    desmoralizao crnica observada em alguns indivduos aprisionados em

    situaes de vida cronicamente insatisfatrias. Outros indivduos poderiam

    satisfazer os critrios para transtorno distmico. O diagnstico diferencial

    fundamental.

    Depresso sazonal

    caracterizada pela ocorrncia de episdios depressivos em algumas pocas

    do ano, mais comumente no incio do outono e inverno, com remisso na

    primavera. O predomnio em mulheres e os sintomas atpicos como

    hipersonia, hiperfagia, letargia, ganho de peso e avidez por carboidratos so

    frequentes.

    Depresso atpica

    O termo depresso atpica surgiu em 1959, com West e Dally, com pacientes

    com depresso que respondiam aos inibidores da monoamina oxidase (IMAO)

    logo nos primeiros dias aps o tratamento. E no respondiam de forma

    satisfatria aos tricclicos e ECT. Esses pacientes apresentavam uma gama de

    caractersticas: depresso secundria a estados fbico-ansiosos, depresso

    no endgena, inverso de sintomas neurovegetativos (aumento de apetite, de

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    libido, de sono, ganho de peso), sensao de ausncia total de fora, padro

    persistente de extrema sensibilidade percepo de rejeio interpessoal, com

    manuteno da reatividade do humor (capacidade de se alegrar diante de

    eventos positivos), depresso bipolar com intensa anergia (paralisia dechumbo), sensao de peso e associao com dor crnica (Lacerda et al.;

    2009). Sintomas atpicos, principalmente hiperfagia e hipersonia, so mais

    comuns em deprimidos bipolares (Moreno et al., 2004). O sono noturno

    perturbado na primeira metade da noite em pessoas com transtorno depressivo

    atpico; irritabilidade, hipersnia, e fadiga diurna poderiam representar estigmas

    diurnos previsveis da privao do sono pela insnia inicial intermitente.

    Parece haver uma especificidade dos IMAOs e antidepressivos serotonrgicos

    para esses pacientes, razo pela qual devem ser levados a srio.

    Depresso psictica

    Trata-se de depresso grave na qual ocorrem sintomas psicticos como

    delrios e/ou alucinaes. No transtorno depressivo com aspectos psicticos o

    pensamento negativo adquire propores amplamente delirantes, sendo

    mantido com convico; os pensamentos no so suscetveis a modificao

    por evidncias em contrrio. Classicamente, o pensamento delirante na

    depresso deriva de quatro inseguranas bsicas da humanidade: sade,

    situao financeira, valor moral e relacionamento interpessoal. Os pacientes

    severamente deprimidos podem ter delrios de indignidade e pecado, referncia

    e perseguio. Eles acreditam estar sendo escolhidos por seus erros do

    passado e que todos tm conhecimento desses erros. A ideao persecutria

    na depresso frequentemente deriva da crena de que a pessoa merece

    punio por essas transgresses. Um homem severamente deprimido pode

    sentir-se to incompetente em todas as reas do funcionamento, incluindo a

    esfera sexual, que pode suspeitar que sua esposa o traia (delrio de

    infidelidade).

    Outras pessoas deprimidas acreditam que perderam todo o seu dinheiro e que

    seus filhos morrero de fome, so os delrios de pobreza; ou que tm uma

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    doena oculta, como cncer ou sndrome de imunodeficincia adquirida (AIDS),

    constituindo os delrios niilistas. Na doena mais severa, o paciente pode sentir

    que o mundo mudou e, portanto, a calamidade e a destruio aguardam a

    todos. Em casos raros, um pai ou me com esses delrios pode vir a matarseus filhos pequenos, para salv-los da decadncia moral ou fsica e depois

    cometer suicdio. Finalmente, uma minoria de pessoas deprimidas pode ter

    alucinaes auditivas ou visuais fugazes com contedo extremamente

    desagradvel, seguindo as linhas de seus delrios, por exemplo, ouvir vozes

    acusatrias ou ver a si mesmas em caixes ou cemitrios. Todas essas

    experincias psicticas so delrios ou alucinaes afetivas genunas. So

    congruentes em vista do humor patolgico predominante.

    Os critrios do DSM-IV para especificadores de gravidade/psictico para

    episdio depressivo maior incluem aspectos congruentes e incongruentes com

    o humor. Nos incongruentes com o humor temos delrios ou alucinaes cujo

    contedo no envolve temas depressivos tpicos de inadequao pessoal,

    culpa, doena, morte, niilismo, ou punio merecida.

    Os sintomas includos so delrios persecutrios, no diretamente relacionados

    com temas depressivos, insero de pensamento, irradiao do pensamento e

    delrios de controle. possvel que sintomas de primeira ordem ou do tipo

    schneideriano surjam no contexto de um episdio depressivo. Uma

    investigao fenomenolgica adequada deve ser realizada para se

    compreender como so originados do humor patolgico e das mudanas

    profundas na atividade psicomotora que o acompanham. fundamental a

    investigao da existncia de uma histria de transtorno pelo uso de lcool

    e/ou substncias ou abstinncia como possvel explicao da incongruncia do

    humor na depresso psictica.

    Depresso ps-parto

    As mulheres so duas vezes mais vulnerveis a desenvolver episdios

    depressivos durante a vida. Trs importantes circuitos permitem, nas mulheres,

    a comunicao entre o crebro e os demais rgos: o eixo hipotlamo-

    pituitria-tireoidiano, o eixo hipotlamo-pituitria-adrenal e o eixo hipotlamo-

    pituitria-ovariano. A ocorrncia de alteraes especficas dos mecanismos de

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    comunicao entre neurotransmissores (dopamina, noradrenalina e serotonina)

    e hormnios (cortisol, tireoide e estrgeno) provoca mudanas no estado

    mental e no humor, particularmente nas fases do ciclo reprodutivo da vida,

    incluindo perodo pr-menstrual, gestao, perodo ps-parto, durante aperimenopausa, e ps-menopausa. O reconhecido impacto dos hormnios

    sexuais femininos sobre o funcionamento do psiquismo tem favorecido as

    mulheres, que podem ser diagnosticadas e tratadas de maneira adequada.

    Prof. Dr. ALEXANDRINA MELEIROProf. Dr. ALEXANDRINA MELEIRO

    Hipfise anterior e posterior

    Um exemplo disso a capacidade do estrgeno em reduzir enzimas como a

    monoamina oxidase (MAO) e a catecol-o-metiltransferase (COMT), enquanto a

    progesterona aumenta a atividade dessas, de onde se pressupe que o

    estrgeno possa melhorar o humor enquanto a progesterona poderia

    desencadear sintomas depressivos. Outro exemplo a maior susceptibilidade

    feminina para as disfunes tireoidianas, sendo reportada a prevalncia de

    30% a 45% de disfuno tireoidiana em mulheres bipolares de ciclagem rpida.

    Ginecologistas e obstetras, como cuidadores da sade de mulheres, precisam

    ser informados sobre a incidncia, etiologia e manifestaes fsicas e psquicas

    da depresso e as possveis implicaes no diagnstico e tratamento.

    Ao contrrio do que se imaginava anteriormente, a gravidez e o puerprio no

    oferecem proteo contra esse transtorno do humor (Lussikin; Pundiak; Habib,

    2007). Metade das gestaes no planejada, o que pode representar um

    estressor importante na vida da mulher. Estima-se que 25% a 35% das

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    grvidas tm sintomatologia depressiva importante, que se inicia no segundo

    trimestre de gestao (depresso pr-natal DPN). Muitas vezes, no

    diagnosticada e s vai se constatar depresso no ps-parto (DPP).

    Os fatores de risco para a DPN so semelhantes queles de qualquer episdiodepressivo: histria de depresso, ausncia de parceiro, dificuldades conjugais,

    falta de apoio social, pobreza, violncia familiar, aumento do estresse cotidiano

    e abuso de substncias psicoativas. A DPN mostra uma associao com

    histria de abortos prvios, gravidez no planejada e ambivalncia relacionada

    gravidez. Mais de 50% das mulheres param ou reduzem a dose de

    antidepressivo quando ficam sabendo que esto grvidas. A possibilidade de

    recada durante a gravidez aps interrupo do antidepressivo de 75% nas

    que tm depresso recorrente (Lussikin, Pundiak, Habib, 2007).

    O episdio depressivo pode no ser diagnosticado devido ao fato de a ateno

    estar voltada para o bem-estar fsico materno-fetal e pela atribuio das

    queixas s mudanas fsicas e hormonais. Mulheres grvidas deprimidas tm

    significativamente mais queixas somticas como nusea, dor epigstrica,

    cefaleia e dificuldade de respirar do que grvidas eutmicas. A DPN acarreta

    prejuzos ao feto e ao beb recm-nascido; devido ao estresse e depresso,

    aumentam-se os nveis maternos de corticosteroides e catecolaminas.

    Consequentemente, h reduo do fluxo sanguneo placentrio e alteraes no

    crebro fetal. Bebs de mulheres deprimidas tm o risco de parto prematuro,

    baixo peso ao nascer, ndice de Apgar baixo, menor capacidade para sugar e

    mais admisses em UTI neonatal.

    O psiquiatra deve avaliar bem o risco do uso de antidepressivo durante a

    gravidez, em relao ao risco de manter uma gestante com depresso

    moderada a grave sem tratamento medicamentoso. Gestantes gravemente

    deprimidas, com ideias suicidas, catatonia, ou psicose podem necessitar de

    internao e com frequncia o tratamento de escolha nesses casos a ECT

    (Camacho et al., 2006).

    No puerprio a incidncia de transtorno do humor alta. A mulher submetida

    a um turbilho hormonal e emocional. A insegurana e a expectativa geradas

    durante a gestao se materializam no beb totalmente dependente dessa

    me. Os trs quadros mais comumente encontrados so o blues, a depresso

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    e a psicose puerperais. O termo blue significa tristeza, melancolia, e um

    perodo de depresso leve e passageira. A maioria se inicia por volta de dois a

    quatro dias aps o parto e os sintomas psquicos so leves: irritabilidade,

    tristeza ocasional, insnia e crises de choro. No preocupante, pois autolimitado.

    Mulheres que j sofriam de transtorno disfrico pr-menstrual ou depresso na

    gestao so mais propensas a terem o bluespuerperal, podendo atingir at

    70% das mulheres. Por sua caracterstica de remisso espontnea, no requer

    farmacoterapia (Horimoto et al., 2005). O apoio familiar importante. Se houver

    persistncia e agravamento dos sintomas, h necessidade da reavaliao

    quanto possibilidade de evoluir para a depresso ps-parto.

    De 10% a 30% das mulheres desenvolvem depresso no ps-parto (DPP), e

    essa condio constitui importante problema de sade pblica. O pico de

    incidncia maior entre as primeiras duas a seis semanas, mas pode ocorrer

    at um ano aps o parto. Na primeira gestao, o maior risco observado de

    forma precoce entre dez e 19 dias depois do parto. A durao pode ser curta,

    embora algumas mulheres continuem deprimidas por at um ano ou mais. Os

    sintomas da DPP incluem reduo da qualidade de vida, isolamento social,

    ataques de ansiedade, choro fcil, perda de interesse na vida, insegurana

    excessiva, pensamentos obsessivos inapropriados, irritabilidade, fadiga,

    sentimento de culpa e inutilidade, de incapacidade de cuidar do beb, medo de

    machucar, relutncia em amament-lo, desligamento emocional do beb e de

    outros familiares. Tambm se observam queixas somticas como dor na

    inciso cirrgica, cefaleia, e dor lombar, ideias de autoagresso e planos

    suicidas (Lee, Chung, 2007).

    A DPP problemtica, pois seus efeitos so experimentados em um perodo

    de demandas excepcionais atribudas s mulheres em relao ao cuidado do

    beb e da famlia. O diagnstico muitas vezes negligenciado por se acreditar

    que o quadro seja resultante do cansao e da ansiedade natural nessa fase.

    Em todo o mundo a DPP subdiagnosticada, de 50% a 90% dos casos de

    depresso puerperal no so detectados e, portanto, no so tratados.

    Em algumas mulheres trata-se do primeiro episdio de depresso, sendo o

    parto considerado um evento vital que se soma predisposio constitucional

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    individual para desencadear a doena. Antecedentes familiares so

    encontrados.

    Algumas purperas podem apresentar ideias delirantes, percepes distorcidas

    sobre seu corpo, alucinaes, desorientao e flutuaes de conscincia. importante avaliar se no h a presena de um componente orgnico, como

    infeco, levando sndrome de deliriume tambm o diferencial com psicose

    puerperal.

    Efeitos deletrios na criana incluem ligaes interpessoais inseguras,

    problemas comportamentais e dficits no desenvolvimento cognitivo,

    agressividade, comportamento deprimido e ansioso, desateno e

    hiperatividade (Lussikin, Pundiak, Habib, 2007).

    Quadro 6: Impacto da depresso e do estresse materno sobre o feto:

    1. Eventos estressantes durante a gestao diminuem o peso de nascimento

    de 55g/evento; 32% tm risco relativo de baixo peso (2500 g);

    2. Ansiedade materna durante gestao reduz a idade gestacional,

    antecipando em trs dias por pontuao de ansiedade;

    3. Suporte social tem associao positiva com aumento do crescimento fetal;

    4. Depresso associa-se a trabalho de parto prematuro e baixo peso para a

    idade gestacional;

    5. Na depresso materna h elevao da taxa de uso de drogas, lcool e

    tabaco; alm de pobre autocuidado, alterao no sono e na nutrio.

    A depresso leve pode ser tratada com abordagem psicolgica e intervenes

    sociais. Os casos mais graves se beneficiam da associao com

    antidepressivos. Com menos efeitos sedativos, so as drogas de escolha para

    as purperas que no esto amamentando, permitindo que cuidem dos bebs

    durante a noite. Os riscos neurocomportamentais incertos dos antidepressivos

    sobre os bebs precisam ser cuidadosamente considerados no caso de mes

    lactantes. Os sinais infantis relatados com mais frequncia so sono inquieto,

    irritabilidade, reduo da alimentao e dificuldade de sugar.

    O benefcio da amamentao com o leite materno j foi bem estabelecido. No

    entanto, o possvel impacto negativo, a curto e longo prazo, de um transtorno

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    do humor materno no tratado na relao me-beb e no desenvolvimento do

    beb tambm deve ser considerado, prevendo-se o melhor desfecho para a

    criana nesse contexto. Por enquanto, as decises acerca da lactao

    envolvem a anlise cuidadosa do risco/benefcio e devem ser avaliadas,individualmente, pela paciente e pelo mdico, incluindo, tambm, outros

    membros da famlia.

    O medo de prescrever psicotrpico durante a gestao e lactao tem gerado

    grandes discusses, e nenhuma deciso livre de risco. de bom senso

    usar medicamentos apenas quando os riscos da doena superarem os da

    farmacoterapia. Como a Food and Drug Administration (FDA) adverte contra o

    uso de todos os psicotrpicos durante a gravidez e amamentao,

    desencorajada a incluso de mulheres grvidas nos estudos; dessa forma,

    poucas informaes existem sobre as diferenas no metabolismo,

    biodisponibilidade, efetividade, resposta, ou efeitos colaterais dos psicotrpicos

    durante a gestao e puerprio.

    Por isso, devemos optar por medicamentos com meia-vida curta, menor tempo

    de eliminao, com poucos sintomas de retirada e menor interao

    medicamentosa, alm de reconhecida eficcia teraputica. A monoterapia

    prefervel, e a dose na gestao maior que na lactao. Estudos recentes

    tm indicado que as intervenes pr e ps-parto so bem-sucedidas,

    reduzindo o risco de apresentarem transtorno de humor no ps-parto.

    As psicoses ps-partoso quadros mais graves e menos prevalentes, podem

    exibir caractersticas tanto maniformes quanto esquizofreniformes, e tm incio

    geralmente nas primeiras duas a quatro semanas aps o parto, com uma

    prevalncia estimada entre 0,1% e 0,2%. O manejo requer uma equipe com

    experincia, pois envolve abordagem psicofarmacolgica, por vezes

    internao, terapia individual e orientao famliar.

    Indiscutvel, no entanto, o fato de as doenas mentais maternas produzirem

    reflexos na sade fsica e mental de sua prole, especialmente no perodo em

    que h uma maior dependncia. Presume-se que uma relao me-filho

    conturbada seja um dos fatores implicados em crimes de abuso, negligncia ou

    mesmo infanticdio. Prevenir melhor que remediar.

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    Quadro 7:Algoritmo para o tratamento da depresso na gestao e ps-parto*

    Comunicao entre Obstetra e

    Psiquiatra

    Identificao de grupo de riscoPr-natalidade

    Clnicos geraisObstetrasPediatras

    Enfermeiras

    Precoce identificao dedepresso ps-parto

    Histria de problemas mdicos edrogas usadas; estabelecer diagnstico

    Interveno imediata

    PsicoterapiaFarmacoterapia

    Combinao de terapia

    Psicoeducacional

    Implementao de tratamento

    Seguimentopor mais de um ano apsremisso do episdio primrio

    Manuteno da terapia

    Discusso sobre futuras gestaes erecorrncias de risco, com seguimento

    adequado na comunidadePreveno

    *Fonte: Shaila Misri, University of Britishi Columbia, Vancouver, Canad, APA 2003.

    Outro fator de mediao entre humor normal e patolgico o temperamento.A maioria das pessoas tem um padro caracterstico de oscilao afetiva

    bsica, que define seu temperamento, que nato. Algumas pessoas so

    facilmente levadas s lagrimas por circunstncias tristes ou felizes, enquanto

    outras permanecem plcidas. Nestas as oscilaes de tom afetivo so

    relativamente pequenas, ressoam com os eventos do dia a dia e no interferem

    no funcionamento. Naquelas em que existe uma maior variabilidade de

    respostas emocionais, sem provocao bvia, pode haver uma alternncia

    entre o humor normal e a tristeza, ou excitao, ou ambos. Temos trs tipos de

    temperamentos bsicos: depressivo (a pessoa oscila facilmente para a

    depresso), hipertmico (a pessoa inclinada para humores alegres) e o

    ciclotmico (o indivduo oscila entre humores alegres e tristes). Esses tipos

    podem ser considerados como variaes da expressividade emocional normal,

    que podem persistir durante a vida toda, sem prejuzo significativo (Quadro 2).

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    Quadro 2: Caractersticas dos temperamentos depressivo e

    hipertmico*

    DEPRESSIVO HIPERT MICO

    1. Sombrio, incapaz de se divertir, queixoso 1. Alegre e exuberante

    2. Sem senso de humor 2. Loquaz e brincalho

    3. Ctico, pessimista e dado a preocupaes intensas 3. Excessivamente otimista e despreocupado

    4. Propenso a culpa, baixa autoestima e preocupado com

    inadequao ou fracasso

    4. Superconfiante, autoafirmativo, conta vantagem,

    grandioso

    5. Introvertido, com vida social restrita 5. Extrovertido, sempre em busca de pessoas

    6. Lento, leva a vida sem ao 6. Alto nvel de energia, cheio de planos e atividades

    7. Poucos interesses 7. Verstil, com amplos interesses

    8. Passivo 8. Superenvolvido e intruso

    9. Confivel e devotado 9. Desinibido, em busca de estmulos

    10. Dorme muito habitualmente (+10h) 10. Dorme pouco habitualmente (menos de 6h)

    *Akiskal HS, 1995.

    Em algumas pessoas, as caractersticas do temperamento podem ter

    acentuao na adolescncia ou idade adulta, com seus problemas

    interpessoais, acadmicos e ocupacionais, e manifestar-se como estados

    mrbidos: transtorno depressivo, distmico, ciclotmico ou transtorno de humor

    bipolar. Esses vo merecer ateno mdica psiquitrica.

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