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DESENVOLVIMENTO DA LEITURA E DA ESCRITA ATRAVÉS DOS CONTOS DE FADAS Adeonilde Gregorini Chiamenti – Professora PDE Greice da Silva Castela – orientadora RESUMO: Os motivos que levam os alunos a não lerem ou não compreenderem de forma satisfatória os textos lidos é o objeto desse estudo. Pode-se perceber que a leitura não é vista como uma atividade prazerosa pelos alunos, por isso torna-se necessário investigar o porquê isso ocorre e o que os afasta da leitura e dificulta a compreensão leitora. Para investigar essa situação e buscar fundamentos que possam nortear o trabalho com leitura de forma mais eficiente, realizou-se essa pesquisa cuja aplicação ocorreu em uma escola estadual situada no perímetro urbano do município Realeza, no estado do Paraná, objetivando a percepção de como alunos e professores conceituam leitura e seus hábitos como leitores. A referida investigação possibilitou a construção de estratégias para a aplicação de atividades de implementação que visavam desenvolver a compreensão leitora e, consequentemente a escrita, nos alunos de quintas e sextas séries. PALAVRAS CHAVES: leitura, escrita, contos de fadas The reasons that make students not reading or undertanding in satisfactory way is the objective of this study. It is notice the reading is not undertanding as an enjoyment for the studentes, that makes necessary investigate why that happens and what separate them of reading and turn hard the reading comprehension. To investigate this situation and find arguments for turning this reading work more efficient a research was done in a public school located in Realeza City, Parana, with the objective of notice how students and teachers see the reading act and their habits as readers. The research turn easier develop the reading comprehension and writing in students of 5 and 6 grades. KEYWORD: reading, writing, fairytale.

DESENVOLVIMENTO DA LEITURA E DA ESCRITA … que está escrito, pois a leitura não se restringe ao aprendizado das correspondências letra-som, mas o extrapola. Porém, Solé (1998,

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DESENVOLVIMENTO DA LEITURA E DA ESCRITA ATRAVÉS DOS CONTOS DE FADAS

Adeonilde Gregorini Chiamenti – Professora PDE

Greice da Silva Castela – orientadora

RESUMO: Os motivos que levam os alunos a não lerem ou não compreenderem de

forma satisfatória os textos lidos é o objeto desse estudo. Pode-se perceber que a

leitura não é vista como uma atividade prazerosa pelos alunos, por isso torna-se

necessário investigar o porquê isso ocorre e o que os afasta da leitura e dificulta a

compreensão leitora. Para investigar essa situação e buscar fundamentos que possam

nortear o trabalho com leitura de forma mais eficiente, realizou-se essa pesquisa cuja

aplicação ocorreu em uma escola estadual situada no perímetro urbano do município

Realeza, no estado do Paraná, objetivando a percepção de como alunos e professores

conceituam leitura e seus hábitos como leitores. A referida investigação possibilitou a

construção de estratégias para a aplicação de atividades de implementação que

visavam desenvolver a compreensão leitora e, consequentemente a escrita, nos alunos

de quintas e sextas séries.

PALAVRAS CHAVES: leitura, escrita, contos de fadas

The reasons that make students not reading or undertanding in satisfactory way is the

objective of this study. It is notice the reading is not undertanding as an enjoyment for

the studentes, that makes necessary investigate why that happens and what separate

them of reading and turn hard the reading comprehension. To investigate this situation

and find arguments for turning this reading work more efficient a research was done in a

public school located in Realeza City, Parana, with the objective of notice how students

and teachers see the reading act and their habits as readers. The research turn easier

develop the reading comprehension and writing in students of 5 and 6 grades.

KEYWORD: reading, writing, fairytale.

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A LEITURA, A ESCRITA E OS CONTOS DE FADAS.

A leitura tem sido objeto de muita discussão por parte de educadores que

buscam estratégias para melhorar a capacidade de leitura dos alunos no ensino

fundamental. Mas ainda pouco se sabe sobre os processos relacionados à

compreensão leitora e os fatores que interferem no processo da compreensão. A partir

de depoimentos e experiências no cotidiano escolar observa-se que muitos alunos,

mesmo avançando na escolaridade, encontram dificuldades na compreensão do

conteúdo lido, sentindo-se inseguros e fazendo, muitas vezes, do ato da leitura um

tormento. Diante da necessidade e utilidade da leitura, sentimos urgência em obter

melhores conhecimentos sobre esta habilidade, suas concepções, os motivos que

levam os alunos, especialmente das quintas e sextas séries, a não lerem ou

encontrarem dificuldade em compreender o que lêem.

A pesquisa em questão realizou-se em uma escola estadual, no município

Realeza, no estado do Paraná. Essa instituição atende alunos da segunda fase do

ensino fundamental, em dois turnos: matutino e vespertino. O referido estudo foi

iniciado com aplicação de um questionário - com perguntas referentes à definição,

objetivos e hábitos de leitura - para seis professores e 152 alunos de quintas e sextas

séries do turno matutino. A faixa etária dos alunos envolvidos varia de 10 a 15 anos.

Indagamos aos docentes sobre o que entendem por leitura, o uso da leitura em suas

disciplinas, seus hábitos como leitores e a disponibilidade de materiais e espaço para

leitura na escola e em suas aulas. Aos alunos indagamos sobre os conceitos de leitura,

hábito de ler em casa e na escola, gênero discursivo preferido e dificuldades que

encontram no ato de ler. Após essa investigação foi possível traçar estratégias

envolvendo atividades com o gênero “contos de fadas” buscando o desenvolvimento da

leitura e da escrita e pesquisar estratégias que pudessem auxiliar os professores no

desenvolvimento da atividade eficiente de leitura.

A escola atual precisa rever seus conceitos, pois segundo Barbosa (1991, p.88),

“ler não é mais decodificar e o leitor não é mais o alfabetizado”. No entanto ainda

encontramos nas escolas alunos que são capazes de decodificar, mas não de co-

produzirem sentidos a partir do que leem, parecendo não demonstrarem a criticidade

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necessária para perceber ideologias dominadoras, nem a capacidade de relacionar o

texto lido com outros já conhecidos, ou ainda fazer inferências que possibilitem a

compreensão.

Nas últimas décadas, a demanda pela leitura e pelo domínio da escrita em nossa

sociedade é cada vez maior. A leitura é requerida para que se possa ter acesso a

informações veiculadas das mais diversas maneiras, seja na escola, no trabalho ou

para estar mais bem inserido na sociedade. Decorrente desse pressuposto, percebe-se

a necessidade que se coloca para a escola: a de possibilitar ao aluno uma formação

que lhe permita compreender criticamente as realidades sociais e nela interagir. Para

isso o aluno precisa apropriar-se do conhecimento, de meios de produção e de

divulgação desse conhecimento, que estão estritamente ligados à linguagem,

principalmente no que se refere à leitura.

Kriegl (2002, p.03) questiona “Ler para quê?” Percebemos que a interação que

se estabelece entre o texto escrito e o leitor é diferente daquela estabelecida entre duas

pessoas em uma conversa. Na fala estão presentes, além das palavras, os gestos, as

expressões faciais, a entonação de voz, possíveis repetições e a possibilidade de se

perguntar quando não houver entendimento do que foi dito. Na leitura, como o leitor

está diante do texto escrito por um autor que não está presente para completar as

informações, o próprio leitor é quem fornecerá ao texto as informações enquanto lê.

Porém o texto também age sobre os esquemas de cognição do leitor. Este, quando lê,

ativa seu esquema cognitivo alterando ou confirmando, e assim, entendendo

mensagens diferentes porque as capacidades já internalizadas e o conhecimento de

mundo de cada um são diferentes. Essa autora responde a essa indagação afirmando

que “a leitura constitui-se em um dos fatores decisivos do estudo e é imprescindível em

qualquer tipo de investigação científica” (KRIEGL, 2002, P.03). Além de favorecer a

aprendizagem com a obtenção de informações já existentes, através da leitura e da

escrita é possível poupar o trabalho da pesquisa de campo ou experimental, pois ler

propicia a aquisição e ampliação de conhecimentos. “Ao mesmo tempo em que abre

horizontes para a mente, aumenta o vocabulário, permitindo melhor entendimento do

conteúdo das obras”. É com a leitura que se podem obter informações básicas ou

específicas dependendo do objetivo de leitura. (KRIEGl, 2002. p.4).

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Utilizar os contos de fadas como aliados no desenvolvimento do letramento do

aluno entra em acordo com a definição de Magda Soares de que “letrar é mais é

ensinar a ler e a escrever dentro de um contexto onde a leitura e a escrita tenham

sentido e façam parte da vida do aluno” (SOARES, 2003, p.3). Para tanto é

imprescindível que as atividades de leitura e escrita possam ser vistas como uma

alternativa prazerosa ao desenvolvimento do letramento, e os contos fantásticos, devido

ao fascínio que exercem nas crianças e até mesmo nos adultos, com suas histórias

povoadas com fadas, príncipes e princesas, bruxas, magos, madrastas, duendes e

animais que voam e falam; podem ser utilizados como elemento motivador da leitura e

reflexão sobre os problemas existenciais, que geralmente estão presentes na fase da

pré-adolescência.

Unir o ensino de estratégias de compreensão leitora com os contos de fadas,

buscando facilitar o entendimento dos alunos, inicialmente em leituras de fácil

compreensão e aumentando gradativamente o grau de dificuldade, pode contribuir para

auxiliá-los na construção de sua competência como leitores e escritores e na aquisição

de conhecimentos relevantes à prática social.

A IMPORTÂNCIA DA LEITURA COMO PRÁTICA SOCIAL

A leitura em sua prática social é vista como uma atividade inerente ao dia-a-dia.

Muitos leitores se questionados sobre a atividade da leitura afirmam que ela não faz

parte do seu cotidiano, mas esquecem que praticamente tudo o que fazem resulta em

atividades de leitura. “Ler é a resposta a um objetivo, a uma necessidade pessoal”

(MENOR ET AL. 2002 p.3). Se forem ao banco, as pessoas precisam entender as

mensagens dos caixas eletrônicos para serem independente. Precisam ler as placas no

trânsito para locomover-se com eficiência, ou estarão restritos ao espaço já conhecido.

Uma dona de casa, quando realizar uma receita não conhecida precisa compreender o

que está escrito para saber os ingredientes a serem usados e como proceder. Esses

são apenas exemplos ilustrativos da leitura como prática social, nem sempre

consciente.

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Para Foucambert (1994, p.133) o acesso à escrita é o único meio de alcance da

democracia e do poder individual, o qual pode ser definido como a capacidade de

compreender por que “as coisas são como são” e não pelo status social do indivíduo.

Desta forma, o acesso à escrita permite ao indivíduo, além de “ser social”, a descoberta

das relações por detrás das circunstâncias, situações ou coisas, estando, portanto,

ligadas à transformação da realidade. Mas isso só é possível através do acesso ao

processo de produção do saber e não apenas por meio da transmissão dos saberes.

Ele afirma que “a escrita é o instrumento do pensamento reflexivo e só o contato com

ela pode favorecer o desenvolvimento de um pensamento abstrato, complexo e de

natureza diferenciada daquele permitido pela linguagem oral” (FOUCAMBERT, Apud

FERREIRA & DIAS 2002, p.41). Somente a leitura, entendida como uma atividade

social e reflexiva pode propiciar uma relação criativa, crítica e libertadora com a escrita,

mostrando-se como um desafio para qualquer processo de democratização e mudança

coletiva. É a partir dessa perspectiva que esse autor (1994,1997), em sintonia com

Smith (1999) e Solé (1998) defende um ensino de leitura, no qual se aprende a ler

lendo, em contato com os mais variados tipos de textos sociais dos quais se utiliza no

dia a dia, e no qual o único pré-requisito para o aprendizado é a capacidade de

questionar sobre as coisas do mundo.

O ENSINO DA LEITURA E AS ESTRATÉGIAS DE COMPREENSÃO LEITORA

Menor et. al. (2002) constata que fora da escola a pratica da leitura não é feita

para se aprender a ler e também não se lê de uma única forma, decodificando as

palavras, ou respondendo a perguntas de verificação do entendimento e preenchendo

fichas exaustivas. Também não são solicitados desenhos para mostrar o que mais

gostou. O leitor não precisa mostrar suas habilidade lendo em voz alta, ou seja; a

prática constante da leitura não significa a repetição infindável dessas atividades

escolares. A pratica de leitura na escola devia pressupor o trabalho com a diversidade

de objetivos e modalidades de texto que caracterizassem as práticas de leitura

concretas. Os diferentes objetivos mostrariam diferentes textos e cada texto geraria um

tipo específico de leitura.

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Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa confirmam as

afirmações de Menor et. al. (2002), Solé (1998) e Foucambert (1994, 1997). Segundo

os PCNs, ler não se restringe na simples extração de informações da escrita,

decodificando-a letra por letra, palavra por palavra. A leitura é uma atividade que

implica necessariamente a compreensão através da qual os sentido vão sendo

construídos, possibilitando o entendimento e a comunicação do que está escrito. A

decodificação é o caminho utilizado para se chegar à leitura fluente, que envolve uma

série de estratégias como seleção, antecipação, inferências e verificação, sem as quais

não é possível rapidez e proficiência. Através da utilização desses procedimentos que

permitem perceber o que vai sendo lido e tomar as decisões diante de dificuldades de

compreensão, arriscar-se diante do desconhecido, buscar no texto a comprovação das

suposições feitas.

Portanto, saber ler é diferente de saber decodificar. O acesso ao código não

significa a compreensão do texto e nem o desenvolvimento da capacidade de ver além

do que está escrito, pois a leitura não se restringe ao aprendizado das

correspondências letra-som, mas o extrapola. Porém, Solé (1998, p.52) argumenta que

“ler não é decodificar, mas é necessário saber decodificar para ler”. Para essa autora, o

ensino do código deve fundamentar-se em contextos significativos para a criança e não

em situações de ensino do código isoladas e descontextualizadas. Afirma ser preciso

mostrar à criança o que precisa ser construído por ela no âmbito do aprendizado da

leitura. Defende, ainda, que o ensino da leitura ocorra em suas três etapas de

realização, ressaltando-se o ensino de estratégias de leitura para cada uma dessas

etapas: na pré-leitura ocorrem as predições iniciais sobre o texto e objetivos de leitura,

durante a leitura há o levantamento de questões e controle da compreensão e depois

ocorre a construção da idéia, o resumo e questões sobre o texto.

Sabe-se que ensinar estratégias de leitura é importante, no entanto pergunta-se:

como ensiná-las para a obtenção de resultados satisfatórios? Que estratégias já

ensinamos? Essas estratégias, segundo o texto de Solé (1998), devem permitir ao

aluno o planejamento da tarefa geral de leitura e da sua própria localização –

motivação, disponibilidade - diante dela, o que irá facilitar a comprovação, a revisão, o

controle do que se lê e a tomada de decisões adequadas em função dos objetivos

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perseguidos. A autora ressalta ainda que “quem lê deve ser capaz de interrogar-se

sobre sua própria compreensão, estabelecer relações entre o que lê e o que faz parte

do seu acervo pessoal, questionar seu conhecimento e modificá-lo, estabelecer

generalizações que permitam transferir o que foi aprendido para outros contextos

diferentes (...) o ensino de estratégias de compreensão contribuem para dotar os alunos

dos recursos necessários para a construção do aprender” (SOLÉ, 1998, p.72).

É importante lembrar e deixar claro para o aluno-leitor que cada texto requer uma

modalidade de leitura diferente, pois em alguns basta ler algumas partes, buscando a

informação desejada; outros precisam ser relidos e estudados e há aqueles que podem

ser lidos na íntegra, rapidamente. Em algumas leituras faz-se necessário controlar

atentamente a compreensão, voltando atrás, relendo partes, para certificar-se do

entendimento; em outros, é possível seguir adiante e entregar-se ao prazer que esse

ato proporciona. Há também leituras que requerem muito esforço intelectual e nem por

isso tiram o prazer de ler e outras em que o esforço é mínimo e que tornam o ato de ler

enfadonho.

Nell (2001, apud: FERREIRA E DIAS, 2002) ressalta que no âmbito afetivo do

ensino da leitura, a escola deveria traçar e alcançar dois objetivos principais quanto a

este ensino: aumentar o número de leitores capazes e ampliar o número de crianças e

adultos que apresentem motivação e afeto frente a esta atividade, a fim de torná-la

satisfatória e freqüente no decorrer da via do indivíduo, e não uma obrigação

acadêmica tediosa e passageira.

Solé (1998) também defende que o ensino do código deve-se fundamentar em

contextos significativos para a criança e não em situações isoladas e

descontextualizadas. Se o objetivo da escola for possibilitar que os alunos se tornem

bons leitores e buscar desenvolver neles, muito mais do que a capacidade de ler, o

gosto pela leitura e um compromisso com ela; essa instituição precisa mobilizá-los

internamente, pois aprender a ler (e também ler para aprender) requer esforço. As

crianças devem ver na leitura algo interessante e desafiador capaz de proporcionar

autonomia e independência, deixando-os confiantes de possuir as condições

necessárias para enfrentar o desafio de “aprender fazendo” (SOLÉ, 1998, p.32).

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A LEITURA E O ENCANTO DOS CONTOS DE FADAS

Os contos de fadas são contados às crianças desde tempos imemoriais.

Ninguém sabe quem foi o primeiro contador dessas histórias, mas sabe-se que foram

contadas durante muitos séculos e que continuam encantando as crianças, e, muitas

vezes encantam os adultos também. Segundo Mesquita (2008, p.01), “esses contos

tratam em linguagem simbólica, de problemas humanos universais e da necessidade de

enfrentar a vida por si só. Nesse sentido, ajudam a criança a ultrapassar as suas

dificuldades e a crescer mais serenamente, dando um sentido à vida”.

Para Gregorin (2008, p. 01), os contos de fadas sempre foram vistos como

narrativas de amor, nas quais tudo acontece de maneira a garantir um final feliz.

“Príncipes e princesas cuja única preocupação é levar adiante uma linda história de

amor e sempre estão associados com a chamada literatura infantil, tipo de texto em que

os elementos moralizantes são os elementos mais importantes”. No entanto pensar que

a literatura infantil serve apenas para fins didático-pedagógicos, segundo esse autor, é

completamente errado. Gregorin afirma que para entender a literatura infantil é

importante que se entenda o processo por meio do qual os textos nasceram na

sociedade, pois no século XVIII havia uma separação bastante nítida do público infantil.

As crianças de classes sociais altas liam os grandes clássicos da literatura, orientadas

pelos pais e preceptores, enquanto as crianças de classes populares não tinham

acesso à escrita e à leitura e por isso tomavam contato com a literatura oral, que era

mantida pela tradição do povo.

Oliveira (2001) sugere que os primeiros contos de fadas tiveram origem céltica

(séc. II a.C.), mas que não se constituíam como simples forma de entretenimento

infantil, uma vez que tratavam da essência da condição humana, e funcionavam como

“espelhos que ocultavam e mostravam profundamente os problemas existenciais,

resolvidos por intervenção do elemento mágico”.

Os contos de fadas, apesar de sua existência datar do séc. XVII, só tornaram-se

conhecidos quando os Irmãos Grimm deram a uma coletânea de narrativas publicadas

em 1812 o título “Contos de fadas para crianças e adultos”. Essa coletânea reuniu toda

a diversidade, num conceito unificado e passou a ser à base de todas as coletâneas

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ulteriores do século XIX. Os Irmãos Grimm são, pois, os responsáveis pelas pesquisas

sobre o conto que até hoje continuam sendo realizadas. No entanto, para os Irmãos

Grimm, as verdadeiras coletâneas começaram no fim do século XVII, com Charles

Perrault, que apresentou os seus contos como se os mesmos tivessem sidos contados

por uma velha ama ao seu filho. “Contos da mamãe Gansa” é uma coletânea com oito

contos, dentre os quais seis são contos de fadas, que têm a intenção de recriar o

maravilhoso popular.

A coleção dos contos de Fadas dos Irmãos Grimm tem atravessado os séculos

com sucesso, Segundo Oliveira (2001, p.03) “Sob a influência do signo romântico,

encontram este mundo mágico em suas pesquisas filológicas, onde a tradição oral

preservara essa fantasia”. Em consonância com os ideais do Romantismo, nessa

coletânea na qual se destaca o conto “Cinderela”, foram retirados trechos que julgavam

menos recomendáveis por sua violência.

Por que esses contos se chamam contos de fadas? Quem são esses seres que

permeiam e nomeiam essas histórias? Sabe-se que a palavra “fada” provém do latim

“fatum”, que significa destino, fatalidade, oráculo, e estas, segundo Chevalier (2000,

apud OLIVEIRA, 2001, p.03), “são seres fantásticos de grande beleza, que se

apresentam, na maioria das vezes, sob a forma feminina”, são dotadas de virtudes e

poderes sobrenaturais. Podem, também, interferir na vida do herói para auxiliá-lo em

situações-limite, quando a solução material não seria possível. Esses seres fantásticos

representam a capacidade que o homem possui de construir na imaginação, os projetos

que não pode realizar. As fadas têm origem pagã, e estão intimamente ligadas à

natureza, para certos povos era considerada a mensageira que viajava sob a forma de

pássaro, como a ave Afrodite. No conto “A Cinderela”, de Grimm, essa relação fada-

pássaro manifesta-se como elemento mágico que faz a ponte entre o humano e o

divino, entre o real e o sobrenatural. Oliveira (2001) ressalta que com a cristianização

essa associação foi desaparecendo e a imagem da fada passou a ser associada à da

mulher.

O conto fantástico é uma forma de estabelecer contato com o mundo da criança,

pois oferece elementos que possibilitam despertar e desenvolver a sua imaginação a

partir das experiências da própria criança, já que os seus conteúdos correspondem às

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contradições e aos conflitos com os quais todos os indivíduos são confrontados. Dessa

maneira, o conto, além de divertir e desenvolver a capacidade criativa dirige à criança

uma linguagem simbólica, possibilita o avanço na compreensão da leitura, melhora o

uso da linguagem e amplia seu vocabulário.

AÇÕES DE DESENVOLVIMENTO DA LEITURA E DA ESCRITA

Apesar de, nestas últimas décadas, ser oportunizado a todos o acesso à escola,

estima-se que cerca de 16 milhões de brasileiros com mais de 15 anos não sabem ler e

escrever. Por vários motivos, muitos alunos não têm contato sistemático com o ato de

ler e com adultos leitores. A escola torna-se o único veículo de interação desses alunos

com textos, cabendo a ela oferecer diversidade de leituras, com textos de gêneros

diversos, buscando ampliar o potencial do aluno em relação à leitura. Segundo Solé

(1998, p.22) a leitura é um processo de interação entre leitor e texto e envolve “um leitor

ativo, que processa e examina o texto” ou seja, envolve um leitor que seleciona, de

acordo com suas necessidades e interesses, o que ler entre os vários gêneros

discursivos que circulam socialmente.

Na Avaliação do SAEB (Sistema de Avaliação Educacional Brasileira) de 2005, a

escola onde a pesquisa foi realizada, situada no município de Realeza, Sudoeste do

Paraná, obteve média 250,60 em leitura nessa avaliação. A média no estado foi de

231,30, e no país, 226,45 nas escolas estaduais. As médias de proficiência variam em

uma escala de 0 a 500 apontam os graus de desenvolvimento de habilidades de leitura,

competências e aquisição de conhecimentos pelos estudantes ao longo dos anos de

estudo.

Através destes dados, pode-se perceber que, mesmo estando acima da média

estadual e nacional, os alunos da escola em questão não apresentam bons resultados

em relação à leitura e, conseqüentemente também possuem problemas relacionados à

escrita. Na prática diária, nas aulas de Língua Portuguesa percebe-se que a maioria

deles sabe apenas decodificar; alguns lêem em voz alta, com certa fluência, mas não

compreendem bem o que leem, não voltam a ler mesmo quando não entendem o texto,

a não ser que sejam obrigados pelo professor, e isso torna a aula de leitura cansativa e

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ineficiente. Como não entendem o que lêem, acabam escrevendo de forma deficitária.

Há muitas reclamações de docentes das diversas áreas do conhecimento sobre a falta

de compreensão leitora e defasagens na escrita desses alunos.

Dessa maneira, percebe-se a necessidade que se coloca para a escola: a de

possibilitar ao aluno uma formação que lhe permita compreender criticamente as

realidades sociais e nela interagir. Para isso o aluno precisa apropriar-se do

conhecimento, de meios de produção e de divulgação do saber, que estão estritamente

ligados à linguagem, principalmente, no que se refere à leitura e a escrita.

Por isso a aplicação deste projeto consistiu em um estudo das estratégias de

compreensão leitora e suas possíveis aplicações no ensino de leitura de contos de

fadas, O objetivo era motivar a leitura e desenvolver estratégias que contribuam para a

compreensão, juntamente com a produção escrita, uma vez que, mesmo sendo

independentes, a leitura e a escrita estão interligadas, e o trabalho integrado dessas

habilidades possibilita obter resultados mais expressivos.

As atividades iniciaram com a investigação do comportamento dos alunos diante

da leitura e da escrita no início da aplicação do projeto, bem como durante todo o

processo. Para avaliar o nível de leitura dos mesmos foram propostas atividades de

compreensão oral, através de questionamentos e da produção textual escrita. Essas

atividades tiveram caráter indagatório e serviram de base para a seleção e aplicação de

estratégias de compreensão leitora, bem como da seleção dos conteúdos que deviam

ser retomados. E as ações implementadas nessa escola visaram o desenvolvimento da

leitura e da produção escrita, através do estudo da estrutura do gênero discursivo

contos de fadas e da aplicação de estratégias de compreensão leitora.

Os textos selecionados, para a aplicação do projeto foram três versões do conto

de fada: “Chapeuzinho Vermelho. Com as versões desse conto de Perrault e dos

Irmãos Grimm foram analisadas as semelhanças e diferenças entre as duas e a

linguagem simbólica presente nos mesmos considerando a idade e a série dos alunos.

Essas ações tiveram como ponto de partida o conhecimento que os alunos possuíam, e

através de debate e análise, buscou-se a ampliação dos horizontes de conhecimento

sobre as relações existentes entre os objetos, personagens, a história, e os fatos da

vida de uma criança em desenvolvimento. Nas versões que há a desconstrução

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desses contos, e que eram desconhecidas para a maioria dos alunos, foram aplicadas

estratégias de leitura como a definição dos objetivos de leitura, ativação do

conhecimento prévio, estabelecimento de hipóteses sobre o texto e realização de

inferências.

OS ALUNOS CONSIDERADOS NA PESQUISA E A LEITURA

Selecionamos os alunos, para a fase de intervenção na escola, alunos de três

turmas de sextas séries e duas turmas de quintas séries do turno matutino, de uma

faixa etária que varia entre 10 e 15 anos. O perfil das turmas de sextas séries não é

diferente do que encontramos na maioria das escolas: uma agitada e com muitos

problemas relacionados à aprendizagem e à disciplina, com alunos que realizam as

atividades somente se estas forem impostas e que não demonstram nenhum interesse

em aprender. Outra mais homogênea em relação a faixa etária, agitada, mas com

alunos que procuram realizar as atividades propostas com interesse. E também uma

turma que apresenta a maior disparidade tanto em relação à faixa etária quanto em

relação à aprendizagem, já que parte dos alunos foi reprovado anteriormente

demonstrando grande dificuldade em realizar as atividades propostas e a outra parte da

turma realiza as atividades propostas com interesse, participa e não apresenta graves

problemas na compreensão leitora.

Nas turmas de quintas séries, enquanto uma é calma, com poucos alunos

indisciplinados, a outra é extremamente agitada. Nas duas turmas há problemas

relacionados à aprendizagem. Enquanto uma pequena parcela dos alunos possui um

excelente vocabulário e facilidade tanto em ler como em se comunicar através da

escrita, muitos não conseguem nem decodificar, por isso não lêem e não escrevem.

O perfil destas turmas comprova o que muitas pesquisas já têm mostrado: que

muitos alunos avançam para a série seguinte sem os requisitos básicos para

acompanhar o desenvolvimento dos conteúdos inerentes àquela série. A reprovação

que continua sendo considerada a vilã da educação porque traumatiza a criança e

desenvolve a baixa estima da mesma, pode muitas vezes ser um mal necessário, uma

vez que integrar o aluno em uma turma com nível de conhecimento acadêmico muito

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superior ao que ele possui, não o fará se sentir melhor, nem contribuirá para que

recupere conteúdos e nem que recupere suas dificuldades. Isso muitas vezes pode

gerar a indisciplina. Dília Maria Andrade Glória (2003, p.01) ao avaliar os benefícios da

retenção e da progressão dos alunos constata que:

a prática da não-retenção escolar não apenas tem sido incapaz de reduzir as

desigualdades de oportunidades educacionais, como chega mesmo a ampliá-las, na

medida em que propicia aos alunos o prosseguimento do curso escolar sem a aquisição

de conhecimentos, competências e habilidades considerados básicos à formação

educacional escolar e à cidadania.( GLÓRIA, 2003 p.01)

Esta autora constatou em sua pesquisa que os próprios alunos se sentem

lesados quando são promovidos sem condições para tanto. E que “a não-retenção

escolar conduz a uma forma de exclusão ainda mais perversa que a anterior, por

permitir a permanência na escola, mas sem propiciar uma aprendizagem efetiva”. É

óbvio que a reprovação deve ser sempre a última opção, somente quando todos os

meios já tiverem sido esgotados: aulas de reforço, mudanças de metodologias e todos

os mecanismos possíveis para resolver o problema de aprendizagem do aluno. Gomes

(2005, p. 13) opina sobre o assunto afirmando que: “se, por um lado, a reprovação,

segundo a literatura, traz mais malefícios que benefícios, ela pode render resultados

positivos quando os alunos retidos recebem atenção especial”. Uma avaliação justa,

contínua, observando o processo ensino-aprendizagem como um todo e não apenas o

resultado de trabalhos avaliativos e testes se fazem necessário para verificar a

possibilidade do aluno ser ou não retido.

Sobre a definição de “leitura” dada pelos discentes no questionário, surgiram

várias respostas ligadas à aquisição de conhecimento e aprendizagem: aprender coisas

novas; conhecer mundos diferentes; mergulhar nas letras do caminho; sabedoria; faz

bem para a mente; desenvolve a inteligência, o entendimento, a cultura; e aumenta a

informação do leitor e é um meio de chegar à universidade. Outros vêem a leitura como

algo especial, mais poético: leitura é voar no mundo da imaginação; algo mágico; viajar

no livro; uma caixa de surpresas; ler é ida para outro mundo; é cultura fabulosa;

esporte; viagem de fantasia; ao ler os problemas acabam; é paz, sossego e quietude;

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ler é uma forma divertida de conhecer o mundo; é aventura e diversão. Também

surgiram aquelas que se referem à decodificação e ao vocabulário: ler é juntar ou

aprender palavras novas e melhorar nas disciplinas; é ver se está errando as palavras,

é aprender o alfabeto. Houve também aqueles para quem a leitura não é nada ou é

coisa chata. Para os docentes, as respostas variaram entre conhecimento, cultura e

lazer. A leitura é vista como excelência do aprender, pois para crescer em

conhecimento é preciso ter o hábito de ler. O aluno que lê, interpreta, expressa e

escreve melhor. Segundo os professores, é importante que se leia com a memória e

imaginação e não somente com os olhos. Uma das respostas ficou mais no nível da

decodificação: “a leitura como compreensão da grafia: entender as palavras e o texto”.

Mas o que é leitura? Goulemont (1996, p.107) responde a essa pergunta ao

afirmar que “Ler é dar um sentido de conjunto, uma globalização e uma articulação aos

sentidos produzidos pelas seqüências. Não é encontrar o sentido desejado pelo autor

[...] Ler é, portanto, constituir e não reconstruir sentido”. Nos Parâmetros Curriculares

Nacionais “A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de

compreensão e interpretação do texto” (PCN, 1998, p. 69). Para Kriegl (2002, p.3), “A

leitura é um dos meios mais importantes na escola para a consecução de novas

aprendizagens”. Por isso constata a necessidade de que se continue reservando um

tempo para a leitura na escola, pois à medida que se avança na escolaridade, a

exigência de uma leitura independente é maior. A partir do ensino fundamental pode-se

afirmar que o ato da leitura deve objetivar a melhoria das habilidades, a familiarização

progressiva com o texto, a aquisição de hábito de leitura e a sua utilização para ter

acesso a novos conteúdos de aprendizagem nas diversas áreas de conhecimento.

Comumente se afirma que as crianças e jovens não gostam de ler e que a

televisão é a grande vilã que afasta as crianças dos livros. Kriegl (2002) discute esse

tema. Para ela “ninguém se torna leitor apenas por um ato de obediência e ninguém

nasce gostando de leitura (...). Dessas coisas aprende-se a gostar, e essa

aprendizagem é cultural”. Pelo resultado da pesquisa percebe-se que essa afirmação

vem de encontro às respostas dos alunos, pois a maioria afirmou gostar de ler (76%).

Outros 12% disseram gostar pouco, enquanto 17% afirmaram que depende do que vão

ler. Aqueles que afirmaram não gostar totalizaram 6%. Os gêneros citados como

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preferidos são contos de fadas, gibis, livros didáticos, bula de remédio e poesias. Kriegl

ainda justifica que as pessoas só desenvolverão o gosto pela leitura se tiverem desde

cedo experiências gratificantes com livros, ou mesmo com a Internet, para poderem

buscar textos significativos para elas. Quanto à televisão ser o obstáculo à leitura,

pesquisas recentes já comprovaram que esse meio de comunicação pode atender a

certas expectativas das pessoas, mas não ocupa o lugar do livro e, muitas vezes até

estimula a leitura chamando a atenção para determinados títulos. É necessário dar

acesso a livros interessantes e possibilitar experiências positivas de leitura, pois um

leitor forma-se aos poucos, com o passar do tempo (KRIEGL, 2002, p.10).

Na escola, a freqüência da leitura dos alunos é maior do que em casa, já que

afirmaram que leem com regularidade (68%), não leem nem na escola (11%) e leem às

vezes (18%), sendo que 3% não se manifestaram. Os materiais mais lidos na escola,

segundo os alunos de todas as turmas são os livros didáticos. Quanto ao entendimento

dos textos que leem, 40% afirmaram entender os textos com facilidade, 28% não

entendem, 39% às vezes entendem, e 6% não responderam. Sobre perceberem

quando não estão entendendo o que estão lendo, 70% disseram perceber que não

entendem durante a leitura, 3% não percebem, 3% só percebem às vezes, 15% não se

manifestaram e 9% deram respostas sem sentido. Quando percebem que não

compreenderam, a maioria afirmou que volta a ler o texto (75%), uma minoria, (5%)

revê o vocabulário e 10% afirmaram que pedem ajuda a alguém. Os outros 10%

afirmaram que param de ler, ficam quietos e dizem não fazer nada para entender. Um

aluno afirmou que se ele não consegue ler é porque o texto está errado, e outros

disseram ficar com muita raiva. O livro didático ainda é tido como material mais lido nas

escolas e as estratégias de leitura se resumem à retomada do texto. Cabe lembrar as

colocações de Sole (1998) sobre as estratégias de leitura que, muitas vezes, passam

despercebidas pela consciência, ocorrem simultaneamente e podem ser mantidas,

modificadas ou desenvolvidas durante a apropriação do conteúdo. Ao ler um texto

qualquer, a mente da pessoa seleciona os aspectos relevantes, isto é, presta-se a

atenção aos aspectos que interessam sem os quais seria impossível compreender o

texto. Levantam-se hipóteses antecipando informações com base nas pistas que são

percebidas durante a leitura. Além disso, utilizam-se as inferências complementando as

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idéias do texto a partir de seus conhecimentos prévios; faz-se a autorregulação da

leitura avaliando as antecipações e as inferências, confirmando ou refutando as

mesmas e ainda a autocorreção quando se repensa a hipótese anteriormente levantada

e se constrói outras, retomando o texto e corrigindo-o. Kriegl afirma que “há uma

relação recíproca entre usar estratégia de leitura e interpretar o texto. Emprega-se uma

estratégia porque se está entendendo o texto; entende-se o texto porque se está

aplicando a estratégia”( KRIEGL, 2002,p.5).

Sobre os objetivos de leitura citados pelos alunos, lembrando que era

possível optar por mais de uma opção, 88% afirmaram que lêem para adquirir

conhecimento, 63% por diversão e lazer, 41% desejam ficar bem informados e 3% não

leem. Alguns afirmaram que o motivo de não lerem é não terem realmente paciência

para buscar o entendimento do texto e também porque se atrapalham ao ler. Vale

lembrar que para despertar o interesse de uma determinada leitura, a primeira condição

refere-se aos objetivos da leitura, e um fator que contribui para o aumento do interesse

é o nível de dificuldade oferecido ao leitor. No entanto, para Menor et. al. (2002) o ato

de aprender a ler e a escrever requer pensar sobre o que a escrita representa e como

ela representa graficamente a linguagem. Afinal, a leitura como prática social é sempre

um meio, nunca um fim. Ler é a resposta a um objetivo, a uma necessidade pessoal.

Segundo essa autora;

A sociedade urgente exige um cidadão leitor e não “ledor”. Esse tem que compreender o

que ler, pois terá que ler também o que não está implícito no texto, ou seja, tem que fazer

inferências e checar se essas se confirmam ou não de acordo com as exigências do

gênero (MENOR et.al. 2002, p.5).

De acordo com o resultado da pesquisa, a maioria dos alunos faz uso da leitura.

Não da leitura indicada pela escola e aconselhada pelos eruditos, mas a leitura que

lhes cabe no momento de lazer ou de buscar conhecimento para solucionar um

problema. Ou seja, eles leem quando têm um objetivo concreto para fazê-lo. A

quantidade de alunos que se declararam leitores é preocupante, porque todos deveriam

ter o acesso ao ensino da leitura e como já foi afirmado só se aprende a ler, lendo.

Após essa pesquisa torna-se possível traçar metas e objetivos concretos que resultem

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em melhorias nas habilidades de compreensão leitora e também no aumento dos

leitores conscientes e críticos, que possam fazer uso da leitura nos diferentes

momentos e em diferentes situações sem que isso seja considerado um tormento.

Para dar continuidade ao trabalho com aplicação de estratégias de leitura e

contos de fadas, visando desenvolver a compreensão leitora e a escrita, foi aplicado um

questionamento sobre o gênero contos de fadas, introduzindo assim o tema, bem como

verificando o conhecimento prévio dos alunos sobre o estudo a ser desenvolvido. As

questões envolveram a definição, estrutura e características do gênero em estudo, os

contos de fadas mais conhecidos, a versão do conto “Chapeuzinho Vermelho” que os

alunos conheciam e os símbolos que aparecem nessas versões.

Os alunos definiram contos como histórias que começam com “era uma vez”, alguém

fica feliz no final, mas no meio alguém faz mal para outra pessoa e terminam com “e

foram felizes para sempre”. Essas histórias são contadas para crianças e faz viajar pela

imaginação. Os fatos narrados são impossíveis de ocorrer na realidade, há o

predomínio da ficção. Nessas histórias as personagens são: vovozinha, meninas,

ursinhos, ogros, dragões, animais falantes, príncipes que salvam princesas, ou

mocinhas pobres e depois casam e vivem felizes para sempre. Segundo eles, essas

histórias têm o objetivo de divertir, emocionar e amedrontar as crianças e já eram

contadas a muitos anos passados, ou seja, passadas de geração em geração. Esses

contos encantam crianças e adultos, segundo um aluno que afirmou adorar ler contos

de fadas e de não gostar de ler outros textos. O preconceito também se revelou nas

respostas dos alunos, já que alguns afirmaram que os contos de fadas são “coisas de

meninas”.

Sobre a estrutura do gênero, eles responderam que para um texto ser

considerado um conto de fadas é preciso ter personagens como: fadas, príncipes,

princesas, bruxas, meninas, mendigos e outros seres fantásticos. Precisam ser tristes e

emocionantes e falar sobre acontecimentos passados, sobre coisas que não existem

mais ou que são inacreditáveis. Disseram também que precisa ter início meio e fim,

sem esquecer da pontuação e da linguagem compreensiva. As sextas séries

acrescentaram aos personagens os animais falantes e falaram sobre os lugares, ou

seja, que os fatos ocorrem sempre em florestas e castelos. Quanto a esses

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personagens, os alunos disseram que eles sempre sobrevivem a coisas incríveis, o

herói viaja, vive aventuras, romances, enfrenta muitos obstáculos e salva alguém.

Os contos mais conhecidos tanto nas quintas, quanto nas sextas séries foram:

Chapeuzinho Vermelho, Cinderela, A Bela e a Fera. A Bela Adormecida, Branca de

Neve e os sete anões, Três Porquinhos, Gato de Botas, Rapunzel A Pequena Sereia,

Pinóquio, O Patinho Feio, João e o pé de feijão, Peter Pan, A princesa e o sapo e O

Pequeno Polegar. Também citaram os nomes de algumas fábulas o que expressa que

ainda confundem esses gêneros.

O conto “Chapeuzinho Vermelho”, objeto de estudo, reflexão e reconstrução

neste trabalho, é um dos mais conhecidos entre as crianças. Segundo Coelho (1982),

ele é um conto maravilhoso, no qual reina o elemento mágico, sobrenatural e integrado

naturalmente nas situações apresentadas.

Ao observar o resumo da história de Chapeuzinho Vermelho que foi solicitado

objetivando ver qual a versão que conheciam e os maiores problemas enfrentados por

eles em relação à escrita, constatamos que há um número grande de versões, mas a

maioria acaba com a menina e a avó salvas e festejando com o caçador. Os problemas

observados em relação à escrita, mais frequentes nas quintas séries, foram: a falta de

uso de maiúsculas, a repetição excessiva de termos (pronomes, e expressões como

então, e aí, era uma vez), a pontuação inexistente (não há pontos no final dos períodos,

nem dos parágrafos, aliás, muitos fizeram o texto num único parágrafo e sem nenhum

tipo de ponto) e a ausência de discurso direto. Em relação à grafia, há alunos que não

distinguem m e n, lh e nh, l do u. Há casos de troca de letras como em lopo, dracou,

secou e favendo; que deveriam ser: lobo, trancou, chegou, fazendo. Outros modificam

as palavras, esquecendo letras: menia (menina),timou (teimou),briga (barriga). Também

apareceram problemas gravíssimos de escrita como por exemplo: “o crapuizino lefol a

seta, deto da folresta pasiu loupo surali... efoicoreno ilibeto arrario”. Nas sextas séries

observou-se que a pontuação ainda é usada inadequadamente, ou está ausente. Os

elementos usados na escrita para indicar o discurso direto também não são usados. Só

usam maiúscula no início de parágrafo, quando os separam, mas não há maiúsculas

em substantivos próprios. Também confundem m e n, nh e lh. Alguns resumos

apresentavam pouca clareza. Quanto à grafia, há problemas relacionados com a

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ilegibilidade das letras em muitos alunos, o que poderia ser solucionado trabalhando-se

com eles o traçado das letras que estão inadequadas. Houve expressões confusas

devido à grafia errada como: prepia dnero pos veiadores ( precisa de dinheiro para os

vereadores); “cando a clafezinha cenelha Era jeguena a nae nado... ecorto o lodo” (

Quando a Chapeuzinho Vermelho era pequena a mãe mandou... e encontrou o lobo.)

ou palavras como segou, chorte, coreno, cocorro, que são respectivamente: chegou,

sorte, correndo e socorro.

Para as sextas séries foram incluídas duas perguntas referentes a símbolos.

Sobre o que a cor vermelha poderia representar, a maioria disse que representava o

amor da vovó pela menina, mas alguns disseram que representava sangue, sorte, que

é uma cor chamativa e por isso atrai os olhares, ou também que a cor é só enfeite. Para

outros, essa cor atrai energia e pode significar: coragem, bravura, pureza, ou vingança.

Ao serem questionados sobre quem seriam os lobos de nossa sociedade, eles

responderam que poderiam ser: bandidos, viciados em drogas, ladrões ou pessoas de

má índole que prejudicam as demais, os políticos, o presidente do país e os, que

exploram a sociedade. Alguns estabeleceram relação entre o lobo e os maus amigos,

que invejam, enganam ou buscam passar por cima do outro por ambição ou maldade.

Segundo Marilena Chauí (1984), o fogo é um símbolo e uma das metáforas mais

usados em nossa cultura para referir-se ao sexo. No conto “Chapeuzinho Vermelho”

também conhecido por "Chapeuzinho cor de fogo", o lobo é mau, prepara-se para

comer a menina ingênua que, muito novinha, o confunde com a vovó, precisando ser

salva pelo caçador que, com um fuzil, mata o animal agressor e a reconduz à casa da

mamãe. Nesse conto esta autora (1984, p.33) explica que “há duas figuras masculinas

antagônicas: o sedutor animalesco e perverso, que usa a boca (tanto para seduzir

como para comer) e o salvador humano e bom, que usa o fuzil (tanto para caçar quanto

para salvar)”. A autora comenta também as três figuras femininas: a mãe que previne a

filha dos perigos da floresta; a vovó que nada pode fazer, e a menina que se

surpreende com o tamanho dos órgãos do lobo. As personagens da mãe muito ausente

e da avó, fraca e doente não conseguem proteger a menina imprudente e ingênua.

Chauí complementa falando sobre a sexualidade do lobo, que aparece não só como

animalesca e destrutiva, mas também como símbolo de sedução e poder.

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Ainda para Chauí (1984) a nossa sociedade dessacralizou a realidade e

eliminou quase todos os ritos, mas os contos continuam funcionando como se fossem

um rito de passagem, pois não só auxiliam a criança a lidar com o presente, mas ainda

a preparam para o que está por vir, a futura separação de seu mundo familiar e a

entrada no universo dos adultos. Em relação à repressão sexual, os contos são

interessantes porque são ambíguos. Chauí argumenta que:

Por um lado, (os contos) possuem um aspecto lúdico e liberador ao deixarem vir á tona desejos, fantasias, manifestações da sexualidade infantil, oferecendo à criança recursos para lidar com eles no imaginário; por outro lado, possuem um aspecto pedagógico que reforça os padrões da repressão sexual vigente, uma vez que orientam a criança para desejos apresentados como permitidos ou lícitos, narram as punições a que estão sujeitos os transgressores e prescrevem o momento em que a sexualidade genital deve ser aceita, qual sua forma correta ou normal. Reforçam, dessa maneira, inúmeros estereótipos da feminilidade e da masculinidade, ainda que, se tomarmos os contos em conjunto, os embaralhem bastante. (CHAUÍ, 1984,p.34)

No estudo da versão de Charles Perrault, o que mais chamou a atenção dos

alunos foi o final: a menina é comida pelo lobo e não há nenhum salvador. Acharam o

texto violento, mas gostaram ao compararem as versões dessa história de Charles

Perrault e a dos Irmãos Grimm. Algumas respostas apresentaram um bom nível de

argumentação, com respostas embasadas no texto e condizentes com as propostas da

professora, outros alunos responderam satisfatoriamente as questões, mas com

argumentos fracos e nem sempre fundamentados e uma parcela de alunos escreveram

respostas incompletas ou mesmo alheias ao texto e às questões.

Sobre a diferença na descrição das personagens, quase todos os alunos

souberam identificar a caracterização de Grimm, mas não conseguiram comparar as

duas versões. Na caracterização do ambiente, boa parte dos alunos observou somente

a descrição da floresta: escura, cerrada onde se ouvia o chilrear dos pássaros e o

barulho dos animaizinhos, mas poucos perceberam alguma diferença entre a fantasia e

a realidade. Alguns alunos descreveram florestas diferentes daquelas dos textos

analisados, ou deram respostas que não condiziam com a pergunta. Na versão dos

irmãos Grimm a floresta é descrita com mais detalhes e na versão de Perrault apenas

menciona o bosque. O único diferencial entre a floresta fantástica e a real é a presença

do lobo, que fala e seduz menininhas.

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Sobre a observação do uso do discurso direto, na conversa entre a menina e o

lobo indagamos sobre as intenções do lobo. Explicou-se aos alunos que a pergunta se

referia ao fato dele ter sido tão amável e o porquê dele agir assim. Quase todos

somente citaram as falas e prendem-se somente aos elementos explícitos no texto e

não demonstraram entender o objetivo das delicadezas do lobo.

Quanto aos planos do lobo e a eficiência dele em enganar a menina e a avó,

houve confusão entre as versões trabalhadas e outras de conhecimento dos alunos. A

maioria observou as versões e respondeu de acordo com elas, mas houve quem

afirmou que o lobo utilizou as roupas da avó para enganar a menina, mas em nenhuma

das versões lidas na aula isso aparece. Nas duas versões o lobo só usa a touca da avó,

deita-se na cama e se cobre para que a menina não o veja direito. Neste caso o

conhecimento prévio do aluno fez com que ele não atentasse para a versão que estava

sendo trabalhada.

Em relação às descrições, se elas deixaram os textos monótonos ou não, todos

responderam que apesar de aumentarem o tamanho do texto, possibilitaram entender

melhor a história e conhecer mais profundamente as personagens. Quanto ao uso dos

diálogos, os alunos afirmaram que tornam o texto mais dinâmico, mais emocionante e

mais vivo. Observa-se na maioria dos estudantes considerados a falta de

argumentação, pois foi solicitado que justificassem a resposta e eles simplesmente

responderam que era legal/ era chato, mas não disseram por que isso ocorria. É

preciso, pois trabalhar a argumentação e a fundamentação desta com análise de

elementos do texto.

Quanto ao entendimento da moral da versão escrita por Perrault, a maioria disse

que se refere a não falar com estranhos, mas não revelou o que isso poderia acarretar.

Talvez a compreensão dessa moral ainda não seja possível por esses alunos devido à

falta de malícia, ou porque não conseguem imaginar que um conto de fadas possa

tratar de assuntos tão sérios quanto o assédio sexual, a pedofilia e o estupro.

Na versão contada pelos Irmãos Grimm, a protagonista Chapeuzinho Vermelho

ao receber o auxílio do caçador sobrevive e o lobo tem um fim trágico. O texto termina

com Chapeuzinho afirmando que não desobedeceria mais a mãe e não conversaria

mais com estranhos. Os alunos perceberam o fim trágico que o lobo teve, mas não

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observaram a moral presente ali. Poucos perceberam que o antagonista foi punido com

a morte e que a moral dizia para as crianças que deviam obedecer aos pais e não falar

com estranhos.

Chauí em um estudo intitulado “Três versões de Chapeuzinho Vermelho:

reflexões sobre a literatura oral e infantil” (1984) expõe a origem desse conto. Segundo

a autora, o conto Le Petit Chaperon Rouge foi colhido por Perrault da literatura oral e

depois adequado e adaptado ao gosto da burguesia. Na maioria dos contos infantis o

vilão é punido, resolvendo assim todos os conflitos infantis, mas não é isso que ocorre

na versão de Perrault. Essa história começa com uma exaltação à menina: “e era a

coisa mais linda que se podia imaginar.” e vai se desenvolvendo tal qual a conhecemos:

a menina atravessa a floresta e encontra o lobo que lhe pergunta sobre seu destino e

ela responde que vai à casa da avó. O lobo sai correndo e ela fica a colher flores,

distraída. Ao chegar à casa da avó, a menina entra e o lobo, que tinha chegado antes e

engolido a avó, pede a ela para se deitar com ele,. Essa versão acaba com o lobo

afirmando que os seus dentes servem para comer a menina, e assim o faz. O desfecho

nesta versão é trágico, menina e avó são mortas. Para Chauí (1984 p. 33) isso

acontece porque “Em Perrault, os princípios educativos são os definidos pela Contra-

Reforma: a valorização do pudor e a cristianização”. Usa-se nesse conto o caráter de

advertência, fazendo com que a personagem que desobedeceu as regras estabelecidas

seja punida. Já os Irmãos Grimm, no final da história, não castigam a Chapeuzinho

Vermelho por ter violado as regras. Apesar da narrativa se desenvolver de forma

semelhante, no desfecho aparece um caçador que abre a barriga do lobo, de onde sai a

menina e a avó. Depois, eles enchem a barriga do animal com pedras e assim, ao

acordar, ele morre. O conto termina com uma frase da menina, dizendo que aprendeu

uma lição: “Nunca mais vou sair do caminho e entrar no bosque quando minha mãe

disser para eu não fazer isso” Grimm com esse desfecho amenizou o final da história,

utilizando-se de uma moral religiosa uma vez que há o pecado (desobediência), o

castigo, o arrependimento e a promessa de se redimir.

Nesta etapa do trabalho observou-se um rendimento maior que na etapa

anterior. Muitas respostas tiveram argumentos fundamentados, mesmo que de forma

simples e pouco conclusiva. Percebemos uma mudança de atitude em relação ao texto,

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pois levaram menos tempo para responder às questões, não houve problemas de

indisciplina durante as aulas em que estiveram envolvidos com este trabalho e a

maioria da turma se empenhou em resolver as questões da melhor forma possível,

questionando a professora quando não entendiam ou perguntando sobre a ortografia de

palavras que desejavam utilizar, buscando adequar as respostas ao texto.

A implementação prosseguiu com uma atividade com o filme “Irmãos Grimm”. A

escolha deste filme se deve a narrativa envolver humor, suspense e fantasia, coisas

que atraem a faixa etária envolvida neste projeto. Os personagens centrais do filme

eram os irmãos Jacob e Wilhem Grimm. A narrativa inicia fazendo relação com o conto

“João e o pé de feijão”, Jake ainda criança se deixa enganar e entrega a vaca, único

bem da família, em troca de feijões mágicos. Vinte anos após esse episódio os irmãos

são encontrados viajando pela Alemanha, então invadida pela França, criando lendas e

enganando as pessoas. Ao serem descobertos, eles são aprisionados e condenados à

morte. No entanto o general francês propõe um acordo, se salvariam se resolvessem o

problema que ocorria na floresta de Marbadem, salvando as crianças desaparecidas e

prendendo os criminosos. Os irmãos se deparam com um mistério verdadeiro. Eles têm

que enfrentar uma rainha bruxa, que presa em uma torre há mais de 500 anos rapta as

meninas em busca de beleza e vida eterna. Após muitas peripécias, o realista Jake

acaba tendo que acreditar no sonhador Will e propõe que ele crie o final da história. Will

destrói o espelho e com ele a bruxa. O interessante neste filme é que vários contos têm

suas histórias relatadas e/ou relacionadas no enredo, permitindo estabelecer muitas

relações intertextuais.

Após assistir ao filme e debater sobre a estrutura dos contos de fadas e as

peculiaridades do gênero, foi proposto aos alunos a reconstrução de conto em forma de

uma notícia, gênero anteriormente estudado pela turma. Os alunos recontaram os

acontecimentos do conto “Chapeuzinho Vermelho” e da história do filme ”Irmãos

Grimm” seguindo a estrutura do gênero notícia. Houve produções muito interessantes,

nas quais os alunos observaram a manchete, os elementos do Lead, escreveram

depoimentos das personagens envolvidas, e criaram órgãos de defesa dos animais e

das personagens.

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Antes da produção de contos de fadas os alunos leram vários textos do gênero

e fizeram um estudo da origem, estrutura e características desse gênero através de

pesquisa na Internet. Depois construíram, em grupos, os textos com as informações

obtidas na pesquisa e partiram para a construção dos próprios contos de fadas.

Observou-se empenho e envolvimento dos alunos nesta tarefa, que foi realizada

em um tempo muito menor que as atividades anteriores. Todos os estudantes

observados se envolveram dando sugestões, construindo personagens, caracterizando

o ambiente e o enredo. O resultado foi muito bom, pois houve melhora consistente na

produção escrita. Os parágrafos construídos pelos alunos já começaram a ser

separados com adequação, os erros ortográficos ocorreram em número muito inferior,

evitaram repetições desnecessárias e solicitaram ajuda do professor sempre que

tinham dúvidas.

Sugerimos aos alunos que em uma atitude de auto-avaliação relatassem como

eles se sentiam em relação à leitura e a escrita no início do projeto e o que eles

perceberam que havia mudado. A maioria relatou que passou a entender com mais

facilidade os textos, que passaram a ver os contos de forma diferente, melhoraram na

pontuação, aprenderam a utilizar parágrafos e que viram que os contos têm mistérios

que só lendo para descobrir. Um aluno disse que havia respondido que contos eram

coisas de menina, mas que agora ele percebeu que não era verdade, que havia muito

mais que romance nestas histórias. Todos identificaram mudanças de atitude em

relação à aprendizagem. Algo surpreendente é que alguns alunos que se recusavam a

ler em voz alta, mesmo que uma linha, passaram a fazê-lo e com melhora consistente

na leitura, e ao mesmo tempo, durante as leituras silenciosas passaram a ler com

curiosidade e interesse.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através dessa pesquisa pode ser observado que os alunos não vêem o ato da

leitura como algo tedioso. Comumente em conversa de professores, ou em qualquer

situação em que se comentam os rumos da educação ouve-se a seguinte afirmação:

“nosso alunos não gostam de ler”, ou ainda “esses jovens não leem mais, só querem

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saber de Internet e da televisão”. Percebe-se pela pesquisa que isso não é verdade. A

grande maioria demonstra gostar de ler, apesar do considerável índice dos alunos que

afirmam não entender adequadamente o que estão lendo. Isso pode ser comprovado

pelos baixos níveis de compreensão leitora revelados, não apenas na disciplina de

Língua portuguesa, mas em outras.

Vale lembrar que a compreensão de um texto requer a existência de uma

bagagem de conhecimento que será a base para o entendimento do conteúdo a ser

transmitido seja ele científico ou literário. Afinal, tudo o que o ser humano aprende,

sistemática ou assistematicamente será ativado na medida em que for necessário para

a construção dos sentidos em suas atividades diárias. Na leitura, os conhecimentos

prévios são imprescindíveis para que haja o entendimento do texto, através da

interação entre o leitor, o texto e o contexto, recorrendo a realização de inferências e o

posicionamento crítico do leitor. A leitura só desperta interesse quando o leitor

consegue interagir com o texto que passa a fazer sentido e traz conceitos que se

articulam com o conhecimento prévio do leitor.

Levando-se em consideração as quatro etapas do processo de leitura:

decodificação, compreensão, interpretação e retenção (MENEGASSI, 1995), este

trabalho permite que reavaliemos nossas práticas em relação ao tema, bem como a

necessidade, não só da escola pesquisada, mas de que se repense a formação dos

alunos no que concerne à atividades de leitura e escrita. Também se faz necessário

que o professor tenha recebido embasamento teórico sobre a leitura interativa e

consiga incorporá-la à sua prática pedagógica.

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