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DESENVOLVIMENTO E VALIDAÇÃO DE UMA ESCALA PARA AVALIAR O RELACIONAMENTO ENTRE JOGADORES E OS JOGOS DO NINTENDO WII Leonardo Studart Batelli (IESB) [email protected] Gisela Demo (UCLA) [email protected] O marketing de relacionamento mostra-se uma relevante fonte de vantagem competitiva em um cenário de forte competitividade, como ocorre no setor de jogos eletrônicos. Este trabalho objetivou desenvolver uma Escala de Relacionamento com Clieentes (ERC) de Jogos do Nintendo Wii. Os jogadores da amostra percebem seu relacionamento como moderadamente positivo e mostraram-se satisfeitos principalmente com a jogabilidade e o modo multijogador, dois dos conceitos centrais dos jogos do Wii e do próprio console. O instrumento obteve bons índices psicométricos, o que o torna uma importante ferramenta de diagnóstico e contribui para o aprofundamento dos estudos acerca do marketing de relacionamento. Palavras-chaves: Marketing de relacionamento, CRM, Jogos Eletrônicos XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.

DESENVOLVIMENTO E VALIDAÇÃO DE UMA ESCALA PARA … · de conteúdo categórica temática proposta por Bardin (2011). Além das entrevistas, a Escala de Relacionamento com Clientes

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DESENVOLVIMENTO E VALIDAÇÃO

DE UMA ESCALA PARA AVALIAR O

RELACIONAMENTO ENTRE

JOGADORES E OS JOGOS DO

NINTENDO WII

Leonardo Studart Batelli (IESB)

[email protected]

Gisela Demo (UCLA)

[email protected]

O marketing de relacionamento mostra-se uma relevante fonte de

vantagem competitiva em um cenário de forte competitividade, como

ocorre no setor de jogos eletrônicos. Este trabalho objetivou

desenvolver uma Escala de Relacionamento com Clieentes (ERC) de

Jogos do Nintendo Wii. Os jogadores da amostra percebem seu

relacionamento como moderadamente positivo e mostraram-se

satisfeitos principalmente com a jogabilidade e o modo multijogador,

dois dos conceitos centrais dos jogos do Wii e do próprio console. O

instrumento obteve bons índices psicométricos, o que o torna uma

importante ferramenta de diagnóstico e contribui para o

aprofundamento dos estudos acerca do marketing de relacionamento.

Palavras-chaves: Marketing de relacionamento, CRM, Jogos

Eletrônicos

XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção

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1. Introdução

A alta competitividade está presente em diversos setores, tornando a migração de clientes algo

rotineiro. Além disso, conquistar novos clientes pode ser significativamente mais caro que

retê-los (DEMO; PONTE, 2008). Neste contexto, é mais vantajoso para a empresa fidelizar

seus clientes. Portanto, o CRM (Customer Relationship Management) assumiu um sentido

mais amplo do que ser somente um banco de dados de clientes. Por isso, são adotados como

sinônimos: marketing de relacionamento e gestão do relacionamento com o cliente. Payne

(2006) afirma que o CRM é uma atividade estratégica que objetiva criar valor para os

acionistas por meio da construção de relacionamentos com clientes estratégicos, combinando

o poder da tecnologia da informação e estratégias de marketing.

As grandes empresas desenvolvedoras de jogos eletrônicos são conhecidas por terem muitos

clientes fiéis, verdadeiramente apaixonados por seus produtos e suas marcas, o que é

fundamental numa indústria extremamente competitiva, em que há milhares de lançamentos

todos os anos, e o ciclo de vida dos produtos é curto. Neste sentido, o objetivo deste estudo foi

desenvolver e validar uma escala para avaliar a percepção dos jogadores quanto a aspectos do

relacionamento com jogos do Nintendo Wii, console líder do mercado mundial. Utilizou-se

como base a escala criada e validada por Rozett e Demo (2010). Além da percepção do

jogador quanto à aspectos do relacionamento, foi verificado se a idade, o sexo e a frequência

com que se joga alteram essa avaliação.

2. Referencial teórico

É importante considerar, nos estudos organizacionais, a perspectiva da competitividade. Junto com a

globalização e as novas tecnologias, a competitividade é imperativa resumindo, em sua essência, a busca

incessante das organizações por alternativas de diferenciação competitiva. Nesse contexto, a conquista da

lealdade dos clientes vem se estabelecendo como prioridade das organizações (DEMO; PONTE, 2008).

Segundo Porter (1991), a vantagem competitiva é o resultado da capacidade da organização de realizar

eficientemente o conjunto de atividades necessárias para obter um custo menor que o dos concorrentes ou de

organizar tais atividades de forma única capaz de gerar um valor diferenciado para os clientes. Kumar et al.

(2011) investigaram se a orientação ao mercado é de fato fonte de vantagem competitiva sustentável e

descobriram um efeito positivo sobre o desempenho do negócio tanto a curto como a longo prazo. Visando a

prosperidade das organizações e a otimização de sua capacidade de se reinventar e competir, os relacionamentos

entre organizações e clientes adquirem conotação especial, e o CRM, englobando aspectos da satisfação e da

lealdade de clientes, e a oferta constante de experiências únicas e encantadoras a eles apresenta-se como

diferencial profícuo quando a questão é competitividade.

Para Grönroos (1994), Sheth e Parvatiyar (2002) e Payne (2006), o CRM representa uma mudança de paradigma

dos conceitos de marketing defendendo uma mudança na orientação do marketing para a conquista de clientes

para o foco na retenção ou lealdade de clientes. Na visão de Payne (2006), o CRM provê oportunidades para

utilizar informações, conhecer melhor os clientes, oferecer valor por meio de ofertas customizadas e desenvolver

relacionamentos duradouros. É então necessário que a empresa tenha processos, operações e pessoas integradas

para que a essência do marketing possa ser a filosofia que norteia todo o negócio. Essa visão confirma a ideia

holística do marketing de relacionamento, em que há integração entre todas as partes da organização.

De acordo com Reichheld e Sasser (1990), à medida que o relacionamento do cliente com a empresa estende-se,

os lucros crescem. Em função do grande aumento da concorrência e do constante aprimoramento tecnológico, os

clientes possuem um leque muito maior de escolhas do que possuíam anteriormente. Nesse contexto, Payne

(2006) assevera que o fator diferenciador torna-se a entrega de um serviço excepcional, distinta e

consistentemente. Vantagem competitiva pode ser adquirida por meio do conhecimento das expectativas,

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preferências e comportamento do cliente. Destarte, reter os clientes, desenvolver um relacionamento com eles e

satisfazê-los continuamente podem ser consideradas as bases de uma trajetória bem-sucedida na maioria das

organizações. “Clientes a longo prazo compram mais, tomam menos tempo da empresa, são menos sensíveis ao

preço e trazem novos clientes, além de não possuírem custo de aquisição” (REICHHELD, 1996, p. 02).

Com seu surgimento, o CRM rapidamente tornou-se uma proposta de patente relevância. No entanto, a

compreensão do que o CRM significa ainda é limitada. Muitas empresas não o entendem como sinônimo do

marketing de relacionamento e o encaram apenas como uma solução tecnológica. Segundo Payne (2006), o

CRM provê oportunidades para entender o cliente e implementar melhor as estratégias de marketing de

relacionamento. Tal definição impacta significativamente a maneira como o CRM é entendido, implantado e

praticado nas organizações. O autor destaca que para o CRM ser bem-sucedido, precisa estar imbuído de visão

estratégica para criar valor ao acionista por meio do desenvolvimento de relacionamentos com clientes

estratégicos, unindo o potencial da tecnologia da informação às estratégias de marketing de relacionamento que

resultarão no estabelecimento de relacionamentos lucrativos de longo prazo.

A produção recente sobre CRM em artigos internacionais traz estudos que confirmam tais

ideias, como o de Mishra e Mishra (2009), que apresenta a implementação bem sucedida de

CRM sob a perspectiva de processo numa organização transnacional, com operações

em diversos segmentos. Segundo os autores, como mais e mais organizações percebem a

importância de tornar-se centrada no cliente na era competitiva de hoje, o CRM precisa ser

adotado como uma estratégia central do negócio requerendo investimento maciço.

Huang e Xiong (2010) constataram que o CRM atingiu uma maturidade estratégica e influencia todo o ciclo de

vida de um produto e não apenas etapas de pré ou pós-venda. Ernst et al. (2011) sustentam que potencial do

CRM tem sido investigado somente no caso de produtos existentes, devendo ser considerado também no

desenvolvimento de novos produtos, uma vez que seus estudos evidenciaram que a gestão de relacionamento

com o cliente tem uma correlação positiva com o desempenho e o sucesso de novos produtos.

No que tange às medidas de CRM, observa-se uma produção ainda tímida de escalas, haja vista que só foram

localizadas 4 medidas, com abordagens diferenciadas. A primeira foi elaborada e validada por Wilson e Vlosky

(1997) para o mercado corporativo e posteriormente, validada e adaptada ao contexto brasileiro por Viana,

Cunha Jr e Slongo (1999). A terceira foi construída e validada por Sin, Tse e Yim (2005), a qual objetiva

mensurar as dimensões do CRM praticado pela empresa, e a mais recente foi construída e validada por Rozzett e

Demo (2010) para o mercado consumidor.

3. Método

Este estudo caracteriza-se como instrumental, descritivo, multimétodo e de caráter transversal.

A empresa estudada foi a Nintendo, que lançou o console Wii em 2006. O Wii nasceu como

uma proposta de interação entre os jogadores. Os controles sem fio sensíveis ao movimento

foram a sua grande inovação. O console é orientado para a família, atraindo novos segmentos

para o mercado. Além disso, possui preço inferior a seus concorrentes. Essas características

aliadas a uma nova visão do mercado de jogos eletrônicos deram a liderança mundial no setor

de consoles à Nintendo (HOLLENSEN, 2010).

A etapa qualitativa teve como foco a construção da escala. Foram entrevistados 40 jogadores

de diversas faixas etárias, que responderam perguntas que buscaram identificar quais os

elementos mais importantes de um jogo que levam à satisfação e à fidelização do jogador. O

número de participantes foi baseado nos princípios de Bardin (2011). O conteúdo das

entrevistas foi registrado em áudio, transcrito e classificado em categorias, conforme a análise

de conteúdo categórica temática proposta por Bardin (2011). Além das entrevistas, a Escala

de Relacionamento com Clientes (ERC) de Jogos do Nintendo Wii também foi elaborada a

partir da literatura acerca de jogos e da adaptação dos itens que compõem o instrumento

desenvolvido por Rozett e Demo (2010). Incialmente, o instrumento possuía 39 itens, do tipo

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escala Likert de cinco pontos, e 3 itens de dados demográficos (idade e sexo) e

comportamento relacionado a jogos (frequência de jogo).

Seguindo as recomendações de Pasquali (2008) e Kerlinger e Lee (2008), o instrumento

passou por análise semântica, em que foi verificado por 27 estudantes de Administração se os

itens apresentavam ambiguidade. Simultaneamente, foi realizada a análise de juízes, em que

foi analisado se os itens propostos se referiam ao construto de relacionamento no caso

específico dos jogadores de jogos eletrônicos. Foram juízes: 2 professores de Administração,

2 de Jogos, 2 de ensino fundamental e um profissional de Computação.

A etapa quantitativa teve como foco a validação do instrumento e a obtenção dos resultados

referentes à percepção do jogador quanto a aspectos do seu relacionamento com os jogos do

Nintendo Wii. Para essa finalidade, o instrumento foi aplicado a 549 sujeitos. Após a etapa de

tratamento de dados, 493 sujeitos compuseram a amostra final, atendendo ao critério exposto

por Tabachnick e Fidell (2007), em que uma amostra inferior a 300 sujeitos torna inadequada

a análise fatorial.

A amostra foi restrita a sujeitos que já haviam jogado jogos do Nintendo Wii. O instrumento

foi aplicado online em fóruns especializados, listas de e-mail, redes sociais e comunidades

especializadas em jogos eletrônicos. Para obter maior variedade de perfis, a pesquisa também

foi realizada em lojas de jogos eletrônicos e instituições de ensino. A coleta de dados ocorreu

do dia 1 a 11 de novembro de 2011. A amostra foi composta principalmente por homens

(66%). Quanto à idade, 31% tinham de 10 a 18 anos, 45% de 19 a 24 anos, 21% de 25 a 34

anos, e 3% possuíam 35 anos ou mais. Quanto à frequência com que jogava, 26% disseram

jogar mais que 1 hora por dia, e 38% afirmaram jogar raramente. O restante (36%) afirmou

jogar, em média, até 1 hora por dia.

Os dados foram analisados por meio do programa Statistical Package for Social Sciences

(SPSS), versão 19, e passaram pelo tratamento de dados recomendado por Tabachnick e

Fidell (2007). O primeiro procedimento de tratamento realizado foi a verificação da coerência

dos dados coletados, optando-se por listwise deletion em casos positivos. Não houve registro

de erros nos valores de média e desvio-padrão. O segundo procedimento realizado foi a

averiguação da presença de outliers. Por fim, foi averiguada a multicolinearidade e

singularidade dos dados. A amostra não apresentou problemas.

Utilizou-se a Análise Fatorial Exploratória (AFE) para validar o instrumento, que é uma

técnica fundamental para a psicometria no que tange à validação de instrumentos de pesquisa

(KERLINGER; LEE, 2007). Foi verificada a consistência teórica dos itens da escala, e para

atestar sua validade, os itens foram classificados de acordo com sua carga fatorial. A

confiabilidade do instrumento foi verificada pelo índice de alfa de Cronbach.

Foram extraídas tabelas com informações de média e desvio-padrão, fazendo uso de

estatística descritiva simples para identificar e descrever como são percebidos os aspectos do

relacionamento dos jogadores com os jogos Nintendo Wii. A Análise de Variância (ANOVA)

foi utilizada para verificar se a idade, gênero e frequência de jogo influenciam essa avaliação.

4. Resultados e Discussão

4.1. Análise qualitativa

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A ERC Jogos do Nintendo Wii foi elaborada a partir da tabulação das respostas das

entrevistas, da categorização do conteúdo e da análise de frequência das respostas, conforme

definido por Bardin (2011). Foram criados a partir das entrevistas, 17 itens de satisfação e 3

de fidelidade. A frequência dessas categorias pode ser observada na Tabela 1.

Tabela 1 – Resultado das entrevistas

Jogos eletrônicos são extremamente complexos e utilizam diversos elementos, o que dificulta

a identificação por parte do jogador. Por isso, optou-se por considerar itens de baixa

frequência, mas entende-se que itens de maior frequência são mais relevantes.

Após a elaboração dos itens a partir das categorias, foram realizadas as análises semântica e

de juízes para verificar a consistência do instrumento. Os itens que apresentaram falta de

clareza ou ambiguidade foram modificados ou eliminados. A partir daí, a versão de aplicação

do instrumento contou com 36 itens de relacionamento e 3 de dados demográficos.

4.2. Análise quantitativa

Segundo Field (2009), a análise fatorial tem como objetivo verificar se as variáveis medidas

apresentam correlação e se fazem parte de uma dimensão maior, denominada fator. Para

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realizar a definição dos fatores é necessário verificar se as variáveis apresentam

fatorabilidade, mensurada, por exemplo, pelo índice de Kayser-Meyer-Olkin (KMO). O valor

obtido foi 0,943. Segundo Kaiser (1974), valores acima de 0,9 são considerados maravilhosos

para a fatorabilidade.

Para a obtenção do número de fatores foi realizada a Análise dos Componentes Principais e

foram considerados o critério de Guttman-Kaiser, o teste scree de Catell, a variância total

explicada, e a análise paralela, que consiste em comparar o autovalor empírico com o

estimado, obtido por meio do software RandEigen. Por fim, as matrizes de correlação entre

fatores foram inspecionadas para identificar a presença de fatores de segunda ordem. Os testes

indicaram uma escala unifatorial.

Os itens do instrumento foram submetidos à análise de validade da escala por meio da

verificação das cargas fatoriais. Tabachnick e Fidell (2007) afirmam que itens com carga

fatorial menor que 0,45 podem ser eliminados. Este critério e a busca por maiores variância

explicada, confiabilidade e adequação à teoria, foram utilizados para a seleção dos itens que

compõem a versão final do instrumento, que contou com 24 itens de alta qualidade: 1

excelente, 13 muito bons e 10 bons, atestando a validade da escala, segundo critérios de

Comrey (1973) e explicando cerca de 44% da variância total do construto. A confiabilidade

da escala foi medida por meio do alfa de Cronbach. Para Nunnally e Bersntein (1994), alfas

significativos devem estar acima de 0,8. O valor obtido foi 0,94, considerado muito confiável.

Os resultados estão sumarizados na Tabela 2.

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Tabela 2 - Carga fatorial

Segundo Pasquali (2008), é necessário verificar a consistência teórica dos itens que compõem

o instrumento. Dezoito itens foram originados por meio de entrevistas e todos os demais

possuem respaldo teórico, conforme a Tabela 3.

Tabela 3 - Origem dos itens

Griffin (2001) caracteriza a fidelidade de um cliente como a frequente repetição de compras,

imunidade à pressão da concorrência, entre outros (Q2, Q3 e Q6,). Segundo Almeida (1995),

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a satisfação é uma relação entre percepção e expectativa. Quando a percepção supera a

expectativa, o cliente fica encantado e estará mais propenso à fidelização (Q4). Reichheld e

Sasser (1990) afirmam que clientes fazem propaganda gratuita sobre a empresa para seus

amigos e familiares enquanto o relacionamento durar (Q7). Segundo Nickels e Wood (1999),

as empresas devem oferecer características do produto que sejam relevantes para o

consumidor (Q17). Schell (2011) afirma que a interface (Q29) constitui uma importante parte

do jogo, porque ela é a ponte que liga o jogador à experiência.

O resultado da percepção dos jogadores quanto a aspectos do seu relacionamento com os

jogos do Nintendo Wii pode ser observada na Tabela 4.

Tabela 4: Percepção acerca do relacionamento

Os jogadores têm percepção moderadamente positiva em relação a aspectos de fidelidade do

relacionamento com os jogos do Nintendo Wii. A Nintendo não possui uma política de

fidelização específica para jogadores brasileiros. A ausência de políticas de fidelização e até

de contato com o jogador brasileiro podem ser o motivo da moderada avaliação acerca dos

aspectos de fidelidade. O resultado positivo foi alavancado por itens como a diversão

proporcionada pelos jogos e, apesar de ser um aspecto de fidelidade, é fruto de elementos de

satisfação.

Os itens de satisfação obtiveram valores altos de média. Dos itens avaliados, destacam-se

positivamente a jogabilidade e o modo multijogador, que são os conceitos principais do Wii e

seus jogos. O item de satisfação pior avaliado foi a qualidade gráfica. Dos consoles mais

modernos, o Wii é o que tem o hardware mais limitado. Porém, possui o menor preço,

facilitando o contato de novos públicos com jogos eletrônicos. O grau de dificuldade também

figura entre os itens que apresentam menor grau de satisfação. Segundo Hollensen (2010), o

Wii e seus jogos têm como foco a família. Isto é reforçado pelas propagandas do Wii. A

menor satisfação em relação ao nível de dificuldade pode ser originada pela ausência de um

alto grau de desafio, já que os jogos têm como público-alvo famílias, que abrigam diversas

faixas etárias com habilidades diferentes.

O desempenho dos itens pode ser observado na Tabela 5.

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Tabela 5 – Percepção acerca do relacionamento

Foi realizada a ANOVA para verificar se havia diferentes percepções entre os grupos (sexo,

idade, frequência de jogo). Segundo Tabachnick e Fidell (2007, p.38), a ANOVA “é um

conjunto de procedimentos que têm como base a comparação entre variâncias”. Por isso,

verificou-se a homocedasticidade da amostra por meio do teste de Levene. Em seguida, foi

realizada a ANOVA para os itens que apresentaram homocedasticidade. Cabe ressaltar que a

realização da ANOVA pressupõe grupos de tamanhos semelhantes. Por este motivo, adotou-

se o critério de seleção aleatória para formar grupos de mesmo tamanho.

A variável sexo apresentou diferença de percepção nos itens Q2, Q21, Q25 e Q27. Os

resultados podem ser vistos na Tabela 6.

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Tabela 6 - Diferença de Percepção (sexo)

A Nintendo obteve sucesso em atrair novos segmentos, como mulheres, para o mercado de

jogos e o item 2 é um indício de que os jogos do Wii são preferidos por elas. O Wii e outros

consoles estimulam a competição no modo multijogador. Schell (2011) afirma que,

frequentemente, homens preferem atividades que estimulam a competição. Enquanto,

mulheres preferem a cooperação. Isso pode explicar o melhor desempenho para o público

masculino.

A idade mostrou diferença entre os grupos nos itens Q20, Q26, Q28 e Q32. Os resultados

podem ser observados na Tabela 7.

Tabela 7: Diferença de Percepção (Idade)

Conforme aumenta a idade, mais a percepção acerca dos itens avaliados sofre um impacto

negativo. Em geral, quanto maior a idade, mais referências a pessoa possui. Desta forma, a

comparação ocorre com um número maior de jogos, tornando o sujeito mais exigente, o que

pode modificar a percepção quanto à originalidade e a jogabilidade. Além disso, conforme

aumenta a idade, diminuiu o tempo livre. A escassez de tempo torna os jogadores mais

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seletivos e exigentes em relação a seus hobbys. A maior exigência, por conta da diminuição

do tempo livre e de atividades concorrentes, e o aumento do número de referências como base

para comparação podem explicar porque esses itens tiveram pior avaliação por pessoas mais

velhas.

A variável frequência de jogo apresentou diferença entre os grupos nos itens Q3, Q25 e Q29.

Os resultados podem ser observados na Tabela 8.

Tabela 8 - Diferença de Percepção (frequência de jogo)

Os jogadores que jogam mais frequentemente apresentaram maiores médias, o que parece

óbvio, já que a lógica dita que quanto mais o sujeito gosta de uma atividade, mais irá praticá-

la. Isto é verdade para a atividade de jogos eletrônicos, mas não para a utilização de uma

plataforma específica, como o Wii, porque quanto mais se adquire conhecimento e

experiência sobre uma área, mais crítico e exigente o sujeito se torna. Então, a alta satisfação

dos jogadores mais frequentes pode ser entendida como uma manifestação de alta qualidade

dos jogos do Wii e das experiências por eles proporcionadas.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

De forma geral, os jogadores da amostra percebem seu relacionamento como moderadamente

positivo. No entanto, a percepção acerca dos aspectos de fidelidade foi inferior à satisfação,

corroborando a ideia de que satisfação não é sinônimo de fidelização, o que significa que a

empresa deixa de obter todos os benefícios de um relacionamento duradouro com os clientes.

Os jogadores mostraram-se satisfeitos principalmente em relação à jogabilidade e ao modo

multiplayer, dois dos conceitos centrais dos jogos do Wii e do próprio console. Os resultados

também sugerem que há muito espaço para a Nintendo incrementar seu relacionamento com

seus clientes, principalmente quanto aos aspectos de fidelização. Além disso, a idade, o

gênero e a frequência de jogo parecem ter pequena influência na satisfação e na percepção

acerca de fidelidade.

Recomenda-se a realização de estudos que avaliem a perspectiva da empresa acerca do

relacionamento para verificar se realmente há esforços em fidelizar o cliente e construir um

relacionamento com ele.

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Em suma, a escala criada e validada constitui uma importante contribuição empresarial, haja

vista que a Administração é uma ciência essencialmente aplicada, porque ressalta a

importância do CRM às empresas brasileiras, principalmente, às de jogos eletrônicos. A

fidelização do cliente é fundamental numa indústria altamente competitiva, em que há

milhares de lançamentos todos os anos e o ciclo de vida dos produtos é curto. Além disso, a

escala criada mostrou-se um instrumento de alta qualidade, segundo os índices psicométricos

obtidos, e constitui uma ótima ferramenta de diagnóstico para as empresas de jogos

eletrônicos.

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