197
FERNANDA MONTEIRO DE CASTRO REZENDE Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico: estudo do processo vivido por um grupo de professores de Matemática de Conselheiro Lafaiete (MG) OURO PRETO 2013

Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

  • Upload
    lyduong

  • View
    219

  • Download
    1

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

FERNANDA MONTEIRO DE CASTRO REZENDE

Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico: estudo

do processo vivido por um grupo de professores de Matemática de

Conselheiro Lafaiete (MG)

OURO PRETO

2013

Page 2: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

ii

FERNANDA MONTEIRO DE CASTRO REZENDE

Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico: estudo

do processo vivido por um grupo de professores de Matemática de

Conselheiro Lafaiete (MG)

Dissertação apresentada à banca examinadora

como exigência parcial à obtenção do título de

Mestre em Educação Matemática pelo

Mestrado Profissional em Educação

Matemática da Universidade Federal de Ouro

Preto, sob orientação da Profa. Dra. Ana

Cristina Ferreira.

OURO PRETO

Page 3: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

iii

Catalogação: [email protected]

R467d Rezende, Fernanda Monteiro de Castro.

Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico: estudo do processo vivido por

um grupo de professores de Matemática de Conselheiro Lafaiete (MG) [manuscrito] / Fernanda

Monteiro de Castro Rezende – 2013.

197f.: il. color.

Orientadora: Profª. Drª. Ana Cristina Ferreira.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Ouro Preto. Instituto de Ciências Exatas e

Biológicas. Departamento de Matemática. Programa de Pós-graduação em Educação

Matemática.

Área de concentração: Educação Matemática

1. Probabilidades 2. Matemática 3. Formação de Professores 4. Professores de Matemática

5. Estudos em Grupo I. Universidade Federal de Ouro Preto. II.Título.

CDU: 51

Page 4: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

iv

Page 5: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

v

Dedico este trabalho...

aos meus pais, Hilda e Raimundo, por me

mostrarem ser o trabalho, a honestidade e o temor a

Deus, os pilares para a realização um sonho.

a meu marido, Vinícius, pelo seu amor e

companheirismo.

Page 6: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

vi

AGRADECIMENTOS

Agradeço, de todo o meu coração, a Deus, por seu amor, sentido em todos os momentos da

minha vida, combustível para minha caminhada.

Diversas pessoas contribuíram, cada uma à sua maneira, para que o sonho do mestrado se

tornasse realidade. Agradeço a todos que em mim confiaram. Em especial,

À minha orientadora por respeitar minhas ideias e decisões, pelo apoio durante o trabalho de

campo e, principalmente, por acreditar em mim e, nos momentos mais difíceis, tentar me

convencer de que sou uma pessoa forte e capaz.

À Alice, Bruna e Paula, pelos momentos de aprendizagem compartilhados, pela amizade

conquistada e por serem prova de que existem professores humildes, que se dispõem a ensinar

e aprender uns com os outros, para aperfeiçoarem suas práticas.

Às professoras Celi e Roseli, pela cuidadosa leitura desta dissertação e pelas contribuições no

exame de qualificação.

Aos professores do Mestrado Profissional em Educação Matemática da UFOP, especialmente,

à Roseli, Marger, Frederico, Plínio, Ana Cristina, Terezinha e Maria do Carmo.

Aos meus amigos Ademir, por permitir que eu fosse sua melhor amiga e me ensinar tanto

durante sua breve vida; e Alexandre, pelo companheirismo, torcida e exemplo de

profissionalismo.

Aos meus irmãos e irmãs, Rogério, Angélica, Marcelo, Juliana e Leandro, por me

fortalecerem com seu amor e sua confiança.

Aos meus colegas da turma 4, em especial à Verônica, Fabiano, Dirceu e Evandro, pela

parceria nos estudos e pelos momentos de descontração.

Page 7: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

vii

RESUMO

Tanto a literatura quanto os documentos oficiais atuais recomendam que os conceitos de

Probabilidade sejam trabalhados desde os anos iniciais do Ensino Fundamental. Contudo,

estudos realizados com professores indicam que uma grande parte deles ainda não se sente

preparada para realizar essa tarefa. Apresenta-se aqui um estudo realizado com professoras de

Matemática da Educação Básica de Conselheiro Lafaiete – MG, abordando duas dimensões:

uma dimensão educativa e uma dimensão de pesquisa. Enquanto oportunidade de educação

continuada, seu propósito principal é contribuir para o desenvolvimento profissional e, mais

especificamente, para o desenvolvimento do pensamento probabilístico de professores de

Matemática. Enquanto pesquisa, buscamos analisar o processo de mobilização de saberes

relacionados à probabilidade de um grupo professoras inseridas em um grupo de estudos de

Probabilidade. Tal proposta se fundamenta na literatura acerca do desenvolvimento do

pensamento probabilístico (BATANERO, LOPES e AZCÁRATE) e no desenvolvimento

profissional (FERREIRA e LOPES). Participaram do estudo três professoras de Matemática

de Conselheiro Lafaiete (MG). O grupo se reuniu ao longo de oito meses, realizando catorze

encontros de duas horas e meia de duração cada. Os dados foram coletados por meio da

gravação em áudio dos encontros, do diário de campo da pesquisadora e dos cadernos de

campo das professoras participantes, além de fotos e registros produzidos pelas participantes

do grupo ao longo dos encontros. A análise evidenciou uma intensa mobilização de saberes

relacionados à Probabilidade, por parte das participantes. Destaca-se a compreensão de

conceitos como probabilidade, aleatoriedade e acaso. Encontraram-se ainda indícios de

mobilização de saberes profissionais relacionados à análise de erros dos alunos ao estudarem

o tema, bem como a possibilidades de desenvolvimento do mesmo em sala de aula. A

participação no grupo de estudos proporcionou às professoras participantes a oportunidade de

rever suas práticas, aprender mais sobre Probabilidade e seu ensino em um ambiente que

privilegiou o respeito mútuo, a aprendizagem coletiva e a troca de experiências. O estudo

gerou um livreto, um Produto Educacional, voltado para professores, futuros professores e

formadores de professores.

Palavras-chave: Probabilidade. Desenvolvimento Profissional. Pensamento Probabilístico.

Professores de Matemática. Grupo de estudos.

Page 8: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

viii

ABSTRACT

Literature and also current official documents recommend probability concepts to be studied

since the first years of elementary school.

However, studies done with teachers show that a big part of them still don’t feel prepared to

perform such task. It’s presented here a study done with math teachers of the elementary

schools of Conselheiro Lafaiete –MG addressing two dimensions: an educational part and a

research part.

As continuing education opportunity, its main purpose is to contribute to the professional

development and, more specifically, to the development of probabilistic thought in math

teachers. As a research, it seeks to analyze the knowledge process related to the probability of

a group of teachers inserted in a probabilistic studies group. This proposal is based on the

literature about the probabilistic thought development (BATANERO, LOPES and

AZCÁRATE) and the professional development (FERREIRA and LOPES). Three math

teachers from Conselheiro Lafaiete – MG participated. The group had meetings through eight

months and attended 14 lectures, each lasting 2,5 hours. The data was collected through

audio, field journals and from the notes taken by the teachers. Pictures were also taken. The

analyses showed an intense knowledge mobilization related to the knowledge of probability.

The understanding of concepts such as probability, randomness and chance. Traces of the

mobilization of professional knowledge related to the students’ mistakes and the possibilities

of development in the classroom can be highlighted. The involvement of the group allowed

the teachers to have the opportunity to review their practices, learn more about probability and

its teaching in an environment that primed for mutual respect, collective learning and the

exchange of experiences. The study was turn into a book aiming teachers and future teachers.

Keywords: Probability. Professional Development. Probabilistic though. Math teachers.

Study groups.

Page 9: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

ix

Lista de Quadros

Quadro 1: O Tema Probabilidade na atual Proposta Curricular de Minas Gerais

Quadro 2: Elementos que caracterizam os diferentes significados da Probabilidade

Quadro 3: Resumo das principais atividades da pesquisa de campo

Quadro 4: Os resultados obtidos na atividade “O Sorteio”

Page 10: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

x

Lista de Figuras

Figura 1: Capa do caderno de Alice

Figura 2: Capa do caderno de Paula

Figura 3: Repetição da atividade “O sorteio”, em 30/06/12 (I)

Figura 4: Repetição da atividade “O sorteio”, em 30/06/12(II)

Figura 5 a): Avaliação do 7º encontro por Paula (frente)

Figura 5 b): Avaliação do 7º encontro por Paula (verso)

Figura 6: Momento de “descontração” de Alice e Paula durante o estudo dos textos.

Figura 7: Imagem do cartaz utilizado no 10º encontro

Figura 8: Encontro “no pátio”

Figura 9: Maquete utilizada no 10º Encontro, na atividade 2, “A Porta dos Desesperados”

(01/09/2012).

Figura 10: O Problema das Cabras - Trocando carro por cabra

Figura 11: O Problema das Cabras - Trocando cabra por carro

Figura 12: Avaliação do 2º encontro feita por Bruna (12/05/2012)

Figura 13: a) Avaliação do 7º encontro escrita por Alice

Figura 13 b) Avaliação do 7º encontro escrita por Alice

Figura 14: Análise da resposta do aluno G. de Fernanda, feita por Alice.12º encontro

(29/09/2012).

Figura 15: Análise da resposta da aluna J. de Fernanda, feita por Alice.12º encontro

(29/09/2012).

Figura 16: Análise da resposta do aluno H. de Fernanda, feita por Alice.12º encontro

(29/09/2012)

Figura 17: Respostas dadas pela aluna L., da professora Alice.13º encontro (20/10/2012)

Figura 18: Resposta dada pela aluna F., da professora Alice.13º encontro (20/10/2012)

Figura 19: Respostas dadas pelo aluno F., da professora Alice.13º encontro (20/10/2012)

Figura 20: Análise da resposta de F., feita por Alice.13º encontro (20/10/2012)

Figura 21: Análise de resposta feita por Paula.13º encontro (20/10/2012)

Figura 22: Análise de resposta feita por Alice. 13º encontro (20/10/2012)

Figura 23: Avaliação do 13º encontro pela professora Paula (20/10/2012)

Page 11: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

xi

Sumário

Introdução 12

Capítulo 1. Ensino de Probabilidade e pensamento probabilístico 16

1.1 O ensino de Probabilidade na Educação Básica 16

1.2 O ensino de Probabilidade nos documentos oficiais: breve retrospectiva 17

1.3 O desenvolvimento do pensamento probabilístico 23

1.4. Alguns conceitos importantes para o ensino de Probabilidade com

vistas ao desenvolvimento do Pensamento Probabilístico 25

1.4.1 As Concepções de Probabilidade 29

Capítulo 2. Desenvolvimento profissional de professores que ensinam Matemática 34

2.1 Estudos de trabalhos com pensamento probabilístico e formação de

professores: ponto de partida para o trabalho de campo 35

2.2 Formação e Desenvolvimento profissional do professor 39

2.3 Ideias sobre saberes docentes 42

2.3.1 Saberes acerca da Probabilidade e sua relação com a docência 44

Capítulo 3. A Metodologia da Pesquisa 47

3.1. Questão de investigação e objetivos 47

3.2 Contexto e Participantes 49

3.2.1. Conhecendo as professoras participantes 50

3.3. Desenvolvimento da Pesquisa 53

3.3.1. Dinâmica dos encontros 54

3.4. A coleta de dados 59

Capítulo 4. Os encontros do grupo de estudo de Probabilidade: descrição do

processo vivido 61

4.1 Algumas considerações sobre o processo 93

Page 12: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

xii

Capítulo 5. Analisando o processo 94

5.1. A apropriação dos termos matemáticos associados à Probabilidade 94

5.1.1. Probabilidade ou possibilidade? 95

5.1.2. A aleatoriedade 105

5.2 Reflexões sobre a prática docente 129

Considerações Finais 144

Referências 148

APÊNDICE A: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 152

APÊNDICE B: Instrumento 1 153

APÊNDICE C: Instrumento 2 154

APÊNDICE D: Algumas atividades realizadas durante os encontros 156

Page 13: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

12

Introdução

A introdução de conceitos de Probabilidade no Ensino Fundamental é sugerida pela

proposta curricular para o estado de Minas Gerais (1995, 2005), bem como pelos Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCN) na parte intitulada “Tratamento da Informação”. Considerando

que, tradicionalmente, tal conteúdo é trabalhado no Ensino Médio quase sempre se limitando

ao uso de fórmulas e algoritmos, somos levados a refletir sobre o que ele é e como abordá-lo

no Ensino Fundamental com vistas a proporcionar o desenvolvimento do pensamento

probabilístico, respeitando os conhecimentos que estes alunos possuem. Cabe acrescentar que,

apesar de a proposta curricular do estado (CBC) e os PCN indicarem o ensino de

Probabilidade na Educação Básica, muitos professores que atuam nesse nível de ensino

podem não se encontrar preparados para abraçar as abordagens propostas ou assumirem seus

impactos para o ensino. Atualmente, o Conselho Nacional de Educação (CNE) não estabelece

a obrigatoriedade das disciplinas Estatística e Probabilidade nos currículos dos cursos de

formação inicial de professores de Matemática.

O Ensino de Probabilidade que o professor recebe em sua formação inicial - quando

existe - geralmente não é tratado de forma a privilegiar uma discussão metodológica na qual o

desenvolvimento do pensamento probabilístico tenha papel de destaque. O usual, em minha1

experiência e na de diversos colegas com os quais tenho contato, é uma disciplina limitada à

mera aplicação de fórmulas. Tal prática não apenas destoa do fazer profissional que se espera

do futuro professor – segundo os documentos oficiais – como deixa de favorecer o

desenvolvimento de seu pensamento probabilístico, o que poderá repercutir negativamente em

sua prática.

Shaughnessy (1992, apud COSTA e NACARATO, 2011) propõe alternativas para

atenuar o que chama de “duplo problema”, ou seja, “1) a falta de conhecimento conceitual em

estocástica2, acompanhado por 02) intuições não formais, crenças e concepções equivocadas”.

Segundo ele, a constituição de sociedades investigativas, com parcerias entre pesquisadores e

professores, seria uma alternativa interessante, pois estes representam “o último elo para a

1 Na maior parte da Introdução, ao abordarmos experiências específicas da autora, utilizaremos a 1ª pessoa do

singular. Porém, a partir da menção ao ingresso no Mestrado, bem como ao longo da pesquisa, utilizaremos a 1ª

pessoa do plural. Isso se justifica por nossa compreensão de que o estudo, totalmente elaborado em parceira com

a orientadora, é produto de quatro mãos. 2 Estocástica é o termo utilizado para tratar a Probabilidade integrada à Estatística.

Page 14: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

13

literacia estocástica de nossos estudantes” (SHAUGHNESSY, 1992, apud COSTA e

NACARATO, 2011, p. 372-373).

O interesse, tanto por trabalhar com formação de professores quanto pelo tema

Probabilidade, vem de minha prática docente. Trabalhando durante nove anos como

professora de Matemática da Educação Básica, sempre senti a falta de um apoio ao trabalho

do professor, tanto no sentido didático, quanto em termos de conhecimento matemático.

As mudanças que ocorrem nas leis e documentos oficiais que tratam da abrangência

dos conteúdos matemáticos da Educação Básica nem sempre estão em acordo com a formação

inicial que é oferecida aos professores durante a graduação. O professor, em seu cotidiano

escolar, acaba recebendo um plano de ensino a ser cumprido com mudanças das quais ele, via

de regra, não participa, como também não é questionado se possui conhecimento profissional

para desenvolvê-lo.

Comecei, então, a desejar criar um espaço no qual professores pudessem trocar

experiências, partilhar dúvidas, sem receio de serem julgados incompetentes, aprender

coletivamente temas e conceitos matemáticos e construir alternativas adequadas às suas

práticas. Nesse momento, busquei no Mestrado a possibilidade de transformar essa ideia em

algo concreto. Percebi que poderiam existir outros professores que se interessassem em

aprender um pouco mais sobre Probabilidade, formas de abordagem, utilização de jogos e

experimentos e, principalmente, melhorar sua prática. Nesse sentido, enviei a carta convite a

todas as escolas de Educação Básica do município, das redes estadual, municipal e particular

e visitei a maioria delas para divulgar a pesquisa que pretendia realizar.

Após nos situarmos no campo de estudo, por meio da pesquisa produzida sobre o

tema, bem como estudarmos a literatura relacionada à Estocástica (com ênfase nos estudos

voltados para a Probabilidade e desenvolvimento do pensamento probabilístico),

vislumbramos a possibilidade de organizar um estudo no qual a mobilização de saberes

relacionados à Probabilidade de um grupo – envolvendo professores e pesquisadores – fosse o

foco. Tal ideia tanto permitia que um espaço de aprendizagem efetivamente pudesse vir a

existir, quanto oferecia elementos para uma pesquisa, agregando nossos anseios como

professores e nosso desejo de nos tornarmos pesquisadoras.

Nesse sentido, buscamos, ao longo de todo o processo, responder à seguinte questão

de investigação: Como a participação em um grupo de estudos contribui para o

desenvolvimento do pensamento probabilístico de professores que lecionam Matemática na

Educação Básica?

Page 15: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

14

O presente estudo tem como objetivo geral, atendendo à sua dimensão educativa,

contribuir para o desenvolvimento do pensamento probabilístico de professores de

Matemática, participantes de um grupo de estudos sobre Probabilidade em Conselheiro

Lafaiete (MG). E como objetivos específicos, atendendo à sua dimensão de pesquisa:

a. compreender como as participantes se relacionam com a Probabilidade, não apenas

enquanto conhecimento formal, mas, pessoalmente, e em termos da prática docente3;

b. investigar como a participação no grupo influencia seu pensamento probabilístico;

c. identificar possíveis reflexões proporcionadas pela participação no grupo acerca da prática

docente.

Além disso, esse estudo nasce com o propósito de gerar um Produto Educacional,

materializado na forma de um livreto, com atividades, discussões e propostas que possam

oferecer subsídios para a prática de professores, futuros professores e formadores de

professores.

O estudo está organizado da seguinte forma:

O primeiro capítulo apresenta uma revisão de literatura sobre pensamento

probabilístico e ensino de Probabilidade na Educação Básica. O capítulo expõe algumas das

ideias que assimilamos ao revisar a literatura existente sobre o ensino de Probabilidade,

apresentando as perspectivas e visões dos que consideramos os principais autores sobre o

tema, além de trazer algumas características e definições dos principais conceitos utilizados

na pesquisa. Ao tratar do ensino de Probabilidade na Educação Básica, relacionamos a

importância do tema neste nível de ensino e apontamos a necessidade de se lançar mão de

novas práticas e metodologias.

O segundo capítulo trata da formação e do desenvolvimento profissional de

professores que ensinam Matemática. Apresentamos as ideias de autores cuja concepção de

desenvolvimento profissional foi por nós assimilada durante a pesquisa e análise de

resultados, bem como um breve estudo sobre os saberes. Expressamos também ideias de

alguns autores como Batanero, que possuem diversas pesquisas sobre ensino e aprendizagem

de Probabilidade realizadas com professores.

O terceiro capítulo descreve o percurso metodológico, desde o convite aos professores,

instrumentos de coleta de dados, até uma breve caracterização dos sujeitos desta pesquisa.

3 A prática docente será tratada, ao longo do estudo, a partir das percepções manifestadas pelas professoras

durante os encontros. Ou seja, não contemplará a observação das professoras em seu ambiente de trabalho, mas

seus comentários, reflexões e registros relacionados ao mesmo.

Page 16: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

15

Traz a questão de investigação e os objetivos da pesquisa e parte do processo vivido para se

responder à questão de investigação e atingir os objetivos propostos.

Apresentamos, no quarto capítulo, uma descrição do processo vivido pelo grupo,

buscando esboçar o trabalho realizado junto às professoras de maio a dezembro de 2012,

apoiando-se, quase sempre, nas transcrições das falas das professoras participantes.

O quinto capítulo apresenta a análise das informações obtidas junto às professoras e

registradas por meio dos instrumentos de coleta de dados apresentados no capítulo 3. A partir

da análise, foi possível elaborar considerações sobre o desenvolvimento profissional e o

desenvolvimento do pensamento probabilístico das educadoras participantes. Destacamos, nos

resultados, a ampliação do conhecimento profissional das professoras no que se refere às

noções de aleatoriedade e acaso, bem como o uso de outros termos probabilísticos e

apontamos o desenvolvimento profissional como fruto de um trabalho permeado por

sentimentos como respeito, responsabilidade, interesse e solidariedade.

Page 17: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

16

Capítulo 1.

Ensino de Probabilidade e pensamento probabilístico

Probabilidade é grau de certeza e difere da certeza

absoluta assim como a parte difere do todo (James

Bernoulli, 1713).

O ensino de Probabilidade e Estatística tem ganhado cada vez mais destaque nas

diversas propostas curriculares. Segundo Azcárate (2006), este reconhecimento institucional é

reflexo das características da nossa sociedade. A vida em sociedade é caracterizada como um

ambiente sujeito a elevados níveis de incerteza, onde a capacidade de analisar, interpretar e

transmitir informações adequadamente é fundamental à vida cotidiana. Uma ação cidadã

efetiva envolve, ainda, a tomada de decisão em muitas situações afetadas pela incerteza. O

fácil acesso à informação reforça esta ideia.

Apresentamos, neste primeiro capítulo, uma revisão da literatura relacionada ao ensino

de Probabilidade, especialmente as que relacionam tal ensino com a formação de professores

como os trabalhos de Azcárate (1996, 2006), Batanero (2004, 2010, 2012) Lopes (2003,

2012) além dos trabalhos que envolvem pelo menos uma destas temáticas. Outros estudos

citados neste texto também foram analisados e influenciaram esta pesquisa.

1.1 O ensino de Probabilidade na Educação Básica

Segundo Batanero (2006, p.1, tradução livre): “o acaso é inerente a nossas vidas e

aparece em múltiplas situações cotidianas ou da vida profissional. Porém, as intuições em

Probabilidade com frequência nos enganam e um ensino formal é insuficiente para superar os

vieses de raciocínio que podem levar a decisões incorretas”4. A autora considera formal o

ensino previamente estruturado, cercado de formalismo e baseado, quase sempre, na mera

aplicação de fórmulas sem dispensar atenção suficiente com os conceitos, termos

probabilísticos e, em especial, com o desenvolvimento do pensamento probabilístico.

Associados à Educação Matemática estão o pensamento algébrico, pensamento

geométrico, pensamento numérico e, entre outros, o pensamento estocástico. Nesse sentido,

4 El azar es inherente a nuestras vidas y aparece en múltiples situaciones cotidianas o de la vida profesional. Pero

las intuiciones en probabilidad con frecuencia nos engañan y una enseñanza formal es insuficiente para superar

los sesgos de razonamiento que pueden llevar a decisiones incorrectas.

Page 18: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

17

torna-se relevante focar não apenas o trabalho com Probabilidade, mas o desenvolvimento do

pensamento probabilístico nos estudantes, desde os anos iniciais, proporcionando-lhes assim,

um instrumento que oriente a sua ação diante da incerteza. Neste capítulo, nos propusemos

discutir elementos teóricos que julgamos importantes na construção e na análise das

concepções probabilísticas dos professores que ensinam Probabilidade.

Embora a Probabilidade tenha estado presente nos currículos da Educação Básica nos

últimos 20 anos, encontramos uma tendência recente em renovar seu ensino, tornando-o mais

experimental, de modo que se possa proporcionar aos estudantes uma experiência estocástica

desde a sua infância (por exemplo, MEC5, 1992, NCTM 2000

6, SEP, 2006

7). Destacam-se

duas razões: o fato de a Probabilidade ser parte dos conhecimentos básicos de Matemática e

de outras disciplinas, e seu papel na preparação dos estudantes para lidar com as situações

cotidianas de modo mais crítico, já que o acaso e os fenômenos aleatórios permeiam nossas

vidas e nosso meio. Essas mudanças nos levam a refletir sobre a natureza da Probabilidade,

seu papel no currículo e sua articulação com a estatística e a combinatória resultando no

desenvolvimento do pensamento estocástico, da criticidade e até mesmo do pensamento

científico.

Estocástica8 é um termo que tem sido utilizado com frequência por diversos

pesquisadores do ensino de Estatística, Probabilidade e Combinatória. Esse termo refere-se à

interface entre os conceitos combinatório, probabilístico e estatístico, os quais possibilitam o

desenvolvimento de formas particulares de pensamento, envolvendo fenômenos aleatórios,

interpretação de amostras e elaboração de inferências (LOPES; MORAN, 1999, apud LOPES,

2012, p. 161). A seguir, apresentamos brevemente a forma como o ensino de Probabilidade é

sugerido pelos documentos oficiais.

1.2 O ensino de Probabilidade nos documentos oficiais: breve retrospectiva

Lopes (1998), em sua pesquisa de mestrado, analisou o currículo de alguns estados

brasileiros, dentre eles, o de Minas Gerais. Com o intuito de analisar os modos como a

Estatística e a Probabilidade se apresentavam nas propostas curriculares oficiais de

Matemática daquele momento, a autora selecionou os estados brasileiros de Minas Gerais,

5 Ministério da Educação e Cultura, órgão brasileiro.

6 NCTM (2000), Principles and Standards for School Mathmatics. Estados Unidos.

7 SEP. 2006. Reforma de la Educación Secundaria: Fundamentación Curricular. Matemáticas. México.

8 Em nosso trabalho nos dedicamos ao estudo da Probabilidade, contudo, os termos Estocástica e Estatística são

citados diversas vezes, dada a relação existente entre estes conceitos.

Page 19: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

18

São Paulo e Santa Catarina por serem estados que já tratavam dos temas em seus currículos de

Matemática. Na ocasião, a proposta curricular de Minas Gerais para o Ensino Fundamental se

apresentava nos volumes I e II: o volume I tratava dos anos iniciais e o volume II dos anos

finais do Ensino Fundamental. A proposta analisada por Lopes (1998) datava de 1995 e

sugeria o trabalho com Probabilidade já na 3ª série (atual 4º ano) e o trabalho com o “acaso” é

proposto na 4ª série (atual 5º ano).

Nessa época, já se recomendava que fossem oferecidas à criança situações de

experimentações aleatórias, de possibilidades e eventos (certo, possível, impossível e

possível, mas não certo). A realização de experimentos simples de lançamento de dados ou de

moedas e de sorteios de bolas coloridas em um saco opaco também já era indicada.

A Probabilidade, no volume II da proposta, era sugerida em todas as séries finais do

Ensino Fundamental, sempre indicando uma abordagem não formal, sugerindo que o trabalho

promovesse vivência com retiradas de bolas coloridas de um saco e experimentos com

material manipulativo, como dados, roletas, moedas etc., que, segundo a proposta,

permitiriam ao aluno lidar com as noções de conjunto de possibilidades, evento possível,

impossível, possível, mas não certo, equiprobabilidade, independência, amostra,

probabilidade etc. (LOPES, 1998, p. 91).

A proposta ressaltava, na parte em que se refere às finalidades do ensino da Estatística

e da Probabilidade, a necessidade dessas noções para que o indivíduo pudesse interpretar

corretamente inúmeros artigos de jornais e revistas nos quais as informações eram dadas sob a

forma de porcentagens, de médias, de gráficos, de pictogramas etc. Assinalava para o quanto

as pessoas eram bombardeadas por declarações de políticos, solicitadas por agências de

publicidade e sondagens de opiniões; para o delírio do povo frente aos jogos de azar e o

quanto era imprescindível que tivessem uma visão realista de suas chances de ganhar e

conseguissem guardar uma atitude crítica diante das “receitas” para dominar o acaso.

Finalmente, entendia que o estudo desse tema poderia outorgar uma oportunidade ao aluno de

desenvolver ou reforçar vários conceitos matemáticos.

Segundo Rotunno (2007, p.60-61), a proposta mineira de 1995 possuía uma relação de

argumentos que justificavam a inserção dos conteúdos de Estatística e Probabilidade no

Ensino Fundamental:

- Sua importância e crescente contribuição nos diversos campos do

conhecimento humano, tais como meteorologia, política, agricultura,

indústria e outros;

Page 20: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

19

- A necessidade de o indivíduo saber interpretar informações apresentadas

pela mídia, que são dadas sob a forma de porcentagens, de médias, de

gráficos, de pictogramas, etc.

- Além disso, em face aos chamados jogos de azar, é imprescindível que as

pessoas tenham uma ideia realista de suas chances de ganhar. O estudo desse

conteúdo possibilitaria uma melhor compreensão dos eventos aleatórios e o

desenvolvimento de atitudes críticas diante de situações semelhantes a essa;

- O ensino de Estatística e Probabilidade possibilita exercitar um modo de

raciocínio por meio do qual é possível lidar com situações não deterministas,

nas quais a incerteza está presente. Provavelmente, alguns dos problemas

que o aluno futuramente enfrentará na vida terão caráter indefinido;

- Finalmente, os elaboradores da proposta argumentam que o estudo de

Estatística e Probabilidade oferece a oportunidade de estabelecer relações

com outros conteúdos matemáticos como frações, dízimas, porcentagens,

construção e leitura de gráficos, etc.

Acrescenta que os elaboradores não se limitaram a apenas tecer sugestões e a mostrar

caminhos, mas detalharam minuciosamente toda a sequência de passos a serem percorridos

durante o desenvolvimento do conteúdo em sala de aula. Chama atenção para a inserção de

atividades de caráter experimental, já verificada por Lopes (1998).

Essa proposta curricular de Minas Gerais foi reformulada e relançada em 2005, a partir

da revisão de parte da proposta curricular do Conteúdo Básico Comum (CBC) para o ensino

da Matemática no Ensino Fundamental em todo o Estado de Minas Gerais.

A proposta fez alterações apenas nas séries finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º

ano). Trata-se, essencialmente, da parte onde são listados os eixos temáticos, ou seja, as

unidades estruturadoras e os tópicos que irão constituir o Conteúdo Básico Comum (CBC)

para todas as propostas curriculares das Escolas Estaduais de Minas Gerais. A proposta traz

uma divisão em tópicos obrigatórios e complementares. O ensino de Probabilidade é o tema9

2, do Eixo temático IV, constituído apenas por tópicos obrigatórios10

e vem esboçado na

proposta como a seguir:

9 O tema 1 do Eixo Temático IV é “Representação Gráfica e Média Aritmética- Tratamento de dados”.

10 Há tópicos complementares em alguns dos Eixos Temáticos.

Page 21: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

20

Tema 2: Probabilidade

Tópicos

Habilidades

Ano/Carga

horária

6º 7º 8º 9º

Contagem - Conceitos

- Resolver problemas simples de contagem utilizando

listagens ou o diagrama de árvore

4 6 4

Conceitos básicos de

Probabilidade

- conceitos

- relacionar o conceito de probabilidade com o de

razão

4

- resolver problemas que envolvam o cálculo de

probabilidade de eventos simples

8

Quadro 1: O Tema Probabilidade na atual Proposta Curricular de Minas Gerais, (CBC, 2005. p. 30)

As principais alterações observadas foram: a divisão do tema em tópicos,

especificação das habilidades desejadas por tópicos e a distribuição de carga horária para o

trabalho com Probabilidade em cada ano de escolaridade.

A partir da análise da atual Proposta, verificamos que as alterações feitas à proposta

anterior, não só em Probabilidade, mas a todos os demais temas se deram, principalmente,

pela necessidade de se delimitar aspectos fundamentais de cada disciplina que, segundo a

proposta, não podem deixar de ser ensinados e que o aluno não pode deixar de aprender. Os

CBC não esgotam todos os conteúdos a serem abordados na escola, mas sua importância é

justificada por este ser tomado como base para a elaboração das avaliações anuais realizadas

por alunos do 5º e do 9º anos. Segundo o documento, o progresso dos alunos, reconhecido por

meio dessas avaliações, constitui a referência básica para o estabelecimento de um sistema de

responsabilização e premiação da escola e de seus servidores.

O documento indica, também, as habilidades e competências que o aluno precisa

adquirir e desenvolver durante o Ensino Fundamental. Na parte intitulada “Considerações

Didático-Metodológicas”, a proposta ressalta que, para alcançar os objetivos, é fundamental

que se adotem estratégias adequadas de ensino e, para isso, é essencial que se conheça não

apenas o que se ensina, mas para quem se ensina.

Em sua extensão, o documento pontua diversos problemas que, constantemente,

poderão surgir ao longo da trajetória percorrida pelo aluno do Ensino Fundamental. São

citados problemas familiares e pessoais dos alunos, as mudanças físicas e emocionais que ele

enfrenta ao longo desse processo, etc. Para trabalhar com este aluno, sugere-se que o

professor lance mão de diferentes opções metodológicas, realize uma avaliação contínua e

Page 22: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

21

diversificada do processo de aprendizagem, proporcione ao aluno o desenvolvimento da

capacidade de interpretar e resolver problemas de diferentes maneiras e saiba ensinar o aluno

a trabalhar com o erro, levando-o a raciocinar e expressar-se matematicamente.

Apesar de citar diversas habilidades esperadas do professor durante o ensino da

estocástica, não se encontra, neste documento, um tópico que remeta à formação continuada

ou ao desenvolvimento profissional do professor11

, para que desempenhe o papel a ele

incumbido a partir desta proposta. O documento não sugere, por exemplo, a criação de

políticas públicas que permitam ao professor se formar ou se aperfeiçoar para atender a este

aluno que, segundo a proposta, clama por mudanças na abordagem que é dada até então nas

salas de aula do Estado.

Para Carneiro et al (2005), hoje em dia, a estatística descritiva e a Probabilidade fazem

parte do discurso jornalístico e científico cotidiano quando se trata, por exemplo, de pesquisas

de intenção de voto, perfil socioeconômico da população brasileira, as chances da cura de

determinada doença ou riscos de contraí-la. Espera-se, portanto, que numa formação básica do

cidadão não apenas se adquira a capacidade de ler e analisar dados expostos em diversas

formas, mas que se possa refletir criticamente sobre os seus significados e emitir juízos

próprios.

No atual currículo de Matemática, as orientações sobre o ensino da Probabilidade e da

Estatística aparecem descritas em um bloco intitulado “Tratamento da Informação” e sua

criação é justificada pela necessidade de o indivíduo compreender as informações veiculadas,

tomar decisões e fazer previsões que influenciem sua vida pessoal e em comunidade.

Considera, também, que o trabalho com a Probabilidade e a Estatística nas aulas de

Matemática da Educação Básica pode possibilitar o desenvolvimento de formas particulares

de pensamento e raciocínio, presentes nos fenômenos aleatórios, na interpretação de amostras,

nas inferências e comunicação de resultados por meio da linguagem estatística (LOPES, 2010,

p. 58).

Segundo Carvalho (2004), os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), publicados

em 1998, sugerem o desenvolvimento de atividades relacionadas a assuntos do cotidiano dos

alunos, partindo de situações-problema e buscando sempre um estudo investigativo,

possibilitando ao aluno a oportunidade de elaborar suas próprias hipóteses, estabelecer

11

Na apresentação do documento é citado um sistema de apoio ao professor, através de um centro de referência

virtual, a ser implementado e desenvolvido até 2008. O Centro de Referência Virtual

(http://crv.educacao.mg.gov.br) foi criado e contempla tanto os conteúdos básicos curriculares, quanto sugestões

de desenvolvimento dos mesmos. Contudo, em 2013, estavam disponíveis apenas alguns roteiros de atividades

que envolviam estocástica, tratamento da informação (desde os anos iniciais).

Page 23: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

22

relações entre informações diversas, observar dados e fazer previsões, desenvolvendo, desta

forma, algumas noções de Probabilidade.Os PCN trazem o ensino de Probabilidade na parte

intitulada Tratamento da Informação, onde se lê:

A demanda social é que leva a destacar este tema como um bloco de

conteúdo, embora pudesse ser incorporado aos anteriores. A finalidade do

destaque é evidenciar sua importância, em função de seu uso atual na

sociedade. Integrarão este bloco estudos relativos a noções de Estatística e de

Probabilidade, além dos problemas de contagem que envolvem o princípio

multiplicativo. Evidentemente, o que se pretende não é o desenvolvimento

de um trabalho baseado na definição de termos ou de fórmulas envolvendo

tais assuntos.

Com relação à Probabilidade, a principal finalidade é a de que o aluno

compreenda que muitos dos acontecimentos do cotidiano são de natureza

aleatória e que se podem identificar possíveis resultados desses

acontecimentos e até estimar o grau da possibilidade acerca do resultado de

um deles. As noções de acaso e incerteza, que se manifestam

intuitivamente, podem ser exploradas na escola, em situações em que o

aluno realiza experimentos e observa eventos (em espaços equiprováveis).

Relativamente aos problemas de contagem, o objetivo é levar o aluno a lidar

com situações que envolvam diferentes tipos de agrupamentos que

possibilitem o desenvolvimento do raciocínio combinatório e a

compreensão do princípio multiplicativo para sua aplicação no cálculo de

Probabilidades. (BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: Matemática.

Brasília: MEC /SEF, 1998, p. 52. Grifo nosso).

Santos (2010) defende que o desenvolvimento do pensamento probabilístico dos

adolescentes “depende, e muito, das ações didáticas que necessitam ser realizadas com os

alunos, nas escolas, uma vez que pouca ou nenhuma experiência probabilística é

experienciada e/ou observada por eles, sem que haja uma intervenção”(SANTOS, 2010,

p.11).

Alguns autores apostam na ideia de que o desenvolvimento do pensamento

probabilístico possa ter suas raízes já na Educação Infantil, etapa onde o aluno encontra-se em

profundo reconhecimento do meio onde vive, no auge de sua curiosidade e num contínuo

processo de formação de sua identidade. É o período onde a criança passa a reconhecer o

meio onde se encontra, as relações sociais e com a natureza. Para Lopes (2003), o

desenvolvimento do pensamento estatístico e probabilístico, quando inserido no contexto

escolar, pode apresentar significativas contribuições para a formação do indivíduo desde a

infância. A realização de experimentos que envolvam aleatoriedade e estimativas, assim como

a vivência de coletar, representar e analisar dados que sejam significativos para o aluno e que

façam parte de seu contexto podem ampliar, segundo a autora, o universo de competências e

acentuar o potencial criativo de nossos estudantes.

Page 24: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

23

Ao analisar os PCN e a proposta curricular de Minas Gerais atual, verificamos uma

orientação no sentido de passar das atividades focando a mera aplicação de fórmulas e os

trabalhosos cálculos probabilísticos distantes da realidade, a uma metodologia caráter mais

experimental.

O desenvolvimento das noções de Probabilidade, das ideias de acaso, azar e

aleatoriedade é fundamental para que o indivíduo possa realizar uma leitura crítica das ações

sociais que o cercam, bem como efetuar tomadas de decisões baseadas em uma visão da

realidade formada de maneira autônoma, após analisar o que é possível, impossível e o que é

provável. Segundo Lopes (2003), a Combinatória, a Probabilidade e a Estatística inter-

relacionam-se, proporcionando uma filosofia do azar de grande alcance para a compreensão

do mundo atual, e capacitam pessoas a enfrentar tomadas de decisões, quando somente

dispõem de dados afetados pela incerteza, situações comuns em nosso cotidiano.

Concordamos com Lopes (2010) quando afirma que, apesar de a inclusão da

Estatística e da Probabilidade no currículo de Matemática de vários países ser explícita e

efetiva, o mesmo não ocorre dentro das salas de aula. Segundo a autora, estes temas, em geral,

são colocados no final dos programas de ensino e, assim, nem sempre são estudados pelos

alunos, por falta de tempo, por falta de convicção do seu real interesse ou por falta de domínio

teórico metodológico do professor sobre os conceitos probabilísticos (LOPES, 2010, p. 58).

Segundo a autora, a implementação curricular da Probabilidade no Brasil ainda

depende de um investimento significativo dos educadores matemáticos no que se refere à

formação inicial e contínua dos professores, à elaboração de livros didáticos e outras

publicações que possam subsidiar o trabalho do professor da Educação Básica. Lopes também

considera importante incentivar e orientar projetos de pesquisa com foco no ensino destas

temáticas na Educação Básica. No próximo tópico, serão apresentadas reflexões de alguns

teóricos sobre o pensamento probabilístico, sempre relacionado ao desenvolvimento deste no

aluno ou no professor.

1.3 O desenvolvimento do pensamento probabilístico

Na sociedade atual, a educação científica não pode reduzir-se a uma interpretação

unívoca e determinista dos acontecimentos. Uma cultura científica eficiente clama por uma

educação no pensamento estatístico e probabilístico. A intuição probabilística não se

desenvolve espontaneamente, exceto dentro de um limite muito estreito (GODINO et al, 1996

apud SILVA, 2002, p.14).

Page 25: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

24

Os trabalhos de Fischbein (1975, apud BATANERO, 2001) e posteriores também

apontam nesta direção, já que constituem uma das primeiras pontes entre Psicologia e

Educação Matemática. Interessado não apenas na formação de conceitos formais, mas

também no desenvolvimento e na ocorrência de intuições parciais sobre os conceitos

estocásticos, preocupou-se também com o efeito do ensino. Suas investigações apóiam

fortemente a necessidade de avançar na educação estocástica e mostram ainda que, sem

ensino, é difícil desenvolver um raciocínio estocástico adequado, mesmo após atingir o

estágio das operações formais. Fischbein foi um dos fundadores do grupo PME (Psicologia da

Educação Matemática) e, em 1994, criou um grupo de trabalho sobre estocástica dentro do

PME.

Assim, para que exista uma significativa percepção estocástica, faz-se necessário o

desenvolvimento do pensamento estatístico e probabilístico, o que exige um trabalho voltado

para as formas de raciocínio combinatório, probabilístico e estatístico. Nesse sentido,

utilizamos as noções de pensamento e raciocínio, tal como propõe Lopes (2012, p. 161-162):

(...) o pensamento é aquilo que é trazido à existência através da atividade

intelectual. Podemos dizer que é um produto da mente, que pode surgir

mediante atividades racionais do intelecto ou por abstrações da imaginação.

O pensamento pode implicar uma série de operações racionais, como a

análise, a síntese, a comparação, a generalização e a abstração. Por outro

lado, devemos ter em conta que o pensamento não só é refletido na

linguagem, como também a determina, pois ela trata de transmitir os

conceitos, os juízos e os raciocínios do pensamento.

O raciocínio é uma operação lógica, discursiva e mental. O intelecto humano

utiliza uma ou mais proposições para concluir, por mecanismos de

comparações e abstrações, quais são os dados que levam às respostas

verdadeiras, falsas ou prováveis. Das premissas, chegamos a conclusões. (...)

O raciocínio pode ser considerado também um integrante dos mecanismos

dos processos cognitivos superiores para a formação de conceitos e para a

solução de problemas. Ele designa um ato mental ou um processo de

pensamento necessário a um tipo de conhecimento mais imediato; e permite

passar, de conhecimentos já adquiridos, para outros que se pretendem

alcançar.

Ao fazer considerações acerca dos diferentes tipos de pensamento e raciocínio, a

autora destaca este último como uma parte do pensamento e afirma que, na Educação

Matemática e Estatística, utilizamos, principalmente, o raciocínio dedutivo, o indutivo e o

raciocínio por analogia12

. Apoiamos, como Lopes (2012), uma Educação Matemática baseada

12

Para Lopes (2012, p.162): O raciocínio dedutivo é uma síntese de juízos que permite estabelecer uma relação

de necessidade lógica entre eles; uns deles são designados “premissas” e outros, “conclusão”. O raciocínio

indutivo permite generalizar determinada propriedade comum a um certo número de casos particulares para

Page 26: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

25

na constante problematização, que provoca o processo investigativo e gera aprendizado e

conhecimento.

Segundo Lopes (2003), o desenvolvimento do Pensamento Probabilístico requer o

reconhecimento de situações de acaso na vida cotidiana e no conhecimento científico, bem

como a formulação e comprovação de conjecturas sobre o comportamento de fenômenos

aleatórios simples e a planificação e realização de experiências nas quais se estude o

comportamento de fatos que abarquem o azar. Para a autora, a partir dessas considerações, é

possível criar situações didáticas que trabalhem com a observação de experimentos, com seus

respectivos registros e análises, favorecendo uma integração entre a Probabilidade e a

Estatística, culminando no desenvolvimento do raciocínio estocástico.

Vale destacar também que, nas decisões e juízos de Probabilidade da vida cotidiana,

podemos nos deixar levar pela intuição que, muitas vezes, nos engana. Então, cometemos

erros que geralmente não são corrigidos simplesmente com uma única abordagem para o

ensino de Probabilidade.

Shaughnessy (1986, apud BATANERO, 2010) acredita ser necessário desenvolvermos

modelos, ferramentas fidedignas de avaliação das concepções de Probabilidade de nossos

estudantes, e aponta para a urgência de serem realizados estudos sobre como os estudantes

pensam em chance, eventos aleatórios e decisões diante de situações de incertezas. Segundo o

autor, há certa lacuna em nosso conhecimento no que se refere aos saberes desses alunos

quanto à Probabilidade.

Concordamos com Lopes (2003) quando afirma que o pensamento probabilístico

sempre tem como referência realizações concretas da realidade, mas, nem por isso, previstas e

pré-determinadas por um comportamento regular. Por isso, faz-se necessário conhecer suas

particularidades, que estão em contraste com o raciocínio determinista. A elaboração do

conhecimento probabilístico depende da experiência que a pessoa teve e de seu nível de

implicação ativa nas situações vivenciadas em diferentes contextos. No tópico seguinte,

abordamos alguns dos trabalhos que deram suporte teórico a nossa pesquisa.

todos os casos semelhantes. O raciocínio por analogia que, considerando semelhanças existentes entre objetos ou

relações, permite-nos supor que existam outras características semelhantes entre eles .

Page 27: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

26

1.4. Alguns conceitos importantes para o ensino de Probabilidade com vistas ao

desenvolvimento do Pensamento Probabilístico

Segundo Batanero e Serrano (1995), questões epistemológicas ocupam um lugar

central no pensamento das pessoas interessadas em aprender Matemática. Isto ocorre porque,

historicamente, os obstáculos encontrados na formação de conceitos são reproduzidos, com

alguma frequência, nos estudantes. Tais estudos podem nos ajudar, em alguma medida, a

compreender as dificuldades dos alunos na utilização dos conceitos ao resolver problemas.

Batanero et al (2012) afirmam que ainda são poucas as investigações que estão

relacionadas com a compreensão da ideia de aleatoriedade por futuros professores, e as que

existem indicam que tal compreensão é pobre. Eles citam estudos realizados por eles e por

diversos outros autores (FALK, 1981; FALK e KONOLD, 1997; NICKERSON, 2002) com

professores em exercício onde uma das principais conclusões desses estudos é que mesmo os

adultos têm dificuldade para produzir ou perceber a aleatoriedade, encontrando desvios

sistemáticos em seus raciocínios.

Neste contexto, faz-se necessário darmos especial atenção à ideia de aleatoriedade. O

cálculo de Probabilidades é o estudo dos fenômenos aleatórios. Quando teve início o cálculo

de Probabilidades, com Cardano, o acaso estava relacionado com a equiprobabilidade dos

diferentes resultados, ou seja, um fenômeno era considerado aleatório se todos os resultados

tivessem a mesma Probabilidade de ocorrer. Naquele momento, essa interpretação não sofreu

maiores resistências já que, a princípio, a teoria da Probabilidade estava intimamente ligada

aos jogos de azar, onde o número de possibilidades é finito e o princípio da indiferença das

diferentes possibilidades pode ser considerado razoável (BATANERO, 2001). Ainda segundo

esta autora, no final do século XVIII e início do XIX aumenta o número de situações

consideradas aleatórias, ultrapassando o limite dos jogos de azar e invadindo o campo dos

fenômenos naturais. Consequentemente, o conceito inicial de aleatoriedade sofre uma

mudança, tornando-se cada vez mais formal, introduzindo a ideia de "Independência", que é

considerada fundamental para garantir a aleatoriedade de um evento em experimentos

repetidos.

Em Matemática, um experimento ou fenômeno aleatório é todo aquele que se

caracteriza pela possibilidade de ceder lugar, em condições idênticas, a diferentes efeitos. Os

possíveis resultados de um experimento aleatório são os que identificamos como sucessos

aleatórios, ou seja, são fenômenos sobre os quais dispomos de alguma informação que não

nos permite antecipar seu resultado com seguridade (AZCÁRATE, 1996).

Page 28: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

27

A aleatoriedade refere-se sempre ao que é incerto, ao que depende da sorte ou do azar.

E este último é a suposta causa dos sucessos não devidos a uma necessidade natural, a uma

intervenção, humana ou divina, intencionada. A importância da noção de aleatoriedade está

diretamente relacionada à nossa forma de compreender a realidade e o conhecimento, e será a

partir dessa concepção que estaremos habilitados à tomada de decisão. Assim sendo, o

conhecimento aleatório adquire uma crucial importância para que possamos nos apropriar dos

conceitos probabilísticos e estatísticos (LOPES, 2003, p.71).

A concepção de aleatoriedade e azar é imprescindível para o desenvolvimento do

pensamento probabilístico. Segundo Konold et al (1991, apud Lopes, 2003), a noção de

aleatoriedade é ambígua e complexa. Porém, tais variações do conceito são o coração do

pensamento probabilístico e estatístico. O sucesso aleatório ocorre, quando, em um fenômeno,

considera-se impossível predizer qual será seu estado final a partir do inicial e das leis

conhecidas da natureza.

Como argumentado em Konold et al. (1991, apud Batanero e Serrano,1995, tradução

livre), na verdade, é preferível ver o termo "aleatoriedade" sendo usado como um termo ao

qual estão associados muitos conceitos como os de experimento, evento, espaço amostral,

Probabilidade, etc. Neste sentido, a palavra aleatoriedade nos leva a um conjunto de conceitos

e procedimentos matemáticos que podem ser aplicados em muitas situações. Portanto,

devemos pensar em uma orientação para o fenômeno que descrevemos como "aleatório" ao

invés de uma qualidade dele. Aplicamos um modelo matemático a uma situação porque nos é

útil para descrevê-la e compreendê-la, mas não acreditamos que a situação é idêntica ao

modelo. Decidir quando o cálculo de probabilidades é mais adequado ou conveniente a uma

situação que outros modelos matemáticos é parte do trabalho de modelagem que deve

direcionar os nossos alunos.

Para Piaget e Inhelder (1951, apud Lopes, 2003), o azar é um domínio complementar

da composição lógica e não poderia ser adquirido até que se constituíssem as operações

reversíveis. Somente com o domínio de um esquema combinatório capaz de considerar o

conjunto de possibilidades e a proporção dos casos favoráveis a um sucesso dado com o total

das mesmas é que se teria a ideia de Probabilidade. Eles veem o azar como um complemento

da noção de causa. Para estes autores, a compreensão da ideia de azar e Probabilidade requer

a aquisição do raciocínio combinatório, proporcional e também da ideia de causalidade.

Page 29: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

28

Batanero e Serrano (1995) afirmam que a introdução gradual dos conceitos e da

notação probabilística servirá para explicar, matematicamente, as regularidades observadas

nos dados recolhidos.

Para Lopes (2003), as investigações a respeito do pensamento probabilístico permitem

que se façam recomendações sobre a prática educativa desse tema. Destacam-se discussões

sobre a necessidade de se realizar experimentos de simulação - nos quais apareçam sequências

aleatórias -, de se valorizar a utilização de vocabulário adequado para descrever e quantificar

situações relacionadas ao azar e de se confeccionar tabelas de frequências e gráficos para

representação do comportamento de fenômenos aleatórios.

Diversas são as dificuldades enfrentadas pelos professores durante o ensino de

Probabilidade. Tal assunto é abordado e confirmado a partir de pesquisas realizadas sobre o

tema ainda neste texto, no próximo capítulo. Os estudos de Batanero, Godino e Roa (2004)

destacam-se porque, além de pontuarem as razões pelas quais a Probabilidade é um tema

difícil de ensinar, discutem os conteúdos necessários na preparação didática dos professores

para ensinar Probabilidade. Segundo os autores, o ‘conhecimento didático’ necessário para os

professores durante o ensino de estocástica inclui os seguintes aspectos:

1. Reflexão epistemológica dos diferentes significados de Probabilidade.

2. Experiência na adaptação do conhecimento para diferentes níveis de ensino e para os

vários níveis de compreensão (desenvolvimento) dos alunos.

3. Capacidade crítica para analisar livros de texto e documentos curriculares.

4. Capacidade de prever as dificuldades de aprendizagem dos alunos, os erros, os obstáculos

e estratégias de resolução de problemas.

5. Habilidade para desenvolver e analisar diferentes tipos e instrumentos de avaliação e para

interpretar as respostas dos alunos.

6. Experiência com bons exemplos de situações de ensino, ferramentas e materiais de ensino

(BATANERO, GODINO e ROA, 2004, p. 3, tradução nossa).

Os autores destacam a importância de se criar meios adequados e eficazes para ensinar

este "conhecimento didático" para os professores. Como consideram que os alunos constroem

seus conhecimentos de uma forma ativa, através da resolução de problemas e interação com

seus colegas de classe, afirmam que essa mesma abordagem deve ser utilizada na formação

dos professores.

Nesse sentido, ressaltam que é preciso criar condições adequadas para os professores

refletirem sobre suas crenças anteriores sobre o ensino e discutirem essas ideias com outros

Page 30: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

29

colegas, bem como ajudá-los a desenvolver o pensamento crítico e criativo e a tornarem-se

agentes da própria formação (SHULMAN, 1986, apud BATANERO, GODINO e ROA, 2004.

Tradução nossa).

Nesta mesma direção, Even y Kvatinsky (2010, apud CAZARES e REYES, 2011)

levantam alguns aspectos que consideram essenciais na formação do professor:

1. As características essenciais são a base da Probabilidade

É necessário que os professores conheçam as características essenciais da

Probabilidade como campo não determinístico, o que o torna diferente de outros campos da

Matemática, bem como a entender que o estudo de Probabilidade pode ser abordado a partir

de diferentes enfoques. Os professores devem reconhecer a importância que tem a

Probabilidade para resolver problemas de incerteza e aleatoriedade que podem ocorrer em

qualquer campo da atividade humana.

2. Diferentes representações e modelos

O trabalho com Probabilidade requer a utilização de diferentes representações e

modelos, tais como diagramas de Venn, diagramas de árvore, tabelas e fórmulas para calcular

e interpretar as Probabilidades. A familiaridade, bem como o manejo adequado das diferentes

representações e modelos e a capacidade de passar de uma representação para outra são

poderosas ferramentas para o professor e o ajudam a entender melhor a Probabilidade.

3. A utilização de abordagens alternativas de Probabilidade

Os professores devem estar familiarizados com as principais abordagens da

Probabilidade (clássica, frequentista e subjetiva), seus usos e escolhas adequadas para certos

problemas.

4. Repertório básico de exemplos

Como parte do conhecimento de Probabilidade que o professor deve ter está contar

com um repertório de exemplos importantes e de fácil acesso que lhe permitam ilustrar ideias,

conceitos, teoremas e propriedades importantes.

5. A natureza da teoria da Probabilidade

Os professores devem saber que o conhecimento matemático está inter-relacionado

com o conhecimento da Probabilidade e que o primeiro dá suporte ao segundo (ou seja,

axiomas e teoremas de Probabilidade como Probabilidade de um espaço amostral, a lei dos

grandes números como o limite de uma Probabilidade, etc.) (EVEN e KVATINSKY, 2010,

apud CAZARES e REYES, 2011, p. 77, tradução nossa).

Page 31: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

30

Cazares e Reyes (2011) confirmaram, em um estudo realizado com 80 professores

mexicanos, que os aspectos que Even y Kvatinsky (2010) apontam devem ser considerados

em um programa de formação inicial ou continuada para o professor que ensina Probabilidade

e pleiteia o desenvolvimento do pensamento probabilístico dos estudantes.

Corroborando com o aspecto de número 3 apontado por Even y Kvatinsky, Batanero

(2005) afirma que o ensino de Probabilidade não pode se limitar a uma das diferentes

perspectivas sobre Probabilidade existentes. Em concordância com estes autores,

consideramos necessário um breve esclarecimento sobre as diferentes concepções de

Probabilidade para, possivelmente, identificá-las nos sujeitos de nossa pesquisa.

1.4.1 As Concepções de Probabilidade

Diferentes concepções de Probabilidade são dadas por diversos autores. A literatura

destaca quatro abordagens: clássica, frequentista ou empírica, subjetivista e axiomática ou

formal.

A concepção clássica é atribuída a Laplace, já que sua obra "Teoríe analytique dês

probabilités", datada de 1812, foi o primeiro trabalho onde a noção de Probabilidade é tratada

com o rigor matemático. Nesta concepção, a Probabilidade é definida como a razão entre o

número de casos favoráveis e o número total de casos possíveis, desde que todos os resultados

sejam admitidos como igualmente prováveis de ocorrer. Podem ser dados como exemplos

para esta perspectiva teórica os jogos de azar realizados com dados, moedas, extração de

bolas de urnas ou de cartas de um baralho, pois são fenômenos cuja variável é discreta e

porque se supõe ser sempre possível selecionar, como espaço amostral, um conjunto de

sucessos elementares que possam garantir a equiprobabilidade (GODINO et al., 1996).

Quando aplicamos a ideia de Probabilidade a situações no mundo físico ou

natural, como na meteorologia, no resultado das eleições, acidentes, etc. nos

deparamos com situações onde não podemos aplicar o princípio da equiprobabilidade. Usando

o conceito de Probabilidade de frequência, ou Probabilidade frequencial, poderíamos

considerar que um objeto é membro aleatório de uma classe se o escolhermos por um método

que forneça a cada membro da classe uma determinada frequência relativa "a priori"

(BATANERO, 2001, p. 14. Tradução nossa).

A principal característica desta abordagem é que a Probabilidade de um evento vem de

um processo de experimentação. Para Batanero (2001), esta definição é muito útil quando

temos estatísticas sobre um grande número de casos, embora tenhamos o problema teórico de

Page 32: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

31

decidir quantos experimentos são necessários para considerar que, a partir deste número,

teríamos suficientemente provada a natureza aleatória do objeto. É importante ressaltar que

esta definição de Probabilidade não prevê ainda um valor exato da Probabilidade, mas apenas

uma estimativa do mesmo (Batanero, 2001).

Nesta concepção, segundo Godino, Batanero e Cañizares (1996), a Probabilidade é

dada pela frequência relativa de sucessos obtidos na realização de um experimento. Por

exemplo, denominemos X um evento considerado sucesso. Realizamos o mesmo experimento

repetidas vezes e anotamos as ocasiões em que ocorre X. A razão entre o número de vezes que

sucede X e o número total de repetições n (razão frequencial ou frequência relativa de X)

assume o padrão de um limite, quando n tende para o infinito.

Para Batanero (2001), na concepção subjetiva, a decisão sobre se um objeto é ou não

um membro aleatório de uma classe depende do conhecimento que temos sobre ele. Neste

caso, levamos em consideração que o que pode ser aleatório para uma pessoa pode não ser

para outra. Nesta concepção, a aleatoriedade não é uma propriedade física "Objetiva", mas

tem um caráter subjetivo. Nesta perspectiva, a Probabilidade é influenciada pelas experiências

pessoais e as crenças do indivíduo que realiza o experimento. O indivíduo utiliza seu

conhecimento sobre determinado assunto para estabelecer a Probabilidade de um sucesso e a

avaliação da Probabilidade pode deixar de ser um fato inerente às ideias do aluno e passar a

ser centrada no aluno, permitindo que este utilize o cálculo de Probabilidades em situações de

seu cotidiano.

Na visão de Godino, Batanero e Cañizares (1996), a concepção formal ou axiomática,

também conhecida como objetiva ou normativa, baseia-se na teoria de conjuntos e surgiu para

suprir as restrições da concepção clássica, uma vez que esta impõe que os sucessos sejam

equiprováveis e que correspondam a um espaço amostral finito. Este conceito permite calcular

com precisão a Probabilidade de determinados eventos a partir de leis matemáticas, podendo

ser usado em situações onde eventos não sejam equiprováveis ou finitos.

Apresentamos a seguir um quadro elaborado por Batanero (2006), que organiza e

resume e complementa as ideias até aqui apresentadas sobre as concepções de Probabilidade:

Page 33: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

32

Significado da

Probabilidade

Problemas

analisados

Procedimentos Linguagem Definições e

propriedades

Alguns

conceitos

relacionados

Intuitivo Sorteios,

adivinhação.

Manipulação de

geradores de

azar: dados,

cartas...

Linguagem

ordinária

(natural).

Opinião

imprevisível,

crença.

Sorte, destino.

Clássico Cálculo de

esperança e

riscos em

jogos de azar.

Combinatória,

proporção,

análise a priori

da estrutura do

experimento.

Triângulo

aritmético,

listas de

eventos,

fórmulas

combinatórias

Quociente de

casos favoráveis e

possíveis,

equiprobabilidade

de eventos

simples.

Esperança,

equitatividade,

independência

Frequentista Estimativa de

parâmetros

em

populações.

Registros de

dados

estatísticos a

posteriori,

ajuste de curvas

matemáticas,

análise

matemática,

simulação.

Tabelas e

gráficos

estatísticos,

curvas de

densidade,

tabelas de

números

aleatórios,

tabelas de

distribuições.

Limites das

frequências

relativas, caráter

objetivo

embasado na

evidência

empírica

Frequência

relativa,

universo,

variável

aleatória,

distribuição da

Probabilidade.

Subjetivo Melhoria do

conhecimento

sobre eventos

incertos,

inclusive não

repetíveis.

Teorema de

Bayes,

designação

subjetiva de

Probabilidades.

Expressão da

Probabilidade

condicional.

Caráter subjetivo,

que pode ser

revisto a partir da

experiência.

Probabilidade

condicional,

distribuições a

priori e a

posteriori.

Axiomático Quantificar a

incerteza de

resultados em

experimentos

aleatórios

abstratos.

Teoria dos

conjuntos,

Álgebra de

conjuntos,

Teoria da

medida.

Símbolos

relacionados à

Teoria dos

conjuntos.

Função

mensurável.

Espaço

amostral,

espaço de

Probabilidade,

Conjuntos de

Borel.

Quadro 2: Elementos que caracterizam os diferentes significados da Probabilidade (tradução livre de

BATANERO, 2006, p.4)

Para a autora, a indefinição do conceito de Probabilidade se deve, por um lado, aos

seus diversos significados que afetam os tipos de problemas que se são resolvidos, a forma de

se atribuir Probabilidades e até mesmo suas propriedades, conceitos relacionados e

terminologia resumidos no quadro apresentado (BATANERO, 2005, apud BATANERO,

2006, p. 5). O significado matemático-axiomático é um significado estrutural, que responde a

uma problemática de organização e estruturação dos demais significados parciais de

Probabilidade. Além disso, na vida real, estes significados são, muitas vezes, misturados

numa mesma situação (BATANERO, 2006). A autora assevera que os diferentes significados

de Probabilidade devem ser trabalhados progressivamente, partindo das noções intuitivas dos

próprios alunos sobre o acaso e Probabilidade, já que a compreensão é um processo contínuo

e crescente, por meio do qual o aluno constrói e relaciona progressivamente os diferentes

Page 34: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

33

elementos do significado do conceito. Completa que se faz necessária uma “passagem

flexível” entre os distintos significados parciais obtidos após um processo de estudos

prolongado, que deve ser planificado e distribuído entre os diferentes níveis de ensino.

Muitos problemas que envolvem uma tomada de decisão, fazer um julgamento ou uma

previsão estão abertos ou possuem mais de uma eventual decisão e sua solução envolve tanto

fatores matemáticos como não matemáticos.

Embora o ensino de Probabilidade já tenha uma forte tradição no Ensino Médio, os

documentos oficiais sugerem uma mudança de metodologia para o ensino de Probabilidade

nesta modalidade de ensino, recomendando a utilização, tanto da abordagem clássica, como

da frequencial de Probabilidade - a última, baseada em simulações ou experimentos.

O conhecimento teórico das diferentes concepções de Probabilidade por parte do

professor faz-se necessária para que ele desenvolva a habilidade necessária para realizar a

devida articulação entre os conceitos e a prática, em especial, com as ideias sobre

Probabilidade já existentes na formação do aluno, seja por conhecimentos matemáticos

prévios ou mesmo por noções intuitivas pré-existentes. No capítulo seguinte apresentamos

algumas pesquisas relacionadas ao desenvolvimento profissional de professores que ensinam

Matemática, em especial, estocástica, bem como nosso entendimento sobre desenvolvimento

profissional de professores além de justificarmos nossa opção por este termo.

Como Lopes (1999), acreditamos que seja necessário desenvolver uma prática

pedagógica na qual sejam propostas situações em que os estudantes realizem atividades, que

permitam observação e construção de um espaço amostral, através de experimentação

concreta. O professor não deve se ater a uma única abordagem. Para tanto, ele deve conhecer

as diferentes abordagens, representações e modelos sobre Probabilidade, além de possuir o

conhecimento didático13

necessário para assumir a melhor postura diante das situações que

poderá enfrentar em sala de aula, durante o ensino de Probabilidade.

Antes de encerrarmos este capítulo, citamos as palavras de Godino (2000, apud

LOPES, 2003, p. 50) ao considerar que a Educação Matemática deve contemplar a teoria, o

desenvolvimento e a prática, pois:

é um sistema social, heterogêneo e complexo no qual é necessário distinguir ao

menos três componentes ou campos: a ação prática e reflexiva sobre os processos de

ensino e aprendizagem das matemáticas; a tecnologia didática, que se propõe a

desenvolver materiais e recursos, usando os conhecimentos científicos disponíveis e

a investigação científica, que trata de compreender o funcionamento do ensino e da

Matemática em seu conjunto, assim como os dos sistemas didáticos específicos

(professor, estudantes e conhecimento matemático).

13

O conhecimento didático necessário ao professor que ensina Probabilidade foi abordado neste texto.

Page 35: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

34

O próximo capítulo traz algumas ideias sobre desenvolvimento profissional extraída

de nossa revisão de literatura. Vale ressaltar que, ao analisarmos as concepções de outros

autores e criarmos as nossas, levamos em consideração diversos aspectos ressaltados neste

primeiro capítulo, em especial, a necessidade de se propor um ensino menos formal. Tal

proposta corrobora é destacada por Batanero (2006), pela Proposta Curricular de Minas

Gerais analisada por Lopes (1998) e pela versão atualizada desta proposta (CBC), que sugere

ainda que o professor opte por utilizar diferentes opções metodológicas e avaliação contínua e

diversificada.

Page 36: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

35

Capítulo 2.

Desenvolvimento profissional de professores que ensinam Matemática

Como professor não me é possível ajudar o educando a

superar sua ignorância se não supero permanentemente a

minha. Não posso ensinar o que não sei (FREIRE, 1996, p.

95).

Uma condição fundamental para a melhoria do ensino de Probabilidade é a preparação

adequada dos professores. Segundo Azcárate (1997), o movimento de reforma do ensino de

Probabilidade nos níveis obrigatórios deve gerar um profundo debate sobre o conhecimento

profissional desejável aos professores. Apesar de muitos professores da Educação Básica

possuírem formação em Matemática, poucos deles receberam formação específica sobre

ensino de Estatística ou de Probabilidade. Dessa forma, muitas vezes, podem não tomar

conhecimento de pesquisas que apontam resultados de investigações sobre as dificuldades

apresentadas por alunos durante o ensino de Probabilidade, o que pode prejudicar não só o

desenvolvimento de seu raciocínio probabilístico como a capacidade de perceber e detectar as

dificuldades de seus alunos e de construir tarefas que lhes permitam superá-las.

Franklin e Mewborn (2006, apud CONTRERAS et al, 2010) destacam a importância

da formação de grupos de investigação e de os departamentos universitários darem apoio aos

professores, auxiliando na sua formação.

Neste cenário, a formação e o desenvolvimento profissional do professor passam a

desempenhar um papel essencial. Segundo Contreras et al (2010), apesar das exigências de

documentos oficiais e das novas diretrizes propostas ou impostas pelos governos ou órgãos da

Educação, alguns professores podem não estar familiarizados com a metodologia sugerida por

estas propostas. Estes autores asseguram, ainda, que sem a formação necessária para o ensino

de Probabilidade, os professores podem não se sentir seguros para lidar com algumas das

dificuldades e pré-conceitos sobre Probabilidade de seus alunos ou mesmo, ainda não estarem

capacitados para interpretar erros e raciocínios destes durante a resolução de alguma situação

problema, experimento ou jogo. Se a sua formação inicial foi focada em habilidades

matemáticas, priorizando a aplicação de fórmulas, pode se sentir inseguro com abordagens

mais informais, como as que utilizam realização de experimentos, jogos e textos. É

importante apoiá-los e proporcionar atividades que sirvam para conectar o conceitual e o

didático.

Page 37: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

36

Nosso propósito primordial é contribuir para o desenvolvimento profissional do

professor de Matemática da Educação Básica. Para isso, buscamos analisar o movimento de

produção de conhecimento probabilístico durante a participação em um grupo de estudos

sobre Probabilidade.

Nossa revisão de literatura priorizou os trabalhos de autores que realizaram estudos

com grupos de professores (FERREIRA, 2003; LOPES, 2003), estudos sobre saberes

profissionais TARDIF (2000) e TARDIF, LESSARD e LAHYAE (1991), e pesquisas com

professores atuantes e professores em formação, abordando o ensino de Probabilidade

(BATANERO, 2001; BATANERO e GODINO, J. D, 2002; CONTRERAS, BATANERO e

ORTIZ, 2010).

Neste capítulo, apresentamos nossa compreensão de desenvolvimento profissional e

dos saberes docentes necessários ao professor que ensina Matemática, consolidada a partir dos

teóricos mencionados.

2.1 Estudos de trabalhos com pensamento probabilístico e formação de professores:

ponto de partida para o trabalho de campo

Realizamos um estudo sobre trabalhos já existentes nas áreas de ensino de

Probabilidade, formação de professores de Matemática e, finalmente, as pesquisas que

envolviam os dois temas: formação de professores e ensino de Probabilidade. No

levantamento realizado no banco de teses da CAPES, em 2011, verificamos que, ainda que a

quantidade de trabalhos produzidos sobre ensino de Probabilidade e formação de professores

tenha aumentado nos últimos anos, a ideia de formar um grupo de estudos de Probabilidade

com professores de Matemática da Educação Básica e pesquisadores exigia que buscássemos

também, referencial teórico fora do Brasil.

Em seu estudo, Batanero (2010) buscou avaliar a existência de algumas intuições

probabilísticas incorretas em professores, bem como a eficácia do desenvolvimento de

oficinas educativas, com base em jogos paradoxais, buscando fazer o professor refletir sobre

essas intuições incorretas e promover uma mudança nas mesmas.

Esse estudo também propõe um modelo educativo que professores possam utilizar

com seus alunos no ensino de Probabilidade. A avaliação foi realizada com base na análise de

protocolos coletados em oficinas para formação de professores no México, Portugal e

Espanha, com um total de 166 participantes. A atividade da oficina foi retirada do estudo de

Fuller, Godino e Roa (2004, apud BATANERO, 2010), que a experimentou com uma

Page 38: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

37

pequena amostra de estudantes de estatística. Este trabalho visou avaliar se os resultados

descritos pelos autores são mantidos em uma amostra maior de sujeitos e, em particular,

professores em serviço. Os resultados indicam a necessidade de melhorar o conhecimento do

conteúdo probabilístico em professores, incluindo professores em exercício que, em uma

proporção substancial, mostraram intuições incorretas no início da atividade e não foram

capazes de dar uma demonstração plena da estratégia, mesmo quando identificada, ao final do

jogo.

A autora acredita que isso se deve ao fato de que a preparação matemática dos

professores em sua formação inicial se concentra no conhecimento geral do conteúdo, e seria

necessário complementá-lo com o que ela chama de um conhecimento especializado de

conteúdo, incluindo informações sobre os vícios de raciocínio probabilístico. Além disso,

destaca que os professores necessitam aprimorar o conhecimento didático do conteúdo,

incluindo aspectos como a metodologia e as representações de ensino, tais como as

demonstrações matemáticas acessíveis aos estudantes.

Corrêa (2010) realizou um estudo de caso a partir do discurso do docente sobre a sua

prática e seu objetivo foi reconhecer como o conhecimento profissional do professor de

Matemática influencia a abordagem da Probabilidade em suas aulas. Participaram de sua

pesquisa seis professores que cursaram licenciatura plena em Matemática, numa mesma

Instituição de ensino e obtiveram formação, tanto na disciplina Probabilidade quanto na

disciplina Estatística, com os mesmos professores. Estes critérios seriam utilizados mais tarde,

durante a construção de um conjunto de dados, a fim de que as variáveis de controle fossem

bem identificadas. O pesquisador utilizou uma entrevista categorizada em três níveis: a

primeira categoria se referia ao perfil dos profissionais, a segunda à formação docente e a

terceira à formação específica em Probabilidade desses professores. O autor analisou os

resultados à luz das concepções estabelecidas por Azcárate (1996) e, segundo o autor, dos seis

entrevistados, cinco apresentam uma concepção “não probabilística” da realidade e uma

pesquisada apresentou a concepção “probabilística intuitiva”.

Ao comparar seus resultados com os observados em Azcárate (1996) e Gonçalves

(2004)14

, o autor observou que, o ensino da Probabilidade caracterizado por uma visão

determinista (enfoque formal), pode tornar-se um entrave ao desenvolvimento do pensamento

probabilístico do indivíduo. Ele considera que o ensino de Probabilidade deve se desenvolver

14

Em suas pesquisas, esses autores encontraram que a grande maioria dos entrevistados possuíam as mesmas

concepções sobre Probabilidade.

Page 39: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

38

em diferentes perspectivas dialeticamente ligadas e limitar seu ensino a uma única abordagem

pouco contribui para aquisição de uma forma de pensar diferente da lógica dicotômica do

sim/não, na qual preside incerteza, campo intermediário onde atua a Probabilidade.

Os trabalhos de Lopes nos influenciaram, desde o primeiro momento, a partir da

escolha pela temática. Como envolvem o ensino de estocástica abrangendo desde a análise

curricular até pesquisas qualitativas realizadas com alunos ou com professores, os

consideramos de especial relevância tanto para a preparação do trabalho de campo, quanto

para a posterior análise dos resultados. Sua visão sobre desenvolvimento profissional e sobre

o ensino de Probabilidade permearam nossa pesquisa.

Em seu trabalho, Lopes (2003) realizou o que denominou uma “intervenção

planejada” com um grupo de professoras da Educação Infantil de uma escola da rede

particular de ensino de Campinas. A pesquisa se constituiu em uma produção colaborativa e

possibilitou a ampliação do conhecimento profissional das educadoras referente à estocástica,

do currículo e do processo de ensino e aprendizagem. Os dados de sua pesquisa ou foram

obtidos ao longo de três anos letivos a partir de questionários, entrevistas, relatórios e notas da

investigadora ou foram resultantes da reflexão coletiva de textos, discussões sobre aulas

filmadas e análises de atividades elaboradas e aplicadas pelas professoras. A autora realizou

estudos de caso das professoras e das coordenadoras participantes do grupo, buscando

identificar aspectos significativos de seus conhecimentos matemáticos, estatísticos e didáticos

e seus processos de desenvolvimento profissional, em um ambiente de trabalho colaborativo.

A autora defende um processo de formação que valorize o saber das professoras

participantes, que provoque reflexão sistemática sobre as questões abordadas, tornando-as

pesquisadoras de suas próprias práticas e capazes de produzirem coletivamente o

conhecimento.

As atividades realizadas permitiram que as docentes participantes se tornassem

construtoras do currículo e a pesquisa de Lopes (2003) mostra-nos o alcance que pode

assumir a realização de projetos colaborativos, nos quais intervenham educadores e

pesquisadores, oportunizando o desenvolvimento profissional dos participantes.

Outro trabalho de especial relevância para esta pesquisa foi o de Azcárate (1996),

realizado na Espanha com professores das séries iniciais. Em seu estudo, a autora buscou

identificar concepções sobre aleatoriedade e Probabilidade com o objetivo de utilizar as

informações obtidas em cursos de formação docente. Nele, Azcárate define quatro tipos de

concepções de Probabilidade para, posteriormente, classificar os professores pesquisados

Page 40: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

39

dentro destas categorias. Como o intuito de utilizarmos também tais concepções durante nossa

análise de resultados, faremos uma breve apresentação das ideias predominantes de cada uma

das concepções:

A concepção “não probabilística da realidade” caracteriza-se por uma falta de

compreensão do azar e/ou dos sucessos aleatórios, restringindo-os a algo desconhecido; não

considerando viável a predição de algo dependente do azar ou, simplesmente, consideram tal

predição como resposta a uma percepção pessoal, subjetiva, do que se espera que ocorra. As

respostas são baseadas em crenças, com modelos deterministas de raciocínio, sem

predominância do raciocínio estocástico. Em geral, indivíduos que possuem tal concepção não

aceitam o sucesso aleatório como um resultado dentre os muitos possíveis, em um

experimento aleatório (AZCÁRATE, 1996, apud GONÇALVES, 2004, p. 20).

Na concepção “probabilística intuitiva” os indivíduos possuem alguma compreensão

do azar e sua relação com sucessos aleatórios. Contudo, em geral, tal compreensão é parcial e

junto a um dos modelos concretos: ou utilizam como explicação de alguma característica

física do mecanismo de azar, ou o relacionam, exclusivamente, com fenômenos de massas.

Em geral, consideram aos fenômenos aleatórios como de difícil tratamento matemático, só o

veem como realizável em casos mais comuns, como os jogos de azar, por exemplo.

Reconhecem a aleatoriedade como uma propriedade de certos fenômenos da realidade, mas

seu tratamento probabilístico não é considerado como algo viável. O raciocínio, quando

submetido à incerteza, está dominado fundamentalmente por juízos heurísticos:

representatividade, disponibilidade, etc.; Suas respostas em geral não são normativas, mas

baseadas em sua experiência pessoal (AZCÁRATE, 1996, apud GONÇALVES, 2004, p. 20-

21).

Já o indivíduo que se encaixa na concepção “probabilística emergente” possui uma

relativa aceitação e compreensão das múltiplas representações matemáticas do azar,

reconhece o aleatório como algo possível de ser estudado. Manifesta um nível razoável de

elaboração nas respostas, podendo ser reconhecidas nestas uma diferenciação entre as crenças

intuitivas e os modelos matemáticos, apresentando certa habilidade para aplicar estes modelos

a problemas simples. Em geral, esta concepção supõe a presença de alguma instrução em

Probabilidade e Estatística, ainda que em caráter inicial (AZCÁRATE, 1996, apud

GONÇALVES, 2004, p. 21).

Finalmente, na concepção classificada pela autora como “normativa”, o indivíduo

reconhece a aleatoriedade como um modelo matemático que pode ser aplicado a certos

Page 41: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

40

fenômenos ou situações para estudá-las e tirar conclusões sobre seu funcionamento. É

também conhecedor de modelos matemáticos para o tratamento da incerteza (clássico,

frequentista, etc.). Apresenta habilidade para comparar e contrastar as diferentes situações

aleatórias em função dos referidos modelos, além de ser capaz de calcular a Probabilidade de

ocorrência de um evento reconhecendo as limitações de cada modelo. Em geral, são sujeitos

com um alto nível de formação e experiência no campo das Probabilidades. É um estado

dificilmente alcançado, inclusive pelos especialistas no tema, pois como comprovado em

diversos estudos, a maioria dos adultos faz uso, em sua vida cotidiana, de juízos heurísticos,

ainda que inconscientemente (AZCÁRATE, 1996, apud GONÇALVES, 2004, p. 22).

Apresentamos, a seguir, nossa concepção sobre a formação continuada de professores.

2.2 Formação e Desenvolvimento profissional do professor

A noção de formação continuada, historicamente, associa-se à ideia de frequentar

cursos visando alcançar resultados previamente determinados por instâncias externas à escola.

Mesmo na última década, persistem iniciativas dessa natureza, nas quais, a partir de

resultados e indicadores obtidos em avaliações em larga escala (nacionais ou regionais), são

propostas ações de formação15

para suprir deficiências curriculares apresentadas pelos alunos

em tais exames. Tais ações apresentam, na maioria das vezes, propostas desligadas da

realidade vivida pelos professores e que desconsideram os saberes, experiências e

necessidades dos mesmos.

Segundo Ponte (1995, 1998), a formação tanto pode favorecer o desenvolvimento

profissional do professor, quanto pode contribuir para reduzir sua criatividade, sua

autoconfiança, sua autonomia e seu sentido de responsabilidade profissional. Para esse autor,

a noção de formação está associada à ideia de frequentar cursos, em um movimento de fora

para dentro, no qual o professor detém o conhecimento e as informações que lhe são

transmitidos.

Em contraposição a essa ideia, Ponte (1995, 1998) propõe a noção de desenvolvimento

profissional. Essa perspectiva envolve um movimento que se dá de dentro para fora e envolve

a pessoa do professor como um todo. O docente é o sujeito que toma as decisões relacionadas

às questões que quer considerar. O desenvolvimento profissional pressupõe a abordagem de

15

Tanto as professoras participantes do estudo, quanto a professora pesquisadora Fernanda, trabalham na rede

pública estadual e vivenciaram estas situações antes e durante o ano no qual o grupo de estudos se reuniu.

Page 42: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

41

habilidades que o professor já possui, mas que podem ser desenvolvidas enquanto que a

formação procura atender principalmente às carências do professor. Além disso, considera as

experiências pessoais como aluno e como professor e está muito mais relacionado ao

processo, à busca consciente e intencional, às trocas de experiências e reflexões a partir de

trabalhos realizados e sobre a própria prática, etc.

Nesta perspectiva, o processo é mais importante que os resultados e, como acontece

constantemente de dentro para fora, possibilita considerar a teoria e a prática de forma

interligada (PONTE, 1998).

Acreditamos que devem ser oferecidas aos professores oportunidades de

desenvolvimento profissional, entendendo o termo segundo Ferreira (2003, p. 34):

Uma concepção que nos parece mais coerente com a nossa visão é a do

desenvolvimento profissional. Atualmente, ele tem sido entendido como um

conceito mais amplo, que envolve a formação inicial e continuada e vai

além, considerando as experiências como aluno e como professor, bem como

a própria história pessoal. (...) Essa perspectiva envolve todos os aspectos do

professor: cognitivo, afetivo e relacional e, ao invés de procurar sanar

carências do professor, envolve múltiplas atividades (cursos, elaboração de

projetos, leituras e reflexões etc.) e procura valorizar suas potencialidades,

considerando sua opinião e escolhas. O professor torna-se sujeito ativo e

responsável por seu desenvolvimento profissional.

Apesar de o ensino de Probabilidade ter ganhado espaço, inclusive em um bloco

próprio, nos PCN e na proposta curricular do estado, nossa prática na Educação Básica,

convivência com professores de Matemática, participação em reuniões, qualificações

oferecidas pela rede estadual e construções de projetos para a Educação Básica nos levam a

concluir que a Probabilidade é muito pouco trabalhada neste segmento, principalmente nas

séries finais do Ensino Fundamental.

As pesquisas sobre desenvolvimento profissional de professores que ensinam

Matemática têm apresentado estudos, na perspectiva do pesquisador-professor, com

resultados positivos. Em seu trabalho de estado da arte da pesquisa brasileira no que diz

respeito à formação de professores que ensinam Matemática, Ferreira (2000) constatou que, a

partir da década de 1990, começam a se desenvolver inúmeros estudos envolvendo projetos

coletivos, nos quais os sujeitos envolvidos não são meros participantes, mas atuam como

investigadores de suas práticas.

Bem como Ferreira (2003) e Lopes (2003), optamos por usar o termo desenvolvimento

profissional por acreditar que se trata de um processo por meio do qual novos conhecimentos

e habilidades vão se agregando aos saberes e à prática do professor. O desenvolvimento

Page 43: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

42

profissional pode ser entendido como uma dialética entre crenças, conhecimentos e

experiências prévias do professor e um novo conhecimento, gerando outros saberes e

influenciando sua prática (FERREIRA, 2003). O desenvolvimento profissional:

Destaca a combinação de processos formais e informais. O professor

não é um objeto distante, mas torna-se o sujeito do processo de

aprendizagem. É dada atenção ao conhecimento e aos aspectos

cognitivos, porém, também às questões afetivas e de relacionamento.

O objetivo não é a ‘normalização’ mas a promoção da

individualidade de cada professor (HARGREAVES, 1998, p.185,

apud LOPES, 2003, p.31).

Ao envolver um professor em um curso, encontro ou grupo de estudos, devemos

considerar os aspectos cognitivo e afetivo deste. É importante valorizar suas vivências e seus

saberes que incluem crenças, concepções, valores e expectativas, além dos conhecimentos

práticos e teóricos construídos pelo docente desde antes de seu curso de formação inicial. Eles

influenciarão diretamente as prováveis mudanças de pensamentos e na prática do professor. A

ideia é possibilitar que os professores se sintam como parceiros em um processo coletivo e

contínuo de construção de conhecimento e aperfeiçoamento de sua prática, onde

responsabilidades são divididas e conhecimentos são compartilhados.

Neste contexto, a formação de um grupo de estudos com professores e pesquisadores

se constitui um ambiente particularmente propício para o desenvolvimento profissional dos

envolvidos. A formação de grupos de estudos tem sido amplamente recomendada pela

literatura. Contudo, o número de pesquisas em estocástica, em especial, as que ressaltam o

potencial de grupos de estudo ou grupos de trabalho para o desenvolvimento profissional de

professores de Matemática ainda precisa aumentar significativamente. Para reforçarmos nossa

ideia, lançamos mão das palavras de Lopes e Moran (1999, p. 6):

Necessitamos de que o cenário da pesquisa em ensino da estocástica, no

Brasil, seja ampliado rapidamente para que possamos alcançar os objetivos

ressaltados pela proposta curricular brasileira e, assim, possamos formar, de

fato, cidadãos mais aptos a tomadas de decisão, especialmente em situações

envolvendo a presença do acaso. Consideramos que não basta verificar as

análises de avaliações realizadas, seja nos cursos ou nos livros didáticos,

pensamos que seja necessário o incentivo a pesquisas que alterem o atual

estado da arte dessa área do conhecimento.

Estudos como os desenvolvidos por Ferreira (2003) e Lopes (2003) evidenciam que a

participação em grupos de estudo pode proporcionar, por meio da reflexão sobre a própria

prática, o desenvolvimento profissional de seus participantes, bem como ricas discussões

acerca da atuação do professor em sala. A estrutura desses trabalhos baseia-se na necessidade

Page 44: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

43

de se perceber os docentes como parceiros de um processo coletivo de construção de

conhecimento, onde dividem responsabilidades no projeto desenvolvido.

Apostamos na criação de um grupo de estudos por acreditarmos em seu potencial para

o desenvolvimento profissional do professor que leciona Matemática e no conteúdo de

Probabilidade, na Educação Básica, por considerarmos que este pode e deve ser trabalhado de

maneira a provocar a criticidade e reflexão do indivíduo. Não se trata de um curso de extensão

ou de aperfeiçoamento com objetivo de tirar dúvidas, suprir dificuldades e/ou lacunas da

formação inicial, mas de um “caminhar juntos”, buscando sempre a formação de conceitos

sólidos sobre Probabilidade assim como a criação de dispositivos e contextos de soluções para

os problemas que afetam, direta ou indiretamente, professores e alunos.

Consideramos que o apoio dado aos professores, o espaço para compartilhar

experiências e a vivência de situações criativas que conduzam à reflexão sobre seus saberes,

práticas e atitudes são algumas das condições que favorecem o processo de mudança e de

desenvolvimento profissional do professor. Como Ferreira (2003), entendemos que o

desenvolvimento profissional do professor se dá ao longo de sua prática profissional e é

influenciado por crenças e valores desenvolvidos durante sua história de vida.

Ao realizarmos um estudo que envolve formação de professores e ensino de

Probabilidade a partir da formação de um grupo de estudos, buscamos observar o movimento

dos saberes profissionais dos professores participantes. Para tanto, faz-se necessário, antes,

discutir sobre saberes docentes, tópico abordado a seguir.

2.3 Ideias sobre saberes docentes

Pretendemos, aqui, analisar brevemente algumas concepções relacionadas aos

conceitos de saberes, especialmente de saberes profissionais do professor, considerando este

como um profissional que adquire e desenvolve conhecimentos a partir da prática e no

confronto com as condições de sua função. Daremos ênfase aos elementos que entendemos

facilitar a compreensão dos processos de ensino e aprendizagem de Probabilidade e/ou a

prática pedagógica de grupos de estudo.

Tardif (1991, 2000) dá à noção de “saber” um sentido bem amplo, que abrange os

conhecimentos, as competências, as habilidades (ou aptidões) e as atitudes, ou seja, segundo

ele, aquilo que, muitas vezes, foi chamado de saber, saber-fazer e saber-ser. Para ele, o

objetivo de existir uma epistemologia da prática profissional é revelar tais saberes, entender

como são integrados concretamente nas tarefas dos profissionais e como estes os integram,

Page 45: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

44

produzem, utilizam, aplicam e transformam em suas atividades de trabalho. Ela também busca

compreender a natureza desses saberes, assim como o papel que desempenham, tanto no

processo de trabalho docente, quanto em relação à identidade profissional dos professores

(TARDIF, 2000, p. 11).

Segundo Tardif, Lessard e Lahyae (1991), quanto mais um saber é desenvolvido,

formalizado, sistematizado, mais se revela longo e complexo o processo de aprendizagem por

exigir uma formalização e uma sistematização adequada. Neste trabalho, os autores

procuraram fazer um esboço da problemática do saber docente e suas interferências na prática

pedagógica, identificando as características e os diferentes tipos de saberes, a relação do

professor com os saberes e a valorização dos saberes da experiência e da prática e

profissional.

O mesmo autor, em outro trabalho, pondera a questão dos saberes profissionais e a sua

relação na problemática da profissionalização do ensino e da formação de professores. Ele

aposta na ideia de que a diferença entre as profissões está na natureza do conhecimento

profissional que, dentre outras coisas, exige uma formação contínua para acompanhar sua

evolução e sua utilização é de responsabilidade do próprio profissional. Para Tardif, os

saberes que professores adquirem e que mobilizam ao longo do tempo surgem a partir de

diversas fontes e sofrem a influência de um contexto sociocultural, levando em consideração a

sua trajetória de vida pessoal e profissional (TARDIF e GAUTHIER, 1999, apud TARDIF,

2000).

Em seu trabalho, Tardif, Lessard e Lahyae (1991), trazem uma reflexão sobre os

saberes da experiência. Para estes autores, a relação dos docentes com os saberes não se limita

à transmissão de conhecimentos prontos, uma vez que sua prática integra diferentes saberes

(os saberes das disciplinas, os curriculares, os da formação profissional e os saberes da

experiência) mantidos ao longo das diferentes relações. Os saberes experienciais, também

conhecidos como saberes práticos, surgem, quase sempre, da prática cotidiana do professor e

representam uma espécie de ‘fio condutor’ que orienta seu trabalho.

Concordamos com Tardif (2000) quando afirma que os saberes profissionais são

adquiridos ao longo do tempo e que uma boa parte do que os professores sabem sobre o

ensino, sobre os papéis do professor e sobre como ensinar provém de sua própria história de

vida, e, sobretudo, de sua história de vida escolar. Ele afirma, com razão, que o professor já

está mergulhado em seu universo de trabalho cerca de 16 anos antes de começar a trabalhar.

Para ele, essa imersão se manifesta através de toda uma bagagem de conhecimentos

Page 46: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

45

anteriores, de crenças, de representações e de certezas sobre a prática docente. Esses

fenômenos permanecem fortes e estáveis ao longo do tempo (TARDIF, 2000, p. 13).

Segundo Tardif (2000, p. 15):

os saberes profissionais dos professores têm uma certa unidade, não se trata

de uma unidade teórica ou conceitual, mas pragmática: como as diferentes

ferramentas de um artesão, eles fazem parte da mesma caixa de ferramentas,

porque o artesão pode precisar deles no exercício de suas atividades. A

natureza da relação entre o artesão e todas as suas ferramentas é, portanto,

pragmática: essas ferramentas constituem recursos concretos integrados ao

processo de trabalho, porque podem servir para fazer alguma coisa

específica relacionada com as tarefas que competem ao artesão. Ocorre o

mesmo com os saberes profissionais dos professores: eles estão a serviço da

ação (Durand, 1996) e é na ação que assumem seu significado e sua

utilidade.

Este teórico sustenta ainda que os saberes profissionais estão inseridos numa situação

de trabalho à qual devem atender. Logo, como as situações de trabalho colocam os

professores na presença uns dos outros acabam por acarretar um processo de negociação e

compreensão do significado de seu trabalho coletivo. A prática acaba se tornando um

processo de aprendizagem quando os professores dão novos sentidos à sua formação e criam

alternativas para desenvolverem suas atividades profissionais, incorporando, mantendo e/ou

adaptando tudo o que julga poder ser útil ao longo de sua prática.

Neste âmbito, sua experiência provoca um efeito de retomada crítica dos saberes

adquiridos antes da prática profissional. Ela acaba por selecionar alguns saberes dentre vários

outros, muitas vezes, avalia-os, transformando-os e reutilizando-os em sua prática educativa.

Os professores são os responsáveis por desenvolver e aperfeiçoar seus próprios saberes - e

devem ter consciência disso. Estes saberes estão intrinsecamente relacionados com o

professor, sua trajetória e sua experiência de vida.

2.3.1 Saberes acerca da Probabilidade e sua relação com a docência

Na presente pesquisa, nos interessam especialmente os saberes relacionados à

Probabilidade. Tanto os saberes do conteúdo em si – o que sabem os professores e o que seria

interessante construir com eles -, quanto os saberes relacionados ao como ensinar esse

conteúdo – o que envolve compreender as dificuldades enfrentadas pelos alunos, bem como

construir alternativas de superação.

Page 47: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

46

As dificuldades enfrentadas pelos professores da Educação Básica durante o ensino de

Probabilidade são citadas em vários estudos. Begg e Edwards (1999, apud BATANERO et al,

2012), em um trabalho com 22 professores em exercício, identificaram que a terça parte tinha

dificuldades com a ideia de evento equiprovável e poucos compreenderam o conceito de

independência.

Batanero, Cañizares e Godino (2005, apud BATANERO et al, 2012) identificaram

três tendências no raciocínio probabilístico de uma amostra de 132 professores do Ensino

Fundamental em formação:

a heurística da representatividade ou confiança excessiva em pequenas

amostras (Tversky e Kahneman, 1982), a tendência à equiprobabilidade ou

crença de que todos os eventos aleatórios são equiprováveis (Lecoutre, 1992)

e o foco no resultado ou dificuldade de interpretar uma questão de

probabilidade em termos probabilísticos (Konold, 1991) (BATANERO,

CAÑIZARES e GODINO, 2005, apud BATANERO et al, 2012, p. 228.

Tradução nossa).

Azcárate, Cardeñoso e Porlán (1998, apud BATANERO et al, 2012) analisaram as

respostas de 57 professores do ensino básico a um questionário, no qual eram descritos vários

eventos e se perguntavam se os professores os consideravam aleatórios. No geral, os

participantes mostraram uma concepção inconsistente de aleatoriedade, refletida, na maioria

dos casos, em argumentos causais e no não reconhecimento de situações aleatórias cotidianas.

Muitos participantes ainda consideraram fenômenos aleatórios como deterministas. Entre as

propriedades que foram corretamente percebidas pelos professores estão a diversidade de

possibilidades e a imprevisibilidade dos resultados.

Contreras, Batanero e Ortiz (2010) realizaram um estudo cujo objetivo foi avaliar a

existência de algumas intuições probabilísticas incorretas em professores e eficácia do

desenvolvimento de oficinas educativas com base em jogos paradoxais para fazer o professor

refletir sobre essas intuições incorretas e promover uma mudança nas mesmas. O estudo

também fornece um modelo que professores podem utilizar com seus alunos durante o ensino

de Probabilidade. A avaliação do estudo foi realizada com base na análise de protocolos

coletados em oficinas para formação de professores no México, Portugal e Espanha, com um

total de 166 participantes. O trabalho também possibilitou avaliar se os resultados descritos

pelos autores são mantidos em uma amostra maior de sujeitos e em professores que atuam em

sala de aula. Algumas das atividades realizadas neste estudo com professores bem como a

análise de resultados obtidos pelos autores foram objetos de estudos do grupo ao longo de

nossa pesquisa de campo.

Page 48: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

47

No Brasil, o trabalho de Corrêa (2010), já apresentado nesta pesquisa, aponta para

resultados semelhantes aos supracitados. Consideramos de realização urgente e necessária

tanto as pesquisas que busquem diagnosticar possíveis carências no conhecimento

profissional do professor que ensina Probabilidade, quanto o trabalho de pesquisadores e

universidades junto a este profissional, a fim de contribuir para seu desenvolvimento

profissional.

Shaughnessy (1986, apud BATANERO, 2010) acredita ser necessário desenvolvermos

modelos, ferramentas fidedignas de avaliação das concepções de Probabilidade de nossos

estudantes, e aponta para a urgência de serem realizados estudos sobre como os estudantes

pensam em chance, eventos aleatórios e decisões diante de situações de incertezas. Segundo o

autor, há uma lacuna em nosso conhecimento no que se refere aos saberes desses alunos

quanto à Probabilidade. Ele destaca, ainda, a necessidade de realização de cursos direcionados

às concepções equivocadas e crenças em Estocástica dos professores e, não obstante, uma

necessidade de sensibilização de nossos futuros professores no que concerne às concepções

equivocadas que os alunos apresentam. Esse teórico aposta na ideia de se formar sociedades

investigativas compostas por docentes e investigadores onde primeiros sejam co-

pesquisadores e os segundos co-professores, e que estes trabalhem juntos na criação e

execução de experimentos pedagógicos clínicos os quais, cuidadosamente, documentem

mudanças em concepções, crenças e atitudes de estudantes de Estocástica, ao longo de um

longo período, a fim de se obter um quadro claro do desenvolvimento cognitivo e afetivo em

Estocástica (SHAUGHNESSY, 1992, apud LOPES, 2003, p. 61).

Consideramos que textos e discussões sobre as principais concepções de Probabilidade

associadas a situações de aprendizagem que possibilitem a percepção e propiciem a discussão

das diferentes ideias sobre Probabilidade e da articulação dessas ideias com as experiências

pessoais dos professores participantes do grupo promovam, não apenas o desenvolvimento do

pensamento probabilístico dos professores, mas também momentos de reflexão sobre a

própria prática.

Após a elaboração dos dois capítulos teóricos é possível destacar os elementos que nos

marcaram e que terão papel crucial, tanto na escolha da metodologia a ser utilizada durante a

pesquisa, quanto na análise dos resultados obtidos. Após identificarmos a importância do

ensino de Probabilidade na Educação Básica para a formação escolar e cidadã do indivíduo,

analisarmos como este ensino tem sido orientado até então e conhecermos e refletirmos sobre

a formação do professor que ensina Probabilidade e o que lhe é exigido para tanto, é possível

Page 49: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

48

identificar também, pontos que devem receber atenção especial durante o trabalho de análise,

podendo até norteá-lo.

O capítulo seguinte traz uma explanação da metodologia utilizada durante a pesquisa,

além da descrição do processo vivido durante os oito meses de trabalho de campo. Como

apresentar todo o volume de atividades trabalhadas, bem como todas as transcrições de

encontros seria inviável, apresentamos alguns “recortes” que consideramos necessários ao

entendimento do leitor.

Page 50: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

49

Capítulo 3.

A Metodologia da Pesquisa

A teoria da Probabilidade é, no fundo, nada além de um senso

comum reduzido a cálculo; nos permite ver com exatidão

aquilo que as mentes rigorosas podem sentir com uma espécie

de instinto que às vezes não conseguem explicar; ensina-nos a

evitar as ilusões que com frequência nos enganam ... não há

ciência mais digna de nossa contemplação, nem mais útil

para ser incluída em nosso sistema de educação pública

(LAPLACE, 1986/1825, p. 206-207).

Esta pesquisa surgiu de um interesse especial pelo tema Probabilidade, da vontade de

tornar seu ensino efetivo, mais interessante e atraente aos olhos dos professores e alunos.

Após realizarmos diversas leituras que abordavam os processos de ensino e

aprendizagem de Probabilidade, e movidos pelo desejo de contribuir com a aprendizagem dos

alunos e professores, surge a ideia de buscar mais profissionais que, de alguma maneira,

também compartilhem de nossa inquietação e que sintam necessidade de provocar mudanças.

Criamos, então, o Grupo de Estudos sobre Probabilidade, no qual pesquisadoras e

professoras dispõem de um tempo, espaço e de liberdade para discutir, expressar suas ideias,

aprender e ensinar, ampliar seus saberes e refletir sobre sua prática. Pode-se dizer que as

professoras são movidas, exclusivamente, pela vontade de aperfeiçoar sua prática e oferecer

um ensino de melhor qualidade a seus alunos enquanto que a pesquisadora, além de

compartilhar desta vontade, busca estudar os processos de constituição e consolidação do

grupo de trabalho e suas possíveis contribuições.

3.1. Questão de investigação e objetivos

Entendendo o desenvolvimento profissional de professores como um processo que vai

além da formação inicial e continuada, que é influenciado pelas experiências acadêmicas

(como aluno) e profissionais (como professor), bem como pelas leituras, contato com colegas,

oportunidades de aprendizagem variadas (seminários, cursos, palestras, oficinas, etc.), e que

se estende ao longo da vida profissional do sujeito, propomos a criação de um grupo de

estudos de Probabilidade, com professores de Matemática em Conselheiro Lafaiete - MG.

A partir da problemática desenvolvida anteriormente, recortamos a seguinte questão

de investigação:

Page 51: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

50

Como a participação em um grupo de estudos contribui para o desenvolvimento do

pensamento probabilístico de professores que lecionam Matemática na Educação Básica?

Tal estudo tem duas dimensões: uma dimensão educativa e uma dimensão de pesquisa.

Enquanto oportunidade de educação continuada, seu propósito principal é contribuir para o

desenvolvimento profissional e, mais especificamente, para o desenvolvimento do

pensamento probabilístico de professores que lecionam Matemática. Enquanto pesquisa,

buscamos analisar o processo de constituição e consolidação de um grupo de estudos

envolvendo professores e pesquisador, cujo foco é o ensino de Probabilidade e o

desenvolvimento do pensamento probabilístico.

Para Minayo (2011), “o ser humano se distingue não só por agir, mas por pensar sobre

o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com

seus semelhantes”.

Entendendo que a pesquisa qualitativa, segundo Minayo (2011), trabalha com o

universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes,

e considerando a natureza da questão de investigação e da dinâmica proposta para o grupo de

estudos, adotamos uma abordagem qualitativa para esta pesquisa. Dessa forma, analisamos o

processo vivido pelo grupo em sua totalidade, buscando revelar tanto o valor das atividades

desenvolvidas com o grupo, na concepção deste, quanto a possível mobilização de saberes ao

longo do trabalho.

De acordo com os objetivos da nossa pesquisa, assumimos a incumbência de

investigar o processo de desenvolvimento profissional de professores participantes de um

grupo estudos sobre Probabilidade e de participar desse processo como membro do grupo.

Durante todos os meses de realização da pesquisa, atuamos, ao mesmo tempo, como

pesquisadora (por estarmos interessadas no processo de formação e constituição do grupo),

professora participante (por realizarmos a maioria das atividades realizadas pelo grupo,

discutirmos e solicitarmos contribuições das demais professoras) e formadora (por

elaborarmos as atividades a serem desenvolvidas e direcionarmos a maioria dos encontros).

Em nosso trabalho de campo, nos preocupamos tanto em desenvolver nossa proposta

de pesquisa quanto em contribuir com o desenvolvimento profissional das professoras.

Colocamo-nos à disposição para ajudá-las com suas classes, caso desejassem implantar

alguma(s) de nossa(s) proposta(s), sem exercermos qualquer “pressão” nesse sentido. Assim,

o respeito por cada participante, por sua atuação profissional e por suas contribuições ao

grupo, permeou todo o trabalho.

Page 52: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

51

Desde o início do trabalho de campo, temíamos que o envolvimento, a proximidade e

a sintonia entre pesquisadora e participantes pudessem comprometer, de alguma forma, a

análise final dos dados. Nesse sentido, optamos por utilizar diferentes técnicas de coleta de

dados, ampliando a possibilidade de interpretá-los de modo mais rigoroso. Tais opções serão

tratadas mais adiante.

3.2 Contexto e Participantes

Realizamos a nossa pesquisa na cidade de Conselheiro Lafaiete, Minas Gerais. O

município possui cerca de 130 mil habitantes (no ano de 2012) e está situado a

aproximadamente 100 quilômetros da capital do estado, Belo Horizonte.

As participantes da pesquisa são professoras que lecionam Matemática na Educação

Básica na referida cidade. O convite para participar do Grupo de Estudos sobre Probabilidade

foi feito a todos os professores que lecionam Matemática na Educação Básica, por meio da

carta-convite enviada via e-mail para as escolas da cidade. Ao todo, foram convidados

professores de mais de 40 escolas de Educação Básica da cidade. O convite foi também

formalizado pessoalmente por uma das pesquisadoras, que visitou a maioria das escolas da

cidade e apresentou a proposta da pesquisa (impressa) aos diretores e/ou supervisores das

instituições visitadas para que a divulgassem junto aos professores. Devido à grande

quantidade de escolas e, consequentemente, professores, não foi possível realizar o convite

pessoalmente aos docentes, salvo nos casos nos quais a pesquisadora chegava à escola durante

o horário de recreio. O convite foi estendido aos professores das séries iniciais da Educação

Básica, já que, como citado anteriormente, o ensino de Probabilidade, segundo os documentos

oficiais, deve iniciar-se neste nível de ensino. Contudo, o grupo não conta com profissionais

desta modalidade de ensino.

A exigência inicial para participar do grupo de estudos sobre Probabilidade era ser

professor (a) da Educação Básica em Conselheiro Lafaiete, lecionar ou já ter lecionado16

Matemática para este nível de ensino, desejar participar do grupo de trabalho e possuir

disponibilidade para participar dos encontros do grupo. Informamos que a participação no

grupo de estudos era voluntária e que o professor poderia se desvincular do grupo a qualquer

momento, caso desejasse.

Inicialmente, a proposta apresentada ao grupo era de se reunir semanalmente e, em

algumas ocasiões, quinzenalmente. Contudo, devido à existência de sábados letivos, festas e

16

O convite foi extensivo aos professores que já ensinaram Matemática mesmo que, no momento da pesquisa,

não estivessem mais lecionando esta disciplina.

Page 53: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

52

comemorações comumente realizadas nas manhãs de sábado (Dia das Mães, Dia dos Pais,

festas juninas, etc.) muito frequentes nas escolas da cidade e, não necessariamente

coincidentes para todas as professoras participantes, alguns encontros tiveram espaços de

tempo maiores entre si.

No primeiro encontro, foi apresentada aos professores a proposta de constituir um

grupo de estudos no qual pesquisador e professores teriam um espaço para discutir, estudar e

criar alternativas para o ensino de Probabilidade. Esclarecemos que pretendíamos criar um

espaço onde a opinião de cada um fosse importante, onde todos poderiam participar das

decisões e escolhas. Informamos que a proposta de criação do grupo estava ligada a um

projeto de pesquisa que pleiteava acompanhar e observar o processo vivido pelo grupo,

justificando o uso das informações coletadas como dados da pesquisa.

Nessa ocasião, foi-lhes garantido o direito de acesso e aprovação das informações,

transcrições de encontros e análises produzidas por eles, a serem utilizadas no trabalho, antes

de uma versão final. Foram discutidas as melhores opções de dias, horário e local dos

encontros.

O primeiro encontro foi realizado no dia 5 de maio de 2012, às 10 horas da manhã, em

uma sala de aula de uma escola estadual de Conselheiro Lafaiete, local onde uma das

pesquisadoras leciona Matemática na Educação Básica. Os demais encontros também

ocorreram nas manhãs de sábado, no mesmo espaço, gentilmente cedido pela diretora da

escola, uma vez que as professoras participantes concordaram com a localização.

O local do primeiro encontro foi definido pela professora-pesquisadora, após visitar

diversas escolas da cidade, com vistas a priorizar a facilidade de acesso dos professores, já

que a escola possui uma localização central, sendo de fácil acesso para aqueles que

desejassem utilizar o transporte público, ou mesmo que optassem por caminhar do centro da

cidade até a escola. Nos dois primeiros encontros, a pesquisadora deixou livre a opção de

mudança do local. Contudo, as pesquisadas optaram por continuar se encontrando naquele

espaço.

3.2.1. Conhecendo as professoras participantes

Apenas três professoras participaram desta investigação. Todas professoras de

Matemática na Educação Básica em escolas públicas municipais e/ou estaduais de

Conselheiro Lafaiete. Optamos por utilizar pseudônimos para identificá-las durante este

trabalho, a fim de preservarmos suas identidades.

Page 54: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

53

As professoras, no momento da pesquisa, trabalhavam com séries finais do Ensino

Fundamental. Todas possuem o curso de licenciatura em Matemática e duas delas possuem

pós-graduação latu sensu. Durante quase todo o período da pesquisa, todas as professoras

ensinaram Matemática em duas escolas, ou seja, dois turnos de trabalho, e se encontraram

semanalmente, em algumas ocasiões, quinzenalmente, nas manhãs de sábado para as reuniões

do Grupo de Estudos.

Apresentamos, a seguir, cada uma delas. Os textos foram redigidos com base nas

respostas dadas pelas professoras a dois instrumentos utilizados durante a pesquisa; um

aplicado no primeiro encontro e outro no sexto mês do trabalho de campo17

. Além disso,

utilizamos informações advindas de conversas realizadas ao longo dos encontros, notas de

nosso diário de campo ou de registros do caderno de campo das próprias professoras.

Alice

Alice é solteira, reside e trabalha em Conselheiro Lafaiete e leciona Matemática para

alunos da Educação Básica, mais especificamente, para o Ensino Fundamental (6º ao 9º ano).

É professora de Matemática há 10 anos e trabalha de segunda a sexta nos turnos da manhã e

da tarde18

.

É uma pessoa alegre e extrovertida, sempre faz brincadeiras e piadinhas durante os

encontros do grupo, além de se sentir à vontade para expressar suas opiniões, divulgar seus

resultados ou apresentar suas dúvidas para o grupo. É prestativa e solidária. Sempre que julga

necessário, lança mão do material manipulativo, disponível em todos os encontros do grupo,

para esclarecer a dúvida de uma colega, ou para contribuir para a formação correta de um

conceito por parte de uma das outras professoras do grupo.

A professora afirma ter estudado Probabilidade durante a licenciatura, com ênfase em

aplicações de fórmulas e cálculos. Para ela, as atividades sobre Probabilidade na Educação

básica podem colaborar na tomada de decisões do cotidiano e contribuir para o

desenvolvimento do aluno.

Afirma gostar de Matemática e, por diversas vezes, mostrou-se interessada em

aprender novas metodologias para aperfeiçoar sua atuação em sala de aula. Mostra-se sempre

muito interessada pelas atividades do grupo, por novas maneiras de se ensinar Matemática.

Quando questionada sobre o que se lembrava da disciplina em que estudou Probabilidade na

graduação, Alice destaca: “Muitos cálculos, muitas fórmulas e pouco desenvolvimento do

17

Apêndices 2 e 3. 18

Durante a pesquisa, Alice frequentava o curso de Engenharia Civil, no período noturno.

Page 55: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

54

pensamento probabilístico. O professor da faculdade nos ensinava mais os cálculos”

(entrevista, 18/10/2012).

Bruna

Bruna é a mais experiente do grupo, leciona Matemática há 17 anos e, na época do

estudo, trabalhava com as séries finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) em duas escolas

públicas estaduais da cidade de Conselheiro Lafaiete, onde reside. A professora trabalha nos

turnos manhã e tarde e afirma ter estudado Probabilidade durante a licenciatura em

Matemática. Contudo, não se recorda muito bem da abordagem que era feita durante as aulas;

apenas que a maioria das atividades eram “escritas”.

Costumava trabalhar com questões de Probabilidade que intitula como “simples”,

segundo ela, para que o aluno pudesse dar respostas de seu cotidiano. Ela era considerada

pelas demais integrantes do grupo como “esperta” e, às vezes, “de sorte”, provavelmente

porque, em algumas ocasiões, descobrira com agilidade a melhor estratégia para se jogar

alguns dos jogos propostos.

Apesar de não se lembrar de como foi o seu contato, enquanto aluna, com o tema

Probabilidade, acredita que trabalhar com experiências pode ser um ingrediente especial para

os processos de ensino e aprendizagem nas classes de Educação Básica: “A percepção pelo

aluno que escolhas aleatórias não dependem da sorte, quanto maior o número de

experimentos, as chances tende a ser iguais, e que algumas são impossíveis de ocorrer”

(entrevista, 15/10/2012).

Paula

Possui uma personalidade alegre, gentil e compromissada. Afirma gostar de

Matemática, motivo pelo qual escolhera o curso de licenciatura. Paula nasceu e cresceu em

uma cidade vizinha, mas trabalhava e residia em Conselheiro Lafaiete, na época do estudo.

Ensinava Matemática há mais ou menos um ano e meio e trabalhava com as séries finais do

Ensino Fundamental e com o Ensino Médio. Desde o início, mostrou-se interessada e

entusiasmada em participar do grupo.

Afirmava amar sua profissão e dedicar-se ao máximo para ser uma boa educadora.

Considera a escola um espaço de aprendizagem e pesquisa, inclusive, para aprender com seus

alunos. Cursou a licenciatura na modalidade à distância e teve contato com Probabilidade em

uma disciplina que afirma ter sido muito breve. Seu comportamento no grupo era marcado

Page 56: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

55

pela vontade de aprender e de se aperfeiçoar. Às vezes tímida, mas sempre atentas em busca

de novos conhecimentos.

Acreditava que conhecimentos sobre Probabilidade poderiam levar o aluno a

desenvolver seu raciocínio lógico, tornando a aula de Matemática mais dinâmica. Em nosso

instrumento inicial (05/05/2012), Paula afirmou nunca ter ensinado Probabilidade. Contudo,

ao realizar atividades sobre o assunto no grupo de estudos, já na segunda semana da pesquisa,

comprou material manipulativo e realizou alguns dos experimentos já realizados pelo grupo

em duas de suas classes do Ensino Fundamental.

3.3. Desenvolvimento da Pesquisa

De maio a dezembro de 2012, realizamos quatorze encontros19

de duas horas e meia a

três horas de duração cada. Com o intuito de contribuir para o desenvolvimento profissional

dos professores, favorecendo o desenvolvimento de seu pensamento probabilístico e,

finalmente provocar uma reflexão sobre sua prática, realizamos nesses encontros atividades

variadas: a) resolução de problemas envolvendo as diversas concepções sobre Probabilidade;

b) realização de experimentos aleatórios e jogos envolvendo eventos dependentes e

independentes; c) exercícios envolvendo conceitos importantes para o estudo de

Probabilidades; d) análise e discussão de textos sobre o tema; e) análise de resoluções e

respostas de alunos a questões que envolvem Probabilidade e f) elaboração de alternativas

metodológicas para desenvolver o conteúdo de forma a favorecer o desenvolvimento do

pensamento probabilístico do aluno sem “podar” a ideia inicial que, em geral, possuem, mas

trabalhando-a, etc..

Em nossos encontros, procuramos promover a realização de experimentos aleatórios e

reflexões por meio de atividades diversificadas de Probabilidade que promovessem o

desenvolvimento de saberes profissionais, em particular daqueles que pudessem contribuir

para o desenvolvimento do pensamento probabilístico. Além disso, buscamos criar um espaço

de respeito mútuo e confiança, onde cada participante pudesse se sentir à vontade para

expressar suas ideias, relatar experiências pessoais privilegiando a troca de saberes e o

crescimento pessoal e profissional dos participantes.

As atividades desenvolvidas no grupo vieram de fontes diversas. A maioria foi

adaptada de artigos, dissertações e teses, sendo estas pesquisas realizadas com professores

e/ou alunos. Algumas atividades foram elaboradas pela pesquisadora juntamente com sua

19

Nos Apêndices, apresentamos alguns exemplos dos roteiros que organizamos na preparação dos encontros.

Page 57: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

56

orientadora. O objetivo principal de cada uma dessas atividades era discutir conceitos e

resoluções de problemas sobre Probabilidade, pensando em seu ensino e aprendizagem. As

professoras participantes apresentaram um interesse especial pelos problemas que geravam

competições, o que fez com que a disputa de jogos envolvendo cálculo de Probabilidades se

tornasse um fato constante, especialmente nos primeiros encontros.

3.3.1. Dinâmica dos encontros

Durante a elaboração das atividades, pesquisadora e orientadora procuraram elaborar

ou reelaborar atividades diversificadas, sempre priorizando aquelas que não costumam ser

trabalhadas em livros didáticos ou, pelo menos, a partir de uma abordagem diferente.

Consideramos que o professor regente de turma conhece bem o(s) livro(s) didático(s) com

o(s) qual(is) trabalha e, ao buscar uma oportunidade de desenvolvimento profissional, queira

ir além dos limites do material que utiliza, muitas vezes, diariamente.

Ao final de cada encontro, as professoras realizavam uma avaliação oral

(posteriormente transcrita a partir do áudio) ou escrita (em seu caderno de campo), onde foi

possível verificar, paralelamente ao processo vivido, o nível de interesse das professoras, bem

como a necessidade de novos trabalhos e/ou uma nova abordagem sobre determinado assunto.

Alguns encontros trataram da análise de respostas de alunos das salas de aulas das professoras

participantes do grupo.

Cada atividade trabalhada ao longo dos encontros tinha como propósito principal

promover o desenvolvimento do pensamento probabilístico das professoras participantes. Ao

final de cada atividade, cada professora expressava o raciocínio utilizado para desenvolvê-la e

este “compartilhar de ideias e saberes” tornou-se um momento muito especial, às vezes

esperado ansiosamente pelas professoras que, lançando mão do cálculo de Probabilidades, já

sabiam que ganhariam o jogo em questão, por exemplo, e socializavam prazerosamente seus

resultados. Ao compartilharmos nossa maneira de solucionar ou criar elementos para

desenvolver uma situação problema, muitas vezes expressas por meio de jogos ou

experimentações, acreditamos estar compartilhando nossos saberes e, consequentemente, nos

desenvolvendo profissionalmente.

Todo encontro era iniciado com um café, providenciado pela pesquisadora, seguido de

um pouco de conversa informal. Contudo, como típicas professoras, a conversa quase sempre

se limitava às salas de aula. A primeira fonte de informação se constituiu em um instrumento

inicial simplificado onde procuramos, basicamente, nos inteirar das ideias iniciais que cada

Page 58: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

57

educadora presente possuía sobre o Ensino de Probabilidade, bem como suas expectativas em

relação ao grupo de Estudos de Probabilidade. Este instrumento foi respondido pelos

professores no primeiro encontro do grupo. Na ocasião, também buscamos prestar

esclarecimentos acerca do desenvolvimento do trabalho de campo da pesquisa, evidenciando

nossos objetivos enquanto oportunidade de desenvolvimento profissional e pesquisa, com

vistas a estabelecer uma relação ética, expondo nossos propósitos e compromissos.

Em seguida, realizamos alguns experimentos que exploravam, basicamente, a ideia de

aleatoriedade. Nosso objetivo era perceber que ideia inicial os professores tinham de

aleatoriedade, ou mesmo se esta existia. A partir da realização dos experimentos e das

respostas das professoras aos questionamentos a elas apresentados, buscamos também

verificar indícios de concepções pré-existentes sobre “sorte” e “azar” e se conheciam

conceitos relacionados ao estudo de Probabilidade.

Em nossa pesquisa, optamos por não realizar entrevistas ou aplicar questionários

iniciais que buscassem identificar possíveis deficiências no conhecimento probabilístico dos

professores participantes para, então, criarmos uma sequência de atividades para serem

trabalhadas “a priori”. As atividades e os experimentos realizados, bem como os textos

discutidos durante os encontros, foram elaborados e situados pelas pesquisadoras durante todo

o período de realização dos encontros, de acordo com a necessidade do grupo.

Durante todo o processo, foram realizadas atividades que buscavam favorecer o

desenvolvimento do pensamento probabilístico dos professores, a maioria adaptada de

estudos realizados com alunos e/ou professores. Estas foram escolhidas, elaboradas e

organizadas priorizando:

- A realização, observação e reflexão sobre experimentos probabilísticos.

- A resolução de problemas a partir das diferentes concepções de Probabilidade.

- As leituras e discussões de textos sobre Probabilidade.

- A análise de respostas dadas a atividades realizadas por alunos das turmas onde as

professoras participantes lecionam Matemática.

As professoras eram incentivadas a socializar suas ideias, podendo dar e/ou receber

sugestões acerca das considerações do grupo. Esta dinâmica foi rapidamente agregada à

política de relacionamento do grupo onde, com frequência, presenciavam-se episódios onde

uma professora, a fim de contribuir com a formação correta de um conceito pela colega, ou

zelando pela resolução que ela julgava correta para determinada atividade, tomava alguns dos

diversos materiais manipuláveis presentes em todos os encontros para criar exemplos ou

Page 59: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

58

simular situações. Ao final de todo encontro, quando cada professora era convidada a fazer

uma avaliação, quase sempre elogiavam esta prática.

Buscamos desenvolver, analisar e refletir sobre atividades orientadas de ensino que

poderiam ser trabalhadas nos diversos níveis da educação básica, e esperávamos que as

professoras, quando julgassem conveniente, pudessem se sentir seguras e aptas a trabalhá-las

nas classes em que lecionam.

Contudo, logo nos primeiros encontros, as professoras manifestaram o interesse de

realizar alguns dos experimentos já efetuados em encontros do grupo em suas classes. Uma

das professoras comprou dados coloridos, realizou a atividade com duas de suas turmas e

classificou a experiência como positiva. Uma segunda professora pediu que a pesquisadora

fornecesse uma sequência de atividades, dentre as trabalhadas pelo grupo, para serem

trabalhadas em suas turmas de 8º ano. Na oportunidade, a pesquisadora se prontificou a ajudar

e participar, caso a regente julgasse necessário. Porém, tal convite não foi feito.

Realizamos nosso trabalho de campo de forma a favorecer a troca de experiências

entre os membros do grupo, buscando viabilizar a criação e reelaboração de atividades

coerentes com a prática e a dinâmica desenvolvida durante os encontros, a fim de que as

integrantes do grupo pudessem enxergar contribuições reais para a sua prática. Consideramos

que um ambiente criado para o estudo e pesquisa pode proporcionar ao professor participante

a oportunidade de analisar, avaliar e reconstruir sua metodologia de trabalho, contribuindo

assim, para seu desenvolvimento profissional, possibilitando que ele adicione à sua prática

uma nova cultura, baseada no diálogo, reflexão e coletivismo.

A seguir, apresentamos um quadro resumo elaborado para facilitar a visualização das

principais atividades realizadas ao longo da pesquisa de campo, seguidas de seus principais

objetivos.

Encontro Atividade Objetivos

Encontro

05/05/12

Instrumento inicial;

Atividade 1: as balas da Fernanda;

Atividade 2: Jogando com dados;

Preenchimento do TCLE

Apresentar a proposta da pesquisa;

Observar ideias iniciais sobre evento possível

e impossível, sorte azar, acaso.

Encontro

12/05/12

Confeccionar a capa do caderno de

campo;

Atividade - Experimento:

Lançamento de uma moeda –

questões.

Trabalhar com experimentos aleatórios,

registrar os resultados apresentados,

questionar sobre possíveis resultados.

Encontro

19/05/12

Atividade: Jogo da diferença.

Questões. Criar uma maneira de

tornar o jogo justo. Discussão sobre a

utilização do jogo em suas aulas.

Identificar o espaço amostral de um

experimento;

Desenvolver a capacidade de comparação

entre dois eventos;

Page 60: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

59

Utilizar as diferentes abordagens para o

cálculo de Probabilidades.

Encontro

26/05/12

Atividade 1: Lançamento de dados.

Atividade 2: Experimento.

Lançamento de moedas (na forma de

jogo).

Atividade 3: Experimento.

Lançamento de moedas (Variação do

jogo anterior).

Trabalhar ideias de aleatoriedade, chance,

acaso, incerteza;

Mobilizar conceitos de Probabilidade segundo

a visão Laplaciana;

Identificar o espaço amostral de um

experimento.

Trabalhar concepções de Probabilidade.

Encontro

02/06/12

Atividade 1: A aleatoriedade.

Atividade 2 - Analisando a ‘trapaça’

no jogo de moedas.

Atividade 3: O jogo de cartões da

Paula.

Estudar as noções de aleatoriedade, acaso,

equiprobabilidade, azar e sorte;

Trabalhar com eventos dependentes e eventos

independentes.

Trabalhar concepções de Probabilidade.

Encontro

23/06/12

Atividade 1: O sorteio.

Atividade 2: Problemas 1 a 5,

realizando comparação de

probabilidades. 1 ao 3 realizando

também o experimento.

Trabalhar com conceitos, a partir dos

experimentos realizados;

Comparação de probabilidades, possibilidade

de trabalhar com comparação de frações;

Associar os casos favoráveis ao sucesso, os

desfavoráveis ao fracasso.

Trabalhar concepções de Probabilidade.

Encontro

23/06/12

Atividade 1: Repetição da atividade

O sorteio.

Atividade 2: A escolha de um carro

para comprar.

Atividade 3: Adivinhando as fichas

(jogo).

Atividade : Moedas dependentes.

Calcular a probabilidade a partir do enfoque

clássico;

Explorar a ideia de eventos dependentes,

união e interseção de eventos e a negativa de

um evento (complemento);

Encontrar a melhor estratégia para se jogar o

jogo (3).

Encontro

18/08/12

Atividade 1: Desafios.

Atividade 2: As peças coloridas.

Análise e discussão de textos sobre

cálculos de Probabilidades.

Utilizar as diferentes abordagens para o

cálculo de Probabilidades;

Explorar a ideia de eventos dependentes, a

união e a interseção de eventos;

Trabalhar com a negativa ou complemento de

um evento.

Encontro

25/08/12

Atividade 1: A porta dos

desesperados (Monte Hall). Análise

de possíveis respostas de alunos.

Atividade 2: Experimentos com

balas.

A partir da maquete criada pela pesquisadora,

explorar todas as opções de escolha;

Retomar as ideias de eventos possíveis,

impossíveis, acaso, aleatoriedade.

10º

Encontro

01/09/12

Atividade 1: A porta dos

desesperados (retomando).

Atividade 2: Estudo de texto.

Discussão e cálculo das

Probabilidades nele contidas.

Cálculo de Probabilidades condicionais;

Discutir, a partir do texto, os usos e abusos da

Probabilidade.

Utilização de softwares ou páginas HTML

para realizarmos simulações.

Trabalhar eventos dependentes.

11º

Encontro

22/09/12

Atividade 1: O astrólogo e sua

sentença de morte.

Atividade 2: Classificando eventos.

Atividade 3: As bolas de tênis

coloridas

Atividade 4: Analisando respostas de

alunos.

Encontrar a melhor solução para o problema

do astrólogo;

Buscar uma formalização dos diversos

conceitos já trabalhados pelo grupo;

Criar “uma cultura” de analisar as respostas

dos alunos antes de tentar “consertá-las”.

Trabalhar eventos dependentes.

12º Atividade 1: Análise de respostas de Dar continuidade à analise das respostas de

Page 61: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

60

Encontro

29/09/12

alunos das professoras participantes.

Atividade 2: Textos com

formalização de conceitos.

alunos;

Formalizar conceitos importantes para os

processos de ensino e aprendizagem de

Probabilidade (pedido das professoras).

13º

Encontro

20/10/12

Atividade 1: Análise de respostas de

alunos das professoras participantes.

Realização de experimentos com

dados, gôndolas e moedas, bem como

do problema Monte Hall no

computador.

Dar continuidade à prática de analisar

respostas de alunos;

Trabalhar com um número maior de

experimentos durante as simulações realizadas

no computador.

14º

Encontro

01/12/12

Atividade 1: Simulação de

experimentos no computador (dados,

moedas)

Atividade 2: Atividade direcionada

onde cada professora analisa

respostas dadas por elas a questões

dos primeiros encontros.

Confraternização

Trabalhar concepções de Probabilidade.

Possibilitar uma reflexão por parte de cada

professora a partir da observação de ideias por

elas registradas em encontros iniciais.

Perceber mudanças em suas concepções

iniciais.

Agradecer a oportunidade de pesquisar e

aprender coletivamente.

Quadro 3: Resumo das principais atividades da pesquisa de campo

Antes de irmos a campo, baseados no estudo teórico sobre Probabilidade realizado,

traçamos algumas metas relativas ao conhecimento profissional que esperávamos que o

professor desenvolvesse ao longo dos encontros:

- perceber a aleatoriedade enquanto capacidade de identificar um experimento aleatório e

caracterizá-lo;

- identificar que experimentos aleatórios são experimentos que, ao serem repetidos sob as

mesmas condições, podem não produzir um mesmo resultado;

- reconhecer o caráter aleatório de fenômenos naturais e sociais compreendendo o significado

e a importância da Probabilidade como meio de prever resultados;

- conceber o sucesso aleatório como sendo um resultado entre os muitos possíveis dentro de

um experimento aleatório;

- desenvolver uma linguagem probabilística coerente e trabalhar o uso da representação

percentual;

- reconhecer claramente azar e sucessos de um experimento aleatório;

- desenvolver a capacidade de quantificar e fazer previsões em situações aplicadas a diversas

áreas do conhecimento humano e da vida cotidiana que envolvam o pensamento

probabilístico;

- diferenciar determinismo de aleatoriedade (utilizar denominadores grandes ou realizar um

experimento um grande número de vezes).

Page 62: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

61

Quanto ao espaço amostral, elaboramos atividades que favorecessem, no professor, o

desenvolvimento da capacidade de:

- entender o espaço amostral como conjunto de todos os resultados possíveis de um

experimento aleatório;

- identificar o espaço amostral de um experimento;

- criar diagramas ou tabelas que representem o espaço amostral de um experimento;

-reconhecer um evento como sendo o resultado ou subconjunto de resultados de um

experimento aleatório;

- representar dados por meio de conjuntos, explorando a união e interseção de eventos, além

de ser capaz de comparar dois eventos.

Buscando possibilitar a fiel análise dos resultados obtidos e almejando tornar possível

averiguar se os objetivos da pesquisa foram atingidos, buscamos diversificar os instrumentos

de coletas de dados. É feita, a seguir, uma breve apresentação dos mesmos.

3.4. A coleta de dados

Os dados da presente pesquisa foram coletados durante os meses de maio a dezembro

do ano de 2012. Para a coleta, foram utilizados diferentes instrumentos:

• Diário de campo

Ao longo de todo o processo, um caderno foi utilizado pela pesquisadora para registrar dados

tais como resultados dos experimentos realizados pelo grupo, impressões pessoais e das

professoras participantes, ideias e sugestões recebidas.

• Registros escritos pelas professoras

Cada professora recebeu, no primeiro encontro, um caderno de campo, o qual

utilizaria para desenvolver a parte escrita das atividades, registrar resultados dos experimentos

que realizasse, para anotar suas impressões e avaliações escritas dos encontros. Durante a

pesquisa, os cadernos eram recolhidos pela pesquisadora e levados por ela a cada encontro

com grupo. Após a conclusão do estudo e análise dos dados, os cadernos serão devolvidos às

professoras.

• Gravações em áudio

Com o consentimento das professoras participantes, todos os encontros, a partir do

segundo, foram gravados em áudio. Durante o decorrer da pesquisa e ao final da mesma, os

Page 63: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

62

14 encontros foram transcritos em sua totalidade. Das transcrições, extraímos a maior parte

dos dados considerados na pesquisa.

• Instrumentos I e II

Dois instrumentos foram utilizados a fim de conhecermos melhor as professoras

participantes. Deles extraímos informações importantes, como formação profissional,

experiências e percepções acerca do ensino e aprendizagem de Probabilidade. Tais

instrumentos foram importantes para a elaboração do perfil de cada participante da pesquisa

apresentado neste texto (Ver Apêndices B e C, p. 153 e 154).

Cada um dos instrumentos de coleta de dados foi muito importante tanto para a

montagem do capítulo que descreve o processo quanto para o capítulo de análise do processo

sendo fundamentais, inclusive, para nortear uma metodologia de análise. Todas as falas das

professoras e da pesquisadora foram extraídas das notas de campo e das transcrições de

gravações em áudio. Algumas imagens (fotos) ou digitalizações do caderno das professoras

também foram utilizadas para ilustrar nosso trabalho de campo, descrito no capítulo seguinte.

No próximo capítulo, descrevemos o processo vivido pelo grupo, a dinâmica

dos encontros, a diversidade de atividades e opções metodológicas adotadas durante o

processo e de como estas sofreram adaptações e/ou mudanças de acordo com a demanda do

grupo. A presença de transcrições das falas das participantes justifica-se pelo desejo de ‘dar

voz’ às participantes do estudo.

Page 64: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

63

Capítulo 4.

Os encontros do grupo de estudo de Probabilidade: descrição do processo

vivido

Terei que correr o sagrado risco do acaso. E substituirei o

destino pela Probabilidade. Clarice Lispector (1920-1977)

Neste capítulo, apresentamos uma descrição das atividades desenvolvidas pelo grupo

de estudos de Probabilidade em seus encontros. Dado o número de encontros e o grande

volume de informações gerado, optamos por apresentar apenas alguns deles, visando construir

uma visão panorâmica do trabalho realizado. A dinâmica dos encontros, conforme

mencionado na Metodologia, sempre envolvia um café – com conversas e trocas de

experiências – e atividades que eram apresentadas e vivenciadas pelas participantes. Ao final,

era realizada uma avaliação oral ou escrita do encontro.

No primeiro encontro, explicamos a proposta, apresentamos os objetivos da pesquisa e

o porquê de escolhermos o tema Probabilidade. Expusemos nossa visão sobre a importância

de se formar grupos de estudos com professores e esclarecemos que a participação no grupo

deveria ser espontânea, ou seja, o professor poderia se desvincular do grupo a qualquer

momento, caso julgasse conveniente. A professora orientadora, presente neste encontro,

participou do desenvolvimento das atividades propostas, bem como da posterior discussão.

No 2º encontro, as professoras receberam um caderno encapado com papel branco e

foram convidadas a fazer uma “arte” na capa. Essa arte deveria estar relacionada à ideia que

vinha à mente quando pensavam em Probabilidade.

Fig. 1: Capa do caderno de Alice Fig. 2: Capa do caderno de Paula

Page 65: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

64

Logo no início do encontro, Paula comentou que tinha ido para casa, na semana

anterior, refletindo sobre o primeiro encontro. Revelou ver a Probabilidade como um

conteúdo muito importante, porque oferece a oportunidade para se trabalhar jogos, mas que

ela nunca havia pensado nisso. Porém, destacou: a “Matemática está pouco interessante para o

aluno. Está chata. Mas se usarmos jogos durante o ensino de Probabilidade, podemos motivar

nossos alunos” (transcrição do 2º encontro, 12/05/12).

Neste dia, realizamos alguns experimentos que exploraram, basicamente, a ideia de

aleatoriedade. Nosso objetivo era perceber que noções as professoras tinham de aleatoriedade

e verificar se suas concepções sobre “sorte” e “azar” se tornariam perceptíveis, ou se

acreditavam fielmente nos resultados obtidos pelos cálculos matemáticos.

Ao longo dos encontros, sempre procuramos vincular as discussões do grupo à sala de

aula. Assim, durante a realização do experimento, propúnhamos comparações entre as noções

das participantes e as de seus alunos. A seguir, exibimos a primeira atividade:

Atividade: Experimento - Lançamento de uma moeda

Com os participantes organizados em duplas. Cada dupla recebe duas moedas. Cada participante

lançará sua moeda 50 vezes e registrará em seu caderno a face voltada para cima. Pergunta-se, durante

o lançamento:

a) Quando observamos a face da moeda voltada para cima durante o experimento, podemos saber qual

será a próxima face? Você seria capaz de identificar características de um experimento aleatório?

Após a realização da atividade, foi iniciada uma discussão sobre experimentos

aleatórios, aleatoriedade. Alice disse: “É aleatório quando um experimento não influencia o

outro; quando um não depende do outro”. Comentamos um pouco sobre eventos dependentes

e independentes, mas Paula não parecia estar segura para falar.

A seguir, o detalhamento dos resultados dos lançamentos de Alice, Paula e Fernanda20

.

Professora Resultados Total

K

Total C

Alice kkkkkckkkckcckkckkccckkkcckcckkckcccckckcckkccckck 26 24

Paula ckckkckcckckkkkkkccckcckccckcckccckcckkkkkkckkkkck 27 23

Fernanda ckccccckkkkkckkckkkkkckcccckkckkkkkcccccccckkkccck 25 25

Observando os resultados, percebemos um total de 78 caras (k) e 72 coroas (c). As

professoras consideraram o resultado como sendo o esperado, já que ficou muito próximo do

“meio a meio” que elas, em especial, Paula, esperavam. Os resultados foram anotados no

20

Bruna não estava presente neste encontro, pois era dia letivo em uma das escolas onde trabalha. O módulo II,

como é chamado, em geral, é cumprido aos sábados nas escolas estaduais e corresponde a uma carga horária

semanal que o governo do estado exige que seja cumprida na escola.

Page 66: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

65

quadro da sala de aula onde o grupo se reunia neste encontro. Assim, as professoras tiveram a

oportunidade de compará-los. Alice observou:

Alice: Como são duas possibilidades, a gente pensa que é meio a meio, que vai... alternar.

Mas não é isso que acontece: quando a gente começa a jogar e vê que tá repetindo muito

um resultado, a gente pensa que tá errado; que a moeda tá viciada. Na verdade, a gente

pode jogar a moeda 50 vezes, ela não ser viciada e ela dar 50 caras...

Pesquisadora interrompe... Será que pode? (rindo)

Alice: Pode! Poder, pode!

Pesquisadora: Pode, Paula?

Paula: Eu acho que não... É mais difícil.

Pesquisadora: Não?

(Alice discorda e fala imediatamente)

Alice: Pode! É por isso que eu acho que a gente tem que parar as aulas para dar

atividades diferenciadas. Por quê? Com o experimento que a gente fez aqui, bonitinho, a

gente para pra pensar o quê? Que a ocorrência de uma face não influencia a outra, por

mais que repita, a outra pode ser a mesma ainda. Eu posso lançar a moeda 50 vezes, ela

não ser viciada, e dar 50 caras ou 50 coroas direto. É mais difícil, como você falou, mas

pode? Pode! Pode!

Paula: Eu falei que era meio a meio e deu mais cara que coroa...

Alice: É porque você tava pensando que tinha que dar o resultado. Tinha a possibilidade

de sair 100 caras em 100 lançamentos. É por isso que eu tô falando que é bom, entendeu?

Fazer o experimento é bom porque desmitifica o mais provável de acontecer.

Paula: Eu acho que é meio a meio, por serem duas faces, continuo essa.

Alice: Eu acredito que pode ocorrer dispersão de dados, por ser aleatório, por mais que a

Matemática fale o que for. Pode sair 100 caras em 100 lançamentos mesmo sem... como é

que fala? A moeda ser viciada. É difícil, mas pode.

Alice procurou convencer Paula de que o evento só é impossível se não existir

nenhuma chance de ele acontecer21

.

Em seu caderno, na avaliação deste encontro, Alice afirmou: “Experiência que pode

ser trabalhada em sala de aula para agregar conhecimento e fazer com que o aluno faça

parte da construção disso. No caso dessa atividade, ele ia aprender de verdade; não iria ser

mais uma verdade absoluta do professor, uma ideia pronta”.

No 3º encontro22

, a primeira atividade realizada foi o Jogo da Diferença.

21

A princípio, optamos por não interferir, já que a Alice percebeu, a partir do experimento, o que tínhamos como

objetivo principal ao propor a questão: a ideia de aleatoriedade. Contudo, como o não convencimento de Paula

foi perceptível, foi necessário trabalhar outras vezes com a ideia de aleatoriedade, em encontros posteriores. 22

Uns dos objetivos deste encontro, bem como das atividades propostas nele, era começar com experimentos

que remetam à ideia de par ordenado para, posteriormente, trabalhar espaço amostral, fazendo-se perceber sua

importância no estudo da estocástica, sendo este crucial para se a melhor estratégia para se jogar o jogo.

Page 67: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

66

Atividade 1: O jogo da diferença

Em duplas, e denominando um dos jogadores como A e outro como B (os participantes escolhem),

devem ser disputadas 20 partidas. Cada jogada consistirá no lançamento de dois dados (um pelo

jogador A e outro pelo B) observando-se as faces voltadas para cima.

Critério: O jogador A marca ponto se a diferença (subtraindo-se sempre o menor número do maior

obtido) entre os números que sair nos dados for 0, 1 ou 2. B marcará pontos se a diferença for 3, 4 ou

5. O jogador vencedor será o que obtiver maior número de pontos nos 20 lançamentos.

Jogador A: diferenças 0, 1 ou 2 Jogador B: diferenças 3, 4 ou 5

Usaremos uma tabela para marcar os pontos obtidos em cada rodada.

Lançamento 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Total

Jogador A

Jogador B

(se possível, realizar o mesmo procedimento mais nove vezes, num total de 200 jogadas para cada

dupla. Manter a ordem: A lança, B lança)

Após explicar as regras do jogo, iniciamos. Imediatamente, Bruna perguntou:

Bruna: Você vai jogar? (Dirigindo-se à pesquisadora)

Pesquisadora: Não, vocês jogam entre si.

Bruna: Então eu sou A.(sorrindo)

Alice: Ah. Então eu sou B.

Pesquisadora: Sem problemas, Alice?

Alice: Ah, a Bruna falou que é A. Então, eu posso ser B; é o que sobrou... (sorrindo)

Bruna: Oba! Já ganhei!

Alice: Ah não! Por quê? Tem alguma maldade nisso...

Foram feitas várias jogadas e o jogador A ganhou a maioria, conforme pode ser visto

observando o resultado dos 20 primeiros lançamentos.

Lançamento 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Total

Jogador A

(Bruna)

x x x x x x x x x x x x x x x x 16

Jogador B

(Alice)

x x x x 4

Ao término dos 20 primeiros lançamentos, passamos a discutir sobre o jogo,

orientadas pelos questionamentos a seguir:

a) Por que você escolheu ser o jogador A ou B? Por que você acha que............... ganhou o jogo? Você

acredita que o jogador.................. venceu o jogo por ter mais sorte? (Justificar)

Esperava-se que as professoras percebessem a necessidade de se criar uma maneira de organizar dados. Outra

ideia que poderia partir dos professores seria a construção de um diagrama de árvore.

Page 68: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

67

b) Se você pudesse trocar (jogador A passar a ser B e vice-versa) de jogador, você o faria? Acha que

isso iria interferir (positiva ou negativamente) em seus resultados? Por quê?

c) Você acha que a ordem ‘A lança, em seguida, B lança’ interferiu nos resultados? Se A efetuar seus

10 lançamentos primeiro e, em seguida, B efetuar todos seus 10 lançamentos, o resultado poderá ser

diferente? Por quê? (Seriam os lançamentos seguidos que iriam interferir nos resultados?)

Espera-se que os participantes percebam, a partir do experimento, a possível vitória de A.

d) Você considera o jogo justo? Por quê? Você tem alguma sugestão de adaptação para esta tarefa? É

conveniente para ser trabalhada com seus alunos? Se sim, de que faixa etária?

Falas das professoras ao final dos lançamentos...

Bruna: Lógico que eu iria ganhar, né?

Pesquisadora: Calma, relaxa! Vamos lá! Alice, por que você escolheu ser B?

Alice: Ah, porque a Bruna escolheu ser A.

Pesquisadora: (rindo) Foi só o que sobrou, não é? E você, Bruna, por que escolheu ser

A?

Bruna: (empolgadíssima) Porque a Probabilidade é muito maior de sair o A do que de

sair o B!

Pesquisadora: Por quê?

Bruna: Ah, olha só (anotando no bloquinho): se você fizer a subtração, 6 com 1, 5; 6 com

2, 4; 6 menos 3, 3; aqui dá 50 %. Só que só dá 50% com os números maiores. Você tem, a

tendência é só eu ganhar, uai!

Alice: Todas as pontuações menores a Bruna vai ganhar.

Bruna: 0, 1 e 2 tem muito mais Probabilidade de sair do que o 5, por exemplo. O 5 é só 6

menos 1.

Alice: É. E eu não tinha percebido isso.

Pesquisadora: É isso que eu ia te perguntar: na hora, você percebeu?

Alice: Não. Não tinha. Na hora, eu não percebi.

Bruna (rindo): Eu saquei. Você viu que eu perguntei: “Fernanda, você vai jogar?”

Porque ela, no início, falou que ela era o A e eu era o B.

Pesquisadora: É, falei por exemplo.

Bruna: Aí eu sabia que ela ia ganhar!

Finalmente, elas perceberam que se fossem apenas observar a face voltada para cima,

não daria para saber quem ia ganhar. Ficaria bem dividido; um jogo justo. Também

discutiram e observaram quantas vezes cada número saiu e que número saiu mais vezes.

Anotaram em um papel, uma mostrando uma para a outra. Discutiram por um bom tempo e

foram anotando o que elas chamaram de ‘opções de resultado’ e concluíram que não haveria

uma maneira de tornar o jogo justo.

Pesquisadora: Não? Por quê?

Pesquisadora: Depois a gente vai... tentar uma maneira de ele ficar justo e... eu acho que

tem!

Alice: Ah, não! Agora eu quero saber isso!

Page 69: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

68

As duas continuaram empenhadas em encontrar a maneira de tornar o jogo justo.

Continuaram investindo em combinações de resultados, anotando, discutindo fervorosamente.

Finalmente, a pesquisadora deu a entender que pode haver uma maneira e elas voltaram às

tentativas.

Pesquisadora: Dá pra trabalhar esta atividade com nossos alunos? É conveniente

trabalhar esta atividade com nossos alunos?

Jogador A: É, mas até ele entender que eu tenho mais chance do que ela, e que tem

quatro maneiras de mudar e de qualquer jeito eu vou ter prioridade sobre ela, seriam

umas quatro ou cinco aulas, né?

Alice: Ah, não! Então, agora eu quero saber![...]

Bruna: Eu daria cara e coroa. Cara e coroa eu acho que o 9º ano pega sim, beleza! E vai

chegar à mesma conclusão que esse aqui. Eu nem sei... tem muito tempo que eu não

trabalho com Ensino Médio, mas Ensino Médio tem condição de fazer isso aí. Eles vão

aprender se você fizer isso no 9º ano? Vão. E talvez nunca mais esqueçam. Mas a gente

tem uma carga pra ensinar. Então, se eu ficar com isso aí, umas cinco aulas... já que

primeiro eles vão jogar. E são turmas de mais de 30 alunos. Eles vão jogar, depois eles

vão... Um só. Um jogo só eles não vão entender. A gente tem uma bagagem matemática,

tem maturidade pra entender, né? Então, às vezes você tem que dar uma outra opção pra

eles chegarem à conclusão. Sem eu falar! Porque se eu der um jogo, eu pelo menos penso

assim: se eu dei um jogo, e eu justifiquei por que é que deu isso, então não adiantou. Eles

têm que chegar à conclusão sozinhos.

Pesquisadora: Eu acho assim: eles demorariam mesmo. Eu também trabalho com essa

faixa etária e sei que eles demorariam mesmo...

Neste momento, ocorreu uma breve discussão sobre a Probabilidade que é ensinada no

Ensino Médio. As professoras afirmaram que este ensino é baseado na mera memorização de

fórmulas, e segundo elas, de maneira totalmente diferente de como a Probabilidade é cobrada

no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), por exemplo. Levantamos a questão da

resolução de problemas e o grupo afirmou que a dificuldade maior do aluno era sempre

interpretar os problemas propostos. As professoras deram exemplos de sua sala de aula, nas

quais o aluno resolve a operação que lhe foi imposta de forma direta, mas, muitas vezes, só

soluciona o problema quando o professor o lê em sala. A graduação também foi citada: as

professoras admitiram que é muito mais fácil resolver uma lista de exercícios com integrais,

por exemplo, do que resolver problemas de aplicação de integrais.

Retomando a atividade, comentamos que seria interessante listar tudo o que poderia

acontecer, já que a ideia de construir o espaço amostral não havia surgido naturalmente. As

professoras concordam. Após montar o espaço amostral com uma tabelinha simples, o grupo

conseguiu encontrar algumas maneiras de tornar o jogo justo. As professoras mostraram, em

suas anotações, um pequeno erro cometido enquanto listavam os resultados, o que as impediu

Page 70: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

69

de descobrir uma maneira de tornar o jogo justo. Isso serviu para reforçar as vantagens de se

construir o espaço amostral23

. Conhecer todos os possíveis resultados permitiu encontrar

diversas maneiras de se reelaborar a questão, caso o objetivo fosse tornar o jogo justo, ou seja,

dois resultados equiprováveis.

A segunda atividade realizada no 4º encontro também foi um jogo:

Atividade: Lançamento de uma moeda

Organizar os participantes em duplas, definir o jogador A e o jogador B. Cada dupla recebe duas

moedas. Cada integrante da dupla lançará sua moeda simultaneamente, 70 vezes. Registrar os

resultados. O jogador A marca ponto se as faces das moedas voltadas para cima forem as mesmas. O

jogador B marca ponto se as faces das moedas voltadas para cima forem diferentes. Vence o jogador

com maior número de pontos.

a) Quem venceu o jogo?

b) Você acha o jogo justo? Por quê?

c) O que é mais fácil de acontecer neste jogo?

d) Um professor realizou esta atividade com seus alunos e o jogador B pediu para se tornar o jogador

A, afirmando que ele teria mais chance de vencer já que ganharia com (c,c) ou (k, k) e o jogador B só

teria uma opção. Você acha justa a reivindicação do aluno? Repetiria o experimento para este aluno?

Por quê? Como você explicaria para este aluno, bem como para o resto da turma, as possibilidades de

resultados nestes lançamentos e a Probabilidade envolvida?

Vejamos também alguns dos relatos das professoras durante o processo.

Alice: Peraí, que isso pode ser uma pegadinha! Peraí... vou estar lançando... se as faces

forem iguais ela marca ponto...Se as faces forem diferentes eu marco ponto...

Pesquisadora: E aí? Escolheria ser A? Ou B? Alguém tem mais chance de ganhar?

Alice: Por enquanto, eu quero o B, o que vai ser face diferente. (Pensa) Ah! Nesse eu não

ia escolher não, mas na outra vez eu também não escolhi e “levei tinta”.

Paula: Olha lá que isso é uma pegadinha!

Elas tornaram a ler as orientações do jogo, achando que é uma “pegadinha”. Alice

montou o espaço amostral e concluiu que tanto faz.

Decidem então: Paula: igual [(c,c), (k,k)] Alice: diferente[(c,k), (k,c)]

A dupla lançou as moedas 80 vezes. Paula, que escolheu faces iguais, venceu com 42

resultados a favor. Alice, que escolheu ficar com faces diferentes, ficou, então, com o total de

38.

Pesquisadora: Vocês acham que o jogo foi justo?

23

Após conversarem sobre as atividades realizadas com o grupo até então, analisar os resultados obtidos e os

comentários das professoras, pesquisadora e orientadora decidiram propor, em cada encontro, pelo menos um

experimento aleatório, dada a importância de que esse conceito fosse compreendido pelas participantes.

Page 71: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

70

Alice: Esse foi justo porque era cara e coroa. Então, quais eram as Probabilidades? Dar

cara e cara, cara e coroa, coroa e cara e coroa e coroa. Então, era 50% para um e 50%

para outro. Então, neste caso, a Probabilidade era a mesma. Então ele é justo.

Pesquisadora: O que te ajudou a descobrir isso?

Alice: Fazer a tabelinha. Eu perdi aquela vez. Então, eu pensei: ‘deixa eu fazer aqui

primeiro para eu saber o que está acontecendo’.

Houve uma longa discussão sobre a questão de repetir o experimento para o aluno que

afirmou que o jogador B só teria uma opção. Todas nós concordamos que o experimento

deveria ser repetido para o aluno, mesmo ele não fazendo uma argumentação correta. Alice

completou dizendo que não podemos deixar os alunos com uma ideia errada. Quando

questionadas sobre uma maneira de ajudá-los a perceber que as chances são iguais para os

dois jogadores e que o jogo é justo, Alice explicou:

Eu pegava as moedinhas e mostrava. (pegando várias moedas) Peraí... e se eu colocar

aqui a coroa e colocar a cara, fazer tipo esse espaço amostral aqui, com a moeda

mesmo. Gente, quais as possibilidades? Essa coroa e cara (mostrando). Beleza. Quais as

outras possibilidades que vocês acharam? Coroa e coroa, cara a cara, e depois mostrar

para ele de uma maneira que a Paula ia tirar a cara e eu a coroa e ia ter um momento

em que eu ia tirar a coroa e ela a cara e a mostrava que eram quatro possibilidades de

ocorrências, ou 50% para cada.

Realizamos também uma variação do jogo anterior. A ordem foi proposital.

Esperávamos que Alice, que havia perdido em um jogo do encontro anterior, refletisse um

pouco mais sobre suas jogadas.

Mudando um pouco o rumo...

Agora os integrantes da dupla jogam duas moedas de cada vez e anotam os resultados. O jogador A

marca ponto "se ambos os lados saem cara", enquanto que o jogador B marca ponto "Quando sai

uma cara e uma coroa”. Observar os resultados obtidos em 50 rodadas.

Anotar os resultados no quadro.

· Quantas vezes A ganhou?

· Quantas vezes B ganhou?

· Quantas vezes nenhum dos dois ganhou?

Alice listou imediatamente o espaço amostral e decidiu que seria a Jogadora B,

afirmando que ganharia o jogo desta vez. Quando perguntamos à Paula se ela via problema

em ser a jogadora A, ela disse que não. Ao final do jogo, observamos os seguintes resultados:

. Quantas vezes A ganhou? 11

· Quantas vezes B ganhou? 24

· Quantas vezes nenhum dos dois ganhou? 15

Page 72: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

71

Alice: Mas essa eu sabia que ia ganhar.

Pesquisadora: Isso. Por que é que você sabia? Paula, você tem certeza de que não foi

prejudicada? Ninguém tem mais chance de ganhar que o outro?

Paula: Olha, neste caso aí, como teria que ser diferente, não, é, se uma face é cara e a

outra é coroa, com certeza.

Pesquisadora: Você não acha que foi prejudicada não?

Paula: Não!

Pesquisadora: E você, Alice?

Alice: Eu sabia que eu ia ganhar. Olha só: as possibilidades não eram coroa e coroa?

Então tinha uma Probabilidade de sair coroa e coroa. A outra possibilidade não era sair

cara e cara, que era a única possibilidade de você ganhar? Uma. Você tinha uma

possibilidade, que era sair isso aqui (mostrando as moedas para Paula). E eu tinha duas

possibilidades de ganhar. Por quê?... Porque ou sairia coroa e cara ou sairia cara e

coroa. São faces diferentes. Então, eu tinha duas chances de ganhar. Por que não são

quatro eventos?

Paula: São.

Alice: Não eram quatro eventos? Quatro situações que poderiam acontecer. Ou coroa e

coroa, ou cara e cara, cara e coroa e coroa e cara? Então, eu tinha duas possibilidades.

E você, tinha quantas? Você tinha uma possibilidade. Por que se você fosse igual na

jogada anterior, no jogo anterior, você, tudo bem, teria 50% e eu 50%. Aqui não. Aqui

você tinha 25% de chances de ganhar. Eu tinha 50% de chances de sair eventos de cara e

coroa, você tinha 25% de chances de sair só cara e cara e tinha 25% de chances de

ninguém ganhar.

Pesquisadora: Mas agora você concorda que você tinha menos chance de você ganhar?

Paula: Eu sei, mas ela escolheu a outra... eu ia bater o pé? Uai, a possibilidade de eu

perder era essa mesmo.

Alice: Mas aí você teve menos chance.

Pesquisadora: Eu sei, mas a princípio você não percebeu isso, não é? Agora você...

Alice: Mas sabe por que eu percebi? Agora eu tenho que defender a Paula. É o caso da

gente fazer experimentos diferentes. Porque na semana passada eu estava jogando com a

Bruna. Aí a Bruna viu e ela teve o pensamento por ela... Pela questão de mais

experiência, mais atenção.

Pesquisadora: Tanto que, para a outra, onde as Probabilidades eram iguais, você pensou

antes.

Alice: Eu parei e pensei...

Paula: É vivendo e aprendendo...

(...)

Percebemos que as professoras sentiram falta de disciplinas que envolvessem mais

prática durante a sua formação inicial. Elas afirmam que o curso de licenciatura deveria ter

disciplinas que trabalhassem com experimentações. Dessa forma, elas se sentiriam mais

seguras para trabalhar com experimentos em suas classes.

Page 73: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

72

Ao final do encontro, o grupo discutiu os conceitos tratados, a possibilidade de realizar

a atividade com nossos alunos, a faixa etária ideal e outros conteúdos matemáticos que

poderiam ser movimentados durante o ensino de Probabilidade.

O encontro foi avaliado oralmente:

Alice: Eu achei muito bom, porque a gente já criou mais experiências e cada vez mais

mostra para mim o quanto que eu tenho que melhorar; o quanto eu tenho que aprender

como professora, o quanto eu tenho que desenvolver se eu quero o efetivo aprendizado

dos meus alunos. (...) O que eu estava dando, mas minhas “aulinhas” de Probabilidade

não estava acrescentando para os meus alunos. Agora, se eu fizer isso, vai acrescentar

para eles. A questão do espaço amostral, a questão da Probabilidade, eu vou estar

mostrando para eles e eu realmente vou estar ensinando Probabilidade. Se fazendo assim

eu estou tendo um entendimento melhor, eu tenho certeza de que, desse jeito, meus alunos

vão entender melhor. Então, isso aqui é uma coisinha que tem que ser feita. E eu vou

fazer.

Paula: Também achei ótimo, porque além da gente estar entendendo, a gente passa um

melhor entendimento para os alunos também. Nesta parte, eu concordo com ela.

Pesquisadora: E aí, Paula, no que você não concorda? Do que você não gostou?

Paula: Não tem ponto negativo; só positivo. A gente tem aprendido muita coisa.

Alice: Pra mim, que não tinha um projeto, às vezes cansada, desestimulada, a atividade

me deu vontade de desenvolver um projeto.

Paula: E para mim, que tenho poucos alunos, posso conversar com a coordenadora:

‘Olha, naquele dia que eu tenho duas aulas, posso dar uma referente à minha matéria’. Aí

eu posso pegar uma para Probabilidades e já ficaria até mais fácil. E eu tenho certeza de

que ela até concordaria comigo.

No 5º encontro, além de analisar a atividade proposta por Batanero (2001), verificando

e justificando possíveis “trapaças” das crianças ao realizarem o experimento, as professoras

tiveram a oportunidade de realizá-lo também.

Atividade 3: O jogo de cartões da Paula

Paula tem um jogo composto por 16 cartões numerados de 1 a 16. Ela coloca os cartões em uma caixa

fechada e a sacode com força, misturando-os bem. Depois, retira um cartão ao acaso e é o 7. Ela marca

com uma cruz o número 7.

Cada jogador retira uma ficha da caixa e marca o número retirado. Ele realiza o experimento 16 vezes,

sempre recolocando a ficha retirada na caixa antes de efetuar uma nova retirada. Outras crianças

jogaram o mesmo jogo, ainda que alguns tenham “trapaceado”.

Page 74: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

73

Questões: O modelo aleatório pode ser aplicado a essas situações? Como você poderia justificar que

crianças “trapacearam”? Baseado (a) em que você retirou esta conclusão? Faça uma lista de situações

da vida real em que o modelo encontrado possa ser útil e pense em que pessoas estão interessadas em

resolver problemas semelhantes ao que foi dado.

(Adaptado de BATANERO, C. Didactica de la estadística, 2001, p. 18)

As professoras receberam a atividade, leram e colaram no caderno. Durante a

discussão, percebemos que Paula não considerava que os resultados apresentados por Jaime

pareciam “forçados”. Pelo contrário: a princípio, ela demonstrou acreditar que os resultados

de Jaime, “em 16 sorteios saírem exatamente os números de 1 a 16 uma vez cada” seriam os

que mais se aproximavam da realidade. Bruna deixou claro que o resultado de Jaime não é

impossível, mas que seria o menos provável de acontecer. Após uma breve conversa e lendo

novamente a atividade, Paula pareceu ter mudado de ideia:

Pesquisadora: Olhando os resultados, vocês acham que alguém trapaceou?

Paula: Não.

Bruna: É pouco provável do Jaime sair, esse cartão dele, mas.... pode sair.

Pesquisadora: (...) Mas só de olhar para a questão. Se déssemos essa questão para os

nossos alunos, explicássemos para eles o que é aleatoriedade e tudo, se algum deles

falasse que o Jaime trapaceou, como é que a gente explica para ele? Como é que eles

justificariam?

Bruna: Eu acho que entra em duas questões: entra pode ter o aluno que vai observar e

falar assim: “É muito difícil sair um número na sequência, um, dois, três, quatro, cinco,

seis...”. O aluno que analisa nesse sentido vai achar que o Jaime errou porque é difícil de

sair. Se você analisar Probabilidade, a chance de sair um, dois, três, quatro é a mesma.

Então, se o aluno olhar para esse lado vai dizer que o Jaime acertou. Então, depende do

que o aluno vai enxergar.

Pesquisadora: E você, Paula?

Page 75: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

74

Paula: Eu acho que pode ter saído repetido sim. Pode.

Pesquisadora: Mas você acha que ter saído repetido assim foi trapaça ou foi por que

aconteceu mesmo?

Paula: Foi sorte.

Pesquisadora: Eu acho legal vocês falarem. Me faz pensar.

Paula: Eu acho assim bem difícil sair uma de cada.

Pesquisadora: Então, foi sorte ou ele trapaceou?

Paula: Foi sorte.

Pesquisadora: E algum dos outros, eles trapacearam?

Paula: Podem sair repetidas.

Bruna: Não tem como afirmar se trapaceou ou se não trapaceou.

Pesquisadora: O exercício falou que alguns trapacearam. Mas não necessariamente eu

tenho que pensar que foi o Jaime que trapaceou.

Bruna: Pode ter trapaceado, mas você não pode afirmar. Tem que sair 16, foram 16

lançamentos. Mas daí saber se marcou não dá, não é? Ah, se você analisar aqui, olha...

Não dá. Não dá para saber. (...)

Pesquisadora: Não é o tipo de questão para gente dar, cobrar resolução, e dizer quem

está certo e quem está errado. É o tipo de questão para avaliar o que é que o aluno está

pensando.

Paula: O que é que ele pensa, não é?

Bruna: É uma fonte de pesquisa, não para avaliar o que está certo ou errado, porque

qualquer resposta pode ser certa. Não tem como avaliar se está certo ou está errado.

Cada uma das presentes realizou o mesmo experimento. Todas receberam um saco não

transparente com fichas numeradas de 1 a 16. Enquanto uma professora efetuava as retiradas,

com reposição, outra anotava os resultados no quadro da sala. Todos os resultados foram

anotados e analisados.

Professora I Professora II Professora III

Os resultados obtidos foram analisados e as professoras destacaram os números que

saíram com maior frequência para cada professora e aqueles que não saíram.

Pesquisadora: É. Comparando os nossos resultados com o do pessoal aqui (voltando aos

resultados apresentados na atividade proposta)...

Bruna: Não deu muito diferente não. Só o Jaime que perderia, não é?

Pesquisadora: É. O dele... bem diferente dos nossos resultados. A gente viu que teve

número que repetiu três vezes. Com a Paula, o número 6.

Bruna: O 1 saiu para todo mundo. Se analisar o nosso, o Jaime roubou.

1 X 2 XX 3 XX 4 XX

5 X 6 7 X 8 XX

9 10 11 X 12

13 X 14XX 15 X 16

1 XX 2 X 3 XX 4 X

5 X 6XXX 7 8

9 10 11 X 12XX

13 14 X 15 16XX

1 XX 2 3 4

5 X 6 7 8 X

9 XX 10 X 11 X 12XXX

13XXX 14 15XX 16

Page 76: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

75

Pesquisadora: É. Se a gente der a questão aos alunos para eles analisarem. Se eles

tiveram a ideia inicial, como a Bruna falou, de que vai sair um número de cada um e

achar que o Jaime é que está certo e que os outros estão errados, trapaceando, aí depois

que realizarem o experimento, a que conclusão eles vão chegar?

Paula: A de que o Jaime está errado. Que ele é que trapaceou.

Bruna: Eu acho que se fizer o experimento, eles vão afirmar que o Jaime errou.

Pesquisadora: Afirmar com certeza?

Bruna: É. É o que eles vão afirmar.

Pesquisadora: E isso pode ajudar a eles em algum sentido?

Bruna: Eles vão ter uma ideia aleatória, não é? Não uma porcentagem. Acho que nisso

vai mais é a maturidade, com o tempo.

Pesquisadora: E aí, gente, o que vocês têm para me falar do encontro?

Bruna: Foi bom, não é? Isso aí são atividades que realmente dá para fazer dentro de sala

de aula.

A partir desse encontro, houve uma mudança significativa na postura das professoras

diante das atividades a elas propostas. Percebemos que, desde então, em todos os momentos

de discussão sobre respostas e resultados, elas pensavam no que seus alunos responderiam e

até comparavam com sua resposta, sem que a pesquisadora pedisse que tal reflexão fosse

feita. Isso nos surpreendeu.

No 7º encontro, decidimos repetir um experimento realizado no encontro anterior; um

sorteio. Em vários momentos dos encontros até então realizados, Alice e Paula afirmaram que

Bruna tinha muita sorte. No 6º encontro, realizamos o sorteio com os quatro nomes das

integrantes do grupo e quem “venceu” o sorteio foi Alice. Contudo, Bruna não estava presente

e Alice, a vencedora, disse que se Bruna estivesse presente, ela teria ganhado, porque tem

mais “sorte”.

Escrevemos, cada uma, o nome das quatro nos papéis e colocamos dentro do

recipiente de plástico transparente. Cada professora com suas quatro caixinhas idênticas. Cada

uma recebeu um saco preto para realizar o sorteio 75 vezes.

Page 77: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

76

Figura 3: Repetição da atividade “O sorteio”, em 30/06/12 (I)

Figura 4: Repetição da atividade “O sorteio”, em 30/06/12 (II)

Após a realização dos sorteios, anotamos os resultados das 300 extrações para que

fossem discutidos pelo grupo. O quadro demonstra os resultados.

Resultados obtidos por cada professora (↓)

Alice Bruna Paula Fernanda Total

Alice 20 15 18 17 70

Bruna 19 19 19 14 71

Paula 21 19 19 24 83

Pesquisadora 15 22 19 20 76

Quadro 4: Os resultados obtidos na atividade “O Sorteio”

Em seguida, apresentamos alguns “recortes” da discussão que se estabeleceu:

Paula: Eu já achei que era a azarada.

Page 78: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

77

Bruna: Não ficou longe não. O que ficou mais longe foi o da Paula. Setenta e poucos para

cada um.

Pesquisadora: E na semana passada a Alice ganhou. E aí, Alice? Você não falou que a

Bruna ia ganhar hoje? O que você acha que aconteceu?

Alice: Aconteceu que a gente fez mais experimentos.

Pesquisadora: Então, eu tinha colocado lá. Na escola de Bruna teve uma festa. No final,

teve um sorteio. Tentar descobrir se são, realmente, as mesmas chances para cada um

ganhar.

Alice: São.

Pesquisadora: Todo mundo tem a mesma chance de ganhar?

Alice: Tem.

Pesquisadora: Por quê?

Alice: Porque são eventos aleatórios. São quatro e todo mundo tem a mesma chance, que,

no caso aqui, é ¼ para cada um, 25% para cada um. Então, as chances são iguais para

todo mundo.

Pesquisadora: Então, por que é que não saiu tudo igual?

Alice: Não saiu tudo igual porque são eventos aleatórios. Pode acontecer que sim, mas...

São eventos aleatórios. Poderia até acontecer de ter uma discrepância muito maior.

Assim, com a coisa da Probabilidade mesmo, a gente sabe, se fossem 100 eventos ia

aproximar a 25% do que a gente tirasse. Mas... Nada impediria de ocorrer aí uma

discrepância. A Fernanda sair com 50 e o resto sair com menos.

Pesquisadora: Entendi.

Alice: As chances são iguais para todo mundo.

Pesquisadora: Bem, o material de cada um foi igualzinho, não foi?

Alice: Foi. Então, a ideia da sorte e azar da Paula... A Paula falou que tinha azar e

ganhou...

Paula: Realmente. Você vê que quando ela começou o jogo eu estava perdendo todas.

Bruna: É por isso que temos que fazer muitas vezes...

Pesquisadora: E a Alice tinha certeza de que a Bruna ia ganhar. E a Bruna só ganhou

dela.

Bruna: Da Alice eu ganhei?

Alice: Lógico!

Pesquisadora: Por um. Você com 71 e a Alice, 70.

A repetição da atividade se fez necessária, já que optamos por não dar respostas

prontas às professoras participantes. Como Alice não definiu o sorteio como sendo aleatório,

mas demonstrava acreditar que os resultados dependeriam da sorte de quem participasse dele,

precisávamos de um meio de favorecer a construção correta do conceito. Logo, repetimos o

experimento.

As demais atividades deste encontro exploravam o cálculo de Probabilidades a partir

do enfoque clássico, a ideia de eventos dependentes, a união e a interseção de eventos e a

negativa de um evento (complemento). Apresentamos a segunda atividade:

Page 79: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

78

Atividade 2: A escolha de um carro para comprar

Um cliente vai a uma loja de carros usados para comprar um carro e percebe que o modelo que ele

procura, todos com o mesmo ano de fabricação, está disponível em três cores diferentes: vermelho,

preto e prata. No pátio da loja há 2 veículos vermelhos, 4 pretos e 1 prata. Gostando das três cores e

com a informação de que todos os carros são exatamente iguais, com exceção da cor, decide escolher

ao acaso uma chave na mesa do vendedor e comprar o carro. Qual é a Probabilidade de que ele compre

um carro prata? Justifique.

Discutindo algumas questões:

a) A escolha da chave é feita ao acaso? Justifique.

b) Podemos escrever todas as possibilidades de resultados antes da escolha da chave? Se sim, quais?

Se não, justifique.

c) Se a cada carro vendido pudermos supor que a loja repõe a cor vendida de forma a manter o estoque

sempre o mesmo, podemos repetir o processo de escolha da chave ao acaso tantas vezes quantas

desejarmos, sempre nas mesmas condições. Neste caso, que característica identificaríamos neste

experimento?

Era determinado um tempo para que as professoras pudessem realizar cada atividade

individualmente. Em seguida, discutiam entre si.

Pesquisadora: Bem, qual é a Probabilidade dele comprar um carro prata? Justifique.

Alice: A Probabilidade é 1/7. 14,3 aproximadamente, porque é um dividido por sete. Deu

uma possibilidade num total de sete.

Pesquisadora: Que regra é essa, Alice?

Alice: Fração.

Pesquisadora: Ah, tá. Você usou fração. Mas que regra que... tem um nome. Lembra da

semana passada?

Alice: Ah, gente. Tem mesmo! Regra de Laplace. [...]

Pesquisadora: Então, vamos lá. A escolha das chaves é feita ao acaso?

Bruna: Sim.

Alice: Sim.

Pesquisadora: Por quê?

Bruna: Porque se estão todas lá têm mais chances para o preto, mas todas têm chance,

não...

Alice: É ao acaso, uai! Pegou, o que vier, do jeito que ele quis...

Paula: Mas pode sair o que ele não quis, não é?

Pesquisadora: Mas ele não está escolhendo cor, não é? Ele gostou de todas.

Alice: É ao acaso.

Bruna: É ao acaso, porque não tem nada pré-definido mesmo. Estão todas iguais.

Alice: Neste caso, tem um que tem chance maior, mas é ao acaso, porque ... Agora eu me

confundi. Não, mas é ao acaso sim.

Pesquisadora: Eu estou vendo que você está falando que “é porque é” e que “é ao acaso

sim e pronto”, mas até agora eu não entendi o que você quis dizer (me referindo a Alice).

Bruna: É ao acaso porque todas as chaves são iguais e estão na mesma condição de

escolha. Então, é ao acaso. Não tem nada pré-definido diferencia uma da outra. Então, é

ao acaso.

Alice: Isso. É ao acaso, mas se perguntasse qual tem a maior chance...

Page 80: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

79

Bruna: Não, a Probabilidade maior é de sair o preto, que tem mais.

Pesquisadora: Aí você separou direitinho. A escolha das chaves. A escolha das chaves é

ao acaso, porque colocaram todas ali e elas não têm uma distinção entre si. Não é,

Paula? São iguais. Então, você pegou uma aqui. Pode ser a bendita da prata. Só tem

uma.

Em seguida, o grupo iniciou uma longa discussão sobre como e quando podemos

mobilizar algumas das ideias trabalhadas pelo grupo, com nossos alunos da Educação

Básica24

. As professoras aproveitaram o momento para relatar episódios de sua prática nos

quais, ao realizarem uma atividade com conteúdos matemáticos, em forma de jogos, não

foram bem vistas pela direção da escola. O grupo concordou que a maioria dos dirigentes das

escolas considera que a boa aula é aquela onde o aluno ouve em silêncio e o professor é quem

fala e mantém todos sentados.

Bruna: Você pode trabalhar porcentagem e fração no 6º ano, com esse nome. Agora com

aleatoriedade, o nome Probabilidade, eu acho que não. Você pode trabalhar com

Probabilidade. Mas sem o nome de Probabilidade. Porque a gente já trabalha, só não dá

o nome Probabilidade. Eu acho que não tem necessidade de aprofundar tanto. Senão, vai

dar um nó. (...)

Bruna: Por acaso, acaso, na sorte, qual sua sorte, aí até dá, mas... Às vezes, você pode

até citar o nome: “Qual que é a Probabilidade?”. “Qual é a chance?”.

Pesquisadora: Então seria uma boa estar usando problemas desse jeito?

Bruna: Já tem uns assim (...)

Bruna: E eles ficam perdidos em problemas individuais, entendeu?

Pesquisadora: É. Eu acho que a importância do grupo, de a gente conversar, de a gente

discutir, tá muito nisso, também. Porque aí você fala uma ideia, você fala outra, e você

fala outra (apontando para as professoras), e a gente começa a ver as coisas que a gente

está fazendo, da nossa prática, e o que a gente não está fazendo e não seria tão difícil

fazer. E tem coisa que ia mudar radicalmente.

Bruna: Quando eu dou uma aula assim, para fazer uma aula assim, com experimento, eu

acho que todo mundo entendeu. No experimento, eles me dão a resposta certinha. Quando

eu dou uma atividade que não é experimento eles erram.

Pesquisadora: Provavelmente porque eles não estão acostumados. Mas eu acho que o

raciocínio deles é desenvolvido, não é?

Bruna: Eu espero. Mas eu acho que acaba amadurecendo um pouquinho.

Apresentamos, a seguir, mais uma atividade trabalhada pelo grupo e fragmentos da

discussão por ela gerada.

24

Procuramos sempre estar associando o trabalho com Probabilidade a outros conteúdos matemáticos, já que as

professoras do grupo sempre se queixam da falta de tempo, principalmente para realizar experimentos durante as

aulas de Matemática da Educação Básica – realidade que conhecemos de perto. Como uma das pesquisadoras

também trabalhava com Matemática há nove anos na Educação Básica, inclusive durante o período de trabalho

de campo, tinha ciência de que a quantidade de conteúdos matemáticos a serem trabalhados, por série é, de fato,

extremamente grande.

Page 81: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

80

Atividade: Adivinhando as fichas

(realizar o jogo) Uma professora (pesquisadora) apresenta às outras três fichas com a mesma forma e

tamanho, das quais uma é vermelha em ambos os lados, outra tem um lado azul e o outro vermelho e a

terceira é azul em ambos os lados. A professora coloca as três fichas em uma caixa e a balança por um

tempo antes de retirar uma das três fichas de forma aleatória. Apresenta às outras professoras, em

seguida, uma das faces da ficha selecionada, mantendo o outro lado coberto, pedindo às professoras

para adivinharem a cor do lado escuro. Uma vez que as apostas foram feitas, a professora mostra o

lado escuro. Cada professora que tenha acertado na previsão feita ganha um ponto. Trata-se de

encontrar a melhor estratégia para se jogar este jogo.

a) Que tipo de raciocínio que você fez (ou faria) para confirmar que sua estratégia é ótima? Um

argumento com base na experimentação é igualmente válido a um argumento formado com base em

considerações lógicas e combinatórias?

b) Você pode provar que sua estratégia é a melhor utilizando apenas experimentação? Há alguma

maneira de formalizar sua estratégia?

(Adaptado de Batanero, C. Didactica de la estadística, 2001, p. 20)

O objetivo da atividade era encontrar a melhor estratégia para se ganhar o jogo,

buscando contribuir para o desenvolvimento do pensamento probabilístico. Com esta

atividade, pretendíamos também reforçar as ideias de chance, acaso, aleatoriedade.

Finalmente, almejávamos criar uma discussão a partir das ideias de sorte e azar, uma vez que

o jogo foi realizado e teríamos vencedora(s).

As professoras gostaram da atividade:

Pesquisadora: Então, vamos lá! Eu vou tirar uma ficha. Eu vou mostrar para vocês um

lado, e eu vou perguntar para vocês qual seria o lado de trás, entendeu? De maneira que

vocês não vão ver. É lógico. Já viram um lado, não é? Qual é o que está aqui atrás?

Bruna: Azul.

Paula: Vermelho.

Alice: Azul.

(após retirarmos várias fichas e anotarmos os resultados)

Pesquisadora: Acho que já deu para perceber alguma coisa. Todas as vezes que eu

estava mostrando o lado azul, a Paula insistia que o de trás também era azul e a Bruna e

a Alice falavam o contrário: que seria o oposto; o vermelho. Vamos lá, Paula. Por que

toda vez que eu te mostrava o vermelho você dizia que o de trás também era vermelho?

Ou te falava que era azul e você falava que o de trás também era azul?

Paula: É que a possibilidade para mim, eu pensei assim, ela seria maior. Porque tanto de

um lado quanto do outro era vermelho. Se no outro era azul ou vermelho, quer dizer que

as chances dele eram iguais.

Pesquisadora: Não entendi.

Paula: Se você estava com um azul e um vermelho, as chances delas seriam iguais. Tanto

uma quanto a outra.

Bruna: Duas fichas com a mesma cor. Duas.

Pesquisadora: Ah, tá. Então você pensou: eu tenho duas fichas que tem dois lados da

mesma cor. Então, provavelmente, é dessa cor, não é?(...)

Alice: Tem três chances de sair a outra.

Page 82: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

81

Pesquisadora: Então, qual é a melhor estratégia para o jogo?

Bruna: Escolher a face oposta ao que saiu.

Pesquisadora: Você acha, Paula? Ou você ainda acha que é melhor escolher a mesma

cor?

Paula: Eu continuo achando que a chance maior é para a mesma cor!

Pesquisadora: É? Então elas não conseguiram te convencer.

Paula: Não.

Aparentemente, as professoras não perceberam a existência da Probabilidade

Condicional neste jogo. Permitimos que Alice e Bruna, principalmente a última, tentassem

convencer Paula que sua estratégia era melhor, para observarmos seus argumentos e,

possivelmente, justificar o uso da Probabilidade Condicional com argumentos razoáveis,

utilizando a mesma técnica que elas usaram para tentar convencer Paula: as fichas coloridas.

Bruna: Olha só: se você escolher uma fichinha aqui ao acaso (tira aleatoriamente a ficha

vermelha de dentro do saco). Qual é a sua chance de sair vermelha aqui atrás?

Paula: É bem menor, não é?

Bruna: Só se essa aqui for uma fichinha que você ganha. Você concorda comigo? Pra

sair vermelho, só tem uma fichinha que você pode ganhar. Se as duas faces forem

vermelhas. Agora se essa aqui for vermelha e você escolher a azul, quantas fichinhas

você tem chance de escolher? A que aqui é vermelho (mostrando), a que aqui é azul, não

pode? Pode ser esta. Mas pode ser esta aqui também.

Paula: O azul.

Bruna: Não. Vermelha e azul.

Alice: Por isso que, na hora de explicar...

Bruna: ...Trocado. Peraí, peraí, peraí que agora eu baguncei também.

Pesquisadora: É. Agora você está chegando na resposta da Paula.

Bruna: Pois é. Porque se você escolheu vermelho aqui...

Paula: Está vendo? É por isso que ...

Alice: Pode ser as outras duas, pode ser essa.... se você escolher o azul pode ser esta, ou

pode ser esta (mostrando as fichas), porque se você virar pode sair azul também.

Paula: Mas a mesma coisa pode acontecer com o vermelho, uai!

Bruna: Eu fiz até as combinações. Diagrama de árvore.

Pesquisadora: Olha só, eu entendi o raciocínio de vocês, mas pensem bem, não é uma

Probabilidade Condicional? A Probabilidade de acontecer uma coisa...

Bruna: Dado que outra já aconteceu. É mesmo, eu vi que tinha alguma coisa estranha...

Alice: É mesmo. Por isso que naquela hora eu me embolei toda!

Bruna: Então a Paula estava certa.

Paula: Viu? Não falei? Era sempre a mesma que estava vendo.

Pesquisadora: Porque eu tenho três faces azuis e três vermelhas nas fichas (mostrando),

olhando assim, um meio a meio. A partir do momento que eu te mostro uma

(mostrando)...

Alice: Uma azul, a de trás tanto pode ser azul quanto vermelha.

Bruna: Então a Paula não estava certa não; todas estavam certas.

Pesquisadora: É. Só que não apostaram pensando nisso, não é?

Alice: Não, lógico, mas agora ficou claro: é a condicional.

Page 83: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

82

Pesquisadora: Para todas?

Paula: Sim.

Bruna: Sim.

Na discussão final desta atividade, as professoras afirmaram ter percebido o que

aconteceria com a face oculta da ficha, mas ficaram muito atreladas ao cálculo da

Probabilidade que Bruna fez no início da atividade. Antes de passarmos para a atividade

seguinte, elas confirmaram a afirmação utilizando novamente as fichas.

Ao avaliarmos o encontro, observamos o impacto do empenho de Alice e Bruna em

apoiar Paula, ajudando-a a esclarecer suas dúvidas, bem como as construções pessoais. Ao

tentar ensinar, aprendemos muito.

Figura 5a): Avaliação do 7º encontro por Figura 5b): Avaliação do 7º encontro por

Paula (frente) Paula (verso)

As atividades que envolviam as ideias de aleatoriedade, acaso, chance, eventos

possíveis e impossíveis, espaço amostral, eventos dependentes e independentes e a abordagem

clássica de Probabilidade receberam atenção especial e foram trabalhadas durante

praticamente todo o período de realização da pesquisa.

Page 84: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

83

Na terceira atividade do 8º encontro, discutimos trechos de um artigo de Batanero25

.

A princípio, as professoras receberam apenas “tirinhas” com fragmentos do texto para

iniciarmos a discussão. Após expressarem suas ideias, independentemente do desfecho que o

caso teve (o texto referia-se a acontecimentos reais), discutiríamos o restante do texto.

As questões a seguir foram baseadas no texto Razonamiento probabilístico en la vida cotidiana: un

desafio educativo de Carmen Batanero (Raciocínio probabilístico na vida cotidiana: um desafio

educativo), com tradução da pesquisadora.

I) Em 1964, quando uma mulher idosa que estava caminhando de volta para casa em um subúrbio de

Los Angeles, foi assaltada por uma jovem loira com rabo de cavalo. A jovem foi vista logo depois, em

um carro amarelo dirigido por um homem negro, com uma barba e bigode. A polícia de Los Angeles

prendeu Janet Collins, loira, que estava com um penteado com um rabo de cavalo e tinha um amigo

negro, com uma barba e bigode, que tinha um carro amarelo. O promotor argumentou que a

Probabilidade de encontrar em Los Angeles um casal com todas as características mencionadas foi de

apenas 1/12000000, e isso provou a culpa dos detidos. O que você acha desta Probabilidade? Você

considera a prisão justa?

Após ler a “tirinha”, o grupo iniciou uma discussão. Destacamos alguns trechos dessa

conversa.

Alice: Você acredita que eu já tinha visto esta história? Li na internet; recebi em um

email.

Pesquisadora: É mesmo?

Após a leitura do texto, iniciamos a discussão.

Paula: Eu acho que não. Loira, com rabo de cavalo e com amigo negro? Não era só ela

que tinha. Olha só, uma pessoa em 12 milhões? Eu acho que não. É muito.

Alice: Olha só: são várias coisas: a mulher tinha que ser loira, com rabo de cavalo e com

amigo negro que tinha barba e bigode, que tinha um carro amarelo... Então, realmente,

baseado na Estatística de uma pessoa em 12 milhões, eu acho que é justo. Não, mas

prender? Ah...

Pesquisadora: Escreva para nós.

Alice: Ah, escrever...

Paula: Você acha sim e eu não.

As professoras recebem uma segunda “tirinha” e, em seguida, o grupo discute o

fragmento de texto a seguir:

No Reino Unido, Sally Clark foi acusada de assassinar seus filhos quando dois deles sofreram

sucessivamente de morte súbita do recém-nascido. Sally foi separada de sua família e ficou presa por

três anos até que um juiz decidiu rever todos os casos de morte súbita e observou que, a cada ano, no

Reino Unido, cerca de 50 casamentos que haviam perdido um filho por morte súbita, perdiam um

segundo. Sally Clark foi então declarada inocente, mas ninguém poderia devolver os três anos de vida

familiar perdidos.

25

Razonamiento Probabilístico En La Vida Cotidiana: Un Desafío Educativo. Ver bibliografia.

Page 85: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

84

a) Você acredita que o cálculo de Probabilidades possa contribuir para decisões judiciais corretas?

( ) sim ( ) não.

Se sim, que medidas seriam necessárias para que a Probabilidade calculada se torne consistente não

apenas através do resultado numérico obtido?

b) Você acredita que o indivíduo que possui algum conhecimento sobre o cálculo de Probabilidades

poderá utilizá-lo a seu favor (ou defesa) em alguma situação cotidiana? Se sim, escreva um exemplo.

c) Nesse contexto, é possível que o desenvolvimento do pensamento probabilístico possa contribuir

para a formação de um indivíduo mais crítico e atuante na sociedade? Por quê?

Todas concordaram que a prisão foi prematura. Desta vez, o cálculo da Probabilidade,

se feito de maneira correta, poderia ajudar a absolver a mãe.

Alice (respondendo à primeira pergunta): Acho que não dá pra condenar só com a

Matemática...

Paula: Aí deu a entender o seguinte: que eles foram perceber depois que prenderam ela,

né?

Alice: Em decisões judiciais, não podem ficar usando Probabilidade.

Pesquisadora: Eu acho que pode... só não pode ser a única prova ou a prova decisiva.

Você não vê nos filmes? É muito comum usarem a Probabilidade para acusar ou tentar

inocentar alguém. Eles podem citar a frequência em casos anteriores. Eu acho que nada

deve ser decidido com uma prova só.

Alice: Ela ajuda a decidir...

Outro fragmento do mesmo artigo foi discutido pelo grupo:

A Falácia do Ministério Público

Suponhamos que alguém tenha cometido um assalto e se encontra uma amostra de material genético

(como sangue) na cena do crime. Esta amostra é comparada com os dados disponíveis em 20000 casos

de registros policiais e se encontra uma coincidência entre o DNA da amostra e o da pessoa A, cujos

dados estão nos registros. Suponha-se que a Probabilidade de encontrar uma pessoa ao acaso com este

tipo de DNA é de apenas 1 em 10.000. Podemos considerar que a pessoa A é culpada pelo roubo?

Claro que não! A Probabilidade de que entre os 20.000 casos registrados apareça pelo menos uma

coincidência com a amostra de DNA é bastante elevada, exatamente %8610000

111

20000

. Seria

equivocado condenar a pessoa A, com esta única evidência. No entanto, este erro conhecido como “A

falácia do Ministério Público”, aparece com frequência em processos judiciais ou na imprensa. Por

exemplo, o jornal el País publicou, em setembro de 2003, uma notícia sobre os resultados da análise

de DNA dos restos encontrados no corpo de Sonia Carabantes, afirmando que a Probabilidade de que

estes pertencessem à mesma pessoa que havia deixado suas impressões digitais genéticas um cigarro

encontrado junto ao corpo de Rocio Wanninkhof era de 99.999997%.

A razão é que, ao comparar a amostra com seus arquivos, a Polícia encontrou uma coincidência com

as encontradas no citado cigarro (Corberán y Montes, 2003). É possível que outros tipos de evidências

envolvessem a mesma pessoa em ambos os casos, mas a Probabilidade calculada pelo jornal el País

estava incorreta. Algumas falhas no raciocínio (geralmente raciocínio como os da falácia do Ministério

Público são):

Page 86: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

85

• Tomar uma pessoa ou um caso dos arquivos policiais não é o mesmo que tomar uma pessoa ao

acaso, da população; pode não atender o pressuposto de independência.

• Ter investido em uma Probabilidade condicional. Considere os eventos: A "encontrar um certo DNA

" e B" escolher uma pessoa aleatória na população.” Podemos, a partir deles calcular duas

Probabilidades condicionais P (A / B) , “tomando um indivíduo extraído aleatoriamente da população,

que essa pessoa tenha o DNA dado", e P (B / A):" tomar um certo DNA, que uma pessoa escolhida

aleatoriamente da população o tenha. "

A Probabilidade calculada pelo jornal el País foi 1 - P (B / A), uma vez que a pessoa envolvida no

caso Carabantes tinha o DNA estudado, foi a Probabilidade de que essa pessoa não fosse uma pessoa

qualquer, tomada ao acaso a partir da população. Uma vez que a Probabilidade é muito elevada, P (não

B / A) = 1-P (B / A) = 99,999997% o resultado deduzido foi que a pessoa não era aleatória, mas a

mesma envolvida no caso anterior.

No caso acima mencionado, você pode ter outras provas que envolvessem a mesma pessoa em ambos

os crimes, o comentário acima se refere apenas ao equilíbrio das Probabilidades utilizadas em um

jornal nacional, mostrando um exemplo da assim chamada falácia condicional (Falk, 1989), que

consiste em confundir utilizando a Probabilidade condicional P (A / B) e P (B / A).

Pesquisadora: Qual foi o problema ao calcular a Probabilidade? O que eles fizeram de

errado na hora de calcular essa Probabilidade?

Alice: Porque eles já tinham um culpado e desse culpado eles calcularam essa

Probabilidade em cima dele. Se eles calculassem em cima da população, os resultado

seriam diferentes. Foi isso?

Pesquisadora: Também. E você, Paula, o que acha?

Paula: Fala o que você pensou, para eu ver...

Pesquisadora: Eu acho assim... o problema deles foi o seguinte: eles usaram a

Probabilidade de encontrar uma pessoa na população toda, só que eles não estudaram a

população toda, e sim, 20 mil casos de registros policiais, entendeu? Só que a

Probabilidade de ter esse DNA do local do crime comparando com a população inteira

seria muito pequena, entendeu? Só que eles não compararam dessa forma. Só

compararam com os que eles já tinham em arquivo; mas eles não tinham o de todo

mundo. Eles tinham 20 mil em arquivos policiais e já procuraram como sendo uma

pessoa criminosa, que já tinha feito alguma coisa errada e estava lá, no banco de dados

deles.

Alice: A amostra ficou pequena; muito menor que a amostra real.

Pesquisadora: É. Do que a população toda. Só que eles usaram a comparação com a

população toda. A chance de isso acontecer é uma em 10 mil para a população toda. Mas

aí não. Eles usaram só os 20 mil casos, olha, para você ver, e ele está lá. Entendeu,

Paula? Então, basicamente, é isso. Você pegar uma pessoa aleatoriamente...

Paula: Bem, eu entendi assim. Nessa parte eu tinha até entendido aqui. Se você me

perguntasse se estava correta eu diria “não”. Que nem aquela do policial lá, da loira, eu

já achei que estava errada. E era a mesma coisa aqui.

Pesquisadora: As pessoas usam a Probabilidade condicional. O que é a Probabilidade

condicional? A Probabilidade condicional é a Probabilidade de acontecer alguma coisa

dado que outra já tenha acontecido. Por exemplo: eu tenho ...

Alice: Achar compatibilidade de uma medula óssea em um banco de dados.

Page 87: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

86

Pesquisadora: É, mas aí você pode pensar em compatibilidade em um banco com

amostras de toda uma população de doadores ou a Probabilidade de compatibilidade de

pessoas da família. Na família aumenta, não aumenta?

Alice: Aumenta.

Pesquisadora: Isso. Eles compararam com o que eles já tinham.

Alice: Probabilidade condicional você pode fazer assim: “Qual é a Probabilidade de tirar

um rei de copas dados quatro reis”, ou “Qual é a Probabilidade de tirar um rei de copas

em todo o baralho?”.

Pesquisadora: Isso mesmo! São diferentes. “Qual é a Probabilidade de tirar um rei, dado

que são cartas de copas?” Aí você tem que pensar: quantas cartas de copas tem o

baralho? E tem que ser um rei... É a Probabilidade de acontecer uma coisa dado que

outra já aconteceu. É a Probabilidade condicional. As pessoas usarem a Probabilidade

condicional para apresentar probabilidades distorcidas, escandalosas, vamos falar assim,

muito grandes ou muito pequenas é muito comum. Eles chamam de falácias na Espanha.

Esta é “A falácia do Ministério Público” porque as pessoas são julgadas e condenadas

por causa dessa probabilidade no meio do processo. Não só ela, não é? Mas como são

números muito grandes as pessoas confiam. Mas você precisa olhar nos autos, o que foi

comparado.

Alice: Quem faz faculdade de Direito tem que fazer probabilidade de qualquer jeito! É

que nesse caso o advogado, tanto de defesa quanto de acusação pode... Isso que eu falo, é

um “Q” a mais, porque quando você fala que o jornal falou que era 99,99997...% todo

mundo tinha certeza...

Paula: E se você for ver a probabilidade exatamente é de 86%. Quer dizer: de 99,99997%

para 86%, para condenar uma pessoa... muda.

Alice: Muda. Se você está em um júri popular e você fala que a pessoa tem 99,9% de

probabilidade e explicar que tem 86% de chance de ser muda muito.

Pesquisadora: Bem pensado. E se ele fizer a análise erradamente, que nem o jornal fez?

Alice: Você está induzindo.

Pesquisadora: É igual a Alice falou: é um júri popular, todo mundo que estiver lá vai

estar a favor de 99,9%

Alice: Você usa a matemática a seu favor.

Pesquisadora: E muitas vezes ela é incontestável. Muita gente que está lá pode não

entender nada de probabilidade, mas alguém calculou e falou que era 99,9%?!

Alice: É igual nesse caso aqui. Foi um jornal e deve ser um jornal sério dentro do país.

Pesquisadora: É o El País. O El País é conhecido no mundo todo.

Alice: E o que é que acontece, a porcentagem da população que vai duvidar e querer

fazer o cálculo vai ser mínima.

Paula: É por isso que eu não concordo de, às vezes, você prender uma pessoa sem ter a

certeza de que ela é inocente ou culpada. Acho que para você prender uma pessoa você

precisa saber mesmo!

Pesquisadora: E você acha que a Probabilidade pode ajudar ou atrapalhar?

Paula: Acho que está tudo bem em usar a probabilidade. Só acho errado eles irem direto

na pessoa; sem pesquisar se havia outros casos. É isso que eu acho errado.

Probabilisticamente, poderia até ser, mas é preciso ter certeza, uai!

Page 88: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

87

Ao serem questionadas se acreditavam que o indivíduo que possui algum conhecimento

sobre o cálculo de Probabilidades poderá utilizá-lo a seu favor (ou defesa) em alguma

situação cotidiana...

Alice: Claro! Evidentemente. Advogados usam para ajudar a prender e a libertar.

Probabilidade serve, gente!

Pesquisadora: Por exemplo: nós ensinarmos nossos alunos Probabilidade pode ajudá-los

um dia, para eles serem cidadãos, vamos dizer assim, mais participativos, eles poderiam

usar isso como argumento um dia, na vida deles?

Alice: Pode! E se pode!Fica difícil de eu exemplificar uma situação agora, mas que sim,

sim. É lógico.

Em sua avaliação, Paula escreveu em seu caderno de campo que achou o encontro

muito bom, mas que teve um pouquinho de dificuldades em interpretar o que se pedia. Como

no encontro anterior, o ponto forte foi a Probabilidade condicional, ou seja, o cálculo feito

através de problemas ou a partir de dados de textos.

Figura 6: Momento de “descontração” de Alice e Paula durante o estudo dos textos.

No 10º encontro, realizamos o estudo de outra parte do artigo de Batanero (2006)26

,

mais especificamente, de um fragmento do texto cujo subtítulo era “Avaliação dos riscos

médicos em ensaios clínicos de prevenção em massa”27

. O texto apontava para erros

cometidos ao se estimar Probabilidades e aproveitar resultados de algumas amostras para se

tirar conclusões e avaliar riscos em políticas públicas de prevenção em massa, divulgando

resultados que, muitas vezes, alarmam a população desnecessariamente. Além disso,

destacava a importância do cálculo da Probabilidade condicional.

26

Razonamiento Probabilístico En La Vida Cotidiana: Un Desafío Educativo. Carmen Batanero. Universidad de

Granada, España, 2006. 27

Evaluación de riesgos médicos en las pruebas de prevención masivas

Page 89: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

88

Figura 7: Imagem do cartaz utilizado no 10º

Encontro

Figura 8: Encontro “no pátio”

Nesse dia, nos reunimos no pátio da escola, utilizando as grandes mesas do refeitório

dos alunos. Nenhum motivo especial, além da brisa fresca daquele ambiente. Apresentamos

um cartaz, com o esquema apresentado no texto a ser discutido (ver Apêndice D, p.174-177),

além de uma maquete que seria utilizada na segunda atividade do encontro. O texto foi lido

em voz alta por Alice, que tomou a iniciativa sem que alguém sugerisse.

Nos trechos seguintes do diálogo que se estabeleceu, ficou evidente que Alice não

concordou com a autora imediatamente, dado que o uso da Probabilidade condicional mudaria

significativamente os valores numéricos apresentados como Probabilidade de uma mulher

possuir câncer de mama.

Pesquisadora: Então vamos só pensar em uma mulher americana, entre 40 e 50 anos, sem

sintomas, a Probabilidade de ter câncer de mama é de 0,8%. (...)

Alice: A pessoa faz o exame e não consegue diagnosticar, por esse exame, que está com

câncer?

Pesquisadora: É. Em 100 mil mulheres, 0,8% têm câncer. 800, então (mostrando o

diagrama de árvore). Se uma mulher tem câncer de mama, a probabilidade de ela ter uma

mamografia positiva é de 90%. Então, já é a Probabilidade de A dado B; condicional,

não é? Se ela tem câncer, a Probabilidade de diagnosticar isso no exame é de 90%.

Então, quer dizer que dessas 800...

Alice: 80 não vão conseguir diagnosticar isso no exame.

Pesquisadora: Quer dizer que elas têm. O resultado deu negativo, mas elas têm câncer,

não é?

Paula e Alice: Isso.

Pesquisadora: Então, quer dizer que 720 têm resultado positivo. Teoricamente, quantas

pessoas na população, de acordo com o percentual, que têm câncer mesmo?

Alice: 800 pessoas.

Pesquisadora: Isso aqui tem câncer, olha. 800 pessoas (mostrando no cartaz). Só que a

gente vai ver, pelos percentuais, que tem 7.664 pessoas com resultado positivo de

mamografias; que têm câncer.

Alice: Está doida, Fernanda?

Page 90: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

89

Pesquisadora: É. Pensa bem: mulheres da população: 0,8% têm câncer. São 800, ou seja,

99.200 são saudáveis (mostrando no cartaz). Aí, dessas que têm câncer, 720 têm o

resultado positivo para a doença na mamografia.

Alice: Ok.

Pesquisadora: E 80 dão resultado negativo, mas têm câncer. Agora olha o que ele fala

aqui: também, em 7% de mulheres saudáveis (mostrando no texto), dão positivas as

mamografias. Quantas mulheres são saudáveis?

Alice: 99.200.

Pesquisadora: Isso. Mas delas, 7% dão resultado positivo na mamografia. Faça as contas

aí pra nós (apontando para a calculadora)...

Paula: Elas estão com câncer? Os resultados estão errados, também.

Pesquisadora: Das mulheres consideradas saudáveis, 7% têm resultados positivos na

mamografia.

Alice: Peraí. 7% vezes...

Pesquisadora: 6.944?

Alice: É. Deu positivo.

Pesquisadora: Mesmo elas não tendo câncer, 7% de seus exames acusam problema.

Alice: Mas a falha é muito grande! (...)

Alice: O resultado não deu positivo? Olha, suponha que o resultado seja positivo.

Suponha que uma mamografia seja positiva. Qual é a positiva lá? 7.664. Qual é a

Probabilidade de que a pessoa tenha, na verdade, câncer de mama? Quantas pessoas

têm, na verdade, câncer de mama? 800. Então vai ser 800. Não é não, Fernanda?

Pesquisadora: (calmamente) Não sei. E você, Paula?

Alice: Peraí. Ah, não, Fernanda!

Pesquisadora: Olha ali. Pela setinha você vai saber se você está comparando certo.

Alice: Uai! Lógico! Estou, uai! Resultados? Seja positiva... Ah, o resultado tem que ser

positivo. Ah... Uai, gente, tem que ser! 800.

Pesquisadora: E você, Paula? Suponha que a mamografia seja positiva. Qual é a

Probabilidade de que a mulher tenha, na verdade, câncer de mama?

Alice: Então é 800. Eu tenho certeza.

Paula: É 800 com a soma dos 7.664. Faz aí, minha filha. É o total, uai!

Ressaltamos que os exemplos analisados28

mostram, dramaticamente, as potenciais

consequências de uma intuição carente sobre a Probabilidade e as possíveis decisões que

tomamos em situações de incerteza. Como afirmado por Fischbein (1975, apud BATANERO,

2006), a distinção entre a acaso e dedução não é feita de forma espontânea e nem totalmente

ao nível das operações formais, pois é influenciada pelas condições culturais e educacionais

da sociedade moderna, que orientam o pensamento em direção a explicações deterministas.

Neste encontro também foi realizada a atividade que envolvia o tradicional problema

das portas, ou Monte Hall, como também é conhecido. As professoras receberam o problema

como enunciado a seguir.

28

Completa, ainda, que o artigo completo possui 17 páginas, e que foram analisados apenas “fragmentos” deste.

Page 91: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

90

A Porta dos Desesperados

Um professor de matemática sugeriu a seguinte questão para uma turma de alunos da Educação

Básica:

Suponha que você seja um participante de um programa de auditório e o apresentador mostra a você

três portas fechadas. Ele diz que atrás de uma das portas está um carro, e atrás das outras duas há

apenas cabras. Se você escolher a porta certa, ganha o carro – caso contrário, levará apenas uma

cabra. Você escolhe uma das portas. O apresentador, então, sem abrir a porta que você escolheu,

dirige-se para uma das outras duas portas que sobraram. Como ele sabe em qual das três portas está

o carro, ele então abre uma das duas portas que você não tinha escolhido – exatamente uma porta

que escondia uma cabra. Restaram, então, apenas duas portas fechadas: aquela que você tinha

escolhido, e uma outra que não foi aberta pelo apresentador. Atrás de uma delas está o carro.

O apresentador, então, pergunta se você quer manter a escolha original ou se quer, agora, trocar de

porta, escolhendo a outra que ele não abriu e que pode conter o carro.

O que você deve fazer?

1 – manter a escolha original, ou 2 – trocar de porta?

Atenção: a posição do carro e das cabras não muda durante o programa; está definida no início e

permanece a mesma durante a rodada inteira.

A aluna Carolina respondeu:

Ora, tanto faz, obviamente. Como continuo sem saber em qual porta está o carro, a chance é a mesma

de ele estar em qualquer uma das duas portas que ainda estão fechadas. É claro que o fato do

apresentador ter aberto uma das portas onde está uma cabra não altera em nada minhas chances –

como poderia??? Tenho pela frente duas portas a escolher, e minha chance é de 50% de escolher a

porta certa. Tanto faz. Jogo uma moeda ou escolho na base da "minha mãe mandou abrir esta daqui..."

e pronto, oras!!!

O aluno Pedro respondeu:

Professor, eu acho que não deveria trocar. Não sei bem, mas intuitivamente, acho que deveria ser fiel à

minha escolha original. Algo me diz isso, mas não sei explicar “matematicamente”, mas creio que a

chance de o carro estar atrás da porta continua sendo de 33%, mesmo após o apresentador abrir uma

porta.

O aluno Rogério respondeu:

Eu mudaria de porta, com certeza! Veja: se eu pudesse optar entre escolher apenas a porta A ou ficar

com ambas as portas B e C, é claro que ficando com B e C eu teria mais chances de ganhar, pra ser

mais exato, 2/3 concorda? Então, trocando de porta, eu acho que é exatamente isso que acontece, uma

vez que o apresentador, gentilmente, abriu uma das duas portas e eu vi que lá só tinha uma cabra.

Então, trocar de porta pode ser entendido como poder escolher duas portas de uma só vez, e, como eu

não sei onde o carro está, isso vai me dar uma chance de 2/3 de ganhar!!!

1) Você concorda com o raciocínio de algum destes alunos? Por quê?

2) Se esta fosse uma questão de um teste e você tivesse que corrigir, aceitaria as respostas como foram

dadas pelos alunos?

3) Como você responderia a esta questão?

Após discutirmos as supostas soluções de alunos, cada uma das professoras realizou o

experimento em uma maquete.

Page 92: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

91

Figura 9: Maquete utilizada no 10º Encontro, na atividade 2, “A Porta dos Desesperados”

(01/09/2012).

Pela primeira vez, elas responderam individualmente, sem terem assistido à realização

da experiência pela colega, a fim de que pudéssemos ter resultados diferentes e que uma não

conhecesse a localização do carro, nas portas.

Paula ficou encantada com a atividade que intitulou como “a melhor de todas.” Ao

analisar as respostas de supostos alunos, afirmou que aceitaria todas, pois, cada um pensa de

maneira diferente, apesar de as chances serem as mesmas, teoricamente seria

aproximadamente 33% (1/3, 1/3, 1/3).

Quando a atividade foi proposta a Paula, ela disse que escolheria a porta de número

dois.

Pesquisadora: Por que é que você escolheu a porta dois?

Paula: Não sei. Eu quis a dois. Eu sei que é igual, que pode estar em qualquer uma das

três, mas eu quero a dois.

Pesquisadora: Intuição?

Paula: Foi.

Pesquisadora: Pois já que você escolheu a 2, eu vou abrir a 1, então. (abre a porta 1,

risos) Uma cabra na porta 1. Você tinha escolhido a porta 2. Agora eu te pergunto: Você

pode trocar, eu te dou a oportunidade, você pode trocar de porta, ou você vai para a 3, ou

você permanece na 2.

Paula: Eu vou continuar na 2. É o que eu falei pra você: a cabra pode estar na terceira.

Pesquisadora: Por que é que você vai continuar na 2?

Paula: É intuição. É sorte.

Pesquisadora: Só intuição e sorte?

Paula: Isso! Eu quando eu quero uma coisa... depois dá errado pra mim, então fico nela.

(...)

Paula: Agora, talvez sua resposta esteja correta e depois você muda. E aí?

Pesquisadora: Pois é. Mas você acha que não tem nada de Probabilidade envolvida na

história?

Page 93: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

92

Paula: Tem sim: ela pode estar na 2 ou na 3.

Pesquisadora: Mas as chances continuam as mesmas?

Paula: Acho que sim, né? Agora eu tenho uma chance em duas.

Neste momento, ela reforçou o fato de que quando decide por alguma coisa, não muda

de ideia. Recordou o encontro onde realizamos jogos com moedas, quando teve a

oportunidade de mudar e não mudou. Aparentemente, neste ponto da nossa pesquisa, Paula

ainda tomava a maioria das decisões, ao jogar, intuitivamente; ainda não tinha se habituado a

utilizar a Probabilidade a seu favor.

Abrimos a porta 2, escolhida por Paula, e aparece uma cabra. A professora afirma que é

azar e que as chances seriam as mesmas.

Ao discutir as respostas dos alunos, Paula se identifica com a resposta de Pedro:

“Professor, eu acho que não deveria trocar. Não sei bem, mas intuitivamente, acho que

deveria ser fiel à minha escolha original, algo me diz isso, mas não sei explicar

“matematicamente”, mas creio que a chance de o carro estar atrás da porta continua sendo

de 33%, mesmo após o apresentador abrir uma porta”.

Chamou-nos a atenção o fato de a professora dizer que, se Bruna estivesse presente,

concordaria com a resposta de Rogério. Quando questionada sobre o porquê da afirmação, ela

diz que Bruna sempre acerta tudo. Porém, em momento algum, disse que pensava que

Rogério estivesse certo. Segundo ela, todas as respostas de alunos a esta questão têm sua parte

correta e devem ser “consideradas”.

Mesmo após insistirmos com Paula para que ela pensasse em uma resolução matemática

para a questão, um possível cálculo de Probabilidades, ela continuou a justificar com as ideias

de sorte e de azar. Para convencê-la de que deveria mudar de porta, explicamos um possível

raciocínio para resolver a este problema29

, a partir do cálculo de Probabilidades, utilizando o

quadro e o giz, mas criando a situação e deixando que Paula respondesse.

Imediatamente, Paula, admirada com a solução, concorda que deveria trocar de porta.

Para ela, o raciocínio é incontestável, além de muito interessante. Apesar de ser um problema

muito “famoso”, ela ainda não o conhecia. Sabemos que existem outras formas para resolvê-

lo. Contudo, ao apresentarmos esta solução, deixamos a cargo das professoras essas

sugestões. Em sua avaliação do encontro, ela escreveu:

29

Considerando, por exemplo, que o carro esteja na porta 1. 1ª situação: Paula escolheu a porta 1, abro a porta 2

(neste caso, ou 3), se trocar de porta, troca carro por cabra (Probabilidade 1/3).

2ª situação: Paula escolheu a porta 2, abro a porta 3, se trocar de porta, troca cabra por carro. (Probabilidade 1/3)

3ª situação: Paula escolheu a porta 3, abro a porta 2, se trocar de porta, troca cabra por carro. (Probabilidade 1/3)

Page 94: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

93

“Cheguei à conclusão de que, matematicamente, eu deveria ter mudado (ou seja, trocado o nº 2 pelo

3), nesse caso, a chance de ter o carro era de 2/3. A chance de ganhar o carro era bem menor, depois

da troca a chance de ganhar o carro aumenta.” (Paula, 22/09/2012)

A atividade foi então apresentada a Alice que, como Paula, recebeu a atividade com

supostas soluções de alunos para serem analisadas. Em seu caderno de campo, Alice avaliou a

resposta de Carolina como errada, considerou o raciocínio de Pedro melhor, mas não o ideal.

Segundo ela, consideraria metade da questão, tanto para Pedro quanto para Rogério. Ela

afirmou acreditar que Rogério está certo. Só não concordou muito com seus argumentos.

Após Alice abrir a porta, voltamos à discussão sobre as respostas dos alunos e alguns

“recortes” serão apresentados a seguir.

Alice escolheu a porta 3. Abrimos a porta 1, que continha uma cabra. Quando

questionada se desejaria mudar de porta, ela decidiu permanecer com a 3 que, segundo ela,

possuía o carro. Abrimos a porta 3, que possuía um carro. Neste momento, percebemos a

importância de se discutir o resultado: Alice não mudou de porta e venceu, mesmo sem tentar

aumentar sua Probabilidade de vencer.

Alice: Eu quero a 3.

Pesquisadora: 3?

Alice: É.

Pesquisadora: Eu vou abrir... uma porta. Que tenha uma cabra.

Alice: Minhas chances aumentaram, hein!

Pesquisadora: [risadas] Agora eu te pergunto: você quer trocar de porta?

Alice: Não.

Pesquisadora: Não por quê?

Alice: Porque eu tenho duas opções. Continuo firme e forte. Eu tenho duas opções e vai

estar na 3.

Pesquisadora: Mas vai estar na 3 por quê?

Alice: Porque eu quero a 3. Estou sentindo que está na 3.

Pesquisadora: Por que você não trocaria de porta?

Alice: Porque, neste momento, eu tenho a mesma chance de sair na 2 e na 3. Então, se eu

já tinha escolhido a 3, vou continuar na três.

Pesquisadora: Vou mostrar para você que você... ganhou um carro! Um (... ) Chique, não

é?

Alice: Ahhh! Chique. Modelo Sedan.

No 13º encontro, procuramos construir a ideia de que não existe uma única forma de

trabalhar com os conceitos de Probabilidade. Problemas podem ser resolvidos segundo a

abordagem clássica, através de experimentos, e pode-se, ainda, lançar mão de recursos como

o computador, para efetuar simulações, aproveitando para trabalhar com grandes números. As

Page 95: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

94

professoras puderam realizar, em uma página HTML, a simulação de experimentos com

moedas, dados, gôndolas divididas em frações com cores diferentes, além de resolver o

problema das cabras, trabalhado a partir de uma maquete em encontros anteriores, por

repetidas vezes no computador30

. O site oferecia, ainda, uma estatística de todas as simulações

realizadas, cujos valores, quando se decide por trocar de porta, se aproximam muito de 67%.

A seguir, apresentaremos algumas imagens como forma de ilustrar parte dos resultados

obtidos para este problema quando realizado no computador.

Figura 10: O Problema das Cabras - Trocando carro por cabra

Figura 11: O Problema das Cabras - Trocando cabra por carro

30

Utilizamos: < http://math.ucsd.edu/~crypto/Monty/monty.html> e

< http://staff.argyll.epsb.ca/jreed/math8/strand4/4201.htm>

Page 96: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

95

Destacamos alguns trechos da discussão realizada após as professoras participantes

responderem ao problema a partir de um simulador no computador:

Pesquisadora: Bem, por último, vamos experimentar o problema do Monte Hall.

Alice: Aquele que você fez, da porta dos desesperados?

Pesquisadora: É. Vamos traduzir a página...

Alice: Faz pra gente ver o que vai acontecer.

Pesquisadora: Vou fazer sim, mas depois de vocês.

Alice: Então vai lá que hoje eu vou trocar de porta.

(Alice escolhe a porta a porta 3, o computador abre a porta 2 e Alice muda para a 1 e é

vencida)

Alice: Ai não! Eu perdi! (risos) Não, mas eu sabia que podia acontecer. Não vou falar

que é sorte. Eu deveria ter trocado mesmo.

Pesquisadora: Com certeza?

Alice: Sim. Olha lá (mostrando a tela do computador e se referindo às estatísticas que ele

apresenta ao usuário): a maioria que muda de porta ganha.

Paula: Esse aí não tem jeito. Tem que mudar mesmo!

Pesquisadora: Agora você joga, Paula!

Paula: Vamos lá! Sou eu. Vamos ver se ganho um carro...

(Paula escolhe a porta a porta 1, o computador abre a porta 3 e Alice muda para a 2 e

vence o jogo)

Paula: Oba! Consegui ganhar o carro.

Pesquisadora: Alguma coisa a dizer?

Paula: Esse não foi sorte; foi a Probabilidade.

Em seguida, o grupo discutiu suas respostas e as professoras afirmaram que seus

conhecimentos sobre Probabilidade foram muito aprimorados com o trabalho do grupo,

exemplificando com as próprias conclusões e argumentos utilizados nesta última atividade

exposta.

4.1 Algumas considerações sobre o processo

Durante os encontros, utilizamos metodologias diversas para, muitas vezes, tratarmos

um mesmo assunto. Dessa forma, permitimos que as professoras tivessem a oportunidade não

só de aprender, mas de ensinar Probabilidade, nos diversos momentos onde uma colega

precisou de um encaminhamento. O grupo nos deu a oportunidade de crescermos a cada

encontro, não só em termos de conhecimento sobre Probabilidade, de como ensiná-la, mas

também enquanto pesquisadora, enquanto membros de um grupo de estudos que privilegia o

trabalho coletivo e o respeito ao próximo.

Page 97: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

96

Vale ressaltar que a participação no grupo, por parte das professoras, foi uma escolha.

Elas decidiram dedicar as manhãs de sábado ao estudo de Probabilidade, sabendo que só

receberiam em troca possíveis contribuições para sua prática. E como o grupo só encerrou

suas atividades com o fim do ano letivo, é provável que as próprias professoras percebam

reais contribuições para seu desenvolvimento profissional.

Page 98: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

97

Capítulo 5.

Analisando o processo

Após apresentarmos uma descrição do processo de constituição do grupo e do

trabalho de campo realizado, partimos para a análise dos resultados. Durante o

desenvolvimento das atividades, tivemos a oportunidade de trabalhar e analisar o uso de

termos e ideias vinculados ao ensino de Probabilidade. As categorias de análise foram criadas

após nos debruçarmos sobre o material produzido e identificarmos, a partir das dificuldades

apresentadas pelas professoras participantes, do volume de atividades que envolviam um

mesmo assunto e do teor dos questionamentos feitos pelo grupo, conceitos e noções que a este

foram propostos ou que emergiram do trabalho realizado pelo grupo. O próprio significado de

termo Probabilidade, a diferença entre este e o termo possibilidade, as noções de sorte, azar,

acaso e aleatoriedade entremearam as diversas fases do processo, em maior ou menor escala,

e foram categorias escolhidas para nossa análise. No último encontro, apresentamos às

professoras exemplos de respostas a questões propostas a elas nos encontros iniciais e suas

respectivas respostas, e foi possível perceber uma mudança significativa de opinião por parte

delas, para melhor, ao avaliarem suas próprias respostas. Analisamos também, as reflexões

sobre a prática docente, que permearam todo o trabalho do grupo, com discussões provocadas

pela professora pesquisadora, levando as professoras a ponderarem não só sobre possíveis

respostas de alunos sobre algumas questões, como a analisarem respostas de alunos das

professoras participantes do grupo.

Pesquisas diversas apontam para uma deficiência, por parte dos professores, de

conhecimento e habilidades para se trabalhar com estes conceitos. Para Nicholson e Darnton

(2003, apud AZCÁRATE, 2006), a maioria dos professores tem pouco conhecimento dos

conceitos probabilísticos e, ao de tratá-los na sala de aula, tende a focar seu ensino

privilegiando os aspectos mais procedimentais, vinculados ao cálculo e não à compreensão

conceitual.

Como estes termos e seus significados permeiam os processos de ensino e

aprendizagem de Probabilidade, e devem ser desenvolvidos e aperfeiçoados ao longo destes,

exploramos e analisamos o desenvolvimento da linguagem probabilística das professoras

participantes por acreditarmos que ele seja também responsável pelo desenvolvimento do seu

pensamento probabilístico.

Page 99: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

98

5.1. A apropriação de termos matemáticos associados à Probabilidade

Nessa primeira categoria, reunimos evidências relacionadas à mobilização de saberes

relativos ao tema matemático norteador dos estudos do grupo: a Probabilidade.

Segundo Konold (1991), "a Probabilidade é um conceito particularmente escorregadio.

Através da Probabilidade buscamos demarcar um estado amorfo entre dois extremos

imaginários: a ignorância total e o perfeito conhecimento" (KONOLD, 1991, p.139, apud

AZCÁRATE, 2006, p. 4).

Azcárate (2006) complementa ressaltando que a Probabilidade é um conceito de difícil

compreensão, pois, em geral, entra em contradição com o pensamento determinista e causal

dominante em nossa educação.

Assim, embora o conhecimento dos termos estocásticos não seja uma dificuldade

usualmente percebida nos professores (AZCÁRATE, 2006), uma vez que já usamos muitos

deles no cotidiano, a compreensão de seu sentido no ‘tratamento do acaso’ não é clara para a

maioria dos docentes, o que se configura em um obstáculo para o desenvolvimento do

pensamento probabilístico.

Azcárate (2006) destaca, ainda, que a abordagem dada por muitos livros didáticos ao

associarem a noção de acaso basicamente a argumentos relacionados à sorte e a noção de

aleatoriedade à incerteza do sucesso. Tais caracterizações são insuficientes para uma

compreensão adequada do significado das noções probabilísticas. Assim como a autora,

também observamos (em nossa prática docente e contato com colegas) que dificilmente um

livro didático apresenta uma seção destinada a trabalhar as definições de termos

probabilísticos.

Apresentamos, a seguir, indícios de mobilização de saberes do conteúdo, mais

especificamente, de saberes relacionados à Probabilidade, evidenciados ao longo dos

encontros do grupo.

5.1.1. Probabilidade ou possibilidade?

Notamos, nos dois primeiros encontros, que as professoras utilizavam com frequência

a palavra “Probabilidade”, muitas vezes, em situações nas quais a palavra não se ajustava (em

algumas ocasiões, em substituição à palavra possibilidade, por exemplo). O trecho a seguir,

retirado da transcrição do 2º encontro, permite-nos perceber a forma como Paula utiliza o

termo Probabilidade para justificar um resultado que ela já conhecia, mesmo não respondendo

à pergunta da pesquisadora.

Page 100: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

99

Em um momento do segundo encontro, a pesquisadora pede à Paula que

lance uma moeda e observe sua face. Sai cara. Então lhe é feita a pergunta:

“Quando observamos a face da moeda voltada para cima durante o

experimento, podemos saber qual será a próxima face”?

Paula: Sim, nesse caso, como agora deu cara, a próxima será coroa.

Pesquisadora: Por quê?

Paula: Nesse caso, porque tem 50% de chance de sair cara ou coroa.

Pesquisadora: Mas é isso que você está percebendo durante seus

lançamentos, a sequência cara, coroa, certinha?

Paula: Não. Aqui eu não tô vendo isso (rindo). Mas o certo, a Probabilidade,

é 50% de ser cara e 50% de ser coroa. [...]

Alice: Como são duas possibilidades, a gente pensa que é meio a meio, que

vai ... alternar. Mas não é isso que acontece. Quando a gente começa a jogar

e vê que tá repetindo muito um resultado, a gente pensa que tá errado; que a

moeda tá viciada. Na verdade, a gente pode jogar a moeda 50 vezes, ela não

ser viciada e ela dar 50 caras...

Pesquisadora interrompe...

Pesquisadora: Será que pode? (rindo)

Alice: Pode! Poder pode!

Pesquisadora: Pode, Paula?

Paula: Eu acho que não... É mais difícil. [...]

Alice: É porque você tava pensando que tinha que dar o resultado. Tinha a

possibilidade de sair 100 caras em 100 lançamentos. É por isso que eu to

falando que é bom, entendeu? Fazer o experimento é bom porque desmitifica

o mais provável de acontecer.

Paula: Eu acho que é meio a meio, por ser duas faces. Continuo essa

(transcrição encontro, 12/05/2012, p.2, grifos nossos).

As afirmações de Paula assemelham-se as dos alunos dos estudos de Serrano et al

(2001). Estes pesquisadores aplicaram um questionário a 277 alunos da escola secundária na

qual aproximadamente metade deles (147), com idades entre 14 e 15 anos, não tinha recebido

nenhuma instrução sobre Probabilidade. Os demais (130), com idades entre 17 e 18 anos,

tinham estudado Probabilidade por aproximadamente um mês quando tinham idades entre 14

e 15 anos, e novamente quando tinham idades entre 16 e 17 anos, pelo mesmo intervalo de

tempo. Ao justificarem suas respostas, assim como Paula, os alunos afirmaram que deveria

haver igual número de caras e coroas, pois as faces tinham a mesma Probabilidade de sair. Os

estudantes expressaram explicitamente sua expectativa sobre a conservação da frequência

relativa de caras e coroas em relação à Probabilidade teórica, mesmo em uma sequência curta,

com 50 resultados.

Outra semelhança que identificamos entre os pesquisados destes autores e Paula é a

ideia inicial por ela apresentada de que deveria haver alternância frequente entre caras e

Page 101: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

100

coroas. Segundo os autores, estes indivíduos se apoiam em uma propriedade diferente a

considerar, que não é a tendência global indicada pela frequência, mas a variabilidade

indicada pela alternância de resultados. Para eles, é mais provável uma alternância entre

caras e coroas do que sair duas caras ou coroas seguidas, como a Probabilidade de que saia

cara ou coroa é de 50%. Teoricamente, deveria sair uma vez sim, e outra não, a face cara.

Segundo Serrano et al (1998), esta é uma resposta típica da heurística da representatividade:

A heurística da representatividade, descrita por Kahneman et al (1982, apud

Serrano et al, 1998), consiste em avaliar a Probabilidade de um evento com

base na representatividade dos mesmos em relação à população da qual ele

provém. Neste tipo de raciocínio, desconsidera-se o tamanho da amostra e,

com ele, o estudo da variabilidade, resultando em confiança indevida em

pequenas amostras. Supõe-se que cada conjunto de repetições do

experimento, embora limitada, deva reproduzir todas as características da

população (...). Esses erros não são típicos apenas de alunos, pessoas com

alta formação estatística chegam a cometê-los (SERRANO et al, p. 3, 1998,

tradução nossa). 31

Durante as discussões ao longo deste encontro, surgidas, principalmente, pela

resistência de Paula em admitir resultados deste experimento diferentes de 50% caras e 50%

coroas, despontou a ideia da aleatoriedade, sendo esta “responsabilizada” pelas pesquisadas

pelos resultados de cara e coroa não serem, exatamente, meio a meio, como ela vinha

sustentando desde o primeiro momento. Ao avaliar o encontro, ela usou o termo

convenientemente apenas para afirmar que a utilização do experimento realizado com moedas

era interessante e poderia ser utilizado durante o ensino de Probabilidade, conforme imagem

retirada de seu caderno de campo.

31

“La heurística de representatividad, descrita por Kahneman et al. (1982) consiste en evaluar la probabilidad de

un suceso en base a la representatividad del mismo respecto a la población de la que proviene. En este tipo de

Razonamiento se prescinde del tamaño de la muestra y, con ello, del estudio de la variabilidad del muestreo,

produciéndose una confianza indebida en las pequeñas muestras. Se supone que cada serie de repeticiones del

experimento, aunque sea limitada, ha de reproducir todas las características de la población (...). Estos errores no

son sólo típicos en estudiantes, sino que personas con alta preparación estadística llegan a cometerlos”.

Page 102: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

101

Figura 12: Avaliação do 2º encontro feita por Bruna (12/05/2012)

No 3º encontro, as professoras começaram a utilizar o termo Probabilidade para

justificar resultados de jogos e experimentos:

32 Bruna: Lógico que eu iria ganhar, né?

Pesquisadora: Calma. Relaxa! Vamos lá! Alice, você escolheu ser B por

quê?

Alice: Ah, porque a Bruna escolheu ser A.

Pesquisadora: (rindo) Foi só o que sobrou, né? E aí Bruna, por que você

escolheu ser A?

Bruna: (empolgadíssima) Porque a Probabilidade é muito maior de sair o A

o que de sair o B!

Pesquisadora: Por quê?

Bruna: Ah, olha só (anotando no bloquinho): Se você fizer a subtração, 6

com 1, 5; 6 com 2, 4; 6 menos 3, 3; aqui dá 50 %. Só que só dá 50% com os

números maiores. Você tem a tendência; é só eu ganhar, uai!

Alice: Todas as pontuações menores a Bruna vai ganhar.

Bruna: 0, 1 e 2 têm muito mais Probabilidade de sair do que o 5, por

exemplo. O 5 é só 6 menos 1.

Alice: É. E eu não tinha percebido isso. (transcrição encontro, 19/05/2012,

p.3, grifos nossos) [...]

Alice: É, não ia ter jeito. Nem se fosse muita sorte, né? (rindo)

Pesquisadora: Vamos lá! Então a Bruna já falou porque ela ganhou, né?

Bruna: É porque eu tenho mais sorte! (rindo)

Alice: Não! É porque a Probabilidade é maior!

32

Após a realização do jogo da diferença, que Bruna vence após descobrir com facilidade a melhor estratégia de

jogo, o grupo discute o porquê de Bruna ter vencido. Após o jogo ser proposto é oferecida a oportunidade de

escolher entre ser Jogador A: resultados 0,1 ou 2 e Jogador B: resultados 3, 4 ou 5. Bruna escolhe ser A

imediatamente. A princípio, Alice não vê problema em ser o jogador B.

Page 103: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

102

Pesquisadora: Isso que eu ia falar: você acha que tem mais sorte?

Alice e Bruna juntas: Não. Nesse caso, a Probabilidade é maior.

Pesquisadora: Então, hoje a Bruna não está achando que ela tá com sorte. No

1º encontro, você achou que a sorte contava...

Bruna: Lógico que conta!33

(transcrição encontro, 19/05/2012, p.4, grifos

nossos).

Os trechos anteriores levaram-nos a presumir que as professoras foram, aos poucos,

desvinculando-se de uma premissa que se mantinha forte até o momento: justificar resultados

de jogos a partir da “sorte” - característica marcante da concepção subjetivista, muito comum

em situações de jogo. No decorrer do encontro, percebeu-se que o uso do termo “sorte”, ao

longo da realização do jogo e da posterior discussão, foi se diluindo até que a justificativa da

vitória da jogadora que escolheu os resultados 0, 1 e 2 fosse totalmente baseada no cálculo de

Probabilidades por ambas e o termo “sorte” fosse usado apenas para se descontrair. A seguir,

podemos comprovar a afirmação anterior, bem como reforçar a ideia de que o termo

Probabilidade foi sendo usado, com cada vez mais segurança, pelas professoras do grupo.

Pesquisadora (referindo-se a Alice): Aí na hora34

, se eu falasse: ‘Você pode

trocar’. Você trocaria para ser A?

Alice: Sem eu ter percebido, não. Só depois que a gente começou a jogar foi

que eu pensei. Realmente...

Bruna: Você se lembra que eu falei: “Já ganhei!”. Mas não é que eu ganhei

porque eu tenho sorte; é por causa da Probabilidade, uai!

Pesquisadora: Como é que você percebeu, Bruna, de primeira, o que era?

Bruna: Os menores! O dado vai até quanto? 6! A Probabilidade de sair um

número grande é muito menor. Se fosse 1, 2, 3, 4, 5 e 6 sem soma, aí sim,

não dá pra saber quem ganha. 1, 2, 3, 4, 5, 6 , jogar o dado. Agora quando

entra subtração... (transcrição encontro, 19/05/2012, p. 5, grifos nossos).

Neste trecho, identificamos que, principalmente Bruna, apesar de não quantificar,

exatamente, a Probabilidade que tinha de vencer o jogo, estava certa de que o venceria

baseada na Probabilidade. Isto ocorreu porque, neste encontro, pudemos perceber que as

professoras Alice e Bruna já começaram a associar a ideia de Probabilidade a um valor

numérico. Notamos, também, principalmente em Bruna, forte influência da concepção

frequentista, como quando justifica sua escolha e consequente vitória dizendo: “Os menores!

33

Em seguida, Bruna justifica a existência da sorte a partir do jogo de azar intitulado “Mega-sena”. Segundo a

professora, as chances são iguais para todos que jogam e o fator sorte seria decisivo nesta situação. 34

A pesquisadora refere-se ao momento em que as professoras puderam escolher entre ser o Jogador A ou

Jogador B.

Page 104: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

103

O dado vai até quanto? 6! A Probabilidade de sair um número grande é muito menor.” e “0,

1 e 2 tem muito mais Probabilidade de sair do que o 5, por exemplo. O 5 é só 6 menos 1”.35

Na sequência desta fala, faz-se presente também a concepção clássica, quando Bruna

completa “Se fosse 1, 2, 3, 4, 5 e 6 sem soma, aí sim, não dá pra saber quem ganha. 1, 2, 3, 4,

5, 6 , jogar o dado”, dando a entender que cada uma das faces do dado, de 1 a 6, tem a mesma

chance de sair em um lançamento.

Pesquisadora: Então, fica até repetitivo perguntar, mas só pra gente... Vocês

acham o jogo justo?

Bruna: Não!

Pesquisadora: Não? Por quê?

Bruna: Não é! Porque quem escolheu o 1 teria que ficar com o 5. Quem

escolheu o 2...(pausa) mesmo assim, não. Não tem como o jogo ficar justo!

(Depois de fazer algumas anotações) Não é justo, um vai ter sempre

prioridade com relação ao outro. Quem ficar com o par vai ganhar. Não é

que vai ganhar, a chance dele ganhar é maior.

Pesquisadora: Depois a gente vai... tentar uma maneira de ele ficar justo e...

eu acho que tem!

Alice: Ah, não! Agora eu quero saber isso!36

(transcrição encontro,

19/05/2012, p.6, grifo nosso).

O exercício de avaliar se um jogo é justo ou não foi proposto com o intuito de

levarmos as professoras a analisar suas conjecturas, pois, somadas ao registro escrito,

“integram as experiências individuais e coletivas na busca da construção e apropriação dos

conhecimentos abstratos estudados” (SANTOS, 2005, p.129). As professoras receberam um

quadro para que colocassem todos os resultados das subtrações obtidas durante os

lançamentos.

O registro foi importante. Durante a discussão e tentativa de tornar o jogo justo, elas

compararam resultados, observaram os valores que se repetiram muitas vezes e os que não

foram obtidos nos primeiros 20 lançamentos. Percebemos que as professoras se sentiam mais

à vontade para utilizar o termo Probabilidade e que o faziam com frequência cada vez maior.

Notamos, ao longo do trabalho de campo, que elas gostavam muito de apresentar suas

conclusões sobre o estudo de Probabilidade obtidas a partir das atividades realizadas durante a

pesquisa e que faziam questão de relacionar possíveis respostas de alunos quando

questionadas neste sentido.

35

Na sequência, Bruna completa que se trata de uma subtração e que se fosse adição seria o contrário. 36

As duas continuam empenhadas em encontrar a maneira de tornar o jogo justo. Continuam investindo em

combinações de resultados, anotando, discutindo fervorosamente. Depois que a pesquisadora deu a entender que

pode haver uma maneira de o jogo ficar justo, elas voltaram às tentativas.

Page 105: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

104

Bruna: Não. Só que é Probabilidade; não é certeza37

. (transcrição encontro,

19/05/2012, p.7, grifo nosso).

Pesquisadora: Em hipótese, eles (os alunos) vão falar que é o quê? 38

Bruna: Que um número saiu mais que o outro; que quem jogou primeiro

tem mais chance de ganhar.

Alice: Será?

Bruna: Ah falam, eu creio que falam. Eu acho que a primeira coisa que você

deve fazer é mandar o A jogar primeiro. Eles vão ver que o A tá ganhando e

vão querer trocar. Aí o A não vai querer trocar. Aí troca a ordem, o B joga

primeiro, e não vai alterar nada. Aí troca e a Probabilidade do A ganhar

continua. Até... chegar nisso aí, eu acho que a primeira coisa que eles vão

achar é que quem joga primeiro ganha. Como aluno, eu acho que seria isso,

sem o conhecimento de Probabilidade. (transcrição encontro, 19/05/2012,

p.10, grifos nossos)

Nos fragmentos acima, podemos perceber que o significado do termo Probabilidade

foi se aproximando cada vez mais ao que consideramos ideal. Ao afirmar que uma

Probabilidade não é uma certeza, Bruna referia-se ao episódio já analisado anteriormente,

agora citado por Alice, onde Paula teve dificuldade de aceitar resultados diferentes de 50%

caras e 50% coroas no lançamento de uma moeda.

Como Lopes (2004), acreditamos que não faz sentido trabalharmos atividades

envolvendo conceitos estatísticos e probabilísticos que não estejam vinculadas a uma

problemática. No nosso caso, não faria sentido trabalhar uma atividade, ou realizar um

experimento, que não pudesse também ser realizado com nossos alunos. Neste tipo de

atividade, podemos estender a discussão ao âmbito da sala de aula e refletir sobre as possíveis

alegações e questionamentos de nossos alunos.

Neste último recorte, é esboçada uma prática que permeou todo o trabalho do grupo:

colocar-se no lugar de nossos alunos, aproveitando a experiência oriunda de anos de docência

para tentar discutir possíveis respostas e/ou questionamentos comuns a alunos, em especial,

das séries finais do Ensino Fundamental, turmas com as quais trabalhávamos durante os sete

meses da pesquisa. Esta atividade tinha como objetivo uma interpretação formal, pois

apresentava possibilidades diferentes para cada evento (conjunto de resultados), o que tornava

nosso espaço amostral assimétrico. Contudo, a concepção subjetivista também permeou o

processo através da ideia de sorte, constantemente citada pelo grupo. Na última fala de Bruna

37

Afirmação precedida do comentário da pesquisadora que remetia ao encontro anterior, onde Paula expressou

sua ideia inicial de que, no lançamento de uma moeda deve ocorrer regularidade nos resultados, mantendo uma

sequência cara, coroa, cara, coroa, porque cada uma tem 50%de chances de ocorrer. Segundo ela, deveria

ocorrer, inclusive, nessa ordem. 38

Em resposta ao questionamento da pesquisadora, que perguntou como, em hipótese, os alunos reagiriam aos

resultados obtidos.

Page 106: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

105

no recorte anterior, ela utiliza o termo Probabilidade tanto para quantificar chances, quanto

para definir um conteúdo curricular de Matemática.

Até este momento, ainda seria precoce afirmar que as professoras conseguiram se

apropriar do conceito de Probabilidade. O trecho, a seguir, mostra-nos que, até então, ainda

era comum utilizar o termo Probabilidade(s) em substituição à palavra possibilidade(s), como

quando Alice diz: “Então, quais eram as Probabilidades? Dar cara e cara, cara e coroa, coroa e

cara e coroa e coroa”. No entanto, ela parece perceber a confusão quando, na mesma fala,

completa: “Porque você tinha duas oportunidades de tirar faces iguais e duas de tirar faces

diferentes”.

Observamos que, apesar de não utilizar o termo possibilidades como já o havia feito

anteriormente, nesta frase, utiliza a palavra “oportunidades” para substituí-lo, o que nos leva a

crer que percebeu o uso inadequado da palavra Probabilidade. O mesmo trecho ainda

apresenta a palavra sendo utilizada corretamente. No recorte da transcrição dos áudios

podemos perceber que elas já procuram um critério para justificar suas escolhas; sua

percepção. Apostamos nessa percepção para a construção do pensamento probabilístico, pois

assim o professor tem a oportunidade de criar; de elaborar seu próprio modelo de resolução.

Contudo, em encontros posteriores, as professoras teriam a oportunidade de demonstrar cada

vez mais segurança em utilizar o termo Probabilidade, inclusive abordando a concepção

clássica, além de justificarem o porquê da utilização.

O trecho a seguir, retirado de nosso quarto encontro, reforça nossa conclusão:

Alice: Esse é justo porque era cara e coroa39

. Aí o outro evento era cara e

coroa. Então, quais eram as Probabilidades? Dar cara e cara, cara e coroa,

coroa e cara e coroa e coroa. Então, era 50% para um e 50% para outro.

Então, neste caso, a Probabilidade era a mesma. Então, ele é justo.

Pesquisadora: O que te ajudou a descobrir isso?

Alice: Fazer a tabelinha. Eu perdi aquela vez40

então eu pensei: deixa eu

fazer aqui primeiro para eu saber o que está acontecendo.

Pesquisadora: Isso mesmo!

Alice: Porque você tinha duas oportunidades de tirar faces iguais e duas de

tirar faces diferentes.

Paula: Meio a meio.

Alice: Quem venceu foi a Paula, mas, neste caso, foi justo porque a

Probabilidade dos eventos era a mesma. (transcrição encontro, 26/05/2012,

p.6, grifos nossos).

39

Neste jogo, o jogador escolheria , ao lançar dois dados, em vencer com duas faces iguais ou duas faces

diferentes. 40

A professora Alice refere-se ao “Jogo da Diferença”, já abordado anteriormente.

Page 107: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

106

Nos 6º e 7º encontros, Alice utilizou ‘possibilidade’ para se referir a ‘chances’ e

‘Probabilidade’ quando julgou necessário quantificar as chances de um evento ocorrer. Nos

encontros posteriores, a confusão não mais aconteceu e Alice aplicou os termos com mais

confiança e com frequência regular.

Apresentaremos, a seguir, a atividade proposta e alguns fragmentos da transcrição do

sétimo encontro do grupo.

Atividade G-2: A escolha de um carro para comprar

Um cliente vai a uma loja de carros usados para comprar um carro e percebe que o modelo que ele

procura, todos com o mesmo ano de fabricação, está disponível em três cores diferentes: vermelho,

preto e prata. No pátio da loja há 2 veículos vermelhos, 4 pretos e 1 prata. Gostando das três cores e

com a informação de que todos os carros são exatamente iguais, com exceção da cor, decide escolher

ao acaso uma chave na mesa do vendedor e comprar o carro. Qual é a probabilidade de que ele compre

um carro prata? Justifique.

Discutindo algumas questões:

a) A escolha da chave é feita ao acaso? Justifique.

b) Podemos escrever todas as possibilidades de resultados antes da escolha da chave? Se sim, quais?

Se não, justifique.

c) Se a cada carro vendido pudermos supor que a loja repõe a cor vendida de forma a manter o estoque

sempre o mesmo, podemos repetir o processo de escolha da chave ao acaso tantas vezes quantas

desejarmos, sempre nas mesmas condições. Neste caso, que característica identificaríamos neste

experimento?

Com esta atividade, pretendíamos trabalhar o cálculo de Probabilidade a partir do

enfoque clássico, explorar a ideia de eventos dependentes, a união e a interseção de eventos e

a negativa de um evento (complemento). Contudo, neste momento, abordaremos apenas os

fragmentos que reforçam nossa ideia de que as professoras participantes, de fato,

amadureceram o conceito de Probabilidade que possuíam.

41Alice: A Probabilidade é 1/7. 14,3 aproximadamente, porque é 1 dividido

por 7. Deu uma possibilidade num total de sete.

Pesquisadora: Que regra que é essa, Alice?

Alice: Fração.

Pesquisadora: Ah, tá. Você usou fração. Mas que regra que, tem um nome.

Lembra da semana passada?

Alice: Ah, gente. Tem mesmo! Regra de Laplace. (transcrição encontro,

30/06/2012, p. 4, grifo nosso) [...]

Pesquisadora: Tá. A gente pode escrever todas as possibilidades de escolha

das chaves?

Bruna: Sim. Sete resultados.

Pesquisadora: Quais?

Bruna: Pode ser preto, preto, preto, preto, vermelho, vermelho e prata.

41

Em resposta à pergunta da pesquisadora: “Bem, qual é a Probabilidade de ele comprar um carro prata?

Justifique.”.

Page 108: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

107

Alice: Eu coloquei só porcentagem. Coloquei 28,6% aproximadamente.

57,1% do preto aproximadamente e o prata 14,28% aproximadamente.

Pesquisadora: A Bruna falou todas as possibilidades. Ela listou todas e as

possibilidades são essas mesmo. Carro preto, preto, preto, preto, vermelho,

vermelho e prata. Não é? São todas as possibilidades. E a Alice colocou os

resultados, fazendo de novo, o quê?

Alice: Teoria de Laplace.(imediatamente)

Pesquisadora: Você comparou o resultado que você queria...

Alice: Com todas as possibilidades. (transcrição encontro, 30/06/2012, p. 5,

grifos nossos)

A partir da fala de Alice: “A Probabilidade é 1/7. 14,3 aproximadamente porque é 1

dividido por 7. Deu uma possibilidade num total de sete”, inferimos que a professora já era

capaz de diferenciar os termos Probabilidade e possibilidade por usá-los corretamente em uma

mesma frase.

Quando questionada sobre todas as possibilidades de escolha das chaves, Bruna

respondeu: “Pode ser preto, preto, preto, preto, vermelho, vermelho e prata”, demonstrando

que entendia perfeitamente o significado da palavra possibilidade.

Paula era um pouco mais tímida ao se expressar. Principalmente por Alice e Bruna

estarem sempre buscando expor suas ideias e opiniões espontaneamente, e quando

questionadas, responderem com rapidez. Mas Paula quase sempre precisava ser questionada

diretamente. Apesar disso, ela parecia se sentir muito à vontade no grupo e sempre que não

entendia, questionava as respostas e opiniões dadas. Contudo, dificilmente tomava a iniciativa

de responder primeiro.

No 11º encontro, ao realizarmos a atividade do astrólogo, fizemos uma simulação de

retirada das bolas da urna e Paula era o astrólogo que, de olhos vendados, retirou bolas de

duas urnas. Em sua fala durante a análise dos resultados, ela utilizou corretamente o termo

possibilidade. Até então, não havíamos percebido esta capacidade de diferenciação, pois a

professora utilizava com frequência o termo chance ou ainda, Probabilidade, em situações nas

quais seria adequado empregar a palavra possibilidade.

Alice: Eu não escolheria essa de jeito nenhum! E foi a que eu fiz.

Paula: Não, eu não penso que seria a pior, não.

Pesquisadora: Não? Por quê?

Paula: Olha só. Ela colocou em uma ponta uma preta. Na outra, ela colocou

duas brancas e uma preta. Nessa que tem duas brancas, ela tinha

possibilidade de tirar uma preta? Tinha. (transcrição encontro, 22/09/2012, p.

3, grifo nosso).

Page 109: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

108

Sem entrarmos no mérito de resposta correta ou errada, neste momento, acreditamos

que a convivência no grupo, as discussões e reflexões provocadas pelas questões abordadas

tenham contribuído para que Paula aprimorasse a capacidade de diferenciar os termos

Probabilidade e possibilidade. Isso não significa que a professora já tivesse se apropriado dos

significados e conceitos discutidos pelo grupo, mas que as argumentações produzidas ao

longo dos encontros contribuíram para a aquisição de algumas concepções probabilísticas.

Mesmo quando Paula utilizava erroneamente a expressão “bastante provável” para

representar eventos “certos”, neste mesmo encontro, utilizou corretamente a palavra

possibilidade, reforçando nossa conclusão de que ela já formou este conceito de maneira

resistente e não mais o confunde com o termo Probabilidade.

Pesquisadora: Presta atenção: eu tenho um vermelho (dados coloridos) e

quatro verdes. Coloco aqui (num saco não transparente). Você tirar um

verde? É “Bastante provável” ou é “Certo”?

Paula: É certo.

Pesquisadora: É certo? Mas olha pra você ver: eu tenho pelo menos um dado

vermelho. É certo que você vai tirar aqui e vai sair um dado verde?

Paula: Tem possibilidade, uai?!

Pesquisadora: Tem possibilidade, mas “Certo” é aquilo que vai acontecer

com certeza; não tem chances contrárias. Então, eu coloquei quatro dados

verdes e um vermelho. Eu coloco aqui dentro e você não vai ver. Aí eu te

pergunto: você tirar um dado verde é certo ou é bastante provável?

Paula: É bastante provável. (transcrição encontro, 22/09/2012, p. 10, grifo

nosso) [...] 42

Pesquisadora: Paula, dá um exemplo de uma atividade que a gente pode

fazer para tirar isso da cabeça do Michael sem dar a resposta?

Alice: O mesmo que faríamos com a Júlia.

Paula: Mostrando que há possibilidade sim. Mostrando que ele está errado.

Pesquisadora: Jogando?

Paula: Eu tenho os dados aqui. É só mostrar pra ele. Tem algum dado

amarelo? Branco? Não tem. Então, isso é impossível. (transcrição encontro,

22/09/2012, p. 19-20, grifo nosso).

Durante todo nosso trabalho de campo havia, na sala de aula onde nos encontrávamos,

uma mesa montada pela pesquisadora com diversos objetos (moedas, dados coloridos e

brancos, baralhos, bolas coloridas, balas, sacos pretos, etc.) que eram utilizados durante os

jogos e experimentos e, livremente, quando sentíamos a necessidade de algo concreto para

ajudarmos uma amiga a chegar a uma resposta correta, sem dizê-la diretamente.

42

Neste momento, analisávamos uma resposta equivocada de um aluno a uma atividade da pesquisa de mestrado

de Santos (2010).

Page 110: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

109

Esta ferramenta contribuiu para que o espírito de grupo se manifestasse durante nossa

pesquisa. Todas nós tínhamos liberdade de lançar mão dos objetos ali presentes que, com

frequência, nos auxiliavam em situações de dúvidas de uma das professoras do grupo.

Segundo Ball (2000 apud BATANERO, CONTRERAS e ARTEAGA, 2009), se a

formação inicial do professor foi baseada em habilidades matemáticas, ele pode se sentir

inseguro em utilizar abordagens mais informais. É importante apoiá-los e proporcionar-lhes

vivência de atividades que lhes sirvam para conectar aspectos conceituais e didáticos. Como

queremos que os alunos construam seu conhecimento ativamente, resolvendo problemas e

interagindo com os colegas na sala de aula, as atividades apresentadas aos professores

também devem basear-se em uma abordagem social construtivista da aprendizagem

(JAWORSKI, 2001, apud BATANERO, CONTRERAS e ARTEAGA, 2009).

5.1.2. A aleatoriedade

Segundo Serrano et al (1998), a noção de aleatoriedade é o ponto de partida para a

Probabilidade. O interesse e a necessidade deste estudo parecem claros, já que a maioria dos

currículos de Matemática dos níveis de ensino obrigatório aponta para uma intensificação do

estudo dos fenômenos aleatórios. Os termos "experimento aleatório", "evento aleatório" e

mesmo as palavras "acaso", "aleatório", aparecem com frequência, tanto na linguagem

cotidiana, quanto em livros didáticos. Com relação à noção de aleatoriedade, estes autores

afirmam, ainda, que em diferentes momentos históricos têm sido interpretada de forma

diferente e que, ainda hoje, resiste a uma definição simples que permite determinar claramente

se um evento ou sequência é ou não aleatório.

Podemos dizer que, ao longo de nosso trabalho de campo, a noção de aleatoriedade foi

a mais trabalhada. Já fomos à campo com o intuito de reforçarmos este estudo em relação aos

demais. Corroboramos com Batanero (2001), que afirma que, com a repetição de experiências

múltiplas, por vezes inconsciente, e com a existência de variáveis aleatórias na vida diária, a

intuição e noção de aleatório, às vezes aparece antes da ideia de Probabilidade. A autora

exemplifica as experiências diárias que temos com variáveis aleatórias contínuas, citando o

tempo de espera de um ônibus, ou a necessidade de chegar de nossa casa ao trabalho.

A seguir, temos um trecho da transcrição do 1º encontro, quando Paula demonstrou

acreditar que haveria uma sequência regular de resultados ao retirarmos uma bala de um saco

não transparente com 30 balas, sendo 15 balas de cada sabor (15 verdes e 15 roxas. As balas

Page 111: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

110

são de mesmo formato e marca, nos sabores uva e menta). Quando perguntamos qual seria o

sabor da bala retirada, ambas concordaram que a chance de sair uma bala de uva era a mesma

de sair uma bala de menta. Mas houve uma situação interessante. A pesquisadora argumentou:

“Suponhamos que eu retire uma bala do saco (retira uma bala roxa). Se eu fizer uma segunda

retirada, que cor de bala eu teria?”. Vejamos as transcrições:

Bruna: Uai, pode ser roxa ou verde, não dá para saber.

Pesquisadora: E você, Paula, o que acha?

Paula: Eu acho que sairia verde.

Pesquisadora: Por quê?

Paula: Porque tá meio a meio. Se saiu uma roxa, a próxima vai ser verde.

Pesquisadora: E você, Bruna. O que você acha?

Bruna: Não. Eu acho que pode ser verde ou roxa. Agora tem uma verde a

mais, mas é aquele caso: mesmo se tivesse uma só de outra cor, não dá pra

saber. Pode ser verde ou roxa. Tem uma chance um pouquinho maior de ser

verde, mas não tem que ser verde.

Pesquisadora: E aí, Paula. A Bruna te convenceu, ou tem que ser verde?

Paula: É, mas a chance de sair verde é maior.

Bruna: Mas não faz muita diferença, 14, 15, não. (transcrição encontro,

02/05/2012, grifos nossos)

No 2º encontro, Paula ainda parecia estar convencida de que haverá uma sequência de

resultados pré-definida por uma Probabilidade. Desta vez, realizamos um experimento que

consistia de lançar uma moeda e observar a face voltada para cima. Cada uma de nós lançou a

moeda 50 vezes e anotou os resultados.

Em seguida, todos os resultados foram copiados no quadro e discutidos pelo grupo.

Assim, as professoras tiveram a oportunidade de comparar os resultados, as longas sequências

de uma única face dos resultados obtidos por cada uma das professoras e, ao final, o valor

próximo do resultado esperado.

Durante os lançamentos, a pesquisadora foi até a mesa da dupla Alice e Paula. Nesse

momento, a primeira professora pediu à Paula que lance uma moeda e observe sua face. Saiu

cara. Então foi feita a pergunta: “Quando observamos a face da moeda voltada para cima

durante o experimento, podemos saber qual será a próxima face?”.

Paula: Sim. Nesse caso, como agora deu cara, a próxima será coroa.

Pesquisadora: Por quê?

Paula: Nesse caso, porque tem 50% de chance de sair cara ou coroa.

Pesquisadora: Mas é isso que você está percebendo durante seus

lançamentos, a sequência cara, coroa, certinha?

Paula: Não. Aqui eu não tô vendo isso (rindo). Mas o certo, a Probabilidade,

é 50% de ser cara e 50% de ser coroa.

Alice: Não, não, não...

Pesquisadora: O que foi, Alice?

Page 112: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

111

Alice: Uma coisa não tem nada a ver com a outra. A gente sabe que a

tendência é dar meio a meio, mas eu acho que não vai dar não. Tem alguma

coisa errada com essa moeda... ela tá viciada...(rindo) (transcrição encontro,

09/05/2012, grifos nossos)

Identificamos, nesta transcrição, semelhanças com os resultados das pesquisas de

Green (1983, 1988, 1989 e 1991, apud AZCÁRATE, CARDEÑOSO e PORLÁN, 1998). Ele

investigou as ideias de aleatoriedade de crianças de diversos níveis de ensino, a partir de

diferentes provas escritas que indicaram que as crianças, diante de uma sequência aleatória

como o resultado do lançamento de uma moeda sucessivas vezes, esperam a presença da

equiprobabilidade e não conseguem compreender o significado da irregularidade dos

resultados obtidos em pequenas amostras.

Apesar de, no momento do questionamento feito pela pesquisadora, Paula e Alice já

terem efetuado diversos lançamentos, que não seguiam um padrão, Paula insistia na ideia de

uma sequência regular e previamente definida. Segundo Serrano et al (1998), num processo

aleatório, espera-se que uma parte da trajetória represente exatamente o processo. Portanto, as

sequências de resultados que aparecem relativamente ordenadas não são consideradas

aleatórias. As pessoas que apresentam esta concepção avaliam as probabilidades comparando-

as com os valores de 0%, 50% e 100%. Se uma probabilidade aproxima-se de 0% ou 100%, o

evento é considerado impossível ou certo, respectivamente. Apenas cerca de 50% é

considerado verdadeiramente aleatório. Estes autores completam ainda que os indivíduos que

apresentam esse tipo de comportamento tendem a buscar explicações causais ao invés de

aleatórias para a ocorrência de resultados inesperados e variabilidade dos fenômenos

aleatórios.

Mais uma vez, identificamos que Paula, mais do que Alice, buscava a casualidade ao

invés da aleatoriedade para explicar a ausência de alternância dos resultados de cara e coroa

(SERRANO et al., 1998). Uma intensa discussão se instalou e Alice tentou, veementemente,

convencer Paula de que o evento só é impossível se não existir nenhuma chance de ele

acontecer.

Procuramos não interferir, já que Alice percebeu, a partir do experimento, o que

tínhamos como objetivo principal ao propor a questão: a ideia de aleatoriedade. Contudo, o

não convencimento de Paula foi perceptível. Por isso, foi necessário trabalhar a ideia de

aleatoriedade nos encontros posteriores. Percebemos que Paula possuía, até o momento, uma

concepção “não probabilística” da realidade, por não reconhecer o azar e os sucessos

aleatórios (AZCÁRATE, 1996).

Page 113: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

112

Iniciamos o 4o encontro trabalhando, novamente, aleatoriedade a partir do simples

experimento de lançar o dado e anotar os resultados (face) obtidos. Apresentamos, a seguir,

“recortes” da transcrição deste encontro.

Pesquisadora: Se a gente dividisse 150 por seis, 25. Então, teoricamente, os

resultados da gente deveriam se aproximar do 25.

Alice: Mas chegou. É próximo, se a gente for pensar bem. 26 é bem

próximo. 23 é próximo. O 1 e o 443

é que foram quantidades maiores, mas

não houve uma coisa assim...

Pesquisadora: Mas o que vocês acham que ia acontecer se a gente

continuasse lançando?

Alice: Cada vez ia ficar mais próximo de 25.

Paula: Cada vez que a gente lançasse, a proximidade ia ser menor.

Alice: Mesmo sabendo que os eventos são aleatórios, que um não depende

do outro, quanto mais experimentos a gente fizesse, mais ia chegar ao

resultado de n aproximado em cada número (se referindo a face).

Pesquisadora: E de novo igual aquele dia, passar no quadro é importante.

Alice: É sim. Se você quer se fazer entender verdadeiramente; tem que se

passar os resultados, os eventos. E olha só: é realmente a quantidade, se a

gente fizesse mais. Se fosse só os 10, olha só como ia ser diferente; se a

gente fizesse só os 10 primeiros (transcrição encontro, 26/05/2012, grifos

nossos).

Até este encontro, Alice não falou diretamente sobre como entendia a aleatoriedade.

Uma definição formal não havia sido cobrada a ela ou a qualquer outra professora participante

do grupo. A intenção era que este conceito fosse construído através dos experimentos e

atividades realizadas e, em sua fala, foi possível perceber que, neste ponto da pesquisa, ela já

era capaz de identificar uma característica de um experimento aleatório quando diz que “um

não depende do outro”, além de perceber também, a necessidade de se realizar vários

lançamentos com o dado.

Segundo Lopes, Carvalho e Mendonça (2012), a aleatoriedade só pode ser definida em

função dos instrumentos de que se disponha para provar o caráter aleatório do fenômeno com

o qual se defronta. Não há uma forma única, precisa e universalmente válida para defini-la. A

aquisição e a compreensão desse conceito se realizam em um desenvolvimento contínuo,

mediante o uso progressivo de múltiplos meios de representação e atividades de ensino

diversificadas e integradas, ou contextos de experiência mais amplos (LOPES, CARVALHO

e MENDONÇA, 2012).

No 5o encontro, Bruna manifestou suas ideias sobre aleatoriedade, ainda de modo

inseguro. Paula ainda apresentava ideias um pouco tímidas, às vezes confusas, sobre o tema,

conforme fragmentos da transcrição que apresentamos:

43

Relação face/quantidade de ocorrência: 1/30, 2/20, 3/26, 4/30, 5/23, 6/21.

Page 114: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

113

Pesquisadora: E observar se nas próximas horas sai o Sol?44

Bruna: Isso não é aleatório. Se tem o dia, tem o Sol.

Pesquisadora: Não é. É um evento certo. Em 24 horas vai acontecer.

Bruna: É certo.

Pesquisadora: Colocar a água no congelador e ver se ela congela a uma

temperatura de 0º?

Bruna: Isso é óbvio. Vai acontecer. Não é aleatório.

Pesquisadora: Lançar uma bola em um cesto, dentro de uma quadra de

basquete, e observar se ela entra.

Bruna: Isso já é aleatório. Você não pode afirmar se vai acertar o cesto.

Pesquisadora: E aí, Paula?

Paula: Eu acho que é aleatório. Ela pode cair dentro do cesto, ou pode não

cair. (transcrição encontro, 02/06/2012, grifos nossos).

Em questões relacionadas ao cotidiano, Bruna parecia classificar corretamente os

eventos como aleatórios ou não, como quando afirma “Porque você não sabe o número que

vai sair. Pode tirar qualquer um”. Contudo, em situações mais complexas, como a apresentada

a seguir, percebemos que Bruna ainda possuía o que Azcárate (1996) denomina concepção

probabilística intuitiva, baseando-se ainda em modelos não normativos.

Pesquisadora: Daí gente, tem o jogo aí da Paula45

. (...) Outras crianças

jogaram o mesmo jogo e alguns parece que trapacearam. Aí tem os

resultados do Jaime, do Luiz, da Maria e do Jesus. Podem observar eles aí,

com calma. Dá uma pensada nas questões que estão aí embaixo.

(silêncio/tempo) Beleza? Então vamos lá: o modelo aleatório pode ser

aplicado a essas situações?

Bruna: Sim.

Pesquisadora: Por quê?

Bruna: Porque você não sabe o número que vai sair. Pode tirar qualquer um.

Pesquisadora: E aí, Paula? Você acha que é aleatório eu tirar um número

qualquer?

Paula: Sim.

Pesquisadora: E sair o 7, foi aleatório?

Paula: Sim.

Pesquisadora: Olhando os resultados, você acha que alguém trapaceou? Só

olhando os resultados?

Paula: Não.

Pesquisadora: Então ninguém trapaceou, ao seu ver?

Bruna: É pouco provável do Jaime46

sair, esse cartão dele, mas.... pode sair.

44

Perguntando se é aleatório ou não. 45

As atividades costumavam receber os nomes das professoras participantes. Esse jogo tem 16 cartões. Ela

(Paula) os numera de 1 a 16 e os coloca em uma caixa fechada. Sacode com força e mistura bem. Depois, ela tira

um cartão e é o número 7. O que é que ela fez? Foi lá no número 7 e marcou ele. E cada jogador faz isso. Cada

jogador tira 16 vezes um número dali de dentro. Lá dentro tem os números do 1 ao 16 e ele vai tirar 16 vezes,

não é? Sempre colocando a ficha lá dentro de novo. Ou seja, com reposição. Então ela tem uma nova chance de

ser retirada (leitura da pesquisadora). 46

O cartão de Jaime apresentava a ocorrência exata dos números 1 a 16, uma vez cada.

Page 115: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

114

Pesquisadora: É. Também penso isso. Pode sair. Mas só de olhar para a

questão... Se a gente trabalhar com os nossos alunos, o que é aleatoriedade e

tudo, se algum deles falar que o Jaime trapaceou, como é que agente explica

para ele, ou como que eles justificariam?

Bruna: Eu acho que entra em duas questões: entra pode ter o aluno que vai

observar e falar assim: “É muito difícil sair um número na sequência, um,

dois, três, quatro, cinco, seis...” O aluno que analisa nesse sentido ele vai

achar que o Jaime errou porque é difícil de sair. Se você analisar

Probabilidade, a chance de sair um, dois, três, quatro é a mesma. Então, se o

aluno que olhar para esse lado vai dizer que o Jaime acertou. Então, depende

do que o aluno vai enxergar.

Pesquisadora: E você, Paula?

Paula: Eu acho que pode ter saído repetido sim. Pode.

Pesquisadora: Mas você acha que ter saído repetido assim foi trapaça ou foi

por que aconteceu mesmo?

Paula: Foi sorte.

Pesquisadora: Eu acho legal vocês falarem, que faz pensar.

Paula: Eu acho assim, bem difícil sair uma de cada.

Pesquisadora: Então foi sorte ou ele trapaceou?

Paula: Foi sorte. (transcrição encontro, 02/06/2012, grifos nossos)

Ao basear sua resposta em critérios de casualidade quando afirma “Eu acho que entra

em duas questões: (...) se você analisar Probabilidade, a chance de sair um, dois, três, quatro é

a mesma. Então, se o aluno que olhar para esse lado vai dizer que o Jaime acertou. Então,

depende do que o aluno vai enxergar”. Bruna não levou em consideração o caráter não

determinístico do experimento. Sendo assim, ela isentou Jaime da provável trapaça.

Baseado em Azcárate (1996), inferimos que esta professora aparenta reconhecer a

aleatoriedade como uma propriedade de certos fenômenos da realidade, mas seu tratamento

probabilístico não é considerado por ela como algo viável. Isso é percebido quando afirma

que o resultado de Jaime é possível. Indivíduos com esta concepção consideram os fenômenos

aleatórios como de difícil tratamento matemático.

Paula, ao afirmar que o resultado de Jaime foi motivado pela sorte, evidenciava

manter, ainda, uma concepção “não probabilística” da realidade (AZCÁRATE, 1996); parecia

não reconhecer claramente o azar e o sucesso aleatórios, baseando suas respostas em crenças,

sem predominância do raciocínio estocástico.

Optamos por iniciar nosso 7º encontro repetindo um experimento do encontro anterior;

um sorteio47

. Em diversas ocasiões, Alice e Paula afirmaram que Bruna tinha muita sorte.

47

No 6º encontro realizamos o sorteio com os quatro nomes das integrantes do grupo e quem “venceu” o sorteio

foi a professora Alice. Contudo, a professora Alice, a vencedora, disse que se a professora Bruna estivesse

presente ela teria ganhado, porque ela tem mais “sorte”.

Page 116: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

115

Isso, por que, como Bennet (2000, p. 13, apud AZCÁRATE, 2006, p. 11), acreditamos que

"as ideias intuitivas sobre o acaso podem preceder as ideias formais e, se são corretas, podem

ser de grande valia na aprendizagem; mas, em caso contrário, podem dificultar a correta

compreensão dos conceitos".

Cada professora recebeu quatro recipientes de plástico transparente idênticos e um

saco preto. Nossos nomes foram inseridos – um em cada recipiente – e cada uma sorteou um

recipiente 75 vezes. Segue um trecho da discussão que se estabeleceu após o sorteio:

Pesquisadora: Então, eu tinha colocado lá: na escola de Bruna teve uma

festa. No final, teve um sorteio. Tentar descobrir se as chances são,

realmente, as mesmas chances de se ganhar.48

Alice: São.

Pesquisadora: Todo mundo tem a mesma chance de ganhar?

Alice: Tem.

Pesquisadora: Por quê?

Alice: Porque são eventos aleatórios. São quatro e todo mundo tem a mesma

chance que, no caso aqui, é ¼ para cada um, 25% para cada um. Então, as

chances são iguais para todo mundo.

Pesquisadora: Então, por que é que não saiu tudo igual?

Alice: Não saiu tudo igual porque são eventos aleatórios. Pode acontecer que

sim, mas... São eventos aleatórios. Poderia até acontecer de acontecer uma

discrepância muito maior. Assim, com a coisa da probabilidade mesmo a

gente sabe, se fossem 100 eventos ia aproximar a 25% do que a gente tirasse.

Mas... nada impediria de ocorrer aí uma discrepância. A Fernanda

(pesquisadora) sair com 50 e o resto sair com menos.

Pesquisadora: É isso aí!

Alice: As chances são iguais para todo mundo.

Pesquisadora: Bem, o material de cada um foi igualzinho, não foi?

Alice: Foi.

Pesquisadora: Então, a ideia da sorte e azar da Paula... A Paula falou (no

início do sorteio) que tinha azar e ganhou...

Paula: Realmente. Você vê que quando ela começou o jogo eu estava

perdendo todas.

Pesquisadora: Mas no finalzinho você estava ganhando na minha. E a Alice

tinha certeza de que a Bruna ia ganhar. E a Bruna só ganhou dela.

Bruna: Da Alice eu ganhei? (transcrição encontro, 30/06/2012, grifos

nossos).

As pesquisas com professores atuantes e futuros professores nos dão algumas pistas

sobre as dificuldades em caracterizar a aleatoriedade (AZCARATE, 1995; CARDEÑOSO,

2001, apud AZCARATE, 2006). Como nossa ideia inicial era trabalhar com professores,

criando um espaço que priorizasse o desenvolvimento de seu pensamento probabilístico,

48

Após os sorteios serem realizados.

Page 117: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

116

analisando e discutindo os resultados obtidos por eles e que poderiam ser alcançados também

em nossas salas de aula durante o ensino de Probabilidade, optamos por repetir o experimento

no encontro posterior ao invés de tentar convencer a professora por meio de argumentações.

Acreditamos que esta deve ser a postura tomada pelo professor durante o ensino de

Probabilidade. Durante os encontros, foram propostas atividades que reforçavam a

necessidade de se realizar um grande número de experimentos. Na avaliação feita por Alice

ao final do 6º encontro, ela escreveu em seu caderno:

Neste encontro, aprendi a Regra de Laplace. Fizemos experimentos que

ajudaram a ideia de eventos aleatórios e os problemas fizeram refletir no que

o aluno pensa e qual é a maneira que devemos conduzir seu aprendizado.

Mais uma vez, observei que devemos fazer vários experimentos como foi o

caso das bolas brancas e pretas pois se fizermos poucos o aluno pode ficar

com dúvidas. (Transcrição do caderno de Alice, avaliação do 6º encontro,

realizado em 23/06/2012)

Figura 13 a) Avaliação do 7º encontro escrita por Alice: “O encontro de hoje contribuiu

para amadurecer eventos dependentes, foi muito bom o exemplo das moedas. Muito bom

também o exemplo dos cartões coloridos...”. 30 /06/2012.

Figura 13 b) Avaliação do 7º encontro escrita por Alice: “...que devemos conduzir seu

aprendizado, mais uma vez observei que devemos fazer vários experimentos como foi o caso das

bolas brancas e pretas pois se fizermos pouco os alunos pode ficar com dúvidas”. 30 /06/2012.

A partir da avaliação de Alice, podemos inferir que a ideia de levar as participantes do

estudo a refletir sobre a necessidade de se realizar experimentos um grande número de vezes,

bem como a de diversificar os tipos de experimentos, foi assimilada. Mencionamos,

Page 118: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

117

anteriormente, a intenção de, durante o estudo do grupo, levar as participantes a identificar

que experimentos aleatórios são aqueles que, ao serem repetidos sob as mesmas condições,

não produzem um mesmo resultado e a conceber o sucesso aleatório como sendo um

resultado entre os muitos possíveis dentro de um experimento aleatório.

Nesse sentido, a repetição da atividade serviu para reforçar nossa proposta. Ao

quantificar as chances de cada uma vencer o sorteio em 25%, Alice pareceu reconhecer que,

mesmo não sendo possível determinar com exatidão o resultado de fenômenos de natureza

aleatória, a Probabilidade procura fornecer o grau ou a medida da possibilidade de um evento

ou de uma classe de eventos. O uso do termo ‘acaso’ também foi comum durante nossa

pesquisa. Ele apareceu, com frequência, associado ao uso do termo aleatório. Segundo

Azcárate (2006, p.3):

A partir das explicações encontradas em diferentes momentos históricos,

podemos supor que, para algumas pessoas, o acaso e a aleatoriedade serão,

por exemplo, tudo aquilo o que tem a ver com a "sorte" ou o "destino" e,

portanto, incontrolável; para outros, é simplesmente o produto da nossa

ignorância sobre certos fenômenos, sobre as causas que os originam ou o seu

funcionamento, o que implica que o controle é impossível; em alguns casos,

a explicação considerada pode estar mais relacionada à complexidade

intrínseca dos fenômenos e, portanto, da impossibilidade de uma previsão

exata do seu resultado, etc. Todas elas são susceptíveis de ser consideradas,

mas nem todas são idôneas para uma adequada compreensão probabilística

da realidade49

.

Por usarem a palavra “acaso” com frequência na vida cotidiana, muitas vezes, as

professoras confundiam seu significado ou, em alguns casos, não estão seguras em relação a

ele:

Pesquisadora: Então, vamos lá! A escolha das chaves é feita ao acaso?50

Bruna: Sim.

Alice: Sim.

49

Desde las explicaciones encontradas en los distintos momentos históricos, podemos suponer que para unas

personas el azar y lo aleatorio será, por ejemplo, todo aquello que tiene que ver con la "suerte" o el "destino" y

Por tanto incontrolable; para otros simplemente el producto de nuestra ignorancia sobre ciertos fenómenos, sobre

Las causas que los originan o sobre su funcionamiento, lo que conlleva su imposible control; en algunos casos, la

explicación considerada puede estar más en función de la complejidad intrínseca de los fenómenos y por tanto,

de la imposibilidad de una predicción exacta de su resultado; etc. Todas ellas son susceptibles de ser

consideradas pero no todas son idóneas para una adecuada comprensión probabilística de la realidad. 50

A pergunta refere-se à segunda atividade do sétimo encontro, intitulada: “A escolha de um carro para

comprar”, já enunciada por completa neste texto. Trata-se de um cliente vai a uma loja de carros usados para

comprar um carro e percebe que o modelo que ele procura está disponível em três cores diferentes: vermelho,

preto e prata, todos com o mesmo ano de fabricação. No pátio da loja há 2 veículos vermelhos, 4 pretos e 1 prata.

Gostando das três cores e com a informação de que todos os carros são exatamente iguais, com exceção da cor,

decide escolher ao acaso uma chave na mesa do vendedor e comprar o carro.

Page 119: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

118

Pesquisadora: Por quê?

Alice: Porque sim, uai!

Bruna: Porque se estão todas lá, tem mais chances para o preto, mas todas

têm chance. Não...

Alice: É ao acaso, uai! Pegou o que vier, do jeito que ele quis...

Paula: Mas pode sair o que ele não quis, não é?

Pesquisadora: Mas ele não está escolhendo cor, não é? Ele gostou de todas!

Alice: É ao acaso.

Bruna: É ao acaso, porque não tem nada pré-definido mesmo. Estão todos

iguais.

Pesquisadora: É. A partir do momento em que...

Alice: Neste caso, tem um que tem chance maior, mas é ao acaso, porque...

Agora eu me confundi. Não, mas é ao acaso sim.

Pesquisadora: Eu estou vendo que você está falando que “é porque é” e que

“é ao acaso sim e pronto”, mas até agora eu não entendi o que você quis

dizer.

Bruna: É ao acaso porque todas as chaves são iguais e estão na mesma

condição de escolha. Então, é ao acaso. Não tem nada pré-definido, de que

opção diferencia uma da outra. Então, é ao acaso.

Alice: Isso. É ao acaso, mas se perguntasse qual tem a maior chance...

Bruna: Não. A probabilidade maior é de sair o preto, que tem mais.

Pesquisadora: Aí você separou direitinho. A escolha das chaves. A escolha

das chaves é ao acaso, porque colocou ali e elas não têm uma distinção entre

si. Não é, Paula? São iguais. [...]

Pesquisadora: Se a cada carro vendido pudermos supor que a loja repõe a cor

vendida de forma a manter o estoque sempre o mesmo, podemos repetir o

processo de escolha da chave ao acaso tantas vezes quantas desejarmos,

sempre nas mesmas condições?

Bruna: Continua o mesmo.

Alice: É a mesma coisa. Não mudou nada.

Pesquisadora: Então, neste caso, que característica identificaríamos neste

experimento?

Alice: É um experimento aleatório.

Pesquisadora: Isso. É um experimento aleatório. Por quê?

Alice: Porque você tira. Você vai tirar, uai. Retira isso aqui, Fernanda

(referindo-se à caixinha de plástico transparente com um nome dentro, da

atividade anterior), e volta com ela de novo. É aleatório. Não é? Por quê?

Reposição. Está com reposição. Se eu tirar Fernanda e deixar do lado de

fora, aí é aleatório?

Bruna: Não.

Pesquisadora: Aí eu vou ter três pessoas aqui dentro (referindo-se ao saco

preto com os nomes na caixinha de plástico) e as chances da Fernanda já são

zero porque eu não voltei com ela pra lá...

Paula: Aí a chance é bem menor. Vai sair só uma vez e vai ficar só as três,

vai descartando cada uma delas, uai!

Page 120: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

119

Pesquisadora: Isso! Aí é característica da aleatoriedade, que a Alice falou

muito bem. Eu voltar com a caixinha para cá toda hora está garantindo que,

apesar de ter saído Fernanda, eu continuo tendo a mesma chance...

Alice: De sair Fernanda. Muito bem! (transcrição encontro, 30/06/2012,

grifos nossos)

Percebemos, quando Alice responde: “Porque sim, uai!” e “É ao acaso, uai! Pegou, o

que vier, do jeito que ele quis...” que ela parecia ter dificuldade de explicar o que é “acaso”,

provavelmente por utilizar esta palavra em situações do dia-a-dia sem se preocupar com

definições (AZCÁRATE, 2006). Mesmo quando ela afirmou ter se confundido ao explicar,

declarou, com segurança, que a retirada foi feita ao acaso. Isso sugere um possível

conhecimento do conceito sem, contudo, conseguir expressá-lo, a princípio.

Bruna partiu da ideia de que todas as chaves eram iguais, de que não havia nada pré-

definido e até afirmou que “é ao acaso porque todas as chaves são iguais e estão na mesma

condição de escolha”, após a cobrança por parte da pesquisadora por uma resposta mais

consistente.

Em seguida, notamos que Alice sentiu necessidade de, a exemplo de Bruna, mostrar

que encontrou características de um experimento aleatório na atividade. Porém, ela preferiu se

expressar por meio de exemplos, sempre utilizando o material manipulativo do grupo.

Quando se explicou a partir do uso do material dizendo: “Porque você tira, você vai tirar,

uai. Retira isso aqui, Fernanda, e volta com ela de novo, é aleatório. Não é? Por quê?

Reposição. Está com reposição. Se eu tirar Fernanda e deixar do lado de fora, aí é

aleatório?”, percebemos um avanço em Alice da capacidade de perceber características de

um experimento aleatório. Vale lembrar que, no 3º encontro, quando a questionamos sobre o

mesmo assunto, recebemos uma pergunta como resposta: “Características de um experimento

aleatório?”.

Outra circunstância marcante foi o fato de que, na ocasião, Alice foi respondida por

Bruna, em seguida, Paula entrou na discussão. O diálogo e a liberdade de expressão sempre

foram características do grupo. Entretanto, a cada encontro, estes atributos foram se

mostrando mais fortes. A este ponto, também se mostrou presente nas falas das professoras do

grupo, em especial de Bruna e Alice, é que elas já conseguiam perceber, num experimento

aleatório, a ação do acaso no decorrer do processo observado, ou seja, os possíveis resultados

podem ser identificados, mas não determinados a priori. Consideramos tais mobilizações de

saber muito positivas, pois, segundo Lopes (2003), uma inadequada compreensão dos

Page 121: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

120

conceitos de sucesso aleatório e de aleatoriedade pode vir a se constituir em um obstáculo

epistemológico para o desenvolvimento do pensamento estocástico.

No 12º encontro, foi possível analisar as concepções sobre acaso e aleatoriedade das

professoras a partir de um enfoque diferente: como elas analisavam/avaliavam as concepções

e respostas de nossos alunos? Foi uma atividade interessante e produtiva, pois, durante este

tipo de tarefa, realizada em três encontros sucessivos, pudemos discutir diversos assuntos, tais

como: como trabalhar Probabilidade a partir das ideias iniciais de nossos (as) alunos (as);

como avaliar em certas ou erradas as respostas por eles (as) dadas e os possíveis motivos que

os (as) levaram a dar tais respostas; o (a) aluno (a) que se dá bem em Matemática é sempre o

(a) mesmo (a) aluno (a) que se dará bem durante o ensino de Probabilidade? Vejamos alguns

trechos das transcrições de alguns destes encontros.

Pesquisadora: Vamos lá: o que você achou das ideias da N.?

Alice: “Deixar cair um ovo do 3º andar de um prédio e verificar se ele

quebra ou não”. Gente, ela está perfeita!

Pesquisadora: Eu pedi para ela falar se era aleatório ou não e ela disse que

não é. E justificou por causa da velocidade e da força e ainda falou de a

casca do ovo ser fina.

Alice: Isso. Ele vai quebrar. Ela está certa. Pra mim, realmente não é

aleatório. (transcrição encontro, 29/09/2012, grifos nossos).

Alice: Eu gostei muito. A argumentação dela reúne conhecimentos de Física

e aleatoriedade. Pra mim, essa menina aqui é boa aluna mesmo! (transcrição

encontro, 29/09/2012, grifos nossos).

Alice: Vamos ver o que o A. e o M., da Paula, escreveram. “Lançar uma

bola de basquete em um cesto, dentro de uma quadra de basquete, e observar

se ela entra. Observar se é aleatório ou não”. O menino respondeu: “Não,

porque depende de quem lançou a bola.” Ah, não! Está muito ruim!

Pesquisadora: No caso da Paula, são dois alunos: A. e M.. Ela deu a

atividade em dupla. Eles estão demonstrando algum conceito de

Probabilidade? Aleatoriedade?

Alice: Não. Nenhum. (transcrição encontro, 29/09/2012, grifos nossos).

A opção por utilizarmos respostas de nossos alunos a questões iniciais sobre

Probabilidade traria, de fato, muitas surpresas. Era uma opção muito diferente da de levar a

campo uma atividade pré-elaborada, da qual sempre conhecíamos possíveis resultados e,

quando eram atividades retiradas de estudos anteriores, estudávamos antes os resultados

obtidos, discussões geradas ou mesmo, eram estes que nos motivavam a escolhê-las.

Analisar respostas de nossos alunos da Educação Básica, mais especificamente, 8º e 9º

anos do Ensino Fundamental, tornou impossível fazer previsões sobre discussões e respostas

de cada professor. Desconhecíamos o ponto ao qual ele daria enfoque e que respostas ele

Page 122: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

121

consideraria corretas. A atividade envolvia, também, o conhecimento do professor sobre cada

aluno seu; sobre como ele relacionaria o comportamento e/ou desempenho de seus alunos

durante as aulas de Matemática com suas respostas dadas a questões de Probabilidade.

Julgamos ter sido um momento de trabalho muito rico para o grupo, uma vez que

foram dadas oportunidades de utilizar os conhecimentos adquiridos ao longo de meses de

trabalho no Grupo de Estudos de Probabilidade em situações práticas e, em especial, em

tarefas realizadas por nossos (as) alunos (as) antes de iniciarmos o ensino de Probabilidade.

Alice: “Lançar uma bola de basquete em um cesto, dentro de uma quadra

de basquete, e observar se ela entra. Observar se é aleatório ou não” O G.

respondeu: É aleatório, pois ela pode não entrar, mas a técnica do jogador

aumenta as chances. Excelente!

Pesquisadora: Na verdade, ele acabou contradizendo o que ele disse, pois

quando é aleatório você não está considerando se a pessoa é boa ou ruim

não.

Alice: Mas ele quis dizer que tem mais chance. Ele sabe que pode

acontecer ou não, mas ele quis dizer que se a pessoa tiver mais técnica... Eu

gostei. Esse menino é bom!

Pesquisadora: Eu também gostei, mas ele se contradisse, porque ele disse

que era aleatório e que a técnica influencia. Aleatório é quando você pode

repetir experimentos infinitas vezes, nas mesmas condições, e você não

consegue prever o que vai acontecer.

Alice: Ele tem essa consciência de que a bola pode entrar e pode não

entrar, mas ele já quis entrar em Probabilidade. Ele falou que, por mais que

seja um evento aleatório, se a pessoa tiver técnica ela vai aumentar as

chances. Com isso, ele foi para a Probabilidade. Pode ser ou não, mas

quanto mais técnica a pessoa tiver, maior as chances.

Pesquisadora: Ele está correto em dizer que está técnica aumenta a chance

e isso é uma coisa que veio na cabeça dele e ele quis expressar, porque não

é igual para qualquer um jogar.

Alice: Achei bacana! (transcrição encontro, 29/09/2012, grifos nossos).

Figura 14: Análise da resposta do aluno G. de Fernanda, feita por Alice.12º encontro (29/09/2012).

Page 123: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

122

As professoras conseguiram perceber, na resposta do aluno de Fernanda, que ele

possuía um conhecimento prévio de aleatoriedade, mesmo sem ter estudado Probabilidade,

com certeza no 7º e no 8º ano até então. Alice avaliou que, ao relacionar as chances de acertar

o cesto com a técnica do jogador o aluno demonstrou, ainda que intuitivamente, algum

conhecimento de Probabilidade.

Alice: “Lançar uma bola de basquete em um cesto, dentro de uma quadra de

basquete, e observar se ela entra. Observar se é aleatório ou não”. Aleatório.

Não está legal.

Pesquisadora: Parece que ela considerou ser aleatório porque depende do

conhecimento de quem está jogando. Parece que a ideia dela não tem nada a

ver com o conceito que era mesmo.

Alice: Nossa, mas a diferença... o menino lá (referindo-se a G.) colocou que

é aleatório, por mais que ela não entre, mas ele justificou de uma maneira

que está correta; está bem dentro do que se espera mesmo, porque ele sabe

que pode não entrar, mas ele sabe que pode entrar. Que por mais que seja

aleatório, tem mais chances de entrar se o jogador for melhor. Já a menina

respondeu que é aleatório: tá. Mas depende de quem joga: não.

Pesquisadora: Parece que ela está falando que o que é aleatório tem

dependência de quem joga. Do conhecimento de quem joga. E isso não é ser

aleatório.

Alice: Não. Esse conhecimento para ela não está formado não. (transcrição

encontro, 29/09/2012, grifos nossos).

Entendemos que a oportunidade de discutir respostas dadas por alunos da Educação

Básica realizada no grupo pode contribuir para uma prática docente que respeita e considera o

conhecimento que o aluno traz de suas vivências. Nesse sentido, concordamos com Lopes,

Carvalho e Mendonça (2012) quando afirmam que: “o professor tem o compromisso de

contribuir para o desenvolvimento do educando, incentivando-o, a partir de seus

conhecimentos prévios, a exercer sua criatividade e a buscar novos conhecimentos. Também

compete ao professor elaborar, juntamente com o aluno, estratégias para a construção de

novos conhecimentos” (LOPES, C. E., CARVALHO, F. D., MENDONÇA, L., 2012, p. 187).

Na figura seguinte, Alice pareceu identificar uma carência na formação probabilística

da aluna que respondeu ao instrumento. Percebeu que, apesar de responder corretamente à

questão que perguntava se o evento era aleatório ou não, sua justificativa não foi condizente

com a resposta inicial correta.

Page 124: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

123

Figura 15: Análise da resposta da aluna J. de Fernanda, feita por Alice.12º encontro (29/09/2012).

Na transcrição a seguir, destacamos a iniciativa de Alice: ao discutir com a

pesquisadora sobre a resposta de determinado aluno, dada a uma pergunta isolada, pediu para

ver a folha com as respostas deste aluno dadas a todas as questões propostas.

Pesquisadora: O H., observar se nas próximas 24h sai o Sol, ele falou que era

aleatório. “Se estiver chuvoso, ele não sai. Mas também pode sair”.

Alice: O que ele está pensando aqui? (referindo-se ao papel com sua resposta

digitalizada)

Pesquisadora: Ele falou que é aleatório.

Alice: Ele está errado.

Pesquisadora: Mas você acha que ele sabe o que é aleatório?

Alice: Ele sabe o que é aleatório.

Pesquisadora: O problema dele é que ele está pensando na hipótese de o Sol

não sair. Ele sabe o que é aleatório, mas o problema dele é aquela questão do

tempo; do Sol. Porque eles acham que se o tempo estiver com nuvem, o Sol

não saiu.

Pesquisadora: Eu achei interessante porque parece que ele tem a ideia de

aleatoriedade razoável. Porque ele considerou a hipótese de sair e não sair,

não é? O problema é que ele pensa na hipótese de o Sol não sair nas

próximas 24h; que ele pode não ver ele.

Alice: Pra ver se ele realmente tem esse conceito seria bom ver como ele

respondeu as outras.

Pesquisadora: Vou pegar as dele aqui para você dar uma olhada (procurando

a folha original, com todas as respostas dadas por ele). Ele é um bom aluno.

Ele responde bem. Não dá para pegar todas de todos.

Alice: Observa as outras respostas de H. e afirma: Ele sabe o que é aleatório

sim. Agora aconteceu a mesma coisa com a questão do basquete. Falou que

era aleatório, mas afirmou que depende do jogador. (transcrição encontro,

29/09/2012, grifos nossos).

Admitimos que foi, para nós, uma atitude inusitada, mas perfeitamente justificável.

Observar as demais respostas do aluno ajudou a professora a não tirar conclusões

precipitadas, ou, pelo menos, a não concluir nada com certeza a priori. A atitude de Alice

remeteu-nos a Freire (1987), que afirma que a educação autêntica não se faz de A para B ou

de A sobre B; mas de A com B, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo

(FREIRE, 1987, apud LOPES, 2012). Sem dúvida, a iniciativa de Alice contribuiu também

para nossa prática, enquanto professora e/ou formadora. A observação feita pela professora à

resposta do aluno é apresentada na imagem seguinte.

Page 125: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

124

Figura 16: Análise da resposta do aluno H. de Fernanda, feita por Alice.12º encontro (29/09/2012)

Alice parecia se sentir segura para analisar as respostas dos alunos. A nossa

preocupação, na maioria das vezes, não foi taxar as respostas como certas ou erradas, mas

sim, analisar o porquê de o (a) aluno (a) ter respondido de determinada forma. Durante essa

análise, foi possível, ainda que indiretamente, controlar nossas intuições sobre o acaso, fato

importante, pois, segundo Carrera (2002, apud AZCÁRATE, 2006):

Os professores, como cidadãos estatisticamente cultos, devem ser capazes de

controlar suas intuições sobre o acaso, diferenciando aquelas que são corretas das

incorretas, e aplicar o raciocínio estatístico para controlar suas intuições em

situações de risco e tomada de decisão. Condição necessária para ajudar seus alunos

a desenvolver um raciocínio adequado e superar a situação atual, onde os alunos

chegam à faculdade com conhecimentos quase nulos e inúmeras intuições incorretas

sobre a estatística e a Probabilidade, o que vai dificultar ainda mais a compreensão

posterior dos conceitos fundamentais como aqueles de inferência (CARRERA,

2002, apud AZCÁRATE, 2006, p. 15).

Neste sentido, consideramos que este tipo de atividade possibilitou às professoras

refletirem sobre a natureza do conhecimento probabilístico, de seus aspectos relacionados ao

ensino e à aprendizagem, além de remeter diretamente à sua prática.

No 13° encontro, demos continuidade às análises de respostas de nossos alunos

podendo contar, desta vez, além das respostas dos (as) alunos (as) de Fernanda e Paula, com

as respostas dos alunos de Alice, que estava de licença médica na semana em que as

atividades foram aplicadas aos alunos das demais professoras. A seguir, apresentamos como

L., aluna de Alice, respondeu às questões:

Page 126: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

125

Figura 17: Respostas dadas pela aluna L., da professora Alice.13º encontro (20/10/2012).

Cada professora analisou as respostas dadas pela aluna. Durante a socialização das

análises surge o diálogo a seguir:

[...]

Pesquisadora: Ela fez! Você viu que ela ainda simplificou 2/6 e 1/3 e

calculou Probabilidade. Ela não listou o que poderia acontecer; ela calculou

mesmo. Ela comparou o que a gente quer com o todo. Eu perguntei qual era

a Probabilidade e ela calculou, está vendo? Porque tem gente que colocou ‘a

primeira vai ganhar’, ‘a segunda vai ganhar’, e ela calculou. Mas eu pedi

Probabilidade. Probabilidade não é um número que representa a chance de

um resultado ocorrer? Ela calculou Probabilidade, está vendo? Parece que o

cálculo ela sabe.

Alice: O cálculo ela sabe. A questão do conceito é porque é o perfil dela. Se

você tivesse falado: “Oh L., seja curta e grossa, é aleatório ou não? São 52

cartas no baralho. São quatro naipes diferentes. a Probabilidade de pegar

uma carta de espadas, o que é que é? É um evento aleatório? Sim ou não? Aí

ela responderia com mais clareza. Mas aí ela falou: “Depende”...

Paula: Acho que ela quis dizer o seguinte: que se fossem as 52 cartas de

espadas, não seria aleatório.

Alice: É. Ela quis dizer foi isso: se todas as cartas fossem de espadas.

Pesquisadora: Mas ela não prestou atenção porque a gente falou ‘um baralho

brasileiro’ e um baralho brasileiro tem 52 cartas de quatro naipes diferentes.

(transcrição encontro, 20/10/2012, grifos nossos)

Page 127: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

126

Em seu caderno de campo, Alice escreveu: “A aluna L. tem um perfil desafiador e

mostra isso nas suas respostas. Fico na dúvida com relação ao conceito, pois ela se

preocupou mais em arrumar argumentos do que responder se era aleatório ou não. Com isso,

não respondeu certo. Enquanto isso na última questão que envolvia o cálculo ela acertou.

Então, ela tem algum conhecimento.”.

Este tipo de atividade nos permitiu, dentre outras coisas, perceber o quanto o

professor, ao avaliar as respostas de seus alunos, é influenciado pelo conhecimento pessoal

que ele possui deles. Até mesmo a pesquisadora cita o desempenho matemático de seu aluno,

na transcrição anterior à em questão, quando disse: “Vou pegar as dele aqui para você dar

uma olhada (procurando a folha original, com todas as respostas dadas por ele). Ele é um

bom aluno. Ele responde bem. Não dá para pegar todas de todos”. Durante a análise das

respostas de nossos alunos, as discussões do grupo tinham sempre a professora regente da

turma do aluno em questão como foco. Todas paravam para ouvir os relatos de como o aluno

se comportava em sala de aula, de como era seu desempenho em Matemática e, assim, cada

professora acabava encontrando um aluno com um perfil parecido.

A partir da transcrição deste encontro, constatamos que Alice afirmou com veemência

que a aluna L. supracitada possuía um desempenho muito bom em Matemática. Inferimos que

este conhecimento prévio das habilidades matemáticas da aluna influenciou fortemente sua

análise, uma vez que ela tentou justificar a inadequação das respostas por ela dadas

mencionando seu perfil desafiador e ainda afirmou ter dúvidas com relação à formação do

conceito por parte da aluna, o que não se repetiu quando ela analisou a resposta (abaixo) de

F., também sua aluna.

Figura 18: Resposta dada pela aluna F., da professora Alice.13º encontro (20/10/2012).

Ao analisar a resposta de F., Alice não demonstrou ter dúvidas sobre o não

conhecimento do conceito de aleatoriedade por parte desta:

Pesquisadora: A F. falou que retirar uma carta de um baralho brasileiro e

observar se é uma carta de espadas é um evento certo porque a pessoa pode

ser um mágico e já tem truques.

Alice: Erradíssimo!

Pesquisadora: Por que será que ela escreveu assim?

Page 128: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

127

Alice: Porque ela já pensou na maldade também. Ela não entendeu. Ela não

sabe.

Pesquisadora: O fato de a gente chegar na sala e dar a atividade sem dar

muita explicação já põe “caraminholas” na cabeça deles. Eles já ficam

pensando: “Isso aí é um teste! Isso é alguma coisa que vai pegar a gente!”.

Eles ficam pensando nessas coisas.

Alice: Mas eles nem tiveram tempo de ficar pensando assim. Podem fazer

agora! (referindo-se a como direcionou a atividade aos seus alunos)

Pesquisadora: Pois é. Mas chega também de supetão assim e eles ficam

desconfiados de ser pegadinha.

Alice: Ela está errada. Errada. Errada. Ela não sabe o que é aleatoriedade.

(transcrição encontro, 20/10/2012, grifos nossos).

Segundo Batanero, Godino e Roa (2004), as pesquisas voltadas para a formação do

professor que ensina Probabilidade produziram informações sobre o "conhecimento didático”

necessário a este professor, que inclui a capacidade de desenvolver e analisar testes e

instrumentos de avaliação, além de interpretar as respostas dos alunos para o mesmo51

.

Quando decidimos realizar a atividade com nossos alunos de 8º e 9º anos não havíamos

trabalhado Probabilidade nestas turmas. Logo, nossa intenção era averiguar que

conhecimentos prévios nossos (as) alunos (as) possuíam e discutirmos como trabalhar com as

concepções iniciais deles (as). Para Serrano et al (2001, p.1):

Como os alunos frequentemente têm ideias incorretas sobre Probabilidade e

aleatoriedade, Garfield (1995) sugere que o ensino efetivo de Probabilidade

deve apoiar-se no conhecimento prévio sobre estas concepções dos

estudantes, porque, quando se ensina algo novo, os alunos construoem este

novo conhecimento ligando novas informações com as quais já havia

assumido como correta. O conhecimento das concepções e formas de

raciocínio dos alunos é, portanto, um ponto chave para o sucesso das novas

propostas curriculares.52

Durante a socialização de nossas análises a partir das respostas de alunos, procuramos

refletir sobre que conhecimentos possuíam e sobre como trabalhar Probabilidade com estes

estudantes considerando suas ideias iniciais. As professoras sugeriram, na maioria dos casos,

que fossem utilizados jogos e experimentos durante o ensino de Probabilidade, levando-nos a

51

“Capacity to develop and analyze assessment tests and instruments and interpret students’ responses to the

same”. 52

“Puesto que los estudiantes tienen con frecuencia ideas incorrectas sobre la probabilidad y la aleatoriedad,

Garfield (1995) indica que la enseñanza efectiva de la probabilidad debe apoyarse en el conocimiento previo

sobre estas concepciones de los estudiantes, ya que, cuando se enseña algo nuevo, los estudiantes construyen este

nuevo conocimiento conectando la nueva información con la que ellos habían asumido previamente como

correcta. El conocimiento de las concepciones y formas de razonamiento de los alumnos es, en consecuencia, un

punto clave para asegurar el éxito de las nuevas propuestas curriculares”.

Page 129: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

128

crer que a utilização de tais recursos contribuiu para o desenvolvimento de seu pensamento

probabilístico durante o trabalho do grupo.

Partíamos das respostas dadas pelos alunos para iniciar questionamentos como, por

exemplo, “Como fazer que este aluno mude de ideia?” ou “Como partir da concepção deste

aluno e ajudá-lo a aperfeiçoar este conceito correlacionando-o com sua ideia inicial?” e as

professoras utilizavam o material manipulativo do grupo para exemplificar possíveis atitudes

frente às respostas de alunos ou afirmavam que utilizariam determinado experimento, já

realizado pelo grupo, para contribuir para a melhoria das ideia probabilísticas dos estudantes.

A seguir, apresentamos mais respostas de alunos seguidas dos respectivos recortes da

transcrição feita de nosso décimo terceiro encontro.

Figura 19: Respostas dadas pelo aluno F., da professora Alice.13º encontro (20/10/2012).

Pesquisadora: Olha o F.: “Colocar a água no congelador e observar se ela

congela quando atinge 0º. “Não é aleatório, porque quando a temperatura

atinge 0º ela congela e isso não tem Probabilidade”.

Alice: Nossa Senhora! Totalmente errado. Peraí! Como é?

Pesquisadora: Leia de novo...

Alice: “Não é aleatório”. Está certo. “Porque quando atinge 0º a água vai

congelar”. Ele está completamente certo. Não tem Probabilidade porque vai

acontecer, ué!?

Pesquisadora: Parece que ele quis dizer que não temos que procurar

Probabilidade pra isso. Se for um evento certo, é 100%. Ele misturou...

Alice: Gostei! Eu não tinha entendido não. Falei, “Ah!”

Pesquisadora: O que você achou, Paula. O F. é bom?

Paula: O F. é ótimo! Ele respondeu bem.

Alice: O F. já tomou bomba, mas em Matemática ele é ‘menos ruim’. Se

depender dele, você fica um semestre sem ouvir a voz dele... (transcrição

encontro, 20/10/2012, grifos nossos).

A princípio, Alice apressou-se em avaliar a resposta do aluno como “totalmente

errada”. Contudo, percebeu ter se precipitado e, incentivada pela professora-pesquisadora,

tornou a ler e reavaliou a resposta de F. como “completamente correta”.

Entendemos que o aluno, que não recebeu uma instrução probabilística sistemática

ainda, baseia-se em experiências cotidianas para dar sua resposta, aspecto relevante que foi

abordado na discussão posterior. O aluno – que não possuía a noção formal de Probabilidade

– considerou que esta não existia por acreditar que as chances de a água “não congelar” eram

Page 130: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

129

nulas. Segundo Batanero, Godino e Roa (2004), a “capacidade de prever as dificuldades de

aprendizagem dos alunos, os erros, os obstáculos e estratégias de resolução de problemas” faz

parte do conjunto de conhecimentos didáticos necessários ao professor que ensina

Probabilidade. Aparentemente, Alice também não considerou importante quantificar chances

de um evento certo e concordou com seu aluno, afirmando não haver Probabilidade. Contudo,

em seu caderno de campo, ela argumentou que o evento certo tem Probabilidade igual a

100%, como podemos verificar na imagem a seguir:

Figura 20: Análise da resposta de F., feita por Alice.13º encontro (20/10/2012).

Paula, ao analisar a resposta dada por um aluno de Alice, utiliza o termo

“Probabilidade” em substituição à palavra aleatoriedade. O recorte a seguir, extraído do

caderno de campo de Paula, ilustra isso:

Figura 21: Análise de resposta feita por Paula.13º encontro (20/10/2012).

A atividade consistia em classificar eventos como aleatórios ou não. Paula pareceu se

precipitar, afirmando que o aluno não sabia que se tratava de Probabilidade, já que o conceito

cobrado era aleatoriedade.

Page 131: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

130

Isso corrobora os resultados de Haro et al (2006) que indicam a necessidade de

reforçar a formação probabilística elementar de futuros professores do Ensino Fundamental.

Para eles, este professor dificilmente poderá ensinar um assunto em que mostra dificuldades

tão evidentes. Logo, é essencial dar atenção especial aos programas de formação de

professores, priorizando os componentes didáticos, mostrando situações de uso em sala de

aula, a metodologia utilizada, os aspectos pedagógicos e cognitivos. Consideramos importante

o trabalho com questões “abertas”, principalmente permitir que refletíssemos sobre as

explicações e possíveis concepções dos alunos sobre determinado tema antes de abordá-lo.

Mais que identificar respostas certas e erradas, estávamos conhecendo um pouco do que o

aluno trazia consigo. O recorte a seguir foi retirado do caderno de Alice:

Figura 22: Análise de resposta feita por Alice. 13º encontro (20/10/2012).

Consideramos que a realização de atividades como as ilustradas possam ser

aproveitadas de duas formas diferentes: para o aluno, um momento onde tem a oportunidade

de apresentar ideias espontâneas que, no caso do ensino de Probabilidade, poderão ser

aproveitadas como indicativos dos significados por ele atribuídos às atividades propostas, e

para o professor, na identificação de uso equivocado da linguagem probabilística, bem como

ponto de partida para iniciar seu trabalho com Probabilidade.

Durante o trabalho de analisar respostas dadas por alunos das professoras do grupo,

identificamos alguns estudantes que, embora não possuíssem um desempenho satisfatório em

Matemática, responderam adequadamente a algumas questões sobre Probabilidade a eles

propostas.

As professoras discutiram por um bom tempo a questão de alunos que não possuem

bom desempenho em Matemática responderem às questões de maneira mais satisfatória que

muitos dos bons alunos de suas classes. Para uma análise mais aprofundada, as folhas com as

atividades por eles desenvolvidas foram analisadas à parte. A explicação dada a esta curiosa

observação não avançou além da possibilidade de estes alunos estarem utilizando sua vivência

Page 132: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

131

para explicarem os eventos. Acreditamos que muitos não perceberam a atividade como uma

prova de Matemática, mas uma série de perguntas simples sobre eventos cotidianos.

Garfield (1995) sugere que o ensino efetivo de Probabilidade deve apoiar-se no

conhecimento prévio sobre as concepções Probabilidade e aleatoriedade dos estudantes, pois,

segundo este autor, quando se ensina algo novo, os alunos constroem este novo conhecimento

ligando novas informações com outras que eles já haviam assumido como corretas. O

conhecimento das concepções e formas de raciocínio dos alunos é, portanto, um ponto chave

para o sucesso das novas propostas curriculares (GARFIELD, 1995, apud SERRANO et al,

2001) e, no caso específico de alunos como A. e M.P., pode representar uma ferramenta de

relevante importância para o sucesso nos processos de ensino e aprendizagem.

Além disso, se, como afirma Batanero (2001), um fenômeno aleatório é, pelo menos

potencialmente, capaz de ser reproduzido, as respostas dadas por estes alunos levam-nos a

crer em uma possível associação com a sua vida cotidiana. Afinal, tratavam-se de situações

que podem ser facilmente vivenciadas em nosso dia a dia. Enquanto professoras, precisamos

perceber que as argumentações dos alunos são marcadas não só por experiências escolares,

mas por experiências cotidianas. Tal fato ficou evidenciado a partir das respostas do aluno A.,

que, segundo sua professora, em outubro, já era considerado reprovado pelos seus professores

(a professora cita um conselho já realizado), mas respondeu razoavelmente às questões

propostas53

.

Consideramos os encontros nos quais analisamos respostas de alunos produtivos e

enriquecedores para nossa prática. Enquanto professoras, não costumamos nos reunir para

discutir respostas de alunos, refletir sobre o que os levou a dar tais respostas ou como partir

destas para o ensino de Probabilidade. Em sua avaliação de um destes encontros, Paula

escreveu:

53

Ressaltamos, mais uma vez, que ainda não havia sido realizado um trabalho de instrução probabilística

sistemática com nossos alunos.

Page 133: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

132

Figura 23: Avaliação do 13º encontro pela professora Paula (20/10/2012).

Paula referiu-se aos conceitos probabilísticos trabalhados também neste 13º encontro,

mas não abordados nestes recortes. Quando escreveu “prevalências de intuições erradas que a

pessoa leva”, provavelmente estivesse se referindo às respostas dadas pelos alunos.

Atribuímos a relação que Paula estabeleceu entre o ensino de Probabilidade e a vida cotidiana

às respostas dadas por alunos que ainda não trabalharam com Probabilidade de maneira

formal, fato abordado com frequência pelo grupo durante as socializações das análises das

professoras a respostas de alunos.

No 14º encontro, realizamos atividades com respostas dadas pelas próprias

professoras, principalmente durante os encontros iniciais. Vejamos alguns “recortes” que

envolvem o trabalho com a aleatoriedade:

A1ª atividade do nosso segundo encontro foi um experimento: Lançamento de uma moeda. Vocês

receberam duas moedas. Na ocasião, cada uma de nós lançou a moeda 50 vezes, anotamos o resultado

individual no caderno e, no quadro, o resultado de cada uma para que pudéssemos analisar. Eu,

Fernanda, pedi a Paula, que lançasse uma moeda e observasse sua face. Saiu cara. Em seguida, fiz a

seguinte pergunta a ela: “Quando observamos a face da moeda voltada para cima durante o

experimento podemos saber qual será a próxima face?” Quando Paula disse que sim, que a próxima

seria coroa, pois a Probabilidade é 50% de ser cara e 50% de ser coroa, você discordou. Observe a

transcrição do diálogo que ocorreu em seguida: [...]

Paula: Não. Aqui eu não tô vendo isto (rindo), mas o certo, a Probabilidade, é 50% de ser cara e 50%

de ser coroa.

Alice: Não, não, não...

Pesquisadora: O que foi, Alice?

Alice: Uma coisa não tem nada a ver com a outra. A gente sabe que a tendência é dar meio a meio,

mas eu acho que não vai dar não. Tem alguma coisa errada com essa moeda... ela está

viciada...(rindo) (trecho da transcrição do 2º encontro.)

Você ainda justificaria as sequências obtidas nos resultados como uma falha da moeda? Por quê?

Page 134: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

133

Não. Justificaria como experimento aleatório. (Caderno de Alice, 01/12/2012).

Em seguida, fiz a seguinte pergunta: “Então, você seria capaz de identificar características de um

experimento aleatório?” E você perguntou: “Experimento aleatório?” Provavelmente por não se sentir

à vontade, naquele momento, com o termo que usei. Hoje, você saberia citar alguma característica de

um experimento aleatório? Se sim, qual (is)?

Experimento aleatório é quando um evento não depende do outro para ocorrer, continua com a

mesma chance. Exemplos: lançamento de moedas, sexo dos filhos, face superior de um dado lançado.

(Caderno de Alice, 01/12/2012).

A questão da aleatoriedade também foi abordada na atividade destinada à Paula, com

fragmentos de suas falas. Todavia, a dificuldade maior dessa professora durante os encontros

não era a definição de aleatoriedade, mas sim, perceber que não há uma sequência pré-

determinada em um experimento aleatório. Vejamos um “recorte” que envolveu o trabalho

com a aleatoriedade:

A1ª atividade do 2º encontro foi um experimento: Lançamento de uma moeda. Vocês receberam duas

moedas. Na ocasião, cada uma de nós lançou a moeda 50 vezes, anotamos o resultado individual no

caderno e no quadro, o resultado de cada uma para que pudéssemos analisar. Eu, Fernanda, pedia

você, Paula, que lançasse uma moeda e observasse sua face. Saiu cara. Em seguida, fiz a seguinte

pergunta: “Quando observamos a face da moeda voltada para cima durante o experimento, podemos

saber qual será a próxima face?” Observe a transcrição do diálogo que ocorreu em seguida:

Paula: Sim. Nesse caso, como agora deu cara, a próxima será coroa.

Pesquisadora: Por quê?

Paula: Nesse caso, porque tem 50% de chance de sair cara ou coroa.

Pesquisadora: Mas é isso que você está percebendo durante seus lançamentos, a sequência cara,

coroa, certinha?

Paula: Não. Aqui eu não tô vendo isto (rindo), mas o certo, a Probabilidade é 50% de ser cara e 50%

de ser coroa. (trecho da transcrição do 2º encontro).

Agora gostaria de saber se você ainda mantém as ideias que apresentou na ocasião.

Ao lançar uma moeda, observamos a face “cara” neste lançamento. Ao repetirmos o experimento, nas

mesmas condições, podemos saber qual será a próxima face? Por quê?

Não. Ao lançarmos uma moeda mostrou que ela pode repetir cara ou pode ser coroa. Não sabe o

certo. (Caderno de Paula, 01/12/2012)

Paula não pareceu ter conservado a ideia que possuía nos encontros iniciais – a

existência de uma alternância perfeita entre caras e coroas durante o lançamento de uma

moeda. Contudo, foi um processo longo54

. Segundo Batanero (2001), a própria idéia de

aleatoriedade não tem uma definição simples, sendo difícil de aplicá-la à situações práticas.

54

Ressaltamos que, no primeiro encontro, a professora acreditava na alternância perfeita de sabores de balas, no

caso de dois sabores em um mesmo saco opaco. Em todo o estudo, ela se mostrou dedicada e responsável,

esforçando-se para estar presente em todas as manhãs de sábado de encontro do grupo. Todas as vezes que sentia

alguma dificuldade durante os estudos do grupo, não se mantinha omissa: apresentava suas opiniões e dúvidas e

não se dava por satisfeita enquanto não acreditava ter entendido o ponto em discussão.

Page 135: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

134

Ao longo da história, recebeu diferentes interpretações, mas nenhuma satisfatória. Como é

possível perceber a partir deste texto, a noção de aleatoriedade foi bastante trabalhada ao

longo dos encontros do grupo e sob diferentes abordagens.

Como Lopes (2003), acreditamos que uma inadequada compreensão do conceito de

sucesso aleatório e de aleatoriedade pode ser um obstáculo epistemológico para a

compreensão do conhecimento estocástico. A definição de aleatoriedade não foi

“transmitida”, mas construída pelas professoras participantes ao longo do trabalho no grupo.

5.2 Reflexões sobre a prática docente

O fato de nossa pesquisa não ter sido realizada em uma sala de aula, com alunos, não

foi porque não desejássemos isso, mas, sim, por que nossa intenção era de atingir várias salas

de aula.

Como Lopes (2010, p.58), percebemos, cotidianamente, que:

Apesar de a inclusão da Estatística e da Probabilidade no currículo de Matemática de

vários países ser explícita e efetiva, o mesmo não ocorre dentro das salas de aula.

Estes temas, em geral, têm sido colocados ao final dos programas de ensino e, assim,

nem sempre estudados pelos alunos, por falta de tempo, por falta de convicção do

seu real interesse ou por falta de domínio teórico-metodológico do professor sobre

os conceitos estatísticos e probabilísticos. Consequentemente, ainda têm foco

limitado nas pesquisas produzidas em Educação Matemática (LOPES, 2010, p.58).

Por considerarmos o professor um dos protagonistas nas ações e propostas que se

materializam nas salas de aula, realizamos nossa pesquisa com alguns deles, movidos pela

vontade de aprender e aperfeiçoar sua prática. Dessa forma, não poderia ser diferente: a sala

de aula é citada a todo o momento durante nosso trabalho de campo.

Em Azcárate (1996), Thompson aponta como uma conclusão bastante geral acerca das

investigações sobre as concepções dos professores a necessidade de se conhecer as ideias dos

professores para disponibilizar explicações que nos possibilitem compreender sua atuação em

sala de aula e para qualquer intenção de promover um processo de evolução de suas práticas.

As professoras participantes deste estudo, bem como a professora pesquisadora, traziam suas

inquietações para o grupo, comparavam suas respostas às possíveis respostas de alunos, às

suas reações às deles, discutiam formas de levar as atividades realizadas no grupo para a sala

de aula e, finalmente, analisavam respostas de alunos das professoras do grupo a questões

sobre Probabilidade. Apresentaremos alguns fragmentos das transcrições dos encontros do

grupo:

Page 136: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

135

Após perceber que a colega ficou confusa ao realizar o lançamento de moedas55

:

Alice: Pode! É por isso que eu acho que a gente tem que parar as aulas para

dar atividades diferenciadas, por quê? Como o experimento que a gente fez

aqui, bonitinho, a gente para pra pensar o quê? Que a ocorrência de uma não

influencia a outra, por mais que repita, a outra pode ser a mesma anterior

ainda. Eu posso lançar a moeda 50 vezes, ela não ser viciada e ela dar 50

caras ou 50 coroas direto. É mais difícil, como você falou, mas pode? Pode!

Pode!

Paula: Eu falei que era meio a meio e deu mais cara que coroa...

Alice: É porque você tava pensando que tinha que dar o resultado. Tinha a

possibilidade de sair 100 caras em 100 lançamentos. É por isso que eu to

falando que é bom, entendeu? Fazer o experimento é bom porque desmitifica

o mais provável de acontecer” (transcrição encontro, 12/05/2012, grifos

nossos).

Segundo Batanero (2005), os problemas epistemológicos sugerem discussões

particularmente interessantes no campo das probabilidades onde, além de lidar com

dificuldades do conhecimento científico, tem-se que lidar com concepções equivocadas e

crenças a respeito de eventos futuros.

Por conhecer a Probabilidade de 50% de caras e de coroas no lançamento de uma

moeda não viciada, Paula acreditou na alternância de resultados. Identificamos em Paula, de

acordo com Serrano (1996), um conceito de aleatoriedade com a visão frequencial de

Probabilidade, já que ela espera que a frequência relativa obtida se aproxime da Probabilidade

teórica. Grande parte dos futuros professores pesquisados por Batanero et al (2012) também

possuíam esta visão e aguardavam o mesmo resultado que Paula.

Batanero (2005), ao analisar interpretações distintas para a natureza de acaso,

aleatoriedade e probabilidades, avalia que as diversas concepções são complementares e que

isso deve ser trabalhado na escola. Nosso estudo de trabalhos sobre o tema permite-nos inferir

que a ideia inicial de Paula assemelha-se às de muitos estudantes Educação Básica,

professores em formação e em exercício. Corroboramos com Lopes (2008), que afirma que

55

A discussão começou após falarmos de eventos independentes, na atividade onde trabalhávamos com os

participantes organizados em duplas. Cada dupla recebeu duas moedas. Cada participante lançou sua moeda 50

vezes e registrou em seu caderno a face voltada para cima. Quando questionada sobre o que é comum em um

experimento aleatório, Paula hesita. Ela se mantinha firme na ideia de metade cara e metade coroa antes de

realizarmos o experimento. Pra sermos mais exatas, alternando cara e coroa. Então, Alice, após a pesquisadora

dizer: “O fato de ser aleatório não é justamente o que a Alice falou? Um evento não vai influenciar no outro. (A

pesquisadora lança a moeda, mostra a face às demais professoras e pergunta: Qual é a próxima? As duas

respondem: “Não sei”). Então quando a gente faz um experimento, por exemplo, a gente joga a moeda que é

uma coisa “boba”, todo mundo tem e todo professor pode fazer na sala de aula, eu acho que ajuda a reforçar.

Quando a gente só fala, não adianta. Eu vou falar pra você que a gente joga uma vez e se jogar de novo não sabe

o que é que é, mas só falar... Isso tem adiantado para o nosso aluno?”.

Page 137: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

136

todos os objetivos que se esperam alcançar com o ensino de Probabilidade e estatística no

Ensino Fundamental devem ser esperados também dos professores que irão ensiná-los.

(Enquanto a pesquisadora passa os resultados da mesma atividade no quadro).

Alice: Tem que colocar no quadro mesmo. Se você faz, e dá tão próximo assim, o

aluno acha que você forçou a barra. Mas, olha, Fernanda, 26 caras e 24 coroas

também está muito próximo. Na hora em que eu estava jogando, no começo, só

estava dando cara, eu nunca pensei que o resultado seria esse...

Paula: No meu, foram 27 caras e 23 coroas, mas no começo só tava dando cara.

Pesquisadora: Quando minha orientadora sugeriu que eu passasse no quadro todas as

faces obtidas e não os totais de cara e coroa obtidos, eu não tinha percebido que seria

tão importante para a nossa análise. Só depois de perceber, por exemplo, no meu,

que a mesma face saiu até oito vezes seguidas é que eu tive certeza de que é

importante fazermos isso sempre. E se fossem com nossos alunos?

Alice: Ah, com eles é que tem que colocar no quadro mesmo, se não eles não

acreditam.

Pesquisadora: Vocês fariam esse experimento com seus alunos?

Paula: Eu faria! Porque eu achei que ia dar cara, coroa, cara, coroa...

Alice: Depende! Depende da série...

Pesquisadora: Não! É isso que eu ia falar: se sim, pra que série?

Alice: Depende do que você quer trabalhar com eles. Por exemplo, o que é que eu

quero que eles saibam de Probabilidade agora?

Pesquisadora: Se eu quisesse falar então, por exemplo, da única coisa que a gente

está dando nome aqui, da aleatoriedade? Porque até a palavra assusta, não é?

Aleatoriedade!

Alice: Eu tenho medo que assim, se eu tirar uma cara agora, a outra não pode tanto

ser coroa ou cara de novo?

Pesquisadora: Não entendi. Não é isso que a gente está percebendo que é ser

aleatório?

Alice: Eu quero ensinar pra ele (aluno) que, por exemplo, joguei uma moeda

(jogando), saiu cara, que eu não dependo, que a próxima face a sair não depende

desta. E está correto se o aluno falar comigo que pode ocorrer 44 faces de uma e 6

da outra. Agora, eu tenho medo de acontecer, por exemplo, sair igual no seu56

, 25

caras e 25 coroas e isso sirva pra reafirmar a ideia pra ele, que ele já tem, do meio a

meio, sabe?

Pesquisadora: Mas olha pra você ver, Alice. Eu entendi seu receio. Mas nesse caso,

você precisaria separar sua turma em grupos...

Alice (interrompendo): Só se fizer várias vezes...

Paula: Vários grupos.

Pesquisadora: É. E cada grupo deve fazer o máximo de lançamentos possíveis e

anotar os resultados no quadro, entendeu? E fazer com eles a soma de todas as caras

e coroas. Tá na cara porque é que eu não posso só por o resultado.

Alice: Porque o resultado só, só mostra que fica perto do meio a meio. E a gente viu

ali (apontando para o quadro com os resultados) que não é sequência; que não tem

sequência. É isso que a gente tem que mostrar pro nosso aluno.

56

Os resultados dos 50 lançamentos da pesquisadora no grupo foram 25 caras e 25 coroas, apesar de não saírem

cara e coroa em sequência.

Page 138: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

137

Paula: Eu acho que trabalhar com a moeda, com dados, é trabalhar com jogos, e os

alunos gostam. Muitos deles tem pavor de Matemática, mas quando ensina desse

jeito, com jogos, eles aprendem muito mais.

Pesquisadora: Mas dá pra ensinar assim? Será que o aluno aprende?

Alice: Dá.

Paula: Muito mais. (transcrição, encontro de 12/05/2012, grifos nossos).

Alice observou que, em 150 eventos, o resultado ficou bem próximo do esperado em

termos de Probabilidade em lançamentos de moedas, mas confessou ter medo de realizar com

seus alunos e obter valores distantes do mais provável e, até mesmo, de obter valores

exatamente correspondentes à Probabilidade de ocorrência do evento e reforçar a ideia do

“meio a meio”, como a que Paula possuía no início da atividade.

Durante a discussão, acrescentamos que não seria viável também um valor exato ou

muito próximo do meio a meio a partir do experimento, pois se o aluno resolve fazê-lo em

casa e obtém exatamente o que viu na sala, pode deixar de acreditar na aleatoriedade.

Complementamos que os resultados não podem ser previstos ou manipulados e que o

professor deve estar preparado para lidar com questionamentos de alunos a qualquer um

deles.

Destacamos, nesta transcrição, a preocupação de Alice que, apesar de ter

compreendido os resultados, destacou que é preciso contar com a impossibilidade de prevê-

los e demonstrou ter receio de não saber trabalhar com eles. A imprevisibilidade de resultados

devidamente percebida pela professora também foi ressaltada pelos sujeitos da pesquisa de

Azcárate, Cardeñoso y Porlán (1998, apud BATANERO, 2012). Esta atitude de não

considerar, a princípio, importante registrar os resultados dos experimentos reforça a ideia de

que as professoras, inclusive a pesquisadora, tiveram acesso somente à perspectiva clássica de

Probabilidade, durante sua formação inicial. Nesta concepção, os resultados da amostra não

são tidos como importantes, pois, de acordo com a concepção clássica, o resultado é dado a

priori.

Valorizamos a sinceridade de Alice ao revelar seu receio em realizar a atividade

proposta no grupo com seus alunos e não obter o resultado previamente esperado por ela, bem

como a dificuldade de lidar com possíveis questionamentos destes. O momento se tornou

propício para refletirmos sobre a importância de se realizar um número grande de

experimentos por grupo e unir todos os resultados. Na avaliação do encontro, Alice escreveu:

Page 139: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

138

Experiência que pode ser trabalhada em sala de aula para agregar conhecimento e fazer com que o

aluno faça parte da construção disso. No caso dessa atividade, ele ia aprender de verdade. Não iria

ser mais uma verdade absoluta do professor; uma ideia pronta.

Na avaliação do encontro feita por Paula:

Este estudo de Probabilidade com os jogos de kara e coroa foi super interessante. Mostra

aproximação das duas dar cara ou coroa são mínimas ou elas por terem duas faces podem ocorrer de

ser 50% cara e 50% coroa. Acho muito interessante isso ser trabalhado em sala de aula (em grupos,

mostrando aleatoriedade de cara e coroa). E isso ajuda a sala de aula a tornar a matemática menos

cansativa.

As avaliações do encontro das professoras apresentadas refletiram a boa aceitação

destas atividades com experimentações durante o ensino de Probabilidade. Ambas fizeram

menção ao aluno ou à sala de aula em seus textos. Consideramos que a prática destas

atividades no grupo possa ser útil à prática das professoras, pois, segundo Even e Kvatinsky

(2010 apud CAZARES e REYES, 2011, p. 77, tradução nossa): “como parte do conhecimento

de Probabilidade que o professor deve ter está contar com um repertório de exemplos

importantes e de fácil acesso que lhe permitam ilustrar ideias, conceitos, teoremas e

propriedades importantes”.

Os fragmentos, a seguir, situam-se em um momento do 3º encontro no qual Alice e

Bruna estavam empenhadas em encontrar a maneira de tornar o jogo57

justo. Investiram em

combinações de resultados, anotando, discutindo fervorosamente. Como sugerimos que

poderia haver uma maneira de o jogo se tornar justo, elas não pouparam tentativas. Vejamos a

parte da transcrição do encontro que faz menção à sala de aula:

Pesquisadora: Dá pra trabalhar esta atividade com nossos alunos? É conveniente

trabalhar esta atividade com nossos alunos?

Bruna: É, mas até ele entender, que eu tenho mais chance do que ela, e que tem

quatro maneiras de mudar e de qualquer jeito eu vou ter prioridade sobre ela, seriam

umas quatro ou cinco aulas, né? (Risos)

Pesquisadora: Eu acho que a ideia de a gente fazer o experimento e estar verificando

depois se é justo, se não é, se teve alguma vantagem, se não teve...

Bruna (interrompendo): Esse aqui dá. Eu só acho difícil pra eles entenderem. É igual

ela (referindo-se a Paula) falou aquele dia... cara e coroa... só tem duas opções. O

dado tem 6. [...]

Alice: Oitava série eu vou ensinar Probabilidade pra eles...

Bruna: Oitava série você ensina mas, eu não daria essa para eles não.

Alice: Eu também não.

57

Jogo da diferença: um dado é lançado diversas vezes e calcula-se a diferença entre o maior e o menor valor das

faces obtidas.

Page 140: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

139

Bruna: Eu daria cara e coroa. Cara e coroa eu acho que o 9º ano ele pega sim,

beleza! E vai chegar à mesma conclusão que nesse aqui. [...] Eles vão aprender se

você fizer isso no 9º ano? Vão. Talvez nunca mais esqueçam. Mas a gente tem uma

carga pra ensinar. Então, se eu ficar com isso aí, umas cinco aulas... que primeiro

eles vão jogar, são turmas de mais de 30 alunos, eles vão jogar, depois eles vão...

Um só, um jogo só eles não vão entender. (...) Então, às vezes, você tem que dar

uma outra opção pra eles chegarem à conclusão, sem eu falar! Porque se eu der um

jogo, eu pelo menos penso assim, se eu dei um jogo, e eu justifiquei por que é que

deu isso, então não adiantou. Eles têm que chegar à conclusão sozinhos. (transcrição

encontro, 19/05/2012, grifos nossos).

Os momentos de socialização das respostas dadas sempre se tornavam um excelente

espaço para discutir e analisar a aplicação ou não da atividade em nossas turmas de Ensino

Fundamental. Neles, o grupo abordava, naturalmente, diversos aspectos envolvidos no

contexto escolar, como nível de desenvolvimento das turmas, material didático disponível,

quantidade de aulas a serem absorvidas pelo ensino de Probabilidade, abordagem adequada,

dentre outros.

Consideramos, a partir das transcrições, que Bruna percebeu na importância da

realização deste tipo de atividade apontando, inclusive, a necessidade de se realizar o

experimento até o aluno chegar a uma conclusão, sem dar respostas prontas, mas que se

considerou limitada pela extensão do currículo de Matemática da Educação Básica.

Apesar de valorizarem a realização de experimentos durante as aulas de Matemática,

as professoras visualizaram uma série de entraves durante este tipo de trabalho. Entretanto,

entendemos que, apesar de reconhecermos a extensão dos currículos de Matemática, não

podemos privar nossos alunos destes momentos. Segundo Lopes (2012), a Educação

Matemática tem-se justificado pela necessidade de o próprio aluno construir e recriar

conhecimentos, desenvolver a imaginação e a criatividade. Completa, ainda, que nessa

perspectiva, ganha sentido a realização de experimentos que envolvem aleatoriedade e

estimativas.

Em seguida, apresentamos fragmentos da sequência do diálogo anterior.

Bruna: (interrompendo) Mas aí você ia gastar uma ou duas aulas. Uma aula com

cara e coroa, né? Vamos supor que com uma aula ele consiga; você faz um jogo de

cara e coroa. Você vai dar isso antes de ensinar Probabilidade. Se você ensinar

Probabilidade primeiro, pra depois dar cara e coroa, perdeu a graça. Você dá cara e

coroa primeiro, pra depois ele entender que a Probabilidade é 50%. [...]

Bruna: Eu acho que o 9º ano entende perfeitamente isso daí. Agora, o número de

aulas que você vai ter que usar, eu não sei se compensa, porque algum conteúdo vai

ter que deixar de dar. Eu nem lembro quantas aulas são pra Probabilidade... [...]

Page 141: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

140

Bruna: E os livros de Matemática não nos auxiliam nisso. Além de você ser

Matemático, professor de Matemática, você tem que ser um pesquisador, pra ensinar

uma Probabilidade por exemplo. E você tem tempo? O tempo que você vai usar,

você vai gastar aí, dois três dias pra dar uma aula?

Alice: E você só dá Probabilidade? E você só tem uma turma? (risos)

Pesquisadora: Nem uma escola só a gente tem... Infelizmente é o que acontece. [...]

(transcrição encontro, 19/05/2012, grifos nossos).

Quase que automaticamente, nós nos imaginávamos em nossas salas de aula,

respondendo aos questionamentos corriqueiros de nossos alunos, testando hipóteses que

poderiam vir a ser levantadas por eles durante o ensino e apontando as possíveis dificuldades

a serem enfrentadas. Provavelmente devido ao número reduzido de participantes, o grupo

desenvolveu rapidamente características como a capacidade de relatar aspetos da sala de aula

e da vida escolar que, se escondidos ou esquecidos durante a discussão talvez a tornaria mais

bela aos olhos do leitor.

Como nosso objetivo era contribuir para a prática das professoras participantes, e

considerando que aspectos como o grande volume de conteúdos a ministrar e deficiência na

abordagem da Probabilidade nos livros didáticos estão intrinsecamente associados ao

processo, deixamos as professoras bem à vontade para expressarem sua realidade ao grupo.

Ao analisar coleções de livros didáticos do Ensino Fundamental, Gonçalves (2004)

comprovou que nem todas apresentavam o conteúdo “Probabilidades” em todos os volumes, o

que, segundo o autor, implica que este tema não seria abordado em todas as séries do Ensino

Fundamental. O autor verificou que, muitas vezes, este tema encontra-se no final dos livros

didáticos. Como já afirmamos, a quantidade de conteúdos matemáticos é sempre muito

extensa e diversos professores não chegam a trabalhar Probabilidade em suas turmas. Cabe

ressaltar que, no momento da pesquisa, todas trabalhávamos com turmas das séries finais do

Ensino Fundamental da rede estadual de Minas Gerais, o que favorecia a troca das ideias.

No encontro seguinte, Alice, que havia perdido para Bruna no encontro anterior,

venceu o jogo e comentou sua estratégia58

:

(Após Alice escolher ser o jogador B, vencer o jogo e participar de uma

longa conversa sobre a importância de realizar o experimento.)

Paula: Eu acho que você acredita naquilo que você vê. Se não vê, não

acredita.

Alice: Mas sabe por que é que eu percebi? Agora eu tenho que defender a

Paula: é o caso de a gente fazer experimentos diferentes. Por quê? Por que

58

Atividade: Organizar os participantes em duplas, definir o jogador A e o jogador B. Cada dupla recebe duas

moedas. Cada integrante da dupla lançará sua moeda simultaneamente, aproximadamente 70 vezes. Registrar os

resultados. O jogador A marca ponto "se ambos os lados saem cara", enquanto que o jogador B marca ponto

"Quando sai uma cara e uma coroa”.

Page 142: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

141

quando eu tava jogando na semana passada com a Bruna, aí a Bruna viu. Por

ela ter mais maturidade no assunto, escolheu e falou: eu vou ganhar. Aí,

depois de eu já ter essa experiência do sábado anterior, eu vi que é o que a

gente tem que mostrar pro aluno, ele joga e depois ganha maturidade. O

aluno vai aprender realmente. [...]

Pesquisadora: O professor ensinou, a gente aceitou e ensina assim até hoje.

A gente tem que perceber os processos que a gente tem que passar para

aprender, para ver o que o nosso aluno também precisa disso. Não é só

passar para ele pronto não. Você viu aquele dia, no jogo do cara e coroa...

Alice: O erro aconteceu onde? O que é que acontece: quando a gente teve

aula de didática. O que o professor formador deve fazer? Ele tem que levar

para nós, na faculdade, e fazer. Ele deve promover meios para a gente

aprender e para contribuir na sala de aula. Se ele tivesse formado esse

conceito na gente eu ia aprender e não ia ter medo de fazer com os meus

alunos. Eu ia ter certeza: serviu pra mim? Então é isso que eu vou ter que

mostrar pros meus alunos. Eu não ia achar errado e nem ia ter perigo de

parar as minhas aulas para poder fazer isso com o aluno.

Paula: Mas sabe por que que eles não deram? Eles achavam que não era

importante. E vocês tiveram professores com vocês. E eu que fiz a distância?

Pesquisadora: Mas você tem um diferencial: está aqui todos os sábados para

melhorar.

Paula: Mas eu tô aqui para buscar melhorar para mim e para os meus alunos.

(transcrição encontro, 19/05/2012, grifos nossos).

Alice, que já havia demonstrado em encontros anteriores estar receosa de não saber

responder aos questionamentos dos alunos após a realização dos experimentos, percebeu uma

deficiência em sua formação inicial. Ela afirmou que a Probabilidade, durante sua graduação,

deveria ter sido trabalhada de forma mais prática, para que o conceito fosse formado nela

enquanto aluna e ela não tivesse “medo” de trabalhá-lo com seus alunos. Paula destacou que

fez o curso de Matemática na modalidade a distância e parece ter sentido falta da presença do

professor. Segundo Lopes (2012, p.171):

Um dos principais impedimentos ao ensino efetivo de probabilidade e estatística na

educação básica tem sido a inexistência de um trabalho na formação inicial e

contínua de professores que ensinam matemática nesses níveis de ensino: Educação

Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio.

Percebemos que Alice sentiu falta de, durante sua formação inicial, aulas que

contribuíssem para a formação de seu conhecimento profissional que, segundo Azcárate

(1999), é configurado como um sistema de idéias, com diferentes níveis de especificidade e

articulação, que estão sujeitas a uma evolução constante. Sua organização está apoiada na

reflexão e resolução de problemas decorrentes da prática.

Sabemos, porém, que as intuições a serem formadas e/ou aperfeiçoadas nas

professoras não devem depender totalmente do processo experimental. É preciso favorecer

Page 143: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

142

uma sistematização das noções discutidas em nível conceitual, abrangendo intuições no

contexto probabilístico, para que o professor se sinta seguro em trabalhar a Probabilidade de

forma experimental, buscando favorecer, no aluno, a aprendizagem também a nível

conceitual.

Em um determinado momento do encontro seguinte, o grupo realizou uma atividade

dividida em dois momentos: a) analisar resultados e verificar se ocorreram trapaças e b)

realizar o experimento e discutir os resultados obtidos. Em ambos os momentos, pedimos às

professoras se colocassem no lugar dos alunos ou que imaginassem possíveis conclusões de

seus alunos. A seguir, são apresentados fragmentos da discussão:

Bruna59

: Eu pensaria, como aluno, sim, que quem errou foi o Jaime. Ou

quem acertou foi o Jaime, exatamente. Errou por quê? Porque se tem de 1 a

16 vai sair um de cada.

Paula: Mas se elas voltam!

Bruna: Eu acho que se você der espaço, acho que se você fizer a pergunta,

quanto mais nova a criança, ela vai dizer que o Jaime acertou.

Pesquisadora: É. Bem pensado.

Bruna: Não é? Porque se tem de 1 a 16 vão sair todas.

Paula: Eu acho que aí é o caso...

Pesquisadora: Não é o tipo de questão para gente dar e cobrar para dizer

quem está certo e quem está errado. É o tipo de questão para avaliar o que é

que o menino está pensando.

Paula: O que é que ele pensa, não é?

Bruna: É uma fonte de pesquisa, não para avaliar o que está certo ou errado,

porque qualquer resposta pode ser certa. Não tem como avaliar se está certo

ou está errado. [...]

Bruna: Parece muito com sorteio. Por exemplo: número de diário. Vamos

sortear pelo número de diário. Então, quer dizer, o número pode repetir. Ou

pode todo mundo ganhar um. (transcrição encontro, 19/05/2012, grifos

nossos).

Quando considerou a análise da atividade sob o ponto de vista do aluno, Bruna

concebeu como mais provável a hipótese de ele acreditar que, ao realizar 16 retiradas de um

saco não transparente com fichas numeradas de um a 16, seriam obtidos resultados de um a

16, sem repetição. Paula lembrou que há reposição. Logo, os números poderiam se repetir,

mas Bruna acreditou que os alunos apostariam na sequência ininterrupta; principalmente, os

mais jovens.

59

Neste momento, as professoras estão analisando a atividade “O jogo de cartões da Paula”, Adaptado de

Batanero, C. Didactica de la estadística, 2001, p. 18. Neste primeiro momento, elas verificam se as crianças

trapacearam.

Page 144: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

143

Green (1991, apud BATANERO, 2001) sugere que os alunos mais velhos aceitam

melhor a variabilidade dos resultados aleatórios. Durante a discussão, Bruna afirmou que tal

situação poderia ocorrer de fato e chegou a afirmar que todas as fichas sairiam, praticamente

desconsiderando o caráter aleatório do experimento.

O grupo desta pesquisa concordou que a atividade deveria ser trabalhada como um

meio e não como um fim, com o intuito de verificar as intuições dos alunos. Contudo,

consideramos importante dar mais espaço à discussão já que, se considerarmos que, ao retirar

16 fichas (com reposição) de um saco com esta quantidade de fichas numeradas de 1 a 16,

podemos obter exatamente os números de 1 a 16, sem repetição, estamos desconsiderando o

caráter aleatório do experimento. Como já era previsto para este encontro, cada uma das

professoras participantes realizou as 16 retiradas. Os resultados de todas foram anotados no

quadro e analisados.

No 11° encontro, analisamos as respostas dadas pelos alunos de uma professora

pesquisadora em sua pesquisa60

. A ideia de trabalharmos com respostas de alunos surgiu

quando percebemos que as professoras participantes chegaram em um ponto em que não se

interessavam apenas em aprender mais sobre Probabilidade, mas em “trazer a sala de aula”

para o grupo. Provavelmente, isto aconteceu por utilizarmos várias atividades extraídas dos

trabalhos de Batanero (2001, 2006, 2010), nas quais analisávamos as respostas dadas pelos

pesquisados, além de verificarmos possíveis trapaças em jogos. Com o tempo, citar prováveis

respostas e justificativas de alunos tornou-se um exercício rotineiro. Tão logo percebemos

isso, buscamos trabalhar mais com respostas de alunos em pesquisas anteriores e, finalmente,

com as respostas dadas por nossos alunos. Dentre outras coisas, neste encontro, trabalhamos

com respostas de alunos utilizando termos probabilísticos em determinadas situações.

Vejamos em alguns recortes, exemplos de como nossos alunos chegavam até o grupo de

estudos de Probabilidade.

Pesquisadora: E o que vocês acham: o Júlio e o Humberto responderam “Possível”!

Alice: Você tem que conversar com eles.

Pesquisadora: Como, Alice? O que você faria?

Alice: Neste caso?61

Coloco eles em um experimento, deixo eles tirarem números

“pra caramba” para eles verem que, com certeza, o que vai sair é menor que 91. Ele

vai cansar (rindo) e vai ter que observar que é menor que 91.

60

SANTOS, Jaqueline A. F. L. O movimento do pensamento probabilístico mediado pelo processo de

comunicação com alunos do 7º ano do ensino fundamental. Dissertação (Mestrado). Itatiba, SP: Universidade

São Francisco, 2010. 61

Roda-se uma tômbola de jogo com número de 1 a 90. Considerando os resultados possíveis deste jogo,

classifique com uma das palavras da lista (impossível, pode ser, possível, bastante provável, certo, se espera que,

Page 145: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

144

Pesquisadora: E aí ele vai mudar a concepção de “Possível” e de “Certo”?

Alice: Deveria, não é?

Pesquisadora: E você, Paula? O que você faria se o menino estivesse respondendo

“Possível” para um evento que é “Certo”? O que você faria para tentar ensinar a ele

sem contar a resposta?

Paula: O mesmo que a Alice. Ia mostrar para ele a possibilidade de sair e o certo.

Pesquisadora: Como?

Paula: Jogando. É a única maneira de provar.

Alice: É. Para a estatística62

tem que ter material concreto mesmo, porque só o

abstrato, só na matemática mesmo...

Pesquisadora: Você vê que a gente mesmo confunde os termos63

; pensa que uma

coisa é igual a outra e não é. Imagina os alunos?

Alice: A gente também poderia usar moedas, ou os dados, como fizemos aqui.

Podemos pegar uma moeda, com cara e coroa, e mostrar para ele o que é possível. E

cunhar uma moeda, em casa mesmo, e mostrar o que é certo e o que é impossível.

Pesquisadora: Ou um dado mesmo. Depende do material que você tem. Se você ficar

jogando um dado e ficar perguntando para ele se é possível ou se é certo sair um

número de 1 a 6.

Alice: E tem a questão da cor que também é muito explicativa (dentre os diversos

materiais manipulativos levados a campo pela pesquisadora havia dados de variadas

cores). Colocando os quatro verdes e um vermelho, que nem você pôs, depois só os

quatro verdes. Ou colocar três vermelhos e cinco azuis. Depois tirar tudo de uma

cor. Isso aí, com certeza, vai ajudar a mostrar para o aluno sobre a possibilidade e a

certeza de acontecer um evento.

Pesquisadora: Então, todos nós concordamos que temos que fazer ele mudar de

ideia, não é? Porque ele não pode considerar o possível como certo. Ou pode?

Paula: Não podemos deixá-lo considerar o possível como certo, mas também não

podemos falar com ele.

Alice: Você vê que a gente não falou com a Paula. A gente foi fazendo as coisas até

ela perceber. Isso porque falar não adianta. Se falar, a pessoa vai ficar a vida toda

com a dúvida.

Pesquisadora: A hora que ele conseguir perceber, por algum meio que o professor

criar, ai é outra história... (transcrição encontro, 22/09/2012, grifos nossos).

Percebemos, neste ponto da pesquisa, que as professoras se sentiam cada vez mais à

vontade para expressar maneiras de se ensinar Probabilidade, de lidar com as respostas dos

alunos, de reagir a seus questionamentos e trabalhar a partir das respostas por eles dadas, e

não lhes dando respostas. A discussão gerada em um momento anterior, a partir da resposta

seguro, há alguma possibilidade, há alguma probabilidade, incerto) o acontecimento: “Sair um número menor do

que 91”. 62

Acreditamos que Alice se referia à Probabilidade, dado o contexto, contudo, transcrevemos fielmente as

gravações em áudio onde a professora utilizou a palavra Estatística. 63

Antes de analisar as respostas dadas pelos alunos da pesquisa, cada professora resolveu as atividades por eles

feitas. Neste momento, a professora referia-se à professora Paula, que em sua atividade classificou um evento

certo como possível - episódio também abordado neste texto.

Page 146: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

145

dada por Paula, considerando um evento certo como possível, serviu para que o grupo

percebesse que é possível trabalhar uma ideia errada sem corrigi-la diretamente.

Percebemos, aqui, a magnitude de se realizar uma pesquisa com professores, dando-lhes

liberdade para aprender e para ensinar. A reação das professoras no momento em que são

convidadas a “mostrar como ensinar” expressa segurança e até mesmo diversidade de opções

para fazê-lo. Cabe lembrar que Alice, nos encontros iniciais, demonstrava insegurança em

lidar com questionamentos de alunos aos possíveis resultados de experimentos. No entanto, a

esta altura da pesquisa, já destacava a importância da utilização do que ela chama de

‘materiais concretos’ e apostava neles para resolver possíveis problemas durante o ensino de

Probabilidade.

Azcárate (2006) lembra-nos que é necessário que o professor reflita sobre a natureza do

conhecimento estocástico, mas que ele também reflita sobre os aspectos relacionados ao

ensino e à aprendizagem. Segundo ela, enquanto o professor analisa o campo conceitual, o

trabalho sobre as questões didáticas deve estar ligado aos seus interesses, às suas ideias e

práticas. A autora afirma que uma mudança na nossa maneira de ensinar só é possível se

somos capazes de rever nossas ideias. E isto significa olhar para nós mesmos, analisar e

questionar as nossas ideias e os planos de ação que orientam nossas práticas.

Embora as professoras já tenham afirmado que a realização de experimentos em aulas

de Matemática não faça parte de sua prática, a este ponto da pesquisa já expressavam, de

modo unânime, a crença nessa estratégia como a única forma de trabalhar com as ideias

iniciais dos alunos ao se ensinar Probabilidade. Tanto Alice quanto Bruna apresentavam forte

influência do enfoque frequentista em seu raciocínio probabilístico, pois validavam situações

aleatórias por meio da experimentação e destacavam a quantidade de eventos que são

significativos ou não para tirar qualquer conclusão numa determinada situação. Também eram

capazes de identificar se os espaços amostrais eram equiprováveis ou não.

A utilização de material concreto e a necessidade de dialogar com os alunos ainda são

priorizadas pelas professoras, fato perceptível no trecho a seguir:

Pesquisadora: Vamos ver rapidamente as respostas dos alunos só para saber o que

eles pensaram. A primeira, a Júlia: “Não há nada que seja impossível, pois têm bolas

de todas as cores”. Hã!

Alice: Mentira. Estamos falando de dentro da caixa. Você vai tirar uma amarela?

Então, tira uma amarela para eu ver! Tem bolas de todas as cores. Pega uma amarela

pra mim, vai!

Pesquisadora: Parece que você acha que tinha que conversar com ela. E você, Paula?

Porque é impossível, sim. Você deu um exemplo, não foi?

Page 147: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

146

Paula: Mostrar pra ela que só tem três cores na urna e que só essas cores que a gente

pode tirar. Ela tem que olhar que é impossível tirar uma cor que não tem ali.

Pesquisadora: O Michael falou que não dá para responder, porque a palavra expressa

certeza e nessa situação não tem como expressar certeza. E aí?

Alice: Tem como expressar certeza sim, que vai sair uma bola de qualquer outra cor

sem ser aquela.

Pesquisadora: Mas como explicar? Ajudar eles? [...]

Paula: Mostrando que há possibilidade sim. Mostrando que ele está errado.

Pesquisadora: Jogando?

Paula: Eu tenho os dados aqui (pegando os dados coloridos). É só mostrar pra ele.

Tem algum dado amarelo? Branco? Não tem. Então, isso é impossível. (...) Muito

bem. Está vendo? Foi simples. Na verdade, estamos podendo usar os dados para

muitas coisas. Eles são coloridos...

Alice: Eu gostei disso! [...]

Pesquisadora: E o número cinco: “Sair o número 31”. O Júlio falou que é “Certo”. O

Humberto e a Júlia falaram que “Há alguma Probabilidade” e o Michael falou que é

“Possível”. E aí?

Alice: O Júlio está errado.

Paula: Ele falou que é “Certo”, mas o 31 pode não sair. Não tem só ele. Ele pode sair

ou pode não sair, uai! [...]

Paula: Realmente é pequena, mas uma vez que ele está lá dentro ele pode sair.

Alice: É. Mas é pequeno. E deveria ter uma palavra que expressasse isso.

Paula: Mas é que nem vocês estavam fazendo com o dado, comigo. Desde que tenha

uma pedra ali, é possível.

Pesquisadora: Eu entendi o que a Alice disse. Ela acha que com “Possível” ficou

muito aberto. Fica muito abrangente. É possível que seja ímpar também e a

quantidade de números ímpares é de 45.

Alice: Foi isso que eu comparei. Acho que foi por isso que eu busquei palavras

diferentes. Porque se eu coloquei “Possível” em uma que era 50% de chance e usar a

mesma palavra para traduzir uma situação que é pequena... aí eu não quis usar a

mesma palavra. (transcrição encontro, 22/09/2012, grifos nossos).

No início da transcrição, percebemos que Alice discordou completamente da resposta

da aluna e expressou isso de maneira bem direta em sua fala. Demonstrou, ainda, ao discordar

da resposta do aluno Michael64

, associar sua postura às de um perfil específico de aluno, pois

afirma que este possuía uma ideia formada e que seria difícil convencê-lo de algo diferente,

provavelmente associando seu comportamento ao de um aluno seu. A professora apresentou

criticidade ao justificar ter buscado outros termos probabilísticos para definir as situações

apresentadas, não concordando em definir todo evento que possa acontecer como possível.

Nosso trabalho, como mencionado anteriormente, objetivava também que o professor

64

Os nomes citados na pesquisa de Santos (2010) são fictícios.

Page 148: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

147

participante criasse/aperfeiçoasse seu repertório de termos comumente utilizados durante o

ensino de probabilidade.

Inferimos aqui que Paula, que durante a realização das atividades apresentou bastante

dificuldade quanto à utilização correta de termos probabilísticos, se sente, nesse momento,

segura para pegar o material manipulativo e exemplificar o que seria um evento impossível.

Ela conclui corretamente que se o número 31 pode não sair, o evento não é certo e, o melhor,

com segurança, o que não era perceptível em vários encontros anteriores.

Recordemos que Paula teve grande dificuldade em diferenciar um evento certo de um

evento possível e só se convenceu da diferença após várias tentativas do grupo de convencê-

la. Contudo, neste momento, ela diferenciava os termos destemidamente, utilizando,

inclusive, os argumentos que o grupo apresentou no momento em que tentava convencê-la. A

atitude de Paula de tomar a iniciativa de pegar o material manipulável para trabalhar a

dificuldade de um aluno partindo da própria resposta incorreta deixa-nos bastante satisfeitas,

pois percebemos um progresso significativo na postura desta professora.

É importante que o professor conheça recursos que possam favorecer a aprendizagem

do aluno e técnicas de ensino adequadas, bem como experimente diferentes situações de

ensino e ferramentas didáticas. Tais capacidades poderão contribuir para o aprimoramento de

sua capacidade de analisar criticamente livros e documentos curriculares, adaptando os temas

em diferentes níveis de ensino (BATANERO, 2010, p.185). Se queremos levar os alunos a

construir o seu conhecimento ativamente, resolvendo problemas e interagindo com os colegas

na sala de aula, as atividades apresentadas para os professores também precisam ser baseadas

numa abordagem construtivista da aprendizagem (JAWORSKI, 2006, apud BATANERO,

2010).

Acreditamos que, ao participar de um grupo de estudos sobre Probabilidade, o

professor tem a oportunidade de desenvolver seu pensamento probabilístico, de apropriar-se

de teorias que lhes permitam contornar problemas da sua prática, criando possibilidades de

mudança e transformação. Graças à motivação, envolvimento e empenho por parte das

participantes, os encontros se tornaram propícios à construção e mobilização de saberes. O

processo se enriqueceu com as experiências relatadas pelas professoras durante as discussões

e pelas dúvidas surgidas nas atividades realizadas, que permitiram um amadurecimento

teórico consistente, pautado na construção dos conhecimentos. Cabe-nos ressaltar o papel

desempenhado pelo respeito mútuo, cumplicidade, amizade e humildade no grupo. A

Page 149: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

148

existência de tais fatores não pode ser imposta ou determinada, mas, quando acontece,

favorece enormemente o processo e o torna mais fecundo.

Page 150: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

149

Considerações Finais

Considerando o professor como o personagem principal em seu próprio

desenvolvimento profissional, investigamos possíveis contribuições que trazidas pela

participação em um grupo de estudo, pautado no diálogo e na prática coletiva, em reflexões

sobre conceitos de Probabilidade e sobre a própria prática para o professor da Educação

Básica.

A análise dos resultados foi baseada no estudo teórico sobre Probabilidade e seu

ensino, apresentado no primeiro e segundo capítulo deste trabalho e as categorias para a

análise partiram do confronto dos dados obtidos com os pressupostos básicos ao professor

para o ensino de Probabilidade, admitidos pelas pesquisadoras antes do trabalho de campo.

A investigação desenvolvida buscou diversificar as estratégias e, ao provocar a

reflexão individual e coletiva a partir de textos, foi possível que as professoras identificassem

o caráter aleatório de fenômenos naturais e sociais compreendendo o significado e a

importância da Probabilidade como meio de prever resultados. As leituras e discussões

permitiram ainda desenvolver a capacidade de quantificar e fazer previsões acerca de

situações aplicadas a diversas áreas do conhecimento humano e da vida cotidiana, que

envolvam o pensamento probabilístico.

Diversos comentários feitos pelas professoras ao longo dos encontros, bem como o

instrumento de sondagem utilizado no 1º destes evidenciaram que a formação inicial das

professoras do grupo, no que se refere à Probabilidade, privilegiou o uso de fórmulas e

algoritmos, sem a realização de jogos ou experimentos. O trabalho com conceitos, termos e

concepções probabilísticas também não foi mencionado pelas educadoras como parte de sua

formação inicial. Durante os encontros, tais metodologias foram citadas, pelas professoras,

como facilitadoras dos processos de ensino e aprendizagem, sendo a ausência destas na

formação inicial das professoras sentida já nos primeiros encontros do grupo. Todas as

professoras participantes do grupo trabalhavam em jornada dupla e, durante a pesquisa, pelo

menos em um dos turnos, lecionavam na rede estadual de Ensino de Minas Gerais, inclusive a

pesquisadora Fernanda. Como a Proposta de Ensino do Estado sugere o ensino de

Probabilidade desde as séries iniciais da Educação Básica sem, contudo, viabilizar

possibilidades de formação continuada sobre o assunto aos servidores da rede percebemos,

durante todo o trabalho desenvolvido, grande interesse por parte das professoras em aprender

mais sobre Probabilidade.

Page 151: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

150

Durante o processo de investigação priorizamos a utilização de atividades (jogos,

experimentações, problemas, textos) que trabalhassem a capacidade de identificar situações

de acaso e de aleatoriedade tanto na vida cotidiana quanto no conhecimento científico. A

realização de experimentos permitiu-nos também analisar o comportamento de situações que

envolvem o azar. Ao longo de sua participação no grupo de estudos, as educadoras

desfrutaram de oportunidades múltiplas de discutir o ensino de Probabilidade na Educação

Básica e práticas pedagógicas, além de serem levadas, em diversas ocasiões, a refletirem

sobre a própria prática.

As atividades desenvolvidas nos encontros caracterizaram-se pela variedade de

situações e pela persistência na busca pelo aprimoramento de determinados conceitos e

termos probabilísticos como Probabilidade, aleatoriedade, etc. levando-as a compreender, de

modo mais profundo, o significado e a importância da Probabilidade como meio de prever

resultados. O trabalho possibilitou o desenvolvimento de uma linguagem matemática e

probabilística, com notável diminuição no uso equivocado de termos como probabilidade em

substituição a possibilidade e vice-versa; além de se tornarem capazes de atribuir, à palavra

aleatoriedade, um significado menos intuitivo. Percebemos a mudança gradual das

concepções sobre Probabilidade das professoras participantes. Professoras que, inicialmente,

recorriam à casualidade ao invés da aleatoriedade para explicar ausência de alternância de

resultados de cara e coroa no lançamento de moedas, por exemplo, nos encontros finais do

grupo eram capazes de definir a aleatoriedade e exemplificar com experimentos seus

argumentos.

A realização de jogos e a observação de experimentos marcou nosso trabalho, já que

optamos por um processo de formação sem o uso exagerado de fórmulas e/ou cálculos muito

extensos, por acreditarmos que esse tipo de trabalho não permitiria as educadoras uma

elaboração/reelaboração de seu raciocínio combinatório ou de seu pensamento probabilístico.

Como os registros de resultados e de opiniões das professoras foram uma constante durante

todo o trabalho de campo, inferimos, a partir da análise destes, que este tipo de atividade

propiciou um aprimoramento significativo destes itens por parte das educadoras participantes

de nossa pesquisa.

Ao percebermos que experimentos e jogos produziam uma motivação especial nas

professoras, buscamos elaborar ou adaptar tais atividades a fim de atingirmos os objetivos

propostos para a pesquisa de campo. Desta forma, após sucessivos ensaios, elas tornaram-se

capazes de identificar, com segurança, um experimento aleatório e citar algumas de suas

Page 152: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

151

características (como a imprevisibilidade de resultados), passando a conceber o sucesso

aleatório como sendo um resultado entre os muitos possíveis dentro de um experimento

aleatório.

O trabalho com espaço amostral surgiu durante a realização de um jogo, na tentativa

de torná-lo justo. Ao perceber que tal ferramenta poderia ser muito útil durante o estudo de

Probabilidade, as professoras passaram a criar o espaço amostral de cada experimento. Após

alguns encontros com esta dinâmica, tornou-se natural para elas identificar o espaço amostral

como conjunto de todos os possíveis resultados de um experimento aleatório. A criação de

diagramas e tabelas para representar o espaço amostral de um experimento foi trabalhada em

alguns encontros, contribuindo para o desenvolvimento da capacidade de identificá-lo.

Contudo, o trabalho com a representação de dados por meio de conjuntos, explorando a união

e interseção de eventos foi abordada em apenas dois encontros, de iniciativa das professoras

participantes durante a socialização de respostas e resultados, e não identificamos uma

contribuição significativa na utilização deste tipo de representação, devido à falta de tempo

para abordá-la com afinco.

Defendemos que todas as noções trabalhadas no grupo bem como as abordagens dadas

contribuíram para o desenvolvimento do pensamento probabilístico das educadoras, na

medida supracitada, e entendemos que as habilidades desenvolvidas no grupo possam

contribuir para o desenvolvimento profissional das professoras participantes, segundo a

concepção que assumimos para este termo.

Outro ganho que merece destaque foi a reflexão acerca da prática docente. Embora

não tenhamos acompanhado suas aulas, em diversos momentos, discutimos questões,

atividades e situações vinculadas às salas de aula, ao conhecimento e dificuldades

manifestadas por alunos e as alternativas e estratégias que poderiam vir a ser implementadas.

Consideramos que o processo de analisar atividades realizadas por seus alunos e por alunos

das outras professoras, desenvolvido no grupo, tenha propiciado um movimento reflexivo a

respeito da própria prática, proporcionando desenvolvimento profissional das docentes. Além

de o ambiente de trabalho do grupo ter priorizado, durante todos os encontros, um espaço para

se falar, ouvir, respeitar as opiniões alheias e discutir ideias, foi possível refletir sobre os

conhecimentos que o aluno traz e como considerá-los durante o ensino de Probabilidade. Em

contrapartida, as professoras puderam verificar os conhecimentos sobre Probabilidade que

haviam solidificado com a presença no grupo até então, dando-lhes mais segurança, não só

Page 153: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

152

para lidar com situações de incerteza, como para trabalhar com as noções de Probabilidade,

corretas ou não, que os alunos trazem (para a sala de aula) de sua vida cotidiana.

Em virtude de todo o exposto, acreditamos que as reflexões sobre a prática docente, o

trabalho coletivo, a ampliação do conhecimento didático e sobre Probabilidade tenham

contribuído efetivamente para o desenvolvimento do pensamento probabilístico das

professoras bem como para seu desenvolvimento profissional.

Durante nossa pesquisa, as professoras mostraram-se dedicadas, dinâmicas, criativas e

responsáveis em busca de seu desenvolvimento profissional. Assumimos também o papel de

professora participante do grupo, contudo, não deixamos de lado a função do pesquisador: ser

um constante agente motivador, organizar bem os encontros, estimular a socialização de

ideias e valorizar as opiniões das participantes.

Ressaltamos a importância do pesquisador, de sua contribuição neste processo de

reconhecimento, por parte das professoras, de sua prática, de seu conhecimento profissional.

Através de questionamentos e de sua capacidade de promover a interatividade, o pesquisador

busca, continuamente, estar articulando as ideias produzidas pelo grupo com os pressupostos

teóricos condizentes com o ensino de Probabilidade, em meio a um ambiente de respeito ao

próximo, onde todos são professores, capazes de ensinar e de aprender.

Completamos que as contribuições trazidas por esta pesquisa não se limitaram apenas

ao crescimento pessoal e profissional das três professoras. Percebi65

mudanças enquanto

professora de Matemática da Educação Básica, tendo que dividir o tempo entre salas de aula e

a busca por meu desenvolvimento profissional, tanto através do grupo quanto por estar

cursando o mestrado. Percebi ainda que, se objetivo o desenvolvimento do pensamento

probabilístico de meus alunos, faz-se necessário repensar minha prática, apesar das

dificuldades atreladas a esta mudança.

Após cursar as disciplinas do mestrado, ir a campo para coletar dados, debruçar sobre

eles para analisá-los à luz do referencial estudado, considero-me uma pesquisadora

afortunada, que teve a oportunidade de conviver e aprender com três educadoras batalhadoras,

que cresceram muito bravamente ao longo desta trajetória. Ao idealizar trabalhos futuros

pretendo continuar apostando na figura do professor, por considerá-lo merecedor da confiança

de pesquisadores, Instituições de Ensino e de elaboradores de Políticas Públicas de

aperfeiçoamento e formação de professores.

65

Neste caso, trata-se da pesquisadora Fernanda.

Page 154: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

153

Avaliando nossa experiência como positiva, destacamos a importância de serem

realizadas pesquisas em Educação Matemática, na perspectiva do professor-pesquisador, que

envolvam grupos de estudos formados por professores da Educação Básica. Acreditamos que

tais trabalhos devam possuir, dentre os objetivos de pesquisa, o desenvolvimento profissional

do professor para que, ao participar de um grupo de estudos, este se veja como principal

responsável por seu desenvolvimento profissional.

Page 155: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

154

Referências

AZCÁRATE, P. Estudio de las Concepciones disciplinares de futuros Profesores de

Primaria en torno a las nociones de Aleatoriedad y Probabilidad. Granada: Comares,

1996.

AZCÁRATE, P. La investigación matemática. Cuestiones sobre los procesos de

formación de los profesores. Relieve, 3 (2). 1997.

AZCÁRATE, P., CARDEÑOSO, J.M. AND R. PORLÁN ARIZA. "Concepciones de

futuros profesores de primaria sobre la noción de aleatoriedad." Enseñanza de las

Ciencias: revista de investigación y experiencias didácticas 16.1: 85-97, 1998.

AZCARÁTE, P. G. ¿Por qué no nos gusta enseñar estadística y probabilidad? In:

FLORES, P. y LUPIÁÑEZ, J. (Ed.). Investigación en el aula de matemáticas: Estadística y

Azar. Granada: SAEM Thales, 2006.

BATANERO C., SERRANO L. La aleatoriedad, sus significados e implicaciones

educativas. Uno: Revista de Didáctica de las Matemáticas, n. 5, p. 15-28, 1995.

BATANERO, C. Didáctica de la estadística. Granada (Espanha): Universidade de Granada /

Grupo de Educación Estadística Universidad de Granada-GEEUG, 2001.

BATANERO, C. Aleatoriedad, modelización, simulación. Departamento de Didática de la

Matemática, Universidad de Granada. Actas: X Jornada sobre el Aprendizaje y la Enseñanza

de las Matemáticas (p.119-30). Zaragoza: ICE, 2001.

BATANERO, C.; GODINO, J. D. Estocástica y su didáctica para maestros. Granada

(Espanha): Universidad de Granada (Proyecto Edumat-Maestros), 2002.

BATANERO, C., GODINO, J. D., ROA, R. Training teachers to teach probability. Journal

of statistics Education, v. 12, n. 1, 2004.

BATANERO, C., HENRY, M., PARZYSZ, B. The nature of chance and probability. In:

JONES, G. A. (Ed.). Exploring probability in school: challenges for teaching and learning.

USA: Springer, p. 13-37, 2005.

BATANERO, C. Razonamiento probabilístico en la vida cotidiana: un desafío educativo.

In: FLORES,P.; LUPIÁÑEZ, J. (Ed.). Investigación en el aula de matemática. Estadística y

Azar. Granada: Sociedad de Educación Matemática. Thales, 2006.

BATANERO, C., CONTRERAS, J. M., DÍAZ, C. Y ARTEAGA, P. Paradojas en la

historia de la probabilidad como recurso didáctico. In C. Cañadas, J. M. Contreras (Eds).

Page 156: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

155

Actas de las XV Jornadas de Investigación en el Aula de Matemáticas: Dimensión Histórica,

Social y Cultural de las Matemáticas. Granada. Thales, 2009.

BATANERO, C., CONTRERAS, J., DíAZ, C., ORTIZ DE HARO, J.. Razonamiento

probabilístico de profesores y su evolución en un taller formativo. Educação Matemática

Pesquisa ISSN 1983-3156, Vol.12 Nº 2, 2010.

BATANERO, C. , GÓMEZ E., SERRANO L., CONTRERAS, J. M. Comprensión de la

aleatoriedad por futuros profesores de educación primaria. In REDIMAT: Revista de

Investigación en Didáctica de Las Matemáticas. Vol. 1 N. 3., p. 222-245, 2012.

BRASIL. Parâmetros curriculares para o ensino fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.

CARNEIRO, Mario Jorge Dias et al.CBC: Matemática, proposta curricular, ensino

fundamental e médio. Minas Gerais, 2005

CARVALHO, Rosália P. F. Formação de Conceitos Probabilísticos em crianças de 4ª

série do Ensino fundamental. Trabalho apresentado no VIII Encontro Nacional de Educação

Matemática (SBEM), Recife, 2004.

CAZARES, S. I., REYES, M. C. G. Comprensión que muestran profesores de secundaria

acerca de los conceptos de probabilidad: un estudio exploratorio. Educación Matemática,

v. 23, n. 1, p. 63-95, 2011

CONTRERAS, J. M., Díaz, C., BATANERO, C. y ORTIZ, J. J. Razonamiento

probabilístico de profesores y su evolución en un taller formativo. Educação Matemática e

Pesquisa, 12 (2), 181-198, 2010.

CORRÊA, M. W. O conhecimento profissional e a abordagem de probabilidade: um

estudo de caso. Dissertação de Mestrado. PUC/SP. São Paulo, 2010.

COSTA, N. M. L. Formação de professores para o ensino de matemática com a

informática integrada à prática pedagógica: exploração e análise de dados em bancos

computacionais. Tese de Doutorado em Educação: currículo. PUC/ SP, São Paulo, 2004.

COSTA, A.; NACARATO, A. M. A estocástica na formação do professor de matemática:

percepções de professores e de formadores. In Bolema, Rio Claro, São Paulo. V. 24, n. 39,

p. 367-386, ago. 2011.

FERREIRA, A. C. et al. Estado da arte da pesquisa brasileira sobre formação de

professores que ensinam Matemática: uma primeira aproximação. Anais do I SIPEM (I

Seminário Internacional de Pesquisa em Educação Matemática). SBEM, 2000.

Page 157: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

156

FERREIRA, A. C. Metacognição e desenvolvimento profissional de professores de

matemática: uma experiência de trabalho colaborativo. 367p. Tese (Doutorado em

Educação: Educação Matemática) — FE, Unicamp, Campinas (SP), 2003.

FIORENTINI, D. (org.). Formação de professores de matemática: explorando novos

caminhos com outros olhares. Campinas: Mercado de Letras, 2003.

FONSECA, M. C. F. R. Letramento no Brasil: habilidades matemáticas. São Paulo: Global

Editora, 2004.

GODINO, J. D.; BATANERO, M. C.; CAÑIZARES, M. J. Azar y probabilidad:

fundamentos didácticos y propuesta curriculares. España: Editorial Síntesis, 1996.

GONÇALVES, C. M. Concepções de professores e o ensino de probabilidades na escola

básica. 125 f. Dissertação (Mestrado em Educação). PUC/SP. São Paulo, 2004.

HARO, J. J. O. et al. Comparación de probabilidades en maestros en formación. In:

Investigación en educación matemática: actas del X Simposio de la Sociedad Española de

Investigación en Educación Matemática, p. 267-276. Instituto de Estudios Altoaragoneses,

2006.

LOPES, C.A.E. A probabilidade e a estatística no ensino fundamental: uma análise

curricular. 1998. Dissertação (Mestrado em Educação) Faculdade de Educação,

Universidade Estadual de Campinas, Campinas (SP).

LOPES, C.A.E. A probabilidade e a estatística no currículo de matemática do ensino

fundamental brasileiro. Experiências e Perspectivas do Ensino de Estatística - Desafios para

o século XXI. Florianópolis, 1999.

LOPES, C. A. E., MORAN, R. C. C. P. A estatística e a probabilidade através das

atividades propostas em alguns livros didáticos brasileiros recomendados para o ensino

fundamental In: Conferência Internacional Experiências e Perspectivas do Ensino da

Estatística - Desafios Para o Século XXI, Florianópolis, 1999.

LOPES, C.A.E. O conhecimento profissional dos professores e suas relações com

estatística e probabilidade na educação infantil. Tese (Doutorado em Educação) –

Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas (SP), 2003.

LOPES, C.A.E. Educação matemática na infância: o desenvolvimento profissional de um

grupo de professoras. In: ANPED, 27., Caxambu. Sociedade, Democracia e Educação: Qual

Universidade? Caxambu, 2004.

LOPES, C.A.E. O ensino da estatística e da probabilidade na educação básica e a

formação dos professores. Cad. Cedes, Campinas, vol. 28, n. 74, p. 57-73, jan./abr. 2008.

Page 158: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

157

LOPES, C. E., CARVALHO, F. D., MENDONÇA, L. Modelagem matemática gerando a

educação estocástica de futuros economistas. Acta Scientiae, v. 14, n. 2, p. 185-199, 2012.

MINAYO, C. S. (org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 30.ed. Petrópolis,

RJ: Vozes, 2011.

PONTE, J. P. Perspectivas de desenvolvimento profissional de professores de

Matemática. Lisboa, 1995.

PONTE, J. P. et al (org.). Desenvolvimento profissional dos professores de Matemática:

que formação? Lisboa: Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação, 1996.

PONTE, J. P. Da formação ao desenvolvimento profissional. In: Actas do Encontro

Nacional de Professores de Matemática ProfMat. 98. Lisboa: Associação dos Professores de

Matemática, 1998.

ROTUNNO, S. A. M. Estatística e probabilidade: um estudo sobre a inserção desses

conteúdos no ensino fundamental. Dissertação de Mestrado. Curitiba: UFPR, 2007.

SANTIAGO, I. C., REYES, G., CATALINA, M. Comprensión que muestran profesores

de secundaria acerca de los conceptos de probabilidad: un estudio exploratório.

Educación Matemática, vol. 23, núm. 1, agosto-abril, p. 63-95. Grupo Santillana México.

Distrito Federal, México, 2011.

SANTOS, J. A. F. L. O movimento do pensamento probabilístico mediado pelo processo

de comunicação com alunos do 7º ano do ensino fundamental. Dissertação (Mestrado).

Itatiba, SP: Universidade São Francisco, 2010.

SANTOS, S. A. Explorações da linguagem escrita nas aulas de matemática. In

NACARATO, A. M., LOPES, C. E. (Orgs.) Escritas e leituras na educação matemática. Belo

Horizonte: Autêntica, p. 127-141, 2005.

SERRANO, L., BATANERO, C., ORTIZ, J. J. CAÑIZARES, M. J. Heurísticas y sesgos en

el razonamiento probabilístico de los estudiantes de secundaria. Educación Matemática,

10(1), 7-25, 1998. Disponível em http://www.ugr.es/~batanero/ARTICULOS/heuristicas.htm,

último acesso em 04/05/2013.

SERRANO, Luis et al. Concepciones de los alumnos de secundaria sobre modelos

probabilísticos en las secuencias de resultados aleatorios. Suma, v. 36, p. 23-32, 2001.

SKOVSMOSE, Ole. Hacia una filosofía de la educación matemática crítica. Trad. Paola

Valero. Bogotá: Universidad de los Andes, 1999.

TARDIF, M.; LESSARD & LAHAYE. Os professores face ao saber: Esboço de uma

problemática do saber docente. Teoria & Educação nº 4, Porto Alegre: Pannônica, 1991.

Page 159: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

158

TARDIF, M. Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários:

elementos para uma epistemologia da prática profissional dos professores e suas

consequências em relação à formação para o magistério. Revista Brasileira de Educação,

nº13, p. 5-24, 2000.

Page 160: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

159

APÊNDICE A- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Eu,____________________________________________________________________________,

professor(a) que ensina Matemática para alunos da Educação Básica em Conselheiro Lafaiete, fui

convidado(a) pela Prof.ª Fernanda Monteiro de Castro Rezende, para participar de um grupo de estudos

sobre Probabilidade.

Estou ciente que este projeto faz parte da pesquisa de Mestrado da Professora Fernanda sobre o

potencial dos grupos de estudo (formados por professores e pesquisadores) para o desenvolvimento

profissional de seus membros. O foco desse grupo será o desenvolvimento do pensamento probabilístico.

Tenho ciência de que poderei participar de modo ativo no projeto, colaborando para a construção de

atividades que farão parte de um livreto composto a partir das experiências do grupo. Dessa forma, tal

grupo terá como objetivos tanto o desenvolvimento profissional e o desenvolvimento do pensamento

probabilístico dos participantes, quanto a produção de um material com a produção do grupo a ser

compartilhada com outros colegas.

Fui informado(a) de que os encontros acontecerão em dias, horários e locais definidos

coletivamente no 1º encontro a ser realizado no dia 05 de maio de 2012, às 10 horas, na Escola Estadual

General Sylvio Raulino de Oliveira na Rua Cassimiro Adriano Silva, 383, Bairro Cachoeira CEP - 36.400-

000 – Conselheiro Lafaiete – MG. Sei que posso desistir de participar do projeto a qualquer momento e que

nada do que eu tiver desenvolvido ao longo do trabalho será considerado na pesquisa.

Finalmente, estou ciente de que algumas atividades serão gravadas em áudio (voz) e vídeo e que

meu nome nem o de nenhum outro participante ou escola, será mencionado em qualquer registro produzido

ao longo e após o trabalho. Poderei escolher um pseudônimo sob o qual serão registradas minhas produções

(tanto na pesquisa quanto no livreto). Além disso, terei acesso aos resultados do estudo por meio de uma

reunião no grupo de trabalho, tão logo os mesmos estejam disponíveis e poderei acessar a pesquisa

completa na página do Mestrado (www.ppgedmat.ufop.br).

Caso eu deseje, por qualquer motivo, esclarecer algum aspecto ético do projeto e/ou das atividades

desenvolvidas no mesmo, sei que poderei entrar em contato com os pesquisadores ou com o CEP através

dos contatos mencionados ao final desse termo.

Sinto-me esclarecido(a) acerca da proposta, quero participar do grupo de estudo e aceito que a

Prof.ª Fernanda filme e grave algumas atividades.

__________________________________________________________

Assinatura do(a) professor(a)

Professora Fernanda Monteiro de Castro Rezende

[email protected] ( 31) 86488489 (31) 84480898

Professora Doutora Ana Cristina Ferreira

[email protected] - (31) 35591241

Comitê de Ética em Pesquisa – Universidade Federal de Ouro Preto (CEP/UFOP)

Campus Universitário – Morro do Cruzeiro – ICEB II – sala 29 - [email protected]

(31) 3559-1368 / Fax: (31) 3559-1370

Conselheiro Lafaiete, _______ de _____________________ de 2012.

Page 161: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

160

APÊNDICE B- Instrumento 1- Conhecendo o grupo...

Nome: __________________________________________________________________

1) Quando você ouve ou lê a palavra ‘probabilidade’, que ideias lhe vêm à cabeça? O que

você pensa?

____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

2) Você se lembra como foi o seu contato, enquanto aluno(a), com o tema Probabilidade?

Descreva.

_________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

3) Você ensina ou já ensinou probabilidade? ( ) sim ( ) não

Se sim, responda:

a) para alunos de que faixa etária?

_____________________________________________________________________

b) como você costuma (ou costumava) trabalhar com esse assunto?

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

4) Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) sugerem que a noção de probabilidade

seja trabalhada no Ensino Fundamental desde os primeiros anos. O que você pensa

sobre isso?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

6) Quais são suas expectativas em relação ao grupo de estudos sobre probabilidade?

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

____________________________________________________________________________

Juntos, podemos crescer profissionalmente e construir conhecimentos que transformem nossa

prática docente. Será um prazer trabalhar com você! Um abraço da Fernanda e da Ana Cristina

Page 162: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

161

APÊNDICE C- Instrumento 2

Universidade Federal de Ouro Preto

Instituto de Ciências Exatas e Biológicas

Departamento de Matemática

Mestrado Profissional em Educação Matemática

Título do trabalho: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico: Estudo do Processo Vivido por

um Grupo de Professores de Matemática de Conselheiro Lafaiete (MG)

Pesquisadora: Fernanda Monteiro de Castro Rezende UFOP

Orientadora: Profª Drª Ana Cristina Ferreira UFOP

1. Dados Pessoais.

Nome Completo:

__________________________________________________________________________________

Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino Idade: .................... anos.

Estado civil:

( ) solteiro(a) ( ) casado(a) ( ) divorciado ( ) viúvo ( ) outros

2. Cidade em que mora:_____________________________________________

3. Atua como professor de Matemática? ( ) sim ( ) não

Se sim, há quanto tempo leciona?_______________________________________

a) Para qual modalidade leciona? ( ) Ensino Fundamental ( ) Ensino Médio

Outro: __________________________________________________________

b) Em quais turnos leciona? ( ) manhã ( ) tarde ( ) noite

Se não, qual sua ocupação?__________________________________________

4. Durante o Curso de Licenciatura em Matemática, cursou alguma disciplina que abordasse o conteúdo

Probabilidade?

( ) sim ( ) não

Se sim, do que se lembra desta disciplina?

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

5. Por que escolheu fazer o curso de Matemática?

( ) Porque gosto da Matemática

( ) Não tive outra opção

( ) Fui motivado por alguém

Page 163: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

162

Outro motivo:

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

6. Você considera importante abordar atividades sobre Probabilidade nas classes de Educação Básica?

( ) sim ( ) não

Justifique:__________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

__________________________________________________________________________________________

Page 164: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

163

APÊNDICE D- Algumas atividades realizadas durante os encontros

Atividades:

As balas da Fernanda

Fernanda trouxe para o encontro dois sacos de balas para o grupo de estudo. Se estivéssemos

em um grupo de crianças pequenas, pediríamos que contassem quantas eram as balas de cada

sabor. Depois, algumas balas – sem contar – de cada sabor seriam colocadas em um saco

plástico transparente. (obs. exagerar na diferença entre a quantidade de balas de cada sabor)

a) se eu pegar uma bala no saco, com os olhos fechados, qual será seu sabor? (deixar os

participantes responderem e depois perguntar por que pensam assim).

b) seria impossível tirar uma bala de ... (sabor com menor quantidade de balas)? Por quê?

c) deixar apenas uma bala de um dos sabores no saco, retirando todas as demais. E agora,

seria impossível tirar uma bala de ...? Por quê?

d) tirar todas as balas do saco e depois colocar quinze balas de cada sabor no mesmo. Fazer as

mesmas perguntas feitas para a situação anterior.

e) que conclusões poderíamos extrair dessa atividade? (deixar os participantes falarem e

registrar seus comentários no quadro, caso seja possível). Ao final, procurar comentar as

respostas e também apresentar algumas reflexões sobre a importância de desenvolver o

raciocínio probabilístico com os alunos.

Jogando com dados

a) Jogo 1:

Distribuir dois dados para cada dupla (ou trio ou quarteto, de acordo com o número de

participantes) e apresentar o jogo: os participantes definem a ordem de jogada. cada jogador

lança os dados ao mesmo tempo e registra em uma tabela o número de pontos que aparece na

face superior de cada dado. Quem conseguir o mesmo número em ambas as faces superiores,

marca um ponto. Ganha o jogo quem marcar mais pontos no tempo determinado para a

partida.

Page 165: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

164

Agora, cada equipe vai analisar todos os lances do jogo e vai apresentar uma observação

sobre os mesmos... o que podemos perceber após jogar dois dados várias vezes? (dar uma bala

para cada participante da equipe que apresentar reflexões interessantes...).

b) Escolha um numeral!

Distribuir dois dados para cada dupla (ou trio ou quarteto, de acordo com o número de

participantes) e apresentar o jogo: cada jogador escolhe um numeral e a equipe registra esses

numerais no caderno. Depois, os participantes definem a ordem de jogada. Cada jogador lança

dois dados ao mesmo tempo. Se a soma dos pontos das faces superiores corresponder ao valor

escolhido por ele, o jogador marca um ponto.

Depois, cada equipe se reúne, analisa os resultados e discute uma estratégia para ‘ganhar’

mais pontos. A seguir, uma nova partida acontece. Porém, agora, a equipe define em conjunto

quais são os numerais da mesma e a cada vez que a soma dos dados corresponder a um desses

valores, a equipe marca um ponto.

Ao final, cada equipe será convidada a explicar sua estratégia (que numerais escolheu? Por

quê? E o que aconteceu?) e quantos pontos conseguiu marcar. Ao final, todos ganham uma

bala.

Experimento: Lançamento de uma moeda

Organizar os participantes em dupla. Cada dupla recebe duas moedas. Cada participante

lançará sua moeda 50 vezes e registrará em seu caderno a face voltada para cima.

a. Passar nas duplas perguntando, durante o lançamento:

Quando observamos a face da moeda voltada para cima durante o experimento podemos

saber qual será a próxima face? (espera-se que o professor perceba a aleatoriedade, caso

contrário, lançar a ideia e iniciar uma discussão). Você seria capaz de identificar

características de um experimento aleatório?

b. Passar nas duplas perguntando, após o lançamento:

Quantas caras foram obtidas? É possível saber qual será a face obtida na vigésima

primeira rodada?

c. Passar nas duplas, pedir um dos cadernos emprestado e registrar no quadro os

lançamentos.

d. Conversar com os participantes sobre o experimento.

- o que se observou?

Page 166: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

165

- quantas vezes a face superior foi cara e quantas vezes foi coroa?

- por que vocês acham que o resultado foi esse?

- poderíamos ter 100 caras em cada dupla?

- se pensássemos no lançamento de uma moeda 1000 vezes, o que seria mais provável

de acontecer, mais caras ou mais coroas? Por quê?

- Avaliação do encontro (o que acharam de hoje? Gostaram da atividade? Gostariam de

continuar trabalhando assim: realizando atividades e discutindo-as?).

Jogo da diferença

Em duplas, e denominando um dos jogadores como A e outro como B (os participantes

escolhem), disputar 20 partidas. Cada jogada consistirá no lançamento de dois dados (um pelo

jogador A e outro pelo B) observando-se as faces voltadas para cima.

Critério: O jogador A marca ponto se a diferença(subtraindo-se sempre o menor número do

maior obtido) entre os números que saírem nos dados for 0, 1 ou 2. B marcará pontos se a

diferença for 3, 4 ou 5. O jogador vencedor será o que obtiver maior número de pontos nos 20

lançamentos.

Jogador A: diferenças 0, 1 ou 2

Jogador B: diferenças 3, 4 ou 5

Usaremos uma tabela para marcar os pontos obtidos em cada rodada. Cada dupla terá um

vencedor.

Lançamento 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Total

Jogador A

Jogador B

(se possível, realizar o mesmo procedimento mais nove vezes, num total de 200 jogadas para

cada dupla)

Manter a ordem: A lança, B lança

a) Por que você escolheu ser o jogador A ou B? Por que você acha que ....... ganhou o jogo?

Você acredita que o jogador ...... venceu o jogo por ter mais sorte? (Justificar)

b) Se você pudesse trocar (jogador A passar a ser B e vice-versa) de jogador você o faria?

Acha que isso iria interferir (positiva ou negativamente) em seus resultados? Por quê?

c) Você acha que a ordem A lança, em seguida, B lança interferiu nos resultados? Se A

efetuar seus 10 lançamentos primeiro e, em seguida, B efetuar todos seus 10 lançamentos o

Page 167: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

166

resultado poderá ser diferente? Por quê? (Seriam os lançamentos seguidos que iriam

interferir nos resultados?)

Espera-se que os participantes percebam, a partir do experimento a possível vitória de A.

d) Você considera o jogo justo? Por quê? Você tem alguma sugestão de adaptação para esta

tarefa? A julga conveniente de ser trabalhada com seus alunos? Se sim, de que faixa etária?

e) Enumeremos (no quadro) todos os resultados possíveis (eventos simples ou elementares)

que podem ser resultado do lançamento de dois dados simultaneamente.

(neste momento é provável que os professores sugiram uma maneira de organizar os dados,

possivelmente uma tabela ou um diagrama de árvore. Mas não será exigida esta maneira de

organização, a princípio. Se eu tivesse que sugerir, usaria uma tabela como as que usamos

em 7º ano, ao trabalharmos as operações com inteiros. Seria legal, para organizarmos todos

os eventos.)

Tarefa: Encontrar uma forma de tornar o jogo mais justo, ou seja, criando uma maneira de

tornar o número de possibilidades de B vencer o jogo ser igual ao de A vencer.

A B 1 2 3 4 5 6

1

2

3

4

5

6

Propósitos do encontro:

- estudar as noções de aleatoriedade, acaso, equiprobabilidade, azar e sorte.

- Começar com experimentos que remetam à ideia de par ordenado, para posteriormente

trabalhar espaço amostral (conjunto de todos os possíveis resultados para um experimento

aleatório).

Questões: O cálculo de probabilidades é o estudo de fenômenos aleatórios. Mas o que é o

acaso? É uma propriedade dos fenômenos para os quais aplicamos esta definição? De onde

surge esta idéia?

Page 168: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

167

A aleatoriedade

a. Apresentar as seguintes experiências ao grupo e pedir que analisem cada uma e respondam

quais podem ser consideradas como aleatórias, justificando sua resposta:

- Tirar uma carta de um baralho brasileiro (52 cartas) e observar se é uma carta de espada.

- Observar se nas próximas 24 horas sai o sol.

- Colocar água no congelador e observar se ela congela quando a temperatura atinge 0º.

- Lançar uma bola de basquete a um cesto (dentro de uma quadra de basquete) e observar se

ela entra.

- Deixar cair um ovo do terceiro andar de um prédio e verificar se ele se quebra ao tocar o

solo.

b. Em uma sacola temos 3 bolas amarelas, 4 azuis e 1 verde. Indique com uma cruz na tabela

a seguir o tipo de evento na experiência de tirar uma bola da sacola e anotar sua cor:

c. Um dado tem 2 faces pintadas de verde, 2 faces pintadas de amarelo e 2 faces pintadas de

vermelho. Fernanda e Alice combinam: a primeira ganha se sai verde e a segunda se sair

amarelo ou vermelho. Qual é a probabilidade de que cada uma delas ganhe ao lançar o dado?

propor ao grupo que pense em como acham que seus alunos responderiam às essas tarefas.

Deixar que levantem suas hipóteses ou suas crenças acerca do que pensam que aconteceria e

depois proponha: e se verificássemos isso? Se o grupo parecer interessado, propor que cada

professora aplique essa sequência de três tarefas a pelo menos uma de suas classes, inclusive a

pesquisadora. Nos próximos encontros, o grupo analisará as respostas.

Analisando a ‘trapaça’ no jogo de moedas

A professora Bruna pediu a alguns alunos que jogassem, cada um deles, uma moeda 150

vezes. Eles deveriam registrar C quando saísse cara e + quando saísse coroa. Alguns fizeram

Certo Possível Impossível

Tirar uma bola azul

Tirar uma bola vermelha

Tirar uma bola que não seja azul

Tirar uma bola que não seja vermelha

Page 169: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

168

corretamente. Outros, ficaram com um pouco de preguiça e trapacearam. Estes são os

resultados de Daniel e Diana:

Daniel:

c+c++cc++cc+c+c++c++c+ccc+++ccc++c++c+c+c++cc+ccc+c+c+cc+++cc++c+c+

+cc+c++cc+c++cc+cc+c+++c++cc++c++c+c+cc+c++cc+c+c++ccc+cc++c+c++cc+

++c+++c+c++ccc++

Diana:

+cc+++c++++c+cc+++cc+cc+++cc+ccc+++c++++++c+c+c+c++++cccccc+ccc+c+

cc+ccccc+ccc++ccc+c+ccccccccc++c+ccccccc+++++cccc++c+c+cc+cc+cc++++++c+

cc++ccc++ccc

Será que algum deles trapaceou? Por quê? Qual é a solução correta para o problema? Acredita

que alunos da Educação Básica se interessariam por este problema? O que você faria para

torná-lo, por exemplo, mais interesssante ou mais difícil?66

Analise agora as respostas dadas por 277 alunos de 14 e 18 anos de idade à mesma situação67

.

Tabela 1. Freqüências e porcentagens das respostas dos estudantes à pergunta: quem

trapaceou, Daniel ou Diana?

14 anos (n=147) 18 anos (n= 130)

Daniel Diana Daniel Diana

Trapaceou 54 (37) 83 (56) 30 (23) 63 (49)

Fez corretamente 86 (58) 53 (36) 82 (63) 48 (37)

Eu não sei 7 (5) 11 (8) 18 (14) 19 (14)

a. Como você explicaria as mudanças no percentual de respostas sobre o item 1 (Quem

trapaceou: Diana ou Daniel?)?

b. Você acha que se alterássemos a representação dos resultados apresentados por Diana e

Daniel, teríamos respostas diferentes dos estudantes?

c. Por que você acha que mais alunos de 18 anos responderam “não sei” a essa questão?

66

Adaptado de Batanero, C. Didactica de la estadística, 2001, p. 21-22. 67

Situação extraída de Batanero, 2004 que menciona pesquisa feita por Serrano, 1996.

Page 170: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

169

[deixar os professores pensarem, discutirem entre si. Depois comentar o que Batanero

concluiu em seu estudo.]

Estratégias e concepções dos estudantes (texto traduzido e adaptado de Batanero, 2004)

Comentar com os professores que os resultados da pesquisa feita com esses alunos pois

mostrou algumas coisas interessantes... Ler e comentar cada parágrafo a seguir.

A porcentagem de respostas positivas ou negativas para o item 1 em cada grupo de alunos

nos fornecem algumas informações. No entanto, uma compreensão mais profunda do

raciocínio subjacente é alcançada quando analisamos os argumentos apresentados pelos

alunos para apoiar sua decisão. Algumas razões dadas por estudantes na investigação de

Serrano para justificar por que Daniel ou Diana haviam trapaceado foram os seguintes:

- o padrão de sequência é demasiado regular para ser aleatório, parece quase uma

alternação de cara e coroa;

- as frequências de caras e coroas são muito diferentes;

- existem sequências de caras ou coroas muito longas e cara e coroa devem aparecer de

modo alternado com mais frequência.

A complexidade da noção de aleatoriedade é observada nos argumentos, uma vez que

diferentes alunos focalizam sua atenção em distintas propriedades das sequências, e não se

pode classificar estritamente um argumento como correto ou errado, uma vez que ele não

apenas depende apenas de se a resposta é positiva ou negativa, mas a qual sequência se

refere.

O jogo de cartões da Paula

Paulatem um jogo composto por 16 cartões numerados de 1 a 16. Ela coloca os cartões em

uma caixa fechada e a sacode com força, misturando-os bem. Depois, retira um cartão ao

acaso e é o 7. Ela marca com uma cruz o número 7.

Page 171: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

170

Cada jogador retira uma ficha da caixa e marca o número retirado. Ele realiza o experimento

dezesseis vezes, sempre recolocando a ficha retirada na caixa antes de efetuar uma nova

retirada. Outras crianças jogaram o mesmo jogo, ainda que alguns tenham “trapaceado”.

Questões: O modelo aleatório pode ser aplicado a essas situações? Como você poderia

justificar que crianças “trapacearam”? Baseado(a) em que você retirou esta conclusão? Faça

uma lista de situações da vida real em que o modelo encontrado possa ser útil e pense em que

pessoas estão interessadas em resolver problemas semelhantes ao que foi dado.

(Adaptado de Batanero, C. Didactica de la estadística, 2001, p. 18)

O sorteio

Na escola da Bruna aconteceu uma festa e, ao final, houve um sorteio de prêmios. Vamos

tentar descobrir se todas as pessoas REALMENTE têm a mesma chance de ganhar?

Em quatro papeizinhos iguais cada professora escreve o nome de cada uma das presentes.

Dobrar todos do mesmo modo e colocar cada um em um recipiente de plástico transparente

(idênticos), em seguida, em um saco que não seja transparente. Ir pedindo que cada professora

tire um papelzinho do saco – com reposição – e registrar o nome que sai. Fazer isso pelo

menos 100 vezes (se não estiver muito cansativo, 150 vezes ou mais).

Analisar os resultados com o grupo.

Depois, dar um pequeno prêmio para cada uma, comentando que, segundo o experimento,

cada uma teria a mesma chance de ganhar, logo, nesse encontro, todas ganhariam .

Page 172: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

171

Tarefa de casa... O astrólogo e sua sentença de morte (SILVA FILHO, 1999).

Conta a lenda que um príncipe se revoltou contra o seu astrólogo e suas promessas vãs, e

resolveu executá-lo. No entanto, como bom príncipe, ele resolveu dar uma última chance ao

astrólogo. O astrólogo estava autorizado a repartir quatro bolas, duas brancas e duas pretas,

entre duas urnas. O carrasco escolheria uma destas urnas e tiraria uma bola: se a bola fosse

preta, o astrólogo seria executado, senão sua vida estava salva. Pergunta-se, então: como o

astrólogo deveria colocar as bolas nas urnas, de forma a ampliar suas chances de

sobreviver?

Probleminhas

Ideias mobilizadas nestas atividades: Comparação de probabilidades, possibilidade de

trabalhar com comparação de frações (que é importante para desenvolvimento do raciocínio

proporcional), possibilidade de trabalhar com a Regra de Laplace, mobilizar concepções

sobre experimento aleatório, utilização de um espaço amostral para organizar e facilitar a

análise, associar os casos favoráveis ao sucesso, os desfavoráveis ao fracasso e considerar o

número total de bolas/fichas, realizando comparações.

Problema 1. Em uma caixa A há 3 fichas pretas e 1 branca. Em uma caixa B há 2 fichas

pretas e 1 branca. Se você tivesse que retirar uma ficha preta para ganhar um prêmio, sem

olhar dentro da caixa, que caixa você escolheria para retirar uma ficha?

Por quê?

Problema 2. Outras duas caixas tem em seu interior algumas fichas pretas e algumas fichas

brancas.

Caixa C: 5 pretas e 2 brancas Caixa D: 5 pretas e 3 brancas

Que caixa ( C ou D ) dá maior probabilidade de se retirar uma ficha preta?

Ou, pelo contrário, as duas dão a mesma probabilidade?

Por quê?

Problema 3. Outras duas caixas diferentes tem fichas pretas e fichas brancas.

Caixa E: 2 pretas e 2 brancas Caixa F: 4 pretas e 4 brancas

Que caixa dá maior probabilidade de se retirar uma ficha preta?

Por quê?

Page 173: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

172

Problema 4. Alice tem 10 anos. Em sua caixa há 40 bolas brancas e 20 pretas. Rosileni tem 8

anos. Em sua caixa há 30 bolas brancas e 15 pretas. Cada uma retira uma bola de sua própria

caixa sem olhar. Paula diz que Alice teve maior probabilidade de retirar uma bola branca

porque ela é maior, e portanto é a mais inteligente das duas. Qual é a sua opinião sobre isso?

Problema 5. Ana tem em sua caixa 10 bolas brancas e 20 pretas. Bruna tem em sua caixa 30

bolas brancas e 60 pretas. A ganhadora será aquela que retirar primeiro uma bola branca. Se

ambas retirarem uma bola branca ou uma bola preta simultaneamente, ninguém ganha, elas

devolvem as bolas à caixa e o jogo continua. Ana afirma que o jogo não é justo porque na

caixa de Bruna há mais bolas brancas do que na sua. Qual é a sua opinião sobre isso?

Problema 6. Outras duas caixas diferentes tem fichas pretas e fichas brancas.

Caixa G: 12 pretas e 4 brancas

Caixa H: 20 pretas e 10 brancas

Que caixa dá maior probabilidade de se retirar uma ficha preta?

a) Caixa G

b) Caixa H

c) As duas caixas dão a mesma probabilidade________

d) Não sei.

Por quê?_____________________________________________________________

Problema 7. Outras duas caixas diferentes das anteriores tem fichas pretas e fichas brancas.

Caixa J: 7 pretas e 5 brancas

Caixa K: 5 pretas e 3 brancas

Que caixa dá maior probabilidade de se retirar uma ficha preta?

a) Caixa J

b) Caixa K

c) As duas caixas dão a mesma probabilidade________

d) Não sei.

Por quê?_____________________________________________________________

Page 174: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

173

Atividade: A escolha de um carro para comprar

Um cliente vai a uma loja de carros usados para comprar um carro e percebe que o modelo

que ele procura, todos com o mesmo ano de fabricação, está disponível em três cores

diferentes: vermelho, preto e prata. No pátio da loja há 2 veículos vermelhos, 4 pretos e 1

prata. Gostando das três cores e com a informação de que todos os carros são exatamente

iguais, com exceção da cor, decide escolher ao acaso uma chave na mesa do vendedor e

comprar o carro. Qual é a probabilidade de que ele compre um carro prata? Justifique.

Discutindo algumas questões:

a) A escolha da chave é feita ao acaso? Justifique.

b) Podemos escrever todas as possibilidades de resultados antes da escolha da chave? Se

sim, quais? Se não, justifique.

c) Se a cada carro vendido pudermos supor que a loja repõe a cor vendida de forma a

manter o estoque sempre o mesmo, podemos repetir o processo de escolha da chave ao

acaso tantas vezes quantas desejarmos, sempre nas mesmas condições. Neste caso, que

característica identificaríamos neste experimento?

O que quero com esta atividade?

Calcular a probabilidade a partir do enfoque clássico; explorar a ideia de eventos dependentes,

a união e a interseção de eventos e a negativa de um evento(complemento).

Atividade: Adivinhando as fichas

(realizar o jogo) Uma professora(pesquisadora) apresenta às demais três fichas com a mesma

forma e tamanho, das quais uma é vermelha em ambos os lados, outra tem um lado azul e o

outro vermelho e a terceira é azul em ambos os lados. A professora coloca as três fichas em

uma caixa e a balança por um tempo antes de retirar uma das três fichas de forma aleatória.

Apresenta às outras professoras, em seguida, uma das faces da ficha selecionada, mantendo o

outro lado coberto, pedindo aos estudantes para adivinhar a cor do lado escuro. Uma vez que

as apostas foram feitas, a professora mostra o lado escuro. Cada professora que tenha acertado

na previsão feita ganha um ponto. Trata-se de encontrar a melhor estratégia para se jogar este

jogo.

1. Que tipo de raciocínio que você fez (ou faria) para confirmar que sua estratégia

é ótima? Um argumento com base na experimentação é igualmente válido a

um argumento formado com base em considerações lógicas e combinatórias?

Page 175: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

174

2. Você pode provar que sua estratégia é a melhor utilizando apenas

experimentação? Há alguma maneira de formalizar sua estratégia?

O que quero com esta atividade?

Encontrar a melhor estratégia para se jogar este jogo, desenvolver o pensamento

probabilístico. Reforçar as ideias de chance, acaso, aleatoriedade. Criar uma discussão a partir

das ideias de sorte e azar.

(Adaptado de Batanero, C. Didactica de la estadística, 2001, p. 30)

Atividade : Moedas dependentes.

Um saco contém 7 moedas. A saber de R$1,00; R$0,50; R$0,50; R$0,50; R$0,10; R$0,10;

R$0,10. Retiramos duas moedas ao acaso. Qual é o valor esperado de sua soma? Será que a

soma dependerá se o valor da primeira moeda é substituído ou não? Por quê?

(Adaptado de Batanero, C. Didactica de la estadística, 2001, p. 32)

Realizar a atividade já realizada no 6º encontro, o sorteio com nomes das professoras dentro

de embalagens plásticas transparentes de balas (tic tac). O objetivo, ao realizar o sorteio mais

150 vezes, é verificar se teremos a mesma ganhadora. Será interessante escrever novamente

os nomes, na frente das professoras.

Repetição da atividade: O sorteio

Na escola da Bruna aconteceu uma festa e, ao final, houve um sorteio de prêmios. Vamos

tentar descobrir se todas as pessoas REALMENTE têm a mesma chance de ganhar?

Utilizar quatro papeizinhos iguais e escrever, na frente das professoras, o nome de cada uma

das presentes, inclusive o da pesquisadora Fernanda. Dobrar todos do mesmo modo e colocá-

los dentro de recipientes transparentes idênticos (caixinha de tic tac), depois em um saco que

não seja transparente. Pedir que cada professora retire uma caixinha do saco – com reposição

– e registrar (pedir a cada uma delas para fazer isso 70 vezes, inclusive a pesquisadora

Fernanda) o nome que sai. Cada uma terá material individual idêntico.

Analisar os resultados com o grupo. Observar e tomar nota das ideias levantadas pelas

professoras.

Desafios

a. Uma moeda “honesta” é lançada 3 vezes. Qual é a probabilidade de sair 2 caras?

Page 176: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

175

b. O que é mais provável: Duas caras no lançamento de 4 moedas ou uma face 6 no

lançamento de dois dados? Justifique.

-O que quero com esta atividade: Calcular a probabilidade a partir do enfoque clássico;

explorar a ideia de eventos dependentes, a união e a interseção de eventos e a negativa de um

evento (complemento). Os professores, ao realizarem a atividade com probabilidade proposta,

podem aproveitar para relacionar um possível experimento com as aulas de geometria sobre

figuras geométricas, além de frações, divisão com resultado decimal e porcentagem.

As peças coloridas

Em uma caixa não transparente há várias peças em formato de figuras geométricas, conforme

a tabela a seguir:

Circulares Quadradas Triangulares Total

Azul 15 12 6 33

Amarela 5 8 4 17

Vermelha 20 5 10 35

Total 40 25 20 85

Sorteando-se uma das peças desta caixa, qual a probabilidade de que ocorra uma peça:

a) triangular

b) amarela quadrangular c) não circular

d) não vermelha e) circular não vermelha f) não circular e não

vermelha

Explique seu raciocínio em cada questão.

As questões a seguir, foram baseadas no texto Razonamiento Probabilístico En La Vida

Cotidiana: Un Desafio Educativo de Carmen Batanero (Raciocínio Probabilístico na Vida

Cotidiana: Um Desafio Educativo), com tradução da pesquisadora.

Fragmentos de textos que envolvem Probabilidade/Pensamento Pobabilístico

Em 1964, quando uma mulher idosa que estava caminhando de volta para casa em um

subúrbio de Los Angeles, foi assaltada por uma jovem loira com rabo de cavalo. A jovem foi

vista logo depois, em um carro amarelo dirigido por um homem negro, com uma barba e

bigode. A polícia de Los Angeles prendeu Janet Collins, loira, que estava com um penteado

Page 177: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

176

com um rabo de cavalo e tinha um amigo negro, com uma barba e bigode, que tinha um carro

amarelo. O promotor argumentou que a probabilidade de encontrar no Angeles um casal que

teve todas as características mencionadas foi de apenas 1/12000000, e isso provou a culpa dos

detidos. O que você acha desta probabilidade? Você considera a prisão justa?

No Reino Unido, Sally Clark foi acusada de assassinar seus filhos quando dois deles sofreram

sucessivamente de morte súbita do recém-nascido. Sally foi separada de sua família e foi

presa por três anos até que um juiz decidiu rever todos os casos de morte súbita e observou

que a cada ano no Reino Unido cerca de 50 casamentos que haviam perdido um filho por

morte súbita, perdiam um segundo. Sally Clark foi então declarada inocente, mas ninguém

poderia retornar os três anos de vida familiar perdidos.

Questões:

* Você acredita que o cálculo de probabilidades possa contribuir para decisões judiciais

corretas? ( ) sim ( ) não. Se sim, que medidas seriam necessárias para que a probabilidade

calculada se torne consistente não apenas através do resultado numérico obtido?

* Você acredita que o indivíduo que possui algum conhecimento sobre o cálculo de

probabilidades poderá utilizá-lo a seu favor (ou defesa) em alguma situação cotidiana? Se

sim, escreva um exemplo.

* Nesse contexto, é possível que o desenvolvimento do pensamento probabilístico possa

contribuir para a formação de um indivíduo mais crítico e atuante na sociedade? Por quê?

Outro exemplo de confusão de uma probabilidade condicional e sua transposta aparece em

situações de diagnóstico médico, onde estas probabilidades podem ser substancialmente

diferentes, acima de tudo nos casos de campanhas de massa, onde toda a população está

sujeita a exames médicos preventivos. Um dos casos recentemente controversos é o da

política de realizar mamografias anuais para mulheres a partir de 40 anos. A seguir

discutiremos este caso, para essa faixa etária, limitando-nos aos casos que não apresentam

nenhum outro sintoma ou histórico familiar ou outro que possa indicar maior probabilidade de

câncer entre 40 e 49 anos; a probabilidade em mulheres mais velhas ou com outras

características pode variar. No caso de uma mulher americana entre 40 e 50 anos, sem

sintomas, a probabilidade de ter câncer de mama é de 0,8%. Se uma mulher tem câncer de

mama, tem uma mamografia positiva com probabilidade de 90%. Também, em 7% de

Page 178: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

177

mulheres saudáveis dão positivas as mamografias. Suponha que uma mamografia seja

positiva, qual é a probabilidade de que a mulher tenha na verdade câncer de mama? A pessoa

que recebe este resultado positivo pode ter um susto, pensando que essas probabilidades são

altas ou não diferenciar as probabilidades condicionais "tem a mamografia positiva, tem

câncer de mama" e "tem câncer de mama, se tiver a mamografia positiva”. Calculemos essa

segunda probabilidade, ajudados por um esquema em forma de árvore e pensando em termos

de frequências absolutas, para o qual consideramos um grupo de 100.000 mulheres com estas

características.

Textos complementares para reflexão sobre os raciocínios apresentados

O texto que segue é parte de um artigo intitulado “RACIOCÍNIO PROBABILÍSTICO NA

VIDA COTIDIANA: UM DESAFIO EDUCATIVO” (Fragmentos do artigo-tradução livre da

pesquisadora) de Carmen Batanero. Após sua leitura, discutiremos as respostas das questões

propostas. Vejamos a seguir o resumo do artigo:

RESUMO

A chance é inerente em nossas vidas e aparece em muitas situações cotidianas ou da vida

profissional. Mas as intuições de probabilidade, muitas vezes nos enganam e uma educação

formal é insuficiente para superar os vieses de raciocínio deixados, o que pode levar a

decisões incorretas. Este artigo defende a necessidade de reforçar a formação do raciocínio

probabilístico em alunos do ensino primário e secundário e, assim, proporcionar uma

instrumento que oriente a ação diante da incerteza (...) nas decisões e juízos de probabilidade

da vida cotidiana nos deixamos levar pela intuição que, muitas vezes, nos engana e não

cometemos enganos que geralmente não são corrigidos simplesmente com uma aprendizagem

formal de probabilidade (Shaughnessy, 1986). A seguir discutimos alguns exemplos.

Falácia do Ministério Público

Suponhamos que você tenha cometido um assalto e se encontra uma amostra de material

genético (como sangue) na cena do crime. Esta amostra foi comparada com os dados

disponíveis em 20000 casos de registros policiais e se encontra uma coincidência entre o

DNA da amostra e o da pessoa A, cujos dados estão nos registros. Suponha-se que a

probabilidade de encontrar uma pessoa ao acaso com este tipo de DNA é de apenas 1 em

10.000. Podemos considerar que a pessoa A é culpada pelo roubo?

Page 179: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

178

Claro que não! A probabilidade de que entre os 20.000 casos registrados apareça pelo menos

uma coincidência com a amostra de DNA é bastante elevada, exatamente

%8610000

111

20000

. Seria equivocado condenar a pessoa A com esta única evidência. No

entanto, este erro, conhecido como “A falácia do Ministério Público”, aparece com

frequência em processos judiciais ou na imprensa. Por exemplo, o jornal el País publicou em

Setembro de 2003 uma notícia sobre os resultados da análise de DNA dos restos encontrados

no corpo de Sonia Carabantes, afirmando que a probabilidade de que estes pertencessem à

mesma pessoa que havia deixado suas impressões digitais genéticas um cigarro encontrado

junto ao corpo de Rocio Wanninkhof era de 99.999997%.

A razão é que, ao comparar a amostra com seus arquivos, a Polícia encontrou uma

coincidência com as encontradas no citado cigarro (Corberán y Montes, 2003). É possível que

outros tipos de evidências envolvessem a mesma pessoa em ambos os casos, mas a

probabilidade calculada pelo jornal el País estava incorreta. Algumas falhas no raciocínio

(geralmente o raciocínio que leva à falácia do Ministério Público são):

• Tomar uma pessoa ou um caso dos arquivos policiais não é o mesmo que tomar uma pessoa

ao acaso, da população; pode não atender o pressuposto de independência.

• Tem se investido em uma probabilidade condicional. Considere os eventos: A "segurar um

certo DNA "e B" escolher uma pessoa aleatória na população.”Podemos, a partir deles

calcular duas probabilidades condicionais P (A / B) , “tomando um indivíduo extraído

aleatoriamente da população, que essa pessoa tenha o DNA dado ", e P (B / A):" tomar um

certo DNA, que uma pessoa escolhida aleatoriamente da população o tenha. "

A probabilidade calculada pelo jornal el País foi 1 - P (B / A), uma vez que a pessoa

envolvida no caso Carabantes tinha o DNA estudado, foi a probabilidade de que essa pessoa

não fosse uma pessoa qualquer, tomada ao acaso a partir da população. Uma vez que a

probabilidade é muito elevada, P (noB / A) = 1-P (B / A) = 99,999997% o resultado deduzido

foi que a pessoa não era aleatória, mas a mesma envolvida no caso anterior.

No caso acima mencionado, você pode ter outras provas que envolvessem a mesma pessoa em

ambos os crimes, o comentário acima refere-se apenas ao equilíbrio das probabilidades

utilizadas em um jornal nacional, mostrando um exemplo da assim chamada falácia

condicional (Falk, 1989), que consiste em confundir utilizando a probabilidade condicional P

Page 180: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

179

(A / B) e P (B / A). No entanto, a falácia do procurador tem alguns casos notórios por

processar um inocente (Schuman, 1987).

Um deles ocorreu em 1964, quando uma mulher idosa que estava caminhando de volta para

casa em um subúrbio de Los Angeles, foi assaltada por uma jovem loira com rabo de cavalo.

A jovem foi vista logo depois, em um carro amarelo dirigido por um homem negro, com uma

barba e bigode. A polícia de Los Angeles prendeu Janet Collins, loira, que estava com um

penteado com um rabo de cavalo e tinha um amigo negro, com uma barba e bigode, que tinha

um carro amarelo. O promotor argumentou que a probabilidade de encontrar no Angeles um

casal que teve todas as características mencionadas foi de apenas 1/12000000, e isso provou a

culpa dos detidos.

Felizmente o defensor, utilizando dados estatísticos de freqüência das características do par

(por exemplo, a freqüência de carros amarelos) provou que a probabilidade de encontrar pelo

menos um outro par a mais com as mesmas características deles na cidade de Los Angeles foi

0,1836, o que não pode ser considerado um evento raro. Joan Collins foi absolvido por falta

de provas.

Em outros casos, os réus foram menos afortunados. Por exemplo, Sally Clark, foi acusada no

Reino Unido de assassinar seus filhos quando dois deles sofreram sucessivamente de morte

súbita do recém-nascido. Sally foi separada de sua família e foi presa por três anos até que um

juiz decidiu rever todos os casos de morte súbita e observou que a cada ano no Reino Unido

cerca de 50 casamentos que haviam perdido um filho por morte súbita, perdiam um segundo.

Sally Clark foi então declarada inocente, mas ninguém poderia retornar os três anos de vida

familiar perdidos.

3.2 Avaliação dos Riscos médicos em ensaios clínicos de prevenção em massa

Outro exemplo de confusão de uma probabilidade condicional e sua transposta aparece em

situações de diagnóstico médico, onde estas probabilidades podem ser substancialmente

diferentes, acima de tudo nos casos de campanhas de massa, onde toda a população está

sujeita a exames médicos preventivos. Um dos casos recentemente controversos é o da

política de realizar mamografias anuais para mulheres a partir de 40 anos. A seguir

discutiremos este caso, para essa faixa etária, limitando-nos aos casos que não apresentam

nenhum outro sintoma ou histórico familiar ou outro que possa indicar maior probabilidade de

câncer entre 40 e 49 anos; a probabilidade em mulheres mais velhas ou com outras

características pode variar. No caso de uma mulher americana entre 40 e 50 anos, sem

Page 181: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

180

sintomas, a probabilidade de ter câncer de mama é de 0,8%. Se uma mulher tem câncer de

mama a probabilidade de ter uma mamografia positiva(com diagnóstico) é de 90%. Também,

em 7% de mulheres saudáveis dão positivas as mamografias. Suponha que uma mamografia

seja positiva, qual é a probabilidade de que a mulher tenha na verdade câncer de mama?

(Eddy, 1982).

A pessoa que recebe este resultado positivo pode ter um susto, pensando que essas

probabilidades são altas ou não diferenciar as probabilidades condicionais "tem a mamografia

positiva tem câncer de mama" e "tem câncer de mama, se tiver a mamografia positiva”.

Calculemos essa segunda probabilidade, ajudados por um esquema em forma de árvore e

pensando em termos de frequências absolutas, para o qual consideramos um grupo de 100.000

mulheres com estas características (Figura 1).

Com a proporção assumida de câncer na população, cerca de 800 dessas mulheres estariam

doentes e delas 720 seriam detectadas na mamografia (90%). 7% delas receberiam um

resultado positivo, mesmo se elas estivessem saudáveis (falso positivo), representando um

total de 6944 mulheres. No total, existem 7664 mamografias positivas das 100.000 mulheres,

aproximadamente, a maioria das quais são realmente de indivíduos saudáveis,

Figura 1. Partição da população assumiu de 100000 mulheres

Simplesmente mediante a aplicação de regra de Laplace, obtém-se que a probabilidade de que

a mulher que recebe um resultado positivo, na verdade tem câncer é a relação 720/7664 que

dá um valor de 0,0939, ou seja, apenas 9% das mulheres que obtêm uma mamografia positiva

neste grupo etário são realmente doentes.

O resultado pode parecer surpreendente e é devido à elevada taxa de mulheres saudáveis da

população que realiza o teste anualmente, levando a um número tão grande de tais falsos

positivos. Além disso, mesmo para mulheres com câncer o teste não é conclusivo, uma vez

que em cerca de 10% dos casos, não é detectada (falsos negativos). As chances poderiam ser

Page 182: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

181

muito diferentes se a taxa de pacientes doentes na população fosse mais elevada (por

exemplo, se fosse para detectar a gripe, ou se a probabilidade de falsos positivos fosse menor

(por exemplo, em mulheres mais velhas).

Os dois exemplos analisados mostram dramaticamente as potenciais consequências de uma

intuição pobre sobre a probabilidade e a importância das possíveis decisões que tomamos em

situações de incerteza. Como afirmado por Fischbein (1975) a distinção entre acaso e dedução

não é feita de forma espontânea e completamente ao nível das operações formais, pois é

influenciada pelas condições culturais e educacionais da sociedade moderna que orientam o

pensamento em direção a explicações deterministas. A pesquisa em ensino de probabilidade

mostra a prevalência dessas intuições erradas (Shaughnessy, 1992; Jones, 2005).

Além disso, os conceitos probabilísticos, mesmo aparentemente simples, são altamente

complexos, porque cada um deles descreve um processo contínuo, estão ligados entre si, e sua

compreensão exige um longo período, que geralmente não é levado em conta (Gal, 2005).

Implicações para o ensino de probabilidade

Um olhar sobre a história permite também tomar consciência do lento desenvolvimento da

probabilidade como conceito matemático e dos múltiplos significados que ainda recebe,

alguns dos quais nós resumimos na Tabela 2 (Batanero, 2005). Em consequência, a

probabilidade deve ser apresentada a partir de perspectivas diferentes, que estão

dialeticamente relacionadas, e cada uma das quais contribui com uma parte para a

compreensão global do conceito: razão a priori de possibilidades a favor e contra, as provas

apresentadas pelos dados, o grau de crença pessoal e um modelo matemático que nos ajude a

compreender a realidade.

Os exemplos discutidos indicam a importância de que o ensino de probabilidade sirva para

desenvolver o raciocínio probabilístico necessário para enfrentar a aleatoriedade na vida diária

e melhorar intuições dos alunos. O estado atual do tecnologia permite que as simulações e as

experiências que ajudam os alunos a resolver os paradoxos que surgem mesmo em problemas

de probabilidade aparentemente simples e poderiam servir para explorar situações

probabilísticas da vida real, sem necessidade de um elevado nível de formalização.

É claro que uma abordagem puramente experimental para o ensino de probabilidade não é

suficiente. Mesmo quando a simulação nos ajuda a encontrar a solução de problemas de

probabilidade que surgem na vida real, não se pode provar que esta solução é a mais

adequada, pois a simulação depende das suposições feitas com antecedência e do modelo

Page 183: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

182

teórico que foi implementado no computador. Um conhecimento verdadeiro de probabilidade

só será alcançado através do estudo de alguma probabilidade formal, embora este estudo deva

ser gradual e apoiado na experiência estocástica dos alunos.

É também importante mostrar aplicações para além da teoria dos jogos, em Godino et al.

(1987) apresentamos uma grande variedade de aplicações reais da probabilidade com

atividades simples que podem introduzir os conceitos de forma gradual ao longo de toda a

escolaridade obrigatória. Alguns professores se perguntam se vale a pena dedicar mais tempo

ao ensino de probabilidade, e se não seria melhor insistir em outros temas matemáticos que

poderiam ter uma aplicação mais ampla.

Para terminar vou repetir as palavras de Laplace

(1986/1825, p 206-207.): A teoria da probabilidade é, no fundo, nada além de um senso

comum reduzido a cálculo, nos permite ver com exatidão aquilo que as mentes rigorosas

podem sentir como uma espécie de instinto que às vezes não consigo explicar; ensina-nos a

evitar as ilusões que muitas vezes nos enganam ... não há ciência mais digna de nossa

contemplação, nem mais útil para ser incluída em nosso sistema educação pública. ".

Atividade 1: Retomando a discussão da tarefa: O astrólogo e sua sentença de morte (SILVA

FILHO, 1999)68

.

Conta a lenda que um príncipe se revoltou contra o seu astrólogo e suas promessas vãs, e

resolveu executá-lo. No entanto, como bom príncipe, ele resolveu dar

uma última chance ao astrólogo. O astrólogo estava autorizado a

repartir quatro bolas, duas brancas e duas pretas, entre duas urnas de

maneira que, em cada urna, fosse colocada pelo menos uma bola. O

carrasco escolheria uma destas urnas e tiraria uma bola: se a bola fosse preta, o astrólogo seria

executado, senão sua vida seria salva. Pergunta-se, então: como o astrólogo deveria colocar

as bolas nas urnas, de forma a ampliar suas chances de sobreviver?

Utilizar as bolinhas para ilustrar as possíveis soluções. Levar venda para realizar o

experimento.

[1ª situação: Fernanda, Alice e Paula→Alice = astrólogo, Paula = carrasco. Levar papel

(bloquinho) ou fazer no caderno de campo o desenho das urnas com as bolas dentro. O

astrólogo anota como distribuiu as bolas dentro das urnas.

68

SILVA FILHO, H., Uma Proposta do Ensino da Probabilidade no Nível Médio, Projeto Final de Curso de

Licenciatura em Matemática, UERJ, Rio de Janeiro, 1999.

Page 184: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

183

2ª situação: Fernanda, Alice, Bruna e Paula →Bruna = astrólogo, Paula = carrasco e Fernanda

= astrólogo e Alice = carrasco. Fazer o desenho das urnas com as bolas dentro no quadro.]

Levar uma venda para o carrasco. Realizar várias vezes a fim de verificar uma tendência.

A seguir, verificar se algumas delas pensou em uma maneira diferente de se calcular a

Probabilidade ou de se listar todos os possíveis eventos, como por exemplo, a árvore de

possibilidades ou o espaço amostral. Se não, propor a construção no quadro. Depois, trabalhar

com todos os eventos possíveis nesse caso e analisar o que aconteceria.].

2º Momento: Atividades para Análise e discussões a partir das respostas de alunos a

Atividades adaptadas de Santos (2010).

Classificando eventos

1- Roda-se uma tômbola de jogo com número de 1 a 90. Considerando os resultados

possíveis deste jogo, classifique com uma das palavras da lista abaixo, cada um dos

acontecimentos seguintes:

Impossível

Pode ser

Possível

Bastante provável

Certo

Se espera que

Seguro

Há alguma possibilidade

Há alguma probabilidade

Incerto

a) Sair um número ímpar:

b) Sair um número menor do que 91:

c) Sair o número 100:

d) Sair um número maior do que 0:

e) Sair o número 31:

2- Retira-se uma bola, ao acaso, de uma caixa que contém 4 bolas azuis, 7 vermelhas e 3

verdes. Referindo-se aos possíveis resultados desta experiência, apresente um exemplo de

acontecimento: a) Impossível:

Page 185: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

184

b) Possível:

c) Pode ser:

d) Bastante provável:

e) Se espera que:

f) Sem dúvida:

g) Há alguma possibilidade:

h) Há alguma probabilidade:

i) Certo:

j) Seguro:

3- As bolas de tênis coloridas: Em uma vitrine de uma loja de esportes há alguns recipientes

transparentes com bolas de tênis coloridas69

. Veja o desenho abaixo, representando a vitrine.

a) Suponha que você fosse retirar, sem olhar, uma bola do recipiente 3. Qual a cor de bola que

provavelmente você iria retirar? Por quê?

b) De qual recipiente seria mais provável retirar (sem olhar) uma bola verde? Justifique sua

resposta.

c) Seria mais fácil retirar uma bola vermelha do recipiente 2 do que do recipiente 1? Explique

o porquê de sua resposta.

4- Qual a probabilidade, ao lançar dois dados e somar os números obtidos, de que o resultado

seja:

- Um número par?

- Um número ímpar?

- O número 1?

5- Na tarefa anterior é possível saber qual resultado tem maior probabilidade de sair?

Justifique sua resposta.

6- Uma classe tem 19 alunos. Há 11 meninas e 8 meninos. Se você escrever o nome de cada

um dos alunos em um papel, colocá-los num saco e retirar um nome ao acaso, o que considera

69

Para facilitar a impressão autora substituiu as bolas de cores verdes por brancas e as bolas de cores vermelhas

por pretas.

Page 186: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

185

que seja mais provável? Assinale, dentre as alternativas abaixo, a que esteja de acordo com

seu pensamento: a) que o nome seja de um menino;

b) que o nome seja de uma menina;

c) a probabilidade de o nome ser de um menino é a mesma de o nome ser de uma menina;

d) não sei responder.

Por quê?

Analisando respostas de alunos

A seguir, são apresentados os quadros com as respostas dos alunos nas tarefas.

Quadro da Tarefa 1: Análise dos acontecimentos

Acontecimento Respostas dos alunos

Page 187: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

186

Page 188: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

187

Page 189: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

188

Grupo de Estudos sobre Probabilidade Alguns conceitos importantes

(atividades respondidas pelos alunos das professoras do grupo cujas respostas seriam

discutidas no mesmo)

Nome(s): __________________________________________________

1. Leia cada tarefa cuidadosamente e faça o que se pede:

a. Considere as seguintes experiências e respondam, para cada uma delas: pode ser

considerada aleatória? Por quê?

-Tirar uma carta de um baralho brasileiro (52 cartas) e observar se é uma carta de espada.

-Observar se nas próximas 24 horas sai o sol.

-Colocar água no congelador e observar se ela congela quando a temperatura atinge 0º.

-Lançar uma bola de basquete a um cesto (dentro de uma quadra de basquete) e observar se

ela entra.

-Deixar cair um ovo do terceiro andar de um prédio e verificar se ele se quebra ao tocar o

solo.

b. Em uma sacola temos 3 bolas amarelas, 4 azuis e 1 verde. Indique com uma cruz na tabela

a seguir o tipo de evento na experiência de tirar uma bola da sacola e anotar sua cor:

c. Um dado tem 2 faces pintadas de verde, 2 faces pintadas de amarelo e 2 faces pintadas de

vermelho. Fernanda e Sônia combinam: a primeira ganha se sai verde e a segunda se sair

amarelo ou vermelho. Qual é a probabilidade de que cada uma delas ganhe ao lançar o dado?

O problema das portas

Um professor de matemática sugeriu a seguinte questão para uma turma de alunos da

Educação Básica:

Certo Possível Impossível

Tirar uma bola azul

Tirar uma bola vermelha

Tirar uma bola que não seja azul

Tirar uma bola que não seja vermelha

Page 190: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

189

Suponha que você seja um participante de um programa de auditório, e o apresentador

mostra a você três portas fechadas. Ele diz que atrás de uma das portas está um carro, e

atrás das outras duas há apenas cabras. Se você escolher a porta certa, ganha o carro – caso

contrário levará apenas uma cabra.

Você escolhe uma das portas. O apresentador, então, sem abrir a porta que você escolheu,

dirige-se para uma das outras duas portas que sobraram. Como ele sabe em qual das três

portas está o carro, ele então abre uma das duas portas que você não tinha escolhido –

exatamente uma porta que escondia uma cabra. Restaram então apenas duas portas

fechadas: aquela que você tinha escolhido, e uma outra que não foi aberta pelo apresentador.

Atrás de uma delas está o carro.

O apresentador então pergunta se você quer manter a escolha original ou se quer, agora,

trocar de porta, escolhendo a outra que ele não abriu e que pode conter o carro.

O que você deve fazer:

1 – manter a escolha original, ou

2 – trocar de porta ?

Atenção: a posição do carro e das cabras não muda durante o programa, está definida no

início e permanece a mesma durante a rodada inteira.

A aluna Carolina respondeu:

Ora, tanto faz, obviamente. Como continuo sem saber em qual porta está o carro, a chance é a

mesma de ele estar em qualquer uma das duas portas que ainda estão fechadas. É claro que o

fato do apresentador ter aberto uma das portas onde está uma cabra não altera em nada minhas

chances – como poderia ????? Tenho pela frente duas portas a escolher, e minha chance é de

50% de escolher a porta certa. Tanto faz. Jogo uma moeda ou escolho na base da "minha mãe

mandou abrir esta daqui..." e pronto, oras !!!

O aluno Pedro respondeu:

Professor, eu acho que não deveria trocar. Não sei bem, intuitivamente acho que deveria ser

fiel à minha escolha original, algo me diz isso, mas não sei explicar “matematicamente”, mas

creio que a chance de o carro estar atrás da porta continua sendo de 33%, mesmo após o

apresentador abrir uma porta.

O aluno Rogério respondeu:

Eu mudaria de porta, com certeza! Veja: se eu pudesse optar entre escolher apenas a porta 1

ou ficar com ambas as portas 2 e 3, é claro que ficando com 2 e 3 eu teria mais chances de

ganhar, pra ser mais exato, 2/3 concorda? Então, trocando de porta, eu acho que é exatamente

Page 191: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

190

isso que acontece, uma vez que o apresentador, gentilmente, abriu uma das duas portas e eu vi

que lá só tinha uma cabra. Então, trocar de porta pode ser entendido como poder escolher

duas portas de uma só vez, e, como eu não sei onde o carro está, isso vai me dar uma chance

de 2/3 de ganhar!!!

1) Você concorda com o raciocínio de algum destes alunos? Por quê?

2) Se esta fosse uma questão de um teste e você tivesse que corrigir, aceitaria as respostas

como foram dadas pelos alunos?

3) Como você responderia a esta questão? Você mudaria de porta? Por quê?

Apresentamos algumas respostas (digitalizadas) de alunos (as) da Fernanda, Paula e Alice

para serem discutidas no 12º Encontro

Nat Ca/F

And e M/P

G/F

Jh/F

Nay/F

Page 192: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

191

A P e Val/P

Ri /F

H /F

Sis, Th e M/P

M/F

Ed/F

Page 193: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

192

G/F

A P e VAL/P

H/F

Mat/F

Page 194: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

193

K/F

Jú Eg Ta/P

Jh/F

M/F

Page 195: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

194

Análisar respostas dos alunos de Alice

LE / A

Fz / A

A S / A

A C/A

Page 196: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

195

Fe / A

A Be / A

Br / A

M /A

Page 197: Desenvolvimento Profissional e Pensamento Probabilístico

196

I / A

B / A