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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA Atuação do Conselho Nacional de Justiça e independência jurisdicional: interfaces e interferências DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2015

DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA - cnj.jus.br · É possível identificar zonas de conforto e de conflito entre a atuação do ... Ação Popular APn: Ação Penal AR: ... Habeas Corpus

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA

Atuação do Conselho Nacional de Justiça e independência jurisdicional: interfaces e

interferências

DOUTORADO EM DIREITO

SÃO PAULO

2015

4

DIOGO RAIS RODRIGUES MOREIRA

ATUAÇÃO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA E INDEPENDÊNCIA

JURISDICIONAL: INTERFACES E INTERFERÊNCIAS

DOUTORADO EM DIREITO

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial

para a obtenção do título de Doutor em Direito sob a orientação

do Prof. Dr. ANDRÉ RAMOS TAVARES.

SÃO PAULO

2015

5

BANCA EXAMINADORA

____________________________________

____________________________________

____________________________________

____________________________________

____________________________________

6

“Tudo quanto aumenta a liberdade, aumenta a responsabilidade”.

(Frase de Victor Hugo, mas que aprendi – no cotidiano – com meus pais.)

7

RESUMO

É possível identificar zonas de conforto e de conflito entre a atuação do

Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a independência jurisdicional? Como elas se

constituem? Como podem ser categorizadas? Buscar respostas para essas e outras

indagações é o objetivo desta tese.

Parte-se da premissa de que a independência jurisdicional não deve constituir

barreira intransponível para a atuação do CNJ e nem sua atuação poderia ser a derrocada

da independência jurisdicional. E, para isso, esta pesquisa segue um fio condutor

formado por diversos questionamentos que identifica o Poder Judiciário Nacional e a

inserção do Conselho Nacional de Justiça nesta estrutura, abordando a relação entre

jurisdição e não jurisdição, bem como, a proteção da independência judicial seja por

atos internacionais seja pela Constituição brasileira, com o objetivo específico de

apresentar definições de independência judicial e jurisdicional, e por fim, a análise da

atuação do Conselho Nacional de Justiça diante de atos jurisdicionais.

Esta análise se iniciou a partir de um rol de 2.750 registros sobre atos normativos

e disciplinares do Conselho Nacional de Justiça, dos quais foram selecionados aqueles

dirigidos especificamente aos atos jurisdicionais, sendo sistematizados e categorizados

de acordo com os seus denominadores em comum e agrupados de acordo com o

resultado que produziram, formando o que se denominou de zonas de interface e de

interferência.

Por fim, a tese apresenta o entrelaçamento dos resultados da pesquisa empírica

com a definição de independência jurisdicional com o objetivo de trazer conclusões a

respeito deste relacionamento constatado entre a atuação do Conselho Nacional de

Justiça e a independência jurisdicional, seja por suas interfaces, seja por suas

interferências.

Palavras-chave: Poder Judiciário; Conselho Nacional de Justiça; independência

jurisdicional; independência judicial; atos jurisdicionais.

8

ABSTRACT

Is it possible to identify zones of accommodation and conflict between the

activity of the Conselho Nacional de Justiça (CNJ – National Council of Justice) and

jurisdictional independence? What constitutes these zones? How can they be

categorized? The aim of this thesis is to seek answers to these and other questions.

Our research is based on the assumption that jurisdictional independence should

not be an insurmountable obstacle to the activity of the CNJ, nor should the Council’s

activity bring about the end of jurisdictional independence. Therefore, this research

follows a central thread formed by a series of questions related to the national judiciary

branch and the insertion of the Conselho Nacional de Justiça in its structure. We address

the relation between jurisdiction and non-jurisdiction and the protection of jurisdictional

independence through international norms and through the Brazilian Constitution, with

the specific aim of presenting definitions of judicial and jurisdictional independence.

We then analyze the decisions of the Conselho Nacional de Justiça that directly address

jurisdictional acts.

This analysis was based on an initial list of 2.750 normative and disciplinary acts

issued by the Conselho Nacional de Justiça, of which only those specifically aimed at

jurisdictional decisions were selected. This selection was then organized and

categorized according with common features and results found in the acts, leading to the

creation of the categories herein referred to as zones of interface and interference.

Lastly, the results of the research are interpreted in the light of the definition of

jurisdictional independence herein adopted. We thus seek to offer some conclusions

about the relationship between the activity of the Conselho Nacional de Justiça and

jurisdictional independence, either by means of an interface zone or through direct

interference.

Keywords: Judiciary Power; Conselho Nacional de Justiça (National Council of

Justice); jurisdictional independence; judicial independence; jurisdictional acts.

9

SUMÁRIO

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ..................................................... 12

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 15

CAPÍTULO 1 .................................................................................................... 20

PLANO DE PESQUISA E NOTAS METODOLÓGICAS ........................... 20

1.1. PLANO DE PESQUISA .................................................................................. 21

1.2. NOTAS METODOLÓGICAS .......................................................................... 22

CAPÍTULO 2 .................................................................................................... 33

JURISDIÇÃO E CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA ......................... 33

2.1. PODER JUDICIÁRIO E CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA .......................... 34

2.2. JURISDIÇÃO E NÃO JURISDIÇÃO ................................................................. 43

2.3. JURISDIÇÃO VERSUS NÃO JURISDIÇÃO: A QUESTÃO JUDICIALIZADA E O CNJ,

UM CONFLITO DE COMPETÊNCIA .................................................................................. 48

2.3.1. O conceito de questão judicializada no âmbito do CNJ ................... 49

2.3.2. Como se desenvolveu a questão judicializada no CNJ ..................... 51

2.3.2.1. Tese da reserva de competência do CNJ ................................... 52

2.3.2.2. Tese do critério cronológico ...................................................... 55

2.3.3. O STF e a prevalência pelo âmbito judicial ...................................... 59

2.3.4. Jurisdição versus não jurisdição: algumas considerações................. 63

CAPÍTULO 3 .................................................................................................... 65

A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA E A INDEPENDÊNCIA JUDICIAL . 65

3.1. GARANTIAS INERENTES À INDEPENDÊNCIA JUDICIAL NO BRASIL .............. 66

3.1.1. Memória constitucional .................................................................... 69

3.1.2. Garantias orgânicas ........................................................................... 76

3.1.2.1. Garantia de autogoverno ............................................................ 76

3.1.2.2. Capacidade normativa ............................................................... 77

3.1.2.3. Garantia de autonomia financeira .............................................. 79

3.1.3. Garantias individuais ........................................................................ 82

3.1.3.1. Vitaliciedade .............................................................................. 85

3.1.3.2. Inamovibilidade ......................................................................... 87

10

3.1.3.3. Irredutibilidade de subsídios ...................................................... 94

3.2. VEDAÇÕES E DEVERES CONSTITUCIONAIS DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS

.................................................................................................................................... 96

3.2.1. Exercício de outro cargo ou função pública ..................................... 97

3.2.2. Recebimento de participação em processo ....................................... 98

3.2.3. Atividade político-partidária ............................................................. 99

3.2.4. Recebimento de auxílios ou contribuições ..................................... 100

3.2.5. Quarentena ...................................................................................... 101

CAPÍTULO 4 .................................................................................................. 104

INDEPENDÊNCIA JUDICIAL .................................................................... 104

4.1. PROTEÇÃO INTERNACIONAL DA INDEPENDÊNCIA JUDICIAL ..................... 105

4.1.1. Independência judicial protegida por atos internacionais ............... 105

4.1.1.1. Atos internacionais que se referem especificamente sobre o

Judiciário .......................................................................................................... 106

4.1.1.2. Outros atos internacionais ........................................................ 115

4.1.2. Independência judicial no âmbito das Cortes Internacionais ......... 121

4.2. A INDEPENDÊNCIA JUDICIAL E SUAS DIVERSAS DEFINIÇÕES .................... 123

4.3. UMA PROPOSTA DE DEFINIÇÃO DE INDEPENDÊNCIA JURISDICIONAL ........ 132

CAPÍTULO 5

A RELAÇÃO ENTRE A ATIVIDADE DO CONSELHO NACIONAL DE

JUSTIÇA E A INDEPENDÊNCIA JURISDICIONAL .......................................... 139

5.1. INTRODUÇÃO .......................................................................................... 140

5.2. ZONA DE INTERFACE ENTRE A ATIVIDADE DO CNJ E A INDEPENDÊNCIA

JURISDICIONAL .......................................................................................................... 141

5.2.1. Criada por via abstrata e prévia aos atos jurisdicionais .................. 141

5.2.1.1. Análise descritiva ..................................................................... 144

5.2.1.2. Síntese conclusiva .................................................................... 157

5.2.2. Criada por via concreta e posterior diante de atos jurisdicionais ... 158

5.2.2.1. Análise descritiva ..................................................................... 162

5.2.2.2. Síntese conclusiva .................................................................... 181

5.3. ZONA DE INTERFERÊNCIA CRIADA POR VIA CONCRETA E POSTERIOR DIANTE

DE ATOS JURISDICIONAIS ........................................................................................... 184

11

5.3.1. Análise descritiva ............................................................................ 184

5.3.2. Síntese conclusiva ........................................................................... 195

CONCLUSÃO ................................................................................................. 197

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................... 212

APÊNDICE I ................................................................................................... 225

APÊNDICE II ................................................................................................. 255

12

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ac.: acórdão

AC: Ação Cautelar

ACO: Ação Cível Originária

ADC: Ação Declaratória de Constitucionalidade

ADCT: Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

ADI: Ação Direta de Inconstitucionalidade

ADPF: Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

Ag.: Agravo

AgI: Agravo de Instrumento

AgRg: Agravo Regimental

AJUFE: Associação dos Juízes Federais do Brasil

AJUFESP: Associação dos Juízes Federais do Estado de São Paulo

AMB: Associação dos Magistrados Brasileiros

ANAMATRA: Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho

ANEEL: Agência Nacional de Energia Elétrica

ANVISA: Agência Nacional de Vigilância Sanitária

AO: Ação Originária no STF

AP: Ação Popular

APn: Ação Penal

AR: Ação Rescisória

Art. – Artigo

CADE: Conselho Administrativo de Desenvolvimento Econômico

CC: Código Civil

CCom: Código Comercial

CComp: Conflito de Competência

CDC: Código de Defesa do Consumidor

CF: Constituição Federal do Brasil de 1988

CLT: Consolidação das Leis do Trabalho

CN: Congresso Nacional

CNJ: Conselho Nacional de Justiça

CNMP: Conselho Nacional do Ministério Público

13

CONAMA: Conselho Nacional do Meio Ambiente

CP: Código Penal

CPC: Código de Processo Civil

CPI: Comissão Parlamentar de Inquérito

CPP: Código de Processo Penal

CSLL: Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido

CTB: Código de Trânsito Brasileiro

CTN: Código Tributário Nacional

CVM: Comissão de Valores Mobiliários

DF: Distrito Federal

DJ: Diário da Justiça

DOU: Diário Oficial da União

EC: Emenda Constitucional

ECA: Estatuto da Criança e do Adolescente

Extr.: Extradição

HC: Habeas Corpus

HD: Habeas Data

IBAMA: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

Renováveis

IF: Intervenção Federal

LC: Lei Complementar

LICC: Lei de Introdução ao Código Civil

LOMAN – Lei Orgânica da Magistratura Nacional

MC: Medida Cautelar

MI: Mandado de Injunção

Min.: Ministro(a)

MP: Medida Provisória

MS: Mandado de Segurança

OAB: Ordem dos Advogados do Brasil

PAD: Processo Administrativo Disciplinar

PEC: Proposta de Emenda Constitucional

Pet.: Petição

PP: Pedido de Providências

14

p.ú.: parágrafo único

QO: Questão de Ordem

RD: Reclamação Disciplinar

RE: Recurso Extraordinário

Recl.: Reclamação

Rel.: Relator(a)

REVDIS: Revisão Disciplinar

RHC: Recurso em Habeas Corpus

RHD: Recurso em Habeas Data

RI: Regimento Interno

RMS: Recurso em Mandado de Segurança

RO: Recurso Ordinário

ROHC: Recurso Ordinário em Habeas Corpus

RT: Revista dos Tribunais

SS: Suspensão de Segurança

STF: Supremo Tribunal Federal

STJ: Superior Tribunal de Justiça

SIND: Sindicância

SUS: Sistema Único de Saúde

TCU: Tribunal de Contas da União

TJ: Tribunal de Justiça

TRE: Tribunal Regional Eleitoral

TRF: Tribunal Regional Federal

TRT: Tribunal Regional do Trabalho

TSE: Tribunal Superior Eleitoral

TST: Tribunal Superior do Trabalho

15

INTRODUÇÃO

Há relacionamento entre a atividade típica do CNJ e a independência

jurisdicional? A independência jurisdicional impede a atuação do CNJ diante do teor

das decisões jurisdicionais? Em caso negativo, quais são os fundamentos e argumentos

para o CNJ deixar de atuar? Em caso positivo, quais são as hipóteses em que o CNJ atua

diante da decisão jurisdicional? Há denominadores em comum dessa atuação? Há

padrões mínimos de comportamento do Conselho diante da relação entre suas atividades

e a independência jurisdicional? Que tipo de relacionamento surge?

Buscar respostas para essas indagações é o objetivo desta tese, sintetizado no

processo e no resultado da busca de limites ou parâmetros da atividade do Conselho

Nacional de Justiça especificamente diante da independência jurisdicional, de modo que

esta independência não constitua as amarras do Conselho e nem a atuação do Conselho

Nacional de Justiça seja a derrocada da independência jurisdicional, identificando uma

zona de conforto e uma zona de conflito entre a independência jurisdicional e a

atividade do CNJ.

Como objetivos específicos têm-se o estudo teórico da independência

jurisdicional, analisando seus aspectos históricos e jurídicos e traçando um paralelo no

direito comparado, além de detalhada pesquisa abrangendo as normas constitucionais

correlatas ao tema.

Além das disposições teóricas e normativas, outro recurso metodológico que se

pretende utilizar é a pesquisa empírica com base na produção normativa e nas decisões

oriundas do poder disciplinar do Conselho Nacional de Justiça, confrontando-as com o

posicionamento do Supremo Tribunal Federal, para buscar, além do discurso, o real

conteúdo da atuação do Conselho diante da independência jurisdicional. Com isso,

pretende-se identificar parâmetros já alcançados ou em fase de construção para fixação

do funcionamento saudável e seguro tanto da independência jurisdicional quanto da

atividade do CNJ.

A abordagem do tema desta tese poderia ser iniciada pela seguinte máxima: a

atuação do CNJ não se relaciona, e nem poderia se relacionar, com a decisão judicial,

uma vez que este Conselho não possui jurisdição, o que consagra a prevalência da

independência jurisdicional perante a atividade do CNJ, devendo esta última ser

16

afastada. Essa primeira impressão pode ser ilustrada por diversas decisões do próprio

Conselho Nacional de Justiça1. A seguir, um exemplar desse raciocínio:

CONSULTA - RECURSO ADMINISTRATIVO - AVERIGUAÇÃO

SOBRE CONDUTA JURISDICIONAL DO TRT E DE

MAGISTRADA DA 2ª REGIÃO - QUESTIONAMENTO SOBRE

CARACTERIZAÇÃO DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR - MATÉRIA

INFENSA AO EXAME DO CNJ - IMPROPRIEDADE DA

CONSULTA - MANUTENÇÃO DA DECISÃO IMPUGNADA.

Consulta sobre oscilação jurisprudencial sobre a mesma matéria

por um mesmo juízo constitui infração disciplinar, focada em

magistrada e tribunal concretos, refoge ao âmbito de atuação do

CNJ e ao escopo da modalidade processual eleita. Se, por um lado,

a segurança jurídica é valor que merece resguardo (Ronald

Dworkin), por outro a reformulação de entendimento encontra-se

no campo da convicção do magistrado, na sua atividade

jurisdicional, não afeita ao controle administrativo do CNJ.

Recurso administrativo desprovido.

“O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos

termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, os

Conselheiros Ministra Eliana Calmon, Milton Nobre, Paulo Tamburini

e Morgana Richa. Presidiu o julgamento o Ministro Cezar Peluso.

Plenário, 23 de novembro de 2010.”

Consulta processo n. 0006533-53.2010.2.00.0000. Rel. IVES

GANDRA. Julgado em 23.11.2010 na 117ª sessão

Nossos grifos.

Embora seja verdadeira a premissa de que o CNJ não possui jurisdição, ela não

implica a separação absoluta entre a atividade do Conselho Nacional de Justiça e a

independência jurisdicional.

Foi constatada, na pesquisa empírica aqui realizada, uma zona onde a atividade

do CNJ e a independência jurisdicional se relacionam, ora provocando o que se

denominou aqui zona de interface, ora provocando o que se denominou aqui zona de

interferência.

A tese está estruturada em cinco capítulos, sendo dedicado o primeiro à

descrição do plano de pesquisa e metodologia empregada na pesquisa, isto é, a notas

sobre o processo de produção desta pesquisa, identificando os elementos centrais para

desenvolvimento de cada capítulo desta tese, apresentando os motivos e métodos para

suas escolhas e desenvolvimento, e indicando os resultados esperados.

1 Dentre as diversas decisões do CNJ nesse sentido, menciona-se: Processo n. 0006086-

65.2010.2.00.0000, Recurso Administrativo. Rel. Walter Nunes. Julgado em 09.11.2010 na 116ª Sessão

Ordinária. Pedido de Providências n. 512. Rel. Paulo Lôbo. Julgado em 19.09.2006 na 25ª sessão. RD 391

- Rel. Cons. José Adonis Callou de Araújo Sá, 69ª Sessão, j. 09.09.08, DJU 26.09.08.

17

No capítulo segundo, que trata de Jurisdição e Conselho Nacional de Justiça,

serão abordados o contexto e os principais atores envolvidos nesta tese, iniciando pela

descrição do Poder Judiciário brasileiro, detalhando sua estrutura, funcionamento e

dimensão, e contemplando a inclusão do Conselho Nacional de Justiça nesta estrutura.

Será ainda abordado o conflito entre jurisdição e não jurisdição, buscando na

doutrina nacional e estrangeira diversas definições de jurisdição, para adiante adentrar o

tema mais específico da chamada questão judicializada no âmbito do CNJ. Busca-se

traçar um panorama do entendimento do Conselho ao longo dos últimos anos, bem

como o posicionamento a respeito desta matéria no Supremo Tribunal Federal.

Vale dizer que a análise da questão judicializada tem relação direta com o tema

central da interface entre a atuação do Conselho Nacional de Justiça e a independência

judicial, uma vez que, dependendo do entendimento adotado pelo Conselho, sua

atividade típica poderia provocar a sobreposição da decisão judicial ou a

desconsideração de decisão judicial.

Uma vez delineado o cenário e os atores, já identificada a jurisdição e

distinguida a questão judicializada diante do objetivo central desta tese, pretende-se a

seguir, no capítulo terceiro, iniciar o mapeamento do tema da proteção constitucional da

independência judicial no Brasil, em especial por sua face instrumental.

Inicialmente recorre-se a uma abordagem histórico-constitucional do tema,

percorrendo as Constituições adotadas no Brasil desde a época do Império até a

Constituição brasileira promulgada em 1988. Serão descritas as garantias referentes à

magistratura: capacidade de autogoverno; autonomia financeira; e capacidade

normativa, e ainda, as garantias dos magistrados: vitaliciedade; inamovibilidade; e

irredutibilidade de vencimentos.

Após a descrição das garantias e com o intuito de complementar o conjunto de

instrumentos com estatura constitucional que protegem a independência judicial, trata-

se – no item posterior – das vedações e deveres dos magistrados no exercício da

jurisdição, com o objetivo de identificar as vedações e deveres dessa categoria que estão

previstos na Constituição brasileira e se relacionam, direta ou indiretamente, com o

tema da independência judicial, identificando a face instrumental dessa independência

na Constituição brasileira.

Em seguida, a partir de questionamentos acerca da relevância da independência

judicial no sistema internacional, ou seja, se e como a independência judicial estaria

18

presente nos mais variados atos internacionais e qual a relevância do tema para

movimentos internacionais em prol de sua adoção e manutenção, se iniciará o quarto

capítulo da tese. Serão identificados os mecanismos internacionais que visam a proteger

a independência judicial no interior dos Estados soberanos e aqueles que pretendem a

adoção e proteção da independência judicial no âmbito das Cortes internacionais.

Partindo da premissa de que é possível encontrar diversas definições de

independência judicial, em especial a partir de perspectivas diferentes, como a

sociológica, a jurídica ou a política, entre tantas outras possibilidades, se desenvolve

ainda no quarto capítulo desta tese uma abordagem específica deste tema, com a

ambição de formular – ao final – uma definição sintética, que será aplicada para os fins

de desenvolvimento e compreensão desta tese. Busca-se a definição de uma das faces da

independência judicial, mais precisamente, a independência jurisdicional, visto que esta

pesquisa analisa apenas atos praticados em decisões judiciais em confronto com a

atividade típica do CNJ, e não a atividade administrativa – por exemplo – realizada pelo

magistrado. É neste sentido que se utiliza aqui a expressão independência jurisdicional.

Pode-se afirmar que será delineado neste item o tema central desta tese, que se

desenvolverá em dois grandes eixos. O primeiro eixo consiste em apresentar uma

definição de independência jurisdicional com base na revisão de literatura feita sobre o

tema, promovendo um diálogo entre algumas definições para formular uma definição

sintética. Essa definição será aplicada como parâmetro para analisar o produto do

segundo eixo: o resultado da pesquisa empírica, que será apresentado no capítulo

quinto.

O quinto e último capítulo desta tese será dedicado à apresentação dos resultados

da pesquisa empírica realizada sobre decisões normativas e disciplinares do Conselho

Nacional de Justiça que se referiram ao conteúdo de decisões jurisdicionais.

Embora esta tese se desenvolva diante de farto material decisório produzido pelo

Conselho Nacional de Justiça, através da análise de 1.419 atos normativos2 e 1.331

2 São atos da Presidência: Atas, Enunciados Administrativos, Instruções Normativas, Moções do

Conselho, Notas Técnicas, Portarias, Portarias Conjuntas, Recomendações, Resoluções, Termos de

Cooperação Técnica, Resoluções Conjuntas e Comunicados. São atos da Corregedoria: Instruções

Normativas, Ofício-Circular, Orientações, Portarias, Projeto de lei, Provimentos, Recomendações,

Relatórios Anuais, Relatórios de Inspeção e Boletim de Serviços. São atos da Secretaria-Geral e da

Diretoria-Geral: Portarias e Instruções Normativas.

19

ocorrências obtidas mediante a busca de jurisprudência no site oficial do CNJ3, é

necessário frisar que esta pesquisa não envolve o comportamento decisório do

Conselho, isto é, não se pretende nesta tese aferir como decidem os Conselheiros. O que

se pretende aqui é identificar, diante das decisões já tomadas e publicadas pelo

Conselho (sejam elas provenientes de seus atos normativos ou decisórios), se há padrão

de comportamento mínimo que ensejou o que se denominou aqui zonas de

relacionamento, seja por interface, seja por interferência, com o objetivo final de

organizar o material produzido pelo próprio Conselho e coletado na pesquisa, tomando

por critérios denominadores comuns presentes nos documentos coletados.

Em outras palavras, não se pretende identificar se a decisão X do magistrado

enseja a decisão Y do CNJ, tentando traçar uma fórmula para prever possíveis

resultados em futuros julgamentos no Conselho. O que se pretende é, diante das

decisões do CNJ (já tomadas por quaisquer motivos), identificar quais delas ensejaram a

zona de relacionamento entre a independência jurisdicional e a atividade típica do CNJ,

justamente pelo fato de ato do CNJ versar sobre ato praticado ou praticável em atividade

típica jurisdicional.

Será apresentada em cada categoria e subcategoria uma análise descritiva dos

resultados da pesquisa e uma síntese conclusiva, sempre pretendendo o cruzamento

entre os dois eixos mencionados: independência jurisdicional e produto da pesquisa

empírica (decisões normativas e disciplinares do CNJ que se referiram a decisão

jurisdicional), com o objetivo de aferir o comportamento decisório e normativo do

Conselho Nacional de Justiça diante da definição de independência jurisdicional que

será aqui formulada.

Após o desenvolvimento dos cinco capítulos, será apresentada a conclusão da

presente tese, onde serão compiladas as sínteses conclusivas de cada capítulo e

apresentados cruzamentos de dados e de considerações conclusivas, seguindo o fio

condutor da tese e indicando o posicionamento final a respeito das questões aqui

levantadas e analisadas.

3 Esclarece-se desde já que a totalidade de ocorrências encontradas (1.331) não corresponde a 1.331 casos

diferentes. Como a busca foi realizada por diversos parâmetros, ocorreram diversas duplicidades de casos

que foram eliminados na triagem, conforme será detalhado ao tratar da metodologia.

20

CAPÍTULO 1

PLANO DE PESQUISA E NOTAS METODOLÓGICAS

21

1.1. Plano de pesquisa

Ao abordar a importância da pesquisa, Booth, Colomb e Williams, como

resposta à pergunta sobre o que a pesquisa representa para o pesquisador, afirmam que

ela deve oferecer o prazer de resolver um enigma ou, ainda, a satisfação de descobrir

algo novo, ou até algo que ninguém mais conhece, mas sempre contribuindo para a

construção do conhecimento humano, embora reconheçam que esta resposta pode

parecer – para muitos – idealista4.

É com este propósito de contribuição e também de agradecimento que esta tese

foi desenvolvida, em especial por ser um dos produtos no âmbito do projeto “CNJ

Acadêmico”, ocasião em que a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em

conjunto a Universidade Presbiteriana Mackenzie, em projeto interinstitucional, foram

selecionadas para, dentre outras atividades, conduzir pesquisas em mestrado e

doutorado voltadas para a temática que envolve o Conselho Nacional de Justiça. Para

uma explicação mais detalhada, transcreve-se a seguir a descrição empregada no edital

“CNJ Acadêmico”:

Atuação, competências e interfaces do Conselho Nacional de Justiça

(CNJ) com os demais órgãos do Poder Judiciário e dos outros Poderes:

desde sua criação o Conselho Nacional de Justiça vem adquirindo

significativa visibilidade em função das mudanças que vem proporcionando

no seio do Poder Judiciário brasileiro. Conjuntamente com essa crescente

visibilidade e com o escopo de atuação do Conselho cada vez mais ampliado,

surgem inevitavelmente questionamentos, dúvidas, debates e reclamações a

respeito do limite de sua atuação e sobre o alcance de suas competências.

Essas questões assumem relevância singular para um órgão novo, em

processo de consolidação institucional, cuja área de atuação tem significativa

probabilidade de se sobrepor à de outros órgãos mais tradicionais. O estudo

do presente tema, nesse sentido, é de suma importância. Outros aspectos ou

subtemas particularmente interessantes nesta área são:

• Limites das competências do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em

função de suas atribuições constitucionais;

• Interfaces das atribuições do Conselho Nacional de Justiça com os

demais órgãos do Poder Judiciário, do Poder Executivo e do Poder

Legislativo (Tribunal de Contas da União);

• Efetividade das decisões do CNJ em função do desafio de sua consolidação

institucional;

• Papel do CNJ no combate à corrupção no Poder Judiciário.

Nossos grifos.

4 BOOTH, W. C.; COLOMB, G. G.; WILLIAMS, J.M. A arte da pesquisa. Trad. Henrique A. Rego

Monteiro. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 3 e 4.

22

A presente tese está adequada tematicamente ao objeto indicado no edital do

projeto “CNJ Acadêmico”, já que se dedica ao estudo e pesquisa da relação entre a

atividade do Conselho Nacional de Justiça e a independência jurisdicional, tema que se

entrelaça com o tema principal e os dois primeiros subtemas, quais sejam: atuação e

interface do Conselho Nacional de Justiça, os limites de sua competência e ainda sua

interface com os demais órgãos do Poder Judiciário, sempre pesquisado diante da

independência jurisdicional.

1.2. Notas metodológicas

O diverso rol de métodos adotados nesta tese atende não apenas ao plano

especificado acima, mas também aos objetivos de cada capítulo, ora sendo realizada

revisão da literatura especializada, ora pesquisa jurisprudencial, ora pesquisa sobre a

normatização.

Vale mencionar aqui que não se ignora as dificuldades das bases eletrônicas de

dados dos julgados, mesmo dos principais tribunais5 e do Conselho Nacional de Justiça,

ou ainda as críticas realizadas diante da pesquisa jurisprudencial brasileira no campo do

Direito6. Acompanhando Dimitri Dimoulis, que ressalta a existência de mais de uma

forma de se fazer pesquisa em Direito, não se pretende o enaltecimento da pesquisa

jurisprudencial em detrimento de outras7.

Entende-se que há extensa variedade de métodos, que não guardam entre si

necessariamente uma relação maniqueísta, mas sim uma relação de adequação, e que o

método é o caminho ou o processo para se alcançar outros objetivos, não sendo ele um

fim em si mesmo. Nesse sentido, procura-se na presente tese adotar aquele mais

adequado aos seus fins, isto é, para verificar se há relacionamento entre a atividade

típica do CNJ e a independência jurisdicional e como esse relacionamento se concretiza,

5 VEÇOSO, Fabia Fernandes Carvalho, et al. A pesquisa em direito e as bases eletrônicas de julgados dos

tribunais: matrizes de análise e aplicação no supremo tribunal federal e no superior tribunal de justiça,

Revista de Estudos Empíricos em Direito, vol. 1, n. 1, jan. 2014, p. 105-139. 6 RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Riscos de uma pesquisa empírica em Direito no Brasil, Consultor

Jurídico, 7 de agosto de 2013. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-ago-07/direito-

comparado-riscos-certa-pesquisa-empirica-direito-brasil#author>. Acesso em: 21 set. 2015. 7 DIMOULIS, Dimitri. Por uma visão mais plural da pesquisa jurídica, Consultor Jurídico, 30 de agosto

de 2013. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-ago-30/dimitri-dimoulis-visao-plural-pesquisa-

juridica>. Acesso em: 21 set. 2015.

23

em especial se a independência jurisdicional impede – ou deveria impedir – a atuação

do CNJ diante de atos jurisdicionais.

Como já mencionado na Introdução, esta tese é composta de cinco capítulos,

sendo este o primeiro, cujo objetivo é apresentar o processo de pesquisa, identificando e

justificando as opções metodológicas. Em seguida, no segundo capítulo será

contextualizado o Poder Judiciário brasileiro e o Conselho Nacional de Justiça, com o

objetivo de situar o leitor na discussão orgânica sobre o Conselho Nacional de Justiça.

A descrição é útil para se conhecer o debate sobre o alegado controle externo do Poder

Judiciário, estimulado por ocasião da instalação desse órgão. No mesmo capítulo, será

ainda traçada a relação entre jurisdição e não jurisdição. A metodologia que se

demonstrou mais eficiente para esse capítulo foi a revisão de literatura, uma vez que há

diversos autores que se dedicaram à estrutura do Judiciário e ao tema da jurisdição;

pretende-se, assim, promover a compilação de diversas definições de jurisdição para a

formulação de uma concepção sintética, que servirá de apoio ao desenvolvimento dos

temas correlatos.

Ainda no segundo capítulo e diante do dilema entre jurisdição e não jurisdição,

será abordada a questão judicializada no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, com o

objetivo de verificar, na prática decisória do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, como

tais órgãos enfrentam este tema, isto é, como lidam com questões que, embora sejam da

competência do CNJ, tenham também sido judicializadas.

Para desenvolver esse item, o método que se revelou mais adequado foi a

pesquisa empírica com base nas decisões do Conselho Nacional de Justiça e do

Supremo Tribunal Federal, uma vez que não foi encontrada literatura suficiente, atual e

especializada sobre o tema.

A expressão “questão judicializada” também é frequentemente, no âmbito do

CNJ e do STF, substituída pelas seguintes expressões: “questão previamente

judicializada”, “judicialização prévia”, “prévia judicialização”, “matéria judicializada”,

“judicialização da questão”, entre outras. Para identificar as decisões que continham tais

expressões, na pesquisa foi utilizado o termo “judicializa” seguido do símbolo “#”, o

que corresponde à pesquisa sobre todos os termos com o radical “judicializa”,

abrangendo, assim, todas as formas pelas quais o Conselho Nacional de Justiça se refere

à matéria. Ainda assim, a maior dificuldade que se apresenta é identificar hipóteses em

que podem ocorrer tais situações.

24

Para que se compreendesse de que forma o CNJ, ao longo de sua história,

definiu sua própria competência diante da questão judicializada, foi realizada uma

pesquisa exaustiva através do mecanismo de busca de jurisprudência do site do

Conselho Nacional de Justiça, obtendo-se material suficiente para o desenvolvimento

desse item.

Em consulta ao site oficial do CNJ, especificamente em sua base de dados

jurisprudenciais, fez-se a pesquisa com os parâmetros “judicializa”, “judicializada”,

“judicializadas” e “judicialização”. O primeiro resultado obtido foi de 230 (duzentos e

trinta) ocorrências, sendo 68 (sessenta e oito) não referentes ao objeto da pesquisa;

assim, o universo de pesquisa foi formado por 162 (cento e sessenta e duas) ocorrências

que trataram da matéria “questão judicializada”, das quais 154 (cento e cinquenta e

quatro) foram decisões de abstenção de julgamento pelo CNJ diante de a questão estar

judicializada, restando 08 (oito) exemplares de decisões em que o CNJ,

independentemente da judicialização da matéria, prosseguiu com o processo

administrativo, reconhecendo sua competência.

Inicia-se no capítulo terceiro o estudo da independência judicial, tema

fundamental para que, ao final, sejam confrontadas as decisões normativas e

disciplinares do CNJ, de modo a atender à finalidade desta tese.

O início desse estudo se dá através do mapeamento do tema da proteção

constitucional da independência judicial no Brasil, em especial por sua face

instrumental, trazendo normas do aparato instrumental que protege a independência

judicial e abordando sua evolução diante do ordenamento constitucional. Para alcançar

esse objetivo, foi reunido na pesquisa bibliográfica farto material contendo diversas

abordagens, que foram compiladas, organizadas e problematizadas; em determinados

itens, a análise do material bibliográfico foi acompanhada do exame de decisões

judiciais a respeito.

Em seguida, prosseguindo na missão de estudar a independência judicial como

um dos passos para atingir o objetivo final desta tese, o capítulo quarto apresenta a

relevância da independência judicial no ordenamento jurídico internacional, baseando-

se em pesquisa das normatizações a respeito do tema na rede mundial de computadores,

sendo também encontrada literatura especializada sobre o tema – ainda que escassa. Os

variados atos internacionais pertinentes foram triados, analisados e – ao final –

comentados e compilados, revelando a importância global da matéria.

25

Partindo da premissa de que é possível encontrar diversas definições de

independência judicial, o capítulo apresentará uma compilação das definições

empregadas por diversos autores, pretendendo formar um diálogo com a literatura

especializada. Apropriando-se de alguns elementos que serão identificados neste item, o

item subsequente providenciará uma definição de independência por uma de suas faces,

a independência jurisdicional.

No quinto e último capítulo, será exposta a pesquisa empírica realizada sobre o

tema específico da independência jurisdicional e sua relação com a atividade do

Conselho Nacional de Justiça. Para apresentar as decisões normativas e disciplinares do

CNJ que se referem a atos jurisdicionais, buscou-se uma forma de organizá-las e

sistematizá-las, pretendendo facilitar a leitura e identificação de suas principais

características.

Inicialmente notou-se que, em diversos casos julgados no âmbito do Conselho

Nacional de Justiça, é possível identificar a distinção entre o error in procedendo e o

error in judicando, sendo afirmada no julgado a impossibilidade de o Conselho adentrar

a seara do error in judicando, salvo em caso de dolo ou má-fé. Vejamos a ementa de

dois exemplares:

Magistrado. Descumprimento de dever funcional. Art. 35, I, da

LOMAN. Inexistência. Regular exercício da atividade jurisdicional.

Princípio do livre convencimento motivado. Error in judicando. O

Juiz tem o dever legal de observar as suas obrigações, no que se

inclui 'cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e

exatidão, as disposições legais e os atos de ofício' (LOMAN, art.

35, I). É-lhe assegurado, todavia, o exercício da função com

liberdade de convencimento (CPC, art. 131) e independência, de

modo a garantir, em última análise, a autonomia e independência

do próprio Poder Judiciário (CF, art. 95). Constatado, no caso

concreto, que, conquanto se possa considerar equivocada a

decisão que condenou terceiro não integrante da relação

processual, o ato em questão foi praticado no regular exercício da

função e de acordo com a convicção do magistrado sobre a

matéria. Não há falar, portanto, em descumprimento de dever

funcional e de responsabilização do magistrado. Revisão

Disciplinar de que se conhece e que se julga improcedente8

Recurso Administrativo em Revisão Disciplinar. Insurgência contra

decisão monocrática que indeferiu pedido de apuração da

responsabilidade dos magistrados que atuam em processos judiciais de

interesse da requerente e contra o indeferimento de afastamento destes

e do desembargador que é parte nos processos na defesa da guarda de

8 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Reclamação Disciplinar nº 200830000000760. Rel. Cons.

Altino Pedrozo dos Santos, 80ª Sessão, j. 17.03.09, DJU 06.04.09.

26

seu neto. Recurso não provido. A Revisão Disciplinar não se presta

à indagação de quaestionis juris, nem ao ataque do error in

judicando do magistrado. A pretensão de incursão em atos

judiciais proferidos em juízo constitui matéria que se posta fora

do âmbito de competência do CNJ. Essa atuação no plano judicial

só se revê através dos meios postos na legislação processual, pela

via do recurso judicial cabível, sendo inadequada e incabível a

Revisão Disciplinar para essa finalidade9

Embora seja possível identificar nesses dois julgados o posicionamento do CNJ

sobre a impossibilidade de adentrar matéria em que tenha havido o error in judicando,

apresenta-se abaixo um exemplo de julgado em que já é possível identificar exceções a

essa vedação. Mais precisamente, vê-se que o Conselho Nacional de Justiça entende

possível discutir (e eventualmente punir) julgadores que cometeram error in judicando,

desde que tenha havido dolo ou má-fé. Vejamos:

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ORDEM DE

PRISÃO. PROCURADORA DO INSS. AGENTE PÚBLICO

RESPONSÁVEL PELO CUMPRIMENTO DE DECISÕES

JUDICIAIS. AUSÊNCIA DE EXERCÍCIO DA ADVOCACIA

PÚBLICA. AMEAÇA À INVIOLABILIDADE

CONSTITUCIONAL. INOCORRÊNCIA. ERROR IN JUDICANDO.

PUNIÇÃO ADMINISTRATIVO-DISCIPINAR.

IMPOSSIBILIDADE. IMPROCEDÊNCIA.

1. Não configura ameaça à inviolabilidade constitucionalmente

garantida aos advogados em geral, extensível aos advogados públicos,

ordem de prisão, por desobediência, contra procurador que não está no

exercício da advocacia pública no feito, mas sim investido de

competência administrativa para dar cumprimento à determinação

judicial.

2. O magistrado não está sujeito a punição administrativo-disciplinar

pelo cometimento de error in judicando sob pena de sacrifício da

independência funcional da magistratura, SALVO em caso de dolo ou

má-fé, máxime quando a punição mostra-se desproporcional em

relação ao equívoco cometido. Precedente do CNJ (RD 0002474-

56.2009.2.00.0000 - Rel. Min. Gilson Dipp – 110ª Sessão Ordinária)

3. Processo Administrativo Disciplinar julgado improcedente10.

À luz dessa sistematização utilizada pelo Conselho Nacional de Justiça,

analisemos um julgado de processo administrativo disciplinar cuja ementa já apresenta

as diferenças que o CNJ atribuiu a essas duas categorias: error in judicando e error in

procedendo.

9 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Revisão Disciplinar n. 200810000005120 e REP nº

200810000005118. Rel. Cons. Rui Stoco, 65ª Sessão, j. 24.06.08, DJU 05.08.08. 10 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Processo n. 0003590-97.2009.2.00.0000. Rel. Paulo

Tamburini. Rel. p/ Acórdão Walter Nunes. 119ª Sessão, j. 25.01.2011.

27

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. APURAÇÃO DE

INFRAÇÕES DISCIPLINARES PRATICADAS POR

MAGISTRADO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO

PIAUÍ. VIOLAÇÃO DO ART. 35, INCISOS I, III E VIII, DA LEI

ORGÂNICA DA MAGISTRATURA NACIONAL. APLICAÇÃO

DO ART. 44 DA LOMAN. PROCEDENTE. APOSENTADORIA

COMPULSÓRIA. ART. 42, V, DA LEI COMPLEMENTAR Nº

35/79.

I – O conjunto probatório existente comprova de forma inequívoca a

atuação do juiz processado para que os objetivos de levantamento de

numerários fossem concretizados. Não se trata aqui, de mero

erro procedimental, onde o autor desconhece completamente as

consequências de seus atos. Trata-se de uma sucessão deliberada

de atos com o escopo de atender e/ou privilegiar determinada

parte.

II – Não apenas desidiosa a conduta do juiz processado, pois a

prática reiterada de liberação de numerário antes da citação da

parte contrária, com a consequente ausência de movimentação

dos processos após o levantamento dos valores, bem como a não

exigência de caução idônea, e ainda, a absoluta omissão na adoção

de medidas para conter ou apurar os crimes praticados, revelam

comportamento tendencioso do magistrado, que não podem ficar

meramente no campo da negligência.

III – Ainda que fosse considerada a mera negligência, não seria o

caso de sanção inferior à aposentadoria compulsória, em razão da

gravidade das ações e omissões técnicas do magistrado e dos

prejuízos causados aos jurisdicionados, tornando incompatível tal

qualificação técnica de fato com as atividades jurisdicionais.

IV – A sucessão de erros praticados na condução dos processos

descritos na portaria inicial revela cabalmente o procedimento

incorreto perpetrado pelo magistrado em inúmeras ocasiões,

consoante previsão contida no art. 44 da LOMAN, onde resta

autorizada a aplicação de punição mais grave, quando a infração

assim justificar11.

Grifos nossos.

Em síntese, a decisão procura distanciar o caso enfrentado do mero erro

procedimental, enquadrando este caso em uma sucessão deliberada de atos com o

escopo de atender e/ou privilegiar determinada parte. Ou seja, trata-se de um erro de

procedimento qualificado por sua finalidade, neste caso por atender e/ou privilegiar

determinada parte, resultando em parcialidade.

Ainda para testar se o modelo apresentado pelo CNJ (que divide a matéria em

dois grandes grupos, error in procedendo e error in judicando) seria suficiente para as

finalidades de identificar os denominadores em comum e apontar padrões mínimos de

11 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Processo n. 0000786-54.2012.2.00.0000. Rel. Tourinho Neto.

Rel. p/ acórdão: Lucio Munhoz. 165ª Sessão, j. 19.03.2013.

28

comportamento do Conselho Nacional de Justiça diante da relação entre suas atividades

e a independência jurisdicional, buscou-se na doutrina a distinção entre error in

judicando e error in procedendo quanto a seus efeitos práticos.

Barbosa Moreira esclarece que o error in judicando é resultante da má

apreciação da questão de direito. Exemplifica essa definição com a hipótese de que o

magistrado tenha erroneamente entendido aplicável determinada norma jurídica ao caso.

Outro exemplo que o autor traz corresponde à definição do error in judicando “de fato”:

hipótese em que passou despercebido um documento ou em que o magistrado tenha

interpretado mal o depoimento de uma testemunha, entre outras possibilidades. O error

in judicando também pode ser composto pelas duas vertentes acima mencionadas, com

incidência em um único caso: erro de apreciação de direito e erro de apreciação de fato.

Afirma ainda o autor que se deve pedir, em consequência do error in judicando,

a reforma da decisão, “(...) acoimada de injusta, de forma que o objeto do juízo de

mérito no recurso identifica-se com o objeto da atividade cognitiva no grau inferior da

jurisdição”.

O error in procedendo, explica Barbosa Moreira, consiste em vício de atividade

como, por exemplo, defeito de estrutura formal da decisão, julgamento que se distancia

do que foi pedido pela parte, impedimento do juiz, incompetência absoluta etc. Por isso

– nas palavras do autor – “(...) se pleiteia neste caso a invalidação da decisão, averbada

de ilegal, e o objeto do juízo de mérito no recurso é o próprio julgamento proferido no

grau inferior”12.

Error in procedendo, neste contexto, não seria qualquer erro de procedimento a

ensejar a zona de relacionamento entre a atuação do CNJ e a independência

jurisdicional. Parece que se exige aqui uma ocorrência que resulte em parcialidade ou

negligência, ou que seja reconhecida como excesso de linguagem ou impropriedade, ou

ainda que sejam identificados indícios de corrupção. Ou seja, não seria o error in

procedendo que provocaria a zona de relacionamento, e sim eventual excesso de

linguagem, parcialidade, negligência ou indícios de corrupção, que ora podem ser

categorizados como error in procedendo, ora como error in judicando. Por exemplo, a

parcialidade pode se revelar tanto pelo procedimento quanto pelo error in judicando

qualificado pelo dolo ou má-fé.

12 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 12ª ed, vol. 5. Rio de

Janeiro: Forense, 2005, p. 267.

29

Por tais motivos, essa divisão em dois grandes grupos se revelou insuficiente

para apontar detalhadamente padrões mínimos de comportamento do Conselho diante

da relação entre suas atividades e a independência jurisdicional, gerando imprecisões ao

buscar a categorização dos motivos propulsores da zona de interface ou interferência

entre a atividade do CNJ e a independência jurisdicional. Diante dessa insuficiência,

propõe-se a seguir uma categorização baseada no produto da pesquisa empírica sobre os

atos normativos e decisões do Conselho Nacional de Justiça que tiveram por objeto

decisão judiciais.

Propõe-se, portanto, uma categorização com a pretensão de aplicação tanto no

presente trabalho quanto em análises futuras sobre a evolução da matéria, quer haja

manutenção ou distorção de seu atual cenário, identificando-se um padrão de

comportamento mínimo do Conselho Nacional de Justiça diante da independência

jurisdicional.

A base de pesquisa para esse objetivo consiste essencialmente no material

produzido pelo próprio Conselho Nacional de Justiça. A pesquisa foi realizada ora na

base de atos normativos e notas técnicas, ora no sistema de busca da seção de

jurisprudência, ambos no sítio oficial do CNJ.

Todos os atos normativos e notas técnicas emanados do Conselho Nacional de

Justiça foram analisados, independentemente de sua espécie, e podem pertencer a uma

das seguintes categorias: enunciados administrativos, instruções normativas, notas

técnicas, orientações, portarias, portarias conjuntas, provimentos, recomendações,

resoluções, resoluções conjuntas e termos de cooperação.

No total foram computados 1.419 documentos normativos. Dentre eles, foram

selecionados os documentos que possuíam pertinência com o objeto da tese e que foram

considerados capazes de caracterizar a zona de relacionamento entre a atuação do CNJ e

a independência jurisdicional, por exemplo, por sugerir método ou procedimento para a

tomada de decisão jurisdicional. Foram encontrados 24 documentos correspondentes a

esse perfil.

Na pesquisa pelo sistema de busca por palavras da seção de jurisprudência,

foram encontradas 1.331 ocorrências com os seguintes parâmetros de busca:

“independência”; “decisão teratológica”; “excesso de linguagem”; “impropriedade”

“imparcialidade”; “livre convencimento”; “livre convicção”; “suspeição”;

30

“impedimento”, “celeridade”, "erro E procedimento", "negligência", “decisão superior",

"incompetência", "corrupção", “má-fé” e “dolo”.

As 1.331 ocorrências foram triadas, resultando no conjunto de 83 (oitenta e três)

exemplares com pertinência ao objeto de estudo, isto é, que apresentam pontos de

contato entre as atividades do Conselho Nacional de Justiça e a independência

jurisdicional13.

Tendo analisado cada decisão e documento normativo, buscando a

sistematização de seu teor, agrupou-se os denominadores em comum, criando uma

categorização diante das situações que ensejaram a zona de interface ou de interferência

entre a atividade do Conselho Nacional de Justiça e a independência jurisdicional. As

decisões e atos normativos foram comentados e deles foram selecionados e grifados

trechos que constam dos Apêndices I e II.

Uma das dificuldades encontradas durante a pesquisa pelos mecanismos de

busca por palavras na seção de jurisprudência consiste no fato de que frequentemente

eram obtidas ocorrências idênticas diante dos diferentes parâmetros de busca. Por

exemplo, o caso X foi revelado na pesquisa tanto através do parâmetro “imprudência”

quanto pelos parâmetros “imparcialidade” e “suspeição”. Isso explica o número de

1.331 ocorrências, das quais foram selecionadas 83.

Para evitar a duplicidade de documentos para apresentação dos resultados da

pesquisa, sejam eles notas técnicas, atos normativos ou decisões, os resultados

duplicados foram desprezados mediante pesquisa do número do caso ou do nome da

parte (quando disponível). Assim, esclarece-se que a totalidade de ocorrências

encontradas (1.331) não corresponde a 1.331 casos diferentes.

Diante da busca e da filtragem tão específica, manteve-se apenas os documentos

com estrita pertinência ao tema. Portanto, todos os documentos selecionados

estabelecem, devido a esse filtro, uma zona de relacionamento entre a atividade do CNJ

e a independência jurisdicional, seja em razão de atos do CNJ sugerirem a julgadores

determinadas atitudes na atividade jurisdicional, seja por haver atos do CNJ que punem,

processam ou investigam juízes por determinadas atitudes na atividade jurisdicional, ou

ainda por interferirem nos efeitos da decisão judicial.

Em síntese, a categorização se estrutura da seguinte maneira:

13 Esta pesquisa está atualizada até o dia 01 de março de 2015.

31

I. Zona de interface entre a atividade do CNJ e a independência jurisdicional:

1. criada por via abstrata e prévia à atuação jurisdicional;

2. criada por via concreta e posterior à atuação jurisdicional;

a. com utilização de excesso de linguagem ou impropriedades;

b.parcial;

c. negligente;

d.com indícios de corrupção.

II. Zona de interferência criada por via concreta e posterior à atuação

jurisdicional.

Outra nota metodológica necessária diz respeito à definição de zona de interface

para o presente trabalho: trata-se da área em que interagem atividade não jurisdicional e

atividade jurisdicional, mais precisamente a atividade do Conselho Nacional de Justiça e

a independência jurisdicional, não havendo transformação nos atos jurisdicionais.

Não se pretende confundir interface com interferência. A zona de interface é o

espaço onde há interação entre os dois tipos de atividade, não havendo indicação de

sobreposição ou de transformação.

O levantamento das decisões normativas e disciplinares proferidas pelo

Conselho Nacional de Justiça foi realizado por meio de pesquisa no banco de dados

eletrônico disponível no site oficial do CNJ14, em sua seção de busca de jurisprudência.

É importante frisar que não se pretende realizar análises quantitativas nesta

pesquisa. Isto é, embora se pretenda expor, sempre que possível, a quantidade de

decisões normativas ou disciplinares que foram encontradas na pesquisa, seu único

intuito é revelar as ocorrências em prol da transparência da pesquisa. Essa ressalva se

deve ao fato de que não foi possível dimensionar a completude e eficiência da

indexação por parte do site oficial do Conselho Nacional de Justiça, o que inviabilizaria

um enfoque quantitativo na pesquisa que trouxesse ilações sobre os números de

14 Disponível em:

<http://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/JurisprudenciaSearch.seam;jsessionid=088C9905BE1778E466CCD54

44A4424D9.node13>. Acesso em 30 set. 2015.

32

decisões que punem ou não magistrados, ou decisões normativas que se referem aos

atos jurisdicionais em comparação com o universo de atos normativos15.

15 O que não desqualifica outras pesquisas que apresentaram dados quantitativos sobre o Conselho

Nacional de Justiça e que consideraram as limitações da base de dados. Dentre elas, menciona-se o item

2.2 (CNJ em números) da dissertação de mestrado de Ivan Candido da Silva de Franco, sob orientação

dos professores doutores Luciana Gross Cunha e Dimitri Dimoulis, defendida na Escola de Direito de São

Paulo da Fundação Getulio Vargas em 2015. Cf. FRANCO, Ivan Candido da Silva de Franco. Quem

julga os juízes? Uma análise do controle disciplinar do Conselho Nacional de Justiça (2005-2013).

Dissertação (Mestrado em Direito e Desenvolvimento) – Escola de Direito de São Paulo da Fundação

Getulio Vargas, 2015.

33

CAPÍTULO 2

JURISDIÇÃO E CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

34

2.1. Poder Judiciário e Conselho Nacional de Justiça

Com a promulgação da Constituição brasileira em 1988, reagindo ao regime

ditatorial militar, tem-se no Judiciário a arena onde seria decidida a efetiva

implementação da democracia brasileira. Nas palavras de Márcio Thomaz Bastos,

presidente da OAB à época e lembrado por Newton de Tavares Filho16, “juízes teriam a

missão fundamental de contribuir a cada sentença para remover o entulho ditatorial que

ainda persistisse”.

Imbuído dessa missão, o Judiciário se edificou, fortalecendo o próprio Estado e

dando suporte para a manutenção da democracia, em resposta à exigência de uma

atuação incisiva e concretizadora de direitos fundamentais (judicialismo) e formando a

salvaguarda necessária para diversos pilares estatais.

Este subitem será dedicado a elucidar a estrutura do Poder Judiciário, com o

objetivo de situar o leitor na discussão orgânica sobre o Conselho Nacional de Justiça,

descrição útil para se conhecer o debate sobre o alegado controle externo do Poder

Judiciário, estimulado por ocasião da instalação desse órgão.

O Poder Judiciário brasileiro possui estrutura unitária e nacional, com arranjo de

competências entre as denominadas “Justiças”, que se subdividem entre Justiças

comuns (federal e estadual) e especializadas (trabalhista, eleitoral e militar).

Na Constituição de 1988 a “estrutura foi redesenhada, com o aumento do

número de Tribunais Regionais do Trabalho, a criação dos Tribunais Regionais na

Justiça Federal comum e a criação de um novo Tribunal Superior – o Superior Tribunal

de Justiça -, que recebeu a incumbência de zelar pela integridade do direito federal,

transferida do STF. Os Juizados Especiais cíveis e criminais, instrumento de

simplificação e barateamento do processo, ganharam sede constitucional [...]”17

André Ramos Tavares, sob o enfoque da unidade, explica que a “estrutura

judiciária brasileira é unitária, nacional. A presença de um espaço próprio para a

atuação (competência jurisdicional) de cada uma das chamadas vulgarmente ‘Justiças’

não pode conduzir à conclusão que seria de todo equivocada e indesejável, de que o

Poder Judiciário no Brasil é fragmentado”18.

16 TAVARES FILHO, Newton. Subcomissão do Poder Judiciário e do Ministério Público. In: BACKES,

Débora Bithiah de Azevedo; ARAÚJO, José Cordeiro de (Orgs). Audiências públicas na Assembleia

Nacional Constituinte: a sociedade na tribuna. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2009, p.

219. 17 TAVARES FILHO, Newton, op. cit., p. 220. 18 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 135.

35

O órgão de cúpula do Judiciário nacional é o Supremo Tribunal Federal (STF),

que também acumula a função de Corte Constitucional. Seguem-se ao STF os Tribunais

Superiores: Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior Eleitoral, Superior Tribunal

Militar e Tribunal Superior do Trabalho, que ocupam função revisora e capacidade – em

regra – terminativa nas questões de sua especialidade.

Tem-se ainda os Tribunais de Justiça, custeados e organizados pelos respectivos

Estados-membros, assim como o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios,

localizado em Brasília, mas custeado e organizado pela União. Esses Tribunais

funcionam como instâncias superiores da Justiça Comum Estadual, tendo o Estado-

membro poderes e competências para organizá-la em sua Constituição Estadual desde

que não contrarie os parâmetros constitucionais nacionais. Na primeira instância da

Justiça Estadual Comum encontram-se os juízes de Direito estaduais, vinculados ao

Tribunal de cada Estado-membro, e os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, que

atuam diante de demandas de pequeno valor e de crimes de menor potencial ofensivo,

ambos regulados pela Lei n. 9.099/95. Além desses, há também os Juizados Especiais

da Fazenda Pública, instituídos pela Lei n. 12.153/2009.

A competência da Justiça Estadual comum é determinada residualmente, isto é,

aquela que não for federal comum ou especializada será da Justiça Estadual Comum.

Essa competência é também delimitada por critérios territoriais, sendo divididas em

Comarcas e subdividida em Varas. De acordo com a organização judiciária, quando for

possível e desejável, determinadas Varas poderão ser incumbidas de matérias

específicas como, por exemplo, Vara da Infância e Juventude, Vara Criminal, Vara

Cível, Vara da Fazenda Pública etc.

A Justiça Federal conta com Tribunais Regionais Federais como instância

superior. Embora tenham essa denominação, eles não correspondem a cada região

geográfica do país19. Ao todo, são cinco Tribunais Regionais Federais, cada um

abarcando um grupo de Estados-membros, sendo o da Primeira Região responsável

pelos Estados: Acre, Amazonas, Amapá, Bahia, Distrito Federal, Goiás, Maranhão,

Minas Gerais, Mato Grosso, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima e Tocantins; o da Segunda

Região, pelos Estados: Rio de Janeiro e Espírito Santo; o da Terceira Região, pelos

19 Sobre o arranjo federalista brasileiro vide RAMOS, Dircêo Torrecillas. Composição da Federação

brasileira. In: RAMOS, Dircêo Torrecillas (Coord.). O Federalista Atual: teoria do federalismo. Belo

Horizonte: Arraes, 2013, p. 84-92.

36

Estados: São Paulo e Mato Grosso do Sul; o da Quarta Região, pelos Estados: Paraná,

Santa Catarina e Rio Grande do Sul; e por fim, o da Quinta Região, pelos Estados:

Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe.

A primeira instância da Justiça Federal se organiza em Seções, Subseções e

Varas Federais, além dos Juizados Especiais Federais (criminais e cíveis) instituídos

pela Lei n. 10.259/2001.

Sua competência é delimitada por sua localização e pela matéria ou pessoas

envolvidas, isto é, caberá à Justiça Federal comum, de acordo com o art. 109 da

Constituição brasileira20, processar e julgar as causas em que a União, entidade

autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés,

assistentes ou oponentes; entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e

Município ou pessoa domiciliada ou residente no País; os crimes políticos e as infrações

penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas

entidades autárquicas ou empresas públicas, dentre outras.

Para ilustrar a dimensão da estrutura da Justiça Nacional, chama-se a atenção

para a quantidade de órgãos federais e estaduais, além dos órgãos nacionais que também

são custeados pela União (Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça).

Na estrutura federal estão: Tribunais Regionais Federais, Juízes federais, Juizados

Federais Cíveis e Criminais, Tribunal Superior Eleitoral, Tribunais Regionais Eleitorais,

Juízes eleitorais, Superior Tribunal Militar, Conselhos de Justiça, Tribunal Superior do

Trabalho, Tribunais Regionais do Trabalho e Juízes do trabalho. Outrossim, a Justiça

Estadual engloba: Tribunais de Justiça, Juízes estaduais, Juizados Especiais Cíveis e

20 “Art. 109 [...] I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem

interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes

de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; II - as causas entre Estado estrangeiro

ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País; III - as causas

fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional; IV - os

crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou

de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a

competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; V - os crimes previstos em tratado ou convenção

internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no

estrangeiro, ou reciprocamente; V-A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste

artigo; VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema

financeiro e a ordem econômico-financeira; VII - os "habeas-corpus", em matéria criminal de sua

competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente

sujeitos a outra jurisdição; VIII - os mandados de segurança e os "habeas-data" contra ato de autoridade

federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais; IX - os crimes cometidos a bordo de

navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar; X - os crimes de ingresso ou

permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o "exequatur", e de sentença

estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à

naturalização; XI - a disputa sobre direitos indígenas.”

37

Criminais, Juizados Especiais da Fazenda Pública, Tribunal de Justiça Militar Estadual,

Conselhos de Justiça e Juízes militares.

Segundo a décima primeira edição do relatório “Justiça em Números”, divulgado

em setembro de 2015 (ano-base 2014), construído a partir dos dados fornecidos por 90

tribunais (divididos em cinco segmentos: Justiça Estadual, Justiça Federal, Justiça do

Trabalho, Justiça Militar, Justiça Eleitoral, além dos Tribunais Superiores – exceto o

Supremo Tribunal Federal) 21 e promovido pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias

do Conselho Nacional de Justiça, em 2014 tem-se o total de 16.927 magistrados, dos

quais 11.631 são da Justiça Estadual22.

Já financeiramente segundo a décima primeira edição do Relatório Justiça em

Números, promovido pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias do Conselho

Nacional de Justiça em 2014, as despesas totais do Poder Judiciário somaram

aproximadamente R$ 68,4 bilhões23.

Dessa breve síntese acerca da composição e atuação do Judiciário Nacional, em

especial diante da variedade de competências e arranjos complexos, com órgãos de

competência especial e comum, federais e estaduais, é possível notar a complexidade e

extensa dimensão dessa estrutura, adotando aqui as palavras de André Ramos Tavares:

[C]om uma dualidade de estrutura judiciária (estadual e federal),

com tribunais de sobreposição e, ainda, com tribunais nacionais, o

Judiciário brasileiro é um composto complexo de unidades

judiciárias. A existência e persistência de certas unidades de atuação

e sua configuração (como a Justiça militar) bem como a inexistência

de outras (como uma Justiça eleitoral especializada), assim como o

grande volume de processos em diversas instâncias pelo país, denotam

a falta de um estudo prévio que pudesse servir de amparo para bem

determinar o tipo de figurino mais apropriado à realidade do país, em

suas diversas realidades regionais. A distribuição de competências

entre as unidades jurisdicionais a partir de uma repartição

exclusivamente teorética, sem maiores preocupações práticas ou

de política judiciária (como a priorização de questões relevantes

nacionalmente, a ponto de merecerem uma estrutura própria e

especializada), fragilizou a proposta constante judiciária da

Constituição de 1988 e, mais do que isso, fragilizou o próprio

Judiciário nacional.

Nossos grifos.

21 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números 2015: ano-base 2014. Brasília: CNJ, 2015.

Apresentação, p. 5. 22 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números 2015, op. cit., p. 29. 23 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números 2015, op. cit., p. 31.

38

A cisão entre as denominadas “Justiças” Federal e Estadual é organizacional e

financeira. Contudo, ambas, somadas às Justiças especializadas e aos Tribunais

Nacionais (STF e STJ), compõem a Justiça Nacional com estrutura unitária, sendo

(salvo o STF) submetidas à atuação do Conselho Nacional de Justiça.

Renault e Bottini já afirmaram que a “discussão sobre a estrutura e o papel do

Poder Judiciário confunde-se com a própria história das instituições públicas

brasileiras”24, em 1992 pela proposta de emenda constitucional n. 96 iniciou a

tramitação na Câmara dos Deputados da reforma do judiciário sendo aprovada apenas

em dezembro de 2004 pela emenda constitucional n. 45.

Sobre o apoio da cúpula do Poder Judiciário à criação do Conselho Nacional de

Justiça, Ivan Franco afirma que esse apoio existiu tendo o STF se destacado neste papel

durante o processo de aprovação, em especial, após a mudança de seu presidente, à

época Maurício Corrêa, que se opunha ao CNJ, sendo eleito presidente o ministro

“Nelson Jobim, um conhecido entusiasta do órgão pelo menos desde sua passagem pelo

Ministério da Justiça (1995-1997)”25.

O art. 92 da Constituição brasileira elenca os órgãos do Poder Judiciário e com a

redação dada pela Emenda Constitucional n. 45 de 2004 foi incluído o inciso I-A

indicando o Conselho Nacional de Justiça como um dos órgãos desse Poder26.

A Emenda Constitucional n. 45 de 2004, conhecida como Reforma do

Judiciário, também incluiu na Constituição brasileira o artigo 103-B, que versa

especificamente sobre o Conselho Nacional de Justiça.

Este dispositivo constitucional introduz em nosso sistema o CNJ, indicando o

número de componentes, período de mandato, recondução, categorias e regras de

nomeação para seus conselheiros, reservando a presidência ao presidente do Supremo

Tribunal Federal e a Corregedoria Nacional de Justiça ao conselheiro proveniente do

Superior Tribunal de Justiça.

O Conselho Nacional de Justiça é composto por quinze membros, o presidente

do Supremo Tribunal Federal tem assento reservado no CNJ pela Constituição, onde

24 RENAULT, Sérgio Rabello Tamm; BOTTINI, Pierpaolo. Primeiros passos. In: RENAULT, Sérgio

Rabello Tamm; BOTTINI, Pierpaolo (Coord.). Reforma do Judiciário. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 1. 25 FRANCO, Ivan Candido da Silva de, op. cit., p. 40. 26 “Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário: I - o Supremo Tribunal Federal; I-A o Conselho Nacional de

Justiça; II - o Superior Tribunal de Justiça; III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais; IV -

os Tribunais e Juízes do Trabalho; V - os Tribunais e Juízes Eleitorais; VI - os Tribunais e Juízes

Militares; VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. § 1º O Supremo

Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais Superiores têm sede na Capital Federal.

§ 2º O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o território nacional.”

39

também ocupa a presidência. Essa reserva veio com a emenda constitucional n. 61 de

2009, antes disso poderia ser qualquer ministro do STF indicado pelo próprio Supremo,

entretanto, durante a vigência da redação antiga, entre dezembro de 2004 e novembro de

2009, mesmo sem a reserva constitucional, todos os ministros do STF que ocuparam a

vaga e, por conseguinte a presidência do CNJ, eram também os presidentes do STF,

forma os ministros: Nelson Jobim, Ellen Gracie e Gilmar Mendes.

Outra questão que vale mencionar, ao contextualizar o Conselho Nacional de

Justiça e sua presidência, é que desde a Emenda Constitucional n. 61/2009, caso o

presidente do STF (que também é presidente do CNJ) tenha que se ausentar ou

reconhecer impedimentos, caberá ao vice-presidente do STF assumir a presidência do

CNJ. Neste caso, o curioso é notar que, durante a ausência ou impedimentos, o

Conselho Nacional de Justiça será presidido por ministro que até aquele momento não

fazia parte do quadro de Conselheiros.

Os outros quatorze conselheiros se dividem de acordo com o seu órgão de

origem. O Supremo Tribunal Federal deve indicar um juiz estadual, além do seu

presidente, que já é expressamente reservado pela norma constitucional; o Superior

Tribunal de Justiça deve indicar um ministro, um juiz de um dos Tribunais Regionais

Federais e um juiz federal; o Tribunal Superior do Trabalho deve indicar um ministro,

um juiz de um dos Tribunais Regionais do Trabalho e um juiz do trabalho. O

Procurador-geral da República deve indicar um membro do Ministério Público da

União, e ainda, deve escolher um membro do Ministério Público estadual dentre os

nomes indicados pelo órgão competente de cada instituição estadual. O Conselho

Federal da Ordem dos Advogados do Brasil deve indicar dois advogados. As outras

duas vagas são destinadas a dois cidadãos, de notável saber jurídico e reputação ilibada,

indicados um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal.

Esses quatorze conselheiros deverão ser nomeados pelo Presidente da República,

depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.

Além disso, o art. 103-B da Constituição brasileira, por seu parágrafo quarto,

especifica as competências do Conselho, destinando a ele o controle da atuação

administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres

40

funcionais dos juízes, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto

da Magistratura27.

O mesmo comando constitucional traz em seus incisos especificamente as

competências do CNJ, tais como:

a) Zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da

Magistratura e pela observância do art. 3728;

b) Poder de revisão de atos administrativos: apreciar, de ofício ou mediante

provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou

órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo

para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei,

sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;

c) Poder normativo: pode expedir atos regulamentares, no âmbito de sua

competência, ou recomendar providências;

d) Poder disciplinar: receber e conhecer das reclamações contra membros ou

órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e

órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação

do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e

correcional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e

determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou

proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções

administrativas, assegurada ampla defesa. Além de poder rever, de ofício ou

mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de

tribunais julgados há menos de um ano;

e) Representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração

pública ou de abuso de autoridade;

f) Elaborar semestralmente relatório estatístico sobre processos e sentenças

prolatadas, por unidade da Federação, nos diferentes órgãos do Poder Judiciário;

e elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias,

sobre a situação do Poder Judiciário no País e as atividades do Conselho.

27 Vale dizer que, embora o art. 93 da Constituição brasileira preveja que lei complementar, de iniciativa

do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, indicando os princípios que

devem ser observados, até o momento de conclusão desta pesquisa, setembro de 2015, não foi editada tal

lei complementar. 28 Que dispõe sobre a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

41

É importante frisar que desde sua redação originária não foi atribuído ao

Conselho Nacional de Justiça o poder jurisdicional; isto é, embora seja órgão integrante

do Poder Judiciário, não tem competência para agir jurisdicionalmente, podendo seus

atos ser revistos pelo Poder Judiciário, uma vez que não estão revestidos da coisa

julgada29.

O Conselho Nacional de Justiça, inaugurado com a Reforma do Judiciário,

notadamente pela Emenda Constitucional n. 45 de dezembro de 2004, não é o primeiro

Conselho do gênero na história constitucional brasileira. Em 1977, pela Emenda

Constitucional nº 7, o regime militar instituiu o famigerado Conselho Nacional de

Magistratura, apontado por Peleja Júnior30 como o órgão censório do Poder Judiciário.

Essa emenda constitucional trouxe uma série de alterações que minaram a força do

Judiciário nacional, retirando-lhe autonomia e submetendo as garantias da magistratura

a exceções de “interesse público”. Pode-se dizer que, ao passo que a Emenda

Constitucional 45/2004 reformou o Judiciário brasileiro, a Emenda Constitucional 7/77

o implodiu.

Embora o Conselho Nacional de Justiça esteja muito distante desse modelo

autoritário que conhecemos em outra época, desde antes mesmo de sua criação figurou

como protagonista de intensos debates. Seu nascimento foi precedido de uma atmosfera

pouco amistosa que permeava a relação entre os poderes, notadamente o

posicionamento do chefe do Executivo diante da pouca transparência do Judiciário

nacional, provocando um memorável discurso amplamente divulgado pela mídia, no

qual o presidente da República se manifestou sobre a necessidade de se “abrir a caixa

preta do Judiciário”. Tal frase lhe rendeu até mesmo uma interpelação pelo Supremo

Tribunal Federal, que requisitou explicações.

O objetivo da criação do Conselho Nacional de Justiça, segundo André Ramos

Tavares, “seria, então, o de vigiar, tal e qual uma sentinela. O axioma que embasa essa

criação é bastante conhecido: a eficiência de determinado poder, bem como a sua lisura,

é mais facilmente obtida por meio da existência de um órgão fiscalizador”31.

29 Adiante será abordado o tema da jurisdição e não jurisdição. 30 PELEJA JÚNIOR, Antônio Veloso. Conselho Nacional de Justiça e a magistratura brasileira. 3. ed.

Curitiba: Juruá, 2009, p. 95. 31 TAVARES, André Ramos. Reforma do Judiciário no Brasil pós-88: (des)estruturando a justiça:

comentários completos à EC n. 45/04. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 160-161.

42

Como observa Sampaio32, enquanto na Europa os Conselhos surgiram para

assegurar a independência jurisdicional, na América Latina foram motivados pelo

“estabelecimento da accountability, da fiscalização, do controle para a modernização do

funcionamento interno do Poder racionalizando o uso dos recursos humanos e

financeiros, bem como, evitando o nepotismo, a corrupção, a má gestão e os

desperdícios”.

O Conselho Nacional de Justiça encontrou, desde os seus primitivos debates,

diversos obstáculos quase intransponíveis. Para ilustrar a arena conflituosa que permeou

sua criação, vale lembrar que, antes mesmo de ser publicada a Emenda Constitucional n.

45, o Supremo Tribunal Federal já havia recebido uma ação direta de

inconstitucionalidade acerca da criação do Conselho Nacional de Justiça. A ADI n.

3367 foi proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros em 9 de dezembro de

2004, quase um mês antes da publicação da Emenda Constitucional n. 45, que ocorreu

apenas em 31 de dezembro de 2004. A ADI foi julgada totalmente improcedente em 13

de abril de 2005, permitindo a instauração de todos os efeitos da criação do Conselho

Nacional de Justiça33.

Essa ação direta de inconstitucionalidade pôs fim às dúvidas sobre a

constitucionalidade do Conselho Nacional de Justiça; entretanto, marcou apenas o início

dos questionamentos acerca do exercício de suas precípuas funções.

No modelo brasileiro, o CNJ acumulou diversas e variadas funções34 que podem

ser agrupadas em dois grandes eixos, um que diz respeito às funções financeiras e outro

relativo às funções administrativas do Poder Judiciário. Dentre suas competências, duas

outras se destacam: a que lhe atribui o poder normativo e aquela relativa ao poder

disciplinar.

Dentre os órgãos constitutivos do Poder Judiciário elencados no art. 92 da

Constituição brasileira, o Conselho Nacional de Justiça é o único que não possui

jurisdição, é órgão judicial, mas não jurisdicional35. Para aprofundarmos a análise e

implicações dessa ausência de jurisdição, será necessário abordar o que é jurisdição e

32 SAMPAIO, José Adércio Leite. Conselho Nacional de Justiça e a independência do Judiciário. Belo

Horizonte: Del Rey, 2007, p. 82. 33 A ADI 3367 será analisada detalhadamente adiante, sendo cada trecho examinado no subitem de

pertinência. 34 Sobre as funções, vide MOREIRA, Diogo Rais Rodrigues; LAZARI, Rafael. A atividade dialógica do

Conselho Nacional de Justiça e o federalismo no cenário brasileiro. In: RAMOS, Dircêo Torrecillas. O

Federalista atual: teoria do federalismo. Belo Horizonte: Arraes, 2013, p. 346-359. 35 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição federal comentada e legislação

constitucional. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 534.

43

quais os efeitos de sua ausência sobre a prática cotidiana da relação entre os órgãos do

Poder Judiciário, especificamente – mais adiante – analisando o conflito diante da

chamada “questão judicializada”.

2.2. Jurisdição e não jurisdição

Pretende-se neste item trazer o posicionamento de diversos autores sobre o que é

jurisdição, com o objetivo de retratar um diálogo doutrinário para que adiante se adote

um posicionamento específico e alinhado ao fio condutor desta tese.

Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco destacam, como uma

das diferenças entre o Poder Judiciário ou a Jurisdição e os Poderes Legislativo e

Executivo, que esses últimos possuem certo entrelaçamento, provocando uma

singularidade mais acentuada do Poder Judiciário36.

Nery Junior e Nery afirmam que a jurisdição é monopólio do poder estatal, é

uma e indivisível37, sobre esse monopólio André Ramos Tavares, abordando o tema do

Poder Judiciário, pondera que “é vedado à justiça privada ter como imperativo a

destinação dos conflitos sociais ao Estado, que passa a contar com o monopólio de uso

da força (se necessária for). No Estado, a tarefa incumbe, como se sabe, ao Poder Judi-

ciário”38.

Daqui André Ramos Tavares extrai duas diretrizes básicas. A primeira é a

vedação de que o particular faça justiça; a segunda é que todo conflito pode ser levado

ao Estado e este, por sua vez, deverá solucioná-lo. Aqui, segundo o autor, é possível

vislumbrar duas ideias que são essenciais:

A) o Estado não pode negar-se a apreciar e decidir o conflito

social; e B) nenhum conflito social poderá ser excluído

(previamente, por lei ou por qualquer outro ato) da

apreciação dos órgãos estatais competentes. Esta última

hipótese encontra-se expressa na Constituição de 1988, em seu

art. 5º, ao determinar: “XXXV — a lei não excluirá da

apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”39.

36 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 8. ed.

São Paulo: Saraiva, 2013, p. 936. 37 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e

legislação extravagante. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 205. 38 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 1120. 39 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, op. cit., loc. cit.

44

Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Dinamarco

conceituam40 jurisdição como

uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui

aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente,

buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça.

Essa pacificação é feita mediante a atuação da vontade do

direito objetivo que rege o caso apresentando em concreto

para ser solucionado; e o Estado desempenha essa função

sempre mediante o processo, seja expressando imperativamente

o preceito (através de uma sentença de mérito), seja realizando

no mundo das coisas o que o preceito estabelece (através da

execução forçada).

Nossos grifos.

Elucidando sinteticamente o conceito de jurisdição, os autores explicam que se

trata ao mesmo tempo de poder, função e atividade. Em sua visão, a jurisdição é poder

por ser manifestação do poder estatal, mais precisamente a capacidade de decidir

imperativamente e impor decisões. Ao mesmo tempo, consideram a jurisdição uma

função por expressar o encargo que têm os órgãos estatais de promover a pacificação

dos conflitos por intermédio do processo. Por último, consideram-na também uma

atividade por ser o “complexo de atos do juiz no processo, exercendo o poder e

cumprindo a função que a lei lhe comete. O poder, a função e a atividade somente

transparecem legitimamente através do processo devidamente estruturado (devido

processo legal)”41.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho, ao explicar a natureza da função jurisdicional,

sintetiza que o Judiciário, um dos três poderes, “é o incumbido da função jurisdicional.

Ou seja, da função de fazer justiça”. Mais adiante, explica que fazer justiça se confunde

com a aplicação da lei, “daí a conceituação tradicional segundo a qual o Judiciário ‘tem

por missão aplicar contenciosamente a lei a casos particulares’ (Pedro Lessa)”42.

40 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel.

Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 129. 41 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel,

op. cit., loc. cit. 42 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 31. ed. São Paulo: Saraiva,

2005, p. 244.

45

Distinguindo a função jurisdicional da administrativa, Manoel Gonçalves

Ferreira Filho afirma que o único ponto pelo qual uma pode ser distinguida da outra é o

modo de execução da lei; em suas palavras43:

[D]e fato, este aplica a lei contenciosamente, isto é, com a

possibilidade rigorosamente garantida de debate entre as partes

interessadas no litígio. Abre-se perante ele sempre a possibilidade

do contraditório, permitindo-se a todos os que serão afetados pela

decisão fazerem ouvir suas razões, seus argumentos. E em razão

dessa garantia que faz presumir o acerto da decisão, ela goza de

uma forma de imutabilidade – a coisa julgada”.

Nossos grifos.

Embora apresente essa doutrina clássica, segundo a qual o juiz está adstrito à

aplicação da lei, Manoel Gonçalves Ferreira Filho chama a atenção do leitor para a

ampliação da função jurisdicional, pois a Constituição de 1988, segundo o autor, operou

uma espécie de alargamento da função jurisdicional, ou seja, “o Judiciário passa a

apreciar não só o estrito cumprimento da lei, mas também alguns outros princípios,

além do de legalidade. São estes, conforme o art. 37, caput, os da ‘impessoalidade,

moralidade, publicidade e eficiência’”44.

Michel Temer define ato jurisdicional como a atividade típica do Poder

Judiciário, capaz de produzir a coisa julgada. Em suas palavras, baseadas no VI Curso

de Especialização em Direito Tributário de Geraldo Ataliba, jurisdição “consiste no

poder de dizer o direito (juris dicere) aplicável a uma controvérsia, deduzida

processualmente em caráter definitivo e com a força institucional do Estado”45.

Em outras palavras, Michel Temer sintetiza seu raciocínio: “[A] definitividade

das suas decisões e a possibilidade de utilizar toda a força institucional do Estado

tipificam o exercício da função primordial do Poder Judiciário: a jurisdição”46.

Celso Bastos, ao tratar do tema da função jurisdicional, afirma inicialmente que

a ela cabe:

“este importante papel de fazer valer o ordenamento jurídico, de

forma coativa, toda vez em que seu cumprimento não se dê sem

resistência. Ao próprio particular (ou até mesmo a pessoas

jurídicas de direito público), o Estado subtraiu a faculdade de

exercício de seus direitos pelas próprias mãos. O lesado tem de

comparecer diante do Poder Judiciário, o qual, tomando

43 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, op. cit., p. 245. 44 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves, op. cit., p. 246. 45 TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 174. 46 TEMER, Michel, op. cit., p. 175.

46

conhecimento da controvérsia, se substitui à própria vontade das

partes que foram impotentes para se autocomporem” 47.

Nossos grifos.

Trazendo os ensinamentos de Mário Guimarães sobre jurisdição, André Ramos

Tavares afirma que “[O] poder de julgar pertence à nação, que o exercita por meio de

seus juízes. Chama-se a esse poder — jurisdição”.48

Para Rocha, a jurisdição seria uma atividade substitutiva das atividades das

partes envolvidas no conflito, isto é, a substituição da atividade privada por uma

atividade pública49.

Dinamarco explica que jurisdição não tem um único escopo, mas que há na

verdade vários escopos que não podem ser restritos ao campo jurídico, já que se deve

considerar a destinação social e política do exercício da jurisdição50.

André Ramos Tavares, ao explicar o conteúdo de jurisdição, afirma: “[A]

jurisdição é, exatamente, a atividade pela qual determinados órgãos pronunciam-se, em

caráter cogente, sobre a aplicação do Direito”51. Esclarece o autor que isso é realizado

por meio da obediência a um procedimento previamente determinado e que, ao final, se

alcança uma decisão que faz coisa julgada entre as partes. Sintetizando o tema, André

Ramos Tavares define jurisdição como a “atividade pela qual o Judiciário substitui-se à

vontade das partes, solucionando os conflitos de interesse que eventualmente surjam no

seio social”52.

Partindo dessa sintetização de André Ramos Tavares, entende-se aqui que

jurisdição é atividade que substitui as partes, revelando o direito e tendo a capacidade de

se revestir da coisa julgada.

O tema da jurisdição é uma constante nos debates acerca da existência e

atividade do Conselho Nacional de Justiça. O CNJ já foi alvo de diversos

questionamentos no Supremo Tribunal Federal sob o argumento em que exerceu ou

pretende exercer a jurisdição53, o que lhe é vedado justamente por não possuir em sua

47 BASTOS, Celso. Curso de Direito Constitucional, 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 377. 48 GUIMARÃES, Mário apud TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, op. cit., p.

1120. 49 ROCHA, Silvio Luís Ferreira da. Manual de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 63. 50 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 27. 51 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, op. cit., loc. cit. 52 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, op. cit., p. 1122. 53 Dentre outros, menciona-se: MS 30793/DF, que se desenvolveu sob relatoria da Ministra Cármen Lúcia

e foi julgado pela Segunda Turma em 05 de agosto de 2014; MS 28939 AgR/DF, que se desenvolveu sob

47

previsão constitucional o instituto da jurisdição, em que pese o CNJ ser órgão integrante

do Poder Judiciário como já foi mencionado.

Em outras situações54 o Supremo Tribunal Federal se referiu à ausência de

jurisdição do CNJ especificamente diante da questão judicializada55, mas em todos os

exemplares encontrados se posicionou afastando desse Conselho a jurisdição.

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3367, julgada no início de 2005, o

Supremo Tribunal Federal enfrentou a constitucionalidade da existência do Conselho

Nacional de Justiça, ocasião em que o Ministro-relator Cezar Peluso e outros ministros

dedicaram-se detalhadamente ao tema da jurisdição e sua inexistência nas competências

e atribuições do Conselho.

Afirmando que Conselho Nacional de Justiça tem natureza meramente

administrativa sendo órgão interno de controle administrativo, financeiro e disciplinar

da magistratura com competência relativa apenas aos órgãos e juízes situados,

hierarquicamente, abaixo do Supremo Tribunal Federal.

Neste mesmo julgado, o STF afirmou que cabe ao CNJ a subsistência do núcleo

político do princípio, mediante preservação da função jurisdicional, típica do Judiciário,

e das condições materiais do seu exercício imparcial e independente.

Nery Junior e Nery afirmam que os Conselheiros do CNJ não são investidos de

jurisdição e, portanto as decisões do CNJ não tem autoridade de coisa julgada, cabendo

ao Conselho controlar a função jurisdicional do Poder Judiciário e de seus membros, e

por essa razão não pode rever nem modificar decisão judicial, isto é, não tem

competência recursal56.

A identificação da jurisdição e a distinção do Conselho Nacional de Justiça

perante os demais órgãos do Poder Judiciário são necessárias para que se compreenda,

ao menos preliminarmente, a vedação da intervenção do órgão em decisões judiciais.

É neste contexto que está a resposta à pergunta: por que o CNJ não pode alterar

ou interferir na eficácia ou no teor de decisão judicial? A decisão judicial tem como um

de seus pressupostos a existência de jurisdição. Dentre os conceitos de jurisdição,

relatoria do Ministro Dias Toffoli e foi julgado pelo Pleno em 06 de março de 2013; MS 27148 AgR/DF,

que se desenvolveu sob relatoria do Ministro Celso de Mello e foi julgado em 11 de maio de 2011.

54 Dentre outros, menciona-se: MS 28174 AgR/DF, que se desenvolveu sob relatoria do Ministro Ricardo

Lewandowski e foi julgado pelo Pleno em 14 de outubro de 2010; MS 28611 MC-AgR/MA, que se

desenvolveu sob relatoria do Ministro Celso de Mello e foi julgado pelo Pleno em 11 de maio de 2011. 55 Vide item que trata especificamente do tema da questão judicializada. 56 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição federal comentada e legislação

constitucional, op. cit., p. 534.

48

recorre-se neste momento a Michel Temer, que sintetiza seu raciocínio nas seguintes

palavras: “[A] definitividade das suas decisões e a possibilidade de utilizar toda a força

institucional do Estado tipificam o exercício da função primordial do Poder Judiciário: a

jurisdição”.57

Assim, entende-se que a definitividade das decisões do Poder Judiciário e os

sistemas tanto de divisão de competências quanto recursal geram a possibilidade de que

as decisões judiciais se sobreporem. Assim, no mesmo caso concreto, a decisão

proferida em um recurso no Tribunal de Justiça pode se sobrepor à decisão proferida

pelo magistrado em primeiro grau; essa sobreposição em nada interfere na

independência judicial, pois ambas as decisões são revestidas de jurisdição e estão na

linha vertical de competências definidas previamente no sistema recursal.

Por que então o Conselho Nacional de Justiça não poderia emitir decisão que se

sobreporia à decisão de magistrado de primeiro grau, ou até mesmo dos Tribunais?

Porque, embora o CNJ seja órgão integrante do Poder Judiciário, não possui jurisdição

e, portanto, não tem o pressuposto indispensável para emitir decisões jurisdicionais

definitivas.

A ausência de jurisdição no Conselho Nacional de Justiça fica evidente diante da

análise do texto constitucional, e abordá-la em abstrato é tarefa relativamente evidente e

pacífica, entretanto, diante de casos concretos nem sempre será fácil fazer essa cisão

entre jurisdição e não jurisdição, em especial, diante da problemática da “questão

judicializada” que será analisada a seguir por força dos pontos de confluência e conflito

sobre a atividade do CNJ e os limites impostos pela ausência de jurisdição.

2.3. Jurisdição versus não jurisdição: a questão judicializada e o CNJ, um conflito

de competência 58

Este subitem é dedicado à análise do conflito entre jurisdição e não jurisdição,

mais especificamente à chamada questão judicializada no âmbito do CNJ, buscando

traçar um panorama do entendimento do Conselho ao longo dos últimos anos e, mais

recentemente, do Supremo Tribunal Federal.

57 TEMER, Michel, op. cit., p. 175. 58 Este item é baseado em: MOREIRA, Diogo Rais Rodrigues; FRANCO, Ivan Candido da Silva de. A

(in)competência do CNJ em face da questão judicializada. No prelo.

49

Vale dizer também que a análise da questão judicializada tem relação direta com

o tema central da interface entre a atuação do Conselho Nacional de Justiça e a

independência judicial, uma vez que, dependendo do entendimento adotado pelo

Conselho, sua atividade típica poderia provocar a sobreposição da decisão judicial ou a

desconsideração de decisão judicial. Antes de prosseguir, no entanto, será necessária a

identificação do que é considerado “questão judicializada” para fins de aplicação no

âmbito do CNJ.

2.3.1. O conceito de questão judicializada no âmbito do CNJ

A expressão “questão judicializada” é a mais comum no teor das decisões do

Conselho Nacional de Justiça para designar o conflito provocado pela utilização

simultânea das vias judicial e administrativa. Em outras palavras, questão judicializada

é aquela que, ainda que de competência do Conselho por envolver matéria

administrativa, encontra-se sub judice em algum órgão jurisdicional, estando pendente

decisão jurisdicional.

Diante da polissemia da expressão “questão judicializada”, buscou-se nas

decisões do CNJ um conceito e parâmetros para que se defina o que é questão

judicializada para fins deste estudo, após a pesquisa empírica obtendo as decisões do

CNJ a respeito do tema, pode-se afirmar que a questão judicializada ocorre se satisfeitas

duas condições: i. nas ocasiões em que a(s) mesma(s) parte(s) se socorrem da atividade

jurisdicional e ii. que o objeto da pretensão jurisdicional é o mesmo submetido ao

Conselho Nacional de Justiça.

Em decisão de 2013, o Conselho se manifestou exatamente neste sentido, foi nos

autos de um procedimento de controle administrativo que tinha por objeto uma licitação

por concorrência e a existência de restrição ao caráter competitivo do certame.

A questão foi judicializada pelo ajuizamento de mandado de segurança

interposto pela DM Construtora de Obras Ltda., sendo considerado que não impede a

apreciação do CNJ na medida em que não há identidade subjetiva entre a impetrante do

mandado de segurança e o requerente deste procedimento de controle administrativo59.

59 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0005673-

81.2012.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro Silvio Rocha, j. 08/10/2013. Ementa.

50

Conclui-se portanto que a identidade subjetiva, isto é, a identidade das partes se

revela imprescindível para a identificação e existência da questão judicializada, mas

exige-se ainda, outra condição para a ocorrência da questão judicializada, é necessário,

também, a identidade objetiva, isto é, a identidade de objeto, de matéria.

Nos autos da revisão disciplinar n. 0000325-53.2010.2.00.0000 que se

desenvolveu sob a relatoria do Conselheiro José Adonis Sá tendo sido julgada em 18 de

maio de 2010, foi enfrentada a alegação de judicialização da matéria diante de mandado

de segurança impetrado perante o Tribunal de Justiça do Pará, sob alegações de

nulidades no processo administrativo disciplina tendo se fixado contra a decisão que

originariamente aplicou a sanção de aposentadoria compulsória.

Mas nesta revisão disciplinar entendeu-se que não estava em discussão a

regularidade do processo administrativo disciplinar e a sanção nele aplicada, pois a

controvérsia posta na revisão disciplinar dizia respeito à existência dos pressupostos

legais para o deferimento do pedido de revisão na instância de origem. O que revelou,

segundo o CNJ, a diversidade de objeto, na ação de mandado de segurança e na revisão

disciplinar60.

Note-se que a questão judicializada no sentido aqui disposto não se refere a uma

ação judicializada diretamente contra o Conselho Nacional de Justiça. Esses casos

possuem regras de competência própria, sendo - via de regra - cabíveis no Supremo

Tribunal Federal61, em decorrência direta da Constituição brasileira pelo art. 102, I, r62.

Portanto, considerando a experiência do Conselho Nacional de Justiça diante da

matéria, identifica-se questão judicializada quando há, simultaneamente, identidade de

sujeitos e de objeto em processos que tramitam no CNJ e em âmbito jurisdicional.

Para que se compreendesse de que forma o CNJ, ao longo de sua história,

definiu sua própria competência diante da questão judicializada, foi realizada uma

pesquisa exaustiva através do mecanismo de busca de jurisprudência do site do

60 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Revisão Disciplinar n. 0000325-53.2010.2.00.0000. Plenário,

Rel. Conselheiro José Adonis Sá, j. 18/05/2010. Voto do relator. 61 Vale salientar que, conforme jurisprudência do STF, as ações que a Corte tem recebido como de sua

competência são as mandamentais (mandado de segurança, habeas corpus, habeas data e mandado de

injunção). Por todos os acórdãos, ver: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AO 1.706 AgR/DF. Plenário,

Rel. Ministro Celso de Mello, j. 18/12/2013. 62 “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-

lhe: I - processar e julgar, originariamente: [...] r) as ações contra o Conselho Nacional de Justiça e contra

o Conselho Nacional do Ministério Público; (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).”

51

Conselho Nacional de Justiça63 que gerou material suficiente para as conclusões

apresentadas a seguir.

2.3.2. Como se desenvolveu a questão judicializada no CNJ

As discussões sobre a “questão judicializada” são recorrentes no CNJ, tendo a

matéria sido enfrentada pela primeira vez em 2007. O primeiro caso que tratou do tema

se desenvolveu sob relatoria do Conselheiro Rui Stoco64 que na própria ementa dispôs

sobre este tema afirmando que a parte interessada não poderia fazer uso

simultaneamente de procedimentos administrativos perante o CNJ e dos meios

jurisdicionais.

No segundo caso, julgado já no ano seguinte, em 2008, o Conselheiro Relator

Felipe Locke Cavalcanti apresentou em sua decisão diante da questão judicializada

entendendo que não pode o CNJ avançar além dos limites impostos pela norma

constitucional, não podendo atingir ou interferir na decisão judicial ou tomar para si o

objeto que está sendo discutido jurisdicionalmente, o que acabaria por esvaziar o

conteúdo decisório65.

Ao final, o recurso administrativo teve negado provimento por unanimidade. Em

sua ementa se afirma que a matéria judicializada pela própria requerente, por meio de

Mandado de Segurança, impede decisão do CNJ, pois poderia, por vias transversas,

tornar ineficaz a decisão judicial ou esvaziar seu objeto66.

Em síntese, considerando os julgados iniciais do Conselho Nacional de Justiça

especificamente em procedimentos que contêm o problema da questão judicializada,

constata-se que, diante da possibilidade de interferência, direta ou indireta, da decisão

do Conselho na decisão jurisdicional, o Conselho se absteve de decidir a respeito da

matéria.

Em outro caso, ainda no ano de 2008, o Conselheiro Relator João Oreste

Dalazena decidiu nesta mesma linha, mas fundamentou sua decisão no princípio da

63 Para detalhamento da metodologia (parâmetros de busca, resultados etc.), vide nesta tese o item a

respeito das notas metodológicas. 64 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Pedido de providências n. 1400. Plenário, Rel. Conselheiro Rui

Stoco, j. 11/09/2007. 65 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Recurso Administrativo em Pedido de Providências n.

0000295-86.2008.2.00.0000 62. Plenário, Rel. Conselheiro Felipe Locke Cavalcanti, j. 13.05.2008, p. 04. 66 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Recurso Administrativo em Pedido de Providências n.

0000295-86.2008.2.00.0000 62. Plenário, Rel. Conselheiro Felipe Locke Cavalcanti, j. 13.05.2008, p. 04.

52

segurança jurídica. Segundo ele, o sistema jurídico não admitiria um conflito de

decisões entre duas esferas distintas, e ainda, eventual decisão do Conselho Nacional de

Justiça a respeito da matéria implicaria uma espécie de interferência na atividade

jurisdicional 67.

Em aproximadamente 95% (noventa e cinco por cento) dos casos encontrados na

pesquisa por tratarem de questão judicializada no âmbito do Conselho Nacional de

Justiça, o Conselho decidiu que deveria se abster de julgar a matéria. Em sua maioria, a

fundamentação incluiu o binômio segurança jurídica e vedação de interferência na

atividade jurisdicional. Entretanto, foram encontradas 08 (oito) decisões em que o

Conselho entendeu de maneira diversa e apresentou solução distinta à matéria, mesmo

se referindo sobre a questão judicializada.

Nestes casos, embora se trate de exceções no conjunto de decisões, contrariando

a jurisprudência predominante do Conselho, a fundamentação das decisões pode ser

sintetizada em duas grandes teses: i) reserva de competência do Conselho Nacional de

Justiça; e ii) critério cronológico.

Dada a singularidade desses casos, faz-se a seguir uma análise detalhada

considerando cada uma dessas teses.

2.3.2.1. Tese da reserva de competência do CNJ

Sobre a reserva de competência do CNJ, em alguns casos concretos o Conselho

Nacional de Justiça decidiu que, mesmo diante da questão judicializada, teria ele

próprio competência para prosseguir no julgamento. Um caso em que o CNJ não se

absteve de julgar diante da questão judicializada, com base nesta tese, foi o de “Iolanda

Nepomuceno Silva e o Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão”, sob a relatoria do

Conselheiro Marcelo Nobre.

67 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0001844-

34.2008.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro João Oreste Dalazena, j. 02/12/2008, voto do Relator, p.

04.

53

Em 25 de setembro de 2008, Iolanda Nepomuceno Silva ingressou no Conselho

Nacional de Justiça com Procedimento de Controle Administrativo68 em face de ato do

Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em vista de alegada afronta

ao que considerava como seu direito adquirido ao longo de 42 anos de trabalho como

Escrevente Juramentada e Escrivã do 2º Oficio da Comarca de Barra do Corda

(Maranhão).

Foi nomeada para o cargo de Escrevente Juramentada Substituta por ato do

Governador do Estado em 1966, o que perdurou até 1978, quando foi renovada sua

designação por ato do então Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão

para os mesmos cargos. Estes são os dois atos que a mantiveram no cargo antes da

entrada em vigor da atual Constituição Federal.

O Tribunal de Justiça do Maranhão informou nos autos (afirmação não

impugnada pela requerente) que ela fora designada para exercer a titularidade do

cartório em 03 de julho de 1998. Foi surpreendida com o edital do concurso em que o 2º

Oficio da Comarca de Barra do Corda foi listado como serventia vaga e, por isso,

requereu liminar para que fosse imediatamente excluída do concurso essa serventia,

reforçando sua tese de que possuía estabilidade excepcionalmente garantida pela

Constituição. Informou, também, que pleiteava a estabilidade no cargo de escrivã, por

meio do processo judicial nº 22232/2008, que à época tramitava no âmbito do Tribunal

de Justiça do Maranhão.

Inicialmente, sob a relatoria do Conselheiro Marcelo Nobre, a liminar foi

indeferida diante da ausência dos requisitos legais e, em ato contínuo, foram solicitadas

informações ao Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em 20 de outubro de 2008.

Vale ressaltar que desde a decisão liminar o Conselheiro já mencionava a

existência de ação judicial sobre a matéria, havendo aparente identidade tanto de objeto

quanto de sujeitos; ainda assim, o procedimento prosseguiu normalmente.

Após o indeferimento da medida liminar, o Processo de Controle Administrativo

recebeu decisão monocrática pelo arquivamento, em 20 de abril de 2009. A decisão foi

baseada em precedentes que trataram de matéria semelhante à questão de mérito e

exigiram a realização de concurso público, com fundamento nos artigos 236 e 37 da

Constituição Federal. O Conselheiro Relator considerou a afirmação do Tribunal de

68 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0002346-

70.2008.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro Marcelo Nobre, j. 07/05/2009.

54

Justiça do Maranhão (não impugnada pela requerente) de que Iolanda fora designada

para exercer a titularidade do cartório em 03 de julho de 1998, portanto, após a

promulgação da Constituição brasileira.

Mesmo que aparentemente solucionado, o caso teve outros desdobramentos. Isso

ocorreu porque a Corregedoria Nacional de Justiça recebeu, em 06 de novembro de

2009, o Pedido de Providências n. 0006179-62.2009.2.00.000069 da A.N.D.C.P.C.A.70.

O Corregedor Nacional de Justiça à época, Ministro Gilson Dipp, decidiu em 11 de

dezembro de 2009 tornar ineficazes as decisões do Tribunal de Justiça do Maranhão que

garantiam a permanência dos registradores que ocupavam as titularidades sem concurso

específico para o setor nos cartórios, salvo os nomeados segundo o regime vigente até o

advento da Constituição Federal de 1988, os efetivados com base na Constituição

Federal de 1967 e aqueles com processos ainda pendentes na Justiça.

Em 08 de junho de 2010, no Supremo Tribunal Federal, o Ministro Celso de

Mello deferiu nos autos do Mandado de Segurança n. 28.598/DF71 o pedido liminar,

suspendendo cautelarmente, até final julgamento do mandado de segurança, e

unicamente em relação à mesma Iolanda Nepomuceno Silva (impetrante), os efeitos da

decisão proferida pelo Corregedor Nacional de Justiça, nos autos do Pedido de

Providências nº 0006179-62.2009.2.00.0000. A decisão monocrática ficou assim

ementada (com grifos nossos):

EMENTA: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ).

CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA. ATO QUE

SUSPENDE A EFICÁCIA DE DECISÃO CONCESSIVA DE

MANDADO DE SEGURANÇA EMANADA DE TRIBUNAL DE

JUSTIÇA. INADMISSIBILIDADE. ATUAÇÃO “ULTRA

VIRES” DO CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA,

PORQUE EXCEDENTE DOS ESTRITOS LIMITES DAS

ATRIBUIÇÕES MERAMENTE ADMINISTRATIVAS

OUTORGADAS PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.

INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO CONSELHO NACIONAL

DE JUSTIÇA, NÃO OBSTANTE ÓRGÃO DE CONTROLE

INTERNO DO PODER JUDICIÁRIO, PARA INTERVIR EM

PROCESSOS DE NATUREZA JURISDICIONAL.

69 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Pedido de Providências 0006179-62.2009.2.00.0000. Plenário,

Rel. Ministro Gilson Dipp / Ministra Eliana Calmon, arquivado sem julgamento definitivo por força da

decisão do STF. 70 Embora não tenhamos tido acesso ao processo e, nos dados das partes, por conta do sigilo, constarem

apenas suas iniciais, supomos – por semelhança – que a sigla A.N.D.C.P.C.A. se refere à Associação

Nacional de Defesa dos Concursos para Cartórios. 71 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 28.598/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello, j.

14/10/2010, Decisão liminar.

55

IMPOSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL DE O CONSELHO

NACIONAL DE JUSTIÇA (QUE SE QUALIFICA COMO

ÓRGÃO DE CARÁTER EMINENTEMENTE ADMINISTRATIVO)

FISCALIZAR, REEXAMINAR E SUSPENDER OS EFEITOS

DECORRENTES DE ATO DE CONTEÚDO JURISDICIONAL,

COMO AQUELE QUE CONCEDE MANDADO DE SEGURANÇA.

PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

MAGISTÉRIO DA DOUTRINA. MEDIDA LIMINAR

DEFERIDA.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em 14 de outubro de 2010, referendou

as liminares do ministro Celso de Mello, de modo a suspender as duas decisões do

Corregedor Nacional de Justiça que haviam tornado sem efeito os acórdãos do Tribunal

de Justiça do Maranhão, dentre elas a que se refere ao caso específico ora analisado, isto

é, o caso de Iolanda Nepomuceno Silva.

Enfim, o Plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu, diante do presente

caso, que o Conselho Nacional de Justiça não tinha poderes para exercer a fiscalização

de atos de conteúdo jurisdicional. Nesse sentido, sua competência seria restrita aos

âmbitos administrativo, financeiro e disciplinar, relativamente ao Poder Judiciário e

seus serviços auxiliares. Dessa forma, foi derrotado o entendimento de que o CNJ

poderia decidir matérias de sua estrita competência (como a de concursos para

serventuários) quando a matéria já fora judicializada – ou, nos termos aqui propostos,

quando houvesse questão judicializada.

2.3.2.2. Tese do critério cronológico

A segunda tese utilizada para que o CNJ não decline a competência em face de

questão judicializada é denominada aqui “tese do critério cronológico”. Segundo essa

tese, o Conselho Nacional de Justiça poderia decidir a matéria se o processo

administrativo tivesse sido protocolado anteriormente ao processo judicial. O caso

“Peixoto, Vieira e Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais”72, que recebeu a

relatoria do Conselheiro Jorge Hélio Chaves de Oliveira, é um exemplo da utilização de

tal linha argumentativa.

Em 26 de junho de 2012, Gisele Sá Peixoto ingressou no Conselho Nacional de

Justiça com o Procedimento de Controle Administrativo em face do Tribunal de Justiça

72 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0003873-

18.2012.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro Jorge Hélio de Oliveira, j. 21/08/2012.

56

do Estado de Minas Gerais. Diante da identidade de matéria, esse procedimento foi, por

prevenção, encaminhado ao Conselheiro Jorge Hélio Chaves de Oliveira, que tinha sob

sua relatoria os seguintes procedimentos conexos: PCA 0003940-80.2012.2.00.000073;

PCA 0006290-75.2011.2.00.000074; PCA 0000956-26.2012.2.00.000075; PCA

0002535-09.2012.2.00.000076 e 0002537-76.2012.2.00.000077.

Em síntese, o caso concreto em destaque se refere ao Concurso Público de

Provas e Títulos para Outorga de Delegações de Notas e de Registro do Estado de

Minas Gerais, tendo a requerente alegado em seu pedido que candidatos que constavam

da lista de classificação final não haviam comprovado todos os requisitos exigidos no

edital do concurso de 2011 para outorga de delegação. Sustentou a requerente que uma

norma específica do edital previa a necessidade de apresentação de certidão negativa,

expedida por órgão competente, comprobatória de regularidade com as obrigações

trabalhistas relacionadas ao Serviço de que é delegado titular78.

Embora o caso, em seu viés processual, possa ser enquadrado no tema da

questão judicializada, o cerne material deste procedimento é a análise de legalidade do

ato do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que aceitou a inscrição de

candidatos que apresentaram certidões diferentes entre si para comprovarem a quitação

de obrigações trabalhistas.

Em 17 de julho de 2012, com fundamento no art. 25, XI do Regimento Interno

do Conselho Nacional de Justiça79, o Conselheiro Relator Jorge Hélio Chaves de

Oliveira indeferiu a medida liminar por entender que não estavam presentes os

requisitos para a concessão de medidas urgentes e acauteladoras, quais sejam: (a)

73 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0003940-

80.2012.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro Jorge Hélio, j. 30/04/2013. 74 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0006290-

75.2011.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro Jorge Hélio, j. 28/02/2012. 75 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0000956-

26.2012.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro Jorge Hélio, j. 21/05/2012. 76 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0002535-

09.2012.2.00.0000. Decisão Monocrática, Rel. Conselheiro Jorge Hélio, j. 21/04/2012. 77 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0002537-

76.2012.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro Silvio Rocha, j. 28/05/2013. 78 No caso concreto, tratava-se de certidão expedida pelo Ministério do Trabalho por meio das Delegacias

Regionais, após a verificação de inexistência de autos de infração lavrados em razão de fiscalizações

administrativas a respeito do cumprimento, pelo delegatário, de suas obrigações trabalhistas, bem como

de observância das restrições legais ao trabalho de menores e adolescentes, além da repressão das

situações análogas à escravidão. 79 “Art. 25. São atribuições do Relator:

XI - deferir medidas urgentes e acauteladoras, motivadamente, quando haja fundado receio de prejuízo,

dano irreparável ou risco de perecimento do direito invocado, determinando a inclusão em pauta, na

sessão seguinte, para submissão ao referendo do Plenário;”

57

existência de fundado receio de prejuízo, (b) dano irreparável ou (c) risco de

perecimento do direito invocado.

Após o ingresso no feito do interessado Jorge Eduardo Brandão Coelho Vieira e

o pedido de reapreciação da liminar, o Conselheiro Relator reexaminou a situação com

novos argumentos e documentos e, nessa nova oportunidade, deferiu medida liminar em

08 de agosto de 2012.

Dentre os novos fatos esclarecidos na ocasião, foi informado que a escolha de

serventias estava marcada para o dia 09 de agosto de 2012, o que segundo seu

convencimento realçaria o periculum in mora. Destacou que a candidata Keziah

Alessandra Vianna Silva Pinto, que teria se classificado equivocadamente, ocupava a

primeira posição na lista de classificação, o que poderia gerar prejuízos irreparáveis em

caso de realização do ato de escolha.

A referida candidata se manifestou espontaneamente nos autos, impugnando o

Procedimento de Controle Administrativo mediante a alegação, em preliminar, de que

haveria no caso “questão judicializada”, uma vez que o interessado Jorge Eduardo

Brandão Coelho Vieira havia impetrado Mandado de Segurança perante o Tribunal de

Justiça do Estado de Minas Gerais com idêntico objeto deste Procedimento de Controle

Administrativo. Além disso, defendeu que o processo tratava de tutela de interesses

meramente individual, que não deveria ser objeto de apreciação do Conselho Nacional

de Justiça. Finalizou requerendo o não conhecimento do presente Procedimento de

Controle Administrativo ou sua improcedência.

A requerente, Gisele Sá Peixoto, apresentou réplica rebatendo justamente a

configuração, no caso, de questão judicializada, alegando que o objeto deste

procedimento seria mais abrangente do que o existente na ação judicial por mencionada

pela candidata Keziah. Dessa forma, buscou a requerente descaracterizar um dos

elementos essenciais da questão judicializada, qual seja, o da identidade de objeto. O

Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em suas informações prestadas, ao contrário da

requerente, limitou-se a mencionar a existência do Mandado de Segurança já referido

pela candidata Keziah, solicitando que o procedimento no CNJ fosse arquivado em

razão da judicialização da matéria.

Ao enfrentar o tema da judicialização da matéria, o Relator entendeu que,

embora o Mandado de Segurança tivesse objeto muito semelhante ao do Procedimento

58

de Controle Administrativo, não se deveria afastar a atuação do Conselho Nacional de

Justiça por força do critério cronológico.

Considerou que o CNJ não vinha conhecendo de questões levadas a exame de

outros órgãos do Poder Judiciário no exercício de suas competências jurisdicionais

quando ocorria a judicialização prévia, isto é, se operada antes da instauração do

procedimento administrativo no Conselho, ou seja, uma vez acionada a competência do

Conselho Nacional de Justiça para o controle da atividade administrativa e financeira

dos órgãos do Poder Judiciário, suas decisões só poderiam ser controladas pelo

Supremo Tribunal Federal80.

Em uma defesa mais aberta da competência do Conselho Nacional de Justiça em

relação à tese da reserva de competência, conforme subitem tratado anteriormente, o

Conselheiro Relator Jorge Hélio considerou que aceitar a judicialização posterior como

forma de inibir a atuação do CNJ seria o mesmo que aceitar a usurpação simultânea de

competências do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. Em suas

palavras (com grifos nossos):

A ideia de que a atuação do Conselho Nacional de Justiça não

pode ser obstada mediante a provocação posterior de outro órgão

do Poder Judiciário tutela não somente a autoridade das suas

decisões e deliberações nas matérias de sua competência, mas

também e principalmente, visa preservar a competência

originária deferida pelo constituinte derivado ao Supremo

Tribunal Federal para processar e julgar as ações contra o

Conselho Nacional de Justiça. Entender em sentido contrário

significa usurpar competência privativa da Corte Suprema.

Neste caso concreto, Mandado de Segurança tratando de objeto semelhante fora

impetrado em 04 de julho de 2012, ao passo que o Procedimento de Controle

Administrativo já tramitava desde 26 de junho do mesmo ano. Por esse motivo, e com

base no raciocínio acima, o Relator não reconheceu judicialização da matéria por não

ser prévia ao acionamento do CNJ, defendendo a tese do critério cronológico81.

Em síntese, por esta segunda tese, entendeu o Conselho Nacional de Justiça que

a questão temporal deveria reger a matéria e, portanto, caso houvesse judicialização

prévia, isto deveria inibir a atuação do Conselho, ao passo que, se a judicialização fosse

posterior, o Conselho deveria prosseguir e decidir a matéria em seu âmbito.

80 Sobre a competência do STF em face de atos do CNJ, vide comentário alhures. 81 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Procedimento de Controle Administrativo n. 0003873-

18.2012.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro Jorge Hélio de Oliveira, j. 21/08/2012.

59

2.3.3. O STF e a prevalência pelo âmbito judicial

Como afirmado anteriormente, o Conselho Nacional de Justiça tem ampla

jurisprudência sustentando a primazia da competência do Poder Judiciário em matérias

com conflito de competências. Os casos relatados em detalhe foram posicionamentos de

exceção, que, com base em teses distintas, buscaram preservar a competência do

Conselho Nacional de Justiça em face de questão judicializada. O Supremo Tribunal

Federal também se manifestou algumas vezes sobre a competência do Conselho

Nacional de Justiça, notadamente em Mandados de Segurança contra atos do

Conselho82.

O primeiro caso apreciado pelo Supremo Tribunal Federal data de 2006. Trata-

se do MS 25.879 AgR/DF83, que versou sobre pedido de uma advogada que alegou que

o Conselho Nacional de Justiça teria sido omisso na fundamentação sobre arquivamento

de petição requerendo abertura de sindicância contra magistrado. O fundamento

utilizado pelo CNJ foi de que o pedido se baseava em proposta de anular decisão

judicial por supostos vícios. Nesse caso, o Plenário do Supremo, por unanimidade,

apenas ratificou decisão tomada pelo CNJ de, justamente, não interferir em matéria

jurisdicional. Vale dizer que a competência do CNJ foi apenas parte do fundamento da

decisão da Corte, não tendo sido seu objeto central de deliberação, e que a decisão

apenas tangenciou o objeto do artigo, pois não tratou de uma questão judicializada

propriamente, ou seja, com o recorte aqui adotado.

O próximo caso encontrado data de 2008. Trata-se de Mandado de Segurança

(MS 26.284/DF) que questionou decisão do Conselho Nacional de Justiça que alterou

notas de candidatos em concurso para a magistratura. Na dicção do relator do acórdão,

Ministro Menezes Direito84, “(...) o ato impugnado no Conselho Nacional de Justiça tem

82 Para as conclusões dessa seção, utilizamo-nos de pesquisa empírica realizada pelo site do STF. Por

meio de duas chaves de pesquisa no motor de busca do site - “(Conselho Nacional de Justiça) e (matéria

submetida à apreciação do Poder Judiciário)” e “(Conselho Nacional de Justiça) e (decisão judicial)” -

chegamos a um total de 6 acórdãos pertinentes: MS 27650 / DF, MS 28174 AgR / DF, MS 29744 AgR /

DF, MS 27148 AgR, MS 26284 / DF, MS 25879 AgR / DF. Após, verificamos quais acórdãos eram

mencionados como precedentes para ampliarmos os resultados. Com isso, foram agregados mais dois

casos: MS 28611 MC-AgR, MS 28598. 83 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 25.879 AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence,

j. 23/08/2006. 84 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 26.284/DF. Plenário, Rel. Ministro Menezes Direito, j.

31/03/2008, p. 09.

60

natureza administrativa, relativo à homologação de concurso público, matéria afeta à

administração do Tribunal. Trata-se do exercício de controle administrativo dos

próprios atos do Judiciário”. Esse caso toca mais de perto a questão judicializada pelo

fato de ter havido um processo judicial prévio (Mandado de Segurança julgado pelo

Tribunal de Justiça de Pernambuco, que reconheceu a possibilidade de revisão de

provas de concurso), mas a decisão do Conselho Nacional de Justiça foi complementar à

decisão judicial, o que não gerou conflito de competência. O Pleno do Supremo

Tribunal Federal, por maioria, seguiu o entendimento do relator no ponto aqui

abordado.

Nestes dois casos, podemos entender que as matérias discutidas diziam respeito

a um primeiro aspecto da fixação da competência do Conselho Nacional de Justiça pelo

Supremo Tribunal Federal. É dizer, questionava-se a competência do Conselho

Nacional de Justiça sobre determinadas matérias, independentemente de sua

judicialização. Essa discussão se insere no contexto da consolidação do Conselho como

órgão administrativo de cúpula, o que exigiu que o Supremo determinasse quais

matérias seriam de sua competência.

Decisões sobre questão judicializada e competência do Conselho Nacional de

Justiça foram apreciadas pelo STF em 2010. No caso mencionado pelos Ministros como

relevante (possivelmente o caso paradigma) sobre o tema, o MS 28.174 AgR/DF, o

Supremo decidiu que o CNJ não deveria se manifestar sobre matéria previamente

judicializada. Segue a ementa do caso (com grifos nossos)85:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE

SEGURANÇA. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. NÃO

CONHECIMENTO DE PROCEDIMENTO DE CONTROLE

ADMINISTRATIVO. PRÉVIA JUDICIALIZAÇÃO DA MATÉRIA.

MANDADO DE SEGURANÇA A QUE SE NEGOU

PROVIMENTO. AGRAVO IMPROVIDO. I – Não cometeu

qualquer ilegalidade o CNJ ao [deixar] de apreciar a questão que

lhe foi submetida, uma vez que a matéria já estava sob o crivo da

jurisdição. II - o CNJ seja órgão do Poder Judiciário, possui tão

somente atribuições de natureza administrativa e, nesse sentido, não

lhe é permitido decidir de forma contrária ao estabelecido em processo

jurisdicional. III – Agravo improvido.

85 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 28.174 AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Ricardo

Lewandowski, j. 14/10/2010. Ementa. A palavra “deixar” foi acrescida pelo fato de não constar no

acórdão consultado, pelo provável motivo de erro de digitação.

61

Vale dizer que a decisão do Plenário do Supremo, tomada de forma unânime,

apenas confirmou decisão do CNJ, que havia declinado da competência para apreciar o

caso em razão de haver questão judicializada.

Ressalta-se, por isso, que o caso do Plenário do Supremo do Tribunal Federal

com posicionamento mais cristalino sobre a matéria apenas referendou posicionamento

adotado pelo próprio Conselho.

Na mesma sessão em que esse caso foi julgado, no dia 14 de outubro de 2010,

outros dois casos (MS 28.598/DF86 e MS 28.611 MC-AgR/DF87) tiveram julgamento

conjunto e trataram da competência do Conselho Nacional de Justiça. Dessa vez,

confirmou-se a desconstituição de uma decisão da Corregedoria Nacional de Justiça do

CNJ (descrita acima, aplicando o que se chamou aqui de tese da reserva de competência

ao Conselho Nacional de Justiça), que havia tornado sem efeito decisão judicial

concedida em sede de Mandado de Segurança.

Nesses dois julgados, evidencia-se a jurisprudência mencionada de que o

Conselho não poderia se imiscuir em matérias jurisdicionais ou, algo particular desse

caso, jurisdicionalizadas. Interessante notar que, ao contrário dos casos anteriores, o

Supremo Tribunal Federal se posicionou contra uma decisão do Conselho – que havia,

segundo o entendimento do Supremo, usurpado de competência judicial, em ato de

estrita revisão.

No ano de 2011, outros dois casos foram apreciados e a jurisprudência sobre a

não revisão de decisões judiciais, mesmo em face de matéria administrativa, foi

mantida. Trata-se do MS 27.148 AgR/DF88 e do MS 29.744 AgR/DF89, ambos

decididos por unanimidade no Plenário do Supremo Tribunal Federal.

O último caso a ser analisado foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal em

2014: MS 27.650/DF. O caso é interessante por trazer alguns elementos novos para a

análise e por tratar especificamente da competência do CNJ em face de questão

judicializada. Como particularidades do caso tem-se o fato de que a matéria foi

judicializada alguns dias após o protocolo do pedido no CNJ – razão pela qual tanto o

86 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 28.598/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello, j.

14/10/2010. 87 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 28.611 MC-AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello,

j. 14/10/2010. 88 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 27.148 AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello, j.

11/05/2011. 89 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 29.744 AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Gilmar Mendes, j.

29/06/2011.

62

Conselho Nacional de Justiça (em decisão de 2008) quanto a Procuradoria-Geral da

República (atuando como custos legis) entenderam possível a decisão pelo Conselho

Nacional de Justiça e, ainda, que a matéria no âmbito jurisdicional fora considerada

prejudicada e, portanto, não tivera decisão de mérito proferida. Mesmo em face dessas

peculiaridades, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade,

julgou descabida a atuação do Conselho Nacional de Justiça90:

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO CONSELHO

NACIONAL DE JUSTIÇA. PROCEDIMENTO DE CONTROLE

ADMINISTRATIVO SOBRE MATÉRIA SUBMETIDA À

APRECIAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE

DE ATUAÇÃO DO CONSELHO, POR DISPOR DE

ATRIBUIÇÕES EXCLUSIVAMENTE ADMINISTRATIVAS. SEGURANÇA CONCEDIDA.

Nossos grifos.

O caso acima mencionado demonstra uma tendência de rigidez do Supremo em

relação à questão judicializada. Mesmo em caso peculiar, a jurisprudência foi mantida.

Como destaca a Ministra Relatora Cármen Lúcia91:

“Apesar da precedência do protocolo do procedimento de controle

administrativo no Conselho Nacional de Justiça, aquele órgão foi

informado da existência de mandado de segurança em tramitação

sobre a matéria, com liminar deferida, e ainda assim deu

prosseguimento ao procedimento de controle administrativo ora

atacado. (...) Mas a ele é vedado apreciar questões submetidas à

apreciação do Poder Judiciário, as quais devem ser impugnadas

pelas vias próprias”.

Nossos grifos.

Essas são as decisões do Supremo Tribunal Federal que ao menos tangenciaram

a questão judicializada ao discutir a competência do Conselho Nacional de Justiça.

Após a análise da jurisprudência sobre o tema, constatou-se que há pouca abertura à

fixação da competência administrativa do Conselho Nacional de Justiça como

prevalente diante da judicialização da demanda, mesmo em matérias estritamente

administrativas.

90 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 27.650/DF. 2ª Turma, Rel. Ministra Cármen Lúcia, j.

24/06/2014. Ementa. 91 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 27.650/DF. 2ª Turma, Rel. Ministra Cármen Lúcia, j.

24/06/2014. Voto do Relator, p. 10.

63

A principal conclusão a respeito do assunto, com base nos julgados do Supremo

Tribunal Federal acima analisados, é que a existência de questão judicializada,

independentemente do momento em que foi ajuizada, atrai a competência de

processamento e julgamento para o órgão jurisdicional, retirando-a do Conselho

Nacional de Justiça.

2.3.4. Jurisdição versus não jurisdição: algumas considerações92

Em mais de uma centena de casos que tramitaram no Conselho Nacional de

Justiça, analisados durante a pesquisa relativa ao assunto da questão judicializada, foi

constatada ampla jurisprudência em que o Conselho Nacional de Justiça declina de sua

competência em face de questão judicializada93.

Observa-se que o próprio Conselho, em face de potencial conflito de

competência entre os órgãos administrativo e judicial, tende a afastar sua própria

competência, com base no binômio segurança jurídica e vedação de interferência na

atividade jurisdicional, evitando, assim, risco de decisões díspares. Há, todavia, alguns

casos de exceção nos quais o Conselho esboçou algumas mudanças pontuais em sua

jurisprudência ou, em outras palavras, um desvio de sua jurisprudência, casos esses que

– por sua relevância – foram tratados especificamente nos tópicos dedicados às suas

principais teses.

O Supremo Tribunal Federal tem poucos acórdãos que versam especificamente

sobre o tema da questão judicializada na discussão da competência do CNJ. Em alguns

casos, apenas tangencia o tema e afirma que o Conselho Nacional de Justiça não pode

interferir na jurisdição porque tem competência meramente administrativa. Nos casos

em que houve manifestação versando especificamente sobre a questão judicializada,

como já foi mencionado acima, o entendimento do STF sempre prestigiou a

competência judicial, fazendo a competência do CNJ ceder à judicial. No caso mais

recente analisado aqui, cuja matéria foi julgada pelo STF ainda que não tenha sido

92 Este item é baseado em: MOREIRA, Diogo Rais Rodrigues; FRANCO, Ivan Candido da Silva de, op.

cit. 93 Ressalta-se que se optou por não trazer dados quantitativos dessa matéria, diante da imprecisão da base

de dados, situação melhor explicitada na introdução ao capítulo que aborda a interface entre a atuação do

CNJ e a independência judicial. Em síntese, o motivo dessa opção é que o método da pesquisa, em razão

de seu objeto, não é quantitativo, abstendo-se de observar qualquer relação numérica entre o universo de

pesquisa e a coleta.

64

julgada pelo Plenário, considerou-se que a judicialização da matéria, mesmo que

posterior ao protocolo da ação no Conselho Nacional de Justiça, afasta sua competência.

Outra consideração importante é que o mapa jurisprudencial sobre o tema

demonstra um conflito ainda existente na atuação concreta do Conselho Nacional de

Justiça, o que ressalta a relevância de entender o difícil limite entre a competência

administrativa e a competência jurisdicional, polêmica observável desde os primeiros

debates sobre o caráter “externo” ou “interno”, em relação ao Poder Judiciário, do CNJ

como órgão administrativo.

Cabe ainda observar que, embora o CNJ tenha realizado raras tentativas de

alteração de sua jurisprudência, buscando a prevalência de sua competência

administrativa perante questões judicializadas, em especial diante de questões de sua

competência, mas que foram posteriormente judicializadas, esse posicionamento não

permaneceu no âmbito do CNJ, sendo imediatamente afastado diante dos novos casos

semelhantes.

Por fim, vale ressaltar a fragilização da competência do Conselho Nacional de

Justiça. Embora o Conselho seja órgão do Poder Judiciário, inserido topologicamente na

Constituição brasileira logo após o Supremo Tribunal Federal e antes de todos os

demais tribunais, com competência própria para questões administrativas e financeiras

do Poder Judiciário em todas suas instâncias e vertentes (especiais ou comuns),

ressalvado o órgão de cúpula do Judiciário nacional (o STF), sua competência para

decidir as matérias que lhe são incumbidas é fragilizada diante de qualquer instância

judicial, tendo o Supremo Tribunal Federal por diversas vezes indicado como absoluta a

competência judicial diante do Conselho Nacional de Justiça, devendo o CNJ abster-se

de decidir o processo em âmbito administrativo diante da questão judicializada. Em

suma, o Conselho Nacional de Justiça, mesmo diante de sua competência

administrativa, se encontra limitado por qualquer decisão ou simples ajuizamento de

ação que verse sobre o mesmo tema e com as mesmas partes.

65

CAPÍTULO 3

A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA E A INDEPENDÊNCIA

JUDICIAL

66

3.1. Garantias inerentes à independência judicial no Brasil

Após a abordagem dos dilemas da jurisdição versus não jurisdição na relação

entre o Poder Judiciário e o Conselho Nacional de Justiça, em especial pelo estudo de

casos que envolvem a chamada “questão judicializada” no CNJ, pretende-se agora

iniciar o mapeamento do tema da proteção constitucional da independência judicial no

Brasil, em especial por seus instrumentos.

O objetivo deste capítulo é apresentar as regras do aparato instrumental que

protege a independência judicial, abordando tanto as regras atuais quanto sua evolução

diante do ordenamento constitucional, cotejando-as com o posicionamento da doutrina a

respeito de suas peculiaridades, de modo a traçar o plano constitucional brasileiro para

realizar a manutenção da independência judicial. Ao final, serão analisadas as decisões

normativas e disciplinares do Conselho Nacional de Justiça, identificando zonas de

conforto e de conflito entre sua atividade e a independência jurisdicional.

As garantias da magistratura e dos magistrados representam o bloco instrumental

da proteção da independência judicial. Diante do arranjo constitucional brasileiro,

Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco apresentam sinteticamente a

relação evidente entre as garantias dos magistrados e do Poder Judiciário e a

independência judicial. Em suas palavras:

As garantias do Poder Judiciário, em geral, e do magistrado, em

particular, destinam-se a emprestar a conformação de

independência que a ordem constitucional pretende outorgar à

atividade judicial. Ao Poder Judiciário incumbe exercer o último

controle da atividade estatal, manifeste-se ela por ato da

Administração ou do próprio Poder Legislativo (controle de

constitucionalidade). Daí a necessidade de que, na sua organização,

materializa-se a clara relação de independência do Poder Judiciário e

do próprio juiz em relação aos demais Poderes ou influências

externas94.

Nossos grifos.

Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Dinamarco

vinculam diretamente a incumbência de guardião das liberdades e direitos individuais,

conferida ao Poder Judiciário, à independência e à imparcialidade. Afirmam que tais

garantias constituem o caminho para a preservação dessa incumbência, daí a

94 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, op. cit., p. 936.

67

importância do estudo das garantias que “a Constituição institui para salvaguardar

aquela imparcialidade e aquela independência”95

Os autores mencionados dividem as garantias em dois grandes blocos: o

primeiro se refere às garantias do Poder Judiciário como um todo, enquanto o segundo

se refere especificamente às garantias dos magistrados, sendo subdividido em garantias

de independência e impedimentos como garantia de imparcialidade.

No primeiro bloco (garantias do Poder Judiciário como um todo) os autores

mencionam o autogoverno, que “(..) se realiza através do exercício de atividades

normativas e administrativas de auto-organização e de auto-regulamentação”. Afirmam

que o autogoverno foi ampliado pela Constituição Federal de 1988, abrangendo “a

autonomia administrativa e a financeira consistente na prerrogativa de elaboração de

proposta orçamentária (art. 99) e na gestão das dotações pelos próprios tribunais” 96.

Quanto às garantias políticas dos magistrados, Antonio Carlos de Araújo Cintra,

Ada Pellegrini Grinover e Cândido Dinamarco, afirmam que elas “complementam as

garantias políticas do Poder Judiciário, entendido como um todo”. Os autores

subdividem este bloco de garantias em i) garantias dos magistrados propriamente ditas e

ii) impedimentos como garantia de imparcialidade. Na primeira subdivisão incluem as

garantias de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos, definindo

este bloco como “garantias de independência”, já que tutela a independência do

magistrado tanto perante terceiros (qualquer Poder ou pessoa) quanto perante o próprio

órgão ou qualquer outro órgão judiciário.

Já na outra subdivisão, definida como “impedimentos como garantia de

imparcialidade”, os autores identificam os impedimentos como os elementos que têm a

finalidade de prestar ao Judiciário e aos litigantes condições de imparcialidade97.

Referem-se notadamente aos impedimentos previstos no parágrafo único do art. 95 da

Constituição brasileira, que vedam: I – exercer, ainda que em disponibilidade, outro

cargo ou função, salvo uma de magistério; II – receber, a qualquer título ou pretexto,

custas ou participação em processo; III - dedicar-se à atividade político-partidária; IV –

receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas,

95 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel,

op. cit., p. 161. 96 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel,

op. cit., p. 162. 97 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel,

op. cit., p. 163-4.

68

entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei; e V – exercer a

advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do

afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração.

José Afonso da Silva também se dedicou ao estudo das garantias constitucionais

da magistratura e dos magistrados, afirmando que há uma relação direta entre o

conjunto de garantias constitucionais e a independência judicial. Adota uma

classificação diferente, dividida em garantias institucionais e garantias funcionais ou de

órgãos. A primeira se refere à proteção do Judiciário como um todo, desdobrando-se nas

garantias de autonomia orgânico-administrativa e financeira. Já a segunda diz respeito

aos institutos que asseguram tanto a independência quanto a imparcialidade dos

membros do Judiciário98.

Como garantias de independência dos órgãos judiciários, o autor indica as

garantias de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos; já como

garantias de imparcialidade dos órgãos judiciários, aponta na Constituição brasileira as

vedações aos juízes. Justifica que se trata, na verdade, de meios de proteção da

independência dos juízes e do próprio Poder Judiciário99.

O vínculo direto entre a independência judicial e as garantias do Poder Judiciário

evidencia-se ainda mais através do estudo detalhado de cada garantia da magistratura ou

dos magistrados. Ainda assim, é necessário realçar o motivo da análise da

independência judicial brasileira neste trabalho pelo sistema de proteção, isto é, pela

ótica das garantias. André Ramos Tavares afirma que as garantias próprias do Poder

Judiciário lhe foram outorgadas com o objetivo de “assegurar a mais ampla

independência para fins de realizar a tão importante tarefa que lhe foi cometida”100 e

pertinentemente recorda Castro Nunes, que observou:

Visando assegurar a independência do Poder Judiciário, a

Constituição cerca a magistratura de garantias especiais, umas

dizendo mais com os órgãos na sua composição ou aparelhamento,

garantias que podemos chamar institucionais ou orgânicas, e outras

que dizem mais de perto com a autonomia da função, e que,

constituindo para os seus titulares direitos subjetivos, podemos

chamar de subjetivas ou funcionais, ainda que umas e outras

convirjam para o mesmo objetivo de assegurar a independência do

Judiciário101.

98 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p.

588. 99 SILVA, José Afonso, op. cit., p. 588-9. 100 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, op. cit., p. 1142-1149. 101 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, op. cit., loc. cit.

69

Nossos grifos.

Portanto, na esteira das lições de Castro Nunes, André Ramos Tavares e outros

juristas, as garantias tanto da magistratura quanto dos magistrados instrumentalizam a

independência judicial, que é, por fim, o objetivo da existência dessas garantias

especiais.

Antes da análise específica de cada garantia e de sua operabilidade e eficácia

perante o ordenamento jurídico e a prática brasileira, faz-se necessário conhecer suas

raízes históricas e evolução constitucional, atravessando o tempo com a descrição de

suas trajetórias.

3.1.1. Memória constitucional

Inicialmente recorre-se a uma abordagem histórico-constitucional do tema,

percorrendo as Constituições adotadas no Brasil desde a época do Império.

Durante a monarquia, na Constituição do Império de 1824, já era possível

encontrar algumas disposições que se relacionavam diretamente com a independência

da magistratura. Mais precisamente nos artigos 153 a 155, a Constituição de 1824 trazia

um traço102, embora ainda muito incipiente, de seu sistema de proteção nacional da

independência judicial. Embora o art. 154 determinasse que o Imperador poderia

suspender essa perpetuidade dos juízes, o que à primeira vista pode representar a falta

de independência, trata-se, na verdade, de um significativo avanço para a época, pois

restringia o poder do Imperador de suspender a perpetuidade dos magistrados e criava

um procedimento que dependia de reclamação, de audiência dos juízes envolvidos e de

parecer do Conselho de Estado.

A vitaliciedade dos juízes aparece com o art. 155, que exigia sentença para

destituir o juiz. Já a inamovibilidade surge mais enfraquecida, uma vez que era

autorizada a mudança de lugar dos juízes, sendo, no entanto, exigida previsão em lei

para tanto.

102 “Art. 153. Os Juizes de Direito serão perpetuos, o que todavia se não entende, que não possam ser

mudados de uns para outros Logares pelo tempo, e maneira, que a Lei determinar.

Art. 154. O Imperador poderá suspende-los por queixas contra elles feitas, precedendo audiencia dos

mesmos Juizes, informação necessaria, e ouvido o Conselho de Estado. Os papeis, que lhes são

concernentes, serão remettidos á Relação do respectivo Districto, para proceder na fórma da Lei.

Art. 155. Só por Sentença poderão estes Juizes perder o Logar.”

70

Em suma, na Constituição do Império de 1824 é possível encontrar traços da

vitaliciedade e da inamovibilidade, mas se verifica omissão quanto à irredutibilidade de

subsídios.

Já a primeira Constituição da República, de 24 de fevereiro de 1891, na Seção

III do Capítulo V, tratou do Poder Judiciário. Em seus artigos 57 e 58, previu a proteção

nacional da independência judicial.

No texto da Constituição de 1891, os artigos 57 e 58 formam o principal aparato

constitucional para garantir a independência judicial, reafirmando e dando maior

dimensão à vitaliciedade e trazendo a irredutibilidade de subsídios aos juízes federais.

Além disso, observa-se também a garantia da autonomia aos juízes dos Tribunais

Federais para elegerem o respectivo presidente entre os seus pares103.

Fátima Cristina Ruppert Mazzo104, em dissertação de mestrado sobre a

inamovibilidade, afirma que, embora esta garantia não estivesse expressa no texto

constitucional, a jurisprudência à época já entendia que a inamovibilidade era

decorrência do art. 2º do Decreto n. 848 de 11 de outubro de 1890, que organizava a

Justiça Federal105.

De toda sorte, com a Emenda Constitucional de 3 de setembro de 1926, o art. 6º

da Constituição de 1891, ao tratar da intervenção do governo federal nos negócios

particulares dos Estados, abordou expressamente a matéria da inamovibilidade do juiz,

além de reafirmar a vitaliciedade e irredutibilidade de subsídios106.

Portanto, embora seja comum encontrarmos a afirmação de que “[A]

Constituição de 1934 foi a primeira a consagrar expressamente as três garantias

103 “Art. 57 - Os Juízes federais são vitalícios e perderão o cargo unicamente por sentença judicial. § 1º -

Os seus vencimentos serão determinados por lei e não poderão ser diminuídos. § 2º - O Senado julgará os

membros do Supremo Tribunal Federal nos crimes de responsabilidade, e este os Juízes federais

inferiores. Art. 58 - Os Tribunais federais elegerão de seu seio os seus Presidentes e organizarão as

respectivas Secretarias. § 1º - A nomeação e a demissão dos empregados da Secretaria bem como o

provimento dos Ofícios de Justiça nas circunscrições judiciárias, competem respectivamente aos

Presidentes dos Tribunais. § 2º - O Presidente da República designará, dentre os membros do Supremo

Tribunal Federal, o Procurador-Geral da República, cujas atribuições se definirão em lei.” 104 MAZZO, Fátima Cristina Ruppert. A garantia da inamovibilidade do juiz como postulado básico do

Estado Democrático de Direito. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de

São Paulo, 2004, p. 84. 105 “Art. 2º. – Os juízes federais são vitalícios e inamovíveis e não poderão ser privados de seus cargos

senão em virtude de sentença proferida em juízo competente e passada em julgado.” 106 “Art. 6º - O Governo federal não poderá intervir em negocios peculiares aos Estados, salvo: [...] II -

para assegurar a integridade nacional e o respeito aos seguintes principios constitucionaes: [...] d) a

independência e harmonia dos Poderes; [...] i) a inamovibilidade e vitaliciedade dos magistrados e a

irreductibilidade dos seus vencimentos; [...] III - para garantir o livre exercicio de qualquer dos poderes

públicos estaduaes, por solicitação de seus legítimos representantes, e para, independente de solicitação,

respeitada a existencia dos mesmos, pôr termo á guerra civil; [...]”

71

clássicas da magistratura – vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de

vencimentos”107, foi a Constituição de 1891, com a Emenda Constitucional de 3 de

setembro de 1926, que inicialmente previu a tripla garantia. Não obstante, há de se

reconhecer que a Constituição de 1934 abordou-a especificamente como garantia da

magistratura, pois a Constituição de 1891, com a Emenda Constitucional mencionada,

apenas previu sua existência nos casos dos Estados.

A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 16 de julho de

1934, referiu-se precisamente à proteção nacional de independência judicial na Seção I

do Capítulo IV, artigos 63 a 67, apresentando pela primeira vez um tratamento

sistematizado de todo o Poder Judiciário, indicando seus órgãos, garantias,

aposentadoria compulsória, exceções diante dos juízes substitutos, vedando o exercício

de outra função pública (ressalvado o magistério) e ainda prevendo consequências em

caso de transgressão, além de vedar aos juízes a atividade político-partidária108.

Desde então passou-se a exigir o concurso para ingresso na magistratura, que

antes era provido por indicação do Executivo. Contudo, logo em seguida, com a

instauração do Estado Novo, o Poder Judiciário no Brasil sofre um significativo abalo:

durante esse período, Getúlio Vargas anulou decisão do Supremo e nomeou o presidente

do Supremo Tribunal Federal, revelando absoluta subordinação do Poder Judiciário ao

Poder Executivo 109.

Assim, em 10 de novembro de 1937, foi outorgada uma nova Constituição que

incluía vários dispositivos semelhantes aos encontrados em Constituições de regimes

autoritários vigentes na Europa, como as de Portugal, Espanha e Itália. Com o

107 MAZZO, Fátima Cristina Ruppert, op. cit., p. 84. 108 “Art. 63 - São órgãos do Poder Judiciário: a) a Corte Suprema; b) os Juízes e Tribunais federais; c) os

Juízes e Tribunais militares; d) os Juízes e Tribunais eleitorais. Art. 64 - Salvas as restrições expressas na

Constituição, os Juízes gozarão das garantias seguintes: a) vitaliciedade, não podendo perder o cargo

senão em virtude de sentença judiciária, exoneração a pedido, ou aposentadoria, a qual será compulsória

aos 75 anos de idade, ou por motivo de invalidez comprovada, e facultativa em razão de serviços públicos

prestados por mais de trinta anos, e definidos em lei; b) a inamovibilidade, salvo remoção a pedido, por

promoção aceita, ou pelo voto de dois terços dos Juízes efetivos do tribunal superior competente, em

virtude de interesse público; c) a irredutibilidade de vencimentos, os quais, ficam, todavia, sujeitos aos

impostos gerais. Parágrafo único - A vitaliciedade não se estenderá aos Juízes criados por lei federal, com

funções limitadas ao preparo dos processos e à substituição de Juízes julgadores. Art. 65 - Os Juízes,

ainda que em disponibilidade, não podem exercer qualquer outra função pública, salvo o magistério e os

casos previstos na Constituição. A violação deste preceito importa a perda do cargo judiciário e de todas

as vantagens correspondentes.

Art. 66 - É vedada ao Juiz atividade político-partidária.” 109 NAPOLITANO, Carlo José. O Poder Judiciário no texto constitucional. Jornal UNESP, n. 238, out.

2008. Disponível em: <http://www.unesp.br/aci/jornal/238/supleb.php>. Acesso em 23 abr. 2014.

72

Congresso Nacional fechado e com a decretação de rigorosas leis de censura, Getúlio

Vargas pôde conduzir o país sem que a oposição pudesse se expressar de forma legal.

Em texto sobre o Estado Novo, o CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação

de História Contemporânea do Brasil), que é a Escola de Ciências Sociais da Fundação

Getúlio Vargas, afirma que os construtores desse regime consideravam necessário

deixar para trás o liberalismo, considerado o causador de todos os males da nação. Para

eles, a decretação do Estado Novo era o complemento da Revolução de 1930, cujos

ideais teriam sido violado pela Constituição liberal de 1934110.

Embora as garantias da magistratura tenham sofrido forte abalo, o texto da

Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 10 de novembro de 1937, outorgada pelo

Presidente da República Getúlio Vargas, trazia em seu art. 91 a tríplice garantia dos

juízes: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios111.

Nas palavras do sociólogo Carlo José Napolitano112, “[a] Constituição de 1946

volta a dar importância ao Judiciário, retomando a justiça federal, através dos Tribunais

Federais de Recursos”.

A Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 18 de setembro de 1946, na

Seção I do Capítulo V, que trata do Poder Judiciário, previu, além da tripla garantia

(vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios), as vedações aos juízes,

proibindo-os de exercer qualquer outra função pública, salvo a de magistério; de

receber, sob qualquer pretexto, percentagens, nas causas sujeitas a sua atuação; e de

exercer atividade político-partidária113.

110 CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO

BRASIL. Estado Novo. In: Fatos e Imagens: artigos ilustrados de fatos e conjunturas do Brasil.

Disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/FatosImagens/EstadoNovo>. Acesso em: 10 set.

2015. 111 “Art. 91 - Salvo as restrições expressas na Constituição, os Juízes gozam das garantias seguintes: a)

vitaliciedade, não podendo perder o cargo a não ser em virtude de sentença judiciária, exoneração a

pedido, ou aposentadoria compulsória, aos sessenta e oito anos de idade ou em razão de invalidez

comprovada, e facultativa nos casos de serviço público prestado por mais de trinta anos, na forma da lei;

b) inamovibilidade, salvo por promoção aceita, remoção a pedido, ou pelo voto de dois terços dos Juízes

efetivos do Tribunal Superior competente, em virtude de interesse público; c) irredutibilidade de

vencimentos, que ficam, todavia, sujeitos a impostos.” 112 NAPOLITANO, Carlo José, op. cit. 113 “Art. 95 - Salvo as restrições expressas nesta Constituição, os Juízes gozarão das garantias seguintes:

I - vitaliciedade, não podendo perder o cargo senão por sentença judiciária; II - inamovibilidade, salvo

quando ocorrer motivo de interesse público, reconhecido pelo voto de dois terços dos membros efetivos

do Tribunal superior competente; III - irredutibilidade dos vencimentos, que, todavia, ficarão sujeitos aos

impostos gerais. III - irredutibilidade de vencimentos, que, todavia, ficarão sujeitos aos impostos gerais §

1º - A aposentadoria será compulsória aos setenta anos de idade ou por invalidez comprovada, e

facultativa após trinta anos de serviço público, contados na forma da lei. § 2º - A aposentadoria, em

qualquer desses casos, será decretada com vencimentos integrais. § 3º - A vitaliciedade não se estenderá

obrigatoriamente aos Juízes com atribuições limitadas ao preparo dos processos e à substituição de Juízes

73

Seguindo a Constituição anterior, a Constituição da República Federativa do

Brasil de 24 de janeiro de 1967 também previu (por meio dos seus artigos 108 e 109) as

mesmas garantias e os mesmos deveres114.

No período de exceção da ditadura, o Ato Institucional n. 5 de 13 de dezembro de

1968, por meio de seu art. 6º, suspendeu essas garantias, facultando ao Presidente da

República demitir, remover, aposentar ou colocar em disponibilidade quaisquer titulares

dessas garantias, por mero decreto. Tal faculdade foi atribuída ao Presidente da

República também diante dos empregados de autarquias, empresas públicas ou

sociedades de economia mista, além dos militares e membros das polícias militares,

podendo demiti-los, transferi-los para a reserva ou reformá-los.

Como é cediço, o Ato Institucional n. 5, assim como os demais Atos

Institucionais, tiveram duração até a Emenda Constitucional n. 11 de 13 de outubro de

1978, ocasião em que por seu art. 3º foram revogados – no que contrariavam a

Constituição – todos os atos institucionais, ressalvados os efeitos dos atos praticados

com base neles, excluindo-os de apreciação judicial.

A Emenda Constitucional n. 1 de 17 de outubro de 1969, que alterou

substancialmente a Constituição de 1967, também trouxe disposições sobre garantias e

deveres dos juízes115.

julgadores, salvo após, dez anos de contínuo exercício no cargo. § 4º Ocorrendo motivo de interêsse

público, poderá o Tribunal competente, pelo voto de dois terços de seus membros efetivos, propor a

remoção ou a disponibilidade do juiz de instância inferior, assegurada, no último caso, a defesa. Art 96 -

É vedado ao Juiz: I - exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo o

magistério secundário, e superior e os casos previstos nesta Constituição, sob pena de perda do cargo

judiciário; II - receber, sob qualquer pretexto, percentagens, nas causas sujeitas a seu despacho e

julgamento; III - exercer atividade político partidária.” 114 “Art. 108 - Salvo as restrições expressas nesta Constituição, gozarão os Juízes das garantias seguintes:

I - vitaliciedade, não podendo perder o cargo senão por sentença judiciária; II - inamovibilidade, exceto

por motivo de interesse público, na forma do § 2º; III - irredutibilidade de vencimentos, sujeitos,

entretanto, aos impostos gerais. § 1 º - A aposentadoria será compulsória aos setenta anos de idade ou por

invalidez comprovada, e facultativa após trinta anos de serviço público, em todos esses casos com os

vencimentos integrais. § 2 º - O Tribunal competente poderá, por motivo de interesse público, em

escrutínio secreto, pelo voto de dois terços de seus Juízes efetivos, determinar a remoção ou a

disponibilidade do Juiz de categoria inferior, assegurando-lhe defesa. Os Tribunais poderão proceder da

mesma forma, em relação a seus Juízes. Art 109 - É vedado ao Juiz, sob pena de perda do cargo

judiciário: I - exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo um cargo de

magistério e nos casos previstos nesta Constituição; II - receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto,

percentagens nos processos sujeitos a seu despacho e julgamento; III - exercer atividade político –

partidária.” 115 Vale mencionar que essa emenda é considerada por alguns estudiosos como uma nova Constituição, a

exemplo de José Afonso da Silva em seu Curso de Direito Constitucional Positivo (SILVA, José Afonso

da, op. cit., p. 87).

74

Observa-se que a Emenda Constitucional n. 1 de 1969 também previu as

garantias (art. 113) e deveres dos juízes (art. 114), sem, no entanto, inovar no tema,

mantendo as mesmas garantias e deveres contidos na Constituição de 1967.

Por fim, a Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de

outubro de 1988, manteve as garantias e os deveres dos juízes, mas no conjunto os

ampliou significativamente, formando uma dimensão protetiva no âmbito do Poder

Judiciário. Nas palavras do sociólogo Carlo José Napolitano116, a guinada do Poder

Judiciário como um verdadeiro Poder da República veio com a Constituição de 1988,

ocasião em que “[o] Brasil passa, então, a ter efetivamente um Judiciário independente,

com autonomia funcional, administrativa, financeira e com as garantias da magistratura

respeitadas”.

Em dezembro de 1985, Francis Selwyn Davis, ao escrever sobre o que esperava

da Constituição que viria, afirmou: “[É] preciso prover o Judiciário de absoluta

independência, de recursos financeiros, juízes bastantes e moderna instrumentação.

Sugestões dos juízes devem merecer atenção” 117.

Na mesma ocasião, Sidney Sanches afirmou que, em seu entendimento, a

Constituinte deveria transformar o Judiciário em um verdadeiro Poder, adicionando que,

para o Judiciário “atuar com eficiência, confiabilidade e rapidez, precisaria sobretudo de

autonomia orçamentária, administrativa e política. Não absoluta, mas ao menos,

relativa”118.

Passamos agora à análise da atual proteção nacional da independência judicial,

que encontra assento na Constituição brasileira. Para iniciar, vejamos a íntegra do

principal dispositivo constitucional sobre o tema:

Art. 95. Os juízes gozam das seguintes garantias:

I - vitaliciedade, que, no primeiro grau, só será adquirida após dois

anos de exercício, dependendo a perda do cargo, nesse período, de

deliberação do tribunal a que o juiz estiver vinculado, e, nos demais

casos, de sentença judicial transitada em julgado;

II - inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, na forma

do art. 93, VIII;

III - irredutibilidade de vencimentos, observado, quanto à

remuneração, o que dispõem os arts. 37, XI, 150, II, 153, III, e 153, §

116 NAPOLITANO, Carlo José, op. cit. 117 DAVIS, Francis Selwyn. Debates. In: DECISÃO - Revista Trimestral da Associação Paulista dos

Magistrados. Ano I, n. 1, dez. 1985, p. 8 e 9. 118 SANCHES, Sidney. Debates. In: DECISÃO - Revista Trimestral da Associação Paulista dos

Magistrados. Ano I, n. 1, dez. 1985, p. 6 e 7.

75

2º, I. (redação original, substituída pelo texto abaixo proveniente da

Emenda Constitucional n. 19 de 1998)

III - irredutibilidade de subsídio, ressalvado o disposto nos arts. 37,

X e XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I. (Redação dada pela

Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Parágrafo único. Aos juízes é vedado:

I - exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função,

salvo uma de magistério;

II - receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação

em processo;

III - dedicar-se à atividade político-partidária.

IV - receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou

contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas,

ressalvadas as exceções previstas em lei; (Incluído pela Emenda

Constitucional nº 45, de 2004)

V - exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou,

antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por

aposentadoria ou exoneração. (Incluído pela Emenda Constitucional

nº 45, de 2004)

Nossos grifos.

O primeiro ponto que merece análise comparativa com os demais textos

constitucionais que trataram da matéria é que, na Constituição de 1988, não há, como

ocorreu nas Constituições anteriores, a ressalva “Salvo as restrições expressas nesta

Constituição os juízes gozarão das seguintes garantias: (...)”

Outro ponto importante refere-se às duas vedações incluídas pela Emenda

Constitucional n. 45 de 30 de dezembro de 2004, amplamente conhecida como a

Reforma do Judiciário: a vedação de os juízes receberem, a qualquer título ou pretexto,

auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas

as exceções previstas em lei; e a quarentena, ambas analisadas detalhadamente adiante.

Para organizar as garantias de modo adequado à proposta desta tese, adotamos a

divisão apresentada por André Ramos Tavares119, que subdivide as garantias em 1º)

orgânicas (ou institucionais) e 2º) individuais. As primeiras se referem à estrutura do

Poder Judiciário, ao passo que as segundas se referem propriamente aos membros dos

órgãos judiciários.

No primeiro grupo (garantias orgânicas) estão as seguintes garantias: a)

capacidade de autogoverno; b) autonomia financeira; e c) capacidade normativa. No

segundo grupo (garantias individuais) tem-se a) vitaliciedade; b) inamovibilidade; e c)

irredutibilidade de vencimentos. Vejamos cada garantia.

119 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, op. cit., p. 1142-1149.

76

3.1.2. Garantias orgânicas

3.1.2.1. Garantia de autogoverno

A Constituição brasileira, no art. 96, I, prevê expressamente a garantia de

autogoverno, conferindo privativamente ao Tribunal algumas funções essenciais às suas

atividades, como a eleição de seus órgãos diretivos, a elaboração de seus regimentos

internos, a organização de suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos que lhes

forem vinculados, a faculdade de propor a criação de novas varas judiciárias, o

provimento dos cargos necessários à administração da Justiça e a concessão de licença,

férias e outros afastamentos a seus membros, juízes e servidores120.

André Ramos Tavares define a capacidade de autogoverno como a possibilidade

de que o Judiciário eleja seus próprios órgãos diretivos, se organize administrativamente

e delibere “sobre assuntos próprios, como realização de concurso, concessão de

benefícios e licenças a seus integrantes, independentemente da posição governamental

acerca de gastos ou diminuição da máquina estatal” 121.

Michel Temer distingue administração e jurisdição no contexto do autogoverno

como garantia destinada ao Poder Judiciário, buscando na finalidade dos conceitos os

limites de sua definição. Assim, passa a definir administração como a ação de fazer

atuar o aparelhamento burocrático, que dará suporte para a outra função, essa sim típica,

a função jurisdicional. Como exemplo dessa atuação administrativa, inclui também o

regramento sobre o pessoal, a responsabilização administrativa122, entre outras.

No bojo da garantia orgânica de autogoverno está a escolha dos dirigentes (ou

órgãos diretivos) pelo próprio tribunal, conforme previsto no art. 96, I, a, da

Constituição brasileira.

120 “Art. 96. Compete privativamente: I - aos tribunais: a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus

regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes,

dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;

b) organizar suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos que lhes forem vinculados, velando pelo

exercício da atividade correicional respectiva; c) prover, na forma prevista nesta Constituição, os cargos

de juiz de carreira da respectiva jurisdição; d) propor a criação de novas varas judiciárias; e) prover, por

concurso público de provas, ou de provas e títulos, obedecido o disposto no art. 169, parágrafo único, os

cargos necessários à administração da Justiça, exceto os de confiança assim definidos em lei; f) conceder

licença, férias e outros afastamentos a seus membros e aos juízes e servidores que lhes forem

imediatamente vinculados;” 121 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, op. cit., p. 1142-1149. 122 TEMER, Michel, op. cit., p. 176.

77

Vale realçar que mesmo o Supremo Tribunal Federal – que, como se sabe, é um

órgão composto por membros escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e

menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada,

sendo nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela

maioria absoluta do Senado Federal123 - também escolhe, por seus membros, o

Presidente da corte. Embora seja de conhecimento de todos, o exemplo ilustra a

garantia, uma vez que os membros do Tribunal não podem escolher os futuros pares,

mas podem (e a somente eles cabe esta prerrogativa) escolher os próprios órgãos

diretivos.

André Ramos Tavares chama a atenção para o fato de que a garantia orgânica de

autogoverno, que engloba a garantia de escolha dos próprios dirigentes, traz consigo

também outra garantia, que é a inalterabilidade de organização, ou seja, também

abrange a mudança do número de membros do Tribunal, a criação ou extinção dos

tribunais inferiores, a alteração da organização e da divisão judiciárias124, tudo

amparado pelo art. 96, II, a, c, d, da Constituição brasileira.

Vale realçar que um dos papéis que o Conselho Nacional de Justiça vem

desempenhando consiste justamente na busca pela manutenção, eficácia e proteção

dessa garantia. André Ramos Tavares afirma que atualmente o Conselho Nacional de

Justiça desempenha o relevante papel da macrodireção do Poder Judiciário, realizando

levantamentos e indicações importantes para que, em suas palavras, “os diversos

gestores possam tomar decisões mais bem fundamentadas e com uma perspectiva de

nivelamento nacional do Poder Judiciário”125.

3.1.2.2. Capacidade normativa

A capacidade normativa do Poder Judiciário é concretizada por algumas

prerrogativas, tais como a competência de iniciativa legislativa diante de determinadas

matérias, além de atribuir aos Tribunais a capacidade de elaborar seu próprio regimento

interno.

123 Constituição Federal, art. 101. 124 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 213. 125 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 213.

78

André Ramos Tavares sintetiza essa garantia afirmando que “cada Tribunal do

País funciona a partir de um Regimento Interno próprio, cuja competência de

elaboração e aprovação é do respectivo Tribunal, nos termos do art. 96, I, a”126.

Essa capacidade é comumente considerada decorrência direta do postulado da

separação de poderes. Dessa maneira, se o regimento interno de um tribunal fosse

instituído por lei em sentido formal, por óbvio produzida no âmbito do Poder

Legislativo, sem a participação do Poder Judiciário, isso já evidenciaria infringência ao

postulado da separação de poderes. André Ramos Tavares explica que já por esse

motivo poderia ser afetada “drasticamente a necessária e proclamada independência dos

poderes” 127.

Já nos comentários à Constituição de 1967, Pontes de Miranda, ao analisar o art.

110, II (que tratava da capacidade normativa), mais especificamente diante da

capacidade atribuída ao tribunal para votar seu Regimento Interno, afirmava ser esta

uma tradição venerável e sempre justa.

Ao tratar do conceito de Regimento Interno, Pontes de Miranda afirma que o

conceito não é rígido, mas que é possível identificar essa capacidade normativa como

um dos elementos de independência do Poder Judiciário. Já naquele momento, alertava

para os cuidados com o excesso desse poder, em especial com a adequação

constitucional no tempo, alertando para uma prática que notava, deixando os Tribunais

de atender às mudanças ocorridas com a superveniência de textos constitucionais,

mantendo regras que não mais se compatibilizariam com a Constituição vigente,

podendo até, em suas palavras, conservar regimentos absurdos.

Ainda sobre essa temática, Pontes de Miranda apresenta críticas incisivas,

afirmando que “aos poucos se gasta [o prestígio] com esses abusos, que são pequeninos

‘golpes de Estado’, por parte da Justiça, em vez de crescer, nas dimensões moral e

jurídica, pela maior confiança do povo” 128.

Abordando o tema a partir da problematização de Pontes de Miranda, Gilmar

Mendes, ao se referir à constitucionalidade dos regimentos internos de Tribunais, afirma

que o Supremo Tribunal Federal, por algumas vezes, declarou a inconstitucionalidade

de normas constantes de Regimentos Internos tanto de tribunais estaduais quanto

126 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 218. 127 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., loc. cit. 128 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967. Tomo III. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 1967, p. 559.

79

federais, justamente por extrapolação dos limites disposto na LOMAN ou por

inadequação diante da Constituição vigente. Gilmar Mendes aponta que, em alguns

casos, notou-se que os regimentos internos, “no sentido de ampliar o leque de possíveis

concorrentes, criaram regras diferenciadas para a eleição dos cargos de direção dos

respectivos tribunais” 129.

Cretella Júnior, ao comentar sobre os contornos constitucionais da competência

de elaboração dos regimentos internos dos Tribunais, ressalva que o legislador

constituinte estabeleceu com minúcias os parâmetros a serem obedecidos pelos

tribunais. Segundo o autor, essa competência deve ser acompanhada de rígida

observância das normas processuais, especialmente as que trazem garantias às partes.

Caberia ao regimento interno dispor – respeitando esses limites – sobre competência e

funcionamento de seus órgãos (jurisdicionais e administrativos), organizando suas

secretarias e serviços auxiliares, bem como os dos juízos que lhes forem vinculados,

zelando pelo exercício da atividade correicional respectiva.

O regimento interno deve ainda prover, na forma prevista na Constituição, os

seus cargos, propor a criação de novas varas judiciárias, além de conceder licença, férias

e outros afastamentos a seus membros e aos juízes e servidores que lhes forem

imediatamente vinculados 130.

3.1.2.3. Garantia de autonomia financeira

Prevista no art. 99 da Constituição brasileira, a autonomia financeira pode ser

sintetizada como a capacidade atribuída ao Poder Judiciário para elaborar sua proposta

orçamentária, constituindo mais um elemento da independência do Poder Judiciário.

Entretanto, esta autonomia encontra seus limites na lei de diretrizes orçamentárias e em

um rito de encaminhamento ao Chefe do Executivo, que por fim apresenta a proposta ao

Congresso Nacional.

Nas palavras de Celso Ribeiro Bastos, a autonomia financeira do Poder

Judiciário vai além da autorização aos Tribunais para fazer a gestão de suas dotações

orçamentárias. Ela também implica a atribuição de o próprio Judiciário “elaborar suas

129 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, op. cit., p. 937. 130 CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. 2. ed., vol. 6. Rio de

Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 3033.

80

propostas orçamentárias, dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais

Poderes, as quais serão submetidas ao Poder Legislativo por ocasião da votação da lei

orçamentária anual”131.

O art. 99 da Constituição brasileira se refere especificamente ao tema da

autonomia financeira, prevendo e garantindo essa autonomia, além de especificar os

limites e procedimento de sua concretização, como a indicação de quem deve

encaminhar a proposta, norma alternativa no caso de os órgãos indicados não

encaminharem as propostas dentro dos prazos estipuladas na lei de diretrizes

orçamentárias, além das regras de adequação das propostas orçamentárias, no caso de

ultrapassarem os limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias132.

André Ramos Tavares afirma que, nos últimos anos, o Poder Judiciário federal e

estadual tem relatado dificuldades orçamentárias para a consecução de seus objetivos e

alerta que “o fortalecimento do Judiciário significa o fortalecimento da cidadania, dos

direitos humanos fundamentais e da própria consciência republicana” 133.

A título ilustrativo, vale mencionar a Ação Ordinária n. 1.482, impetrada pelo

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em face de ato coator da Governadora e da

Mesa da Assembleia Legislativa desse Estado. A questão foi decidida no Supremo

Tribunal Federal em sede cautelar pelo Ministro-relator Marco Aurélio. O deslocamento

para o STF decorreu da impossibilidade de julgamento do feito pelo próprio Tribunal de

Justiça, que impetrou o mandado de segurança, socorrendo-se do disposto no artigo 102,

inciso I, alínea ‘n’, da Constituição Federal e valendo-se de precedente relatado pelo

Ministro Octavio Gallotti, o Mandado de Segurança 21.450-3/MT.

131 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. 4 v. T.III,

arts 92 a 126. 1997, p. 112-3. 132 “Art. 99. Ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira. § 1º - Os tribunais

elaborarão suas propostas orçamentárias dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais

Poderes na lei de diretrizes orçamentárias. § 2º - O encaminhamento da proposta, ouvidos os outros

tribunais interessados, compete: I - no âmbito da União, aos Presidentes do Supremo Tribunal Federal e

dos Tribunais Superiores, com a aprovação dos respectivos tribunais; II - no âmbito dos Estados e no do

Distrito Federal e Territórios, aos Presidentes dos Tribunais de Justiça, com a aprovação dos respectivos

tribunais. § 3º Se os órgãos referidos no § 2º não encaminharem as respectivas propostas orçamentárias

dentro do prazo estabelecido na lei de diretrizes orçamentárias, o Poder Executivo considerará, para fins

de consolidação da proposta orçamentária anual, os valores aprovados na lei orçamentária vigente,

ajustados de acordo com os limites estipulados na forma do § 1º deste artigo. § 4º Se as propostas

orçamentárias de que trata este artigo forem encaminhadas em desacordo com os limites estipulados na

forma do § 1º, o Poder Executivo procederá aos ajustes necessários para fins de consolidação da proposta

orçamentária anual. § 5º Durante a execução orçamentária do exercício, não poderá haver a realização de

despesas ou a assunção de obrigações que extrapolem os limites estabelecidos na lei de diretrizes

orçamentárias, exceto se previamente autorizadas, mediante a abertura de créditos suplementares ou

especiais.” 133 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 213.

81

No caso mencionado, o Poder Judiciário gaúcho havia encaminhado ao Poder

Executivo sua proposta orçamentária para o ano de 2008, atendendo aos prazos e

disposições legais e constitucionais. Contudo, diante da política governamental, o

Executivo decidiu reduzir essa proposta orçamentária e, após consolidar suas mudanças,

submeteu-a diretamente ao Poder Legislativo para deliberação.

O relator do caso, Ministro Marco Aurélio, considerou incompreensível que um

certo poder do Estado, neste caso o Executivo, decidisse de maneira diametralmente

oposta ao STF. Entendeu então que estava diante de ingerência incabível do Poder

Executivo no Judiciário do Rio Grande do Sul e, por isso, deferiu a liminar nos termos

em que fora pleiteada. Determinou, portanto, que a Governadora do Estado do Rio

Grande do Sul procedesse ao aditamento à proposta orçamentária para 2008,

considerando a diferença entre o que fora inserido e o valor total encaminhado pelo

Tribunal de Justiça. Vale mencionar que o Ministro Marco Aurélio também acolheu o

segundo pedido, suspendendo o processo legislativo referente ao projeto de lei

orçamentária para o exercício de 2008 até que ocorresse o aditamento que

determinou134.

Sobre eficácia e normas constitucionais, embora com enfoque nos direitos sociais,

Bercovici considerando o contexto das tentativas de mudança no papel do Estado

brasileiro, analisa o papel da constituição afirmando que embora ela pretenda consagrar

as bases de um projeto nacional, de um plano de transformações, de implementadora de

políticas públicas e de estruturadora do Estado, isto não passou da pretensão, afirmando

ainda que há um diálogo entre ausentes se referindo ao diálogo entre Estado e

constituição135.

Especificamente sobre a eficácia da autonomia financeira, José Afonso da Silva,

apoiando-se nos parágrafos 3º e 4º do art. 99, aponta que ela se demonstra bastante

limitada, afirmando inclusive que nos dias atuais essa autonomia tende a gerar mais

problemas do que benefícios, pois destina aos julgadores uma atividade política, ao

passo que eles precisam ficar imunes a quaisquer disputas que envolvem decisões

134 Disponível em:

http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28AO%24%2ESCLA%2E+E+1

482%2ENUME%2E%29&base=basePresidencia&url=http://tinyurl.com/d544knz. Acesso em: 06 mai.

2014. 135 BERCOVICI, Gilberto. Estado intervencionista e Constituição Social no Brasil: o silêncio

ensurdecedor de um diálogo entre ausentes. In: NETO, Cláudio Pereira de Souza; SARMENTO, Daniel;

BINENBOJM, Gustavo (Coord.). Vinte anos da Constituição Federal de 1988. Rio de Janeiro: Lumen

Juris, 2009, p. 725 e 734.

82

políticas. Afirma ainda que deveria o Conselho Nacional de Justiça ter recebido essa

atribuição, ou seja, deveria este Conselho ser o responsável por planejar e elaborar a

proposta orçamentária dos Tribunais, atribuição que foi cogitada, mas não foi efetivada.

Em suas palavras:

Tudo isso está a mostrar que essa autonomia financeira não é

assim tão pronunciada, é, ao contrário, bastante limitada e vai

gerar mais problemas do que benefícios. As divergências e

disputas entre tribunais, que devem aprovar as propostas, logo

demonstrarão ao Poder Judiciário que assuntos de administração

devem competir mesmo aos administradores e nunca aos

julgadores, que precisam ficar imunes a disputas que, no fundo,

envolvem decisões políticas. A ideia de um órgão de controle externo

da administração da Justiça que tivesse, entre suas incumbências, o

planejamento e a preparação da proposta orçamentária do Poder

Judiciário foi cogitada; mas o Conselho Nacional de Justiça que, em

seu lugar, foi criado pela EC 45/2004 não recebeu essa atribuição,

só cumprindo a ele, nesse particular, o controle da atuação

administrativa e financeira do Poder Judiciário 136.

Nossos grifos.

Parece que, embora a matéria seja controversa, dependendo de conjugação de

muitos interesses, deve-se buscar soluções mais pragmáticas, preservando a atuação

eficiente do Poder Judiciário. Talvez esta seja uma postura extremamente vinculada às

disposições constitucionais. Sobre o tema, André Ramos Tavares afirma que, para a boa

prestação de serviços jurisdicionais, não se deve encarar a discussão orçamentária como

se fosse uma “guerra” pelos recursos, mas sim “privilegiar as próprias prioridades

constitucionais, o que significa a priorização dos serviços públicos essenciais, a serem

imediatamente alçados aos primeiros patamares na destinação das verbas públicas”137.

3.1.3. Garantias individuais

Após a análise das garantias orgânicas da magistratura, prossegue-se no objetivo

de analisar a face instrumental da independência judicial no ordenamento constitucional

brasileiro, enfrentando agora o universo mais restrito de garantias, isto é, as garantias

individuais dos magistrados. Neste item pretende-se descrever as três principais

garantias que compõem o conjunto de garantias dos magistrados com o objetivo de

136 SILVA, José Afonso, op. cit., p. 589-590. 137 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 214.

83

proteger a independência judicial, quais sejam: vitaliciedade, inamovibilidade e

irredutibilidade de subsídios.

Na busca de uma definição suficiente de garantias, André Ramos Tavares as

explica didática e resumidamente: “[A] garantia pode ser entendida – grosseiramente –

como um direito ao direito, isto é, a salvaguarda de que determinado direito [...]”138.

As garantias individuais têm por objetivo proteger a independência judicial,

afastando o magistrado da oscilação inerente à política e trazendo segurança para julgar

com isenção, sem temer ataques funcionais sobre sua pessoa. A finalidade dessas

garantias é manter o Judiciário ativo e vigoroso, nas palavras de André Ramos Tavares,

pois de outro modo não se teria efetividade de Direitos Fundamentais139.

Pontes de Miranda, em comentários ao art. 108 da Constituição de 1967, que

tratava das garantias individuais dos magistrados, descreveu-as da seguinte maneira:

“são direitos constitucionais, oriundos de regras jurídicas diretas e imediatas, e não

simples garantias institucionais”140.

José Cretella Júnior, retomando as lições de A. de Sampaio Dória (cf. Direito

constitucional, 3ª ed., São Paulo, 1953, Companhia Editora Nacional, vol. II, p. 367),

procura estabelecer a diferença entre garantias e direitos, dividindo-a em duas acepções,

uma geral e outra estrita. Na acepção geral descrita pelo autor, direitos e garantias

constitucionais são sinônimos; já em sentido estrito, direito e garantias se distinguem,

uma vez que as garantias não são condições em si, permanentes, da vida humana, mas

sim condições de emergência, prontas para atuar diante das violações de direito, em

especial perante abuso de poder. Neste sentido A. Sampaio Dória, citado por Cretella

Júnior, afirma que as garantias supõem abusos ou a possibilidade de abuso contra os

direitos.

Após referenciar as lições de A. Sampaio Dória, José Cretella Júnior afirma que

garantias são proteções dispostas em regras jurídicas constitucionais, cuja finalidade

consiste em permitir que seu titular aja livremente no desempenho da função pública

sem qualquer espécie de pressão. Realça que entre as garantias dos juízes manifestam-se

três atributos ou prerrogativas: a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de

vencimentos. Em suas palavras, “‘[g]arantias dos juízes’ são as proteções

138 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 237. 139 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 239. 140 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti, op. cit., p. 551.

84

constitucionais – não meramente as da lei -, asseguradas ao magistrado assegurando-lhe

condições ideais para o exercício objetivo e imparcial da função jurisdicional”141.

Embora com alterações ao longo do tempo, em nossa história algumas garantias

sempre estiveram presentes nos textos constitucionais, em especial a vitaliciedade e a

inamovibilidade (ainda que com exceções), acrescidas mais tarde da irredutibilidade de

subsídios, conforme já mencionado no item 3.1.1 (Memória constitucional).

Marcelo Caetano (lembrado por Celso Bastos), ao tratar da independência

judicial e de sua devida proteção pelo ordenamento jurídico, diz que a função dessas

garantias é libertar e fazer saber que os juízes são libertos, tanto de direito quanto de

fato, de quaisquer pressões ou influências exteriores, afirmando que assim: “[...] as

decisões proferidas exprimem, unicamente, a aplicação do Direito cabível aos fatos

dados como provados no processo”142.

Celso Bastos também relaciona as garantias dos magistrados diretamente à

independência do Judiciário, lembrando que a independência do Judiciário está em

quase todas Constituições modernas e que, no nosso direito constitucional, a

independência judicial está “assegurada, entre outras, pelas garantias contempladas no

artigo sob comento143: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos

dos magistrados” 144.

Dada a relevância de que essas três garantias se revestem no tema da

independência judicial, opta-se aqui por apresentar revisão literária sobre as

mencionadas garantias, promovendo sempre que possível o diálogo com decisões

jurisprudenciais, no prosseguimento do objetivo de mapear a independência judicial no

ordenamento jurídico constitucional para, ao final, analisar as decisões normativas e

disciplinares do Conselho Nacional de Justiça, identificando zonas de conforto e de

conflito entre sua atividade e a independência jurisdicional.

141 CRETELLA JÚNIOR, José, op. cit., p. 3025. 142 CAETANO, Marcelo. Direito Constitucional. Vol. 2. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 384 apud

BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. T. II. São

Paulo: Saraiva, 1998, p. 65. 143 Artigo 95 da Constituição Federal. 144 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra, op. cit., loc. cit.

85

3.1.3.1. Vitaliciedade

Vitaliciedade é a garantia individual – atribuída ao magistrado após o

preenchimento de certas condições – que consiste no impedimento de destituir o

magistrado do cargo sem decisão judicial transitada em julgado.

Não há previsão de perda da vitaliciedade. André Ramos Tavares afirma que,

“[r]igorosamente falando, o magistrado nunca perde sua vitaliciedade, mas sim o

próprio cargo. Se magistrado é, então tem a vitaliciedade ao seu lado. Do contrário,

deixou de ser magistrado” 145.

No primeiro grau de jurisdição, a vitaliciedade é adquirida após dois anos de

exercício, período em que o magistrado poderá perder o cargo por deliberação do

tribunal a que estiver vinculado (art. 95, I, primeira parte).

No segundo grau de jurisdição, nos Tribunais Superiores e no Supremo Tribunal

Federal, a vitaliciedade já é atribuída com a posse. Essa diferença se justifica por

diversos motivos, não parecendo um privilégio em si destinado aos julgadores de

segunda instância ou Corte superior. O mais evidente e pragmático motivo é que nos

tribunais é possível que o nomeado sequer seja oriundo da magistratura, podendo ser

proveniente do Ministério Público, Advocacia ou ainda de outra carreira, desde que

atenda os requisitos específicos. Portanto, neste caso, não traria consigo a vitaliciedade

de magistrado de primeira instância, justamente por não ser – até então – magistrado;

dessa maneira, a Constituição brasileira resolveu a questão, limitando a exigência do

prazo de dois anos apenas aos juízes de primeiro grau, conforme se verifica no art. 95, I.

Pedro Lessa, ressaltando o caráter fundamental da vitaliciedade, faz uma

comparação inversa com a manutenção dos cargos nos Poderes Judiciário e Legislativo,

afirmando que a vitaliciedade é condição necessária da independência dos juízes e é tão

essencial ao Poder Judiciário quanto a temporariedade o é ao Poder Legislativo146.

Pontes de Miranda, ao analisar a matéria sob a Constituição de 1967, considera

que a vitaliciedade isenta o magistrado da pressão, da influência e das seduções da

permanência, indicando essa como sua principal finalidade147.

Cretella Júnior, na busca de definir as atribuições do vitalício, afirma que este é

o agente público que não pode ser afastado do cargo a não ser em virtude de (a)

145 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 246. 146 LESSA, Pedro. Do Poder Judiciário. Coleção História Constitucional Brasileira. Brasília: Senado

Federal, Conselho Editorial, 2003, p. 29. 147 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti, op. cit., p. 543.

86

sentença judicial transitada em julgado; (b) exoneração a pedido; (c) aposentadoria; (d)

morte; (e) invalidez comprovada; ou (f) extinção do cargo148 149.

Sobre este último, a extinção do cargo, Rocha frisa que embora a vitaliciedade

não impeça a extinção do cargo, conforme a súmula 11 do STF, essa extinção – ainda

que por economia de despesas – obrigará o Estado a pôr o servidor vitalício em

disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo de serviço150.

Vale lembrar ainda que, especificamente para os ministros do Supremo Tribunal

Federal, há previsão constitucional de impeachment mediante processo e julgamento

pelo Senado Federal na hipótese de crime de responsabilidade, conforme o art. 52, II, da

Constituição brasileira.

Temístocles Brandão Cavalcanti151, em comentários à Constituição de 1946,

afirmou que a vitaliciedade na época se revelou como motivo de grandes debates, “(...)

porque é, incontestavelmente, um privilégio, contrário aos princípios democráticos, e

que só se justifica por motivos muito relevantes”.

Com base na premissa de ser a vitaliciedade um privilégio, Cavalcanti admitia e

sustentava que a vitaliciedade não poderia ser decretada por lei ordinária, devendo

forçosamente ser proveniente de texto constitucional. Em suas palavras:

A tese, discutível, tem sido debatida entre nós. É preciso, no entanto

atender a uma distinção, que ora fazemos, entre os funcionários

cuja demissão depende de condenação judicial, e outros cuja

demissão depende de processo administrativo. Rigorosamente,

dentro dessa técnica, somente os primeiros são vitalícios, no sentido

constitucional do termo. A questão da vitaliciedade, imposta por lei

ordinária, não tem amis o mesmo interesse, à vista das disposições

constitucionais vigentes.

Grifos nossos.

André Ramos Tavares afirma que o principal significado da vitaliciedade diz

respeito diretamente ao cidadão, sendo ela uma garantia de que a ameaça ou violação

dos direitos do cidadão será objeto da decisão de um juiz sem temor de sua permanência

no cargo, independente da decisão que proferir. Segundo o autor, o significado dessa

148 STF, Súmula 11: “A vitaliciedade não impede a extinção do cargo, ficando o funcionário em

disponibilidade, com todos os vencimentos.” 149 CRETELLA JÚNIOR, José, op. cit., p. 3026. 150 ROCHA, Silvio Luís Ferreira da, op. cit., p. 247. 151 CAVALCANTI, Temístocles Brandão. A Constituição Federal comentada. 2. ed., vol. IV, p. 175-6

apud CRETELLA JÚNIOR, José, op. cit., p. 3027.

87

garantia “(...) é o de prestar ao cidadão a garantia de que seus direitos, se e quando

violados ou ameaçados, serão prontamente restabelecidos ou protegidos por um juiz

sem temores quanto à permanência em seu cargo após a decisão tomada”.

Vale retomar o raciocínio do autor, que alerta e clama por atenção a uma

confusão comum que se faz a respeito da vitaliciedade: muitas vezes ela é

compreendida como a impossibilidade de perda do cargo, mas na verdade é a garantia

de que não haverá perda do cargo por decisão não definitiva152.

Os juízes de primeiro grau, antes de completado o biênio, portanto, antes de

serem vitalícios, ficam sujeitos ao procedimento de perda de cargo previsto na Lei

Orgânica da Magistratura Nacional, a Lei Complementar n. 35 de 1979 (LOMAN).

Mais precisamente, o art. 27 da LOMAN prevê esse procedimento detalhado,

determinando a competência para iniciar o procedimento e exigindo defesa prévia do

magistrado no prazo de 15 dias. Além de trata de outros atos e prazos, a lei determina

que cabe ao Tribunal ou ao seu órgão especial decidir sobre eventual afastamento do

magistrado até a decisão final.

3.1.3.2. Inamovibilidade

A segunda garantia aqui tratada é a inamovibilidade, que possui previsão

constitucional desde a Constituição do Império de 1824. É verdade que, nesse momento

inicial, sua previsão como garantia ainda se revelava extremamente frágil e passível de

mudança por lei, mas ainda assim já possuía estatura constitucional (art. 153 da

Constituição de 1824)153.

Uma vez que a garantia da inamovibilidade tratada anteriormente em conjunto

com a vitaliciedade, Castro Nunes estabeleceu uma relação entre as duas garantias,

afirmando que “no conceito doutrinário de inamovibilidade se inclue não só o direito ao

cargo, garantia que conhecemos pela palavra vitaliciedade, como também à

irremovibilidade, com o sentido, porém de inamovibilidade na função”154.

Mais adiante Castro Nunes diferencia vitaliciedade e inamovibilidade,

entendendo que a última é “a garantia que tem o juiz de não ser destituído e a de não ser

152 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 242. 153 “Os Juizes de Direito serão perpetuos, o que todavia se não entende, que não possam ser mudados de

uns para outros Logares pelo tempo, e maneira, que a Lei determinar.” 154 NUNES, José de Castro. Teoria e Prática do Poder Judiciário. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1943,

p. 94.

88

removido. É por este segundo elemento que se define em nosso direito a

inamovibilidade de que fala a Constituição”155.

André Ramos Tavares encontra como fundamento da inamovibilidade a garantia

de imparcialidade da própria Justiça, ressaltando que ela “(...) impede que determinado

juiz seja removido de um cargo para outro de acordo com interesses políticos ou

governamentais, ou mesmo para evitar o ‘julgamento popular’, designando-se

determinado juiz por ser reputado mais ‘severo’ ou mais ‘leve’. Impede-se a mudança

do juiz da causa por circunstâncias que comprometeriam a isenção do próprio processo

judicial” 156.

Celso Bastos define inamovibilidade como a garantia pela qual se assegura ao

juiz o direito de permanência na sua sede, e não só para o seu cargo157. Afirma ainda

que o princípio da inamovibilidade assegura ao juiz o direito de não ser removido, nem

mesmo sob a forma de promoção; a remoção depende, assim, do seu assentimento,

manifestado na forma da lei (CF, art. 95, II e LOMAN, art. 30). Frisa que o

assentimento na hipótese de remoção é obrigatório mesmo no caso de mudança da sede

do juízo, ocasião em que é facultado ao magistrado remover-se para ela ou para

comarca de igual entrância, ou pedir disponibilidade com vencimentos integrais

(LOMAN, art. 31).

Michel Temer relaciona a inamovibilidade com a independência judicial,

afirmando que seu objetivo é permitir a livre atuação do magistrado na sua jurisdição,

sem qualquer temor de eventual remoção por haver desagradado quem quer que seja.

Nesse sentido, a inamovibilidade teria com uma de suas funções garantir decisões

altivas. Temer explica ainda que a eventual remoção por motivo de interesse público só

seria possível mediante decisão do Tribunal competente e nunca por decisão de órgão

estranho ao Poder Judiciário158.

Moacyr Amaral Santos explica que a inamovibilidade comporta exceção sem

descaracterizar o sentido da garantia, pois há possibilidade de o juiz de primeiro grau de

jurisdição ser removido, mesmo sem seu consentimento; no entanto, para isso deve

ocorrer motivo de interesse público reconhecido em escrutínio secreto pelo voto de dois

155 NUNES, José de Castro, op. cit., p. 101. 156 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 252. 157 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra, op. cit., p. 67. 158 TEMER, Michel, op. cit., p. 125.

89

terços dos membros efetivos do tribunal, ou, se for o caso, por esse mesmo quórum de

seu Órgão Especial.

A remoção terá que ser deliberada por meio de procedimento próprio (LOMAN,

arts. 46159 e 27), no qual o juiz deve ter ampla defesa. Caso seja resolvida a sua

remoção, deve ser-lhe ainda facultada a disponibilidade com vencimentos proporcionais

ao tempo de serviço (CF, art. 93, VII; LOMAN, arts. 30, 45, I, 46, 27).

Igualmente por motivo de interesse público, magistrados do segundo grau de

jurisdição poderão ser postos em disponibilidade, com vencimentos proporcionais ao

tempo de serviço (CF, art. 93, VIII; LOMAN, art. 45, II)160.

A inamovibilidade tampouco é absoluta, porque o magistrado pode ser

promovido; neste tocante, exige-se a aceitação do magistrado para essa promoção como

expressão da incidência da inamovibilidade. Outras exceções se apresentam desde a

redação originária da Constituição brasileira de 1988, como previsto no art. 93, VIII da

Constituição, trazendo a possibilidade de remoção e aposentadoria compulsórias e

disponibilidade por interesse público em decisão por voto de dois terços do tribunal. A

Emenda Constitucional n. 45 (Reforma do Judiciário) alterou este dispositivo, exigindo

decisão por voto da maioria absoluta do respectivo tribunal ou do Conselho Nacional de

Justiça.

Cretella Júnior, buscando o sentido técnico da inamovibilidade, entende-a como

a garantia constitucional que confere ao magistrado o direito subjetivo público de não

ser removido de uma comarca para outra, relacionando a inamovibilidade com a

vitaliciedade e irredutibilidade de vencimentos. Em suas palavras: “[T]odo vitalício é,

de regra, inamovível e de vencimento irredutíveis” 161.

O juiz inamovível pode ser removido em três hipóteses: 1) remoção a pedido; 2)

remoção em virtude de promoção aceita; 3) remoção compulsória por motivo de

interesse público nos termos do art. 93, VIII da Constituição brasileira.

Mas quando o juiz se torna inamovível?

Vimos que a vitaliciedade é garantida ao magistrado, na primeira instância, após

o decurso do prazo de dois anos, período denominado estágio probatório; já nos

Tribunais a vitaliciedade é garantida com a posse do julgador no Tribunal. Entretanto, a

159 “Art. 46 - O procedimento para a decretação da remoção ou disponibilidade de magistrado obedecerá

ao prescrito no art. 27 desta Lei.” 160 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva, p.

104 apud BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra, op. cit., p. 44. 161 CRETELLA JÚNIOR, José, op. cit., p. 3029-30.

90

Constituição brasileira foi silente sobre o início da incidência da garantia da

inamovibilidade162.

A questão é especialmente relevante diante da existência dos magistrados

substitutos, bem como dos magistrados itinerantes. Cretella Júnior afirma que as

exceções à inamovibilidade são aquelas relativas ao ocupante de cargo criado na

qualidade de temporário ou itinerante163. A questão foi debatida especificamente diante

da polaridade entre o juiz substituto e o juiz titular, tanto no âmbito do Conselho

Nacional de Justiça quanto no Supremo Tribunal Federal, sendo ao final encontradas

decisões díspares.

Para enfrentar adequadamente essa problemática, trazemos aqui um breve estudo

de caso que teve fase administrativa no âmbito do CNJ e jurisdicional por mandado de

segurança no Supremo Tribunal Federal. Trata-se do mandado de segurança n. 27.958,

impetrado por Fernando da Fonsêca Melo em face do Conselho Nacional de Justiça, por

força da decisão nos autos do procedimento de controle administrativo n.

2008.10.00.001873-3, e do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso. Foi julgado

pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal em 17 de maio de 2012 e publicado no

Diário de Justiça eletrônico de 29 de agosto de 2012.

O impetrante afirmou que ingressara na magistratura do Estado de Mato Grosso

em 18/11/2006, ocasião em que havia sido lotado na 1ª Vara da Comarca de Alto

Araguaia, onde permaneceu por dois anos e oito meses.

Em 17/10/2007 foi informado por uma servidora do Tribunal de Justiça do Mato

Grosso que, a partir de 18/10/2007, deveria apresentar-se na Comarca de Rio Branco,

por força de nova lotação, além de ter sido designado cumulativamente para a Comarca

de Porto Esperidião.

O impetrante afirmou também que em 14/3/2008 havia passado por situação

semelhante, tendo sido informado, mais uma vez, sobre a alteração de sua lotação, desta

feita para a Comarca de Vila Rica, a partir de 17/3/2008, alteração recusada pelo

impetrante e por isso tornada sem efeito.

162 “Art. 95. Os juízes gozam das seguintes garantias: […] II - inamovibilidade, salvo por motivo de

interesse público, na forma do art. 93, VIII; Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal

Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: […] VIII - o ato de

remoção, disponibilidade e aposentadoria do magistrado, por interesse público, fundar-se-á em decisão

por voto da maioria absoluta do respectivo tribunal ou do Conselho Nacional de Justiça, assegurada

ampla defesa; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)” 163 CRETELLA JÚNIOR, José, op. cit., p. 3029-30.

91

Contudo, em 4/4/2008, o Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do

Estado do Mato Grosso publicou a Portaria 222/2008, lotando-o na Comarca de Vila

Rica, a contar de 7/4/2008.

Inconformado, ingressou com requerimentos no Tribunal de Justiça local e

pedido de providências no CNJ autuado sob o n. 2008.10.00.001873-3. O pedido foi

julgado improcedente pelo Conselho Nacional de Justiça, com base na tese de que o

instituto da inamovibilidade não alcança os juízes substitutos, mesmo aqueles que já

tenham conquistado a garantia da vitaliciedade, conforme se nota a partir de trecho da

ementa:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO.

MAGISTRADO. REMOÇÃO. JUIZ SUBSTITUTO. 1.

JUDICIALIZAÇÃO PRÉVIA DA QUESTÃO INDIVIDUAL.

NÃO CONHECIMENTO. Estéril de poderes jurisdicionais, refoge

do diâmetro de competência do Conselho Nacional de Justiça a

apreciação de demanda judicializada previamente. 2. JUIZ

SUBSTITUTO. VITALICIEDADE E INAMOVIBILIDADE.

INDEPENDÊNCIA ONTOLÓGICA E TELEOLÓGICA DOS

INSTITUTOS. Embora integrem o rol de garantias fundamentais

para o exercício da magistratura, vitaliciedade e inamovibilidade

(CF, art. 95, I e II) são inconfundíveis. A passagem do juiz

substituto pelo estágio probatório bienal não lhe outorga, somente

pelo decurso do tempo, a inamovibilidade, própria dos juízes

promovidos à titularidade. A vitaliciedade propicia estabilidade

na carreira; a inamovibilidade enseja estabilidade geográfica.

Limitar a movimentação de juízes substitutos seria frustrar a

própria finalidade de sua existência: substituir ou auxiliar onde o

tribunal detecte necessidade. Conseqüentemente, juízes

substitutos, vitalícios ou em estágio probatório, não são

inamovíveis. A designação do juiz substituto para comarca

diversa daquela em que esteja lotado prescinde do procedimento

especial previsto no art. 93, VIII, da CF”164.

Nossos grifos.

Portanto, o CNJ distinguiu vitaliciedade da inamovibilidade para além de seu

conteúdo, entendendo que a incidência dessas garantias também é independente. A

primeira seria relativa ao prazo de dois anos (estágio probatório) e a segunda,

correlacionada com a titularidade do magistrado, desconsiderando-se o cumprimento do

estágio probatório e a vitaliciedade. O critério decisivo para esta decisão do Conselho

Nacional de Justiça é a titularidade, de modo que limitar a movimentação dos juízes

164 Ementa do Pedido de Providências n. 2008.10.00.001873-3. Julgado em 16.12.2008 sob a relatoria do

Conselheiro Antônio Humberto Souza Júnior.

92

substitutos frustra a própria finalidade de sua existência, que, nos termos da decisão do

CNJ, consiste em “substituir ou auxiliar onde o tribunal detecte necessidade” 165.

Em voto apresentado na sessão de julgamento de 3 de fevereiro de 2011, o

Ministro-relator Ricardo Lewandowski reproduziu trechos da fundamentação do

Conselho Nacional de Justiça no julgamento do pedido de providências. Primeiramente,

o relator esclareceu que a tese central alegada pelo requerente residia no argumento de

que, uma vez superado o estágio probatório, incidiria a garantia de vitaliciedade, o que

implicaria, mesmo enquanto não promovido a juiz titular, a aquisição também da

garantia de inamovibilidade.

O Ministro Lewandowski entendeu que nenhuma censura deveria se impor, em

regra, aos atos que designassem juízes não titulares para responderem por determinada

vara, dentro ou fora da mesma comarca de atuação momentânea dos magistrados

respectivos166.

Note-se que, em sentido diverso do que afirmado por Cretella Júnior (“[t]odo

vitalício é, de regra, inamovível e de vencimento irredutíveis”167), o Conselho Nacional

de Justiça decidiu, neste caso, que há uma distinção decorrente da finalidade do juiz

substituto como indicada pelo CNJ. Por uma questão de lógica e de necessidade, esses

magistrados podem ser a qualquer momento deslocados para substituir juiz titular ou

auxiliar, quando o volume de serviços justifique tal reforço.

Mas o Supremo Tribunal Federal entendeu diferentemente, recorrendo à

premissa de que a inamovibilidade é uma garantia da magistratura, cuja finalidade é

assegurar a independência e imparcialidade do próprio Poder Judiciário. Na ocasião, o

Ministro-relator afirmou não poder concordar com a tese de que a inamovibilidade só

alcançaria os juízes titulares; diante dos efeitos práticos e das necessidades dos

Tribunais, sugeriu que a substituição – quando necessária – fosse exercida por meio de

escala, sem se socorrer de remoção compulsória. Ao final, o Ministro-relator Ricardo

Lewandowski concluiu:

165 Ementa do Pedido de Providências n. 2008.10.00.001873-3. Julgado em 16.12.2008 sob a relatoria do

Conselheiro Antônio Humberto Souza Júnior. 166 STF, MS n. 27.958. Trechos citados no voto do relator Min. Ricardo Lewandowski remetendo à

argumentação nos autos do Pedido de Providências n. 2008.10.00.001873-3. Julgado em 16.12.2008 sob a

relatoria do Conselheiro Antônio Humberto Souza Júnior. Observação: trechos indisponíveis no site

oficial do Conselho Nacional de Justiça. 167 CRETELLA JÚNIOR, José, op. cit., p. 3029-30.

93

[D]essa forma, entendo que a inamovibilidade constitui garantia de

toda a magistratura e não apenas dos juízes titulares.

Consequentemente, o magistrado só poderá ser removido com o seu

consentimento, ou, ainda, se o interesse público o exigir, nos

termos do inc. VIII do art. 93 da Constituição Federal. Isso para que se

garanta, de forma efetiva, a imparcialidade e independência da

magistratura, desde o momento da primeira investidura do juiz.

Essa garantia não impede que, nos termos da Lei de Organização

Judiciária local, o juiz substituto seja designado para substituir ou

auxiliar alguma comarca, todavia, sem ser removido.

Nossos grifos.

No parecer da Procuradoria-Geral da República nos autos desse mandado de

segurança, foi realçada a necessidade de movimentação dos substitutos, que não é

incompatível com a necessidade de auxílio do juiz substituto, e que não deve – por si –

excluir a garantia da inamovibilidade. A PGR entendeu que a inamovibilidade e a

necessidade prática de movimentação dos substitutos não seriam fatores excludentes,

mas que conviveriam em harmonia. Afirmou ainda que o substituto indicado para cobrir

a ausência do titular convocado ao Tribunal não deveria ser retirado da Vara antes do

retorno deste, bem como aquele ocupante de Vara vaga, anteriormente à conclusão do

concurso de promoção ou remoção.

Dentre os ministros que apresentaram seus votos nesse caso, apenas o Ministro

Marco Aurélio divergiu do entendimento do Relator e restou vencido, pois entendeu que

reconhecer direito líquido e certo à inamovibilidade do substituto seria negar a própria

natureza do cargo, já que a nomeação do juiz substituto serviria justamente para atender

às necessidades de substituição. Portanto, em seu entendimento, a prerrogativa da

inamovibilidade não guardaria pertinência com o cargo ocupado.

Questionado quanto ao princípio do juiz natural, o Ministro Marco Aurélio

respondeu que, no tocante aos substitutos, não havia fixação que gerasse a figura do juiz

natural, já que a própria substituição é eventual.

Ao final, o acórdão do Mandado de Segurança n. 27.958, julgado em 17 de maio

de 2012, ficou assim redigido:

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do

Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a Presidência

do Senhor Ministro Ayres Britto, na conformidade da ata de

julgamentos e das notas taquigráficas, por maioria, conceder a

segurança para anular a decisão do Conselho Nacional de Justiça

- CNJ e invalidar a Portaria 222/2008 da Presidência do Tribunal

94

de Justiça do Estado do Mato Grosso, que determinou a lotação

do impetrante na Comarca de Vila Rica - MT, ressalvada a

validade dos atos já praticados pelo impetrante, tudo nos termos

do voto do Relator, ora reajustado, vencido o Senhor Ministro

Marco Aurélio, que conhecia parcialmente do pedido e nesta

parte, denegava a segurança. Ausentes, justificadamente, a Senhora

Ministra Cármen Lúcia, e o Senhor Ministro Dias Toffoli em

representação do Tribunal na II Assembleia da Conferência das

Jurisdições Constitucionais dos Países de Língua Portuguesa, em

Maputo, Moçambique, e na IX Conferência Ibero-americana de

Justiça Constitucional, em Cádiz, na Espanha.

Nossos grifos.

Em caso mais recente, julgado em 5 de agosto de 2014 pela Segunda Turma do

Supremo Tribunal Federal, nos autos da Ação Ordinária n. 1.656, sob a relatoria da

Ministra Cármen Lúcia, o precedente estudado acima também foi invocado e ratificado

na parte que cabe a este estudo. Assim, o tribunal reafirmou que a inamovibilidade é

assegurada indistintamente aos magistrados, sejam eles titulares ou substitutos, não

impedindo sua designação para atuar em unidade judiciária distinta da qual exerçam

ordinariamente suas atribuições, desde que isso decorra de razões de interesse público.

Tal designação deve ser sempre orientada ao atendimento dos princípios constitucionais

que regem todos os atos administrativos e devidamente motivada, de modo a permitir

que eventuais abusos e desvios de finalidade sejam corrigidos.

É importante ressaltar que, antes do julgamento do Mandado de Segurança n.

27.958 pelo Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça já havia passado

a reconhecer a inamovibilidade como garantia dos juízes, mesmos dos substitutos, como

se constata no Pedido de Providência n. 0005955-90.2010.2.00.0000. O pedido foi

decidido em 19 de outubro de 2010 sob a relatoria da Conselheira Morgana Richa e teve

como redator da decisão o Conselheiro Walter Nunes.

3.1.3.3. Irredutibilidade de subsídios

A terceira garantia que será abordada aqui é a irredutibilidade de subsídios, que

possui previsão constitucional desde a primeira Constituição da República, de 24 de

95

fevereiro de 1891. Essa Constituição tratou do Poder Judiciário na Seção III do Capítulo

V e, em seu artigo 57, §1º, previu a irredutibilidade de subsídios, ainda que limitada168.

Alcino Salazar, em obra de 1975, defendeu a existência da garantia

constitucional da irredutibilidade de subsídios, diante da eventualidade ou do risco de

pressão proveniente de qualquer outro Poder, fazendo uma correlação entre a

irredutibilidade e a separação de poderes169.

Em obra de 1999, Cretella Júnior afirma que, apesar de considerar necessária a

irredutibilidade de subsídios dos magistrados, não se justifica incluí-la no rol de

garantias constitucionais. Na sua visão, bastaria que lei ordinária tratasse do assunto,

uma vez que as necessidades atuais diferem das do século passado. Conforme explica o

autor:

Nunca, nestas últimas décadas, houve diminuição ou redução de

salários de empregados, de funcionários públicos, em geral, diante

da crescente e contínua inflação. Ao contrário, o que se tem visto é

o aumento das contraprestações devidas por serviços prestados,

públicos ou privados. Depois, em que área o poder público iria

reduzir os vencimentos dos magistrados? Na federal, na estadual?

Na distrital? Por lei? Por ato do Poder Executivo? Qual a

repercussão desse tipo de medida? Qual o motivo invocado?

A vitaliciedade poderia ainda ser vulnerada por lei ordinária, caso

não houvesse a garantia constitucional. Ou abusivamente pelo

Executivo. A inamovibilidade poderia ser atingida no âmbito do

próprio Judiciário, fundada a medida na oportunidade ou

conveniência da remoção. Entretanto, a redutibilidade de

vencimento dos juízes, de primeiro, de segundo ou superior grau, não

teria sentido. Estaria patente a figura do desvio de poder, por

parte do Poder Executivo, em qualquer área, a redução ou

diminuição de vencimentos dos juízes, quando outras classes,

como a dos trabalhadores e a dos funcionários públicos, em geral,

vêm obtendo aumentos do quantum recebido por serviços

prestados170. Nossos grifos.

Na busca de identificação das finalidades da irredutibilidade de subsídios, adota-

se aqui posicionamento de André Ramos Tavares, que afirma que tais finalidades

podem ser resumidas em: 1ª) segurança jurídica mínima em matéria de vencimentos e

2ª) a manutenção da insularidade do Poder Judiciário. O autor explica que, se o

168 “Art. 57 – Os Juízes federais são vitalícios e perderão o cargo unicamente por sentença judicial. § 1º -

Os seus vencimentos serão determinados por lei e não poderão ser diminuídos.” 169 SALAZAR, Alcino. Poder Judiciário: bases para reorganização. Rio de Janeiro: Forense, 1975, p.

171. 170 CRETELLA JÚNIOR, José, op. cit., p. 3031.

96

magistrado permanecer dependente do Legislativo e do Executivo em relação aos seus

subsídios, isso poderia estimular que o magistrado decidisse de forma a manter seu

nível de remuneração, o que Tavares chama de “humor” em níveis elevados171.

Conclui-se que a Constituição brasileira promulgada em 1988 trouxe maior

proteção à independência do Judiciário, em especial se comparada àquela da época

analisada por Alcino Salazar, e considerada a autonomia administrativa e financeira já

mencionada anteriormente. Constitui, enfim, a irredutibilidade de subsídios um

importante mecanismo que consagra e fortalece a separação de poderes.

3.2. Vedações e deveres constitucionais dos magistrados brasileiros

Complementando o conjunto de instrumentos com estatura constitucional que

protegem a independência judicial, trata-se neste item das vedações e deveres dos

magistrados no exercício da jurisdição.

O objetivo deste item é identificar e comentar vedações e deveres inerentes ao

exercício da jurisdição que estão previstos na Constituição brasileira e se relacionam,

direta ou indiretamente, com o tema da independência judicial, identificando a face

instrumental dessa independência na Constituição brasileira.

André Ramos Tavares afirma que as vedações se destinam a manter e reforçar a

divisão funcional entre poderes e a autonomia judicial, que são intimamente

relacionadas com a imparcialidade, e ilustra esse raciocínio da seguinte maneira: “[J]uiz

dependente ou subordinado, seja economicamente, seja moralmente, seja

ideologicamente, não será, objetivamente falando, juiz imparcial”172.

Vale mencionar também que o ordenamento jurídico infraconstitucional traz

alguns deveres e vedações da magistratura que não serão tratados especificamente neste

tópico por força do recorte aqui adotado, qual seja: vedações e deveres constitucionais

dos magistrados.

Este item tratará das vedações: exercício de outro cargo ou função pública;

recebimento de participação em processo; atividade político-partidária; recebimento de

auxílios ou contribuições; e quarentena.

171 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 255. 172 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 307.

97

3.2.1. Exercício de outro cargo ou função pública

As vedações estão previstas no art. 95, parágrafo único, da Constituição

brasileira. O primeiro inciso do mencionado parágrafo veda o exercício, ainda que em

disponibilidade, de outro cargo ou função, ressalvado o magistério.

Pontes de Miranda indica que a consequência da inobservância desta vedação é a

perda do cargo judiciário e de todas as vantagens correspondentes a ele, isto é,

antiguidade de classe e função173.

Uma das discussões em busca da completude desse comando constitucional

refere-se à carga horária relativa à ressalva da vedação, isto é: há limite para a carga

horária de magistério?

A Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3126 tratou da matéria ao questionar a

Resolução n. 336/2003 do Conselho da Justiça Federal. Nesse caso, o STF decidiu que o

objetivo da restrição constitucional é o de impedir o exercício da atividade de

magistério que se revele incompatível com os afazeres da magistratura, o que implica

avaliar, em cada caso concreto, se a atividade de magistério inviabilizaria o ofício

judicante174.

O Ministro Gilmar Mendes, ao se manifestar no julgamento da medida cautelar

na ADI 3126, afirmou estar convencido do acerto dos argumentos e da conclusão a que

chegara o Ministro Jobim, ou seja, que o objetivo da restrição constitucional é o de

impedir o exercício da atividade de magistério que se revele incompatível com os

afazeres da magistratura. Nas palavras do ministro: “[O] que importa, de fato, é o tempo

utilizado pelo magistrado para o exercício do magistério em face do tempo reservado à

atividade judicante”.

Exemplificando seu raciocínio, o Ministro Gilmar Mendes entendeu que um

magistrado poderia assumir função de magistério em uma única instituição, respeitando

a literalidade do comando constitucional, dedicando-se a uma carga horária de quarenta

horas-aula; outro magistrado poderia exercer o magistério em duas instituições,

173 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967. 2. ed. T. III.

São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p. 578 apud TAVARES, André Ramos. Manual do Poder

Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 308. 174 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 3126. Rel. Min. Rosa Weber. Decisão liminar em

17.02.2005, na ocasião sob relatoria do Min. Gilmar Mendes. Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI%24%2ESCLA%2E+E

+3126%2ENUME%2E%29+OU+%28ADI%2EACMS%2E+ADJ2+3126%2EACMS%2E%29&base=ba

seAcordaos&url=http://tinyurl.com/aef7zpz>. Acesso em: 28 jan. 2015.

98

somando no máximo vinte horas-aulas semanais, já que o critério aplicável é o tempo a

dedicar-se à magistratura. Em suma, o fator decisivo a ser verificado é se a atividade de

magistério inviabiliza a atividade na magistratura com o devido zelo.

Outro caso no qual o Supremo Tribunal Federal enfrentou o tema do acúmulo de

cargos ou funções pelos magistrados foi o Mandado de Segurança n. 25.938, processado

sob relatoria da Ministra Cármen Lúcia. Na ocasião, foi questionado se magistrado

poderia acumular cargo ou função na Justiça Desportiva. O acórdão do STF, mais

precisamente no terceiro item da ementa, reafirmado a jurisprudência da corte175.

A Resolução nº 34 de 24 de abril de 2007, do Conselho Nacional de Justiça, trata

da matéria explicitando a exigência de compatibilidade entre os horários fixados para o

expediente forense e para a atividade acadêmica (mesmo remunerada), aceitando -

também nessas condições - o exercício de cargos ou funções de coordenação acadêmica.

Porém, veda o desempenho de cargo ou função administrativa ou técnica em

estabelecimento de ensino, desde que não seja em escolas ou cursos dos Tribunais, em

associações ou fundações vinculadas a eles.

Para fiscalização e controle, essa resolução exige que o exercício de qualquer

atividade docente seja comunicado formalmente pelo magistrado ao órgão competente

do Tribunal, com a indicação do nome da instituição de ensino, da(s) disciplina(s) e dos

horários das aulas que serão ministradas.

3.2.2. Recebimento de participação em processo

O art. 95, parágrafo único, II da Constituição brasileira veda o recebimento, a

qualquer título ou a qualquer pretexto, de custas ou participação em processo.

Com o claro intuito de preservar a imparcialidade do julgador, afastando da

atuação jurisdicional qualquer interesse pessoal do juiz, a Constituição veda - a qualquer

título e sob qualquer pretexto – a participação em processos e o recebimento de custas,

sejam elas provenientes de pessoas físicas ou jurídicas, tanto privadas quanto públicas.

Pontes de Miranda, em sua obra sobre a Constituição de 1967, tratando da

temática da vedação de recebimento de participação em processo, afirmou que no

175 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS n. 25.938. Rel. Min. Cármen Lúcia. J. em 24.04.2008.

99

passado a lógica que vigia era outra, sendo direito dos magistrados a participação no

produto da causa com o intuito de incentivar a atividade jurisdicional176.

André Ramos Tavares afirma que esta vedação diz respeito à garantia, individual

e da sociedade, de uma Justiça imparcial custeada pelo Poder Público e não pelos

particulares direta ou indiretamente envolvidos nos processos. Explica que, com o

monopólio do uso da força e a definitividade das decisões, “(...) o custeio da atividade

jurisdicional foi igualmente absorvido plenamente pelo Estado” 177.

3.2.3. Atividade político-partidária

O art. 95, parágrafo único, III da Constituição brasileira veda a atividade

político-partidária. Mais especificamente quanto à abrangência desta vedação, constata-

se que ela se refere à atividade político-partidária e não a ideologia ou afinidade

político-partidária; isto é, o magistrado pode ter suas convicções políticas e exercer seu

direito de voto. O que lhe é retirado é o direito de atuar direta ou indiretamente em

nome de partidos políticos ou em atividade política.

Com foco em uma síntese pragmática, André Ramos Tavares detalha a vedação

de que os magistrados, de qualquer instância, exerçam atividade político-partidária. O

autor explica que essa vedação implica: 1ª) não poder acompanhar os políticos em suas

campanhas eleitorais; 2ª) não adotar decisões nos processos que atuam com base em

determinada ideologia partidária, mesmo que tenham sido designados para compor um

Tribunal por ato do Chefe do Executivo (que necessariamente pertencerá a algum

partido); 3ª) não poder subsidiar candidatos; 4ª) não poder apoiar determinado partido

ou candidato, seja em seu nome como magistrado, ou em nome do Judiciário 178.

Outra questão reflexa a esta vedação é a divulgação do voto do magistrado. Em

outras palavras: o magistrado como cidadão mantém o seu direito de votar, mas, ao

exercê-lo, poderia divulgar sua preferência pessoal? André Ramos Tavares, apoiando-se

nas lições de Pontes de Miranda, trata dessa especificidade da matéria e afirma179:

“Mas não se impede que o juiz tenha, como salienta Pontes de

Miranda (1946:185), opinião político-partidária, até porque essa

176 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967. 2. ed. T. III.

São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p. 578 apud TAVARES, André Ramos. Manual do Poder

Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 318. 177 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 310. 178 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 310. 179 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 311.

100

possibilidade insere-se no contexto das liberdades públicas e,

em particular, da liberdade de pensamento. Mais do que isso,

não se pode impedir o magistrado de expressar, como

cidadão, sua posição partidária, de antecipar o exercício de

seu voto eleitoral, que é secreto mas não sigiloso, embora

não seja desejável e não se possa admitir que essa

declaração venha a ser amplamente utilizada em campanha

eleitoral. Não pode, porém, o magistrado apresentar

pretensões políticas enquanto no exercício de seu cargo;

também não pode, por meio de sua liberdade de expressão e

opinião, passar a integrar o debate político-partidário das

eleições”.

Nossos grifos.

Talvez aqui resida a maior dificuldade de encontrar os contornos dessa vedação

ao magistrado: expressar sua opinião como cidadão no uso da liberdade de expressão.

Entretanto, os limites dessa liberdade podem ser aferidos em caso concreto, em especial

pelos efeitos de eventual manifestação sobre seu ato cidadão. Parece que o limite se

evidencia com a entrada no debate político-partidário, o que ocorreria não por ser a

expressão do voto de um cidadão, mas sim de um magistrado, o que transferiria para o

cenário eleitoral a influência de seu cargo e respeitabilidade de sua atividade. Nesse

ponto se vislumbra uma das finalidades dessa vedação.

3.2.4. Recebimento de auxílios ou contribuições

A vedação ao recebimento de auxílios ou contribuições alcançou estatura

constitucional expressa ao ser incluída, pela Reforma do Judiciário (Emenda

Constitucional n. 45 de 2004), no art. 95, parágrafo único, inciso IV da Constituição

brasileira. Esse inciso veda aos juízes receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou

contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções

previstas em lei.

Apesar da clareza do texto, alguns comentários se fazem necessários,

especialmente a preocupação diante de uma interpretação puramente gramatical que

poderia revelar comandos estapafúrdios e distantes da função do dispositivo. André

Ramos Tavares chama a atenção para esta dificuldade, recomendando uma interpretação

conforme à razoabilidade e teleologia para não se criar uma vedação bizarra,

exemplificando o argumento da seguinte maneira: “nem mesmo auxílio (vantagem) de

instituição financeira (como empréstimo a juros baixos do Banco do Brasil) poderia ser

101

recebido, o que torna a leitura linear e gramatical do texto imprestável em sua largueza

conceitual”.

De fato, ao se buscar rigor máximo diante da preocupação com a corrupção no

âmbito do Judiciário, a redação deste dispositivo, se considerada literalmente,

abrangeria a vida privada do magistrado, o que seria um exagero normativo e

inviabilizaria sua aplicação plena. Assim, a interpretação da norma deve ser razoável e

buscar atingir sua finalidade.

3.2.5. Quarentena

Outra inovação da Emenda Constitucional n. 45/2004 (Reforma do Judiciário)

no campo das vedações foi a inclusão do inciso V no art. 95, parágrafo único da

Constituição brasileira, vedando ao juiz o exercício da advocacia no juízo ou tribunal do

qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria

ou exoneração.

Com a finalidade de evitar ameaças ou afronta à imparcialidade, ou ainda uma

avalanche de suspeições, este dispositivo incluiu no texto constitucional um patamar

temporal em que é vedada a advocacia do ex-magistrado no mesmo juízo ou tribunal,

pelo prazo de três anos a contar da data de afastamento do cargo por aposentadoria ou

exoneração. Esse prazo ficou amplamente conhecido como “quarentena” no âmbito do

Poder Judiciário.

Gilmar Mendes lembra que no início este dispositivo suscitou certa polêmica,

especialmente por criar limitação sobre os direitos individuais do ex-juiz, mas pondera

que “a decisão afigura-se plenamente respaldada na ideia de reforço da independência e

da imparcialidade dos órgãos judiciais”180.

Exemplo da “polêmica” referida por Gilmar Mendes e da dificuldade de

determinar os limites da incidência da quarentena pode ser encontrado em um caso

concreto em que se discute se a quarentena se estende a todo o escritório de advocacia

que o ex-magistrado atua. O Conselho Pleno do Conselho Federal da Ordem dos

Advogados do Brasil editou a Ementa 18/2013/COP, prevendo justamente esta

extensão.

180 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, op. cit., p. 942-3.

102

O caso que referimos corresponde à medida cautelar de Suspensão de Segurança

autuada sob o n. 4848 no Supremo Tribunal Federal. Na ocasião, o Ministro Joaquim

Barbosa, enquanto Presidente do Supremo Tribunal Federal, foi chamado a decidir

diante do indeferimento de liminar do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que havia

mantido a liminar da 22ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal nos autos

do Mandado de Segurança 0053135-87.2013.4.01.3400. A liminar de primeira instância

suspendera a Ementa 18/2013/COP, norma do Conselho Pleno do Conselho Federal da

Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) com a seguinte redação:

EMENTA N. 018/2013/COP. Quarentena. Constituição de empresa.

Inserção em empresa já existente, como sócio, associado ou

funcionário de advogado impedido de advogar por quarentena

contamina o escritório e todos os associados com o impedimento

no âmbito territorial do tribunal no qual atuou como magistrado,

desembargador ou ministro. Mesmo que de forma informal.

Escritório de advocacia, sócios e funcionários passam a ter o

mesmo impedimento do advogado que passar a participar do

escritório formal ou informalmente. Qualquer tentativa de burlar a

norma constitucional incide no art. 34, item I, do Estatuto da

Advocacia e da OAB.

Nossos grifos.

Em sua decisão, o Ministro Joaquim Barbosa entendeu que o sentido desta

norma é impedir que sociedade de advogados se transforme em burla à regra da

quarentena, ressalvando que o princípio da liberdade de exercício de profissão não

oferece fundamentação jurídica adequada para resolver a matéria. Assim, em 10 de

outubro de 2013, o ministro Barbosa deferiu o pedido de medida cautelar para

suspender a liminar proferida no Mandado de Segurança 0053135-87.2013.4.01.3400.

Portanto, confirmou, segundo seu voto monocrático, a adequação da Ementa n.

018/2013/COP do Conselho Federal da OAB, mantendo a extensão da quarentena ao

escritório no qual o ex-magistrado atua. Mas a questão não se encerra aqui.

Sobre essa mesma ementa do Conselho Federal da OAB, a Associação dos

Magistrados Brasileiro (AMB), a Associação Nacional da Magistratura do Trabalho

(Anamatra) e a Associação dos Juízes Federais (Ajufe) ingressaram com a Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental autuada sob o n. 310 no Supremo Tribunal

Federal, com pedido de liminar.

A ADPF sob relatoria do Ministro Teori Zavascki tem por objeto a ineficácia de

ato do Conselho Federal da OAB que editou a Ementa n. 018 de 2013, ampliando o

103

alcance da quarentena para os magistrados aposentados ou exonerados. As entidades

alegaram que a norma ofende a garantia das liberdades: a) de exercício de trabalho,

ofício ou profissão (art. 5º, inciso XVII); b) da livre iniciativa e da valorização do

trabalho humano (art. 170, caput, e inciso VIII); c) da magistratura (art. 95) e d) do

devido processo legal substancial (art. 5º, LIV).

As requerentes argumentam que a regra da quarentena restringe direito e,

portanto, deve ser interpretada de forma estrita, sendo vedada sua ampliação. As

associações entendem que, por meio do ato, a OAB ampliou a abrangência da vedação,

ultrapassando os limites pessoais do juiz e estendendo-a a todos os advogados que a ele

estejam associados. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 310,

até o momento desta pesquisa181, não possui decisão, estando em conclusão ao relator

desde 28 de julho de 2015.

Foram descritas, enfim, as garantias orgânicas (capacidade de autogoverno,

autonomia financeira e capacidade normativa) e individuais (vitaliciedade,

inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos), além de revisada a literatura sobre o

tema. Também foram abordadas as vedações e deveres dos magistrados no exercício da

jurisdição, com o objetivo de identificar e comentar vedações e deveres inerentes ao

exercício da jurisdição que estão previstos na Constituição brasileira e se relacionam,

direta ou indiretamente, com o tema da independência judicial, identificando-se a face

instrumental dessa independência na Constituição brasileira. Contudo, neste ponto, resta

a indagação: o que é independência judicial?

Não parece ser possível responder a essa indagação de maneira concisa sem

promover a revisão de literatura sobre o tema. Essa tarefa será desempenhada no

próximo capítulo, que se inicia com o panorama internacional sobre o tema, contendo

vários atos internacionais que abordam a independência judicial, ainda que não se

refiram especificamente ao Judiciário, mas cuja reunião pode refletir a dimensão e

relevância global do tema. Serão também reunidas diversas definições de independência

judicial, para que em seguida seja proposta uma definição sintética para uma das faces

da independência judicial: a independência jurisdicional.

181 26 de setembro de 2015.

104

CAPÍTULO 4

INDEPENDÊNCIA JUDICIAL

105

4.1. Proteção internacional da independência judicial

Qual é a relevância da independência judicial no sistema internacional? É essa a

pergunta que move este subitem, isto é, como a independência judicial está presente nos

mais variados atos internacionais e qual a relevância do tema para movimentos

internacionais em prol de sua adoção e manutenção.

Não se pretende neste subitem identificar o regramento internacional sobre a

independência judicial e sua aplicação ao Brasil ou a qualquer outro país, uma vez que o

objetivo aqui é apenas ilustrar a relevância da temática, explorando a preocupação

global com o tema. Nesse sentido, não serão realizadas aqui considerações quanto à

eficácia dos atos normativos internacionais ou à sua classificação segundo a respectiva

abrangência ou aplicabilidade.

A proteção internacional da independência judicial pode ser analisada sob, ao

menos, dois enfoques distintos. O primeiro se refere aos mecanismos internacionais que

visam a proteger a independência judicial no interior dos Estados soberanos; o segundo

é a adoção e proteção da independência judicial no âmbito das cortes internacionais.

Considerando a independência judicial como pressuposto indispensável de

Justiça, chega-se à conclusão de que um Estado pode violar suas obrigações

internacionais caso seu Poder Judiciário não seja independente, conforme se pretende

demonstrar ao longo deste subitem. Há farta documentação a respeito do tema,

conforme apresentaremos a seguir ao tratar de alguns atos internacionais que abordam o

tema da independência judicial.

4.1.1. Independência judicial protegida por atos internacionais

Aqui serão abordados especificamente os atos internacionais que visam a

proteger a independência judicial no interior dos Estados soberanos, como mencionado

anteriormente. Trata-se aqui da independência judicial analisada sob o primeiro

enfoque, com síntese descritiva dos pontos em que esses atos internacionais se referem à

proposta, propagação e/ou proteção da independência judicial.

Primeiramente serão abordados os atos internacionais que se referem

especificamente sobre o Judiciário, em seguida serão abordados os atos internacionais

que, embora se refiram à independência judicial, o fazem no contexto de outros temas.

106

4.1.1.1. Atos internacionais que se referem especificamente sobre o

Judiciário

Os Princípios Básicos das Nações Unidas Relativos à Independência da

Magistratura, adotados pelo Sétimo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção

do Crime e o Tratamento dos Delinquentes182 apresentam diversas disposições que

compõem o que chamamos aqui de proteção internacional da independência judicial.

O preâmbulo do documento que reúne os referidos Princípios contém as

premissas de existência do próprio documento, dentre as quais, considerando o tema da

independência, se destacam ao menos dois, aquele que parte da igualdade perante a lei

e da presunção de inocência exigindo um julgamento justo, público, independente e

imparcial, e outro que se refere precisamente à finalidade do judiciário que em última

instância se pronuncia sobre a vida, as liberdades, os direitos, os deveres e os bens dos

cidadãos183.

Em síntese, os Princípios Básicos das Nações Unidas relativos à Independência

da Magistratura pretendem “ajudar os Estados Membros na sua tarefa de garantir e

promover a independência da magistratura, devem ser tomados em consideração e

respeitados pelos Governos no âmbito da sua legislação e prática nacionais” 184.

As primeiras disposições do documento tratam da independência da

magistratura. O item 1 aborda a necessidade de garantia da independência por parte do

Estado, que a deve prever em seu ordenamento jurídico, impondo a todas instituições

(governamentais ou não) o respeito e aceitação da independência da magistratura.

No segundo item, a imposição e proteção da independência é dirigida

especificamente ao juiz, trazendo o dever de julgar todos os casos com imparcialidade

com base nos fatos e no ordenamento jurídico, não se sujeitando a qualquer restrição ou

influência, direta ou indireta de qualquer setor ou por qualquer motivo.

182 Realizado em Milão de 26 de agosto a 6 de setembro de 1985, e endossados pela Assembleia Geral das

Nações Unidas nas Resoluções 40/32, de 29 de novembro de 1985, e 40/146, de 13 de dezembro de 1985. 183 Tradução parcialmente baseada no texto publicado em: GABINETE DE DOCUMENTAÇÃO DE

DIREITO COMPARADO. Separata autónoma do Boletim Documentação e Direito Comparado, n.º

duplo 61/62, 1995, p. 233 a 236. Disponível em: <http://www.gddc.pt/actividade-editorial/pdfs-

publicacoes/Outros/OUTROS_6.PDF>. Acesso em: 03 abr. 2014. 184 Tradução parcialmente baseada no texto publicado em: GABINETE DE DOCUMENTAÇÃO DE

DIREITO COMPARADO, op. cit.

107

Em seguida, nos itens 3 e 4, está prevista a importância da jurisdição e sua

definitividade pelo Judiciário livre de interferências.

O item 5 é dirigido aos indivíduos, reafirmando que todos têm o direito de serem

julgados por tribunais de acordo com as regras processuais estabelecidas, vedando

tribunais de exceção ou dispensados de seguir as regras processuais.

O item 6 dispõe sobre o dever dos magistrados de garantir a condução dos

processos judiciais de forma justa, respeitando os direitos das partes. O último item

dessa primeira parte (que trata da independência da magistratura) é dirigido ao Estado,

impondo o dever de proporcionar recursos necessários para que a magistratura possa

desempenhar devidamente as suas funções185.

Embora a primeira parte do documento possua o título “Independência da

Magistratura”, disposições constantes de outras partes se referem direta ou

indiretamente à independência, como ocorre com os itens 8 e 9, que tratam da liberdade

de expressão e de associação e garantem aos magistrados – assim como aos outros

cidadãos – as liberdades de expressão, convicção, associação e reunião. Entretanto,

prevê-se a limitação da forma de exercício destes direitos, exigindo dos juízes que se

comportem sempre de modo a preservar a dignidade do seu cargo, a imparcialidade e

independência da magistratura.

Outra liberdade garantida aos juízes é a constituição ou adesão às associações de

juízes e outras organizações representativas de seus interesses, em especial, para que

promovam a sua formação profissional e protejam a independência do poder judicial.

Ao tratar das condições de trabalho e inamovibilidade dos magistrados, os

Princípios Básicos das Nações Unidas Relativos à Independência da Magistratura

trazem nos itens 11, 12, 13 a 14 disposições sobre o mandato, inamovibilidade e

promoção dos magistrados, indicando a necessidade de remuneração adequada,

condições de trabalho, de fatores objetivos para basear a promoção dos juízes

considerando a capacidade profissional, a integridade e a experiência, além de se referir

à organização interna judicial.

185 Tradução parcialmente baseada no texto publicado em: GABINETE DE DOCUMENTAÇÃO DE

DIREITO COMPARADO, op. cit.

108

A Declaração de Beijing sobre os princípios relativos à independência do

Poder Judiciário na região da LAWASIA186, adotada em 1995 pelos Presidentes das

Cortes Supremas da região da LAWASIA e por outros juízes da Ásia e do Pacífico e

pelo Conselho de LAWASIA em 2001, possui também um capítulo dedicado à

independência judicial. Vejamos:

Independência judicial

1. A magistratura é uma instituição de máximo valor em toda a

sociedade.

2. A Declaração Universal de Direitos Humanos (art. 10) e o Pacto

Internacional de Direitos Civis e Políticos (art. 14 (I)) sustentam que

todas as pessoas devem ter direito a um juízo justo e público ante

um tribunal competente, independente e imparcial estabelecido

por lei.

Um Judiciário independente é indispensável para a

implementação desses direitos.

3. A independência judicial exige que:

a) O Judiciário decida os assuntos que conheça de acordo com sua

avaliação imparcial dos feitos e seu entendimento do Direito, sem

influências impróprias, diretas ou indiretas, de qualquer fonte; e

b) O Judiciário tenha jurisdição, diretamente ou mediante revisão,

sobre todos os assuntos de natureza judicial.

4. A manutenção da independência judicial é essencial para o

sucesso dos objetivos numa sociedade livre em um Estado de

Direito. É essencial que essa independência seja garantida pelo

Estado e incluída na Constituição ou lei.

5. É dever da magistratura respeitar e observar os objetivos e as funções

próprias das outras instituições de governo. É dever dessas

instituições respeitar e observar os objetivos e funções próprios da

magistratura. 6. No processo de tomada de decisões, qualquer organização hierárquica

do Poder Judiciário e qualquer diferença de grau ou categoria não

interferirá no dever do juiz que exerce a jurisdição individualmente

ou dos juízes que atuam coletivamente para sentenciar de acordo com

o artigo 3 (a).

A magistratura, por sua vez, individual ou coletivamente, exercerá as

funções de acordo com a Constituição e a lei.

7. Os juízes defenderão a integridade e a independência da

magistratura evitando irregularidades e a aparência de

irregularidades em todas suas atividades. [...].187 Nossos grifos.

186 LAWASIA é a Law Association for Asia and the Pacific. É uma organização internacional que

congrega advogados, juízes, juristas e outros interessados das profissões jurídicas na Região da Ásia

Pacífica. Informações disponíveis em: <http://lawasia.asn.au/profile-of-lawasia.htm>. Acesso em: 27

ago. 2015. 187 ZEITUNE, José; ANDREU-GUZMÁN, Frederico. Principios internacionales sobre la independencia

y responsabilidad de jueces, abogados y fiscales: Guía para Profesionales n. 1. Genebra: Comissão

Internacional de Juristas, 2005, p. 247.

109

A Carta Europeia sobre o Estatuto dos Juízes, oriunda da reunião organizada

pelo Conselho da Europa entre 8 e 10 de julho de 1998, dispõe em seu primeiro item

sobre os princípios gerais, frisando que o Estatuto dos Juízes pretende assegurar a

competência, independência e imparcialidade que cada indivíduo espera legitimamente

dos tribunais e de cada juiz ao qual confia a proteção de seus direitos.

No início a Carta traz diretrizes capazes de garantir esses objetivos, cuja

finalidade é aumentar o nível de garantia dos diversos Estados Europeus, vedando

modificações nos estatutos nacionais tendentes a diminuir o nível de garantias já

alcançado pelos países envolvidos.

O memorando explicativo afirma que as disposições da Carta estão relacionadas

com o estatuto dos juízes de todas as jurisdições. A Carta busca definir o conteúdo do

estatuto dos juízes com base nos objetivos de assegurar a competência, independência e

imparcialidade que a população tem o direito de esperar dos tribunais e juízes188.

Outro ato internacional relevante para a temática da independência judicial é o

Estatuto Universal dos Juízes da União Internacional dos Magistrados, aprovado na

reunião de Taipei (Taiwan) de 17 de novembro de 1999.

O primeiro artigo desse Estatuto trata da independência, expondo claramente a

lógica de sua proteção. Dispõe que os juízes garantem os direitos de cada pessoa através

de processos equitativos e por isso a independência dos juízes é indispensável à

sociedade, sendo indivisível, devendo todas as instituições e autoridades, nacionais ou

internacionais, respeitá-la, protegê-la e defendê-la189.

O segundo artigo também aborda a independência judicial, dispondo sobre os

mecanismos de garantia e funcionalidade especificando que os juízes devem poder

“exercer as funções do seu cargo com toda independência em relação a todos os

segmentos sociais, econômicos ou políticos, em relação aos outros juízes e à

administração da Justiça”190.

O Estatuto Universal dos Juízes da União Internacional dos Magistrados

enfrenta diversas questões que se relacionam com o tema da independência judicial,

188 Disponível em: http://www.constitucionweb.com/2013/07/carta-europea-sobre-el-estatuto-de-los-

jueces-y-memorando-explicativo-1998.html. Acessado em 07.04.2014. 189 Contribuição de Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).

Disponível em: https://www.amb.com.br/index.asp?secao=artigo_detalhe&art_id=779 Acessado em

07.04.2014. 190 Contribuição de Luiz Guilherme Marques,

Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG). Disponível em:

https://www.amb.com.br/index.asp?secao=artigo_detalhe&art_id=779 Acessado em 07.04.2014.

110

embora o texto essencial ao tema esteja nos dois primeiros artigos, os temas que aborda

são: art. 3º - Obediência às leis, art. 4º - Autonomia pessoal, art. 5º - Imparcialidade e

dever de reserva, art. 6º - Efetividade, art. 7º - Atividades paralelas, art. 8º - Proteção

ao status do cargo, art. 9º -Nomeação, art. 10 - Responsabilidade civil e penal, art. 11 -

Administração e princípios em matéria disciplinar, art. 12 – Associações, art. 13 -

Proventos e aposentadoria, art. 14 - Recursos materiais, art. 15 - O Ministério Público.

Dentre eles se destacam, considerando o tema desta tese, os arts. 3º a 5º que

exigem que os juízes somente devem submeter-se às leis, agindo de acordo somente

com elas, sem permitir que ninguém – diante de seu exercício funcional – dê ou tente

dar ordens ou instruções, sejam de que natureza forem, ressalvando recursos para

reforma das decisões por parte de autoridades hierarquicamente superiores.

Dispondo ainda que “[O]s juízes devem ser e parecer imparciais no exercício das

funções jurisdicionais. Devem cumprir suas atribuições com moderação e dignidade

face à dignidade do seu cargo e das pessoas interessadas” 191.

Princípios de Conduta Judicial Bangalore192

O ministro Gilson Dipp, no prefácio da edição brasileira dos Comentários aos

Princípios de Bangalore, publicada pelo Conselho de Justiça Federal em 2008, explica

que os Princípios de Conduta Judicial de Bangalore consistem na verdade em um

projeto de Código Judicial em âmbito global, que foi elaborado com base em outros

códigos e estatutos sobre o tema, de âmbito nacional, regional e internacional. Dentre

esses atos normativos, ressalta-se a Declaração Universal dos Direitos Humanos da

ONU, que “prevê um julgamento igualitário, justo e público, por tribunal independente

e imparcial, princípio de aceitação geral pelos Estados-Membros”193.

Mais adiante, Gilson Dipp explica que:

[N]ão se trata de um código propriamente dito, a vincular os

países a suas diretivas e comandos teóricos. Todavia, ao servir de

191 Contribuição de Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).

Disponível em: https://www.amb.com.br/index.asp?secao=artigo_detalhe&art_id=779 Acessado em

07.04.2014. 192 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Escritório Contra Drogas e Crime (UNODC).

Comentários aos Princípios de Bangalore de Conduta Judicial. Tradução de Marlon da Silva Malha e

Ariane Emílio Kloth. Brasília: Conselho da Justiça Federal, 2008. Disponível em:

<https://www.unodc.org/documents/lpo-

brazil//Topics_corruption/Publicacoes/2008_Comentarios_aos_Principios_de_Bangalo re.pdf>. Acesso

em: 07 abr. 2014. 193 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Escritório Contra Drogas e Crime (UNODC), op. cit., p.

7.

111

inspiração para a elaboração de códigos de conduta ou estatutos

nacionais, regionais ou internacionais, em sua área de

abrangência, certamente estará contribuindo para a construção

de uma comunidade global mais consentânea com os valores éti-

cos, pois conta com a adesão de nações das mais variadas tradições

jurídicas. 194

Nossos grifos

Com o propósito de assegurar a integridade do Judiciário de todos os países e

considerando que essa é uma tarefa que evidentemente demanda muita energia,

habilidade e experiência, a busca para assegurar a integridade do Judiciário foi assumida

pelo Grupo Judicial para o Fortalecimento da Integridade Judicial (The Judicial

Integrity Group).

No prefácio dos Comentários aos Princípios de Bangalore, o presidente do

Judicial Integrity Group, C. G. Weeramantry, explica sinteticamente a importância

desses princípios que em alguns Estados foi adotado, em outros serviu de modelo.

Ressaltou o apoio e endosso das organizações internacionais como o do Conselho

Econômico e Social das Nações Unidas, que pela Resolução 2006/23, convidou os

Estados-membros a compatibilizarem seus sistemas om os Princípios de Bangalore de

Conduta Judicial. Ou ainda o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes que

apoiou ativamente destinando aos Princípios de Bangalore o reconhecimento de

organismos tais como a Associação Americana de Advogados e da Comissão

Internacional de Juristas.

Vale mencionar que os Princípios de Conduta Judicial de Bangalore se baseou em

diversos atos internacionais, regionais e nacionais indicando como referência, os

seguintes195:

Códigos Nacionais

a) Código de Conduta Judicial, adotado pela Casa de Representantes da

Associação Americana de Advogados em agosto de 1972.

b) Declaração de Princípios da Independência Judicial, promulgada pelos

Presidentes das Supremas Cortes dos Estados e Territórios Australianos em

abril de 1997.

194 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Escritório Contra Drogas e Crime (UNODC), op. cit., p.

8. 195 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Escritório Contra Drogas e Crime (UNODC), op. cit., p.

15-17.

112

c) Código de Conduta para os Juízes da Suprema Corte de Bangladesh,

estabelecido pelo Supremo Conselho Judicial no exercício do poder

determinado pelo Artigo 96(4)(a) da Constituição do Povo da República de

Bangladesh em maio de 2000.

d) Princípios Éticos para Juízes, de 1998, esboçados com a cooperação da

Conferência de Juízes Canadenses e apoiados pelo Conselho Judicial

Canadense.

e) Código Judicial de Conduta de Idaho, de 1976.

f) Revisão de Valores da Vida Judicial, adotada na Conferência de Presidentes de

Tribunais Superiores da Índia em 1999.

g) Código de Conduta Judicial de Iowa.

h) Código de Conduta para Funcionários da Justiça do Quênia, de julho de 1999.

i) Código de Ética dos Juízes da Malásia, promulgado em 1994 por Yang di-

Pertuan Agong sob recomendação do Presidente da Suprema Corte, do

Presidente da Corte de Apelação e dos Presidentes de Cortes Superiores, no

exercício dos poderes conferidos pelo Artigo 125(3A) da Constituição Federal

da Malásia.

j) Código de Conduta para Magistrados na Namíbia.

k) Regras de Conduta Judicial de Nova Iorque, EUA.

l) Código de Conduta para Funcionários do Judiciário da República Federal da

Nigéria.

m) Código de Conduta a ser observado por Juízes da Suprema Corte e das Cortes

Superiores do Paquistão.

n) Código de Conduta Judicial das Filipinas, de setembro de 1989.

o) Cânones Gerais de Ética Judicial das Filipinas, propostos pela Associação dos

Advogados das Filipinas, aprovados pelos Juízes de Primeira Instância de

Manila e adotados como regras de orientação e observância pelos juízes sob a

supervisão administrativa da Suprema Corte, incluindo juízes municipais e

juízes da cidade.

p) Declaração de Yandina: Princípios de Independência do Judiciário nas Ilhas

Salomão, de novembro de 2000.

q) Orientações para Juízes da África do Sul, promulgadas pelo Presidente da

Suprema Corte, Presidente da Corte Constitucional, e Presidentes das Cortes

113

Superiores, Corte de Apelação Trabalhista, e Corte de Demandas sobre

Imóveis, de março de 2000.

r) Código de Conduta para Funcionários Judiciais da Tanzânia, adotado na

Conferência de Juízes e Magistrados de 1984.

s) Código de Conduta Judicial do Texas.

t) Código de Conduta para Juízes e outros Funcionários da Justiça de Uganda,

adotado pelos Juízes da Suprema Corte e Corte Superior em julho de 1989.

u) Código de Conduta da Conferência Judicial dos Estados Unidos.

v) Orientações de Conduta Judicial da Comunidade da Virgínia, adotadas e

promulgadas pela Suprema Corte da Virgínia em 1998.

w) Código de Conduta Judicial adotado pela Suprema Corte do Estado de

Washington, EUA em outubro de 1995.

x) Ato Judicial (Código de Conduta), transformado em lei pelo Parlamento da

Zâmbia em dezembro de 1999.

Instrumentos

a) Anteprojeto dos Princípios sobre Independência do Judiciário (Princípios de

Siracusa), preparado em 1981 por um comitê de peritos reunidos pela

Associação Internacional de Direito Penal, pela Comissão Internacional de

Juristas, e pelo Centro para a Independência de Juízes e Advogados.

b) Padrão Mínimo de Independência Judicial, adotado pela Associação

Internacional de Advogados em 1982.

c) Princípios Básicos das Nações Unidas para a Independência do Judiciário,

aprovados pela Assembleia Geral da ONU em 1985.

d) Anteprojeto da Declaração Universal de Independência da Justiça (Declaração

de Singhvi), preparado pelo Sr. L.V. Singhvi, Relator Especial da ONU para

Estudos sobre a Independência do Judiciário em 1989.

e) Declaração de Princípios de Beijing sobre a Independência do Judiciário na

Região da LAWASIA196, adotada pela 6ª Conferência de Presidentes das

Supremas Cortes em agosto de 1997.

196 LAWASIA é a Law Association for Asia and the Pacific. É uma organização internacional que

congrega advogados, juízes, juristas e outros interessados das profissões jurídicas na Região da Ásia

Pacífica. Informações disponíveis em: <http://lawasia.asn.au/profile-of-lawasia.htm>. Acesso em: 27 ago.

2015.

114

f) Orientações da Casa de Latimer para a Comunidade das boas práticas nas

relações governamentais entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário na

promoção do bom governo, da lei e dos direitos humanos para assegurar a

efetiva implementação dos Princípios de Harare, de 1998.

g) Carta Europeia sobre o Estatuto dos Juízes, adotada pelo Conselho da Europa

em julho de 1998.

h) Política de Princípios para Prevenção e Eliminação da Corrupção e Garantia da

Imparcialidade do Sistema Judicial, adotada por um grupo de peritos reunidos

pelo Centro para a Independência de Juízes e Advogados em fevereiro de 2000.

No preâmbulo dos Princípios de Bangalore são mencionados vários motivos que

ensejaram a sua construção, dentre eles, os que demonstram sua relação direta com o

tema central da tese, se referem a indispensabilidade de um Judiciário competente,

independente e imparcial para a proteção dos direitos humanos, já que “a

implementação de todos os outros direitos, ao final, depende acima de tudo de uma

administração apropriada da Justiça”197.

O preâmbulo dos Princípios de Bangalore estabelece os seguintes objetivos:

a) definir padrões para a conduta ética dos juízes;

b) orientar juízes;

c) proporcionar ao Judiciário uma estrutura para regular a conduta judicial; e

d) ajudar membros do Executivo e do Legislativo, advogados e o público em

geral a ter melhor entendimento do Judiciário e a apoiá-lo.

Os princípios de Bangalore também pressupõem que os juízes devem responder

por seus atos, mas a investigação e julgamento dessa responsabilização deve ser

realizado por instituições próprias, justamente por estabelecer padrões judiciais, que

devem ser, por si sós, independentes e imparciais.

Quanto a estrutura, os Princípios de Bangalore, possuem seis eixos nos quais se

desenvolvem seus princípios, esses eixos são chamados de “valores”, sendo a

197 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Escritório Contra Drogas e Crime (UNODC), op. cit., p.

29-38.

115

independência o primeiro valor. São eles: independência, imparcialidade, integridade,

idoneidade, igualdade, e o último valor, competência e diligência.

Cada um desses valores dá base à construção de um princípio, que por sua vez se

desdobra em itens. Na versão comentada, cada princípio e item recebem comentários

que elucidam o seu alcance.

Considerando o tema deste item, nos concentraremos no primeiro valor, qual seja

a independência. Entretanto, vale realçar que em outros itens desta tese os demais

valores e princípios serão comentados, ainda que parcialmente, mas sempre de acordo

com a temática em referência.

Valor 1: INDEPENDÊNCIA

Princípio

A independência judicial é um pré-requisito do estado de Direito e

uma garantia fundamental de um julgamento justo. Um juiz,

consequentemente, deverá apoiar e ser o exemplo da independência

judicial tanto no seu aspecto individual quanto no aspecto

institucional.

Aplicação

1.1. Um juiz deve exercer a função judicial de modo independente,

com base na avaliação dos fatos e de acordo com um consciente

entendimento da lei, livre de qualquer influência estranha,

induções, pressões, ameaças ou interferência, direta ou indireta de

qualquer organização ou de qualquer razão.

1.2 Um juiz deverá ser independente com relação à sociedade em

geral e com relação às partes na disputa que terá de julgar.

1.3 Um juiz não só deverá ser isento de conexões inapropriadas e

influência dos ramos executivo e legislativo do governo, mas deve

também parecer livre delas, para um observador sensato.

1.4 Ao desempenhar a função judicial, um juiz deverá fazê-lo de

modo independente dos colegas quanto à decisão que é obrigado a

tomar independentemente.

1.5 Um juiz deve encorajar e garantir proteção para a exoneração

das obrigações judiciais de modo a manter e fortalecer a

independência institucional e operacional do Judiciário.

1.6 Um juiz deve exibir e promover altos padrões de conduta

judicial de ordem a reforçar a confiança do público no Judiciário, a

qual é fundamental para manutenção da independência judicial.

Nossos grifos

4.1.1.2. Outros atos internacionais

Aqui apresenta-se outros atos internacionais que, embora se refiram à

independência judicial, o fazem no contexto de outros temas.

116

O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, promulgado pelo

Decreto n. 592, de 06 de julho de 1992, dispõe em seu artigo 14 sobre a igualdade das

pessoas perante os tribunais, as garantias por um tribunal competente, independente e

imparcial, além de exigir que as decisões judiciais devam ser públicas, a menos que o

interesse de menores exija procedimento oposto, ou processo diga respeito à

controvérsia matrimoniais ou à tutela de menores.198

A Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os

Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias, adotada pela Resolução

45/158 da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas em 18 de dezembro de

1990, dispõe em seu artigo 18 sobre a igualdade de direitos dos trabalhadores migrantes

e os membros da sua família e dos nacionais perante os tribunais, frisando ainda que

têm direito que sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal

competente, independente e imparcial, instituído por lei199.

A Convenção sobre os Direitos da Criança, promulgada no Brasil pelo

Decreto n. 99.710, de 21 de novembro de 1990, dispõe em seus artigos 37 e 40 sobre os

casos em que a criança é privada de sua liberdade, exigindo o direito a rápido acesso a

assistência, em especial, a jurídica, além do direito a impugnar a legalidade da privação

de sua liberdade perante um tribunal ou outra autoridade competente, independente e

imparcial, devendo receber uma rápida decisão200. O art. 40 exige que os Estados Partes

assegurem que toda criança em que lhe teve imputada a infraçaõ de leis penais, lhes

sejam atribuídas, pelo menos, algumas garantias – e dentre elas – as decisões judiciais

levem em consideração sua idade ou situação e a de seus pais ou representantes legais,

além da revisão dessa decisão por autoridade ou órgão judicial superior competente,

independente e imparcial, de acordo com a lei201.

A Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas Contra o

Desaparecimento Forçado, assinada em Paris em 6 de fevereiro de 2007, cujo texto foi

198 BRASIL. Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0592.htm>. Acesso em: 04 abr. 2014. 199 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos

de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias. Disponível em:

<http://www.camara.gov.br/sileg/integras/917816.pdf>. Acesso em: 04 abr. 2014. 200 BRASIL. Decreto nº 99.710, de 21 de novembro de 1990. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99710.htm>. Acesso em: 04 abr. 2014. 201 BRASIL. Decreto nº 99.710, de 21 de novembro de 1990. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99710.htm>. Acesso em: 04 abr. 2014.

117

aprovado pelo Decreto Legislativo n. 661, de 1º de setembro de 2010202, traz em seu

artigo 11 a exigência de que o julgamento de toda pessoa julgada por um crime de

desaparecimento forçado deve ser justo, ante uma corte ou tribunal de justiça

competente, independente e imparcial estabelecido por lei203.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos,

adotada e proclamada pela Resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações

Unidas em 10 de dezembro de 1948, determina em seu artigo X que “[T]oda pessoa tem

direito, em plena igualdade, a uma audiência justa e pública por parte de um tribunal

independente e imparcial”204.

A Declaração sobre o Direito e a Responsabilidade dos Indivíduos, Grupos

ou Órgãos da Sociedade de Promover e Proteger os Direitos Humanos e

Liberdades Fundamentais Universalmente Reconhecidos (Defensores de Direitos

Humanos), Resolução 53/144 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 9 de

dezembro de 1998, traz em seu artigo 9º o direito de ação destinado a todas as pessoas

cujos direitos ou liberdades foram violados para apresentar queixa, que deve ser

examinada rapidamente em audiência pública perante uma autoridade “independente,

imparcial e competente estabelecida por lei e de obter dessa autoridade uma decisão, em

conformidade com a lei, que lhe atribua uma reparação205”.

A Resolução 2003/39 da Comissão de Direitos Humanos, adotada em 23 de

abril de 2003 e que versa sobre a integridade do sistema judicial, já no início estabelece

que a integridade do sistema judicial é um requisito prévio indispensável para proteger

os direitos humanos e para garantir a não discriminação na administração da justiça,

destacando que a integridade do sistema judicial deve ser observada a todo o momento.

Reitera que toda pessoa tem o direito, em condições de plena igualdade, a ser ouvida

publicamente e com justiça por um tribunal independente e imparcial, para a

202 BRASIL. Decreto Legislativo nº 661, de 2010. Disponível em:

<http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=241749&norma=2 62644&anexos=>.

Acesso em: 04 abr. 2014. 203 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção Internacional para a Proteção de Todas as

Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados. Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-

conteudos-de-apoio/legislacao/direito-a-memoria-e-a-verdade/convencoes/convencao-internacional-

desaparecimento-forcado>. Acesso em 04 abr. 2014. 204 Disponível em: http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm Acessado em

04.04.2014. 205 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração sobre o Direito e a Responsabilidade dos

Indivíduos, Grupos ou Órgãos da Sociedade de Promover e Proteger os Direitos Humanos e Liberdades

Fundamentais Universalmente Reconhecidos (Defensores de Direitos Humanos). Disponível em:

<http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhuniversais/o-defensores-dh.html>.

Acessado em 04 abr. 2014.

118

determinação de seus direitos e obrigações ou para o exame de qualquer acusação

contra ela em matéria penal.

Determina também que toda pessoa tem o direito de ajuizar ou ter ajuizada

demanda nos tribunais ou juizados ordinários mediante procedimentos jurídicos

devidamente estabelecidos, sendo vedados tribunais de exceção. Ademais, dispõe que

toda pessoa tem o direito de ser ouvida publicamente por um tribunal competente,

independente e imparcial estabelecido pela lei206.

A Resolução 2004/33 da Comissão de Direitos Humanos (adotada em votação

em 19 de abril de 2004), diante da independência e imparcialidade do poder judicial,

jurados e assessores, e a independência dos advogados, já em seu preâmbulo ressalta,

entre outros motivos, a importância do papel que desempenham as organizações não

governamentais, o colégio de advogados e as associações profissionais de magistrados

na defesa dos princípios da independência de advogados e magistrados. A Comissão

considera ainda que são cada vez mais frequentes os atentados contra a independência

dos magistrados, advogados e funcionários, salientando a gravidade de tais ocorrências

perante os direitos humanos.

No item 2 da referida Resolução, a Comissão reconhece a preocupação do

Relator Especial na medida em que a independência dos juízes e advogados, que é o

fundamento do estado de Direito, segue sendo frágil em muitas partes do mundo.

No sétimo item, pede a todos os governos que respeitem e defendam a

independência dos magistrados e advogados e, com este fim, adotem medidas

legislativas, para o cumprimento da lei ou outras medidas eficazes e apropriadas a

garantir o desempenho das funções desses profissionais sem nenhum tipo de

hostilização ou intimidação.

No item 10, em missão de disseminação de suas práticas, a Resolução convida

os governos que tenham dificuldades para garantir a independência dos magistrados e

advogados, ou que estejam decididos a melhorar seu desempenho na garantia desses

princípios, a consultarem o Relator Especial e considerarem a possibilidade de utilizar

seus serviços, por exemplo, convidando-o ao país, se julgarem necessário207.

206 Disponível em: http://www.constitucionweb.com/2013/07/resolucion-de-la-comision-de-derechos-

humanos-200329.html Acessado em 07.04.2014. 207 Disponível em: http://www.constitucionweb.com/2013/07/resolucion-de-la-comision-de-derechos-

humanos-200433.html Acessado em 07.04.2014.

119

Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia em junho de 1999, o

Conselho Europeu de Colônia considerou oportuno consagrar numa Carta os direitos

fundamentais em vigor no nível da União Europeia (UE), de modo a conferir-lhes maior

visibilidade208.

A Carta reúne num único documento os direitos que anteriormente se

encontravam dispersos por diversos instrumentos legislativos. Ela é composta pelos por

seis capítulos: dignidade, liberdades, igualdade, solidariedade, cidadania e justiça.

No último capítulo, justiça, a Carta traz o direito à ação e a um tribunal

imparcial, presunção de inocência e direitos de defesa, princípios da legalidade e da

proporcionalidade dos delitos e das penas, direito a não ser julgado ou punido

penalmente mais do que uma vez pelo mesmo delito209.

O art. 47 à semelhança do disposto no art. 6º da Convenção Europeia dos

Direitos do Homem (Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das

Liberdades Fundamentais) dispõe precisamente sobre o direito à ação e a um tribunal

imparcial dispondo que todos têm direito a ter sua causa julgada de forma equitativa,

publicamente e em prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial,

previamente estabelecido por lei210.

A Convenção Europeia dos Direitos do Homem (Convenção para a

Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais), de 4 de abril de

1950, também se refere ao tema, especialmente ao tratar em seu artigo 6º do “direito a

um processo equitativo” atribui a qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja

examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal

independente e imparcial, estabelecido pela lei211.

A Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa

Rica), de 22 de novembro de 1969, promulgada no Brasil pelo Decreto n. 678 de 06 de

novembro de 1992, traz em seu artigo 8º disposições sobre as garantias judiciais

208 A Carta foi elaborada por uma convenção composta por um representante de cada país da União

Europeia e da Comissão Europeia, bem como por deputados do Parlamento Europeu e dos parlamentos

nacionais. Foi formalmente adotada em Nice, em dezembro de 2000, pelo Parlamento Europeu, pelo

Conselho Europeu e pela Comissão Europeia. 209 UNIÃO EUROPEIA. Carta dos Direitos Fundamentais. Disponível em:

<http://europa.eu/legislation_summaries/justice_freedom_security/combating_discri

mination/l33501_pt.htm>. Acessado em 09 abr. 2014. 210 ASSOCIAÇÃO SINDICAL DOS JUÍZES PORTUGUESES. Documentos Internacionais sobre os

Tribunais e os Juízes. Disponível em: <http://www.asjp.pt/info/para-o-cidadao/documentos-

internacionais-sobre-os-tribunais-e-os-juizes/>. Acesso em: 09 abr. 2014. 211 DHNET. Sistema Global de Proteção aos Direitos Humanos. Disponível em:

<http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/euro/>. Acessado em 07 abr. 2014.

120

dispondo que toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro

de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial,

estabelecido anteriormente por lei212.

A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada na

Nona Conferência Internacional Americana (Bogotá, 1948), prevê em seu artigo XXVI o

direito a processo regular dispondo que toda “pessoa acusada de um delito tem o direito de

ser ouvida numa forma imparcial e pública, de ser julgada por tribunais já estabelecidos de

acordo com leis preexistentes”213.

A Carta Democrática Interamericana, aprovada em 11 de setembro de 2001

pela Organização dos Estados Americanos, traz em seu artigo 3º como elementos

essenciais da democracia representativa, entre outros, o respeito aos direitos humanos e

às liberdades fundamentais, o acesso ao poder e seu exercício com sujeição ao Estado

de Direito e a separação e independência dos poderes públicos214.

A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (Carta de Banjul),

aprovada pela Conferência Ministerial da Organização da Unidade Africana (OUA) em

Banjul, Gâmbia, em janeiro de 1981, e adotada pela XVIII Assembleia dos Chefes de

Estado e Governo da Organização da Unidade Africana (OUA) em Nairóbi, Quênia, em

27 de julho de 1981, traz em seu artigo 26 o dever do Estados-parte de garantir a

“independência dos tribunais e de permitir o estabelecimento e o aperfeiçoamento de

instituições nacionais apropriadas encarregadas da promoção e da proteção dos direitos

e liberdades garantidos pela presente Carta” 215.

212 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos.

Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm>.

Acesso em: 07 abr. 2014. 213 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Declaração Americana dos Direitos e Deveres

do Homem. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/b.Declaracao_Americana.htm>.

Acesso em: 07 abr. 2014. 214 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Carta Democrática Interamericana. Disponível

em: <http://www.oas.org/OASpage/port/Documents/Democractic_Charter.htm>. Acesso em: 07 abr.

2014. 215 ORGANIZAÇÃO DA UNIDADE AFRICANA. Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.

Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/africa/banjul.htm>. Acessado em 07 abr. 2014.

121

4.1.2. Independência judicial no âmbito das Cortes Internacionais

O segundo enfoque sob o qual se abordará a proteção internacional à

independência judicial refere-se à independência dos juízes que atuam em organismos

internacionais. Vejamos alguns atos pertinentes a esse tema.

Princípios de Burgh House sobre a Independência da Judicatura Internacional

O Grupo de Estudos da Associação Internacional de Direito sobre a Prática e o

Processo das Cortes e Tribunais Internacionais, junto ao Projeto sobre Cortes e

Tribunais Internacionais, reconhecendo a necessidade de diretrizes gerais para

contribuir com a independência e imparcialidade da judicatura internacional, e com a

intenção de assegurar a legitimidade e eficácia do processo judicial internacional,

propôs o documento conhecido como Princípios de Burgh House sobre a Independência

da Judicatura Internacional.

Embora diversas disposições desse documento tratem da independência, vale

essencialmente a transcrição do primeiro item, intitulado “independência e liberdade

frente a interferências”. Vejamos:

1. Independência e liberdade frente a interferências

1.1 O tribunal e os juízes desempenham suas funções livres de

interferências direta ou indireta ou de influência de qualquer

pessoa ou entidade.

1.2. Onde um tribunal está estabelecido como um órgão ou com o

apoio de uma organização internacional, o tribunal e os juízes

exercerão suas funções judiciais livres de interferência de outros

órgãos ou autoridades da própria organização. Esta liberdade se

aplicará tanto aos processos judiciais quanto em casos pendentes,

entre eles a atribuição de casos a determinados juízes, assim como a

operação do tribunal e seu registro.

1.3. O tribunal será livre para estabelecer as condições de sua

administração interna, incluídas a política de seleção de pessoal, os

sistemas de informação e de atribuição de gastos.

1.4. As deliberações do tribunal terão caráter confidencial216.

Tradução livre.

Grifos nossos.

216 Texto original: “1.1. El tribunal y los jueces desempeñarán sus funciones libres de interferencia directa

o indirecta o de la influencia de cualquier persona o entidad.

1.2 Donde un tribunal esté establecido como un órgano o con el apoyo de una organización internacional,

el tribunal y los jueces ejercerán sus funciones judiciales libres de interferencia de otros órganos o

autoridades de dicha organización. Esta libertad se aplicará tanto a los procesos judiciales en casos

pendientes, entre ellos la asignación de casos a determinados jueces, como a la operación del tribunal y su

registro.

1.3 El tribunal será libre de establecer las condiciones de su administración interna, incluidas la política

de selección de personal, los sistemas de información y de asignación de gastos presupuestales.

1.4 Las deliberaciones del tribunal tendrán carácter confidencial.”

122

Em seu preâmbulo, o documento considera que alguns princípios de direito

internacional são de aplicação geral, afirmando que, para assegurar a independência

judicial, os juízes devem gozar de independência não se sujeitando às partes, ou aos

seus próprios Estados (onde nasceram ou residem), ou aos países em que desempenham

funções e às organizações internacionais sob a qual a Corte é estabelecida.

Dispondo que os juízes devem estar livres de influências indevidas, provenientes

de qualquer classe, decidindo de modo imparcial com base nos autos e no direito.

Além do ponto inicial, que aborda diretamente a independência judicial, os

Princípios de Burgh House sobre a Independência da Judicatura Internacional tratam

também da nomeação, eleição e designação de juízes, da segurança no cargo, das

condições de serviço e remuneração, dos privilégios e imunidades, da liberdade de

expressão e associação, da atividade extrajudicial, da imparcialidade, da renúncia, da

má conduta, entre outros217.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da

Costa Rica), de 22 de novembro de 1969, promulgada no Brasil pelo Decreto n. 678 de

06 de novembro de 1992, dispõe sobre a independência judicial no âmbito da Corte

Interamericana de Direitos Humanos.

Atribuindo imunidades de agentes diplomáticos aos juízes e membros da

Comissão vedando a responsabilidade a eles, por votos e opiniões emitidos no exercício

de suas funções.

Os cargos de juiz da Corte ou de membro da Comissão são declarados

incompatíveis, pelo art. 71 da Convenção, com outras atividades que possam afetar sua

independência ou imparcialidade218.

O Estatuto de Roma, tratado que estabeleceu o Tribunal Penal

Internacional (TPI), foi adotado em 17 de julho de 1998, tendo vigência desde 1º de

julho de 2002, ocasião em foi ratificado por 60 (sessenta) países. O TPI (também

conhecido como Corte Penal Internacional – CPI) iniciou suas atividades em 11 de

março de 2003.

217 Disponível em: http://www.constitucionweb.com/2013/07/principios-de-burgh-house-sobre-la-

independencia-de-la-judicatura-internacional.html Acessado em 07.04.2014. 218 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos.

Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm>.

Acesso em: 07 abr. 2014.

123

O referido Estatuto foi promulgado pelo Brasil por meio do Decreto 4.388, de 25

de setembro de 2002. No primeiro artigo do Estatuto define-se o Tribunal como uma

instituição permanente, com jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes de

maior gravidade com alcance internacional, sendo complementar às jurisdições penais

nacionais.

O Estatuto de Roma traz em seus artigos 40 e 41 disposições específicas sobre a

independência de seus juízes, vedando atividades incompatíveis ou prejudiciais à sua

independência, além de prever um mecanismo de impugnação no caso de violação ou

ameaça à quebra da imparcialidade, cabendo ao procurador ou a pessoa objeto de

inquérito ou procedimento criminal solicitar a desqualificação de um juiz por

imparcialidade, essas questões serão decididas por maioria absoluta dos juízes,

facultando ao juiz cuja desqualificação foi solicitada, a manifestação sobre a questão,

sem ter – por óbvio – direito a voto.

Enfim, o que se pretendeu ao desenvolver este item, foi apresentar – ainda que

de modo descritivo – a elevada extensão e relevância da preocupação global com o tema

da independência judicial. Não obstante, pergunta-se, afinal, o que é independência

judicial? Responder a essa pergunta é o objetivo dos próximos itens.

4.2. A independência judicial e suas diversas definições

Partindo da premissa de que é possível encontrar diversos conceitos de

independência judicial, em especial se partir de vieses diferentes, como por exemplo,

sociológico, jurídico ou político, entre tantas outras possibilidades, inicia-se aqui uma

abordagem específica deste tema, com a ambição de encontrar – ao final – uma

definição sintética e adequada tanto para os fins de desenvolvimento e compreensão

desta tese, quanto para aplicação em trabalhos futuros. Ou seja, busca-se identificar o

conteúdo mínimo e os contornos da independência judicial com a finalidade de

confrontá-la com a atuação do Conselho Nacional de Justiça, identificando zonas de

interface e de interferência.

Inicialmente apresenta-se uma revisão da literatura pertinente ao tema,

pretendendo revelar diversas definições de independência judicial, compilando-as e

identificando seus autores, semelhanças e diferenças.

124

Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel

Dinamarco, ao abordarem as garantias que a Constituição instituiu para salvaguardar a

independência, afirmam que algumas dessas garantias se referem à independência

política do Judiciário como a garantia de autogoverno da magistratura e “as garantias da

vitaliciedade, da inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos e na vedação do

exercício de determinadas atividades, que garantem às partes a imparcialidade do

juiz”219. Os autores esclarecem que entendendo o Poder Judiciário, como guardião das

liberdades e direitos individuais, essa finalidade só poderia ser preservada através de sua

independência e imparcialidade220.

Os autores abordam ainda a denominada independência jurídica dos juízes,

afirmando que esta retira “o magistrado de qualquer subordinação hierárquica no

desempenho de suas atividades funcionais; o juiz subordina-se somente à lei”.

José Roberto Dromi, ao escrever sobre o Judiciário na democracia, afirma que a

competência jurisdicional deve ser exercida exclusivamente por juízes de direito

(membros que integram o Poder Judiciário e estão previstos na Constituição), por

considerar que são os únicos revestidos da qualidade essencial da jurisdição:

independência221.

Nas palavras de Dromi:

[L]a independencia es el recaudo de esencialidad de la

Jurisdicción que, como presupuesto de existencia, le viene exigido

por la propia finalidad de la misión política que el Estado le ha

conferido. En su mérito, los jueces en el Estado de Derecho

Democrático deben tener asegurada – no sólo en la norma – la

exclusividad de su competencia, la estabilidad funcional, la

irreductibilidad de su remuneración y la imparcialidad política222.

[A] independência é a essência da Jurisdição que, como

pressuposto de sua existência, é exigida pela finalidade da missão

política que o Estado conferiu. Em seu mérito, aos juízes do Estado

Democrático de Direito devem ser assegurados efetivamente - não

apenas juridicamente - a competência exclusiva, a estabilidade

funcional, irredutibilidade de sua remuneração e imparcialidade

política.223

Nossos grifos.

219 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel,

op. cit., p. 161. 220 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel,

op. cit., loc. cit. 221 DROMI, José Roberto. El poder judicial. Buenos Aires: Editorial Astrea, 1984, p. 244. 222 DROMI, José Roberto, op. cit., p. 244-5. 223 DROMI, José Roberto, op. cit., loc. cit. Tradução livre.

125

Fabio Konder Comparato, ao escrever sobre “O Poder Judiciário no regime

Democrático”, traz o sentido técnico do termo em uma fórmula de simples compreensão

afirmando que o Poder Judiciário em seu conjunto é independente quando não se

submete aos demais Poderes do Estado 224.

Ao mencionar a independência dos magistrados, esclarece que ela ocorre quando

“não há subordinação hierárquica entre eles, não obstante a multiplicidade de instâncias

e graus de jurisdição. Com efeito, ao contrário da forma como é estruturada a

administração pública, os magistrados não dão nem recebem ordens, uns dos outros”225.

A Declaração de Beijing sobre os princípios relativos à independência do Poder

Judiciário na região da LAWASIA226, adotada em 1995 pelos Presidentes das Cortes

Supremas da região da LAWASIA e por outros juízes da Ásia e do Pacífico e pelo

Conselho de LAWASIA em 2001, que possui um capítulo dedicado à independência

judicial e já foi mencionada ao tratar da proteção internacional deste tema, dispõe em

seu art. 3º o que a independência judicial exige, e para identificar essa exigência, a

Declaração traz uma junção entre a imparcialidade do judiciário e a plenitude da

jurisdição, dispondo que o Judiciário deve decidir os assuntos com avaliação imparcial

dos feitos e seu entendimento do Direito, “sem influências impróprias, diretas ou

indiretas, de qualquer fonte; e ainda, que tenha jurisdição, diretamente ou mediante

revisão, sobre todos os assuntos de natureza judicial”227.

Luiz Flávio Gomes, no início da década de 90, enquanto exercia a função de

juiz, escreveu que a total e irrestrita independência em relação aos outros poderes é

requisito prévio e fundamental para que a atividade jurisdicional possa cumprir

adequadamente seus papéis constitucionais e, em consequência, legitimar-se

democraticamente228. Entendendo independência judicial como gênero que abarca tanto

a independência do juiz como a autonomia da magistratura.

O autor considera ainda que a independência judicial pode ser compreendida sob

dois enfoques: como valor e como garantia. Entende-a como valor fundamental do

224 COMPARATO, Fábio Konder. O Poder Judiciário no regime democrático, Estudos Avançados, vol.

18, n. 51, p. 151-159, ago. 2004. P. 151. 225 COMPARATO, Fábio Konder, op. cit., p. 151. 226 LAWASIA é a Law Association for Asia and the Pacific. É uma organização internacional que

congrega advogados, juízes, juristas e outros interessados das profissões jurídicas na Região da Ásia

Pacífica. Informações disponíveis em: http://lawasia.asn.au/profile-of-lawasia.htm. Acesso em: 27 ago.

2015. 227 ZEITUNE, José; ANDREU-GUZMÁN, Frederico, op. cit., p. 247. 228 GOMES, Luiz Flávio. A questão do controle externo do Poder Judiciário: natureza e limites da

independência judicial no Estado Democrático de Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 57.

126

Estado Democrático de Direito, pois o juiz, embora independente, “está estritamente

vinculado ao ordenamento jurídico, isto é, à lei e à Constituição”229. Já como garantia,

segundo o autor, a independência judicial, deve contar com uma série de mecanismos

que “relacionam-se ou com a pessoa do juiz (independência pessoal externa e interna)

ou com a própria instituição da magistratura (autonomia coletiva)” 230.

Vale mencionar a crítica de Gustavo Rabay Guerra, que afirma que a

independência judicial não se resume às garantias institucionais da vitaliciedade,

inamovibilidade e autonomia em face de eventuais interferências dos demais poderes.

Em sua visão, trata-se na verdade de “desdobramentos do primado da interdependência

entre as funções do Estado aplicado diretamente à função jurisdicional, embora a

literatura especializada a identifique assim, tanto nos Estados Unidos como no Brasil e,

ainda, na maioria dos países ocidentais” 231.

Gustavo Rabay Guerra apoiado em outros autores, em especial Mathew D.

McCubbins, Roger Noll e Barry Weingast232 conhecidos por Mcnollgast, que trazem

sua teoria política positiva e no tema partem da seguinte premissa: o conceito de

independência judicial não é algo estático, resultado automático de dispositivos

constitucionais e legais que estabeleçam a vitaliciedade, nem a independência judicial

sopesada no sistema de checks and balances. Guerra afirma que “[A]o contrário, eles

definem o conceito como um processo dinâmico que emerge das interações estratégicas

entre os poderes” 233, escrevendo que:

Longe de ser uma concepção estanque, a independência judicial

alterna de acordo com mudanças na composição política dos três

ramos do governo. À guisa de exemplo, nos períodos em que o

governo está dividido, especulam os Mcnollgasts, a expectativa é a de

que o Congresso ou o próprio Executivo se sobreponham às decisões

tendentes a frustrar cometimentos políticos daqueles entes, sobretudo,

as manifestações (ou meras ameaças) da Suprema Corte. De outra

banda, quando esses ramos do governo estão unificados em torno

de escolhas públicas, a tendência é o enfraquecimento do

Judiciário, na medida em que o Executivo e o Legislativo

coordenam mudanças capazes de restringir a autonomia dos

229 GOMES. Luiz Flávio, op. cit., p. 58. 230 GOMES. Luiz Flávio, op. cit., loc. cit. 231 GUERRA, Gustavo Rabay. O Conselho Nacional de Justiça e a nova condição da independência

judicial, Revista Brasileira de Estudos Constitucionais, n. 18, p. 57-8, abr.-jun. 2011. 232 Professores da Universidade da California, de San Diego e de Stanford, respectivamente, que

frequentemente se identificam e são identificados sob a conjunção abreviada do início de seus

sobrenomes: Mcnollgast. 233 GUERRA, Gustavo Rabay, op. cit., p. 57.

127

juízes, em um jogo estratégico que os autores sintetizam

metaforicamente como o “estica-e-puxa” da independência

judicial (waxing and waning)234. Esse vai-e-vem promoverá

oscilações nas condições concretas do que pode ser um Judiciário

independente235.

Nossos grifos.

Para Elida Lauris dos Santos a independência judicial apresenta-se com dois

significados, um relacionado à noção de autonomia (individual ou coletiva) dos juízes

perante outros indivíduos e instituições; outro se relaciona ao comportamento individual

do juiz236.

Sobre o comportamento individual do juiz, a autora distingue autonomia e

comportamento judicial independente, afirmando que não são conceitos que se

condicionam reciprocamente, explicando que a capacidade do juiz pensar e julgar de

forma independente, não decorreria – ao menos necessariamente – que ele desfrutaria de

um alto grau de autonomia em relação ao sistema.

Para a autora, um comportamento judicial independente pode até significar um

ato individual “de rebeldia do juiz contra o sistema, do mesmo modo, em condições de

autonomia, os juízes ainda podem apresentar um comportamento deferencial em relação

ao poder político”237.

Desenvolvendo o argumento de que o comportamento judicial não é o melhor

indicativo da independência do juiz, a autora afirma considerar a independência um

conceito relacional e não comportamental, pois para ela a “independência judicial está

relacionada com os arranjos institucionais que podem promovê-la ou protegê-la” 238.

Mas vale ressaltar a clássica pergunta feita por Lord Bingham de Cornhill,

presidente da Corte da Inglaterra em 1996, em seu artigo “Judicial Independence”

diante do tema da independência judicial, que questionou: independente de quê?239 O

autor escreveu que:

234 Nota de rodapé original do texto transcrito. Vianna Monteiro (2006b) prefere a expressão “vai-e-

vem”. 235 GUERRA, Gustavo Rabay, op. cit., p. 57. 236 SANTOS, Elida Lauris dos. A independência judicial na reforma do judiciário brasileiro. In: VI

Congresso Português de Sociologia, Universidade Nova de Lisboa, 25 a 28 de junho de 2008, p. 12-15.

Disponível em: <http://www.aps.pt/vicongresso/pdfs/423.pdf>. Acesso em: 27 mar. 2014. 237 SANTOS, Elida Lauris dos, op. cit., p. 12. 238 SANTOS, Elida Lauris dos, op. cit., p. 12-15. 239 No prefácio dos Comentários aos Princípios de Bangalore, o presidente do Judicial Integrity Group, C.

G. Weeramantry, traz em síntese o panorama de importância desses princípios: “Não só foram os

Princípios de Bangalore adotados por alguns Estados, como ainda serviram de modelo a outros para a

formação de seus próprios princípios de conduta judicial. As organizações internacionais também

128

[Q]ualquer menção de independência judicial deve eventualmente

levar à questão: independente do quê? A resposta mais óbvia é, por

conseguinte, independente do governo. Eu acho impossível pensar

em qualquer modo em que os juízes, no seu papel de decidir, não

sejam independentes do governo. Mas eles serão também

independentes do Legislativo, salvo quanto à sua capacidade de

fazer leis. Os juízes não deverão acatar as opiniões do parlamento ou

decidir os casos com um ponto de vista que busque a sua aprovação

ou que evite sua censura. Eles devem também, evidentemente,

assegurar que suas imparcialidades não sejam determinadas por

qualquer outra associação, quer profissional, comercial ou

pessoal240.

Nossos grifos.

O que pode ser visto como outra resposta à indagação Lord Bingham de

Cornhill, talvez de um modo mais detalhado, mas ainda partindo do pressuposto de que

o termo “independência” implica a ausência de vínculos entre um sujeito e um objeto,

Sebastián Linares241 aplica esses elementos ao sistema judicial (ausência de vínculo,

objeto e sujeito), apresentando uma relação de hipóteses que podem ser reproduzidas

nas tabelas abaixo:

apoiaram-nos e deram-lhes seus endossos. O Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, pela

Resolução 2006/23, convidou os Estados-membros a compatibilizarem seus sistemas legais domésticos

com os Princípios de Bangalore de Conduta Judicial e a incentivar seus judiciários a levarem em

consideração suas regras ao rever ou ao desenvolver normas referentes ao profissional e à conduta ética

dos membros do Judiciário. O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes apoiou-os ativamente

e os Princípios de Bangalore receberam também o reconhecimento de organismos tais como a Associação

Americana de Advogados e da Comissão Internacional de Juristas. Os juízes dos Estados-membros do

Conselho Europeu também os avaliaram positivamente”. WEERAMANTRY, C. G. Prefácio. In:

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Escritório Contra Drogas e Crime (UNODC). Comentários

aos Princípios de Bangalore de Conduta Judicial. Tradução de Marlon da Silva Malha e Ariane Emílio

Kloth. Brasília: Conselho da Justiça Federal, 2008. Disponível em:

<https://www.unodc.org/documents/lpo-

brazil//Topics_corruption/Publicacoes/2008_Comentarios_aos_Principios_de_Bangalo re.pdf>. Acesso

em: 07 abr. 2014. 240 Lord Bingham de Cornhill, Lord Chief Justice of England (NT: Presidente da Corte da Inglaterra).

‘Judicial Independence’, Judicial Studies Board Annual Lecture, 1996. Disponível em:

www.jsboard.co.uk. 241 LINARES, Sebastián. La independencia judicial: conceptualización y medición. In: SILVA, Germán

Burgos (Ed.). Independencia Judicial en América Latina. ¿De quién? ¿Para qué? ¿Cómo?. Colección

Textos de Aquí y Ahora. 1. ed. Bogotá: ILSA, 2003, p. 110-3. Disponível em

<http://ilsa.org.co:81/biblioteca/dwnlds/taq/taq02/Taq02-02-04.pdf>. Acesso em: 27 mar. 2014.

129

Segundo Linares, para explicar o conceito de independência judicial é mais

apropriado concentrar-se somente em um sujeito: o juiz individual, evitando assim que

as figuras se sobreponham, o que ocorreria caso fossem relacionados os três sujeitos

possíveis (juiz individual; poder judicial em seu conjunto; e decisões judiciais).

O autor apresenta o seguinte quadro:

Quadro 1

Sujeito Vínculo Objeto

Juiz individual Partes

Juiz individual Governo

Juiz individual Legislativo

Juiz individual Organizações não governamentais

Juiz individual Meios de comunicação

Juiz individual Grupos de poder econômico

Juiz individual Outros juízes

Juiz individual Público em geral

Juiz individual Órgãos não jurisdicionais do sistema de justiça

Fonte: elaborado por Sebastián Linares242

242 LINARES, Sebastián, op. cit.

Objeto

a) Governo

b) Legislativo

c) Meios de comunicação

d) Grupos de poder econômico

e) Organizações não governamentais

f) Outros juízes

g) Partes do processo

h) Público em geral

i) Outros organismos pertencentes ao sistema

de justiça

Sujeitos

a) Juiz individual

b) Poder judicial em seu

conjunto

c) Decisões judiciais

130

O autor compreende a dimensão negativa da independência judicial, por se

referir à ausência de vínculo, mas chama a atenção para a necessidade de estabelecer

uma segunda dimensão para o seu conceito: a dimensão positiva.

Segundo Sebastián Linares, a dimensão positiva refere-se à necessidade de que o

juiz individual se vincule ao objeto, isto é, ao Direito e aos autos. Nesse sentido,

teríamos:

Quadro 2

Sujeito Vínculo Objeto

Juiz individual Fontes do Direito (normas, doutrina,

precedentes, princípios gerais do Direito)

Juiz individual Autos

Linares entende que a independência judicial se expressa no seguinte enunciado:

“o juiz deve resolver um caso de modo imparcial sujeitando-se exclusivamente à regra

de decisão que se deriva da interpretação das fontes do Direito e a verdade dos autos”

(tradução livre) 243 244.

Também em uma busca pelo conceito de independência judicial, Germán Burgos

Silva245, em seu artigo ¿Qué se entiende hoy por independencia judicial? Algunos

elementos conceptuales, aborda de maneira elucidativa o conflito e a dificuldade em

definir independência judicial, justamente porque o termo tem uma conotação negativa,

isto é, um “não ingerir” dirigido aos outros organismos do Judiciário, aos outros poderes

estatais, às partes e a quaisquer outros atores.

O autor diferencia entre os objetivos mediatos e os imediatos da independência

judicial. Em sua opinião, o objetivo imediato é permitir o império do direito e sua

aplicação imparcial aos casos concretos, assim como a defesa da Constituição. Quanto

ao objetivo mediato, menciona o recorrente entendimento de que a independência

judicial permite uma melhor garantia dos direitos humanos, através da ausência de

243 Texto original: “el juez debe resolver un caso de modo neutral sujetándose exclusivamente a la regla

de decisión que se deriva de interpretación de las fuentes del derecho y a la verdad de los hechos”. 244 LINARES, Sebastián, op. cit., p. 110-1. 245 SILVA, Germán Burgos. ¿Qué se entiende hoy por independencia judicial? Algunos elementos

conceptuales. In: SILVA, Germán Burgos (Ed.). Independencia Judicial en América Latina. ¿De quién?

¿Para qué? ¿Cómo?. Colección Textos de Aquí y Ahora. 1. ed. Bogotá: ILSA, 2003. Disponível em

<http://ilsa.org.co:81/biblioteca/dwnlds/taq/taq02/Taq02-01.pdf>. Acesso em: 27 mar. 2014.

131

ingerência dos poderes públicos. Tem-se também argumentado, segundo o autor, que a

independência judicial contribui para o crescimento econômico dos países em

desenvolvimento, já que tende a garantir o controle da burocracia e das mudanças

repentinas e injustificadas de marcos regulatórios da política econômica246.

Embora Germán Burgos Silva saliente essa dificuldade de conceituar a

independência judicial, o autor apresenta duas perspectivas de compreensão do

conceito: a primeira é normativa e a segunda, instrumental247. Sob uma perspectiva

normativa, a independência judicial é antes de tudo um meio ligado a fins superiores, é

um instrumento que depende de objetivos substantivos tanto do Estado de Direito como

do crescimento econômico. Já a perspectiva instrumental permite diferenciar a

independência judicial do isolacionismo e corporativismo, embora tenha havido muita

confusão a esse respeito, sobretudo na dimensão prática do conceito. Na verdade, nem

os juízes nem o poder judicial são independentes no sentido de isolar-se da realidade

social ou de isolar-se como um pretexto para a defesa de interesses corporativos à

margem de qualquer responsabilidade e controle248.

Gustavo Rabay Guerra afirma que a independência judicial “exige a preservação

da autoridade de cada magistrado, na apreciação de matérias administrativas e

jurisdicionais que estão sob sua competência” 249. Mais adiante, o autor explica que a

evolução do conceito e do exercício da jurisdição estatal se deu lado a lado com a noção

de independência judicial. Em suas palavras:

Além das garantias típicas atribuídas aos juízes nas democracias

constitucionais do Ocidente, as quais podem ser sintetizadas na

ideia de inviolabilidade de convicções, a independência e seus

corolários (vitaliciedade, prerrogativas funcionais etc.) são

contrapartidas face à grande responsabilidade que representa

julgar as controvérsias entre particulares e aquelas em que há a

presença do próprio Estado, com imparcialidade e vinculação à

legalidade. O aparecimento histórico das garantias processuais da

cidadania, tais como os princípios do juízo natural e do direito de

ação, veio a recrudescer, ainda mais, a eminente posição ocupada pela

magistratura, enquanto guardiã legítima da ordem jurídica, conditio

sine non para a edificação do primado de divisão das funções do

Estado250.

Nossos grifos.

246 SILVA, Germán Burgos, op. cit., p. 14. 247 SILVA, Germán Burgos, op. cit. 248 A responsabilidade judicial e seu controle serão tratados adiante no presente trabalho. 249 GUERRA, Gustavo Rabay, op. cit., p. 53. 250 GUERRA, Gustavo Rabay, op. cit., p. 55.

132

Apoiando-se nos artigos “Judicial Independence: often cited, rarely understood”,

de Lydia Brashear Tiede251, e “Conditions for Judicial Independence”, de Mathew D.

McCubbins, Roger Noll e Barry Weingast252, bem como no artigo “Algunos aspectos de

la independencia del Poder Judicial en Brasil”, de Claudia Maria Barbosa253, Gustavo

Rabay Guerra afirma que esses autores são unânimes em afirmar que o conceito de

independência judicial está repleto de déficits compreensivos; não é algo estático, mas

produto de um modelo dinâmico de percepções, que exige aprofundamento de análise

circunstancial e um método mais vigoroso de exame.

Partindo dessa premissa, ou seja, da ampla dificuldade em se adotar uma

definição de independência judicial diante da dinamicidade de percepções e da

complexidade que envolve o tema, optou-se aqui por vincular sua definição ao âmbito

de abrangência, isto é, optou-se por alinhar a definição à proposta da presente pesquisa,

sem prejuízo de que a mesma definição venha a ser utilizada em trabalhos posteriores.

Portanto, não se pretende apresentar uma definição que encerre o debate, mas oferecer

uma síntese baseada em elementos apresentados por alguns autores, se utilizando disso

como ponto de partida para a discussão, sempre verificando sua utilidade para ser

aplicada nesta tese.

4.3. Uma proposta de definição de independência jurisdicional

Pretende-se aqui se utilizar das definições de independência judicial com foco

em uma de suas faces, mais precisamente, a independência jurisdicional. Por isso, a

primeira tarefa consiste em diferenciar independência judicial e independência

jurisdicional.

Entende-se por independência judicial o gênero que abarca a independência na

prática de atos jurisdicionais e administrativos pelos julgadores. Não obstante, a

presente tese se limita a analisar a atuação do CNJ diante dos atos jurisdicionais; em

outras palavras, nesta tese não será analisada a relação entre a atividade típica do CNJ

251 TIEDE, Lydia Brashear. Judicial Independence: often cited, rarely understood, Journal of

Contemporary Legal Issues, vol. 15, p. 129-161, 2006. 252 MCCUBBINS, Matthew D.; NOLL, Roger; WEINGAST, Barry. Conditions for Judicial

Independence, Journal of Contemporary Legal Issues, vol. 15, p. 105-128, 2006. 253 BARBOSA, Claudia Maria. Algunos aspectos de la independencia del Poder Judicial en Brasil. In:

SILVA, Germán Burgos (Ed.). Independencia Judicial en América Latina. De quién? Para qué? Cómo?.

Bogotá: ILSA, 2003, p. 417-437.

133

com atos administrativos praticados por magistrados, como, por exemplo, quando o

magistrado atua como ordenador de despesa em uma licitação para o fórum que dirige,

ou quando realiza atos administrativos de remanejamento de funcionários. Portanto, a

pesquisa analisa apenas atos jurisdicionais, isto é, atos praticados em decisões judiciais

que foram objeto da atuação do CNJ, por isso se utiliza, a partir daqui, independência

jurisdicional.

Para definir independência jurisdicional, busca-se realizar uma abstração

generalizadora que identifique suas finalidades e natureza, sem desconsiderar o âmbito

desta tese254.

Com base em alguns autores citados acima, mais precisamente Sebastian Linares

e Germán Burgos Silva, somando a eles André Ramos Tavares, buscou-se alguns

elementos para definir independência jurisdicional. Os dois primeiros elementos

definidores foram desenvolvidos no item anterior; por isso, ao invés de repeti-los

integralmente, pretende-se apenas sistematizá-los. Para isso, esses elementos foram

agrupados em três eixos:

Eixo 1: A independência jurisdicional sob as dimensões negativa (ausência

de vínculos com quaisquer atores) e positiva (necessidade de se vincular ao

Direito e aos autos), utilizadas por Sebastián Linares;

Eixo 2: A independência judicial sob duas perspectivas, de acordo com

German Burgos Silva255:

i. Normativa: a independência judicial é antes de tudo um meio

ligado a fins superiores;

ii. Instrumental: a independência judicial exige a incidência de

responsabilidade e controle, e é justamente isso que nos permite

diferenciá-la do isolacionismo e corporativismo.

Eixo 3: O Judiciário, os direitos fundamentais e os direitos fundamentais

judiciários (conforme estabelecido por André Ramos Tavares).

254 ROCHA, José de Albuquerque. Estudos sobre o Poder Judiciário. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 16-

17. 255 SILVA, Germán Burgos, op. cit.

134

O primeiro eixo de elementos mencionado acima identifica na independência

jurisdicional as suas finalidades representadas por duas dimensões, a positiva e a

negativa; isto é, a vinculação do exercício da independência jurisdicional com os autos e

o ordenamento jurídico, e ao mesmo tempo, a ausência de vínculos subjetivos, ou seja,

vínculos com quaisquer pessoas sejam elas físicas ou jurídicas, privadas ou públicas,

tais como partes, terceiros, Estado, empresas, mídia, demais juízes e qualquer outro ator.

Sobre este eixo, mais precisamente sobre a dimensão positiva, vale mencionar

aqui dois posicionamentos que parecem antagônicos. Eles se referem mais precisamente

à teoria da decisão, mas, para justificar aqui a adoção e relevância da dimensão positiva,

se faz necessária a sua abordagem, ainda que breve256.

Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel

Dinamarco, ao abordarem as garantias que a Constituição instituiu para salvaguardar a

independência, afirmam que o magistrado deve ser “inteiramente livre na formação de

seu convencimento e na observância dos ditames de sua consciência”.

Entende-se aqui que a adoção da dimensão positiva, vinculando o magistrado

aos autos e ao ordenamento jurídico, não se conforma com a afirmação dos autores

citados acima, sem fazer importantes ressalvas. Para contribuir com o debate e revelar a

outra face sobre a livre convicção, vale trazer aqui também, o posicionamento de Lenio

Streck, que em artigo sobre este tema afirma que tem pânico quando lê na doutrina ou

nas decisões judiciais “coisas como: entre a lei e minha consciência, fico com a

minha consciência. Ora, uma democracia se faz aplicando o direito e não a

convicção pessoal de um conjunto de juízes ou tribunais”257.

O segundo eixo de elementos, por sua face normativa, conecta a independência

jurisdicional ao Estado de Direito e, por sua face instrumental, sujeita essa

independência à responsabilidade, ao controle e, por conseguinte, à fiscalização.

256 Vale mencionar que esta tese não se dirige à teoria da decisão jurisdicional, já que não pretende buscar

meios e mecanismos de aferir os elementos da decisão judicial e parâmetros para identificar a presença de

correção, elasticidade ou livre convencimento. Para tanto, remete-se o leitor a – dentre outros –

ABBOUD, Georges. Discricionariedade: alcance da atuação administrativa e judicial no Estado

Constitucional. Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2013. Ver

também STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência?. 2. ed. Porto Alegre:

Livraria do Advogado, 2011. 257 STRECK, Lenio Luiz. Dilema de dois juízes diante do fim do Livre Convencimento do NCPC,

Consultor Jurídico, 19 de março de 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mar-

19/senso-incomum-dilema-dois-juizes-diante-fim-livre-convencimento-ncpc>. Acesso em: 20 set. 2015.

135

Aqui também vale uma breve digressão a respeito da responsabilidade, nos

comentários aos Princípios de Bangalore258 sobre o primeiro valor, que é justamente a

“independência”, em seu item 22 ressalta-se a preocupação com a confusão da

independência com privilégio ou prerrogativa individual do juiz. Dispõe-se que a

independência judicial é na verdade uma responsabilidade imposta a cada juiz, e é

justamente essa responsabilidade que o habilita a julgar, exigindo sempre que aja de

forma honesta e imparcialmente diante de um conflito com base na lei e nas evidências

dos autos, sem pressões externas ou influência e sem medo de interferência de quem

quer que seja259.

O terceiro eixo de elementos consiste no Judiciário como garantidor e

concretizador dos direitos humanos fundamentais. Aqui se percebe o papel do Judiciário

além da solução de conflitos, assumindo ele também o papel de “ordenador da

respeitabilidade dos direitos humanos fundamentais, seu garante último, inclusive

contra o próprio Estado-administrador, ou Estado-legislador ou, ainda, Estado-

executivo”260.

Este eixo também abarca os direitos judiciários fundamentais, que avalizam uma

marcha processual consistente com um Estado judicial de Direitos, tais como: acesso ao

Judiciário e à Justiça; indeclinabilidade da prestação jurisdicional; devido processo

legal; celeridade judicial processual; juiz natural; juiz imparcial; julgamento pelo

Tribunal do Júri; motivação das decisões; publicidade e sigilo processual; duplo grau de

jurisdição; contraditório e ampla defesa; prova lícita; segurança jurídico-judicial;

decisão judicial legal e constitucional; e por fim proteção supranacional dos direitos

fundamentais261.

Embora os denomine “direitos judiciários fundamentais”, André Ramos Tavares

explica que, perante os magistrados e a Justiça, esses direitos se apresentam como

verdadeiros deveres262. Portanto, entende-se aqui que a existência e concretização

específica desses direitos judiciários fundamentais é indissociável da independência

jurisdicional. Isto é, quando esses direitos são direcionados à sociedade, apresentam-se

258 Para mais informações a respeito dos “Princípios de Bangalore”, vide item que trata da proteção

internacional da independência judicial. 259 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Escritório Contra Drogas e Crime (UNODC), op. cit., p.

45. 260 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 38. 261 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 38 e 63. 262 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 63.

136

como direitos fundamentais, mas, quando direcionados aos magistrados e à Justiça,

apresentam-se como deveres.

Assim, os três eixos de elementos mencionados podem ser entendidos e

sintetizados como uma relação tripartite inerente à independência jurisdicional da

seguinte maneira: a independência jurisdicional é a) um direito fundamental da

sociedade, b) um dever do judiciário e c) objeto de fiscalização do Conselho Nacional

de Justiça.

a) A independência jurisdicional é um direito fundamental da sociedade

Identificar a independência jurisdicional como direito fundamental implica

reconhecer sua proteção perante qualquer pessoa, inclusive seu próprio beneficiário, por

ser direito indisponível, gerando para o Judiciário um dever, justamente por ser este o

“organismo legitimado constitucionalmente para proceder à tutela, quando necessário,

dos direitos humanos fundamentais”263.

b) A independência jurisdicional é um dever do judiciário

A independência jurisdicional na acepção de dever também é indisponível, mas,

por ser dever, demanda sua concretização tanto pelo magistrado quanto pelo Judiciário,

exigindo do Estado a criação de condições suficientes para sua operacionalização,

concretização e manutenção. Como se trata de dever do Judiciário, seu adequado

desenvolvimento clama por adequada fiscalização, que neste caso é função tanto dos

órgãos de controle do próprio tribunal a que se vincula o magistrado quanto do

Conselho Nacional de Justiça.

c) A independência jurisdicional é objeto de fiscalização do Conselho

Nacional de Justiça

Nos debates sobre a constitucionalidade do Conselho Nacional de Justiça,

verifica-se o tema recorrente da independência jurisdicional, despontando como tese a

favor da inconstitucionalidade do CNJ o temor de rompimento das garantias inerentes

ao Judiciário. Ao contrário, nesta tese entende-se que o regular funcionamento do CNJ

protege e reestabelece a independência jurisdicional, justamente por ser este o órgão

máximo responsável por sua fiscalização.

263 TAVARES, André Ramos. Manual do Poder Judiciário Brasileiro, op. cit., p. 38.

137

Como já afirmou Rocha, o papel do Conselho Nacional de Justiça, enquanto

órgão legítimo de controle da magistratura, é o de zelar pela sua autonomia e

independência e não amesquinhá-las, por isso que eventuais desvios éticos cometidos

pelos magistrados devem ser apurados com respeito à dignidade da pessoa e punidos

segundo o devido processo legal, os postulados da razoabilidade e proporcionalidade264.

Vejamos trecho da decisão do voto do Ministro-relator Cezar Peluso na ADI n.

3367, que confirmou a constitucionalidade do CNJ265 e servirá de apoio para o

desenvolvimento deste argumento:

Tem-se, portanto, de reconhecer, como imperativo do regime

republicano e da própria inteireza e serventia da função, a

necessidade de convívio permanente entre a independência

jurisdicional e instrumentos de responsabilização dos juízes que

não sejam apenas formais, mas que cumpram, com efetividade, o

elevado papel que lhes predica. Para isso, é preciso, com reta

consciência e grandeza de espírito, desvestirem-se os juízes dos

preconceitos corporativos e outras posturas irracionais, como a que vê

na imunidade absoluta e no máximo isolamento do Poder

Judiciário condições sine qua non para a subsistência de sua

imparcialidade.

Grifos originais.

Buscando fundamentação no princípio republicano, o Min. Cezar Peluso afirma

que é inerente à função jurisdicional a necessidade de instrumentos que garantem tanto

a independência jurisdicional quanto a responsabilização dos julgadores.

Evidente que os órgãos competentes para fiscalizar o Judiciário, sejam eles

estaduais, regionais ou nacionais, deste último como é o caso do Conselho Nacional de

Justiça, devem fazê-lo sempre no âmbito de sua competência, sob pena de praticar atos

ilegais ou inconstitucionais, que – por mais que sigam uma legítima pretensão ou

finalidade – apenas por existirem já transgridem o Estado de Direito, ao invés de

restabelecerem a independência jurisdicional. Eventuais atos ilegais ou inconstitucionais

de tais órgãos, portanto, não deveriam sequer existir ou produzir efeitos.

Em suma, uma vez que a independência jurisdicional é considerada um direito

fundamental da sociedade e dever do Judiciário, sua fiscalização é indispensável. Em

caso de transgressão, deve ser buscado o restabelecimento da independência, mas

264 ROCHA, Silvio Luís Ferreira da. Papel do CNJ não é o de órgão repressor da magistratura, Consultor

Jurídico, 3 de outubro de 2011. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2011-out-03/cnj-zelar-

autonomia-magistratura-nao-amesquinha-la>. Acesso em: 15 out. 2015. 265 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 3367. Rel. Ministro Cezar Peluso, j. em 13/04/2005.

138

sempre nos limites da competência do órgão fiscalizador. Assim, o Conselho Nacional

de Justiça quando atua de acordo com seu desenho constitucional e legal, não romperá

ou mitigará a independência jurisdicional, mas a restabelecerá nos casos em que o

julgador houver rompido (por ação) ou permitido que se rompesse (por omissão) a

independência jurisdicional.

Com a proposta de apresentar essa definição de maneira unificada, entende-se

aqui que a independência jurisdicional se apresenta com natureza de direito fundamental

aos jurisdicionados (sejam efetivos ou em potencial) e dever para os magistrados. Nesse

sentido, a independência jurisdicional se diferencia de privilégio (pelos fins a que se

presta) e de prerrogativa (por ser indisponível), exigindo esforços para sua

concretização e mecanismos que evitem o isolacionismo e o corporativismo, sujeitando

as atividades jurisdicionais à fiscalização e atribuindo as responsabilidades pertinentes.

Já o modo de efetividade da independência jurisdicional é representado pelas

duas dimensões, a positiva e a negativa, isto é, a vinculação aos autos e ao ordenamento

jurídico e, ao mesmo tempo, a ausência de quaisquer vínculos subjetivos capazes de

atingir a independência.

A independência jurisdicional deve, além de ser garantida, ter efetividade, e isso

é possível com a adoção de instrumentos adequados (garantias e deveres da magistratura

e dos magistrados), fiscalização e, eventualmente, responsabilização, permitindo ao

julgador a certeza de que não tem o que temer e nem motivo para sucumbir às pressões

externas ou internas de quem quer que seja, mas também aos indivíduos – que são

destinatários – dessa atividade a certeza de que eventual desvio pode ser punido.

139

CAPÍTULO 5

A RELAÇÃO ENTRE A ATIVIDADE DO CONSELHO NACIONAL

DE JUSTIÇA E A INDEPENDÊNCIA JURISDICIONAL

140

5.1. Introdução

Nos capítulos anteriores foi possível abordar, além do plano de pesquisa e das

notas metodológicas, algumas circunstâncias da origem do Conselho Nacional de

Justiça. Foram comparados alguns conceitos de jurisdição e abordada sua ausência no

caso específico do CNJ e presença nos demais órgãos do Judiciário, utilizando-se da

questão judicializada para analisar os principais pontos de confluência e conflito sobre a

prévia jurisdicionalização e a posição do CNJ no rol de órgãos do Poder Judiciário.

Em seguida dedicou-se um capítulo ao viés instrumental da independência

judicial, sendo examinada a evolução constitucional do tema no cenário brasileiro,

descrito e analisado o conjunto de garantias da magistratura e dos magistrados e

também o conjunto de vedações constitucionais, sob o fio condutor da proteção

constitucional à independência judicial no Brasil.

O quarto capítulo dedicou-se ao estudo da independência judicial na perspectiva

de sua proteção internacional, abordando diversas definições de modo a apresentar uma

definição específica de independência jurisdicional passível de ser aplicada tanto nesta

tese quanto em trabalhos futuros, com o intuito de deixar visível o recorte da pesquisa e

subsidiando o presente capítulo.

Este capítulo versará sobre o tema da relação entre a atuação do Conselho

Nacional de Justiça e a independência jurisdicional, utilizando-se da metodologia e

categorias desenvolvidas no primeiro capítulo desta tese e apresentando o produto desta

pesquisa empírica, na qual foram analisados 1.419 atos normativos266 e 1.331

ocorrências obtidas através de busca de jurisprudência no site oficial do CNJ267. A

análise recai sobre as decisões já tomadas e publicadas pelo Conselho (sejam elas

provenientes de seus atos normativos ou decisórios).

Com o objetivo de organizá-las de acordo com seus denominadores comuns, foi

desenvolvida a seguinte categorização:

266 São atos da Presidência: Atas, Enunciados Administrativos, Instruções Normativas, Moções do

Conselho, Notas Técnicas, Portarias, Portarias Conjuntas, Recomendações, Resoluções, Termos de

Cooperação Técnica, Resoluções Conjuntas, Comunicados. São atos da Corregedoria: Instruções

Normativas, Ofício-Circular, Orientações, Portarias, Projeto de lei, Provimentos, Recomendações,

Relatórios Anuais, Relatórios de Inspeção e Boletim de Serviços. São atos da Secretaria-Geral e da

Diretoria-Geral: Portarias e Instruções Normativas. 267 Esclarece-se desde já que a totalidade de ocorrências encontradas (1.331) não corresponde a 1.331

casos diferentes. Como a busca foi realizada por diversos parâmetros, houve frequente duplicidade de

casos, que foram eliminados na triagem.

141

I. Zona de interface entre a atividade do CNJ e a independência jurisdicional:

1. criada por via abstrata e prévia aos atos jurisdicionais;

2. criada por via concreta e posterior diante de atos jurisdicionais;

a. com utilização de excesso de linguagem ou impropriedades;

b.parciais;

c. negligentes;

d.com indícios de corrupção.

III. Zona de interferência criada por via concreta e posterior à atuação

jurisdicional.

A seguir trataremos de cada item abordando inicialmente as espécies de atos

normativos e de procedimentos que envolvem as decisões do Conselho Nacional de

Justiça, além de, em cada subitem, apresentar atos ou decisões pertinentes ao tema com

os comentários a respeito.

5.2. Zona de interface entre a atividade do CNJ e a independência

jurisdicional

Antes de avançarmos, vale relembrar o que foi definido como zona de interface

no presente trabalho. Em síntese, trata-se da área em que interagem atividade não

jurisdicional e atividade jurisdicional, mais precisamente a atividade do Conselho

Nacional de Justiça e a independência jurisdicional, não havendo transformações nos

atos jurisdicionais.

Para criar as categorias abaixo, buscou-se entender por quais ações e reações

essa zona de interface é provocada e mantida, realizando a categorização mediante

agrupamento de acordo com características semelhantes em cada documento analisado.

5.2.1. Criada por via abstrata e prévia aos atos jurisdicionais

Desde a criação do Conselho Nacional de Justiça por meio de norma

constitucional, foi-lhe atribuído o poder normativo de expedir atos regulamentares e

142

recomendar providências no âmbito específico de sua competência, com o propósito de

zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da

Magistratura268.

De forma geral, os atos do Conselho Nacional de Justiça são provenientes de

quatro eixos:

1) Atos da Presidência,

2) Atos da Corregedoria,

3) Atos da Secretaria-Geral e

4) Atos da Diretoria-Geral.

São atos da Presidência: Atas, Enunciados Administrativos, Instruções

Normativas, Moções do Conselho, Notas Técnicas, Portarias, Portarias Conjuntas,

Recomendações, Resoluções, Termos de Cooperação Técnica, Resoluções Conjuntas e

Comunicados.

São atos da Corregedoria: Instruções Normativas, Ofício-Circular, Orientações,

Portarias, Projeto de lei, Provimentos, Recomendações, Relatórios Anuais, Relatórios

de Inspeção e Boletim de Serviços.

São atos da Secretaria-Geral e da Diretoria-Geral: Portarias e Instruções

Normativas.

O Regimento Interno do CNJ traz em seu art. 102 disposições comuns sobre os

atos normativos, atribuindo ao Plenário a competência de edição de atos normativos

mediante resoluções, instruções, enunciados administrativos (súmula de sua

jurisprudência dominante269) e recomendações.

Os parágrafos 4º e 5º dispõem que os efeitos do ato serão definidos pelo

Plenário, ao passo que as resoluções e enunciados administrativos terão força

vinculante, após sua publicação no Diário da Justiça eletrônico e no sítio eletrônico do

CNJ270.

268 “Art. 103-B, § 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder

Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições

que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de

2004) I - zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura,

podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;

(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).” 269 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição federal comentada e

legislação constitucional, op. cit., p. 534. 270 Do ato normativo: “Art. 102. O Plenário poderá, por maioria absoluta, editar atos normativos,

mediante Resoluções, Instruções ou Enunciados Administrativos e, ainda, Recomendações. § 1º A edição

143

Vale dizer que, ao tratar das atribuições do Corregedor Nacional de Justiça, o

art. 8º, X e XI lhe confere a competência de expedir recomendações, provimentos,

instruções, orientações e outros atos normativos destinados ao aperfeiçoamento das

atividades dos órgãos do Poder Judiciário, de seus serviços auxiliares e dos serviços

notariais e de registro, bem como dos demais órgãos correicionais, sobre matéria

relacionada com a competência da Corregedoria Nacional de Justiça. Atribui também à

Corregedoria a competência para propor ao Plenário do CNJ a expedição de

recomendações e a edição de atos regulamentares que assegurem a autonomia, a

transparência e a eficiência do Poder Judiciário e o cumprimento do Estatuto da

Magistratura.

O Conselho Nacional de Justiça também pode endereçar notas técnicas ao

Supremo Tribunal Federal relativas a políticas públicas que afetem o desempenho do

Poder Judiciário, anteprojetos de lei, projetos de lei, e quaisquer outros atos com força

normativa que tramitam no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas ou em

quaisquer outros entes da Administração Pública Direta ou Indireta, quando

caracterizado o interesse do Poder Judiciário271.

O quadro a seguir detalha a quantidade de atos normativos em cada espécie272.

de ato normativo ou regulamento poderá ser proposta por Conselheiro ou resultar de decisão do Plenário

quando apreciar qualquer matéria; ainda, quando o pedido seja considerado improcedente, podendo ser

realizada audiência pública ou consulta pública. § 2º Decidida pelo Plenário a edição do ato normativo ou

da recomendação, a redação do texto respectivo será apreciada em outra sessão plenária, salvo

comprovada urgência. § 3º A edição de ato normativo poderá, a critério do Plenário ou do Relator, ser

precedida de audiência pública ou consulta pública, por prazo não superior a 30 (trinta) dias. § 4º Os

efeitos do ato serão definidos pelo Plenário. § 5º As Resoluções e Enunciados Administrativos terão força

vinculante, após sua publicação no Diário da Justiça eletrônico e no sítio eletrônico do CNJ. § 6º Os

Enunciados serão numerados em ordem crescente de referência, com alíneas, quando necessário, seguidas

de menção aos dispositivos legais e aos julgados em que se fundamentam. § 7º Nos casos em que a

proposta de ato normativo ensejar impacto orçamentário aos órgãos ou Tribunais destinatários, receberá

prévio parecer técnico do órgão competente no âmbito do CNJ.” 271 “Art. 103. O Plenário poderá, de ofício, ou mediante provocação: I - elaborar notas técnicas, de ofício

ou mediante requerimento de agentes de outros Poderes, sobre políticas públicas que afetem o

desempenho do Poder Judiciário, anteprojetos de lei, projetos de lei, e quaisquer outros atos com força

normativa que tramitam no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas ou em quaisquer outros

entes da Administração Pública Direta ou Indireta, quando caracterizado o interesse do Poder Judiciário;

II - elaborar notas técnicas sobre normas ou situações específicas da Administração Pública quando

caracterizado o interesse do Poder Judiciário; III - elaborar notas técnicas endereçadas ao Supremo

Tribunal Federal relativas aos projetos de lei de iniciativa do Poder Judiciário.” 272 Este quadro está atualizado até o dia 01 de março de 2015.

144

Quadro 1

Espécie do ato Ocorrências

Enunciado Administrativo 17

Instrução normativa 76

Nota técnica 14

Orientação 6

Portaria 1008

Portaria Conjunta 19

Provimento 32

Recomendação 55

Resolução 187

Resolução conjunta 5

Total de ocorrências na pesquisa 1419

Total de ocorrências com estrita

pertinência ao objeto de estudo

24

Todos os 1.419 atos normativos do Conselho Nacional de Justiça foram triados,

tendo sido selecionados aqueles que se referem a atos jurisdicionais, mais precisamente,

os que traziam alguma disposição referente às decisões judiciais, seja por versarem

sobre dados que deveriam constar nos atos jurisdicionais, seja por exigirem

procedimento específico, seja por exigirem a juntada de documentos ou colheita de

informações previamente à prolatação dos atos jurisdicionais. Enfim, buscou-se atos

normativos do CNJ que se relacionassem com atos jurisdicionais independentemente de

sua força normativa ou grau de intensidade dessa relação.

A seguir os atos selecionados serão objeto de descrição e análise, seguidas de

síntese conclusiva.

5.2.1.1. Análise descritiva

Aqui será apresentada a descrição e a análise dos atos selecionados, detalhando

por quais peculiaridades entende-se que foi provocada a interface, isto é, nos casos

145

específicos o que se considerou na pesquisa para indicar que há entre esses atos

normativos e a independência jurisdicional uma zona de interface.

Com a finalidade de organização, os casos foram agrupados de acordo com sua

espécie, sendo dispostos na análise descritiva de modo cronológico, do mais antigo ao

mais recente, mas considerando a espécie do ato. Vale mencionar que no apêndice

transcreveu-se o texto do próprio ato normativo, tendo sido selecionados os trechos de

interesse e grifado aquilo que se identificou de maior relevância.

RECOMENDAÇÕES

É o tipo de ato normativo do CNJ com mais exemplares selecionados,

considerando os critérios mencionados anteriormente. No total são dezesseis

recomendações, sendo 15 recomendações do CNJ e 1 recomendação conjunta

(Corregedoria Nacional de Justiça e Corregedor-Geral da Justiça Federal).

A primeira recomendação com pertinência à relação entre o CNJ e a

independência jurisdicional é a Recomendação n. 3 de 30 de maio de 2006273, que trata

da especialização de varas criminais para processar e julgar delitos praticados por

organizações criminosas, aprovada à época da presidência da Ministra Ellen Gracie.

Em seu art. 2º, o Conselho Nacional de Justiça sugere a adoção do conceito de

crime organizado estabelecido na Convenção das Nações Unidas sobre Crime

Organizado Transnacional, de 15 de novembro de 2000 (Convenção de Palermo),

aprovada pelo Decreto Legislativo nº 231, de 29 de maio de 2003 e promulgada pelo

Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004, e ainda especifica este conceito descrevendo

grupo criminoso organizado como aquele “de três ou mais pessoas, existente há algum

tempo e atuando concentradamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações

graves ou enunciadas na Convenção das Nações Unidas sobre Crime Organizado

Transnacional, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício

econômico ou outro benefício material”.

No item b.1 do mesmo artigo, o CNJ sugere que, caso sejam vários os atos

conexos de execução, ou ainda, se não for possível identificar o local ou a data do início

dos atos de execução, seja fixada a competência em qualquer deles; já quando os atos de

execução forem praticados em mais de um Estado, recomenda que seja competente a

vara criminal especializada que primeiro tiver conhecimento dos fatos.

273 A transcrição dos trechos de interesse, com grifos, está disponível no Apêndice I.

146

A Recomendação n. 18 de 04 de novembro de 2008, que recomenda aos

magistrados criminais que evitem a denominação dada às operações policiais em atos

judiciais, foi aprovada à época da presidência do Ministro Gilmar Mendes.

Em um de seus parágrafos preambulares iniciados pela palavra “considerando”,

relaciona o princípio da dignidade da pessoa humana e o dever do magistrado de adotar

linguagem apropriada e evitar excessos, citando o art. 41 da Lei Orgânica da

Magistratura Nacional274. Em seu único dispositivo, recomenda aos magistrados

criminais que evitem a utilização de “denominações de efeito” para designar as

operações policiais em atos judiciais.

A Recomendação n. 20 de 16 de dezembro de 2008 sugere aos tribunais maior

intercâmbio de experiências no âmbito da execução penal, a adoção de processo

eletrônico, a estruturação e a regionalização das varas de execuções penais; e aos juízes,

maior controle dos mandados de prisão. Foi expedida sob a presidência do Ministro

Gilmar Mendes e prevê especificamente em seu art. 2º a recomendação aos juízes para

que façam constar do mandado de prisão seu termo final de validade, vinculado ao

prazo prescricional, e outras cautelas que entenderem necessárias, além de submeterem

a reexame os mandados de prisão já expedidos e ainda pendentes de cumprimento, à

vista dessas cautelas mencionadas.

A Recomendação n. 19 de 16 de dezembro de 2008 foi expedida sob a

presidência do Ministro Gilmar Mendes e sugere que os Tribunais de Justiça Estaduais e

Militares, Regionais Federais e Regionais do Trabalho destinem os recursos recebidos

em transações penais ao Fundo Estadual da Defesa Civil de Santa Catarina para as

vítimas das enchentes. A própria recomendação dispõe que essa destinação seja

realizada por meio de depósitos bancários endereçados ao Fundo Estadual de Defesa

Civil do Estado de Santa Catarina, indicando o número de agência e conta bancária,

além de dispor que, na medida das possibilidades legais, sejam destinadas outras

sanções pecuniárias em matéria civil, penal, militar e trabalhista.

A Recomendação n. 22 de 04 de março de 2009 também foi expedida sob a

presidência do Ministro Gilmar Mendes e recomenda aos tribunais que priorizem e

monitorem permanentemente demandas jurídicas envolvendo conflitos fundiários e

implementem medidas concretas e efetivas objetivando o controle desses andamentos.

274 “Art. 41 - Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido

ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir.”

147

A Recomendação n. 23 de 12 de junho de 2009, expedida sob a presidência do

Ministro Gilmar Mendes, recomenda que os Tribunais de Justiça Estaduais e Militares,

Tribunais Regionais Federais e Tribunais Regionais do Trabalho destinem os recursos

recebidos em transações penais à Defesa Civil do Amazonas, Ceará, Maranhão, Pará e

Piauí para as vítimas das enchentes. Recomenda ainda que essa destinação seja

realizada por meio de depósitos bancários endereçados à Defesa Civil de cada Estado

mencionado, e que, dentro das possibilidades legais, seja feita também com outras

sanções pecuniárias em matéria civil, penal, militar e trabalhista.

A Recomendação n. 24 de 04 de agosto de 2009, expedida sob a presidência do

Ministro Gilmar Mendes, sugere aos juízes e tribunais, no art. 1º, I e II, a realização de

mutirão para instrução e julgamento de processos criminais e sessões de julgamento do

Tribunal do Júri, atribuindo preferência aos processos de réus presos, com atenção

especial ao cumprimento da Meta nº 2 do Planejamento Estratégico do Poder Judiciário

e aos processos afetos à competência do Tribunal do Júri, em seguida, aos processos

com réus soltos e por último, àqueles que possam ser realizadas sem a presença do réu.

A Recomendação n. 30 de 10 de fevereiro de 2010, expedida sob a presidência

do Ministro Gilmar Mendes, recomenda aos magistrados com competência criminal,

diante de processos em que haja bens apreendidos sujeitos à pena de perdimento na

forma da legislação respectiva, que mantenham, desde a data da efetiva apreensão,

rigoroso acompanhamento do estado da coisa ou bem; além disso, que ordenem, em

cada caso e justificadamente, a alienação antecipada da coisa ou bem apreendido para

preservar-lhe o respectivo valor, quando se cuide de coisa ou bem apreendido que pela

ação do tempo ou qualquer outra circunstância, independentemente das providências

normais de preservação:

a) venha a sofrer depreciação natural ou provocada, ou

b) venha a perder valor em si, ou

c) venha a ser depreciada como mercadoria, ou

d) venha a perder a aptidão funcional ou para o uso adequado, ou

e) de qualquer modo venha a perder a equivalência com o valor real na data da

apreensão.

Essa recomendação ainda atribui ao Corregedor Nacional de Justiça a apreciação

das questões decorrentes da aplicação da mesma recomendação, dispondo que a

Corregedoria pode editar instruções complementares a essas recomendações.

148

A Recomendação n. 31 de 30 de março de 2010, expedida sob a presidência do

Ministro Gilmar Mendes, visando a assegurar maior eficiência na solução das demandas

judiciais envolvendo a assistência à saúde, recomenda aos Tribunais de Justiça dos

Estados e aos Tribunais Regionais Federais que orientem os magistrados, através das

suas corregedorias, a:

1. procurarem instruir as ações, tanto quanto possível, com relatórios médicos,

com descrição da doença, inclusive CID, contendo prescrição de medicamentos, com

denominação genérica ou princípio ativo, produtos, órteses, próteses e insumos em

geral, com posologia exata;

2. evitarem autorizar o fornecimento de medicamentos ainda não registrados

pela ANVISA, ou em fase experimental, ressalvadas as exceções expressamente

previstas em lei;

3. ouvirem, quando possível, preferencialmente por meio eletrônico, os gestores,

antes da apreciação de medidas de urgência;

4. verificarem, junto à Comissão Nacional de Ética em Pesquisas (CONEP), se

os requerentes fazem parte de programas de pesquisa experimental dos laboratórios,

caso em que estes devem assumir a continuidade do tratamento;

5. determinarem, no momento da concessão de medida abrangida por política

pública existente, a inscrição do beneficiário nos respectivos programas.

A Recomendação n. 35 de 12 de julho de 2011, expedida sob a presidência do

Ministro Cezar Peluso, dispondo sobre as diretrizes a serem adotadas em atenção aos

pacientes judiciários, recomenda aos Tribunais que, na execução da medida de

segurança, adotem a política antimanicomial em meio aberto, sempre que possível. Traz

também as diretrizes sobre a política antimanicomial, indicando como suas orientações

a mobilização dos diversos segmentos sociais, o compartilhamento de

responsabilidades, e o estabelecimento de estratégias humanizadoras que possibilitem a

efetividade do tratamento da saúde mental e infundam o respeito aos direitos

fundamentais e sociais das pessoas sujeitas às medidas de segurança.

A Recomendação n. 36 de 12 de julho de 2011, expedida sob a presidência do

Ministro Cezar Peluso, recomenda aos Tribunais a adoção de medidas visando a melhor

subsidiar os magistrados e demais operadores do direito, com vistas a assegurar maior

eficiência na solução das demandas judiciais envolvendo a assistência à saúde

suplementar. Nesse sentido, recomenda aos Tribunais de Justiça dos Estados e Tribunais

149

Regionais Federais que orientem os magistrados, através das suas corregedorias, a fim

de que oficiem, quando cabível e possível, à Agência Nacional de Saúde Suplementar

(ANS), à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), ao Conselho Federal de

Medicina (CFM) e ao Conselho Federal de Odontologia (CFO), para se manifestarem

acerca da matéria debatida dentro das atribuições de cada órgão, específica e

respectivamente sobre obrigações regulamentares das operadoras, medicamentos,

materiais, órteses, próteses e tratamentos experimentais.

A Recomendação Conjunta n. 04, expedida pela Corregedoria Nacional de

Justiça em conjunto com o Corregedor-Geral da Justiça Federal e assinada pela Ministra

Eliana Calmon (Corregedora Nacional de Justiça) e por João Otávio de Noronha

(Corregedor-Geral da Justiça Federal), dispondo sobre os elementos mínimos a serem

inseridos nas sentenças ou atos ordinatórios exarados nos processos que versem sobre a

concessão ou revisão de benefícios previdenciários ou assistenciais, recomenda aos

juízes que exerçam jurisdição em matéria previdenciária, tendo como parte o Instituto

Nacional do Seguro Social, inclusive os com competência constitucional delegada, a

inclusão nas sentenças ou nos atos ordinatórios de alguns elementos mínimos que foram

apresentados em anexo à recomendação. Sua justificativa é que tais elementos são

necessários para viabilizar o cumprimento das decisões judiciais na concessão ou

revisão de benefícios previdenciários ou assistenciais de forma mais célere.

A recomendação indica os seguintes elementos mínimos necessários:

I) Para implantação sem pedido prévio na via administrativa:

1. número do CPF;

2. nome da mãe;

3. número do PIS/PASEP;

4. endereço do segurado;

5. nome do segurado;

6. benefício concedido;

7. renda mensal inicial – RMI, fixada judicialmente ou “a calcular pelo INSS”,

quando for o caso;

8. renda mensal atual, fixada judicialmente ou “a calcular pelo INSS”, quando

for o caso;

9. data de início do benefício – DIB;

10. data do início do pagamento administrativo.

150

II) Para implantação com pedido prévio na via administrativa, restabelecimento

e revisão do benefício:

1. nome do segurado;

2. benefício concedido;

3. número do benefício;

4. renda mensal inicial – RMI, fixada judicialmente ou “a calcular pelo INSS”,

quando for o caso;

5. renda mensal atual, fixada judicialmente ou “a calcular pelo INSS”, quando

for o caso;

6. data de início do benefício – DIB;

7. data do início do pagamento administrativo.

III) Informações condicionais:

1. nos casos de conversão de tempo especial em comum ou averbação de tempo

rural ou urbano – o(s) período(s) acolhido(s) judicialmente;

2. se efetuado cálculo do tempo de serviço pelo Poder Judiciário – encaminhar o

cálculo ou tabela de tempo de serviço;

3. nas hipóteses de benefícios concedidos a pessoa incapaz – o nome do

representante legal autorizado a receber o benefício do INSS;

4. nas hipóteses de pensão por morte – identificação do instituidor e dados da

certidão de óbito ou cópia da certidão.

5. nas hipóteses de salário-maternidade – dados da certidão de nascimento ou

cópia da certidão de nascimento.

A Recomendação n. 08 de 7 novembro de 2012 da Corregedoria Nacional de

Justiça, expedida por Francisco Falcão, que dispõe sobre a colocação de criança e

adolescente em família substituta por meio de guarda, recomenda em seu art. 1º aos

juízes que, ao concederem a guarda provisória de criança com idade menor ou igual a 3

anos, seja ela concedida somente a pessoas ou casais previamente habilitados nos

cadastros a que se refere o art. 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente, em consulta

a ser feita pela ordem cronológica da data de habilitação na seguinte ordem: primeiro os

da comarca; esgotados eles, os do Estado e, em não havendo, os do Cadastro Nacional

de Adoção.

151

A Recomendação n. 43 de 20 de agosto de 2013, expedida sob a presidência do

Ministro Joaquim Barbosa, recomenda aos Tribunais Regionais Federais e aos Tribunais

e Juízes dos Estados que promovam a especialização de Varas para processar e julgar

ações que tenham por objeto o direito à saúde pública e orientem as Varas competentes

para priorizar o julgamento dos processos relativos à saúde suplementar.

A Recomendação n. 44 de 26 de novembro de 2013, expedida sob a presidência

do ministro Joaquim Barbosa, dispõe sobre atividades educacionais complementares

para fins de remição da pena pelo estudo e estabelece critérios para a admissão pela

leitura em suas disposições. Assim, recomenda aos tribunais que, para fins de remição

pelo estudo (Lei nº 12.433/2011), sejam valoradas e consideradas as atividades de

caráter complementar, assim entendidas aquelas que ampliam as possibilidades de

educação nas prisões, tais como as de natureza cultural, esportiva, de capacitação

profissional, de saúde, entre outras, conquanto integradas ao projeto político-

pedagógico (PPP) da unidade ou do sistema prisional local e oferecidas por instituição

devidamente autorizada ou conveniada com o poder público para esse fim;

Recomenda ainda aos tribunais que considerem, para fins de remição pelo

estudo, o número de horas correspondente à efetiva participação do apenado nas

atividades educacionais, independentemente de aproveitamento, exceto, neste último

aspecto (aproveitamento), quando o condenado for autorizado a estudar fora do

estabelecimento penal (LEP, art. 129, § 1º), ocasião em que terá de comprovar,

mensalmente, por meio de autoridade educacional competente, tanto a frequência

quanto o aproveitamento escolar.

Além disso, na hipótese de o apenado não estar, circunstancialmente, vinculado

a atividades regulares de ensino no interior do estabelecimento penal e realizar estudos

por conta própria, ou com simples acompanhamento pedagógico, logrando, com isso,

obter aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão do ensino

fundamental – Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos

(ENCCEJA) – ou médio – Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) –, a fim de se

dar plena aplicação ao disposto no § 5º do art. 126 da LEP (Lei n. 7.210/84), sugere

considerar, como base de cálculo para fins de cômputo das horas, visando à remição da

152

pena pelo estudo, 50% da carga horária definida legalmente para cada nível de

ensino275.

A Recomendação n. 47 de 24 de fevereiro de 2014 recomenda aos juízes de

direito e aos Tribunais de Justiça que promovam mutirão para realização anual da

Semana Nacional do Tribunal do Júri, em data a ser definida pelo CNJ em todas as

unidades das comarcas com competência para o Tribunal do Júri, ocasião em que será

realizada ao menos uma sessão do Tribunal do Júri, em cada dia da semana, dando

preferência aos processos que integram o acervo das Metas da ENASP e aos processos

de réus presos.

RESOLUÇÕES

A Resolução n. 71 de 31 de março de 2009, expedida sob a presidência do

Ministro Gilmar Mendes, dispõe sobre regime de plantão judiciário em primeiro e

segundo graus de jurisdição e prevê as matérias sobre as quais se destinam

exclusivamente esses plantões276.

Traz ainda em suas disposições a vedação de reiteração de pedido já apreciado

no órgão judicial de origem ou em plantão anterior, assim como vedação de sua

reconsideração ou reexame e da apreciação de solicitação de prorrogação de autorização

judicial para escuta telefônica, proibindo que sejam apreciados – em plantão judiciário –

pedidos de levantamento de importância em dinheiro ou valores, assim como a

liberação de bens apreendidos.

Sobre essa última vedação, a Resolução ainda especifica que as medidas de

comprovada urgência que tenham por objeto o depósito de importância em dinheiro ou

valores só poderão ser ordenadas por escrito pela autoridade judiciária competente e só

serão executadas ou efetivadas durante o expediente bancário normal por intermédio de

275 Fundamental ou Médio - art. 4º, incisos II, III e seu parágrafo único, todos da Resolução n. 03/2010,

do CNE, isto é, 1600 (mil e seiscentas) horas para os anos finais do Ensino Fundamental e 1200 (mil e

duzentas) horas para o Ensino Médio ou educação profissional técnica de nível médio. 276 a) Pedidos de habeas-corpus e mandados de segurança em que figurar como coator autoridade

submetida à competência jurisdicional do magistrado plantonista; b) medida liminar em dissídio coletivo

de greve; c) comunicações de prisão em flagrante e à apreciação dos pedidos de concessão de liberdade

provisória; d) em caso de justificada urgência, de representação da autoridade policial ou do Ministério

Público visando à decretação de prisão preventiva ou temporária; e) pedidos de busca e apreensão de

pessoas, bens ou valores, desde que objetivamente comprovada a urgência; f) medida cautelar, de

natureza cível ou criminal, que não possa ser realizado no horário normal de expediente ou de caso em

que da demora possa resultar risco de grave prejuízo ou de difícil reparação; g) medidas urgentes, cíveis

ou criminais, da competência dos Juizados Especiais a que se referem as Leis nº 9.099, de 26 de setembro

de 1995 e 10.259, de 12 de julho de 2001, limitadas as hipóteses acima enumeradas.

153

servidor credenciado do juízo ou de outra autoridade por expressa e justificada

delegação do juiz.

A Resolução n. 82 de 09 de junho de 2009, expedida sob a presidência do

Ministro Gilmar Mendes, regulamenta as declarações de suspeição por foro íntimo e

dispõe que o magistrado de primeiro grau fará essa declaração nos autos, mas em ofício

reservado, e que imediatamente deve expor as razões desse ato à Corregedoria local ou

a órgão diverso designado pelo seu Tribunal. Diante da mesma situação, o magistrado

de segundo grau também deve fazer esta afirmação nos autos e, em ofício reservado,

imediatamente deve expor as razões desse ato à Corregedoria Nacional de Justiça.

A Resolução n. 105 de 06 de abril de 2010, expedida sob a presidência do

Ministro Gilmar Mendes, dispõe sobre a documentação dos depoimentos por meio do

sistema audiovisual e realização de interrogatório e inquirição de testemunhas por

videoconferência, e determina, considerando as ocasiões em que a testemunha arrolada

não residir na sede do juízo em que tramita o processo, que se deve dar preferência, em

decorrência do princípio da identidade física do juiz, à expedição da carta precatória

para a inquirição pelo sistema de videoconferência.

Dispõe ainda que o testemunho por videoconferência deve ser prestado na

audiência una realizada no juízo deprecante, cabendo ao juiz deprecante a direção da

inquirição de testemunha realizada por sistema de videoconferência. A resolução indica

uma série de elementos que devem constar da carta precatória277.

Ressalva em seu art. 5º que a regra é o interrogatório presencial, ainda que de

réu preso, salvo decisão devidamente fundamentada, nas hipóteses do art. 185, § 2º,

incisos I, II, III e IV, do Código de Processo Penal.

Esta resolução dispõe que, na hipótese em que o acusado esteja solto e queira

prestar o interrogatório, mas haja relevante dificuldade para seu comparecimento em

juízo, seja por enfermidade ou outra circunstância pessoal, o ato deverá, se possível,

para fins de preservação da identidade física do juiz, ser realizado pelo sistema de

videoconferência, mediante a expedição de carta precatória. Salvo neste caso, não deve

ser expedida carta precatória para o interrogatório do acusado pelo juízo deprecado.

277 “Art. 3º, §3º: I - A data, hora e local de realização da audiência una no juízo deprecante; II - A

solicitação para que a testemunha seja ouvida durante a audiência una realizada no juízo deprecante; III -

A ressalva de que, não sendo possível o cumprimento da carta precatória pelo sistema de

videoconferência, que o juiz deprecado proceda à inquirição da testemunha em data anterior à designada

para a realização, no juízo deprecante, da audiência una.”

154

Quanto aos direitos assegurados aos acusados, a resolução dispõe que o

interrogatório por videoconferência deverá ser prestado na audiência una realizada no

juízo deprecante, adotado, no que couber, o disposto nesta mesma resolução para a

inquirição de testemunha, asseguradas ao acusado uma série de garantias, tais como o

direito de assistir, pelo sistema de videoconferência, à audiência una realizada no juízo

deprecante; o direito de presença de seu advogado ou de defensor na sala onde for

prestado o seu interrogatório, assim como na sala onde for realizada a audiência una de

instrução e julgamento; e ainda, o direito de entrevista prévia e reservada com o seu

defensor, o que compreende o acesso a canais telefônicos reservados para comunicação

entre o defensor ou advogado que estejam no presídio ou no local do interrogatório, e

compreende também a presença do defensor ou advogado na sala de audiência do

fórum.

A Resolução n. 113 de 20 de abril de 2010, expedida sob a presidência do

ministro Gilmar Mendes, dispõe sobre o procedimento relativo à execução de pena

privativa de liberdade e de medida de segurança. Em seu primeiro artigo, determina que

a sentença penal condenatória será executada não apenas nos termos da Lei 7.210, de 11

de julho de 1984 e a lei de organização judiciária local, mas também nos termos desta

resolução, exigindo que componham o processo de execução, além da guia, no que

couber, diversas peças e informações, tais como: qualificação completa do executado,

interrogatório do executado na polícia e em juízo, cópias da denúncia, da sentença, dos

voto(s) e acórdão(s), além de seus respectivos termos de publicação, contendo, se for o

caso, a menção expressa ao deferimento de detração que importe determinação do

regime de cumprimento de pena mais benéfico do que seria não fosse a detração.

Em seu art. 3º, a resolução exige que o juiz competente para a execução da pena

ordene a formação do Processo de Execução Penal (PEP), a partir das peças exigidas no

dispositivo anterior. Especifica que, para cada réu condenado, deverá ser formado um

Processo de Execução Penal, individual e indivisível, reunindo todas as condenações

que lhe forem impostas, inclusive aquelas que vierem a ocorrer no curso da execução.

O art. 16 exige que seja formado esse processo de execução também para as

medidas de segurança. Outra exigência consta do art. 17: que o juiz competente para a

execução da medida de segurança, sempre que possível, busque implementar políticas

antimanicomiais, conforme a sistemática da Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001.

155

A Resolução n. 165 de 16 de novembro de 2012, expedida sob a presidência do

Ministro Carlos Ayres Britto, dispõe sobre normas gerais para o atendimento, pelo

Poder Judiciário, ao adolescente em conflito com a lei no âmbito na internação

provisória e do cumprimento das medidas socioeducativas em suas disposições. Mais

precisamente, em seu art. 7º dispõe que a guia de internação provisória será instruída,

obrigatoriamente, com os seguintes documentos, além de outros considerados

pertinentes pela autoridade judicial: documentos de caráter pessoal do adolescente

existentes no processo de conhecimento, especialmente os que comprovem sua idade;

cópias da a) representação e/ou do pedido de internação provisória; b) certidão de

antecedentes e c) decisão que determinou a internação.

À semelhança do art. 7º, seu art. 9º dispõe que, não tendo sido decretada a

internação provisória no curso do processo de conhecimento, prolatada a sentença,

deverá ser expedida a guia de execução provisória de medida socioeducativa de

internação, semiliberdade ou em meio aberto, que deverá ser instruída,

obrigatoriamente, com os seguintes documentos, além de outros considerados

pertinentes pela autoridade judicial: documentos de caráter pessoal do adolescente

existentes no processo de conhecimento, especialmente os que comprovem sua idade; e

cópias a) do termo que propõe a remissão como forma de suspensão do processo

cumulada com medida socioeducativa em meio aberto; b) da representação; c) da

certidão de antecedentes; d) da sentença que aplicou a respectiva medida socioeducativa

ou da sentença que homologou a remissão cumulada com medida socioeducativa em

meio aberto e, por fim, e) de estudos técnicos realizados durante a fase de

conhecimento.

A Resolução n. 175 de 14 de maio de 2013, expedida sob a presidência do

Ministro Joaquim Barbosa, dispõe sobre a habilitação, celebração de casamento civil, ou

de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo. Por meio de

seus dois artigos, veda às autoridades competentes a recusa de habilitação, de

celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre

pessoas de mesmo sexo, prevendo ainda imediata comunicação ao respectivo juiz

corregedor para as providências cabíveis.

156

PROVIMENTOS

O Provimento n. 26 de 12 de dezembro de 2012, expedido pela corregedoria à

época do Corregedor Nacional de Justiça e Ministro Francisco Falcão, dispõe sobre o

“Projeto Pai Presente – 2012”. Em seu artigo 8º, determina que, nos casos em que o

suposto pai não atenda à notificação judicial, ou negue a paternidade que lhe é atribuída,

o juiz deve, a pedido da mãe ou do interessado capaz, remeter o expediente para o

representante do Ministério Público ou da Defensoria Pública ou para serviço de

assistência judiciária, a fim de que seja proposta ação de investigação de paternidade,

caso os elementos disponíveis sejam suficientes.

O Provimento n. 32 de 24 de junho de 2013, expedido pela corregedoria à época

do Corregedor Nacional de Justiça e Ministro Francisco Falcão, dispõe sobre as

audiências concentradas nas Varas da Infância e Juventude. Prevê que o juiz da infância

e juventude deve realizar a cada semestre (preferencialmente em abril e outubro) as

“audiências concentradas”, que não podem prejudicar o andamento regular, permanente

e prioritário dos processos sob sua condução e que, sempre que possível, devem ser

realizadas nas dependências das entidades de acolhimento, com a presença dos atores do

sistema de garantia dos direitos da criança e do adolescente, para reavaliação de cada

uma das medidas protetivas de acolhimento, diante de seu caráter excepcional e

provisório, com a subsequente confecção de atas individualizadas para juntada em cada

um dos processos.

No art. 1º, §1º, dispõe ainda que, nas varas de grandes comarcas, com excessivo

número de acolhidos, fica reservado ao magistrado a possibilidade da seleção dos

processos mais viáveis para audiência, desde que mantenha absoluto controle da

situação dos demais.

No parágrafo seguinte do artigo, o provimento sugere o roteiro para a realização

dessas audiências concentradas. Transcreve-se a seguir algumas regras para o roteiro

sugerido por meio deste provimento: designação das audiências e intimação do

Ministério Público, Defensoria Pública, e representantes dos seguintes órgãos, onde

houver, para fins de envolvimento único e tomada de medidas efetivas que visem

abreviar o período de institucionalização: a) Equipe interdisciplinar atuante perante a

vara da infância e juventude; b) Conselho Tutelar; c) Entidade de acolhimento e sua

equipe interdisciplinar; d) Secretaria Municipal de Assistência Social; e) Secretaria

Municipal de Saúde; f) Secretaria Municipal de Educação; g) Secretaria Municipal de

157

Trabalho/Emprego; h) Secretaria Municipal de Habitação e i) Escrivão(ã) da própria

Vara278.

O art. 2º sugere que, sem prejuízo do uso deste roteiro na condução rotineira do

processo antes e depois da audiência, seja observada uma série de quesitos, tais como:

Há nos autos foto(s) da criança ou do adolescente, de preferência na primeira página

após a capa? O infante está matriculado na rede oficial de ensino? O infante, se o caso,

recebeu atendimento médico necessário aos eventuais problemas de saúde que possua?

O infante recebe visita dos familiares? Com qual frequência? O acolhido e/ou seus pais

ou responsáveis foram encaminhados a programas oficiais ou comunitários de

orientação, apoio e promoção social com vistas a futura reintegração familiar? 279

5.2.1.2. Síntese conclusiva

A partir dos atos normativos encontrados na pesquisa exploratória, foram

selecionados aqueles que se referem a decisões judiciais, seja por versarem sobre dados

que deveriam constar das decisões judiciais, seja por exigirem procedimento específico,

seja ainda por exigirem a juntada de documentos ou a colheita de informações

previamente à prolatação da decisão judicial. Dessa maneira, relacionam-se com a

independência jurisdicional, prevendo algumas diretrizes para a decisão; contudo, não

foi constatada interferência na independência jurisdicional no sentido que se emprega

aqui, pois, embora se observe a criação de uma zona de interface por via abstrata e

prévia à decisão, o teor dos atos normativos encontrados não conflita com a

independência jurisdicional em uma relação de sobreposição ou de transformação. O

que se constatou foi a busca de padronização de alguns elementos e procedimentos, no

exercício da competência do Conselho Nacional de Justiça.

Aqui não se faz juízo de valor sobre a adequação da decisão do CNJ em criar

este ou aquele ato normativo. A intenção é frisar que há relacionamento entre a

atividade do CNJ e os atos normativos, o que por si já é um produto desta pesquisa.

Uma vez encontrados esses atos, o que se avalia é sua capacidade de direcionar a

decisão jurisdicional.

278 O roteiro integral está disponível no Apêndice I. 279 O roteiro integral está disponível no Apêndice I.

158

Alguns atos se revelaram mais incisivos, criando condições para que o juiz

julgue determinada matéria. Em especial, aqui vale destacar a Recomendação n. 31, que

em um de seus itens recomenda aos juízes que evitem “autorizar o fornecimento de

medicamentos ainda não registrados pela ANVISA, ou em fase experimental,

ressalvadas as exceções expressamente previstas em lei;”.

Outros atos, embora se relacionem com a independência jurisdicional, revelam-

se pouco capazes de direcionar a decisão jurisdicional, como, por exemplo, a Resolução

n. 175, que veda às autoridades competentes a recusa de habilitação, de celebração de

casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de

mesmo sexo. Embora não seja dirigida à decisão jurisdicional diretamente, exige a

imediata comunicação ao respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis,

providências essas que podem permear a questão da jurisdicionalidade.

Mas não é apenas diante de atos normativos que se cria a zona de interface entre

a atividade do Conselho Nacional de Justiça e a independência jurisdicional. A seguir

pretende-se demonstrar como se constitui essa relação diante de seus atos disciplinares

no mais amplo sentido.

5.2.2. Criada por via concreta e posterior diante de atos jurisdicionais

Reiterando a explicação apresentada na introdução deste capítulo sobre a

metodologia para desenvolvimento da pesquisa empírica, vale neste momento frisar que

as decisões encontradas são provenientes de pesquisa pelo sistema de busca por palavras

da seção de jurisprudência do site do Conselho Nacional de Justiça. Foram encontradas

1.331 ocorrências com os parâmetros de busca mencionados na introdução280; após a

triagem, eliminadas as duplicidades, foram selecionados 83 exemplares com pertinência

ao objeto de estudo, isto é, que apresentam pontos de contato entre as atividades do

Conselho Nacional de Justiça e a independência jurisdicional281.

Diante da busca e da filtragem tão específica, manteve-se apenas os documentos

com estrita pertinência ao tema; portanto, todos os documentos selecionados ilustram

uma zona de relacionamento entre a atividade do CNJ e a independência jurisdicional;

280 Para facilitar a leitura, optou-se por repetir os parâmetros de busca. São eles: “independência”;

“decisão teratológica”; “excesso de linguagem”; “impropriedade” “imparcialidade”; “livre

convencimento”; “livre convicção”; “suspeição”; “impedimento”, “celeridade”, "erro E procedimento",

"negligência", “decisão superior", "incompetência", "corrupção", “má-fé” e “dolo”. 281 Esta pesquisa está atualizada até o dia 01 de março de 2015.

159

por se referirem a atos do CNJ que punem, processam ou investigam juízes por

determinadas atitudes na atividade jurisdicional, ou ainda que interferem nos efeitos da

decisão judicial.

Essa zona de interface pode se estabelecer por meio de qualquer tipo de

processo, sendo nesta triagem encontrados exemplares nas seguintes categorias:

processo administrativo disciplinar, processo de controle administrativo, revisão

disciplinar, reclamação administrativa, recurso administrativo, sindicância e pedido de

providências.

Embora não se pretenda analisar os efeitos de cada ato do CNJ diante de cada

caso concreto, para conferir mais fluidez à leitura, vale reiterar os tipos de processos de

competência do Conselho Nacional de Justiça segundo seu regimento interno. O

terceiro capítulo do regimento possui o título “Dos diversos tipos de processos” e indica

os seguintes tipos processuais: inspeção; correição; sindicância; reclamação disciplinar;

processo administrativo disciplinar; representação por excesso de prazo; avocação;

revisão disciplinar; consulta; procedimento de controle administrativo; pedido de

providências; reclamação para garantia das decisões e recursos administrativos.

A seguir é feita uma breve descrição de cada um desses tipos de processos sob a

competência do CNJ.

INSPEÇÃO

A Corregedoria Nacional de Justiça poderá realizar inspeções, rotineiras ou a

qualquer tempo, para apuração de fatos relacionados ao conhecimento e à verificação do

funcionamento dos serviços judiciais e auxiliares, das serventias e dos órgãos

prestadores de serviços notariais e de registro, havendo ou não evidências de

irregularidades282.

CORREIÇÃO

Também à disposição da Corregedoria Nacional de Justiça, a correição poderá

ser realizada para apuração de determinados fatos relacionados a deficiências graves dos

serviços judiciais e auxiliares, das serventias e dos órgãos prestadores de serviços

282 RICNJ, art. 48.

160

notariais e de registro, sem prejuízo da atuação disciplinar e correicional dos

Tribunais283.

SINDICÂNCIA

A sindicância é o procedimento investigativo sumário, levado a efeito pela

Corregedoria Nacional de Justiça, destinado a apurar irregularidades atribuídas a

magistrados ou servidores nos serviços judiciais e auxiliares, ou a quaisquer

serventuários, nas serventias e nos órgãos prestadores de serviços notariais e de registro,

cuja apreciação não se deva dar por inspeção ou correição284.

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR

A reclamação disciplinar deve ser dirigida ao Corregedor Nacional de Justiça em

requerimento assinado contendo a descrição do fato, a identificação do reclamado e as

provas da infração, podendo ser proposta contra membros do Poder Judiciário e contra

titulares de seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais

e de registro285.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR

O processo administrativo disciplinar é o instrumento destinado a apurar

responsabilidades de magistrados e de titulares de serviços notariais e de registro por

infração disciplinar praticada no exercício de suas atribuições286.

REPRESENTAÇÃO POR EXCESSO DE PRAZO

A representação contra magistrado por excesso injustificado de prazo para a

prática de ato de sua competência jurisdicional ou administrativa poderá ser formulada

por qualquer pessoa com interesse legítimo, pelo Ministério Público, pelos Presidentes

de Tribunais ou, de ofício, pelos Conselheiros, devendo ser instruída com os

documentos necessários à sua demonstração e dirigida ao Corregedor Nacional de

Justiça287.

283 RICNJ, art. 54. 284 RICNJ, art. 60. 285 RICNJ, art. 67. 286 RICNJ, art. 73. 287 RICNJ, art. 78.

161

AVOCAÇÃO

A avocação de processo de natureza disciplinar em curso contra membros do

Poder Judiciário ou de seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de

serviços notariais e de registro dar-se-á, a qualquer tempo, mediante representação

fundamentada de membro do CNJ, do Procurador-Geral da República, do Presidente do

Conselho Federal da OAB ou de entidade nacional da magistratura288.

REVISÃO DISCIPLINAR

Poderão ser revistos, de ofício ou mediante provocação de qualquer interessado,

os processos disciplinares de juízes e membros de Tribunais julgados há menos de um

ano do pedido de revisão, desde que apresentada petição escrita, devidamente

fundamentada e com toda a documentação pertinente e diante de:

I – decisão contrária a texto expresso da lei, à evidência dos autos ou a ato

normativo do CNJ;

II – decisão que se funda em depoimentos, exames ou documentos

comprovadamente falsos;

III – novos fatos ou novas provas ou circunstâncias que determinem ou

autorizem modificação da decisão proferida pelo órgão de origem, após a decisão289.

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO

O controle dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder

Judiciário deve ser exercido pelo Plenário do CNJ, de ofício ou mediante provocação,

sempre que restarem contrariados os princípios estabelecidos no art. 37 da Constituição,

especialmente os de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência,

sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União e dos Tribunais de Contas

dos Estados290.

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS

As propostas e sugestões tendentes à melhoria da eficiência e eficácia do Poder

Judiciário, bem como todo e qualquer expediente que não tenha classificação específica

nem seja acessório ou incidente, serão incluídas na classe de pedido de providências,

288 RICNJ, art. 79. 289 RICNJ, arts. 82 a 84. 290 RICNJ, Art. 91.

162

cabendo o seu conhecimento e julgamento ao Plenário do CNJ ou ao Corregedor

Nacional de Justiça, conforme a respectiva competência291.

RECLAMAÇÃO PARA GARANTIA DAS DECISÕES

A reclamação para garantia das decisões ou atos normativos poderá ser

instaurada de ofício ou mediante provocação, sendo submetida ao Presidente do CNJ.

Seu requerimento deverá ser instruído com cópia da decisão atacada e referência

expressa ao ato ou decisão do Plenário cuja autoridade se deva preservar, sob pena de

indeferimento liminar292.

RECURSOS ADMINISTRATIVOS

A autoridade judiciária ou o interessado que se considerar prejudicado por

decisão do Presidente, do Corregedor Nacional de Justiça ou do Relator poderá, no

prazo de cinco (05) dias, contados da sua intimação, interpor recurso administrativo ao

Plenário do CNJ.

São recorríveis apenas as decisões monocráticas terminativas de que

manifestamente resultar ou puder resultar restrição de direito ou prerrogativa,

determinação de conduta ou anulação de ato ou decisão, nos casos de processo

disciplinar, reclamação disciplinar, representação por excesso de prazo, procedimento

de controle administrativo ou pedido de providências293.

Apresentados os tipos de processos no Conselho Nacional de Justiça, a seguir

serão submetidos a análise descritiva e síntese conclusiva os casos analisados e

selecionados.

5.2.2.1. Análise descritiva

Aqui será apresentada a descrição da análise, ou seja, por quais peculiaridades

entende-se que foi provocada a interface. Será apresentado nos casos específicos o que

se considerou na pesquisa para indicar que há, entre essas decisões do Conselho

Nacional de Justiça e a independência jurisdicional, uma zona de interface.

291 RICNJ, art. 98. 292 RICNJ, art. 101. 293 RICNJ, art. 115.

163

Diante das decisões que se revelaram na pesquisa como exemplares da zona de

interface entre a atividade do CNJ e a independência jurisdicional criada por via

concreta diante dos atos jurisdicionais, isto é, decisões do CNJ que enfrentaram a

conduta do julgador diante daquilo que ele dispôs na decisão jurisdicional, foi possível

agrupá-las de acordo com o motivo central adotado pelo CNJ. Assim, tem-se zona de

interface entre a atividade do CNJ e a independência jurisdicional criada por via

concreta diante da decisão judicial: a) com utilização de excesso de linguagem ou

impropriedade; b) com parcialidade; c) com negligência; e d) com indícios de

corrupção294.

Vale mencionar que no apêndice transcreveu-se o texto de cada decisão

selecionada do CNJ, destacados os trechos de interesse e grifado aquilo que se

identificou de maior relevância.

a. Com utilização de excesso de linguagem ou impropriedades

A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar n. 35 de 14 de

março de 1979), ao tratar das penalidades, dispõe em seu art. 40 que a atividade

censória de Tribunais e Conselhos é exercida com o resguardo devido à dignidade e à

independência do magistrado. Já no artigo seguinte, art. 41, apresenta as exceções a tal

regra, dispondo que “[s]alvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem o

magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo

teor das decisões que proferir”.

Na pesquisa realizada foram encontrados alguns exemplares em que se

questionava a impropriedade ou o excesso de linguagem; entretanto, em apenas uma

ocorrência foi identificada a punição do julgador. Frisa-se que aqui não se pretende

destacar apenas aqueles processos em que ocorreu a punição, pois o que se busca é esta

zona de interface, que, pelo simples questionamento pode revelar a posição do Conselho

diante da matéria.

294 Vale mencionar que como motivo central foi considerada a motivação determinante para a atuação do

CNJ, mas outras possibilidades de atuação ou até responsabilização existem. A título de exemplo, cita-se

aqui a observância da decisão dotada de eficácia vinculante, que em caso de oposição infundada pode

gerar a obrigação de responsabilidade administrativa e civil. Sobre o tema vide: RAMOS, Elival da Silva.

Controle de constitucionalidade no Brasil: perspectivas de evolução. São Paulo, Saraiva, 2010, p. 293-

294; e MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. 3. ed. São

Paulo: Saraiva, 2004, p. 451.

164

Cabe mencionar o Recurso Administrativo diante da Reclamação Disciplinar n.

0000623-40.2013.2.00.0000, cujo relator foi o Corregedor Nacional de Justiça à época,

o Ministro Francisco Falcão, e que foi julgado em 02.12.2013. A referida reclamação

disciplinar versou contra ato de magistrada consistente em expressar conceitos sobre a

conduta da parte ao requerer o benefício da assistência judiciária gratuita, perguntando

se ela era advogado. O Conselho entendeu que, embora a conduta tenha sido

equivocada, a expressão de conceitos acerca das pretensões que defende em juízo não

ensejaria sanção disciplinar ao magistrado.

Um caso relevante sobre o tema, justamente por ter trazido em sua ementa

algumas características do que seria o excesso de linguagem, foi constatado no processo

de Revisão Disciplinar n. 0001235-51.2008.2.00.0000, sob a relatoria do Conselheiro

Jorge Maurique, julgado em 31.03.2009 na 81ª sessão do Conselho Nacional de Justiça.

O caso abordado nesse processo envolvia uma discussão sobre a autenticidade

documental no bojo de um incidente de falsidade. O Conselho entendeu que a questão

possuía nítido caráter jurisdicional, o que por si só conflitaria com a competência do

Conselho.

O dever de abstenção de opinião diz respeito à manifestação exarada

extraprocessualmente, perante os meios de comunicação (TV, jornais, etc.), sendo

plenamente possível a crítica do magistrado nos autos de processo pendente de seu

julgamento, por justamente ser essa atividade inerente ao exercício da judicatura, que

nada mais é do que a própria análise de mérito, questão tipicamente jurisdicional e fora

da competência do CNJ.

A ementa do julgado dispõe, no entanto, que, por excesso de linguagem, no

âmbito administrativo-disciplinar da magistratura, entende-se o juízo ofensivo, lançado

pelo magistrado contra as partes ou seus procuradores. Já em âmbito jurisdicional, em

especial no processo da competência do Tribunal do Júri, entende-se por excesso de

linguagem “a exagerada incursão do juiz sobre as provas dos autos, capaz de influir no

ânimo do Conselho de Sentença (art. 413, § 1º, do CPP)295”.

Outro elemento que se extrai de decisões do CNJ é a relação desenvolvida entre

o alegado excesso de linguagem e a realidade dos fatos. Sobre esse ponto, vale

mencionar a Revisão Disciplinar n. 0001727-43.2008.2.00.0000, relator Jorge

295 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Revisão Disciplinar n. 0001235-51.2008.2.00.0000.

Rel. Jorge Maurique. 81ª Sessão. J. em 31.03.2009. Ementa.

165

Maurique, sendo o relator para o acórdão o Conselheiro Rui Stoco. A revisão foi

julgada em 31 de março de 2009, 81ª sessão.

Neste caso, o Conselho entendeu que não há excesso de linguagem se as

afirmações feitas no despacho judicial correspondem à realidade dos fatos. No caso

concreto, o magistrado afirmou em audiência que o argumento lançado pelo advogado

era falacioso. Segundo o Conselho, no caso foi comprovado que de fato o argumento do

advogado não correspondia à verdade; assim, na ementa o Conselho dispôs que “se o

magistrado afirma fato verdadeiro na sua decisão, contrapondo afirmação do causídico

que não corresponde à realidade fática, não estará excedendo em sua linguagem”, não se

vislumbrando nisso qualquer excesso ou ofensa296.

Um caso curioso que foi encontrado nesta pesquisa se refere ao Processo

Administrativo Disciplinar n. 0001923-76.2009.2.00.0000, sob a relatoria do

Conselheiro Leomar Barros, julgado em 29 de junho de 2010 na 108ª sessão do

Conselho Nacional de Justiça.

Neste processo foi alegado que o magistrado haveria adjetivado de ridícula a

jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e por isso teria sido caracterizado o

excesso de linguagem, desacato, irreverência ou desrespeito à jurisprudência da Corte

Superior. Outra alegação trazida neste caso foi que o magistrado teria agarrado e

empurrado uma procuradora do Estado no exercício de suas funções.

Todas as alegações foram consideradas sem provas suficientes nos autos do

processo administrativo disciplinar, tendo o CNJ considerado apenas uma das

alegações: a de que o magistrado teria afirmado que “alguns defensores, que deixavam

de interpor o recurso legalmente previsto, para depois impetrarem habeas corpus, o fazia

lembrar os antigos rábulas velhacos”. Ainda assim, o Conselho entendeu que essa

afirmação não teria o “propósito inequívoco de ofender”297, decidindo por unanimidade

pela improcedência do pedido, nos termos do voto do relator.

O único caso encontrado298 em que o magistrado foi punido por excesso de

linguagem é o Processo Administrativo Disciplinar n. 0005370-72.2009.2.00.0000,

296 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Revisão Disciplinar n. 0001727-43.2008.2.00.0000. Rel.

Jorge Maurique. Rel. p/ o acórdão Rui Stoco. 81ª Sessão. J. em 31.03.2009. Ementa. 297 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. PDA n. 0001923-76.2009.2.00.0000. Rel. Leomar Barros.

108ª Sessão. J. em 29.06.2010. Ementa. 298 Encontrado na pesquisa no site oficial do CNJ, realizada por ocasião da elaboração deste capítulo e

atualizada até março de 2015. Vide metodologia na introdução deste capítulo.

166

julgado em 09 de novembro de 2010 sob a relatoria do Conselheiro Marcelo Neves, na

116ª Sessão do Conselho Nacional de Justiça.

Neste processo, foi aplicada a punição por excesso de linguagem diante de

expressões discriminatórias contra o gênero feminino em sentença prolatada pelo então

juiz de Sete Lagoas (Minas Gerais). Na ocasião, além do que dispôs na sentença o

magistrado, seu pronunciamento teve publicidade ampla pelos meios regulares de

comunicação e por seu site pessoal na internet, ampliando ainda mais a gravidade de sua

conduta, que foi considerada de alta reprovabilidade por ser discriminatória e análoga à

do crime de racismo. Além disso, constatou-se conduta persistente e reiterada na

divulgação dessa decisão judicial, insistindo o magistrado na suposta correção de sua

conduta.

O Conselho Nacional de Justiça decidiu, por maioria, pela aplicação da pena

de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao magistrado, nos termos do voto

do Relator. Restaram vencidos os Conselheiros Ministra Eliana Calmon e Ministros

Ives Gandra, Milton Nobre, Leomar Barros Amorim, Nelson Tomaz Braga e

Paulo Tamburini, que votaram pela aplicação da pena de censura.

Diante das peculiaridades do caso, apresenta-se a seguir trechos da decisão

judicial prolatada pelo magistrado de Sete Lagoas, que também cuidou de sua ampla

divulgação por meio de entrevistas e pelo próprio sítio pessoal na rede mundial de

computadores:

DECISÃO. Autos nº 222.942-8/06 (“Lei Maria da Penha”) Vistos,

etc…[...] Esta “Lei Maria da Penha” — como posta ou editada — é,

portanto, de uma heresia manifesta. Herética porque é antiética;

herética porque fere a lógica de Deus; herética porque é

inconstitucional e por tudo isso flagrantemente injusta. Ora! A

desgraça humana começou no Éden: por causa da mulher — todos nós

sabemos — mas também em virtude da ingenuidade, da tolice e da

fragilidade emocional do homem. Deus então, irado, vaticinou, para

ambos. E para a mulher, disse: “(…) o teu desejo será para o teu

marido e ele te dominará (…)” Já estalei diz que aos homens não é

dado o direito de “controlar as ações (e) comportamentos (…)” de sua

mulher (art. 7º, inciso II). Ora! Que o “dominar” não seja um “você

deixa?”, mas ao menos um “o que você acha?”. Isto porque o que

parece ser não é o que efetivamente é, não parecia ser. Por causa da

maldade do “bicho” Homem, a Verdade foi então por ele interpretada

segundo as suas maldades e sobreveio o caos, culminando — na

relação entre homem e mulher, que domina o mundo — nesta

preconceituosa lei.

Mas à parte dela, e como inclusive já ressaltado, o direito natural, e

próprio em cada um destes seres, nos conduz à conclusão bem diversa.

Por isso — e na esteira destes raciocínios — dou-me o direito de ir

167

mais longe, e em definitivo! O mundo é masculino! A idéia que temos

de Deus é masculina! Jesus foi Homem! Á própria Maria —

inobstante a sua santidade, o respeito ao seu sofrimento (que inclusive

a credenciou como “advogada” nossa diante do Tribunal Divino) —

Jesus ainda assim a advertiu, para que também as coisas fossem postas

cada uma em seu devido lugar: “que tenho contigo, mulher!?”. E

certamente por isto a mulher guarda em seus arquétipos inconscientes

sua disposição com o homem tolo e emocionalmente frágil, porque foi

muito também por isso que tudo isso começou.

E ainda continua o magistrado em sua decisão jurisdicional:

A mulher moderna — dita independente, que nem de pai para seus

filhos precisa mais, a não ser dos espermatozóides — assim só o é

porque se frustrou como mulher, como ser feminino. Tanto isto é

verdade — respeitosamente — que aquela que encontrar o homem de

sua vida, aquele que a complete por inteiro, que a satisfaça como ser e

principalmente como ser sensual, esta mulher tenderá a abrir mão de

tudo (ou de muito), no sentido dessa “igualdade” que hipocritamente e

demagogicamente se está a lhe conferir. Isto porque a mulher quer ser

amada. Só isso. Nada mais. Só que “só isso” não é nada fácil para as

exigências masculinas299.

Nota-se que o único caso encontrado em que o magistrado foi punido pelo

Conselho Nacional de Justiça por excesso de linguagem revela uma conduta extrema,

discriminatória e com divulgação excessiva, ao passo que as decisões que não previram

punição por excesso de linguagem revelaram por vezes ausência de provas e

enxergaram relação entre o que foi mencionado pelo magistrado e a verdade, o que

afastou a punição nos casos mencionados.

b. Parciais

Outra subcategoria em que se estabelece uma zona de interface entre a atividade

do CNJ e a independência jurisdicional, criada por via concreta e posterior à atuação

jurisdicional (justamente porque o CNJ enfrenta nesses processos questões provenientes

de decisões jurisdicionais), refere-se à existência de parcialidade na decisão judicial.

Nesta subcategoria foi incluído o maior número de ocorrências desta pesquisa.

299 E por fim, decidiu o magistrado nesses autos: “[E]m virtude de tudo isso, e por considerar, afinal, e em

resumo, discriminatório — e, portanto, inconstitucionais (na medida em que ferem o princípio da

isonomia, colidindo ainda frontalmente com o disposto no § 8º do art. 226 da Constituição Federal) —

nego vigência do art. 1º ao art. 9º; art. 10, parágrafo único; art. 11, inciso v; art. 12, inciso III; arts 13 e

14; arts. 18 e 19; do art. 22 ao art. 24 e do art. 30 ao art. 40, todos da lei nº 11.340/06, conhecida como

‘lei maria da penha’. [...]”

168

Na Reclamação Disciplinar n. 0005930-09.2012.2.00.0000, julgada em 20 de

maio de 2014 sob a relatoria da Conselheira Ana Maria Duarte Amarante Brito, o

Conselho Nacional de Justiça analisou um caso em que se entendeu que o magistrado

havia utilizado a máquina judicial para atender interesse privado. O Conselho concluiu

que houve desvio da finalidade da função judicante, ao buscar designação para oficiar

em Comarca diversa de sua atuação, retendo processo que se referia à área rural em

litígio, de maneira proposital, no intuito de satisfazer interesse próprio de caráter

patrimonial, valendo-se ainda do cargo para obtenção de informações privilegiadas,

além de utilizar aparato policial para ingressar em fazenda, destruir guarita e torre de

medição de vento.

Nota-se aqui que na própria ementa, além da conduta parcial, frisa-se o dolo ao

tratar a conduta como “proposital”300 sob o fundamento legal de infringência ao art. 35,

I e VIII da Lei Orgânica da Magistratura Nacional a Lei Complementar n. 35 de 14 de

março de 1979. O artigo mencionado dispõe que são deveres do magistrado: “I -

Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições

legais e os atos de ofício; VIII - manter conduta irrepreensível na vida pública e

particular.”

No Processo Administrativo Disciplinar n. 0001460-03.2010.2.00.0000, julgado

em 29 de março de 2011 na 123ª sessão do Conselho Nacional de Justiça, sob a relatoria

do Conselheiro Milton Nobre, foi enfrentado um caso em que o magistrado havia

prolatado diversas decisões judiciais envolvendo a liberação de vultosas quantias, sem

garantias consistentes, em desfavor de partes notoriamente solventes.

Na ocasião, o Conselho entendeu que a reiterada violação de deveres funcionais,

por meio da prolação de decisões teratológicas, revelava a existência de dolo na atuação

do magistrado, diante da deliberada intenção de beneficiar um dos polos da relação

processual.

A decisão foi identificada como teratológica por ser desprovida de qualquer

razão jurídica sustentável, situação que foi considerada exorbitante dos limites da

regular atuação judicante e exigindo a responsabilização disciplinar.

Na ementa deste caso, o Conselho dispôs que o princípio da independência

judicial não pode constituir manto de proteção absoluta do magistrado, sendo incapaz de

300 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Reclamação Disciplinar n. 0005930-09.2012.2.00.0000. Rel.

Cons. Ana Maria Duarte Amarante Brito. J. em 20 de maio de 2014.

169

afastar qualquer possibilidade de punição diante das decisões que profere, indicando

ainda que a independência judicial “tampouco funciona como a cartola de mágico, da

qual o juiz pode retirar, conforme seu exclusivo desejo, arbitrariamente, ilusões de

direito. Ele é uma garantia do cidadão para assegurar julgamentos livres de pressões,

mas de acordo com a lei e o direito”301.

Ao final o Conselho decidiu, por unanimidade, pela aplicação da pena de

aposentadoria compulsória ao magistrado, nos termos do voto do relator, apoiando-se na

Lei Orgânica da Magistratura Nacional e utilizando, além do art. 35, I (já mencionado

acima), o art. 56, I e II, que dispõe:

Art. 56 - O Conselho Nacional da Magistratura poderá determinar a

aposentadoria, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço,

do magistrado: I - manifestadamente negligente no cumprimento dos deveres do

cargo; II - de procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o

decoro de suas funções;

Outros três exemplares em que se fixou a expressão “decisão teratológica” foram

selecionados para descrição a seguir. Optou-se por esta seleção diante da quantidade e

gravidade das transgressões apuradas pelo CNJ.

O primeiro caso é proveniente da Reclamação Disciplinar n. 0007678-

76.2012.2.00.0000, julgada em 08 de outubro de 2013 na 176ª sessão do Conselho

Nacional de Justiça, sob relatoria do ministro Francisco Falcão.

Nesse caso, tratou-se de decisão judicial prolatada em ação que pleiteara a

obrigatoriedade de registro dos contratos de alienação fiduciária e leasing de veículos

como condição para registro no DETRAN.

Esse registro, segundo a decisão judicial que levou o caso ao CNJ, deveria ser

realizado em cartório de registro de títulos e documentos, tendo sido deferida e,

portanto, obrigado judicialmente aos residentes em todo o Estado de Goiás que se

dirigissem a cartório de Goiânia para proceder ao registro.

O magistrado ainda decidira colocar os autos em segredo de justiça, o que,

segundo o Conselho Nacional de Justiça, configurou abuso do segredo de justiça, já que

se tratava de procedimento onde se discutia o direito do cartório de repassar ao usuário

301 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Processo Administrativo n. 0001460-03.2010.2.00.0000. Rel.

Milton Nobre. 123ª Sessão. J. em 29.03.2011. Ementa.

170

tributo devido ao Estado, ou seja, uma ação de cunho meramente patrimonial cuja

decisão favorecia o cartório, autorizando o repasse ao usuário.

A decisão também foi considerada teratológica pelo CNJ por criar ônus

manifesta e injustificadamente desproporcional. Além disso, outros atos foram

mencionados, como a escolha do juízo pela parte e a omissão do magistrado diante da

carga do processo pelo advogado da parte autora por cinco meses após liminar deferida,

inviabilizado a impugnação de decisão pela parte contrária (no caso, o Estado de Goiás),

entre outros.

Foi constatada, pela Corregedoria Nacional de Justiça, decisão judicial proferida

em processo com sentença transitada em julgado que tivera objeto diverso, revogando a

designação de interventor em cartório submetido à fiscalização, beneficiando o mesmo

cartorário já favorecido pelas demais decisões. Fora também concedida, por decisão do

mesmo magistrado, a isenção do cumprimento do provimento 27 da Corregedoria

Nacional de Justiça em processo que não teve o CNJ como parte, favorecendo

novamente a mesma serventia extrajudicial.

Tratou-se, portanto, de decisão manifestamente teratológica que contornou

decisão do Tribunal de Justiça em agravo de instrumento e em sentido contrário, por

meio de “arbitramento judicial” de emolumentos, sem previsão legal, de forma cautelar,

em benefício da mesma serventia.

A parcialidade também foi constatada diante da concessão de diversas

entrevistas à imprensa, tendo o magistrado manifestado opiniões sobre procedimentos

criminais e administrativos em curso, com posição claramente favorável ao cartorário

beneficiado pelas decisões por ele proferidas e que, ademais, eram contrárias aos

trabalhos de fiscalização do CNJ, gerando interferência na atividade da Corregedoria

Nacional de Justiça.

Nesse caso, outra questão considerada pelo CNJ foi a autopromoção em sítio

eletrônico de propriedade do magistrado na internet, que era utilizado para divulgar

sentenças e decisões com exibição de fotografia e um cabeçalho com o seguinte teor:

“Ari Ferreira de Queiroz – sinônimo de competência”302.

O Conselho, por unanimidade, decidiu pela instauração de processo

administrativo disciplinar contra o magistrado, com seu afastamento cautelar.

302 Esses dados estão disponíveis no site oficial do CNJ por meio da busca à Reclamação Disciplinar n.

0007678-76.2012.2.00.0000. Rel. Francisco Falcão. Julgada em 08.10.2013 na 176ª sessão.

171

O segundo caso que se refere à decisão teratológica e que, por sua recorrência e

gravidade, foi selecionado para descrição desenvolveu-se nos autos do Processo

Administrativo Disciplinar n. 0005003-77.2011.2.00.0000, sob a relatoria da

Conselheira Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, tendo sido julgado em 17 de dezembro de

2013.

No caso, a decisão judicial foi proferida em plantão judiciário, determinando a

liberação da quantia aproximada de R$ 13 milhões de reais, relativa à execução de

astreintes, sem a prévia oitiva do executado e sem o oferecimento de caução idônea.

Esse conjunto de circunstâncias permitiu ao CNJ a classificação da decisão como

teratológica.

Foi mencionada ainda a celeridade incomum empreendida pela magistrada para

proferir decisão ainda no plantão judiciário, desconsiderando má-fé da parte, que

manteve, ilegal e injustificadamente, os autos em seu poder durante 51 (cinquenta e um)

meses.

Além disso, também foi mencionada a autorização de arrombamento dos cofres

do banco executado, sem qualquer incidente de resistência, requisitando previamente o

auxílio de força policial para dar cumprimento a essa decisão judicial.

Embora esse tenha sido, segundo a relatora, um incidente isolado, havia

gravidade suficiente para justificar a imposição da pena de disponibilidade com

vencimentos proporcionais, e assim decidiu a maioria dos Conselheiros.

Em outros casos de parcialidade303, o Conselho Nacional de Justiça não se

utilizou da expressão “decisão teratológica”, mas agiu diante do que denominou

indicativos de violações aos deveres funcionais, como no caso da Sindicância n.

0002524-82.2009.2.00.0000, julgada em 17 de agosto de 2010 sob a relatoria do

Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Gilson Dipp.

Nesse caso, foi imputada a um desembargador a desídia na fiscalização dos

trabalhos de seu gabinete, bem como na condução dos feitos sob sua responsabilidade,

revelando escassa ou insuficiente capacidade de trabalho, o que para o Conselho

303 Dentre eles menciona-se: Avocação n. 0002549-95.2009.2.00.0000. Relator Corregedor Nacional de

Justiça Gilson Dipp. Julgado em 17.08.2010; Sindicância n. 0002699-76.2009.2.00.0000 Relator

Corregedor Nacional de Justiça Gilson Dipp. Julgado em 29.06.2010; Avocação n. 0002544-

73.2009.2.00.0000 Relator Corregedor Nacional de Justiça Gilson Dipp. Julgado em 03.08.2010;

Reclamação Disciplinar n. 0006159-71.2009.2.00.0000, Relator Corregedor Nacional de Justiça Gilson

Dipp. Julgado em 06.04.2010; Sindicância n. 0003173-76.2011.2.00.0000, relatoria do Corregedor

Nacional de Justiça Francisco Falcão, julgada em 23 de setembro de 2013.

172

constituiu descumprimento dos deveres dos arts. 35, incisos I, II, III e VII, c/c 56, III da

LOMAN.

Diante do dilema entre a independência judicial e a atividade do CNJ, o

Conselho considerou que a independência judicial é uma garantia do cidadão para

assegurar julgamentos livres de pressões, mas sempre de acordo com a lei e o direito, o

que não a torna tal independência incompatível com o controle disciplinar da

magistratura.

No caso, entendeu o CNJ (ainda que em sede de sindicância) que o

desembargador agira com desídia de forma reiterada, contrariando dispositivos legais

expressos, em violação ao dever do art. 35, I, da LOMAN, e adotando, de forma

reiterada e com dolo (revelado por um conjunto de indícios), procedimentos incorretos

que geraram prejuízos a uma das partes.

Por tratar-se de conduta, em tese, incompatível com o exercício da judicatura, o

Conselho Nacional de Justiça impôs o afastamento preventivo do sindicado.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. APURAÇÃO DE

INFRAÇÕES DISCIPLINARES PRATICADAS POR

MAGISTRADO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO

PIAUÍ. VIOLAÇÃO DO ART. 35, INCISOS I, III E VIII, DA LEI

ORGÂNICA DA MAGISTRATURA NACIONAL. APLICAÇÃO

DO ART. 44 DA LOMAN. PROCEDENTE. APOSENTADORIA

COMPULSÓRIA. ART. 42, V, DA LEI COMPLEMENTAR Nº

35/79.

I – O conjunto probatório existente comprova de forma inequívoca a

atuação do juiz processado para que os objetivos de levantamento de

numerários fossem concretizados. Não se trata aqui, de mero

erro procedimental, onde o autor desconhece completamente as

consequências de seus atos. Trata-se de uma sucessão deliberada

de atos com o escopo de atender e/ou privilegiar determinada

parte.

II – Não apenas desidiosa a conduta do juiz processado, pois a

prática reiterada de liberação de numerário antes da citação da

parte contrária, com a consequente ausência de movimentação

dos processos após o levantamento dos valores, bem como a não

exigência de caução idônea, e ainda, a absoluta omissão na adoção

de medidas para conter ou apurar os crimes praticados, revelam

comportamento tendencioso do magistrado, que não podem ficar

meramente no campo da negligência.

III – Ainda que fosse considerada a mera negligência, não seria o

caso de sanção inferior à aposentadoria compulsória, em razão da

gravidade das ações e omissões técnicas do magistrado e dos

prejuízos causados aos jurisdicionados, tornando incompatível tal

qualificação técnica de fato com as atividades jurisdicionais.

IV – A sucessão de erros praticados na condução dos processos

descritos na portaria inicial revela cabalmente o procedimento

173

incorreto perpetrado pelo magistrado em inúmeras ocasiões,

consoante previsão contida no art. 44 da LOMAN, onde resta

autorizada a aplicação de punição mais grave, quando a infração

assim justificar304.

Grifos nossos.

Em síntese, a decisão procura distanciar o caso enfrentado do mero erro

procedimental, enquadrando este caso em uma sucessão deliberada de atos com o

escopo de atender e/ou privilegiar determinada parte. Ou seja, trata-se de um erro de

procedimento qualificado por sua finalidade, neste caso por atender e/ou privilegiar

determinada parte, ou seja, parcialidade.

Ainda é possível perceber, nesse caso, que a conduta do magistrado consistiu em

prática reiterada de liberação de numerário antes da citação da parte contrária sem a

devida caução; além disso, posteriormente ao levantamento da quantia foi constatada a

ausência de movimentação dos processos. Esse comportamento foi entendido pelo

Conselho Nacional de Justiça como tendencioso e transcendente da mera negligência; o

Conselho entendeu também que, mesmo que fosse constatada a mera negligência, diante

da gravidade dos atos e consequências caberia a mesma punição – neste caso, a punição

mais grave disponível ao poder do Conselho, que é a de aposentadoria compulsória.

O fundamento utilizado neste caso foi o art. 44 da Lei Orgânica da Magistratura

Nacional, que autoriza a aplicação de punição mais grave, quando a infração assim

justificar305.

O Relator Conselheiro Tourinho Neto baseou o seu voto306 na inexistência de

prova diante do que chamamos aqui de erro de procedimento qualificado, uma vez que,

em sua opinião, a única certeza que emergiu dos autos é que a atuação do magistrado foi

negligente, não havendo provas suficientes a indicar a ausência do dever de

independência/imparcialidade na condução de processos.

304 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Processo n. 0000786-54.2012.2.00.0000. Rel. Tourinho Neto.

Rel. p/ acórdão: Lucio Munhoz. Julgado em 19.03.2013 na 165ª Sessão Ordinária. 305 “Art. 44 - A pena de censura será aplicada reservadamente, por escrito, no caso de reiterada

negligência no cumprimento dos deveres do cargo, ou no de procedimento incorreto, se a infração não

justificar punição mais grave. Parágrafo único - O Juiz punido com a pena de censura não poderá figurar

em lista de promoção por merecimento pelo prazo de um ano, contado da imposição da pena.” 306 Voto que restou vencido, pois, embora tenha votado pela procedência do Processo Administrativo

Disciplinar, o fez para impor ao magistrado a pena de advertência e não a de aposentadoria compulsória,

como restou decidido pela maioria dos Conselheiros.

174

Outro caso que vale mencionar mais detalhadamente é a Reclamação Disciplinar

n. 0001163-25.2012.2.00.0000, julgada em 16 de junho de 2014 sob a relatoria do

Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Francisco Falcão.

Foi constatado possível favorecimento de advogado atuante na Comarca de

Trairí/CE, consistente no deferimento de liminares em inúmeras ações ajuizadas por

associações de defesa do consumidor criadas mediante fraude. As liminares foram

deferidas em curto espaço de tempo, antes mesmo da própria autuação em alguns casos,

mesmo diante da inexistência, na maior parte delas, de documento comprobatório de

filiação dos representados à entidade representante.

Constatou-se nesses casos que a celeridade predominante na realização do ato de

notificação para imediato cumprimento da liminar não se repetia para o

desenvolvimento do processo, uma vez que após a notificação o processo entrava em

“verdadeiro estado de hibernação, uma vez que não se proced[ia] à citação das partes

demandadas e não se pratica[va] nenhum outro ato processual”307.

Aos autos do processo no Conselho Nacional de Justiça foram juntadas

declarações de que o advogado que atuava nessas ações judiciais era amigo íntimo do

magistrado, a ponto de se hospedar na residência oficial, além de ter trabalhado no

mesmo escritório de advocacia no qual laborou o magistrado antes de assumir o cargo.

Ao final, foi decidida por unanimidade a instauração de processo administrativo

disciplinar, com o afastamento do magistrado das funções judicantes e a suspensão do

processo de vitaliciamento.

Por fim, o terceiro caso que se refere à parcialidade e às decisões teratológicas é

o Processo Administrativo Disciplinar n. 0005993-05.2010.2.00.0000 que se

desenvolveu sob a relatoria do conselheiro Walter Nunes e foi julgado em 15 de março

de 2011 na 122ª sessão ordinária do Conselho Nacional de Justiça. Este caso envolve

distribuição direcionada de processos, liberação de quantia sem caução, suspeição não

reconhecida, sobreposição de decisão judicial, entre outras.

Foi constatado que três dos quatro processos judiciais decididos pelo magistrado

foram distribuídos por dependência em situações que não autorizavam tal procedimento,

e o magistrado, mesmo ciente dessa distribuição anômala, aceitou o direcionamento dos

processos, prolatando tutelas antecipadas que foram tachadas de teratológicas pelo CNJ.

307 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Reclamação Disciplinar n. 0001163-25.2012.2.00.0000.

Relator Corregedor Nacional de Justiça Francisco Falcão. J. em 16.06.2014.

175

Essas decisões sequer permitiram à parte contrária oportunidade para ser ouvida. O

magistrado determinou a liberação de vultosas quantias em dinheiro, variando entre R$

615.510,08 (seiscentos e quinze mil, quinhentos e dez reais e oito centavos) e R$

2.139.311,62 (dois milhões, cento e trinta e nove mil, trezentos e onze reais e sessenta e

dois centavos).

Em três ações ordinárias promovidas contra a CAPOF – Caixa de Assistência e

Aposentadoria dos Funcionários do Banco do Estado do Maranhão, o magistrado

deferiu tutelas antecipadas, determinando a liberação de quase R$ 2.500.000,00, além

da incidência de honorários advocatícios, de modo a viabilizar que três pessoas, já

aposentadas e recebendo renda mensal da aposentadoria complementar, pudessem

retirar os valores que formavam parte do fundo de previdência – o que só poderiam

fazer antes ou mediante opção feita no momento da implementação das condições para

a aposentadoria. Tais pessoas, beneficiárias da justiça gratuita, garantiram o juízo

apenas com a emissão de notas promissórias. Na decisão do Conselho Nacional de

Justiça foi apontado o motivo pelo qual não houve a devolução das quantias.

Constatou-se ainda nesse processo administrativo disciplinar que ocorrera a

denominada distribuição cruzada, caracterizada pela distribuição de petição inicial

assinada por filho de magistrado na qualidade de advogado, em demanda promovida

contra a CAPOF, por dependência para a 5ª Vara Cível, dirigida pelo juiz José Ribamar

Santos Vaz. Ao mesmo tempo, outros processos, um deles patrocinado pela filha do

mencionado juiz, foram promovidos contra a mesma entidade com a mesma causa de

pedir e pedido, inclusive com a reprodução da exordial da ação anteriormente

mencionada. Tais processos foram distribuídos, igualmente por dependência, para a 2ª

Vara, cujo titular era o juiz Nemias Nunes, tendo, em todas as hipóteses, pelos

respectivos juízos, sido deferidas as tutelas antecipadas teratológicas308.

Os alvarás foram deferidos pelo magistrado no mesmo dia de seus ajuizamentos

sem a presença física dos autos, que se encontravam com vista para a CAPOF, em razão

da intimação das tutelas antecipadas, ao passo que, nada obstante a intervenção da

União no feito, pedindo a sua inclusão na relação processual, o magistrado retardou

sobremaneira o envio dos autos para a Justiça Federal, a fim de que naquele juízo fosse

decidida a questão incidental.

308 Trechos da ementa do Processo Administrativo Disciplinar n. 0005993-05.2010.2.00.0000. Rel.

Walter Nunes. Julgado em 15.03.2011 na 122ª Sessão.

176

O Conselho Nacional de Justiça, por unanimidade, decidiu pela aplicação da

pena de aposentadoria compulsória ao magistrado e determinou remessa de cópia

dos autos à Ordem dos Advogados do Brasil e à Receita Federal, nos termos do voto do

relator.

Vale descrever outro caso de imparcialidade envolvendo amizade íntima entre

magistrado e advogado: aquele analisado no Processo Administrativo Disciplinar n.

0007400-80.2009.2.00.0000, que foi desenvolvido sob a relatoria do Conselheiro Jorge

Hélio e julgado em 15 de março de 2011 na 122ª sessão do Conselho Nacional de

Justiça.

O CNJ afirmou que o magistrado deve afastar-se de toda causa que tenha o

potencial de alterar expressivamente a posição equidistante na qual deveria se manter

em relação às partes dos processos, sob pena de afrontar as exigências legais e éticas

que pautam sua atuação profissional.

Neste caso, constatou-se que o magistrado – à época dos autos – morava

luxuosamente309 havia anos em apartamento de propriedade do patrono de inúmeros

processos julgados por ele, afirmando pagamento irrisório, o que configuraria para o

CNJ moradia praticamente a título gratuito, mitigando a independência do magistrado.

Além disso, nos autos do processo no CNJ também foi constatada a nomeação

de servidor advindo do escritório de amigo íntimo do magistrado, daquele que

subvencionava sua moradia. Mesmo sabendo que este servidor era filho de membro

daquele escritório de advocacia, o magistrado havia mantido o servidor na elaboração

das minutas de decisão, sem qualquer ressalva ou organização no gabinete que

impedisse a prática de atos pelo servidor nos processos em que seu pai figurava como

advogado.

Na ocasião, o CNJ afirmou que a punição disciplinar não era ensejada por todo

caso em que o magistrado suspeito para o julgamento de determinados processos

deixasse de declarar sua suspeição. Contudo, entendeu que a combinação da patente

suspeição do magistrado, em vista de sua amizade fraternal e do recebimento de

vantagem econômica pelos advogados mencionados nos autos que tramitaram no

Conselho e, ainda, de sua conduta suspeita, indicando o favorecimento dos mesmos

advogados nos processos mencionados, evidenciou o descumprimento de seus deveres

funcionais.

309 “Luxuosamente” é o termo utilizado pelo CNJ em sua decisão.

177

Em outros processos310 encontrados na pesquisa a imparcialidade foi alegada,

mas, por ausência ou insuficiência de provas, foi afastada, sendo improcedente qualquer

pedido neste sentido.

c. Negligentes

Outra subcategoria em que se percebe uma zona de interface entre a atividade do

CNJ e a independência jurisdicional criada por via concreta e posterior à atuação

jurisdicional, justamente por enfrentar em seus processos questões provenientes de

decisões jurisdicionais, refere-se à existência de negligência na atuação jurisdicional.

Dentre os casos provenientes da pesquisa, enfrentou detalhadamente o tema da

negligência o Processo Administrativo Disciplinar n. 0004931-56.2012.2.00.0000,

desenvolvido sob a relatoria do Conselheiro Jefferson Kravchychyn e julgado em 11 de

junho de 2013, na 171ª sessão ordinária do Conselho Nacional de Justiça.

Na ocasião, uma magistrada esteve diante de situação em que a parte autora

Maria Alves de Araújo estava, desde o dia 29 de outubro de 2009, na sala de pós-

operatório do hospital público municipal Instituto Dr. José Frota, apesar de sua

prescrição médica indicar a necessidade de internação em leito de UTI. A autora propôs

uma Ação de Obrigação de Fazer com Pedido de Antecipação dos Efeitos da Tutela em

face do Município de Fortaleza/CE, no dia 7/11/2009 (sábado). O pedido foi apreciado

no mesmo dia em sede de plantão judicial, por outro magistrado, que deferiu a

antecipação dos efeitos da tutela.

Entretanto, alegando a recusa da direção do hospital municipal em cumprir a

decisão judicial de transferir a autora Maria Alves de Araújo para o leito de UTI, seu

advogado protocolou no dia seguinte (domingo, dia 8/11/2009) nova petição requerendo

o cumprimento da decisão prolatada no dia anterior. Nessa petição constavam as

expressões: “plantão judicial”, “risco de morte da requerente” e “ordem judicial sendo

descumprida”.

Contudo, a magistrada requerida nos autos do processo administrativo

disciplinar que tramitou no CNJ era a plantonista daquele dia e não estava presente,

310 Entre outros: Processo Administrativo Disciplinar n. 0003752-24.2011.2.00.0000, julgado na 156ª

Sessão Ordinária do Conselho Nacional de Justiça; Processo Administrativo Disciplinar n. 0004057-

42.2010.2.00.0000, Relator Conselheiro Marcelo Neves, Relatora para o Acórdão Corregedora Nacional

de Justiça Eliana Calmon, julgado em 14.02.2012; Pedido de Providências - Corregedoria n. 0007384-

92.2010.2.00.0000, Relatora Corregedora Nacional de Justiça Eliana Calmon, Relator para o acórdão

Conselheiro Sílvio Rocha, julgado em 25.10.2011.

178

sendo o advogado recebido por uma servidora que entrou em contato com a magistrada.

Na ocasião, a magistrada orientou a servidora a informar ao advogado que seria

impossível reapreciação de decisão judicial proferida em plantão, conforme Resolução

71 do CNJ. No dia seguinte (9/11/2009), a ação foi distribuída e apreciada pelo juízo da

8ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza/CE, que determinou ao Município

de Fortaleza o cumprimento da decisão proferida em 7 de novembro de 2011, “sob pena

de execução de multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), sem prejuízo das

sanções penais, com a instauração de inquérito policial por crime de desobediência e

omissão de socorro”.

A ordem foi cumprida às 14h do dia 9 de novembro de 2011. No entanto, a

autora Maria Alves de Araújo faleceu às 15h do mesmo dia.

O Conselho Nacional de Justiça entendeu que a magistrada fora negligente ao

não adotar os devidos cuidados a fim de tomar conhecimento integral da situação,

considerando que a mera reiteração de pedido, em sede de plantões judiciais, vedada

pela Resolução nº 71/CNJ, acontece quando há o indeferimento do pedido anterior. O

que não havia sido o caso e, portanto, deveria a magistrada ter apreciado o pedido.

A omissão da magistrada foi reconhecida pelo CNJ, tendo este lhe imputado

violação ao dever de cumprimento com exatidão das disposições legais e dos atos de

ofício (art. 35, inc. I, da LOMAN).

À magistrada foi aplicada a penalidade de advertência, por escrito, fazendo-a

constar em sua ficha funcional, com fundamento no art. 42 e 43 da LOMAN e art. 4º da

Resolução 135/2011 do CNJ.

Em outros casos, a negligência foi enfrentada através do exame da existência de

dolo e má-fé. No Processo Administrativo Disciplinar n. 0004639-37.2013.2.00.0000,

desenvolvido sob a relatoria da Conselheira Ana Maria Duarte Amarante Brito e julgado

em 16 de junho de 2014, o caso concreto envolveu a imputação de depósito judicial a

terceiro por juiz sem competência para tal ato jurisdicional.

A incompetência verificou-se porque no caso inexistia qualquer relação do bem

apreendido administrativamente com o juízo de titularidade do magistrado, que proferiu

a decisão judicial por duas vezes, deixando de cumprir o devido processo legal, sem

oportunizar manifestação do pretenso proprietário, bem como do Ministério Público, o

que consistiu – no entendimento do CNJ – em infração ao disposto no inciso I, do art.

35, da LOMAN.

179

O CNJ também decidiu que a conduta do magistrado havia infringido o art. 4º da

Resolução n. 60/2008 (Código de Ética da Magistratura Nacional)311, já que o depósito

inicial do bem apreendido emitido por outro juízo pode ser reavaliado apenas por

aquele, indevida sua deliberação por juízo diverso.

Diante da alegação de ausência de má-fé e dolo, o CNJ entendeu que essa

ausência não tem o condão de eximir o magistrado da responsabilidade de atuar com

zelo na prática de atos processuais, porque o zelo constitui um dos deveres impostos

pelo art. 25 do Código de Ética da Magistratura312, cujo descumprimento é passível de

penalização.

Em outros casos a má-fé e o dolo tampouco foram considerados elementos

necessários à imputação de penalidade ao magistrado considerado negligente313.

Entretanto, há casos em que a negligência sobreveio não apenas da conduta do

magistrado, mas também de seu gabinete. Dentre eles menciona-se o Processo

Administrativo Disciplinar n. 0002789-79.2012.2.00.0000, que se desenvolveu sob a

relatoria do Conselheiro Gilberto Martins e foi julgado na 166ª sessão ordinária do

Conselho Nacional de Justiça.

Esse processo versou sobre faltas funcionais relativas à negligência na condução

de processos criminais, o que teria resultado na ocorrência de diversas prescrições. Na

ocasião, foi alegada a existência de problemas estruturais na 2ª Auditoria Militar de

Minas Gerais, onde oficiava o magistrado, mas o CNJ entendeu que isso não constituía

motivo para impedir o julgamento das ações penais que tramitavam, embora tenha

reconhecido expressamente as mencionadas deficiências estruturais. Considerou que a

causa principal ou “a motivação da perda da pretensão punitiva do Estado se de[ra] pela

forma leniente, descompromissada e negligente com a qual os requeridos conduziram os

processos criminais que tramitavam na serventia”314.

Assim, concluiu o Conselho Nacional de Justiça que o magistrado que age com

desídia na fiscalização dos trabalhos da vara, “bem como na condução dos feitos,

311 “Art. 4º Exige-se do magistrado que seja eticamente independente e que não interfira, de qualquer

modo, na atuação jurisdicional de outro colega, exceto em respeito às normas legais.” 312 “Art. 25. Especialmente ao proferir decisões, incumbe ao magistrado atuar de forma cautelosa, atento

às consequências que pode provocar.” 313 Entre outros: Processo de Revisão Disciplinar 0003862-86.2012.2.00.0000, Relator Conselheiro

Jefferson Luis Kravchychyn, julgado em 11.12.2012. 314 Ementa do Processo Administrativo Disciplinar n. 0002789-79.2012.2.00.0000, Relator Conselheiro

Gilberto Martins, j. 166ª Sessão Ordinária.

180

descumpre os deveres do art. 35, incisos II e III da LOMAN, acarretando descrédito ao

Poder Judiciário entre a população” 315.

Ao final, o Conselho decidiu por maioria julgar procedente o pedido para aplicar

pena de censura aos magistrados.

d. Com indícios de corrupção

A última subcategoria em que se vislumbra uma zona de interface entre a

atividade do CNJ e a independência jurisdicional criada por via concreta e posterior à

atuação jurisdicional, por enfrentar em seus processos questões provenientes de

decisões jurisdicionais, refere-se à existência de indícios de corrupção na atuação

jurisdicional.

O primeiro deles que se pretende descrever aqui é o Processo Administrativo

Disciplinar n. 0001776-84.2008.2.00.0000, foi julgado em junho de 2009 sob a relatoria

do Conselheiro Mairan Maia.

Na ocasião, o CNJ entendeu que havia sido comprovadas diversas práticas

comerciais, com escopo de satisfação de interesse pessoal do magistrado com obtenção

de vantagens econômicas, para si ou para terceiros, em detrimento dos deveres inerentes

ao exercício da judicatura e das vedações legais. A decisão foi fundamentada nos artigos

35, VIII, e 36, I, da LOMAN316.

Segundo o CNJ, houvera demonstração cabal, ao longo da instrução, de

materialidade das infrações disciplinares, dolo e consciência plena da ilicitude por parte

do magistrado. Levando em conta a gravidade da conduta ensejadora da imputação, a

carga coativa da pena, o grau de culpabilidade e a eficácia da medida punitiva, o

Conselho Nacional de Justiça aplicou a pena de aposentadoria compulsória, com

vencimentos proporcionais ao tempo de serviço.

Outro caso semelhante encontrado na pesquisa foi enfrentado no Processo

Administrativo Disciplinar n. 0000787-44.2009.2.00.0000, julgado em 16 de outubro de

2012 na 156ª sessão ordinária do Conselho Nacional de Justiça, sob relatoria do

Conselheiro Gilberto Martins.

315 Ementa do Processo Administrativo Disciplinar n. 0002789-79.2012.2.00.0000, Relator Conselheiro

Gilberto Martins, j. 166ª Sessão Ordinária. 316 “Art. 35 - São deveres do magistrado: [...] VIII - manter conduta irrepreensível na vida pública e

particular. Art. 36 - É vedado ao magistrado: [...] I - exercer o comércio ou participar de sociedade

comercial, inclusive de economia mista, exceto como acionista ou quotista;”

181

Foram juntadas aos autos no CNJ as transcrições das interceptações telefônicas

legais. Seu teor, segundo os conselheiros do CNJ, não deixou dúvida de que a

magistrada solicitava reiteradamente vantagens indevidas para si e para pessoas do seu

círculo social.

Foi decidido que se tratava de comportamento incompatível com o exercício da

magistratura, tendo sido aplicada a penalidade de remoção compulsória a bem do

interesse público, com fundamento no art. 42, III da Lei Orgânica da Magistratura

Nacional (LOMAN)317.

Mais um caso encontrado na pesquisa que se refere aos indícios de corrupção

será descrito a seguir. Trata-se da Revisão Disciplinar n. 0004926-34.2012.2.00.0000,

que se desenvolveu sob a relatoria do Conselheiro Bruno Dantas e foi julgada em

28.05.2013 na 170ª sessão ordinária do Conselho Nacional de Justiça.

Na ocasião, o magistrado já havia sido punido pelo tribunal de origem com a

pena de remoção compulsória, tendo entendido o tribunal que o caso era de negligência

do magistrado, não de corrupção. Contudo, segundo o CNJ, os autos demonstraram

procedimento incorreto do magistrado a reclamar penalidade maior, o que justificou a

aplicação da pena de aposentadoria compulsória ao magistrado.

5.2.2.2. Síntese conclusiva

Como visto nos casos descritos acima, por vezes o Conselho afirmou que a

independência judicial não pode constituir proteção absoluta do magistrado, sendo

incapaz de afastar qualquer possibilidade de punição diante das decisões que profere,

indicando ainda que a independência judicial é “uma garantia do cidadão para assegurar

julgamentos livres de pressões, mas de acordo com a lei e o direito”318. Isso demonstra

também que o CNJ entende que sua atividade e a independência jurisdicional se

relacionam.

Quanto à subcategoria relativa a excesso de linguagem ou impropriedade, vale

mencionar que o único caso encontrado na pesquisa em que o Conselho Nacional de

Justiça puniu o magistrado com essa justificativa apresenta um ato jurisdicional com

termos extremos e discriminatórios, além de sua divulgação excessiva. Isto facilitou a

317 “Art. 42 - São penas disciplinares: [...] III - remoção compulsória;” 318 Ementa, Processo Administrativo n. 0001460-03.2010.2.00.0000. Rel. Milton Nobre. Julgado em

29.03.2011 na 123ª sessão.

182

produção de provas, ao mesmo tempo em que realçou a atitude do magistrado,

aumentando a cobrança por responsabilidade. Por outro lado, nos demais exemplares

que trataram do excesso de linguagem não houve punição dos magistrados,

principalmente por ausência de provas. Quando este excesso de linguagem ou

impropriedade não consta de registro escrito, sua prova se revela de difícil produção,

uma vez que, geralmente, deve-se socorrer de prova testemunhal e muitas vezes, até

mesmo pela composição do ambiente judicial, não é sempre possível apresentar uma

testemunha desinteressada no processo.

Vale mencionar ainda que, nesta subcategoria, também foi considerado que o

alegado excesso de linguagem não se verifica “se o magistrado afirma fato verdadeiro

na sua decisão, contrapondo afirmação do causídico que não corresponde à realidade

fática”. Ou seja, quando o magistrado, no caso examinado, mencionou que o argumento

era falacioso, não haveria ofensa, porque o CNJ entendeu comprovado que o

pronunciamento do juiz correspondia à verdade319.

Na subcategoria que se refere à existência de parcialidade nos atos

jurisdicionais, foi alocado o maior número de ocorrências desta pesquisa320. Por

diversas vezes, o Conselho Nacional de Justiça se socorreu da expressão “decisão

teratológica”. Como um dos resultados de pesquisa pode-se afirmar, considerando os

casos analisados, que por decisão teratológica o CNJ entende a decisão desprovida de

qualquer razão jurídica sustentável, sendo o juiz – nos casos estudados – alvo de

responsabilização disciplinar por ultrapassar os limites da regular atuação judicante.

Exemplo de aplicação desse entendimento é o caso concreto em que foi prolatada

decisão judicial obrigando registro (em cartório de títulos e documentos) dos contratos

de alienação fiduciária e leasing de veículos como condição para registro no DETRAN.

Durante a pesquisa foram encontrados outros exemplares que se referiram à

decisão teratológica à semelhança do caso mencionado acima321, mas optou-se por não

criar uma nova subcategoria “decisão teratológica”, uma vez que o fundamento das

decisões do Conselho Nacional de Justiça que se utilizaram da expressão continuou

319 Ementa, Revisão Disciplinar 0001727-43.2008.2.00.0000. Rel. Jorge Maurique. Rel. p/ o acórdão Rui

Stoco. Julgado em 31.03.2009. 81ª Sessão. 320 Não obstante já tenha sido mencionado que nesta pesquisa optou-se por não fazer referências ou

cruzamentos de pesquisa quantitativa. Vide notas metodológicas. 321 Dentre eles menciona-se: Processo Administrativo Disciplinar n. 0004353-64.2010.2.00.0000, Rel.

Milton Nobre, julgado em 29.03.2011; Processo Administrativo Disciplinar 0001589-08.2010.2.00.0000,

Rel. Vasi Werner, julgado em 28.02.2012 na 142ª sessão; PAD 0005953-86.2011.2.00.0000, Rel.

Emmanoel Campelo, j. 170ª Sessão Ordinária.

183

sendo o da imparcialidade. Enfim, notou-se que a decisão teratológica é apenas o meio

de identificação da imparcialidade no caso concreto.

Outra constatação relativa a essa subcategoria foi a denominada distribuição

cruzada, que foi identificada através de petição inicial assinada por filho de magistrado

na qualidade de advogado e, em outro caso, petição assinada por filha de outro

magistrado, com a mesma causa de pedir e pedido. As ações foram promovidas contra a

mesma entidade, inclusive com identidade do texto da petição inicial, e os respectivos

processos foram sido distribuídos aos magistrados de forma cruzada, sendo cada petição

direcionada ao pai do outro advogado e, em ambos os casos, deferidas as tutelas

antecipadas, também caracterizadas pelo Conselho como teratológicas322.

Outra constatação desta subcategoria que deve ser ressaltada é a afirmação do

CNJ de que o magistrado tem o dever de se afastar de toda causa que tenha o potencial

de alterar expressivamente a posição equidistante na qual deveria se manter em relação

às partes dos processos. No entendimento do Conselho, o não afastamento do

magistrado pode afrontar as exigências legais e éticas que pautam sua atuação

profissional.

Em outro caso, o CNJ afirmou a punição disciplinar não é ensejada por todo

caso em que o magistrado seja suspeito para o julgamento e não declare sua suspeição.

O Conselho considerou como indicativo de favorecimento a combinação de suspeição

do magistrado e de sua conduta suspeita323.

Quanto à subcategoria que se refere à negligência, apresenta-se a conclusão de

que o Conselho Nacional de Justiça, nos casos analisados, não considerou a má-fé e o

dolo elementos necessários à imputação de penalidade ao magistrado considerado

negligente324.

Sobre a última subcategoria dessa zona de interface entre a atividade do

Conselho Nacional de Justiça e a independência jurisdicional criada por via concreta e

posterior diante dos atos jurisdicionais, mais precisamente, aquela que se refere aos

indícios de corrupção, notou-se o comportamento parcial, mas qualificado pela

corrupção. Destaca-se o caso em que se juntou nos autos do CNJ as transcrições das

interceptações telefônicas legais, cujo teor, segundo os conselheiros do CNJ, não deixou

322 Trechos da ementa do Processo Administrativo Disciplinar n. 0005993-05.2010.2.00.0000. Rel.

Walter Nunes. Julgado em 15.03.2011 na 122ª Sessão. 323 “Luxuosamente” é o termo utilizado pelo CNJ em sua decisão. 324 Entre outros: Processo de Revisão Disciplinar 0003862-86.2012.2.00.0000, Rel. Cons. Jefferson Luis

Kravchychyn, julgado em 11.12.2012.

184

dúvida de que a magistrada solicitava reiteradamente vantagens indevidas para si e para

pessoas do seu círculo social.

Um elemento comum às decisões do Conselho Nacional de Justiça encontradas

nesta pesquisa, em especial àquelas em que se constatou a punição (ou abertura de

processo administrativo e afastamento), é que o CNJ se apoia na demonstração cabal de

materialidade das infrações disciplinares, exigindo, para a identificação de indícios de

corrupção, o dolo e consciência plena da ilicitude por parte do magistrado, além de

considerar a gravidade da conduta e o seu grau de culpabilidade.

5.3. Zona de interferência criada por via concreta e posterior diante de atos

jurisdicionais

Este subitem se dedicará à interferência provocada pela atividade do CNJ nos

efeitos da decisão judicial. Utiliza-se o termo “interferência” em razão da identificação

de dominante e dominado, ou de transformador e transformado, precisamente diante de

ato do Conselho Nacional de Justiça que suspende a eficácia de decisão judicial.

Embora tal interferência seja rara dentre as decisões do Conselho Nacional de

Justiça, foi constatada em alguns casos encontrados na pesquisa realizada no sítio oficial

do Conselho na rede mundial de computadores. Por sua relevância, notoriedade e

controvérsia, tais casos serão apresentados na análise descritiva a seguir.

5.3.1. Análise descritiva

Neste subitem será apresentada a descrição da análise, ou seja, por quais

peculiaridades se identificou a interferência entre as decisões do Conselho Nacional de

Justiça e a independência jurisdicional.

Vale mencionar que no Apêndice II foi transcrito o texto da própria decisão do

CNJ, tendo sido selecionados os trechos de interesse, além de grifado aquilo que se

identificou de maior relevância.

185

a. Caso dos tabeliães maranhenses

O primeiro caso que trazemos como representante de uma zona de interferência

da atividade do Conselho Nacional de Justiça nos efeitos da decisão judicial ocorreu em

06 de novembro de 2009325, quando a Corregedoria Nacional de Justiça recebeu o

Pedido de Providências n. 0006179-62.2009.2.00.0000326 da A.N.D.C.P.C.A327.

O Corregedor Nacional de Justiça à época, Ministro Gilson Dipp, decidiu em 11

de dezembro de 2009 tornar ineficazes as decisões do Tribunal de Justiça do Maranhão

que garantiam a permanência dos registradores que ocupavam as titularidades sem

concurso específico para o setor nos cartórios, salvo os nomeados segundo o regime

vigente até o advento da Constituição Federal de 1988, os efetivados com base na

Constituição Federal de 1967 e aqueles com processos ainda pendentes na Justiça.

Em 08 de junho de 2010, no Supremo Tribunal Federal, o Ministro Celso de

Mello deferiu nos autos do Mandado de Segurança n. 28.598/DF328 o pedido liminar,

suspendendo cautelarmente, até final julgamento do mandado de segurança, e

unicamente em relação à impetrante (Iolanda Nepomuceno Silva), os efeitos da decisão

proferida pelo Corregedor Nacional de Justiça, nos autos do Pedido de Providências nº

0006179-62.2009.2.00.0000. A decisão monocrática ficou assim ementada (com grifos

nossos):

EMENTA: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ).

CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA. ATO QUE

SUSPENDE A EFICÁCIA DE DECISÃO CONCESSIVA DE

MANDADO DE SEGURANÇA EMANADA DE TRIBUNAL DE

JUSTIÇA. INADMISSIBILIDADE. ATUAÇÃO “ULTRA

VIRES” DO CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA,

PORQUE EXCEDENTE DOS ESTRITOS LIMITES DAS

ATRIBUIÇÕES MERAMENTE ADMINISTRATIVAS

OUTORGADAS PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.

INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO CONSELHO NACIONAL

DE JUSTIÇA, NÃO OBSTANTE ÓRGÃO DE CONTROLE

325 A parte inicial deste caso foi analisada ao tratar da tese de critério cronológico diante da questão

judicializada, mas seu último desdobramento tem pertinência estrita com o tema da interferência da

atividade do CNJ nos efeitos da decisão. Por isso, optou-se por trazer aqui esse último desdobramento. 326 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Pedido de Providências n. 0006179-62.2009.2.00.0000.

Plenário, Rel. Ministro Gilson Dipp / Ministra Eliana Calmon, arquivado sem julgamento definitivo por

força da decisão do STF. 327 Embora não seja possível ter acesso ao processo, devido ao seu sigilo, havendo apenas as iniciais em

seu registro no CNJ, supõe-se – por semelhança – que a sigla A.N.D.C.P.C.A. se refere à Associação

Nacional de Defesa dos Concursos para Cartórios. Entretanto, não é possível trazer certeza a essa

indicação. 328 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 28.598/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello, j.

14/10/2010, Decisão liminar.

186

INTERNO DO PODER JUDICIÁRIO, PARA INTERVIR EM

PROCESSOS DE NATUREZA JURISDICIONAL.

IMPOSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL DE O CONSELHO

NACIONAL DE JUSTIÇA (QUE SE QUALIFICA COMO

ÓRGÃO DE CARÁTER EMINENTEMENTE ADMINISTRATIVO)

FISCALIZAR, REEXAMINAR E SUSPENDER OS EFEITOS

DECORRENTES DE ATO DE CONTEÚDO JURISDICIONAL,

COMO AQUELE QUE CONCEDE MANDADO DE SEGURANÇA.

PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

MAGISTÉRIO DA DOUTRINA. MEDIDA LIMINAR

DEFERIDA.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em 14 de outubro de 2010, referendou

as liminares do Ministro Celso de Mello que suspenderam as duas decisões do

Corregedor Nacional de Justiça que haviam tornado sem efeito os acórdãos do Tribunal

de Justiça do Maranhão, dentre elas a que se refere ao caso específico que ora se analisa,

isto é, o caso de Iolanda Nepomuceno Silva.

Enfim, o Plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu, diante do presente

caso, que o Conselho Nacional de Justiça não tem poderes para exercer a fiscalização de

atos de conteúdo jurisdicional, especialmente para interferir em sua eficácia, já que sua

competência se restringe aos âmbitos administrativo, financeiro e disciplinar,

relativamente ao Poder Judiciário e a seus serviços auxiliares.

b. Caso Banco do Brasil

Pouco tempo depois, surgiu caso semelhante em que se verificou zona de

interferência da atividade do Conselho Nacional de Justiça nos efeitos da decisão

judicial.

Em 16 de dezembro de 2010, a Corregedora Nacional de Justiça à época, Eliana

Calmon, por medida liminar no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, suspendeu a

eficácia de uma decisão judicial proferida pela juíza Vera Araújo de Souza da 5ª Vara

Cível de Belém do Pará, que havia bloqueado R$ 2,3 bilhões do Banco do Brasil.

Na fundamentação da liminar, a Corregedora Nacional de Justiça afirmou que a

decisão da magistrada paraense extravasou a normalidade e havia indícios de que a

manobra jurídica favoreceria uma quadrilha interestadual. Em suas palavras: “O CNJ

187

não interfere nas decisões judiciais, mas isso é necessário quando o magistrado

ultrapassa o limite judicial”329.

Argumentou ainda considerar estranha a rapidez com que a decisão judicial fora

tomada, tendo o bloqueio sido determinado em cinco dias, pois a ação judicial fora

distribuída no dia 4 de novembro de 2010 e a liminar fora concedida no dia 8 de

novembro de 2010.

Eliana Calmon disse ainda que: “[P]ode ser ingenuidade ou mesmo o livre

convencimento”, informando que o CNJ abriria procedimentos administrativos para

analisar a participação de membros do Judiciário no esquema. Vejamos o caso concreto

em sua completude.

Foi inicialmente ajuizada uma ação judicial por Francisco Nunes Pereira,

alegando ter direito por usucapião a uma quantia bilionária de origem desconhecida que

fora depositada em sua conta havia cinco anos. Em sua decisão, a magistrada Vera

Araújo de Souza reconheceu o direito a essa quantia e a colocou em disponibilidade no

Banco do Brasil.

Entretanto, a Corregedora Nacional de Justiça afirmou que os documentos que

atestavam o depósito na conta do autor eram falsos; além disso, havia outra ação, com

os mesmos nomes, documentos e valores, “ajuizada no Distrito Federal, sem sucesso,

uma vez que os documentos usados como prova foram declarados como falsos. A ação

foi arquivada sem possibilidade de recurso. Agora vemos a história se repetir no

Pará”330.

O Banco do Brasil alegou que havia procurado a magistrada para informar a

possível atuação de um grupo criminoso que buscava enriquecimento ilícito por meio da

ação. Segundo o banco, a juíza alegara que não encontrava os papéis relativos ao

processo e que “sofre[ra] pressões de cima”331, sem esclarecer de quem e por que

motivo, tendo o banco recorrido ao Tribunal de Justiça do Pará. A primeira

desembargadora declarou-se suspeita e não analisou o recurso. A segunda

desembargadora, Marneide Merabet, manteve o bloqueio, negando o efeito suspensivo

329 AGÊNCIA BRASIL. Pela primeira vez, CNJ anula uma decisão judicial, Último Segundo, 17 de

dezembro de 2010. Disponível em:

<http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/pela+primeira+vez+cnj+anula+uma+decisao+judicial/n12378823

06124.html>. Acesso em: 25 out. 2013. 330 AGÊNCIA BRASIL, op. cit. 331 AGÊNCIA BRASIL, op. cit.

188

requerido pelo Banco do Brasil e pedindo informações à 5ª Vara Cível e aos agravantes

para, após, decidir a respeito do mérito do agravo.

O Banco do Brasil ingressou no Conselho Nacional de Justiça por intermédio da

Reclamação Disciplinar n. 0007997-15.2010.2.00.0000 em 15 de dezembro de 2010,

tendo sido deferido o pedido liminar e suspensa a eficácia da decisão judicial no dia 16

de dezembro de 2010.

O processo foi examinado pelo Plenário do CNJ no dia 12 de abril de 2011,

ocasião em que o Ministro Cezar Peluso (presidente do Supremo Tribunal Federal e do

Conselho Nacional de Justiça à época) pediu vista. O julgamento foi retomado em 13 de

setembro de 2011, momento em que o Ministro Cezar Peluso votou pela conversão da

Reclamação Disciplinar em Sindicância, tendo sido acompanhado pelos demais

conselheiros do Conselho Nacional de Justiça, exceto o Conselheiro Gilberto Valente. A

ementa do caso quanto à medida liminar, embora extensa, é esclarecedora acerca dos

debates travados na sessão do CNJ:

“Após a decisão plenária aqui mencionada veio aos autos

manifestação do Ministério Público do Estado do Pará (evento

147) comunicando a grave circunstância de que JUAREZ

CORREA DOS ANJOS o já mencionado comerciante procurador

do autor da demanda contra o Banco do Brasil tem na agenda de

seu celular o telefone celular da Desembargadora aqui Reclamada (Evento 147. Doc. 123). A manifestação do Ministério Público fez-se

acompanhar de um documento (DOe 125) pelo qual a

Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará comunica ao

Promotor responsável que um informante custodiado com Antonio

Vallinoto Neto um dos supostos integrantes da quadrilha; testemunhou

uma conversa telefônica em que Vallinoto dizia que se a perícia

conseguisse recuperar HD de seu computador encontraria evidências

de que a Desembargadora e a Juíza seriam destinatárias de 30 milhões

cada uma. (...)

É missão deste Conselho de zelar pela defesa do Poder Judiciário

e das prerrogativas de seus membros, sendo necessário para tanto

que suspeitas de corrupção e de eventuais desvios de Magistrados

sejam rigorosamente apuradas. Não se pode, simplesmente, cegar

diante de tão graves acusações, sem ao menos as investigar. As

diligências devem prosseguir para aferir os fatos em questão.

Por fim, importa frisar que o arquivamento da Reclamação promovida

perante o Supremo Tribunal Federal em nada prejudica o raciocínio

aqui exposto. A Reclamação tinha por objeto a liminar deferida neste

procedimento e que suspendeu a decisão que indisponibilizava o

montante já mencionado do Banco do Brasil. Aduzia-se que a liminar

extrapolava os limites da atuação deste Conselho, imiscuindo-se em

matéria jurisdicional. Não se questionava a competência deste

189

Conselho para a apuração dos fatos narrados nos seus aspectos

disciplinares332.

Nossos grifos.

No Supremo Tribunal Federal, a questão foi examinada através da Reclamação

n. 11090 do Distrito Federal, promovida pela Associação dos Magistrados Brasileiros

(AMB) contra o Conselho Nacional de Justiça. A ação se desenvolveu sob relatoria do

Ministro Gilmar Mendes, tendo sido julgada monocraticamente no dia 18 de fevereiro

de 2011.

Embora a questão central fosse relativa ao ato da Corregedora Nacional de

Justiça que suspendera a eficácia de decisão jurisdicional, não foi enfrentada por perda

superveniente de objeto. Em consequência, a ação foi extinta sem julgamento de mérito,

nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil.

No âmbito do Conselho Nacional de Justiça, o caso foi examinado na

Sindicância n. 0005448-95.2011.2.00.0000, que se desenvolveu sob a relatoria do

Corregedor Nacional de Justiça Francisco Falcão e foi decidida em 19 de maio de 2014.

Por unanimidade, determinou-se a abertura de processo administrativo disciplinar contra

a Desembargadora e a Juíza e, por maioria, decidiu-se pelo afastamento das requeridas.

Ficaram vencidos os Conselheiros Gisela Gondin, Emmanoel Campelo e Fabiano

Silveira.

Na decisão, após descrever o caso, o CNJ menciona as provas no inquérito

perante o STJ para apurar suposta prática de crime de corrupção passiva por parte das

magistradas. Através da quebra do sigilo telefônico dos investigados, constatou-se que a

Desembargadora teria mantido contato telefônico com o autor da demanda e com o

advogado que atuou nos autos antes da distribuição do feito. Além disso, também foi

mencionado que a Receita Federal do Brasil detectara indícios de movimentação

financeira irregular por parte da Desembargadora no ano de 2010.

Foi indicada como fundamentação da decisão a presença de indícios de prática

de condutas que contrariavam os arts. 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 19, 24, 25 e 26 do Código de

Ética da Magistratura e o art. 35, I e VIII, da LC n° 35/79.

332 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Medida liminar na Reclamação Disciplinar n. 0007997-

15.2010.2.00.0000. Julgada em 13 de setembro de 2011. Rel. Cons. Eliana Calmon. Decisão: “O

Conselho, por maioria, decidiu converter a reclamação disciplinar em sindicância para apuração dos fatos,

oficiando-se ao Ministério Público do Estado do Pará para os fins constantes do voto da Relatora, vencido

o Conselheiro Jorge Hélio. Manifestou impedimento o Conselheiro Gilberto Martins. Votou o Ministro

Presidente. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros Ney Freitas e Bruno Dantas. Presidiu o

julgamento o Ministro Cezar Peluso. Plenário, 13 de setembro de 2011.”

190

Vale também mencionar neste estudo de caso a conclusão do voto do relator, o

Corregedor Geral de Justiça Francisco Falcão, nos autos da sindicância mencionada:

Queixar-se é lídimo a quem se nega direito, se impõe sanção;

argumentar que houve erro, recorrer, reclamar na mídia. Enfim, não se

conformar. A falta de aplauso é ínsita a atividade jurisdicional.

Contudo, envenena a vida em sociedade a dúvida sobre a higidez

moral da decisão do juiz. A menor suspeita de corrupção deita por

terra a edificação moral que sustenta o poder jurisdicional.

O ambiente forense deve respirar honestidade como bálsamo ao

sofrimento das pessoas que procuram socorro para os direitos que

entendem lanhados. Como se sentiriam futuros jurisdicionados

das reclamadas respirando dúvidas, insegurança ética?

Nossos grifos.

c. Caso Banco Itaú

O segundo caso em que foi criada uma zona de interferência por via concreta e

posterior mediante atuação direta na decisão, atingindo sua eficácia, envolveu o Banco

Itaú. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) suspendeu em 30 de julho de 2013 a

eficácia da decisão judicial proferida pelo magistrado Ari Ferreira de Queiroz, da 3ª

Vara da Fazenda Pública Estadual de Goiânia, nos autos da Reclamação Disciplinar n.

0004319-84.2013.2.00.0000, proposta pelo Banco Itaú em 29 de julho de 2013, cabendo

ao Conselheiro Guilherme Calmon Nogueira da Gama (em exercício na Corregedoria

Nacional de Justiça) a análise liminar do caso.

O Banco Itaú alegou que houvera “celeridade incomum” no trâmite do processo

e “insistente expedição de ordens de transferência de quantia superior a R$ 130 milhões,

mesmo com o feito suspenso por ordem do TJGO [Tribunal de Justiça de Goiás]”, além

de “possível envolvimento do reclamado com representante legal da parte contrária”333.

O Conselheiro Guilherme Calmon Nogueira da Gama, em exercício na

Corregedoria Nacional de Justiça, deferiu liminar334, argumentando que na rotina do

Fórum “não [havia] situações que exig[issem] pressa quase afobada e uso de meios

violentos para a ruptura de obstáculos físicos como cercas, portões, portas, cofres,

333 Disponível em:

http://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/Jurisprudencia.seam;jsessionid=F4DC2380BB5485313BFED30D41329

8F6.node1?jurisprudenciaIdJuris=46580&indiceListaJurisprudencia=1&firstResult=5025&tipoPesquisa=

BANCO. Acesso em: 29 out. 2013. 334 Disponível em:

http://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/Jurisprudencia.seam;jsessionid=F4DC2380BB5485313BFED30D41329

8F6.node1?jurisprudenciaIdJuris=46580&indiceListaJurisprudencia=1&firstResult=5025&tipoPesquisa=

BANCO. Acesso em: 29 out. 2013.

191

paredes”. Resumiu a questão afirmando que o caso contava com partes hiperssuficientes

(pessoas jurídicas) litigando por valores milionários, não havendo qualquer carência de

dinheiro nem “desespero” para recebê-lo, como seria o caso de uma obrigação

alimentar. Foi categórico ao afirmar que: “[A] efetivação da transferência de quase 130

milhões de reais para conta judicial e de cinco milhões decorrentes de astreintes não

parece ser urgente, imperiosa”335. Argumentou também que:

“[A] linha divisória entre a decisão judicial altiva e a que

desborda do razoável, tornando-se teratológica, é fácil de

distinguir quando o conjunto das circunstâncias objetivas e

subjetivas corroboram o ato jurisdicional. Na vigência do AI5

assegurar a vida e liberdade de pessoas por meio de sentenças

judiciais, a altivez saltava aos olhos. Em plena democracia, o denodo

de juízes para cumprimento de decisões atinentes à saúde de pessoas

que estão à mercê de falhas inaceitáveis do serviço público de saúde,

sói ser denotativo de intenso compromisso com os valores que

fundamentam a organização política brasileira. Todavia, são situações

excepcionais, raras no cotidiano forense que é feito de prudência e

lhaneza firme” 336.

Nossos grifos.

Para fundamentar sua decisão, o Conselheiro se socorreu do precedente que

envolveu o Banco do Brasil337, referindo-se à dificuldade de compreensão das razões de

decisão do magistrado requerido e afirmando sua preocupação notadamente quando a

via [em suas palavras]:

“com olhos do povo, para o qual as filigranas jurídicas são opacas,

impenetráveis em suas motivações. A grave repercussão das

dúvidas que assomam dos argumentos apresentados pelo

requerente podem lanhar a reputação do Poder Judiciário.

Alguma mitigação da velocidade do curso processual para expor aos

cidadãos toda a fundamentação é ato de decoro forense. O adiamento

cautelar da transferência do dinheiro da posse do Requerente (Banco

Itaú) para a pessoa jurídica com quem litiga (Roma Empreendimentos

e Turismo Ltda.), até que se clareiem as razões, vem ao encontro da

translucidez que se deseja da ação do Poder Judiciário, do qual não se

335 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Reclamação Disciplinar n. 0004319-84.2013.2.00.0000,

proposta pelo Banco Itaú em 29 de julho de 2013. Rel. Cons. Guilherme Calmon Nogueira da Gama (em

exercício na Corregedoria Nacional de Justiça). 336 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Reclamação Disciplinar n. 0004319-84.2013.2.00.0000,

proposta pelo Banco Itaú em 29 de julho de 2013. Rel. Cons. Guilherme Calmon Nogueira da Gama (em

exercício na Corregedoria Nacional de Justiça). 337 O mesmo caso que foi analisado acima, dispondo que: “[H]á precedente nesta Corregedoria Nacional

de Justiça em caso análogo ao presente, no qual a então Corregedoria Nacional de Justiça Ministra Eliana

Calmon aos 16/12/2010 nos autos do PP nº 0007997-15.2010.2.00.0000 decidiu pela suspensão da ordem

de bloqueio de valores determinada em certo processo”.

192

espera apenas publicidade pro forma, mas verdadeira capacidade de

comunicação para que haja compreensão da ratio decidendi”

Nossos grifos.

O Conselheiro Guilherme Calmon Nogueira da Gama afirmou que, em sua

opinião, o Conselho Nacional de Justiça deveria ser a ligação entre a confiança do povo

“na instituição que distribui justiça, o bem mais precioso do mundo, e a atuação

independente, corajosa dos juízes investidos do dever de atuar para a entrega de

decisões justas a quem delas carece” 338.

Em sua decisão, determinou:

“Dest’arte, com essas considerações, nos termos do art. 25, XI do

Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, ad referendum

do Plenário, visando preservar o decoro do Poder Judiciário,

SUSPENDO ATÉ ULTERIOR DELIBERAÇÃO OS ATOS DO

MAGISTRADO REQUERIDO QUE POSSAM IMPLICAR EM

PERDA DA POSSE DOS VALORES PERTENCENTES AO

REQUERENTE JÁ BLOQUEADOS NOS AUTOS

SUPRACITADOS. Serve a cópia deste despacho como Carta de

Ordem endereçada ao Presidente do Tribunal de Justiça de Goiás,

solicitando dê ciência imediata desta liminar ao magistrado

representado, intimando-o a prestar as informações que reputar

adequadas no prazo de 15 (quinze) dias”339

Nossos grifos.

O caso concreto envolveu a penhora online e a transferência de dinheiro do

Banco Itaú S/A à empresa Roma Empreendimentos e Turismo Ltda., no total de R$ 130

milhões, em ação que tramita no Poder Judiciário desde 1991.

Em entrevista a um jornal local340 em 05 de agosto de 2013 (véspera do

referendo da liminar pelo Plenário do CNJ), o magistrado requerido afirmou sua

convicção diante de sua decisão, mas que daria o devido provimento à determinação do

Conselho Nacional de Justiça e aguardaria a resolução definitiva, afirmando não ter

intenção de questionar a atuação do CNJ neste caso.

O magistrado explicou o caso ao jornal nos seguintes termos:

338 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Reclamação Disciplinar n. 0004319-84.2013.2.00.0000,

proposta pelo Banco Itaú em 29 de julho de 2013. Rel. Cons. Guilherme Calmon Nogueira da Gama (em

exercício na Corregedoria Nacional de Justiça). 339 Disponível em:

http://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/Jurisprudencia.seam;jsessionid=F4DC2380BB5485313BFED30D41329

8F6.node1?jurisprudenciaIdJuris=46580&indiceListaJurisprudencia=1&firstResult=5025&tipoPesquisa=

BANCO. Acessado em 29 out. 2013. 340 FERNANDES, Ketllyn. CNJ suspende decisão do juiz Ari Queiroz sobre a empresa Roma

Empreendimentos, Jornal Opção, Seção Justiça, 5 de agosto de 2013. Disponível em:

<http://www.jornalopcao.com.br/posts/ultimas-noticias/cnj-suspende-decisao-do-juiz-ari-queiroz-sobre-a-

empresa-roma-empreendimentos>. Acesso em: 01 nov. 2013.

193

“[D]e forma bem sintética posso resumir que, ordinariamente, este

caso não se tratava de uma ação contra o Banco Itaú, mas ao extinto

BEG [Banco do Estado de Goiás]. Sendo que a extinção desse banco

acabou fazendo o Itaú entrar no caso. Tanto na primeira instância

quanto o Tribunal [de Justiça de Goiás] entenderam que o Itaú S/A se

tornou o responsável pela dívida. Dessa forma, fiz o que se faz em

qualquer processo: pedi a penhora online, de forma que o dinheiro da

penhora sairia da conta do Itaú para uma conta judicial no Banco do

Brasil até que se desse a conclusão do caso” 341.

Nossos grifos.

Durante a entrevista citada, o magistrado reiterou que o Banco Itaú recorrera e

que o Tribunal de Justiça de Goiás havia negado o recurso, explicando também que, a

partir da determinação do Conselho Nacional de Justiça, o Banco Itaú S/A permanecia

como depositário fiel da quantia presente na decisão cautelar e que, se algum valor

tivesse sido transferido para a conta judicial no Banco do Brasil, o mesmo retornaria à

instituição financeira.

Nas palavras do magistrado: “Ou seja, enquanto não ocorrer a decisão final, a

penhora ocorrerá, mas sem necessidade de o dinheiro ser transferido para outra conta”.

Afirmou ainda que “ao contrário do alegado na representação do Banco ao CNJ, um

trâmite de ‘quase 23 anos’ não pode ser considerado célere” 342.

A liminar concedida na reclamação disciplinar foi ratificada pelo Plenário do

CNJ em 06 de agosto de 2013 na 173ª sessão ordinária, vencidos os Conselheiros Vasi

Werner, José Lucio Munhoz, Silvio Rocha e Emmanoel Campelo, que não ratificaram a

liminar por tratar-se de matéria jurisdicional343.

A empresa Roma Empreendimentos também ingressou em 06 de dezembro de

2014 com mandado de segurança contra o ato de suspensão dos efeitos da decisão

jurisdicional pelo Conselho Nacional de Justiça. O writ foi autuado no Supremo

Tribunal Federal sob o n. 32659 e desenvolvido sob a relatoria do Ministro Luiz Fux344.

O mandado de segurança foi decidido em 18 de novembro de 2014, tendo o

ministro relator lhe negado seguimento, na forma do art. 21, § 1º, do Regimento Interno

do Supremo Tribunal Federal.

341 FERNANDES, Ketllyn, op. cit. 342 FERNANDES, Ketllyn, op. cit. 343 BRASIl. Conselho Nacional de Justiça. Reclamação Disciplinar 0004319-84.2013.2.00.0000. Relator:

Conselheiro Francisco Falcão, Relator para o Acórdão: Guilherme Calmon Nogueira da Gama.

Requerente: Banco Itaú S/A. Requerido: Ari Ferreira de Queiroz. Assunto: TJGO - Apuração - Denúncia

- Infração Disciplinar - Magistrado. 344 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 32659. Min. Rel. Luiz Fux. Julgado em 18 de novembro de

2014.

194

Embora, em sua decisão, o Ministro Luiz Fux tenha reafirmado que o Conselho

Nacional de Justiça, no entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, não

possui competência para suspender os efeitos de ato de conteúdo jurisdicional, em

decorrência de sua natureza exclusivamente administrativa, a questão não foi enfrentada

no mandado de segurança, pois – como afirmou o ministro – a cassação da decisão do

Conselho Nacional de Justiça não seria suficiente para modificar o acórdão já proferido

pelo Tribunal de Justiça de Goiás. Em suas palavras: “[O]u seja, ainda que fosse

concedida a segurança, a impetrante não alcançaria o resultado pretendido com o

presente mandado de segurança”. Vejamos trechos da decisão no Supremo Tribunal

Federal:

“Entretanto, contra a decisão suspensa pelo CNJ, também houve a

interposição de agravo de instrumento pelo Banco Itaú. Embora o

Tribunal de Justiça do Estado de Goiás tenha negado a suspensão

do ato judicial questionado no CNJ, determinou, no julgamento

dos embargos de declaração opostos pela instituição financeira, a

‘manutenção da constrição judicial do dinheiro, devendo o Itaú-

Unibanco S/A permanecer como depositário fiel da quantia, com

as cautelas de estilo, até o trânsito em julgado de todos os atos

judiciais, devendo esclarecer que impõe-se a abertura de uma

conta judicial remunerada na referida instituição financeira,

conforme determinado na decisão agravada’.

Desse modo, a cassação da decisão do CNJ não seria suficiente

para modificar o acórdão já proferido pelo Tribunal de Justiça.

Ou seja, ainda que fosse concedida a segurança, a impetrante não

alcançaria o resultado pretendido com o presente mandado de

segurança” 345.

Nossos grifos.

Vale mencionar que o jornal afirma que em “menos de 30 dias esta é a segunda

decisão de Ari Queiroz que sofre intervenção do Conselho Nacional de Justiça. Na

ocasião anterior o Corregedor Nacional de Justiça, Francisco Falcão, suspendeu decisão

do magistrado que retornava a titularidade do 1º Tabelionato de Notas de Goiânia a

Maurício Borges Sampaio”346. A decisão suspensa é administrativa e por isso não será

objeto da presente tese, uma vez que o recorte da pesquisa se limitou à relação entre a

atividade do Conselho Nacional de Justiça e a independência jurisdicional.

345 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 32659. Min. Rel. Luiz Fux. Julgado em 18 de novembro de

2014. 346 FERNANDES, Ketllyn, op. cit.

195

5.3.2. Síntese conclusiva

Os exemplares selecionados que representam esta zona de relacionamento,

denominada zona de interferência, criada por via concreta e posterior diante de atos

jurisdicionais, revelam a gravidade da conduta dos magistrados e – ao que indicam as

decisões do CNJ – são embasados em provas de materialidade e autoria.

Trata-se de situações que parecem extremas e que, no momento em que levadas

a exame pelo Conselho Nacional de Justiça, poderiam ser objeto de imediata ação para

evitar danos maiores. Diante do binômio gravidade acentuada e possibilidade iminente

de maiores danos, o CNJ agiu – primeiro pela Corregedoria Nacional de Justiça, depois

pelo Conselho em si – suspendendo os efeitos dos atos jurisdicionais que estavam em

desconformidade com a lei, pretendendo salvaguardar direitos das partes envolvidas

diante de conduta extremamente anormal de magistrado.

Carolina Ormanes Massoud, em obra específica sobre a Reforma do Judiciário,

trata das atribuições do Conselho Nacional de Justiça no mesmo ano da instalação do

CNJ. A autora, embora considere que o legislador não tenha atribuído função

jurisdicional ao Conselho Nacional de Justiça, argumenta que a decisão do Conselho

que aplica uma sanção disciplinar a um magistrado (por exemplo, por ter recebido

determinado valor monetário para proferir determinada sentença, como viu-se aqui ao

tratar de indícios de corrupção) deverá, em suas palavras, “ter reflexos no próprio

processo, pois os jurisdicionados não podem ser prejudicados por atos contrários aos

seus interesses”, já que se trataria de decisão jurisdicional fundada não no ordenamento

jurídico, mas no interesse particular de um magistrado347.

Entretanto, a partir da síntese desenvolvida nesta tese acerca das diferenças entre

jurisdição e não jurisdição, conclui-se neste item pela inviabilidade dessa ação, uma vez

que o Conselho Nacional de Justiça não possui jurisdição, ou seja, lhe é vedado

modificar, suspender, anular ou revogar atos jurisdicionais, justamente por não ter

amparo constitucional para esta atribuição.

Embora a autora mencione que a aplicação de penalidade pelo CNJ ao

magistrado – em casos, por exemplo, com indícios de corrupção – deverá ter reflexos no

processo porque os jurisdicionados não podem ser prejudicados, o desenvolvimento

347 MASSOUD. Carolina Ormanes. Criação do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do

Ministério Público. In: VELOSO, Zeno; SALGADO, Gustavo Vaz (Coord.). Reforma do judiciário

comentada. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 171.

196

desta tese permite afirmar que não caberá ao Conselho Nacional de Justiça resolver o

caso com vistas a atender àquele jurisdicionado em específico, mas sim a todos os

jurisdicionados (efetivos ou em potencial), firmando-se assim como órgão fiscalizador

da independência jurisdicional.

197

CONCLUSÃO

Os tópicos iniciais deste trabalho foram dedicados ao plano da tese e notas sobre

a metodologia adotada. No capítulo segundo, ao tratar de Jurisdição e Conselho

Nacional de Justiça, contextualizou-se o tema da tese, identificando os principais atores

aqui envolvidos. Destacou-se a descrição e dimensão do Poder Judiciário brasileiro, que

em 2014 contou com o total de 16.927 magistrados, dos quais 11.631 são da Justiça

Estadual, com despesas totais – no mesmo ano – somando aproximadamente R$ 68,4

bilhões348.

Foi identificada e contextualizada a inclusão do Conselho Nacional de Justiça na

estrutura do Poder Judiciário, abordando-se sua composição e as discussões acerca do

alegado controle externo do Poder Judiciário, tese que restou vencida no Supremo

Tribunal Federal, que declarou a constitucionalidade da existência do CNJ e estabeleceu

alguns parâmetros para sua atuação.

Após enfrentarmos o conflito entre jurisdição e não jurisdição, por meio da

apresentação e revisão da literatura nacional e estrangeira, foi analisada a denominada

questão judicializada, que se concretiza, a título conclusivo após a pesquisa das decisões

do CNJ a respeito do tema, quando há simultaneamente identidade de sujeitos e de

objeto em processos que tramitam no CNJ e em âmbito jurisdicional. Em suma, a

questão judicializada ocorre se satisfeitas duas condições: nas ocasiões em que i. a(s)

mesma(s) parte(s) se socorrem da atividade jurisdicional e ii. o objeto da pretensão

jurisdicional é o mesmo submetido ao Conselho Nacional de Justiça.

Constatou-se – após três estudos de casos – as teses defendidas no âmbito do

Conselho Nacional de Justiça e sua análise judicial pelo Supremo Tribunal Federal,

restando a conclusão de que, em mais de uma centena de casos que tramitaram no

Conselho Nacional de Justiça, analisados durante a pesquisa específica sobre a questão

judicializada, foi constatada ampla jurisprudência em que o Conselho Nacional de

Justiça declina de sua competência em face da atividade jurisdicional.

A motivação deste declínio de competência frequentemente orbitou o binômio

segurança jurídica e vedação de interferência na atividade jurisdicional. Todavia, foram

encontrados alguns casos de exceção, nos quais o Conselho esboçou desvios pontuais de

348 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números 2015, op. cit., p. 31.

198

sua jurisprudência, em especial por duas teses: reserva de competência e critério

cronológico.

Sobre a reserva de competência do CNJ, em alguns casos concretos o Conselho

Nacional de Justiça decidiu que, mesmo diante da questão judicializada, teria ele

próprio competência para prosseguir no julgamento. A outra tese utilizada para que o

CNJ avalie sua competência em face de questão judicializada é a tese do critério

cronológico, segundo a qual o Conselho Nacional de Justiça aceitaria sua competência

para decidir a matéria se o processo administrativo tivesse sido protocolado

anteriormente ao processo judicial.

O Supremo Tribunal Federal enfrentou poucas vezes este tema da relação entre a

questão judicializada e a competência do CNJ, tendo em alguns casos apenas

tangenciado o tema e decidido o caso concreto diante de preliminares processuais,

embora também tenha afirmado que o Conselho Nacional de Justiça não pode interferir

na jurisdição porque tem competência meramente administrativa. Assim, o STF

priorizou a competência jurisdicional, determinando o esvaziamento desta competência

do CNJ. No caso mais recente sobre esta matéria analisado na tese, ainda que não tenha

sido julgado pelo Plenário, considerou-se que a judicialização da matéria, mesmo que

posterior ao protocolo da ação no Conselho Nacional de Justiça, afasta a competência

do Conselho.

Uma conclusão proveniente da análise desses casos é a fragilização da

competência do Conselho Nacional de Justiça diante de qualquer instância judicial. Essa

fragilização ocorre a despeito de o Conselho ser órgão do Poder Judiciário, inserido

topologicamente na Constituição brasileira logo após o Supremo Tribunal Federal e

antes de todos os demais tribunais, e possuir competência própria para questões

administrativas e financeiras do Poder Judiciário em todas suas instâncias e vertentes

(especiais ou comuns), ressalvado o órgão de cúpula do Judiciário nacional (o STF). Em

suma, o Conselho Nacional de Justiça, mesmo diante de sua competência

administrativa, é limitado por qualquer decisão ou mero ajuizamento de ação, desde que

tal decisão ou ação verse sobre o mesmo tema (identidade objetiva) e possua as mesmas

partes (identidade subjetiva).

Após a abordagem do Poder Judiciário e do Conselho Nacional de Justiça, bem

como dos dilemas da jurisdição versus a não jurisdição, em especial pelo estudo de

casos que envolvem a chamada “questão judicializada” no CNJ, foi realizado o

199

mapeamento do tema da proteção constitucional da independência judicial no Brasil,

notadamente por seus instrumentos.

Foi revisado o ordenamento constitucional desde a Constituição do Império até a

promulgada em 1988 e suas emendas, tendo sido cotejadas as normas constitucionais

com o posicionamento da doutrina a respeito de suas peculiaridades, além de traçado o

plano constitucional brasileiro para a manutenção da independência judicial.

Foram descritas as garantias orgânicas (capacidade de autogoverno, autonomia

financeira e capacidade normativa) e individuais (vitaliciedade, inamovibilidade e

irredutibilidade de vencimentos), além de revisada a literatura sobre o tema.

Enfrentou-se as semelhanças e diferenças entre vitaliciedade e inamovibilidade

diante das decisões do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal,

em especial sobre a incidência dessas garantias e o estágio probatório, entre outros

elementos.

Sobre a inamovibilidade, apresentou-se as teses do CNJ e do STF a respeito de

sua incidência diante dos juízes que, embora tenham superado o estágio probatório,

continuavam substitutos, devendo ser decidido sobre a aplicação ou não da

inamovibilidade. O caso julgado no Supremo Tribunal Federal em 05 de agosto de 2014

pela Segunda Turma349 reafirmou que a inamovibilidade deve ser assegurada

indistintamente aos magistrados, sejam titulares ou substitutos, o que não impede sua

designação para atuar em unidade judiciária distinta da qual exerçam ordinariamente

suas atribuições, desde que haja razões de interesse público e elas assim exigirem. Tal

designação, segundo o Supremo, deve ser sempre orientada ao atendimento dos

princípios constitucionais que regem todos os atos administrativos, bem como

devidamente motivada, de modo a permitir que eventuais abusos e desvios de finalidade

possam ser corrigidos.

Complementando o conjunto de instrumentos constitucionais que protegem a

independência judicial, tratou-se das vedações e deveres dos magistrados no exercício

da jurisdição, com o objetivo de identificar e comentar vedações e deveres inerentes ao

exercício da jurisdição que estão previstos na Constituição brasileira e se relacionam,

direta ou indiretamente, com o tema da independência judicial, identificando a face

instrumental dessa independência na Constituição brasileira.

349 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Ordinária n. 1.656 sob a relatoria da Ministra Cármen

Lúcia. Segunda Turma. J. em 05.08.2014.

200

Foi enfrentado, dentre outros, o tema do acúmulo de cargos ou funções pelos

magistrados, descrevendo-se o posicionamento do Supremo Tribunal Federal e do

Conselho Nacional de Justiça. Primeiramente, abordou-se a ADI n. 3126, que tratou da

matéria ao questionar a Resolução n. 336/2003 do Conselho da Justiça Federal,

decidindo que o objetivo da restrição constitucional é o de impedir o exercício da

atividade de magistério que se revele incompatível com os afazeres da magistratura, o

que exige que se avalie, em cada caso concreto, se a atividade de magistério

inviabilizaria o ofício judicante350. Em seguida, abordou-se o Mandado de Segurança n.

25.938, ocasião em que se questionava se magistrado poderia acumular cargo ou função

na Justiça Desportiva, tendo o STF reafirmado sua jurisprudência351.

Quanto ao posicionamento do CNJ, discutiu-se a Resolução nº 34, de 24 de abril

de 2007 do Conselho Nacional de Justiça, que exige compatibilidade entre os horários

fixados para o expediente forense e para a atividade acadêmica (mesmo remunerada),

aceitando - também nessas condições - o exercício de cargos ou funções de coordenação

acadêmica. Porém, veda o desempenho de cargo ou função administrativa ou técnica em

estabelecimento de ensino, desde que não seja em escolas ou cursos dos Tribunais,

associações ou fundações vinculadas a eles, dispondo ainda sobre mecanismos de

fiscalização e controle.

Foi enfrentado ainda o tema da vedação de atividade político-partidária por parte

dos magistrados, concluindo-se que expressar sua opinião como cidadão no uso da

liberdade de expressão não seria objeto dessa vedação; entretanto, entendeu-se que os

limites podem ser aferidos em caso concreto, em especial pelos efeitos de eventual

manifestação sobre seu ato cidadão. O limite parece evidenciar-se com a entrada no

debate político-partidário, o que se daria não por ser a expressão do voto de um cidadão,

mas sim de um magistrado, o que transferiria para o cenário eleitoral a influência de seu

cargo e respeitabilidade de sua atividade.

Outra vedação enfrentada na tese foi a chamada quarentena, isto é, a vedação de

que juízes exerçam a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastaram, antes de

decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração, e

350 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 3126. Rel. Min. Rosa Weber. Decisão liminar em

17.02.2005, na ocasião sob relatoria do Min. Gilmar Mendes. Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI%24%2ESCLA%2E+E

+3126%2ENUME%2E%29+OU+%28ADI%2EACMS%2E+ADJ2+3126%2EACMS%2E%29&base=ba

seAcordaos&url=http://tinyurl.com/aef7zpz>. Acesso em: 28 jan. 2015. 351 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS n. 25.938. Rel. Min. Cármen Lúcia. J. em 24.04.2008.

201

especificamente diante do ex-magistrado nos quadros de sociedade de escritório de

advocacia. Foi especialmente abordada a Medida Cautelar em Suspensão de Segurança

n. 4848 no Supremo Tribunal Federal, relatada pelo Ministro Joaquim Barbosa, que, em

10 de outubro de 2013, suspendeu a liminar proferida no Mandado de Segurança

0053135-87.2013.4.01.3400352, mantendo a extensão da quarentena ao escritório no

qual o ex-magistrado atuava. Embora haja Arguição de Descumprimento de Preceito

Fundamental autuada sob o n. 310 no Supremo Tribunal Federal com pedido de liminar,

constatou-se que até o momento desta pesquisa353 não há decisão a respeito, estando a

ADPF em conclusão ao relator desde 28 de julho de 2015.

O quarto capítulo foi motivado pela investigação da relevância da independência

judicial no sistema internacional. Verificou-se que a independência judicial está

presente nos mais variados atos internacionais e que existem movimentos internacionais

em prol de sua adoção e manutenção.

Após a pesquisa e descrição dos pontos principais de diversos atos

internacionais, fez-se a divisão entre atos internacionais específicos referentes ao

Judiciário, outros atos internacionais e, ainda, atos internacionais que defendem a

independência judicial no âmbito das Cortes internacionais.

Como atos internacionais específicos referentes ao Judiciário, foram analisados

os Princípios Básicos das Nações Unidas Relativos à Independência da Magistratura

(ONU), a Declaração de Beijing sobre os princípios relativos à independência do Poder

Judiciário na região da LAWASIA354, a Carta Europeia sobre o Estatuto dos Juízes, o

Estatuto Universal dos Juízes da União Internacional dos Magistrados e os Princípios de

Conduta Judicial de Bangalore.

Os outros atos internacionais analisados, isto é, atos que trouxeram contribuições

para a temática, mas não trataram especificamente do Judiciário, são o Pacto

Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, a Convenção Internacional sobre a

Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas

Famílias, a Convenção sobre os Direitos da Criança, a Convenção Internacional para a

Proteção de Todas as Pessoas Contra o Desaparecimento Forçado, a Declaração

352 Que tramitou na 22ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, tendo a liminar sido negada

no TRF. 353 26 de setembro de 2015. 354 LAWASIA é a Law Association for Asia and the Pacific. É uma organização internacional que

congrega advogados, juízes, juristas e outros interessados das profissões jurídicas na Região da Ásia

Pacífica. Informações disponíveis em: <http://lawasia.asn.au/profile-of-lawasia.htm>. Acesso em: 27

ago. 2015.

202

Universal dos Direitos Humanos, a Declaração sobre o Direito e a Responsabilidade dos

Indivíduos, Grupos ou Órgãos da Sociedade de Promover e Proteger os Direitos

Humanos e Liberdades Fundamentais Universalmente Reconhecidos (Defensores de

Direitos Humanos), a Resolução 53/144 da Assembleia Geral das Nações Unidas, as

Resoluções 2003/39 e 2004/33 da Comissão de Direitos Humanos, a Carta dos Direitos

Fundamentais da União Europeia, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem

(Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais), a

Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), a

Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, a Carta Democrática

Interamericana e a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (Carta de Banjul).

Por fim, dentre os atos internacionais que buscam a independência judicial no

âmbito das Cortes internacionais, foram analisados os Princípios de Burgh House sobre

a Independência da Judicatura Internacional e o Estatuto de Roma.

Considerando a independência judicial como pressuposto indispensável de

Justiça, concluiu-se que um Estado pode violar suas obrigações internacionais caso seu

Poder Judiciário não seja independente. Vale lembrar que não foi a coercibilidade o

tema deste estudo, e sim a relevância e abundância de atos internacionais que versam

sobre a temática da independência, ilustrando a preocupação global sobre o tema, além

de permitir a compreensão de sua existência e dimensão.

Partindo da premissa de que é possível encontrar diversos conceitos de

independência judicial, realizou-se revisão da literatura pertinente ao tema, pretendendo

revelar diversas definições de independência judicial, compilando-as e identificando

seus autores, semelhanças e diferenças.

Diante da dificuldade em se adotar uma definição de independência judicial,

optou-se por vincular sua definição ao âmbito de abrangência. Embora não se tenha

pretendido apresentar uma definição que encerre o debate, buscou-se na verdade uma

definição sintética que possa ser aplicada e desenvolvida tanto nesta tese quanto em

trabalhos futuros.

Realizando o recorte mais preciso ao tema da tese, a definição concentrou-se em

uma das faces da independência judicial: a independência jurisdicional.

Entendeu-se que independência judicial é gênero que abarca a independência na

prática de atos tanto jurisdicionais quanto administrativos pelos magistrados. Foi

adotado o foco na independência jurisdicional justamente por esta tese se limitar a

203

analisar a atividade jurisdicional do julgador e sua confrontação com a atividade típica

do CNJ. Em outras palavras, não foi objeto desta tese a relação entre a atividade típica

do CNJ e atos administrativos praticados por magistrados, como ocorre nos exemplos já

mencionados ao tratar especificamente do tema, como a atuação do magistrado como

ordenador de despesa em uma licitação para o fórum que dirige, ou quando realiza atos

administrativos de remanejamento de funcionários. Portanto, a pesquisa analisou apenas

atos praticados em decisões judiciais em confronto com a atividade típica do CNJ; desse

modo, fixou-se a expressão independência jurisdicional.

Com base nos autores Sebastian Linares, Germán Burgos Silva e André Ramos

Tavares, buscou-se alguns elementos para definir independência jurisdicional e que

foram agrupados em três eixos, de acordo com os autores citados355.

Concluiu-se ao final que a independência jurisdicional possui natureza de direito

fundamental dos jurisdicionados (sejam efetivos ou em potencial) e de dever dos

magistrados. Nesse sentido, a independência jurisdicional diferencia-se de privilégio

(pelos fins a que se presta) e de prerrogativa (por ser indisponível), exigindo esforços

para sua concretização e mecanismos que evitem o isolacionismo e o corporativismo,

sujeitando as atividades jurisdicionais à fiscalização e atribuindo as responsabilidades

pertinentes.

O quinto e último capítulo foi dedicado à pesquisa empírica sobre a relação da

atividade do CNJ e a independência jurisdicional, tendo apresentado os resultados por

meio de análises descritivas e sínteses conclusivas, sempre considerando a definição de

independência jurisdicional desenvolvida no capítulo quarto desta tese.

Num momento inicial da pesquisa, optou-se por agrupar as decisões em julgados

sobre o error in procedendo e julgados sobre o error in judicando, como feito pelo

próprio CNJ por algumas vezes. Contudo, notou-se que não seria qualquer erro de

procedimento que ensejaria a zona de relacionamento entre a atuação do CNJ e a

independência jurisdicional, pois exigia-se ainda uma qualificação deste erro que

provocasse a parcialidade ou a negligência, ou ainda o reconhecimento de excesso de

linguagem, de impropriedade, ou de indícios de corrupção. Concluiu-se que não seria

355 Eixo 1: A independência jurisdicional sob as dimensões negativa (ausência de vínculos com quaisquer

atores) e positiva (necessidade de se vincular ao Direito e aos autos), utilizadas por Sebastián Linares;

Eixo 2: A independência judicial sob duas perspectivas, de acordo com German Burgos Silva: i.

Normativa: a independência judicial é antes de tudo um meio ligado a fins superiores; ii. Instrumental: a

independência judicial exige a incidência de responsabilidade e controle, e é justamente isso que nos

permite diferenciá-la do isolacionismo e corporativismo. Eixo 3: O Judiciário, os direitos fundamentais e

os direitos fundamentais judiciários (conforme estabelecido por André Ramos Tavares).

204

simplesmente o error in procedendo que provocaria a zona de relacionamento, mas

eventual excesso de linguagem, parcialidade, negligência ou indícios de corrupção, que

conforme a pesquisa, surgiram provenientes ora de error in procedendo, ora de error in

judicando.

Por esses motivos, a divisão inicial revelou-se insuficiente para apontar

detalhadamente padrões mínimos de comportamento do Conselho diante da relação

entre suas atividades e a independência jurisdicional. Diante dessa insuficiência, foi

proposta uma categorização baseada no produto da pesquisa empírica sobre os atos

normativos e decisões do Conselho Nacional de Justiça, sempre segundo o recorte

específico da independência jurisdicional, ou seja, decisões disciplinares ou normativas

que tiveram por objeto atos jurisdicionais.

No total foram computados 1.419 documentos normativos; dentre eles, foram

selecionados os documentos com pertinência ao objeto da tese e que seriam capazes de

criar a zona de relacionamento entre a atuação do CNJ e a independência jurisdicional,

por exemplo, por sugerir método ou procedimento para a tomada de decisão

jurisdicional. Foram encontrados 24 documentos com esse perfil.

Na pesquisa pelo sistema de busca por palavras da seção de jurisprudência do

site do CNJ, foram encontradas 1.331 ocorrências com os parâmetros de busca

indicados no Capítulo 1. Todas essas ocorrências foram analisadas para que se fizesse a

seleção daquelas com pertinência ao objeto de estudo, sendo constatados 83 (oitenta e

três) exemplares de decisões do CNJ que se referiram a atos jurisdicionais.

Em suma, dentre os resultados da pesquisa empírica, que encontrou 2.750

decisões tanto normativas quanto disciplinares, foram selecionadas 107 decisões com

estrita pertinência ao recorte adotado nesta tese, sendo 24 normativas e 83 disciplinares.

Todas foram analisadas e sistematizadas, considerando-se seus denominadores em

comum e criando-se uma categorização diante das situações que ensejaram a zona de

relacionamento.

Diante dessa zona de relacionamento entre a atividade do CNJ e a independência

jurisdicional constatou-se duas espécies de zonas de relacionamento, denominadas zona

de interface e zona de interferência. A primeira é a área em que interagem a atividade

não jurisdicional e a atividade jurisdicional, mais precisamente a atividade do Conselho

Nacional de Justiça e a independência jurisdicional. Na zona de interface, ocorre

interação entre os dois tipos de atividade sem indicação de transformação.

205

Já a zona de interferência é o espaço onde há interação entre a atividade do CNJ

e a independência jurisdicional (esta última pelo seu produto típico, os atos

jurisdicionais), caracterizada pela relação de transformação, uma vez que, nos casos

encontrados na pesquisa, o Conselho Nacional de Justiça decidiu suspender a eficácia

de decisões jurisdicionais.

A sistematização apresentou as zonas de interface e de interferência entre a

atividade do Conselho Nacional de Justiça e a independência jurisdicional, além de

subsidiar a criação dos Apêndices I e II, construídos com trechos selecionados e

grifados dessas decisões e atos normativos. Ao final, a estrutura da sistematização pode

ser descrita da seguinte maneira:

I. Zona de interface entre a atividade do CNJ e a independência jurisdicional:

1. criada por via abstrata e prévia aos atos jurisdicionais;

2. criada por via concreta e posterior diante dos atos jurisdicionais:

a. com utilização de excesso de linguagem ou impropriedades;

b. parciais;

c. negligentes;

d. com indícios de corrupção.

II. Zona de interferência criada por via concreta diante de atos jurisdicionais

A zona de interface entre a atividade do CNJ e a independência jurisdicional

criada por via abstrata e prévia aos atos jurisdicionais foi identificada pelos atos

normativos do Conselho Nacional de Justiça que se referem às decisões jurisdicionais.

Os atos normativos selecionados, embora determinem comportamentos no contexto da

decisão jurisdicional, como a exigência de documentos, a realização de algum

procedimento específico ou, ainda, a busca de informações prévias, não criam zona de

interferência, pois entre esses atos normativos e a independência jurisdicional foi

detectada uma relação que não pode ser considerada de transformação forçada, mas sim

uma relação de interação, geralmente em prol da unidade do Judiciário, que foi aqui

denominada de interface.

Essa zona de interface operou-se abstratamente porque não versa sobre casos

concretos, uma vez que estipula – abstrata e previamente – regras que interagem com os

atos jurisdicionais.

206

Em seguida, por meio da análise descritiva, foram apresentadas as decisões

oriundas do poder disciplinar do Conselho Nacional de Justiça que se referiram a atos

jurisdicionais, isto é, que investigaram e/ou puniram magistrados pelo que foi realizado

em atos jurisdicionais. Entretanto, não ocorreu interferência em nenhuma decisão

jurisdicional analisada nesse momento da pesquisa. Embora tenha havido punições para

os seus prolatores, os atos jurisdicionais se mantiveram ou foram modificados na

estrutura jurisdicional, não sendo transformados ou modificados pelo CNJ.

A análise desses casos possibilitou identificar denominadores comuns em sua

principal motivação; por esses denominadores eles foram triados, constituindo quatro

subcategorias da zona de interface entre a atividade do CNJ e a independência

jurisdicional criada por via concreta e posterior aos atos jurisdicionais. Foram definidas

as seguintes subcategorias: decisões com utilização de excesso de linguagem ou

impropriedades; decisões parciais; decisões negligentes; e decisões com indícios de

corrupção.

Foi em seguida apresentada síntese conclusiva especificamente sobre essa

categoria. Constatou-se que, quanto aos casos em que a zona de interface se estabeleceu

diante de atos jurisdicionais com utilização de excesso de linguagem ou

impropriedades, em apenas um caso ocorreu a punição, caso que se revelou sem dúvida

o mais extremo desta subcategoria, tendo o magistrado atuado de modo discriminatório

e com divulgação excessiva. Os exemplares em que se tratou do excesso de linguagem e

em que não houve punição dos magistrados foram por vezes caracterizados por ausência

de provas e, ainda, pela correlação entre o que foi mencionado pelo magistrado e a

verdade, o que afastou a punição nos casos mencionados.

Outra subcategoria que foi constatada na tese refere-se à existência de

parcialidade nas decisões judiciais, hipótese em que percebe uma zona de interface entre

a atividade do CNJ e a independência jurisdicional criada por via concreta e posterior

diante dos atos jurisdicionais.

Nessa subcategoria foi alocada a maioria das ocorrências. Através da análise dos

casos decididos pelo Conselho Nacional de Justiça, constatou-se a aplicação de critérios

estritos para a verificação da parcialidade. No entanto, uma vez constatada, a

parcialidade ensejou a punição ou abertura de processo administrativo com afastamento

do magistrado em um grande número de decisões.

207

Um dos casos ilustra esse raciocínio que se desprende da maioria das decisões

do CNJ e, por isso, vale mencioná-lo novamente aqui, ainda que brevemente. No

processo em questão, o Conselho afirmou que nem todo caso em que haja suspeição do

magistrado, por ele não reconhecida, ensejaria a punição disciplinar. Contudo, entendeu,

naquele caso específico, que o descumprimento dos deveres funcionais do magistrado

ficou evidenciado pela combinação da patente suspeição do magistrado, em vista de sua

amizade fraternal com os advogados que atuavam no caso judicial concreto (envolvendo

o recebimento de vantagem econômica), com a suspeição da própria conduta do

magistrado, indicando o favorecimento dos mesmos advogados nos processos

mencionados.

Nota-se que a parcialidade combatida nas decisões, via de regra, é aquela patente

e efetiva, geralmente constatada por meio de um conjunto de atos jurisdicionais, sendo

visível na análise caso a caso. Não parece ser suficiente, portanto, a presunção de

parcialidade na hipótese de ausência de reconhecimento de suspeição; mais do que isso,

exigiu-se em diversos casos atos jurisdicionais efetivamente parciais. Quanto à

subcategoria da negligência na atuação jurisdicional, dentre os casos encontrados na

pesquisa e analisados nesta tese, constatou-se que a negligência foi punida nos casos em

que se verificou efetivo prejuízo para o jurisdicionado diante da omissão de magistrado.

Exemplo dessa orientação foi o caso em que a magistrada não estava presente no

plantão judiciário e informou, por intermédio de funcionário e via telefone, que não

despacharia o pedido urgente porque, em sede de plantões judiciais, seria vedada a mera

reiteração de pedido em caso indeferimento do pedido anterior, com fundamento na

Resolução nº 71/CNJ. Contudo, o caso era outro: pedia-se naquele ato o cumprimento

de decisão jurisdicional anterior, portanto, deveria a magistrada apreciar o pedido. A

omissão da magistrada foi reconhecida pelo CNJ, que lhe imputou violação ao dever de

cumprimento com exatidão das disposições legais e dos atos de ofício (art. 35, inc. I, da

LOMAN), tendo sido aplicada a penalidade de advertência, por escrito, fazendo-a

constar em sua ficha funcional, com fundamento no art. 42 e 43 da LOMAN e no art. 4º

da Resolução 135/2011 do CNJ.

Quanto à subcategoria referente à existência de indícios de corrupção na atuação

jurisdicional, uma das principais características em comum encontradas nos casos

oriundos da pesquisa, mais precisamente nos casos em que ocorreu a punição, é a

demonstração cabal de materialidade das infrações disciplinares, dolo e consciência

208

plena da ilicitude por parte do magistrado, tendo sido considerados também a gravidade

da conduta e o grau de culpabilidade.

A última categoria que foi constatada na pesquisa denominou-se zona de

interferência criada por via concreta e posterior aos atos jurisdicionais. A primeira

diferença desta em relação às demais categorias foi justamente a utilização do termo

interferência, pois identificou-se nesses casos a existência de transformação,

precisamente por meio de ato do Conselho Nacional de Justiça que suspendeu a eficácia

de atos jurisdicionais.

Embora tal interferência seja rara dentre as decisões do Conselho Nacional de

Justiça, foi constatada em alguns casos encontrados na pesquisa realizada no sítio oficial

do Conselho na rede mundial de computadores, sendo descritos e analisados três casos

que foram aqui identificados como caso dos tabeliães maranhenses, caso Banco do

Brasil e caso Banco Itaú.

Em comum a esses casos notou-se perigo imediato e abundância de provas a

respeito da parcialidade e/ou ilegalidade dos atos jurisdicionais, tudo isso somado à

imprudência patente e, em dois dos três casos, quantias elevadas que constituiriam

prejuízo para um dos jurisdicionados. Nas ocasiões, o CNJ entendeu que deveria agir de

imediato, pretendendo salvaguardar direitos das partes envolvidas diante de conduta de

magistrado com anormalidade extrema.

Após a sistematização em categorias e subcategorias, adotando-se por critério a

relação entre a atividade do CNJ e os atos jurisdicionais, bem como os efeitos diante da

decisão jurisdicional e a motivação indicada pelo Conselho, pretendeu-se apresentar de

forma organizada essa relação, adotando um posicionamento diante de cada categoria e

indicando se havia ali interface ou interferência, de acordo com o que se definiu sobre a

independência jurisdicional.

As dificuldades que a matéria apresenta parecem ser proporcionais à relevância

de seu estudo. A título de exemplo, menciona-se aqui dois casos divulgados

recentemente pela agência de notícias do CNJ. O primeiro se refere ao afastamento de

um magistrado do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul pelo Plenário

do Conselho Nacional de Justiça, que decidiu, por maioria, também instaurar processo

administrativo disciplinar. Essas medidas foram propostas pela Corregedora Nacional

de Justiça, Ministra Nancy Andrighi, na sessão de 01 de setembro de 2015, sob a

motivação de que a atuação do juiz teria sido anormal, por aparente inobservância de

209

deveres como imparcialidade, transparência, prudência, fundamentação adequada e

atuação independente356.

Vinte dias depois dessa decisão, o Plenário do Conselho Nacional de Justiça

também aprovou, por unanimidade, a abertura de processo administrativo disciplinar

contra dois desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. Eles serão

investigados por (suposta) concessão indevida de liminares durante plantões judiciários

na corte cearense.

Contra um dos desembargadores pesam suspeitas acerca da lisura na concessão

de 15 liminares entre 33 habeas corpus impetrados durante o plantão judiciário de 31 de

dezembro de 2011, número discrepante quando comparado com as estatísticas dos

demais plantonistas da Corte. O desembargador também será investigado pela suspeita

de, no plantão de 21 de dezembro de 2013, conceder dois alvarás de soltura em favor de

uma mesma pessoa mediante a suposta exigência de R$ 10 mil.

O outro desembargador é suspeito de cometer infração disciplinar ao ter

concedido liminar pela soltura de três presos mediante o suposto pagamento de R$ 150

mil. A oferta teria sido feita por dois advogados que, frequentemente, visitariam os dois

desembargadores às vésperas de seus plantões judiciários.

Foram mencionadas nos autos algumas postagens nas redes sociais realizadas

por um advogado, que também é filho de um dos desembargadores, mencionando que

aquele seria o “dia da liminar”, sendo as postagens acompanhadas de fotos de cédulas

de R$ 50,00 e R$ 100,00357.

Por meio desses casos recentes, nota-se que a matéria tratada nesta tese está

presente no Conselho Nacional de Justiça e sua relevância exige estudo e reflexão a

respeito.

Outra forma de aferir a relevância da matéria estudada nesta tese está no Índice

de Confiança na Justiça Brasileira – ICJBrasil, que é um levantamento estatístico de

natureza qualitativa, realizado em sete estados brasileiros, com base em amostra

representativa da população. O índice é publicado pela FGV DIREITO SP e seu

356 AGÊNCIA CNJ DE NOTÍCIAS. CNJ afasta juiz do TJMS para apurar suspeitas de irregularidades. 2

de setembro de 2015. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/80342-cnj-afasta-juiz-do-tjms-

para-apurar-suspeitas-de-irregularidades>. Acesso em: 25 set. 2015. 357 AGÊNCIA CNJ DE NOTÍCIAS. CNJ abre processo administrativo disciplinar contra

desembargadores do TJCE. 23 de setembro de 2015. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/80498-cnj-abre-processo-administrativo-disciplinar-contra-

desembargadores-do-tjce>. Acesso em: 25 set. 2015.

210

objetivo é acompanhar de forma sistemática o sentimento da população em relação ao

Judiciário brasileiro358.

Embora não se pretenda tomar o ICJBrasil como medida para a aferição do que

realmente acontece no Poder Judiciário, pois se trata uma pesquisa de percepção, seus

resultados podem refletir a preocupação generalizada com os temas mais sensíveis ao se

tratar de Judiciário, como os temas de honestidade, parcialidade e independência,

apresentando percepções que exigem respostas por parte do Estado, como a que se

refere à honestidade: 62% dos entrevistados consideraram o Judiciário nada ou pouco

honesto. Outro exemplo é a percepção da imparcialidade e independência: 59% dos

entrevistados acreditaram que o Judiciário é nada ou pouco independente. Não obstante,

a maioria dos entrevistados, a partir do relato de seis situações hipotéticas, declarou que

procuraria o Judiciário para resolver tais conflitos359.

A título conclusivo, entende-se que o Conselho Nacional de Justiça, em sua

recente experiência e contando apenas com uma década de existência, age diante do teor

dos atos jurisdicionais, mas o faz de maneira ainda incipiente e extremamente cuidadosa

na maioria dos casos. Em alguns raros casos, avança e interfere na decisão jurisdicional,

suspendendo sua eficácia. O Conselho decide de tal maneira sem ter seus atos revestidos

de jurisdição, agindo como se a possuísse e escapando de seu desenho constitucional.

Vale mencionar também que, como o CNJ não possui jurisdição, outra dificuldade

surge do fato de que ele não está sujeito a nenhuma regra de jurisdição. Caso lhe seja

reconhecida uma espécie de autorização tácita a exercer a jurisdição, o Conselho

receberia uma espécie de jurisdição universal sem amparo no ordenamento

constitucional ou legal.

Por outro lado, nas ocasiões em que o CNJ age e provoca o que se denominou

aqui de zona de interface, conclui-se que sua atividade não fere a independência

jurisdicional, pois, quando estabelece alguns procedimentos para os atos jurisdicionais,

não intervém de forma coercitiva no resultado desses atos, buscando geralmente

padronização e unidade. Já quando age por seu poder disciplinar diante de atos

jurisdicionais, ele o faz nas ocasiões em que, por alguma razão, o julgador responsável

358 Informações extraídas da página inicial do Índice de Confiança na Justiça Brasileira, coordenado por

Luciana Gross Cunha, cujos relatórios trimestrais são publicados em:

http://direitosp.fgv.br/publicacoes/icj-brasil. 359 CUNHA, Luciana Gross et al. Relatório ICJBrasil: 2º e 3º trimestres 2014. Vol. 20, p. 13. FGV

DIREITO SP. Disponível em:

<https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/13599/Relat%C3%B3rio%20ICJBrasil_2

%C2%BA-e-3%C2%BA-Trim_2014.pdf?sequence=3&isAllowed=y>. Acesso em: 20 out. 2015.

211

pelos atos jurisdicionais tenha agido contrariamente à independência jurisdicional por

ter decidido parcialmente, com excesso de linguagem, de modo negligente ou com

indícios de corrupção.

Em todos esses casos, é justamente o julgador quem afasta dos atos

jurisdicionais a independência jurisdicional. Uma vez que, como sustentado nesta tese, a

independência jurisdicional não é prerrogativa, privilégio ou direito do juiz, sendo,

portanto, indisponível e ao mesmo tempo um dever que exige fiscalização, deve o

Conselho Nacional de Justiça agir, não para ferir a independência jurisdicional, mas sim

para restabelecê-la. A independência jurisdicional deve, assim, ser restabelecida não no

caso individual, uma vez que caberá aos órgãos jurisdicionais a respectiva solução, mas

em sua potencialidade, informando-se a todos os envolvidos no sistema judicial que há

órgão nacional incumbido, dentre outros, do dever constitucional de controle do

cumprimento dos deveres funcionais dos juízes e de zelar pela autonomia do Poder

Judiciário.

212

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______. Reclamação Disciplinar nº 200830000000760. Rel. Cons. Altino Pedrozo dos

Santos, 80ª Sessão, j. 17.03.09, DJU 06.04.09.

______.Processo n. 0006086-65.2010.2.00.0000, Recurso Administrativo. Rel. Walter

Nunes. Julgado em 09.11.2010 na 116ª Sessão Ordinária.

______. Pedido de Providências n. 512. Rel. Paulo Lôbo. Julgado em 19.09.2006 na 25ª

sessão.

______. Revisão Disciplinar n. 391. Rel. Cons. José Adonis Callou de Araújo Sá, 69ª

Sessão, j. 09.09.08, DJU 26.09.08.

______. Revisão Disciplinar nº 200810000005120 e REP nº 200810000005118. Rel.

Cons. Rui Stoco, 65ª Sessão, j. 24.06.08, DJU 05.08.08.

______. Processo n. 0003590-97.2009.2.00.0000. Rel. Paulo Tamburini. Rel. p/

Acórdão Walter Nunes. 119ª Sessão, j. 25.01.2011.

______. Processo n. 0000786-54.2012.2.00.0000. Rel. Tourinho Neto. Rel. p/ acórdão:

Lucio Munhoz. 165ª Sessão, j. 19.03.2013.

______. Procedimento de Controle Administrativo n. 0005673-81.2012.2.00.0000.

Plenário, Rel. Conselheiro Silvio Rocha, j. 08/10/2013.

______. Revisão Disciplinar n. 0000325-53.2010.2.00.0000. Plenário, Rel. Conselheiro

José Adonis Sá, j. 18/05/2010.

214

______. Pedido de Providências n. 1400. Plenário, Rel. Conselheiro Rui Stoco, j.

11/09/2007.

______. Recurso Administrativo em Pedido de Providências n. 0000295-

86.2008.2.00.0000 62. Plenário, Rel. Conselheiro Felipe Locke Cavalcanti, j.

13.05.2008.

______. Procedimento de Controle Administrativo n. 0001844-34.2008.2.00.0000.

Plenário, Rel. Conselheiro João Oreste Dalazena, j. 02/12/2008.

______. Procedimento de Controle Administrativo n. 0002346-70.2008.2.00.0000.

Plenário, Rel. Conselheiro Marcelo Nobre, j. 07/05/2009.

______. Pedido de Providências 0006179-62.2009.2.00.0000. Plenário, Rel. Ministro

Gilson Dipp / Ministra Eliana Calmon, arquivado sem julgamento definitivo por força

da decisão do STF.

______. Processo de Controle Administrativo n. 0003873-18.2012.2.00.0000. Plenário,

Rel. Conselheiro Jorge Hélio de Oliveira, j. 21/08/2012.

______. Procedimento de Controle Administrativo n. 0003940-80.2012.2.00.0000.

Plenário, Rel. Conselheiro Jorge Hélio, j. 30/04/2013.

______. Procedimento de Controle Administrativo n. 0006290-75.2011.2.00.0000.

Plenário, Rel. Conselheiro Jorge Hélio, j. 28/02/2012.

______. Procedimento de Controle Administrativo n. 0000956-26.2012.2.00.0000.

Plenário, Rel. Conselheiro Jorge Hélio, j. 21/05/2012.

______. Procedimento de Controle Administrativo n. 0002535-09.2012.2.00.0000.

Decisão Monocrática, Rel. Conselheiro Jorge Hélio, j. 21/04/2012.

______. Procedimento de Controle Administrativo n. 0002537-76.2012.2.00.0000.

Plenário, Rel. Conselheiro Silvio Rocha, j. 28/05/2013.

______. Procedimento de Controle Administrativo n. 0003873-18.2012.2.00.0000.

Plenário, Rel. Conselheiro Jorge Hélio de Oliveira, j. 21/08/2012.

______. Revisão Disciplinar n. 0001235-51.2008.2.00.0000. Rel. Jorge Maurique. 81ª

Sessão. J. em 31.03.2009.

______. Revisão Disciplinar n. 0001727-43.2008.2.00.0000. Rel. Jorge Maurique. Rel.

p/ o acórdão Rui Stoco. 81ª Sessão. J. em 31.03.2009.

______. PDA n. 0001923-76.2009.2.00.0000. Rel. Leomar Barros. 108ª Sessão. J. em

29.06.2010.

______. Reclamação Disciplinar n. 0005930-09.2012.2.00.0000. Rel. Cons. Ana Maria

Duarte Amarante Brito. J. em 20 de maio de 2014.

215

______. Processo Administrativo n. 0001460-03.2010.2.00.0000. Rel. Milton Nobre.

123ª Sessão. J. em 29.03.2011.

______. Reclamação Disciplinar n. 0007678-76.2012.2.00.0000. Rel. Francisco Falcão.

Julgada em 08.10.2013 na 176ª sessão.

______. Avocação n. 0002549-95.2009.2.00.0000. Relator Corregedor Nacional de

Justiça Gilson Dipp. Julgado em 17.08.2010.

______. Sindicância n. 0002699-76.2009.2.00.0000. Relator Corregedor Nacional de

Justiça Gilson Dipp. Julgado em 29.06.2010.

______. Avocação n. 0002544-73.2009.2.00.0000. Relator Corregedor Nacional de

Justiça Gilson Dipp. Julgado em 03.08.2010.

______. Reclamação Disciplinar n. 0006159-71.2009.2.00.0000. Relator Corregedor

Nacional de Justiça Gilson Dipp. Julgado em 06.04.2010.

______. Sindicância n. 0003173-76.2011.2.00.0000 relatoria do Corregedor Nacional

de Justiça Francisco Falcão, julgada em 23 de setembro de 2013.

______. Reclamação Disciplinar n. 0001163-25.2012.2.00.0000. Relator Corregedor

Nacional de Justiça Francisco Falcão. J. em 16.06.2014.

______. Processo Administrativo Disciplinar n. 0005993-05.2010.2.00.0000. Rel.

Walter Nunes. Julgado em 15.03.2011 na 122ª Sessão.

______. Processo Administrativo Disciplinar n. 0003752-24.2011.2.00.0000, julgado na

156ª Sessão Ordinária.

______. Processo Administrativo Disciplinar n. 0004057-42.2010.2.00.0000, Relator

Conselheiro Marcelo Neves, Relatora para o Acórdão Corregedora Nacional de Justiça

Eliana Calmon, julgado em 14.02.2012.

______. Pedido de Providências - Corregedoria n. 0007384-92.2010.2.00.0000,

Relatora Corregedora Nacional de Justiça Eliana Calmon, Relator para o acórdão

Conselheiro Sílvio Rocha, julgado em 25.10.2011.

______. Processo de Revisão Disciplinar 0003862-86.2012.2.00.0000, Relator

Conselheiro Jefferson Luis Kravchychyn, julgado em 11.12.2012.

______. Processo Administrativo Disciplinar n. 0002789-79.2012.2.00.0000, Relator

Conselheiro Gilberto Martins, j. 166ª Sessão Ordinária.

______. Processo Administrativo n. 0001460-03.2010.2.00.0000. Rel. Milton Nobre.

Julgado em 29.03.2011 na 123ª sessão.

______. Revisão Disciplinar 0001727-43.2008.2.00.0000. Rel. Jorge Maurique. Rel. p/

o acórdão Rui Stoco. Julgado em 31.03.2009. 81ª Sessão.

216

______. Processo Administrativo Disciplinar n. 0004353-64.2010.2.00.0000, Rel.

Milton Nobre, julgado em 29.03.2011

______. Processo Administrativo Disciplinar n. 0001589-08.2010.2.00.0000, Rel. Vasi

Werner, julgado em 28.02.2012 na 142ª sessão

______. Processo Administrativo Disciplinar n. 0005953-86.2011.2.00.0000, Rel.

Emmanoel Campelo, j. 170ª Sessão Ordinária.

______. Processo Administrativo Disciplinar n. 0005993-05.2010.2.00.0000. Rel.

Walter Nunes. Julgado em 15.03.2011 na 122ª Sessão.

______. Processo de Revisão Disciplinar n. 0003862-86.2012.2.00.0000, Rel. Cons.

Jefferson Luis Kravchychyn, julgado em 11.12.2012.

______. Pedido de Providências n. 0006179-62.2009.2.00.0000. Plenário, Rel. Ministro

Gilson Dipp / Ministra Eliana Calmon, arquivado sem julgamento definitivo por força

da decisão do STF.

______. Medida liminar na Reclamação Disciplinar n. 0007997-15.2010.2.00.0000.

Julgada em 13 de setembro de 2011. Relatora Conselheira Eliana Calmon.

______. Reclamação Disciplinar n. 0004319-84.2013.2.00.0000, proposta pelo Banco

Itaú em 29 de julho de 2013. Rel. Cons. Guilherme Calmon Nogueira da Gama (em

exercício na Corregedoria Nacional de Justiça).

______. Reclamação Disciplinar n. 200830000000760, Rel. Cons. Altino Pedrozo dos

Santos, 80ª Sessão, j. 17.03.09, DJU 06.04.09.

______. Processo n. 0003590-97.2009.2.00.0000. Rel. Paulo Tamburini. Rel. p/

Acórdão Walter Nunes. Julgado em 25.01.2011 na 119ª Sessão Ordinária.

______. Processo n. 0000786-54.2012.2.00.0000. Rel. Tourinho Neto. Rel. p/ acórdão:

Lucio Munhoz. Julgado em 19.03.2013 na 165ª Sessão Ordinária.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AO 1.706 AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso

de Mello, j. 18/12/2013.

______. MS 28.598/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello, j. 14/10/2010, Decisão

liminar.

______. MS 25.879 AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, j.

23/08/2006.

______. MS 26.284/DF. Plenário, Rel. Ministro Menezes Direito, j. 31/03/2008.

______. MS 28.174 AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, j.

14/10/2010.

217

______. MS 28.598/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello, j. 14/10/2010.

______. MS 28.611 MC-AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello, j.

14/10/2010.

______. MS 27.148 AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello, j. 11/05/2011.

______. MS 29.744 AgR/DF. Plenário, Rel. Ministro Gilmar Mendes, j. 29/06/2011.

______. MS 27.650/DF. 2ª Turma, Rel. Ministra Cármen Lúcia, j. 24/06/2014.

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______. ADI 3367. Rel. Ministro Cezar Peluso, j. em 13/04/2005.

______. MS 28.598/DF. Plenário, Rel. Ministro Celso de Mello, j. 14/10/2010, Decisão

liminar.

______. MS 32659. Min. Rel. Luiz Fux. Julgado em 18 de novembro de 2014.

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225

APÊNDICE I

ATOS NORMATIVOS

RECOMENDAÇÃO Nº 3, DE 30 DE MAIO DE 2006

Recomenda a especialização de varas criminais para processar e julgar delitos

praticados por organizações criminosas e dá outras providências

A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas

atribuições, tendo em vista o decidido na Sessão de 30 de maio de 2006, e

CONSIDERANDO a necessidade de o Estado combater o crime organizado,

mediante a concentração de esforços e de recursos públicos e informações;

CONSIDERANDO a necessidade de resposta judicial ágil e pronta, em relação às

medidas especiais de investigação aplicáveis no combate ao crime organizado, nos

termos da Lei nº 9.034/95 e da Convenção de Palermo;

CONSIDERANDO que a especialização ao combate ao crime organizado já foi

levada a efeito pelo Ministério Público e pelas Forças Policiais;

CONSIDERANDO que a especialização de varas tem se revelado medida salutar,

com notável incremento na qualidade e na celeridade da prestação jurisdicional,

em especial para o processamento de delitos de maior complexidade, seja quanto

ao modus operandi, seja quanto ao número de pessoas envolvidas;

CONSIDERANDO que os Tribunais Regionais Federais possuem autorização legal

para especializar varas, de acordo com o disposto nos artigos 11 e 12 da Lei nº

5.010/66, c/c o artigo 11, parágrafo único, da Lei nº 7.727/89 e que os Tribunais de

Justiça dos Estados estão também autorizados a especializar varas nos termos da

legislação de organização judiciária local, resolve

RECOMENDAR

1. Ao Conselho da Justiça Federal e aos Tribunais Regionais Federais, no que respeita

ao Sistema Judiciário Federal, bem como aos Tribunais de Justiça dos Estados, a

especialização de varas criminais, com competência exclusiva ou concorrente, para

processar e julgar delitos praticados por organizações criminosas.

2. PARA OS FINS DESTA RECOMENDAÇÃO, SUGERE-SE:

A) A ADOÇÃO DO CONCEITO DE CRIME ORGANIZADO ESTABELECIDO NA CONVENÇÃO

DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE CRIME ORGANIZADO TRANSNACIONAL, DE 15 DE

NOVEMBRO DE 2000 (CONVENÇÃO DE PALERMO), APROVADA PELO DECRETO

226

LEGISLATIVO Nº 231, DE 29 DE MAIO DE 2003 E PROMULGADA PELO DECRETO Nº

5.015, DE 12 DE MARÇO DE 2004, OU SEJA, CONSIDERANDO O "GRUPO CRIMINOSO

ORGANIZADO" AQUELE ESTRUTURADO, DE TRÊS OU MAIS PESSOAS, EXISTENTE HÁ

ALGUM TEMPO E ATUANDO CONCERTADAMENTE COM O PROPÓSITO DE COMETER UMA

OU MAIS INFRAÇÕES GRAVES OU ENUNCIADAS NA CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS

SOBRE CRIME ORGANIZADO TRANSNACIONAL, COM A INTENÇÃO DE OBTER, DIRETA

OU INDIRETAMENTE, UM BENEFÍCIO ECONÔMICO OU OUTRO BENEFÍCIO MATERIAL.

b) o processamento, perante a vara criminal especializada, dos crimes previstos no item

1, qualquer que seja o meio, modo ou local de execução, inclusive as ações e incidentes

relativos a seqüestro e apreensão de bens, direitos ou valores, pedidos de restituição de

coisas apreendidas, busca e apreensão, hipoteca legal e quaisquer outras medidas

assecuratórias, bem como todas as medidas relacionadas com a repressão penal de que

tratam os itens 1 e 2, inclusive medidas cautelares antecipatórias ou preparatórias.

b.1) se forem vários os atos conexos de execução, ou se não for possível identificar o

local ou a data do início dos atos de execução, que qualquer deles seja considerado

para a fixação da competência; e quando os atos de execução forem praticados em

mais de um Estado, que seja competente a vara criminal especializada que

primeiro tiver conhecimento dos fatos.

[...]

Ministra Ellen Gracie Northfleet

Presidente

RECOMENDAÇÃO N° 18

Recomenda aos Magistrados Criminais que evitem a denominação dada às operações

policiais em atos judiciais.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições, e

CONSIDERANDO que a Emenda Constitucional n.45/2004 atribuiu ao Conselho Nacional de

Justiça o poder de recomendar providências; e

CONSIDERANDO a generalização da prática de adoção de denominações de efeito a

investigações ou operações policiais, adotadas pela mídia, e sua utilização em atos judiciais;

CONSIDERANDO o princípio da dignidade da pessoa humana;

CONSIDERANDO o dever do magistrado de adotar linguagem apropriada e evitar

excessos (LOMAN, art. 41);

227

RESOLVE:

RECOMENDAR aos Magistrados Criminais que evitem a utilização das denominações de

efeito dadas as operações policiais em atos judiciais.

Publique-se e encaminhe-se cópia desta Recomendação a todos os Tribunais de Justiça.

Brasília, 4 de novembro de 2008.

Ministro Gilmar Mendes

Presidente

RECOMENDAÇÃO N° 20, de 16 de dezembro de 2008.

Recomenda aos tribunais que proporcionem maior intercâmbio de experiências no âmbito

da execução penal, a adoção de processo eletrônico, a estruturação e a regionalização das

varas de execuções penais; e, aos juízes, maior controle dos mandados de prisão.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições, e

CONSIDERANDO as propostas apresentadas pelos juízes de execuções penais, no primeiro

seminário de execução penal realizado em 11/09/08;

CONSIDERANDO o decidido pelo Grupo de Trabalho de Execução Penal, instituído pela

Portaria nº 383, de 18 de setembro de 2008;

CONSIDERANDO que a realidade constatada pelo Conselho Nacional de Justiça, nos

mutirões carcerários, indica a necessidade de medidas no sentido de priorizar o

andamento dos processos de execução penal;

CONSIDERANDO a existência de inúmeros mandados de prisão pendentes de

cumprimento em relação aos quais a pena encontra-se prescrita ou não mais se justifica a

privação da liberdade;

CONSIDERANDO a necessidade de maior integração entre os juízes de execução penal;

CONSIDERANDO o que foi decidido na Sessão Plenária do dia 16/12/2008;

RESOLVE:

[...]

ART. 2º RECOMENDAR AOS JUÍZES QUE:

I – FAÇAM CONSTAR DO MANDADO DE PRISÃO SEU TERMO FINAL DE VALIDADE,

VINCULADO AO PRAZO PRESCRICIONAL, E OUTRAS CAUTELAS QUE ENTENDEREM

NECESSÁRIAS;

II – SUBMETAM A REEXAME OS MANDADOS DE PRISÃO JÁ EXPEDIDOS E AINDA

PENDENTES DE CUMPRIMENTO, À VISTA DAS CAUTELAS MENCIONADAS NA ALÍNEA

ANTERIOR,

228

Publique-se e encaminhe-se cópia desta Recomendação a todos os Tribunais de Justiça.

Brasília, 16 de dezembro de 2008.

Ministro Gilmar Mendes

Presidente

RECOMENDAÇÃO N° 19, DE 16 DE DEZEMBRO DE 2008

Recomenda aos Tribunais de Justiça Estaduais e Militares, Regionais Federais e Regionais

do Trabalho destinarem os recursos recebidos em transações penais ao Fundo Estadual da

Defesa Civil de Santa Catarina para as vítimas das enchentes.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições, e

CONSIDERANDO a situação delineada nos autos do PCA nº 31038, bem como a proposição

do Conselheiro Relator Jorge Antonio Maurique, a qual foi acolhida por unanimidade pelo

Plenário na Sessão de 02.12.2008;

CONSIDERANDO a situação de calamidade pública enfrentada no estado de Santa

Catarina;

CONSIDERANDO a anormalidade dos trabalhos forenses e as dificuldades materiais dos

servidores do Poder Judiciário local, bem como as dificuldades dos respectivos

jurisdicionados; e

CONSIDERANDO a possibilidade de serem destinados recursos materiais e humanos por

meio de transação penal e outras sanções de naturezas diversas às vítimas das enchentes

naquela localidade;

RESOLVE RECOMENDAR AOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA, AOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA

MILITAR, AOS TRIBUNAIS REGIONAIS FEDERAIS E AOS TRIBUNAIS REGIONAIS DO

TRABALHO, QUE SEJA ENCORAJADA, AOS SEUS RESPECTIVOS MEMBROS, A DESTINAÇÃO

DOS RECURSOS, PROVENIENTES DE APLICAÇÃO DE PENAS RESTRITIVAS DA LIBERDADE EM

PENAS ALTERNATIVAS, PARA AUXÍLIO HUMANITÁRIO ÀS VÍTIMAS DAS ENCHENTES EM

SANTA CATARINA, POR MEIO DE DEPÓSITOS, DESTINADOS AO FUNDO ESTADUAL DE DEFESA

CIVIL DAQUELE ENTE, PERANTE O BANCO DO BRASIL, AGÊNCIA 3.582-3, CONTA

CORRENTE 80.000-7, BEM COMO, NA MEDIDA DAS POSSIBILIDADES LEGAIS, DE OUTRAS

SANÇÕES PECUNIÁRIAS EM MATÉRIA CIVIL, PENAL, MILITAR E TRABALHISTA.

Publique-se e encaminhe-se cópia desta Recomendação a todos os Tribunais referidos.

Brasília, 16 de dezembro de 2008.

Ministro GILMAR MENDES

Presidente

RECOMENDAÇÃO Nº 22, DE 4 DE MARÇO DE 2009

229

Recomenda aos tribunais que priorizem e monitorem permanentemente demandas

jurídicas envolvendo conflitos fundiários.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições,

CONSIDERANDO a existência, no Brasil, de elevado número de processos judiciais

envolvendo questões fundiárias,

CONSIDERANDO ainda que a atividade judiciária é essencial para a pacificação dos

conflitos sociais,

CONSIDERANDO, finalmente, que a contenção dos crescentes níveis de violência

constatados diariamente sobre esse tema depende de uma atuação alerta, assertiva e eficaz

do sistema de justiça em nosso país;

RESOLVE:

RECOMENDAR aos Tribunais e às Varas que:

I - priorizem e monitorem constantemente o andamento dos processos judiciais

envolvendo conflitos fundiários;

II - implementem medidas concretas e efetivas objetivando o controle desses andamentos.

Publique-se e encaminhe-se cópia desta Recomendação para todos os Tribunais da Justiça

Comum Estadual, Federal e do Distrito Federal.

Brasília, 4 de março de 2009.

Ministro GILMAR MENDES

Presidente

RECOMENDAÇÃO N° 23, de 12 de junho de 2009.

Recomenda aos Tribunais de Justiça Estaduais e Militares, Tribunais Regionais Federais e

Tribunais Regionais do Trabalho a destinarem os recursos recebidos em transações penais

à Defesa Civil do Amazonas, Ceará, Maranhão, Pará e Piauí para as vítimas das

enchentes.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições, e

CONSIDERANDO a situação delineada nos noticiários nacionais e regionais, bem como a

proposição do Conselheiro Relator Jorge Antonio Maurique, a qual foi acolhida por

unanimidade pelo Plenário na Sessão de 09.06.2009;

CONSIDERANDO a situação de calamidade pública enfrentada nos Estados de Amazonas,

Ceará, Maranhão, Pará e Piauí;

CONSIDERANDO a anormalidade dos trabalhos forenses e as dificuldades materiais dos

servidores do Poder Judiciário local, bem como as dificuldades dos respectivos jurisdicionados;

e

230

CONSIDERANDO a possibilidade de serem destinados recursos materiais e humanos por meio

de transação penal e outras sanções de naturezas diversas às vítimas das enchentes naquela

localidade;

RESOLVE RECOMENDAR:

AOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA, AOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA MILITAR, AOS TRIBUNAIS

REGIONAIS FEDERAIS E AOS TRIBUNAIS REGIONAIS DO TRABALHO, QUE SEJA

ENCORAJADA, AOS SEUS RESPECTIVOS MEMBROS, A DESTINAÇÃO DOS RECURSOS,

PROVENIENTES DE APLICAÇÃO DE PENAS RESTRITIVAS DA LIBERDADE EM PENAS

ALTERNATIVAS, PARA AUXÍLIO HUMANITÁRIO ÀS VÍTIMAS DAS ENCHENTES NO

AMAZONAS, CEARÁ, MARANHÃO, PARÁ E PIAUÍ, POR MEIO DE DEPÓSITOS, DESTINADOS

À DEFESA CIVIL DE CADA UM DELES, BEM COMO, NA MEDIDA DAS POSSIBILIDADES

LEGAIS, DE OUTRAS SANÇÕES PECUNIÁRIAS EM MATÉRIA CIVIL, PENAL E MILITAR E

TRABALHISTA.

Publique-se e encaminhe-se cópia desta Recomendação a todos os Tribunais referidos.

Ministro Gilmar Mendes

Presidente

RECOMENDAÇÃO N° 24, de 04 de agosto de 2009.

Recomenda aos juízes e tribunais a realização de mutirão para instrução e julgamento de

processos criminais e sessões de julgamento do Tribunal do Júri.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições, e

CONSIDERANDO o que se tem apurado nas inspeções da Corregedoria Nacional de Justiça e

nos mutirões carcerários coordenados pelo Conselho Nacional de Justiça, em relação ao

funcionamento ao Sistema de Justiça Criminal;

CONSIDERANDO a grande quantidade de processos pendentes de instrução e julgamento,

especialmente os afetos à competência do Tribunal do Júri;

CONSIDERANDO a necessidade de se dar resposta rápida e efetiva em relação a esses crimes

de gravidade inquestionável;

CONSIDERANDO o que dispõe o artigo 457 da Lei nº 11.689, de 09 de junho de 2008, quanto

à possibilidade de realização da sessão de julgamento mesmo sem a presença do réu;

CONSIDERANDO o que foi decidido pelo Conselho Nacional de Justiça no PCA nº 043/2005.

RESOLVE:

Art. 1º RECOMENDAR aos Juízes e Tribunais que:

I - viabilizem mutirões para instrução e julgamento de processos criminais, dando

preferência: a) aos processos de réus presos, com atenção especial ao cumprimento da

231

Meta nº 2 do Planejamento Estratégico do Poder Judiciário; b) aos processos afetos à

competência do Tribunal do Júri, com atenção idêntica.

II - viabilizem mutirões para a realização de sessões de julgamento do Tribunal do Júri,

dando preferência: a) aos processos de réus presos, com atenção especial ao cumprimento

da Meta nº 2 do Planejamento Estratégico do Poder Judiciário; b) aos processos com réus

soltos; c) àqueles que possam ser realizadas sem a presença do réu.

III - em reforço aos titulares das varas beneficiadas, seja criado grupo de trabalho composto por

juízes, que terão jurisdição em todo o Estado ou região, e por servidores em número compatível

com a quantidade de processos que serão levados a instrução e julgamento e sessões de

julgamento;

IV - os juízes comuniquem às Corregedorias locais, e os Tribunais à Corregedoria Nacional de

Justiça, os óbices ao desencadeamento do mutirão, para que se viabilize atuação conjunta,

inclusive no âmbito do Programa Integrar, do Conselho Nacional de Justiça;

V - os Tribunais promovam ações integradas com as demais instituições, sobretudo com o

Ministério Público, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil, Administração

Penitenciária e Instituições de Ensino, a fim de se viabilizar o cumprimento da presente

recomendação;

VI - os Tribunais comuniquem à Corregedoria Nacional de Justiça os resultados dos mutirões;

Publique-se e encaminhe-se cópia desta Recomendação aos Presidentes e Corregedores dos

Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais, bem como aos Gestores da Meta 2 desses

tribunais.

Ministro Gilmar Mendes

Presidente

RECOMENDAÇÃO Nº 30, DE 10 DE FEVEREIRO DE 2010

Recomenda a alienação antecipada de bens apreendidos em procedimentos criminais e dá

outras providências.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições, e

CONSIDERANDO que a eficiência e a efetividade das decisões judiciais são objetivos a serem

perseguidos pelo Poder Judiciário, a teor da Resolução nº 70 do Conselho Nacional de Justiça;

CONSIDERANDO o volume, importância e valor dos bens móveis apreendidos em processos

penais em andamento em todo o país, tais como aeronaves, embarcações, veículos automotores

e equipamentos de informática, tanto na Justiça Estadual como na Justiça Federal, conforme

dados informados no Sistema Nacional de Bens Apreendidos (Resolução CNJ n. 63);

CONSIDERANDO A CONVENIÊNCIA E, SOBRETUDO, A URGÊNCIA NA DELIBERAÇÃO PELOS

JUÍZES EM FACE DA NECESSIDADE DE ADMINISTRAÇÃO DOS BENS APREENDIDOS E QUE, SEM

232

EMBARGO DAS DETERMINAÇÕES JUDICIAIS PRÓXIMAS OU FUTURAS, ESTÃO SOB A

RESPONSABILIDADE MATERIAL ADMINISTRATIVA DO PODER JUDICIÁRIO;

CONSIDERANDO o encargo dos magistrados, juízes de primeiro ou segundo grau, em

cada caso, de prover sobre a proteção, manutenção e oportuna restituição ou destinação

desses bens na mesma quantidade, qualidade ou funcionalidade em que foram apresados;

CONSIDERANDO a necessidade de preservar os valores correspondentes aos bens

apreendidos, naturalmente sujeitos à depreciação, desvalorização ou descaracterização

pelo tempo, pelo desuso, pela defasagem ou pelo simples envelhecimento inevitável;

CONSIDERANDO O PODER GERAL DE CAUTELA E, POR ANALOGIA, O DISPOSTO NOS ARTS.

120 E §§, 122 E §, 123 E 133 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL; E

CONSIDERANDO o deliberado pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça na 98ª Sessão,

realizada em 10 de fevereiro de 2010, nos autos ATO 0000828-74.2010.2.00.0000.

RECOMENDA:

I - AOS MAGISTRADOS COM COMPETÊNCIA CRIMINAL, NOS AUTOS DOS QUAIS EXISTAM

BENS APREENDIDOS SUJEITOS À PENA DE PERDIMENTO NA FORMA DA LEGISLAÇÃO

RESPECTIVA, QUE:

a) mantenham, desde a data da efetiva apreensão, rigoroso acompanhamento do estado da coisa

ou bem, diretamente ou por depositário formalmente para isso designado sob responsabilidade;

B) ORDENEM, EM CADA CASO E JUSTIFICADAMENTE, A ALIENAÇÃO ANTECIPADA DA COISA

OU BEM APREENDIDO PARA PRESERVAR-LHE O RESPECTIVO VALOR, QUANDO SE CUIDE DE

COISA OU BEM APREENDIDO QUE PELA AÇÃO DO TEMPO OU QUALQUER OUTRA

CIRCUNSTÂNCIA, INDEPENDENTEMENTE DAS PROVIDENCIAS NORMAIS DE PRESERVAÇÃO,

VENHA A SOFRER DEPRECIAÇÃO NATURAL OU PROVOCADA, OU QUE POR ELA VENHA A

PERDER VALOR EM SI, VENHA A SER DEPRECIADA COMO MERCADORIA, VENHA A PERDER A

APTIDÃO FUNCIONAL OU PARA O USO ADEQUADO, OU QUE DE QUALQUER MODO VENHA A

PERDER A EQUIVALÊNCIA COM O VALOR REAL NA DATA DA APREENSÃO;

c) observem, quando verificada a conveniência, oportunidade ou necessidade da alienação

antecipada, as disposições da lei processual penal e subsidiariamente as da lei processual civil

relativas à execução por quantia certa no que respeita à avaliação, licitação e adjudicação ou

arrematação e da respectiva jurisprudência;

d) depositem as importâncias em dinheiro ou valor, assim apuradas, em banco autorizado a

receber os depósitos ou custódia judiciais, vencendo as atualizações correspondentes, e ali as

conservem até a sua restituição, perda ou destinação por ordem judicial;

e) adotem as providencias no sentido de evitar o arquivamento dos autos antes da efetiva

destinação do produto da alienação.

233

II - Aos juízos de primeiro grau e tribunais que, na medida do possível, promovam

periodicamente audiências ou sessões unificadas para alienação antecipada de bens nos

processos sob a sua jurisdição ou sob a jurisdição das suas unidades judiciárias (leilão

unificado), com ampla divulgação, permitindo maior número de participações.

III - O CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA APRECIARÁ AS QUESTÕES OU PROPOSIÇÕES

DECORRENTES DA APLICAÇÃO DESTA RECOMENDAÇÃO, PODENDO EDITAR INSTRUÇÕES

COMPLEMENTARES E SOBRE ELAS DELIBERAR.

IV - Esta recomendação entra em vigor na data de sua publicação.

Ministro GILMAR MENDES

RECOMENDAÇÃO Nº 31, DE 30 DE MARÇO DE 2010

Recomenda aos Tribunais a adoção de medidas visando a melhor subsidiar os magistrados

e demais operadores do direito, para assegurar maior eficiência na solução das demandas

judiciais envolvendo a assistência à saúde.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ, no uso de suas

atribuições, e

CONSIDERANDO O GRANDE NÚMERO DE DEMANDAS ENVOLVENDO A ASSISTÊNCIA À

SAÚDE EM TRAMITAÇÃO NO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO E O REPRESENTATIVO

DISPÊNDIO DE RECURSOS PÚBLICOS DECORRENTE DESSES PROCESSOS JUDICIAIS;

[...]

RESOLVE:

I. RECOMENDAR AOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA DOS ESTADOS E AOS TRIBUNAIS REGIONAIS

FEDERAIS QUE:

a) até dezembro de 2010 celebrem convênios que objetivem disponibilizar apoio técnico

composto por médicos e farmacêuticos para auxiliar os magistrados na formação de um juízo de

valor quanto à apreciação das questões clínicas apresentadas pelas partes das ações relativas à

saúde, observadas as peculiaridades regionais;

B) ORIENTEM, ATRAVÉS DAS SUAS CORREGEDORIAS, AOS MAGISTRADOS VINCULADOS,

QUE:

B.1) PROCUREM INSTRUIR AS AÇÕES, TANTO QUANTO POSSÍVEL, COM RELATÓRIOS

MÉDICOS, com descrição da doença, inclusive CID, contendo prescrição de medicamentos,

com denominação genérica ou princípio ativo, produtos, órteses, próteses e insumos em

geral, com posologia exata;

B.2) EVITEM AUTORIZAR O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS AINDA NÃO

REGISTRADOS PELA ANVISA, OU EM FASE EXPERIMENTAL, RESSALVADAS AS

EXCEÇÕES EXPRESSAMENTE PREVISTAS EM LEI;

234

B.3) OUÇAM, QUANDO POSSÍVEL, PREFERENCIALMENTE POR MEIO ELETRÔNICO, OS

GESTORES, ANTES DA APRECIAÇÃO DE MEDIDAS DE URGÊNCIA;

B.4) VERIFIQUEM, JUNTO À COMISSÃO NACIONAL DE ÉTICA EM PESQUISAS (CONEP),

SE OS REQUERENTES FAZEM PARTE DE PROGRAMAS DE PESQUISA EXPERIMENTAL DOS

LABORATÓRIOS, CASO EM QUE ESTES DEVEM ASSUMIR A CONTINUIDADE DO

TRATAMENTO;

b.5) determinem, no momento da concessão de medida abrangida por política pública

existente, a inscrição do beneficiário nos respectivos programas;

[...]

Publique-se e encaminhe-se cópia desta Recomendação a todos os Tribunais.

Ministro GILMAR MENDES

RECOMENDAÇÃO Nº 35, DE 12 DE JULHO DE 2011.

Dispõe sobre as diretrizes a serem adotadas em atenção aos pacientes judiciários e a

execução da medida de segurança.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas

atribuições constitucionais e regimentais;

[...]

RESOLVE RECOMENDAR aos Tribunais que:

I – na execução da medida de segurança, adotem a política antimanicomial, sempre que

possível, em meio aberto;

II – a política antimanicomial possua como diretrizes as seguintes orientações:

a) mobilização dos diversos segmentos sociais, compartilhamentos de responsabilidades,

estabelecimento de estratégias humanizadoras que possibilitem a efetividade do

tratamento da saúde mental e infundam o respeito aos direitos fundamentais e sociais das

pessoas sujeitas às medidas de segurança;

b) diálogo e parcerias com a sociedade civil e as políticas públicas já existentes, a fim de buscar

a intersetorialidade necessária;

c) criação de um núcleo interdisciplinar, para auxiliar o juiz nos casos que envolvam sofrimento

mental;

d) acompanhamento psicossocial, por meio de equipe interdisciplinar, durante o tempo

necessário ao tratamento, de modo contínuo;

e) permissão, sempre que possível, para que o tratamento ocorra sem que o paciente se afaste do

meio social em que vive, visando sempre à manutenção dos laços familiares;

f) adoção de medida adequada às circunstâncias do fato praticado, de modo a respeitar as

singularidades sociais e biológicas do paciente judiciário;

235

g) promoção da reinserção social das pessoas que estiverem sob tratamento em hospital de

custódia, de modo a fortalecer suas habilidades e possibilitar novas respostas na sua relação com

o outro, para buscar a efetivação das políticas públicas pertinentes à espécie, principalmente

quando estiver caracterizada situação de grave dependência institucional, consoante o art. 5º da

Lei no 10.216/2001;

h) manutenção permanente de contato com a rede pública de saúde, com vistas a motiva a

elaboração de um projeto de integral atenção aos submetidos às medidas de segurança;

i) realização de perícias por equipe interdisciplinar.

III – em caso de internação, ela deve ocorrer na rede de saúde pública ou conveniada, com

acompanhamento do programa especializado de atenção ao paciente judiciário, com observância

das orientações previstas nesta recomendação.

Publique-se e encaminhe-se cópia desta Recomendação a todos os Tribunais.

Ministro Cezar Peluso

Presidente

RECOMENDAÇÃO Nº 36, DE 12 DE JULHO DE 2011.

Recomenda aos Tribunais a adoção de medidas visando a melhor subsidiar os magistrados

e demais operadores do direito, com vistas a assegurar maior eficiência na solução das

demandas judiciais envolvendo a assistência à saúde suplementar.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas

atribuições;

CONSIDERANDO que a assistência à saúde é livre à iniciativa privada e que são de

relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos

termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle (arts. 197 e 199 da

Constituição da República),

CONSIDERANDO que os planos de saúde constituem forma contratual de assistência à saúde,

regulamentada pela Lei nº 9.656/1998,

CONSIDERANDO o crescente número de demandas envolvendo a assistência à saúde

suplementar em tramitação no Poder Judiciário brasileiro,

CONSIDERANDO que o Poder Judiciário tem buscado a mediação como melhor forma

de solução de conflitos,

CONSIDERANDO a decisão plenária da 130ª Sessão Ordinária, de 5 de julho de 2011, deste

Conselho Nacional de Justiça, exarada nos autos do Ato nº 0003257-77.2011.2.00.0000,

RESOLVE:

I – Recomendar aos Tribunais de Justiça dos Estados e Tribunais Regionais Federais que:

a) celebrem convênios que objetivem disponibilizar apoio técnico, sem ônus para os Tribunais,

236

composto por médicos e farmacêuticos, indicados pelos Comitês Executivos Estaduais, para

auxiliar os magistrados na formação de um juízo de valor quanto à apreciação das questões

clínicas apresentadas pelas partes, observadas as peculiaridades regionais;

b) facultem às operadoras interessadas o cadastramento de endereços para correspondência

eletrônica junto às Comarcas, Seções e Subseções Judiciárias, com vistas a facilitar a

comunicação imediata com os magistrados, e, assim, fortalecer a mediação e possibilitar a

autorização do procedimento pretendido ou a solução amigável da lide, independentemente do

curso legal e regular do processo;

c) orientem os magistrados vinculados, por meio de suas corregedorias, a fim de que

oficiem, quando cabível e possível, à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), à

Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), ao Conselho Federal de Medicina

(CFM), ao Conselho Federal de Odontologia (CFO), para se manifestarem acerca da

matéria debatida dentro das atribuições de cada órgão, específica e respectivamente sobre

obrigações regulamentares das operadoras, medicamentos, materiais, órteses, próteses e

tratamentos experimentais.

II – Recomendar à Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM)

e às Escolas de Magistratura Estaduais e Federais que promovam a realização de seminários

para estudo e mobilização na área da saúde, congregando magistrados, membros do Ministério

Público e operadoras, a fim de propiciar maior entrosamento sobre a matéria.

III – Recomendar aos Comitês Executivos Estaduais que incluam, dentre os seus membros, um

representante de planos de saúde suplementar, no intuito de fomentar o debate com as

operadoras, diante dos dados constantes em seus arquivos.

Publique-se e encaminhe-se cópia desta Recomendação a todos os Tribunais.

Ministro Cezar Peluso

Presidente

RECOMENDAÇÃO CONJUNTA Nº 04

Dispõe sobre os elementos mínimos a serem inseridos nas sentenças ou atos ordinatórios

exarados nos processos que versem sobre a concessão ou revisão de benefícios

previdenciários ou assistenciais.

A CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA e o CORREGEDOR-GERAL DA JUSTIÇA

FEDERAL, no uso de suas atribuições,

CONSIDERANDO as deliberações do Grupo de Trabalho instituído pela Portaria nº 91, de 25

de Julho de 2011, da Corregedoria Nacional de Justiça, com a participação da Corregedoria-

Geral da Justiça Federal, do Instituto Nacional do Seguro Social e da Procuradoria Federal

Especializada junto ao INSS;

237

CONSIDERANDO a necessidade da padronização e a racionalização dos serviços da

justiça federal e dos juízes de direito que exercem competência constitucional delegada;

CONSIDERANDO a conveniência para cumprimento, com maior celeridade pelo

Instituto Nacional do Seguro Social, das decisões e atos ordinatórios do poder judiciário.

RESOLVEM:

Art. 1º. Recomendar aos juízes que exerçam jurisdição em matéria previdenciária, tendo

como parte o Instituto Nacional do Seguro Social, inclusive os com competência

constitucional delegada, a inclusão nas sentenças ou nos atos ordinatórios, os elementos

mínimos constantes do Anexo desta Recomendação para viabilizar o cumprimento das

decisões judiciais na concessão ou revisão de benefícios previdenciários ou assistenciais de

forma mais célere.

Art. 2º. Publique-se, inclusive no site do CNJ.

Art. 3º. Encaminhe-se cópia aos Presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais Federais, dos

Tribunais de Justiça, bem como aos Coordenadores dos Juizados Especiais Federais.

Art. 4º. A presente Recomendação entrará em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 17 de maio de 2012.

Ministra ELIANA CLAMON

Corregedora Nacional de Justiça

Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA

Corregedor-Geral da Justiça Federal

ANEXO DA RECOMENDAÇÃO nº 04, 17 de maio de 2012.

1. Para implantação sem pedido prévio na via administrativa

1. número do CPF;

2. nome da mãe;

3. número do PIS/PASEP;

4. endereço do segurado;

5. nome do segurado;

6. benefício concedido;

7. renda mensal inicial – RMI, fixada judicialmente ou “a calcular pelo INSS”, quando for

o caso;

8. renda mensal atual, fixada judicialmente ou “a calcular pelo INSS”, quando for o caso;

9. data de início do benefício – DIB;

10. data do início do pagamento administrativo.

238

2. Para implantação com pedido prévio na via administrativa, restabelecimento e revisão

do benefício

1. nome do segurado;

2. benefício concedido;

3. número do benefício;

4. renda mensal inicial – RMI, fixada judicialmente ou “a calcular pelo INSS”, quando for

o caso;

5. renda mensal atual, fixada judicialmente ou “a calcular pelo INSS”, quando for o caso;

6. data de início do benefício – DIB;

7. data do início do pagamento administrativo.

3. Informações Condicionais

1. nos casos de conversão de tempo especial em comum ou averbação de tempo rural ou

urbano – o(s) período(s) acolhido(s) judicialmente;

2. se efetuado cálculo do tempo de serviço pelo Poder Judiciário – encaminhar o cálculo ou

tabela de tempo de serviço;

3. nas hipóteses de benefícios concedidos à pessoas incapaz – o nome do representante

legal autorizado a receber o benefício do INSS;

4. nas hipóteses de pensão por morte – identificação do instituidor e dados da certidão de

óbito ou cópia da certidão.

5. nas hipóteses de salário maternidade – dados da certidão de nascimento ou cópia da

certidão de nascimento.

RECOMENDAÇÃO Nº 08

Dispõe sobre a colocação de criança e adolescente em família substituta por meio de

guarda.

[...]

RESOLVE:

Art. 1º. Recomendar aos juízes com jurisdição na infância e juventude que ao conceder a

guarda provisória, em se tratando de criança com idade menor ou igual a 3 anos, seja ela

concedida somente a pessoas ou casais previamente habilitados nos cadastros a que se

refere o art. 50 do ECA, em consulta a ser feita pela ordem cronológica da data de

habilitação na seguinte ordem: primeiro os da comarca; esgotados eles, os do Estado e, em

não havendo, os do Cadastro Nacional de Adoção.

[...]

Brasília, 7 novembro de 2012.

239

MINISTRO FRANCISCO FALCÃO

Corregedor Nacional de Justiça

RECOMENDAÇÃO Nº 43, DE 20 DE AGOSTO DE 2013

Recomenda aos Tribunais de Justiça e aos Tribunais Regionais Federais que promovam a

especialização de Varas para processar e julgar ações que tenham por objeto o direito à saúde

pública e para priorizar o julgamento dos processos relativos à saúde suplementar.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições

legais e regimentais, e

CONSIDERANDO a decisão do Plenário do Conselho Nacional de Justiça, no julgamento do

PP nº 0002150-61.2012.2.00.0000, realizado na 173ª Sessão Ordinária, em 6 de agosto de 2013;

CONSIDERANDO que a judicialização da saúde envolve questões extremamente

complexas, a exigir a adoção de diversas medidas interdisciplinares e intersetoriais;

CONSIDERANDO que o Fórum Nacional do Judiciário para monitoramento e resolução das

demandas de assistência à saúde, criado pelo CNJ, tem adotado medidas concretas e normativas

voltadas à prevenção de conflitos judiciais e à definição de estratégias nas questões de direito

sanitário, além do estudo e da proposição de outras medidas pertinentes;

CONSIDERANDO que a saúde é direito fundamental e tem por objeto a preservação da

dignidade da pessoa humana;

CONSIDERANDO que a especialização de Varas de Saúde Pública poderá garantir

decisões mais adequadas e tecnicamente precisas;

RESOLVE:

Art. 1º Fica recomendado aos Tribunais indicados nos incisos III e VII do art. 92 da

Constituição Federal que:

I - promovam a especialização de Varas para processar e julgar ações que tenham por

objeto o direito à saúde pública;

II - orientem as Varas competentes para priorizar o julgamento dos processos relativos à

saúde suplementar.

Art. 2º Esta recomendação entra em vigor na data da sua publicação.

Art. 3º Publique-se e intimem-se os Tribunais mencionados no art. 1º.

Ministro Joaquim Barbosa

Presidente

RECOMENDAÇÃO Nº 44, DE 26 DE NOVEMBRO DE 2013

Dispõe sobre atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo

estudo e estabelece critérios para a admissão pela leitura.

240

[...]

RESOLVE:

Art. 1º Recomendar aos Tribunais que:

I - para fins de remição pelo estudo (Lei nº 12.433/2011), sejam valoradas e consideradas

as atividades de caráter complementar, assim entendidas aquelas que ampliam as

possibilidades de educação nas prisões, tais como as de natureza cultural, esportiva, de

capacitação profissional, de saúde, entre outras, conquanto integradas ao projeto político-

pedagógico (PPP) da unidade ou do sistema prisional local e sejam oferecidas por

instituição devidamente autorizada ou conveniada com o poder público para esse fim;

II - para serem reconhecidos como atividades de caráter complementar e, assim, possibilitar a

remição pelo estudo, os projetos desenvolvidos pelas autoridades competentes podem conter,

sempre que possível:

a) disposições a respeito do tipo de modalidade de oferta (presencial ou a distância);

b) indicação da instituição responsável por sua execução e dos educadores e/ou tutores, que

acompanharão as atividades desenvolvidas;

c) fixação dos objetivos a serem perseguidos;

d) referenciais teóricos e metodológicos a serem observados;

e) carga horária a ser ministrada e respectivo conteúdo programático;

f) forma de realização dos processos avaliativos;

III - considerem, para fins de remição pelo estudo, o número de horas correspondente à

efetiva participação do apenado nas atividades educacionais, independentemente de

aproveitamento, exceto, neste último aspecto (aproveitamento), quando o condenado for

autorizado a estudar fora do estabelecimento penal (LEP, art. 129, § 1º), ocasião em que

terá de comprovar, mensalmente, por meio de autoridade educacional competente, tanto a

frequência, como o aproveitamento escolar.

IV - na hipótese de o apenado não estar, circunstancialmente, vinculado a atividades

regulares de ensino no interior do estabelecimento penal e realizar estudos por conta

própria, ou com simples acompanhamento pedagógico, logrando, com isso, obter

aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão do ensino fundamental Exame

Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) ou médio

Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), a fim de se dar plena aplicação ao disposto no

§ 5º do art. 126 da LEP (Lei n. 7.210/84), considerar, como base de cálculo para fins de

cômputo das horas, visando à remição da pena pelo estudo, 50% (cinquenta por cento) da

carga horária definida legalmente para cada nível de ensino [fundamental ou médio - art.

4º, incisos II, III e seu parágrafo único, todos da Resolução n. 03/2010, do CNE], isto é,

241

1600 (mil e seiscentas) horas para os anos finais do ensino fundamental e 1200 (mil e

duzentas) horas para o ensino médio ou educação profissional técnica de nível médio;

[...]

Ministro Joaquim Barbosa

RECOMENDAÇÃO Nº 47, DE 24 DE FEVEREIRO DE 2014

Recomenda aos juízes de direito e aos Tribunais de Justiça que promovam mutirão para

realização da Semana Nacional do Tribunal do Júri, especialmente com processos afetos

às novas Metas ENASP/CNJ.

[...]

RESOLVE:

Art. 1º Fica recomendado aos Juízes de Direito e aos Tribunais de Justiça que:

I – organizem anualmente a Semana Nacional do Júri, em data a ser definida pelo CNJ em

todas as unidades das comarcas com competência para o Tribunal do Júri, ocasião em que

será realizada ao menos uma sessão do Tribunal do Júri, em cada dia da semana, dando

preferência aos processos que integram o acervo das Metas da ENASP e aos processos de

réus presos;

II – providenciem a criação de grupo de trabalho composto por juízes, que poderão

receber designação específica para atuar em qualquer vara do Estado, e por servidores em

número compatível com a quantidade de processos que serão levados às sessões de

julgamento;

III – promovam ações integradas com as demais instituições, sobretudo com o Ministério

Público, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil, Administração Penitenciária e

Instituições de Ensino, a fim de viabilizar o cumprimento da presente Recomendação.

Art. 2º Nas unidades judiciárias em que não haja juiz titular, ou naquelas cujo juiz titular

esteja de férias ou por algum outro motivo afastado, poderá ser designado magistrado

integrante do grupo de trabalho (inciso II do art. 1º) para a realização das sessões do

Tribunal do Júri.

[...]

Ministro Joaquim Barbosa

RESOLUÇÕES

RESOLUÇÃO Nº 71, DE 31 DE MARÇO DE 2009

Dispõe sobre regime de plantão judiciário em primeiro e segundo graus de jurisdição

242

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições

legais e regimentais,

CONSIDERANDO a responsabilidade do Conselho Nacional de Justiça pelo bom

funcionamento do Poder Judiciário, prevista no § 4º do art. 103-B da Constituição;

CONSIDERANDO a competência do Conselho Nacional de Justiça de zelar pelo

cumprimento do Estatuto da Magistratura e de recomendar as providencias para tanto

necessárias, conforme dispõe o art. 19, I do Regimento Interno;

CONSIDERANDO a urgência na obtenção da prestação jurisdicional, relacionada a

processos judiciais em regime de plantão, bem como objetivando evitar distorções no

desempenho das competências dos diferentes órgãos judiciais;

CONSIDERANDO a necessidade e conveniência de os plantões atuarem com objetividade

e clareza para jurisdicionados e advogados que utilizam os serviços judiciários e a

padronização das hipóteses de comprovada urgência, que se incluem na competência

jurisdicional em regime de plantão; padronizar a disciplina correspondente, com

objetividade e clareza para os jurisdicionados e advogados que utilizam os serviços

judiciários;

RESOLVE:

Art. 1º. O Plantão Judiciário, em primeiro e segundo graus de jurisdição, conforme a

previsão regimental dos respectivos tribunais ou juízos destina-se exclusivamente ao

exame das seguintes matérias:

a) pedidos de habeas-corpus e mandados de segurança em que figurar como coator

autoridade submetida à competência jurisdicional do magistrado plantonista;

b) medida liminar em dissídio coletivo de greve;

c) comunicações de prisão em flagrante e à apreciação dos pedidos de concessão de

liberdade provisória;

d) em caso de justificada urgência, de representação da autoridade policial ou do

Ministério Público visando à decretação de prisão preventiva ou temporária;

e) pedidos de busca e apreensão de pessoas, bens ou valores, desde que objetivamente

comprovada a urgência;

f) medida cautelar, de natureza cível ou criminal, que não possa ser realizado no horário

normal de expediente ou de caso em que da demora possa resultar risco de grave prejuízo

ou de difícil reparação.

g) medidas urgentes, cíveis ou criminais, da competência dos Juizados Especiais a que se

referem as Leis nº 9.099, de 26 de setembro de 1995 e 10.259, de 12 de julho de 2001,

limitadas as hipóteses acima enumeradas.

243

§ 1º. O Plantão Judiciário não se destina à reiteração de pedido já apreciado no órgão

judicial de origem ou em plantão anterior, nem à sua reconsideração ou reexame ou à

apreciação de solicitação de prorrogação de autorização judicial para escuta telefônica.

§ 2°. As medidas de comprovada urgência que tenham por objeto o depósito de

importância em dinheiro ou valores só poderão ser ordenadas por escrito pela autoridade

judiciária competente e só serão executadas ou efetivadas durante o expediente bancário

normal por intermédio de servidor credenciado do juízo ou de outra autoridade por

expressa e justificada delegação do juiz.

§3º. Durante o Plantão não serão apreciados pedidos de levantamento de importância em

dinheiro ou valores nem liberação de bens apreendidos.

[...]

Ministro GILMAR MENDES

RESOLUÇÃO Nº 82, DE 09 DE JUNHO DE 2009

Regulamenta as declarações de suspeição por foro íntimo.

CONSIDERANDO que durante Inspeções realizadas pela Corregedoria Nacional de

Justiça foi constatado um elevado número de declarações de suspeição por motivo de foro

íntimo;

CONSIDERANDO que todas as decisões dos órgãos do Poder Judiciário devem ser

fundamentadas (art. 93, IX, da CF);

CONSIDERANDO que é dever do magistrado cumprir com exatidão as disposições legais

(art. 35, I, da LC 35/1979), obrigação cujo observância somente pode ser aferida se

conhecidas as razões da decisão;

CONSIDERANDO que no julgamento do relatório da Inspeção realizada no Poder

Judiciário Estadual do Amazonas foi aprovada a proposta de edição de Resolução, pelo

Conselho Nacional de Justiça, para que a as razões da suspeição por motivo íntimo,

declarada pelo magistrado de primeiro e de segundo grau, e que não serão mencionadas

nos autos, sejam imediatamente remetidas pelo magistrado, em caráter sigiloso, para

conhecimento pelo Tribunal ao qual está vinculado;

CONSIDERANDO que a sistemática de controle é adotada, com êxito, há vários anos, por

alguns Tribunais do País.

RESOLVE:

Art. 1º No caso de suspeição por motivo íntimo, o magistrado de primeiro grau fará essa

afirmação nos autos e, em ofício reservado, imediatamente exporá as razões desse ato à

Corregedoria local ou a órgão diverso designado pelo seu Tribunal.

244

Art. 2º No caso de suspeição por motivo íntimo, o magistrado de segundo grau fará essa

afirmação nos autos e, em ofício reservado, imediatamente exporá as razões desse ato à

Corregedoria Nacional de Justiça.

[...]

Ministro GILMAR MENDES

RESOLUÇÃO Nº 105, DE 06 DE ABRIL DE 2010

Dispõe sobre a documentação dos depoimentos por meio do sistema audiovisual e

realização de interrogatório e inquirição de testemunhas por videoconferência.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições

conferidas pela Constituição da República, especialmente o disposto no inciso I, §4º, art. 103-B;

CONSIDERANDO que, nos termos do art. 405, § 1º, do Código de Processo Penal, sempre

que possível, com a finalidade de obter maior fidelidade das informações, dentre as formas

possíveis de documentação dos depoimentos, deve-se dar preferência ao sistema

audiovisual;

CONSIDERANDO que, embora o art. 405, § 2º, do Código de Processo Penal, quando

documentados os depoimentos pelo sistema audiovisual, dispense a transcrição, há registro

de casos em que se determina a devolução dos autos aos juízes para fins de degravação;

CONSIDERANDO que para cada minuto de gravação leva-se, no mínimo, 10 (dez)

minutos para a sua degravação, o que inviabiliza a adoção dessa moderna técnica de

documentação dos depoimentos como instrumento de agilização dos processos;

CONSIDERANDO que caracteriza ofensa à independência funcional do juiz de primeiro

grau a determinação, por magistrado integrante de tribunal, da transcrição de

depoimentos tomados pelo sistema audiovisual;

RESOLVE:

[...]

Art. 3º Quando a testemunha arrolada não residir na sede do juízo em que tramita o

processo, deve-se dar preferência, em decorrência do princípio da identidade física do juiz,

à expedição da carta precatória para a inquirição pelo sistema de videoconferência.

§ 1º O testemunho por videoconferência deve ser prestado na audiência una realizada no

juízo deprecante, observada a ordem estabelecida no art. 400, caput, do Código de

Processo Penal.

§ 2º A direção da inquirição de testemunha realizada por sistema de videoconferência será

do juiz deprecante.

§ 3º A carta precatória deverá conter:

I - A data, hora e local de realização da audiência una no juízo deprecante;

245

II - A solicitação para que a testemunha seja ouvida durante a audiência una realizada no

juízo deprecante;

III - A ressalva de que, não sendo possível o cumprimento da carta precatória pelo sistema

de videoconferência, que o juiz deprecado proceda à inquirição da testemunha em data

anterior à designada para a realização, no juízo deprecante, da audiência uma.

Art. 4º No fórum deverá ser organizada sala equipada com equipamento de informática

conectado com a rede mundial de computadores (internet), destinada para o cumprimento

de carta precatória pelo sistema de videoconferência, assim como para ouvir a testemunha

presente à audiência una, na hipótese do art. 217 do Código de Processo Penal.

Art. 5º De regra, o interrogatório, ainda que de réu preso, deverá ser feito pela forma

presencial, salvo decisão devidamente fundamentada, nas hipóteses do art. 185, § 2º,

incisos I, II, III e IV, do Código de Processo Penal.

Art. 6º Na hipótese em que o acusado, estando solto, quiser prestar o interrogatório, mas

haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra

circunstância pessoal, o ato deverá, se possível, para fins de preservação da identidade

física do juiz, ser realizado pelo sistema de videoconferência, mediante a expedição de

carta precatória.

Parágrafo único. Não deve ser expedida carta precatória para o interrogatório do acusado

pelo juízo deprecado, salvo no caso do caput.

Art. 7º O interrogatório por videoconferência deverá ser prestado na audiência una

realizada no juízo deprecante, adotado, no que couber, o disposto nesta Resolução para a

inquirição de testemunha, asseguradas ao acusado as seguintes garantias:

I - direito de assistir, pelo sistema de videoconferência, a audiência una realizada no juízo

deprecante;

II - direito de presença de seu advogado ou de defensor na sala onde for prestado o seu

interrogatório;

III - direito de presença de seu advogado ou de defensor na sala onde for realizada a

audiência una de instrução e julgamento;

IV - direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor, o que compreende o

acesso a canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor ou advogado que

esteja no presídio ou no local do interrogatório e o defensor ou advogado presente na sala

de audiência do fórum, e entre este e o preso.

Art. 8º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação.

Ministro GILMAR MENDES

RESOLUÇÃO Nº 113, DE 20 DE ABRIL DE 2010

246

Dispõe sobre o procedimento relativo à execução de pena privativa de liberdade e de

medida de segurança, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições

constitucionais e regimentais,

CONSIDERANDO a necessidade de uniformizar procedimentos relativos à execução de

pena privativa de liberdade e de medida de segurança, no âmbito dos Tribunais;

[...]

RESOLVE:

DA EXECUÇÃO PENAL

Art. 1º A sentença penal condenatória será executada nos termos da Lei 7.210, de 11 de julho de

1984, da lei de organização judiciária local e da presente Resolução, devendo compor o

processo de execução, além da guia, no que couber, as seguintes peças e informações:

I - qualificação completa do executado;

II - interrogatório do executado na polícia e em juízo;

III - cópias da denúncia;

IV - cópia da sentença, voto(s) e acórdão(s) e respectivos termos de publicação

IV - cópia da sentença, voto(s) e acórdão(s) e respectivos termos de publicação, inclusive

contendo, se for o caso, a menção expressa ao deferimento de detração que importe

determinação do regime de cumprimento de pena mais benéfico do que seria não fosse a

detração, pelo próprio juízo do processo de conhecimento, nos termos do art. 387, § 2º, do

Código de Processo Penal, acrescentado pela Lei 12.736/12; (Redação dada pela Resolução nº

180, de 03.10.13)

V - informação sobre os endereços em que possa ser localizado, antecedentes criminais e grau

de instrução;

VI - instrumentos de mandato, substabelecimentos, despachos de nomeação de defensores

dativos ou de intimação da Defensoria Pública;

VII - certidões de trânsito em julgado da condenação para a acusação e para a defesa;

VIII - cópia do mandado de prisão temporária e/ou preventiva, com a respectiva certidão da data

do cumprimento, bem como com a cópia de eventual alvará de soltura, também com a certidão

da data do cumprimento da ordem de soltura, para cômputo da detração, caso, nesta última

hipótese, esta já não tenha sido apreciada pelo juízo do processo de conhecimento para

247

determinação do regime de cumprimento de pena, nos termos do art. 387, § 2º, do Código de

Processo Penal, acrescentado pela Lei 12.736/12; (Redação dada pela Resolução nº 180, de

03.10.13)

IX - nome e endereço do curador, se houver;

X - informações acerca do estabelecimento prisional em que o condenado encontra-se recolhido

e para o qual deve ser removido, na hipótese de deferimento de detração que importe

determinação do regime de cumprimento de pena mais benéfico do que haveria não fosse a

detração, pelo próprio juízo do processo de conhecimento, nos termos do art. 387, § 2º, do

Código de Processo Penal, acrescentado pela Lei 12.736/12; (Redação dada pela Resolução nº

180, de 03.10.2013)

XI - cópias da decisão de pronúncia e da certidão de preclusão em se tratando de condenação

em crime doloso contra a vida;

XII - certidão carcerária;

XIII - cópias de outras peças do processo reputadas indispensáveis à adequada execução da

pena.

[...]

Art. 3º O Juiz competente para a execução da pena ordenará a formação do Processo de

Execução Penal (PEP), a partir das peças referidas no artigo 1º.

§ 1° Para cada réu condenado, formar-se-á um Processo de Execução Penal, individual e

indivisível, reunindo todas as condenações que lhe forem impostas, inclusive aquelas que

vierem a ocorrer no curso da execução.

§ 2° Caso sobrevenha condenação após o cumprimento da pena e extinção do processo de

execução anterior, será formado novo processo de execução penal.

§ 3º Sobrevindo nova condenação no curso da execução, após o registro da respectiva guia

de recolhimento, o juiz determinará a soma ou unificação da pena ao restante da que está

sendo cumprida e fixará o novo regime de cumprimento, observada, quando for o caso, a

detração ou remição.

Art. 16. O juiz competente para a execução da medida de segurança ordenará a formação

do processo de execução a partir das peças referidas no artigo 1º dessa resolução, no que

couber.

Art. 17. O juiz competente para a execução da medida de segurança, sempre que possível

buscará implementar políticas antimanicomiais, conforme sistemática da Lei nº 10.216, de

06 de abril de 2001.

[...]

248

Ministro GILMAR MENDES

RESOLUÇÃO Nº 165, DE 16 DE NOVEMBRO DE 2012

Dispõe sobre normas gerais para o atendimento, pelo Poder Judiciário, ao adolescente em

conflito com a lei no âmbito na internação provisória e do cumprimento das medidas

socioeducativas

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições

constitucionais e regimentais,

[...]

CONSIDERANDO que o Programa Justiça ao Jovem, do Conselho Nacional de Justiça,

após conhecer o sistema de internação de todos os Estados do País, diagnosticou a

necessidade de uniformização do procedimento de execução de medida socioeducativa;

CONSIDERANDO que compete ao Conselho Nacional de Justiça zelar pela unicidade do

Poder Judiciário, implementando diretrizes nacionais para nortear a atuação de

Magistrados com jurisdição na área da infância e juventude;

[...]

RESOLVE consolidar e editar normas gerais sobre a execução das medidas

socioeducativas no âmbito do Poder Judiciário.

CAPÍTULO I

Art. 1º Esta resolução estabelece normas gerais para o atendimento, pelo Poder Judiciário,

do adolescente em conflito com a lei, na internação provisória e no cumprimento das

medidas socioeducativas.

[...]

Art. 7º A guia de internação provisória, devidamente extraída do CNACL, será instruída,

obrigatoriamente, com os seguintes documentos, além de outros considerados pertinentes

pela autoridade judicial: (Alterado pela Resolução nº 191, de 25.04.2014)

249

I – documentos de caráter pessoal do adolescente existentes no processo de conhecimento,

especialmente os que comprovem sua idade;

II – cópia da representação e/ou do pedido de internação provisória;

III – cópia da certidão de antecedentes;

IV – cópia da decisão que determinou a internação.

[...]

Art. 9º Não tendo sido decretada a internação provisória no curso do processo de

conhecimento, prolatada a sentença, deverá ser expedida a guia de execução provisória de

medida socioeducativa de internação, semiliberdade ou em meio aberto (parágrafo único

do art. 39 da Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012), que deverá ser instruída,

obrigatoriamente, com os seguintes documentos, além de outros considerados pertinentes

pela autoridade judicial: (Alterado pela Resolução nº 191, de 25.04.2014)

I – documentos de caráter pessoal do adolescente existentes no processo de conhecimento,

especialmente os que comprovem sua idade;

II – cópia do termo que propõe a remissão como forma de suspensão do processo

cumulada com medida socioeducativa em meio aberto; ou cópia da representação;

III – cópia da certidão de antecedentes;

IV – cópia da sentença que aplicou a respectiva medida socioeducativa ou da sentença que

homologou a remissão cumulada com medida socioeducativa em meio aberto;

V – cópia de estudos técnicos realizados durante a fase de conhecimento.

[...]

Ministro AYRES BRITTO

250

RESOLUÇÃO Nº 175, DE 14 DE MAIO DE 2013

Dispõe sobre a habilitação, celebração de casamento civil, ou de conversão de união estável

em casamento, entre pessoas de mesmo sexo.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições

constitucionais e regimentais,

CONSIDERANDO a decisão do plenário do Conselho Nacional de Justiça, tomada no

julgamento do Ato Normativo no 0002626-65.2013.2.00.0000, na 169ª Sessão Ordinária,

realizada em 14 de maio de 2013;

CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal, nos acórdãos prolatados em julgamento

da ADPF 132/RJ e da ADI 4277/DF, reconheceu a inconstitucionalidade de distinção de

tratamento legal às uniões estáveis constituídas por pessoas de mesmo sexo;

CONSIDERANDO que as referidas decisões foram proferidas com eficácia vinculante à

administração pública e aos demais órgãos do Poder Judiciário;

CONSIDERANDO que o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do RESP 1.183.378/RS,

decidiu inexistir óbices legais à celebração de casamento entre pessoas de mesmo sexo;

CONSIDERANDO a competência do Conselho Nacional de Justiça, prevista no art. 103-B, da

Constituição Federal de 1988;

RESOLVE:

Art. 1º É vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de

casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo

sexo.

Art. 2º A recusa prevista no artigo 1º implicará a imediata comunicação ao respectivo juiz

corregedor para as providências cabíveis.

Art. 3º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Ministro Joaquim Barbosa

PROVIMENTO Nº 26

Dispõe sobre o “Projeto Pai Presente – 2012”

[...]

CONSIDERANDO que durante as inspeções realizadas em inúmeras varas judiciais e

serviços extrajudiciais a Corregedoria Nacional de Justiça observou que o número de

averiguações de paternidade (Lei n. 8.560/1992) ainda é insignificante;

[...]

CONSIDERANDO que o reconhecimento da paternidade pode ser manifestado expressa e

diretamente perante o juiz (artigo 1º, IV, da Lei n. 8.560/1992 Conselho Nacional de Justiça

251

Corregedoria e artigo 1609, IV, do Código Civil) ou perante os próprios oficiais de registro civil

nos termos do Provimento 16 desta Corregedoria Nacional;

RESOLVE:

[...]

Artigo 8º Caso o suposto pai não atenda à notificação judicial, ou

negue a paternidade que lhe é atribuída, o Juiz, a pedido da mãe ou do interessado capaz,

remeterá o expediente para o representante do Ministério Público, ou da Defensoria

Pública ou para serviço de assistência judiciária, a fim de que seja proposta ação de

investigação de paternidade caso os elementos disponíveis sejam suficientes.

Parágrafo único: A iniciativa conferida ao Ministério Público não impede a quem tenha legítimo

interesse de intentar a investigação, visando obter o pretendido reconhecimento da paternidade.

[...]

Brasília, 12 de dezembro de 2012

MINISTRO FRANCISCO FALCÃO

Corregedor Nacional de Justiça

PROVIMENTO N.º 32

Dispõe sobre as audiências concentradas nas Varas da Infância e Juventude.

[...]

CONSIDERANDO a experiência exitosa das "Audiências Concentradas", iniciada em

todos os tribunais do país após o 1º Encontro Nacional das Coordenadorias de Infância e

Juventude em 2010;

[...]

RESOLVE:

Art. 1º O Juiz da Infância e Juventude, sem prejuízo do andamento regular, permanente e

prioritário dos processos sob sua condução, deverá realizar, em cada semestre,

preferencialmente nos meses de abril e outubro, os eventos denominados "Audiências

Concentradas", a se realizarem, sempre que possível, nas dependências das entidades de

acolhimento, com a presença dos atores do sistema de garantia dos direitos da criança e do

adolescente, para reavaliação de cada uma das medidas protetivas de acolhimento, diante

de seu caráter excepcional e provisório, com a subsequente confecção de atas

individualizadas para juntada em cada um dos processos.

252

§ 1º Nas varas de grandes comarcas, com excessivo número de acolhidos, reserva-se ao

magistrado a possibilidade da seleção dos processos mais viáveis para audiência, desde que

mantenha absoluto controle da situação dos demais.

§ 2º Sugere-se o seguinte roteiro para a realização das audiências:

I - conferência pela vara, no Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Acolhidos

(CNCA), dos dados cadastrais da(s) entidade(s) de acolhimento a ela submetida(s), com a

atualização completa dos seus dados;

II - levantamento prévio, a ser feito diretamente perante a(s) entidade(s) de acolhimento

ou por ela encaminhado, da lista dos nomes das crianças e adolescentes ali acolhidos;

III - conclusão ao gabinete de todos os processos dos infantes listados no inciso anterior

onde foi aplicada a medida protetiva de acolhimento, autuando-se desde já novos

processos em favor dos acolhidos que, eventualmente, se encontrarem na instituição de

forma irregular, ou seja, sem guia de acolhimento ou qualquer decisão judicial

respaldando a institucionalização;

IV - designação das audiências e intimação do Ministério Público,

Defensoria Pública, e representantes dos seguintes órgãos, onde houver, para fins de

envolvimento único e tomada de medidas efetivas que visem abreviar o período de

institucionalização:

a)Equipe interdisciplinar atuante perante a vara da infância e juventude;

b)Conselho Tutelar;

c)Entidade de acolhimento e sua equipe interdisciplinar;

d)Secretaria Municipal de Assistência Social;

e)Secretaria Municipal de Saúde;

f)Secretaria Municipal de Educação;

g)Secretaria Municipal de Trabalho/Emprego;

h)Secretaria Municipal de Habitação

i)Escrivão(ã) da própria Vara.

VI - Intimação prévia dos pais ou parentes do acolhido que com eles mantenham vínculos

de afinidade e afetividade, ou sua condução no dia do ato.

VII - Confecção de ata de audiência individualizada para cada acolhido ou grupo de

irmãos, com assinatura dos presentes e as medidas tomadas, com a sua juntada aos

respectivos autos.

VIII - Anotação final das medidas tomadas nas audiências, para fins estatísticos, a ser

incluída no Sistema CNCA, em campo criado exclusivamente para este fim, separado por

entidade de acolhimento, com os seguintes dados fundamentais:

a)semestre a que se referem (1º ou 2º) / ano;

253

b)local onde as audiências se realizaram;

c)total geral de acolhidos na entidade;

d)total de acolhidos com genitores falecidos ou desconhecidos;

e)total de acolhidos com consentimento ou a pedido dos genitores para

colocação em família substituta;

f) total de audiências realizadas;

g)total de reintegrados à família de natural (pai e/ou mãe);

h)total de reintegrados à família extensa;

i)total de reintegrados à família substituta;

j)total de mantidos acolhidos;

k)total de acolhidos há mais de 2 (dois) anos ininterruptamente; l)total de acolhidos há

mais de 6 (seis) meses sem ação de destituição do poder familiar ajuizada;

m)total de acolhidos há mais de 6 (seis) meses com ação de destituição do poder familiar

em andamento;

n)total de acolhidos há mais de 6 (seis) meses com ação de destituição do poder familiar

com sentença transitada em julgado;

Art. 2º Na audiência, sem prejuízo do uso deste roteiro na condução rotineira do processo

antes e depois da audiência, sugere-se seja observado e regularizado minimamente o

seguinte:

a)Há nos autos alguma tarja específica identificando que se trata de processo com infante

acolhido?

b)Há nos autos foto(s) da criança ou do adolescente, de preferência na primeira página

após a capa?

c)O acolhimento foi realizado por decisão judicial ou ao menos por ela ratificado?

d)Foi expedida a competente Guia de Acolhimento no Sistema CNCA com juntada de

cópia nos autos?

e)O infante possui certidão de nascimento com cópia juntada aos autos?

f) O infante está matriculado na rede oficial de ensino?

g)O infante, se o caso, recebeu atendimento médico necessário aos eventuais problemas de

saúde que possua?

h)O infante recebe visita dos familiares? Com qual frequência?

i)Já foi elaborado o PIA de que trata do art. 101, § 4º do ECA?

j)A criança, respeitado seu estagio de desenvolvimento e capacidade de compreensão, ou o

adolescente, bem como seus pais, já foram ouvidos em juízo e informados dos seus direitos

e dos motivos que determinaram a intervenção nos termos do que dispõe os incisos XI e

XII do parágrafo único do art. 100 do ECA?

254

k)O acolhido e/ou seus pais ou responsáveis foram encaminhados a programas oficiais ou

comunitários de orientação, apoio e promoção social com vistas a futura reintegração

familiar?

l)É possível no momento a reintegração do infante à família de origem?

m)Em caso negativo, foram esgotadas as buscas de membros da família extensa que

possam ter o infante sob sua guarda?

n)Se o caso, já foi ajuizada a ação de destituição do poder familiar? Em que data?

o)Em caso positivo, está ela tendo o andamento adequado?

p)Se já transitou em julgado a ação de destituição, o nome do infante já foi inserido

adequadamente no Cadastro Nacional de Adoção?

q)Foi tentada, pelo Cadastro Nacional de Adoção, a busca de eventuais pretendentes?

Qual a última vez que foi tentada a busca?

[...]

Brasília, 24 de junho de 2013

Ministro FRANCISCO FALCÃO

255

APÊNDICE II

DECISÕES DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO POR

CONCORRÊNCIA. CONSTRUÇÃO DE FÓRUM CÍVEL NA COMARCA DE

CURITIBA. RESTRIÇÃO AO CARÁTER COMPETITIVO DO CERTAME.

NULIDADE. JUDICIALIZAÇÃO DA QUESTÃO. MANDADO DE

SEGURANÇA. IDENTIDADE SUBJETIVA ENTRE O IMPETRANTE NO MS E

O ORA REQUERENTE NÃO CONFIGURADA. POSSIBILIDADE DE

APRECIAÇÃO PELO CONSELHO. INABILITAÇÃO DE EMPRESA.

INTIMAÇÃO. RECURSO INTEMPESTIVO. NÃO IMPUGNAÇÃO DO EDITAL.

PRECLUSÃO.

(...)

2. Questão foi judicializada pelo ajuizamento de mandado de segurança interposto

pela DM Construtora de Obras Ltda., do qual há notícia de desistência, o que, no

entanto, não impede a apreciação desse Conselho na medida em que não há

identidade subjetiva entre a impetrante do mandado de segurança e o requerente

neste procedimento de controle administrativo.

360Conforme já se destacou, a decisão submetida à revisão por este CNJ é a que deferiu

o pedido de revisão no âmbito do Tribunal de Justiça para modificar a sanção

originariamente aplicada. Não se trata de revisão da decisão proferida no PAD julgado

na Sessão Ordinária de 10.12.2008.

Não procede, portanto, a alegação de judicialização da matéria. O mandado de

segurança impetrado perante o TJ/PA, sob alegações de nulidades no PAD, ataca a

decisão que originariamente aplicou a sanção de aposentadoria compulsória.

Não está em discussão no presente pedido de revisão a regularidade do PAD e a

sanção nele aplicada. A controvérsia posta nestes autos diz respeito à existência dos

pressupostos legais para o deferimento do pedido de revisão na instância de

origem. Apresenta-se claríssima a diversidade de objeto, na ação de mandado de

segurança e no presente pedido de revisão disciplinar. Rejeito a alegação de

judicialização do tema.

360 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. REVDIS 0000325-53.2010.2.00.0000. Plenário, Rel.

Conselheiro José Adonis Sá, j. 18/05/2010. Voto do relator, sem página.

256

361 “Questão posta já judicializada. A parte interessada não pode fazer uso, a um só

tempo, dos procedimentos administrativos excepcionais assegurados pelo art. 103-

B, § 4º da CF/88 perante o CNJ e dos meios judicialiformes tendentes a obter a

coisa julgada definitiva no âmbito do Poder Judiciário”.

362Parece, portanto, evidente que o Conselho Nacional de Justiça, embora competente

para o controle da atuação administrativa do Poder Judiciário, nos termos do parágrafo

4° do art. 103-B da Constituição da República, não pode avançar além dos limites

impostos pela norma constitucional, de modo a indevidamente atingir decisão

judicial ou nela interferir. Muito menos pode, mesmo que eventualmente, furtar-

lhe o objeto, esvaziando seu conteúdo decisório.

Recurso Administrativo no Pedido de Providências. Matéria judicializada pela

própria requerente, por meio de Mandado de Segurança. Segundo entendimento

pacificado por este Conselho Nacional de Justiça, uma vez judicializada a questão,

não cabe ao CNJ examiná-la, sob pena de, por vias transversas, imprimir

ineficácia à decisão judicial ou esvaziar seu objeto. Recurso a que se nega

provimento.

363A Requerente pretende, portanto, manejar de maneira imprópria o Procedimento

de Controle Administrativo, objetivando o exame pelo Conselho Nacional de

Justiça de questão anteriormente judicializada.

Com efeito, a parte submeteu a matéria a um órgão de natureza judicial e,

posteriormente, a outro de índole administrativa, a fim de alcançar, por uma ou outra

via, o deferimento de sua pretensão.

O CNJ não se presta a proporcionar à parte uma possibilidade paralela de êxito,

caso não o obtenha pela via judicial.

Quando a parte opta livremente pela utilização de medidas judiciais antes de postular o

controle de legalidade do ato pelo Conselho Nacional de Justiça, este não deve exercê-

361 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. PP 1400. Plenário, Rel. Conselheiro Rui Stoco, j.

11/09/2007. 362 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. RA-PP 0000295-86.2008.2.00.0000 62. Plenário, Rel.

Conselheiro Felipe Locke Cavalcanti, j. 13.05.2008, p. 04. 363 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. PCA 0001844-34.2008.2.00.0000. Plenário, Rel.

Conselheiro João Oreste Dalazena, j. 02/12/2008, voto do Relator p. 04.

257

lo, em respeito ao princípio da segurança jurídica, evitando-se que sobrevenham

decisões conflitantes.

Ademais, o pronunciamento do CNJ posterior à decisão proferida em sede judicial

implicaria interferência na atividade jurisdicional do Estado, atribuição não

inserida nas competências conferidas ao Conselho, cuja atividade de controle se

limita ao exame de atos administrativos, e não atos judiciais, emanados do Poder

Judiciário.

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. JUÍZES SUBSTITUTOS. INAMOVIBILIDADE.

APLICAÇÃO. DESIGNAÇÃO E REMOÇÃO. CRITÉRIOS OBJETIVOS.

PROCEDÊNCIA.

1. Aplica-se aos juízes substitutos a garantia constitucional da inamovibilidade, por

se tratar de garantia funcional de independência da atividade jurisdicional,

cláusula pétrea da magistratura, que dá guarida, ao lado da irredutibilidade e da

vitaliciedade, ao princípio da imparcialidade, de maneira que, exceto nas hipóteses

de designação temporária para substituições eventuais, o magistrado deve ter sua

independência preservada, por meio de lotação em unidade jurisdicional

específica.

2. A Carta Magna de 1988, com mais evidência, manteve a tradição constitucional

de, dentre as cláusulas pétreas, quanto aos juízes recém-admitidos, excepcionar

apenas a garantia da vitaliciedade, ainda assim, apenas se e enquanto o magistrado

estiver no lapso temporal correspondente ao estágio probatório.

3. Pedido de Providências julgado procedente.

Pedido de Providência n. 0005955-90.2010.2.00.0000 decidido em 19 de

outubro de 2010 sob a relatoria da Conselheira Morgana Richa tendo como redator da

decisão o Conselheiro Walter Nunes.

RECURSO ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR EM FACE DE

MAGISTRADA. EXCESSO DE LINGUAGEM NÃO CONFIGURADO.

I. Reclamação Disciplinar contra ato de magistrada consistente em expressar

conceitos sobre a conduta do reclamante ao requerer o benefício da assistência

judiciária gratuita;

258

II. A menção ao reclamante como advogado, ainda que equivocada, ou a expressão

de conceitos acerca das pretensões que defende em juízo não ensejam sanção

disciplinar ao magistrado;

III. Recurso a que se nega provimento.

“O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do

Relator. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros Deborah Ciocci, Gilberto Valente

Martins e Flavio Sirangelo. Presidiu o julgamento o Conselheiro Joaquim Barbosa.

Plenário, 2 de dezembro de 2013.”364

PROCESSO DE REVISÃO DISCIPLINAR – MAGISTRADO – EXCESSO DE

LINGUAGEM EM PROCESSO JUDICIAL – DISTINÇÃO – INAPLICABILIDADE

NO PRESENTE PROCEDIMENTO DISCIPLINAR – QUESTÃO JURISDICIONAL –

AUSÊNCIA DE COMPETÊNCIA DO CNJ – NÃO-CONHECIMENTO

I. A questão sobre discussão centrada na autenticidade documental, em sede de

incidente de falsidade, possui nítido caráter jurisdicional, conflitando com a

competência deste CNJ sobre a atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário,

nos termos do art. 103-B, §4º, da CF/88

II. Por “excesso de linguagem”, no âmbito administrativo-disciplinar da magistratura,

entende-se como sendo o juízo ofensivo, lançado pelo magistrado contra as partes ou

seus procuradores (art. 41 da LOMAN). Já em âmbito jurisdicional, em especial, no

processo da competência do Tribunal do Júri, entende-se por “excesso de linguagem” a

exagerada incursão do juiz sobre as provas dos autos, capaz de influir no ânimo do

Conselho de Sentença (art. 413, § 1º, do CPP). A insurgência contra alegada incursão no

mérito final de determinada questão sub judice, em incidente de falsidade documental,

não implica em qualquer uma das hipóteses semânticas do instituto “excesso de

linguagem”.

III. Não se considera violação de deveres de conduta de magistrados de urbanidade

e de não se pronunciar sobre processo judicial em andamento – arts. 35, IV, e 36,

III, da LOMAN) a caracterização de suposto error in procedendo em produção

probatória, feita em processo judicial, nem mesmo eventual juízo prévio de mérito

sobre o teor ideativo ou material de documento não periciado. O dever de

364 CNJ, Reclamação Disciplinar n. 0000623-40.2013.2.00.0000 Relator Corregedor Nacional de Justiça

Francisco Falcão, julgada em 02.12.2013.

259

abstenção de opinião diz respeito à manifestação exarada extraprocessualmente –

i.e., perante os meios de comunicação (TV, jornais, etc), sendo plenamente possível

a crítica do magistrado nos autos de processo pendente de seu julgamento, por

justamente ser essa atividade inerente ao exercício da judicatura, que nada mais é

do que a própria análise de mérito, questão tipicamente jurisdicional e fora da

competência do CNJ (art. 103-B, §4º, da CF/88).

IV. Processo de revisão disciplinar a que se indefere.

"O Conselho, por maioria, julgou improcedente o pedido de revisão disciplinar, nos

termos do voto do Relator. Vencido o Conselheiro Paulo Lobo que não conhecia do

pedido. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros Técio Lins e Silva e Andréa Pachá.

Presidiu o julgamento o Conselheiro Ministro Gilson Dipp, Plenário, 31 de março de

2009".

REVDIS 0001235-51.2008.2.00.0000. Rel. Jorge Maurique. Julgado em 31.03.2009.

81ª sessão.

REVISÃO DISCIPLINAR. MAGISTRADO. AFIRMAÇÃO NOS AUTOS DE QUE

O DEFENSOR UTILIZOU-SE DE ARGUMENTO FALACIOSO. ALEGAÇÃO

DE EXCESSO DE LINGUAGEM. IMPOSIÇÃO DE PENA DE ADVERTÊNCIA

PELO TRIBUNAL PLENO. INADMISSIBILIDADE. NÃO CARACTERIZAÇÃO DO

EXCESSO. – “Não há falar em excesso de linguagem a que se refere o art. 41 da

LOMAN se as afirmações feitas no despacho judicial correspondem à realidade

dos fatos. Portanto, se o magistrado afirma fato verdadeiro na sua decisão,

contrapondo afirmação do causídico que não corresponde à realidade fática, não

estará excedendo em sua linguagem se disser que tal afirmação ou argumento –

por não retratar a verdade – é falacioso, não se vislumbrando nisso qualquer

excesso ou ofensa”.

"O Conselho, por maioria, julgou procedente o pedido para arquivar definitivamente o

procedimento, anulando a pena de advertência. Vencidos parcialmente os Conselheiros

Jorge Maurique (Relator), José Adonis, Felipe Locke, Paulo Lobo e Mairan Maia.

Lavrará o acórdão o Conselheiro Rui Stoco. Ausente, justificadamente, o Conselheiro

Técio Lins e Silva. Presidiu o julgamento o Conselheiro Ministro Gilson Dipp, Plenário,

31 de março de 2009".

260

REVDIS 0001727-43.2008.2.00.0000. Rel. Jorge Maurique. Rel. p/ o ac. Rui Stoco.

Julgado em 31.03.2009. 81ª sessão.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRELIMINARES DE EXCESSO

DE PRAZO E DE PRESCRIÇÃO AFASTADAS. INEXISTÊNCIA DE EXCESSO DE

LINGUAGEM. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO USO DE VIOLÊNCIA

CONTRA DEFENSORA PÚBLICA. PEDIDO IMPROCEDENTE.

1. O art. 7º, § 5º, da Resolução n. 30 do Conselho Nacional de Justiça autoriza

expressamente a prorrogação do prazo de 90 (noventa) dias para a conclusão do

processo administrativo quando a delonga decorrer do direito de defesa. Preliminar de

excesso de prazo afastada.

2. Incabível o reconhecimento da prescrição virtual, antecipada ou em perspectiva ante a

ausência de fundamentação legal para tanto na esfera criminal como na administrativa.

Aplicação, por analogia, do entendimento constante da Súmula n. 438 do STJ.

3. Nos termos do art. 42 da Lei Complementar n. 37/79 (LOMAM), “salvo os casos de

impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido ou

prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir”.

4. Não há prova de ato judicial ou manifestação do magistrado que adjetive como

“ridícula” a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, de forma a

caracterizar o excesso de linguagem, desacato, irreverência ou desrespeito à

jurisprudência da Corte Superior.

5. Resta evidente do conjunto probatório que não existe comprovação de que o

magistrado tenha agarrado, empurrado ou afastado a Procuradora do Estado

DANIELLE GONÇALVES PINHEIRO.

6. O magistrado não deve ser punido por ter dito que a atitude de alguns

defensores, que deixavam de interpor o recurso legalmente previsto, para depois

impetrarem habeas corpus, fazia lembrar os antigos rábulas velhacos, ante a

ausência do propósito inequívoco de ofender.

7. Pedido improcedente

“O Conselho, por unanimidade, julgou improcedente o pedido, nos

termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros Ministro Cezar

Peluso, Nelson Tomaz Braga, Felipe Locke e Marcelo Neves. Ausente,

261

circunstancialmente, o Conselheiro Marcelo Nobre. Presidiu o julgamento o Ministro

Gilson Dipp. Plenário, 30 de junho de 2010.”

PCA 0001923-76.2009.2.00.0000, Rel. Leomar Barros. Julgado em 29.06.2010, na 108ª

sessão.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da

Penha). Excesso de linguagem. Expressões discriminatórias contra o gênero feminino.

Publicação. Sentença, meios regulares de comunicação e manutenção de “site” pessoal

na internet. Níveis de Gravidade. Alta reprovabilidade. Ocorrência. Pedido de

condenação. Procedência. Prescrição. Não ocorrência. Conduta discriminatória análoga

à do crime de racismo. Procedimento incorreto. Persistência. Reiteração. Pena.

Dosimetria. Disponibilidade compulsória. Após rigorosa análise de dosimetria da pena,

aplica-se a pena de disponibilidade compulsória ao procedimento incorreto praticado

pelo requerido de maneira reiterada. A conduta consistiu em excesso de linguagem

manifestada em expressões de discriminação ao gênero feminino, de modo análogo

ao de crime de racismo. O excesso de linguagem comporta níveis de gravidade. No

presente caso, configurou-se alta reprovabilidade. Além das expressões utilizadas

no exercício da atividade judicante, por meio de sentença, o requerido conferiu

extensa publicidade ao conteúdo da mesma, concedendo entrevistas e divulgando

nota em diversos meios de comunicação, assim como, ainda mais grave, manteve

por longa data livre acesso ao teor da sentença em seu “site” pessoal na rede

mundial de computadores, insistindo na correção de sua conduta.

"A Lei Orgânica da Magistratura Nacional não fixou regras de prescrição da pretensão

punitiva por faltas disciplinares praticadas por magistrados. Aplica-se, subsidiariamente,

a Lei nº 8.112/90,

conforme precedentes do STF (MS 25191/DF, TP, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Julg.

19/11/2007, DJ 14.12.2007), do STJ

(RMS 14797/BA, Rel. Min. GILSON DIPP, DJ 26.5.2003) e deste CNJ (REVDIS 27,

Rel.Cons. Felipe Locke Cavalcanti, DJU

26.11.2007; PAD nº 200810000008582, Rel.Cons. José Adonis, DJU

19.12.2008; REVDIS nº 0001644-56.2010.2.00.0000, Rel. Cons. José Adonis, DJU

16/09/2010).

262

Nos termos da aplicação subsidiária do art. 142 da Lei nº 8.112/90, a ação disciplinar

prescreve em dois anos quanto à censura e em cinco anos quanto à disponibilidade e à

aposentadoria compulsórias. Conforme o § 1º dessa disposição legal, o “prazo de

prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido” (a rigor, da data

de “conhecimento de indícios prenunciadores de possível falta funcional”). O curso da

prescrição interrompe-se com a

abertura da sindicância ou a instauração do processo disciplinar, conforme o § 3º do

mesmo dispositivo. Na interpretação

dada à Lei nº 8.112/90, o Supremo Tribunal Federal, considerando os

artigos 152 e 167 desta Lei, firmou jurisprudência no sentido de que o prazo da

prescrição recomeça a correr a partir do prazo máximo para a conclusão do processo,

que é de 140 dais (MS nº 22.728, Rel. Moreira Alves, DJ 13.11.98; MS nº 22.679, Rel.

Sepúlveda Pertence,

DJ 7.8.98; MS nº 23.013, Rel. Sidney Sanches, RTJ 172/57).

I.3. Prevalecendo a hipótese, que será sustentada a partir da do item VI deste voto, de

que cabe a aplicação da pena de disponibilidade compulsória com vencimentos

proporcionais, a inocorrência da prescrição é incontrovertida. A decisão judicial que

justificou originariamente a instauração do presente PAD foi prolatada em 12

de fevereiro de 2007, não podendo ter transcorrido, evidentemente, o prazo quinquenal

de prescrição aplicável à hipótese. Além disso, cabe enfatizar que o prazo de um ano,

previsto no art. 82 do Regimento Interno do CNJ, para a apresentação do pedido ou a

instauração

de ofício da Revisão Disciplinar, foi respeitado: o arquivamento da

Representação nº 2007/31525 pelo Corregedor-Geral de Justiça do Estado de Minas

Gerais ocorreu em 23/07/2007 e a

Revisão Disciplinar foi instaurada por este Conselho, de ofício, em

20/11/2007."

Voto Relator - MARCELO NEVES

O Conselho, por maioria, decidiu pela aplicação da pena de

disponibilidade com vencimentos proporcionais ao magistrado, nos termos do voto do

Relator. Vencidos os Conselheiros Ministra Eliana Calmon, Ministro Ives Gandra,

Milton Nobre, Leomar Barros Amorim, Nelson Tomaz Braga e Paulo Tamburini, que

votaram pela aplicação da pena de censura. Votou o Ministro Ayres Britto. Ausente,

263

justificadamente, o Presidente Ministro Cezar Peluso.

Presidiu o julgamento o Ministro Ayres Britto. Plenário, 9 de novembro de 2010.

Processo n. 0005370-72.2009.2.00.0000 PAD. Julgado em 09.11.2010. Rel. Marcelo

Neves. 116ª Sessão

Vejamos alguns trechos da fundamentação da decisão judicial do juiz de Sete

Lagoas:

DECISÃO. Autos nº 222.942-8/06 (“Lei Maria da Penha”)

Vistos, etc…

[...]

Esta “Lei Maria da Penha” — como posta ou editada — é, portanto, de uma

heresia manifesta. Herética porque é antiética; herética porque fere a lógica de

Deus; herética porque é inconstitucional e por tudo isso flagrantemente injusta.

Ora! A desgraça humana começou no Éden: por causa da mulher — todos nós

sabemos — mas também em virtude da ingenuidade, da tolice e da fragilidade

emocional do homem.

Deus então, irado, vaticinou, para ambos. E para a mulher, disse:

“(…) o teu desejo será para o teu marido e ele te dominará (…)”

Já estalei diz que aos homens não é dado o direito de “controlar as ações (e)

comportamentos (…)” de sua mulher (art. 7º, inciso II). Ora! Que o “dominar”

não seja um “você deixa?”, mas ao menos um “o que você acha?”. Isto porque o

que parece ser não é o que efetivamente é, não parecia ser. Por causa da maldade

do “bicho” Homem, a Verdade foi então por ele interpretada segundo as suas

maldades e sobreveio o caos, culminando — na relação entre homem e mulher, que

domina o mundo — nesta preconceituosa lei.

Mas à parte dela, e como inclusive já ressaltado, o direito natural, e próprio em

cada um destes seres, nos conduz à conclusão bem diversa. Por isso — e na esteira

destes raciocínios — dou-me o direito de ir mais longe, e em definitivo! O mundo é

masculino! A idéia que temos de Deus é masculina! Jesus foi Homem! Á própria

Maria — inobstante a sua santidade, o respeito ao seu sofrimento (que inclusive a

credenciou como “advogada” nossa diante do Tribunal Divino) — Jesus ainda

264

assim a advertiu, para que também as coisas fossem postas cada uma em seu

devido lugar: “que tenho contigo, mulher!?”.

E certamente por isto a mulher guarda em seus arquétipos inconscientes sua

disposição com o homem tolo e emocionalmente frágil, porque foi muito também

por isso que tudo isso começou.

A mulher moderna — dita independente, que nem de pai para seus filhos precisa

mais, a não ser dos espermatozóides — assim só o é porque se frustrou como

mulher, como ser feminino. Tanto isto é verdade — respeitosamente — que aquela

que encontrar o homem de sua vida, aquele que a complete por inteiro, que a

satisfaça como ser e principalmente como ser sensual, esta mulher tenderá a abrir

mão de tudo (ou de muito), no sentido dessa “igualdade” que hipocritamente e

demagogicamente se está a lhe conferir. Isto porque a mulher quer ser amada. Só

isso. Nada mais. Só que “só isso” não é nada fácil para as exigências masculinas.

Por isso que as fragilidades do homem tem de ser reguladas, assistidas e

normatizadas, também. Sob pena de se configurar um desequilíbrio que, além de

inconstitucional, o mais grave, gerará desarmonia, que é tudo o que afinal o Estado

não quer.

Ora! Para não se ver eventualmente envolvido nas armadilhas desta lei absurda o

homem terá de se manter tolo, mole — no sentido de se ver na contingência de ter

de ceder facilmente às pressões — dependente, longe portanto de ser um homem

de verdade, másculo (contudo gentil), como certamente toda mulher quer que seja

o homem que escolheu amar.

[...]

Em virtude de tudo isso, e por considerar, afinal, e em resumo, discriminatório —

e, PORTANTO, INCONSTITUCIONAIS (na medida em que ferem o princípio da

isonomia, colidindo ainda frontalmente com o disposto no § 8º do art. 226 da

Constituição Federal) — NEGO VIGÊNCIA DO ART. 1º AO ART. 9º; ART. 10,

PARÁGRAFO ÚNICO; ART. 11, INCISO V; ART. 12, INCISO III; ARTS 13 E

14; ARTS. 18 E 19; DO ART. 22 AO ART. 24 e DO ART. 30 AO ART. 40, TODOS

DA LEI Nº 11.340/06, conhecida como “Lei Maria da Penha”.

[...]

Intimem-se ainda o M.P. e cumpra-se.

Sete Lagoas/MG, 12 de fevereiro de 2007

265

Edílson Rumbelsperger Rodrigues

Juiz de Direito

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES INDÍCIOS DE

INOBSERVÂNCIA AOS DEVERES FUNCIONAIS - PROCEDER INCOMPATÍVEL

COM A DIGNIDADE, A HONRA E O DECORO DA FUNÇÃO - INSTAURAÇÃO

DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.

1. "A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não

ofende a Constituição” (Súmula Vinculante nº 5/STF).

2. A sindicância, por se tratar de procedimento preliminar e inquisitorial visando apurar

a ocorrência de infrações administrativas, não se submete à observância dos princípios

do contraditório e da ampla defesa.

3. "O excesso de prazo na conclusão do processo administrativo disciplinar só é causa

de nulidade quando se evidencia a ocorrência de prejuízo a defesa do servidor' (MS

13.9581DF, 3' Seção, ReI. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 22/612011 ,

DJe de , •,8120 1, ), o que não ocorreu na espécie.

4. É valida a prova tomada por empréstimo de expediente em tramitação na

Corregedoria Geral da Justiça Federal da 3ª Região instaurado para apurar conduta de

magistrado de primeiro grau de jurisdição. Precedentes do STJ e do STF.

5. Possível favorecimento de partes integrantes da relação processual formada nos

autos de ação cautelar de arrolamento, apreensão, sequestro e indisponibilidade de

bens.

6. Quebra do dever de imparcialidade, transparência e independência, inerentes â

atividade jurisdicional, com violação dos deveres impostos aos magistrados (art.

35, I e VIII, da LC 35/79). Conduta incompatível com a dignidade, a honra e o

decorro das funções (LOMAN, art. 56, II).

7. Recomendável instauração de processo administrativo disciplinar.

(VOTO – MIN. ELIANA CALMON)

“O Conselho decidiu:

I – por unanimidade, indeferir o pedido formulado pelo Dr. Carlos Alberto de Jesus

Marques, OAB/MS 4.862, para renovar a sustentação oral, em razão dos novos

266

Conselheiros declararem-se aptos e suficientemente informados, nos termos do artigo

127, §2º, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça;

II – por maioria, após o voto vista do Conselheiro Joaquim Barbosa, determinar a

instauração de processo administrativo disciplinar contra os magistrados requeridos.

Vencidos os então Conselheiros Carlos Alberto, Tourinho Neto, Ney Freitas e José

Lucio Munhoz. Suspeito, na ocasião, o então Conselheiro Sílvio Rocha;

III – por unanimidade, aprovar o afastamento cautelar dos magistrados requeridos,

proposto pelo Conselheiro Gilberto Martins, e a portaria de instauração do PAD.

Presidiu o julgamento o Conselheiro Joaquim Barbosa. Plenário, 23 de setembro de

2013.”365

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. UTILIZAÇÃO DA MÁQUINA JUDICIAL PARA

ATENDER INTERESSE PRIVADO. DESVIO DE FINALIDADE DA FUNÇÃO

JUDICANTE. MAGISTRADO QUE SE PRONTIFICA A COOPERAR EM OUTRO

JUÍZO POR RAZÕES PESSOAIS. INFRINGÊNCIA AO DEVER FUNCIONAL DE

IMPARCIALIDADE. ABUSO DE PODER. DESRESPEITO AO CÓDIGO DE ÉTICA

DA MAGISTRATURA NACIONAL E À LOMAN – ARTIGO 35, INCISOS I E VIII.

OBRIGATORIEDADE DE ABERTURA DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

DISCIPLINAR. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO DO MAGISTRADO DO

EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES.

1. Age em desacordo com a LOMAN o magistrado que, movido por interesses

meramente pessoais, mas sob a falsa premissa de prestígio ao interesse público,

busca designação para oficiar em Comarca diversa de sua atuação.

2. Infringe os deveres esposados na LOMAN o juiz que, afastando-se do interesse

público, realiza atos incompatíveis com seus deveres funcionais – retendo processo

que se referiria à área rural em litígio, valendo-se do cargo para obtenção de

informações privilegiadas e utilizando-se de aparato policial para ingressar em

fazenda, destruir guarita e torre de medição de vento.

3. Descumpre dever funcional o magistrado que retém processo a envolver a área

rural em litígio, de maneira proposital, no intuito de satisfazer interesse próprio de

caráter patrimonial.

365 CNJ, Sindicância n. 0003173-76.2011.2.00.0000 relatoria do Corregedor Nacional de Justiça

Francisco Falcão, julgada em 23 de setembro de 2013.

267

O Conselho, por unanimidade, decidiu pela abertura de processo administrativo

disciplinar contra o magistrado Vitor Manoel Sabino Xavier Bizerra, com afastamento

do requerido, aprovando, desde logo, a portaria de instauração do processo

administrativo disciplinar, nos termos propostos pelo Relator. Presidiu o julgamento o

Conselheiro Joaquim Barbosa. Plenário, 19 de maio de 2014.”366

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. REITERADA PROLAÇÃO DE

DECISÕES TERATOLÓGICAS. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA

IMPARCIALIDADE E DA PRUDÊNCIA, BEM COMO DO DEVER IMPOSTO NO

ART. 35, I, DA LOMAN, E INCIDÊNCIA NAS INFRAÇÕES DESCRITAS NO ART.

56, I E III, SEGUNDA PARTE, DO MESMO DIPLOMA LEGAL.

A reiterada violação de deveres funcionais, por meio da prolação de decisões

teratológicas, envolvendo a liberação de vultosas quantias, sem garantias

consistentes, em desfavor de partes notoriamente solventes, revela a existência de

dolo na atuação do magistrado acusado, consubstanciado na deliberada intenção

de beneficiar, na solidão de qualquer razão de direito sustentável, um dos polos da

relação processual, o que, evidentemente, ultrapassa os limites da regular atuação

judicante e passa ao campo da responsabilização disciplinar, caracterizando

contumácia na prática de condutas incompatíveis a merecer punição.

O princípio da independência judicial não constitui manto de proteção absoluto do

magistrado, capaz de afastar qualquer possibilidade de sua punição em razão das

decisões que profere, e tampouco funciona como a cartola de mágico, da qual o

juiz pode retirar, conforme seu exclusivo desejo, arbitrariamente, ilusões de

direito. Ele é uma garantia do cidadão para assegurar julgamentos livres de

pressões, mas de acordo com a lei e o direito.

Processo administrativo disciplinar julgado procedente para aplicar a pena de

aposentadoria compulsória, com proventos proporcionais ao tempo de serviço.

Parte superior do formulário

Parte inferior do formulário

“O Conselho, por unanimidade, decidiu pela aplicação da pena de aposentadoria

compulsória ao magistrado, nos termos do voto do Relator.

366 CNJ, Reclamação Disciplinar n. 0005930-09.2012.2.00.0000 Relatora Conselheira Ana Maria Duarte

Amarante Brito, julgada em 20 de maio de 2014.

268

Ausente, justificadamente, o Conselheiro Leomar Barros. Presidiu o julgamento o

Ministro Cezar Peluso. Plenário, 29 de março de 2011.”

Processo Administrativo n. 0001460-03.2010.2.00.0000. Rel. Milton Nobre. Julgado em

29.03.2011 na 123ª sessão.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. REITERADA PROLAÇÃO DE

DECISÕES TERATOLÓGICAS. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA

IMPARCIALIDADE E DA PRUDÊNCIA, BEM COMO DO DEVER IMPOSTO

NO ART. 35, I, DA LOMAN E INCIDÊNCIA NAS INFRAÇÕES DESCRITAS NO

ART. 56, I E III, SEGUNDA PARTE, DO MESMO DIPLOMA LEGAL.

PRECEDENTE DESTE CONSELHO. PROCEDÊNCIA PARA APLICAÇÃO DA

PENA DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA, COM VENCIMENTOS

PROPORCIONAIS.

“O Conselho, por unanimidade, julgou parcialmente procedente o

pedido, nos termos do voto do Relator. Ausente, justificadamente, o

Conselheiro Marcelo Nobre. Presidiu o julgamento o Ministro Cezar Peluso. Plenário,

28 de fevereiro de 2012.”

PAD 0001589-08.2010.2.00.0000. Rel. Vasi Werner. Julgado em 28.02.2012 na 142ª

sessão.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. IMPUTAÇÃO: VIOLAÇÃO DO

DEVER DE IMPARCIALIDADE, CONDUTA INADEQUADA, VIOLAÇÃO DO

DEVER DE MORALIDADE PÚBLICA E FAVORECIMENTO IRREGULAR

DE CONTRA-PARENTE. IMPROCEDÊNCIA DAS ACUSAÇÕES.

ARQUIVAMENTO.

1. Inexistência nos autos de prova ou sequer indício de que o requerido tenha

beneficiado ilegalmente o candidato a Prefeito de Manaus, havendo apenas indícios

e ilações não confirmados do conjunto probatório.

2. A alegação de ter requisitado servidor para assumir cargo em comissão de modo

a procrastinar as investigações que envolvia pessoa de sua família está baseada em

mera suposição, que não pode levar à reprovação disciplinar do Requerido.

3. Além de não haver nos autos nenhuma prova de intervenção parcial do

Requerido em favor do Governador do Estado, nem de outra qualquer autoridade,

269

não se pode exigir de um Desembargador, Presidente do Tribunal de Justiça ou do

Tribunal Regional Eleitoral, que não se relacione social, institucional ou quiçá

pessoalmente com autoridades locais.

4) A concessão de liminar em demanda judicial possessória em favor de contra-parente

ficou restrita ao campo da atividade jurisdicional, regulável pela via dos recursos

próprios, só ensejando reprovação disciplinar caso fosse comprovado o dolo ou má-fé, o

que não foi comprovado.

5) Improcedência do Processo Administrativo Disciplinar, com o seu consequente

arquivamento. Processo Administrativo Disciplinar n. 0004057-42.2010.2.00.0000.

Relator Conselheiro Marcelo Neves, Relatora para o Acórdão Corregedora Nacional de

Justiça Eliana Calmon julgado em 14.02.2012.

SINDICÂNCIA. REAPRECIAÇÃO DE FATOS APURADOS PELA

CORREGEDORIA LOCAL INDICATIVOS DE VIOLAÇÕES AOS DEVERES

FUNCIONAIS. POSSIBILIDADE. SUPEIÇÃO DE JUÍZA AUXILIAR DA

CORREGEDORIA LOCAL. INEXISTÊNCIA. FATOS DIVERSOS.

INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.

DECRETAÇÃO DE AFASTAMENTO PREVENTIVO.

I – O Conselho Nacional de Justiça detém, em matéria disciplinar, competência

concorrente com os Tribunais de Justiça, podendo reapreciar, no exercício de seus

poderes originários (CF, art. 103-A, § 4º, III) fatos não alcançados pela prescrição, o

que não se confunde com o exercício do poder de revisão, sujeito a requisitos

específicos e a prazo decadencial de um ano (CF, art. 103-A, § 4º, V).

II - Compete a este Conselho instaurar o processo administrativo disciplinar exatamente

para apurar os fatos, garantindo ao Reclamado a mais ampla defesa e contraditório.

III – O poder correicional de investigação e de atuação é exclusivo do Corregedor

Geral, sendo que os Juízes Auxiliares, como a designação já explica, não são

efetivamente responsáveis pela apuração, senão auxiliares, não possuindo poderes de

decisão em matéria disciplinar, uma vez que a abertura de processo administrativo

disciplinar e a imposição de sanção dependem de votação da maioria absoluta dos

membros do Tribunal (CF, art. 93, X).

IV - Os fatos trazidos a conhecimento deste Conselho somente poderão ser

integralmente apreciados no processo administrativo a ser instaurado, sendo certo que o

270

atual procedimento, por sua natureza de mero instrumento preparatório, limita-se à

verificação da existência de indícios de irregularidades eventualmente praticadas.

V - Compete a este Conselho instaurar o processo administrativo disciplinar exatamente

para apurar os fatos, garantindo ao Sindicado a mais ampla defesa e contraditório.

VI – A independência judicial é uma garantia do cidadão para assegurar

julgamentos livres de pressões, mas de acordo com a lei e o direito. A

independência judicial não é, porém, incompatível com o controle disciplinar da

magistratura. A imunidade garantida pelo art. 41 da LOMAN não é absoluta,

sendo possível a responsabilização administrativo- disciplinar do magistrado

quando, no exercício da atividade jurisdicional, viola o dever de imparcialidade

CPC, art. 135, I) e age, de forma reiterada, contrariando dispositivos legais

expressos, em violação ao dever do art. 35, I, da LOMAN, e adotando, de forma

reiterada e com dolo, revelado por um conjunto de indícios, procedimentos

incorretos (LOMAN, art. 44), que acarretam prejuízos a uma das partes, em

procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções

(LOMAN, art. 56, I) e proceder funcional incompatível com o bom desempenho

das atividades do Poder Judiciário (LOMAN, art. 56, II).

VII - Havendo indicativos de grave violação aos deveres funcionais praticados por Juiz

de Direito, titular da 2ª Vara Cível da Comarca de São Luís/MA, com a adoção de

postura incompatível com o exercício da magistratura, mostra-se necessária a

instauração de processo administrativo disciplinar, a fim de que sejam esclarecidos os

fatos e aplicada a penalidade eventualmente cabível.

VIII – Tratando-se de conduta, em tese, incompatível com o exercício da

judicatura, impõe-se o afastamento preventivo do Sindicado (LOMAN art. 27, § 3º

e RICNJ art. 75, parágrafo único), em especial por se tratar de conduta reiterada,

na qual o magistrado persistiu mesmo após a instauração da sindicância.

IX – O afastamento implica na suspensão, com exceção dos vencimentos, de todas as

vantagens decorrentes da condição de magistrado, tais como uso de gabinete, de veículo

oficial e manutenção ou designação de servidores em cargos de confiança ou funções

comissionadas.

X – Os feitos atribuídos ao magistrado afastado deverão ser conduzidos por magistrado

designado para substituição, na forma da regulamentação local, evitando-se prejuízo aos

271

jurisdicionados. Avocação n. 0002549-95.2009.2.00.0000. Relator Corregedor Nacional

de Justiça Gilson Dipp. Julgado em 17.08.2010.

SINDICÂNCIA. REAPRECIAÇÃO DE FATOS ANTERIORMENTE JULGADOS.

IMPOSSIBILIDADE. ARQUIVAMENTO. INDICATIVOS DE VIOLAÇÕES AOS

DEVERES FUNCIONAIS. FATOS DIVERSOS. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO

ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DECRETAÇÃO DE AFASTAMENTO

PREVENTIVO.

I – Os fatos descritos na Sindicância n. 0002699-76.2.00.0000 já foram objeto de

apreciação e julgamento nos autos do Procedimento de Controle Administrativo n.

0000966-75.2009.2.00.0000, quando se entendeu que se tratava de ato jurisdicional.

Como a matéria já foi apreciada por este Conselho, e não existem novos elementos de

prova, deve ser arquivada a presente Sindicância quanto a tais fatos.

II - Os fatos trazidos a conhecimento deste Conselho somente poderão ser

integralmente apreciados no processo administrativo a ser instaurado, sendo certo que o

atual procedimento, por sua natureza de mero instrumento preparatório, limita-se à

verificação da existência de indícios de irregularidades eventualmente praticadas.

III - Compete a este Conselho instaurar o processo administrativo disciplinar

exatamente para apurar os fatos, garantindo ao Sindicado a mais ampla defesa e

contraditório.

IV – O magistrado que age com desídia na fiscalização dos trabalhos da vara, bem

como na condução dos feitos, descumpre os deveres dos arts. 35, incisos II e III, 41,

44 e 56 da LOMAN, acarretando descrédito ao Poder Judiciário entre a

população.

V – A independência judicial é uma garantia do cidadão para assegurar

julgamentos livres de pressões, mas de acordo com a lei e o direito. A

independência judicial não é, porém, incompatível com o controle disciplinar da

magistratura.

A imunidade garantida pelo art. 41 da LOMAN não é absoluta, sendo possível a

responsabilização administrativo-disciplinar do magistrado quando, no exercício

da atividade jurisdicional, viola o dever de imparcialidade (CPC, art. 135, I) e age,

de forma reiterada, contrariando dispositivos legais expressos, em violação ao

272

dever do art. 35, I, da LOMAN, e adotando, de forma reiterada e com dolo,

revelado por um conjunto de indícios, procedimentos incorretos (LOMAN, art.

44), que acarretam prejuízos a uma das partes, em procedimento incompatível

com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções (LOMAN, art. 56, I) e

proceder funcional incompatível com o bom desempenho das atividades do Poder

Judiciário (LOMAN, art. 56, II).

VI - Havendo indicativos de grave violação aos deveres funcionais praticados por

Juiz de Direito, titular da 2ª Vara Cível da Comarca de Teresina/PI, com a adoção

de postura incompatível com o exercício da magistratura, mostra-se necessária a

instauração de processo administrativo disciplinar, a fim de que sejam esclarecidos

os fatos e aplicada a penalidade eventualmente cabível.

VII – Tratando-se de conduta, em tese, incompatível com o exercício da judicatura,

impõe-se o afastamento preventivo do Sindicado (LOMAN art. 27, § 3º e RICNJ

art. 75, parágrafo único), em especial por se tratar de conduta reiterada, na qual o

magistrado persistiu mesmo após a instauração da sindicância.

VIII – O afastamento implica na suspensão, com exceção dos vencimentos, de todas as

vantagens decorrentes da condição de magistrado, tais como uso de gabinete, de veículo

oficial e manutenção ou designação de servidores em cargos de confiança ou funções

comissionadas.

IX – Os feitos atribuídos ao magistrado afastado deverão ser conduzidos por magistrado

designado para substituição, na forma da regulamentação local, evitando-se prejuízo aos

jurisdicionados. SIND - Sindicância n. 0002699-76.2009.2.00.0000 Relator Corregedor

Nacional de Justiça Gilson Dipp. Julgado em 29.06.2010

SINDICÂNCIA. SUSPEIÇÃO DE JUÍZA AUXILIAR DA CORREGEDORIA

LOCAL. INEXISTÊNCIA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. FATOS

DIVERSOS. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO

DISCIPLINAR. DECRETAÇÃO DE AFASTAMENTO PREVENTIVO.

I – Irrelevante a alegação de inimizade com a Juíza Auxiliar da Corregedoria,

responsável apenas pelo início da apuração, que foi seguida por sindicância levada a

efeito por esta Corregedoria Nacional de Justiça, em especial porque a abertura de

273

processo administrativo disciplinar e a imposição de sanção dependem de votação da

maioria absoluta dos membros do Tribunal ou do Conselho (CF, art. 93, X).

II - A LOMAN não estabelece regras de prescrição da pretensão punitiva do Estado em

relação a infrações disciplinares praticadas por magistrados, devendo ser aplicado,

subsidiariamente, o art. 142 da Lei 8112/90 (STF, MS 25191/DF, Cármen Lúcia, Pl., u.,

19.11.07), considerando-se como termo inicial da prescrição a data em que os fatos se

tornaram conhecidos (Lei 8.112/90, art. 142, § 1º).

III - Os fatos trazidos a conhecimento deste Conselho somente poderão ser

integralmente apreciados no processo administrativo a ser instaurado, no qual

serão garantidos a mais ampla defesa e o contraditório, sendo certo que a

sindicância, por sua natureza de mero instrumento preparatório, limita-se à

verificação da existência de indícios de irregularidades eventualmente praticadas.

V – A independência judicial é uma garantia do cidadão para assegurar

julgamentos livres de pressões, mas de acordo com a lei e o direito. A

independência judicial não é, porém, incompatível com o controle disciplinar da

magistratura. A imunidade garantida pelo art. 41 da LOMAN não é absoluta,

sendo possível a responsabilização administrativo-disciplinar do magistrado

quando, no exercício da atividade jurisdicional, viola o dever de imparcialidade

(CPC, art. 135, I) e age, de forma reiterada, contrariando dispositivos legais

expressos, em violação ao dever do art. 35, I, da LOMAN, e adotando, de forma

reiterada e com dolo, revelado por um conjunto de indícios, procedimentos

incorretos (LOMAN, art. 44), que acarretam prejuízos a uma das partes, em

procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções

(LOMAN, art. 56, I) e proceder funcional incompatível com o bom desempenho

das atividades do Poder Judiciário (LOMAN, art. 56, II).

VI - Havendo indicativos de grave violação aos deveres funcionais praticados por

Juiz de Direito, titular da 7ª Vara Cível da Comarca de São Luís/MA, com a

adoção de postura incompatível com o exercício da magistratura, mostra-se

necessária a instauração de processo administrativo disciplinar, a fim de que sejam

esclarecidos os fatos e aplicada a penalidade eventualmente cabível.

VII – Tratando-se de conduta, em tese, incompatível com o exercício da judicatura,

impõe-se o afastamento preventivo do Sindicado (LOMAN art. 27, § 3º e RICNJ

274

art. 75, parágrafo único), em especial por se tratar de conduta reiterada, na qual o

magistrado persistiu mesmo após a instauração da sindicância.

VIII – O afastamento implica na suspensão, com exceção dos vencimentos, de todas as

vantagens decorrentes da condição de magistrado, tais como uso de gabinete, de veículo

oficial e manutenção ou designação de servidores em cargos de confiança ou funções

comissionadas.

IX – Os feitos atribuídos ao magistrado afastado deverão ser conduzidos por magistrado

designado para substituição, na forma da regulamentação local, evitando-se prejuízo aos

jurisdicionados. Avocação n. 0002544-73.2009.2.00.0000 Relator Corregedor Nacional

de Justiça Gilson Dipp. Julgado em 03.08.2010

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. DISPENSA DE

SINDICÂNCIA. INDICATIVOS DE VIOLAÇÕES AOS DEVERES FUNCIONAIS.

INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.

I – Ao investigado deve ser dada a oportunidade de defesa prévia, após intimação

pessoal, nos termos do parágrafo único do art. 69 do Regimento Interno do Conselho

Nacional de Justiça e do § 1º do art. 27 LOMAN.

II – Renova-se o do julgamento para abertura do PAD em relação aos fatos nos quais

observou-se a inobservância do prazo legal de defesa. Havendo outros fatos em relação

aos quais o magistrado defendeu-se regularmente, que constituíam motivo suficiente

para abertura do processo e afastamento do magistrado, não há nulidade a ser

reconhecida no julgamento anterior, mantidos a abertura do processo e o afastamento.

II – A sindicância, por ser mero procedimento preparatório do processo administrativo

disciplinar, é dispensável quando já existirem elementos suficientes para a instauração

daquele processo.

III – A independência judicial é uma garantia do cidadão para assegurar

julgamentos livres de pressões, mas de acordo com a lei e o direito. A

independência judicial não é, porém, incompatível com o controle disciplinar da

magistratura. A imunidade garantida pelo art. 41 da LOMAN não é absoluta,

sendo possível a responsabilização administrativo-disciplinar do magistrado

quando, no exercício da atividade jurisdicional, viola o dever de imparcialidade

(CPC, art. 135, I) e age, de forma reiterada, contrariando dispositivos legais

expressos, em violação ao dever do art. 35, I, da LOMAN, e adotando, de forma

275

reiterada e com dolo, revelado por um conjunto de indícios, procedimentos

incorretos (LOMAN, art. 44), que acarretam prejuízos a uma das partes, em

procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções

(LOMAN, art. 56, I) e proceder funcional incompatível com o bom desempenho

das atividades do Poder Judiciário (LOMAN, art. 56, II).

VI – Havendo indicativos de grave violação aos deveres funcionais praticados por

Juiz de Direito, titular da 6ª Vara da Comarca de São Luis/MA, com a adoção de

postura incompatível com o exercício da magistratura, mostra-se necessária a

instauração de processo administrativo disciplinar, a fim de que sejam esclarecidos

os fatos e aplicada a penalidade eventualmente cabível.

VII – Tratando-se de conduta, em tese, incompatível com o exercício da judicatura,

impõe-se o afastamento preventivo do Sindicado (LOMAN art. 27. § 3º e RICNJ

art. 75, parágrafo único), em especial por se tratar de conduta reiterada, na qual o

magistrado persistiu mesmo após a instauração de Sindicância.

VIII – O afastamento implica na suspensão, com exceção dos vencimentos, de todas as

vantagens decorrentes da condição de magistrado, tais como uso de gabinete, de veículo

oficial e manutenção ou designação de servidores em cargos de confiança ou funções

comissionadas.

IX – Os feitos atribuídos ao magistrado afastado deverão ser conduzidos por magistrado

designado para substituição, na forma da regulamentação local, evitando-se prejuízo aos

jurisdicionados.

Reclamação Disciplinar n. 0006159-71.2009.2.00.0000 Relator Corregedor Nacional

de Justiça Gilson Dipp. Julgado em 06.04.2010.

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO

ADMINISTRATIVO. MAGISTRADO. ATO JURISDICIONAL. QUEBRA DO

DEVER DE IMPARCIALIDADE NÃO CONFIGURADO. ARQUIVAMENTO.

1. O ato imputado ao requerido como violador do dever de imparcialidade foi praticado

no exercício de função jurisdicional e, por isso, considero-o passível de ser investigado

por esse Conselho apenas nos casos em que a decisão judicial configure procedimento

276

incorreto ou tenha sido praticada com nítidos propósitos ilícitos, situações que, no

entanto, não se encontram presentes nos autos.

2. Atenta contra a própria atividade jurisdicional cogitar que um magistrado possa ser

responsabilizado por ter proferido uma decisão equivocada. Em Novum Crimen: O

Crime de Hermenêutica, Obras Completas, vol. XXIII, Tomo III, 1976, fl. 243, Rui

Barbosa, adverte para o despropósito de tal hipótese, passível de ocorrer tão somente na

hipótese de prevaricação: “Não há delitos de interpretação. Por interpretação jurídica, só

é responsável o juiz quando ele ferir “disposição literal” e, ainda nesse caso, não é o

erro, que se reprime; é o dolo, a saber: a sentença dada por afeição, ódio, contemplação

ou para promover interesse pessoal seus (Cód. Penal, art. 207,§ 1º).”

3. Na suspensão de segurança ou tutela antecipada, medida praticada pelo requerido,

não se aprecia o mérito do processo principal, mas os aspectos relacionados à

potencialidade lesiva do ato judicial em face de parâmetros extrajurídicos, como a

ordem, a saúde, a segurança e a economia. No caso a amplitude da decisão judicial

suspensa, concedida além do pedido, não apenas vedava novas concessões de licenças

urbanísticas para novos empreendimentos imobiliários, como também suspendia às

existentes, em desrespeito ao ato jurídico perfeito, para determinados bairros da cidade

de Niterói e, com isso, atingiu uma gama de interesses coletivos, como trabalhistas

(desemprego no setor da construção civil); comerciais (quebra de contratos entre

fornecedores, consumidores); tributários (perda de arrecadação de tributos sobre

serviços e imobiliários para o Município) que justificaram a decisão tomada pelo

requerido de suspendê-la.

4. O ato judicial do requerido foi devidamente fundamentado e mantido pelo

Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que, por

unanimidade de votos, negou provimento ao agravo regimental interposto pelo

Ministério Público contra a decisão do requerido que suspendia a execução de

tutela antecipada em ação civil pública ambiental e urbanística.

5. A imparcialidade é um valor caro à magistratura. O magistrado em sua

atividade substitutiva deve atuar sem estar comprometido com a causa e, por isso,

o referido valor é protegido no sistema pelos institutos da suspeição e do

impedimento, cujas hipóteses, se comprovadas, afastam o magistrado da causa. No

caso não houve parcialidade. A decisão judicial foi proferida em relação à ação

civil pública em que são partes apenas o Ministério Público e o Município de

277

Niterói. A repercussão dos efeitos da decisão na esfera jurídica de terceiros não

constitui fator de quebra da imparcialidade do magistrado.

6. Procedimento arquivado pela maioria do Pleno do Conselho Nacional de Justiça,

conforme certidão de julgamento da 137ª Sessão Ordinária.

Pedido de Providências - Corregedoria n. 0007384-92.2010.2.00.0000 Relatora

Corregedora Nacional de Justiça ELIANA CALMON, Relator para o acórdão

Conselheiro SÍLVIO ROCHA. Julgado em 25.10.2011.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRESCRIÇÃO E MATÉRIA DE

NATUREZA JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. PLANTÃO JUDICIÁRIO.

DECISÃO LIMINAR. EXECUÇÃO DE ASTREINTES. INEXISTÊNCIA DE

CAUTELA IDÔNEA. DECISÃO TERATOLÓGICA. APLICAÇÃO DA PENA DE

DISPONIBILIDADE.

1. De acordo com a orientação plenária deste Eg. Conselho é possível o recebimento de

reclamação disciplinar como revisão disciplinar, desde que respeitado o prazo de até 1

(um ano) contado do trânsito em julgado no processo original (Regimento Interno do

Conselho Nacional de Justiça), além do contraditório e ampla defesa.

2. O prazo prescricional de falta funcional praticada pelo magistrado é de 5 (cinco) anos

(art. 24 da Resolução CNJ nº 135/2011), interrompido pela instauração de Processo

Administrativo Disciplinar neste Eg. CNJ.

3. O princípio da independência judicial não constitui manto de proteção absoluta

do magistrado, capaz de afastar punição em razão das decisões que profere. A

independência judicial é, sobretudo, uma garantia do cidadão para assegurar

julgamentos livres de pressões, mas de acordo com a lei e o direito. Precedentes.

4. Decisão proferida em plantão judiciário que determina a liberação da quantia

de cerca de R$ 13 milhões de reais, relativa à execução de astreintes, sem a prévia

oitiva do executado e sem o oferecimento de caução idônea, possui natureza

teratológica.

5. Celeridade empreendida pela Magistrada para proferir decisão ainda no

plantão judiciário, desconsiderando má-fé da parte, que manteve, ilegal e

injustificadamente, os autos em seu poder durante 51 meses.

278

6. Autorização de arrombamento dos cofres do banco executado sem o incidente de

resistência, com a requisição prévia de auxílio de força policial para dar

cumprimento a sua decisão.

7. Inobservância das cautelas previstas na legislação processual em vigor, além de

aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

8. Violação dos deveres de imparcialidade e prudência (artigos 8º, 24 e 25 do

Código de Ética da Magistratura), além do dever de “cumprir e fazer cumprir,

com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e atos de ofício”

(artigo 35, I, da LOMAN), configurando “procedimento incompatível com a

dignidade, a honra e o decoro de suas funções (artigo 56, II, da LOMAN).

9. Incidente isolado, porém de gravidade suficiente para justificar a imposição da

pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais (artigo 42, IV e 45, II, da

LOMAN e artigo 6º da Resolução CNJ nº 135).

Processo Administrativo Disciplinar que se conhece e que se julga procedente para

aplicação da pena de DISPONIBILIDADE.

(Ementa, PAD 0005003-77.2011.2.00.0000, Relator Conselheiro Carlos Alberto,

j. 181ª Sessão Ordinária).

DOLO E PARCIALIDADE

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. REITERADA PROLAÇÃO DE

DECISÕES TERATOLÓGICAS. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA

IMPARCIALIDADE E DA PRUDÊNCIA, BEM COMO DO DEVER IMPOSTO NO

ART. 35, I, DA LOMAN, E INCIDÊNCIA NAS INFRAÇÕES DESCRITAS NO ART.

56, I E III, SEGUNDA PARTE, DO MESMO DIPLOMA LEGAL.

A reiterada violação de deveres funcionais, por meio da prolação de decisões

teratológicas, envolvendo a liberação de vultosas quantias, sem garantias

consistentes, em desfavor de partes notoriamente solventes, revela a existência de

dolo na atuação do magistrado acusado, consubstanciado na deliberada intenção

de beneficiar, na solidão de qualquer razão de direito sustentável, um dos pólos da

relação processual, o que, evidentemente, ultrapassa os limites da regular atuação

279

judicante e passa ao campo da responsabilização disciplinar, caracterizando

contumácia na prática de condutas incompatíveis a merecer punição.

O princípio da independência judicial não constitui manto de proteção absoluto do

magistrado, capaz de afastar qualquer possibilidade de sua punição em razão das

decisões que profere, e tampouco funciona como a cartola de mágico, da qual o

juiz pode retirar, conforme seu exclusivo desejo, arbitrariamente, ilusões de

direito. Ele é uma garantia do cidadão para assegurar julgamentos livres de

pressões, mas de acordo com a lei e o direito.

Processo administrativo disciplinar julgado procedente para aplicar a pena de

aposentadoria compulsória, com proventos proporcionais ao tempo de serviço,

cuja execução, porém, fica suspensa se e enquanto ocorrer o cumprimento da pena

imposta no PAD n. 0001460-03.2010.2.00.0000.

Processo Administrativo Disciplinar n. 0004353-64.2010.2.00.0000 MILTON NOBRE.

Julgado em 29.03.2011.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRESCRIÇÃO E MATÉRIA DE

NATUREZA JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. PLANTÃO JUDICIÁRIO.

DECISÃO LIMINAR. EXECUÇÃO DE ASTREINTES. INEXISTÊNCIA DE

CAUTELA IDÔNEA. DECISÃO TERATOLÓGICA. APLICAÇÃO DA PENA DE

DISPONIBILIDADE.

1. De acordo com a orientação plenária deste Eg. Conselho é possível o recebimento de

reclamação disciplinar como revisão disciplinar, desde que respeitado o prazo de até 1

(um ano) contado do trânsito em julgado no processo original (Regimento Interno do

Conselho Nacional de Justiça), além do contraditório e ampla defesa.

2. O prazo prescricional de falta funcional praticada pelo magistrado é de 5 (cinco) anos

(art. 24 da Resolução CNJ nº 135/2011), interrompido pela instauração de Processo

Administrativo Disciplinar neste Eg. CNJ.

3. O princípio da independência judicial não constitui manto de proteção absoluta

do magistrado, capaz de afastar punição em razão das decisões que profere. A

independência judicial é, sobretudo, uma garantia do cidadão para assegurar

julgamentos livres de pressões, mas de acordo com a lei e o direito. Precedentes.

4. Decisão proferida em plantão judiciário que determina a liberação da quantia

280

de cerca de R$ 13 milhões de reais, relativa à execução de astreintes, sem a prévia

oitiva do executado e sem o oferecimento de caução idônea, possui natureza

teratológica.

5. Celeridade empreendida pela Magistrada para proferir decisão ainda no

plantão judiciário, desconsiderando má-fé da parte, que manteve, ilegal e

injustificadamente, os autos em seu poder durante 51 meses.

6. Autorização de arrombamento dos cofres do banco executado sem o incidente de

resistência, com a requisição prévia de auxílio de força policial para dar

cumprimento a sua decisão.

7. Inobservância das cautelas previstas na legislação processual em vigor, além de

aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

8. Violação dos deveres de imparcialidade e prudência (artigos 8º, 24 e 25 do

Código de Ética da Magistratura), além do dever de “cumprir e fazer cumprir,

com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e atos de ofício”

(artigo 35, I, da LOMAN), configurando “procedimento incompatível com a

dignidade, a honra e o decoro de suas funções (artigo 56, II, da LOMAN).

9. Incidente isolado, porém de gravidade suficiente para justificar a imposição da

pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais (artigo 42, IV e 45, II, da

LOMAN e artigo 6º da Resolução CNJ nº 135).

Processo Administrativo Disciplinar que se conhece e que se julga procedente para

aplicação da pena de DISPONIBILIDADE.

Após o voto do Conselheiro Vistor, o Conselho, por maioria, julgou procedente o

processo administrativo disciplinar para aplicar à magistrada Rosa Maria da Conceição

Correia Oliveira a pena de disponibilidade, com vencimentos proporcionais ao tempo de

serviço. Vencidos os Conselheiros Guilherme Calmon, Saulo Bahia, Luiza Frischeisen,

Gilberto Valente Martins, Gisela Gondin, Fabiano Silveira e Francisco Falcão que

aplicavam pena de aposentadoria. Presidiu o julgamento o Conselheiro Joaquim

Barbosa. Plenário, 17 de dezembro de 2013”367.

SINDICÂNCIA. INSTRUMENTO PREPARATÓRIO. DESNECESSIDADE DE

OBSERVAÇÃO DE FORMALIDADES.

INDICATIVOS DE VIOLAÇÕES AOS DEVERES FUNCIONAIS. INSTAURAÇÃO

367 CNJ, Processo Administrativo Disciplinar n. 0005003-77.2011.2.00.0000 Relatora Conselheira Maria

Cristina Irigoyen Peduzzi julgado em 17.12.2013.

281

DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DECRETAÇÃO DE

AFASTAMENTO PREVENTIVO.

I – Não há irregularidade na reunião de várias reclamações ou sindicâncias contra o

mesmo magistrado, medida que facilita tanto o trabalho de apuração quanto o exercício

da ampla

defesa, além de permitir uma graduação mais adequada da penalidade, considerado o

conjunto dos fatos e eventual reiteração.

II – Não cabe prorrogação do prazo para apresentação da defesa prévia, que é definido

em lei (LOMAN, art. 27, § 1º), ao argumento de complexidade dos fatos, em especial

quando já eram

estes, em sua quase totalidade, conhecidos do Sindicado, que já havia tido

oportunidades anteriores de se manifestar, em sede de Reclamação Disciplinar ou ao

longo da Sindicância.

III - Consoante entendimento doutrinário e jurisprudencial, a sindicância, por ser mero

instrumento preparatório, prescinde de formalidades e contraditório, os quais ficam

diferidos para posterior processo administrativo disciplinar.

IV – O Desembargador que age com desídia na fiscalização dos trabalhos do

Gabinete, bem como na condução dos feitos, revelando escassa ou insuficiente

capacidade de trabalho descumpre os deveres dos arts. 35, incisos I, II, III e VII,

c/c 56, III da LOMAN.

V – A independência judicial é uma garantia do cidadão para assegurar

julgamentos livres de pressões, mas de acordo com alei e o direito. A

independência judicial não é, porém, incompatível

com o controle disciplinar da magistratura. A imunidade garantida pelo art. 41 da

LOMAN não é absoluta, sendo possível a responsabilização administrativo-

disciplinar do magistrado quando, no exercício da atividade jurisdicional, viola o

dever de imparcialidade (CPC, art. 135, I) e age, de forma reiterada, contrariando

dispositivos legais expressos, em violação ao dever do art. 35, I, da LOMAN, e

adotando, de forma reiterada e com dolo, revelado por um conjunto de indícios,

procedimentos incorretos (LOMAN, art. 44), que acarretam prejuízos a uma das

partes, em procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas

funções (LOMAN, art. 56, I) e proceder funcional incompatível com o bom

desempenho das atividades do Poder Judiciário (LOMAN, art. 56, II).

282

VI - Havendo indicativos de grave violação aos deveres funcionais praticados por

Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, com a adoção de postura

incompatível com o

exercício da magistratura, mostra-se necessária a instauração de processo administrativo

disciplinar, a fim de que sejam esclarecidos os fatos e aplicada a penalidade

eventualmente cabível.

VII - Os fatos trazidos a conhecimento deste Conselho somente poderão ser

integralmente apreciados no processo administrativo a ser instaurado, sendo certo

que o atual procedimento, por sua natureza de mero instrumento preparatório,

limita-se à verificação da existência de indícios de irregularidades eventualmente

praticadas.

VIII - Compete a este Conselho instaurar o processo administrativo disciplinar

exatamente para apurar os fatos, garantindo ao Sindicado a mais ampla defesa e

contraditório.

IX – Tratando-se de conduta, em tese, incompatível com o exercício da judicatura,

impõe-se o afastamento preventivo do Sindicado (LOMAN art. 27, § 3º e RICNJ

art. 75, parágrafo único).

X – O afastamento implica a suspensão, com exceção dos vencimentos, de todas as

vantagens decorrentes da condição de magistrado, tais como uso de gabinete, de

veículo oficial e

manutenção ou designação de servidores em cargos de confiança ou funções

comissionadas.

XI – Os feitos atribuídos ao desembargador afastado deverão ser conduzidos por

magistrado designado para substituição, na forma da regulamentação local, evitando-se

prejuízo aos jurisdicionados.

Sindicância n. 0002524-82.2009.2.00.0000 Relator Corregedor Nacional de Justiça

Gilson Dipp. Julgamento em 17.08.2010.

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - POSSÍVEL OFENSA AO ART. 35, I, III, V, VII E

VIII, DA LC 35/79 – PROCEDER INCOMPATÍVEL COM A DIGNIDADE, A

HONRA E O DECORO DAS FUNÇÕES DA MAGISTRATURA - INSTAURAÇÃO

DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.

283

1. Possível favorecimento de advogado atuante na Comarca de Trairí/CE,

consistente no deferimento de liminares em inúmeras ações ajuizadas por

associações de defesa do consumidor criadas mediante fraude.

2. Liminares deferidas em curto espaço de tempo, antes mesmo da própria

autuação em alguns casos, a despeito da inexistência, na maior parte delas, de

documento comprobatório de filiação dos representados à entidade representante.

3. Celeridade predominante na realização do ato de notificação para imediato

cumprimento da liminar, após o que o processo entra em verdadeiro estado de

hibernação, uma vez que não se procede à citação das partes demandadas e não se

pratica nenhum outro ato processual.

4. Declarações de que o advogado supostamente favorecido é amigo íntimo do

magistrado, a ponto de se hospedar na residência oficial, além de ter trabalhado no

mesmo escritório de advocacia no qual laborou o Requerido, antes de assumir o

cargo de magistrado.

5. Admissão de pessoa sem vínculo com o Poder Judiciário para assessorar nos

trabalhos do Foro, também favorecida mediante deferimento de liminar para

religação de energia elétrica fundada no pagamento da obrigação, não obstante a

inexistência de documento comprobatório da quitação.

6. Consentimento dado à mesma pessoa para utilização de patrimônio público

(residência oficial).

7. Descumprimento ao dever de residir na sede da respectiva Comarca.

8. Condutas contrárias aos deveres impostos aos magistrados, especialmente àqueles

previstos no art. 35, I, III, V, VII e VIII, da LC 35/79.

9. Negligência no cumprimento dos deveres do cargo e conduta incompatível com a

dignidade, a honra e o decorro de suas funções (LOMAN, art. 56, I e 11).

10. Recomendável instauração de processo administrativo disciplinar, com o

afastamento do magistrado das funções judicantes e a suspensão do processo de

vitaliciamento.

O Conselho, por unanimidade, ratificou o voto da Ministra Eliana Calmon e a decisão

colegiada que determinou o afastamento do magistrado das funções judicantes e a

suspensão do processo de vitaliciamento até o término do processo administrativo

disciplinar ou até que o Plenário entenda conveniente ou oportuno, bem como

determinou a retomada da tramitação do já instaurado PAD 0005846-

284

08.2012.8.00.0000, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente. Ausente,

justificadamente, o Conselheiro Fabiano Silveira. Presidiu o julgamento o Conselheiro

Joaquim Barbosa. Plenário, 16 de junho de 2014.”368

NEGLIGÊNCIA

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. MAGISTRADO. PRESCRIÇÃO.

PRAZO QUINQUENAL. CONTAGEM A PARTIR DO CONHECIMENTO DOS

FATOS PELA ADMINISTRAÇÃO. BENS APREENDIDOS PELO

DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO. DEPÓSITO JUDICIAL EM FAVOR DE

TERCEIROS. INCOMPETÊNCIA DO MAGISTRADO. DESCUMPRIMENTO

DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

VIOLAÇÃO DO ART. 35, I, DA LOMAN E ART. 4º E 25 DA RESOLUÇÃO

60/2008. APLICAÇÃO DA PENA DE ADVERTÊNCIA. ART. 42 DA LOMAN E

ART. 4º DA RESOLUÇÃO CNJ Nº 135/2011.

1. A Resolução 135/CNJ determina que o cálculo da prescrição deve observar o prazo

quinquenal, contado da data em que os fatos tornaram-se conhecidos pela autoridade

competente e não da data em que tais fatos ocorreram.

2. Inexistindo qualquer relação do bem apreendido administrativamente com o juízo de

titularidade do Magistrado, evidencia-se a incompetência deste último para acautelar o

referido bem em favor de terceiro sem qualquer relação com a Administração Pública

ou com o pretenso proprietário.

3. Configura infração ao disposto no inciso I, do art. 35, da LOMAN, bem como ao

art. 25 da Resolução 60/2008, o fato de magistrado acautelar bem em favor de

terceiro, por duas vezes, deixando de cumprir o devido processo legal, sem

oportunizar manifestação do pretenso proprietário, bem como do Ministério

Público, mormente quando o ato não encontra respaldo na legislação de regência.

Cumpre ao administrador não só não fazer o que a lei proíbe, como é cediço, mas

agir nos estritos limites da legalidade.

4. Sendo o depósito inicial do bem apreendido emitido por outro juízo, apenas por

aquele pode ser reavaliado, indevida sua deliberação por juízo diverso, em

368 CNJ, Reclamação Disciplinar n. 0001163-25.2012.2.00.0000 Relator Corregedor Nacional de Justiça

Francisco Falcão julgada em 16.06.2014

285

conformidade com o art. 4º da Resolução CNJ nº 60/2008.

5. A ausência de má-fé ou dolo não exime o Magistrado da responsabilidade de

atuar com zelo na prática de atos processuais, porque constitui o zelo um dos

deveres impostos pelo art. 25 do Código de Ética da Magistratura, cujo

descumprimento é passível de penalização.

6. A negligência eventual no cumprimento dos deveres do cargo no qual está

investido é uma infração disciplinar de baixo potencial ofensivo que determina à

imposição de pena de advertência.

7. Processo Administrativo Disciplinar que se julga procedente por violação dos deveres

funcionais previstos nos arts. 35, I, da Lei Complementar nº 35/1979, e art. 4º e 25 da

Resolução CNJ nº 60/2008. Processo Administrativo Disciplinar n. 0004639-

37.2013.2.00.0000. Relatora Conselheira Ana Maria Duarte Amarante Brito. Julgado

em 16.06.2014.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO

ESTADO DO CEARÁ. SINDICÂNCIA Nº 5961-97. PLANTÃO JUDICIAL.

NEGLIGÊNCIA DA MAGISTRADA EM APRECIAR PEDIDO EM QUE A PARTE

CORRIA RISCO DE MORTE. VIOLAÇÃO DOS DEVERES DE CUMPRIR E

FAZER CUMPRIR AS DISPOSIÇÕES LEGAIS E OS ATOS DE OFÍCIO

IMPOSTOS NO ART. 35, I, DA LOMAN, BEM COMO VIOLAÇÃO DO

PRINCÍPIO DA PRUDÊNCIA. PROCEDÊNCIA PARA APLICAÇÃO DA PENA

DE ADVERTÊNCIA RESERVADAMENTE, POR ESCRITO.

1. Processo Administrativo Disciplinar instaurado em face de magistrada para

apurar suposta negligência, durante plantão judicial, quanto à apreciação de

requerimento formulado por jurisdicionado, que, em plantão do dia anterior, já

havia tido o deferimento de seu pleito. Na oportunidade, o pedido recusado de

conhecimento pela magistrada continha as seguintes expressões: “plantão

judicial”, “risco de morte da requerente” e “ordem judicial sendo descumprida”.

2. A parte autora Maria Alves de Araújo estava, desde o dia 29 de outubro de 2009, na

sala de pós-operatório do hospital público municipal Instituto Dr. José Frota, apesar de

sua prescrição médica indicar a necessidade de internação em leito de UTI.

Devidamente representada por seu advogado, a autora propôs uma Ação de Obrigação

286

de Fazer com Pedido de Antecipação dos Efeitos da Tutela em face do Município de

Fortaleza/CE, no dia 7/11/2009 (sábado). O pedido foi apreciado, em sede de plantão

judicial, no mesmo dia (7/11/2009), pelo então Juiz de Direito Manoel Cefas

Fonteles Tomaz, da 23ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza/CE, que deferiu a

antecipação dos efeitos da tutela.

3. Alegando, entretanto, a recusa da direção do hospital municipal de cumprir a decisão

judicial de transferir a autora Maria Alves de Araújo para o leito de UTI, seu procurador

protocolizou, no dia seguinte (domingo, dia 8/11/2009), nova petição requerendo o

cumprimento da decisão prolatada no dia anterior.

4. A Juíza plantonista não se encontrava presente, sendo o advogado recebido pela

servidora Camila Portela Nunes, que entrou em contato com a magistrada e

recebeu orientação no sentido de que seria impossível reapreciação de decisão

judicial proferida em plantão, conforme Resolução 71 do CNJ. No dia seguinte

(9/11/2009), a ação foi distribuída e apreciada pelo juízo da 8ª Vara da Fazenda

Pública da Comarca de Fortaleza/CE, que determinou ao Município de Fortaleza o

cumprimento da decisão proferida em 7 de novembro de 2011, “sob pena de

execução de multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), sem prejuízo das

sanções penais, com a instauração de inquérito policial por crime de desobediência

e omissão de socorro”.

5. A ordem foi cumprida às 14h do dia 9 de novembro de 2011. No entanto, a

autora Maria Alves de Araújo faleceu às 15h do mesmo dia.

6. Na situação exposta, verifica-se que a magistrada foi negligente ao não adotar os

devidos cuidados a fim de tomar conhecimento integral da situação, considerando

que a mera reiteração de pedido, em sede de plantões judiciais, vedada pela

Resolução nº 71/CNJ, acontece quando há o indeferimento do pedido anterior. No

caso, houve um deferimento do pedido, com o consequente descumprimento, o que,

num juízo lógico, não haveria qualquer impedimento para a apreciação. Ademais, os

pedidos tinham objetos diversos, enquanto o primeiro tinha como pretensão a internação

da autora, o outro, submetido à magistrada, era para que a decisão anterior fosse

cumprida, dada a urgência em face do estado clínico da parte.

7. Diante disso, não tenho dúvidas de que houve omissão da magistrada, forçando-

se reconhecer a responsabilidade da requerida no descumprimento dos seus

287

deveres funcionais, mormente na violação do dever de cumprimento com exatidão

das disposições legais e os atos de ofício (art. 35, inc. I, da LOMAN).

8. Procedência da pretensão punitiva com a condenação da magistrada pela negligência,

aplicando-se a penalidade de advertência, por escrito, à magistrada, do Tribunal de

Justiça do Estado do Ceará, fazendo-a constar em sua ficha funcional, com fundamento

no art. 42 e 43 da LOMAN e art. 4º da Resolução 135/2011 do CNJ.

“Após o voto do Conselheiro vistor, o Conselho, por maioria, julgou procedente o

pedido para aplicar a pena de advertência à magistrada. Vencidos os Conselheiros José

Lucio Munhoz, Sílvio Rocha e Neves Amorim. Votou o Presidente. Ausente,

justificadamente, o Conselheiro Bruno Dantas. Presidiu o julgamento o Conselheiro

Joaquim Barbosa. Plenário, 11 de junho de 2013.”

Processo n. 0004931-56.2012.2.00.0000, PAD, Rel Jefferson Kravchychyn. Julgado em

11.06.2013, na 171ª sessão ordinária.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. JUSTIÇA MILITAR DO ESTADO

DE MINAS GERAIS. NEGLIGÊNCIA DOS MAGISTRADOS. OCORRÊNCIA.

GRANDE NÚMERO DE PROCESSOS CRIMINAIS PRESCRITOS.

PROCEDÊNCIA. APLICAÇÃO DA PENA DE CENSURA.

1. Trata-se de Processo Administrativo Disciplinar instaurado pelo Conselho Nacional

de Justiça. O processo teve origem em requerimento de Revisão Disciplinar do então

Corregedor de Justiça do Tribunal de Justiça Militar que se insurgiu contra o

arquivamento de Representação Disciplinar. A apuração refere-se à faltas funcionais

relativas à negligência na condução de processos criminais, o que teria resultado na

ocorrência de diversas prescrições.

2. Problemas estruturais não constituem motivo para impedir o julgamento das ações

penais que tramitavam na 2ª Auditoria Militar.

3. Dificuldades na remarcação de audiências em razão de feriados, compensação de

plantão, férias ou licença saúde de magistrado são demonstrações irrefutáveis da falta de

organização e planejamento das serventias judiciais, que evidenciam a atuação

descuidada e comprovam a leniência dos magistrados militares.

4. Além desses, outros fatores como ausência de testemunha, a dificuldade de localizar

o réu ou mesmo a existência de muitos réus a exigir prazos mais largos, são fatos

288

corriqueiros e frequentes em todas as esferas da Justiça Penal, comum ou especializada.

Contudo, não há registro de elevado número de causas de IMPUNIDADE.

5. Não obstante reconheça-se que a 2ª Auditoria Militar do Estado de Minas Gerais

padece de deficiências estruturais, a causa principal ou a motivação da perda da

pretensão punitiva do Estado se deu pela forma leniente, descompromissada e

negligente com a qual os requeridos conduziram os processos criminais que

tramitavam na serventia. A percepção desses problemas escapou às observações

dos magistrados.

6. Deixaram de ser observadas regras de eficiência e presteza determinadas no

Código de Ética da Magistratura, pois é mister do magistrado “velar para que os

atos processuais se celebrem com a máxima pontualidade e para que os processos a

seu cargo sejam solucionados em um prazo razoável, reprimindo toda e qualquer

iniciativa dilatória ou atentatória à boa-fé processual”.

7. O magistrado que age com desídia na fiscalização dos trabalhos da vara, bem

como na condução dos feitos, descumpre os deveres do art. 35, incisos II e III da

LOMAN, acarretando descrédito ao Poder Judiciário entre a população.

8. Procedimento Administrativo Disciplinar julgado procedente para aplicar a pena de

censura aos magistrados, determinando-se outras providências.

(Acordão lavrado pelo Cons. Gilberto Martins)

“O Conselho decidiu:

I - por maioria, julgar procedente o pedido para aplicar pena de censura aos

magistrados. Vencidos os Conselheiros Neves Amorim (Relator) e José Lucio

Munhoz que, inicialmente, julgavam improcedente o pedido e, em seguida,

aderiram à aplicação da pena de censura. Vencidos, em menor extensão, os

Conselheiros Gilberto Martins, Jorge Hélio, Francisco Falcão e Joaquim Barbosa,

que aplicavam pena de disponibilidade. Lavrará o acórdão, o Conselheiro Gilberto

Martins.

II – por unanimidade, criar grupo de trabalho para elaborar diagnóstico da Justiça

Militar federal e estadual, com encaminhamento de propostas ao Congresso Nacional e

Assembleias Legislativas estaduais, no prazo de 90 dias;

III – por unanimidade, determinar ao TJMMG que, em sessenta dias, apresente plano de

trabalho para solucionar os problemas apresentados;

IV – por unanimidade, encaminhar cópia dos autos à Corregedoria Nacional de Justiça

289

para avaliar a necessidade de realizar inspeção na Justiça Militar de Minas Gerais para

apurar a presença de servidores militares nos serviços judiciários. Presidiu o julgamento

o Conselheiro Joaquim Barbosa. Plenário, 2 de abril de 2013.”

(Ementa do PAD 0002789-79.2012.2.00.0000, Relator Conselheiro Gilberto

Martins, j. 166ª Sessão Ordinária)

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. MAGISTRADO.

DESEMBARGADOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO

MARANHÃO. IMPUTAÇÃO DE OFENSA AO ART. 35, INCISOS I E II, DA

LOMAN, ART. 125, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, E ARTS. 9º

E 25 DO CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA NACIONAL. CONJUNTO

PROBATÓRIO QUE DEMONSTROU REGULARIDADE NA ATUAÇÃO DO

MAGISTRADO. RETARDAMENTO INJUSTIFICADO NÃO CONFIGURADO.

PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA PELO

ARQUIVAMENTO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR JULGADO

IMPROCEDENTE.

1. Imputação de ofensa ao princípio da imparcialidade e de retardamento

injustificado na apreciação de processos judiciais.

2. Conjunto probatório que demonstra não ter havido infração dos deveres

funcionais estabelecidos na LOMAN e no Código de Ética da Magistratura.

3. Processo Administrativo Disciplinar julgado improcedente.

(PAD 0003752-24.2011.2.00.0000, j. 156ª Sessão Ordinária, pp. 36-37).

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. IMPUTAÇÃO DE

OFENSA AO PRINCIPIO DA IMPARCIALIDADE. ARTS. 125, I, DO CPC C.C

ART. 35, I E II DA LOMAN E ART. 9º E 25 DO CÓDIGO DE ÉTICA DA

MAGISTRATURA.

1 Comprovadas nos autos a conduta do magistrado, que autorizou

temerariamente levantamento de vultosas quantias em execução contra devedor

solvente, sem qualquer lastro no valor da condenação imposta.

2 Atitude temerária do magistrado, descumprindo seu dever de imparcialidade, de

maneira reiterada, como se vê de duas outras condenações sofridas em processos

disciplinares junto a este CNJ, por fatos análogos.

290

3 Desinteresse do requerido em produzir provas no processo, deixando de

comparecer à audiência e de fornecer endereços de testemunhas, além de apresentar

alegações finais meramente remissivas, reforçando a veracidade dos fatos que lhe são

imputados.

“O Conselho, por unanimidade, julgou procedente o pedido para aplicar ao

magistrado requerido a pena de aposentadoria compulsória, nos termos do voto do

Relator. Presidiu o julgamento o Conselheiro Joaquim Barbosa. Plenário, 28 de maio

de 2013.”

PAD 0005953-86.2011.2.00.0000 (Relator Conselheiro Emmanoel Campelo, j.

170ª Sessão Ordinária

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – JUIZ DE DIREITO DO

MARANHÃO – DESÍDIA NO CUMPRIMENTO DAS ATRIBUIÇÕES DO CARGO

– PENA DE CENSURA.

1. A deficiência de recursos humanos e materiais de muitos órgãos jurisdicionais

pode explicar sua morosidade, mas não justificar situações de notória má

administração de Vara Cível marcada pela negligência reiterada do magistrado no

impulsionar e solucionar os processos que lhe estão confiados.

2. “In casu”, o Requerido, como responsável pela 3ª Vara Cível de São Luís (MA),

mostrou-se notavelmente moroso na condução e solução dos processos de sua

jurisdição, acumulando elevado número de feitos e, mais, adotando práticas

heterodoxas e desidiosas, com nítido intuito de se ver livre, ao menos

temporariamente, dos feitos, conforme consta dos relatórios da última correição a

que se submeteu sua Vara, “verbis”: “em repetidas Correições Ordinárias anuais,

proferir despachos idênticos, determinando que os autos lhe voltem oportunamente

conclusos. Entretanto, os processos permanecem paralisados na Secretaria até a

Correição seguinte, quando submetidos novamente ao juiz, que repete o mesmo

despacho, sem impulsionar o feito”; “a quantidade de sentenças extintivas do processo

sem resolução do mérito que são reformadas pelo Tribunal de Justiça do Estado do

Maranhão. Tornando os autos ao Juízo da 3ª Vara Cível, o magistrado titular, com base

em motivo não claramente elucidado, novamente profere sentença de extinção sem

resolução do mérito” (DOC115, fl. 16).

291

3. A conduta do Requerido é incompatível com a diligência mínima que se exige de

um magistrado, tornando-se merecedora da pena de censura prevista no art. 44 da

LOMAN.

Processo administrativo disciplinar julgado parcialmente procedente.

“Após o voto da Conselheira Vistora, o Conselho, por unanimidade, julgou

parcialmente procedente o pedido, nos termos do voto do Relator. Ausentes,

justificadamente, os Conselheiros Leomar Barros e Marcelo Neves. Presidiu o

julgamento o Ministro Cezar Peluso. Plenário, 29 de março de 2011.”

(Ementa do PAD 0002370-30.2010.2.00.0000, Relator Conselheiro Ives Gandra, j. 123ª

Sessão Ordinária).

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. MAGISTRADO. PRESCRIÇÃO.

PRAZO QUINQUENAL. CONTAGEM A PARTIR DO CONHECIMENTO DOS

FATOS PELA ADMINISTRAÇÃO. BENS APREENDIDOS PELO

DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO. DEPÓSITO JUDICIAL EM FAVOR DE

TERCEIROS. INCOMPETÊNCIA DO MAGISTRADO. DESCUMPRIMENTO DO

DEVIDO PROCESSO LEGAL. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. VIOLAÇÃO DO

ART. 35, I, DA LOMAN E ART. 4º E 25 DA RESOLUÇÃO 60/2008. APLICAÇÃO

DA PENA DE ADVERTÊNCIA. ART. 42 DA LOMAN E ART. 4º DA RESOLUÇÃO

CNJ Nº 135/2011.

1. A Resolução 135/CNJ determina que o cálculo da prescrição deve observar o prazo

quinquenal, contado da data em que os fatos tornaram-se conhecidos pela autoridade

competente e não da data em que tais fatos ocorreram.

2. Inexistindo qualquer relação do bem apreendido administrativamente com o juízo de

titularidade do Magistrado, evidencia-se a incompetência deste último para acautelar o

referido bem em favor de terceiro sem qualquer relação com a Administração Pública

ou com o pretenso proprietário.

3. Configura infração ao disposto no inciso I, do art. 35, da LOMAN, bem como ao

art. 25 da Resolução 60/2008, o fato de magistrado acautelar bem em favor de

terceiro, por duas vezes, deixando de cumprir o devido processo legal, sem

oportunizar manifestação do pretenso proprietário, bem como do Ministério

Público, mormente quando o ato não encontra respaldo na legislação de regência.

292

Cumpre ao administrador não só não fazer o que a lei proíbe, como é cediço, mas

agir nos estritos limites da legalidade.

4. Sendo o depósito inicial do bem apreendido emitido por outro juízo, apenas por

aquele pode ser reavaliado, indevida sua deliberação por juízo diverso, em

conformidade com o art. 4º da Resolução CNJ nº 60/2008.

5. A ausência de má-fé ou dolo não exime o Magistrado da responsabilidade de

atuar com zelo na prática de atos processuais, porque constitui o zelo um dos

deveres impostos pelo art. 25 do Código de Ética da Magistratura, cujo

descumprimento é passível de penalização.

6. A negligência eventual no cumprimento dos deveres do cargo no qual está

investido é uma infração disciplinar de baixo potencial ofensivo que determina à

imposição de pena de advertência.

7. Processo Administrativo Disciplinar que se julga procedente por violação dos

deveres funcionais previstos nos arts. 35, I, da Lei Complementar nº 35/1979, e art.

4º e 25 da Resolução CNJ nº 60/2008.

O Conselho, por unanimidade, julgou procedente o pedido para aplicar pena de

advertência ao requerido, nos termos apresentados pela Relatora. Votou o Presidente.

Ausente, justificadamente, o Conselheiro Fabiano Silveira. Presidiu o julgamento o

Conselheiro Joaquim Barbosa. Plenário, 16 de junho de 2014.”369

REVISÃO DISCIPLINAR. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ. CONHECIDO. APLICAÇÃO

DE PENALIDADE DE ADVERTÊNCIA. DESNECESSIDADE DE CONDUTA

DOLOSA. PENALIDADE CONTRÁRIA ÀS PROVAS DOS AUTOS. PEDIDO DE

APLICAÇÃO DE PENALIDADE DE CENSURA. PEDIDO DEFERIDO. PEDIDO

DE CORREIÇÃO. INDEFERIDO. REVISÃO DISCIPLINAR PROVIDA.

- É passível de revisão a penalidade imputada a magistrado em desacordo com o

conjunto probatório dos autos (art. 83, inc. I, do RICNJ).

- “A Lei Orgânica da Magistratura Nacional é cristalina ao vincular a pena de

advertência a atos omissivos, caracterizadores de conduta meramente negligente (art.

369 CNJ, Processo Administrativo Disciplinar n. 0004639-37.2013.2.00.0000 Relatora Conselheira Ana

Maria Duarte Amarante Brito, julgada em 16.06.2014.

293

43)”. Precedente do CNJ.

- In casu, o represamento injustificado e a mora processual, por culpa de

magistrado, atentam contra o dever do magistrado de não exceder

injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar, previsto no art. 35, inc.

II , da LOMAN, o que dá azo à penalidade de censura, nos termos do art. 42, inc.

II, c/c art. 44, todos da LOMAN.

- Não se pode considerar culpado o magistrado, que em virtude de férias regulares,

deixa de marcar audiências para esse período. Esse encargo é do seu substituto

legal.

- A conduta reiterada do magistrado, que não recebeu recursos em sentido estrito

do Ministério Público, contra decisão que concede habeas corpus (art. 581, inc. X,

do CPP), sob a alegação de existência de recurso de ofício, é passível de aplicação

da penalidade de advertência (art. 35, inc. I, c/c art. 42, inc. I, e c/c art. 43, todos da

LOMAN).

- Outrossim, a conduta do magistrado de não abrir vista ao Ministério Público,

nem antes nem depois da prolação de decisão que concedeu liberdade provisória,

agindo em desacordo com o art. 333 e art. 310, ambos do Código de Processo

Penal, também é passível de advertência, consoante o art. 35, inc. I, c/c art. 42, inc.

I, e c/c art. 43, todos da LOMAN.

- A reiteração de condutas culposas e a verificação de procedimento incorreto do

magistrado, ainda que desprovidos de má-fé, ensejam a aplicação da penalidade de

censura, nos termos do art. 35, incs. I e II, c/c art. 42, inc. II, c/c art. 44, todos da

LOMAN e do art. 4º da Resolução nº 135 do Conselho Nacional de Justiça.

- Não há necessidade de correição do CNJ em vara judicial que já foi alvo de

procedimentos correicionais recentes por parte do Tribunal de origem, sem que haja

qualquer elemento novo que não foi avaliado por este.

- Diante do exposto, julgo procedente a presente Revisão Disciplinar, consoante o art.

83, inc. I, c/c art. 88, ambos do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça,

para aplicar a penalidade de censura ao magistrado José Ribamar Oliveira Silva, nos

termos do art. 35, incs. I e II, c/c art. 42, inc. II, c/c art. 44, todos da LOMAN e do art.

4º da Resolução nº 135 do Conselho Nacional de Justiça.

Processo de Revisão Disciplinar 0003862-86.2012.2.00.0000 Relator Conselheiro

JEFFERSON LUIS KRAVCHYCHYN julgado em 11.12.2012.

294

REVISÃO DISCIPLINAR. REPRESENTAÇÃO JULGADA PELO TJSP. QUESTÕES

JURISDICIONAIS. DESCABIMENTO DA VIA CORRECIONAL. AUSÊNCIA DE

HIPÓTESES DE ADMISSÃO DO ART. 83 DO RICNJ.

- O fato de o magistrado requerido ter impedido que o advogado ditasse diretamente à

escrevente as razões de agravo retido por ele interposto, bem como, o suposto resumo

desconexo dos pronunciamentos ocorridos em audiência, não merece atuação

correcional, mas sim o manejo de expediente recursal cabível, salvo se comprovado

dolo na atuação do magistrado requerido, o que não se verifica na situação exposta.

- No que concerne à liberação de valores incontroversos, a nomeação de credores

como fiéis depositários, a concessão de prazos superiores aos definidos na

legislação processual e o deferimento do benefício da assistência judiciária

anteriormente indeferido, entendo que a via adequada para enfrentar tais decisões

é a judicial, restando ao advogado, caso entenda que foi prejudicado pela decisão,

ou mesmo que esta encontra-se equivocada, valer-se de procedimento cabível no

âmbito judicial.

- Como bem entendeu o Corregedor-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, os

prazos de 15 ou 20 dias concedidos pelo requerido para manifestações e

especificação de provas não ultrapassam os limites razoáveis da devida duração do

processo.

- Quanto à existência de despacho proferido pelo requerido em que este manda

retornar ao cartório, para lá permanecer por 20 (vinte) dias, processo já concluso

para sentença, verifica-se irregularidade na conduta do magistrado. Contudo, por

não configurar reiterada atuação do magistrado e sim ato isolado, não vislumbro

motivo para a reforma do que fora decidido no âmbito do Tribunal de Justiça do

Estado de São Paulo.

- Ademais como reiteradamente tem afirmado esse Conselho, nem toda

transgressão merece ser combatida com sanção disciplinar. Diferentemente de

outros casos que nos são apresentados, a conduta aqui observada não caracteriza

má-fé ou dolo do magistrado requerido.

- Vê-se que a situação em voga não se enquadra em nenhuma das hipóteses

transcritas no artigo 83 RICNJ, a decisão tomada na Corregedoria paulista não se

mostrou contrária à evidência dos autos nem mesmo pautada em provas falsas,

295

tampouco surgiu fato posterior que motive a modificação da decisão proferida pelo

órgão de origem.

- Ante o exposto voto por não admitir a presente Revisão Disciplinar pela ausência

de enquadramento nas hipóteses do artigo 83 do Regimento Interno desse

Conselho.

Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro n. 0004643-16.2009.2.00.0000 Relator

Conselheiro JEFFERSON LUIS KRAVCHYCHYN julgado em 09.11.2010.

RECURSO ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO POR EXCESSO DE PRAZO.

MOROSIDADE NA PROLAÇÃO DA SENTENÇA. JUSTIFICATIVA. PERDA DE

OBJETO. EFETIVAÇÃO DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.

RECURSO DESPROVIDO.

1. Reclamação disciplinar distribuída ao Gabinete da Corregedoria Nacional de Justiça

em 12.08.2013.

2. Cinge-se a controvérsia a apurar morosidade apontada pela recorrente em relação ao

processo n. 0001478-14.2011.4.03.6119, em trâmite perante o juízo reclamado, uma vez

que: (i) o processo encontrava-se concluso para sentença desde 20.03.2013; e (ii) o

pedido de tutela antecipada apresentado em 15.01.2013 também não havia sido

apreciado.

3. Ausente morosidade injustificada na prolação de sentença pelo juízo

representado dado: (i) o acúmulo de serviço; e (ii) a ausência de desídia ou de dolo

do juiz responsável pelo processo.

4. Manifestamente improcedente a alegação de ausência de manifestação do juízo

representado quanto ao pedido de tutela antecipada, uma vez que a referida

prestação jurisdicional encontrava-se já efetivada. Recurso Administrativo

Representação por Excesso de Prazo 0004634-15.2013.2.00.0000 Relatora Conselheira

NANCY ANDRIGHI. Julgado em 18.11.2014.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – TRIBUNAL REGIONAL DO

TRABALHO DA 3ª REGIÃO – INFRAÇÃO DISCIPLINAR – SUSPEIÇÃO –

RECEBIMENTO DE VANTAGEM ECONÔMICA – ASSESSOR – IMPEDIMENTO

– APOSENTADORIA COMPULSÓRIA.

296

1. O magistrado deve afastar-se de toda causa que tenha o potencial de alterar

expressivamente a posição equidistante na qual deveria se manter em relação às

partes dos processos, sob pena de afrontar as exigências legais e éticas que pautam

sua atuação profissional.

2. Ao receber vantagem econômica de uma das partes – no caso, mora

luxuosamente há anos em apartamento de propriedade do patrono de inúmeros

processos julgados por ele, praticamente a título gratuito – é evidente que a

independência do magistrado é colocada em jogo, e por ele mesmo. O juiz não

pode dispor da independência judicial individual que lhe foi constitucionalmente

conferida: ela é mais uma responsabilidade do que um privilégio. Trata-se da

responsabilidade de se manter independente, de zelar por sua independência, para

que suas atribuições não sejam ameaçadas por pressões das mais variadas

naturezas. Tal conduta configura prática de irregularidades no exercício da

magistratura, previstas nos arts. 35, incisos I da LOMAN e a inobservância à

vedação imposta pelo art. 95, parágrafo único, inciso IV, da Constituição Federal,

ensejando a aplicação da pena de aposentadoria compulsória.

3. Nem todo caso em que o magistrado suspeito para o julgamento de

determinados processos deixa de declarar sua suspeição ensejará a punição

disciplinar. Na verdade, a combinação da patente suspeição do magistrado, em

vista de sua amizade fraternal e do recebimento de vantagem econômica pelos

advogados mencionados e, ainda, de sua conduta suspeita, indicando o

favorecimento dos mesmos advogados nos processos mencionados, é que evidencia

o descumprimento de seus deveres funcionais.

4. A nomeação de servidor advindo do escritório de amigo íntimo do magistrado,

daquele que subvenciona sua moradia, e mesmo sabendo que este servidor é filho de

membro daquele escritório, mantendo o servidor na elaboração das minutas de decisão,

sem qualquer ressalva, sem qualquer organização no gabinete que impedisse a prática

de atos pelo servidor nos processos em que seu pai figurava como advogado é dever

funcional ao art. 35, VII da LOMAN.

5. Não se aplica pena de advertência a magistrado de segundo grau, nos termos do

parágrafo único do art. 42 da LOMAN.

6. Procedência da pretensão punitiva quanto ao primeiro requerido, com aplicação da

pena de aposentadoria compulsória, porquanto demonstrado que a conduta do

297

magistrado processado está tipificada no art. 56, II, da Lei Complementar nº 35, de 1979

(“... procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções”).

Improcedência da pretensão punitiva quanto ao segundo requerido, pois, mesmo

configurada a infração ao dever inscrito no artigo 35, VII da LOMAN, não se pode

aplicar pena menos severa que aposentadoria compulsória e disponibilidade ao Juiz, nos

termos do parágrafo único do art. 42 da LOMAN.

“O Conselho decidiu:

I - por maioria, rejeitar a preliminar de decadência argüida pelo

Conselheiro Leomar Barros, que ficou vencido;

II - por maioria, com relação ao magistrado A.F.G., pela aplicação da

pena de aposentadoria compulsória, com vencimentos proporcionais ao tempo de

serviço, vencidos os Conselheiros Ministro Ives Gandra, Leomar Barros e Ministro

Presidente, que votavam pela improcedência do pedido; III - por maioria, com relação

ao magistrado R.A.M, pela improcedência do pedido, nos termos do voto do Relator.

Vencidos os Conselheiros José Adonis, Felipe Locke e Jefferson Kravchychyn, que

aplicavam a pena de disponibilidade e

IV- por unanimidade, determinar a remessa de cópia dos autos ao

Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, à Seccional e à Receita Federal e

Estadual. Ausente, justificadamente, o Conselheiro Marcelo Neves.

Presidiu o julgamento o Ministro Cezar Peluso. Plenário, 15 de março de 2011.”

Processo n. 0007400-80.2009.2.00.0000, PAD, Rel. Jorge Hélio, julgado em

15.03.2011, na 122ª sessão.

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. AFRONTA AO JUIZ NATURAL ABUSO NA

JURISDIÇÃO. DESCONTROLE NO RECEBIMENTO DE PROCESSOS

DISTRIBUÍDOS "POR DEPENDÊNCIA" SUGERINDO

DIRECIONAMENTO. FALTA DE CAUTELA DO MAGISTRADO. DECISÃO

BENEFICIANDO EM VALORES EXPRESSIVOS UM ÚNICO CARTÓRIO.

Ação pleiteando a obrigatoriedade de registro em cartório de registro de títulos e

documentos, de contratos de alienação fiduciária e leasing de veículos, como

condição para registro no DETRAN. Deferimento do pedido para obrigar os

residentes em todo o Estado de Goiás a se dirigirem a cartório de Goiânia para

298

proceder ao registro. Decisão teratológica que cria ônus manifestamente

desproporcional e injustificadamente responsável por um cartório.

Abuso do segredo de justiça, procedimento onde se discute o direito do cartório de

repassar ao usuário tributo devido ao estado. Ação de cunho meramente patrimonial.

Decisão que favorece cartório autorizando o repasse ao usuário. O segredo de justiça

impede a defesa do contribuinte, obrigado a arcar com o ônus.

Ampliação do polo ativo após liminar deferida. Violação ao principio do juiz natural.

Pedido de ingresso em processo feito por novos cartórios, após o deferimento de

liminar. Evidente escolha do juízo pela parte.

Omissão do magistrado ante a carga do processo pelo advogado da parte autora

por cinco meses após liminar deferida, inviabilizado a impugnação de decisão pela

parte contrária (estado) e a fiscalização do magistrado para realização da citação.

Parcialidade.

Concessão pelo magistrado de entrevistas à imprensa manifestando claramente

opiniões sobre procedimentos criminais e administrativos em curso, com posição

favorável ao cartorário beneficiado por inúmeras decisões por ele proferidas e

contrárias aos trabalhos de fiscalização do CNJ.

Autopromoção em sítio eletrônico próprio na internet.

Manutenção de página eletrônica utilizada para divulgar sentenças e decisões com

exibição de fotografia e um cabeçalho com o seguinte teor: “Ari Ferreira de

Queiroz – sinônimo de competência”.

Interferência nos trabalhos da Corregedoria Nacional de Justiça. Decisão judicial,

proferida em processo com sentença transitada em julgado que teve objeto diverso,

revogando a designação de interventor em cartório submetido à fiscalização,

beneficiando o mesmo cartorário já favorecido pelas demais decisões.

Isenção, por decisão judicial, do cumprimento do provimento 27 da Corregedoria

Nacional de Justiça em processo que não teve o CNJ como parte. Favorecimento à

mesma serventia extrajudicial.

Decisão manifestamente teratológica que contornou decisão do tribunal em sentido

contrário. “arbitramento judicial” de emolumentos, sem previsão legal, de forma

299

cautelar, em benefício da mesma serventia, feito para contornar decisão do

tribunal de justiça em agravo de instrumento.

“O Conselho, por unanimidade, decidiu:

I - indeferir o pedido de adiamento;

II - determinar a instauração de processo administrativo disciplinar contra o magistrado

requerido com seu afastamento cautelar, aprovando desde já a portaria de instauração do

PAD, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente. Presidiu o julgamento o

Conselheiro Joaquim Barbosa. Plenário, 8 de outubro de 2013.”

RD 0007678-76.2012.2.00.0000. Rel. Francisco Falcão. Julgada em 08.10.2013 na 176ª

sessão (grifos nossos).

REVISÃO DISCIPLINAR. ALEGAÇÃO DE DESPROPORCIONALIDADE DA

PENA EM RAZÃO DA GRAVIDADE DOS FATOS. MAGISTRADO PUNIDO

PELO TRIBUNAL DE ORIGEM COM A PENA DE REMOÇÃO COMPULSÓRIA.

DEMONSTRAÇÃO DE PROCEDIMENTO INCORRETO DO MAGISTRADO.

APLICAÇÃO DA PENA DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA.

1. O procedimento de revisão de processos administrativos disciplinares ostenta

natureza excepcional, aproximando-se mais da Ação Rescisória que da Apelação ou do

Recurso Ordinário, não podendo, quer em razão dos requisitos exigidos para a sua

propositura, quer em virtude do lapso temporal demasiadamente dilatado que lhe foi

excepcionalmente conferido, ser utilizado como sucedâneo recursal.

2. O tribunal de origem entendeu que o caso era de negligência do magistrado, não

de corrupção, mas os autos demonstram procedimento incorreto do magistrado a

justificar penalidade maior.

3. Pedido de revisão julgado procedente, para aplicar a pena de aposentadoria

compulsória ao magistrado.

“Após o voto da Conselheira vistora, o Conselho, por unanimidade, julgou procedente o

pedido de revisão disciplinar para aplicar ao magistrado a pena de aposentadoria

compulsória, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente. Presidiu o julgamento

o Conselheiro Joaquim Barbosa. Plenário, 28 de maio de 2013.

Processo n. 0004926-34.2012.2.00.0000, REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar –

Conselheiro, julgado em 28.05.2013 Rel. Bruno Dantas, 170ª Sessão Ordinária.

300

PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. TRIBUNAL DE JUSTIÇA

DO ESTADO DO AMAZONAS. CONDUTA INCOMPATÍVEL COM OS DEVERES

DA MAGISTRATURA. COMPROVAÇÃO DE RECEBIMENTO DE BENESSES

NO EXERCÍCIO DO CARGO. RELAÇÃO ESPÚRIA ENTRE MEMBROS DO

PODER JUDICIÁRIO E AGENTE PÚBLICO DE MUNICÍPIO.

I – A competência do CNJ para julgar processos administrativos disciplinares decorre

diretamente do comando constitucional veiculado no art. 103-B, inciso III, da

Constituição Federal, não sendo a atuação do CNJ dependente ou condicionada à

atuação do Tribunal ao qual se encontram vinculados os Juízes investigados por

infração disciplinar.

II – A análise das transcrições das interceptações telefônicas não deixa dúvida de

que a magistrada solicitava reiteradamente vantagens indevidas para si e para

pessoas do seu círculo social.

III – Impõe-se ao magistrado pautar-se no desempenho de suas atividades sem receber

indevidas influências externas e estranhas à justa convicção que deve formar para a

solução dos casos que lhe sejam submetidos.

IV– Em casos de desvio de conduta que envolvam corrupção e clientelismo por

parte de magistrados e servidores públicos dificilmente a prova será cristalina,

fácil, direta. A prova em casos tais é fragmentária, dispersa, assemelha-se a um

verdadeiro mosaico, montado a partir de várias fontes, para permitir chegar-se a

uma conclusão, seja pela pluralidade de agentes, pela utilização da estrutura da

organização como anteparo, pela hierarquia e compartimentalização, e, não raro,

pela adoção de rotinas de segredo e destruição das provas.

IV - O comportamento incompatível com o exercício da magistratura, dentre

outras possibilidades previstas na LOMAN, é penalizado com remoção

compulsória a bem do interesse público – art. 42, III da Lei Orgânica da

Magistratura Nacional (LOMAN)

“O Conselho, por maioria, decidiu aplicar pena de remoção

compulsória a bem do interesse público à magistrada com sua alocação imediata em

outro juízo, nos termos do voto do Relator. Vencidos os Conselheiros Emmanoel

Campelo e José Lucio Munhoz que aplicavam pena de censura. Juntará declaração de

voto convergente o Conselheiro Carlos Alberto. Presidiu o julgamento o Conselheiro

Ayres Britto. Plenário, 16 de outubro de 2012.”

301

Processo n. 0000787-44.2009.2.00.0000 (PAD). Rel. Gilberto Martins. Julgado em

16.10.2012 na 156ª sessão ordinária.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. APURAÇÃO DE INFRAÇÃO

DISCIPLINAR – MAGISTRADO – REALIZAÇÃO DE ATOS NEGOCIAIS –

VIOLAÇÃO DA LOMAN – ART. 42, V – PENALIDADE DE APOSENTADORIA

COMPULSÓRIA.

I. Comprovação de práticas comerciais reiteradas, com escopo de satisfação de interesse

pessoal e obtenção de vantagens econômicas, para si ou para terceiros, em detrimento

dos deveres inerentes ao exercício da judicatura e das vedações legais (arts. 35, VIII, e

36, I, da LOMAN).

II. Demonstração cabal, ao longo da instrução, de materialidade das infrações

disciplinares, dolo e consciência plena da ilicitude.

III. Constatadas a autoria e a materialidade do descumprimento de dever funcional, a

escolha da pena disciplinar incidente é iluminada pelo princípio da proporcionalidade,

ou seja, por um juízo de ponderação ancorado no caso concreto, considerada a carga

retributiva da sanção, a finalidade preventiva de novos desvios e, sobretudo, o grau de

reprovabilidade da ação/omissão combatida.

IV. Deve-se se levar em conta a gravidade da conduta ensejadora da imputação, a carga

coativa da pena, o grau de culpabilidade e a eficácia da medida punitiva.

V. Procedimento a que se defere para aplicar-se a pena de aposentadoria compulsória,

com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço (arts. 28 e 42, V, LOMAN).

Processo Administrativo Disciplinar n. 0001776-84.2008.2.00.0000 Conselheiro

MAIRAN MAIA. Julgado em 09.06.2009.

PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NULIDADE DA

CORREIÇÃO NO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUSPEIÇÃO DE JUÍZA-AUXILIAR.

AVOCAÇÃO PELO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. NOVA INSTRUÇÃO.

INSTAURAÇÃO DO PAD. DECISÃO SOBRE AS PRELIMINARES. PRECLUSÃO.

INADMISSIBILIDADE DE REEXAME NO PAD. ACÓRDÃO. DESCRIÇÃO

PRECISA DA ACUSAÇÃO. INSTAURAÇÃO DO PAD. RESOLUÇÃO Nº 30, DE

2007 DO CNJ. PRECEDENTE DO CNJ. MAGISTRADO. PROCEDIMENTO

INCOMPATÍVEL COM A DIGNIDADE, A HONRA E O DECORO DE SUAS

302

FUNÇÕES (ART. 56, II, DA LOMAN). CAPOF. PREVIDÊNCIA

COMPLEMENTAR. RESGATE DAS COTAS INDIVIDUAIS. BENEFICIÁRIOS JÁ

APOSENTADOS. EVIDÊNCIA DE DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA

CRUZADA. INTERVENÇÃO DA UNIÃO. DEMORA NA REMESSA DOS AUTOS

PARA A JUSTIÇA FEDERAL. FAVORECIMENTO DAS PARTES. EXCEÇÕES DE

SUSPEIÇÃO. RETARDAMENTO DO ENVIO DOS AUTOS PARA O TRIBUNAL

DE JUSTIÇA. FAVORECIMENTO AOS BENEFICIÁRIOS DA TUTELA

ANTECIPADA. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL DE QUANTIA CERTA. TUTELA

ANTECIPADA TERATOLÓGICA. REPRODUÇÃO DE DECISÃO ANTERIOR

SUSPENSA PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MODUS OPERANDI:

DISTRIBUIÇÃO DIRIGIDA, DECISÕES TERATOLÓGICAS,

LEVANTAMENTO DE QUANTIAS VULTOSAS. EVIDÊNCIA DE

PARCIALIDADE. PROCEDÊNCIA. APOSENTADORIA COMPULSÓRIA.

[...]

4. Consoante sobejamente evidenciado nos autos, três dos quatro processos

analisados foram distribuídos por dependência, quando não era o caso, para o

magistrado investigado que, mesmo ciente dessa anomalia, aceitou o

direcionamento dos feitos e, mediante tutelas antecipadas teratológicas, sem dar

oportunidade à parte contrária de ser ouvida, determinou a liberação de vultosas

quantias em dinheiro, variando entre R$ 615.510,08 (seiscentos e quinze mil,

quinhentos e dez reais e oito centavos) e R$ 2.139.311,62 (dois milhões, cento e

trinta e nove mil, trezentos e onze reais e sessenta e dois centavos).

5. Em três ações ordinárias promovidas contra a CAPOF – Caixa de Assistência e

Aposentadoria dos Funcionários do Banco do Estado do Maranhão, o magistrado

deferiu tutelas antecipadas determinando a liberação de quase R$ 2.500.000,00, além da

incidência de honorários advocatícios, de modo a viabilizar que três pessoas, já

aposentadas e no gozo da renda mensal da aposentadoria complementar, pudessem

retirar os valores que formavam parte do fundo de previdência – o que só poderiam

fazer antes ou mediante opção feita no momento da implementação das condições para

a aposentadoria – as quais, beneficiárias da justiça gratuita, garantiram o juízo apenas

com a emissão de notas promissórias, daí por que, conquanto suspensas as tutelas de

urgência pelo Tribunal de Justiça, ainda hoje não houve a devolução das quantias nem

muito menos foi julgado o mérito.

303

6. A Lei Complementar nº 109, de 2001, que dispõe sobre o Regime de Previdência

Complementar, e o Regulamento do Plano Misto de Benefícios da CAPOF não

permitem que o assistido já aposentado levante os valores que formam o Fundo e,

ainda que tivessem o direito ao levantamento, obviamente, seria necessário

determinar o desconto da taxa de administração, ademais de tudo o que ele

recebeu, ao longo dos anos, a título de aposentadoria complementar, o que importa

em cálculo extremamente complexo, de modo que a quantia não tinha como ser

quantificada em uma tutela antecipada.

7. Restou demonstrada ainda, a despeito da distribuição por dependência cuja

finalidade, em ofensa ao princípio do juiz natural, era claramente direcionar os

autos para o juiz processado, a existência do que aqui se convencionou denominar

distribuição cruzada, caracterizada com a circunstância de processo com a petição

inicial assinada por seu filho na qualidade de advogado, em demanda promovida

contra a CAPOF, ter sido distribuída, por dependência, para a 5ª Vara Cível,

dirigida pelo juiz José Ribamar Santos Vaz, enquanto outros processos, um deles

patrocinado pela filha deste, com a mesma causa de pedir e pedido, promovidos

contra a mesma entidade, inclusive com a exordial sendo reprodução daquela

anteriormente mencionada, terem sido distribuídos, igualmente por dependência,

para a 2ª Vara, cujo titular era o juiz Nemias Nunes, tendo, em todas as hipóteses,

pelos respectivos juízos, sido deferidas as tutelas antecipadas teratológicas.

8. A ação referente a um dos processos promovidos contra a CAPOF (Ação Ordinária

nº 8.763/2004), em que foi deferida a tutela antecipada, havia sido ajuizada no

distante ano de 2004, mas, mesmo assim, ficou dormitando em cartório, sem

nenhum impulso, durante 8 (oito) meses e 10 (dez) dias, somente sendo deferida em

04 de fevereiro de 2005, sem que, ainda assim, fosse ouvida a parte contrária, ou

seja, poucos dias após a distribuição da Ação Ordinária nº 1.976/2005 (31 de

janeiro de 2005), cuja petição fazia referência à decisão do juiz José Ribamar

Santos Vaz e continha como fundamentação reprodução da petição inicial assinada

por seu filho em outro processo, circunstância que denota a agilidade na

apreciação dos feitos ser guiada conforme fosse de seu interesse.

9. Em compasso com o demonstrado nos autos, a pressa na liberação dos valores era

tanta que, em dois dos processos, os pedidos de liberação dos valores bloqueados, com a

consequente expedição dos alvarás, foram deferidos no mesmo dia de seus

304

ajuizamentos, pelo magistrado processado, sem a presença física dos autos, que se

encontravam com vista para CAPOF, em razão da intimação das tutelas antecipadas,

ao passo que, nada obstante a intervenção da União no feito, pedindo a sua inclusão na

relação processual, o magistrado retardou, sobremaneira, o envio dos autos para a

Justiça Federal, a fim de que naquele juízo fosse decidida a questão incidental.

10. Consta dos autos que o magistrado processado ainda retardou,

deliberadamente, as exceções de suspeição referentes aos três processos

promovidos contra a CAPOF, nos quais ele deferiu as tutelas antecipadas

teratológicas, cujas distribuições, indevidamente, ocorreram por dependência,

sendo que uma delas, a de registro cronológico 5.760/2005, somente foi enviada

para o Tribunal de Justiça após um ano, enquanto as outras duas,

respectivamente, de nºs 4.490 e 4.491, ambas de 2005, somente foram enviadas

depois de mais de dois anos, viabilizando, com isso, que os feitos, nos quais havia

deferido tutelas antecipatórias de valores exorbitantes, ficassem paralisados, com

as partes usufruindo das decisões, o que explica, mas naturalmente não justifica, a

circunstância de até hoje ainda não haver decisão quanto ao mérito das demandas,

comportamento que caracteriza, estreme de dúvidas, tipificação da conduta

descrita no art. 56, II, da LOMAN.

11. O juiz processado aceitou a distribuição, por dependência, da Ação de

Execução Extrajudicial nº 4.925/2008, cujo idêntico pedido havia tramitado e sido

deferido pelo juiz da 6ª Vara, Abraão Lincoln Sauáia, porém suspenso pelo

Tribunal de Justiça, e, ainda assim, deferiu tutela antecipada teratológica,

determinando a liberação de mais de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), cuja

decisão foi a reprodução daquela que estava suspensa, o que evidencia a sua

ciência sobre a litigância de má-fé e a flagrante ilegalidade do deferimento do

pleito.

12. Procedência da pretensão punitiva, com aplicação da pena de aposentadoria

compulsória, porquanto demonstrado que a conduta do magistrado processado está

tipificada no art. 56, II, da Lei Complementar nº 35, de 1979 (“... procedimento

incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções”).

“O Conselho, por unanimidade, decidiu pela aplicação da pena de

aposentadoria compulsória ao magistrado e determinou remessa de cópia dos autos à

Ordem dos Advogados do Brasil e à Receita Federal, nos termos do voto do Relator.

305

Declarou-se suspeito o Conselheiro Leomar Barros Amorim. Ausente, justificadamente,

o Conselheiro Marcelo Neves. Ausente, circunstancialmente, a Conselheira Morgana

Richa. Presidiu o julgamento o Ministro Cezar Peluso. Plenário, 15 de março de 2011.”

PAD n. 0005993-05.2010.2.00.0000. Rel. Walter Nunes. Julgado em 15.03.2011 na

122ª sessão [processo sigiloso, iniciais do requerido: N.N.C] (grifos nossos).