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DIREITO DE IMAGEM E DIREITO DIREITO DE IMAGEM E DIREITO DIREITO DE IMAGEM E DIREITO DIREITO DE IMAGEM E DIREITO DIREITO DE IMAGEM E DIREITO DE ARENA NO CONTRATO DE DE ARENA NO CONTRATO DE DE ARENA NO CONTRATO DE DE ARENA NO CONTRATO DE DE ARENA NO CONTRATO DE TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL DE FUTEBOL DE FUTEBOL DE FUTEBOL DE FUTEBOL Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011 Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011 Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011 Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011 Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011

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DIREITO DE IMAGEM E DIREITODIREITO DE IMAGEM E DIREITODIREITO DE IMAGEM E DIREITODIREITO DE IMAGEM E DIREITODIREITO DE IMAGEM E DIREITO

DE ARENA NO CONTRATO DEDE ARENA NO CONTRATO DEDE ARENA NO CONTRATO DEDE ARENA NO CONTRATO DEDE ARENA NO CONTRATO DE

TRABALHO DO ATLETA PROFISSIONALTRABALHO DO ATLETA PROFISSIONALTRABALHO DO ATLETA PROFISSIONALTRABALHO DO ATLETA PROFISSIONALTRABALHO DO ATLETA PROFISSIONAL

DE FUTEBOLDE FUTEBOLDE FUTEBOLDE FUTEBOLDE FUTEBOL

Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011

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DIREITO DE IMAGEM E DIREITODIREITO DE IMAGEM E DIREITODIREITO DE IMAGEM E DIREITODIREITO DE IMAGEM E DIREITODIREITO DE IMAGEM E DIREITO

DE ARENA NO CONTRATO DEDE ARENA NO CONTRATO DEDE ARENA NO CONTRATO DEDE ARENA NO CONTRATO DEDE ARENA NO CONTRATO DE

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Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011Análise sob a ótica da Lei n. 12.395/2011

22222a edição atualizada

JORGE MIGUEL ACOSTA SOARES

Advogado, Mestre em Direito do Trabalho, Historiador e Jornalista

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Índices para catálogo sistemático:

EDITORA LTDA.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

R

Rua Jaguaribe, 571CEP 01224-001São Paulo, SP — BrasilFone (11) 2167-1101www.ltr.com.brOutubro, 2012

Todos os direitos reservados

Soares, Jorge Miguel AcostaDireito de imagem e direito de arena nocontrato de trabalho do atleta profissional defutebol: análise sob a ótica da lei n. 12.395/2011 /Jorge Miguel Acosta Soares. — 2. ed. rev., atual.e ampl. — São Paulo : LTr, 2012.Bibliografia.

1. Atletas — Brasil 2. Contratos de trabalho —Brasil 3. Direito de arena — Brasil 4. Direito deimagem — Brasil I. Título.12-11610 CDU-347.78:331.116:796.071.24

1. Atletas profissionais : Direito de imagem edireito de arena : Contratos de trabalho347.78:331.116:796.071.242. Direito de imagem e direito de arena :Atletas profissionais : Contratos de trabalho347.78:331.116:796.071.24

Versão impressa - LTr 4711.7 - ISBN 978-85-361-2321-9

Versão digital - LTr 7437.6 - ISBN 978-85-361-2341-7

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Dedico este livro a Sandra,amada companheira de todas as horas,

e a Maria Clara e Maria Laura,filhas maravilhosas.

Apoio e estímulo inesgotáveis.

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Desejo registrar aqui meus agradecimentos a algumaspessoas que muito colaboraram para a realização deste livro.

Antes de todos, uma declaração de gratidão aoProf. Dr. Renato Rua de Almeida, por sua confiança e seu apoio.

Meu agradecimento também à Profª. Drª Ivani Contini Bramante que,pacientemente, muito auxiliou no corte epistemológico do tema. E o

reconhecimento do papel de Maria Lúcia F. Moro, irmã do coração, cujasleituras e sugestões ajudaram a sanar alguns dos problemas do texto.

Por último, mas não menos importante, uma deferência especial aoSindicato de Atletas de São Paulo (Sapesp), onde, por seus dirigentes e

funcionários, foi-me permitido vivenciar o dia a dia dos problemas dosjogadores, em um momento crucial de sua nova realidade jurídica.

A todos, meus agradecimentos especiais.

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SUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIO

APRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃO ................................................................................................................... 11

PREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃO .................................................................................... 13

PREFÁCIO ............................................................................................................................... 15

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 19

1. HISTÓRIA DA PROFISSÃO DE ATLETA ................................................................... 23

1.1. Futebol no Brasil — Origens ..................................................................................... 23

1.2. “Amadorismo marrom”............................................................................................... 26

1.3. Êxodo para o exterior ................................................................................................. 30

1.4. A profissionalização ................................................................................................... 34

1.5. O futebol e o Estado .................................................................................................... 35

1.6. A organização do esporte nacional — A era da legislação .................................... 41

1.7. A regulamentação da atividade do atleta — A era do passe .................................. 47

1.8. A Constituição de 1988 — A era dos direitos .......................................................... 53

1.9. A aplicação e as alterações da “Lei Pelé” — A era dos embates ............................ 55

1.10. Lei n. 12.395/2011, a alteração da “Lei Pelé” — O retrocesso ........................... 60

2. O CONTRATO DE ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL — NATUREZAJURÍDICA .......................................................................................................................... 68

2.1. Polêmica pré-normativa ............................................................................................. 68

2.1.1. Natureza civil do contrato ............................................................................... 69

2.1.2. Natureza desportiva ......................................................................................... 72

2.1.3. Natureza trabalhista ........................................................................................ 75

2.2. Solução legal e a situação atual ................................................................................. 78

2.2.1. Lei n. 6.354/76, a “Lei do Passe” ................................................................... 79

2.2.2. Lei n. 9.615/98, a “Lei Pelé” ........................................................................... 82

3. DIREITO DE IMAGEM ................................................................................................... 84

3.1. A imagem e os direitos da personalidade ................................................................. 85

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3.2. Direito de Imagem ...................................................................................................... 91

3.2.1. Conceito e autonomia ....................................................................................... 91

3.2.2. Garantia constitucional ................................................................................... 93

3.2.3. O uso consentido da imagem, a cessão ........................................................... 95

3.3. Direito de Imagem no contrato de trabalho do atleta profissional ........................ 99

3.3.1. Imagem pessoal e imagem profissional ......................................................... 100

3.3.2. Valorização da imagem pessoal do atleta ...................................................... 101

3.3.3. A imagem pessoal e o clube empregador ...................................................... 102

3.3.4. A licença lícita do uso de imagem.................................................................. 104

3.3.5. A contratação ilegal ......................................................................................... 106

3.3.6. A Lei n. 12.395/2011 e o Direito de Imagem ............................................... 118

4. DIREITO DE ARENA ....................................................................................................... 122

4.1. Direitos da personalidade na pessoa jurídica .......................................................... 123

4.2. Direito intelectual e direitos conexos ...................................................................... 124

4.3. O Direito de Arena e o atleta profissional ................................................................ 127

4.3.1. Evolução legislativa .......................................................................................... 127

4.3.2. Características, titularidade e natureza jurídica .......................................... 132

4.3.3. Arrecadação e distribuição do Direito de Arena ........................................... 136

4.3.4. A Lei n. 12.395/2011 e o Direito de Arena ................................................... 141

4.3.5. O cálculo do Direito de Arena ......................................................................... 144

CONCLUSÕES ....................................................................................................................... 149

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 153

ANEXO — LEGISLAÇÃO .................................................................................................... 161

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APRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃOAPRESENTAÇÃO

A vida acadêmica é uma das maiores entregas a que uma pessoa sesubmete. Não afirmo isso como uma situação de sofrimento ou de sacrifícios.Quando falo em entrega, afirmo o caráter de dedicação a que se submetemaqueles que lecionam, escrevem e pesquisam na vida universitária.

Com efeito, o tempo que é dedicado à Academia se o fosse em outrasatividades, a recompensa financeira certamente seria maior.

Ocorre, entretanto, que a satisfação e a sensação de utilidade àhumanidade que o trabalho acadêmico proporciona é maior do que qualquercompensação financeira.

Para se dedicar à vida acadêmica, o professor, o pesquisador, enfim,aquele que trabalha com educação, deve ter sensibilidade diferenciada,humildade sincera e sentido de doação ao próximo, além de desapego a bensmateriais, ao menos advindos da atividade a que se dedica.

Essas virtudes, sem dúvida, as têm o autor desta obra, professor JorgeMiguel Acosta Soares.

Mesmo aqueles que não compartilham do convívio com o autor, basta aleitura deste trabalho para concluir que se está diante de um pesquisadorsensível, humilde e desprendido.

Uma obra que inicialmente foi escrita como dissertação de mestrado,apresentada à banca examinadora na Pontifícia Universidade Católica de SãoPaulo e que recebeu nota 10, por si só comprova a preocupação de seu autorem apresentar à comunidade acadêmica um trabalho sem máculas, fossemde mérito ou de escrita.

Poucas dissertações e teses são tão completas quanto a elaborada peloprofessor Jorge Miguel, e que agora se torna esta obra que você, leitor, temem mãos.

Por ter participado da banca de defesa como examinador, posso garantir,com a experiência de quem nos últimos dez anos examinou 150 dissertações/teses, que o trabalho escrito e a defesa oral foram simplesmente impecáveis.

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O autor nos apresenta uma análise do Direito de Imagem e do Direito deArena, analisando doutrina e jurisprudência, fazendo críticas e apresentandosoluções aos problemas que envolvem os institutos, além de uma partehistórica admirável.

Quem quer conhecer as origens do futebol em nosso país encontra nestetrabalho uma fonte excelente, pois o autor conseguiu sintetizar as informaçõesque se encontram em várias outras obras, com a vantagem que sua forma deredigir é extremamente agradável.

Portanto, caro leitor, você tem em suas mãos um trabalho de alto nível.

Sinto-me profundamente honrado em poder ocupar este espaço paraapresentar o professor Jorge Miguel e sua obra.

Bem-vindo amigo Jorge Miguel, a academia jurídica te recebe com carinhoe se sente engrandecida com sua presença.

Aulas, palestras e outros trabalhos que você apresentará só enriquecerãoo estudo do Direito do Trabalho.

Felicito a LTr pela publicação desta obra que, não tenho dúvidas, seráum grande sucesso.

Boa leitura!

Domingos Sávio Zainaghi

Doutor e mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP.Pós-doutor em Direito do Trabalho pela Universidade Castilla-La Mancha,Espanha. Presidente do Instituto Iberoamericano de Derecho Desportivo.

Vice-Presidente da Asociación Iberoamericana de Derecho Del Trabajo y dela Seguridad Social. Membro da Academia Paulista de Direito. Advogado.

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PREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃOPREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃOPREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃOPREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃOPREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃO

Originalmente este trabalho foi elaborado tendo preocupações de longo ede curto prazo. No longo prazo, estava o estudo da história da profissionalizaçãodo atleta, gestada ao longo de mais sessenta anos, buscando entender oprocesso que desaguou na Lei n. 9.615/98, a “Lei Pelé”. Também no longoprazo estava o estudo dos Direitos da Personalidade, em especial o Direito deImagem e o Direito de Arena, de suas características gerais e de como eles seexpressavam no caso específico do atleta profissional.

No curto prazo, o trabalho tinha o objetivo bastante pragmático decolaborar, de forma prática, com a busca desses direitos da personalidadeno dia a dia do atleta. Viu-se que a profissionalização do atleta é tardia eincompleta e, ainda, que alguns direitos definidos em lei deixam de ser pagospelas agremiações desportivas. Assim, entendeu-se que a indicação de algunscaminhos para a obtenção desses direitos poderia ser bastante útil. Osdepoimentos de atleta e de advogados, assim como a referência do livro emdecisões dos tribunais, mostraram que essa finalidade, de certa forma, foialcançada.

A realidade é dinâmica, e as relações entre as agremiações desportivase os atletas são conflitivas. A “Lei Pelé”, o primeiro documento legal a pretenderregular essas relações, há catorze anos enfrenta a resistência dos clubesque ainda não conseguiram se adequar totalmente à nova realidade. Essainadequação se expressa especialmente no Congresso Nacional, onde umpoderoso lobby dos clubes já conseguiu diversas alterações na lei, sempreem detrimento dos direitos dos atletas.

A mais recente delas foi a aprovação da Lei n. 12.395, de 16 de marçode 2011, que alterou 32 dos 96 artigos da “Lei Pelé”, muitos deles subtraindodos atletas direitos conquistados há bem pouco tempo. Entre essas alterações,estavam duas em especial, os arts. 42 e 87-A, que mudaram completamenteo Direito de Imagem e o Direito de Arena. As alterações deram novascaracterísticas a esses direitos, impondo a necessidade da presente reedição.

A simples menção ou referência a uma possível “flexibilização” das leistrabalhistas causa inflamados debates nos meios de comunicação, o quetambém ocorre quando se menciona a supressão de algum direito de umadeterminada categoria profissional. As centrais sindicais, assim como os

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partidos e organismos progressistas ou mais à esquerda do espectro político,não admitem sequer o início de um debate que possa concluir pela extinçãode direitos.

O mesmo não acontece quando a categoria é a dos atletas. A Lei n.12.395/2011, que subtraiu e alterou direitos dos profissionais do esporte, foiaprovada no Congresso Nacional por votação simbólica, sem discussão. Maisque disciplinar alguns aspectos da lei geral do esporte, a nova normademonstrou que os direitos dos atletas, obtidos muitas décadas depois dasoutras categorias, ainda não estão consolidados.

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PREFÁCIOPREFÁCIOPREFÁCIOPREFÁCIOPREFÁCIO

Num primeiro momento, tratar do regime jurídico do atleta profissional defutebol pode parecer de pouco interesse social e científico.

Essa postura provavelmente é reflexo de certo preconceito a respeitodo meio esportivo futebolístico, às vezes sacudido por práticas condenáveis.

Por outro lado, pode-se pensar que esse regime jurídico não oferecemaiores indagações, já que regulado por legislação sem nenhumacomplexidade e de fácil aplicação.

No entanto, nos dias de hoje, o futebol reveste-se de importância socialcrescente, envolvendo interesses os mais diversos no mundo dos negócios,onde as práticas condenáveis constituem exceções, como em qualqueratividade humana.

Ademais, o exame do regime jurídico do atleta profissional de futebolnão pode limitar-se a uma análise meramente positivista da legislaçãopertinente, mas exige sua contextualização numa visão mais aberta do direitomoderno, já que os direitos trabalhistas do atleta de futebol, como trabalhador,são protegidos como direitos humanos positivados constitucionalmente nalinha dos direitos fundamentais.

Portanto, esse é o mérito de Jorge Miguel Acosta Soares, que, damilitância profissional como advogado trabalhista na área, aliada àsexperiências no magistério de História e no jornalismo, preparou-se paraencetar pesquisa acadêmica a respeito do regime jurídico do atleta profissionalde futebol. Para tanto, valeu-se da metodologia de Karl Popper, buscando oconhecimento científico sobre o regime jurídico do atleta profissional de futebol,ao utilizar-se da técnica da problematização sobre conceitos aparentementeconsolidados.

Recorreu, primeiramente, à história da profissionalização do atletaprofissional de futebol, que lhe deu verdadeira cidadania.

A seguir, debruçou-se sobre o estudo da natureza jurídica do contratodo atleta profissional de futebol, tão necessária para a solução dos eventuaisconflitos jurídico-trabalhistas.

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Finalmente, fez brilhante análise dos institutos jurídicos do direito deimagem e do direito de arena no contrato de trabalho do atleta profissional defutebol, algumas vezes confundidos justamente por falta de análiseaprofundada.

Tive o privilégio de orientar a dissertação de mestrado de Jorge MiguelAcosta Soares, intitulada “Direito de imagem e direito de arena no contrato detrabalho do atleta profissional”, na Pontifícia Universidade Católica de SãoPaulo, onde obteve o título universitário de Mestre em Direito, e, agora, tenhoa satisfação de prefaciar seu livro sobre o tema, que, certamente, preencherálacuna no meio editorial do Direito Desportivo.

Professor Doutor Renato Rua de AlmeidaPontifícia Universidade Católica de São Paulo

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Aceitamos, portanto, a ideia de que a função da ciência é a busca daverdade, ou seja, de teorias verdadeiras (embora, como observou

Xenófanes, podemos nunca alcançá-las ou mesmo não reconhecer suaveracidade). Enfatizamos, porém, o fato de que a verdade não é o único

objetivo da ciência. Procuramos mais do que a simples verdade:buscamos uma verdade interessante — difícil de ser descoberta.

Karl Popper, Conjecturas e refutações, 1963.

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INTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃO

Nosso primeiro contato com o Direito Desportivo, e com as questõesrelativas ao contrato de trabalho do atleta profissional, deu-se no início doano de 2000, quando iniciamos uma colaboração no Departamento Jurídicodo Sindicato de Atletas de São Paulo (Sapesp). O Direito nascia como umaopção madura. O tardio início da carreira jurídica se dava após uma experiênciano magistério de História e uma longa militância no jornalismo paulista. Asquestões ligadas ao desporto estavam distantes de nosso dia a dia. O futebolera apenas mais um assunto do caótico cotidiano nas páginas dos jornais,olhado sempre com certo distanciamento e indiferença.

A colaboração no Sindicato dos Atletas alterou de forma significativaessa representação. Atletas e clubes, que antes eram apenas um conjuntode nomes impressos nos jornais do dia seguinte, ganharam fisionomia,tornando-se reais e palpáveis. O que antes nos parecia apenas uma atividadequase lúdica, muito próxima do lazer, sem muita importância, tornou-se umaprofissão, com normas, regulamentação, contratos, história, direitos...

O atleta profissional de futebol vivia um momento inédito, pois a “LeiPelé”,(1) que institui as normas gerais sobre desporto, ainda era muito recente,e alguns de seus dispositivos ainda estavam em vacatio legis, e somenteentrariam em vigor em março de 2001. A hodierna lei era uma novidade paratodos; jogadores, clubes, advogados e juízes ainda não tinham a completatradução de seu sentido e significado. Supunha-se sua modernidade e osavanços que representava, mas, naquele momento, não era possível avaliarquão profundos eram.

Ao lado das incertezas e inseguranças, a vivência da nova lei trazia apossibilidade da inovação, da construção, da experimentação dos limites.Apresentava-se a possibilidade concreta da inserção definitiva do atleta defutebol, desde sempre um pária no mundo do Direito, nas modernas relaçõesde trabalho.

Nos anos que se seguiram, muito foi feito. Hoje se tem um grande eaprofundado conhecimento da lei que regulamentou a atividade do atletaprofissional. Já existe uma volumosa jurisprudência sobre vários aspectos

(1) Lei n. 9.615/98, de 24 de março de 1998.

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do contrato de trabalho do atleta, assim como farta bibliografia doutrinária.Entretanto, as questões ligadas ao jogador de futebol, em sua relação com osclubes, não estão encerradas. Muito ainda se debate sobre a relação atleta/empregado, clube/empregador. Os tribunais, em todo o país, ainda têmentendimentos discordantes e divergentes sobre o real sentido dos institutosligados ao contrato de trabalho desportivo. Grupos de pressão ainda tentammudar a lei, que desde sua promulgação até, pouco menos de dez anos, já foialterada quatro vezes, havendo ainda no Congresso Nacional alguns projetosde lei que buscam novas mudanças.

Este trabalho nasceu de reflexões, sentimentos, certezas e dúvidasformulados ao longo desse período. Indiretamente, foi sendo construído emcada novo processo, em cada nova demanda, em cada nova questão quenos era apresentada. De forma alguma, pretende-se que seja definitivo ouconclusivo. Ao contrário, é uma contribuição para um debate que ainda estámuito longe de acabar. Apenas mais uma colaboração, mas com a qualidadede ter sido forjada ao longo da História.

* * *

A busca do conhecimento sempre esteve presente na elaboração destelivro. Buscou-se entender algumas questões que envolvem o contrato detrabalho do atleta profissional a partir da clara consciência de um problemaconcreto, que aflige e afeta pessoas reais, e não de formulações abstratas.Foi a percepção da existência material desses problemas que despertou anecessidade da reflexão, mais teórica certamente, buscando sua superação.

Procurando não incorrer no erro das falsas verdades e das opiniõesabsolutamente conclusivas, mas que escondem toda uma série de problemase divergências, busca-se, ao contrário, apresentar os problemas. Aproblematização do tema foi a escolha para demonstrar que se está tratandode temas novos, inconclusos, com muitas opiniões discordantes e divergentes.

Em todo o trabalho, procura-se evitar a mera leitura da lei e a apresentaçãopura e simples de uma extensiva relação das características definidoras docontrato de trabalho do atleta. Essa opção está apoiada em duas convicções.Em primeiro lugar, porque outros estudiosos já o fizeram, antes e melhor, e otrabalho não iria muito além de reproduzir seus textos, afastando-se da propostainicial de problematização. Em segundo lugar, não se fez por acreditar que ascaracterísticas do contrato estão muito bem expressas, de forma quaseautoexplicativa, na legislação correspondente, e uma leitura cuidadosa jáesclarece seu teor. Essas características são destacadas no texto apenasquando se faz necessário citar particularidades de tais contratos.

Persegue-se aqui tarefas que se acredita serem mais relevantes. Deum lado, buscar as origens dos institutos que hoje se apresentam, entendendo

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que estes são frutos de uma longa evolução histórica, legal, doutrinária ejurisprudencial. De outro, apresentar propostas de solução para alguns nósgórdios encontrados no dia a dia, no cumprimento dos contratos de trabalhode atletas e nos embates nos tribunais, especialmente para a questão doDireito de Imagem do atleta e do Direito de Arena.

A primeira preocupação específica do livro é buscar na História a gêneseda atividade profissional do atleta e sua evolução no tempo. Essa abordageminicial se deve apenas a uma necessidade burocrática. Sabe-se que o esporte,no geral, e o futebol, em particular, ocupa grande parte das preocupações edo imaginário nacional, chegando a ser usado como metáfora das qualidadese dos defeitos da nacionalidade. O futebol, que não poucas vezes faz o paísser visto como a “pátria de chuteiras”, é uma febre, uma paixão nacional, masainda é um grande desconhecido. Muitos ainda têm guardadas na memória aescalação de um determinado time campeão, uma partida especial, a descriçãode um gol heróico, mas não conseguem avaliar os percalços e as mazelasque se escondem por trás do espetáculo.

A abordagem histórica busca exatamente mostrar as dificuldades e osdilemas da carreira de atleta profissional, que sempre foram escondidas pelaglória e pela fama. Mostra que os deuses da bola enfrentavam, e ainda, decerta forma, enfrentam, dificuldades profissionais que há muito foramsolucionadas para quase todas as outras categorias de trabalhadores do país.A evolução da legislação específica para a categoria sempre foi muito lenta,com atraso de mais de 40 anos comparada à CLT. A reflexão histórica mostraque os problemas contemporâneos vividos pelos atletas têm raízes nopassado, em velhas práticas arraigadas, impossíveis de serem esquecidase difíceis de serem superadas.

O recurso à História também está presente no segundo capítulo do livro.Agora não são mais os fatos que se encadeiam, mas a evolução dasconcepções da doutrina sobre o atleta e seu contrato com os clubes. Assimcomo no ponto anterior, o que se busca não é o simples relato burocrático, asimples observação. Busca-se a origem do cotidiano, a criação do presente.Tenta-se entender como e por que os jogadores demoraram mais de quatrodécadas para terem livre acesso à Justiça do Trabalho.

O capítulo seguinte mergulha especificamente em um dos pontos centraisdo trabalho: os direitos da personalidade, o Direito de Imagem e como ele seapresenta no caso do atleta profissional. Aqui, socorre-nos a ConstituiçãoFederal de 1988, que, de forma inédita no país, e inovadora perante asconstituições de todo o mundo, elevou tais direitos à categoria das garantiasindividuais inafastáveis. Os direitos da personalidade, dotados de statusconstitucional, trouxeram novas questões para os trabalhadores,especialmente para aqueles cuja exibição da imagem é inerente à própriaprática profissional.

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O enquadramento constitucional do Direito de Imagem passou a colidircom antigas e arraigadas práticas dos clubes envolvendo os contratos decessão de imagem, usuais quando da contratação do atleta. Velhos modosde proceder, iluminados por uma nova luz, mostraram esconder ardis, quegradativamente vêm sendo afastados pelo Poder Judiciário. O livro procuramostrar por que essas práticas devem ser entendidas como fraude, mas, aomesmo tempo, indica que é possível utilizar-se da imagem do atleta de formalícita, sem incorrer em práticas fraudulentas.

Por último, mas não menos importante, o trabalho trata do Direito deArena, instituto de criação nacional, sem paralelo no mundo, e constantementeconfundido com o Direito de Imagem. Há grande confusão entre os dois, cujoslimites, em uma primeira aproximação, parecem ser pouco definidos. Contudo,a fronteira entre ambos é bastante clara se observados do ângulo correto,mudando um pouco o foco de visão, buscando auxílio de instrumental deoutros ramos do Direito, especialmente das ferramentas do Direito Civil. Oobjetivo aqui é desfazer esse equívoco, mostrando que são direitos distintos,com distinta natureza jurídica e titulares diferenciados.

De uma forma geral, assim se organiza o presente trabalho. Procurou-seser claro e, ao mesmo tempo, rigoroso quanto à utilização de conceitos ecritérios. Da mesma forma, procurou-se fugir de uma dicotomia maniqueístapresente em muitos trabalhos que tratam dos direitos dos clubes e dos atletas.Esforçou-se para manter uma linha equânime entre as posições absolutas,entre as trevas e a luz. Contudo, essa prudência não deve ser entendidacomo neutralidade. As experiências, que deram origem a muitas reflexõesaqui esboçadas, foram vividas pelo ponto de vista dos atletas. Essa ótica emnenhum momento foi ocultada.

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Capítulo 1Capítulo 1Capítulo 1Capítulo 1Capítulo 1

HISTÓRIA DA PROFISSÃO DE ATLETAHISTÓRIA DA PROFISSÃO DE ATLETAHISTÓRIA DA PROFISSÃO DE ATLETAHISTÓRIA DA PROFISSÃO DE ATLETAHISTÓRIA DA PROFISSÃO DE ATLETA

1.1. FUTEBOL NO BRASIL — ORIGENS1.1. FUTEBOL NO BRASIL — ORIGENS1.1. FUTEBOL NO BRASIL — ORIGENS1.1. FUTEBOL NO BRASIL — ORIGENS1.1. FUTEBOL NO BRASIL — ORIGENS

A origem do futebol no Brasil tem uma história quase lendária, repetida àexaustão por comentaristas, jornalistas e torcedores em geral: no final doséculo XIX, 1894, Charles William Miller, um jovem anglo-brasileiro, trouxe ofutebol junto com suas bagagens depois de uma temporada na Inglaterra.Trabalhos acadêmicos mostraram que esse mito popular resiste a uma análisehistórica.(1) Realmente o jovem Miller, depois de anos estudando na Europa,voltou ao país, apaixonado e entusiasmado pelo novo esporte. Este ardor seexpandiu pelas terras brasileiras, contagiando outros jovens, dispostos adifundi-lo e divulgá-lo.

Mais que uma aventura literária, o futebol chegou ao Brasil marcado porum componente social muito forte, que profundamente determinou seudesenvolvimento nos 30 anos seguintes: a elitização. O esporte nasceu eteve seu desenvolvimento inicial no país como uma expressão da elitedominante das grandes cidades do Centro-Sul.

Os jovens das elites urbanas, ao voltarem de seus estudos no exterior,transportaram para o país o novo jogo que começava a virar febre na Europa.No final do século XIX, nos colégios e nas universidades da Inglaterra, o jogohavia se tornado uma mania nacional, uma disciplina específica, ensinadocomo parte da formação dos jovens elegantes e nobres. Os brasileiros queforam estudar em terras britânicas incorporaram essa aura de virtude doesporte, e se apaixonaram.

O caso de Charles Miller, ao trazer uma bola em sua bagagem, foiemblemático e simbólico, mas não foi o único. Como ele, diversos outrosjovens da elite brasileira também tinham em suas malas a paixão pelo futebol.Aqui encontraram altos funcionários das empresas inglesas, que aportavamno país acompanhando e representando os maciços investimentos do

(1) Ver CALDAS, Waldenyr (1990); PEREIRA, Leonardo Affonso de Miranda (2000); SANTOSNETO, José Moraes dos (2002).

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capitalismo britânico em terras brasileiras. Eram engenheiros, contadores,técnicos, também formados pelas mesmas escolas inglesas, tambémseduzidos, que se reuniam em clubes particulares, onde praticavam o novoesporte. Nessa fase, o futebol podia verdadeiramente ser chamado de “esportebretão”.

Para difundir o futebol entre os ingleses, que viviam em São Pauloe jogavam cricket, Miller entregou-se a uma fervorosa atividade demissionário. O primeiro círculo que cultivou o jogo numa formaorganizada foi formado por sócios de um clube inglês — o São PauloAthletic Club —, que havia sido fundado para a prática do cricket eao qual Miller se associou. O clube reunia altos funcionários inglesesda Companhia de Gás, do Banco de Londres e da São PauloRailway. (Rosenfeld, 1973. p. 62-3)

Na Inglaterra, o futebol levou quase um século para se consolidar entreos jovens escolares. A prática do esporte, que no início do século XIX erarigorosamente proibida, acusada de desviar a atenção dos moços dosassuntos sérios, poucas décadas depois se tornara uma atividade elegante eestimulada (Caldas, 1990. p. 23). No Brasil, sua expansão foi muito maisrápida. Nos colégios da elite, formavam-se bons jogadores, que passaram aintegrar os clubes da época, como o Payssandu, no Rio de Janeiro, o Germânia— atual Pinheiros —, o São Paulo Athletic Club, na capital paulistana.

O futebol surgia no Rio de Janeiro como uma novidade moderna eelegante. Introduzido no Brasil por imigrantes europeus e por jovensque traziam da Europa as novidades do moderno esporte, osprimeiros anos do futebol na cidade ganharam na historiografia, comovimos, a marca de um jogo de elite, um fidalgo esporte inacessívela negros e trabalhadores em geral — na reafirmação de uma imagemconstruída, no período, pelos próprios administradores do jogo quese reuniam nos recém-fundados clubes da Zona Sul. (Pereira, 2000.p. 17)

O nascimento e os primeiros anos do futebol no Brasil ficaram marcadospor esse caráter elitista. Os ingleses e estudantes que voltavam da Grã--Bretanha foram seus precursores; estes faziam parte da elite social eeconômica das sociedades paulista e carioca. Era um esporte de ricos, pararicos. Além de sua origem transplantada, é necessário se considerar quetudo o que dizia respeito ao jogo — uniformes, bolas, redes, e até mesmoapitos — era muito caro, importado da Europa. Sua prática, inicialmente, exigiaum grande campo, muito bem gramado e tratado. Essas características derama conotação social do esporte em seus primeiros anos, mas essa face iriamudar rapidamente.

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No início dos anos de 1910, começou-se a perceber que o esporte nãoficaria restrito às elites que o criaram. Empresas inglesas, com seusengenheiros e técnicos, formavam times de futebol, que se apresentavamnos dias de folga e nos intervalos do trabalho. O mais significativo dessesclubes foi o Bangu, criado no subúrbio da cidade do Rio de Janeiro, pelosingleses da empresa têxtil Companhia Progresso Industrial do Brasil, patronada equipe time. As apresentações do time passaram a ser assistidas comentusiasmo pelos operários, não só por “amor à camisa” da empresa, maspelo fascínio que o esporte despertava. Não demorou muito para que essesmesmos operários passassem a praticar esse esporte nas ruas de terra enos terrenos próximos de suas casas. Não demorou muito também para quesurgissem bons jogadores entre esses operários.

Fundado por ingleses em 1904, sob o nome de The Bangu AthleticClub (...). Os técnicos ingleses da Cia. Progresso Industrial estavamfelizes. Entre outras, por terem podido criar um time de futebol paraseu lazer. Mas, ao mesmo tempo, surgem os primeiros problemas.Não havia técnicos suficientes para formar dois times e isso, é claro,frustrava a expectativa dos ingleses. Nesse caso, então, a soluçãoteria que ser doméstica, e a única alternativa possível era contarcom os operários interessados em jogar futebol. Quase sempre ojogador-operário era mais rapidamente promovido. Os consideradoscraques, então, eram nitidamente protegidos pela diretoria. (Caldas,1990. p. 29)

A Companhia Progresso Industrial localizava-se fora da cidade do Riode Janeiro, o que dificultava o acesso de outros ingleses até o campo doBangu. Assim, aos ingleses que quisessem praticar o futebol não restavaalternativa senão abrir espaços, para completar o time, aos operários que semostrassem talentosos em campo. Essa necessidade/dificuldade marcou,segundo os relatos (ibidem, p. 20),(2) o início da democratização do esporte, ocomeço do fim da discriminação social. Porém, esses mesmos autores deixamclaro que a elite cedeu espaço em seus times não por um anseio democráticoou progressista. Apenas desejava continuar praticando o esporte. No casodo Bangu, o pioneiro, o futebol deu prestígio comercial à fábrica de tecidos,obrigando seus dirigentes a darem ainda mais importância ao time. A partir de1909, os operários selecionados passaram a integrar o time, treinandoregularmente (ibidem, p. 31).

(2) Em uma carta publicada no jornal Correio da Manhã, em 22 de abril de 1918, “O queescreve um leitor sobre amadorismo”, um leitor cita que clubes ligados a empresas,Bangu e Andaraí, traziam em seus quadros “honrados operários” (apud Pereira, 2000.p. 312).

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1.2. “AMADORISMO MARROM”

A abertura do futebol às camadas populares trazia um fator complicador:como poderiam os atletas-operários, ou operários-atletas, trabalhar e aomesmo tempo dispor de força e energia para desempenhar suas funções nogramado?

Os primeiros atletas do futebol, jovens oriundos das elites e técnicos eprofissionais estrangeiros, não trabalhavam em funções pesadas eextenuantes. Suas tarefas diárias eram, quase sempre, intelectuais e demando, não exigindo grande esforço ou desgaste físico. Assim, tinhamdisposição suficiente para os treinos e as partidas, quase sempre disputadasnos finais de semana. O mesmo não acontecia com os operários. Asprolongadas jornadas de trabalho, a exposição a condições precárias einsalubres os esgotavam e debilitavam. As poucas horas fora do local detrabalho eram reservadas para a recomposição das forças e preparação paraa jornada do dia seguinte. Os dias de folga, normalmente os domingos, erampoucos para permitir que o trabalhador tivesse ânimo e energia para disputasesportivas.

Os times ligados às empresas, como já se viu, resolveram o problemaretirando os operários-atletas da produção, dando-lhes condições para treinare se preparar para as disputas. Protegidos, aqueles que eram escolhidos setornavam apenas atletas.

O mesmo não acontecia nos clubes. As agremiações esportivas queapenas reuniam a elite não tinham como cooptar jogadores fora de seusquadros associativos. Não tinham como introduzir jogadores das camadaspopulares sem dar-lhes condições para serem atletas em tempo integral, ouna maior parte do tempo.

Ainda em 1915, quando dava seus primeiros passos, nosso futebolapresenta, talvez, o primeiro sintoma de que o amadorismo não iriamuito longe. Jogadores de São Paulo e do Rio de Janeiro járecebiam, nessa época, algum dinheiro para entrar em campo comoforma de incentivo às vitórias. Era a gratificação(3) independente do

(3) A partir de 1923, o Clube de Regatas Vasco da Gama instituiria essa gratificação, quepassaria a ser chamada de “bicho”. A origem da palavra “bicho” liga-se ao Jogo do Bicho,prêmio que os atletas, ainda amadores, recebiam pelas vitórias e, à época, dizia-se serproveniente do jogo ilícito. Mário Rodrigues Filho descreve o pagamento peculiar: “(...) oportuguês dava dinheiro aos jogadores de Moraes e Silva. Chamava-se esse dinheiro debicho porque, às vezes, era um cachorro, cinco mil réis, outras um coelho, dez mil réis,outras um peru, vinte mil réis, um galo, cinqüenta, uma vaca cem. Não pára aí. Havia vacasde uma, de duas pernas, de acordo com o jogo. Contra o América, campeão do centenário,contra o Flamengo, bicampeão, contra o Fluminense, tricampeão, uma vaca de uma perna

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resultado, estava assegurada, por antecipação, uma certa quantiaque, na verdade, servia de estímulo ao jogador. Seu interesse eaplicação durante o jogo poderiam significar futuras escalações e,portanto, mais gratificações. Isto, evidentemente, não caracteriza oprofissionalismo: no entanto, cria condições satisfatórias para seusurgimento. (Caldas, 1990. p. 38)

Mas a prática não era bem-vista. Membros e dirigentes dos clubes, assimcomo torcedores e intelectuais da época, resistiam duramente à ideia depagamentos para recompensar o tempo dos atletas que não eram “bem--nascidos”. O discurso contra o pagamento, e a defesa do amadorismo,oscilava entre os ideais utópicos do olimpismo e o mais puro preconceitosocial.

Verdadeiros sportman como Oscar Cox, o festejado introdutor dofutebol na cidade (Rio de Janeiro), brigaram até a morte contra o“profissionalismo mascarado” que ia tomando conta do futebol nacidade. Antigos adeptos do amadorismo como Marcos Mendonça,que anos antes largara os campos aos primeiros sinais do“profissionalismo marrom”, afirmavam em 1932 ser esse processo“resultante da substituição gradativa dos princípios idealistas pelosutilitaristas entre as classes moças” uma “desgraçada avalancheque ameaça os alicerces morais de todas as organizaçõesesportivas do mundo” — clamando pela volta “à época em que oesporte era praticado a bem do corpo e do espírito”, e não em trocade alguns milhares de réis. (Pereira, 2000. p. 318)(4)

O discurso fundava-se nos ideais olímpicos, surgidos na Inglaterra nasegunda metade do século XIX, imbuídos da moral vigente durante o períodovitoriano. O cavalheirismo, a solidariedade e o respeito mútuo eram, segundoeles, princípios presentes no amadorismo esportivo, que deixavam de existircom a remuneração do atleta, qualquer que fosse ela.

O discurso subjacente era outro; escondidos estavam o preconceito e aaversão às camadas populares. Significativamente, esse período de semi--amadorismo ficou registrado na história do futebol com vários nomes, todoseles pejorativos: “falso amadorismo”, “amadorismo marrom”, “profissionalismo

era pouco, só mesmo de duas pernas. O português não encontrava jogador do Vasco semmeter a mão no bolso. Toma lá, ó Nelson Conceição, para que não engulas nenhum gol.Toma lá ó Bolão, é justo que leves o teu, pois já me deste muito dinheiro a ganhar” (1964.p. 123-4).(4) No trecho destacado, o autor transcreve citações de Cox, publicadas no artigo “Reparodo Dia”, no Jornal dos Sports, 16 out. 1931, e de Mendonça, publicadas em “Amadorismo”,no jornal esportivo FFC, 31 jul. 1932.