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Introdução 1.1. Locação – noção e importância do instituto Noção : “Locação é o 1) contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o 2) gozo 3) temporário de uma coisa, mediante 4) retribuição ”. – (1022.º CCiv). A locação é um género amplo, onde participam duas espécies fundamentais: o arrendamento e o aluguer. 1.2. Caracteres definidores do conceito legal de locação Na definição do 1022.º CCiv, emergem os seguintes traços característicos: 1- Contrato: Antes de mais a locação é definida como um “contrato” (1022.º CCiv). E uma vez que este contrato se encontra tipificado na lei (1022.º ss. CCiv), é um contrato típico . Admite-se frequentemente na doutrina que tal princípio não será absoluto, comportando desvios. Apresentamos de seguida os dois casos mais relevantes: 1.ª Excepção - Contrato de Promessa a que tenha sido dado execução específica nos termos do 830.º CCiv A questão é controvertida: JANUÁRIO GOMES defende que o arrendamento, nestes casos, é constituído por sentença (a sentença da execução específica); PINTO FURTADO defende que o arrendamento ainda é constituído por contrato, uma vez que a decisão do juiz não é alheia à vontade das partes, mas limita-se a impor a observância do que elas ajustaram no contrato de promessa, 1 Direito do Arrendamento

Direito do Arrendamento - 1.ª frequência (revisão)

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Introdução

1.1. Locação – noção e importância do instituto

Noção: “Locação é o 1) contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o 2)

gozo 3) temporário de uma coisa, mediante 4) retribuição”. – (1022.º CCiv).

A locação é um género amplo, onde participam duas espécies fundamentais: o arrendamento e o aluguer.

1.2. Caracteres definidores do conceito legal de locaçãoNa definição do 1022.º CCiv, emergem os seguintes traços característicos:

1- Contrato:Antes de mais a locação é definida como um “contrato” (1022.º CCiv). E uma vez que este contrato se encontra tipificado na lei (1022.º ss. CCiv), é um contrato típico.Admite-se frequentemente na doutrina que tal princípio não será absoluto, comportando desvios. Apresentamos de seguida os dois casos mais relevantes:

1.ª Excepção - Contrato de Promessa a que tenha sido dado execução específica nos termos do 830.º CCivA questão é controvertida:

JANUÁRIO GOMES defende que o arrendamento, nestes casos, é constituído por sentença (a sentença da execução específica);

PINTO FURTADO defende que o arrendamento ainda é constituído por contrato, uma vez que a decisão do juiz não é alheia à vontade das partes, mas limita-se a impor a observância do que elas ajustaram no contrato de promessa, sendo o contrato prometido a moldar a relação arrendatícia e não a sentença judicial.

2.ª Excepção – Arrendamento em caso de divórcio/separação judicial de pessoas e bens (1793.º e 1794.º CCiv; 4.º Lei 7/2001)Neste caso, o tribunal pode dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a cada de morada de família, quer seja comum quer própria de outro.Este arrendamento fica sujeito às regras do arrendamento para habitação, mas o tribunal pode definir as condições. O n.º 2 do 1793.º CCiv denomina este arrendamento de contrato, no entanto, entende PINTO FURTADO que a qualificação não é a mais adequada, uma vez que não há acordo de vontades na constituição da relação arrendatícia. Assim, em vez de contrato, temos aqui um despacho do juiz, sendo esta a real fonte da relação arrendatícia.

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Direito do Arrendamento

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2- Obrigação de proporcionar a outrem o gozo de uma coisa corpórea (1022.º; 1031.º/b) CCiv)

A obrigação que impende sobre o locador de proporcionar o gozo de uma coisa, desdobra-se em três noções:

A da obrigação, ou seja, o vínculo a que fica adstrito o locador pelo contrato; A do gozo que pode ser estipulado; E a de coisa susceptível de ser locada.

A ObrigaçãoTal obrigação executa-se através de duas prestações distintas (1031.º CCiv):

A de entrega da coisa locada (prestação de dare); A de assegurar o gozo da coisa para os fins a que se destina (1037.º/1 a contrario

CCiv), podendo ser:o (prestação de facere): realização de reparações e ou despesas necessárias ao

gozo da coisa (1036.º CCiv); ou,o (prestação non facere): não perturbar o gozo da coisa (excepções: 1038.º/b) e

e) CCiv…).Esta prestação constitui uma obrigação de execução continuada, porque se prolonga ininterruptamente no tempo.

O GozoEste vocábulo designa um conceito amplo que compreende dentro de si duas noções mais restritas e precisas:

Pode haver locação só de uso, de mera fruição ou locação de uso e fruição. (Locação só de uso: aluguer de veículos automóveis terrestres sem condutor; Locação de mera fruição: sublocação total).O gozo proporcionado ao locatário pode compreender a generalidade das utilidades da coisa, ou restringir-se a alguma delas (ex: quando num prédio urbano se concede unicamente a utilização da superfície da sua fachada ou de um muro, para afixação de cartazes publicitários).

A CoisaNos termos do 204.º/1 CCiv são coisas imóveis:

Os prédios urbanos e rústicos; As águas; As árvores, os arbustos e os frutos naturais ligados ao solo; Os direitos inerentes aos imóveis mencionados nas alíneas anteriores; As partes integrantes dos prédios rústicos e urbanos.

Dispõe ainda o 205.º/1 do CC que “são móveis todas as coisas não compreendidas no artigo anterior”.

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Gozo

Fruição -> Aproveitamento dos frutos da coisa

Uso -> Aproveitamento das utilidades das coisas, para satisfação de necessidades

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Assim, devemos concluir que o contrato de arrendamento abrange a locação de um prédio rústico ou urbano, de águas do domínio privado, de árvores, arbustos ou frutos ligados ao solo ou de um direito inerente a tais imóveis. De forma diversa, de uma forma geral, podemos afirmar que o contrato de aluguer consiste na locação de qualquer coisa não compreendida na noção anterior.

3- Carácter temporárioA locação não pode celebrar-se por mais de 30 anos (1022.º; 1025.º CCiv). Esta é uma norma imperativa, não estando disponível para ser alterada pelas partes.O 1099.º ss. CCiv permite, ainda, que o arrendamento possa ser celebrado como contrato de duração indeterminada, sendo que, tal, não coloca obstáculos à sua natureza temporária (o contrato é temporário, não está é definido o seu término).No que toca ao à locação de bens imóveis (arrendamento), o carácter temporário não impede a sua prorrogação sucessiva. Neste caso, o prazo de 30 anos corresponde apenas ao limite máximo do prazo inicial do contrato e não ao seu limite de duração, pelo que ocorrendo a renovação do prazo, nos termos do 1054.º CCiv, naturalmente que nada impedirá que tal leve a que o contrato de arrendamento tenha uma duração máxima superior a 30 anos.

4- RetribuiçãoA retribuição é a contrapartida, a que fica obrigado o locatário, pelo gozo temporário da coisa, que lhe é facultado pelo locador.Não há locações gratuitas (1038.º/a) CCiv), não havendo a retribuição, estaríamos perante um contrato de comodato.A retribuição pode ser constituída por quaisquer bens económicos – uma coisa ou uma prestação – quando isso não esteja concretamente proibido e não conduza à configuração de um novo tipo legal de contrato (Ex: uma quota de frutos).No 1075.º/1 CCiv prevê que, para o arrendamento urbano, a retribuição será constituída por “uma prestação pecuniária periódica ”.A retribuição deverá ser determinada (ou determinável). No entanto, retribuição determinada não quer dizer que esta tenha de ser fixa, em princípio, é admissível a estipulação de rendas escalonadas.

1.3. Espécies básicas da locação no Direito português: aluguer e arrendamento

Nos termos do 1023.º CCiv é possível distinguir entre duas modalidades de locação:→ Aluguer: quando recai sobre coisa móvel.→ Arrendamento: quando recai sobre coisa imóvel.

Regimes legais de arrendamento

Regime no âmbito do RAU: (DL 321-B/90; DL 257/95) Arrendamento para habitação Arrendamento para comércio e indústria

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Arrendamento para exercício de profissão liberal Arrendamento para fins não habitacionais

Regime no âmbito do NRAU (e actual) (1067.º CCiv):(L 6/2006 e 31/2012)

Arrendamento urbanos: quando recai sobre prédios urbanos, para fins: Habitacionais (1092.º ss. CCiv):

Prazo certo (1095.º a 1098.º CCiv) Duração indeterminada (1099.º a 1107.º CCiv) Antigo arrendamento vinculístico (doutrina!!)

Não Habitacionais (1108.º ss. CCiv): Arrendamento rústico para fim não sujeito a regime especial; Arrendamento para fim comercial ou industrial Arrendamento para exercício de profissão liberal Arrendamento para fim desportivo Arrendamento para fim associativo, recreativo, político e outros

Arrendamento rústico: quando recai sobre prédios rústicos, e pode ser: Rural: quando tenha fins agrícolas, florestais ou outras actividades de produção de

bens e serviços associados à agricultura, à pecuária e à floresta (2.º/1 DL 294/2009); Não Rural : quando for destinado a outros fins.

Se o arrendamento recair sobre prédios rústicos, presume-se arrendamento rural (2.º/1 DL 294/2009). O conceito de “prédio” encontra-se no 204.º/2 CCiv.

Arrendamento Urbano

2.1. Natureza Jurídica do Direito do Arrendatário

A natureza jurídica do arrendatário é controvertida na doutrina.

1.ª Posição (minoritária): o direito do arrendatário é um DIREITO REAL de gozo(Tese Realista)

Argumentos:1) Há um poder directo e imediato do locatário sobre a coisa, o que caracteriza os

direitos reais (1031.º/b) CCiv).Crítica: o gozo da coisa pelo locatário está limitado aos fins expressos no contrato (1083.º/2 CCiv)

2) O locatário pode recorrer ao contencioso possessório, o que significa que é possuidor; e o que pode ser objecto de posse são os direitos reais de gozo (1037.º/2 CCiv).Crítica: o locatário é um mero detentor (1253.º/c) CCiv); há titulares de direitos de

crédito que também podem recorrer ao contencioso possessório (1188.º/2; 1125.º/2;

1133.º/2 CCiv); se o locatário fosse titular de um direito real de gozo não era preciso

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dizer que ele pode propor acções possessórias pois já se sabe que os titulares de

direitos reais de gozo as podem propor (princípio da utilidade das normas).

3) Há casos em que se reconhece o direito de propriedade, sendo possível recusar a restituição da coisa (1311.º/2 CCiv)Critica: há outros direitos obrigacionais que levam à improcedência da acção de reivindicação (ex. comodato).

4) Quando há uma transmissão da posição do locador, o locatário conserva intactos os seus direitos e obrigações (1057.º CCiv)Critica: o direito do locatário, na verdade, tem uma eficácia meramente relativa, ou seja, o direito do locatário só é oponível ao locador, o que mais de resto é uma característica dos direitos de crédito.

2.ª Posição (maioritária): o direito do arrendatário é um direito de crédito(Tese Personalista)

Argumentos:1) Argumento de Coerência Sistémica: Todos os direitos reais de gozo encontram-se

elencados no Livro III do CCiv, excepcionando o direito real de habitação periódica, vulgo “Time Sharing”, que está previsto em legislação avulsa. Ora, o direito do locatário está previsto no Livro II do mesmo diploma.

2) Argumento Literal: O próprio legislador chama ao arrendamento um direito pessoal de gozo, ou seja, um direito de crédito (1682.º-A/1/a) CCiv). A mesma lógica está patente no 1682.º-A/2 CCiv.

3) Argumento Conceptual (1022.º CCiv): Este argumento traduz-se no conceito de locação. Aqui o locatário tem apenas o direito de exigir ao locador o gozo da coisa, ou seja, tem uma prestação. Ao ter uma prestação, tem um direito de crédito.

2.2. Âmbito do objecto do contrato de arrendamento urbanoNos termos do 1064.º CCiv o contrato de arrendamento urbano tem, normalmente (excepção – 1108.º/in fine; 1109.º CCiv), por objecto prédios urbanos, podendo abranger tanto a totalidade como parte da coisa sobre que incide (1064.º CCiv). (ex: partes do prédio, muros e terraços (publicidade; instalação de antenas) ou janelas e varandas (para assistir a cortejos)).

Revisão: Contrato Misto vs. União de Contratos

Contratos Mistos União de Contratos Unidade Contratual Pluralidade Contratual Um único negócio jurídico Cada negócio jurídico tem autonomia

própria Elementos essenciais de tipos de

contratuais distintos Os contratos não vivem separadamente

Finalidade económica comum Vicissitudes de um repercutem-se no

outro

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Contrato Misto (Def.): aquele que resulta da fusão de dois ou mais contratos ou partes de contratos distintos, ou inclusão num contrato de aspectos próprios de outros negócios jurídicos (405.º/2 CCiv).

Assim,Caso o contrato tenha por objecto não apenas um prédio urbano, mas também elementos de outra natureza, como móveis, acessórios ou uma parte rústica, estar-se-á perante um contrato misto (e não um contrato de arrendamento típico).

Qual o regime que regula o contrato misto? Há várias teorias:1.ª Teoria: Teoria da Absorção -> o regime de arrendamento deve absorver a situação do aluguer;2.ª Teoria: Teorias da Combinação -> devem aplicar-se combinadamente os dois regimes;3.ª Teoria: Teoria da Analogia -> o regime deve considerar-se lacunoso, a integrar por analogia.

Tendo os vários regimes em mente, vamos observar as duas situações previstas no CCiv:

1.ª Situação: Locação de imóveis mobilados e seus acessórios (1065.º CCiv):Originalmente, o CCiv determinava a aplicação da teoria da absorção, considerando arrendamento urbano todo o contrato e renda todo o preço locativo.No entanto, o NRAU determinou a extinção do vinculismo arrendatício deixando de se estabelecer imperativamente a teoria da absorção, passando esta a constituir, agora, uma mera presunção, que as partes podem afastar.

Regra: Presunção da absorção do regime do aluguer pelo do arrendamento.Excepção: As partes podem afastar a presunção.

2.ª Situação: Arrendamento conjunto de parte urbana e parte rústica (1066.º CCiv):Neste caso, estabelece-se que é a vontade dos contraentes que determina a qualificação do arrendamento como urbano ou rural, funcionando o fim principal do contrato e a renda atribuída a cada uma das partes apenas como critérios de resolução de casos dubitativos, sendo que, na falta ou insuficiência de qualquer desses critérios, o arrendamento será havido como urbano. Assim:

1.º Critério: Vontade dos contraentes (n.º1); não sendo possível apurar a sua vontade, aplica-se,2.º Critério: Correspondência com a parte principal do contrato/valor da renda atribuída (n.º 2); na falta/insuficiência de qualquer dos primeiros dois critérios, aplica-se,3.º Critério: Regime do arrendamento urbano (n.º 3).

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Resumindo,

2.2.1. Arrendamento para habitaçãoArrendamento urbano para habitação (Def): locação de prédio ou parte de prédio urbano para fim habitacional (1064.º; 1067.º CCiv).

“Habitação”O significado de “habitação” é sinónimo de “uso residencial” (1092.º CCiv) ou “morada” (1484/2; 1682-A/2; 1682-B/2; 1793/1 CCiv).

2.2.1.1. Espécies Legais de Arrendamento Urbano para Habitação – O VINCULÍSMOApesar de o homem ser um ser eminentemente social, em certos aspectos da sua vida quotidiana (repouso, procriação, defesa própria e dos filhos de tenra idade), carece de se apartar da comunidade para realizá-los em casa, dentro do núcleo restrito e fechado da família.Habitar, residir, morar, significa, pois, a vida íntima familiar (não comunitária) que decorre dentro de casa – vida doméstica.No nosso direito é importante distinguir, em matéria de arrendamento, a habitação não permanente da habitação estável (habitação permanente ou primária).Presume-se, quando se fale de habitação, sem nada mais acrescentar, que nos referimos à habitação estável.

Assim,

O prédio arrendado só será considerado de habitação se lhe for dado um uso residencial, ié, nele se faça decorrer a vida não comunitária, não sendo essencial que se desenvolva exclusivamente num único edifício.Não é incomum repartir-se a vida doméstica por mais de um edifício (ex. casa da cidade, casa do campo, casa na praia, sendo ambas adequadas à vida privada que se faz em diferentes épocas do ano)

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Quanto ao âmbito

Contrato Misto

Contrato Típico

Parcial

Total

Urbano+

Rústico

Imóvel+

Móvel

ArrendamentoUrbano

Quanto ao objecto

Imóvel Urbano

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Neste sentido, o arrendamento de uma ou várias casas com fim de lazer é compatível com a existência de um arrendamento urbano para habitação permanente do agregado familiar.O que não se admite é a cumulação de dois ou mais arrendamentos vinculísticos para habitação permanente alternada, pois tal desvirtua a racio legis do vinculismo, enquanto sistema legalmente imposto, por período transitório, com o fim de obviar à escassez de casas perante as imperiosas exigências sociais da procura.Acresce que, a aptidão que estas casas têm para a realização de actividades que não propriamente os actos da vida doméstica, pode atrair o arrendatário, no sentido de tentar modificar o destino contratualmente atribuído, realizando nele o comércio, indústria ou profissão liberal, a par da vida doméstica.

Essa ampliação do fim consignado no contrato poderá constituir fundamento de resolução por parte do senhorio.No entanto, o legislador admitiu a legitimidade do exercício de certas actividades, que pela pequena dimensão e recatado aproveitamento que fazem da casa, não descaracterizam o seu uso habitacional.

Excepções à resolução com fundamento em ampliação do fim do contrato Exercício de pequena indústria doméstica (1092.º CCiv) Hospedagem a não mais que três hospedes (1093.º CCiv)

1.ª Situação - Exercício de pequena INDÚSTRIA DOMÉSTICA (1092.º CCiv)

Este preceito foi instituído com o fim de proteger a situação dos trabalhadores artesanais que realizem a profissão na própria residência.

Existe, porém, quem censure esta disposição, por entender que as indústrias domésticas são, hoje, uma forma de exploração do trabalho infantil ou clandestino, defendendo que o preceito deveria inverter-se: o seu exercício seria proibido, salvo cláusula em contrário – MENEZES CORDEIRO.

Segundo o 1092.º CCiv são três os elementos caracterizadores da “indústria doméstica”: Ser a “indústria doméstica” exercida pelo arrendatário:

“Indústria doméstica” deve entender-se como:PINTO FURTADO o exercício, ainda que tributado, das actividades laborais que costumam desenvolver-se no âmbito das paredes domésticas (ex: trabalho a domicílio, a empresa artesanal, o ensino particular, o exercício de profissão liberal em escala doméstica) e já não, as próprias indústrias que, mesmo de pequena dimensão, sejam, pelas suas características, incompatíveis com o exercício doméstico, designadamente por se revelarem incómodas, perigosa, insalubres ou tóxicas.

JURISPRUDÊNCIA MAIORITÁRIA a qualificação legal de uma indústria como doméstica depende apenas da verificação dos requisitos constantes deste artigo, não interessando a quantidade de objectos produzidos ou transformados, nem a sua espécie ou qualidade.

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Devendo partir-se da ideia básica de que será industrial "toda a actividade que transforma matérias-primas ou produtos, noutros produtos ou objectos, que se tornam mais valiosos por via dessa transformação", com o que se pretende criar riqueza” – Anotações ao Regime do Arrendamento Urbano (5.ª Ed., pág. 63 e 242).Assim, fica de fora a actividade comercial, que se caracteriza fundamentalmente pela compra de bens naturais ou de produtos para revenda, intervindo o comerciante na circulação da riqueza através de uma actividade de mediação e, ainda, o exercício de profissões liberais (entendendo alguns autores, que neste último caso, dependerá de existir ou não uma dependência na casa arrendada destinada directa/indirectamente ao exercício da profissão).

Na casa de habitação ; Sem ocupar mais de três auxiliares assalariados (o arrendatário realiza pessoal e

isoladamente a indústria doméstica, ou realiza-a com os seus auxiliares assalariados, familiares ou não).

Se a actividade exercida não tiver alguma das características acima, o arrendatário estará, com ela, a aplicar à casa um fim diverso ao que foi destinado, incorrendo assim, no fundamento de resolução pelo senhorio (1083.º/2/c) CCiv).O mesmo se concluí no caso de o arrendatário exercer qualquer indústria doméstica violando cláusula contratual que proíba a sua prática (1083.º/1 CCiv).

2.ª Situação - HOSPEDAGEM a não mais que três hospedes (1093.º CCiv)O uso residencial do prédio, no arrendamento para habitação, é conciliável com a prestação de hospedagem a não mais de três pessoas, salvo cláusula em contrário.Obviamente que, este limite máximo admitido deve ser compatível com a capacidade de ocupação concreta da casa.Assim, como afirma MÁRIO FROTA: “Três hóspedes são demais para um T-0”.A prática de hospedagem nessas condições tem de ser equiparada ao excesso do limite legal, ainda que igual ou inferior a três, o número de hóspedes – subsumindo-se ao fundamento de resolução previsto no 1083.º/2/b) CCiv, por utilização contrária “aos bons costumes”.

Não se incluem no número de hóspedes, os que vivam com o arrendatário em economia comum (1093.º/1/a) CCiv). Assim, todas as pessoas previstas no n.º 2 do 1093.º CCiv podem residir com o arrendatário, são eles:

Pessoa que com ele viva em União de Facto; Os seus parentes ou afins na linha reta; Os colaterais até ao 3.º grau; Qualquer pessoa relativamente à qual haja obrigação de convivência ou alimentos

(2009.º/1 CCiv; “empregadas domésticas residentes”).A presunção do 1093.º/2 CCiv é iuris et de iure (inilidível).No entanto, apesar da ilimitada permissão do 1093/1/a) CCiv, esta estará sempre condicionada à capacidade de alojamento, dentro de uma utilização prudente, por força do 1083.º/2 proémio – “incumprimento que, pela sua gravidade e consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento”.

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2.2.1.2. Espécies Legais de Arrendamento Urbano para Habitação – Prazo Certo (1095.º a 1098.º CCiv)As linhas estruturais deste subtipo legal de arrendamento urbano para habitação, são as seguintes:

É um arrendamento de prédio urbano (1064.º CCiv); Por prazo não superior a 30 anos (1095.º/2 CCiv); Em que o Senhorio e Arrendatário têm direito à livre oposição à renovação (1096.º/3;

1097.º e 1098.º/1 e 2 CCiv); O arrendatário, além da livre oposição à renovação, tem direito de denúncia (1098.º/3

a 5 CCiv); Renova-se automaticamente, caso não haja oposição à renovação, denúncia (1096.º/1

CCiv), excepto, nos contratos celebrados por prazo inferior a 30 dias (n.º 2). Esta é, no entanto, uma norma supletiva, permitindo-se estipulação em contrário (1096.º/1 ab initio; 1096.º/2 ab initio CCiv). Assim, as partes podem definir:

o A duração inicial do contrato;o Os períodos de renovação (que podem ser diferentes do período inicial – ex.

prazo certo: 6 anos, renovação: 3 em 3); ou, simplesmente,o Afastar a renovação automática.

O prazo deve constar de cláusula inserida no contrato (1095.º/1 CCiv).

Oposição à Renovação pelo Senhorio (1097.º CCiv):Sendo a oposição realizada pelo senhorio, a mesma tem que ser efectuada nos seguintes prazos:

240 dias -> prazo de duração inicial/renovação ≥ 6 anos; 120 dias -> 6 anos ≩ prazo de duração inicial/renovação ≥ 1 ano 60 dias -> 1 ano ≩ prazo de duração inicial/renovação ≥ 6 meses; 1/3 do prazo de duração inicial/renovação-> prazo de duração inicial/renovação

do prazo ≨ 6 meses.

Caso Prático:Contrato celebrado (hoje).Duração inicial: 6 anosRenovável por períodos sucessivos de 1 ano.Senhorio pretende opor-se à renovação, quando pode fazê-lo?

6 anos 1 1 1 1 ano (…)

240 dias 120 dias

- No caso de oposição para o termo do prazo de duração inicial -> 240 dias (n.º 1/a))- No caso de oposição para o termo do prazo de uma das renovações -> 120 dias (n.º 1/b)).

Comunicação da oposição (9.º/1, 3, 6 NRAU)O comprovativo da comunicação acompanhado do contrato constitui pressuposto necessário ao processo especial de despejo (15.º/2/c) NRAU).

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Oposição à Renovação pelo Arrendatário (1098.º/1 e 2 CCiv)Sendo a oposição à renovação realizada pelo arrendatário, a mesma tem de ocorrer nos seguintes prazos:

120 dias -> prazo de duração inicial/renovação ≥ 6 anos; 90 dias -> 6 anos ≩ prazo de duração inicial/renovação ≥ 1 ano 60 dias -> 1 ano ≩ prazo de duração inicial/renovação ≥ 6 meses; 1/3 do prazo de duração inicial/renovação-> prazo de duração inicial/renovação

do prazo ≨ 6 meses.

Caso Prático:Contrato celebrado (hoje).Duração inicial: 6 anosRenovável por períodos sucessivos de 1 ano.O Arrendatário pretende opor-se à renovação, quando pode fazê-lo?

6 anos 1 1 1 1 ano (…)

120 dias 90 dias

- No caso de oposição para o termo do prazo de duração inicial -> 120 dias (n.º 1/a))- No caso de oposição para o termo do prazo de uma das renovações -> 90 dias (n.º 1/b)).

A comunicação do arrendatário produz efeitos no final do prazo inicial do contrato ou no final do prazo de cada período de renovação.

Denúncia pelo Arrendatário (1098.º/3 a 5 CCiv)O arrendatário pode, ainda, decorrido 1/3 do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, denunciá-lo a todo o tempo, mediante comunicação ao senhorio, com a antecedência seguinte:

120 dias do termo pretendido -> prazo de duração inicial/renovação ≥ 1 ano; 60 dias do termo pretendido -> prazo de duração inicial/renovação ≨ 1 ano

Não esquecer dos dois pressupostos cumulativos: Decorrido 1/3 do prazo de duração inicial/renovação; Comunicação com a antecedência exigida nas al. a) ou b) do 1098.º/3 CCiv.

Caso Prático:Contrato celebrado (hoje).Duração inicial: 6 anosRenovável por períodos sucessivos de 1 ano.O Arrendatário pretende denunciar (para o prazo mínimo), quando pode fazê-lo?

6 anos 1 1 1 1 ano (…) 2 anos 1/3 + 120 dias (1/3 -> 4 meses) + 120 dias

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- No caso de denúncia durante o prazo de duração inicial -> 2 anos + 120 dias (n.º 3/a))- No caso de denúncia durante o prazo de uma das renovações -> 4 meses + 120 dias (n.º 3/a)).

A denúncia do contrato só produz efeitos no FINAL do mês calendar, a contar da comunicação (ex: prazo antecedência: 120 (4 meses); comunicação: 20/01/2013; Efeitos: 31/05/2013, o que resulta que o contrato, neste caso concreto, só se extingue 131 dias após a comunicação!!…)

2.2.1.3. Espécies Legais de Arrendamento Urbano para Habitação – DURAÇÃO INDETERMINADA

Quando as partes não estipulam prazo, o contrato presume-se de dois anos (com aplicação apenas aos contratos celebrados a partir de 14/11/2012).

Questão: O limite de trinta anos, estabelecido no 1025.º CCiv para a locação aplica-se também aos contratos de arrendamento de duração indeterminada?

PINTO FURTADO “a existência de tal limite destina-se essencialmente a evitar que, pela indeterminação temporal, se forme uma locação perpétua,Não haverá, pois, razão para fazer funcionar semelhante limite perante um arrendamento de duração indeterminada, quando seja passível, como no nosso Direito positivo o é, de denúncia suscitada livremente por qualquer das partes”

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Que dizer, porém, dos contratos de arrendamento celebrados ao abrigo do regime anterior?

António, arrendatário, celebrou um contrato de arrendamento de uma habitação por prazo certo, com prazo inicial de 6 anos, renovando-se automaticamente de 3 em 3 anos. O prazo inicial termina em 30/06/2013. Hoje (01/01/2013), António pretende opor-se à sua renovação. Quid Iuris?

O 1098/1 CCiv, na redacção da L 6/2006, previa que a oposição à renovação automática, por parte do arrendatário, fosse comunicada ao senhorio com a antecedência mínima de 120 dias do termo do contrato – ou seja, até 01/03/2013. Neste caso, António estaria dentro do prazo para oposição.Em 14/11/2012 foi dada nova redacção ao 1098.º CCiv, pela L 31/2012, prevendo regras diferentes para a oposição à renovação, sem, contudo, ser instituído regime transitório para contratos antigos. Assim, nos termos da nova lei, António deveria ter comunicado a oposição à renovação, 240 dias antes do termo do contrato, ou seja, em 01/11/2012, apesar da L 31/2012 nem sequer estar ainda em vigor nessa data!!!!!Por não fazer qualquer sentido e ser lesivo dos direitos do arrendatário/senhorio, entende a doutrina que, nestes casos, se aplica o regime antigo!O mesmo acontece no que diz respeito à mudança de regras referentes à habitação não permanente, antes não sujeita à renovação automática, facto que veio a ser alterado com a nova lei, onde agora se exige oposição à renovação (1096.º CCiv, comparar ambas as redações).

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Denúncia:O arrendamento com duração indeterminada admite amplamente a denúncia pelo arrendatário, obrigando apenas a uma antecedência mínima de 120 ou mesmo 60 dias se o contrato tiver até um ano de duração efectiva (1100.º CCiv).Com relação à faculdade de denúncia do senhorio existem alguns limites.

Vejamos,

Denúncia pelo arrendatário (1100.º CCiv):O 1100.º CCiv prevê para o arrendatário uma denúncia ad nutum (sem justificação).Exige-se apenas uma comunicação ao senhorio com antecedência não inferior a:

120 dias -> quando o contrato tenha a duração efectiva superior a 1 ano; 60 dias -> quando o contrato tenha a duração efectiva de 6 meses a 1 ano; 30 dias -> quando o senhorio impeça a sua renovação automática,

independentemente da sua duração efectiva.

A comunicação ao senhorio deve ser feita por carta registada com aviso de recepção (9.º/1 NRAU).Se estivermos perante a casa de morada de família, a denúncia carece do consentimento de ambos os cônjuges (1682.º-B/a) CCiv), sendo a comunicação subscrita por ambos (12.º/3 NRAU).A denúncia produz efeitos no final de um mês correspondente do calendário gregoriano, a contar da comunicação (1100.º/3 CCiv).Caso não seja respeitado o prazo de pré-aviso, o contrato cessa, mas o arrendatário terá de pagar as rendas correspondentes ao período do pré-aviso (1100.º/4; 1098.º/6 CCiv).

Denúncia pelo senhorio – c/ fundamento: para habitação do senhorio ou dos seus descendentes de 1.º grau (1101/a) CCiv):

→ Pagamento ao arrendatário do equivalente a um ano de renda (1102.º/1 proémio CCiv), no momento da entrega do locado (1103.º/8 CCiv);

→ Ser o senhorio proprietário/comproprietário/usufrutuário do prédio há mais de 2 anos, salvo se tiver adquirido por sucessão (1102.º/1/a) CCiv);

→ Não ter, há mais de 1 ano, na área dos concelhos de Lisboa/Porto ou limítrofes ou na respectiva localidade (quanto ao resto do país), casa própria ou arrendada que satisfaça as suas necessidades de habitação própria ou dos seus descendentes em 1.º grau (1102.º/1/b) CCiv);

→ O contrato tenha tido a duração efectiva de pelo menos dois anos (1103.º/10 CCiv);→ O senhorio terá de dar ao local a utilização invocada no prazo de 3 meses e por um

período mínimo de 2 anos, salvo por motivo que não lhe seja imputável (1103.º/5 CCiv). A violação desta obrigação obriga o senhorio a pagar ao arrendatário uma indemnização correspondente a 10 anos de renda (1103.º/9 CCiv).

Denúncia pelo senhorio – c/ fundamento: para demolição ou realização de obras de remodelação ou restauro profundos:

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→ A denúncia com algum destes fundamentos é objecto de legislação especial (1103.º/11 -> 6.º ss. do RJOPA – Regime Jurídico das Obras em Prédios Arrendados)

1.º Fundamento: Denúncia com fundamento em remodelação ou restauro profundos:A denúncia com base num destes fundamentos obtém-se mediante acordo das partes entre duas alternativas:

1.ª Opção: Pagamento de uma indemnização correspondente a um ano de renda (1103.º/6/a) CCiv; 6.º/1/a) RJOPA);

OU2.ª Opção: Garantir o realojamento do arrendatário no mesmo concelho, em condições análogas às que já detinha (quer quanto ao local, quer quanto ao valor da renda e encargos) (1103.º/6/b) CCiv; 6.º/1/b), 3 a 5 RJOPA)

Na falta de acordo, no prazo de 30 dias após comunicação, prevalece a primeira opção, a título supletivo (1103.º/4 CCiv; 6.º/2 RJOPA).

2.º Fundamento : Denúncia com fundamento em demolição do imóvel (7.º/1 RJOPA) Neste caso aplicam-se, tal como no fundamento anterior, uma das opções acima, definida por acordo das partes ou a primeira opção (supletivamente), no caso de não haver acordo.No entanto, o senhorio não estará obrigado a qualquer das opções no caso de:

A demolição ser ordenada nos termos do 89.º/3 e 57.º RJUE – Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (7.º/2/a) RJOPA);

Ser necessária por força da degradação do prédio , a atestar pelo município (7.º/2/b) RJOPA);

Decorrer de plano de pormenor de reabilitação urbana (7.º/2/c) RJOPA)

A denúncia com os fundamentos do 1101.º/b) CCiv é feita mediante:

-> Comunicação ao arrendatário com a antecedência não inferior a 6 meses sobre a data pretendida para desocupação (é suficiente escrito assinado pelo declarante, remetido em carta regista com aviso de recepção – 9.º/1 NRAU);-> Devendo constar da comunicação de forma expressa o fundamento da denúncia;-> A comunicação, sob pena de ineficácia, deverá ser acompanhada da demostração de que irá ser efectivamente realizada a operação urbanística (1103.º/2/a) e b), 3; 8.º/2/a) e b), 3, 7; 24.º/2 RJOPA).

Denúncia pelo senhorio – s/ fundamento:O senhorio pode ainda denunciar o contrato mediante comunicação ao arrendatário com antecedência não inferior a 2 anos sobre a data em que pretenda a cessação (1101.º/c) CCiv).

2.3. O Contrato de Arrendamento – CARACTERÍSTICAS

Antes de mais, vamos fazer uma revisão à matéria de Teoria Geral do Direito Civil, no que toca à classificação dos negócios jurídicos,

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Os negócios jurídicos classificam-se em consensuais e formais, sob o critério classificativo da sua forma.São consensuais aquele para cuja celebração é suficiente o consenso das partes, não sendo necessária uma forma especial de expressão da declaração negocial ou de documentação do negócio, nem a prática de uma especial formalidade como a entrega, real ou simbólica, da coisa que é objecto de negócio (219.º CCiv).São formais os negócios para cuja celebração ou titulação a lei exija uma forma especial. A violação das exigências legais de forma acarreta a nulidade do negócio (220.º CCiv).

Os negócios podem ser classificados em obrigacionais ou reais.São classificados como obrigacionais os negócios jurídicos dos quais resulte a vinculação das partes, ou de alguma delas, à execução de prestações, ié, a comportamentos devidos (ex: mandato; comodato; arrendamento).Negócios jurídicos reais são, por outro lado, os que têm efeitos de direitos reais – eficácia real – e, por outro, os que se materializam com a entrega da coisa que constitui o seu objecto.Os primeiros, aqueles que têm eficácia real constituem uma subclasse: a dos negócios jurídicos reais quoad effectum (ex: compra e venda – opera com a transmissão da propriedade em consequência da simples celebração do contrato, e ainda que não haja entrega da coisa vendida). Os segundos, aqueles contratos que se fecham sem que ocorra a entrega da coisa, constituem a subclasse dos negócios jurídicos reais quoad constitutionem (ex: mútuo e o depósito típicos).

A classificação dos negócios jurídicos em sinalagmáticos ou não sinalagmáticos tem como critério a existência no conteúdo do negócio de um especial vínculo entre as prestações e contraprestações das partes, entre as atribuições patrimoniais implicadas pelo negócio, vínculo este designado sinalagma.No caso dos negócios sinalagmáticos a prestação ou a atribuição patrimonial de uma das partes constitui a razão de ser e o fundamento jurídico da sua contraprestação ou da atribuição patrimonial correspectiva, em termos tais que a falta de uma tem como consequência que a outra não seja exigível ou seja restituída.

Os contratos onerosos, subclassificam-se em comutativos, aleatórios e parciários, assentando no critério do modo de ser da contrapartida que é própria da onerosidade.Nos negócios comutativos a onerosidade é, em princípio, perfeita. Quer dizer que à atribuição patrimonial de uma das partes corresponde uma atribuição patrimonial da outra parte de valor, pelo menos, equivalente (ex: compra e venda) (237.º/2.ª parte CCiv).Nos negócios aleatórios existe, no próprio tipo de negócio ou como sua característica essencial, uma álea, ié, um risco que dá ao negócio o seu sentido jurídico. Os negócios aleatórios são negócios de risco. Aos decidirem da sua celebração, as partes assumem voluntária e conscientemente o risco da eventualidade do desequilíbrio patrimonial (ex: jogo e aposta; contratos de seguro).Os negócios parciários são aqueles que se caracterizam pela participação de uma ou de ambas as partes no resultado de um acto ou de uma actividade económica. Nestes negócios, a atribuição patrimonial de uma ou de mais partes traduz-se numa participação, que muitas vezes é uma percentagem, do resultado económico da operação económica subjacente. Esta

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participação é usualmente proporcional ao valor da entrada ou da actividade da parte, mas não tem necessariamente de o ser (ex: parceria; associação em participação, a comandita e a própria sociedade).

In Teoria Geral do Direito Civil, de PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, pág. 441 a 450

Agora sim, vamos analisar as características do contrato de arrendamento:

1- Contrato nominado e típico: Possui denominação (nomem iuris) e regime regulado pela lei (1022.º e ss; 1064.º e ss. CCiv);

2- Contrato consensual: O contrato de arrendamento não exige, para seu acabamento, que haja entrega do bem arrendado. Não é pois um contrato real quoad constitutionem. Como salienta expressamente o 1022.º CCiv, este, completa-se com a estipulação da simples obrigação de proporcionar o seu gozo ao arrendatário.É, portanto, um contrato consensual (fica perfeito, completo ou acabado no próprio momento em que se exprime o consenso).

3- Contrato formal: Forma escrita (1069.º CCiv); Não cumprindo a forma o contrato é nulo (220.º; 289.º CCiv).O contrato sob forma escrita é pressuposto necessário para se recorrer ao procedimento especial de despejo, previsto no 15.º L 6/2006.

4- Contrato obrigacional: O contrato de arrendamento não transfere, por si, um direito real de gozo para o arrendatário, nem um simples gozo de natureza obrigacional, mas, antes, a obrigação de o senhorio proporcionar ao arrendatário o gozo do prédio arrendado e de, para o efeito, lhe fazer a respectiva entrega, a qual representa já a execução do contrato, e não um elemento constitutivo deste.Não é, por conseguinte, real quoad effectum, mas um contrato obrigacional.Com efeito, na falta de entrega, não poderá o arrendatário utilizar os meios possessórios (1037.º/2 CCiv), contra o senhorio, visto o contrato ser obrigacional e não conferir, por si, a equivalência da posse do objecto do arrendamento.

Assim, o arrendamento é um direito pessoal de gozo, contraposto a uma obrigação positiva do senhorio (1031.º/b) CCiv), resultando em que:

a) O senhorio tem a obrigação de assegurar o gozo da coisa (1032.º; 798.º CCiv);b) O senhorio pode constituir validamente o contrato, mesmo não sendo proprietário da

coisa locada, apenas respondendo por incumprimento se não conseguir proporcionar o gozo da coisa ao arrendatário (1034.º CCiv);

c) O direito do arrendatário é tutelável através de acção de cumprimento (817.º CCiv).

5- Contrato oneroso: Implica sacrifícios de ambas as partes (o senhorio abdica do gozo da coisa; o arrendatário paga o correspondente preço locativo);

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6- Contrato sinalagmático: Ambos os contraentes estão sujeitos a obrigações recíprocas (o senhorio de proporcionar o gozo da coisa -1031.º/b); o arrendatário de pagar a renda – 1038.º/a) CCiv). É um contrato bilateral.Há um nexo de interdependência entre as prestações das partes (“toma-lá-dá-cá” cf. MANUEL DE ANDRADE).

Da qualificação do arrendamento como contrato sinalagmático, resulta a aplicação de vários institutos jurídicos:

a) Excepção de não cumprimento (428.º ss.; 1040.º CCiv) – podendo o locatário efectuar a redução da renda proporcional à privação ou diminuição do gozo da coisa;

b) Resolução por incumprimento (801.º/2; 1083.º ss. CCiv). A resolução não tem eficácia retroactiva uma vez que o arrendamento constitui contrato de execução duradoura (434.º/2 CCiv);

c) Caducidade por impossibilidade não culposa de uma das prestações (795.º/1 – ex: 1051.º/e) a g) CCiv).

7- Contrato comutativo: As prestações (concessão de gozo vs. pagamento do preço) de ambas as partes são certas e não aleatórias.

8- Contrato de execução duradoura: As prestações de qualquer das partes aparecem relacionadas com um certo período de tempo que delimita o seu conteúdo e extensão (sobre as Modalidades das Prestações, remeto para a sebenta facultada pela Professora de Obrigações I – pág. 11 e ss. – Dr.ª Cátia Cebola)A prestação do senhorio (proporcionar o gozo da coisa) é uma prestação contínua (não sofre qualquer interrupção, antes, é exercida de forma constante).A prestação do arrendatário (pagar a renda) é uma prestação periódica (não é executada ininterruptamente, mas renova-se em sucessivos períodos de tempo).O facto de o contrato de arrendamento ser de execução duradoura implica que:

a) Se aplique o instituto de denúncia do contrato, sempre que este seja celebrado com duração indeterminada (1099.º ss. CCiv);

b) Exista um regime especial de resolução, sem eficácia retroactiva (434.º/2 CCiv) e, quando exercida pelo senhorio, esteja sujeita a fundamentos mais restritos, em ordem a tutelar a parte mais fraca – o arrendatário (1083.º/2 CCiv).

Caso Pratico: A e mulher são proprietários de uma fracção autónoma do prédio X, sito na Estrada N1, concelho de Pombal. A e mulher declararam arrendar a C a referida fracção (denominada "unidade habitacional), incluindo todo o seu mobiliário, com início em 1 de Dezembro de 2012 e mediante a retribuição mensal global de 400 euros.

1) Tendo em conta os factos enunciados pronuncie-se sobre a qualificação do contrato. Justifique a sua resposta. -> Definição de contrato locação (1022.º CCiv);-> Espécies de locação: arrendamento e aluguer (1023.º CCiv);

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-> Definição de contrato misto-> Presunção do 1065.º CCiv – o arrendamento sobrelevará ao aluguer, considerando-se arrendamento de prédio urbano todo o contrato.

2) O contrato de arrendamento foi celebrado oralmente. Quid Juris?-> Forma escrita (1069.º CCiv)-> Nulidade (220.º e 289.º CCiv) – as partes devem ser restituídas à forma anterior.

3) Imagine que o contrato foi celebrado e que as partes nada dizem sobre o prazo de duração do contrato. Entretanto a 1 de Setembro de 2014, C pretende opor-se à renovação do contrato. Pode fazê-lo? Se a resposta for afirmativa, qual a forma para o fazer?-> Prazo certo (1094.º/3 CCiv);-> No silêncio das partes considera-se celebrado por 2 anos, renovável por períodos de igual duração (1096.º/1 CCiv).-> Oposição à renovação pelo arrendatário (C) – 1098.º/1/b) – 90 dias;-> Comunicação – 9.º/1, 6 NRAU.

4) Suponha que, para além de C, passaram a residir no locado Eneida e Francisca, primas de C e foram também viver com eles Maria, Joana, Luísa e Sónia, tendo sido estipulado pelo arrendatário, como contrapartida, o pagamento de uma retribuição. Quid iuris?-> Vivem em economia comum (1093.º/1/a) e 2 CCiv);-> Máximo de 3 Hóspedes (1093.º/1/b) CCiv);-> Resolução do contrato (1083.º/2/c); 1047.º CCiv);-> Prescrição do direito de resolução do contrato – 1 ano (1085.º/1 CCiv);-> Procedimento (15.º/2/e) NRAU).

5) Imagine que C residia sozinho, a solidão incomodava-o e o tempo livre era muito. Decidiu prestar serviços de engomagem para fora. Todavia, a situação em causa veio a demonstrar-se demasiado trabalhosa para C. Em consequência, contratou uma pessoa para o ajudar nos serviços domésticos, ficando contratualmente estipulado que a mesma, para além do montante salarial pago em dinheiro, teria direito a residir no local. Quid Juris?-> Limite de 3 pessoas – Pequena Indústria Doméstica (1092.º/2 CCiv);-> União de contratos (Contrato de Prestação de Serviços + Contrato de Hospedagem) – são dois contratos autónomos, mas na dependência um do outro, não sobrevivendo um sem o outro, se um findar o outro também finda (e aqui estão três formas diferentes de dizermos a mesmíssima coisa….)

2.4. O Contrato de Arrendamento – A Promessa de ArrendamentoA susceptibilidade de as partes, em vez de celebrarem imediatamente o contrato final, começarem por se vincular tão-somente à celebração de contrato futuro, é amplamente reconhecida, em geral, na nossa ordem jurídica (410.º ss. CCiv).

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A Promessa pode formar um: Negócio jurídico unilateral, pelo qual certa pessoa se obriga, solitariamente, à

prestação de um contrato futuro (457.º CCiv); Contrato (Contrato-Promessa), podendo este ser:

o Bilateral, em que as duas partes se vinculam à celebração do futuro contrato;o Unilateral, em que só uma das partes se vincula (411.º CCiv).

Forma:O contrato de promessa de arrendamento deverá constar de documento particular assinado, uma vez que para o contrato de arrendamento é exigida a forma escrita (cjg. 1069.º e 410.º/2 CCiv).

Prazo:O contrato-promessa não tem de conter cláusula a estabelecer o prazo em que será celebrado o contrato prometido. Assim, se o contrato for:

Unilateral (411.º CCiv): o “tribunal” poderá fixar à outra parte um prazo para o exercício do direito, a requerimento do promitente;

Bilateral (777.º CCiv): qualquer dos contraentes poderá, em qualquer altura, exigir do outro o cumprimento.

Contrato bilateral assinado só por um dos contraentes:Neste caso, dever-se-á recorrer ao mecanismo da redução e admitir que o negócio será válido como promessa unilateral, salvo se se mostrar que não teria sido concluído sem a parte viciada (292.º CCiv; 410.º/2; 411.º CCiv).

Incumprimento do contratoExiste incumprimento definitivo quando a prestação se tornou impossível ou deixou de ter interesse para a parte não faltosa e incumprimento temporário quando existe apenas uma demora ou atraso. No caso de incumprimento definitivo, sobressaiam três direitos ao não faltoso:

Indemnização; Resolução do contrato; Direito à execução específica.

Direito à execução específicaO beneficiário de uma promessa de contrato, não cumprida, pode, na falta de convenção contrária, obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial do faltoso, desde que a tal não se oponha a natureza da obrigação (830.º/1 CCiv).

O direito à execução específica poderá ser afastado nos termos do 830.º/1 e 2 CCiv), ou seja, quando:

Houver convenção em contrário; Tiver sido fixado sinal; Tiver sido estipulada cláusula penal

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Questão: Para a execução específica, bastará que conste do documento escrito a assinatura do contraente remisso, ou deverá figurar ainda a assinatura do seu cônjuge, quando a intervenção deste seja necessária para assegurar a legitimidade negocial do contrato definitivo?

STJ -> considerou a execução inadmissível, se o não interveniente se recusar à celebração do contrato definitivo, tendo apenas cabimento a indemnização por incumprimento da promessa (Supremo 28-6-1984 - BMJ n.º 338, p. 409; Supremo, 21-3-1985 - BMJ n.º 345, p. 408; Supremo, 31-10-1985 – BMJ n.º 350, p. 336).Admitindo, porém,Que, para a hipótese de falecimento do signatário da promessa, se admite expressamente a execução específica, não obstante a falta de subscrição da promessa do cônjuge supérstite (Supremo 7-10-1993 – Ver. Leg. Jurs. 126.º, p. 296) – “…se o casamento se dissolveu, cessam, cf. disposto no 1688 CC, as relações patrimoniais a que o casamento deu origem, e já não há que aplicar a regra do 1682-A CPC, tornando-se admissível a execução específica”

PINTO FURTADO -> não subscreve este entendimento, assim, entende que:Para a validade do contrato-promessa sem eficácia real, é suficiente a sua celebração por apenas um dos cônjuges, pois ele não implica, em si, a alienação, oneração, arrendamento, ou constituição de outros direitos pessoais de gozo sobre imóveis que exijam dupla intervenção conjugal (1682 e 1682-A CCiv). Isto porque, mais do que uma obrigação de alienar, onerar ou arrendar, tal contrato, envolve, por sua natureza, uma obrigação de contratar.Acresce que, o efeito jurídico da execução específica, não é executar uma obrigação, mas emitir um como-que-contrato-prometido. Assim, o tribunal não estaria a impor a cônjuge não subscritor o cumprimento de uma obrigação que ele não assumiu, mas apenas a emitir um sucedâneo do contrato prometido, com a vinculação de um só dos cônjuges, permitindo, ao cônjuge não subscritor o direito de impugnação que este teria, se em vez da promessa, se tivesse logo subscrito, solitariamente, o contrato definitivo.Não se entende que por se extinguir o estatuto familiar, se exclua o direito à impugnação, uma vez que se a obrigação de contratar constituída pela promessa, transmitida aos herdeiros, fê-lo nos estritos termos em que foi subscrita. A extinção do estatuto familiar, produzida pela dissolução, só opera para o futuro e não, relativamente a uma obrigação herdada, que a sentença de execução específica se limita a projectar para o como-que-contrato prometido.

Posto isto,Diz, ainda, PINTO FURTADO que compreender-se-ia que o tribunal se recusasse a decretar a execução específica se o contrato definitivo resultante fosse nulo. O que, porém, de modo algum pode conceber-se é que se considere inadmissível a execução específica em virtude de o contrato definitivo, que de tal execução resultaria, estar sujeito a uma eventual impugnação do cônjuge do promitente faltoso, pois isso, implicaria, necessariamente, um conhecimento oficioso da anulabilidade, proibido por lei (287.º CCiv).O que pode admitir-se é que, tendo o cônjuge do faltoso sido chamado à execução específica, imediatamente proteste que arguirá a anulabilidade, nesse caso faz sentido o tribunal pôr termos ao processo, sob pena de praticar acto inútil.

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TransmissãoNo tocante à transmissão das posições negociais dos promitentes rege o 412.º CCiv. Assim:

A transmissão entre vivos : Sujeita-se às regras gerais (n.º 2);

A transmissão mortis causa:Aplica-se o disposto no n.º 1, ié, os direitos e obrigações transmitem-se aos sucessores das partes, excepto se forem exclusivamente pessoais. Assim, no caso de:

1.ª Situação: Falecimento do Senhorio: A posição do de cujus é transmissível aos seus sucessores, tendo estes de cumprir a promessa daquele, não fincando também arrendatário desvinculado perante do falecimento do de cujus.

2.ª Situação: Falecimento do Arrendatário: Esta situação é controvertida, assim:

1.ª Posição: PEREIRA COELHO: O arrendamento para habitação -> o promitente senhorio deixa de estar obrigado

a realizar o contrato prometido, pois não poderá nesse tipo de arrendamento, invocar-se a analogia do 1106.º CCiv;

O arrendamento para fim comercial, industrial ou exercício de profissão liberal -> a transmissibilidade impor-se-á face ao disposto no 1113.º CCiv e os herdeiros do promitente arrendatário poderão exigir ao promitente senhorio a outorga do contrato

Em qualquer dos tipos de arrendamento, os sucessores do promitente arrendatário não ficarão vinculados à promessa.

2.ª Posição: PINTO FURTADO: Especificamente para a promessa, não se vislumbra, na prática, um só caso em

que os direitos e obrigações do promitente arrendatário não sejam exclusivamente pessoais (412.º/1 CCiv);

Assim, sendo de natureza pessoal, a posição do arrendatário é intransmissível, não podendo exigir-se a celebração do contrato prometido, nem ao promitente senhorio nem ao sucessor do promitente arrendatário.

2.5. O Contrato de Arrendamento – OS SUJEITOS

Os sujeitos do contrato são aqueles que nele assumem a posição de contraentes: O senhorio (aquele que presta arrendamento); O arrendatário (aquele que adquire arrendamento).

Convém, todavia, não cair no equívoco de identificar estritamente a pessoa deste com a do utente do prédio, em virtude do contrato celebrado, uma vez que não é forçoso que as posições de arrendatário e de utente do prédio coincidam.

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COMUNICABILIDADE (1068.º CCIV)

O direito de arrendatário será comunicável ao cônjuge nos termos gerais e de acordo com o regime de bens vigente, assim: Regime Comunhão Geral OU Comunhão de Adquiridos ANTERIOR ao contrato de

arrendamento -> o direito do arrendatário COMUNICA-SE ao outro cônjuge “nos termos gerais (a contrario no 1733.º ex-vi 1732.º e 1724.º/b) CCiv);

Regime de Separação OU Comunhão de Adquiridos POSTERIOR ao contrato de arrendamento -> NÃO SE COMUNICA o direito do arrendatário (1735.º e 1722.º/1/a) CCiv).Apesar se não haver lugar à comunicabilidade, casos estejamos na presença de um arrendamento para habitação, poderá haver lugar à transmissão (≠ comunicabilidade) do arrendamento, nos termos do 1105.º e 1106.º CCiv (e de que falaremos mais tarde).

CAPACIDADE(tutela os interesses do contratante)

A locação constitui para o locador um acto de administração ordinária (de importância patrimonial e risco económico negligenciáveis, correntes), sempre que for celebrada por prazo inferior a 6 anos e, a contrario, um acto de administração extraordinário (os que possam afectar seriamente o património a que reportem) quando celebrada por prazo superior a 6 anos ou com duração indeterminada (1024.º/1 CCiv). Tal disposição aplica-se ao arrendamento urbano. Assim,

Pessoas singulares:Têm capacidade para celebrar contratos de arrendamento com duração:

Até 6 anos com prazo certo (1095.º ss. e 1110.º CCiv) Todos os que podem contratar e administrar os seus bens (no caso dos incapazes –

menores, interditos e inabilitados – será o representante legal que poderá celebrar os respectivos contrato, caducando o contrato de locação com a cessação dos poderes legais de administração – 122.º ss; 138.º ss.; 152.º ss; 1051.º/c) CCiv);

O maior de 16 anos, quando o imóvel for adquirido com o produto do seu trabalho (127.º/1/a) CCiv).

Superior a 6 anos (1095.º/2 e 1110.º CCiv) ou de duração indeterminada (1099.º ss. e 1110.º CCiv) Senhorios -> uma vez que se trata de acto de administração extraordinária, só poderão

ser celebrados nessa qualidade por pessoas com capacidade para a prática desses actos;

Arrendatário -> para este, o arrendamento, ainda que superior a 6 anos ou por duração indeterminada, constitui um acto de administração ordinária.

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Pessoas colectivasQuanto às pessoas colectivas (160.º CCiv), também estas têm capacidade jurídica excepto quanto àquilo que é indissociável da pessoa singular (1051.º/d) – casos de caducidade; 1059.º/1 CCiv – transmissão da posição do locatário). Uma vez que o arrendamento para habitação é atributo próprio de pessoas singulares, não está a pessoa colectiva em condições de exercer os correspondentes direito, poderá, no entanto, fazê-lo a favor de terceiro.

Questão: Pode um representante dar de arrendamento a si próprio?Em princípio não, o representante não pode dar de arrendamento a si próprio pois o negócio consigo mesmo é anulável (261.º CCiv). Porém, existem

Excepções: Se o representado tiver especificamente consentido na celebração;

OU

Se o negócio excluir por sua natureza a possibilidade de um conflito de interesses.

Questão: Pode o representante dar de arrendamento ao seu cônjuge?Já não se aplicam as regras do negócio consigo mesmo pois está em causa o cônjuge, mas entende-se que também este negócio é anulável pois na opinião da doutrina deve aplicar-se aqui analogicamente o 281.º CCiv.

LEGITIMIDADE(tutela os interesses de terceiros)

Legitimidade para dar de arrendamento

Contratos de Arrendamento celebrados por prazo superior a 6 anos ou com duração indeterminada

Proprietário (1305.º CCiv); Usufrutuário (1444.º CCiv); Fiduciário (2290.º/1 CCiv); Procurador com poderes especiais para o acto; Arrendatário, se se encontrar autorizado a subarrendar o prédio, total ou

parcialmente (1038.º/f); 1109.º/2 e 1112.º/1 CCiv); Pais ou tutores, com autorização do tribunal (1889.º/1/m); 1938.º/1/a) CCiv).

Contratos de Arrendamento celebrados por prazo inferior a 6 meses Qualquer das pessoas com poderes para celebrar arrendamento pelo prazo

superior a 6 anos ou com duração indeterminada, acima referidos; Mandatário com poderes gerais de administração (1159.º/1 CCiv); Pais, tutores, curadores ou administradores de bens de menores interditos ou

inabilitados (a contrario 1889.º/m); 1935.º; 1971.º; 139.º 154.º CCiv); Curadores provisórios ou definitivos do ausente (94.º e 110.º CCiv); Consignatário de rendimentos (661.º/1/b) CCiv); Cabeça-de-Casal (2079.º; 2087.º/1 CCiv); Administradores de sociedades e outras pessoas colectivas;

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+ Importantes

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Administrador da Insolvência (55.º CIRE); Depositário judicial de bens penhorados, arrolados, arrestados ou consignados em

depósito (843.º/1; 424.º/5; 406.º/2; 1024.º/2 CPC).

Casos Especiais: Compropriedade -> exige consentimento, por escrito, dos comproprietários (1024.º/2 CCiv);Cônjuges -> carece do consentimento de ambos os cônjuges:

a) O arrendamento de bens imóveis próprios ou comuns, quando o regime não é o de separação de bens (1682.º-A/1/a) CCiv);

b) o arrendamento da casa de morada de família, independentemente do regime (1682.º-A/2 CCiv).

“Casa de morada da família” -> edifício incorporado no solo, onde se estabelece a habitação própria permanente da família nuclear.

Legitimidade para tomar de arrendamento Mandatário com poderes gerais de administração (1159.º CCiv) Pais em representação do menor (“a contrario” 1889.º/h) CCiv), uma vez que este pode

denunciar o contrato uma vez atinja a maioridade; Tutor, administrador de bens ou curador, para assegurar habitação ao pupilo ou tal se

mostre necessário à administração do património deste (1938.º/1/d); 1971.º; 94.º CCiv); Qualquer dos cônjuges, sem necessidade do consentimento do outro (1690.º/1 CCiv),

ainda que depois não possa isoladamente dispor dele se o arrendamento se comunicar ao outro cônjuge (1068.º; 1682.º-B CCiv) (o pagamento das rendas é da responsabilidade de ambos os cônjuges – 1691.º/1/b) CCiv).

2.6. O Contrato de Arrendamento – OPONIBILIDADE A TERCEIROSQuando por contratos sucessivos, se constituírem, a favor de pessoas diferentes, sobre a mesma coisa, direitos pessoais de gozo incompatíveis, prevalece o direito mais antigo em data, sem prejuízo das regras próprias do registo (407.º CCiv).De acordo com o 2.º/1/m) do CRPredial apenas estão sujeitos a registo os arrendamentos cuja duração se fixe em mais de seis anos.Isto significa que, no caso de o senhorio haver arrendado o mesmo imóvel a mais do que um arrendatário, prevalecerá o direito daquele que houver registado primeiro (6.º/1 CRPredial). Mas, tal regra, só poderá ser aplicada no caso de os dois contratos terem duração superior a seis anos, caso contrário não faria sentido. Assim, se o prazo convencionado de qualquer um dos contratos ou de ambos os contratos for inferior a seis anos, impor-se-á o que haja sido celebrado primeiro.

2.7. O Contrato de Arrendamento – formaDiferentemente do que sucede com a locação em geral, que em princípio não está sujeita a forma especial (princípio da liberdade de forma – 219.º CCiv), o contrato de arrendamento urbano está sujeito a forma escrita.A falta de forma escrita determina a nulidade do contrato de arrendamento urbano (220.º CCiv). A falta de forma não pode ser suprida através de exibição de recibo de renda. No entanto, pode ocorrer uma inalegabilidade formal, o que consubstanciaria abuso de direito.

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2.8. O Contrato de Arrendamento - INVALIDADEA invalidade do contrato de arrendamento urbano, pode ocorrer sempre que: Não seja celebrado pela forma legalmente exigida (1069.º) -> nulidade (220.º CCiv); Ocorra violação dos limites legais relativos ao objecto e fim negocial (280.º; 281.º CCiv) ->

nulidade; Seja celebrado contra disposição de carácter imperativo (294.º CCiv) -> nulidade; Haja incapacidade de exercício de direitos (menoridade; inabilitação; interdição) ->

anulabilidade; Ilegitimidade negocial:

Do cônjuge -> um dos cônjuges presta arrendamento sem o consentimento do outro, quando isso lhe era exigível (“Casos Especiais”) -> anulabilidade.A anulabilidade pode ser arguida pelo cônjuge/seu herdeiro no prazo de 6 meses a contar do conhecimento (1687.º/1 e 2 CCiv).Do consorte -> quando o consorte administrador presta arrendamento sem consentimento dos outros (1024.º/2 CCiv) -> nulidade atípica, que só pode ser invocada pelos outros consortes, mas não está sujeita a prazo e é susceptível de sanação através de confirmação (288.º/1 CCiv). A jurisprudência tem entendido que nesta situação o contrato é ineficaz em relação aos outros consortes;

Dos pais/tutores -> na locação de bens por duração superior a 6 anos (1889.º/1/m) e 1938.º/1/a) CCiv) -> anulabilidade (1893.º/1; 1940.º CCiv);

Padeça de vício de vontade (culpa na formação; erro sobre os motivos; simulação (…) (240.º ss. CCiv)

Verificada uma situação de invalidade, terá as seguintes consequências:Para o senhorio: Deixa de ser obrigado a assegurar o gozo do imóvel; Perde o direito a receber a renda (devendo restituir aquelas que haja recebido).Para o arrendatário: Deverá restituir o valor correspondente ao gozo locativo do imóvel (289.º/1 CCiv).

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A inalegabilidade formalEste tipo de abuso de direito consiste na invocação da invalidade formal de um negócio pela parte que provocou intencionalmente a ocorrência do vício de que decorre (actuação dolosa) ou que, embora não a tenha provocado participou na sua prática (actuações ingénua, confiante, oportunista e contraditória). A invocação do vício formal, nestas circunstâncias, constitui um comportamento contraditório, que frustra a expectativa da outra parte, contraria a boa-fé e é desconforme com os bons costumes.Este caso tem sido tratado em numerosas decisões judiciais que o qualificam, bem, como “venire contra factum proprium”: num primeiro tempo o agente daria azo a uma nulidade formal, prevalecendo-se do negócio (nulo) assim mantido enquanto lhe conviesse; na melhor (ou pior) altura, invocaria a nulidade, recuperando a sua liberdade. Haveria uma grosseira violação da confiança com a qual o sistema não poderia pactuar.

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As duas obrigações de restituição devem ser cumpridas simultaneamente (o que basicamente redundará em nada…), sendo aplicáveis as regras da excepção de não cumprimento do contrato (290.º CCiv).

Para obter a restituição do imóvel, o senhorio terá de intentar: Acção de invalidade e consequente restituição do imóvel (285.º CCiv);

OU Acção de reivindicação, no caso de o senhorio ser proprietário do imóvel (1311.º CCiv);

MAS JÁ NÃO Acção de despejo, uma vez que esta destina-se a fazer cessar a situação jurídica do

arrendamento (que no caso, por efeito da invalidade do contrato, inexiste) (14.º NRAU).

Caso a invalidade do arrendamento ser imputável ao senhorio, designadamente por este não ter aceite celebrar o arrendamento pela forma legalmente exigível (“A inalegabilidade formal”)

2.9. Efeitos do Contrato

2.9.1. Efeitos do Contrato - OBRIGAÇÕES DO SENHORIO

Obrigações do Senhorio - A ENTREGA

Sendo a locação o contrato pelo qual uma das partes se obriga a “proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa”, a primeira e fundamental obrigação do senhorio, no arrendamento urbano, será a de fazer a entrega do prédio arrendado ao arrendatário, habilitando-o assim a gozá-lo (1031.º/a); 1022.º CCiv).“Entrega” -> todo o acto com idoneidade para “pôr à disposição” do arrendatário o gozo da coisa arrendada.

A entrega pode ser feita por: Tradição Material -> o senhorio leva pessoalmente o arrendatário à intimidade da

casa arrendada, entregando-lhe aí as chaves de entrada. Tradição Simbólica -> o senhorio entrega as chaves da casa arrendada ao locatário. Entrega indirecta/mediata -> entrega feita por terceiro.

Tempo de entrega: Havendo prazo estipulado, cumprir-se-á esse prazo (805.º/2/a) CCiv), nada havendo sido estipulado, será aplicável o disposto no 777.º CCiv, podendo o arrendatário exigi-la a “todo o tempo”, assim como o senhorio poderá “a todo tempo” proceder à entrega.Caso haja incumprimento da obrigação de entrega, pode esta ser exigida judicialmente (817.º CCiv).

Lugar: A tradição material do imóvel, por força da natureza das coisas, deverá realizar-se no lugar onde se encontra o imóvel, salvo estipulação das partes em sentido diverso (“princípio da autonomia da vontade”).

Obrigações do Senhorio - PROPORCIONAR O GOZO (prestação positiva)Além da entrega, cabe ao senhorio a obrigação consequente de realizar as prestações necessárias ao cabal exercício desse gozo.

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A obrigação a que o locador está adstrito, não se resume a não perturbar o uso ou fruição do locatário, mas inclui prestações positivas (comportamentos activos por parte do senhorio) pontuais ou específicas para que se possa materializar o gozo da coisa pelo locatário, nos termos contratuais.Essas prestações compreendem despesas a cargo do senhorio a fim de assegurar ao arrendatário o gozo da coisa (1031.º/b) CCiv) e podem dividir-se em duas classes:

Os encargos -> despesas necessárias para o imóvel locado continuar a realizar a sua função (aquelas que decorrem do funcionamento da coisa) (ex: despesas de condomínio; encargos tributários) (1030.º e 1078.º CCiv);

As benfeitorias -> todas as despesas de conservação do imóvel, para os fins a que ele se destina e em conformidade com a legislação urbanística aplicável (1074.º/1; 1111.º/1 CCiv), salvo quando estas, por força de estipulação no contrato, corram por conta do arrendatário. Assim, embora se preveja supletivamente que é sobre o senhorio que recai o dever de realizar obras, admite-se estipulação em contrário, o que se justifica, uma vez que o valor da renda pode ser convencionado em função dessa obrigação, como acontece nos casos da cláusula de “arrendamento de imóvel no estado em que se encontra”.

Assim, o arrendatário só poderá efectuar obras no prédio se obtiver autorização escrita do senhorio ou quando o contrato o permita (n.º 2); Com EXCEPÇÃO (1036.º ex-vi 1074.º/3 CCiv) das:

o Obras urgentes que não se compadeçam com delongas do procedimento judicial, e que não tenham sido levadas a cabo pelo senhorio em tempo útil, tendo, o arrendatário, direito ao seu reembolso (1036.º/1; 1074.º/3 e 4 CCiv);

o Obras urgentíssimas (ié, quando não se compadeça com dilação alguma) e contanto avise o senhorio ao mesmo tempo, tendo, igualmente, direito ao seu reembolso (1036.º/2; 1074.º/3 e 4 CCiv);

o Obras exigidas por lei ou requeridas pelo fim do contrato, MAS SÓ para arrendamentos para fins não habitacionais (1111.º/2 CCiv)

Nos restantes casos, o arrendatário ficará, em relação a elas, por via da sua ilicitude, equiparado ao possuidor de má-fé (1046.º/1 CCiv), significando que perderá as benfeitorias voluptuárias, não as podendo sequer levantar (1275.º/2 CCiv).

Fundamento de resoluçãoNo caso de as obras estarem a cargo do senhorio, a sua não realização constitui fundamento de resolução do contrato pelo arrendatário (1083.º/1 CCiv).

Garantia contra os víciosO cumprimento do contrato de arrendamento por parte do locador impõe que se encontre a coisa locada isenta de vício que lhe não permita realizar cabalmente o fim a que se destina.

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Ocorrendo vício impeditivo da cabal realização do fim, considera-se o contrato não cumprido, se o defeito datar, pelo menos, do momento da entrega e o locador não provar que, sem culpa, o desconhecia, ou mesmo se surgir só após a entrega, mas por culpa sua (1032.º CCiv).

Excepção de não cumprimentoNão parece que, enquanto se mantiver o gozo do imóvel, o arrendatário possa utilizar a excepção de não cumprimento do contrato para se recusar a pagar a renda, em consequência da não realização das obras, apenas podendo efectuar a redução da renda na medida proporcional à privação ou diminuição do gozo (1040.º CCiv) (Ac STJ 4/4/2006, Colectânea de Jurisprudência -ASTJ 14 (2006), 2, pp. 33-42).

Obras de remodelação ou restauro profundo do prédio urbanoSempre que o estado do prédio o justifique, a lei permite ao senhorio a realização de obras de remodelação ou restauro profundo, que obrigam à desocupação do locado (4.º/1 RJOPA).A denúncia do contrato com tais fundamentos obriga a obtenção de acordo (6.º/1/proémio RJOPA) junto do arrendatário, entre:

Pagamento de indemnização correspondente a um ano de renda (6.º/1/a) RJOPA); ou, Realojamento do arrendatário por período não inferior a 2 anos em condições

análogas às que ele detinha (quer quanto ao local, quer quanto ao valor da renda e encargos) (6.º/1/b), 3 a 5 RJOPA).

Na falta de acordo, aplica-se supletivamente a primeira solução (6.º/2 RJOPA).

(tratando-se de obra realizada no âmbito do regime de reabilitação urbana, aplica-se o 73.º RJRU por força do 6.º/6 RJOPA).

Obras de demolição do prédio urbanoO senhorio pode denunciar o contrato quando pretenda efectuar a demolição do imóvel (1101.º/b) CCiv).A denúncia obriga o senhorio a indemnizar o arrendatário ou a garantir o seu realojamento (ver tópico anterior; 7.º/1 RJOPA), com excepção das demolições:

Ordenadas nos termos do 89.º/3 RJUE ou 57.º RJRU (7.º/2/a) RJOPA), excepto quando ordem de demolição resultar de acção/omissão culposa do proprietário (n.º 3);

Por força da degradação do prédio, a atestar pelo município (7.º/2/b) RJOPA), excepto quando a necessidade de demolição resultar de acção/omissão do proprietário (n.º 3);

Decorrentes do plano de pormenor de reabilitação urbana (7.º/2/c) RJOPA).

Solicitação ao Município pela intimação do senhorio à realização de obrasQuando a legislação urbanística aplicável imponha a realização de obras, esse dever recairá sobre o senhorio e não sobre o arrendatário, podendo o município intimar aquele a fazer obras, ou a proceder à sua realização coerciva (89.º RJUE). Apesar do RJOPA ter deixado de fazer referência a qualquer requerimento do arrendatário, MENEZES LEITÃO entende que não está excluída a possibilidade de o arrendatário solicitar a intimação do senhorio à realização das obras (89.º/2 RJUE). É possível, no entanto, considerar certos casos como abuso de direito por parte do arrendatário quando apresente tal requerimento em desconformidade com o convencionado com o senhorio (334.º CCiv).

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Determinação da realização de obras pelo município e outras entidadesO município/entidade gestora de operação de reabilitação urbana pode determinar a realização de obras coercivas nos prédios arrendados, caso as mesmas não sejam realizadas pelos senhorios (12.º RJOPA).A entidade promotora das obras coercivas pode (91.º e 107.º RJUE):

Proceder ao despejo administrativo; Ocupar o prédio (total ou parcialmente); Até ao período de um ano após a data da conclusão das obras (13.º RJOPA).

Para tal, deverá: Assegurar os realojamento dos arrendatários existentes em condições idênticas

quanto (15.º/1 e 6.º/3 a 5 RJOPA):o Ao local;o Ao valor da renda;o Aos encargos.

A obrigação do pagamento da renda pelo arrendatário mantém-se, devendo este passar a depositá-la (15.º/2 RJOPA; 17.º ss. NRAU).

Arrendamento não habitacional -> a entidade promotora pode limitar-se a indemnizar o arrendatário pelo valor de um ano de renda, caso (15.º/3 e 6.º/1 RJOPA):

Não seja possível o seu realojamento Este não concorde com as condições oferecidas

Para proceder às obras, a entidade promotora deve elaborar previamente um orçamento, que envia ao senhorio por escrito, o qual representa o valor máximo pelo qual este será responsável (14.º RJOPA).

Antes da concretização do despejo administrativo, o arrendatário deve ser notificado com antecedência não inferior a 30 dias (16.º; 19.º RJOPA; 17.º NRAU) por:

Carta registada; Edital na porta da casa; Afixação na sede da junta de freguesia.

No caso de serem encontrados bens no local, aquando da sua ocupação, proceder-se-á ao seu arrolamento (21.º RJOPA).Depois de concluídas as obras, o arrendatário deve ser notificado para reocupar o local no prazo de 3 meses, salvo justo impedimento. Caso não reocupe o locado o contrato caduca (17.º RJOPA).

A entidade promotora recupera os gastos realizados nas obras recebendo os depósitos de renda que o arrendatário é obrigado a efectuar (19.º/1 e 18.º RJOPA), não podendo ultrapassar o limite do orçamento enviado ao senhorio (14.º RJOPA).Caso o senhorio demonstre que as rendas são indispensáveis para o sustento do seu agregado familiar/sustentabilidade económica da pessoa colectiva, pode ser-lhe atribuído 50% dos depósitos (18.º/2 RJOPA).

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Quando a entidade promotora se encontrar integralmente ressarcida, notifica o arrendatário no prazo de 10 dias, da cessação do dever de depositar a renda (19.º/2 RJOPA).

Caso existam fogos devolutos (não arrendados) no prédio reabilitado, o município pode arrendá-los (por concurso público, por prazo de 2 anos renováveis), a fim de ser reembolsado das obras realizadas (20.º/1 e 2 RJOPA; 1096.º CCiv). A renda a praticar corresponde a 1/15 do valor do locado, avaliado nos termos do CIMI (35.º/2/a) e b) NRAU; 20.º/3 RJOPA).

Entende-se por:RABC – Rendimento Anual Bruto Corrigido (a correcção é feita nos termos do DL 266-C/2012)RMNA – Retribuição Mínima Nacional Anual (vulgo, salário mínimo)

Obrigações do Senhorio - NÃO IMPEDIR O GOZO (prestação negativa)Além da obrigação positiva de manutenção do gozo da coisa, acresce uma obrigação negativa: a de não praticar actos impeditivos desse gozo ou susceptíveis de o diminuírem ou afectarem.Esta é uma obrigação de carácter imperativa (1037.º/1 CCiv), uma vez que prevalece sobre a própria convenção em contrário, cedendo apenas nos casos previstos na lei, pelos usos ou pelo consentimento pontual do locatário.

Obrigações do Senhorio - A COMPENSAÇÃO/INDEMNIZAÇÃOCertos factos durante o cumprimento do contrato ou por causa da sua cessação impõem ao senhorio uma obrigação de:

Compensação:o Por reparações e outras despesas urgentes (1036.º/1 e 1074.º/3 e 4 CCiv);o Por reparações urgentíssimas (1036.º/2 e 1074.º/3 e 4 CCiv);o Por obras do arrendatário, mediante autorização escrita do senhorio (1074.º/5; 1273.º e

1275.º CCiv), nos termos aplicáveis às benfeitorias realizadas por possuidor de boa-fé, ou seja: Terá direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias (as que têm por fim

evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa); Terá direito a levantar as benfeitorias úteis (as que, não sendo indispensáveis à

conservação da coisa, lhe aumentam, todavia, o valor) e as benfeitorias voluptuárias (as que, não sendo indispensáveis à conservação nem aumentando o valor da coisa, servem apenas para recreio do benfeitorizante), contanto o possa fazer sem detrimento do prédio ou fracção arrendada;

Indemnização:o Por denúncia justificada dos contratos de duração indeterminada, com o fundamento em

necessidade de habitação própria ou dos seus descendentes em 1.º grau -> indemnização correspondente a 1 ano de renda (1101.º/a) CCiv);

o Por denúncia justificada dos contratos de duração indeterminada, com fundamento em demolição ou realização de obras de remodelação ou restauro profundos (1101.ºb) e 1 CCiv), com as seguintes opções alternativas:

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Indemnização correspondente a 1 ano de renda; OU Garantir o realojamento do arrendatário em condições análogas às que este já

detinha.

Obrigações do Senhorio – OBRIGAÇÃO DE PREFERÊNCIAO senhorio deve dar preferência ao arrendatário na:

Compra e venda ou dação em cumprimento do prédio arrendado há mais de 3 anos (1091.º/1/a) CCiv);

Celebração de novo contrato de arrendamento, em caso de caducidade do seu contrato do arrendatário (1091.º/1/b) CCiv), mantendo-se a obrigação de preferência enquanto não for exigível a restituição do prédio (1091.º/2; 1053.º CCiv).

O direito de preferência do arrendatário é graduado imediatamente acima do direito de preferência conferido ao proprietário solo e sujeito ao regime geral dos art.ºs 416.º a 418.º; 1410.º CCiv (1091.º/3 e 4 CCiv).

2.9.2. Efeitos do Contrato - Obrigações do ArrendatárioAnalisadas as obrigações legais do senhorio, cabe agora passar àquelas em que fica constituído o arrendatário.

Obrigações do Arrendatário – PAGAMENTO DA RENDANo 1038.º/a) CCiv exprime-se como a primeira das obrigações do locatário a de “pagar a renda ou o aluguer”.Diz-se renda, em tema de arrendamento, a prestação patrimonial, em dinheiro, espécie ou constituindo uma quota de frutos, periódica ou única, a que se obriga o arrendatário em contrapartida do gozo do imóvel.

No arrendamento urbano, estabeleceu-se que a renda corresponde a uma prestação pecuniária periódica (1075.º/1; 550.º a 558.º CCiv).

A disciplina desta obrigação do locatário encontra-se nos art.ºs 1039.º a 1042.º CCiv e, especificamente para o arrendamento urbano, nos 1075.º a 1077.º CCiv.

Momento/tempoO momento do pagamento da renda é disciplinado pelo 1039.º CCiv, complementando-se pelo 1075.º/2 CCiv.Para o arrendamento urbano e salvo disposição em contrário, se as rendas tiverem sido estipuladas em correspondência com os meses do calendário gregoriano, a primeira vencer-se-á no momento da celebração do contrato e cada uma das restantes no primeiro dia útil do mês imediatamente a anterior àquele a que diga respeito (1075.º/2 CCiv).Esta regra é supletiva, podendo estipular-se uma antecipação superior, mas nunca superior a 3 meses (1076.º/1 CCiv).Não correspondendo as rendas com os meses do calendário gregoriano, aplicar-se-á o disposto no 1039.º/1 CCiv, devendo a renda ser paga no último dia do período a que respeita.É legítima a correspondência convencional das rendas a períodos diferentes do mês (rendas semanais, bimensais, trimestrais, semestrais e anuais), aplicando-se, na falta de cláusula acerca do vencimento, a regra do 1039.º CCiv.

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LugarNão havendo estipulação ou usos em contrário, deve ser feito no domicílio do arrendatário, presumindo-se que, caso não seja efectuado o pagamento da renda, tal se deveu ao facto de o senhorio não ter ido nem ter mandado receber a prestação no dia do vencimento (1039.º/2 CCiv).

A moraPara a mora no pagamento da renda é aplicável a disciplina geral da locação, contida nos art.ºs 1041.º e 1042.º CCiv.A mora constitui fundamento de resolução do contrato, pelo senhorio, podendo o arrendatário fazer cessar a mora, realizando o pagamento da renda vencida dentro dos oito dias subsequentes ao vencimento (1041.º/2; 297.º e 279.º/d) CCiv).Caso o atraso do arrendatário exceda os oito dias subsequentes ao vencimento, o senhorio tem o direito de exigir, além do valor correspondente à renda ajustada, uma indemnização equivalente a 50% do que for devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento (1041.º/1 CCiv).Recusando-se o senhorio a receber a renda, o arrendatário poderá consignar em depósito a renda não recebida (813.º; 841.º; 842.º 1042.º/2 CCiv e 17.º ss. NRAU ), devendo comunicar ao senhorio por escrito assinado pelo declarante, e remetido por carta registada com aviso de recepção (19.º/1 e 9.º/1 NRAU) (produz o efeito da comunicação, a junção do(s) duplicado(s) do(s) depósito(s) à contestação em processo judicial instaurado pelo senhorio, por falta de pagamento de rendas - 19.º/2 NRAU).No entanto, pretendendo o senhorio cobrar as rendas em dívida, não necessita interpor acção judicial, dado que a lei (até ver…) considera título executivo o próprio contrato de arrendamento quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante da dívida (14.º-A NRAU).A consignação em depósito não é uma obrigação do arrendatário (841.º/2 CCiv)

Cláusula penal moratóriaÉ possível estabelecer uma cláusula penal moratória no contrato de arrendamento, tal faculdade assenta no “princípio da liberdade contratual” e aplicação “a contrario” do Regime da Locação.

Resolução de contrato com base na falta de pagamento da rendaA resolução do contrato com base na falta de pagamento da renda, pode ocorrer quando: A mora do arrendatário for igual ou superior a dois meses (1083.º/3 CCiv), bastando

comunicação do senhorio (9.º/7 NRAU; 1084.º/2 CCiv), pode, no entanto o arrendatário por fim à mora no prazo de 1 mês (1084.º/3 CCiv), faculdade que só pode exercer uma vez com referência a cada contrato (n.º 4);Se, no entanto, o arrendatário proceder ao depósito das rendas e o senhorio decidir impugnar tal depósito, terá de instaurar acção de despejo (21.º/2 NRAU).

O arrendatário se constitua em mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses, com referência a cada contrato (1083.º/4 CCiv). Nesta situação, a lei já não concede ao arrendatário a possibilidade de sanar a situação (n.º 4 in fine).

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Fixação da rendaA renda não tem que estar determinada, no momento da celebração do contrato, bastando que seja determinável, sendo aplicável a essa determinação os critérios do 883.º ex-vi 939.º CCiv (a questão é controvertida -> a favor: MENEZES LEITÃO; PINTO LOUREIRO; JANUÁRIO GOMES / contra: GALVÃO TELLES).

Uma vez fixada a renda, o seu montante pode ser objecto de alteração, pela: Actualização da renda por estipulação das partes (1077.º/1 CCiv), sendo admissível a

convenção de rendas escalonadas (incremento no valor da renda ao longo da vigência do contrato – ex: 1.º ano: € 200; 2.º ano: € 300; 3.º ano: € 400...);

Actualização anual da renda, de acordo com os coeficientes de actualização vigentes (1077.º/2 CCiv e 24.º NRAU), podendo a primeira actualização ser exigida após um ano de vigência do contrato e as seguintes sucessivamente, um ano após a actualização anterior (1077.º/2/b) CCiv). A renda apurada é arredondada para a unidade de cêntimo imediatamente superior (25.º/1 e 2 NRAU).

Para efeitos de actualização o senhorio deve comunicar, por escrito e com a antecedência mínima de 30 dias, o coeficiente de actualização e a nova renda dele resultante (1077.º/2/c) CCiv; 9.º ss NRAU).

Garantias do pagamento da rendaAs partes podem caucionar, por qualquer das formas legalmente previstas (sobre garantias gerais e especiais ver Sebenta de Obrigações II da Prof. Dr.ª Cátia Cebola – pág. 49 ss.; Fianças – pág. 62 ss.), o cumprimento das obrigações respectivas (1076.º/2; 624.º/1 CCiv).A obrigação de pagamento da renda pode assim, nos termos gerais, ser objecto de qualquer garantia que as partes venham a estipular para a hipótese de incumprimento do arrendatário.A forma mais comum de garantia de pagamento das obrigações do arrendatário é a fiança, com renúncia do fiador ao benefício da excussão prévia (ié, o fiador não se pode opor à execução dos seus bens para pagamento da dívida afiançada ainda que não estejam esgotados os bens do devedor susceptíveis de penhora….portanto, há que pensar duas vezes antes de…).A fiança prestada mantém-se durante todo o período de vigência do arrendamento, incluindo as suas renovações (!!!), podendo as partes convencionar que o fiador apenas se obriga pelo período inicial de duração do contrato (excluindo as renovações) ou que a fiança se extinga logo que ocorra qualquer alteração da renda.

Obrigações do Arrendatário – EVENTUAL PAGAMENTO DE ENCARGOS E DESPESAS DO IMÓVELA lei prevê que o regime dos encargos e despesas seja estipulado (por escrito) pelas partes (1078.º/1 CCiv), podendo, inclusive, acordar o pagamento de uma quantia fixa mensal a pagar por conta dos encargos/despesas, com acertos semestrais (n.º 7)Caso as partes nada estipulem, aplica-se o regime supletivo (1078.º/2 a 6 CCiv), como segue:

Encargos e despesas correntes respeitantes a fornecimento de bens e serviços (água/luz…) -> são por conta do arrendatário (n.º 2);

Despesas de condomínio -> são por conta do senhorio (nº 3). Os encargos devem ser contratados no nome do responsável pelo pagamento (n.º 4)

o Excepção: caso o arrendatário seja responsável por um encargo/despesa contratado em nome do senhorio:

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O Senhorio deve apresentar o comprovativo de pagamento ao arrendatário, no prazo de 1 mês (n.º 5) [a lei não esclarece quais as consequências no caso do senhorio ultrapassar o mês, aparentemente à remissão para a situação de mora do credor (813.º ss. CCiv)].

A obrigação vence-se no final do mês seguinte ao da comunicação do senhorio (n.º 6);

O arrendatário cumpre a obrigação simultaneamente com o pagamento da renda subsequente (n.º 6).

MoraCaso o arrendatário entre em mora no pagamento dos encargos/despesas por prazo superior a 2 meses, o senhorio poderá resolver o contrato (1083.º/3), mediante comunicação ao arrendatário (1084.º/2 CCiv), nos termos do 9.º/7 NRAU. Podendo o arrendatário pôr fim à mora no prazo de 1 mês (1084.º/3 CCiv), faculdade que só pode exercer uma vez com referência a cada contrato (n.º 4)

Obrigações do Arrendatário – USAR EFECTIVAMENTE O IMÓVEL O arrendatário urbano deve usar efectivamente o imóvel para o fim do contrato, não deixando de o utilizar por mais de um ano, sob pena de o senhorio poder resolver o contrato (1072.º/1; 1083.º/2/d) CCiv), exceptuam-se da ilicitude os seguintes casos (1072.º/2; 1083.º/2 in fine):

De força maior ou de doença; Da ausência for devida ao cumprimento de deveres militares/profissionais, do cônjuge

ou do unido de facto, não podendo perdurar mais de dois anos; De a utilização for mantida por quem tenha o direito de usar o locado e quando o faça

há mais de um ano; Da ausência devida a prestação de apoios continuados a pessoas com deficiência com

grau de incapacidade superior a 60%, incluindo a familiares.

Obrigações do Arrendatário - MANUTENÇÃO DO PRÉDIOAo receber a coisa locada, o arrendatário fica investido num dever jurídico de guarda ou custódia e de manutenção ou conservação do locado, deveres estes que emergem das obrigações de utilização prudente (1038.º/d) CCiv) e de comunicação ao senhorio de quaisquer vícios da coisa, ameaça de perigo ou de arrogação de direitos sobre a coisa por parte de terceiros (1038.º/h) CCiv).

Obrigações do Arrendatário – EXAME DO PRÉDIOO 1038.º/b) CCiv impõe ao locatário a obrigação de facultar o exame da coisa locada. O exame visa permitir ao senhorio controlar o bom estado do imóvel, e eventualmente suprir deficiências ou exigir responsabilidade pelos danos, a este, causados. No entanto, este exame tem de ser exercido em termos moderados, sob pena de constituir abuso de direito (334.º CCiv), perturbando o gozo do arrendatário.A imposição não se limita ao exame do senhorio, mas alarga-se ainda ao dever que ocorre de mostrar a casa a quem pretenda recebê-la em arrendamento, findo o contrato com o arrendatário (1081.º/3 e 4 CCiv).

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A violação deste dever do arrendatário confere ao senhorio o direito à resolução do contrato, se esse incumprimento, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento (1083.º/2 CCiv).

Obrigações do Arrendatário – RESPEITAR AS LIMITAÇÕES IMPOSTAS AOS PROPRIETÁRIOSOs arrendatários estão sujeitos às limitações impostas aos proprietários de coisas imóveis, tanto nas relações de vizinhança (1346.º ss. CCiv) como nas relações entre arrendatários de partes de uma mesma coisa (1422.º ss. CCiv).Em caso de incumprimento, o senhorio tem direito de indemnização pelos danos causados, constituindo, ainda, fundamento de resolução (1083.º/2/a) CCiv).

Pluralidade de responsáveisOs outros proprietários ou condóminos poderão reagir contra o arrendatário e contra o senhorio. O primeiro pela actuação em desrespeito dos limites à propriedade imobiliária (483.º CCiv), o segundo pela omissão em não impedir essa actividade do arrendatário (486.º CCiv), quando o poderia fazer, designadamente, através da resolução do contrato.Assim, ambos respondem pelos danos a terceiro (490.º CCiv), sendo a responsabilidade solidária e sendo o direito de regresso realizado na medida das respectivas culpas (497.º CCiv).

Obrigações do Arrendatário – NÃO APLICAÇÃO PARA FIM DIVERSOA utilização do arrendatário, mesmo que prudente, não poderá afastar-se do fim a que, pelo contrato ou por disposição da lei, se destina o prédio arrendado (1038.º/c) CCiv).A violação desta obrigação dá ao senhorio fundamento para resolução do contrato (1083.º/2/c) CCiv).Admitem-se, no entanto, excepções, são elas:

A pequena indústria doméstica (1092.º/1 CCiv); A hospedagem, para um máximo de e hóspedes (1093.º/1/b) CCiv).

Caso as partes não estipulem o fim do contrato de arrendamento?O local arrendado poderá ser usado no âmbito das suas aptidões, resultantes da licença de habitação. Não havendo licença de utilização, o arrendamento vale como habitacional se o local for habitável, ou como não habitacional, se o não for (1067.º/3 CCiv).

Pluralidade de finsNeste caso há que distinguir duas situações:

1.ª Situação: Se não houver subordinação de uns fins aos outros (1028.º/1 e 2 CCiv) – Teoria da CombinaçãoObservar-se-á, relativamente a cada um deles, o regime respectivo, ainda que se admita que a invalidade ou resolução de um dos elementos possa afectar igualmente o outro em caso de não ser possível a discriminação ou haver solidariedade dos diversos elementos entre si.

Exemplo: Se alguém arrendar simultaneamente duas fracções, uma para instalação de um restaurante e outra para servir de armazém aos produtos desse restaurante, a invalidade ou

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resolução do arrendamento relativo ao restaurante afectará igualmente o arrendamento relativo ao armazém, devido à solidariedade existente entre os dois.

2.ª Situação: Se um dos fins for principal e os outro subordinados (1028.º/3 CCiv) – Teoria da AbsorçãoSempre que exista um fim preponderante no arrendamento, será aplicado a todo o contrato o regime daquele.

Obrigações do Arrendatário – UTILIZAÇÃO IMPRUDENTEA obrigação do arrendatário de não fazer da coisa locada uma utilização imprudente está descrita no 1038.º/d) CCiv (e, ainda,1043.º/1 CCiv)A utilização por, na verdade, situar-se dentro do fim a que se destina o gozo do prédio ou fracção, e vir a assumir, todavia, carácter imprudente.A caracterização desta imprudência tem de fazer-se caso a caso, através de um prudente arbítrio do juiz.A violação desta obrigação confere ao senhorio o direito à resolução do contrato, se esse incumprimento, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento (1083.º/2 CCiv).

Exemplo: sobrepovoamento do prédio por familiares ou pessoas em economia comum em número tão elevado que constitua um uso imprudente que torne inexigível a manutenção pelo senhorio em tais condições; ou o caso da célebre caso francês da idosa que tinha quase tantos gatos como a Carla…27 ao todo!!

Se ocorrer a destruição do imóvel ou se verificarem deteriorações no mesmo não correspondentes a uma prudente utilização, a lei presume a responsabilidade do arrendatário, podendo, porém, este elidir a presunção demonstrando que não resultaram de causa que lhe seja imputável nem a terceiro a quem tenha permitido a utilização (1044.º CCiv).

Naturalmente, o arrendatário não é responsável pelos estragos que a acção do tempo causa ao imóvel, designadamente, a desvalorização resultante da sua vetustez (1073.º CCiv).

Obrigações do Arrendatário –TOLERAR REPARAÇÕES/OBRAS URGENTESEfectivamente pode haver necessidade de reparações urgentes para evitar a deterioração da coisa locada, sendo que por vezes a própria autoridade pública impõe essas reparações para evitar riscos maioresNestes casos, terá o arrendatário de suportar essa perturbação do gozo da coisa em ordem a evitar maiores riscos para o prédio (1038.º/e) CCiv), caso contrário haverá fundamento para resolução do contrato (1083.º/2 proémio; 1084.º/1 CCiv).O 1083.º/4 CCiv considera inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento, se houver oposição do arrendatário à realização de obra ordenada por autoridade pública, permitindo nesse caso a resolução por comunicação à outra parte, ainda que esta fique sem efeito, se o arrendatário, no prazo de um mês, cessar essa oposição (1083.º/3; 1084.º/5 CCiv)

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Obrigações do Arrendatário – NÃO PROPROCIONAR A OUTREM O GOZO DO PRÉDIOO 1038.º/f) CCiv impõe ao arrendatário a obrigação de não proporcionar a outrem o gozo total/parcial da coisa por meio de cessão onerosa/gratuita da sua posição jurídica, sublocação ou comodato, excepto se a lei o permitir ou o locador autorizar.

O preceito enumera, assim, 3 figuras de transmissão do gozo total/parcial: Cessão da posição jurídica de locatário (qualquer das partes pode transmitir a terceiro

a sua posição contratual, desde que o outro contraente consinta na transmissão – 424.º/1 CCiv);

Sublocação (1060.º a 1063.º CCiv); Comodato (1129.º a 1141.º CCiv).

Estes três casos não esgotam as hipóteses em que está proibido o arrendamento urbano proporcionar o gozo do prédio a terceiro. Em qualquer hipótese, diferente destas, desde que não haja autorização legal (ver quadro abaixo) ou convencional, o arrendatário fica abrangido pela proibição.A sua violação é considerada tão grave que a lei sanciona com a faculdade do senhorio pedir nesse caso ao tribunal a resolução do contrato, salvo se tiver reconhecido o beneficiário da cedência como tal (1083.º/2/e); 1049.º CCiv).

Obrigações do Arrendatário – COMUNICAÇÃO DA CEDÊNCIA DO GOZO DO PRÉDIOO 1038.º/g) CCiv estabelece que o locatário é obrigado a comunicar ao locador, dentro de 15 dias, a cedência de gozo da coisa, quando permitida ou autorizada.O prazo considera-se observado mesmo que venha o senhorio a ter conhecimento da comunicação só mais tarde.A comunicação não está sujeita a nenhum requisito especial de forma.Não cumprindo o arrendatário esta obrigação, não poderá a cedência ser oposta ao senhorio, a menos que este a tenha reconhecido, permitindo-lhe resolver o contrato. (1061.º; 1049.º; 1083.º/2/e) CCiv).

Obrigações do Arrendatário – CONHECIMENTO DE VICIO/PERIGO QUE AMECE O PRÉDIOO 1038.º/h) CCiv impõe ao locatário a obrigação de avisar imediatamente o locador, sempre que tenha conhecimento de vícios na coisa ou saiba que a ameaça algum perigo ou que terceiros se arrogam direitos em relação a ela (implica um dever de custódia mínimo), desde que o facto seja ignorado pelo locador, sendo que a violação de tal obrigação constituí fundamento para resolução, nos termos do 1083.º/2 proémio CCiv (1084.º/1 CCiv).A violação deste dever jurídico pode constituir fundamento de resolução do contrato de arrendamento urbano por parte do senhorio, face ao carácter aberto da norma do 1083.º CCiv (se, pela sua gravidade, torne inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento), mas releva para efeitos da (ir)responsabilidade do locador por vícios da coisa locada (1033.º/d); 1032.º CCiv).

Obrigações do Arrendatário – RESTITUIR O PRÉDIOEstabelece o 1038.º/i) CCiv que é obrigação do locatário restituir a coisa locada findo contrato, obrigação, essa, que se regula pormenorizadamente nos artºs 1043.º a 1046.º CCiv, assim:

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O prédio deve ser restituído por ele, no estado em que foi recebido, ressalvadas as deteriorações (ou estragos, do latim, deter = pior) inerentes a uma prudente utilização em conformidade com os fins do contrato (1043.º/1 CCiv) ou as que se destinem a assegurar o conforto ou comodidade, devendo, no entanto, estas últimas ser reparadas (1073.º CCiv);

O locatário responde pela perda ou da deterioração da coisa (não incluída no ponto anterior) salvo se resultarem de causa que lhe não seja imputável nem a terceiro, a quem tenha permitido a utilização (1044.º CCiv);

Se o prédio não for restituído por qualquer causa, findo o contrato, o arrendatário é obrigado a pagar ao senhorio, a título de indemnização, a renda que estava estipulada (1045.º/1 CCiv) e, em caso de mora do arrendatário, a indemnização é elevada ao dobro (n.º 2);

A desocupação do locado é imediatamente exigível (1081.º/1 CCiv),EXCEPTO:

o Acordo das partes -> exigível no momento por elas fixado;o Disposição legal -> como é o caso da resolução do contrato, em que a

desocupação do locado só é exigível passado um mês após a resolução (salvo disposição em contrário) (1087.º CCiv).

Ser exigível não implica, porém, que a obrigação se vence automaticamente, é apenas a partir da interpelação, que o arrendatário entra em mora quanto à restituição (777.º/1; 805.º/1 CCiv), com as respectivas consequências legais em termos de indemnização (804.º/1 CCiv) e inversão do risco pela perda ou deterioração da coisa (807.º CCiv).(ver Sebenta de Obrigações II – da Prof. Dr.ª Cátia Cebola – pág. 130 e ss.)

Se a restituição do imóvel por parte do arrendatário, após a extinção do arrendamento, for impedida por facto relativo ao senhorio, verifica-se uma situação de mora do credor (813.º CCiv). Nessa situação, o senhorio:→ Não terá o direito de reclamar a renda do arrendatário ou indemnização pelo

atraso na restituição, → Deverá indemnizar as maiores despesas em que o arrendatário tenha incorrido

pelo facto da restituição não ter ocorrido na data prevista (816.º CCiv)→ Deverá suportar o risco por qualquer perda ou deterioração posterior do imóvel

(814.º/1 CCiv).→ O arrendatário tem, ainda, a faculdade de consignar em depósito o imóvel

(841.º/1/b) CCiv).

Garantia do Cumprimento das Obrigações de ArrendatárioPara garantia do cumprimento das diferentes obrigações que impendem sobre o arrendatário, pode ser-lhe exigido que preste fiança.(ver o que foi dito debaixo do tópico Garantias do pagamento da renda)

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BOM ESTUDO!! BOA FREQUÊNCIA!REMETAM!!!

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