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DIREITO PENAL 1. CONCEITO DE DIREITO PENAL 1.1. Conceito formal Sob o aspecto formal, trata-se de um conjunto de normas jurídicas mediante o qual o Estado proíbe determinadas condutas (ações ou omissões), sob ameaça de sanção penal (penas e medidas de segurança). Também se incluem as normas que estabelecem os princípios gerais e as condições ou pressupostos de aplicação da sanção penal, que igualmente podem ser impostas aos autores de um fato previsto como crime. 1.2. Conceito social Em uma perspectiva social, o Direito Penal é um dos modos de controle social utilizados pelo Estado. 1.3. Conceito Material Conjuntos de penas que são impostas ao infratores. 2. DENOMINAÇÕES ESPECÍFICAS DO DIREITO PENAL 2.1. Direito Penal objetivo e Direito Penal subjetivo O Direito Penal objetivo constitui-se das normas penais incriminadoras (definem as infrações penais e cominam as sanções penais) e não-incriminadoras. Direito Penal subjetivo é o direito de punir do Estado (jus puniendi), ou seja, o direito do Estado de aplicar as normas penais. O direito de punir possui três momentos: 1º) ameaça da pena (pretensão intimidatória); 2°) aplicação da pena (pretensão punitiva); 3º) execução da pena (pretensão executória). Até mesmo na hipótese de ação penal privada o Estado não transfere o jus puniendi à vítima, mas sim possibilita por parte desta o exercício do jus accusationis. 2.2. Direito Penal de culpabilidade e Direito Penal de periculosidade

Direito Penal

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Direito Penal parte geral

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Page 1: Direito Penal

DIREITO PENAL

1. CONCEITO DE DIREITO PENAL

1.1. Conceito formal

Sob o aspecto formal, trata-se de um conjunto de normas jurídicas mediante o qual o Estado proíbe determinadas condutas (ações ou omissões), sob ameaça de sanção penal (penas e medidas de segurança). Também se incluem as normas que estabelecem os princípios gerais e as condições ou pressupostos de aplicação da sanção penal, que igualmente podem ser impostas aos autores de um fato previsto como crime.

1.2. Conceito social

Em uma perspectiva social, o Direito Penal é um dos modos de controle social utilizados pelo Estado.

1.3. Conceito Material

Conjuntos de penas que são impostas ao infratores.

2. DENOMINAÇÕES ESPECÍFICAS DO DIREITO PENAL

2.1. Direito Penal objetivo e Direito Penal subjetivo

O Direito Penal objetivo constitui-se das normas penais incriminadoras (definem as infrações penais e cominam as sanções penais) e não-incriminadoras.

Direito Penal subjetivo é o direito de punir do Estado (jus puniendi), ou seja, o direito do Estado de aplicar as normas penais. O direito de punir possui três momentos: 1º) ameaça da pena (pretensão intimidatória); 2°) aplicação da pena (pretensão punitiva); 3º) execução da pena (pretensão executória). Até mesmo na hipótese de ação penal privada o Estado não transfere o jus puniendi à vítima, mas sim possibilita por parte desta o exercício do jus accusationis.

2.2. Direito Penal de culpabilidade e Direito Penal de periculosidade

Se a pessoa pode escolher agir ou deixar de agir conforme a norma, pode ser censurada (culpabilidade). O limite da pena é o grau de culpabilidade.

Para o Direito Penal de periculosidade o homem é determinado (não possui capacidade de escolha) e a pena tem como objeto e único limite a periculosidade.

2.3. Direito Penal do fato, Direito Penal do autor e Direito Penal do fato que considera o autor

A expressão Direito Penal do fato significa que as leis penais somente devem punir fatos causados pelo homem e lesivos a bens jurídicos de terceiro. Não se pune o pensamento, mas sim as manifestações exteriores do ser humano.

O Direito Penal do autor é marcado pela punição de pessoas que não tenham praticado nenhuma conduta. Pune-se alguém pelo seu modo de ser ou pela sua característica ou condição pessoal e não pelo seu fato.

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Na lição de Francisco de Assis Toledo, existem correntes moderadas, no sentido de predominar o Direito Penal do fato, mas levando também em consideração o seu autor. A comprovação disso se dá ao analisarmos as leis penais, que tipificam fatos (modelo de conduta proibida) e não o perfil psicológico do autor. Porém, condições ou qualidades do autor também são consideradas dentro do quadro de punibilidade do fato, como a personalidade e os antecedentes criminais, utilizados como critérios na aplicação da pena.

2.4. Direito Penal primário (clássico) e Direito Penal secundário (extravagante ou penal administrativo)

O Direito Penal primário é aquele contido nos Códigos Penais. O Direito Penal secundário é o contido nas leis especiais não integrantes do Código Penal.

2.5. Direito Penal de duas velocidades (Direito Penal nuclear e Direito Penal periférico)

Direito Penal de primeira velocidade: assegura todos os critérios clássicos de imputação e os princípios penais e processuais penais tradicionais (ex.: princípios da subsidiariedade e ofensividade) mas permite a aplicação da pena de prisão. Trata-se do Direito Penal clássico que protege bens jurídicos individuais e, eventualmente, supraindividuais, sempre que efetivamente houver lesão ou perigo concreto de lesão (ob. cit., p. 147). Nesse nível de intensidade, o Direito Penal é reduzido ao seu núcleo dum (Direito Penal nuclear).

Direito Penal de segunda velocidade: ao lado do Direito Penal nuclear, em uma zona periférica, admitir-se-ia a segunda expansão do Direito Penal dirigido à proteção dos novos e grandes riscos da sociedade, com a possibilidade de flexibilização de garantias penais e processuais penais (Direito Penal periférico). Confere proteção aos bens jurídicos supraindividuais, possibilitando a antecipação da tutela penal (tipificação de condutas presumivelmente perigosas - crimes de perigo presumido) e a criação de crimes de acumulação (a lesão ao bem jurídico pressupõe a soma de várias condutas praticadas individualmente). Porém, diante dessa flexibilização, não admite a aplicação da pena de prisão, mas somente as penas restritivas de direitos e pecuniárias.

2.6. Direito Penal de terceira velocidade

Direito Penal marcado pela "'relativizaçõo de garantias político-criminais, regras de imputaçõo e critérios processuais". Apesar de reconhecer a sua existência nas legislações modernas, principalmente no Direito Penal socioeconômico, Silva Sánchez sustenta que seu âmbito deve ser reconduzido a uma das duas velocidades (ob. cit., 148). Caracteriza-se como Direito Penal de terceira velocidade o chamado Direito Penal do inimigo (Jakobs).

2.7. Direito Penal do inimigo

Segundo Günther Jakobs (Direito Penal do Inimigo: Noções e Críticas, 2005), o Estado deve proceder de dois modos com os criminosos. Ao 'delinquente-cidadão' aplica-se o Direito Penal do cidadão, ao passo que o 'delinquente inimigo' se aplica o Direito Penal do inimigo.

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Para Jakobs, algumas pessoas cometem erros e devem estar sujeitas ao Direito Penal do cidadão. Nesse caso, apesar de haver danificação à vigência da norma, deve ser chamado de modo coativo, como cidadão, a equilibrar o dano. Esse equilíbrio se dá com a aplicação da pena.

Por outro lado, outros delinquentes (inimigos) devem ser impedidos de destruir o ordenamento jurídico, mediante coação, utilizando o denominado Direito Penal do inimigo. Isso porque o inimigo não possui a condição de cidadão, tendo em vista que não cumpre a sua função no corpo social ao deixar de satisfazer, de forma duradoura, mínimas expectativas normativas.

2.8. Direito Penal de quarta velocidade ou neopunitivismo

Seria o modelo de sistema penal utilizado pelo Tribunal Penal Internacional, com restrição e supressão de garantias penais e processuais penais de réus que no passado ostentaram a função de chefes de estado e, como tal, violaram gravemente tratados internacionais que tutelam direitos humanos.

Para o Direito Penal do inimigo e Direito Penal de terceira velocidade, o inimigo (réu no âmbito do Direito Penal interno) é aquele que perdeu a condição de cidadão por ter deixado de cumprir sua função no corpo social (não satisfez as mínimas expectativas normativas) ao passo que, para o neopunitivismo, o inimigo (réu na esfera do Direito Penal internacional) é aquele que alguma vez foi detentor do poder estatal e violou direitos humanos.

2.9. Direito Penal de emergência, Direito Penal simbólico e Direito Penal promocional

Direito Penal de emergência , expressão utilizada para expressar as hipóteses nas quais o Estado utiliza legislação excepcional para limitar ou derrogar garantias penais e processuais penais em busca do controle da alta criminalidade.

Nesse sentido, foram criadas as Leis 8.072/90 (crimes hediondos) e 9.034/95 (organizações criminosas).

Sempre que a sociedade clama por segurança pública, máxime nos tempos atuais de uma sociedade de risco, surge o legislador com sua pretensão de dar uma rápida resposta aos anseios sociais, e, com isso, muitas vezes criminaliza condutas sem qualquer fundamento criminológico e de política criminal, criando a ilusão de que resolverá o problema por meio da utilização da tutela penal.

Com efeito, se a criação da lei penal não afeta a realidade, o Direito Penal acaba cumprindo apenas uma função simbólica. Daí a expressão Direito Penal simbólico.

De outra parte, o Direito Penal promocional ocorre quando o Estado utiliza as leis penais para consecução de suas finalidades políticas, por ser um poderoso instrumento de desenvolvimento e transformação social (função promocional). Essa função é criticada por parte da doutrina, uma vez que o Direito Penal deixa de ser utilizado pelo legislador como modo de controle social subsidiário (ultima ratio).

2.10. Direito Penal subterrâneo e Direito Penal paralelo

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Como o sistema penal formal do Estado não exerce grande parte do poder punitivo, outras agências acabam se apropriando desse espaço e passam a exercer o poder punitivo paralelamente ao estado (sistemas penais paralelos). Ex.: médico aprisionando doentes mentais; institucionalização pelas autoridades assistenciais dos morados de rua.

No escólio do citado autor, "todas as agências executivas exercem algum poder punitivo à margem de qualquer legalidade ou com marcos legais muito questionáveis, mas sempre fora do poder jurídico", o que acarreta um abuso de poder. Chama-se esse âmbito de atuação ilícita de sistema penal subterrâneo. Ex.: institucionalização de pena de morte (execução sem processo), desaparecimentos, torturas, extradições mediante sequestro, grupos especiais de inteligência italianos, norte-americanos e espanhóis que atuam fora da lei (ob. cit.,p 26).

2.11. Direito Penal Internacional

São as normas de direito internacional (combinação de princípios de Direito Penal e direito internacional) que dispõem as consequências jurídico-penais.

3. FUNÇÕES DO DIREITO PENAL

3.1. Função de proteção de bens jurídicos

Uma das mais destacadas funções do Direito Penal é a proteção dos bens jurídicos. Entretanto, o Direito Penal não tutela todos os bens jurídicos, mas somente os mais relevantes para um convívio harmônico em sociedade.

3.2. Função de garantia de vigência da norma

Para Günther Jakobs (Direito Penal e Funcionalismo, 2005, p.33-34), o Direito Penal garante a vigência da norma e não a proteção de bens jurídicos.

3.3. Outras funções

Diz-se, ainda, que o Direito Penal possui a função de prevenir a vingança privada.

4. GARANTISMO PENAL

Conforme o autor italiano Luigi Ferrajoli (Direito e Razão, p. 786), o garantismo, dentre outros significados, pode ser visto, sob o plano político, como técnica de reduzir a violência e maximizar a liberdade. Sob o plano jurídico, seria uma forma de limitação do poder punitivo em garantia dos direitos fundamentais do cidadão.

PRINCÍPIOS PENAIS E POLÍTICO-CRIMINAIS

1. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE PENAL

O princípio da legalidade ou da reserva legal constitui efetiva limitação ao poder punitivo estatal.

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O princípio da legalidade também é chamado de legalidade estrita, reserva legal ou intervenção legalizada. Para a definição de crime e cominação de pena é necessária uma lei (aprovada pelo Congresso Nacional).

Parte da doutrina faz a correta observação acerca da distinção entre "princípio da legalidade" e "princípio da reserva legal".

Legalidade abrange várias espécies normativas, como leis ordinárias, complementares, delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções. Seria, neste sentido amplo, o princípio consagrado no art. 50, II, da Constituição Federal (princípio da legalidade em sentido amplo). Por sua vez, o princípio da reserva legal (legalidade estrita) possui um sentido restrito, já que abrange apenas lei ordinária ou complementar aprovada pelo Congresso Nacional.

No Brasil, em matéria penal, a competência legislativa é privativa da União (CF, an. 22, 1). Deve ser observado, todavia, o parágrafo único do art. 22.

Por sua vez, é vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria relativa a Direito Penal (CF, an. 62, § 1°, 1, b). Entretanto, é razoável o entendimento no sentido de que o texto constitucional deve ser interpretado restritivamente, de que a proibição só alcançaria as leis penais incriminadoras e não as leis penais não incriminadoras.

Não se pode, também, veicular matéria penal por lei delegada, em virtude da restrição imposta no art. 68, § 1°, li (direitos individuais), da Constituição Federal.

1.4. Funções

O princípio da legalidade possui algumas funções fundamentais:

1ª) Lei estrita: a competência para criar crimes e cominar penas é do Poder Legislativo (CF, art. 22, 1), por meio de lei, de sorte que essa tarefa é proibida aos Poderes Executivo e Judiciário, bem como é proibida a analogia contra o réu (nullum crimen, nulla poena sine lege stricta).

2ª) Lei escrita: os costumes não têm a força de criar crimes e cominar sanções penais, uma vez que a lei deve ser escrita, ou seja, é proibido o costume incriminador (nullum crimen, nulla poena sine lege scripta).

3ª) Lei certa: os tipos penais devem ser de fácil entendimento pelo cidadão, justamente para que possa se orientar daquilo que é certo ou errado. Desse modo, decorre a proibição da criação de tipos penais vagos e indeterminados. A lei penal deve ser precisa e determinada. Nesse enfoque, tem-se o princípio da taxativídade (nullum crimen, nulla poena sine lege certa).

4ª) Lei prévia: proibição da aplicação da lei penal incriminadora a fatos - não considerados crimes - praticados antes de sua vigência. Trata-se do princípio da anterioridade (nullum crimen, nulla poena sine lege praevia).

Por fim, a lei deve observar o critério formal (forma para ser aprovado a lei) e critério material (conteúdo das leis – observando tratados e a CF).

2. PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIEDADE

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O Direito Penal não deve tutelar todos os bens jurídicos, mas somente os mais relevantes para a sociedade (vida, liberdade, patrimônio, meio ambiente etc.).

3. PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE

O Direito Penal deve atuar de forma subsidiária (Direito Penal de ultima ratio), isto é, somente quando insuficientes as outras formas de controle social.

4. PRINCÍPIO DA OFENSIVIDADE (NULLUM CRIMEN SINE INIURIA)

Apenas as condutas que causam lesão (efetiva ou potencial) a bem jurídico, relevante e de terceiro, podem estar sujeitas ao Direito Penal. Somente haverá crime se a conduta for apta a ofender determinado bem jurídico.

Nilo Batista (Introduçõo Crítica ao Direito Penal Brasileiro, 2004, p. 92-95) destaca quatro principais funções do princípio da ofensividade ou lesividade, a saber:

1) a proibição da incriminação de uma atitude interna, como as ideias, convicções, aspirações e desejos dos homens. Por esse fundamento, não se pune a cogitação nem os atos preparatórios do crime.

2) a proibição da incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio autor. Exemplo: não se pune a autolesão corporal e a tentativa de suicídio, bem como não se deveria punir o uso de drogas. Nesse enfoque, trata-se do chamado princípio da alteridade.

3) a proibição da incriminação de simples estados ou condições existenciais. A pessoa deve ser punida pela prática de uma conduta ofensiva a bem jurídico de terceiro e não pelo que ela é.

4) a proibição da incriminação de condutas desviadas que não causem dano ou perigo de dano a qualquer bem jurídico. O Direito Penal não deve tutelar a moral, mas sim os bens jurídicos mais relevantes para a sociedade (princípio da exclusiva proteção dos bens jurídicos).

5. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Na tipicidade material, incide o princípio da insignificância, afastando-a . Isto quer dizer que exclui ou afasta a tipicidade em seu aspecto material, de sorte que inexiste o primeiro elemento do crime, e, por consequência, o próprio crime. Trata-se de uma "infração bagatelar" (ou "infração bagatelar própria").

Sob um enfoque hermenêutico, o princípio da insignificância pode ser visto como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal, tendo em vista que restringe o âmbito de incidência da lei penal incriminadora e afasta a tipicidade material.

Infração bagatelar Imprópria:

O fato praticado é, por isso, em princípio, penalmente punível. Instaura-se processo contra o agente. Mas tendo em vista todas as circunstâncias do fato (concomitantes e posteriores ao delito) assim como o seu autor, pode ser que a pena se torne desnecessária".

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Ainda conforme o STF, quatro são os vetores na aferição do relevo material da tipicidade penal:

a) mínima ofensividade da conduta do agente;

b) nenhuma periculosidade social da ação;

c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento;

d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Entretanto, o STF ainda leva em consideração a reincidência e a habitualidade criminosa do agente para afastar a aplicação do princípio da insignificância.

Obs.: É inaplicável o patamar estabelecido no art. 20 da Lei 10.522/2002, no valor de RS 10 mil, para se afastar a tipicidade material, com base no princípio da insignificância, de delitos concernentes a tributos que não sejam da competência da União. De fato, o STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.112.748-TO, Terceira Seção, DJe 13/10/2009, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento de que deve ser aplicado o princípio da insignificância aos crimes referentes a débitos tributários que não excedam RS 10 mil, tendo em vista o disposto no art. 20 da Lei 10.522/2002.

- Apropriação indébita previdenciária (art. 168-A):

Inviável reconhecer a atipicidade material da conduta do paciente, que contribui para agravar o quadro deficitário da previdência social. (STF: HC 98o21, lª T., j. 22/06/2010).

- Crimes contra a administração pública:

É inaplicável o princípio da insignificância aos crimes contra a Administração Pública, pois, nesses casos, a norma penal busca resguardar não somente o aspecto patrimonial, mas a moral administrativa, o que toma inviável a afirmação do desinteresse estatal à sua repressão. (HC 167.515/SP. 5• T., j. 16/11/2010).

6. PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE

Como bem esclarece Cezar Roberto Bitencourt (Tratado de Direito Penal, 2011, p. 47), decorrem três consequências materiais do princípio da culpabilidade: "'a) não há responsabilidade penal objetiva; b) a responsabilidade penal é pelo fato praticado e não pelo autor; e) a culpabilidade é a medida da pena".

7. PRINCÍPIO DA EXCLUSIVA PROTEÇÃO DE BENS JURÍDICOS

O Direito Penal possui como função a proteção de bens jurídicos mais relevantes para a sociedade. Assim, o Estado não pode utilizar o Direito Penal para tutelar a moral, a religião, os valores ideológicos etc., sob pena de prevalecer a intolerância. Como anteriormente explicado, é uma das decorrências do princípio da ofensividade.

8. PRINCÍPIO DA MATERIALIZAÇÃO DO FATO (NULLUN CRIMEN SINE ACTIO)

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Deve haver um Direito Penal do fato e não um Direito Penal do autor, ou seja, a pena deve ser imposta por ter o agente praticado um fato lesivo a bem jurídico de terceiro e não em razão do modo de ser do sujeito. Assim, devem ser abolidas de nosso ordenamento infrações penais como a disposta no art. 59 da LCP (vadiagem).

9. PRINCÍPIO DA PESSOALIDADE OU DA INTRANSCENDÊNCIA DA PENA

A pena deve ser aplicada somente ao autor do fato e não a terceiros.

Assim, com a morte do condenado, a sanção penal se resolve (mors omnia solvit). No entanto, os efeitos secundários extrapenais da sentença penal condenatória subsistem (obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens), de sorte que os herdeiros respondem até o limite da herança.

10. PRINCÍPIO DA HUMANIDADE

Nenhuma pena pode atentar contra a dignidade da pessoa humana, de sorte que é vedada a aplicação de penas cruéis e infamantes, bem como determina que a pena seja cumprida de forma a efetivamente ressocializar o condenado.

11. PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL

Pode-se dizer que uma conduta socialmente adequada não pode ser típica, de sorte que não será criminosa. Como exemplo, cita o autor as lesões corporais causadas por um pontapé em partidas de futebol.

12. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE (PROIBIÇÃO DE EXCESSO)

O agir estatal há de ser proporcional, proporcionalidade esta que há de ser observada entre os meios a serem empregados e os fins a serem alcançados.

13. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE (PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO DEFICIENTE)

Nas palavras de Luciano Feldens, a proibição de proteção deficiente encerra, nesse contexto, uma aptidão operacional que permite ao intérprete determinar se um ato estatal – eventualmente retratado em uma omissão, total ou parcial - vulnera um direito fundamental.

Foi considerado CORRETO o seguinte item: Uma das vertentes do princípio da proporcionalidade é a proibição de proteção deficiente, por meio da qual se busca impedir um direito fundamental de ser deficientemente protegido, seja mediante a eliminação de figuras típicas, seja pela cominação de penas inferiores à importância exigida pelo bem que se quer proteger.

LEI PENAL E SUA APLICAÇÃO

FONTES DO DIREITO PENAL

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1. FONTES MATERIAIS (SUBSTANCIAIS OU DE PRODUÇÃO)

Fonte material é o órgão responsável pela declaração do Direito.

Em nosso país, segundo o an. 22, 1, da CF/88, compete privativamente à União legislar sobre Direito Penal. Entretanto, o parágrafo único do referido artigo dispõe que lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas de Direito Penal.

2. FONTES FORMAIS

Fontes formais ou de conhecimento são os meios pelos quais se exterioriza o direito.

2.1. Fonte formal imediata

Conforme a doutrina clássica, a fonte formal imediata é a lei que pode ser entendida em sentido amplo ou estrito. Em sentido estrito (lei penal incriminadora), é a norma de Direito que manifesta a vontade do Estado na definição dos fatos proibidos e na cominação das sanções. Além destas, tem-se aquelas (sentido amplo) que completam o sistema penal com os seus princípios gerais e dispõem sobre a aplicação e os limites das normas incriminadoras.

Fontes formais imediatos são: Constituição, tratados de direitos humanos, leis.

2.2. Fontes formais mediatas

a) Costumes: são normas de conduta que as pessoas obedecem de maneira constante e uniforme com a convicção de sua obrigatoriedade. Se não houver essa convicção de obrigatoriedade, teremos apenas um hábito. Assim, são elementos do costume: a) repetição da conduta (elemento objetivo); b) convicção de obrigatoriedade (elemento subjetivo).

O costume não é fonte de normas incriminadoras. Mas, por outro lado, pode auxiliar em sua interpretação, como no caso da definição de certos elementos do tipo penal, tais como: honra, decoro, reputação, ato obsceno etc.

b) Princípios gerais do direito: constituem orientações do pensamento jurídico e premissas éticas que inspiram a elaboração e a interpretação das normas os princípios gerais não podem declarar a existência de algum crime, mas são admitidos em matéria penal, como, por exemplo, para se reconhecer uma causa supralegal de exclusão da ilicitude.

c) Ato administrativo: nas leis penais em branco em sentido estrito o complemento do preceito primário é formulado por meio de ato administrativo. Nesses casos, o ato é considerado fonte mediata do Direito Penal.

Obs.: alguns autores acrescentam como fonte mediata a jurisprudência. Com o surgimento da súmula vinculante (art. 103-A da CF/88 e Lei 11.417/2oo6), fortaleceu ainda mais essa posição de ser a jurisprudência, ao menos nessa hipótese, fonte de Direito Penal.

DA LEI PENAL

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3. CLASSIFICAÇÃO DA LEI PENAL

3.1. Leis penais incriminadoras e não incriminadoras

a) Leis penais incriminadoras: descrevem os fatos puníveis (preceito primário) e suas sanções (preceito secundário). Também são chamadas de leis penais em sentido estrito.

b) Leis penais não incriminadoras:

- leis penais permissivas: são as que autorizam ou ordenam a prática de certos fatos típicos. Ex.: art. 23 do CP.

- leis penais exculpantes: são as que excluem a culpabilidade de certos fatos típicos e ilícitos. Ex.: art. 26, caput, do CP.

- leis penais interpretativas: são as que esclarecem o conteúdo de outras leis. Ex.: art. 327 do CP; art. 250, § 4°, do CP.

- leis penais complementares: são as que delimitam o âmbito de aplicação de outras leis. Ex.: art. 5° do CP.

- leis penais de extensão ou integrativas: são utilizadas para que haja a tipicidade de certos fatos. Ex.: art. 14, li; art. 29 do CP.

3.2. Lei penal em branco (norma cega)

3.2.1. Conceito

A lei penal incriminadora possui: a) preceito primário, que descreve a conduta (ação ou omissão) ilícita; b) preceito secundário, que comina a sanção penal.

No entanto, algumas leis penais incriminadoras não possuem preceito primário completo, necessitando da complementação de seu conteúdo por meio de outra norma (integradora ou complementar). São as chamadas leis penais em branco. Segundo Binding, a lei penal em branco é um corpo errante em busca de sua alma.

3.2.2. Lei penal em branco em sentido amplo (lato), imprópria, homogênea ou homóloga

O complemento do preceito primário deve ser formulado pela mesma instância legislativa que formulou a lei penal em branco, isto é, pelo Poder Legislativo da União.

3.2.2.1. Lei penal em branco homovitelínea e heterovitelínea

Para Luiz Flávio Gomes e Antonio Molina (Direito Penal. Parte Geral. Vol. 2, p. 50), a lei penal em branco homogênea pode ser homovitelínea ou heterovitelínea.

Será homovitelínea quando a norma que a complementa for da mesma instância legislativa (Poder Legislativo) e estiver na mesma estrutura normativa da descrição típica.

A lei penal homogênea heterovitelínea é aquela em que a norma complementar se origina da mesma instância legislativa (Poder Legislativo), mas se encontra em diversa estrutura normativa da descrição típica. Ou seja, a lei penal em branco é

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complementada por lei extrapenal. Ex.: o art. 184 do CP prevê como crime a violação dos direitos autorais, mas a definição desses direitos estão em lei extrapenal.

3.2.3. Lei penal em branco em sentido estrito, própria ou heterogênea

O complemento do preceito primário é formulado por instância legislativa diversa da que formulou a lei penal em branco, ou seja, por outra norma que não se origina do Poder Legislativo.

3.2.4. (ln)constitucionalidade das leis penais em branco em sentido estrito

Existe divergência doutrinária acerca da constitucionalidade da lei penal em branco em sentido estrito. Orientações:

1. ofende o princípio da legalidade, pois todo preceito primário deve estar definido em lei em sentido estrito.

2. Não ofende o princípio da legalidade, pois a lei define o núcleo essencial do tipo penal (conduta típica). Trata-se do posicionamento majoritário.

3.3. Lei penal em branco inversa ou ao avesso

Chama-se de lei penal em branco inversa ou ao avesso (lei penal incompleta) a que possui preceito secundário (cominação da pena) incompleto. Seu preceito primário é completo, ao contrário da lei penal em branco.

4. CARACTERÍSTICAS DA LEI PENAL

a) exclusividade: somente a lei penal pode definir crimes e suas sanções.

b) imperatividade: possibilidade de aplicação da sanção a quem descumprir seu mandamento.

c) impessoalidade: em regra, a lei não é criada para ser aplicada a um fato concreto. Dirige-se abstratamente a fatos futuros. Como exceção, pode-se citar a anistia e a abolitio criminis.

d) generalidade: o preceito primário da lei penal dirige-se a todas as pessoas. o preceito secundário (sanções) dirige-se também a todos, mas especificamente aos juízes, encarregados de sua aplicação.

Obs: Os tratados de Direito Internacional de Direitos Humanos podem definir crimes e cominar penas '"quando cuidam das relações do indivíduo com o Direito Internacional penal. Mas não podem definir crimes e penas nas relações do indivíduo com o Estado soberano brasileiro

Obs: A Constituição não define crimes nem comina penas, pois essa tarefa compete ao legislador infraconstitucional por meio de lei em sentido estrito (princípio da legalidade penal). Porém, muitas Constituições modernas impõem certas criminalizações, situação denominada de mandados ou obrigações constitucionais de criminalização.

9. INTERPRETAÇÃO DAS LEIS PENAIS

9.1. Classificação quanto à origem ou quanto ao sujeito

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a) Interpretação autêntica: realizada pelo próprio legislador. Pode ocorrer no próprio texto da lei (interpretação autêntica contextual. O ou mediante uma lei editada posteriormente à norma em que se dará a devida interpretação (interpretação autêntica posterior).

Importante:

A exposição de motivos do CP. embora possa auxiliar a interpretação, não se trata de interpretação autêntica contextual.

b) interpretação judiciária ou jurisprudencial: realizada pelos juízes e tribunais ao aplicar a norma aos casos concretos.

c) interpretação doutrinária: realizada pela doutrina, ou seja, pelos teóricos do direito. A exposição de motivos do Código Penal se trata de uma interpretação doutrinária.

9.2. Classificação quanto aos meios

a) interpretação gramatical ou literal: verifica-se o significado literal das palavras, mediante o emprego de meios gramaticais e etimológicos.

b) interpretação lógica: busca o sentido da lei utilizando raciocínio dedutivo.

c) interpretação teleológica: busca a finalidade da lei.

d) interpretação sistemática: investiga a coerência entre a lei interpretada e as demais leis que compõem o sistema.

e) interpretação histórica: investiga as condições e os fundamentos de sua origem (analisa-se: a sociedade da época da elaboração da lei, a justificativa apresentada no projeto de lei; as discussões parlamentares etc.).

9.3. Classificação quanto ao resultado

a) interpretação declarativa: a letra da lei corresponde ao seu significado ou sentido. Não haverá restrição nem ampliação do seu alcance.

b) interpretação restritiva: não há correspondência entre o texto da lei e sua vontade. A letra da lei diz mais que o seu real sentido. O alcance da lei deve ser restringido para alcançar sua vontade.

e) interpretação extensiva: não há correspondência entre o texto da lei e sua vontade. A letra da lei diz menos que sua vontade. Assim, o alcance da lei deve ser ampliado para alcançar a sua vontade.

9.4. Interpretação analógica (intra legem)

O texto da lei abrange uma cláusula genérica logo em seguida de uma fórmula casuística, sendo que a cláusula genérica deve ser interpretada e compreendida segundo os casos análogos descritos (fórmula casuística).

São espécies de analogia:

a) analogia legis ou legal: faz-se a aplicação da analogia tendo por base outra disposição legal que regula caso semelhante.

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b) analogia juris ou jurídica: faz-se a aplicação da analogia tendo por base, ao invés de outra disposição legal que regula caso semelhante, um princípio geral do direito.

e) analogia in bonam partem: aplica-se ao caso omisso uma lei em benefício ao réu. É possível a sua aplicação no âmbito penal.

d) analogia in malam partem: seria a aplicação ao caso omisso de uma lei prejudicial ao réu. Não se aplica no âmbito do Direito Penal. Exemplo: "O crime de associação para o tráfico não integra a listagem legal de crimes equiparados a hediondos. Impossível analogia in malam partem com o fito de considerá-lo crime dessa natureza" (STJ-HC i77.220/RJ, 6• T, j. 02/06/2011).

LEI PENAL NO TEMPO

Três teorias acerca do tema se destacam: teorias da atividade, do resultado e mista.

1.2. Teorias

a) teoria da atividade: considera praticado o crime no momento da 'conduta (ação ou omissão), ainda quê outró seja o momento do resultado. o CP adotou esta teoria (art. 40).

b) teoria do resultado: considera o momento da produção do resultado.

c) teoria mista: considera tanto o momento da conduta como o do resultado.

Importante:

• Crime permanente e imputabilidade. Se uma pessoa menor de 18 anos inicia a prática de um crime permanente (ex.: sequestro) e atinge a maioridade enquanto não cessada a permanência, aplica-se a legislação penal, tendo em vista que passou a ser imputável durante a prática da conduta.

• Crime continuado e imputabilidade. Se alguém praticar dois atos infracionais da mesma espécie (ex.: furto) e outros dois furtos já quando maior de 18 anos, as duas primeiras condutas não serão consideradas para fim de reconhecimento de crime continuado.

• Fixação da imputabilidade (tempo da conduta). Se um menor de 18 anos desfere facadas na vítima que vem a falecer dias depois, ocasião em que já atingiu a maioridade, aplica-se o Estatuto da Criança e do Adolescente e não o Código Penal, tendo em vista que o ato infracional foi praticado na época em que era inimputável (momento da conduta).

2. VIGÊNCIA DA LEI PENAL

Da mesma forma que as demais leis, a lei penal está sujeita, quanto à sua obrigatoriedade e efetiva vigência, às mesmas regras de publicação oficial e decurso do prazo de vacatio. Igualmente, pode ser revogada totalmente (ab-rogação) ou parcialmente (derrogação).

Em regra, os fatos praticados na vigência de uma lei devem ser por ela regidos (tempus regit actum). Como exceção à regra, é prevista a extra-atividade da lei penal

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mais benéfica (CF, art. 5º, XL, e CP, art. 2°), possibilitando a sua retroatividade (aplicação da lei penal a fato ocorrido antes de sua vigência) ou a ultra-atividade (aplicação da lei após a sua revogação, mas a fato ocorrido durante a sua vigência), desde que ainda não esgotadas as consequências jurídicas do fato.

A lei processual penal, por sua vez, possui aplicação imediata (CPP, art. 2°).

3. CONFLITO DE LEIS PENAIS NO TEMPO

Este conflito de leis penais é solucionado pelo art. 5°, XL, da CF: "a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu". Dessa norma constitucional extraem-se os seguintes princípios: princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa; princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica.

3.2. lei nova mais severa (novatio legis in pejus; - lex gravior)

A lei nova mais grave não pode ser aplicada aos fatos ocorridos antes de sua vigência (princípio da irretroatividade da lei nova mais severa).

Sendo a lei nova mais severa, os fatos praticados antes de sua vigência serão regulados pela lei revogada, que possuirá ultra-atividade.

Súmula 711 do STF – A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.

3.3. Lei nova mais benéfica (novatio legis in mellius - lex mitior)

A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado".

A lei nova será aplicada pela autoridade judiciária competente para o julgamento da ação (antes do trânsito em julgado). Depois do trânsito em julgado da sentença condenatória compete ao juiz da execução aplicar a lei nova, nos termos da Súmula 611 do STF.

3.4. Abolitio criminis

3.4.1. Descriminalização

Conforme o art. 2°, caput, do CP, ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.

Nos termos do art. 107, inc. Ili, do CP, ocorre a extinção da punibilidade.

Depois do trânsito em julgado da condenação, cessam a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Observe-se que não cessam os efeitos extrapenais (ex.: arts. 91 e 92 do CP), como a obrigação civil de reparação do dano causado pelo crime e outros efeitos secundários de natureza extrapenal.

Obs.: a sentença penal condenatória transitada em julgado possui efeitos principais (imposição da sanção penal) e efeitos secundários (de natureza penal e extrapenal). Ocorrendo abolitio criminis, somente cessam os efeitos penais (principais e secundários

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de natureza penal). Desse modo, uma pessoa condenada irrecorrivelmente por adultério e que viesse a praticar novo crime logo após a revogação da lei ocorrida em 2005 não seria considerada reincidente, pois com a abolitio criminis cessam os efeitos secundários de natureza penal da condenação pelo crime de adultério.

3.4.2. Abolitio criminis temporária

Situação interessante surgiu com a Lei n.10.826/03 (Estatuto do Desarmamento) ao estabelecer um prazo para que os possuidores e proprietários de armas de fogo entregassem ou regularizassem o registro da arma. Durante esse prazo, não houve a incidência do crime de posse de arma de fogo. Esse prazo é chamado de abolitio criminis temporária ou indireta.

3.4.3. Princípio da descontinuidade normativo-típica

Pode ocorrer a revogação formal da lei sem que ocorra a abolitio criminis, em razão de inexistir a descontinuidade normativo-típica.

Como exemplo, pode ser citado o crime de atentado violento ao pudor (CP, art. 214).

Ou seja, o fato definido como crime não deixou de ser considerado crime.

3.5. Lei nova incriminadora

A lei passa a considerar determinado fato como crime. Não se pode aplicá-la aos fatos ocorridos antes de sua vigência, em observância ao princípio da anterioridade.

4. LEI EXCEPCIONAL E LEI TEMPORÁRIA

4.1. Conceito legal

Lei excepcional é aquela que possui vigência durante situação transitória emergencial, como nos casos de guerra, calamidade pública, inundação etc. Não é fixado prazo de vigência, que persistirá enquanto não cessar a situação que a determinou.

Lei temporária, por sua vez, é aquela que possui vigência previamente determinada.

Pode-se dizer que são leis autorrevogáveis e criadas para atender situações anômalas.

Nos termos do art. 3° do CP, "a lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência". Assim, o dispositivo permite que em relação a essas leis seja aplicada a ultra-atividade gravosa, devido à sua finalidade.

5. CONFLITO APARENTE DE LEIS PENAIS

Na hipótese de determinado fato apresentar dificuldade para a correta adequação típica, tendo em vista que aparentemente se mostra subsumido a mais de um tipo penal, surge o conflito aparente de normas. Assim, a unidade de fato e a pluralidade de normas (de tipos penais) são os pressupostos desse conflito.

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Para solucionar a questão, evitando o bis in idem, tem-se quatro princípios: princípio da especialidade, princípio da subsidiariedade, princípio da consunção e princípio da alternatividade.

5.1. Princípio da especialidade

No conflito entre um tipo penal específico e um tipo penal genérico, prevalece o específico o tipo penal específico (que pode estar contido no Código Penal ou na legislação penal especial) contém todos os elementos do tipo penal genérico e outros que caracterizam a especialidade.

5.2. Princípio da subsidiariedade

O tipo subsidiário (norma subsidiária) descreve um crime autônomo com cominação de pena menos grave que a prevista em outro tipo penal, chamado de norma primária. A norma subsidiária funciona como um "soldado de reserva" (expressão cunhada por Nélson Hungria), aplicando-se quando não houver incidência da norma primária.

5.3. Princípio da consunção

Ocorre a absorção de um delito por outro, tornando-se uma unidade complexa.

5.4. Princípio da alternatividade

Assim, mesmo havendo várias formas de conduta (mais de um verbo) no mesmo tipo, somente haverá a consumação de um único delito, independente da quantidade de condutas realizadas no mesmo contexto. Na realidade, observa-se que não há conflito de normas, mas conflito dentro da própria figura típica . Ex.: art. 122 do CP; art. 33, caput, da Lei i i.343/06.

LEI PENAL NO ESPAÇO

1. TERRITORIALIDADE

1.1. Princípio da territorialidade relativa ou mitigada

Em regra, ao crime praticado no território nacional aplica-se a lei brasileira. Como exceção, pode ocorrer a incidência da lei de outro país a um crime praticado no território nacional, desde que haja previsão em convenções, tratados e regras de direito internacional.

O Código Penal adotou o princípio da territorialidade, porém de forma temperada ou mitigada por permitir a aplicação de convenções, tratados e regras de direito internacional.

1.2. Conceito de território nacional

a) sentido jurídico: espaço sujeito à soberania do Estado.

b) sentido material, efetivo ou real: o território abrange a superfície terrestre (solo e subsolo), as águas interiores, o mar territorial (12 milhas marítimas a partir da baixa-mar do litoral continental e insular - Lei n° 8.617/93, art. 1°) e o espaço aéreo

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correspondente (teoria da soberania sobre a coluna atmosférica). No caso de território neutro, aplica-se a lei do país do agente.

c) território por extensão ou flutuante: para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional:

- as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública

ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem (CP, art. 5°, § lº, l• parte).

- as aeronaves e as embarcações brasileiras (matriculadas no Brasil), mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ao alto-mar ou em alto-mar (CP, art. 5°, § 1°, 21 parte). O dispositivo está de acordo com a "lei da bandeira" ou "princípio do pavilhão, da representação, da substituição ou subsidiário".

Observa-se, segundo disposições do § 2°, que a legislação nacional é aplicada mesmo se o crime for praticado a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, desde que:

1) a aeronave estrangeira privada se encontre em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, inclusive ao do mar territorial;

2) a embarcação estrangeira privada se encontre em porto ou no mar territorial do Brasil.

1.3. Questões pontuais

Princípio da reciprocidade. As embarcações e aeronaves estrangeiras, de natureza pública ou a serviço do governo estrangeiro, são consideradas extensão do território estrangeiro, mesmo se estiverem em território brasileiro.

Embaixadas. Para fins penais, as embaixadas estrangeiras situadas no território brasileiro não são consideradas extensão do território estrangeiro, bem como as embaixadas do Brasil em território estrangeiro não são consideradas território brasileiro por extensão.

2. LUGAR DO CRIME (LOCUS COMMISSI DWCTI)

Nos termos do art. 6° do CP, considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a açõo ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.

Existem várias teorias acerca do lugar do crime. As principais são:

a) teoria da atividade: local em que ocorreu a conduta;

b) teoria do resultado: local em que ocorreu o resultado;

c) teoria pura da ubiquidade, mista ou unitária: local em que ocorreu a ação ou omissão (conduta), no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.

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O Código Penal adotou a teoria da ubiquidade ou mista· Não se deve confundir com as regras de competência interna (processo penal), independentemente de se tratar do art. 5° ou 7° do Código Penal.

O dispositivo é aplicável aos chamados crimes à distância (a conduta é praticada em território estrangeiro e o resultado ocorre no Brasil ou vice-versa). Ou seja, se a conduta ou o resultado ocorrerem no território brasileiro, aplica-se nossa lei (CP, art. 5° c/c art. 6° ). Mesmo se a conduta e o resultado ocorrerem fora do território nacional, nossa lei penal poderá ser aplicada em alguns casos (CP, art. 70).

A hipótese de tentativa vem disposta na expressão "deveria produzir-se o resultado". Para ser aplicado o art. 5°, a circunstância alheia à vontade do agente que impediu a consumação do delito deve ocorrer no território nacional. Não há interesse do Estado de punir o agente se nenhuma fase ofensiva do delito (execução ou consumação) tiver sido praticada em nosso país.

Se uma bomba é enviada da Argentina para o Brasil, mas sequer chega a entrar no território nacional, o crime não tocou em nosso País, de sorte que o Brasil não pode ser considerado lugar do crime. Isto quer dizer que não importa a intenção do agente, mas apenas que parte da execução do crime tenha se realizado em nosso território.

3. EXTRATERRITORIALIDADE

O artigo 7º dispõe acerca da aplicação da lei brasileira a crimes cometidos em território estrangeiro, ao passo que o art. 5º trata da aplicação de lei brasileira a crimes cometidos em território brasileiro.

Obs.: não se aplica a lei penal brasileira às contravenções penais praticadas no estrangeiro (LCP, art. 2°).

3. 1. Extraterritorialidade incondicionada

Aplica-se a lei nacional a determinados crimes cometidos fora do território, independentemente de qualquer condição, ainda que o acusado seja absolvido ou condenado no estrangeiro. São os seguintes crimes (CP, art. 7°, 1).

3.2. Extraterritorialidade condicionada

Aplica-se a lei nacional a determinados crimes cometidos fora do território, desde que haja o concurso de algumas condições (art. 7°, lI, e §§ 2° e 3°, do CP).

Questão: uma brasileira, a bordo de uma embarcação estrangeira de propriedade privada (embarcação registrada em país que não pune o aborto), enquanto navega em alto-mar, consente que terceiro provoque o aborto. Pergunta-se: será aplicada a lei penal brasileira? Resposta: não. Embora se trate de um fato considerado crime pela lei penal brasileira (art. 124 do CP), foi praticado fora do nosso território e em local em que não se pune o aborto, de sorte que faltará a condição disposta no art. 7°, § 2°, alínea "b". Deve haver a dupla tipicidade.

3.4. Extraterritorialidade prevista na Lei n° 9.455/97 (tortura)

Nos termos do art. 2° da Lei nº 9.455/97: "O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira

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ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira". Ou seja, trata de outra hipótese de extraterritorialidade da lei penal brasileira.

5. LEI PENAL EM RELAÇÃO ÀS PESSOAS

5.1. Imunidades Diplomáticas

Trata-se de prerrogativa dos membros do quadro diplomático de carreira (do embaixador ao terceiro-secretário). bem como dos membros do quadro administrativo e técnico (desde que oriundos do Estado acreditante, e não recrutados in locu), de não se sujeitarem à jurisdição criminal do país (a11. 31). Estende-se aos familiares, mas desde que vivam sob dependência e tenham sido incluídos na lista diplomática (a11. 37). Aplica-se. também. ao chefe de Estado estrangeiro, e membros de sua comitiva, em visita ao país.

Nos termos do a11. 29 da referida Convenção, a pessoa do agente diplomático é inviolável, não podendo ser objeto de nenhuma forma de detenção ou prisão.

As sedes diplomáticas (a11. 22) e as residências dos membros do quadro (al1. 30) são invioláveis, mas não são consideradas como território estrangeiro.

Os cônsules possuem apenas imunidade ao processo - penal ou civil - pelos atos realizados no exercício de suas funções (REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público, p. 162). Não se estende aos familiares.

2. Imunidades Parlamentares

A imunidade parlamentar (ou material ou substancial) está vinculada às atividades parlamentares, razão pela qual deve haver conexão temática entre o exercício do mandato e a eventual ofensa.

Os excessos cometidos, com o firme propósito de ofender a honra alheia, não estão acobertados pela imunidade, já que não há nexo com a atividade legislativa.

Entendemos que a liberdade dos parlamentares por suas opiniões, palavras e votos que extrapolam o ordinário, de forma abusiva, a ponto de rebaixar-se a um insulto, não merece proteção constitucional, mesmo que a manifestação seja dentro do Congresso Nacional, uma vez que deve prevalecer o valor fundamental da dignidade da pessoa humana.

O art. 53, caput, também se aplica aos Deputados Estaduais por força do art. 27, § 1°, da CF. Por sua vez, a CF garante no art. 29, VIII, a "inviolabilidade dos Vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município".

O Presidente goza de imunidade à prisão, nos termos do art. 86, § 3º, da CF: Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da República não estará sujeito à prisão.

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TEORIA GERAL DO CRIME

1.

CONCEITO DE CRIME

a) Material (substancia): refere-se ao conteúdo do ilícito penal, com análise da conduta danosa e sua consequência social. Nesse sentido, crime é o comportamento humano que causa lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico.

b) Formal (formal sintético): conceito sob o aspecto da contradição do fato à norma penal, ou seja, é toda a conduta (ação ou omissão) proibida por lei sob ameaça de pena.

c) Analítico (dogmático ou formal analítico): enfoca os elementos ou requisitos do crime. O delito é concebido como conduta típica, antijurídica e culpável (conceito tripartido), ou apenas como conduta típica e antijurídica (conceito bipartido).

Crime (conceito tripartido)

Fato típico Ilicitude Culpabilidade

Crime (conceito bipartido)

Fato típico Ilicitude

Pelo conceito bipartido, a culpabilidade não é elemento do crime, mas sim pressuposto de aplicação da pena. Pode ter ocorrido o crime (fato típico + ilicitude) e mesmo assim ser o agente isento de pena.

Predomina na doutrina o conceito tripartite, bem como é o posicionamento do STF e do STJ. Em relação a este: "A imputabilidade, a exigibilidade de conduta diversa e o potencial conhecimento da ilicitude constituem pressupostos da culpabilidade como elemento integrante do conceito analítico do crime (. . .)!' (STJ: HC 123.265/MG, 6• T, j. 24/11/2009). No mesmo sentido: STJ-HC 170.135/ PE, 6• T., j. 14/06/2011).

Obs.: nos termos do art. 1° da Lei de Introdução ao Código Penal: considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.

2. CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA DOS CRIMES

2.1 Crime simples, crime qualificado e crime privilegiado

Crime simples: é o tipo penal básico (ex.: art. 121, caput, - homicídio), sem conter circunstância que modifique a pena.

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Crime qualificado: o tipo penal possui circunstância que torna a pena mais elevada do que a do tipo básico (ex.: art. 121, § 2° - homicídio qualificado).

Crime privilegiado: possui circunstância que torna a pena menos grave do que a do tipo básico (ex.: art. 242, parágrafo único).

2.2. Crime comum, crime próprio e crime de mão própria

Crime comum: o tipo penal não exige nenhuma qualidade específica do sujeito ativo, de modo que qualquer pessoa poderá praticá-lo (ex.: homicídio, lesão corporal, furto, roubo, estelionato).

Crime próprio: o tipo penal exige uma qualidade especial do sujeito ativo (ex.: art. 312 - peculato, que requer a qualidade de funcionário público).

Crime de mão própria: o tipo penal exige do sujeito ativo qualidade específica e, ainda, que realize a conduta pessoalmente, de sorte que não se admite coautoria e, segundo predomina, nem a autoria mediata. Ex.: crime de autoaborto (CP, art. 124, 1 1 parte).

2.4. Crime instantâneo, crime permanente e crime instantâneo de efeitos permanentes

Crime instantâneo: a consumação é imediata (ex.: art. 121 - homicídio).

Crime permanente: a consumação se protrai no tempo (ex.: art.148 - sequestro).

Crime instantâneo de efeitos permanentes: a consumação é imediata, mas o resultado se prolonga no tempo independente da vontade do agente (ex.: art. 235 – bigamia).

2.5. Crime habitual

A consumação, em regra, não ocorrerá com a prática de apenas um ato, mas sim de vários atos que caracterizaram um estilo de vida. (ex.: art. 284 - curandeirismo; art. 282 - exercício ilegal de medicina, arte dentária ou farmacêutica).

2.6. Crime comissivo, crime omissivo e crime de conduta mista

Crime comissivo: o tipo penal descreve uma ação proibida (ex.: art. 121). A norma penal é proibitiva.

Crime omissivo próprio: o tipo penal descreve uma conduta omissiva (não fazer). Para sua consumação dispensa qualquer resultado naturalístico. A norma penal nesse caso é preceptiva ou mandamental (ex.: art. 135 - omissão de socorro).

Crime omissivo impróprio (comissivo por omissão): em certas situações (art. 13, § 2°), mesmo o tipo penal descrevendo uma ação, pode haver a sua execução por omissão. o agente deixa de evitar o resultado quando podia e devia agir (ex.: salva-vidas dolosamente deixa de evitar a morte de pessoa que estava se afogando – art. 121, c/c art. 13, § 2°, do CP). Sua consumação se dá no momento.

2.8. Crime unissubsistente e crime plurissubsistente

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Crime unissubsistente: consuma-se com a prática de um só ato (ex.: injúria verbal); crime plurissubsistente: consuma-se com a prática de um ou vários atos (ex.: art. 121 – homicídio).

2.9. Crime consumado, crime tentado e crime exaurido

Crime consumado: ocorre quando se reúnem todos os elementos de sua definição legal (art. 14, I); crime tentado: ocorre quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente (art. 14, li); crime exaurido: consequência mais lesiva após a consumação (ex.: recebimento da vantagem após a extorsão mediante sequestro).

2.11. Crime material, crime formal e crime de mera conduta

Crime material: o tipo descreve a conduta e o resultado naturalístico. Para consumar o delito é necessário o resultado naturalístico (ex.: homicídio, furto, roubo).

Crime formal (consumação antecipada): o tipo descreve uma conduta que possibilita a produção de um resultado naturalístico, mas não exige a realização deste (ex.: no crime de extorsão mediante sequestro o tipo descreve a conduta de sequestrar, bem como descreve o resultado, que é o recebimento da vantagem, mas para a sua consumação basta o sequestro com o fim de alcançar o resultado).

Sobre o tema merece destaque o enunciado da Súmula 500 do STJ : "A configuração do crime do art. 244-B do ECA independe da prova da efetiva corrupção do menor, por $e tratar de delito formal".

Crime de mera conduta: o tipo descreve apenas a conduta, da qual não decorre nenhum resultado naturalístico externo a ela (ex.: porte ilegal de arma de fogo). Obs.: para alguns autores, não existe diferença entre crimes formais e de mera conduta, já que em ambos não é exigida a produção de nenhum resultado naturalístico.

2.12. Crime de dano e crime de perigo

Crime de dano: consuma-se com a efetiva lesão ao bem jurídico (ex.: art. 121 - homicídio).

Crime de perigo: consuma-se com a possibilidade de lesão ao bem jurídico (ex.: art. 132 - periclitação). Pode ser de perigo concreto, i.e., necessita de comprovação do perigo (ex.: CTB, art. 309 - Dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida Permissão para Dirigir ou Habilitação ou, ainda, se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano), ou de perigo abstrato/presumido (ex.: art. 130 - perigo de contágio venéreo), que dispensa a comprovação do perigo. Parte da doutrina critica a criação de crimes de perigo abstrato sob a justificativa de haver violação do princípio da ofensividade.

4. OBJETO DO CRIME

O objeto do crime subdivide-se em objeto jurídico e objeto material:

a) objeto jurídico: bem ou interesse tutelado pela norma. Exemplos : no crime de homicídio é a vida; no crime de furto é o patrimônio; no crime de estupro é a liberdade sexual.

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b) objeto material: pessoa ou coisa atingida pela conduta criminosa. Exemplos: no crime de homicídio o objeto material é a pessoa; no crime de furto é a coisa subtraída. Pode haver crime sem objeto material, como na hipótese de falso testemunho.

CONDUTA

O crime é formado por três elementos: FATO TÍPICO + ILICITUDE + CULPABILIDADE (conceito tripartido). Entretanto, pelo conceito bipartido (posição minoritária), o crime se constitui de apenas dois elementos (FATO TÍPICO + ILICITUDE), figurando a CULPABILIDADE como pressuposto de aplicação da pena.

2. CONCEITO DE CONDUTA

Conduta é um agir humano, ou um deixar de agir, de forma consciente e voluntária, dirigido a determinada finalidade. A conduta deve ser concebida como um ato de vontade com conteúdo (finalidade/querer interno). Para que a conduta seja típica deverá ser dolosa (crime doloso) ou culposa (crime culposo).

Segundo predomina na doutrina, o Código Penal adotou a teoria finalista da conduta de Hans Welzel (atualmente essa teoria é complementada por princípios constitucionais).

CRIME

FATO TIPICO ANTIJURIDICIDADE CULPABILIDADE

1. Conduta

2. resultado

3. nexo causal

4. tipicidade

1. imputabilidade

2. potencial consciência

da ilicitude do fato

3. exigibilidade de conduta

diversa

3.3. Teoria finalista - Concepção finalista (ôntico-fenomenológica)