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Direito Penal Militar

Prof. Rodolfo Souza

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Professor Rodolfo Souza

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Edital

DIREITO PENAL MILITAR: Aplicação da lei penal militar. Do Crime. Da Imputabilidade Penal. Concurso de agentes. Das penas principais. Das Penas acessórias. Efeitos da condenação. Ação penal. Extinção da punibilidade. Dos crimes militares em tempo de paz. Dos crimes contra a autoridade ou disciplina militar. Dos crimes contra o serviço e o dever militar. Dos crimes contra a Administração Militar.

BANCA: FUNRIO

CARGO: Soldado da 3ª Classe

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Direito Penal Militar

CONCEITO E PRINCÍPIOS

1. Conceito de Direito Penal Militar

É o ramo especializado do Direito Penal que estabelece as regras jurídicas vinculadas à prote-ção das instituições militares e ao cumprimento de sua destinação constitucional.

A especialidade do Direito Penal Militar decorre da natureza dos bens jurídicos tutelados, prin-cipalmente a autoridade, a disciplina, a hierarquia, o serviço e o dever militar, que podem ser resumidos na expressão “regularidade das instituições militares”.

2. Princípio da Legalidade

Nos termos do artigo 5º, XXXIX, Constituição de 1988 e do Art. 1º do CPM (Dec. Lei nº 1.001/69), “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.

No Brasil, é pacífico o entendimento de que apenas a lei (ordinária e complementar) em senti-do formal pode incriminar condutas (Princípio da Reserva Legal), tratando-se de competência privativa da União (art. 22, I, CF/88). Nessa linha, o STF já havia se manifestado no sentido de que medidas provisórias não podem incriminar condutas. A emenda constitucional nº 32/2001 trouxe vedação expressa ao tema no art. 62, § 1º, I, b, CF/88.

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Obs.: convém lembrar que nada impede a edição de Medidas Provisórias a fim de tratar maté-ria penal, desde que seja para dar tratamento mais benéfico ao acusado, a exemplo da MP n° 417/08, que alterou o Estatuto do Desarmamento (abolitio criminis temporária, que concedeu novo prazo para regularização e entrega de armas).

O Princípio da Legalidade também se desdobra na exigência da Taxatividade, a qual impõe que a lei penal deve ser certa, não admitindo descrições vagas e imprecisas da conduta proibi-da. Historicamente, é sabido que o Princípio da Legalidade nasceu da necessidade de limitar o poder sancionador do Estado. Tal garantia foi efetivada com a determinação de que a conduta incriminada estivesse previamente definida em lei (Princípio da Anterioridade).

O enunciado do princípio da legalidade diz respeito não só à incriminação de condutas, mas também à cominação das respostas penais – penas e medidas de segurança.

3. Princípio da Intervenção Mínima (Ultima Ratio ou Subsidiariedade)

De acordo com o princípio da intervenção mínima, a atuação do Direito Penal deve se restringir à proteção de bens jurídicos mais importantes e necessários à vida em sociedade. Portanto, o Direito Penal só intervirá naqueles casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais im-portantes.

Assim, somente quando se verificar que as demais áreas do Direito se revelaram incapazes de proteger devidamente os interesses mais importantes para a sociedade, o Direito Penal deve intervir, evidenciando seu caráter subsidiário de proteção aos bens jurídicos.

Na esfera penal militar, é importante a identificação de alguns bens jurídicos especialmente protegidos (por exemplo, hierarquia, a disciplina, o dever e os serviços militares) que não en-contram correspondência no Direito Penal comum e que dão peculiar alcance ao princípio da subsidiariedade.

4. Princípio da Lesividade (Ofensividade)

Determina que somente podem sofrer a incidência da lei penal as condutas que afetem grave-mente direitos de terceiros. À luz do referido princípio, proíbe-se a incriminação de condutas internas (pensamentos e sentimentos), bem como de condutas que não excedam o âmbito do próprio autor (autolesão; atos preparatórios; crime impossível).

Obs.: cumpre salientar a existência de valores importantes à vida na caserna, como a honra, a disciplina, os bons costumes e o pundonor militar, o que explica a tipificação do crime de pederastia ou outro ato de libidinagem no artigo 235 do Código Penal Castrense, como crime propriamente militar.

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5. Princípio da Adequação Social

Visa precipuamente o legislador, orientando-o na escolha de condutas a serem proibidas, bem como na revogação de tipos penais. Serve também como princípio interpretativo da norma penal. Assim, apesar de uma conduta se subsumir ao modelo legal, o juiz pode não considerá--la típica se for socialmente adequada, conforme a ordem social historicamente condicionada.

Obs.: merece especial atenção o delito previsto no artigo 204, do Código Penal Castrense, de exercício de comércio por oficial, o qual, segundoparte da doutrina, deveria ser abolido, dei-xando-se a repressão a cargo dos regulamentos disciplinares.

6. Princípio da Fragmentariedade

O caráter fragmentário do Direito Penal é a consequência da adoção dos princípios da inter-venção mínima, da lesividade e da adequação social. Informa o princípio que, de toda sorte de condutas vedadas ou impostas e de bens jurídicos protegidos pelo ordenamento jurídico, o Direito Penal somente se ocupa de pequenos fragmentos. O Direito Penal Castrense, por ser ramo especial do Direito Penal, deve incidir de forma ainda mais restrita.

7. Princípio da Insignificância (bagatela)

O legislador seleciona os direitos mais importantes para a vida em sociedade, elevando-os à categoria de bens jurídicos e, para tutelá-los, enuncia uma norma, a qual se concretiza em um tipo penal. Assim, a tipicidade penal requer que a conduta, além de enquadrar-se no tipo legal, viole a norma de proteção e afete o bem jurídico. Não se concebe, portanto, a existência de condutas típicas que não afetem o bem jurídico.

Haverá tipicidade material quando a conduta for ofensiva a bens de relevo para o Direito Penal, ficando afastados aqueles inexpressivos. Segundo jurisprudência do pretório excelso, para se caracterizar hipótese de aplicação do denominado “princípio da insignificância” e, assim, afas-tar a recriminação penal, é indispensável que a conduta do agente seja marcada pela ofensivi-dade mínima ao bem jurídico tutelado, reduzido grau de reprovabilidade, inexpressividade da lesão e nenhuma periculosidade social.

No Direito Penal Militar, o princípio da insignificância tem aplicação mais restrita perante sua especialidade em razão das naturezas dos bens jurídicos tutelados. Contudo, é importante des-tacar que a exposição de motivos do CPM reconhece que “entre os crimes de lesão corporal, inclui-se o de lesão levíssima, o qual, segundo o ensino da violência militar, pode ser desclassi-ficado pelo juiz para infração disciplinar, poupando-se, em tal caso, o pesado encargo de um processo penal para fato de tão pequena monta”.

Nesse cenário, rendendo homenagem ao princípio da insignificância, deve-se proferir sentença absolutória, com lastro na atipicidade da conduta, por não constituir o fato infração penal.

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Quanto ao furto atenuado, o artigo 240 §1° do CPM afirma que “se o agente é primário e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços ou considerar a infração como disciplinar. Entende-se pequeno o valor que não exceda a um décimo da quantia do mais alto salário mínimo do País”.

Por fim, tema polêmico e de grande relevância refere-se à aplicação do Princípio da Insignifi-cância ao crime de porte de pequena quantidade de substância entorpecente para consumo pessoal em lugar sujeito à administração militar, previsto no art. 290, CPM. Após um período de divergência entre as turmas do Supremo, o tema foi afetado ao plenário que, conforme no-ticiado no informativo n° 605, por apertada maioria, nos autos do HC 103684/DF (21.10.2010), decidiu que a posse, por militar, de reduzida quantidade de substância entorpecente em lugar sujeito, a administração militar não autoriza a aplicação do princípio da insignificância.

8. Princípio da Individualização das Penas

De acordo com o art. 5º XLVI, CF/88, “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:

a) Privação ou restrição da liberdade;

b) Perda de bens;

c) Multa;

d) Prestação social alternativa;

e) Suspensão ou interdição de direitos.

Importante consignar que o Direito Penal Militar possui um sistema sancionatório próprio, o que não significa desrespeito à individualização da pena. A título de exemplo, relembre-se que não há previsão de pena de multa no Código Penal Militar, nem de substituição de penas priva-tivas de liberdade por penas restritivas de direito.

As penas de reclusão e detenção, quando cumpridas no âmbito da justiça militar, são executa-das em regime fechado, não havendo previsão de progressão de regime no Código Castrense. Todavia, merece registro recente da decisão da segunda turma do STF, que concedeu parcial-mente a ordem de HC para determinar ao juízo da execução penal que promova a avaliação das condições objetivas e subjetivas para progressão de regime prisional, na concreta situação do paciente, e que aplique, para tanto, o Código Penal e a Lei nº 7.210/84 naquilo que for omissa a Lei Castrense.

9. Princípio da Limitação ou da Humanidade das Penas

O art. 5º, XLVII, CF/88 dispõe que não haverá penas:

a) De morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;

b) De caráter perpétuo;

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c) De trabalhos forçados;

d) De banimento;

e) Cruéis.

A vedação constitucional atende a um fundamento do Estado Democrático de Direito, previsto no art. 1º, III, CF/88: a dignidade da pessoa humana, que impõe uma limitação fundamental em relação à qualidade e à quantidade das penas. Mais uma vez, deve-se atentar para a especia-lidade do bem jurídico tutelado na esfera penal militar, sobretudo em tempo de guerra, daí a autorização constitucional de cominação e aplicação de pena de morte.

10. Princípio da Proporcionalidade

Ilustrado pela máxima que diz que “não se matam pássaros com tiros de canhão”, o princípio da proporcionalidade exige que se faça um juízo de ponderação sobre a relação existente entre o bem jurídico lesionado ou colocado em perigo (gravidade do fato) e o bem de que pode al-guém ser privado (gravidade da pena).

11. Princípio da Responsabilidade Pessoal (ou da pessoalidade ou da intranscendência da pena)

De acordo com o art. 5º, XLV, CF/88, “nenhuma pena passará da pessoa do condenado, poden-do a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens, nos termos da lei, se estendida aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transfe-rido.

Assim, somente o condenado deverá submeter-se à sanção penal que lhe foi imposta pelo Es-tado, tendo em vista que a pena é uma medida de caráter estritamente pessoal, haja vista ser uma ingerência ressocializadora sobre o condenado.

APLICAÇÃO DA LEI PENAL MILITAR

1. Aplicação da Lei Penal Militar no Tempo

O Direito Penal Militar segue o princípio geral do tempus regit actum. Portanto, aplica-se a lei penal em vigor quando foi praticado o fato e, sobrevindo nova lei, somente retroagirá para be-neficiar o acusado (art. 2º, CPM e art. 5º, XL, CF/88).

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2. Regras do Conflito aparente de Leis no Tempo

2.1. Abolitio Criminis – descriminalização de condutas (art. 2º, CPM) Ocorre a abolitio criminis quando nova lei descriminaliza conduta anteriormente criminalizada, não afastando a existência do crime já cometido, mas extinguindo sua punibilidade (art. 123, III, CPM) e afastando todos os efeitos penais (primários e secundários) da sentença condenató-ria, mesmo com o trânsito em julgado.

Ao dispor sobre a lei supressiva de incriminação, o art. 2º do CPM afirma que “ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando, em virtude dela, a própria vigência da sentença condenatória irrecorrível”.

2.2. Retroatividade da Lei Mais Benigna – Lex Mitior ou Novatio Legis in MelliusA lei penal nova só alcança fato ocorrido antes de sua vigência se for melhor, mais benéfica, pois o preceito constitucional determina que “a lei não retroagirá, salvo para beneficiar o réu” (art. 5º, XL, CF/88).

É considerada benéfica, por exemplo, a lei que reduz a pena, permite a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, facilita a progressão de regime etc. De acordo com o artigo 2º, §1º do CPM, “a lei que, de qualquer outro modo, favorece o agente, aplica-se retroativamente, ainda quando já tenha sobrevindo sentença condenatória irrecorrível.

2.3. Irretroatividade da Lei PenalA novatio legis incriminadora (lei nova que torna conduta que antes era permitida) e a lex gra-vior ou novatio legis in pejus (nova lei mais gravosa) nunca retroagirão. Assim, o juiz é obrigado a aplicar a lei anterior, vigente ao tempo do crime, mesmo depois de revogada. Trata-se da efi-cácia ultra-ativa da norma mais benéfica, que deve prevalecer por força do que prescreve o art. 5º, XL, CF/88.

2.4. Extra-atividade da Lei Intermediária mais benéficaSe, depois de praticado um crime, houver sucessão de mais de uma lei penal e a lei mais be-néfica situar-se no período intermediário, essa terá aplicação retroativa e terá ultra-atividade, aplicando-se após a sua revogação pela lei posterior, que, por ser mais gravosa, não poderá retroagir.

2.5. Vacatio LegisA doutrina entende que a lei penal mais benéfica pode ser aplicada imediatamente, mesmo no período de vacatio legis, porque este instituto é protetivo e visa dar à sociedade um tempo de adaptação à nova ordem legal, não podendo limitar a garantia da retroatividade prevista na Constituição Federal.

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2.6. Apuração da Maior Benignidade

A lei melhor é aquela que atenua a resposta penal, reduzindo o tempo de encarceramento ou a quantidade de pena, por exemplo. É possível que uma nova lei pareça mais gravosa em abstra-to, mas que no caso concreto efetivamente seja mais benéfica, devendo retroagir. Portanto, a benignidade da nova lei deve ser sempre aferida no caso concreto, cabendo exclusivamente ao juiz comparar a lei em confronto de per si e decidir qual é a mais benéfica.

Nessa linha, o art. 2º, §2º do , orienta que, “para se reconhecer qual a mais favorável, a lei posterior e a anterior devem ser consideradas separadamente, cada qual no conjunto de suas normas aplicáveis ao fato”.

2.7. Combinação de Leis

A doutrina dominante e a jurisprudência dos tribunais superiores (súmula 501, STJ) têm orien-tação consolidada no sentido de que não é possível a combinação de elementos benéficos de leis distintas, uma vez que, agindo assim, o juiz estaria criando uma terceira lei (lex tercia). Con-forme já anotado no tópico anterior, o Código Penal Militar expressamente veda a combinação de leis, afirmando que a verificação da maior benignidade de cada lei deve ser feita em separa-do, à luz do conjunto de suas normas aplicáveis ao fato.

2.8. Lei Aplicável às Medidas de Segurança

O artigo 3º do Código Penal Militar estatui que “as medidas de segurança regem-se pela lei vigente ao tempo da sentença, prevalecendo, entretanto, se diversa, a lei vigente ao tempo da execução”. O referido dispositivo pode ser interpretado à luz do art. 5º, XL, CF/88, pois a lei pe-nal posterior somente se aplica aos fatos anteriores a sua vigência se trouxer algum benefício ao réu. Todavia, alguns doutrinadores entendem que o artigo não foi recepcionado pela Cons-tituição.

Não se deve esquecer que as medidas de segurança no Direito Penal Militar não são aplicáveis somente aos inimputáveis, mas assemelham-se muito às penas restritivas de direito do Direito Penal Comum (exílio local, proibição de frequentar determinados lugares, cassação de licença para dirigir veículos, dentre outras).

2.9. Ultra-atividade Gravosa das Leis Excepcionais ou Temporária

A Lei Temporária é aquela que traz em seu texto um período prefixado de duração, delimitando de antemão o lapso temporal em que estará em vigor. Já a Lei Excepcional é aquela que tem vigência enquanto persistirem determinadas circunstancias excepcionais, pois objetiva atender a situações extraordinárias, de anormalidade social ou de emergência.

O Código Penal Militar, à semelhança do Código Penal Comum, dispõe que “a lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência” (art. 4º, CPM).

Segundo a lei castrense, se alguém praticou uma infração penal durante a vigência da lei excep-cional ou temporária, mas só vem a ser julgado em momento posterior a sua revogação, já em

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período de normalidade, deve submeter-se àquela norma, ainda que mais gravosa. Portanto, a referida lei tem efeitos ultra-ativos.

3. Tempo do Crime

Para definir o tempo do crime, o Código Penal Militar adotou a Teoria da Atividade: “considera--se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o do resultado” (art. 5º). Nesse ponto, o estatuto penal castrense adota o mesmo critério do Código Penal Co-mum.

Obs.: Súmula nº 711, STF – “a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado e ao crime permanente, se sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou permanência”.

No concurso de analista judiciário do STM, em 2011, foi considerada errada a seguinte afirma-ção: “considere que um militar em atividade se ausente de sua unidade por período superior a 15 dias sem a devida autorização, sendo que, no decorrer de sua ausência, lei nova, mais severa e redefinindo o crime de deserção, entre em vigor. Nessa situação, será aplicada a lei referente ao momento da conduta de ausentar sem autorização, porquanto o CPM determina o tempo do crime de acordo com a teoria da atividade”.

De acordo com o gabarito, a banca examinadora adotou a orientação do Superior Tribunal Mili-tar de que o crime de deserção tem natureza permanente.

4. Lugar do Crime

Para definir o lugar do crime, diferentemente do Código Penal Comum, o artigo 6º do Código Penal Militar adota um Sistema Misto que concilia duas teorias.

• Quanto ao Crime Comissivo adota-se a Teoria da Ubiquidade (Mista ou Unitária), pois “considera-se praticado o fato, no lugar em que se desenvolveu a atividade criminosa, no todo ou em parte, e ainda que sob forma de participação, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado”.

• Quanto ao Crime Omissivo adota-se a Teoria da Ação ou Atividade, pois “considera-se o lugar do crime aquele em que deveria realizar-se a ação omitida”.

No concurso de Promotor de Justiça do Espírito Santo, em 2010, foi considerada errada a se-guinte afirmação: “no tocante ao lugar do crime, o CPM aplica a teoria da ubiquidade para os crimes comissivos e omissivos, do mesmo modo que o CP”.

Ao acolher a teoria da ubiquidade nos crimes comissivos, o legislador ampliou a noção de lugar do crime para incluir tanto aquele no qual se verifica a conduta do agente, como aquele no qual se verifica o resultado naturalístico (nos crimes em que é exigido) ou ainda do bem jurídico vio-lado (onde deveria produzir-se o resultado).

Por outro lado, tal ampliação pode ocasionar o inconveniente de duplo julgamento do mesmo fato no Brasil e no estrangeiro, óbice que pode ser resolvido pela regra do artigo 8º do com,

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que afasta o bis in idem, já que “a pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Bra-sil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas”.

5. Aplicação da Lei Penal Militar no Espaço

Mais uma vez, diversamente do tratamento adotado no Código Penal Comum, o Direito Penal Militar adota a territorialidade e a extraterritorialidade incondicionada igualmente como re-gras de aplicação da lei penal no espaço.

Segundo o caput do artigo 7º do CPM, “aplica-se a lei penal militar, sem prejuízo de conven-ções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no todo ou em parte no território nacional ou fora dele, ainda que, neste caso, o agente esteja sendo processado ou tenha sido condenado pela justiça estrangeira”.

5.1. Princípio da territorialidade

Aplica-se o referido princípio de forma temperada, uma vez que a aplicação da lei penal militar brasileira ocorrerá “sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional”.

No sentido jurídico, o território é o âmbito espacial sujeito ao poder soberano do Estado evi-denciado no território efetivo (real), que corresponde à superfície terrestre (solo e subsolo), às aguas territoriais (fluviais, lacustres e marítimas) e ao espaço aéreo correspondente (o Brasil adota a teoria da soberania sobre a coluna atmosférica).

Segundo orientação dominante, o mar territorial estende-se por 12 milhas da costa, não se confundindo com a zona econômica exclusiva, que é a faixa de 200 milhas. Alguns autores in-cluem a zona econômica exclusiva (200 milhas) no território jurídico.

O conceito jurídico de território desdobra-se na ficção do território por extensão ou flutuante, que no CPM alcança “as aeronaves e os navios brasileiros, onde quer que se encontrem, sob comando militar ou militarmente utilizados ou ocupados por ordem legal de autoridade com-petente, ainda que de propriedade privada” (art. 7º, §1º, CPM).

O Código Penal Militar vai além e amplia a sua incidência para aplicar-se “ao crime praticado a bordo de aeronaves ou navios estrangeiros, desde que em lugar sujeito à administração militar, e o crime atente contra as instituições militares” (art. 7º, §2º, CPM).

Para efeito de aplicação do Código Penal Militar, considera-se navio toda embarcação sob co-mando militar conforme o artigo 7º, §3º do CPM.

5.2. Princípio da extraterritorialidade irrestrita ou incondicionada

Aplica-se a lei penal militar ao crime cometido fora do território nacional, ainda que, neste caso, o agente esteja sendo processado ou tenha sido julgado pela justiça estrangeira.

A extraterritorialidade da Lei Penal Militar justifica-se como regra pela própria natureza da ati-vidade militar e pelos bens jurídicos tutelados, sendo suficiente para sua aplicação fora do ter-

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ritório nacional o Princípio da Soberania ou Defesa da Pátria, uma vez que o deslocamento de militares fora do território nacional e o interesse das instituições militares representam a sobe-rania do Estado Brasileiro.

6. Aplicação da Lei Penal Militar quanto às Pessoas

6.1. Definição de Militar para efeito de aplicação da Lei Penal Militar

Nos termos do artigo 22 do CPM, é “considerada militar, para efeito de aplicação deste Código, qualquer pessoa que, em tempo de paz ou de guerra, seja incorporada às forças armadas, para nelas servir em posto, graduação, ou sujeição à disciplina militar”.

O Estatuto dos Militares (Lei n° 6.880/80) define de forma mais ampla os militares como “os membros das forças armadas que, em razão de sua destinação constitucional, formam uma categoria especial de servidores da pátria”, podendo encontrar-se na ativa ou em inatividade.

a) Militares da Ativa

São militares da ativa, na ativa, em serviço ativo, em serviço na ativa, em serviço, em atividade ou em atividade militar.

• Os de carreira, aqueles que, no desempenho voluntário e permanente do serviço militar, tenham vitaliciedade assegurada ou presumida.

Obs.: em recentes julgados, o Superior Tribunal de Justiça e Superior Tribunal Militar têm reco-nhecido que o militar agregado deve ser considerado militar da ativa para o fim da aplicação do Código Penal Castrense.

• Os incorporados às forças armadas para a prestação de serviço militar inicial, durante os prazos previstos na legislação que trata do serviço militar.

Obs.: se o sujeito for considerado inapto em inspeção de saúde, ou declarar-se arrimo de famí-lia, ou possuir condenação criminal, não preencherá os requisitos para a incorporação. Assim, haverá defeito do ato de incorporação quando estiverem presentes alguns desses impedimen-tos e, mesmo assim, efetivar-se a sua inclusão no serviço ativo. Nesses casos, alerta o artigo 14, CPM, que o “o defeito do ato de incorporação não exclui a aplicação da lei penal militar, salvo se alegado ou conhecido antes da prática do crime”.

• Os componentes da reserva das forças armadas quando convocados, reincluídos, designa-dos ou mobilizados.

• Os alunos de órgãos de formação de militares da ativa e da reserva.

• Em tempo de guerra, todo cidadão brasileiro mobilizado para o serviço ativo nas forças armadas.

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b) Militares Inativos

Os militares na inatividade são.

• Reserva remunerada, quando pertençam à reserva das forças armadas e percebam remu-neração da União, porém sujeitos, ainda, à prestação de serviços na ativa, mediante convo-cação ou mobilização;

• Reformados, quando, tendo passado por uma das situações anteriores estejam dispensa-dos, definitivamente, da prestação de serviço na ativa, mas continuem a perceber remune-ração da União.

Obs.: o artigo 12 do Código Penal Militar afirma que o “militar da reserva ou reformado, empre-gado na administração militar, equipara-se ao militar em situação de atividade, para o efeito da aplicação da lei penal militar”. Nessa esteira, o artigo 13, CPM, dispõe que “o militar da reserva ou reformado, conserva as responsabilidades e prerrogativas do posto ou graduação, para o efeito da aplicação da lei penal militar, quando pratica ou contra ele é praticado crime militar”.

c) Militares dos Estados e a competência da Justiça Militar da União

Cumpre ressaltar que a competência da Justiça Militar da União restringe-se a processar e jul-gar os crimes militares definidos em lei e não apenas os militares das forças armada. De outro lado, a Justiça Militar dos Estados tem competência mais restrita, processando e julgando ape-nas militares dos Estados nos crimes militares definidos em lei, excluindo-se os crimes dolosos contra a vida de civil.

Segundo entendimento do STF, à luz do artigo 22, CPM, e do artigo 3° do Estatuto dos Militares, perante a Justiça Militar da União, somente é considerado militar propriamente dito o militar da ativa das Forças Armadas. O militar estadual (policial militar e bombeiro militar) é conside-rado civil (não militar propriamente dito). Em sentido oposto, o STM e o STJ consideram que o militar estadual da ativa é militar propriamente dito, para efeito de fixação de competência da Justiça Militar da União.

6.2. Militares Estrangeiros

De acordo com o artigo 11 do Código Penal Militar, “os militares estrangeiros quando em co-missão ou estágio nas forças armadas, ficam sujeitos à lei penal militar brasileira, ressalvados o disposto em tratados ou convenções internacionais”.

6.3. Referência a Brasileiro ou Nacional

O art. 26 do Código Penal Militar traz uma nota explicativa: “quando a lei penal militar se refere a brasileiro ou nacional, compreende as pessoas enumeradas como brasileiros na Constituição do Brasil”. Nos termos do artigo 12 da Constituição, o termo “brasileiro” é gênero que compor-ta duas espécies: os brasileiros natos e os naturalizados. Logo, não há diferença quando a lei penal militar refere-se a nacional ou a brasileiro (nato ou naturalizado).

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6.4. Equiparação a estrangeiros

O parágrafo único do artigo 26, CPM, explica que, “para os efeitos da lei penal militar, são con-siderados estrangeiros os apátridas e os brasileiros que perderam a nacionalidade”. A condição jurídica de estrangeiro corresponde aquelas pessoas que não nasceram em território nacional nem adquiriram a nacionalidade brasileira nos termos do artigo 12 da Constituição, sendo regi-dos pela lei 6.815/80.

6.5. Assemelhado

Dispõe o artigo 21 do Código Penal Militar que se “considera assemelhado o servidor, efetivo ou não, dos ministérios da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, submetido a preceito de dis-ciplina militar, em virtude de lei ou regulamento”. Segundo entendimento majoritário da dou-trina e pacífico do Superior Tribunal Militar, não existe a figura do civil assemelhado a militar.

Nessa linha, o STJ tem firme posicionamento de que o Soldado PM temporário, nos termos da Lei do Estado de São Paulo (Lei 11.064/02), presta serviços administrativos e auxiliares de saúde e de defesa civil, não sendo, portanto, considerado militar, mas civil – razão pela qual compete à Justiça Comum Estadual seu processo e julgamento.

6.6. Comandante

Comando é a soma de autoridade, deveres e responsabilidades de que o militar é investido le-galmente quando conduz homens ou dirige uma organização militar. O comando é vinculado ao grau hierárquico e constitui uma prerrogativa impessoal, em cujo exercício o militar se define e se caracteriza como chefe. Segundo o artigo 23 do CPM, “equipara-se ao comandante, para o efeito da aplicação da lei penal militar, toda autoridade com função de direção”.

6.7. Superior

A condição de superior é fundamental em algumas normas penais militares, daí o artigo 24, CPM, esclarecer que “o militar que, em razão de função, exerce autoridade sobre outro de igual posto ou graduação, considera-se superior, para efeito da aplicação da lei penal militar”.

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CRIME MILITAR

1. Conceito

O direito penal Militar é especial em virtude dos bens jurídicos tutelados: as instituições mi-litares, a hierarquia e a disciplina, o serviço militar e o dever militar, bem como a condição de militar como sujeito ativo ou passivo.

É a própria Constituição da República que aponta a especialidade dos Crimes Militares e da Jus-tiça competente para seu processo e julgamento, remetendo ao legislador ordinário a tarefa de definí-los (art. 124, CF e Art. 125, §4º, CF).

1.1. No Aspecto Material, o crime militar caracteriza uma acentuada violação do dever militar e dos valores das instituições militares, enquanto a transgressão disciplinar configura, pelo menos em tese, uma afronta mais branda àqueles valores, o que autoriza seu processa-mento pela via administrativa.

1.2. No aspecto formal, diferentemente do sistema penal comum, o Direito Penal Militar não adota o sistema bipartite, que classifica as infrações penais em crime e contravenções pe-nais. O Código Castrense somente se ocupa dos crimes militares, já que, nos termos de seu art. 19, afirma-se expressamente que “este código não compreende as infrações dos regulamentos disciplinares”. As transgressões disciplinares ficam a cargo dos regulamentos internos das insti-tuições militares.

2. Classificação Doutrinária

A doutrina mais moderna divide o crime militar em apenas dois grupos: propriamente e impro-priamente militares.

2.1. Crime propriamente militar é aquele cujo bem jurídico tutelado é inerente ao meio militar e estranho à sociedade civil (autoridade, dever, serviço, hierarquia, disciplina, etc.) e somente pode ser praticado por militar da ativa. Assim, é crime previsto somente no Código Penal Militar, pois o tipo penal é criado especificamente para proteger interesses jurídicos ex-clusivos da vida militar e o sujeito ativo só pode ser militar da ativa, uma vez que tal qualidade do agente é essencial ao tipo.

2.2. Crime Impropriamente Militar por afetar bens jurídicos comuns às esferas militar e civil (vida, integridade corporal, patrimônio etc), tem previsão legal tanto no Código Penal Militar quanto na legislação comum e pode ser praticado por militar ou por civil, mas só serão considerados militares se a conduta for praticada nas condições expressas no Código Castrense.

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3. Critérios Determinantes

De acordo com a doutrina, o Código Castrense não apresenta uma definição do crime militar, apenas enumera alguns critérios para orientar o intérprete na sua identificação. Prevalece o critério objetivo (ratione legais): é crime militar aquele elencado no Código Penal Militar.

Contudo, deve-se combinar o critério legal com alguma das hipóteses apontadas no art. 9º e 10º do CPM: ratione personae, ratione loci, ratione materiae ou ratione temporis.

• Ratione Personae: crime militar é aquele cujo sujeito ativo é militar.

• Ratione loci: crime militar é aquele que ocorre em lugar sujeito à administração militar.

• Ratione Materiae: exige-se dupla qualidade de militar – no ato e no sujeito. Crime cometi-do por militar em serviço ou em razão do serviço, mesmo que fora do lugar sujeito à admi-nistração militar.

• Ratione Temporis: crime militar é aquele cometido em determinada época ou circunstân-cia (tempo de guerra, período de exercícios ou manobras).

4. Crime Militar em tempo de paz (art. 9º, CPM)

4.1. Art. 9º, inciso I, do Código Penal Militar

Nos termos do art. 9º, inciso I do CPM, “consideram-se crimes militares, em tempo de paz: os crimes de que trata esse código, quando definidos de modo diverso na lei penal comum, ou nela não previstos, qualquer que seja o agente, salvo disposição especial”.

O inciso I apenas reconhece a existência dos crimes impropriamente militares (definidos de modo diverso da lei penal comum, qualquer que seja o agente) e dos propriamente militares (crimes não previstos na lei penal comum praticados somente por militar – “salvo disposição especial”).

Como já foi registrado, o crime próprio só pode ser praticado por militar, consistindo na viola-ção de deveres que lhes são próprios, sendo irrelevante o fato de o sujeito ativo estar de folga quando da suposta prática delituosa.

Exemplos de crimes propriamente militares:

• Motim e Revolta (art. 149 a 153, CPM);

• Violência contra superior (art. 157 e forma qualificada – art. 159, CPM);

• Reunião ilícita (art. 165, CPM);

• Recusa de Obediência (art. 163, CPM);

• Deserção (art. 187 a 192, CPM);

• Omissão de oficial (art. 194, CPM);

• Abandono de posto e outros crimes em serviço (art. 195 a 203, CPM);

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4.2. Crime Propriamente Militar e coautoria com civilA orientação mais tradicional da doutrina, encampada por Célio Lobão, é a impossibilidade de coautoria entre militar e civil no crime propriamente militar, não havendo que cogitar-se em aplicação do artigo 53 , 1º, in fine, CPM. De outro lado, Jorge de Assis defende que a condição pessoal de militar, por ser elementar do tipo, comunica-se ao concorrente por força do artigo 53, §1º, in fine, CPM.

O STM, em decisão recente, firmou entendimento que “não há que se falar em coautoria de ci-vil para a prática do crime de abandono de posto, por ser esse propriamente militar”. (Apelação nº 2007.01.050543-1/MS. 11/03/2008).

Quanto ao tema, o Superior Tribunal Militar já decidiu que, em caso de ofensa aviltante a infe-rior (art. 176, do CPM), havendo concursos de agentes é irrelevante que os concorrentes seja estranho á carreira militar. As circunstâncias elementares do crime consistentes na condição de militar e de superior se comunicam ao civil, por força do artigo 53, §1°, in fine, CPM.

4.3. Art. 9°, inciso II, do Código Penal MilitarNos termos do Art. 9°, II, do CPM “consideram-se crimes militares em tempos de paz (…) os cri-mes previstos neste código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticado por militar em situação e atividade”.

Todas as hipóteses caracterizam crimes impropriamente militares (ratione legis) tendo sempre como sujeito ativo militar em atividade (ratione personae). A posterior exclusão do serviço ati-vo das forças armadas é irrelevante, pois a condição de militar do agente que deve ser aferida no momento em que cometido o delito.

a) Contra militar na mesma situação – trata-se de crime impropriamente militar praticado por militar da ativa contra outro militar da ativa, não havendo necessidade de que um saiba da condição do outro, nem que os envolvidos estejam em situação de serviço, tampouco em lugar sujeito à administração militar.

De acordo com a jurisprudência dominante nos tribunais superiores (STF, STJ e STM), basta que os sujeitos ostentem a condição de militares da ativa para que o crime seja militar.

Todavia, sinalizando mudança de entendimento, foi noticiado informativo numero 626 do STF decisão da primeira turma deferindo habeas corpus para “declarar a incompetência da justiça castrense para apreciar ação penal instaurada pela suposta pratica do crime de lesão corporal grave cometido por um policial militar contra o outro, sem que os envolvidos conhecessem a si-tuação funcional de cada qual, além de não estarem uniformizados. Entendeu-se que a compe-tência da justiça militar, conquanto excepcional, não poderia ser fixada apenas à luz do critério subjetivo, mas também por outros elementos que e lhe justificassem a submissão, assim como a precípua analise de existência de lesão, ou não, do bem juridicamente tutelado”. (HC 99541/RJ).

Em sentido diverso e, mantendo a orientação tradicional o Supremo Tribunal Militar tem afirmado que “é desnecessária a conjugação da condição funcional com os demais elemen-tos circundante do crime, bastando que o agente e a vítima sejam militares das forças arma-das para a fixação da competência da justiça castrense”. (Embargos Infringentes 0000016-90.2003.7.01.0401/DF).

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Na mesma linha, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu que no crime de ameaça, que é impropriamente militar, se tanto o autor quanto a vítima são militares da ativa, enquadra-se a hipótese na alínea “a” do inciso II do artigo 9° do Código Penal Militar. (HC 123.802/PB).

Controvérsia: crimes envolvendo militares federais e dos estados: nos termos do artigo 124, da Constituição da Republica, a competência da Justiça Militar da União restringe-se a proces-sar e julgar os crimes militares definidos em lei e não apenas os militares das forças armadas.

De outro lado, as justiças Militares dos Estados têm competência mais restrita, processando e julgando apenas os militares dos Estados nos crimes militares definidos em lei, excluindo-se os crimes dolosos contra a vida de civil (125, §4°, CF).

A luz do Código Penal Militar (art. 22), perante a Justiça Militar da União, o militar estadual ( Po-licial Militar e Bombeiro Militar) não é considerado militar propriamente dito. De outro lado, os militares das forças armadas não são julgados perante as justiças Militares Estaduais, uma vez que essas julgam os militares dos Estados que pratiquem crimes militares.

O STF confirmando essa orientação concedeu habeas corpus, impetrado em favor de soldado da policia militar, denunciado pela suposta pratica do crime de desacato militar (CPM, art. 299) perpetrado contra oficial das forças armadas, para declarar a competência da justiça castrense estadual. (HC 105844/RS)

Em sentido oposto, o Superior Tribunal Militar considera que o militar estadual da ativa é mili-tar propriamente dito, para efeito de fixação de competência da Justiça Militar da União. (RSE 2002.01.007044-9/RS).

Em recente decisão a terceira turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que “lesões cor-porais praticadas por policial militar contra capitão do Exército, dentro de um batalhão de in-fantaria, local sujeito à Administração Militar Federal, é crime militar da competência da Justiça Militar da União, em face da qualificação do envolvidos e também pela proteção que merece o local onde acontecido os fatos. (CC 107.148/SP).

b) Em lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva ou reformado ou civil – trata-se de crime impropriamente militar (ratione legis), com definição idêntica no Código Penal Comum, mas que só poder ser praticado por militar da ativa (ratione personae) contra alguém que não ostente essa condição (militar da reserva, reformado ou civil) em lugar sujeito a administração militar (ratione loci).

Considera-se local sujeito à administração militar aquele que pertence ao patrimônio das ins-tituições militares ou que se encontra sob sua administração por disposição legal ou ordem de autoridade competente. Compreende nesse conceito bens imóveis e os móveis (veiculo, em-barcação ou aeronave).

c) Por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado ou civil – novamente cuida-se de crime impropriamente militar (ratio-ne legis), praticado por militar da ativa (ratione personae) em serviço, ou seja, exercendo sua função de natureza militar (ratione materiae), contra alguém que não ostente essa condição (militar da reserva, reformado ou civil) em qualquer lugar (ainda que fora do lugar sujeito à ad-ministração militar).

Por exemplo, durante o desfile em comemoração ao Dia da Independência, um militar em for-matura agride um civil, causando-lhe lesões corporais. Todavia, se o militar em atividade aban-

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donar o posto, não está mais no exercício da atividade militar, configurando hipótese de crime comum.

d) Durante o período de manobras ou exercícios, contra militar da reserva, ou reformado, ou civil – à semelhança da figura anterior, o crime é impropriamente militar (ratione legis), pratica-do por militar da ativa (ratione personae) contra alguém que não ostente essa condição (militar da reserva, reformado ou civil), em período de manobras ou exercícios (ratione Temporis).

Imagine-se um militar em período de manobras e exercícios (treinamento em campo) que, ao atravessar o terreno de uma fazenda, dispare contra o animal de propriedade de um civil, pro-vocando-lhe a morte. O comportamento caracteriza crime de dano e será tipificado no artigo 259, CPM.

e) Por militar em situação de atividade, contra o patrimônio sob a administração militar, ou a ordem administrativa militar – nessa hipótese, para configura-se o crime militar, é necessário que o militar da ativa cause lesão ao patrimônio ou à ordem administrativa militar.

4.4. Art. 9°, inciso III, do Código Penal Militar

Nos termos do Art. 9°, II, do CPM “consideram-se crimes militares em tempos de paz (…) os cri-mes praticados por militar da reserva, ou reformado ou civil, contra as instituições militares…”.

Todas as Hipóteses caracterizam crimes contra as instituições militares tendo sempre como su-jeito ativo pessoa que não seja militar propriamente dito: da reserva, reformado ou civil. Na hi-pótese, para efeito de conceituar o crime militar, equipara-se o militar da reserva ou reformado ao civil.

O referido inciso somente se aplica na esfera da Justiça Militar da União, uma vez que, como já registrado, a Justiça Militar Estadual somente julga militares dos Estados por expressa disposi-ção constitucional (125, §4°, CF).

a) Contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem administrativa militar – Trata-se de crime impropriamente militar praticado por sujeito que não ostenta a qualidade de militar da ativa contra o patrimônio sob a administração militar ou contra a ordem adminis-trativa militar (ratione materiae).

O roubo praticado por civil contra o patrimônio sob administração militar é crime militar, con-soante o artigo 9°, inciso III, alínea “a”, do Código Penal Militar, sendo irrelevante o local em que a ação se desenvolveu para a caracterização do delito. Portanto há crime militar no caso de civis que, agindo em conjunto, em local público, abordam militar e, sob ameaça de emprego de violência, roubam-lhe o carro e a arma que portava, pertencente ao Exército Brasileiro. (STM. Apelação 2005.01.049923-7/SP).

b) Em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou contra funcionário de Ministério Militar ou da Justiça Militar, no exercício de função inerente ao seu cargo – trata-se de crime impropriamente militar praticado por sujeito que não ostenta a qua-lidade de militar da ativa contra militar da ativa ou funcionários públicos da administração mili-tar ou da Justiça Militar (ratione personae), no exercício de função inerente a seu cargo (ratione materiae), e em lugar sujeito à administração militar (ratione loci).

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Conforme entendimento do STM, caracteriza-se os crimes militares de difamação e injúria, pre-vistos nos artigos 215 e 216, CPM, na situação em que “um oficial da reserva e outro civil, pai e filho, por meio de reiterados documentos encaminhados a diversas autoridades militares, nos quais invariavelmente ofendiam a dignidade e a honra de uma praça e um oficial, ambos do Exército Brasileiro. Tendo as ofensas se consumado no interior das Organizações Militares às quais foram encaminhados os documentos e dirigidos aos militares no pleno exercício das suas atividades. (Apelação nº 0000011-75.2007.7.03.0303/RS).

c) Contra militar em formatura, ou durante o período de prontidão, vigilância, observação, exploração, exercício, acampamento, acantonamento ou manobras – trata-se de crime impro-priamente militar praticado por sujeito que não ostenta a qualidade de militar da ativa contra militar da ativa (ratione personae) em formatura, ou durante o período de prontidão etc (ratio-ne materiae e temporis), qualquer que seja o lugar.

d) Ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de na-tureza militar, ou no desempenho do serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública, administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquele fim, ou em obediência à determinação legal superior – é hipótese semelhante à anterior, de crime impro-priamente militar praticado por sujeito que não ostenta a qualidade de militar da ativa contra militar da ativa (ratione Personae), em função de natureza militar, ou no desempenho de ser-viço de vigilância, garantia e preservação da ordem (ratione materiae), independentemente do local.

O civil que descumpre ordem de soldado do Exército em serviço externo de policiamento de trânsito de fronte a quartel responde por delito de desobediência (art. 301, CPM), consoante a alínea “d” inciso III do artigo 9º do CPM, uma vez que o militar teria agido, na garantia e na pre-servação da ordem pública, a partir do poder de polícia, que a segurança pública propriamente dita poderia implementar. (HC 115671/RJ - STF).

No âmbito da Justiça Militar da União, o homicídio doloso praticado por civil contra militar em situação de serviço configura crime militar. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de ser constitucional o julgamento dos crimes dolosos contra a vida de militar em servi-ço pela Justiça Castrense, sem a submissão destes crimes ao Tribunal do Júri, nos termos do art. 9º, inc. III, “d” do CPM. (HC 91003/BA).

5. Homicídio doloso praticado por militar contra civil (art. 9°, parágrafo único do CPM)

“Os crimes de que trata esse artigo quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão da competência da justiça comum, salvo quando praticados no contexto de ação militar realiza-da na forma do artigo 303 da Lei nº 7.565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica).”

Segundo o entendimento dominante nos tribunais superiores (STF e STM), o parágrafo único do artigo 9º, CPM só pode ser aplicado aos Militares dos Estados que cometessem crimes do-losos contra a vida de civis, ficando sujeitos a julgamento perante o tribunal do júri. Os crimes dolosos contra a vida de civis praticados por militares das Forças Armadas atuando em razão da função continuariam sendo crimes militares e julgados na Justiça Militar da União.

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6. Crime Militar em tempo de Guerra

Nos exatos termos do artigo 15 do CPM, “o tempo de guerra, para os efeitos da aplicação da lei penal militar, começa com a declaração ou o reconhecimento do estado de guerra, ou com o decreto de mobilização se nele estiver compreendido aquele reconhecimento”.

Importante frisar que o estado de guerra pode existir independentemente da declaração for-mal de guerra, desde que evidenciada a ocorrência de atos de guerra, quando um Estado deli-beradamente pratica atos de violência contra outro Estado, através de sua força armada.

O tempo de guerra termina quando ordena a cessação das hostilidades (art. 15, in fine, CPM), competindo ao Presidente da República celebrar a paz, autorizado ou com o referendo do con-gresso nacional (art. 84, XX, CF).

Para definir os crimes militares em tempo de guerra, o legislador castrense deu primazia aos critérios ratione legis e ratione temporis. Assim, à luz das balizas indicadas no art. 10 do CPM, qualquer delito pode ser considerado crime militar em tempo de guerra, senão vejamos:

• os crimes especialmente previstos no Código Penal Militar para o tempo de guerra estão elencados no livro II da parte especial do CPM, do artigo 355 em diante;

• os crimes propriamente militares previstos para o tempo de paz, agregando-se à circuns-tância temporal: se praticados em tempo de guerra;

• os crimes impropriamente militares (previstos neste Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum ou especial, qualquer que seja o agente) quando praticados em: território nacional, ou estrangeiro, militarmente ocupado; qualquer lugar, se comprometerem ou puderem comprometer a preparação, a eficiência ou as operações militares ou, de qualquer outra forma, que atentem contra a segurança externa do país ou podem expô-la a perigo.

• os crimes comuns (definidos na lei penal comum ou especial, embora não previstos no CPM), quando praticados: em zona de efetivas operações militares; em território estrangei-ro, militarmente ocupados.

6.1. Causa de Aumento de penaO artigo 20 do CPM prevê uma causa de aumento de pena de um terço para os crimes militares praticados em tempo de guerra. Note que a fração de aumento, salvo disposição especial, inci-de sobre as penas cominadas para o tempo de paz.

Conclui-se, portanto, que somente haverá incidência da majorante nas hipóteses dos incisos II, III e IV, do artigo 10 do Código Castrense, já que os crimes especialmente previstos para o tem-po de guerra (inciso I) apresentam penas mais graves em seus preceitos secundários. Aumentá--las em um terço caracterizaria odioso bis in idem.

6.2. Aplicação da lei penal militar em crimes cometidos em prejuízo de país aliadoO artigo 18 do CPM apresenta uma hipótese de incidência excepcional da lei castrense aos cri-mes cometidos em prejuízo de país aliado (em guerra contra país inimigo do Brasil) desde que

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tenham sido praticados por brasileiro ou, qualquer que seja o agente, se praticados no territó-rio nacional ou em território militarmente ocupado por força brasileira.

TEORIA DO CRIME

1. Conceito Analítico de Crime

Sob o aspecto formal, crime é toda conduta que atenta contra a lei penal editada pelo Estado. No sentido material, crime é a conduta que viola os bens jurídicos mais importantes. Toda-via, essas duas abordagens não são suficientes para traduzir com precisão a ideia de crime, fazendo-se necessário desenvolver um conceito analítico de crime, que exponha seus elemen-tos constitutivos.

No Brasil, parte da doutrina (Damásio, Dotti, Mirabete e Delmanto) sustenta que os elementos do crime são dois: fato típico e antijurídico. Para quem adota esse conceito bipartite de crime, a culpabilidade não é requisito, mas sim mero pressuposto de aplicação da pena.

A doutrina hoje dominante sustenta que o conceito analítico de crime apresenta três pressu-postos (teoria tripartite): conduta típica, antijurídica e culpável. Há quem acrescente um quar-to elemento (teoria quadripartite): a punibilidade. Tal orientação é criticada, pois se trata, a rigor, de consequência do crime e não de elemento constitutivo.

Adotando-se a concepção tripartite, neste trabalho serão estudados três elementos com suas respectivas características: o fato típico (conduta, tipicidade, relação de causalidade e resulta-do), a ilicitude (relação de antagonismo entre a conduta típica e o ordenamento jurídico) e a culpabilidade (juízo de reprovação pessoal que se faz sobre a conduta típica e ilícita do agente).

2. Fato típico

A doutrina divide o fato típico em quatro partes com vistas a facilitar o seu estudo didático. São partes do fato típico:

• Conduta, em sentido jurídico penal

• Relação de Causalidade (nexo causal)

• Resultado

• Tipicidade penal

2.1. Conduta

a) Conceito

É todo comportamento humano (ação ou omissão), dotado de voluntariedade e consciência e que tenha dado causa (dirigida finalisticamente) à produção de um resultado típico (jurídico).

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b) Formas de manifestação (ação ou omissão)

Na conduta comissiva (ação), o comportamento penalmente relevante se manifesta de forma ativa. Na visão causalista, a ação é um movimento qualquer do agente percebido no mundo ex-terior. O agente direciona sua conduta a uma finalidade específica. Em Direito Penal, a conduta comissiva pressupõe a existência de um tipo penal, proibindo-a (norma proibitiva). No crime comissivo, o tipo penal exige de todos uma abstenção (não fazer algo).

Já a conduta omissiva (omissão), ocorre a abstenção de uma atividade imposta pela lei ao agente. Há uma atividade juridicamente exigida e o sujeito manifesta uma atitude psicológica e física de não atendimento da ação esperada, quando devia e podia ser praticada. Pune-se a inércia, pois a ordem jurídica penal exige uma ação (norma mandamental).

O crime é omissivo próprio (puro ou simples) quando descreve no próprio tipo penal uma con-duta negativa, de não fazer o que a lei determina (ex.: omissão de eficiência, art. 198, CPM). A omissão caracteriza a transgressão da norma jurídica, independentemente de qualquer resul-tado naturalístico.

No crime omissivo impróprio (comissivo por omissão ou omissão qualificada), a ação espe-rada é dirigida especialmente a uma pessoa que tem o dever especial de preservação do bem jurídico. A omissão não está descrita no tipo, só será penalmente relevante quando o sujeito estiver na posição de garantidor.

As situações de agente garantidor são elencadas na norma de extensão do art. 29 § 2º do CPM: quem, por força de lei, tem obrigação de cuidado, proteção ou vigilância, ou de outra forma assumiu a responsabilidade de impedir o resultado, ou ainda quem, com seu comportamento anterior, criou o risco de sua superveniência.

c) Comportamento humano

Se conduta ó o comportamento humano, a rigor, não há que se falar em conduta praticada por pessoa jurídica, a ponto de imputar-lhe a prática de infração penal. Entretanto, a Constituição federal, em seu artigo 225, § 3º, previu a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, no to-cante a crime ambiental, o que foi regulamentado nos artigos 3º e 21 da lei 9.605/98. Em que pese a controvérsia doutrinária acerca da matéria, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, têm reconhecido a responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes am-bientais.

d) Voluntariedade e consciência

Na visão finalista, se não houver vontade dirigida a uma finalidade, não há conduta. A conduta é voluntária quando a ação ou omissão tenham derivado livremente da vontade do agente, sem imposição de qualquer força exterior. Por ausência de voluntariedade, não há conduta nas seguintes hipóteses:

• força física irresistível (vis absoluta), que pode ser proveniente de evento da natureza ou do acaso ou de ação humana. Por exemplo: sujeito empurrado por alguém, choca-se com uma pessoa, causando-lhe lesões corporais. Note que a coação é física irresistível. O coator é quem atua com vontade e é o autor imediato, enquanto que aquele que causa o dano ou lesão é mero instrumento.

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• movimentos reflexos, quando a ação deriva de reflexos ou impulsos naturais, que o sujeito não possa controlar, como por exemplo, ao tocar em um fio desencapado ou em superfície quente.

• impossibilidade física de agir nos crimes omissivos (próprios ou impróprios).

Além da voluntariedade, a consciência é requisito fundamental para a existência de conduta penalmente relevante. Condutas praticadas em estado de inconsciência, sendo ativas ou pas-sivas, não têm relevância jurídico-penal. Por exemplo: sujeito sonâmbulo ou epilético ou em estado de hipnose que causa lesões corporais em outrem.

2.2. Tipicidade Penal

Requer que a conduta, além de enquadrar-se no tipo legal, viole a norma de proteção e afete o bem jurídico. Não se concebe, portanto, a existência de condutas típicas que não afetem o bem jurídico

a) Tipicidade Legal ou formal

Pode-se dizer que a conduta é típica quando se amolda perfeitamente a um modelo abstrato previsto na lei (tipo penal).

A norma estabelece um modelo abstrato de comportamento proibido ou esperado e esse mo-delo deve ser realizado no caso concreto para que haja uma conduta típica. Esse juízo de ade-quação da conduta pode ocorrer de forma direta ou indireta:

• Adequação típica direta – há uma subsunção direta (linear) da conduta ao tipo penal. Por exemplo: com a intenção de matar, um soldado atira em um colega e este vem a falecer. Assim, a conduta se adequou diretamente à norma do artigo 205, do CPM.

• Adequação típica indireta – a conduta se amolda ao tipo penal por meio de uma norma de extensão (relação triangular), que viabiliza a adequação típica, ampliando os limites da tipicidade. Se no exemplo anterior, a vítima não morresse, a conduta não encontraria ade-quação típica linear à norma do artigo 205, CPM, mas, mesmo assim, o agente seria res-ponsabilizado pela tentativa, porque a norma de extensão do art. 30, II, CPM, viabilizaria a adequação típica indireta.

b) Tipicidade Material

Só há tipicidade material quando a conduta é ofensiva a bens de relevo para o Direito Penal. Portanto, não se pode conceber a existência de uma conduta típica que não afete a um bem jurídico.

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2.3. Teoria do Tipo Penal

a) Conceito

Tipo penal é a descrição precisa do comportamento humano, feita pela lei. Trata-se de um ins-trumento legal necessário, de natureza predominantemente descritiva, que tem por finalidade individualizar condutas humanas que apresentem relevância penal.

b) Elementares e Circunstâncias

Elementares são dados essenciais à figura típica, sem os quais pode ocorrer a atipicidade ab-soluta (tornando-se um indiferente penal) ou relativa (desclassificação). Trata-se de elementos integrantes do tipo penal incriminador básico.

Já as circunstâncias são elementos periféricos, que gravitam ao redor da figura típica básica, não alterando a sua definição, mas somente interferindo na delimitação da pena. As circuns-tâncias objetivas (materiais ou reais) relacionam-se com o fato delituoso em sua materialidade e atuam sobre a magnitude do injusto (modo de execução, uso de determinados instrumentos, espécie, meios, lugar, tempo, ocasião, qualidade da vítima) ex.: art. 157 § 2º do CPM e art. 149, parágrafo único do CPM.

De outro lado, as circunstâncias subjetivas (pessoais) são condições ou qualidades que se re-ferem à pessoa do agente, nada tendo a ver com a materialidade do delito, portanto, atuam sobre a medida da culpabilidade (motivos determinantes, condições ou qualidades pessoais) ex.: art. 205, § 1º, CPM.

c) Elementos que integram o tipo

O tipo objetivo é composto de elementos cuja finalidade é descrever a ação, o objeto da ação e, sendo o caso, o resultado, as circunstâncias externas do fato e a pessoa do autor e do sujeito passivo. Tais elementos subdividem-se em:

• Elementos descritivos têm a finalidade de evidenciar dados que, com simplicidade, podem ser percebidos pelo intérprete.

• Elementos normativos são aqueles para cuja compreensão se faz necessário um juízo de valor ético ou jurídico, podendo variar de acordo com a interpretação de cada pessoa ou em virtude do sentido que lhe dá a norma. (Dignidade e decoro, sem justa causa, indevida-mente).

O tipo subjetivo compõe-se de elementos anímicos do agente: o dolo – consciência e vontade de realizar o tipo objetivo; os elementos objetivos especiais, como intenções ou mesmo moti-vações excepcionais – especial fim de agir; e a culpa.

d) Elementos específicos do tipo penal:

• Núcleo é o verbo que descreve a conduta proibida pela lei penal, com a finalidade de evi-denciar o comportamento que se procura evitar ou impor. Os tipos podem ser uninucleares

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(art. 205, CPM) ou plurinucleares também denominados crimes de ação múltipla ou conte-údo variado (art. 290, CPM).

• Sujeito ativo é a pessoa que pode praticar a conduta descrita no tipo. Classifica-se em:

• Crime comum, quando a infração, por sua natureza, pode ser cometida por qualquer pessoa. Ex.: Incitamento – art. 155, CPM; homicídio – art. 205, CPM.

• Crime próprio, quando o tipo penal exige qualidade ou condição especial do sujeito ativo e somente pode ser praticado por determinada pessoa em virtude de circuns-tâncias pessoais, admitindo delegação e autoria mediata. Ex.: motim – art. 149, CPM; conspiração – art. 152, CPM.

• Crime de mão própria, quando o crime é personalíssimo e só pode ser praticado dire-tamente por aquele sujeito ativo e mais ninguém, não admitindo coautoria, mas ad-mite a participação. Ex.: abandono de posto – art. 195, CPM; embriaguez em serviço – art. 202, CPM; deserção – art. 187, CPM.

• Sujeito passivo

• Formal, constante ou mediato é o Estado, que é atingido todas as vezes que suas leis são descumpridas.

• Material, eventual ou imediato é o titular do bem ou interesse juridicamente tutelado sobre o qual recai a conduta criminosa, que em alguns casos pode ser o próprio Estado.

• Objeto material é a pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta delituosa do agente. Em alguns casos pode ocorrer de o sujeito passivo coincidir com o objeto material (homicídio). Porém, não se pode confundir o objeto material com o objeto jurídico (bem ou interesse juridicamente tutelado). Nem todos crimes possuem objeto material, mas todos possuem objeto jurídico.

2.4. Tipo subjetivo

Na estrutura da Teoria Normativa Pura (finalismo), o tipo penal é complexo, pois compreende a parte objetiva e a parte subjetiva. Como já mencionado, o tipo subjetivo vincula-se à manifes-tação psíquica ou anímica do sujeito.

a) Tipo doloso

O dolo é a vontade consciente e livre de realizar os elementos objetivos do tipo penal. A ação é sempre conduzida pela consciência do que se quer (momento intelectual) e pela decisão a respeito de querer realiza-lo.

b) Elementos do dolo

O dolo é composto por dois elementos: consciência (elemento intelectual) e vontade (elemen-to volitivo).

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A consciência – elemento cognitivo do dolo – refere-se ao conhecimento idôneo sobre a situa-ção fática retratada no tipo objetivo. Quando o agente dirige sua vontade ao cometimento de uma conduta baseada em uma análise inidônea da realidade fática, o dolo estará irremediavel-mente prejudicado, porque o elemento cognitivo, a consciência equivocada, viciará o elemento volitivo. Ex.: um militar, em operação na selva amazônica, atira em direção a uma moita pró-xima, que estava se mexendo, acreditando ser um animal selvagem. Cessando o movimento, aproxima-se e constata que era uma pessoa.

No caso, há concretização do tipo objetivo: matar alguém. Contudo, no tocante ao tipo subjeti-vo, não há dolo, pois, o elemento cognitivo orientou-se por dado inidôneo, laborando em erro quanto a elementar do tipo de homicídio (alguém), em virtude de uma análise equivocada da situação de fato.

A vontade deve ser dirigida livremente à realização do elemento objetivo do tipo que foi corre-tamente analisado pelo sujeito. O agente quer o resultado delitivo como consequência de sua própria ação e se atribui alguma influência em sua produção.

c) Teorias do dolo no Código Penal Militar

Nos termos do artigo 33, I, CPM “diz-se crime doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”. O Código Castrense adota duas teorias para definir o dolo:

• Teoria da vontade, que considera o dolo como vontade livre e consciente de querer prati-car a conduta prevista no tipo penal incriminador. O agente atribui à sua conduta a produ-ção do resultado por ele desejado.

• Teoria do assentimento (consentimento ou assunção), que entende que atua com dolo aquele que, antevendo como possível o resultado lesivo decorrente de sua conduta, mes-mo não o querendo diretamente, não se importa com sua ocorrência, assumindo o risco de produzi-lo.

d) Espécies de dolo

Como visto acima, a própria lei penal distingue as espécies de dolo. Na locução “quis o resul-tado”, há dolo direto, pois, o agente pratica a conduta dirigindo-a diretamente à produção do resultado por ele pretendido. É o dolo por excelência.

De outro lado, na locução “assumiu o risco de produzi-lo”, há dolo indireto (eventual), pois não há certeza quanto à ocorrência do resultado, mas há assunção do risco de produzi-lo, eviden-ciando-se uma manifestação de desprezo pelo bem jurídico protegido. De acordo com a Teoria Positiva do Conhecimento de Frank, se o agente diz a si mesmo: “seja como for, dê no que der, e qualquer caso, não deixo de agir”, há dolo eventual.

Além da distinção legal, a doutrina classifica o dolo direto em duas modalidades: de primeiro e segundo graus. Em alguns casos, para que seja atingida a finalidade principal do sujeito, a con-cretização do plano delituoso, da forma como planejado e desenvolvido, produz vários resulta-dos entendidos como efeitos colaterais necessários.

Assim, o dolo de 1º grau é aquele em que o resultado corresponde à meta optada pelo agente, perfazendo seu objetivo principal, enquanto o dolo de 2º grau (ou dolo de consequências ne-

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cessárias) corresponde aos efeitos colaterais indispensáveis ou necessários ocorridos em fun-ção dos meios empregados ou do modo de execução escolhido para que o sujeito pudesse atin-gir sua meta. Ex.: uma praça querendo matar um oficial implanta uma bomba no avião pilotado pela vítima. Além de matá-lo, também ceifará a vida dos outros tripulantes do avião.

A importância da distinção reside no fato de que haverá uma ação com vários resultados, o que aponta para o concurso formal impróprio, em que vários resultados decorrem de desígnios autônomos e não por acidente, implicando o somatório das penas (regra do cúmulo material).

e) Tipo Culposo

O artigo 33, II, CPM define o crime culposo, “quando o agente, deixando de empregar a cautela, a atenção ou a diligência ordinária ou especial, a que estava obrigado em face das circunstân-cias, não prevê o resultado que podia prever ou, prevendo-o, supõe levianamente que não se realizaria ou que poderia evitá-lo”.

A estrutura do tipo culposo é completamente diversa do tipo do crime de dolo. Enquanto nes-te se observa claramente a distinção entre o elemento objetivo e subjetivo, o tipo culposo é incongruente, já que a vontade do sujeito não se dirige à concretização do resultado ilícito. Ao contrário, a definição da culpa parte do pressuposto de que o sujeito não quis nem assumiu o risco da produção do resultado.

A vontade no tipo culposo é orientada para a prática de uma conduta lícita, atípica, mas o resul-tado típico ocorre porque o sujeito se comportou manifestando falta de cuidado frente ao bem jurídico. Na culpa, o resultado típico decorre de uma vontade defeituosa.

Segundo entendimento de parte da doutrina, a divisão do tipo em partes objetiva e subjetiva só faria sentido na modalidade dolosa. Assim, por ser uno, o tipo culposo não conteria parte subjetiva e, nessa linha, a culpa não seria elemento subjetivo do tipo, mas sim elemento nor-mativo.

Para a tipificação de um crime culposo é necessária a conjugação de vários elementos:

• A conduta humana voluntária comissiva (imprudência), omissiva (negligência) ou inapta (imperícia).

• A inobservância de um dever objetivo de cuidado (negligência, imprudência ou imperícia);

• resultado lesivo não desejado, tampouco risco assumido pelo agente;

• Nexo de causalidade entre a conduta descuidada do agente e o resultado dela advindo;

• A previsibilidade objetiva (mesmo que, em alguns casos, o sujeito sequer consiga prever subjetivamente o resultado – culpa inconsciente);

• A tipicidade.

f) Princípio da excepcionalidade

Conforme dispõe o parágrafo único do artigo 33, CPM, “salvo os casos expressos em lei, nin-guém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente”.

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Se não houver previsão de tipo penal fazendo menção explicita à punição culposa, só haverá punição pela modalidade dolosa, daí porque se diz que o dolo é elemento subjetivo implícito do tipo penal. Se não houver previsão por conduta culposa, o fato é atípico.

g) Dever objetivo de cuidado

Para que a sociedade possa se desenvolver sem que bens jurídicos fundamentais sejam vul-nerados, deve-se exigir de todos os seus membros, indistintamente, que observem o dever de cuidado.

A culpa se evidencia quando alguém atua com violação de dever de cuidado e desse comporta-mento resulta lesão a bens jurídicos essenciais. A doutrina dominante defende que a conduta culposa corresponde à violação do dever de cuidado objetivo.

Importante, também, salientar que a compensação de culpas não é admitida no Direito Penal a fim de isentar o sujeito de punição, como, por exemplo, em um acidente de trânsito em que os dois motoristas causam lesões corporais recíprocas.

Havendo a concorrência de culpas, o grau de culpa de cada um será apreciado no momento da fixação da pena-base (art. 69, CPM – circunstâncias judiciais).

h) Espécies de culpa

Voltando ao artigo 33, II, CPM: ao afirmar que o sujeito “não prevê o resultado que podia pre-ver ou, prevendo-o, supõe levianamente que não se realizaria ou que poderia evitá-lo”, o legis-lador distingue duas espécies de culpa.

• A culpa inconsciente é despida de previsão subjetiva, já que o sujeito “não prevê o resul-tado que podia prever”. Há sempre a previsibilidade objetiva, que corresponde à possi-bilidade que o homem médio, naquele contexto, prever o resultado. Se não existir a pre-visibilidade objetiva, haverá um acontecimento inusitado, um acontecimento fortuito. O imprevisível exclui a culpa.

• Já na culpa consciente, o sujeito, prevendo o resultado, supõe levianamente que não re-alizaria o que poderia evitá-lo. Havendo previsão objetiva, pois, antes ou durante a prática da conduta, o sujeito representa a ocorrência do resultado, mas acredita sinceramente que esse não ocorrerá, sem assumir o risco de produzi-lo por ser autoconfiante.

Não se deve confundir culpa consciente com o dolo eventual. O ponto de semelhança reside em que ambos há previsibilidade subjetiva. O sujeito representa, antes de agir, a possibilidade da produção do resultado. Mas a diferença evidencia-se quando, no dolo eventual, o sujeito prevê a possibilidade de produzir o resultado e aceita, manifestando desprezo pelo bem jurídi-co tutelado (assume o risco). Na culpa consciente, apesar de antecipar mentalmente a possibi-lidade de ocorrência do resultado, o sujeito sinceramente crê que ele não irá ocorrer.

i) Formas de manifestação da culpa

O resultado culposo pode ocorrer mediante diversas modalidades de condutas que exteriori-zam a inobservância do seu exigível dever de cuidado.

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• A imprudência é a conduta comissiva que corresponde à pratica de um ato perigoso sem os cuidados que o caso requer.

• A negligência é a conduta omissiva, de deixar de fazer aquilo que a diligência normal exigia.

• A imperícia é a inaptidão, momentânea ou não, para o exercício de arte, profissão ou ofí-cio. Normalmente está ligada a uma atividade profissional e pode derivar de uma inobser-vância de regra técnica.

2.5. Resultado:

a) Conceito

Em sede doutrinária, o conceito de resultado é disputado por duas teorias:

• A teoria normativista defende que todo crime tem resultado (jurídico), pois este represen-ta lesão ou perigo de lesão a um bem jurídico. O resultado tem natureza normativa, pois exige um juízo de valor em cada caso para se verificar se o bem jurídico protegido pela nor-ma entrou no raio de ação dos riscos criados pela conduta.

• A teoria naturalística define resultado como a modificação do mundo exterior causada pela conduta. Assim, sustenta-se que nem todo crime tem resultado, pois este é estudado sob o ponto de vista naturalístico, como algo destacado da conduta, representando a alte-ração no mundo exterior.

b) Classificação quanto ao resultado naturalístico e momento consumativo

• Crime material: o tipo penal exige a prática da conduta e a produção do resultado material (naturalístico) previsto para que haja consumação. Ex.: homicídio (art. 205, CPM) e lesão corporal (art. 209, CPM).

• Crime formal (ou de consumação antecipada): o tipo penal prevê o resultado, mas o cri-me consuma-se de forma antecipada, com a prática da conduta, independentemente da ocorrência do resultado. Se ocorrer o resultado, há exaurimento do crime. Ex.: corrupção passiva (art. 308, CPM) e concussão (art. 305, CPM).

• Crime de mera conduta: o tipo penal não prevê qualquer resultado do ponto de vista natu-ralístico, só exige a previsão da conduta. Logo, o crime se consuma com a prática da condu-ta. Ex.: abandono de posto (art. 195, CPM).

2.6. Relação de causalidade

a) Conceito

A relação de causalidade é o vínculo necessário entre a conduta praticada pelo agente e o re-sultado por ela produzido. Nos termos do artigo 29, CPM, “o resultado de que depende a exis-

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tência do crime somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”.

Ao vincular a conduta ao resultado naturalístico, o Código Castrense dá a entender que só há relevância na análise nos crimes materiais, uma vez que os crimes formais e de mera conduta não exigem produção de resultado para sua consumação.

b) Teoria da equivalência dos antecedentes causais ou Conditio Sine Qua Non

Segundo dispõe o artigo 29, do CPM, é considerada causa toda ação ou omissão sem a qual não haveria resultado, ou seja, tudo que concorre para o resultado é causa. Todos os fatos que ante-cedem ao resultado se equivalem, desde que indispensáveis à sua ocorrência.

A doutrina critica a teoria da conditio sine qua non, adotada pelo CPM, afirmando que ela pode levar a uma responsabilidade infinita. Como corretivo à equivalência dos antecedentes causais é proposta a teoria da causalidade adequada, que define a causa como toda ação ou omissão sem a qual não seria possível a ocorrência do resultado da maneira como ele ocorreu.

Assim, não basta haver nexo de causalidade, mas também é necessário que a conduta seja dolosa ou culposa. Portanto, deve-se interromper a cadeia causal no momento em que não houver dolo ou culpa por parte daquelas pessoas que tiveram importância na produção do resultado.

O próprio Código Penal Castrense impõe limites ao alcance da teoria da conditio sine qua non, pois o art. 29, § 1º, CPM reconhece a possibilidade de fatos supervenientes excluírem a res-ponsabilidade pelo resultado, devendo atribuir-se ao sujeito somente os fatos anteriormente praticados.

c) Espécies de causas que contribuem ou não para o resultado

• Causa absolutamente independente é aquela que produziria o resultado, mesmo que não tivesse havido qualquer conduta por parte do sujeito. Nesse caso, o resultado não poderia ser imputado ao agente.

Em todos os casos acima, o sujeito “A” responderá pela tentativa, pois, com a eliminação hipo-tética de sua conduta, não haverá modificação do resultado. Assim, se o resultado ocorre em

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virtude de qualquer das causas absolutamente independentes, não poderá ser atribuído ao agente, que responderá somente pelos atos anteriormente praticados compreendidos por seu dolo.

• Causa relativamente independente é aquela que somente tem a possibilidade de produzir o resultado se for conjugada com a conduta do agente. Há uma relação de dependência entre conduta e a outra causa que também influencia o resultado.

Em todos os casos acima, o sujeito responde pelo delito consumado. Pode-se concluir que, desde que tenham entrado na esfera de conhecimento do agente, as causas relativamente independentes preexistentes e concomitantes, quando conjugadas com a conduta, levam à imputação do resultado.

Nas causas supervenientes relativamente independentes, o resultado só pode ser imputado ao agente se estiver na mesma linha de desdobramento natural da ação. Contudo, determina o artigo 29, § 1º, CPM que “a superveniência de causa relativamente independente exclui a im-putação quando, por si só, produziu o resultado. Os fatos anteriores imputam-se, entretanto, a quem os praticou”.

A expressão “por si só” significa que somente aqueles resultados que se encontram como um desdobramento natural da ação é que poderão ser imputados ao agente. Se a causa superve-niente relativamente independente, por si só, produzir o resultado, por não estar na mesma li-nha de desdobramento físico da ação, há rompimento da cadeia causal e o agente só responde pelos atos praticados compreendidos por seu dolo (tentativa).

Por exemplo, com a intenção de matar, “A” dispara contra “B”, causando-lhe grave ferimento, que certamente o levará à morte. Ao ser socorrida, a vítima falece em razão de traumatismo craniano, eis que a ambulância que a transportava se envolve num grave acidente de trânsito. No caso acima, “A” responde pelo homicídio tentado, pois o traumatismo craniano decorre do acidente automobilístico que causou a morte de “B” não estava na linha de desdobramento natural da ação.

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2.7. Iter Criminis

a) Conceito

É o caminho do crime, ou seja, o conjunto de etapas que se sucedem, cronologicamente, no desenvolvimento do delito. Trata-se de instituto exclusivo dos crimes dolosos. De acordo com a doutrina, o Iter Criminis comporta as seguintes fases:

1ª fase – Cogitação (cogitatio), que se passa na mente do agente, quando este define a infra-ção penal que deseja praticar, representando e antecipando o resultado almejado. Por força do princípio da ofensividade, não pune cogitação, uma vez que o Direito Penal não pode incidir sobre atitudes interiores, que não atingem a esfera jurídica de terceiros.

2ª fase – Preparação (conatus remotus): após decidir pela realização do delito, o sujeito passa aos atos preparatórios, necessários ao êxito da empreitada criminosa. Assim, o agente provi-dencia os meios, escolhe o local apropriado para realizar o ato etc. Os atos preparatórios, em regra, também não são puníveis, pois o inciso II do artigo 30 do CPM exige início de execução para que seja punida a tentativa.

Entretanto, em algumas hipóteses, o legislador optou por punir de forma autônoma condutas que, a princípio, poderiam ser consideradas atos preparatórios. Por exemplo, no crime de cons-piração, previsto no art. 152, CPM, pune-se antecipadamente a conduta de concertarem-se militares para a prática do crime previsto no artigo 149 (motim).

3ª fase – Execução (conatus proximus), quando o agente ingressa nos atos executórios do cri-me. Há polêmica quanto à definição do que vem a ser ato de execução, havendo diversas teo-rias que disputam o tema:

• Teoria subjetiva – há execução quando o agente, de modo inequívoco, exterioriza qualquer conduta orientada no sentido de praticar a infração penal. Essa teoria não distingue atos preparatórios dos atos de execução. Nessa linha, por exemplo, haveria tentativa se o sujei-to ficasse de tocaia, à espreita da vítima, aguardando que passasse por determinado local, quando a mesma segue por outro itinerário.

• Teoria objetivo-formal (adotada pelo Código Penal Militar) – ato executório é o comporta-mento descrito no tipo penal objetivo. Todos os atos anteriores, que conduzem à realização da conduta descrita no tipo penal, são considerados atos preparatórios. Assim, a título de exemplo, no homicídio com emprego de arma de fogo, a ação de matar começaria com o acionamento do gatilho da arma de fogo carregada e apontada para a vítima. Já no furto, o ato de execução seria a ação de remover a carteira do bolso da vítima.

• Teoria objetivo-material – atos executórios são aqueles vinculados à conduta típica e que produzem situação de risco para o bem jurídico. Logo, apontar a arma carregada para a ví-tima, já seria ato executório de homicídio.

• Teoria objetivo-individual – para determinar-se a diferença entre atos preparatórios e exe-cutórios, deve-se levar em conta o plano concreto individual do autor. Portanto, a execu-ção inicia-se com a atividade com que o autor, segundo seu plano delitivo, imediatamente aproxima-se da sua realização.

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• Teoria da hostilidade ao bem jurídico – ato executório é aquele que ataca efetivamente e imediatamente o bem jurídico, enquanto que ato preparatório é o que possibilita tal ata-que. Assim, deve-se indagar se houve ou não agressão ao bem jurídico.

4ª fase – Consumação (summatum opus): diz-se consumado o crime quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal (art. 30, I, CPM). A consumação depende da natureza do delito.

• Nos crimes materiais, culposos e omissivos impróprios, o momento consumativo ocorre com a produção do resultado naturalístico.

• Os crimes formais (ou de consumação antecipada) consumam-se com a prática da conduta descrita no núcleo do tipo, independentemente da obtenção do resultado previsto. Caso este venha a ocorrer, há mero exaurimento.

• Nos crimes de mera conduta, a consumação se dá com a realização do simples comporta-mento previsto no tipo penal, não havendo previsão de resultado naturalístico.

• Nos crimes omissivos próprios consumam-se com a abstenção do comportamento impos-to ao sujeito ativo.

• Nos crimes permanentes, enquanto durar a permanência, o delito estará em consumação, pois essa se prolonga no tempo.

5ª fase – Exaurimento, para maioria da doutrina, é a fase posterior à consumação do delito, esgotando-o completamente.

b) Tentativa: nos exatos termos do artigo 30, II, CPM, “diz-se o crime tentado, quando, inicia-da a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade da agente”. O artigo 30, II, do CPM, é uma norma de extensão que amplia a figura típica, de modo a abranger situações não previstas expressamente no tipo penal. Trata-se de adequação típica mediata, sem a qual seria impossível a punição do agente cuja infração penal não se consumasse.

c) Espécies de tentativa

• Tentativa perfeita (tentativa acabada ou crime falho) – O agente esgota toda a fase execu-tória, empregando, segundo seu entendimento, todos os meios que tinha a sua disposição para alcançar a consumação do crime, que não ocorre por motivos alheios a sua vontade. Ex.: “A”, com dolo de matar, dispara cinco tiros contra “B”, atingindo-o em região letal, po-rém a vítima é socorrida e sobrevive.

• Tentativa imperfeita (tentativa inacabada) – O agente não exaure toda a sua potencialida-de lesiva, ou seja, não realiza todos os atos executórios que entendia necessários ao alcan-ce da consumação. O sujeito é interrompido durante os atos de execução, antes de esgotar todos os meios que pretendia inicialmente empregar para consumar o crime. Ex.: “A”, com dolo de matar, almeja disparar cinco tiros contra “B”, mas após efetuar dois disparos, é in-terrompido por “C”, sendo que a vítima é socorrida e sobrevive.

• Tentativa branca (incruenta) – O agente não consegue atingir o objeto material (a pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta). É preciso pesquisar o dolo do agente para determi-nar o crime tentado.

• Tentativa cruenta – O agente consegue atingir o objeto material, mas não consuma o delito pretendido.

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d) Hipóteses em que não se admite tentativa

• Nos crimes culposos não há tentativa, pois não há vontade dirigida à finalidade a causar o resultado lesivo. A tentativa é instituto exclusivo dos delitos dolosos. Contundo, convém atentar para a chamada culpa imprópria, incidente no erro de fato vencível (art. 36, § 1º, CPM), em que o sujeito, embora agindo dolosamente, é punido a título de culpa, em virtu-de de sua falsa representação da realidade.

• Nos crimes preterdolosos há dolo na conduta antecedente e o resultado agravador advém de culpa, logo não há o que se falar em tentativa (lesão corporal seguida de morte – artigo 209, § 3º, CPM).

• Nos crimes unissubsistentes, não havendo fracionamento do Inter Criminis, não há pos-sibilidade de tentativa, pois o crime se realiza num único ato (injuria verbal – artigo 216, CPM).

• Nos crimes omissivos próprios, a simples omissão já configura a consumação. Se o sujeito pratica o comportamento previsto no comando da lei, não pratica fato típico (descumpri-mento de missão – art. 196, CPM).

• Nos crimes de atentado ou de empreendimento, o comportamento típico já inclui dire-tamente a tentativa, que é punida com a mesma pena da modalidade consumada (tentar evadir-se mediante violência contra a pessoa – art. 180, CPM).

• Nos crimes Habituais, segundo o entendimento majoritário, não cabe tentativa, porque o crime se aperfeiçoa com a reiteração da conduta, que, considerada de forma isolada, é um irrelevante penal.

e) Aplicação da pena na tentativa

De acordo com o parágrafo único do artigo 30 do Código Castrense, “pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime, diminuída de um a dois terços, podendo o juiz, no caso de excepcional gravidade, aplicar a pena do crime consumado”.

Conforme se depreende do dispositivo acima, adotou-se a teoria objetiva temperada (ou ma-tizada), pois o Código prevê a causa de diminuição de pena para o crime tentado. Todavia, di-ferentemente do Código Penal Comum, o estatuo repressivo militar adota também a teoria subjetiva, autorizando o juiz, no caso de excepcional gravidade, a aplicar a pena da figura típica consumada ao crime tentado.

f) “Tentativa” qualificada – desistência voluntária e arrependimento eficaz

Dispõe o artigo 31, do CPM, que o agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na exe-cução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados”.

• Na desistência voluntária (tentativa abandonada ou “ponte de ouro”), é necessário que o agente já tenha ingressado nos atos de execução e, sem esgotar todos os meios que tinha à disposição para consumar o crime (quadro de tentativa imperfeita), desista voluntariamen-te de prosseguir com a ação. O sujeito não deseja mais o crime, pois mudou de propósito.

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Ex.: “A”, com animus necandi, pretende disparar cinco tiros contra “B”. Após efetuar o pri-meiro disparo, fica sensibilizado com os pedidos de clemência da vítima e interrompe a execução, não efetuando os demais disparos que pretendia fazer. Não ocorrendo o resul-tado morte, o sujeito não responde pela tentativa de homicídio, mas somente pelas lesões corporais.

• No arrependimento eficaz, depois de esgotar todos os meios executórios de que pretendia utilizar para chegar à consumação da infração penal (quadro de tentativa perfeita), o su-jeito arrepende-se e atua em sentido contrário, evitando a produção do resultado por ele pretendido inicialmente.

Ex.: após uma intensa discussão, “A” lança “B” ao marpara que morra afogado, eis que não sabe nadar. Pouco depois, arrependido, “A” resolve salvar a vítima, atirando-lhe um salva--vidas. Se a vítima sofrer alguma lesão corporal, esta será atribuída ao agente, que não responde pela tentativa de homicídio.

A diferença entre a desistência voluntária e o arrependimento eficaz está em que, na primeira, o processo de execução ainda está curso (o agente está diante de uma situação de tentativa imperfeita) e, no segundo, a fase de execução já foi encerrada (quadro de tentativa perfeita). Na desistência voluntária, há uma omissão, pois, o agente deixa de prosseguir na execução. No arrependimento eficaz, há uma ação, já que, esgotada a execução, o sujeito age para impedir o resultado.

Em ambos os casos, se houver a produção do resultado, o sujeito não será beneficiado pelos institutos acima, mas responderá pelo crime consumado. Mesmo tendo desistido de prosse-guir na ação, sua conduta foi apta a produzir o resultado. Mesmo havendo arrependimento e ação no sentido de impedir o resultado, a conduta não foi eficaz. Contudo, essas circunstâncias serão relevantes na análise da culpabilidade, no momento da aplicação da pena-base.

g) Arrependimento posterior

O Código Castrense não contempla o arrependimento posterior como causa obrigatória de re-dução de pena. Diferentemente do previsto no artigo 16 do Código Penal Comum, não há previ-são de diminuição de pena de um a dois terços, pela restituição da coisa ou reparação do dano por ato voluntário do agente antes do recebimento da inicial acusatória.

Registre que a reparação do dano é elencada no artigo 72, III, “b”, do CPM, no rol de circuns-tâncias atenuantes, podendo beneficiar o agente se realizada antes do julgamento. Na parte especial do Código Penal Militar, há previsão de diminuição de pena de um a dois terços, no caso de furto (art. 240, § 2º, CPM), se o acusado é primário e restitui a coisa ou repara o dano voluntariamente, antes de iniciada a ação penal. O mesmo benefício se repete para os cri-mes de apropriação indébita (art. 250, CPM), estelionato (art. 253, CPM), receptação (art. 254, CPM) e dano (art. 260, CPM).

No peculato culposo, extingue-se a punibilidade se a reparação do dano precede a sentença irrecorrível. A pena é reduzida da metade, se a reparação é posterior ao transito em julgado (art. 303, § 4º, CPM). O mesmo benefício se repete no Código Penal Comum (art. 312, § 3º, CP).

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h) Crime impossível (tentativa inidônea ou inadequada ou quase-crime)

Estatui o artigo 32 do CPM: “quando, por ineficácia absoluta do meio empregado ou por abso-luta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime, nenhuma pena é aplicável”. Na mesma linha do Código Penal Comum, o Código Castrense adotou a teoria Objetiva tem-perada, que afasta a punibilidade da tentativa somente quando houver ineficácia absoluta do meio empregado ou absoluta impropriedade do objeto.

Se os meios são relativamente ineficazes e os objetos são relativamente impróprios, há alguma possibilidade de o agente alcançar o resultado pretendido, portanto, pune-se a tentativa.

• Se meio é todo recurso empregado pelo agente capaz de conduzi-lo à produção do resul-tado pretendido, absolutamente ineficaz é aquele meio que não possui a mínima aptidão para produzir os efeitos pretendidos, como, por exemplo, um revólver sem munição ou com munição já detonada, bem como uma falsificação grosseira destinada à obtenção de vantagem ilícita.

• Objeto é a pessoa ou coisa contra a qual se dirige a conduta do agente. Se o objeto é ab-solutamente impróprio, o resultado jamais será alcançado, como, por exemplo, no caso de se atirar num cadáver ou na ingestão de substância abortiva sem haver gravidez em curso.

Outro tema que merece lembrança é a hipótese de crime impossível em virtude de flagrante preparado. (Provocado). Na esteira militar aplica-se o enunciado da súmula 145, STF: “não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”. O flagrante preparado ocorre quando alguém (agente provocador), de forma insidiosa, provoca o sujeito ativo à pratica de um crime e, ao mesmo tempo, adota providências a fim de que o mesmo não venha não venha a se consumar.

i) Pena agravada pelo resultado

O Código Penal Militar consagrou o princípio da culpabilidade (nullum crimen sine culpa), ao prever que ninguém pode ser punido por um resultado mais grave se não o tiver causado pelo menos a título de culpa.

• Dispõe o artigo 34 do Código Castrense que “pelos resultados que agravam especialmente as penas só responde o agente quando os houver causado, pelo menos, culposamente”. A doutrina desenvolve o tema do crime qualificado pelo resultado, apontando as hipóteses de tipificação complexa, que podem ser:

• Crimes de dupla tipicidade dolosa (dolo + dolo) – Há dolo na conduta antecedente e na ocorrência do resultado agravador (lesões corporais qualificadas – art. 209, §§ 1º e 2º, CPM).

• Crimes preterdolosos (dolo + culpa) – A ação é, ao mesmo tempo típica de rime doloso, em razão de sua finalidade, e de um tipo culposo, em face da violação de um dever de cuidado. O resultado vai além da intenção do agente. Há dolo na conduta antecedente e culpa na consequente (lesão corporal seguida de morte – art. 209, § 3º, CPM e na rixa qualificada – artigo 211, p. único, CPM).

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• Crime de dupla tipicidade culposa (culpa + culpa) – Há culpa na conduta antecedente e no resultado agravador (incêndio culposo – crime de perigo comum – com resultado lesão corporal ou morte – art. 269 § 2º c/c art. 277, parte final, ambos do CPM).

3. Ilicitude (antijuridicidade)

3.1. Conceito

Ilicitude é a relação de contrariedade entre o fato humano e as exigências do ordenamento jurídico em sentido amplo, representando uma lesão ou ameaça de lesão a bens jurídicos pro-tegidos.

De acordo com a teoria da Ratio Cognoscendi, adotada pela orientação dominante, a tipicidade exerce uma função indiciária de ilicitude. Assim, verificada a ocorrência de um fato típico, há um juízo condicionado de ilicitude, que se confirmará se não houver incidência de nenhuma das causas de justificação previstas no ordenamento jurídico.

3.2. Causas de exclusão da ilicitude (descriminantes, justificativas ou cau-sas de justificação)

a) Princípio Fundamentador

A causa de justificação tem fundamento no predomínio do direito preeminente. Faz-se um pro-cesso de ponderação, no caso concreto, a fim de determinar o direito prevalente de acordo com o ordenamento jurídico. Assim, aquele que atua amparado por uma causa de justificação, embora sacrificando um bem jurídico alheio, comporta-se conforme as exigências do direito.

b) Requisitos das causas de exclusão da ilicitude

• O requisito objetivo diz respeito aos elementos objetivos constantes na norma permissiva.

• O requisito subjetivo caracteriza-se pela consciência e vontade de agir justificadamente, evidenciadas pela relação de congruência entre conduta do agente e a norma que permite sua prática.

c) Espécies de causas de exclusão da ilicitude

O Código Penal Militar apresenta um rol meramente enumerativo de excludentes de ilicitude. Cediço que a lista de causas de justificação não pode ser exaustiva, pois não se trata de questão exclusiva da esfera penal, mas do ordenamento jurídico.

De acordo com o artigo 42 do estatuto penal militar, não há crime quando o agente pratica o fato em:

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• Estado de necessidade

• Legítima defesa

• Estrito cumprimento do dever legal

• Exercício regular de direito

No parágrafo único do referido artigo, há uma causa de justificação exclusiva do comandante de navio, aeronave ou praça de guerra, que na iminência de perigo ou grave calamidade, com-pele os subalternos, por meios violentos, a executar serviços e manobras urgentes, para salvar a unidade ou vidas, ou evitar o desânimo, a desordem, a rendição, a revolta ou o saque.

Importante registrar que o consentimento do ofendido não encontra aplicação na esfera penal militar, diferentemente do que ocorre no Direito Penal comum, onde é reconhecido pela dou-trina como causa supralegal de exclusão da ilicitude.

A razão é simples, os bem jurídicos tutelados no regime castrense são indisponíveis (hierarquia, disciplina, bom funcionamento das instituições militares), daí porque a ação penal é sempre pública, conforme reza o artigo 121, do CPM.

3.3. Estado de necessidade justificante – art. 43, CPM

a) Conceito

De acordo com o artigo 43 do Código Penal Militar, “considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para preservar direito seu ou alheio, de perigo certo e atual, que não pro-vocou, nem podia de outro modo evitar, desde que o mal causado, por sua natureza e impor-tância, é consideravelmente inferior ao mal evitado, e o agente não era legalmente obrigado a arrostar o perigo”.

O quadro no estado de necessidade é de colisão de dois bens jurídicos igualmente amparados pelo ordenamento jurídico, levando a um juízo de ponderação que determinará a prevalência de um sobre o outro.

b) Teorias acerca do estado de necessidade

O Código Penal comum adota a teoria unitária, pois a definição do seu artigo 24 não estabelece previamente diferença quanto aos valores dos bens jurídicos em conflito. Basta ler o disposi-tivo: “considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se”.

Assim, para o Código Penal comum, respeitado o critério de razoabilidade, todo estado de ne-cessidade seria justificante, a eliminar a ilicitude do fato típico praticado pelo agente, não im-portando se o bem por ele protegido é de menor, igual ou superior valor ao daquele sacrifica-do.

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O Código Penal Militar adota a Teoria Diferenciadora alemã, pois, considerando-se os valores dos bens jurídicos em conflito, distinguem-se o estado de necessidade justificante e o estado de necessidade exculpante.

O estado de necessidade justificante afasta a ilicitude, quando o bem jurídico protegido é de valor superior ao daquele sacrificado. Não há crime, nos termos do artigo 43, CPM, “desde que o mal causado, por sua natureza e importância, é consideravelmente inferior ao mal evitado”. De outro lado, o estado de necessidade exculpante elimina a culpabilidade, quando o bem protegido é de valor igual ou inferior ao valor sacrificado. Trata-se de hipótese de inexigibilida-de de conduta diversa.

Por exemplo, se durante um naufrágio, dois marinheiros disputarem o último lugar no bote salva-vidas, haverá estado de necessidade exculpante para aquele que sacrifica a vida do colega para salvar-se.

De acordo com o artigo 39, CPM, “não é igualmente culpado quem, para proteger direito pró-prio ou de pessoa a quem está ligado por estreitas relações de parentesco ou afeição, contra perigo certo ou atual, que não provocou, nem podia de outro modo evitar, sacrifica direito alheio, ainda quando superior o direito protegido, desde que não lhe era razoavelmente exigí-vel conduta diversa”.

c) Requisitos legais do estado de necessidade justificante

O agente deve ter consciência dos elementos objetivos da causa de justificação apontados no artigo 43, CPM, e agir com vontade de salvamento (elemento subjetivo).

A lei castrense exige ameaça a direito próprio ou alheio. Assim, o interesse em perigo pode ser do próprio agente (estado de necessidade próprio) ou de outrem (estado de necessidade de terceiro). O estado de necessidade de terceiro fundamenta-se no reconhecimento da impos-sibilidade de imediata e eficiente assistência estatal, que outorga a faculdade de intervenção protetora de um particular em favor de outro, ainda que não exista entre eles relação especial de preservação do bem jurídico (ex.: parentesco, amizade, subordinação etc.).

Segundo a doutrina, é perfeitamente possível agir em estado de necessidade de terceiros, des-de que o bem a ser defendido seja indisponível. Todavia, sendo o bem jurídico disponível, em regra, sua defesa compete somente ao seu titular, que, diante do caso concreto, pode optar em defendê-lo ou não. Nesse caso, só pode agir em estado de necessidade de terceiros se houver anuência do titular.

Vale ressaltar que o estado de necessidade exculpante (art. 39, CPM), somente autoriza agir em estado de necessidade de terceiros quando o sujeito estiver a ele “ligado por estreitas relações de parentesco ou afeição”.

De outro lado, é necessária a ocorrência de uma concreta situação de perigo certo e atual, que é aquela que está prestes a acontecer. De acordo com a orientação doutrinária, considera-se atual o perigo se, a demora da intervenção aumentar de forma considerável e não recomendá-vel o risco de dano. Também se considera atual o perigo permanente, como por exemplo, num imóvel e, ruínas.

Ademais, o dano para o bem jurídico deve ser inevitável. Isso significa que o dano só pode ser evitado com o sacrifício de outro bem, não havendo opção por parte do agente. Não pode

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haver uma alternativa de saída mais cômoda. Logo, se houver possibilidade de fuga ou outro modo de evitar o perigo, não se pode falar em estado de necessidade. Deve-se sempre buscar a solução menos gravosa para salvaguardar o bem. O dano deve ser sempre a ultima ratio para salvar-se ou a terceiros.

A lei exige que a situação de perigo não tenha sido provocada pelo agente. Assim, não pode invocar estado de necessidade o agente que provocou o perigo. Note que, diferentemente do Código Penal comum, o Código Penal Militar não utiliza a expressão “que não provocou por sua vontade”. Portanto, não importa se a situação de perigo foi dolosa ou culposamente criada pelo sujeito.

Por fim, contempla-se o quadro do estado de necessidade justificante com a inexistência do dever legal de afastar o perigo (“e o agente não era legalmente obrigado a arrostar o perigo”). Arrostar significa olhar de frente, sem medo.

Nesse ponto, há importante discussão acerca da possibilidade de o garantidor alegar estado de necessidade. É cediço que o garantidor tem o dever legal de evitar a ocorrência do resulta-do. Diante de um comportamento imposto pelo ordenamento jurídico, sua omissão equivale a uma ação em virtude de uma relação especial de proteção com o bem jurídico.

d) Espécies de estado de necessidade

• Denomina-se estado de necessidade defensivo quando a conduta do agente se orienta diretamente contra a fonte da situação de perigo, a fim de eliminá-la. Por exemplo, num ataque de um cão feroz, o sujeito saca o revólver e mata o animal.

• Já o estado de necessidade agressivo ocorre quando a conduta do necessitado vem a sa-crificar bens de um inocente, não provocador da situação de perigo, como na hipótese de um motorista que, para escapar de um caminhão desgovernado, desvia seu carro para o acostamento e colide com outro veículo que ali estava estacionado.

• Por fim, o estado de necessidade putativo é aquele em que a situação de perigo que per-mitiria ao agente agir amparado pela causa de justificação é imaginária. Aplica-se a regra do art. 36, caput e § 1º, CPM, referente ao erro de fato. Se o erro for escusável, isenta de pena. Todavia, se o erro derivar de culpa, permite-se a punição se o fato é previsto como crime culposo.

3.4. Legítima defesa

a) Conceito

Nos exatos termos do artigo 44 do Código Penal Militar, “entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.

De acordo com a doutrina, a legítima defesa traduz-se na possibilidade de reação direta do sujeito em defesa de um direito próprio ou de terceiro, em face da impossibilidade de inter-venção tempestiva do Estado, que tem igualmente por fim que interesses dignos de tutela não sejam afetados.

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b) Requisitos da legítima defesa

O comportamento justificado é aquele que realiza de forma consciente todos os pressupostos fáticos da causa de justificação e cuja finalidade se orienta à defesa de um bem jurídico frente a uma injusta agressão (animus defendendi).

• Agressão injusta é o ato oriundo de uma conduta humana lesiva a bem juridicamente pro-tegido e não autorizada pelo ordenamento jurídico. A injusta agressão independe de impu-tabilidade penal de seu autor. A agressão perpetrada por inimputável pode ser repelida le-gitimamente, devendo-se utilizar a forma de repulsa que provoque menos danos possível.

• Para configurar a legítima defesa, exige-se a atualidade ou eminência da agressão. Diz--se atual a agressão que está em curso no momento da reação defensiva, enquanto que eminente é aquela que está prestes a acontecer, apresentando-se como concreta possibi-lidade, em vias de desencadear-se. Portanto, excluem-se da legítima defesa as agressões passadas, que já consumaram e produziram seus efeitos, bem como as futuras, que corres-pondem à simples ameaça ou temor de agressão.

• Autoriza-se a defesa de direito próprio ou de terceiro, neste caso cabível se o bem jurídico for indisponível.

• O comportamento justificado também implica o uso moderado dos meios necessários. Meios necessários são aqueles, dentre outros que estavam disponíveis, eficazes e suficien-tes para repelir a injusta agressão.

c) Observações

Pela regra disposta no artigo 44 do CPM, não se pode invocar legítima defesa em face de al-guém que age amparado por qualquer das causas de justificação, já que a conduta é lícita, am-parada pelo ordenamento jurídico, mesmo que, inevitavelmente, venha ofender outros bens jurídicos. Assim, não se afigura possível agir em legítima defesa em face do estado de neces-sidade, estrito cumprimento do dever legal, ou exercício regular de direito, salvo se houver excesso ou erro de fato.

Também não se admite a chamada legítima defesa recíproca, já que não é possível que dois sujeitos estejam ao mesmo tempo em legítima defesa real. Somente poderá ser aventada hipó-tese de legítima defesa se um dos agentes injustificadamente agredir o outro.

Todavia, admite-se a coexistência de legítima defesa real (autêntica) em face de legítima defesa putativa, uma vez que aquele que labora em erro não pratica uma ação justificada, ainda que seja isento de pena. Nesse caso, pode alguém defender-se legitimamente da injusta agressão derivada de erro. Frente à agressão praticada numa situação de descriminante putativa (erro de fato), cabe legítima defesa, pois a situação imaginária não torna lícita a conduta do agente.

Situação distinta se configura na chamada legítima defesa sucessiva ou pendular, que ocorre na hipótese de excesso extensivo. A reação defensiva praticada pelo agente, embora inicialmente legítima, transforma-se em agressão injusta quando incide no excesso doloso ou culposo (art. 45 e 46, CPM), autorizando aquele que viu repelida e cessada a sua agressão, inicialmente in-justa, agora alegar a excludente a seu favor, porque o agredido passou a ser considerado agres-sor, em virtude de seu excesso.

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d) Ofendículos

Ofendículos (ou ofensáculas) são aparelhos visíveis (concertinas, arame farpado, lanças, cacos de vidro em muros etc) predispostos em defesa da vida, da integridade física ou da proprie-dade. Englobam também a utilização de meios mecânicos ocultos (eletrificação de cercas ou de maçanetas de portas, instalação de armas prontas para disparar), bem como cães e outros animais de guarda.

As ofendículas são aceitas pelo ordenamento jurídico, mas o usuário deve adotar precauções em seu emprego, sob pena de responder a título de excesso pelos resultados advindos. Segun-do o entendimento dominante, ofendículos legítima defesa preordenada. Argumenta-se que seu funcionamento somente será efetivo se ocorrer injusta agressão ao bem jurídico protegido. Em sentido contrário, a corrente minoritária entende que se trata de exercício regular de direi-to, já que não se pode vislumbrar legítima defesa a uma agressão futura.

3.5. Estrito cumprimento do dever legal

De acordo com o artigo 42, III, CPM, “não há crime quando alguém pratica os atos estritamente necessários para o cumprimento de um dever previsto em norma jurídica”.

Conforme entendimento da doutrina, o estrito cumprimento do dever legal, em regra, abran-ge o dever de intervenção dos agentes públicos na esfera particular com o fito de garantir o cumprimento da lei ou de ordens de superiores do poder público, o que autoriza a realização justificada de algumas condutas típicas (coação, privação da liberdade, violação de domicílio, lesão corporal).

Dever legal é aquele previsto em norma jurídica de caráter geral, penal ou extrapenal, incluin-do normas jurídico-administrativas (decretos, portarias, regulamentos). Não se confunde com dever social, moral ou religioso. Além disso, a ação justificada deve ser realizada obedecendo estritamente às condições objetivas a que esteja subordinada, nos termos vinculados pela dis-posição legal.

Exige-se, ainda, a orientação de ânimo do agente (elemento subjetivo) que envolve a consciên-cia do dever imposto pela norma legal e a vontade de cumpri-lo.

Na esfera militar, merece especial atenção o cumprimento do dever militar referente à seguran-ça de área militar. Nessa linha, já decidiu o Superior Tribunal Militar que “não caracteriza cons-trangimento ilegal o ato de oficial militar que, em estrito cumprimento do dever legal, adverte civis que invadem área proibida, durante uma festividade”.

3.6. Exercício regular de direito

Dispõe também o artigo 42, CPM, que “não há crime quando o agente pratica o fato em exercí-cio regular de direito”. Nessa causa de justificação, o sujeito usufrui de uma faculdade conferida pelo ordenamento jurídico, desempenhando uma atividade ou realizando uma conduta auto-rizada.

Sobre o tema, vale conferir decisão do Superior Tribunal Militar, no sentido de que “a garantia da imunidade profissional do advogado, prevista no artigo 7º, § 2º, da lei 8.906/04, c/c o artigo

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133 da Constituição federal, não é absoluta. Tal garantia só se aplica no exercício regular da advocacia, por ocasião dos debates em defesa do postulado. Qualquer manifestação caluniosa, difamatória ou injuriosa perpetrada fora dessas condições, constitui justa causa para a instau-ração da competente ação penal”. (HC nº 2006.01.034183-8/CE).

3.7. Excludente de ilicitude do comandante (art. 42, p. único, CPM)

Em algumas situações excepcionais, na iminência ou perigo de calamidade, o comandante de navio, aeronave ou praça de guerra é autorizado a constranger, por meios violentos, seus subal-ternos a executarem serviços ou manobras urgentes, de modo a salvar a unidade ou vidas, ou evitar o desânimo, o terror, a desordem, a rendição, a revolta ou o saque.

Há uma combinação de estado de necessidade com estrito cumprimento do dever legal, uma vez que o comandante é legalmente obrigado, em situação de perigo, a empregar todos os meios ao seu alcance para evitar a perda, destruição ou inutilização de instalações militares, navio, aeronave ou engenho de guerra motomecanizado.

Em ocasião de incêndio, naufrágio, encalhe, colisão, ou outro perigo semelhante, o coman-dante é obrigado a tomar as providências adequadas para salvar seus comandados e minorar as consequências do sinistro, devendo ser o último a sair de bordo ou a deixar a aeronave ou quartel ou sede militar sobre seu comando. Se assim não fizer, incorrerá no delito previsto no artigo 200, CPM.

3.8. Excesso nas causas de justificação

a) Excesso culposo

A ação justificada deve ater-se aos limites impostos pela lei quanto à sua intensidade e à sua extensão. Conforme assenta o artigo 45, CPM, o agente que, em qualquer dos casos de exclu-são de crime, excede culposamente os limites da necessidade, responde pelo fato, se este é punível, a título de culpa.

Há excesso culposo em sentido estrito quando o sujeito, em função de sua má avaliação da si-tuação fática, atua com uma intensidade além do necessário para afastar o perigo, defender-se de injusta agressão, cumprir um dever ou exercitar um direito.

Nesse contexto, o chamado excesso intensivo ocorre quando o agente, durante a ação justifica-da, podendo fazê-lo de forma menos lesiva, intensifica-a de forma imoderada. Parte do pressu-posto de que a agressão e o perigo são atuais, mas a ação defensiva poderia e deveria ter sido menos gravosa, e o sujeito, por medo, susto ou consternação, acabou excedendo-se na medida requerida para a defesa. Portanto, o excesso se refere à espécie dos meios empregados ou ao grau de sua utilização.

Também pode haver o excesso culposo por erro de fato vencível quando o agente, em função de sua má avaliação dos fatos, não consegue identificar o limite da causa de justificação, ou seja, o momento em que cessa a situação de perigo ou a injusta agressão. Assim, acreditan-do que ainda está sob o manto da causa de justificação, o sujeito dá continuidade à sua ação, ocorrendo em excesso extensivo. Nesse caso, responde pelo fato, se este é punível a título de

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culpa. Por exemplo, após fazer cessar a injusta agressão, o agente dá continuidade à repulsa, quando essa já não é mais necessária, por não estarem mais presentes os pressupostos da legí-tima defesa.

b) Excesso exculpante ou escusável

Diferentemente do Código Penal comum, o Código Castrense prevê de forma expressa o ex-cesso exculpante, que não é punível quando resulta de escusável surpresa ou perturbação de ânimo, em face da situação (art. 45, p. único, CPM).

Enquanto, no Direito Penal comum, o excesso escusável é reconhecido pela doutrina como cau-sa supralegal, o Direito Penal Militar o trata como causa legal de exclusão da culpabilidade do agente por inexigibilidade de conduta diversa.

A perturbação psíquica decorrente do pavor experimentado no caso concreto pelo sujeito du-rante a situação de perigo ou agressão suprime-lhe a capacidade de avaliar perfeitamente a intensidade de sua reação. Assim, não há que se falar em resposta excessiva em razão de uma postura dolosa ou culposa, mas sim decorrente de perturbação emocional do agredido ou ne-cessitado, daí não se poder exigir do agente conduta diversa.

Nem todo excesso intensivo é exculpante. É necessário que as circunstâncias do caso concreto evidenciem que a perturbação psíquica retirou do sujeito a possibilidade de avaliar correta-mente a intensidade de sua reação defensiva. Afastada essa situação peculiar, responde pelo excesso culposo.

c) Excesso doloso

Há duas modalidades de excesso doloso: em sentido estrito e decorrente de erro de direito.

O excesso doloso em sentido estrito ocorre quando o agente, após iniciar sua conduta con-forme o direito, conscientemente e voluntariamente, extrapola os limites de sua atuação, de-sejando o resultado ilícito. Sabendo que não podia prosseguir, por não ser mais necessário, voluntariamente, o sujeito dá continuidade. Em consequência deve responder pelo resultado antijurídico decorrente do seu excesso intencional.

O excesso doloso decorrente de erro de direito acontece quando, após iniciada a ação justifi-cada, em virtude de erro de interpretação da lei quanto aos limites da causa de justificação, o sujeito acredita que pode prosseguir albergado pela excludente.

É somente nessa situação de erro de direito que se aplica o artigo 46 do Código Penal Militar, que dispõe que o juiz pode atenuar a pena ainda quando punível o fato por excesso doloso. Nesse caso o agente responde pelo resultado a título de dolo, sendo facultada ao juiz aplicação de atenuante.

3.9. Elementos não constitutivos do crime (art. 47, CPM)

Considerando que a hierarquia e a disciplina são fundamentos da instituição militar, em alguns crimes propriamente militares, a confrontação entre superiores e subordinados é importante tanto para sua tipificação quanto para a aplicação da pena.

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Em alguns crimes contra a autoridade ou disciplina militar (ex.: art. 157, 158, 168, 174, 175 e 176, CPM) é necessária a consciência dessa condição pessoal do sujeito passivo para a caracte-rização do delito. Por óbvio, deixam de ser elementos constitutivos do crime a qualidade de su-perior ou a de inferior, quando não conhecida do agente (art. 47, I, CPM). Nesse caso, pode ha-ver desclassificação do crime de violência contra superior para lesões corporais (art. 209, CPM).

Já na hipótese do artigo 47, II, CPM embora sabendo da condição pessoal, o militar reage a uma injusta agressão. Não cometerá crime, pois se encontra em legítima defesa. Todavia, se houver excesso, será responsabilizado na forma dos artigos 45 (culposo) e 46 (doloso), do Código Penal Militar, desconsiderando-se como elementos do crime a qualidade de superior ou a de inferior, a de oficial de dia, de serviço ou de quarto, ou a de sentinela, vigia ou plantão.

4. Culpabilidade

4.1. Conceito

Na concepção da Teoria Clássica ou Psicológica (Sistema Causal-Naturalista de List-Beling), a culpabilidade era o vínculo psicológico que unia o agente ao fato por ele praticado. Assim, dolo e culpa eram espécies de culpabilidade e a imputabilidade era seu pressuposto.

Sob a Teoria Normativa (Frank) ou Psicológica-Normativa (Sistema Neoclássico – Metodologia Neokantiana), a culpabilidade passa a ser o juízo de desaprovação jurídica do ato que recai sobre o autor. A imputabilidade deixa de ser pressuposto da culpabilidade e passa a ser seu ele-mento. Ainda são considerados como espécies de culpabilidade o dolo (vontade e consciência de realizar o fato proibido) e culpa (vontade defeituosa que produz o resultado). Agrega-se a ideia de dolo normativo, que, além da vontade, exige a consciência da ilicitude do fato. Nesse contexto, a inexigibilidade de conduta diversa era causa geral de exclusão da culpabilidade.

Por fim, de acordo com a Teoria Finalista (Normativa Pura), o dolo é retirado da culpabilidade e passa a integrar um tipo complexo (objetivo e subjetivo). Afasta-se sua carga normativa, sendo tratado como natural. Assim, o tipo doloso é definido como ação dirigida à realização de um resultado socialmente intolerável.

Já a culpa configura a violação do dever objetivo de cuidado exigido no âmbito de relação. O tipo culposo é a execução da ação final em relação às consequências socialmente intoleráveis que o autor pensa que não ocorrerão (culpa consciente) ou sequer representa sua ocorrência (culpa inconsciente).

A Culpabilidade passa a ser juízo de reprovação pessoal que se realiza sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente. Por encerrar um juízo individual, todos os fatores, internos e externos, devem ser considerados a fim de se apurar se o agente, nas circunstâncias em que se encontrava, podia submeter-se às determinações e proibições do Direito.

Na visão finalista, os elementos da culpabilidade são: a imputabilidade penal; a potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa.

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4.2. Imputabilidade (Capacidade de Culpabilidade)

a) Conceito

A imputabilidade é a aptidão psíquica do agente em relação à compreensão do ilícito e à capa-cidade de determinar seu comportamento. Configura o conjunto das condições de maturidade e sanidade mental que permitem ao agente conhecer o caráter ilícito de seu ato e determinar--se de acordo com este entendimento.

Por ter plena capacidade de entender e querer, o imputável responde por seus atos, sendo do-tado de responsabilidade criminal.

A imputabilidade penal desdobra-se em dois aspectos:

• Cognoscitivo (intelectivo), que é a capacidade genérica de compreender as proibições ou determinações jurídicas, levando a que o agente possa prever as repercussões de sua con-duta no mundo social.

• Volitivo (determinação da vontade): evidenciando a capacidade de dirigir a sua conduta de acordo com o entendimento ético-jurídico. O sujeito deve ter condições de valorar o motivo e o valor inibitório da ameaça penal e atuar de acordo com essa compreensão.

b) Causas de exclusão da imputabilidade (causas de inimputabilidade)

b.1) Inimputabilidade por alienação mental (art. 48, CPM)

O artigo 48, do Código Penal Militar estatui “não é imputável quem, no momento da ação ou omissão, não possui a capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento, em virtude de doença mental, de desenvolvimento mental incompleto ou retardado.

À semelhança do Código Penal comum, adotou-se na esfera militar o Critério (sistema) Biopsi-cológico ou misto, que atende tanto às causas biológicas que produzem a imputabilidade como às suas consequências na esfera psicológica do agente. A imputabilidade caracteriza-se pela combinação de dois elementos: presença de anomalias mentais e a completa incapacidade de entendimento e determinação.

O Código Penal Militar adota o sistema vicariante em caso de inimputabilidade por alienação mental, devendo o juiz aplicar medida de segurança em lugar de pena, sendo-lhe vedada a im-posição simultânea ou concorrente das duas respostas penais.

Assim, o inimputável que apresenta periculosidade submete-se ao disposto no artigo 112, CPM: “quando o agente é inimputável (art. 48), mas suas condições pessoais e o fato praticado revelam que ele oferece perigo à incolumidade alheia, o juiz determina sua internação em ma-nicômio judicial”.

Todavia, se a doença ou deficiência mental não suprime, mas diminui consideravelmente a ca-pacidade de entendimento da ilicitude do fato ou a de autodeterminação, não fica excluída a imputabilidade, porém a pena pode ser atenuada.

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Trata-se de uma redução da reprovação penal, que deve ser proporcional à capacidade de cul-pabilidade. Assim constatada tal circunstância, o juiz deve atenuar a pena, devendo-se interpre-tar a expressão “pode” à luz das frações previstas no artigo 73, CPM, que dispõe que quando a lei determina a agravação ou atenuação da pena sem mencionar o quantum, deve o juiz fixá-lo entre um quinto (1/5) e um terço (1/3), guardados os limites da pena cominada ao crime.

Ademais, se o juiz verificar que o semi-imputável necessita de tratamento curativo, deve aplicar o parágrafo único do artigo 48 do CPM, em homenagem ao sistema vicariante, substituindo a pena já atenuada por medida de segurança de internação em estabelecimento psiquiátrico.

b.2) Inimputabilidade por embriaguez acidental completa (art. 49, CPM)

Nos termos do artigo 49 do Código Penal Militar “não é igualmente imputável o agente que, por embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”.

Embriaguez é o distúrbio físico-mental (perturbação psicológica) resultante de intoxicação por álcool ou substância de efeito análogo, que afeta o sistema nervoso central como depressivo ou narcótico.

A causa de inimputabilidade exige que a embriaguez seja involuntária. Quando decorrente de caso fortuito (imprevisibilidade – evento do acaso), o sujeito desconhece o efeito inebriante da substância, que associada a sua particular condição fisiológica, causa estado de embriaguez. Na segunda hipótese, a embriaguez é decorrente de força maior quando alguém é coagido física ou moralmente por outrem (ação humana) a ingerir bebida alcoólica ou substância de efeitos análogos.

Além disso, para que seja excluída a imputabilidade penal, exige-se que a embriaguez seja com-pleta, ou seja, suficiente para provocar a incapacidade total de entendimento e determinação.

Caso a incapacidade seja apenas relativa, haverá causa de redução de pena. Conforme dispos-to no parágrafo único do artigo 49, CPM, a “pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou omissão, a plena capacidade de entender o caráter criminoso do fato ou de determi-nar-se de acordo com esse entendimento”.

Cumpre registrar, ainda, que o Código Castrense, assim como o Código Penal Comum, adota a teoria da actio libera in causa (ação livre na causa), segundo a qual é imputável ao sujeito que, em estado de embriaguez, é causador, por ação ou omissão de um resultado punível, desde que se tenha colocado naquele estado de embriaguez de forma voluntária ou culposa.

A aferição da imputabilidade é transferida para o momento anterior ao do estado de embria-guez e não no momento da prática delitiva. Há três situações que caracterizam a aplicação da teoria da Actio Libera in Causa:

• Embriaguez voluntária em sentido estrito: o estado de embriaguez é desejado pelo sujei-to, que faz a ingestão da substância com a finalidade de embriagar-se, sem necessariamen-te haver intenção de praticar crimes.

• Embriaguez Preordenada: voluntariamente o sujeito coloca-se em estado de embriaguez a fim de praticar infrações penais.

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• Embriaguez Culposa: o estado de embriaguez, apesar de não ser desejado, é previsível pelo sujeito, pois este, sem observar o dever de cuidado, ingere álcool em quantidade sufi-ciente para colocá-lo naquele estado.

O tema tem relevância, pois o Código Penal Militar trata a embriaguez não acidental do militar sempre como circunstância agravante (art. 70, II, “c”, CPM). Se o agente for civil, a pena será agravada somente no caso de embriaguez preordenada, conforme ressalva do parágrafo único do mesmo artigo 70, CPM.

Por fim, atente-se para o fato de que, no Código Castrense, a embriaguez em serviço é tipifi-cada como crime contra o dever militar (art. 202, CPM). O tipo penal descreve duas condutas voluntárias: embriagar-se o militar estando de serviço ou apresentar-se para prestar o serviço embriagado.

Note-se que não basta a simples ingestão de bebida alcoólica ou substâncias de efeitos análo-gos, sendo necessária a comprovação efetiva do estado de embriaguez, em regra, através de perícia de dosagem alcoólica ou, na falta dessa, de outra prova idônea, de acordo com o con-junto probatório.

b.3) Inimputabilidade por imaturidade natural (art. 228, CF)

A Constituição da República adota a presunção absoluta de imputabilidade do menor de 18 anos, sujeitando-o às normas da legislação especial. O legislador constitucional acolheu o cri-tério biológico puro, por questões de política criminal, para presumir a inimputabilidade dos menores de 18 anos.

Somente por meio de um procedimento qualificado de emenda à Constituição, a menoridade penal pode ser reduzida, não cabendo ao legislador ordinário alterar tal critério. O menor de dezoito anos fica sujeito às disposições específicas do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), respondendo pela prática de ato infracional e submetendo-se às medidas de prote-ção e medidas socioeducativas.

Assim, as ressalvas e equiparações dos artigos 50 a 52 do Código Penal Militar não foram recep-cionadas pela atual ordem constitucional.

De outro lado, na esfera penal, considera-se que o sujeito com idade entre 18 e 21 anos ainda não completou sua formação psicológica e, apesar de imputável, merece menor reprovação, o que se traduz na atenuação da pena (art. 72, I, 1ª parte, CPM) e redução do prazo prescricional pela metade (art. 129, CPM).

b.4) Emoção e paixão

Segundo a doutrina, a emoção é um sentimento intenso e passageiro que altera o estado psico-lógico do indivíduo (angústia, medo, vingança, tristeza). Já a paixão é considerada uma emoção--sentimento, ou seja, uma ideia permanente ou crônica por algo (cupidez, amor, ódio, ciúme).

O Código Penal Militar adota o critério puramente psicológico. Portanto, os estados emotivos ou passionais não excluem a imputabilidade, salvo quando patológicos (art. 48, caput, CPM).

Todavia, em certas circunstâncias, a emoção pode caracterizar circunstância atenuante (art. 72, III, “c”, CPM “cometido o crime sob a influência de violenta emoção...”) ou causa de dimi-

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nuição de pena de 1/6 a 1/3 (artigo 205, §1º, CPM – Homicídio privilegiado e artigo 209, §9º, CPM – Lesão corporal privilegiada: “sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a in-justa provocação da vítima”).

4.3. Potencial consciência da ilicitude

a) Conceito

A consciência da ilicitude é a capacidade que o agente de uma conduta proibida tem, na situ-ação concreta, de apreender a ilicitude de seu comportamento. Trata-se de uma consciência profana do injusto, constituída do conhecimento da antissocialidade, da imoralidade ou lesivi-dade de sua conduta, a partir das normas de cultura, dos princípios morais e éticos, dos conhe-cimentos adquiridos na vida em sociedade.

No Direito Penal Militar, a consciência da ilicitude não precisa ser real, sendo grande a possibi-lidade que o agente apresentava, no caso concreto, de alcançar este conhecimento (potencial consciência).

b) Erro de direito

A consciência da ilicitude é adotada no Código Castrense de forma diversa do Código Penal Comum, já que sua disciplina envolve o chamado Erro de Direito, previsto no artigo 35 do CPM, que determina que a “pena pode ser atenuada ou substituída por outra menos grave quando o agente, salvo em tratando de crime que atente contra o dever militar, supõe lícito o fato, por ignorância ou erro de interpretação da lei, se escusável”.

Erro é a falsa representação da realidade ou o falso ou equivocado conhecimento de um objeto. Já a ignorância é a falta de representação da realidade ou o desconhecimento total do objeto.

Percebe-se que, ao definir o erro de direito, o Código Penal Militar dá igual tratamento à igno-rância da lei (falta de conhecimento – aspecto negativo) e ao erro de interpretação da lei (falsa representação da realidade – aspecto positivo).

No erro de direito, o autor tem domínio da situação fática, pois sabe o que está fazendo, mas não tem consciência de que aquele comportamento é reprovável do ponto de vista penal. O su-jeito, ao praticar o fato, supõe-no lícito porque ignora a norma ou porque, apesar de conhecê--la, interpreta-a de forma equivocada.

O erro de direito do CPM é semelhante ao erro de proibição do Código Penal (art. 21, CP), pois também recai sobre a consciência da ilicitude, já que o sujeito “supõe lícito o fato”. Por exem-plo, o agente invade um compartimento não aberto ao público onde alguém exerce profissão, pensando que não se trata de domicílio (por equívoco na interpretação do termo casa) – art. 226, § 4º, III, CPM.

Diferentemente do Código Penal Comum, o Código Penal Militar não isenta de pena o agente que supõe lícito o fato por ignorância ou por erro de direito escusáveis. Nesse caso, a pena pode ser atenuada de 1/5 a 1/3, à luz do artigo 73, CPM, ou substituída por outra menos grave, como, por exemplo, de reclusão por detenção.

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Todavia, não se pode alegar erro de direito em se tratando de crime que atente contra o dever militar, porque nesse caso o agente tem a obrigação de conhecer a norma castrense e interpre-tá-la corretamente. Os crimes contra o dever militar estão elencados entre os artigos 187 e 204 do CPM.

c) Erro de fato

De outro lado, o artigo 36 do Código Penal Militar dispõe acerca do erro de fato, afirmando que é “isento de pena quem, ao praticar o crime, supõe, por erro plenamente escusável, a inexis-tência de circunstância de fato que o constitui ou existência de situação de fato que tornaria a ação legitima”.

O erro de fato do estatuto penal castrense não se confunde com o erro de tipo do Código Pe-nal comum, que é mais amplo, pois recai não só sobre os elementos fático-descritivos do tipo, como também sobre os elementos jurídico-normativos.

O erro de tipo do caput do artigo 20 do Código Penal incide sobre as elementares ou qualquer outro dado que se agregue a determinada figura típica, por isso sempre exclui o dolo, seja evi-tável ou não, por que nele a vontade é baseada na premissa inidônea à luz do tipo penal.

Já o erro de fato do Direito Penal Militar, o sujeito equivoca-se quanto a algum elemento do plano fático, pois, ao praticar o crime, supõe a inexistência de circunstância de fato que o cons-titui. Por exemplo, o agente subtrai a mochila de um colega de farda, supondo ser a própria por ser idêntica à sua mochila (situação fática).

Interessante notar que o estatuto repressivo castrense insere no mesmo dispositivo o erro so-bre descriminante putativa (supõe a existência de situação de fato que tornaria a ação legíti-ma), conferindo-lhe o mesmo regramento do erro de fato sobre o elemento constitutivo do tipo. Por exemplo, um soldado de serviço de sentinela, acreditando tratar-se de uma invasão ao quartel, mata um civil que, fugindo de um assalto, correra em direção à área militar em busca de abrigo.

Na hipótese de erro de fato invencível ou plenamente escusável, o agente não tinha como evi-tá-lo nas circunstâncias em que se encontrava, mesmo tomando todas as cautelas necessárias. Assim, qualquer pessoa naquela mesma situação teria incorrido naquele erro. A solução ado-tada pelo Código Castrense nesse caso é distinta daquela apresentada no Código Comum: o agente é isento de pena.

De outra sorte, se o erro de fato é vencível ou inescusável, quando verificado que o agente, se tivesse atuado com diligência exigida, teria evitado o erro. Embora não seja isento de pena, há um tratamento mais brando, pois, o fato poderá ser-lhe atribuído a título de culpa se houver previsão legal de modalidade culposa. É assim que o Código Penal Militar define a hipótese de erro de fato culposo, em seu artigo 36, §1º: “se o erro deriva de culpa a este título responde o agente, se o fato for punível como crime culposo”.

A doutrina fala em culpa imprópria ou culpa por assimilação nessa situação em que o agente, em virtude de erro evitável pelas circunstâncias, realiza voluntariamente a conduta típica, mas responde como se tivesse praticado um delito culposo.

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d) Erro determinado por terceiro

De acordo com o § 2º do artigo 36, CPM, “se o erro é provocado por terceiro, responderá este pelo crime, a título de dolo ou culpa, conforme o caso”.

Se o terceiro determina o erro dolosamente, deve-se verificar se o agente incidiu em erro es-cusável ou inescusável. Na primeira hipótese, haverá autoria mediata, pois, o terceiro utiliza o instrumento inculpável (isento de pena) para realização material do delito. Por exemplo, um oficial médico ordena que ao enfermeiro que injete determinado “remédio” no paciente, o que é feito prontamente. O paciente vem a falecer, eis que, de fato, tratava-se de poderoso veneno.

No caso de erro inescusável, ter-se-á um caso de autoria colateral heteróloga, pois aquele que terminou o erro dolosamente responderá pelo erro dolosamente, ou seja, responderá por cri-me doloso, enquanto que o sujeito que praticou o fato induzido a erro culposo, responderá a título de culpa, se houver previsão legal. Como exemplo, um soldado desafia um colega míope a mostrar sua boa pontaria disparando sua arma em direção a um “tronco”, que na verdade era outro militar, o qual vem a falecer em virtude do ferimento. O soldado que determinou o erro responde por homicídio doloso, enquanto que o que disparou a arma responde por homicídio culposo.

Se o terceiro determina o erro culposamente, responde a título de culpa, sem prejuízo de se verificar se o agente incorreu em erro escusável (isento de pena) ou inescusável (culpa impró-pria).

e) Erros Acidentais

O erro acidental não isenta de pena, pois não faz o agente julgar lícita a ação criminosa. O sujei-to atua com consciência da antijuridicidade de seu comportamento, mas se equivoca quanto a um elemento não essencial do fato ou erra no seu movimento de execução.

Há três modalidades de erro acidental previstas no artigo 37 do Código Penal Militar:

• Erro na identificação da pessoa (erro in personam)

• Erro na execução (aberratio ictus)

• Erro quanto ao bem jurídico (aberratio criminis)

No erro na identificação da pessoa (erro in personam), o agente, por erro de percepção, atinge uma pessoa em vez de outra e, portanto, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela que pretendia atingir. Há substituição das pessoas que se viram envolvidas no fato. A execução é correta, mas a pessoa tem uma falha de percepção na identificação da vítima, o que nada modifica a classificação do crime cometido.

Não se consideram as qualidades da vítima real, mas sim da vítima virtual, que realmente pre-tendia ofender. Por exemplo, um soldado pretendia praticar violência contra superior hierár-quico (superior), mas confunde-se e golpeia no escuro outro soldado.

A doutrina dá maior elasticidade ao conceito acima e reconhece a hipótese de erro sobre o ob-jeto (erro in objecto), quando o agente, tendo vontade e consciência de praticar uma conduta típica e ilícita, erra na identificação do objeto. Por exemplo, pretendendo subtrair uma arma de

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fogo, o sujeito furta uma réplica (simulacro). Responde como se tivesse praticado o crime con-tra aquela coisa que realmente pretendia atingir.

O erro na execução (aberratio ictus), previsto na segunda parte do caput do artigo 37, CPM, ocorre quando o agente, por erro no uso dos meios de execução, ou outro acidente, atinge pessoa diversa da pretendida. A expressão aberratio ictus pode ser traduzida por “desvio de golpe”. Assim, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela pessoa que realmente pretendia atingir. Por exemplo, um soldado querendo matar um colega, dispara sua arma, vin-do a acertar outro militar que passava pelo mesmo local naquele momento.

O erro quanto ao bem jurídico (resultado diverso do pretendido ou aberratio criminis) (art. 37 § 1º) ocorre quando, por erro ou outro acidente na execução, é atingido bem jurídico diverso do visado pelo agente, que responderá por culpa se houver previsão legal.

A única hipótese juridicamente plausível é considerar erro de coisa para pessoa. Por exemplo, o sujeito arremessa uma pedra a fim de danificar uma vidraça do alojamento de praças, mas erra o alvo e acaba atingindo um militar que transitava pela alameda do quartel. Não responde pela tentativa de dano, mas pela lesão culposa.

Pensar o inverso significaria premiar o infrator, pois em vez de responder pela tentativa de cri-me contra a pessoa, seria punido pelo crime culposo contra a coisa. Para ilustrar o absurdo: com a intenção de matar um colega de farda, o sujeito dispara sua arma, mas erra o alvo, vindo a danificar equipamento militar. Não obstante, haver previsão de dano culposo no Código Cas-trense, é inviável ignorar a tentativa de homicídio para que o agente responda somente pelo crime contra o patrimônio a título de culpa.

Tanto no erro na execução quanto no erro quanto ao bem jurídico, se houver duplicidade do resultado aplica-se a regra do concurso formal próprio (art. 79, CPM).

4.4. Exigibilidade de conduta diversa

a) Conceito: a exigibilidade de conduta diversa é a possibilidade de alguém comportar-se de acordo com o direito, considerando sua particular condição de pessoa humana frente a circuns-tâncias do caso concreto. Em outras palavras, é a possibilidade, determinada pelo ordenamen-to jurídico, de atuar de uma forma distinta e melhor do que aquela que o sujeito decidiu.

Na inexigibilidade de conduta diversa, há uma impossibilidade de determinar-se conforme o direito, em que pese estar presente a consciência da ilicitude.

b) Causas legais de inexigibilidade de conduta diversa

O Código Penal Militar elenca quatro causas legais de exclusão da culpabilidade por inexigibili-dade de conduta diversa:

• Coação irresistível (art. 38)

• Obediência hierárquica (art. 38)

• Estado de necessidade exculpante (art. 39)

• Excesso escusável (art. 45)

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c) Coação irresistível

Nos termos do artigo 38, CPM, não é culpado quem comete o crime sob coação irresistível ou que lhe suprima a faculdade de agir segundo a própria vontade. Deve-se distinguir duas situa-ções: a coação moral irresistível (vis compulsiva), que exclui a culpabilidade e a coação física irresistível (vis absoluta), que afasta a própria tipicidade, uma vez que não há conduta, por au-sência de voluntariedade.

Na coação moral irresistível, o comportamento é voluntário, mas a vontade é viciada, já que o agente não pode determinar-se livremente. A irresistibilidade da coação é aferida pela gravida-de do mal prenunciado, conforme o poder do coator em cumpri-lo.

A ameaça de mal pode ser dirigida ao próprio coagido ou a alguém a ele relacionado. Por exem-plo, um soldado é obrigado a subtrair munições do quartel, caso contrário, seu filho que está em poder de traficantes, será morto.

Não se exige que o coagido se oponha para atuar conforme o Direito. Só é punível o autor da coação. O coagido é mero instrumento nas mãos do coator e pratica um fato típico e antijurí-dico, embora não seja culpável. Não há que se falar em concurso de pessoas, pois trata-se de autoria imediata.

Nos crimes em que há violação do dever militar (artigo 187 a 204, CPM), o agente não pode invocar coação moral irresistível. O motivo da vedação diz respeito à própria natureza da ativi-dade castrense, que exige que os militares suportem as mais diversas pressões para assegurar o cumprimento do dever militar.

De outro lado, se a coação é física ou material, não há conduta, por ausência de vontade. As-sim, mesmo em crimes contra o dever militar, o sujeito não pode ser responsabilizado, daí a ressalva da parte final do artigo 40, CPM.

Por fim, se era possível resistir à coação, o juiz, tendo em vista as condições pessoais do réu, pode atenuar a pena.

d) Obediência hierárquica

De acordo com o Código Penal Militar, não é culpado quem comete o crime em estrita obedi-ência à ordem direta de superior hierárquico, em matéria de serviços. Na hipótese, há autoria mediata, respondendo pelo crime somente o autor da ordem.

Para que seja inculpável, é necessário que o executor seja subordinado hierarquicamente àque-la pessoa que deu diretamente a ordem.

Além disso, trata-se de ordem vinculada à matéria de serviço e não manifestamente criminosa. Se a ordem do superior tem por objeto a prática de ato manifestamente criminoso, é punível também o inferior.

Se a ordem não for manifestamente ilegal, o subalterno deve obedecer ao superior hierárqui-co, não lhe cabendo questionar, pois se presume legal. A ordem legal deve ser cumprida, pois corresponde ao Direito e o militar que se recusa a cumprir ordens superiores responde por insubordinação (art. 163, CPM).

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Todavia, havendo fundada dúvida quanto à legalidade da ordem (não era manifestamente ile-gal), o juiz, tendo em vista as condições pessoais do réu, pode atenuar a pena (art. 41, 1º parte, CPM).

Por fim, o executor da ordem deve ater-se estritamente aos limites dessa. Se o agente extrapo-la esses limites, não pode ser beneficiado com causa de exclusão da culpabilidade, responden-do pelo excesso tanto nos atos quanto na forma da execução (art. 38, § 2º, CPM).

e) Estado de necessidade exculpante

De acordo com o artigo 39, CPM, “não é igualmente culpado que, para proteger direito próprio ou de pessoa a quem está ligado por estreitas relações de parentesco ou afeição, contra perigo certo e atual, que não provocou, nem podia de outro modo evitar, sacrifica direito alheio, ainda quando superior ao direito protegido, desde que não lhe era razoavelmente exigível conduta diversa”.

O estado de necessidade exculpante elimina a culpabilidade, quando o bem protegido é de va-lor igual ou inferior que o bem sacrificado. Trata-se de hipótese de inexigibilidade de conduta diversa.

f) Excesso exculpante ou escusável

Diante de determinadas situações de perigo ou agressão injusta, a perturbação psíquica experi-mentada pelo sujeito retira-lhe a capacidade de avaliar perfeitamente a intensidade da reação. Nesses casos, o Direito Penal Militar reconhece o excesso escusável como causa legal de exclu-são da culpabilidade do agente por inexigibilidade de conduta diversa.

De acordo com o parágrafo único do artigo 45, CPM, o excesso não é punível quando resulta escusável perturbação de ânimo, em face da situação. Não há que se falar em reação excessiva em razão de uma postura dolosa ou culposa, mas sim de corrente de perturbação emocional do agredido ou necessitado, daá não se pode exigir do agente conduta diversa.

CONCURSOS DE PESSOAS

1. Introdução

Os crimes podem ser classificados em unissubjetivos ou plurissubjetivos.

Nos crimes unissubjetivos, basta um único sujeito ativo para a realização do tipo penal. En-tretanto, pode ocorrer que se reúnam duas ou mais pessoas para a prática da infração penal. Nesse caso, há o concurso eventual de pessoas.

Os crimes plurissubjetivos exigem a presença de duas ou mais pessoas para a configuração do tipo penal, ou seja, são crimes de concurso necessário. Nesse caso, não há que se falar em

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concurso eventual de pessoas, pois a conduta plural é tipicamente obrigatória. Temos como exemplos os crimes de motim e revolta, previstos no artigo 149, CPM.

2. Teorias acerca do concurso de pessoas

a) Teoria Monística (ou monista, ou unitária ou igualitária)

A teoria monista pura é consequência da Teoria da Equivalência dos Antecedentes Causais (con-ditio sine qua non) e do tratamento igualitário para todos os concorrentes. Segundo a teoria unitária, o crime é uno e indivisível e mantém essa unidade em razão da convergência objetiva e subjetiva das ações dos concorrentes. Portanto, há um crime único atribuído a todos os que contribuem para ele. A participação não é entendida como acessória: o partícipe é considerado coautor e responde inteiramente pelo evento.

O Código Penal Militar, ao dispor em seu artigo 53 que “quem, de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a este cominadas”, adotou a teoria monista. Mas o fez de forma matizada ou temperada, já que estabeleceu algumas exceções, como, por exemplo, a atenuan-te para a participação de menor importância.

O Código Castrense consagrou o princípio constitucional da individualização da pena, ao es-tabelecer que a “punibilidade de qualquer dos concorrentes é independente da dos outros, determinando-se segundo a sua própria culpabilidade”.

b) Teoria Dualista

A Teoria Dualista distingue o crime praticado pelo autor daquele praticado pelo partícipe. Não é a regra do sistema penal militar, mas pode ser identificada em algumas situações excepcionais em que o legislador optou por romper com a regra monista.

É o caso, por exemplo, do crime de incitamento em que a conduta típica é “incitar à desobedi-ência, à indisciplina ou à pratica de crime militar”. Assim, quem incita o motim responde pelo crime do artigo 155, CPM, enquanto que o amotinado responde pelo artigo 149 do mesmo Código.

c) Teoria Pluralista

De acordo com essa teoria, haverá tantas infrações penais quantos forem os concorrentes. Os crimes de corrupção passiva e ativa, previstos respectivamente nos artigos 308 e 309, CPM, configuram exceção pluralista à regra monista do Código Castrense.

3. Requisitos do concurso de pessoas de acordo com a teoria monista

a) Pluralidade de pessoas e de condutas: deve haver uma pluralidade de agentes praticando diversas condutas.

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b) Relevância causal da conduta: exige-se um nexo causal eficaz de cada conduta para a pro-dução do resultado.

c) Liame subjetivo ou psicológico entre as pessoas: deve haver um vínculo psicológico entre os concorrentes, que traduz na comum resolução para fato. A convergência subjetiva cor-responde à consciência e à vontade, que devem ser comuns, ou seja, na unidade de desíg-nios para todos os concorrentes e contribuir para uma obra coletiva. Não há necessidade de ajuste prévio entre os concorrentes.

d) Identidade do ilícito penal: o delito deve ser idêntico ou uma unidade jurídica para todos. Os agentes, unidos pelo liame subjetivo, concorrem para a realização da mesma infração penal.

4. Comunicabilidade e incomunicabilidade das condições pessoais

De acordo com o art. 53, § 1º, CPM, “não se comunicam, outrossim, as condições ou circuns-tâncias de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime”.

4.1. Comunicabilidade das elementares de caráter pessoal

Elementares são dados essenciais à figura típica, sem os quais ocorre atipicidade absoluta (o fato torna-se um indiferente penal) ou relativa (desclassificação). Trata-se de elementos inte-grantes do tipo penal incriminador básico.

A regra é o princípio da comunicabilidade: as elementares de caráter pessoal, quando do co-nhecimento do concorrente, sempre se comunicam a estes, conforme dispõe a parte final do art. 53, § 1º, CPM.

Com base na regra da comunicabilidade, o STM (RSE 2000.01.0006744-8/RJ) decidiu que, em caso de ofensa aviltante a inferior (art. 176), havendo concurso de agentes, é irrelevante que o concorrente seja estranho à carreira militar. As elementares do crime consistentes na condição de militar e de superior se comunicam ao civil por força do art. 53, § 1º, CPM. O STF firmou en-tendimento no mesmo sentido (HC 81438/RJ).

Em sede doutrinária, o tema é polêmico. Parte da doutrina segue orientação dos Tribunais Su-periores e defende que a condição pessoal de militar, por ser elementar do tipo, comunica-se ao concorrente por força do artigo 53, §1º, do CPM. Em sentido contrário, a orientação da doutrina mais tradicional é pela impossibilidade de coautoria entre militar e civil no crime pro-priamente militar, uma vez que a norma constitucional (art. 5º, LXI), que se refere aos crimes propriamente militares somente se aplica aos militares.

A questão requer análise caso a caso. Se o crime propriamente militar é também de mão pró-pria, não se comunica as condições pessoais, já que somente o militar pode realizar direta e materialmente a conduta prevista no tipo. Nesse diapasão, o STM afirmou que “não há que se falar em coautoria de civil para a prática de crime de abandono de posto, por ser esse propria-mente militar”. (Apelação nº 2007.01.0505543-1/MS)

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Há que se cogitar também os casos em que o legislador previu outra figura para tipificar o com-portamento do civil, optando por estabelecer uma exceção dualista à teoria monista. Assim, deve o militar responder pelo crime propriamente militar e o civil pelo crime impropriamente militar ou comum.

É o que pode ocorrer no caso de militares que se reúnem para descumprir ordem recebida de superior, incitados por civis, estes respondem pelo incitamento (art. 155, CPM) e os militares são enquadrados no crime de motim (art. 149, CPM).

Em outro exemplo, em conluio, um militar e um civil desobedecem a uma ordem de uma auto-ridade militar em matéria de serviço. O primeiro responde por recusa de obediência (art. 163, CPM) e o segundo responde por desobediência (art. 301, CPM).

4.2. Incomunicabilidade das circunstâncias de caráter pessoal

Circunstâncias são dados periféricos que gravitam ao redor da figura típica básica, somente interferindo na graduação da pena. A existência da circunstância não altera a definição do tipo--base, mas apenas reflete no aumento ou diminuição da pena. Assim, as circunstâncias podem ser classificadas como qualificadoras, privilegiadoras, causas de aumento ou redução de pena, agravantes ou atenuantes.

As circunstâncias subjetivas ou pessoais são aquelas atuantes na medida da culpabilidade. Tra-ta-se de condições ou qualidades que se referem à pessoa do agente, nada tendo a ver com a materialidade do delito. Elas seguem a regra da incomunicabilidade.

4.3. Circunstâncias objetivas

As circunstâncias objetivas (reais ou materiais) relacionam-se com o fato delituoso em sua ma-terialidade e atuam sobre a magnitude do injusto, como por exemplo, os meios e modos de execução, o uso de determinados instrumentos, espécie, lugar, tempo, ocasião, qualidade da vítima.

Por serem objetivas, tais circunstâncias comunicam-se a todos que concorrem para o crime, se ingressarem na sua esfera de conhecimento. É necessário verificar se a circunstância pode ser havida como materialmente causada pelo concorrente e se é abrangida por seu dolo (direito ou eventual).

5. Autoria

5.1. Conceito de autor

De acordo com a teoria objetivo-formal, adotada pelo Código Penal Militar, o autor é quem rea-liza a figura típica. Já o participe é aquele que comete ações fora do tipo, limitando-se a instigar, induzir ou auxiliar, vinculando-se ao fato por meio da norma de extensão do concurso eventual de pessoas – art. 53, CPM.

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5.2. Distinção entre autoria mediata e imediata

Autor direto (imediato) é aquele que tem o domínio do fato, na forma do domínio da ação, pela pessoal (de mão própria) e dolosa (consciência e vontade) realização da conduta típica. É quem pratica o faro típico pessoalmente e diretamente. Autor direto pode ser o executor, se realiza pessoalmente (direta/materialmente) a ação típica, ou o autor intelectual, se a domina dolosamente por completo, delegando ao coautor a sua realização material.

Autor indireto (mediato) é aquele que, possuindo o domínio do fato, pelo domínio da vontade, para a realização material do delito, serve-se de terceiro, geralmente inculpável, que atua como mero instrumento. Se na instigação ocorre a corrupção do homem livre e, portanto, há con-curso de pessoas, na autoria mediata há o abuso do homem não-livre e, através deste abuso, o autor mediato controla o fato. O autor mediato sofre a incidência da agravante prevista no artigo 53, §2º, CPM.

Ex.: utilização de inimputável (doente mental, menor de dezoito anos, ou embriaguez voluntá-ria e completa), coação irresistível e estrita obediência hierárquica.

Obs.: não se admite autoria mediata nos crimes culposos, de mão própria e nos crimes omissi-vos.

5.3. Autoria colateral ou acessória

A autoria colateral não integra o concurso de pessoas, em face da ausência de vínculo subjeti-vo (liame psicológico) entre os concorrentes. Tal situação se dá quando duas ou mais pessoas, simultaneamente, contribuem para a produção de um evento típico de modo independente, sem atuarem conjunta e conscientemente.

Diz-se que a autoria colateral é incerta quando não é possível identificar quem foi o produ-tor do resultado. Assim, ambos os agentes respondem pela tentativa. Quando sequer se sabe quem são autores, diz-se que há autoria desconhecida.

6. Participação

6.1. Conceito

É a contribuição dolosa (livre e consciente), sem o domínio do fato, em fato punível doloso alheio. Conforme já registrado, para a teoria objetivo-formal, partícipe é aquele que comete ações fora do tipo, limitando-se a instigar, induzir ou auxiliar o autor.

A participação requer um elemento objetivo, que é o comportamento no sentido de auxiliar, contribuir com o crime alheio, bem como o elemento subjetivo, evidenciando a vontade livre e consciente de concorrer com a própria conduta, na ação delitiva de outrem.

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6.2. Punibilidade da participação

De acordo com a teoria da promoção, o fundamento da punibilidade da participação está sim-plesmente no desvalor intrínseco da colaboração prestada a um fato socialmente intolerável. Mesmo não realizando o comportamento descrito no tipo penal, o partícipe promove o delito, induzindo, instigando ou auxiliando.

A participação é sempre acessória, dependendo de um fato principal. Quanto à acesssoriedade da participação, algumas teorias disputam a delimitação da punibilidade do partícipe, de acor-do com a situação do autor.

Para a teoria da acessoriedade mínima, basta que o autor pratique um fato típico para que o partícipe seja punido. A teoria da acessoriedade limitada, adotada pelo Código Penal Militar segundo a orientação dominante da doutrina, entende que é suficiente que a conduta do au-tor seja típica e ilícita para que o partícipe seja responsabilizado. Já a teoria da acessoriedade máxima ou extrema exige que o autor pratique fato típico ilícito e culpável. E por fim, a teoria da hiperacessoriedade requer que o autor pratique fato típico, antijurídico, culpável e punível.

6.3. Impunibilidade da participação

Nos termos do artigo 54, CPM, o “ajuste, a determinação, ou instigação e ao auxílio, salvo dis-posição em contrário, não são puníveis se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado”.

O ajuste é o acordo ou pacto celebrado entre pessoas, enquanto que a determinação é a deci-são tomada para alguma finalidade. Instigação é a sugestão ou estimulo à realização de algo e o auxilio ajuda ou assistência material ou intelectual dada a alguém.

A impunibilidade da participação diz respeito ao fato e não ao agente. Trata-se de causa de atipicidade, que afasta incidência da norma de extensão do art. 53, CPM. Como a participação tem caráter meramente acessório, sua punição sempre dependerá da conduta do autor. De acordo com o princípio da executividade, é necessário que, pelo menos, o autor inicie os atos executórios, não havendo punição do partícipe, se aquele apenas ficou na cogitação ou nos atos preparatórios.

O artigo 54, CPM, faz ressalva em relação aos delitos de fusão quando há previsão de crime au-tônomo nucleado em condutas que originariamente seriam de participação. São as hipóteses, por exemplo, de favorecimento pessoal (art. 350, CPM) e de favorecimento real (art. 351, CPM).

6.4. Espécies de participação

A doutrina classifica as modalidades de participação em instigação e cumplicidade.

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A instigação é indução intencional de outrem ao cometimento do delito e implica sujeito certo como destinatário e fato determinado. Não é possível persuasão por omissão, pois deve haver relevância causal na conduta do instigador.

A instigação se desdobra em duas espécies:

a) A persuasão ou instigação por determinação significa fazer nascer no autor, através de influência moral ou por outro meio, a decisão que o conduz à execução do crime.

b) A incitação ou instigação propriamente dita corresponde a reforçar e alimentar no autor uma resolução ainda não concretizada, mas preexistente. O partícipe instigador estimula alguém a levar a diante sua decisão anterior de praticar o crime.

A cumplicidade também se desdobra em duas figuras:

a) Cumplicidade física, material ou real corresponde à promoção, colaboração, cooperação ou auxilio material relevante ao autor direto, como exemplo no fornecimento da arma.

b) Cumplicidade moral corresponde à colaboração intelectual, psíquica ou psicológica, como por exemplo, em fornecer o segredo do cofre ou ensinar determinada técnica.

7. Punibilidade no concurso de agentes (sentido amplo)

7.1. Atenuante da participação de somenos importância (53, § 2º, CPM)

A pena é atenuada com relação ao agente, cuja participação no crime é de somenos importân-cia. Trata-se de atenuante obrigatória de pena somente aplicável na participação em sentido estrito, não alcançando a coautoria. Assim, o partícipe que pouco tomou parte na empreitada criminosa, colaborando minimamente, deve receber a pena atenuada obedecendo-se aos pa-râmetros do artigo 73, CPM (1/5 a 1/3).

7.2. Agravantes do concurso de pessoas

O artigo 53, § 2º, CPM, aponta quatro situações no concurso de pessoas em que a pena é agra-vada. Se o agente promove ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes ou coage outrem à execução material do crime.

Aplica-se também a agravante a quem instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade, ou não punível em virtude de condição ou qualidade pessoal ou se executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa (torpeza).

7.3. Cabeças

Nos parágrafos 4º e 5º do artigo 53, o Código Penal Militar apresenta uma norma explicativa, definindo o conceito de “cabeças”

a) Crimes de concurso necessário (plurissubjetivos) – cabeça é aquele que dirige, provoca, instiga ou excita a ação, seja ele oficial ou praça.

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b) Em qualquer hipótese (crime de concurso necessário ou eventual) – cabeça é o oficial, quando delinquir junto com inferiores. Estes últimos também são considerados cabeças, se exercem função de oficial (ex.: sargento comandando pelotão).

7.4. Cooperação dolosamente distinta (participação em crimes menos graves ou desvio subjetivo de conduta)

Embora o Com não tenha feito menção expressa à cooperação dolosamente distinta, prevista no artigo 29, §2º do Código Penal Comum, boa parte da doutrina entende que seria cabível a aplicação subsidiária dessa disposição comum na esfera militar, sob pena de operar-se odiosa responsabilidade objetiva.

A expressão “concorrente” tem sentido amplo, aplicando-se à coautoria e à participação. Na hipótese, há divergência entre o elemento subjetivo de um dos concorrentes e a conduta reali-zada pelo outro. Se um dos intervenientes queria participar de delito menos grave, sua culpabi-lidade deverá ser mensurada individualmente, com a aplicação proporcional da pena daquele delito.

A luz do artigo 29, §2º do Código Penal Comum, há uma mitigação da teoria monista em que o coautor/participe responderá pelo crime menos grave e não pela concretização do crime mais grave pelo comparsa. Se previsível objetivamente o resultado mais grave, mesmos assim res-ponderá com a pena do crime menos grave, que será aumentada até a metade.

PENAS E MEDIDAS DE SEGURANÇA

1. Introdução

O Direito Penal Militar possui um sistema sancionatório próprio. Há previsão de penas e me-didas de segurança. As penas são classificadas em principais e acessórias. As penas acessórias dependem da imposição de uma pena principal, sendo aplicadas cumulativamente. O Código Castrense não prevê a pena de multa nem a substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos.

De acordo com a orientação do Supremo Tribunal Federal, não se aplica aos crimes militares a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, prevista no art. 44 do Có-digo Penal, pois o art. 59 do Código Penal Militar disciplinou de modo diverso as hipóteses de substituição cabíveis sob sua égide. (HC 94083, 12.03.2010).

Na mesma linha é o entendimento dominante do Superior Tribunal Militar de que, diante do princípio da especialidade, descabe cogitar da substituição da pena restritiva de liberdade im-posta por outra de restrição de direitos, uma vez que o instituto não foi consagrado no ordena-mento penal e processual penal militar.

Segundo parte da doutrina, em relação aos civis condenados pela Justiça Militar da União, nada impede a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, já que

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aqueles cumprem pena em estabelecimento comum e que não há qualquer afronta direta à hierarquia e à disciplina militares.

Importante também registrar que as penas privativas de liberdade aplicadas e executadas na esfera da Justiça Militar são cumpridas em regime fechado, não havendo previsão de progres-são de regime no Código Penal Militar.

A orientação do STM é de que o regime deve ser fechado, sujeitando o condenado que cumpre pena em estabelecimento militar ao regramento da legislação castrense. A Lei de Execução Pe-nal não se aplicaria enquanto o sujeito mantivesse a condição de militar.

Todavia, recentes julgados do STF têm mitigado esse rigor da legislação militar. A primeira tur-ma, nos autos do RHC 92746/2008, concedeu a ordem para que um oficial cumprisse pena privativa de liberdade superior a dois anos em regime aberto, no estabelecimento militar, sem que houvesse a decretação da perda do estado de militar. A condenação na primeira instância fixa o regime inicial aberto caso o condenado viesse a adquirir a condição de civil.

Em outra decisão, a segunda turma do STF concedeu parcialmente ordem de habeas corpus para determinar ao juízo da execução penal que promova a avaliação das condições objetivas e subjetivas para a progressão de regime prisional, na concreta situação do paciente, e que apli-que, para tanto, o Código Penal e a Lei 7.210/84 naquilo que for omissa a Lei Castrense.

A turma entendeu que “os militares, indivíduos que são, não foram excluídos da garantia cons-titucional da individualização da pena” sendo “contrária ao texto constitucional a exigência do cumprimento de pena privativa de liberdade sob o regime integralmente fechado em estabe-lecimento militar, seja pelo invocado fundamento da falta de previsão legal na lei especial, seja pela necessidade do resguardo da segurança ou do respeito à hierarquia e à disciplina no âmbi-to castrense. (HC 104174 – 18.05.2011).

2. Penas principais

O artigo 55 do Código Penal Militar elenca sete penas principais conforme o quadro abaixo:

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2.1. Pena de Morte

A pena de morte aplica-se somente em caso de guerra declarada (art. 5º, XLVII c/c art. 84, XIX, CF). Nos termos do artigo 56 do CPM, a pena de morte é executada por fuzilamento, sendo o procedimento delineado no artigo 707 do Código de Processo Penal Militar. O condenado mili-tar deverá deixar a prisão com uniforme sem as insígnias, e o condenado civil deverá estar ves-tido decentemente. O condenado, civil ou militar, deverá estar de olhos vendados no momento da execução, salvo se o recusar.

A lei penal castrense exige que a sentença definitiva de condenação à morte seja comunicada, logo que passe em julgado, ao Presidente da República, e não pode ser executada senão depois de sete dias após a comunicação (art. 57, CPM). O prazo justifica-se em razão da possibilidade de concessão de indulto ou comutação da pena (art. 84, XII, CF).

Todavia, se a pena é imposta em zona de operações de guerra, pode ser imediatamente execu-tada quando o exigir o interesse da ordem e da disciplina militares. A prescrição da pretensão punitiva dos crimes a que cominada a pena de morte se dá com o decurso do prazo de 30 anos, de acordo com o artigo 125, CPM.

2.2. Penas Privativas de liberdade

O Código Penal Militar não faz distinção substancial entes as penas de reclusão e detenção. A diferença é meramente formal e evidencia-se nos seus limites genéricos, conforme estatuído no artigo 58, CPM: o mínimo da pena da reclusão é de um ano e o máximo de trinta anos, en-quanto o mínimo da pena de detenção é de trinta dias e máximo de dez anos.

a) Penas privativas de liberdade aplicada a militar

A pena privativa de liberdade (reclusão ou detenção) até dois anos aplicada a militar é obriga-toriamente convertida em prisão (art. 59), se não for possível a suspensão condicional da pena (sursis).

A prisão deverá ser cumprida em recinto de estabelecimento militar se o condenado for oficial. Se o condenado for praça, a pena será cumprida em estabelecimento militar. Nesse caso, deve--se observar a separação entre a praça que cumpre pena de prisão e aquelas que cumprem sanção disciplinar e pena superior a dois anos, bem como atender-se hierarquia (praças espe-ciais e graduadas).

Nos exatos termos do artigo 61, “a pena privativa de liberdade por mais de dois anos, aplicada a militar, é cumprida em penitenciária militar e, na falta dessa, em estabelecimento prisional civil, ficando o recluso ou detento sujeito ao regime conforme a legislação penal comum, de cujos benefícios e concessões, também, poderá gozar.

Se a pena aplicada a militar for superior a 2 (dois) anos, não haverá substituição por prisão e será cumprida em penitenciária militar. Se não houver penitenciária militar, a pena será execu-tada em estabelecimento comum, sujeitando-se o condenado ao regramento da Lei de Execu-ção Penal.

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Todavia, deve-se alertar que, para cumprimento da pena em estabelecimento comum, é neces-sário que o condenado tenha perdido a condição de militar. Assim, se for praça, primeiro deve-rá haver a exclusão e, se for oficial, deverá ter havido a perda do posto e da patente. O militar da ativa jamais cumprirá pena em presídio comum juntamente com outros presos civis.

O juiz-auditor é competente para a execução das penas aplicadas pela Justiça Militar e cum-pridas em estabelecimento militar, sendo cabível a transferência de presos de uma região para outra (art. 68, CPM).

Conforme já alertado, se a pena é cumprida em estabelecimento militar, o regime de cumpri-mento é fechado, não havendo previsão legal de progressão de regime. Do cárcere, o militar passa ao livramento condicional, desde que atendidos os requisitos legais. Relembre-se a con-trovérsia entre o STM e o STF, no tocante à progressão de regime, com aplicação do Código Penal e da Lei de Execução Penal já mencionada na introdução deste capítulo.

Para efeito de detração, computam-se na pena privativa de liberdade o tempo de prisão pro-visória, no Brasil ou no estrangeiro, e o de internação em hospital ou manicômio, bem como o excesso de tempo, reconhecido em decisão judicial irrecorrível, no cumprimento da pena, por outro crime, desde que a decisão seja posterior ao crime de que se trata (art. 67, CPM).

b) Pena privativa de liberdade aplicada a civil

Qualquer que seja a quantidade de pena, o civil condenado pela Justiça Militar sempre é exe-cutado em estabelecimento comum, submetendo-se inteiramente à Lei de Execução Penal (art. 62). Aplicam-se as disposições da Súmula 192, do STJ e do artigo 2º, p. único, LEP.

Excepcionalmente, o Código Penal Militar afirma que o civil condenado por Crime Militar prati-cado em tempo de guerra poderá cumprir a pena, no todo ou em parte, em penitenciária mili-tar, se, em beneficio da segurança nacional, assim determinar a sentença.

Segundo orientação de parte da doutrina, tal ressalva não tem aplicação, pois os crimes contra a segurança nacional são considerados crimes políticos, de competência da Justiça Federal co-mum e tratados em lei própria (Lei 7.170/83), não se sujeitando às regras do Código Castrense.

2.3. Impedimento

A pena de impedimento sujeita o condenado a permanecer no recinto da unidade, sem preju-ízo da instrução militar (art. 63). Trata-se de pena de natureza restritiva da liberdade, em que não há encarceramento.

A pena de impedimento é cominada exclusivamente ao crime de insubmissão (art. 183) e tem duração de três meses a um ano.

2.4. Suspensão do exercício do posto, graduação, cargo ou função pública

A pena de suspensão consiste na agregação, no afastamento ou licenciamento temporário do condenado (art. 64). Trata-se de pena principal, de natureza restritiva de direitos, que acarreta a suspensão do exercício de posto (oficial), graduação (praça) ou cargo (civil), pelo prazo deter-minado na sentença.

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Em que pese o apenado ser obrigado a comparecer regularmente à sede do serviço, o tempo de cumprimento da pena de suspensão não é computado como tempo de serviço. A pena de suspensão é prevista, por exemplo, para os crimes de ordem arbitrária de invasão (art. 170) e de exercício de comércio por oficial (art. 204).

De acordo com o p. único do artigo 64, CPM, se o condenado, quando proferida a sentença, já estiver na reserva, ou reformado ou aposentado, a pena de suspensão será convertida em pena de detenção, de três meses a um ano.

2.5. Reforma

A pena de reforma sujeita o militar estável condenado à situação de inatividade compulsória, com proventos proporcionais ao tempo de serviço, não podendo perceber mais de 1/25 (um vinte cinco avos) do soldo por anos de serviço, nem receber importância superior à do soldo (art. 65).

Trata-se de pena de natureza restritiva de direitos prevista para alguns crimes militares como, por exemplo, ordem arbitrária de invasão (art. 170) e exercício de comércio por oficial (art. 204). Obviamente que os militares sem estabilidade não se submetem à pena de reforma, o que configura um verdadeiro prêmio pela prática de infração penal.

3. Penas acessórias

A aplicação das penas acessórias depende da imposição de uma pena principal. Não se trata de penas alternativas aplicadas em substituição às penas privativas de liberdade. As penas aces-sórias são aplicadas cumulativamente com as penas principais, de acordo com a natureza do crime.

O artigo 98 do Código Castrense apresenta um rol taxativo de oito penas acessórias.

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3.1. Perda de posto e patente (art. 99)

Nos termos do artigo 99 do CPM, a perda de posto e patente do oficial resulta da condenação à pena privativa de liberdade por tempo superior a dois anos e importa a perda das condeco-rações. O artigo 107 do CPM afirma que a imposição da perda de posto e patente não precisa constar expressamente da sentença. Entretanto segundo parte a doutrina, essa pena acessória não tem aplicação imediata e automática porque os oficiais das forças armadas são vitalícios e só podem perder o posto e a patente por decisão do STM (art. 142, § 3º, VI, CF).

Nos termos da Constituição da República, há dois caminhos possíveis para a decretação da per-da do posto e da patente do oficial das forças armadas:

a) Decisão administrativa do Conselho de Justificação confirmada pelo STM.

b) Decisão judicial condenatória a pena privativa de liberdade superior a dois anos e repre-sentação do Procurador-Geral da Justiça Militar ao Superior Tribunal Militar.

3.2. Declaração de indignidade para o oficialato (art. 100)

Conforme determina o artigo 100 do CPM, fica sujeito à declaração de indignidade para o ofi-cialato o militar condenado, qualquer que seja a pena, nos crimes de traição, espionagem, ou cobardia, ou em qualquer dos definidos nos artigos 161, 235, 240, 242, 243, 244, 245, 251, 252, 303, 304, 311 e 312, todos do Código Penal Militar.

Trata-se de rol taxativo, que vincula a aplicação da pena acessória de declaração de indignidade para o oficialato.

3.3. Declaração de incompatibilidade com o oficialato

A pena de declaração de incompatibilidade com o oficialato aplica-se ao militar condenado aos crimes dos artigos 141 e 142 do Código Penal Militar.

Obs.: Indigno é o oficial cuja conduta mostra repulsiva abjeta, torpe, ou seja, aquele que não merece ostentar a dignidade constitucional de Oficial Militar. Já incompatível é aquele que, por sua conduta, mostra-se inconciliável com o Oficialato.

3.4. Pena de exclusão das forças armadas

Na literalidade do artigo 102 do CPM, a condenação da praça à pena privativa de liberdade, por tempo superior a dois anos, importa sua exclusão das forças armadas. Nos termos do artigo 107 do CPM, a imposição da pena acessória de exclusão deve constar expressamente da sentença.

Convém asseverar que compete à Justiça Militar Estadual decidir sobre a perda da graduação de praças somente quando se tratar de crime militar. Porém, em caso de crime comum, a per-da do cargo público constitui efeito da condenação, quando a pena privativa de liberdade é superior a 4 anos de reclusão, sendo decidida tal questão na própria sentença condenatória, sem a necessidade de instauração de procedimento específico para esse fim perante o Tribunal Militar.

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O crime de tortura, tipificado na lei 9.455/97, não se qualifica como de delito de natureza cas-trense, achando-se incluído, por isso mesmo, na esfera de competência penal da Justiça Co-mum, ainda que praticado por militar. Nesse caso, a perda do cargo constitui efeito extrapenal secundário obrigatório da sentença, dispensando inclusive a motivação.

3.5. Perda da função pública

De acordo com o artigo 103 do CPM, incorre na perda da função pública o civil condenado à pena privativa de liberdade por crime cometido com abuso de poder ou violação de dever ine-rente à função pública ou condenado a qualquer crime à pena privativa de liberdade superior a dois anos. Nos termos do artigo 107 do CPM, a imposição dessa pena acessória não precisa constar expressamente na sentença, portanto trata-se de pena automática.

3.6. Inabilitação para o exercício de função pública

A pena de inabilitação para exercício de função pública aplica-se ao condenado à pena privativa de liberdade de reclusão superior a quatro anos, em virtude de crime praticado com abuso de poder ou violação do dever militar ou inerente à função pública. O prazo da inabilitação para o exercício de função pública varia de dois a vinte anos e começa ao término da execução da pena ou medida de segurança.

Computa-se no prazo das inabilitações temporárias o tempo de liberdade resultante da suspen-ção condicional da pena ou do livramento condicional, se não sobrevém revogação (art. 108).

3.7. Suspensão do poder familiar, tutela ou curatela

O condenado à pena privativa de liberdade por mais de dois anos, seja qual for o crime prati-cado, fica suspenso (art. 105) do exercício do poder familiar, tutela ou curatela, enquanto dura a execução da pena ou medida de segurança imposta em substituição. Caso necessário, o juiz pode decretar a suspensão provisória ainda durante o processo.

3.8. Suspensão dos direitos políticos

Durante a execução da pena privativa de liberdade ou da medida de segurança imposta em substituição, ou enquanto perdurar a inabilitação para função pública, o condenado não pode votar, nem ser votado. Nos termos do artigo 107 do CPM, a imposição dessa pena acessória não precisa constar expressamente da sentença.

4. Medidas de Segurança

O artigo 110 do Código Penal Militar apresenta o rol de medidas de segurança mais amplo do que aqueles previstos no Código Penal comum. Na esfera castrense, as medidas de segurança

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dividem-se em pessoais e patrimoniais. Por sua vez, as medidas de segurança pessoais divi-dem-se em detentivas (internação) e não-detentivas (restritivas de direito).

Conforme determina o artigo 111 do CPM, em regra, as medidas de segurança somente podem ser impostas aos civis e aos militares que tenham perdido essa condição em virtude de conde-nação à pena privativa de liberdade por tempo superior a dois anos ou que ,de outro modo, hajam perdido posto e patente ou hajam sido excluídos das forças armadas.

Aos militares aplica-se a medida de segurança de internação, no caso de inimputabilidade por doença mental e a cassação de licença para dirigir veículos motorizados. A medida de seguran-ça é imposta em sentença, que lhe estabelecerá as condições, nos termos da lei penal militar, não impedindo a expulsão do estrangeiro (art. 120, CPM).

4.1. Internação em manicômio judiciário

O artigo 112 do Código Penal Militar determina a internação em manicômio judiciário do agen-te inimputável por alienação mental que oferece perigo à incolumidade alheia em razão de suas condições pessoais e do fato praticado.

A lei penal castrense adota o sistema vicariante que, em oposição ao sistema do duplo binário, rejeita a possibilidade de aplicação cumulativa ou sucessiva de pena e medida de segurança de internação. Assim, aplica-se medida de segurança em lugar de pena, caso o autor do fato típico e ilícito seja imputável e perigoso.

Em caso de semi-imputabilidade, haverá condenação com pena reduzida, podendo o juiz subs-titui-la por internação em estabelecimento psiquiátrico anexo ao manicômio judiciário ou es-tabelecimento penal, ou seção especial de um ou de outro, caso o sujeito necessite de especial tratamento curativo (art. 113).

Todavia, se o sujeito já cumpriu integralmente a pena imposta em homenagem ao sistema vica-riante, não se admite a aplicação de medida de segurança, ainda que persista sua periculosida-de. O caso recomendaria tratamento em estabelecimento de saúde comum, fora da esfera do manicômio judiciário.

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O Código Penal Militar não prevê expressamente medida de segurança de tratamento ambu-latorial para o inimputável. A doutrina sugere aplicação subsidiária do Código Penal comum, sempre que a providência for benéfica ao acusado.

Semelhantemente ao Código comum, o Código Penal Militar estabelece o prazo mínimo de internação de um e três anos. Nesse período serão realizados exames para a verificação da ces-sação da periculosidade. Salvo determinação da instância superior, a perícia médica é realizada ao término do prazo mínimo fixado à internação e, não sendo esta revogada, a perícia deve ser repetida de ano em ano.

Não há prazo máximo. A internação é por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade do internado. De acordo com a orientação do Supremo Tribunal Federal, o prazo máximo de internação é de 30 anos, que equivale ao limite de unificação das penas privativas de liberdade.

Importante salientar que o Superior Tribunal de Justiça editou recentemente a Súmula 527, limitando o máximo da medida de segurança ao teto da pena abstratamente cominada à infra-ção penal praticada.

O condenado a que sobrevenha doença mental deve ser recolhido em manicômio judiciário ou, na falta deste, a outro estabelecimento adequado, onde lhe seja assegurada custódia e tratamento (art. 66). Trata-se de internação não definitiva, daí porque, sobrevindo a cura, pode o internado ser transferido para o estabelecimento penal, não ficando excluído o seu direito a livramento condicional, sendo computado o tempo de internação como pena cumprida.

Se verificado que o estado mórbido é permanente, converte-se a pena em medida de seguran-ça, vigorando esta por tempo indeterminado.

4.2. Cassação da licença para dirigir veículos motorizados

Nos exatos termos do artigo 115 do CPM, ao condenado por crime cometido na direção ou re-lacionado à direção de veículos motorizados, deve ser cassada a licença para tal fim pelo prazo mínimo de um ano, se as circunstâncias do caso e os antecedentes do condenado revelarem a sua inaptidão para essas atividades e, consequentemente, perigo para a incolumidade alheia.

O prazo da interdição se conta do dia em que termina a execução da pena privativa de liberda-de ou da medida de segurança detentiva. A cassação da licença deve ser determinada ainda no caso de absolvição do réu em razão de inimputabilidade.

4.3. Exílio local

O exílio local consiste na proibição de que o condenado resida ou permaneça, durante um ano, pelo menos, na localidade, município ou comarca em que o crime foi praticado, em face da ne-cessidade de garantir a ordem pública ou para o próprio bem do condenado (art. 116).

O exílio deve ser cumprido logo que cessa ou é suspensa condicionalmente a execução da pena privativa de liberdade.

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4.4. Proibição de frequentar determinados locais

A proibição de frequentar determinados lugares consiste em privar o condenado, durante um ano, pelo menos, da faculdade de acesso a lugares que favoreçam, por qualquer motivo, seu retorno à atividade criminosa. O cumprimento da proibição inicia-se logo que cessa ou é sus-pensa condicionalmente a execução da pena privativa de liberdade.

4.5. Interdição de estabelecimento, sociedade ou associação

Segundo dispõe o artigo 118 do CPM, a interdição de estabelecimento comercial ou industrial, ou sociedade ou associação, pode ser decretada por tempo não inferior a quinze dias, nem su-perior a seis meses, se o estabelecimento, sociedade ou associação servir de meio ou pretexto para a prática de infração penal.

A interdição consiste na proibição de exercer no local o mesmo comércio ou indústria, ou a ati-vidade social. A sociedade ou associação, cuja sede é interditada, não pode exercer em outro local as suas atividades.

4.6. Confisco

A medida de segurança prisional de confisco, prevista no artigo 119 do CPM, determina que o juiz, embora não apurada a autoria, ou ainda quando o agente é inimputável, ou não punível, deve ordenar o confisco dos instrumentos e produtos do crime, desde que constam em coisas:

• cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitui fato ilícito;

• que, pertencendo às forças armadas ou sendo de uso exclusivo de militares, estejam em poder ou em uso do agente, ou de pessoa não devidamente autorizada;

• abandonadas, ocultas ou desaparecidas.

4.7. Efeitos da condenação

O artigo 109 do Código Penal Militar repete a redação do artigo 91 do Código Penal comum, elencando os efeitos genéricos da condenação.

O primeiro efeito automático é o dever de indenizar, pois o trânsito em julgado da sentença condenatória torna certa a obrigação de reparar o dano resultante do crime.

Além disso, ressalvado o direito do lesado ou de terceiros de boa-fé, a condenação definitiva também gera a perda, em favor da Fazenda Nacional, dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito, bem como do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a sua prática.

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EXTINÇÃO DAPUNIBILIDADE

1. Introdução

A punibilidade é a consequência natural da prática de crime. A possibilidade de punir o autor de uma infração penal pertence exclusivamente ao Estado e esse interesse reflete uma preten-são que se define como:

• Pretensão punitiva: obter um provimento judicial, condenando o réu ao cumprimento de uma sanção penal.

• Pretensão executória: executar o título judicial obtido após o trânsito em julgado, impondo efetivamente a sanção penal.

2. Causas de extinção da punibilidade

Após a ocorrência do delito podem surgir situações que impedem a aplicação ou a execução da sanção respectiva. A punibilidade do fato cessa em razão de certas contingências ou por motivos de conveniência e oportunidade política. Em determinadas situações expressamente previstas em lei, o Estado pode abrir mão do direito de punir ou até mesmo perder a pretensão punitiva.

O Código Penal Militar apresenta um rol de causas de extinção da punibilidade distinto daquele previsto no Código Penal comum:

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As causas de extinção da punibilidade devem ser previstas expressamente em lei, não se ad-mitindo, em regra, utilização de analogia para a integração de supostas lacunas na lei penal militar. A extinção de um crime que é pressuposto, elemento constitutivo ou circunstância agra-vante de outro, não se estende a este. Nos crimes conexos, a extinção de um deles não impede, quanto aos outros, a agravação da pena resultante da conexão (art. 123).

2.1. Extinção da punibilidade pela morte do agente

De acordo com o princípio da intranscendência da pena, previsto no artigo 5º, XLV da Cons-tituição Federal, “nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendida aos su-cessores e contra eles executada até o limite do valor do patrimônio transferido”.

A responsabilidade penal é pessoal, não podendo passar do agente que praticou o ilícito, sem prejuízo da obrigação de reparar o dano e da perda de bens. A pena é uma medida de caráter estritamente pessoal, sobretudo por se caracterizar uma ingerência ressocializadora sobre o condenado.

A comprovação da morte se dá mediante a apresentação de documento contábil (certidão de óbito). Há uma interessante controvérsia quanto às consequências da comprovação da falsida-de da certidão de óbito apresentada em juízo para fundamentar a extinção da punibilidade.

1º Corrente: para a maioria da doutrina, a decisão que julga extinta a punibilidade é terminati-va de mérito em sentido amplo, justamente por declarar não haver mais pretensão punitiva do Estado. Como não há revisão criminal prosocietate, não se pode reiniciar a ação penal contra o réu, cabendo apenas processá-lo pelo crime de falsidade documental.

2º Corrente: de acordo com a jurisprudência dominante dos Tribunais Superiores, revoga-se o despacho que julgou extinta a punibilidade, pois é fundamentado em documento compro-vadamente falso. Além de não fazer coisa julgada em sentido estrito, já que o acusado estaria se beneficiando de conduta ilícita, a decisão fundou-se em fato juridicamente inexistente, não produzindo qualquer efeito. Se não houve morte, estava ausente o pressuposto de extinção da punibilidade, não podendo fazer coisa julgada. Assim, o processo retoma seu curso, se não houver ocorrido a prescrição.

2.2. Extinção da punibilidade pela anistia ou pelo indulto

a) Anistia

A anistia, também chamada de clemência soberana ou indulgência principis, corresponde ao esquecimento jurídico de crimes pelo Estado. Essa causa de extinção da punibilidade é irre-vogável e tem por objeto fatos e não pessoas, sendo concedida por meio de Lei do Congresso Nacional com sanção presidencial, nos termos dos artigos 21, XVII e 48, VIII, da CF, com efeitos retroativos.

Quanto ao momento, a doutrina classifica a anistia em própria e imprópria. A primeira ocorre antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, enquanto a última se dá após o trânsi-to em julgado, não atingindo os efeitos civis da condenação (subsiste a obrigação de indenizar). Nos dois casos, extingue-se todos os efeitos penais (inclusive o pressuposto da reincidência).

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Quanto aos sujeitos beneficiados, a doutrina distingue a anistia geral, que favorece a todos os que praticaram determinado fato indistintamente, ou parcial, beneficiando somente alguns criminosos, como por exemplo, apenas os não reincidentes.

Quanto ao objeto, classifica-se em irrestrita e limitada, conforme abranja todos os delitos rela-cionados ao fato criminoso principal ou exclua somente alguns deles. É cediço que a anistia não se aplica aos crimes hediondos e equiparados, nos termos do art. 5º, XLIII da CF.

Porém, vale lembrar que os crimes militares não integram o rol de crimes hediondos e equipa-rados da lei 8.072/90. Assim, mesmo que se trate, por exemplo, de homicídio qualificado ou estupro previstos no Código Penal Militar, não há vedação de concessão de anistia.

b) Indulto

O indulto extingue a pena imposta a uma pessoa, sendo concedido mediante decreto presiden-cial ou de autoridade com delegação, como por exemplo, o Ministro da Justiça ou o Advogado--Geral da União, nos termos do artigo 84, XII e parágrafo único da Constituição.

O indulto fulmina apenas a pretensão executória, não atingindo os demais efeitos penais (rein-cidência) e extrapenais (dever de indenizar). Apesar de não haver referência à graça no Código Penal Militar, não há óbice à sua concessão, eis que, na essência, tem a mesma natureza do indulto. A diferença está em que, enquanto o indulto tem caráter coletivo, dirigindo-se a um grupo indeterminado de condenados e sendo delimitado pela natureza do crime e quantidade da pena aplicada, a graça tem caráter individual, sendo direcionada especificamente a determi-nado condenado.

Por fim, mesmo não havendo disposição expressa, admite-se também a comutação (diminui-ção) de penas, pois equivale a um indulto parcial.

2.3. Extinção da punibilidade pela retroatividade de lei que não mais con-sidera o fato como criminoso – abolitio criminis

A abolitio criminis não desfaz a existência do crime já cometido, mas extingue a sua punibilida-de, afastando todos os efeitos penais (primário e secundários) da sentença condenatória, mes-mo com trânsito em julgado. Nesse caso, extingue-se a pretensão executória, mas não são afas-tados os efeitos civis, como por exemplo, o dever de indenizar por eventuais danos causados.

Antes do trânsito em julgado, a abolitio criminis também impede a incidência dos efeitos civis, já que, faltando o título executivo judicial, não há possibilidade de executá-lo diretamente, sen-do necessária a propositura da ação de conhecimento na esfera civil.

2.4. Reabilitação

Diferentemente do Direito Penal comum, a reabilitação na esfera penal militar é tratada como causa de extinção de punibilidade, alcançando quaisquer penas impostas por sentença defini-tiva (art. 134).

Enquanto o Código Penal comum estabelece o prazo de dois anos, o prazo exigido no CPM para requerer a reabilitação é de cinco anos contados do dia em que for extinta, de qualquer

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modo, a pena principal ou terminar a execução desta ou da medida de segurança aplicada em substituição (art. 113), ou do dia em que terminar o prazo da suspensão condicional da pena ou do livramento condicional, desde que o condenado seja domiciliado no país, no prazo acima referido, e tenha dado, durante esse tempo, demonstração efetiva e constante de bom com-portamento público e privado.

Além disso, exige-se que o sujeito tenha ressarcido o dano causado pelo crime ou demonstre absoluta impossibilidade de fazê-lo até o dia do pedido, ou exiba documento que comprove a renúncia da vítima ou novação da dívida.

Não se concede reabilitação em favor dos que foram reconhecidos perigosos, salvo prova cabal em contrário, e em relação aos atingidos pelas penas acessórias de suspensão do exercício do poder familiar, tutela ou curatela, se o crime for de natureza sexual em detrimento de filho, tutelado ou curatelado.

Negada a reabilitação, não pode ser novamente requerida senão após o decurso de dois anos. Mais uma vez, o Código Castrense difere do Código Penal comum, que permite a renovação do pedido a qualquer tempo, desde que com nova fundamentação.

Se o reabilitado for definitivamente condenado ao cumprimento de pena privativa de liberda-de, a reabilitação será revogada de ofício ou a requerimento do Ministério Público.

Nos termos do artigo 135 do CPM, declarada a reabilitação, serão cancelados, mediante aver-bação, os antecedentes criminais. Concedida a reabilitação, o registro oficial de condenações penais não pode ser comunicado senão à autoridade policial,judiciária ou penal que venha a ser instaurada contra o reabilitado.

2.5. Ressarcimento do dano no peculato culposo

No caso de peculato culposo, a reparação do dano antes da sentença irrecorrível é causa de extinção da punibilidade (art. 303, § 4º, CPM). O Código Penal Militar traz disposição idêntica à do Código Penal comum (art. 312, § 3º, CP). Se a reparação é posterior ao trânsito, não há extinção da punibilidade, mas reduz-se de metade a pena imposta.

2.6. Perdão Judicial

Apesar de não mencionado no rol do artigo 123 do Código Penal Militar, há previsão de perdão judicial, no caso de RECEPTAÇÃO CULPOSA (art. 255), podendo o juiz deixar de aplicar a pena se o agente é primário e o valor da coisa não é superior a um décimo do salário mínimo.

2.7. Prescrição

2.7.1. Conceito

A prescrição é a perda da pretensão punitiva do Estado pelo decurso de tempo, em razão do seu não exercício no prazo fixado em lei.

Trata-se de instituto jurídico de natureza penal mediante o qual o Estado, por não ter capacida-de de fazer valer seu direito de punir em determinado lapso temporal previsto em lei, faz com que ocorra a extinção da punibilidade.

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O próprio Estado estabelece critérios limitadores para o exercício do direito de punir e, levando em conta a gravidade da conduta delituosa e da resposta penal correspondente, fixa o lapso temporal dentro do qual estará legitimado a aplicar a sanção correspondente.

Por ser matéria de ordem pública, a prescrição, embora não alegada, deve ser declarada de ofí-cio (art. 133). Trata-se de questão preliminar que antecede o mérito (súmula nº 241, TFR)

De acordo com o artigo 124 do Código Penal Militar, a prescrição refere-se à ação penal ou à execução da pena. A prescrição antes do trânsito, impropriamente chamada de prescrição da ação penal, diz respeito à pretensão punitiva (ius puniendi), que se traduz na possibilidade de formar o título executivo. Após o trânsito em julgado, a prescrição é da pretensão executória (ius punitionis).

2.7.2. Fundamentos políticos da prescrição

• Decurso do prazo (teoria do esquecimento do fato): o decurso do tempo leva ao esque-cimento do fato. Aos poucos, o alarme social desaparece até apagar-se definitivamente, gerando desinteresse de fazer valer a pretensão punitiva.

• Correção do condenado: o decurso do prazo leva à autorrecuperação do criminoso. Se o condenado não voltar a delinquir após longo lapso temporal, conclui-se que, por si mesmo, foi capaz de alcançar o reajustamento social que a pena se dispõe a fazer. Assim, a pena perde seu fundamento de prevenção especial, esgotando-se os motivos do Estado para desencadear a punição.

• Negligência da autoridade: o Estado deve suportar o ônus da sua inércia, não se admitindo que o delinquente submeta-se, ad infinitum, ao império da vontade estatal.

• Fundamento processual: o decurso do prazo enfraquece o suporte probatório e dificulta uma justa apreciação do delito. A apuração torna-se mais incerta e a defesa mais difícil.

2.7.3. Espécies de prescrição da pretensão punitiva:

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2.7.4. Prescrição pela pena em abstrato

Antes da sentença condenatória, a prescrição regula-se pelo máximo da pena abstratamente cominada ao crime, verificando-se nos prazos do artigo 125, CPM.

a) Termo inicial

O termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o crime se consumou. No caso de tentativa, começa a correr a prescrição do dia em que cessou a atividade criminosa e, nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência. Nos crimes de falsidade, o marco inicial é a data em que o fato se tornou conhecido (art. 125, §2º, CPM).

b) Causas suspensivas

O Código Penal Militar indica duas causas suspensivas da pretensão punitiva. Havendo ques-tões prejudiciais obrigatórias, a prescrição não corre enquanto não resolvida, em outro proces-so, questão que dependa o reconhecimento da existência do crime. Também fica suspenso o prazo prescricional enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro.

Obs.: importante registrar que não se aplica subsidiariamente o artigo 366 do CPP à esfera castrense. No caso de citação por edital em que o réu não comparece nem constitui advogado, não há suspensão do prazo prescricional nem do processo, que segue à revelia do acusado. A adoção da referida suspensão, além de ferir a índole do processo penal militar, caracteriza ana-logia in malam partem.

c) Causas interruptivas

O prazo prescricional é interrompido pela instauração do processo (recebimento da denúncia ou da queixa subsidiária) e pela prolação da sentença condenatória recorrível (art. 125, § 5º, CPM). Interrompida a prescrição, todo o prazo começa a correr, novamente, do dia da interrup-ção (art. 128).

A interrupção da prescrição produz efeito relativamente a todos os concorrentes do crime. Nos crimes conexos que sejam objeto do mesmo processo, a interrupção relativa a qualquer deles estende-se aos demais (art. 125, § 6º).

d) Causas modificativas do prazo prescricional

Para calcular o prazo prescricional definitivo, é preciso computar as causas de aumento de pena (majorantes) em seu grau máximo e as causas de redução de pena (minorantes) em seu grau

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mínimo. No cálculo da prescrição pela pena em abstrato, deve-se considerar a pior hipótese para o réu, pois prevalece o interesse da sociedade.

Excluem-se desse cálculo as circunstâncias agravantes e atenuantes. No caso de concurso de crimes ou de crime continuado, o prazo de prescrição de cada crime é considerado isoladamen-te (art. 125, § 4º).

De acordo com o artigo 129, “são reduzidas de metade os prazos da prescrição, quando o crimi-noso era, ao tempo do crime, menor de vinte e um anos ou maior de setenta”. Trata-se de con-dições pessoais que beneficiam o agente com a redução do prazo prescricional pela metade.

O Código Penal Militar exige que o sujeito tenha setenta anos ao tempo do crime, diferente-mente do Código comum, em que o preenchimento desse requisito se dá por ocasião da pri-meira decisão condenatória.

2.7.5. Prescrição da pena em concreto

a) Prescrição retroativa

Transitada em julgado para a acusação da sentença condenatória, o prazo prescricional é calcu-lado com fundamento na pena em concreto aplicada na tabela do artigo 125 do Código Penal Militar.

Os lapsos prescricionais são considerados retroagindo-se da sentença ao primeiro marco in-terruptivo. Nos exatos termos do art. 125 §1º do CPM, “sobrevindo sentença condenatória, de que somente o réu tenha recorrido, a prescrição passa a regular-se pela pena imposta, e deve ser logo declarada, sem prejuízo do andamento do recurso se, entre a última causa interruptiva do curso da prescrição e a sentença, já decorreu tempo suficiente”.

Note-se que o Código Castrense não menciona a retroatividade a fato anterior ao recebimento da denúncia. Antes da edição da lei nº 12.234/10, a jurisprudência dos Tribunais Superiores ad-mitia aplicação subsidiária do Código Penal à esfera castrense e permitia a prescrição retroativa até a data do crime.

A chamada prescrição pela pena ideal, que consiste no reconhecimento antecipado da pres-crição retroativa em razão da pena em perspectiva, a ser virtualmente aplicada ao réu numa hipotética condenação, não tem sido admitida pelos Tribunais Superiores por falta de amparo legal e por ferir o princípio da presunção de inocência.

b) Prescrição superveniente ou intercorrente

Também leva em conta a pena aplicada em concreto na sentença condenatória, sendo calcula-da da mesma forma, mas dirige-se ao futuro. Dias hipóteses podem ocorrer:

• Recurso exclusivo da defesa – o lapso prescricional começa a correr do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação e termina com a prolação do acordão, indepen-dentemente da sorte do recurso.

• Recurso da acusação – o lapso prescricional começa a correr da prolação da sentença con-denatória e termina com o improvimento do recurso.

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2.7.6. Prescrição da pretensão executória

Nos termos do artigo 126 do Código Penal Militar, a prescrição da execução da pena privativa de liberdade ou da medida de segurança que a substitui (art. 113) regula-se pelo tempo fixado na sentença e verifica-se nos mesmo prazos estabelecidos no art. 125, os quais se aumentam de 1/3, se o condenado é reincidente.

A prescrição da pretensão executória leva em conta a pena aplicada em concreto na sentença condenatória, mas somente após o trânsito em julgado para a acusação e para a defesa.

a) Termo inicial

A prescrição executória começa a correr do dia em que passa em julgado a sentença condena-tória ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional ou do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena.

Ressalva-se a hipótese de interdição por doença mental superveniente ao inicio da execução, em que o prazo da internação é computado na pena.

No caso de evadir-se o condenado ou de revogar-se o livramento ou desinternação condicio-nais, a prescrição se regula pelo restante do tempo da execução.

b) Causas Suspensivas

O curso da prescrição da execução da pena suspende-se enquanto o condenado está preso por outro motivo.

c) Causas interruptivas

O curso da prescrição da execução da pena interrompe-se pelo início ou continuação do cum-primento da pena ou pela reincidência. De acordo com o artigo 128, interrompida a prescrição, salvo o caso de inicio ou continuação de cumprimento da pena, todo o prazo começa a correr, novamente, do dia da interrupção.

2.7.7. Regras especiais da prescrição

A prescrição nos crimes cuja pena cominada, no máximo é de reforma ou de suspensão do exercício do posto, graduação, cargo ou função, verifica-se em quatro anos (art. 127).

De acordo com o artigo 130, é imprescritível a execução das penas acessórias. O Código Penal Militar não segue a regra do Código Penal comum de que as penas mais leves prescrevem com as mais graves.

2.7.8. Prescrição no crime de insubmissão

No crime de insubmissão, a prescrição começa a correr do dia em que o insubmisso atinge a idade de trinta anos (art. 131). Essa regra especial somente se aplica à prescrição em abstrato referente aos trânsfugas, que são aqueles insubmissos que não foram capturados.

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É pacífica a orientação do STM no sentido de que: “sendo a insubmissão crime de natureza per-manente, a prescrição, em relação a ele, começa a correr da data em que cessa a permanência, ou seja, quando o insubmisso que se furtou à incorporação no devido tempo comparece volun-tariamente à unidade militar ou é capturado”.

2.7.9. Prescrição no crime de deserção

Nos termos do artigo 132 do Código Penal Militar, “no crime de deserção, embora decorrido o prazo da prescrição, esta só extingue a punibilidade quando o desertor atinge a idade de qua-renta e cinco anos, e, se oficial, a de sessenta”.

Essa regra especial para a prescrição no crime de deserção somente se aplica ao trânsfuga (de-sertor não capturado). Nesse caso, estando o réu ausente, a extinção de punibilidade pela pres-crição ocorre com o advento da idade de 45 anos, para praças, e de 60 anos, para oficiais.

Para o desertor presente, segue-se a regra geral prevista no artigo 125, VI do Código Penal Mili-tar, operando-se a extinção da punibilidade com o decurso de prazo de 4 (quatro) anos, poden-do haver redução do prazo pela metade se, na data do fato, o desertor era menor de 21 anos.

A orientação pacífica do STM e do STF, com apoio na ampla maioria da doutrina, é no sentido de que ser trata de crime permanente. Assim, enquanto o trânsfuga não é capturado nem se apresenta voluntariamente, o crime está em consumação, não correndo o prazo prescricional enquanto não cessar a permanência.

AÇÃO PENAL

Nos termos do artigo 121 do Código Penal Militar, a ação penal somente pode ser promovida por denúncia do Ministério Público Militar. Assim, a ação penal na esfera militar é sempre pú-blica e, em regra, incondicionada.

Excepcionalmente, conforme o artigo 122 do Código Castrense, nos crimes contra a seguran-ça externa do país (art. 136 a art. 141), a ação penal é pública, condicionada à requisição do Ministro da Defesa ao Procurador-Geral da Justiça Militar quando o autor do crime for militar. Afirma também o estatuto repressivo que, no caso do artigo 141, quando o agente for civil e não houver coautor militar, a requisição será do Ministro da Justiça.

Em virtude da indisponibilidade dos bens jurídicos tutelados na esfera penal militar, não há previsão de ação penal condicionada à representação do ofendido, nem ação penal privada originária. Mesmo não havendo disposição expressa na lei militar, é perfeitamente cabível ação penal privada subsidiária da pública em caso de inércia do Ministério Público Militar, nos ter-mos do art. 5º, LIX, da Constituição Federal da República.

Também não se aplicam à esfera militar as disposições contidas na Lei nº 9.099/95, que trata dos Juizados Especiais Criminais (art. 90-A da Lei nº 9.099/95). Segundo entendimento doutri-nário, não haveria incompatibilidade na aplicação da Lei nº 9.099/95 ao civil processado pela Justiça Militar da União, pois não afetaria a disciplina e a hierarquia militar.

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Todavia, em julgado recente, envolvendo civil acusado de desacato e desobediência praticados contra militar das Forças Armadas no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preserva-ção da ordem pública, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal relembrou que o Plenário declarou a constitucionalidade do art. 90-A da Lei nº 9.099/95, com redação dada pela Lei nº 9.839/99, daí a inaplicabilidade da Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Militar. (HC 1131218 – 20.02.2014).

Convém salientar que, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a superveniên-cia da Lei nº 9.839 não se aplica a fatos delituosos ocorridos antes da sua vigência, em virtude da garantia constitucional da irretroatividade da lei penal in pejus. (HC 80099 – 16.06.2000).

Crimes Militares em Tempo de Paz – Código Penal Militar – Dec. Lei nº 1.001/69

Título II - CRIMES MILITARES EM TEMPO DE PAZ:

DOS CRIMES CONTRA A AUTORIDADE OU DISCIPLINA MILITAR

1. DO MOTIM E DA REVOLTA

1.1. Motim

• Tipo legal

Art. 149. Reunirem-se militares ou assemelhados:

I – agindo contra a ordem recebida de superior, ou negando-se a cumpri-la;

II – recusando obediência a superior, quando estejam agindo sem ordem ou praticando violên-cia;

III – assentindo em recusa conjunta de obediência, ou em resistência ou violência, em comum, contra superior;

IV – ocupando quartel, fortaleza, arsenal, fábrica ou estabelecimento militar, ou dependência de qualquer deles, hangar, aeródromo ou aeronave, navio ou viatura militar, ou utilizando-se de qualquer daqueles locais ou meios de transporte, para ação militar, ou prática de violência, em desobediência a ordem superior ou em detrimento da ordem ou da disciplina militar:

Pena – reclusão, de quatro a oito anos, com aumento de um terço para os cabeças.

• Objetividade jurídica: o bem jurídico protegido por esse tipo penal é a disciplina militar, pois é inequívoco que um grupo de militares que desobedecem à ordem superior e à or-dem pública a atinja frontalmente. Da mesma forma, tutela-se a autoridade militar, tanto a do superior que teve sua determinação descumprida quanto a da lei ou norma que venha a ser violada.

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• Sujeitos do delito: trata-se de crime plurissubjetivo, sendo delito de concurso necessário, condição que fica clara pela utilização dos termos no plural (“militares” e “assemelhados”), bastando que existam dois militares para que seja possível o cometimento do delito. A nor-ma impõe como autores militares ou assemelhados, na atualidade inexiste a segunda figu-ra, restando, dessa forma, tão só, os militares como sujeitos ativos.

O elemento típico “militar”, aqui designado no plural, deve ser compreendido nos termos do art. 22 do CPM, ou seja, como militar em situação de atividade (que não se confunde com militar em serviço), o que, de pronto, afasta a sujeição ativa do delito por militares inativos, exceto se equiparados a militares da ativa, na dicção do art. 12 ou, ainda, sob previsão expressa do Código Castrense, se houver concurso do militar inativo com, ao menos, dois militares em serviço ativo, ocasião em que a elementar “militar” comunicar-se-á com os militares que já não pertencem ao serviço ativo (art. 53, § 1º, segunda parte, do CPM).

Figura no polo passivo o titular do bem jurídico atingido, a saber, a Instituição Militar, seja ela federal ou estadual, mesmo porque a autoridade e a disciplina constituem sua própria essên-cia.

• Elementos objetivos: o motim, como crime de coautoria necessária, implica a reunião de militares (já deixamos de mencionar os assemelhados por inexistirem no ordenamento ju-rídico atual) para que, unidos pelos mesmos propósitos, pratiquem atos contrários à or-dem.

O tipo menciona “reunirem-se militares”, não especificando o número mínimo de autores. O mesmo silêncio se opera no art. 53 do CPM, ao discorrer sobre a coautoria. Assim, resta-nos aceitar, como acima suscitado, que o número de amotinados em uma mesma ação poderá par-tir de dois, ou seja, são suficientes dois militares para se caracterizar esse delito.

Passemos, pois, ao estudo das hipóteses dos incisos do crime de motim.

Inciso I – Na primeira parte do inciso I, os militares agem contra a ordem recebida de superior, implicando postura ativa (modalidade comissiva), em que os autores fazem algo contrário ao que deveriam, por força de ordem de superior, ordem essa que pode ser escrita ou verbal. Como exemplo, tomemos um pelotão que recebe ordem para uma instrução ou para um patru-lhamento e, em vez de obedecê-la, dirige-se, sem ordem ou autorização, à sede do Comando para apresentação de suas reivindicações trabalhistas.

Na segunda parte do inciso I, prevê-se a situação em que os autores negam cumprimento à ordem superior, ou seja, adotam postura passiva em relação ao assunto da ordem (modalidade omissiva). Nesse caso, a negativa pode ser expressa (anuncia-se a intenção de não fazer ou se pratica algo quando a determinação impunha o inverso) ou tácita (silêncio em face da obriga-ção de fazer algo).

Inciso II – O inciso II, por sua vez, contém a situação em que os autores se recusam a obedecer a superior no momento em que estão agindo contrários à ordem ou praticando violência (físi-ca e não moral) contra a pessoa ou contra a coisa, sendo digno de nota que, se militares estão praticando violência, evidentemente agem contra a ordem, exceto se estiverem escudados por excludentes de ilicitude. Assim, os autores já estão na prática ilegal quando sofrem a interven-ção de superior que tenta resgatar a normalidade, oportunidade em que esse interventor não é acatado. Em verdade, essa situação denota maior gravidade, pois os militares, além de já esta-rem atentando contra a ordem, recusam obediência ao superior que tenta resgatá-la.

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Inciso III – No caso do inciso III, os militares assentem, concordam, consentem, anuem com a recusa conjunta de obediência ou com a resistência ou a violência. Não são os cabeças (defini-dos no art. 53, §§ 4º e 5º, do CPM), mas sim os que aderem a eles, aliando-se ao grupo, forta-lecendo-o quantitativamente, o que por certo gera efeito na agremiação dos que ainda não se definiram em relação ao motim.

Note que o inciso em exame é muito semelhante ao delito de conspiração (art. 152 do CPM), porquanto ambos tratam de uma anuência para a prática de algumas modalidades de motim. No entanto, a distinção dos tipos penais deve dar-se junto ao verbo nuclear. No caso da moda-lidade estudada, há a mera concordância, o simples assentimento na prática de recusa coletiva, na violência ou resistência contra superior, exigindo-se, porém, que o concerto já tenha sido ul-trapassado. Já no caso da conspiração, a conduta nuclear é anterior, preparatória, para, poste-riormente, se assim caminharem os fatos, haver a anuência coletiva à prática delitiva de motim.

Inciso IV – Por fim, no inciso IV, os autores se manifestam ocupando quartel, fortaleza, arsenal, fábrica ou estabelecimento militar, em sua totalidade ou em parte, hangar, aeródromo ou ae-ronave, navio ou viatura militar. Como exemplo, citamos um grupo de militares grevistas que, de folga, dirijam-se ao quartel ocupando-o e impedindo, por força disso, o desempenho das missões legais e cotidianas daquela unidade, lesionando de forma ímpar a ordem e a disciplina militar. Note que, assim como discorremos acima, a greve, por si só, não configura o delito, mas o modo de manifestação pela ocupação de instalações turbando a ordem e a disciplina sim.

Cabeças – No crime de motim, a pena dos cabeças é majorada de um terço, cumprindo esclare-cer que a definição de “cabeças” está nos §§ 4º e 5º do art. 53 do CPM.

Elemento subjetivo: é o dolo, a vontade livre e consciente de macular a autoridade e a discipli-na militares, seja pelo descumprimento de ordens dadas, seja pela prática de atos sem ordem, seja com a ocupação de instalações ou com o uso de viaturas para essa finalidade. O dolo, nes-se caso, é direto, pois razão não há para falar em assunção de risco de eventual prática delituo-sa, uma vez que é inequívoco que qualquer dessas condutas caracteriza infração penal, e essa certeza elide o pretenso risco.

• Consumação: o iter criminis do delito se completa com a execução do verbo de cada qual das condutas descritas. Consuma-se, portanto, com a ação ou omissão contrária à ordem, com a negativa de obediência, com o consentimento diante do ato delituoso do grupo, com a ocupação delituosa do quartel (sentido amplo) ou da viatura militar.

• Tentativa: é possível nas formas comissivas, exceto no anúncio verbal do não cumprimento da ordem e na mera anuência do inciso III, por se tratar de formas unissubsistentes.

• Crime propriamente militar

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

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1.2. Revolta

• Tipo legal

Parágrafo único. Se os agentes estavam armados:

Pena – reclusão, de oito a vinte anos, com aumento de um terço para os cabeças.

A revolta, nome dado ao motim qualificado pela presença de armas, passa a existir, tecnica-mente, quando, em meio ao grupo de amotinados, existirem dois agentes, pelo menos, que estejam armados. Note que o verbo nuclear é utilizado no plural (“estavam”), o que conduz à interpretação de que, se apenas um dos agentes estiver armado, o delito de motim não se qua-lificará como revolta.

Para que se verifique a presente qualificadora, basta que os militares do Estado estejam arma-dos, ainda que não utilizem as armas efetivamente, podendo estar em punho, no coldre, sobre as vestes, etc.; é necessário, no entanto, que os militares conheçam a condição de estar arma-do dos demais, ou, do contrário, aqueles que ignorarem a presença de armas responderão pelo tipo base (motim). Necessário que se note que, quando o legislador quis que a arma fosse efe-tivamente empregada, o fez de forma expressa, como se depreende do art. 157, § 4º, do CPM.

A qualificadora em questão deverá ser aplicada inclusive àqueles que não estão armados, pois, evidentemente, a presença de pelo menos duas pessoas armadas aumenta consideravelmente o potencial ofensivo do grupo dos amotinados, fator de sensível importância e repercussão ao falarmos de atentados contra a autoridade e disciplina militares. Logo, aquele que se alia a um grupo com esse perfil se verá beneficiado pela força majorada pela presença de armas, mesmo que não seja ele que as porte.

A expressão “estavam armados” conduz à concepção de arma em sentido lato – não de arma-mento, como estudaremos no delito capitulado no art. 150, que se configura em substantivo de significação restrita –, ou seja, não se deve compreender obrigatoriamente a arma própria (objeto idealizado e produzido para servir como instrumento de agressão física), aceitando-se, também, a arma imprópria (qualquer objeto que tenha outra finalidade, mas que pode ser usa-do como instrumento de agressão – pé de mesa, tijolos, pedras, paus, etc.) para que se qualifi-que o motim. Contudo, para que a arma imprópria seja invocada como qualificadora do motim, é necessário que tenha sido usada como instrumento de agressão ou de ameaça.

Assim como no motim, a pena dos cabeças é majorada, cumprindo esclarecer que a definição de “cabeças” está nos §§ 4º e 5º do art. 53 do CPM.

1.3. Organização de grupo para a prática de violência

• Tipo legal

Art. 150. Reunirem-se dois ou mais militares ou assemelhados, com armamento ou material bélico, de propriedade militar, praticando violência à pessoa ou à coisa pública ou particular em lugar su-jeito ou não à administração militar:

Pena – reclusão, de quatro a oito anos.

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• Objetividade jurídica: os bens jurídicos protegidos por esse tipo penal são a disciplina mili-tar – pois, como já dito, é inequívoco que um grupo de militares recalcitrantes à ordem su-perior e à ordem pública a atinja frontalmente – e a autoridade militar, em face da violação da lei.

• Sujeitos do delito: os sujeitos ativos (delito de coautoria necessária) são os militares, fede-rais ou estaduais, sendo válidos aqui os comentários consignados para o delito de motim, exceto no que concerne às modalidades omissivas, uma vez que o delito ora estudado so-mente admite forma comissiva.

No polo passivo, figura o titular do bem jurídico atingido, a saber, também a exemplo do crime de motim, a Instituição Militar, seja ela federal ou estadual.

• Elementos objetivos: o delito em estudo, como o de motim, é de coautoria necessária. Sig-nifica dizer que implica a reunião de militares (pelo menos 2) que, movidos pelos mesmos propósitos, praticam atos de violência (física) contra a pessoa ou coisa, desde que portan-do – não necessariamente empregando – armamento ou material bélico, elemento típico do crime.

Redundante foi o legislador ao consignar a expressão “armamento ou material bélico, de pro-priedade militar”, porquanto o conceito deste contém o daquele, ou seja, a compreensão de material bélico engloba a de armamento. Como exemplo, tome a definição dada pelo nº 20 do art. 2º do Regulamento para as Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares (R-200), aprovado pelo Decreto federal nº 88.777, de 30 de setembro de 1983, que assim dispõe:

“Material Bélico de Polícia Militar – Todo o material necessário às Polícias Militares para o de-sempenho de suas atribuições específicas nas ações de Defesa Interna e de Defesa Territorial.

Compreendem-se como tal:

a) armamento;

b) munição;

c) material de Motomecanização;

d) material de Comunicações;

e) material de Guerra Química;

f) material de Engenharia de Campanha.”

• Elemento subjetivo: é o dolo, a vontade livre e consciente de macular a autoridade e a dis-ciplina militares por meio de atos de violência física contra a pessoa ou coisa, obviamente, conhecendo a circunstância de estarem, pelo menos um dos consortes, munidos de arma-mento ou de material bélico.

• Consumação: ainda que o nomen juris possa indicar um delito formal, quando se exigiria apenas a organização do grupo para a prática de violência, os elementos do tipo permitem a conclusão por delito material, significando dizer que o crime se consuma com a efetiva prática do ato de violência contra pessoa ou coisa.

• Tentativa: é possível, por exemplo, no caso de os agentes investirem contra a pessoa ou coisa, sendo impedidos por terceiros.

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• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito somente pode ser perpetrado propriamente por mili-tares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, deve-se ve-rificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

1.4. Omissão de lealdade militar

• Tipo legal

Art. 151. Deixar o militar ou assemelhado de levar ao conhecimento do superior o motim ou re-volta de cuja preparação teve notícia, ou, estando presente ao ato criminoso, não usar de todos os meios ao seu alcance para impedi-lo:

Pena – reclusão, de três a cinco anos.

• Objetividade jurídica: continua sendo tanto a autoridade como a disciplina militares. A omissão do militar diante do motim (qualificado ou não) perturba o exercício da autorida-de do superior que não esteja envolvido no delito. Ademais, macula a disciplina, frontal-mente contrária a esse tipo de comportamento do grupo.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o militar, federal ou dos estados, visto que assim dispõe o próprio tipo, bem como o assemelhado, que, na atualidade, é letra morta, como já se consignou. O crime é monossubjetivo, exigindo apenas um militar para que possa ser per-petrado.

Como também já consignado, a palavra “militar”, como elemento típico do crime, conduz à conclusão de que somente o militar da ativa é que pode figurar como sujeito ativo do delito. Como exceção, entendemos apenas ser possível que o inativo figure no polo ativo se estiver equiparado a militar da ativa, nos termos do art. 12 do CPM.

• Elementos objetivos: o tipo objetivo é constituído por duas condutas omissivas.

Na primeira parte, o militar fica sabendo (seja por qual meio for) do planejamento do motim ou revolta, mas silencia, deixando de avisar seu superior acerca do fato. Necessário destacar que, se a participação (comunicação) for extemporânea, impossibilitando que a autoridade tome qualquer medida para impedir o levante, o crime estará configurado.

No meio militar, por vezes, confunde-se o dever de ofício de denunciar infrações penais milita-res e administrativas com a maledicência, o “diz que diz que”, o mexerico, a delação infame, a alcaguetagem. Essa impressão é falsa e perigosa, pois, na primeira, há dever de ofício e, na se-gunda, há falha de caráter. A denúncia de uma infração é obrigação de todo militar (da ativa ou inativo), sob pena de o omisso sofrer consequências disciplinares e, no caso do militar da ativa, dada a restrição do tipo penal, também penais militares, merecendo ser alvo de atenção pelos militares, especialmente pelos comandantes de tropa. Já o mexerico, é desprezível.

Na segunda parte, o militar não sabe do ato delituoso que se planejou, mas está presente quan-do o amotinamento ou a revolta são deflagrados. Militar que é, conhecedor de seus deveres de

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ofício, abandona a norma e deixa de promover a prisão dos envolvidos e/ou deixa de tomar qualquer providência para fazer cessar as ações do grupo de rebeldes (acionar o superior hie-rárquico, acionar tropa especializada, etc.).

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de se omitir em face da eclosão criminosa de terceiros.

• Consumação: o crime se consuma quando o autor, sabendo do delito (motim ou revolta) que se planejou, deixa de comunicá-lo a seu superior ou, ainda, na segunda modalidade, quando não utiliza os meios de que dispõe para impedir o delito, estando presente quando de sua deflagração.

• Tentativa: não é possível, em vista de a conduta ser omissiva, excluindo-lhe, portanto, a relevância jurídica.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

1.5. Conspiração

• Tipo legal

Art. 152. Concertarem-se militares ou assemelhados para a prática do crime previsto no art. 149:

Pena – reclusão, de três a cinco anos.

Isenção de pena

Parágrafo único. É isento de pena aquele que, antes da execução do crime e quando era ainda possível evitar-lhe as consequências, denuncia o ajuste de que participou.

• Objetividade jurídica: o bem jurídico protegido é a disciplina militar, pois, ao se reunirem para planejamento de motim ou revolta, os militares ferem a estrutura, a ordem castrense. Em vista do ato que se prepara, pode-se ver também em prejuízo a autoridade militar, caso o delito implique afronta a superiores, atingindo a hierarquia.

• Sujeitos do delito: os sujeitos ativos (delito de coautoria necessária ou plurissubjetivo) são os militares, federais ou estaduais, sendo válidos aqui os comentários consignados para o delito de motim, exceto no que concerne às modalidades omissivas, uma vez que o delito ora estudado, ainda que possa visar à futura modalidade omissiva de motim, importa em preparação, exigindo condutas comissivas (reunião, planejamento, etc.).

No polo passivo, figura o titular do bem jurídico atingido, a saber, também a exemplo do crime de motim, a Instituição Militar, seja ela federal ou estadual.

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• Elementos objetivos: o núcleo do tipo é “concertar”, ou seja, entrar em acordo, ajustar, pactuar, cotejar, harmonizar. Aqui os militares se ajustam para a prática das modalidades delituosas do art. 149, a saber, o motim e a revolta. É a combinação, o preparo do motim, qualificado ou não.

Não caracteriza o delito em estudo a mera conversa sobre o assunto ou manifestação de insa-tisfação, mas sim a determinação, com atos preparatórios para o delito (reunião, planejamen-to, etc.).

Há, na verdade, a criminalização autônoma de atos preparatórios de um delito, transmitindo um zelo extremado do legislador, antecipando a tutela do bem jurídico, o que denota a afronta que essa modalidade de crime provoca às Instituições Militares. Ressalta-se que não se trata de punição de atos preparatórios de motim, mas de criminalização de atos preparatórios.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de concer-tarem-se os militares, porém com o fim certo de praticar o crime de motim (o elemento subjetivo especial do injusto ou antigo dolo é específico).

• Consumação: o delito se consuma quando os autores se reunirem conscientes da finalida-de do encontro. Se porventura algum, entre eles, desconhecer o motivo da reunião, não estará cometendo o delito, mas, tão logo o conheça e permaneça integrando o grupo, já se torna coautor. Não se exige resultado de qualquer ordem, bastando que o grupo se forme com o escopo de prática futura de motim (ou de revolta).

• Tentativa: não é possível, tendo em vista que é delito de consumação instantânea. Ou se participa da reunião para planejamento de motim, ou não se participa. A intenção de jun-tar-se ao grupo sem a efetiva participação não tipificará o crime em estudo, pois não passa de mera cogitação.

• Isenção de pena: o tipo em estudo, em seu parágrafo único, dispõe que é “isento de pena aquele que, antes da execução do crime e quando era ainda possível evitar-lhe as consequ-ências, denuncia o ajuste de que participou”. Trata-se de uma escusa absolutória, que leva à extinção da punibilidade.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

1.6. Cumulação de penas

• Tipo legal

Art. 153. As penas dos arts. 149 e 150 são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.

Trata-se de concurso formal de crimes, que possui regra própria, diversa daquela estipulada pelo art. 79 do CPM. No dispositivo da Parte Geral, a regra é o cúmulo material das penas dos

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crimes se forem de mesma espécie ou, se penas de espécies diferentes, a exasperação – a pena única será a mais grave, aumentada da metade do tempo das menos graves. O art. 153, no entanto, considerando a gravidade da conduta, determinou apenas o cúmulo material, a soma das penas, ainda que de espécies diferentes, o que se torna cristalino pela expressão “sem pre-juízo das correspondentes à violência”.

Caso o resultado seja um homicídio doloso e praticado contra civil, o processo será dividido em face da competência do Tribunal do Júri sobre o segundo delito, determinado pelo parágrafo único do art. 9º do CPM, introduzido pela Lei nº 9.299, de 7 de agosto de 1996, hoje com o res-paldo do § 4º do art. 125 da CF, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 45/2004.

Note que, no âmbito processual penal, haverá aqui uma exceção à regra de processo único, ex-ceção essa trazida pela alínea “a” do art. 102 do CPPM e pelo inciso I do art. 79 do CPP, os quais, em suma, dispõem que a conexão e a continência determinarão a unidade do processo, salvo no concurso entre a jurisdição militar e a comum.

2. DA ALICIAÇÃO E DO INCITAMENTO

2.1. Aliciação para motim ou revolta

• Tipo legal

Art. 154. Aliciar militar ou assemelhado para a prática de qualquer dos crimes previstos no capítulo anterior:

Pena – reclusão, de dois a quatro anos.

• Objetividade jurídica: aqui o bem jurídico protegido é, especialmente, a disciplina militar, pois o autor, ao tentar convencer terceiros para o motim ou a revolta, fere a estrutura ins-titucional, a ordem castrense.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é qualquer pessoa, civil ou militar.

No caso de sujeição ativa de um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso o alvo do aliciador seja militar estadual, a tipifica-ção seria buscada na legislação penal comum, por exemplo, no art. 286 do CP comum.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: aliciar é atrair, seduzir, envolver, convencer o militar a praticar um dos crimes previstos no Capítulo I do Título II do CPM (“Do Motim e da Revolta”). Entende-mos que aqui está também a geração da ideia, o induzimento para a prática de delitos enu-merados. Façamos, pois, a propósito dessa discussão, a diferenciação entre induzir, incitar e aliciar, o que aproveitará a outras figuras delitivas.

Induzir, pela significação léxica, deve ser compreendido como “persuadir à prática de alguma coisa” ou “ser causa ou motivo de (sensação, impressão) em (alguém); inspirar, provocar”. Por vezes, a palavra aparece como sinônima de incitar, porém a compreensão jurídica deve restrin-gir-se à geração de uma ideia. Nesse sentido, ao comentar o delito de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, Bitencourt assinala que induzir “significa suscitar o surgimento de uma

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ideia, tomar a iniciativa intelectual, fazer surgir no pensamento de alguém uma ideia até então inexistente”.

Incitar, também na compreensão dos dicionários, significa “impelir, mover, instigar” ou “esti-mular (alguém) [a realizar algo]; instigar, impelir, encorajar”. Buscando a compreensão jurídica do termo, instigar, na visão de Bitencourt, deve compreender o ato de “animar, estimular, refor-çar uma ideia existente. Ocorre instigação quando o instigador atua sobre a vontade do autor, no caso, do instigado”.

Aliciar, como exigido pelo tipo em estudo, significa “atrair, chamar a si, convidar, seduzir” ou, ainda, “atrair a si; tornar (alguém) seu sequaz ou cúmplice; seduzir, envolver”. Nesse sentido, Mirabete, ao comentar o núcleo do tipo do art. 206 do CP, explica que, anteriormente, era gra-fado como aliciar e, hoje, é grafado como recrutar. Para o saudoso mestre, recrutar, que tem sentido semelhante a aliciar, “exige a iniciativa do agente para atrair, seduzir ou angariar”, no caso do tipo por ele comentado, trabalhadores.

Pelas compreensões expostas, fica claro que o induzimento, ou seja, a geração da ideia de se amotinar, aproxima-se mais da ideia de aliciar que da de incitar. Tradicionalmente, na doutrina, mormente quando se comentam as ações afetas ao suicídio que são criminalizadas, distingue--se com muita veemência a instigação (incitamento) do induzimento, tornando claro que não são termos correspondentes no plano jurídico.

Partindo da premissa de que seduzir significa previamente gerar a ideia (induzimento), não coincidindo, pois, com o ato de incitar, mas com o de aliciar. Nessa toada, se houver uma sequ-ência lógico-temporal, primeiro se seduz, aliciando os suscetíveis de convencimento e, poste-riormente, se insufla, se instiga, ou seja, há o incitamento. É preciso lembrar, no entanto, que é perfeitamente possível haver o incitamento sem que o sujeito ativo tenha, primeiro, cooptado (aliciado) aqueles que estavam propensos a praticar o motim (a revolta, etc.).

Esse convencimento pode ser exercido de qualquer forma, mas a verbal e a escrita são as mais usuais, especialmente a primeira, por não deixar a prova material da mensagem difundida. A atitude de convencimento do sujeito ativo deve recair sobre militar ou sobre assemelhado, o qual, segundo nossa compreensão, não mais existe nas forças militares.

Note que a exigência típica não recai sobre o convencimento de dois ou mais militares, mas apenas de um. Dessa forma, ainda que o sujeito ativo interaja apenas com um militar, indepen-dentemente da adesão posterior de outro(s), estaria caracterizado o delito.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de cooptar alguém para a prática de delitos capitulados nos arts. 149 a 152 do CPM.

• Consumação: o delito se consuma quando o receptor do chamamento para os delitos do capítulo de motim e revolta (militar) se deixa seduzir e concorda com o autor. Com efeito, o verbo nuclear, “aliciar”, exige que haja a anuência do destinatário do convite, não bastando que seja proposta meramente propalada, quando poderá ocorrer a forma tentada. Caso o legislador desejasse antecipar mais ainda a tutela penal, utilizaria, em vez de “aliciar”, ou-tro verbo nuclear que dispensasse a anuência do interlocutor, formando expressões como “convidar militar” ou “sugerir a militar”.

Não é necessário que o militar aliciado pratique qualquer conduta, pois o mero acatamento do discurso que visa a atrair militares para o ato delituoso já perturba a disciplina e consuma

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o presente delito. Trata-se, portanto, de crime formal, significando a execução do motim, por exemplo, por parte daquele que foi aliciado, o mero exaurimento do delito.

• Tentativa: é discutível pela doutrina, mas entendemos ser possível quando o autor discur-sa, escreve ou de qualquer forma envia mensagem ao militar, mas não o convence. Inclui--se aqui o caso do militar que tenta distribuir panfleto concitando militares à paralisação – contrariando ordem expressa e precedente em sentido contrário – e é preso antes de distribuir seu material.

• Crime impropriamente militar.

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade desse delito, deve--se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafa-dos no tipo penal da Parte Especial. Ainda que o fato possa ser capitulado em delitos do Código Penal comum, como o já citado “incitação ao crime” (art. 286 do CP) e também a “apologia de crime ou de criminoso” (art. 287 do CP), não há semelhança suficiente para justificar a complementação da tipicidade pelo inciso II do art. 9º do CPM.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, nesse caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

2.2. Incitamento

• Tipo legal

Art. 155. Incitar à desobediência, à indisciplina ou à prática de crime militar:

Pena – reclusão, de dois a quatro anos.

Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem introduz, afixa ou distribui, em lugar sujeito à administração militar, impressos, manuscritos ou material mimeografado, fotocopiado ou gra-vado, em que se contenha incitamento à prática dos atos previstos no artigo.

• Objetividade jurídica: tutela-se a disciplina militar, pois o autor, ao buscar levar terceiros à prática de crime militar, de atos de indisciplina ou de desobediência em geral, fere, igual-mente, a estrutura, a ordem castrense; atinge também a autoridade quando se prega a desobediência.

• Sujeitos do delito: aqui também o sujeito ativo é qualquer pessoa, civil ou militar.

No caso de sujeição ativa de um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso o alvo do incitador seja militar estadual, a tipifica-ção seria buscada na legislação penal comum, por exemplo, o art. 286 do CP comum.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: como já mencionamos acima, incitar significa “impelir, mover, insti-gar” ou “estimular (alguém) [a realizar algo]; instigar, impelir, encorajar”, empurrar à prá-tica que caracterize desobediência, indisciplina ou crime militar, não compreendendo, em

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nossa visão e respeitando as notáveis opiniões em sentido oposto, o induzimento, a gera-ção da ideia. A ideia é preexistente, sendo reforçada, encorajada pelo agente.

Em verdade, o crime militar abrange a indisciplina e a desobediência, do que se depreende que o legislador quis aqui tutelar o incitamento não só de atitudes que caracterizem crime castren-se, como também de infrações administrativas disciplinares de desobediência e de indisciplina que não chegam a configurar crime, mas cuja instigação, sim, é de tutela penal militar.

É pertinente lembrar que, se o delito que se está incitando for comum, não resvalando em de-sobediência ou em indisciplina, o incitamento configurará crime comum capitulado no art. 286 do CP comum. Ocorre que será impossível que alguém insufle um militar à prática de ilícito pe-nal comum sem que isso importe em ato de indisciplina, porquanto, em regra, os regulamentos disciplinares militares consideram o respeito e o acatamento às leis manifestações essenciais da disciplina.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente.

• Consumação: o delito se consuma, como no delito anterior, com a concordância do re-ceptor (militar) da mensagem que caracteriza o incitamento, a instigação para a prática de atitudes de indisciplina, desobediência ou crime militar. Da mesma forma, não é necessário que o militar pratique qualquer conduta, pois a mera aceitação já perturba a disciplina e consuma o presente delito. A prática de conduta afim por parte daquele que foi instigado é mero exaurimento.

• Tentativa: é possível quando o autor envia mensagem ao militar-alvo e ela é interceptada ou não surte o efeito de excitar a ideia preexistente.

• Crime impropriamente militar.

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade desse delito, deve--se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial. Ainda que o fato possa ser capitulado em delitos do Código Penal comum, como o já citado “incitação ao crime” (art. 286 do CP), não há semelhança suficiente para justificar a complementação da tipicidade pelo inciso II do art. 9º do CPM.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, nesse caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

2.3. Apologia de fato criminoso ou do seu autor

• Tipo legal

Art. 156. Fazer apologia de fato que a lei militar considera crime, ou do autor do mesmo, em lugar sujeito à administração militar:

Pena – detenção, de seis meses a um ano.

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• Objetividade jurídica: perturba essencialmente a disciplina, pois se exalta o infrator da norma castrense ou o próprio delito militar, o que afeta a regularidade da atividade militar.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é qualquer pessoa, civil ou militar.

No caso de ser um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso o alvo do apologista seja militar estadual, a tipificação seria buscada na legislação penal comum, por exemplo, o art. 287 do CP comum.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: fazer apologia é exaltar, elogiar, enaltecer, engrandecer fato delituoso (conduta tipificada como crime militar), o que pode fazer com que seja, para alguém, exemplo ou meta a ser seguida ou alcançada, explicando, pois, a nocividade da conduta.

A apologia pode ainda ser de autor de delito militar, mas só haverá crime se for ele engrande-cido pelo seu desvio de conduta. O engrandecimento de qualquer qualidade pessoal do autor de delito, a solidariedade e a sua defesa não serão, por si só, delituosos. Se assim fosse, o autor de um crime militar nunca mais poderia ser elogiado por alguma virtude pessoal ou por algum bem que tivesse feito.

O elemento espacial “em lugar sujeito à administração militar” é exigido para as duas modali-dades, ou seja, o enaltecimento do crime militar ou de seu autor, para se configurarem delito, hão de ser em espaço sob a Administração Militar; fora desse limite, o delito será comum.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de enaltecer o crime militar ou o seu autor pelo delito cometido.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor promove o elogio, o enaltecimento, o destaque ao fato ou a seu autor.

• Tentativa: possível somente na modalidade escrita, quando interceptada antes de chegar a seu destino.

• Crime impropriamente militar.

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade desse delito, deve--se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafa-dos no tipo penal da Parte Especial. Ainda que o fato possa ser capitulado em delitos do Código Penal comum, como o de “apologia de crime ou criminoso” (art. 287 do CP), não há semelhança suficiente para justificar a complementação da tipicidade pelo inciso II do art. 9º do CPM, uma vez que aqui, além da necessária relação com o delito militar, exige-se que a conduta ocorra em lugar sujeito à Administração Militar.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, nesse caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

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3. DA VIOLÊNCIA CONTRA SUPERIOR OU MILITAR DE SERVIÇO

3.1. Violência contra superior

• Tipo legal

Art. 157. Praticar violência contra superior:

Pena – detenção, de três meses a dois anos.

Formas qualificadas

§ 1º Se o superior é comandante da unidade a que pertence o agente, ou oficial general:

Pena – reclusão, de três a nove anos.

§ 2º Se a violência é praticada com arma, a pena é aumentada de um terço.

§ 3º Se da violência resulta lesão corporal, aplica-se, além da pena da violência, a do crime con-tra a pessoa.

§ 4º Se da violência resulta morte:

Pena – reclusão, de doze a trinta anos.

§ 5º A pena é aumentada da sexta parte, se o crime ocorre em serviço.

• Objetividade jurídica: certamente, tanto a autoridade do superior atingido como a discipli-na militar são os bens tutelados por esse tipo penal.

A autoridade do superior agredido é maculada tanto perante o inferior hierárquico que o agre-diu como perante terceiros que tenham assistido ou sabido da ocorrência.

Quanto à disciplina, não são necessários maiores comentários, pois a agressão física de subor-dinado contra superior perturba a regularidade, a ordem disciplinar vigente.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o inferior hierárquico ou funcional (este por compreen-são do art. 24 do CPM), o que restringe o cometimento do delito ao militar, federal ou dos Estados.

Não se utilizou o legislador da expressão “militar”, mas sim “superior”, significando que o de-lito pode ser perpetrado por militares da ativa ou por inativos, desde que contra um superior. Nessa construção, o militar inativo poderá perpetrar esse delito, exceto na compreensão de superior funcional, porquanto não está ele, em inatividade, no desempenho de função, ressal-va feita se estiver sendo empregado na Administração Militar, conforme expõe o art. 12 do CP castrense. Deve-se, ademais, verificar que, para o inativo, não equiparado a militar da ativa, co-meter esse delito, devem incidir também as circunstâncias do inciso III do art. 9º, já estudadas na Parte Geral.

Qualquer pessoa, à exceção, pode perpetrar esse delito, se em concurso com um militar infe-rior ao sujeito passivo, quando a circunstância pessoal inferior (hierárquico ou funcional), que é implicitamente uma elementar do tipo, comunica-se aos consortes (art. 53, § 1º, Segunda Parte, do CPM).

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O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar, mas não podemos esquecer do próprio superior agredido, ainda que inativo, que é vítima secundária (ofendido), configurando-se, ademais, sujeito passivo mediato.

É necessário frisar, mais uma vez, destoante entendimento de Célio Lobão, ao postular que somente militares da ativa praticam e podem ser vítimas desse delito. Assim expõe o autor: “Tratando-se de crime propriamente militar, somente o militar pode ser sujeito ativo. Portanto, completamente equivocado o exposto no HC 81.438. Sujeito passivo, as instituições militares, e ofendido, o superior hierárquico”.

Outra premissa que nos parece equivocada na visão de Célio Lobão é a conclusão de que a lei penal militar considera o reformado e o militar da reserva como civis. Indiscutível que a agres-são por ou contra um inativo pode afetar, sobremaneira, a autoridade e a disciplina militares, bens tutelados pelo título que contém a violência contra superior.

• Elementos objetivos: o conceito de “superior”, já consignamos várias vezes, possui duas compreensões. Inicialmente, há a concepção que se infere de uma organização militar, onde vinga o conceito hierárquico – o General de Exército é superior ao General de Divisão, que é superior ao General de Brigada, que o é ao Coronel, que o é ao Tenente-coronel, e assim por diante.

Todavia, para evitar distorções na compreensão do escopo trazido pelo CPM, a própria lei traz outro conceito de superior, aquele atrelado à função, que somente vingará quando houver igualdade de posto ou de graduação. O conceito de superior funcional está na Parte Geral do Código Penal Militar (art. 24) e abrange aquele que, em face de um par, está desempenhando função de posto ou graduação superior de ambos.

Obs.: Ainda acerca da temática da elementar superior, conforme dispusemos no estudo da Parte Geral, não entendemos haver vínculo de subordinação capaz de preencher o tipo penal entre militares das Polícias Militares (ou Corpos de Bombeiros Militares) e os militares das For-ças Armadas. Por outro lado, exceto no que tange à superioridade funcional, é perfeitamente possível – pela doutrina dominante, esquecendo-se do nosso tão caro pacto federativo discu-tido na Parte Geral – vínculo hierárquico entre militares de Força Armada diversa (p. ex.: um do Exército e outro da Marinha) e de Instituições Militares Estaduais de Unidades Federativas distintas (p. ex.: militar do Estado de São Paulo que agride superior da Polícia Militar do Rio Grande do Norte).

O tipo diz praticar violência contra superior. Violência consiste na força física empregada, no caso, contra o corpo do superior. Trata-se de vis corporalis, quando o agente utiliza o próprio corpo, ou de vis physica, quando o agente utiliza um instrumento para praticar a violência.

Dessa forma, considera-se violência não só o empurrão, mas também o arremesso de um obje-to, a ordem para um animal atacar ou investidas similares, porquanto, nesses casos, apesar de o autor não atingir a vítima secundária pessoalmente, foi ele o responsável pela conduta, assim como pelo resultado.

Não há como falar na ocorrência do delito quando a violência é praticada contra coisa, por exemplo, atingir o veículo no qual se encontra o superior. Por outro lado, ministrar substâncias que afetem o organismo do superior pode constituir o crime.

Em suma, como exemplos de violência contra superior podemos citar o empurrão caracteri-zador de vias de fato, como acima referido, “a bofetada, a esputação”, o ato de “arrancar dis-

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tintivo, botão do bolso ou outra parte do fardamento ou do traje civil, dar tapa na cobertura, lançando-a ao chão ou simplesmente deslocando-a, assim como empurrar o superior com o corpo ou com um objeto, segurar-lhe o braço, bater-lhe com a mão ou com qualquer objeto ou "coscientemente e volontariamente trattiene per un braccio il superiore".

Por outro lado, não se configura violência contra superior o ato de cuspir sobre ele, conduta que poderá caracterizar outros delitos, como o desrespeito a superior (art. 160 do CPM) ou mesmo o desacato a superior (art. 298 do CPM). Não se exige para a configuração do delito que haja a lesão corporal, mas, sim, que haja o deslocamento de energia atingindo o corpo do supe-rior de modo a afetá-lo, adaptando-se ao conceito de violência.

• Formas qualificadas

Havendo a lesão, ou mesmo resultado mais grave, o crime poderá ingressar naquilo que a lei intitulou, de forma equivocada, de formas qualificadas. Assim, vejamos as formas qualificadas e as majorantes do crime de violência contra superior.

Forma do § 1º – A primeira delas, grafada no § 1º, consiste em uma forma qualificada, em que o superior agredido é o comandante da Unidade Militar a que pertence o autor do fato. Essa previsão tem amparo no fato de que o comandante é a personificação da autoridade militar no quartel, a autoridade máxima daquela célula de tropa. Além disso, por questão hierárquica, é cada vez menor o acesso que o militar tem a seus superiores à medida que o grau hierárquico vai se elevando. Investir fisicamente contra o baluarte da disciplina e da autoridade militar cujo acesso é o mais restrito representa, certamente, lesão ao bem jurídico sensivelmente maior que a de um soldado que agride um cabo.

Forma do § 2º – A outra espécie das chamadas “formas qualificadas”, prevista no § 2º, é, em verdade, uma majorante ou causa especial de aumento de pena. Segundo ela, a pena será au-mentada de um terço se houver o uso de arma. A arma, aqui, é de notar, pode ser própria ou imprópria, mas deverá ser utilizada na prática da violência, não bastando que o militar agressor a porte ou a utilize como objeto potencializador de uma grave ameaça. A razão para essa ma-jorante é simples e repousa no fato de que a arma aumenta o potencial ofensivo do autor em desfavor do ofendido, acentuando-se, pois, a reprovação da conduta.

Forma do § 3º – Conforme inteligência do § 3º do art. 157, a pena será afetada também no caso de lesão corporal resultante da violência. Em verdade, trata-se de uma regra que objetiva o concurso formal dos crimes de violência contra superior e o de lesão corporal, uma vez que a ação atinge bens jurídicos diversos, tutelados por dispositivos diferentes.

Forma do § 4º – A morte resultante da violência também qualifica o delito, nos termos do § 4º, elevando os limites, mínimo e máximo, para os mesmos cominados ao homicídio qualificado (art. 205, § 2º, do CPM). Não se trata de regra de concurso de crimes, mas de qualificadora. Interessante notar que não se fala aqui, como, aliás, também no caso do resultado lesão corpo-ral, em crime preterdoloso, cuja possibilidade será estudada quando da análise do art. 159 do CPM. Há, sim, dolo no antecedente e dolo no consequente, descrevendo, pois, uma progressão criminosa em que o agente, primeiro, desejou meramente agredir o superior e, posteriormen-te, decidiu dar cabo de sua vida.

Forma do § 5º – Por fim, haverá causa especial de aumento de pena, e não qualificadora, se-gundo o § 5º do artigo estudado, se o crime ocorrer em serviço. Serviço, aqui, deve ser enten-dido de forma ampla, segundo a qual estará em serviço o militar que esteja desempenhando

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funções em sua Corporação, ainda que em caráter precário, sem escala de serviço, mas, por adesão, em face de uma situação repentina que o chame a atuar. Para o tipo penal, tanto faz estarem em serviço o autor, o ofendido ou ambos, pois o fato em questão prejudicará o serviço em qualquer dessas hipóteses, sem contar a eventual presença de outros militares, o que faria a repercussão do evento ser maior, promovendo danos mais sensíveis à disciplina e à autorida-de.

• Elemento subjetivo: o tipo penal em estudo só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de investir fisicamente contra o superior.

É preciso frisar que nesse delito a ação incriminada é a violência empregada contra o superior, não importando o resultado, que pode somente qualificar o delito. Destarte, a condição de superior deve ser conhecida pelo agente ou, de outra forma, não haverá conformação típica subjetiva, desconstituindo-se essa infração, por ausência do elemento subjetivo (inciso I do art. 47 do CPM). Na verdade, à letra da lei penal militar, estaria afastada a própria tipicidade ob-jetiva (“deixam de ser elementos constitutivos do crime”), mas preferimos entender que há a afetação do dolo.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor atinge fisicamente o superior, seja dire-ta, seja indiretamente.

• Tentativa: é possível, no caso em que o agente investe contra a vítima, mas circunstâncias alheias à sua vontade o impedem de atingi-la.

Visão interessante é trazida por Célio Lobão, entendendo que o simples fato de o agente se-gurar um objeto, um tinteiro, como exemplo, sem arremessá-lo efetivamente, não configura a modalidade tentada do art. 157 do CPM, mas, sim, consumada, do delito capitulado no art. 160, sob a rubrica “desrespeito a superior”. Com efeito, não havendo, ao menos, a tentativa branca pelo arremesso do objeto, não há por que fazer a construção da tipicidade indireta da tentativa, quando o tipo do art. 160 subsume perfeitamente o fato. Há, mais uma vez, a aplica-ção de uma norma prevalente em face do princípio da especialidade.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito somente pode ser perpetrado propriamente por mili-tares, da ativa ou em inatividade (exceto os da reserva não remunerada), para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, devem-se verificar o inciso I ou o inciso III, ambos do art. 9º do CPM, conforme o caso, que trarão ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

3.2. Violência contra militar de serviço

• Tipo legal

Art. 158. Praticar violência contra oficial de dia, de serviço, ou de quarto, ou contra sentinela, vigia ou plantão:

Pena – reclusão, de três a oito anos.

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Formas qualificadas

§ 1º Se a violência é praticada com arma, a pena é aumentada de um terço.

§ 2º Se da violência resulta lesão corporal, aplica-se, além da pena da violência, a do crime con-tra a pessoa.

§ 3º Se da violência resulta morte:

Pena – reclusão, de doze a trinta anos.

• Objetividade jurídica: a objetividade jurídica desse delito continua sendo a autoridade e a disciplina militares, visto que a agressão, na forma descrita pelo tipo em estudo, perturba sobremaneira a regularidade das Instituições Militares e, consequentemente, a ordem dis-ciplinar vigente.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo poderá ser o militar, federal ou dos Estados, bem como qualquer civil, este somente na seara federal, em vista da limitação constitucional das justi-ças castrenses estaduais.

Interessante notar que mesmo um militar superior hierárquico pode figurar no polo ativo, per-petrando o delito contra uma pessoa investida das funções consignadas no tipo. Assim, e. g., seria possível um General de Exército ser sujeito ativo ao praticar violência contra um soldado, na função de sentinela.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar, mas não podemos esquecer do próprio militar agredido, que é vítima secundária (ofendido), ou, ainda, sujeito passivo mediato. Contudo, aqui não falamos de qualquer militar, mas tão somente da-quele que exerce as funções descritas no tipo estudado.

• Elementos objetivos: como já ressaltado acima, no tipo ora estudado, qualquer pessoa pode praticar a conduta nuclear, que, mais uma vez, refere-se à violência, sendo, portanto, válidas as construções consignadas no art. 157 do CPM.

A conduta violenta é direcionada contra o militar de serviço, nas funções grafadas no tipo pe-nal, ou seja, contra oficial de dia, de serviço, ou de quarto, ou contra sentinela, vigia ou plantão.

• Figuras qualificadas: O delito em estudo, como no crime anterior, sob a rubrica equivocada de “formas qualificadas”, prevê uma forma qualificada, outra causa especial de aumento de pena e uma regra expressa para o concurso de crimes. Faremos breves anotações acerca das formas qualificadas, rogando ao estudioso que verifique os comentários apostos ao art. 157.

O § 1º traz a mesma majorante do § 2º do art. 157, segundo a qual a pena será aumentada de um terço se houver o uso de arma (própria ou imprópria), que deverá ser efetivamente utiliza-da na prática da violência.

Tal como o § 3º do art. 157, o § 2º do art. 158 dispõe que haverá concurso formal de crimes no caso de a lesão corporal resultar da violência, exigindo-se também o cúmulo material de penas.

Por fim, resultando a morte do ofendido em razão da violência, havendo dolo em ambos, a prática da violência e o atingimento do resultado letal, o delito será, nos termos do § 3º, quali-ficado, com pena de reclusão de doze a trinta anos.

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• Elemento subjetivo: da mesma forma que no delito anterior, o tipo penal estudado só ad-mite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de investir fisicamente contra militar nas funções descritas pelo tipo.

A condição do militar de serviço deve ser conhecida pelo agente. Muito embora não exista expressamente a exclusão da condição de militar de serviço (art. 47, I, do CPM), quando des-conhecida pelo agente, a nosso ver, como postulamos nos comentários à Parte Geral, o dispo-sitivo merece uma releitura, já que a exclusão não pode ser restrita aos casos de superioridade e inferioridade hierárquica, porquanto a estrutura apresentada seria incoerente com a com-preensão que se tem do dolo, seja na atual vertente em que se postula o dolo natural, seja na compreensão anterior em que estava contida no dolo a consciência da ilicitude (dolus malus).

• Consumação: o delito se consuma quando o autor atinge fisicamente o ofendido, seja dire-ta, seja indiretamente, pela utilização de objetos.

• Tentativa: é possível, no caso em que o agente investe contra o ofendido, mas circunstân-cias alheias à sua vontade o impedem de atingi-lo.

• Crime impropriamente militar.

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade desse delito, deve--se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse tipo penal, basta que sejam encontrados os elementos grafados na Parte Especial.

Em caso do cometimento do delito por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementa-ção deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, nesse caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

3.3. Ausência de dolo no resultado

• Tipo legal

Art. 159. Quando da violência resulta morte ou lesão corporal e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzi-lo, a pena do crime contra a pessoa é diminuída de metade.

Comentários

Aqui se abranda o rigor da punição daquele que tinha, sim, a intenção de agredir, o dolo de ata-car fisicamente o superior hierárquico ou o militar em serviço; entretanto, a apuração demons-tra que ele, autor, não queria o resultado lesão corporal ou morte (dolo direto) nem assumiu o risco de produzi-lo (dolo eventual).

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4. DO DESRESPEITO A SUPERIOR E A SÍMBOLO NACIONAL OU A FARDA

4.1. Desrespeito a superior

• Tipo legal

Art. 160. Desrespeitar superior diante de outro militar:

Pena – detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.

Desrespeito a comandante, oficial-general ou oficial de serviço

Parágrafo único. Se o fato é praticado contra o comandante da unidade a que pertence o agen-te, oficial-general, oficial de dia, de serviço ou de quarto, a pena é aumentada da metade.

• Objetividade jurídica: ainda aqui, a objetividade do crime em estudo continua sendo a au-toridade militar, personificada no superior hierárquico que é desrespeitado, e a disciplina militar, ordem essencial que permite a regularidade das atividades da Instituição Militar.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo, novamente, é o inferior hierárquico ou funcional (este por compreensão do art. 24 do CPM), o que restringe o cometimento do delito por militar, federal ou dos Estados.

Também aqui não se utilizou o legislador da expressão “militar”, mas sim “superior”, significan-do que o delito pode ser perpetrado por militares da ativa ou por inativos, desde que contra um superior.

É possível, para a maioria da doutrina, o desrespeito entre militares de Unidades Federativas distintas, em que o sujeito ativo é policial ou bombeiro militar de um Estado e o ofendido, de outro, sendo o juízo competente à Auditoria do Estado a que pertence o acusado. Somente para ilustração, imagine que um policial militar de São Paulo esteja fazendo curso de especia-lização na Polícia Militar de Santa Catarina e lá desrespeite um superior hierárquico. Por outro lado, inviável, o desrespeito entre militares estaduais contra federais, e vice-versa.

Deve-se ter em mente que o crime tem por escopo a tutela da autoridade e da disciplina mili-tares, portanto o militar que presencia a atitude desrespeitosa há de ser integrado ao corpo da ativa ou, do contrário, não haveria sequer potencial lesão à disciplina do ambiente de caserna. Por essa razão, a palavra “militar” grafada no tipo deve seguir a definição trazida pelo art. 22 do CPM.

Esse militar da ativa que presencia o desrespeito deverá possuir cargo semelhante ao dos sujei-tos do delito. Assim, caso o desrespeito se dê, por exemplo, de um soldado da Polícia Militar de Minas Gerais contra um superior da mesma Milícia, porém presenciado por um soldado da Po-lícia Militar do Estado de São Paulo, o fato estará subsumido pelo tipo pena. Com o testemunho do militar estadual, a estrutura das Milícias estaduais foi abalada.

Igual compreensão, até mesmo para mantermos coerência de raciocínio, não se pode ter quan-do o fato, praticado por militar estadual contra outro do mesmo Estado, é presenciado por militar federal. Não há lesão, nem mesmo potencial, à disciplina de ambas as instituições no caso citado. O militar federal que presenciou o fato terá a compreensão de que, nas Milícias, a disciplina está enfraquecida, porém não duvidará que, se repetir o ato em um quartel de sua

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Força, sofrerá as severas consequências de sua indisciplina. O raciocínio também é empregado em situação inversa, ou seja, o desrespeito por militar federal presenciado por militar estadual.

• Elemento subjetivo: só se admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de ofen-der aquele que se sabe ser superior hierárquico.

Aqui também são válidos os comentários acerca do art. 47 do CPM, ao afastar o dolo pelo des-conhecimento da condição de superior (inciso I), bem como quando a ação desrespeitosa é praticada em repulsa a agressão, valendo, aqui, os comentários já consignados para o art. 157 do CPM. Na verdade, à letra da lei penal militar, estaria afastada a própria tipicidade objetiva (“deixam de ser elementos constitutivos do crime”), mas preferimos entender que há a afeta-ção do dolo.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor ofende a vítima secundária, seja de que forma for.

• Tentativa: hipoteticamente, poderia ser aceita, exceto se perpetrada por gesto, por imita-ção, por palavra ou por qualquer outro meio que se exaura em si mesmo. Ocorre que, na prática, esse delito decorre, quase sempre, de perda de controle emocional por parte do autor, sendo raras as vezes em que é premeditado e praticado por escrito ou outro meio melhor trabalhado.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares, da ativa ou em inatividade (exceto os da reserva não remunerada), para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, devem-se verificar o inciso I ou o inciso III do art. 9º do CPM, conforme o caso, que trarão ao intérprete o entendimento de que, para a sub-sunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

4.2. Desrespeito a símbolo nacional

• Tipo legal

Art. 161. Praticar o militar diante da tropa, ou em lugar sujeito à administração militar, ato que se traduza em ultraje a símbolo nacional:

Pena – detenção, de um a dois anos.

• Objetividade jurídica: a objetividade jurídica desse crime é, particularmente, a disciplina militar, pois um desvio de conduta usando símbolo nacional depõe contra a ordem mínima necessária à normalidade da vida disciplinada de caserna.

• Elementos objetivos: desrespeitar é sinônimo, como o próprio tipo faz concluir, de ultrajar, que significa ofender, injuriar, insultar, aviltar, vilipendiar, menosprezar, faltar com o respei-to, podendo ser praticado por palavras, gestos, desenhos, escritos, etc.

O desrespeito deve recair sobre os símbolos nacionais, que, segundo o art. 13, § 1º, da CF, são a bandeira, o hino, as armas e o selo nacionais. Os dois primeiros estão presentes na vida de todo

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brasileiro, mas os dois últimos não. Entretanto, deve o militar lembrar que não pode desconhe-cer seus significados, mesmo porque esse conhecimento integra os cursos de formação dos postos (oficiais) e graduações (praças) de quaisquer das carreiras militares existentes no Brasil, incutindo-se, como já afirmado, o valor do patriotismo.

Por óbvio, em interpretação restritiva da lei penal militar, estão fora do tipo estudado os sím-bolos dos Estados-membros, porquanto se fala em “símbolo nacional”. Caso um militar, por exemplo, cuspa na bandeira do Estado de São Paulo, não estará em prática desse delito, o que não exime sua responsabilidade disciplinar pelo fato.

É imprescindível que esse delito ocorra diante de tropa ou em lugar sob a Administração Militar.

• Elemento subjetivo: assim como no delito anterior, só admite o dolo.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor pratica o ato de desrespeito ao símbolo nacional.

• Tentativa: é possível, exceto se praticada por gesto, palavra ou qualquer outra conduta ins-tantânea.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

4.3. Despojamento desprezível

• Tipo legal

Art. 162. Despojar-se de uniforme, condecoração militar, insígnia ou distintivo, por menosprezo ou vilipêndio:

Pena – detenção, de seis meses a um ano.

Parágrafo único. A pena é aumentada da metade, se o fato é praticado diante da tropa, ou em público.

• Objetividade jurídica: novamente, a objetividade é particularmente a disciplina militar, pois um desvio de conduta, usando símbolos militares, depõe contra a ordem mínima ne-cessária à normalidade da vida disciplinada de caserna.

A farda, as condecorações, as insígnias e os distintivos são signos da vida militar, cultuados como elementos formadores do brio militar, sendo, portanto, sua conspurcação uma ofensa ímpar à disciplina.

• Sujeitos do delito: da leitura do tipo penal poder-se-á inclinar pela conclusão de que não há restrições ao sujeito ativo do presente delito, principalmente porque as condecorações militares podem ser conferidas a civis.

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Todavia, há que se verificar que o bem jurídico especificamente focado pelo tipo penal é a disci-plina militar, que não estará abalada com a prática da conduta descrita por um civil. Diferente-mente de alguns crimes deste capítulo, como já vimos e veremos adiante, não se busca a tutela da autoridade militar ou da disciplina por meio da conduta de militares, o que poderia levar à sujeição ativa por civil.

Nesse sentido, adequadas as palavras de Célio Lobão, que sustenta: “Embora a condecoração militar possa ser concedida a civil, evidentemente, este não se inclui como agente do delito, porquanto a lei penal tutela a disciplina militar, à qual o civil não se encontra subordinado”.

• Elementos objetivos: despojar-se é retirar de si, despir-se. Naturalmente, o tipo exige que a conduta do militar seja direcionada a seu uniforme, a seu distintivo, etc., não comportan-do a possibilidade de um terceiro praticar o ato em um militar. Dessa forma, não haverá o crime se um militar arrancar, por menosprezo, o distintivo de Unidade de um outro militar, atirando-o ao solo. Poderá o fato ser subsumido em outro tipo penal, por exemplo, o de-lito de violência contra superior, já estudado, ou de ofensa aviltante a inferior (art. 176 do CPM).

Exige o tipo, no entanto, que esse despojamento ocorra por menosprezo ou vilipêndio.

Menosprezo é a falta de estima, de apreço, o desdém para com o uniforme, a condecoração, a insígnia ou o distintivo.

Vilipêndio é o ato de tornar o uniforme, a condecoração, a insígnia ou o distintivo algo vil, re-baixado, indigno.

Uniforme é o conjunto de peças de vestimenta que compõem a identidade visual de uma força militar. O conjunto de peças pode variar de instituição para instituição e, dentro de uma mesma instituição, pode variar de acordo com o órgão ou a ocasião.

Condecorações são distinções honoríficas ou recompensas por algum serviço prestado ou ato praticado, com que se agracia alguém, a exemplo das medalhas. Podem ser conferidas aos mili-tares e aos civis em reconhecimento à prática de atos de extrema relevância para a organização militar.

Insígnia, para o tipo em estudo, é o símbolo que representa o posto ou a graduação do militar, bem como a arma ou o serviço a que está vinculado (quadros de saúde, combatente, auxiliar, especialista, arma de artilharia, etc.).

Distintivo, também na compreensão do tipo em estudo, é o símbolo que representa curso fre-quentado pelo militar, a unidade em que ele está lotado, a função que ocupa (como os alama-res), etc.

• Elemento subjetivo: assim como no delito anterior, só admite o dolo, porém direcionado ao menosprezo ou ao vilipêndio do uniforme, da condecoração, da insígnia ou do distinti-vo. Há, portanto, um elemento subjetivo específico do tipo penal a ser preenchido (antigo dolo específico).

• Consumação: o delito se consuma quando o autor arranca, por menosprezo (desdém, falta de consideração, falta de estima) ou por vilipêndio (repulsa, asco, indignidade), no todo ou em parte, uniforme, condecoração militar, insígnia ou distintivo que ele próprio ostenta.

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Na modalidade qualificada, como já exposto, exige-se que haja a apreensão do fato pela tropa ou pelo público. Note que essa exigência se assemelha ao que sustentamos no desrespeito a superior (art. 160) e no desrespeito a símbolo nacional (art. 161).

• Tentativa: é possível somente quando o autor anuncia sua intenção, tenta despojar-se, mas é impedido por terceiro.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado por militar, da ativa ou inativo, para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, devem-se verificar o inciso I, para os militares da ativa, ou o inciso III, para os inativos, ambos do art. 9º do CPM, que trarão ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

5. DA INSUBORDINAÇÃO

5.1. Recusa de obediência

• Tipo legal

Art. 163. Recusar obedecer a ordem do superior sobre assunto ou matéria de serviço, ou relativa-mente a dever imposto em lei, regulamento ou instrução:

Pena – detenção, de um a dois anos, se o fato não constitui crime mais grave.

• Objetividade jurídica: inserida ainda no mesmo título, o objeto jurídico continua sendo a autoridade militar (traduzida no descumprimento da ordem do superior), bem como a dis-ciplina militar (perturbada por esse descumprimento).

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o inferior hierárquico ou funcional (este por compreen-são do art. 24 do CPM), o que restringe o cometimento do delito ao militar, federal ou dos Estados.

Aqui, também, a exemplo do art. 157 do CPM, não se utilizou no tipo penal a expressão “mili-tar”, mas sim “superior”, significando que o delito pode ser perpetrado por militares da ativa ou inativos, desde que contra um superior.

• Elementos objetivos: inicialmente, cabe uma observação acerca do termo “insubordina-ção”, o qual ecoa nas casernas como sinônimo de recusa de obediência e, na definição mais simplista, representa “o motim de um só”, enquanto, ao revés, diz-se que o motim é a “in-subordinação coletiva”.

Atualmente, o nosso o Código Penal Militar entendeu a insubordinação como gênero do qual a recusa de obediência (art. 163), a oposição à ordem de sentinela (art. 164), a reunião ilícita (art. 165) e a publicação ou crítica indevida (art. 166) são espécies. Portanto, a priori, não há o crime de insubordinação, mas os crimes de insubordinação.

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Partindo agora para a análise do tipo penal, o núcleo da conduta é recusar, negar acatamento, obediência à ordem superior, o que pode materializar-se por uma conduta omissiva (simples-mente permanecer inerte sem acatar o que lhe foi determinado) ou comissiva (agir de forma contrária ao determinado, fazer quando o superior manda não fazer).

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de recusar obediência ao superior, afrontando a autoridade e disciplina militares.

A excludente de dolo prevista no inciso I do art. 47 também é aplicável ao tipo em estudo, ou seja, se o subordinado ignorar a qualidade de superior do emitente da ordem não haverá dolo de recusa de obediência. Exemplificativamente, pode-se citar o primeiro-tenente PM, Coman-dante de Pelotão que, ignorando que seu par, outro primeiro-tenente, está na função de Co-mandante de Companhia (de sua Companhia), recusa-se a cumprir a ordem por este emitida.

Também é possível que a excludente de dolo do inciso II do art. 47 seja aplicada nesse tipo estudado. Assim, o militar que descumpre ordem emitida por superior, verbalizada com impro-périos, não estará cometendo o delito, por falta do elemento subjetivo (ex.: “vá fazer a ronda, seu lixo!”).

• Consumação: o delito se consuma quando o autor recusa obediência à ordem, seja por ação, seja por omissão, contudo sempre acompanhado de afronta à autoridade que deter-minou ou que está fazendo cumprir a ordem, bem como afronta à disciplina.

• Tentativa: não é possível, em razão de o crime ser unissubsistente.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares, da ativa ou em inatividade (exceto os da reserva não remunerada), para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, devem-se verificar o inciso I ou o inciso III, ambos do art. 9º do CPM, conforme o caso, que trarão ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

5.2. Oposição a ordem de sentinela

• Tipo legal

Art. 164. Opor-se às ordens da sentinela:

Pena – detenção, de seis meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.

• Objetividade jurídica: tutela-se aqui a autoridade militar, personificada no ordenador da ordem transmitida pela sentinela. A disciplina é maculada em face da perturbação à regu-laridade da Instituição promovida pela oposição.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo poderá ser o militar, federal ou dos Estados, bem como qualquer civil, este somente na seara federal, em vista da limitação constitucional das justi-ças castrenses estaduais.

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Interessante notar que militar de qualquer posto ou graduação, ainda que superior hierárquico do militar na função de sentinela, poderá figurar no polo ativo perpetrando o delito. Assim, por exemplo, seria possível um coronel PM ser sujeito ativo ao se opor à ordem de uma sentinela, soldado PM.

O sujeito passivo, titular do bem jurídico aviltado, é a própria Instituição Militar, podendo ser apontada como vítima secundária (ofendido) a sentinela e até o ordenador da ordem retrans-mitida por aquela.

• Elementos objetivos: o núcleo da conduta é “opor”, obstar, contrariar, interromper, impe-dir.

O alvo da oposição é a ordem da sentinela, cuja definição já vimos no estudo do art. 158 do CPM, cabendo ratificar que se cultua no meio militar, por força de regulamentos e mesmo das previsões penais militares, como a ora estudada, a inviolabilidade da sentinela.

A oposição à ordem pode dar-se por palavras, por gestos, por comportamento comissivo ou omissivo, que permitam a qualquer um entender que o autor não se curvará à determinação recebida.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de se opor.

Obviamente, ausente a intenção de afronta à autoridade militar, não haverá tipicidade subjeti-va e, por consequência, não haverá o delito. Como exemplo, citemos o caso em que um militar, alertado de que naquele local é proibido estacionar, para, momentaneamente, seu veículo para interceder junto ao oficial de dia, para que, em seu caso, abra uma exceção.

Também é possível, nesse delito, a exclusão do dolo prevista no inciso II do art. 47. Assim, o militar que se opõe à ordem de sentinela verbalizada com impropérios não estará cometendo o delito, por falta do elemento subjetivo (ex.: “É proibido estacionar aqui, seu porcaria!”).

• Consumação: o delito se consuma quando o autor se opõe, seja da forma que for, à ordem da sentinela.

• Tentativa: não é possível, por ser crime unissubsistente.

• Crime impropriamente militar.

• Tipicidade indireta: no caso de prática por militares da ativa, para se ter a completa com-preensão da tipicidade desse delito, deve-se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse tipo penal, basta que sejam encontrados os elementos grafados na Parte Especial.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, nesse caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

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5.3. Reunião ilícita

• Tipo legal

Art. 165. Promover a reunião de militares, ou nela tomar parte, para discussão de ato de superior ou assunto atinente à disciplina militar:

Pena – detenção, de seis meses a um ano a quem promove a reunião; de dois a seis meses a quem dela participa, se o fato não constitui crime mais grave.

• Objetividade jurídica: o bem jurídico tutelado é a disciplina militar; acresça-se a autorida-de militar, se a discussão versar sobre ordem de superior.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o militar, federal ou dos Estados, bem como, apenas nas modalidades de promoção da reunião ou de tomar parte para discussão de assunto atinen-te à disciplina, o civil, porém, nesse caso, somente se for no âmbito federal.

Entendemos, apesar de ilustres posicionamentos contrários, que o civil pode promover e ainda tomar parte da reunião que discute assuntos próprios da disciplina da caserna, embora, por uma análise superficial, possamos ser levados a crer que o assunto é totalmente estranho aos interesses dos particulares (civis).

Ocorre que, não raramente, deve-se advertir, percebemos civis embrenhados nas questões mi-litares.

• Elementos objetivos: antes de passarmos ao estudo dos elementos objetivos do tipo, pe-dimos vênia para firmar nossa posição pela constitucionalidade do tipo estudado, de sorte que foi ele recepcionado pela nova ordem constitucional, desde que com a interpretação adequada.

Ao enumerar os direitos e deveres individuais e coletivos, no Capítulo I, especificamente no inciso XVI do art. 5º, a Lei Maior garantiu a todos o direito de reunião pacífica, nos seguintes termos: “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, inde-pendentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convo-cada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”.

Sacramenta-se, portanto, o direito de reunião como um direito individual e ao mesmo tempo uma garantia coletiva, “uma vez que consiste tanto na possibilidade de determinados agrupa-mentos de pessoas reunirem-se para livre manifestação de seus pensamentos, quanto na livre opção do indivíduo participar ou não dessa reunião”.

Como bem sabemos, no entanto, nenhum direito grafado no Texto Maior possui caráter abso-luto. Nesse sentido, devemos entender que os “direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no art. 5º da Constituição Federal, não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito”.

O tipo penal, contudo, da forma como está grafado, permite a interpretação de que toda e qualquer reunião, para discutir ato de superior ou para discutir assunto atinente à disciplina, constituir-se-ia em reunião direcionada a um fim ilícito, o que, absurdamente, abrangeria tam-bém a discussão elogiosa do ato de superior ou de assunto afeto à disciplina. Um grupo de

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militares que se reunisse para elogiar a ordem emitida por um superior, ou para elogiar a nova postura disciplinar de uma Corporação, estaria, em tese, em prática do delito.

Aqui, no entanto, pensamos que deve haver a interpretação conforme o sistema do Código Penal Militar e da própria Constituição Federal, no sentido de restringir o elemento típico dis-cussão ao entendimento de que somente haverá o delito se a discussão significar afronta à disciplina ou à autoridade, o que só se alcança pela discussão que desprestigie, critique negati-vamente os assuntos referidos no tipo.

Pode-se chegar a essa compreensão, primeiramente, pela já consignada objetividade jurídica, significando que o escopo protetor do tipo são a disciplina e a autoridade. Ora, se a reunião se propõe a elogiar, não há afetação dos bens jurídicos protegidos, significando que não há como falar no cometimento do crime estudado.

• Os núcleos do tipo são “promover” e “tomar parte”.

Promover significa organizar, acionar, convocar ou mobilizar outras pessoas, tornando a reunião real para, no caso do tipo, discutir os assuntos grafados (ato de superior ou assunto atinente à disciplina). Essa compreensão afasta o delito se houver o convite recusado pelo convidado, porquanto a reunião não foi promovida.

Tomar parte significa participar, estar presente de forma engajada.

A reunião se configurará, em face da ausência de disposição em sentido contrário, com a parti-cipação de, no mínimo, dois militares.

Ato de superior deve ser compreendido como qualquer atitude, no bojo das relações afetas ao serviço, que contenha decisão, deliberação, opinião, etc., podendo ser esse ato praticado ges-tualmente, por escrito, por palavras ou outras formas.

Além do ato de superior, a reunião também pode versar sobre assunto atinente à disciplina. Essa expressão é muito ampla, mas é certo que o cerne da questão continua sendo o choque, o desrespeito, a afronta dos mesmos bens por meio daquela discussão.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de promo-ver a reunião ou dela tomar parte com um fim específico: discutir ato de superior ou assun-to afeto à disciplina. Há, portanto, uma finalidade específica, configurando-se um elemento subjetivo específico do tipo penal (antigo dolo específico).

Caso o militar seja chamado à reunião e, sem conhecer os seus motivos, lá compareça, não po-derá ser incriminado até o momento em que se anuncie o que se pretende com a reunião, isso se deliberar pela permanência e por tomar parte na discussão. Até esse momento, falta-lhe o dolo de afrontar os bens jurídicos tutelados e, portanto, não há como falar em crime.

• Consumação: o delito se consuma quando a reunião acontece, pois, até então, não há como falar em “promover”, já que não existiu, nem em “tomar parte”, pelo mesmo motivo.

Não se exige, no entanto, como já ressaltamos, que ocorra a efetiva discussão dos assuntos grafados no tipo.

• Tentativa: não cabe em nenhuma das previsões, por se configurar delito unissubsistente.

• Crime impropriamente militar.

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• Tipicidade indireta: no caso de prática por militares da ativa, para se ter a completa com-preensão da tipicidade desse delito, deve-se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse tipo penal, basta que sejam encontrados os elementos grafados na Parte Especial.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, nesse caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

5.4. Publicação ou crítica indevida

• Tipo legal

Art. 166. Publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar pu-blicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Governo:

Pena – detenção, de dois meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.

• Objetividade jurídica: assim como no delito anterior, o bem jurídico protegido é a discipli-na militar perturbada pela afronta da publicação ou da crítica; entretanto, se o alvo da con-duta for ato de superior, teremos também o ferimento à autoridade de quem o praticou.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o militar (federal ou estadual), que deve ser compre-endido, nos termos do art. 22 do CPM, como o militar em situação de atividade. O militar inativo e o civil podem perpetrar esse delito se em concurso com um militar da ativa, quan-do a circunstância pessoal militar, que é elementar do tipo, comunica-se aos consortes (art. 53, § 1º, Segunda Parte, do CPM). O militar inativo, ademais, poderá perpetrar esse delito se estiver sendo empregado na administração militar, conforme expõe o art. 12 do Código Castrense.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar, que se vê lesada em sua disciplina. Ademais, na forma de crítica de ato de superior, o praticante do ato é atingido pela conduta nuclear, sendo, portanto, sujeito passivo mediato.

• Elementos objetivos: as condutas nucleares são publicar e criticar.

Publicar é tornar público, levar a conhecimento, o que pode ser de viva voz, por escrito, direta-mente ou por qualquer outro meio de comunicação, como televisão, jornal, e-mail, etc.

Irrelevante, para o crime sob exame, se o público que poderia ser alcançado pelo ato de publi-cação é composto de civis (público externo) ou de militares (público interno).

A publicação, ademais, para ser delituosa, pressupõe a ausência de licença, de autorização de autoridade competente, reconhecendo-se, aqui, um elemento normativo do tipo, em que o aplicador do Direito Penal Militar deverá investigar muito bem tal elemento e, somente se con-firmá-lo, concluir pela perfeita subsunção.

O objeto da publicação é o ato ou documento oficial.

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A segunda possibilidade é a de criticar publicamente. Faz-se necessário, nesse ponto, a mesma advertência feita quando do estudo do tipo anterior. Com efeito, tal qual a discussão vista ante-riormente, a crítica pode comportar conteúdo positivo ou negativo. Por óbvio, a crítica positiva não ameaçará os bens tutelados e, por consequência, não se bastará ao preenchimento do tipo penal estudado.

A crítica, para ser delituosa, recairá sobre três objetos, a saber: a) o ato de superior, b) o assun-to atinente à disciplina e c) a resolução do governo.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a vontade livre e consciente de praticar as condutas descritas.

Caso o agente publique o ato ou documento, por autorização de pessoa que pense ser compe-tente para tanto, sem que de fato o seja, haverá hipótese de erro de fato que afastará o dolo e, se plenamente escusável, isentará o agente de pena (art. 36 do CPM), sem prejuízo de respon-sabilização da pessoa que, indevidamente, autorizou e provocou o erro (art. 36, § 2º, do CPM).

• Consumação: o delito se consuma quando ocorre a publicação do ato ou documento em questão, sendo indiferente para o tipo estudado que alguém tenha acesso à publicação; basta que, potencialmente, possa ela chegar ao conhecimento de alguém, configurando--se, pois, em crime de perigo abstrato, o que também leva à conclusão de que não se exige para a configuração do delito que a veiculação da informação lese efetivamente a disciplina ou a autoridade militares; é suficiente a simples conduta, sendo presumido o risco de lesão.

Na modalidade de se fazer crítica, o crime se consuma com a externalização do pensamento crítico, desde que publicamente, exigindo-se, porém, nessa modalidade, que pessoas apreen-dam as críticas publicadas (crime de perigo concreto). O advérbio “publicamente” é sinônimo da expressão “em público”, equiparando a compreensão desse artigo àquela consignada nos comentários à consumação da forma majorada do delito de despojamento desprezível. Dife-rente seria se a norma consignasse a expressão “em local público”, quando a referência ao lo-cal, e não à assistência pelo modo como se pratica o ato, levaria à conclusão de que o risco seria presumido, bastando a prática da conduta no local indicado.

• Tentativa: é admissível nos casos em que se tomam todas as providências para efetivar a publicação e esta acaba por não acontecer por fatores alheios à vontade do autor. No caso específico da crítica, é inadmissível por se tratar de modalidade unissubsistente.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade desse crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

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6. DA USURPAÇÃO E DO EXCESSO OU ABUSO DE AUTORIDADE

6.1. Assunção de comando sem ordem ou autorização

• Tipo legal

Art. 167. Assumir o militar, sem ordem ou autorização, salvo se em grave emergência, qualquer co-mando, ou a direção de estabelecimento militar:

Pena – reclusão, de dois a quatro anos, se o fato não constitui crime mais grave.

• Objetividade jurídica: continua sendo a autoridade militar (do cargo indevidamente ocu-pado), bem como a disciplina militar, pelo fato de alguém se investir e tentar impor autori-dade que não possui.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o militar (federal ou estadual), que deve ser compreen-dido, nos termos do art. 22 do CPM, como o militar em situação de atividade. Em regra, o delito seria cometido apenas por Oficiais, que são formados para o exercício da função de comando. No entanto, como o delito pressupõe uma assunção ilegal, embora raro, Praças também poderiam perpetrá-lo.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: aqui, o militar, seja de que esfera for, assume comando (designação dada a Unidades operacionais) ou a direção (designação dada a Unidades administrativas) de estabelecimento militar. A abrangência do tipo, portanto, chega até o nível de Unidade, operacional ou administrativa, afastando-se a possibilidade de subsunção de uma assun-ção ilegal de subunidade incorporada a uma Unidade, de um Pelotão ou de um Grupo.

Assumir o comando ou a direção implica a prática de ato, administrativo ou operacional, exclu-sivo do cargo que está sendo usurpado. Não basta que o militar ocupe fisicamente a posição de comandante e que pratique atos irrelevantes, não decisivos aos desígnios do comando. Como exemplo, não teríamos o delito no simples ato de um tenente sentar-se na cadeira do coman-dante e determinar meras ações irrelevantes à condução da Unidade, como para que o soldado lhe traga um café, um copo d’água etc.

Afasta-se a tipicidade, por óbvio, se a assunção for autorizada, sendo aqui reconhecido um elemento normativo do tipo a ser investigado pelo operador do Direito Penal Militar. Em ou-tros termos, o tipo transmite a ideia de que a assunção de função de comando somente pode decorrer de ordem (um superior determina que alguém assuma o comando ou direção da Uni-dade – iniciativa do superior) ou de autorização (o subordinado pleiteia determinado comando ou direção e seu pedido é aceito pelo superior – iniciativa do subordinado). Para a figura típica, portanto, o autor deve usar essa assunção indevida como forma de afrontar os bens jurídicos tutelados, uma vez que não recebeu determinação nem foi autorizado a assumir a função de comando.

Também se afasta a tipicidade pela verificação de uma situação emergencial que exija a assun-ção sem autorização. Não se pode compreender qualquer emergência, mas somente aquela que importe na exigência de que alguém assuma o comando que não lhe é próprio. Seria o caso, por exemplo, do major que assumisse momentaneamente Grupo de Artilharia, em um

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exercício prático, em razão de o comandante efetivo ter-se ferido durante a manobra. Exige-se, pois, que a conduta seja praticada em situação de normalidade.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de praticar atos oficiais no exercício de cargo de que não está incumbido nem autorizado.

Caso o agente pense que está no desempenho da função legalmente e, de fato, não esteja, o dolo será afastado, verificando-se o erro de fato essencial, que isentará o agente de pena se escusável sua conduta (art. 36 do CPM).

O animus jocandi, evidentemente, também exclui o dolo, pois não há a intenção de ofender, nem à autoridade nem à disciplina. Assim, o militar que, desejando pregar uma peça no colega, finge ter assumido o comando de um estabelecimento militar, não terá sua conduta subsumida pelo tipo, pela falta de elemento subjetivo.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor determinar a prática do ato administra-tivo ou operacional próprio de Comandante ou Diretor, não sendo necessário que ele se efetive.

• Tentativa: não é possível, pois, mesmo que a primeira ordem daquele que assumiu indevi-damente o comando fosse interceptada antes de seu cumprimento, o momento consuma-tivo já se teria operado, quando da emissão da ordem ao destinatário, independentemente de ela alcançar ou não seu objetivo.

• Crime propriamente militar

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

6.2. Conservação ilegal de comando

• Tipo legal

Art. 168. Conservar comando ou função legitimamente assumida, depois de receber ordem de seu superior para deixá-los ou transmiti-los a outrem:

Pena – detenção, de um a três anos.

• Objetividade jurídica: a objetividade jurídica continua sendo a autoridade militar (do cargo indevidamente ocupado), bem como a disciplina militar pelo fato de alguém se investir e tentar impor autoridade que não possui.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o militar (federal ou estadual), desde que em serviço ativo.

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Deve-se reparar que, embora o tipo não grafe expressamente a palavra “militar”, utiliza-se da expressão “ordem de seu superior”, o que exclui a possibilidade de o civil cometer, propriamen-te, este delito.

Da mesma forma, o fato de referir-se à assunção de comando ou de função afasta a possibili-dade de o inativo, exceto se equiparado a militar da ativa (art. 12 do CPM), perpetrar o delito.

O militar inativo e o civil podem praticar este delito se em concurso com um militar da ativa, quando a circunstância pessoal de ser militar da ativa, exigida para a perpetração do delito, co-munica-se aos consortes (art. 53, § 1º, segunda parte, CPM). No concurso, no entanto, somente será possível a participação, por tratar-se de crime de mão própria.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: na disposição em estudo, a única diferença que se aponta em relação ao delito anterior é que o autor já está no comando ou na função quando é afastado por ordem de autoridade competente, seja por questão administrativa ou operacional, discipli-nar ou estratégica. Indiferente a isso, afrontando os bens jurídicos em foco, ele não desocu-pa o comando ou a função e continua a exercitá-la, praticando atos exclusivos dela fora da vigência de seu exercício ou se negando expressamente a deixá-la.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de praticar atos oficiais no exercício de cargo de que não está mais incumbido, nem autorizado. Caso o militar não conheça a determinação superior, obviamente afastar-se-á o dolo, inexistindo o delito.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor determinar a prática do ato administra-tivo ou operacional próprio de comandante, ou de outra função, não sendo necessário que ele se efetive.

• Tentativa: possível somente no caso de a determinação ter sido encaminhada por escrito e interceptada por circunstâncias alheias à vontade do autor, sem ter chegado a quem de direito.

• Crime propriamente militar

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

6.3. Operação militar sem ordem superior

• Tipo legal

Art. 169. Determinar o comandante, sem ordem superior e fora dos casos em que essa se dispensa, movimento de tropa ou ação militar:

Pena – reclusão, de três a cinco anos.

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Forma qualificada

Parágrafo único. Se o movimento da tropa ou ação militar é em território estrangeiro ou contra força, navio ou aeronave de país estrangeiro:

Pena – reclusão, de quatro a oito anos, se o fato não constitui crime mais grave.

• Objetividade jurídica: atinge, preliminarmente, a disciplina militar, pois a realização de operação militar sem ordem ou autorização perturba a regularidade da Instituição. Ine-gavelmente, a conduta descrita afronta também a autoridade sob a qual está o autor da operação indevida, uma vez que ele a promoveu à socapa daquele.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o comandante; portanto, não se exige apenas a qualida-de de militar, mas ainda que ele esteja na função de comandante.

Deve-se reparar que, embora o tipo não grafe expressamente a palavra “militar”, utiliza o ter-mo “comandante”, excluindo, assim, a sujeição ativa de civis e de inativos, exceto, neste caso, se empregados na Administração Militar e designados para a função de comandante.

Militar inativo e civil podem perpetrar este delito se em concurso com um militar da ativa, quando a circunstância pessoal “comandante”, que é elementar do tipo, comunica-se aos con-sortes (art. 53, § 1º, segunda parte, do CPM). No concurso, no entanto, somente será possível a participação, por tratar-se de crime de mão própria.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: o núcleo do tipo penal militar em questão é “determinar”, “mandar”, “ordenar”. O modo pelo qual se determina é livre, podendo ser de forma direta ou por ter-ceiro, verbalmente ou por qualquer outro meio (carta, bilhete, e-mail etc.).

Essa imposição é feita pelo Comandante, seja Oficial ou Praça, que esteja na função de direção de estabelecimento militar ou qualquer fração de tropa, até mesmo um grupo.

“Note-se que o tipo em estudo diferencia-se dos anteriores a ele similares pelo fato de que, aqui, o desempenho da função é regular, não tendo nem a assunção nem a prorrogação ilegal.

A ilegalidade está na ordem emitida, cujo objeto é o movimento de tropa ou ação militar de-sautorizados.

Movimento de tropa implica tão somente o deslocamento de um ponto a “outro, sem que haja, propriamente, uma estratégia em si.

Ação militar, por sua vez, é o emprego da tropa com execução e fim definidos, ou seja, em um contexto estratégico planejado.

Excluir-se-á a tipicidade do fato, por expressa previsão, se o movimento ou a ação de tropa se derem em casos de dispensa de ordem superior. Trata-se aqui dos casos em que a movimenta-ção ou ação fazem parte das atividades próprias daquela tropa e, mesmo que não corriqueiras, compõem o rol de atribuições legais de que ela foi investida, isso porque a resposta deve ser emergencial e pronta. Cite-se, como exemplo, a fuga em massa de um estabelecimento prisio-nal que está situado ao lado de um quartel da Polícia de Choque (Militar); por óbvio que a tropa ali em prontidão irá operar de imediato, no sentido de conter a fuga em massa, independente-mente de qualquer ordem, mesmo porque sua missão constitucional de preservação da ordem pública assim o exige.

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O delito torna-se qualificado se for perpetrado em território estrangeiro, o que é de fácil as-similação, pois a repercussão da afronta à autoridade e à disciplina é sensivelmente maior e atinge o próprio país, através de seus órgãos de segurança, sem falar da repercussão da própria movimentação ou da ação de uma tropa militar, sem ordem, em território alheio. A propósito da compreensão acerca do que se entende por território estrangeiro, remetemos o leitor aos comentários ao art. 138 do CPM, que definem o território nacional, permitindo, por raciocínio inverso, o entendimento desse elemento típico.

Igualmente qualificados, decorrentes do mesmo motivo, serão o movimento ou a ação militar perpetrados, mesmo que em território nacional, contra força estrangeira, ou ainda navio ou ae-ronave estrangeira. Como força estrangeira entenda-se a tropa pertencente ao país estrangei-ro. Navio, conforme expõe o § 3º do art. 7º do próprio CPM, é “toda embarcação sob comando militar”. Aeronave deve ser compreendida como todo e qualquer aparelho, com a função de transporte pessoal ou material, capaz de se sustentar e se conduzir no ar.

Por fim, cumpre anotar que o delito em estudo é subsidiário, especialmente a forma qualifica-da, em que a subsidiariedade é expressa, conforme indica o preceito secundário.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de determi-nar a movimentação de tropa ou a ação militar indevida.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor der a ordem de movimentação da tropa ou da ação militar, não sendo necessário que a determinação seja cumprida.

• Tentativa: não é possível na forma oral, mas o é de modo escrito, em que, por circunstân-cias alheias à vontade do agente, a determinação não chega a atingir seu destino.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

6.4. Ordem arbitrária de invasão

• Tipo legal

Art. 170. Ordenar, arbitrariamente, o comandante de força, navio, aeronave ou engenho de guerra motomecanizado a entrada de comandados seus em águas ou território estrangeiro, ou sobrevoá--los:

Pena – suspensão do exercício do posto, de um a três anos, ou reforma.

• Objetividade jurídica: os bens jurídicos focados pela norma em estudo também são a disci-plina militar e a autoridade militar.

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• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o Comandante de força, navio, aeronave ou engenho de guerra motomecanizado, porquanto não se exige apenas a qualidade de militar, mas ainda que esse militar esteja na função de Comandante das frações que o tipo consagra.

Embora o tipo também não grafe expressamente a palavra “militar”, a utilização do termo “Co-mandante” exclui a possibilidade de sujeição ativa por civis e inativos, exceto, neste caso, se empregados na Administração Militar e designados para a função de Comandante.

Ademais, focando a análise no preceito secundário, exige-se que o Comandante de força, navio, aeronave ou engenho de guerra motomecanizado seja Oficial, sob pena de não haver subsun-ção para o fato se o autor for Praça ou Praça Especial. Com efeito, embora o preceito primário não deixe tal situação clara, a pena do delito, ao ser fixada em suspensão do exercício do posto, de um a três anos, ou reforma, atrela o cometimento do delito aos Oficiais, pois somente eles possuem posto.

O militar que seja Praça (especial ou não), o inativo ou mesmo o civil [art. 1.201, CC] podem perpetrar este delito se em concurso com um militar da ativa, quando a circunstância pesso-al de ser “comandante”, que é elementar do tipo, comunica-se aos consortes (art. 53, § 1o, Segunda Parte, do CPM). No concurso, no entanto, somente será possível a participação, por tratar-se de crime de mão própria.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: o núcleo da conduta é ordenar, mandar, determinar, assim como no delito anterior. O modo pelo qual se determina é livre, podendo ser de forma direta ou por terceiro, oral ou por qualquer outro meio (carta, bilhete, e-mail etc.).

Nesta figura delitiva, o militar, comandante de qualquer fração de tropa, impõe a seus coman-dados a entrada em território, água ou espaço aéreo estrangeiro. O autor, portanto, está no co-mando de força terrestre, navio, aeronave ou ainda engenho de guerra motomecanizado, que já comentamos acima, e impõe tal determinação.

Força terrestre compreende o corpo de tropa formado por militares. Navio, conforme expõe o § 3º do art. 7º do próprio CPM, é “toda embarcação sob comando militar”. Aeronave deve ser compreendida como todo e qualquer aparelho, com a função de transporte pessoal ou mate-rial, capaz de se sustentar e se conduzir no ar. Por fim, engenho de guerra motomecanizado é a máquina, aparelho ou mecanismo com emprego bélico, destinado a potencializar a capacida-de de utilização em terra de uma força militar, seja pelo aumento da velocidade útil, seja pelo aumento do poder de fogo, ou mesmo com incremento de ambos, a exemplo dos carros de combate.

A propósito do que se entende por águas ou território estrangeiro, mais uma vez remetemos o leitor aos comentários ao art. 138, que definem o território nacional, permitindo, por raciocínio inverso, o entendimento deste elemento típico.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de deter-minar a invasão de espaço terrestre, aéreo ou marinho estrangeiro; portanto, se por culpa (negligência) o autor determina a operação de sua tropa em área que entendia ser nacional e na verdade não o era, não responderá pelo delito. Evidentemente, deve-se avaliar, no caso concreto, a possibilidade de ocorrência do dolo eventual, quando, então, presente o elemento subjetivo, o “delito ocorreria.

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• Consumação: o delito se consuma quando o autor dá a ordem para o ingresso em território estrangeiro, não sendo necessário que a determinação seja cumprida.

• Tentativa: não é possível na modalidade oral, mas o é na escrita.

• Crime propriamente militar.

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9o do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

6.5. Uso indevido por militar de uniforme, distintivo ou insígnia

• Tipo legal

Art. 171. Usar o militar ou assemelhado, indevidamente, uniforme, distintivo ou insígnia de posto ou graduação superior:

Pena – detenção, de seis meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.

• Objetividade jurídica: a disciplina militar é o alvo de proteção dessa previsão legal, pois a ordem é perturbada com a aparição pública de militar com indumentária que não lhe é pertinente. Como a peça indevida pertence a superior, há afronta, também, à autoridade do posto ou da graduação que está sendo violado, sendo ela, a autoridade militar, também objeto de proteção.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o militar (federal ou estadual), que deve ser compreen-dido, nos termos do art. 22 do CPM, como o militar em situação de atividade.

Afastamos, desde nossos comentários à Parte Geral, a possibilidade do cometimento de delito militar por assemelhado, por entendermos não mais existir essa figura no cenário jurídico.

Militar inativo e civil podem perpetrar este delito se em concurso com um militar da ativa, quando a circunstância pessoal “militar”, que é elementar do tipo, comunica-se aos consortes (art. 53, § 1º, Segunda Parte, do CPM). No concurso, no entanto, somente será possível a parti-cipação, por tratar-se de crime de mão própria.

O militar inativo, ademais, poderá perpetrar este delito se estiver sendo empregado na Admi-nistração Militar, conforme expõe o art. 12 do Código Castrense.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: o núcleo da conduta é “usar”, que significa “utilizar”, no caso unifor-me, distintivo ou insígnia de posto ou graduação superior.

Evidentemente, exige-se que a utilização seja em público, pois o uso de uniforme ou de suas peças e distintivos de forma velada, às escondidas, com o fim único de analisar-se em frente a um espelho, por exemplo, é mero desejo pueril e não afronta os valores tutelados. Ademais, ausente estará o elemento subjetivo exigido pelo tipo em estudo.

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O uso deve ser indevido, o que implica desconformidade com os regulamentos e ordens vigen-tes e está desabrigado pela autorização superior (p. ex.: autorização de uso para teatralização em um treinamento ou até mesmo para um evento de cunho artístico).

Quanto aos demais elementos típicos, o agente deve usar uniforme, distintivo ou insígnia de posto ou graduação superior.

Uniforme é o fardamento constituído pela roupa, cobertura, calçados, equipamentos e acessó-rios como cinto, meias, quepes, capacetes e outras peças que assim forem definidas em regu-lamento.

Distintivo é o símbolo sobreposto ao uniforme, indicativo de curso (brevê), da Unidade Militar (brasão), ou de função desempenhada pelo militar (p. ex., o alamar).

Insígnia é o símbolo também sobreposto ao uniforme, geralmente nas golas, ombreiras ou mangas de camisa, indicativo de quadro, arma, posto ou graduação.

Por essa compreensão, aquele que se utiliza de peças avulsas do uniforme não estará em práti-ca delitiva, resolvendo a questão apenas na esfera disciplinar. Com efeito, o crime visa tutelar a disciplina e a autoridade militares, exigindo que aquele que pratique a conduta nuclear esteja hábil a passar-se por superior.

A utilização dos elementos acima deve ser capaz de provocar o engodo, de levar à confusão, sem o que os bens tutelados estejam em risco. Não significa dizer, por outro lado, que o unifor-me deve estar completo e com todas as insígnias e distintivos para caracterização do delito, bas-tando a utilização de peça(s) que possa(m) levar à confusão – obviamente somada ao elemento subjetivo. Dessa forma, por exemplo, não está em prática delitiva, mas de simples transgressão disciplinar, aquele que sobrepõe ao seu casaco, não pertencente ao fardamento (casaco de couro, jeans etc), uma insígnia de oficial superior, quando detém o posto de primeiro-tenente.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente do autor de usar uniforme, distintivo ou insígnia de superior, capaz de provocar o engodo, não necessa-riamente praticando atos em que pretensamente se passe por superior.

O dolo está ausente; portanto inexiste o delito se o ato for praticado por brincadeira (animus jocandi), em peças teatrais, trotes etc. Caso a “brincadeira” ou a peça tenha sido autorizada, nada restará ao agente; porém, não havendo a autorização, a questão se resolverá na esfera administrativo-disciplinar, não havendo o porquê de se falar em crime, pela ausência do ele-mento subjetivo, mas em mera transgressão disciplinar.

Também não há elemento subjetivo, não prevalecendo, portanto o crime na conduta do aspi-rante a oficial que, em data de promoção, pensa ter sido sua promoção ao posto de segundo--tenente publicada em Diário Oficial, quando, em verdade, por qualquer motivo, a publicação não foi efetivada. Todavia, uma vez conhecendo a ausência de publicação e, ainda assim, in-sistindo na ostentação da insígnia do posto de segundo-tenente, estará, em tese, incorrendo neste delito.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor usa peça (própria de superior) a que não faz jus, independentemente de praticar ou não o ato de passar-se por superior; basta, como já suscitamos, a demonstração de que sua conduta era capaz de confundir os que com ele eventualmente interagissem, gerando, portanto, um risco à disciplina e à autorida-de militares (crime de perigo concreto).

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• Tentativa: não é possível em vista de ser crime unissubsistente.

• Crime propriamente militar

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

6.6. Uso indevido de uniforme, distintivo ou insígnia militar por qualquer pessoa

• Tipo legal

Art. 172. Usar, indevidamente, uniforme, distintivo ou insígnia militar a que não tenha direito:

Pena – detenção, até seis meses.

• Objetividade jurídica: o bem jurídico tutelado é a autoridade militar, que pode ser lesada diante do engodo criado pelo uso indevido de uniforme, distintivo ou insígnia. Também visa, o tipo, resguardar a disciplina militar afetada pelo uso indevido dessas peças por um militar.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é qualquer pessoa, civil ou militar (da ativa ou inativo).

No caso de sujeição ativa de um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso o uniforme (insígnia ou distintivo) utilizado seja das milícias estaduais, a tipificação seria buscada na legislação penal comum, especificamente na Lei de Contravenções Penais (Dec.-Lei nº 3.688, de 3-10-1941), art. 46.

O sujeito passivo, titular do bem jurídico aviltado, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: a descrição da conduta é idêntica à do delito anterior, diferindo ape-nas no fato de que, naquele, a conduta recai sobre uniforme, distintivo ou insígnia próprios de superior, enquanto nesta a utilização pode recair sobre qualquer uniforme, insígnia ou distintivo, excetuando-se, obviamente, aquele referente a um superior, quando haveria subsunção pelo tipo precedente. Assim, incorreria no delito o Oficial que, para afrontar a disciplina, vestisse uniforme com insígnias de sargento.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de usar in-devidamente o objeto.

Nesse sentido, se o militar possui a crença fiel de que faz jus ao uniforme, distintivo ou insígnia, o dolo não poderá ser reconhecido. Assim, por exemplo, aquele que crê que a mera habilitação em veículo automotor e o fato de ter sido escalado como motorista o permitem utilizar o brevê do curso de direção defensiva de veículos policiais, não cometerá o delito por ausência do ele-mento subjetivo.

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Também exclui o dolo a utilização indevida de fardamento por brincadeira (animus jocandi). Nessa linha, havendo a utilização por um civil de uniforme das Forças Armadas para frequentar um baile à fantasia, o fato não será típico por falta do elemento subjetivo. Obviamente, não sendo o fato típico, não há de se falar, como expusemos acima, em participação daquele que emprestou o uniforme ao civil.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor usa uniforme, distintivo ou insígnia a que não faz jus, independentemente de ele, se civil, praticar ou não ato, passando-se por militar ou, se militar, praticar ato especificamente respaldado por curso, estágio, classifica-ção em Unidade ou função, representados pelo distintivo ou insígnia, bastando, como no tipo anterior, a demonstração de que sua conduta era capaz de confundir os que com ele eventualmente interagissem, gerando, portanto, risco à disciplina e à autoridade militares (crime de perigo concreto).

• Tentativa: não é possível, em vista de ser delito unissubsistente.

• Crime impropriamente militar

• Tipicidade indireta: no caso da prática por militares da ativa, para se ter a completa com-preensão da tipicidade deste delito, deve-se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, neste caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

6.7. Abuso de requisição militar

• Tipo legal

Art. 173. Abusar do direito de requisição militar, excedendo os poderes conferidos ou recusando cumprir dever imposto em lei:

Pena – detenção, de um a dois anos.

• Objetividade jurídica: macula a autoridade militar, pois esta foi usada indevidamente e sua imagem sai atingida pelo mau exercício, assim como a disciplina militar, tendo em vista que esse desvio de comportamento perturba a regularidade necessária à Instituição Militar.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o militar (federal ou estadual), desde que em serviço ativo.

Deve-se reparar que, embora o tipo não grafe expressamente a palavra “militar”, ao utilizar a expressão “direito de requisição militar”, limita a sujeição ativa àquele que esteja desem-penhando função na Administração Militar que lhe confira a prerrogativa de, observadas as premissas legais e regulamentares, requisitar bens ou serviços de um particular, o que exclui a possibilidade de o civil cometer, propriamente, este delito.

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Da mesma forma, a expressão suso leva à impossibilidade de o inativo, exceto se equiparado a militar da ativa (art. 12 do CPM), perpetrar o delito, porquanto não possui ele função na Admi-nistração Militar que lhe confira a prerrogativa de requisitar.

Militar inativo e civil [1209] podem, por outro lado, perpetrar este delito se em concurso com um militar da ativa, quando a circunstância pessoal de ser militar da ativa, exigida para a confi-guração do delito, comunica-se aos consortes (art. 53, § 1º, segunda parte, do CPM).

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: a requisição (civil ou militar) é uma das formas de intervenção da Administração Pública sobre a propriedade particular e “pode apresentar-se sob diferentes modalidades, incidindo ora sobre bens, móveis ou imóveis, ora sobre serviços, identifican-do-se, às vezes, com a ocupação temporária e assemelhando-se, em outras, à desapropria-ção; é forma de limitação à propriedade privada e de intervenção no domínio econômico; justifica-se em tempo de paz ou de guerra”. É procedimento unilateral dotado de auto-executoriedade, o que significa que independe da concordância do particular afetado e de prévia autorização do Poder Judiciário. Exige-se, entretanto, a situação excepcional que justifique a urgência em requisitar, caracterizada por um iminente perigo público – isso quando a requisição recair sobre bens, nos termos do art. 5º, XXV, da Carta Magna, que dá amparo constitucional à requisição, postulando alguns autores que não se exige tal si-tuação (iminente perigo público) quando o objeto da requisição for serviços. Obviamente, aquele afetado pela requisição fará jus à indenização, podendo, em caso de negativa da Administração, buscar a tutela jurisdicional.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de praticar as condutas descritas.

Obviamente, se o agente desconhece os deveres e as formalidades impostos pelas normas afe-tas ao assunto, não há por que falar em dolo, afastando, por consequência, o delito.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor tira da esfera de vigilância do proprietá-rio a parcela ou a coisa de que não precisa, quando requisita o serviço ou quando se nega a cumprir a imposição de lei ou regulamento de lei, por exemplo, emitir o recibo daquilo que retirou de terceiro.

• Tentativa: seria possível no caso da requisição excessiva (de bens ou serviços), em que a notificação escrita, enviada pela autoridade e conduzida por interposta pessoa, fosse inter-ceptada antes de chegar ao seu destino.

• Crime propriamente militar

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime, deve-se verificar o in-ciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

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6.8. Rigor excessivo

• Tipo legal

Art. 174. Exceder a faculdade de punir o subordinado, fazendo-o com rigor não permitido, ou ofen-dendo-o por palavra, ato ou escrito:

Pena – suspensão do exercício do posto, por dois a seis meses, se o fato não constitui crime mais grave.

• Objetividade jurídica: tutela-se pelo tipo penal a autoridade militar daquele que exercita mal seu poder e perde ascendência sobre seus subordinados, assim como a disciplina mili-tar, atingida pela quebra da relação funcional sadia entre as partes.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o superior, hierárquico ou funcional (nos termos do art. 24 do CPM), exigindo-se ainda que ele tenha ascendência disciplinar que resulte em poder de punir um subordinado.

A utilização do termo “subordinado” exclui, de pronto, a sujeição ativa por civil, porquanto so-mente os militares possuem superiores e subordinados, segundo o exigido pelo Código Penal Militar.

Embora o tipo não use expressamente a palavra “militar”, há a presunção de que o sujeito ativo tem o poder de punir o subordinado, excluindo também da sujeição ativa a figura do militar que não pertença mais ao serviço ativo das instituições militares, porquanto não possuem eles poder disciplinar sobre outros militares. Obviamente, a exclusão do inativo não ocorrerá se ele estiver sendo empregado de forma regular na Administração Militar, quando poderá haver construção que lhe confira poder de punir a um subordinado.

Também, neste tipo penal, a análise do preceito secundário conduz à interpretação de que o superior capaz de praticar o delito há de ser oficial, não havendo subsunção para o fato se o au-tor for praça ou praça especial. Com efeito, embora o preceito primário não deixe tal situação clara, a pena do delito, ao ser fixada em suspensão do exercício do posto por dois a seis meses, atrela o cometimento do delito aos oficiais, já que somente eles possuem posto. Ademais, a previsão do delito alinha-se aos postulados trazidos pelos Regulamentos Disciplinares que, em sua totalidade, no Brasil, conferem o poder de punir apenas a oficiais, geralmente ocupantes de funções, no mínimo, de capitão.

• Elementos objetivos: o núcleo da conduta é “exceder”, que significa passar do limite legal, ultrapassar a possibilidade técnica trazida pela lei ou regulamento.

Como já esboçamos, em razão de o excesso se verificar no ato de punir, o autor deve ser neces-sariamente alguém que possua atribuição para punir seus subordinados no campo disciplinar, circunstância delimitada por lei ou regulamento fomentado por uma lei.

À guisa de exemplo, tomemos o Regulamento Disciplinar da Polícia Militar Paulista (Lei Comple-mentar nº 893, de 9-3-2001), que restringe essa possibilidade legal ao oficial de posto igual ou superior ao de capitão, ou àquele que, embora detentor de posto inferior, esteja em funções referentes aos postos de capitão a coronel. Assim, somente quem estiver na função de capitão ou de Ooficial de posto superior é que pode exceder no ato de punir seus subordinados.

Necessário esclarecer que a expressão “faculdade de punir o subordinado” deve ser tomada em uma acepção mais abrangente – o que não significará interpretação extensiva, mas com-

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preensão do significado trazido pela Lei –, incluindo não somente a primeira autoridade disci-plinar que impõe a sanção disciplinar, mas também aquela que, tomando por base uma puni-ção imposta, a agrava de forma exacerbada. Essa compreensão deve-se ao entendimento de que o ato de punir é, em sua quase totalidade, um ato administrativo complexo que exige, para ter seu termo, não só a imposição da sanção, mas, também, a anuência de uma autoridade superior que, nesse momento, poderá não concordar com a dosimetria e agravar a punição. Vá-rios são os detalhes que podem ser consignados acerca dos momentos do ato punitivo, o que seria interessante se nos detivéssemos nesta obra ao Direito Administrativo Disciplinar Militar, bastando ao nosso escopo que firmemos o entendimento de que o excesso criminoso poderá ocorrer não só por aquele que impõe o corretivo em fase inicial como ainda por aquele que, em segundo momento, agrava a sanção aplicada.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de atacar seu subordinado mediante a aplicação de punição excessiva ou ilegal.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor publica a punição indevida ou quando ofende seu subordinado por palavra ou ato, ou, ainda, quando lhe impõe o cumprimento do corretivo em local incompatível com a sobrevivência humana digna.

• Tentativa: é possível, na primeira modalidade, no caso de a infração ter sido praticada por escrito, enviada à publicação e interceptada por motivos alheios à vontade do acusado, ou ainda no caso de o rigor excessivo ter sido determinado, mas impedido no momento da execução.

• Crime propriamente militar

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares da ativa, especificamente os oficiais dotados de atribuição disciplinar para punir, para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime, deve-se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

6.9. Violência contra inferior

• Tipo legal

Art. 175. Praticar violência contra inferior:

Pena – detenção, de três meses a um ano.

Resultado mais grave

Parágrafo único. Se da violência resulta lesão corporal ou morte é também aplicada a pena do crime contra a pessoa, atendendo-se, quando for o caso, ao disposto no art. 159.

• Objetividade jurídica: o tipo penal em foco visa tutelar a autoridade que é lesada quando o superior pratica violência contra seu subordinado, uma vez que sua ascendência sobre ele e tantos outros que conhecerem o fato estará sensivelmente prejudicada depois desse evento. A disciplina igualmente será atingida com a conduta, pois a estética militar terá um de seus elos quebrados. Subsidiariamente, protege-se também a integridade física do ofendido.

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• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o superior hierárquico ou funcional (este por compre-ensão do art. 24 do CPM), o que restringe o cometimento do delito ao militar, federal ou dos Estados.

Não se utilizou o legislador da expressão “militar”, mas sim do termo “inferior”, significando que o delito pode ser perpetrado por militares da ativa ou inativos, desde que contra um infe-rior. Nessa construção, o militar inativo poderá perpetrar este delito, exceto na compreensão de superior funcional, porquanto não está ele, em inatividade, no desempenho de função, res-salva feita se estiver sendo empregado na Administração Militar, conforme expõe o art. 12 do Código Castrense. Deve-se, ademais, verificar que para o inativo, não equiparado a militar da ativa, cometer este delito, devem incidir também as circunstâncias do inciso III do art. 9º, já estudadas na Parte Geral.

Qualquer pessoa, à exceção, pode perpetrar este delito se em concurso com um militar supe-rior ao sujeito passivo, quando a circunstância pessoal “superior” (hierárquico ou funcional), que é implicitamente uma elementar do tipo, comunica-se aos consortes (art. 53, § 1º, Segun-da Parte, do CPM).

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar. Há o sujeito passivo mediato, personificado no inferior que sofreu a violência.

• Elementos objetivos: a conduta cinge-se à prática de violência contra inferior hierárquico ou funcional.

Já estudamos, por mais de uma ocasião, o significado para o CPM do termo violência, sendo possível afirmar que toda vez que a lei se utiliza dessa palavra quer significar a agressão de or-dem exclusivamente física. Portanto, nesta previsão, o superior hierárquico ataca fisicamente o seu subordinado, respondendo ele por este delito mesmo que a agressão não deixe qualquer vestígio.

Por outro bordo, caso resulte da agressão lesão corporal ou mesmo a morte do sujeito passivo mediato, teremos o cúmulo material das penas. Conforme já dispusemos ao comentar o resul-tado lesão corporal na violência contra superior (§ 3º do art. 157 do CPM), em verdade, a regra trazida pelo parágrafo único – que unifica a premissa tanto para a lesão corporal como para o resultado morte, o que não se verifica na violência contra superior, visto que o resultado morte qualifica o delito —, trata-se de uma regra que objetiva o concurso formal dos crimes de vio-lência contra inferior e o de lesão corporal ou de homicídio; porém, aqui também há uma regra própria, diversa daquela estipulada pelo art. 79 do CPM, impondo sempre o cúmulo material, ainda que se trate de espécies diversas, o que deflui da análise da palavra “também”, que indica soma, afastando-se, pois, a exasperação. É de notar que, se fôssemos aplicar a regra do art. 79 no crime de violência contra inferior que resultasse em morte, teríamos, para o primeiro fato, a pena de detenção e, para o segundo, ainda que homicídio simples, a pena de reclusão, portan-to, penas de espécies diversas que deveriam, pela regra do concurso de crimes, ser unificadas pela exasperação, e não pela simples soma.

Aproveitam-se também ao tipo penal militar em estudo os comentários feitos ao art. 159, uma vez que, por imposição do parágrafo único do art. 175, aquele dispositivo deve, quando for o caso, ser atendido. Como exemplo, temos o caso do superior que dá um soco em seu subordi-nado por uma discussão sobre questão qualquer, vindo este a cair ao solo, falecendo em razão de ter batido sua cabeça contra o meio-fio.

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Deve-se destacar, por fim, que o art. 42, do CPM, exclui o crime quando o “comandante de navio, aeronave ou praça de guerra, na iminência de perigo ou grave calamidade, compele os subalternos, por meios violentos, a executar serviços e manobras urgentes, para salvar a uni-dade ou vidas, ou evitar o desânimo, o terror, a desordem, a rendição, a revolta ou o saque”. A exclusão da antijuridicidade aqui está calcada na iminência de perigo ou grave calamidade.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de investir fisicamente contra o subordinado (inferior hierárquico ou funcional).

É importante frisar que, neste delito, a ação incriminada é a violência empregada contra o in-ferior, não importando o resultado, que pode somente qualificar o delito. Destarte, a condição de inferior deve ser conhecida pelo agente ou, de outra forma, não haverá conformação típica subjetiva, desconstituindo-se, esta infração, por ausência do elemento subjetivo (inciso I do art. 47 do CPM). Na verdade, à letra da lei penal militar, estaria afastada a própria tipicidade objetiva (“deixam de ser elementos constitutivos do crime”), mas preferimos entender que há a afetação do dolo.

O mesmo art. 47 do CPM possui outra causa excludente do elemento subjetivo, especificamen-te em seu inciso II, que dispõe não se configurar elementar do tipo “a qualidade de superior ou a de inferior, a de oficial de dia, de serviço ou de quarto, ou a de sentinela, vigia, ou plantão, quando a ação é praticada em repulsa a agressão”.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor atinge o subordinado fisicamente.

• Tentativa: é possível no caso de o autor investir fisicamente contra seu subordinado, sendo impedido por um terceiro.

• Crime propriamente militar

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares, da ativa ou em inatividade (exceto os da reserva não remunerada), para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime, deve-se verificar os incisos I ou III, ambos do art. 9º do CPM, conforme o caso, que trarão ao intérprete o entendimento de que, para a sub-sunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

6.10. Ofensa aviltante a inferior

• Tipo legal

Art. 176. Ofender inferior, mediante ato de violência que, por natureza ou pelo meio empregado, se considere aviltante:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto no parágrafo único do artigo anterior.

• Objetividade jurídica: assim como na violência contra inferior, o tipo penal protege a auto-ridade e a disciplina militares, bem como a integridade física do ofendido e sua honra.

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• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o superior hierárquico ou funcional (este por compre-ensão do art. 24 do CPM), o que restringe o cometimento do delito ao militar, federal ou dos Estados.

Aqui também não se utilizou o legislador da expressão “militar”, mas sim do termo “inferior”, significando que o delito pode ser perpetrado por militares da ativa ou inativos, desde que contra um inferior. Nessa construção, o militar inativo poderá perpetrar este delito, exceto na compreensão de superior funcional, porquanto não está ele, em inatividade, no desempenho de função, ressalva feita se estiver sendo empregado na Administração Militar, conforme expõe o art. 12 do Código Castrense. Deve-se, ademais, verificar que, para o inativo, não equiparado a militar da ativa, cometer este delito, devem incidir também as circunstâncias do inciso III do art. 9º, já estudadas na Parte Geral.

Qualquer pessoa, à exceção, pode perpetrar este delito se em concurso com um militar supe-rior ao sujeito passivo, quando a circunstância pessoal ´superior´” (hierárquico ou funcional), que é implicitamente uma elementar do tipo, comunica-se aos consortes (art. 53, § 1º, Segun-da Parte, do CPM)”.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar. Há o sujeito passivo mediato, personificado no inferior que sofreu a conduta delitiva.

• Elementos objetivos: a conduta em si é idêntica àquela tipificada no delito de violência contra inferior. Ocorre, todavia, que, aqui, o tipo de agressão é humilhante, afronta a honra do ofendido, inferioriza, desvaloriza, ataca a dignidade (atributos morais) e/ou o decoro (atributos físicos e intelectuais), além de lhe atingir a integridade física. São exemplos: ba-ter no rosto do inferior com luvas; com uma sandália de borracha na mão, bater nas náde-gas do inferior, colocando-o como se criança fosse; puxar as orelhas do subordinado; despir o subordinado diante de todos; imobilizar o subordinado para que outrem lhe cuspa no rosto; desferir golpe de rebenque com o intuito de humilhar o subordinado; dar um tapa no rosto do subordinado acompanhado de comentários e realizado de tal forma que dê a conotação de subjugo de um pelo outro; em síntese, são investidas físicas com objetivo moral.

É irrelevante o local dos fatos e se as partes estão ou não uniformizadas.

Deve-se ter em foco que os atos configuradores de ofensa aviltante são os mesmos caracte-rizadores da injúria real. Nesse sentido, pode-se firmar que a diferenciação entre os delitos repousa, inicialmente, na questão objetiva de haver um superior contra um inferior na ofensa aviltante, enquanto a injúria real não exige qualidades específicas dos sujeitos ativo e passivo. Ademais, outro ponto de diferenciação está no aspecto subjetivo da tipicidade, como abaixo aduziremos.

Por fim, no caso de advir lesão corporal ou morte, os parâmetros para a caracterização do deli-to com a consequente imposição da pena obedecerão aos moldes da violência contra inferior, conforme dispõe o parágrafo único do art. 176 do CPM.

• Elemento subjetivo: no delito em estudo, exige-se a caracterização da vontade guiada por dois vetores: primeiro, o desejo de aviltar, humilhar, vulnerando moralmente o inferior, uti-lizando-se de meio violento (violência física); há que reconhecer também o desejo de avilte direcionado a um inferior hierárquico ou funcional. Exige-se, portanto, um dolo específico (na atual compreensão doutrinária, um elemento subjetivo específico do tipo) para a con-figuração do crime.

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Por essa compreensão, não se reconhecendo a vontade de utilizar a violência como meio de aviltar o inferior, e sim como fim – ou seja, a violência é o fim almejado pelo autor –, estaremos diante do delito capitulado no art. 175, e não diante de hipótese de ofensa aviltante.

A linha traçada, ademais, permite excluir o delito, assim como no caso de violência contra supe-rior, quando a relação superior-inferior estiver fora da cognição ou da vontade do agente, como nos casos das já mencionadas hipóteses dos incisos do art. 47, do CPM, e da relação entre pai e filho, entre cônjuges etc. Eventualmente, afastada a elementar “inferior”, poderá ocorrer hipó-tese de injúria real, capitulada no art. 217 do Código Castrense.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor atinge o subordinado fisicamente por conduta que o ofenda.

• Tentativa: é possível no caso de o autor investir fisicamente contra seu subordinado e ser impedido por terceiro.

• Crime propriamente militar

• Tipicidade indireta: como o delito só pode ser perpetrado propriamente por militares, da ativa ou em inatividade (exceto os da reserva não remunerada), para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime, deve-se verificar os incisos I ou III, ambos do art. 9º do CPM, conforme o caso, que trarão ao intérprete o entendimento de que, para a sub-sunção do fato a este delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial.

• Ação penal: é pública incondicionada.

7. DA RESISTÊNCIA

7.1. Resistência mediante ameaça ou violência

• Tipo legal

Art. 177. Opor-se à execução de ato legal, mediante ameaça ou violência ao executor, ou a quem esteja prestando auxílio:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Forma qualificada

§ 1º Se o ato não se executa em razão da resistência:

Pena – reclusão de dois a quatro anos.

Cumulação de penas

§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência, ou ao fato que constitua crime mais grave.

• Objetividade jurídica: o tipo penal protege a disciplina militar, perturbada pelo ímpeto de não se submeter ao ato legal. Tutela-se também a autoridade daquele que executa ou ten-ta executar o ato legal ao qual o agente se opõe.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa, civil ou militar.

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No caso de sujeição ativa de um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso a resistência ocorra contra ato de autoridade mi-litar estadual, a tipificação deverá ser buscada na legislação penal comum, especificamente no art. 329 do CP comum.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar, e, eventu-almente, o executor ou aquele que o auxilia na execução do ato legal (sujeito passivo mediato).

• Elementos objetivos: para satisfazer os elementos típicos, o autor deve opor-se à execução de ato legal. Opor-se à execução significa tentar obstar a realização, buscar fazer com que o ato legal não se realize.

Essa obstrução, todavia, deve ocorrer com o emprego de violência (física) ou ameaça (“violên-cia moral”) ao executor (ou quem o auxilie). Caso não haja violência ou ameaça na oposição ao ato legal, não haverá, por atipicidade, o delito em estudo, constituindo o que se denomina re-sistência passiva. Como exemplo,o militar que algema a si próprio em um poste de iluminação com o escopo de evitar a sua prisão em flagrante por outro delito. Ademais, a violência deve ser dirigida à pessoa, afastando, portanto, a violência contra a coisa. Nesse contexto, não se configurará a resistência, por exemplo, se o autor dirigir sua conduta para o veículo do executor.

Ato legal constitui toda e qualquer atitude adotada pela Administração Militar com respaldo na legislação em geral. Normalmente manifesta-se pela emissão de uma determinação, uma ordem legal por parte daquele incumbido de fazer valer a vontade da Administração Militar (executor). Dessa forma, o ato, como todo ato administrativo, para ser considerado legal, deve obedecer aos requisitos ou pressupostos de validade, como já estudamos acima (competência, finalidade, forma, motivo e objeto – vide comentários à legalidade da ordem no crime de recu-sa de obediência – art. 163, do CPM).

Há, no tipo em estudo, a forma qualificada se, em razão da oposição mediante violência ou ameaça, o ato legal não for executado. Evidentemente, se o ato legal não é executado, o preju-ízo aos bens jurídicos tutelados será maior, o que implica maior reprovação da conduta, justifi-cando, assim, a modalidade qualificada prevista.

Também há cúmulo material de penas da resistência com a de eventual delito dela resultante, por exemplo, o homicídio, a lesão corporal, o desacato a superior, enfim, crime, como rotula o próprio CPM, mais grave.

Note que, em relação ao crime mais grave, diferentemente de alguns tipos já estudados, não é trazida pela lei uma relação de subsidiariedade, e sim o concurso de delitos com regra do cú-mulo material. Caso desejasse que a resistência fosse delito subsidiário ao, por exemplo, desa-cato a superior, a lei penal militar traria a expressão “se o fato não constitui crime mais grave”, e não teria determinado que a pena da resistência fosse aplicada “sem prejuízo das correspon-dentes” ao fato que constitui crime mais grave.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de, usando de violência ou ameaça, opor-se à execução de ato legal.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor usa violência física contra o executor da ordem ou quem lhe esteja auxiliando ou, ainda, lhe promove ameaça.

• Tentativa: possível no caso de o autor investir fisicamente contra o executor da ordem ou seu auxiliar, não chegando a atingi-lo por questões alheias à sua vontade. Também é ima-

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ginável que a ameaça por escrito possa ser interceptada antes de chegar ao conhecimento do executor do ato legal, configurando, pois, forma tentada.

• Crime impropriamente militar

• Tipicidade indireta: para a completa compreensão da tipicidade deste delito, quando pra-ticado por militar em situação de atividade, deve-se verificar o inciso II do art. 9º do CPM, complementando a tipicidade com uma das alíneas consignadas no inciso, geralmente a alínea a, que subsume fato praticado por militar da ativa contra militar na mesma situação. A complementação, pelo inciso II, de notar, deve-se ao fato de o tipo penal em estudo pos-suir semelhante previsão no Código Penal comum, especificamente no art. 329.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, neste caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

8. DA FUGA, EVASÃO, ARREBATAMENTO E AMOTINAMENTO DE PRESOS

8.1. Fuga de preso ou internado

• Tipo legal

Art. 178. Promover ou facilitar a fuga de pessoa legalmente presa ou submetida à medida de segu-rança detentiva:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Formas qualificadas

§ 1º Se o crime é praticado a mão armada ou por mais de uma pessoa, ou mediante arromba-mento:

Pena – reclusão, de dois a seis anos.

§ 2º Se há emprego de violência contra pessoa, aplica-se também a pena correspondente à violência.

§ 3º Se o crime é praticado por pessoa sob cuja guarda, custódia ou condução está o preso ou internado:

Pena – reclusão, até quatro anos.

• Objetividade jurídica: o tipo penal tutela a autoridade militar personificada no comandan-te do presídio, comandante de Unidade encarregada da escolta ou de quem os represente, porquanto as prisões militares constituem Unidades regularmente previstas na organiza-ção das Instituições Militares.

Curioso notar que o delito correspondente no Código Penal comum (art. 351) – assim como os demais que o seguem, tratando da evasão, do arrebatamento ou do amotinamento de presos – possui outra objetividade jurídica, visto que está capitulado entre os crimes contra a Adminis-

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tração da Justiça, enquanto o crime militar em análise está incluído nos crimes contra a autori-dade ou disciplina militares.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa, civil ou militar.

No caso de sujeição ativa de um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso a fuga ocorra em estabelecimento prisional militar estadual, ou quando o favorecido estiver sob a guarda de autoridade militar estadual, a tipifica-ção deverá ser buscada na legislação penal comum, especificamente no art. 351 do CP comum.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: os núcleos da conduta em questão são “promover” ou “facilitar” a fuga de preso ou internado.

Promoção de fuga significa originar, iniciar, causar ou provocar a fuga de preso ou internado. Já na facilitação, embora o agente não seja o desencadeador do plano de fuga, toma parte no es-quema montado, favorecendo-a, tornando-a fácil, facultando-a, por exemplo, pela remoção de obstáculo. Como muito bem anota Mirabete, na segunda modalidade, a iniciativa é do favore-cido, ao que adere o agente, “auxiliando-o com instrumentos, meios de disfarces, informações etc”, ou mesmo se omitindo quando tem o dever de obstar a fuga.

É de notar que o tipo penal fala em pessoa presa ou submetida à medida de segurança detenti-va, levando à conclusão de que o favorecido deve estar sob jurisdição de autoridade judiciária. Em outras palavras, somente é elemento típico a prisão por crime (provisória ou definitiva) e a prisão civil por dívida nas exceções permitidas pela Constituição Federal (não pagamento de prestação alimentícia e depositário infiel), excluindo, pois, o delito em estudo se a promoção ou favorecimento for de uma fuga de militar preso, por força de previsão disciplinar, podendo, no entanto, haver a prática de outro delito, a exemplo daquele capitulado no § 2º do art. 308 do CPM.

Por outro bordo, como o crime tutela a autoridade e a disciplina militares, entendemos haver o delito em foco quando a conduta se dá em circunstâncias fora de estabelecimento prisional, porém sob autoridade de escolta militar. Assim, estará caracterizado o crime do art. 178 do CPM se, por exemplo, militar integrante da escolta de um preso à disposição da justiça (comum ou militar) promover ou facilitar fuga.

O crime sob exame possui formas qualificadas que se justificam por si sós.

Qualifica o delito, inicialmente, o emprego de arma (própria ou imprópria), a prática por mais de uma pessoa ou com o arrombamento de instalação (§ 1º). Justifica-se a maior reprovação porque tais modalidades facilitam o exercício da ação ilícita.

Também é qualificado o delito se for praticado por pessoa sob cuja guarda, custódia ou con-dução está o preso ou internado (§ 3º), justificando-se a maior reprovação porque aquele que recebeu a incumbência estatal de guardar, que deveria, por força de seu ofício, estar compro-metido com a causa, faltou com lealdade para com a autoridade militar. Ademais, mais simples se torna a fuga quando quem tem o dever de guarda com ela concorda, merecendo, pois, pena maior.

• Embora concebido sob uma forma qualificada, o § 2º, em verdade, trata-se de uma regra especial que traz em seu bojo o concurso de infrações penais militares (concurso material e não formal, conforme vimos no estudo dos arts. 153, 157, 158, § 2º, e 175, parágrafo

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único). Embora aqui exista o concurso material, ao contrário do que vimos quando estuda-mos os arts. 153, 157, 158, § 2º, e 175, parágrafo único, todos do CPM, em que verificamos concurso formal de infrações, há uma regra própria, diversa daquela estipulada pelo art. 79 do referido diploma, impondo sempre o cúmulo material, ainda que se trate de espécies diversas, o que deflui da análise da palavra “também”, que indica soma, afastando, pois, a exasperação. Como se fôssemos aplicar a regra do art. 79 na facilitação de fuga que re-sultasse em morte, teríamos, para o primeiro fato, a pena de detenção e, para o segundo, ainda que homicídio simples, a pena de reclusão, portanto, penas de espécies diversas que deveriam, pela regra do concurso de crimes do art. 79, ser unificadas pela exasperação, e não pela simples soma.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção de promover ou facilitar a fuga.

• Consumação: o delito se consuma quando o preso ou submetido à medida de segurança detentiva foge, mesmo que seja capturado em seguida.

• Tentativa: é possível no caso em que se perpetram as ações em questão, mas a pessoa aca-ba por não fugir ou, ainda, é capturada na tentativa, antes que consiga desvencilhar-se da esfera de vigilância do Estado.

• Crime impropriamente militar.

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade deste delito, quan-do praticado por militar em situação de atividade, deve-se verificar o inciso II do art. 9º do CPM, complementando a tipicidade com uma das alíneas consignadas no inciso, a saber, a alínea e, que subsume fato praticado contra a ordem administrativa militar. A complemen-tação pelo inciso II, é de notar, deve-se ao fato de o tipo penal em estudo possuir seme-lhante previsão no Código Penal comum, especificamente no art. 351.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, neste caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

8.2. Modalidade culposa

• Tipo legal

Art. 179. Deixar, por culpa, fugir pessoa legalmente presa, confiada à sua guarda ou condução:

Pena – detenção, de três meses a um ano.

• Objetividade jurídica: da mesma forma que o artigo anterior, busca-se proteger a autorida-de militar, representada pelo diretor ou comandante do recinto militar que possua prisão, ou da Unidade responsável pela guarda e locomoção de presos, ou quem os represente.

• Sujeitos do delito: pela leitura do tipo penal, o sujeito ativo poderia ser qualquer pessoa, civil ou militar, cabendo anotar que, no caso de sujeição ativa de um civil, somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal.

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Por outro lado, conforme sustentamos nos comentários afetos ao inciso III do art. 9º, o civil, as-sim como o militar inativo, para poderem perpetrar crimes militares, devem com sua conduta afrontar a própria instituição militar (a que pertencem, no caso dos inativos, ou a instituição militar visada, no caso dos civis), exigindo, pois, um elemento subjetivo especial do tipo, na espécie de delito de intenção. Ora, se tratamos de modalidade culposa, obviamente devemos descartar o elemento subjetivo especial do tipo, porquanto a conduta não seria dirigida a um fim típico, consignado no artigo.

Dessa construção, e em resumo, podemos firmar que a modalidade culposa em estudo somen-te pode ser perpetrada por militares da ativa, seja em âmbito federal ou estadual. Caso um militar inativo ou um civil colaborem culposamente para fuga, deve-se buscar subsunção no Código Penal comum, especialmente no § 4º do art. 351.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: o núcleo da conduta em questão é “deixar”, por culpa, fugir pessoa presa confiada à guarda do autor. Como se trata de postura omissiva, a culpa se verifica na modalidade de negligência.

No tipo em estudo, portanto, o autor não adota as cautelas necessárias, fomentando, ainda que não deseje isso, a fuga de pessoa presa confiada à sua guarda (vigilância estática em deter-minado local) ou condução (escolta).

Note que não é figura típica do crime em estudo a fuga de pessoa submetida à medida de segu-rança, restringindo-se somente à fuga de pessoa presa que, assim como no delito anterior, limi-ta-se à prisão por crime (provisória ou definitiva) e à prisão civil por dívida nas exceções permi-tidas pela Constituição Federal (não pagamento de prestação alimentícia e depositário infiel), não abrangendo a fuga, em face de restrição ou privação de liberdade por razões disciplinares.

Assim como no crime anterior, caso a fuga se opere em estabelecimento penal comum, não se falará em crime militar. Por outro lado, nada impede que ocorra o delito na forma culposa em transporte (escolta) de preso civil que tenha cometido crime comum ou militar, ou então de um civil que, por questões de política penitenciária, cumpra pena ou prisão provisória em estabele-cimento militar (prisional ou não).

• Elemento subjetivo: como se trata de modalidade culposa, irrelevante se torna o elemento subjetivo, bastando a culpa, no caso do tipo em estudo, por negligência.

• Consumação: o delito se consuma quando o preso foge, mesmo que seja capturado em seguida.

• Tentativa: é impossível por se tratar de delito culposo.

• Crime propriamente militar

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade deste delito, consi-derando que somente o militar da ativa pode praticá-lo, deve-se verificar o inciso II do art. 9º do CPM, complementando a tipicidade com uma das alíneas consignadas no inciso, a saber, a alínea e, que subsume fato praticado contra a ordem administrativa militar. A com-plementação pelo inciso II, vale dizer, deve-se ao fato de o tipo penal em estudo possuir semelhante previsão no Código Penal comum, especificamente no § 4º do art. 351.

• Ação penal: é pública incondicionada.

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8.3. Evasão de preso ou internado

• Tipo legal

Art. 180. Evadir-se, ou tentar evadir-se o preso ou internado, usando de violência contra a pessoa:

Pena – detenção, de um a dois anos, além da correspondente à violência.

§ 1º Se a evasão ou a tentativa ocorre mediante arrombamento da prisão militar:

Pena – detenção, de seis meses a um ano.

Cumulação de penas

§ 2º Se ao fato sucede deserção, aplicam-se cumulativamente as penas correspondentes.

• Objetividade jurídica: o tipo penal em estudo busca proteger a autoridade militar, repre-sentada pelo diretor ou comandante do recinto militar que possua prisão, ou da Unidade responsável pela guarda e locomoção de presos, ou quem os represente, por exemplo, na execução de escolta.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa, civil ou militar, desde que preso em recinto militar (prisão ou Unidade dotada de cela) ou submetido à escolta ou guarda de autoridade militar.

No caso de sujeição ativa de um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso a fuga ocorra em estabelecimento prisional militar estadual, ou quando o favorecido estiver sob a guarda de autoridade militar estadual, a tipifica-ção deverá ser buscada na legislação penal comum, especificamente no art. 352 do CP comum.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: o núcleo da conduta é “evadir-se” ou “tentar evadir-se”, podendo-se firmar que a figura tentada se equipara à consumada. O legislador equiparou às modali-dades porque o cerne da questão aqui não é a fuga, mas sim o uso de violência contra a pessoa ou contra a coisa para a fuga. Todavia, não é correto afirmar que fugir “é um direito do preso”, pois, em verdade, a fuga é reprovada por outra face do Direito que não o Direi-to Penal, a saber, aquela atrelada à execução penal. Com efeito, a fuga, ou sua tentativa, é considerada infração disciplinar de natureza grave (arts. 49, parágrafo único, e 50, II, da Lei nº 7.210/84 – Lei de Execução Penal), capaz de trazer consequências negativas ao seu autor, por exemplo, a revogação de autorização de trabalho (art. 37, parágrafo único, da LEP), suspensão ou restrição de direito e inclusão no regime disciplinar diferenciado (art. 57, parágrafo único, da LEP), perda de período remido (art. 127 da LEP). Caso a fuga efeti-vamente fosse um direito do preso, todo aquele que estivesse recolhido ao cárcere poderia peticionar ao juízo competente, que, por sua vez, deveria assegurar-lhe a passagem para rua, o que é inverossímil. Em conclusão, fugir é tão somente fato atípico.

Evadir-se é fugir, é subtrair-se à custódia ou guarda de outrem”, sendo fundamental que a pri-são seja legal ou, de outra forma, o delito não se verificará.

Essa evasão, nos termos do caput, somente será delituosa se for empregada violência contra a pessoa, não importando ser ela a autoridade responsável pela guarda ou ainda um outro preso. Mais uma vez alertamos que violência deve ser compreendida como aquela dotada de conta-

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to físico, afastando-se, portanto, a violência moral, representada pela grave ameaça. Ademais, não se exige que a violência produza lesão ou morte naquele contra quem se dirigiu a conduta, porém, se houver resultado nesse sentido, o preceito secundário comanda o cúmulo material, hipótese de concurso material de crimes com regra diversa do art. 79 do CPM.

Pelas notas já consignadas nos tipos penais anteriores, podemos concluir que o fato, para que seja delito militar, deva ocorrer em recinto militar, seja o fugitivo um militar, seja um civil (mili-tares já expulsos, demitidos e exonerados das Corporações, assim como os que sempre foram civis e que cumprem pena em prisão especial determinada pelo juízo comum competente), ou então que a guarda do agente esteja sob responsabilidade de militares, por exemplo, em uma escolta para comparecimento do preso a julgamento.

Também a pessoa presa o deve estar em razão da prática de crime (prisão provisória ou definiti-va) e de dívida nas exceções permitidas pela Constituição Federal (não pagamento de prestação alimentícia e depositário infiel), excluindo-se, pois, a prisão por força de previsão disciplinar.

A modalidade do § 1º consiste em forma de delito com violência empregada contra a coisa, ca-racterizada pelo arrombamento da prisão militar com o escopo de empreender fuga. Como se denota do tipo penal, somente ocorrerá o delito se o arrombamento se der em prisão militar, localizada em estabelecimento prisional militar ou mesmo em quartel dotado dessa instalação (cela). O arrombamento, por outro lado, não precisa ser exatamente da carceragem, sendo abrangido pelo tipo qualquer acesso da prisão militar de que o agente se sirva para buscar a liberdade. Note, por derradeiro, que esta modalidade não possui correspondente no Código Penal comum.

Cumpre lembrar que a fuga, nos termos do art. 192 do CPM, desencadeará a contagem para a deserção. É dizer que o preso militar, caso fuja, deve apresentar-se em oito dias, sob pena de configurar outro delito, o de deserção, circunstância em que, por regra constante do § 2º do art. 180, haverá o concurso material de infrações penais militares, com cúmulo material das penas. Essa regra, ressaltamos, aplica-se tanto à modalidade do caput como à trazida pelo § 1º.

Hipótese a ser estudada trata-se do caso em que o agente, para fugir, pratica violência contra a pessoa (com resultado) e contra a coisa, simultaneamente, havendo subsunção nas modali-dades previstas no caput e no § 1º. Nesse caso, postulamos que deva prevalecer a modalida-de do caput, funcionando a outra circunstância (violência contra a coisa) como circunstância judicial a influir na aplicação da pena, nos termos do que dispõe o art. 69 do CPM (...maior ou menor extensão do dano ou perigo de dano...).

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de praticar a violência contra a pessoa ou contra a coisa com o fim único de conseguir fugir. Exige-se, portanto, um elemento subjetivo específico do injusto (antigo dolo específico).

• Consumação: o delito se consuma quando o autor pratica o ato de violência e atinge a pessoa, ou ainda destrói ou inutiliza, total ou parcialmente, o mecanismo de segurança de algum acesso que impeça a sua saída, tudo isso com o intuito de fugir, mesmo que não consiga.

• Tentativa: a tentativa foi equiparada pelo próprio tipo ao delito consumado; portanto, não há de se falar em tentativa da tentativa. A investida física contra a pessoa ou coisa admite a tentativa, o que, se desconhecido o verdadeiro intento do autor, caracterizaria delito ten-

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tado contra a pessoa ou até contra militar de serviço ou ainda contra patrimônio, respecti-vamente.

• Crime impropriamente militar

• Tipicidade indireta: no caso da modalidade do caput, para se ter a completa compreensão da tipicidade deste delito, quando praticado por militar em situação de atividade, deve-se verificar o inciso II do art. 9º do CPM, complementando a tipicidade com uma das alíneas consignadas no inciso, a saber a alínea e, que subsume fato praticado contra a ordem ad-ministrativa militar. A complementação pelo inciso II, vale dizer, deve-se ao fato de o tipo penal em estudo possuir semelhante previsão no Código Penal comum, especificamente no art. 352.

Já no caso da modalidade do § 1º, quando também praticada por militar da ativa, por não pos-suir correlato na legislação penal comum, a complementação da tipicidade deve ser buscada no inciso I do art. 9º do CPM.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, seja qual for a modalidade (caput ou § 1º), a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, neste caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

8.4. Arrebatamento de preso ou internado

• Tipo legal

Art. 181. Arrebatar preso ou internado, a fim de maltratá-lo, do poder de quem o tenha sob guarda ou custódia militar:

Pena – reclusão, até quatro anos, além da correspondente à violência.

• Objetividade jurídica: o tipo penal em estudo também busca tutelar a autoridade militar, personificada na pessoa que tem o preso arrebatado sob guarda.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa, civil ou militar.

No caso de sujeição ativa de um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso a fuga ocorra quando o favorecido estiver sob guarda de autoridade militar estadual, a tipificação deverá ser buscada na legislação penal co-mum, especificamente no art. 353 do CP comum. Note que, caso o arrebatamento por civil se dê em estabelecimento militar estadual próprio para execução de medida de segurança, o tipo penal do art. 353 do CP comum não subsumirá o fato, porquanto somente é prevista a figura do “preso”.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar. Secundaria-mente, temos o militar de quem o preso foi arrebatado, lesado em sua autoridade (sujeito pas-sivo mediato). O preso arrebatado não constitui sujeito passivo do delito em estudo, mesmo que, posteriormente, seja efetivamente maltratado, ocasião em que poderá ser sujeito passivo de outro delito (lesão corporal, atentado violento ao pudor etc).

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• Elementos objetivos: o núcleo da conduta é “arrebatar”, que significa tomar à força, arran-car, afastar a custódia de autoridade militar, exigindo, pois, que haja emprego de violência física contra a pessoa ou violência contra a coisa.

O militar que guarda a pessoa arrebatada, em vista de ter sua resistência vencida, não respon-de por delito. Entretanto, caso haja condescendência daquele que deveria custodiar, o qual, em vez de zelar pelo ofendido, entrega-o àquele que deseja maltratá-lo, não responderá por este delito, mas sim, em concurso de pessoas, por tudo o que venha a acontecer ao custodiado, seja o constrangimento ilegal, a lesão corporal, a tortura ou até mesmo a sua morte.

Pertinente lembrar, como o faz Loureiro Neto, norteado pelas lições do saudoso Mirabete, que no presente caso, ao contrário dos delitos anteriores que tratam da fuga de preso, “pouco im-porta que a prisão seja legal, pois o preso, diz a lei, está sob a guarda ou custódia militar, por-tanto, do Estado, que por ele é responsável”.

Da comparação do dispositivo sub examine com seu correlato na legislação penal comum, per-cebe-se que a lei penal militar foi mais abrangente ao prever também o arrebatamento de in-ternado, significando aquele submetido à medida de segurança pessoal detentiva. A ausência dessa figura no art. 353 do CP é apontada pela doutrina como uma exclusão inexplicável, por-tanto, uma falha.

O preceito secundário do tipo penal dispõe que a pena será de reclusão, até quatro anos, além da correspondente à violência. Nitidamente estamos diante de concurso material de crime com regra de cúmulo material de penas (compreensão do termo “além”), não se obedecendo ao preceituado pelo art. 79, no que tange às penas de espécie diferente, em que teríamos a exas-peração.

• Elemento subjetivo: o tipo penal em foco só admite a modalidade dolosa, caracterizada pela prática do arrebatamento com o específico fim de maltratar a pessoa arrebatada (ele-mento subjetivo específico do tipo, antigo dolo específico).

Os motivos que levaram o agente ao desejo de maltratar o preso são irrelevantes à constituição típica do delito em apreço.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor consegue tirar o preso ou internado do poder daquele que o guardava. Como exaustivamente já consignado, não se exige que o preso seja efetivamente maltratado.

• Tentativa: é possível, como no caso do agente que inicia a ação, mas é impedido, mediante força necessária da autoridade militar, de tomar a guarda do preso.

• Crime impropriamente militar

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade do delito, quando praticado por militar em situação de atividade, deve-se verificar o inciso II do art. 9º do CPM, complementando a tipicidade com uma das alíneas consignadas no inciso, a saber, a alínea e, que subsume fato praticado contra a ordem administrativa militar. A comple-mentação pelo inciso II, vale dizer, deve-se ao fato de o tipo penal em estudo possuir se-melhante previsão no CP comum, especificamente no art. 353. Com efeito, não há exata coincidência na descrição típica das duas previsões (comum e militar), contudo, em nossa concepção, para se clamar a semelhança, basta que haja aproximação entre os tipos penais

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de modo a poder afirmar que se trata, com algumas peculiaridades, de figuras típicas aná-logas.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, neste caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

8.5. Amotinamento

• Tipo legal

Art. 182. Amotinarem-se presos, ou internados, perturbando a disciplina do recinto de prisão mili-tar:

Pena – reclusão, até três anos, aos cabeças; aos demais, detenção de um a dois anos.

Responsabilidade de partícipe ou de oficial

Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem participa do amotinamento ou, sendo oficial e estando presente, não usa os meios ao seu alcance para debelar o amotinamento ou evitar as consequências.

• Objetividade jurídica: neste delito, diversamente dos anteriores, a disciplina militar é tra-zida ao primeiro plano da proteção da norma por ser indispensável ao bom funcionamento de um recinto de prisão militar. Evidentemente, de forma adjacente, sai maculada também a autoridade dos militares comandantes ou dirigentes da Unidade prisional ou da Unidade em que se localiza a prisão.

• Sujeitos do delito: crime de autoria coletiva, exige pluralidade de pessoas para configurá--lo. Em nosso entender, ante a não definição expressa do tipo penal, basta a prática da con-duta nuclear por duas pessoas para que o delito ocorra.

O sujeito ativo na figura do caput do artigo poderá ser qualquer pessoa, civil ou militar, desde que esteja preso em estabelecimento prisional militar (ou Unidade com dependência de pri-são).

Curioso notar que, embora o tipo penal preveja a possibilidade de o internado submetido à medida de segurança praticar o delito, ele (tipo) exige a turbação da disciplina em recinto de prisão militar e não consagra a turbação da disciplina em manicômio judiciário ou em estabele-cimento psiquiátrico anexo ao manicômio judiciário, hoje condensados no hospital de custódia. Teríamos, pois, uma incongruência no tipo penal, uma vez que, em primeira análise, não é pos-sível alguém submetido à medida de segurança turbar a disciplina de prisão militar, porquanto não é esta destinada ao acolhimento daqueles a quem foi imposto esse tipo de sujeição. Nos parece, contudo, que o tipo penal buscou delinear possibilidades em que internados pudessem cometer o delito, das quais consignamos alguns exemplos: a) primeiro, o tipo penal em estudo não menciona presídio militar, mas recinto de prisão militar, que poderá ser encontrado em hospital de custódia para a contenção de casos extremos de inimputáveis agressivos, que co-loquem em risco a vida dos demais internados; nesse caso, sendo o hospital de custódia uma Unidade militar, o recinto destinado às celas será recinto de prisão militar; b) outra possibili-

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dade consiste no fato de o hospital de custódia localizar-se em área adstrita a presídio, possi-bilitando que o internado tenha acesso à prisão militar, podendo, pois, amotinar-se; c) não se pode esquecer também da possibilidade de um preso, por doença mental superveniente, ter sua pena convertida em medida de segurança, permanecendo no presídio militar até sua remo-ção para o hospital de custódia.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: o núcleo da conduta é “amotinar-se”, ou seja, rebelar-se, perturbar a ordem vigente no recinto de prisão militar, negando-se a sair ou a voltar para as celas, fazendo algazarra, tomando terceiro qualquer como refém, em suma, alterando indevida-mente a regularidade das atividades do estabelecimento que contenha prisão militar.

Recinto de prisão militar, para Célio Lobão, inclui o “local fora das grades, onde os presos tra-balham ou estudam ou tomam sol, como tombadilho do navio, pátio interno da penitenciária militar, além de outros locais do estabelecimento castrense, onde se encontram os presos em recreação, fazendo exercício, além de atividades diversas, destinadas a amenizar as agruras do recolhimento à prisão”. Essa construção, com a qual pactuamos, reforça nossa visão de que o tipo penal foi além da compreensão de estabelecimento prisional, consistindo a expressão “recinto de prisão militar” em toda e qualquer instalação em que existam pessoas presas em cumprimento de pena, prisão provisória, prisão civil, nos casos constitucionalmente permiti-dos, ou eventualmente com privação de liberdade em cela durante o desconto de medida de segurança.

O preceito secundário do tipo-base comina pena com aumento para os “cabeças”, definidos no art. 53, §§ 4º e 5º, do CPM. Embora a previsão da pena não o consagre expressamente, como o faz a sua correlata no Código Penal comum, o resultado de violência no curso do amotinamento importará em delito autônomo, ao qual o agente responderá em concurso material de delitos, vingando a regra do art. 79 do CPM.

A lei penal militar, no parágrafo único do artigo em estudo (primeira parte), previu casos assi-milados, equiparando-os ao amotinamento do caput. Assim, na mesma pena incorre quem, embora não preso ou internado, participa, de qualquer forma, dos atos de amotinamento, pre-visão despicienda na perspicaz visão de Jorge César de Assis, em face da regra definidora do concurso de pessoas (coautoria) do art. 53 do CPM.

Por força da segunda parte do parágrafo único do art. 182, também se equipara ao tipo-base a conduta de Oficial (da ativa ou equiparado) que, estando presente no momento do amotina-mento, deixa de usar todos os meios possíveis para debelar o movimento ou evitar suas conse-quências.

• Elemento subjetivo: o tipo em estudo só admite a modalidade dolosa, caracterizada pela intenção, vontade livre e consciente de desencadear ou participar do amotinamento.

• Consumação: o delito se consuma com a deflagração do amotinamento, com a prática de atos que perturbem a disciplina do recinto.

• Tentativa: por ser delito plurissubsistente, é admissível quando os sujeitos ativos, em fase inicial da execução, não conseguirem seu intento (tomar o recinto, p. ex.).

• Crime impropriamente militar.

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• Tipicidade indireta: na modalidade do caput, para se ter a completa compreensão da tipi-cidade do delito, quando praticado por militar em situação de atividade, deve-se verificar o inciso II do art. 9º do CPM, complementando a tipicidade com uma das alíneas consignadas no inciso, a saber, a alínea e, que subsume fato praticado contra a ordem administrativa militar. A complementação pelo inciso II, cumpre notar, deve-se ao fato de o tipo penal em estudo possuir semelhante previsão no Código Penal comum, especificamente no art. 354. Com efeito, não há exata coincidência na descrição típica das duas previsões (comum e militar); contudo, em nossa concepção, para se clamar a semelhança, basta que haja apro-ximação entre os tipos penais de modo a poder afirmar-se que se trata, com algumas pecu-liaridades, de figuras típicas análogas.

A tipicidade das figuras assimiladas, previstas no parágrafo único do art. 182 do CPM, deve ser complementada pelo inciso I do art. 9º, quando praticadas por militar da ativa. Não estará de todo equivocada, por outro lado, a construção que complemente a tipicidade da figura assimi-lada da primeira parte do parágrafo único do artigo estudado (aquele que participa do amoti-namento sendo militar da ativa, não sendo preso ou internado) pela alínea e do inciso II, desde que combine com a previsão do art. 53 do CPM.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, em todas as modalidades, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, neste caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

9. SURSIS, LIVRAMENTO CONDICIONAL E LIBERDADE PROVISÓRIA

No Código Penal Militar, os delitos de aliciação (art. 154), incitamento (art. 155), violência con-tra superior (art. 157), violência contra oficial de dia, de serviço ou de quarto, sentinela, vigia ou plantão (art. 158), desrespeito a superior (art. 160), desrespeito a símbolo nacional (art. 161), despojamento desprezível (art. 162) e de recusa de obediência (art. 163), todos comen-tados neste capítulo, são insuscetíveis de suspensão condicional da pena, conforme expõe o art. 88, II, a e b, do citado diploma. Não há, perceberá o atento estudioso, construção técnica da lei penal que nos permita firmar que as disposições do art. 88 refiram-se a capítulos, e não a delitos. Por vezes, temos a impressão de que há menção ao delito isoladamente, como no caso do crime de violência contra oficial de dia, de serviço ou de quarto, sentinela, vigia ou plantão. Em outros pontos, parece que o CPM buscou abranger o capítulo, como no caso da insubordi-nação. Dada a péssima construção da lei, que não seguiu rigor técnico, aliada ao fato de não se mencionar a palavra “capítulo”, optamos por uma visão menos gravosa, restringindo-nos aos delitos isoladamente para reconhecer a impossibilidade de concessão de sursis.

O livramento condicional nos crimes de motim ou de revolta (art. 149, caput, e parágrafo úni-co, do CPM), de aliciação (art. 154), de incitamento (art. 155), violência contra superior (art. 157) ou militar de serviço somente é cabível após o cumprimento de dois terços da pena, nos termos do art. 97 do Código Castrense. Também no caso do livramento condicional, a falta de rigor técnico nos leva a uma construção mais benéfica, buscando apenas entender que o cum-primento de dois terços é exigido para os crimes, isoladamente, e não para os capítulos.

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Versando dispositivos do CPM, a liberdade provisória também não poderá ser concedida nos delitos de violência contra superior (art. 157), desrespeito a superior (art. 160), desrespeito a símbolo nacional (art. 161), despojamento desprezível (art. 162), recusa de obediência (art. 163), oposição à ordem de sentinela (art. 164), publicação ou crítica indevida (art. 166), abuso de requisição militar (art. 173), ofensa aviltante a inferior (art. 176), resistência mediante ame-aça ou violência (art. 177) e fuga de preso ou internado (art. 178), nos termos da alínea b do parágrafo único do art. 270 do CPPM. Diferentemente do Código Penal Militar, o Código de Pro-cesso Penal Militar, na previsão da concessão de liberdade provisória, foi mais claro, prevendo os artigos expressamente, não dando, pois, margem à dúvida.

CRIMES MILITARES EM TEMPO DE PAZ:

DOS CRIMES CONTRA O SERVIÇO MILITAR E O DEVER MILITAR

1. DA INSUBMISSÃO

1.1. Insubmissão

• Tipo legal

Art. 183. Deixar de apresentar-se o convocado à incorporação, dentro do prazo que lhe foi marca-do, ou, apresentando-se, ausentar-se antes do ato oficial de incorporação:

Pena – impedimento, de três meses a um ano.

Caso assimilado

§ 1º Na mesma pena incorre quem, dispensado temporariamente da incorporação, deixa de se apresentar, decorrido o prazo de licenciamento.

Diminuição da pena

§ 2º A pena é diminuída de um terço:

a) pela ignorância ou a errada compreensão dos atos da convocação militar, quando escusáveis;

b) pela apresentação voluntária dentro do prazo de um ano, contado do último dia marcado para a apresentação.

• Objetividade jurídica: o tipo em estudo, embora inaugure o capítulo dos crimes contra o serviço e o dever militares, tutela apenas o serviço militar, uma vez que aquele que é con-vocado não está ainda atado ao dever militar.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o civil convocado, porquanto em nenhuma das condu-tas descritas no tipo exige-se que o sujeito ativo esteja incorporado à Instituição Militar. Portanto, de forma sui generis, no diploma castrense, este delito limita a sujeição ativa apenas a quem não é militar.

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Cumpre-nos, neste ponto, identificar um iter a ser seguido na identificação do convocado.

A Lei nº 4.375, de 17 de agosto de 1964 (“Lei do Serviço Militar”), define uma figura preliminar ao convocado, qual seja, o refratário. O art. 24 da referida Lei dispõe que o “brasileiro que não se apresentar para a seleção durante a época de seleção do contingente de sua classe ou que, tendo-o feito, se ausentar sem a ter completado, será considerado refratário”.

O art. 25 da mesma Lei dispõe que “o convocado selecionado e designado para incorporação ou matrícula, que não se apresentar à Organização Militar que lhe for designada, dentro do prazo marcado ou que, tendo-o feito, se ausentar antes do ato oficial de incorporação ou matrí-cula, será declarado insubmisso”.

Agora, resta verificar quem é o convocado. É considerada convocada à incorporação a pessoa selecionada para tanto e designada para a incorporação ou matrícula em Organização Militar, devendo apresentar-se no prazo que lhe for fixado.

Essas definições são complementadas pelo Decreto nº 57.654, de 20 de janeiro de 1966, que regulamenta a “Lei do Serviço Militar”. Assim, o Decreto em relevo define, em seu art. 3º, as expressões e termos acima utilizados.

Em resumo e simplificadamente, portanto, teríamos uma primeira condição de irregularidade que não configuraria ilícito penal militar, a situação do jovem que não se alista, não comparece para a seleção ou dela não participa até o fim, considerado refratário. Uma vez selecionado, no entanto, e tendo designada Organização Militar e data para se apresentar para a incorporação ou matrícula, o cidadão ocupará a figura do convocado, sendo, pois, passível de cometimento do delito de insubmissão. Apenas para se ter o completo iter, o convocado incorporado passa à condição de militar, podendo, por exemplo, caso se ausente ilegalmente por mais de oito dias do lugar onde presta o serviço militar, praticar o delito de deserção, que estudaremos adiante.

Cumpre observar, em instância final da composição do sujeito ativo, que a figura do convocado como acima delineado inexiste nas Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares do Brasil, os quais possuem um sistema de voluntariado na prestação do serviço da Instituição, conforme comanda o art. 11 do Decreto-Lei nº 667, de 2 de agosto de 1969. Nessa ordem, o delito em es-tudo não ocorre no âmbito das milícias estaduais. É dizer, em outros termos, que, por exemplo, na milícia paulista, o candidato aprovado que não se apresentar para tomar posse no cargo será considerado desistente e abrirá vaga para o próximo classificado; caso se apresente, por outro bordo, e efetive sua admissão, saindo em seguida e não mais retornando, será considerado au-sente, tendo início a contagem de prazo para sua deserção.

O sujeito passivo, titular do bem jurídico aviltado, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: como se pode inferir, o delito em estudo visa alcançar o civil que, convocado, busca escapulir da prestação do serviço militar, iniciado com o ato de incor-poração ou de matrícula. O serviço militar no Brasil, nos termos do caput do art. 143 da CF, é obrigatório, segundo os parâmetros dados por lei específica. Essa lei é exatamente a supracitada “Lei do Serviço Militar”, que define, em seu art. 1º, o serviço militar como o exercício de atividades específicas desempenhadas nas Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica), compreendendo, na mobilização, todos os encargos relacionados com a defesa nacional.

Para aqueles que alegarem imperativo de consciência (escusas de consciência), a própria Cons-tituição Federal prevê o serviço alternativo, que eximirá tais pessoas de atividades de caráter

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essencialmente militar. Nesse prisma foi editada a Lei nº 8.239, de 4 de outubro de 1991, que conferiu ao Estado-Maior das Forças Armadas, em coordenação com os ministérios militares, a competência para atribuir serviço alternativo, o que foi regulado pela Portaria COSEMI nº 2.681, de 28 de julho de 1992, em vigência.

São duas as condutas reprimidas por este tipo. A primeira delas é deixar de se apresentar e a segunda é ausentar-se.

Na primeira possibilidade, o autor, convocado para incorporação à Força, deixa de apresentar--se à Instituição Militar no prazo que lhe foi determinado.

Já na segunda, ele se apresenta à Força no prazo determinado, mas, em seguida, ausenta-se antes da formalização de sua incorporação.

No § 1º do artigo em estudo consagrou-se um caso assimilado, dispondo que incorrerá na mes-ma pena aquele que, dispensado temporariamente da incorporação, deixa de se apresentar, findo o prazo de licenciamento. Em verdade, a “Lei do Serviço Militar” fala em adiamento do serviço militar, e não em dispensa temporária de incorporação. Tais casos estão enumerados no art. 29 da referida Lei.

Por fim, o § 2º do dispositivo em estudo prevê minoração da pena em um terço, com base na ignorância ou errada compreensão dos atos da convocação militar, quando escusáveis ou quando há o arrependimento posterior do agente, que se apresenta voluntariamente dentro do prazo de um ano, contado do último dia marcado para a apresentação. No primeiro caso vemos a plena materialização do princípio ignorantia legis neminen excusat, ou seja, o dogma de que a ignorância da lei é inescusável e, ainda que o seja, a culpabilidade do agente não es-tará afastada. Essa construção, aliás, é muito frequente no Código Penal Militar, que, já no art. 35, ao tratar do erro de direito – que não se aplica à insubmissão, visto que se trata de crime contra o serviço militar –, prevê que a pena pode ser atenuada ou substituída por outra menos grave quando o agente, salvo em se tratando de crime que atente contra o dever militar, supõe lícito o fato, por ignorância ou erro de interpretação da lei, se escusáveis. Note que o dispositi-vo passa ao largo de uma escusa a isentar de pena, mas, tão somente, permite a atenuação da culpabilidade.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de se furtar ao serviço militar, deixando de apresentar-se ou ausentando-se após sua apresentação.

Por admitir somente a modalidade dolosa, por óbvio, para que o crime se verifique, o autor deve necessariamente saber o dia, a hora e o local da apresentação, o que deverá estar expres-so em documento que recebeu na vez anterior em que esteve em seleção.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor deixa de comparecer à Instituição Mi-litar no limite do tempo que lhe foi concedido para tal ou quando se ausenta, tendo já se apresentado para a incorporação que ainda não foi oficializada.

• Tentativa: não é possível, em vista de a conduta ser omissiva (1ª hipótese) e de mera con-duta (2ª hipótese).

• Crime propriamente militar: uma observação deve ser trazida à análise do leitor. A teoria clássica, ao classificar os delitos militares em próprios e impróprios, vê na insubmissão uma exceção, por ser o único crime militar que somente o civil pode cometer. Justifica-se essa exceção pelo fato de que, apesar de ser praticado por um civil, a incorporação do faltoso,

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portanto a condição de militar, é condição de punibilidade ou de procedibilidade, nos ter-mos do art. 464, § 2º, do CPPM. Vale dizer que, antes de adquirir a qualidade de militar, com sua inclusão nas Forças Armadas, não cabe ação penal contra o insubmisso.

Foi justamente essa excepcional condição da insubmissão que fez com que Jorge Alberto Ro-meiro idealizasse outra teoria para definir os crimes propriamente militares, firmando que cri-me propriamente militar traduz-se por aquele “cuja ação penal somente pode ser proposta contra militar.

• Tipicidade indireta: como o delito somente pode ser perpetrado por um civil com a espe-cial condição de convocado, para se ter a completa compreensão da tipicidade deste crime deve-se verificar o inciso III do art. 9º do CPM.

• Ação penal: é pública incondicionada. Contudo, é necessário lembrar da necessidade de prévia incorporação do insubmisso para que se possa desencadear a ação penal (condição de procedibilidade).

1.2. Criação ou simulação de incapacidade física

• Tipo legal

Art. 184. Criar ou simular incapacidade física, que inabilite o convocado para o serviço militar:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

• Objetividade jurídica: o presente dispositivo também tutela somente o serviço militar, uma vez que aquele que é convocado não está ainda atado ao dever militar.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo poderá ser qualquer pessoa, o convocado, bem como aquele que, militar ou civil, o auxilie a simular ou a criar a incapacidade.

O sujeito passivo, titular do bem jurídico aviltado, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: os núcleos da conduta são “criar” ou “simular”.

Criar implica fazer, tornar existente, gerar a incapacidade que impeça a prestação do serviço militar. Como se verifica, estamos diante de uma excepcional responsabilização penal pela au-tolesão. É o caso do convocado que se autolesiona para furtar-se ao serviço militar, ou de quem o auxilie ou mesmo crie a incapacidade, como no caso do pai que, não desejando que o filho preste o serviço militar, mutila-o durante o sono, devendo responder por este delito, além da-quele correspondente à lesão provocada.

“Simular”, por sua vez, significa “fingir”, representar com semelhança, fazer crer, por um engo-do, que o convocado está inabilitado para o serviço militar por incapacidade. Pode ser perpe-trado pelo próprio convocado ou por terceiro.

A primeira modalidade (criar) faz existir e a segunda (simular) faz parecer que existe algo que incapacite o acusado a fim de inabilitá-lo para o serviço militar. Essa incapacidade poderá ser física, muito mais comum, ou mental.

Evidentemente, a prova deste delito só se fará por avaliação médica, em vista de o exame e a conclusão serem eminentemente técnicos, dependendo de profissional habilitado.

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Note que o presente delito, como se verá, diferencia-se da modalidade prevista do art. 188, IV, do CPM, porquanto se tem em foco, no artigo em análise, apenas o convocado, enquanto, na-quele, a atenção se volta para o militarjá incorporado, que alcança a inatividade por simulação de incapacidade.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de se furtar ao serviço militar apresentando incapacidade física (real ou ficta) provocada.

• Consumação: o delito se consuma quando é reconhecida a incapacidade do convocado, tornando-o inabilitado para o serviço militar.

• Tentativa: é possível, nos casos em que o acusado não chega a ser reconhecido inapto, mas há ações no sentido de criar ou de simular essa incapacidade. Tome, por exemplo, a mal-fadada tentativa de mutilação, com o escopo de inabilitar para o serviço militar, que não conduza à incapacidade.

• Crime impropriamente militar

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade deste delito, deve--se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, no caso de o sujeito ativo ser militar em situação de atividade, obviamente quando crie ou simule a incapacidade em ser convocado. Caso o sujeito ativo seja civil – e aqui incluímos o próprio convocado – ou militar inativo, a com-plementação da tipicidade deve dar-se pelo inciso III do mesmo artigo, em uma de suas alíneas.

• Ação penal: é pública incondicionada.

1.3. Substituição de convocado

• Tipo legal

Art. 185. Substituir-se o convocado por outrem na apresentação ou na inspeção de saúde:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem substitui o convocado.

• Objetividade jurídica: da mesma forma que os dispositivos anteriores deste capítulo, este busca tutelar somente o serviço militar.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o convocado, figura já delineada quando do estudo do art. 183. Por previsão do parágrafo único, também pode cometer o delito aquele que, civil ou militar, fez-se passar pelo convocado.

O sujeito passivo, titular do bem jurídico aviltado, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: no tipo em análise, o convocado se faz substituir por outra pessoa, no momento de sua apresentação à Instituição Militar, ou no ato de inspeção de saúde que venha a sofrer.

O parágrafo único, como já frisado, estende a possibilidade de autoria ao terceiro que se faz passar pelo convocado, sofrendo repulsa penal de mesma intensidade. Há, nitidamente, hipó-tese de coautoria necessária, pois se presume que o convocado anuiu na substituição.

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É elemento estranho ao tipo penal em relevo a consequência da substituição, caracterizando--se o delito pela simples conduta. Assim, perpetrará o delito o convocado que se fizer substituir por pessoa com enfermidade para burlar a prestação do serviço, ou aquele convocado que, desejando ser incorporado, mas, portando alguma enfermidade que impeça a incorporação, substitua-se por terceiro que não possua tal enfermidade.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de se ver substituído ou de substituir o convocado na apresentação ou no exame de saúde.

Não é elemento expresso no tipo penal a intenção motivadora da farsa, delimitando-se tão somente a oportunidade em que ela se dá, ou seja, na apresentação ou na inspeção de saúde. Dessa forma, ainda que a intenção não seja ludibriar a convocação, frustrando o serviço militar, o delito ocorrerá.

• Consumação: o delito se consuma quando o terceiro se passa pelo convocado diante da Administração Militar.

• Tentativa: não é possível, em vista de ser delito instantâneo. O fato de os agentes planeja-rem a substituição e se aproximarem da execução não tem relevância jurídica.

• Crime impropriamente militar

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade deste delito, deve--se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, no caso de o sujeito ativo ser militar em situação de atividade, obviamente na hipótese do parágrafo único. Caso o sujeito ativo seja civil – e aqui incluímos o próprio convocado – ou militar inativo – este também na figura do pará-grafo único –, a complementação da tipicidade deve dar-se pelo inciso III do mesmo artigo em uma de suas alíneas.

• Ação penal: é pública incondicionada.

1.4. Favorecimento a convocado

• Tipo legal

Art. 186. Dar asilo a convocado, ou tomá-lo a seu serviço, ou proporcionar-lhe ou facilitar-lhe trans-porte ou meio que obste ou dificulte a incorporação, sabendo ou tendo razão para saber que come-teu qualquer dos crimes previstos neste capítulo:

Pena – detenção, de três meses a um ano.

Isenção de pena

Parágrafo único. Se o favorecedor é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica isento de pena.

• Objetividade jurídica: mais uma vez, como nos delitos anteriores, busca-se a tutela apenas do serviço militar.

• Sujeitos do delito: o sujeito poderá ser qualquer pessoa, exceto o próprio convocado favo-recido.

O sujeito passivo, titular do bem jurídico aviltado, é a própria Instituição Militar.

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• Elementos objetivos: a conduta nuclear é “dar asilo”, significando dar guarida, abrigo ao convocado, para que se furte da incorporação ou a dificulte.

Também é abrangida pela descrição típica a conduta daquele que toma o convocado como seu serviçal, ou seja, que lhe dá serviço, emprega-o, o que, por si só, já minimizaria as consequên-cias da clandestinidade do protegido, proporcionando-lhe meio de subsistência.

Por fim, outra forma de perpetração do delito cinge-se à ação daquele que facilita transporte ou propicia meio que impeça ou atrapalhe a incorporação. Repare que, aqui, o agente não é quem proporciona diretamente tal auxílio, mas quem o facilita para que outrem o promova.