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DireitodoTrabalho-MinistroAugusto Cesar Leite de Carvalho

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CARVALHO, Augusto Cesar Leite de. Direito do Trabalho. Aracaju: Evocati, 2011, ISBN 9788599921081

DIREITO DO TRABALHO Curso e DiscursoAugusto Csar Leite de Carvalho1 SUMRIO 1 ORIGEM DO DIREITO DO TRABALHO 1.1 A pr-histria do direito do trabalho. 1.2 Os fatores econmicos que inspiraram o direito do trabalho. 1.2.1 A revoluo industrial. 1.2.2 O trabalho humano, produtivo, alheio e livre. 1.3 Os fatores sociais que inspiraram o direito do trabalho. 1.3.1 Os primeiros movimentos de insurreio dos trabalhadores. 1.3.1.1 A reao dos trabalhadores na Inglaterra. 1.3.1.2 A reao dos trabalhadores na Frana. 1.3.1.3 A reao dos trabalhadores na Alemanha. 1.3.2 A organizao das profisses. 1.4 Os fatores polticos que inspiraram o direito do trabalho. 2 HISTRIA DO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO 2.1 Direito coletivo e institutos afetos sindicato, greve e conveno coletiva. 2.2 O sindicalismo no sistema capitalista de produo. 2.3 O sindicalismo sob interveno totalitria. 3 HISTRIA DO DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL 3.1 Pr-histria do direito do trabalho: trabalho escravo e corporaes de arte e ofcio no Brasil. 3.1.1 As corporaes de ofcio na Europa e a analogia com o emprego. 3.1.2 A escravido na Amrica e especialmente no Brasil. 3.1.3 A escravido inibe as corporaes de ofcio no Brasil. 3.1.4 As leis trabalhistas surgiram antes da abolio da escravatura. 3.2 A substituio do escravo africano pelo imigrante europeu. 3.3 O direito do trabalho e a industrializao no Brasil. 4 FONTES DO DIREITO DO TRABALHO4.1 Conceito. 4.2 As fontes materiais e as fontes formais do direito. 4.2.1 As fontes formais do direito do trabalho. 4.3 Mtodos de integrao da norma jurdica. 4.4 Eficcia da norma trabalhista no tempo e no espao. 4.4.1 Eficcia da norma trabalhista no tempo. 4.4.2 Eficcia da norma trabalhista no espao.

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O autor professor universitrio. mestre em Direito Constitucional pela UFC e em Direito das Relaes Sociais pela Universidad Castilla la Mancha, onde cursa o doutorado. Ministro do Tribunal Superior do Trabalho. Endereo eletrnico: [email protected]

5 PRINCPIOS DE DIREITO DO TRABALHO5.1 Conceito e funes do princpio. 5.2 Preeminncia do princpio constitucional da dignidade (da pessoa) humana. 5.2.1 A importante contribuio do positivismo jurdico na conceituao da dignidade humana. 5.2.2 A adoo do princpio da dignidade na relao entre capital e trabalho. 5.3 Princpios especiais do direito do trabalho. 5.3.1 Princpio da proteo. 5.3.2 Princpio da irrenunciabilidade. 5.3.2.1. A indisponibilidade e a prescrio de pretenses trabalhistas. 5.3.3 Princpio da continuidade. 5.3.4 Princpio da primazia da realidade. 5.3.5 Princpio da razoabilidade. 5.3.6 Princpio da boa-f. 5.3.7 Princpio da igualdade de tratamento. 5.3.8 Princpio da autodeterminao coletiva. 5.3.8.1 A autonomia coletiva e os princpios regentes da organizao sindical. 5.3.8.2 A autodeterminao coletiva e a flexibilizao do direito do trabalho. O princpio constitucional da proteo ao trabalhador.

6 A PRESCRIO TRABALHISTA 6.1 A prescrio e o temor de propor a ao. 6.2 Actio nata como termo inicial do prazo prescricional de cinco anos. 6.3 Outras relevantes ciznias jurisprudenciais frente evoluo constitucional e das leis. 6.3.1 Os fundamentos tradicionais da prescrio total de cinco anos. 6.3.2 A prescrio total contra a pretenso de matriz constitucional. 6.3.3 A possvel influncia do atual Cdigo Civil no debate sobre a prescrio total de pretenso fundada em nulidade. 6.3.4 A jurisprudncia trabalhista sobre a prescrio da pretenso que investe contra o negcio jurdico nulo. 6.3.5 A extino do contrato como nico termo inicial da prescrio bienal. 6.3.6. Smulas 326 e 327 do TST a complementao de proventos da aposentadoria. 7 - EMPREGADO 7.1 O conceito de empregado a partir da realidade social. 7.2 Conceito legal de empregado. Requisitos da prestao laboral. 7.2.1 A pessoalidade. 7.2.2 A no eventualidade. 7.2.2.1 Distino entre o trabalho no eventual e o trabalho intermitente. 7.2.2.2 Distino entre o trabalho no eventual e o trabalho temporrio. 7.2.2.3 Distino entre o trabalho no eventual e o trabalho avulso. 7.2.3 A subordinao. 7.2.3.1 Fundamento e grau da subordinao. 7.2.3.2 O poder de comando contraface da subordinao. A) Morfologia do poder de comando. B) Natureza jurdica do poder de comando. C) Do poder regulamentar extenso do poder diretivo. 7.2.4 A onerosidade. 7.3. Os elementos acidentais da prestao laboral. 7.4 Empregados excludos da proteo pela CLT. 7.5 Tipos especiais de empregados. 7.5.1 Altos-empregados. Os empregados-diretores e os diretoresempregadores. 7.5.2 Os empregados pblicos. 7.5.3 Os empregados domsticos. 7.5.4 O empregado em domiclio. 7.5.5 O trabalho intra-familiar entre filhos e pais ou entre cnjuges. 7.5.6 O empregado aprendiz. 7.5.6.1 Distino de aprendizagem e estgio curricular. 7.5.7 Os trabalhadores intelectuais. 7.5.8 Os empregados-scios. 7.5.9 O trabalhador cooperativado. 7.5.10 O trabalhador rural. 8 EMPREGADOR 8.1 Empresa. 8.2 O conceito legal de empregador. 8.3 Empresa e estabelecimento. 8.4 Sucesso de empregadores. 8.4.1 A sucesso em outras searas do direito. 8.4.1.1 Os efeitos da transferncia do estabelecimento no direito civil. 8.4.1.2 Os efeitos da

transferncia do estabelecimento na relao de consumo. 8.4.1.3 Os efeitos da transferncia de estabelecimento na relao tributria. 8.4.2 A sucesso trabalhista no Brasil. 8.4.3 A sucesso trabalhista em situaes normais e anormais. 8.4.3.1 A mudana na estrutura jurdica da sociedade empresria. 8.4.3.2 A sucesso no mbito de empresas prestadoras de servio. 8.4.3.3 A sucesso entre sociedades irregularmente constitudas. 8.4.3.4 A invalidade da sucesso simulada. 8.4.3.5 Os efeitos da sucesso predatria. 8.5 A solidariedade entre entes empresariais que integram grupo econmico. 8.6 A subcontratao e a intermediao de mo-deobra. 8.6.1 A subempreitada em vista da Smula 331 do TST. 8.6.2 A Smula 331, IV e VI a responsabilidade subsidiria do tomador dos servios, inclusive da administrao pblica. 8.6.3 A extenso da responsabilidade subsidiria do tomador dos servios. 8.6.4 A subcontratao de servios (terceirizao) nas hipteses de contrato de faco. 8.6.5 A igualdade de direitos entre os empregados da tomadora dos servios e os empregados da empresa prestadora. 8.6.6 A terceirizao da atividade-fim nos servios de telefonia e de energia eltrica. 9 REMUNERAO E SALRIO 9.1 Conceito. 9.1.1 As teorias da tripartio e da bipartio. 9.2 O salrio. 9.2.1 O salrio mnimo. 9.2.1.1 Salrio mnimo profissional. Piso salarial. 9.2.1.2 O salrio por unidade de tempo e o salrio mnimo. Jornada reduzida. 9.2.1.3 O salrio varivel e o salrio mnimo. Hiptese de jornada reduzida. 9.2.2 Salrio-utilidade. 9.2.2.1 Limites percentuais do salrio-utilidade. 9.2.2.2 Configurao do salrioutilidade. 9.2.2.3 Converso em dinheiro. Salrio-utilidade na suspenso contratual. 9.2.3 Modalidades de salrio. 9.2.3.1 Comisso e percentagem. 9.2.3.2 Gratificaes ajustadas. A) O dcimo terceiro salrio: a antiga gratificao natalina. B) A gratificao de funo. Reverso ao cargo efetivo. Incorporao da gratificao ao salrio. C) A gratificao e o prmio. 9.2.3.3 Diria para viagem. A distino entre diria e ajuda de custo. 9.2.3.4 Abono. 9.2.4 O salrio-base e os complementos salariais. 9.2.4.1 A acessoriedade dos complementos salariais. 9.2.4.2 A periodicidade dos complementos salariais. 9.2.4.3 A multicausalidade e a plurinormatividade dos complementos salariais. 9.2.4.4 A condicionalidade dos complementos salariais. 9.2.5 Prestaes trabalhistas sem natureza salarial ou remuneratria. 9.2.5.1 A participao nos lucros, resultados ou gesto da empresa. 9.2.5.2 O Programa de Integrao Social (PIS). 9.2.5.3 O Programa de Alimentao ao Trabalhador. 9.2.5.4 O vale-transporte. 9.3 A remunerao. 9.3.1 A gorjeta imprpria. 9.3.2 A oportunidade de ganho. 9.3.2.1 O direito de arena como oportunidade de ganho. 9.3.3 A remunerao, em especial a gorjeta, como base de clculo de outras parcelas. 9.4 Os adicionais (indenizaes na teoria da tripartio). Vedao incidncia recproca. 9.4.1 O adicional de hora extra. 9.4.2. O adicional noturno. 9.4.2.1 O trabalho noturno em regime de revezamento. 9.4.2.2 O trabalho noturno decorrente da natureza da atividade. 9.4.2.3 A prorrogao do trabalho noturno. 9.4.2.4 O trabalho noturno do empregado rural. 9.4.2.5 O trabalho noturno em regimes especiais empregado porturio e advogado. 9.4.3 Os adicionais de insalubridade e de periculosidade. 9.4.3.1 Hipteses de incidncia. 9.4.3.2 A base de clculo dos adicionais de insalubridade e periculosidade. 9.4.3.3 A prvia regulamentao pelo Ministrio do Trabalho. 9.4.3.4 A necessidade de percia tcnica em sede judicial. 9.4.3.5 A supresso do direito ao adicional pela neutralizao ou eliminao do risco. 9.4.3.6 A condicionalidade do direito ao adicional de insalubridade ou periculosidade. 9.4.3.7 A inacumulabilidade dos

adicionais de insalubridade e de periculosidade. 9.4.4 O adicional de transferncia. 9.5 Os princpios informantes da teoria jurdica do salrio. 9.5.1 Princpio da irredutibilidade. 9.5.2 Princpio da integridade do salrio. 9.5.2.1 A integridade do salrio e sua determinao supletiva. 9.5.2.2. A integridade do salrio e a vedao de descontos. A) O desconto salarial e o risco da atividade econmica. Recebimento de cheques sem fundo por frentistas. Dano por coliso de veculo por culpa de motorista. As diferenas de caixa e a gratificao quebra-de-caixa. B) O desconto da contribuio assistencial. 9.5.3 Princpio da intangibilidade do salrio. 9.5.3.1 Proteo contra a imprevidncia do empregador. Falncia do empresrio empregador. Recuperao judicial e extrajudicial do empregador. Liquidao extrajudicial da sociedade empregadora. 9.5.3.2 Proteo contra a imprevidncia do empregado. Incessibilidade. Impenhorabilidade absoluta. 9.5.4 Princpio da igualdade de salrio. 9.5.4.1 Os pressupostos da equiparao salarial com empregado brasileiro. 9.5.4.2 A existncia de quadro de carreira fato impeditivo da equiparao. Direito ao enquadramento. 9.5.4.3 Equiparao salarial com estrangeiro. 9.5.5 Princpio da certeza do pagamento do salrio. 9.5.5.1 A certeza que emana do modo de pagar o salrio. O recibo de pagamento e o salrio complessivo. 9.5.5.2 A certeza quanto ao valor do salrio. 9.5.5.3 A certeza quanto ao tempo e ao lugar do pagamento de salrio. 10 DURAO DO TRABALHO 10.1 Durao. Jornada. Horrio. 10.2 A jornada de trabalho. 10.2.1 Critrios gerais de fixao da jornada. 10.2.1.1 O tempo de trabalho e o tempo disposio do empregador. O nus da prova. 10.2.1.2 O tempo de deslocamento residnciatrabalho-residncia. 10.2.1.3. O tempo de afastamento justificado. 10.2.2 Critrios especiais de fixao da jornada. 10.2.2.1 O tempo de prontido. 10.2.2.2 O tempo de sobreaviso. 10.2.2.3 O tempo de intervalo especial. 10.2.3 Jornada extraordinria. 10.2.3.1 Jornada realmente extraordinria. 10.2.4 Jornadas normais reduzidas bancrios, telefonistas, operadores cinematogrficos, mineiros, cabineiros de elevador, professores, advogados, aeronautas, tcnicos em radiologia, artistas, msicos. 10.2.5 Compensao de jornadas. Banco de horas e fonte do direito. 10.2.6 Turnos ininterruptos de revezamento. 10.2.6.1 Os intervalos em turnos ininterruptos de revezamento. 10.2.6.2 A sobrevigncia da Lei 5811/72. 10.2.6.3 A reduo da hora noturna no sistema de turnos ininterruptos de revezamento. 10.2.7 Trabalhadores no protegidos pela norma regente da durao do trabalho. 10.3 Intervalos intrajornadas e interjornadas. 10.3.1 Intervalos intrajornadas. 10.3.1.1 Intervalo mnimo. Autorizao do Ministrio do Trabalho para reduo e efeitos da supresso. 10.3.1.2 Intervalo mximo. Possibilidade de prorrogao por norma escrita. Efeitos da dilao no autorizada. 10.3.2 Intervalos interjornadas. 10.3.2.1 Intervalo entre duas jornadas. 10.3.2.2 Repouso semanal e em feriados. A) A preferncia da folga aos domingos. B) A folga obrigatria em feriados. C) A folga e a remunerao da folga. D) A remunerao do trabalho em dia de folga. 10.3.2.3 Frias. A) Conceito, finalidade e histria das frias. B) Natureza jurdica das frias. C) Aquisio do direito ao gozo de frias. D) Perodo concessivo das frias. Poder patronal de datar a fruio das frias. Fracionamento. Aviso prvio e registros pertinente. D1) Perodo legal de fruio em meio ao perodo concessivo. E) Possibilidade de converso em pecnia. F) Remunerao das frias. G) Frias no concedidas. Remunerao em dobro e outras sanes. H) Frias coletivas. I) Efeitos da cessao do contrato. Frias

vencidas e proporcionais. J) Frias remuneradas mas no gozadas. K) As frias do empregado domstico. L) Prescrio das frias. M) A Conveno 132 da OIT. 11 NATUREZA DA RELAO DE EMPREGO 11.1 Natureza ou fonte das obrigaes. 11.2 As teorias anticontratualistas A) A teoria da relao de trabalho. B) A teoria institucionalista. 11.3 As teorias contratualistas. A) Teoria do contrato de locao. B) Teoria do contrato de compra e venda. C) Teoria do contrato de sociedade. D) Teoria do contrato de mandato. E) Teoria do contrato-realidade. 12 CONTRATOS AFINS AO DE EMPREGO 12.1 Relao de emprego: espcie do gnero relao de trabalho. 12.2 A relevncia da subordinao como elemento distintivo. 12.3 A locao de servios e o novo contrato de prestao de servios. 12.4 Distino entre emprego e empreitada. 12.5 Distino entre emprego e mandato. 12.6 Distino entre emprego e sociedade. 12.7 Distino entre emprego e relao de consumo. 13 CARACTERES DO CONTRATO DE EMPREGO 13.1 Classificao do contrato de emprego. 13.1.1 Contrato nominado. 13.1.2 Contrato de direito privado. 13.1.3 Contrato principal. 13.1.4 Contrato consensual. 13.1.5 Contrato bilateral. 13.1.6 Contrato oneroso e comutativo. 13.1.7 Contrato intuitu personae. 13.1.8 Contrato continuado. 13.1.9 Contrato de adeso. 14 ELEMENTOS DO CONTRATO DE EMPREGO 14.1 O que so elementos de um contrato. 14.2 Elementos essenciais do contrato de emprego. 14.2.1 Os pressupostos: a capacidade, a liceidade do objeto e, em alguns casos, a legitimao. A) A capacidade trabalhista. B) A licitude do objeto. C) A legitimao. 14.2.2 Os requisitos da relao de trabalho: causa, consentimento e, excepcionalmente, a forma especial. A) A causa. B) O consentimento. C) A forma escrita ou a exigncia de solenidade. 14.3 Elementos acidentais do contrato de emprego. 15 CLASSIFICAO DOS CONTRATOS DE EMPREGO 15.1 Classificao quanto aos sujeitos. 15.2 Classificao dos contratos de emprego quanto durao. 15.2.1 O termo final em norma geral. 15.2.2 O termo final em norma especial. 15.2.3 Contrato de trabalho sob condio resolutiva. 15.2.4 Peculiaridades dos contratos a termo. Durao mxima. Reconduo tcita. Suspenso contratual. Ruptura antecipada. Aquisio de estabilidade. Sucesso de contratos com termo certo. 16 CONTEDO DO CONTRATO DE EMPREGO

16.1 A semntica da teoria dos contratos distino entre contedo e objeto mediato. 16.2 O contedo do contrato de emprego. 17 ALTERAO DO CONTRATO DE EMPREGO 17.1 A alterao contratual no mbito do direito civil. 17.2 Consideraes gerais sobre a alterao contratual no mbito do direito do trabalho. O direito de variar e o direito de resistir. 17.3 Alteraes por interveno do Estado e por negociao coletiva. 17.4 Alteraes voluntrias do contrato de emprego. 17.4.1 A alterao consensual do contrato de emprego. 17.4.2 A inalterabilidade unilateral do contrato e o jus variandi. 17.4.2.1 A alterao funcional e seu limite de licitude. 17.4.2.2 A tentativa de padronizar o jus variandi. 17.4.2.3 A mudana de localidade e seus efeitos pecunirios. Grupo econmico. 17.4.2.4 O jus variandi extraordinrio. 18 SUSPENSO DO CONTRATO DE EMPREGO 18.1 A suspenso contratual sob a tica do direito do trabalho. 18.2 Nome e contedo dos tipos de suspenso. 18.3 Classificao legal. 18.3.1 Hipteses de interrupo contratual. 18.3.2 Hipteses de suspenso contratual. 18.3.2.1 Efeitos da suspenso contratual no tocante a prestaes no sinalagmticas assistncia escolar, mdica ou odontolgica. 18.3.2.2 Efeitos da suspenso contratual no tocante justa causa. 18.3.2.3 A proteo ao empregado portador da AIDS. 18.3.2.4 Efeitos da suspenso contratual no tocante prescrio. 18.3.3 Casos hbridos. Efeitos jurdicos. 18.4 Conversibilidade da suspenso do contrato. 19 CESSAO DO CONTRATO DE EMPREGO 19.1 Terminologia. 19.2 Resilio do contrato de emprego. Direito potestativo, nus da prova e aviso prvio. 19.2.1 O aviso prvio. 19.2.1.1 Conceito e cabimento do aviso prvio. 19.2.1.2. Forma do aviso prvio. Aviso prvio de trabalhador menor. 19.2.1.3. Indenizao compensatria do aviso prvio. Integrao ao tempo de servio do aviso prvio indenizado pelo empregador. 19.2.1.4 Prazo de aviso prvio. 19.2.1.5 Especificidades do aviso prvio devido pelo empregador. 19.2.1.6 Natureza jurdica do aviso prvio. 19.2.1.7 Aviso prvio e justa causa. Aquisio de estabilidade provisria. 19.2.1.8 Aviso prvio e suspenso contratual. 19.2.1.9 Aviso prvio, prazo para pagamento das resilitrias e prescrio. 19.2.2 Assistncia ao empregado demissionrio. Empregado menor que se demite. 19.3 Resoluo do contrato de emprego. Extino normal. Justa causa. 19.3.1 A resoluo mediante extino normal do contrato de emprego. 19.3.2 A justa causa implemento da condio resolutiva tcita. 19.3.2.1 A justa causa e a falta grave. 19.3.2.2 As justas causas atribuveis aos empregados. A) Ato de improbidade. B) Incontinncia de conduta ou mau procedimento. C) Negociao habitual. D) Condenao criminal. E) Desdia no desempenho das funes. F) Embriaguez habitual ou em servio. G) Violao de segredo da empresa. H) Indisciplina ou insubordinao. I) Abandono de emprego. J) Ato lesivo da honra e boa fama ou ofensas fsicas. K) Prtica constante de jogos de azar. 19.3.2.3 As justas causas atribuveis aos empregadores. A) Servios superiores s foras do empregado. B) Rigor excessivo. C) Perigo manifesto de mal considervel. D) No cumprimento de obrigaes do contrato. E)

Ato lesivo da honra ou boa fama. Ofensas fsicas. F) Reduo do trabalho remunerado por pea ou tarefa. 19.3.2.4 A culpa recproca. 19.3.2.5 Justa causa do empregado domstico. 19.3.2.6 A resoluo do contrato de empregado pblico. 19.3.2.7 A greve e a resoluo contratual. 19.4 Resciso do contrato de emprego. 19.5 Caducidade do contrato de emprego. A) Morte do empregado. B) Aposentadoria do empregado. C) Morte do empregador. D) Fora maior que determina a extino da empresa. E) Factum principis. F) Outros casos de cessao da empresa ou estabelecimento. Falncia. Recuperao judicial. Liquidao extrajudicial. G) A confuso como causa extintiva da obrigao trabalhista. 19.6 O regime do Fundo de Garantia do Tempo de Servio. 19.6.1 A histria e a estrutura do sistema de depsitos. 19.6.2 Alquotas e titulares do direito ao FGTS. 19.6.3 Natureza jurdica do FGTS. Contribuio social ou salrio diferido. A Lei Complementar 110 e sua aparente inconstitucionalidade. 19.6.4 A movimentao da conta vinculada. 19.7 A forma e a fora liberatria do recibo firmado no desate contratual. 19.8 Efeitos da cessao do contrato de emprego. 19.8.1 O direito reintegrao. 19.8.2 As prestaes tpicas da dissoluo do contrato. A) Indenizao e integrao do perodo de aviso prvio. B) Frias em dobro, simples e proporcionais. C) Dcimo terceiro salrio proporcional. D) Fundo de Garantia do Tempo de Servio e acrscimo indenizatrio de 40%. E) Multa do artigo 477, 8 o, da CLT. F) Sano do artigo 467 da CLT. G) Indenizao adicional. Artigo 9 o da Lei 7238/84. H) Seguro-desemprego. I) Indenizao por danos morais. 20 ESTABILIDADE NO EMPREGO 20.1 Fonte jurdica e tipologia da estabilidade. 20.2 A estabilidade definitiva. 20.3 A estabilidade provisria. 20.3.1 A estabilidade sindical. 20.3.2 A estabilidade dos membros da CIPA eleitos pelos empregados. 20.3.3 A estabilidade da gestante. 20.3.4 A estabilidade acidentria. 20.3.5 A estabilidade dos membros da Comisso de Conciliao Prvia eleitos pelos empregados. 20.3.6 A estabilidade do membro do Conselho Curador do FGTS. 20.3.7 A estabilidade do empregado eleito diretor de cooperativa. 20.3.8 A estabilidade do membro do CNPS. 20.3.9 A estabilidade dos representantes dos trabalhadores na empresa. 20.3.10 A estabilidade no perodo pr-eleitoral. 21 DIREITO FUNDAMENTAL DE GREVE 1 Conceito. 2 A greve e o meio ambiente de trabalho. 3 A interao com os sistemas poltico e econmico por ocasio da greve. 4 A decomposio do conceito de greve. 4.1 A greve como direito fundamental direito coletivo fundamental. 4.1.1 As dimenses individual e coletiva do direito fundamental greve. 4.1.2 A greve como direito fundamental a opo pela via pacfica e a ausncia de mtodos alternativos de soluo dos conflitos coletivos. 4.1.3 O interesse coletivo e as greves geral, poltica e de solidariedade. 4.1.4 A greve como direito fundamental o lockin e o lock-out. 4.2 A greve e o princpio da boa-f objetiva. 4.2.1 Imunizao da greve contra a perturbao patronal. 4.2.2 Imunizao da greve contra a perturbao obreira. 4.3 A suspenso do contrato durante a greve. 5 A greve sob interveno judicial. 6 A greve e o interdito proibitrio. 6.1 A ameaa posse como pressuposto do interdito possessrio. 6.2 A necessidade de audincia de justificao para a concesso do mandado proibitrio.

Atualizado em julho de 2010

1 Origem do Direito do TrabalhoAugusto Csar Leite de Carvalho 1 SUMRIO: 1.1 A pr-histria do direito do trabalho. 1.2 Os fatores econmicos que inspiraram o direito do trabalho. 1.2.1 A revoluo industrial. 1.2.2 O trabalho humano, produtivo, alheio e livre. 1.3 Os fatores sociais que inspiraram o direito do trabalho. 1.3.1 Os primeiros movimentos de insurreio dos trabalhadores. 1.3.1.1 A reao dos trabalhadores na Inglaterra. 1.3.1.2 A reao dos trabalhadores na Frana. 1.3.1.3 A reao dos trabalhadores na Alemanha. 1.3.2 A organizao das profisses. 1.4 Os fatores polticos que inspiraram o direito do trabalho. 1.1 A pr-histria do direito do trabalho Houve tempo em que o homem produzia para atender s suas prprias necessidades e s de sua famlia, interagindo com a natureza e com outros homens que agiam sua semelhana. Era um tempo, portanto, de mediaes de primeira ordem 2 , ou mediaes primrias, e de comportamento instintivo. Produzindo o que era til para o prprio consumo, o homem primitivo desconhecia o conceito de mercadoria e o mundo do trabalho no comportava, em situao de normalidade, a estrutura hierrquica que mais tarde viria a predominar nas relaes de trabalho. A terra no estava repartida, nem havia quem a repartisse. A troca ou escambo ganhou, progressivamente, alguma complexidade at que se iniciou um processo de converso do valor de uso em valor de troca 3 , pois as coisas transferidas no o eram mais segundo o valor da utilidade que proporcionavam, mas passaram a ter o seu valor inflado pelo trabalho humano e, mais adiante, pelo valor que correspondia ao lucro, vale dizer, o ganho do empresrio que precisava existir para justificar o seu investimento na produo.O autor professor universitrio. mestre em Direito Constitucional pela UFC e em Direito das Relaes Sociais pela Universidad Castilla la Mancha, onde cursa o doutorado. Ministro do Tribunal Superior do Trabalho. 2 Sobre o tema, ver, por todos, Ricardo Antunes (ANTUNES, Ricardo. Os Sentidos do Trabalho: ensaio sobre a afirmao e a negao do trabalho. So Paulo: Editorial Boitempo, 2000, passim). 3 As expresses valor de uso e valor de troca so usadas por Marx (MARX, Karl. Para a Crtica da Economia Poltica. Traduo de Edgard Malagodi. Coleo Os Pensadores. So Paulo: Editora Nova Cultural, 1999, passim), mas, segundo nota na p. 57, foram cunhadas por Aristteles, que assim se referiu: Pois todo o bem pode servir para dois usos... Um prprio coisa como tal, mas o outro no o : assim, uma sandlia pode servir como calado, mas tambm pode ser trocada. Trata-se, nos dois casos, de valores de uso da sandlia, porque aquele que troca a sandlia por aquilo de que necessita, alimentos, por exemplo, serve-se tambm da sandlia como sandlia. Contudo, no este o seu modo natural de uso. Pois a sandlia no foi feita para a troca. O mesmo se passa com os outros bens.1

O investimento na produo de mercadorias, em escala industrial, no foi a primeira forma de inverso do capital a contribuir para que se reduzissem gradualmente as mediaes de primeira ordem. Um modelo econmico que pressupunha a realizao de capital e, sob perspectiva histrica, precedeu o sistema capitalista fora decerto o sistema mercantilista. Desde as primeiras formas de mercantilismo (bulionismo ou metalismo), preconizava-se estar a riqueza das naes associada quantidade de metais preciosos ouro e prata acumulada, servindo o incremento das exportaes a esse fim. No por acaso, as naes colonialistas impediam que o ouro da colnia fosse vendido a outros povos. Tambm a explorao do trabalho humano no surgiu, evidentemente, com a primeira revoluo industrial. Ademais de citar o trabalho escravo e as suas modalidades desde aquele que se realizava por meio de prisioneiros de guerra at o crudelssimo aprisionamento da gente africana podem-se mencionar o labor dos servos de gleba 4 e dos aprendizes e oficiais nas corporaes de arte e ofcio 5 . O aparecimento do direito do trabalho tem relao com um modo especfico de produo capitalista que emergiu com a realidade social sobrevinda aps os movimentos de ruptura scio-poltica e econmica que caracterizaram o fim da era moderna, no tumultuado sculo XVIII. As condies adversas do trabalho humano que se percebiam no mbito do emprego industrial exigiam um sistema de compensao jurdica que por zelo ou hipocrisia as legitimasse, atenuando o seu carter espoliativo, alm de demandarem uma construo terico-filosfica que fizesse face ideia, desde antes difundida entre os colbertistas, de que o industrial deveria assegurar aos seus trabalhadores apenas a remunerao que lhes garantisse a sobrevivncia, pois do contrrio no ocorreria a acumulao de riqueza to cara ao mercantilismo. Inspirando-se em sistematizao proposta por Maurcio Godinho Delgado 6 , convm destacar os fatores econmicos, sociais e polticos que deflagraram o surgimento do direito do trabalho como ramo especfico do direito privado. Pode ser referido como fator econmico o advento do trabalho humano, alheio, produtivo e livre mas subordinado que caracterizou o emprego industrial; o fator social4

Conforme ressaltamos em outro escrito, o homem se libertou do trabalho escravo, mas no completamente, pois se seguiu a Era Medieval e, nela, uma sociedade dividida em rgidos estamentos: os senhores feudais e os servos. A servido era imposta a quase todos os camponeses e se diferenciava do trabalho escravo porque o servo se ligava terra e pelo seu uso pagava diversos tributos, passando a ter novo amo quando a terra era vendida. Vinculava-se o servo gleba como antes se vinculara o escravo ao seu senhor. 5 Vide VIDA SORIA, J., MONEREO PREZ, J.L., MOLINA NAVARRETE, C., Manual de Derecho del Trabajo. Granada: Comares, 2004, p. 64. Os autores observam que o trabalho em regime gremial ou corporativo exibia algumas caractersticas coincidentes com a relao laboral prpria da empresa capitalista, alm de outras que o faziam diferente. As diferenas mais expressivas se encontravam no modo de se constituir a organizao em que se realizava o trabalho. No plano das relaes individuais, eram, porm, parecidas as condies em que se trabalhava sob as ordens dos mestres ou, mais adiante, dos empresrios. As coincidncias estavam presentes, por exemplo, na circunstncia de que as ordenanas gremiais relativas ao perodo de prova, disciplina, durao do contrato e tempo de trabalho seguiam orientao anloga que tem o atual direito do trabalho e tambm na peculiaridade de os aprendizes, companheiros e mestres serem trabalhadores livres. Mas os autores advertem, porm, que a liberdade de trabalho dos aprendizes era seriamente afetada, em muitos casos, pela combinao de uma longa durao de seus contratos eram comuns contratos de seis anos com um regime de desvinculao ou desate contratual muito rigoroso. 6 DELGADO, Maurcio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. So Paulo: LTr, 2008, p. 87.

mais relevante ter sido a concentrao urbana que propiciou a organizao das profisses e viabilizou assim os movimentos obreiros reivindicatrios; os fatores polticos a serem ressaltados so decerto a liberdade de exercer qualquer profisso sem as amarras da sociedade estamental ou mesmo do sistema corporativo, bem assim as aes coletivas que se desencadearam a partir do ambiente de empresa e geraram no apenas a normatizao das condies de trabalho sem a colaborao do Estado, mas tambm o modelo de democracia social que se contraporia soluo de fora preconizada por Marx para a conquista de uma sociedade menos desigual. Cabe destrinar cada um desses fatos determinantes para o nascimento e consolidao do direito laboral. 1.2 Os fatores econmicos que inspiraram o direito do trabalho Nos estertores do sculo XVIII, os trabalhadores perceberam a influncia danosa da primeira revoluo industrial na oferta de trabalho e recusaram, por isso, a submisso a normas inspiradas nos princpios da revoluo burguesa, especialmente nos postulados da igualdade e liberdade que os supunham, no plano artificial das abstraes jurdicas, semelhantes a empresrios que os submetiam, inclementemente, a condies injustas de trabalho. Cabe-nos estudar, portanto e analiticamente, os atributos do trabalho que justificaram a nova regncia, ou melhor, impende analisar o fenmeno social que motivou o surgimento do direito do trabalho. Antes de detalhar as condies em que o trabalhador prestara servio naquele novo modelo de organizao social, ou seja, na empresa que emergira com a primeira revoluo industrial, convm, por certo, relembrar o significado e as derivaes desse conceito (revoluo industrial). 1.2.1 A revoluo industrial Poderia causar estranheza o uso indiscriminado do vocbulo revoluo para designar uma transformao nos meios de produo como o caso da revoluo industrial e tambm alguns movimentos de ruptura poltica, como a Revoluo Francesa de 1789 e, na mesma Inglaterra, a Revoluo Gloriosa, um sculo antes. Ensina-nos Fbio Konder Comparato que revolutio, em latim, o ato ou efeito de revolvere (volvere significa volver ou girar, com o prefixo re indicando repetio), no sentido literal de rodar para trs e no figurativo de volver ao ponto de partida, ou de relembrar-se 7 . Anota Comparato que o uso poltico do vocbulo revoluo comeou com os ingleses, no sentido de uma volta s origens e, mais precisamente, de uma restaurao dos antigos costumes e liberdades. [...] O termo revolution assim usado, pela primeira vez, para caracterizar a restaurao monrquica de 1660, aps a ditadura de Cromwell8 . Deuse, porm, um giro semntico a partir da Revoluo Francesa, pois a mesma palavra que expressava o retorno ao regime poltico anterior passou a significar uma mudana completa de valores e na ordem dos fatos, com o sinal claramente prospectivo da promessa de um mundo novo:O grande movimento que eclodiu na Frana em 1789 veio operar na palavra revoluo uma mudana semntica de 180. Desde ento, o termo passou a ser usado para indicar uma renovao completa das estruturas sociopolticas, a7

COMPARATO, Fbio Konder. A Afirmao Histrica dos Direitos Humanos. So Paulo: Saraiva, 2003, p. 124. 8 Idem, ibidem.

instaurao ex novo no apenas de um governo ou de um regime poltico, mas de toda uma sociedade, no conjunto das relaes de poder que compem a sua estrutura. Os revolucionrios j no so os que se revoltam para restaurar a antiga ordem poltica, mas os que lutam com todas as armas inclusive e sobretudo a violncia para induzir o nascimento de uma sociedade sem precedentes histricos. 9

Nos dias que correm, o termo revoluo polissmico, embora preserve a conotao de ruptura que lhe foi dada pela Revoluo Francesa. Lembra Paulo Bonavides10 que pode tal palavra significar, para os historiadores, a transformao fundamental de uma situao existente, no importa em que domnio; enquanto para os juristas a revoluo essencialmente a quebra do princpio da legalidade, a queda de um ordenamento jurdico de direito pblico, sua substituio pela normatividade nova que advm da tomada do poder e da implantao e exerccio de um poder constituinte originrio. Muito prximo e at se relacionando intrinsecamente com o conceito jurdico, o conceito poltico de revoluo: a modificao violenta dos fundamentos jurdicos de um Estado. Interessa o tema sobretudo aos socilogos e eles, quando instados ao conceito de revoluo, concebem-na, como ocorrera a Marx, como a busca retroativa de um desenvolvimento obstaculizado, o que corresponderia, na sociedade de classes em constante conflito, ao momento em que as foras materiais de produo na Sociedade caem em contradio com as relaes de produo existentes. Ainda no campo sociolgico, Ortega y Gasset observou que a revoluo no barricada mas um estado de esprito, rematando enfim que o revolucionrio no se rebela contra os abusos da sociedade, conforme fazia o homem medieval, mas contra os usos, quer dizer, contra as instituies, como faz o homem moderno. O mestre Bonavides, de cujo ensinamento extramos vrias destas breves notas, acrescenta: se a mudana se refere ao pessoal de governo, no houve revoluo, mas golpe de Estado; se a mudana, porm, atingiu a Constituio poltica e a forma de governo, j possvel falar em revoluo, a saber, revoluo poltica; se, porm, as transformaes se verticalizarem mais [...], com ascenso de uma nova classe ao poder ou apario de um novo sistema de camadas sociais, redistribuio de propriedade ou at mesmo sua abolio [...], a o cientista poltico reconhecer ento a revoluo social 11 . Como se pode perceber, o termo revoluo no comporta, sob o ponto de vista conceitual, reduo sociolgica, jurdica ou poltica. Os seus vrios sentidos denotam mudana e no raro se interpenetram os vrios matizes dos fatos ou atos que socilogos, juristas e cientistas polticos classificam, ao mesmo tempo, como revolucionrios. O laboralista Evaristo de Moraes Filho 12 atribui a autoria da expresso revoluo industrial a Arnold Toynbee, situando-a em escrito de 1884, e nos remete a trecho pinado da obra de Blanqui (clebre revolucionrio e socialista francs que passou na priso quase trinta anos de sua vida):

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COMPARATO, op. cit., p. 125. BONAVIDES, Paulo. Cincia Poltica. 10a edio. So Paulo : Malheiros Editores, 1997. p. 402. 11 Bonavides. Op. cit. p. 408. 12 MORAES FILHO, Evaristo de. Do Contrato de Trabalho como Elemento da Empresa. So Paulo: LTr, 1993. Edio fac-similada, nota 33 da Parte I. p. 78.10

Enquanto a Revoluo Francesa fazia suas grandes experincias sociais em cima de um vulco, a Inglaterra comeava as suas no terreno da indstria. O fim do sculo XVIII assinalou-se naquele pas por descobertas admirveis, destinadas a modificar a face do mundo e aumentar de modo inesperado o poder de seus inventores. As condies de trabalho sofreram a mais profunda modificao que haviam experimentado desde a origem das sociedades. Duas mquinas, imortais desde ento, a mquina a vapor e a mquina de fiar, transformaram o velho sistema comercial e fizeram nascer no mesmo momento produtos materiais e questes sociais, desconhecidas dos nossos pais. Os pequenos trabalhadores iriam tornar-se tributrios dos grandes capitalistas; a mquina-ferramenta substitua a roda de fiar, e o cilindro a vapor sucedia a economia domstica.

O autor francs se referia ao maquinismo e nova realidade social que dele emergia. E que progresso teve, afinal, a mquina, ao fim do sculo XVIII? Historiando a Idade Contempornea, Cludio Vicentino 13 anota que a revoluo industrial se iniciou com a mecanizao do setor txtil, cuja produo tinha amplos mercados nas colnias, inglesas ou no, da Amrica, frica e sia. Alinha, entre as principais invenes mecnicas do perodo, a mquina de fiar, o tear hidrulico e o tear mecnico. Em 1712, Thomas Newcomen inventou a mquina movida a vapor, sendo sua inveno aperfeioda por James Watt (1765). Em 1805, surgiu o barco a vapor e em 1814, a locomotiva a vapor, sendo assim os transportes igualmente influenciados pela descoberta do vapor como fora motriz. Em verdade, a associao entre o maquinismo e a evoluo dos meios de transporte tem um efeito singular: a um s tempo, produzia-se em srie e se distribua o bem produzido em mercados antes no explorados, o que estimulava novos investimentos na produo desse e de outros bens. Inicialmente, a Inglaterra monopolizou a industrializao. Os ingleses abandonaram inclusive a produo e a exportao de produtos primrios 14 , transferindo-as para as colnias que, situando-se em zona temperada, possuam solo frtil para a agricultura que era, na grande ilha europeia, substituda pela criao de carneiros que proveriam as novas indstrias txteis 15 . fato, porm, que o padro ingls de industrializao exigia investimentos no muito elevados e tecnologia pouco complexa, o que permitiu a outros povos (Alemanha, EUA, Frana, Japo e Rssia) inserir-se gradualmente, ao decorrer o sculo XIX, no mesmo modelo de produo fabril que caracterizou a primeira revoluo industrial 16 . Sobreveio, porm, a segunda revoluo industrial, configurando-se afinal por uma maior escala de produo imposta pelo produo de novos bens que exigiam investimentos de maior monta, a exemplo da produo de energia eltrica, automvel, qumica, petrleo, ao etc. Pochmann explica:

VICENTINO, Cludio. Histria Geral. So Paulo: Scipione, 1997, p. 284. Anota Marcio Pochmann (POCHMANN, Marcio. O Emprego na Globalizao. So Paulo: Boitempo Editorial, 2005, p. 20) que a Inglaterra pde comportar apenas 9% de sua fora de trabalho no setor primrio, em 1900, enquanto os Estados Unidos possuam 37% de sua populao ativa no campo, a Alemanha 34%, a Frana 43%, a Itlia 59%, a Espanha 67%, o Japo 69%, o Mxico 71%, a ndia 72%, o Brasil 73%, a Rssia 77% e a China 81%, conforme apona a pesquisa de Morris & Irwin (1970). 15 Sobre o tema, ver, por todos, PRADO JR, Formao do Brasil Contemporneo. So Paulo: Brasiliense, 2000, passim. 16 Cf. Pochmann, op. cit., p. 20.14

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O surgimento de grandes empresas, por meio de fuso e cartis, e a unio dos capitais industrial e bancrio (financeiro) viabilizaram, para poucos empresrios, a possibilidade de produo e difuso de uma nova onda de inovao tecnolgica. As dificuldades adicionais de acesso segunda Revoluo Industrial e Tecnolgica tornaram mais complexas as possibilidades de transio das naes perifricas para as naes do centro capitalista. Assim, entre 1890 e 1940, as exportaes mundiais de produtos manufaturados estiveram concentradas em apenas 5 pases (Inglaterra, Estados Unidos, Frana, Japo e Alemanha), que respondiam por cerca de 80% do total do comrcio internacional (Chirot, 1977).

A bem dizer, a segunda revoluo industrial teve incio na ltima metade do sculo XIX, quando se descobriu a eletricidade (o dnamo a ensejar a substituio do vapor), como fonte alternativa de energia para a indstria, e inveno de Henry Bessemer permitiu a transformao do ferro em ao, este suplantando aquele por suas caractersticas de dureza, resistncia e baixo custo - a inveno revolucionou a indstria metalrgica, que passou a produzir o ao em larga escala. Ao incio do sculo XX, a Inglaterra d sinais de fragilidade na sua condio de potncia hegemnica, agravando-se esse quadro em razo das duas guerras mundiais e da depresso econmica de 1929. A seu turno, os Estados Unidos j se apresentavam como a principal economia do centro capitalista e, no segundo ps-guerra, assumiram afinal a posio de hegemonia 17 . A evoluo tecnolgica se intensificou desde a insero do petrleo (motor de combusto interna) como fonte energtica e, em vista do atual processo de informatizao da indstria, j h quem se refira a uma terceira revoluo industrial, no se podendo abstrair que a agilidade dos atuais meios de comunicao e a globalizao dos mercados, mediante a formao de blocos econmicos e interao entre estes, est por transmudar, como lembra o Professor Jos Eduardo Faria, a sociedade industrial em uma nova sociedade informacional, na qual o tempo de explorao comercial das invenes industriais se acelera na mesma proporo em que tais invenes so superadas por outras que revelam maior avano tecnolgico, contando-se esse tempo razo de semanas ou meses, sequer de anos... O alto investimento em pesquisa e a expanso do mercado mediante a globalizao da economia se justificariam, assim, como frmula medicinal para o tempo mnimo por que uma inveno industrial se converte em lucro. O paralelismo entre a questo social vivenciada no final do sculo XVIII (ou desde ento) com a realidade de nossos dias nos autoriza, quando menos, a diagnosticar a causa recorrente do conflito entre capital e trabalho: a evoluo do maquinismo e da tecnologia sempre exigiram o desemprego como custo social. irresistvel lembrar, contudo, a viso otimista de Domenico de Masi, que concebe o desemprego estrutural, causado pela automao em todos os setores da economia, como uma fase de transio que desembocar na libertao do trabalho, tal como a humanidade outrora se libertou da escravido e, por meio do direito do trabalho, libertou-se da fadiga. De Masi 18 nos traz o alento:Quando comparada libertao da escravido, que caracterizou a Idade Mdia, e libertao da fadiga, que caracterizou a sociedade industrial, a libertao do trabalho, que ir caracterizar a sociedade ps-industrial, delineia-se com traos17 18

Cf. Pochmann, op. cit., p. 22. DE MASI, Domenico. Op. cit. p. 11.

peculiares. Posto que as mquinas se incumbiro de quase todo o trabalho fsico, assim como de boa parte do trabalho intelectual do tipo executivo, o ser humano ir guardar para si o monoplio da atividade criativa que, por sua prpria natureza, d muito menos margem do que a atividade industrial para a alocao de tarefas e para a diviso entre tempo de trabalho e tempo livre. De modo diferente do desemprego, que necessariamente acompanhado pelos males da misria e da marginalizao, a libertao do trabalho admite formas de vida muito mais livres e felizes.

Ainda no alcanamos, decerto, esse promissor estgio. Como ainda tende a ocorrer num regime de dominao do capital, o trabalhador que assistiu ao nascimento do maquinismo, no final de sculo (XVIII), no convivia apenas com a ameaa de desemprego. Aceitava ele qualquer condio de trabalho, e a chamada meia-fora (mulheres e crianas) despendia, em contra-senso, ainda mais fora de trabalho em troca de pior remunerao. Mas se rebelava a massa trabalhadora contra essa situao indigna, a que fora injustamente lanado. A realidade social indicava uma tenso insuportvel entre a necessidade de o trabalhador garantir a subsistncia e, do outro lado, a oferta de trabalho que rareava na mesma proporo em que se desenvolvia o maquinismo, sobretudo aps a insero da energia eltrica no processo produtivo. O direito do trabalho veio sendo conquistado pelos trabalhadores na exata medida em que a presso desses pontos extremos rompeu o tnue fio do individualismo jurdico (fundado no axioma: quem diz contratual, diz justo; depende do indivduo assumir ou no obrigaes) e inspirou na classe proletria o anseio de um novo DIREITO. A origem primeira do direito do trabalho nos remete, contudo e certamente, realidade vivenciada, ao final do sculo XVIII, pelos trabalhadores da Europa Ocidental, pois nessa regio se desenvolveu, mais intensamente, o emprego industrial e a conseqente necessidade de resgatar a dignidade do trabalho humano. No deve causar estranheza a circunstncia de no nos atermos experincia sovitica, embora a ela se refiram os homens de nosso tempo quando, desavisadamente, pretendem estabelecer alguma correlao inexorvel entre o regime comunista e o direito do trabalho vigente entre ns. preciso antecipar que o marxismo no se coaduna com a presena de um Estado, menos ainda de uma estrutura estatal que, sendo provedora de direitos laborais, legitime o modo de produo capitalista. Alm disso, parece-nos assistir razo a Hobsbawn 19 , quando afirma o historiador:Com exceo dos romnticos que viam uma estrada reta levando das prticas coletivas da comunidade alde russa a um futuro socialista, todos tinham como igualmente certo que uma revoluo na Rssia no podia e no seria socialista. As condies para uma tal transformao simplesmente no estavam presentes num pas campons que era sinnimo de pobreza, ignorncia e atraso, e onde o proletariado industrial, o predestinado coveiro do capitalismo de Marx, era apenas uma minscula minoria, embora estrategicamente localizada.

1.2.2 O trabalho humano, produtivo, alheio e livre

HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos: o breve sculo XX 1914-1991. Traduo de Marcos Santarrita. So Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 64.

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Que o direito do trabalho disciplina o trabalho humano, no h dvida. As relaes jurdicas de direito privado tm a pessoa como sujeito, regra geral. Quando pormenorizamos as caractersticas da relao jurdica de trabalho, percebemos, contudo, que o direito laboral cuida exclusivamente do trabalho prestado pelo homem, pessoa fsica ou natural, no lhe interessando o servio realizado por pessoa jurdica ou ideal. No demasia lembrar, ainda, que o direito do trabalho trata o homem como tal, sublimando inclusive o fato de a prestao de trabalho importar o dispndio de energia humana. No mais se iguala o homem ao semovente ou coisa - objeto da locao que retorna ao proprietrio quando cessa o contrato. A saber, a razo de o direito do trabalho existir decerto a perspectiva de o trabalho ser um valor social que dignifica o homem na era contempornea e a necessidade de o trabalho humano exigir uma regncia normativa que o associe dignidade da pessoa que o realiza. Trabalho produtivo e lazer no se distinguem pela tcnica acaso utilizada (o mesmo mtodo de pescar pode servir a uma atividade profissional ou ldica), mas se diferenciam pela caracterstica, que s o primeiro revela, de o homem usar seu esforo tendo como finalidade prxima a obteno atravs deste dos meios materiais, dos bens econmicos de que necessita para subsistir, como ensina Olea 20 . Trabalho por conta alheia, certamente, porque na empresa que surgira aps a abolio das corporaes de arte e ofcio, a partir da inverso do capital burgus na aquisio de maquinrio e contratao de pessoal, a novidade estava no apenas na diviso e tcnica de trabalho mas, sobremodo, no fato de os operrios serem contratados para movimentar a engrenagem empresarial em troca de uma remunerao que significava apenas parte do produto de seu trabalho. A outra parte era convertida em lucro. Nessa perspectiva, a alienao do trabalho era o resultado dessa produo coletivizada de mercadorias em que o trabalhador no se identificava no objeto que ajudara a criar. Em suma, ao trabalhador j no cabia o fruto de seu labor, que era atribuda, na nova forma de produo, ao titular da empresa (mais adiante, diria Marx: utilidade do trabalho - salrio = plus valia). O trabalho livre diferia, por igual, daquele que at ento prevalecia nas organizaes produtivas. Lembremos que a Antigidade conheceu, predominantemente, o trabalho escravo. Segadas Viana 21 anota que aos escravos eram dados os servios manuais exaustivos no s por essa causa como, tambm, porque tal gnero de trabalho era considerado imprprio e at desonroso para os homens vlidos e livres [...] Na Grcia havia fbricas de flautas, de facas, de ferramentas agrcolas e de mveis onde o operariado era todo composto de escravos. Em Roma os grandes senhores tinham escravos de vrias classes, desde os pastores at gladiadores, msicos, filsofos e poetas. Aristteles, que concebia o homem como um ser poltico, j preconizava, a seu modo, que a real igualdade consistia em tratar igualmente os iguais e desigualmente osOLEA, Manuel Alonso. Introduo ao Direito do Trabalho. Traduo de Regina Maria Macedo Nery Ferrari e outros. Curitiba: Gnesis, 1997., p. 48. 21 SSSEKIND, Arnaldo, MARANHO, Dlio, VIANA, Segadas. Instituies de Direito do Trabalho. So Paulo: LTr, 1992, p. 27.20

desiguais. Com essa proposio pretendia, porm, justificar a escravido e a dizia mesmo necessria para que outros homens pudessem pensar. E supondo, num vaticnio no confirmado pela Histria, que a automao viria libertar o homem do trabalho, afirmou Aristteles 22 que se cada instrumento pudesse, a uma ordem dada, trabalhar por si, se as lanadeiras tecessem sozinhas, se o arco tocasse sozinho a ctara, os empreendedores no iriam precisar de operrios e os patres dispensariam os escravos. O homem se libertou do trabalho escravo que se revelava como uma forma legitimada de violncia, mas a transio para o modelo atual de trabalho, na modalidade de emprego, no se deu linearmente, pois se seguiu a Era Medieval e, nela, uma sociedade dividida em rgidos estamentos: os senhores feudais e os servos. A servido era imposta a quase todos os camponeses e se diferenciava do trabalho escravo porque o servo se ligava terra e pelo seu uso pagava diversos tributos 23 , passando a ter novo amo quando a terra era vendida. A Baixa Idade Mdia 24 assistiu a transformaes sociais e econmicas que serviram progressiva estruturao do sistema capitalista de produo. A sociedade estamental foi gradativamente se desintegrando e, nesse mesmo toar, a economia autosuficiente, tpica do feudalismo, foi sendo substituda por uma economia comercial. O crescimento demogrfico 25 e o renascimento urbano, com a emancipao pacfica ou no das cidades onde mais florescia a atividade comercial, deram origem a uma nova sociedade, agora estruturada em classes e a habitar cidades ou burgos 26 . Nessas cidades, as corporaes de mercadores, que buscavam garantir o monoplio do comrcio local, e as corporaes de ofcio, visando cada uma destas monopolizao de uma certa arte ou ofcio, eram influenciadas pela cultura crist conhecida como escolstica e, sob a sua doutrina, condenavam a usura. Por isso, uma mercadoria deveria sempre ser vendida pelo preo da matria-prima utilizada mais o valor da mo-deobra empregada 27 . Apenas os companheiros (ou oficiais) eram remunerados como se fossem prottipos de assalariados, pois o mestre-arteso retribua o trabalho dos aprendizes, que ocupavam a base da pirmide corporativa, atravs de alimentos, vesturio e alojamento, alm do aprendizado. Com o passar do tempo, muitos dos mestres se enriqueciam e exerciam, com rigor, a exclusividade da atividade artesanal. Os companheiros se uniam com o intuito deCf. DE MASI, Domenico. Desenvolvimento sem trabalho. Traduo de Eugnia Deheinzelin. So Paulo : Editora Esfera, 1999. p. 14. Igual remisso faz Segadas Viana, op. cit. p. 28. 23 A exemplo da corvia (trabalho gratuito nas terras do senhor em alguns dias da semana), da talha (percentagem da produo das tenncias) e da banalidade (tributo cobrado pelo uso de instrumentos ou bens do senhor). A servido medieval sofreu influncia, em sua formao, de instituies romanas e germnicas, a exemplo da clientela (relao de dependncia social entre os indivduos na sociedade romana, influenciando o modo como se constituiu a relao senhor-servo na ordem feudal), do colonato (institudo pelo Imprio Romano, impunha a fixao do homem terra, objetivando conter o xodo rural e a crise de abastecimento causada pelo fim da escravatura) e do precarium (entrega de terras a um grande senhor em troca de proteo). Cf. VICENTINO, Cludio. Histria Geral. So Paulo : Scipione, 1997. p. 110. 24 A Baixa Idade Mdia estendeu-se dos sculos X ao XV. 25 Crescimento demogrfico proporcionado pelo fim das invases na Europa e pela reduo dos nveis de mortandade que as grandes epidemias provocaram. 26 Burgu, em latim, significa fortaleza, referindo-se, assim, s muralhas que circundavam as cidades. 27 Vicentino, op. cit., p. 139.22

conquistar as parcelas de monoplio asseguradas mestria, quando no se resignavam ante a ausncia de perspectiva econmica mais favorvel. Noutro passo, a burguesia, que se fortalecia economicamente, interessava-se na instituio de um poder central que reduzisse a influncia poltica da nobreza, no tardando a se constiturem as monarquias nacionais, que grassaram por toda a Era Moderna. Os avanos tecnolgicos, de que vamos tratar no subitem relativo Revoluo Industrial, e, mais adiante, as novas tcnicas de diviso do trabalho prometiam alargar oportunidades e permitir que o homem se libertasse, uma vez por todas, dos grilhes da escravatura e da servido, sem as amarras que o corporativismo impunha ao desenvolvimento de atividades econmicas por quem delas no tinha o direito mestria. Contudo, o trabalho livre que surgira na empresa moderna no o era por completo, uma vez que se caracterizava exatamente pelo fato de o trabalhador ser livre (ou livre de coao absoluta) para escolher entre prestar ou no trabalho, embora no estivesse investido de igual liberdade no tocante ao tempo, lugar e modo de executar essa prestao laboral. Olea conclui: A liberdade a que estamos aludindo se refere ao momento do estabelecimento da relao de alheamento, sendo, portanto, seu sentido o de que aquela, no trabalho forado, fica anulada frente presena de uma violncia invalidante do consentimento 28 . 1.3 Os fatores sociais que inspiraram o direito do trabalho O trabalho penoso que se desenvolvia na indstria txtil do fim do sculo XVIII propiciava, em contraponto, a concentrao dos trabalhadores nas cidades e, sobretudo, no cho da fbrica, onde se aguavam, a um s tempo, os sentimentos de indignao e solidariedade entre os que vivenciavam aquelas mesmas condies adversas de trabalho. 1.3.1 Os primeiros movimentos de insurreio dos trabalhadores Os movimentos obreiros de insurreio surgiam e se desdobravam na Inglaterra e, mais aidante, tambm nos pases que se inseriam no processo de industrializao. Vale a pena referir o modo como reagiram os trabalhadores nesses pases. 1.3.1.1 A reao dos trabalhadores na Inglaterra Os trabalhadores almejavam uma condio mnima de trabalho que pudesse ser imposta ao industrial capitalista e, para alcanarem o objetivo, se rebelaram. Inicialmente na Inglaterra, onde o luddismo e a revoluo cartista davam o sinal do inconformismo. Ned Ludd comandou trabalhadores que atribuam s mquinas a culpa pelos males que os afligiam. O luddismo foi o movimento obreiro que se ops, portanto, mecanizao do trabalho vinda a reboque da primeira revoluo industrial, e pode ser ilustrado por carta que Ludd endereou a um certo empresrio de Hudersfield, em 1812: "Recebemos a informao de que dono dessas detestveis tosquiadoras mecnicas. Fica avisado de que se elas no forem retiradas at o fim da prxima semanal eu mandarei imediatamente um de meus representantes destrui-las... E se o senhor tiver a imprudncia

28

Olea, op. cit. p. 57.

de disparar contra qualquer dos meus Homens, eles tm ordem de mat-lo e queimar toda a sua casa". 29 Por sua vez, os cartistas surgiram quando, em 1832, o Parlamento ingls aprovou o Reform Act, uma lei eleitoral que privou os operrios do direito ao voto. Os trabalhadores reagiram e formularam suas reivindicaes na "Carta do Povo", um documento com quase trezentas mil assinaturas e contedo poltico que fundava, assim, o movimento operrio conhecido como cartismo 30 . Esclarecem Olga Coulon e Fabio Pedro 31 :[...] o movimento cartista ajudou os operrios ingleses a melhorarem suas condies de vida e deu-lhes experincia de luta poltica. Assim, em 1833, surgiu a primeira lei limitando a 8 horas de trabalho a jornada das crianas operrias. Em 1842 proibiu-se o trabalho de mulheres em minas. Em 1847, houve a reduo da jornada de trabalho para 10 horas.

Em 1842, os cartistas encaminharam nova carta, em que reclamavam a existncia de milhares de homens morrendo de fome na Esccia, Irlanda e Pas de Gales e denunciavam: a jornada de trabalho, especialmente nas fbricas, excede o limite das foras humanas e o salrio por um trabalho que se presta nessas condies ruins de uma fbrica insuficiente para manter a sade dos obreiros e assegurar o conforto to necessrio depois de um desgaste intenso da fora muscular [...]. Os cartistas tentaram deflagrar motins e greves gerais, porm quando no fracassavam eram reprimidos fora. 1.3.1.2 A reao dos trabalhadores na Frana Mas o movimento revolucionrio dos trabalhadores tambm eclodiu na Frana, em 1848, inclusive com maior ressonncia na Europa e influncia decisiva para que na Alemanha, por igual, se iniciasse a revoluo obreira. Diferente da Inglaterra, a Frana era antes um pas de vocao agrria, em que o pequeno agricultor era sacrificado por pesados impostos, destinados a custear a burocracia e a casta militar. Contudo, o processo de industrializao se acelerou e, tambm na Frana, em prejuzo do artesanato e do pequeno proprietrio, originando a proletarizao do homem da cidade. Ainda sobre o movimento obreiro francs, observa De La Cueva que durante toda la monarqua, desde la restauracin de los Borbones, fu Francia un verdadero volcn. Bastara recordar los dos grandes movimientos huelgusticos de los trabajadores de la sede de Lyon de 1831 y 1834 y la organizacin, desde 1821, de diversas sociedades secretas 32 . Ainda na Frana, intensificava-se o trnsito do socialismo utpico, em que a crtica ao regime se associava inteno de suplant-lo atravs da tentativa malsucedida de convencer a burguesia a promover ou aceitar a transformao social. Em 1848, surge o Manifesto Comunista de Marx e Engels, que ao historicismo hegeliano incrementava a idia de o regime burgus ser uma etapa transitria e, no processo histrico, o advento de uma sociedade regida pelos princpios do socialismo seria a conseqncia necessria da evoluo das foras econmicas. A Histria, para Marx, era a histria da luta de classes,

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Cf. COULON, Olga Maria Fonseca, PEDRO, Fabio Costa. Os Movimentos Operrios e o Socialismo. Disponvel em: http://br.geocities.com/fcpedro/cartism.html. 30 DE LA CUEVA, Mario. Derecho Mexicano Del Trabajo. Mxico: Editorial Porrua S/A, 1961, p. 29. 31 Idem, ibidem. 32 De La Cueva, op. cit., p. 32.

classes estas que se digladiavam visando conquista dos meios de produo. Assim inspirado, Marx conclamava: Proletrios de todo o mundo, uni-vos. No obstante a pouca tolerncia greve e ao associativismo, a duras penas o trabalhador francs adquiriu conscincia de classe e promoveu a divulgao da doutrina marxista, com reflexos positivos na evoluo do direito do trabalho, mesmo aps Napoleo III ser alado a imperador, aps o golpe de estado que restaurara a monarquia, em 1851. Mas, num embarao a esse processo, a histria obrigou o povo francs a se unir em razo da guerra franco-prussiana, vencida pela Alemanha em 1870. A derrota da Frana exigiu de seu povo uma significativa indenizao de guerra. 1.3.1.3 A reao dos trabalhadores na Alemanha J na Alemanha, a industrializao teve impulso somente na segunda metade do sculo XIX, quando j era inegvel o poder poltico e econmico da Inglaterra. Mas semelhana do que ocorrera entre os ingleses, que promoveram a revoluo cartista, o progresso industrial produziu na Alemanha um intenso movimento obreiro. A primeira insurreio de trabalhadores na Alemanha ter sido, segundo Jaques Droz , a sublevao dos teceles da Silsia, em 1844. O autor explica:33

Na origem da revolta preciso colocar o fardo das imposies feudais que continuavam a pesar sobre a classe rural da Silsia mesmo com a abolio da escravatura: trabalhadores a domiclio, obrigados a vender o produto do seu trabalho a negociantes que comercializavam em seguida as mercadorias, os teceles eram sobrecarregados pelos foros censitrios e pelas prestaes em dinheiro, sem falar dos impostos do Estado; a sua situao agravou-se com o encerramento dos mercados americanos e a criao de uma indstria txtil na Polnia, e isto num quadro de um mercado onde a concorrncia inglesa se fazia sentir duramente e cuja produo estava tecnicamente mal organizada.

As revoltas que tiveram lugar em Peterswaldau e em Langenbielau, no ms de junho de 1844, resultaram na destruio de residncias, confiscando-se ttulos de propriedade e dizimando-se mquinas. Embora no houvesse violncia contra pessoas, os levantes daquele ano foram afinal reprimidos por foras militares que, mobilizadas, aplicaram penas variadas a oitenta e sete teceles. Anota Jaques Droz 34 que o proletariado de fbrica era de pouca expresso numrica, mas a construo de ferrovias, especialmente em Saxe, teve papel relevante no processo de industrializao na Alemanha, desencadeando cerca de quarenta greves entre 1844 e 1848. 1.3.2 A organizao das profisses A aluso a esses movimentos obreiros permite verificar que, aps o impacto da primeira revoluo industrial, os trabalhadores formaram coalizes, que se dissolviam aps a vitria ou insucesso de cada insurgncia. Os sindicatos vieram depois, quando as vantagens de se institurem organismos permanentes foram percebidas pelos trabalhadores. Sanseverino situa entre 1815 e 1848 a fase das coalizes e anota que o mundo do trabalho

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DROZ, Jaques. O Movimento Operrio na Alemanha e o Neo-hegelianismo. Disponvel em: http://www.pco.org.br/biblioteca/origens/movimentooperarioalemanha.htm. 34 Idem, ibidem.

encaminhou-se, definitivamente, rumo consciente conquista da liberdade sindical quando publicado o Manifesto Comunista de 1848, por Marx e Engels 35 . O capitalismo comercial e, mais adiante (sculo XVIII), o capitalismo industrial, forjaram o trabalhador livre e investido de liberdade cvica. Ao trabalhador, dava-se a liberdade de contratar e a paradoxal perspectiva de ajustar assim a prpria espoliao, como alternativa para sua sobrevivncia. Observa Bourguin:[...] nos sistemas anteriores, ou havia associao do trabalho e da propriedade neste caso, o trabalhador gozava de liberdade cvica , ou o trabalhador no era proprietrio, mas ento no era tambm um cidado livre. A alternativa era bem clara na era pr-capitalista. Mas o capitalismo empreendeu a grande aventura de associar, nas massas de homens sempre crescentes, a ausncia completa de propriedade a uma completa liberdade pessoal e a uma completa igualdade poltica 36 .

O sindicato foi, na sequncia, a forma associativa que se constituiu no sistema capitalista de produo, visando defesa dos interesses coletivos dos trabalhadores. Contra esses interesses, somavam-se o fim das corporaes medievais com a ruptura da estrutura econmico-social, o maquinismo e a transformao do homem que, a custo menor e em maior quantidade, operava a mutao da matria. A produo de bens ou servios j no mais dependia da aptido artstica ou especializao do homem profissional, podendo mulheres e crianas prestar, com salrio reduzido, o mesmo trabalho. Esse sentimento de angstia e desamparo por que passava o trabalhador associada por Deveali s causas sociais do sindicalismo, em passagem emblemtica de sua obra: Essa transformao de carter psicolgico tem, na nossa opinio, uma influncia preponderante na formao da mentalidade classista que o efeito e a causa, por sua vez, da unio de massas indiferenadas, unidas exclusivamente por uma dor comum, por um sentir comum e pelo mesmo desejo de libertao, se no de vingana37. O sindicalismo no teria trajetria exitosa, porm, caso tivesse prescindido da greve, como meio de presso para novas conquistas obreiras, e no houvesse institudo as convenes coletivas de trabalho, em detrimento do monoplio estatal na produo normativa. Esses trs institutos (sindicato, direito de greve e conveno coletiva) percorreram a mesma estrada, sendo inicialmente proscritos, em seguida tolerados e, afinal, reconhecidos pela ordem jurdica. A histria do sindicalismo, quando relacionada com a institucionalizao das convenes coletivas e da greve, revela o modo como reagiu a classe operria consagrao, pela revoluo burguesa, do princpio da autonomia da vontade individual. Em suma, os referidos institutos jurdicos expressam, hoje, o modo de atuao da vontade coletiva. 1.4 Os fatores polticos que inspiraram o direito do trabalho O final do sculo XVIII assistiu ao nascimento da primeira gerao dos direitos humanos, aquela que se traduz nas liberdades civis e polticas. A Declarao de Direitos da Virgnia (1776) proclamava:SANSEVERINO, Luisa Riva. Curso de Direito do Trabalho. Traduo de lson Guimares Gottschalk. So Paulo: LTr, 1976, p. 10. 36 Apud Evaristo de Moraes Filho, op. cit., p. 79. 37 Apud RUPRECHT, Alfredo J. Relaes Coletivas de Trabalho. Traduo de Edlson Alkmin Cunha. So Paulo: LTr, 1995, p. 52.35

Todos os seres humanos so, pela sua natureza, igualmente livres e independentes, e possuem certos direitos inatos, dos quais, ao entrarem no estado de sociedade, no podem, por nenhum tipo de pacto, privar ou despojar sua posteridade; nomeadamente, a fruio da vida e da liberdade, como os meios de adquirir e possuir a propriedade de bens, bem como de procurar e obter a felicidade e a segurana.

A seu turno, o art. 1 da Declarao dos Direitos do Homem e do Cidado, na Frana de 1789, reiterava que os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos. verdade que a preocupao dos norte-americanos era mais a de consolidar a sua prpria independncia em relao coroa britnica, enquanto os franceses consideraramse investidos de uma misso universal de libertao dos povos 38 . Assinalando que as grandes etapas histricas de inveno dos direitos humanos coincidem com as mudanas nos princpios bsicos da cincia e da tcnica, Comparato observa com a acuidade de sempre:Foi justamente no sentido francs, e no na acepo inglesa, que a transformao radical na tcnica de produo econmica, causada pela introduo da mquina a vapor [...] na Inglaterra, tomou o nome de Revoluo Industrial. 39

Nessa quadra histrica em que se festejavam os direitos de liberdade, unam-se a liberdade de exercer qualquer profisso, sem os limites da sociedade estamental ou dos grmios corporativos, e o modo de reagir o operariado s aes da empresa. Criaram-se, assim, novos espaos de participao poltica dos trabalhadores que os fariam atuantes na normatizao das condies de trabalho e na construo de uma sociedade que lhes parecesse menos injusta. A circunstncia de a empresa ser uma coletividade, no se esgotando na dimenso individual as agruras vivenciadas pelos trabalhadores que nela mourejavam, porque todos o faziam em condies semelhantes, traduziu-se em um campo frtil coletivizao tambm das condutas reativas desses trabalhadores. Por assim dizer, os operrios resistiam coletivamente s aes danosas do ser coletivo, que era a organizao produtiva na qual laboravam. A um s tempo, os trabalhadores organizados inauguravam uma nova maneira de regular a vida social. Desde essa poca at os dias atuais, passaram a atuar diretamente, sem a interveno do Estado, na elaborao de normas jurdicas que viriam a disciplinar as suas condies laborais. Em um primeiro momento, as convenes coletivas surgiram como gentlemens agreement, ou seja, como um pacto que no podia ser cobrado coercitivamente e comportava, no caso de descumprimento, apenas sanes morais. A possibilidade de os prprios atores sociais regularem as relaes de trabalho que porventura os unisse importava, na linha do pensamento liberal, um ato de demasiada condescendncia com a ao dos sindicatos, em detrimento dos ideais burgueses que proscreviam, a pretexto de conjurarem as velhas corporaes de ofcio, os corpos intermedirios.

COMPARATO, op. cit., p. 51. O autor remata que, efetivamente, o esprito da Revoluo Francesa difundiu-se, em pouco tempo, a partir da Europa, a regies to distantes quanto o subcontinente indiano, a sia Menor e a Amrica Latina. 39 Op. cit., p. 52.

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Mas as convenes coletivas brotavam incessantemente e solucionavam conflitos, ganhando legitimidade em razo de sua natural eficcia. Alm disso, a ao poltica dos trabalhadores no se esgotava na elaborao da norma coletiva, imiscuindo-se gradualmente nos recintos do Estado Liberal que pareciam guardados para a ao poltica do empresariado, investido de poder econmico. A esse propsito, o advento da social democracia alem revela o modo como as coletividades de trabalhadores se organizaram politicamente, ilustrando como aprenderam a valer-se dos instrumentos de ao democrtica para ocupar espaos polticos antes reservados burguesia ou, residualmente, a classes hegemnicas de variado matiz. Em rigor, os alemes sofreram clara influncia do Manifesto Comunista e das idias de Lassalle. Ferdinand Lassalle foi personalidade marcante do trabalhismo alemo, que em 1863 convocou o congresso obreiro em que fora constituda a Associao Geral de Trabalhadores Alemes, cujos fundadores, em declarao de princpios, firmavam: somente o sufrgio universal e direto pode assegurar uma representao adequada e segura dos interesses sociais da classe obreira alem, assim como a eliminao dos antagonismos de classe. Foi a urgncia de praticar a democracia, aps o estabelecimento do imprio germnico, com um Reichstag eleito por voto popular amplo, o que uniu, em 1875, os einsenachers marxistas aos lassallistas, todos pressionados pela necessidade de fundirem os dois partidos socialistas alemes em um nico, o Partido Social Democrtico Alemo. Uniram-se em Gotha com vistas voltadas para a perspectiva de sucesso eleitoral. Quando lembramos que Marx propunha a substituio da classe hegemnica pela via revolucionria, bem assim a substituio da sociedade estatal em sociedade noestatal, parece paradoxal a necessidade que se apresentava aos socialistas, na maior parte da Europa ocidental (inclusive Frana e Alemanha), de apresentarem aos eleitores programas imediatos de reforma dentro do sistema poltico e econmico. O chefe de governo era responsvel perante o parlamento, parecendo, assim, invivel a obteno do socialismo integral, a substituio revolucionria da classe dominante, sem a colaborao dos parlamentares. Sobre essa unio entre marxistas e lassalistas traduzir, ento, um recuo de Marx, porque incompatvel com sua doutrina a ascenso do proletariado pela via eleitoral, elucidativa a observao de George Cole:O Partido Social Democrtico Alemo de 1875, embora adotasse em grande parte o marxismo como credo histrico, na prtica aceitava essa necessidade (de apresentar um projeto de reforma dentro do sistema), sem a qual no teria sido possvel a fuso com os lassalistas. Marx, que recebera de seus adeptos alemes um exemplar adiantado da proposta das condies da fuso, protestou energicamente contra o que considerava uma traio aos princpios socialistas; seus adeptos suprimiram o longo e arrazoado protesto (que foi publicado como Crtica ao Programa de Gotha, somente muitos anos aps sua morte). Marx no publicou suas opinies, compreendendo que os eisenachers o repudiariam se o fizesse. A democracia social nasceu em conseqncia de um compromisso ao qual o homem geralmente considerado como seu profeta era violentamente contrrio 40 .40

COLE, George. Ideologias Polticas. Org. Anthony de Crespigny e Jeremy Cronin. Traduo de Srgio Duarte. Braslia: Editora UnB, 1998, p. 80.

Como anota Mario de la Cueva, a Alemanha vivia enfim uma extraordinria contradio: um progresso industrial incomparvel e um grande movimento socialista, perigo grande para o progresso industrial, pois a crescente agitao ameaava destruir a paz social e deter, por greves e movimentos obreiros, o trabalho normal nas fbricas 41 . Bismarck, o Chanceler de Ferro, percebera a importncia do movimento obreiro e entabulara negociao com Lassalle. Todavia, a morte de Ferdinand Lassalle, em duelo, no ano de 1864, evidentemente significara um estorvo nesse processo de conquistas dos trabalhadores alemes. De toda sorte, o temor dessa influncia socialista em meio classe proletria fez Bismarck precaver-se, expedindo uma regulamentao minudente das relaes de trabalho, em que inclusive limitava a vontade dos contratantes - bom auspcio! - no que tocava, entre outros assuntos, s medidas de proteo sade e vida dos trabalhadores, s normas para o trabalho de mulheres e crianas e s disposies a propsito da vigilncia obrigatria das empresas.

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De La Cueva, op. cit., p. 36, traduo livre.

Atualizado em julho de 2010

2 HISTRIA DO DIREITO COLETIVO DO TRABALHOAugusto Csar Leite de Carvalho 1 SUMRIO: 2.1 Direito coletivo e institutos afetos sindicato, greve e conveno coletiva. 2.2 O sindicalismo no sistema capitalista de produo. 2.3 O sindicalismo sob interveno totalitria. 2.1 Direito coletivo e institutos afetos sindicato, greve e conveno coletiva No h como dissociar o sindicato, o direito de greve e a conveno coletiva do trabalho, institutos que so a melhor expresso do fenmeno social mais expressivo dos dois ltimos sculos, o sindicalismo. O sindicalismo nasceu como um movimento espontneo dos trabalhadores que estavam concentrados em torno das cidades industriais e, movidos pelo instinto gregrio, perceberam que a sua unio os fortalecia na luta contra as condies desumanas de trabalho que lhes estavam sendo impostas. No sem razo, a Inglaterra que se fez bero da revoluo industrial gerou a primeira forma de associativismo a que se pde emprestar o atributo de sindicato: a trade union. Passado o primeiro impacto da Grande Revoluo, os trabalhadores formaram coalizes, que se dissolviam aps a vitria ou insucesso do movimento. Os sindicatos vieram depois, quando as vantagens de se institurem organismos permanentes fora percebida pelos trabalhadores. Sanseverino situa entre 1815 e 1848 a fase das coalizes e anota que o mundo do trabalho encaminhou-se, definitivamente, rumo consciente conquista da liberdade sindical quando publicado o Manifesto Comunista de 1848, por Marx e Engels 2 . preciso ver que o sindicato no derivou de outras formas precedentes de associativismo, sendo merecedora de apupos ou poucos aplausos a doutrina que sugere os colgios romanos, as guildas (entre germnicos e saxnicos) ou as corporaes de arte e ofcio como organizaes que se tenham convertido em sindicatos, quando estes experimentavam o seu estado germinal. No h investigao histrica que permita certificar, por exemplo, que trabalhadores assalariados tivessem ingresso nos colgios de Roma, como observa Russomano, que acentua os fins preponderantemente mutualistas dos collegia, dada a sua finalidade de ajuda recproca entre os que se dedicavam ao mesmo1

O autor professor universitrio. mestre em Direito Constitucional pela UFC e em Direito das Relaes Sociais pela Universidad Castilla la Mancha, onde cursa o doutorado. Ministro do Tribunal Superior do Trabalho. 2 Sanseverino, op. cit., p. 10.

ofcio e para defesa dos interesses resultantes da similitude das posies por ele ocupadas na vida romana. O movimento colegial guarda semelhanas, porm, com a experincia vivida pelos sindicatos. Aps se expandirem, num crescimento espontneo, e passarem a exercer influncia no encaminhamento dos problemas do Imprio, o Senado Romano proibiu o seu funcionamento, exceo apenas dos oito colgios criados por Numa Pomplio. Em estudo proveitoso, Russomano assinala que se seguiu a represlia, mas as novas foras se organizam e dispem-se a enfrentar, ao se sentirem poderosas, a resistncia do Estado. A Lex Clodia (ano 59 a. C.) reconheceu enfim o direito de associao mas Jlio Csar percebeu a prosperidade dos colgios e resolveu novamente aboli-los. Em 56 a. C, aps a morte de Csar, Augusto editou a Lex Julia, que reconheceu direitos e privilgios dos colgios romanos mas os transformou em rgos oficiosos do Estado Romano, inclusive quanto arrecadao de contribuies fiscais. ainda do mestre gacho o remate:A crnica dos colgios mostra que h irresistvel tendncia represso, pelo Estado, das novas foras sociais, que podem atuar, mais tarde, algumas vezes, em tom de contestao, em face do prprio Estado. Sucede-se, em geral, o reconhecimento de sua livre expanso e, logo depois, em uma etapa terciria, o Estado trata de intervir atravs de sistemas de controle e conduo, em proveito prprio, das novas foras desencadeadas pela vida das comunidades. Isso se deu, exatamente, com os colgios romanos. E aquilo que ocorreu em Roma, vrios sculos antes de Cristo, ocorre, ainda hoje, neste sculo interplanetrio e tecnolgico que levou nossos passos alm das estrelas que nossos olhos conheciam 3 .

As guildas (ou gildas) tinham carter mercantil e no laboral, tendo dado origem s ligas de mercadores dos mares do norte europeu. Sobre as corporaes de arte e ofcio, pode-se dizer que o movimento das companhias (ou compagnonnages - reunio de companheiros com fins reinvindicatrios) significou o primeiro momento em que o monoplio dos mestres fora posto prova, no regime corporativo. Mas tambm pertinente, quanto ao mais, a lio de Mozart Victor Russomano 4 :As corporaes representaram a organizao de classes, segundo critrio unilateral, dispostas essas classes em planos sucessivos e nveis hierrquicos ascendentes (do aprendiz ao mestre). O sindicato, ao contrrio, um movimento bilateral, que parte do confronto entre trabalhadores e empresrios e, por isso, os coloca, frente a frente, em sindicatos distintos e opostos, em evidente paralelismo, mas sobre o mesmo plano.

O sindicato foi, portanto, a forma associativa que se constituiu no sistema capitalista de produo, visando defesa dos interesses coletivos dos trabalhadores. Contra estes, somavam-se o fim das corporaes medievais com a ruptura da estrutura econmicosocial, o maquinismo e a transformao do homem, enfim, de arteso a operador da mquina que, a custo menor e em maior quantidade, operava a mutao da matria. A produo de bens ou servios j no mais dependia da aptido artstica ou especializao do homem profissional, podendo mulheres e crianas prestar, com salrio reduzido, o mesmo trabalho.3

RUSSOMANO, Mozart Victor. Princpios Gerais de Direito Sindical. Rio de Janeiro : Forense, 1995. pp. 8-9. 4 Russomano, op. cit., p. 15.

Esse sentimento de angstia e desamparo por que passava o trabalhador associada por Deveali s causas sociais do sindicalismo, em passagem emblemtica de sua obra: Essa transformao de carter psicolgico tem, na nossa opinio, uma influncia preponderante na formao da mentalidade classista que o efeito e a causa, por sua vez, da unio de massas indiferenadas, unidas exclusivamente por uma dor comum, por um sentir comum e pelo mesmo desejo de libertao, se no de vingana 5 . O sindicalismo no teria trajetria exitosa, porm, caso tivesse prescindido da greve, como meio de presso para novas conquistas obreiras, e no houvesse institudo as convenes coletivas de trabalho, em detrimento do monoplio estatal na produo normativa. Esses trs institutos (sindicato, direito de greve e conveno coletiva) percorreram a mesma estrada, sendo inicialmente proscritos, em seguida tolerados e, afinal, reconhecidos pela ordem jurdica. A histria do sindicalismo, quando relacionada com a institucionalizao das convenes coletivas e da greve, revela o modo como reagiu a classe operria consagrao, pela revoluo burguesa, do princpio da autonomia da vontade individual. Em suma, os referidos institutos jurdicos expressam, hoje, o modo de atuao da vontade coletiva. 2.2 O sindicalismo no sistema capitalista de produo fato, porm, que o movimento sindical no incorporou aos seus objetivos a revoluo socialista, ao menos como regra. No Ocidente capitalista, os sindicatos tm lutado, o mais das vezes, pela implementao de medidas compensatrias que so outorgadas aos trabalhadores pelo direito laboral, como observa Ricardo Antunes 6 :Pode-se dizer que junto com o processo de trabalho taylorista/fordista erigiu-se, particularmente durante o ps-guerra, um sistema de 'compromisso' e de 'regulao' que, limitado a uma parcela dos pases socialistas avanados, ofereceu a iluso de que o sistema de metabolismo social do capital pudesse ser efetiva, duradoura e definitivamente controlado, regulado e fundado num compromisso entre capital e trabalho mediado pelo Estado [...]. O 'compromisso fordista' deu origem, progressivamente, subordinao dos organismos institucionalizados, sindicais e polticos, da era da prevalncia social-democrtica, convertendo esses organismos em verdadeiros cogestores do processo global de reproduo do capital.

Por isso, era inevitvel que o sindicalismo de enfrentamento cedesse lugar, gradualmente, a um novo modelo, que Ruprecht denomina sindicalismo de participao, no qual as corporaes de trabalhadores consideram a possibilidade de colaborar na gesto da empresa e do Estado, reorientando assim a sua funo social. Alfredo Ruprecht quem nota:De La Cueva chama a ateno para essa evoluo, observando que o sindicalismo pertence ao futuro e sonha com uma sociedade fundada na justia social. Seu fim primordial era econmico: melhorar as condies de vida do trabalhador. No meado do sculo XIX, sua finalidade tinha um ntido trao poltico, uma vez que a conveno coletiva e sua ao no eram suficientes para obter o que desejava e, ento, era preciso partir para a organizao poltica mesmo. No comeo deste

Apud RUPRECHT, Alfredo J. Relaes Coletivas de Trabalho. Traduo de Edlson Alkmin Cunha. So Paulo: LTr, 1995. p. 52. 6 ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: Ensaios sobre a afirmao e a negao do trabalho. So Paulo: Boitempo, 1999. p. 38.

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sculo j deixa de ser exclusivamente um rgo de luta para se transformar num rgo de cooperao 7 .

No h como desvincular o movimento sindical da insero dos direitos sociais em vrias cartas polticas editadas a partir da Constituio mexicana de 1917 e da Constituio de Weimar (Alemanha), que alargaram assim o contedo e os horizontes dos direitos fundamentais (antes restritos aos direitos civis e direitos polticos). 2.3 O sindicalismo sob interveno totalitria Mas sofreu duro golpe o sindicalismo na dcada seguinte, por obra ou influncia do regime fascista. Observam Wilson Batalha e Slvia Marina Batalha 8 :[...] segundo a Declarao VI da Carta del Lavoro, as corporaes (os sindicatos entre estas) constituam a organizao unitria das foras da produo e lhe representavam integralmente os interesses. Constituam, portanto, rgos do Estado, compostos de representantes dos trabalhadores e dos empregadores das vrias categorias econmicas, atuando-se nelas a integrao das foras econmicas e das foras polticas do Pas. Objeto de sua atividade era a disciplina da produo e do trabalho [...] Eram institudas por decreto do Chefe do Governo.

Esse sistema corporativista passou a vigorar nos vrios pases que se fizeram receptivos ou se renderam a tal concepo de Estado totalitrio, a exemplo da Frana (durante a ocupao nazista), Alemanha, Espanha (sob o regime de Franco e da Falange), Portugal (sob o mando de Salazar) e Brasil, neste sob o Governo Vargas. O retorno democracia sindical, com a possibilidade de ratificar a Conveno n. 87 da Organizao Internacional do Trabalho, que cuida da liberdade de os sindicatos se constiturem e agirem na medida de sua legitimidade, teve lugar, nos pases citados, aps a derrocada das foras do Eixo e conseqente fim da Segunda Grande Guerra. Menos no Brasil.

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Ruprecht, op. cit., p. 54. BATALHA, Wilson de Souza Campos, BATALHA, Slvia Marina Labate. Sindicatos, Sindicalismo. So Paulo : LTr, 1994. p. 29.

Atualizado em julho de 2010

3 HISTRIA DO DIREITO DO TRABALHO NO BRASILAugusto Csar Leite de Carvalho 1 SUMRIO: 3.1 Pr-histria do direito do trabalho: trabalho escravo e corporaes de arte e ofcio no Brasil. 3.1.1 As corporaes de ofcio na Europa e a analogia com o emprego. 3.1.2 A escravido na Amrica e especialmente no Brasil. 3.1.3 A escravido inibe as corporaes de ofcio no Brasil. 3.1.4 As leis trabalhistas surgiram antes da abolio da escravatura. 3.2 A substituio do escravo africano pelo imigrante europeu. 3.3 O direito do trabalho e a industrializao no Brasil. 3.1 Pr-histria do direito do trabalho: trabalho escravo e corporaes de arte e ofcio no Brasil O trabalho de escravos, dos servos de gleba e dos aprendizes e companheiros em corporaes de arte e ofcio antecedeu o modo de prestar trabalho que, mais adiante, ambientou-se na empresa capitalista e provocou o surgimento do direito laboral. Mas tambm se costuma dizer que, no Brasil, o direito do trabalho no teria sido o resultado desse quadro evolutivo, migrando para a nossa ordem jurdica pela interveno de Vargas. Ainda que a teoria da generosidade getulista agrida a memria de todos quantos antes se integraram aos movimentos de insurreio contra a explorao do trabalho humano 2 , decerto que a universalidade do direito fundamental, especialmente do direito fundamental a um trabalho digno, torna irrelevante, em boa parte, a procura da realidade mais prxima, vale dizer, a discusso sobre o direito do trabalho vigente no Brasil ser um legado de nossas prprias agruras e conflitos ou, por outro lado, se a histria do trabalho no Ocidente bastaria ao aparecimento de um direito laboral em nossas plagas. De toda sorte, dvidas existem sobre a influncia das formas antigas de organizao do trabalho especialmente a escravido e as corporaes no modo de se organizar o trabalho no mbito da empresa que emergiu com a primeira revoluo industrial. No h, por exemplo e toda vista, relao de causalidade entre o trabalho escravo e a relao de emprego. O que h de extraordinrio na histria do trabalho humano, no Brasil, a converso do trabalhador escravo em trabalhador empregado, sem que se vivenciasse intensamente a experincia das corporaes de arte e ofcio. Esforcemo-nos, pois, por rememorar um pouco da pr-histria do emprego, em terras brasileiras.

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O autor professor universitrio. mestre em Direito Constitucional pela UFC e em Direito das Relaes Sociais pela Universidad Castilla la Mancha, onde cursa o doutorado. Ministro do Tribunal Superior do Trabalho. 2 Vide MORAES, Apontamentos de direito operrio, p. XXXII.

3.1.1 As corporaes de ofcio na Europa e a analogia com o emprego O trabalho em regime gremial ou corporativo exibia algumas caractersticas coincidentes com a relao laboral prpria da empresa capitalista, alm de outras que o faziam diferente. As diferenas mais expressivas se encontravam no modo de se constituir a organizao em que se realizava o trabalho. No plano das relaes individuais, eram, porm, parecidas as condies em que se trabalhava sob as ordens dos mestres ou, mais adiante, dos empresrios. As coincidncias estavam presentes, por exemplo, na circunstncia de que as ordenanas gremiais relativas ao perodo de prova, disciplina, durao do contrato e tempo de trabalho seguiam orientao anloga que tem o atual direito do trabalho 3 e tambm na peculiaridade de os aprendizes, companheiros e mestres serem trabalhadores livres 4 . Evidenciavam-se, porm, as dessemelhanas. A saber, a produo era sobretudo artesanal nas corporaes de arte e ofcio, a elas no se ajustando as ideias de alienao e diviso do trabalho. Ademais, a revoluo industrial foi contempornea ao fim do regime corporativo e, possivelmente, com este no se harmonizaria uma vez que a hierarquia interna das empresas no teria a formao profissional como pressuposto, sendo possvel a qualquer pessoa, inclusive a mulheres e crianas, participar da cadeia de produo nas empresas que surgiam. Os grmios ou corporaes profissionais desapareceriam definitivamente com a revoluo industrial, ainda que fossem igualmente incompatveis com os cnones da Revoluo Francesa de 1789. Aparentemente, os fatores econmicos so comumente mais influentes que as normativas de iniciativa poltica. 3.1.2 A escravido na Amrica e especialmente no Brasil No Brasil, os fatos foram diferentes. Enquanto a Europa via desaparecerem suas velhas organizaes corporativas e surgirem as empresas capitalistas, o Brasil ainda vivia um perodo de escravido de negros originrios da frica. Em obra publicada em 1942, o historiador Caio Prado Junior argumentava que para compreender o trabalho livre no Brasil era necessrio admiti-lo em sua perspectiva histrica:No terreno econmico, por exemplo, pode-se dizer que o trabalho livre no se organizou ainda inteiramente em todo o pas. H apenas, em muitas partes dele, um processo de ajustamento em pleno vigor, um esforo mais ou menos bem-sucedido naquela direo, mas que conserva traos bastante vivos do regime escravista que o precedeu 5 .

O trabalho forado foi utilizado tanto no Brasil como nos Estados Unidos 6 . Sem embargo, necessrio entender as diferenas entre a colonizao das zonas temperadas da3 4

Cf. VIDA, MONEREO, MOLINA. Manual de Derecho del Trabajo, p. 64. Idem, ibidem. Os autores advertem, porm, que a liberdade de trabalho dos aprendizes era seriamente afetada, em muitos casos, pela combinao de uma longa durao de seus contratos eram comuns contratos de seis anos com um regime de desvinculao ou desate contratual muito rigoroso. 5 PRADO JR, Formao do Brasil Contemporneo. Brasiliense, So Paulo, 2000, p. 3. 6 Cf. FURTADO, Formao Econmica do Brasil. Publifolha, So Paulo, 2000, p. 123. O autor adverte: interessante observar que a evoluo diversa que teve o estoque de escravos nos dois principais pases escravistas do continente: os EUA e o Brasil. Ambos os pases comearam o sculo XIX com um estoque de aproximadamente um milho de escravos. As importaes brasileiras, no correr do sculo, foram cerca de trs vezes maiores do que as norte-americanas. Sem embargo, ao iniciar-se a Guerra da Secesso, os EUA tinham uma fora de trabalho escrava de cerca de quatro milhes e o Brasil na mesma poca algo como 1,5 milho. A

Amrica, inclusive das terras norte-americanas, e a colonizao de zonas tropicais como aquela que teve lugar no Brasil. Embora a compreenso das causas da escravatura tenha a ver com a falta de mo-de-obra nas colnias da Amrica, interessante observar que a emigrao de ingleses na direo do Novo Mundo a partir do sculo XVI tem significativo incremento com a transformao econmica vivida pela Inglaterra desde o advento da revoluo industrial. que o surgimento da indstria txtil provocou o deslocamento do campesino ingls que abandonava a lavoura porque nada mais tinha a cultivar seno as pastagens dos carneiros e ovelhas cuja l iria abastecer as novas fbricas. Os campesinos migravam para as colnias situadas na Amrica em busca de uma nova sociedade que lhes oferecesse garantias de sobrevivncia no mais oferecidas pelo continente europeu. Portanto, o que levou novos colonos para as zonas temperadas da Amrica, cujas condies naturais se assemelhavam s do Velho Continente, no foram as razes comerciais da colonizao, at ento dominantes 7 . Caio Prado Junior observa, a propsito da ocupa