329
Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos GENEBRA Direitos Humanos e Aplicação da Lei MANUAL DE FORMAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS PARA AS FORÇAS POLICIAIS Série de Formação Profissional n. º 05 Direitos Humanos e Aplicação da Lei Procuradoria-Geral da República Gabinete de Documentação e Direito Comparado

Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

  • Upload
    others

  • View
    1

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos

GENEBRA

Direitos Humanose Aplicação

da LeiMANUAL DE FORMAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS

PARA AS FORÇAS POLICIAIS

Sér

ie d

e Fo

rmaç

ão P

rofi

ssio

nal

n

.º 0

5

Dir

eito

s H

uman

os e

Apl

icaç

ão d

a Le

i

Procuradoria-Geral da RepúblicaGabinete de Documentação

e Direito Comparado

Page 2: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos

GENEBRA

Direitos Humanose Aplicação

da LeiMANUAL DE FORMAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS

PARA AS FORÇAS POLICIAIS

NAÇÕES UNIDAS

Sér

ie d

e Fo

rmaç

ão P

rofi

ssio

nal

n.o

05

Page 3: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Os conceitos utilizados e a apresentação do material constante da presente publi-cação não implicam a manifestação de qualquer opinião, seja de que cariz for, daparte do Secretariado das Nações Unidas relativamente ao estatuto jurídico dequalquer país, território, cidade ou região, ou das suas autoridades, ou em relaçãoà delimitação das suas fronteiras ou limites territoriais.

** *

O material constante da presente publicação pode ser livremente citado oureproduzido, desde que indicada a fonte e que um exemplar da publicação con-tendo o material reproduzido seja enviada para o Alto Comissariado/Centro paraos Direitos Humanos, Nações Unidas, 1211 Genebra 10, Suíça.

nota

*

HR/P/PT/5

PUBLICAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS

N.o de Venda E.96.XIV.5

ISBN 92-1-154121-2

ISSN 1020-1688

Page 4: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

III

A administração da justiça, incluindo os departamentos policiais […]em total conformidade com as normas aplicáveis constantes de ins-trumentos internacionais em matéria de Direitos Humanos, sãoessenciais para a concretização plena e não discriminatória dosDireitos Humanos e indispensáveis aos processos da democracia e dodesenvolvimento sustentável.

[…]

Os serviços consultivos e os programas de assistência técnica do sis-tema das Nações Unidas deverão ser capazes de responder imedia-tamente a pedidos dos Estados relativos a actividades educacionaise de formação em matéria de Direitos Humanos, bem como à edu-cação específica sobre normas contidas em instrumentos internacionaisde Direitos Humanos e de Direito Humanitário e a sua aplicação agrupos especiais tais como […] os funcionários responsáveis pela apli-cação da lei […].

DECLARAÇÃO E PROGRAMA DE ACÇÃO DE VIENA(Parte I, parágrafo 27; Parte II, parágrafo 82)

Page 5: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

IV

O presente manual é parte integrante de um conjuntode três materiais de formação em matéria de direi-tos humanos destinados às forças policiais. Este kitde formação para a polícia inclui também um dos-

sier para formação de formadores e uma compilação de bolso das normasde direitos humanos aplicáveis à actuação das forças policiais. Os trêscomponentes deste kit são complementares e, no seu conjunto, contêm todosos elementos necessários para a organização de programas de formaçãoem direitos humanos para os funcionários responsáveis pela aplicação dalei, segundo a abordagem adoptada pelo Alto Comissariado das Nações Uni-das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos.

O presente manual (primeiro componente do kit) contém informação apro-fundada sobre as fontes, sistemas e normas de direitos humanos relativasà aplicação da lei, bem como orientações práticas nesta área, incluindo emanexo o texto de diversos instrumentos internacionais.

O Guia para Formadores (segundo componente do kit) contém instruçõese conselhos práticos destinados aos formadores, exercícios adicionais emateriais-tipo de formação, tais como acetatos para retro projecção, a serutilizados em conjunto com o manual no decorrer dos cursos.

O Livro de Bolso de normas (terceiro componente do kit) foi concebido parafuncionar como um material de referência portátil e de fácil acesso paraos funcionários responsáveis pela aplicação da lei, contendo centenas de nor-mas simplificadas, organizadas segundo os deveres e funções da polícia epor tópicos, a partir das quais se remete para notas finais mais detalha-das.

Os utilizadores do manual interessados em obter exemplares do Guia deFormadores e do Livro de Bolso deverão contactar o Alto Comissaria-do/Centro para os Direitos Humanos das Nações Unidas.N.T.

Para mais informação relativa ao sistema internacional de protecção dosdireitos humanos e instrumentos jurídicos aplicáveis, consulte a web pagedo Gabinete de Documentação e Direito Comparado, www.gddc.pt

Relativamente a esta edição em língua portuguesa, os interessados pode-rão contactar o Gabinete de Documentação e Direito Comparado, Rua doVale de Pereiro, n.o 2, 1169-113 Lisboa.

Nota para os utilizadores do manual

N.T.As notas do tradutor (N.T.) constantes da presente publicação são da responsabilidade do Gabinete de Documentação

e Direito Comparado da Procuradoria-Geral da República e não responsabilizam a Organização das Nações Unidas.

Page 6: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Tenhamos em conta a lógica sim-ples da Declaração Universal dosDireitos do Homema (preâmbulo):

Considerando que é essencial aprotecção dos direitos do homem através de umregime de direito, para que o homem não sejacompelido, em supremo recurso, à revolta con-tra a tirania e a opressão […]

A mensagem é tão clara hoje como o era em 1948.Sem a subsistência do Estado de Direito, ocorremviolações de direitos humanos; e, quando ocor-rem violações, fomenta-se a rebelião. A conclusãoé inevitável: a violação dos direitos humanos nãopode contribuir para a manutenção da ordem esegurança públicas, pode apenas exacerbar a suadeterioração. Esta mensagem deveria já ser vistacomo um axioma. Pelo menos para as Nações Uni-das, nada pode ser mais claro.

Então, porque continuam a subsistir velhos mitosem alguns círculos responsáveis pela aplicação dalei? Todos ouvimos já o argumento segundo o qualo respeito pelos direitos humanos é, de algumaforma, incompatível com a efectiva aplicação dalei – a velha e estafada noção de que, para aplicara lei, capturar o delinquente e garantir a sua con-denação, é necessário "ludibriar" um pouco a lei.Já todos assistimos à tendência para utilizar a forçade forma excessiva para controlar manifestações, oupressão física para obter informação dos detidos, ouainda um excessivo uso da força para garantir umacaptura. Para esta forma de pensar, a aplicação dalei é uma guerra contra o crime, constituindo osdireitos humanos meros obstáculos colocados nocaminho da polícia pelos advogados e organiza-ções não governamentais de protecção dos direitos

humanos. Estes mitos sobrevivem, apesar de a his-tória nos ter demonstrado, uma vez e outra, que nadapode estar mais longe da verdade.

Para o utilizador deste manual, a tarefa que lhe pro-pomos consiste em trabalhar para fazer desaparecer,de uma vez por todas, estes mitos absurdos maspersistentes; declarar que as violações dos direitoshumanos por parte das forças policiais podemapenas tornar mais difícil a já de si árdua missãode aplicar a lei e convencer disso os polícias seuscolegas; lembrar ao mundo que, quando um res-ponsável pela aplicação da lei viola a lei, o resul-tado é, não apenas um atentado à dignidadehumana e à própria lei, mas também um erguerde barreiras à eficaz actuação da polícia.As violações da lei por parte das forças policiais têmmúltiplos efeitos práticos:• diminuem a confiança do público;• agravam a desobediência civil;• ameaçam o efectivo exercício da acção penalpelos tribunais;• isolam a polícia da comunidade;• resultam na libertação dos culpados e na puni-ção dos inocentes;• deixam a vítima do crime sem que se lhe faça jus-tiça pelo seu sofrimento;• comprometem a noção de "aplicação da lei", aoretirar-lhe o elemento "lei";• obrigam os serviços de polícia a adoptar umaatitude de reacção e não de prevenção;• provocam críticas por parte da comunidade inter-nacional e dos meios de comunicação social ecolocam o respectivo Governo sob pressão.

Pelo contrário, o respeito dos Direitos Humanospor parte das autoridades responsáveis pela apli-cação da lei reforça de facto a eficácia da actuação

V

Prefácio

a As referências das fontesdos instrumentos interna-cionais de direitos huma-nos citados no presentemanual estão indicadasna lista de instrumentosconstante das páginas XIX a XXV, infra.

Page 7: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

dessas autoridades. Neste sentido, o respeito da polí-cia pelos direitos humanos, além de ser umimperativo ético e legal, constitui também uma exi-gência prática em termos de aplicação da lei.Quando se verifica que a polícia respeita, protegee defende os direitos humanos:• reforça-se a confiança do público e estimula-se acooperação da comunidade;• contribui-se para a resolução pacífica de confli-tos e queixas;• consegue-se que a acção penal seja exercida comêxito pelos tribunais;• consegue-se que a polícia seja vista como parteintegrante da comunidade, desempenhando umafunção social válida;• presta-se um serviço à boa administração da jus-tiça, pelo que se reforça a confiança no sistema;• dá-se um exemplo aos outros membros da socie-dade em termos de respeito pela lei;• consegue-se que a polícia fique mais próxima dacomunidade e, em consequência disso, em posi-ção de prevenir o crime e perseguir os seus auto-res através de uma actividade policial de naturezapreventiva;• ganha-se o apoio dos meios de comunicaçãosocial, da comunidade internacional e das autori-dades políticas.

Os agentes policiais e serviços responsáveis pelaaplicação da lei que respeitam os direitos huma-nos colhem, pois, benefícios que servem os pró-prios objectivos da aplicação da lei, ao mesmotempo que constroem uma estrutura de aplicaçãoda lei que não se baseia no medo ou na forçabruta, mas antes na honra, no profissionalismo ena dignidade.

Esta visão do agente policial está na base da abor-dagem adoptada pelo Alto Comissariado/Centropara os Direitos Humanos das Nações Unidasrelativamente à formação das forças policiais emmatéria de direitos humanos. Considera os agen-tes policiais, não como inevitáveis violadores dedireitos humanos, mas antes como a primeiralinha de defesa destes direitos. Na verdade, cada vezque um funcionário responsável pela aplicação dalei intervém em auxílio de uma vítima de crime,tudo o que faz para servir a comunidade e defen-der a lei, incluindo as normas relativas aos direi-

tos humanos, coloca-o na vanguarda do combateem prol destes direitos.

A importância de garantir que os direitos huma-nos sejam protegidos no quadro de um Estado deDireito tem sido sublinhada pelas Nações Unidasdesde a elaboração da Declaração Universal, tendovindo a orientar a Organização nas suas activida-des em prol da promoção e protecção dos direitoshumanos desde essa altura. Esta tem sido umanoção central no trabalho do Programa de Servi-ços Consultivos e de Assistência Técnica no Domí-nio dos Direitos Humanos das Nações Unidas.Este programa foi iniciado em 1995 para apoiar osEstados, a seu próprio pedido, na criação e reforçode estruturas nacionais com impacto directo naobservância dos direitos humanos pelas pessoas emgeral e na manutenção do Estado de Direito.

À medida que o programa foi evoluindo, o mesmosucedeu com as áreas de assistência em que secentra. Orientado por sucessivas resoluções daAssembleia Geral e da Comissão dos Direitos doHomem, bem como pela natureza dos própriospedidos dos Estados, o programa tem vindo aaperfeiçoar progressivamente a capacidade deassistência em diferentes domínios, constituindohoje um enquadramento útil dos esforçosempreendidos a nível nacional para o reforço dosdireitos humanos e do Estado de Direito. Assim,o Alto Comissariado/Centro para os DireitosHumanos aborda actualmente a questão do esta-belecimento de instituições de defesa dos direitoshumanos de forma global, considerando funda-mentais uma série de elementos constitutivos dasmedidas empreendidas a nível nacional para asse-gurar a protecção dos direitos humanos no quadrode um Estado de Direito e dispensando atençãoprioritária, nomeadamente, ao reforço da boaadministração da justiça e à adopção de políticase práticas humanas no domínio da aplicação da lei.

Acreditamos que a publicação da obra DireitosHumanos e Aplicação da Lei constitui um acon-tecimento importante no contexto dos esforçosactualmente empreendidos pelas Nações Unidaspara promover e proteger os direitos humanos.Na verdade, a crucial interdependência entre aprotecção dos direitos fundamentais e a manu-

VI *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 8: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

tenção da lei e da ordem merecem particular aten-ção. Foi precisamente este nexo fundamental queesteve no espírito dos autores da Declaração Uni-versal quando redigiram o artigo 29.o, n.o 2, destehistórico instrumento:

No exercício destes direitos e no gozo destas liber-dades ninguém está sujeito senão às limitações esta-belecidas pela lei com vista exclusivamente apromover o reconhecimento e o respeito dos direi-tos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer asjustas exigências da moral, da ordem pública e dobem-estar numa sociedade democrática.

Nesta conformidade, a missão da polícia nas socie-dades modernas consiste em proteger os direitoshumanos, defender as liberdades fundamentais emanter a ordem pública e o bem-estar geral numasociedade democrática, através de políticas e prá-ticas que sejam legais, humanas e deontologica-mente correctas.

A profissão de polícia é, de facto, nobre e absolu-tamente vital para o bom funcionamento de umasociedade democrática. A polícia dever-se-ia orgu-lhar de isto ter sido implicitamente reconhecido naDeclaração Universal há meio século atrás e expli-citamente declarado em tantos instrumentos dedireitos humanos adoptados no âmbito do sistemadas Nações Unidas desde então, nomeadamente oCódigo de Conduta para os Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei, os Princípios Básicossobre a Utilização da Força e de Armas de Fogopelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação daLei e uma série doutras declarações e directrizes.Trata-se de normas internacionais directamenterelevantes para o trabalho da polícia, desenvolvi-das, não para entravar a aplicação da lei, mas a fimde fornecer orientações precisas para o desempe-nho dessa função que é fundamental numa socie-dade democrática.

De qualquer forma, para que possa proteger osdireitos humanos, a polícia deverá primeiro saberem que consistem estes direitos. As Nações Uni-das têm vindo a contribuir desde há três décadaspara a formação dos funcionários responsáveispela aplicação da lei, em reconhecimento da fun-damental influência deste grupo na situação dos

direitos humanos em cada sociedade. Não obs-tante, só em Janeiro de 1992, após uma cuidadosaavaliação da metodologia e impacto desses cur-sos, foi adoptada pelo Alto Comissariado/Centropara os Direitos Humanos uma abordagem novae inovadora à formação em matéria de aplicação dalei, que resultou na publicação do presentemanual.

Durante anos, o Programa de Serviços Consultivose de Assistência Técnica das Nações Unidas pro-moveu inúmeros cursos de formação para forçaspoliciais em todas as regiões do mundo. Em mui-tos casos, estes cursos permitiram que os partici-pantes tomassem contacto pela primeira vez comas normas internacionais de direitos humanosque disciplinam a sua conduta profissional. Comotal, parece inquestionável que tais exercícios sejustificaram. Mas quão eficazes foram efectiva-mente? Há três anos atrás, o Alto Comissa-riado/Centro para os Direitos Humanos iniciou umprocesso com o objectivo de responder a esta ques-tão. Os resultados deste inquérito alteraram pro-fundamente a nossa forma de conceber asactividades desenvolvidas para ajudar os serviçosde polícia a respeitarem os direitos humanos.

As tradicionais abordagens aos cursos de forma-ção em matéria de direitos humanos apresentavamcertamente algumas vantagens para os partici-pantes. No mínimo, ajudavam a sensibilizar osfuncionários responsáveis pela aplicação da lei anível nacional para a existência de fontes, sistemase normas internacionais de direitos humanos naárea da administração da justiça. Mas o AltoComissariado/Centro para os Direitos Humanos,na avaliação que efectuou destas actividades, nãoficou convencido de que tais cursos estivessem acontribuir para aperfeiçoar as aptidões e condutasnecessárias para garantir que os participantes tra-duzam esses princípios internacionais em com-portamentos operacionais apropriados e eficazes.

Os cursos iniciais compreendiam uma série depalestras essencialmente teóricas e destinadas aosprofissionais, ministradas por especialistas naárea dos direitos humanos, sobre noções gerais des-tes direitos. Como os formadores não possuíamqualquer experiência prática enquanto funcioná-

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* VII

Page 9: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

VIII *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

rios responsáveis pela aplicação da lei, fazia-sepouco esforço para assegurar uma formação comefeitos duradouros em termos da aplicação dasnormas internacionais no trabalho quotidiano dasforças policiais, havendo de resto poucas possibi-lidades de tal acontecer. Na maioria das vezes, ainformação era ministrada através de palestras,centrando-se quase exclusivamente em prescri-ções negativas, tais como: "a polícia não deverá uti-lizar força excessiva no desempenho das suasactividades".

É evidente que a polícia deverá conhecer as regras.Mas isto, só por si, revelou-se claramente insufi-ciente para alterar o comportamento dos agentesde forma significativa. De acordo com o relatóriode uma comissão parlamentar encarregada dainvestigação de violações da lei nas esquadras depolícia do seu país, os agentes policiais, quando con-frontados com provas da existência de abusos,diziam que não compreendiam os métodos e téc-nicas de interrogatório, que interrogavam deacordo com métodos ultrapassados e que ignora-vam a forma como os interrogatórios eram con-duzidos em países democráticos e desenvolvidos.Para comparar os métodos por si utilizados e aper-feiçoá-los, queriam ter a possibilidade de fazerestudos e observar os métodos de interrogatório uti-lizados nos países democráticos.

Tais declarações põem em destaque duas impor-tantes áreas nas quais deverá incidir a formação dasforças policiais. Em primeiro lugar, o facto deserem apresentadas justificações para graves vio-lações de direitos humanos, como a tortura,demonstra falta de familiaridade com as normasmais fundamentais de direitos humanos no domí-nio da administração da justiça. Não existem jus-tificações legítimas para semelhantes actos. Emsegundo lugar, a polícia, no mundo real, quersaber não só quais as normas aplicáveis, mas tam-bém como desempenhar o seu trabalho de formaeficaz com observância destas normas. As inicia-tivas de formação que ignorem qualquer uma des-tas áreas não serão provavelmente quer credíveisquer eficazes. Nesta conformidade, o Centro incluiinformação de índole prática sobre técnicas com-provadas para o desempenho das funções dopúblico-alvo, proveniente de recomendações de

peritos e de recolhas de boas práticas actualmenteseguidas na profissão em causa.

O Centro convenceu-se, assim, de que, para sergenuinamente prática, a formação dos elementosdas forças policiais deverá incluir a participação deformadores com experiência no domínio da apli-cação da lei. Constatou que se obtêm muitomelhores resultados através da utilização de umaabordagem colegial, segundo a qual os políciasdiscutem com outros polícias seus colegas, do quecom o clássico modelo professor-aluno. Em con-sequência, o Centro começou a elaborar uma listade formadores e consultores orientada para a prá-tica.

Ao invés de reunir painéis compostos exclusiva-mente por professores e teóricos, o Centro incluiformadores com experiência no domínio da apli-cação da lei. Esta abordagem tem-lhe permitido ava-liar a cultura profissional própria da polícia etornar as sessões de formação muito mais práticase adaptadas ao trabalho dos agentes policiais. Poroutro lado, os estagiários e formadores das forçaspoliciais raramente são peritos em direitos huma-nos; necessitam por isso de ser acompanhados eorientados por pessoal qualificado do Centro e daDivisão para a Prevenção do Crime e Justiça Penal,assim garantindo que o essencial das normas dasNações Unidas se veja plena e sistematicamentereflectido no conteúdo dos cursos. Painéis de for-madores compostos por estes dois grupos com-plementares oferecem as melhores possibilidadesde ministrar cursos adequados tanto em termos desubstância como do tão importante elemento quesão as actividades práticas.

O processo de avaliação promovido pelo Centropermitiu também tirar outras importantes lições.O Centro apercebeu-se de que os cursos de for-mação de agentes policiais deverão, se quiseremobter a efectiva participação dos seus destinatários,ser organizados em torno das tarefas quotidianasda polícia (investigações; capturas; detenção; uti-lização da força e armas de fogo) e não em funçãode determinados instrumentos de direitos huma-nos. Deverá ser prestada a devida atenção aosdireitos das vítimas dos crimes, com as quais a polí-cia simpatiza mais facilmente. As exposições orais

Page 10: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

deverão deixar espaço para a utilização de técnicasde formação interactivas (por exemplo, dramati-zação, exercícios e casos práticos), a fim de asse-gurar a participação activa dos formandos. Deveráser seguida uma abordagem de "formação de for-madores", por forma a multiplicar o impacto decada curso e reforçar as capacidades locais. Umacuidadosa exposição das normas deverá ser com-plementada por sessões concebidas com o objec-tivo de sensibilizar os elementos das forçaspoliciais para a importância dos direitos huma-nos e para o risco que correm de os violar, mesmosem intenção. Finalmente, cada curso organizadosegundo esta concepção deverá ser cuidadosa-mente concebido por forma a ter em conta a par-ticular realidade cultural, educativa, histórica epolítica do país que os destinatários têm por mis-são servir e proteger.

Estas lições fundamentais constituíram a base daelaboração do programa do Centro destinado àformação das forças policiais. Cada uma delas foitida em conta na abordagem da formação policialformalmente introduzida em 1992, já aplicada atítulo experimental em numerosos países daÁfrica, Ásia, América Latina e Europa. Formado-res, comandantes e agentes das forças policiaisnacionais, bem como agentes que prestam ser-viço nos contingentes de polícia civil (CIVPOL)das operações de manutenção da paz das NaçõesUnidas, têm vindo a beneficiar de cursos minis-trados ao abrigo deste programa. É importantesalientar que cada curso experimental foi seguidoda adequada avaliação e revisão do programa, numesforço permanente e concertado para delinearum programa de formação que culminou napublicação do presente manual.

O programa beneficiou, desde asua criação, da preciosa contri-buição de diversos parceiros doCentro. Conselhos úteis foramprestados pela Comissão Inter-nacional de Juristas, InstitutoRaoul Wallenberg para os Direitos Humanos eDireito Humanitário, Instituto Henry Dunant,INTERPOL, ACNUR, CICV e diversos departa-mentos de polícia e institutos de formação policialespalhados pelo mundo. Além disso, realizou-se em

Genebra, em Maio de 1993, um seminário para dis-cutir a abordagem e o manual propostos pelo Cen-tro. Participaram neste seminário formadores emembros das forças policiais de todas as regiõesdo mundo, bem como importantes organizaçõesnão governamentais e peritos de direitos humanosda área. Nos cursos experimentais realizados aoabrigo do programa, o Centro beneficiou dos pre-ciosos conhecimentos especializados de dezenas deconsultores policiais oriundos do mundo inteiro.O Alto Comissariado/Centro para os DireitosHumanos deixa aqui o seu agradecimento portodo este apoio fundamental.

Um especial reconhecimento é devido à Divisãopara a Prevenção do Crime e Justiça Penal do Cen-tro para o Desenvolvimento Social e QuestõesHumanitárias das Nações Unidas, em Viena. Estemanual e o programa para forças policiais do Cen-tro para os Direitos Humanos são dois dos ele-mentos de um projecto desenvolvido em conjuntocom a Divisão para a Prevenção do Crime e JustiçaPenal desde 1992, numa parceria plena e frutíferapela qual o Alto Comissariado/Centro para osDireitos Humanos está profundamente grato.

Finalmente, e muito em especial, as Nações Uni-das manifestam o seu reconhecimento e os seusagradecimentos ao principal autor do primeiroprojecto deste manual, Ralph Crawshaw, do Cen-tro de Direitos Humanos da Universidade deEssex, no Reino Unido.

JOSÉ AYALA LASSO

Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos HumanosN.T.1

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* IX

N.T.1José Ayala Lasso,

do Equador, foi o primeiroAlto Comissário das Nações Unidas paraos Direitos Humanos,tendo desempenhado estas funções de 5 de Abrilde 1994 a 15 de Março de 1997.

Page 11: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 12: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XI

Índice

PrefácioAbreviaturasInstrumentos internacionais citados no presente manualDeclaração de objectivos

Primeira ParteFORMAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS RESPONSÁVEIS PELA APLICAÇÃO DA LEITeoria e Prática

Parágrafos

Cap. 01 Método do Alto Comissariado / Centro para os Direitos Humanos nas Nações Unidas para a Formação da Polícia 1-10

a. Método colegial

b. Formação de formadores 3

c. Técnicas pedagógicas 4

d. Especificidade dos destinatários 5

e. Orientação prática 6

f. Explicação pormenorizada das normas 7

g. Sensibilização 8

h. Flexibilidade de concepção e aplicação 9

i. Instrumentos de avaliação 10

Cap. 02 Participantes nos programas de formação 11-20

a. Definição e categorias 11-13

b. Razões específicas que justificam a formação de diversas categorias

de funcionários responsáveis pela aplicação da lei 14-18

c. Características particulares dos organismos e funcionários

pela aplicação da lei 19-20

Página

V

XXIII

XXIV

XXX

1

3

3

3

3

4

4

4

4

5

5

7

7

8

8

Page 13: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XII

Parágrafos

Cap. 03 Técnicas de formação eficazes 21-44

a. Objectivos da aprendizagem 21-22

b. Recomendações gerais 23

c. Método participativo 24-26

d. Técnicas participativas 27-42

1. APRESENTAÇÃO E DEBATE 28-29

2. CONFERÊNCIAS-DEBATE 30-31

3. GRUPOS DE TRABALHO 32

4. ESTUDO DE CASOS PRÁTICOS 33-34

5. RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS/SESSÕES DE REFLEXÃO CONJUNTA 35-36

6. SIMULAÇÃO/DRAMATIZAÇÃO 37-38

7. VISITAS DE ESTUDO 39

8. EXERCÍCIOS PRÁTICOS 40

9. MESAS REDONDAS 41

10. MATERIAL AUDIOVISUAL 42

e. Locais para a realização dos cursos 43

f. Planificação tendo em conta as necessidades dos participantes 44

Cap. 04 Educadores e Formadores 45-49

a. Utilizadores do manual 45-46

b. Selecção dos educadores e formadores 47

c. Orientação dos educadores e formadores 48

d. Funções do formador 49

Cap. 05 Utilização do Manual 50-89

a. Segunda parte (Conceitos fundamentais) 53-58

b. Terceira parte (Deveres e funções da polícia) 59-67

c. Quarta parte (Grupos necessitados

de protecção especial ou tratamento distinto) 68-73

d. Quinta parte (questões de comando, direcção e controlo) 74-76

e. Estrutura dos capítulos 77-78

f. Anexos 89

Cap. 06 Estrutura e conteúdo dos cursos 90-115

a. Introdução 90-92

b. Observações sobre os temas dos capítulos 93-102

c. Estrutura dos cursos 103-114

1. CURSO COMPLETO 105-107

2. SEMINÁRIO PARA FUNCIONÁRIOS SUPERIORES DE POLÍCIA 108-111

3. CURSO BÁSICO PARA AGENTES SEM FUNÇÕES DE COMANDO 112-114

d. Observações finais 115

Página

11

11

11

12

13

13

13

14

14

14

14

14

15

15

15

15

15

17

17

17

17

18

19

19

20

21

22

22

24

25

25

25

27

27

27

28

28

Page 14: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XIII

Parágrafos

Segunda ParteCONCEITOS FUNDAMENTAIS

Cap. 07 Fontes, sistemas e normas de Direitos Humanos no domínio da Aplicação da Lei 116-172

a. Importância das normas internacionais 116-119

b. Fontes fundamentais 120-148

1. CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS 120-122

2. DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM 123

3. TRATADOS: PACTOS E CONVENÇÕES 124-138

4. PRINCÍPIOS, REGRAS MÍNIMAS E DECLARAÇÕES 139-148

c. Mecanismos de direitos humanos das Nações Unidas 149-163

1. MECANISMOS CONVENCIONAIS (BASEADOS NOS TRATADOS) 153-156

2. MECANISMOS EXTRACONVENCIONAIS (BASEADOS NA CARTA) 157-163

(a) Procedimento 1503 158-159

(b) Alguns relatores especiais e grupos de trabalho 160-163

d. Fontes, sistemas e normas a nível regional 164-170

1. O SISTEMA EUROPEU NO ÂMBITO DO CONSELHO DA EUROPA 165-168

2. O SISTEMA INTERAMERICANO NO ÂMBITO DA ORGANIZAÇÃO

DE ESTADOS AMERICANOS 169

3. O SISTEMA AFRICANO NO ÂMBITO DA ORGANIZAÇÃO

DE UNIDADE AFRICANA 170

e. Conclusões 171-172

f. Revisão básica do capítulo

g. Exercício prático

h. Tópicos para discussão

Cap. 08 Conduta policial lícita e conforme aos princípios éticos 173-192

a. Normas internacionais sobre uma conduta policial lícita e conforme

aos princípios éticos – Informação para as apresentações 173-192

1. INTRODUÇÃO 173-176

2. ASPECTOS GERAIS DE UMA CONDUTA POLICIAL LÍCITA

E CONFORME AOS PRINCÍPIOS ÉTICOS 177-186

(a) Princípios fundamentais 177

(b) Disposições específicas sobre uma conduta policial lícita

e conforme aos princípios éticos 178-186

[I] Ética policial e utilização da força 182-183

[II] Conduta policial lícita e conforme

aos princípios éticos responsabilidade individual 184

[III] Conduta policial lícita e conforme aos princípios éticos – dever

de denunciar as violações 185

[IV] Conduta policial lícita e conforme aos princípios

éticos – circunstâncias excepcionais e situações de emergência pública 186

3. OBSERVAÇÕES FINAIS 187-192

b. Normas internacionais sobre uma conduta policial lícita

e conforme aos princípios éticos – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Página

29

31

31

33

33

33

33

38

41

41

42

42

43

44

44

44

44

45

45

45

45

47

48

48

48

48

48

49

49

50

51

51

52

52

53

54

Page 15: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XIV

Parágrafos

Cap. 09 O papel da polícia numa sociedade democrática 193-224

a. Normas internacionais sobre direitos humanos e actividade policial

numa sociedade democrática – Informação para as apresentações 193-224

1. INTRODUÇÃO 193-198

2. ASPECTOS GERAIS DA ACTIVIDADE POLICIAL

NUMA SOCIEDADE DEMOCRÁTICA 199-222

(a) Princípios fundamentais 199

(b) Disposições específicas sobre a actividade policial

numa sociedade democrática 200-206

[I] Direito à liberdade de pensamento, consciência e religião 201-202

[II] Direito à liberdade de opinião e de expressão 203-204

[III] Direitos à liberdade de reunião e de associação pacíficas 205-206

(c) Os direitos políticos e o papel da polícia 207-209

(d) Disposições específicas sobre actividade policial e eleições

democráticas 210-215

(e) Disposições específicas sobre uma actividade

policial democrática 216

[I] Polícia representativa 217-218

[II] Polícia receptiva às necessidades da comunidade 219-220

[III] Polícia responsável 221-222

3. OBSERVAÇÕES FINAIS 223-224

b. Normas internacionais sobre direitos humanos e actividade policial

numa sociedade democrática – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Cap. 10 Polícia e não discriminação 225-298

a. Normas internacionais sobre não discriminação – Informação

para as apresentações 225-298

1. INTRODUÇÃO 225-229

2. ASPECTOS GERAIS DA NÃO DISCRIMINAÇÃO 230-296

(a) Princípios fundamentais 230-231

(b) Disposições específicas sobre a não discriminação 232-251

[I] Direito ao reconhecimento da personalidade jurídica 233-234

[II] Direito à igualdade perante a lei 235-237

[III] Direito a um julgamento equitativo 238-240

[IV] Direito de acesso à função pública em condições de igualdade 241-243

[V] Incitamento à discriminação 244-247

[VI] Derrogação das obrigações durante os estados de emergência 248-251

(c) Disposições de instrumentos com especial relevância

no domínio da aplicação da lei 252-262

[I] Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis

pela Aplicação da Lei 252-254

[II] Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas

de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei 255-256

[III] Conjunto de Princípios para a Protecção de Todas as Pessoas

Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão 257-258

[IV] Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas

da Criminalidade e de Abuso de Poder 259-260

Página

55

56

56

57

57

57

57

57

57

58

58

59

59

60

60

60

61

61

62

63

65

66

66

66

66

66

66

67

67

67

68

68

69

69

69

69

69

Page 16: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XV

Parágrafos

[V] Declaração sobre a Protecção de Todas as Pessoas contra

a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos

ou Degradantes e Convenção contra a Tortura e Outras Penas

ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes 261-262

(d) Discriminação racial 263-270

[I] Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação

de Todas as Formas de Discriminação Racial 264-267

[II] Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas

as Formas de Discriminação Racial 268-270

(e) Discriminação por motivos de religião 271-276

[I] Declaração Universal dos Direitos do Homem 272

[II] Declaração sobre a Eliminação de Todas as Formas

de Intolerância e Discriminação Baseadas na Religião

ou na Convicção 273-276

(f) Discriminação contra as mulheres 277-283

[I] Declaração sobre a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres 278-280

[II] Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas

de Discriminação contra as Mulheres 281-283

(g) Discriminação e crianças 284-296

[I] Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos 285

[II] Convenção sobre os Direitos da Criança 286-288

(h) Manifestações particulares de discriminação 289-296

3. OBSERVAÇÕES FINAIS 297-298

b. Normas internacionais sobre não discriminação

– Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Terceira ParteDEVERES E FUNÇÕES DA POLÍCIA

Cap. 11 Investigação policial 299-344

a. Normas internacionais sobre investigação policial

– Informação para as apresentações 299-344

1. INTRODUÇÃO 299-302

2. ASPECTOS GERAIS SOBRE DIREITOS HUMANOS

E INVESTIGAÇÃO POLICIAL 303-344

(a) Princípios fundamentais 303

(b) Normas específicas sobre a investigação 304-326

[I] Presunção de inocência 305-307

[II] Direito a um processo equitativo 308-310

[III] Garantias mínimas para assegurar um processo

equitativo 311-321

(a) A ser informado pronta e detalhadamente

das acusações contra si formuladas 311-313

(b) Julgamento num prazo razoável 314-316

(c) A interrogar, ou fazer interrogar, as testemunhas

de acusação 317-319

Página

70

70

70

70

71

71

71

71

71

72

72

72

72

73

73

74

74

75

75

77

79

80

80

80

80

80

80

81

81

81

82

82

Page 17: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XVI

Parágrafos

(d) De não ser obrigado a testemunhar contra

si próprio ou a confessar-se culpado 320-321

[IV] Intromissões arbitrárias na vida privada 322-326

(c) Aspectos técnicos da investigação 327-330

(d) Relação com os informadores da polícia 331-337

(e) Vítimas 338-342

3. OBSERVAÇÕES FINAIS 343-344

b. Normas internacionais sobre investigação policial

– Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3.. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Cap. 12 Captura 345-380

a. Normas internacionais sobre captura – Informação

para as apresentações 345-380

1. INTRODUÇÃO 345-347

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS HUMANOS E CAPTURA 348-378

(a) Princípios fundamentais 348

(b) Normas específicas sobre captura 349-365

[I] Proibição da detenção arbitrária 350-353

[II] Procedimentos a seguir na sequência da captura 354-356

[III] Salvaguardas adicionais 357-360

[IV] Captura de jovens 361-362

[V] Indemnização em caso de captura ilegal 363-365

(c) Medidas de derrogação 366-371

(d) Desaparecimentos forçados ou involuntários 372-378

Relatos de desaparecimentos 377-378

3. OBSERVAÇÕES FINAIS 379-380

b. Normas internacionais sobre captura – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Cap. 13 Detenção 381-438

a. Normas internacionais sobre detenção – Informação

para as apresentações 381-438

1. INTRODUÇÃO 381-384

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS HUMANOS DURANTE A DETENÇÃO 385-435

(a) Princípios fundamentais 385-386

(b) Normas específicas sobre a detenção 387

[I] Proibição da tortura 388-397

[II] Exigências gerais de um tratamento humano dos detidos 398-403

[III] Jovens detidos 404-410

[IV] Mulheres detidas 411-415

(c) Audição ou Interrogatório dos Suspeitos 416-427

[I] Normas internacionais pertinentes 418-420

[II] Objectivo das normas 421-422

[III] Implicações das normas sobre os processos de audição

ou interrogatório 423-427

Página

82

82

83

84

85

86

87

87

88

89

91

92

92

92

92

92

93

93

94

94

95

95

96

96

96

97

97

98

99

101

102

102

103

103

103

103

105

106

107

108

108

108

109

Page 18: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XVII

Parágrafos

(d) Medidas de derrogação 428-433

(e) Desaparecimentos forçados ou involuntários 434-435

3. OBSERVAÇÕES FINAIS 436-438

b. Normas internacionais sobre detenção – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Cap. 14 Utilização da força e de armas de fogo 439-471

a. Normas internacionais sobre a utilização da força

– Informação para as apresentações 439-471

1. INTRODUÇÃO 439-442

2. ASPECTOS GERAIS DA UTILIZAÇÃO DA FORÇA 443-469

(a) Princípios fundamentais 443

(b) Disposições específicas sobre a utilização da força 444-460

[I] Regulamentos; utilização diferenciada da força 448

[II] Recurso inicial a meios não violentos 449

[III] Moderação; medidas humanitárias 450

[IV] Participação do uso da força 451

[V] Utilização de armas de fogo 452-454

[VI] Manutenção da ordem durante reuniões públicas 455

[VII] Utilização da força sobre pessoas detidas 456

[VIII] Recrutamento e formação 457

[IX] Participação e recurso 458

[X] Responsabilidade hierárquica 459

[XI] Ordens ilícitas 460

(c) Utilização da força e direito à vida 461-464

(d) Utilização da força e execuções extrajudiciais 465-466

(e) Utilização da força e desaparecimentos 467-469

3. OBSERVAÇÕES FINAIS 470-471

b. Normas internacionais sobre utilização da força

– Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIO PRÁTICO

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Cap. 15 Distúrbios Internos, Estados de Excepção e Conflitos Armados 472-569

a. Normas internacionais sobre conflitos armados, estados de emergência

e distúrbios internos – Informação para as apresentações 472-569

1. INTRODUÇÃO 472-480

2. ASPECTOS GERAIS 481-566

(a) Princípios fundamentais 481-482

(b) Disposições específicas 483-490

[I] Direitos humanos especialmente vulneráveis 483

[II] Direito dos conflitos armados 484-486

[III] Tipos de conflito armado e categorias de pessoas 487-490

(c) Conflito Armado Internacional 491-499

[I] Estatuto da polícia 494-499

[II] Direitos, deveres e responsabilidades da polícia 500-502

Página

110

110

110

111

111

113

115

117

119

119

120

120

120

120

121

121

121

121

121

121

122

122

122

122

122

123

123

123

123

123

125

125

127

129

129

130

130

131

131

131

132

132

133

133

Page 19: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XVIII

Parágrafos

(d) Conflito armado não internacional 503-519

[I] Artigo 3.o comum às Convenções 505-507

[II] Protocolo Adicional II 508-517

[III] Estatuto 518

[IV] Deveres e responsabilidades da polícia 519

(e) Distúrbios internos 520-536

[I] Definições e características dos distúrbios internos 522-523

[II] Normas internacionais 524-526

[III] Princípios e normas humanitárias 527-534

[IV] Deveres e responsabilidades da polícia 535-536

(f) Terrorismo 537-554

[I] Definições e tipos de terrorismo 538-544

[II] Actos de terror praticados durante conflitos armados 545-547

[III] Cooperação internacional na luta contra o terrorismo 548-553

[IV] Deveres e responsabilidades da polícia 554

(g) Estados de excepção e medidas de derrogação 555-566

[I] Disposições convencionais 556-565

[II] Responsabilidades da polícia 566

3. CONCLUSÕES 567-569

b. Normas internacionais sobre conflitos armados e distúrbios

internos – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Quarta ParteGRUPOS NECESSITADOS DE PROTECÇÃO ESPECIAL OU TRATAMENTO DISTINTO

Cap. 16 Polícia e Protecção de Jovens 570-675

a. Normas internacionais sobre a polícia e a

protecção de jovens – Informação para apresentações 570-675

1. INTRODUÇÃO 570-572

2. ASPECTOS GERAIS RELATIVOS AO PAPEL DA POLÍCIA E À PROTECÇÃO DOS JOVENS 573-671

(a) Princípios fundamentais 573

(b) Disposições específicas em matéria de direitos humanos,

polícia e protecção de jovens 574-671

[I] Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração

da Justiça de Menores (Regras de Beijing) 575-607

[II] Princípios Orientadores das Nações Unidas para a Prevenção

da Delinquência Juvenil (Princípios Orientadores de Riade) 608-615

[III] Regras das Nações Unidas para a Protecção dos Menores

Privados de Liberdade 616-626

[IV] Convenção sobre os Direitos da Criança 627-653

[V] Regras Mínimas das Nações Unidas para a Elaboração

de Medidas não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio) 654-671

3. CONCLUSÕES 672-675

b) Normas internacionais sobre polícia e protecção

de menores – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Página

135

135

136

137

137

138

138

139

140

141

141

141

142

142

143

143

143

145

145

145

145

149

150

153

155

156

156

156

156

157

157

160

163

165

167

169

170

170

171

172

Page 20: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XIX

Parágrafos

Cap. 17 Aplicação da Lei e os Direitos das Mulheres 676-757

a. Normas internacionais sobre a aplicação da lei e os direitos

das mulheres – Informação para as apresentações 676-757

1. INTRODUÇÃO 676-680

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS DAS MULHERES E A APLICAÇÃO DA LEI 681-754

(a) Princípios fundamentais 681-682

(b) Disposições específicas relativas aos direitos das mulheres

e à aplicação da lei 683-754

[I] A Protecção das mulheres 684-754

(a) As mulheres e a discriminação 684-702

(b) As mulheres vítimas de violência doméstica 703-719

(c) As mulheres vítimas de violação e de outros delitos sexuais 720-726

(d) As mulheres detidas 727-731

(e) A protecção das mulheres em período de conflito 732-746

[II] As mulheres polícias 747-754

3. CONCLUSÕES 755-757

b. Normas internacionais sobre a aplicação da lei e os direitos

das mulheres – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Cap. 18 Refugiados e não nacionais 758-823

a. Normas internacionais sobre refugiados e não

nacionais – Informação para apresentações 758-823

1. INTRODUÇÃO 758-765

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS HUMANOS DOS REFUGIADOS

E DOS NÃO NACIONAIS 766-819

(a) Princípios fundamentais 766

(b) Disposições específicas sobre os direitos humanos

dos refugiados e dos não nacionais 767-771

(c) Disposições da Convenção de 1951 que visam especificamente

o estatuto dos refugiados 772-782

(d) Disposições específicas do direito internacional dos direitos

humanos e do direito internacional humanitário aplicáveis

à situação dos refugiados 783-790

(e) Pessoas deslocadas no interior do território 791-794

(f) Disposições específicas da Declaração sobre os direitos humanos das

pessoas que não possuem a nacionalidade do país em que vivem 795-802

(g) Disposições específicas do direito internacional dos direitos

humanos e do direito internacional humanitário aplicáveis

à situação dos não nacionais 803-808

(h) Disposições específicas da Convenção de 1954 sobre o Estatuto

dos Apátridas 809-817

(i) Disposições específicas do direito internacional dos direitos

humanos e do direito internacional humanitário aplicáveis

à situação dos apátridas 818-819

3. CONCLUSÕES 820-823

b. Normas internacionais sobre refugiados e não nacionais– Aplicação prática

1. MEDIDAS PARA A APLICAÇÃO PRÁTICA DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS DE DISCUSSÃO

Página

175

176

176

177

177

177

177

177

179

181

182

183

184

186

186

186

188

189

191

193

193

194

194

194

195

196

197

198

199

200

201

201

201

201

202

203

Page 21: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XX

Parágrafos

Cap. 19 Protecção e indemenização das vítimas 824-877

a. Normas internacional sobre os direitos humanos, protecção

e indemnização de vítimas – Informação para as apresentações 824-877

1. INTRODUÇÃO 824-829

2. ASPECTOS GERAIS SOBRE OS DIREITOS HUMANOS, PROTECÇÃO

E INDEMNIZAÇÃO DAS VÍTIMAS

(a) Princípios fundamentais 830

(b) Disposições específicas relativas aos direitos fundamentais

das vítimas, protecção e indemnização 831-836

(c) Protecção das vítimas de criminalidade 837-857

(d) Protecção das vítimas de abusos de poder 858-863

(e) Recomendações para a aplicação da Declaração dos Princípios

Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidade

e de Abuso de Poder 864-866

(f) Protecção das vítimas de conflitos 867-873

3. CONCLUSÕES 874-877

b. Normas internacionais sobre os direitos das vítimas – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS DE DISCUSSÃO

Quinta ParteQUESTÕES DE COMANDO, DIRECÇÃO E CONTROLO

Cap. 20 Direitos Humanos nas questões de comando, direcção e organização da polícia 878-943

a. Normas internacionais sobre comando, gestão e organização

policial – Informação para as apresentações 878-943

1. INTRODUÇÃO 878-884

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS HUMANOS NAS QUESTÕES DE COMANDO,

DIRECÇÃO E ORGANIZAÇÃO DA POLÍCIA 885-940

(a) Princípios fundamentais 885-887

(b) Implicações de certas disposições em matéria de direitos humanos

nas questões de comando, direcção e controlo da polícia 888-889

(c) Fins e objectivos de uma organização policial 890-893

(d) Ética profissional 894-901

(e) Planificação estratégica e elaboração de políticas 902-907

(f) Sistemas de comando, direcção e controlo 908-923

[I] Sensibilidade e responsabilidade da polícia 909-910

[II] Direitos humanos e investigações policiais 911-915

[III] Direitos humanos e captura 916

[IV] Direitos humanos no período de detenção 917-919

[V] Direitos humanos e utilização da força pela polícia 920-923

(g) Recrutamento 924

[I] Direitos humanos, policia e não discriminação 925

[II] Os direitos humanos e a missão da polícia nas democracias 926-927

(h) Formação 928-940

[I] Utilização da força 932-933

[II] Tratamento dos detidos 934-935

Página

205

206

206

206

206

207

208

210

211

212

213

213

213

214

215

217

219

221

221

221

221

222

222

222

224

225

225

225

226

226

226

227

227

227

227

228

228

Page 22: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XXI

Parágrafos

[III] Conflito armado e distúrbios internos 936-937

[IV] Protecção dos jovens 938

[V] Protecção das vítimas e sua indemnização 939-940

3. CONCLUSÕES 941-943

b. Normas internacionais sobre o comando, gestão

e organização policial – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIO PRÁTICO

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

Cap. 21 Investigação das violações cometidas pela polícia 944-985

a. Normas internacionais sobre a investigação de violações

de direitos humanos pela polícia – Informação para as apresentações 944-985

1. INTRODUÇÃO 944-948

2. ASPECTOS GERAIS 949-979

(a) Princípios fundamentais 949-950

(b) Disposições precisas relativas às queixas, controlo e investigação 951-973

[I] Código de Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis

pela Aplicação da Lei 952-955

[II] Declaração sobre a Protecção de todas as Pessoas contra a Tortura

e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes 956-957

[III] Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis,

Desumanos ou Degradantes 958-961

[IV] Princípios Relativos a uma Prevenção Eficaz e Investigação

das Execuções Extra-judiciais, Arbitrárias ou Sumárias 962-964

[V] Conjunto de princípios para a protecção de todas as pessoas

sujeitas a qualquer tipo de detenção ou prisão 965-969

[VI] Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo

pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei 970-973

(c) Desaparecimentos forçados ou involuntários 974-978

(d) Procedimentos e organismos internacionais estabelecidos com vista

a supervisionar o respeito pelas normas de direitos humanos 979

3. CONCLUSÕES 980-985

b. Normas internacionais sobre investigações de violações

de direitos humanos pela polícia – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

ANEXOS

I. PRINCIPAIS INSTRUMENTOS INTERNACIONAIS EM MATÉRIA DE APLICAÇÃO DA LEI

II. PLANO GERAL DE UM ESTÁGIO

III. QUESTIONÁRIO A PREENCHER ANTES DO ESTÁGIO

IV. EXAME DE FIM DE ESTÁGIO

V. QUESTIONÁRIO DE AVALIAÇÃO DO ESTÁGIO A SER PREENCHIDO

DEPOIS DA REALIZAÇÃO DO MESMO

Página

228

228

229

229

230

230

231

231

233

234

234

234

234

235

235

236

236

237

237

238

238

239

239

240

240

241

243

245

287

291

293

297

Page 23: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XXII

Page 24: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XXIII

ECOSOC Conselho Económico e Social

CICV Comité Internacional da Cruz Vermelha

INTERPOL Organização Internacional de Polícia Criminal

OUA Organização de Unidade Africana

ACNUR Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados

Abreviaturas

Page 25: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Carta Internacional dos Direitos Humanos

Declaração Universal dos Direitos do Homem

Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Cul-turais (entrada em vigor: 3 de Janeiro de 1976)

Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (entrada em

vigor: 23 de Março de 1976)

Protocolo Facultativo referente ao Pacto Internacional sobre osDireitos Civis e Políticos (entrada em vigor: 23 de Março de 1976)

Segundo Protocolo Adicional ao Pacto Internacional sobre os Direi-tos Civis e Políticos com vista à Abolição da Pena de Morte(entrada em vigor: 11 de Julho de 1991)

Instrumentos de Carácter Geral

Convenção de Viena sobre Relações Consulares (Viena, 24 de Abril de

1963) (entrada em vigor: 19 de Março de 1967)

Declaração dos Princípios de Direito Internacional relativos àsRelações Amigáveis e à Cooperação entre Estados em confor-midade com a Carta das Nações Unidas

Declaração e Programa de Acção de Viena

XXIV

Instrumentos Internacionaiscitados no presente manual

Compilação Human Rights: A Compilation of International Instruments, vol. I (2 partes),Universal Instruments (Publicação das Nações Unidas, N.o de Venda E.94.XIV.1); vol. II,Regional Instruments (Publicação das Nações Unidas, N.o de Venda E.97.XIV.1) [em por-tuguês: "Direitos Humanos: Uma Compilação de Instrumentos Internacionais", vol. 1 (2 partes), "Instrumentos Universais"; vol. 2, "Instrumentos Regionais"]

Relatório do Oitavo Congresso Eigth United Nations Congress on the Prevention of Crimeand Treatment of Offenders, Havana, 27 August - 7 September 1990, report prepared by theSecretariat [em português: "Oitavo Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção doCrime e o Tratamento dos Delinquentes, Havana, 27 de Agosto - 7 de Setembro de1990: relatório preparado pelo Secretariado"] (Publicação das Nações Unidas, N.o de VendaE.91.IV.2)

Os instrumentos referidos no presente manual são listados por ordem cronoló-gica em cada uma das categorias abaixo indicadas. Sempre que apropriado, a desig-nação abreviada pela qual o instrumento foi identificado aparece indicada.

Fonte

• Resolução 217 A (III) da Assembleia Geral, de

10 de Dezembro de 1948; Compilação, vol. I, p. 1.

Vide também infra, anexo I.1.

• Resolução 2200 A (XXI) da Assembleia Geral,

de 16 de Dezembro de 1966, anexo; Compila-

ção, vol. I, p. 8.

• Resolução 2200 A (XXI) da Assembleia Geral,

de 16 de Dezembro de 1966, anexo, Compila-

ção, vol. I, p. 20. Vide também infra, anexo I.2.

• Resolução 2200 A (XXI) da Assembleia Geral,

de 16 de Dezembro de 1966, anexo; Compila-

ção, vol. I, p. 41.

• Resolução 44/128 da Assembleia Geral, de 15 de

Dezembro de 1989, anexo; Compilação, vol. I,

p. 46.

• Nações Unidas, Treaty SeriesN.T.2, vol. 596,

p. 261.

• Resolução 2625 (XXV) da Assembleia Geral,

de 24 de Outubro de 1970, anexo.

• Adoptada pela Conferência Mundial sobre

Direitos Humanos, Viena, 25 de Junho de 1993

(A/CONF.157/24 (Parte I), cap. III).

Instrumentos Universais

N.T.2 Em português. Série de Tratados

Page 26: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XXV

Direitos Humanos na Administração da Justiça

Tratamento dos reclusosRegras Mínimas para o Tratamento de Reclusos

Normas para a Aplicação Efectiva das Regras Mínimas para o Tra-tamento de Reclusos

Conjunto de Princípios para a Protecção de Todas as Pessoas Sujei-tas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão

Regras Mínimas das Nações Unidas para a Elaboração de Medi-das não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio)

Princípios Básicos Relativos ao Tratamento de Reclusos

Tortura e Maus TratosDeclaração contra a TorturaDeclaração sobre a Protecção de Todas as Pessoas contra a Tor-tura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ouDegradantes

Convenção contra a TorturaConvenção contra a Tortura e Outras Penas ou TratamentosCruéis, Desumanos ou Degradantes (entrada em vigor: 26 de Junho de

1987)

Pena de morteGarantias para a Protecção dos Direitos das Pessoas Sujeitas aPena de Morte

Segundo Protocolo Adicional ao Pacto Internacional sobre os Direi-tos Civis e Políticos com vista à Abolição da Pena de Morte

Execuções extrajudiciaisPrincípios sobre a Prevenção Eficaz e Investigação das ExecuçõesExtrajudiciais, Arbitrárias ou Sumárias

Aplicação da LeiCódigo de Conduta para os Funcionários Responsáveis pelaAplicação da Lei

• Primeiro Congresso das Nações Unidas sobre

a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delin-

quentes: relatório do Secretariado (publicação das

Nações Unidas, N.o de Venda 1956.IV.4), anexo

I.A; aprovadas pelas resoluções 663 C (XXIV), de

31 de Julho de 1957, e 2076 (LXII), de 13 de Maio

de 1977 do Conselho Económico e Social; Com-

pilação, vol. I, p. 243.

• Resolução 1984/47 do Conselho Económico e

Social, de 25 de Maio de 1984, anexo.

• Resolução 43/173 da Assembleia Geral, de 9

de Dezembro de 1988, anexo; Compilação,

vol. I, p. 265. Vide também infra anexo I.5.

• Resolução 45/110 da Assembleia Geral, de 14

de Dezembro de 1990, anexo; Compilação,

vol. I, p. 336.

• Resolução 45/111 da Assembleia Geral, de 14

de Dezembro de 1990, anexo; Compilação,

vol. I, p. 263.

• Resolução 39/46 da Assembleia Geral, de 10

de Dezembro de 1984, anexo; Compilação,

vol. I, p. 293.

• Resolução 39/46 da Assembleia Geral, de 10

de Dezembro de 1984, anexo; Compilação,

vol. I, p. 293.

• Resolução 1984/50 do Conselho Económico e

Social, de 25 de Maio de 1984, anexo; Compilação,

vol. I, p. 310.

• Vide supra, Carta Internacional dos Direitos

Humanos

• Resolução 1989/65 do Conselho Económico

e Social, de 24 de Maio de 1989, anexo;

Compilação, vol. I, p. 409. Vide também infra

anexo I.8.

• Resolução 34/169 da Assembleia Geral, de 17

de Dezembro de 1979, anexo; Compilação,

vol. I, p. 312. Vide também infra anexo I.3.

Page 27: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XXVI

Princípios Orientadores para a Aplicação Efectiva do Código deConduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei

Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogopelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei

Justiça de MenoresRegras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Jus-tiça de Menores (Regras de Beijing)

Convenção sobre os Direitos da Criança (entrada em vigor: 2 de Setembro

de 1990)

Princípios Orientadores das Nações Unidas para a Prevenção daDelinquência Juvenil (Princípios Orientadores de Riade)

Regras das Nações Unidas para a Protecção dos Menores Priva-dos de Liberdade

Protecção das vítimasDeclaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimasda Criminalidade e de Abuso de Poder

Desaparecimentos forçadosDeclaração sobre a Protecção de Todas as Pessoas contra osDesaparecimentos Forçados

Prevenção da Discriminação

RaçaDeclaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas asFormas de Discriminação Racial

Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formasda Discriminação Racial (entrada em vigor: 4 de Janeiro de 1969)

SexoDeclaração sobre a Eliminação da Discriminação contra asMulheres

Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discri-minação contra as Mulheres (entrada em vigor: 3 de Setembro de 1981)

• Resolução 1989/61 do Conselho Económico e

Social, de 24 de Maio de 1989, anexo.

• Relatório do Oitavo Congresso, capítulo I, sec-

ção B.2; Compilação, vol. I, p. 318. Vide tam-

bém infra anexo I.4.

• Resolução 40/33 da Assembleia Geral, de

29 de Novembro de 1985, anexo; Compilação,

vol. I, p. 356. Vide também infra anexo I.9.

• Resolução 44/25 da Assembleia Geral, de 20

de Novembro de 1989, anexo; Compilação,

vol. I, p. 174.

• Resolução 45/112 da Assembleia Geral, de 14

de Dezembro de 1990, anexo; Compilação,

vol. I, p. 346.

• Resolução 45/113 da Assembleia Geral, de 14

de Dezembro de 1990, anexo; Compilação,

vol. I, p. 275.

• Resolução 40/34 da Assembleia Geral, de 29

de Novembro de 1985, anexo; Compilação,

vol. I, p. 382. Vide também infra anexo I.6.

• Resolução 47/133 da Assembleia Geral, de 18

de Dezembro de 1992; Compilação, vol. I,

p. 401. Vide também infra anexo I.7.

• Resolução 1094 (XVIII) da Assembleia Geral,

de 20 de Novembro de 1963; Compilação, vol. I,

p. 61.

• Resolução 2106 A (XX) da Assembleia Geral,

de 21 de Dezembro de 1965, anexo; Compilação,

vol. I, p. 66.

• Resolução 2263 (XXII) da Assembleia Geral,

de 7 de Novembro de 1967; Compilação, vol. I,

p. 145.

• Resolução 34/180 da Assembleia Geral, de 18

de Dezembro de 1979, anexo; Compilação,

vol. I, p. 150.

Page 28: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XXVII

Manifestações particulares de discriminaçãoConvenção Relativa à Escravatura (Genebra, 25 de Setembro de 1926) (entrada

em vigor: 9 de Março de 1927)

Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocí-dio (entrada em vigor: 12 de Janeiro de 1951)

Protocolo que altera a Convenção Relativa à Escravatura, assinadoem Genebra a 25 de Setembro de 1926 (entrada em vigor: 7 de Dezembro

de 1953)

Convenção Suplementar Relativa à Abolição da Escravatura, doTráfico de Escravos e das Instituições e Práticas Análogas àEscravatura (Genebra, 7 de Setembro de 1956) (entrada em vigor: 30 de Abril de 1957)

Convenção Internacional para a Eliminação e Repressão doCrime de Apartheid (entrada em vigor: 18 de Julho de 1976)

Religião ou convicção

Declaração sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerânciae Discriminação Baseadas na Religião ou na Convicção

Trabalhadores migrantesConvenção Internacional sobre a Protecção dos Direitos deTodos os Trabalhadores Migrantes e Membros das Suas Famílias

Terrorismo

Convenção Internacional contra a Tomada de Reféns (entrada em

vigor: 3 de Junho de 1983)

Medidas contra o terrorismo internacional

Nacionalidade, apátridas e refugiados

Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados (Genebra, 28 de Julho

de 1951) (entrada em vigor: 22 de Abril de 1954)

Convenção Relativa ao Estatuto das Pessoas Apátridas (Nova Iorque,

28 de Setembro de 1954) (entrada em vigor: 6 de Junho de 1960)

Protocolo Relativo ao Estatuto dos Refugiados (Nova Iorque, 31 de

Janeiro de 1967) (entrada em vigor: 4 de Outubro de 1967)

Declaração sobre os Direitos Humanos dos Indivíduos Que nãosão Nacionais do País onde Vivem

• Liga das Nações, Treaty Series, vol. LX, p. 253;

Compilação, vol. I, p. 201.

• Resolução 260 A (III) da Assembleia Geral, de

9 de Dezembro de 1948, anexo; Compilação,

vol. I, p. 673.

• Resolução 794 (VIII) da Assembleia Geral, de

23 de Outubro de 1953; Compilação, vol. I, p. 206.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 266, p. 3;

Compilação, vol. I, p. 209.

• Resolução 3060 (XXVIII) da Assembleia

Geral, de 30 de Novembro de 1973, anexo; Com-

pilação, vol. I, p. 80.

• Resolução 36/55 da Assembleia Geral, de 25 de

Novembro de 1981; Compilação, vol. I, p. 122.

• Resolução 45/158 da Assembleia Geral, de

18 de Dezembro de 1990, anexo; Compilação,

vol. I, p. 554.

• Resolução 34/146 da Assembleia Geral, de 17

de Dezembro de 1979, anexo.

• Relatório do Oitavo Congresso, capítulo I, sec-

ção C, resolução 25, anexo.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 189, p. 137;

Compilação, vol. I, p. 638.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 360, p. 117;

Compilação, vol. I, p. 625.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 606,

p. 267; Compilação, vol. I, p. 655.

• Resolução 40/144 da Assembleia Geral, de

13 de Dezembro de 1985, anexo; Compilação,

vol. I, p. 668.

Page 29: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XXVIII

Conflitos Armados Internacionais

Convenção da Haia de 1907Convenção da Haia (IV) relativa às Leis e Costumes da Guerraem Terra (Haia, 18 de Outubro de 1907) (entrada em vigor: 26 de Janeiro de 1910)

Primeira Convenção de GenebraConvenção I de Genebra para Melhorar a Situação dos Feridose Doentes das Forças Armadas em Campanha (Genebra, 12 de Agosto

de 1949) (entrada em vigor: 21 de Outubro de 1950)

Segunda Convenção de GenebraConvenção II de Genebra para Melhorar a Situação dos Feridos,Doentes e Náufragos das Forças Armadas no Mar (Genebra, 12 de Agosto

de 1949) (entrada em vigor: 21 de Outubro de 1950)

Terceira Convenção de GenebraConvenção III de Genebra relativa ao Tratamento dos Prisioneirosde Guerra (Genebra, 12 de Agosto de 1949) (entrada em vigor: 21 de Outubro de 1950)

Quarta Convenção de GenebraConvenção IV de Genebra relativa à Protecção das Pessoas Civisem Tempo de Guerra (Genebra, 12 de Agosto de 1949) (entrada em vigor: 21 de Outu-

bro de 1950)

Protocolo I AdicionalProtocolo I Adicional às Convenções de Genebra de 12 de Agostode 1949 relativo à Protecção das Vítimas dos Conflitos ArmadosInternacionais (Genebra, 8 de Junho de 1977) (entrada em vigor: 7 de Dezembro

de 1978)

Conflitos Armados Não Internacionais

Protocolo II AdicionalProtocolo II Adicional às Convenções de Genebra de 12 deAgosto de 1949 relativo à Protecção das Vítimas dos ConflitosArmados Não Internacionais (Genebra, 8 de Junho de 1977) (entrada em vigor:

7 de Dezembro de 1978)

• J. B. Scott, ed., The Hague Conventions and

Declarations of 1899 and 1907N.T.3, 3.a edição

(Nova Iorque, Oxford University Press, 1918),

pp. 101-102; Supplement to the American Jour-

nal of International LawN.T.4 (Nova Iorque),

vol. 2 (1908), Official DocumentsN.T.5, p. 90.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 75, p. 31;

Compilação, vol. I, p. 685.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 75, p. 85;

Compilação, vol. I, p. 711.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 75, p. 135;

Compilação, vol. I, p. 732.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 75, p. 287;

Compilação, vol. I, p. 803.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 1125, p. 3;

Compilação, vol. I, p. 866.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 1125, p. 609;

Compilação, vol. I, p. 934.

N.T.3 Em português. “As Convenções e Declarações da Haia de 1899 e 1907”N.T.4 Em português. “Suplemento ao Jornal Americano de Direito Internacional”N.T.5 Em português. “Documentos Oficiais”

Page 30: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XXIX

N.T6 Em português. “Série de Tratados Europeus”N.T.7 Em português. “Materiais Jurídicos Internacionais”

Instrumentos Regionais

Convenção Europeia dos Direitos do HomemConvenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liber-dades Fundamentais (Roma, 4 de Novembro de 1950) (entrada em vigor: 3 de Setem-

bro de 1953)

Protocolo Adicional n.o 1 à Convenção Europeia dos Direitos doHomem (Paris, 20 de Março de 1952) (entrada em vigor: 18 de Maio de 1954)

Protocolo Adicional n.o 4 à Convenção Europeia dos Direitos doHomem (Estrasburgo, 16 de Setembro de 1963) (entrada em vigor: 2 de Maio de 1968)

Convenção Americana sobre Direitos Humanos (“Pacto de São José

da Costa Rica”) (São José, 22 de Novembro de 1969) (entrada em vigor: 18 de Julho de 1978)

Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos (Nairobi, 26 de

Junho de 1981) (entrada em vigor: 21 de Outubro de 1986)

Convenção Europeia para a Prevenção da Tortura e das Penas ouTratamentos Desumanos e Degradantes (Estrasburgo, 26 de Novembro de

1987) (entrada em vigor: 1 de Fevereiro de 1989)

Fonte

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 213, p. 221;

Compilação, vol. II.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 213, p. 221;

Compilação, vol. II.

• Conselho da Europa, European Treaty

SeriesN.T.6, n.o 46; Compilação, vol. II.

• Nações Unidas, Treaty Series, vol. 1144, p. 123;

Compilação, vol. II.

• OUA, documento CAB/LEG/67/3/Rev.;

International Legal MaterialsN.T.7 (Washington,

D.C.), vol. XXI (1982), p. 58; Compilação, vol. II.

• Conselho da Europa, European Treaty Series,

n.o 126; Compilação, vol. II.

Page 31: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

XXX

Declaração de objectivos

O presente manual, o método que enuncia e os cursos sugeri-dos em conformidade com este método têm por objectivos:

a) Fornecer informação sobre as normas internacionais de direi-tos humanos relevantes para o trabalho da polícia;

b) Estimular a aquisição de conhecimentos e a formulação e apli-cação das políticas necessárias à tradução desses conhecimen-tos em condutas práticas;

c) Sensibilizar os participantes para o particular papel que desem-penham na promoção e protecção dos direitos humanos e para apossibilidade de as suas actividades quotidianas afectarem osdireitos humanos;

d) Reforçar o respeito e a confiança dos funcionários responsáveispela aplicação da lei na dignidade humana e nos direitos huma-nos fundamentais;

e) Promover e reforçar um sistema de valores baseado na legalidadee na observância das normas internacionais de direitos huma-nos no seio dos organismos responsáveis pela aplicação da lei;

f ) Ajudar os organismos responsáveis pela aplicação da lei e seusagentes a exercer eficazmente as suas actividades mediante aobservância das normas internacionais de direitos humanos;

g ) Habilitar os instrutores e formadores das forças policiais aministrar educação e formação em matéria de direitos huma-nos aos funcionários responsáveis pela aplicação da lei.

Os principais destinatários são:

• Formadores e instituições de formação das forças policiais;• Agentes da polícia nacional, tanto civil como militar;• Contingentes de polícia civil [CIVPOL] das operações demanutenção da paz das Nações Unidas.

Page 32: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*FORMAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS RESPONSÁVEISPELA APLICAÇÃO DA LEITEORIA E PRÁTICA

Primeira Parte

Page 33: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 34: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 3

1. O Alto Comissariado para os Direitos Humanos//Centro para os Direitos Humanos (AC/CDH),através do seu programa de serviços consultivose de assistência técnica, participa desde há mui-tos anos na formação de profissionais de todas asáreas da administração da justiça, nomeada-mente a aplicação da lei. O presente manualbaseia-se no método desenvolvido ao longo des-ses anos, cujos elementos fundamentais são osseguintes:

a. Método colegial2. O AC/CDH recorre a umalista de peritos orientada para aprática. Em lugar de reunir pai-néis compostos apenas por pro-fessores e teóricos, o AC/CDHescolhe profissionais da áreaem questão, nomeadamente agentes e formadoresdas forças policiais. De acordo com a experiênciado AC/CDH, obtêm-se melhores resultadosrecorrendo ao método colegial através do qual ospolícias discutem entre si do que seguindo ummodelo baseado na relação professor-aluno. Estaabordagem permite ao AC/CDH aperceber-seda cultura profissional própria das forças policiais.Ao mesmo tempo, formandos e formadores sãoacompanhados e orientados por pessoal espe-cializado do AC/CDH e da Divisão para a Pre-venção do Crime e Justiça Penal das Nações

Unidas, assim assegurando que o essencial dasnormas das Nações Unidas se veja plena e sis-tematicamente reflectido no conteúdo dos cur-sos.1

b. Formação de formadores3. Os participantes nacionais nos cursos doAC/CDH são seleccionados no pressuposto deque as suas responsabilidades se manterão uma vezconcluída a actividade de formação. São encarre-gados da organização das suas próprias actividadesde formação e divulgação após regressarem aos res-pectivos postos. Desta forma, os cursos têm umefeito multiplicador, à medida que a informação édifundida no seio das instituições em causa.Desde 1992, os cursos do AC/CDH incluem com-ponentes de formação de formadores, tais comolições e materiais concebidos para dar a conheceraos participantes diversas técnicas pedagógicas,assim os habilitando a ministrar eles próprios for-mação, para além do conteúdo substancial das ses-sões. Para melhores resultados, os organizadoresdos cursos deverão procurar seguir este mesmomodelo de formação.

c. Técnicas pedagógicas4. Todos os cursos desenvolvidos pelo AC/CDHincluem uma diversidade de técnicas eficazes paraa formação de adultos. Em particular, sugere-se autilização de métodos de ensino criativos e inte-

1 Quando não haja disponi-bilidade por parte dos peri-tos de direitos humanos dasNações Unidas, os organi-zadores de cursos prepara-dos com base no presentemanual poderão conside-rar a possibilidade de pedira participação de peritos deorganizações não governa-mentais de defesa e pro-moção dos direitoshumanos.

Método do Alto Comissariado / Centropara os Direitos Humanos nas NaçõesUnidas para a Formação da Polícia

capítulo

01

Page 35: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

ractivos, que oferecem as melhores possibilida-des de garantir a participação activa dos poten-ciais formandos. Discussões recentementerealizadas entre pessoal do AC/CDH e diversasorganizações não governamentais e instituiçõescom larga experiência na área da formação levaramà identificação das seguintes técnicas como sendoespecialmente adequadas e eficazes na formaçãode adultos em matéria de direitos humanos: gru-pos de trabalho, conferências-debate, estudo decasos práticos, discussões em grupo, mesas redon-das, sessões de reflexão, simulação e dramatização,visitas de estudo, exercícios práticos (nomeada-mente a elaboração de curricula de cursos eregulamentos internos) e meios audiovisuais.Recomendações sobre a maneira de utilizar tais téc-nicas podem ser encontradas no capítulo III, infra.

d. Especificidade dos destinatários5. O AC/CDH constatou que a mera enuncia-ção de vagos princípios de aplicação geral apre-senta poucas probabilidades de influenciar ocomportamento concreto dos destinatários. Paraserem eficazes – e, no fundo, para valerem detodo a pena – as actividades de formação e educaçãodevem ser concebidas e desenvolvidas tendo emconta o público específico a que se destinam,sejam polícias, pessoal dos serviços de saúde,juristas, estudantes ou outros. Nesta conformi-dade, as actividades pedagógicas do AC/CDHcolocam maior ênfase nas normas directamenterelevantes para, por exemplo, o trabalho quoti-diano da polícia, e menos na história e estruturados mecanismos das Nações Unidas.

e. Orientação prática6. No mundo real, a polícia quer saber não só“quais são as regras”, mas também como desem-penhar o seu trabalho de forma eficaz dentro doslimites impostos por essas regras. As actividadesde formação que ignorem qualquer um destesaspectos não serão provavelmente credíveis nemeficazes. Neste pressuposto, o AC/CDH inclui emtodos os seus cursos informação prática sobre téc-nicas comprovadas para o bom desempenho dasfunções do grupo-alvo, proveniente de recomen-dações de peritos e de publicações sobre as actuaismelhores práticas para a profissão em causa. Con-

tudo, embora as recomendações práticas constituamum dos componentes essenciais dos cursos, nãoseria possível assegurar uma formação aprofundadasobre as aptidões técnicas necessárias ao bomdesempenho da actividade policial num manual oucurso de direitos humanos. Em vez disso, há quedestacar a existência dessas técnicas, que deverãomais tarde complementar a formação em matériade direitos humanos. A formação técnica das polí-cias é assegurada, a nível internacional, por diver-sas instituições nacionais de formação policial, noquadro de programas de âmbito internacional hámuito estabelecidos.

f. Explicação pormenorizada das normas7. Os cursos ministrados pelo AC/CDH pre-tendem expor de forma detalhada as normas inter-nacionais pertinentes. Para este fim, sãotraduzidos e distribuídos pelos participantes osinstrumentos internacionais relevantes, bemcomo materiais pedagógicos simplificados. Dequalquer forma, o pessoal especializado doAC/CDH controla o conteúdo dos cursos e das ses-sões e completa a explicação das normas, conformenecessário. O presente manual sugere uma estru-tura pré-definida para esse conteúdo, a fim de faci-litar o trabalho dos formadores.

g. Sensibilização8. Para além de ensinarem as normas e detransmitirem conhecimentos práticos, os cursos doAC/CDH incluem exercícios concebidos para sen-sibilizar os formandos para a possibilidade de elespróprios atentarem contra os direitos humanos,mesmo que de forma involuntária. Por exemplo,podem ser muito úteis os exercícios bem concebidos(nomeadamente a dramatização) destinados aconsciencializar os formandos para a existênciade preconceitos raciais ou de género nas suas pró-prias atitudes ou comportamentos. Do mesmomodo, a particular importância de determinadasnormas no que se refere, por exemplo, às mulhe-res nem sempre resulta de imediato evidente. Os formandos deverão conseguir compreender,nomeadamente, que o termo “tratamento degra-dante”, que encontramos em diversos instru-mentos internacionais, se pode traduzir emdiferentes actividades ou restrições consoante se

4 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 36: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 5

aplique a mulheres ou a homens, ou a distintos gru-pos culturais.

h. Flexibilidade de concepção e aplicação9. Para serem de utilidade universal, os cursos deformação devem ser concebidos de forma a facili-tar a flexibilidade da respectiva utilização, semimpor aos formadores enfoques ou métodos rígidos.Os cursos deverão ser passíveis de adaptação àsnecessidades específicas e às particulares circuns-tâncias culturais, educativas, regionais e vivenciaisde uma ampla diversidade de potenciais destinatá-rios no seio de um determinado grupo-alvo. Porconseguinte, o presente manual não se destina a ser“lido” textualmente aos formandos, devendo anteso formador seleccionar o material relevante e cons-

truir as suas próprias notas e material de apresen-tação, com base no conteúdo do manual e na reali-dade específica no terreno.

i. Instrumentos de avaliação10. Os cursos do AC/CDH incluem exercícios deavaliação anteriores e posteriores ao próprio curso,tais como questionários de exame, com três objec-tivos principais. Os questionários prévios, quandocorrectamente utilizados, permitem aos formado-res adequar o curso às particulares necessidades dosdestinatários. Os questionários finais e as sessõesde avaliação permitem aos formandos avaliar osconhecimentos adquiridos e contribuem para amodificação e para o aperfeiçoamento contínuo (ecrucial) dos cursos sugeridos no presente manual.

Page 37: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 38: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 7

Participantesnos programas de formação

a. Definição e categorias11. Os programas de formação indicados no pre-sente manual destinam-se aos funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei. Estes funcionáriossão definidos no comentário ao artigo 1.o doCódigo de Conduta para os Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei da seguinte forma:

a) A expressão «funcionários responsáveis pela apli-

cação da lei» inclui todos os agentes da lei, quer nomea-

dos, quer eleitos, que exerçam poderes de polícia,

especialmente poderes de prisão ou detenção.

b) Nos países onde os poderes policiais são exercidos

por autoridades militares, quer em uniforme, quer não,

ou por forças de segurança do Estado, a definição dos

funcionários responsáveis pela aplicação da lei incluirá

os funcionários de tais serviços.

[…]12. Para maior brevidade e diversidade linguís-tica, o termo “polícia” é também utilizado nestemanual como alternativa à expressão “funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei”. Ambas asexpressões se referem à categoria de pessoal abran-gida pela definição acima indicada, bem como aoscontingentes de polícia civil (CIVPOL) das operaçõesde manutenção da paz das Nações Unidas.

13. Convém distinguir entre as diferentes cate-gorias de agentes policiais, tanto em termos

hierárquicos como funcionais, a fim de asse-gurar que os programas de formação se ade-quam aos diversos tipos de participantes. Asseguintes categorias genéricas de funcionáriossão identificadas para os fins dos programas de formação e para a utilização do presentemanual:

Funcionários superiores nacionais responsáveispela aplicação da lei – aqueles que desempenhamfunções de definição política ou estratégica e têmresponsabilidades de comando no seio das orga-nizações policiais.Instrutores e formadores de funcionários respon-sáveis pela aplicação da lei – pessoas responsáveispela instrução e formação dos funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei em todos os domí-nios da formação policial.

Funcionários nacionais responsáveis pela apli-cação da lei sem funções de comando – aquelesque exercem funções “nas ruas” e os que têm res-ponsabilidades de supervisão imediata sobreesses funcionários. É também útil identificarsubcategorias neste escalão hierárquico, porexemplo: investigadores criminais, pessoas quedesempenham funções específicas de luta con-tra a instabilidade civil e polícia “generalista”que desempenha uma ampla variedade de fun-ções de policiamento.

capítulo

02

Page 39: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Funcionários que prestam serviço nos contingen-tes de polícia civil (CIVPOL) das operações demanutenção da paz das Nações Unidas.

NOTA PARA O FORMADOR: em função das estruturashierárquicas e de outros factores de organização,os funcionários responsáveis pela aplicação da leide grau intermédio ou “quadros médios” podemser incluídos nos programas de formação desti-nados quer aos funcionários superiores quer aosque não desempenham funções de comando.

b. Razões específicas que justificam a for-mação de diversas categorias de funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei14. É importante formar os funcionários superioresa fim de dar credibilidade ao programa de formaçãopara a organização policial no seu conjunto, bemcomo por aquilo que representam – não apenas noseio da instituição, mas também no âmbito dos sis-temas político e de justiça penal. Por exemplo, ospolícias deste escalão poderão exercer pressão para quesejam introduzidas as alterações que consideremnecessárias ao desempenho da função policial;podem integrar organismos nacionais criados para for-mular recomendações sobre alterações ou reformasconstitucionais ou legais; podem definir directrizesa seguir dentro da organização e podem adoptar deci-sões operacionais com amplas repercussões.

15. Em particular, é importante ministrar for-mação em matéria de direitos humanos e normashumanitárias a esta categoria de funcionários paraalcançar os objectivos (b) e (e) enunciados na“Declaração de Objectivos” supra referida (pág. 1).

16. A importância da formação dos instrutores eformadores das forças policiais é reconhecida napolítica de formação de formadores do AC/CDH.Ao formar esta categoria de funcionários, é possí-vel cumprir todos os objectivos enunciados na“Declaração de Objectivos”.

17. É obviamente importante que os funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei com responsa-bilidades de policiamento directo “nas ruas” conhe-çam as normas de direitos humanos e direitohumanitário e que tais normas orientem as suas ati-

tudes e condutas. Isto é verdade quer tais funcio-nários desempenhem funções gerais de policia-mento quer sejam especialistas em matérias comoinvestigação criminal ou manutenção da ordempública. É no desempenho efectivo e quotidiano daactividade essencial da polícia que os direitoshumanos são respeitados ou, pelo contrário, viola-dos. Além disso, os agentes a este nível operam fre-quentemente sozinhos ou em pequenos grupos –muitas vezes sem supervisão. É, pois, de importânciafundamental que reconheçam que o respeito dosdireitos humanos constitui um elemento indis-pensável para o bom desempenho das suas funções.

18. Os contingentes de polícia civil (CIVPOL) dasoperações de manutenção da paz têm uma parti-cular responsabilidade de respeitar as normas dedireitos humanos das Nações Unidas, uma vezque trabalham sob a égide da organização quecriou essas normas. As suas funções incluem tam-bém o dever de aconselhar os organismos locaisencarregados da aplicação da lei com base, não nalei do respectivo Estado, mas nas normas inter-nacionais indicadas no presente manual. Assim,os agentes da CIVPOL devem respeitar escrupu-losamente e promover activamente as normas dasNações Unidas em matéria de aplicação da lei.

c. Características particulares dos organis-mos e funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei19. Nem todas as características dos organismosencarregados da aplicação da lei, ou da cultura policialsão universais; existem variações em função da per-sonalidade, geração e orientação profissional dos agen-tes. É, porém, possível fazer uma série de observaçõesgerais a respeito das organizações e funcionários de polí-cia, relevantes para os programas de formação em direi-tos humanos. Até que ponto e de que forma asorganizações e os funcionários individualmente con-siderados se afastam destas generalizações são aspec-tos que devem, naturalmente, ser apreciados ao níveldo local onde se levam a cabo os programas.

20. Essas observações gerais são as seguintes:Podem existir divisões significativas no seio dosorganismos, em função dos diversos níveis hie-rárquicos e funcionais.

8 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 40: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 9

Existe a tendência para fazer grandes distinçõesentre as actividades definidas como “o verdadeirotrabalho do polícia” (tarefas operacionais e práti-cas) e outras funções necessárias nos organismosencarregados da aplicação da lei.

Existe frequentemente um sentimento de que osimperativos da actividade policial prática sãoincompatíveis com os requisitos legais e admi-nistrativos.

Um corolário destas tendências é o facto demuitos funcionários responsáveis pela aplicação

da lei considerarem que o trabalho da polícia éuma actividade essencialmente prática queexige respostas pragmáticas e muitas vezesexpeditas para situações a que dão uma soluçãoimediata, embora por vezes meramente tem-porária.

NOTA PARA O FORMADOR: As observações ecomentários constantes do presente capítulo ser-viram de base a algumas das recomendações cons-tantes dos capítulos seguintes. Deverão ser tidosem conta pelos organizadores e intervenientes noscursos.

Page 41: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 42: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 11

a. Objectivos da aprendizagem21. O formador tem por objectivo satisfazer asnecessidades do aluno. Nesta conformidade, são trêsos objectivos fundamentais de aprendizagem que ser-vem de base a este programa e reflectem as seguin-tes três necessidades de educativas dos participantesem todos os programas de formação para forçaspoliciais:

• Receber informação e adquirir conhecimentos –sobre o que são e o que significam as normas dedireitos humanos e direito humanitário;• Adquirir ou reforçar aptidões – para que as fun-ções dos organismos responsáveis pela aplicaçãoda lei e as tarefas dos agentes possam ser desem-penhadas com eficácia e dentro do respeito dosdireitos humanos. O simples conhecimento dasnormas não é suficiente para que a polícia as tra-duza numa conduta operacional apropriada. Aaquisição de conhecimentos deve ser olhadacomo um processo gradual, já que as aptidões seaperfeiçoam com a prática e a aplicação. Pode,assim, haver necessidade de prolongar o pro-cesso, se as necessidades de formação que seidentifiquem em áreas específicas da actividadepolicial assim o exigirem, através dos programasde assistência técnica das Nações Unidas ou de for-mas de cooperação estabelecidas ao abrigo de pro-gramas bilaterais de carácter técnico no domínioda actividade policial.

• Ficar sensibilizado, ou seja, experimentar umamudança de atitudes (negativas) ou reforçar atitudes(positivas) e assim aperfeiçoar a sua conduta – porforma a que os agentes da lei reconheçam, ou conti-nuem a reconhecer, a necessidade de promover e pro-teger os direitos humanos e o façam, de facto, noexercício das suas funções. Tudo isto tem a ver com osvalores do funcionário responsável pela aplicação dalei. Este é, também, um processo de longo prazo quedeverá ser reforçado mediante uma formação com-plementar e práticas adequadas de comando e gestão.

22. Assim, uma formação eficaz deverá procuraraperfeiçoar:• conhecimentos• aptidões• atitudesa fim de contribuir para: um comportamento adequado.

b. Recomendações gerais23. Com base na informação e nos comentáriosrelativos à classificação dos participantes estabe-lecida no capítulo II, podem formular-se asseguintes recomendações gerais sobre a forma-ção da polícia em direitos humanos:

a) Quando for possível, devem ser organizadosprogramas de formação diferenciados para as diversascategorias de funcionários responsáveis pela apli-cação da lei, segundo as respectivas funções e posi-

Técnicasde FormaçãoEficazes

capítulo

03

Page 43: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

ção hierárquica. Isto permite que a formação secentre nos seguintes aspectos:• estratégia e formulação de políticas em matériade aplicação da lei para os funcionários superioresde polícia;• questões pedagógicas para instrutores e forma-dores;• táctica e policiamento “de rua” para os funcio-nários não incluídos nas categorias anteriores;• questões de particular relevância para os fun-cionários com funções específicas, por exemplo deinvestigação criminal ou manutenção da ordempública, ou agentes da polícia civil (CIVPOL).

NOTA PARA OS FORMADORES: Tal como supraindicado no capítulo II.A, dependendo dasestruturas hierárquicas e de outros factoresorganizacionais, os funcionários responsáveispela aplicação da lei de grau intermédio podemser incluídos nos programas de formação des-tinados quer aos funcionários superiores, queraos que operam “nas ruas”. Caso se considereque a participação de funcionários com dife-rentes funções no mesmo programa é inevitá-vel, ou mesmo desejável, poder-se-ão entãoexplorar as diferentes experiências dos partici-pantes, para fins pedagógicos. As distintas pers-pectivas e prioridades de uns e outros podem sercomparadas, para conseguir melhores resulta-dos.

b) A orientação predominantemente prática e prag-

mática dos agentes policiais deverá ver-se reflec-tida nos métodos pedagógicos e formativosadoptados. Isto significa:• criar oportunidades para traduzir em termos prá-ticos as ideias e os conceitos;• permitir aos participantes concentrar-se nosreais problemas da actividade policial;• responder a questões de interesse imediato paraos participantes, por estes colocadas no decorrer doprograma.

c. Método participativo24. Para obter os melhores resultados possíveis,devem ser tidos em conta alguns princípios bási-cos na aplicação do método participativo enun-ciado no capítulo I.

25. Recordemos os nove elementos do métodoproposto pelo Alto Comissariado/Centro para osDireitos discriminados no capítulo I:• apresentações colegiais;• formação de formadores;• técnicas pedagógicas interactivas;• especificidade dos destinatários;• orientação prática;• explicação pormenorizada das normas;• ensino orientado para a sensibilização;• flexibilidade de concepção e aplicação;• utilização de instrumentos de avaliação.

Este método exige uma abordagem interactiva,flexível, pertinente e variada, tal como explicitadoem seguida:

Interactivo – O programa implica a utilização de ummétodo de formação participativo e interactivo. Osagentes policiais, tal como outros grupos de for-mandos adultos, absorvem com mais facilidade oconteúdo dos cursos quando a informação não lhesé “injectada”. Para que a formação seja eficaz, os par-ticipantes devem intervir em pleno no processo. Comoprofissionais que são, os formandos podem contri-buir com um importante acervo de experiências quedevem ser activamente aproveitadas para transfor-mar o curso numa actividade interessante e eficaz.

Flexível – Contrariamente a certos mitos associadosà formação das polícias, não é recomendável aadopção de uma metodologia “militar”, obrigandoos alunos a participar. O resultado mais frequentede tais técnicas é o suscitar de um ressentimentoentre os participantes e, em consequência, a obs-trução das vias de comunicação entre formadorese formandos. Embora o formador deva manterum certo controlo, a primeira regra deverá ser aflexibilidade. As questões colocadas pelos partici-pantes – mesmo as mais difíceis – devem ser bemacolhidas e respondidas pelos formadores deforma positiva e franca. Da mesma forma, umhorário excessivamente rígido pode ser motivo defrustração e ressentimento entre os participantes.

Pertinente – A pergunta que o aluno se fará em silên-cio ao longo de todo o curso será: “O que tem isto aver com o meu trabalho diário?”. A forma como o

12 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 44: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

formador consiga dar resposta continuamente a essapergunta será um factor importante para o seu êxito.Assim, deve fazer-se tudo quanto seja possível paraassegurar que todo o material apresentado é rele-vante para o trabalho dos participantes e que essa rele-vância é posta em destaque sempre que não forimediatamente evidente. Esta tarefa pode ser maisfácil na abordagem de temas operacionais, como acaptura ou utilização de armas de fogo. Pode, porém,exigir um planeamento mais cuidadoso relativa-mente às questões de carácter essencialmente teó-rico, como a actividade da polícia numa sociedadedemocrática ou a protecção de grupos vulneráveis.

Variado – Para conseguir e manter a participaçãoactiva dos formandos, será conveniente variar astécnicas pedagógicas utilizadas ao longo do curso.Os agentes não estão, na sua maioria, acostuma-dos a longas sessões de estudo e uma rotina abor-recida e monótona fá-los-á tomar mais consciênciada própria aula do que das questões que nela seabordam. Dever-se-ão seleccionar técnicas diver-sificadas, alternando a discussão com a dramati-zação e o estudo de casos práticos com sessões dereflexão colectiva, consoante o tema em análise.

26. Assim, em linhas gerais, devem adoptar-se osseguintes métodos e abordagens:

Exposição das normas – uma breve apresentação dasnormas de direitos humanos e direito humanitáriorelevantes para um determinado aspecto da acti-vidade policial e implicações dessas normas no tra-balho do agente;

Utilização de técnicas de participação – permite aos par-ticipantes utilizarem os seus conhecimentos e aexperiência adquirida no desempenho da actividadepolicial para traduzir na prática as ideias e os con-ceitos enunciados na exposição teórica; permite-lhestambém considerar as repercussões práticas dasnormas de direitos humanos e direito humanitá-rio nas actividades quotidianas das forças poli-ciais.

Enfoque e flexibilidade – permite aos participantesconcentrarem-se em questões de interesse real eactual; e permite aos instrutores e formadores

adaptarem-se às necessidades dos destinatáriosao longo do curso.

d. Técnicas participativas27. Indicam-se em seguida algumas técnicas par-ticipativas.

1. APRESENTAÇÃO E DEBATE

28. Depois da exposição (conforme acima des-crita, no parágrafo 26), é conveniente promover umdebate informal para esclarecer alguns pontos e faci-litar o processo de tradução das ideias na prática.Este debate é moderado pela pessoa que proce-deu à exposição que deve tentar suscitar a inter-venção de todos os participantes. Convém que osformadores tenham preparada uma lista de ques-tões a fim de iniciar o debate.

29. No final da exposição e do debate, o formadordeverá fazer um resumo ou dar uma panorâmicageral da discussão. Deverá também complemen-tar a sessão com a utilização de suportes audiovi-suais previamente preparados ou material deestudo distribuído antecipadamente a todos osparticipantes.

2. CONFERÊNCIAS – DEBATE

30. A constituição de um painel de formadoresou peritos, eventualmente depois de uma expo-sição feita por um ou vários deles, é por vezesmuito útil. Este método é particularmente eficazquando os peritos têm experiência em diversosaspectos de um mesmo tema, em resultado dasrespectivas trajectórias profissionais ou países deorigem. O ideal é que este grupo seja compostopor peritos de direitos humanos e por especia-listas na actividade e formação das forças poli-ciais.

31. Um dos formadores intervenientes na exposi-ção deverá servir de mediador, a fim de permitir umaparticipação tão ampla quanto possível, garantirque as necessidades dos formandos sejam satisfei-tas e fazer um resumo ou exposição das linhas

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 13

Page 45: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

gerais do debate no final do mesmo. Este métododeverá incluir a interacção directa entre os própriosmembros do painel e entre estes e os participantes.

3. GRUPOS DE TRABALHO

32. Os formandos podem ser divididos em peque-nos grupos de cinco ou seis participantes. A cadagrupo será dado um tema para debater, um problemapara resolver ou algo concreto para produzir numcurto período de tempo – até 50 minutos. Se neces-sário, pode ser afecto um moderador a cada grupo.Em seguida, reúnem-se de novo todos os forman-dos e um porta-voz de cada grupo apresenta as deli-berações do seu grupo. Os formandos podem entãodebater os temas e as respostas de cada grupo.

4. ESTUDO DE CASOS PRÁTICOS

33. Além de debater os temas propostos para dis-cussão, os grupos de trabalho podem analisarcasos práticos. Estes dever-se-ão basear em situa-ções plausíveis e realistas que não sejam excessi-vamente complexas e girem em torno de duas outrês questões principais. A solução dos casos prá-ticos deverá permitir aos participantes exercitaras suas aptidões profissionais e aplicar as normasde direitos humanos e direito humanitário. Osfuncionários superiores de polícia deverão exerci-tar as suas aptidões de comando e gestão.

34. A situação que se propõe para análise pode serapresentada aos participantes para que a examinemno seu conjunto ou sucessivamente desenvolvidaperante eles (“hipóteses evolutivas”) mediante asucessiva introdução de novos elementos a quetêm de dar resposta.

5. RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS/SESSÕES

DE REFLEXÃO CONJUNTA

35. Estas sessões podem ser conduzidas comoexercícios intensivos para solucionar problemassimultaneamente teóricos e práticos. Exigem quese proceda à análise de um problema e que se ten-

tem depois encontrar soluções para o mesmo. Osexercícios de reflexão colectiva encorajam e exigemum elevado grau de participação e estimulam aomáximo a criatividade dos participantes.

36. Depois da apresentação do problema, todas asideias que surjam para resolvê-lo serão anotadasnum quadro ou painel. Serão tidas em conta todasas respostas, sem pedir que se expliquem e, nestafase, não se julgará nem rejeitará nenhuma delas.Em seguida, o moderador classifica e analisa as res-postas e é nesta altura que algumas se combinam,adaptam ou rejeitam. Por último, o grupo formularecomendações e delibera sobre o problema. O pro-cesso de aprendizagem ou de sensibilização ocorreem resultado do debate em grupo sobre cada proposta.

6. SIMULAÇÃO/DRAMATIZAÇÃO

37. Nestes exercícios, os participantes são chama-dos a desempenhar uma ou mais tarefas numa situa-ção plausível que simula a “vida real”. No contextodos direitos humanos e aplicação da lei, os exercí-cios de simulação ou dramatização podem ser utili-zados para praticar os conhecimentos adquiridos oupara que os participantes possam experimentar situa-ções que até então lhes eram desconhecidas.

38. O resumo da situação deverá ser distribuídopor escrito a todos os participantes, atribuindo-sea cada um deles uma personagem (o agente dapolícia, a vítima, o juiz e outros). Durante o exer-cício não se deverá permitir que alguém abandonea sua personagem qualquer que seja o motivo. Estatécnica revela-se particularmente útil para sensi-bilizar os participantes para o respeito dos senti-mentos e da perspectiva de outros grupos, assimcomo para a importância de certas questões.

7. VISITAS DE ESTUDO

39. As visitas em grupo a instituições ou locaiscom interesse (esquadras de polícia, campos derefugiados, centros de detenção) podem ser bastanteúteis. O objectivo da visita será explicado deantemão, devendo pedir-se aos participantes que

14 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 46: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 15

prestem especial atenção e anotem as suas obser-vações para posterior debate.

8. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

40. Os exercícios práticos supõem a designaçãode participantes para que apliquem e façamdemonstrações de determinadas aptidões profis-sionais sob a supervisão dos formadores. Podesolicitar-se aos agentes policiais que redijam regu-lamentos internos em matéria de direitos huma-nos sobre um aspecto particular da actividadepolicial. Os formadores das forças policiais podemser encarregados de redigir um plano de estudosou de ministrar uma das sessões do curso.

9. MESAS REDONDAS

41. Para a realização de mesas redondas, como deconferências-debate, é necessário reunir um grupodiversificado de especialistas em diversas áreas, comdiferentes perspectivas do tema a abordar. Para queo debate seja animado, é necessário que estejampresentes os seguintes elementos fundamentais: ummoderador firme e dinâmico, conhecedor quer dotema em debate quer do uso da técnica de “advogadodo diabo”, e a utilização de hipóteses. O moderadordeve provocar intencionalmente os participantes,estimulando o debate entre os peritos e os forman-dos e controlando o desenrolar da discussão.

10. MATERIAL AUDIOVISUAL

42. A formação dos adultos pode ser aperfeiçoadamediante a utilização de quadros, acetatos, posters,exposições, painéis, fotografias, diapositivos evídeos ou filmes.

e. Locais para a realização dos cursos43. Em termos ideais, o local de realização dos cur-sos deverá reunir as seguintes condições:

a) Os cursos devem realizar-se num local distintodo habitual local de trabalho dos participantes.

b) A sala utilizada deve ter capacidade suficientepara o número previsto de participantes.

c) Devem existir pequenas salas auxiliares emnúmero suficiente para acolher os grupos de tra-balho, de modo que os participantes se possamocupar sem interrupção dos temas que lhestenham sido atribuídos.

d) As cadeiras e mesas devem ser cómodas efáceis de transportar, a fim de permitir a utiliza-ção de diversas técnicas pedagógicas.

f. Planificação tendo em conta as necessi-dades dos participantes44. O nível de conforto físico dos participantes nocurso repercutir-se-á directamente nos resultadosdo mesmo. Tenha presentes, em termos de pla-neamento, os seguintes factores básicos:

a) Deverá ser possível regular a temperatura eventilação da sala.

b) O número de participantes nunca deveráexceder a capacidade das salas.

c) As casas de banho deverão ser de fácil acesso.

d) O programa diário deverá incluir um inter-valo de 15 minutos durante a manhã, um intervalopara almoço de pelo menos uma hora e outrointervalo de 15 minutos durante a tarde.

e) Deverá permitir-se aos participantes que,entre os intervalos previstos, se levantem e esti-quem as pernas ocasionalmente. Dois ou trêsminutos são suficientes, com intervalos apro-priados, eventualmente duas vezes por dia.

f ) Sempre que possível, deverá colocar-se à dis-posição dos participantes presentes na sala água,café ou bebidas sem álcool.

g) Os intervalos para almoço deverão ter lugardurante o período a que os participantes estãohabituados. Isto pode variar em função das regiõese dos locais de trabalho.

Page 47: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 48: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 17

a. Utilizadores do manual45. Os principais utilizadores do presentemanual são os seguintes:• formadores e organizadores nacionais que preparamcursos de direitos humanos para elementos das for-ças policiais;• pessoal das instituições e programas de forma-ção policiais;• pessoal dos organismos e programas das NaçõesUnidas que proporcionam formação às forças poli-ciais;• formadores das forças de polícia civil (CIVPOL)das Nações Unidas;• especialistas na área policial que participam emcursos de formação em matéria de direitos huma-nos;• estudantes que tenham concluído cursos reali-zados no âmbito deste programa;• peritos de direitos humanos e organizações nãogovernamentais que participam em cursos de for-mação para polícias.

46. O manual pode também servir de referên-cia aos profissionais responsáveis pela aplica-ção da lei.

b. Selecção dos educadores e formadores47. É importante que a selecção das pessoas res-ponsáveis pelas exposições e outras actividadesdesenvolvidas no âmbito dos cursos de formação em

direitos humanos para forças policiais seja feitacom base nos seguintes critérios:• conhecimentos especializados na área em ques-tão;• capacidade para adoptar a metodologia do pro-grama de formação, em particular no que diz res-peito aos aspectos participativos;• credibilidade e reputação, especialmente entre osagentes policiais a quem o programa se destina.Em termos ideais, o grupo de formadores deveráser composto principalmente por instrutores dasforças policiais e pessoas com experiência nodomínio da aplicação da lei, que deverão ser acom-panhados por pelo menos um especialista na áreados direitos humanos.

c. Orientação dos educadores e formadores48. É importante que os educadores e formado-res recebam informação adequada relativamenteaos seguintes aspectos:• elementos básicos sobre a história, geografia,demografia e questões políticas, económicas esociais do país onde o programa se vai desenvolver;• elementos básicos sobre as disposições consti-tucionais e legais em vigor nesse país;• tratados de direitos humanos e direito humani-tário de que o Estado é parte;• organização e dimensões do organismo ou organis-mos responsáveis pela aplicação das leis existentesno país;

Educadores e Formadores

capítulo

04

Page 49: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

18 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

• categorias e número de agentes policiais, bemcomo questões actuais relativas à aplicação da lei eaos direitos humanos de particular interesse nopaís onde o programa irá ser desenvolvido.

d. Funções do formador49. Os formadores que participam nos cursosorganizados com base no presente manual deve-rão receber as seguintes instruções:

ANTES DO CURSO:

a) Estude o manual, prestando especial atençãoàs sessões em que irá participar.

b) Prepare notas muito breves para o auxilia-rem nas exposições, tendo em conta as limitaçõesde tempo estabelecidas no programa de curso.

c) Prepare recomendações práticas para os assis-tentes, com base na sua experiência profissional, afim de os auxiliar a aplicar as relevantes normas dedireitos humanos no seu trabalho quotidianoenquanto agentes policiais.

d) Participe numa reunião prévia em conjuntocom toda a equipa de formadores, pelo menos umdia antes do início do curso.

DURANTE O CURSO:

a) Participe em reuniões de informação diárias,antes e depois das aulas, em conjunto com toda aequipa de formadores.

b) Assista e participe em todas as sessões do curso.

c) Em caso de exposições conjuntas, reúna-se como colega que consigo irá dirigir a sessão no dia anteriora cada apresentação, a fim de a preparar em conjunto.

d) Faça exposições breves, respeitando os limi-tes de tempo estabelecidos no manual, relativa-

mente a cada um dos temas que lhe tenham sidoatribuídos.

e) Formule recomendações práticas com basena sua experiência profissional no decorrer dosdebates e das reuniões dos grupos de trabalho,nomeadamente durante as sessões dirigidas poroutros formadores.

f ) Seleccione um dos exercícios práticos suge-ridos no presente manual para cada uma dassessões que esteja encarregado de dirigir, a fimde a utilizar com os grupos de trabalho.

g) Utilize material visual auxiliar sempre quepossível.

h) Assegure-se de que quaisquer recomendaçõesou comentários formulados sejam conformes àsnormas internacionais indicadas no manual;

i) Estimule a participação e discussão activasno seio do grupo.

j) Dê conselhos e formule observações a res-peito dos materiais de formação utilizados nocurso, incluindo o presente manual.

k) Assista a todas as cerimónias de abertura eencerramento e a todos os eventos que acompa-nhem o programa de formação.

DEPOIS DO CURSO:

a) Participe numa reunião final em conjuntocom toda a equipa de formadores.

b) Estude o manual para aperfeiçoar o seuconhecimento de qualquer matéria na qual não sesinta completamente confortável.

c) Aperfeiçoe e reveja os seus materiais didácticospessoais antes de cada curso subsequente.

Page 50: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 19

50. Uma vez considerados quatro aspectos parti-culares da teoria e prática da formação nos capí-tulos anteriores, convém agora explicar a estruturae o conteúdo do restante manual.

51. As partes segunda a quinta do manual contêma informação e os materiais essenciais para a formaçãodos agentes policiais em matéria de direitos huma-nos, abordando os seguintes aspectos: conceitos fun-damentais (segunda parte); deveres e funções dapolícia (terceira parte); grupos necessitados de pro-tecção especial ou tratamento distinto (quarta parte);e questões de comando, direcção e controlo (quintaparte). Como veremos, algum do material assumeuma relevância distinta para cada uma das diversascategorias de funcionários e este aspecto será objectode comentários à medida que o conteúdo específicode cada capítulo seja exposto. Os anexos contêm tex-tos dos principais instrumentos internacionais, bemcomo outra informação que complementa os capí-tulos substantivos abaixo apresentados.

52. Na secção E do presente capítulo, onde sedescrevem a forma e o conteúdo geral dos capítu-los, serão dadas mais indicações a respeito da uti-lização e aplicação do material pedagógico.

a. Segunda parte (Conceitos fundamentais)53. A segunda parte trata dos conceitos amplosque são a ética policial, o papel da polícia numa

sociedade democrática e a não discriminação.Aborda questões de princípio que são importantesa nível da definição de políticas e estratégia poli-cial, logo relevantes para os funcionários que tra-balham a esse nível. O seu conteúdo é igualmenteimportante para educadores e formadores das for-ças policiais, que devem conhecer devidamenteos conceitos e princípios fundamentais no domí-nio da aplicação da lei e direitos humanos. Algunsdos tópicos abordados na segunda parte são tam-bém importantes para os funcionários que traba-lham “nas ruas”.

Capítulo VII – Fontes, sistemas e normas de direi-tos humanos relevantes no domínio da aplicaçãoda lei

54. Este capítulo dá-nos uma panorâmica geral dosistema internacional de protecção dos direitoshumanos na área da aplicação da lei. Nele se resu-mem os diversos organismos, instrumentos emecanismos de controlo internacionais, aomesmo tempo que se destacam determinadostipos de violação para os quais a polícia deveráestar sensibilizada. Este capítulo constitui a basede uma sessão introdutória com a qual se deverãoiniciar todos os cursos preparados com base no pre-sente manual. Fornece, essencialmente, os alicer-ces em que deverá assentar o remanescente docurso.

capítulo

05

Utilização do Manual

Page 51: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Capítulo VIII • Conduta policial ética e lícita

55. A exigência de respeitar a dignidade essencialda pessoa humana, assim como os fundamentosjurídicos das normas de direitos humanos, sãoelementos fundamentais neste capítulo e apre-sentam um interesse considerável para todas ascategorias de agentes policiais.

Capítulo IX • O papel da polícia numa sociedadedemocrática

56. Este capítulo trata da necessidade de respon-sabilizar a polícia pelas suas acções perante a socie-dade, através das instituições políticas democráticas,bem como de a sensibilizar para as necessidades eanseios da população. Estas exigências devem serdadas a conhecer, ou recordadas, a todos os funcio-nários responsáveis pela aplicação da lei.

Capítulo X • Polícia e não discriminação

57. O respeito do princípio da não discriminaçãoé fundamental para a protecção dos direitos huma-nos e para que a actuação policial seja eficaz, lícitae humana. Este princípio é importante a todos osníveis da actividade policial.

OBSERVAÇÕES GERAIS

SOBRE A SEGUNDA PARTE

58. Embora os aspectos fundamentais dos capítulossupra referidos sejam de interesse para todas as cate-gorias de funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei, o conteúdo das apresentações deverá variar emfunção das necessidades dos participantes. Os prin-cípios básicos podem ser apresentados de formabreve e sucinta aos funcionários que não necessitemde analisar todas as suas repercussões na actividadepolicial no seu sentido mais amplo. Contudo, haveráque desenvolver e alargar os conceitos teóricos e dis-cutir as questões mais amplas, sempre que necessá-rio (por exemplo, com os funcionários superiores depolícia e com os instrutores e formadores).

b. Terceira Parte (Deveres e funções da policia)59. Os capítulos compreendidos na terceira parteproporcionam o enquadramento indispensável

para qualquer curso de formação em matéria dedireitos humanos para forças policiais. Abordamas normas directamente relevantes para os domí-nios fundamentais da actividade da polícia, noâmbito da qual os direitos humanos são, quer res-peitados e protegidos, quer violados. Por estesmotivos, todos os capítulos têm interesse directopara qualquer uma das categorias de funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei, embora a formade apresentação da matéria possa variar de acordocom as necessidades dos participantes.

Capítulo XI • Investigações policiais

60. Neste capítulo, são identificadas as normasinternacionais com impacto directo sobre as acti-vidades de investigação da polícia. Os agentes comfunções especiais de investigação devem examinaro seu conteúdo com algum pormenor. Não obstante,quase todos os agente policiais levam a cabo inves-tigações em maior ou menor grau, por poucas quesejam; por isso, todos os participantes devemtomar contacto com os elementos fundamentais daquestão.

Capítulo XII • Captura

61. A competência para efectuar capturas é um dosmais importantes poderes das forças policiais,tendo particular impacto em termos de direitoshumanos; por isso, é indispensável que todos osfuncionários responsáveis pela aplicação da leiconheçam as normas internacionais que discipli-nam esta questão. Os agentes operacionais, quelevam directamente a cabo as operações de captura,devem conhecer bem as salvaguardas e os limitesestabelecidos nesta matéria.

Capítulo XIII • Detenção

62. Alguns agentes da lei têm responsabilidadesespecíficas em relação aos detidos, devendo debru-çar-se sobre o conteúdo deste capítulo com algumpormenor. Contudo, a protecção dos detidos é umamatéria de tal forma importante que todos os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei devemconhecer as normas internacionais concebidaspara a garantir.

20 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 52: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 21

Capítulo XIV • Utilização da força e de armas de fogo

63. A aplicação da lei e a manutenção da ordemimplicam a possibilidade de recorrer à força paraalcançar estes objectivos; daí a importância que otema reveste para todos os agentes policiais.

64. Alguns funcionários são mais susceptíveis deser chamados a recorrer à utilização da força doque outros, sendo aliás especialmente treinadospara o fazer (por exemplo, aqueles que desem-penham funções específicas no domínio damanutenção da ordem pública). O capítulo XIVassume particular relevância para os políciasdessa categoria.

Capítulo XV • Distúrbios internos, estados deexcepção e conflitos armados

65. Neste capítulo, são apresentados os prin-cípios e as normas de direito internacionalhumanitário, por forma a sublinhar o impera-tivo de uma conduta humana e da protecçãodas vítimas no decorrer de um conflito. Paraalém disso, são analisados outros períodos detensão aguda, tais como os distúrbios internose estados de excepção, explicando aos polícias aslimitações jurídicas que acompanham as medi-das de emergência.

66. Os funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei são, na sua maioria, chamados a intervirem situações de conflito e desordem ao longo dasua carreira e a importância da matéria torna-anum elemento essencial de qualquer curso de for-mação em direitos humanos destinado à polícia.

OBSERVAÇÕES GERAIS

SOBRE A TERCEIRA PARTE

67. Em todas as matérias abordadas nesta parte,é importante concentrar-se nos aspectos estratégicose de definição política com os funcionários supe-riores de polícia e nos aspectos práticos com osagentes operacionais. A formação destes últimosdever-se-á centrar nas imposições legais e na con-dução efectiva das actividades policiais.

c. Quarta parte (Grupos necessitados deprotecção especial ou tratamento distinto)

68. A quarta parte é importante devido à vulne-rabilidade das pessoas a que se refere cada um doscapítulos e ao impacto da actividade da políciasobre a situação dessas pessoas. Embora o seuconteúdo seja mais teórico do que prático, não émenos importante do que outras secções.

Capítulo XVI • Polícia e protecção dos jovens

69. Alguns agentes policiais têm especiais res-ponsabilidades relativamente aos jovens, sendoeste capítulo claramente importante para eles. Con-tudo, nele se identificam as normas internacionaisrelativas à captura e detenção dos delinquentesjuvenis, pelo que reveste interesse para todos os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei.

Capítulo XVII • Aplicação da lei e direitos dasmulheres

70. Neste capítulo, as mulheres são considera-das não apenas como vítimas ou potenciais vítimasde violações de direitos humanos e da criminali-dade, mas também como agentes e participantesna administração da justiça. Por esta razão, todasas categorias de funcionários responsáveis pelaaplicação da lei necessitam de ser confrontados comas questões que aborda.

Capítulo XVIII • Refugiados e não nacionais

71. Por razões históricas e geográficas, algunspaíses têm enormes e imediatas responsabilidadesem relação aos refugiados. A maioria dos países temde dar resposta às necessidades dos estrangeirose apátridas seus residentes. Embora existam, porvezes, unidades especializadas da polícia encarre-gadas de lidar com essas pessoas, qualquer políciapode, em determinado momento, ser confrontadocom elas.

72. A medida e a forma como este capítulo podeser utilizado como base para um curso dependemda situação do país em causa e das categorias defuncionários participantes. Em qualquer caso, a par-

Page 53: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

ticular vulnerabilidade dos refugiados e não nacio-nais, bem como a função protectora da polícia,fazem com que este tema mereça atenção particular.

Capítulo XIX • Protecção e indemnização das víti-mas

73. Todos os agentes policiais devem conhecer asformas de prestar apoio às vítimas de delitos e vio-lações de direitos humanos. A criação de esquemase sistemas capazes de cumprir este objectivo é cla-ramente da responsabilidade dos funcionáriossuperiores, sendo o conhecimento das normasinternacionais relativas à protecção das vítimas degrande importância para eles.

d. Quinta parte (Questões de comando,direcção e controlo)74. A quinta parte assume particular relevânciapara os funcionários superiores de polícia, apesarde as matérias que aborda não dizerem respeito ape-nas a esta categoria de funcionários. Tanto os for-madores e instrutores das forças policiais comoalguns funcionários de grau intermédio deverãoconhecer o conteúdo dos capítulos XX e XXI.

Capítulo XX • Direitos humanos nas questões decomando, direcção e organização da polícia

75. Uma vez conhecidas as matérias abordadas noscapítulos precedentes do presente manual, deverá serdada aos funcionários responsáveis pela aplicação dalei com funções de comando e gestão a oportunidadede considerarem as implicações das normas inter-nacionais de direitos humanos e direito humanitá-rio nessas responsabilidades. O capítulo XX tem porfunção facilitar e estimular este processo.

Capítulo XXI • Investigação das violações cometi-das pela polícia

76. A investigação das violações cometidas pelapolícia cabe evidentemente aos comandantes edirigentes das forças policiais, mas o conteúdo docapítulo XXI será também útil para outros fun-cionários, nomeadamente para os que desempe-nham funções disciplinares a nível interno. Emcertos casos, será também conveniente que os

agentes operacionais conheçam alguns aspectosdesta questão.

e. Estrutura dos capítulos77. Os capítulos estão estruturados de forma a faci-litar a consideração das repercussões práticas das maté-rias sobre a actividade da polícia e a auxiliar na explicaçãoda informação em causa às diferentes categorias defuncionários responsáveis pela aplicação da lei.

Princípios fundamentais

78. Cada capítulo substantivo começa pela enu-meração dos respectivos princípios fundamentais.Estes são definidos com base nos princípios quefundamentam as detalhadas normas internacionaisde direitos humanos e direito humanitário e emprincípios de importância fundamental no domí-nio da aplicação da lei. Constituem um resumosucinto do essencial de cada um dos temas e todasas categorias de funcionários responsáveis pelaaplicação da lei devem conhecê-los.

79. Os capítulos VIII a XXI estão, por sua vez, divi-didos em duas secções, conforme explicado emseguida.

Secção A

80. A secção A contém as informações necessá-rias à apresentação do tema, divididas em trêsrubricas: Introdução, Aspectos gerais (do tema) eObservações finais.

Introdução – Situa o tema dentro do contexto daactividade policial.

Aspectos gerais – Fornece informação organizadaem torno de diversas sub-rubricas:

Princípios fundamentais – Exposição e explicação dosprincípios fundamentais de direitos humanos edireito internacional humanitário que servem debase às disposições concretas relativas ao tema;

Disposições específicas – Exposição das normas per-tinentes relativas ao tema constantes dos diversosinstrumentos.

22 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 54: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Qualquer informação adicional baseada em normasinternacionais com interesse para o tema emcausa é então exposta nas sub-rubricas seguintes.Por exemplo, no capítulo XIV, relativo à Utilizaçãoda Força e das Armas de Fogo, existem três sub--rubricas sobre “Utilização da força e direito àvida”, “Utilização da força e execuções extrajudiciais”e “Utilização da força e desaparecimentos”, res-pectivamente.

Observações finais – Apresentação das conclusõestiradas com base na informação precedentequanto à actividade policial no domínio em ques-tão.

Apresentações para formadores e instrutores

81. Deverão incluir uma exposição completa detodo o material constante da secção A. Os deba-tes informais que se seguem à apresentaçãodeverão incidir nas questões pedagógicas susci-tadas pelo material e nos aspectos conceptuais dotema.

Apresentações para funcionários superiores depolícia

82. Deverão destacar os princípios fundamen-tais, resumindo os pormenores das disposiçõesespecíficas. Os debates informais subsequentesdeverão incidir sobre as questões relevantes em ter-mos de estratégia, definição de políticas, comandoe gestão policial.

Apresentações para funcionários sem funções decomando

83. As apresentações destinadas aos agentesoperacionais deverão colocar ênfase nos porme-nores das disposições específicas, em especialdas que definem normas de conduta. Deverárecorrer-se às declarações de princípio a fim dereforçar as proibições e obrigações. As discus-sões informais deverão privilegiar os aspectostácticos da actividade policial e formas de desem-penhar as acções policiais concretas em confor-midade com as normas de direitos humanos edireito humanitário.

Secção B

84. A Secção B trata da aplicação prática das nor-mas de direitos humanos e direito humanitário.Contém uma lista de medidas práticas a adoptarpelos organismos e funcionários responsáveis pelaaplicação da lei a fim de garantir o cumprimentodas normas, uma série de exercícios práticos euma lista de temas para discussão.

Medidas práticas

85. As medidas práticas aparecem divididas emduas categorias: as que se aplicam a todos os fun-cionários e as que se aplicam apenas aos funcio-nários com funções de comando e supervisão.Podem ser utilizadas de diversas formas no con-texto da formação, por exemplo:

a) como base para os debates informais comformadores e instrutores das forças policiais sobreaspectos pedagógicos importantes;

b) para identificar os aspectos do tema que sejamrelevantes em termos de estratégia, definição depolíticas, comando e gestão policial nas apresenta-ções destinadas aos funcionários superiores;

c) para identificar os aspectos do tema quesejam relevantes em termos de táctica e activida-des operacionais, nas apresentações destinadasaos funcionários sem funções de comando;

d) como tema central para os debates com ogrupo de especialistas;

e) para proporcionar novos tópicos de discussãono seio dos grupos de trabalho;

f ) como base para as sessões de resolução de pro-blemas ou reflexão colectiva (por exemplo, podepedir-se aos participantes que procurem asmelhores formas de cumprir as obrigações).

EXERCÍCIOS PRÁTICOS

86. Estes exercícios baseiam-se na prática e exi-gem que os participantes se pronunciem sobre

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 23

Page 55: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

24 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

determinadas questões concretas. Devem ser uti-lizados para aperfeiçoar a compreensão das normasinternacionais e analisar formas de as cumpriratravés de uma actividade policial eficaz.

87. Segundo a forma como estão concebidos, osexercícios podem ser utilizados como tópicos paradiscussão no seio dos grupos de trabalho, comoexercícios de resolução de problemas ou reflexãocolectiva, ou como estudo de casos práticos. Algunsabordam questões estratégicas e de definição polí-tica, sendo por isso particularmente adequados paraos funcionários superiores de polícia. Outros tratamde questões tácticas e práticas, pelo que assumemespecial relevância para os funcionários sem res-ponsabilidades de comando. Por vezes, é indicadaa categoria de funcionários a que os exercícios sãoespecialmente dirigidos. Outros, porém, são apro-priados para consideração por todas as categorias defuncionários responsáveis pela aplicação da lei, nãosendo dada qualquer indicação a seu respeito.

Temas para discussão

88. Estes temas foram concebidos para estimularo debate, quer informalmente, na sequência deuma apresentação, quer no seio dos grupos de tra-balho ou em outros contextos apropriados. Podemser utilizados para aperfeiçoar o conhecimentodas normas internacionais e dos fundamentos queserviram de base à sua formulação.

f. Anexos89. O presente manual compreende diversosanexos que, no seu conjunto, se destinam acomplementar o conteúdo das primeira esegunda partes e a facilitar a organização e exe-cução dos programas de formação. É conve-niente que os formadores e organizadores doscursos consultem os anexos antes de prosseguirno programa, a fim de se familiarizarem comalgum do precioso material de referência queneles se encontra.

Page 56: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 25

a. Introdução90. A estrutura geral e o conteúdo dos cursos deformação em matéria de direitos humanos parafuncionários responsáveis pela aplicação da lei orga-nizados com base no presente manual foram defi-nidos em função das considerações expostas noscapítulos anteriores, em particular:

a) a abordagem adoptada pelo Alto Comissa-riado/Centro para os Direitos Humanos dasNações Unidas, em especial a importância atri-buída aos aspectos práticos da formação;

b) os participantes nos programas de formação,tendo em conta as respectivas características e cate-gorias em que se integram;

c) as técnicas pedagógicas, que privilegiam aparticipação dos destinatários;

d) os formadores e instrutores, que devem serespecialistas, credíveis e demonstrar flexibilidade;

e) o próprio manual, como enquadramento para aconceptualização e divisão temática da ampla área daaplicação da lei e direitos humanos, conforme resultados títulos de cada uma das partes e capítulos.

91. A estrutura e o conteúdo concretos de cada umdos cursos de formação em matéria de direitos

humanos podem, além disso, depender dosseguintes factores:

a) resultado das acções de avaliação de necessidadeslevadas a cabo em relação a determinado país e seuorganismo ou organismos responsáveis pela aplica-ção da lei, bem como aos potenciais participantes;

b) tempo disponível para o curso ou cursos.

92. Formularemos em seguida algumas reco-mendações a respeito da importância a atribuir adeterminados temas abordados em diferentescapítulos do presente manual, nos cursos destina-dos a distintas categorias de funcionários respon-sáveis pela aplicação da lei. Estas recomendaçõesdeverão ser tidas em conta ao considerar o tempoa destinar a cada um dos temas no programa decurso. Em seguida, serão propostos três modelospossíveis para a estrutura dos cursos.

b. Observações sobre os temas dos capítulos

Segunda parte (conceitos fundamentais)

NOTA PARA O FORMADOR: tenha em conta asobservações formuladas no capítulo V.A, supra.

93. Cada um dos capítulos deverá ser abordadoem relativa profundidade com os formadores e ins-

Estruturae Conteúdodos Cursos

capítulo

06

Page 57: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

trutores das forças policiais. Deverá solicitar-se aosparticipantes que considerem os temas numaperspectiva conceptual e teórica, bem como emtermos práticos e operacionais.

94. Os funcionários superiores de polícia deverãotambém estudar em pormenor o conteúdo dasegunda parte, pois esta abrange amplas matériasde princípio importantes para as suas funções decomando e decisão.

95. Os funcionários sem responsabilidades decomando deverão conhecer os temas da segundaparte, pois fornecem uma base sólida capaz de osincitar a adoptar as atitudes e, assim, as condu-tas que se impõem para a promoção e protecçãodos direitos humanos. Contudo, conforme supraindicado no capítulo V.A, os princípios básicos decada um dos temas poderão ser apresentados deforma breve e sucinta a esta categoria de funcio-nários policiais.

96. A segunda parte é particularmente impor-tante para os contingentes de polícia civil (CIV--POL), pois define o enquadramento que permitecompreender a importância das normas interna-cionais (das Nações Unidas) relativas aos direitoshumanos no domínio da aplicação da lei.

Terceira parte

NOTA PARA O FORMADOR: tenha em conta asobservações formuladas no capítulo V.B, supra.

97. Dever-se-ão ter presentes as observaçõesformuladas no capítulo V.B sobre a relevânciados diversos capítulos para as diferentes cate-gorias de funcionários responsáveis pela aplica-ção da lei (por exemplo, o capítulo XI para osinvestigadores, o capítulo XIII para os funcio-nários com especiais responsabilidades em rela-ção aos detidos e os capítulos XIV e XV para osfuncionários especializados na manutenção daordem pública).

98. Tal como referido no capítulo V.B, os temasdos capítulos da terceira parte do presente manualdeverão constituir o cerne dos cursos de formação

em direitos humanos destinados a todas as cate-gorias de agentes policiais. Em consequência,estes temas deverão ocupar a maior parte de qual-quer um dos cursos, apesar de o tempo atribuídoa cada tema em concreto dever variar em funçãodas responsabilidades dos participantes.

Quarta parte

NOTA PARA O FORMADOR: tenha em conta asobservações formuladas no capítulo V.C, supra.

99. A importância atribuída aos temas aborda-dos na quarta parte depende essencialmente dasituação concreta do país em causa (por exemplo,existe algum problema sério em matéria de refu-giados? Está em causa o tratamento dispensado aoscidadãos estrangeiros?) e das responsabilidadesdos participantes no curso (por exemplo, têm os par-ticipantes algumas responsabilidades especiaisrelativamente a alguma das categorias de pessoasem questão?).

100. Os formadores e instrutores devem receberinformações e orientações completas a respeitode todos os temas.

101. Se o tempo destinado ao curso assim o per-mitir, os funcionários superiores de polícia e agen-tes de grau inferior deverão receber informação eorientação semelhantes. Se isto não for possível,deverão ser-lhes dadas a conhecer as questões deinteresse actual que se colocam relativamente a cadaum dos temas, a forma como as normas interna-cionais abordam essas questões e as soluçõesadoptadas em diferentes países ou regiões paradar resposta aos problemas identificados. (Esteúltimo aspecto é particularmente importante paraos funcionários superiores, em virtude da sua res-ponsabilidade de definição política e estratégica.)

Quinta parte

NOTA PARA O FORMADOR: tenha em conta asobservações formuladas no capítulo V.D, supra.

102. O tema central de cada capítulo da quintaparte deverá constituir uma parte importante dos

26 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 58: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

cursos destinados aos funcionários superiores,bem como aos formadores e instrutores da polícia.Sempre que possível, alguns elementos do capí-tulo XXI (Investigação das violações cometidaspela polícia) deverão ser incluídos nos cursos des-tinados aos funcionários sem responsabilidades decomando.

c. Estrutura dos cursos

103. Propõem-se em seguida três modelos possí-veis para a estrutura dos cursos. Podem basear-seem variações do modelo proposto no anexo II ouser adaptadas às necessidades e circunstânciaslocais. Os modelos-tipo são os seguintes:• Cursos completos – para todas as categorias defuncionários responsáveis pela aplicação da lei,sempre que possível (com um estudo menos deta-lhado da quinta parte do manual para os agentessem funções de comando), formadores das forçaspoliciais e elementos da CIVPOL.• Seminários – para funcionários superiores depolícia.• Cursos básicos – para funcionários sem funçõesde comando.104. Relativamente a estas propostas, convém terem conta as seguintes questões:Sequência dos temas: Deverá seguir-se a sequên-cia das partes e capítulos do presente manual. Estasequência obedece a uma determinada lógica. Porexemplo:• é preferível abordar as questões tratadas nasegunda parte como temas introdutórios, uma vezque derivam de conceitos fundamentais;• os temas da quinta parte serão mais proveitosa-mente abordados no final do curso, quando osparticipantes adquiriram já conhecimento dasnormas internacionais;• em termos de procedimento, a captura antecede adetenção, daí que as questões de direitos humanossuscitadas por estas situações devam seguir a mesmasequência (capítulos XII e XIII da terceira parte);• qualquer análise das questões de direitos huma-nos no contexto de situações de conflito e desor-dem (capítulo XV) deve pressupor o conhecimentodas questões genéricas de direitos humanos e apli-cação da lei abordadas nos anteriores capítulos daterceira parte (em especial no capítulo XIV, sobrea utilização da força).

Organização de um dia de trabalho: Supõe-se queum dia de curso tem início cerca das 09:00 horase termina ao redor das 18:00, com um intervalo paraalmoço cerca do meio-dia e duas pausas mais cur-tas, uma a meio da manhã e outra a meio da tarde,a fim de assegurar que os participantes se mantêmbem dispostos e atentos. Os intervalos para almoçodeverão ser marcados em função dos costumeslocais. Deverá reservar-se algum tempo para que ogrupo de formadores se reúna para uma breve ses-são preparatória antes das sessões e para fazer oponto da situação no final de cada dia.

1. CURSO COMPLETO

105. O curso completo é composto por uma sessãosobre cada um dos temas de todos os capítulos daspartes segunda a quinta do manual, segundo asequência neste estabelecida. A fim de permitir:• uma apresentação aprofundada de cada tema;• um debate informal suficiente depois da apre-sentação; e• um tratamento completo de todos os exercícios prá-ticos e tópicos para discussão, recomenda-se que cadasessão ocupe meio dia de curso, o que significa quecada um dos temas deverá ser abordado durante esseperíodo de meio dia. Existem 15 temas a analisar destemodo (partes segunda a quinta).

106. Recomenda-se que seja dedicada uma sessãoadicional de meio dia à introdução e apresentação docurso e seus participantes e uma outra aos procedi-mentos de encerramento e avaliação da formação.

107. O curso completo deverá, pois, ser compostopor 16 sessões de meio dia, ou seja, oito dias com-pletos de formação.

2. SEMINÁRIO PARA FUNCIONÁRIOS SUPERIORES

DE POLÍCIA

108. Caso os funcionários superiores não dispo-nham de tempo para seguir um curso completo,pode organizar-se um seminário de curta dura-ção. A sequência dos capítulos constante domanual deverá ser mantida. Para permitir um

Formação dos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei* 27

Page 59: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

28 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

tratamento adequado de cada um dos temas numperíodo de tempo reduzido, recomenda-se quecada sessão de trabalho de meio dia seja dedicada:aos quatro capítulos da segunda parte (em con-junto);aos capítulos XI a XIII da terceira parte (em con-junto);aos capítulos XIV e XV da terceira parte (em con-junto);aos quatro capítulos da quarta parte (em conjunto)ea ambos os capítulos da quinta parte (em conjunto).

109. Recomenda-se que seja dedicada uma sessãoadicional de meio dia aos procedimentos de apre-sentação e de encerramento (por exemplo, meio diadividido entre o início e o fim do seminário).

110. O seminário para funcionários superiores depolícia seria, assim, composto por seis sessões demeio dia ou três dias de formação.

111. A fim de conseguir contemplar os temas doscapítulos nestas sessões e responder às necessidadesdos funcionários superiores, recomenda-se queos princípios fundamentais de cada um dos temassejam explicados numa apresentação e se façamalgumas referências às normas constantes de ins-trumentos internacionais. Podem ser dados exem-plos de algumas destas normas. A primeira partede cada sessão de meio dia ficaria então concluídacom um debate informal, reservando-se a segundaparte para a realização de exercícios práticos.

3. CURSO BÁSICO PARA AGENTES SEM FUNÇÕES

DE COMANDO

112. Caso os agentes sem funções de comandonão disponham de tempo para seguir um cursocompleto, poderá organizar-se um curso básico.

A sequência dos capítulos constante do manualdeverá ser mantida. Recomenda-se que cada ses-são de trabalho de meio dia seja dedicada:aos capítulos VII e VIII da segunda parte (em con-junto);aos capítulos IX e X da segunda parte (em con-junto);aos capítulos XI e XII da terceira parte (em con-junto);ao capítulo XIII da terceira parte;ao capítulo XIV da terceira parte;ao capítulo XV da terceira parte;aos capítulos XVI e XVII da quarta parte (em con-junto); eaos capítulos XIX da quarta parte e XXI da quintaparte (em conjunto).

113. Recomenda-se que seja dedicada uma sessãoadicional de meio dia à apresentação do curso e seusparticipantes e uma outra aos procedimentos deencerramento e avaliação da formação.

114. O curso básico para funcionários responsáveispela aplicação da lei sem funções de comando seria,assim, composto por 10 sessões de meio dia, ou seja,5 dias de formação.

d. Observações finais115. As anteriores recomendações pretendemservir de base aos diversos tipos de cursos eseminários, sendo naturalmente possíveis algu-mas alterações. Por exemplo, tanto o curso com-pleto como o curso básico podem sofrermodificações a fim de responder às exigências dosfuncionários com funções especializadas, porforma a que os temas pertinentes para as res-pectivas áreas de especialização sejam alargadose outros correspondentemente reduzidos. Emregra, ao planear a estrutura dos cursos, os seusorganizadores devem prestar atenção às neces-sidades dos destinatários.

Page 60: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*CONCEITOS FUNDAMENTAIS

Segunda Parte

Page 61: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 62: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 31

Fontes, Sistemas e Normas de Direitos Humanos no domínio da Aplicação da Lei

capítulo

07

• Dar a conhecer aos formadores e, através deles, aos participantes no cursoo enquadramento geral do sistema estabelecido no âmbito das Nações Uni-das para a protecção dos direitos humanos no domínio da aplicação da lei.

• Fornecer uma panorâmica geral dos principais instrumentos, mecanismosde controlo e organismos das Nações Unidas relevantes para o trabalho dapolícia.

• Destacar determinados tipos de violações de direitos humanos para os quaisa polícia deverá estar sensibilizada.

• As normas internacionais de direitos humanos são obrigatórias paratodos os Estados e seus agentes, incluindo funcionários responsáveis pelaaplicação da lei.

• Os direitos humanos constituem um objecto legítimo do direito interna-cional e o seu respeito pode ser controlado pela comunidade internacional.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei estão obrigados aconhecer e a aplicar as normas internacionais de direitos humanos.

Objectivos do capítulo

Princípios fundamentais

}

}

}

}

a. Importância das normas internacionais116. As normas internacionais de direitos huma-nos no domínio da aplicação da lei foram adop-tadas por diversos organismos do sistema dasNações Unidas. Entre eles, assumiram particularrelevância a Comissão dos Direitos do Homem,a sua Sub-Comissão para a Prevenção da Dis-criminação e Protecção das Minorias e os Con-

gressos periódicos das Nações Unidas para aPrevenção do Crime e o Tratamento dos Delin-quentes. A adopção destas normas pela Assem-bleia Geral e pelo Conselho Económico e Social,dois dos principais órgãos das Nações Unidas,conferiu às mesmas um carácter de universali-dade, uma vez que significa que a comunidadeinternacional no seu conjunto as aceita e consi-

Page 63: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

dera como regras mínimas em matéria de apli-cação da lei, independentemente do sistema jurí-dico ou do direito interno do Estado Membroem causa.

117. Por outro lado, o conteúdo normativo de taisregras e os detalhes da sua adequada aplicação anível nacional são definidos pela jurisprudência emconstante evolução do Comité dos Direitos doHomem das Nações Unidas, órgão de controlo daaplicação do Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos instituído em virtude deste ins-trumento.

118. Antes de analisar as diversas fontes, siste-mas e normas existentes a nível internacional,há que fazer referência à força jurídica dessasnormas. O conjunto das normas examinadasno presente manual abrange disposições com for-ças jurídicas muito diferentes, desde obriga-ções imperativas estabelecidas em pactos econvenções até orientações universais que seimpõem no plano ético e estão contidas emdiversas declarações, regras mínimas e con-juntos de princípios. No seu conjunto, estesinstrumentos definem um enquadramento jurí-dico internacional completo e pormenorizado,tendo em vista assegurar o respeito dos direitoshumanos, da liberdade e da dignidade no con-texto da justiça penal.

119. Em termos estritamente jurídicos, podeargumentar-se que apenas os tratados oficiaisratificados pelos Estados, ou a que estes hajamaderido, são juridicamente vinculativos. Entreestes, contam-se, por exemplo, o Pacto Inter-nacional sobre os Direitos Civis e Políticos, oPacto Internacional sobre os Direitos Econó-micos, Sociais e Culturais, a Convenção sobreos Direitos da Criança e a Convenção para a Pre-venção e Repressão do Crime de Genocídio.Deverá também ser referida a Carta das NaçõesUnidas, ela própria um tratado juridicamentevinculativo no qual todos os Estados Membrossão necessariamente Partes. No entanto, o valorprático das diversas declarações, directrizes e

regras mínimas, examinadas neste manual apar das pertinentes convenções, não deve sernegligenciado com base em argumentos jurídi-cos teóricos. A nossa posição justifica-se combase em, pelo menos, três razões fundamentais:

a) Tais instrumentos não convencionais consti-tuem afirmações de valores partilhados pelas prin-cipais culturas e sistemas jurídicos. Podem serencontrados no direito interno dos principais sis-temas jurídicos a nível mundial e foram elabora-dos através de um processo internacional, com acontribuição da generalidade dos Estados Membrosdas Nações Unidas. Por conseguinte, têm umaincontestável força moral.

b) Os tratados escritos não são a única fontede normas imperativas. Devido à sua origeminternacional e ampla aceitação nas legislaçõesnacionais, as disposições das declarações, con-juntos de princípios e outros instrumentos sãoconsideradas por muitos juristas como “princí-pios gerais de direito internacional”, que cons-tituem uma das fontes de direito internacionalreconhecidas pelo Estatuto do Tribunal Inter-nacional de Justiça. Muitas destas disposiçõessão consideradas cláusulas declarativas deprincípios em vigor do chamado “direito inter-nacional consuetodinário”, isto é, normas vin-culativas originadas com base na práticareiterada dos Estados (uma vez que os Estadostêm a convicção de que se encontram obriga-dos por tais princípios) e não em disposiçõesconcretas de quaisquer tratados.

c) As normas internacionais enunciadas nostratados formais não são, por vezes, suficiente-mente detalhadas para permitir que os Estadosinterpretem o seu valor normativo, ou determi-nem as suas repercussões ao nível da aplicação.As disposições mais detalhadas das directrizes,princípios e regras mínimas, entre outros ins-trumentos, representam, pois, um valioso com-plemento jurídico para os Estados que seesforçam por aplicar as normas internacionais anível interno.

32 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 64: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

b. Fontes fundamentais

1. CARTA DAS NAÇÕES UNIDASN.T.1

120. A principal fonte que servede base à adopção de normas dedireitos humanos pelos orga-nismos das Nações Unidas é,sem dúvida, a própria Carta. Noseu segundo parágrafo pream-bular, afirma-se que um dosprincipais objectivos da organi-zação consiste em:[…] reafirmar a nossa fé nosdireitos fundamentais dohomem, na dignidade e novalor da pessoa humana, naigualdade de direitos dos homens e das mulheres,assim como das nações, grandes e pequenas […]

O artigo 1.o, n.o 3, da Carta estabelece o princípiode que a cooperação internacional deverá ser rea-lizada:[…] promovendo e estimulando o respeito pelosdireitos do homem e pelas liberdades fundamen-tais para todos, sem distinção de raça, sexo, línguaou religião […]

121. Estas disposições não devem ser vistas comomeras declarações de princípio, destituídas de sig-nificado; pelo contrário, como atrás ficou dito, aCarta é um tratado juridicamente vinculativo doqual todos os Estados Membros são partes. Tais nor-mas tiveram como efeito jurídico fazer cessar, deuma vez por todas, a polémica sobre se os direi-tos humanos e o seu gozo pelos indivíduos cons-tituem questões de direito internacional ou apenasdizem respeito à soberania dos Estados. Conse-quentemente, é agora incontestável que tais nor-mas obrigam a polícia.

122. As Nações Unidas, na sua actividade para-legislativa, produziram, desde aí, diversos ins-trumentos, cada um dos quais reforça ecompleta os que o antecederam. Os mais impor-tantes, para os fins do presente manual, são aDeclaração Universal dos Direitos do Homem de1948 e os dois pactos de 1966 que a aplicam e

dotam de força jurídica vinculativa: o PactoInternacional sobre os Direitos Económicos,Sociais e Culturais e o Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos. O conjuntodestes instrumentos é designado por CartaInternacional dos Direitos Humanos.

2. DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS

DO HOMEMN.T.2

123. A Declaração Universalrepresenta um importante pro-gresso alcançado pela comuni-dade internacional em 1948.O seu valor de persuasão moral deriva do facto deser reconhecida como uma declaração de normasinternacionais de aceitação geral. Essa compila-ção de objectivos de direitos humanos foi elaboradaem termos amplos e genéricos, tendo constituídoa fonte – e o enquadramento substantivo – dos doisoutros instrumentos que compõem a Carta Inter-nacional dos Direitos Humanos. Por outro lado, naDeclaração Universal foram enunciados e defini-dos os direitos fundamentais proclamados naCarta das Nações Unidas. Os artigos 3.o, 5.o, 9.o, 10.o

e 11.o da Declaração Universal são particularmenterelevantes no domínio da administração da justiça.Estes artigos abordam, respectivamente, o direitoà vida, à liberdade e à segurança pessoal; a proibiçãoda tortura e das penas ou tratamentos cruéis,desumanos ou degradantes; a proibição da deten-ção arbitrária; o direito a um julgamento equitativo;o direito à presunção de inocência até prova em con-trário; e a proibição da retroactividade da lei penal.Embora estes sejam os artigos que mais directa-mente se relacionam com a aplicação da lei, todoo texto da Declaração Universal fornece orientaçõespara o trabalho da polícia.

3. TRATADOS: PACTOS E CONVENÇÕES

Pacto Internacional sobre os Direitos Civis

e Políticos

124. O conteúdo dos direitos acima enumera-dos ficou definido de forma mais precisa com

Conceitos Fundamentais* 33

N.T.2 Publicada no Diário daRepública, I Série A, n.o 57//78, de 9 de Março de 1978,mediante aviso do Ministé-rio dos Negócios Estrangei-ros.

N.T.1 Portugal foi admitidocomo membro das NaçõesUnidas em sessão especial daAssembleia Geral realizada a14 de Dezembro de 1955, noâmbito de um acordo entreos EUA e a então UniãoSoviética (resolução 995 (X)da Assembleia Geral). Adeclaração de aceitação porPortugal das obrigações cons-tantes da Carta foi deposi-tada junto doSecretário-Geral a 21 de Feve-reiro de 1956 (registon.o 3155), estando publicadana United Nations TreatySeries, vol. 229, página 3, de1958. O texto da Carta dasNações Unidas foi publicadono Diário da República ISérie A, n.o 117/91, medianteo aviso n.o 66/91, de 22 deMaio de 1991.

Page 65: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

34 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

a entrada em vigor, em Março de 1976, doPacto Internacional sobre os Direitos Civis ePolíticos. Este instrumento, nos seus artigos 6.o,7.o, 9.o, 11.o, 14.o e 15.o, define em maior deta-lhe o direito à vida, a proibição da tortura, aproibição da prisão ou detenção arbitrárias, aproibição de aplicação de uma pena de prisãopor impossibilidade de cumprimento de umaobrigação contratual e a proi-bição da retroactividade da leipenal. Com mais de 100 Esta-dos PartesN.T.3, o Pacto é uminstrumento juridicamentevinculativo que deve ser res-peitado pelos Governos esuas instituições, nomeadamente a polícia. Asua aplicação é controlada pelo Comité dosDireitos do Homem, órgão criado em confor-midade com as disposições do próprio Pacto.

Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos,

Sociais e Culturais

125. As publicações como opresente manual, que seocupam das normas aplicá-veis no domínio da aplicaçãoda lei, fazem essencialmentereferência aos instrumentosde carácter civil e político. Não obstante, seriaum erro prosseguir sem mencionar o PactoInternacional sobre os Direitos Económicos,Sociais e Culturais, que entrou em vigor emJaneiro de 1976N.T.4. Existem pelo menos trêsbons motivos para isso:

a) A lei não é administrada no vazio. A políciadeve desempenhar as suas funções no contextoda realidade económica concreta enfrentada pelapopulação que se comprometeu a servir e proteger.

b) Não é correcto supor que os direitos econó-micos e sociais, no seu conjunto, são irrelevan-tes para o trabalho da polícia. Claros exemplos dedireitos económicos com relevância directa nestedomínio são, entre outros, a não discriminação,a protecção contra as expulsões forçadas e as nor-mas fundamentais de direito laboral.

c) Os dois conjuntos de direitos protegidos porambos os Pactos são universalmente reconheci-dos como sendo interdependentes e tendo igualimportância.

126. Nesta conformidade, tenha-se em atençãoque o Pacto Internacional sobre os Direitos Eco-nómicos, Sociais e Culturais protege uma amplavariedade de direitos, nomeadamente o direito aotrabalho, a condições de trabalho razoáveis, àconstituição de associações sindicais, à segu-rança social e a mecanismos de seguro social, àprotecção das famílias e das crianças, a um nívelde vida suficiente, à saúde, à educação e à parti-cipação na vida cultural. A aplicação deste Pactoé controlada pelo Comité dos Direitos Económi-cos, Sociais e Culturais.

Primeiro Protocolo Facultativo referente ao Pacto

Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos

127. O primeiro ProtocoloFacultativo referente ao PactoInternacional sobre os DireitosCivis e PolíticosN.T.5 entrou emvigor em simultâneo com oPacto. Este instrumento adicio-nal atribui ao Comité dos Direi-tos do Homem competência para receber econsiderar comunicações de indivíduos que ale-guem ser vítimas de violações de qualquer um dosdireitos enunciados no Pacto. Ao examinar taisqueixas, o Comité tem vindo a desenvolver umconsiderável corpo de jurisprudência, que propor-ciona preciosas orientações para interpretar asrepercussões do Pacto sobre o trabalho da polícia.

Segundo Protocolo Adicional ao Pacto Internacio-

nal sobre os Direitos Civis e Políticos

128. Embora o Pacto Internacional sobre os Direi-tos Civis e Políticos não proíba a pena de morte,impõe estritas limitações à sua aplicação. Peranteuma opinião pública internacional cada vez maisfavorável à completa abolição da pena de morte, aAssembleia Geral adoptou, em 1989, o Segundo Pro-tocolo Adicional ao Pacto Internacional sobre osDireitos Civis e Políticos com vista à Abolição da

N.T.3 Assinado por Portugal a7 de Outubro de 1976 eaprovado para ratificaçãopela Lei n.o 29/78, de 12 deJunho, publicada no Diárioda República, I Série A,n.o 133/78. O instrumentode ratificação foi depositadojunto do Secretário-Geraldas Nações Unidas a 15 deJunho de 1978.

N.T.4 Assinado por Portugala 7 de Outubro de 1976 eaprovado para ratificaçãopela Lei n.o 45/78, de 11 deJulho, publicada no Diá-rio da República, I Série A,n.o 157/78. O instrumentode ratificação foi deposi-tado junto do Secretário--Geral das Nações Unidas a 31 de Julho de 1978.

N.T.5 Assinado por Portugala 1 de Agosto de 1978 eaprovado para adesão pelaLei n.o 13/82, de 15 deJunho, publicada no Diárioda República, I Série A,n.o 135/82. O instrumentode adesão foi depositadojunto do Secretário-Geraldas Nações Unidas a 3 de Maio de 1983.

Page 66: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 35

Pena de MorteN.T.6, que interditaaos Estados Partes a utilização dapena de morte.

Convenção contrao Genocídio

129. A Convenção para a Pre-venção e Repressão do Crime deGenocídio entrou em vigor em1951N.T.7. Resultou, tal como as próprias Nações Uni-das, do horror e da indignação universais sentidospela comunidade internacional face às graves vio-lações de direitos humanos que caracterizaram aSegunda Guerra Mundial. A Convenção confirmaque o genocídio constitui um crime de direito inter-

nacional, tendo por objectivoreforçar a cooperação interna-cional com vista à erradicação detal atrocidade. Refere, em parti-cular, os actos cometidos com aintenção de destruir, no todo ouem parte, um grupo nacional,étnico, racial ou religioso atravésdo assassinato de membrosdesse grupo, atentado grave à respectiva integri-dade física e mental, submissão deliberada dogrupo a condições de existência passíveis de acarretara sua destruição física, imposição de medidas des-tinadas a impedir os nascimentos no seu seio outransferência forçada das crianças do grupo paraoutro grupo.

N.T.6 Assinado por Portugala 13 de Fevereiro de 1990 eaprovado para ratificaçãopela Resolução da Assem-bleia da República n.o 25/90, de 27 de Setem-bro, publicada no Diário daRepública, I Série A, n.o 224/90. Ratificado peloDecreto do Presidente daRepública n.o 54/90, de 27de Setembro, publicado noDiário da República, I Série A, n.o 224/90. O ins-trumento de ratificação foidepositado junto do Secre-tário-Geral das Nações Uni-das a 17 de Outubro de 1990.

N.T.7 Aprovada para ratifica-ção por Portugal pela Reso-lução da Assembleia daRepública n.o 37/98, de 14de Julho e ratificada peloDecreto do Presidente daRepública n.o 33/ /98, de 14de Julho. Ambos osdocumentos se encontrampublicados no Diário daRepública, I Série A, n.o 160/98. O instrumentode ratificação foi depositadojunto do Secretário-Geraldas Nações Unidas a 9 de Fevereiro de 1999.

* Nota para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da lei

GENOCÍDIO

• Actos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, umgrupo nacional, étnico, racial ou religioso, nomeadamente:a) assassinato de membros do grupo; b) atentado grave à integridade física e mental de membros do grupo; c) submissão deliberada do grupo a condições de existência destinadas aprovocar a sua destruição física, total ou parcial; d) imposição de medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio dogrupo; e) transferência forçada das crianças do grupo para outro grupo.

Page 67: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

36 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Convenção sobre a Eliminação da Discriminação

Racial

131. A Convenção Internacio-nal sobre a Eliminação deTodas as Formas da Discrimi-nação Racial entrou em vigorem Janeiro de 1969N.T.9, proi-bindo todas as formas de discriminação racial nasesferas política, económica, social e cultural.Entre outras disposições, impõe a igualdade de tra-tamento perante os tribunais, agências e orga-nismos que participam na administração dajustiça, sem distinção quanto à raça, cor ou origemnacional ou étnica.

Convenção sobre a Eliminação da Discriminação

contra as Mulheres

132. Após a sua entrada emvigor, em Setembro de 1981, aConvenção sobre a Eliminaçãode Todas as Formas de Discrimi-nação contra as MulheresN.T.10

tornou-se o principal instru-

mento internacional que aborda o problema da dis-criminação contra as mulheres nas esferas polí-tica, económica, social, cultural e civil. Exige que osEstados Partes adoptem medidas específicas emcada uma destas áreas para pôr fim à discrimina-ção contra as mulheres e garantir-lhes o exercícioe o gozo dos direitos humanos e liberdades fun-damentais em condições de igualdade com oshomens.

Convenção sobre os Direitos da Criança

133. A Convenção sobre osDireitos da Criança entrou emvigor em Setembro de 1990,contando agora com mais de100 Estados PartesN.T.11. Garantealguns direitos especiais aosdelinquentes juvenis, em reco-nhecimento da sua particularvulnerabilidade e do interesseda sociedade na sua reabilita-ção. Em concreto, a Convenção estabelece a proi-bição de aplicar a prisão perpétua a menores, bemcomo a sua protecção contra a pena de morte e a

Convenção contra a Tortura

130. A Convenção contra a Tor-tura e Outras Penas ou Trata-mentos Cruéis, Desumanos ouDegradantes entrou em vigorem Junho de 1987N.T.8. A Con-venção vai consideravelmentemais longe do que o Pacto Inter-nacional sobre os Direitos Civise Políticos na protecção do indi-víduo contra o crime internacional que é a tortura.Nos termos da Convenção, os Estados partes estão

obrigados a adoptar medidas eficazes nos planoslegislativo, administrativo, judicial e outros paraimpedir a ocorrência de actos de tortura; a respei-tar a proibição de expulsar, entregar ou extraditaruma pessoa para outro Estado quando existammotivos sérios para crer que o indivíduo possa sersubmetido a tortura; a garantir às vítimas de torturao direito de queixa perante as autoridades compe-tentes, que deverão examinar o caso rápida eimparcialmente; a proteger os queixosos e teste-munhas; a excluir qualquer elemento de prova outestemunho obtido através do recurso à tortura; ea compensar as vítimas e pessoas a seu cargo.

N.T.8 Assinada por Portugal a4 de Fevereiro de 1985 eaprovada para ratificaçãopela Resolução da Assem-bleia da República n.o 11/88,de 21 de Maio, publicada noDiário da República, I Série A,n.o 118/88. Ratificada peloDecreto do Presidente da República n.o 57/88, de 20 de Julho, publicado noDiário da República, I Série A, n.o 166/88. O ins-trumento de ratificação foidepositado junto do Secretá-rio-Geral das Nações Unidasa 9 de Fevereiro de 1989.

* Nota para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da lei

TORTURA

Actos cometidos com a intenção de provocar dor ou sofrimento agudo, físicoou mental, a uma pessoa, com os fins de, nomeadamente:a) obter dela uma informação ou confissão; b) punir, intimidar ou coagir essa pessoa.

N.T.10 Assinada por Portugala 24 de Abril de 1980 eaprovada para ratificaçãopela Lei n.o 23/80, de 26 deJulho, publicada no Diárioda República I Série A,n.o 171/80. O instrumentode ratificação foi depositadojunto do Secretário-Geraldas Nações Unidas a 30 deJulho de 1980.

N.T.11 Assinada por Portugala 26 de Janeiro de 1990 eaprovada para ratificaçãopela Resolução da Assem-bleia da República n.o 20/90,de 12 de Setembro. Ratifi-cada pelo Decreto do Presi-dente da Repúblican.o 49/90, da mesma data.Ambos os documentos seencontram publicados noDiário da República, I Série A, n.o 211/ /90. O instrumento de ratifica-ção foi depositado junto doSecretário-Geral das NaçõesUnidas a 21 de Setembro de 1990.

N.T.9 Aprovada para adesãopela Lei n.o 7/82, de 29 deAbril, publicada no Diárioda República I Série A,n.o 99/82. O instrumentode adesão foi depositadojunto do Secretário-Geraldas Nações Unidas a 24 deAgosto de 1982.

Page 68: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 37

tortura. A privação da liberdade dos menores deveser sempre uma medida de último recurso e,quando imposta, deve sê-lo pelo período de tempomais curto possível. Em qualquer circunstância, aConvenção exige que os menores em conflito coma lei sejam tratados com a humanidade e o respeitodevidos à dignidade da pessoa humana e demaneira que tenha em conta a idade da criança eas possibilidades de a reabilitar. Esta Convenção seráanalisada em maior detalhe no capítulo XVI, sobrePolícia e Protecção dos Jovens.

Convenção sobre os Direitos dos Trabalhadores

Migrantes

134. A Convenção Internacio-nal sobre a Protecção dos Direi-tos de Todos os Trabalhadores Migrantes eMembros das Suas Famílias foi adoptada pelaAssembleia Geral em Dezembro de 1990N.T.12. Foielaborada pelas Nações Unidas em reconheci-mento do grande impacto dos fluxos de trabalha-dores migrantes sobre os Estados e pessoas emcausa e da necessidade de desenvolver normascapazes de contribuir para a harmonização dasatitudes dos Estados mediante a aceitação de prin-cípios básicos de protecção dos trabalhadoresmigrantes e suas famílias. A Convenção enumeraos direitos fundamentais deste grupo particular-mente vulnerável de pessoas e garante a protecçãode tais direitos.

Direito internacional humanitário

135. Para fins de formação dasforças policiais, o direito inter-nacional humanitário pode serdefinido como o subconjuntodas normas de direitos humanosaplicáveis em tempo de conflitoarmado. Esta área será explicada em maior deta-lhe no capítulo XV. O conteúdo fundamental dodireito humanitário está definido, artigo porartigo, nas quatro Convenções de Genebra de1949 que protegem, respectivamente, os feridos edoentes das forças armadas em campanha, os náu-fragos, os prisioneiros de guerra e as pessoascivisN.T.13.

136. Como fontes temos,nomeadamente, os dois Proto-colos Adicionais (de 1977) àsConvenções de GenebraN.T.14. OProtocolo I reafirma e desen-volve as disposições das Con-venções de Genebra no que diz respeito aosconflitos armados internacionais, ao passo que oProtocolo II faz o mesmo relativamente aos con-flitos internos, sem carácter internacional.

137. Em conformidade com estes instrumentos, odireito internacional humanitário deverá ser apli-cado a todas as situações de conflito armado, nodecorrer das quais os princípios de humanidadedevem ser sempre respeitados, qualquer que sejao caso. Neles se dispõe ainda que os não comba-tentes e pessoas colocadas fora de combate devidoa ferimentos, doenças, captura ou outras causasdevem ser respeitadas e protegidas, e que as pes-soas que sofrem em consequência da guerradevem ser auxiliadas e tratadas sem discriminação.O direito internacional humanitário proíbe osseguintes actos, em todas as situações:• assassínio;• tortura;• castigos corporais;• mutilações;• atentados à dignidade da pessoa;• tomada de reféns;• penas colectivas;• execuções sem julgamento regular;• tratamentos cruéis ou degradantes.

138. Os mesmos instrumentos proíbem tambémas represálias contra os feridos, doentes ou náu-fragos, pessoal e serviços médicos, prisioneirosde guerra, pessoas civis, bens civis e culturais,ambiente natural e instalações que contenhamforças perigosas. Eles estabelecem que ninguémpode renunciar, nem ser forçado a renunciar, àprotecção conferida pelo direito humanitário.Finalmente, dispõem que as pessoas protegidasdevem poder recorrer a todo o momento a umapotência protectora (Estado neutro que protegeos seus interesses), ao Comité Internacional daCruz Vermelha ou a qualquer outra organiza-ção humanitária imparcial.

N.T.12 Não ratificada porPortugal até 29 de Novem-bro de 2000.

N.T.13 Portugal assinou asquatro Convenções deGenebra a 11 de Fevereirode 1950, tendo procedido àrespectiva ratificação a 14de Março de 1961. Portugalapôs ainda, no momento daratificação, uma reserva aoartigo 10.o/10.o/10.o/11.o dasreferidas Convenções.

N.T.14 Portugal assinou osProtocolos Adicionais I e IIa 12 de Dezembro de 1977,procedeu à respectiva ratifi-cação a 27 de Maio de 1992e declarou aceitar a compe-tência da Comissão Interna-cional para o Apuramentodos Factos, ao abrigo doartigo 90.o do Protocolo I, a1 de Julho de 1994.

Page 69: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

4. PRINCÍPIOS, REGRAS MÍNIMAS E DECLARAÇÕES

Código de Conduta para os Funcionários

Responsáveis pela Aplicação da Lei

139. Em Dezembro de 1979, a Assembleia Geraladoptou o Código de Conduta para os Funcioná-rios Responsáveis pela Aplicação da Lei. EsteCódigo é composto por oito artigos fundamentais,que definem as responsabilidades específicas dosfuncionários responsáveis pela aplicação da lei noque diz respeito às seguintes questões: serviço dacomunidade; protecção dos direitos humanos; uti-lização da força; tratamento de informação confi-dencial; proibição da tortura e das penas outratamentos cruéis, desumanos ou degradantes; pro-tecção da saúde dos reclusos; corrupção; e res-peito da lei e do próprio Código. Cada artigo éseguido de um comentário detalhado, que clarificaas implicações normativas do preceito. EsteCódigo constitui, na sua essência, o critério fun-damental com base no qual a polícia – civil ou mili-tar, uniformizada ou não – deverá ser julgada pelacomunidade internacional.

Princípios Básicos sobre a Utilização da Força

e de Armas de Fogo

140. Os Princípios Básicos sobre a Utilização daForça e de Armas de Fogo pelos Funcionários Res-ponsáveis pela Aplicação da Lei foram adoptados em1990 pelo Oitavo Congresso das Nações Unidaspara a Prevenção do Crime e o Tratamento dosDelinquentes. Os Princípios têm em consideraçãoo carácter muitas vezes perigoso da actividade defazer cumprir a lei, assinalando que uma ameaça àvida ou à segurança dos funcionários responsáveispela aplicação da lei constitui uma ameaça à esta-bilidade da sociedade no seu todo. Ao mesmotempo, estabelecem normas estritas para a utiliza-ção da força e de armas de fogo por parte da polí-cia, nomeadamente quanto às circunstâncias emque se pode recorrer a elas e formas de o fazer, pro-cedimentos a seguir após essa utilização e respon-sabilidade decorrente do seu uso indevido. OsPrincípios sublinham que apenas se pode recorrerà força quando estritamente necessário e unica-mente na medida em que tal seja necessário para o

desempenho de funções legítimas no domínio daaplicação da lei. Este instrumento resultou de umcuidadoso equilíbrio entre o dever da polícia degarantir a ordem e a segurança pública e o seu deverde proteger os direitos à vida, à liberdade e à segu-rança da pessoa. As suas disposições serão analisa-das em maior profundidade no capítulo XIV, sobreUtilização da Força e de Armas de Fogo.

Conjunto de Princípios para a Protecção

de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma

de Detenção ou Prisão

Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos

Princípios Básicos Relativos ao Tratamento

de Reclusos

141. Estes três instrumentos estabelecem umregime geral de protecção dos direitos das pes-soas sujeitas a detenção ou prisão. O Conjuntode Princípios foi adoptado pela AssembleiaGeral em Dezembro de 1988. As Regras Mínimasforam adoptadas pelo Primeiro Congresso dasNações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tra-tamento dos Delinquentes, realizado em 1955na cidade de Genebra, e mais tarde aprovadas peloConselho Económico e Social. Os PrincípiosBásicos, adoptados pela Assembleia Geral emDezembro de 1990, completam o regime, com11 parágrafos normativos.

142. O conteúdo destes instrumentos será exami-nado em maior detalhe no capítulo XIII, sobre aDetenção. Em resumo, eles prevêem que todos ospresos e detidos devem ser tratados com o res-peito devido à sua dignidade humana, no que con-cerne às condições de detenção, tratamento edisciplina, contacto com o mundo exterior, saúde,classificação e separação, queixas, registos, traba-lho e lazer e religião e cultura.

Declaração dos Princípios Básicos de Justiça

Relativos às Vítimas da Criminalidade

e de Abuso de Poder

143. Nas suas actividades de construção normativa,as Nações Unidas têm-se também ocupado da

38 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 70: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 39

importante questão dos direitos das vítimas. Paraeste fim, a Assembleia Geral adoptou, em Novem-bro de 1985, a Declaração dos Princípios Básicosde Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidadee de Abuso de Poder. Esta Declaração exige,nomeadamente, que os Estados garantam às víti-mas o acesso à justiça, que as vítimas sejam tra-tadas com compaixão pelo sistema jurídico, que lhesseja concedida reparação sempre que possível e atri-buída compensação caso a reparação se reveleimpossível e que tais pessoas recebam assistênciamédica, material, psicológica e social.

Garantias para a Protecção dos Direitos

das Pessoas Sujeitas a Pena de Morte

144. As Garantias para a Protecção dos Direitos dasPessoas Sujeitas a Pena de Morte foram aprovadaspelo Conselho Económico e Social em Maio de1984. Elas estabelecem que a pena de morte sópoderá ser aplicada aos crimes mais graves e proí-bem a execução de pessoas que eram menores deidade à data da prática do crime, bem como demulheres grávidas ou que tenham sido mãesrecentemente e de dementes. Além disso, esteinstrumento consagra determinadas garantiasprocessuais e exige que, caso a pena de morte sejaaplicada, a execução seja levada a cabo de forma acausar o menor sofrimento possível.

Regras Mínimas para a Elaboração de Medidas

não Privativas de Liberdade

145. Em Dezembro de 1990, a Assembleia Geraladoptou as Regras Mínimas das Nações Unidaspara a Elaboração de Medidas não Privativas deLiberdade (Regras de Tóquio), com o objectivode estimular a aplicação pelos Estados deste tipode medidas. Elas promovem a participação dacomunidade na administração da justiça penal e

servem a causa da justiça, ao mesmo tempo quereduzem a aplicação das penas de prisão, as quaisdevem, em qualquer caso, ser vistas como umasanção extrema. As Regras estabelecem que taismedidas deverão ter em conta os direitos huma-nos e a reabilitação do delinquente, a protecçãoda sociedade e os interesses das vítimas. Esteinstrumento fornece orientações relativamente amatérias como autorizações de saída, libertaçãopara fins de trabalho, liberdade condicional,remissão da pena, indulto, serviço cívico e san-ções pecuniárias, entre outros aspectos.

Princípios Orientadores das Nações Unidas

para a Prevenção da Delinquência Juvenil

(Princípios Orientadores de Riade)

Regras Mínimas das Nações Unidas

para a Administração da Justiça de Menores

(Regras de Beijing)

Regras das Nações Unidas para a Protecção

dos Menores Privados de Liberdade

146. Estes três instrumentos, em conjunto com aConvenção sobre os Direitos da Criança, consti-tuem as normas essenciais no domínio da admi-nistração da justiça de menores. Tal como aConvenção, estes textos (adoptados pela Assem-bleia Geral em Dezembro de 1990, Novembro de1985 e Dezembro de 1990, respectivamente) exi-gem que os sistemas jurídicos nacionais tenhamem conta a situação e a vulnerabilidade particula-res dos menores que hajam entrado em conflitocom a lei. Ocupam-se tanto da prevenção como dotratamento, com base no princípio de que o inte-resse superior da criança deve ser a consideraçãoprimordial no domínio da justiça de menores. O seuconteúdo será analisado em maior profundidade nocapítulo XVI, sobre a Polícia e Protecção dos Jovens.

Page 71: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

40 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Declaração sobre os DesaparecimentosForçados

147. Em Dezembro de 1992, a Assembleia Geraladoptou a Declaração sobre a Protecção de Todas asPessoas contra os Desaparecimentos Forçados. EstaDeclaração exprime a preocupação da comunidadeinternacional perante esta atrocidade de proporçõesmundiais. O texto compreende 21 artigos destina-

dos a prevenir os actos pelos quais se priva alguémde liberdade sem deixar qualquer rasto do seu para-deiro, assimilando-os a crimes contra a Humani-dade. Exige a adopção de medidas eficazes nos planoslegislativo, administrativo, judicial e outros para pre-venir e pôr fim a tais actos, indicando expressamentealgumas dessas medidas, que dizem respeito,nomeadamente, às garantias processuais, responsa-bilização, aplicação de sanções e reparação das vítimas.

* Nota para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da lei

DESAPARECIMENTOS FORÇADOS OU INVOLUNTÁRIOS

Captura, detenção, rapto ou outra privação de liberdade, perpetrada peloGoverno ou seus agentes, ou com a sua cumplicidade, tolerância ou aquies-cência, sempre que o destino ou paradeiro da vítima não seja revelado, oua privação de liberdade não seja confirmada.

Princípios sobre as Execuções Extrajudiciais, Arbitrárias ou Sumárias

148. Os Princípios sobre a Prevenção Eficaz eInvestigação das Execuções Extrajudiciais, Arbi-trárias ou Sumárias foram recomendados aosEstados pelo Conselho Económico e Social emMaio de 1989. Os Princípios proporcionam orien-tação aos funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei e outras autoridades nacionais sobre a pre-venção e investigação desses crimes e procedi-mentos judiciais a seguir para levar os autores aresponder perante a justiça. Sublinham a impor-tância de exercer um controlo rigoroso, nomea-

damente através de uma cadeia de comando cla-ramente definida, sobre os organismos responsá-veis pela aplicação da lei, bem como de assegurarcuidadosos sistemas de registo, inspecção e noti-ficação das detenções às famílias e aos represen-tantes legais. Exigem ainda a protecção dastestemunhas e dos membros da família, bemcomo a cuidadosa recolha e apreciação das provaspertinentes. Os Princípios desenvolvem em deta-lhe as disposições dos tratados de direitos huma-nos que garantem o direito à vida. O seu conteúdoserá analisado em maior detalhe no capítulo XXI,sobre Investigação das Violações Cometidas pelaPolícia.

* Nota para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da lei

EXECUÇÕES EXTRAJUDICIAIS, ARBITRÁRIAS OU SUMÁRIAS

Privação da vida sem um procedimento judicial completo e com a parti-cipação, cumplicidade, tolerância ou aquiescência do Governo ou seusagentes. Inclui a morte provocada por uma excessiva utilização da forçapela polícia ou pelas forças de segurança.

MASSACRES

Execução extrajudicial, arbitrária ou sumária de três ou mais pessoas.

Page 72: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

c. Mecanismos de direitos humanos das NaçõesUnidas149. As Nações Unidas instituíram um complexosistema de mecanismos para a elaboração de nor-mas de direitos humanos, sua aplicação e respec-tivo controlo.

150. As normas de direitos humanos relevantes nodomínio da aplicação da lei foram adoptadas por dife-rentes organismos do sistema das Nações Unidas,nomeadamente a Assembleia Geral, o Conselho Eco-nómico e Social, a Comissão dos Direitos do Homeme os Congressos periódicos das Nações Unidas paraa Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delin-quentes. O processo de produção normativa com-preende a participação de todos os Estados Membros,representando todas as tradições culturais, jurídicas,religiosas e filosóficas existentes no mundo. Esseprocesso beneficia também da contribuição de orga-nizações não governamentais, associações profis-sionais e especialistas no domínio da aplicação da lei.

151. No desempenho destas actividades, os orga-nismos acima mencionados recebem considerávelassistência da parte de duas unidades do Secreta-riado das Nações Unidas. O Alto Comissariado/Cen-tro para os Direitos Humanos funciona como ocentro de coordenação no âmbito do sistema dasNações Unidas para todas as questões relativas aosdireitos humanos. A Divisão para a Prevenção doCrime e Justiça Penal funciona como o centro de coor-denação para as questões relativas à justiça penal.

152. Os mecanismos de aplicação e controlopodem ser divididos em duas categorias funda-mentais, de acordo com a origem dos respectivosmandatos:a) Mecanismos convencionais (baseados nos tra-tados): Trata-se de organismos criados em confor-midade com as disposições de determinados tratadosinternacionais de direitos humanos para controlar aaplicação desses mesmos tratados. A lista desses seisorganismos pode ser encontrada mais adiante.b) Mecanismos extraconvencionais (baseados naCarta): A Comissão dos Direitos do Homemnomeou diversos relatores especiais e estabeleceugrupos de trabalho a fim de supervisionar a situa-ção dos direitos humanos em diferentes países ou,

em alternativa, determinados fenómenos relativosaos direitos humanos, como a tortura, a detenção arbi-trária e os desaparecimentos. Estes mecanismosnão se baseiam em nenhum tratado de direitoshumanos em particular, mas antes na autoridade doConselho Económico e Social e suas comissões fun-cionais, em conformidade com a Carta das NaçõesUnidas. Alguns deles aparecem abaixo indicados.

1. MECANISMOS CONVENCIONAIS

(BASEADOS NOS TRATADOS)

153. Diversos organismos do sistema das NaçõesUnidas foram criados ao abrigo de pactos e con-venções internacionais a fim de controlar a obser-vância pelos Estados Partes das disposições dessesinstrumentos. Tais organismos, designados porórgãos de controlo da aplicação dos tratados, foramestabelecidos, nomeadamente, em conformidadecom as disposições dos dois Pactos Internacionais,Convenção contra a Tortura, Convenção sobre a Eli-minação da Discriminação Racial, Convenção sobrea Eliminação da Discriminação contra as Mulherese Convenção sobre os Direitos da Criança.

154. No desenrolar das suas actividades, estes comi-tés proporcionam importantes orientações para umacorrecta aplicação da lei, não apenas aos Estados cujasituação está sob exame, mas a todos os Estados quese esforçam por realizar os direitos consagrados nosinstrumentos em questão. As disposições dos trata-dos são muitas vezes de carácter bastante genérico,mas necessitam de ser postas em prática através dedisposições específicas e detalhadas ao nível do direitointerno. Por exemplo, os direitos à vida, à liberdadee à segurança pessoal não podem ser asseguradospor normas legais meramente declaratórias. Pelocontrário, há que adoptar legislação e procedimen-tos detalhados em matéria penal, civil e administra-tiva a fim de garantir a reparação das vítimas e apunição dos infractores, assim como as indispensá-veis garantias processuais. Os funcionários e orga-nismos responsáveis pela aplicação da leidesempenham um papel central na aplicação dasnormas internacionais, mediante uma observânciarigorosa de normas e procedimentos humanos, legaise éticos no desempenho das suas funções.

Conceitos Fundamentais* 41

Page 73: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

42 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

155. A actividade dos órgãos de controlo da aplicaçãodos tratados – e em especial, para os fins do pre-sente manual, do Comité dos Direitos do Homem –que elaboram uma abundante jurisprudência nodecurso da análise das comunicações e dos relató-rios estaduais que lhes são apresentados e atravésda formulação de comentários gerais e directrizes,serve para informar os processos legislativos a nível

interno e para auxiliar os organismos responsáveispela aplicação da lei nos seus esforços de inter-pretação e garantia dos direitos consagrados nos ins-trumentos internacionais.

156. Os seis principais tratados de direitos huma-nos e organismos criados para controlar a respec-tiva aplicação são os seguintes:

Tratado de direitos humanos Correspondente órgão de controloda aplicação

Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Cul-turais

Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos

Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formasde Discriminação Racial

Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discri-minação contra as Mulheres

Convenção contra a Tortura e Outras Penas ou TratamentosCruéis, Desumanos ou Degradantes

Convenção sobre os Direitos da Criança

• Comité dos Direitos Económicos, Sociais e

Culturais

• Comité dos Direitos do Homem

• Comité para a Eliminação da Discriminação

Racial

• Comité para a Eliminação da Discriminação

contra as Mulheres

• Comité contra a Tortura

• Comité dos Direitos da Criança

2. MECANISMOS EXTRACONVENCIONAIS

(BASEADOS NA CARTA)

157. Diversos procedimentos foram instituídos aoabrigo dos poderes conferidos pela Carta dasNações Unidas ao Conselho Económico e Social e,através deste, aos seus órgãos subsidiários quesão a Comissão dos Direitos do Homem e a Sub-comissão para a Prevenção da Discriminação eProtecção das Minorias. Tais procedimentospodem ser públicos ou terem carácter confidencial.O chamado “procedimento 1503”, por exemplo, éconfidencial, ao passo que os diversos relatoresespeciais e grupos de trabalho temáticos ou encar-regados de examinar a situação de determinadospaíses, operam publicamente.

(a) Procedimento 1503

158. Em conformidade com a resolução 1503(XLVIII) do Conselho Económico e Social, de 27de Maio de 1970, a Subcomissão para a Prevençãoda Discriminação e Protecção das Minorias (órgãodas Nações Unidas composto por peritos de direi-tos humanos), através do seu Grupo de Trabalhosobre Comunicações, analisa anualmente milha-res de comunicações que lhe são apresentadas porindivíduos e grupos que alegam a existência de vio-lações sistemáticas de direitos humanos. Caso oGrupo de Trabalho considere que existem provassuficientes da existência de um padrão regular degraves violações de direitos humanos, remete aquestão para exame pelo pleno da Sub-Comissão.

Page 74: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 43

Esta pronuncia-se, então, sobre a questão de saberse o caso deverá ser submetido à Comissão dosDireitos do Homem, por revelar um padrão regu-lar de violações de direitos humanos. Caberádepois à Comissão decidir sobre a realização de umestudo aprofundado da situação que inclua umrelatório e recomendações ao Conselho Econó-mico e Social.

159. Todas as fases iniciais do processo são con-fidenciais, apesar de ser dada oportunidade aosGovernos em causa de formular observações. O pro-cedimento torna-se, porém, público quando a situa-ção é remetida ao Conselho Económico e Social.Desta forma, as violações sistemáticas ocorridas numdeterminado país para as quais não seja encontradauma solução no decurso das fases iniciais do processo,podem ser levadas ao conhecimento da comunidadeinternacional através do Conselho Económico e Social– um dos principais órgãos das Nações Unidas.

(b) Alguns relatores especiais e grupos

de trabalho Relator Especial sobre execuções

extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias

160. Este mecanismo foi criado em 1982 com oobjectivo de permitir à Comissão dos Direitos doHomem supervisionar a situação das execuçõesarbitrárias no mundo e reagir com eficácia àinformação que lhe seja apresentada, em parti-cular quando esteja iminente uma execuçãodeste tipo ou existam receios de que se possa veri-ficar. O Relator Especial, com a assistência AltoComissariado/Centro para os Direitos Huma-nos, recebe e aprecia a informação pertinentesobre tais casos, podendo comunicar com osGovernos em causa a fim de evitar execuçõesiminentes ou solicitar uma investigação oficiale medidas penais apropriadas nos casos em quetenha ocorrido uma execução arbitrária.

Relator Especial sobre a Tortura

161. Em 1985, a Comissão dos Direitos do Homemdesignou um Relator Especial sobre a Tortura, paraacompanhar as questões relativas à tortura e outraspenas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degra-dantes através da comunicação com os Governos,realização de visitas aos países para consultas sobrea prevenção dos crimes em causa e recepção de pedi-dos de acção urgente. O Relator Especial dá segui-mento a estas solicitações, contactando o Governoem causa a fim de garantir a protecção dos indiví-duos em questão. Deverá ser sublinhado que o man-dato do Relator Especial não se sobrepõe ao do Comitécontra a Tortura, criado ao abrigo da Convenção con-tra a Tortura, uma vez que a Convenção se aplica ape-nas aos Estados que nela são partes, ao passo que omandato do Relator Especial é de âmbito universal.

Grupo de Trabalho sobre os Desaparecimentos

Forçados ou Involuntários

162. Em 1980, a Comissão dos Direitos do Homeminstituiu o Grupo de Trabalho sobre os Desapareci-mentos Forçados ou Involuntários para acompanharo fenómeno, que se verifica em diversos países, do“desaparecimento” de pessoas, ou seja, situações emque estas são raptadas pela força por determinadosGovernos ou grupos que não deixam rasto do destinoque lhes é dado. O Grupo de Trabalho já examinoucerca de 20 000 casos individuais registados em maisde 40 países, recorrendo a procedimentos de acçãourgente para impedir a ocorrência de desapareci-mentos, apurar o paradeiro das pessoas supostamente“desaparecidas”, processar queixas e canalizar infor-mação entre os Governos e as famílias afectadas.

Grupo de Trabalho sobre a Detenção Arbitrária

163. O último mecanismo a ser mencionado nestarubrica é o Grupo de Trabalho sobre a Detenção Arbi-

* Nota para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da lei

PRISÃO E DETENÇÃO ARBITRÁRIAS

Privação de liberdade, sem motivo legal ou processo adequado, por acto doGoverno ou dos seus agentes, ou com a sua cumplicidade, tolerância ou aquies-cência.

Page 75: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

trária, instituído pela Comissão dos Direitos doHomem em 1991 para investigar tais situações e apre-sentar as suas conclusões à Comissão. O Grupo deTrabalho recorre a procedimentos de acção urgentepara intervir em casos em que se suspeita de quealguém tenha sido detido arbitrariamente e que a suavida ou saúde esteja em perigo em resultado dessadetenção. O Grupo de Trabalho formula recomen-dações que apresenta directamente aos Governos emcausa e submete os casos confirmados à Comissão.

d. Fontes, sistemas e normas a nível regional164. O presente manual, que se destina a servir deinstrumento de formação utilizável em todo omundo, baseia-se nas normas deâmbito universal adoptadas pelaOrganização das Nações Unidas.Não obstante, os formadores eformandos devem conhecertambém os instrumentos e meca-nismos de âmbito regional exis-tentes na Europa, nas Américase em África (na Ásia não exis-tem ainda mecanismos destegénero).

1. O SISTEMA EUROPEU

NO ÂMBITO DO CONSELHO

DA EUROPAN.T.15

165. O principal instrumento dedireitos humanos existente noespaço da Europa é a Convençãopara a Protecção dos Direitos doHomem e das Liberdades Funda-mentaisN.T.16 (geralmente desig-nada por Convenção Europeiados Direitos do Homem), queentrou em vigor em Setembrode 1993. Os órgãos do sistemaeuropeu relacionados com estaConvenção são a ComissãoEuropeia dos Direitos doHomem, o Tribunal Europeudos Direitos do Homem e oComité de Ministros do Conselhoda Europa.

166. A Comissão é um órgão parajudicial que recebequeixas (petições), procura encontrar uma soluçãoamigável para a questão e formula pareceres nãovinculativos sobre a ocorrência ou não de uma vio-lação da Convenção.

167. O Tribunal é um órgão judicial que emitepareceres consultivos e decide sobre os casos jásubmetidos à Comissão, a pedido de um dos Esta-dos em causa ou da própria Comissão, sendo estasdecisões vinculativas. Os indivíduos não podemrecorrer directamente ao Tribunal.

168. O Comité de Ministros é um órgão políticocomposto pelos Governos. Decide sobre os casos jáexaminados pela Comissão mas não submetidos àapreciação do Tribunal. O Comité vela pela execuçãodas sentenças do Tribunal, adopta resoluçõesmediante as quais solicita aos Estados que tomem asmedidas necessárias a este respeito e pode suspen-der ou expulsar um Estado do Conselho da Europa.

2. O SISTEMA INTERAMERICANO NO ÂMBITO

DA ORGANIZAÇÃO DE ESTADOS AMERICANOS

169. No continente americano, os direitos humanosestão protegidos a nível regional pela ConvençãoAmericana sobre Direitos Humanos, que entrouem vigor em Julho de 1978. No sistema interame-ricano, a Comissão Interamericana de DireitosHumanos recebe queixas por violação da Conven-ção, investiga o caso e formula recomendações, decarácter não vinculativo, destinadas ao Governo emcausa. As petições dirigidas contra um Estado Partena Convenção podem acabar por ser submetidas àapreciação do Tribunal Interamericano de DireitosHumanos, que profere decisão vinculativa.

3. O SISTEMA AFRICANO NO ÂMBITO

DA ORGANIZAÇÃO DE UNIDADE AFRICANA

170. A Carta Africana dos Direitos do Homem e dosPovos foi adoptada pela Organização de UnidadeAfricana em 1981, tendo entrado em vigor emOutubro de 1986. Nos termos da Carta, foi criadaa Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos

44 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

N.T.15 O sistema europeusofreu recentemente profun-das alterações: já o Protocolon.o 9 à Convenção Europeiados Direitos do Homem,entrado em vigor a 1 deOutubro de 1994, abriu aosrequerentes individuais a pos-sibilidade de submeter o casoao Tribunal, cumpridos queestivessem alguns requisitos. A entradaem vigor, a 1 de Novembrode 1998, do Protocolo n.o 11à Convenção Europeia trans-formou o sistema por com-pleto, extinguindo aComissão Europeia, abolindoos poderes de decisão doComité de Ministros e admi-tindo expressamente a possi-bilidade de recurso dosparticulares a um TribunalEuropeu único e perma-nente. O sistema de protec-ção dos direitos do Homemno âmbito do Conselho daEuropa transformou-se,assim, no primeiro sistemainternacional de protecçãodos direitos humanos decarácter puramente jurisdi-cional.N.T.16 Assinada por Portugala 22 de Setembro de 1976 eaprovada para ratificaçãopela Lei n.o 65/78, de 13 deOutubro, publicada no Diá-rio da República, I Série A,n.o 236/78. O aviso de depó-sito do instrumento de ratifi-cação (aviso 1/79, de 2 deJaneiro) encontra-se publi-cado no Diário daRepública, I Série A,n.o 1/79. O instrumento deratificação foi depositadojunto do Secretário-Geral doConselho da Europa a 9 deNovembro de 1978. O Proto-colo n.o 11 foi assinado a 11de Maio de 1994, aprovadopara ratificação pela Resolu-ção da Assembleia da Repú-blica n.o 21/97, de 3 de Maioe ratificado pelo Decreto doPresidente da Repúblican.o 20/97, da mesma data.Ambos os documentos seencontram publicados noDiário da República, I SérieA, n.o 102/97. O instrumentode ratificação foi depositadojunto do Secretário-Geral do Conselho da Europa a 14 de Maio de 1997.

Page 76: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 45

Povos com a missão de promover e proteger osdireitos humanos em África. A Comissão inter-preta ainda as normas da Carta e tem competên-cia para receber queixas de violações de direitoshumanos apresentadas por Estados, indivíduos egrupos. Com base em tais queixas, pode procuraruma solução amigável, empreender estudos e for-mular recomendações.

e. Conclusões171. O presente capítulo destina-se apenas a daruma panorâmica geral das fontes, sistemas enormas internacionais de direitos humanosrelevantes no domínio da aplicação da lei.Embora os formadores se devam familiarizartanto quanto possível com as matérias abordadas,não é aconselhável tentar transmitir toda a infor-mação contida neste capítulo numa só sessão. Aoinvés, ele deverá ser utilizado como fonte dainformação necessária para transmitir aos par-ticipantes, numa sessão introdutória, o conhe-cimento básico do sistema internacional quedisciplina a respectiva actividade e, ao longo docurso, como material de referência para res-

ponder às questões que se coloquem a respeitodo mesmo sistema.

172. A mensagem essencial a ser retirada do pre-sente capítulo é a seguinte: os direitos humanosnão são uma questão sob a jurisdição exclusivado Estado ou dos seus agentes. Pelo contrário,constituem uma preocupação legítima da comu-nidade internacional, empenhada há mais demeio século na definição de normas, criação demecanismos para a aplicação das mesmas e con-trolo da respectiva observância. Os funcionáriose organismos responsáveis pela aplicação da leique desempenham as suas importantes funçõesde forma a respeitar e proteger os direitos huma-nos honram, não só a si próprios, mas tambémo Governo que os emprega e a nação que servem.Aqueles que cometem violações de direitoshumanos acabarão por chamar a atenção dacomunidade internacional e ser por ela conde-nados. O desafio do verdadeiro profissional depolícia deverá, pois, consistir em aplicar e defen-der as normas de direitos humanos, em todas asocasiões.

Primeira RevisãoPrincipais organismos do sistema das Nações Unidas relevantes no domínio daaplicação da lei

• Assembleia Geral

• Conselho Económico e Social

• Comissão dos Direitos do Homem

• Subcomissão para a Prevenção da Discriminação e Protecção das Minorias

• Congressos periódicos das Nações Unidas para a Prevenção do Crime eo Tratamento dos Delinquentes

Segunda RevisãoPrincipais instrumentos de direito internacional relevantes no domínio da apli-cação da lei

• Declaração Universal dos Direitos do Homem

• Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos

• Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais

• Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei

• Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelosFuncionários Responsáveis pela Aplicação da Lei

f. Revisão básica do capítulo

Page 77: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

46 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

g. Exercício práticoVocê foi designado como conselheiro para as ques-tões de polícia da delegação oficial do seu país a umaconferência das Nações Unidas sobre direitoshumanos. A conferência tem por objectivo elabo-rar uma nova declaração internacional sobre a pro-tecção dos direitos humanos, para ser submetidaao Conselho Económico e Social. Enquanto con-selheiro para as questões de polícia e com base nasua experiência profissional:

a) Considera que existe algum grupo particular-mente vulnerável que, na sua opinião, necessite demaior protecção no âmbito do sistema internacionalde direitos humanos?

b) Considera que existem algumas práticas con-cretas no domínio da aplicação da lei que, na suaopinião, deveriam estar sujeitas a um controlo inter-nacional mais rigoroso?

h. Tópicos para discussão1. Por que motivos se deverão os funcioná-rios responsáveis pela aplicação da lei preocu-par com as normas internacionais de direitoshumanos?

2. Em que medida a lei do seu país incorpora asnormas internacionais? Existem algumas áreasem que a lei interna oferece maior protecção emtermos de direitos humanos do que as normasinternacionais? Existem algumas áreas em queoferece menor protecção?

3. Podem as violações de direitos humanos porparte da polícia tornar mais difícil a missão das for-ças da ordem? Como?

4. Por que razão o papel da polícia nacionalé tão importante na protecção dos direitoshumanos?

• Conjunto de Princípios para a Protecção de Todas as Pessoas Sujeitas aQualquer Forma de Detenção ou Prisão

• Declaração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas da Cri-minalidade e de Abuso de Poder

• Declaração sobre a Protecção de Todas as Pessoas contra os Desapare-cimentos Forçados

• Princípios sobre a Prevenção Eficaz e Investigação das Execuções Extra-judiciais, Arbitrárias ou Sumárias

• Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores

Terceira RevisãoPrincipais mecanismos internacionais de direitos humanos relevantes nodomínio da aplicação da lei

• Órgãos de controlo da aplicação dos tratados das Nações Unidas em maté-ria de direitos humanos

• Procedimento confidencial 1503

• Relator Especial sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias

• Relator Especial sobre a Tortura

• Grupo de Trabalho sobre os Desaparecimentos Forçados ou Involuntários

• Grupo de Trabalho sobre a Detenção Arbitrária

Page 78: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Segunda Parte 47

Conduta policial lícitae conforme aos princípios éticos

*capítulo

08

• Familiarizar os formadores e, através deles, os participantes no curso, comos princípios éticos fundamentais que derivam dos instrumentos interna-cionais relevantes e se aplicam aos seus deveres profissionais.

• Os direitos humanos derivam da dignidade inerente à pessoa humana.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão respeitar e cum-prir a lei em todas as ocasiões.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão cumprir os deve-res que lhes são impostos pela lei em todas as ocasiões, servindo a sua comu-nidade e protegendo todas as pessoas contra actos ilegais, em conformidadecom o alto nível de responsabilidade exigido pela sua profissão.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei não deverão cometerqualquer acto de corrupção. Dever-se-ão opor frontalmente a tais actos ecombatê-los.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão respeitar e pro-teger a dignidade humana, bem como defender e garantir os direitoshumanos de todas as pessoas.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão participar asviolações de leis, códigos e conjuntos de princípios que promovem e prote-gem os direitos humanos.

• Todas as actividades da polícia deverão respeitar os princípios da legali-dade, necessidade, não discriminação, proporcionalidade e humanidade.

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

}

Page 79: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

a. Normas internacionais sobre uma con-duta policial lícita e conforme aos princípios éti-cos – Informação para as apresentações

1. INTRODUÇÃO

173. As normas internacionais de direitos huma-nos relevantes no domínio da aplicação da lei pro-porcionam uma base sólida para uma actividadepolicial ética e lícita. Contudo, algumas normasdizem particularmente respeito à ética policial, eoutras colocam questões de ordem ética aos orga-nismos e funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei. O presente capítulo centra-se nessas normasparticularmente importantes.

174. Os direitos humanos baseiam-se na noção derespeito pela dignidade inerente à pessoa humana.Estes direitos são inalienáveis: ninguém pode serdeles privado. Além disso, os direitos humanos sãoprotegidos pelo direito internacional e pela leiinterna dos Estados.

175. A polícia, enquanto força responsável pelaaplicação da lei, tem claramente a obrigação de res-peitar esta mesma lei, nomeadamente a legislaçãoadoptada para promoção e protecção dos direitoshumanos. Ao fazê-lo, estará a respeitar o princípiofundamental que serve de base à própria lei – o prin-cípio do respeito pela dignidade humana. Estará tam-bém a reconhecer a inalienabilidade dos direitoshumanos de todas as pessoas.

176. As bases de uma conduta policial ética e lícitasão, pois, o respeito da lei, o respeito da digni-dade humana e, consequentemente, o respeitodos direitos humanos.

2. ASPECTOS GERAIS DE UMA CONDUTA POLICIAL

LÍCITA E CONFORME AOS PRINCÍPIOS ÉTICOS

(a) Princípios fundamentais

177. A aplicação e a manutenção da ordem públicadevem ser compatíveis com:• o respeito e o cumprimento da lei;

• o respeito da dignidade da pessoa humana;• o respeito e a protecção dos direitos humanos.

São estes os princípios fundamentais que servemde base a uma conduta policial ética e lícita e dosquais derivam todas as obrigações e disposiçõesespecíficas neste domínio que passamos a enun-ciar:

(b) Disposições específicas sobre

uma conduta policial lícita e conforme aos

princípios éticos

178. Os princípios supra mencionados estão con-sagrados nos artigos 2.o e 8.o do Código de Condutapara os Funcionários Responsáveis pela Aplica-ção da Lei. Ao adoptar este Código, na sua resolu-ção 34/169 de 17 de Dezembro de 1979, aAssembleia Geral reconheceu as importantes tare-fas que os funcionários responsáveis pela aplica-ção da lei desempenham, com diligência edignidade, em conformidade com os princípiosde direitos humanos, e instou a que o conteúdo eo significado das normas do Código fossem incul-cados a todos os funcionários responsáveis pela apli-cação da lei, através da educação, da formação e doestabelecimento de mecanismos de controlo.

179. O Código de Conduta é composto por oitoartigos, cada um dos quais seguido de um comen-tário explicativo, que podem ser resumidos nosseguintes termos:

O artigo 1.o exige que os funcionários responsá-veis pela aplicação da lei cumpram, a todo omomento, o dever que a lei lhes impõe. Aexpressão “funcionários responsáveis pela apli-cação da lei” é definida no comentário,incluindo todos os agentes da lei que exercempoderes de polícia, especialmente poderes decaptura ou detenção.

O artigo 2.o exige que os funcionários responsáveispela aplicação da lei respeitem e protejam a dig-nidade humana e que defendam e garantam osdireitos humanos. O comentário enuncia os ins-trumentos internacionais de direitos humanosrelevantes no domínio da aplicação da lei.

48 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 80: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

O artigo 3.o restringe a utilização da força por partedos funcionários responsáveis pela aplicação da leiao estritamente necessário e na medida exigidapelo cumprimento do seu dever. O comentário fazreferência ao princípio da proporcionalidade no usoda força e considera a utilização de armas de fogocomo uma medida extrema.

O artigo 4.o estabelece que as informações denatureza confidencial em poder dos funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei devem ser man-tidas em sigilo, a menos que o cumprimento dodever ou as necessidades da justiça exijam abso-lutamente o contrário.

O artigo 5.o consagra a proibição absoluta da tor-tura e de outros tratamentos cruéis, desumanos oudegradantes. Afirma ainda que nenhum funcionárioresponsável pela aplicação da lei poderá invocarordens superiores ou circunstâncias excepcionais,tais como a guerra ou a ameaça à segurança nacio-nal, para justificar a prática da tortura.

O artigo 6.o exige que os funcionários responsáveispela aplicação da lei assegurem a protecção dasaúde das pessoas à sua guarda.

O artigo 7.o proíbe que os funcionários responsá-veis pela aplicação da lei cometam qualquer acto decorrupção.

O artigo 8.o exige que os funcionários responsáveispela aplicação da lei respeitem a lei e o Código deConduta e que evitem e se oponham vigorosa-mente a quaisquer violações dos mesmos. Impõe--lhes ainda a obrigação de denunciar as violaçõesdo Código.

180. As “ordens superiores” e “circunstânciasexcepcionais”, referidas no artigo 5.o do Código, bemcomo a obrigação de participar violações enun-ciada no artigo 8.o, são claramente importantesno domínio da ética da actividade policial e serãoanalisadas em maior detalhe mais adiante, uma vezque relevam também de outros instrumentos.

181. O Código de Conduta pode ser consideradocomo um código deontológico que fornece orien-

tações para o cumprimento das obrigações jurídi-cas de promover e proteger os direitos humanos,ao mesmo tempo que reafirma algumas destasobrigações. O Código constitui a base ideal para aelaboração de códigos deontológicos nacionaisdestinados aos agentes policiais.

[i] Ética policial e utilização da força

182. O presente manual compreende um capítuloautónomo dedicado à utilização da força pela polí-cia. Contudo, é importante referir nesta fase oprincípio 1 dos Princípios Básicos sobre a Utiliza-ção da Força e de Armas de Fogo pelos Funcioná-rios Responsáveis pela Aplicação da Lei, nostermos do qual “os Governos e os organismos deaplicação da lei devem manter sob permanenteavaliação as questões éticas ligadas à utilização daforça e de armas de fogo”.

183. A exigência de avaliação permanente dasquestões éticas implica a necessidade de instituirsistemas para esse fim e tem implicações nos pro-gramas de formação que abordam os aspectos teó-ricos e práticos da utilização da força.

[ii] Conduta policial lícita e conforme

aos princípios éticos – responsabilidade

individual

184. A responsabilidade individual dos agentespoliciais é abordada nos seguintes instrumentos:

Convenção contra a Tortura e Outras Penas ouTratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes– o artigo 2.o, n.o 3, estabelece que: “Nenhumaordem de um superior ou de uma autoridadepública poderá ser invocada para justificar a tor-tura”. Esta norma aplica-se a qualquer funcioná-rio público ou pessoa actuando a título oficial. Dequalquer forma, conforme já indicado, o Código deConduta para os Funcionários Responsáveis pelaAplicação da Lei inclui uma norma semelhante.

Código de Conduta para os Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei – o artigo 5.o, que rei-tera a proibição da tortura, dispõe que nenhumfuncionário responsável pela aplicação da lei

Conceitos Fundamentais* 49

Page 81: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

poderá invocar ordens superiores para justificar aprática da tortura.Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e deArmas de Fogo pelos Funcionários Responsáveispela Aplicação da Lei – Incluem três princípios rela-tivos à responsabilidade individual, a saber:

Princípio 24 – exige que os Governos e organismosresponsáveis pela aplicação da lei garantam que osfuncionários superiores são responsabilizados casotenham, ou devessem ter, conhecimento de que osfuncionários sob as suas ordens utilizam outenham utilizado ilicitamente a força ou armas defogo, e não tomem as medidas ao seu alcance paraimpedir, fazer cessar ou denunciar tal abuso.

Princípio 25 – exige que os Governos e organismosresponsáveis pela aplicação da lei assegurem quenão é imposta qualquer sanção penal ou discipli-nar aos agentes policiais que, em conformidade como Código de Conduta para os Funcionários Res-ponsáveis pela Aplicação da Lei e com os Princí-pios Básicos, se recusem a cumprir uma ordem parautilizar a força ou armas de fogo ou denunciem essautilização por parte de outros funcionários.

Princípio 26 – estabelece que a obediência aordens superiores não pode ser invocada caso osagentes policiais soubessem que a ordem de uti-lização da força ou de armas de fogo de queresultaram a morte ou lesões graves era mani-festamente ilegal e tivessem uma possibilidaderazoável de se recusar a cumpri-la.Princípios sobre a Prevenção Eficaz e Investigaçãodas Execuções Extrajudiciais, Arbitrárias ou Sumá-rias – Incluem dois princípios, cada um dos quaiscompreende diversas disposições, que se relacio-nam com a responsabilidade individual, nos termosseguintes:

Princípio 3 – impõe aos Governos a obrigação deproibir ordens de funcionários superiores ou auto-ridades públicas que autorizem ou incitem outraspessoas a levar a cabo execuções extrajudiciais,arbitrárias ou sumárias; exige que todas as pessoastenham o direito e o dever de se recusar a cumprirtais ordens; e estabelece que a formação das for-ças policiais deverá destacar estas disposições.

Princípio 19 – dispõe que, sem prejuízo do prin-cípio 3, uma ordem de um superior hierárquico oude uma autoridade pública não poderá ser invocadacomo justificação para tais execuções; e estabe-lece que os superiores hierárquicos ou outros fun-cionários públicos poderão ser responsabilizadospelos actos cometidos pelos agentes sob as suasordens caso tivessem tido uma possibilidaderazoável de impedir a ocorrência desses actos.

[iii] Conduta policial lícita e conforme

aos princípios éticos – dever de denunciar

as violações

185. O dever dos agentes policiais de denunciaremas violações de direitos humanos que cheguemao seu conhecimento está consagrado nos seguin-tes instrumentos:

Código de Conduta para os Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei: conforme já ficoudito, o artigo 8.o ocupa-se da denúncia das viola-ções. Em termos concretos, isto significa que osagentes policiais que tenham motivos para crer quese produziu ou está prestes a produzir-se uma vio-lação do Código de Conduta deverão dar contadesse facto aos seus superiores e, se necessário, aoutras autoridades ou instâncias de controlo ou derecurso competentes. O comentário a este artigoreconhece a necessidade de preservar a disciplinainterna do organismo em questão. Os funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei só deverão, pois,efectuar tais denúncias junto de outras entidadesque não os seus superiores imediatos caso nãoexista, ou não seja eficaz, outra alternativa.

Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e deArmas de Fogo pelos Funcionários Responsáveispela Aplicação da Lei: a obrigação de denunciar asviolações dos Princípios não está explicitamenteconsagrada mas, como já tivemos oportunidade dereferir, o princípio 25 proíbe a imposição de san-ções penais ou disciplinares aos funcionários queprocedam a essas denúncias.

Conjunto de Princípios para a Protecção de Todasas Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detençãoou Prisão: Incluem um princípio, composto por

50 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 82: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 51

várias normas, que obriga à denúncia das violações.O n.o 2 do Princípio 7 estabelece que os funcionáriosque tenham razões para acreditar que ocorreu ouestá iminente uma violação do Conjunto de Prin-cípios, deverão comunicar esse facto aos seussuperiores e, se necessário, a outras autoridadescompetentes de controlo ou de recurso.

[iv] Conduta policial lícita e conforme

aos princípios éticos – circunstâncias

excepcionais e situações de emergência pública

186. Os seguintes instrumentos abordam as ques-tões relativas às circunstâncias excepcionais esituações de emergência pública:

Declaração sobre a Protecção de Todas as Pessoascontra a Tortura e Outras Penas ou TratamentosCruéis, Desumanos ou Degradantes: o artigo 3.o

afirma que não se poderão invocar circunstânciasexcepcionais tais como o estado de guerra ouameaça de guerra, a instabilidade política internaou qualquer outra situação de emergência públicacomo justificação para a prática da tortura ou deoutros maus tratos.

Convenção contra a Tortura e Outras Penas ouTratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes:o artigo 2.o, n.o 2, contém uma disposição seme-lhante à da Declaração.

Código de Conduta para os Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei: conforme supra men-cionado, o artigo 5.o proíbe expressamente aosagentes policiais a invocação de circunstânciasexcepcionais ou situações de emergência públicapara justificar a prática da tortura ou outros maustratos.

Princípios sobre a Prevenção Eficaz e Investiga-ção das Execuções Extrajudiciais, Arbitrárias ouSumárias: nos termos do Princípio 1, que exigeque os Governos proíbam por lei quaisquer exe-cuções desse tipo, as circunstâncias excepcio-nais, nomeadamente o estado de guerra ou aameaça de guerra, a instabilidade política internaou qualquer outra situação de emergênciapública, não poderão ser invocadas como justifi-

cação para a prática de execuções extrajudiciais,arbitrárias ou sumárias.

3. OBSERVAÇÕES FINAIS

187. As demais partes relevantes dos instrumen-tos de direitos humanos acima mencionados serãoanalisadas nos capítulos seguintes. É evidente quea observância por parte dos agentes das disposiçõesdestes instrumentos garantirá uma conduta poli-cial ética e lícita nas áreas pelos mesmos abrangidas.

188. Para além das normas do Código de Condutapara os Funcionários Responsáveis pela Aplicaçãoda Lei, que dizem respeito à ética policial em geral,as disposições dos outros instrumentos referidos nopresente capítulo foram destacadas uma vez quetratam de questões específicas relativas à ética elicitude do comportamento policial.

189. Por exemplo, a questão da responsabilidade indi-vidual – dos funcionários superiores que emitamordens ilícitas e de outros funcionários que even-tualmente recebam semelhantes ordens – é muitoimportante numa instituição disciplinada e hierar-quicamente organizada. As disposições dos instru-mentos examinados no presente capítulo são bastanteclaras quanto a determinar quem incorre em res-ponsabilidade individual: a pessoa que profere a ordemilícita e a pessoa que comete o acto ilícito, não obstanteeste ter ou não sido ordenado por um superior.

190. Quanto às disposições que exigem que a polí-cia denuncie as violações de direitos humanos, osinstrumentos não se limitam a elevar esta obriga-ção de denunciar à categoria de norma interna-cional, eles indicam também as situações em queo agente pode e deve recorrer a instâncias exterioresà instituição policial para o fazer.

191. A terceira questão de relevância específicaque abordámos, isto é, a proibição de invocaçãode circunstâncias excepcionais ou situações deemergência para justificar uma conduta policialilícita ou anti-ética, reveste-se da maior impor-tância. Sempre que se verifiquem circunstânciasexcepcionais, bem como durante situações de

Page 83: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

52 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

emergência, a polícia pode ficar sujeita a consi-deráveis pressões no sentido de demonstrar efi-cácia e “conseguir resultados”. Esta pressão podeser imposta pelo poder político, pela opiniãopública ou ter origem dentro do próprio orga-nismo responsável pela aplicação da lei. Taissituações colocam dilemas tanto éticos comojurídicos a todos os agentes de polícia, consti-tuindo as normas internacionais, que são bas-tante claras na matéria, um importante ponto dereferência tanto para estes últimos como para asinstituições policiais.

192. A exigência de uma conduta policial ética elícita significa essencialmente que os agentes poli-

ciais individualmente considerados e as organi-zações de polícia se devem esforçar por ser efica-zes e, ao mesmo tempo, por respeitar a lei, adignidade humana e os direitos humanos. Garan-tir a eficácia da acção policial é, em parte, uma ques-tão de competência profissional e técnica; mas,independentemente do nível de competência, esseobjectivo não poderá ser atingido sem o apoioactivo e a cooperação efectiva do público em geral.É mais fácil conseguir e manter tal apoio e coo-peração caso a actividade policial seja desenvolvidade forma lícita e humana. Uma polícia arbitrária,violenta e desrespeitadora da lei suscita o medo eo desprezo. Tal polícia não recebe, nem merece, oapoio do público.

• Inscreva-se em programas de formação contínua para compreendermelhor as competências que a lei lhes atribui e respectivas limitações.

• Lembre-se que a “obediência a ordens superiores” não poderá ser invo-cada para justificar violações graves de direitos humanos, tais como exe-cuções extrajudiciais e actos de tortura.

• Procure conhecer bem os procedimentos, tanto internos como externos,de queixa e denúncia.

• Denuncie as infracções à lei e as violações de direitos humanos.

• Organize acções de formação contínua a fim de garantir que todos os agen-tes policiais compreendem plenamente as suas competências legais e os direi-tos dos cidadãos.

• Através do exemplo e de uma boa prática de comando e gestão, assegure--se de que todos os agentes policiais respeitam a dignidade de todas as pes-soas.

• Assegure-se de que toda a política e estratégia policiais, bem como asordens dadas aos subordinados, têm em conta a exigência de proteger epromover os direitos humanos.

• Assegure-se de que todas as participações e queixas por violações dedireitos humanos são adequada e cabalmente investigadas.

• Elabore e aplique regulamentos internos que incorporem as normasinternacionais de direitos humanos.

• Elabore um código deontológico para o corpo de polícia a que pertence,incorporando as normas internacionais referidas no presente capítulo.

b. Normas internacionais sobre uma conduta policial lícita e conforme aos princípios éticos – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

RECOMENDAÇÕES DESTINADAS

A TODOS OS AGENTES POLICIAIS

}

}

Page 84: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 53

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

Os instrutores e formadores das forças policiais,sobretudo os que se ocupam dos novos agentes,deparam-se com o problema de as atitudes e osconhecimentos adquiridos nos programas de for-mação serem por vezes contrariados pelas atitudese comportamentos prevalecentes no seio da insti-tuição policial. Por outras palavras, a cultura da orga-nização pode ser hostil a algumas atitudes econhecimentos considerados desejáveis numagente de polícia. Isto é especialmente verdade noque diz respeito à formação policial em matéria dedireitos humanos.

O que pode ser feito para solucionar este problemapor parte dos:

a) Formadores e instrutores das forças policiais?

b) Comandantes e supervisores das forças policiais?

Elabore uma pequeno texto com os conselhos quedaria aos novos agentes colocados às suas ordensou sob a sua supervisão, sobre a forma comopodem ser polícias eficazes e ao mesmo tempo res-peitadores dos direitos humanos.

Exercício n.o

2

Imagine que foi nomeado para um comité encar-regado de elaborar um código deontológico para apolícia do seu país. Você deverá ter em conta:

a) O princípio do respeito pela dignidade inerenteà pessoa humana;

b) O Código de Conduta para os FuncionáriosResponsáveis pela Aplicação da Lei, das NaçõesUnidas;

c) As circunstâncias do seu país, nomeadamentequaisquer preocupações com a actual evolução dacriminalidade e com a actividade policial, e elabo-rar um código deontológico composto por diversosartigos, cada um dos quais seguido de um comen-

tário explicativo, para distribuição por todos osagentes policiais. O documento será também tor-nado público. Redija um instrumento que preen-cha os requisitos enunciados na presente hipótese.

Exercício n.o

3

O Princípio 1 dos Princípios Básicos sobre a Uti-lização da Força e de Armas de Fogo pelos Fun-cionários Responsáveis pela Aplicação da Lei exigeque os Governos e organismos responsáveis pelaaplicação da lei mantenham “sob permanente ava-liação as questões éticas ligadas à utilização daforça e de armas de fogo”.

1). Que práticas e procedimentos podem seradoptados a fim de manter as questões éticas liga-das à utilização da força e de armas de fogo sob per-manente avaliação?

2). Analise e descreva formas de abordar asquestões éticas relacionadas com a utilização daforça e de armas de fogo pela polícia no âmbitoda formação dos agentes policiais.

Exercício n.o

4

O Princípio 7, n.o 2, do Conjunto de Princípios paraa Protecção de Todas as Pessoas Sujeitas a QualquerForma de Detenção ou Prisão estabelece:

Os funcionários com razões para crer que ocorreuou está iminente uma violação do presente Con-junto de Princípios devem comunicar esse facto aosseus superiores e, sendo necessário, a outras auto-ridades ou instâncias competentes de controlo oude recurso.

1). Que dificuldades poderá um agente policialque faça uma denúncia desse tipo ter de enfren-tar dentro da instituição a que pertence?

2). Como podem essas dificuldades ser ultra-passadas?

3). Caso um agente policial tenha motivos paraacreditar que ocorreu uma violação do Conjunto dePrincípios, terá ele o direito de, em todas as cir-

Page 85: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

54 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

cunstâncias, levar a questão ao conhecimento deentidades estranhas à organização policial – porexemplo, à imprensa?

4). O que aconselharia aos novos agentes emfase de formação sobre a maneira de respondercaso sejam testemunhas de maus tratos cometi-dos por colegas seus contra detidos?

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). Que vantagens tem a afirmação de que os direi-tos humanos são inalienáveis e inerentes a todasas pessoas e não direitos concedidos pelos Estados?

2). Porque sentem alguns polícias existir umacerta incompatibilidade entre a aplicação da lei ea protecção dos direitos humanos?

3). O que pode ser feito para fazer desaparecer aideia presente em alguns polícias de que o respeitodos direitos humanos pode ser incompatível coma aplicação da lei?

4). Que utilidade têm os códigos adoptados anível internacional, tais como o Código de Condutapara os Funcionários Responsáveis pela Aplica-ção da Lei, para cada agente policial e organismoresponsável pela aplicação da lei?

5). Que procedimentos de gestão e supervisãopodem ser adoptados para garantir que todos os fun-cionários de polícia respeitam a obrigação de confi-dencialidade imposta pelo artigo 4.o do Código deConduta para os Funcionários Responsáveis pela Apli-cação da Lei?

6). O artigo 7.o do Código de Conduta para os Fun-cionários Responsáveis pela Aplicação da Leiproíbe que os agentes policiais cometam qualqueracto de corrupção. Como definiria um acto de cor-rupção? Indique as três condições que consideramais importantes para prevenir a corrupção noseio da polícia.

7). A utilização da força por parte da polícia con-tra uma pessoa levanta questões tanto éticas comojurídicas. Que nível de força terá um agente de exer-cer para que se coloquem tais questões? Por outraspalavras, pode a mais pequena utilização de forçacolocar questões no domínio da ética e da legali-dade, ou tal só acontecerá caso se verifiquemlesões corporais?

8). Uma vez que a polícia tem a obrigação decumprir as disposições da lei interna, que defineas competências das forças policiais e protege osdireitos humanos, qual a finalidade dos códigosdeontológicos adoptados nos diferentes países?

9). Na sua opinião, que qualidades deverá reunirum candidato ao ingresso na polícia, tendo emconta que deverá ser capaz de agir com eficácia eem conformidade com os princípios éticosenquanto agente policial?

10). Existem algumas vantagens na elaboração decódigos deontológicos distintos para as diferentescategorias de agentes policiais, por exemplo, para osfuncionários responsáveis pela investigação penal?Em que medida seria esse código distinto das dis-posições fundamentais do Código de Conduta paraos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Leidas Nações Unidas?

Page 86: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Segunda Parte 55

O papel da Polícianuma Sociedade democrática

09

• Sensibilizar os formadores e os formandos para as normas e concepçõesrelativas à actividade policial que sejam conformes aos princípios da ordemdemocrática, por confronto com os modelos baseados no autoritarismo.

• No exercício dos seus direitos e liberdades, cada pessoa está sujeita ape-nas às limitações estabelecidas pela lei.

• As limitações ao exercício dos direitos e liberdades serão apenas as neces-sárias para assegurar o reconhecimento e o respeito dos direitos dos outrose para satisfazer as justas exigências da moralidade, da ordem pública edo bem-estar numa sociedade democrática.

• Todos têm o direito de tomar parte na direcção dos negócios públicos doseu país, quer directamente, quer por intermédio de representantes livre-mente escolhidos.

• A vontade do povo constitui o fundamento da autoridade do poder político.

• A vontade do povo deve exprimir-se através de eleições honestas, a rea-lizar periodicamente por sufrágio universal e igual.

• Cada organismo responsável pela aplicação da lei deve ser representa-tivo da comunidade no seu conjunto, responder às suas necessidades eser responsável perante ela.

• Todas as pessoas têm direito à liberdade de opinião, expressão, reuniãoe associação.

• Todos os agentes policiais são parte integrante da comunidade e têm odever de a servir.

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

}

*capítulo

Page 87: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

a. Normas internacionais sobre direitoshumanos e actividade policial numa socie-dade democrática – Informação para as apre-sentações

1. INTRODUÇÃO

193. O termo “democracia” tem múltiplos sig-nificados e existem diversas formas degoverno democrático. Como este manual sedestina a ser utilizado no mundo inteiro, e dizrespeito aos direitos humanos e à aplicação dalei, há que interpretar esse termo em sentidomuito amplo e conforme consagrado em diver-sos instrumentos de direitos humanos.

194. Por exemplo, a maior parte dos PrincípiosFundamentais acima enunciados figuram naDeclaração Universal dos Direitos do Homem, cujoartigo 21.o estabelece que toda a pessoa tem direito:• de tomar parte na direcção dos negócios públi-cos do seu país, quer directamente, quer por inter-médio de representantes livremente escolhidos;• de acesso, em condições de igualdade, às funçõespúblicas do seu país.

O artigo 21.o refere ainda que:• a vontade do povo é o fundamento da autoridadedos poderes públicos;• esta vontade deve exprimir-se através de eleiçõeshonestas a realizar periodicamente;• as eleições serão realizadas por sufrágio univer-sal e igual, com voto secreto ou segundo processoequivalente que salvaguarde a liberdade de voto.

195. O Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos (artigo 25.o) consagra os mes-mos direitos:• direito de tomar parte na direcção dos negóciospúblicos, directa ou indirectamente;• direito de aceder, em condições gerais de igual-dade, às funções públicas do seu país;• direito de votar em eleições genuínas e perió-dicas.

NOTA PARA OS FORMADORES: Os seguintes ins-trumentos de direitos humanos de âmbito regio-

nal contêm disposições análo-gas:

Carta Africana dos Direitos doHomem e dos Povos – artigo 13.o:

Convenção Americana sobreDireitos Humanos – artigo 23.o;Protocolo n.o 1N.T.1 à Convenção Europeia dos Direitos do Homem – artigo 3.o.

Convém também fazer referência a estes textos,sempre que necessário.

196. A democracia está relacionada com doisoutros ideais importantes no domínio da aplicaçãoda lei:• o princípio do Estado de Direito;• a promoção e protecção dos direitos humanos.

De facto, estes três ideais são interdependentes, poisa melhor forma de proteger os direitos humanosconsiste em garantir a existência de processosdemocráticos eficazes e a manutenção do Estadode Direito; além disso, os textos de direitos huma-nos consagram direitos e liberdades que sãoessenciais tanto para os processos democráticoscomo para o Estado de Direito.

197. Um aspecto significativo da actividade policialnuma sociedade democrática que deverá ser refe-rido nestas observações iniciais é a questão do“policiamento democrático”. Este conceito éimportante, uma vez que a actividade policial é umdos meios através dos quais se governa umEstado. Como os processos e as formas de governodemocráticos constituem direitos humanos fun-damentais, a noção de policiamento democráticobaseia-se nestes direitos. Um dos requisitos deum policiamento democrático é a responsabili-dade da polícia perante a população que serve.

198. Os direitos essenciais numa democracia e opapel da polícia relativamente a esses direitos sãoquestões de que nos ocuparemos mais adiante,

56 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

N.T.1 Assinado por Portugal a22 de Setembro de 1976 eaprovado para ratificaçãopor Portugal pela Lein.o 65/78, de 13 de Outu-bro, publicada no Diário daRepública, I Série A,n.o 236/ /78. O aviso dedepósito do instrumento deratificação (aviso n.o 1/79,de 2 de Janeiro) encontra-sepublicado no Diário daRepública, I Série A, n.o

1/79. O instrumento de rati-ficação foi depositado juntodo Secretário-Geral do Con-selho da Europa a 9 deNovembro de 1978.

Page 88: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

assim como o policiamento democrático e seusrequisitos.

2. ASPECTOS GERAIS DA ACTIVIDADE POLICIAL

NUMA SOCIEDADE DEMOCRÁTICA

(a) Princípios fundamentais

199. Os princípios democráticos fundamentaisenunciados nos textos de direitos humanos sãoos seguintes:• participação directa e por intermédio de represen-tantes na direcção dos negócios públicos (de ondedecorre o direito de todas as pessoas de participar,directa ou indirectamente, no governo do seu país);• igualdade de acesso à função pública;• sufrágio universal e igual com base em eleiçõeslivres e periódicas;• respeito das liberdades fundamentais.

As normas específicas dos instrumentos de direi-tos humanos foram concebidas para tornar efecti-vos os princípios acima enunciados e serãoanalisadas em seguida.

(b) Disposições específicas sobre

a actividade policial numa sociedade

democrática

200. Os direitos essenciais aos processos políticosdemocráticos e aos princípios acima enumerados(que se encontram, eles próprios, consagrados em ins-trumentos de direitos humanos) são os seguintes:

[i] Direito à liberdade de pensamento,

consciência e religião

201. Este direito é protegido pela Declaração Uni-versal dos Direitos do Homem (artigo 18.o), PactoInternacional sobre os Direitos Civis e Políticos(artigo 18.o), Carta Africana dos Direitos doHomem e dos Povos (artigo 8.o), Convenção Ame-ricana sobre Direitos Humanos (artigo 12.o) e Con-venção Europeia dos Direitos do Homem (artigo 9.o).

202. A liberdade de consciência, bem como aliberdade de ter e de manifestar as suas convicções

são claramente importantes para que as pessoas,individualmente ou em grupo, possam concebere desenvolver ideias e ideais. Isto constitui, poroutro lado, um elemento fundamental dos pro-cessos políticos democráticos.

[ii] Direito à liberdade de opinião

e de expressão

203. Este direito é protegido pela Declaração Uni-versal dos Direitos do Homem (artigo 19.o), PactoInternacional sobre os Direitos Civis e Políticos(artigo 19.o), Carta Africana dos Direitos do Homeme dos Povos (artigo 9.o), Convenção Americanasobre Direitos Humanos (artigo 13.o) e ConvençãoEuropeia dos Direitos do Homem (artigo 10.o).

204. A liberdade de opinião é indispensável aos pro-cessos políticos, da mesma forma que a liberdadede consciência. A possibilidade de comunicar pen-samentos e opiniões é mais um dos elementosnecessários ao exercício da democracia.

[iii] Direitos à liberdade de reunião

e de associação pacíficas

205. Estes direitos são protegidos pela DeclaraçãoUniversal dos Direitos do Homem (artigo 20.o),Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Polí-ticos (artigos 21.o e 22.o), Carta Africana dos Direi-tos do Homem e dos Povos (artigos 10.o e 11.o),Convenção Americana sobre Direitos Humanos(artigos 15.o e 16.o) e Convenção Europeia dosDireitos do Homem (artigo 11.o).

206. As actividades políticas só podem ser desen-volvidas em associação com outras pessoas e a par-tir do momento em que existam instâncias para acomunicação de ideias, propostas e estratégias. Porestes motivos, os direitos à liberdade de reunião ede associação pacíficas são tão importantes quantoos direitos referidos nas rubricas precedentes.

NOTA PARA OS FORMADORES: 1. A liberdade de reu-nião pacífica é referida no princípio 12 dos Prin-cípios Básicos sobre a Utilização da Força e deArmas de Fogo pelos Funcionários Responsáveispela Aplicação da Lei. Esse princípio, bem como

Conceitos Fundamentais* 57

Page 89: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

os dois que se lhe seguem, relativos à utilização daforça em caso de reuniões ilegais e em caso de reu-niões violentas, respectivamente, aparecem repro-duzidos no capítulo XV, secção A.2 (e), infra, quese ocupa dos distúrbios internos.

2. Na introdução ao presente capítulo, foramidentificados os três ideais interdependentes dademocracia, Estado de Direito e protecção dosdireitos humanos. Após examinarmos os direitosessenciais à democracia, cabe agora referir osdireitos essenciais ao Estado de Direito. Deles sãoexemplos o direito à presunção da inocência e odireito a um julgamento equitativo em caso dededução contra a pessoa de qualquer acusação emmatéria penal. Estes direitos são protegidos pelaDeclaração Universal dos Direitos do Homem(artigos 10.o e 11.o), Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (artigo 14.o), CartaAfricana dos Direitos do Homem e dos Povos(artigo 7.o), Convenção Americana sobre DireitosHumanos (artigo 8.o) e Convenção Europeia dosDireitos do Homem (artigo 6.o). Outros exemplospodem ser encontrados e, na verdade, pode enten-der-se que todos os chamados “direitos civis”reforçam o Estado de Direito.

(c) Os direitos políticos e o papel da polícia

207. Os direitos políticos acima enunciados, con-sagrados em normas internacionais juridicamentevinculativas para os Estados Partes nos diversos tra-tados, têm implicações na actividade e prática poli-ciais. Para que possam ser exercidos, é necessárioque a polícia adopte uma série de medidas, infraindicadas na secção B.1: “Medidas práticas para aaplicação das normas internacionais”. Porém, éconveniente considerar nesta fase o importantepapel desempenhado pela polícia no que diz res-peito aos direitos políticos.

208. Em muitos aspectos, a polícia pode ser con-siderada como uma promotora dos direitos polí-ticos, permitindo que estes sejam exercidos pelosindivíduos. Isto significa:• assegurar um justo equilíbrio entre a ordempública e o exercício de tais direitos pelas pessoase grupos de pessoas;

• manter a imparcialidade e não discriminar entreas pessoas e os grupos que pretendem exercer taisdireitos.

209. De uma forma mais geral, a polícia deverá man-ter a ordem social (paz e tranquilidade sociais) paraque os processos políticos possam ser conduzidosem conformidade com a Constituição e com a lei ede forma a que os direitos políticos indispensáveisa esses processos possam ser exercidos. De facto, oartigo 28.o da Declaração Universal proclama:

Toda a pessoa tem direito a que reine, no planosocial e no plano internacional, uma ordem capazde tornar plenamente efectivos os direitos e asliberdades enunciados na presente Declaração.

A manutenção da ordem social é uma das princi-pais funções da polícia.

(d) Disposições específicas sobre actividade policial

e eleições democráticas

210. A polícia e as forças de segurança desempe-nham um duplo papel nos processos eleitorais. A eficaz administração da justiça em período eleitoral exige um equilíbrio entre, por um lado,a necessidade de segurança e manutenção daordem durante o período eleitoral e, por outro, anecessidade de não atentar contra os direitos doscidadãos e de garantir um ambiente livre de inti-midação. O Código de Conduta para os Funcio-nários Responsáveis pela Aplicação da Lei impõea todos os agentes da ordem a obrigação de servira comunidade. Esta noção exige necessariamenteque as forças de segurança se esforcem por garan-tir que todos os cidadãos participem em eleiçõesque sejam regulares no plano administrativo etenham lugar ao abrigo de qualquer intervenção sus-ceptível de colocar entraves à livre expressão da von-tade popular.

211. O Código de Conduta estabelece também que“os funcionários responsáveis pela aplicação dalei devem respeitar e proteger a dignidadehumana, manter e apoiar os direitos fundamentaisde todas as pessoas” (artigo 2.o), o que abrange, nãosó o direito de participar em eleições, mas todos

58 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 90: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

os direitos humanos. As instituições policiais quenão respeitam os direitos humanos fundamentaisarriscam-se a criar uma atmosfera de intimidaçãoinibidora do eleitorado e, assim, subverter a vera-cidade da eleição.

212. Para além disso, em conformidade com oCódigo de Conduta, os funcionários responsáveispela aplicação da lei devem “opor-se rigorosa-mente e combater” qualquer acto de corrupção(artigo 7.o). Assim, eles estão claramente obrigadosa impedir quaisquer tentativas de fraude eleitoral,falsificação de identidade, suborno, intimidação etodos os outros actos que possam afectar a vera-cidade dos resultados eleitorais. O Código estabe-lece ainda que os funcionários responsáveis pelaaplicação da lei “não devem cometer qualquer actode corrupção” (artigo 7.o). Esta obrigação reveste--se da maior importância, dada a tendência deassociar a polícia e as forças de segurança com umaou outra das partes nos processos eleitorais em cer-tos países. Por último, e com o objectivo de asse-gurar a imparcialidade das forças de segurança, opapel da polícia na manutenção da ordem emperíodo eleitoral subordina-se frequentemente aodos supervisores eleitorais.

213. No caso dos serviços nacionais de polícia, osagentes presentes nos locais de recenseamentoou de voto devem agir de forma discreta, profis-sional e disciplinada. Em geral, isto exige que, emcada local, sejam colocados funcionários de polí-cia e segurança no número mínimo necessáriopara assegurar a segurança do espaço em causa.Este “número mínimo necessário” é geralmentedeterminado em conjunto com os supervisoreseleitorais. Em caso algum a polícia deverá estar posi-cionada de forma a impedir o legítimo acesso aolocal de voto, intimidar os eleitores ou desencora-jar a sua participação.

214. Em geral, solicita-se aos contingentes depolícia civil (CIVPOL) das operações de manu-tenção da paz que adoptem uma postura umpouco diferente. O seu mandato compreendealguns elementos de reforço da confiança e aprópria visibilidade desses funcionários noslocais de recenseamento e de voto pode contribuir

para inspirar a confiança dos votantes na neu-tralidade, regularidade e segurança do processo.Os agentes da CIVPOL devem, como é evidente,comportar-se de forma absolutamente objectivae, tal como os seus colegas da polícia nacional,demonstrar o mais alto grau de disciplina e pro-fissionalismo.

215. Tanto os funcionários nacionais de políciacomo os agentes da CIVPOL têm por missão con-tribuir para uma verdadeira e manifesta atmosferade ordem e segurança, comportando-se com objec-tividade e defendendo os direitos das partes, doscandidatos, dos votantes e do público em geral,durante os períodos eleitorais.

(e) Disposições específicas sobre

uma actividade policial democrática

216. Na sua resolução 34/169, de 17 de Dezembrode 1979, pela qual adoptou o Código de Conduta paraos Funcionários Responsáveis pela Aplicação daLei, a Assembleia Geral declarou que como qualquerórgão do sistema de justiça penal, todos os órgãosde aplicação da lei devem ser representativos dacomunidade no seu conjunto, responder às suasnecessidades e ser responsáveis perante ela […]

Uma polícia representativa, receptiva às necessi-dades da comunidade e responsável perante ela, poroutras palavras, uma actividade policial democrá-tica, é fundamental numa democracia.

[i] Polícia representativa

217. Isto significa que a polícia deve assegurar-sede que os seus agentes são suficientemente repre-sentativos da comunidade que servem. Os gruposminoritários devem estar adequadamente repre-sentados dentro das instituições policiais,mediante políticas de recrutamento justas e não dis-criminatórias e de medidas destinadas a permitirque os membros de tais grupos desenvolvam asua carreira no seio dos organismos em causa.

218. Além disso, a polícia deve ter em conta acomposição do pessoal ao seu serviço em termosqualitativos, bem como quantitativos. Isto significa

Conceitos Fundamentais* 59

Page 91: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

60 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

garantir, não só que os efectivos policiais existemem número suficiente e são devidamente repre-sentativos da população, mas também que osagentes têm a vontade e a capacidade de exercer asua missão no quadro de um sistema políticodemocrático.

[ii] Polícia receptiva às necessidades

da comunidade

219. Para este fim, a polícia deve conhecer asnecessidades e expectativas do público e sabercomo lhes dar resposta. É evidente que a popula-ção necessita e espera que a polícia:• previna as infracções e, caso elas sejam cometi-das, descubra os seus autores;• mantenha a ordem pública.

Estas são, porém, necessidades e expectativasmuito genéricas. A polícia deverá também ter emconsideração:• a forma como a população deseja que essesobjectivos sejam alcançados (por exemplo, demaneira lícita e humana);• as necessidades e expectativas específicas de cadapopulação num dado momento e em determinadolugar.

Compete aos comandantes das forças policiaiscompreender as necessidades e expectativas dacomunidade que servem, fazer a sua própria ava-liação profissional e ter ambos os factores emconta na definição das políticas e estratégias deactuação policial.

220. Um outro aspecto da actividade policialreceptiva às necessidades da comunidade – que serelaciona com a noção de actividade policial res-ponsável – é a necessidade de que os actos dos agen-tes da polícia fiquem sujeitos ao escrutíniopúblico. No parágrafo d) do preâmbulo da resolu-ção 34/169 da Assembleia Geral sugerem-se algu-mas formas de garantir o exercício deste tipo decontrolo. Entre elas, incluem-se o controlo porparte de uma comissão de avaliação, ministério,órgão especializado, poder judicial, provedor,comité de cidadãos, ou qualquer combinação detodos estes métodos.

[iii] Polícia responsável

221. Este objectivo pode ser alcançado de três prin-cipais formas:• legalmente – tal como todos os indivíduos e ins-tituições nos países onde vigora o princípio doEstado de Direito, os polícias são responsáveisperante a lei;• politicamente – a polícia é responsável perante apopulação que serve, através das instituições políticasdemocráticas do Estado. Desta forma, as suas políti-cas e práticas no domínio da aplicação da lei e manu-tenção da ordem ficam sujeitas ao controlo público;• economicamente – a polícia é responsável pelaforma como utiliza os recursos que lhe são atri-buídos. Este aspecto vai além do controlo das suasprincipais funções no domínio da aplicação da lei,constituindo uma forma suplementar de controlodemocrático sobre todos os escalões de comando, ges-tão e administração de uma instituição policial.

222. É também possível encontrar métodos decontrolo mais informais a nível local, por exemplomediante a criação de grupos de ligação entre a polí-cia e os cidadãos. Por outro lado, esta forma de con-trolo pode funcionar como um meio capaz depermitir à polícia conhecer e dar resposta à neces-sidades locais imediatas.

3. OBSERVAÇÕES FINAIS

223. A análise da actividade policial numa sociedadedemocrática destaca os aspectos políticos destaactividade. Esta pode ser uma área sensível e difí-cil, pelas seguintes razões:

a) algumas circunstâncias dos países em processode transição para formas de governo democráticascolocam dificuldades especiais à polícia. Nestassituações, a polícia tem de estar particularmenteconsciente da necessidade de permanecer impar-cial e de adoptar uma atitude não discriminatória;

b) em países com uma longa tradição democrá-tica, existe a tendência para ignorar e minimizaros aspectos políticos da actividade policial, ten-dência essa que resulta, em parte, da preocupação

Page 92: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 61

da própria polícia de se manter independente eimparcial. Isto pode levar a alguma ingenuidadena abordagem de situações altamente politizadas.

Contudo, em sentido bastante amplo, a activi-dade policial é por vezes uma actividade vinca-damente política. Há que garantir que a acção dasforças policiais se mantém independente e

imparcial. Para que isto seja conseguido, todos osagentes da polícia devem ter consciência de quenão estão ao serviço de qualquer Governo ouregime em particular.

224. O fundamento de toda a actividade policialreside na Constituição e na lei. A polícia está ao ser-viço do Estado de Direito e dos fins da justiça.

• Demonstre independência política e imparcialidade em todas as oca-siões.

• Conheça a população da comunidade onde exerce as suas funções.

• Aproxime-se da comunidade. Regra geral, não permaneça na esquadracaso possa fazer a patrulha de automóvel e não faça o patrulhamento deautomóvel caso o possa fazer a pé.

• Ofereça-se como voluntário para missões de serviço à comunidade.

• Em locais de voto, no decorrer de missões de segurança eleitoral, reúna--se primeiro com os responsáveis pelas operações eleitorais e mantenha umaatitude discreta, disciplinada e profissional perante os votantes.

• Quando lhe forem atribuídas missões de policiamento em concentraçõese manifestações políticas, dê provas de tolerância e lembre-se de que os objec-tivos da segurança pública e da prevenção de conflitos devem prevalecer sobreos restantes.

b. Normas internacionais sobre direitos humanos e actividade policial numa sociedadedemocrática – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

}

}

Page 93: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

62 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

Uma das mais importantes obrigações da polícianuma sociedade democrática consiste em perma-necer politicamente imparcial e independente.

Tendo presente esta exigência, deverão os agentespoliciais ser autorizados a:

a) votar?b) pertencer a partidos políticos?c) pertencer a associações sindicais?

d) manifestar opiniões políticas?e) escrever cartas para o correio de leitores de umjornal?

Para fins de debate, imagine que é membro de umgrupo de trabalho encarregado da elaboração de umconjunto de directrizes destinadas aos agentespoliciais sobre a forma de se manterem politica-mente imparciais. As directrizes serão utilizadasna formação dos novos agentes e para recordaraos agentes em serviço as suas obrigações a tal res-peito. Estas directrizes deverão consistir numasérie de conselhos práticos destinados a orientara acção dos agentes no desempenho das suas fun-

• Recomendações destinadas a todos os funcionários com responsabilida-des de comando e supervisão

• Defina e aplique, no âmbito da instituição policial, políticas e estratégiasbaseadas no respeito pelo governo democrático.

• Introduza, no seio da comunidade, estratégias de acção policial que impli-quem o estabelecimento de uma relação de parceria entre a polícia e a comu-nidade e façam com que a polícia seja vista como parte integrante dessamesma comunidade.

• Realize consultas públicas para apurar as necessidades específicas dacomunidade local e adopte medidas a fim de responder a essas necessida-des. Institua programas de relações públicas que estimulem a cooperaçãoentre a polícia e a comunidade.

• Assegure-se de que os membros da instituição policial são representati-vos da comunidade no seu todo mediante a adopção de políticas e práti-cas de recrutamento e gestão justas e não discriminatórias.

• Estabeleça procedimentos de recrutamento e programas de formação des-tinados a recrutar para a organização e a manter no seu seio agentesdesejosos e capazes de responder às exigências de uma actividade policialdemocrática sob a autoridade de um governo democrático.

• Estabeleça laços de cooperação estreitos com as autoridades responsá-veis pelas operações eleitorais, dirigentes sindicais e organizações não gover-namentais.

• Sempre que possível, coloque agentes em missões de segurança eleitoralde acordo com as necessidades apuradas pelas autoridades responsáveis pelasoperações eleitorais.

• Coloque o número mínimo necessário de funcionários nas missões de segu-rança eleitoral.

• Crie um mecanismo acessível ao público para a apresentação de queixae sugestões e para a comunicação de inquietações.

Objectivos do capítulo

}

}

Page 94: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 63

ções, assim como no âmbito das suas vidas priva-das. Qual deverá ser o conteúdo dessas directrizes?

Exercício n.o

2

Na resolução 34/169 da Assembleia Geral, pela qualfoi adoptado o Código de Conduta para os Funcioná-rios Responsáveis pela Aplicação da Lei, declara-se:

[…] como qualquer órgão do sistema de justiçapenal, todos os órgãos de aplicação da lei devemser representativos da comunidade no seu con-junto, responder às suas necessidades e ser res-ponsáveis perante ela,

1). De que formas pode um organismo respon-sável pela aplicação da lei ser representativo dacomunidade no seu conjunto?2). Uma forma de assegurar que o organismo érepresentativo da comunidade no seu conjuntoconsiste em recrutar para os seus quadros umnúmero proporcional e representativo dos mem-bros dos grupos minoritários existentes no seio dasociedade. Tendo presente esta consideração:

a) identifique um grupo minoritário presentena sua comunidade que não esteja devidamenterepresentado dentro do seu organismo;

b) indique os obstáculos que se colocam à ade-quada representação desse grupo no seio do orga-nismo no momento presente;

c) considere formas de ultrapassar esses obstá-culos e defina as linhas gerais da estratégia parao conseguir.

Exercício n.o

3

Na resolução 34/169 da Assembleia Geral, pela qualfoi adoptado o Código de Conduta para os Funcioná-rios Responsáveis pela Aplicação da Lei, declara-se:

[…] como qualquer órgão do sistema de justiçapenal, todos os órgãos de aplicação da lei devemser representativos da comunidade no seu con-junto, responder às suas necessidades e ser res-ponsáveis perante ela,

1). De que formas pode um organismo respon-sável pela aplicação da lei responder às necessidadesda comunidade e ser responsável perante ela?

2). Responder às necessidades da comunidade sig-nifica conhecer essas necessidades e encontraruma forma de as satisfazer. De que formas podeum organismo responsável pela aplicação da leitomar conhecimento das necessidades da comu-nidade?

3). Os funcionários superiores de polícia são res-ponsáveis pelo comando e pela gestão das insti-tuições policiais. São também responsáveis pelocomando estratégico das actividades operacionais.De que forma podem as exigências de responderàs necessidades da comunidade e ser responsávelperante ela afectar tais responsabilidades?

Exercício n.o

4

Tendo em conta as obrigações da polícia de:

• assegurar um policiamento eficaz;• respeitar e proteger os direitos humanos;• permanecer representativa da comunidade noseu conjunto, responder às suas necessidades e serresponsável perante ela:

a) Que qualidades e características pessoaisdeverá possuir um agente policial?

b) Que qualidades e características são indese-jáveis?

c) Que métodos e técnicas podem ser utilizadospara identificar as qualidades e característicasdesejáveis e indesejáveis nos candidatos aoingresso nas forças policiais?

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). Considere as diferenças entre a actividadepolicial no seio de uma sociedade democrática e aactividade policial no seio de uma sociedade nãodemocrática. Indique as cinco diferenças que con-sidere mais significativas.

Page 95: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

64 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

2). O artigo 21.o da Declaração Universal dosDireitos do Homem consagra o direito de todas aspessoas de participarem na direcção dos negóciospúblicos do seu país, quer directamente quer atra-vés de representantes livremente escolhidos. De queformas pode este direito político reforçar a protecçãode outros direitos civis e políticos?

3). O que entende pela expressão “Estado deDireito”? Por que razão é importante que todas aspessoas e instituições do Estado se subordinem aoprincípio do Estado de Direito?

4). Quando o princípio do Estado de Direito pre-valece num país, de que forma isso promove eprotege os direitos humanos?

5). Pense em formas de a polícia proteger odireito à liberdade de pensamento, consciência ereligião no seio de uma sociedade. Indique ascinco formas que considere mais importantes.

6). Pense em formas de a polícia proteger odireito à liberdade de opinião e de expressão no seiode uma sociedade. Indique as cinco formas que con-sidere mais importantes.

7). Pense em formas de a polícia proteger odireito à liberdade de reunião e de associação noseio de uma sociedade. Indique as cinco formas queconsidere mais importantes.

8). De que forma pode a polícia desempenhar oseu papel da melhor maneira durante os períodoseleitorais, de maneira independente e imparcial epor forma a manter a ordem, a segurança e a pazdurante o escrutínio? Deverá a polícia apoiarpublicamente as campanhas eleitorais dos candi-datos que defendem políticas firmes em matériade lei e de ordem?

9). Pense no sistema em vigor no seu país pararesponsabilizar a polícia perante a comunidadeque serve através de instituições políticas demo-cráticas. É satisfatório? Em caso negativo, que defi-ciências tem? Como poderá ser aperfeiçoado?

10). Embora seja fundamental que a polícia res-ponda perante a comunidade através de instituiçõespolíticas democráticas, é também essencial que ospolíticos não interfiram nas operações quotidianasda polícia. Porque é indispensável que a polícia man-tenha esta forma de independência operacional?

Page 96: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Segunda Parte 65

Políciae não discriminação

• Familiarizar a polícia com as exigências legais de uma conduta não dis-criminatória e sensibilizá-la para os efeitos nefastos das atitudes discrimi-natórias.

• Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direi-tos.

• Os direitos humanos derivam da dignidade inerente à pessoa humana.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão cumprir, emtodas as ocasiões, os deveres que a lei lhes impõe, servindo a comunidadee protegendo todas as pessoas contra os actos ilegais.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão respeitar eproteger a dignidade humana e defender e garantir os direitos humanosde todas as pessoas.

• Todas as pessoas são iguais perante a lei e têm direito, sem discrimina-ção, à igual protecção da lei.

• Ao proteger e servir a comunidade, a polícia não deverá discriminar ile-galmente com base na raça, no sexo, na religião, na língua, na cor, na opi-nião política, na origem nacional, na fortuna, no nascimento ou emqualquer outra condição.

• Não será considerada discriminação ilegal a aplicação por parte da polí-cia de determinadas medidas especiais concebidas para atender à especialcondição e necessidades das mulheres (incluindo mulheres grávidas e mãesde crianças de tenra idade), menores, doentes, idosos e outras pessoas quenecessitem de tratamento especial em conformidade com as normas inter-nacionais de direitos humanos.

• As políticas de recrutamento, contratação, colocação e promoção adop-tadas pelas instituições policiais não deverão admitir qualquer forma de dis-criminação ilegal.

10

Objectivos do capítulo

}

}Princípios fundamentais

}

}

*capítulo

Page 97: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

a. Normas internacionais sobre não discriminação – Informação para as apresentações

1. INTRODUÇÃO

225. Na Carta das Nações Unidas, os Estados Mem-bros reafirmam a sua fé nos direitos humanos fun-damentais, na dignidade e no valor da pessoahumana e na igualdade de direitos entre homens emulheres. Comprometeram-se também a promovere estimular o respeito pelos direitos humanos epelas liberdades fundamentais para todos, sem dis-tinção quanto à raça, sexo, língua ou religião.

226. O artigo 2.o da Declaração Universal dosDireitos do Homem dispõe que:

Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as

liberdades proclamados na presente Declaração, sem dis-

tinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo,

de língua, de religião, de opinião política ou outra, de

origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento

ou de qualquer outra situação.

[…]

227. Diversos tratados em matéria de direitoshumanos obrigam os Estados Partes a respeitar egarantir a todos, sem discriminação, os direitosneles consagrados. Por exemplo, o artigo 2.o, n.o 1, do Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos estabelece:

Cada Estado Parte no presente Pacto compromete-se a

respeitar e a garantir a todos os indivíduos que se

encontrem nos seus territórios e estejam sujeitos à sua

jurisdição os direitos reconhecidos no presente Pacto,

sem qualquer distinção, derivada, nomeadamente, de

raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião

política, ou de qualquer outra opinião, de origem

nacional ou social, de propriedade ou de nascimento,

ou de outra situação.

228. Uma vez que os Estados cumprem, ou não, assuas obrigações jurídicas internacionais atravésda acção dos funcionários que agem em seunome, é claramente importante que os agentes

policiais compreendam e respeitem o princípiofundamental da não discriminação. É tambémimportante que os polícias compreendam as dis-posições dos textos internacionais de direitoshumanos, bem como da legislação nacional, queprocuram tornar efectivo esse princípio.

229. O presente capítulo analisa as normas inter-nacionais relativas à não discriminação, fazendoparticular referência às mais significativas noâmbito do processo de aplicação da lei e manu-tenção da ordem.

2. ASPECTOS GERAIS DA NÃO DISCRIMINAÇÃO

(a) Princípios fundamentais

230. A não discriminação constitui, em si própria,um princípio fundamental, essencial à promoçãoe protecção de todos os direitos humanos e liber-dades fundamentais. Todos os membros da famí-lia humana têm direitos iguais e inalienáveis.Estes direitos derivam da dignidade e valor inerentesà pessoa humana e têm carácter universal.

231. A não discriminação relaciona-se com osseguintes três princípios fundamentais:• igualdade de direitos;• inalienabilidade dos direitos;• universalidade dos direitos.

(b) Disposições específicas sobre

a não discriminação

232. Todas as disposições concretas que passamosa enunciar têm relevância directa no domínio daaplicação da lei ou da actividade policial em geral:

[i] Direito ao reconhecimento

da personalidade jurídica

233. Este direito está consagrado no artigo 6.o daDeclaração Universal dos Direitos do Homem,que dispõe:

Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento em

todos os lugares da sua personalidade jurídica.

66 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 98: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Encontra-se expresso em termos praticamenteidênticos no Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos (artigo 16.o) e na Convenção Ame-ricana sobre Direitos Humanos (artigo 3.o).O artigo 5.o da Carta Africana dos Direitos doHomem e dos Povos garante o direito ao reco-nhecimento da personalidade jurídica.

234. Este direito aplica-se a “todos os indivíduos”,sendo o reconhecimento da personalidade jurí-dica fundamental num sistema que protege osdireitos humanos através da lei. A negação destedireito pode conduzir à negação de outros direitos.Exige-se, pois, que a personalidade jurídica seja ple-namente reconhecida a todos os cidadãos de umEstado, em condições de igualdade.

[ii] Direito à igualdade perante a lei

235. Este direito é protegido pelo artigo 7.o daDeclaração Universal dos Direitos do Homem,segundo o qual:

Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm

direito a igual protecção da lei. Todos têm direito a pro-

tecção igual contra qualquer discriminação que viole a

presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal

discriminação.

236. O Pacto Internacional sobre os Direitos Civise Políticos contém disposições similares e exige quea lei proíba a discriminação por motivos de, nomea-damente, raça, cor, sexo, língua e religião (artigo 26.o);a Carta Africana dos Direitos do Homem e dosPovos estabelece que todas as pessoas beneficiam deuma total igualdade perante a lei e têm direito a umaigual protecção da lei (artigo 3.o); e a ConvençãoAmericana sobre Direitos Humanos dispõe nomesmo sentido, acrescentando no entanto que essedireito deverá ser reconhecido a todas as pessoas“sem discriminação” (artigo 24.o).

237. Estes requisitos são muito significativos emtermos de policiamento, uma vez que determi-nam que, na aplicação da lei, a polícia deve concederuma protecção igual a todos. Não deverá assimhaver qualquer discriminação de natureza adversaaquando da aplicação da lei.

[iii] Direito a um julgamento equitativo

238. Este direito é protegido pelo artigo 10.o daDeclaração Universal dos Direitos do Homem,que estabelece:

Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a

sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um

tribunal independente e imparcial que decida dos seus

direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusa-

ção em matéria penal que contra ela seja deduzida.

239. O Pacto Internacional sobre os Direitos Civise Políticos (artigo 14.o), a Carta Africana dos Direi-tos do Homem e dos Povos (artigo 7.o), a Conven-ção Americana sobre Direitos Humanos (artigo 8.o)e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem(artigo 6.o) garantem o direito a um julgamentoequitativo. Acrescentam também alguns requisitosdestinados a garantir essa finalidade. Muito impor-tante, neste contexto, é o facto de estabeleceremque este direito se aplica a “todas as pessoas”, ou a“toda a pessoa” ou a “qualquer pessoa” ou a “todos”.

240. Embora tais disposições imponham obrigaçõesaos tribunais e sistemas jurídicos em geral, éimportante lembrar que uma conduta contrária àética, ilegal ou discriminatória da parte da políciapode comprometer o direito a um julgamentoequitativo. Para que o processo seja justo, é neces-sário que os tribunais possam analisar provasautênticas e imparciais, obtidas por meios lícitose conformes aos princípios éticos. Esta é uma dascondições necessárias para garantir o direito detodas as pessoas a um processo equitativo.

[iv] Direito de acesso à função pública em condiçõesde igualdade

241. Este direito relaciona-se com o direito de todaa pessoa a tomar parte na direcção dos negóciospúblicos do seu país e com o direito de voto em eleições livres e genuínas. Está consagrado noartigo 21.o, n.o 2, da Declaração Universal dosDireitos do Homem, que dispõe:

Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de

igualdade, às funções públicas do seu país.

Conceitos Fundamentais* 67

Page 99: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

242. O artigo 25.o, alínea c), do Pacto Internacio-nal sobre os Direitos Civis e Políticos estabelece quetodos os cidadãos têm direito de aceder “em con-dições gerais de igualdade” à função pública do seupaís. Este direito é igualmente reconhecido naCarta Africana dos Direitos do Homem e dosPovos (artigo 13.o) e na Convenção Americanasobre Direitos Humanos (artigo 23.o). Todos estesartigos consagram o direito de participar nosnegócios públicos ou no governo do país, bemcomo o direito a eleições livres e honestas. Estesdireitos deverão ser garantidos sem discriminaçãoa “todos os cidadãos”.

243. A actividade policial é uma função públicaimportante. Todos os cidadãos devidamente qualifi-cados, e que o desejem fazer, deverão ter a oportu-nidade de aceder a essa função e de nela participar.O ingresso nas corporações de polícia de um paísdeverá depender exclusivamente das qualificações,aptidões para o desempenho da função e compe-tência dos candidatos. Ninguém deverá ser excluídocom base apenas na respectiva raça, cor ou sexo.

[v] Incitamento à discriminação

244. O artigo 20.o, n.o 2, do Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos estabelece:

Todo o apelo ao ódio nacional, racial e religioso que cons-

titua uma incitação à discriminação, à hostilidade ou à

violência deve ser interditado pela lei.

Esta obrigação dos Estados Partes no Pacto signi-fica que lhes incumbe adoptar e reforçar legislaçãoque proíba o incitamento à discriminação nos ter-mos enunciados nesse artigo.

245. Conforme acima indicado, o artigo 7.o daDeclaração Universal dos Direitos Humanos con-sagra o direito a igual protecção contra qualquerdiscriminação que viole a Declaração e contraqualquer incitamento a tal discriminação.

246. As normas da Declaração Universal têm clarasimplicações no domínio da aplicação da lei, pois quandoos Estados adoptam legislação em conformidade comessas normas, incumbe à polícia aplicá-las.

247. Dada a gravidade dos actos que infringem essalegislação, as suas consequências negativas sobre osdireitos humanos e o risco de a incitação à discrimi-nação, à hostilidade ou à violência poder conduzir agraves situações de distúrbio civil, a resposta da polí-cia a essas infracções deverá ser rápida e eficaz.

[vi] Derrogação das obrigações durante

os estados de emergência

248. O artigo 4.o do Pacto Internacional sobre osDireitos Civis e Políticos permite aos Estados toma-rem medidas que derroguem algumas das obriga-ções assumidas em virtude do Pacto em situaçõesde emergência pública que ameacem a existênciada nação. Estes estados de emergência devem seroficialmente declarados e as medidas derrogató-rias adoptadas dever-se-ão limitar às estritamenteexigidas pela situação. Além do mais, tais medidas:• não deverão ser incompatíveis com outras obriga-ções impostas ao Estado pelo direito internacional;• não deverão envolver uma discriminação fun-dada unicamente na raça, na cor, no sexo, na lín-gua, na religião ou na origem social.

Alguns artigos não podem ser objecto de derro-gação, nomeadamente os que protegem o direitoà vida e a proibição da tortura e dos maus tratos.

249. Disposições semelhantes figuram no artigo 27.o

da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.(As normas derrogatórias constantes do artigo 15.o

da Convenção Europeia dos Direitos do Homem nãofazem qualquer referência específica à questão dadiscriminação).

250. A exigência de que as medidas de derrogação nãosejam discriminatórias reveste-se de considerávelimportância. As situações de emergência pública sãomuitas vezes declaradas em períodos de tensão e desor-dem civil. Nessas circunstâncias, um Governo pode,por exemplo, considerar necessário reforçar os pode-res da polícia em matéria de captura, assim derrogandoas normas dos tratados que protegem o direito à liber-dade e segurança da pessoa. Caso sejam adoptadasmedidas nesse sentido, é fundamental que os pode-res suplementares atribuídos à polícia sejam exerci-dos rigorosamente dentro dos limites impostos por lei

68 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 100: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

e sem discriminação. O exercício ilegal ou discrimina-tório das competências policiais em períodos de ten-são e desordem civil pode contribuir significativamentepara o exacerbar dessa mesma tensão e desordem.

251. A questão das medidas derrogatórias seráanalisada em maior detalhe no capítulo XV sobreDistúrbios Internos, Estados de Excepção e Con-flitos Armados.

(c) Disposições de instrumentos

com especial relevância no domínio

da aplicação da lei

[i] Código de Conduta para os Funcionários Res-

ponsáveis pela Aplicação da Lei

252. Os artigos 1.o, 2.o e 8.o do Código relacionam--se com a questão da discriminação.

253. O artigo 1.o estabelece que os funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei devem servir a comu-nidade e proteger todas as pessoas contra actos ilegais.O artigo 2.o exige-lhes que protejam a dignidade humanae que mantenham e defendam os direitos fundamentaisde todas as pessoas. O artigo 8.o estabelece que os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei devem res-peitar a lei e o próprio Código de Conduta.

254. A referência a “todas as pessoas” constante dosartigos 1.o e 2.o exclui claramente qualquer hipótesede discriminação, enquanto que as normas do artigo8.o significam que quaisquer disposições legais queproíbam a discriminação, bem como as disposiçõesdo próprio Código de Conduta, devem ser respeitadas.

[ii] Princípios Básicos sobre a Utilização

da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários

Responsáveis pela Aplicação da Lei

255. O princípio 5 deste instrumento refere-se asituações em que é inevitável a utilização da forçae de armas de fogo por parte da polícia.

256. Nos termos do princípio 5 b), a polícia deveráesforçar-se por reduzir ao mínimo os danos e lesõese respeitar e preservar a vida humana. O princípio5 c) exige que a polícia assegure a prestação de

assistência e socorros médicos às pessoas feridasou afectadas, tão rapidamente quanto possível. Istosignifica que existe uma obrigação geral de res-peitar a vida humana – toda a vida humana – e degarantir a prestação de assistência médica.

NOTA PARA OS FORMADORES: Este instrumentoserá analisado em maior detalhe no capítulo XIV,sobre Utilização da Força e de Armas de Fogo.

[iii] Conjunto de Princípios para a Protecção de

Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de

Detenção ou Prisão

257. O Princípio 1 impõe que todas as pessoassujeitas a qualquer forma de detenção ou prisãosejam tratadas de forma humana e com respeitopela dignidade inerente à pessoa humana.

258. O Princípio 5, n.o 1, exige que o Conjunto dePrincípios se aplique a todas as pessoas que se encon-trem no território de um determinado Estado, semdistinção alguma, nomeadamente de raça, cor, sexo,língua, religião ou convicção religiosa, opinião polí-tica ou outra, origem nacional, étnica ou social, for-tuna, nascimento ou qualquer outra situação. Contudo,o n.o 2 acrescenta uma importante condição:As medidas aplicadas ao abrigo da lei e exclusiva-mente destinadas a proteger os direitos e a condiçãoespecial das mulheres, especialmente das mulhe-res grávidas e mães de crianças de tenra idade, dascrianças e dos adolescentes, dos idosos, dos doen-tes ou das pessoas deficientes não serão conside-radas medidas discriminatórias. A necessidade detais medidas, bem como a sua aplicação, serãosempre ser objecto de reapreciação por parte de umaautoridade judiciária ou outra autoridade.

NOTA PARA OS FORMADORES: Este instrumentoserá analisado em maior detalhe no capítulo XIII,sobre Detenção.

[iv] Declaração dos Princípios Básicos

de Justiça Relativos às Vítimas

da Criminalidade e de Abuso de Poder

259. Conforme declarado pela Assembleia Geral nasua resolução 40/34, de 29 de Novembro de 1985

Conceitos Fundamentais* 69

Page 101: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

(terceiro parágrafo preambular), pela qual adoptouesta Declaração:

[…] as vítimas da criminalidade e as vítimas de abuso

de poder e, frequentemente, também as respectivas

famílias, testemunhas e outras pessoas que acorrem

em seu auxílio sofrem injustamente perdas, danos ou

prejuízos e […] podem, além disso, ser submetidas a pro-

vações suplementares quando colaboram na persegui-

ção dos delinquentes.

260. O parágrafo 3.o da Declaração exige que asdisposições do instrumento se apliquem a todas aspessoas, sem distinção de qualquer espécie. Acres-centa aos fundamentos habituais (nomeadamentea raça, a cor e o sexo), as “crenças ou práticas cul-turais” e a “capacidade física”.

NOTA PARA OS FORMADORES: Este instrumentoserá analisado em maior detalhe no capítulo XIX,sobre Protecção e Indemnização das Vítimas.

[v] Declaração sobre a Protecção de Todas

as Pessoas contra a Tortura e Outras Penas

ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes

e

Convenção contra a Tortura e Outras Penas ou

Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes

261. Ambos os instrumentos contêm parágrafosintrodutórios (no preâmbulo da resolução da Assem-bleia Geral que adopta a Declaração e no texto da pró-pria Convenção) onde se declara que, em conformidadecom os princípios enunciados na Carta das NaçõesUnidas, o reconhecimento dos direitos iguais e ina-lienáveis de todas as pessoas constitui o fundamentoda liberdade, da justiça e da paz no Mundo.

262. Além do mais, ambos os instrumentos com-preendem disposições (artigo 8.o da Declaração eartigo 13.o da Convenção) que garantem a qual-quer indivíduo que alegue ter sido submetido a tor-tura o direito de apresentar queixa junto dasautoridades competentes do Estado em causa.

NOTA PARA OS FORMADORES: Ambos os instru-mentos serão analisados em maior detalhe nocapítulo XIII, sobre Detenção.

(d) Discriminação racial

263. Existem dois instrumentos que se ocupamespecificamente da discriminação racial.

[i] Declaração das Nações Unidas sobre

a Eliminação de Todas as Formas

de Discriminação Racial

264. O artigo 1.o proclama que a discriminação entreseres humanos com base na raça, cor ou origem étnicaconstitui um atentado à dignidade humana e deveráser condenada enquanto negação dos princípios daCarta das Nações Unidas, violação dos direitos humanose liberdades fundamentais consagrados na DeclaraçãoUniversal dos Direitos do Homem, obstáculo às rela-ções amistosas e pacíficas entre as nações e facto sus-ceptível de perturbar a paz e segurança entre os povos.

265. O artigo 2.o, n.o 2, exige que nenhum Estadoestimule, defenda ou apoie, mediante a actuação dapolícia ou de qualquer outra forma, qualquer dis-criminação baseada na raça, cor ou origem étnica pra-ticada por qualquer grupo, instituição ou indivíduo.

266. O artigo 7.o determina que toda a pessoa temdireito à igualdade perante a lei e a igual justiça nostermos da lei, direito à segurança pessoal e à pro-tecção do Estado contra qualquer violência ouatentado à sua integridade física e direito a umrecurso e protecção efectivos contra qualquer dis-criminação de que possa ser vítima com base naraça, cor ou origem étnica.

267. Nos termos do artigo 9.o, n.o 2, todos os actosde violência contra qualquer raça ou grupo de pes-soas de outra cor ou origem étnica, bem comoqualquer incitamento à prática de tais actos,devem ser punidos por lei.

[ii] Convenção Internacional sobre a Eliminação

de Todas as Formas de Discriminação Racial

268. A discriminação racial é definida pelo artigo 1.o

nos seguintes termos:

[…] qualquer distinção, exclusão, restrição ou prefe-

rência fundada na raça, cor, ascendência na origem

70 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 102: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

nacional ou étnica que tenha como objectivo ou como

efeito destruir ou comprometer o reconhecimento, o gozo

ou o exercício, em condições de igualdade, dos direitos

do homem e das liberdades fundamentais nos domínios

político, económico, social e cultural ou em qualquer

outro domínio da vida pública.

269. Nos termos do artigo 2.o, os Estados Partes naConvenção condenam a discriminação racial e com-prometem-se a prosseguir uma política tendente aeliminar tal discriminação em todas as suas formas.

270. Em conformidade com o artigo 5.o, os EstadosPartes obrigam-se a garantir o direito de todos,sem distinção quanto à raça, cor ou origem nacio-nal ou étnica, à igualdade perante a lei, nomeada-mente no gozo de uma série de direitos. Entreestes, incluem-se:• o direito à igualdade de tratamento perante os tri-bunais;• o direito à segurança da pessoa e à protecção doEstado contra a violência ou os atentados à res-pectiva integridade física, infligidos quer por fun-cionários públicos quer por qualquer indivíduo,grupo ou instituição.

(e) Discriminação por motivos de religião

271. O direito à liberdade de pensamento, cons-ciência e religião é protegido por diversos ins-trumentos universais e regionais de direitoshumanos e a discriminação por motivos religiososé objecto de uma declaração específica.

[i] Declaração Universal dos Direitos do Homem

272. A liberdade religiosa é protegida pelo artigo 18.o,nos seguintes termos:

Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento,

de consciência e de religião; este direito implica a liber-

dade de mudar de religião ou de convicção, assim como

a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozi-

nho ou em comum, tanto em público como em privado,

pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos.

É igualmente protegida pelo Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos (artigo 18.o), pela

Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos(artigo 8.o), pela Convenção Americana sobre Direi-tos Humanos (artigo 12.o) e pela Convenção Euro-peia dos Direitos do Homem (artigo 9.o).

[ii] Declaração sobre a Eliminação de Todas

as Formas de Intolerância e Discriminação

Baseadas na Religião ou na Convicção

273. O artigo 1.o deste instrumento protege odireito à liberdade de religião e convicção nos mes-mos termos que o artigo 18.o da Declaração Uni-versal dos Direitos do Homem.

274. O artigo 2.o proclama que ninguém seráobjecto de discriminação por parte de qualquerEstado, instituição, grupo de pessoas ou indiví-duo por motivos de religião ou outra convicção.

275. A discriminação com base na religião ou con-vicção é condenada pelo artigo 3.o como um atentadoà dignidade humana e uma violação dos direitos eliberdades proclamados na Declaração Universal.

276. Nos termos do artigo 4.o, os Estados deverãotomar medidas eficazes para prevenir e eliminara discriminação por motivos de religião ou con-vicção, devendo adoptar ou revogar legislação,segundo necessário, a fim de proibir qualquer dis-criminação deste tipo.

(f ) Discriminação contra as mulheres

277. Existem dois instrumentos que abordamespecificamente a questão da discriminação con-tra as mulheres. Tal como acontece com osinstrumentos específicos sobre discriminaçãoracial e discriminação por motivos religiosos, elescomplementam as disposições em matéria de dis-criminação constantes dos instrumentos gerais dedireitos humanos de âmbito universal e regional.

[i] Declaração sobre a Eliminação

da Discriminação contra as Mulheres

278. O artigo 1.o condena a discriminação contraas mulheres, considerando-a fundamentalmenteinjusta e um atentado à dignidade humana.

Conceitos Fundamentais* 71

Page 103: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

279. O artigo 2.o exige que sejam abolidas as leis,costumes, regulamentos e práticas em vigor queconstituam discriminação contra as mulheres.

280. O artigo 10.o exige que sejam adoptadasmedidas a fim de garantir a igualdade de direi-tos entre mulheres e homens nos domínios eco-nómico e social. Impõe, em particular, que sejamassegurados às mulheres o direito a receber for-mação profissional, o direito ao trabalho e odireito à livre escolha da profissão e do emprego,bem como o direito à progressão na carreira e pro-fissão.

[ii] Convenção sobre a Eliminação de Todas

as Formas de Discriminação contra as Mulheres

281. A discriminação contra as mulheres é definidano artigo 1.o desta Convenção como:

[…] qualquer distinção, exclusão ou restrição baseada no

sexo que tenha como efeito ou como objectivo com-

prometer ou destruir o reconhecimento, o gozo ou o exer-

cício pelas mulheres, seja qual for o seu estado civil, com

base na igualdade dos homens e das mulheres, dos

direitos do homem e das liberdades fundamentais nos

domínios político, económico, social, cultural e civil

ou em qualquer outro domínio.

282. Nos termos do artigo 2.o, os Estados conde-nam a discriminação contra as mulheres ecomprometem-se, entre outros aspectos, a abste-rem-se de qualquer acto ou prática de discrimi-nação contra as mulheres e a assegurar que asautoridades e instituições públicas se conformamcom esta obrigação.

283. Em conformidade com o artigo 11.o, n.o 1, alí-nea b), os Estados Partes deverão garantir o direitoà igualdade de oportunidades no emprego entremulheres e homens, nomeadamente a aplicação dosmesmos critérios de selecção em matéria deemprego.

NOTA PARA OS FORMADORES: Ambos os instru-mentos serão analisados em maior detalhe nocapítulo XVII, sobre Aplicação da Lei e Direitos dasMulheres.

(g) Discriminação e crianças

284. O problema da discriminação contra acriança é abordado em dois instrumentos.

[i] Pacto Internacional sobre os Direitos

Civis e Políticos

285. O artigo 24.o, n.o 1, estabelece:

Qualquer criança, sem nenhuma discriminação de

raça, cor, sexo, língua, religião, origem nacional ou

social, propriedade ou nascimento, tem direito, da parte

da sua família, da sociedade e do Estado, às medidas de

protecção que exija a sua condição de menor.

[ii] Convenção sobre os Direitos da Criança

286. Tal como a maioria dos instrumentos interna-cionais de direitos humanos, os direitos iguais einalienáveis de todos os membros da famíliahumana são referidos nos parágrafos preambulares.

287. O artigo 1.o deste instrumento define acriança como todo o ser humano menor de 18anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for apli-cável, atingir a maioridade mais cedo.

288. Em conformidade com o artigo 2.o, os Esta-dos Partes obrigam-se a:

[…] respeitar e a garantir os direitos previstos na presente

Convenção a todas as crianças que se encontrem sujei-

tas à sua jurisdição, sem discriminação alguma, inde-

pendentemente de qualquer consideração de raça, cor,

sexo, língua, religião, opinião política ou outra da

criança, de seus pais ou representantes legais, ou da sua

origem nacional, étnica ou social, fortuna, incapaci-

dade, nascimento ou de qualquer outra situação.

e a:

[…] toma[r] todas as medidas adequadas para que a

criança seja efectivamente protegida contra todas as

formas de discriminação ou de sanção decorrentes da

situação jurídica, de actividades, opiniões expressas ou

convicções de seus pais, representantes legais ou outros

membros da sua família.

72 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 104: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

(h) Manifestações particulares

de discriminação

289. O genocídio, a escravatura e o apartheid cons-tituem formas particulares e graves de discrimi-nação que analisaremos brevemente.

290. Nos termos do artigo 2.o da Convenção paraa Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio,entende-se por genocídio:

[…] os actos abaixo indicados, cometidos com aintenção de destruir, no todo ou em parte, um gruponacional, étnico, racial ou religioso, tais como:

a) Assassinato de membros do grupo;

b) Atentado grave à integridade física e mental de

membros do grupo;

c) Submissão deliberada do grupo a condições de

existência que acarretarão a sua destruição física, total

ou parcial;

d) Medidas destinadas a impedir os nascimentos no

seio do grupo;

e) Transferência forçada das crianças do grupo para

outro grupo.

291. O artigo 4.o exige que as pessoas que tenhamcometido genocídio sejam punidas, quer sejamgovernantes constitucionalmente responsáveis,funcionários públicos ou particulares.

292. A escravatura é proibida pelo artigo 4.o daDeclaração Universal dos Direitos do Homem, nosseguintes termos:

Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão;

a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas,

são proibidos.

É também proibida pela Carta Africana dos Direi-tos do Homem e dos Povos (artigo 5.o), ConvençãoAmericana sobre Direitos Humanos (artigo 6.o) eConvenção Europeia dos Direitos do Homem(artigo 4.o).

293. Existe uma ConvençãoRelativa à EscravaturaN.T.1, quecontém detalhadas disposiçõesdestinadas a prevenir e a erra-dicar a escravatura, um Proto-coloN.T.2 de emenda a estaConvenção e uma ConvençãoSuplementar Relativa à Aboli-ção da EscravaturaN.T.3.

294. O apartheid é qualificadocomo um crime contra a Hu-manidade ao abrigo do artigo 1.o

da Convenção Internacional para a Eliminação eRepressão do Crime de Apartheid.

295. Esta Convenção contém disposições detalha-das destinadas a prevenir e abolir o apartheid. Emconformidade com o seu artigo 1.o, n.o 2, os Esta-dos Partes declaram criminosas as organizações,instituições e indivíduos que cometam o crime deapartheid.

296. O crime de apartheid é pormenorizadamentedefinido no artigo 2.o, compreendendo diversosactos específicos cometidos com o objectivo deinstituir e manter a dominação de um grupo racialde seres humanos sobre qualquer outro gruporacial de seres humanos e de o oprimir de formasistemática.

3. OBSERVAÇÕES FINAIS

297. Sendo a não discriminação um aspectoextremamente importante da protecção e pro-moção dos direitos humanos, ela está relacio-nada com as questões abordadas em todos oscapítulos do presente manual. Afecta todos osaspectos do trabalho dos funcionários responsá-veis pela aplicação da lei e constitui um elementoessencial de uma actividade policial ética, lícitae democrática.

298. O presente capítulo concentrou-se nos ele-mentos da não discriminação que assumem par-ticular relevância para a teoria e prática daactividade policial, bem como para o comando e ges-

Conceitos Fundamentais* 73

N.T.1 Ratificada por Portugala 2 de Janeiro de 1929(aviso publicado no Diáriodo Governo, I Série, n.o

1/29).N.T.2 Portugal não é parteneste instrumento.N.T.3 Assinada por Portugal a 7 de Setembro de 1956 eaprovada para ratificaçãopelo Decreto-Lei n.o 42/172,de 2 de Março de 1959,publicado no Diário doGoverno, I Série, n.o 47. O instrumento de ratifica-ção foi depositado junto doSecretário-Geral das NaçõesUnidas a 10 de Agosto de1959. O aviso de depósitodo instrumento de ratifica-ção encontra-se publicadono Diário do Governo, ISérie, n.o 116, de 21 de Maiode 1959.

Page 105: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

74 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

tão das organizações policiais. Ao apresentar otema desta forma intensiva e detalhada aos fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei,

espera-se dar-lhes a conhecer, ou recordar-lhes, aexigência absoluta de desenvolverem a sua activi-dade de forma imparcial e não discriminatória.

• Procure conhecer bem a comunidade que serve. Encontre-se com líderese representantes dos diversos grupos étnicos e raciais.

• Participe em patrulhas a pé e actividades de serviço comunitário em bair-ros multiétnicos.

• Insurja-se contra os estereótipos ou insultos com fundamentos étnicos ouraciais na comunidade e dentro da esquadra de polícia.

• Participe em programas de formação oferecidos pelo seu serviço queabordem a temática das relações étnicas ou raciais.

• Fale com membros dos grupos minoritários existentes na comunidade ondepresta serviço, para se aperceber das respectivas necessidades e receber osseus comentários e sugestões. Seja sensível e receptivo.

b. Normas internacionais sobre não discriminação – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

• Organize programas de formação contínua para sensibilizar a polícia paraa importância da existência de boas relações inter-étnicas e inter-raciais ede uma aplicação da lei justa e não discriminatória.

• Elabore uma plano de acção para as relações inter-raciais, em consultacom as diversas comunidades étnicas.

• Emita ordens claras sobre a linguagem, atitudes e comportamento ade-quados face aos diversos grupos étnicos e raciais.

• Avalie as suas políticas de recrutamento, contratação e promoção a fimde garantir a representação equitativa dos diversos grupos.

• Recrute activamente membros de minorias étnicas e raciais, bem comode grupos sub-representados no seio do seu serviço.

• Estabeleça mecanismos permanentes para receber as queixas e sugestõesdos membros dos diversos grupos étnicos, raciais, religiosos e linguísticosexistentes na sua comunidade.

• Adopte estratégias de policiamento da comunidade.

• Designe um coordenador para as relações com as minorias no âmbito doseu serviço.

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

}

Recomendações destinadas

a todos os funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

}

Page 106: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Conceitos Fundamentais* 75

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

Para fins de debate, imagine que foi adoptada noseu país uma nova lei destinada a manter e con-trolar a ordem pública. Contém disposições que con-sideram infracções penais os seguintes actos:• Palavras, escritos ou comportamentos destinadosa incitar o ódio ou o ressentimento contra qualquergrupo racial, étnico ou religioso ou a ridicularizá--lo ou que, nas actuais circunstâncias, sejam sus-ceptíveis de produzir tais efeitos;• Palavras, escritos ou comportamentos injurio-sos ou insultuosos que se destinem a provocarviolência ou agressões físicas contra quaisquerpessoas em virtude de estas pertencerem a umdeterminado grupo racial, étnico ou religioso, ousejam susceptíveis de ter tais consequências.

Você foi designado para membro de um grupo detrabalho com as seguintes atribuições:“Analisar a nova lei que qualifica como infracçõespenais o ódio racial e a violência racial.

1). Formular recomendações destinadas ao seusuperior hierárquico dentro da instituição policiala respeito da política a seguir relativamente aosnovos delitos. Elabore uma breve exposição (umparágrafo) sobre esta política, a ser transmitidaaos meios de comunicação social.

2). Preparar uma breve declaração destinada a cir-cular no âmbito da instituição policial a fim de lem-brar aos agentes a sua responsabilidade de agirimparcialmente e sem discriminação, indicando astrês razões mais importantes que justificam talobrigação.

3). Elaborar um pequeno conjunto de directrizespara os agentes sobre os dois novos crimes, a fimde facilitar a aplicação da lei que os institui”.

Exercício n.o

2

Foi-lhe solicitado que proferisse uma palestra aosnovos agentes sobre o tema “Não discriminação eaplicação da lei”.

1). Prepare o plano geral da exposição (em tópicos).

2). Indique os princípios e normas internacionaisde direitos humanos relevantes para a sua exposiçãoe enumere as disposições da lei interna do seupaís a que fará referência.

3). Resuma as orientações gerais e práticas quedaria sobre o tema, enquanto agente policial expe-riente, aos novos funcionários.

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). No que diz respeito à não discriminação, qualé a importância do princípio: “Todos os sereshumanos nascem livres e iguais em dignidade eem direitos”?

2). Enumere sucintamente as diversas formasmediante as quais um Estado pode cumprir a suaobrigação de garantir os direitos humanos detodas as pessoas sujeitas à sua jurisdição sem dis-tinção quanto à raça, à cor, ao sexo, à religião e àconvicção.

3). Enumere sucintamente as formas mediante asquais a polícia pode ajudar o Estado a cumprir a sua

• Aplique sanções aos funcionários que demonstram um comportamentoprofissional discriminatório, insensível ou inadequado.

• Recompense os agentes que tomam iniciativas a fim de melhorar as rela-ções entre as diferentes comunidades.

• Organize cursos de formação contínua em matéria de relações inter-raciaise inter-étnicas para todos os funcionários de polícia.}

Page 107: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

76 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

obrigação de garantir os direitos humanos de todasas pessoas sujeitas à sua jurisdição sem distinçãoquanto à raça, à cor, ao sexo, à religião e à convicção.

4). Pense no direito de todas as pessoas a bene-ficiarem de igual protecção da lei e indique quaisas repercussões deste direito sobre a actividadepolicial.

5). O Pacto Internacional sobre os Direitos Civise Políticos (artigo 20.o) impõe que todo o apelo aoódio racial seja proibido por lei. Existe também odireito à liberdade de opinião e de expressão.Como podem conciliar-se estes dois imperativos?Qual é o mais importante?

6). A Convenção sobre a Eliminação de Todas asFormas de Discriminação contra as Mulheres(artigo 11.o) exige que os Estados Partes garantamàs mulheres as mesmas oportunidades doemprego que aos homens, nomeadamente a apli-cação dos mesmos critérios de selecção em maté-ria de emprego. Que dificuldades coloca estaexigência no domínio do recrutamento dos agen-tes policiais? Como podem estas dificuldades serultrapassadas?

7). A Declaração Universal dos Direitos doHomem (artigo 6.o), tal como outros instrumen-tos de direitos humanos, estabelece que todos osindivíduos têm direito ao reconhecimento da suapersonalidade jurídica. Que perigos enfrenta umser humano cuja personalidade jurídica não éreconhecida?

8). Por que motivo é importante, para efeitos dapromoção e protecção dos direitos humanos, queestes direitos sejam considerados inalienáveis e uni-versais?

9). Embora a maioria das formas de discrimina-ção contra pessoas constituam violações de direi-tos humanos, a discriminação que favorecedeterminadas categorias de pessoas (tais comomulheres e crianças) é estimulada e por vezesobrigatória. Em que domínios da aplicação da leié esta forma de discriminação “positiva” importantee necessária?

10). Redija um artigo para inclusão num código dedisciplina policial nos termos do qual a discrimi-nação passe a constituir uma infracção a essecódigo.

Page 108: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*DEVERES E FUNÇÕES DA POLÍCIA

Terceira Parte

Page 109: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 110: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Deveres e funções da Polícia 79

Investigação policial

11*capítulo

• Apresentar as normas internacionais relativas à investigação criminal eexplicar a respectiva relevância para a actividade da polícia.

• Durante as investigações, audição de testemunhas, vítimas e suspeitos,revistas pessoais, buscas de veículos e instalações, bem como intercepçãode correspondência e escutas telefónicas:

• Todo o indivíduo tem direito à segurança pessoal;

• Todo o indivíduo tem direito a um julgamento justo;

• Todo o indivíduo tem direito à presunção da inocência até que a sua culpafique provada no decurso de um processo equitativo;

• Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, família,domicílio ou correspondência;

• Ninguém sofrerá ataques à sua honra ou reputação;

• Não será exercida qualquer pressão, física ou mental, sobre os suspeitos,testemunhas ou vítimas, a fim de obter informação;

• A tortura e outros tratamentos desumanos ou degradantes são absolu-tamente proibidos;

• As vítimas e testemunhas deverão ser tratadas com compaixão e consi-deração;

• A informação sensível deverá ser sempre tratada com cuidado e o seu carác-ter confidencial respeitado em todas as ocasiões;

• Ninguém será obrigado a confessar-se culpado nem a testemunhar con-tra si próprio;

• As actividades de investigação deverão ser conduzidas em conformidadecom a lei e apenas quando devidamente justificadas;

• Não serão permitidas actividades de investigação arbitrárias ou indevi-damente intrusivas.

Objectivos do capítulo

}

}Princípios fundamentais

}

Page 111: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

a. Normas internacionais sobre investiga-ção policial – Informação para as apresenta-ções

1. INTRODUÇÃO

299. A investigação do crime constitui a primeiraetapa fundamental na administração da justiça.Trata-se do meio pelo qual aqueles que são acusa-dos de um crime poder ser levados a comparecerperante a justiça a fim de determinar a sua culpa-bilidade ou inocência. É também essencial para obem-estar da sociedade, pois o crime causa sofri-mento entre a população e compromete o desen-volvimento económico e social. Por estas razões,a condução das investigações criminais de formaeficaz e em conformidade com a lei e com os prin-cípios éticos é um aspecto extremamente impor-tante da actividade policial.

300. O objectivo do presente capítulo consiste emanalisar a investigação do crime enquanto actividadepolicial autónoma. Assim, serão consideradas as nor-mas internacionais de direitos humanos parti-cularmente relevantes no domínio da investigaçãocriminal. Contudo, todas as restantes normasimportantes para o exercício da actividade policialem geral, referidas nos capítulos precedentes esubsequentes, continuam a ser aplicáveis.

301. No decorrer de uma investigação, os agentespodem efectuar capturas, mas apenas quando tal sejanecessário e caso disponham de autoridade legalpara o fazer. Os suspeitos da prática de um crimesob investigação podem ser detidos, mas deverãoser sempre tratados com humanidade. Poderá sernecessário utilizar a força para capturar ou deter umsuspeito, mas apenas quando estritamente neces-sário e na medida exigida para alcançar o objectivolícito prosseguido. Dever-se-ão consultar os capítu-los XII, XIII e XIV, infra, para uma análise por-menorizada das normas internacionais relativas aestes aspectos da actividade policial.

302. Para que a investigação policial seja feita emconformidade com os princípios éticos, os inves-tigadores deverão respeitar a dignidade humana e

os direitos humanos, e cumprir a lei. Numa socie-dade democrática, o investigador criminal deverámostrar-se receptivo e ser responsável perante acomunidade. Além do mais, as investigações deve-rão ser conduzidas tendo devidamente em contao princípio da não discriminação. As normas rela-tivas à ética policial, actividade policial numasociedade democrática e não discriminação sãoanalisadas atrás nos capítulos VIII, IX e X e deve-rão ser consultadas para mais informação.

2. ASPECTOS GERAIS SOBRE DIREITOS

HUMANOS E INVESTIGAÇÃO POLICIAL

(a) Princípios fundamentais

303. A investigação criminal tem por objectivos arecolha de provas, identificação do presumívelautor do crime e apresentação das provas em tri-bunal para que a culpabilidade ou inocência doarguido possa ser determinada. Os princípios fun-damentais que emanam das normas internacionaissão, assim, os seguintes:• presunção da inocência de todos os arguidos;• direito de todas as pessoas a um julgamento justo;• respeito pela dignidade, honra e privacidade detodas as pessoas.

(b) Normas específicas sobre a investigação

304. Os princípios acima enunciados encontram--se consagrados nas disposições dos instrumentosde direitos humanos que garantem o direito à pre-sunção de inocência até prova em contrário, odireito a um processo equitativo e a interdição deintromissões ilícitas e arbitrárias na vida privada.

[i] Presunção de inocência

305. Este direito está consagrado no artigo 11.o, n.o 1, da Declaração Universal, onde se lê:

Toda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-

se inocente até que a sua culpabilidade fique legal-

mente provada no decurso de um processo público em

que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam

asseguradas.

80 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 112: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

É também garantido pelo Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos (artigo 14.o, n.o 2), Carta Africana dos Direitos do Homem e dosPovos (artigo 7.o, n.o 1, alínea b)), Convenção Ame-ricana sobre Direitos Humanos (artigo 8.o, n.o 2)e Convenção Europeia dos Direitos do Homem(artigo 6.o, n.o 2).

306. Duas importantes questões decorrem destasdisposições:

a) A culpabilidade ou a inocência só podem serdeterminadas por um tribunal regularmente cons-tituído, na sequência de um processo regular noâmbito do qual tenham sido concedidas aoarguido todas as garantias necessárias para a suadefesa;

b) O direito à presunção de inocência até provaem contrário é essencial para garantir um julga-mento justo.

307. A presunção de inocência tem uma importanteconsequência sobre o processo de investigação:todas as pessoas sob investigação deverão ser tra-tadas como inocentes, quer tenham sido detidas oupresas preventivamente quer permaneçam emliberdade no decurso do inquérito.

[ii] Direito a um processo equitativo

308. Este direito está consagrado no artigo 10.o daDeclaração Universal dos Direitos do Homem,que estabelece:

Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a

sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um

tribunal independente e imparcial que decida dos seus

direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusa-

ção em matéria penal que contra ela seja deduzida.

Aparece também, em termos mais desenvolvidos,no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Polí-ticos (artigo 14.o), Carta Africana dos Direitos doHomem e dos Povos (artigo 7.o), Convenção Ame-ricana sobre Direitos Humanos (artigo 8.o) e Con-venção Europeia dos Direitos do Homem (artigo 6.o).309. Para que uma pessoa seja equitativamente

julgada em razão de qualquer acusação em maté-ria penal contra si deduzida, toda a investigação docrime ou crimes que servem de base a tal acusa-ção deverá ser conduzida dentro do respeito dosprincípios éticos e em conformidade com as dis-posições jurídicas que disciplinam a investigação.O respeito das normas é particularmente impor-tante no que diz respeito aos seguintes aspectos:• obtenção de provas;• interrogatório dos suspeitos (também analisadoinfra, no capítulo XIII);• imperativo de declarar a verdade perante o juizou tribunal.

310. As disposições dos instrumentos de direitoshumanos atrás mencionados incluem uma série degarantias mínimas consideradas necessárias paraassegurar o direito a um processo equitativo. Ana-lisaremos em seguida aquelas que têm particula-res implicações na condução das investigaçõescriminais.

[iii] Garantias mínimas para assegurar

um processo equitativo

a) A ser informado pronta e detalhadamentedas acusações contra si formuladas

311. Esta norma reitera e reforça uma das obriga-ções que os funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei deverão cumprir ao efectuar uma detenção.Por exemplo, o artigo 9.o, n.o 2, do Pacto Interna-cional sobre os Direitos Civis e Políticos dispõe:

Todo o indivíduo preso será informado, no momento

da sua detenção, das razões dessa detenção e receberá

notificação imediata de todas as acusações apresenta-

das contra ele.

Isto significa que, ao capturar uma pessoa, há queseguir o seguinte procedimento:

NO MOMENTO DA CAPTURA – a pessoa deverá serimediatamente informada dos motivos da captura;

LOGO QUE POSSÍVEL APÓS A CAPTURA – a pessoadeverá ser informada das acusações contra si for-muladas.

Deveres e funções da Polícia* 81

Page 113: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

312. Caso a pessoa sujeita a investigação não hajasido detida, ela tem também o direito de ser infor-mada, logo que possível, das acusações contra sideduzidas.

313. É evidente que a natureza das investigações podeinfluenciar o período de tempo durante o qual a pes-soa deverá ser informada das acusações contra si for-muladas. Em casos muito complexos, esse períodode tempo poderá ser mais longo do que em casosmenos complexos. Contudo, a regra é sempre a mesma:a pessoa deverá ser informada logo que possível.

b) Julgamento num prazo razoável

314. Esta garantia significa que a investigaçãodeverá ser efectuada e concluída tão rápida e efi-cazmente quanto possível.

315. Tal como a primeira das garantias referidas,a complexidade do caso poderá afectar o períodoque efectivamente decorre até que a pessoa sejalevada a julgamento. Outros factores, tais como adisponibilidade das testemunhas e o comporta-mento da pessoa no decorrer da investigação,podem também influir na duração das investiga-ções. Não obstante, o julgamento deverá ter sem-pre lugar num prazo razoável.

316. A maneira de conduzir a investigação policialnão deverá dar azo ao desrespeito desta garantia.

NOTA PARA OS FORMADORES: Existe também umagarantia mínima impondo que a pessoa acusadadisponha do tempo e dos meios suficientes parapreparar a sua defesa, o que deverá ser conjugadocom a exigência de que o julgamento tenha lugarnum prazo razoável.

c) A interrogar, ou fazer interrogar, as testemu-nhas de acusação

e a obter a comparência e o interrogatório das testemu-nhas de defesa nas mesmas condições que as testemunhasde acusação

317. A primeira parte desta garantia diz respeito àforma de condução do julgamento, mas a segunda

tem repercussões sobre as investigações criminais.Um exemplo é dado em seguida, mas outros podemsurgir nos diversos sistemas jurídicos e policiaisdos Estados Membros das Nações Unidas.

318. No decorrer das investigações, a polícia podeencontrar testemunhas do crime cujo depoimentonão corrobore as acusações contra a pessoa que seencontra a ser investigada. É evidente que taldepoimento pode ser suficiente para indicar queo suspeito do crime não foi, de facto, o seu autor.Nesse caso, a pessoa em causa deve deixar de serobjecto de investigação.

319. Por outro lado, essa prova pode simples-mente enfraquecer as acusações formuladas con-tra o suspeito, sem as fazer desaparecercompletamente. As restantes provas podem sersuficientes para deduzir acusação contra o sus-peito e levá-lo a julgamento. Porém, o facto é queuma testemunha cujo depoimento enfraquece aacusação é uma testemunha de defesa, pelo quedeverá ser citada para comparecer em julgamento.

d) De não ser obrigado a testemunhar contra sipróprio ou a confessar-se culpado

320. Sendo certo que esta garantia protege a pes-soa acusada na fase de julgamento, ela afecta tam-bém as investigações aquando do interrogatório dosuspeito pelas autoridades policiais.

321. Os interrogatórios e exames das pessoas sus-peitas da prática de um crime são objecto de nor-mas específicas, que analisaremos mais adiante nocapítulo XIII. Algumas destas normas destinam--se exactamente a impedir que se exerça uma pres-são excessiva sobre os suspeitos para que seconfessem culpados. É evidente que, se alguém tiversido ilicitamente compelido a confessar-se cul-pado durante a fase de inquérito, esta garantia, quese destina a proteger os arguidos durante o julga-mento, terá sido violada.

[iv] Intromissões arbitrárias na vida privada

322. A privacidade, a honra e a reputação dos indi-víduos são protegidas pelo artigo 12.o da Declara-

82 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 114: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

ção Universal dos Direitos do Homem, que diz oseguinte:

Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida

privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua

correspondência, nem ataques à sua honra e reputação.

Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem

direito a protecção da lei.

323. Disposições semelhantes estão consagradas naConvenção Americana sobre Direitos Humanos(artigo 11.o) e na Convenção Europeia dos Direitosdo Homem (artigo 8.o), embora este último ins-trumento limite tal direito (artigo 8.o, n.o 2) nosseguintes termos:

Não pode haver ingerência da autoridade pública no exer-

cício deste direito senão quando esta ingerência estiver pre-

vista na lei e constituir uma providência que, numa

sociedade democrática, seja necessária para a segurança

nacional, para a segurança pública, para o bem-estar eco-

nómico do país, a defesa da ordem e a prevenção das

infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou

a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros.

324. Estas normas têm repercussões óbvias sobreas investigações criminais:Revistas e Buscas – em especial das pessoas esuas casas, outros bens e veículos,eIntercepção – de correspondência, mensagenstelefónicas e outras comunicações, deverão res-peitar escrupulosamente a lei e ser absolutamentenecessárias para fins legítimos de aplicação da lei.

325. A protecção da intimidade é reforçada pelasdisposições do artigo 4.o do Código de Conduta paraos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei,que estabelece:

As informações de natureza confidencial em poder dos

funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem

ser mantidas em segredo, a não ser que o cumprimento

do dever ou as necessidades da justiça estritamente

exijam outro comportamento.

O comentário ao artigo assinala que, devido ànatureza das suas funções, os agentes policiais

obtêm informações que podem ser potencial-mente prejudiciais à reputação de outras pessoas.Sublinha que se deverá tomar a máxima cautela notratamento de tais informações e que qualquerdivulgação das mesmas para outros fins que nãoo desempenho do dever ou os interesses da justiçaé totalmente abusiva.

326. A divulgação abusiva de informação confi-dencial prejudicial à reputação de um indivíduo vio-laria certamente as disposições da DeclaraçãoUniversal e Convenções Americana e Europeia,acima referidas.

(c) Aspectos técnicos da investigação

327. A eficácia das investigações, se levadas a cabocom base no respeito pela dignidade humana e peloprincípio da legalidade, depende em larga medidados seguintes factores:• disponibilidade de recursos científicos e técnicose utilização inteligente dos mesmos;• aplicação intensiva de técnicas policiais elemen-tares;• conhecimentos e preparação dos investigadores;• observância das disposições legais que discipli-nam as investigações, bem como das normasinternacionais de direitos humanos.

328. Os recursos científicos e técnicos compreen-dem, por exemplo:• meios para examinar o local do crime, elemen-tos descobertos nesse local e outro material comeventual valor probatório;• meios para registar e referenciar a informaçãorecolhida durante as investigações. As investigaçãoem larga escala podem exigir o recurso a meiosinformáticos.

329. As técnicas policiais elementares dizem res-peito, nomeadamente, aos seguintes aspectos:• interrogatório de testemunhas e suspeitos (são téc-nicas diferentes que exigem abordagens diferen-ciadas);• buscas em diversos locais, tais como espaçosabertos, edifícios e veículos, bem como revistas pes-soais (mais uma vez, são técnicas diferentes queexigem abordagens diferenciadas).

Deveres e funções da Polícia* 83

Page 115: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

330. Os conhecimentos e a preparação dos investi-gadores dependem, designadamente, dos seguin-tes factores:• recursos e meios ao seu dispor;• conhecimentos e aptidões básicas que possuem;• competências legais que lhes estão atribuídas eprincípios éticos que regem a sua conduta.

NOTA PARA OS FORMADORES: A disponibilidade derecursos, a aquisição de conhecimentos técnicos nodomínio da aplicação da lei e o nível de prepara-ção dos investigadores são matérias em que osagentes dependem dos Governos e das instituiçõespoliciais. Para manter um sistema de polícia efi-caz e humano, os Governos deverão dotar os orga-nismos responsáveis pela aplicação da lei dosnecessários recursos e, através deles, ministrarformação aos agentes policiais e garantir-lhes aatribuição dos meios de que necessitam parapoderem desempenhar as suas funções.

Estes exemplos de aspectos técnicos da actividadepolicial foram incluídos no presente capítulo comos seguintes objectivos:

• Estabelecer ou reforçar, no espírito dos partici-pantes, a ligação entre a competência profissionale a protecção dos direitos humanos;• Dar oportunidade para discutir os programas deassistência técnica do Centro para os DireitosHumanos e da Divisão para a Prevenção do Crimee Justiça Penal das Nações Unidas ou a possibilidadede vir a beneficiar dessa assistência através do con-tacto directo com os Estados Membros das NaçõesUnidas que dispõem de organismos e funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei com conheci-mentos especializados nas áreas em questão.Deverá ser feito notar aos participantes que a insu-ficiência de conhecimentos técnicos ou de recur-sos não constitui desculpa para as violações dedireitos humanos.

(d) Relação com os informadores da polícia

331. Esta subsecção ocupa-se de um aspecto técnicoda investigação, o qual, tendo em conta as impor-tantes questões éticas e jurídicas que coloca,merece uma análise autónoma e particular.

332. Os informadores são uma fonte extremamenteimportante de informação sobre o meio criminal eos delinquentes, constituindo por vezes a única formade levar alguns criminosos, em especial os envolvi-dos no crime organizado, a responder perante a jus-tiça. A manutenção e utilização de informadores porparte dos investigadores policiais pode contribuirsignificativamente para aumentar a eficácia das inves-tigações e da instituição policial no seu conjunto.

333. Contudo, este processo reveste-se de consi-deráveis perigos, pelas seguintes razões:

a) os próprios informadores são por vezes cri-minosos, ou mantêm estreitas ligações com eles;

b) a informação é geralmente fornecida a trocode dinheiro ou outros favores;

c) os contactos entre os agentes policiais e osinformadores são necessariamente secretos.

334. O processo apresenta os seguintes perigos:

a) o informador pode explorar a situação de maneiraa conseguir cometer o crime e evitar ser detectado;

b) o informador pode encorajar terceiros acometerem crimes a fim de ser pago pelas infor-mações fornecidas relativamente a estes;

c) um agente pode levar a que o informadorencoraje terceiros a cometer crimes que o mesmoagente possa depois detectar, a fim de demonstrarmaior eficácia;

d) o agente pode tornar-se corrupto através dastransacções financeiras com os informadores.

335. Pelas razões acima expostas, os organismosresponsáveis pela aplicação da lei devem definire aplicar regras disciplinadoras das relações etransacções entre os agentes e os informadoresda polícia. Estas regras devem ter em conta osseguintes aspectos:

a) Cada informador deve tratar apenas com umagente policial, sendo este último o único res-

84 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 116: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

ponsável, no seio da instituição policial, pelamanutenção dos contactos e realização de todas astransacções. Isto permite responsabilizar umdeterminado agente por todos os contactos com oinformador em questão;

b) Embora a identidade do informador deva emgeral permanecer confidencial, para protecção doagente que com ele contacta e do próprio infor-mador deverá ser mantido um registo oficial comindicação da identidade de cada informador e doagente responsável pela ligação com ele. Esseregisto deverá poder ser consultado apenas porum superior hierárquico especificamente designadopara o efeito.

c) As actividades dos informadores deverão sercuidadosamente vigiadas. Acontece frequente-mente que o informador, não só tem conheci-mento do planeamento de um crime, como estátambém envolvido nesse mesmo planeamento epode ser considerado um potencial participante nasua execução. Regra geral, isto não é aceitável,uma vez que significa, quase inevitavelmente, queo informador irá cometer um delito.

d) Muito raramente, a actividade criminosa emplaneamento é de tal magnitude, e a não participa-ção do informador colocá-lo-á em tal perigo, que elepoderá ter de participar na sua execução. Tolerarquaisquer crimes, incluindo os cometidos pelosinformadores, coloca graves questões jurídicas e éti-cas. Qualquer decisão de o fazer deverá ser tomadaao mais alto nível no seio da instituição policial e ape-nas depois das devidas consultas com as autoridadesjudiciárias. Estas decisões e consultas deverão ser sem-pre tomadas e efectuadas caso a caso. Não devejamais conceder-se qualquer imunidade geral.

e) As contrapartidas económicas oferecidas aosinformadores nunca devem ser excessivas. Ospagamentos não devem constituir um grande ali-ciante ao fornecimento de informações, caso con-trário o informador poderá ser tentado a encorajarterceiros a perpetrar novos crimes.

f ) Os pagamentos efectuados aos informadoresdeverão ser estritamente controlados através de

procedimentos contabilísticos bem definidos e deuma fiscalização rigorosa. O funcionário quedecide sobre a autorização de pagamento deveráignorar a identidade do informador, mas é indis-pensável que conheça os pormenores do crime ea natureza da informação fornecida.

336. Ainda relativamente às relações entre a polí-cia e os informadores, devemos acrescentar que aprobabilidade de corrupção de alguns agentes, emdeterminadas fases, é tão alta, que se torna quaseinevitável. Os funcionários superiores de polícia têmassim a enorme responsabilidade de:

a) definir uma política clara que sirva de base aprocedimentos reguladores e directrizes eficazese permita optimizar os benefícios a retirar da reco-lha de informação confidencial sobre o crime e osdelinquentes;

b) estabelecer procedimentos reguladores estri-tos e directrizes explícitas a fim de que os agentesseus subordinados compreendam exactamente deque forma deverão conduzir as suas relações comos informadores e até que ponto essas relaçõessão vigiadas.

337. A criação de um sistema para a utilização efi-caz dos informadores policiais é fundamental naprevenção e detecção do crime. A corrupção dessesistema implica a corrupção dos próprios agentes,a subversão do sistema de justiça penal e a viola-ção dos direitos humanos.

(e) Vítimas

338. A questão das vítimas do crime será abor-dada em detalhe no capítulo XIX, infra. Contudo,uma vez que diversas questões relativas às víti-mas de crime se relacionam estreitamente com oprocesso de investigação, é importante fazer-lhesaqui referência.

339. Um dos três princípios fundamentais quereferimos no início do presente capítulo é aqueleque exige o respeito da dignidade, honra e priva-cidade de todas as pessoas. Este princípio aplica--se particularmente às vítimas. O parágrafo 4.o da

Deveres e funções da Polícia* 85

Page 117: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

86 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Declaração dos Princípios Básicos de JustiçaRelativos às Vítimas da Criminalidade e de Abusode Poder proclama:

As vítimas devem ser tratadas com compaixão e respeito

pela sua dignidade. Têm direito ao acesso às instâncias

judiciárias e a uma rápida reparação do prejuízo por si

sofrido, de acordo com o disposto na legislação nacional.

340. As vítimas do crime são frequentementeimportantes testemunhas desse mesmo crime. Éimportante que os investigadores se preocupemcom o bem-estar das vítimas, em virtude de impe-rativos humanitários fundamentais, e que asse-gurem a sua cooperação voluntária no decorrerdo inquérito e subsequente julgamento. Para oconseguir, poderão alertar os organismos de assis-tência social competentes para as necessidades decada vítima, ou informar as próprias vítimas a res-peito da existência desses serviços e organizações.

341. Para além das necessidades derivadas da suacondição de vítimas, essas pessoas enfrentam tam-bém necessidades decorrentes da sua participaçãoem quaisquer processos judiciais ou administra-tivos subsequentes. A Declaração dos PrincípiosBásicos de Justiça Relativos às Vítimas da Crimi-nalidade e de Abuso de Poder, acima mencionada,identifica essas necessidades e enuncia formas delhes dar resposta. O parágrafo 6.o estabelece oseguinte

A capacidade do aparelho judiciário e administra-tivo para responder às necessidades das vítimas deveser melhorada:

a) Informando as vítimas da sua função e das pos-

sibilidades de recurso abertas, das datas e da marcha dos

processos e da decisão das suas causas, especialmente

quando se trate de crimes graves e quando tenham

pedido essas informações;

b) Permitindo que as opiniões e as preocupações das

vítimas sejam apresentadas e examinadas nas fases

adequadas do processo, quando os seus interesses pes-

soais estejam em causa, sem prejuízo dos direitos da

defesa e no quadro do sistema de justiça penal do país;

c) Prestando às vítimas a assistência adequada ao

longo de todo o processo;

d) Tomando medidas para minimizar, tanto quanto

possível, as dificuldades encontradas pelas vítimas, pro-

teger a sua vida privada e garantir a sua segurança,

bem como a da sua família e a das suas testemunhas,

preservando-as de manobras de intimidação e de repre-

sálias;

e) Evitando demoras desnecessárias na resolução

das causas e na execução das decisões ou sentenças

que concedam indemnização às vítimas.

342. Os agentes policiais encarregados da investi-gação criminal estão muitas vezes numa posiçãoúnica para garantir que as normas consagradas notexto acima transcrito são respeitadas e que asvítimas encontram resposta para outras neces-sidades que possam sentir. Podem fazê-loinformalmente ou em conformidade com meca-nismos estabelecidos para o efeito. Alguns EstadosMembros das Nações Unidas conseguiram criarmecanismos eficazes de apoio às vítimas do crime.

3. OBSERVAÇÕES FINAIS

343. Deverá recordar-se aos participantes do cursoque todas as normas de direitos humanos aplicá-veis à actuação policial em geral se aplicam tam-bém aos procedimentos de investigação criminal.As normas analisadas no presente capítulo têmespecial relevância no domínio do inquérito.Dever-se-á também lembrar que um sólido conhe-cimento dos aspectos técnicos da investigação éimportante, não só para a eficaz detecção docrime, mas também para promoção e protecção dosdireitos humanos.

344. Diversos Estados Membros das Nações Uni-das possuem conhecimentos especializados eexperiência em todos os aspectos da investigaçãoanalisados no presente capítulo, nomeadamente noque diz respeito à utilização de informadores. Osformandos deverão ser estimulados a aproveitá-los,bem como a partilhar a experiência e os conheci-mentos que eles próprios tenham adquirido.

Page 118: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 87

b. Normas internacionais sobre investigação policial – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

• Institua procedimentos normalizados para o registo de informação nodecorrer das investigações.

• Sempre que possível, em caso de dúvida sobre a legalidade de uma acti-vidade de investigação, esclareça-se com os seus superiores antes de pros-seguir.

• Trate todos os suspeitos como pessoas inocentes, de forma educada, res-peitosa e profissional.

• Mantenha um registo detalhado de todos os interrogatórios efectuados.

• Participe em acções de formação contínua a fim de aperfeiçoar os seusconhecimentos no domínio da investigação.

• Antes de qualquer interrogatório, informe sempre as vítimas, testemu-nhas e suspeitos dos respectivos direitos.

• Antes de empreender qualquer acção no âmbito de um inquérito, perguntea si próprio: É legal? Será admitida em tribunal? É necessária? É indevida-mente intrusiva?

• Nunca procure nem se apoie numa confissão para fundamentar umprocesso. Pelo contrário, o objectivo da investigação consiste em reunir ele-mentos de prova independentes.

• Sempre que possível, solicite um mandado ou ordem judicial antes deempreender quaisquer buscas. As buscas sem mandado devem ser excep-cionais e efectuadas apenas na medida do razoável e com motivo justifi-cado, na sequência de uma captura lícita, quando livremente consentidasou quando a obtenção de um mandado prévio seja impossível, dadas ascircunstâncias.

• Conheça a comunidade onde trabalha. Desenvolva estratégias activas deprevenção do crime, nomeadamente tomando consciência dos riscos exis-tentes no seio dessa comunidade.

• Recomendações destinadas a todos os funcionários com responsabilida-des de comando e supervisão

• Institua mecanismos administrativos destinados a acelerar o processo de inves-tigação.

• Emita ordens de serviço que salientem as garantias jurídicas aplicáveisao processo de investigação.

• Organize programas de formação incidentes sobre as normas jurídicas apli-cáveis e técnicas científicas eficazes no domínio da investigação criminal.

• Institua procedimentos de supervisão rigorosos para o tratamento deinformação confidencial.

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

}

}

}

Recomendações destinadas

a todos os funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

}

Page 119: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

88 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

• Institua, em coordenação com os organismos de segurança social com-petentes, mecanismos de apoio às vítimas.

• Formule directivas que limitem o recurso à confissão.

• Desenvolva estratégias de policiamento voltadas para a comunidade, porforma a que a polícia se aproxime da sociedade e, assim, da informaçãonecessária à prevenção e solução dos crimes.

• Solicite cooperação técnica, nomeadamente, e quando necessário, de pro-gramas técnicos internacionais no domínio da actividade das polícias,sobre as técnicas e tecnologias modernas de investigação policial.

• Aplique sanções rigorosas em caso de violação das normas relativas à lega-lidade das práticas de investigação e divulgue a existência de tais sanções.

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

Um dos objectivos da investigação policial con-siste na recolha de informação. Isto pode ser feitoatravés do recurso a meios técnicos (por exemplo,escutas telefónicas) ou a meios tácticos (por exem-plo, utilização de informadores).

Os investigadores policiais podem ser seriamentetentados a ignorar os princípios éticos e as normasjurídicas, em especial nas fases mais críticas dainvestigação de um crime grave, por exemploquando possa estar iminente uma captura. Na ver-dade, um investigador pode considerar que, em cer-tas ocasiões, é indispensável violar determinadasnormas para garantir o sucesso das investigações.

1). Indique os argumentos que utilizaria nessaocasião para convencer um investigador da neces-sidade de respeitar as normas jurídicas e os prin-cípios éticos.

2). Alguma vez se justifica a violação da lei como objectivo de aplicar a lei?

3). Se forem dados argumentos para justificar aviolação da lei com o objectivo de aplicar a lei,como podem eles ser conciliados com a presunçãode inocência de todas as pessoas suspeitas ouacusadas de um crime?

4). Caso os investigadores se sintam tentados a vio-lar as normas jurídicas e os princípios éticos, queimplicações tem isto sobre a supervisão e comandodas investigações – especialmente em relação aosexemplos de recolha de informação indicados no pri-meiro parágrafo do presente exercício?

Exercício n.o

2

Imagine que é membro de um grupo de trabalho esta-belecido com o objectivo de aconselhar a estruturade comando do seu organismo a respeito dos prin-cípios éticos aplicáveis às investigações criminais.

1). Elabore um código deontológico para orien-tação dos agentes encarregados das investigaçõessobre a forma de conduzir as mesmas em con-formidade com os princípios éticos.

2). Pense nos conselhos que daria acerca da apli-cação desse código: deveriam as violações a essedocumento constituir fundamento para a instau-ração de processo disciplinar por infracção docódigo de disciplina policial, ou deveriam os códi-gos e procedimentos disciplinares permanecer dis-sociados dos códigos deontológicos? Indique asrazões que justificam qualquer uma das conclusões.

Exercício n.o

3

Para fins de discussão, imagine que a sua instituiçãopolicial está a investigar uma organização envolvida

}

Page 120: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 89

no tráfico de droga. Os membros desta organizaçãosão implacáveis e extremamente eficientes. Os resul-tados da investigação desenvolvida até ao momentoindicam que só poderão ser feitos progressos infil-trando agentes na organização a fim de obter provasdas actividades a que esta se dedica. Caso tal tácticaseja bem sucedida, a intenção será capturar imedia-tamente todos os implicados nas actividades crimi-nosas da organização. O responsável do seu serviçoautoriza a táctica da infiltração, mas pretende quesejam elaboradas algumas directrizes destinadas aosagentes a infiltrar, a fim de assegurar que a sua actua-ção seja eficaz e conforme aos princípios éticos.

1). Elabore as directrizes solicitadas pelo res-ponsável do seu serviço.

2). Durante quanto tempo, na sua opinião, deveráum agente policial trabalhar no seio de uma orga-nização do tipo da descrita no presente exercício?

3). Deverão os agentes infiltrados participar nasactividades criminosas da organização? Que con-selhos lhes daria a este respeito?

Exercício n.o

4

O Ministro da Justiça solicitou a diversas fontes aapresentação de recomendações e conselhos sobreas práticas das escutas telefónicas e intercepção decorrespondência pela polícia para fins de investi-gação criminal.

1). Indique as recomendações e conselhos quedaria enquanto:(a) funcionário superior de polícia;(b) director de um grupo de defesa das liberda-des cívicas preocupado com o excesso de poderesda polícia e a invasão da privacidade.

2). Elabore uma declaração de princípios desti-nada ao ministro, com base no exame imparcial deambos os conjuntos de recomendações e conselhos.

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). Por que razão é importante respeitar o direitoà presunção de inocência?2). De que forma contribui a presunção de ino-cência para o respeito do direito a um julgamentoequitativo?

3). De que forma contribui o direito de uma pes-soa a ser informada prontamente das acusaçõesdeduzidas contra si para o respeito do direito a umjulgamento equitativo?

4). Por que razão é importante que uma pessoaacusada da prática de um crime não seja obrigadaa testemunhar contra si própria?

5). Quais são as qualidades essenciais de umagente da polícia especializado na investigação cri-minal?

6). Indique sucintamente os conselhos que dariaa um novo agente sobre a forma de proceder a revis-tas pessoais.

7). Descreva sucintamente os riscos a que seexpõe um agente policial que utiliza os serviços deum informador.Como podem reduzir-se esses riscos?

8). Descreva sucintamente os riscos que colocaa utilização de informadores ao desenvolvimentoda actividade policial em conformidade com osprincípios éticos. Como podem reduzir-se esses ris-cos?

9). Dever-se-ão aplicar os mesmos princípios éti-cos à investigação de crimes graves e à investiga-ção de pequenos delitos?

10). Os criminosos não respeitam as normas. Por-que deverá a polícia fazê-lo?

Page 121: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 122: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Terceira Parte 91

• Apresentar as normas internacionais aplicáveis a qualquer acto das autori-dades que tenha por efeito privar uma pessoa de liberdade, nomeadamente porter alegadamente cometido um delito, e destacar alguns aspectos práticos daaplicação dessas normas.

• Todo o indivíduo tem direito à liberdade e à segurança pessoal, bem comoà liberdade de movimentos.

• Ninguém será objecto de prisão ou detenção arbitrárias.

• Ninguém será privado de liberdade, a não ser pelos motivos e de acordocom os procedimentos estabelecidos por lei.

• Todo o indivíduo capturado será informado, no momento da captura, dasrazões que a justificam.

• Todo o indivíduo capturado será prontamente informado de qualqueracusação deduzida contra si.

• Todo o indivíduo capturado será presente sem demora a uma autoridadejudicial.

• Toda o indivíduo capturado terá direito a comparecer perante uma auto-ridade judicial a fim de que esta decida sem demora sobre a legalidade dasua captura ou detenção e será libertado caso a detenção seja consideradailegal.

• Todo o indivíduo detido tem direito a ser julgado num prazo razoável ou liber-tado.

• A prisão preventiva será uma excepção e não a regra geral.

• Todas as pessoas capturadas ou detidas têm direito aos serviços de umadvogado ou outro representante legal e deverão dispor de oportunidadessuficientes para se comunicarem com ele.

• Todas as capturas efectuadas deverão ficar registadas e este registoincluirá os seguintes elementos: motivo da captura; dia e hora da captura;

Captura

12

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

*capítulo

Page 123: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

92 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

a. Normas internacionais sobre captura –Informação para as apresentações

1. INTRODUÇÃO

345. Capturar uma pessoa significa privá-la deliberdade. No domínio da aplicação da lei, os finshabituais de uma captura são:• impedir que a pessoa cometa, ou continue acometer, um acto ilícito;• permitir a realização de investigações em relaçãoao acto ilícito alegadamente cometido pela pessoacapturada; ou• levar uma pessoa a comparecer em tribunal paraque este examine as acusações formuladas contra ela.

346. Qualquer que seja o seu objectivo, ou objec-tivos, a captura de uma pessoa deve ser baseada nalei e efectuada de modo profissional, competentee eficaz. Isto significa que, ao efectuar uma cap-tura, a polícia deverá fazer uso tanto dos seusconhecimentos como da sua perícia técnica.

347. O termo “captura” não aparece definido nosinstrumentos de direitos humanos que proíbem adetenção arbitrária, mas sim no Conjunto de Prin-cípios para a Protecção de Todas as Pessoas Sujei-tas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão, soba secção “Terminologia”, nos seguintes termos:

[…] acto de deter um indivíduo por suspeita da prática

de infracção ou por acto de uma autoridade.

É de importância fundamental que os funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei conheçam per-feitamente a forma como o termo “captura” é defi-nido na lei dos seus países e os poderes de capturaque essa legislação lhes confere.

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS HUMANOS

E CAPTURA

(a) Princípios fundamentais

348. A liberdade individual é um dos princípiosfundamentais de onde emanam todos os direitoshumanos. A privação da liberdade individual éuma questão extremamente grave que apenas sepode justificar quando for simultaneamentelegal e necessária. Os três princípios da liber-dade, legalidade e necessidade estão subjacen-tes a todas as normas específicas em matéria decaptura.

(b) Normas específicas sobre a captura

349. Os instrumentos internacionais de direitoshumanos compreendem diversas disposições des-tinadas a proteger a liberdade individual. Aquelasque dizem especificamente respeito à captura sãoa proibição da detenção arbitrária; as normas quedefinem procedimentos a seguir na sequência deuma captura; as normas relativas à detenção demenores; e as que exigem a compensação das víti-mas de detenção ilegal.

dia e hora da transferência para um local de detenção; dia e hora da com-parência perante uma autoridade judicial; identidade dos agentes envol-vidos; informação precisa sobre o local de detenção; e pormenores relativosao interrogatório.

• O registo da captura será comunicado ao detido, ou seu representantelegal.

• A família da pessoa detida será prontamente notificada da captura e localde detenção.

• Ninguém será obrigado a confessar-se culpado nem a testemunhar contra sipróprio.

• Sempre que necessário, a pessoa será assistida por um intérprete duranteo interrogatório.}

Page 124: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

[i] Proibição da detenção arbitrária

350. Esta proibição está consagrada no artigo 9.o

da Declaração Universal dos Direitos do Homem,que estabelece:

Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou

exilado.

351. A mesma proibição está expressa no artigo 9.o,n.o 1, do Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos, nos seguintes termos:

Todo o indivíduo tem direito à liberdade e à segurança

da sua pessoa. Ninguém pode ser objecto de prisão ou

detenção arbitrária. Ninguém pode ser privado da sua

liberdade a não ser por motivo e em conformidade com

processos previstos na lei.

352. A detenção arbitrária é também proibida pelaCarta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos(artigo 6.o), Convenção Americana sobre DireitosHumanos (artigo 7.o, n.os 1 a 3) e Convenção Euro-peia dos Direitos do Homem (artigo 5.o, n.o 1). Cadaum destes textos proclama o direito à liberdade esegurança pessoal, a proibição da detenção arbitráriae a exigência de que os fundamentos de qualquerdetenção estejam definidos na lei.

353. Com efeito, o artigo 5.o da Convenção Euro-peia dos Direitos do Homem afirma que ninguémserá privado de liberdade excepto em casos espe-cificamente determinados e que, em resumo, con-sistem na captura ou detenção:a) na sequência de condenação por um tribunalcompetente;b) por desobediência a uma ordem legítima deum tribunal ou para garantir o cumprimento deuma obrigação imposta por lei;c) a fim de comparecer perante uma autoridadejudicial competente por suspeita razoável de tercometido uma infracção;d) detenção de um menor em virtude de ordemproferida em conformidade com a lei, para fins deeducação sob vigilância ou para o fazer comparecerperante a autoridade competente nos termos da lei;e) detenção de pessoas a fim de impedir a pro-pagação de doenças infecciosas, bem como de alie-

nados mentais, alcoólicos, toxicodependentes ouvagabundos;f ) para impedir a entrada ou residência ilegaisde uma pessoa no país.Estes casos inscrevem-se em três amplas catego-rias, apesar de haver alguma sobreposição entreelas. As situações referidas nas alíneas a) e c)dizem claramente respeito à lei e aos procedi-mento penais; os casos mencionados nas alíneas b)e e) relacionam-se sobretudo com a protecção ouo controlo sociais; e a alínea f) tem a ver com a cha-mada “detenção administrativa”.

NOTA PARA OS FORMADORES: Apesar de estasúltimas disposições se aplicarem apenas aosEstados que são Partes na Convenção Europeia,é altamente provável que normas semelhantesestejam em vigor em muitos Estados espalhadospelo mundo. Cada uma das diferentes categoriasde casos tem repercussões sobre a actividade dapolícia que variam de local para local, podendo seranalisadas durante sessões de debate formais einformais. Algumas das questões levantadaspelas normas acima indicadas são colocadas nosTópicos para Discussão, no final do presentecapítulo.

[ii] Procedimentos a seguir na sequência

da captura

354. Os procedimentos a seguir na sequência dacaptura encontram-se descritos nos n.os 1 e 2 doartigo 9.o do Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos, que dispõe:

2). Todo o indivíduo preso será informado, no

momento da sua detenção, das razões dessa detenção

e receberá notificação imediata de todas as acusações

apresentadas contra ele.

3). Todo o indivíduo preso ou detido sob acusação

de uma infracção penal será prontamente conduzido

perante um juiz ou uma outra autoridade habilitada pela

lei a exercer funções judiciárias e deverá ser julgado num

prazo razoável ou libertado. A detenção prisional de

pessoas aguardando julgamento não deve ser regra

geral, mas a sua libertação pode ser subordinada a

garantir que assegurem a presença do interessado no

Deveres e funções da Polícia* 93

Page 125: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

julgamento em qualquer outra fase do processo e, se for

caso disso, para execução da sentença.

355. Estas disposições são reiteradas na ConvençãoAmericana sobre Direitos Humanos (artigo 7.o,n.os 4 e 5) e na Convenção Europeia dos Direitosdo Homem (artigo 5.o, n.os 2 e 3). Não existempreceitos análogos na Carta Africana dos Direitosdo Homem e dos Povos.

356. Quatro normas do Conjunto de Princípiospara a Protecção de Todas as Pessoas Sujeitas aQualquer Forma de Detenção ou Prisão referem--se a procedimentos a seguir na sequência da cap-tura, nos seguintes termos:Princípio 2 – A captura só deve ser efectuada emconformidade com a lei e pelas autoridades com-petentes ou pessoas autorizadas para o efeito.Princípio 10 – A pessoa capturada deve ser infor-mada, no momento da captura, dos motivos destae notificada sem demora das acusações contra siformuladas.Princípio 12 – Será lavrado registo de onde cons-tarão os motivos e o momento da captura, omomento de chegada da pessoa ao local de deten-ção e o da primeira comparência perante umaautoridade judicial ou outra autoridade, a identi-dade dos funcionários responsáveis pela aplica-ção da lei que tenham intervido e indicaçõesprecisas sobre o local de detenção.Princípio 13 – As pessoas capturadas devem rece-ber informação, bem como uma explicação, a res-peito dos seus direitos e modo de os exercer.

[iii] Salvaguardas adicionais

357. Diversos instrumentos prevêem garantiasadicionais, concebidas para assegurar o controlo doprocesso de captura.

358. O artigo 9.o, n.o 4, do Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos estabelece:

Todo o indivíduo que se encontrar privado de liber-

dade por prisão ou detenção terá o direito de intentar

um recurso perante um tribunal, a fim de que este

estatua sem demora sobre a legalidade da sua detenção

e ordene a sua libertação se a detenção for ilegal.

Disposições do mesmo tipo podem ser encontra-das na Convenção Americana sobre DireitosHumanos (artigo 7.o, n.o 6) e Convenção Europeiados Direitos do Homem (artigo 5.o, n.o 4), masnão na Carta Africana dos Direitos do Homem edos Povos.

359. O princípio 37 do Conjunto de Princípiospara a Protecção de Todas as Pessoas Sujeitas aQualquer Forma de Detenção ou Prisão dispõe:

A pessoa detida pela prática de uma infracção penal deve

ser presente a uma autoridade judiciária ou a outra

autoridade prevista por lei, prontamente após a sua

captura. Essa autoridade decidirá sem demora da lega-

lidade e necessidade da detenção. Ninguém pode ser

mantido em detenção aguardando a abertura de instrução

ou julgamento salvo por ordem escrita da referida auto-

ridade. A pessoa detida, quando presente a essa auto-

ridade, tem o direito de fazer uma declaração sobre a

forma como foi tratada enquanto em detenção.

360. O Princípio 2 dos Princípios sobre a Preven-ção Eficaz e Investigação das Execuções Extraju-diciais, Arbitrárias ou Sumárias estabelece:

A fim de prevenir a ocorrência de execuções extrajudi-

ciais, arbitrárias ou sumárias, os Governos deverão

assegurar um controlo rigoroso, nomeadamente atra-

vés de uma estrutura hierárquica claramente definida,

sobre todos os funcionários responsáveis pela retenção,

captura, detenção, custódia e prisão, bem como sobre

os funcionários autorizados por lei a utilizar a força e

armas de fogo.

[iv] Captura de jovens

361. A regra 10 das Regras Mínimas das NaçõesUnidas para a Administração da Justiça de Meno-res (Regras de Beijing) exige:a) que os pais ou o tutor do menor detido sejamimediatamente notificados da captura;b) que um juiz ou outro funcionário ou orga-nismo competente examine imediatamente a pos-sibilidade de libertar o menor;c) que os contactos entre os funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei e o jovem delin-quente sejam estabelecidos de forma a respeitar o

94 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 126: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 95

estatuto jurídico do menor e a evitar prejudicá-lo,tendo em conta as circunstâncias do caso.

362. A Convenção sobre os Direitos da Criançaaborda também a questão da captura de jovens. O artigo 37.o, alínea b), estabelece:

Nenhuma criança será privada de liberdade de forma ile-

gal ou arbitrária: a captura, detenção ou prisão de uma

criança devem ser conformes à lei, serão utilizadas uni-

camente como medida de último recurso e terão a dura-

ção mais breve possível.

NOTA PARA OS FORMADORES: Deverá tambémfazer-se referência ao capítulo XVI, sobre Políciae Protecção dos Jovens.

[v] Indemnização em caso de captura ilegal

363. O artigo 9.o, n.o 5, do Pacto Internacional sobreos Direitos Civis e Políticos exige que as vítimas deprisão ou de detenção ilegal tenham direito a obtercompensação. O artigo 5.o, n.o 6, da Convenção Euro-peia dos Direitos do Homem reitera esta exigência.

364. Não existe disposição semelhante quer naCarta Africana dos Direitos do Homem e dosPovos quer na Convenção Americana sobre Direi-tos Humanos. Contudo, o artigo 10.o deste últimoinstrumento estabelece que os indivíduos terãodireito a indemnizações caso sejam condenados,por sentença transitada em julgado, com basenum erro judiciário. A captura ou detenção ilegaispodem ser elementos de um erro judiciário.

365. O princípio 35 do Conjunto de Princípios paraa Protecção de Todas as Pessoas Sujeitas a QualquerForma de Detenção ou Prisão determina que todosos danos emergentes de actos ou omissões de umfuncionário público contrários aos direitos previs-tos no Conjunto de Princípios serão passíveis deindeminização, nos termos das normas de direitointerno aplicáveis em matéria de responsabilidade.

(c) Medidas de derrogação

366. Em certas circunstâncias, os Governospodem considerar necessário e correcto limitar as

liberdades individuais em nome do interessepúblico mais vasto e com o objectivo de asseguraroutros benefícios, designadamente a ordempública e a segurança da população.

367. A necessidade de restringir o exercício dedireitos humanos para salvaguardar a existênciada nação é reconhecida e permitida pelo PactoInternacional sobre os Direitos Civis e Políticos(artigo 4.o), pela Convenção Americana sobreDireitos Humanos (artigo 27.o) e pela ConvençãoEuropeia dos Direitos do Homem (artigo 15.o).

368. Em termos gerais, é necessário que se estejaperante uma situação de emergência pública queameace a existência da nação, só podendo as medi-das de derrogação ser introduzidas na estritamedida em que a situação o exigir. Continua ahaver algum controlo por parte da comunidadeinternacional sobre os Governos em causa sempreque tais medidas são adoptadas.

369. Alguns direitos não são passíveis de derro-gação, continuando protegidos em todas as cir-cunstâncias. Variam ligeiramente consoante asdisposições do instrumento em causa, masincluem sempre:• o direito à vida• a proibição da tortura;• a proibição da escravatura.

370. A questão das medidas derrogatórias seráexaminada em maior detalhe no capítulo XV,sobre Distúrbios internos, estados de excepção econflitos armados. A breve referência feita nopresente capítulo destina-se a assinalar que aderrogação pode ter algumas consequências. Porexemplo, podendo os mecanismos destinados agarantir o controlo das autoridades judiciáriassobre a captura e detenção de indivíduos sersuprimidos ou restringidos, corre-se o risco deabrir caminho à ocorrência de detenções arbi-trárias, torturas e outras formas de maus tratosdos detidos.

371. Deverá insistir-se no facto de que, ao seremadoptadas medidas de derrogação, os agentes poli-ciais deverão respeitar escrupulosamente as

Page 127: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

96 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

garantias que permanecem em vigor para a pro-moção e protecção dos direitos humanos.

(d) Desaparecimentos forçados

ou involuntários

372. Um exemplo de um desaparecimento forçadoou involuntário é apresentado na Ficha Informa-tiva n.o 6 (Rev.1) do Centro para os Direitos Huma-nos das Nações Unidas, que se ocupa do tema,nos seguintes termos (página 2):

[…] uma pessoa é presa, detida ou raptada contra a sua

vontade ou de outra forma privada de liberdade por

agentes governamentais de qualquer ramo ou nível,

ou ainda por grupos organizados ou particulares que

actuam em nome, ou com o apoio, directo ou indi-

recto, consentimento ou aquiescência do Governo, que

de seguida se recusam a revelar o destino ou paradeiro

da pessoa em causa ou se recusam a reconhecer a pri-

vação de liberdade, assim subtraindo essa pessoa à pro-

tecção da lei.

373. Sempre que funcionários responsáveispela aplicação da lei participam em actos con-ducentes a um desaparecimento forçado ouinvoluntário, subvertem de forma muito graveo papel da polícia, uma vez que a pessoa “desa-parecida” é subtraída à protecção da lei e, em con-sequência, privada de todos os seus direitoshumanos.

374. Os desaparecimentos forçados ou involuntá-rios implicam a violação de diversos direitoshumanos fundamentais, nomeadamente:• o direito à liberdade e à segurança pessoal;• o direito do detido um tratamento humano;• o direito à vida.

NOTA PARA OS FORMADORES: Breves referênciasao fenómeno dos desaparecimentos forçados ouinvoluntários serão feitas mais adiante, nos capí-tulos XIV e XXI.

375. É evidente que, se os funcionários respon-sáveis pela aplicação da lei forem responsáveis pelaprática de desaparecimentos forçados ou invo-luntários, estarão a exercer ilegalmente poderes

de captura e a violar o direito à liberdade e àsegurança da pessoa. Estarão também a violardiversas normas destinadas a funcionar comogarantias adicionais para protecção das pessoassujeitas a detenção.

376. Incumbe aos funcionários responsáveis pelaaplicação da lei:a) prevenir e detectar todos os crimes relacio-nados com o fenómeno dos desaparecimentos for-çados ou involuntários;b) velar para que os outros agentes da institui-ção policial onde trabalham não participem emtais crimes.

RELATOS DE DESAPARECIMENTOS

377. Através da sua resolução 20 (XXXVI), de 29de Fevereiro de 1980, a Comissão dos Direitos doHomem estabeleceu o Grupo de Trabalho sobre osDesaparecimentos Forçados ou Involuntários,composto por peritos nomeados a título indivi-dual, para examinar as questões relativas ao desa-parecimento de pessoas nas circunstâncias atrásreferidas.

378. O Grupo de Trabalho recebe e examinadenúncias de desaparecimentos apresentadas porfamiliares das pessoas desaparecidas, ou por orga-nizações de direitos humanos que actuam em seunome. Depois de determinar se a comunicaçãopreenche determinados requisitos, o Grupo deTrabalho transmite os casos individuais aos Gover-nos em causa, solicitando-lhes que procedam ainvestigações e o informem do resultado das mes-mas.

3. OBSERVAÇÕES FINAIS

379. O poder de captura é uma das principaisprerrogativas das autoridades policiais. É essencialà aplicação da lei e à administração da justiça. Odireito à liberdade individual é um direito humanofundamental. É essencial ao gozo de outros direi-tos e constitui uma condição prévia indispensávelde um governo democrático no seio de uma socie-dade democrática.

Page 128: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 97

380. As normas internacionais indicadas no pre-sente capítulo demonstram como um poder essen-cial da polícia pode ser conciliado com um direitohumano fundamental. A polícia necessita de com-preender em pleno os poderes de que dispõe nesteâmbito, bem como os limites dos mesmos. Os agen-

tes deverão também possuir as aptidões práticas etácticas necessárias ao exercício desses poderesdentro dos limites que lhes estão impostos. É nodesempenho concreto e prático da actividade poli-cial que tais poderes são correcta ou incorrecta-mente exercidos e os direitos respeitados ou violados.

• Reveja regularmente os poderes de que dispõe em matéria de captura e osprocedimentos a seguir no momento e na sequência da captura, a fim de asse-gurar que os compreende plenamente.

• Participe em acções de formação para adquirir e aperfeiçoar capacida-des de relação interpessoal, em particular capacidades de comunicação, quelhe permitam efectuar as capturas de forma profissional, discreta e com orespeito devido à dignidade humana.

• Caso a pessoa não ofereça resistência, fale calmamente, utilizandouma linguagem educada e dissuasora, e recorra a tons enérgicos e auto-ritários apenas quando necessário.

• Adquira e aperfeiçoe os conhecimentos técnicos e tácticos necessários paraque possa efectuar as capturas de forma profissional, discreta e com o res-peito devido à dignidade humana.

• Adquira e aperfeiçoe as técnicas relativas ao uso de algemas e outros dis-positivos de restrição de movimentos.

• Desenvolva a sua autoconfiança, nomeadamente através da aprendiza-gem de técnicas de defesa pessoal.

• Estude cuidadosamente o capítulo XIV do presente manual, sobre a uti-lização da força, em tudo quanto se aplique à captura.

• Solicite uma ordem ou um mandado de captura, sempre que possível.

• Transporte sempre consigo, no uniforme, um cartão de onde constem osdireitos da pessoa detida e leia-o textualmente à pessoa em causa uma vezque esta esteja controlada.

• Estude técnicas de resolução de conflitos, no âmbito de acções de formaçãocontínua ou de programas pedagógicos oferecidos pela sua comunidade.

• Mantenha um registo detalhado de todas as capturas, com todos os por-menores necessários (questão prática fundamental).

b. Normas internacionais sobre captura – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

}

}

Page 129: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

98 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

• Adopte e faça aplicar regulamentos internos claros sobre os procedi-mentos a seguir em caso de captura.

• Proporcione a todos os agentes acções de formação contínua sobre os pro-cedimentos a seguir em caso de captura, direitos da pessoa capturada e téc-nicas para efectuar uma captura de forma segura e humana.

• Proporcione formação em matéria de técnicas de comunicação interpessoal,resolução de conflitos, defesa pessoal e utilização de dispositivos de restri-ção de movimentos.

• Crie formulários normalizados para o registo da informação relativa à cap-tura, com base nas indicações fornecidas no presente capítulo, bem comona legislação e procedimentos de captura aplicáveis no âmbito da suajurisdição.

• Sempre que uma captura possa ser antecipadamente planeada, assegure--se de que os agentes dispõem de diversas opções e de que o planeamento,a preparação, a informação fornecida e as tácticas seguidas são adequa-das às circunstâncias e condições em que a captura deverá ser efectuada.

• Depois de cada captura, reúna-se com os agentes que nela participarame peça que lhe apresentem informação sobre a mesma, verificando cuida-dosamente o registo respectivo a fim de se assegurar de que está completo.

• Estabeleça procedimentos destinados a assegurar que a pessoa detida podecomunicar livremente com o seu advogado ou representante legal.

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

O direito de não ser sujeito a captura ou detençãoarbitrária é um direito humano fundamental queassume grande relevo no domínio da actuação dosagentes policiais.Comente o disposto nas alíneas seguintes:

(a) De que forma é este direito protegido pelaConstituição e pelas leis do seu país?

(b) Eficácia de quaisquer directrizes formuladaspelos poderes públicos ou pelas autoridadesjudiciárias para ajudar a polícia a respeitar estedireito.

(c) Eficácia de quaisquer instruções específicasemitidas pelos comandos policiais ou supervisores

de polícia sobre o exercício do poder de captura eprevenção das detenções arbitrárias.

(d) Meios utilizados pelos mecanismos de controloexistentes no seio das instituições policiais a fimde prevenir a ocorrência de capturas arbitrárias.

(e) Elabore um breve conjunto de directrizes e ins-truções para os funcionários de polícia, destinadasa assegurar que todas as capturas efectuadas sãolícitas e necessárias.

Exercício n.o

2

Considere as seguintes disposições do artigo 9.o doPacto Internacional sobre os Direitos Civis e Polí-ticos (n.os 1 e 2):

Todo o indivíduo tem direito à liberdade e à segu-rança da sua pessoa. Ninguém pode ser objecto de

Recomendações destinadas

a todos os funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

}

Page 130: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 99

prisão ou detenção arbitrária. Ninguém pode serprivado da sua liberdade a não ser por motivo e emconformidade com processos previstos na lei.

Todo o indivíduo preso será informado, nomomento da sua detenção, das razões dessa deten-ção e receberá notificação imediata de todas asacusações apresentadas contra ele.

1). Tendo em conta estas normas, pense queoutras salvaguardas poderiam ser necessárias paraproteger as pessoas contra a detenção arbitrária.

2). Discuta até que ponto as disposições da lei doseu país são suficientes para proteger as pessoascontra a detenção arbitrária.

3). Que formação recebem os agentes policiais doseu país em matéria de poderes e técnicas de captura?

4). Diga de que forma considera que essa for-mação poderia ser aperfeiçoada, a fim de garantirque todas as capturas efectuadas por agentes poli-ciais são lícitas e necessárias.

Exercício n.o

3

Imagine que foi incumbido de proceder à capturade uma pessoa que se julga estar armada e ser peri-gosa. Essa pessoa encontra-se escondida numacasa na cidade que é ocupada por mais quatro pes-soas. A pessoa a capturar não sabe que a polícia des-cobriu o seu paradeiro e considera a casa umesconderijo seguro. Sabe-se que a pessoa em causaresistiu a anteriores capturas, tendo utilizado umaarma de fogo contra a polícia.

1). De que informação adicional necessitariapara planear a operação de captura com um riscomínimo de provocar quaisquer lesões corporais?

2). Indique quais os elementos essenciais de umplano destinado a assegurar que a pessoa é cap-turada de forma eficaz, lícita e segura.

3). Indique as instruções que daria aos agentes,antes da operação de captura, sobre a utilização dearmas de fogo no decorrer da mesma.

4). Que implicações tem a presença na casa dequatro pessoas, além da pessoa a capturar, sobreos seus planos operacionais?

Exercício n.o

4

Num prazo de seis meses, quatro mulheres forambrutalmente assassinadas na capital do seu país.Existem indícios de que os homicídios foramcometidos pela mesma pessoa – um homem – eque têm motivação sexual. A população em geralestá extremamente sobressaltada, as mulheresaterrorizadas, enquanto que os órgãos de comu-nicação social e a classe política questionam acompetência da polícia. Não tem havido qualquerprogresso nas investigações.

1). Considera que estes são motivos suficientespara que se afaste a protecção contra a detenção arbi-trária, a fim de que mais homens possam ser deti-dos e interrogados sobre os crimes?

2). Exponha os argumentos a favor do aumentodos poderes de captura da polícia nas circunstân-cias enunciadas. Quais deveriam ser esses pode-res?

3). Exponha os argumentos a favor da manu-tenção em vigor, em tais circunstâncias, das dis-posições e procedimentos legais destinados agarantir a protecção das pessoas contra a detençãoarbitrária.

4). Para além do exercício de poderes acresci-dos, que outras medidas poderiam ser adoptadaspela polícia para tranquilizar a população?

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). Por que é tão importante o direito à liberdadee à segurança pessoal?

2). Relativamente à questão das capturas des-necessárias, exponha os motivos pelos quaisnem sempre é conveniente capturar uma pes-soa, mesmo que esteja legalmente habilitado afazê-lo.

Page 131: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

100 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

3). Os textos internacionais de direitos huma-nos proíbem a captura arbitrária. Elabore umadefinição de captura arbitrária.

4). Para além dos poderes habituais de captura edetenção (por exemplo, no caso de pessoas que pos-sam ter cometido uma infracção penal), a políciatem por vezes a faculdade de deter pessoas a fimde prevenir a propagação de doenças infecciosas,bem como de capturar pessoas dementes, alcoóli-cos, toxicodependentes e vagabundos. Consideraque compete à polícia ocupar-se de todas estascategorias de pessoas? De qual, ou quais, destascategorias se deveria ocupar a polícia? Será sem-pre necessário fazer uso dos poderes de captura rela-tivamente a tais pessoas?

5). Tanto os textos internacionais de direitoshumanos como a legislação interna exigem quetodas as pessoas detidas por suspeita de havercometido uma infracção penal sejam levadas pron-tamente à presença de um juiz ou outra autoridadejudicial. Por que motivos considera que foramintroduzidas tais disposições?

6). Que violações das normas internacionais dedireitos humanos são cometidas quando uma pes-soa é vítima de um desaparecimento forçado ou

involuntário? Que violações da lei interna do seupaís seriam cometidas nessas situações?

7). Por que razão são importantes as capacidadesde relacionamento interpessoal, em especial acapacidade de comunicação, ao efectuar uma cap-tura?

8). Poder-se-ão ensinar com êxito as capacida-des de relacionamento interpessoal, incluindo acapacidade de comunicação? Imagine que lhe soli-citaram a preparação de um curso para formaçãodos agentes policiais nesta matéria. Elabore umesboço do programa de curso, indicando as maté-rias a abordar.

9). Enumere os principais conselhos que daria aosnovos agentes sobre a forma de efectuar capturaslícitas e necessárias, de forma profissional e dis-creta.

10). Para fins de debate, imagine que uma equipade agentes policiais procedeu à captura de uma sériede pessoas suspeitas de haverem cometido umcrime grave, na sequência de uma operação poli-cial previamente planeada. Que pontos gostariade passar em revista ao reunir com os agentesapós a operação?

Page 132: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Terceira Parte 101

• Apresentar as normas internacionais relativas às condições de detençãoe ao tratamento dos detidos e dar oportunidade aos utilizadores do manuale formandos de praticar a aplicação dessas normas.

• A prisão preventiva deverá constituir a excepção e não a regra.

• Todas as pessoas privadas de liberdade deverão ser tratadas com huma-nidade e com respeito pela dignidade inerente à pessoa humana.

• Todas as pessoas acusadas de uma infracção penal serão consideradas ino-centes até que a sua culpabilidade tenha sido legalmente provada.

• Nenhum detido será sujeito à tortura ou a penas ou tratamentoscruéis, desumanos ou degradantes, nem a qualquer forma de violênciaou coacção.

• Os detidos serão mantidos apenas nos locais de detenção oficialmentereconhecidos, devendo as suas famílias e representantes legais receberinformação completa a tal respeito.

• Nos locais de detenção, os menores deverão ser separados dos adultos,as mulheres dos homens e as pessoas condenadas daquelas que aguardamjulgamento.

• As decisões relativas à duração e legalidade da detenção deverão sertomadas por uma autoridade judicial ou equivalente.

• Os detidos têm o direito de ser informados dos motivos da detenção e dequaisquer acusações contra si formuladas.

• A pessoa detida tem o direito de contactar com o mundo exterior e dereceber visitas dos membros da sua família, bem como o direito de comu-nicar em privado e pessoalmente com o seu representante legal.

• Os detidos deverão permanecer em instalações que ofereçam condiçõesde detenção humanas, concebidas para preservar a sua saúde e receber ali-mentação, água, abrigo, vestuário, serviços de saúde e artigos de higienepessoal, devendo ainda ter a possibilidade de praticar exercício.

Detenção

13

Objectivos do capítulo

}

}Princípios fundamentais

(vide também Capítulo XII,Captura)

}

}

*capítulo

Page 133: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

102 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

a. Normas internacionais sobre detenção – Informação para as apresentações

1. INTRODUÇÃO

381. As normas internacionais de direitoshumanos, bem como a maioria dos sistemasjurídicos nacionais, distinguem entre “detidos”e “presos”. Um detido é alguém que se encon-tra privado de liberdade, mas não foi condenadopela prática de qualquer delito. Um preso é umapessoa privada de liberdade em resultado deuma condenação. Uma vez que a polícia, namaior parte dos sistemas jurídicos, lida princi-palmente com detidos na fase prévia ao julga-mento, o presente capítulo centra-se nessacategoria de pessoas.

NOTA PARA OS FORMADORES: Os utilizadoresdo manual deverão estar alerta para o facto de otema do presente capítulo ser analisado em pro-fundidade na obra Direitos Humanos e PrisãoPreventiva: Um Manual de Normas Internacio-nais relativas à Prisão Preventiva (n.o 3 da Sériede Formação Profissional), publicada pelo Cen-tro para os Direitos Humanos das Nações Uni-das e pela Divisão para a Prevenção do Crime eJustiça Penal das Nações Unidas. Este manualpode ser obtido directamente através do Centro

para os Direitos Humanos ou através dos Cen-tros de Informação das Nações Unidas existen-tes na maioria dos Estados Membros (n.o deVenda E.94.XIV.6).

382. Todas as pessoas privadas de liberdade são vul-neráveis aos maus tratos. Algumas categorias,tais como as mulheres e as crianças, são parti-cularmente vulneráveis. Além do mais, conformeacima referido, os detidos à guarda da polícia nãoforam em geral condenados pela prática de qual-quer crime. São pessoas inocentes relativamenteàs quais se aplica a regra da presunção de ino-cência.

383. Por estas razões, a conduta da polícia rela-tivamente a um detido deverá ser humana eestritamente conforme à lei e aos regulamentosque disciplinam o tratamento das pessoas priva-das de liberdade. Isto é particularmente impor-tante aquando do interrogatório ou exame depessoas acusadas ou suspeitas da prática de umcrime.

384. As normas internacionais relativas ao trata-mento dos detidos consagram disposições deta-lhadas e princípios fundamentais que, serespeitados, irão garantir que as pessoas privadasde liberdade à guarda da polícia beneficiam decondições de detenção humanas e lícitas.

• As convicções religiosas e morais dos detidos deverão ser respeitadas.

• Toda a pessoa detida tem o direito de comparecer perante uma autori-dade judiciária que decidirá sobre a legalidade da sua detenção.

• Os direitos e a condição especial das mulheres e dos delinquentes juve-nis deverão ser respeitados.

• Ninguém se deverá aproveitar da situação de uma pessoa detida paracoagir essa pessoa a confessar qualquer facto, incriminar-se por qualqueroutro modo ou testemunhar contra terceiro.

• Só serão adoptadas as medidas de disciplina e manutenção da ordem pre-vistas na lei, não devendo os regulamentos ir além do necessário paragarantir a segurança da detenção ou ser desumanos.

Princípios fundamentais

(vide também Capítulo XII,Captura)

}

}

Page 134: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS HUMANOS

DURANTE A DETENÇÃO

(a) Princípios fundamentais

385. As pessoas passam a ficar à guarda da políciana sequência do exercício de poderes legais decaptura por parte das autoridades policiais ou pordecisão de um juiz ou outra autoridade com com-petência legal para o exercício do poder judicial.

386. A detenção é objecto de um processo disci-plinado por lei, beneficiando os detidos de formasespecíficas de protecção que se baseiam nosseguintes princípios:• ninguém será sujeito à tortura ou a outros maustratos;• todos os detidos têm direito a um tratamentohumano e ao respeito pela dignidade inerente à pes-soa humana;• todas as pessoas se presumem inocentes até quea sua culpabilidade seja provada nos termos dalei.

(b) Normas específicas sobre a detenção

387. Os instrumentos internacionais de direitoshumanos contêm disposições muito detalhadassobre a detenção, que abrangem a proibição datortura, exigências genéricas de um tratamentohumano e exigências específicas relativamente aotratamento dos menores e das mulheres. Todas elasserão analisadas no presente capítulo, juntamentecom outras questões relevantes: interrogatório eexame dos suspeitos, detenção na sequência demedidas derrogatórias das disposições dos tratadostomadas pelos Governos e desaparecimentos for-çados ou involuntários.

[i] Proibição da tortura

388. A tortura foi absolutamente interditada pelacomunidade internacional. É proibida pelo artigo 5.o

da Declaração Universal dos Direitos do Homem, queestabelece:

Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou

tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

É também proibida praticamente nos mesmos ter-mos pelo Pacto Internacional sobre os Direitos Civise Políticos (artigo 7.o), Carta Africana dos Direitos doHomem e dos Povos (artigo 5.o), Convenção Ameri-cana sobre Direitos Humanos (artigo 5.o, n.o 2) e Con-venção Europeia dos Direitos do Homem (artigo 3.o).

389. No âmbito das Nações Unidas, foram adop-tadas uma Declaração e uma Convenção contra atortura, que estabelecem um conjunto de medidasespecíficas para combater esta odiosa prática.

Declaração sobre a Protecção de Todas as Pessoascontra a Tortura e Outras Penas ou TratamentosCruéis, Desumanos ou Degradantes

390. A Declaração define a tortura no seu artigo 1.o.Esta definição interessa aos agentes policiais, umavez que nela se afirma que a tortura consiste emtodo acto pelo qual penas ou sofrimentos graves,físicos ou mentais são intencionalmente infligidosa uma pessoa por um funcionário público, ou outrem

por ele instigado […] com o fim de obter dela ou de ter-

ceiro uma informação ou uma confissão, de a punir por

um acto que tenha cometido ou se suspeite que come-

teu, ou de intimidar essa ou outras pessoas […]

391. Diversas disposições da Declaração exigem:

a) a proibição da tortura pelos Estados;

b) a investigação dos alegados casos de tortura;

c) que a formação dos agentes policiais e outrosfuncionários públicos tenha plenamente em contaa proibição da tortura;

d) a inclusão da proibição da tortura nas normasou instruções gerais relativas aos deveres e funçõesde todos aqueles que possam ser chamados aintervir na guarda ou tratamento dos detidos;

e) o controlo sistemático pelos Estados dosmétodos e práticas de interrogatório;

f ) o exame periódico das disposições relativas àcustódia e ao tratamento das pessoas privadas deliberdade.

Deveres e funções da Polícia* 103

Page 135: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Convenção contra a Tortura e Outras Penas ouTratamentos Cruéis, Desumanos ou Degra-dantes

392. A Convenção baseia-se na Declaração, masalarga muitas das suas disposições. Por exemplo,a definição de tortura é alargada, no artigo 1.o daConvenção, por forma a incluir todo o acto pormeio do qual uma dor ou sofrimento agudos, físi-cos ou mentais, são intencionalmente causados auma pessoa por um agente público ou qualquer outra

pessoa agindo a título oficial, a sua instigação ou com

o seu consentimento expresso ou tácito […]

Isto significa que a responsabilidade dos funcio-nários públicos é alargada, a fim de incluir os fun-cionários de todos os níveis, que podem serresponsabilizados caso tenham conhecimento dapossibilidade de ocorrência de um acto de torturae nada façam para o impedir.

393. O artigo 2.o da Convenção assume particularsignificado para os agentes policiais. Este artigo dizo seguinte:

1). Os Estados partes tomarão as medidas legislati-

vas, administrativas, judiciais ou quaisquer outras que

se afigurem eficazes para impedir que actos de tortura

sejam cometidos em qualquer território sob a sua

jurisdição.

2). Nenhuma circunstância excepcional, qualquer

que seja, quer se trate de estado de guerra ou de ameaça

de guerra, de instabilidade política interna ou de outro

estado de excepção, poderá ser invocada para justificar

a tortura.

3). Nenhuma ordem de um superior ou de uma auto-

ridade pública poderá ser invocada para justificar a tor-

tura.

394. A Convenção contém normas destinadas agarantir que as pessoas acusadas da prática da tor-tura respondam perante a justiça, independente-mente da respectiva nacionalidade ou do localonde o crime tenha sido cometido. A Convençãoinstituiu ainda o Comité contra a Tortura, a fim decontrolar a sua própria aplicação.

NOTA PARA OS FORMADORES: Existe também aConvenção Europeia para a Prevenção da Tor-tura e das Penas ou Tratamentos Desumanos ouDegradantes. Em conformidade com este ins-trumento, foi criado um Comité que, por inter-médio de visitas, examina o tratamento prestadoàs pessoas privadas de liberdade com o objectivode reforçar, se necessário, a protecção dessas pes-soas contra a tortura e as penas ou tratamentosdesumanos ou degradantes (artigo 1.o). CadaEstado Parte deverá permitir a realização de visi-tas, em conformidade com as disposições daConvenção, a qualquer local sujeito à sua juris-dição onde se encontrem pessoas privadas deliberdade por ordem de uma autoridade pública(artigo 2.o).

395. Deverá ser feito notar aos funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei que a tortura nãopode ser considerada lícita nem justificável quais-quer que sejam as circunstâncias. Por exemplo:• As quatro Convenções de Genebra de 1949 eseus dois Protocolos Adicionais de 1977 proíbema tortura em período de conflito armado interna-cional e não internacional. (Voltar-se-á a fazer refe-rência a estes instrumentos no capítulo XV, infra.)• O Pacto Internacional sobre os Direitos Civis ePolíticos, bem como diversos tratados de âmbitoregional, não admitem qualquer derrogação das nor-mas que proíbem a tortura, durante os estados deexcepção.

396. O artigo 5.o do Código de Conduta para os Fun-cionários Responsáveis pela Aplicação da Leidemonstra todo o alcance da proibição da tortura:

Nenhum funcionário responsável pela aplicação da lei

pode infligir, instigar ou tolerar qualquer acto de tortura

ou qualquer outra pena ou tratamento cruel, desumano

ou degradante, nem invocar ordens superiores ou cir-

cunstâncias excepcionais, tais como o estado de guerra

ou uma ameaça à segurança nacional, instabilidade

política interna ou qualquer outra emergência pública

como justificação para torturas ou outras penas ou tra-

tamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

397. A tortura nunca se justifica sejam quaisforem as circunstâncias e nenhum funcionário

104 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 136: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

público pode invocar qualquer argumento parajustificar a prática da tortura.

[ii] Exigências gerais de um tratamento humano

dos detidos

398. As exigências gerais de um tratamentohumano das pessoas detidas estão definidas noartigo 10.o do Pacto Internacional sobre os Direi-tos Civis e Políticos, que impõe:

a) que todas as pessoas privadas de liberdadesejam tratadas com humanidade e com o devidorespeito pela dignidade inerente à pessoa humana;

b) que as pessoas acusadas sejam separadas daspessoas condenadas e submetidas a um regime dife-renciado, adequado à sua condição de pessoas nãocondenadas;

c) que os menores acusados da prática de umainfracção sejam separados dos adultos;

Disposições semelhantes podem ser encontradasna Convenção Americana sobre Direitos Humanos,mas não na Carta Africana dos Direitos doHomem e dos Povos nem na Convenção Europeiados Direitos do Homem.

399. A definição do conceito de “pessoa detida”,constante do Conjunto de Princípios para a Protec-ção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Formade Detenção ou Prisão na secção entitulada “Ter-minologia”, interessa directamente aos funcioná-rios responsáveis pela aplicação da lei:

pessoa privada da sua liberdade, excepto se o tiver sido em

consequência de condenação pela prática de uma infracção.

assim como a definição de “pessoa presa”:

pessoa privada da sua liberdade em consequência de con-

denação pela prática de uma infracção.

Em geral, é a primeira categoria de pessoas que se

encontra sob custódia policial.

400. O Conjunto de Princípios é composto por 39princípios. O princípio 1 define os requisitos básicos

para o tratamento humano das pessoas detidas ou pre-sas. O princípio 6 consagra a proibição da tortura.

401. As normas específicas constantes deste ins-trumento podem ser discutidas com os partici-pantes do curso e as suas disposições comparadascom a legislação interna, com os regulamentos e ins-truções a que obedecem no desempenho das res-pectivas funções e com a verdadeira prática policial.São particularmente importantes as disposiçõesque estabelecem:

a) o controlo judicial dos detidos (princípios 4,11 e 37);

b) o direito dos detidos a comunicarem com o seuadvogado ou defensor (princípios 11, 15, 17 e 18);

c) o direito dos detidos a comunicarem e man-terem contacto com as suas famílias (princípios 15,16, 19 e 20);

d) o acompanhamento médico adequado daspessoas detidas (princípios 24 e 26);

e) a manutenção de registos das circunstânciasda captura e detenção (princípio 12);

f ) o registo detalhado das circunstâncias dequalquer interrogatório (princípio 23).

402. A questão da responsabilidade individualdos funcionários responsáveis pela aplicação dalei é abordada no princípio 7, n.o 2. De acordocom esta disposição, os funcionários que tive-rem razões para crer que ocorreu ou está imi-nente uma violação do Conjunto de Princípiosdeverão comunicar esse facto aos seus superio-res e, se necessário, a outras autoridades ouinstâncias competentes de controlo ou derecurso.

403. O Conjunto de Princípios contém disposi-ções mais relevantes no que concerne aos indiví-duos sob custódia policial do que as RegrasMínimas para o Tratamento dos Reclusos. Contudo,os funcionários responsáveis pela aplicação da leicom responsabilidades importantes no que diz

Deveres e funções da Polícia* 105

Page 137: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

respeito à guarda de detidos devem conhecer tam-bém este último instrumento – em especial, a sec-ção C da Parte II (regras 84 a 93) intitulada“Reclusos detidos ou aguardando julgamento”.

[iii] Jovens detidos

404. Para além das normas e princípios geraisrelativos ao tratamento dos detidos acima enun-ciados, aplicam-se também aos jovens detidos asdisposições dos seguintes instrumentos:

Regras Mínimas das Nações Unidas para a Admi-nistração da Justiça de Menores (Regras de Beijing)

405. Este instrumento é composto por 30 regras,cada uma das quais com um comentário explica-tivo, estando dividido em seis partes.

406. Deverão ser lembrados aos participantes docurso os fins da justiça de menores, definidos naregra 5, que afirma:

O sistema da Justiça de menores deve dar a maior

importância ao bem-estar destes e assegurar que qual-

quer decisão em relação aos delinquentes juvenis seja

sempre proporcional às circunstâncias especiais tanto

dos delinquentes como do delito.

407. A segunda parte das Regras é aquela que dizmais directamente respeito ao tratamento dosjovens por parte da polícia, pois tem por objecto a“Investigação e Procedimento”. Deverão ser des-tacados os seguintes aspectos:

a) As regras 10.1 e 10.2 estabelecem que, sem-pre que um menor é detido, os seus pais ou tutordevem ser imediatamente notificados do facto e umjuiz ou outro funcionário ou organismo competentedeverão examinar sem demora a possibilidade deo libertar.

b) A regra 10.3 diz que os contactos entre o orga-nismo responsável pela aplicação da lei e o menordeverão ser estabelecidos de forma a respeitar o esta-tuto jurídico do menor, a favorecer o seu bem--estar e a evitar prejudicá-lo, tendo em conta ascircunstâncias do caso.

c) A regra 11 trata do recurso a meios extraju-diciais nos casos que envolvem menores e exigeque os funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei que disponham de poderes discricioná-rios para o tratamento dos casos de delinquên-cia juvenil façam uso desses poderes, evitandorecorrer ao processo penal estabelecido sempreque possível.

d) A regra 12 impõe que o tratamento dos meno-res e dos casos de delinquência juvenil sejam con-fiados a agentes e serviços policiais especializadosna matéria.

Regras das Nações Unidas para a Protecção dosMenores Privados de Liberdade

408. Este instrumento é composto por 87 regras eestá dividido em cinco capítulos. Foi concebido afim de assegurar que os jovens são privados de liber-dade e mantidos sob detenção unicamente emcasos de necessidade absoluta; e que os delin-quentes juvenis detidos são tratados humana-mente, tendo devidamente em conta o seuestatuto de menores e com o devido respeito dosseus direitos humanos.

409. A secção III, “Menores sob detenção ou queaguardam julgamento”, é aquela que mais direc-tamente se relaciona com a actividade policial. Asduas regras que compõem essa secção (regras 17e 18) destacam que os menores se deverão presu-mir inocentes e ter direito ao tratamento especialque decorre dessa condição. Estas Regras estabe-lecem também as condições mínimas para amanutenção dos menores sob detenção, entre asquais se incluem:

a) o direito aos serviços de um advogado e aassistência judiciária;

b) oportunidades de trabalhar contra remune-ração;

c) oportunidades de estudar e receber formação;

d) possibilidade de receber e guardar materiaisde lazer e recreio.

106 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 138: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Convenção sobre os Direitos da Criança

410. A Convenção sobre os Direitos da Criança écomposta por 54 artigos, estando dividida em trêspartes. Este instrumento reitera e reforça muitasdas proibições e garantias enunciadas no presentecapítulo. O artigo 37.o assume particular relevân-cia, dispondo da seguinte forma:

a) A alínea a) proíbe a tortura e os maus tratosda criança, bem como a imposição da pena demorte e da prisão perpétua;

b) A alínea b) proíbe a privação da liberdade deuma criança de forma ilegal ou arbitrária;

c) A alínea c) exige que a criança privada deliberdade seja tratada com a humanidade e o res-peito devidos à dignidade da pessoa humana.Deverá também ser tratada de forma consentâneacom as necessidades das pessoas da sua idade,permanecer separada dos adultos e ter o direito demanter contacto com a sua família.

d) A alínea d) concede à criança privada de liber-dade o direito de aceder rapidamente à assistênciajurídica, bem como o direito de impugnar a lega-lidade da sua privação de liberdade perante um tri-bunal ou outra autoridade competente.

NOTA PARA OS FORMADORES: Deverá também serfeita referência ao capítulo XVI, sobre a Polícia eProtecção dos Jovens.

[iv] Mulheres detidas

411. A especial condição das mulheres é reconhe-cida e protegida por dois tipos de disposições: umasque exigem que as mulheres detidas permaneçamalojadas em locais separados dos dos homens eoutras relativas à questão da discriminação.

412. LOCAIS DE DETENÇÃO – esta questão é abordadana regra 8 das Regras Mínimas para o Tratamentodos Reclusos. Apesar de a resolução 663 C (XXIV)do Conselho Económico e Social, de 31 de Julho de1957, pela qual o Conselho adoptou as Regras, terrecomendado que fosse favoravelmente conside-

rada a adopção e aplicação das mesmas na admi-nistração dos estabelecimentos penitenciários e cor-reccionais, o princípio da separação consagrado naregra 8 é relevante para a situação das mulheres deti-das à guarda da polícia. Esta regra exige:

a) que as diferentes categorias de reclusossejam mantidas em instituições separadas ou emzonas distintas da mesma instituição, tendo emconsideração, nomeadamente, o respectivo sexo,idade e antecedentes criminais;

b) que mulheres e homens sejam mantidos,tanto quanto possível, em instituições separadas;nos estabelecimentos que recebam pessoas deambos os sexos, as instalações destinadas àsmulheres devem ser completamente separadas.

413. Embora, em geral, a existência de estabeleci-mentos e instalações separadas para as mulherescolocadas sob custódia policial não seja necessárianem exequível, o princípio segundo o qual as mulhe-res devem permanecer alojadas em locais distintosdos dos homens deve ser rigorosamente respeitado.

414. A questão da DISCRIMINAÇÃO é tratada noprincípio 5 do Conjunto de Princípios para a Pro-tecção de Todas as Pessoas Sujeitas a QualquerForma de Detenção ou Prisão. Este preceito esta-belece que:

a) os Princípios se aplicam a todas as pessoas,sem discriminação alguma, nomeadamente deraça, cor, sexo e língua;

b) as medidas aplicadas nos termos da lei eexclusivamente destinadas a proteger os direitos e a especial condição das mulheres, em especial dasmulheres grávidas e lactantes, não serão conside-radas discriminatórias.

415. As leis e regulamentos internos que exigem:

a) que a vigilância das mulheres detidas sejaefectuada por mulheres polícias,

b) que as revistas pessoais sejam efectuadas porfuncionários do mesmo sexo que os detidos em

Deveres e funções da Polícia* 107

Page 139: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

causa, devem ser escrupulosamente aplicados e res-peitados.

NOTA PARA OS FORMADORES: Deverá também serfeita referência ao capítulo XVII, sobre Aplicaçãoda Lei e Direitos das Mulheres.

(c) Audição ou interrogatório

dos suspeitos

416. A audição ou o interrogatório dos suspeitos fazemnecessariamente parte do processo de investigação.Contudo, uma vez que as pessoas interrogadas comosuspeitas se encontram em geral detidas e as normasinternacionais sobre a matéria se referem aos deti-dos, a questão será abordada no presente capítulo enão no capítulo XI, relativo à Investigação Policial.

417. As audições ou interrogatórios de suspeitos exi-gem conhecimentos técnicos particulares. Existesobre esta matéria um abundante acervo de conhe-cimentos teóricos e práticos que não é possívelnem conveniente tentar transmitir no decorrer deum curso de formação sobre direitos humanos eaplicação da lei. Será, porém, conveniente:• identificar as normas internacionais pertinentes;• considerar as implicações dessas normas no pro-cesso de interrogatório;• assinalar a necessidade de recorrer aos conheci-mentos teóricos actualmente disponíveis e às boaspráticas policiais nesta área.

[i] Normas internacionais pertinentes

418. A Declaração sobre a Protecção de Todas as Pes-soas contra a Tortura e Outras Penas ou TratamentosCruéis, Desumanos ou Degradantes estabelece que osEstados “examinarão periodicamente os métodos deinterrogatório” a fim de prevenir a tortura e os maustratos das pessoas privadas de liberdade (artigo 6.o).

419. A Convenção contra a Tortura e Outras Penasou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degra-dantes exige que os Estados:

a) garantam que a educação e informação relativasà proibição da tortura sejam incluídas na formaçãodo pessoal responsável pela aplicação da lei e de outras

pessoas que possam intervir na guarda, no interro-gatório ou no tratamento dos detidos (artigo 10.o);

b) exerçam uma vigilância sistemática sobre as nor-mas, instruções, métodos e práticas de interrogatório,a fim de evitar qualquer caso de tortura (artigo 11.o).

420. O Conjunto de Princípios para a Protecção deTodas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma deDetenção ou Prisão estabelece que:

a) será proibido abusar da situação da pessoadetida para a coagir a confessar, incriminar-se porqualquer outro modo ou testemunhar contra ter-ceiro (princípio 21, n.o 1);

b) nenhuma pessoa detida será submetida,durante o interrogatório, a violência, ameaças oumétodos de interrogatório susceptíveis de com-prometer a sua capacidade de decisão ou de dis-cernimento (princípio 21, n.o 2);

c) a duração do interrogatório de um detido e dosintervalos entre os interrogatórios, bem como aidentidade dos funcionários que conduzem osinterrogatórios e de outras pessoas presentes nodecorrer dos mesmos serão registadas e autenti-cadas nos termos impostos pela lei;

d) o incumprimento das disposições dos Prin-cípios na recolha de provas deverá ser tida emconta na determinação da admissibilidade de uti-lizar tais provas contra o detido (princípio 27);

e) um detido suspeito ou acusado de um delitocriminal presume-se inocente até que a sua cul-pabilidade tenha sido legalmente provada peranteum tribunal (princípio 36, n.o 1).

[ii] Objectivo das normas

421. O objectivo das normas relativas à audição eao interrogatório consiste em garantir o trata-mento humano dos detidos:

a) como um fim em si próprio – em conformi-dade com o princípio do respeito pela dignidadeinerente à pessoa humana;

108 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 140: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 109

b) a fim de prevenir a ocorrência de erros judi-ciários – devido ao facto de os detidos poderem con-fessar crimes que não cometeram na sequência dasujeição a torturas ou maus tratos.

422. As falsas confissões de um crime são, nessascircunstâncias, um perigo muito real, devido:

a) à vulnerabilidade dos detidos em geral;

b) à particular vulnerabilidade de alguns detidos,devido a factores pessoais e psicológicos passíveisde afectar a sua capacidade de decidir livrementee de pensar de forma racional;

c) à compreensível tendência das pessoas sujei-tas a maus tratos de tudo fazer para que essesmaus tratos cessem, nomeadamente confessandocrimes que não cometeram.

[iii] Implicações das normas sobre os processos de

audição ou interrogatório

423. As normas acima referidas têm repercussõestanto sobre as finalidades da audição ou interro-gatório como sobre a atitude, os conhecimentos ea preparação dos funcionários que conduzemesses actos, bem como as respectivas competênciastécnicas.

424. A audição ou interrogatório de um detido nãopoderá ter por finalidade:

• obrigar a pessoa a confessar-se culpada, a incri-minar-se a si própria ou a testemunhar contra ter-ceiro;• sujeitar a pessoa a um tratamento susceptível decomprometer a sua capacidade de decisão ou dis-cernimento.

A audição ou interrogatório dos detidos é parte inte-grante do processo de investigação e visa a recolhae a análise de informação. Ambas as finalidadesserão melhor servidas se o funcionário adoptar aseguinte atitude:a) demonstrar abertura de espírito, isto é, não ten-tar utilizar o interrogatório para reforçar ideiaspreconcebidas;

b) procurar apurar os factos ou recolher infor-mação, isto é, não ter unicamente em vista obtera confissão da pessoa interrogada.

425. A atitude do funcionário que interroga deveráestar condicionada pelo respeito da dignidade ine-rente à pessoa humana e pelos fins da audição ouinterrogatório, conforme acima indicados.

426. Os conhecimentos e a preparação do funcio-nário que procede ao interrogatório deverão abran-ger:

a) as normas éticas e jurídicas aplicáveis ao pro-cesso de audição ou interrogatório;

b) toda a informação disponível sobre o crime ouincidente sobre o qual irá incidir o interrogatório;

c) os factores psicológicos que intervêm no pro-cesso de interrogatório, particularmente aqueles queafectam a capacidade dos indivíduos de decidirlivremente e pensar de forma racional;

d) a personalidade e o carácter da pessoa a serouvida.

É fundamental que as duas últimas áreas de conhe-cimento e preparação tenham por base o trabalhoteórico actualmente desenvolvido nesta área.

427. As aptidões técnicas da pessoa que interrogaresultarão da formação e da experiência adquiridascom base nos conhecimentos actualmente dispo-níveis sobre a teoria e a prática do interrogatório.

NOTA PARA OS FORMADORES: As observações for-muladas centraram-se no interrogatório de pessoassuspeitas ou acusadas da prática de um crime. Ointerrogatório das testemunhas do crime é tambémextremamente importante para uma investigaçãocriminal eficaz. Cada tipo de interrogatório exigeuma diferente abordagem e a aplicação de diferentesconhecimentos e técnicas.

Profissionais na área da psicologia e agentes poli-ciais têm vindo a acumular significativos conhe-cimentos especializados na teoria e prática dos

Page 141: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

110 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

interrogatórios, tanto de suspeitos como de teste-munhas. Diversos Estados dispõem de compe-tências técnicas especializadas neste domínio,devendo recorrer-se a elas sempre que se constateque os conhecimentos nesta área são insuficien-tes. As dificuldades no domínio das técnicas deinterrogatório continuam a conduzir aos maustratos dos detidos e a provocar erros judiciários.

(d) Medidas de derrogação

428. Em certas circunstâncias, os Governospodem considerar necessário e correcto limitar asliberdades individuais em nome do interessepúblico mais vasto e com o objectivo de asseguraroutros benefícios, como a ordem pública e a segu-rança da população.

429. A necessidade de restringir o exercício dedireitos humanos para salvaguardar a existênciada nação é reconhecida e permitida pelo PactoInternacional sobre os Direitos Civis e Políticos(artigo 4.o), pela Convenção Americana sobre Direi-tos Humanos (artigo 27.o) e pela Convenção Euro-peia dos Direitos do Homem (artigo 15.o).

430. Em termos gerais, é necessário que se estejaperante uma situação de emergência pública queameace a existência da nação, só podendo as medi-das de derrogação ser introduzidas na estritamedida em que a situação o exigir. Continua ahaver algum controlo por parte da comunidadeinternacional sobre os Governos em causa sempreque tais medidas são adoptadas.

431. Alguns direitos não são passíveis de derro-gação, continuando protegidos em todas as cir-cunstâncias. Variam ligeiramente consoante asdisposições do instrumento em causa, masincluem sempre:

• o direito à vida;• a proibição da tortura;• a proibição da escravatura.

432. A questão das medidas derrogatórias seráexaminada em maior detalhe no capítulo XV,sobre Distúrbios internos, estados de excepção e

conflitos armados. A breve referência feita no pre-sente capítulo destina-se a:

a) sublinhar que a proibição da tortura é absolutae mantém-se, sejam quais forem as circunstâncias;

b) assinalar que a derrogação pode ter algumasconsequências. Por exemplo, podendo os meca-nismos destinados a garantir o controlo das auto-ridades judiciárias sobre os detidos ser suprimidosou restringidos, corre-se o risco de abrir caminhoà ocorrência da tortura e outras formas de maustratos das pessoas sujeitas a detenção.

433. Deverá insistir-se no facto de que, ao seremadoptadas medidas de derrogação, os agentes policiais deverão respeitar escrupulosamente asgarantias que permanecem em vigor para a pro-moção e protecção dos direitos humanos.

(e) Desaparecimentos forçados

ou involuntários

434. Deverá ser feita referência à análise dos desa-parecimentos forçados ou involuntários feita nocapítulo XII, sobre Captura (parágrafos 372-376,supra). Foi aí assinalado que o direito do detido aum tratamento humano é um dos direitos funda-mentais violados sempre que ocorre um desapa-recimento forçado ou involuntário.

435. Deverá recordar-se aos participantes do cursoo exemplo de um desaparecimento deste tipo dadono capítulo XII (parágrafo 372, supra), bem comoas responsabilidades dos funcionários responsáveispela aplicação da lei relativamente a tais desapare-cimentos, conforme descrito no mesmo capítulo.

3. OBSERVAÇÕES FINAIS

436. O tratamento e a guarda dos detidos sãoaspectos extremamente importantes da actividadepolicial. Apesar do facto de o tratamento das pes-soas sujeitas a detenção ser estritamente regula-mentado, tanto pelo direito internacional comopelo direito interno dos diferentes Estados, conti-nuam a ser cometidos abusos.

Page 142: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 111

437. O tratamento humano dos detidos não exigeum alto nível de conhecimentos técnicos especia-lizados; exige apenas o respeito pela dignidadeinerente à pessoa humana e a observância de algu-mas regras de conduta elementares. De todas asquestões abordadas no presente capítulo, apenasa audição ou o interrogatório dos detidos exigemconhecimentos particulares. Um interrogatórioeficaz e, ao mesmo tempo, conforme aos princí-pios éticos exige um alto nível de competênciatécnica da parte dos agentes, que pode ser adqui-rida através da formação e da experiência. Contudo,

é essencial que a formação se baseie em conheci-mentos teóricos sólidos e nas boas práticas actual-mente desenvolvidas.

438. A forma como uma instituição policial trata aspessoas colocadas à sua guarda revela-nos a medidado profissionalismo dos seus agentes; dos princí-pios éticos que é capaz de respeitar; e demonstra atéque ponto a instituição poderá ser considerada comoprestadora de um serviço à comunidade e não comoum instrumento de repressão. A longo prazo, estesfactores irão determinar a eficácia do organismo.

b. Normas internacionais sobre detenção – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

• Inscreva-se em programas de formação para aperfeiçoar as suas aptidõestécnicas nos domínios do aconselhamento, controlo da desordem pública,primeiros socorros, defesa pessoal, resolução de conflitos e supervisão.

• Estude os antecedentes e o processo de todos os detidos para se aperce-ber daqueles que se encontram em perigo.

• Facilite as visitas dos sacerdotes ou outros religiosos, representantes legais,familiares, inspectores e pessoal médico.

• Estude e utilize as melhores e mais modernas técnicas de interrogatório.

• Ostente uma placa com a sua identificação claramente visível, em todasas ocasiões.

• Não entre nas instalações de detenção transportando uma arma defogo, a menos que seja para conduzir um detido ao exterior.

• Reviste regularmente os detidos, para garantir a segurança.

• Aconselhe-se com o pessoal médico sobre todas as questões relacionadascom a alimentação, os meios de coacção e a disciplina.

• Participe imediatamente qualquer suspeita de maus tratos, físicos ou men-tais, sobre os detidos.

• Nunca utilize os dispositivos de restrição de movimentos como um cas-tigo. Utilize-os apenas, se necessário, para prevenir a fuga durante as trans-ferências, por motivos médicos certificados; ou por ordem do director, casotenham falhado outros métodos, para evitar que o detido se magoe a sipróprio ou a terceiros, ou danifique as instalações.

• Facilite a utilização de materiais recreativos, livros e material de escrita.

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

}

Page 143: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

112 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

• Estabeleça, divulgue, aplique e reveja regularmente regulamentos inter-nos relativos ao tratamento dos detidos.

• Proporcione formação especializada a todos os funcionários que traba-lham nas instalações de detenção.

• Adopte medidas especiais para garantir o respeito pelas convicções reli-giosas e morais dos detidos, incluindo os seus hábitos alimentares.

• Adopte um sistema de notificação em três fases: notificação dos motivosda detenção (imediata); notificação das acusações (no mais curto espaçode tempo); notificação dos direitos do detido (em duas ocasiões: aquandoda notificação dos motivos da detenção e de novo com a notificação dasacusações);

• Ao decidir sobre a colocação dos agentes, mantenha os funcionáriosencarregados da vigilância dos detidos independentes dos funcionários queprocedem às capturas e efectuam as investigações.

• Reúna-se periodicamente com os delegados do Ministério Público, juizes,investigadores criminais e assistentes sociais a fim de identificar as pessoascuja detenção tenha deixado de ser necessária.

• Designe agentes do sexo feminino para vigiar, revistar e supervisionar asmulheres detidas.

• Proíba a entrada de funcionários do sexo masculino nas zonas destina-das a mulheres dentro das instalações de detenção, excepto em situaçõesde emergência.

• Destine uma sala especial, separada da área de visitas familiares, paraos detidos se reunirem em privado com o seu advogado.

• Assegure-se de que existe uma área destinada às visitas normais, com umagrelha, mesa ou divisória semelhante entre o visitante e o detido.

• Proíba em absoluto, investigue de imediato e puna severamente, nomea-damente através da instauração de processo penal, qualquer acto de tor-tura, penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

• Providencie para que as refeições satisfaçam as necessidades alimenta-res básicas e sejam servidas a intervalos regulares, não devendo o períodoentre o pequeno-almoço e o jantar exceder as 15 horas.

• Estude cuidadosamente o capítulo XIV do presente manual, sobre a uti-lização da força.

• Estude e aplique as relevantes recomendações para os funcionários comresponsabilidades de comando e supervisão, abaixo formuladas.

Recomendações destinadas

a todos os funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

}

Page 144: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 113

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

O artigo 6.o da Declaração sobre a Protecção deTodas as Pessoas contra a Tortura e Outras Penasou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degra-dantes afirma:

Todos os Estados examinarão periodicamente osmétodos de interrogatório e as disposições relati-vas à custódia e ao tratamento das pessoas priva-das de liberdade no seu território, a fim deprevenir qualquer caso de tortura ou de outraspenas ou tratamentos cruéis, desumanos oudegradantes.

1). Defina um procedimento e elabore um con-junto de instruções, para utilização no seio da suainstituição policial, a fim de garantir:

a) um exame periódico dos métodos e práticasde interrogatório;

b) um exame periódico das disposições relativasà custódia e ao tratamento das pessoas privadas deliberdade.

2). Elabore uma lista sucinta de directrizes e ins-truções destinadas aos funcionários responsáveispela aplicação da lei para garantir que aos detidos sejaprestado um tratamento humano entre o momentoda captura e a chegada ao local de detenção.

• Providencie para que esteja sempre de serviço pelo menos um agente com for-mação ao nível da psicoterapia e apoio psicológico, nomeadamente no domínioda prevenção do suicídio.

• Examine todos os detidos, no momento da admissão, procurando detectar sinaisde doença, ferimentos, intoxicação por álcool ou drogas ou alienação mental.

• Trate dos problemas disciplinares de menor gravidade de forma discreta e comoassuntos de rotina. Trate dos problemas mais graves em conformidade com os pro-cedimentos estabelecidos, que deverão ser dados a conhecer e explicados a todosos detidos no momento da admissão.

• Dê instruções aos agentes que trabalham nas instalações de detenção para quenão transportem consigo armas de fogo, excepto quando devam conduzir os deti-dos ao exterior.

• Providencie para que todos os agentes colocados em áreas de detenção recebamformação em métodos de controlo não letais, bem como em técnicas e utilizaçãode equipamento anti-motim.

• Exija que todos os funcionários das instalações de detenção usem placas de iden-tificação claramente visíveis, a fim de facilitar a denúncia de qualquer infracção.

• Estabeleça uma relação construtiva com o Comité Internacional da Cruz Ver-melha e outras organizações similares.

• Estabeleça sanções por eventuais violações, informando todo o pessoal a esse res-peito. Tendo em conta a gravidade do acto, essas sanções poderão ir desde a sus-pensão, multa e expulsão da instituição até à instauração de processo criminal emcaso de violações graves.

Recomendações destinadas

a todos os funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

}

Page 145: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

3). Elabore um outro conjunto de directrizes einstruções para assegurar que aos detidos sejaprestado um tratamento humano enquanto per-manecem no local de detenção.

Exercício n.o

2

O artigo 9.o do Pacto Internacional sobre os Direi-tos Civis e Políticos estipula (n.os 3 e 4) que todoo indivíduo detido sob acusação de haver cometidouma infracção penal terá direito a:

a) ser prontamente conduzido perante um juizou uma outra autoridade habilitada pela lei a exer-cer funções judiciárias;

b) ser julgado num prazo razoável ou libertado;

c) intentar um recurso perante um tribunal, a fimde que e≤ste decida sem demora sobre a legalidadeda sua detenção.

O Conjunto de Princípios para a Protecção deTodas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma deDetenção ou Prisão incorpora as normasacima enunciadas e estabelece que aos sus-peitos ou detidos deverá ser garantido oacesso:

a) à assistência de um advogado;

b) às suas famílias;

c) a um médico.

1). Segundo a lei do seu país, em que cir-cunstâncias pode qualquer um destes direitos,ou todos eles (reconhecidos pelo Pacto Inter-nacional e Conjunto de Princípios), ser negadoou diferido?

2). Imagine que é membro de um grupo detrabalho constituído para considerar os direi-tos dos detidos a serem levados prontamenteà presença de um juiz ou outra autoridadejudicial, e a terem acesso à assistência de umadvogado.

a) Identifique as dificuldades que se colocam àeliminação de todas as restrições a estes direitos.

b) Sugira formas de ultrapassar essas dificulda-des.

3). Considera-se, por vezes, que o acesso de cer-tos suspeitos a um advogado ou à família podecomprometer o sucesso de uma investigação cri-minal. Indique com exactidão os motivos pelosquais isto poderá acontecer; depois, encontresoluções para conciliar as exigências da investi-gação com os direitos dos suspeitos a receberassistência judiciária e a que a sua família sejainformada da detenção.

Exercício n.o

3

O princípio 21 do Conjunto de Princípios para a Pro-tecção de Todas as Pessoas Sujeitas a QualquerForma de Detenção ou Prisão afirma:

1. É proibido abusar da situação da pessoa detida ou presa para

a coagir a confessar, a incriminar-se por qualquer outro modo

ou a testemunhar contra outra pessoa.

2. Nenhuma pessoa detida pode ser submetida, durante o inter-

rogatório, a violência, ameaças ou métodos de interrogatório

susceptíveis de comprometer a sua capacidade de decisão ou

de discernimento.

1). Estão normas semelhantes consagradas nalegislação do seu país, ou nas instruções e direc-trizes destinadas à polícia?

2). Caso normas semelhantes estejam consa-gradas na legislação do seu país, ou nas instru-ções e directrizes destinadas à polícia, serárealista esperar que os funcionários superioresassegurem o respectivo cumprimento, ou serásempre necessária alguma forma de controlojudicial ou legal?

3). Uma das consequências do princípio 21 éobrigar a polícia a utilizar técnicas de interroga-tório que não se baseiem na coacção física oupsicológica. Considera que os agentes policiais doseu organismo conhecem e sabem utilizar tais téc-nicas?

114 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 146: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

4). Imagine que é membro de um grupo de tra-balho encarregado de formular recomendaçõessobre:

a) as medidas de controlo e

b) os programas de formação

necessários para assegurar que os agentes poli-ciais interrogam os suspeitos de forma eficaz e emconformidade com os princípios éticos e com a lei.

Enumere os principais aspectos das suas reco-mendações e indique resumidamente formas de asaplicar.

Exercício n.o

4

Imagine que ocorreram recentemente no seu paísdiversos casos de pessoas condenadas a longaspenas de prisão pela prática de crimes graves combase em confissões que mais tarde se veio ademonstrar que eram falsas. Esta situação levou auma grande perda de confiança no sistema judi-cial e policial. A principal razão para estas falsasconfissões foram os maus tratos por parte da polí-cia, especialmente dos agentes responsáveis pelacondução dos interrogatórios.

As infracções cometidas pelos agentes estão a serobjecto dos normais inquéritos judiciais, bemcomo de procedimentos disciplinares internos.

A Comissão de Inquérito nomeada pelo Governoa fim de estudar as reformas do sistema de justiçapenal e do procedimento de interrogatório dossuspeitos pela polícia formulou diversas reco-mendações, nomeadamente as seguintes:

a) O advogado ou representante legal do sus-peito deverá estar sempre presente durante osinterrogatórios a que este seja sujeito por parte dapolícia.

b) Todas as audições dos suspeitos pela políciaserão filmadas e as gravações serão utilizadascomo prova em quaisquer procedimentos legaissubsequentes.

c) Nenhuma condenação pela prática de umainfracção penal se poderá basear exclusivamentena confissão como elemento de prova. Quaisquerconfissões deverão ser sempre corroboradas por ele-mentos de prova adicionais que demonstrem aculpabilidade da pessoa.

d) Sempre que alguém confesse a prática de umcrime a um agente policial, essa pessoa será de ime-diato conduzida a um tribunal para que um juizou outra autoridade judicial possa verificar que aconfissão foi feita voluntariamente e sem qual-quer pressão abusiva.

O Governo deixou claro que iria introduzir pelomenos algumas destas recomendações.

Para fins de debate, imagine que é membro de umgrupo de trabalho da polícia encarregado de darparecer, em nome das autoridades policiais, sobreestas quatro recomendações. Exponha os argu-mentos contra e a favor de cada uma delas e selec-cione a recomendação ou recomendações quejulga deverem ser adoptadas. Indique os motivosda sua escolha.

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). Você capturou um homem que escondeuuma bomba algures no centro da cidade. O enge-nho deverá explodir dentro de uma hora e elerecusa-se a dizer onde o colocou. Tem o direito detorturar esse homem para o obrigar a revelar oesconderijo da bomba?

2). De que formas poderá a formação dos fun-cionários responsáveis pela aplicação da leiassegurar que seja plenamente tomada em consi-deração a proibição da tortura, conforme dispostona Declaração sobre a Protecção de Todas as Pes-soas contra a Tortura e Outras Penas ou Trata-mentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes(artigo 5.o)?

3). Por que motivo é importante que as pessoasacusadas sejam separadas das pessoas condenadase recebam um tratamento diferenciado?

Conceitos Fundamentais* 115

Page 147: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

116 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

4). Por que motivo é importante tratar o casodos delinquentes juvenis evitando o recurso aosistema de justiça penal, conforme exigido pelasRegras Mínimas das Nações Unidas para a Admi-nistração da Justiça de Menores (Regra 11)?

5). Quais são as vantagens de dispor de unidadespoliciais especializadas no tratamento das questõesrelativas aos menores e à delinquência juvenil?

6). Que factores pessoais e psicológicos podemafectar a capacidade do detido que está a ser inter-rogado de decidir livremente e formular juízosracionais?

7). Quais serão as diferenças entre um interroga-tório que visa o apuramento dos factos e a recolhade informação e um outro que tem exclusivamentepor objectivo obter a confissão do suspeito?

8). Que qualidades pessoais deverá possuir umagente policial para conduzir os interrogatórioscom eficácia e em conformidade com os princípioséticos? Poderão estas qualidades ser adquiridasatravés da formação, ou são talentos inatos?

9). Quais são as vantagens e as desvantagens dagravação em vídeo do interrogatório policial dos sus-peitos? Indique todos os fins para os quais essasgravações poderão ser utilizadas.

10). Foi demonstrado que algumas pessoas queconfessam a prática de um crime sem que otenham cometido conseguem relatar a sua parti-cipação de forma convincente porque os agentespoliciais que conduzem os interrogatórios lhesfornecem involuntariamente suficiente informaçãocom base na qual são construídos os relatos. De queformas poderá esta situação ser evitada?

Page 148: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Terceira Parte 117

• Dar indicações aos funcionários responsáveis pela aplicação da lei sobrea utilização da força e de armas de fogo, seu impacto sobre os direitos àvida e à segurança pessoal e normas internacionais relativas à adequadautilização da força e de armas de fogo para fins policiais legítimos.

Nota: Contrariamente aos anteriores, o presente capítulo apresenta cinco grelhas de

Princípios Fundamentais e não apenas uma. Estas grelhas foram concebidas para apre-

sentar com clareza a formadores e formandos as normas relativas a este aspecto altamente

técnico da actividade policial.

Utilização da força

• Deve tentar recorrer-se em primeiro lugar a meios não violentos.

• A força deverá ser utilizada apenas quando estritamente necessário.

• A força deverá ser utilizada apenas para fins lícitos de aplicação da lei.

• Não serão admitidas quaisquer excepções ou desculpas para a utilizaçãoilícita da força.

• A utilização da força deverá ser sempre proporcional aos objectivos líci-tos prosseguidos.

• A força deverá ser sempre utilizada com moderação.

• Os danos e as lesões deverão ser reduzidos ao mínimo.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão dispor deuma série de meios que permitam a utilização da força em diferentesgraus.

• Todos os agentes policiais deverão receber formação sobre o uso dos dife-rentes meios capazes de permitir a utilização da força em diferentes graus.

• Todos os agentes policiais deverão receber formação sobre a utilização demeios não violentos.

Utilização da forçae de armas de fogo

14

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

}

*capítulo

Page 149: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

118 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Responsabilidade pela utilização da força e de armas de fogo

• Todos os incidentes de utilização da força e de armas de fogo serão par-ticipados aos funcionários superiores, que os examinarão.

• Os funcionários superiores serão responsabilizados pelas acções dos agen-tes seus subordinados caso conhecessem ou devessem conhecer os abusosmas não tenham tomado medidas concretas adequadas.

• Os funcionários que se recusem a cumprir ordens superiores ilegais nãoserão punidos.

• A obediência a ordens superiores não poderá ser invocada para justificara utilização ilícita da força ou de armas de fogo.

Circunstâncias que poderão justificar a utilização de armas de fogo

• As armas de fogo deverão ser utilizadas apenas em caso de extremanecessidade.

• As armas de fogo deverão ser utilizadas apenas em caso de legítima defesado agente ou de terceiros contra uma ameaça iminente de morte ou de feri-mentos graves.

– ou –

• Para impedir a ocorrência de um crime particularmente grave que colo-que em sério risco vidas humanas

– ou –

• Para capturar ou impedir a fuga de uma pessoa que constitua umaameaça semelhante e que resista aos esforços para afastar tal ameaça

– e –

• Em qualquer caso, unicamente quando as medidas menos extremas serevelem insuficientes.

• A utilização intencional da força e de armas de fogo com consequênciasmortais apenas será permitida quando for absolutamente inevitável e tivercomo objectivo proteger a vida humana.}

Princípios fundamentais

}

Page 150: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 119

a. Normas internacionais sobre a utilizaçãoda força – Informação para as apresentações

1. INTRODUÇÃO

439. Todas as sociedades confiam à polícia umadiversidade de poderes para fins de aplicação da leie manutenção da ordem. Inevitavelmente, o exer-cício, por um agente policial, de qualquer um dospoderes que lhe estão atribuídos tem um efeitodirecto e imediato sobre os direitos e liberdades dosseus concidadãos.

440. A par da faculdade de recorrer à força, emcertas circunstâncias e dentro de limites precisos,

a polícia tem também a grande responsabilidadede assegurar que a sua autoridade é exercida deforma lícita e eficaz. A missão da polícia é difícile delicada, reconhecendo-se que a utilização daforça por parte das autoridades policiais, em cir-cunstâncias claramente definidas e controladas,é inteiramente legítima. Contudo, o abuso dopoder de utilizar a força ofende o princípio essen-cial que serve de base à noção de direitos huma-nos – o do respeito pela dignidade inerente àpessoa humana. É, assim, fundamental, quesejam adoptadas medidas para prevenir tal abuso,bem como para garantir a existência de meca-nismos de reparação, investigação e sanção,quando se tenha verificado uma excessiva ou abu-siva utilização da força.

Procedimentos relativos à utilização de armas de fogo

• O funcionário deverá identificar-se como agente policial.

– e –

• O funcionário deverá advertir claramente da sua intenção de utilizar aarma de fogo

– e –

• O funcionário deverá dar tempo suficiente para que o delinquente se con-forme com tal advertência

– mas –

• Isto não será necessário se a demora puder resultar na morte ou em lesõescorporais graves do agente ou de terceiros

– ou –

• Se a espera for claramente inútil ou inadequada, dadas as circunstân-cias.

Após a utilização de armas de fogo

• Deverá ser prestada assistência médica a todas as pessoas feridas.

• Os parentes ou amigos das pessoas afectadas deverão ser notificados.

• Dever-se-á permitir a investigação do incidente quando tal for solicitadoou requerido.

• Deverá ser feito um relatório completo e detalhado do incidente.

Princípios fundamentais

}

}

Page 151: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

441. O conceito de “força” não aparece definido nostextos internacionais relativos à utilização da forçapelas autoridades policiais. As habituais defini-ções dos dicionários invocam termos como“potência”, “poder”, “violência” e “esforço”. Osfuncionários responsáveis pela aplicação da leidevem conhecer bem a forma como o conceito de“força” é definido pela sua lei e códigos nacionais,devendo ser lembrados dessas definições ao abor-dar a questão objecto do presente capítulo.

442. As secções seguintes expõem os princípiose as normas internacionais que deverão orientara conduta da polícia no que diz respeito à utili-zação da força. Tais normas tentam conciliar asexigências da manutenção da ordem e da segu-rança públicas com o respeito da segurança pes-soal dos agentes policiais e a protecção dosdireitos humanos.

2. ASPECTOS GERAIS DA UTILIZAÇÃO DA FORÇA

(a) Princípios fundamentais

443. Os princípios da necessidade e da proporcio-nalidade estão subjacentes a todas as detalhadas dis-posições que regulamentam a utilização da forçapela polícia. Estes princípios exigem, respectiva-mente, que a força seja utilizada apenas quandoestritamente necessário para fazer respeitar a leie manter a ordem pública, e que a aplicação da forçaseja proporcional, ou seja, que a força seja aplicadaapenas na medida exigida para os fins legítimos daaplicação da lei e manutenção da ordem pública.

(b) Disposições específicas sobre a utilização da

força

444. Os princípios acima indicados estão consa-grados no artigo 3.o do Código de Conduta para osFuncionários Responsáveis pela Aplicação da Lei,que estabelece:

Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei só

podem empregar a força quando tal se afigure estrita-

mente necessário e na medida exigida para o cumpri-

mento do seu dever.

O comentário ao artigo 3.o reitera a exigência de pro-porcionalidade no recurso à força e afirma que autilização de armas de fogo é considerada umamedida extrema.

445. Os Princípios Básicos sobre a Utilização daForça e de Armas de Fogo pelos Funcionários Res-ponsáveis pela Aplicação da Lei fornecem orien-tações específicas e precisas sobre a forma deassegurar que os princípios da necessidade e da pro-porcionalidade são respeitados.

446. No preâmbulo destes Princípios, reconhece--se que:

[…] o trabalho dos funcionários responsáveis pela apli-

cação da lei representa um serviço social de grande

importância […]

[…] a ameaça à vida e à segurança dos funcionários res-

ponsáveis pela aplicação da lei deve ser considerada

como uma ameaça à estabilidade da sociedade no seu

todo,

[…] os funcionários responsáveis pela aplicação da lei têm

um papel essencial na protecção do direito à vida, à liber-

dade e à segurança da pessoa, tal como garantido pela

Declaração Universal dos Direitos do Homem e reafir-

mado no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e

Políticos,

[…]

447. Os Princípios podem ser resumidos nosseguintes pontos:

[i] Regulamentos; utilização diferenciada

da força

448. Os Governos e organismos responsáveis pelaaplicação da lei deverão adoptar, aplicar e reverconstantemente normas que regulamentem a uti-lização da força e de armas de fogo. A fim de limi-tar o recurso a meios susceptíveis de causar amorte ou ferimentos pessoais, deverão providen-ciar pela disponibilização de uma série de meioscapazes de permitir uma utilização diferenciada daforça. Estes últimos incluem armas neutralizantesnão letais e equipamentos de defesa pessoal, taiscomo escudos e capacetes.

120 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 152: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

[ii] Recurso inicial a meios não violentos

449. Tanto quanto possível, os agentes policiaisdeverão utilizar meios não violentos antes derecorrer à força ou a armas de fogo.

[iii] Moderação; medidas humanitárias

450. Caso a utilização legítima da força ou de armasde fogo seja inevitável, os funcionários responsáveispela aplicação da lei deverão recorrer a tais métodoscom moderação e reduzir ao máximo os danos elesões, bem como respeitar e preservar a vidahumana. Para estes fins, deverão garantir a presta-ção de assistência médica a qualquer pessoa feridaou afectada no mais curto espaço de tempo e asse-gurar-se de que os familiares ou amigos das pessoasferidas ou afectadas são avisados do incidente.

[iv] Participação do uso da força

451. Os ferimentos ou mortes resultantes da uti-lização da força ou de armas de fogo deverão serparticipados aos funcionários superiores e toda autilização arbitrária ou abusiva da força deverá sertratada como um crime. As circunstâncias excep-cionais ou situações de emergência pública não jus-tificam a violação dos Princípios.

[v] Utilização de armas de fogo

452. Permite-se a utilização de armas de fogo emlegítima defesa do próprio ou de terceiros contraum perigo iminente de morte ou lesões físicasgraves, ou a fim de proceder à captura de umapessoa que apresente tal perigo, caso as medidasmenos extremas se revelem insuficientes. É proi-bida a utilização intencional de armas de fogo comconsequências fatais, a menos que absolutamenteinevitável a fim de salvar uma vida.

453. Antes de utilizar uma arma de fogo contraalguém, o polícia deverá identificar-se e advertir cla-ramente da sua intenção de utilizar a arma em ques-tão. Deverá ser dado tempo suficiente para que odelinquente se conforme com a advertência, amenos que tal se mostre susceptível de resultar namorte ou em lesões físicas graves do agente ou de

terceiros, ou claramente inútil ou inadequado,dadas as circunstâncias.

454. As normas e regulamentos sobre a utilizaçãode armas de fogo por parte de funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei deverão fornecerorientações sobre as circunstâncias em que tais fun-cionários estão autorizados a transportar armasde fogo, garantir que as armas de fogo sejam uti-lizadas apenas nas circunstâncias adequadas e demaneira conforme a diminuir os riscos de lesões,disciplinar o controlo, armazenagem e distribuiçãode armas de fogo e prever um sistema de partici-pação sempre que os agentes policiais façam usode uma arma de fogo no exercício das suas funções.

[vi] Manutenção da ordem durante reuniões

públicas

455. No dispersar de reuniões ilegais mas não vio-lentas, os funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei deverão evitar o recurso à força ou, quandotal não seja possível, restringi-lo ao mínimo neces-sário. No dispersar de reuniões violentas, os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei apenaspodem utilizar armas de fogo caso o recurso ameios menos perigosos seja impraticável. Emqualquer situação, conforme acima indicado, só épermitida a utilização de armas de fogo em legí-tima defesa do próprio ou de terceiros, para afas-tar um perigo iminente de morte ou lesões físicasgraves, ou a fim de proceder à captura de umapessoa que apresente tal perigo. É proibida a uti-lização intencional de armas de fogo com conse-quências fatais, a menos que absolutamenteinevitável com o objectivo de salvar uma vida.

[vii] Utilização da força sobre pessoas detidas

456. Os funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei não poderão utilizar a força sobre as pessoassujeitas a detenção a menos que tal se revele abso-lutamente indispensável à manutenção da segu-rança e da ordem dentro da instituição, ou emcaso de ameaça à segurança pessoal. As armas defogo não poderão ser utilizadas contra tais pessoas,excepto em legítima defesa do próprio ou de ter-ceiros contra um perigo iminente de morte ou

Deveres e funções da Polícia* 121

Page 153: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

lesões graves ou para impedir a fuga de um detidoque apresente tal perigo.

[viii] Recrutamento e formação

457. Todos os funcionários responsáveis pela apli-cação da lei deverão possuir as característicasmorais, psicológicas e físicas adequadas e receberformação apropriada. A sua aptidão para o desem-penho das respectivas funções deverá ser reexa-minada periodicamente. A formação deveráincidir sobre a legítima utilização da força, osdireitos humanos e as técnicas policiais, devendoser prestada especial atenção às alternativas à uti-lização da força e de armas de fogo, nomeada-mente métodos de resolução pacífica de conflitos.Deverá ser garantida a prestação de apoio psico-lógico aos funcionários que intervenham emsituações de utilização da força e de armas de fogo,a fim de lhes permitir ultrapassar a tensão própriade tais situações.

[ix] Participação e recurso

458. Deverão ser postos em prática procedimentoseficazes de participação e recurso, aplicáveis atodos os incidentes de utilização da força e dearmas de fogo. As pessoas afectadas deverão teracesso a processos judiciais independentes.

[x] Responsabilidade hierárquica

459. Os funcionários superiores deverão ser con-siderados responsáveis pela utilização ilegal daforça ou de armas de fogo por parte dos seussubordinados caso tenham conhecimento, oudevessem ter tido conhecimento, de tais abusos enão tomem medidas adequadas para lhes pôr fim.

[xi] Ordens ilícitas

460. Os funcionários que se recusem a obedecera ordens ilícitas para utilização da força ou dearmas de fogo não deverão ser objecto de quaisquersanções. A obediência a ordens superiores nãoiliba de responsabilidade os funcionários que uti-lizem ilicitamente a força ou armas de fogo dasua responsabilidade.

(c) Utilização da força e direito à vida

461. O exercício do poder de utilizar a força podeafectar o mais fundamental dos direitos huma-nos: o direito à vida. A utilização da força por partedas autoridades policiais em termos tais que resul-tem numa violação do direito à vida significa umaclara derrota de um dos principais objectivos da acti-vidade policial: a manutenção da segurança doscidadãos. Dependendo das circunstâncias, poderáconstituir também uma violação muito grave da leipenal interna e do direito internacional.

462. O direito à vida é protegido pelo direito inter-nacional consuetudinário e pelo artigo 3.o daDeclaração Universal, que afirma:

Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade eà segurança pessoal.

É também protegido pelo Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos (artigo 6.o) e pordiversos instrumentos de âmbito regional, taiscomo a Carta Africana dos Direitos do Homeme dos Povos (artigo 4.o), a Convenção Americanasobre Direitos Humanos (artigo 4.o) e a Con-venção Europeia dos Direitos do Homem(artigo 2.o).

463. O Pacto Internacional exige que o direito à vidaseja protegido por lei e proíbe a privação arbitrá-ria da vida; a Convenção Americana e a Conven-ção Europeia estabelecem que o direito à vidadeverá ser protegido por lei; a Carta Africana e aConvenção Americana afirmam explicitamenteque ninguém poderá ser arbitrariamente privadoda vida.

464. Pode considerar-se “arbitrária” uma acçãoque não é conforme à lei, bem como uma acção queé injusta mesmo respeitando a lei. As privações arbi-trárias da vida incluem atrocidades como o geno-cídio, os crimes de guerra, as mortes resultantesde execuções não precedidas dos devidos procedi-mentos judiciais, as mortes resultantes da torturaou maus tratos e as mortes resultantes do exces-sivo uso da força por parte dos funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei.

122 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 154: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 123

(d) Utilização da força e execuções

extrajudiciais

465. A expressão “execuções extrajudiciais”designa as privações arbitrárias da vida acima des-critas, quando perpetradas, por exemplo, pela polí-cia, pelo exército ou por outros agentes do Estado.As execuções extrajudiciais constituem umaforma de terrorismo de Estado, sendo por vezescometidas por unidades que se tornaram conhe-cidas como os “esquadrões da morte”.

466. Os Princípios sobre a Prevenção Eficaz eInvestigação das Execuções Extrajudiciais, Arbi-trárias ou Sumárias enunciam medidas de combatea estas flagrantes violações do direito à vida. Esteinstrumento é composto por 20 princípios desti-nados a prevenir a ocorrência de execuções extra-judiciais e a garantir a cuidadosa investigação dasmesmas, caso se verifiquem. Os Princípios exigemque se exerça um controlo rigoroso sobre os fun-cionários que exercem poderes de captura e deten-ção, bem como sobre aqueles que se encontramautorizados a utilizar a força e as armas de fogo.

(e) Utilização da força e desaparecimentos

467. Deverá ser feita referência ao capítulo XII,sobre Captura, na medida em que contém obser-vações gerais sobre os desaparecimentos forçadosou involuntários (parágrafos 372-376, supra).

468. O fenómeno dos desaparecimentos forçados ouinvoluntários é referido no presente capítulo uma vezque uma pessoa desaparecida nessas circunstânciasterá muito provavelmente sido vítima de uma utili-zação indevida da força. Além do mais, as vítimasdeste tipo de abuso são muitas vezes ilegalmente exe-cutadas, assim se vendo privadas do seu direito à vida.

469. Será conveniente recordar aos funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei as suas respon-sabilidades relativamente ao fenómeno dosdesaparecimentos forçados ou involuntários,nomeadamente:

a) prevenir e detectar todos os crimes relacio-nados com este fenómeno;

b) velar para que os outros agentes do orga-nismo onde trabalham não participem em taiscrimes.

3. OBSERVAÇÕES FINAIS

470. Para além dos motivos éticos e jurídicos queobrigam a que a polícia respeite as normas inter-nacionais relativas à utilização da força e de armasde fogo, existem também considerações de índoleprática e política. Os abusos e excessos na utiliza-ção da força por parte da polícia podem ter comoefeito levar a que um trabalho, já de si difícil, setorne impossível. Para além disso, tais abusos eexcessos comprometem um dos principais objec-tivos da actividade policial – a manutenção da paze estabilidade social. Casos houve em que a utili-zação excessiva da força por parte da polícia resul-tou numa instabilidade pública em tão larga escalae de tal forma violenta que as instituições res-ponsáveis pela aplicação da lei se tornaram tem-porariamente incapazes de manter a ordem eproteger a segurança pública. As consequênciasgeneralizadas de tais incidentes, bem como assuas enormes repercussões mediáticas, compro-metem seriamente o fundamental apoio da popu-lação à actividade policial.

471. Em resumo, as normas internacionais dedireitos humanos exigem que a utilização dearmas de fogo pela polícia seja uma medida excep-cional; que a utilização da força por parte da polí-cia seja necessária e proporcional ao objectivopretendido; e que a utilização da força e de armasde fogo pela polícia seja regulamentada, controladae compatível com os direitos fundamentais à vida,à liberdade e à segurança da pessoa.

b. Normas internacionais sobre utilização daforça – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO

DAS NORMAS INTERNACIONAIS

Recomendações destinadas a todos os agentespoliciais

Page 155: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Inscreva-se em programas de formação paraaumentar os seus conhecimentos e melhorar assuas aptidões nos seguintes domínios: primeirossocorros, defesa pessoal, utilização de equipa-mento defensivo, utilização de dispositivos nãomortíferos, utilização de armas de fogo, compor-tamento das multidões, resolução de conflitos e con-trolo das situações de tensão.

Adquira e aprenda a utilizar escudos defensivos,coletes à prova de bala, capacetes e dispositivos nãomortíferos.

Adquira, pratique e utilize diversos meios capazesde permitir a utilização diferenciada da força,nomeadamente armas incapacitantes não mortí-feras.

Participe em sessões de apoio psicológico, paraaliviar o stress.

Acondicione cuidadosamente e de forma seguratodas as armas que lhe sejam entregues.

Parta do princípio de que todas as armas estãocarregadas.

Estude e utilize técnicas de persuasão, mediaçãoe negociação.Planeie antecipadamente a utilização gradual eprogressiva da força, começando pelos meios nãoviolentos.

Esteja atento ao estado físico e mental dos seus cole-gas e intervenha sempre que seja necessário paraassegurar que recebam atenção, orientação e acon-selhamento adequados.

Recomendações destinadas a todos os funcionárioscom responsabilidades de comando e supervisão.

Estabeleça e aplique regulamentos internos cla-ros sobre a utilização da força e de armas de fogo.

Organize regularmente cursos de formação nosseguintes domínios: primeiros socorros, defesapessoal, utilização de equipamento defensivo, uti-lização de armas não mortíferas, utilização de

armas de fogo, comportamento das multidões,resolução de conflitos, controlo das situações de ten-são e persuasão, mediação e negociação.

Adquira e distribua equipamento defensivo,nomeadamente capacetes, escudos, coletes à provade bala, máscaras de gás e veículos blindados.Adquira e distribua dispositivos incapacitantesnão letais e de dispersão de multidões.

Adquira a maior variedade possível de meios capa-zes de permitir uma utilização diferenciada daforça.

Providencie pela inspecção periódica dos agentes,a fim de conhecer o respectivo estado de saúde físicae mental, bem como a sua capacidade de avaliar danecessidade e adequação de utilizar a força ouarmas de fogo.

Organize sessões de apoio psicológico para todosos funcionários que utilizam a força, a fim de osajudar a lidar com o stress.

Defina directivas claras para a participação detodos os incidentes que envolvem a utilização daforça ou de armas de fogo.

Regule de forma rigorosa o controlo, acondicio-namento e distribuição de armas de fogo, nomea-damente instituindo procedimentos destinados agarantir que todos os funcionários se responsabi-lizam pelas armas e munições que lhes são con-fiadas.

Proíba a utilização de armas e munições que pro-voquem lesões, danos ou riscos injustificados.Assegure-se periodicamente de que os agentesapenas transportam consigo as armas e muniçõesque lhes são oficialmente atribuídas. Preveja san-ções adequadas para qualquer agente em cujaposse sejam encontrados materiais não distribuí-dos pela via oficial (especialmente dispositivoscomo balas de fragmentação, projécteis de pontaoca ou “dumdum”).

Defina estratégias para diminuir o risco de os agen-tes se verem forçados a utilizar armas de fogo.

124 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 156: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 125

2. EXERCÍCIO PRÁTICO

Para fins de debate, imagine que, na zona onde tra-balha, ocorreram os seguintes incidentes:

a) Durante uma patrulha, um agente policialdeparou-se com um homem que roubava um tran-seunte. O ladrão ameaçou a vítima com umaarma, roubando-lhe a pasta e a carteira e pondo--se, de seguida, em fuga. O agente ordenou-lhe quese detivesse. Como tal não acontecesse, puxou daarma e disparou sobre o assaltante, que resultoumortalmente ferido.

b) Durante uma patrulha, um agente policialdeparou-se com duas pessoas que partiam a mon-tra de uma joalharia e furtavam uma grande quan-tidade de jóias em exposição. Nenhuma delasparecia estar armada e, logo que viram o agente,puseram-se em fuga. O polícia ordenou-lhes quese detivessem. Um dos assaltantes obedeceu, maso outro continuou a fugir. O agente puxou dorevólver e, depois de lhe ordenar uma vez mais queparasse, disparou e matou-o. O cúmplice, quehavia parado, foi detido.

Comente a justificação legal para a utilização deuma arma mortífera, em cada um destes casos,tendo em conta:

• a legislação e directrizes sobre a utilização da forçapela polícia em vigor no seu país;• os Princípios Básicos sobre a Utilização da Força ede Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveispela Aplicação da Lei, em particular o princípio 9.

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). Por que razão os Estados e a comunidadeinternacional estabelecem restrições à utilização daforça pela polícia?

2). De que forma a utilização excessiva e abusiva daforça pela polícia torna o trabalho desta mais difícil?

3). Qual o significado da expressão “utilização pro-porcional da força” no contexto da actividade policial?

4). Que alternativas existem à utilização da força?Que conhecimentos técnicos especializados exigemessas alternativas e de que forma podem os agen-tes receber formação neste domínio?

5). Em que circunstâncias se justifica a utilizaçãointencional da força com consequências mortais porparte da polícia?

6). Por que razão o direito internacional nãoaceita a invocação de ordens superiores como jus-tificação para a prática de violações de direitoshumanos?

7). Como podem as organizações policiais tornarmais fácil aos agentes policiais a recusa do cum-primento de ordens superiores ilegais passíveisde conduzir a violações de direitos humanos?

8). De que formas pode a polícia proteger odireito à vida?

9). As normas internacionais sobre a utilizaçãoda força pela polícia encorajam o recurso a armasincapacitantes não mortíferas. Que armas destanatureza conhece? Quais estão à sua disposição eque perigos apresenta a sua utilização? Comopodem estes perigos ser ultrapassados?

10). Sempre que recorram à força, os funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei têm a obrigaçãode participar o facto aos seus superiores. A queníveis de utilização da força se deverá aplicar estaobrigação? Como se podem descrever os diferen-tes níveis de utilização da força a fim de que os fun-cionários saibam que casos devem participar?

Page 157: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 158: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Terceira Parte 127

• Apresentar aos utilizadores do manual e aos participantes, que fre-quentem cursos de formação, as normas de direitos humanos e de direitohumanitário aplicáveis às actividades de manutenção da ordem em situa-ções excepcionais e indicar-lhe os limites das medidas excepcionais que podemser adoptadas nestas circunstâncias.

Distúrbios internos

• Todas as medidas de restabelecimento da ordem devem respeitar os direi-tos humanos.

• O restabelecimento da ordem deve efectuar-se sem qualquer tipo de dis-criminação.

• Os direitos só podem ser alvo de restrições que sejam previstas pela lei.

• Toda a acção ou restrição ao exercício dos direitos deve visar unica-mente a garantia do respeito pelos direitos e liberdades de terceiros e res-ponder às justas exigências da moral, ordem pública e paz social.

• São unicamente aceitáveis as acções e restrições de direitos, desde que con-formes às regras e princípios de uma sociedade democrática.

• O direito à vida, o direito a não ser submetido à tortura, a proibição daescravatura, a proibição de prisão por razões que se prendam unicamentecom a incapacidade de executar uma obrigação contratual não poderão serderrogados em caso algum.

• Antes de qualquer recurso à força devem ser experimentados os meios nãoviolentos.

• A força só deverá ser utilizada em casos de necessidade absoluta.

• A força só deve ser utilizada para fins lícitos de aplicação da lei.

• O recurso à força deve ser sempre proporcional aos objectivos legítimosda aplicação da lei.

Distúrbios Internos,Estados de Excepçãoe Conflitos Armados

15

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

}

*capítulo

Page 159: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

128 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

• Devem ser envidados todos os esforços para limitar danos e ferimentos.

• Deve estar disponível uma panóplia de meios que permitam uma utili-zação diferenciada da força.

• Os direitos à liberdade de expressão, à liberdade de reunião e associaçãoe à liberdade de circulação não devem ser inutilmente restringidos.

• Não deve ser imposta nenhuma restrição à liberdade de opinião.

• Deve ser preservada a independência da magistratura.

• Todas as pessoas que tenham sido alvo de ferimentos ou que tenham sofridotraumatismos devem ser imediatamente socorridas.

Estados de excepção

• Os Estados de excepção só podem ser decretados em conformidade coma lei e só poderão ser proclamados se um perigo público ameaçar a exis-tência da nação e se as medidas ordinárias forem claramente insuficien-tes para fazer face à situação.

• Os estados de excepção devem ser oficialmente proclamados, antes quepossam ser adoptadas medidas excepcionais.

• Toda a medida excepcional deve ser estritamente requerida pelas exigênciasda situação.

• As medidas excepcionais não devem ser, em caso algum, incompatíveiscom outras obrigações impostas pelo direito internacional.

• Uma medida excepcional não deve, em caso algum, dar origem a dis-criminação baseada na raça, cor, sexo, língua, religião ou origem social.

• Não é permitida nenhuma derrogação no que diz respeito ao direito àvida, à proibição da tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desu-manos ou degradantes; à proibição da escravatura e à proibição de proce-der a prisões motivadas unicamente pela impossibilidade de executar umaobrigação contratual.

• Ninguém poderá ser condenado por uma infracção penal que não cons-tituía um delito no momento da sua prática.

• Se, em momento posterior à infracção, a lei prevê a aplicação de umapena mais leve, o delinquente deve beneficiar desta alteração legislativa.

Conflitos armados

• Nas situações de conflito armado e de ocupação, os polícias devem ser con-siderados como não combatentes, a menos que tenham sido oficialmenteintegrados nas forças armadas.

• Os polícias têm o direito de se absterem de exercer as suas funções porconsiderações de consciência, o que não deverá conduzir a uma modifica-ção do seu estatuto.

Objectivos do capítulo

}

}}

Objectivos do capítulo

}

Page 160: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 129

• O direito humanitário aplica-se em todas as situações de conflitoarmado.

• Os princípios de humanidade devem ser respeitados em toda as situações.

• Os não combatentes e as pessoas colocadas fora de combate por razõesde doença, ferimento, detenção ou por qualquer outra causa, devem ser res-peitados e protegidos.

• As pessoas que sofrem as consequências da guerra devem ser ajudadas ecuidadas sem discriminação.

• São proibidos em todas as circunstâncias designadamente os seguintes actos:

– homicídio;– tortura;– tratamentos cruéis ou degradantes;– castigos corporais;– mutilações;– atentados à dignidade da pessoa;– tomada de reféns;– penas colectivas;– execuções não precedidas de um processo regular.

• É proibido exercer represálias contra os feridos, doentes ou náufragos, con-tra o pessoal e serviços médicos, contra os prisioneiros de guerra, os civis,os bens civis e culturais, o meio ambiente natural e as obras contendo for-ças perigosas.

• Ninguém poderá renunciar à protecção que lhe é conferida pelo direitohumanitário nem ser constrangido a ela renunciar.

• As pessoas protegidas devem ter recurso, a todo o tempo, à potência pro-tectora (um Estado neutro que protege os seus interesses), ao Comité Inter-nacional da Cruz Vermelha ou a qualquer outra organização humanitáriaimparcial.

a. Normas internacionais sobre conflitosarmados, estados de emergência e distúrbiosinternos – Informação para as apresentações

1. INTRODUÇÃO

472. Os conflitos armados e os distúrbios dãoorigem a situações de perigo extremo, a diver-sos graus de sofrimento e crueldade, o quesucede com maior gravidade ainda quando aconduta das hostilidades não obedece a qualquerregra. Por outro lado, estas situações colocamgravemente em perigo os direitos individuais ecolectivos.

473. O direito internacional humanitário visaregulamentar a conduta das hostilidades e prote-ger as vítimas de conflitos, impõe obrigações atodos os beligerantes e só se torna eficaz após a eclo-são de um conflito armado. Trata-se de um sub-sistema muito detalhado e especial do direito dosdireitos humanos e que se aplica em situações deconflito armado.

474. O direito internacional dos direitos humanosvisa a protecção dos direitos das pessoas e gruposde pessoas em todas as circunstâncias, impondoaos Estados obrigações face às pessoas e grupos depessoas sob a sua jurisdição, aplicando-se tanto emtempo de paz como em tempo de guerra.

}

Page 161: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

130 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

475. Os polícias têm tarefas importantes e denatureza diversa a desempenhar nos diferentestipos de conflitos e distúrbios internos, devendo rea-lizá-las no respeito pelas normas internacionais dedireitos humanos e pelos princípios de direitohumanitário. O presente capítulo expõe e analisaas normas que se aplicam especificamente às acti-vidades de manutenção da ordem.

476. As secções seguintes tratam da questão damanutenção da ordem nas seguintes situações:conflito armado internacional; conflito armadonão internacional (ou guerra civil); estado deexcepção e distúrbios internos. Se julgar não serútil incluir na sua exposição todos os pormenoresrelacionados com os conflitos armados, o forma-dor poderá a eles fazer referência para prepararexposições a partir de outras partes no capítulo.

477. É essencial que os agentes das forças públi-cas conheçam, não só as normas de direitos huma-nos, mas também os princípios decorrentes dodireito internacional humanitário, que se devemaplicar à repressão dos distúrbios internos. Éigualmente importante que estejam informadossobre os limiares a partir dos quais se aplicam asdiferentes categorias de normas.

478. Se tivéssemos de definir uma hipotética hie-rarquia da violência, poderíamos imaginar pelomenos cinco níveis sucessivos:

Nível 1: situação normal.

Nível 2: tensões internas, distúrbios internos,tumultos, actos de violência isolados e esporádicos.

Nível 3: estado de excepção proclamado no segui-mento de tensões internas e de violências esporá-dicas que ameaçam a existência da nação.

Nível 4: conflito armado internacional (guerra civil).

Nível 5: conflito armado internacional.

479. É evidente que o estado de excepção pode serproclamado no seguimento do início de um con-flito armado e as fronteiras entre os diferentes

níveis não são sempre claras. Para nos situarmosrapidamente podemos, no entanto, considerar quecada situação requer a aplicação das seguintescategorias de normas:

Nível 1: todos os direitos humanos, sem qualquerderrogação.

Nível 2: todos os direitos humanos, sem qualquerderrogação, sob reserva única das restrições auto-rizada pela lei com os únicos fins de garantir ple-namente o reconhecimento e respeito pelosdireitos e liberdades de terceiros, bem como asjustas exigências da moral, ordem pública e bem--estar geral numa sociedade democrática.

Nível 3: todos os direitos humanos, salvo algumasexcepções limitadas, as quais permitem derroga-ções não discriminatórias, nos estritos limitesnecessários pelas exigências da situação. Não éautorizada qualquer derrogação no que diz res-peito ao direito à vida, à proibição de tortura, à proi-bição da escravatura ou à proibição de sujeitaruma pessoa à prisão por incapacidade de execuçãode uma obrigação contratual.

Nível 4: o artigo 3.o comum às quatro Convençõesde Genebra de 1949, o Protocolo Adicional II a estasConvenções (1977), bem como as restantes dispo-sições de direitos humanos, incluindo a protecçãodos direitos não derrogáveis.

Nível 5: as quatro Convenções de Genebra e o Pro-tocolo Adicional I a estas Convenções (1977), bemcomo as outras disposições relativas aos direitoshumanos, incluindo a protecção dos direitos nãoderrogáveis.

480. Estes diferentes níveis de violência e distúr-bios internos são analisados em pormenor infra.

2. ASPECTOS GERAIS

(a) Princípios fundamentais

481. A mensagem fundamental do direito inter-nacional humanitário que rege os conflitos arma-

Page 162: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

dos consiste no facto de o direito dos beligeran-tes utilizarem meios para atingir o inimigo nãoser ilimitado. Os princípios de proporcionalidade(em relação às acções do adversário ou aos resul-tados militares esperados das suas própriasacções) e de selectividade (na escolha dos méto-dos, armamentos e alvos) decorrem deste princípiofundamental.

482. A repressão dos distúrbios civis é regidapelos princípios da necessidade e da proporcio-nalidade no recurso à força. Ambos os princípiosrequerem respectivamente que a polícia não uti-lize a força, a menos que tal se revele estritamentenecessário para a aplicação da lei e manutenção daordem e que a aplicação da força seja proporcional–por outras palavras, a força só deverá ser utilizadana estrita medida em que permita a aplicação dalei e a manutenção da ordem.

(B) Disposições específicas

[i] Direitos humanos especialmente vulneráveis

483. Os direitos humanos mais vulneráveis emperíodo de conflito armado e de distúrbios civis,e que têm implicações directas na aplicação da lei,são o direito à liberdade e à segurança da pessoa,o direito a ser tratado com humanidade em casode detenção e o direito à vida. As normas que pro-tegem estes direitos foram expostas detalhada-mente nos capítulos precedentes. De formaresumida:

• o direito à liberdade e à segurança da pessoaencontra-se parcialmente garantido pela proibi-ção das prisões arbitrárias. Todas as prisões devemser legais e necessárias;• o direito a ser tratado com humanidade em casode detenção encontra-se protegido pela proibiçãoda tortura e pela obrigação de tratar toda a pessoaprivada de liberdade com humanidade e no respeitoda dignidade inerente à pessoa humana. Estedireito é igualmente protegido por disposiçõesmais detalhadas de execução da proibição e obri-gação.• o direito à vida está protegido pela obrigaçãoimposta aos Estados de inscreverem na sua legis-

lação a protecção deste direito e a proibição da pri-vação arbitrária da vida. Este direito encontra-seigualmente protegido pelas regras que restringemo recurso à força pela polícia.

[ii] Direito dos conflitos armados

484. O direito dos conflitos armados é compostopor dois grandes grupos convencionais (desig-nados por «direito convencional da Haia» e«direito convencional de Genebra») e por umcerto número de regras consuetudinárias basea-das nos princípios fundamentais acima referi-dos.

485. O «direito convencional daHaia» é essencialmente com-posto por uma série de declaraçõese convenções, nomeadamente aConvenção da Haia (IV) de 18 deOutubro de 1907 relativa às leisde costumes da guerra em terra (Convenção da Haia,1907)N.T.1. O «direito convencional de Genebra» éessencialmente composto pelas quatro Convençõesde Genebra de 12 de Agosto de 1949, bem como pelosdois Protocolos Adicionais a estas Convenções (8 deJunho de 1977), a saber:

• Convenção I de Genebra para Melhorar aSituação dos Feridos e Doentes das ForçasArmadas em Campanha (primeira Convençãode Genebra);• Convenção II de Genebra para Melhorar aSituação dos Feridos, Doentes e Náufragos das For-ças Armadas no Mar (segunda Convenção deGenebra);• Convenção III de Genebra relativa ao Tratamentodos Prisioneiros de Guerra (terceira Convençãode Genebra);• Convenção IV de Genebra relativa à Protecção dasPessoas Civis em Tempo de Guerra (quarta Con-venção de Genebra);• Protocolo I Adicional às Convenções de Genebrade 12 de Agosto de 1949 relativo à Protecção dasVítimas dos Conflitos Armados Internacionais(Protocolo Adicional I);• Protocolo II Adicional às Convenções de Gene-bra de 12 de Agosto de 1949 relativo à Protecção

Deveres e funções da Polícia* 131

N.T.1

Assinada por Portugal a18 de Outubro de 1907. Oinstrumento de ratificaçãofoi depositado a 13 de Abrilde 1911. O texto da Conven-ção encontra-se publicadono Diário do Governo n.o 49, de 2 de Março de 1911 e no Diário do Governo n.o 104, de 5 de Maio de 1911.

Page 163: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

das Vítimas dos Conflitos Armados Não Interna-cionais (Protocolo Adicional II).

486. Os dois grupos de direito convencional dis-tinguem-se pelo facto de o «direito convencionalda Haia» reger a conduta das hostilidade, – osmeios e métodos de guerra aceitáveis - enquantoque o «direito convencional de Genebra» dizerrespeito à protecção das vítimas de guerra. Na prá-tica, a distinção não é muito clara, já que os doisgrupos convencionais se encontram actualmenteem certa medida reunidos nas disposições con-vencionais posteriores – nomeadamente nos doisProtocolos Adicionais às Convenções de Genebra.

[iii] Tipos de conflito armado e categorias

de pessoas

487. O direito internacional humanitário reco-nhece dois tipos de conflitos armados:

a) o conflito armado internacional – isto é asguerras entre Estados, as guerras de libertaçãonacional contra o domínio colonial ou a ocupaçãoestrangeira;

b) o conflito armado não internacional ouguerra civil.

488. As situações de tensões e distúrbios inter-nos, como por exemplo os tumultos e os actosesporádicos de violência, que não constituem con-flitos armados, não cabem no campo de aplicaçãodo direito internacional humanitário.

489. No que diz respeito às categorias de pessoas, dis-tinguem-se principalmente os combatentes e os nãocombatentes. De forma esquematizada, têm direitoao estatuto de combatente os membros das forçasarmadas de uma parte no conflito que use as suasarmas abertamente. Este estatuto só é concedido àque-les que combatam em conflitos armados internacio-nais. As pessoas com direito ao estatuto de combatente:

• têm o direito de participar nas hostilidades;• têm o direito a ser consideradas como prisionei-ros de guerra se forem capturadas pelo inimigo;• devem respeitar as leis da guerra;

• beneficiam de uma certa protecção durante as hos-tilidades, através de medidas que visam regula-mentar os métodos e meios de guerra.

490. Os últimos pontos serão analisados nas sec-ções «Conflito armado internacional», «Conflitoarmado não internacional» e «Distúrbios inter-nos» infra. Os outros aspectos serão estudadosnas secções «Terrorismo» e «Estados de excepçãoe medidas de derrogação».

(C) Conflito armado internacional

491. Durante muito tempo o direito dos conflitosarmados só dizia respeito às guerras entre Estados.É por esta razão que o artigo 2.o da Convenção daHaia (1907) precisa que a Convenção e o Regula-mento que se lhe encontram anexados só se apli-cam entre as Altas Partes Contratantes eunicamente se os beligerantes forem partes naConvenção.

492. O artigo 2.o comum às Convenções de Gene-bra de 1949 limita a aplicação das referidas Con-venções

[…] em caso de guerra declarada ou de qualquer outro

conflito armado que possa surgir entre duas ou mais das

Altas Partes contratantes, mesmo que o estado de

guerra não seja reconhecido por uma delas.

[…] em todos os casos de ocupação total ou parcial do

território de uma Alta Parte

contratante, mesmo que esta ocupação não encontre

qualquer resistência militar. […]

NOTA PARA O FORMADOR: como iremos verificarna secção «Conflito armado não internacional»infra., o artigo 3.o comum às quatro Convenções deGenebra é a única disposição destas Convençõesque visa os conflitos armados não internacionais.

493. O n.o 4.o do artigo primeiro do Protocolo Adi-cional I às Convenções de Genebra alarga a definiçãodo conflito armado internacional para nele incluir:

[…] os conflitos armados em que os povos lutam con-

tra a dominação colonial e a ocupação estrangeira e

132 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 164: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

contra os regimes racistas no exercício do direito dos

povos à autodeterminação […]

[i] Estatuto da polícia

494. No parágrafo 489 supra foi invocado o «esta-tuto de combatente», avançada uma definiçãogeral desta noção e precisados alguns direitos eobrigações dos combatentes. Com efeito, a definiçãodo termo evoluiu ao longo dos anos, por forma ater em conta os tipos de conflitos em curso e osdesejos da comunidade internacional.

495. Foi por exemplo assim que a definição decombatente contida nos artigos 43.o e 44.o do Pro-tocolo Adicional I às Convenções de Genebra nãoopera uma distinção entre as forças armadasmuito organizadas de um Estado e as tropasmenos estruturadas dos movimentos de libertação.Esta definição permite assim atribuir um reco-nhecimento jurídico a certos tipos de guerrilhas sur-gidas nos conflitos recentes.

496. Ainda que um pouco esbatida, a distinçãoentre combatentes e civis subsiste – continuando porexemplo os combatentes a beneficiar da protecçãoconferida aos prisioneiros de guerra no caso de cap-tura e podendo os civis prevalecer-se da protecçãoespecial a que têm direito em tempo de guerra.

497. O estatuto civil dos agentes da força públicaé devidamente reconhecido e garantido, e a defi-nição de combatente não inclui os funcionáriospoliciais. Além disso o artigo 50.o do Protocolo Adi-cional I define como civil toda a pessoa que nãopertença a uma das categorias de combatente nostermos do artigo, e especificando ainda que emcaso de dúvida essa pessoa será considerada comocivil.

498. O artigo 43.o do Protocolo Adicional I contémno seu n.o 3 uma disposição importante, com aseguinte redacção:

A parte num conflito que incorpore, nas suas forças

armadas, uma organização paramilitar ou um serviço

armado encarregado de fazer respeitar a ordem, deve

notificar esse facto às outras Partes no conflito.

Por outras palavras, para serem consideradoscomo combatentes os polícias devem fazer partede um serviço responsável pela aplicação da leioficialmente incorporado nas forças armadas deuma parte no conflito. Este acto de incorporação,bem como a obrigação de notificação das outras par-tes, além de modificar o estatuto dos membros doserviço em causa, confirma igualmente o estatutocivil dos polícias que pertençam a serviços nãocontemplados no n.o 3 do artigo 43.o.

499. Finalmente, e ainda no que concerne o esta-tuto das pessoas, a quarta Convenção de Genebrarelativa à Protecção das Pessoas Civis em Tempode Guerra (título III, secção III, artigo 54.o) dis-põe que:

A Potência ocupante não poderá modificar o estatuto dos

funcionários ou dos magistrados do território ocupado

ou tomar contra eles sanções ou quaisquer medidas

coercivas ou de diferenciação no caso de deixarem de

exercer as suas funções por razões de consciência.

[…]

Esta disposição confere uma certa protecção aosmembros das forças de polícia dos territóriosocupados no caso em que a potência ocupanteprocure utilizá-los para executar tarefas ou aplicarmedidas por eles tidas como inaceitáveis.

[ii) Direitos, deveres e responsabilidades da polícia

500. Os funcionários policiais com o estatuto decombatente têm direitos e responsabilidadesenquanto combatentes, mas também enquantoresponsáveis pela aplicação da lei. Estes direitos eresponsabilidades são, de forma esquemáticas, osseguintes:

DIREITOS – durante as hostilidades beneficiar daprotecção conferida pelas medidas que regula-mentam os métodos e meios de guerra e serem tra-tados como prisioneiros de guerra se foremcapturados pelo inimigo.

RESPONSABILIDADES – na sua qualidade de com-batentes implicados na luta contra o inimigo, res-

Deveres e funções da Polícia* 133

Page 165: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

peitar as regras do direito internacional aplicáveisem conflitos armados. Estas regras, em número ele-vado, diversas e precisas, têm por objectivo:

a) A protecção dos feridos, doentes e náufragos

Por exemplo, o artigo 10.o do Protocolo Adicional Iàs Convenções de Genebra impõe o respeito e a pro-tecção de todos os feridos, doentes e náufragos,independentemente da parte a que pertençam.

b) Métodos e meios de guerra

Por exemplo, o artigo 37.o do Protocolo Adicio-nal I proíbe matar, ferir ou capturar um adver-sário por meio do recurso à perfídia. Os actos deperfídia contemplados no artigo 37.o são nomea-damente: simular a intenção de negociar acoberto da bandeira parlamentar, ou simular a rendição e simular uma incapacidade causadapor ferimentos ou doença.

c) Tratamento dos prisioneiros de guerra

Por exemplo, o artigo 14.o da terceira Convençãode Genebra dispõe que os prisioneiros de guerratêm direito ao respeito pela sua pessoa e honra emtodas as circunstâncias.

d) Protecção das pessoas e das populações civis

Por exemplo, o artigo 51.o, n.o 2, do Protocolo Adicional I dispõe que nem a população civilenquanto tal, nem as pessoas civis devem ser alvode ataques. O mesmo parágrafo proíbe ainda osactos ou ameaças de violência cujo fim principalé de espalhar o terror entre a população civil.

501. É de notar que, em relação à regra vigente emtempo de paz, as actividades correntes de manu-tenção da ordem são «desviadas» para tarefasdecorrentes da situação criada pelo conflito. Esteponto será examinado de forma mais detalhadaaquando da análise consagrada aos deveres dospolícias que não tenham o estatuto de combatente.

502. Os agentes da força pública que não tenhamo estatuto de combatente – como é o caso dos fun-

cionários da polícia com funções unicamente deaplicação da lei – devem agir em conformidade coma legislação nacional e nomeadamente com as leisque consagrem normas internacionais em matériade direitos humanos. Estes funcionários policiais– ou, por outras palavras, aqueles que conservaramo seu estatuto de civil – têm os direitos, deveres eresponsabilidades habituais de qualquer responsávelpela aplicação da lei, a saber:

DIREITOS – beneficiar da protecção conferida aoscivis durante os conflitos armados internacional pelaquarta Convenção de Genebra e pelo ProtocoloAdicional I; beneficiar da protecção conferida aosfuncionários pelo artigo 54.o da quarta Conven-ção de Genebra, referido acima sob o título «Esta-tuto da polícia» (parágrafo 499).

DEVERES – desempenhar as funções gerais depolícia (aplicação da lei e manutenção da ordem).A situação criada pelo conflito pode ter importan-tes repercussões neste domínio, tal como édemostrando, através dos seguintes exemplos:

a) Protecção dos prisioneiros de guerra

Em virtude do artigo 12.o da terceira Convenção deGenebra, a Potência detentora é responsável pelotratamento de que são alvos os prisioneiros deguerra. Como existem nesta Convenção disposiçõessobre a evasão e captura dos prisioneiros deguerra, as infracções cometidas por ou contra osprisioneiros de guerra e ainda relativas aos pro-cessos judicias, é muito provável que as forças depolícia da Potência detentora sejam chamadas aintervir.

b) Protecção das pessoas e populações civis

O capítulo VI, título IV, secção I, do ProtocoloAdicional I visa a protecção civil no sentido doartigo 61.o, nomeadamente a realização de umcerto número de tarefas humanitárias destinadasa proteger a população civil contra os perigos dashostilidades e a ajudar a superar os seus efeitos ime-diatos. Em tempo de guerra, a polícia pode serchamada a realizar algumas destas tarefas, nomea-damente os alertas, evacuações, salvamentos, loca-

134 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 166: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

lizações e sinalizações das zonas de perigo e o res-tabelecimento e a manutenção da ordem naszonas sinistradas.

c) Manutenção da ordem sob a autoridade deuma potência ocupante

Por exemplo o artigo 43.o das Regras anexadas àConvenção da Haia de 1907 impõe à Potência ocu-pante que restabeleça e mantenha a ordem públicae a segurança no território que ocupa. Esta dispo-sição inclui a obrigação de respeitar as leis emvigor no país ocupado – a menos que seja expres-samente impedido de o fazer.

São definidas nos artigos 64.o a 78.o da quarta Con-venção de Genebra e nos artigos 75.o a 77.o do Pro-tocolo Adicional I regras mais detalhadas relativas àlegislação penal e ao processo judicial. Estas regrasbaseiam-se no princípio de que a legislação penal doterritório ocupado deve permanecer em vigor, amenos que constitua uma ameaça para a Potência ocu-pante, caso esse em que a referida Potência ocu-pante poderá revogá-la ou suspendê-la. Tanto esteúltimo princípio como as regras dele decorrentes, têmpor objectivo dar às instituições e aos funcionáriosdo território ocupado a possibilidade de continuarema desempenhar as suas funções como no passado –na medida em que tal seja possível.

As tarefas de natureza corrente de manutenção daordem seriam afectadas não só pelas condiçõesgerais do conflito, mas também pelas condiçõesespecíficas da ocupação do território. Os funcioná-rios policiais continuariam a exercer as suas funçõescomo no passado, a menos que se abstenham de ofazer por considerações de consciência ou sejamafastados das suas responsabilidades pela Potênciaocupante, sendo todos estes casos contempladosno artigo 54.o da quarta Convenção de Genebra.

RESPONSABILIDADES – na sua qualidade de fun-cionário da polícia em exercício das funções geraisde aplicação da lei:

a) respeitar as leis e procedimentos nacionais,nomeadamente aqueles que consagram normasinternacionais em matéria de direitos humanos;

b) consoante a incidência que o conflito ou aocupação do território sobre eles exerça, respeitaras regras do direito internacional aplicáveis à suasituação.

(d) Conflito armado não internacional

503. As quatro Convenções de Genebra de 1949 sãocompostas por mais de 400 artigos muito deta-lhados. Por si só, o artigo 3.o comum às quatro Con-venções visa a protecção das vítimas de conflitos«que não apresentem um carácter internacional»e estabelece regras mínimas para a protecção daspessoas que não participam activamente nas hos-tilidades, incluindo os membros das forças arma-das postos fora de combate.

504. Em 1977 as disposições do artigo 3.o comumàs quatro Convenções de Genebra foram comple-tadas por um protocolo adicional à Convenções, oProtocolo II. Este instrumento composto por 28 arti-gos precisa a protecção de que devem beneficiar asvítimas dos conflitos armados não internacionais.

[i] Artigo 3.o comum às Convenções

505. O artigo 3.o comum às quatro Convenções deGenebra confere uma protecção humanitária ele-mentar a certas categorias de pessoas, através daextensão dos princípios basilares das Convençõesaos conflitos armados não internacionais queocorram no território de uma das partes. Nesse casocada parte no conflito deve aplicar «pelo menos»as disposições do preceito, sendo o artigo 3.o porvezes qualificado como «convenção dentro dasConvenções».

506. O princípio fundamental de tratamentohumano é enunciado no primeiro parágrafo, quedefine igualmente as pessoas cobertas pelo preceito,a saber:

As pessoas que não tomem parte directamente nas hos-

tilidades, incluídos os membros das forças armadas

que tenham deposto as armas e as pessoas que tenham

sido postas fora de combate por doença, ferimento,

detenção ou por qualquer outra causa, serão, em todas

as circunstâncias, tratadas com humanidade, sem

Deveres e funções da Polícia* 135

Page 167: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

nenhuma distinção de carácter desfavorável baseada

na raça, cor, religião ou crença, sexo, nascimento ou for-

tuna, ou qualquer critério análogo. […]

A parte restante do parágrafo enuncia um certonúmero de actos proibidos «em qualquer oca-sião e lugar» em relação às pessoas protegidas.Estes actos proibidos consistem nomeada-mente em:

a) homicídio;

b) tortura;

c) tomadas de reféns;

d) atentados à dignidade das pessoas;

(e) condenações e execuções não precedidas deum julgamento equitativo pronunciado num tri-bunal regularmente constituído e rodeado detodas as garantias judiciárias necessárias.

507. O n.o 2 do artigo 3.o impõe às partes no con-flito a obrigação de recolher e tratar os doentes eferidos, impondo-lhes igualmente a obrigação dese esforçarem por aplicar, através da celebraçãode acordos especiais, todas ou parte das restantesdisposições das Convenções.

[ii] Protocolo Adicional II

508. O Protocolo Adicional II às Convenções deGenebra, que veio completar o artigo 3.o comumdas Convenções, aplica-se aos conflitos armados nãointernacionais que se desenrolam

em território de uma Alta Parte Contratante, entre as

suas forças armadas e forças armadas dissidentes ou gru-

pos armados organizados que, sob a chefia de um

comando responsável, exerçam sobre uma parte do seu

território um controlo tal que lhes permita levar a cabo

operações militares continuas e organizadas e aplicar

o presente Protocolo (n.o 1 do artigo 1.o).

Por outras palavras, o Protocolo aplica-se unica-mente aos conflitos em que as forças governa-mentais defrontem as forças armadas dissidentes

exercendo um controlo sobre um território e nãose aplica

a) aos conflitos entre grupos que não incluam for-ças governamentais;

b) aos conflitos mais circunscritos que nãoimpliquem o controlo de território por grupos dis-sidentes.

PESSOAS PROTEGIDAS

509. O Protocolo protege todas as pessoas afecta-das por um conflito armado, nomeadamente:

a) todas as pessoas que não participam directa-mente ou que deixaram de participar nas hostili-dades, quer estejam privadas de liberdade ou não(título II);

b) os feridos, doentes e náufragos (título III);

c) a população civil (título IV).

GARANTIAS E PROTECÇÃO

510. O título II do Protocolo enuncia as garantiasfundamentais de todas as pessoas que não parti-cipam directamente ou que deixaram de participarnas hostilidades, quer estejam privadas de liberdadeou não. Estas garantias são as seguintes:

a) direito ao respeito da sua pessoa, honra, con-vicções e práticas religiosas;

b) direito a ser tratado com humanidade, semqualquer distinção de carácter desfavorável.

511. De seguida, o artigo 4.o comum enumerauma série de actos proibidos, sendo designada-mente visados:

a) os atentados contra a vida;

b) a tortura;

c) a tomada de reféns;

136 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 168: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

d) os actos de terrorismo e os atentados contraa dignidade da pessoa.

512. O artigo 4.o prevê igualmente a protecção dascrianças, designadamente a proibição de recrutarcrianças menores de quinze anos para as forçasarmadas e a proibição de as deixar participar nashostilidades.

513. O artigo 5.o enuncia as garantias das pessoasprivadas de liberdade – sem qualquer distinçãoquanto aos motivos desta privação e sem criarum estatuto de prisioneiro de guerra, com oobjectivo de garantir que os detidos sejam tra-tados com humanidade e que a sua segurançaseja assegurada.

514. O artigo 6.o diz respeito ao exercício daacção penal e à repressão de infracções penais rela-cionadas com o conflito armado, enunciando asregras susceptíveis de garantir o respeito pelas nor-mas elementares mínimas em matéria de processojudicial.

515. O título III do Protocolo comporta seis arti-gos relativos às pessoas afectadas por um conflitoarmado devido à sua qualidade de feridos, doen-tes ou náufragos. Este título reafirma o princípiode humanidade do tratamento, enuncia regrasdestinadas a garantir protecção e cuidados a estacategoria de vítimas e a proteger o pessoal médico,as missões e unidades médicas e os transportessanitários.

516. O título IV do Protocolo contém seis artigosrelativos à protecção da população civil, obri-gando as partes no conflito a garantirem à popu-lação civil e às pessoas civis uma protecção geralcontra os perigos resultantes de operações mili-tares, com a reserva de que as pessoas civisgozam desta protecção « salvo se participaremdirectamente nas hostilidades e enquanto durartal participação» (artigo 13.o, n.os 1 e 3). O n.o 2do artigo 13.o proíbe que a população civil e as pes-soas civis sejam objecto de ataques. Proíbeigualmente os actos ou ameaças de violênciacujo objectivo principal é de espalhar o terrorentre a população civil.

517. A única protecção prevista para as pessoasque participam directamente nas hostilidadesencontra-se inscrita no artigo 4.o, n.o 1, que proíbeordenar que não haja sobreviventes.

[iii] Estatuto

518. As pessoas que participam nas hostilidades noâmbito de um conflito armado não internacionalsão:

a) os membros das forças armadas, das forças depolícia ou de outras forças de segurança do Estadoque estejam sujeitas ao direito internacional dosdireitos humanos, ao direito internacional huma-nitário e ao direito penal nacional,oub) os membros dos grupos armados dissidentesorganizados que, em virtude do direito penalnacional, devem responder por terem recorridoilicitamente à força, pelos seus actos de insurrei-ção e outras infracções que possam ter cometidoe que se encontram igualmente obrigados a res-peitar o direito internacional humanitário, porserem uma «parte no conflito».

[iv] Deveres e responsabilidades da polícia

519. Nos conflitos armados não internacionais osfuncionários policiais têm os seguintes deveres eresponsabilidades:

DEVERES – enquanto responsáveis pela aplicaçãoda lei:

a) defrontar os grupos armados de oposição, deacordo com as funções e capacidades do serviçoencarregue da aplicação da lei e de acordo com asituação geral;

b) proceder a investigações sobre a actuação dosmembros dos grupos armados da oposição;

c) realizar tarefas correntes de manutenção daordem que – tal como é o caso num conflitoarmado internacional – serão «desviadas» das acti-vidades normais desenvolvidas em tempo de paz,devido à situação criada pelo conflito.

Deveres e funções da Polícia* 137

Page 169: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

RESPONSABILIDADES – enquanto responsáveispela aplicação da lei:

a) respeitar os princípios de direito internacio-nal aplicáveis aos conflitos armados não interna-cionais;

b) respeitar a legislação nacional e nomeada-mente as regras que consagram normas interna-cionais em matéria de direitos humanos.

(e) Distúrbios internos

520. O acima mencionado «direito convencional deGenebra» distingue duas categorias de conflitosarmados, aos quais deve ser acrescentada umacategoria, abrangendo as situações de violênciaque não são consideradas como conflitos armados.Estas três categorias são as seguintes:

a) Conflitos armados internacionais, aos quaissão aplicáveis as quatro Convenções de Genebra,bem como o Protocolo Adicional I às Convençõesde Genebra;b) Conflitos armados não internacionais de altaintensidade, nos quais as forças rebeldes exercemum controlo sobre uma parte do território que lhespermite desenvolver operações militares contínuase concertadas e aplicar o presente Protocolo. Estesconflitos entram no campo de aplicação do Proto-colo II Adicional às Convenções de Genebra e doartigo 3.o comum às quatro Convenções de Genebra;c) Situações de violência especificamenteexcluídas do n.o 2 do artigo 1.o do Protocolo II, a saber: as situações de tensão e de perturbaçãointernas, tais como motins, actos de violência iso-lados e esporádicos e outros actos análogos, que nãosão considerados como conflitos armados.

Esta última categoria de conflitos será agora exa-minada sob a rubrica geral «Distúrbios internos».

NOTA PARA O FORMADOR: apesar de a distinçãoentre conflitos armados e distúrbios ou tensõesinternas não estar prevista no artigo 3.o comum àsquatro Convenções, este preceito refere-se clara-mente aos conflitos armados implicando hostili-dades entre as forças armadas.

521. Apesar da distinção operada entre conflitoarmado internacional e «conflito» que se encontreaquém do conflito armado no sentido da Conven-ção, continua a ser difícil distinguir ambos na prá-tica. É, por exemplo, assim que certos distúrbioscivis não assimiláveis a conflitos armados, masno entanto muito próximos do seu limiar, em nadaficam a dever aos conflitos armados em termos decrueldade e de violência. Para além disso, estas for-mas de distúrbios civis:

a) causam vítimas que têm necessidade de pro-tecção;

b) envolvem uma muito elevada possibilidade deviolações de direitos humanos;

[i) Definições e características dos distúrbios

internos

522. Certos peritos internacionais propuseramdiversos tipos de distúrbios e tensões internas nãoassimiláveis a conflitos armados. Por seu lado, oComité Internacional da Cruz Vermelha identificouum certo número de características comuns, asquais se encontram presentes, total ou parcialmente,nas situações de distúrbios civis. Assim, os distúrbiosinternos foram descritos da seguinte forma:

… situações nas quais não existe

um conflito armado não interna-

cional enquanto tal, mas em que

se verifica uma confrontação no seio do país, apresen-

tando uma certa gravidade ou duração e envolvendo actos

de violência. Estes últimos podem revestir diversas for-

mas, indo desde a geração espontânea de actos de

revolta até à luta entre grupos mais ou menos organi-

zados e as autoridades no poder. Nestas situações, que

não degeneram necessariamente em lutas abertas, as

autoridades no poder fazem apelo a vastas forças de polí-

cia, podendo mesmo incluir as forças armadas, para res-

tabelecer a ordem interna. O elevado número de

vítimas tornou necessária a aplicação de um mínimo de

regras humanitáriasN.T.2.

523. O termo «tensões internas» refere-se a situa-ções de tensões graves (quer elas sejam políticas,religiosas, raciais, económicas ou outras) ou às

138 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

N.T.2

Vide International Reviewof the Red Cross (Genebra),28o ano, n.o 262 ( Janeiro-Feve-reiro de 1988), p. 12.

Page 170: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

sequelas de um conflito armado ou de distúrbiosinternos. Os distúrbios e tensões internas podemincluir:

a) introdução de diversas formas de detenção –maciças e prolongadas;

b) torturas e sevícias contra os detidos;

c) suspensão das garantias judiciárias funda-mentais;

d) desaparecimentos forçados e outros actos deviolências como a tomada de reféns;

e) medidas repressivas contra as famílias econhecidos dos detidos;

f ) campanhas de terror noseio da população civilN.T.3.

[ii] Normas internacionais

524. O direito internacional dos direitos humanosaplica-se, tanto em tempo de paz como em tempode guerra, ao conjunto das categorias de conflitos,nomeadamente a:

• distúrbios civis;• conflitos armados não internacionais;• conflitos armados internacionais.

Este ramo do direito destina-se a promover e pro-teger os direitos humanos.

NOTA PARA OS FORMADORES: os direitos humanosque se encontram em situação de especial vulne-rabilidade durante conflitos armados e distúrbiosinternos foram indicados no presente capítulosupra (vide parágrafo 483).

525. Convém insistir no facto de que a polícia,quando reprime distúrbios civis, só deverárecorrer à força em casos de necessidade abso-luta e de forma proporcional às exigências dasituação. A este propósito, devem ser salientadosos seguintes princípios dos Princípios Básicossobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo

pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicaçãoda Lei:

12). Dado que a todos é garantido o direito de par-

ticipação em reuniões lícitas e pacíficas, de acordo

com os princípios enunciados na Declaração Universal

dos Direitos do Homem e no Pacto Internacional

sobre os Direitos Civis e Políticos, os Governos e os

serviços e funcionários responsáveis pela aplicação

da lei devem reconhecer que a força e as armas de

fogo só podem ser utilizadas de acordo com os prin-

cípios 13 e 14.

13). Os funcionários responsáveis pela aplicação da

lei devem esforçar-se por dispersar as reuniões ilegais

mas não violentas sem recurso à força e, quando isso

não for possível, limitar a utilização da força ao estri-

tamente necessário.

14). Os funcionários responsáveis pela aplicação da

lei só podem utilizar armas de fogo para dispersarem

reuniões violentas se não for possível recorrer a

meios menos perigosos, e somente nos limites do estri-

tamente necessário. Os funcionários responsáveis

pela aplicação da lei não devem utilizar armas de

fogo nesses casos, salvo nas condições estipuladas no

princípio 9.

526. O direito internacional humanitário só é apli-cável em situações de conflito armado – interna-cional e não internacional – e visa proteger asvítimas. No entanto:

a) certas formas de distúrbios internos têma aparência de um conflito armado e apresen-tam pelo menos algumas das suas caracterís-ticas;b) apesar de o direito internacional dos direitoshumanos se aplicar a todo o tempo, a sua aplica-ção pode ser limitada em caso de perigo público,se o governo proclamar medidas de derrogaçãomuito limitadas e excepcionais;c) o direito internacional dos direitos humanosimpõe aos governos obrigações para com as pes-soas sob a sua jurisdição, mas já não em relaçãoaos grupos e indivíduos que se poderiam opor àautoridade desses governos;d) o direito internacional humanitário visa

Deveres e funções da Polícia* 139

N.T.3

Ibid., p. 13.

Page 171: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

sobretudo a situação material das vítimas;e) o direito internacional humanitário impõe aosgovernos e às outras partes no conflito obrigaçõespara com as vítimas desse conflito.

Por conseguinte, apesar das regras do direitointernacional dos direitos humanos e de direitointernacional humanitário serem igualmente per-tinentes para a repressão dos distúrbios civis, sóo direito internacional dos direitos humanos éjuridicamente aplicável.

[iii] Princípios e normas humanitárias

527. Certos peritos internacionais interrogaram-sesobre a pertinência e aplicabilidade das normasinternacionais em casos de distúrbios civis. Assuas reflexões deram origem a três textos que defi-nem os princípios e normas aplicáveis a este tipode situação. Presentemente, trata-se simples-mente de projectos de instrumentos que se reve-lam, no entanto, de uma certa importância tendoem conta as indicações normativas que forneceme as fontes das quais são originárias. Trata-se dosseguintes textos:

a) Código de Conduta – elaborado por Hans-Peter Gasser, conselheiro jurídico do ComitéInternacional da Cruz VermelhaN.T.4;b) Projecto de modelo dedeclaração sobre os distúrbioscivis – elaborado por Theodor Meron, professor deDireito na Universidade de Nova IorqueN.T.5;c) Projecto de declaração denormas humanitárias mínimas– elaborado por um grupo de peritos reunido naÅbo Akademi University Turku/Åbo (Finlândia),com base no anteprojecto doProfessor MeronN.T.6.

528. Estes textos não pretendem formar um novocorpo jurídico aplicável às situações de distúrbiosinternos. Com efeito, os textos em questão colo-cam ênfase nas regras fundamentais existentes,extraídas dos princípios gerais de direito, dodireito consuetudinário e do direito convencional,aplicáveis em tais situações. Desta forma, sãoevidenciadas as regras imperativas decorrentes da

proibição de derrogar os direitos e proibiçõesconsagrados:

a) no artigo 3.o comum às Convenções de Gene-bra de 1949;b) nos Protocolos Adicionais I e II a estas Con-venções;c) nos tratados em matéria de direitos humanos– nomeadamente no Pacto Internacional sobre osDireitos Civis e Políticos.

529. O código de conduta enuncia, sob forma deregras, as proibições e obrigações aplicáveis nassituações de tensões e distúrbios internos, nãoconsistindo a ideia na elaboração de um texto jurí-dico, mas antes na ampla divulgação de umdocumento destinado a promover o respeito pelosprincípios humanitários fundamentais.

530. Ambos os projectos de declaração são apre-sentados como sendo textos de direito. O projectode declaração das regras humanitárias mínimas ins-pira-se, em grande medida, nos instrumentos emmatéria de direitos humanos, mas também nasConvenções de Genebra e respectivos ProtocolosAdicionais.

531. As disposições dos três textos aplicam-se emtodas as situações de tensões ou distúrbios inter-nos. Todas as pessoas e grupos afectados devem res-peitá-los e fazer com que sejam respeitados semdiscriminação.

532. Cada texto contém uma declaração inspiradano princípio geral de humanidade do tratamentoe de respeito pela dignidade humana, proibindodiversos actos correntemente cometidos emperíodo de distúrbios civis, nomeadamente ohomicídio, a tortura, as mutilações, as violações,as tomadas de reféns, os desaparecimentos força-dos, as pilhagens e o terrorismo.

533. Os três textos enunciam uma série de medi-das humanitárias que visam a protecção das víti-mas de distúrbios internos, incluindo asseguintes:

a) Os feridos, doentes e pessoas desaparecidas

140 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

N.T.4

Ibid., p. 38 e seguintes.

N.T.5

Ibid., p. 59 e seguintes.

N.T.6

Ibid., 31.o ano, n.o 282(Maio-Junho de 1991), p. 328 e seguintes.

Page 172: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

devem ser procurados e recolhidos;b) Os feridos e doentes devem ser protegidos etratados;c) Devem ser colocados à disposição dos orga-nismos humanitários meios que lhes permitamsocorrer as vítimas.

534. Os três textos, que traduzem os princípios enormas em vigor, podem ser ainda utilizados como:

a) afirmações das normas internacionais emmatéria de direitos humanos e direito humanitá-rio pertinentes e aplicáveis em situações de dis-túrbios e tensões internos;b) instrumentos para a educação e formação dosfuncionários policiais sobre estas normas;c) instrumento de investigação teórica, estraté-gica e táctica para fazer face às situações de dis-túrbios civis.

[iv] Deveres e responsabilidades da polícia

535. Em períodos de distúrbios civis, os deveres eresponsabilidades dos funcionários policiais são osseguintes:

DEVERES – na qualidade de responsáveis pela apli-cação da lei, devem restabelecer a paz e desenvol-ver tarefas gerais de manutenção da ordem.

RESPONSABILIDADES – na qualidade de respon-sáveis pela aplicação da lei, devem respeitar asnormas internacionais em matéria de direitoshumanos e direito humanitário, e respeitar a legis-lação nacional, especialmente as leis que consa-gram normas internacionais em matéria de direitoshumanos.

536. É do conhecimento geral que, em período dedistúrbios civis, os serviços de polícia têm res-ponsabilidades imensas e contraditórias, e que ospolícias são pessoalmente expostos a graves peri-gos. No entanto, os funcionários responsáveis pelaaplicação da lei são obrigados a aplicar as regrasdestinadas a proteger os direitos humanos e os prin-cípios humanitários de forma absoluta.

(f ) Terrorismo

537. Os actos de terrorismo são contrários aos finse princípios da Carta das Nações Unidas, eforam condenados pela Assembleia Geral emdiversas resoluções, nomeadamente em 1970pela Declaração sobre os Princípios de DireitoInternacional relativos às Relações Amigáveis eà Cooperação, em conformidade com a Cartadas Nações Unidas, a qual proíbe expressamenteo terrorismo.

[i] Definições e tipos de terrorismo

538. O terrorismo é uma noção vaga e frequen-temente muito politizada, de forma que é difí-cil chegar a um acordo sobre uma definição doconceito para fins jurídicos. Nenhum dos ins-trumentos internacionais relativos à matériatratada neste capítulo definem o que é o terro-rismo.

539. Os estudos teóricos neste domínio permitiramidentificar um determinado número de definiçõese distinguir entre os diferentes tipos de terro-rismo. A principal distinção opõe:

a) O terrorismo de direito comum – que obedecea um móbil estritamente criminoso,eb) o terrorismo político – com motivações pura-mente políticas,

apesar de se admitir que as duas intenções seencontrem por vezes misturadas.

540. É feita igualmente a distinção entre:

a) O terrorismo de Estado – os actos perpetra-dos pelos representantes do Estado para finsrepressivos,eb) o terrorismo contra o Estado – os actos sub-versivos perpetrados por grupos ou pessoas pri-vadas.

Deveres e funções da Polícia* 141

Page 173: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

541. Certos teóricos distinguem ainda entre:

a) Os actos de terror cometidos durante um con-flito armado, internacional ou não internacional,eb) os actos de terror cometidos na ausência deum conflito armado.

542. As definições gerais de terrorismo tendem acolocar ênfase na violência destinada a infligirmedo, tanto junto das vítimas reais e potenciais,como junto da população em geral, insistindo fre-quentemente nos homicídios ou atentados deli-berados e cegos cometidos contra os terroristas.

543. Os actos de terror são, por vezes, métodosde luta mas, quer sejam ou não perpetrados nocontexto de um conflito são totalmente ilegais.O direito internacional humanitário proíbeesses actos durante os conflitos armados e odireito interno dos Estados proíbe-os igual-mente. A comunidade internacional adoptoumedidas de cooperação para melhor combater cer-tas formas de terrorismo.

544. O terrorismo de Estado pode ser acompa-nhado de atentados graves contra os direitoshumanos, já que o direito internacional dos direi-tos humanos impõe aos Governos que protejam epromovam os direitos das pessoas que se encon-tram sob a sua jurisdição.

[ii] Actos de terror praticados durante conflitos

armados

545. Os actos de terror são expressamente proibi-dos tanto durante os conflitos armados interna-cionais como não internacionais, em virtude dasseguintes disposições:

CONFLITOS ARMADOS INTERNACIONAIS – O artigo51.o do Protocolo Adicional I às Convenções deGenebra de 1949 proíbe os actos ou ameaças deviolência cujo objectivo principal é espalhar o ter-ror entre a população civil (n.o 2).

CONFLITOS ARMADOS NÃO INTERNACIONAIS –O artigo 13.o do Protocolo Adicional II às Con-

venções de Genebra de 1949 enuncia a mesmaproibição (n.o 2).

546. Os actos de terror são implicitamente proibi-dos nos conflitos armados internacionais quandodirigidos:

a) Contra os combatentes – esta regra decorre daproibição geral de causar danos supérfluos (porexemplo, no artigo 35.o, n.o 2, Protocolo Adicional I)e de ordenar que não haja sobreviventes (artigo 40.o

do mesmo instrumento);b) Contra os prisioneiros de guerra – esta regradecorre das disposições gerais da terceira Con-venção de Genebra relativa à obrigação de tratar osprisioneiros com humanidade.

547. Os actos de terror são também implicita-mente proibidos durante os conflitos armados nãointernacionais quando dirigidos:

a) Contra quem participa nas hostilidades –regra que decorre da proibição geral de ordenar quenão haja sobreviventes (artigo 4.o do ProtocoloAdicional II);b) Contra as pessoas que não participam acti-vamente nas hostilidades – regra que decorre daobrigação geral de tratamento humano e da proi-bição de actos específicos (artigo 3.o comum àsquatro Convenções de Genebra e artigo 4.o do Pro-tocolo Adicional II).

[iii] Cooperação internacional na luta contra

o terrorismo

548. A violência causada peloterrorismo é proibida por umcerto número de instrumentosinternacionais que definem osmeios de luta contra os actos deterror que visam certos alvosespecíficos. Tal é, por exemplo,o caso da Convenção Interna-cional contra a Tomada de RefénsN.T.7, adoptada pelaAssembleia Geral em 1979.

549. Convém ainda chamar a atenção dos partici-pantes em cursos de formação para as Medidas de

142 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

N.T7

Assinada por Portugal a16 de Junho de 1980 e apro-vada para ratificação pelaResolução da Assembleia da República n.o 3/84, de 8 de Fevereiro de 1984,publicada no Diário da República, I Série, n.o 33/84. O instrumento de ratificação foi depositadojunto do Secretário-Geraldas Nações Unidas a 6 de Julho de 1984.

Page 174: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Luta contra o Terrorismo Internacional, propostasem 1990 pelo Oitavo Congresso das Nações Uni-das sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dosDelinquentes, as quais constituem um guia útil paracoordenar a luta contra o terrorismo internacionalquer a nível nacional como internacional.

550. O parágrafo 5.o das Medidas insta a umreforço da cooperação internacional para a pre-venção da violência provocada pelo terrorismo,enumerando um certo número de acções quedeveriam ser tomadas, nomeadamente:

a) Cooperação entre os serviços responsáveis pelaaplicação da lei, Ministério Público e magistrados;b) Integração e cooperação reforçadas no seiodos diversos serviços responsáveis pela aplicaçãoda lei e justiça penal, no respeito dos direitoshumanos fundamentais;c) Instrução e formação reforçadas do pessoalencarregue da aplicação da lei no domínio da pre-venção da delinquência e da cooperação interna-cional em matéria penal.

551. As medidas contêm 37 parágrafos relativos aoreforço da cooperação internacional, compreen-dendo directivas nomeadamente sobre:

a) extradição – instando ao desenvolvimento eaplicação efectiva dos tratados em matéria deextradição;b) não aceitação da obediência a ordens supe-riores como meio de defesa para as pessoas acusa-das de violação das convenções internacionais queproíbem actos de terrorismo;c) protecção do pessoal judiciário e das autori-dades penais, bem como das vítimas e testemunhasde actos de terrorismo.

552. O parágrafo 28 trata especificamente das pes-soas acusadas ou condenadas pela prática de cri-mes terroristas. Estas pessoas devem ser tratadasde forma não discriminatória e em conformidadecom os princípios e normas em matéria de direi-tos humanos reconhecidos internacionalmente,tais como os que são enunciados na Declaração Uni-versal dos Direitos do Homem e no Pacto Inter-nacional sobre os Direitos Civis e Políticos e ainda

nos instrumentos que proíbem a tortura e a escra-vatura.

553. As disposições do parágrafo 28 são impor-tantes, já que na luta contra o terrorismo os própriosEstados não devem recorrer a métodos terroristas.

[iv] Deveres e responsabilidades da polícia

554. Os deveres e responsabilidades dos funcio-nários policiais em matéria de terrorismo são osseguintes:

DEVERES – combater o terrorismo, através dodesenvolvimento de meios preventivos e daentrega à justiça dos autores de actos terroristas.Neste contexto, é particularmente importanteconhecer todos os meios e medidas requeridos ourecomendados pela comunidade e organizaçõesinternacionais.

RESPONSABILIDADES – respeitar a proibição deactos de terror nos conflitos armados, bem comoo conjunto dos direitos humanos e normas huma-nitárias aplicáveis em conflitos, distúrbios civis etempo de paz.

(g) Estados de excepção e medidas de derrogação

555. Os instrumentos internacionais em matéria dedireitos humanos admitem e prevêem a necessidadede restringir certos direitos humanos em caso deperigo público. Convém, todavia, sublinhar que cer-tos direitos são considerados de tal forma funda-mentais que em caso algum poderão ser derrogadasas disposições convencionais que os protegem.

[i] Disposições convencionais

556. O Pacto Internacional sobre os Direitos Civise Políticos dispõe, no seu artigo 4.o, que os Esta-dos podem adoptar medidas derrogatórias dasobrigações previstas no Pacto se um perigopúblico de natureza excepcional, proclamado porum acto oficial, ameaçar a existência da nação.Estas medidas devem:a) ser estritamente necessárias pelas exigênciasda situação;

Deveres e funções da Polícia* 143

Page 175: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

b) não ser incompatíveis com as outras obriga-ções impostas pelo direito internacional;c) não podem originar uma discriminaçãobaseada na raça, cor, sexo, língua, religião ou ori-gem social.

Os outros Estados Partes no Pacto devem ser ime-diatamente avisados sobre as disposições alvo dederrogação pelo Estado em questão, os motivosque provocaram essa derrogação e a data em quefoi colocado um termo à derrogação, por inter-médio do Secretário-Geral da Organização dasNações Unidas.

557. Os seguintes artigos do Pacto não podem serobjecto de derrogação:

a) protecção do direito à vida (artigo 6.o);b) proibição de tortura e de penas e tratamentoscruéis, desumanos ou degradantes (artigo 7.o);c) proibição da escravatura e da servidão (artigo 8.o,n.os 1 e 2 );d) Proibição de prisão pela única razão de a pes-soa estar incapacitada de executar uma obrigaçãocontratual (artigo 11.o);e) Proibição de leis retroactivas (artigo 15.o);f ) Direito de toda e qualquer pessoa ao reco-nhecimento, em qualquer lugar, a uma personali-dade jurídica (artigo 16.o);g) Direito de toda e qualquer pessoa à liberdadede pensamento, de consciência e de religião(artigo 18.o).

558. A Carta Africana dos Direitos do Homem e dosPovos não contém qualquer artigo específico queautorize os Estados a derrogar obrigações por elaimpostas. No entanto, inúmeras disposições con-têm uma cláusula que permite aos Estados res-tringirem direitos dentro dos limites permitidospela legislação nacional. É, por exemplo, o quesucede com o direito de associação (artigo 10.o)garantido a todos «sob reserva de se conformar àsregras prescritas na lei».

559. Estas cláusulas não prevêem o tipo de controloexterno do comportamento do Estado que utilizao direito de derrogação que é imposto pelas outrasconvenções previamente examinadas.

560. O artigo 27.o da Convenção Americana sobreDireitos Humanos dispõe que em caso de guerra,perigo público, ou outra emergência que ameacea independência ou segurança do Estado Parte,este poderá adoptar disposições que, na medida epelo tempo estritamente limitados às exigências dasituação, suspendam as obrigações contraídas emvirtude da Convenção. Tal como sucede com oPacto Internacional sobre os Direitos Civis e Polí-ticos, a Convenção precisa que tais medidas nãodevem ser incompatíveis com as outras obriga-ções decorrentes do direito internacional, nem darorigem a discriminações baseadas nos motivoshabituais.

561. Todo o Estado que faça uso do direito de der-rogação deve avisar imediatamente os outros Esta-dos Partes na Convenção, por intermédio doSecretário-Geral da Organização dos Estados Ame-ricanos. Os restantes Estados devem ser informa-dos sobre quais as disposições que foramsuspensas, motivos que provocaram esta suspen-são e a data prevista para pôr termo à suspensão.

562. A Convenção Americana sobre Direitos Huma-nos não permite qualquer derrogação às garantiasda Convenção acima enunciada (parágrafo 557),excepto no que diz respeito à alínea d), proibindoainda qualquer derrogação aos seguintes artigos:

a) protecção dos direitos da família (artigo 17.o);b) direito ao nome (artigo 18.o);c) protecção dos direitos da criança (artigo 19.o);d) direito à nacionalidade (artigo 20.o);e) direitos políticos (artigo 23.o).

563. A Convenção Europeia dos Direitos doHomem dispõe, no seu artigo 15.o, que em caso deguerra ou de outro perigo público que ameace a vidada nação, qualquer Estado pode tomar providên-cias que derroguem as obrigações previstas naConvenção, na estrita medida em que a situação oexigir, e em que tais providências não estejam emcontradição com as outras obrigações decorrentesdo direito internacional.

564. Os Estados que adoptem medidas derrogató-rias da Convenção devem manter o Secretário-

144 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 176: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 145

-Geral do Conselho da Europa plenamente informadosobre as medidas tomadas e motivos que as provo-caram. Devem igualmente informar o Secretário--Geral do Conselho da Europa da data em que essasdisposições tiverem deixado de estar em vigor.

565. A Convenção Europeia não autoriza qualquerderrogação aos seguintes artigos:

a) direito à vida (artigo 2.o), exceptuando oscasos em que a morte resultar de um acto lícito deguerra;b) proibição da tortura e penas ou tratamentoscruéis, desumanos ou degradantes (artigo 3.o);c) proibição da escravatura e servidão (artigo 4.o,n.o 1);d) proibição das leis retroactivas (artigo 7.o).

[ii] Responsabilidades da polícia

566. É especialmente difícil defender e proteger osdireitos humanos em período de conflito armadoou de distúrbios civis. E é precisamente durante estegénero de situações que os Estados são mais fre-quentemente levados a tomar medidas derrogató-rias. Quando tal se verifica, os funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei têm a obrigaçãoabsoluta de:

a) respeitar e proteger o núcleo de direitoshumanos não derrogáveis a todo o momento e emqualquer circunstância;b) respeitar as medias que ainda garantem pro-tecção de todos os outros direitos humanos, apósas derrogações decididas pelo Governo.

3. CONCLUSÕES

567. Os instrumentos examinados no presentecapítulo distinguem diversos níveis de distúrbiosinternos e conflitos armados: distúrbios internosque não constituem um conflito armado, conflitosarmados não internacionais de fraca ou forteintensidade e conflitos armados internacionais.Devemos, no entanto, relembrar que a maior partedas reuniões pacíficas e legais permanecem legaise pacíficas, não degenerando em tumultos. Damesma forma, a maior parte dos distúrbios civisviolentos não terminam em conflitos armados e amaior parte das guerras civis não se transforma emconflitos interestaduais.

568. É, no entanto, importante saber que existem porvezes riscos de recrudescimento e que a polícia temum papel crucial a desempenhar com vista à pre-venção deste tipo de evolução. Nos casos em que aspessoas exercem o seu direito de reunião pacífica norespeito pela lei, a polícia tem o dever de as ajudar aexercer este direito, devendo tomar todas as medi-das preventivas necessárias para evitar qualquer inci-dente violento. Contudo, se ocorreram estes tipos dedesordem, a intervenção policial poderá levar a umadiminuição, ou a um aumento dos distúrbios.

569. A capacidade da polícia prevenir desacatos e restabelecer a ordem rapida e humanamentedepende da aplicação das estratégias e tácticas demanutenção da ordem mais apropriadas. Nestecontexto, revestem-se de importância primordial astécnicas de manutenção da ordem e, por conse-guinte, a formação prática.

b. Normas internacionais sobre conflitos armados e distúrbios internos – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

Conflitos armados

• Receber formação para tomar conhecimento das exigências impostaspelo direito internacional dos direitos humanos e pelo direito humanitárioem período de conflito armado.

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

com estatuto civil

}

}

Page 177: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

146 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

• Receber formação sobre os métodos de primeiros socorros, gestão decatástrofes e protecção civil.

• Familiarizar-se com as estratégias de manutenção da ordem e protecçãoda população civil que seriam aplicadas pelo seu serviço de polícia em casode conflito.

• Cooperar estreitamente com os serviços médicos, de bombeiros e as auto-ridades civis e militares.

• Prestar uma especial atenção às necessidades específicas dos grupos par-ticularmente vulneráveis em período de conflito armado, nomeadamentedos refugiados, pessoas deslocadas, crianças e feridos.

Conflitos armados

• Dar formação a todos os agentes sobre as exigências impostas pelo direitointernacional dos direitos humanos e pelo direito humanitário em períodode conflito armado.

• Assegurar uma formação sobre os métodos de primeiros socorros, gestãode catástrofes e protecção civil.

• Elaborar estratégias precisas de manutenção da ordem e protecção dapopulação civil em períodos de conflito.

• Elaborar procedimentos padronizados de cooperação em situações deurgência, a fim de poder desenvolver uma acção coordenada com os ser-viços médicos, bombeiros, autoridades civis e militares.

• Afirmar claramente o estatuto civil da polícia em períodos de conflitos armados.

Conflitos armados

• Aprender e aplicar o regulamento militar*:

• Fazer prova de disciplina. Toda a violação do direito da guerra desonra tantoo soldado como o seu exército e causa sofrimentos desnecessários. Em vezde enfraquecer a vontade do inimigo lutar, irá frequentemente fortalecê-la.

• Limitar-se a combater os combatentes do inimigo e atacar unicamenteos objectivos militares.

• Limitar as destruições às exigências da missão.

• Não atacar inimigos que tenham sido colocados fora de combate ou quese tenham rendido. Desarmá-los e levá-los ao seu superior.

• Recolher e tratar os feridos e doentes, independentemente do facto de sereminimigos ou não.

• Tratar todos os civis e inimigos no seu poder com humanidade.

Recomendações destinadas

aos funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

com um estatuto civil

}

Polícias mobilizados

pelas forças armadas

durante os conflitos

}

}}

Page 178: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 147

• Os prisioneiros de guerra estão unicamente obrigados a revelar a sua iden-tidade, devendo ser tratados com humanidade. É proibido infligir-lhes tor-turas físicas ou psicológicas.

• Não fazer reféns.

• Abster-se de qualquer acto de vingança.

• Respeitar todas as pessoas e bens que usem o emblema da Cruz Verme-lha ou do Crescente Vermelho, a bandeira branca das tréguas ou os emble-mas que designem bens culturais.

• Respeitar os bens de terceiros. A pilhagem é proibida.

• Esforçar-se por evitar qualquer violação das regras acima enunciadas. Infor-mar o seu superior de qualquer violação. Toda a violação do direito da guerraé punível.

Distúrbios civis

• Elaborar estratégias de manutenção da ordem e verificar o nível de ten-são entre os diversos grupos sociais e entre estes grupos e as autoridades.

• Manter-se vigilante em relação a todos os preparativos de manifestações ilegais.

• Fazer prova de tolerância relativamente às reuniões ilegais de naturezapacífica, que não apresentem um carácter ameaçador, a fim de não pro-vocar inutilmente uma escalada.

• Estabelecer contactos com os manifestantes e os seus porta-vozes.

• Se for necessário dispersar uma multidão, deixar sempre um corredor deevacuação bem visível e desimpedido.

• Tratar a multidão como um conjunto de indivíduos de pensamento inde-pendente e não como uma massa guiada por uma vontade única.

• Evitar as tácticas inutilmente provocadoras.

• Elaborar técnicas de domínio das multidões que servem para reduzir anecessidade do recurso à força.

• Frequentar programas de formação para se aperfeiçoar nos seguintes domí-nios: primeiros socorros, autodefesa, utilização de equipamentos defensi-vos, utilização de armas não letais, utilização de armas de fogo,comportamento das multidões, resolução dos conflitos e gestão do stress.

• Munir-se de equipamentos defensivos, nomeadamente escudos, coletesà prova de balas, capacetes e armas não letais, e aprender a servir-se deles.

• Equipar-se com uma panóplia de meios que permitam uma utilizaçãodiferenciada da força e nomeadamente de armas não letais neutralizado-ras, aprender a servir-se deles e a utilizá-los.

• Estudar e aplicar técnicas de persuasão, mediação e negociação.

Recomendações destinadas

a todos os agentes

da força pública

}

}

Page 179: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

148 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

• Planificar atempadamente o recurso progressivo e diferenciado da força,começando pelos meios não violentos.

Distúrbios civis

• Elaborar instruções claras de respeito pelas reuniões e a agrupamentoslivres e pacíficos.

• Desenvolver estratégias de manutenção da ordem no seio das comuni-dades e entre elas, e supervisionar o nível de tensões entre os diferentes gru-pos sociais, bem como entre estes grupos e as autoridades.

• Ordenar aos agentes da força pública que façam prova de tolerância relati-vamente aos agrupamentos ilegais, mas pacíficos, que não constituam umaameaça, a fim de não provocar uma escalada inútil. Aquando da elaboraçãodas estratégias de disciplina das multidões, convém relembrar que o seu objec-tivo é, antes de mais, de manutenção da ordem e da segurança e de protegeros direitos humanos, e não a aplicação de tecnicismos jurídicos relativos à neces-sidade de autorizações ou a comportamentos ilegais não ameaçadores.

• Estabelecer instruções precisas e aplicáveis a todo o tempo sobre a utili-zação da força e as armas de fogo e fazer com que elas sejam respeitadas.

• Assegurar uma formação regular nos seguintes domínios: primeiros socor-ros, autodefesa, utilização de equipamentos defensivos, utilização de armasnão letais, utilização de armas de fogo, comportamento das multidões, reso-lução de conflitos, gestão do stress, persuasão, mediação e negociação.

• Equipar-se com equipamentos defensivos, incluindo capacetes, escudos,coletes à prova de balas, máscaras de gás e veículos blindados e apetrecharos agentes com esses mesmos equipamentos.

• Equipar-se com armas não letais neutralizadoras, bem como de equi-pamento de dispersão de multidões, e apetrechar os agentes com esses mes-mos equipamentos.

• Equipar-se com um leque, o mais vasto possível, de meios que permitama utilização diferenciada da força.

• Estabelecer regras claras para a apresentação de relatórios para cada inci-dente que tenha envolvido a utilização da força e de armas de fogo.

• Regular de forma rígida o controlo, armazenamento e entrega de armasde fogo, e aplicar processos que assegurem que os agentes são responsá-veis pelas armas e munições que lhes sejam entregues.

• Proibir o uso de armas e munições que causem ferimentos, danos ou ris-cos injustificados.

• Estabelecer estratégias para evitar que os agentes sejam colocados em situa-ções que os obriguem a utilizar armas de fogo.

Recomendações destinadas

aos funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

}}

Page 180: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

Você é informado de que, na cidade onde exerce oseu poder de polícia, está prevista uma manifestaçãocontra a discriminação racial. No seguimento de con-tactos entre a polícia e os organizadores da mani-festação, você toma conhecimento de que sãoesperados mais de 10 000 manifestantes e que amanifestação será pacífica e não violenta.

O itinerário combinado com os organizadores atra-vessará a cidade e os manifestantes dirigir-se-ão àCâmara Municipal, com vista a entregar uma peti-ção ao Presidente, que por sua vez fará uma decla-ração pública. Os manifestantes são escoltadosatravés da cidade por polícias em trajes normais(isto é, sem escudos nem capacetes) e é igualmentecombinado com os organizadores que a polícia faráprova de tolerância permanecendo a sua presençadiscreta.

Dois dias antes da data fixada para a manifes-tação você toma conhecimento, através dosseus informadores, que grupos extremistashostis decidiram confrontar os manifestantesperto da Câmara Municipal e perturbar o des-file esperando, desta forma, provocar gravesincidentes e desacreditar os objectivos damobilização. Os militantes extremistas recu-sam qualquer diálogo com a polícia, sendo difí-cil obter mais pormenores sobre os seusplanos. As estimativas apontam para que estessejam cerca de 700.

Por razões de princípio foi decidido que amanifestação seria mesmo assim autorizada eque seria protegido o direito de reunião pacíficados manifestantes. Os grandes princípios queenquadram as tarefas de manutenção da ordemneste género de manifestações são os seguin-tes:

a) Deve ser preservada a ordem pública dentrodo respeito pelos direitos humanos.b) Não serão tolerados os atentados contra aordem pública e os actos contrários à lei.

c) Os autores de atentados contra a ordempública e de actos contrários à lei serão detidos, amenos que a sua detenção imediata possa agravarseriamente a situação.d) Deve ser excluído o recurso à força, salvo emcasos de ameaça imediata contra a vida ou asegurança de terceiros, ou se for absolutamentenecessário para proceder a detenções ou impedirdesacatos graves.e) O recurso às armas de fogo é proibido,excepto em caso de ameaça iminente de morte oude ferimento grave.

TAREFA: tendo em conta a situação inicial, osnovos factos ocorridos e os princípios que devemenquadrar as tarefas de manutenção da ordem:

1). Elabore um plano para manter a ordemdurante a manifestação.

2). Indique o número de agentes policiais quedeveria ser destacado.

3). Concretize o tipo e quantidade de equipa-mento especial que entregaria aos agentes policiaisou que teria disponível em reserva.

4). Descreva a estrutura hierárquica no seio do ser-viço de polícia encarregue de dar ordens e de asse-gurar que não existem incidentes.

5). Indique as principais responsabilidades decada escalão hierárquico.

6). Descreva a táctica que aplicaria para enqua-drar a manifestação e indique a forma como ela per-mitiria alcançar os objectivos de manutenção daordem.

7). Enumere os factos que comunicaria aos orga-nizadores da manifestação no que diz respeito àsintenções dos contra-manifestantes extremistas ejustifique a sua escolha.

8). Indique as instruções que daria aos agentespoliciais relativamente à utilização da força, de-tenções e respeito geral pelos direitos humanos epelos princípios humanitários. Concretize as ins-

Deveres e funções da Polícia* 149

Page 181: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

150 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

truções relativas aos cuidados e tratamentos aministrar aos manifestantes feridos.

Exercício n.o

2

Estude as seguintes disposições do Pacto Interna-cional sobre os Direitos Civis e Políticos:

• artigo 6.o (direito à vida);• artigo 7.o (proibição da tortura e penas ou trata-mentos cruéis, desumanos ou degradantes);• artigo 9.o (direito à liberdade e à segurança da pes-soa);• artigo 10.o (direito dos detidos a serem tratadoscom humanidade);• artigo 14.o (direito a um processo equitativo).

Estude igualmente as disposições do artigo 3.o

comum às quatro Convenções de Genebra de 1949.

Redija um Código de Conduta destinado aos agen-tes policiais, que inclua instruções e directivas a apli-car em casos de distúrbios internos, de forma a queos agentes estejam plenamente conscientes dosdireitos humanos e das normas humanitárias apli-cáveis neste tipo de situações.

Exercício n.o

3

Imagine que ocorreram incidentes graves emdiversos pontos do território nacional, opondoduas populações étnicas, sendo que uma delas - derepresentação minoritária – se queixa de servítima de discriminação por parte da outra – derepresentação maioritária. Houve vítimas entre ospolícias e os manifestantes.

No decurso do primeiro incidente, a polícia reagiude forma exagerada e fez um uso excessivo daforça, o que causou inúmeros feridos graves entreos manifestantes. Esta intervenção suscitoucomentários muito hostis contra a polícia, por umlado por parte dos meios de comunicação social e,por outro, por parte da classe política, bem aindacomo pelos dois grupos étnicos em questão.

Desde então, o Governo tomou medidas econó-micas, sociais e políticas para responder a certas

reivindicações do grupo minoritário, mas a políciacontinua a sofrer fortes pressões políticas no sen-tido de se reformar e rever os seus modos de fun-cionamento, de forma a intervir com maioreficácia e humanidade quando ocorram distúrbioscivis.

Enquanto membro de um grupo de trabalhocriado pelo seu chefe de polícia:

1). Defina as grandes linhas de uma políticageral de restabelecimento da ordem em casosde distúrbios civis, determinando qual deveráser a abordagem de base e os objectivos maisvastos.

2). Baseando-se na política geral por si definida,redija instruções concisas destinadas aos quadrossuperiores da polícia, as quais deverão ser aplica-das quando aqueles definirem estratégias e tácti-cas de restabelecimento da ordem em caso dedistúrbios civis específicos.

3). A partir da política geral e das instruções porsi formuladas, estabeleça um quadro de referênciaque deverá ser entregue ao responsável pela for-mação.

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). Porque é que geralmente se admite que as par-tes num conflito armado não têm um direito ili-mitado no que concerne aos meios adoptados paraatingir o inimigo? Se estamos a combater o inimigo,porque é que não temos o direito de utilizar qual-quer meio para o atingir?

2). Estudar e analisar alguns dos dilemas moraiscom os quais se defronta um agente policial queserve num país ocupado por uma potência ini-miga.

3). Os princípios internacionais humanitáriosaplicáveis nos conflitos armados não internacionaisvisam a protecção das pessoas que não participamactiva ou directamente nas hostilidades. A proibi-ção de ordenar que não haja sobreviventes contida

Page 182: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Deveres e funções da Polícia* 151

no Protocolo Adicional II às Convenções de Gene-bra de 1949 confere uma protecção às pessoasque participam nas hostilidades. Parece-lhe queseria interessante estender alguma forma de pro-tecção aos combatentes na conduta das hostilida-des, tal como foi o caso nas regras relativas aosconflitos armados internacionais?

4). Em que medida é que um código de condutaque definisse as regras de comportamento aplicá-veis em período de distúrbios civis poderia ajudara polícia?

5). Quais são os direitos humanos fundamen-tais não derrogáveis que correm um especial riscode ser violados em caso de conflito armado nãointernacional ou de distúrbios civis graves? Porqueé que ocorrem atentados aos direitos humanosnestes tipos de situações?

6). Porque é que devemos respeitar os direitos daspessoas que perpetraram actos terroristas ou quesão suspeitas da prática de tais actos?

7). De que forma é que a polícia pode ajudar osindivíduos a exercerem o seu direito de reuniãopacífica?

8). Quais são as vantagens e inconvenientes dosseguintes meios para reprimir os distúrbios civis:gás lacrimogéneo, matracas, munições em plásticoou borracha e mangueira de água?

9). Como é que o oficial que dirige a intervençãoda polícia aquando de um tumulto grave e queordena que a multidão seja espancada com matra-cas, poderá preservar a sua autoridade e dominara situação, isto é como poderá ele fazer com queos polícias obedeçam às suas ordens sem fazeruma utilização excessiva da força?

10). Em que medida é que lhe parece interessanteque as unidades de polícia sejam especialmente trei-nadas para intervirem em casos de distúrbios públi-cos? Esta fórmula apresenta igualmente inconvenientes.Quais são eles e como poderão ser evitados?

11). Poderá a utilização incorrecta de armas nor-malmente não letais (tais como o gás lacrimogé-neo e as munições em borracha) causar a morte eferimentos graves? Como? Como podem estes aci-dentes ser evitados?

Page 183: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 184: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Quarta Parte 153

*GRUPOS NECESSITADOSDE PROTECÇÃO ESPECIALOU TRATAMENTO DISTINTO

Quarta parte

Page 185: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 186: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Quarta Parte 155

• Proporcionar aos utilizadores do manual uma compreensão básica dasnormas internacionais de direitos humanos aplicáveis a jovens que tenhamcontacto com o sistema de justiça penal, e sensibilizá-los para a importânciade proteger todas as crianças contra o abuso e tomar medidas para pre-venir a delinquência juvenil.

• As crianças devem beneficiar de todas as garantias reconhecidas aosadultos em matéria de direitos humanos. Devem ainda ser aplicadas às crian-ças as seguintes regras:

• As crianças devem ser tratadas de uma forma que promova o seu sen-tido de dignidade e valor pessoal, que facilite a sua reintegração na socie-dade, que reflita o interesse superior da criança e que tenha em conta asnecessidades de uma pessoa daquela idade.

• As crianças não devem ser sujeitas a tortura, a tratamentos ou penas cruéis,desumanos ou degradantes, a castigos corporais ou à pena de prisão per-pétua sem possibilidade de libertação.

• A detenção ou captura de crianças deve ser uma medida extrema tomada emúltimo recurso e deve ser aplicada pelo mínimo período de tempo necessário.

• As crianças em detenção devem ser separadas dos adultos.

• As crianças detidas devem ser autorizadas a receber visitas e correspon-dência dos membros das suas famílias.

• Deve ser fixada uma idade mínima para a responsabilidade penal.

• Devem ser previstos procedimentos não judiciários e alternativas à colo-cação em instituições.

• Deve ser respeitada a privacidade da criança. Devem ser mantidos regis-tos completos e fiáveis, cuja confidencialidade deve ser mantida.

Polícia e Protecção de Jovens

16

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

*capítulo

Page 187: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

156 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

a. Normas internacionais sobre a polícia e a protecção de jovens – Informação paraapresentações

1. INTRODUÇÃO

570. Os jovens devem gozar de todos os direitos eliberdades discutidos nos capítulos precedentesdeste manual, não devendo por exemplo ser sujei-tos a prisão arbitrária. Os jovens detidos devem sertratados humanamente e não devem ser sujeitosa tortura. Todas as limitações ao uso da força pelapolícia ser-lhes-ão aplicáveis.

571. O jovens são ainda protegidos por instrumen-tos que reflectem normas internacionais que têm emconta o seu estatuto e as suas necessidades particu-lares. A comunidade internacional, por intermédiodas Nações Unidas, reconhece a importância de:

a) proteger o bem-estar de todos os jovens queestejam em conflito com a lei;b) proteger os jovens contra o abuso, a negli-gência e a exploração;c) adoptar medidas especiais para prevenir adelinquência juvenil.

Em relação a este último ponto, é reconhecido queo facto de um jovem ser qualificado como «delin-quente» ou como «criminoso» contribui fre-quentemente para o desenvolvimento de umcomportamento sistematicamente anti-social eindesejável por parte desse jovem.

572. Para que a lei e as medidas de prevenção docrime sejam aplicadas de forma eficaz e humana énecessária a consciencialização e respeito, por parteda polícia, por boas práticas em matéria de protec-ção de jovens e de prevenção da delinquência juve-nil. A legislação e a prática a que é feita referência,tal como se encontra consagrada em instrumentosde direito internacional, será considerada infra.

2. ASPECTOS GERAIS RELATIVOS AO PAPEL

DA POLÍCIA E À PROTECÇÃO DOS JOVENS

(a) Princípios fundamentais

573. Assegurar o bem-estar dos jovens e o afastá-losdo sistema de justiça penal constituem princípiosfundamentais de direitos humanos e de protecçãode jovens. Estes princípios são também funda-mentais para a prevenção da delinquência juvenil.

• As medidas de coacção física e de utilização da força em crianças devemser excepcionais, ser unicamente utilizadas quando todas as outras medi-das de controlo tenham sido exaustas e ser unicamente aplicadas pelo mínimoperíodo de tempo necessário.

• O porte de armas em instituições para jovens é proibido.

• A disciplina deve respeitar a dignidade da criança e deve promover umsentido de justiça, de respeito pelo próprio e pelos direitos humanos nacriança.

• Os funcionários e agentes que lidam com jovens devem receber uma for-mação adequada e ter qualidades pessoais que os tornem aptos a desem-penhar essas funções.

• Devem ser efectuadas visitas periódicas e visitas não anunciadas por ins-pectores aos estabelecimentos de jovens.

• Os pais do jovem devem ser notificados em caso de prisão, detenção,doença, ferimento ou morte do jovem.}

Page 188: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Todas as disposições detalhadas que serão conside-radas neste capítulo decorrem destes princípios.

(b) Disposições específicas em matéria de

direitos humanos, polícia e protecção de

jovens

574. Serão consideradas as disposições de cincoinstrumentos que consagram normas interna-cionais relativas a jovens. Contudo, deverá serfeita igualmente referência aos capítulos XII e XIIIsupra, nos quais são consideradas as disposiçõesespecíficas relativas à prisão e detenção dejovens, no contexto das normas gerais relativasà prisão e detenção.

[i] Regras Mínimas das Nações Unidas

para a Administração da Justiça de Menores

(Regras de Beijing)

575. As Regras de Beijing são consagradas num ins-trumento detalhado composto por 30 regras con-tidas em seis partes, a saber: “Princípios Gerais”,“Investigação e Procedimento”, “Julgamento eDecisão”, “Tratamento em Meio Aberto”, “Trata-mento em Instituição” e “Investigação, Planifica-ção, Formulação de Políticas e Avaliação”.

576. A PRIMEIRA PARTE (PRINCÍPIOS GERAIS) con-tém nove regras, podendo aquelas que têm uma rele-vância directa para os agentes responsáveis pelaaplicação da lei, ser resumidas da seguinte forma:

577. A regra n.o 1 consagra as “orientações funda-mentais” nos termos das quais:

a) os Estados membros promovem o bem-estardo jovem;b) os Estados membros criam condições queassegurem ao jovem uma vida útil na comuni-dade, fomentando um processo de desenvolvi-mento pessoal e de educação afastado, tantoquanto possível, de qualquer contacto com a cri-minalidade e a delinquência;c) medidas positivas que assegurem a mobili-zação completa de todos os recursos existentes,incluindo a família, a comunidade, as instituiçõescomunitárias e as escolas, com o fim de promo-

ver o bem-estar do jovem e reduzir a necessi-dade de intervenção da lei e tratar de forma efi-caz, equitativa e humanitária o jovem em conflitocom a lei;d) a justiça juvenil deve ser concebida comoparte integrante do processo de desenvolvimentonacional de cada país;e) a aplicação destas Regras deve ser feita den-tro do contexto das condições económicas, sociaise culturais existentes em cada Estado membro;f ) os serviços de justiça de jovens devem sersistematicamente desenvolvidos e coordenadostendo em vista aperfeiçoar e apoiar a capacidadedos funcionários que trabalham nestes serviços, emespecial os seus métodos, modos de actuação eatitudes.

578. A regra n.o 2 define um jovem como

qualquer criança ou pessoa jovem que, em rela-ção ao sistema jurídico considerado, pode serpunido por um delito, de forma diferente da de umadulto.

O comentário à regra n.o 2 salienta o facto de queos limites de idade dependem expressamente decada sistema jurídico, respeitando assim total-mente os sistemas económicos, sociais, políticose culturais dos Estados membros.

579. A regra n.o 3 requer que as disposições per-tinentes das presentes Regras sejam aplicadasnão só aos delinquentes juvenis, mas tambémaos jovens que possam ser processados por qual-quer comportamento específico, que não seriapunido se fosse cometido por um adulto. Procu-rar-se-ão alargar os princípios contidos nas pre-sentes Regras a todos os jovens aos quais seapliquem medidas de protecção e de assistênciasocial.

580. A regra n.o 4 relaciona-se com a idade da res-ponsabilidade penal, determinando que nos sis-temas jurídicos que reconhecem a noção deresponsabilidade penal em relação aos jovens, estanão deve ser fixada a um nível demasiado baixo,“tendo em conta os problemas de maturidade afec-tiva, psicológica e intelectual”.

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 157

Page 189: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

581. A regra n.o 5 estabelece os objectivos da jus-tiça juvenil, que deve dar a maior importância aobem-estar destes e assegurar que qualquer decisãoem relação aos delinquentes juvenis seja sempreproporcional às circunstâncias especiais tanto dosdelinquentes como do delito.

582. A questão da proporcionalidade das medidasaplicáveis a delinquentes juvenis é desenvolvida nocomentário relativo à regra n.o 5, onde se afirma que

[…] Em relação aos delinquentes juvenis deve ter-se em

conta não só a gravidade da infracção, mas também as

circunstâncias pessoais. As circunstâncias individuais

do delinquente (tais como a condição social, a situação

familiar, o dano causado pela infracção ou outros fac-

tores em que intervenham circunstâncias pessoais)

devem influenciar a proporcionalidade da decisão (por

exemplo, tendo em conta o esforço do delinquente para

indemnizar a vítima ou o seu desejo de encetar uma vida

sã e útil). […]

583. A regra n.o 6 diz respeito à margem de dis-cricionariedade, e exige um poder discricionáriosuficiente em todas as fases do processo e a dife-rentes níveis da administração da justiça juvenil,designadamente nas fases de instrução, de acusa-ção, de julgamento e de aplicação e seguimento dasmedidas tomadas. As pessoas que exercem estepoder discricionário devem ser especialmentequalificadas ou formadas para o exercer judicio-samente.

584. O comentário à regra n.o 6 salienta a neces-sidade de:

a) se permitir o exercício do poder discricioná-rio em todas as fases importantes do processo,para que as pessoas que tomam decisões possamadoptar as medidas consideradas mais apropriadasem cada caso;b) prever medidas de controlo e equilíbrio quelimitem o abuso do poder discricionário;c) proteger os direitos do jovem delinquente.

585. É feita uma referência específica aos direi-tos dos jovens delinquentes na regra n.o 7, queexige garantias fundamentais, que deverão ser

asseguradas em todas as fases do processo, taiscomo:

• a presunção de inocência;• o direito a ser notificado das acusações;• o direito a não responder;• o direito à assistência judiciária;• o direito à presença dos pais ou tutor;• o direito a interrogar e confrontar as testemunhas;– o direito ao recurso

586. A regra n.o 8 destina-se a proteger o direitoà vida privada. Nos termos desta disposição odireito do jovem à vida privada deve ser respei-tado em todas as fases, com vista a evitar que sejaprejudicado por uma publicidade inútil ou peloprocesso de estigmatização. Em princípio, nãodeve ser publicada nenhuma informação quepossa conduzir à identificação de um delin-quente juvenil.

587. A SEGUNDA PARTE (INVESTIGAÇÃO E PRO-CEDIMENTO) contém quatro regras, que poderão serresumidas da seguinte forma:

588. A regra n.o 10 diz respeito ao primeiro con-tacto e determina que:

a) sempre que um jovem é detido, os pais ou otutor devem ser imediatamente notificados ou, nocaso de tal não ser possível, a notificação deverá serfeita com a maior brevidade após a detenção;b) um juiz ou qualquer outro funcionário ouorganismo competente deverá examinar imedia-tamente a possibilidade de libertar o jovem;c) os contactos entre os organismos encarrega-dos de fazer cumprir a lei e o jovem delinquentedeverão ser estabelecidos de forma a respeitar o esta-tuto jurídico do jovem, favorecer o seu bem-estare evitar prejudicá-lo, tendo em conta as circuns-tâncias do caso.

589. O comentário à regra n.o 10 afirma que oenvolvimento em processos de justiça juvenil podeem si mesmo ser «nocivo» para os jovens e requerque o termo «evitar prejudicá-lo» seja interpre-tado de forma lata. Salienta igualmente a impor-tância deste aspecto no primeiro contacto com as

158 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 190: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

agências responsáveis pelo cumprimento da lei, jáque ele poderá influenciar profundamente a atitudede um jovem face ao Estado e à sociedade. Ocomentário salienta que a benevolência e a fir-meza são essenciais em tais situações.

590. A regra n.o 11 exige que, sempre que possível,os casos dos delinquentes juvenis sejam tratadosevitando o recurso a um processo judicial. A polí-cia e as outras agências que se ocupam de casosenvolvendo jovens poderão lidar com eles discri-cionariamente, evitando o recurso ao formalismoprocessual penal estabelecido.

591. O comentário à regra n.o 11 salienta que orecurso a meios extrajudiciais, que permite evitar umprocesso penal e implica, muitas vezes, o encami-nhamento para os serviços comunitários, é comum-mente aplicado em vários sistemas jurídicos, deforma oficial e oficiosa. Acrescenta que em muitassituações, a não intervenção é a melhor solução e queo recurso a meios extrajudiciais desde o começo, semencaminhamento para serviços (sociais) alternativos,pode constituir a melhor resposta. Tal sucede,sobretudo, quando o delito não é de natureza gravee quando a família, ou outras instituições de controlosocial informal já reagiram, ou estão em vias dereagir, de modo adequado e construtivo.

592. É sublinhada ainda a importância de assegu-rar o consentimento do delinquente juvenil (dosseus pais ou tutor) para as medidas extrajudiciaisrecomendadas.

593. A regra n.o 12 exige que os polícias que seocupam frequentemente, ou exclusivamente, demenores ou que se dedicam essencialmente à pre-venção da delinquência juvenil recebam umainstrução e formação especiais. Com este fim,deveriam ser criados nas grandes cidades serviçosespeciais de polícia destinados a lidar com delin-quentes juvenis e com a prevenção da criminali-dade juvenil.

594. O comentário à regra n.o 12 sublinha que,sendo a polícia sempre o primeiro ponto de con-tacto com o sistema de justiça juvenil, é importanteque ela actue de maneira informada e adequada.

595. No que concerne as unidades especializadasde polícia dentro das cidades, o comentário afirmaque o aumento da delinquência juvenil é asso-ciado ao desenvolvimento das grandes cidades, eque tais unidades são indispensáveis, não só paraa aplicação das disposições das Regras, mas tam-bém para melhorar a prevenção e o controlo da cri-minalidade juvenil.

596. A regra n.o 13 requer que a prisão preventivaconstitua uma medida de último recurso e que asua duração seja o mais curta possível. Os jovenssob prisão preventiva devem estar separados dosadultos e devem receber cuidados, protecção etoda a assistência de que necessitem, tendo emconta a sua idade, sexo e personalidade.

597. O comentário à regra n.o 13 realça o perigo da«contaminação criminal» dos jovens presos pre-ventivamente e sublinha a necessidade de medidasalternativas.

598. A TERCEIRA PARTE (JULGAMENTO E DECI-SÃO) contém nove regras, a maioria das quais nãotem uma relevância directa para os agentes dapolícia.

599. A regra n.o 14 determina que, no caso de umjovem delinquente não ter sido alvo de um processoextrajudicial (previsto na regra n.o 11), este deve serjulgado pela autoridade competente em confor-midade com os princípios de um processo justo eequitativo. A regra n.o 15 dispõe que, durante todoo processo, o jovem tem o direito a ser represen-tado pelo seu advogado e a que os seus pais ou tutorparticipem no processo.

600. Nos termos do artigo 16.o, as autoridadescompetentes devem dispor de relatórios deinquérito social relativos aos delinquentes juve-nis antes de pronunciarem o julgamento. Oartigo 17.o enuncia detalhadamente princípiosorientadores para as autoridades envolvidas no jul-gamento e na decisão. A regra n.o 18 estabelecediversas medidas para as disposições do julga-mento e o artigo 19.o estipula que o recurso à colo-cação numa instituição deve ser o menorpossível.

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 159

Page 191: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

601. A regra n.o 20 pretende evitar atrasos desne-cessários e exige que cada caso seja tratado deforma expedita desde o início.

602. A regra n.o 21 exige que os registos referen-tes aos jovens delinquentes sejam consideradoscomo sendo estritamente confidenciais e inco-municáveis a terceiros. O acesso a estes registosdeve ser limitado às pessoas directamente envol-vidas no julgamento do processo em causa ou aoutras pessoas devidamente autorizadas.

603. O comentário à regra n.o 21 afirma que aregra pretende alcançar um compromisso entreinteresses antagónicos relacionados com os regis-tos e os processos: por um lado, os da polícia, doMinistério Público e de outras autoridades inte-ressadas em melhorar o controlo, e por outro, osinteresses do delinquente juvenil.

604. A regra n.o 22 sublinha a necessidade de for-mação profissional, para que todas as pessoasencarregues de matérias relativas a jovens possamadquirir e manter a sua competência profissional.

605. A QUARTA PARTE (TRATAMENTO EM MEIO

ABERTO) e a QUINTA PARTE (TRATAMENTO EM

INSTITUIÇÃO) contêm sete regras, não tendonenhuma delas relevância directa para os agentespoliciais no exercício das suas funções normais deaplicação da lei ou de prevenção do crime. Contudo,em certas jurisdições, os agentes policiais estãoenvolvidos em programas de reabilitação de delin-quentes juvenis no seio da comunidade.

606. A SEXTA PARTE (INVESTIGAÇÃO, PLANIFICA-ÇÃO, FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS E AVALIAÇÃO)equivale à regra n.o 30, que requer que sejam envi-dados esforços especiais para:

a) organizar e fomentar a investigação necessá-ria à formulação de planos e políticas eficazes;b) rever e avaliar periodicamente as tendências,os problemas e as causas da delinquência e da cri-minalidade juvenis, assim como as necessidadesespecíficas dos jovens detidos;c) estabelecer, com carácter regular, um dispo-sitivo permanente de investigação e de avaliação,

integrado no sistema de administração da justiçajuvenil, bem como compilar e analisar os dados einformações pertinentes necessários a uma ava-liação apropriada e a um aperfeiçoamento ulte-rior do referido sistema.

607. O comentário à regra n.o 30 chama a atençãopara a importância da simbiose entre a investiga-ção e as políticas, e para o facto de a avaliaçãoconstante das necessidades do jovem, assim comodas tendências e problemas da delinquência, seruma condição indispensável para melhorar a for-mulação de políticas apropriadas e conceber inter-venções.

[ii] Princípios Orientadores das Nações Unidas

para a Prevenção da Delinquência Juvenil (Princí-

pios Orientadores de Riade)

608. Os Princípios Orientadores de Riade vêmconsagrados num instrumento detalhado com-posto por 66 parágrafos, contido em sete partes:“Princípios Fundamentais”, “Âmbito dos PrincípiosOrientadores”, “Prevenção Geral”, “Processo deSocialização”, “Política Social”, “Legislação eAdministração da Justiça de Menores” e “Investi-gação, Elaboração de Políticas e Coordenação”.

609. A PARTE I (PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS) con-tém seis parágrafos, que resumidamente afirmamque:

a) a prevenção da delinquência juvenil constituiuma parte essencial da prevenção do crime noseio de uma sociedade;b) uma prevenção bem sucedida da delinquên-cia juvenil requer esforços por parte de toda asociedade;c) para efeitos de interpretação destes Princí-pios Orientadores, deverá seguir-se uma orienta-ção centrada na criança;d) na aplicação destes Princípios Orientadoresqualquer programa de prevenção deverá, deacordo com os sistemas jurídicos nacionais, cen-trar-se desde a primeira infância no bem-estar dosjovens;e) deverá reconhecer-se a necessidade eimportância de adoptar políticas progressivas

160 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 192: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

de prevenção da delinquência. Estas medidasdevem evitar criminalizar e penalizar um jovempor um comportamento que não cause danossérios ao seu desenvolvimento, nem prejudi-que terceiros. Tais políticas e medidas devemenvolver:

i) a promoção de oportunidades para satisfazeras várias necessidades dos jovens;ii) adopção de concepções e métodos especial-mente adaptados à prevenção da delinquência;iii) uma intervenção oficial cuja finalidade pri-mordial seja velar pelo interesse geral do jovem eseja guiada pela justiça e equidade;iv) protecção do bem-estar, desenvolvimento,direitos e interesses de todos os jovens;v) consideração de que o comportamento ouconduta dos jovens, que não é conforme às normase valores sociais gerais, faz muitas vezes parte doprocesso de maturação e crescimento, e tende adesaparecer espontaneamente, na maior parte dosindivíduos, na transição para a idade adulta;vi) a consciência de que rotular um jovemcomo «desviante» ou «delinquente» contribui,muitas vezes, para o desenvolvimento pelosjovens de um padrão consistente de comporta-mento indesejável.

f ) deveriam ser desenvolvidos serviços e pro-gramas de base comunitária para a prevenção dadelinquência juvenil.

610. A PARTE II (ÂMBITO DOS PRINCÍPIOS ORIEN-TADORES) contém os parágrafos 7 e 8, nos termosdos quais:

a) os Princípios Orientadores devem ser inter-pretados e aplicados no quadro da Declaração Uni-versal dos Direitos do Homem, e de outrosinstrumentos, incluindo o Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos, a Convençãosobre os Direitos da Criança e as Regras Mínimasdas Nações Unidas para a Administração da Justiçade Menores;b) os Princípios Orientadores devem ser igual-mente aplicados no contexto das condições eco-nómicas, sociais e culturais prevalecentes em cadaEstado membro.

611. A PARTE III (PREVENÇÃO GERAL) corres-ponde ao parágrafo 9, que contém nove subpará-grafos. Em resumo este parágrafo exige ainstituição de planos de prevenção detalhados emtodos os níveis da administração pública queincluam:

a) análises do problema e um inventário dosprogramas, serviços e recursos existentes;b) a atribuição de responsabilidades claramentedefinidas aos organismos, instituições e pessoalenvolvidos em acções de prevenção;c) mecanismos de coordenação das acções deprevenção entre organismos governamentais enão governamentais;d) políticas, programas e estratégias baseadosem estudos de prognóstico, os quais devem serconstantemente vigiados e cuidadosamente ava-liados durante a sua aplicação;e) métodos para reduzir eficazmente as opor-tunidades de se cometerem actos delinquentes;f ) envolvimento da comunidade através de umconjunto de serviços e programas;g) estreita cooperação entre os diversosníveis de Governo, o sector privado, cidadãosrepresentativos da comunidade em causa,organismos responsáveis pela prestação de cui-dados à criança e agências responsáveis pelaaplicação da lei, assim como instâncias judi-ciais, para o desenvolvimento de acções con-certadas com vista à prevenção da delinquênciajuvenil;h) participação da juventude nas políticas e pro-cessos de prevenção da delinquência, incluindo orecurso à auto-ajuda juvenil e a programas deindemnização e assistência às vítimas;i) recrutamento de pessoal especializado atodos os níveis.

612. A PARTE IV (PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO)contém 35 parágrafos sob as rubricas “Família”,“Educação”, “Comunidade” e “Meios de comu-nicação social”. Deve ser atribuída especialimportância às políticas de natureza preventivaque facilitam a socialização e a integração bemsucedidas de todas as crianças e jovens. Estaslinhas de orientação, que se revestem de particularrelevância para os agentes e organismos respon-

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 161

Page 193: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

sáveis pela aplicação da lei, podem ser assimresumidas:

a) Família:• Cada sociedade deve atribuir uma elevada prio-ridade às necessidades e ao bem-estar da família.b) Educação:• Os jovens e as suas famílias devem ser informadossobre a legislação e sobre os seus direitos e res-ponsabilidades nos termos da lei, bem como sobreo sistema de valores universais, nomeadamentesobre os instrumentos das Nações Unidas.• Deve ser atribuída uma atenção especial às polí-ticas e estratégias globais para a prevenção doabuso de álcool, drogas e outras substâncias porparte dos jovens;c) Comunidade:• Os serviços e programas de base comunitáriaque respondem às necessidades especiais, pro-blemas, interesses e preocupações dos jovens eque oferecem aconselhamento e orientação ade-quados aos jovens devem ser desenvolvidos, oureforçados;• Devem ser criadas instalações especiais, deforma a proporcionar alojamento adequado aosjovens que já não possam continuar a viver em casa,ou que não disponham de habitação;• Devem ser estabelecidos serviços e medidas deauxílio para lidar com as dificuldades dos jovens.Estes serviços devem incluir programas especiaispara os jovens toxicodependentes, que atribuamespecial importância ao tratamento, aconselha-mento e assistência.• As agências governamentais devem assumiruma responsabilidade especial em relação àscrianças sem abrigo ou aos meninos da rua.Devem ser prontamente postas à disposição dosjovens informações sobre instalações, alojamento,emprego e outras formas e fontes de assistência.

613. A PARTE V (POLÍTICA SOCIAL) contém seteparágrafos. Aqueles que se revestem de impor-tância para os agentes e organismos responsáveispela aplicação da lei podem ser assim resumidos:

a) As agências governamentais devem atribuirespecial prioridade aos planos e programas desti-nados aos jovens.

b) A colocação de jovens em instituições deve seruma medida de último recurso e deve durar omínimo período de tempo necessário;c) Os programas de prevenção da delinquênciajuvenil devem ser planeados e desenvolvidos combase em conclusões fiáveis de investigações cien-tíficas e periodicamente vigiados, avaliados e ajus-tados de acordo com as mesmas;d) Deve ser distribuída informação científica aosprofissionais e ao público em geral sobre os tiposde comportamento ou situações que indiciam oupodem vir a resultar em vitimização física e psi-cológica, maus tratos e abuso, bem como na explo-ração dos jovens;e) Os Governos devem começar ou continuar aexplorar, elaborar e aplicar medidas e estratégias,dentro e fora do sistema de justiça penal, paraprevenir a violência no seio da família de que ascrianças são vítimas e assegurar-lhes um trata-mento justo.

614. A PARTE VI (LEGISLAÇÃO E ADMINISTRA-ÇÃO DA JUSTIÇA JUVENIL) compreende oito pará-grafos, alguns dos quais contêm disposiçõesrelativas à aplicação da lei ou, de uma forma ououtra, com relevo para o pessoal da polícia. Asregras enunciadas podem ser resumidas daseguinte forma:

a) os governos devem adoptar e aplicar leis eprocedimentos visando a promoção e protecçãodos direitos e bem-estar de todos os jovens;b) devem adoptar e aplicar uma legislação queproíba os maus tratos e exploração contra as crian-ças e jovens, bem como a sua utilização para aprática de actividades criminais;c) nenhuma criança ou jovem deve ser subme-tido a medidas de correcção ou castigos duros oudegradantes em casa, nas escolas ou quaisqueroutras instituições;d) deve ser encorajada a adopção e aplicação delegislação destinada a restringir e controlar oacesso a qualquer tipo de armas, por qualquercriança ou jovem;e) com vista a prevenir qualquer estigmatiza-ção, vitimização e criminalização dos jovens, deveser adoptada legislação que assegure que uma con-duta não considerada como crime quando come-

162 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 194: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

tida por um adulto, não seja penalizada quandocometida por um jovem;f ) o pessoal de administração da justiça deambos os sexos deve ser formado para responderàs necessidades especiais dos jovens e estar fami-liarizado e usar as possibilidades e programasalternativos que permitam subtrair os jovens ao sis-tema judiciário;g) deve ser adoptada e estritamente aplicada legis-lação para proteger as crianças e os jovens contra oconsumo de drogas e o tráfico de estupefacientes;

615. A PARTE VII (INVESTIGAÇÃO, ELABORAÇÃO DE

POLÍTICAS E COORDENAÇÃO) contém sete pará-grafos. Aqueles que dizem respeito às pessoas eorganismos responsáveis pela aplicação da leipodem resumir-se da seguinte forma:

a) Devem ser desenvolvidos esforços e estabe-lecidos mecanismos para promover a interacção ecoordenação entre entidades e serviços económi-cos, sociais, educativos e de saúde, o sistema judi-ciário, os organismos para a juventude, osorganismos comunitários e de desenvolvimento eoutras instituições relevantes.b) A troca de informações, experiência e conhe-cimentos técnicos, obtidos através de projectos,programas e iniciativas relativas à criminalidadejuvenil, à prevenção da delinquência e à justiça demenores, deve ser intensificada, a nível nacional,regional e internacional.c) A cooperação regional e internacional em maté-ria de criminalidade juvenil, prevenção da delin-quência e justiça juvenil que envolva práticos, peritose pessoas responsáveis pela tomada de decisões namatéria, deve ser desenvolvida e fortalecida.d) Deve ser encorajada a colaboração na realizaçãode trabalhos de investigação sobre as modalidadeseficazes de prevenção do crime e da delinquênciajuvenis, devendo os resultados de tais investigaçõesser amplamente difundidos e avaliados.

[iii] Regras das Nações Unidas para a Protecção

dos Menores Privados de Liberdade

616. Estas Regras são enunciadas num instru-mento detalhado de 87 regras contidas em cincosecções: “Perspectivas Fundamentais”, “Âmbito e

Aplicação das Regras”, “Jovens sob Detenção ou queAguardam Julgamento”, “A Administração dosEstabelecimentos de Menores” e “Pessoal”.

617. Este instrumento é aplicável a todos os tipose formas de estabelecimentos e instituições, nosquais existem jovens privados da sua liberdade. Con-tudo, o essencial das suas disposições diz respeitoàs instituições onde os jovens são detidos por umlongo período de tempo, tendo em vista o seu tra-tamento e readaptação, e não a detenção nasesquadras de polícia. A detenção dos jovens pelapolícia tem normalmente uma curta duração e érealizada por razões ligadas com a protecção ime-diata do jovem ou com a investigação criminal.

618. Os princípios e disposições que se revelam deinteresse para os funcionários responsáveis pelaaplicação da lei ou que se revestem de maiorimportância no tratamento de jovens detidos pelapolícia são considerados infra.

619. A SECÇÃO I (PERSPECTIVAS FUNDAMENTAIS)contém 10 regras, podendo ser resumidas daseguinte forma aquelas que se revestem de impor-tância para os casos de detenção pela polícia:

a) O sistema de Justiça de Menores deverágarantir os direitos e a segurança, e promover obem-estar físico e mental dos jovens.b) A privação de liberdade de um jovem deve seruma medida de último recurso e deve ser tomadapelo período mínimo necessário;c) As Regras devem ser aplicadas de formaimparcial, sem discriminação de qualquer espéciequanto à raça, cor, sexo, língua ou religião. Ascrenças religiosas, as práticas culturais e os con-ceitos morais dos jovens devem ser respeitados.d) Os jovens que não sejam fluentes na língua faladapelo pessoal do estabelecimento de detenção devemter direito aos serviços gratuitos de um intérprete.

620. A SECÇÃO II (ÂMBITO E APLICAÇÃO DAS

REGRAS) contém seis regras, a primeira das quaiscompreende as seguintes definições:

a) Menor é qualquer pessoa que tenha menos de 18

anos. A idade limite abaixo da qual não deve ser per-

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 163

Page 195: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

mitido privar uma criança de liberdade deve ser fixada

por lei;

b) Privação de liberdade significa qualquer forma de

detenção, de prisão ou a colocação de uma pessoa, por

decisão de qualquer autoridade judicial, administrativa

ou outra autoridade pública, num estabelecimento

público ou privado do qual essa pessoa não pode sair

por sua própria vontade.

621. As restantes regras podem ser assim sinteti-zadas:

a) A privação da liberdade deve ser efectuadaem condições e circunstâncias que assegurem o res-peito pelos direitos humanos dos jovens.b) Os jovens privados de liberdade não devem,por força do seu estatuto de detidos, ser privadosdos direitos civis, económicos, políticos, sociaisou culturais dos quais se possam prevalecer.c) A protecção dos direitos individuais dosjovens, com especial relevância para a legalidadeda execução das medidas de detenção, deve serassegurada pela autoridade competente.d) As Regras aplicam-se a todos os tipos e for-mas de instituições de detenção, através dos quaisos jovens se encontrem privados de liberdade.e) As Regras serão aplicadas no contexto dascondições económicas, sociais e culturais existen-tes em cada Estado membro.

622. A SECÇÃO III (MENORES SOB DETENÇÃO OU

QUE AGUARDAM JULGAMENTO) contém duasregras, que reafirmam a presunção de inocência daspessoas acusadas, as quais ainda aguardam julga-mento. As disposições destas duas regras podemser assim sintetizadas:

a) Os jovens que estão detidos preventivamenteou que aguardam julgamento («não julgados»)presumem-se inocentes e serão tratados como tal.b) A detenção antes do julgamento deve ser evi-tada, na medida do possível, e limitada a circuns-tâncias excepcionais.c) No entanto, quando se recorrer à detençãopreventiva, os tribunais de menores e os órgãos deinvestigação tratarão esses casos com a maiorurgência, a fim de assegurar a mínima duração pos-sível da detenção.

d) Os detidos que aguardam julgamento devemestar separados dos jovens condenados.e) Os jovens devem ter direito aos serviços deum advogado e poder requerer assistência judi-ciária gratuita, quando essa assistência esteja dis-ponível.f ) Os jovens devem poder comunicar regular-mente com os seus conselheiros jurídicos, emcondições de privacidade e confidencialidade.g) Os jovens devem dispor de oportunidades deefectuar um trabalho remunerado, e de continuara sua educação e formação profissional, mas nãolhes deve ser exigido que o façam.h) O trabalho, os estudos ou a formação profis-sional não devem causar a continuação da deten-ção.i) Os jovens podem receber e guardar materiaispara os seus tempos livres e recreio, na medida emque tal seja compatível com os interesses da admi-nistração da justiça.j) Os jovens que ainda não tenham sido sujei-tos a julgamento devem beneficiar de todas asoutras disposições tidas por necessárias e apro-priadas, em função da presunção de inocência, daduração da detenção, da sua situação legal e das cir-cunstâncias do jovem.

623. A SECÇÃO IV (A ADMINISTRAÇÃO DOS

ESTABELECIMENTOS DE MENORES) contém 62regras detalhadas, subdivididas em 14 rubricasintituladas: Registos, “Admissão, registo, movi-mento e transferência”, “Classificação e coloca-ção”, “Ambiente físico e alojamento”, “Educação,formação profissional e trabalho”, “Recreio”,“Religião”, “Cuidados médicos”, “Notificação dedoença, acidente ou morte”, “Contactos com oexterior”, “Limitações à coacção física e ao uso daforça”, “Processos disciplinares”, “Inspecção equeixas” e “Regresso à comunidade”.

624. A Secção IV enuncia as regras aplicáveis aoscasos de jovens detidos por um longo períodopara fins de tratamento ou de reabilitação, nãodizendo directamente respeito ao tratamento dejovens em esquadras de polícia. No que concerneàs normas aplicáveis a estes últimos, faremosreferência ao capítulo XII do Manual, relativo àdetenção, bem como às disposições pertinentes dos

164 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 196: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

instrumentos examinados no presente capítulo– por exemplo aquelas que dizem respeito aosjovens presos ou aguardando julgamento, expos-tas no parágrafo 622.

625. É, no entanto, importante colocar ênfasenuma disposição específica da secção IV destasRegras, a saber a regra 56, nos termos da qual afamília ou o tutor dos jovens deve ser avisado ime-diatamente:

a) em caso de morte do jovem detido;b) em caso de doença que exija a transferên-cia do jovem para um estabelecimento médicoexterior;c) se o estado de saúde do jovem obrigar a cui-dados na enfermaria do estabelecimento, por umperíodo superior a 48 horas.

626. A SECÇÃO V (PESSOAL) inclui sete artigosdetalhados relativos às qualificações, à selecção, àformação e ao comportamento do pessoal das ins-tituições especializadas no tratamento e readapta-ção de jovens.

[iv] Convenção sobre os Direitos

da Criança

627. Este importante instrumento é composto por54 artigos que prevêem uma protecção completada criança.

628. O preâmbulo da Convenção:

a) recorda que a Declaração Universal dos Direi-tos do Homem proclamou que a infância temdireito a uma ajuda e assistência especiais;b) reconhece que em todos os países do mundo,há crianças que vivem em condições particular-mente difíceis e que importa assegurar uma aten-ção especial a essas crianças.

629. Nos termos do artigo primeiro da Convençãodeve ser considerado como criança

[…] todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos

termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade

mais cedo.

630. Em virtude do artigo 2.o, os Estados Par-tes comprometem-se a garantir os direitosenunciados na Convenção a todas as criançasque se encontrem sujeitas à sua jurisdição, semdistinção alguma, independentemente de qual-quer consideração de raça, cor, sexo, língua oureligião.

631. O artigo 3.o dispõe que, em todas as decisõesrelativas a crianças adoptadas por instituiçõespúblicas ou privadas de protecção social, por tri-bunais, autoridades administrativas ou órgãoslegislativos, o interesse superior da criança será tidoprimacialmente em conta.

632. As matérias tratadas na Convenção quedizem respeito às pessoas e organismos respon-sáveis pela aplicação da lei podem ser classificadassob as rubricas «Protecção dos direitos», «Protec-ção contra a exploração» e «Protecção das criançasem situações especiais». As disposições em causaencontram-se resumidas infra.

Protecção dos direitos

633. Nos termos do artigo 6.o da Convenção, osEstados Partes reconhecem que toda a criança temum direito inerente à vida e asseguram, na medidado possível, a sobrevivência e o desenvolvimentoda criança.

634. O artigo 8.o enuncia o direito da criança apreservar a sua identidade, incluindo a sua nacio-nalidade, nome e relações familiares, nos termosda lei e sem ingerência ilegal.

635. O artigo 12.o obriga os Estados a garantiremà criança com capacidade de discernimento odireito de exprimir livremente a sua opinião sobreas questões que lhe digam respeito. Para este fim,deve ser nomeadamente dada à criança a possibi-lidade de ser ouvida nos processos judiciais que lheinteressem, seja directamente, seja através de umrepresentante.

636. O artigo 13.o enuncia o direito à liberdade deexpressão, que inclui a liberdade de procurar, rece-ber e expandir informações e ideias de toda a espé-cie, sem considerações de fronteiras, sob forma oral,

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 165

Page 197: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

escrita, impressa ou artística ou por qualqueroutro meio à escolha da criança.

637. O artigo 14.o protege o direito da criança à liber-dade de pensamento, de consciência e de religião.Os pais ou o tutor têm o direito de orientar acriança no exercício deste direito.

638. O artigo 15.o enuncia o direito à liberdade deassociação e à liberdade de reunião pacífica.

639. O artigo 16.o protege as crianças contra asintromissões arbitrárias ou ilegais na sua vida pri-vada, família, domicílio ou correspondência, eainda contra ofensas ilegais à sua honra e reputa-ção. A criança tem direito à protecção da lei con-tra tais intromissões ou ofensas.

640. O artigo 30.o refere que, nos Estados ondeexistam minorias étnicas, religiosas ou linguísticasou pessoas de origem indígena, as crianças de ori-gem indígena ou pertencentes a uma destas mino-rias não poderão ser privadas do direito a uma vidacultural própria, a professar e praticar a sua própriareligião ou de utilizar a sua própria língua emcomum com os outros membros do seu grupo.

641. O artigo 37.o contém quatro parágrafos nos ter-mos dos quais:

a) as crianças são protegidas contra a tortura eoutras penas ou tratamentos cruéis, desumanos oudegradantes, não podendo ser condenadas nem àpena capital nem à prisão perpétua;b) a prisão ilegal ou arbitrária é proibida;c) as crianças devem ser tratadas com humani-dade, com o respeito devido à dignidade da pessoahumana e de forma consentânea com as necessi-dades das pessoas da sua idade. A criança privadade liberdade deve ser separada dos adultos e temo direito de manter o contacto com a sua família;d) as crianças privadas de liberdade têm o direitode aceder rapidamente à assistência jurídica ou a qual-quer outra assistência adequada, como o direito deimpugnar a legalidade da sua privação de liberdade.

642. O artigo 40.o impõe aos Estados a obrigaçãode reconhecerem, a qualquer criança suspeita,

acusada ou que comprovadamente infringiu a leipenal, o direito a um tratamento:

a) que seja capaz de favorecer o seu sentido dedignidade e valor;b) que reforce o seu respeito pelos direitos huma-nos e as liberdades fundamentais de terceiros;c) que tenha em conta a sua idade e a necessi-dade de facilitar a sua reintegração social e o assu-mir de um papel construtivo no seio da sociedade.

Protecção contra a exploração

643. O artigo 19.o estipula que os Estados devemadoptar todas as medidas legislativas, administra-tivas, sociais e educativas apropriadas para prote-ger a criança contra qualquer forma de:

a) violência física ou mental;b) dano ou sevícia;c) abandono ou tratamento negligente;d) maus tratos ou exploração;e) violência sexual, enquanto se encontrar sob aguarda dos seus pais ou de um deles, dos repre-sentantes legais ou de qualquer outra pessoa acuja guarda haja sido confiada.

644. Estas medidas de protecção devem incluir osprocedimentos para fins de identificação, elaboraçãode relatórios, transmissão e investigação, bemcomo processos de intervenção judicial.

645. O artigo 32.o dispõe que os Estados protegemas crianças contra a exploração económica e quedevem tomar as medidas legislativas, administra-tivas, sociais e educativas necessárias para atingiresses fins.

646. O artigo 33.o dispõe que os Estados devemtomar as medidas legislativas, administrativas,sociais e educativas necessárias para:

a) proteger as crianças contra a utilização ilícitade estupefacientes e de substâncias psicotrópicas;b) evitar a utilização de crianças na produção etráfico ilegais de tais substâncias.

647. O artigo 34.o estipula que os Estados devemproteger as crianças contra todas as formas de

166 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 198: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

exploração e violência sexuais. Para atingir estefim serão adoptadas medidas para evitar:

a) que as crianças sejam incitadas ou coagidasa dedicarem-se a uma actividade sexual ilícita;b) que as crianças sejam exploradas para finsde prostituição ou outras práticas sexuais ilegais;c) que as crianças sejam exploradas para finsde produção de espectáculos ou materiais de carác-ter pornográfico.

648. O artigo 36.o requer aos Estados que protejamas crianças contra todas as formas de exploraçãoprejudiciais a qualquer aspecto do seu bem-estar.

Protecção das crianças em situações especiais

649. O artigo 9.o diz respeito à separação dascrianças dos seus pais, e exige que os Estados asse-gurem que as crianças não sejam separadas dosseus pais contra a sua vontade, a menos que as auto-ridades competentes decidam que esta separaçãoé necessária de acordo com o interesse superior dacriança, sob reserva de revisão judiciária e em con-formidade com a legislação e procedimentos apli-cáveis.

650. Nos casos em que a separação é resultado dasmedidas adoptadas por um Estado, tais como adetenção, a prisão, o exílio, a expulsão ou a mortede um ou de ambos os pais ou da própria criança,o preceito obriga o Estado, se tal lhe for solicitado,a dar aos pais, à criança ou a outro membro da famí-lia as informações essenciais sobre o paradeiro domembro ou membros ausentes da família, amenos que a divulgação destas informações sejaprejudicial ao bem-estar da criança.

651. O artigo 22.o diz respeito aos refugiados esolicita aos Estados que adoptem medidas apro-priadas para que uma criança:

a) que requeira o estatuto de refugiado, oub) que seja considerada refugiado, de harmoniacom as normas e processos de direito internacio-nal ou nacional aplicáveis, quer se encontre só,quer acompanhada de seus pais ou de qualqueroutra pessoa,

beneficie de adequada protecção e assistênciahumanitária, de forma a permitir o gozo dos direi-tos reconhecidos pela Convenção e por outros ins-trumentos internacionais relativos aos direitoshumanos ou de carácter humanitário.

652. O artigo 35.o diz respeito ao rapto, venda outráfico de crianças e solicita aos Estados quetomem todas as medidas apropriadas nos planosnacional, bilateral e multilateral para evitar taisabusos.

653. O artigo 38.o prende-se com os conflitosarmados e impõe aos Estados que respeitem efaçam respeitar as regras do direito internacionalhumanitário aplicáveis às crianças. Os Estadosdevem, em particular:

a) tomar todas as medidas pos-síveis na prática para garantir quenenhuma criança com menos de15 anos participe directamentenas hostilidadesN.T.1;b) abster-se de incorporar nasforças armadas as pessoas quenão tenham a idade de 15anosN.T.2;c) nos termos das obrigaçõescontraídas à luz do direito inter-nacional humanitário para aprotecção da população civil emcaso de conflito armado, osEstados Partes na presente Con-venção devem tomar todas asmedidas possíveis na prática para assegurar pro-tecção e assistência às crianças afectadas por umconflito armado.

[v] Regras Mínimas das Nações Unidas

para a Elaboração de Medidas não Privativas

de Liberdade (Regras de Tóquio)

654. As Regras de Tóquio são enunciadas numinstrumento detalhado composto por 23 artigosrepartidos por oito rubricas intituladas: «Princípiosgerais», «Antes do processo», «Processo e conde-nação», «Aplicação das penas», «Execução dasmedidas não privativas de liberdade», «Pessoal»,

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 167

N.T.1

Foi entretanto adoptado,a 25 de Maio de 2000, pelaAssembleia Geral dasNações Unidas, o ProtocoloFacultativo à Convençãosobre os Direitos daCriança, relativo ao Envolvi-mento de Crianças em Con-flitos Armados, queaumenta a idade para a participação de criançasem conflitos armados de 15para 18 anos. Nos termosdo artigo 10.o, n.o 1, o Pro-tocolo entrará em vigor trêsmeses após o depósito dodécimo instrumento de rati-ficação.

N.T.2

O mesmo ProtocoloFacultativo à Convençãosobre os Direitos da Criançafixa a idade mínima para o recrutamento obrigatórioem 18 anos (artigo 2.o) e exige aos Estados Partesque aumentem a idademínima para o recruta-mento voluntário «emanos» (artigo 3.o, n.o 1).

Page 199: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

«Voluntariado e outros recursos da colectividade»e «Pesquisa, planificação, elaboração das políticase avaliação».

655. As Regras assentam na ideia de que as medi-das de substituição da prisão podem ser um meioeficaz de tratar os delinquentes no seio da colec-tividade, consentâneo com o interesse superiordos delinquentes e da sociedade.

656. Apesar das Regras se aplicarem simultanea-mente aos delinquentes adultos e aos jovens, éparticularmente importante estudá-las em relaçãoaos delinquentes juvenis, à luz dos princípios e dis-posições enunciados nos instrumentos examina-dos supra. Eis alguns exemplos:

a) Os jovens privados de liberdade são parti-cularmente expostos às sevícias, à vitimização e àviolação dos seus direitos.b) A colocação de jovens numa instituição deveser uma medida de último recurso tomada pelomínimo período de tempo necessário.c) Devem ser evitados os processos penais e assanções contra uma criança que tenha tido uma con-duta delituosa.d) Sempre que seja possível, os jovens deveriamser subtraídos aos processos judiciários e ser enca-minhados para os serviços de apoio comunitário.e) Em todas as fases do processo da justiça juve-nil, a autoridade competente deve poder exercer umpoder discricionário apropriado.f ) A polícia e as outras instituições deveriamestar habilitadas a resolver as matérias de que seocupam sem aplicar o processo penal oficial.

657. As disposições enunciadas nas Regras relati-vas à polícia e às suas funções na administração dajustiça juvenil são resumidas infra.

658. Os artigos relativos aos «Princípios gerais»dizem respeito aos objectivos fundamentais, aocampo de aplicação das medidas não privativas deliberdade e às garantias jurídicas.

659. O artigo primeiro enuncia os objectivos fun-damentais do instrumento, a saber formular umasérie de princípios de base que visam favorecer o

recurso a medidas não privativas da liberdade,bem como a garantias mínimas para as pessoas sub-metidas a medidas de substituição da prisão. O pre-ceito dispõe que as Regras se aplicam de acordo coma situação política, económica, social e cultural decada país e tendo em conta os fins e objectivos doseu sistema de justiça penal.

660. Os Estados devem esforçar-se por aplicar as Regrasde forma a que se verifique um equilíbrio justo entre:

a) os direitos dos delinquentes;b) os direitos das vítimas, ec) as preocupações da sociedade em relação àsegurança pública e à prevenção do crime.

661. O artigo 2.o dispõe que as Regras se aplicama todas as pessoas que sejam alvo de um processojudiciário, de um julgamento ou da execução deuma sentença, em todas as fases da administraçãoda justiça penal. Para os fins das referidas Regrasestas pessoas são designadas «delinquentes»,independentemente do facto de se tratar de sus-peitos, acusados ou condenados.

662. As Regras aplicam-se sem qualquer tipo de dis-criminação fundada nos motivos habituais, taiscomo a raça, a cor, o sexo, a idade ou a religião.

663. O artigo 2.o exige igualmente que seja consi-derado o tratamento dos delinquentes no seio dacomunidade, evitando na medida do possível orecurso a um processo judiciário ou aos tribunais,no respeito pelas garantias jurídicas e pelos prin-cípios subjacentes a um Estado de Direito.

664. O artigo 3.o enuncia as garantias jurídicasdestinadas a assegurar o respeito pela legalidade,a proteger os direitos do delinquente, a sua dig-nidade, segurança e vida privada, quando são con-sideradas ou aplicadas medidas não privativas daliberdade. Em particular:

a) A escolha da medida não privativa da liberdadebaseia-se na avaliação da natureza e da gravidadedo delito, da personalidade e dos antecedentes dodelinquente, do objecto da condenação e dos direi-tos das vítimas.

168 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 200: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

b) As medidas não privativas da liberdade queacarretem uma obrigação para o delinquente, eque sejam aplicáveis antes ou em vez do processo,requerem o consentimento do delinquente.

665. Os artigos relativos à «Fase anterior ao pro-cesso» dizem respeito às medidas que podem seradoptadas antes do processo e aos meios de evitara detenção provisória.

666. O artigo 5.o exige que a polícia, o MinistérioPúblico ou os outros serviços com competênciasem matéria de justiça penal estejam habilitados aretirar as acusações contra o delinquente, desde quetal seja apropriado e compatível com o sistemajurídico e se considerarem não ser necessário terrecurso a um processo judiciário para os fins de:

a) protecção da sociedade:b) prevenção do crime;c) promoção do respeito pela lei e pelos direitosdas vítimas.

Cada sistema jurídico fixará critérios para determinarse é conveniente retirar as acusações contra o delin-quente ou para decidir qual o processo a seguir.

667. Nos termos do artigo 6.o, a detenção provisóriasó poderá constituir uma medida de últimorecurso nos processos penais, tendo devidamenteem conta o inquérito sobre a presumível infracçãoe a protecção da sociedade e da vítima.

668. Os artigos da rubrica «Processo e condena-ção» dizem respeito aos relatórios de inquéritossociais e às penas, e os artigos da rubrica «Apli-cação das penas» contêm disposições relativas àaplicação das penas. Trata-se de processos nosquais a polícia habitualmente não intervém direc-tamente.

669. Os artigos da rubrica «Execução das medi-das não privativas da liberdade» prendem-se coma vigilância, duração das medidas não privativas daliberdade, tratamento, disciplina e desrespeitopelas condições de tratamento. Apesar de não serhabitual que a polícia esteja directamente envolvidanestes processos, em certas jurisdições os agentes

policiais estão envolvidos na supervisão de medi-das não privativas da liberdade.

670. Os artigos da rubrica «Pessoal» prendem-secom o recrutamento e a formação e os artigos darubrica «Voluntariado e outros recursos da colec-tividade» tratam da participação da colectividade,da compreensão e cooperação por parte do públicoe finalmente dos voluntários.

671. Nos artigos da rubrica «Pesquisa, planificação,elaboração das políticas e avaliação» é sublinhada,inter alia, a importância de que se revestem:

a) a pesquisa sobre os problemas que enfrentamos indivíduos em causa, os práticos a comunidadee os responsáveis (artigo 20.o, n.o 2);b) as avaliações regulares para que a aplicação dasmedidas não privativas de liberdade seja mais efi-caz (artigo 21.o, n.o2);c) a ligação entre os serviços responsáveispelas medidas não privativas da liberdade, osoutros sectores do sistema de justiça penal e osorganismos de desenvolvimento e de protecçãosocial (artigo 22.o).

3. CONCLUSÕES

672. O número e a diversidade das normas inter-nacionais relativas aos jovens demonstram aimportância que se atribui à sua protecção e à pre-venção da delinquência juvenil.

673. Todos os funcionários policiais devem estar aocorrente das boas práticas – tais como se encontramconsagradas nas normas internacionais – nestedomínio. Os funcionários policiais que estão maisespecialmente encarregues da protecção dos jovensou que lidam com delinquentes juvenis devem terum perfeito domínio destas boas práticas.

674. Certos serviços de polícia adquiriram umagrande competência técnica no que diz respeito aoscuidados e à protecção a prestar aos jovens, e os res-ponsáveis da polícia que pretendem melhorar o fun-cionamento dos seus serviços deviam recorrer aestas competências.

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 169

Page 201: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

675. Existem diversas maneiras de um Estadoconformar às exigências enunciadas nas nor-mas internacionais, de forma a respeitar as suascaracterísticas sociais e culturais. Os poderes

públicos têm todo o interesse em assegurar queos jovens são tratados em conformidade comestas normas.

170 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

b. Normas internacionais sobre polícia e protecção de jovens – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

• Receber uma formação especializada sobre o tratamento e cuidados efi-cazes e humanos a prestar aos delinquentes juvenis.

• Participar em programas educativos destinados às crianças a fim de con-tribuir para a luta contra a criminalidade de jovens e a vitimização juvenil.

• Conhecer as crianças e os seus pais que se encontrem na sua área de serviço.

• Saber identificar os locais e os adultos crimogéneos e identificar as crian-ças que frequentam os locais ou os adultos em questão.

• Se foram vistas crianças fora da escola durante o horário escolar, inves-tigar e avisar os pais e a escola.

• Na presença de qualquer tipo de indício de que as crianças teriam sidovítimas de negligência ou de sevícias domésticas, na sua comunidade ounos locais de polícia, investigar prontamente a situação.

• Reunir-se regularmente com os trabalhadores sociais e os membros dasprofissões médicas para examinar os problemas relacionados com criançasque se colocam no âmbito do seu trabalho.

• No caso de infracções jovens, enviar os delinquentes juvenis aos seus paisou aos serviços sociais.

• Guardar separadamente e em local seguro todos os processos relativos acrianças.

• Levar ao conhecimento dos superiores qualquer informação indicando queum colégio não está qualificado para se ocupar de menores.

• Encorajar o recurso a uma série de disposições como alternativas ao tra-tamento de crianças em instituições, incluindo as medidas de protecção,de ajuda e de supervisão, a orientação, a liberdade condicional, o inter-namento numa instituição, os programas de ensino e de formação profis-sional, bem como outras medidas adequadas e proporcionais à situação.

• Manter um processo completo, guardado em local seguro para cadajovem detido, indicando a sua identidade, as razões que o levaram à prá-tica do delito, o dia e a hora da detenção, da transferência ou da liberta-

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

}

Recomendações destinadas

aos funcionários

com responsabilidade

de comando e supervisão

}

}

Page 202: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 171

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

Nos termos da regra 1.2 das Regras Mínimas dasNações Unidas para a Administração da Justiça deMenores os Estados

… esforçar-se-ão por criar condições que asseguremao menor uma vida útil na comunidade fomen-

tando, durante o período de vida em que o menor seencontre mais exposto a um comportamento des-viante, um processo de desenvolvimento pessoal ede educação afastado tanto quanto possível de qual-quer contacto com a criminalidade e a delinquência.

1). Identifique os diferentes métodos, atravésdos quais os organismos e funcionários respon-sáveis pela aplicação da lei podem contribuir paraa satisfação desta exigência.

ção, os detalhes sobre as notificações enviadas aos pais, os seus problemasde saúde (física ou mental) e a indicação das pessoas encarregues pela suaguarda ou tratamento.

• Estabelecer procedimentos que permitam aos jovens detidos dirigir quei-xas ou comunicações ao director do estabelecimento ou às autoridades judi-ciárias e aos serviços sociais.

• Contribuir para a elaboração e execução dos programas comunitários deprevenção da criminalidade juvenil.

• Recrutar e formar pessoal com competência e qualidades necessárias paratratar jovens delinquentes.

• Providenciar o exame e a revisão periódicos das políticas relativas ao tra-tamento dos delinquentes juvenis, em consulta com os serviços sociais, opessoal médico, os membros do poder judiciário e os representantes da colec-tividade.

• Estabelecer procedimentos acelerados para que os jovens detidos sejamapresentados a um tribunal, quando for julgada apropriada uma acção judi-cial. Estabelecer uma ligação e cooperação estreitas com o aparelho de jus-tiça de menores, os serviços de protecção à infância e os serviços sanitáriose sociais.

• Elaborar estratégias que permitam acompanhar regularmente as crian-ças particularmente vulneráveis, que vivam numa situação de pobrezaextrema, não tenham habitação, sejam vítimas de violência doméstica ouque vivam em bairros afectados por uma forte criminalidade.

• Se tal for possível, criar um serviço especial para jovens, composto porperitos que se dedicarão ao estudo da criminalidade juvenil e aos casos devitimização dos jovens.

• Dar instruções claras sobre a confidencialidade de que se deve revestir otratamento dos processos relativos a jovens.

• Supervisionar de perto o pessoal que se ocupa dos jovens e investigar qual-quer incidente em que os jovens tenham sido alvo de sevícias, maus tratosou exploração, com vista à respectiva reparação.}

Page 203: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

172 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

2). Seleccione um dos métodos ainda não adop-tados no seu país e que, na sua opinião, seria efi-caz. Redija um projecto de relatório, dirigido ao seusuperior hierárquico, no qual propõe a adopçãodesse método explicando as razões para tal.

Exercício n.o

2

Os Princípios Orientadores das Nações Unidaspara a Prevenção da Delinquência Juvenil con-têm uma secção sobre «Educação», em cujo pará-grafo 23 é recomendado que seja divulgada aosjovens a legislação em vigor, bem como os seusdireitos e responsabilidade ao abrigo da lei.O parágrafo 25 afirma que deve ser concedidauma atenção especial às estratégias para preven-ção do abuso de álcool, drogas e outras substân-cias pelos jovens. Estas são áreas nas quais apolícia possui algumas competências técnicas.

1). Que argumentos poderão ser invocados emfavor e contra os programas nos quais os funcio-nários policiais se dirigem directamente aosjovens para abordar estas questões nas escolas?2). Quais são os outros domínios nos quais apolícia possui uma competência técnica que pode-ria ser benéfica para a educação social dos jovensnas escolas?3). Se os funcionários da polícia tiverem de falarsobre «direitos» e «responsabilidades» aos jovensnas escolas, indique brevemente o que deveriamdizer sobre ambos.

Exercício n.o

3

O parágrafo 9.o dos Princípios Orientadores dasNações Unidas para a Prevenção da DelinquênciaJuvenil recomenda que sejam instituídos planos deprevenção completos que prevejam nomeada-mente métodos para a redução eficaz das possibi-lidades de os jovens cometerem actos delituosos.

1). Identifique os métodos que seriam mais efi-cazes no seu país para reduzir as possibilidades dosjovens cometerem actos delituosos.2). Para cada método identificado, indique quaisos serviços, para além da polícia, que participariamna sua aplicação.

3). Para cada método identificado, explique bre-vemente qual seria o papel da polícia e qual opapel que você esperaria dos outros serviços men-cionados no n.o 2.

Exercício n.o

4

A Regra n.o 11 das Regras Mínimas das Nações Uni-das para a Administração da Justiça de Menores dis-põe que os serviços de polícia devem ter o poder delidar com os casos de delinquência juvenil «discri-cionariamente, evitando o recurso ao formalismoprocessual penal estabelecido». Tal pode significar

a) o recurso a meios extrajudiciais que impli-quem o reenvio aos serviços comunitários ououtros, oub) o recurso a meios extrajudiciais «desde o iní-cio» e sem reenvio a outros serviços, nos casos emque a família, a escola ou outras instituições capa-zes de exercer um controlo social oficioso játenham reagido ou estejam prestes a fazê-lo.

Redija um conjunto de princípios directores des-tinados aos funcionários da polícia habilitados alidar com os casos de delinquência juvenil. Estesprincípios devem enunciar os critérios a ter emconta pelos responsáveis da polícia para decidir seconvém:

a) aplicar o processo penal oficial;b) recorrer a meios extrajudiciais que impli-quem o reenvio aos serviços comunitários apro-priados;c) «recorrer aos meios extrajudiciais desde oinício», sem proceder ao reenvio a outros serviços.

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). A maioria dos peritos pensa que o facto de sequalificar um jovem como «delinquente» ou «cri-minoso» encoraja frequentemente o desenvolvi-mento de um comportamento sistematicamenteanti-social e repreensível por parte do jovem. Par-tilha desta opinião? Explique as suas razões.2). Como é que o sistema de justiça penal, noâmbito do qual você trabalha, assegura que as

Page 204: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

medidas tomadas em relação aos delinquentesjuvenis permanecem sempre proporcionais às cir-cunstâncias do delinquente e à infracção? Propo-nha a introdução de melhorias para assegurar ummelhor respeito pelo princípio da proporcionali-dade.3). Os jovens suspeitos de terem cometido umdelito têm três importantes direitos ou garantiasde processo, a saber o direito ao silêncio, o direitoà assistência judiciária e o direito à presença de umdos pais ou de um tutor em todas as fases do pro-cesso. Como é que estes direitos são garantidos pelosistema de justiça penal em que você trabalha?Quais são os limites estabelecidos a estes direitos?Proponha melhorias para que estas garantiassejam respeitadas.4). Em certos países, a polícia participa em pro-gramas de reinserção dos delinquentes juvenis noâmbito da comunidade. Quais são as vantagens einconvenientes desta participação?5). Reflita sobre a forma como o serviço respon-sável pela aplicação da lei em que você trabalhapoderá contribuir para um programa de investi-gação sobre as causas e prevenção da criminalidadejuvenil. Que informações poderão ser fornecidaspelo seu serviço? Que competências técnicas pode-rão ser oferecidas pelo seu serviço? Será que o seuserviço cooperaria nesse tipo de investigação no casode esta ser desenvolvida por uma universidade noseu país?6). Quais são os meios utilizados pelos sistemade justiça penal no âmbito do qual você trabalhapara evitar que sejam instaurados processospenais contra jovens por um comportamentoque não prejudique gravemente nem o interes-sado nem um terceiro? Existem outros meios?Quais?

7). Os Princípios Orientadores das Nações Uni-das para a Prevenção da Delinquência Juvenil(Princípios Orientadores de Riade) afirmam que «ocomportamento ou conduta dos jovens, que não éconforme às normas e valores sociais gerais, fazmuitas vezes parte do processo de maturação ecrescimento e tende a desaparecer espontanea-mente na maior parte dos indivíduos na transiçãopara a idade adulta» (parágrafo 5 e). Está deacordo? Se esta afirmação estiver correcta no seuconjunto, quais são as suas implicações para apolícia no plano da acção e da prática policiais?8). Os Princípios Orientadores de Riade reco-mendam que os organismos públicos se encarre-guem mais especialmente das crianças semhabitação ou que vivam na rua, e que lhes assegu-rem os serviços necessários. É igualmente reco-mendado que os jovens possam obter, semdificuldades, informações sobre os equipamentos,meios de habitação, possibilidades de emprego eoutras fontes de assistência a nível local (parágrafo38). Em que medida é que a polícia deveria serenvolvida neste contexto? Através de que outrosmeios é que a polícia poderá contribuir para a pro-tecção e ajuda às crianças sem habitação?9). Imagine que o governo do seu país produzuma brochura informativa sobre o abuso deálcool, drogas e outras substâncias nocivas aosjovens, com vista à sua difusão pelo público.Diversos organismos públicos enviam informa-ções e conselhos para esta brochura. Quais são asinformações e conselhos que a polícia deveria pro-por incluir na brochura?10). Explique as modalidades de acordo com asquais os funcionários da polícia e os professoresdevem cooperar com vista à prevenção da exploraçãoe abuso de crianças.

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 173

Page 205: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 206: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Quarta Parte 175

• Permitir que os utilizadores do manual compreendam o essencial das nor-mas internacionais relativas aos direitos humanos aplicáveis às mulheresna administração da justiça e sensibilizar os utilizadores para a necessidadede eliminar a discriminação baseada no sexo nas actividades de aplicaçãoda lei, bem como para o importante papel desempenhado pela polícia naluta contra todas as formas de violência contra as mulheres.

• As mulheres têm direito a gozar de forma igual todos os direitos nos domí-nios político, económico, social, cultural, civil e outros.

• Estes direitos incluem, inter alia, o direito à vida, à igualdade, à liberdadee à segurança da pessoa, a uma protecção igual perante a lei, a não ser vítimade discriminação, ao melhor estado de saúde física ou mental possível, a con-dições de trabalho justas e favoráveis e a estar protegida contra a tortura eoutras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

• A violência contra as mulheres pode ser física, sexual ou psicológica e incluia violência de facto, as sevícias sexuais, a violência relacionada com o dote,a violação conjugal, as práticas tradicionais prejudiciais, o assédio sexual, aprostituição forçada, o tráfico de mulheres e a violência ligada à exploração.

• A violência contra as mulheres, independentemente da forma assumida,viola, impede ou anula o exercício dos direitos humanos e liberdades fun-damentais das mulheres.

• A polícia deve fazer prova de uma diligência razoável para prevenir qual-quer acto de violência dirigido contra as mulheres, investigar estes casos eproceder às detenções, independentemente do facto de os seus autoresserem funcionários públicos ou particulares, ou destes actos terem sido come-tidos em casa, na colectividade ou em instituições oficiais.

• A polícia deve tomar rigorosas medidas oficiais para evitar que as mulheressejam vítimas de violência e assegurar a prevenção da revitimização imputá-vel a omissões ou a práticas policiais que não tenham em conta o sexo da vítima.

Aplicação da lei e os direitos das mulheres

17

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

*capítulo

Page 207: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

176 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

a. Normas internacionais sobre a aplicaçãoda lei e os direitos das mulheres – Informação para as apresentações

1. INTRODUÇÃO

676. Este capítulo cobre um domínio muitovasto, já que reagrupa uma grande diversidadede questões relacionadas com a aplicação da leie os direitos humanos, algumas das quais jáforam examinadas nos capítulos precedentes,enquanto que outras serão consideradas pelaprimeira vez.

677. As questões centrais são «a discriminação» e«a violência», e têm, em certas situações, umaestreita ligação com os problemas das mulheresenquanto vítimas e, noutras situações, com o pro-blema do estatuto e das necessidades específicasdas mulheres.

678. A sensibilização é um elemento muito impor-tante em relação a todas as questões abordadas nopresente capítulo, revestindo-se de grande relevo nosserviços responsáveis pela aplicação da lei, que con-

tinuam a caracterizar-se por uma predominânciamasculina, tanto em termos numéricos como cul-turais, e assumindo igualmente importância nasociedade em geral. O objectivo essencial das apre-sentações subordinadas ao tema do presente capí-tulo deve consistir em sensibilizar os funcionáriospoliciais para os direitos humanos que deverão serrespeitados em relação às mulheres no âmbito dosprocessos de aplicação da lei.

679. Os funcionários policiais no exercício das suasfunções devem respeitar o princípio da não discri-minação. Têm o dever de evitar que as pessoas setornem vítimas e, no caso de tal ocorrer, devem lidarcom as consequências da vitimização. Quandolidem com mulheres têm o dever de assegurar quea sua condição especial é respeitada e que as suasnecessidades específicas são satisfeitas.

680. Se estes funcionários se conformarem comtodas estas exigências, poderão prevenir ou sanarcertos danos ou prejuízos, sensibilizarão a socie-dade para estas questões e, em certos casos, evitarãoque o prejuízo causado não seja mais grave ouque ocorra uma tragédia.

• A violência contra as mulheres constitui um crime e deve ser tratadaenquanto tal, mesmo quando ocorra no seio da família.

• As mulheres presas ou detidas não devem ser alvo de discriminação e serãoprotegidas contra todas as formas de violência e de exploração.

• As mulheres detidas serão supervisionadas e sujeitas a buscas por mulhe-res polícias e por pessoal do sexo feminino.

• As mulheres detidas serão separadas dos homens.

• As mulheres grávidas e as mães de crianças de tenra idade detidas terãodireito a instalações especiais.

• Os serviços responsáveis pela aplicação da lei não exercerão qualquer tipode discriminação em relação às mulheres em matéria de recrutamento, con-tratação, formação, afectação, promoção, salário ou qualquer outra ques-tão de ordem administrativa ou que diga respeito à carreira.

• Os serviços responsáveis pela aplicação da lei recrutarão um número suficientede mulheres, a fim de assegurar uma representação equitativa deste grupo, bemcomo a protecção dos direitos das mulheres suspeitas, presas ou detidas.}

Page 208: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS DAS MULHERES

E A APLICAÇÃO DA LEI

(a) Princípios fundamentais

681. O princípio da não discriminação é funda-mental no âmbito do presente capítulo, da mesmaforma que o princípio segundo o qual as medidasaplicadas em virtude da lei para proteger os direi-tos e a condição especial das mulheres não devemser consideradas como discriminatórias.

682. Todas as normas e regras examinadas no pre-sente capítulo decorrem destes dois princípios.

(b) Disposições específicas relativas aos

direitos das mulheres e à aplicação da lei

683. No âmbito da matéria abordada no presentecapítulo, parece apropriado examinar as disposi-ções específicas, classificando-as sob duas gran-des rubricas: «Protecção das mulheres» e «Asmulheres polícias». A primeira rubrica será sub-dividida da seguinte forma: «As mulheres e adiscriminação», «As mulheres vítimas de vio-lência doméstica», «As mulheres vítimas de vio-lação e outros delitos sexuais», «As mulheresdetidas» e «A protecção das mulheres emperíodo de conflito».

[i] A protecção das mulheres

a. As mulheres e a discriminação

684. Deve ser feita igualmente referência ao capí-tulo X do manual, sobre Polícia e Não Discrimi-nação, onde se encontram informações e fontessobre a questão da não discriminação em geral.

685. Os principais instrumentos em matéria dedireitos humanos proíbem a discriminação noexercício dos direitos humanos. Por exemplo oartigo 2.o da Declaração Universal dos Direitos doHomem dispõe que:

Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as

liberdades proclamados na presente Declaração, sem dis-

tinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de

língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem

nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qual-

quer outra situação. […]

686. Diversos instrumentos em matéria de direitoshumanos impõem às partes a obrigação de assegurarque os direitos enunciados no tratado em causasejam respeitados sem qualquer tipo de discrimi-nação, nomeadamente quando fundada no sexo.Encontramos este tipo de disposição no artigo 2.o doPacto Internacional sobre os Direitos Civis e Polí-ticos, na Carta Africana dos Direitos do Homem edos Povos, no artigo 1.o da Convenção Americanasobre os Direitos do Homem e no artigo 14.o da Con-venção Europeia sobre os Direitos do Homem.

687. O artigo 3.o do Pacto Internacional acrescentauma exigência suplementar, a saber que os Esta-dos Partes devem assegurar a homens e mulhereso igual gozo de todos os direitos civis e políticosconsagrados no Pacto.

688. Existem dois instrumentos internacionaisque abordam especificamente a discriminaçãocontra as mulheres: a Declaração sobre a Eliminaçãoda Discriminação contra as Mulheres e a Con-venção sobre a Eliminação de Todas as Formas deDiscriminação contra as Mulheres.

689. Nos termos do artigo 1.o da Declaração, a dis-criminação contra as mulheres «é fundamental-mente injusta e constitui um atentado contra adignidade humana».

690. Nos termos do artigo 2.o devem ser tomadastodas as medidas apropriadas para abolir as leis, cos-tumes, regulamentos e práticas em vigor que cons-tituam uma discriminação contra as mulheres, epara assegurar uma protecção jurídica adequada daigualdade de direitos de homens e mulheres.

691. Nos termos do artigo 3.o devem ser tomadastodas as medidas apropriadas para educar a opiniãopública e incutir, em todos os países, o desejo deabolir os preconceitos e suprimir as práticasbaseadas na ideia de inferioridade da mulher.

692. O artigo 8.o da Declaração dispõe que devemser tomadas todas as medidas apropriadas,

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 177

Page 209: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

incluindo a adopção de disposições legislativas,para combater todas as formas de tráfico e deexploração da prostituição de mulheres.

693. No artigo 1.o da Convenção sobre a Elimina-ção de Todas as Formas de Discriminação contraas Mulheres encontra-se uma definição da «dis-criminação contra as mulheres», nos termos da quala expressão significa:

[…] qualquer distinção, exclusão ou restrição baseada no

sexo que tenha como efeito ou como objectivo compro-

meter ou destruir o reconhecimento, o gozo ou o exercício

pelas mulheres, seja qual for o seu estado civil, com base

na igualdade dos homens e das mulheres, dos direitos do

homem e das liberdades fundamentais nos domínios polí-

tico, económico, social, cultural e civil ou em qualquer outro

domínio.

694. O artigo 2.o da Convenção exige que os Esta-dos Partes condenem a discriminação contra asmulheres sob todas as formas e se comprometama adoptar uma política que tenha por objectivo aeliminação desta discriminação. É solicitado aosEstados que adoptem um certo número de medi-das, nomeadamente inscrever na sua constituiçãoou na sua legislação nacional o princípio da igual-dade entre homens e mulheres, adoptar medidaslegislativas que proíbam a discriminação contra asmulheres, instaurar uma protecção jurisdicional dosdireitos das mulheres em pé de igualdade com oshomens e adoptar medidas para eliminar a dis-criminação praticada contra as mulheres por umapessoa, uma organização ou uma qualquerempresa.

695. O artigo 6.o exige que os Estados Partes adop-tem todas as medidas apropriadas, incluindo dispo-sições legislativas, para suprimir todas as formas detráfico e de exploração da prostituição de mulheres.

696. O Comité para a Eliminação da Discrimina-ção contra as Mulheres, constituído com base noartigo 17.o da Convenção, examina os relatóriosapresentados pelos Estados Partes ao Secretário--Geral sobre as medidas adoptadas com vista adar efeito às disposições da Convenção. O Comitépode formular recomendações, baseadas no

exame dos relatórios e nas informações fornecidaspelos Estados, aquando da apresentação do relatórioanual das suas actividades à Assembleia Geral porintermédio do Conselho Económico e Social.

697. A Convenção dispõe igualmente que qualquerdiferendo entre os Estados Partes relativo à interpre-tação ou aplicação da Convenção que não seja resol-vido pela via da negociação será submetido à arbitragem(artigo 29.o). Se as Partes não chegarem a acordo sobrea organização da arbitragem, o diferendo pode sersubmetido ao Tribunal Internacional de Justiça. Estadisposição aplica-se sob reserva de nenhuma das Par-tes no diferendo ter declarado, no momento da assi-natura, ratificação ou adesão à Convenção, que não seconsiderava vinculado a esta disposição.

698. O direito à igualdade perante a lei e o direitoa uma igual protecção da lei constituem doisaspectos da não discriminação que dizem espe-cialmente respeito à protecção das mulheres e serevestem de uma especial importância no âmbitodas duas subdivisões da presente rubrica queserão examinadas infra.

699. Ambos os direitos encontram-se consagra-dos no artigo 7.o da Declaração Universal dosDireitos do Homem, nos termos da qual:

Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm

direito a igual protecção da lei. Todos têm direito a pro-

tecção igual contra qualquer discriminação que viole a

presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal

discriminação.

700. Estes mesmos direitos são enunciados noartigo 26.o do Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos, no artigo 3.o da Carta Africana dosDireitos do Homem e dos Povos e no artigo 24.o daConvenção Americana sobre os Direitos do Homem.Em virtude destes instrumentos, estes direitos devemter força de lei nos Estados que nelas são Partes.

701. É claro que os processos de aplicação da lei sãoum dos meios que permitem assegurar a todos aigualdade perante a lei e a protecção da lei,devendo a polícia exercer as suas funções de formaa que estes direitos sejam respeitados.

178 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 210: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 179

702. Esta exigência é enunciada no artigo 1.o doCódigo de Conduta para os Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei, o qual dispõe que osagentes dos serviços de polícia devem cumprir, atodo o momento, o dever que a lei lhes impõe, ser-vindo a comunidade e protegendo todas as pessoascontra actos ilegais. O artigo 2.o do referido Códigorefere que a polícia deve respeitar e proteger adignidade humana, e defender e proteger os direi-tos fundamentais de todas as pessoas.

b. As mulheres vítimas de violência domés-tica

703. A violência infligida contra as mulheres pelosseus parceiros do sexo masculino constitui uma vio-lação grave dos seus direitos. Quando esta violên-cia se produz, tal significa que o Estado falhou noseu dever de proteger o direito à segurança da pes-soa e talvez mesmo o direito à vida, em relação auma ou mais pessoas sob a sua jurisdição.

704. É em parte graças aos serviços de manuten-ção da ordem que os Estados podem assegurar orespeito por estes dois direitos fundamentais e épor esta razão que a questão da violência domés-tica constitui um elemento importante da forma-ção em matéria de direitos humanos ministrada aosresponsáveis pela aplicação da lei. Porém, a inter-venção da polícia nos casos de violência doméstica,constitui uma questão técnica de manutenção daordem na qual entram em jogo considerações queafectam matérias como a política, a prática, ocomando, o enquadramento, a formação e as rela-ções com os outros serviços e grupos sociais.

705. O fenómeno da violência doméstica foiobjecto de inúmeras pesquisas e os organismosresponsáveis pela aplicação da lei devem asse-gurar que todos os sectores intervenientes namanutenção da ordem estão plenamente infor-mados sobre as boas práticas fundadas nesta pes-quisa. Tal pode, por exemplo, ser feito atravésdo contacto directo com os serviços de políciados Estados onde já tenham sido desenvolvidasestratégias eficazes.

NOTA PARA OS FORMADORES: algumas destas estra-tégias foram descritas em Strategies for Confronting

Domestic Violence: a Resource Manual, publicadopelo Centro das Nações Unidas para a o Desenvolvi-mento Social e Assuntos Humanitário em 1993. Osparágrafos que se seguem são extractos deste manuale pretendem dar uma visão geral das questões quese revestem de interesse para os serviços de polícia.

706. DEFINIÇÃO: existem diversas definições, mas emsubstância, entendem-se por «violência doméstica» assevícias físicas ou a violência moral exercidas sobre amulher pelo seu parceiro do sexo masculino. As mani-festações deste fenómeno vão desde as simples agres-sões ao homicídio, passando pelos insultos verbaisrepetidos, pela reclusão e pela privação de rendimentos.

707. AMPLITUDE DO PROBLEMA: é difícil medir aincidência da violência doméstica, já que este con-siste, em grande parte, num problema ocultado,podendo ser actualmente detectado em muitasfamílias dos países desenvolvidos ou em desen-volvimento. Este problema afecta as famílias detodas as classes sociais e atravessa todas as cliva-gens culturais. Aparentemente nenhuma região domundo está ao abrigo deste fenómeno.

708. As causas de natureza individual, tais comoo alcoolismo ou a toxicodependência, puderamser isoladas mas, de acordo com certas teorias,são a dependência social, política e económica damulher em relação ao homem que criam umaestrutura social na qual o homem pode perpetraractos de violência contra as mulheres.

709. Apesar de poderem ser identificadas causasindividuais para o problema, tais como o abuso doálcool ou de drogas, certas teorias sugerem que adependência social, política e económica dasmulheres em relação aos homens, fornece a estru-tura através da qual os homens cometem actos deviolência contra as mulheres.

710. Há quem defenda que as origens desta vio-lência se encontram nas estruturas sociais, costumese crenças de ordem cultural – por exemplo aquelasque dizem respeito à superioridade masculina.

711. Devem, por isso, ser adoptados métodos e polí-ticas especiais para enfrentar a violência doméstica,

Page 211: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

não só porque esta tem consequências nefastas e cau-sas complexas, mas também por constituir umcrime cometido no seio da família, entre pessoasque têm laços afectivos e financeiros entre si.

712. POLÍTICAS DE APLICAÇÃO DA LEI: Foram iden-tificadas duas abordagens julgadas necessárias quandoos casos de violência doméstica forem tratados pelosistema de justiça penal. Estas políticas devem:

a) reflectir o carácter único da criminalidadeligada à violência doméstica, proporcionandoajuda à vítima e às pessoas que dela dependem;b) ter em conta as realidades culturais, econó-micas e políticas do país em questão.

Para além disso, estas políticas só serão eficazesse for preenchido um conjunto de requisitos,nomeadamente:

a) uma intensa formação da polícia sobre aforma de lidar com este fenómeno;b) um serviço de consultas familiares que possaintervir 24 horas por dia em situações de crise;c) centros de acolhimento de emergência paramulheres e crianças;d) centros de consulta onde as mulheres possamobter ajuda e apoio psicológico;e) tratamento para os homens que cometamactos de violência e de agressão (para além da ins-tauração de processos penais).

Estas condições só poderão ser preenchidas noâmbito de uma acção na qual intervenham vários ser-viços, o que depende dos recursos disponíveis. Noscasos em que os recursos sejam limitados, a colec-tividade deve desempenhar um papel mais activo.

713. Quando seja aplicada a lei penal, existem nor-malmente dois processos possíveis, a saber:

a) os autores dos actos de violência podem serexaminados nos casos em que o inquérito, provase testemunhos recolhidos tenham permitido cons-tatar que foi cometida uma infracção penal;b) a autoridade judiciária pode, nos casos em quea legislação o previr, emitir um despacho judicial des-tinado a proteger a vítima contra quaisquer novos

actos de violência ou sevícias. O desrespeito por estedespacho judicial constitui uma infracção penal emrelação à qual a polícia está habilitada a deter o autor.

A eficácia dos processos que consistem em recor-rer à justiça penal depende claramente dos prin-cípios de acção e das práticas seguidas em matériade manutenção da ordem.

714. O PAPEL ESSENCIAL DA POLÍCIA decorre dasseguintes características da missão das forças demanutenção da ordem:

a) atribuição de poderes de captura e detençãoaos funcionários policiais;b) disponibilidade dos funcionários policiais 24horas por dia;c) capacidade de intervenção dos serviços depolícia em caso de emergência.

715. Dada a gravidade e amplitude do fenómenoda violência doméstica e o papel crítico desem-penhado pela polícia através das suas interven-ções, recomenda-se que todos os serviços depolícia:

a) sejam dotados de princípios directores querejam a acção da polícia;b) assegurem uma organização eficaz das suasintervenções para fazer face a este problema.

716. Os princípios directores incluem nomeada-mente:

a) uma definição da violência doméstica;b) uma explicação do regime jurídico aplicávelà violência doméstica;c) uma exposição clara daquilo que se esperadas intervenções da polícia nos casos de inciden-tes devidos a violência doméstica;d) um resumo dos processos destinados a pro-teger as vítimas;e) um especial enfoque em relação à responsa-bilidade da polícia para a orientação das vítimas paraos serviços de apoio apropriados;f ) o reconhecimento da necessidade da políciacolaborar com os outros profissionais dos servi-ços comunitários em todos os estádios da sua

180 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 212: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 181

intervenção em casos particulares e, em geral, noseu envolvimento com o problema.

717. A organização eficaz das intervenções incluinomeadamente:

a) o estabelecimento de unidades especiaisencarregues dos casos de violência doméstica;b) o desenvolvimento, para as intervenções de emer-gência, técnicas e práticas orientadas para a vítimaque melhorem o apoio proporcionado às mesmas;c) assegurar a realização de inquéritos efectivossobre os delitos que resultem dos incidentes cau-sados pela violência doméstica.

718. Todas estas recomendações são inspiradasnas políticas, práticas e técnicas de manutenção daordem elaboradas nos serviços de polícia dealguns Estados Membros da Organização dasNações Unidas. Os serviços de polícia que pre-tendem melhorar o seu funcionamento nos domí-nios em questão deveriam inspirar-se nosconhecimentos e competências técnicas já exis-tentes.

719. COOPERAÇÃO INTERDEPARTAMENTAL: a vio-lência doméstica constitui um problema complexoexigindo o recurso a profissionais que exerçam a suaactividade em diferentes domínios e à comunidadeem geral. Entre aqueles que geralmente se vêemenvolvidos, encontramos os educadores, os membrosde organizações religiosas, os trabalhadores sociais,o pessoal médico-sanitário, o pessoal dos serviços dealojamento, os membros de associações de defesadas mulheres e as pessoas que trabalham em cen-tros de acolhimento e refúgios para as vítimas de vio-lência doméstica. É essencial que a polícia e aspessoas ou grupos em questão cooperem para quepossa ser adoptada a abordagem interdisciplinarnecessária, por forma a evitar qualquer duplicaçãodas intervenções e permitir que as funções essen-ciais de uma organização ou de um grupo não sub-vertam as acções de outros.

c. As mulheres vítimas de violação e de outros delitos sexuais

720. Qualquer tipo de violência sexual infligidacontra as mulheres constitui uma violação grave

dos seus direitos e um acto criminal de uma gra-vidade extrema. Isto significa, à semelhança doque sucede nos casos de violência doméstica, queo Estado falhou em proteger o direito à segurançada pessoa e possivelmente mesmo o direito à vidade uma ou mais pessoas que se encontram sob asua jurisdição. Por esta razão, e também porque aviolação e as outras agressões sexuais constitueminfracções penais, a polícia deve ser eficaz tanto noplano da prevenção, como no plano da detecção des-tas infracções, mas também de assegurar um tra-tamento humano e profissional às vítimas.

721. A PREVENÇÃO exige o desenvolvimento deestratégias preventivas eficazes, tanto num planogeral como para fazer face a situações que apre-sentem um risco acrescido de vitimização, pornão ter sido detectada uma ou mais infracçõesanteriores.

722. No âmbito das estratégias de prevenção, apolícia deverá por exemplo aconselhar as mulhe-res sobre a conduta a adoptar para evitarem servítimas de agressões sexuais, assegurar um serviçode segurança reforçada nas zonas de elevado riscoe, enfim, investigar os suspeitos, controlá-los deforma eficaz e em conformidade com a lei.

723. As actividades de prevenção, nos casos de ris-cos acrescidos de violência, devem incluir conse-lhos mais específicos sobre as condutas a adoptarpara evitar as violações e um desdobramento per-tinente de pessoal e de outros meios, ambosbaseados no exame e avaliação do risco específico.

724. A DETECÇÃO exige a aplicação dos meios téc-nicos necessários que se prendam com todos osaspectos da investigação criminal e a detecção deinfracções, nomeadamente:

a) a interrogação das vítimas, as testemunhas eos vizinhos;b) a recolha e conservação dos relatórios médico--legais;c) o interrogatório dos suspeitos.

Compete aos funcionários com responsabilidadesde comando e supervisão da polícia assegurar a

Page 213: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

disponibilidade e aplicação dos meios e compe-tências técnicas. No caso de faltar um destesmeios, compete às autoridades policiais recorrerà assistência técnica para criar as competênciasnecessárias.

725. INTERVENÇÃO JUNTO DAS VÍTIMAS: À seme-lhança do que sucede nos casos de violênciadoméstica, trata-se de um domínio relacionadocom a manutenção da ordem, alvo de múltiplasinvestigações e no qual certos serviços de políciaadquiriram uma competência considerável.

726. Por diversas razões, essencialmente deordem cultural e social, a forma como a polícia trata as vítimas de agressões sexuais não é porenquanto satisfatória em muitos países, caracte-rizando-se por uma falta de sensibilidade paracom as vítimas. De entre as medidas a tomar pararesolver este problema e contribuir para que apolícia faça prova de maior competência profissionalpodemos enumerar:

a) as declarações de princípios exigindo que as víti-mas sejam tratadas com sensibilidade e humanidade;b) medidas decretadas pelos responsáveis pelocomando, direcção e supervisão, com vista a asse-gurar o respeito por estes princípios;c) uma formação especializada ministrada a cer-tos funcionários, com vista a iniciá-los nas técni-cas que permitem interrogar as vítimas comhumanidade e eficácia;d) o acolhimento das vítimas num ambienteacolhedor quando estas sejam submetidas a inter-rogatórios e exames médicos.

d. As mulheres detidas

727. Todos os funcionários policiais devem ter emconta os direitos e a especial situação das mulhe-res detidas.

728. Os direitos humanos das pessoas sob deten-ção policial foram amplamente tratados no capí-tulo XIII do presente manual relativo à Detenção.Os princípios fundamentais enunciados naquelecapítulo consistem na proibição da tortura e maustratos, no dever de tratar os detidos humana-mente e na presunção de inocência. As normas que

os funcionários responsáveis pela aplicação da leidevem respeitar em relação aos detidos são igual-mente objecto de um exame bastante detalhado.

729. É sublinhada a importância das seguintes exi-gências em relação às mulheres detidas:

a) as mulheres detidas devem ser alojadas emlocais separados dos dos homens;b) as mulheres detidas devem ser vigiadas pormulheres;c) as mulheres detidas devem ser revistadas pormulheres.

730. Nos termos do princípio n.o 5 do Conjuntode Princípios para a Protecção de Todas as Pes-soas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ouPrisão, os referidos princípios devem ser aplica-dos sem qualquer distinção, nomeadamentebaseada no sexo. Este texto dispõe igualmenteque (parágrafo 2):

As medidas aplicadas ao abrigo da lei e exclusivamente

destinadas a proteger os direitos e a condição especial

da mulher, especialmente da mulher grávida e da mãe

com crianças de tenra idade […] não são consideradas

como medidas discriminatórias. […]

731. Para que sejam respeitados os direitos e asituação especial das mulheres detidas, bem comoas normas que lhes dizem especialmente respeitoé necessário

a) que todos os funcionários responsáveis pelaaplicação da lei conheçam as normas que sãosupostas respeitar em relação aos detidos, bemcomo as normas que digam especialmente res-peito às mulheres;b) que os funcionários com responsabilidades decomando e supervisão assegurem o respeito porestas normas;c) que sejam nomeadas, formadas e colocadas deforma apropriada mulheres polícias em númerosuficiente para que possam vigiar e, quandonecessário, revistar as mulheres detidas;d) que os locais utilizados para a detenção dasmulheres sob detenção policial sejam suficientes,para que os direitos e a situação especial das

182 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 214: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

mulheres detidas possam ser respeitados – sobre-tudo no que diz respeito à regra que impõe a deten-ção de mulheres e homens em locais separados.

e. A protecção das mulheres em período de conflito

732. Apesar de o direito internacional dos direitoshumanos continuar a ser aplicável em período deconflito, o seu efeito pode ser diminuído atravésde medidas derrogatórias tomadas pelo Governopara fazer frente a estados de emergência. Contudo,nos casos em que o conflito assume as proporçõesde um conflito armado, o direito internacionalhumanitário torna-se aplicável e é especialmenteconcebido para regular a conduta das hostilida-des e proteger as vítimas do conflito.

733. Convém referir o capítulo XV do presentemanual, consagrado aos Distúrbios Internos, Esta-dos de Emergência e Conflitos Armados, no qualforam expostos todos os princípios e disposiçõesde direito internacional humanitário relacionadoscom a aplicação da lei em período de conflito. Asmedidas derrogatórias autorizadas pelos instru-mentos de direitos humanos são examinadas na sec-ção A.2 g) daquele capítulo.

734. O direito internacional humanitário, tal comoo direito internacional dos direitos humanos, con-têm medidas para a protecção dos direitos e do esta-tuto especial das mulheres. As medidas aplicáveisem conflitos armados internacionais e não inter-nacionais são resumidas infra, sendo igualmenteexaminados os princípios extraídos do direitointernacional humanitário que dizem respeito aosdistúrbios e tensões que não constituem um con-flito armado.

735. CONFLITO ARMADO INTERNACIONAL: o ar-tigo 12.o da primeira Convenção de Genebra ParaMelhorar a Situação dos Feridos e Doentes das For-ças Armadas em Campanha e o artigo 12.o dasegunda Convenção de Genebra para Melhorar aSituação dos Feridos, Doentes e Náufragos das For-ças Armadas no Mar estipulam que os membrosdas forças armadas (e certas outras categorias depessoas), que se encontram feridos ou doentes,devem ser respeitados e protegidos em todas as cir-

cunstâncias. Estes dois artigos enunciam as con-dições a respeitar para que estas pessoas sejamtratadas com humanidade e estipulam expressa-mente que as mulheres devem ser tratadas comdeferências especiais devidas ao seu sexo.

736. A terceira Convenção de Genebra Relativa aoTratamento dos Prisioneiros de Guerra contémdiversas medidas sobre a protecção das mulheres.O artigo 14.o enuncia a regra geral nos termos daqual as mulheres devem ser tratadas com todas asdeferências especiais devidas ao seu sexo e diver-sos artigos contêm disposições específicas relati-vas nomeadamente às condições de detenção e àssanções disciplinares ou judiciárias.

737. A quarta Convenção de Genebra Relativa à Pro-tecção das Pessoas Civis em Tempo de Guerracontém uma disposição geral sobre a protecçãodas mulheres, enunciada no artigo 27.o, nos termosdo qual as mulheres serão especialmente protegi-das contra qualquer ataque à sua honra e parti-cularmente contra a violação e a prostituiçãoforçada ou contra qualquer forma de atentado aoseu pudor.

738. A secção III do Título IV do Protocolo Adicionalàs Convenções de Genebra de 1949 (Protocolo I) dizrespeito ao tratamento das pessoas em poder de umaparte no conflito e o seu artigo 76.o prende-se coma protecção das mulheres, dispondo que:

a) as mulheres devem ser objecto de um respeitoespecial e protegidas nomeadamente contra a vio-lação, a prostituição forçada e qualquer outraforma de atentado ao pudor;b) os casos de mulheres grávidas ou de mães decrianças de tenra idade delas dependentes e queforem presas, detidas ou internadas por razõesligadas ao conflito armado serão examinados comprioridade absoluta;c) na medida do possível, as Partes no conflitoprocurarão evitar que a pena de morte seja pro-nunciada contra mulheres grávidas ou mães decrianças de tenra idade que delas dependam, porinfracção cometida relacionada com o conflitoarmado. A condenação à morte dessas mulheresnão será nunca executada.

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 183

Page 215: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

739. Nos termos do artigo 75.o do Protocolo I (n.o 5), as mulheres privadas de liberdade pormotivos relacionados com o conflito armado serãomantidas em locais separados dos dos homens eserão colocadas sob vigilância directa de mulheres.Se forem detidas ou internadas famílias, a uni-dade dessas famílias deverá ser preservada, namedida do possível, quanto ao seu alojamento.

740. A quarta Convenção de Genebra e o ProtocoloAdicional I contêm diversas outras disposiçõesdestinadas a proteger as mulheres grávidas e asmães de crianças que delas dependam, contra asconsequências da guerra e dizem respeito aossocorros a trazer a essas mulheres.

741. CONFLITO ARMADO NÃO INTERNACIONAL: oartigo 3.o comum às quatro Convenções de Gene-bra de 1949 estipula que todas as pessoas que nãoparticipam directamente nas hostilidades serãotratadas em todas as circunstâncias com humani-dade, sem qualquer distinção baseada nas consi-derações habituais, nomeadamente o sexo.

742. O Protocolo Adicional II às Convenções deGenebra de 1949 desenvolve e completa as dis-posições do artigo 3.o comum às Convenções e, nostermos do n.o 2 e) do seu artigo 4.o, são proibidosa violação, a prostituição forçada e todo o aten-tado ao pudor.

743. O artigo 5.o do mesmo Protocolo diz respeitoàs pessoas privadas de liberdade por motivos rela-cionados com o conflito armado. Nos termos do n.o 2 a) deste artigo, as mulheres serão guardadasem locais separados dos dos homens, exceptoquando os homens e mulheres de uma mesmafamília são alojados conjuntamente.

744. O n.o 4 do artigo 6.o do Protocolo dispõe que apena de morte não será executada contra as mulhe-res grávidas e as mães de crianças de tenra idade.

745. DISTÚRBIOS E TENSÕES INTERNAS: as dispo-sições do direito internacional humanitário não seaplicam a estes conflitos, já que não se trata de con-flitos armados. Contudo, como já foi indicado nocapítulo XV, existem três textos elaborados por

peritos internacionais, nos quais são consignadosos princípios e as normas de carácter humanitário.Estes textos retomam as normas imperativas fun-dadas nos direitos e proibições que não podemser alvo de derrogações enunciados no artigo 3.o

comum às quatro Convenções de Genebra de1949, nos Protocolos Adicionais (I e II) às Con-venções de Genebra e nos instrumentos sobredireitos humanos, tais como o Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos.

746. Os três textos, que são expostos de formamais detalhada nos parágrafos 527 a 534 supra, sãoum código de conduta, um projecto de declaração--tipo sobre os conflitos internos e um projecto dedeclaração sobre as normas humanitárias mínimas.De acordo com estes textos, a pena de morte nãoé aplicável às mulheres grávidas ou às mães decrianças de tenra idade, e as violações são proibi-das pela declaração de regras humanitárias míni-mas.

[ii] As mulheres polícias

747. Esta secção diz respeito às mulheres queexercem a profissão de responsáveis pela aplicaçãoda lei ou de empregadas nos serviços responsáveispor esta aplicação. Apesar da presente secção, aocontrário do que sucede com outras secções pre-cedentes, não lidar com a «protecção das mulhe-res», a questão da discriminação – e da protecçãocontra a discriminação – não pode ser ignorada.

748. As normas internacionais relativas às mulhe-res polícias podem ser examinadas sob as seguin-tes rubricas: «Acesso e nomeação para um empregona polícia», «Igualdade de oportunidades na polícia»e «Desdobramento das mulheres polícias».

749. O ACESSO E A NOMEAÇÃO PARA UM

EMPREGO NA POLÍCIA são regidos pelas seguintesregras:

a) Os efectivos da polícia devem ser represen-tativos.

Esta exigência é examinada no capítulo IX domanual, consagrado ao Papel da Polícia numa

184 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 216: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Sociedade Democrática. A Assembleia Geral, naresolução 34/169, de 17 de Dezembro de 1979,através da qual adoptou o Código de Conduta paraos Responsáveis pela Aplicação da Lei, estipulaque todo o serviço responsável pela aplicação da leideve ser representativo da colectividade no seutodo.Isto significa que seria necessário que um númerosuficiente de mulheres estivesse empregado numserviço de aplicação da lei para que este possa serconsiderado como representativo da comunidadeque está a servir.

b) O direito à igualdade de acesso à funçãopública.

Este direito é examinado no capítulo X, que diz res-peito à Polícia e Não Discriminação. O n.o 2 doartigo 21.o da Declaração Universal dos Direitos doHomem refere que toda a pessoa tem direito deacesso, em condições de igualdade, às funçõespúblicas do seu país. Este mesmo direito é prote-gido pelo Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos (artigo 25.o c)), bem como porinstrumentos jurídicos regionais. Este direitoimplica que as mulheres que possuam as qualifi-cações requeridas deverão ter acesso às funçõespúblicas na polícia e aí ocupar um posto.

c) O direito à livre escolha da profissão e doemprego.

Este direito vem consagrado na Declaração sobrea Eliminação da Discriminação contra as Mulhe-res (artigo 10.o, n.o 1a)) e na Convenção sobre a Eli-minação de todas as Formas de Discriminaçãocontra as Mulheres (artigo 11.o, n.o 1 c)). No artigo11.o, n.o 1 b) da Convenção, é igualmente enunciadoo direito das mulheres às mesmas possibilidade deemprego que os homens, incluindo a aplicaçãodos mesmos critérios de selecção em matéria deemprego.

As consequências destes direitos consistem nofacto de as mulheres que pretendam servir na polí-cia e preencham os critérios exigidos para o recru-tamento terem o direito de ser nomeadas para umposto nesse serviço.

750. É evidente que a nomeação para um serviço depolícia específico depende do número de lugares apreencher num determinado momento, bem comodos critérios fixados para o recrutamento. Tendo emconta as exigências e os direitos acima enunciados,tais considerações não devem servir de pretexto paraexcluir as mulheres suficientemente qualificadaspara um emprego num serviço de polícia.

751. A IGUALDADE DE OPORTUNIDADES NO SEIO

DA POLÍCIA é regulada pelas seguintes regras:

a) o direito a receber uma formação profissional;b) o direito à progressão ou promoção profissional;c) o direito das mulheres à igualdade de remu-neração em relação aos homens e à igualdade detratamento para um trabalho de valor igual;d) o direito a férias pagas e às prestações dedesemprego, reforma, doença, invalidez e velhice;e) o direito à protecção da saúde e à segurançadas condições de trabalho;f ) o direito a ser protegida contra a discriminaçãoem função do casamento ou da maternidade (o queinclui a proibição de sanções ou de despedimentodevidos à gravidez ou à maternidade, a concessãode uma licença de parto paga ou de um benefíciocomparável sem perda do emprego; a concessão deuma protecção especial às mulheres durante a gra-videz, bem como a concessão de serviços sociais, taiscomo serviços de guarda de crianças).

Estes seis pontos constituem um resumo dasmedidas especificadas na Declaração sobre a Eli-minação da Discriminação contra a Mulheres(artigo 10.o) e na Convenção sobre a Eliminação detodas as Formas de Discriminação contra asMulheres (artigo 11.o).

752. O desdobramento das mulheres polícias éregido por:

a) os direitos que requerem a igualdade de opor-tunidades em relação aos homens no emprego(por exemplo os direitos à formação e à progres-são profissionais). Isto significa que as mulheresdevem ter as mesmas possibilidades que oshomens de alargar e aprofundar a sua experiênciacomo polícias e de realizar as funções de manu-

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 185

Page 217: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

tenção da ordem consideradas necessárias para odesenvolvimento e progresso na carreira;b) as exigências impostas aos organismos depolícia relativamente à afectação de mulheres acertas tarefas (por exemplo de vigiar e revistar asmulheres detidas).

753. Parece evidente que as considerações deordem operacional podem entrar em linha deconta quando é necessário decidir se podemosafectar mulheres polícias a uma missão especial,e em que medida o podemos fazer. Estas consi-derações não devem servir de pretexto para privaras mulheres da possibilidade de adquirirem certasformas de experiência operacional ou de servirem qualquer unidade especializada da polícia.

754. A limitação da designação, das possibilidadesde carreira ou dos postos a que as mulheres políciassão afectadas, equivale a privar a polícia dos talen-tos e aptidões destas últimas, prejudicando assim oserviço e a comunidade na qual prestam serviço.

3. CONCLUSÕES

755. Na introdução ao presente capítulo é indicadoque o seu principal objectivo consiste na sensi-

bilização dos polícias para os direitos que devemser respeitados em relação às mulheres noâmbito da aplicação da lei. Por outras palavras,trata-se de sensibilizar a polícia para os direitosdas mulheres em termos das suas necessidadese da sua condição especial, enquanto pessoasnecessitando de uma protecção especial, e emtermos das suas necessidades e condição especialenquanto colegas nos serviços responsáveis pelaaplicação da lei.

756. Por razões de ordem cultural e religiosa, a ati-tude em relação às mulheres varia de forma con-siderável de um país para outro. Contudo, todasas culturas e religiões respeitam, cada uma à suamaneira, a dignidade inerente à pessoa humana,bem como as necessidades e a condição espe-ciais das mulheres.

757. As normas examinadas no presente capítulotêm uma natureza global e foram adoptadas pelacomunidade internacional. O processo de sensi-bilização dos funcionários policiais para os direi-tos humanos das mulheres será facilitado seestas normas forem expostas aos polícias e sefor com eles discutida a forma de aplicação des-tas normas aos seus países e nos serviços emque trabalham.

186 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

b. Normas internacionais sobre a aplicação da lei e os direitos das mulheres – Aplicaçãoprática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

• Considerar os delitos de violência doméstica como sendo equivalentes àsoutras agressões.

• Reagir rapidamente aos pedidos de ajuda em casos de violência domés-tica ou sexual, informar as vítimas sobre os auxílios disponíveis nos planosmédico, social, psicológico e material e conduzi-las a um local seguro.

• Proceder a um inquérito completo e aprofundado sobre os casos de violênciadoméstica. Interrogar as vítimas, as testemunhas, os vizinhos e o pessoal médico.

• Redigir relatórios detalhados sobre os incidentes de violência domésticae acompanhar atentamente os processos com os superiores hierárquicos e

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

}

Page 218: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 187

Recomendações destinadas

aos funcionários

com responsabilidade

de comando e supervisão

}

}

com a vítima; fazer uma comparação com eventuais incidentes anterioresque se encontrem nos arquivos e tomar todas as medidas necessárias paraevitar as reincidências.

• Após terem sido cumpridas as formalidades médicas, administrativas eoutras, propor à vítima de actos de violência doméstica acompanhá-la atécasa para que esta possa levar os seus efeitos pessoais para um local seguro.

• Matricular-se em cursos de formação com vista ao seu aperfeiçoamentonas técnicas de tratamento e protecção das vítimas de violência doméstica.

• Cooperar estreitamente com o pessoal médico e com os serviços sociaisno tratamento de casos de violência doméstica.

• Assegurar que todas as intervenções junto de mulheres delinquentes emulheres vítimas de violência contam com a presença de uma mulher polí-cia. Sempre que possível submeter estes casos à inteira responsabilidade dascolegas do sexo feminino.

• Separar as mulheres detidas dos homens. Assegurar que as mulheres deti-das são vigiadas e revistadas por mulheres.

• Os polícias do sexo masculino devem evitar e desencorajar as conversase anedotas sexistas com outros colegas do mesmo sexo.

• Solicitar a opinião das colegas do sexo feminino no que concerne aos prin-cípios de acção, práticas, comportamentos ou atitudes que estabelecem umadistinção em função do sexo, tentar melhorar a situação por iniciativa pró-pria e apoiar as colegas do sexo feminino nos seus esforços.

• Divulgar e aplicar instruções claras precisando que os pedidos de auxílioem casos de violência doméstica devem ser alvo de intervenções rápidas eeficazes e que, nos termos da lei, os delitos de violência doméstica são equi-valentes, às outras agressões.

• Prever uma formação permanente dos funcionários policiais sobre aforma de lidar com a violência dirigida contra as mulheres.

• Criar uma unidade especial de polícia encarregue de receber pedidos de auxí-lio em casos de violência doméstica e prever a possibilidade de solicitar auxí-lio a assistentes sociais, que seriam destacados para as unidades em questão.

• Estabelecer uma ligação estreita e estratégias comuns com o pessoalmédico, serviços sociais, «refúgios» locais e organismos ou associaçõescompetentes.

• Passar em revista as políticas de recrutamento, contratação, formaçãoe promoção para eliminar toda a tendência de favorecimento de um sexoem detrimento do outro.

• Afectar as mulheres polícias às intervenções junto das mulheres vítimasde actos criminosos.

Page 219: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

188 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

• Prever locais especiais para a detenção das mulheres grávidas e mães decrianças de tenra idade,

• Adoptar políticas que proíbam a discriminação contra as mulheres polí-cias baseadas em razões de gravidez ou maternidade.

• Estabelecer canais abertos de comunicação para que as mulheres polí-cias possam apresentar queixas ou recomendações sobre as questões quese prendam com o sexismo.

• Intensificar os patrulhamentos e a acção preventiva nas zonas de fortecriminalidade, nomeadamente com agentes que efectuem o patrulha-mento a pé e com a participação da comunidade na prevenção do crime,a fim de reduzir os riscos de crimes e de violências contra as mulheres.}

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

Uma «boa prática» policial face à violência domés-tica pressupõe a existência de princípios orienta-dores para orientar a acção da polícia. Redijaprincípios orientadores adaptados às realidadesculturais, económicas e políticas do seu país, quesejam dirigidos ao seu serviço de polícia, e que

a) dêem uma definição de violência familiar;b) expliquem o estatuto da violência familiar nalegislação do seu país;c) exponham claramente aquilo que se espera dapolícia quando ela intervém em casos de inciden-tes de violência doméstica;d) resumam os processos destinados à protecçãodas vítimas;e) atribuam importância ao dever da políciaorientar as vítimas para os serviços de apoio apro-priados e dêem instruções sobre a maneira de pro-ceder;f ) reconheçam o facto de a polícia dever colaborarcom os outros intervenientes dos serviços comuni-tários em todos os estádios da sua intervenção, tantonos casos especiais como face ao problema em geral.

Exercício n.o

2

Foi decidida a criação de uma unidade especialno seu serviço de polícia que se ocupará dos casosde violência doméstica. Na sua qualidade de mem-bro de um grupo de trabalho designado pelo seusuperior hierárquico:

1). Prepare um projecto de mandato para estaunidade especial.2). Faça recomendações sobre a estrutura hie-rárquica e a composição dessa unidade, especifi-cando o número de polícias de que será compostae o leque de competências exigido aos membrosdessa unidade.3). Precise os outros serviços sociais com osquais esta unidade deverá estar em contacto.4). Redija um projecto de instruções desti-nadas a todos os funcionários do seu serviçode polícia, no qual indique em que é que deveconsistir a sua intervenção inicial em casos deincidentes de violência familiar, como deveminformar a unidade especial sobre esse inci-dente e sobre a sua intervenção e, finalmente,em que estádio e em que medida essa uni-dade especial deve intervir para lidar comesse caso.

Page 220: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 189

Exercício n.o 3

Foi decidido, no plano dos princípios, que asmulheres polícias seriam afectadas a uma uni-dade especializada do seu serviço de polícia, a qualestá encarregue dos distúrbios à ordem pública edas intervenções armadas antiterroristas. Redijarecomendações dirigidas ao seu superior hierár-quico sobre:

a) a percentagem de mulheres/homens nosefectivos dessa unidade;b) os critérios de selecção, bem como ummétodo para proceder à selecção de mulheres quese candidatem para integrar essa unidade;c) a afectação operacional das mulheres, porexemplo a questão de saber se devem ou não exis-tir limites a essa afectação e a forma de as afectarquando estiver mobilizada uma unidade parafazer face a distúrbios violentos contra a ordempública.

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). Identifique os factores que põem em causa oprincípio de acordo com o qual todas as pessoasdevem beneficiar de uma protecção igual da lei eindique o que pode ser feito para melhorar a situa-ção.2). A violência física infligida contra umamulher pelo seu parceiro constitui um crime. Nes-tas condições, porque que é que foi necessárioindicar claramente aos serviços e aos funcioná-rios da polícia que esses delitos devem ser alvo deinquéritos completos e levados a cabo de umaforma justa?3). Há quem defenda que as desigualdadessociais, económicas e políticas de que as mulhe-res são vítimas se encontram na origem da vio-lência perpetrada pelos homens contra elas.Está de acordo com este raciocínio? Se não esti-ver de acordo, indique as razões e avance outraexplicação. Se pensar que este raciocínio éjusto, o que poderá ser feito para corrigir estasituação?4). Em que medida é que a violência infligidacontra uma mulher pelo seu parceiro difere dos

actos de violência ilegais cujos protagonistas per-tencem a outras categorias de pessoas? No seu paísestes actos de violência são abrangidos pela lei nor-malmente aplicável aos casos de violência eagressão, ou antes existe um delito distinto eespecial de «violência exercida sobre concubinaou cônjuge do sexo feminino» ou de «violênciae agressões exercidas sobre uma mulher» ao qualcorrespondem penas mais pesadas do que paraas outras formas de violência? Examine as van-tagens e inconvenientes de que se reveste a exis-tência de uma categoria distinta e especial dedelitos.5). É, por vezes, alegado que, por razões deordem social e cultural, a polícia não intervém deforma satisfatória em favor das vítimas de delitossexuais. Concretize quais podem ser estas razõesde ordem social e cultural. Parece-lhe que são váli-das no caso do seu país? O que é que se podefazer para ultrapassar o problema?6). Uma das soluções para assegurar uma ade-quada cooperação entre os diversos serviços cha-mados a intervir em casos de violência domésticacontra as mulheres, consistiria na criação de umaunidade composta, por exemplo, por funcionáriospoliciais, agentes dos serviços sanitários e sociaise especialistas na área da assistência psicológica.Quais as vantagens e inconvenientes da criação deuma unidade deste tipo?7). Examine as diferentes formas pelas quaisum organismo de polícia poderia criar umambiente favorável para entrevistar as vítimasde violações. Qual seria a forma mais prática e efi-caz no seu país?8). Quais os métodos utilizados no seu serviçode polícia para que as mulheres polícias benefi-ciem de igualdade de oportunidades? Parece-lheque estas consideram esses métodos suficien-tes? O que é que poderia ainda ser feito paramelhorar as perspectivas de carreira das mulhe-res polícias?9). Se as mulheres pudessem exercer livre-mente o seu direito à livre escolha da profissão,cerca de metade dos membros de um serviço depolícia poderiam ser mulheres. Parece-lhe queum tal serviço de polícia seria mais ou menoseficaz sob o plano operacional do que os servi-ços com uma percentagem de mulheres polícias

Page 221: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

menos elevada? Indique qual seria, na sua opi-nião, a proporção ideal de homens e mulheresnum serviço de polícia. Justifique a sua res-posta.10). Imagine a seguinte situação: verificou-seuma série de violações e outras agressões violen-tas dirigidas contra mulheres no bairro onde se

encontra o seu serviço de polícia, não tendo oagressor ou os agressores sido ainda identifica-dos. Exponha todas as medidas que poderiam sertomadas pelo seu serviço de polícia, a fim de acon-selhar as mulheres sobre a conduta a assumir paraevitar agressões, prevenir novas agressões e asse-gurar a população em geral.

190 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 222: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Quarta Parte 191

• Dar aos utilizadores do manual um conhecimento básico da especial vul-nerabilidade dos refugiados e não nacionais e indicar as normas interna-cionais que protegem estas categorias de pessoas, bem como as funções dosfuncionários policiais na aplicação destas normas.

Refugiados

• Em caso de perseguição, todos têm o direito de procurar e de beneficiarde asilo num outro país.

• Um refugiado é uma pessoa que, receando com razão ser perseguida emvirtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social oudas suas opiniões políticas, não possa ou, em virtude daquele receio, não queiravoltar ao seu país de origem (ou, no caso de ser apátrida, regressar ao paísde residência habitual).

• Os refugiados podem invocar todos os direitos humanos fundamentais,com excepção de alguns direitos políticos. Porém se se encontrarem ile-galmente no território de um Estado, a sua liberdade de circulação poderáser restringida no interesse da saúde e ordem públicas.

• Os refugiados devem beneficiar de um tratamento no mínimo tão favo-rável como aquele que é concedido aos nacionais no que diz respeito aoexercício de direitos fundamentais, tais como a liberdade de associação ede religião, o direito à educação primária, a assistência pública, o acessoaos tribunais, o direito à propriedade e à habitação.

• Ninguém poderá ser enviado para um país, no qual a sua vida ou liber-dade se encontre ameaçada e no qual seja perseguido, ou para um país ter-ceiro que tenha por política enviar os seus refugiados para tais países.

• Os refugiados que se encontrem em situação irregular no território de umEstado, e que chegam directamente de um país onde eram perseguidos, não

Refugiados e não nacionais

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

*capítulo

18

Page 223: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

192 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

devem ser objecto de qualquer tipo de pena, no caso de se apresentaremimediatamente às autoridades.

• Não pode ser negado asilo, pelo menos de natureza temporária, aos refu-giados que chegam directamente de um país onde eram perseguidos.

• Os refugiados que se encontram legalmente no território têm o direitode nele circular livremente e de ali escolher o seu local de residência.

• Os refugiados que se encontrem legalmente no território têm direito adocumentos de viagem e identificação.

• Os requerentes de asilo devem ser informados sobre os procedimentos neces-sários; serão colocados à sua disposição os meios necessários para quefaçam o seu pedido de asilo e serão autorizados a permanecer no territó-rio enquanto aguardam uma decisão final.

• Um refugiado que se encontre legalmente no território só poderá ser expulsopor razões de segurança nacional ou ordem pública, e em execução de umadecisão tomada em conformidade com a lei.

• Antes de ser expulso, deverá se dada ao refugiado a oportunidade de apre-sentar as provas necessárias à sua defesa, de ser representado e de apre-sentar recurso perante uma autoridade superior.

Não nacionais

• Os estrangeiros e apátridas são não nacionais.

• Os não nacionais encontram-se em situação regular no território de umEstado, se nele entraram de maneira conforme com a lei e se possuíremuma autorização de residência válida.

• Os não nacionais, que se encontram legalmente no território podem invo-car todos os direitos humanos, à excepção de certos direitos políticos.

• Os não nacionais têm o mesmo direito de deixar o país e de emigrar queos nacionais.

• Os não nacionais que se encontrem legalmente no território, que tenham umaestreita ligação com o país e que o considerem como seu (por nele terem esta-belecido um lar, nascido ou aí desde há muito residirem) não serão expulsos.

• Os outros não nacionais que se encontrem legalmente no território nãopodem ser expulsos, a menos que a lei a tal obrigue e se a decisão de expul-são não for arbitrária nem discriminatória e as garantias de processo tive-rem sido respeitadas.

• As garantias de processo em matéria de expulsão consistem no direito deser ouvido, a ver o seu caso examinado por uma autoridade competente,à representação, a recorrer perante uma autoridade superior, a dispor detodos os meios para interpor esse recurso, a permanecer no territórioenquanto se espera o resultado do recurso e a ser informado sobre as viasde recurso possíveis.

Princípios fundamentais

}

}

Page 224: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 193

• Podem ser autorizadas excepções a certas garantias de processo, unica-mente por razões imperiosas de segurança nacional, por exemplo se pesa-rem ameaças políticas ou militares sobre do conjunto da nação.

• São proibidas as expulsões colectivas.

• O cônjuge e os filhos menores dependentes de um não nacional que seencontre legalmente no território devem ser autorizados a acompanhá-lo.

• Todos os não nacionais devem poder, a todo o momento, contactar como seu consulado ou missão diplomática.

• Os não nacionais expulsos devem ser autorizados a deslocar-se paraqualquer país que os aceite, e não podem ser enviados para países em queos seus direitos individuais sejam violados.}

a. Normas internacionais sobre refugiados enão nacionais – Informação para apresentações

1. INTRODUÇÃO

758. A situação dos refugiados e das pessoas des-locadas constitui um dos problemas mais com-plexos e árduos que se colocam actualmente àcomunidade internacional.

759. Quando o Alto Comissariado das Nações Uni-das para os Refugiados foi criado em 1951, o númerode refugiados sob o seu mandato ascendia a cerca deum milhão de pessoas. No início dos anos 90 haviamais de 17 milhões de refugiados no mundo, aos quaisse acrescentavam mais de 25 milhões de pessoasdeslocadas no interior do território.

760. As razões que explicam estes movimentos maci-ços e imprevisíveis de populações são variados, indodesde as catástrofes naturais à miséria, passando pelasperseguições individuais ou colectivas. Contudo, ésobretudo a violência a principal responsável pelamaior parte dos êxodos involuntários. As duas guer-ras mundiais e os cerca de 130 conflitos armados quetiveram lugar desde 1945 provocaram o deslocamentode milhões de pessoas e de povos no mundo.

761. O «refugiado» é definidona Convenção de 1951 relativaao Estatuto dos RefugiadosN.T.1

como uma pessoa que:

Em consequência de acontecimen-

tos ocorridos antes de 1 de Janeiro

de 1951, e receando, com razão ser

perseguida em virtude da sua raça,

religião, nacionalidade, filiação em

certo grupo social ou das suas opi-

niões políticas, se encontre fora do

país de que tem a nacionalidade e

não possa ou, em virtude daquele

receio, não queira pedir a protecção

daquele país; ou que, se não tiver

nacionalidade e estiver fora do país

no qual tinha a sua residência

habitual após aqueles aconteci-

mentos, não possa ou, em virtude

do dito receio, a ele não queira vol-

tar (artigo 1.o, secção A.2.) […]

O Protocolo de 1967 relativo aoEstatuto dos Refugiados N.T.2

estende a aplicação da Convençãode 1951 às pessoas que, apesar depreencherem os critérios conti-dos na definição da Convenção,se tornaram refugiados no segui-mento de acontecimentos ocorri-dos depois de 1 de Janeiro de 1951.

762. Os outros termos empre-gues no presente capítulo são ode «pessoas deslocadas no inte-rior do território» e «estrangei-

N.T.1

Assinada por Portugal a28.07.1951 e aprovada paraadesão através do Decreto--Lei n.o 43201, de 1 de Outu-bro de 1960, publicado noDiário do Governo n.o 229.O Decreto n.o 281/76, que

dá uma nova redacção aoartigo 3.o do anteriorDecreto, foi publicado noDiário da República n.o 91,I Série, de 17 de Abril de1976. O instrumento deadesão foi depositado a 22de Dezembro de 1960.A 27 de Abril de 1999 oGoverno de Portugal infor-mou o Secretário-Geral dasNações Unidas que a Con-venção seria aplicável aMacau. Subsequentemente,a 3 de Dezembro de 1999, o Secretário-Geral recebeuuma comunicação da Repú-blica Popular da Chinainformando que a Conven-ção seria aplicável à RegiãoAdministrativa Especial deMacau (RAEM) a partir de20 de Dezembro de 1999 eque o Governo da RepúblicaPopular da China assumiriaa responsabilidade pelosdireitos e obrigações inter-nacionais decorrentes daaplicação da Convenção à RAEM a partir daqueladata.

N.T.2

Assinado a 31 de Janeirode 1967 e aprovado paraadesão pelo Decreto Lei n.o 207/75, de 1 de Abril de1975, publicado no Diárioda República n.o 90, I Série, de 17 de Abril de1975. O depósito do instru-mento de adesão junto doSecretário-Geral das NaçõesUnidas deu-se a 13 de Julhode 1976.Portugal fez uma declara-ção nos termos da qual 1) opresente Protocolo será apli-cado sem qualquer limita-ção geográfica; e 2) emtodos os casos que o Proto-colo confere o estatuto depessoa mais favorecida aosrefugiados de países estran-geiros, esta cláusula nãodeverá ser interpretada porforma a significar o estatutoconcedido por Portugal aosnacionais do Brasil ou deoutros países com os quaisPortugal possa estabelecerrelações do tipo das daCommonwealth.

Page 225: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

194 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

ros» ou «não nacionais». As pessoas deslocadas nointerior do território são as pessoas que foram for-çadas a fugir de casa, mas que permanecem no ter-ritório do seu próprio país; os estrangeiros são aspessoas não originárias do país em que se encon-tram.

763. Um dos elementos essenciais que define orefugiado consiste no temor justificado de perse-guições. No entanto, tal como é indicado supra, osmovimentos de populações ocorrem devido a múl-tiplas e complexas razões que não se limitam às per-seguições imediatas. Daí resulta que algunsrequerentes de asilo não sejam considerados refu-giados em certos países, mas antes como migran-tes económicos, apesar de na prática não sersempre possível distinguir verdadeiramente estasduas categorias de pessoas.

764. Existe uma nítida relação de causa efeitoentre os atentados aos direitos humanos e o fenó-meno dos refugiados. As violações dos direitoshumanos provocam êxodos maciços, são perpe-tradas contra pessoas que se tronaram refugiadose a sua persistência no país de origem dos refu-giados impede os repatriamentos.

765. Independentemente da categoria na qual ascoloquemos, as pessoas deslocadas têm direitoao respeito, em virtude da dignidade inerente àpessoa humana e dos direitos humanos funda-mentais.

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS HUMANOS

DOS REFUGIADOS E DOS NÃO NACIONAIS

(a) Princípios fundamentais

766. O tratamento dos refugiados e dos nãonacionais funda-se nos seguintes quatro princí-pios:

• igualdade dos direitos;• inalienabilidade dos direitos;• universalidade dos direitos;• em caso de perseguição, direito a procurar ebeneficiar de asilo.

(b) Disposições específicas sobre

os direitos humanos dos refugiados

e dos não nacionais

767. As disposições pertinentes são inscritas nostextos que visam, especificamente os refugiados eos não nacionais, bem como nos instrumentossobre direitos humanos.

768. A Convenção de 1951 relativa ao Estatuto dosRefugiados constitui o principal instrumento emmatéria de direito dos refugiados, enunciando asnormas mínimas para o tratamento dos refugia-dos, nomeadamente os direitos fundamentais queos refugiados podem invocar e estabelecendo o seuestatuto jurídico. A Convenção contém disposiçõessobre o direito a um emprego lucrativo e à segu-rança social, sobre a emissão de documentos deidentificação e de viagem, sobre a aplicação dosencargos fiscais e sobre o direito dos refugiadostransferirem os seus bens para o país no qual foramadmitidos, a fim de nele se estabelecerem. Serão,de seguida, referidas com maior pormenor outrasmedidas importantes as disposições que visamespecificamente a aplicação da lei e a protecção dosdireitos humanos.

769. No dia 1 de Abril de 1992, cerca de 111 Estadoseram Partes na Convenção relativa ao Estatuto dosRefugiados e/ou ao respectivo Protocolo de 1967, oqual veio estender a aplicação da Convenção às pes-soas que se tornaram refugiadas como consequênciade acontecimentos ocorridos após 1 de Janeiro de 1951.

770. É de notar que existem igualmente instrumentosregionais em matéria de direitos dos refugiados. Em1969, a Organização da Unidade Africana adoptoua Convenção da OUA que regula os aspectos espe-cíficos dos problemas dos refugiados em África. OConselho da Europa adoptou vários instrumentosem matéria de refugiados; parece adequado citarigualmente os instrumentos relativos ao direito deasilo na América Latina, bem como a Declaração deCartagena sobre os Refugiados (1984).

771. As disposições que dizem especificamente res-peito à aplicação da lei e aos direitos humanos serãoanalisadas nas secções c a i, que visam os refugia-

Page 226: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

dos, as pessoas deslocadas no interior do território,os estrangeiros ou não nacionais e os apátridas.

(c) Disposições da Convenção de 1951

que visam especificamente o estatuto

dos refugiados

772. INAPLICABILIDADE DA CONVENÇÃO: a Con-venção não é aplicável às pessoas em relação àsquais existem razões sérias para se pensar:

a) que cometeram um crime contra a paz, umcrime de guerra ou um crime contra a humanidade,no sentido da definição contida nos instrumentosinternacionais;b) que cometeram um crime grave de direitocomum fora do país de acolhimento antes de neleterem sido admitidas como refugiados;c) que foram consideradas culpadas pela prá-tica de actos contrários aos fins e princípios dasNações Unidas (artigo 1.o, Secção F).

773. OBRIGAÇÕES GERAIS: todo o refugiado tem,para com o país em que se encontra, deveres queincluem, em especial, a obrigação de acatar as leis,regulamentos, bem como as medidas de manu-tenção da ordem pública adoptadas (artigo 2.o).

774. NÃO DISCRIMINAÇÃO: as disposições da Con-venção devem aplicar-se aos refugiados sem dis-criminação quanto à raça, religião ou país deorigem (artigo 3.o).

775. DIREITO DE ASSOCIAÇÃO: os Estados contra-tantes concederão aos refugiados que residamregularmente nos seus territórios, o tratamentomais favorável concedido aos nacionais de umpaís estrangeiro, no que se refere às associações deobjectivos não políticos e não lucrativos e aos sin-dicatos profissionais (artigo 15.o).

776. DIREITO DE SUSTENTAR ACÇÃO EM JUÍZO: osrefugiados nos territórios dos Estados contratantesterão livre e fácil acesso aos tribunais. Os refugia-dos beneficiarão do mesmo tratamento que osnacionais no que diz respeito ao acesso aos tribunais,incluindo a assistência judiciária no Estado contra-tante onde têm a residência habitual (artigo 16.o).

777. LIBERDADE DE CIRCULAÇÃO: os Estadoscontratantes devem conceder aos refugiados quese encontrem regularmente nos seus territórioso direito de neles escolherem o lugar de resi-dência e circularem livremente, com as reservasinstituídas pela regulamentação aplicável aosestrangeiros geralmente nas mesmas circuns-tâncias (artigo 26.o).

778. DOCUMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO: os Esta-dos contratantes devem emitir documentos deidentificação a qualquer refugiado que se encon-tre no seu território e que não possua umdocumento de viagem válido (artigo 27.o).

779. DOCUMENTOS DE VIAGEM: as medidasincluem a obrigação de emitir documentos para osrefugiados que residam regularmente nos seusterritórios, com os quais possam viajar fora dessesterritórios, a não ser que a isso se oponham razõesimperiosas de segurança nacional ou de ordempública (artigo 28.o).

780. REFUGIADOS EM SITUAÇÃO IRREGULAR NO

PAÍS DE ACOLHIMENTO: as medidas incluem aobrigação de os Estados contratantes não aplica-rem sanções penais aos refugiados em situação irre-gular, que chegam directamente de um território noqual a sua vida ou liberdade se encontravamameaçadas, e que se apresentam imediatamenteàs autoridades.

781. EXPULSÕES: os Estados contratantes só pode-rão expulsar um refugiado que se encontre regu-larmente nos seus territórios por razões desegurança nacional ou de ordem pública. A expul-são de um refugiado só se fará em execução de umadecisão tomada em conformidade com o processoprevisto pela lei. O texto prevê ainda que o refu-giado deve ser autorizado a apresentar provascapazes de o ilibarem de culpa, a apelar e a fazer-serepresentar para esse efeito perante uma autori-dade competente ou perante uma ou mais pessoasespecialmente designadas pela autoridade com-petente (artigo 32.o).

782. PROIBIÇÃO DE EXPULSÃO E DE REFOULEMENT:nenhum dos Estados contratantes expulsará ou

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 195

Page 227: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

reenviará um refugiado, seja de que maneira for, paraas fronteiras dos territórios onde a sua vida ou a sualiberdade sejam ameaçadas em virtude da sua raça,religião, nacionalidade, filiação em certo gruposocial ou opiniões políticas. Contudo, a presentedisposição não poderá ser invocada por um refugiadoem relação ao qual existam razões sérias para con-siderar que coloca perigo para a segurança do paísonde se encontra, ou que, tendo sido objecto deuma condenação definitiva por um crime ou delitoparticularmente grave, constitua ameaça para acomunidade do dito país (artigo 33.o).

(d) Disposições específicas do direito inter-

nacional dos direitos humanos

e do direito internacional humanitário apli-

cáveis à situação dos refugiados

783. Parece evidente que as disposições que maisde perto se relacionam com a situação dos refu-giados são o direito à liberdade de circulação e odireito a procurar e a beneficiar de asilo em casode perseguição. Estes direitos são protegidos pelaDeclaração Universal dos Direitos do Homem nosseguintes artigos:

Artigo 13.o

1). Toda a pessoa tem o direito de livremente circular

e escolher a sua residência no interior de um Estado.

2). Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país

em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de

regressar ao seu país.

Artigo 14.o

1). Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o

direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros

países.

2). Este direito não pode, porém, ser invocado no

caso de processo realmente existente por crime de

direito comum ou por actividades contrárias aos fins e

aos princípios das Nações Unidas.

784. Estes direitos encontram-se protegidospelo artigo 12.o da Carta Africana dos Direitos

do Homem e dos Povos e pelo artigo 22.o daConvenção Americana sobre Direitos Huma-nos. Os direitos à liberdade de circulação e deresidência no interior de um Estado, de deixarqualquer país e de regressar ao seu própriopaís são igualmente protegidos pelo artigo 12,o

do Pacto Internacional sobre os Direitos Civise Políticos e pelos artigos 2.o e 3.o do Protocolon.o 4 à Convenção Europeia sobre os Direitos doHomem.

785. Outra disposição de importância fundamen-tal para a situação dos refugiados consiste nafaculdade de invocar os seus direitos sem distin-ção ou discriminação, tal como é consagrado noartigo 2.o da Declaração Universal dos Direitos doHomem:

Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as

liberdades proclamados na presente Declaração, sem dis-

tinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo,

de língua, de religião, de opinião política ou outra, de

origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento

ou de qualquer outra situação. […]

Este direito é igualmente protegido pelo PactoInternacional sobre os Direitos Civis e Políticos(artigo 2.o), pelo Pacto Internacional sobre osDireitos Económicos, Sociais e Culturais (artigo 2.o,n.o 2), pela Carta Africana dos Direitos do Homeme dos Povos (artigo 2.o), pela Convenção Americanasobre Direitos Humanos (artigo 1.o) e pela Con-venção Europeia sobre os Direitos do Homem(artigo 14.o).

786. Existe, assim, um leque de direitos humanos– económicos, sociais e culturais, mas tambémcivis e políticos – que pode ser invocado pelos refu-giados. No entanto, os direitos mais vulneráveisno que diz respeito à aplicação da lei e às activi-dades de manutenção da ordem em geral, isto éaqueles cuja protecção mais depende da aplicaçãoda lei e da manutenção da ordem, são os direitoscivis e políticos.

787. Convém nomeadamente relembrar os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei que asseguintes disposições da Declaração Universal dos

196 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 228: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Direitos do Homem se revestem de especial rele-vância para a situação dos refugiados:

a) direito à vida, liberdade e segurança da pes-soa (artigo 3.o);b) proibição de tortura e penas ou tratamentoscruéis, desumanos ou degradantes (artigo 5.o);c) direito ao reconhecimento em todos os luga-res da sua personalidade jurídica (artigo 6.o);d) direito à igualdade perante a lei e a uma igualprotecção da lei (artigo 7.o);e) proibição de prisões e detenções arbitrárias(artigo 9.o);f ) direito a que a sua causa seja equitativa e publi-camente examinada no que concerne a determina-ção dos seus direitos e obrigações, bem como sobrequalquer acusação em matéria penal (artigo 10.o);g) proibição de qualquer intromissão arbitráriana vida privada, família, domicílio ou correspon-dência (artigo 12.o);h) direito à liberdade de pensamento, consciên-cia e religião (artigo 18.o);i) direito à liberdade de opinião e de expressão(artigo 19.o);j) direito à liberdade de reunião e de associaçãopacíficas (artigo 20.o).

Todos os direitos e proibições acima mencionadosencontram-se igualmente inscritos no Pacto Inter-nacional sobre os Direitos Civis e Políticos e nos ins-trumentos regionais. Estes textos foram analisadospormenorizadamente nos capítulos precedentes.

788. Os princípios específicos do direito inter-nacional humanitário aplicáveis à situação dosrefugiados em período de conflitos armados inter-nacionais encontram-se inscritos nos seguintesinstrumentos:

a) o artigo 44.o da Convenção de Genebra Rela-tiva à Protecção das Pessoas Civis em Tempo deGuerra (quarta Convenção) dispõe que, ao aplicaras medidas de fiscalização mencionadas na presenteConvenção, a Potência detentora não tratará comoestrangeiros inimigos, exclusivamente na base dasua subordinação jurídica a um Estado inimigo, osrefugiados que não gozem de facto da protecção dequalquer Governo.

b) o artigo 73.o do Protocolo Adicional I às Con-venções de Genebra de 1949 dispõe que as pessoasque, antes do início das hostilidades, foram consi-deradas apátridas ou refugiadas, nos termos dos ins-trumentos internacionais pertinentes aceites pelasPartes interessadas, ou da legislação nacional doEstado de acolhimento ou de residência, serão, emqualquer circunstância e sem qualquer discrimi-nação, pessoas protegidas, nos termos dos títulos Ie III da Convenção IV. O título I da Convençãodefine as disposições gerais e o título III diz respeitoao estatuto e tratamento das pessoas protegidas.

789. Nenhuma disposição do direito internacio-nal humanitário visa especificamente a situação dosrefugiados em conflitos armados não internacio-nais. No entanto:

a) o artigo 3.o comum às quatro Convenções deGenebra de 1949, que se aplica em caso de con-flitos armados que não apresentem um carácterinternacional e que ocorram no território de umadas Altas Partes Contratantes, exige que as pessoasque não participem directamente nas hostilida-des sejam tratadas com humanidade, «sem qual-quer distinção de carácter desfavorável baseadana raça, cor, religião ou crença, sexo, nascimentoou fortuna, ou qualquer critério análogo».b) o Protocolo Adicional II às Convenções de Gene-bra, que diz igualmente respeito à protecção das víti-mas de conflitos armados não internacionais, deve seraplicado sem qualquer distinção de carácter desfavo-rável, baseado nas razões já enunciadas no artigo 3.o

comum às quatro Convenções de Genebra (artigo 2.o).

790. Para além das medidas de protecção, é de lem-brar que a Convenção de 1951 relativa ao Estatuto dosRefugiados e os outros instrumentos relativos aoestatuto e tratamento dos refugiados se revestem deuma pertinência especial durante os conflitos arma-dos e quando um território está ocupado.

(e) Pessoas deslocadas no interior

do território

791. O vasto número de êxodos maciços verificadonos últimos anos produziu «pessoas deslocadas nointerior do território» – isto é, pessoas obrigadas

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 197

Page 229: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

a fugir dos seus lares, mas que não atravessam asfronteiras do seu país.

792. As populações deslocadas encontram-segeralmente em países em desenvolvimento e com-põem-se maioritariamente por mulheres e crian-ças. Em certos países, as pessoas deslocadasrepresentam mais de 10% da população.

793. Como continuam a viver no seu próprio país,as pessoas deslocadas são excluídas do presente sis-tema de protecção dos refugiados. Convém, noentanto, relembrar os funcionários responsáveispela aplicação da lei que os princípios e disposiçõesdo direito internacional em matéria de direitoshumanos continuam a ser plenamente aplicáveis.As pessoas deslocadas são extremamente vulne-ráveis e têm o direito de invocar todos os direitoshumanos, sem qualquer distinção de carácter des-favorável nem qualquer tipo de discriminação.

794. Convém ainda chamar a atenção dos funcioná-rios responsáveis pela aplicação da lei para as dispo-sições do artigo 17.o do Protocolo Adicional II àsConvenções de Genebra de 1949, que consiste noProtocolo relativo à Protecção das Vítimas dos Con-flitos Armados Não Internacionais. O seu artigo 17.o

proíbe as deslocações forçadas de civis, dispondo que:

a) a deslocação da população civil não poderá serordenada por razões relacionadas com o conflito,salvo nos casos em que a segurança das pessoascivis ou razões militares imperativas o exijam;b) se tal deslocação tiver de ser efectuada, serão toma-das todas as medidas possíveis para que a populaçãocivil seja acolhida em condições satisfatórias de aloja-mento, salubridade, higiene, segurança e alimentação;c) as pessoas civis não poderão ser forçadas a dei-xar o seu próprio território por razões que se rela-cionem com o conflito.

(f ) Disposições específicas da Declaração

sobre os direitos humanos das pessoas

que não possuem a nacionalidade

do país em que vivem

795. ADOPÇÃO DA DECLARAÇÃO: a Declaração foiadoptada pela Assembleia Geral na sua resolução

47/144, de 13 de Dezembro de 1985 e faz expres-samente referência:

a) à Carta das Nações Unidas, que encoraja o res-peito universal e efectivo pelos direitos humanos eliberdades fundamentais de todos os seres humanos,sem distinção de raça, sexo, língua ou religião;b) à Declaração Universal dos Direitos doHomem, que proclama que todos os seres huma-nos nascem livres e iguais em dignidade e emdireitos, e que todos podem invocar todos os direi-tos e liberdades proclamados na referida Declara-ção, sem qualquer distinção, nomeadamente deraça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ouqualquer outra opinião, origem nacional ou social,fortuna, nascimento ou qualquer outra situação, eque proclama ainda que todos têm direito ao reco-nhecimento em todos os lugares da sua personali-dade jurídica, que todos são iguais perante a lei, têmdireito a igual protecção da lei sem distinção e a pro-tecção igual contra qualquer discriminação.

A resolução reconhece ainda que a protecção dosdireitos humanos e das liberdades fundamentaisprevista nos instrumentos internacionais deveriaser igualmente assegurada às pessoas que nãopossuem a nacionalidade do país no qual vivem.

796. DEFINIÇÃO: para os fins da Declaração, otermo «estrangeiro» aplica-se a todo o indivíduo quenão possui a nacionalidade do Estado no qual seencontre (artigo 1.o).

797. OBRIGAÇÕES DOS ESTRANGEIROS: os estran-geiros devem conformar-se às leis do Estado no qualresidem ou se encontram, no respeito pelos cos-tumes e tradições do seu povo (artigo 4.o).

798. DIREITOS DOS ESTRANGEIROS: os estrangeirosgozam inter alia dos seguintes direitos, em confor-midade com o direito interno e sob reserva das obri-gações internacionais do Estado no qual se encontram:

a) o direito à vida, à segurança da sua pessoa;nenhum estrangeiro pode ser capturado ou detidoarbitrariamente; um estrangeiro só pode ser pri-vado da sua liberdade por motivos e em confor-midade com o procedimento previsto pela lei;

198 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 230: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

b) o direito à protecção contra qualquer inge-rência arbitrária ou ilegal na sua vida privada e fami-liar, o seu domicílio ou correspondência;c) o direito à igualdade perante os tribunais eoutros órgãos e autoridades judiciárias e, em casode procedimentos judiciários ou quando a lei o pre-vir em caso de acções de outra natureza, o direitoa ser assistido gratuitamente por um intérprete, setal for necessário;d) o direito à liberdade de pensamento, opinião,consciência e religião; o direito a manifestar a suareligião ou convicções, só podendo este direito serobjecto das restrições previstas na lei que se reve-lem necessárias à protecção da segurança, da ordeme da saúde públicas ou da moral e das liberdades edireitos fundamentais de outrem (artigo 5.o, n.o 1).

799. DIREITOS SUJEITOS A CERTAS CONDIÇÕES:sob reservas das restrições previstas pela lei enecessárias numa sociedade democrática para aprotecção da segurança nacional e pública, daordem e saúde públicas, da moral ou dos direitose liberdades de outrem, e que são compatíveiscom os outros direitos reconhecidos nos instru-mentos internacionais pertinentes e com os direi-tos enunciados na Declaração, os estrangeirosbeneficiam do:

a) direito de deixar o país;b) direito de liberdade de expressão;c) direito de reunião pacífica;d) direito à propriedade, tanto sozinhos como emcolectividade, sob reserva do direito interno;e) direito de circular livremente e de escolher asua residência no interior desse Estado (se seencontrarem legalmente no território de umEstado) (artigo 5.o, n.os 2 e 3).

800. DIREITO A NÃO SER SUJEITO À TORTURA:nenhum estrangeiro será submetido à tortura,nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos oudegradantes (artigo 6.o).

801. EXPULSÃO: um estrangeiro que se encontrelegalmente no território de um Estado só podedele ser expulso em execução de uma decisãotomada em conformidade com a lei. É proibida aexpulsão individual ou colectiva de estrangeiros que

se encontrem nesta situação por razões de raça, cor,religião, cultura, ascendência ou origem nacionalou étnica (artigo 7.o).802. COMUNICAÇÃO: qualquer estrangeiro devepoder contactar a todo o momento a missão diplo-mática do Estado da sua nacionalidade ou, na suafalta, o consulado ou missão diplomática de qual-quer outro Estado encarregue da protecção dosinteresses do Estado da sua nacionalidade noEstado no qual reside (artigo 10.o).

(g) Disposições específicas do direito inter-

nacional dos direitos humanos

e do direito internacional humanitário apli-

cáveis à situação dos não nacionais

803. As normas de direito internacional dosdireitos humanos aplicáveis à situação dos nãonacionais são enunciadas nos diferentes artigosda Declaração sobre os Direitos Humanos dasPessoas que não Possuem a Nacionalidade doPaís no qual Vivem, acima referida. Todas estasnormas se encontram espelhadas de formas dife-rentes na Declaração Universal dos Direitos doHomem e nos tratados internacionais e regio-nais analisados de forma mais detalhada noscapítulos anteriores.

804. Convém assinalar muito especialmente oPacto Internacional sobre os Direitos Civis ePolíticos (artigo 13.o); a Carta Africana dos Direi-tos do Homem e dos Povos (artigo 12.o) e a Con-venção Americana sobre Direitos Humanos(artigo 22.o). Todos estes artigos contêm dispo-sições que proíbem a expulsão de estrangeiros quese encontrem legalmente no território dos Esta-dos Partes nos instrumentos, a menos que talocorra em execução de uma decisão tomada emconformidade com a lei. Os tratados regionaisproíbem igualmente as expulsões colectivas de nãonacionais.

805. O artigo 4.o do Protocolo n.o 4 à ConvençãoEuropeia sobre os Direitos do Homem proíbe asexpulsões colectivas de estrangeiros.

806. As disposições específicas do direito interna-cional humanitário aplicáveis à situação dos não

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 199

Page 231: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

nacionais num conflito armado internacionalencontram-se essencialmente na quarta Convençãode Genebra relativa à Protecção das Pessoas Civisem Tempo de Guerra e no Título IV do ProtocoloAdicional II às Convenções de Genebra de 1949.

807. O artigo 4.o da quarta Convenção de Genebraprotege as pessoas que num dado momento e dequalquer forma se encontrem, em caso de conflitoou ocupação, em poder de uma Parte, no conflitoou de uma Potência ocupante de que não sejamnacionais. São especialmente previstos na Con-venção os casos dos nacionais de um país neutro,estrangeiros que se encontram num territórioocupado e estrangeiros que se encontram no ter-ritório de um Estado beligerante.

808. As disposições do artigo 3.o comum às quatroConvenções de Genebra de 1949 e do Protocolo Adi-cional II às Convenções de Genebra mencionadasna subsecção d supra (parágrafo 789) a propósitodos refugiados aplicam-se igualmente aos nãonacionais.

(h) Disposições específicas da Convenção de

1954 sobre o Estatuto dos ApátridasN.T.3

809. PREÂMBULO: o primeiroparágrafo do Preâmbulo relem-bra que a Carta das Nações Uni-das e a Declaração Universaldos Direitos do Homem afir-maram o princípio de que osseres humanos devem gozar osdireitos humanos e liberdadesfundamentais sem qualquer discriminação. O ter-ceiro parágrafo do Preâmbulo sublinha que só osapátridas que são igualmente refugiados podembeneficiar da Convenção de 1951 relativa ao Esta-tuto dos Refugiados e que existem inúmeros apá-tridas aos quais não é aplicável esta Convenção.

810. DEFINIÇÃO: um apátrida é uma pessoa nãoreconhecida por nenhum Estado como sua nacio-nal, nos termos da sua legislação (artigo 1.o).

811. OBRIGAÇÕES DOS APÁTRIDAS: todo o apátridatem deveres em relação ao país no qual se encon-

tra, os quais incluem nomeadamente a obrigaçãode respeitar as leis e regulamentos, bem como asmedidas tomadas para a manutenção da ordempública (artigo 2.o).

812. RELIGIÃO: os Estados contratantes concedemaos apátridas que se encontrem no seu territórioum tratamento pelo menos tão favorável como oque é concedido aos nacionais, no que diz res-peito à liberdade de praticar a sua religião e no queconcerne à liberdade de instrução religiosa dosseus filhos (artigo 4.o).

813. ACESSO AOS TRIBUNAIS: os apátridas terãoacesso livre e facilitado aos tribunais no territóriodos Estados contratantes. No que concerne aoacesso aos tribunais, incluindo à assistência judi-ciária, os apátridas gozarão do mesmo tratamentoque os nacionais do Estado contratante no qual têma sua residência habitual (artigo 16.o).

814. LIBERDADE DE CIRCULAÇÃO: os Estados con-tratantes concederão aos apátridas que se encon-tram regularmente no seu território o direito deescolher o seu local de residência e de livre circu-lação, sujeito às reservas instituídas pela regula-mentação aplicável aos estrangeiros geralmentenas mesmas circunstâncias (artigo 26.o).

815. DOCUMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO: os Esta-dos contratantes emitirão documentos de identi-ficação a todos os apátridas que se encontrem noseu território e que não possuam um documentode viagem válido (artigo 27.o).

816. DOCUMENTOS DE VIAGEM: os Estados con-tratantes concederão aos apátridas que residemregularmente no seu território documentos de via-gem destinados a permitir-lhes viajar fora desse ter-ritório, a menos que a tal se oponham razõesimperiosas de segurança nacional ou de ordempública (artigo 28.o).

817. EXPULSÕES: os Estados contratantes só expul-sarão um apátrida que se encontre regularmenteno seu território por razões de segurança nacionalou de ordem pública. A expulsão desse apátrida sópoderá ocorrer em execução de uma decisão pro-

200 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

N.T.3

Esta Convenção, adop-tada a 28 de Setembro de1954 por uma Conferênciade Plenipotenciários reali-zada no seguimento daresolução do Conselho Eco-nómico e Social 526A(XVII) de 26 de Abril de1954, entrou em vigor naesfera jurídica internacionala 6 de Junho de 1960, nos termos do respectivoartigo 39.o. Portugal nãoassinou nem é Parte nestaConvenção.

Page 232: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 201

nunciada em conformidade com o procedimentoprevisto na lei (artigo 31.o).

(i) Disposições específicas do direito inter-

nacional dos direitos humanos

e do direito internacional humanitário apli-

cáveis à situação dos apátridas

818. As disposições pertinentes são essencial-mente os direitos civis e políticos fundamentais eas disposições do direito internacional humanitá-rio destinadas a proteger as pessoas civis e as pes-soas que não participam nas hostilidades e que são visadas nas subsecções anteriores.

819. É conveniente relembrar especialmente aosparticipantes em cursos de formação:

a) o direito de todos a invocar os direitos e liber-dades reconhecidos pela Declaração Universal dosDireitos do Homem;b) o princípio da não-discriminação na aplicaçãodas disposições contidas na Declaração Universaldos Direitos do Homem, bem como nos tratadosinternacionais e regionais em matéria de direitoshumanos;c) o direito à igualdade perante a lei e à igual pro-tecção da lei.

3. CONCLUSÕES

820. As deslocações maciças de populações têmcausas múltiplas e complexas, das quais a mais

importante consiste indubitavelmente no des-respeito pelos direitos humanos, já que traduzemclaramente carências ou abusos de poder porparte dos governos em causa. Como a manuten-ção da ordem é um dos meios através dos quaisum governo protege e favorece os direitos huma-nos, a existência de tais deslocações pode indicarigualmente uma incapacidade de manter aordem ou a existência de abusos de poder naaplicação da lei.

821. As pessoas deslocadas encontram-se fre-quentemente numa situação desesperada e sãosempre vulneráveis. Os refugiados e outras cate-gorias de pessoas que não têm a nacionalidade dopaís no qual se encontram estão expostas àsagressões xenófobas ou racistas. Com efeito, estesatentados são de tal forma prováveis, que a viti-mização de não nacionais se torna praticamenteprevisível.

822. Incumbe claramente à polícia desempenhar assuas tarefas de forma eficaz, no respeito pela legali-dade e com humanidade, a fim de não criar ou de nãocontribuir para a criação de situações que levem cer-tas pessoas a tornar-se deslocados ou que impeçamas pessoas deslocadas de regressar aos seus lares.

823. Incumbe nitidamente à polícia proteger osnão nacionais, independentemente da categoria àqual pertençam. As normas decorrentes dos ins-trumentos estudados neste capítulo proporcionamum padrão inequívoco para aferir o sucesso oufracasso da polícia nesta matéria.

b. Normas internacionais sobre refugiados e não nacionais – Aplicação prática

1. MEDIDAS PARA A APLICAÇÃO PRÁTICA DAS NORMAS INTERNACIONAIS

• Permanecer alerta em relação a qualquer indício de actividades xenófo-bas ou racistas no sector ao qual se encontram afectados.

• Cooperar estreitamente com os serviços de imigração e organismos sociaisde ajuda aos refugiados e não nacionais.

Recomendações destinadas

a todos os agentes policiais

}

Page 233: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

202 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

• Nas zonas de forte concentração de imigrantes, tranquilizar os residen-tes informando-os do seu direito a solicitar protecção e ajuda da polícia semtemor de serem expulsos.

• Relembrar os colegas de que os estrangeiros em situação irregular nãosão criminosos nem suspeitos da prática de crimes pelo simples facto de seencontrarem numa situação irregular.

• Assegurar uma protecção visível aos lares e campos de refugiados.

• Relembrar a especial vulnerabilidade dos refugiados e dos não nacionaise dar ordens claras relativas às suas necessidades de protecção.

• Elaborar modalidades de luta contra a violência e actos de intimidação racistae xenófobos, em cooperação com os representantes das comunidades.

• Organizar patrulhas a pé nos sectores com forte concentração de refu-giados e prever que neles sejam implantadas subesquadras de polícia.

• Criar unidades especiais com formação jurídica necessária, bem como comcompetências linguísticas e sociais, para a execução de uma missão queassente mais na protecção, do que na aplicação de leis de imigração.

• As autoridades de polícia encarregues dos controlos fronteiriços e da apli-cação da lei sobre imigração devem assegurar aos seus agentes uma for-mação especializada sobre os direitos dos refugiados e dos não nacionaise sobre as garantias de processo destas categorias de pessoas.

• Trabalhar em estreita concertação com os organismos sociais que ajudam osrefugiados e os não nacionais que se encontram em situação de necessidade.

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

A guerra civil e a violência que ocorrem num país vizi-nho levaram a que os seus habitantes fugissem e serefugiassem em massa no seu país. Os exilados per-tencem essencialmente a uma minoria que se encon-tra em conflito com as autoridades do respectivo país,já que se julgam tratados injustamente e perseguidosenquanto minoria. As acusações desta minoria cons-tituem uma das causas da guerra civil naquele país.

O seu governo decidiu conceder o direito de asilo aestas pessoas e de alojá-las temporariamente numcampo próximo da fronteira e situado na área em rela-ção à qual você tem responsabilidade de policia-mento. A comunidade internacional, as organizaçõeshumanitárias e as autoridades do seu país fornece-rão alimentos, vestuário e medicamentos aos refu-

giados. A chegada de refugiados suscita sentimen-tos de medo e rancor no seio da população local.O chefe da polícia do seu país pediu-lhe que,enquanto responsável por uma unidade local dapolícia, avaliasse a situação em termos de manu-tenção da ordem e identificasse os problemas queantecipa. Tendo em conta estes elementos:

1). Indique que informações suplementares irásolicitar sobre a situação.2). Apresente um esquema da avaliação que iriaapresentar, bem como dos problemas que prevê.

A título de medida temporária, e enquantoaguarda a resposta e ajuda suplementares porparte do chefe de polícia, redija um conjunto de ins-truções gerais sobre a situação, destinadas aosagentes policiais colocados sob as suas ordens.

Recomendações

para os funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

}}

Page 234: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 203

As suas reacções em relação a esta situação devemfundar-se em considerações pragmáticas de manu-tenção da ordem e nas normas internacionais per-tinentes.

3. TÓPICOS DE DISCUSSÃO

1). A natureza e amplitude internacionais dosproblemas originados pela concessão de asilo sãoactualmente bem conhecidas. De que forma pode-ria ser empreendida uma acção internacional parafazer face aos problemas de manutenção da ordemcausados pelo fluxo de refugiados para um deter-minado país?2). Os refugiados e outros não nacionais têm odever de respeitar as leis e regulamentos dos paísesonde se encontram. O que é que a polícia poderáfazer para assegurar que estas pessoas são infor-madas sobre a legislação e regulamentação locais?3). Um dos princípios em matéria de direitoshumanos proclama que todos os seres huma-

nos nascem livres e iguais em dignidade e direi-tos e que consequentemente os não nacionais dequalquer país têm geralmente menos direitosque os nacionais desse país. Como é que tal sejustifica?4). As disposições da Convenção de 1951 relativaao Estatuto dos Refugiados não são aplicáveis àspessoas que «cometeram um crime grave dedireito comum for a do país de acolhimento»(artigo 1.o, Secção F b). Em que é que consiste um«crime político»? De que forma é que ele se dis-tingue de um crime de direito comum?5). Como é que a polícia pode permanecer infor-mada sobre a atitude e os sentimentos da popula-ção local face aos refugiados e a outros nãonacionais, a fim de adoptar medidas para impediras agressões xenófobas ou racistas?6). Se a polícia detectar uma certa animosidadeno seio da comunidade local em relação aos refu-giados e outros não nacionais, que medidaspoderá ela tomar para prevenir as agressões xenó-fobas ou racistas contra estas populações?

Page 235: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 236: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Quarta Parte 205

• Permitir que os utilizadores do manual compreendam a responsabili-dade especial que incumbe à polícia em matéria de protecção das víti-mas de criminalidade, abuso de poder e violações dos direitos humanos,a obrigação que têm de tratá-los com respeito, compaixão e atenção ede agir com toda a diligência para colocar à sua disposição todos os meiosque lhes permitam obter uma indemnização.

• Todas as vítimas de criminalidade, abuso de poder ou violações dos direi-tos humanos devem ser tratadas com compaixão e respeito.

• As vítimas devem ter acesso às instâncias judiciárias e a uma rápida indem-nização.

• Os procedimentos que permitam obter indemnizações devem ser rápidos,equitativos, pouco dispendiosos e acessíveis.

• As vítimas devem ser informadas sobre os direitos que lhes são reconhe-cidos, com vista a obterem indemnização e protecção.

• As vítimas devem ser informadas sobre o seu papel nos procedimentosjudiciários, as possibilidades de recurso que esses procedimentos oferecem,as datas e o desenrolar dos procedimentos e o resultado dos processos.

• As vítimas devem ser autorizadas a apresentar os seus pontos de vista esentimentos sempre que os seus interesses pessoais estejam em causa.

• As vítimas devem receber toda a assistência jurídica, material, médica,psicológica e social de que necessitem e ser informadas sobre a existênciae disponibilidade dessa assistência.

• As dificuldades sentidas pelas vítimas na resolução dos seus casos devemser, tanto quanto possível, limitadas.

• A vida privada e a segurança das vítimas devem ser protegidas.

Protecção e indemnização das vítimas

19

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

*capítulo

Page 237: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

206 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

a. Normas internacionais sobre os direitoshumanos, protecção e indemnização de vítimas – Informação para as apresentações

1. INTRODUÇÃO

824. A situação das vítimas de criminalidade e abu-sos de poder suscita um interesse considerável aosníveis nacional, regional e internacional, tal comoo demonstra a amplitude das investigações levadasa cabo sobre esta questão, bem como a actividade polí-tica, jurídica e administrativa que daí decorre.

825. Temos actualmente uma ideia muito precisa doque é necessário para ajudar as vítimas e do que talrepresenta para os diferentes elementos do sistemade justiça penal. É evidente que a melhor forma deajudar as vítimas é através da prevenção da crimina-lidade e abusos de poder, por forma a limitar aomáximo os casos de vitimização ou de revitimização.

826. A responsabilidade em matéria de prevenção per-tence ao Estado, já que a garantia da segurança doscidadãos constitui uma função fundamental dos pode-res públicos. No entanto, a sociedade e os indivíduospodem agir de maneira positiva, por forma a evitaremtornar-se vítimas, através da adopção de certas medi-das de precaução e evitando certos comportamentos.

827. O papel da polícia na prevenção da vitimiza-ção e na assistência às vítimas é essencial; mas éigualmente fundamental que a polícia possa con-tar com a cooperação das vítimas. As pesquisasefectuadas mostram que o sistema de justiça penal

não lida com a maior parte dos crimes cometidos.Tal sucede, por um lado, porque as vítimas decidemfrequentemente não apresentar queixa e, por outrolado, porque para a grande maioria dos crimescomunicados não é apurado um responsável.

828. A polícia necessita da cooperação das víti-mas, as quais devem não só comunicar o crimecometido para que a justiça penal possa ser accio-nada, como também fornecer informações quepossam permitir que o inquérito chegue a bomtermo. As relações entre a polícia e as vítimas sãoassim de dependência e interesse mútuos.

829. As normas internacionais consideradas nopresente capítulo reflectem a política dos Estadosmembros da ONU em matéria de justiça penal,podendo a sua aplicação influenciar profunda e posi-tivamente as relações entre a polícia e as vítimas,no interesse de ambas.

2. ASPECTOS GERAIS SOBRE OS DIREITOS

HUMANOS, PROTECÇÃO E INDEMNIZAÇÃO

DAS VÍTIMAS

a) Princípios fundamentais

830. Existem dois princípios fundamentais quedevem ser respeitados por forma a que a protec-ção das vítimas seja assegurada e para que estas pos-sam obter uma indemnização:

• as vítimas têm direito a ser tratadas com com-paixão e no respeito pela sua dignidade;

• Devem ser evitados os atrasos inúteis na decisão de processos.

• Sempre que tal seja apropriado, os autores de crimes devem indemnizaras vítimas pelos prejuízos causados.

• Nos casos em que os danos sofridos sejam da responsabilidade de funcio-nários públicos, as vítimas devem receber uma restituição por parte do Estado.

• As vítimas devem obter uma indemnização financeira por parte do delin-quente ou, no caso de tal não ser possível, por parte do Estado.

• Os polícias devem receber uma formação que os sensibilize para asnecessidades das vítimas, bem como instruções que visem garantir uma ajudaimediata e apropriada às vítimas.}

Page 238: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

• as vítimas têm direito a uma indemnizaçãorápida do prejuízo que sofreram.

Todas as normas consideradas no presente capítulodecorrem destes dois princípios.

b) Disposições específicas relativas aos

direitos fundamentais das vítimas, protecção

e indemnização

831. Em 1985, a Assembleia Geral adoptou aDeclaração dos Princípios Básicos de JustiçaRelativos às Vítimas da Criminalidade e deAbuso de Poder. Esta Declaração enuncia as nor-mas básicas para o tratamento das vítimas da cri-minalidade e abuso de poder, no que dizrespeito ao acesso aos procedimentos judiciá-rios e administrativos, ao direito a ser infor-mado e a receber um tratamento equitativo, aodireito a que os seus pontos de vista sejam toma-dos em consideração ou ao direito a obter umarestituição e indemnização.

832. A Assembleia Geral, na sua resolução 40/34de 29 de Novembro de 1985, através da qual adop-tou esta Declaração, afirma:

a necessidade de adopção, a nível nacional e interna-

cional, de medidas que visem garantir o reconheci-

mento universal e eficaz dos direitos das vítimas da

criminalidade e de abuso de poder (parágrafo 1).

A Assembleia solicita igualmente aos EstadosMembros que adoptem as medidas necessáriaspara dar efeito às disposições contidas na Decla-ração e aplicar uma série de medidas, nomeada-mente:

a) reduzir a vitimização e estimular a ajuda àsvítimas em situação de carência;b) incentivar os esforços colectivos e a partici-pação dos cidadãos na prevenção do crime;c) examinar regularmente a legislação e as prá-ticas existentes, a fim de assegurar a respectiva adap-tação à evolução das situações;d) adoptar e aplicar legislação que proíba actoscontrários às normas internacionalmente reco-nhecidas no âmbito dos direitos humanos, do

comportamento das empresas e de outros actos deabuso de poder;e) incentivar o respeito pelos códigos de con-duta e pelas normas éticas e, nomeadamente,das normas internacionais, por parte dos fun-cionários, incluindo o pessoal encarregado daaplicação da lei.

833. Na sua resolução 1989/57, de 24 de Maio de1989, o Conselho Económico e Social fez um certonúmero de recomendações relativas à aplicaçãoda Declaração. Uma destas recomendações apon-tava para a necessidade de ser elaborado, publicadoe difundido um guia para os profissionais de jus-tiça penal (parágrafo 1.o).

834. Em 1990, o Secretariado da ONU publicou umGuia destinado aos profissionais sobre a aplicação daDeclaração dos Princípios Básicos de Justiça Relati-vos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder.

835. O Conselho da Europa debruçou-se tambémactivamente sobre esta questão e elaborou diversostextos, entre os quais se encontra a ConvençãoEuropeia Relativa à Indemnização das Vítimas de Cri-mes Violentos (1983), bem como duas recomenda-ções: a Recomendação n.o R (85) 11 sobre a posiçãoda vítima no âmbito do direito e do processo penais(1985) e a Recomendação n.o R (87) 21 sobre a assis-tência às vítimas e prevenção da vitimização (1987).

836. Diversas disposições da Declaração dasNações Unidas de 1985 serão adiante examinadassob os títulos «Protecção das vítimas de criminali-dade» e «Protecção das vítimas de abuso de poder».Algumas das recomendações enunciadas pelo Con-selho Económico e Social na sua resolução 1989/57relativa à aplicação da Declaração serão expostas sobo título «Recomendações para a aplicação da Decla-ração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos àsVítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder». Asfontes relativas às normas sobre o tratamento dasvítimas de conflitos são indicadas sob o título «Pro-tecção das vítimas de conflitos».

NOTA PARA OS FORMADORES: convém igualmentereferir o capítulo XVII do presente manual, que tratada Aplicação da Lei e Direitos das Mulheres, e em

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 207

Page 239: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

especial as secções deste capítulo relativas àsmulheres vítimas de violência no seio da famíliae às mulheres vítimas de violação e outras formasde violência sexual.

c) Protecção das vítimas de criminalidade

837. DEFINIÇÃO: no parágrafo 1.o da Declaraçãodos Princípios Básicos de Justiça Relativos às Víti-mas da Criminalidade e de Abuso de Poder, as«vítimas» da criminalidade são definidas como

as pessoas que, individual ou colectivamente, tenham

sofrido um prejuízo, nomeadamente um atentado à

sua integridade física ou mental, um sofrimento de

ordem moral, uma perda material, ou um grave aten-

tado aos seus direitos fundamentais, como conse-

quência de actos ou de omissões violadores das leis

penais em vigor num Estado membro, incluindo as

que proíbem o abuso de poder.

838. O parágrafo 2.o da Declaração indica que umapessoa pode ser considerada como «vítima» noquadro da Declaração, independentemente de oautor ser ou não identificado, preso, processado oudeclarado culpado, e quaisquer que sejam os laçosde parentesco deste com a vítima. É acrescentadoque o termo “vítima” pode também incluir, a famí-lia próxima ou as pessoas a cargo da vítima directae as pessoas que tenham sofrido um prejuízo aointervirem com vista a prestar assistência às víti-mas em situação de carência ou para impedir a viti-mização. Parece claro que a última categoria podeincluir os funcionários policiais.

839. DISCRIMINAÇÃO: o parágrafo 3.o da Declara-ção prevê que as disposições da Declaração se apli-quem a todos, sem qualquer distinção baseadanas razões geralmente consideradas, tais como araça, cor, sexo, idade ou a origem étnica ou social.

840. TRATAMENTO, ACESSO ÀS INSTÂNCIAS JUDICIÁ-RIAS E INDEMNIZAÇÃO: o parágrafo 4.o da Declaraçãodispõe que as vítimas devem ser tratadas com compaixãoe no respeito da sua dignidade, tendo direito:

a) ao acesso às instâncias judiciárias, eb) a uma rápida indemnização,

pelo danos que sofreram, nos termos da legislaçãonacional.

841. Os princípios relativos ao acesso à justiça eà indemnização encontram-se enunciados noartigo 8.o da Declaração Universal dos Direitosdo Homem, cujo texto é o seguinte:

Toda a pessoa tem direito a recurso efectivo para as juris-

dições nacionais competentes contra os actos que vio-

lem os direitos fundamentais reconhecidos pela

Constituição ou pela lei.

Os direitos de acesso às instâncias judiciárias e aum recurso efectivo encontram-se protegidospelas disposições do parágrafo 3.o do artigo 2.o

do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis ePolíticos, do artigo 25.o da Convenção Americanasobre Direitos Humanos e do artigo 13.o da Con-venção Europeia dos Direitos do Homem. Oartigo 7.o da Carta Africana dos Direitos doHomem e dos Povos protege o direito de recorreraos tribunais nacionais competentes por qual-quer acto que viole os direitos garantidos por lei.

842. MECANISMOS QUE PERMITEM A OBTENÇÃO DE

UMA INDEMNIZAÇÃO: o parágrafo 5.o da Declara-ção dos Princípios Básicos de Justiça Relativos àsVítimas da Criminalidade e de Abuso de Poderapela à criação e, se necessário, ao reforço dosmecanismos judiciários e administrativos que per-mitam às vítimas a obtenção de reparação atravésde procedimentos, oficiais ou oficiosos, que sejamrápidos, equitativos, de baixo custo e acessíveis. Asvítimas devem ser informadas dos direitos quelhes são reconhecidos para procurar a obtenção dereparação por estes meios.

843. CAPACIDADE DO APARELHO JUDICIÁRIO E

ADMINISTRATIVO PARA RESPONDER ÀS NECESSI-DADES DAS VÍTIMAS: o parágrafo 6.o da Declara-ção dispõe que uma tal capacidade deve sermelhorada:

a) informando as vítimas da sua função e daspossibilidades de recurso abertas, das datas eda marcha dos processos e da decisão das suascausas;

208 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 240: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

b) permitindo que as opiniões e as preocupa-ções das vítimas sejam apresentadas e examinadasnas fases adequadas do processo, quando os seusinteresses pessoais estejam em causa, sem prejuízodos direitos da defesa e no quadro do sistema dejustiça penal do país;c) prestando a assistência adequada às vítimasao longo de todo o processo;d) tomando medidas para minimizar, tantoquanto possível, as dificuldades encontradas pelasvítimas, proteger a sua vida privada e garantir a suasegurança, bem como a da sua família e das suastestemunhas;e) evitando demoras desnecessárias na resoluçãodas causas e na execução das decisões ou senten-ças que concedam indemnizações às vítimas.

Esta última disposição está em conformidade como direito de toda a pessoa acusada a ser julgada semdemoras excessivas, o qual se encontra enunciadono parágrafo 3 c) do artigo 14.o do Pacto Interna-cional sobre os Direitos Civis e Políticos, no pará-grafo 1 d) do artigo 7.o da Carta Africana dosDireitos do Homem e dos Povos, no artigo 8.o daConvenção Americana sobre Direitos Humanos eno artigo 6.o da Convenção Europeia dos Direitosdo Homem.

844. MEIOS NÃO OFICIAIS DE SOLUÇÃO DE DIFE-RENDOS: o parágrafo 7.o da Declaração dos Prin-cípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas daCriminalidade e de Abuso de Poder dispõe que osmeios, tais como a mediação, a arbitragem e as prá-ticas de direito consuetudinário ou as práticasautóctones de justiça devem ser utilizados,quando se revelem adequados, para facilitar aconciliação e obter uma indemnização em favordas vítimas.

845. Estes meios não são propostos como alter-nativas aos procedimentos de justiça penal, tendoantes por objecto resolver os diferendos e facilitara conciliação, independentemente do curso queassuma o processo de justiça penal. Os termos«práticas de direito consuetudinário» e «práticasautóctones de justiça» dizem respeito aos proces-sos que permitem tratar os diferendos que surjamno âmbito dos mecanismos tradicionais e das rela-

ções sociais – por exemplo, na família, comunidadeou o local de trabalho. Mais uma vez, estes méto-dos não impedem o decurso normal do procedi-mento de justiça penal.

846. RESTITUIÇÃO: o parágrafo 8.o da Declaraçãodispõe que os autores de actos criminosos ou osterceiros responsáveis pelo seu comportamentodevem, se necessário, reparar de forma equitativao prejuízo causado às vítimas, às suas famílias ouàs pessoas a seu cargo. Tal reparação deve incluira restituição dos bens, uma indemnização peloprejuízo ou pelas perdas sofridas.

847. Por vezes a polícia apreende bens dos réuse retém-nos enquanto espera a conclusão doprocesso judiciário. Na medida em que a «resti-tuição de bens» constitui um aspecto importanteda restituição, parece evidente que os bensapreendidos pela polícia devem ser entreguesàs vítimas logo que possível. A necessidade dereter os bens como elemento de prova devegeralmente ser examinada pelos legisladores eespecificamente pela polícia e Ministério Pú-blico em cada caso concreto.

848. A INDEMNIZAÇÃO COMO SANÇÃO: o pará-grafo 9.o da Declaração dispõe que os Governosdevem reexaminar as respectivas práticas, regula-mentos e leis, de modo a fazer que a restituiçãoconste da sentença nos casos penais, para além dasoutras sanções penais.

849. A REABILITAÇÃO DO AMBIENTE: o pará-grafo 10.o da Declaração dispõe que em todos oscasos em que sejam causados graves danos aoambiente, a restituição deve incluir, na medidado possível, a reabilitação do ambiente, a repo-sição das infra-estruturas e a substituição dosequipamentos colectivos.

850. RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR

ACTOS DOS SEUS FUNCIONÁRIOS E AGENTES: Oparágrafo 11.o da Declaração prevê que, quandofuncionários ou outras pessoas, agindo a títulooficial ou quase oficial, tenham cometido umainfracção penal, as vítimas devem receber a res-tituição por parte do Estado cujos funcionários

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 209

Page 241: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

ou agentes sejam responsáveis pelos prejuízossofridos.

851. O direito a um recurso efectivo acima evocado,tal como se encontra enunciado no Pacto Inter-nacional sobre os Direitos Civis e Políticos, naConvenção Americana sobre os Direitos Humanose na Convenção Europeia dos Direitos do Homem(vide parágrafo 841 supra), contém uma disposi-ção nos termos da qual este direito existe mesmoquando a violação tenha sido cometida por pessoasagindo no exercício das suas funções oficiais.

852. INDEMNIZAÇÃO POR PARTE DO ESTADO: oparágrafo 12 da Declaração dos Princípios Básicosde Justiça Relativos às Vítimas da Criminalidadee de Abuso de Poder determina que os Estados sedevem esforçar por assegurar uma indemnizaçãofinanceira às vítimas que sofreram um dano cor-poral significativo no seguimento de actos crimi-nosos graves, nos casos em que não seja possívelobter uma indemnização completa junto do delin-quente ou de outras fontes. Deve ser concedida umaindemnização financeira à família ou às pessoasque se encontrem a cargo da pessoa falecida ou queforam vítimas de incapacidade física ou mental nasequência dessa vitimização.

853. FUNDOS DE INDEMNIZAÇÃO: o parágrafo 13.o

da Declaração estipula que será incentivado o esta-belecimento, o reforço e a expansão de fundosnacionais de indemnização às vítimas.

854. ASSISTÊNCIA ÀS VÍTIMAS: o parágrafo 14.o daDeclaração dispõe que as vítimas devem receber aassistência material, médica, psicológica e socialde que necessitem, através de organismos esta-tais, de voluntariado, comunitários e autóctones.

855. INFORMAÇÃO E ACESSO: o parágrafo 15.o daDeclaração estipula que as vítimas devem serinformadas da existência de serviços de saúde, deserviços sociais e de outras formas de assistênciaque lhes possam ser úteis e devem ter fácil acessoaos mesmos.

856. FORMAÇÃO: o parágrafo 16.o da Declaração dis-põe que o pessoal dos serviços de polícia, justiça

e saúde, tal como o dos serviços sociais e o deoutros serviços interessados deve receber uma for-mação que o sensibilize para as necessidades dasvítimas, bem como instruções que garantam umaajuda pronta e adequada às vítimas.

857. NECESSIDADES ESPECIAIS: o parágrafo 17.o

da Declaração dispõe que quando sejam prestadosserviços e ajuda às vítimas, deve ser dispensadaatenção àquelas que tenham necessidades especiaisem razão da natureza do prejuízo sofrido ou de fac-tores susceptíveis de prejudicá-las de uma formaou de outra.

d) Protecção das vítimas de abusos

de poder

858. DEFINIÇÃO: no parágrafo 18.o da Declaração,as «vítimas» de abusos de poder são definidascomo

pessoas que, individual ou colectivamente, tenham

sofrido prejuízos, nomeadamente um atentado à sua

integridade física ou mental, um sofrimento de

ordem moral, uma perda material, ou um grave

atentado aos seus direitos fundamentais, como con-

sequência de actos ou de omissões que, não consti-

tuindo ainda uma violação da legislação penal

nacional, representam violações das normas inter-

nacionalmente reconhecidas em matéria de direitos

do homem.

A formulação desta definição é idêntica à de víti-mas de criminalidade, enunciada no parágrafo 1.o,com a diferença que esta se refere a actos queainda não constituem uma violação da legislaçãopenal nacional, enquanto que a primeira definiçãose refere a actos ou omissões que violam essamesma legislação.

859. As «normas internacionalmente reconheci-das em matéria de direitos humanos» são enun-ciadas nas convenções, resoluções, directivas,princípios ou regras adoptados no âmbito dos sis-tema das Nações Unidas ou de organizações regio-nais. As normas relativas à aplicação da lei e dosdireitos humanos foram examinadas nos capítulosanteriores.

210 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 242: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

860. É evidente que as violações das normas inter-nacionais em matéria de direitos humanos queconstituem igualmente violações da legislaçãopenal nacional serão visadas pelas disposiçõesdesta legislação. Os parágrafos 1.o a 17.o da Decla-ração aplicam-se a estas violações.

861. NORMAS NACIONAIS E INDEMNIZAÇÃO: oparágrafo 19.o da Declaração determina que osEstados deveriam encarar a possibilidade de inser-ção de normas que proíbam os abusos de poder eque prevejam reparações às vítimas de tais abusosnas suas legislações nacionais. Entre tais repara-ções deveriam figurar, nomeadamente, a restitui-ção e a indemnização, bem como a assistência e oapoio de ordem material, médica, psicológica esocial que seja necessário.

862. ADESÃO A CONVENÇÕES: o parágrafo 20.o daDeclaração dispõe que os Estados deveriam enca-rar a possibilidade de negociar convenções inter-nacionais multilaterais em favor da protecção dosdireitos humanos.

863. LEGISLAÇÃO E PRÁTICAS: O parágrafo 21.o daDeclaração dispõe que os Estados deveriam:

a) reexaminar periodicamente a legislação e aspráticas em vigor, com vista a adaptá-las à evolu-ção das situações;b) adoptar e aplicar, se necessário, textos legis-lativos que proibissem qualquer acto que consti-tua um grave abuso de poder político oueconómico;c) incentivar as políticas e os mecanismos de pre-venção destes actos;d) estabelecer direitos e recursos apropriados efacilmente acessíveis para as vítimas de tais actos.

e) Recomendações para a aplicação

da Declaração dos Princípios Básicos

de Justiça Relativos às Vítimas

da Criminalidade e de Abuso de Poder

864. Como já vimos acima (parágrafo 833), o Con-selho Económico e Social, na sua resolução1989/57 formulou recomendações para a aplicaçãoda Declaração das Nações Unidas de 1985. A

maior parte das recomendações relacionam-secom o objectivo do presente Manual e são adianteresumidas.

865. Recomenda-se aos ESTADOS MEMBROS:

a) que adoptem e apliquem as disposições daDeclaração em conformidade com os seus proce-dimentos constitucionais e com a sua práticanacional;b) que examinem os métodos utilizados paraajuda às vítimas, incluindo a indemnização ade-quada por um prejuízo ou dano efectivamentesofrido, que identifiquem os inconvenientes queeles acarretam e os meios de os contornar, deforma a responder eficazmente às necessidades dasvítimas;c) que adoptem as medidas adequadas para pro-teger as vítimas contra abusos, calúnias ou inti-midações no decurso ou no seguimento de umprocesso penal ou de outro processo relativo aodelito, incluindo a instituição de recursos eficazes.

866. Recomenda-se aos ESTADOS MEMBROS, EM

COLABORAÇÃO COM OS SERVIÇOS, INSTITUIÇÕES

E ORGANIZAÇÕES COMPETENTES que se esforcempara:

a) encorajar o fornecimento de assistência esocorro às vítimas de criminalidade, tendo emconta os diferentes sistemas sociais, culturais ejurídicos e a experiência adquirida na utilização dosdiferentes mecanismos e métodos de prestaçãode tais serviços, bem como o estado actual dosconhecimentos sobre a vitimização;b) desenvolver uma formação apropriada detodos aqueles que prestam serviços às vítimas,com vista a permitir-lhes que adquiram compe-tências e a compreensão necessárias para ajudaras vítimas a enfrentar os efeitos psicológicos dadelinquência e a ultrapassar eventuais preconcei-tos, bem como fornecer informações factuais;c) criar meios de comunicação eficazes entretodos aqueles que se ocupam das vítimas, orga-nizar cursos e reuniões e divulgar informações,com vista a permitir-lhes evitar que o funciona-mento do sistema agrave os prejuízos sofridospelas vítimas;

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 211

Page 243: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

d) assegurar que as vítimas são informadassobre os seus direitos e possibilidades existentespara a obtenção de uma indemnização por parte dodelinquente, de um terceiro ou do Estado, bemcomo sobre o andamento dos procedimentospenais que lhes dizem respeito e as possibilidadesque podem estar envolvidas;e) quando existam mecanismos oficiosos desolução de diferendos, assegurar que os desejos esentimentos das vítimas são plenamente tidos emconsideração e que aquelas obtêm, no mínimo,as mesmas vantagens que teriam no caso de ter sidoutilizado o sistema oficial;f ) estabelecer um programa de controlo e inves-tigação que permita acompanhar constantementeas necessidades das vítimas e verificar a eficácia dosserviços que lhes são fornecidos. Este programapoderia incluir a organização regular de reuniõese conferências, por ocasião das quais os represen-tantes dos sectores competentes do sistema de jus-tiça penal e de outros organismos encarregues dadefesa dos interesses das vítimas, examinariam sea legislação existente, a prática e os serviços ofere-cidos às vítimas respondem às suas necessidades;g) desenvolver estudos, com vista a determinaras necessidades das vítimas de crimes e delitosdenunciados e oferecer-lhes os serviços apropriados.

f ) Protecção das vítimas de conflitos

867. As vítimas de conflitos têm necessidadesespeciais, as quais são reconhecidas e tomadasem conta pelos princípios e disposições do direitointernacional humanitário que protegem diferen-tes categorias de vítimas em diferentes tipos de con-flito.

868. CONFLITO ARMADO INTERNACIONAL: nestetipo de conflitos as pessoas protegidas são os feri-dos, doentes e náufragos das forças armadas nomar, os prisioneiros de guerra e as pessoas civis (pri-meira à quarta Convenções de Genebra de 1949).

869. CONFLITO ARMADO NÃO INTERNACIONAL:neste tipo de conflitos as pessoas protegidas são:

a) as pessoas que não tomem parte directa-mente nas hostilidades, incluindo os membros

das forças armadas que tenham deposto as armase as pessoas que tenham sido postas fora de com-bate por doença, ferimento, detenção ou por qual-quer outra causa (artigo 3.o comum às quatroConvenções de Genebra de 1949);b) as pessoas que não participam directamenteou que deixaram de participar nas hostilidades, querestejam privadas de liberdade ou não (Protocolo Adi-cional II às Convenções de Genebra de 1949);

870. DISTÚRBIOS E TENSÕES INTERNAS: as pes-soas protegidas nestes casos são todas aquelas quese encontram num Estado, no qual existam tensões,distúrbios e conflitos que não constituam confli-tos armados.

871. As disposições do direito internacionalhumanitário relativas aos conflitos armadosinternacionais e não internacionais não são apli-cáveis a este tipo de conflitos. No entanto, foramelaborados projectos de instrumentos (vide parágra-fos 527 a 534 supra) que enunciam as regras fun-damentais existentes, as quais decorrem dosprincípios jurídicos gerais, do direito consuetu-dinário e do direito dos tratados aplicáveis emsituações semelhantes. Remetemos para o capítuloXV do presente manual para uma exposição com-pleta dos princípios e disposições relativas ao res-peito pela aplicação da lei em período de conflito,no qual são enunciadas as normas humanitáriasaplicáveis em período de conflito armado.

872. PROTECÇÃO DAS VÍTIMAS DE CRIMINALI-DADE E DE ABUSO DE PODER: convém notar que asdisposições dos instrumentos destinados à pro-tecção deste tipo de vítimas continuam em vigorem período de conflito.

873. É evidente que em caso de perturbações gra-ves da lei e da ordem em período de guerra, podeser impossível respeitar toda a legislação nacional,incluindo aquela que se baseia na Declaração dosPrincípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimasda Criminalidade e de Abuso de Poder. Contudo,a possibilidade de vitimização com origem naactividade criminosa e abuso de poder é extrema-mente elevada em período de conflito e as medi-das de manutenção da ordem podem ser eficazes

212 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

Page 244: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 213

em tais circunstâncias. Sempre que seja possível,convém conceder uma prioridade especial à pro-tecção e assistência em favor dessas vítimas.

3. CONCLUSÕES

874. As normas enunciadas na Declaração dosPrincípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimasda Criminalidade e de Abuso de Poder e noutrosinstrumentos destinados a assegurar a protecçãodas vítimas são normas fundamentais, já que per-mitem avaliar o grau de protecção concedido àsvítimas pelos diferentes órgãos do Estado.

875. Nos casos em que estas normas são incor-poradas na legislação nacional é necessário asse-gurar a aplicação efectiva dessa legislação, atravésde diferentes medidas impostas e recomendadasnos textos acima considerados. Estas medidasdizem especialmente respeito à formação dos

profissionais, bem como à procura e troca deinformações.

876. Devem ser envidados todos os esforços paraassegurar o respeito por estas normas, desde que talnão ocorra em detrimento dos direitos dos suspei-tos. O primeiro destes direitos é, sem dúvida, a pre-sunção de inocência. Este direito, bem como outrosimportantes direitos dos suspeitos, é examinado deforma bastante detalhada nos capítulos precedentes,nomeadamente nos capítulos XI (InvestigaçõesPoliciais), XII (Captura) e XIII (Detenção).

877. Tanto a falta de conhecimento sobre os direi-tos das vítimas, como a ausência de protecção dosdireitos dos suspeitos conduzem a uma perda deconfiança na capacidade do Estado para protegeras pessoas sob a sua jurisdição. A manutençãodesta confiança é essencial para que o respeitopela aplicação da lei possa ser assegurado deforma eficaz, ética e humana.

b. Normas internacionais sobre os direitos das vítimas – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

• Informar, de forma clara e compreensível, todas as vítimas sobre a exis-tência de serviços de assistência jurídica, material, médica, psicológica e social.No caso de as vítimas o desejarem, colocá-las directamente em contactocom esses serviços.

• Manter uma lista de contactos, com todas as informações relativas aosserviços de assistência disponíveis para as vítimas.

• Explicar cuidadosamente às vítimas os seus direitos, o seu papel nos pro-cedimentos judiciários, as possibilidades de recurso, as datas e a evoluçãodos procedimentos, bem como a conclusão dos seus processos.

• Assegurar o transporte das vítimas para os serviços médicos e para os seusdomicílios, propor o controlo da segurança dos locais e patrulhar os arre-dores.

• Frequentar uma formação em matéria de assistência às vítimas.

• Guardar os processos relativos às vítimas num local seguro e preservarcuidadosamente o seu carácter confidencial. Informar as vítimas sobre asmedidas que serão tomadas para este fim.

Recomendações para todos

os agentes p0liciais

}

Page 245: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

214 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

• Logo que possível, restituir todos os bens pertencentes às vítimas após teremsido completadas as formalidades exigidas.

• Prever uma formação em matéria de assistência às vítimas para todosos funcionários.

• Estabelecer uma estreita cooperação com os organismos e programas quefornecem assistência médica, social, jurídica e outras às vítimas.

• Estabelecer grupos de assistência às vítimas compostos por polícias(homens e mulheres), membros das profissões médicas e paramédicas, tra-balhadores sociais e conselheiros, os quais possam ser rapidamente desta-cados.

• Elaborar directivas oficiais relativas à assistência às vítimas e que permitamresponder de forma rápida, adequada e completa às necessidades de assis-tência jurídica, material, médica, psicológica e social das vítimas.

• Estudar as estatísticas da criminalidade no quadro da elaboração deestratégias de prevenção, centrando-se na prevenção da revitimização.

• Encarregar os funcionários de assegurar o seguimento e facilitar os pro-cessos apresentados pelas vítimas que procuram uma indemnização e aobtenção de justiça.

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o

1

Enquanto membro de um grupo de trabalhonacional criado para o efeito, elabore uma versãopreliminar

a) do conjunto de direitos que devem ser garan-tidos às pessoas que se tornaram vítimas da cri-minalidade, com vista a ajudá-las a enfrentar as suasdificuldades imediatas;b) do conjunto de direitos que devem ser garan-tidos às vítimas da criminalidade durante operíodo que antecede o julgamento dos presumí-veis autores do crime em questão.

Uma vez que estes dois grupos de direitos estejamdefinidos, elabore um conjunto de directivas paraos funcionários policiais relativas à forma de asse-gurar o respeito e a protecção destes direitos.

Exercício n.o

2

Em conformidade com o parágrafo 16.o da Decla-ração dos Princípios Básicos de Justiça Relativos àsVítimas da Criminalidade e de Abuso de Poder, opessoal dos serviços de polícia e de outros serviçosinteressados deve receber uma formação que os sen-sibilize para as necessidades das vítimas.

Esta disposição foi na incluída Declaração, por-que se julgou que o trabalho de rotina efectuadopela polícia e outros agentes do sistema de justiçapenal enfraquecia a sensibilização dos mesmospara as necessidades das vítimas. Tal como podesuceder por os polícias serem obrigados a adqui-rir um certo desprendimento afectivo por forma apoderem enfrentar situações difíceis, ou então porterem outras prioridades (por exemplo, a preven-ção e o despiste da criminalidade) que os impeçamde conceder a assistência e protecção desejadas àsvítimas.

Recomendações

para os funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

}}

Page 246: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Enquanto membro de um grupo de trabalhonomeado pelo seu chefe, faça recomendaçõessobre os seguintes pontos:

a) meios que possam auxiliar os funcionáriospoliciais a enfrentar situações difíceis, mantendo--os porém suficientemente sensíveis em relação àsvítimas dessas situações;b) outros meios, para além da formação, comvista a sensibilizar os polícias para as necessidadesdas vítimas;c) a estrutura e conteúdo de um programa de for-mação destinado aos membros do seu serviço,com vista a sensibilizá-los para as necessidades dasvítimas e indicar-lhes quais os recursos existentesno âmbito e fora do sistema de justiça penal quepodem ser utilizados para a ajuda às vítimas.

3. TÓPICOS DE DISCUSSÃO

1). Analise três exemplos de vitimização gravede mulheres na sua sociedade e proponha méto-dos e directivas que a polícia poderia adoptar pararesponder às preocupações e às necessidades dasmulheres vítimas e para evitar uma «dupla viti-mização».

2). Para além de o Governo ter responsabilida-des em matéria de segurança dos cidadãos, acolectividade e os particulares devem igualmentecontribuir para a prevenção do crime e, destaforma igualmente da vitimização. Que medidaspodem ser tomadas pela colectividade e pelosparticulares para a prevenção do crime? Como éque a polícia pode melhorar os seus esforçosneste domínio?

3). Diversos estudos demonstraram que umaimportante percentagem dos crimes efectiva-mente cometidos não eram denunciados à polícia.Será que a polícia deve encorajar a denúncia de umamaior percentagem de crimes? Que vantagens einconvenientes é que tal poderá acarretar?

4). Que efeitos positivos é que um acréscimo noapoio e assistência da polícia às vítimas terá na pre-venção e despiste de crimes?

5). Examine os mecanismos oficiosos de solu-ção de diferendos junto das vítimas e autores decrimes, tais como a mediação, a arbitragem e as prá-ticas de direito consuetudinário existentes no seupaís. Qual a sua eficácia? Poderiam ser introduzi-dos outros mecanismos? De que forma é que a polí-cia se encontra associada a estes mecanismosoficiosos? Como é que poderemos aumentar a efi-cácia destes mecanismos?

6). A restituição de bens constitui um importanteelemento da restituição para uma vítima de cri-minalidade. No seu país, através de que meios éque as vítimas podem recuperar os bens que lheforam roubados, antes da conclusão do processoque iniciaram contra os suspeitos? De que formapoderia ser melhorado o sistema existente derestituição de bens roubados às vítimas no seupaís?

7). Tanto os suspeitos da prática de crimes, comoas vítimas da criminalidade têm direitos, sendo quealguns deles podem ser contraditórios, tais como,por exemplo, o direito do suspeito a ser libertadosob caução e o direito da vítima à segurança e a nãotemer a prática de um novo crime, ou ainda odireito do suspeito a beneficiar de tempo e meiossuficientes para preparar a sua defesa e o direitoda vítima obter justiça e a ver o seu caso rapida-mente decidido. Indique outros direitos quepodem entrar em contradição e discuta a forma deconciliar os direitos destas duas categorias de pes-soas.

8). Examine a forma de adaptar as disposições daDeclaração dos Princípios Básicos de Justiça Rela-tivos às Vítimas da Criminalidade e de Abuso dePoder às particularidades jurídicas, sociais e cul-turais do seu país. Elabore um projecto de direc-tivas, com vista a ajudar os funcionários policiaisa respeitarem estes princípios.

9). Analise a forma como as vítimas de crimina-lidade se encontram protegidas contra os abusose intimidações que podem resultar da sua partici-pação num processo penal e ainda como no seu paísé assegurada a sua segurança física. Como poderáser reforçada a protecção das vítimas a este respeito?

Grupos necessitados de protecção especial ou tratamento distinto* 215

Page 247: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

216 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional n.º 05 [ACNUDH]

10). Que organizações é que prestam assistênciaàs vítimas no seu país, tanto dentro como fora dosistema de justiça penal? Examine as relaçõesentre estas organizações e o seu serviço de polícia.Que canais de comunicação existem entre estasorganizações e a polícia e qual a melhor forma demelhorá-los? De que forma é que estas organiza-ções ajudam a polícia na sua tarefa geral de pre-venção e despiste do crime?

11). Examine os diferentes meios através dosquais a polícia poderá contribuir para os progra-mas de investigação sobre a vitimização. Na sua opi-nião, que aspectos da vitimização deverão serestudados? Como poderão ser empreendidas asinvestigações sobre estes aspectos e como é que oseu serviço poderia contribuir para a realizaçãodesse trabalho?

Page 248: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Quinta Parte 217

*QUESTÕES DE COMANDO,DIRECÇÃO E CONTROLO

Quinta parte

Page 249: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 250: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Quinta Parte 219

• Permitir que os utilizadores do manual compreendam as obrigações e res-ponsabilidades especiais em matéria de direitos humanos dos funcionáriosencarregues pelo comando e direcção da polícia, incluindo as implicaçõesem matéria de direitos humanos originadas pelo recrutamento, afectações,enquadramento, disciplina e planificação estratégica.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem desempenhar atodo o tempo as obrigações que lhes são impostas pela lei, devendo para talservir a colectividade e proteger todas as pessoas contra os actos ilegais, emconformidade com o alto grau de responsabilidade que a sua profissão exige.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei não devem cometernenhum acto de corrupção, devendo opor-se vigorosamente e combater todosos actos deste género.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem respeitar e pro-teger a dignidade humana e ainda defender e proteger os direitos huma-nos e as liberdades fundamentais de todos.

• Todo o serviço encarregue da aplicação da lei deve ser representativo dacolectividade no seu conjunto, responder às suas necessidades e ser responsávelperante a mesma.

• As políticas de recrutamento, contratação, afectação e promoção dos servi-ços de polícia devem estar isentos de qualquer forma de discriminação ilegal.

• Devem ser mantidos processos claros, completos e exactos no que diz res-peito aos inquéritos, capturas, detenções, casos de recurso à força e utili-zação de armas de fogo, assistência às vítimas e todos os aspectos daactividade da polícia.

• Deve ser proporcionada formação e instrução claras sobre todos os aspec-tos das actividades da polícia que tenham uma incidência sobre os direi-tos humanos.

Direitos Humanosnas questões de comando, direcção e organização da polícia

20

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

*capítulo

Page 251: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

220 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

• Os serviços de polícia devem instituir um vasto leque de meios que per-mitam uma utilização diferenciada da força e formar polícias com vista àutilização destes meios.

• Sempre que se verifique o recurso à força ou a utilização de uma arma defogo, o caso deve ser comunicado e examinado pelos superiores hierárquicos.

• Os superiores hierárquicos devem ser responsabilizados nos casos em que,tendo tido ou devendo ter conhecimento de que os agentes encarregues daaplicação da lei colocados sob as suas ordens cometeram um abuso, não tive-rem tomado todas as medidas à sua disposição para evitar esses abusos.

• Os polícias que se recusem executar uma ordem ilícita dos seus superio-res beneficiam de imunidade.

• As informações de carácter confidencial devem ser tratadas de forma segura.

• Todas as pessoas que se candidatem a um emprego na polícia devem pos-suir as aptidões psicológicas e físicas exigidas.

• Todos os polícias devem ser alvo de relatórios e exames contínuos e eficazes.

• A polícia deve estabelecer estratégias eficazes, legais e consentâneas comos direitos humanos, para o respeito da aplicação da lei.

• A missão da polícia na comunidade.

• Estabelecer uma colaboração entre a polícia e os membros da comuni-dade respeitadores da lei.

• Adoptar uma política e um plano de acção relativos às relações com acomunidade.

• Recrutar polícias oriundos de todos os sectores da comunidade.

• Formar agentes com vista a ensiná-los a fazer face à diversidade.

• Estabelecer programas de sensibilização e informação da população.

• Manter contactos regulares com todos os grupos da sociedade.

• Estabelecer contactos com a comunidade no âmbito das actividades nãorepressivas.

• Afectar os mesmos polícias à vigilância permanente de um bairro.

• Aumentar a participação da comunidade nas actividades de polícia e nosprogramas de segurança pública desenvolvidos a nível local.

• Associar a comunidade à identificação dos problemas e preocupações.

• Adoptar uma abordagem imaginativa na resolução de problemas, comvista a desenvolver meios de resposta aos problemas especiais da comuni-dade, incluindo tácticas e estratégias não tradicionais.

• Coordenar as políticas, estratégias e actividades com outros serviçospúblicos e organizações não governamentais.

}Notas de estratégia

}

}

Page 252: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

a. Normas internacionais sobre comando,gestão e organização policial – Informaçãopara as apresentações

1. INTRODUÇÃO

878. Uma das principais funções do Estado consistena manutenção da paz e da segurança dentro dassuas fronteiras. Apesar de a polícia consistir numadas formas para desempenhar esta função, os ser-viços encarregues da aplicação da lei constituemum elemento importante na governação de umEstado.

879. Outra função essencial do Estado consisteem assegurar o respeito pelas suas obrigações jurí-dicas internacionais em matéria de defesa e pro-tecção dos direitos fundamentais das pessoas quese encontram sob a sua jurisdição. Também nestecaso a polícia constitui um dos meios que permi-tem ao Estado desempenhar esta função.

880. Estas observações têm por objectivo subli-nhar a importância da função policial na admi-nistração de um Estado e, por conseguinte, aimportância de um bom comando e de uma boadirecção dos serviços de polícia.

881. As obrigações jurídicas internacionais trans-formam-se em obrigações jurídicas nacionais porvia das disposições constitucionais e legislativasadoptadas pelos Estados. Os direitos humanos sãoassim protegidos pela legislação nacional. Noentanto, a protecção eficaz dos direitos humanosimplica a intervenção do conjunto das actividadesgovernativas, incluindo a função legislativa, orça-mental, a elaboração de políticas e práticas, o esta-belecimento de estruturas e dispositivos noconjunto do aparelho de Estado e no seio dos orga-nismos públicos e instituições governamentaisdele dependentes.

882. No que concerne à função policial, a defesa eprotecção dos direitos humanos exigem que sejaprestada uma grande atenção aos diferentes aspec-tos do comando, direcção e administração dos ser-viços de polícia, bem como das modalidadesconcretas de aplicação da lei e da manutenção da

ordem. Para tal, é antes de mais necessário que apolícia seja responsabilizada e controlada. A polí-cia deve ser responsável perante o governo e, porconseguinte, perante a população por via do pro-cesso político democrático.

883. O respeito pelos direitos humanos noâmbito do exercício da função policial depende,por conseguinte, dos sistemas políticos e jurídi-cos existentes e dos agentes que asseguram ofuncionamento destes sistemas, e depende igual-mente de forma crucial dos responsáveis pelocomando e direcção dos serviços de polícia.

884. Neste capítulo examinaremos as implicaçõesda obrigação jurídica de protecção e promoção dosdireitos humanos para os agentes com responsa-bilidades de comando e direcção dos serviços depolícia.

2. ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS HUMANOS

NAS QUESTÕES DE COMANDO, DIRECÇÃO E ORGANI-

ZAÇÃO DA POLÍCIA

a) Princípios fundamentais

885. Os seguintes princípios são essenciais para quea defesa e protecção dos direitos humanos sejamasseguradas pela polícia e no âmbito do exercícioda função policial:

• respeito pela lei e sujeição à lei;• respeito pela dignidade inerente à pessoahumana;• respeito pelos direitos humanos.

886. Os serviços de polícia devem ser comandadose dirigidos de maneira consentânea com estes prin-cípios e em conformidade com o seguinte princí-pio, enunciado na resolução 34/169 da AssembleiaGeral, de 17 de Dezembro de 1979 (preâmbulo),através da qual foi adoptado o Código de Condutapara os Funcionários Responsáveis pela Aplicaçãoda Lei:

[…] todos os órgãos de aplicação da lei devem ser repre-

sentativos da comunidade no seu conjunto, responder

às suas necessidades e ser responsáveis perante ela.

Questões de comando, direcção e controlo* 221

Page 253: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

222 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

887. Finalmente, os serviços de polícia devem sercomandados e dirigidos em conformidade com oprincípio da responsabilidade, o que significa queos funcionários de polícia devem ser pessoal-mente responsáveis perante a lei pelos seus pró-prios actos ou omissões.

b) Implicações de certas disposições

em matéria de direitos humanos

nas questões de comando, direcção

e controlo da polícia

888. Para que a função policial seja exercida em con-formidade com as normas em matéria de direitoshumanos e com os padrões de humanidade, os prin-cípios acima enunciados devem ser tidos em contaaquando da determinação ou revisão:

a) dos fins e objectivos;b) das normas de ética;c) dos planos e políticas estratégicas

de qualquer organização de polícia. Estes dife-rentes aspectos do comando e direcção são adianteexaminados separadamente.

889. Por outro lado, certos instrumentos em maté-ria de direitos humanos contêm disposições quedizem mais especificamente respeito ao comandoe direcção das organizações policiais. Estas dispo-sições são examinadas sob os títulos «Sistemaspara o comando, direcção e controlo», «Recruta-mento» e «Formação».

c) Fins e objectivos de uma organização

policial

890. Tendo em conta:

a) a importância do papel da polícia na admi-nistração de um Estado;b) o direito de toda a pessoa de participar nadirecção dos assuntos públicos, tanto directa-mente como através de representantes, tal como éconsagrado na Declaração Universal dos Direitosdo Homem (artigo 21.o), no Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos (artigo 25.o), naCarta Africana sobre os Direitos do Homem e dos

Povos (artigo 13.o), na Convenção Americana sobreDireitos Humanos (artigo 23.o) e o Protocolo n.o 1à Convenção Europeia sobre os Direitos doHomem (artigo 3.o).c) todos os princípios fundamentais acimaenunciados, em especial o princípio de que a polí-cia deve responder às necessidades da colectividadeno seu conjunto e ser responsável perante ela (videparágrafo 886), os fins e objectivos de cada orga-nização policial devem ser clara e publicamenteenunciados e incluir a protecção e promoção dosdireitos humanos.

891. Os fins e objectivos de uma organização poli-cial podem ser enunciados em termos genéricos,como consistindo:

a) na prevenção e despiste do crime;b) na manutenção da ordem pública;c) na entrega de assistência humanitária deemergência a todos os que dela necessitem;d) na defesa e protecção dos direitos humanos.

892. Os responsáveis pelo comando e direcção dosserviços encarregues da aplicação da lei devemestabelecer e publicar uma declaração de objectivosadaptada à situação particular do seu serviço. Cer-tos serviços poderão, por exemplo, especializar-senum único aspecto, como o despiste do crime,sendo vários serviços confrontados com situaçõesque necessitem ser especificamente identificadasnas declarações de objectivos.

893. Independentemente das funções especí-ficas de uma serviço de polícia e da sua situaçãoparticular, a defesa e protecção dos direitoshumanos devem estar sempre inscritas na suadeclaração de objectivos. Para facilitar a partici-pação e representação da população e contribuirpara que a polícia responda às necessidades dacolectividade, e seja perante aquela responsá-vel, as declarações de objectivos devem ser tor-nadas públicas.

d) Ética profissional

894. Todos os cidadãos de um Estado, incluindo osresponsáveis pela aplicação da lei, encontram-se

Page 254: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

sujeitos à lei desse Estado. É essencial para adefesa e protecção dos direitos humanos que os fun-cionários policiais estejam pessoalmente sujeitosà lei em relação aos seus actos ou omissões.

895. Um grande número de agentes encarreguesda aplicação da lei, para além de estarem sujeitosà lei, encontram-se igualmente submetidos àsregras e sanções de códigos, tais como os códigosde disciplina aplicáveis no seio dos serviços encar-regues da aplicação da lei e unicamente aos mem-bros desses serviços. A existência de tais códigosnão significa que os funcionários policiais nãodevam estar sujeitos à lei do Estado, já que a suaresponsabilidade perante ela é da mais altaimportância.

896. Contudo, no exercício das suas funções, ospolícias

a) devem resolver dilemas morais;b) devem fazer face a situações em relação àsquais pensam poder violar a lei, para a obtençãode resultados;c) estão submetidos a influências corruptíveis.

Por todas estas razões é muito importante queas normas gerais de ética dos serviços respon-sáveis pela aplicação da lei sejam do mais altonível e claramente entendidos e aceites portodos os agentes.

897. Nos casos em que as normas de ética pro-fissional são de alto nível, os polícias estão emmelhores condições para resolver os problemasmorais e de resistir às tentações de ilegalidadee corrupção. O estabelecimento e manutenção deum alto nível de ética profissional no seio dosorganismos policiais constituem assim uma dastarefas primordiais dos responsáveis pelocomando e direcção da polícia. Esta tarefa podeser desempenhada de diversas formas, nomea-damente:

a) dando o exemplo, através de uma boa práticade direcção e comando;b) assegurando que todos os polícias estão sujei-tos à lei e a qualquer código de disciplina interna;

c) enunciando as normas éticas num código deconduta.

898. Esse código de normas éticas:

a) não deve prever sanções, já que estas seencontram consagradas na lei e nos códigos dis-ciplinares;b) deve enumerar valores éticos e relacioná-loscom os fins e objectivos da organização;c) deve conter directivas de natureza ética tendoexplicitamente em consideração os dilemasmorais e tentações específicas que a polícia deveenfrentar.

899. Tendo em conta todos os princípios funda-mentais acima definidos, em particular os prin-cípios relativos ao respeito pela dignidadehumana e pelos direitos humanos, bem como o princípio nos termos do qual a polícia deveresponder às necessidades do conjunto da colec-tividade e responder perante ela (vide parágra-fos 885 e 886):

a) a necessidade de defender e proteger os direi-tos humanos deve ser expressamente consagradano código;b) o código de normas éticas deve ser tornadopúblico.

900. As normas enunciadas numa declaração devalores éticos ou num código de conduta devem seraceites e reconhecidas como válidas para todos osseus destinatários. Para assegurar que tal ocorra,pode-se nomeadamente:

a) associar todos os membros da organizaçãopolicial à elaboração ou revisão do código, atravésde um processo de consultas;b) exigir que os candidatos a um emprego naorganização conheçam e aceitem formalmente ocódigo;c) apresentar o código, bem como os seus objec-tivos, no âmbito dos programas de formação.

901. Convém notar que os textos que enunciamnormas em matéria de direitos humanos e normashumanitárias, nomeadamente os textos que dizem

Questões de comando, direcção e controlo* 223

Page 255: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

directamente respeito à aplicação da lei, consti-tuem ricas fontes de referência para a elaboraçãode códigos de ética.

e) Planificação estratégica e elaboração de

políticas

902. A planificação estratégica e elaboração depolíticas implicam a formulação de planos a longotermo e orientações gerais que permitam a reali-zação dos fins e objectivos da organização policial.Tendo em conta os princípios de:a) respeito e sujeição à lei;b) respeito pela dignidade inerente à pessoahumana;c) respeito pelos direitos humanos,

é essencial que esses planos e orientações satisfa-çam as normas éticas da organização, as quaisforam elaboradas em conformidade com os prin-cípios acima mencionados e outros princípios fun-damentais.

903. Aquando da planificação estratégica e elabo-ração das políticas devem ser consideradas diver-sas questões, tais como:

a) a situação política, económica e social actualdo país;b) os níveis e formas de criminalidade actuais eprevistos;c) os níveis e formas de desordem pública actuaise previstos;d) a política e as orientações do governo sobretodas as questões relativas à polícia;e) as alterações constitucionais e legislativasprevistas, no que concerne às forças de manuten-ção da ordem;f ) as inovações tecnológicas aplicáveis à funçãopolicial;g) as preocupações e expectativas sentidas pelapopulação.

904. A necessidade de defender e proteger osdireitos humanos exige que os responsáveis pelocomando e direcção das organizações policiaisassegurem, não só que os planos e políticas sejamconsentâneos com os valores éticos da organização,

mas também que aqueles incluam consideraçõesrelativas a direitos humanos nas declarações deestratégia e política. Por exemplo:

a) A estratégia e política de prevenção e des-piste do crime poderiam fazer referência às nor-mas de ética relativas aos inquéritos de políciadecorrentes das normas internacionais em maté-ria de direitos humanos;b) Poderia ser elaborado um plano a longo termopara melhorar as competências na realização deinterrogatórios no seio da organização;c) A estratégia e política destinadas a enfrentaros distúrbios civis poderiam fazer uma referênciaexpressa aos princípios de necessidade e propor-cionalidade na utilização da força;d) Poderia ser elaborado um plano a longotermo para melhorar as competências técnicasque permitam fazer face aos distúrbios civis comeficácia e humanidade.

905. Sempre que possível, devem ser associadostodos os membros da organização à elaboraçãode planos e políticas através de consultas, comvista a:

a) dar melhor a conhecer esses planos e políti-cas;b) melhorar a sua aceitação;c) aumentar as suas possibilidades de realização.

906. Em conformidade com o princípio da res-ponsabilidade da polícia perante a colectivi-dade, convém ponderar a possibilidade detornar públicos os planos estratégicos e as polí-ticas. Na medida em que estas questões nãoafectem a táctica da organização, as actividadesoperacionais da polícia não serão postas emperigo.

907. Nos últimos anos, os serviços de polícia nomundo inteiro decidiram adoptar as chamadas«estratégias de policiamento comunitário», como objectivo de reforçar a colaboração entre a polí-cia e a população local. Certas ideias sobre asquais assentam estas estratégias são expostas na«Nota estratégica» que se encontra no início destecapítulo.

224 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 256: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

f ) Sistemas de comando, direcção

e controlo

908. A necessidade de estabelecer, gerir e avaliaros sistemas para o comando, direcção e controlodos serviços encarregues da aplicação da leidecorre de disposições precisas enunciadas emdiversos instrumentos em matéria de direitoshumanos. Esta necessidade, tal como o demons-tram os diferentes exemplos extraídos de capítu-los anteriores, é simultaneamente explícita eimplícita.

[i] Sensibilidade e responsabilidade

da polícia

909. A necessidade de a polícia responder àsnecessidades da colectividade e de ser responsávelperante esta, constitui um princípio essencial parao comando e direcção das organizações de polícia,o qual decorre da resolução 34/169 da AssembleiaGeral, através da qual foi adoptado o Código de Con-duta para os Funcionários Responsáveis pela Apli-cação da Lei (vide parágrafo 886 supra).

910. Tal como é referido no capítulo IX do presentemanual (A Missão da Polícia nas Democracias):

A polícia pode RESPONDER ÀS NECESSIDADES DA

COLECTIVIDADE:

a) tendo em consideração os desejos da populaçãoquanto aos meios através dos quais são desempe-nhadas as tarefas gerais da polícia em matéria deprevenção e despiste do crime e de manutenção daordem pública;b) através do exame das expectativas e necessi-dades específicas da população a todo o momentoe em qualquer localidade.

A POLÍCIA PODE SER RESPONSÁVEL perante acolectividade:

a) de forma institucional – por via da lei e dosprocessos democráticos;b) de forma não institucional – localmente, porexemplo, através de grupos que estabeleçam a liga-ção entre a polícia e os cidadãos.

Tal significa que os responsáveis pelo comando edirecção da polícia devem estabelecer e gerir, no seiodos serviços encarregues da aplicação da lei, sis-temas que permitam:

a) que a polícia seja jurídica e politicamente res-ponsável – por exemplo, através de sistemas ade-quados para a elaboração de relatórios e processosque possam ser consultados por pessoas exterio-res ao serviço;b) a comunicação entre a polícia e a populaçãolocal.

[ii] Direitos humanos e investigações policiais

911. O direito a um processo equitativo e o trata-mento das fontes de informações confidenciais,encontram-se entre as questões examinadas nocapítulo XI do presente manual (InvestigaçõesPoliciais).

912. A maneira como as provas são reunidas pelapolícia e apresentadas às autoridades de instruçãoe aos tribunais é essencial para a protecção dodireito a um processo equitativo. Tal pressupõe aexistência de sistemas internos de controlo e super-visão eficazes, que permitam assegurar a regulari-dade da conduta dos investigadores a este respeito.

913. Uma das garantias mínimas necessárias parao desenvolvimento de um processo equitativo con-siste no direito a ser julgado sem um atraso exces-sivo, do qual decorre a necessidade de os sistemasde supervisão estabelecidos no seio das organiza-ções policiais garantirem que as investigações sãorealizadas e concluídas tão rápida e eficazmentequanto possível.

914. A boa gestão das fontes de informação con-fidenciais é extremamente importante para a efi-cácia do papel da polícia e para a protecção dosdireitos humanos. A importância de uma políticabem definida e de regras e procedimentos regu-lamentares rígidos neste domínio é salientada nocapítulo XI. Nesse capítulo são igualmente indicadasalgumas das questões que deverão ser tomadasem conta aquando da elaboração destas regras eprocedimentos regulamentares.

Questões de comando, direcção e controlo* 225

Page 257: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

915. Os funcionários com responsabilidades decomando e supervisão nos serviços encarregues daaplicação da lei devem estabelecer sistemas degestão das fontes de informação confidenciais quepermitam:

a) explorar da melhor forma as fontes de infor-mação sobre a criminalidade;b) limitar ao máximo os riscos de corrupção e deviolação dos direitos humanos no seio da polícia.

[iii] Direitos humanos e captura

916. São examinados no capítulo XII do presentemanual (Capturas) os procedimentos a seguir emcaso de captura, devendo-se nomeadamente:

a) indicar as circunstâncias da captura (dia e horada captura, hora de chegada ao local de detenção,identidade do agente de polícia envolvido, etc.);b) informar a pessoa capturada sobre os seus direitos;c) trazer rapidamente toda a pessoa capturadapela prática de uma infracção penal perante um juizou outra autoridade judiciária.

Devem ser sempre estabelecidos e aplicados sis-temas que permitam o respeito pelos procedi-mentos.

[iv] Direitos humanos no período de detenção

917. Uma das questões examinadas no capí-tulo XIII (Detenção) diz respeito às medidas des-tinadas a prevenir a tortura e os maus tratados dosdetidos. A Declaração contra a Tortura dispõeque todos os Estados devem exercer uma vigilânciasistemática em relação às práticas e métodos deinterrogatório, bem como em relação às disposi-ções relativas à guarda e tratamento dos detidos(artigo 6.o). É impossível que um Estado se con-forme a esta dupla exigência sem estabelecer sis-temas apropriados para o comando, direcção eenquadramento.

918. Para além dos dispositivos de controlo exter-no, devem ser ainda instituídos sistemas para ocontrolo dos serviços de polícia. Para além de pre-venir a tortura e os maus tratos, estes sistemas

podem apresentar outras vantagens, nomeada-mente:

a) permitir aumentar a eficácia dos métodos deinterrogatório considerados éticos;b) promover de forma geral a noção de umpapel ético da polícia no seio da organização.

919. No capítulo XIII são igualmente examinadasas disposições gerais existentes no que diz res-peito ao tratamento humano dos detidos, deter-minando uma dessas disposições que ascondições do interrogatório (duração dos interro-gatórios, intervalos entre os interrogatórios, iden-tidade dos agentes implicados, etc.) devem serregistadas. Mais uma vez esta exigência dependeda existência de sistemas eficazes no seio dos ser-viços de polícia.

[v] Direitos humanos e utilização da força

pela polícia

920. A questão da utilização de armas de fogo pelapolícia é examinada no capítulo XIV (Utilização daForça e de Armas de Fogo), no qual é indicado queos Princípios Básicos sobre a Utilização da Forçae de Armas de Fogo pelos Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei exigem:

a) a regulamentação do controlo, armazena-mento e distribuição de armas de fogo;b) a instituição de um sistema de relatórios deocorrência, sempre que os funcionários respon-sáveis pela aplicação da lei utilizem armas de fogono exercício das suas funções;c) prever processos para a elaboração de relató-rios e inquéritos que possam ser invocados noscasos em que a utilização da força ou de armas defogo pela polícia cause ferimentos ou a morte.

921. Outra questão considerada no capítulo XIVprende-se com a utilização da força e as execuçõesextrajudiciais. Em conformidade com os Princí-pios relativos a uma Prevenção Eficaz e à Investi-gação das Execuções Extrajudiciais, Arbitrárias eSumárias, deve ser exercido um controlo rigorosoem relação a todos os funcionários responsáveispela captura e detenção, bem como em relação a

226 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 258: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

todos os funcionários autorizados a empregar aforça e utilizar armas de fogo.

922. As disposições dos dois instrumentos acimamencionados só poderão ser respeitadas se, noseio dos serviços encarregues da aplicação da lei,existirem sistemas adequados e se esses sistemasforem aplicados e controlados.

923. A necessidade de sistemas e estruturas decorrede outras disposições especiais enunciadas em ins-trumentos em matéria de direitos humanos. A maio-ria dos serviços encarregues da aplicação da leiinstituíram a totalidade ou parte dos sistemas neces-sários. Contudo, continuam a verificar-se violações dosdireitos humanos, devido a imperfeições nesses sis-temas, o que significa que os responsáveis pelo comandoe direcção da polícia devem examiná-los permanen-temente a fim de assegurar a respectiva eficácia.

g) Recrutamento

924. As políticas e práticas em matéria de recruta-mento pelos serviços encarregues da aplicação dalei devem ter em conta as considerações seguintes,já invocadas nos capítulos anteriores deste manual:

[i] Direitos humanos, polícia e não discriminação

925. Uma das questões examinadas no capítulo X(Polícia e Não Discriminação) consiste no direitode aceder às funções públicas em condições deigualdade. Este direito encontra-se protegido porconvenções internacionais e regionais e significaque todos os cidadãos que preencham as condiçõesexigidas e que o desejem devem poder aceder e par-ticipar na função policial. Ninguém poderá serexcluído unicamente por razões, como a raça, cor,sexo ou religião, devendo as únicas consideraçõesa ter em conta para fins de recrutamento ser aqualidade e competências pessoais dos candidatose o número de vagas a preencher no serviço.

[ii] Os direitos humanos e a missão da polícia nas

democracias

926. Outra questão examinada no capítulo IX (OPapel da Polícia numa Sociedade Democrática)

diz respeito à representatividade da polícia, a qualse encontra prevista na resolução 34/169 de 17 deDezembro de 1979 da Assembleia Geral (preâm-bulo), através da qual foi adoptado o Código de Con-duta para os Responsáveis pela Aplicação da Lei.Encontra-se aí concretamente estipulado que todoo serviço encarregue da aplicação da lei deve serrepresentativo do conjunto da colectividade, o quesignifica que os responsáveis pelo comando edirecção da polícia devem assegurar que o pes-soal do seu serviço é suficientemente representa-tivo da população local.

927. Os grupos minoritários devem estar devida-mente representados no seio dos serviços de polí-cia, devendo aí poder fazer carreira.

h) Formação

928. Os responsáveis pelo comando e direcçãoda polícia têm explicitamente o dever de assegu-rar que os membros do seu serviço recebem a for-mação necessária para desempenhar todas assuas funções.

929. Tendo em conta os princípios fundamentaisde:a) respeito e sujeição à lei;b) respeito pela dignidade inerente à pessoahumana;c) respeito pelos direitos humanos,é essencial que todos os agentes policiais tenhamconhecimento das disposições da legislaçãonacional, bem como as normas internacionaisdestinadas a garantir os direitos humanos. Talencontra-se previsto nos Princípios Orientadorespara a Aplicação Efectiva do Código de Condutapara os Funcionários Responsáveis pela Aplicaçãoda Lei, adoptados pelo Conselho Económico eSocial, através da sua resolução 1989/61, de 24 deMaio de 1989, os quais dispõem que (secção I.A.,parágrafo 4):

Os Governos devem adoptar as medidas necessá-rias para que os funcionários responsáveis pelaaplicação da lei recebam instrução, no âmbito daformação de base e de todos os cursos posterioresde formação e de aperfeiçoamento sobre as dis-

Questões de comando, direcção e controlo* 227

Page 259: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

posições da legislação nacional relativas ao Códigoassim como outros textos básicos sobre a questãodos direitos do homem.

930. A necessidade de proteger e promover osdireitos humanos significa igualmente que apolícia deve receber formação sobre a aplicaçãoprática das normas em matéria de direitoshumanos e das normas humanitárias, isto é,deve receber orientações sobre a forma dedesempenhar as suas funções em conformidadecom essas normas.

931. Certos textos que enunciam as normas inter-nacionais fazem uma referência expressa à for-mação, tal como é indicado infra.

[i] Utilização da força

932. Os Princípios Básicos sobre a Utilização daForça e de Armas de Fogo pelos Funcionários Res-ponsáveis pela Aplicação da Lei exigem que:

a) seja assegurada uma « formação profissionalcontínua e completa» a todos os funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei (princípio 18.o);b) os funcionários responsáveis pela aplicação dalei recebam uma formação « de acordo com nor-mas de avaliação adequadas sobre a utilização daforça» (princípio 19.o);c) que os funcionários responsáveis pela apli-cação da lei obrigados a usar armas de fogo sósejam autorizados a fazê-lo «após terem recebidoformação especial para a sua utilização» (princí-pio 19.o);d) que, aquando da formação dos responsáveispela aplicação da lei, seja prestada uma atençãoespecial «às questões de ética policial e de direitoshumanos, em particular no âmbito da investigação,aos meios de evitar a utilização da força ou dearmas de fogo, incluindo a resolução pacífica deconflitos, ao conhecimento do comportamento demultidões e aos métodos de persuasão, de nego-ciação e mediação, bem como aos meios técnicos,tendo em vista limitar a utilização da força ou dearmas de fogo» (princípio 20.o);e) que os programas de formação sejam revistosem função de incidentes concretos (princípio 20.o).

933. Os Princípios relativos a uma Prevenção Efi-caz e à Invesgação das Execuções Extrajudiciais,Arbitrárias e Sumárias determinam (princípio 3.o):

a) que os poderes públicos devem proibir as ordensde superiores hierárquicos ou de serviços oficiais queautorizem ou incitem outras pessoas a proceder aexecuções extrajudiciais, arbitrárias ou sumárias;b) que todas as pessoas têm o direito e dever arecusar a execução dessas ordens;c) que a formação dos funcionários responsáveis pelaaplicação da lei deve insistir sobre estas disposições.

[ii] Tratamento dos detidos

934. A Declaração contra a Tortura prevê que, naformação do pessoal encarregue da aplicação da lei,se assegure que é plenamente tida em conta aproibição de tortura e outros tratamentos cruéis,desumanos ou degradantes (artigo 5.o).

935. A Convenção contra a Tortura dispõe que oensino e formação sobre a proibição da torturadevem ser parte integrante da formação do pessoalencarregue da aplicação da lei (artigo 10.o).

[iii] Conflito armado e distúrbios internos

936. Cada uma das quatro Convenções de Genebra de1949 contém um artigo determinando que os EstadosPartes se comprometem a difundir o texto da Con-venção e a incorporar o seu estudo nos programas deinstrução militar e civil. É evidente que estas disposi-ções se revestem de grande importância para a formaçãodos membros da polícia, os quais podem ser chama-dos a combater em conflitos armados internacionais.

937. A quarta Convenção de Genebra, sobre a Pro-tecção de Pessoas Civis em Tempo de Guerra esti-pula que as autoridades de polícia que assumamresponsabilidades em relação às pessoas protegi-das «deverão especialmente incluir no seu estudo»as disposições da Convenção (artigo 144.o).

[iv] Protecção dos jovens

938. As Regras Mínimas das Nações Unidas paraa Administração da Justiça de Menores dispõem que

228 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 260: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

os agentes policiais « os polícias que se ocupam fre-quentemente, ou exclusivamente, de jovens ouque se dedicam essencialmente à prevenção dadelinquência juvenil» devem receber uma instru-ção e uma formação especiais (regra 12).

[v] Protecção das vítimas e sua indemnização

939. A Declaração dos Princípios Básicos de Jus-tiça Relativos às Vítimas da Criminalidade e deAbuso de Poder determina que o pessoal dos ser-viços de polícia e dos outros serviços interessadosdeve receber uma formação que o sensibilize paraas necessidades das vítimas, bem como instru-ções que garantam uma ajuda pronta e adequadaàs vítimas (parágrafo 16).

940. Todas as disposições acima mencionadas quese referem expressamente à formação dizem res-peito a importantes domínios da actividade dapolícia e devem ser tidas em conta aquando daelaboração das políticas de formação e ser con-cretizadas nas acções práticas de formação.

3. CONCLUSÕES

941. Alguns dos aspectos relativos ao comando edirecção da polícia considerados no presente capí-tulo contêm elementos necessários ao bom exer-cício das funções operacionais de um serviçoencarregue da aplicação da lei. Cada um destesaspectos exige que os chefes de polícia apliquemcompetências múltiplas em matéria de comandoe direcção, incumbindo aos poderes públicos asse-gurar que estas competências são suficientementedesenvolvidas. Tal como sucede noutros domíniosda actividade policial considerados no presentemanual, é possível em caso de necessidade, recor-rer à competência considerável que os diversosEstados membros da ONU podem oferecer.

942. A obrigação que recai sobre os responsáveispelo comando e direcção da polícia prende-se com

a necessidade de terem plenamente em conta asimplicações das suas responsabilidades em rela-ção ao imperativo legal de defender e proteger osdireitos humanos, para que a função policial sejaexecutada de forma eficaz e em conformidadecom as normas em matéria de direitos humanose as normas humanitárias. Tal aplica-se tanto àsoperações planeadas e concertadas levadas a cabosob o controlo directo dos chefes ou superiores hie-rárquicos, como às actividades não supervisiona-das desenvolvidas por cada agente de polícia noâmbito do seu trabalho de rotina. No primeirocaso:

a) a necessidade de defender e proteger os direi-tos humanos pela polícia e no âmbito da funçãopolicial deve ser tida em consideração aquando daplanificação, preparação e execução das operaçõesde polícia;b) as reuniões organizadas para os polícias antese depois de uma operação devem fazer uma refe-rência expressa às questões que essa operaçãolevanta do ponto de vista dos direitos humanos.

No segundo caso, cada agente de polícia deveadmitir plenamente, e sem reserva, a necessidadee utilidade de respeitar os direitos humanos no exer-cício das tarefas que desempenha sem supervi-são. Esta aceitação depende dos métodos deselecção e formação dos agentes policiais, das nor-mas éticas gerais do serviço de polícia, bem comode outros aspectos do comando e direcção da polí-cia considerados neste capítulo.

943. O exercício da função policial pode ser ava-liado de múltiplas formas e de acordo com diver-sos critérios. Uma das formas de se proceder àrespectiva avaliação consiste em determinar amedida em que a função policial responde aosobjectivos gerais de garantia dos direitos huma-nos. Neste contexto, as normas internacionais emmatéria de direitos humanos e as normas inter-nacionais de direito humanitário oferecem algunscritérios.

Questões de comando, direcção e controlo* 229

Page 261: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

230 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

b. Normas internacionais sobre o comando, gestão e organização policial – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

Nota: para além destas recomendações, devem ser atentamente exa-minadas as recomendações práticas formuladas para os funcionárioscom responsabilidades de comando e supervisão no final de cadacapítulo do manual.

• Dirigir um serviço de polícia não consiste num trabalho de escritório. Sigade perto as realidades operacionais, mantenha-se atento aos sentimentose preocupações da população local e permaneça em estreito contacto comos seus subordinados.

• Elaborar um código de conduta ético de carácter voluntário para os res-ponsáveis pela aplicação da lei.

• Emitir instruções permanentes precisas e com carácter vinculativo em rela-ção ao respeito pelos direitos humanos em todos os domínios da actividadepolicial.

• Prever formação no momento da contratação e durante a formaçãocontínua de todos os membros do serviço, a qual deve realçar os aspectosdo trabalho da polícia considerados no presente manual ligados aos direi-tos humanos.

• Desenvolver sistemas de exame metódicos para os novos membros do ser-viço, bem como uma avaliação periódica do conjunto dos agentes policiais,a fim de determinar as qualidades morais necessárias para o exercício dasdiferentes funções policiais.

• Elaborar estratégias de polícia comunitárias, tal como é indicado na«Nota de estratégia» que se encontra no início do capítulo.

• Estabelecer e promover a aplicação de instruções rigorosas no que diz res-peito ao registo de factos e a elaboração de relatórios.

• Estabelecer um mecanismo acessível destinado a receber queixas de par-ticulares e assegurar que todas as queixas apresentadas são alvo de inves-tigações aturadas e dão lugar a indemnizações.

• Elaborar um plano destinado a assegurar que a composição do serviço érepresentativa do conjunto da colectividade e nomeadamente que as polí-ticas de recrutamento e enquadramento são equitativas e não discrimi-natórias.

Regra geral

para os funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

Recomendações

para os funcionários

com responsabilidades

de comando e supervisão

}

}

Page 262: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Questões de comando, direcção e controlo* 231

• Apelar à assistência técnica disponibilizada pelos programas internacio-nais e bilaterais a fim de desenvolver métodos, competências e capacida-des técnicas que permitam uma aplicação da lei adequada e eficaz.

• Estabelecer e tornar público um conjunto adequado de sanções aplicá-veis em casos de violações cometidas pela polícia, que possam ir desde asuspensão, retenção do salário e despedimento às acções penais em casode violações graves.

• Regulamentar de forma rígida o controlo, armazenamento e entrega dearmas e munições.

• Efectuar periodicamente controlos sem pré-aviso nos locais de detenção,esquadras de polícia e inspeccionar as armas e munições detidas pela polí-cia, por forma a garantir a sua conformidade com os regulamentos oficiais.

• Estabelecer laços estreitos de cooperação com outros serviços encarreguesda aplicação da lei, magistrados e procuradores, serviços médicos e sociais,serviços de urgência, meios de comunicação social e organizações locais.

• Desenvolver unidades especializadas, por forma a permitir que as ques-tões que se prendam com menores, vítimas, fenómenos de massas, esta-belecimentos de detenção para mulheres, controlos de fronteiras entreoutros sejam consideradas de um ponto de vista profissional.

2. EXERCÍCIO PRÁTICO

Exercício n.o

1

Com o objectivo de encetar uma discussão sobreo assunto, imagine que três quadros médios daindústria e comércio e três agentes policiais denível intermédio devem trocar os seus empregos,com o objectivo de alargarem a sua experiência pro-fissional.

Um dos polícias será afectado a uma grandeempresa de relações públicas, o segundo ao serviçoeditorial de um jornal nacional e o terceiro ao ser-viço de pessoal de uma sociedade petrolífera mul-tinacional.

1). Defina as tarefas de cada um dos três agen-tes policiais. Indique nomeadamente os objectivosgerais da sua afectação, as competências especiaisque podem possuir e que se poderiam revelarúteis em cada uma das três organizações, bem

como sobretudo as competências em matéria degestão e organização que os três agentes policiaispoderiam adquirir por via da sua afectação a estasdiferentes organizações.

2). Seleccione postos adequados no seio de um ser-viço de aplicação da lei para cada um dos quadrosde empresas e defina as suas funções. Estas funçõesdevem incluir a elaboração de disposições destina-das a garantir a segurança pessoal de cada indivíduo.Indique aquilo que cada um dos três quadros iráaprender no seu novo posto e mencione um aspectoconcreto da organização policial que você gostasseque fosse examinado por cada um deles, tendo emvista a formulação de recomendações.

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). Quais são os argumentos existentes a favor econtra a nomeação de um profissional de relaçõespúblicas para uma organização de polícia?

}

Page 263: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

232 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

2). Para fins de elaboração de um código de éticapara um serviço de polícia, determine os três dile-mas morais com os quais se deparam os políciasno exercício das suas funções e proponha meiospara os resolver.3). Imagine um dispositivo que permita associartodos os membros de uma grande organização depolícia à elaboração de um código de ética para essamesma organização. Que meios de consulta utili-zaria?4). No presente capítulo foram examinadosdiversos aspectos relacionados à organização edirecção da polícia, nomeadamente: fins e objec-tivos de uma organização de polícia, ética profis-sional, planeamento estratégico e elaboração depolíticas, sistemas de comando, direcção e con-trolo, recrutamento e formação. Indique outrosaspectos relativos à organização e direcção da polí-cia afectados pela obrigação de garantir os direitoshumanos e explique de que forma são afectados.5). Identifique quatro meios que permitam a umresponsável da polícia tomar conhecimento dasnecessidades e expectativas do público.6). Indique seis competências, em matéria decomando e direcção, que um superior hierárquico

deve possuir e explique como, na sua opinião, é pos-sível adquiri-las.7). Qual a diferença entre o «comando» e a«direcção»? Em que consiste a «autoridade» econstituirá ela numa qualidade que deva possuirum responsável pelo comando ou direcção?8). Determine alguns dos meios que permitema um superior hierárquico saber quais dos seussubordinados respeitam de forma geral os direitoshumanos e quais têm tendência a violá-los.9). De que forma é possível reconhecer e recom-pensar os agentes policiais que desempenham assuas funções respeitando plenamente os direitoshumanos?10). Foi proposto que os locais de polícia ondetivessem sido detidos suspeitos pudessem servisitados a todo o tempo por um comité de pes-soas com direito a um acesso imediato a cada umdos detidos. Este comité seria composto por umadvogado, uma pessoa eleita e um médico. De queforma é que uma medida desta índole contri-buiria para a garantia dos direitos humanos?Indique os argumentos que militam a favor econtra esta medida.

Page 264: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

*Quinta Parte 233

• Permitir que os utilizadores do manual compreendam a importância de pre-ver medidas rígidas para a prevenção das violações dos direitos humanos pelapolícia, nos casos em que sejam cometidas tais violações efectuar sem demorainvestigações aturadas e eficazes e prever sanções efectivas contra os culpados.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem respeitar e pro-teger a dignidade da pessoa humana e defender os direitos humanos de todos.

• Os serviços encarregues da aplicação da lei são responsáveis perante acolectividade no seu conjunto.

• Devem ser estabelecidos mecanismos eficazes para assegurar a disciplinainterna, o controlo externo, bem como a supervisão eficaz dos responsáveis pelaaplicação da lei.

• Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei que tenham razões parapensar que se verificou ou que está prestes a verificar-se uma violação dedireitos humanos devem relatar o caso.

• Devem ser estabelecidas disposições para receber e dar seguimento às quei-xas apresentadas por particulares contra responsáveis pela aplicação da lei,devendo essas disposições ser tornadas públicas.

• As investigações relativas a violações dos direitos humanos cometidas pelapolícia devem ser conduzidas de forma célere, competente, profunda eimparcial.

• As investigações devem procurar identificar as vítimas, obter e preservaras provas, encontrar as testemunhas, estabelecer a causa da violação, a forma,o local e o momento em que a violação ocorreu e ainda identificar e deteros seus autores.

• Os locais onde foram cometidas as violações devem ser cuidadosamenteexaminados.

Investigação das violações cometidas pela polícia

21

Objectivos do capítulo

}

}

Princípios fundamentais

}

*capítulo

Page 265: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

234 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

a. Normas internacionais sobre a investiga-ção de violações de direitos humanos pelapolícia – Informação para as apresentações

1. INTRODUÇÃO

944. A obrigação jurídica que recai sobre os Esta-dos no sentido de estes defenderem e protegeramos direitos fundamentais das pessoas que seencontram sob a sua jurisdição, significa queexiste uma exigência geral de investigar alegaçõesde violações de direitos humanos, visto que osdireitos humanos não se encontram protegidossempre que a sua violação não for alvo de umainvestigação.

945. Este imperativo de carácter geral é reforçadopor medidas internacionais de controlo e aplicação.Foram, por exemplo, estabelecidos procedimentose organismos no âmbito de certos instrumentos emmatéria de direitos humanos, com o objectivo decontrolar a aplicação das respectivas disposições.Sempre que estes procedimentos sejam invoca-dos, um Estado poderá ser convidado a explicar arazão pela qual não respeitou as disposições de umou outro instrumento, situação essa que poderequerer a realização de uma investigação sobreuma violação dos direitos humanos.

946. Mais concretamente, certos instrumentosem matéria de direitos humanos, contêm dispo-sições que obrigam de forma inequívoca os Esta-dos a investigar as queixas relativas a violações denormas neles enunciadas, enquanto que outrosobrigam os Estados a estabelecer mecanismos eprocedimentos que possam conduzir a investi-

gações e controlos. Estas disposições são exami-nadas de forma mais detalhada na secção 2 binfra e são próprias de instrumentos que dizemmais concretamente respeito à questão dos direi-tos humanos e à aplicação da lei, sendo impor-tante que os agentes policiais delas tenhamconhecimento.

947. Se, por um lado, não é necessário que osagentes policiais tenham um conhecimento deta-lhado dos procedimentos e organismos interna-cionais estabelecidos para controlar a forma comoos Estados defendem e protegem os direitoshumanos, parece-nos importante que aquelestenham conhecimento da existência desses orga-nismos e procedimentos. Eles serão, por isso,invocados na subsecção 2 d infra.

948. A secção 2 c diz respeito às investigações quepodem estar na origem de informação relativas adesaparecimentos forçados ou involuntários.

3. ASPECTOS GERAIS

(a) Princípios fundamentais

949. O princípio da responsabilidade reveste-se deuma importância capital para as investigaçõesrelativas a violações dos direitos humanos – no quediz respeito à responsabilidade dos serviços encar-regues da aplicação da lei perante a colectividade,através de processos políticos democráticos e da res-ponsabilização de cada membro destes serviçosperante a lei, visto que sem responsabilidade nãopoderá existir uma investigação válida.

• Os superiores hierárquicos devem ser responsabilizados nos casos em que,tendo conhecimento ou devendo ter conhecimento de que foi cometido umabuso, não tomaram todas as medidas no seu poder para o prevenir.

• Os agentes policiais que se recusem a executar uma ordem ilícita dos seussuperiores devem receber imunidade contra acções penais e sanções disci-plinares.

• A obediência a ordens superiores não poderá ser invocada como meio dedefesa em caso de violações cometidas pela polícia.}

Page 266: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

950. O segundo princípio fundamental decorre doprimeiro e exige que as investigações sejam com-pletas, rápidas e imparciais.

(b) Disposições precisas relativas

às queixas, controlo e investigações

951. O facto de as disposições relativas às queixas,controlo e investigações estarem incorporadas nosinstrumentos que consagram determinadas normasem matéria de direitos humanos aplicáveis aosfuncionários responsáveis pela aplicação da lei,demonstra a importância que a comunidade inter-nacional lhes atribui. Estas disposições são enun-ciadas de seguida em relação a cada instrumentoconcreto.

[i] Código de Código de Conduta

para os Funcionários Responsáveis

pela Aplicação da Lei

952. A resolução 34/169 da Assembleia Geral, de17 de Dezembro de 1979, através da qual foi adop-tado o Código de Conduta, dispõe (preâmbulo):

[…] que os actos dos funcionários responsáveis pela

aplicação da lei devem estar sujeitos ao escrutínio

público, exercido por uma comissão de controlo, um

ministério, um procurador-geral, pela magistratura,

por um provedor, uma comissão de cidadãos, ou por

vários destes órgãos, ou ainda por um outro organismo

de controlo.

953. O artigo 8.o do Código de Conduta dispõe oseguinte:

Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei

devem respeitar a lei e o presente Código. Devem, tam-

bém, na medida das suas possibilidades, evitar e opor-

se vigorosamente a quaisquer violações da lei ou do

Código.

Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei que

tiverem motivos para acreditar que se produziu ou irá

produzir uma violação deste Código, devem comunicar

o facto aos seus superiores e, se necessário, a outras auto-

ridades com poderes de controlo ou de reparação com-

petentes.

A alínea c do comentário ao artigo 8.o tem aseguinte redacção:

A expressão «autoridade com poderes de controlo e de

reparação competentes» refere-se a qualquer autori-

dade ou organismo existente ao abrigo da legislação

nacional, quer esteja integrado nos organismos de apli-

cação da lei quer seja independente destes, com pode-

res estatutários, consuetudinários ou outros para

examinarem reclamações e queixas resultantes de vio-

lações deste Código.

A alínea d do mesmo comentário tem o seguinteconteúdo:

Nalguns países, pode considerar-se que os meios de

comunicação social («mass media») desempenham

funções de controlo, análogas às descritas na alínea

anterior. Consequentemente, os funcionários respon-

sáveis pela aplicação da lei poderão como último

recurso e com respeito pelas leis e costumes do seu país

e pelo disposto no artigo 4.o do presente Código, levar

as violações à atenção da opinião pública através dos

meios de comunicação social.

NOTA PARA OS FORMADORES: o artigo 4.o doCódigo de Conduta estipula que as informaçõesde carácter confidencial que se encontram nopoder dos funcionários responsáveis pela aplica-ção da lei devem ser mantidas em segredo «a nãoser que o cumprimento do dever ou as necessi-dades da justiça estritamente exijam outro com-portamento».

954. O Conselho Económico e Social, atravésda resolução 1989/61, de 24 de Maio de 1989,adoptou os Princípios Orientadores para aAplicação Efectiva do Código de Conduta paraos Funcionários Responsáveis pela Aplicaçãoda Lei.

O parágrafo 3.o da secção I.B. destes Princípiosdispõe o seguinte:

Disciplina e supervisão. Devem ser estabelecidos meca-

nismos eficazes para assegurar a disciplina interna e o

controlo externo assim como a supervisão dos funcio-

nários responsáveis pela aplicação da lei.

Questões de comando, direcção e controlo* 235

Page 267: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

O parágrafo 4.o da secção I.B. dispõe que:

Queixas de particulares. Devem ser adoptadas disposi-

ções especiais, no âmbito dos mecanismos previstos pelo

parágrafo 3, para o recebimento e tramitação de quei-

xas formuladas por particulares contra os funcionários

responsáveis pela aplicação da lei, e a existência destas

disposições será dada a conhecer ao público.

955. Da conjugação destas disposições podemosconcluir que:

a) os actos dos diferentes membros do pessoaldos responsáveis pela aplicação da lei devem sercontrolados oficialmente por organismos eficazese independentes desses mesmos serviços;b) devem ser estabelecidos mecanismos disci-plinares eficazes no seio dos serviços responsáveispela aplicação da lei;c) estes organismos e mecanismos devem seracessíveis aos particulares e aos funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei que pretendam comu-nicar uma violação ou dar início a um inquérito.Todas estas disposições podem dar origem à aber-tura de inquéritos sobre as violações de direitoshumanos cometidas pela polícia.

[ii] Declaração sobre a Protecção de todas

as Pessoas contra a Tortura e outras Penas

ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes

956. Em conformidade com a Declaração contraa Tortura, toda a pessoa que alegue ter sido sujeitaa tortura tem o direito de apresentar queixa,devendo os alegados casos de tortura ser alvo deum inquérito, independentemente do facto de tersido apresentada uma queixa. Deve ser instau-rado um processo penal contra os presumíveisautores.

957. O artigo 8.o da Declaração dispõe o seguinte:

Toda a pessoa que alegue ter sido submetida a tor-

tura ou a outras penas ou tratamentos cruéis, desu-

manos ou degradantes, por um funcionário público

ou a instigação do mesmo, terá direito a que o seu

caso seja examinado imparcialmente pelas autori-

dades competentes do Estado visado.

O artigo 9.o determina que:

Sempre que haja motivos razoáveis para crer que foi

cometido um acto de tortura tal como definido no

artigo 1.o, as autoridades competentes do Estado inte-

ressado procederão oficiosamente e sem demora a uma

investigação imparcial.

O artigo 10.o determina o seguinte:

Se da investigação a que se referem os artigos 8.o ou 9.o

resultar que foi cometido um acto de tortura tal como

definido no artigo 1.o, haverá lugar a procedimeto penal

contra o suposto culpado ou culpados, em conformidade

com a legislação nacional. Se se considerar fundada

uma alegação de outras formas de penas ou tratamen-

tos cruéis, desumanos ou degradantes, o suposto cul-

pado ou culpados serão submetidos a procedimentos

penais, disciplinares ou outros procedimentos ade-

quados.

[iii] Convenção contra a Tortura e outras Penas ou

Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes

958. As disposições da Declaração contra a Torturaencontram-se desenvolvidas na Convenção, na qualé acrescentada a obrigação de indemnizar as vítimas.

959. O artigo 12.o da Convenção estipula oseguinte:

Os Estados partes deverão providenciar para que as

suas autoridades competentes procedam imediata-

mente a um rigoroso inquérito sempre que existam

motivos razoáveis para crer que um acto de tortura foi

praticado em qualquer território sob a sua jurisdição.

O artigo 13.o convenciona que:

Os Estados partes deverão garantir às pessoas que ale-

guem ter sido submetidas a tortura em qualquer terri-

tório sob a sua jurisdição o direito de apresentar queixa

perante as autoridades competentes desses Estados,

que procederão de imediato ao exame rigoroso do caso.

Deverão ser tomadas medidas para assegurar a protec-

ção do queixoso e das testemunhas contra maus tratos

ou intimidações em virtude da apresentação da queixa

ou da prestação de declarações.

236 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 268: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

O artigo 14.o dispõe que:

1). Os Estados partes deverão providenciar para que

o seu sistema jurídico garanta à vítima de um acto de

tortura o direito de obter uma reparação e de ser indem-

nizada em termos adequados, incluindo os meios

necessários à sua completa reabilitação. Em caso de

morte da vítima como consequência de um acto de tor-

tura, a indemnização reverterá a favor dos seus herdeiros.

2). O presente artigo não exclui qualquer direito a

indemnização que a vítima ou outra pessoa possam

ter por força das leis nacionais.

960. O artigo 4.o da Convenção requer que todosos actos de tortura, bem como a tentativa de come-ter tortura e a cumplicidade ou participação naprática de actos de tortura constituam infracçõesà luz do direito penal.

961. Tanto a Declaração como a Convenção contêmdisposições exigindo o início de investigações emcasos de alegada tortura ou maus por parte de res-ponsáveis pela aplicação da lei ou nos casos em quetais responsáveis sejam, de outra forma, suspeitosde estar implicados em actos de tortura.

[iv] Princípios Relativos a uma Prevenção Eficaz

e Investigação das Execuções Extrajudiciais,

Arbitrárias ou Sumárias

962. Este instrumento contém um certo númerode disposições detalhadas sobre as investigaçõesrelativas às execuções extrajudiciais, muitas deentre elas aplicáveis por analogia a outros tipos deviolações dos direitos humanos.

963. O princípio 9.o enuncia o seguinte:

Proceder-se-á a uma investigação exaustiva, imediata

e imparcial de todos os casos em que haja suspeita de

execuções extrajudiciais, arbitrárias ou sumárias,

incluindo aqueles em que as queixas de parente ou

outras informações credíveis faça pensar que se verifi-

cou uma morte não devida a causas naturais, nas refe-

ridas circunstâncias. Os Governos manterão órgãos e

procedimentos de investigação para realizar tais inqué-

ritos. A investigação terá como objectivo determinar a

causa, a forma e o momento da morte, a pessoa res-

ponsável e o procedimento ou prática susceptível de a

ter provocado. Durante a investigação será feita uma

autópsia adequada, serão recolhidas e analisadas todas

as provas materiais e documentais e serão ouvidos os

depoimentos das testemunhas. A investigação distinguirá

entre a morte por causas naturais, a morte por aci-

dente, o suicídio e o homicídio.

964. O princípio 10.o estipula que a autoridadeencarregue da investigação deverá ter todos ospoderes para obter as informações necessárias e dis-porá de todos os recursos de que necessite, porforma a desempenhar a sua tarefa conveniente-mente, devendo estar nomeadamente habilitada acitar testemunhas, incluindo os funcionários emcausa, e fazê-las prestar testemunho.

[v] Conjunto de princípios para a protecção

de todas as pessoas sujeitas a qualquer tipo

de detenção ou prisão

965. Em conformidade com o parágrafo 2.o do prin-cípio 7.o deste instrumento, os funcionários quetenham razões para crer que ocorreu ou está iminenteuma violação do Conjunto de Princípios, devemcomunicar esse facto aos seus superiores e, sendonecessário, a outras autoridades ou instâncias decontrolo ou de recurso competentes. Em conformi-dade com o parágrafo 3.o do princípio 7.o, qualqueroutra pessoa tem direito a comunicar esse facto.

966. O princípio 29.o prevê que os lugares dedetenção sejam inspeccionados regularmente porpessoas qualificadas e experientes, nomeadas poruma autoridade competente diferente da autoridadedirectamente encarregada da administração dolocal de detenção. O seu objectivo é de asseguraro respeito pelas leis e regulamento aplicáveis, esti-pulando este mesmo princípio que os detidos têmo direito de comunicar em regime de absolutaconfidencialidade com as pessoas que inspeccio-nam os lugares de detenção.

967. O princípio 33.o dispõe que:

a) a pessoa detida ou presa, ou o seu advogado,têm o direito de apresentar um pedido ou queixa rela-

Questões de comando, direcção e controlo* 237

Page 269: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

tivos ao seu tratamento perante as autoridades res-ponsáveis pela administração do local de detençãoe autoridades superiores e, se necessário, peranteautoridades competentes de controlo ou de recurso;b) no caso de a pessoa detida ou presa, ou o seuadvogado, não poderem exercer estes direitos, elespoderão ser exercidos por um membro da famíliada pessoa detida ou presa, ou por qualquer outrapessoa que tenha conhecimento do caso;c) o carácter confidencial do pedido ou daqueixa é mantido se o requerente o solicitar;d) o pedido ou queixa devem ser examinadosprontamente e devem obter uma resposta semdemora injustificada. No caso de indeferimento dopedido ou da queixa, ou em caso de demora exces-siva, o requerente tem o direito de apresentar opedido ou queixa perante uma autoridade judi-ciária ou outra.

968. As disposições de cada um dos princípiosacima enunciados podem dar origem a investiga-ções sobre as violações dos direitos humanoscometidas pelos responsáveis pela aplicação da lei.

969. O princípio 35.o prevê que os danos sofridospor actos ou omissões de um funcionário públicoque se mostrem contrários aos direitos previstosnum dos presentes princípios serão passíveis deuma indemnização.

[vi] Princípios Básicos sobre a Utilização da Força

e de Armas de Fogo pelos Funcionários

Responsáveis pela Aplicação da Lei

970. Os princípios 22.o e 23.o deste instrumentorevestem-se de interesse para este capítulo.

971. O princípio 22.o refere-se ao princípio 6.o

(nos termos do qual os funcionários responsáveispela aplicação da lei devem apresentar aos seussuperiores um relatório de ocorrência sempre queda utilização da força ou de armas de fogo pelosfuncionários responsáveis pela aplicação da leiresultem mortes ou ferimentos e ao princípio 11.o

f) (nos termos do qual convém prever um sistemade relatórios de ocorrência, sempre que os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei utili-zem armas de fogo no exercício das suas funções).

O princípio 22.o exige procedimentos adequadosde comunicação hierárquica e de inquérito para osincidentes referidos nos princípios 6.o e 11.o f).Este preceito prevê igualmente que as autoridadesindependentes possam exercer a sua jurisdiçãonas condições adequadas, no seio da Administra-ção ou do Ministério Público. Em caso de morteou lesão grave, deve ser enviado de imediato umrelatório detalhado às autoridades competentesencarregadas do inquérito administrativo ou do con-trolo judiciário.

972. O princípio 23.o dispõe que as pessoas contraas quais sejam utilizadas a força ou armas de fogoou os seus representantes autorizados devemter acesso a um processo independente, em parti-cular um processo judicial.

973. É evidente que os procedimentos exigidospor estas disposições podem dar origem a inves-tigações sobre violações de direitos humanoscometidas pela polícia.

(c) Desaparecimentos forçados

ou involuntários

974. Convém neste ponto fazer referência ao capí-tulo XII do presente manual (Captura) que examinaa questão dos desaparecimentos forçados ou invo-luntários (vide supra os parágrafos 372 e seguin-tes) e que faz nomeadamente referência ao grupode Trabalho sobre os Desaparecimentos Forçadosou Involuntários constituído pela Comissão dosDireitos do Homem em 1980.

975. O objectivo do Grupo de Trabalho consiste emajudar as famílias a obter informações sobre odestino de pessoas que lhes estejam próximas etenham desaparecido. Para tal, o Grupo de Traba-lho esforça-se por estabelecer vias de comunicaçãoentre as famílias e os governos implicados, a fimde assegurar que os casos trazidos à sua atençãosejam alvo de investigações e que sejam obtidasinformações sobre o paradeiro das pessoas desa-parecidas.

976. É evidente que as investigações sobre desa-parecimentos exigem o exame de diversos tipos de

238 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 270: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

violações dos direitos humanos, nomeadamente dasviolações dos seguintes direitos:

a) direito à vida;b) direito à liberdade e à segurança da pessoa;c) direito a um tratamento humano para os detidos.

977. Quando os agentes encarregues da aplicaçãoda lei são responsáveis por desaparecimentos for-çados ou involuntários e consequentemente porviolações dos direitos humanos, as comunicaçõesentre o Grupo de Trabalho e os governos podemconduzir à abertura de inquéritos sobre as violaçõesde direitos humanos cometidas por esses agentes.

978. O Grupo de Trabalho desempenha o seu papelsempre que é determinado o paradeiro de uma pes-soa desaparecida no seguimento de um inquérito,independentemente do facto de a pessoa estar vivaou não. A sua acção assenta no princípio de que osEstados devem assumir a responsabilidade pelasviolações de direitos humanos cometidas no seuterritório, o que significa nomeadamente quedevem investigar as alegações de violações de direi-tos humanos cometidas pelos agentes policiais.

(d) Procedimentos e organismos

internacionais estabelecidos com vista

a supervisionar o respeito pelas normas

de direitos humanos

979. Tal como foi indicado na introdução ao pre-sente capítulo, os agentes policiais não necessitamde um conhecimento profundo sobre este aspectoda questão, sendo contudo importante que estejamao corrente da existência dos mecanismos inter-nacionais encarregues de controlar o comporta-mento da polícia. Os utilizadores do manual quepretendam obter uma visão geral destes mecanis-mos e organismos deverão assim recorrer ao capí-tulo VII (Fontes, sistemas e normas de direitoshumanos relevantes no domínio da aplicação da lei).

3. CONCLUSÕES

980. A tarefa de defesa e protecção dos direitoshumanos consiste, antes de mais, numa tarefa de

âmbito nacional. Todos os Estados têm o dever de asse-gurar uma legislação adequada e uma magistraturaindependente e o respeito e observância pelos direi-tos humanos, através de instituições democráticas.Esta tarefa e este dever compreendem a obrigação deinvestigar as violações de direitos humanos.

981. Devido à natureza do papel da polícia e à vul-nerabilidade dos direitos humanos face à actividadepolicial, é altamente provável que as violações dedireitos humanos pela polícia constituam infrac-ções penais.

982. Os agentes policiais suspeitos ou acusados deterem cometido infracções que constituam violaçõesdos direitos humanos devem estar sujeitos aos pro-cedimentos normais de investigação existentes noEstado em causa. Da mesma forma, as acusaçõespenais dirigidas contra agentes policiais devem serexaminadas pela jurisdição penal normal.

983. Constituem assim fundamentos da protecçãodos direitos humanos a nível nacional a existên-cia de uma magistratura independente e de um sis-tema legislativo que funcione correctamente.Inúmeros países estabeleceram, contudo, insti-tuições que complementam o papel da magistra-tura e dos tribunais neste domínio, as quaispodem oferecer meios suplementares de investi-gação sobre as violações de direitos humanoscometidas pela polícia. Estas instituições podemser classificadas de acordo com três grandes cate-gorias:

a) comissões de direitos humanos – são esta-belecidas para assegurar a aplicação da lei e dosregulamentos que protegem os direitos humanos.Estas comissões têm igualmente competência(pela legislação ou por decreto) para receber e exa-minar queixas de particulares ou de grupos deindivíduos, controlar a política do governo emmatéria de direitos humanos e melhorar o conhe-cimento geral em matéria de direitos humanosda população;b) serviços dos provedores de justiça (ombuds-person) – estabelecidos para proteger os direitosdas pessoas que se queixam de ter sido vítimas deinjustiças por parte da administração pública. Os

Questões de comando, direcção e controlo* 239

Page 271: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

240 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

provedores de justiça são nomeados em confor-midade com a legislação, sendo-lhes atribuídascompetências para receber e examinar as queixasque digam respeito a casos de negligência porparte da administração;c) instituições especializadas – são estabeleci-das para incentivar a adopção de medidas públicase sociais em favor da protecção dos grupos vulne-ráveis e minoritários. Estas instituições são geral-mente autorizadas a examinar os casos dediscriminação contra particulares ou grupos deindivíduos.984. As estruturas e funções, bem como o alcancee natureza das responsabilidades das comissões,provedores de justiça e instituições especializadasvariam de um país para outro em matéria de

investigação de alegações de violações de direitoshumanos cometidas pela polícia.

985. Inúmeros Estados estabeleceram aindaorganismos especialmente encarregues de rece-ber queixas relativas a desvios de conduta,incluindo as violações de direitos humanoscometidas pela polícia e examinar ou requerer oexame destas queixas. Existem duas grandes van-tagens no estabelecimento destes organismos:em primeiro lugar eles permitem que se adqui-ram conhecimentos e especialização em relaçãoà investigação de queixas ou alegações contra apolícia e, em segundo lugar, constituem um sinalda importância que é atribuída a tais investiga-ções.

b. Normas internacionais sobre investigações de violações de direitos humanos pela polícia – Aplicação prática

1. MEDIDAS PRÁTICAS PARA A APLICAÇÃO DAS NORMAS INTERNACIONAIS

• Emitir instruções permanentes e precisas e prever uma formação perió-dica no que diz respeito aos direitos fundamentais de todas as pessoas quetenham contacto com a polícia. Insistir no facto de que todos os agentespoliciais têm simultaneamente o direito e o dever de desafiar as ordens ilí-citas dos seus superiores e de participar imediatamente o caso a um fun-cionário hierarquicamente superior.

• Afastar qualquer agente implicado num caso de violação dos direitos huma-nos enquanto se aguarda o resultado da investigação. No caso de, após umjulgamento, o agente ser tido como culpado devem ser-lhe impostas sançõespenais e disciplinares. No caso de o agente ser declarado inocente, o seu bomnome deve ser reabilitado e todos os seus benefícios devem ser restabelecidos.

• Publicar uma declaração de princípios clara, bem como as instruções res-pectivas, exigindo a todos os funcionários que colaborem com as comissõesde investigação independentes e internas e que lhes comuniquem todas asinformações.

• Estabelecer e aplicar de forma eficaz sanções severas em casos de impo-sição de entraves à realização de investigações internas e independentes,ou em situação de falta de cooperação.

• Controlar regularmente a eficácia da cadeia de comando no seio do ser-viço de polícia e, em caso de necessidade, adoptar rapidamente medidaspara a reforçar.

Regra geral

para os funcionários

com responsabilidade

de comando e supervisão

}

Page 272: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Questões de comando, direcção e controlo* 241

2. EXERCÍCIOS PRÁTICOS

Exercício n.o 1

A resolução 34/169 da Assembleia Geral de 17 deDezembro de 1979, através da qual foi adoptadoo Código de Conduta para os Funcionários Res-ponsáveis pela Aplicação da Lei, prevê que os actospraticados por funcionários responsáveis pela apli-cação da lei sejam sujeitos a um controlo oficial.No que diz respeito aos órgãos sugeridos para oexercício desse controlo, a Assembleia Geralindica que se pode tratar nomeadamente de umministério, de um procurador-geral ou de umcomité de cidadãos.

1). Tendo em conta o objectivo de assegurar queas violações de direitos humanos cometidas por fun-cionários da polícia são alvo de inquéritos, indiqueas vantagens e inconvenientes de cada um destesorganismos.

2). Tendo em vista uma discussão sobre a maté-ria, imagine que no seu país estão prestes a ser esta-belecidos comités locais de cidadãos, com vista acontrolar as actividades da polícia. Estes comitéstêm competência para:

a) visitar as pessoas que se encontram detidas emesquadras de polícia;b) interrogar os responsáveis da polícia sobreincidentes que indiciem uma utilização excessivada força pela polícia;c) examinar, conjuntamente com os responsáveisda polícia, os objectivos da sua missão a nível local.

Redija um conjunto de instruções e directivas des-tinado aos responsáveis da polícia local, em rela-ção a cada uma das três áreas de actividade dascomissões, com o objectivo de assegurar a maiorcooperação possível entre esses responsáveis e oscomités, sem no entanto diminuir a eficácia ope-racional da polícia.

• Estabelecer directivas claras para a elaboração de relatórios e para a reco-lha e preservação de provas, bem como de procedimentos para a protec-ção do carácter confidencial das testemunhas.

• Prever para todos os membros do serviço uma formação, tanto nomomento da sua contratação, como uma formação contínua duranteo exercício de funções, a qual insista nos aspectos do trabalho da polí-cia relacionados com os direitos humanos referidos no presentemanual.

• Desenvolver um mecanismo de exame metódico dos novos membros doserviço policial e de avaliação periódica de todos os agentes policiais, comvista a determinar as qualidades morais exigidas para o exercício das dife-rentes funções de polícia.

• Estabelecer um mecanismo acessível para receber queixas de particula-res e assegurar que as queixas apresentadas são alvo de investigações com-pletas e dão lugar a uma indemnização.

• Regulamentar de forma rígida o controlo, armazenamento e entrega dearmas e munições.

• Efectuar periodicamente controlos sem pré-aviso dos locais de deten-ção, esquadras de polícia e inspeccionar as armas e munições detidas pelapolícia, por forma a garantir que sejam conformes aos regulamentos ofi-ciais.}

Page 273: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Exercício n.o

2

O parágrafo 3.o da secção I.B. dos PrincípiosOrientadores para a Aplicação Efectiva do Códigode Conduta para os Funcionários Responsáveispela Aplicação da Lei enuncia que:

Devem ser estabelecidos mecanismos eficazespara assegurar a disciplina interna e o controloexterno assim como a supervisão dos funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei.

1). Quais são os diferentes mecanismos que per-mitem assegurar

a) a disciplina interna;b) o controlo externo

de um serviço responsável pela aplicação da lei?Quais são, a seu ver, os mecanismos mais eficazes?

2). Foi-lhe pedido que redigisse a versão preli-minar do capítulo de um código de disciplinainterna no qual serão definidos os actos e omissõescometidos por funcionários policiais que consti-tuirão infracções a esse código.

a) Que actos e omissões é que incluiria nessecapítulo?b) Qualificaria a «violação dos direitos huma-nos» como uma infracção especial do código, ouidentificaria os actos concretos que corresponde-riam a violações dos direitos humanos, qualifi-cando-os como infracções? Indique as razões quepresidiram à sua escolha.

3). Pediram-lhe que desse a sua opinião sobre apreparação de um estágio de formação destinadoaos mais altos funcionários da polícia recente-mente nomeados:

a) Recomendaria a inclusão de que matériasnesse estágio?b) No seu discurso de abertura, o responsável pelaescola de polícia quer sublinhar aos participantesa importância do papel dos superiores hierárqui-cos para assegurar que as funções policiais sejamexercidas de forma eficaz, em conformidade com

a lei e com humanidade. Elabore uma plano geralda sua exposição.

Exercício n.o

3

Tendo em vista uma discussão sobre o assunto, ima-gine que faz parte de um grupo de trabalho encar-regue de formular recomendações ao governosobre o estabelecimento de um sistema destinadoa garantir que as infracções penais cometidas pelapolícia, incluindo as violações de direitos humanos,serão alvo de investigações.Actualmente estas investigações são efectuadaspor um gabinete especializado, composto unica-mente por funcionários policiais. Contudo amagistratura, a classe política e os meios de comu-nicação social exprimiram a sua preocupaçãoperante o facto de as violações dos direitos huma-nos cometidas pela polícia não serem alvo deinvestigações imediatas e eficazes.

O mandato do grupo de trabalho consiste em:

Fazer recomendações ao Ministro da Administra-ção Interna a propósito do estabelecimento de umsistema de investigação sobre as alegações e quei-xas relativas a infracções penais e violações dos direi-tos humanos cometidas pela polícia, fazendo umareferência especial:

a) à necessidade de garantir que os particularestenham um fácil acesso a este sistema;b) à composição do serviço de investigação doponto de vista do perfil profissional e das qualifi-cações dos seus membros;c) aos poderes que devem ser atribuídos a esseserviço, por forma a permitir-lhe desempenhar assuas funções;d) à necessidade de conservar a confiança dopúblico e da polícia no seio do sistema.

Que recomendações faria a propósito de cada umdos pontos mencionados nas alínea a) a d)?

Exercício n.o

4

Foi constituído um comité governamental, com-posto por membros do governo, funcionários do

242 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 274: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Ministério da Administração Interna e advogadospara fazer recomendações detalhadas, tendo emvista o estabelecimento de um novo sistema parao tratamento das queixas e alegações relativas ainfracções penais e violações dos direitos humanospela polícia. Este comité publicou um relatóriopreliminar contendo as seguintes propostas:

a) todas as queixas contra a polícia e todas as ale-gações de infracções penais ou violações dedireitos humanos contra a polícia devem ser apre-sentadas pessoalmente ou por escrito numaesquadra de polícia;b) todas as queixas ou alegações recebidas atra-vés deste procedimento devem ser registadas;c) os registos de queixas e alegações contra a polí-cia devem poder ser inspeccionados a todo o momentopor juízes, magistrados, advogados dos autores dasqueixas ou das alegações, bem como pelos funcio-nários do Ministério da Administração Interna;d) todas estas queixas ou alegações devem ser exa-minadas imediatamente e de forma detalhada porpolícias especializados;e) todos estes exames devem ser controladospor um comité judicial.

O Comité governamental consultou diversos orga-nismos interessados:

a) solicitando-lhes os seus pontos de vista sobreos prováveis efeitos e eficácia de um dispositivo queassentasse nessas propostas;b) pedindo-lhes que elaborassem recomenda-ções precisas com vista a dar seguimento a essaspropostas.

Responda a estes dois pontos em nome:

a) do chefe de polícia;b) de uma organização não governamentalnacional de direitos humanos.

3. TÓPICOS PARA DISCUSSÃO

1). A alínea d) do comentário ao artigo 8.o doCódigo de Conduta para os Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei dispõe que, em certos

países, se pode considerar que os meios de comu-nicação social desempenham as funções de controloem relação aos recursos ou queixas contra os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei. Em quecircunstâncias é que lhe parece aceitável que umfuncionário de polícia comunique violações aocódigo de conduta a um jornal?

2). Que medidas poderão ser adoptadas no seiodas organizações de polícia para assegurar que osmembros das organizações comuniquem as vio-lações de direitos humanos cometidas por colegas?

3). O que poderá ser feito para assegurar à popu-lação que as investigações levadas a cabo por fun-cionários da polícia sobre actos ilegais, incluindoviolações de direitos humanos cometidos poroutros agentes policiais, são completas e rigorosas?

4). Identifique os diferentes meios que permitem dara conhecer ao público os sistemas adoptados para inves-tigar as violações de direitos humanos cometidas pelapolícia. Qual a melhor forma de tornar estes sistemasacessíveis ao público, por forma a que nada impeça aapresentação de queixas relativas a tais violações?

5). Na sua opinião parece-lhe que a polícia deveinvestigar alegações de actos ilegais, incluindo vio-lações de direitos humanos, cometidas pelos seusmembros, ou acha que estas investigações deverãoantes ser efectuadas por um organismo total-mente independente?

6). Em que circunstâncias e em que medida é queos superiores hierárquicos devem ser consideradosresponsáveis por violações de direitos humanoscometidas pelos seus subordinados?

7). Parece-lhe que a existência de sistemas deinvestigação eficazes sobre violações de direitoshumanos cometidas por agentes da polícia correo risco de levar a polícia a mostrar-se excessiva-mente prudente e menos inclinada a tomar medi-das importantes para a prevenção e despiste docrime? Em caso de resposta afirmativa, que medi-das poderão ser adoptadas pelos responsáveis dapolícia para evitar este risco sem comprometer aeficácia dos sistemas de investigação?

Questões de comando, direcção e controlo* 243

Page 275: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

244 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

8). Um governo sem legitimidade junto da popu-lação ou que dependa demasiado das forças desegurança para a sua sobrevivência poderá serlevado a não querer, ou não poder, encetar inves-tigações eficazes sobre as violações de direitoshumanos cometidas pelos funcionários responsá-veis pela aplicação da lei. Tendo em conta estasituação recomendaria o estabelecimento de umórgão internacional permanente de investigaçãocom poderes para investigar as violações de direi-tos humanos nos Estados e apresentar os presu-míveis autores dessas violações perante umtribunal penal internacional? Justifique as suasconclusões. Que factores limitariam a eficácia deum tal organismo?

9). Você tem conhecimento, através de umafonte fidedigna, que um agente de polícia que seencontra sob as suas ordens torturou uma pessoadetida, levando-a a admitir que tinha participadono assalto de um banco por ocasião do qual foimorto um guarda. Esta confissão levou à recupe-ração dos bens roubados e à detenção dos outrosassaltantes. Que medidas tomaria?

10). Em diversos países são constituídas brigadasespeciais de polícia para investigar actos de cor-rupção e outros actos criminosos cometidos pelapolícia. Como é que asseguraria a imunidade des-sas brigadas especiais à corrupção? Quem super-visiona os supervisores?

Page 276: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Anexos* 245

Principais instrumentos internacionais em matéria de aplicação da lei

Anexo I

1. DECLARAÇÃO UNIVERSAL

DOS DIREITOS DO HOMEM1

(Extractos)[…]

Artigo 3.o

Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade eà segurança pessoal.[…]

Artigo 5.o

Ninguém será submetido a tortura nem a penas outratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.[…]

Artigo 9.o

Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detidoou exilado.

Artigo 10.o

Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, aque a sua causa seja equitativa e publicamentejulgada por um tribunal independente e imparcialque decida dos seus direitos e obrigações ou dasrazões de qualquer acusação em matéria penalque contra ela seja deduzida.

Artigo 11.o

1. Toda a pessoa acusada de um acto delituosopresume-se inocente até que a sua culpabilidadefique legalmente provada no decurso de um pro-

cesso público em que todas as garantias necessá-rias de defesa lhe sejam asseguradas.

2. Ninguém será condenado por acções ouomissões que, no momento da sua prática, nãoconstituíam acto delituoso à face do direito internoou internacional. Do mesmo modo, não será infli-gida pena mais grave do que a que era aplicável nomomento em que o acto delituoso foi cometido.[…]

2. PACTO INTERNACIONAL

SOBRE OS DIREITOS CIVIS E

POLÍTICOS2

(Extractos)

[…]

Artigo 6.o

1. O direito à vida é inerente à pessoa humana.Este direito deve ser protegido pela lei: ninguémpode ser arbitrariamente privado da vida.

2. Nos países em que a pena de morte não foiabolida, uma sentença de morte só pode ser pro-nunciada para os crimes mais graves, em con-formidade com a legislação em vigor, nomomento em que o crime foi cometido e quenão deve estar em contradição com as disposiçõesdo presente Pacto nem com a Convenção para aPrevenção e a Repressão do Crime de Genocídio.Esta pena não pode ser aplicada senão em virtude

1 Adoptada pela AssembleiaGeral na sua resolução 217A (III) de 10 de Dezembrode 1948.

2 Adoptado pela AssembleiaGeral na sua resolução2200 A (XXI) de 16 deDezembro de 1966.

Page 277: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

de um juízo definitivo pronunciado por um tri-bunal competente.

3. Quando a privação da vida constitui o crimede genocídio fica entendido que nenhuma dispo-sição do presente artigo autoriza um Estado Parteno presente Pacto a derrogar de alguma maneiraqualquer obrigação assumida em virtude das dis-posições da Convenção para a Prevenção e aRepressão do Crime de Genocídio.

4. Qualquer indivíduo condenado à morte terá odireito de solicitar o perdão ou a comutação dapena. A amnistia, o perdão ou a comutação da penade morte podem ser concedidos em todos os casos.

5. Uma sentença de morte não pode ser pro-nunciada em casos de crimes cometidos por pes-soas de idade inferior a 18 anos e não pode serexecutada sobre mulheres grávidas.

6. Nenhuma disposição do presente artigo podeser invocada para retardar ou impedir a abolição dapena capital por um Estado Parte no presente Pacto.

Artigo 7.o

Ninguém será submetido à tortura nem a pena oua tratamentos cruéis, inumanos ou degradantes. Emparticular, é interdito submeter uma pessoa a umaexperiência médica ou científica sem o seu livre con-sentimento.[…]

Artigo 9.o

1. Todo o indivíduo tem direito à liberdade e àsegurança da sua pessoa. Ninguém pode serobjecto de prisão ou detenção arbitrária. Ninguémpode ser privado da sua liberdade a não ser pormotivo e em conformidade com processos pre-vistos na lei.

2. Todo o indivíduo preso será informado, nomomento da sua detenção, das razões dessa deten-ção e receberá notificação imediata de todas asacusações apresentadas contra ele.

3. Todo o indivíduo preso ou detido sob acusa-ção de uma infracção penal será prontamente con-

duzido perante um juiz ou uma outra autoridadehabilitada pela lei a exercer funções judiciárias edeverá ser julgado num prazo razoável ou libertado.A detenção prisional de pessoas aguardandojulgamento não deve ser regra geral, mas a sua liber-tação pode ser subordinada a garantir que asse-gurem a presença do interessado no julgamento emqualquer outra fase do processo e, se for casodisso, para execução da sentença.

4. Todo o indivíduo que se encontrar privadode liberdade por prisão ou detenção terá o direitode intentar um recurso perante um tribunal, a fimde que este estatua sem demora sobre a legali-dade da sua detenção e ordene a sua libertação sea detenção for ilegal.

5. Todo o indivíduo vítima de prisão ou dedetenção ilegal terá direito a compensação.[…]

Artigo 11.o

Ninguém pode ser aprisionado pela única razão deque não está em situação de executar uma obrigaçãocontratual.[…]

Artigo 14.o

1. Todos são iguais perante os tribunais de jus-tiça. Todas as pessoas têm direito a que a suacausa seja ouvida equitativa e publicamente porum tribunal competente, independente e impar-cial, estabelecido pela lei, que decidirá quer do bemfundado de qualquer acusação em matéria penaldirigida contra elas, quer das contestações sobreos seus direitos e obrigações de carácter civil. Asaudições à porta fechada podem ser determinadasdurante a totalidade ou uma parte do processo, sejano interesse dos bons costumes, da ordempública ou da segurança nacional numa socie-dade democrática, seja quando o interesse da vidaprivada das partes em causa o exija, seja ainda namedida em que o tribunal o considerar absoluta-mente necessário, quando, por motivo das cir-cunstâncias particulares do caso, a publicidadeprejudicasse os interesses da justiça; todavia qual-quer sentença pronunciada em matéria penal oucivil será publicada, salvo se o interesse dos

246 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 278: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

menores exigir que se proceda de outra forma ouse o processo respeita a diferendos matrimoniaisou à tutela de crianças.

2. Qualquer pessoa acusada de infracção penalé de direito presumida inocente até que a sua cul-pabilidade tenha sido legalmente estabelecida.

3. Qualquer pessoa acusada de uma infracçãopenal terá direito, em plena igualdade, pelo menosàs seguintes garantias:

a) A ser prontamente informada, numa línguaque ela compreenda, de modo detalhado, acerca danatureza e dos motivos da acusação apresentadacontra ela;b) A dispor do tempo e das facilidades necessáriaspara a preparação da defesa e a comunicar com umadvogado da sua escolha;c) A ser julgada sem demora excessiva;d) A estar presente no processo e a defender-se asi própria ou a ter a assistência de um defensor dasua escolha; se não tiver defensor, a ser informadado seu direito de ter um e, sempre que o interesseda justiça o exigir, a ser-lhe atribuído um defensoroficioso, a título gratuito no caso de não ter meiospara o remunerar;e) A interrogar ou fazer interrogar as testemu-nhas de acusação e a obter a comparência e ointerrogatório das testemunhas de defesa nasmesmas condições das testemunhas de acusação;f ) A fazer-se assistir gratuitamente de um intér-prete, se não compreender ou não falar a língua uti-lizada no tribunal;g) A não ser forçada a testemunhar contra si pró-pria ou a confessar-se culpada.

4. No processo aplicável às pessoas jovens a leipenal terá em conta a sua idade e o interesse queapresenta a sua reabilitação.

5. Qualquer pessoa declarada culpada de crimeterá o direito de fazer examinar por uma jurisdi-ção superior a declaração de culpabilidade e a sen-tença em conformidade com a lei.

6. Quando uma condenação penal definitiva éulteriormente anulada ou quando é concedido o

indulto, porque um facto novo ou recentemente reve-lado prova concludentemente que se produziu umerro judiciário, a pessoa que cumpriu uma pena emvirtude dessa condenação será indemnizada, em con-formidade com a lei, a menos que se prove que anão revelação em tempo útil do facto desconhe-cido lhe é imputável no todo ou em parte.

7. Ninguém pode ser julgado ou punido nova-mente por motivo de uma infracção da qual já foiabsolvido ou pela qual já foi condenado por sen-tença definitiva, em conformidade com a lei e o pro-cesso penal de cada país.

Artigo 15.o

1. Ninguém será condenado por actos ou omis-sões que não constituam um acto delituoso,segundo o direito nacional ou internacional, nomomento em que forem cometidos. Do mesmomodo não será aplicada nenhuma pena mais fortedo que aquela que era aplicável no momento em quea infracção foi cometida. Se posteriormente a estainfracção a lei prevê a aplicação de uma pena maisligeira, o delinquente deve beneficiar da alteração.

2. Nada no presente artigo se opõe ao julga-mento ou à condenação de qualquer indivíduo pormotivo de actos ou omissões que no momentoem que foram cometidos eram tidos por crimi-nosos, segundo os princípios gerais de direitoreconhecidos pela comunidade das nações.[…]

3. CÓDIGO DE CONDUTA PARA OS FUNCIO-

NÁRIOS RESPONSÁVEIS PELA APLICAÇÃO DA LEI

(Anexado à resolução 34/169 da Assembleia Geral, de 17

de Dezembro de 1979)

A ASSEMBLEIA GERAL

Considerando que um dos objectivos proclamadosna Carta das Nações Unidas é o da realização da coo-peração internacional para o desenvolvimento eencorajamento do respeito pelos direitos dohomem e das liberdades fundamentais para todos,sem distinção de raça, sexo, língua ou religião,

Anexos* 247

Page 279: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Lembrando, em particular, a Declaração Universaldos Direitos do Homem 108 e os Pactos Interna-cionais sobre os direitos do homem 109,

Lembrando igualmente a Declaração sobre a Pro-tecção de Todas as Pessoas contra a Tortura e OutrasPenas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ouDegradantes, adoptada pela Assembleia Geral na suaresolução 3452 (XXX) de 9 de Dezembro de 1975,

Consciente de que a natureza das funções de apli-cação da lei para defesa da ordem pública e aforma como essas funções são exercidas, têm umaincidência directa sobre a qualidade de vida dos indi-víduos e da sociedade no seu conjunto,

Consciente das importantes tarefas que os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei levama cabo, com diligência e dignidade, em conformi-dade com os princípios dos direitos do homem,

Consciente, no entanto, das possibilidades deabuso que o exercício destas tarefas proporciona,

Reconhecendo que a elaboração de um Código deConduta para os Funcionários Responsáveis pelaAplicação da Lei é apenas uma das várias medidasimportantes para garantir a protecção de todos osdireitos e interesses dos cidadãos servidos pelosreferidos funcionários,

Consciente de que existem outros importantesprincípios e condições prévias ao desempenhohumanitário das funções de aplicação da lei,nomeadamente:

a) Que, como qualquer órgão do sistema de jus-tiça penal, todos os órgãos de aplicação da leidevem ser representativos da comunidade no seuconjunto, responder às suas necessidades e serresponsáveis perante ela,b) Que o respeito efectivo de normas éticas pelosfuncionários responsáveis pela aplicação da lei,depende da existência de um sistema jurídico bemconcebido, aceite pela população e de carácterhumano,c) Que qualquer funcionário responsável pela apli-cação da lei é um elemento do sistema de justiça

penal, cujo objectivo consiste em prevenir o crimee lutar contra a delinquência, e que a conduta decada funcionário do sistema tem uma incidênciasobre o sistema no seu conjunto,d) Que qualquer órgão encarregado da aplicaçãoda lei, em cumprimento da primeira norma dequalquer profissão, tem o dever de autodisciplina,em plena conformidade com os princípios e nor-mas aqui previstos, e que os actos dos funcioná-rios responsáveis pela aplicação da lei devem estarsujeitos ao escrutínio público, exercido por umacomissão de controlo, um ministério, um procu-rador-geral, pela magistratura, por um provedor,uma comissão de cidadãos, ou por vários destesórgãos, ou ainda por um outro organismo de con-trolo,e) Que as normas, enquanto tais, carecem de valorprático, a menos que o seu conteúdo e significadoseja inculcado em todos os funcionários respon-sáveis pela aplicação da lei, mediante educação, for-mação e controlo,

Adopta o Código de Conduta para os FuncionáriosResponsáveis pela Aplicação da Lei, que figura emanexo à presente resolução e decide transmiti-lo aosGovernos, recomendando que encarem favoravel-mente a sua utilização no quadro da legislação eprática nacionais como conjunto de princípios quedeverão ser observados pelos funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei.[…]

ANEXO

Código de Conduta para os Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei

Artigo 1.o

Os funcionários responsáveis pela aplicação da leidevem cumprir, a todo o momento, o dever que alei lhes impõe, servindo a comunidade e pro-tegendo todas as pessoas contra actos ilegais, emconformidade com o elevado grau de responsabi-lidade que a sua profissão requer.

Comentário:a) A expressão «funcionários responsáveis pela apli-cação da lei» inclui todos os agentes da lei, quer

248 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 280: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

nomeados, quer eleitos, que exerçam poderes de polí-cia, especialmente poderes de prisão ou detenção.b) Nos países onde os poderes policiais são exer-cidos por autoridades militares, quer em uni-forme, quer não, ou por forças de segurança doEstado, a definição dos funcionários responsáveispela aplicação da lei incluirá os funcionários de taisserviços.c) O serviço à comunidade deve incluir, em parti-cular, a prestação de serviços de assistência aosmembros da comunidade que, por razões deordem pessoal, económica, social e outras emer-gências, necessitam de ajuda imediata.d) A presente disposição visa, não só todos osactos violentos, destruidores e prejudiciais, mastambém a totalidade dos actos proibidos pela legis-lação penal. É igualmente aplicável à conduta depessoas não susceptíveis de incorrerem em res-ponsabilidade criminal.

Artigo 2.o

No cumprimento do seu dever, os funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei devem respeitare proteger a dignidade humana, manter e apoiaros direitos fundamentais de todas as pessoas.

Comentário:a) Os direitos do homem emquestão são identificados e pro-tegidos pelo direito nacional einternacional. De entre os ins-trumentos internacionais rele-vantes contam-se a DeclaraçãoUniversal dos Direitos do Homem, o Pacto Inter-nacional sobre os Direitos Civis e Políticos, a Decla-ração sobre a Protecção de Todas as Pessoas contraa Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis,Desumanos ou Degradantes, a Declaração dasNações Unidas sobre a Eliminação de Todas as For-mas de Discriminação Racial, a Convenção Inter-nacional sobre a Supressão e Punição do Crime deApartheid, a Convenção sobre a Prevenção e Puni-ção do Crime de Genocídio, as Regras Mínimas parao Tratamento de Reclusos e a Convenção de Vienasobre Relações ConsularesN.T.1.b) Os comentários nacionais a esta cláusuladevem indicar as provisões regionais ou nacionaisque definem e protegem estes direitos.

Artigo 3.o

Os funcionários responsáveis pela aplicação da leisó podem empregar a força quando tal se afigureestritamente necessário e na medida exigida parao cumprimento do seu dever.

Comentário:a) Esta disposição salienta que o emprego daforça por parte dos funcionários responsáveispela aplicação da lei deve ser excepcional.Embora admita que estes funcionários possamestar autorizados a utilizar a força na medida emque tal seja razoavelmente considerado comonecessário, tendo em conta as circunstâncias,para a prevenção de um crime ou para deter ouajudar à detenção legal de delinquentes ou desuspeitos, qualquer uso da força fora deste con-texto não é permitido.b) A lei nacional restringe normalmente oemprego da força pelos funcionários responsáveispela aplicação da lei, de acordo com o princípio daproporcionalidade. Deve-se entender que tais prin-cípios nacionais de proporcionalidade devem serrespeitados na interpretação desta disposição. A pre-sente disposição não deve ser, em nenhum caso,interpretada no sentido da autorização doemprego da força em desproporção com o legítimoobjectivo a atingir.c) O emprego de armas de fogo é consideradouma medida extrema. Devem fazer-se todos osesforços no sentido de excluir a utilização dearmas de fogo, especialmente contra as crianças.Em geral, não deverão utilizar-se armas de fogo,excepto quando um suspeito ofereça resistênciaarmada, ou quando, de qualquer forma coloque emperigo vidas alheias e não haja suficientes medi-das menos extremas para o dominar ou deter.Cada vez que uma arma de fogo for disparada,deverá informar-se prontamente as autoridadescompetentes.

Artigo 4.o

As informações de natureza confidencial empoder dos funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei devem ser mantidas em segredo, a não serque o cumprimento do dever ou as necessidadesda justiça estritamente exijam outro comporta-mento.

Anexos* 249

N.T.1 Assinada a 24 de Abrilde 1963 e aprovada paraadesão pelo Decreto-Lei n.o 183/72, Diário doGoverno n.o 127, Suple-mento de 30 de Maio de1972. O instrumento de ade-são foi depositado junto doSecretário-Geral das NaçõesUnidas a 13 de Setembro de 1972.

Page 281: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Comentário:Devido à natureza dos seus deveres, os funcioná-rios responsáveis pela aplicação da lei obtêm infor-mações que podem relacionar-se com a vidaparticular de outras pessoas ou ser potencialmenteprejudiciais aos seus interesses e especialmente àsua reputação. Deve-se ter a máxima cautela na sal-vaguarda e utilização dessas informações as quaissó devem ser divulgadas no desempenho do deverou no interesse. Qualquer divulgação dessas infor-mações para outros fins é totalmente abusiva.

Artigo 5.o

Nenhum funcionário responsável pela aplicação dalei pode infligir, instigar ou tolerar qualquer actode tortura ou qualquer outra pena ou tratamentocruel, desumano ou degradante, nem invocarordens superiores ou circunstanciais excepcionais,tais como o estado de guerra ou uma ameaça à segu-rança nacional, instabilidade política interna ouqualquer outra emergência pública como justifi-cação para torturas ou outras penas ou tratamen-tos cruéis, desumanos ou degradantes.

Comentário:a) Esta proibição decorre da Declaração sobre a Pro-tecção de Todas as Pessoas contra a Tortura eoutras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanosou Degradantes, adoptada pela Assembleia Geral,de acordo com a qual:«tal acto é uma ofensa contra a dignidade humanae será condenado como uma negação aos propó-sitos da Carta das Nações Unidas e como uma vio-lação aos direitos e liberdades fundamentaisafirmados na Declaração Universal dos Direitos doHomem (e noutros instrumentos internacionaissobre os direitos do homem)».b) A Declaração define tortura da seguinte forma:«Tortura significa qualquer acto pelo qual umador violenta ou sofrimento físico ou mental éimposto intencionalmente a uma pessoa por umfuncionário público, ou por sua instigação, comobjectivos tais como obter dela ou de uma terceirapessoa informação ou confissão, puni-la por umacto que tenha cometido ou se supõe tenha come-tido, ou intimidá-la a ela ou a outras pessoas. Nãose considera tortura a dor ou sofrimento apenasresultante, inerente ou consequência de sanções

legítimas, na medida em que sejam compatíveiscom as Regras Mínimas para o Tratamento deReclusos».c) A expressão «penas ou tratamentos cruéis,desumanos ou degradantes» não foi definida pelaAssembleia Geral, mas deve ser interpretada deforma a abranger uma protecção tão ampla quantopossível contra abusos, quer físicos quer mentais.

Artigo 6.o

Os funcionários responsáveis pela aplicação da leidevem assegurar a protecção da saúde das pes-soas à sua guarda e, em especial, devem tomarmedidas imediatas para assegurar a prestação decuidados médicos sempre que tal seja necessário.

Comentário:a) «Cuidados Médicos», significando serviçosprestados por qualquer pessoal médico, incluindomédicos diplomados e paramédicos, devem serassegurados quando necessários ou solicitados.b) Embora o pessoal médico esteja geralmenteadstrito aos serviços de aplicação da lei, os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei devemtomar em consideração a opinião de tal pessoal,quando este recomendar que deve proporcionar--se à pessoa detida tratamento adequado, atravésou em colaboração com pessoal médico não ads-trito aos serviços de aplicação da lei.c) Subentende-se que os funcionários responsáveispela aplicação da lei devem assegurar também cui-dados médicos às vítimas de violação da lei ou deacidentes que dela decorram.

Artigo 7.o

Os funcionários responsáveis pela aplicação da leinão devem cometer qualquer acto de corrupção.Devem, igualmente, opor-se rigorosamente e com-bater todos os actos desta índole.

Comentário:a) Qualquer acto de corrupção, tal como qualqueroutro abuso de autoridade, é incompatível com aprofissão de funcionário responsável pela aplica-ção da lei. A lei deve ser aplicada na íntegra em rela-ção a qualquer funcionário que cometa um acto decorrupção, dado que os Governos não podemesperar aplicar a lei aos cidadãos se não puderem

250 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 282: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

ou quiserem aplicá-la aos seus próprios agentes edentro dos seus próprios organismos.b) Embora a definição de corrupção deva estarsujeita à legislação nacional, deve entender-secomo incluindo tanto a execução ou a omissãode um acto, praticada pelo responsável, nodesempenho das suas funções ou com estasrelacionado, em virtude de ofertas, promessas ouvantagens, pedidas ou aceites, como a aceitaçãoilícita destas, uma vez a acção cometida ou omi-tida.c) A expressão «acto de corrupção», anteriormentereferida, deve ser entendida no sentido de abran-ger tentativas de corrupção.

Artigo 8.o

Os funcionários responsáveis pela aplicação da leidevem respeitar a lei e o presente Código. Devem,também, na medida das suas possibilidades, evi-tar e opor-se vigorosamente a quaisquer violaçõesda lei ou do Código.

Os funcionários responsáveis pela aplicação da leique tiverem motivos para acreditar que se produ-ziu ou irá produzir uma violação deste Código,devem comunicar o facto aos seus superiores e, senecessário, a outras autoridades com poderes decontrolo ou de reparação competentes.

Comentário:a) Este Código será observado sempre que tenhasido incorporado na legislação ou na prática nacio-nais. Se a legislação ou a prática contiverem dis-posições mais limitativas do que as do actualCódigo, devem observar-se essas disposições maislimitativas.b) O presente artigo procura preservar o equi-líbrio entre a necessidade de disciplina internado organismo do qual, em larga escala, dependea segurança pública, por um lado, e a necessidadede, por outro lado, tomar medidas em caso de vio-lações dos direitos humanos básicos. Os fun-cionários responsáveis pela aplicação da leidevem informar das violações os seus superio-res hierárquicos e tomar medidas legítimas semrespeitar a via hierárquica somente quando nãohouver outros meios disponíveis ou eficazes.Subentende-se que os funcionários responsá-

veis pela aplicação da lei não devem sofrer san-ções administrativas ou de outra natureza pelofacto de terem comunicado que se produziu ouque está prestes a produzir-se uma violaçãodeste Código.c) A expressão «autoridade com poderes de con-trolo e de reparação competentes» refere-se a qual-quer autoridade ou organismo existente ao abrigoda legislação nacional, quer esteja integrado nosorganismos de aplicação da lei quer seja inde-pendente destes, com poderes estatutários, con-suetudinários ou outros para examinaremreclamações e queixas resultantes de violaçõesdeste Código.d) Nalguns países, pode considerar-se que osmeios de comunicação social («mass media»)desempenham funções de controlo, análogas às des-critas na alínea anterior. Consequentemente, osfuncionários responsáveis pela aplicação da leipoderão como último recurso e com respeito pelasleis e costumes do seu país e pelo disposto noartigo 4.o do presente Código, levar as violações àatenção da opinião pública através dos meios decomunicação social.e) Os funcionários responsáveis pela aplicação dalei que cumpram as disposições deste Códigomerecem o respeito, o total apoio e a colaboraçãoda comunidade em que exercem as suas funções,do organismo de aplicação da lei no qual serveme dos demais funcionários responsáveis pela apli-cação da lei.

4. PRINCÍPIOS BÁSICOS

SOBRE A UTILIZAÇÃO DA

FORÇA E DE ARMAS DE FOGO

PELOS FUNCIONÁRIOS RES-

PONSÁVEIS PELA APLICAÇÃO

DA LEI3

Considerando que o trabalhodos funcionários responsáveispela aplicação da lei* repre-senta um serviço social degrande importância e que, con-sequentemente, há que mantere, se necessário, aperfeiçoar, assuas condições de trabalho e o seu estatuto,

Anexos* 251

3 Adoptados pelo oitavo Con-gresso das Nações Unidas paraa prevenção do crime e trata-mento dos delinquentes, reali-zado em Havana (Cuba) de 27de Agosto a 7 de Setembro de1990.

* Nos termos do comentário aoartigo 1.o do Código de Con-duta para os responsáveis pelaaplicação da lei, a expressão«responsáveis pela aplicaçãoda lei» engloba todos os repre-sentantes da lei, que sejamdesignados ou eleitos, que exer-çam poderes de polícia e emparticular poderes de detençãoe captura.

Page 283: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Considerando que a ameaça à vida e à segurançados funcionários responsáveis pela aplicação da leideve ser considerada como uma ameaça à estabi-lidade da sociedade no seu todo,

Considerando que os funcionários responsáveis pelaaplicação da lei têm um papel essencial na protecçãodo direito à vida, à liberdade e à segurança da pes-soa, tal como garantido pela Declaração Universaldos Direitos do Homem e reafirmado no PactoInternacional sobre os Direitos Civis e Políticos,

Considerando que as Regras Mínimas para o Tra-tamento de Reclusos prevêem as circunstâncias emque os funcionários prisionais podem recorrer àforça no exercício das suas funções,

Considerando que o artigo 3.o do Código de Con-duta para os Funcionários Responsáveis pela Apli-cação da Lei dispõe que esses funcionários sópodem utilizar a força quando for estritamentenecessário e somente na medida exigida para odesempenho das suas funções,

Considerando que a reunião preparatória inter-regional do Sétimo Congresso das Nações Unidaspara a Prevenção do Crime e o Tratamento dosDelinquentes, que teve lugar em Varenna (Itália),acordou nos elementos que deveriam ser aprecia-dos, no decurso dos trabalhos ulteriores, com rela-ção às restrições à utilização da força e de armasde fogo pelos funcionários responsáveis pela apli-cação da lei,

Considerando que o Sétimo Congresso, na suaresolução 14, sublinha, nomeadamente, que a uti-lização da força e de armas de fogo pelos funcio-nários responsáveis pela aplicação da lei deve serconciliada com o respeito devido pelos Direitosdo Homem,

Considerando que o Conselho Económico eSocial, na secção IX da sua Resolução 1986/10, de21 de Maio de 1986, convidou os Estados membrosa concederem uma atenção particular, na aplicaçãodo Código, à utilização da força e de armas de fogopelos funcionários responsáveis pela aplicação dalei e que a Assembleia Geral, na sua Resolução

41/149, de 4 de Dezembro de 1986, se congratulacom esta recomendação do Conselho,

Considerando que é conveniente atender, tendo emdevida conta as exigências de segurança pessoal,ao papel dos funcionários responsáveis pela apli-cação da lei na administração da justiça, na pro-tecção do direito à vida, à liberdade e à segurançadas pessoas, bem como à responsabilidade dosmesmos na manutenção da segurança pública e dapaz social e à importância das suas qualificações,formação e conduta,

Os Governos devem ter em conta os Princípios Bási-cos a seguir enunciados, que foram formuladostendo em vista auxiliar os Estados membros agarantirem e a promoverem o verdadeiro papeldos funcionários responsáveis pela aplicação da lei,a observá-los no quadro das respectivas legislaçãoe prática nacionais e a submetê-los à atenção dosfuncionários responsáveis pela aplicação da lei,bem como de outras pessoas como os juízes, osmagistrados do Ministério Público, os advogados,os representantes do poder executivo e do poderlegislativo e o público em geral.

Disposições gerais1. Os Governos e os organismos de aplicação da leidevem adoptar e aplicar regras sobre a utilizaçãoda força e de armas de fogo contra as pessoas, porparte dos funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei. Ao elaborarem essas regras, os Governos eos organismos de aplicação da lei devem mantersob permanente avaliação as questões éticas liga-das à utilização da força e de armas de fogo.

2. Os Governos e os organismos de aplicação dalei devem desenvolver um leque de meios tãoamplo quanto possível e habilitar os funcionáriosresponsáveis pela aplicação da lei com diversostipos de armas e de munições, que permitam umautilização diferenciada da força e das armas defogo. Para o efeito, deveriam ser desenvolvidasarmas neutralizadoras não letais, para uso nassituações apropriadas, tendo em vista limitar demodo crescente o recurso a meios que possamcausar a morte ou lesões corporais. Para o mesmoefeito, deveria também ser possível dotar os fun-

252 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 284: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

cionários responsáveis pela aplicação da lei deequipamentos defensivos, tais como escudos,viseiras, coletes antibalas e veículos blindados, afim de se reduzir a necessidade de utilização dequalquer tipo de armas.

3. O desenvolvimento e utilização de armas neu-tralizadoras não letais deveria ser objecto de umaavaliação cuidadosa, a fim de reduzir ao mínimoos riscos com relação a terceiros, e a utilizaçãodessas armas deveria ser submetida a um con-trolo estrito.

4. Os funcionários responsáveis pela aplicação dalei, no exercício das suas funções, devem, namedida do possível, recorrer a meios não violen-tos antes de utilizarem a força ou armas de fogo.Só poderão recorrer à força ou a armas de fogo seoutros meios se mostrarem ineficazes ou não per-mitirem alcançar o resultado desejado.

5. Sempre que o uso legítimo da força ou de armasde fogo seja indispensável, os funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei devem:

a) Utilizá-las com moderação e a sua acção deveser proporcional à gravidade da infracção e aoobjectivo legítimo a alcançar;b) Esforçar-se por reduzirem ao mínimo os danose lesões e respeitarem e preservarem a vida humana;c) Assegurar a prestação de assistência e socorrosmédicos às pessoas feridas ou afectadas, tão rapi-damente quanto possível;d) Assegurar a comunicação da ocorrência à famí-lia ou pessoas próximas da pessoa ferida ou afec-tada, tão rapidamente quanto possível.

6. Sempre que da utilização da força ou de armasde fogo pelos funcionários responsáveis pela apli-cação da lei resultem lesões ou a morte, os res-ponsáveis farão um relatório da ocorrência aosseus superiores, de acordo com o princípio 22.

7. Os Governos devem garantir que a utilização arbi-trária ou abusiva da força ou de armas de fogopelos funcionários responsáveis pela aplicação dalei seja punida como infracção penal, nos termosda legislação nacional.

8. Nenhuma circunstância excepcional, tal comoa instabilidade política interna ou o estado deemergência, pode ser invocada para justificar umaderrogação dos presentes Princípios Básicos.

Disposições especiais9. Os funcionários responsáveis pela aplicação dalei não devem fazer uso de armas de fogo contrapessoas, salvo em caso de legítima defesa, defesade terceiros contra perigo iminente de morte oulesão grave, para prevenir um crime particular-mente grave que ameace vidas humanas, para pro-ceder à detenção de pessoa que represente essaameaça e que resista à autoridade, ou impedir a suafuga, e somente quando medidas menos extre-mas se mostrem insuficientes para alcançaremaqueles objectivos. Em qualquer caso, só devemrecorrer intencionalmente à utilização letal dearmas de fogo quando isso seja estritamente indis-pensável para proteger vidas humanas.

10. Nas circunstâncias referidas no princípio 9,os funcionários responsáveis pela aplicação da leidevem identificar-se como tal e fazer uma adver-tência clara da sua intenção de utilizarem armasde fogo, deixando um prazo suficiente para queo aviso possa ser respeitado, excepto se essemodo de proceder colocar indevidamente emrisco a segurança daqueles responsáveis, impli-car um perigo de morte ou lesão grave paraoutras pessoas ou se se mostrar manifestamenteinadequado ou inútil, tendo em conta as cir-cunstâncias do caso.

11. As normas e regulamentações relativas à utili-zação de armas de fogo pelos funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei devem incluirdirectrizes que:

a) Especifiquem as circunstâncias nas quais os fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei sejamautorizados a transportar armas de fogo e pres-crevam os tipos de armas de fogo e muniçõesautorizados;b) Garantam que as armas de fogo sejam utili-zadas apenas nas circunstâncias adequadas ede modo a reduzir ao mínimo o risco de danosinúteis;

Anexos* 253

Page 285: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

c) Proíbam a utilização de armas de fogo e demunições que provoquem lesões desnecessárias ourepresentem um risco injustificado;d) Regulamentem o controlo, armazenamento edistribuição de armas de fogo e prevejam nomea-damente procedimentos de acordo com os quaisos funcionários responsáveis pela aplicação da leidevam prestar contas de todas as armas e muni-ções que lhes sejam distribuídas;e) Prevejam as advertências a efectuar, sendo casodisso, se houver utilização de armas de fogo;f ) Prevejam um sistema de relatórios de ocor-rência, sempre que os funcionários responsáveispela aplicação da lei utilizem armas de fogo no exer-cício das suas funções.

Manutenção da ordem em caso de reuniões ilegais12. Dado que a todos é garantido o direito de par-ticipação em reuniões lícitas e pacíficas, de acordocom os princípios enunciados na Declaração Uni-versal dos Direitos do Homem e no Pacto Inter-nacional sobre os Direitos Civis e Políticos, osGovernos e os serviços e funcionários responsáveispela aplicação da lei devem reconhecer que a forçae as armas de fogo só podem ser utilizadas deacordo com os princípios 13 e 14.

13. Os funcionários responsáveis pela aplicação dalei devem esforçar-se por dispersar as reuniõesilegais mas não violentas sem recurso à força e,quando isso não for possível, limitar a utilizaçãoda força ao estritamente necessário.

14. Os funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei só podem utilizar armas de fogo para dis-persarem reuniões violentas se não for possívelrecorrer a meios menos perigosos, e somente noslimites do estritamente necessário. Os funcioná-rios responsáveis pela aplicação da lei não devemutilizar armas de fogo nesses casos, salvo nas con-dições estipuladas no princípio 9.

Manutenção da ordem entre pessoas detidas oupresas15. Os funcionários responsáveis pela aplicação dalei não devem utilizar a força na relação com pes-soas detidas ou presas, excepto se isso for indis-pensável para a manutenção da segurança e da

ordem nos estabelecimentos penitenciários, ouquando a segurança das pessoas esteja ameaçada.

16. Os funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei não devem utilizar armas de fogo na relaçãocom pessoas detidas ou presas, excepto em caso delegítima defesa ou para defesa de terceiros contraperigo iminente de morte ou lesão grave, ouquando essa utilização for indispensável paraimpedir a evasão de pessoa detida ou presa repre-sentando o risco referido no princípio 9.

17. Os princípios precedentes entendem-se sem pre-juízo dos direitos, deveres e responsabilidades dosfuncionários dos estabelecimentos penitenciários,tal como são enunciados nas Regras Mínimas parao Tratamento de Presos, em particular as regras 33,34 e 54.

Habilitações, formação e aconselhamento18. Os Governos e os organismos de aplicação dalei devem garantir que todos os funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei sejam selecciona-dos de acordo com procedimentos adequados,possuam as qualidades morais e aptidões psico-lógicas e físicas exigidas para o bom desempenhodas suas funções e recebam uma formação pro-fissional contínua e completa. Deve ser submetidaa reapreciação periódica a sua capacidade paracontinuarem a desempenhar essas funções.

19. Os Governos e os organismos de aplicação dalei devem garantir que todos os funcionários res-ponsáveis pela aplicação da lei recebam formaçãoe sejam submetidos a testes de acordo com normasde avaliação adequadas sobre a utilização da força.Os funcionários responsáveis pela aplicação da leique devam transportar armas de fogo deveriam serapenas autorizados a fazê-lo após recebimento deformação especial para a sua utilização.

20. Na formação dos funcionários responsáveispela aplicação da lei, os Governos e os organismosde aplicação da lei devem conceder uma atençãoparticular às questões de ética policial e de direi-tos do homem, em particular no âmbito da inves-tigação, aos meios de evitar a utilização da força oude armas de fogo, incluindo a resolução pacífica de

254 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 286: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

conflitos, ao conhecimento do comportamento demultidões e aos métodos de persuasão, de nego-ciação e mediação, bem como aos meios técnicos,tendo em vista limitar a utilização da força ou dearmas de fogo. Os organismos de aplicação da leideveriam rever o seu programa de formação e pro-cedimentos operacionais, em função de incidentesconcretos.

21. Os Governos e os organismos de aplicação dalei devem garantir aconselhamento psicológicoaos funcionários responsáveis pela aplicação dalei envolvidos em situações em que sejam utiliza-das a força e armas de fogo.

Procedimentos de comunicação hierárquica e deinquérito22. Os Governos e os organismos de aplicação dalei devem estabelecer procedimentos adequados decomunicação hierárquica e de inquérito para os inci-dentes referidos nos princípios 6 e 11 f ). Para osincidentes que sejam objecto de relatório por forçados presentes Princípios, os Governos e os orga-nismos de aplicação da lei devem garantir apossibilidade de um efectivo procedimento decontrolo e que autoridades independentes (admi-nistrativas ou do Ministério Público), possamexercer a sua jurisdição nas condições adequadas.Em caso de morte, lesão grave, ou outra conse-quência grave, deve ser enviado de imediato umrelatório detalhado às autoridades competentesencarregadas do inquérito administrativo ou do con-trolo judiciário.

23. As pessoas contra as quais sejam utilizadas aforça ou armas de fogo ou os seus representantesautorizados devem ter acesso a um processo inde-pendente, em particular um processo judicial. Emcaso de morte dessas pessoas, a presente disposi-ção aplica-se às pessoas a seu cargo.

24. Os Governos e organismos de aplicação da leidevem garantir que os funcionários superiores sejamresponsabilizados se, sabendo ou devendo saber queos funcionários sob as suas ordens utilizam ou uti-lizaram ilicitamente a força ou armas de fogo, nãotomaram as medidas ao seu alcance para impedi-rem, fazerem cessar ou comunicarem este abuso.

25. Os Governos e organismos responsáveis pelaaplicação da lei devem garantir que nenhuma san-ção penal ou disciplinar seja tomada contra fun-cionários responsáveis pela aplicação da lei que, deacordo como o Código de Conduta para os Fun-cionários Responsáveis pela Aplicação da Lei ecom os presentes Princípios Básicos, recusemcumprir uma ordem de utilização da força ouarmas de fogo ou denunciem essa utilização poroutros funcionários.

26. A obediência a ordens superiores não pode serinvocada como meio de defesa se os responsáveispela aplicação da lei sabiam que a ordem de uti-lização da força ou de armas de fogo de queresultaram a morte ou lesões graves era manifes-tamente ilegal e se tinham uma possibilidaderazoável de recusar cumpri-la. Em qualquer caso,também existe responsabilidade da parte do supe-rior que proferiu a ordem ilegal.

5. CONJUNTO DE PRINCÍPIOS

PARA A PROTECÇÃO DE TODAS

AS PESSOAS SUJEITAS A QUAL-

QUER TIPO DE DETENÇÃO OU PRISÃO4

ÂMBITO DO CONJUNTO DE PRINCÍPIOS

Os presentes Princípios aplicam-se para a protec-ção de todas as pessoas sujeitas a qualquer formade detenção ou prisão.

TERMINOLOGIA

Para efeitos do Conjunto de Princípios:

a) “captura” designa o acto de deter um indivíduopor suspeita da prática de infracção ou por acto deuma autoridade;b) “pessoa detida” designa a pessoa privada da sualiberdade, excepto se o tiver sido em consequên-cia de condenação pela prática de uma infracção;c) “pessoa presa’’ designa a pessoa privada da sualiberdade em consequência de condenação pelaprática de uma infracção,d) “detenção” designa a condição das pessoas deti-das nos termos acima referidos;

Anexos* 255

4 Adoptado pela AssembleiaGeral na sua resolução43/173, de 9 de Dezembrode 1988.

Page 287: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

e) “prisão” designa a condição das pessoas presasnos termos acima referidos;f ) A expressão “autoridade judiciária ou outra auto-ridade” designa a autoridade judiciária ou outraautoridade estabelecida nos termos da lei cujo esta-tuto e mandato ofereçam as mais sólidas garantiasde competência, imparcialidade e independência.

Princípio 1A pessoa sujeita a qualquer forma de detenção ouprisão deve ser tratada com humanidade e com res-peito da dignidade inerente ao ser humano.

Princípio 2A captura, detenção ou prisão só devem ser apli-cadas em estrita conformidade com as disposi-ções legais e pelas autoridades competentes oupessoas autorizadas para esse efeito.

Princípio 3No caso de sujeição de uma pessoa a qualquerforma de detenção ou prisão, nenhuma restriçãoou derrogação pode ser admitida aos direitos dohomem reconhecidos ou em vigor num Estado aoabrigo de leis, convenções, regulamentos ou cos-tumes, sob o pretexto de que o presente Conjuntode Princípios não reconhece esses direitos ou osreconhece em menor grau.

Princípio 4As formas de detenção ou prisão e as medidas queafectem os direitos do homem, da pessoa sujeita aqualquer forma de detenção ou prisão devem ser deci-didas por uma autoridade judiciária ou outra auto-ridade, ou estar sujeitas à sua efectiva fiscalização.

Princípio 51. Os presentes princípios aplicam-se a todas aspessoas que se encontrem no território de umdeterminado Estado, sem discriminação alguma,independentemente de qualquer consideração deraça, cor, sexo, língua, religião ou convicções reli-giosas, opiniões políticas ou outras, origem nacio-nal, étnica ou social, fortuna, nascimento ou dequalquer outra situação.

2. As medidas aplicadas ao abrigo da lei e exclusi-vamente destinadas a proteger os direitos e a con-

dição especial da mulher, especialmente da mulhergrávida e da mãe com crianças de tenra idade, dascrianças, dos adolescentes e idosos, doentes oudeficientes, não são consideradas medidas discri-minatórias. A necessidade de tais medidas bemcomo a sua aplicação poderão sempre ser objectode reapreciação por parte de uma autoridade judi-ciária ou outra autoridade.

Princípio 6Nenhuma pessoa sujeita a qualquer forma de deten-ção ou prisão será submetida a tortura ou a penasou tratamentos cruéis, desumanos ou degradan-tes. Nenhuma circunstância, seja ela qual for,poderá ser invocada para justificar a tortura ououtras penas ou tratamentos cruéis, desumanos oudegradantes.

Princípio 71. Os Estados devem proibir por lei os actos con-trários aos direitos e deveres enunciados nos pre-sentes Princípios, prever sanções adequadas paratais actos e investigar de forma imparcial as quei-xas apresentadas.

2. Os funcionários com razões para crer que ocor-reu ou está iminente, uma violação do presente Con-junto de Princípios, devem comunicar esse factoaos seus superiores e, sendo necessário, a outrasautoridades ou instâncias competentes de con-trolo ou de recurso.

3. Qualquer outra pessoa, com motivos para crerque ocorreu ou está iminente uma violação dopresente Conjunto de Princípios, tem direito acomunicar esse facto aos superiores dos funcionáriosenvolvidos, bem como a outras autoridades ouinstâncias competentes de controlo ou de recurso.

Princípio 8A pessoa detida deve beneficiar de um tratamentoadequado à sua condição de pessoa não conde-nada. Desta forma, sempre que possível será sepa-rada das pessoas presas.

Princípio 9As autoridades que capturem uma pessoa, a man-tenham detida ou investiguem o caso devem exer-

256 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 288: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

cer estritamente os poderes conferidos por lei,sendo o exercício de tais poderes passível derecurso perante uma autoridade judiciária ououtra autoridade.

Princípio 10A pessoa capturada deve ser informada, nomomento da captura, dos motivos desta e pronta-mente notificada das acusações contra si formu-ladas.

Princípio 111. Ninguém será mantido em detenção sem ter apossibilidade efectiva de ser ouvido prontamentepor uma autoridade judiciária ou outra autoridade.A pessoa detida tem o direito de se defender ou deser assistida por um advogado nos termos da lei.

2. A pessoa detida e o seu advogado, se o houver,devem receber notificação pronta e completa da ordemde detenção, bem como dos seus fundamentos.

3. A autoridade judiciária ou outra autoridadedevem ter poderes para apreciar, se tal se justifi-car, a manutenção da detenção.

Princípio 121. Serão devidamente registados:a) As razões da captura;b) O momento da captura, o momento em que apessoa capturada foi conduzida a um local dedetenção e o da sua primeira comparência peranteuma autoridade judiciária ou outra autoridade;c) A identidade dos funcionários encarregados defazer cumprir a lei que hajam intervindo;d) Indicações precisas sobre o local de detenção;

2. Estas informações devem ser comunicadas àpessoa detida ou ao seu advogado, se o houver, nostermos prescritos pela lei.

Princípio 13As autoridades responsáveis pela captura, deten-ção ou prisão de uma pessoa devem, respectiva-mente no momento da captura e no início dadetenção ou da prisão, ou pouco depois, prestar--lhe informação e explicação sobre os seus direi-tos e sobre o modo de os exercer.

Princípio 14A pessoa que não compreenda ou não fale sufi-cientemente bem a língua utilizada pelas autori-dades responsáveis pela sua captura, detenção ouprisão tem o direito de receber sem demora, numalíngua que entenda, a informação mencionadanos princípios 10, 11, n.° 2, 12, n.° 1, e 13 e debeneficiar da assistência, se necessário gratuita, deum intérprete no âmbito do processo judicial sub-sequente à sua captura.

Princípio 15Sem prejuízo das excepções previstas no n.° 4 doPrincípio 16 e no n.° 3 do Princípio 18, a comuni-cação da pessoa detida ou presa com o mundoexterior, nomeadamente com a sua família ou como seu advogado, não pode ser negada por mais doque alguns dias.

Princípio 161. Imediatamente após a captura e após cada trans-ferência de um local de detenção ou de prisão paraoutro, a pessoa detida ou presa poderá avisar ourequerer à autoridade competente que avise osmembros da sua família ou outras pessoas por sidesignadas, se for esse o caso, da sua captura,detenção ou prisão, ou da sua transferência e dolocal em que se encontra detida.

2. No caso de um estrangeiro, este será igual-mente informado sem demora do seu direitode comunicar, por meios adequados, com umposto consular ou a missão diplomática doEstado de que seja nacional ou que por outromotivo esteja habilitada a receber tal comuni-cação, à luz do direito internacional, ou com orepresentante da organização internacionalcompetente no caso de um refugiado ou de umapessoa que, por qualquer outro motivo, seencontre sob a protecção de uma organizaçãointergovernamental.

3. No caso de um menor ou de pessoa incapaz decompreender os seus direitos, a autoridade com-petente deve, por sua própria iniciativa, procederà comunicação mencionada no presente princí-pio. Deve em especial procurar avisar os pais ouos representantes legais.

Anexos* 257

Page 289: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

4. As comunicações mencionadas no presenteprincípio devem ser feitas ou autorizadas semdemora. A autoridade competente pode, noentanto, atrasar a comunicação por um períodorazoável, se assim o exigirem necessidades excep-cionais da investigação.

Princípio 171. A pessoa detida pode beneficiar da assistênciade um advogado. A autoridade competente deveinformá-la desse direito prontamente após a suacaptura e proporcionar-lhe meios adequados parao seu exercício.

2. A pessoa detida que não tenha advogado da suaescolha, tem direito a que uma autoridade judiciáriaou outra autoridade lhe designem um defensor ofi-cioso sempre que o interesse da justiça o exigir ea título gratuito no caso de insuficiência de meiospara o remunerar.

Princípio 181. A pessoa detida ou presa tem direito a comuni-car com o seu advogado e a consultá-lo.

2. A pessoa detida ou presa deve dispor do tempoe das facilidades necessárias para consultar o seuadvogado.

3. O direito de a pessoa detida ou presa ser visitadapelo seu advogado, de o consultar e de comunicarcom ele, sem demora nem censura e em regimede absoluta confidencialidade, não pode serobjecto de suspensão ou restrição, salvo em cir-cunstâncias excepcionais especificadas por lei oupor regulamentos adoptados nos termos da lei,quando uma autoridade judiciária ou outra auto-ridade o considerem indispensável para manter asegurança e a boa ordem.

4. As entrevistas entre a pessoa detida ou presa eo seu advogado podem ocorrer à vista mas não emcondições de serem ouvidas pelo funcionárioencarregado de fazer cumprir a lei.

5. As comunicações entre uma pessoa detida oupresa e o seu advogado, mencionadas no presentePrincípio, não podem ser admitidas como prova

contra a pessoa detida ou presa salvo se respeita-rem a uma infracção contínua ou premeditada.

Princípio 19A pessoa detida ou presa tem o direito de recebervisitas nomeadamente dos membros da sua famí-lia, e de se corresponder, nomeadamente comeles, e deve dispor de oportunidades adequadas paracomunicar com o mundo exterior sem prejuízo dascondições e restrições razoáveis, previstas por leiou por regulamentos adoptados nos termos da lei.

Princípio 20Se a pessoa detida ou presa o solicitar, é, se pos-sível, colocada num local de detenção ou de prisãorelativamente próximo do seu local de residênciahabitual.

Princípio 211. É proibido abusar da situação da pessoa detidaou presa para a coagir a confessar, a incriminar-sepor qualquer outro modo ou a testemunhar con-tra outra pessoa.

2. Nenhuma pessoa detida pode ser submetida,durante o interrogatório, a violência, ameaças oumétodos de interrogatório susceptíveis de com-prometer a sua capacidade de decisão ou de dis-cernimento.

Princípio 22Nenhuma pessoa detida ou presa pode, ainda quecom o seu consentimento, ser submetida a expe-riências médicas ou científicas susceptíveis de pre-judicar a sua saúde.

Princípio 231. A duração de qualquer interrogatório a que sejasujeita a pessoa detida ou presa e dos intervalosentre os interrogatórios, bem como a identidade dosfuncionários que os conduziram e de outros indi-víduos presentes devem ser registadas e autenti-cadas nos termos prescritos pela lei.

2. A pessoa detida ou presa, ou o seu advogado,quando a lei o previr, devem ter acesso às infor-mações mencionadas no n.°1 do presente princí-pio.

258 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 290: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Princípio 24A pessoa detida ou presa deve beneficiar de umexame médico adequado, em prazo tão brevequanto possível após o seu ingresso no local dedetenção ou prisão; posteriormente, deve benefi-ciar de cuidados e tratamentos médicos sempre quetal se mostre necessário. Esses cuidados e trata-mentos são gratuitos.

Princípio 25A pessoa detida ou presa ou o seu advogado têm,sem prejuízo das condições razoavelmente neces-sárias para assegurar a manutenção da segurançae da boa ordem no local de detenção ou de prisão,o direito de solicitar à autoridade judiciária ou aoutra autoridade um segundo exame médico ouopinião médica.

Princípio 26O facto de a pessoa detida ou presa ser submetidaa um exame médico, o nome do médico e dosresultados do referido exame devem ser devida-mente registados. O acesso a esses registos deveser garantido, sendo-o nos termos das normaspertinentes do direito interno.

Princípio 27A inobservância destes Princípios na obtenção deprovas deve ser tomada em consideração na deter-minação da admissibilidade dessas provas contraa pessoa detida ou presa.

Princípio 28A pessoa detida ou presa tem direito a obter, den-tro do limite dos recursos disponíveis, se provie-rem de fundos públicos, uma quantidade razoávelde material educativo, cultural e informativo, semprejuízo das condições razoavelmente necessáriaspara assegurar a manutenção da segurança e da boaordem no local de detenção ou de prisão.

Princípio 291. A fim de assegurar a estrita observância das leise regulamentos pertinentes, os lugares de deten-ção devem ser inspeccionados regularmente porpessoas qualificadas e experientes, nomeadas poruma autoridade competente diferente da autoridadedirectamente encarregada da administração do

local de detenção ou de prisão, e responsáveisperante ela.

2. A pessoa detida ou presa tem o direito de comu-nicar livremente e em regime de absoluta confi-dencialidade com as pessoas que inspeccionamos lugares de detenção ou de prisão, nos termos don.° 1, sem prejuízo das condições razoavelmentenecessárias para assegurar a manutenção da segu-rança e da boa ordem nos referidos lugares.

Princípio 301. Os tipos de comportamento da pessoa detida oupresa que constituam infracções disciplinaresdurante a detenção ou prisão, o tipo e a duração dassanções disciplinares aplicáveis e as autoridadescom competência para impor essas sanções devemser especificados por lei ou por regulamentosadoptados nos termos da lei e devidamente publi-cados.

2. A pessoa detida ou presa tem o direito de serouvida antes de contra ela serem tomadas medi-das disciplinares. Tem o direito de impugnar estasmedidas perante autoridade superior.

Princípio 31As autoridades competentes devem garantir,quando necessário, e à luz do direito interno,assistência aos familiares a cargo da pessoa detidaou presa, nomeadamente aos menores, e devemassegurar, em especiais condições, a guarda dosmenores deixados sem vigilância.

Princípio 321. A pessoa detida ou o seu advogado têm o direitode, em qualquer momento interpor, recurso nos ter-mos do direito interno, perante uma autoridadejudiciária ou outra autoridade para impugnar alegalidade da sua detenção e obter sem demora asua libertação, no caso de aquela ser ilegal.

2. O processo previsto no n.° 1 deve ser simples erápido e gratuito para o detido que não disponhade meios suficientes. A autoridade responsávelpela detenção deve apresentar, sem demora des-razoável, a pessoa detida à autoridade perante a qualo recurso foi interposto.

Anexos* 259

Page 291: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Princípio 331. A pessoa detida ou presa, ou o seu advogado, têmo direito de apresentar um pedido ou queixa rela-tivos ao seu tratamento, nomeadamente no caso detortura ou de outros tratamentos cruéis, desuma-nos ou degradantes, perante as autoridades res-ponsáveis pela administração do local de detençãoe autoridades superiores e, se necessário, peranteautoridades competentes de controlo ou derecurso.

2. No caso de a pessoa detida ou presa ou o seuadvogado não poderem exercer os direitos previs-tos no n.° 1 do presente princípio, estes poderão serexercidos por um membro da família da pessoadetida ou presa, ou por qualquer outra pessoa quetenha conhecimento do caso.

3. O carácter confidencial do pedido ou da queixaé mantido se o requerente o solicitar.

4. O pedido ou queixa devem ser examinadosprontamente e respondidos sem demora injusti-ficada. No caso de indeferimento do pedido ou daqueixa, ou em caso de demora excessiva, o reque-rente tem o direito de apresentar o pedido ouqueixa perante uma autoridade judiciária ou outraautoridade. A pessoa detida ou presa, ou o reque-rente nos termos do n.° 1, não devem sofrer pre-juízos pelo facto de terem apresentado um pedidoou queixa.

Princípio 34Se uma pessoa detida ou presa morrer ou desa-parecer durante a detenção ou prisão, a autori-dade judiciária ou outra autoridade determinará arealização de uma investigação sobre as causas damorte ou do desaparecimento, oficiosamente ou apedido de um membro da família dessa pessoa oude qualquer outra pessoa que tenha conhecimentodo caso. Quando as circunstâncias o justificarem,será instaurado um inquérito, seguindo idênticostermos processuais, se a morte ou o desapareci-mento ocorrerem pouco depois de terminada adetenção ou prisão. As conclusões ou o relatórioda investigação serão postos à disposição de quemo solicitar, salvo se esse pedido comprometer umainstrução criminal em curso.

Princípio 351. Os danos sofridos por actos ou omissões de umfuncionário público que se mostrem contráriosaos direitos previstos num dos presentes princípiosserão passíveis de indemnização, nos termos dasnormas de direito interno aplicáveis em matéria deresponsabilidade.

2. As informações registadas nos termos dos pre-sentes princípios devem estar disponíveis, de har-monia com o direito interno aplicável, para efeitode pedidos de indemnização apresentados nos ter-mos do presente princípio.

Princípio 361. A pessoa detida, suspeita ou acusada da pra-tica de infracção penal presume-se inocente,devendo ser tratada como tal até que a sua cul-pabilidade tenha sido legalmente estabelecida nodecurso de um processo público em que tenhagozado de todas as garantias necessárias à suadefesa.

2. Só se deve proceder à captura ou detenção dapessoa assim suspeita ou acusada, aguardando aabertura da instrução e julgamento quando orequeiram necessidades da administração da jus-tiça pelos motivos, nas condições e segundo o pro-cesso prescritos por lei. É proibido impor a essapessoa restrições que não sejam estritamentenecessárias para os fins da detenção, para evitar quedificulte a instrução ou a administração da jus-tiça, ou para manter a segurança e a boa ordem nolocal de detenção.

Princípio 37A pessoa detida pela prática de uma infracçãopenal deve ser presente a uma autoridade judi-ciária ou outra autoridade prevista por lei, pron-tamente após a sua captura. Essa autoridadedecidirá sem demora da legalidade e necessidadeda detenção. Ninguém pode ser mantido emdetenção aguardando a abertura da instrução ou jul-gamento salvo por ordem escrita da referida auto-ridade. A pessoa detida, quando presente a essaautoridade, tem o direito de fazer uma declaraçãosobre a forma como foi tratada enquanto emdetenção.

260 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 292: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Princípio 38A pessoa detida pela prática de infracção penaltem o direito de ser julgada em prazo razoável oude aguardar julgamento em liberdade.

Princípio 39Salvo em circunstâncias especiais previstas porlei, a pessoa detida pela prática de infracção penaltem direito, a menos que uma autoridade judiciá-ria ou outra autoridade decidam de outro modo nointeresse da administração da justiça, a aguardarjulgamento em liberdade sujeita às condiçõesimpostas por lei. Essa autoridade manterá emapreciação a questão da necessidade da detenção.

Cláusula geralNenhuma disposição do presente Conjunto dePrincípios será interpretada no sentido de res-tringir ou derrogar algum dos direitos definidos peloPacto Internacional sobre os Direitos Civis e Polí-ticos.

6. DECLARAÇÃO DOS PRIN-

CÍPIOS BÁSICOS DE JUSTIÇA

RELATIVOS ÀS VÍTIMAS DA CRI-

MINALIDADE E DE ABUSO DE PODER5

a. VÍTIMAS DA CRIMINALIDADE

1. Entendem-se por “vítimas” as pessoas que, indi-vidual ou colectivamente, tenham sofrido umprejuízo, nomeadamente um atentado à sua inte-gridade física ou mental, um sofrimento de ordemmoral, uma perda material, ou um grave atentadoaos seus direitos fundamentais, como conse-quência de actos ou de omissões violadores das leispenais em vigor num Estado membro, incluindoas que proíbem o abuso de poder.

2. Uma pessoa pode ser considerada como“vítima”, no quadro da presente Declaração, quero autor seja ou não identificado, preso, proces-sado ou declarado culpado, e quaisquer que sejamos laços de parentesco deste com a vítima. Otermo “vítima” inclui também, conforme o caso,a família próxima ou as pessoas a cargo da vítimadirecta e as pessoas que tenham sofrido um pre-

juízo ao intervirem para prestar assistência às víti-mas em situação de carência ou para impedir a viti-mização.

3. As disposições da presente secção aplicam-se atodos, sem distinção alguma, nomeadamente deraça, cor, sexo, idade, língua, religião, nacionalidade,opiniões políticas ou outras, crenças ou práticas cul-turais, situação económica, nascimento ou situa-ção familiar, origem étnica ou social ou capacidadefísica.

Acesso à justiça e tratamento equitativo4. As vítimas devem ser tratadas com compaixãoe respeito pela sua dignidade. Têm direito aoacesso às instâncias judiciárias e a uma rápidareparação do prejuízo por si sofrido, de acordocom o disposto na legislação nacional.

5. Há que criar e, se necessário, reforçar meca-nismos judiciários e administrativos que permitamàs vítimas a obtenção de reparação através de pro-cedimentos, oficiais ou oficiosos, que sejam rápi-dos, equitativos, de baixo custo e acessíveis. Asvítimas devem ser informadas dos direitos quelhes são reconhecidos para procurar a obtenção dereparação por estes meios.

6. A capacidade do aparelho judiciário e adminis-trativo para responder às necessidades das víti-mas deve ser melhorada:

a) Informando as vítimas da sua função e daspossibilidades de recurso abertas, das datas e damarcha dos processos e da decisão das suas cau-sas, especialmente quando se trate de crimes gra-ves e quando tenham pedido essas informações;b) Permitindo que as opiniões e as preocupaçõesdas vítimas sejam apresentadas e examinadas nasfases adequadas do processo, quando os seus inte-resses pessoais estejam em causa, sem prejuízo dosdireitos da defesa e no quadro do sistema de jus-tiça penal do país;c) Prestando às vítimas a assistência adequada aolongo de todo o processo;d) Tomando medidas para minimizar, tantoquanto possível, as dificuldades encontradas pelasvítimas, proteger a sua vida privada e garantir a sua

Anexos* 261

5 Adoptada pela Assem-bleia Geral na sua resolu-ção 40/34, de 29 deNovembro de 1985.

Page 293: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

segurança, bem como a da sua família e a dassuas testemunhas, preservando-as de manobrasde intimidação e de represálias;e) Evitando demoras desnecessárias na resoluçãodas causas e na execução das decisões ou senten-ças que concedam indemnização às vítimas.

7. Os meios extrajudiciários de solução de dife-rendos, incluindo a mediação, a arbitragem e as prá-ticas de direito consuetudinário ou as práticasautóctones de justiça, devem ser utilizados,quando se revelem adequados, para facilitar a con-ciliação e obter a reparação em favor das vítimas.

Obrigação de restituição e de reparação8. Os autores de crimes ou os terceiros respon-sáveis pelo seu comportamento devem, se neces-sário, reparar de forma equitativa o prejuízocausado às vítimas, às suas famílias ou às pes-soas a seu cargo. Tal reparação deve incluir arestituição dos bens, uma indemnização peloprejuízo ou pelas perdas sofridos, o reembolsodas despesas feitas como consequência da viti-mização, a prestação de serviços e o restabeleci-mento dos direitos.

9. Os Governos devem reexaminar as respectivaspráticas, regulamentos e leis, de modo a fazer darestituição uma sentença possível nos casospenais, para além das outras sanções penais.

10. Em todos os casos em que sejam causadosgraves danos ao ambiente, a restituição deveincluir, na medida do possível, a reabilitação doambiente, a reposição das infra-estruturas, a subs-tituição dos equipamentos colectivos e o reem-bolso das despesas de reinstalação, quando taisdanos impliquem o desmembramento de umacomunidade.

11. Quando funcionários ou outras pessoas, agindoa título oficial ou quase oficial, tenham cometidouma infracção penal, as vítimas devem receber arestituição por parte do Estado cujos funcionáriosou agentes sejam responsáveis pelos prejuízossofridos. No caso em que o Governo sob cuja auto-ridade se verificou o acto ou a omissão na origemda vitimização já não exista, o Estado ou o

Governo sucessor deve assegurar a restituição àsvítimas.

Indemnização12. Quando não seja possível obter do delinquenteou de outras fontes uma indemnização completa,os Estados devem procurar assegurar uma indem-nização financeira:

a) Às vítimas que tenham sofrido um dano corporalou um atentado importante à sua integridade física oumental, como consequência de actos criminosos graves;b) À família, em particular às pessoas a cargo daspessoas que tenham falecido ou que tenham sidoatingidas por incapacidade física ou mental comoconsequência da vitimização.

13. Será incentivado o estabelecimento, o reforçoe a expansão de fundos nacionais de indemniza-ção às vítimas. De acordo com as necessidades,poderão estabelecer-se outros fundos com talobjectivo, nomeadamente nos casos em que oEstado de nacionalidade da vítima não esteja emcondições de indemnizá-la pelo dano sofrido.

Serviços14. As vítimas devem receber a assistência mate-rial, médica, psicológica e social de que necessitem,através de organismos estatais, de voluntariado,comunitários e autóctones.

15. As vítimas devem ser informadas da existênciade serviços de saúde, de serviços sociais e deoutras formas de assistência que lhes possam serúteis e devem ter fácil acesso aos mesmos.

16. O pessoal dos serviços de polícia, de justiça ede saúde, tal como o dos serviços sociais e o deoutros serviços interessados deve receber uma for-mação que o sensibilize para as necessidades dasvítimas, bem como instruções que garantam umaajuda pronta e adequada às vítimas.

17. Quando sejam prestados serviços e ajuda às víti-mas, deve ser dispensada atenção às que tenhamnecessidades especiais em razão da natureza do pre-juízo sofrido ou de factores tais como os referidosno parágrafo 3, supra.

262 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 294: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

b. VÍTIMAS DE ABUSO DE PODER

18. Entendem-se por “vítimas” as pessoas que,individual ou colectivamente, tenham sofrido pre-juízos, nomeadamente um atentado à sua inte-gridade física ou mental, um sofrimento de ordemmoral, uma perda material, ou um grave atentadoaos seus direitos fundamentais, como conse-quência de actos ou de omissões que, não consti-tuindo ainda uma violação da legislação penalnacional, representam violações das normas inter-nacionalmente reconhecidas em matéria de direi-tos do homem.

19. Os Estados deveriam encarar a possibilidade deinserção nas suas legislações nacionais de normasque proíbam os abusos de poder e que prevejamreparações às vítimas de tais abusos. Entre taisreparações deveriam figurar, nomeadamente, arestituição e a indemnização, bem como a assis-tência e o apoio de ordem material, médica, psi-cológica e social que sejam necessários.

20. Os Estados deveriam encarar a possibilidadede negociar convenções internacionais multilate-rais relativas às vítimas, de acordo com a definiçãodo parágrafo 18.

21. Os Estados deveriam reexaminar periodica-mente a legislação e as práticas em vigor, comvista a adaptá-las à evolução das situações, deveriamadoptar e aplicar, se necessário, textos legislativosque proibissem qualquer acto que constituísse umgrave abuso de poder político ou económico e queincentivassem as políticas e os mecanismos deprevenção destes actos e deveriam estabelecerdireitos e recursos apropriados para as vítimas detais actos, garantindo o seu exercício.

7. DECLARAÇÃO SOBRE A PRO-

TECÇÃO DE TODAS AS PESSOAS

CONTRA OS DESAPARECIMEN-

TOS FORÇADOS6

A Assembleia Geral,Considerando que, em conformidade com os prin-cípios proclamados na Carta das Nações Unidas e

em outros instrumentos internacionais, o reco-nhecimento da dignidade inerente e dos direitosiguais e inalienáveis de todos os membros dafamília humana constitui o fundamento da liber-dade, da justiça e da paz no mundo,

Tendo presente a obrigação dos Estados em virtudeda Carta, em particular do seu artigo 55.o, de pro-mover o respeito universal e efectivo dos direitoshumanos e das liberdades fundamentais,

Profundamente preocupada por constatar que emmuitos países, frequentemente de forma persistente,ocorrem desaparecimentos forçados, no sentido deque as pessoas são presas, detidas ou raptadas con-tra a sua vontade ou de outra forma privadas de liber-dade por agentes governamentais de qualquer ramoou nível, que de seguida se recusam a revelar o des-tino ou paradeiro das pessoas em causa ou se recu-sam a reconhecer a privação de liberdade, assimsubtraindo tais pessoas à protecção da lei,

Considerando que os desaparecimentos forçadosatentam contra os mais profundos valores de qual-quer sociedade empenhada em respeitar o Estadode Direito, os direitos humanos e as liberdades fun-damentais, e que a prática sistemática de tais actosconfigura um crime contra a Humanidade,

Recordando a sua resolução 33/173, de 22 deDezembro de 1978, na qual manifestou preocu-pação pelos relatos de desaparecimentos forçadosou involuntários oriundos de diversas partes domundo, bem como pela angústia e pela dor pro-vocadas por esses desaparecimentos, e instou osGovernos a fazer incorrer as autoridades encarre-gadas de aplicar a lei e as forças de segurança emresponsabilidade jurídica pelos excessos que pos-sam conduzir a desaparecimentos forçados ouinvoluntários de seres humanos,

Recordando também a protecção conferida às víti-mas de conflitos armados pelas Convenções deGenebra de 12 de Agosto de 1949 e seus Protoco-los Adicionais de 1977,

Tendo em conta em particular os pertinentes arti-gos da Declaração Universal dos Direitos do

Anexos* 263

6 Adoptada pela Assem-bleia Geral na sua resolu-ção 47/133, de 18 deDezembro de 1992.

Page 295: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Homem e do Pacto Internacional sobre os Direi-tos Civis e Políticos, que protegem o direito à vida,o direito à liberdade e à segurança da pessoa, odireito a não ser sujeito à tortura e o direito ao reco-nhecimento da personalidade jurídica,

Tendo em conta também a Convenção contra a Tor-tura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desu-manos ou Degradantes, que estabelece que osEstados partes deverão tomar medidas eficazespara prevenir e punir os actos de tortura,

Tendo presentes o Código de Conduta para osFuncionários Responsáveis pela Aplicação da Lei,os Princípios Básicos sobre a Utilização da Forçae de Armas de Fogo pelos Funcionários Respon-sáveis pela Aplicação da Lei, a Declaração dos Prin-cípios Básicos de Justiça Relativos às Vítimas daCriminalidade e de Abuso de Poder e as RegrasMínimas para o Tratamento de Reclusos,

Afirmando que, para prevenir os desaparecimen-tos forçados, é necessário garantir a estrita obser-vância do Conjunto de Princípios para a Protecçãode Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma deDetenção ou Prisão contidos em anexo à sua reso-lução 43/173, de 9 de Dezembro de 1988, e dos Prin-cípios sobre a Prevenção Eficaz e Investigação dasExecuções Extrajudiciais, Arbitrárias ou Sumárias,constantes do anexo à resolução 1989/65 do Con-selho Económico e Social, de 24 de Maio de 1989e aprovados pela Assembleia Geral na sua resolu-ção 44/162, de 15 de Dezembro de 1989,

Tendo presente que, embora os actos que confi-guram um desaparecimento forçado constituamuma violação das proibições constantes dos ins-trumentos internacionais acima mencionados,continua, no entanto, a ser importante elaborar uminstrumento que caracterize todos os actos dedesaparecimento forçado de pessoas como infrac-ções muito graves e consagre normas concebidaspara punir e prevenir tais crimes,

1. Proclama a presente Declaração sobre a Protec-ção de Todas as Pessoas contra os Desapareci-mentos Forçados como um conjunto de princípiosaplicáveis a todos os Estados;

2. Insta a que sejam feitos todos os esforços paraque a Declaração se torne amplamente conhecidae respeitada:

Artigo 1.o

1. Qualquer acto de desaparecimento forçado cons-titui um atentado à dignidade humana. É conde-nado enquanto uma negação dos objectivos dasNações Unidas e uma grave e flagrante violação dosdireitos humanos e liberdades fundamentais pro-clamados na Declaração Universal dos Direitos doHomem e reafirmados e desenvolvidos noutrosinstrumentos internacionais nesta matéria.

2. Todo o acto de desaparecimento forçado subtraias pessoas que a ele são sujeitas à protecção da leie provoca grandes sofrimentos a essas pessoas eàs suas famílias. Constitui uma violação das nor-mas de direito internacional que garantem,nomeadamente, o direito ao reconhecimento dapersonalidade jurídica, o direito à liberdade esegurança pessoal e o direito a não ser sujeito à tor-tura ou a outras penas ou tratamentos cruéis,desumanos ou degradantes. Também viola ouconstitui uma grave ameaça ao direito à vida.

Artigo 2.o

1. Nenhum Estado deverá cometer, permitir outolerar os desaparecimentos forçados.

2. Os Estados deverão agir aos níveis nacional eregional e em cooperação com as Nações Unidaspara contribuir por todos os meios para a pre-venção e erradicação dos desaparecimentos for-çados.

Artigo 3.o

Todos os Estados deverão adoptar medidas efica-zes nos planos legislativo, administrativo, judicialou outros para prevenir e erradicar os actos con-ducentes a desaparecimentos forçados em qualquerterritório sujeito à sua jurisdição.

Artigo 4.o

1. Todos os actos conducentes a desaparecimentosforçados serão considerados infracções nos ter-mos da lei penal e puníveis com penas adequadasque tenham em conta a sua extrema gravidade.

264 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 296: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

2. A lei nacional poderá prever circunstâncias ate-nuantes para as pessoas que, tendo participadoem desaparecimentos forçados, contribuam paraa reaparição da vítima com vida ou voluntaria-mente forneçam informações que possam con-tribuir para o esclarecimento dos casos dedesaparecimento forçado.

Artigo 5.o

Para além das sanções penais aplicáveis, os desa-parecimentos forçados fazem incorrer os seusautores e o Estado ou autoridades públicas queorganizem, consintam ou tolerem tais desapare-cimentos, em responsabilidade civil, sem prejuízoda responsabilidade internacional do Estado emcausa em conformidade com os princípios dedireito internacional.

Artigo 6.o

1. Nenhuma ordem ou instrução emanada de qual-quer autoridade pública, civil, militar ou de outranatureza poderá ser invocada para justificar umdesaparecimento forçado. Qualquer pessoa quereceba tal ordem ou instrução terá o direito e o deverde não lhe obedecer.

2. Todos os Estados deverão garantir que as ordensou instruções que ordenem, autorizem ou enco-rajem qualquer desaparecimento forçado sejamproibidas.

3. Na formação dos funcionários responsáveis pelaaplicação da lei dever-se-ão destacar as disposi-ções do primeiro e segundo parágrafos do pre-sente artigo.

Artigo 7.o

Nenhumas circunstâncias, sejam de que naturezaforem, quer se trate de ameaça de guerra, estadode guerra, instabilidade política interna ou qualqueroutra situação de emergência pública, poderão serinvocadas para justificar um desaparecimento for-çado.

Artigo 8.o

1. Nenhum Estado deverá expulsar, repatriar ouextraditar uma pessoa para outro Estado caso exis-tam motivos sérios para crer que aí a pessoa possa

estar em risco de ser vítima de um desapareci-mento forçado.

2. A fim de determinar se esses motivos existemou não, as autoridades competentes deverão ter emconta todas as considerações relevantes, nomea-damente e se for o caso, a existência no Estado emcausa de um padrão constante de violações graves,flagrantes e sistemáticas de direitos humanos.

Artigo 9.o

1. É necessário garantir o direito a um recursojudicial rápido e eficaz, enquanto meio de deter-minar o paradeiro ou estado de saúde das pessoasprivadas de liberdade e/ou de identificar a autori-dade que ordenou ou levou a cabo a privação deliberdade, a fim de prevenir a ocorrência de desa-parecimentos forçados em todas as circunstân-cias, nomeadamente as referidas no artigo 7.o,supra.

2. No âmbito desses processos de recurso, as auto-ridades nacionais competentes deverão ter acessoa todos os locais onde se encontrem pessoas privadasde liberdade e a todas as áreas desses locais, bemcomo a qualquer local onde existam razões para crerque essas pessoas possam ser encontradas.

3. Qualquer outra autoridade competente nos ter-mos da lei interna do Estado ou de qualquer ins-trumento jurídico internacional do qual o Estadoseja parte poderá também ter acesso a esses locais.

Artigo 10.o

1. Toda a pessoa privada de liberdade deverá sermantida num local de detenção oficialmente reco-nhecido e, em conformidade com a lei nacional,comparecer perante uma autoridade judicial nomais curto espaço de tempo após a detenção.

2. Informação exacta sobre a detenção das pes-soas em causa e seu local ou locais de detenção,incluindo locais para onde sejam transferidas,deverá ser prontamente fornecida aos membros dasua família, ao seu advogado e a qualquer outra pes-soa com um interesse legítimo em tal informação,a menos que as pessoas privadas de liberdademanifestem o desejo em contrário.

Anexos* 265

Page 297: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

3. Todos os locais de detenção deverão manterregistos oficiais actualizados de todas as pessoasprivadas de liberdade. Para além disso, cadaEstado deverá adoptar medidas a fim de manterregistos centralizados similares. A informaçãoconstante dos registos deverá ser posta à disposi-ção das pessoas referidas no parágrafo anterior, dequalquer autoridade judicial ou outra autoridadenacional competente e independente e de qual-quer outra autoridade competente nos termos dalei do Estado ou de qualquer instrumento jurídicointernacional do qual o Estado em causa sejaparte, que procure determinar o paradeiro da pes-soa detida.

Artigo 11.o

Todas as pessoas privadas de liberdade deverãoser libertadas de forma a permitir verificar com cer-teza que foram de facto postas em liberdade e,além do mais, que foram libertadas em condiçõesque garantam a sua integridade física e capaci-dade de exercer plenamente os seus direitos.

Artigo 12.o

1. Todos os Estados deverão adoptar normas inter-nas a fim de designar os funcionários autorizadosa ordenar a privação de liberdade, definir em quecondições essas ordens podem ser dadas e preversanções para os funcionários que, sem justificaçãolegal, se recusem a prestar informação sobre qual-quer detenção.

2. Todos os Estados deverão, de forma semelhante,garantir uma supervisão rigorosa, nomeadamenteatravés de uma cadeia hierárquica bem definida,de todos os funcionários responsáveis pela aplicaçãoda lei cujas funções incluam a captura, detenção,guarda, transferência e prisão de pessoas, bemcomo de todos os outros funcionários autoriza-dos por lei a utilizar a força ou armas de fogo.

Artigo 13.o

1. Todos os Estados deverão garantir a todas aspessoas que tenham conhecimento ou possaminvocar um interesse legítimo e aleguem que umapessoa foi vítima de um desaparecimento forçado,o direito de denunciar os factos perante uma auto-ridade do Estado e a que essa denúncia seja

pronta, exaustiva e imparcialmente investigadapela autoridade em causa. Sempre que existammotivos razoáveis para acreditar que ocorreu umdesaparecimento forçado, o Estado deverá comu-nicar os factos a essa autoridade para que seja ins-taurado inquérito, mesmo na ausência de umadenúncia formal. Não deverá ser tomada qualquermedida a fim de limitar ou colocar obstáculos a esseinquérito.

2. Todos os Estados deverão garantir que a auto-ridade competente disponha das competências erecursos necessários para conduzir as investigaçõesde forma eficaz, nomeadamente poderes para exi-gir a comparência de testemunhas e a apresenta-ção dos documentos pertinentes e para visitarimediatamente os locais em causa.

3. Deverão ser adoptadas medidas para garantir quetodas as pessoas envolvidas na investigação,nomeadamente o denunciante, o advogado, as tes-temunhas e os agentes que conduzem o inquérito,sejam protegidos contra quaisquer maus tratos,actos de intimidação ou represálias.

4. Os resultados das investigações deverão sercomunicados a todas as pessoas interessadas, apedido destas, a menos que isso prejudique asinvestigações em curso.

5. Deverão ser adoptadas medidas para garantir quequalquer forma de maus tratos, intimidação ourepresálias ou qualquer outra forma de interfe-rência aquando da apresentação da denúncia ou nodecorrer do processo de investigação seja adequa-damente punida.

6. Uma investigação, em conformidade com osprocedimentos acima descritos, deverá manter-seem curso enquanto o destino da vítima do desa-parecimento forçado não for esclarecido.

Artigo 14.o

Todos os presumíveis autores de actos conducen-tes a um desaparecimento forçado perpetradosnum determinado Estado deverão, uma vez queos factos apurados mediante uma investigação ofi-cial assim o justifiquem, comparecer perante as

266 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 298: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

autoridades civis desse Estado para fins de instau-ração de acção penal e julgamento, a menos quetenham sido extraditados para outro Estado quedeseje exercer jurisdição em conformidade com ospertinentes acordos internacionais em vigor. Todosos Estados deverão adoptar todas as medidas líci-tas e apropriadas ao seu dispor para levar a responderperante a justiça todos os presumíveis autores deactos conducentes a desaparecimentos forçadosque se encontrem sob a sua jurisdição ou controlo.

Artigo 15.o

O facto de existirem motivos razoáveis para acre-ditar que uma pessoa participou em actos deextrema gravidade como os referidos no artigo 4.o,n.o 1, supra, independentemente dos motivos por-que o fez, deverá ser tomado em conta pelas auto-ridades competentes do Estado ao decidirem sobreum pedido de asilo.

Artigo 16.o

1. Os presumíveis autores de qualquer dos actosreferidos no artigo 4.o, n.o 1, supra, deverão ser sus-pensos do exercício de quaisquer funções oficiaisdurante a investigação referida no artigo 13.o, supra.

2. Deverão ser julgados apenas pelos competentestribunais comuns do Estado e não por quaisquer tri-bunais especiais, em particular tribunais militares.

3. Não serão reconhecidos quaisquer privilégios,imunidades ou dispensas especiais no âmbito detais processos, sem prejuízo das disposições enun-ciadas na Convenção de Viena sobre RelaçõesDiplomáticas.

4. Aos presumíveis autores de tais actos deverá sergarantido, em todas as fases da investigação eeventual processo penal e julgamento, um trata-mento equitativo, em conformidade com as perti-nentes disposições da Declaração Universal dosDireitos do Homem e de outros pertinentes acor-dos internacionais em vigor.

Artigo 17.o

1. Os actos que consubstanciam um desapareci-mento forçado deverão ser considerados um crimecontinuado enquanto os seus autores continua-

rem a esconder o destino e o paradeiro das pessoasdesaparecidas e estes factos não ficarem esclare-cidos.

2. Quando os meios de recurso previstos no ar-tigo 2.o do Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos deixarem de ser eficazes, a conta-gem do prazo de prescrição aplicável aos actosconducentes a um desaparecimento forçado serásuspensa até que os meios de recurso sejam res-tabelecidos.

3. O prazo de prescrição aplicável aos actos con-ducentes a um desaparecimento forçado, quandoexista, deverá ser longo e proporcional à extremagravidade da infracção.

Artigo 18.o

1. Os autores ou presumíveis autores das infracçõesreferidas no artigo 4.o, n.o 1, supra, não deverão bene-ficiar de qualquer lei especial de amnistia oumedida semelhante que possa ter como efeito ilibá-los de qualquer procedimento ou sanção penal.

2. No exercício do direito de solicitar o indulto,dever-se-á ter em conta a extrema gravidade dosactos conducentes a um desaparecimento forçado.

Artigo 19.o

As vítimas de desaparecimentos forçados e suasfamílias deverão obter reparação e terão direito auma adequada compensação, nomeadamente a meiosque permitam uma reabilitação tão completa quantopossível. Na eventualidade de morte da vítima emresultado de um desaparecimento forçado, a suafamília deverá também ter direito a compensação.

Artigo 20.o

1. Os Estados deverão prevenir e erradicar o raptode crianças filhas de pais vítimas de desapareci-mentos forçados e de crianças nascidas durante operíodo de desaparecimento forçado das suasmães e deverão empreender esforços no sentido deprocurar e identificar essas crianças e enviá-las devolta ao seio das suas famílias de origem.

2. Considerando a necessidade de proteger o inte-resse superior das crianças referidas no parágrafo

Anexos* 267

Page 299: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

anterior, deverá ser possível, nos Estados que reco-nhecem o sistema de adopção, rever o processo deadopção dessas crianças e, em particular, anularqualquer adopção que tenha tido origem numdesaparecimento forçado. Tal adopção deverá, noentanto, continuar a produzir efeitos caso sejadado consentimento, no momento da revisão,pelos familiares mais próximos da criança.

3. O rapto de crianças filhas de pais vítimas de desa-parecimentos forçados ou de crianças nascidasdurante o período de desaparecimento das suasmães, bem como o acto de alterar ou suprimirdocumentos comprovativos da sua verdadeiraidentidade, deverão ser consideradas infracçõesextremamente graves e punidas como tal.

4. Para estes fins, os Estados deverão, se apro-priado, celebrar acordos bilaterais e multilaterais.

Artigo 21.o

As disposições da presente Declaração não preju-dicam as disposições enunciadas na DeclaraçãoUniversal dos Direitos do Homem ou em qualqueroutro instrumento internacional e não deverão serinterpretadas como uma restrição ou derrogaçãode qualquer dessas disposições.

8. PRINCÍPIOS RELATIVOS A

UMA PREVENÇÃO EFICAZ E À

INVESTIGAÇÃO DAS EXECU-

ÇÕES EXTRAJUDICIAIS, ARBITRÁRIAS E SUMÁ-

RIAS7

PREVENÇÃO

1. Os Governos proibirão por lei todas as execuçõesextrajudiciais, arbitrárias ou sumárias e velarãopara que, todas essas execuções sejam tipificadascomo crimes no seu direito penal e sejam puníveiscom penas adequadas que tenham em conta a gra-vidade de tais infracções. Não poderão ser invocadaspara justificar essas execuções circunstânciasexcepcionais, como, por exemplo, o estado deguerra ou de risco de guerra, a instabilidade polí-tica interna nem nenhuma outra emergênciapública. Essas execuções não serão levadas a cabo

em nenhuma circunstância, nem sequer em situa-ções de conflito armado interno, de abuso ou deuso ilegal da força por parte de um funcionáriopúblico ou de outra pessoa que actue com carác-ter oficial ou de outrem que actue por instigação,ou com o consentimento ou aquiescência daquela,nem mesmo em situações em que a morte se veri-fique durante a prisão preventiva. Esta proibiçãoprevalecerá sobre os decretos promulgados pelaautoridade executiva.

2. Com o objectivo de impedir as execuções extra-judiciais, arbitrárias ou sumárias, os Governosgarantirão um controlo rigoroso, nomeadamentemediante o respeito pela ordem hierárquica, detodos os funcionários responsáveis pela captura,detenção, prisão, custódia e encarceramento,assim como de todos os funcionários autorizadospor lei a usar a força e armas de fogo.

3. Os Governos proibirão os funcionários supe-riores ou as autoridades públicas de daremordens autorizando ou incitando outras pessoasa levar a cabo execuções extrajudiciais, arbitráriasou sumárias. Qualquer pessoa terá o direito e odever de negar-se a cumprir essas ordens. Naformação dos funcionários responsáveis pelocumprimento da lei deverá insistir-se nas dispo-sições expostas.

4. Será garantida uma protecção eficaz, judicial oude outro tipo, aos particulares e aos grupos que este-jam em perigo de execução extrajudicial, arbitrá-ria ou sumária, em particular aos que recebamameaças de morte.

5. Ninguém será obrigado a regressar nem seráextraditado para um país em que haja motivosfundados para se crer que possa ser vítima de umaexecução extrajudicial, arbitrária ou sumária.

6. Os Governos velarão para que as pessoas privadasde liberdade sejam mantidas em lugares de reclu-são publicamente reconhecidos e para que sejaimediatamente dada aos seus familiares, advoga-dos ou outras pessoas de confiança informaçãoexacta sobre a sua detenção e paradeiro, incluindoas transferências.

268 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

7 Recomendados pelo Con-selho Económico e Socialna sua resolução 1989/65de 24 de Maio de 1989.

Page 300: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

7. Inspectores especialmente qualificados,incluindo pessoal médico ou uma autoridadeindependente equivalente, efectuarão periodica-mente inspecções aos lugares de reclusão e terãoa faculdade de realizar inspecções sem aviso pré-vio e por sua própria iniciativa, com todas asgarantias de independência no exercício dessafunção. Os inspectores terão livre acesso a todasas pessoas que se encontrem nos ditos lugares dereclusão, bem como a todas as peças do respec-tivo processo.

8. Os Governos farão quanto esteja ao seu alcancepara evitar as execuções extrajudiciais, arbitráriasou sumárias, recorrendo, por exemplo, à inter-cessão diplomática, facilitando o acesso dosdemandantes aos órgãos intergovernamentais ejudiciais e fazendo denúncias públicas. Serão uti-lizados os mecanismos intergovernamentais paraestudar as informações sobre cada uma destas exe-cuções e para adoptar medidas eficazes contra taispráticas. Os Governos, incluídos os dos países emque se suspeite, fundadamente, da existência deexecuções extrajudiciais, arbitrárias ou sumárias,cooperarão plenamente nas investigações inter-nacionais sobre o assunto.

INVESTIGAÇÃO

9. Proceder-se-á a uma investigação exaustiva,imediata e imparcial de todos os casos em quehaja suspeita de execuções extrajudiciais, arbi-trárias ou sumárias, incluindo aqueles em queas queixas de parentes ou outras informações cre-díveis façam pensar que se verificou uma mortenão devida a causas naturais, nas referidas cir-cunstâncias. Os Governos manterão órgãos eprocedimentos de investigação para realizar taisinquéritos. A investigação terá como objectivodeterminar a causa, a forma e o momento damorte, a pessoa responsável e o procedimento ouprática susceptível de a ter provocado. Durantea investigação será feita uma autópsia adequada,serão recolhidas e analisadas todas as provasmateriais e documentais e serão ouvidos osdepoimentos das testemunhas. A investigação dis-tinguirá entre a morte por causas naturais, amorte por acidente, o suicídio e o homicídio.

10. A autoridade de investigação terá poderes paraobter toda a informação necessária à investigação.As pessoas que dirijam a investigação disporão detodos os recursos orçamentais e técnicos necessáriospara uma investigação eficaz e terão tambémpoderes para obrigar os funcionários suposta-mente implicados em tais execuções a comparecere a prestar depoimento. A mesma regra aplicar-se--á às testemunhas. Para tal fim, poderão notificaras testemunhas - incluindo os funcionários supos-tamente implicados e ordenar a apresentação deprovas.

11. Nos casos em que os procedimentos de inves-tigação estabelecidos se mostrem insuficientesdevido à falta de competência ou de imparcialidade,à importância do assunto ou aos indícios de exis-tência de uma habitual conduta abusiva, bemcomo naqueles em que haja queixas da famíliapor tais insuficiências ou haja outros motivossubstanciais para isso, os Governos procederão ainvestigações através de uma comissão de inqué-rito independente ou de outro procedimentoanálogo. Os membros dessa comissão serão esco-lhidos em razão da sua comprovada imparcialidade,competência e independência pessoal. Em parti-cular, deverão ser independentes de qualquer ins-tituição ou pessoa que possa ser alvo dainvestigação. A comissão terá a faculdade de obtertoda a informação necessária à investigação e levá-la-á a cabo de acordo com o estabelecido nestes Prin-cípios.

12. Não poderá proceder-se à inumação, incinera-ção, etc., do corpo da pessoa falecida até que ummédico, se possível perito em medicina legal,tenha realizado uma autópsia adequada. As pessoasque realizem a autópsia terão acesso a todos osdados da investigação, ao lugar onde foi desco-berto o corpo e àquele em que se suponha que ocor-reu a morte. Se depois de ter sido enterrado ocorpo se mostre necessária uma investigação, seráo mesmo exumado sem demora e de forma ade-quada à realização de uma autópsia. No caso de sedescobrirem restos ósseos, deverá proceder-se à res-pectiva exumação com as precauções necessáriase ao seu estudo, de acordo com as técnicas siste-máticas da antropologia.

Anexos* 269

Page 301: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

13. O corpo da pessoa falecida deverá estar à dis-posição de quem realize a autópsia durante umperíodo suficiente para permitir uma investiga-ção minuciosa. Na autópsia dever-se-á tentardeterminar, pelo menos, a identidade da pessoafalecida e a causa e circunstâncias da morte. Namedida do possível, deverão precisar-se tambémo momento e o lugar em que ela ocorreu. Deve-rão incluir-se no relatório da autópsia fotogra-fias pormenorizadas, a cores, da pessoa falecida,com o objectivo de documentar e corroborar asconclusões da investigação. O relatório da autóp-sia deverá descrever todas e cada uma das lesõesapresentadas pela pessoa falecida e incluir qual-quer indício de tortura.

14. Com o fim de garantir a objectividade dosresultados, é necessário que quem realize a autóp-sia possa actuar de forma imparcial e com inde-pendência em relação a quaisquer pessoas,organizações ou entidades potencialmente impli-cadas.

15. Os litigantes, as testemunhas, quem realize ainvestigação e as suas famílias serão protegidos deactos ou ameaças de violência ou de qualqueroutra forma de intimação. Quem esteja suposta-mente implicado em execuções extrajudiciais,arbitrárias ou sumárias será afastado de todas asfunções que impliquem um controlo ou poder,directo ou indirecto, sobre os litigantes, as teste-munhas e suas famílias, bem como sobre quem levea cabo as investigações.

16. Os familiares da pessoa falecida e os seusrepresentantes legais serão informados dasaudiências que se realizem a que terão acesso,bem como a toda a informação pertinente àinvestigação e terão direito a apresentar outrasprovas. A família do falecido terá direito a insis-tir em que um médico ou outro seu represen-tante qualificado esteja presente na autópsia.Uma vez determinada a identidade do falecido,anunciar-se-á publicamente o seu falecimento enotificar-se-á imediatamente a família ou osparentes. O corpo da pessoa falecida será devol-vido aos seus familiares, depois de completadaa investigação.

17. Será feito em tempo razoável um relatórioescrito sobre os métodos e conclusões das inves-tigações. O relatório será publicado imediata-mente e nele serão expostos o alcance dainvestigação, os procedimentos e métodos utili-zados para avaliar as provas e as conclusões e reco-mendações baseadas nos resultados de facto e nalegislação aplicável. O relatório exporá também, por-menorizadamente, os factos concretos ocorridos,de acordo com os resultados das investigações,bem como as provas em que tais conclusões este-jam baseadas, e enumerará os nomes das teste-munhas que hajam prestado depoimento, àexcepção daquelas cuja identidade se mantenhareservada por razões de protecção. O Governo res-ponderá num prazo razoável ao relatório da inves-tigação, ou indicará as medidas que, na sequênciado mesmo, serão adoptadas.

PROCEDIMENTOS JUDICIAIS

18. Os Governos velarão para que as pessoas quea investigação tenha identificado como partici-pantes em execuções extrajudiciais, arbitrárias ousumárias sejam julgadas em qualquer território sobsua jurisdição. Os Governos farão comparecer taispessoas perante a justiça ou colaborarão na suaextradição para outros países que se proponhamjulgá-las. Este princípio será aplicado indepen-dentemente de quem quer que sejam os agentesou as vítimas, do lugar em que se encontrem, dasua nacionalidade e do lugar em que se praticouo crime.

19. Sem prejuízo do estabelecido no princípio 3,supra, não poderá ser invocada uma ordem de umfuncionário superior ou de uma autoridadepública como justificação para execuções extra-judiciais, arbitrárias ou sumárias. Os funcioná-rios superiores, oficiais ou outros funcionáriospúblicos poderão ser considerados responsáveispelos actos cometidos por funcionários subor-dinados à sua autoridade se tiveram uma possi-bilidade, razoável, de evitar os ditos actos. Emcircunstância alguma, nem sequer em estado deguerra, de sítio ou noutra emergência pública,será concedida, previamente ao processo, imu-nidade geral às pessoas supostamente implica-

270 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 302: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

das em execuções extrajudiciais, arbitrárias ousumárias.

20. As famílias e as pessoas que estejam a cargodas vítimas de execuções extrajudiciais, arbitrá-rias ou sumárias terão direito a receber, numprazo razoável, uma indemnização justa e sufi-ciente.

9. REGRAS MÍNIMAS DAS

NAÇÕES UNIDAS PARA A

ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA DE MENORES

«REGRAS DE BEIJING»8

[ PRIMEIRA PARTE ]PRINCÍPIOS GERAIS

1. Orientações fundamentais

1.1 Os Estados membros procurarão, em con-formidade com os seus interesses gerais, promo-ver o bem-estar do menor e da sua família.

1.2 Os Estados membros esforçar-se-ão por criarcondições que assegurem ao menor uma vida útilna comunidade fomentando, durante o períodode vida em que o menor se encontre mais expostoa um comportamento desviante, um processo dedesenvolvimento pessoal e de educação afastadotanto quanto possível de qualquer contacto com acriminalidade e a delinquência.

1.3 É necessário tomar medidas positivas queassegurem a mobilização completa de todos osrecursos existentes incluindo a família, os volun-tários e os outros grupos comunitários, assimcomo as escolas e outras instituições comunitárias,com o fim de promover o bem-estar do menor ereduzir a necessidade de intervenção da lei e tra-tar de forma eficaz, equitativa e humanitária ojovem em conflito com a lei.

1.4 A Justiça de menores deve ser concebidacomo parte integrante do processo de desenvolvi-mento nacional de cada país, no quadro geral da

justiça social para todos os jovens, contribuindoassim, ao mesmo tempo, para a protecção dosjovens e a manutenção da paz e da ordem na socie-dade.

1.5 A aplicação destas regras deve ser feita den-tro do contexto das condições económicas, sociaise culturais existentes em cada Estado membro.

1.6 Os serviços de Justiça de menores devem sersistematicamente desenvolvidos e coordenadostendo em vista aperfeiçoar e apoiar a capacidadedos funcionários que trabalham nestes serviços, emespecial os seus métodos, modos de actuação eatitudes.

Comentário:Estas orientações básicas de carácter geral refe-rem-se à política social no seu conjunto e visam pro-mover ao máximo a protecção social dos jovens,para evitar a necessidade de intervenção do sistemade Justiça de menores e o prejuízo muitas vezes cau-sado por essa intervenção. Estas medidas de pro-tecção social dos jovens, antes da passagem àdelinquência, são absolutamente indispensáveispara evitar a necessidade de aplicação das pre-sentes regras.

As regras 1.1 a 1.3 sublinham o papel importanteque uma política social construtiva em benefíciodos jovens pode desempenhar, designadamentena prevenção do crime e da delinquência juvenis.A regra 1.4 define a Justiça de menores como parteintegrante da Justiça social para os jovens,enquanto a regra 1.6 se refere à necessidade de seaperfeiçoar constantemente a Justiça de menores,para que esta não se afaste da evolução de uma polí-tica social progressista elaborada em benefício dosjovens em geral e tendo em mente a necessidadede melhorar constantemente a qualidade dos ser-viços competentes.

A regra 1.5 procura ter em consideração as condi-ções existentes nos Estados membros o que pode-ria fazer com que a forma de aplicação dedeterminadas regras num desses Estados fossenecessariamente diferente da forma adoptadanoutros.

Anexos* 271

8 Adoptado pela AssembleiaGeral na sua resolução 40/33de 29 de Novembro de 1985.

Page 303: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

2. Campo de aplicação das regras e definiçõesutilizadas

2.1 As Regras Mínimas a seguir enunciadasserão aplicadas imparcialmente aos jovens delin-quentes, sem qualquer distinção, designada-mente de raça, cor, sexo, língua, religião, deopiniões políticas ou outras, de origem nacionalou social, de condição económica, nascimento ououtra condição.

2.2 Para os fins das presentes Regras, as defini-ções a seguir enunciadas serão aplicadas pelosEstados membros de modo compatível com osseus respectivos sistemas e conceitos jurídicos:

a) Menor é qualquer criança ou jovem que, em rela-ção ao sistema jurídico considerado, pode serpunido por um delito, de forma diferente da de umadulto;b) Delito é qualquer comportamento (acto ouomissão) punível por lei em virtude do sistema jurí-dico considerado;c) Delinquente juvenil é qualquer criança oujovem acusado de ter cometido um delito ou con-siderado culpado de ter cometido um delito.

2.3 Em cada país, procurar-se-á promulgar umconjunto de leis, normas e disposições especial-mente aplicáveis aos delinquentes juvenis e àsinstituições e organismos encarregados da admi-nistração da Justiça de menores e destinado:

a) A responder às necessidades específicas dosdelinquentes juvenis, protegendo ao mesmotempo os seus direitos fundamentais;b) A responder às necessidades da sociedade;c) A aplicar efectiva e equitativamente as regras aseguir enunciadas.

Comentário:As Regras Mínimas estão deliberadamente for-muladas de forma a serem aplicadas em sistemasjurídicos diferentes e, ao mesmo tempo, a fixaremnormas mínimas para o tratamento dos delin-quentes juvenis, qualquer que seja a definição dejovem e qualquer que seja o sistema que lhes é apli-cado. Estas Regras devem ser sempre aplicadas

imparcialmente e sem qualquer espécie de dis-tinção.

A regra 2.1 sublinha a importância das regrasserem aplicadas imparcialmente e sem qualquerespécie de distinção. Segue a formulação do prin-cípio 2 da Declaração dos Direitos da Criança.

A regra 2.2 define os termos «menor» e «delito»como componentes da noção de «delinquentejuvenil», que constitui o objecto principal das pre-sentes Regras Mínimas (contudo, ver também asregras 3 e 4).

Note-se que os limites de idade dependem expres-samente de cada sistema jurídico, respeitandoassim totalmente os sistemas económicos, sociais,políticos e culturais dos Estados membros. Isto fazcom que a noção de menor se aplique a jovens deidades muito diferentes, que vão dos 7 aos 18 anosou mais. Esta disparidade é inevitável, dada adiversidade dos sistemas jurídicos nacionais e nãodiminui em nada o impacto destas Regras Míni-mas.

A regra 2.3 prevê a necessidade de legislaçãonacional específica, destinada a assegurar amelhor aplicação possível destas Regras Mínimas,tanto no plano jurídico como prático.

3. Extensão das Regras

3.1 As disposições pertinentes das presentesRegras serão aplicadas não só aos delinquentesjuvenis, mas também aos menores que possam serprocessados por qualquer comportamento espe-cífico, que não seria punido se fosse cometido porum adulto.

3.2 Procurar-se-á alargar os princípios contidosnas presentes Regras a todos os menores a quemse apliquem medidas de protecção e assistênciasocial.

3.3 Procurar-se-á também alargar os princípiosincorporados nas presentes Regras aos jovensadultos delinquentes.

272 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 304: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Comentário:A regra 3 alarga a protecção concedida pelasRegras Mínimas para a Administração da Justiçade Menores:

a) Aos chamados «delitos de status», previstosem vários sistemas jurídicos nacionais onde agama de comportamentos considerados comodelitos é maior para os jovens do que para osadultos (p. ex., absentismo escolar, indisciplinaescolar e familiar, embriaguez pública, etc.)(regra 3.1);b) Às medidas de protecção e auxílio social em favordos jovens (regra 3.2);c) Ao tratamento dos jovens adultos delinquentes,segundo o limite de idade fixado em cada caso(regra 3.3).

O alargamento das regras a estes três domíniosparece justificar-se. A regra 3.1 prevê garantiasmínimas nestes domínios e a regra 3.2 é conside-rada como um passo desejável no sentido de umaJustiça penal mais justa, mais equitativa e maishumana para todos os menores que entram em con-flito com a lei.

4. Idade da responsabilidade penal

4.1 Nos sistemas jurídicos que reconhecem anoção de responsabilidade penal em relação aosmenores, esta não deve ser fixada a um níveldemasiado baixo, tendo em conta os problemas dematuridade afectiva, psicológica e intelectual.

Comentário:A idade mínima e os efeitos de responsabilidadepenal variam muito segundo as épocas e as cul-turas. A atitude moderna consiste em perguntarse uma criança pode suportar as consequênciasmorais e psicológicas da responsabilidade penal;isto é, se uma criança, dada a sua capacidade dediscernimento e de compreensão, pode ser con-siderada responsável por um comportamentoessencialmente anti-social. Se a idade da respon-sabilidade penal for fixada a nível demasiadobaixo ou se não existir um limite mínimo, a noçãode responsabilidade deixará de ter qualquer sen-

tido. Em geral, existe uma estreita ligação entre anoção de responsabilidade por um comporta-mento delituoso ou criminal e outros direitos e res-ponsabilidades sociais (tais como o estado decasado, a maioridade civil, etc.).

Será, pois, necessário encontrar um limite deidade razoável, que seja internacionalmente apli-cável.

5. Objectivos da Justiça de menores

5.1. O sistema da Justiça de menores deve dar amaior importância ao bem-estar destes e assegu-rar que qualquer decisão em relação aos delin-quentes juvenis seja sempre proporcional àscircunstâncias especiais tanto dos delinquentescomo do delito.

Comentário:A regra 5 diz respeito a dois dos objectivos maisimportantes da Justiça de menores. O primeiro éa promoção do bem-estar do menor. Este é o prin-cipal objectivo dos sistemas jurídicos onde oscasos dos delinquentes juvenis são examinadospelos tribunais de família ou pelas autoridadesadministrativas, mas também os sistemas jurídi-cos que seguem o modelo do tribunal penaldeverão promover o bem-estar dos menores, con-tribuindo assim para evitar sanções meramentepunitivas (ver, igualmente, a regra 14.).

O segundo objectivo é o «princípio da proporcio-nalidade». Este princípio é bem conhecido comoum instrumento que serve para moderar as san-ções punitivas, relacionando-as geralmente com agravidade do crime. Em relação aos delinquentesjuvenis deve ter-se em conta não só a gravidade dainfracção, mas também as circunstâncias pessoais.As circunstâncias individuais do delinquente (taiscomo a condição social, a situação familiar, o danocausado pela infracção ou outros factores em queintervenham circunstâncias pessoais) deveminfluenciar a proporcionalidade da decisão (porexemplo, tendo em conta o esforço do delinquentepara indemnizar a vítima ou o seu desejo de ence-tar uma vida sã e útil).

Anexos* 273

Page 305: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Do mesmo modo, as decisões que visam assegu-rar a protecção do delinquente juvenil podem irmais longe do que o necessário e infringir assimos seus direitos fundamentais, como aconteceuem alguns sistemas de Justiça de menores. Tam-bém aqui é necessário salvaguardar a proporcio-nalidade da decisão em relação às circunstânciasespecíficas do delinquente, da infracção, assimcomo da vítima.

Essencialmente a regra 5 pede apenas uma deci-são justa em todos os casos de delinquência e decriminalidade juvenis. Os dois aspectos encara-dos na regra podem permitir a realização de novosprogressos a dois níveis: é tão desejável aplicarmedidas de um tipo novo e original como conse-guir evitar o aumento excessivo da rede de controlosocial sobre os menores.

6. Alcance do poder discricionário

6.1 Dadas as diferentes necessidades específicasdos menores e a diversidade de medidas possí-veis, deve ser previsto um poder discricionáriosuficiente em todas as fases do processo e a dife-rentes níveis da administração da Justiça de meno-res, designadamente nas fases de instrução, deacusação, de julgamento e de aplicação e segui-mento das medidas tomadas.

6.2 Contudo, devem ser feitos esforços no sentidode assegurar que este poder discricionário sejaexercido de um modo responsável, em todas as fasesdo processo e a todos os níveis.

6.3 As pessoas que o exercem devem ser espe-cialmente qualificadas ou formadas para o exercerjudiciosamente e de acordo com as suas funçõese mandatos respectivos.

Comentário:As regras 6.1, 6.2 e 6.3 tratam de vários aspec-tos importantes para a administração de umajustiça de menores eficaz, justa e humana: anecessidade de se permitir o exercício do poderdiscricionário em todas as fases importantes doprocesso para que as pessoas que tomam deci-

sões possam adoptar as medidas consideradasmais apropriadas em cada caso; e a necessidadede prever medidas de controlo e equilíbrios quelimitem o abuso do poder discricionário eprotejam os direitos do jovem delinquente. Aresponsabilidade e o profissionalismo são con-siderados como as qualidades mais necessáriaspara moderar um poder discricionário dema-siado amplo. Assim, as qualificações profis-sionais e a formação especializada são aquiapresentadas como meios de assegurar o exercíciojudicioso do poder discricionário nos assuntosrelativos aos jovens delinquentes (ver também asregras 1.6 e 2.2). A formulação de directrizesespecíficas sobre o exercício do poder discricio-nário e a criação de um sistema de revisão, derecurso, etc. que permitam o exame das decisõese que assegurem que aqueles que as tomam têmo sentido da sua responsabilidade, são subli-nhadas neste contexto. Tais mecanismos não sãoaqui especificados, uma vez que não se prestamfacilmente à inclusão num conjunto de RegrasMínimas internacionais, que não pode, obvia-mente, abranger todas as diferenças que existemnos sistemas de Justiça.

7. Direitos dos menores

7.1 As garantias fundamentais do processo, taiscomo a presunção de inocência, o direito de sernotificado das acusações, o direito de não res-ponder, o direito à assistência judiciária, o direitoà presença dos pais ou tutor, o direito de interrogare confrontar as testemunhas e o direito aorecurso serão asseguradas em todas as fases doprocesso.

Comentário:A regra 7.1 sublinha alguns pontos importantes queapresentam os elementos essenciais de um julga-mento equitativo e que são internacionalmentereconhecidos nos instrumentos existentes dosdireitos do homem (ver também a regra 14).A presunção de inocência, por exemplo, figuraigualmente no artigo 11 da Declaração Universal dosDireitos do Homem e no artigo 14.2 do PactoInternacional sobre Direitos Civis e Políticos.

274 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 306: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

As regras 14 e seguintes das presentes RegrasMínimas especificam os elementos importantes nosprocessos que envolvam menores em particular,enquanto a regra 7.1 afirma, de um modo geral, asgarantias processuais mais importantes.

8. Protecção da vida privada

8.1 O direito do menor à protecção da sua vidaprivada deve ser respeitado em todas as fases afim de se evitar que seja prejudicado por umapublicidade inútil ou pelo processo de estigma-tização.

8.2 Em princípio, não deve ser publicadanenhuma informação que possa conduzir à iden-tificação de um delinquente juvenil.

Comentário:A regra 8 sublinha a importância da protecção dodireito do menor à vida privada. Os jovens sãoparticularmente sensíveis à estigmatização. Asinvestigações criminológicas neste domínio mos-traram os efeitos perniciosos (de toda a espécie)resultantes do facto de os jovens serem qualifica-dos, de uma vez por todas, como «delinquentes»ou «criminosos».

A regra 8 mostra que é necessário proteger osjovens dos efeitos nocivos da publicidade, nosmeios de comunicação, de informações sobre o seucaso (por exemplo, o nome dos jovens delinquen-tes, acusados ou condenados). É preciso protegere respeitar, pelo menos em princípio, o interessedo indivíduo. (O conteúdo geral da regra 8 é espe-cificado, à frente, na regra 21).

9. Cláusula de protecção

9.1 Nenhuma disposição das presentes Regraspoderá ser interpretada como excluindo a aplica-ção das Regras Mínimas das Nações Unidas parao Tratamento de Reclusos e dos outros instru-mentos e regras reconhecidos pela comunidadeinternacional e relativos ao tratamento e à protec-ção dos jovens.

Comentário:A regra 9 visa evitar qualquer confusão na inter-pretação e aplicação das presentes Regras em con-formidade com outras normas e instrumentosinternacionais dos direitos do homem, existentesou em elaboração tais como a Declaração Univer-sal dos Direitos do Homem, o Pacto Internacionalsobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturaise o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis ePolíticos e a Declaração dos Direitos da Criança1e o projecto de Convenção sobre os Direitos daCriança. Entende-se que a aplicação das presentesRegras não prejudica nenhum outro instrumentointernacional que contenha disposições de aplica-ção mais lata 10 (veja-se igualmente a regra 27).

[ SEGUNDA PARTE ]INVESTIGAÇÃO E PROCEDIMENTO

10. Primeiro contacto

10.1.Sempre que um menor é detido, os pais ou otutor devem ser imediatamente notificados ou, seisso não for possível, deverão vê-lo no mais curtoprazo de tempo.

10.2 O Juiz ou qualquer outro funcionário ou orga-nismo competente deverá examinar imediata-mente a possibilidade de libertar o menor.

10.3 Os contactos entre os organismos encarrega-dos de fazer cumprir a lei e o jovem delinquentedeverão ser estabelecidos de forma a respeitar o esta-tuto jurídico do menor, a favorecer o seu bem--estar e a evitar prejudicá-lo, tendo em conta ascircunstâncias do caso.

Comentário:A regra 10 está contida, em princípio, na regra 92das Regras Mínimas para o Tratamento de Reclu-sos.A questão da libertação (regra 10.2) deve ser exa-minada sem delongas pelo juiz ou qualquer outrofuncionário competente. Este último termo refere--se a qualquer pessoa ou instituição, no sentido maislato do termo, incluindo os conselhos comunitá-

Anexos* 275

Page 307: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

rios ou autoridades policiais com competênciapara libertarem as pessoas detidas (ver também oparágrafo 3.o do artigo 9.o do Pacto Internacionalsobre os Direitos Civis e Políticos).

A regra 10.3. trata de aspectos fundamentais relati-vos aos processos e ao comportamento dos políciasou outros agentes dos organismos encarregados defazer cumprir a lei nos casos de delinquência juve-nil. A expressão «evitar prejudicá-lo» é, semdúvida, vaga e cobre muitos aspectos possíveis deinteracção (palavras, violência física, riscos devidosao meio). Como o próprio envolvimento num pro-cesso de Justiça de menores pode em si ser«nocivo» para os jovens, a expressão «evitar pre-judicá-lo» deve ser compreendida como signifi-cando, antes de mais, a redução ao mínimo dodano infligido aos menores e o evitar qualquerprejuízo suplementar ou indevido. Isto é espe-cialmente importante no primeiro contacto com osorganismos encarregados de fazer cumprir a lei,porque esse contacto pode influenciar profunda-mente a atitude do menor em relação ao Estado eà sociedade. Além disso, o sucesso de qualqueroutra intervenção depende destes primeiros con-tactos. A benevolência e a firmeza são essenciaisem tais situações.

11. Recurso a meios extrajudiciais

11.1. Sempre que possível tentar-se-á tratar o casodos delinquentes juvenis evitando o recurso a umprocesso judicial perante a autoridade competentereferida na regra 14.1 infra.

11.2 A polícia, o Ministério Público e os outrosorganismos que se ocupem de casos de delin-quência juvenil poderão lidar com eles discricio-nariamente, evitando o recurso ao formalismoprocessual penal estabelecido, antes faseando-se emcritérios fixados para esse efeito nos seus sistemasjurídicos e nas presentes regras.11.3 Qualquer recurso a meios extrajudiciais queimplique o encaminhamento para serviços comu-nitários ou outros serviços competentes exige o con-sentimento do interessado, dos seus pais ou do seututor; contudo, a decisão relativa à remessa do

caso será sujeita a exame por uma autoridadecompetente, se isso for solicitado.

11.4 A fim de facilitar a abordagem discricionáriados casos de delinquência juvenil, procurará orga-nizar-se programas comunitários, designada-mente de vigilância e de orientação temporárias eassegurar a restituição dos bens e a indemnizaçãodas vítimas.

Comentário:O recurso a meios extrajudiciais, que permite evi-tar um processo penal e implica, muitas vezes, oencaminhamento para os serviços comunitários écomummente aplicado, de forma oficial e oficiosa,em sistemas jurídicos. Esta prática permite evitaras consequências negativas de um processo nor-mal na administração da Justiça de menores (porexemplo, o estigma de uma condenação e de umjulgamento). Em muitos casos, a não intervençãoseria a melhor solução. Assim, o recurso a meiosextrajudiciais desde o começo, sem encaminha-mento para serviços (sociais) alternativos, podeconstituir a melhor resposta. É, assim, sobretudoquando o delito não é de natureza grave e quandoa família, a escola ou outras instituições de controlosocial informal já reagiram, ou estão em vias de rea-gir, de modo adequado e construtivo.

Tal como é apontado na regra 11.2., o recurso ameios extrajudiciais pode dar-se em qualquer faseda tomada de decisão - pela polícia, pelo Ministé-rio Público ou outras instituições, tais como tri-bunais, comissões ou conselhos. Pode ser exercidopor uma ou várias destas instâncias ou por todas,segundo as regras e políticas nos diferentes siste-mas e de acordo com o espírito das presentesregras. O recurso a meios extrajudiciais é um ins-trumento importante, que não deve ser necessa-riamente limitado a casos de menor gravidade.

A regra 11.3 sublinha a necessidade de se assegu-rar o consentimento do delinquente juvenil (ou dosseus pais ou tutor) às medidas extrajudiciais reco-mendadas. (O recurso a serviços comunitáriossem este consentimento violaria a Convençãosobre a Abolição dos Trabalhos Forçados). Con-tudo, esse consentimento não deve ser irreversível,

276 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 308: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

porque muitas vezes, pode ser dado pelo menor,em desespero de causa. A regra sublinha a neces-sidade de se minimizarem as possibilidades de coacção e de intimidação a todos os níveis doprocesso de recurso a meios extrajudiciais. Osmenores não se devem sentir pressionados (porexemplo, para evitarem comparecer perante o tri-bunal) ou coagidos a dar o seu consentimento.Assim, recomenda-se a tomada de medidas que per-mitam uma avaliação objectiva da conveniênciada intervenção, em relação aos jovens delinquen-tes, de uma «autoridade competente, se isso for soli-citado». (A autoridade competente pode serdiferente da referida na regra 14).

A regra 11.4 recomenda que se prevejam alterna-tivas viáveis para substituir o processo normal daJustiça de menores, na forma de programas detipo comunitário; recomenda-se, em especial, os queprevêem a restituição de bens às vítimas ou quepermitem evitar que os menores entrem, defuturo, em conflito com a lei, graças a uma vigi-lância e orientação temporárias. São as circuns-tâncias especiais de cada caso que justificam orecurso a meios extrajudiciais, mesmo quandoforam cometidas infracções mais graves (primeirainfracção, acto cometido sob pressão de compa-nheiros do menor, etc.)

12. Especialização nos serviços de polícia

12.1 Para melhor cumprir as suas funções, os polí-cias que se ocupam frequentemente, ou exclusi-vamente, de menores ou que se dedicamessencialmente à prevenção da delinquência juve-nil devem receber uma instrução e uma formaçãoespeciais. Com este fim deveriam ser criados nasgrandes cidades serviços especiais de polícia.

Comentário:A regra 12 chama a atenção para a necessidade deuma formação especializada para todos os funcio-nários responsáveis pela aplicação da lei que parti-cipam na administração da Justiça de menores.Como a polícia é sempre o primeiro ponto de con-tacto com o sistema de Justiça de menores, é impor-tante que actue de maneira informada e adequada.

Embora a relação entre a urbanização e a crimi-nalidade seja muito complexa, associa-se, muitasvezes, o aumento de delinquência juvenil com odesenvolvimento das grandes cidades, sobretudoquando este é rápido e anárquico. Seriam, pois,indispensáveis serviços de polícia especializados,não só para aplicar os princípios enunciados naspresentes Regras (por exemplo, na regra 1.6) masainda, de modo mais geral, para melhorar a eficáciada prevenção e da repressão da delinquência juve-nil e do tratamento dos jovens delinquentes.

13. Prisão preventiva

13.1 A prisão preventiva constitui uma medida deúltimo recurso e a sua duração deve ser o mais curtapossível.

13.2 Sempre que for possível, a prisão preventivadeve ser substituída por outras medidas, tais comouma vigilância apertada, uma assistência muitoatenta ou a colocação em família, em estabeleci-mentos ou em lar educativo.

13.3 Os menores em prisão preventiva devembeneficiar de todos os direitos e garantias previs-tos nas Regras Mínimas das Nações Unidas parao Tratamento de Reclusos.

13.4 Os menores em prisão preventiva devem estarseparados dos adultos e ser detidos em estabele-cimentos diferentes ou numa parte separada de umestabelecimento em que também se encontramdetidos adultos.

13.5 Durante a sua prisão preventiva, os menoresdevem receber cuidados, protecção e toda a assis-tência individual - no plano social, educativo, pro-fissional, psicológico, médico e físico - de quenecessitem, tendo em conta a sua idade, sexo e per-sonalidade.

Comentário:O perigo de «contaminação criminal» para osjovens presos preventivamente não deve sersubestimado. É, pois, importante sublinhar anecessidade de medidas alternativas. Ao fazê-lo, a

Anexos* 277

Page 309: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

regra 13.1 encoraja a elaboração de medidas novase inovadoras destinadas a evitar a prisão preven-tiva no interesse do bem-estar do menor.

Os menores em prisão preventiva beneficiam detodos os direitos e garantias previstos nas RegrasMínimas para o Tratamento de Reclusos bemcomo no Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos em especial no artigo 9.o, e na alí-nea b), do parágrafo 2.o e no parágrafo 3.o doartigo 10.o.

A regra 13.4 não impede os Estados de tomaremoutras medidas de protecção contra a influêncianefasta dos delinquentes adultos, que sejam pelomenos tão eficazes como as que aí são mencio-nadas.

Foram enumeradas diversas formas de assistênciaque podem ser necessárias para chamar a atençãopara a larga gama de necessidades especiais dosjovens detidos (por exemplo, consoante se trate dehomens ou mulheres, de toxicómanos, de alcoó-licos, de jovens doentes mentais ou de jovens trau-matizados, designadamente após a sua detenção,etc.).

As diversas características físicas e psicológicasdos jovens detidos podem justificar medidas quepermitam separá-los dos outros quando estão deti-dos preventivamente, e que contribuam para evi-tar que se tornem vítimas de outros reclusos eque possam beneficiar da assistência mais apro-priada ao seu caso.

O Sexto Congresso das Nações Unidas para a Pre-venção do Crime e o Tratamento dos Delinquen-tes, na sua Resolução 4, sobre a elaboração deRegras Mínimas para a Administração da Justiçade Menores especificou que as regras deveriam,entre outros aspectos, reflectir o princípio de basesegundo o qual a prisão preventiva só deve serutilizada em último recurso, que nenhum menordeve ser detido num estabelecimento onde estejasujeito a sofrer a influência negativa de adultosdelinquentes e que é necessário ter sempre em con-sideração as necessidades próprias do seu estadode desenvolvimento.

[ TERCEIRA PARTE ]JULGAMENTO E DECISÃO

14. Autoridade competente para julgar

14.1 Se o caso de um jovem delinquente não foiobjecto de um processo extrajudicial (previsto naregra 11), é examinado pela autoridade competente(tribunal, comissão, conselho, etc.) de acordo comos princípios de um processo justo e equitativo.

14.2 O processo favorecerá os interesses do menore será conduzido numa atmosfera de compreen-são, que permita ao jovem participar e expressar-se livremente.

Comentário:É difícil dar uma definição do organismo ou de pes-soa competente que descreva de modo univer-salmente aceitável a autoridade jurisdicional. Aexpressão «autoridade competente» deve com-preender as pessoas que presidem aos tribunais(compostos por um ou vários membros), incluindomagistrados profissionais e não profissionais, assimcomo as comissões administrativas (sistema escocêse escandinavo, por exemplo) ou outros organismoscomunitários de carácter mais informal, especializadosna resolução de conflitos e de carácter jurisdicional.

O processo seguido para julgar os jovens delin-quentes deve, de qualquer modo, conformar-secom as normas mínimas, asseguradas quase uni-versalmente a qualquer acusado, expressas pelo res-peito das fórmulas legais. Nestas fórmulas, umprocesso «justo e equitativo» compreende garan-tias fundamentais, tais como a presunção de ino-cência, a apresentação e exame de testemunhas,meios comuns de defesa, o direito de não res-ponder, o direito final de réplica, o direito derecurso, etc. (ver igualmente a regra 7.1).

15. Assistência judiciária e direitos dos pais etutores

15.1 Ao longo de todo o processo, o menor tem odireito de ser representado pelo seu advogado ou

278 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 310: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

pedir a designação de um advogado oficioso,quando existam no país disposições legais queprevejam essa assistência.

15.2 Os pais ou o tutor podem participar no pro-cesso e a autoridade competente pode, no inte-resse do menor, requerer que o façam. Esta pode,contudo, recusar essa participação se existiremrazões para supor que essa exclusão é necessáriano interesse do menor.

Comentário:A regra 15.1. utiliza uma terminologia paralela à doregra 93 das Regras Mínimas para o Tratamentode Reclusos 10. Enquanto a assistência de umadvogado ou assistência judiciária gratuita énecessária para assegurar a assistência judiciáriado menor, o direito à participação dos pais oututor, tal como é enunciado na regra 15.2., deve serconsiderado como uma assistência geral ao menorde carácter psicológico e afectivo, função que per-siste ao longo de todo o processo.

A procura de uma solução adequada pela autori-dade competente pode ser facilitada, designada-mente, pela cooperação dos representantes legaisdo menor (ou de outra pessoa, em quem o menorpossa ter ou tenha efectivamente confiança). Masjá não é assim se a presença dos pais ou do tutordesempenha um papel negativo na audiência; porexemplo, se eles manifestam uma atitude hostil emrelação ao menor; donde as disposições relativasà possibilidade da sua exclusão.

16. Relatórios de inquérito social

16.1 Para facilitar o julgamento do caso pela autori-dade competente e a menos que se trate de infrac-ções leves, antes da autoridade competente tomar adecisão final, os antecedentes do menor, as condi-ções em que vive e as circunstâncias em que o delitofoi cometido são objecto de um inquérito profundo.

Comentário:Os relatórios de inquérito social (relatórios sociaisou relatórios pré-sentenciais) são uma ajuda indis-pensável na maior parte dos casos referentes a

processos judiciais contra jovens delinquentes. Aautoridade competente deve ser informada sobrefactos importantes referentes ao menor, tais comoos seus antecedentes sociais e familiares, a sua esco-laridade, as suas experiências em matéria de edu-cação, etc. Certas jurisdições recorrem, com estefim, a serviços sociais especializados ou a pessoaldependente dos tribunais ou das comissões. Exis-tem outras pessoas, designadamente os agentes dosserviços de prova, que podem desempenhar amesma função. A regra exige, pois, que serviçossociais adequados estejam encarregados de ela-borar relatórios de inquérito social apropriados.

17. Princípios relativos ao julgamento e à decisão

17.1 A decisão de qualquer autoridade competentedeve basear-se nos seguintes princípios:

a) A decisão deve ser sempre proporcional não sóàs circunstâncias e gravidade da infracção, mastambém às circunstâncias e necessidades dojovem delinquente, assim como às necessidades dasociedade;b) As restrições à liberdade pessoal do menor sãoimpostas somente depois de um estudo cuidadosoe limitadas ao mínimo possível;c) A privação da liberdade individual só é impostase o menor for considerado culpado de um factograve que implique violência contra outra pessoaou de reincidência noutros crimes graves e se nãoexistir outra solução adequada;d) O bem-estar do menor deve ser o elementocondutor no exame do caso.

17.2 A pena de morte não é aplicável aos crimescometidos por menores.

17.3 Os menores não estão sujeitos a castigos cor-porais.

17.4 A autoridade competente pode suspender oprocesso em todo e qualquer momento.

Comentário:A principal dificuldade na formulação de princípiosorientadores do julgamento de menores resulta

Anexos* 279

Page 311: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

do facto de existirem ainda conflitos não resolvi-dos, de natureza filosófica, tais como os seguintes:

a) Reinserção social ou sanção merecida;b) Assistência ou repressão e castigo;c) Reacção adaptada às características de um casoindividual ou reacção inspirada na protecção dasociedade em geral;d) Dissuasão geral ou protecção individual.

O conflito entre estas soluções é mais grave no casodos menores do que no dos adultos. Perante agrande diversidade das causas e das reacções quecaracterizam os casos referentes a menores, todasestas alternativas se encontram estritamente liga-das. A função das Regras Mínimas para a admi-nistração da Justiça de menores não é prescrevera solução a seguir, mas definir a que esteja maisde acordo com os princípios universalmente acei-tes. É por isso que os princípios enunciados na regra17.1 e, em especial, nas alíneas a) e c), devem serconsiderados como linhas de orientação práticas,que permitam assegurar um ponto de partidacomum; se as autoridades os tiverem em conta (verigualmente a regra 5), estes princípios poderãocontribuir consideravelmente para assegurar aprotecção dos direitos fundamentais dos jovens,designadamente em matéria de desenvolvimentopessoal e de educação.

A alínea b) da regra 17.1 afirma que não são con-venientes soluções puramente punitivas. Quandose trata de adultos e talvez também em casos deinfracções graves cometidas por jovens, as noçõesde pena merecida e de sanções adaptadas à gravi-dade da infracção podem ser relativamente justi-ficadas, mas nos casos referentes a menores ointeresse e o futuro do menor deve sempre sobre-por-se a considerações deste género.

De acordo com a resolução 8 do Sexto Congressodas Nações Unidas 14, esta regra encoraja orecurso, sempre que possível a alternativas àmedida de colocação institucional, tendo emmente a preocupação de responder às necessida-des específicas dos jovens. Assim, dever-se-á fazerpleno uso de toda a gama de sanções alternativasexistentes e criar novos tipos de sanções, tendo sem-

pre presente a noção da segurança pública. Oregime de prova deve ser aplicado sempre quepossível através da suspensão da sentença, de sen-tenças condicionais, decisões de comissões e outrotipo de disposições.

A alínea c) da regra 17.1 corresponde a um dosprincípios orientadores que figuram na resolução4 do Sexto Congresso, que visa evitar a prisão dosjovens delinquentes, a menos que não existaoutro meio adequado de garantir a segurançapública.

A disposição contra a pena de morte, incluída naregra 17.2, está de acordo com o parágrafo 5.o doartigo 6.o do Pacto Internacional sobre os DireitosCivis e Políticos.

A disposição contra os castigos corporais corres-ponde ao artigo 7.o do Pacto Internacional sobre osDireitos Civis e Políticos e à Declaração sobre a Pro-tecção de Todas as Pessoas contra a Tortura e outrasPenas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ouDegradantes, assim como ao projecto de Conven-ção sobre a Tortura e outras Penas ou TratamentosCruéis, Desumanos ou Degradantes e ao projectode Convenção sobre os Direitos da Criança.

O poder de suspender o processo a qualquermomento (regra 17.4) é uma característica ine-rente ao tratamento dado aos jovens delinquentespor oposição aos adultos. Em qualquer momento,podem chegar ao conhecimento da autoridadecompetente circunstâncias que pareçam aconselhara suspensão definitiva do processo.

18. Várias medidas aplicáveis

18.1 A autoridade competente pode assegurar aexecução do julgamento sob formas muito diver-sas, usando de uma grande maleabilidade a fim deevitar, tanto quanto possível, o internamentonuma instituição. Tais medidas, algumas dasquais podem ser aplicadas cumulativamente,incluem:

a) Medidas de protecção, orientação e vigilância;

280 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 312: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

b) Regime de prova;c) Medidas de prestação de serviços à comunidade;d) Multas, indemnização e restituição;e) Tratamento intermédio e outras medidas detratamento;f ) Participação em grupos de «counselling» eoutras actividades semelhantes;g) Colocação em família idónea, em centro comu-nitário ou outro estabelecimento;h) Outras medidas relevantes.

18.2 Nenhum menor será subtraído à vigilância dospais, quer parcial quer totalmente, a não ser queas circunstâncias do caso façam com que isso sejanecessário.

Comentário:A regra 18.1 tenta enumerar algumas decisões esanções importantes que até aqui foram adoptadascom sucesso em diferentes sistemas jurídicos.Representam, no conjunto, opções interessantesque merecem ser seguidas e aperfeiçoadas. Aregra não alude às necessidades de pessoal dada apossível penúria de pessoal competente em certasregiões; nestas regiões poder-se-á tentar ou procurarmedidas que exijam menos pessoal.

Os exemplos citados na regra 18.1 têm sobretudoum elemento comum, o de que a comunidadedesempenha um papel importante na aplicaçãode medidas alternativas. A reeducação baseada naacção comunitária é uma medida clássica quereveste hoje muitos aspectos. Assim, as autorida-des competentes deveriam ser encorajadas a ofe-recer serviços deste tipo.

A regra 18.2 sublinha a importância da famíliaque, segundo o parágrafo 1 do artigo 10.o do PactoInternacional sobre os Direitos Económicos,Sociais e Culturais é o «elemento natural e fun-damental da sociedade». No interior da família, ospais têm não só o direito, mas também o dever desustentar e educar os filhos. A regra 18.2 exige, por-tanto, que os filhos não sejam separados dos paissenão em último recurso. Só se deve recorrer a estamedida quando os factos justifiquem plenamenteesta grave decisão (por exemplo, em caso de maustratos infligidos aos filhos).

19. Recurso mínimo à colocação em instituição

19.1 A colocação de um menor em instituição, ésempre uma medida de último recurso e a suaduração deve ser tão breve quanto possível.

Comentário:A criminologia mais avançada recomenda o trata-mento em meio aberto de preferência à colocaçãoem instituição. Em termos de sucesso, pouca ounenhuma diferença foi encontrada entre estes doismétodos. As numerosas influências negativas quese exercem sobre o indivíduo e que parecem ine-vitáveis em meio institucional não podem, evi-dentemente, ser contrabalançadas por reforços nodomínio do tratamento. Isto aplica-se especial-mente aos jovens delinquentes, cuja vulnerabilidadeé maior. Para mais, as influências negativas resul-tantes não só da falta de liberdade, mas tambémda separação do meio social habitual, são certa-mente mais graves nos menores, dada a sua faltade maturidade.

A regra 19 visa restringir a colocação em institui-ção em dois aspectos: frequência («medida deúltimo recurso») e duração («tão breve quanto pos-sível»). Retoma um dos princípios fundamentaisda Resolução 4 do Sexto Congresso das NaçõesUnidas: um jovem delinquente não deve ser presonum estabelecimento penitenciário, a menos quenão exista outro meio apropriado. A regra apela,pois, para que, em caso de necessidade de deten-ção de um jovem delinquente, a privação de liber-dade seja o mais limitada possível, que sejamprevistas condições especiais na instituição para asua detenção e que se tenham em consideração osdiversos tipos de delinquentes, de infracções e deinstituições. De facto, seria necessário dar priori-dade às instituições «abertas» sobre as institui-ções «fechadas». Além disso, todos osestabelecimentos deveriam ser de tipo correctivoou educativo em vez de tipo prisional.

20. Prevenção de demoras desnecessárias

20.1 Qualquer caso deve ser tratado de formaexpedita, desde o princípio, sem atrasos evitáveis.

Anexos* 281

Page 313: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Comentário:A celeridade dos processos nos assuntos refe-rentes aos jovens delinquentes é da maiorimportância, caso contrário ficará comprometidaqualquer solução satisfatória que o processo e ojulgamento poderiam permitir. Quanto maistempo passar, mais difícil será ao menor, senãomesmo impossível, fazer a ligação entre o processoe o julgamento por um lado, e por outro, a infrac-ção, tanto do ponto de vista intelectual como psi-cológico.

21. Registos

21.1 Os registos referentes aos jovens delinquen-tes devem ser considerados estritamente confi-denciais e incomunicáveis a terceiros. O acesso aestes registos deve ser limitado às pessoas direc-tamente envolvidas no julgamento do processoem causa ou a outras pessoas devidamente auto-rizadas.

21.2 Os registos de jovens delinquentes não serãoutilizados em processos subsequentes de adultosem que esteja implicado o mesmo delinquente.

Comentário:A regra visa estabelecer um compromisso entreinteresses contraditórios em matéria de registosou processos: por um lado, os da polícia, doMinistério Público e de outras autoridades inte-ressadas em melhorar o controlo e, por outro, osinteresses do delinquente (ver também a regra 8).A expressão «outras pessoas devidamente autori-zadas» pode aplicar-se, por exemplo, aos investi-gadores.

22. Necessidade de profissionalização e de for-mação

22.1 A formação profissional, a formação perma-nente, os cursos de reciclagem e outros tipos de for-mação apropriados servirão para proporcionar aaquisição e manutenção da competência profis-sional necessária a todas as pessoas encarregadasde assuntos referentes a menores.

22.2 Os funcionários da Justiça de menores devemreflectir a diversidade dos jovens que entram emcontacto com o sistema de Justiça de menores.Tentar-se-á assegurar uma representação equitativade mulheres e de minorias nos órgãos da Justiçade menores.

Comentário:As autoridades competentes para tomar uma deci-são podem ter uma formação muito diferente(magistrados no Reino Unido da Grã-Bretanha eIrlanda do Norte e nas regiões que se inspiram nosistema de common law, juízes com formação jurí-dica nos países de tradição romanística e nasregiões que nela se inspiram; e, noutros sítios, juris-tas ou não juristas, eleitos ou nomeados, membrosde comissões comunitárias, etc.). Todas estas auto-ridades precisam de ter um conhecimento mínimodo direito, da sociologia, da psicologia, da crimino-logia e das ciências do comportamento, conside-rado tão importante como a especialização ou aindependência da autoridade competente.

Para os trabalhadores sociais e os agentes dos ser-viços de prova, pode não ser possível insistir sobrea especialização profissional como condição pré-via para o desempenho de funções junto dosjovens delinquentes. Assim, a habilitação mínimaindispensável poderia obter-se com uma formaçãoprofissional permanente.

As habilitações profissionais constituem um ele-mento essencial para assegurar uma administra-ção imparcial e eficaz da Justiça de menores. Porconseguinte, é preciso melhorar o recrutamento,as perspectivas de promoção e a formação do pes-soal e dar-lhe meios para desempenhar correcta-mente as suas funções.

Para assegurar a imparcialidade na administraçãoda Justiça de menores é necessário evitar qual-quer discriminação de ordem política, social,sexual, religiosa, cultural ou outra, na selecção,nomeação e promoção profissional dos funcioná-rios encarregados da administração da Justiça demenores. Isto foi recomendado pelo Sexto Con-gresso. Além disso, o mesmo Congresso pediuaos Estados membros que assegurassem um tra-

282 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 314: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

tamento justo e equitativo às mulheres, enquantoparte do pessoal encarregado de administrar a Jus-tiça penal e recomendou que tomassem medidasespeciais para recrutar, formar e facilitar a pro-moção profissional do pessoal feminino na admi-nistração da Justiça de menores.

[ QUARTA PARTE ]TRATAMENTO EM MEIO ABERTO

23. Meios de execução do julgamento

23.1 A fim de assegurar a execução das decisões daautoridade competente, referida na regra 14.1., essamesma autoridade ou uma outra, se as circunstân-cias o exigirem, tomará as medidas necessárias.

23.2 Com esse fim, a autoridade pode, se o julgarnecessário, modificar as decisões, com a condi-ção dessa modificação ser conforme aos princí-pios que figuram nas presentes regras.

Comentário:Tratando-se de menores delinquentes, a execuçãodo julgamento pode, mais ainda do que para osadultos, ter uma longa incidência sobre a vida dointeressado. Assim, é importante que a autoridadecompetente ou um órgão independente (comis-são competente para conceder a liberdade condi-cional ou vigiada, serviço de prova, instituiçãoencarregada da protecção da juventude, etc.),dotado de competência igual à da autoridade queinicialmente pronunciou o julgamento, vigie a suaexecução. Em alguns países, foi designado para esseefeito um juiz de execução das penas.

A composição, os poderes e as funções da autori-dade têm de ser flexíveis; a descrição que deles édada na regra 23 é propositadamente geral, a fimde assegurar a sua ampla aceitação.

24. Assistência aos menores

24.1 Procurar-se-á assegurar aos menores, emtodas as fases do processo, assistência em matéria

de alojamento, de educação, de formação profis-sional, de emprego ou outra forma de assistênciaprática e útil, com vista a facilitar a sua reinserção.

Comentário:A promoção do bem-estar do menor é um ele-mento extremamente importante. Assim, a regra 24sublinha a necessidade de se preverem as instala-ções, os serviços e todas as outras formas de assis-tência necessárias para melhor servir os interessesdo menor durante todo o processo de reinserção.

25. Mobilização de voluntários e outros servi-ços comunitários

25.1 Solicitar-se-á a voluntários, a organizações devoluntários, às instituições locais e a outros serviçoscomunitários que contribuam eficazmente para areinserção do menor num quadro comunitário e,tanto quanto possível, no interior da célula familiar.

Comentário:Esta regra mostra que é preciso orientar todas asactividades referentes aos delinquentes juvenispara a reinserção. A cooperação com a comunidadeé indispensável se se quiser aplicar de forma efi-caz as directrizes da autoridade competente. Osvoluntários e os serviços de voluntariado, em espe-cial, revelaram-se recursos valiosos, de que atéaqui não se tirou o partido suficiente. Em algunscasos, a cooperação de antigos delinquentes(designadamente de ex-toxicodependentes) pode serextremamente útil.

A regra 25 deriva dos princípios expostos nasregras 1.1 a 1.6 e segue as disposições do Pacto Inter-nacional sobre os Direitos Civis e Políticos.

[ QUINTA PARTE ]TRATAMENTO NUMA INSTITUIÇÃO

26. Objectivos do tratamento numa instituição

26.1 A formação e o tratamento dos menores colo-cados em instituição têm por objectivo assegurar-lhes

Anexos* 283

Page 315: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

assistência, protecção, educação e formação profis-sional, a fim de os ajudar a desempenhar um papelconstrutivo e produtivo na sociedade.

26.2 Os jovens colocados em instituição receberãoa ajuda, protecção e assistência – no plano social,educativo, profissional, psicológico, médico efísico – de que possam necessitar, em função dasua idade, sexo e personalidade e no interesse doseu desenvolvimento harmonioso.

26.3 Os menores colocados em instituição devemestar separados dos adultos e detidos em estabele-cimento distinto ou numa parte separada de um esta-belecimento em que também se encontrem adultos.

26.4 As jovens delinquentes colocadas em insti-tuição devem beneficiar de uma atenção especialno que diz respeito às suas necessidades e pro-blemas próprios. A ajuda, protecção, assistência,tratamento e formação de que beneficiam, nãodeve, em nenhum caso, ser inferior àquelas deque beneficiam os jovens delinquentes. Deve ser-lhes assegurado um tratamento justo.

26.5 No interesse e para o bem-estar do menor colo-cado em instituição, os pais ou o tutor gozarão dedireito de visita.

26.6 Favorecer-se-á a cooperação interministeriale interdepartamental, com o fim de assegurar aosmenores internados uma formação escolar apro-priada ou, se se justificar, uma formação profis-sional adequada, para que, ao deixar a instituição,não se encontrem prejudicados nos seus estudos.

Comentário:Os objectivos do tratamento em instituição, talcomo se encontram enunciados nas regras 26.1e 26.2, deveriam ser aceitáveis por todos os siste-mas e por todas as culturas. Contudo, não foramainda atingidos em toda a parte e há muito a fazerneste domínio.

A assistência médica e psicológica, em especial, sãoextremamente importantes para os jovens toxicó-manos violentos ou deficientes mentais, colocadosem instituição.

A preocupação de evitar as influências negativas dosdelinquentes adultos, e de garantir o bem-estar dosmenores colocados em instituição, enunciada naregra 26.3, está em conformidade com um dos prin-cípios básicos das regras fixadas pelo Sexto Con-gresso na sua resolução 414. A regra não impede osEstados de adoptarem outras medidas contra ainfluência negativa dos delinquentes adultos, quesejam pelo menos tão eficazes como as medidasmencionadas nesta regra (ver também a regra 13.4).

A regra 26.4 diz respeito ao facto de as delinquen-tes não beneficiarem geralmente da mesma atençãoque os delinquentes, como foi observado pelo SextoCongresso. Em especial, a resolução 9 do SextoCongresso 14 pede que seja assegurado às delin-quentes um tratamento justo em todas as fases doprocesso penal e que se dê uma atenção especial aosseus problemas e às suas necessidades, enquanto seencontram detidas. Além disso, é preciso ver estaregra à luz da Declaração de Caracas do Sexto Con-gresso na qual se pede, entre outras coisas, a igual-dade de tratamento na administração da justiçapenal e no contexto da Declaração sobre a Elimina-ção da Discriminação contra as Mulheres e da Con-venção sobre a Eliminação de todas as Formas deDiscriminação contra as Mulheres.

O direito de visita (regra 26.5) decorre das disposi-ções das regras 7.1, 10.1, 15.2 e 18.2. A cooperaçãointerministerial e interdepartamental (regra 26.6.)tem uma importância especial para melhorar, emgeral, a qualidade do tratamento e da formação nasinstituições.

27. Aplicação das Regras Mínimas das NaçõesUnidas para o Tratamento de Reclusos

27.1 As Regras Mínimas das Nações Unidas parao Tratamento de Reclusos e Recomendações cone-xas serão aplicáveis no que diz respeito ao trata-mento dos jovens delinquentes colocados eminstituição, inclusive àqueles que se encontramem detenção preventiva.

27.2 Na medida do possível, procurar-se-á aplicaros princípios pertinentes enunciados nas Regras

284 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 316: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Mínimas para o Tratamento de Reclusos, com o fimde responder às diversas necessidades dos meno-res, próprias da sua idade, sexo e personalidade.

Comentário:As Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusose Recomendações conexas encontram-se entre asprimeiras disposições promulgadas pelas NaçõesUnidas. Reconhece-se que estes textos tiveramrepercussão à escala mundial. Embora existamainda países onde a sua aplicação constituiu maisuma aspiração do que uma realidade, o certo é queas Regras Mínimas continuam a exercer umainfluência importante sobre a administração huma-nitária e justa dos estabelecimentos penitenciários.

Alguns dos princípios básicos relativos aos jovensdelinquentes colocados em instituição estão conti-dos nas Regras Mínimas para o Tratamento deReclusos (locais de detenção, arquitectura, roupa decama, vestuário, queixas e pedidos dos detidos,contacto com o mundo exterior, alimentação, ser-viços médicos, serviços religiosos, separaçãosegundo as idades, pessoal, trabalho, etc.), assimcomo disposições referentes aos castigos, à disci-plina e a meios de coacção aplicáveis a delinquen-tes perigosos. Não seria oportuno modificar essasRegras Mínimas para o Tratamento de Reclusosem função das características específicas que osestabelecimentos para jovens delinquentes devemter dentro do quadro das presentes Regras Mínimaspara Administração da Justiça de Menores.

A regra 27 diz respeito às condições exigidas paraos jovens colocados em instituição (regra 27.1),bem como às diversas necessidades próprias da suaidade, sexo e personalidade (27.2). Assim, osobjectivos e o conteúdo desta regra estão em rela-ção directa com as disposições pertinentes dasRegras Mínimas para o Tratamento de Reclusos.

28. Aplicação frequente e rápida do regimede liberdade condicional

28.1 A autoridade apropriada recorrerá à liberdadecondicional tantas vezes quanto possível e tão cedoquanto possível.

28.2 Os menores colocados em liberdade condi-cional serão assistidos e supervisionados por umaautoridade apropriada e receberão todo o apoio dacomunidade.

Comentário:O poder de decretar a liberdade condicional podeser conferido à autoridade competente, comoestá previsto na regra 14.1, ou a uma outra auto-ridade. Por isso que convém empregar o termoautoridade «apropriada» e não autoridade «com-petente».

Na medida em que as circunstâncias o permitam,dar-se-á preferência à liberdade condicional, emlugar de deixar o jovem delinquente cumprir atotalidade da pena. Quando existam provas de umprocesso satisfatório de reabilitação, mesmo osdelinquentes que parecem perigosos no momentoda sua colocação em instituição podem ser condi-cionalmente libertados. Tal como o regime deprova, a liberdade condicional pode ser concedidasob reserva do cumprimento satisfatório de con-dições especificadas pelas autoridades pertinentesdurante um período de prova previsto na decisão:por exemplo, o «bom comportamento» do delin-quente, a sua participação em programas comu-nitários, a sua residência em estabelecimentos detransição, etc.

Quando os delinquentes colocados em instituiçãosão libertados condicionalmente, deverá ser desig-nado um agente dos serviços de prova ou umoutro funcionário (designadamente nas situaçõesem que o regime de prova ainda não tenha sidoadoptado) para supervisionar o seu comporta-mento e prestar-lhes assistência e encorajar acomunidade a apoiá-los.

29. Regimes de semidetenção

29.1 Procurar-se-á estabelecer sistemas de semi-detenção tais como estabelecimentos de transição,lares educativos, centros diurnos de formaçãoprofissional e outros estabelecimentos apropria-dos, destinados a favorecer a reinserção socialdos menores.

Anexos* 285

Page 317: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Comentário:A importância do enquadramento à saída de umainstituição é evidente. Esta regra faz ressaltar anecessidade da criação de diversas modalidades deregimes de semidetenção.

Esta regra sublinha igualmente a necessidade deorganização de toda uma gama de meios e servi-ços destinados a satisfazer as necessidades dosjovens delinquentes que reingressam na comuni-dade e a fornecer-lhes orientação e instituições deapoio que contribuam para o sucesso da sua rein-serção social.

[ SEXTA PARTE ]INVESTIGAÇÃO, PLANIFICAÇÃO, FORMULAÇÃO

DE POLÍTICAS E AVALIAÇÃO

30. A investigação, base da planificação, da for-mulação de políticas de avaliação

30.1 Procurar-se-á organizar e fomentar a investi-gação necessária à formulação de planos e de polí-ticas eficazes.

30.2 Procurar-se-á rever e avaliar periodicamenteas tendências, os problemas e as causas da delin-quência e da criminalidade juvenis, assim como asnecessidades específicas dos menores detidos.

30.3 Procurar-se-á estabelecer com carácter regu-lar um dispositivo permanente de investigação ede avaliação, integrado no sistema de administra-ção da Justiça de menores, bem como compilar eanalisar os dados e informações pertinentes neces-sários a uma avaliação apropriada e a um aperfei-çoamento ulterior do referido sistema.

30.4 Na administração da Justiça de menores, aprestação de serviços deve ser sistematicamente pla-nificada e implementada e fazer parte integrantedo esforço de desenvolvimento nacional.

Comentário:A utilização da investigação como base de umapolítica bem informada da Justiça de menores é

reconhecida como um mecanismo importantepara garantir que a prática siga os progressosocorridos no domínio dos conhecimentos e parafavorecer o aperfeiçoamento constante do sis-tema da Justiça de menores. A simbiose entre ainvestigação e as políticas reveste uma impor-tância especial em matéria de Justiça de menores.Dadas as modificações rápidas e por vezes radi-cais dos estilos de vida dos jovens e das formase dimensões da criminalidade juvenil, as reacçõesda sociedade e da Justiça à criminalidade e àdelinquência juvenis estão, muitas vezes, ultra-passadas e inadequadas.

A regra 30 fixa normas que permitem integrar ainvestigação no processo de formulação e aplica-ção de políticas na administração da Justiça demenores. Chama em especial a atenção para anecessidade de rever e avaliar os programas e asmedidas existentes e de planificar a Justiça demenores no contexto mais amplo, dos objectivosdo desenvolvimento global.

Uma avaliação constante das necessidades domenor, assim como das tendências e problemasda delinquência, é condição indispensável paramelhorar a formulação de políticas apropriadase conceber intervenções satisfatórias, tanto decarácter formal como informal. Neste contexto, osorganismos responsáveis devem facilitar a inves-tigação levada a cabo por pessoas e organismosindependentes. Poderá ser útil solicitar e ter emconta a opinião dos próprios jovens e não apenasdaqueles que entrem em contacto com o sistema.

O processo de planificação deve, em particular,colocar um acento tónico num mais efectivo ejusto sistema de fornecimento dos serviços neces-sários. Para este efeito deve efectuar-se uma ava-liação detalhada e regular da vasta gama denecessidades e problemas particulares do menore uma identificação clara das prioridades. Nestecontexto, deverá também coordenar-se a utiliza-ção dos recursos existentes, nomeadamente dasmedidas alternativas e de apoio da comunidade,de forma a permitir a elaboração de mecanismosde aplicação e de controlo dos programas adop-tados.

286 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 318: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Plano geral de um estágio

Anexos* 287

Anexo II

PROGRAMA DE TRABALHO

PRIMEIRO DIA

[ MANHÃ ]7h30 • 8h30 Inscrição dos participantes;

distribuição da documentação8h30 • 9h Discurso de abertura de um

representante da políciaDiscurso de abertura de um representante do grupo de formação

9h • 9h30 Apresentação da equipa de formação e dos participantes

9h30 • 9h45 Pausa para café

9h45 • 10h Apresentação e panorâmica geral do curso

10h • 11h Fontes, sistemas e normas em matériade direitos humanos relacionados com a aplicação da leiApresentação: 40 minutos

Perguntas e respostas: 20 minutos

11h • 13h A missão civil da polícia numa democracia: ética e primado do direitoApresentação: 40 minutos

Grupos de trabalho: 40 minutos

Relatórios dos grupos de trabalho

na reunião plenária: 40 minutos

[ TARDE ]13h • 14h Almoço

14h • 15h30 Os direitos humanos, a polícia e a não discriminação

Apresentação: 20 minutos

Debate: 70 minutos

SEGUNDO DIA

[ MANHÃ ]8h30 • 11h Os direitos humanos

e as investigações policiaisApresentação: 40 minutos

Perguntas e respostas: 20 minutos

Grupos de trabalho: 40 minutos

Relatórios dos grupos de trabalho

na reunião plenária: 50 minutos

11h • 11h15 Pausa para café

11h15 • 13h A protecção dos direitos dos refugiadosApresentação: 20 minutos

Grupos de trabalho: 40 minutos

Relatórios dos grupos de trabalho

na reunião plenária: 45 minutos

[ TARDE ]13h • 14h Almoço

14h15 • 15h30A polícia e a justiça juvenilApresentação: 30 minutos

Debate sobre a prevenção da delinquência

juvenil: 60 minutos

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS

ALTO COMISSÁRIO PARA OS DIREITOS HUMANOS/ CENTRO DOS DIREITOS HUMANOS

Direitos humanos e aplicação da leiEstágio de formação para instrutores da polícia

Page 319: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

288 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

TERCEIRO DIA

[ MANHÃ ]8h30 • 11h Direitos humanos,

captura e detençãoApresentação: 40 minutos

Perguntas e respostas: 20 minutos

Grupos de Trabalho: 40 minutos

Relatórios dos grupos de trabalho

na sessão plenária: 50 minutos

11h • 11h15 Pausa para café

11h15 • 13h A missão da polícia na comunidadeApresentação: 30 minutos

Sessão de reflexão: 75 minutos

[ TARDE ]13h • 14h Almoço

14h • 15h30 Os direitos da mulherna administração da justiçaApresentação: 30 minutos

Debate sobre a protecção

dos direitos da mulher: 60 minutos

QUARTO DIA

[ MANHÃ ]8h30 • 11h A utilização da força

e de armas de fogoApresentação: 40 minutos

Perguntas e respostas: 20 minutos

Grupos de trabalho: 40 minutos

Relatórios dos Grupos de Trabalho

na sessão plenária: 45 minutos

11h • 11h15 Pausa para café

11h15 • 13h Investigações sobre violações cometidas pela políciaApresentação: 20 minutos

Grupos de trabalho: 40 minutos

Relatórios dos grupos de trabalho

na sessão plenária: 45 minutos

[ TARDE ]13h • 14h Almoço

14h • 15h30 Protecção e indemnização das vítimasApresentação: 30 minutos

Debate sobre a justiça

para as vítimas: 60 minutos

Page 320: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Anexos* 289

QUINTO DIA

[ MANHÃ ]8h30 • 11h Distúrbios internos

e conflitos armadosApresentação: 40 minutos

Perguntas e respostas: 20 minutos

Grupos de trabalho: 40 minutos

Relatórios dos Grupos de Trabalho

na sessão plenária: 50 minutos

11h • 11h15 Pausa para café

11h15 • 13h Incorporação dos direitos humanosnos programas de formação para a políciaApresentação: 30 minutos

Grupos de trabalho: 45 minutos

Relatórios dos Grupos de Trabalho na sessão

plenária: 30 minutos

[ TARDE ]13h • 14h Almoço

14h • 16h Elaboração de programas de cursossobre direitos humanosInstruções: 15 minutos

Grupos de redacção orientados: 90 minutos

Balanço em reunião plenária: 45 minutos

SEXTO DIA

[ MANHÃ ]8h30 • 11h Cursos sobre direitos humanos

Instruções: 15 minutos

Apresentação de cursos

pelos estagiários: 135 minutos

11h • 11h15 Pausa para café

11h15 • 13h Cursos (continuação): 95 minutos[ TARDE ]

13h • 14h Almoço

14h • 15h Exame final15h • 15h15 Pausa para café15h15 • 16h Controlo dos exames

SÉTIMO DIA

[ MANHÃ ]9h • 10h Avaliação do estágio

Apresentação: 5 minutos

Respostas ao questionário

de avaliação: 30 minutos

Debate: 25 minutos

10h • 10h15 Pausa para café

10h15 • 11h15 >Cerimónia de encerramento>Entrega dos certificados>Intervenção de encerramento do representante do governo>Intervenção de encerramento do representante do Alto Comissáriopara os Direitos Humanos/Centro dos Direitos Humanos ou do grupo de formação

Page 321: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 322: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Anexos* 291

Anexo III

Questionário a preencher antes do estágio

1. Quais as suas habilitações académicas (matériasestudadas, diplomas obtidos)?

2. Quais as funções que exerce?

3. Já frequentou alguma formação em matéria dedireitos humanos? Em caso de resposta afirmativa,por favor dê pormenores sobre essa formação.

4. Qual é o problema mais importante com o qualse depara enquanto funcionário da polícia?

5. Na sua opinião, quais as questões em matériade direitos humanos que um estágio como estedeverá abordar?

6. Conhece normas internacionais que se apli-cam expressamente ao trabalho dos polícias?

7. Em caso de resposta afirmativa, pode citar osinstrumentos/ convenções que contêm tais normas?

8. Quais são os direitos das pessoas capturadas?

9. Existem circunstâncias nas quais é aceitável autilização de tortura?

10. Em que situações é que um agente de políciaestá autorizado a utilizar uma arma de fogo?

11. Um responsável pela aplicação da lei tomaconhecimento de que um dos seus colegas come-teu uma violação grave dos direitos humanos. Quemedidas é que ele deverá tomar?

12. Acha que os delinquentes juvenis devem sertratados de uma forma diferente dos delinquentesadultos? Explique porquê.

13. Acha que a polícia deve intervir em caso de vio-lência no seio da família?

14. Existem outras questões que gostaria de tra-zer ao conhecimento da equipa de formação ou quegostaria que fossem discutidas no âmbito do está-gio?

Esperando que este estágio responda da melhor forma possível às suas

necessidades, agradecíamos que preenchesse este breve questionário

Page 323: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 324: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Anexos* 293

Exame de fim de estágio

Anexo IV

1. Os diferentes pactos e convenções referidos

durante o estágio podem ser descritos como

A. não sendo vinculativos, mas representando umideal no sentido do qual se deverá trabalhar;B. não sendo vinculativos, mas tendo um fortepoder persuasivo;C. sendo vinculativos para os governos, mas nãopara a polícia;D. sendo plenamente vinculativos.

2. As diversas declarações e conjuntos de prin-

cípios e códigos de conduta referidos no âmbito

deste estágio foram elaborados para:

A. complicar a tarefa da polícia;B. fornecer orientações solidamente alicerçadaspara a aplicação de normas internacionais a nívelnacional pelas forças de polícia e outras;C. dar um enquadramento teórico para o estudo dosdireitos humanos;D. proporcionar aos advogados uma base paracontestarem a conduta dos agentes policiais.

3. Um dos objectivos do Código de Conduta

para os Funcionários Responsáveis pela Apli-

cação da Lei consiste em assegurar que os ser-

viços nacionais responsáveis pela aplicação

da lei:

A. estão dispostos a solicitar o consentimento detodos em todas as circunstâncias;

B. são representativos da colectividade no seu con-junto, respondem às suas necessidades e são res-ponsáveis perante a mesma;C. são social e politicamente autónomos;D. estão acima da lei.

4. Os funcionários nacionais responsáveis pela

aplicação da lei, quando garantem a segurança

nos locais de votação devem:

A. facilitar o acesso dos eleitores que apoiam os can-didatos defensores da lei e da ordem às urnas;B. impedir o acesso às urnas dos eleitores queapoiam os candidatos subversivos;C. fazer prova de neutralidade ao assegurar a segu-rança de todos os eleitores;D. tentar convencer os eleitores a não apoiarem oscandidatos manifestamente subversivos e apoiar oscandidatos que defendem a lei e a ordem.

5. Um agente de polícia que descobre que um dos

seus colegas se deixou corromper:

A. não deve intervir no caso de se tratar de uma pri-meira infracção;B. deve falar discretamente com o seu colega, semintervir de forma oficial;C. deve intervir oficialmente de acordo com asmesmas modalidade que adoptaria se se tratassede qualquer outra infracção;D. deve consultar os seus colegas e elaborar umaresposta colectiva oficiosa.

Por favor assinale a resposta correcta para cada questão

Page 325: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

6. No âmbito de um inquérito às actividades

terroristas, um agente de polícia recebe uma

ordem do seu superior hierárquico no sentido de

penetrar sem mandato no local onde se encon-

tra um suspeito. A atitude correcta do agente

de polícia consiste em:

A. executar a ordem do seu superior e não tomarqualquer outra medida;B. executar a ordem do seu superior e apresentarposteriormente uma queixa;C. recusar-se a executar a ordem e comunicar o caso;D. recusar-se a executar a ordem e não tomar qual-quer medida posterior.

7. Em conformidade com o artigo 7.º

da Decla-

ração Universal dos Direitos do Homem, todos

têm direito a uma protecção igual da lei sem

qualquer discriminação. É admitida uma excep-

ção a esta regra:

A. no caso de uma pessoa não adoptar as normassociais, culturais e religiosas dominantes;B. se uma pessoa pertencer a um grupo queameace a segurança nacional;C. se uma pessoa pertencer a um grupo étnicotido como responsável pela existência de elevadosníveis de certos crimes;D. em situação alguma.

8. Toda a pessoa acusada de ter cometido uma

infracção penal beneficia de uma presunção de

inocência até que:

A. uma testemunha credível apresente à polícia pro-vas suficientes contra a pessoa em questão;B. a pessoa confesse a prática da infracçãoaquando de um interrogatório de polícia;C. a sua culpa tenha sido legalmente provada nodecurso de um processo judicial público;D. a polícia esteja convencida da sua culpa.

9. Qual dos seguintes direitos não figura nas

disposições internacionais relativas a proces-

sos de captura?

A. o direito a ser informado sobre os motivos dacaptura, no momento em que esta ocorra;

B. o direito a ser informado prontamente sobre asacusações existentes contra si;C. o direito a ser informado sobre os seus direitose meios de os exercer;D. o direito a ser informado sobre a identidade detodas as testemunhas, incluindo dos informadoresconfidenciais.

10. As pessoas detidas podem ser submetidas a

formas ligeiras de tortura:

A. em caso algum;B. em circunstâncias excepcionais, como porexemplo em caso de grande instabilidade políticainterna;C. nos casos em que a ordem foi dada por umsuperior hierárquico;D. com o objectivo de obter informações indis-pensáveis para evitar a ocorrência de um acto ter-rorista iminente contra civis.

11. Em qual das seguintes situações é expressa-

mente autorizada a utilização de armas de

fogo contra pessoas, em virtude do princípio

9.o

dos Princípios Básicos sobre a Utilização da

Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários

Responsáveis pela Aplicação da Lei?

A. em caso de legítima defesa ou para a defesa deterceiros contra uma ameaça iminente de morte ouferimento grave.B. para proteger a segurança nacional.C. para impedir a fuga de uma pessoa que seencontre a praticar um crime.D. aquando da captura de uma pessoa que ofereceresistência.

12. Em conformidade com as normas interna-

cionais em matéria de administração da justiça

juvenil, o objectivo do sistema de justiça penal

quando está em causa o tratamento dos jovens

delinquentes, consiste em:

A. satisfazer a necessidade de castigo existente nasociedade;B. dissuadir outros jovens de cometerem delitos;C. facilitar a recuperação do jovem e uma reinserçãobem sucedida na sociedade;

294 *Direitos Humanos e Aplicação da Lei • Série de Formação Profissional N.º05 [ACNUDH]

Page 326: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

D. tentar incitar todos os pais a supervisionar osseus filhos correctamente.

13. Os agentes policiais devem considerar os

casos de violência no seio da família como:

A. distúrbios menores da tranquilidade da vizi-nhança;B. equivalentes a outros tipos de vias de facto denatureza criminosa;C. um assunto privado que deve ser resolvido noseio da família;D. um assunto que não diz respeito à polícia eque deve ser remetido aos serviços sociais.

14. Qual das seguintes afirmações está correcta?

A. todos têm o direito a viver num país da sua escolha;B. todos têm o direito a procurar e beneficiar de asilonoutros países, para fugirem a uma perseguição;C. todos têm o direito a procurar e beneficiar de asilonoutros países para escaparem a dificuldades eco-nómicas;D. todos têm o direito a procurar e beneficiar deasilo noutros países para escaparem a tensõespolíticas.

15. De acordo com as disposições internacionais

pertinentes em matéria de direitos humanos,

qual dos seguintes direitos é garantido às víti-

mas de criminalidade?

A. o direito a receber imediatamente uma indem-nização financeira pela dor e sofrimento sofridos.B. o direito a ser tratado com compaixão e res-peito.C. o direito a ser informado sobre os procedi-mentos judiciários nos quais estão envolvidos;D. o direito à protecção da sua segurança.

16. Os responsáveis pela aplicação da lei com

razões para pensar que um dos seus colegas come-

teu uma violação dos direitos humanos devem:

A. nada dizer, a fim de preservar a lealdade para como grupo;B. comunicar sempre esta violação aos meios decomunicação social;

C. comunicar esta violação no seio da hierarquiaou, no caso de tal não surtir qualquer efeito, auma autoridade externa competente;D. recusar-se a colaborar nas investigações einquéritos relativos a esta violação.

17. Qual das seguintes afirmações relativas à

detenção de mulheres está correcta?

A. as medidas exclusivamente destinadas a protegeros direitos e a situação especial das mulheres devemser consideradas como uma discriminação inaceitável.B. as directivas nos termos das quais as mulheresdetidas devem ser vigiadas por funcionários dosexo feminino não têm de ser respeitadas no casode o número de funcionários não ser suficiente.C. as revistas efectuadas a detidos devem ser sem-pre realizadas por pessoas do mesmo sexo.D. em circunstâncias excepcionais os homens emulheres podem ser detidos conjuntamente.

18. De acordo com o Conjunto de Princípios

para a Protecção de Todas as Pessoas Sujeitas a

Qualquer Forma de Detenção ou Prisão, qual dos

seguintes direitos não é reconhecido como um

direito dos detidos e prisioneiros?

A. o direito a consultar um advogado;B. o direito de comunicar sem restrições com omundo exterior;C. o direito a beneficiar de um exame médico;D. o direito a que a continuação da detenção sejacontrolada por uma autoridade judiciária ou outra.

19. Em conformidade com as quatro Conven-

ções de Genebra de 1949 e os respectivos Proto-

colos Adicionais:

A. os agentes policiais têm sempre o estatuto decombatentes em conflitos armados internacionais;B. os agentes policiais têm sempre o estatuto de civisem casos de conflitos armados internacionais;C. uma potência ocupante pode impor sançõesaos agentes policiais dos territórios ocupados, nocaso destes agentes não cumprirem as suas tare-fas por razões de consciência;D. a tomada de reféns é proibida durante um con-flito armado.

Anexos* 295

Page 327: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém
Page 328: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Anexos* 297

Questionário de avaliação do estágioa ser preenchido depois da realizaçãodo mesmo

Anexo V

1. Está satisfeito com a forma como foram apre-sentadas as normas internacionais durante o estágio?

A. muito satisfeitoB. satisfeitoC. insatisfeitoPor favor comente:

2. Está satisfeito com a importância atribuídadurante o estágio aos meios que permitem aplicarconcretamente essas normas no seu trabalho?

A. muito satisfeitoB. satisfeitoC. insatisfeitoPor favor comente:

3. Está satisfeito com a estrutura do estágio?

A. muito satisfeitoB. satisfeitoC. insatisfeitoPor favor comente:

4. Está satisfeito com as comunicações dos peritos?

A. muito satisfeitoB. satisfeitoC. insatisfeitoPor favor comente:

5. Está satisfeito com os grupos de trabalho e outrosexercícios práticos organizados durante o estágio?

A. muito satisfeito

B. satisfeitoC. insatisfeitoPor favor comente:

6. Está satisfeito com os debates realizados nas ses-sões plenárias durante o estágio?

A. muito satisfeitoB. satisfeitoC. insatisfeitoPor favor comente:

7. Está satisfeito com a documentação distribuídadurante o estágio?

A. muito satisfeitoB. satisfeitoC. insatisfeitoPor favor comente:

8. O estágio permitiu-lhe adquirir conhecimentose competências necessários:

A. para aplicar as normas em matéria de direitoshumanos no seu trabalho?B. para transmitir as informações recebidas aos seuscolegas?Por favor comente

9. Na sua opinião qual é o melhor método para for-mar os funcionários da polícia em matéria dedireitos humanos?

10. Que outras observações gostaria de fazer?

Para podermos conhecer as suas impressões e apreciação sobre

o estágio que acabou de frequentar, e por forma a podermos responder

aos seus desejos no âmbito do processo permanente de elaboração

e melhoria das nossas actividades de formação, agradecíamos que

respondesse a algumas breves questões. Agradecemos-lhe desde já

a sua colaboração.

Page 329: Direitos Humanos Direitos Humanos e Aplicação da Lei e ...€¦ · das para os Direitos Humanos/Centro para os Direitos Humanos. O presente manual (primeiro componente do kit) contém

Editor

Comissão Nacional para as Comemorações do 50.o Aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem e Década das Nações Unidas

para a Educação em matéria de Direitos Humanos

Gabinete de Documentação e Direito Comparado Procuradoria-Geral da República

Rua do Vale de Pereiro, 2, 1269-113 Lisboawww.gddc.pt

Tradução

Catarina de Albuquerque e Raquel TavaresGabinete de Documentação e Direito Comparado

Procuradoria-Geral da República

Revisão

Carlos LacerdaGabinete de Documentação e Direito Comparado

Procuradoria-Geral da República

Título Original

Human Rights and Law Enforcement. A Manual on Human Rights Training for the Police. Professional Training Series n.o 5 – United Nations

Design Gráfico

José Brandão | Paulo Falardo[Atelier B2]

Impressão

Textype

Tiragem

1500 exemplares

isbn

972-97831-9-5

Depósito Legal

169 001/01

Primeira Edição

Setembro de 2001