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1 Discutindo Tendências no Ensino da Matemática Dione Lucchesi de Carvalho Faculdade de Educação - Unicamp Prática Pedagógica em Matemática – Prapem Grupo de Sábado - GdS [email protected] Maio de 2010 II Semana de Educação Matemática da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

Discutindo Tendências no Ensino da Matemática - uesb.br · • as concepções de ensino e de aprendizagem; ... FORMALISTA MODERNA ... (re)significado, adota-se uma

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Discutindo Tendências no Ensino da Matemática

Dione Lucchesi de CarvalhoFaculdade de Educação - Unicamp

Prática Pedagógica em Matemática – PrapemGrupo de Sábado - GdS

[email protected]

Maio de 2010

II Semana de Educação Matemática da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

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II Semana de Educação Matemática da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

• Esperamos trazer pontos que suscitem o debate, seja através de recordações, seja problematizando concepções...

• Inicialmente vamos nos referir às tendências identificadas por Fiorentini (1994, 1995). Por que trazê-las?

Até hoje os modos e ver e conceber o ensino da matemática sistematizados em teses e dissertações brasileiras até 1990 influenciam as diretrizes curriculares sobre a inserção da matemática nos currículos da escola básica do Brasil.

Tendências: 1) formalista clássica2) empírico-ativista3) formalista moderna4) tecnicista e variações5) construtivista6) socioetnocultural

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Em cada tendência:• a concepção de matemática;

• a concepção do modo como se processa a produção do conhecimento matemático;

• os fins e os valores atribuídos ao ensino de matemática;

• as concepções de ensino e de aprendizagem;

• a visão de mundo subjacente;

• a proposta de relação professor/aluno/conhecimento matemático;

• a perspectiva de estudo/pesquisa visando à melhoria do ensino da Matemática.

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FORMALISTA CLÁSSICA

• Ênfase às idéias e formas da matemática clássica, sobretudo ao modelo euclidiano e à concepção platônica de matemática.

• Ensino acentuadamente livresco e centrado na explanação do professor.

• A aprendizagem do aluno era considerada passiva, consistindo na memorização e reprodução dos raciocínios e procedimentos ditados pelo professor ou pelo livro didático.

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EMPÍRICO-ATIVISTA• As idéias matemáticas são obtidas por descoberta.

• Buscava-se atender à natureza da criança.

• Deslocou o eixo da questão pedagógica do intelecto para a espontaneidade.

• O professor torna-se o orientador ou facilitador da aprendizagem cujo centro é o aluno.

• Surgem as propostas pedagógicas que privilegiam atividades lúdicas e a utilização de materiais manipulativos.

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FORMALISTA MODERNA

• Influenciada pelo movimento mundial da Matemática Moderna;

• Acentua-se a abordagem internalista da matemática; enfatiza-se o uso preciso da linguagem matemática, o rigor e as justificativas das transformações algébricas pelas propriedades estruturais.

• A proposta pedagógica continua centrada no professor e o aluno continua sendo considerado passivo (salvo poucas experiências alternativas).

• A “significação histórico-cultural e a essência ou a concretude das idéias e conceitos ficaram relegados ao segundo plano” (Fiorentini, 1995, p.15).

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TECNICISTA E VARIAÇÕES

• Procura reduzir a matemática a um conjunto de técnicas, regras e algoritmos, sem grande preocupação de fundamentá-los ou justificá-los.

• A pedagogia tecnicista não se centra nem no professor nem no aluno, mas nos objetivos instrucionais, nos recursos e nas técnicas de ensino.

Exemplos: instrução programada e o método “Kumon”.

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CONSTRUTIVISTA

• A matemática é vista como uma construção humana constituída por estruturas e relações abstratas entre formas e grandezas reais ou possíveis.

• O conhecimento matemático resulta da ação interativa/reflexiva do homem com o meio ambiente e/ou com atividades (não diretamente do mundo físico nem de mentes humanas isoladas do mundo).

O papel do professor é (re)significado, adota-se uma perspectiva construtivista radical ou não.

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SOCIOETNOCULTURAL• Traz uma visão de feição antropológica, social e política, a matemática – e a Educação Matemática – passam a ser vistas como atividades humanas, determinadas sócio-culturalmente pelo contexto em que são produzidas.

• A Etnomatemática tem dado sustentação aporte teórico-metodológica aos estudos nesta tendência.• Os métodos de ensino proferidos são a problematização – do saber popular e daquele produzido pelos matemáticos – e a modelagem matemática.

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E o professor? Temos trabalhado na perspectiva de que o professor produz conhecimento e, constituindo-se em comunidades de prática em um ambiente culturalmente sensível, ultrapassam os limites da sala de aula .

Ou seja, como destacam Cochran-Smith & Lytle (1999):

• não se privilegia uma perspectiva na qual o conhecimento é prioritariamente produzido por especialistas para que o professor o aplique em suas aulas;

• não se privilegia uma perspectiva na qual se o conhecimento é produzido pelo professor na prática; professa-se

• que os professores que dão aula de matemática têm promovido transformações curriculares que refletem sua capacidade de produzir conhecimento da prática.

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Ao analisar práticas de sala de aula tradicionais – e mais frequentes – em diferentes épocas da escola do século XX e XXI podemos perceber que são regidas pelo paradigma do exercício “imperando” o que Alrø & Skovsmose (2006) chamam de “absolutismo burocrático”.

“Professor: Isso está errado, faça de novo.

Professor: Tem um errinho nas duas.”

[...]

“Professor: Apague esses números... eles não vão servir pra nada.”

(Alrø & Skovsmose, 2006, p.23)

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Escolhemos alguns exemplos de tarefas que desafiam o paradigma do exercício rompendo o absolutismo burocrático.

Poderíamos considerar que as tarefas apresentadas referem-se a diversas modalidades de “resolução de problemas”; tema ainda polêmico com relação à aprendizagem da matemática, por isso preferimos assumir o termo “problematização”.

Permanece a questão:Qual o papel da resolução de problemas na

aprendizagem de matemática?

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Problematizações inspiradas na História da Matemática:

1ª parte – São apresentados, em papel quadriculado, diversos pares de quadrados e solicitado que o aluno construa o quadrado cuja área é a soma das áreas dos dois que compõem cada par.

2ª parte – “Você acha que é possível construir um único quadrado cuja área seja igual à soma das áreas de dois quadrados quaisquer? Justifique sua resposta.”

(Miguel et alli, 2009, p.195)

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Investigações matemáticas:

“Outro olhar sobre a tabuada:1.Construa a tabuada de 3. O que encontra de

curioso nesta tabuada?Prolongue-a calculando 11 x 3, 12 x 3, 13 x 3 ... e

formule algumas conjecturas.2. Investigue agora o que acontece na tabuada do 9

e do 11.”(Conti & Soares, 2006, p.139)

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Atividades exploratório-investigativas:1) “Pense em um número inteiro positivo qualquer (Por

exemplo: 5, 8, 9, 11,...). Este número, agora, é a área do seu quadrado. Encontre o valor do lado do quadrado o mais precisamente possível.

2) Este número que representa o lado deste quadrado sempre existe para qualquer área que você imaginar? Experimente outros números e justifique sua resposta.

3) Que tipo de número é este? Encontre mais de uma maneira de representar o valor deste lado. Este número sempre pertence a reta numérica? Encontre uma maneira de justificar sua resposta.”

(Oliveira & Fiorentini, 2009, p.135)

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Fases da modelagem matemática:

• “Escolha do tema;

• Pesquisa exploratória;

• Levantamento do(s) problema(s);

• Resolução do(s) problema(s);

• Análise crítica das soluções.”(Trevisan, 2004, p.5)

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Fases de um projeto de ensino:• Definição do tema

• Planejamento das ações

• Realização das ações

• Elaboração das análises e das conclusões

• Divulgação e comunicação dos resultados

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De acordo com Alrø & Skovsmose (2006), nessa busca instigamos diálogos nos quais:

1. fazemos uma investigação;

2. acreditamos que algo imprevisto possa acontecer, corramos este risco; e

3.promovemos a igualdade.

Enfim, desejamos promover em aulas de matemática a “cooperação

investigativa”.

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A busca da cooperação investigativa exige a utilização de outros recursos de registro das produções e/ou outras linguagens.

Vamos destacar a utilização da língua escrita neste processo. Escrevendo:

• sobre a matemática, e/ou

• sobre aprender e ensinar matemática, e/ou

• sobre conceitos e procedimentos matemáticos.

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“Acho que a gente deveria resolver estes problemas apenas utilizando o raciocínio. O que complica na Matemática é que existe sempre um jeito de encurtar as coisas e que, na verdade, apenas nos faz raciocinar menos. Quando precisamos pensar para resolver um problema, ficamos travados tentando lembrar fórmulas ou achar um caminho mágico para chegar a solução. Não interpretamos o problema e nem raciocinamos sobre o que está sendo dito.”

(Parateli et alli., 2006, p.41)

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[...] começamos a aula com a professora corrigindo a tarefa, depois ela explicou por que o três se chama cubo e o dois se chama quadrado no expoente das potências..[...] a professora nos mostrou como traçar a altura nos diferentes triângulos com régua e compasso[...][...] hoje ela explicou sobre frações...depois ela explicou sobre simplificação de frações[...][...] depois a professora leu o 2º problema das histórias de Malba Tahan, que ficou de tarefa. [..]

(Pontes, 2009, p.154)

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“Equação do 2º grau”

Se eu tiver dois coeficientescompleta não serei,

pois para ser completade três coeficientes precisarei.

O Coeficiente “a”sempre aparecerá,

pois o x²ele acompanhará.

O coeficiente “b”pode aparecer

ele é um númeroque parceiro do x vai ser.

O coeficiente “c”sozinho vai aparecer

pois de nenhum xcompanheiro ele vai ser.

Completa ou Incompletahá vários modos de resolverusar a formula de “Bhaskara”

ou produto e soma das raízes, posso escolher.

(Pontes, 2009, p.158)

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Bíblia MatemáticaLivro das Equações – Cap. 23Salmo da Equação do 2º grau

A raiz é a solução e nada me faltará.Pensar me faz na potenciação, leva-me mansamente ao valor de delta.Responda-me a raiz quadrada, guia-me pelas contas de Bhaskara, pelo número da solução.Ainda que não resolvesse por produto e soma, não temeria mal algum, porque a solução está comigo. O teu delta e a tua fórmula me consolamPrepara uma conta com as minhas dificuldades, mas lembra-me da fórmula e a facilidade me transborda.Certamente que a fórmula, o produto e a soma das raízes me seguirão por todos os dias da minha vida e resolverei na escola as equações por longos e longos dias.

(Pontes, 2009, p.158)

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Dentre os recursos considerados “outros”, porque não usuais, discorremos sobre a utilização da língua escrita como instrumento de registro em aulas de matemática.

Temos consciência que não é a única linguagem alternativa possível a ser utilizada em aulas de matemática. Por exemplo, não nos referimos a gráficos, tabelas, diagramas, a desenhos, ilustrações, histórias em quadrinhos...

Além disso, outros equipamentos de registros – como o computador, equipamentos de filmagens, gravadores – nos fornecem alternativas atraentes para produzir ensino e aprendizagem de matemática na escola.

Vamos ao “discutir”?

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Referências bibliográficas:ALRØ, Helle & SKOVSMOSE, Ole. Diálogo e Aprendizagem em Educação Matemática, Tradução de Orlando Figueiredo. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.COCHRAN-SMITH, M., & LYTLE, S. L. Relationships of Knowledge and Practice: teacher learning in communities. In: Review of Research in Education. USA, 24, 1999, p. 249–305. Tradução GEPFPM. FIORENTINI, Dario. Rumos da pesquisa brasileira em Educação Matemática. Campinas : FE-Unicamp, tese de doutorado, 1994. FIORENTINI, Dario. Alguns Modos e ver e conceber o ensino da matemática no Brasil. In: Zetetiké, ano 3, nº. 4, 1995, p.1-37. OLIVEIRA, Thais & FIORENTINI, Dario. Explorando o sentido de número irracional no ensino fundamental. In: CARVALHO, D. L.; CONTI, K. C. (Org.) Histórias de colaboração e investigação na prática pedagógica em matemática: ultrapassando os limites da sala de aula. Campinas: Alínea, 2009, p.132-148.FIORENTINI, Dario; CRISTOVÃO, Eliane M. (org.) Histórias e Investigação de/em Aulas de Matemática. Campinas: Alínea, 2006.MIGUEL, Antonio et alli. História da matemática em atividades didáticas. São Paulo : Editora Livraria da Física, 2009. PARATELI, Conceição aparecida et alli. A escrita no processo de aprender matemática. In: A FIORENTINI, Dario; CRISTOVÃO, Eliane M. (org.) Histórias e Investigação de/em Aulas de Matemática. Campinas: Alínea, 2006, p.39-53. PONTES, Regina Célia M.O potencial da escrita discursiva em aulas de matemática. In:CARVALHO, D. L.; CONTI, K. C. (Org.) Histórias de colaboração e investigação na prática pedagógica em matemática: ultrapassando os limites da sala de aula. Campinas: Alínea, 2009, p.149-161. TREVISAN, André Luis. Modelagem matemática como proposta para o ensino. Campinas-SP, em elaboração, 2004.