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Dissertação de Mestrado COMPORTAMENTO DE ENROCAMENTOS EM BARRAGENS – ESTUDO DE CASO DA BARRAGEM DE EMBORCAÇÃO AUTOR: PAULA LUCIANA DIVINO ORIENTADOR: Prof. Dr. Saulo G. S. Ribeiro (UFOP) MESTRADO PROFISSIONAL EM ENGENHARIA GEOTÉCNICA DA UFOP OURO PRETO - OUTUBRO DE 2010

Dissertacao Enrocamento

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  • Dissertao de Mestrado

    COMPORTAMENTO DE ENROCAMENTOS EM BARRAGENS ESTUDO DE CASO DA

    BARRAGEM DE EMBORCAO

    AUTOR: PAULA LUCIANA DIVINO

    ORIENTADOR: Prof. Dr. Saulo G. S. Ribeiro (UFOP)

    MESTRADO PROFISSIONAL EM ENGENHARIA GEOTCNICA DA UFOP

    OURO PRETO - OUTUBRO DE 2010

  • Catalogao: [email protected]

    D618c Divino, Paula Luciana. Comportamento de enrocamentos em barragens [manuscrito] : estudo de caso

    da Barragem de Emborcao / Paula Luciana Divino. 2010. xxii, 188f.: il., color.; grafs.; tabs.

    Orientador: Prof. Dr. Saulo Gutemberg Silva Ribeiro.

    Dissertao (Mestrado) - Universidade Federal de Ouro Preto. Escola de Minas. NUGEO. rea de concentrao: Geotecnia de barragens.

    1. Mecnica dos Solos - Teses. 2. Barragens - Teses. 3. Enrocamentos - Teses. 4. Deformaes e Tenses - Teses. 5. Anlise numrica - Teses. I. Universidade Federal de Ouro Preto. II. Ttulo.

    CDU: 624.136:517

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    DEDICATRIA

    minha famlia, meus verdadeiros bens e luz no meu caminho.

    Ao Dan, amor verdadeiro e anjo.

    Aos amigos, pedras preciosas.

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    AGRADECIMENTOS

    A Deus que me proporcionou a Vida e todas as conquistas e que est sempre ao meu lado.

    Ao Professor Saulo, pela confiana, disponibilidade e encorajamento; pelas sugestes que permitiram o aprimoramento deste trabalho e principalmente pela contribuio especial para minha formao profissional.

    minha famlia pelo amor incondicional, pacincia, fora, carinho e compreenso.

    Ao Dan, grande amor, pelas palavras de amor, carinho e encorajamento, pela confiana sem limites e f incondicional no melhor.

    Aos amigos da Gerncia de Segurana de Barragens e Planejamento da Manuteno Civil, pelo incentivo para a concluso deste trabalho; especialmente Adelaide Linhares e ao Alexandre Vaz pelas horas dedicadas a ouvir, revisar o trabalho e me apoiar, e Teresa Cristina pela confiana, apoio e grande incentivo para vencer mais uma etapa.

    Cemig Gerao e Transmisso pela disponibilizao das informaes e oportunidade constante de aprimoramento profissional e pessoal.

    A todos que colaboraram direta ou indiretamente para a realizao deste trabalho.

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    RESUMO

    Este trabalho visa avaliar o comportamento tenso-deformao da barragem de Emborcao, por meio da avaliao das possveis condicionantes que geraram recalques a montante e na crista da barragem acima do previsto, na construo e enchimento do reservatrio, assim como a persistncia de recalque, em pequena escala, no tempo. Para isto, foi exposta a evoluo do conceito dos enrocamentos, bem como as caractersticas geomecnicas mais importantes para o comportamento destes materiais: resistncia ao cisalhamento e deformabilidade. No menos importante, as tenses de grande magnitude atuantes nos contatos dos enrocamentos e outros fatores intervenientes no comportamento geomecnico destes materiais so discutidos. O estudo foi desenvolvido por meio de modelagem numrica com suporte do sistema computacional GeoStudio 2007, mdulo Sigma. Os dados obtidos numericamente so correlacionados com os dados da instrumentao de campo, sempre que possvel, uma vez que boa parte dos instrumentos de medio de recalques e deslocamentos horizontais da barragem danificou-se durante o perodo construtivo. A simulao numrica evidenciou que trs condicionantes principais propiciaram os recalques excessivos, a saber: mdulo de elasticidade dos enrocamentos compactados com espessura de 120cm com valores inferiores aos preditos na fase de projeto; elevado deslocamento do ncleo argiloso no enchimento do reservatrio, proporcionada pela baixa rigidez dos materiais de jusante; efeito da submerso e possvel colapso nos enrocamentos de montante. Artifcios numricos foram implementados para avaliar numericamente o recalque no tempo em funo das oscilaes do reservatrio, pois o sistema computacional no permite a aplicao da carga do reservatrio em camadas internas. A modelagem dos recalques por enchimento, colapso e oscilao do nvel do reservatrio mostrou-se bastante compatvel com os dados medidos na crista da barragem e no comportamento geral do macio.

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    ABSTRACT

    This paper aims to analyze Emborcao dam stress-strain behavior, by evaluating the possible factors that generated higher settlements than predicted for upstream slope and the crest of the dam, during construction and filling of reservoir, as well as continuity of settlements, on short scale, in the course of time. The developments on rockfill concepts were initially explained, as well as the most important geomechanical characteristics of these materials behavior: shear strength and deformability. Not less important, the tensions of great magnitude acting on the rockfill contacts and other factors intervenient in the geomechanical behavior of these materials are discussed. The study was developed using numerical modeling, supported by computer system GeoStudio 2007, Sigma. Whenever possible, the numerical data are correlated with field instrumentation data, since many settlements and horizontal displacements instruments installed in the dam were damaged during the construction period. The numerical modeling simulation and the field instrumentation data showed that three main reasons led to the excessive settlements observed, namely: deformability modulus of the rockfill compacted in 120cm layers, lower than predicted in the design phase; high displacement of the clay core during the reservoir filling, due to high deformability of downstream materials; effect of submersion and possible collapse in the upstream rockfill. Numerical devices were implemented to assess numerically the settlements in the course of time in terms of the reservoir level variations, as the computational system do not allow to apply the hydraulic load of the reservoir at the dam core surface. The settlements modeling due to reservoir impoundment, collapse and reservoir level fluctuations proved to be quite compatible with the data measured at dam crest and the general behavior of the embankment.

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    Lista de Figuras

    Figura 2.1 Curvas do ndice de vazios em funo do percentual de solo acrescentado ao enrocamento (Marsal 1976; citado em Bourdeaux, 1982). Figura 2.2 - Curvas de deformao axial x presso, em ensaio de compresso unidimensional (corpos de prova compactados dinamicamente) (Marsal 1976; citado em Bourdeaux, 1982). Figura 2.3 - Faixa granulomtrica dos enrocamentos (Neves, 2002). Figura 2.4 Curvas granulomtricas dos enrocamentos de montante de algumas barragens brasileiras. Figura 2.5 - Representao esquemtica da fora transmitida atravs do solo. (Lambe e Whitman, 1969). Figura 2.6 - Causas dos deslocamentos relativos entre partculas de solos. (adaptado de Lambe e Whitman, 1969). Figura 2.7 Ruptura de uma srie instvel de partculas (Lambe e Whitman, 1969). Figura 2.8 Mtodo de modelagem da curva granulomtrica de campo (Pinto; 1982, citado em Basso, 2007). Figura 2.9 Mdulos de deformao Sistemas de carregamentos diversos (adaptado de Parra, 1985). Figura 2.10 Curvas de Mohr de alguns materiais granulares (adaptado de Cruz et al., 2009). Figura 2.11 Contribuies para a resistncia ao cisalhamento de solos granulares (Rowe; 1962, adaptado de Mitchell e Soga, 2005). Figura 2.12 - Fatores que influenciam o comportamento mecnico dos enrocamentos (Basso, 2007). Figura 2.13 Resistncia ao cisalhamento de enrocamentos a partir de ensaios triaxiais de grandes dimenses (Leps, 1970). Figura 2.14 Variao do ngulo de atrito com a presso normal para os enrocamentos das barragens de Diamond Valley (Duncan, 2004). Figura 2.15 Alto Anchicaya Teste de deformabilidade em oedmetro dimetro

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    0,75m (Materon; 1972 citado em Narvaez, 1980). Figura 2.16 Curvas granulomtricas de uma camada compactada (Cruz et al., 2009). Figura 2.17 Enrocamento da barragem de Shiroro antes e depois da compactao (Cruz et al., 2009). Figura 2.18 Benefcio da compactao com molhagem na reduo dos recalques ps-construo devido inundao (IESA, 1992). Figura 2.19 Enrocamentos de rochas brandas e semi-duras Benefcio da molhagem durante a compactao na resistncia ao cisalhamento no estado saturado (IESA, 1992). Figura 3.1 Efeitos do enchimento do reservatrio numa barragem de enrocamento com ncleo de argila (Neves, 1991). Figura 3.2 Curvas tenso deformao em ensaio edomtrico dos enrocamentos da barragem Pyramid (Nobari e Duncan; 1972, citado em Neves, 1991). Figura 3.3 Movimentos da crista e trincas na barragem de Cougar (Pope; 1967, citado em Neves, 1991). Figura 3.4 Perfil da fundao da ombreira direita na barragem Round Butte com localizao de trinca transversal (Sherard, 1973). Figura 3.5 Deslocamentos e deformaes na crista da barragem El Infiernillo durante elevao do nvel de gua (Neves, 1991). Figura 3.6 Barragem de enrocamento Canales (Bravo et. al., 1988; citados em Neves, 1991). Figura 3.7 Fases da fluncia (adaptado de Neves, 2002). Figura 3.8 Comportamento cclico dos enrocamentos de granito da barragem de Serra da Mesa (Maia, 2001). Figura 3.9 Curvas dos enrocamentos densos de basalto da barragem de Marimbondo (adaptado de Maia, 2001). Figura 3.10 Curvas dos enrocamentos fofos de basalto da barragem de Marimbondo (adaptado de Maia, 2001). Figura 4.1 Arranjo geral do aproveitamento hidreltrico de Emborcao. Figura 4.2 Vista geral da usina hidreltrica de Emborcao e da barragem principal. Figura 4.3 Desvio do rio Paranaba para construo da Usina de Emborcao. Figura 4.4 Seo transversal tpica da barragem de Emborcao. Figura 4.5 Materiais de fundao da barragem de Emborcao.

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    Figura 4.6 Detalhe do filtro cego na fundao da barragem de Emborcao. Figura 4.7 - Filtro invertido aplicado nas reas de rocha decomposta na fundao. Figura 4.8 Padro de injeo e detalhe tpico zona do ncleo impermevel. Figura 4.9 Fontes dos materiais utilizados na construo da barragem. Figura 4.10 Curvas granulomtricas dos enrocamentos utilizados na barragem de Emborcao. Figura 4.11 Penteamento do talude de jusante setembro de 1981. Figura 4.12 Locais de aplicao do material tipo borderline. Figura 4.13 Curvas granulomtricas dos materiais de transio e filtro da barragem de Emborcao. Figura 4.14 Curva granulomtrica, material do ncleo de Emborcao. Figura 4.15 Granulometria mdia dos materiais empregados no tapete impermevel interno da barragem de emborcao. Figura 4.16 - Seo 2 Estaca 10 + 0,0: clulas de presso total e medidores de recalque Hall utilizados nas anlises. Figura 4.17 - Seo 2 Estaca 10+00: caixas suecas, inclinmetro e piezmetros Hall

    utilizados nas anlises. Figura 4.18 Localizao dos marcos de deslocamento superficial. Figura 4.19 Detalhe de tubo de inclinmetro com anomalias. Figura 4.20 Detalhe esquemtico de disposio de caixas suecas. Figura 5.1 Critrios adotados no projeto bsico da barragem de Emborcao. Figura 5.2 Grfico tenso-deformao da camada inferior s caixas suecas CS201 a CS204, est. 10+0,00.

    Figura 5.3 Grfico tenso-deformao, camada de enrocamento entre as caixas suecas CS205/CS201 e CS206/CS202, est. 10+0,00. Figura 5.4 Grfico tenso-deformao, medidores de recalque Hall, RH 201, RH206 e RH211, est. 10+0,00.

    Figura 5.5 Grfico tenso-deformao comparativo para as barragens de Emborcao, Foz do Areia e Salto Santiago e localizao dos instrumentos. Figura 5.6 Recalque significativo do random da base da barragem de Emborcao, perodo construtivo. Figura 5.7 Zoneamento da barragem de Emborcao projeto bsico versus projeto

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    executivo.

    Figura 5.8 Detalhes da crista da barragem de Emborcao projeto bsico versus projeto executivo. Figura 5.9 Deformao acumulada nos marcos de superfcie da estaca 10+00, perodo construtivo.

    Figura 5.10 Curva do enchimento do reservatrio de Emborcao. Figura 5.11 Deslocamentos na barragem de Emborcao advindos do enchimento do reservatrio (Parra, 1985). Figura 5.12 Deslocamentos verticais na barragem de Emborcao advindos do enchimento do reservatrio, caixas suecas estaca 10+00. Figura 5.13 Deslocamentos verticais na barragem de Emborcao, marcos de superfcie das bermas de jusante, estaca 10+00. Figura 5.14 Deslocamentos verticais na barragem de Emborcao, medidor de recalque pneumtico RH 201, estaca 10+00.

    Figura 5.15 Incremento de recalques na barragem de Emborcao, IR 300, estaca 10+00, advindo do enchimento do reservatrio. Figura 5.16 Deslocamentos horizontais crista montante de Emborcao, estaca 10+00, perodo de enchimento do reservatrio. Figura 5.17 Deslocamentos horizontais crista jusante de Emborcao, estaca 10+00, perodo de enchimento do reservatrio. Figura 5.18 Deslocamentos horizontais ao longo da berma jusante el.605m, estaca 10+00, perodo de enchimento do reservatrio. Figura 5.19 Abertura de trinca a montante, na regio da estaca 9+50,00m, 11 de maro de 1982. Figura 5.20 Comparao recalque dos enrocamentos jusante e ncleo argiloso da barragem de Emborcao, final de enchimento do reservatrio. Figura 5.21 Perfil longitudinal pela fundao da barragem de Emborcao. Figura 5.22 Trinca de montante vista no interior de um poo, da ombreira esquerda para a direita (abril/1982). Figura 5.23 Trajetria de tenses efetivas, el. 577m, material de transio de montante.

    Figura 5.24 Linha de tendncia para resistncia ao cisalhamento de enrocamentos

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    (adaptado de Leps, 1970). Figura 5.25 Detalhamento da geometria da crista da barragem de Emborcao. Figura 5.26 Incrementos de recalques nas estacas 9+00 e 10+00 pelas oscilaes do reservatrio.

    Figura 5.27 Deslocamentos horizontais e nveis do reservatrio, estaca 10+00m. Figura 5.28 Detalhe da escavao realizada na barragem de Emborcao, estaca 10+81m a 10+89m. Figura 5.29 Trinca longitudinal na crista da barragem de Emborcao. Figura 6.1 Evoluo da construo do aterro da barragem de Emborcao. Figura 6.2 Modelagem da construo do aterro em 14 etapas Vista da 1 etapa. Figura 6.3 Modelagem da construo do aterro em 14 etapas Vista da 7 etapa. Figura 6.4 Malha de elementos finitos da barragem de Emborcao. Figura 6.5 Isovalores de recalques final de construo. Figura 6.6 Evoluo dos recalques modelo numrico x instrumentos de campo CS205 e RH212.

    Figura 6.7 Evoluo dos recalques modelo numrico x instrumentos de campo CS204, RH214 e MS102. Figura 6.8 Evoluo dos recalques modelo numrico x instrumentos de campo CS209, RH210 e MS108.

    Figura 6.9 Tenses verticais no final de construo. Figura 6.10 - Zonas de plastificao (em amarelo) com aplicao da redistribuio de tenses Linhas de isovalores de deformaes cisalhantes mximas. Figura 6.11 - Plastificao nos sistemas de drenagem. Figura 6.12 Zonas plastificadas para redistribuio de tenses no final da construo (a) e para simulao da construo com modelo elasto-plstico (b). Figura 6.13 Recalques na barragem de enrocamento de So Simo. Figura 6.14 Recalques na barragem de enrocamento de Nova Ponte. Figura 6.15 Plastificao devida mudana na estrutura granular (GeoSlope, 2007). Figura 6.16 Modelagem do alteamento do nvel do reservatrio em 8 meses, 240 dias. Figura 6.17 Zonas suscetveis redistribuio de tenses para reservatrio na elevao 625m. Figura 6.18 Zonas suscetveis redistribuio de tenses para reservatrio na elevao

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    660m. Figura 6.19 Superfcie de ruptura no talude de montante quando da elevao do nvel do reservatrio cota 625m. Figura 6.20 Fator de segurana talude de montante para enchimento total do reservatrio, elevao 660m. Figura 6.21 Estabilidade do talude de montante para enchimento total - superfcie de ruptura biplanar passando nos enrocamentos de montante. Figura 6.22 Estabilidade do talude de montante para enchimento total - superfcie de ruptura biplanar passando pelo ncleo. Figura 6.23 Fator de segurana na base de cada fatia da superfcie de ruptura no talude de montante, imediatamente aps o enchimento. Figura 6.24 Regies com fator de segurana local menor que 1. Figura 6.25 Deslocamento horizontal previsto para o ncleo, imediatamente aps o enchimento pleno.

    Figura 6.26 Deslocamento horizontal da crista da barragem. Figura 6.27 Deslocamento horizontal da face do talude de jusante aps o enchimento do reservatrio. Figura 6.28 Esquema ilustrativo da simulao numrica do enchimento do reservatrio.

    Figura 6.29 Aplicao da carga hidrulica, el. 660m, na face de montante do ncleo. Figura 6.30 Diferenciao dos materiais de montante submersos e materiais de jusante secos.

    Figura 6.31 Recalques cumulativos na crista montante advindos do enchimento do reservatrio.

    Figura 6.32 Esquema utilizado para simular numericamente as oscilaes do reservatrio.

    Figura 6.33 Recalque advindo do primeiro ciclo de rebaixamento do reservatrio modelo numrico. Figura 6.34 Recalques cumulativos na crista montante da barragem de Emborcao modelo numrico. Figura 7.1 Linhas de isovalores de recalques para barragem de Emborcao, substituio dos E120 e zona de grandes blocos por E90.

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    Lista de Tabelas

    Tabela 2.1 Caractersticas dos materiais utilizados por Marsal (adaptado de Bourdeaux, 1982). Tabela 2.2 Valores tpicos para foras de contato mdias em solos granulares (adaptado de Lambe e Whitman, 1969). Tabela 2.3 Tenses de contato Quartzo liso D = 0,3mm (Ribeiro; 2001, citado em Lemos, 2003). Tabela 2.4 Tenses de contato Enrocamento D = 300mm. Tabela 2.5 Mdulos de deformabilidade vertical de campo de enrocamentos (adaptado e complementado de Musman, 2002). Tabela 2.6 Resultados de ensaios de resistncia em enrocamentos (adaptado de Cruz et al., 2009). Tabela 2.7 Sntese dos resultados da pista experimental 2 da UHE Miranda (adaptado de IESA, 1992). Tabela 2.8 Valores do fator de abrandamento para algumas rochas (Bourdeaux, 1982). Tabela 2.9 Resistncia compresso de rochas secas e midas (Terzaghi; 1960c, citado em Cruz et al., 2009). Tabela 4.1 Instrumentao instalada na barragem principal da UHE Emborcao (Fusaro, 2007). Tabela 4.2 - Localizao dos marcos de deslocamento superficial das estacas 10+00 e 10+50m. Tabela 5.1 Informaes associadas s caixas suecas das barragens de Emborcao, Foz do Areia e Salto Santiago, apresentadas na Figura 5.5. Tabela 5.2 Comparao entre parmetros utilizados no modelo numrico de projeto e obtidos por meio da instrumentao de campo. Tabela 5.3 Comparao entre deformaes verticais do modelo numrico e da instrumentao de campo. Tabela 5.4 Efeito da transferncia de carga do ncleo para as transies durante o

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    perodo construtivo. Tabela 5.5 Recalques diferenciais mximos medidos em barragens de enrocamento da Cemig, enchimento do reservatrio. Tabela 6.1 Mdulos de elasticidade calibrados (apoio Cssio Viotti). Tabela 6.2 Mdulos de deformao anisotrpica calculados. Tabela 6.3 Recalques do modelo numrico e medidas de campo. Tabela 6.4 Tenses verticais e horizontais fornecidas pela simulao numrica e pela instrumentao de campo. Tabela 6.5 Parmetros de resistncia dos enrocamentos. Tabela 6.6 Parmetros de resistncia dos materiais argilosos e granulares. Tabela 6.7 Condutividade hidrulica dos materiais. Tabela 6.8 Parmetros dos materiais utilizados nas etapas (a), (b) e (c) da simulao particular de enchimento do reservatrio. Tabela 6.9 Parmetros dos materiais utilizados nas etapas (d) e (e) da simulao particular de enchimento do reservatrio. Tabela 6.10 Comparao recalques de campo e numrico devido enchimento reservatrio.

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    Lista de Smbolos, Nomenclatura e Abreviaes

    A Parmetro que igual tan para tenso normal unitria Ac rea do contato B Mdulo de deformao volumtrica

    b Parmetro que representa variao de com BT Barragem de terra c Coeso verdadeira CBDB Comit Brasileiro de Barragens CBGB Comit Brasileiro de Grandes Barragens CEMIG Companhia Energtica de Minas Gerais CS Caixa sueca Cu Coeficiente de uniformidade D Mdulo de deformao confinada dc Dimetro da rea de contato de Dimetro efetivo dmax Dimetro mximo dmdio Dimetro mdio dmin Dimetro mnimo E Mdulo de elasticidade e ndice de vazios ED Mdulo de deformabilidade El Elevao

    EM Emborcao E120 Enrocamentos compactados em camadas de 1,20m E90 Enrocamentos compactados em camadas de 90cm E60 Enrocamentos compactados em camadas de 60cm

    a Deformao axial

    Fa Fora de atrito tangencial mxima no contato

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    ngulo de resistncia ao cisalhamento ngulo de atrito efetivo b ngulo de atrito bsico crit ngulo de atrito crtico f ngulo de atrito corrigido pelo trabalho da dilatncia m ngulo de atrito de pico mobilizado quebra ngulo de rearranjo Peso especfico natural

    Peso especfico submerso H Altura da barragem h Altura de aterro ICOLD International Comission on Large Dams IESA Internacional de Engenharia Sociedade Annima IR Inclinmetro de recalque k Coeficiente de permeabilidade LL Limite de liquidez LP Limite de plasticidade M Mdulo de deformao com compresso anisotrpica MS Marco de recalque superficial MW MegaWatt

    Coeficiente de atrito N Fora normal superfcie de contato N.A. Nvel de gua Nc Fora no contato

    nc Nmero de contatos Np Nmero de partculas em um volume unitrio pc Tenso de contato PH Piezmetro Hall

    PT Clula de presso total R Recalque

    RH Medidor de recalque Hall

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    seco max Massa especfica seca mxima

    Tenso vertical

    a Tenso axial

    c Tenso confinante

    t Tenso total

    y Tenso de plastificao no ponto de contato da partcula de solo

    T Fora tangencial superfcie de contato

    Tenso de cisalhamento

    UHE Usina Hidreltrica UNAM Instituto de Engenharia da Universidade Nacional do Mxico V Volume

    Vs Volume de slidos wot Umidade tima y Coeso intrnseca

    Coeficiente de Poisson

    V Variao volumtrica

    ngulo de dilatncia maxh Recalque mximo em funo da altura da barragem

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    Lista de Anexos

    Anexo I Posio dos instrumentos na seo da estaca 10+00 na barragem de Emborcao

    Anexo II Recalques do perodo de enchimento do reservatrio da barragem de Emborcao

    Anexo III Recalques mximos em funo da altura - barragens de enrocamento Anexo IV Simulao numrica calibrada para os recalques no final da construo da

    barragem de Emborcao Anexo V Comparao recalques modelos numricos e recalques de campo Anexo VI Simulao de uma barragem de enrocamento com ncleo vertical

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    NDICE

    CAPTULO 1 - INTRODUO 1.1 CONSIDERAES INICIAIS 1 1.2 METODOLOGIA 2

    1.3 ESTRUTURAO DA DISSERTAO 3

    CAPTULO 2 COMPORTAMENTO DE ENROCAMENTOS 2.1 CONCEITOS DE ENROCAMENTOS 6

    2.2 TENSES DE CONTATO 15

    2.3 RESISTNCIA E DEFORMABILIDADE DOS ENROCAMENTOS 23

    2.3.1 Deformabilidade 23 2.3.2 Resistncia ao cisalhamento 31

    2.4 PRINCIPAIS FATORES INFLUENCIANTES NO COMPORTAMENTO TENSO DEFORMAO DOS ENROCAMENTOS 36

    2.4.1 Influncia do nvel de tenso 37 2.4.2 Influncia da resistncia ao esmagamento 40 2.4.3 Influncia da compactao 41 2.4.4 Influncia da gua 43

    CAPTULO 3 COLAPSO E MECANISMOS DE DEFORMAO NO TEMPO 3.1 INTRODUO 50

    3.2 O FENMENO DO COLAPSO NOS ENROCAMENTOS 50 3.2.1 Os fundamentos do colapso nos enrocamentos 50 3.2.2 Trincas produzidas pelo colapso dos enrocamentos 53

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    3.3 FLUNCIA 58

    3.4 FENMENOS CCLICOS 60 3.4.1 Ciclos de carga-descarga pelas oscilaes do reservatrio 61 3.4.2 Secagem e umedecimento 66

    CAPTULO 4 ASPECTOS GERAIS DO PROJETO E CONSTRUO DA BARRAGEM DE EMBORCAO

    4.1 DESCRIO DO PROJETO 67

    4.2 ASPECTOS GEOLGICOS DO LOCAL 73 4.3 CARACTERSTICAS GEOTCNICAS DA FUNDAO 74

    4.4 MATERIAIS UTILIZADOS NA CONSTRUO 77 4.4.1 Enrocamentos (Zonas 1, 2 e 3) 79 4.4.2 Transies (Zonas 4 e 8) 81 4.4.3 Filtros (Zona 5) 83 4.4.4 Ncleo impermevel (Zona 6) 83 4.4.5 Random Tapete impermevel interno (Zona 7) 84

    4.5 INSTRUMENTAO CIVIL 86 4.6 OCORRNCIAS DURANTE A CONSTRUO 91

    CAPTULO 5 ANLISE DO COMPORTAMENTO TENSO DEFORMAO DA BARRAGEM DE EMBORCAO POR MEIO DA INSTRUMENTAO INSTALADA

    5.1 INTRODUO 95

    5.2 HISTRICO 95 5.3 COMPORTAMENTO DA BARRAGEM DE EMBORCAO 97

    5.3.1 Perodo construtivo 98 5.3.2 Perodo de enchimento do reservatrio 110 5.3.3 Perodo operativo 126

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    CAPTULO 6 ESTUDO NUMRICO PARA AVALIAO DO COMPORTAMENTO TENSO DEFORMAO DA BARRAGEM DE EMBORCAO

    6.1 CONTEXTUALIZAO 136 6.2 - CALIBRAO DOS MDULOS DE ELASTICIDADE DOS MATERIAIS 136

    6.3 TENSES VERTICAIS NO FINAL DE CONSTRUO 146

    6.4 REDISTRIBUIO DE TENSES NO FINAL DE CONSTRUO 148 6.5 SIMULAO DA CONSTRUO DA BARRAGEM COM MODELO ELASTO-PLSTICO 151 6.6 EFEITO DO ENCHIMENTO DO RESERVATRIO 152 6.7 EFEITO DAS OSCILAES DO RESERVATRIO 171

    CAPTULO 7 CONCLUSES E SUGESTES PARA PESQUISAS FUTURAS 7.1 CONSIDERAES FINAIS 175

    7.2 PRINCIPAIS CONCLUSES 176

    7.3 SUGESTES PARA PESQUISAS FUTURAS 181

    REFERNCIAS BILBIOGRFICAS 183

  • CAPTULO 1

    INTRODUO

    1.1 CONSIDERAES INICIAIS

    A utilizao de enrocamentos em barragens data de 1850, quando mineiros na

    Sierra Nevada, Califrnia, utilizaram esses materiais para construo de barragens para

    armazenamento de gua, uma vez que havia muito material rochoso disponvel e eles

    detinham a tcnica de utilizao de explosivos para fragmentao dos macios rochosos.

    Nessa poca os enrocamentos eram simplesmente lanados e a nica exigncia era a alta

    resistncia da rocha e a presena de poucos finos. Como vedao, eram utilizados

    troncos de madeira sobrepostos, formando uma barreira de vedao.

    A evoluo de equipamentos, a criao de sistemas computacionais e o avano

    em investigaes e estudos, permitiram conhecer melhor o comportamento destes

    materiais. No entanto, problemas relacionados com deformaes surgiram e

    evidenciaram a necessidade de mais avanos e pesquisas.

    No caso das barragens de enrocamento com ncleo argiloso, o principal desafio

    compatibilizar as deformaes no elemento resistente com as deformaes ocorridas

    no elemento impermeabilizante, evitando concentraes elevadas de tenses e eventual

    fissurao do ncleo.

    O problema de trincas e fissuras em barragens de enrocamento recorrente,

    tendo sido observado ao longo da histria das barragens em uma quantidade

    significativa de estruturas. A principal preocupao com estas patologias a

    possibilidade de comprometer a segurana estrutural.

    Neste sentido, o programa de Segurana de Barragens da Cemig compreende o

    monitoramento das barragens e a realizao de atividades para garantir a segurana

    operacional, estrutural e hidrolgica das estruturas e detectar em tempo hbil, mudanas

    de comportamento que possam afetar negativamente seu comportamento. A barragem

    de Emborcao, inserida neste processo, demandou a realizao de uma reavaliao de

    1

  • segurana pormenorizada, para permitir avaliao mais criteriosa de seu

    comportamento, e assim, indicar com maior eficincia a condio atual.

    Desta forma, surge a necessidade de reavaliar o comportamento da barragem de

    Emborcao, devido ao aparecimento de trincas na crista com o incio do enchimento do

    reservatrio e a persistncia delas at o presente momento, sendo influenciadas

    especialmente pelas oscilaes do nvel de gua no reservatrio. eficicncia

    Neste contexto, esta dissertao tem por objetivo principal avaliar o

    comportamento tenso-deformao da barragem de Emborcao, por meio de anlise

    pormenorizada dos dados da instrumentao instalada e da elaborao de um modelo

    numrico mais representativo das condies de campo. Estas anlises se mostram teis

    para melhor compreenso da persistncia de recalques, em pequena escala, no tempo, e

    para entendimento dos mecanismos que culminam na abertura de trincas.

    1.2 METODOLOGIA

    Para avaliao do comportamento tenso-deformao da Barragem de

    Emborcao, preliminarmente foi realizada uma ampla pesquisa bibliogrfica acerca

    dos principais fatores influenciantes no comportamento geomecnico dos enrocamentos.

    Nesta fase, pesquisou-se a ocorrncia de trincas em barragens de enrocamento com

    ncleo argiloso, bem como as provveis causas associadas.

    nfase especial foi dada s caractersticas de deformabilidade e resistncia ao

    cisalhamento dos enrocamentos e ao fenmeno de colapso, que gera deformaes

    bruscas nos enrocamentos quando sujeitos a submerso.

    Os dados obtidos da pesquisa bibliogrfica nortearam as diretrizes a serem

    adotadas para a realizao das anlises subsequentes.

    Todos os relatrios de inspeo de campo, relatrios de anlise da

    instrumentao referentes ao perodo de operao da barragem e relatrios de

    intervenes ocorridas neste perodo foram analisados. Nesta fase de estudos, parte dos

    dados da instrumentao da poca da construo foi recuperada e inserida no banco de

    dados da instrumentao civil de barragens da CEMIG.

    2

  • As anlises da instrumentao permitiram a compreenso inicial dos

    mecanismos de deformao atuantes na barragem, possibilitando realizar retroanlises

    para calibrar os mdulos de deformabilidade dos materiais, parmetros necessrios para

    realizar as anlises tenso-deformao por meio do programa SIGMA. Foi escolhida a

    seo de mxima altura da barragem, a seo do leito do rio, por ser a seo da

    barragem onde os deslocamentos apresentam maior magnitude. No entanto, o

    conhecimento das condies gerais do stio de implantao da barragem permitiu

    verificar, por exemplo, que as trincas ocorrem, tambm, em pontos do macio onde h

    descontinuidades na fundao.

    Os demais parmetros geotcnicos dos materiais empregados na construo da

    barragem foram obtidos a partir de relatrios tcnicos de projeto e da construo da

    barragem, sendo reavaliados com base nos estudos subsequentes e nos resultados dos

    ensaios efetuados mais recentemente. Ensaios estes realizados apenas para o material do

    ncleo argiloso.

    Os dados obtidos das simulaes numricas foram confrontados com os

    resultados da instrumentao, quando possvel, para se avaliar a consistncia e para

    calibrar o modelo adotado.

    Todos os resultados destes estudos e anlises foram sistematizados neste

    trabalho de dissertao, que pretende, neste sentido, melhorar a avaliao do

    comportamento da Barragem de Emborcao, consistindo em uma fonte de referncia

    para quaisquer estudos futuros. Tal pretenso baseada na natureza e na amplitude do

    trabalho aqui apresentado, que sintetiza as informaes relevantes para um contexto

    global do conhecimento dos mecanismos de deformao da barragem de Emborcao.

    1.3 ESTRUTURAO DA DISSERTAO

    O trabalho foi estruturado em 7 captulos e 6 anexos, de acordo com a seguinte

    abordagem:

    3

  • No Captulo 1, Introduo, so caracterizados a importncia e o impacto da

    pesquisa, os objetivos e a metodologia adotada no trabalho, bem como a estruturao e

    subdiviso dos assuntos abordados nos diferentes captulos.

    No Captulo 2 apresentada uma reviso bibliogrfica relativa ao

    comportamento dos enrocamentos, englobando seu comportamento geomecnico em

    termos de resistncia ao cisalhamento e deformabilidade, incluindo fatores importantes

    como quebra de gros e tenses de contato.

    No Captulo 3 realizada uma abordagem geral do colapso e mecanismos de

    deformao no tempo, que so fenmenos importantes para avaliar o comportamento de

    longo-prazo das barragens de enrocamento. So apresentados alguns casos de trincas em

    barragens de enrocamentos com ncleo argiloso e so caracterizados alguns efeitos dos

    ciclos de carga e descarga do reservatrio no comportamento das barragens.

    No Captulo 4 so relacionados os aspectos gerais do projeto e construo da

    Barragem de Emborcao, bem como aspectos geolgicos do stio, caractersticas

    geotcnicas da fundao, geologia local, materiais utilizados na construo, informaes

    sobre instrumentos instalados e fatos relevantes observados no perodo construtivo.

    No Captulo 5 so apresentadas as anlises dos resultados da instrumentao de

    medio de recalques e deslocamentos horizontais em operao na barragem da usina

    hidreltrica de Emborcao, bem como os dados parciais de alguns instrumentos que se

    danificaram ao longo do tempo. Foram traados grficos de acompanhamento destes

    instrumentos, incluindo-se o registro de dados de outras barragens semelhantes.

    No Captulo 6 so apresentados os resultados das simulaes das anlises

    numricas de tenso-deformao da barragem de Emborcao, com base em parmetros

    representativos dos materiais do macio. Nestas abordagens, foram realizadas as

    seguintes simulaes:

    calibrao dos mdulos de deformabilidade dos materiais; construo do aterro; efeito do enchimento do reservatrio; anlise particular dos efeitos das oscilaes do nvel de gua no

    reservatrio no comportamento da barragem.

    4

  • 5

    No Captulo 7 apresentada a anlise dos resultados obtidos por meio dos

    modelos tericos, quando comparados aos dados da instrumentao instalada e das

    observaes de campo. Para finalizar, so apresentadas as principais concluses obtidas

    ao longo do trabalho e feitas algumas sugestes/recomendaes para a implementao

    de estudos e pesquisas futuras envolvendo a abordagem dos mecanismos de deformao

    da barragem da UHE Emborcao e o comportamento de enrocamentos.

  • Captulo 2

    COMPORTAMENTO DE ENROCAMENTOS

    2.1 CONCEITOS DE ENROCAMENTOS

    Para estudar o comportamento dos enrocamentos importante conhecer a

    evoluo dos conceitos ao longo do tempo, uma vez que estes conceitos influenciam

    notadamente seu comportamento.

    O termo enrocamento equivale ao termo rockfill em ingls e enrochement

    em francs. Uma definio bem simples de enrocamento, ou seja, uma definio no-

    tcnica, segundo o dicionrio Aurlio, seria: um macio de pedras para proteger aterros

    ou estruturas contra a eroso.

    No entanto, dentro desse contexto simples est associada uma das grandes

    utilizaes dos enrocamentos para a engenharia civil de barragens: a proteo de taludes

    contra a eroso. Alm da finalidade de proteo, os enrocamentos vm sendo

    largamente utilizados como materiais de construo, notadamente em barragens,

    principalmente por serem obtidos facilmente em exploraes obrigatrias para a

    construo das estruturas civis associadas s usinas hidreltricas.

    Segundo Kjaernsli et al. (1992), o ICOLD define uma barragem de enrocamento

    como sendo uma barragem de aterro em que mais de 50% do volume do aterro foi

    obtido de uma pedreira, de escavao em rocha ou de pedras naturais.

    Usualmente, no se fala muito em definio de barragem de enrocamento,

    especialmente em termos do volume do material que a constitui. As definies de

    enrocamento foram sugeridas ao longo dos anos por vrios estudiosos sendo que esto,

    muitas vezes, associadas granulometria e s propriedades mecnicas determinantes no

    comportamento desses materiais: resistncia, deformabilidade e condutividade

    hidrulica.

    Estas definies evoluram ao longo do tempo medida que mais estudos e

    investigaes eram realizados. A seguir so apresentados alguns desses conceitos, de

    forma cronolgica, segundo seus respectivos estudiosos/pesquisadores.

    6

  • Terzaghi (1960; citado em Bourdeaux, 1982) emitiu a opinio que o

    enrocamento ideal a ser utilizado numa barragem deveria ser constitudo por um

    material bem graduado. Esta opinio baseia-se no fato de num enrocamento bem

    graduado e bem compactado, a resistncia ao cisalhamento poder ser mobilizada para

    um mnimo de deformao, ao passo que num enrocamento mal graduado, de

    granulometria uniforme, com alto ndice de vazios, ser exigida uma grande deformao

    para conseguir mobilizar a resistncia ao cisalhamento.

    No entendimento da autora desta dissertao, o conceito de enrocamento bem

    graduado est associado a uma distribuio granulomtrica desuniforme, ou seja, que

    possua fraes da amostra distribudas em algumas das faixas granulomtricas da curva.

    O conceito de bem compactado, por sua vez, est relacionado ao atendimento das

    especificaes de projeto para compactao (garantir a energia de compactao

    necessria), que muitas vezes se baseiam em estudos experimentais e experincias

    prvias.

    Terzaghi e Peck (1967; citados em Affonso, 2004) classificaram o enrocamento

    como um material fragmentado, derivado de rocha s com partculas pesando entre

    13kgf e 18tf.

    Segundo Leps (1970; citado em Bourdeaux, 1982) a palavra enrocamento

    utilizada para definir um conjunto no coesivo de fragmentos de rocha cuja distribuio

    granulomtrica corresponde essencialmente a gros maiores que 12,5mm com uma

    frao de no mximo 30% (preferivelmente 10%) de gros passando pela peneira n 4

    (4,8mm).

    Marsal (1973) definiu enrocamentos como: materiais que, quando submetidos a

    uma variao de tenses, sofrem transformaes estruturais devidas a deslocamentos,

    rotaes e quebra dos gros. Para computar estas variaes e a sua influncia nas

    caractersticas de deformao e resistncia, necessrio estudar a distribuio das foras

    de contato e os fundamentos da quebra de gros.

    Sugeriu ainda que o material ideal para enrocamento deva ter menos de 10% em

    peso de partculas menores que 0,2 mm, dimenso mxima entre 20 e 30 cm e um

    coeficiente de uniformidade Cu maior ou igual a 15, tendo observado por meio de

    numerosos ensaios laboratoriais que para um mesmo valor de coeficiente de

    uniformidade, a resistncia ao cisalhamento decresce com o aumento das dimenses dos

    7

  • gros. Este comportamento foi observado por Leslie (1963; citado em Lambe e

    Whitman, 1969).

    Wilson (1973; citado em Bourdeaux, 1982) enfatizou que os enrocamentos

    menos compressveis so aqueles que so bem graduados e que contm finos siltosos

    e/ou arenosos. Pistas experimentais, ensaios em laboratrios e observao do

    desempenho de barragens de enrocamento construdas indicaram que um enrocamento

    bem graduado com finos tem caractersticas de resistncia e deformabilidade melhores

    que as de um enrocamento uniforme, de fragmentos grandes, todos constitudos por

    rocha s.

    Penman e Charles (1976; citados por Bourdeaux, 1982) recomendaram o

    seguinte critrio para a eliminao de finos dentro de um macio de enrocamento: Um

    enrocamento no poder desenvolver presses neutras durante a construo em ritmos

    normais de construo. A granulometria e tipo de finos so limitados pela exigncia de

    no se desenvolver essas presses intersticiais. Os autores desse critrio consideram

    um enrocamento livremente drenante, em ritmos de construo usuais, quando os

    coeficientes de permeabilidade so maiores que 10-5 m/s.

    Segundo Bourdeaux (1982), no XII Congresso Internacional de Grandes

    Barragens no Mxico (1976), o Prof. R. Marsal apresentou os primeiros resultados de

    ensaios laboratoriais sistemticos realizados sobre misturas de enrocamento com areia,

    com silte e com argila. Como enrocamento foi utilizada uma rocha basltica densa,

    ligeiramente vesicular, com resistncia compresso simples entre 50MPa e 70MPa. A

    Tabela 2.1 mostra as caractersticas dos materiais ensaiados por Marsal.

    Tabela 2.1 Caractersticas dos materiais utilizados por Marsal (adaptado de

    Bourdeaux, 1982).

    Caractersticas

    Material dmax

    (cm)

    dmin

    (cm) de (cm) Cu LL LP

    seco max (t/m3)

    wot

    (%)

    Enrocamento de rocha basltica 17,5 0,6 0,9 5,3 - - - -

    Areia mdia a grossa graduada - - - - - - - -

    Silte pouco argiloso com areia

    mdia e fina - - - - 29 22 1,52 20

    Argila passando pela peneira 40

    (0,4mm) - - - - 38 25 1,465 21

    8

  • Os resultados dessas investigaes so extremamente interessantes e servem de

    subsdio para resolver problemas relacionados com a seleo e utilizao de

    enrocamento para a construo de uma barragem, bem como para entender que o

    conceito de enrocamento est associado a alguns parmetros de controle que

    determinaro seu comportamento.

    Em termos de compactao, conforme ilustrado na Figura 2.1, os efeitos so

    significativamente influenciados pelo percentual de material adicionado.

    (a)

    (b) (c)

    Figura 2.1 Curvas do ndice de vazios em funo do percentual de solo acrescentado

    ao enrocamento (Marsal; 1976, citado em Bourdeaux, 1982).

    9

  • Na Figura 2.1, a variao do ndice de vazios em funo do percentual de areia

    mostra que a vibrao de misturas de enrocamento com areia eficiente, e que, com um

    percentual de 45% de areia, se consegue obter uma massa especfica mxima com um

    ndice de vazios de apenas 0,27. Os valores do ndice de vazios obtidos para o

    enrocamento sem areia e para a areia pura so da ordem de 0,55 e 0,50 respectivamente.

    Com a adio de silte ao enrocamento, a curva do ndice de vazios com funo do

    percentual de finos similar curva correspondente mistura de enrocamento com

    areia, s que o ndice de vazios mnimo obtido para uma percentagem de silte de

    apenas 10%.

    A comparao entre a curva de compactao dinmica (a) e a de compactao

    esttica (b) mostra que a compactao dinmica, que realizada no laboratrio por meio

    do ensaio Proctor e no campo por meio da utilizao dos rolos lisos vibratrios, se

    mostra mais eficiente para a compactao de materiais de enrocamento com adio de

    areia. Atualmente, a compactao com os rolos lisos vibratrios o mtodo mais

    empregado para a compactao de macios de enrocamento, que pode ser considerada

    uma boa prtica, confirmada pelas curvas acima, especialmente pela comparao entre a

    curva (a) e a curva (c), uma vez que o ndice de vazios para enrocamento com areia

    menor quando se emprega apenas compactao dinmica.

    Para a curva de compactao dinmica e esttica (c), observa-se ndice de vazios

    menor para ambos os materiais, que na opinio da autora deste trabalho se deve a um

    maior rearranjo das partculas devido presso e vibrao aplicadas ao mesmo tempo.

    Cabe ressaltar que estes tipos de compactao combinados podem ser obtidos em

    campo com a utilizao dos rolos combinados, que, normalmente, tem pouca utilizao

    na engenharia de barragens.

    No mbito da deformabilidade, conforme ilustrado na Figura 2.2, Marsal

    (1976; citado em Bourdeaux, 1982), mostrou que a adio de certa quantidade de

    materiais arenosos no coesivos ao enrocamento colabora para a diminuio da

    deformabilidade do enrocamento, cabendo ressaltar que a percentagem tima da mistura

    depender da composio granulomtrica do enrocamento e da areia disponvel. Com os

    materiais pesquisados, a adio de 30 a 40% de areia ao enrocamento utilizado permitiu

    obter material menos compressvel, entretanto, a adio de qualquer percentual de

    10

  • material siltoso e/ou argiloso resultou numa mistura sempre mais compressvel que o

    prprio enrocamento no contaminado.

    O termo enrocamento no contaminado refere-se, no entendimento da autora

    desta dissertao, a um enrocamento que possui em sua constituio apenas blocos e

    fragmentos de rocha utilizada na sua obteno.

    13%

    Figura 2.2 - Curvas de deformao axial x presso, em ensaio de compresso

    unidimensional (corpos de prova compactados dinamicamente) (Marsal; 1976, citado

    em Bourdeaux, 1982).

    11

  • Observou-se tambm que um dos efeitos mais marcantes na adio de qualquer

    tipo de solo ao enrocamento a substancial reduo de quebra de gros quando o

    percentual de finos ultrapassa os 30%, diminuindo, portanto a deformabilidade da

    mistura solo-enrocamento. Do ponto de vista prtico, Marsal (1976) conclui que a

    adio de areias, pedregulhos e finos de pedreira a um enrocamento mais ou menos

    uniforme, em propores da ordem de 20 a 50% melhora a distribuio granulomtrica

    da mistura resultante e favorece a eficincia das operaes de compactao com rolos

    vibratrios. A aceitao da contaminao de uma mistura de enrocamento com materiais

    granulares por solos plsticos, mesmo em propores menores que 15%, exige

    consideraes extremamente prudentes sob o aspecto das caractersticas drenantes e de

    deformabilidade da massa resultante.

    relevante comentar que dependendo dos percentuais de argila e/ou de silte

    dentro de um macio de enrocamento ele pode se tornar pouco permevel, sendo at

    possvel utilizar tais misturas para a execuo de ncleo impermevel de uma barragem.

    A partir do contexto acima, pode-se concluir como aceitvel a mistura de

    enrocamento com outros materiais, desde que a resistncia e deformabilidade dos

    enrocamentos no sejam governadas pelas caractersticas dos outros materiais. Para

    exemplificar este fato, cita-se o preenchimento dos vazios dos fragmentos de rocha do

    enrocamento por partculas finas, as quais podem fazer o macio de enrocamento se

    comportar como um macio de terra, uma vez que estes finos passaro a comandar as

    condies de percolao e resistncia, bem como as relaes de tenso e deformao.

    Na opinio da autora desta dissertao, os ensaios laboratoriais realizados por

    Marsal (1976) foram teis para avaliar a mistura de enrocamento com materiais finos e

    deste modo, para ajudar na deciso da escolha dos materiais. No entanto, na engenharia

    de barragens atual, comum a presena de finos originados apenas da fragmentao dos

    blocos de rocha provenientes da descarga dos materiais na praa de trabalho e da

    compactao, uma vez que os enrocamentos so molhados na caamba dos caminhes

    antes de serem lanados, ocasionando a lavagem dos finos provenientes dos desmontes

    das escavaes obrigatrias e da explorao de pedreiras. O equipamento de

    compactao mais utilizado o rolo liso vibratrio.

    Ainda sobre a evoluo do conceito de enrocamento, Materon (1983; citado em

    Affonso, 2004) definiu que a granulometria de um enrocamento est ligada espessura

    12

  • da camada lanada. O dimetro mximo funo da espessura, variando de 75% at

    100% da altura total da camada.

    Albuquerque Junior (1993; citado em Affonso, 2004) relacionou o conceito de

    enrocamento permeabilidade da camada compactada, ressaltando que esta no deve

    ser inferior a 10-5 m/s, de forma a impedir o desenvolvimento de excesso de

    poropresses.

    De acordo com Neves (2002), a porcentagem de fragmentos com dimenso

    inferior a 0,074mm no deve exceder 10% e a dimenso mxima dificilmente ultrapassa

    1000mm. Frequentemente, a porcentagem de gros com dimenso superior a 50mm

    superior a 60%. Nesse caso, so os blocos de maior dimenso que controlam o

    comportamento do macio. A Figura 2.3 apresenta a faixa granulomtrica dos

    enrocamentos segundo Neves (2002).

    Figura 2.3 - Faixa granulomtrica dos enrocamentos (Neves, 2002).

    A Figura 2.4 mostra algumas curvas granulomtricas de enrocamentos de

    barragens construdas no Brasil. Ressalta-se que as curvas apresentadas se referem a

    enrocamentos utilizados no talude de montante das respectivas barragens.

    Como pode ser observado, as curvas granulomtricas dos enrocamentos de

    montante das barragens da Figura 2.4 se situam dentro da faixa proposta por Neves

    (2002).

    13

  • 0

    10

    20

    30

    40

    50

    60

    70

    80

    90

    100

    0,1 1 10 100 1000

    Por

    cent

    agem

    que

    pas

    sa

    Dimetro dos Gros

    Curvas Granulomtricas de Enrocamentos

    NOVA PONTE

    EMBORCAO

    MIRANDA

    IRAP

    AMADOR AGUIAR I

    CAMPOS NOVOS

    Figura 2.4 Curvas granulomtricas dos enrocamentos de montante de algumas

    barragens brasileiras.

    Segundo Watzko (2007), atualmente h granulometrias onde o dimetro mximo

    atinge at 1,5m e o percentual de material fino chega aos 35% ou 40% passante na

    peneira n 4, 4,8mm, ou at mesmo um percentual da ordem de 10% passante na

    peneira 200, 0,074mm. Um dos requisitos a que se d importncia a permeabilidade

    do material, que deve ser superior a k = 10-5 m/s.

    Para concluir, importante ressaltar que os conceitos de enrocamento evoluram

    de maneira satisfatria para garantir a funcionalidade das estruturas e que as qualidades

    desejveis destas devem ser sempre perseguidas durante o projeto e a construo.

    Dentre estas qualidades, destacam-se: baixa alterabilidade, que evita a

    desagregao e melhora a durabilidade; resistncia mecnica adequada s solicitaes

    de servio e, forma e distribuio granulomtrica adequadas para garantir a estabilidade

    estrutural.

    14

  • 2.2 TENSES DE CONTATO

    A previso do comportamento de estruturas de enrocamento implica na

    utilizao de equaes e modelos constitutivos, que para utilizaes de ordem prtica,

    necessitam de uma abordagem macromecnica como a da mecnica dos contnuos.

    Alm desta abordagem, vrios estudos consideram os enrocamentos como

    sistemas particulados, ou seja, que pertencem a um sistema de partculas, mas apenas no

    sentido de se fazer compreender o mecanismo atuante nestes sistemas, uma vez que

    muito complexo desenvolver modelos matemticos com base nas inmeras foras

    atuantes nos sistemas. Sendo assim, para considerar os sistemas particulados, torna-se

    necessrio aplicar o conceito de tenso em um ponto desenvolvida pela mecnica dos

    contnuos.

    Segundo Cruz et al. (2009), os fenmenos que ocorrem nos contatos entre os

    blocos so, em particular, determinantes no comportamento mecnico desses materiais.

    Tem-se que, muito embora nas anlises das estruturas de enrocamento seja quase

    exclusivamente usada a mecnica dos meios contnuos, s uma abordagem

    micromecnica pode ajudar a explicar o comportamento desse material. No entanto,

    dentro do contexto deste trabalho, ser abordada, mais intensivamente, a mecnica dos

    contnuos, uma vez que o modelo numrico adotado neste trabalho baseado na teoria

    dos contnuos.

    Outro fator a ser considerado so as interaes entre seus blocos e

    consequentemente as interaes entre seus pontos de contato, onde surgem as tenses de

    contato que so de fundamental importncia no estudo da mecnica dos enrocamentos.

    Nesse sentido, segundo Lambe e Whitman (1969), ao se aplicar uma carga

    vertical, como mostrado na Figura 2.5 a, as partculas de solo se aproximam e foras de

    contato se desenvolvem entre as partculas adjacentes. Pela ampliao da seo

    transversal, Figura 2.5 b, pode-se ver as partculas individualmente e assim, torna-se

    possvel prever a maneira como a fora aplicada transmitida e observar o

    desenvolvimento de foras de contato entre as partculas adjacentes.

    15

  • Por convenincia e com base nos conceitos clssicos da esttica, estas foras de

    contato foram decompostas em componentes normal N e tangencial T para as

    superfcies de contato.

    Figura 2.5 - Representao esquemtica da fora transmitida atravs do solo. (Lambe e

    Whitman, 1969).

    A atuao das foras nos contatos resulta na deformao das partculas do

    sistema, que conduzem a um aumento da rea de contato entre as partculas, como

    mostrado na Figura 2.6a.

    Figura 2.6 - Causas dos deslocamentos relativos entre partculas de solos. (adaptado de

    Lambe e Whitman, 1969).

    16

  • Este aumento na rea de contato induz em quebra de partculas que merece

    maior ateno no estudo dos enrocamentos que no caso dos solos pelo fato de estarem

    submetidos a elevadas tenses. As linhas cheias na Figura 2.6a mostram as superfcies

    das partculas depois do carregamento (assumiu-se que a partcula inferior no se

    move); linhas pontilhadas mostram as superfcies antes do carregamento.

    Em funo das deformaes decorrentes da aplicao da carga aparecer a fora

    cisalhante em um contato, que sendo maior que a resistncia ao cisalhamento, naquele

    contato, resultar em deslizamento entre as partculas (Figura 2.6b).

    No contexto de transmisso de foras, num sistema cuja matriz constituda de

    gros de areia, a carga aplicada transmitida de forma complexa sobre todos os pontos

    de contato. Assim, quanto maior o nmero de contatos, menor ser a fora por contato,

    ou seja, para uma mesma fora externa, quanto menor forem os gros de areia, menor

    ser a fora nos contatos. No caso dos enrocamentos, como o nmero de contatos

    reduzido devido dimenso dos blocos, para a mesma carga vertical aplicada na areia, a

    fora de contato nos enrocamentos ser muito maior conforme exemplificado na Tabela

    2.2.

    Tabela 2.2 Valores tpicos para foras de contato mdias em solos granulares

    (adaptado de Lambe e Whitman, 1969).

    Tipo de

    Partcula

    Dimetro

    (mm)

    Fora de contato mdia (N) por

    Tenso macroscpica (kPa)

    6,9kPa 68,9kPa 689,5kPa

    Cascalho 60 13,34N 133,45N 1.334,47N

    Areia 2.0 0,013N 0,133N 1,33N

    0.06 1,33x10-5N 1,33x10-4N 1,33x10-3N

    Silte 0.002 1,3x10-8N 1,33x10-7N 1,33x10-6N

    De acordo com Lambe e Whitman (1969), em funo da magnitude das foras

    internas (peso prprio) e externas (cargas induzidas), as partculas individuais

    deformam-se conforme as foras de contato. Assim, deformaes elsticas

    (recuperveis) e/ou plsticas (irrecuperveis) podem ocorrer nos pontos de contato.

    17

  • No mbito das deformaes plsticas, Terzaghi (1925; citado em Lemos, 2003)

    convencido de que a rea de contato era muito pequena, props que a tenso de contato

    seria a prpria tenso de plastificao do material, ou seja,

    ycAN = (2.1)

    onde N a fora normal no contato, Ac a rea do contato e y a tenso de plastificao no ponto de contato da partcula de solo.

    Terzaghi (1925; citado em Lemos, 2003) sugeriu ento que a matriz de

    partculas de solo teria uma resistncia ao cisalhamento de contato puramente coesiva,

    sendo a fora de atrito tangencial mxima no contato igual a

    yAF ca = (2.2)

    onde y a coeso no contato proporcionada pela plastificao.

    Das Equaes (2.1) e (2.2), tem-se

    yya

    yNyNF == (2.3)

    De acordo com a Equao 2.3, a fora de atrito, Fa, proporcional fora

    normal, N, como ser comentado no item 2.3.2.

    Da Fsica Clssica, sabe-se que a relao entre a fora de atrito, Fa, e a fora

    normal, N, igual ao coeficiente de atrito, , substituindo-se esta relao na Equao

    2.3, tem-se

    == tanyk

    (2.4)

    Para tratar da plastificao nos contatos, Ribeiro (2001; citado em Lemos, 2003),

    apresentou um estudo resumido para avaliao da possibilidade de plastificao nos

    18

  • contatos de solos arenosos naturais submetidos a nveis de tenses de engenharia. Esse

    estudo brevemente apresentado a seguir.

    De acordo com a teoria da elasticidade, o dimetro da rea de contato, dc, entre

    duas esferas elsticas dado pela Equao 2.5 (citado em Lambe e Whitman, 1969)

    3/1

    21

    212 )1.(12

    +=

    RRRRN

    Ed cc

    (2.5)

    onde , o coeficiente de Poisson; E, o mdulo de elasticidade; Nc a fora no contato; e R1 e R2, os raios das esferas 1 e 2, respectivamente.

    O volume de slidos, Vs, de um volume unitrio pode ser determinado pela

    Equao 2.6.

    eVs += 1

    1 (2.6)

    onde e o ndice de vazios.

    O nmero de partculas em um volume unitrio pode ser ento obtido por meio

    da razo entre este e o volume de uma partcula slida. De uma forma aproximada, para

    esse clculo, foram consideradas partculas esfricas de raio representativo R.

    343

    )1(1

    ReN p += (2.7)

    Como proposto por Lambe e Whitman (1969), o nmero de contatos pode ser

    determinado considerando que cada partcula faz dois contatos numa unidade de rea.

    Assim, esses autores sugerem que o nmero de contatos, nc, seja

    3/2)(2 pc Nn = (2.8)

    De posse do nmero de contatos determina-se a fora em cada contato

    19

  • cc n

    N = (2.9)

    onde a tenso externa. Substituindo Nc na Equao (2.5), torna-se possvel estimar a rea de contato

    4

    2c

    cdA =

    (2.10)

    A tenso de contato, pc, ser igual a

    c

    cc A

    Np = (2.11)

    Dentro deste estudo, Ribeiro (2001; citado em Lemos, 2003) realizou um breve

    clculo para avaliao da possibilidade de plastificao no contato, em um solo arenoso

    hipottico. Admitiram-se gros esfricos de quartzo; uniformes; dimetro 0,3mm;

    arranjo matricial tipo cbico com ndice de vazios igual a 0,92.

    Sendo a tenso de plastificao de contato do quartzo igual a 10.300MPa,

    segundo Lambe e Whitman (1969), o mdulo de elasticidade igual a 75.800MPa e o

    coeficiente de Poisson igual a 0,31 e simulando os nveis de tenso tpicos de

    engenharia que so normalmente adotados em ensaios de laboratrio, tem-se para as

    tenses mdias externas de 50, 100, 200 e 400kPa, os resultados apresentados na Tabela

    2.3.

    Tabela 2.3 Tenses de contato Quartzo liso D=0,3mm (Ribeiro; 2001,

    citado em Lemos, 2003).

    (kPa) nc Nc (kN) dc (m) Ac (m2) pc (kPa) 50 3,42E+07 1,46E-06 3,15E-06 7,81E-12 1,87E+05

    100 3,42E+07 2,92E-06 3,97E-06 1,24E-11 2,36E+05

    200 3,42E+07 5,85E-06 5,01E-06 1,97E-11 2,97E+05

    400 3,42E+07 1,17E-05 6,31E-06 3,13E-11 3,74E+05

    20

  • Com base nos resultados, no haveria possibilidade de plastificao nos

    contatos.

    Dentro do contexto deste trabalho, apresenta-se na Tabela 2.4 uma adaptao

    deste clculo para um enrocamento de gnaisse hipottico.

    Para o enrocamento hipottico, admitem-se gros esfricos de quartzo

    uniformes; com dimetro 300mm; num arranjo matricial tipo cbico e com ndice de

    vazios igual a 0,92. Para esta simulao, considera-se que a transmisso de foras se faz

    por meio do contato direto mineral a mineral. Entretanto, a transmisso se faz nos

    contatos e, portanto, em reas muito reduzidas em relao rea total envolvida.

    Tabela 2.4 Tenses de contato Enrocamento D=300mm.

    (kPa) nc Nc (kN) dc (m) Ac (m2) pc (kPa) 50 2,21E+01 2,26 3,65E-04 1,04E-07 2,16E+07

    100 2,21E+01 4,52 4,59E-04 1,66E-07 2,72E+07

    200 2,21E+01 9,03 5,79E-04 2,63E-07 3,43E+07

    400 2,21E+01 1,81E+01 7,29E-04 4,18E-07 4,33E+07

    Comparando-se as Tabelas 2.3 e 2.4 observa-se que para o enrocamento,

    considerando-se um dimetro mdio de 30cm, haveria plastificao nos contatos para

    todos os nveis de tenso comumente adotados nos ensaios convencionais. No entanto,

    em campo os valores de tenso podem atingir a ordem de 2.00kPa. Observa-se ainda

    que a tenso de contato aumentada em mais de 100 vezes. A plastificao nos contatos

    dos enrocamentos ocasiona quebra dos blocos/gros e assim, um novo arranjo estrutural

    obtido.

    Segundo Tran et al. (2005) as deformaes que ocorrem nos enrocamentos so

    essencialmente devidas ruptura local dos blocos. Considera-se que o fato acima possa,

    simplificadamente, explicar estas constataes.

    Ainda com o enfoque de avaliar a distribuio das foras de contato entre gros,

    desenvolveu-se no Instituto de Engenharia da Universidade Nacional do Mxico

    (UNAM), uma metodologia para determinar, aproximadamente, a distribuio

    estatstica das foras de contato em funo das tenses efetivas atuantes na massa

    granular. Nesta metodologia desconsideraram-se as deformaes elsticas e plsticas

    21

  • que podem ocorrer nos contatos e admitiram-se os gros como corpos rgidos e com

    resistncia ilimitada.

    Para avaliar as foras de contato entre os gros, o nmero de contatos por

    partculas precisa ser conhecido. Os estudos realizados no UNAM, apresentados em

    Marsal (1973), mostram que as foras de contato no so constantes e suas direes

    variam aleatoriamente, por que os gros no so esfricos e a distribuio de tamanho

    raramente uniforme.

    No entanto, a estimativa, mesmo que simplificada das foras que atuam nos

    pontos de contato entre gros ou blocos de rocha de fundamental importncia para

    avaliar satisfatoriamente o comportamento dos enrocamentos.

    Segundo a metodologia do UNAM, o carter estatstico das foras de contato em

    uma geometria estrutural irregular dos gros e a variao das reas de contato torna

    impossvel a previso do estado de tenses interno do gro.

    Marsal (1973) desenvolveu um modelo matemtico e estatstico para avaliar a

    distribuio das foras de contato, mesmo face s limitaes e aproximaes utilizadas.

    Realizou, assim, uma aproximao de clculo para diferentes materiais, considerando

    uma presso constante em uma determinada rea e obteve as seguintes relaes das

    foras de contato mdias:

    areiamdiapedregulhooenrocament xpxpp63 1010 == (2.12)

    Considerando-se uma tenso resultante de 98kPa, estimaram-se as seguintes

    foras de contato mdias:

    Areia mdia 1 grama-fora

    Cascalho 1 kilograma-fora

    Enrocamento (dmdio = 70 cm) 1 tonelada-fora

    Resultado similar est apresentado na Tabela 2.2.

    Dessa forma, verifica-se que baixas foras de contato podem causar quebra de

    blocos ou gros de enrocamento ao passo que para quebra de gros de areia necessrio

    que haja um nvel de tenses aplicadas muito mais alto.

    22

  • As foras de contato so usadas nas anlises de caractersticas de tenso-

    deformao e quebra de blocos/gros, sendo a ltima um importante fenmeno em

    enrocamentos sujeitos a campos elevados de tenses, como o caso de enrocamentos

    em barragens altas.

    2.3 RESISTNCIA E DEFORMABILIDADE DOS ENROCAMENTOS

    As caractersticas geomecnicas mais importantes dos enrocamentos para

    entender seu comportamento so a resistncia ao cisalhamento e a deformabilidade.

    Estes parmetros, caso no sejam adequados aos nveis de tenso aplicados, podem

    levar ao surgimento de fenmenos como recalques diferenciais e trincas, os quais

    podem comprometer a funcionalidade e segurana das estruturas.

    2.3.1 Deformabilidade

    A deformabilidade reconhecida como um dos parmetros mais importantes que

    governa o comportamento dos enrocamentos e est diretamente relacionada resistncia

    dos materiais. De maneira bem simples, quanto maior a resistncia de um material,

    menos deformvel ele deveria ser. No entanto, no caso dos solos e dos enrocamentos

    este conceito no deve ser aplicado, pois h muitos fatores intervenientes no

    comportamento de deformao desses materiais, como o arranjo das partculas e sua

    composio mineralgica.

    Segundo Lambe e Whitman (1969), fundamentalmente, h dois mecanismos nos

    solos granulares que contribuem para a deformao: quebra de gros e movimento

    relativo entre os gros como resultado do deslizamento ou rolamento. No entanto, estes

    dois mecanismos raramente so independentes entre si.

    A deformao pode ser expressa por deslocamento relativo, sendo uma

    propriedade que tem o material de alterar sua forma em resposta ao de cargas. A

    quantidade de deformao causada depender da composio do material, ndice de

    vazios, maneira como a tenso aplicada, dentre outros.

    23

  • Segundo estes autores, a srie de partculas mostradas na Figura 2.7, por

    exemplo, poderia ser estvel sob as foras aplicadas se as partculas fossem rgidas e se

    no deslizassem relativamente umas s outras. Como as partculas normalmente no so

    rgidas, a deformao causar pequeno movimento, levando ruptura da srie

    potencialmente instvel. Enquanto os movimentos relativos entre partculas causam as

    maiores deformaes geralmente encontradas nos solos, estes movimentos geralmente

    no seriam possveis se no houvesse distoro das partculas.

    Figura 2.7 Ruptura de uma srie instvel de partculas (Lambe e Whitman,

    1969).

    Segundo Penman (1982; citado em Basso, 2007), as deformaes em macios de

    enrocamento ocorrem essencialmente devido a dois mecanismos: quebra dos contatos

    entre os blocos e at mesmo a quebra do prprio bloco e rearranjo e reorientao dos

    blocos no interior do macio.

    Esta constatao reafirmada por Cruz et al. (2009), que diz: Nos

    enrocamentos, como esto normalmente sujeitos a elevados nveis de tenso, ocorre

    basicamente a quebra de blocos, ao passo que a dilatncia mais frequente para baixos

    nveis de tenso.

    Segundo Basso (2007) a reao do material s deformaes depende, sobretudo,

    do imbricamento que as partculas exercem sobre si e do estado de tenso. O

    imbricamento das partculas depende, por sua vez, da densidade do material. Segundo

    este autor, em ensaios de deformaes distorcionais verifica-se que, em amostras

    submetidas a baixas tenses de confinamento, acentuam-se as dilatncias positivas

    24

  • devido ao movimento relativo entre os blocos. Para elevadas tenses de confinamento,

    verifica-se uma considervel quebra dos blocos, uma vez que as deformaes

    volumtricas so normalmente de compresso.

    No contexto deste trabalho no se dar muita nfase quebra dos blocos, devido

    complexidade deste fenmeno, apesar das vrias constataes em bibliografia tcnica,

    de que a deformabilidade dos enrocamentos ocorre basicamente por este fenmeno.

    Neste trabalho sero apresentados os parmetros de deformabilidade dos enrocamentos

    para ilustrar seu comportamento e estes parmetros incorporam a possibilidade de

    quebra de blocos.

    A determinao dos parmetros de deformabilidade dos enrocamentos apresenta,

    inicialmente, algumas dificuldades em funo das grandes dimenses dos blocos e da

    impossibilidade de modelar em laboratrio, uma amostra com escala real. Desta forma,

    dados de deformabilidade muitas vezes so obtidos em campo e utilizados em

    retroanlises para determinar o comportamento da estrutura face s condies reais.

    Cabe salientar que os parmetros obtidos nos ensaios de laboratrio diferem

    consideravelmente daqueles obtidos a partir das deformaes medidas no campo em

    aterros construdos com os mesmos materiais utilizados no laboratrio. A concluso

    anterior confirmada pelas comparaes de Boughton (1970), Shermer (1973) e Marsal

    (1976), citados em Parra (1985).

    As diferenas de deformabilidade para um enrocamento compactado no campo e

    no laboratrio se devem principalmente limitao do dimetro mximo dos blocos de

    rocha para os ensaios triaxiais, de cisalhamento direto e edomtricos (compresso

    unidimensional).

    Segundo Parra (1985), no campo, as deformaes ocorrem principalmente por

    esmagamento dos pontos de contato dos blocos de rocha devido concentrao de

    tenses nestes pontos. No laboratrio, como o nmero de pontos de contato entre os

    blocos maior, a tenso concentrada nestes pontos no suficiente para esmag-los, e

    as deformaes so fundamentalmente devidas ao deslocamento de um bloco em

    relao ao outro.

    Mesmo em face dessas diferenas, atualmente, ensaios de laboratrio so

    realizados para permitir a modelagem das barragens e, durante a construo, os

    25

  • parmetros de deformabilidade so determinados no campo para calibrar os modelos

    tericos.

    Segundo Cruz et al. (2009), ao se utilizar ensaios de laboratrio, h que se

    simular as condies de campo com a escolha de uma granulometria e de uma

    densidade relativa. Este autor ressalta que para a granulometria, duas tcnicas tm sido

    utilizadas:

    - mtodo das curvas paralelas: utiliza-se uma curva paralela do enrocamento de

    campo, com uma diferena de D, que representa a diferena entre o dimetro mximo dos blocos de enrocamento em campo e o dmax dos gros da amostra,

    cujo valor depende do tamanho da amostra.

    - mtodo das curvas com eliminao: eliminam-se as fraes do enrocamento de

    campo superiores ao dmax dos gros da amostra e as substituem por gros

    correspondentes ao mesmo peso de material dessa frao.

    A Figura 2.8 ilustra curva granulomtrica paralela e com eliminao, usualmente

    utilizadas em ensaios de laboratrio com amostras de enrocamento.

    Curva paralela

    Curva com eliminao

    Figura 2.8 Mtodo de modelagem da curva granulomtrica de campo (Pinto;

    1982, citado em Basso, 2007).

    Segundo Fumagalli (1969), se a relao entre o dimetro da amostra da e o

    dimetro mximo dos gros (dmax da amostra) for menor que 5, existir uma elevada

    proporo de gros com grandes dimenses, e os valores de resistncia sero majorados

    devido influncia desses gros maiores. Entretanto, Holltz e Gibbs (1956; citados em

    26

  • Basso, 2007) concluram que, se o nmero de gros com dimenses mximas for

    inferior a 30% e a relao entre dimetro mximo do enrocamento e dimetro da

    amostra for maior que 6, o efeito da dimenso da amostra desprezvel.

    Segundo Basso (2007), esses procedimentos devem ser analisados

    cuidadosamente, pois cada caso tem sua caracterstica particular. Por exemplo, a

    utilizao de curvas paralelas pode fornecer uma quantidade elevada de finos, o que

    deve mudar radicalmente o comportamento da amostra. O segundo mtodo fornece uma

    amostra mais uniforme, que tambm tem influncia no comportamento do enrocamento.

    Apesar dos finos, o mtodo das curvas paralelas o mais utilizado.

    Para a escolha da densidade relativa a ser utilizada nos ensaios de laboratrio,

    segundo Santos et al. (2005), a falta de um ensaio padronizado para determinao das

    densidades mximas e mnimas deve ser suprida pelo estabelecimento de uma

    metodologia simples, sem citar qual, que permita a repetitividade dos resultados e seja

    compatvel com as tcnicas adotadas em campo.

    Ainda no mbito dos ensaios de laboratrio, o teste de compresso

    unidimensional tem sido o mais utilizado na determinao das caractersticas mecnicas

    dos enrocamentos.

    Charles (1976; citado em Pacheco, 2005) ressalta que, durante a fase de

    construo das barragens, as trajetrias de tenses dos materiais se aproximam mais das

    obtidas nos ensaios de compresso unidimensional do que as adquiridas nos ensaios de

    compresso triaxial convencionais.

    Segundo Pacheco (2005), o ensaio de compresso unidimensional simula a

    trajetria de tenses percorrida pelo enrocamento no eixo principal da barragem, onde

    um elemento do material encontra-se solicitado simetricamente (desde que a barragem

    seja construda de forma a manter a simetria de carregamento em relao ao eixo

    vertical da seo).

    Considerando os parmetros de deformabilidade de campo, usual determinar o

    mdulo de deformabilidade durante a construo da barragem e durante o perodo de

    enchimento do reservatrio.

    Estes mdulos so calculados medindo-se os recalques das camadas da barragem

    por meio de instrumentos e relacionando-os uma carga correspondente tenso

    normal devida ao peso prprio da coluna de enrocamento ou da carga do reservatrio.

    27

  • Segundo Basso (2007) importante salientar que o mdulo calculado pode ser

    incorreto, pois os valores das cargas atuantes em cada camada nem sempre equivalem

    ao peso da camada de enrocamento, sofrendo a influncia, por exemplo, da forma do

    vale e do efeito de arqueamento.

    Na Tabela 2.5, apresentam-se os mdulos de deformabilidade vertical medidos

    no campo para alguns tipos de enrocamentos. Os dados apresentados referem-se apenas

    a barragens brasileiras.

    Tabela 2.5 Mdulos de deformabilidade vertical de campo de enrocamentos

    (adaptado e complementado de Musman, 2002).

    Rocha Barragem Mdulo (MPa) Basalto vesicular Salto Osrio 33,5 a 50 Basalto So Simo 75 Basalto Foz do Areia 37 a 56 Basalto e brecha basltica Foz do Areia 26 a 30 Basalto Nova Ponte 40 a 80 Basalto (montante) Segredo 60 Basalto (jusante) Segredo 38 Basalto denso It 30 a 60 Basalto e brecha basltica It 20 a 25 Gnaisse Emborcao 22 a 50 Gnaisse Pedra do Cavalo 28 a 31 Gnaisse e basalto Miranda 41 Gnaisse e basalto (jusante) Miranda 60 Granito (montante) Xing 32 Granito (jusante) Xing 20 Granito Serra da Mesa 120 a 170 Quartzo-micaxisto Irap 60 a 80

    Cabe ressaltar que os valores destes mdulos so dependentes de fatores tais

    como: grau de compacidade, nvel de tenso, tipo de rocha, mineralogia e

    granulometria.

    Alm destes mdulos prticos, alguns parmetros de deformabilidade baseados

    na teoria da elasticidade podem ser usados. Dentre alguns citam-se o coeficiente de

    Poisson e o mdulo de deformao secante.

    28

  • Para sua utilizao importante lembrar, como mencionado em Lambe e

    Whitman (1969), que: Mdulo de deformao e coeficiente de Poisson no so

    constantes de um solo, e sim parmetros que descrevem aproximadamente o seu

    comportamento, para uma combinao particular de esforos. Para outra srie de

    esforos se aplicaro valores diferentes desses mdulos. Em se tratando de mdulo,

    deve-se definir cuidadosamente a qual sistema de carregamento se refere.

    Mdulos bastante utilizados so os mdulos tangente e secante. Define-se que o

    mdulo tangente a inclinao de uma reta tangente curva tenso-deformao em um

    ponto particular da curva. O valor do mdulo tangente variar com o ponto selecionado.

    O mdulo tangente no ponto inicial da curva o mdulo tangente inicial. De acordo

    com Lambe e Whitman (1969), o mdulo secante a inclinao da reta que conecta dois

    pontos separados da curva. O valor do mdulo secante variar com a locao de ambos

    os pontos. medida que os dois pontos ficam mais prximos, o mdulo secante se

    torna igual ao mdulo tangente.

    Em termos prticos, o mdulo secante tem sido obtido por meio de uma reta que

    passa pela origem e cruza a curva tenso-deformao no nvel de tenso requerido.

    As definies e correlaes entre os diversos tipos de mdulos da teoria da

    elasticidade mais frequentemente usados na Engenharia Geotcnica so apresentados na

    Figura 2.9.

    Figura 2.9 Mdulos de deformao Sistemas de carregamentos diversos

    (adaptado de Parra, 1985).

    29

  • O estabelecimento do comportamento tenso x deformao dos solos e materiais

    granulares bastante complexo devido a fatores como natureza do esqueleto granular

    dos materiais e dificuldade de obter amostras indeformadas que representem o ndice de

    vazios de campo. Entretanto, no caso dos materiais granulares, a melhor aproximao

    para se medir as deformaes por meio de ensaios de laboratrio, onde so aplicadas

    as tenses que ocorrero na prtica. Apesar das dificuldades na montagem das amostras

    e nas limitaes dos ensaios, os valores obtidos permitem uma aproximao satisfatria

    do comportamento da estrutura.

    A utilizao dos mdulos de campo auxilia na avaliao dos mdulos dos

    ensaios de laboratrio e permitem uma melhor calibrao dos parmetros previstos no

    projeto.

    Quando da anlise da deformabilidade de campo comparada com as

    deformabilidades determinadas por meio de ensaios de laboratrio, Mello (1977)

    comenta que: em todos os tipos de ensaios de laboratrio a disperso de resultados de

    corpo de prova a corpo de prova muito grande: assim, para fins prticos,

    reconhecendo-se a variabilidade do macio compactado escala das dimenses dos

    corpos de prova, no tem sentido realizar ensaios pretendendo detectar diferenas de

    deformabilidades em funo de condies de moldagem. Da mesma forma observa-se

    que a faixa de resultados essencialmente a mesma para todos os tipos de ensaios:

    portanto, para fins prticos, basta realizar ensaios edomtricos por serem os mais

    coerentes e prticos. Em ambas estas afirmaes cabe salientar que a disperso de

    resultados no preocupa perante um problema de deformabilidade, porquanto o

    comportamento do macio determinado pela estatstica das mdias: o que interessa

    realizar um mnimo de 10 a 12 ensaios, superp-los todos num grfico e determinar o

    comportamento mdio.

    Concluindo o tema deformabilidade, cabe ressaltar que o comportamento dos

    enrocamentos face s deformaes controlado por interaes entre gros individuais,

    especialmente pelo deslizamento. Como o deslizamento uma deformao no-linear e

    irreversvel, espera-se que o comportamento tenso x deformao dos solos e

    enrocamentos, como sendo meios particulados, seja fortemente no-linear e irreversvel.

    30

  • 2.3.2 Resistncia ao Cisalhamento

    A resistncia ao cisalhamento entre duas partculas a fora que dever ser

    aplicada para causar um movimento relativo entre essas partculas. Segundo Lambe e

    Whitman (1969), a origem da resistncia ao cisalhamento so as foras que atuam entre

    as superfcies das partculas. Sendo assim, a resistncia ao atrito entre duas partculas

    fundamentalmente da mesma natureza que a da resistncia ao cisalhamento de um bloco

    slido de ao, por exemplo.

    No entanto, o entendimento da magnitude da resistncia ao cisalhamento entre

    partculas envolve o entendimento dos fatores que influenciam a interao entre seus

    pontos de contato.

    Pode-se resumir o efeito dessa interao dizendo que a resistncia ao

    cisalhamento total (o produto da resistncia de cada contato e o nmero total de

    contatos) proporcional fora normal que une as duas partculas. Se esta fora normal

    diminui, a resistncia ou o nmero de contatos tambm diminui e ento a resistncia

    cisalhante total diminui. Portanto, diz-se que a resistncia ao cisalhamento

    interpartculas de natureza friccional.

    Esta natureza friccional traduzida em resistncia devida ao atrito, que participa

    do processo de mobilizao de resistncia da estrutura granular.

    Douglas (2002) acredita que a resistncia ao cisalhamento dos enrocamentos

    para uma dada tenso confinante pode ser vista como uma combinao de um ngulo de

    atrito bsico (resistncia entre superfcies de rocha), b, mais uma componente de dilatncia, menos uma parcela causada pela perda da aspereza do contato dos gros

    devido ao esmagamento/cisalhamento. Desta forma, o ngulo de atrito, atualmente

    denominado de ngulo de resistncia ao cisalhamento, ser dado pela Equao 2.13.

    quebrab += (2.13)

    O valor de b um parmetro fundamental para rochas intactas, e, segundo Barton e Kjaernsli (1981), tambm um parmetro chave na descrio da resistncia ao

    31

  • cisalhamento dos enrocamentos. Este parmetro considerado quando as juntas

    rochosas no esto saturadas.

    Segundo Barton e Kjaernsli (1981), os enrocamentos e as juntas rochosas tm

    vrias caractersticas comuns, incluindo comportamento dilatante sob baixas tenses

    normais efetivas e significante quebra de pontos de contato com dilatncia reduzida sob

    tenses elevadas.

    Segundo estes autores, cada ruptura nos pontos de contato resistida por ngulos

    de atrito fortemente dependentes do nvel de tenso. Como exemplo, cita-se que o

    ngulo de atrito de pico drenado () de um enrocamento prximo do centro e na base de uma barragem alta pode ser inferior a 35, enquanto que prximo ao p da barragem

    o mesmo enrocamento pode exibir um valor de maior que 60. Estes autores destacam que o ngulo de atrito dos enrocamentos pode ser

    estimado pelo conhecimento dos seguintes parmetros: resistncia compresso

    simples da rocha, o d50, o grau de esfericidade dos gros (entendido como coeficiente de

    forma) e a porosidade aps compactao. O grau de esfericidade dos gros e a

    porosidade determinam a magnitude da componente estrutural de resistncia.

    Conforme relatado anteriormente, se a resistncia ao cisalhamento dos

    enrocamentos funo do nvel de tenso, ento a envoltria de Mohr-Coulomb

    curva, podendo ser traduzida pela Equao 2.14 (Mello; 1977, citado em Neves, 2002).

    Esta equao mostra que a resistncia ao cisalhamento dos enrocamentos obedece a uma

    relao do tipo exponencial.

    = A ()b (2.14)

    Onde a resistncia ao cisalhamento, a tenso normal e A e b so parmetros caractersticos do material podendo ser obtidos por ajuste dos dados de

    ensaios. O parmetro A igual a tan para tenso normal unitria e b reflete as variaes de com .

    A Tabela 2.6, apresentada em Cruz et al. (2009), mostra alguns resultados de

    ensaios triaxiais realizados por vrios pesquisadores, inclusive os parmetros A e b.

    32

  • Tabela 2.6 Resultados de ensaios de resistncia em enrocamentos (adaptado de

    Cruz et al., 2009).

    Material Ensaio Dmx

    (mm)

    A

    (kPa)

    b 1 Ref.

    Basalto So Francisco TR 200 1,68 0,79 59 Marsal, 1971

    Diorito Barragem El

    Infiernillo

    TR 200 1,00 0,90 45 Marsal, 1973

    Granito-gnaisse-mica TR 200 85,32 0.90 41 Marsal, 1973

    Conglomerado silicificado

    Barragem El Infiernillo

    TR 200 1,53 0,79 57 Marsal, 1973

    Granito-gnaisse-xisto/

    Barragem Mica

    TR 200 78,45 0.94 38 Marsal, 1973

    Basaltos - - 151,02 0.82 57 Mello, 1977

    Basalto TR - 220,65 0.75 65 M. Neves, 2002

    Grauvaca TR - 208,88 0.75 64 Intertechne

    Arenito DR=85% 0,85 0,96 40 Marachi, 1969

    Basalto Barragem Marimbondo

    Pedreira TR - 213,78 0.79 64

    Maia, 2001 Barragem (aps 25 anos) TR - 171,62 0.85 62

    Alterado TR - 156,91 0.88 61

    Basalto Campos Novos DS 51 135,33 0.892 54 Basso e Cruz,

    2006

    Gnaisse-xisto-micaxisto Itapebi DS 25.0

    75.0

    81,4

    88,26

    1 1 - Fleury et al., 2004

    Enrocamento com 25% de

    material cimentado

    TR - 294,20 0.60 72 Peng Yii, 2006

    Barragem Oroville TR - 1,12 0,82 48 Marachi et al.,

    1969

    1 ngulo de atrito para = 98,0665kPa TR ensaio triaxial

    DS ensaio de cisalhamento direto

    A Figura 2.10 apresenta envoltrias de resistncia de enrocamentos ensaiados

    por Marsal (1973; citado em Cruz et al., 2009).

    33

  • 0500

    1000

    1500

    2000

    2500

    3000

    3500

    0 1000 2000 3000 4000 5000Res

    ist

    ncia

    ao

    cisa

    lham

    ento

    (kPa

    )

    Presso normal efetiva (kPa)

    Basalto SoFrancisco

    Diorito ElInfiernillo

    GnaissegranticoBarragemMicaX

    GnaissegranticoBarragemMicaY

    Gnaissegrantico+30%xisto BarragemMica

    Figura 2.10 Curvas de Mohr de alguns materiais granulares (adaptado de Cruz et al.,

    2009).

    A anlise desta figura mostra que as envoltrias so curvas, o que reflete uma

    reduo no valor do ngulo de resistncia ao cisalhamento, pois ocorre uma restrio

    dilatncia do sistema.

    Apesar do comentrio no item 2.31 sobre a dilatncia ocorrer mais

    frequentemente em baixos nveis de tenso, ressalta-se que vlido analisar a mudana

    de volume durante o cisalhamento, uma vez que este fenmeno importante para

    caracterizar a deformao plstica nos solos.

    Dentro desse contexto, Mitchell e Soga (2005) relatam que o ngulo de atrito de

    pico mobilizado (m) ou taxa de tenso cisalhante de pico consiste tanto do imbricamento quanto do deslizamento friccional entre gros.

    Rowe (1962; citado em Mitchell e Soga, 2005) reconheceu que o ngulo de

    atrito mobilizado (m) leva em conta tanto o rearranjo das partculas quanto a resistncia ao deslizamento nos contatos e a dilatncia. Este autor afirma que a quebra

    de gros, que aumenta em importncia medida que a presso confinante aumenta e o

    ndice de vazios diminui, tambm deve ser adicionada a estes componentes.

    As interrelaes gerais entre os fatores contribuintes para a resistncia e a

    porosidade so representadas na Figura 2.11.

    34

  • Figura 2.11 Contribuies para a resistncia ao cisalhamento de solos granulares

    (Rowe; 1962, adaptado de Mitchell e Soga, 2005).

    Na Figura 2.11, f o ngulo de resistncia ao cisalhamento corrigido pelo trabalho da dilatncia. Ele influenciado pelo arranjo dos gros e o deslizamento nos

    contatos. Quanto mais densa a amostra, mais importante a dilatncia. medida que o

    ndice de vazios aumenta, o m diminui. O estado crtico definido pela condio onde no h mudana de volume pelo cisalhamento. Ento o m correspondente o crit. Segundo o autor, o atrito verdadeiro mostrado na Figura 2.11 est associado

    resistncia ao deslizamento nos contatos.

    Para porosidades menores, a resistncia de pico alcanada antes que ocorra

    movimento significante entre os gros, o que indica que o trabalho de rearranjo

    pequeno. A ruptura requer expanso volumtrica contra a tenso confinante, resultando

    na grande contribuio de dilatncia mostrada. Se as tenses confinantes so muito

    altas, haver menos dilatncia, mas maior quebra para acomodar as deformaes

    cisalhantes. Para porosidades maiores, o rearranjo de gros se desenvolve antes da

    ruptura.

    Com base nos aspectos apresentados, pode-se c