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SUELEN SANTOS MAURICIO DIVERSIDADE CULTURAL & EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: O ENSINO DE GEOGRAFIA PELOS LIVROS DIDÁTICOS Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Educação, no Centro de Ciências Humanas e da Educação, na Universidade do Estado de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação. Orientadora: Profa. Dra. Rosa Elisabete Militz Wypyczynski Martins Florianópolis, SC 2018

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SUELEN SANTOS MAURICIO

DIVERSIDADE CULTURAL & EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: O ENSINO DE GEOGRAFIA PELOS LIVROS DIDÁTICOS

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Educação, no Centro de Ciências Humanas e da Educação, na Universidade do Estado de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação. Orientadora: Profa. Dra. Rosa Elisabete Militz Wypyczynski Martins

Florianópolis, SC 2018

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Ficha catalográfica

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AGRADECIMENTOS Registro aqui todo meu carinho e gratidão por aqueles que fizeram parte de

minha trajetória nestes últimos dois anos.

O nascimento de meu filho nos primeiros meses de mestrado foi desafiador e

de uma importância ímpar para meu fortalecimento enquanto pessoa e qualificação

enquanto acadêmica. Entretanto, sozinha nada eu conseguiria.

Agradeço a meus pais e marido pelos primeiros e mais difíceis momentos.

A minha querida sogra pelos últimos momentos de pesquisa, quando seu

apoio foi fundamental.

Agradeço a minha querida orientadora pela compreensão e força nos

momentos em que me ausentei para cumprir meu papel de mãe. Pela atenção

dedicada a mim, a meu trabalho e, até mesmo, às dificuldades.

Aos colegas de laboratório, LEPEGEO1, sempre prestativos, compartilhando

conhecimento, alegrias e angústias.

A Luiz Martins Junior que foi grande parceiro de escrita.

À Profa. Larissa Correa que sem esperar nada em troca me estendeu a mão

com carinho para qualificar meu trabalho, para diminuir minhas angústias e para

compartilhar das alegrias e sofrimentos da vida.

Aos amigos, professores, parceiros deste percurso: Maynine, Mayra, Sara,

Kathy, Luiz Jr., Angel, Lucas, Profa. Larissa Correa, Larissa Anjos, Robson, Roberto,

Prof. Lourival, Profa. Ana Preve.

Para encerrar, obrigada meu amado filho por me ensinar a ser mais dura e

mais flexível, mais forte e mais fraca, por me tornar mais humana.

1 Laboratório de Estudos e Pesquisas de Educação em Geografia

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RESUMO

A dissertação desenvolvida busca identificar se a Diversidade Cultural está sendo

abordada, e de que modo, nos livros didáticos de Geografia para a Educação de

Jovens e Adultos. Com este intuito, ancorei-me na abordagem dos Estudos

Culturais, uma perspectiva pós-estruturalista para a compreensão da categoria

Cultura e Diversidade Cultural. A partir da metodologia queer, ou seja, com a

promoção de estranhamento e desnaturalização dos conceitos, textos, imagens,

mapas e gráficos, é possível verificar se as categorias em questão são trabalhadas

pelos materiais pesquisados na mesma perspectiva deste trabalho e também de que

modo a Diversidade Cultural é abordada pelas diferentes linguagens presentes no

livro didático. Utilizei três coleções de diferentes editoras, cedidas pela Secretaria de

Educação do município de Florianópolis, que foram aprovadas e distribuídas pelo

Programa Nacional do Livro Didático – 2014. Entre as diversas considerações e

pensamentos que surgiram com esta pesquisa, posso destacar uma ideia presente e

unânime de Cultura e Diversidade Cultural enquanto características genéricas

estáticas, imóveis possuídas por grupos étnicos. Diferente desta concepção acredito

que cultura é uma instância instável que é construída e desconstruída

cotidianamente por todo sujeito. A Diversidade Cultural por sua vez, é um fenômeno

humano, ligado ao processo de construção e desconstrução cultural que todo sujeito

agencia em seu cotidiano. A possibilidade de ver-se e refletir-se na cultura enquanto

agente ativo no mundo não foi identificada nas coleções analisadas, entretanto pude

encontrar a valorização das diferenças de cor de pele, sexo e origem, além da

presença de textos e imagens majoritariamente de autores e artistas brasileiros e

brasileiras.

Palavras-chave: Diversidade Cultural. Educação de Jovens e Adultos. Ensino de

Geografia. Estudos Culturais. Livro didático

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ABSTRACT

The developed dissertation seeks to identify if Cultural Diversity is being approached,

and in what way, in the geography textbooks for the Education of Young and Adults.

With this in mind, I anchored myself in the approach to Cultural Studies, a post-

structuralist perspective for the understanding of the category Culture and Cultural

Diversity. It is possible to verify whether the categories in question are worked by the

researched materials in the same perspective of this work and also in the way that

the queer methodology, that is, by promoting the estrangement of the concepts,

texts, images, maps and Cultural Diversity is approached by the different languages

present in the textbook. I used three collections from different publishers, provided by

the Education Department of the city of Florianópolis, which were approved and

distributed by the National Program of Didactic Book - 2014. Among the various

considerations and thoughts that came up with this research, I can highlight a

present and unanimous idea of Culture and Cultural Diversity as generic static

characteristics, real estate owned by ethnic groups. Different from this conception I

believe that culture is an unstable instance that is constructed and deconstructed

daily by every subject. Cultural Diversity, in turn, is a human phenomenon, linked to

the process of construction and cultural deconstruction that every subject agency in

their daily lives. The possibility of seeing and reflecting on culture as an active agent

in the world was not identified in the analyzed collections. However, I was able to find

the appreciation of differences in skin color, gender and origin, as well as the

presence of texts and images mostly by authors and Brazilian and Brazilian artists.

Keywords: Cultural Diversity. Youth and Adult Education. Teaching Geography. Cultura Studies. Textbook.

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RESUMEN

La disertación desarrollada busca identificar si la Diversidad Cultural está

siendo abordada, y de qué modo, en los libros didácticos de geografía para la

Educación de Jóvenes y Adultos. Con este propósito, me ancló en el abordaje de los

Estudios Culturales, una perspectiva post-estructuralista para la comprensión de la

categoría Cultura y Diversidad Cultural. A partir de la metodología que, es decir, con

la promoción de extrañamiento y desnaturalización de los conceptos, textos,

imágenes, mapas y gráficos, es posible verificar si las categorías en cuestión son

trabajadas por los materiales investigados en la misma perspectiva de este trabajo y

también de qué modo la diversidad cultural es abordada por los diferentes lenguajes

presentes en el libro didáctico. En el caso de las mujeres, las mujeres, las mujeres,

las mujeres, las mujeres, las mujeres, las mujeres, las mujeres, de Cultura y

Diversidad Cultural como características genéricas estáticas, inmuebles poseídas

por grupos étnicos. A diferencia de esta concepción creo que la cultura es una

instancia inestable que es construida y deconstruida cotidianamente por todo sujeto.

La Diversidad Cultural a su vez, es un fenómeno humano, ligado al proceso de

construcción y desconstrucción cultural que todo sujeto agencia en su cotidiano. La

posibilidad de verse y reflejarse en la cultura como agente activo en el mundo no fue

identificada en las colecciones analizadas, sin embargo pude encontrar la

valorización de las diferencias de color de piel, sexo y origen, además de la

presencia de textos e imágenes mayoritariamente de autores y artistas brasileños y

brasileños.

Palabras clave: Diversidad Cultural. Educación de Jóvenes y Adultos. Enseñanza de Geografía. Estudios Culturales. Libro de texto.

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LISTA DE ABREVIATURAS

ABRELIVROS – Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares

EJA – Educação de Jovens e Adultos

CEAA – Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos

CEB – Câmara de Educação Básica

CEJA – Centro de Educação de Jovens e Adultos

CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

CNE – Conselho Nacional de Educação

FAED – Centro de Ciências Humanas e da Educação

FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

LD – Livro didático

LDB – Lei de Diretrizes e Bases

LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LEPEGEO – Laboratório de Estudos e Pesquisas de Educação em Geografia

MABEC – Movimento Afro-brasileiro de Educação e Cultura

MEB – Movimento de Educação de Base

MEC – Ministério da Educação

MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização

PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais

PNE – Plano Nacional de Educação

PNLD – Programa Nacional do Livro Didático

PNLD EJA – Programa Nacional do Livro Didático para Educação de Jovens e

Adultos

PPGE – Programa de Pós-Graduação em Educação

SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial

UDESC – Universidade do Estado de Santa Catarina

UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UHC – União dos Homens de Cor

UNE – União Nacional dos Estudantes

TCC – Trabalho de Conclusão de Curso

TEN – Teatro Experimental do Negro

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 – Coleções de livros didáticos trabalhadas na pesquisa empírica ........... 78

Figura 1 – Capa do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 6º Ano ..... 94

Figura 2 – Capa do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 7º Ano ..... 95

Figura 3 – Capa do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 8º Ano ..... 95

Figura 4 – Capa do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 9º Ano ..... 96

Figura 5 – Capa do livro didático de “EJA Moderna: Geografia” ............................... 96

Figura 6 – Capa do livro didático de Geografia “Alcance EJA”.................................. 97

Figura 7 – Sumário do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 6º Ano.

................................................................................................................................ 100

Figura 8 – Sumário do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 7º Ano

................................................................................................................................ 101

Figura 9 – Sumário do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 8º Ano

................................................................................................................................ 102

Figura 10 – Sumário do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 9º Ano

................................................................................................................................ 103

Figura 11 – Quadro de Candido Portinari, Futebol (1935) ...................................... 105

Figura 12 – Homens trabalhadores na construção de Brasília ................................ 107

Figura 13 – Homens trabalhadores se encaminhando para construção de Brasília107

Figura 14 – Letra da música “Mágoa de boiadeiro” ................................................. 109

Figura 15 – Fotografia do campo. ........................................................................... 109

Figura 16 – Fotografia da cidade ............................................................................. 110

Figura 17 – Canção “A cidade”, de Chico Science .................................................. 111

Figura 18 – Homem em seu relógio solar ............................................................... 112

Figura 19 – Mapa de Torres Garcia ........................................................................ 113

Figura 19 – Jovens observando um globo terrestre ................................................ 114

Figura 20 – Letra da canção “Racismo é burrice”, de Gabriel, o Pensador. ............ 116

Figura 21 – Mulheres trabalhadoras ........................................................................ 117

Figura 22 – Letra da canção “Inclassificáveis”, de Arnaldo Antunes. ...................... 118

Figura 23 – Mulheres trabalhando em malharia na década de 1910 ...................... 120

Figura 24 – Sobre o Nordeste brasileiro .................................................................. 122

Figura 25 – Mapa-múndi de imagens-clichês .......................................................... 123

Figura 26 – “La tejedora”, de Diego Rivera. ............................................................ 125

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Figura 27 – “La gran Tenochtitlán”, de Diego Rivera. ............................................. 125

Figura 28 – “Vendedora de flores”, de Diego Rivera .............................................. 126

Figura 29 – Homem peruano .................................................................................. 126

Figura 30 – Homens peruanos tecendo artesanalmente ........................................ 127

Figura 31 – Cerimônia ritual indígena ..................................................................... 128

Figura 32 – Médicos realizando sessão de cura ..................................................... 129

Figura 33 – Dançando frevo ................................................................................... 129

Figura 34 – Frida .................................................................................................... 130

Figura 35 – Letra da música “Disneylândia”, de Arnaldo Antunes .......................... 132

Figura 36: Trabalho escravo no engenho de cana ................................................. 132

Figura 37 – Barco de refugiados ............................................................................. 133

Figura 38 – Homens trabalhando em uma linha de montagem .............................. 133

Figura 39 – Trabalho infantil ................................................................................... 134

Figura 40 – Sumário “EJA Moderna” ...................................................................... 135

Figura 41 – Sumário do livro do 6º Ano .................................................................. 136

Figura 42 – Congada da Festa de São Benedito – Ilhabela (SP) ........................... 137

Figura 43 – Festival das estrelas – São Paulo (SP) ............................................... 138

Figura 44 – Memorial ucraniano – Curitiba (PR) ..................................................... 139

Figura 45 – Cidade ................................................................................................. 140

Figura 46 – Centro de São Paulo (SP) ................................................................... 140

Figura 47 – Cerimônia de troca da Bandeira Nacional ........................................... 141

Figura 48 – Exército brasileiro ................................................................................ 142

Figura 49 – Praça das Bandeiras ........................................................................... 143

Figuras 50 – Poluição, panfletagem, período eleitoral ............................................ 144

Figura 51 – Bandeiras em Copacabana ................................................................. 144

Figura 52 – Desigualdade social ............................................................................. 145

Figura 53 – Eleitora ................................................................................................ 146

Figura 55 – Eleitor indígena .................................................................................... 147

Figura 56 – Dilma Rousseff .................................................................................... 147

Figura 57 – Carlota Pereira de Queiroz .................................................................. 148

Figura 58 – Outras formas de participação social ................................................... 148

Figura 59 – Eleitores em plebiscito ......................................................................... 149

Figura 60 – Orçamento participativo ....................................................................... 149

Figura 62 – Sumário “Alcance EJA” ........................................................................ 152

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Figura 63 – Sumário “Alcance EJA” ........................................................................ 152

Figura 64 – Abertura da unidade 7: O povo brasileiro ............................................. 154

Figura 65 – Refletir e debater: carimbó ................................................................... 155

Figura 66 – Diversidade .......................................................................................... 156

Figura 67 – Brasil: densidade demográfica ............................................................. 157

Figura 68 – Crescimento da população brasileira ................................................... 158

Figura 69 – Antiga família brasileira ........................................................................ 159

Figura 70 – Família atual brasileira ......................................................................... 159

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SUMÁRIO

CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS ........................................................... 21

APROXIMAÇÕES AO TEMA DE PESQUISA................................................... 28

1. UM ESTUDO CULTURALISTA ........................................................................ 33

2. EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS – REFLEXÕES ................................ 47

2.1. UMA HISTÓRIA MARGINAL ............................................................................ 48

2.2. SUJEITO JOVEM, ADULTO E EXCLUSO ....................................................... 54

2.3. BASES LEGAIS ................................................................................................ 57

3. ENSINO DE GEOGRAFIA................................................................................ 61

3.1. A TRADIÇÃO DO ENSINO DE GEOGRAFIA ................................................... 61

3.2. ENSINO DE GEOGRAFIA/EDUCAÇÃO GEOGRÁFICA .................................. 65

4. PERCURSOS METODOLÓGICOS .................................................................. 71

5. LIVRO DIDÁTICO: INSTRUMENTO, RECURSO E ARTEFATO CULTURAL 81

5.1. PNLD, PNLD EJA ............................................................................................. 82

5.2. LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA E A EJA EM QUESTÃO .......................... 84

6. ANÁLISE DE LIVROS DIDÁTICOS ................................................................. 93

6.1. ANÁLISES DA COLEÇÃO “SABERES DA VIDA, SABERES DA ESCOLA” .... 98

6.2. ANÁLISE DA COLEÇÃO “EJA MODERNA” ................................................... 135

6.3. ANÁLISE DA COLEÇÃO ALCANCE EJA ....................................................... 151

6.4. NOTAS DE ENCERRAMENTO DAS ANÁLISES ........................................... 160

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................ 163

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 171

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CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

A pesquisa que apresento nesta dissertação trata sobre uma temática que

vem merecendo atenção de pesquisadores, ativistas, governos e professores de

Geografia. Refere-se ao entrelaçamento de campos e temas da Educação, que são

o ensino de Geografia, o Livro didático, a Educação de Jovens e Adultos e a

Diversidade Cultural em tempos e espaços contemporâneos, o que representa nas

mais diversas esferas questões complexas e profundas a serem pensadas. Esta

pesquisa está vinculada à linha de pesquisa “Políticas Educacionais, Ensino e

Formação” do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) do Centro de

Ciências Humanas (FAED) e da Educação da Universidade do Estado de Santa

Catarina (UDESC).

Baseado no que foi exposto, inicio este trabalho fazendo uma breve

apresentação de minha trajetória escolar e acadêmica para situar como e por que

cheguei à proposta desta pesquisa de mestrado.

A Geografia como componente curricular sempre me foi atrativa, não somente

pelas metodologias dos diferentes professores que tive nas escolas por onde

estudei, mas pela variedade de conteúdos, familiaridade com aqueles temas que se

relacionavam com meu cotidiano e por uma facilidade de aprendizado maior em

relação às demais disciplinas.

Uma escola em particular foi de grande importância nesta trajetória, pois nela

foi onde fiquei dos três anos de vida até a antiga quarta-série. Chamava-se

Ensinarte, uma pequena escola privada e muito familiar, por ser de um bairro

pequeno em que todos se conheciam. Os muros eram baixos, víamos todos e tudo

que estava do lado de fora. Quase não existia o fora e o dentro do espaço escolar. A

diretora da escola tinha muito gosto pelas expressões artísticas, então quase todos

os dias tocava violão e cantava embalada por nossas vozes e danças de criança.

Fazíamos muitas interpretações em peças de teatro. Muitas vezes por semana

fazíamos passeios pelo bairro para estudá-lo, que eram saídas de campo, mesmo

que não fossem assim denominadas.

Por falta de espaço amplo na escola, as aulas de educação física aconteciam

na Associação Recreativa Cultural Esportiva Avante, ou somente Avante, como

costumávamos chamar, que era o mesmo local onde meu pai jogava futebol e onde

também meu avô sempre ia assistir aos jogos que lá aconteciam, ou até mesmo

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para bater papo com os outros que lá estavam vagando. O Avante é um antigo clube

do bairro de Santo Antônio de Lisboa, em Florianópolis/SC, onde morei e fui criada,

que possui um campo de futebol de tamanho oficial, o que para mim era imenso, e

outro espaço um pouco menos extenso de areia e terra, em que costumávamos

brincar de pega-pega, queimada, e tantos outros jogos propostos pelo professor de

educação física.

Meu avô foi uma figura muito importante em minha vida e considero ser

necessário falar um pouco dele para chegar à Educação de Jovens e Adultos – EJA

que é um dos temas deste trabalho. Morávamos em casas diferentes, mas no

mesmo terreno. Por conta desta proximidade das casas, meu avô cuidava de mim

enquanto meus pais trabalhavam. Seu espírito, a meu ver, era andarilho. Vivia pelas

ruas do bairro que morávamos, flanando, conversando com os moradores,

trabalhadores, observando o movimento de pessoas, ou somente contemplando o

marasmo da praia num dia de inverno. Quando criança, meu avô me levava junto

em suas andanças pelo bairro e costumava desenhar para mim na areia, no chão

batido, com algum graveto que encontrara no chão, no intuito de explicar como era

algo que não podia somente descrever com palavras. Aliás, ele não sabia ler e

escrever, mas era tão sábio que isso parecia significar nada.

Ao passar pela frente da escola, como era de praxe em seu cotidiano de

andanças, algumas vezes meu avô era convidado pela diretora a entrar, para falar

aos estudantes como era o bairro antigamente, as mudanças que ocorreram com o

passar do tempo, como era a vida de nossos antepassados que ali moraram. Ele

adorava conversar, falar do passado. Cheio de coragem e desenvoltura entrava nas

salas de aula, local que nunca adentrara como aluno. Um homem analfabeto, sem

boa parte dos dentes, de origem humilde, pescador, era valorizado naquele

ambiente e naqueles momentos de construção de conhecimento.

Relato este momento de minha vida, pois, de forma ainda muito abstrata e

indireta, é o início de minha admiração pelos sujeitos da EJA. Mesmo que eu os

tenha conhecido somente anos mais tarde, já me dava conta da genialidade dos

indivíduos que carregam conhecimentos populares e grande experiência de vida.

Na Universidade do Estado de Santa Catarina cursei três semestres do curso

de Pedagogia nos anos de 2010 e 2011 e estando muito próxima ao curso de

Geografia, observando os laboratórios pelos corredores, conversando com amigos

graduandos na área, fui me encantando e tomei a decisão de cursar esta outra

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graduação. Iniciei a graduação em Geografia no ano de 2012 e concluí o curso no

ano de 2015.

Ao chegar à metade do curso de Licenciatura em Geografia, iniciava ali as

disciplinas de Estágio Supervisionado, aquelas voltadas ao período de docência nas

escolas. Tive o privilégio de poder optar entre ensino regular e Educação de Jovens

e Adultos. Não pensei duas vezes, realizei as quatro disciplinas de Estágio

Supervisionado (no período de dois anos) na modalidade EJA, mais especificamente

no Centro de Educação de Jovens e Adultos do Estado – CEJA, em

Florianópolis/SC.

Foram experiências desafiadoras, ricas e gratificantes. Deparei-me com

turmas extremamente diversas: diferentes idades, cores, sotaques, crenças,

religiões, ideologias, trabalhos, preferências etc. Eram turmas pequenas, de no

máximo quinze estudantes. De modo geral, eram alunos participativos, curiosos,

interessados no que eu tinha proposto para as aulas do período noturno e, muitas

vezes, cansados. Foi na docência da disciplina de Estágio Curricular Supervisionado

que me dei conta da diversidade de sujeitos, histórias e origens presente nas turmas

de EJA e da riqueza cultural e pedagógica que encontramos nesta modalidade.

Concomitante ao estágio de docência, porém em outro espaço realizei meu

Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, intitulado “Geografias Constituídas com o

Projeto de Educação Comunitária Integrar”. Parti de uma pesquisa que já estava em

andamento como bolsista de Iniciação Científica (IC)2, com a temática da educação

geográfica em espaços não escolares, no Projeto de Educação Comunitária

Integrar3. Eu desenvolvia atividades como bolsista IC e participava das aulas de

Geografia, tomando nota do que acontecia na dinâmica do dia-a-dia das aulas, dos

professores e dos estudantes, encontros, interações, tensões, afetos. Este projeto

era destinado a estudantes trabalhadores, que no contexto de trabalho, família,

baixa renda e tantas outras dificuldades e ocupações, pretendem ingressar em

universidades públicas. Levando isto em consideração, os professores do projeto

buscam realizar e propor diferentes processos de construção de conhecimento

voltados para um aprendizado que permita um bom desempenho nos vestibulares.

2 Fui bolsista de Iniciação Científica da Professora Rosa Martins no projeto “Educação geográfica e práticas pedagógicas em espaços formais e não formais de educação”, no ano de 2015. 3 Curso pré-vestibular social que atende estudantes de baixa renda e que acontece nas dependências do Instituto Estadual de Educação.

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Meu TCC teve como questão central investigar se os estudantes ao passar

pelo Projeto Integrar, demostravam alguma mudança no modo de ver e pensar o

mundo, de se ver, de ver a sociedade e o mercado de trabalho. Existia alguma

mudança de atitude destes estudantes com relação a vida e a sociedade? Se sim,

quais, como e por quê? Ao final, com observações e anotações, aplicação de

questionários e conversas informais com minha escuta comprometida com a

pesquisa percebi que sim, existe uma mudança reconhecida pelos próprios sujeitos,

no modo de ver a sociedade, existe uma maior conscientização, criticidade no modo

de ver o mundo e agir cotidianamente.

Depois de me graduar, no ano de 2016 atuei por poucos meses como

professora de Geografia de sétimos anos em uma escola pública em Florianópolis.

Posso dizer que minha experiência não foi tão prazerosa como fora na EJA, por

causa dos inúmeros problemas que nós, professores, precisamos enfrentar no

modelo escolar vigente. O maior de todos é a quantidade de estudantes dentro de

sala de aula, uma média de trinta e cinco, enquanto na EJA, o número reduz pela

metade.

Em razão da experiência como professora da educação básica, tive o contato

direto com os livros didáticos – LD, pois na EJA não tive acesso a nenhum livro

didático destinado a esta modalidade de ensino. Nesta ocasião foi quando precisei

refletir, profundamente, até que ponto este material que está disponível na escola

pode auxiliar no planejamento das aulas e pode ser utilizado pelos estudantes.

Quais os limites e potências do uso do livro didático em sala de aula? De onde

posso partir, por onde seguir e onde chegar?

Analisando este material e utilizando-o em minha prática pedagógica pude

perceber algo muito nítido: os estudantes não compreendiam os textos, exercícios e

por isso o livro didático servia mais para mim, como apoio em minha prática

pedagógica, do que para eles. Parto então da premissa de que há uma

incompatibilidade entre os conteúdos e temas dos LD de Geografia e a real

necessidade/ habilidade/ preparo/ maturidade intelectual dos estudantes para a qual

os livros são destinados.

Além disso, participei, de certo modo, do processo de escolha de livros

didáticos de Geografia que seriam adotados no próximo ano na escola em que

estava lecionando. Naquela ocasião, percebi que o único professor de Geografia

efetivo na escola trabalhava quarenta horas semanais e não possuía nenhum tempo

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concedido especificamente para analisar e escolher o LD. Fui convidada a conhecer

os exemplares e opinar sobre qual coleção, em minha compreensão, possuía maior

consistência para o ensino de Geografia. A intenção da escola em me incluir na

escolha era no sentido de tornar o processo mais democrático, acredito. Mas eu

estaria ali até, no máximo, final do ano, pois era professora substituta, contratada no

regime de apenas um ano letivo. Será que o próximo professor de Geografia, o que

viria depois de mim, teria a mesma opinião que eu no que se refere ao livro didático

escolhido para uso?

No ano de 2016 participei da seleção para a turma de Mestrado em Educação

da UDESC, que ocorreu concomitantemente ao período que me mantive como

professora naquela escola. Neste sentido é importante frisar que a elaboração do

projeto da presente pesquisa se inspira também no seio deste momento que me

encontro como professora de Geografia em uma escola pública. Neste ínterim, inicio

meu curso de mestrado no mês de agosto de 2016, pelo qual consegui bolsa de

fomento à pesquisa e por este motivo finalizo minha atuação profissional na referida

escola, podendo então me dedicar aos estudos.

Já como bolsista de mestrado e assim frequentando o LEPEGEO4 me

aproximo às discussões e debates imersos na perspectiva teórica dos Estudos

Culturais, tomando este como referencial teórico de meus próprios estudos, escritas,

leituras, reflexões. Reconheço então que não poderia partir de outra abordagem, se

não esta, pois a mesma compartilha da ideia e embasa os questionamentos que

desenvolvo ao longo desta dissertação.

É neste contexto teórico que me coloco a estudar os LD de Geografia

voltados à EJA, esta modalidade de ensino que me despertou interesse, em especial

pela diversidade de sujeitos que ali se encontram. Os estudantes da EJA são

pessoas acima dos quinze anos, portanto, possuem as mais variadas idades,

histórias de vida, gerações, origens, modos de pensar, orientação sexual, gênero,

religião etc. Isso significa dizer que este público é extremamente heterogêneo. Além

disso, este público é composto por pessoas que escolhem retornar aos bancos

escolares, carregam a característica de quem anseia obter a escolaridade básica,

sendo sua maior parte composta por mães e pais trabalhadores, muitos de idade

avançadas, ou até mesmo jovens que acabam de atingir a maioridade, encerrando o

4 Laboratório de Estudos e Pesquisas de Educação em Geografia.

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último turno diário na escola. O currículo desta modalidade deve levar isto em conta,

ou seja, o planejamento das aulas, dos conteúdos a serem desenvolvidos, bem

como, os livros didáticos que são produzidos e utilizados por estes sujeitos.

Pelo fato da Geografia ser um componente curricular do cotidiano e do lugar,

da EJA ser constituída por um público característico pela diversidade e do livro

didático ser um instrumento mediador entre professor, estudante, conhecimento e

método, busco compreender de que modo este material aborda a Diversidade

Cultural nos conteúdos e conceitos de Geografia dos livros didáticos destinados para

EJA. Mesmo ciente que muitas vezes este material não é utilizado em sala de aula,

ele é distribuído (através de uma política pública: PNLD) para as escolas e deve

servir ao menos como material de pesquisa e suporte de informação para o uso dos

estudantes. Independente do uso que é feito, o que pretendemos é verificar, analisar

e problematizar como é sua abordagem no que se refere à Diversidade Cultural.

Com isso, nosso problema de pesquisa é: a Diversidade Cultural está

presente explícita ou implicitamente nos conteúdos trazidos pelos livros didáticos de

Geografia destinados aos anos finais do Ensino Fundamental da EJA?

O objetivo geral desta pesquisa é investigar de que modo a Diversidade

Cultural é abordada e atravessa os conteúdos e temas de Geografia nos livros

didáticos de EJA dos anos finais do ensino fundamental.

Os objetivos específicos são: (1) analisar o conceito de Diversidade Cultural;

(2) apresentar a modalidade da EJA segundo políticas públicas atuais; (3)

problematizar a Diversidade Cultural na EJA e nos LDs; (4) verificar nos LDs de

Geografia para EJA como a questão da Diversidade Cultural está presente (ou não)

nos conteúdos/conceitos que compõem os anos finais do ensino fundamental.

Esta pesquisa tem como objeto de estudo o livro didático de Geografia

voltado para a EJA. A pesquisa não entrará no mérito de sua utilização pelos

professores, ainda que seja um elemento muito importante, pois o tempo destinado

à pesquisa não permite que possamos ir a campo investigar seu uso em sala de

aula.

Desta forma, a pesquisa propõe um estudo bibliográfico sobre o modo como a

Diversidade Cultural aparece (ou se não está presente) nos LDs de Geografia para a

EJA emaranhada pelos conteúdos e imagens que compõe este material.

Consideramos imprescindível que a Diversidade Cultural esteja presente, visto que a

EJA é composta e caracterizada por ela. Penso ser inaceitável um discurso que

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homogeneíza culturalmente os sujeitos, sobretudo no campo da educação. Penso

que na sociedade em que vivemos existem padrões culturais estabelecidos, e a

educação escolar tem a função primordial de questionar e repensar toda esta

estrutura e contexto em que vivemos.

Ao me desafiar em seguir com esta proposta de pesquisa tenho clara a

possibilidade de não encontrar esta categoria inserida nos temas e conceitos de

Geografia. Caso isto ocorra, é uma importante constatação que demanda reflexões.

Lanço-me a esta pesquisa com o pensamento de construir o seu caminho

através de meu próprio caminhar como pesquisadora em Educação. O modo de

fazer esta pesquisa será o de analisar bibliografias e documentos. A técnica para

isso é a leitura, interpretação e análise buscando a compreensão do fenômeno como

um todo, sem fragmentações e binarismos.

Para tanto, a organização desta dissertação está estruturada de forma a

trazer, inicialmente, o aporte teórico abarcado pela pesquisa, posteriormente aborda

a metodologia que orientou o estudo teórico e a análise dos LDs e por último

apresenta a análise dos livros didáticos a partir da pesquisa empírica.

Sendo assim, no primeiro capítulo abordo os Estudos Culturais como

perspectiva teórica assumida ao longo da pesquisa, um pouco de sua história e a

relação desta abordagem com este trabalho. Ainda nesta parte trago as categorias

teóricas para apresentação e problematização ancoradas principalmente em Stuart

Hall, que são Cultura e Diversidade Cultural. No segundo capítulo abarco uma

apresentação da modalidade da Educação de Jovens e Adultos a partir de suas

políticas em termos de legislação de âmbito nacional. Além disso, nesta parte do

trabalho discuto questões pertinentes a sua história, trajetória, constituição, até

alcançar as reflexões da composição da EJA atualmente com relação aos sujeitos

que a constituem. No terceiro capítulo reflito sobre o ensino de Geografia, o que

entendo sobre sua importância e seu papel escolar. Seguindo em frente, no quarto

capítulo entro na discussão metodológica do trabalho. Já no quinto capítulo

apresento as políticas de produção e aquisição do LD por parte do governo federal e

também discuto questões pertinentes a este material pedagógico, e seu uso em sala

de aula. Por último, trago a análise bibliográfica das três coleções de livros didáticos

pesquisadas e em seguida as considerações finais, pontuando aspectos importantes

de cada capítulo, os resultados mais relevantes da pesquisa empírica com minhas

contribuições enquanto pesquisadora e professora.

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APROXIMAÇÕES AO TEMA DE PESQUISA

Constatei através de revisão bibliográfica realizada para compor este trabalho

que não há investigações sobre os livros didáticos de Geografia destinados a EJA.

Esta questão coloca-se como uma justificativa que faz crescer a necessidade e

relevância de pesquisas que envolvam livros didáticos de Geografia e EJA.

Sabe-se através de diversas pesquisas já realizadas por autores, como

Santos (2007), Marques (2012) e Santos (2011), que o livro didático ainda é utilizado

pela maioria dos professores, se não como principal recurso, como um dos materiais

mais utilizados no preparo das aulas e como suporte em sala de aula. Santos (2007)

salienta que um dos resultados de sua pesquisa é o fato de que o livro didático é um

dos recursos mais presentes no trabalho em sala de aula. A mesma autora

constatou também através de entrevistas com professores que muitas vezes o livro

didático é a única fonte de conhecimento para os estudantes mais carentes.

Em sua dissertação, Marques (2012) afirma que de modo geral, no Brasil, os

livros didáticos são os únicos recursos que os professores de escolas públicas

possuem como suporte nas aulas. Isso demonstra a carência que a educação

pública no país enfrenta e que em meio a tantos aparatos tecnológicos disponíveis

no mercado (e em escolas particulares), o único suporte para professores em sala é

o livro didático.

Entretanto, não me proponho a estudar o livro didático por considerá-lo um

problema ou um entrave, pelo contrário, reconheço sua importância e seu

protagonismo na realidade escolar brasileira, além de acreditar na grande influência

que este artefato cultural carrega na constituição e formação dos sujeitos que o

consomem (estudantes, familiares dos estudantes, professores etc.).

Além destas autoras, Santos (2011) confirma a importância do livro didático

no contexto da educação brasileira:

Compreendemos que o livro didático é um dos elementos centrais do trabalho docente, como também, algumas vezes é o único meio de acesso ao conhecimento e mediação entre ensino e aprendizagem, por parte dos educandos e dos docentes, que neles buscam apoio e consolidação do conhecimento transmitido em suas aulas. (SANTOS, 2011, p. 44)

Consto dessa forma a relevância e necessidade de que existam pesquisas

comprometidas com este recurso tão presente nas salas de aula, e fora delas

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também, como acesso ao conhecimento e não somente como suporte para a prática

pedagógica.

Trago uma citação que explicita ainda mais a importância do livro didático já

que é um elemento do currículo que acaba possuindo inúmeras funções:

Diante da excessiva carga horária de trabalho que o impede de estudar, planejar as aulas e buscar outras fontes de informação e conhecimento, diante das limitadas condições objetivas materiais/ financeiras que o poder público destina às escolas; diante da ausência de políticas públicas de formação continuada, muitos professores utilizam o livro didático em substituição à metodologia de ensino, como o único recurso/ instrumento pedagógico, como a única fonte de consulta e ou fundamentação teórica, e muitas vezes, como o único instrumento de formação continuada. (FREITAS, SANTOS e MOURA, 2007, p. 18 APUD SANTOS, 2011, p. 45).

Considero que o conhecimento na área da educação produzido na academia

deve ter sua contribuição direcionada à sociedade, sobretudo a produção científica

realizada em universidades públicas, como é o caso desta pesquisa, afinal os

financiadores são a sociedade. Esta pesquisa busca contribuir na área de

conhecimentos e pesquisas relacionadas aos livros didáticos de Geografia para EJA

e no que diz respeito aos estudos sobre Diversidade Cultural.

As reflexões que trago sobre Diversidade Cultural, sujeitos da EJA e livro

didático podem também servir de estímulo e reflexão para que professores e

pesquisadores envolvidos com a educação pensem de forma mais profícua suas

práticas e seus estudos.

De acordo com a Associação Brasileira de Editores de Livros Escolares –

ABRELIVROS5, os valores investidos pelo Ministério da Educação – MEC na

aquisição de livros didáticos destinados as escolas públicas brasileiras através do

Programa Nacional do Livro Didático – PNLD para os anos de 2015 e 2016 com as

editoras que produziram os livros do PNLD modalidade EJA, totalizaram um valor de

R$ 87.623.734,97. Já no site do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação –

FNDE6, os dados estatísticos sobre o PNLD 2017, ano de consolidação e escrita

desta dissertação, mostram que foram investidos R$ 70.591.754,55 em livros

didáticos para a modalidade EJA.

5 < http://www.abrelivros.org.br/home/images/pnld_eja_2015-2016_dados-estatisticos_valores-negociados-por-editora.pdf > Acessado em 01 de agosto de 2017. 6 http://www.fnde.gov.br/programas/livro-didatico/livro-didatico-dados-estatisticos Acessado em 01 de agosto de 2017.

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Visto que este montante está relacionado apenas à EJA e considerando que

há outros valores significantes em vigência para o ensino regular (1º ao 9º ano do

Ensino Fundamental e os três anos do Ensino Médio), faz-se necessário que todo

este material traga consigo corretas e interessantes referências científicas, teórico-

metodológicas, conceituais, sociais e éticas, levando em conta as especificidades

dos sujeitos que utilizarão, bem como o viés educativo que se pretende promover.

Caso contrário, o montante investido estará sendo mal utilizado.

A opção por investigar como os livros didáticos trabalham com o tema da

Diversidade Cultural implícito ou explicito na gama de conteúdos do componente

curricular Geografia dá-se em primeiro lugar devido à premissa da diversidade

presente nas turmas de EJA. Em segundo lugar por reconhecer que a Diversidade

Cultural é característica da sociedade como um todo, mas que apesar de ser

intrínseca a ela, o Estado e diversas instâncias que possuem algum grau de

influência sobre os sujeitos (comerciais midiáticos, novelas, livros, igrejas etc.)

procuram negligenciá-la ou ainda negar este fenômeno próprio do humano.

Busco analisar nos livros didáticos de Geografia como e se a Diversidade

Cultural é abordada nestes materiais. A forma como os conteúdos são trazidos,

aqueles em que a ideia de Diversidade Cultural está ou poderia estar presente, dão

conta de uma educação libertadora para estes sujeitos? Afinal, consideramos que a

educação acontece dentro e fora de sala de aula, na relação entre os sujeitos, na

relação destes com dispositivos eletrônicos, mídias, livros e na relação entre sujeito

e livros didáticos.

Tonini (2002) a partir da abordagem dos Estudos Culturais, considera que o

discurso presente nos livros didáticos se configura a partir de uma perspectiva (e

não da realidade e/ou verdade) e salienta que

Apenas nas últimas décadas publicam-se alguns, de maneira embrionária, estudos que procuram focalizar o livro didático, não só como transmissor de conhecimentos, mas também como instância produtora de significados culturais. (TONINI, 2002, p. 25).

A colocação de Tonini (2002) traz a perspectiva de que o livro didático é mais

que um mero transmissor de informações, pois é também produto e produtor de

significados culturais.

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Se afirmo que algumas grandes redes de televisão são capazes de constituir

modos de pensar, agir, condutas e valores sociais, também posso afirmar que os

livros didáticos, materiais produzidos em larga escala, distribuídos por todo território

nacional e que habitam as mesas escolares, também colocam-se como potenciais

influenciadores e criadores de significados culturais.

Busco analisar dentro disso se ao tratar temas em que a cultura de alguma

forma esteja sendo trabalhada, de forma implícita ou explícita, existe algum traço de

discriminação, preconceito, hierarquização etc.

De acordo com a unidade referente ao tema transversal Pluralidade Cultural7,

dos PCN:

A temática da Pluralidade Cultural diz respeito ao conhecimento e à valorização de características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais que convivem no território nacional, às desigualdades socioeconômicas e à crítica às relações sociais discriminatórias e excludentes que permeiam a sociedade brasileira, oferecendo ao aluno a possibilidade de conhecer o Brasil como um país complexo, multifacetado e algumas vezes paradoxal. (BRASIL, 1998, p. 121).

Estou de acordo, mas busco ir além quando penso que a temática se refere à

valorização e ao conhecimento de características étnicas e culturais do povo

brasileiro. Quero propor, portanto, a Diversidade Cultural como categoria que

reconhece em todo sujeito a diversidade, pois todos somos diferentes. Compreendo

que a temática da Diversidade Cultural deve partir da valorização e conhecimento

desta diversidade humana, antes de cultural, e a partir desta reconhecer as

desigualdades socioeconômicas, construídas historicamente e culturalmente, as

práticas discriminatórias e excludentes enquanto produto de um modelo de

sociedade que deve ser repensado.

7 Neste trabalho ao trazer a Pluralidade Cultural, enquanto tema transversal, constituinte dos Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) tomo à semelhança da categoria Diversidade Cultural que penso nesta dissertação.

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1. UM ESTUDO CULTURALISTA

Este capítulo diz respeito à perspectiva teórica do presente trabalho, o campo

dos Estudos Culturais, que oferece suporte a toda reflexão a respeito das categorias

que vou analisar, ou seja, cultura e Diversidade Cultural. Mais que isso, fornece

subsídios para compreender o livro didático como um artefato cultural e para poder

analisá-lo em cada meandro de seus conceitos geográficos.

Nesta parte da dissertação vamos contextualizar teoricamente a abordagem

tomada como âncora para as análises da pesquisa empírica, os Estudos Culturais, o

conceito de Diversidade Cultural adotado para esta pesquisa, bem como o conceito

de cultura, que sustenta todo o viés epistemológico e empírico deste trabalho.

Os Estudos Culturais – EC surgem no século passado como um campo de

estudos e de pesquisas ligado a uma forma de pensar a cultura diferente da que

vinha sendo abordada até aquele momento. Altera-se a perspectiva predominante e

unânime, até então, histórica e cultural de compreensão da cultura, ou seja, a partir

das elites, da alta classe, nos níveis mais elevados da hierarquia inglesa;

compreensão de que a cultura é um bem de privilégio de grupos enriquecidos. Este

campo de estudos reconhece a cultura como pertencente a todos.

Institucionalmente os EC ganham reconhecimento na década de 1960 na

Inglaterra. Existem três textos que surgem no final dos anos 1950 e que são

identificados como as fontes dos EC; são textos dos autores: Hoggart, Williams e

Thompson (ESCOSTEGUY, 1998). A autora ressalta que seu surgimento está ligado

a dois pontos de vista, político e teórico.

Do ponto de vista político, é sinônimo de “correção política”, podendo ser identificado como a política cultural dos vários movimentos sociais da época de seu surgimento. Da perspectiva teórica, resultam da insatisfação com os limites de algumas disciplinas, propondo, então, a interdisciplinaridade (ESCOSTEGUY, 1998, p. 88).

Ou seja, é possível reconhecer a emergência dos Estudos Culturais num

período socialmente crítico, tendo então um forte viés político ligado aos movimentos

sociais que buscavam visibilidade. Ao mesmo tempo, não se pode negligenciar ou

menosprezar a proeminência da origem acadêmica e intelectual deste campo de

estudos, que busca maior interdisciplinaridade e superação da perspectiva

epistemológica dominante até então.

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Dalmonte (2001) diz que os EC surgem ancorados ao marxismo8. Seus

fundadores, Richard Hoggart (1918), Raymond Williams (1921-1988), Edward. P.

Thompson (1924-1993) e Stuart Hall (1932), buscam o entendimento “das relações

entre pessoas e classes, levando em consideração os diversos grupos, todos,

inclusive a classe operária, desprovida de ‘tudo’, eram geradores de cultura.”

(DALMONTE, 2001, p. 1)

Apesar de institucionalmente a origem histórica dos EC ter ocorrido na

década de 1960, Dalmonte (2001) aponta que em meados do século anterior, com a

Revolução Industrial (na Grã-Bretanha) e o consequente despontamento da

modernidade, iniciam mudanças sutis e gradativas na concepção e democratização

de arte9 (e cultura) que se encaminham e fazem parte do processo de

desenvolvimento dos Estudos Culturais. Segundo este autor, este processo não

deve ser glamorizado, afinal, está ligado à forma de dominação burguesa pela

mercantilização. Os meios de comunicação em massa e outras produções industriais

vêm popularizar a arte, e acrescento aqui a informação, e desse modo a cultura vai

gradativamente tornando-se mercantilizada.

Apesar de parecer contraditório, a Revolução Industrial, a modernidade (ou

Art Nouveau10) ao mesmo tempo em que desencadeia um crescimento das

desigualdades sociais, de sérios problemas sociais, a cultura torna-se mercadoria

para todos.

É neste sentido que podemos afirmar que os EC, talvez como a maioria das

teorias científicas, têm sua origem em um processo histórico que torna possível e

pertinente seu desenvolvimento por intelectuais, pesquisadores, pensadores etc.

Este processo histórico muitas vezes constitui-se de movimentos e conflitos entre

8 “Para o marxismo ortodoxo as ideias dominantes em uma sociedade são as ideias da classe dominante. A sociedade, segundo esse paradigma, divide-se entre a produção (economia) e a dominação (ideologia) [...] É a economia que determina a ação cultural, e essa por sua vez, age sobre a base, adaptando-a ideologicamente ao sistema. Para Olga Maria Ribeiro Guedes (1999, p. 2) ‘A metáfora da base/superestrutura emergiu como um problema central na teoria Marxista. Esta noção é tomada para significar que a base (econômico) tem prioridade explicativa ou estabelece limites sobre a superestrutura (instituições culturais e políticas)’. O que aconteceria na superestrutura (cultura) seria uma resposta reflexiva a uma determinação (econômica). É justamente este ponto que não é aceito pelos founding fathers dos estudos culturais britânicos. Nesse contexto se gesta uma nova forma de se conceber os estudos de cultura, tendo a dinâmica cultural por meio da comunicação como objeto central” (DALMONTE, 2001, p. 1-2) 9 “A arte passa a ter uma função utilitária, o que desencadeia uma ação dupla, uma exercendo força sobre a outra. Num primeiro plano há o conceito de arte para todos, o que promove uma reconceituação, associando o utilitário ao artístico” (DALMONTE, 2001, p. 3) 10 Termo francês usado para denominar o Modernismo. (DALMONTE, 2001)

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nações, classes sociais, grupos religiosos etc. em que nem sempre o êxito ou o

fracasso condiz com a abordagem de tais teorias, correntes filosóficas e campos do

saber. Os Estudos Culturais, por exemplo, nascem ligados em certa medida ao

marxismo, que é totalmente crítico ao modo de produção capitalista, que por sua vez

tem seu desenvolvimento proporcionado pelas Revoluções Industriais.

Escosteguy (1998) diz que é a partir dos três autores pioneiros nos EC que se

altera a ideia de cultura que é fundamental para a compreensão deste novo campo

de pesquisa. “Para Williams e Thompson, cultura era uma rede vivida de práticas e

relações que constituíam a vida cotidiana dentro da qual o papel do indivíduo estava

em primeiro plano” (ESCOSTEGUY, 1998, p. 89). Ou seja, altera-se a concepção de

cultura global, ou de cultura com foco na alta classe inglesa, para a ideia de que

todos os sujeitos, de todas as esferas sociais e econômicas, possuem cultura, sem

níveis de hierarquia entre elas. Mais que isto, cultura passa a ser objeto complexo

de estudos, afinal, não é mais algo estático, imóvel, mas dinâmico, que carrega sua

historicidade, mas que cotidianamente é reconstruído, reinventado e ressignificado.

Ao mesmo tempo em que é uma rede, que só pode ser compreendido a partir de

grupos, comunidades, populações, é também pertencente a todo sujeito e dele

depende para ser esta categoria.

A partir do trabalho de Schutz (2012) apreendo que nos EC não se

compreende “a cultura”, mas “as culturas”, justamente pelo fato delas comporem

modos de vida, de serem construídas, modificadas, instáveis e ligadas ao tempo

histórico em que se vive. De acordo com Nicodem (2015), são os autores Williams e

Thompson que formulam a tese de que a palavra cultura traz em si “questões

propostas pelas mudanças históricas, que as modificações na indústria, na

democracia e nas classes sociais representam, de maneira própria, e às quais a arte

responde também, de forma semelhante” (NICODEM, 2015, p. 25).

Escosteguy (1998) afirma que a proposta original dos EC é considerada por

alguns como mais política que analítica. Embora se sustentasse em um marco

teórico específico amparado pelo marxismo, a história deste campo está entrelaçada

com os movimentos sociais da época. Apesar de seu surgimento e fortalecimento

institucional e político estar ligado aos movimentos sociais daquele momento

específico, local, socioeconômico, político, este campo de estudos ganhou

repercussão em diferentes outros contextos por não se limitar em estabelecer

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fronteiras teóricas, políticas e sociais à concepção de cultura, de identidade, de

diferença, que foram categorias adotadas por teóricos adeptos dos EC pelo mundo.

Os EC adentraram no Brasil, no campo da Educação, na última década do

século passado. Um dos marcos disto foi verificado nas discussões sobre currículo,

inicialmente no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal

do Rio Grande do Sul – UFRGS:

Um dos acontecimentos decisivos para o estabelecimento de algumas das vinculações que hoje temos entre EC e Educação teve lugar no final de 1996, quando, na reestruturação do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS, foram introduzidas linhas de pesquisa, em substituição às anteriores áreas de concentração, entre as quais a linha ‘Estudos Culturais em Educação’. (WORTMANN, COSTA, SILVEIRA, 2015, p.33)

Escosteguy (1998) afirma que a partir da década de 1970 os EC transformam-

se numa força motriz de viés cultural intelectual de esquerda. O movimento

intelectual representou um impulso teórico e político para além da universidade, pois

na Inglaterra constituiu-se em questões de resistência política, compromisso com

mudanças sociais. É por este viés que busco partir para produzir novas discussões

tanto no âmbito teórico quanto político no que se refere, nesta pesquisa, à

Diversidade Cultural na EJA e nos livros didáticos.

Stuart Hall (1997, p. 1) aborda conceitualmente a cultura, levando em conta “a

enorme expansão de tudo que está associado a ela, na segunda metade do século

XX, e o seu papel constitutivo, hoje, em todos os aspectos da vida social”. A

linguagem, a literatura, a arte, a filosofia, os sistemas de crenças morais e religiosas

por algum tempo constituíram aquilo que se considerava ser a cultura, mas

contemporaneamente, nos EC, amplia-se e remodela-se esta ideia.

A ação social, diferente da ação por instinto, genética, biológica, é carregada

de significados. A ação social é, então, significativa para os mais diversos sujeitos

de acordo com os sistemas de significado “que os seres humanos utilizam para

definir o que significam as coisas e para codificar, organizar e regular sua conduta

uns em relação aos outros” (HALL, 1997, p. 1). Estes sistemas de significados

atribuem sentido a nossas ações e nos permitem interpretar, julgar, compreender ou

não, as ações do outro. Segundo Hall (1997) são estes sistemas que constituem

nossas “culturas”. Ele assim a denomina, no plural, justamente porque não existe

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uma unidade cultural, mas a diversidade de culturas é o que caracteriza a sociedade

em sua pluralidade de ações sociais.

Neste contexto, é fundamental estabelecer um paralelo da cultura em sua

esfera substantiva, material, no tempo de fluidez informacional, de transações e

conexões globais instantâneas em decorrência das tecnologias. Segundo Hall

(1997), a segunda metade do século XX (e o que viria acontecer no novo milênio)

atribui uma importância ímpar à cultura: “Os meios de produção, circulação e troca

cultural, em particular, têm se expandido, através das tecnologias e da revolução da

informação” (HALL, 1997, p. 2). De acordo com este autor, em outros momentos

históricos, não há revolução que se equipare com os produtos culturais e mudanças

estabelecidas como nos últimos tempos, afinal, “a importância das revoluções

culturais do final deste século XX reside em sua escala e escopo globais, em sua

amplitude de impacto, em seu caráter democrático e popular” (HALL, 1997, p. 2).

A mídia representa, portanto, uma questão complexa em que ao mesmo

tempo em que torna a circulação e troca cultural mais democrática, não foge de ser

elemento constituinte (e de grande poder) de uma estrutura capitalista globalizada:

[...] a mídia é, ao mesmo tempo, uma parte crítica na infra-estrutura material das sociedades modernas, e, também, um dos principais meios de circulação das idéias e imagens vigentes nestas sociedades. Hoje, a mídia sustenta os circuitos globais de trocas econômicas dos quais depende todo o movimento mundial de informação, conhecimento, capital, investimento, produção de bens, comércio de matéria prima e marketing de produtos e ideias. (HALL, 1997, p. 02)

O objetivo desta reflexão não é valorizar ou desvalorizar, reconhecer um

papel positivo ou negativo da mídia no contexto cultural brasileiro ou mundial.

Pretendo apenas reconhecer e destacar sua influência e seu impacto na dinâmica

da sociedade em termos práticos de cultura vivida, cotidiana e substantiva. Além de

sua grande influência no campo acadêmico, na produção e desenvolvimento de

conhecimentos, sobretudo nos processos de construção e desconstrução de teorias

sociais, culturais e econômicas.

A mídia carrega em si o potencial ímpar de estabelecer conexões em curtos

espaços de tempo, entre diferentes grupos, diferentes culturas. Permite que sujeitos

das mais variadas regiões do mundo tenham acesso a informações, conhecimentos,

que outrora não se imaginava.

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A mídia encurta a velocidade com que as imagens viajam, as distâncias para reunir bens, a taxa de realização de lucros (reduzindo o “tempo de turn-over do capital”), e até mesmo os intervalos entre os tempos de abertura das diferentes Bolsas de Valores ao redor do mundo — espaços de minutos em que milhões de dólares podem ser ganhos ou perdidos. Estes são os novos “sistemas nervosos” que enredam numa teia sociedades com histórias distintas, diferentes modos de vida, em estágios diversos de desenvolvimento e situadas em diferentes fusos horários. É, especialmente, aqui, que as revoluções da cultura a nível global causam impacto sobre os modos de viver, sobre o sentido que as pessoas dão à vida, sobre suas aspirações para o futuro — sobre a “cultura” num sentido mais local. (HALL, 1997, p. 2)

A partir daqui podemos estabelecer a relação entre as culturas, o contexto

contemporâneo e a influência e mútua retroalimentação do local – global. A mídia

vem, entre diversos resultados e objetivos, democratizar o acesso ao conhecimento,

a possibilidade de contato com outras culturas, a popularização da informação etc.

As culturas são influenciadas cotidianamente pelo contexto tecnológico vigente e a

ação social concomitante aos sistemas de significado estão em dinâmica e

transformação na velocidade em que o tempo corre. As culturas são parte do

combustível midiático, que por sua vez é parte indissociável das grandes transações

de capital global.

De acordo com Hall (1997), há uma teia que enreda culturas: uma

sociedade tão plural, diversa e heterogênea está em uma rede em que nada foge de

conexões. Por isso, e por tudo que já foi exposto, posso afirmar que a cultura é uma

instância dinâmica, sem fronteiras, delimitações, construída e desconstruída a todo

tempo.

Por bem ou por mal, a cultura é agora um dos elementos mais dinâmicos — e mais imprevisíveis — da mudança histórica no novo milênio. Não deve nos surpreender, então, que as lutas pelo poder sejam, crescentemente, simbólicas e discursivas, ao invés de tomar, simplesmente, uma forma física e compulsiva. (1997, p. 04).

Existe uma crítica cultural no berço dos EC que questiona o estabelecimento

de hierarquias entre formas e práticas culturais, ou seja, critica a tendência histórica

de se hierarquizar as culturas (ESCOSTEGUY, 2006), fazendo a oposição entre

cultura alta e baixa, superior e inferior, em uma relação que Boff (2017) denomina

como dualismo11.

11 “As dualidades (...) são dimensões da mesma e única realidade complexa. Formam uma dualidade, mas não um dualismo. Errôneo seria confundir dualidade com dualismo. [...] O dualismo vê os pares

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Morin (2011) diz que faz parte da racionalidade12 compreender que todas as

sociedades possuem sua racionalidade. A isso refiro a elaboração das ferramentas,

estratégias de caça, desenvolvimento de técnicas (e tecnologia), conhecimento

sobre plantas, animais, solo, e que parte da racionalidade é composta pela esfera

irracional, ou seja, além da razão, voltada as subjetividades, afetividades, mitos,

magia, religião. Este autor atribui inclusive à razão, a ideia do mito, ou seja,

acreditamos, sujeitos de todas as culturas, no mito da razão, que não passa de uma

ideia equivocada, de que a razão é composta somente pelas faculdades mentais de

racionalizar sobre fatos reais.

Tal crítica, se pensada pelo viés dos EC propostos por Hall, por exemplo,

desconstrói a lógica que gerou tanto estes dualismos quanto sua hierarquização.

Afinal, a cultura não é um artefato estático para ser classificado em relação de

oposição. Do mesmo modo, tal qual Boff (2017) acredita, a cultura compõe um

complexo sistema onde tudo se inter-relaciona. Não existe nada isolado, não existe

objeto independente de outro objeto. O todo não é igual à soma dos objetos. Ou

seja, para compreender a cultura e seu conceito é necessário abandonar a ideia de

que ela é composta por elementos como literatura e arte somente, enquanto

dimensões culturais isoladas e autônomas, mas é necessário entender que todos os

elementos que constituem a cultura não podem ser isolados e nem aqui citados um

a um, pois limitaria equivocadamente as possibilidades infinitas de ser das culturas.

Segundo Nicodem (2015), a cultura é originária das relações sociais, da

língua falada, da escrita e das tecnologias, como também dos mecanismos de

comunicação. Esta autora apresenta a crítica de Williams (um dos fundadores dos

EC) à ideia predominante nos anos 50 do século XX de que há uma cultura superior

e outra inferior; uma erudita e outra popular; uma culta e outra de massa.

Considerava ele que tal perspectiva originava-se da tradição do Romantismo,

período histórico que prevaleceu na Europa entre os séculos XVII e XIX. Williams

(1992) defendia que a “cultura não se restringe a questões de ordem econômica e

política, como também não se constitui em prerrogativa de uma ou de outra classe

social que se coloca economicamente privilegiada”. (NICODEM, 2015, p. 25).

como realidades justapostas, sem relação entre si. Separa aquilo que, no concreto, vem sempre junto. Assim pensa o esquerdo ou o direito, o interior ou o exterior, o masculino ou o feminino. A dualidade, ao contrário, coloca e onde o dualismo coloca ou.” (BOFF, 2017, p. 47) 12 Para compreender este conceito na abordagem de Morin (2011) cf. o capítulo 5 desta dissertação – Ensino de Geografia.

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Adiante, buscarei verificar as contribuições à ideia de Cultura a partir de Paulo

Freire, autor e pensador brasileiro com visibilidade internacional no campo da

Educação. Propus trazer esta breve reflexão que darei início, levando em

consideração a realidade brasileira e contemporânea, para assim aproximar a

Cultura dos EC britânicos ao nosso cotidiano, ao nosso chão, valorizando a

produção de conhecimento que acontece entre nós.

Paulo Freire (1963) apresenta aquilo que chama de cultura:

A cultura como acrescentamento que o homem faz ao mundo que ele não fez. A cultura como resultado de seu trabalho. De seu esforço criador e recriador. [...] Descobriria que tanto é cultura um boneco de barro feito pelos artistas, seus irmãos do povo, como também é a obra de um grande escultor, de um grande pintor ou músico. Que cultura é a poesia dos poetas letrados do seu país, como também a poesia do seu cancioneiro popular. Que cultura são as formas de comportar-se. Que cultura é toda criação humana” (p. 17)

Não é difícil estabelecer uma comparação com a ideia de Cultura que traz

Stuart Hall (1997) no contexto britânico da segunda metade do século passado.

Freire apresenta uma noção de cultura muito desenvolvida para seu tempo, visto

que este fragmento foi escrito em 1963, um ano antes do golpe militar que

representou ao país, pode-se dizer, um grande atraso cultural.

A ideia de cultura trazida por Freire (1963) é vista, neste trabalho, em

entrelaçamento epistemológico com os EC, ainda que em nenhum momento o autor

estabeleça alguma relação com esta abordagem. Veja-se as semelhanças: em

primeiro lugar, a cultura é considerada por ambos como criação humana, como ação

social, distinta, portanto de ações meramente instintivas ou biológicas, portanto

diferencia-se da vida animal, em que não há uma articulação social, com hábitos,

costumes, tradições, moral, ética tal qual na sociedade humana.

Em segundo lugar, ambos atribuem à cultura uma dimensão popular e

democrática que até então se desconhecia ou se desvalorizava. Ambos reconhecem

em todas as classes sociais o mesmo pertencimento a determinada cultura e a

mesma produção dinâmica e complexa desta.

Ressalto assim o pensamento de ambos como em convergência com a

mudança da concepção de cultura enquanto atributo, artefato, objeto, para a de

ação. Concomitante e consequência desta nova perspectiva é a não estabilidade

nem concretude da própria concepção de cultura. Se ela está alicerçada ao

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movimento, à ação, jamais se poderá atribuir a ela um ponto final, uma estagnação.

Segundo Escosteguy (2006, sp.), “ao enfatizar a noção de cultura como prática se

dá relevo ao sentido de ação, de agência na cultura”.

É neste ínterim que valorizo esta perspectiva cultural, no sentido de

reconhecer a agência na cultura da qual todo sujeito protagoniza. Não há cultura que

rompa com as infinitas possibilidades de ser no mundo. Não há cultura herdada

historicamente que não seja possível de ser desconstruída e reconstruída e se

necessário desconstruída e construída novamente.

Nicodem (2015) disserta sobre a concepção de cultura em Paulo Freire

relacionando-o à perspectiva dos Estudos Culturais, demonstrando a mesma ideia

de agenciamento da cultura presente em todo ser humano:

Freire (2001) aborda que ‘a possibilidade humana de existir – forma acrescida de ser – mais do que viver, faz do homem um ser eminentemente relacional. Estando nele, pode também sair dele. Projetar-se. Discernir. Conhecer. É um ser aberto. Distingue o ontem do hoje.’ Esta afirmação, que foca o homem em seu aspecto relacional, conduz ao raciocínio eminente de que este mesmo homem é um criador, um produtor de cultura. (NICODEM, 2015, p. 26)

Freire (1983) atualiza sua concepção de Cultura em sua obra “Educação

como prática de liberdade”, mantendo a definição que já havia apresentado uma

década antes, mas com acrescentamentos importantes:

A cultura como o acrescentamento que o homem faz ao mundo que não fez. A cultura como o resultado de seu trabalho. Do seu esforço criador e recriador. O sentido transcendental de suas relações. A dimensão humanista da cultura. A cultura como aquisição sistemática da experiência humana. Como uma incorporação, por isso crítica e criadora, e não como uma justaposição de informes ou prescrições doadas. A democratização da cultura- dimensão da democratização fundamental. O aprendizado da escrita e da leitura como uma chave com que o analfabeto iniciaria a sua introdução no mundo da comunicação escrita. O homem, afinal, no mundo e com o mundo. O seu papel de sujeito e não de mero e permanente objeto. (FREIRE, 1983, p. 109)

Noto dessa maneira que, para Paulo Freire, a cultura da qual o sujeito faz

parte ativamente independe de seu nível de escolaridade, de sua alfabetização, mas

compõe a dimensão da experiência e da existência humana. Vai além, partindo

desta concepção e desta abordagem cultural, ele destaca a importância da

escolarização, da alfabetização, da democratização da educação emancipatória.

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Dessa forma, inicio a discussão a respeito da categoria predominante para

nossa pesquisa, a Diversidade Cultural. Foi fundamental apresentar a Cultura, pois

reconhecemos que a Diversidade Cultural deriva de sua concepção. Assim, a

categoria que vou discutir representa nada mais que a pluralidade de culturas.

Pretendo repensar a ideia de que diversidade é tudo aquilo que foge do padrão

estabelecido pelos meios de comunicação e pelas imposições socioeconômicas.

Considero que Diversidade Cultural é a própria concepção de Cultura, ou seja, na

realidade concreta, substantiva: culturas.

As culturas constituem e compõem a Diversidade Cultural. Não há uma

Cultura que seja o símbolo ou o arquétipo da Diversidade Cultural, isto significaria

confrontá-la a algum nível de hierarquização cultural.

Segundo Felipe e França (2014) a diversidade biológica é um produto da

natureza, o mesmo não se pode dizer sobre a Diversidade Cultural, pois ela não é

um ponto de origem, mas um processo forjado pelas relações de poder, que faz

parte da sociedade, que por sua vez estabelece o outro diferente do “eu” e o “eu”

diferente do outro como uma forma de exclusão e marginalização.

Em certa medida não concordo com esta concepção, visto que a Diversidade

Cultural é pensada por mim como um fenômeno social independente das relações

de poder que se estabelecem. De fato, estas relações acontecem, com intensidade,

mas são fruto, em sua maior parte, do sistema de produção e não característica do

fenômeno social em si. Diversidade Cultural são as culturas, é um fenômeno

humano, constitui a sociedade, independente de como esta se organiza.

Trarei o tema transversal da pluralidade cultural dos Parâmetros Curriculares

Nacionais para fazer um paralelo com a Diversidade Cultural, alvo deste trabalho.

Fica estabelecido que para minha pesquisa, adoto estes conceitos como similares.

Por este motivo, trabalho com o tema trazido pelos PCN (BRASIL, 1998).

A Pluralidade Cultural é um tema trazido pelos Parâmetros Curriculares

Nacionais (BRASIL, 1998), que orienta sobre a importância do trabalho transversal

em sala de aula e no currículo. Segundo Candau (2012, p. 2):

A cultura escolar dominante em nossas instituições educativas, construída fundamentalmente a partir da matriz político-social e epistemológica da modernidade, prioriza o comum, o uniforme, o homogêneo, considerados como elementos constitutivos do universal.

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Ou seja, ignora-se ou se trata como problema o diverso, o diferente do que se

considera normal. Aquilo que foge ao que é definido como normal é desvalorizado,

menosprezado, em função da valorização do comum. Ainda que muitas vezes a

maioria não se enquadre naquilo que se valoriza. Ainda que a maioria sejam grupos

menos favorecidos socialmente.

Neste sentido, a Pluralidade Cultural é uma categoria que merece atenção

não somente na escola, pelos professores e gestores, mas em termos de políticas

públicas e educacionais, para que o currículo esteja compatível com uma sociedade

plural e diversa, que clama pelo reconhecimento à alteridade, a valorização das

diferenças e o respeito a todos.

Apesar de estarmos em uma sociedade grafocêntrica, eurocêntrica, capitalista

e que reproduz o machismo, consideramos que não existe superioridade entre

culturas. Independentemente do desenvolvimento tecnológico, situação econômica,

política ou financeira, cada cultura está em uma relação horizontal com as outras

(ainda que seja dominada, como é o caso de tribos indígenas historicamente

exploradas por grupos que consideram estar em uma hierarquia superior).

Peroza (2012) afirma que ao considerar a cultura como toda atividade

humana não se pode compreender a segmentação social a partir da perspectiva de

que há cultura inferior e cultura superior: “Se cultura é toda e qualquer atividade

produtiva humana, não há por que estabelecer graus de superioridade e

inferioridade cultural entre as pessoas a fim de legitimar a segmentação social.”

(PEROZA, 2012, p. 5)

É importante salientar que uma cultura não é definida pelas fronteiras de um

continente, país, de um estado ou mesmo de uma cidade. Ela é variável em

extensão territorial e número de integrantes.

Pluralidade cultural é o reconhecimento e valorização das diversas culturas

existentes, ou da diversidade dos sujeitos. Por se tratar, neste trabalho, do Brasil,

Pluralidade Cultural significa reconhecer as diferentes culturas presentes neste país,

levando em conta a história de diferentes grupos que contribuíram para constituição

do Brasil, em que a dominação e a exploração se fez tão presente desde que se

iniciou a colonização portuguesa.

Pode parecer contraditório, afinal, pluralidade cultural diz respeito à

diversidade de sujeitos ou de grupos? Considero que tanto a alteridade dos sujeitos

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quanto a cultura de um grupo social (comunidades indígenas, por exemplo)

constituem a pluralidade cultural.

Reconhecer que no século XXI o Brasil ainda é um país desigual, classista,

hierárquico, discriminatório, preconceituoso, que hierarquiza culturas, significa que é

preciso a emancipação em termos de postura, conduta, pensamento, conhecimento

e atitudes. Nesse sentido, a Pluralidade Cultural é uma categoria fundamental nos

currículos, nas práticas pedagógicas e nos livros didáticos.

Felipe e França (2014) dizem que apesar do discurso da Diversidade Cultural

estar registrado nos documentos oficiais e dela compor as culturas dos estudantes

de uma sala de aula, os conteúdos programáticos dos LD e dos currículos escolares

apresentam ainda o homem branco e heterossexual como padrão. Segue então

ressaltando a importância de adotar uma perspectiva do currículo (e do livro didático

para esta dissertação) enquanto artefato cultural, para que assim as certezas que

foram construídas socialmente sejam fragilizadas, desvanecidas, repensadas.

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental -

Anos Finais (BRASIL, 1998, p. 121):

A temática da Pluralidade Cultural diz respeito ao conhecimento e à valorização de características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais que convivem no território nacional, às desigualdades socioeconômicas e à crítica às relações sociais discriminatórias e excludentes que permeiam a sociedade brasileira, oferecendo ao aluno a possibilidade de conhecer o Brasil como um país complexo, multifacetado e algumas vezes paradoxal.

Ainda de acordo com os PCN, encontramos na página 140 a questão “Ensinar

a pluralidade ou viver a pluralidade?”, trazendo a seguinte resposta:

Sem dúvida, pluralidade vive-se, ensina-se e aprende-se. É trabalho de construção, no qual o envolvimento de todos se dá pelo respeito e pela própria constatação de que, sem o outro, nada de sabe sobre ele, a não ser o que a própria imaginação fornece. (BRASIL, 1998, p. 140).

Acrescento ainda que é a partir do que a imaginação fornece sobre o outro

que muitas vezes são criados os pré-conceitos e a partir daí podem surgir diferentes

tipos de práticas discriminatórias.

Inserido neste tema transversal dos PCN encontra-se os objetivos gerais para

o Ensino Fundamental:

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O tema da Pluralidade Cultural busca contribuir para a construção da cidadania na sociedade pluriétnica e pluricultural. Tendo esse objetivo maior em vista, propõe o desenvolvimento das seguintes capacidades: • conhecer a diversidade do patrimônio etnocultural brasileiro, cultivando atitude de respeito para com pessoas e grupos que a compõem, reconhecendo a diversidade cultural como um direito dos povos e dos indivíduos e elemento de fortalecimento da democracia; • compreender a memória como construção conjunta, elaborada como tarefa de cada um e de todos, que contribui para a percepção do campo de possibilidades individuais, coletivas, comunitárias e nacionais; • valorizar as diversas culturas presentes na constituição do Brasil como nação, reconhecendo sua contribuição no processo de constituição da identidade brasileira; • reconhecer as qualidades da própria cultura, valorando-as criticamente, enriquecendo a vivência de cidadania; • desenvolver uma atitude de empatia e solidariedade para com aqueles que sofrem discriminação; • repudiar toda discriminação baseada em diferenças de raça/ etnia, classe social, crença religiosa, sexo e outras características individuais ou sociais; • exigir respeito para si e para o outro, denunciando qualquer atitude de discriminação que sofra, ou qualquer violação dos direitos de criança e cidadão; • valorizar o convívio pacífico e criativo dos diferentes componentes da diversidade cultural; • compreender a desigualdade social como um problema de todos e como uma realidade passível de mudanças; • analisar com discernimento as atitudes e situações fomentadoras de todo tipo de discriminação e injustiça social. (BRASIL, 1998, p. 143)

Estes objetivos ainda não lograram êxito. Afinal, nossa sociedade continua

tendo traços fortes de todo tipo de desigualdade e milhares de casos diários

relacionados à discriminação, ao ódio, à não aceitação do outro como este se

identifica ou se constitui no espaço geográfico. Acredito que a formulação e a

concretização de políticas relacionadas à formação inicial, continuada e permanente,

bem como uma maior democratização da formação continuada, cursos de

especialização, melhores condições de trabalho aos professores, são apenas um

ponto de partida para uma aproximação destes objetivos citados acima.

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2. EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS – REFLEXÕES

A Educação de Jovens e Adultos – EJA é uma modalidade de ensino da

Educação Básica que possui diretrizes e normativas próprias devido a suas

particularidades e especificidades, que lhe conferem importantes e profundos

diferenciais em relação às demais modalidades (Educação Infantil, Ensino

Fundamental, Ensino Médio e Educação Especial). Dentre tais especificidades está

o perfil dos alunos, que em sua maioria são trabalhadores, oriundos das periferias e

do campo (ALTHOF; MARTINS FILHO, 2016), com diferentes trajetórias e que

carregam consigo experiências de vida que lhes diferenciam das crianças que

compõem o alunado da Educação Infantil e Ensino Fundamental. Além disso, tais

sujeitos vivenciaram a exclusão da escola na “idade própria”13.

Outro diferencial da EJA é a diversidade dos sujeitos, afinal, não existe

relação entre faixa etária e seriação (ano escolar). A exigência para inscrição na EJA

é a idade mínima de quinze anos para ingresso no ensino fundamental e de dezoito

anos para ensino médio (BRASIL, 2000). Este perfil, confere às turmas desta

modalidade a pluralidade de fases de vida. Com isso, as práticas docentes

referentes a esta modalidade devem estar inteiramente voltadas a um público jovem

e adulto, plural e trabalhador, diferentes das demais práticas pedagógicas que são

desenvolvidas com turmas em que a faixa etária da educação escolar regular é

mantida (dos sete aos catorze anos).

De acordo com Arroyo (2006), a história da própria EJA está ligada a uma

trajetória de luta, de busca pela escolarização que leve à emancipação e não à

regulação, que é a educação que acontece nas modalidades regulares.

Neste capítulo proponho refletir sobre a EJA, sua história e quem faz parte

dela, o que a torna diferente e peculiar para além do que trazem as políticas

educacionais. Para isso, tomamos como base os documentos oficiais como as

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos, resolução

CNE/CEB n.º 1/200, a Proposta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos de

2002, a Proposta Curricular de Santa Catarina de 1998 e também autores como

13 De acordo com a Resolução CNE/CEB Nº 4, DE 13 DE JULHO DE 2010 que Define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica no capítulo II: a EJA é uma modalidade da Educação Básica e segundo o Artigo 28. “A Educação de Jovens e Adultos (EJA) destina-se aos que se situam na faixa etária superior à considerada própria, no nível de conclusão do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.” (BRASIL, 2010, p. 9).

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Oliveira (2011), Santos (2011), Vigano (2016), Laffin (2016), Arroyo (2006), Althof e

Martins Filho (2016) e Haddad e Di Pierro (2000).

A EJA por ter seu público de jovens e adultos acima de quinze anos no ensino

fundamental e acima de dezoito anos no médio, sem qualquer vinculação entre

idade e ano escolar, é marcada pela Diversidade Cultural enquanto grupo dentro de

sala de aula. Neste sentido Vigano e Laffin (2016, p. 2) salientam que:

No que diz respeito à Educação de Jovens e Adultos, ressalta-se que a EJA é um espaço, muitas vezes, marcado por estigmas e preconceitos. Há, até mesmo no senso comum, quem compreenda a EJA como uma educação de “segunda chance”, desvalorizada. Isso porque os alunos e alunas dessa modalidade de ensino não puderam estudar quando crianças ou adolescentes, ou foram estudantes que reprovaram diversas vezes. Também há casos de desistência devido à condição financeira (busca de emprego) ou formação de uma nova família (gravidez precoce).

Desejo ressaltar ao iniciar esta parte do trabalho que a EJA por si só muitas

vezes já é vista sob um ângulo preconceituoso e alvo de discriminação, o que é

apenas um reflexo da estrutura social em que a mesma está inserida. Entenderemos

melhor esta questão ao contextualizar a história da EJA no Brasil.

2.1 UMA HISTÓRIA MARGINAL

A Educação de Jovens e Adultos pensada como uma prática de ensino

remonta ao período colonial, quando figuras religiosas como jesuítas, por exemplo,

buscavam dominar os indígenas que aqui habitavam através da prática da

catequização. É importante enfatizar o caráter de imposição e dominação de uma

cultura sobre outra, uma considerada superior, a europeia, e outra inferior, das tribos

indígenas brasileiras.

No período imperial a educação de jovens e adultos ainda tinha traços das

ações missionárias, “porém, pouco ou quase nada foi realizado oficialmente nesses

períodos, devido principalmente à concepção de cidadania, considerada apenas

como direito das elites econômicas” (BRASIL, 2002, p. 13).

Segundo Santos (2011), com a vinda da família real para o Brasil em 1808,

surge a preocupação com a organização do sistema de ensino brasileiro, pois era

necessário atender a demanda educacional da elite aristocrática portuguesa.

De acordo com a mesma autora, no período imperial há uma iniciativa do

professor negro Pretextato dos Passos e Silva na luta por uma escola para meninos

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negros e pardos, que mobilizou pessoas para a produção de um abaixo-assinado.

Os escravos não eram considerados cidadãos, estavam na condição jurídica de

pertencimento aos senhores, e eram compreendidos como “coisas”, portanto não

tinham direito ao ensino, de acordo com a Constituição de 1824.

Na última década do século XIX, já na República,

[...] cursos noturnos de “instrução primária” eram propostos por associações civis que poderiam oferecê-los em estabelecimentos públicos desde que pagassem as contas de gás. (Cf. Decreto nº 13 de 13.1.1890 do Ministério do Interior). Eram iniciativas autônomas de grupos, clubes e associações que almejavam, de um lado, recrutar futuros eleitores e de outro atender demandas específicas. A tradição de movimentos sociais organizados, via associações sem fins lucrativos, dava sinais de preenchimento de objetivos próprios e de alternativas institucionais, dada a ausência sistemática dos poderes públicos neste assunto (BRASIL, 2000, p. 15).

Do século XIX, em que praticamente nada de oficial existia em termos de

educação de jovens e adultos, passamos para o século XX, quando a revolução

industrial no Brasil começa a apresentar alguns sinais de aparecimento. Segundo

Santos (2011), nas primeiras décadas do século XX houve várias mobilizações em

torno da alfabetização de adultos. Uma delas foi a Liga Brasileira Contra o

Analfabetismo, no ano de 1915.

Segundo o Parecer CEB nº: 11/2000 aprovado em 10 de maio de 2000, na

década de 1920 o analfabetismo atingia 64,9% da população brasileira perfazendo

um total de 11.401.715 pessoas:

Nos anos 20, muitos movimentos civis e mesmo oficiais se empenham na luta contra o analfabetismo considerado um "mal nacional" e "uma chaga social". A pressão trazida pelos surtos de urbanização, os primórdios da indústria nacional e a necessidade de formação mínima da mão de obra do próprio país e a manutenção da ordem social nas cidades impulsionam as grandes reformas educacionais do período em quase todos os Estados. Além disso, os movimentos operários, fossem eles de inspiração libertária ou comunista, passavam a dar maior valor à educação em seus pleitos e reivindicações. (BRASIL, 2000, p. 15).

Em 1921 ocorre no Rio de Janeiro a Conferência Interestadual convocada

pela União para discussões sobre o que constava o art. 35 da Constituição vigente

face ao problema do analfabetismo e das competências da União:

Ela acabou por sugerir a criação de escolas noturnas voltadas para os adultos com a duração de um ano. Tal medida chegou a fazer parte do Decreto n. 16.782/A de 13/1/1925, conhecido como Lei Rocha Vaz ou

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Reforma João Alves, que estabelece o concurso da União para a difusão do ensino primário. Dizia o art. 27 do referido +decreto: Poderão ser criadas escolas noturnas, do mesmo caráter, para adultos, obedecendo às mesmas condições do art. 25. O art. 25 obrigava a União a subsidiar parcialmente o salário dos professores primários atuantes em escolas rurais. Aos Estados competia pagar o restante do salário, oferecer residência, escola e material didático. A alegada carência de recursos da União, o temor das elites face a uma incorporação massiva de novos eleitores e a defesa da autonomia estadual tornaram sem efeito esta dimensão da Reforma (BRASIL, 2000, p. 16).

É perceptível que as tentativas de bases legais para a educação noturna para

adultos não lograram sucesso. O analfabetismo, apesar de ser um mal nacional e

chaga social que ameaçava o projeto de urbanização e os primórdios do

nacionalismo, ainda era um aspecto positivo para o conforto das elites.

Em 1931, com a implantação definitiva do regime de séries adotado na

Reforma para o ensino secundário, fortalece-se a relação entre faixa etária

apropriada e seriação do ensino regular. Através de exames e provas a fim de se

constatar a efetivação do processo de ensino-aprendizagem, o sujeito passaria para

a série seguinte, e assim “estava aberto o caminho para uma oposição dual entre o

regular e o que se chamaria supletivo” (BRASIL, 2000, p. 16).

Com a Constituição de 1934, se reconhece pela primeira vez a educação

como direito de todos, inclusive dos adultos:

A Constituição, ao se referir no art. 150 ao Plano Nacional de Educação, diz que ele deve obedecer, entre outros, ao princípio do ensino primário integral, gratuito e de freqüência obrigatória, extensivo aos adultos (§ único, a). Isto demonstra que o legislador quis declarar expressamente que o todos do art. 149 inclui os adultos do art. 150 e estende a eles o estatuto da gratuidade e da obrigatoriedade. (BRASIL, 2000, p. 17).

Na segunda metade da década de 1930 foi feito o Plano Nacional de

Educação – PNE, que não foi sequer votado por conta do golpe que instituiu o

Estado Novo. Neste documento havia uma parte voltada para o ensino supletivo.

Paschoal Lemme, que fez parte da administração de Anísio Teixeira na

Secretaria da Educação do Distrito Federal, fez parte neste contexto da iniciativa em

relação à educação básica de adultos. Foi a primeira tentativa oficial de organizar o

Ensino Supletivo. Ele fomentou a criação de cursos noturnos supletivos da União

Trabalhista (Santos, 2011).

Com a Constituição outorgada em 1937:

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Fruto do temor das elites frente às exigências de maior democratização social e instrumento autoritário de um projeto modernizador excludente, deslocará, na prática, a noção de direito para a de proteção e controle. Assim, ela proíbe o trabalho de menores de 14 anos durante o dia, o de menores de 16 anos à noite e estimula a criação de associações civis que organizem a juventude em vista da disciplina moral, eugênica, cívica e da segurança nacional. Isto não significa que o Estado Novo não tivesse uma proposta de ação sistemática para a educação escolar, ainda que sob a égide do controle centralizado e autoritário (BRASIL, 2000, p. 17).

Em 1940 criam-se diversos projetos e instituições para a educação de jovens

e adultos, com a finalidade de tirar o Brasil do atraso em que se encontrava, como o

Serviço Nacional de Educação Industrial – SENAI em 1942, a Campanha de

Educação de Adolescentes e Adultos – CEAA em 1947, o Movimento Afro-brasileiro

de Educação e Cultura – MABEC em 1941, a União dos Homens de Cor – UHC em

1943 e o Teatro Experimental do Negro – TEN em 1944.

Segundo Santos (2011), neste período a alfabetização de jovens e adultos

estava pautada numa educação de curto espaço de tempo e o material pedagógico

era o mesmo utilizado para as crianças. Desta forma, percebe-se que naquela época

“já que se comparava o adulto analfabeto a uma criança, bem como era considerado

um incapaz e marginal”.

Nas décadas de 50 e 60 já existiam diversas críticas às campanhas de

alfabetização de jovens e adultos, devido à superficialidade e a inadequação dos

modelos e materiais que não consideravam as especificidades do adulto. A partir daí

também surgem diferentes iniciativas voltadas à educação popular. Difundiram-se as

ideias de educação popular e estudantes e intelectuais da época desenvolviam

novas perspectivas de cultura e educação unidos a alguns grupos. Destacaram-se

neste sentido:

Movimento de Educação de Base (MEB), da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); Movimento de Cultura Popular do Recife, iniciado em 1961; Centros Populares de Cultura da União Nacional dos Estudantes (UNE); Campanha De Pé no Chão Também se Aprende a Ler, da Secretaria Municipal de Educação de Natal; Programa Nacional de Alfabetização do Ministério da Educação e Cultura, em 1964, que contou com a presença de Paulo Freire (BRASIL, 2002, p. 14).

Ainda neste contexto Paulo Freire ganha destaque nacional e seu método de

alfabetização que reconhece o analfabeto como portador e produtor de cultura e

saberes. Freire teve papel fundamental no desenvolvimento da EJA no país, ao

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destacar a importância da participação de todos na vida pública nacional e o papel

da educação para sua conscientização.

O método de Paulo Freire era considerado então o caminho a ser adotado

pelas iniciativas de educação popular naquele período: “As iniciativas de educação

popular eram organizadas a partir de trabalhos que levavam em conta a realidade

dos alunos, implicando a renovação de métodos e procedimentos educativos”.

(BRASIL, 2002, p. 15)

Em 1964 foi aprovado o Plano Nacional de Alfabetização, que previa a

criação, por todo o Brasil, de programas de alfabetização orientados pela proposta

de Paulo Freire. Entretanto, este plano foi suspenso por ocasião do golpe militar e

muitos dos educadores e pesquisadores passaram a sofrer fortes repressões e até

mesmo alguns deles foram exilados, como foi o caso de Paulo Freire.

A Lei 5.379/67 cria a fundação denominada Movimento Brasileiro de

Alfabetização – MOBRAL, com a finalidade de erradicar o analfabetismo e propiciar

a educação continuada de adolescentes e adultos. “Vários decretos decorreram

desta Lei a propósito de levantamento de recursos (Decreto nº 61.311/67) e da

constituição de campanhas cívicas em prol da alfabetização (Decreto nº 61.314/67).”

(BRASIL, 2000, p. 20)

Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e

Adultos, Parecer CEB nº 11/2000 (aprovado em 10/05/2000): “Se o material didático

e a técnica pedagógica se inspiravam no ‘método Paulo Freire’, a nova orientação

esvaziara toda a ótica problematizadora que nela primava”. (BRASIL, 2000, p. 50)

Na década de 70, movimentos populares, sindicais e de comunidades

começaram a se manifestar com maior intensidade, como uma reação da sociedade

ao autoritarismo e à repressão:

Ganhou força a idéia e a prática de uma educação popular autônoma e reivindicativa. O governo federal instituiu, então, o III Plano Setorial de Educação, Cultura e Desporto (1980- 1985), tomando como base a redução das desigualdades e assinalando a educação como direito fundamental para a conquista da liberdade, da criatividade e da cidadania. (BRASIL, 2002, p. 16)

O ensino supletivo começou então a contar socialmente com a mobilização

educacional inovadora da comunidade. Surgiram os programas de caráter

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compensatório, que se caracterizavam por recuperar o atraso dos que “não haviam

usufruído da escolarização na idade própria”. (BRASIL, 2002, p. 16).

O Parecer n.º 699/72 do Conselho Federal de Educação citado pelo Parecer

CEB nº 11/2000 destaca quatro funções do ensino supletivo: a suplência, ou seja, a

substituição compensatória do ensino regular pelo supletivo via cursos e exames

com direito a certificação de ensino de 1º grau para maiores de dezoito anos, e de

ensino de 2º grau para maiores de vinte e um anos. O suprimento, ou

complementação da escolaridade inacabada por meio de cursos de aperfeiçoamento

e de atualização. A aprendizagem e a qualificação.

Com o término do período militar, o MOBRAL foi extinto e, em 1985,

substituído pela Fundação Nacional para Educação de Jovens e Adultos. A

chamada “Fundação Educar” tinha como funções, entre outras, fomentar o

atendimento às séries inicias do 1º grau, a produção de material e a avaliação de

atividades. Com a extinção da Fundação Educar, em 1990, os órgãos públicos, as

entidades civis e outras instituições passaram a arcar sozinhos com a

responsabilidade educativa pela EJA.

Na LDBEN n.º 9.394/96, a parte referida à educação básica de jovens e

adultos afirmou o seu direito a um ensino básico adequado às suas condições e o

dever do poder público de oferecê-lo gratuitamente, na forma de cursos e exames

supletivos. Também alterou a idade mínima para realização de exames supletivos

para quinze anos, no Ensino Fundamental, e dezoito no Ensino Médio, além de

incluir a EJA no sistema de ensino regular.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos,

resolução CNE/CEB n.º 1/2000, definem a EJA como modalidade da Educação

Básica e como direito do cidadão, “afastando-se da idéia de compensação e

suprimento e assumindo a de reparação, eqüidade e qualificação – o que representa

uma conquista e um avanço.” (BRASIL, 2002, p. 17).

O século XXI inicia, segundo Santos (2011) com programas de escolarização

de jovens e adultos, mas que ocupam um lugar secundário nas políticas públicas

educacionais da EJA restringindo-se em uma política de caráter compensatório, não

havendo de fato uma política eficaz na redução da baixa escolaridade e superação

do analfabetismo.

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2.2 SUJEITO JOVEM, ADULTO E EXCLUSO

O contexto brasileiro, tanto moderno quanto contemporâneo, é de

precariedade na educação popular e de exclusividade na educação de qualidade. A

EJA representa o território daqueles que não acessaram a escola quando crianças

em idade universal escolar, daqueles que evadiram por algum motivo, daqueles que

de tanto sofrer repetência foram proibidos de efetuarem a rematrícula porque

extrapolaram a faixa etária e também daqueles que o aprendizado não se enquadra

no que se espera da “normalidade”. Segundo Haddad e Di Pierro (2000, p. 125-126):

A má qualidade do ensino combina-se à situação de pobreza extrema em que vive uma parcela importante da população para produzir um contingente numeroso de crianças e adolescentes que passam pela escola sem lograr aprendizagens significativas e que, submetidas a experiências penosas de fracasso e repetência escolar, acabam por abandonar os estudos. Temos agora um novo tipo de exclusão educacional: antes as crianças não podiam freqüentar a escola por ausência de vagas, hoje ingressam na escola mas não aprendem e dela são excluídas antes de concluir os estudos com êxito.

Parto do pressuposto de que a EJA é composta por um público diverso. Os

sujeitos que a compõem possuem qualquer faixa etária acima de quinze anos para

ensino fundamental e dezoito para ensino médio, sendo de diversas idades e

podendo ser de gerações distintas, que vivenciaram distintos momentos históricos,

evolução tecnológica etc. Além disso, falando especificamente do Brasil, podemos

identificar variadas etnias, religiões, origens, orientações sexuais, modos de viver,

etc. Isso se confirma em algumas das referências que serão exploradas neste

momento do trabalho.

Santos (2011) evidencia a presença da diversidade dos sujeitos da EJA em

alguns dos fragmentos que exponho nesse momento. Sobre o multiculturalismo e a

EJA:

Reconhecemos esse movimento como um postulado desafiador para EJA, pela diversidade presente nesses sujeitos, no qual o currículo seja capaz de incorporar a pluralidade de forma positiva, rompendo com uma perspectiva de educação monocultural. (SANTOS, 2011, p. 38).

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Um fragmento sobre configurações identitárias e currículo que esta mesma

autora traz evidenciando a diversidade dos sujeitos da EJA, problematizando a

questão da Diversidade Cultural neste espaço:

A EJA, muitas vezes repleta de configurações identitárias diversas, recai em uma perspectiva que anula e nega a diferença entre os sujeitos, não situando essa pluralidade nas políticas curriculares, tratando-a de forma marginal ou transversal. (SANTOS, 2011, p. 42).

Outra referência que evidencia esta diversidade é a Proposta Curricular

nacional para EJA (BRASIL, 2002), que traz uma pesquisa feita com estudantes de

EJA de todo território nacional afim de traçar um perfil dos mesmos. Não são

propriamente os dados estatísticos que mostram a diversidade, mas características

como “solteiro, casado, separado, viúvo” que os estudantes da modalidade Ensino

Fundamental, por exemplo, não possuem.

Características como as elencadas no parágrafo anterior, ou a quantidade de

filhos, quanto tempo trabalhou em cada emprego, quantos empregos já teve,

também demonstram a possibilidade de uma enorme diversidade entre um

estudante e outro, sob diversos aspectos.

A pesquisa em que obtemos os dados na Proposta Curricular para EJA

(BRASIL, 2002) foi realizada em todas as regiões do território brasileiro em que

professores, alunos e técnicos de secretarias da educação responderam a

questionários que pudessem traçar um perfil dos sujeitos da EJA e também para se

ter uma ideia de como está configurado o currículo destes cursos.

Podemos observar em diversas tabelas as tabulações dos dados, referentes,

por exemplo, ao currículo do Ensino Fundamental da EJA, em que temos a

porcentagem de cada disciplina no total da carga horária do curso. As disciplinas de

Geografia, História e Ciências estão com o índice de 10 a 15%, enquanto Língua

Portuguesa e Matemática representam de 20 a 25%, sendo que Língua Estrangeira

e Artes apresentam de 5 a 10% e Educação Física e outros 0 a 5%.

Por ser uma pesquisa extensa, não é possível trazer aqui tantos dados

quanto seria pertinente, mas para efeito de conhecimento, exponho alguns dados

importantes relativos à EJA:

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a) Quanto aos alunos matriculados em cada um dos segmentos ou etapas,

verifico uma redução significativa do número de alunos ao longo do processo,

motivada por repetência e/ou evasão.

b) Constato que a repetência, na maioria dos casos, acarreta perdas mais

significativas na etapa correspondente à passagem da 5ª para a 6ª série. Os alunos

que conseguem atravessar essa primeira barreira tendem a ser bem sucedidos nas

etapas seguintes. Mesmo assim, em algumas regiões, há perdas importantes na

etapa correspondente à passagem da 7ª para a 8ª série.

c) Diversas regiões apontam índices elevados de evasão, associados ou à

repetência ou a outros motivos, entre os quais se destacam, em ordem de

importância: mudança de residência (de cidade, de estado); problemas familiares;

falta de motivação; problemas para compatibilizar trabalho e estudo; cansaço físico e

mental; falta de qualificação profissional dos professores que realizam o trabalho.

d) Enquanto nas regiões Norte e Centro-Oeste a maioria dos alunos tem

filhos, isso não ocorre nas demais regiões. Quanto ao número de filhos, a maior

incidência é de um e dois.

e) Entre os pais dos alunos, um percentual significativo nunca frequentou a

escola e também tem peso o grupo que estudou até a 3ª ou a 4ª série. No Nordeste,

Norte e Centro-Oeste, o percentual de pais que nunca frequentaram a escola supera

o de mães. A situação se inverte no Sul e no Sudeste. Em todas as regiões, o

percentual de pais que estudaram até a 8ª série ou ultrapassaram o Ensino

Fundamental, em geral, é bem reduzido.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação de Jovens e Adultos

resolução CNE/CEB n.º 1/2000 também trazem em alguns excertos a ideia presente

da diversidade na EJA, como, por exemplo:

Os princípios da contextualização e do reconhecimento de identidades pessoais e das diversidades coletivas constituem-se em diretrizes nacionais dos conteúdos curriculares. Muitos alunos da EJA têm origens em quadros de desfavorecimento social e suas experiências familiares e sociais divergem, por vezes, das expectativas, conhecimentos e aptidões que muitos docentes possuem com relação a estes estudantes. (BRASIL, 2000, p. 61).

A presente pesquisa não possui um recorte espacial, pois se trata de uma

pesquisa bibliográfica e documental, sendo assim, trabalhar com a realidade

brasileira, pois tanto as políticas públicas e educacionais quanto a abrangência do

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PNLD são de caráter nacional. Por este motivo não posso nem pretendo fazer um

panorama geral do perfil dos estudantes da EJA. A única característica que busco

trazer como intrínseca desta modalidade de ensino é a sua diversidade.

2.3 BASES LEGAIS

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos

Resolução CNE/CEB Nº 1, DE 5 DE JULHO DE 2000 estabelece no Art. 2º que a

respectiva resolução

[...] abrange os processos formativos da Educação de Jovens e Adultos como modalidade da Educação Básica nas etapas dos ensinos fundamental e médio, nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em especial dos seus artigos 4º, 5º ,37, 38, e 87 e, no que couber, da Educação Profissional (BRASIL, 2000, p. 01).

O Art. 3º diz que as Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental

estabelecidas e vigentes na Resolução CNE/CEB 02/98 se estendem para a

modalidade da Educação de Jovens e Adultos no ensino fundamental. Bem como o

Art. 4º do mesmo modo estende as Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino

Médio estabelecidas e vigentes na Resolução CNE/CEB 3/98, para a modalidade de

Educação de Jovens e Adultos no ensino médio.

No parágrafo único, Art. 5º observamos importantes definições para a EJA

enquanto modalidade destas etapas da Educação Básica,

[...] a identidade própria da Educação de Jovens e Adultos considerará as situações, os perfis dos estudantes, as faixas etárias e se pautará pelos princípios de eqüidade, diferença e proporcionalidade na apropriação e contextualização das diretrizes curriculares nacionais e na proposição de um modelo pedagógico próprio (BRASIL, 2000, p. 2).

Quanto ao princípio de equidade: “a distribuição específica dos componentes

curriculares a fim de propiciar um patamar igualitário de formação e restabelecer a

igualdade de direitos e de oportunidades face ao direito à educação”. (BRASIL,

2000, p.1)

É possível afirmar que o princípio de equidade se refere a uma equidade com

aqueles sujeitos que concluíram todas as etapas do ensino regular “na idade

própria”. Significa dizer que o Estado considera importante que o aluno da EJA

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tenha acesso ao mesmo currículo para que tenha um nível de formação equiparado

aos demais estudantes.

Não pretendo concordar ou discordar desta ideia, mas há de se ressaltar que

o modelo escolar vigente acaba excluindo e marginalizando todos aqueles que a ela

não se enquadram. É pertinente pensar se não haveria um modo de alterar o

currículo e o modelo de ensino para promover a inclusão na sociedade, sem que a

formação intelectual destes estudantes seja prejudicada na possibilidade de

desejarem prestar um concurso público, vestibular e processos seletivos.

O princípio da diferença:

[...] a identificação e o reconhecimento da alteridade própria e inseparável dos jovens e dos adultos em seu processo formativo, da valorização do mérito de cada qual e do desenvolvimento de seus conhecimentos e valores (BRASIL, 2000, p.1).

O princípio da diferença faz referência à distinção existente entre sujeitos da

EJA em relação aos sujeitos das demais modalidades de ensino da Educação

Básica. É importante ressaltar que este princípio é indispensável para conhecimento

dos professores e profissionais que trabalham na EJA, pois é na prática pedagógica,

no cotidiano da sala de aula e da instituição de ensino que muitos sujeitos se veem

desmotivados e até mesmo excluídos deste outro modo de educação, de estudo e

de reinserção na vida escolar. É por este motivo que a formação dos professores

que atuarão na EJA deve ser tratada de modo específico.

Quanto ao princípio da proporcionalidade:

[...] a disposição e alocação adequadas dos componentes curriculares face às necessidades próprias da Educação de Jovens e Adultos com espaços e tempos nos quais as práticas pedagógicas assegurem aos seus estudantes identidade formativa comum aos demais participantes da escolarização básica (BRASIL, 2000, p. 2).

O princípio da proporcionalidade visa garantir aos estudantes da EJA a

possibilidade de estudar apesar de tantos obstáculos. Trabalho, cuidado com os

filhos, com os pais, dificuldades financeiras e o esgotamento físico e mental são

alguns possíveis aspectos presentes na vida destes sujeitos, que necessitam de

condições diferenciadas dos demais estudantes da escolarização básica.

Em termos de Diretrizes Curriculares Nacionais para EJA considero que o

Brasil se desenvolveu positivamente visto o que foi exposto de algumas décadas

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atrás. Os princípios de equidade, diferença e proporcionalidade representam um

significativo avanço ao se tratar do direito à educação ao longo da vida.

Trago os artigos 7º e 8º que tratam das bases legais atuais da EJA no Brasil:

Obedecidos o disposto no Art. 4º, I e VII da LDB e a regra da prioridade para o atendimento da escolarização universal obrigatória, será considerada idade mínima para a inscrição e realização de exames supletivos de conclusão do ensino fundamental a de 15 anos completos. Parágrafo único. Fica vedada, em cursos de Educação de Jovens e Adultos, a matrícula e a assistência de crianças e de adolescentes da faixa etária compreendida na escolaridade universal obrigatória ou seja, de sete a quatorze anos completos. Art. 8º Observado o disposto no Art. 4º, VII da LDB, a idade mínima para a inscrição e realização de exames supletivos de conclusão do ensino médio é a de 18 anos completos” (BRASIL, 2000, p. 3).

Como pode se observar no Art. 7º, a EJA não deve ser frequentada por

crianças e jovens que preferem esta modalidade à do ensino fundamental e médio

regular, pois a lei defende que dos 7 aos 14 anos o sujeito deve estar em

“escolaridade universal obrigatória”, no regime de seriação relacionado a faixa etária

apropriada ao ano escolar. Por este motivo, os Art. 7º e 8º estabelecem a idade

mínima para realização do exame supletivo ensino fundamental de 15 anos

completos e, para o Ensino Médio, 18 anos completos.

De acordo com a Resolução CNE/CEB Nº 4, DE 13 DE JULHO DE 2010 que

define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica no capítulo

II: a EJA é uma modalidade da Educação Básica e segundo o Artigo 28. “A

Educação de Jovens e Adultos (EJA) destina-se aos que se situam na faixa etária

superior à considerada própria, no nível de conclusão do Ensino Fundamental e do

Ensino Médio”. (BRASIL, 2010, p. 09).

No § 1º e § 2º consta que:

Cabe aos sistemas educativos viabilizar a oferta de cursos gratuitos aos jovens e aos adultos, proporcionando-lhes oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos, exames, ações integradas e complementares entre si, estruturados em um projeto pedagógico próprio[...] e § 2º Os cursos de EJA, preferencialmente tendo a Educação Profissional articulada com a Educação Básica, devem pautar-se pela flexibilidade, tanto de currículo quanto de tempo e espaço [...] (BRASIL, 2010, p. 10).

Neste trabalho discordo do termo utilizado no Artigo 28 e nas outras leis que

discorrem sobre a EJA, “faixa etária superior à considerada própria”, pois sendo a

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educação um direito de todos os cidadãos, não existe idade própria para a mesma,

ainda que os jovens devam estar inseridos obrigatoriamente na escola na idade

entre 7 e 14 anos.

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3. ENSINO DE GEOGRAFIA

“Penso a Educação como uma ético-política. Tenho o desejo de resgatar a Educação para a ética salvando-a da economia. Tenho a impressão de que, salva da economia, ela possa voltar a ser política”. (Tiburi; Hermann)

Este capítulo está fragmentado em duas partes. A primeira consta uma

revisão histórica do ensino de Geografia trazendo um pouco de sua gênese, sua

relação com a Geografia como ciência institucionalizada e sua herança para a

contemporaneidade. A segunda parte é voltada para uma reflexão da educação

escolar na sociedade, em espaços e tempos líquidos14 e, neste contexto, esboçando

de que modo se encontra o ensino de Geografia nestes moldes fluidos.

Consideramos pertinente para este trabalho um capítulo voltado unicamente

ao ensino de Geografia e a Educação Geográfica, pois o livro didático desta

componente curricular está completamente alicerçado a esse campo, baseado em

uma perspectiva de educação em Geografia. Além do que, inserida nesta discussão,

está a possibilidade de que professores e toda comunidade escolar superem e

reflitam sobre uma práxis pedagógica15 baseada no uso dos LDs enquanto fonte de

verdades epistemológicas e filosóficas e não de transmissão e veículo de discursos

e elementos culturais.

3.1 A TRADIÇÃO DO ENSINO DE GEOGRAFIA

A origem da Geografia institucionalizada e sistematizada remonta ao século

XIX, assentada sobre bases positivistas,

[...] forjada num processo de consolidação do sistema capitalista alemão, possui uma constante variável em seu objeto de estudo. Ora o conhecimento científico geográfico estava ligado ao levantamento de dados físicos espaciais pautados numa visão determinista, ora se tentava presumir

14 Este conceito é defendido por Bauman (2004), o contexto da pós-modernidade ou modernidade líquida é amplamente discutida em sua obra “Amor líquido” onde associa a sensação de que mais nada é estável ou duradouro, as relações sociais são fluidas e se transformam em curtos espaços de tempo, ou seja, na mesma velocidade em que o prazer, os desejos e as alegrias movem-se para a capacidade de consumo. 15 Entende-se a práxis como “a atividade concreta pela qual os sujeitos humanos se afirmam no mundo, modificando a realidade objetiva e, para poderem alterá-la, transformando-se a si mesmos. É a ação que, para se aprofundar de maneira mais consequente, precisa da reflexão, do autoquestionamento da teoria; e é a teoria que remete à ação, que enfrenta o desafio de verificar seus acertos e desacertos, cotejando-os com a prática” (KONDER, 1992, p. 115).

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e legitimar divisões de áreas em um período capitalista de expansão territorial sob um pretexto possibilista. Sob estas perspectivas adotam-se e alteram-se o objeto de estudo, sendo ele desde a superfície terrestre, a paisagem, os lugares, o espaço geográfico até a relação homem-meio, homem-natureza. Pode-se dizer que tanto o objeto quanto a metodologia adotada são proporcionais à intencionalidade do geógrafo e são tão múltiplas e ao mesmo tempo singulares quanto forem as intenções. (MAURICIO, 2015, p. 24)

Podemos relacionar então o advento desta ciência com o processo de

consolidação do capitalismo na Alemanha, país este que à época não era unificado,

mas dividido em quatro territórios. Em relação aos demais países europeus naquela

época, a Alemanha não unificada encontrava-se em atraso econômico e político, de

acordo com Moraes (1994, p. 41):

A sistematização da Geografia, sua colocação como uma ciência particular e autônoma, foi um desdobramento das transformações operadas na vida social, pela emergência do modo de produção capitalista [...] a geografia foi na verdade um instrumento da etapa final deste processo de consolidação do capitalismo.

A relação científica desta ciência com um projeto político estatal de expansão

da economia alemã permite que a Geografia se torne sistematizada e

institucionalizada. Na realidade, isto significa uma condição sine qua non para o

desenvolvimento capitalista alemão. Moraes (1994) cita cinco pressupostos neste

contexto: o conhecimento efetivo da real extensão do planeta, a existência de uma

base de armazenamento de informações técnicas sobre os diversos lugares da

Terra, o aprimoramento e padronização das técnicas cartográficas, o surgimento das

técnicas de impressão para uma gradual difusão e popularização de mapas e atlas.

Por último, a evolução do pensamento filosófico baseado no positivismo:

A Geografia como ciência tem seu berço na Alemanha ainda não unificada, onde surgem as primeiras cátedras e faculdades. Mais tarde surge a disciplina institucionalizada nas escolas. O afã deste país ainda em consolidação em expandir seu território e garantir colônias deu à Educação geográfica um caráter herdado até hoje. O ensino de geografia persuasivo, ditatorial, pautado no empirismo lógico, na necessidade de dominação dos povos não-civilizados, diga-se, não europeus, elitista, exclusivo, voltado para interesses político-econômicos tem suas raízes na insígnia do capital. Pode-se dizer que o ensino de geografia nasceu em decorrência deste panorama econômico, para se atingir metas capitalistas, de imperialismo e colonização. (MAURICIO, 2015, p. 24)

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Com a sistematização e institucionalização da Geografia, esta ciência se

torna componente curricular tanto nas universidades alemãs quanto nas escolas

para crianças e adolescentes. Este é, portanto, o berço do ensino de Geografia,

ainda que por todo o continente europeu há muito já se utilizasse a cartografia, os

estudos dos territórios e dos povos ao redor do mundo, e uma base de dados para

registro de informações sobre a extensão e características da Terra. No entanto, é

neste contexto de forte desenvolvimento do sistema de produção capitalista alemão

que surge o ensino de Geografia de modo oficializado, em instituições de ensino.

A partir desta resumida explanação do contexto de surgimento da Geografia

como ciência sistematizada, é possível pensar sobre como era a abordagem do

ensino desta ciência no âmbito escolar. Pensava-se a Geografia como propulsora de

conhecimentos e informações a respeito da descrição da Terra. Desta forma, era

imprescindível que a Geografia trabalhasse conteúdos como a cartografia, ou seja,

as forma de representação dos territórios.

Segundo Martins (2008, p. 199):

Ao longo da trajetória, a geografia escolar serviu para difundir os princípios que justificavam a expansão dos territórios e o avanço e domínio das relações capitalistas de produção. Historicamente, a ciência geográfica contribui com informações úteis e necessárias ao processo de avanço e domínio dos territórios. A emergência e consolidação dos Estados-nação conduzem a que o Estado assuma o compromisso de promover a educação do seu povo.

Yves Lacoste escreve em 1976 o livro cujo título é autoexplicativo: “A

Geografia – isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra”. Esta é uma

importante obra da chamada Geografia Crítica, em que o autor destaca o papel

desta ciência como estratégia geopolítica, para dominar o espaço, muito utilizada

militarmente pelos grupos imperialistas, e menos utilizada (pelo menos na época de

sua escrita, século XX, ditadura militar no Brasil e impasses de toda ordem pelo

mundo) pelo povo oprimido para pensar o espaço como palco de transformação

social e luta. O autor chama a atenção para a possibilidade de se pensar o espaço e

nele atuar de modo profícuo e contundente.

A educação geográfica, diferente do ensino de Geografia, segundo Mauricio

(2015), acontece como todo ato educativo, pensado como construção de

conhecimento, se dá: a partir da relação com o outro, em todo e qualquer ambiente,

seja ele intencional ou não, repressivo ou não, formal ou não formal, ou seja,

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acontece naturalmente. A educação geográfica diz respeito ao pensamento em

relação ao espaço, ao local onde se vive, aos acontecimentos sociais e físicos.

Sabe-se que desde a mais tenra idade o indivíduo estabelece uma relação com o espaço onde vive (lar, rua, bairro, praça, igreja, escola etc.), constitui laços afetivos com estes espaços e com as pessoas, e cria uma identidade influenciada pela cultura, pelo idioma, pelos hábitos, e pela interação com outros sujeitos (família, vizinhos, educadores e etc.), ou seja, em qualquer contexto, sob qualquer estrutura, o indivíduo se desenvolve moral, cognitivo, social, psicológico, intelectualmente com o lugar em que vive e transita e com as pessoas que dividem estes lugares com ele, e todo este desenvolvimento constitui o processo educativo e está intimamente ligado ao pensamento geográfico. (MAURICIO, 2015, p. 25)

Sobre o ensino de Geografia tradicional e informacional, Lima e Vlach (2002,

p. 45) afirmam que:

O ensino de Geografia, construído pela reprodução de manuais, conduz a uma insatisfação e a um descomprometimento dos alunos frente a essa disciplina, podendo-se perceber afirmações que reforçam a ideia de que a metodologia utilizada pela maioria dos professores nas escolas da cidade não tem relação com a vida cotidiana dos alunos, o que direciona a aprendizagem para repetições, impossibilitando a criação/recriação.

Em introdução ao próximo item desta dissertação, encerramos esta primeira

parte do capítulo diferenciando o ensino de Geografia tradicional de origem alemã à

educação geográfica da qual discute Mauricio (2015). A educação geográfica se

difere do ensino de Geografia, conforme fazemos neste trabalho, uma vez que a

primeira diz respeito ao processo educativo de desenvolvimento do pensamento

geográfico e reflexão a respeito dos elementos que constituem o espaço geográfico,

como a sociedade, natureza, modos de produção e etc. Já o segundo se refere ao

ensino de Geografia em oposição ao aprendizado em Geografia, ou seja, diz

respeito a uma concepção e modo de fazer educação pautados nas premissas

modernas e tradicionais, conservadoras, que consideram mais o ensino-

aprendizagem em Geografia que o processo de educação geográfica.

Pretendo discutir e apresentar o ensino de Geografia na abordagem da

emancipação humana, da educação geográfica, com a finalidade ético-política e não

estatal e/ou econômica, ou seja, um ensino de Geografia voltado ao sujeito do

processo educativo e não às demais instâncias.

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3.2 ENSINO DE GEOGRAFIA/EDUCAÇÃO GEOGRÁFICA

Estudar, escrever e ler o mundo por meio da interpretação geográfica da

realidade, segundo Azambuja (2017), é o objetivo de aprendizagem da Geografia

Escolar dos nossos tempos. Isto porque não é mais possível, neste contexto, um

ensino escolar que não trabalhe com as informações de modo a construir o

conhecimento, ou seja, pensando, refletindo e sistematizando a informação.

De modo a tornar familiar a compreensão da diferença entre ensino de

Geografia tradicional e da educação geográfica, trago algumas questões a serem

pensadas sobre a tradição das ciências e a essência da sociedade contemporânea.

A ciência conhecida é fundamentalmente composta por paradigmas.

Paradigmas estes que possuem conceitos-mestres da inteligibilidade16 e

determinação das operações lógicas-mestras. Ou seja, a ciência caracteriza-se por

selecionar suas categorias, suas definições, suas teorias e negar as demais, os

conceitos que se opõem, as categorias que privilegiam outro objeto, outra forma de

estudo.

O paradigma desempenha um papel, ao mesmo tempo, subterrâneo e soberano em qualquer teoria, doutrina ou ideologia. O paradigma é inconsciente, mas irriga o pensamento consciente, controla-o e, neste sentido, é também supraconsciente. Em resumo, o paradigma instaura relações primordiais, que constituem axiomas, determina conceitos, comanda discursos e/ou teorias. (MORIN, 2011, p. 25)

Absorvo disto que discursa Morin o fato de que a ciência, ainda no século

XXI, se constitui por paradigmas. Dissociações, polaridades, hierarquizações etc.

Segundo este autor, “os indivíduos conhecem, pensam e agem segundo paradigmas

inscritos culturalmente neles” (MORIN, 2011, p. 24).

Morin cita exemplos de paradigmas cartesianos que são comumente

identificados nas ciências: sujeito/objeto, alma/corpo, espírito/matéria,

qualidade/quantidade, finalidade/causalidade, sentimento/razão,

liberdade/determinismo, existência/essência. Ora, tais categorias não compõem um

mesmo sujeito? Não fazem parte de um mesmo fenômeno? Considero insensato

16 “A ordem, nas concepções deterministas, a Matéria, nas concepções materialistas, o Espírito, nas concepções espiritualistas, a Estrutura, nas concepções estruturalistas, são os conceitos-mestres selecionados/selecionadores, que excluem ou subordinam os conceitos que lhes são antinômicos. Desse modo, o nível paradigmático é o do princípio de seleção das ideias que estão integradas no discurso ou na teoria, ou postas de lado e rejeitadas”. (MORIN, 2011, p. 24)

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que estes paradigmas sejam levados a fundo em pesquisas na área da Educação e

que se reproduzam no espaço escolar através dos discursos presentes neste

ambiente.

Neste ínterim, o autor estabelece a relação entre racionalidade e

racionalização, que compõem a ciência sem deixar de expor o vínculo necessário

entre ambos. Ambos constituem a atividade racional da mente, entretanto, o que

lhes torna distintos no caso da racionalidade é sua característica de abertura ao que

a contesta. A racionalidade permite o reconhecimento do erro, da ilusão, da

possibilidade de não comprovação. Assemelha-se à teoria, que pretende ser uma

teoria e não um fato. A racionalização “crê-se racional, porque constitui um sistema

lógico perfeito, fundamentado na dedução ou na indução, mas fundamenta-se em

bases mutiladas ou falsas e nega-se à contestação de argumentos e à verificação

empírica” (MORIN, 2011, p. 22).

Morin (2011) afirma que nenhum dispositivo cerebral permite distinguir a

alucinação da percepção, o sonho da vigília, o imaginário do real, o subjetivo do

objetivo. Fato que torna o sujeito submetido à parcialidade da ciência. Não há

neutralidade, quando o mais próximo do real e palpável que é possível chegar é a

verificação empírica. Para resumir, é possível afirmar que a emoção que cada sujeito

possui, seus sentimentos, medos, desejos, é parte indispensável da mente humana

ao estabelecimento de comportamentos racionais. O racionalismo ignora as

subjetividades e as afetividades. A racionalidade deve reconhecer a parte de afeto,

de amor e de lógica, e sabe que a mente humana não comporta o mistério da

realidade.

Contudo, ambas envolvem-se e por vezes se misturam. A racionalidade pode

perverter-se em racionalização e a racionalização tornar-se racionalidade quando

exercida a autocrítica. Pensadores, intelectuais, pesquisadores, professores,

cientistas devem ser autocríticos e se perceberem como portadores destas duas

categorias.

Concluo esta breve reflexão ressaltando que paradigmas devem ter

racionalidade, devem permitir a reconfiguração do pensamento simplista, para que

não se propague a mera reprodução de conhecimentos polarizados, recheados de

dualismos, que perdem a essência do pensamento e do conhecimento complexo. O

reconhecimento da subjetividade humana em toda e qualquer ciência faz parte da

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compreensão de que a mente humana não funciona de forma fragmentada, pois

emoção e razão compõem um mesmo sujeito de modo sistêmico.

Neste viés, é possível dialogar então com o ensino de Geografia e a

Educação, que deve buscar na ciência as maiores contribuições da racionalidade e

não da racionalização, que deve reconhecer as limitações da informação e a

necessidade de promoção do pensamento complexo em busca de conhecimentos.

Além disso, ressalto que o papel do professor em meio a sociedade líquida,

no contexto do ensino de Geografia, é muito mais de promover a racionalidade

frente a tantas fontes informacionais, que propriamente de transmissor de conteúdos

sobre a Terra acumulados historicamente.

Cabe ao professor entender as especificidades inerentes a Geografia, mas desconstruir o caráter de fragmentação que a envolve, de forma a intervir no processo de ensino-aprendizagem valorizando o entendimento do espaço geográfico como uma extensão humana e física. (LIMA; VLACH, 2002, p. 46)

Ao relacionar o ensino de Geografia tradicional à renovação do ensino de

Geografia escolar, Azambuja (2017) ressalta a importância da alteração dos

métodos e da didática, bem como uma nova perspectiva da prática pedagógica e

dos materiais didáticos:

Para cumprir a finalidade cidadã, sintonizada com a formação de sujeitos ativos e participantes, impõe-se a renovação paradigmática da Geografia Escolar. É necessário alterar os métodos da ciência e da didática da ciência. O conteúdo-forma disciplinar da Geografia terá então a finalidade de instrumentalizar os estudantes para a desejada cidadania ativa. Não mais a formação de sujeitos passivos que se adaptaram a uma Pátria já pronta. A formação geográfica escolar precisa promover outra cidadania, ativa, criativa, participante. A identidade com a Pátria será então de sujeitos identificados com a construção de um território em movimento. As transformações teóricas e metodológicas da ciência e da didática da ciência, já praticadas em muitas escolas e também incluídas em Coleções Didáticas, identificam superações, ainda que parciais, da perspectiva informativa e conteudista dessa prática de ensino. (p.64)

Callai (2011) nos diz que a Educação geográfica consiste em um conceito

que:

Diz respeito a algo mais que simplesmente ensinar e aprender geografia. Significa que o sujeito pode construir as bases de sua inserção no mundo em que vive e compreender a dinâmica do mesmo através do entendimento da sua espacialidade (...) Significa, então, transpor a linha de simplesmente

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obter informações para realização de aprendizagens significativas envolvendo/utilizando os instrumentos para fazer a análise geográfica. (p. 2)

Aprofundando esta questão, a autora reconhece que para uma atuação

comprometida com a educação geográfica é necessário que nos cursos de formação

inicial de professores de Geografia “sejam trabalhados os conteúdos de forma que

incorporem os princípios didáticos pedagógicos dos mesmos. Ao vivenciar as formas

de aprender a geografia o graduando poderá estabelecer as bases para ensinar

geografia”. (CALLAI, 2011, p. 7)

Acredito que o ensino de Geografia de caráter humanizado, voltado ao

sujeito, deve ser pensado como um processo que se inicia na formação inicial de

professores, que se dá nos cursos de Licenciatura em Geografia. Esta formação

deve acontecer através de um currículo que permita o acesso aos conhecimentos

historicamente construídos, aos conhecimentos da área da Educação, a promoção

do processo de pensamento complexo, e a vivência do próprio estudante da

graduação em um modo de aprender Geografia.

Segundo Lima e Vlach (2002):

Os conteúdos trabalhados nos cursos de graduação em Geografia são necessários para o reconhecimento e organização dessa área acadêmica, mas não basta dominar conceitos teóricos, é preciso refletir sobre as concepções pedagógicas que perpassam a relação teoria e prática, revendo a didática e a metodologia que instrumentalizam esses trabalhadores para o exercício da profissão docente. (p. 46)

De acordo com essa abordagem ancorada nos Estudos Culturais, com minha

metodologia (próximo capítulo) e com os autores que trago, ressalto a necessidade

e importância da interdisciplinaridade17 presente nas práticas pedagógicas, no

currículo, nos livros didáticos etc. Lima e Vlach (2002) dizem que sendo a Geografia

uma ciência que estuda questões sociais, é fundamental efetuar uma relação com

outras ciências que possuem como categoria de análise a sociedade.

Neste sentido, Martins (2008) corrobora com minha proposição quando diz

que é preciso que “a geografia coloque o aluno em contato com o mundo, para que

ele possa compreender a sua dimensão e nele interaja, participe, interprete e analise

criticamente a complexidade de elementos que se interligam”. (p. 206)

17 A interdisciplinaridade para este trabalho representa a contribuição que outras ciências podem

trazer para a Geografia, pois na realidade a Geografia é constituída por diversas ciências.

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O não isolamento e fragmentação da Geografia enquanto ciência e

componente curricular é condição para que estudantes desenvolvam um processo

de construção de pensamento complexo, que permita reconhecer e compreender a

herança da Geografia tradicional em termos de ciência e ensino nos materiais

didáticos, nas informações trazidas pelas mais diversas fontes informacionais,

superando-os de maneira autônoma e autêntica.

Azambuja (2017, p. 68) traz alguns indicativos do ensino de Geografia que

promove o processo de construção do conhecimento geográfico:

O conteúdo escolar precisa ser mais formativo do que informativo, ser meio e não fim para o processo de ensinar e aprender. O objetivo é aprender a trabalhar com informações geográficas transformando-as em conhecimento geográfico, ou seja, aprender a coletar, organizar, interpretar, elaborar sínteses. A renovação didática inclui a diversidade de atividades e linguagens como recursos para o trabalho com o conhecimento com finalidade escolar.

Concluímos neste capítulo, portanto, que a interdisciplinaridade promovida de

diversas formas e também por meio de diferentes linguagens, fontes de

informações, métodos e atividades dentro de sala de aula na educação geográfica é

fundamental no contexto de uma sociedade fluida, em que o cotidiano e a vida

exigem dos sujeitos conhecimentos e posturas mais complexas e dinâmicas que

outrora.

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4. PERCURSOS METODOLÓGICOS

A dissertação apresentada até aqui se estruturou em um raciocínio lógico que

pudesse fazer sentido para mim e para o leitor. Discuti no âmbito teórico sobre os

Estudos Culturais, os conceitos de Cultura e Diversidade Cultural e a Educação de

Jovens e Adultos – suas bases legais, sua história e os sujeitos que fizeram e fazem

parte dela. Trouxe também meu pensamento com relação ao Ensino de Geografia e

utilizei-me desta ordem para que inicialmente pudesse ser explorado o aparato de

tudo que seria trazido a partir dali, ou seja, a abordagem dos Estudos Culturais.

A Educação de Jovens e Adultos foi trabalhada de modo que fosse possível

conhecer sua trajetória e a atual configuração. A partir desta aproximação com a

modalidade da qual destino a análise dos livros didáticos, é possível pensar num

Ensino de Geografia que dê conta de promover a educação libertadora e

emancipatória que defendo para estes sujeitos. A concepção de cultura adotada

está alicerçada à toda dimensão educacional que permeia o Ensino de Geografia,

que por sua vez leva em consideração a perspectiva dos Estudos Culturais.

Após o presente capítulo, que visa apresentar e refletir sobre o percurso

metodológico que foi feito até a finalização desta dissertação, trarei questões que

envolvem tudo aquilo que foi discutido nos capítulos anteriores com relação ao livro

didático. Relacionarei a cultura e sua relação com este material, bem como o Ensino

de Geografia e a Educação de Jovens e Adultos. A tentativa de efetuar um diálogo

entre todos os aspectos que permeiam este estudo constitui a lógica teórico-

metodológica proposta.

Novamente trago a ideia presente na obra “A águia e a galinha”, de Leonardo

Boff (2017), de que a dimensão social e humana no mundo é um complexo sistema,

em que cada parte que o compõe está interligada e em constante interação e

dinamicidade. Ou seja, todo este trabalho, apesar de fragmentado em capítulos, é

um sistema em que todos os elementos trazidos estão em mutua retroalimentação.

Além disso, muito foi deixado do lado de fora, devido a necessidade de se criar um

recorte para produzir um legítimo trabalho acadêmico. Isto não significa que muitas

coisas relevantes não estão em processo relacional com nosso tema, tais como:

conceitos familiares, categorias, reflexões de outros autores, temáticas pertinentes à

modalidade da EJA etc.

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Este trabalho é um ponto de vista dentre muitos outros, pois apesar de ser

composto com as ideias de diversos autores, abordagens de outros pensadores,

perspectivas, foi pensado a partir do lugar que ocupo como indivíduo e da mente

que me permite alargar pensamentos. Isto significa que não há verdade

epistemológica, mas diversas formas de refletir, pensar, repensar, construir e habitar

a temática e a área de pesquisa, conforme nos explana Boff (2017)

Todo ponto de vista é a vista de um ponto. Para entender como alguém lê é necessário saber como são seus olhos e qual é sua visão de mundo. Isso faz da leitura sempre uma releitura. A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam. Para compreender é essencial conhecer o lugar social de quem olha. Vale dizer: como alguém vive, com quem convive, que experiências tem, em que trabalha, que desejos alimenta, como assume os dramas da vida e da morte e que esperanças o animam. Isso faz da compreensão sempre uma interpretação (p. 13).

Com relação à metodologia científica, antes de apresentá-la, vale ressaltar

que:

Metodologia contém a ideia de caminho a ser seguido, podendo-se atribuir ao metodólogo a tonalidade moralizante do guarda de trânsito. O rigor lógico pode ser tomado tão a sério que, em vez de ser caminho da produção criativa, se torna fim em si mesmo. O cientista ‘quadrado’ pode originar-se da sujeição obtusa a normas metodológicas. (DEMO, 1995, p.61-62)

Por este motivo, opto por ancorar-me no campo da metodologia de pesquisa

pós-crítica, que permite maior autonomia do próprio percurso. Isto não significa que

o rigor científico e metodológico é desvalorizado ou negligenciado, pelo contrário, a

trajetória e o processo que vão acontecendo demandam ainda maior atenção e zelo

para a manutenção do rigor necessário.

Todo o referencial teórico e a pesquisa empírica estão alinhados como um

estudo de natureza qualitativa, também chamada de interpretacionista (que se difere

do positivismo18). Ou seja, coloca o sujeito no cerne da pesquisa, sujeito este que,

não sendo passivo, interpreta o mundo em que vive continuamente. É agente em

seu contexto (OLIVEIRA, 2009). Tal abordagem é utilizada comumente na área da

18 “Para a abordagem positivista, o estudo do homem pode ser realizado por meio dos métodos das ciências naturais, seguindo sua lógica. Moreira (2002) enuncia que o positivismo contemporâneo tem suas bases em Auguste Comte e John Stuart Mill. Ambos os autores advogam ser possível que as ciências humanas e sociais realizem suas pesquisas através das ciências físicas. Ao descrever as idéias de Comte, que via a ciência como sendo uma maneira de se emancipar da Teologia e das especulações metafísicas(...)” (OLIVEIRA, 2009, s.p.)

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Educação por compreender que fenômenos não podem ser quantificados tal qual os

objetos de estudo das ciências exatas.

Gastaldo (2012) afirma que a metodologia qualitativa em Educação no Brasil

vem em contraposição às ideias predominantes nos estudos quantitativos (e

positivistas) de que é possível efetuar generalizações de resultados e de que há

neutralidade do pesquisador, que seria alguém separado do contexto do estudo.

Em continuidade ao que foi exposto, apresentarei neste momento a

metodologia queer, que sustenta a análise que farei sobre os livros didáticos de

Geografia para EJA na pesquisa empírica problematizada no último capítulo deste

trabalho.

Os estudos queer, pensados como metodologia e teoria, surgiram na década

de 80 nos Estados Unidos, sob a influência dos Estudos Culturais, do pós-

estruturalismo francês, da teoria feminista, dos estudos gays e lésbicos. Sua origem

está ligada aos movimentos sociais ligados a questões de identidade e gênero,

enquanto que no Brasil, sua inserção se dá em meio acadêmico.

A metodologia queer tem sido discutida e apresentada como aquela que subverte padrões rígidos relacionados ao fazer científico [...], tais estudos enfocaram, inicialmente a desconstrução de identidades sexuais e de gênero fixas, e posteriormente, passaram a enfocar, também, os variados processos de produção do conhecimento. (REIS, 2012, p. 243)

O termo queer é de origem norte-americana e pode ser traduzida para a

língua portuguesa como “estranho, raro, esquisito”, o que era utilizado para designar

pessoas que não se encaixavam nos padrões culturais e de gênero, de forma

pejorativa, discriminatória, ofensiva. A mesma denominação foi utilizada por teóricos

e militantes de movimentos gays e lésbicos, na década de 80, como contestação à

normalização promovida pela heteronormatividade19 compulsória da sociedade.

(REIS, 2012)

O pensamento queer, segundo a mesma autora, busca e promove o

questionamento da própria necessidade de se fixar uma concepção única sobre o

processo de pesquisa. Sendo assim, o modo queer de fazer pesquisa permite e até

carrega como pressuposto a ideia de que cada objeto de pesquisa exige seus

próprios processos investigativos, que devem passar pelo crivo do pesquisador.

19 Este termo é proposto por Guacira Lopes Louro (2004), que denomina o padrão e norma social estabelecida da heterossexualidade.

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Pesquisas realizadas com a metodologia queer utilizam-se de procedimentos

que visam desconstruir os objetos de análise, desnaturalizar concepções fixas.

Adoto esta metodologia, portanto, por ter o intuito de desconstruir o conteúdo trazido

pelo livro didático de Geografia para EJA. Busco desnaturalizar tudo aquilo dado

como natural, normal, padrão estabelecido historicamente e culturalmente pela

sociedade e meios de comunicação das sociedades. Isto significa dizer que a

análise deste material não tem o viés de caracterizá-lo como bom ou ruim, ou

identificar dados corretos ou incorretos do conteúdo, mas desnaturalizar textos e

imagens com o objetivo de verificar se a Diversidade Cultural é abordada ou

constitui os meandros dos temas geográficos.

Neste trabalho a noção, ou o pressuposto, de verdade epistemológica cai por

terra. Enfoco em reconhecer os processos de classificação, hierarquização e

normalização da cultura, seja ela de sujeitos, grupos, classes, continentes, de modo

a perceber “a produção cultural e discursiva daquilo que é tido como natural, estável

e verdade” (REIS, 2012, p. 243).

Os estudos queer opõe-se a binarismos e dualismos

(heterossexual/homossexual, por exemplo), pois estes últimos produzem a exclusão

e negação de tudo que há entre estes dois polos. Ao realizar este modo de relação

de oposição e classificação compreendo que se negligencia ou recusa as múltiplas

manifestações e possibilidades de ser e existir em um mundo que está em

constante, inegável e interminável processo de construção e desconstrução, onde

cada parte que o constitui se relaciona mutuamente, e que nada pode ser pensado

de maneira isolada, estática, estagnada.

Acredito que outros binarismos também não condizem com a sociedade em

sua pluralidade, pois dualismos reduzem as possibilidades humanas. Posso citar

como exemplos: corpo-alma, terra-céu, bom-mau, normal-anormal, bonito-feio,

grande-pequeno, científico-senso-comum etc.

Neste sentido “pensar queer passou a significar, portanto, uma forma de

questionar, problematizar, contestar, todas as formas bem-comportadas de

conhecimento e de identidade” (REIS, 2012, p. 245). Por bem-comportadas entende-

se formas de conhecimento herdadas da modernidade, do Romantismo, que não se

repensam, não atribuem a si a possibilidade de mudança, transformação,

atualização, ressignificação.

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A metodologia queer se utiliza de diferentes métodos para coletar, interpretar

e produzir informações. Além disso, rejeita a exigência acadêmica de uma coerência

entre as disciplinas (similar aos Estudos Culturais). Ou seja, tanto os EC quanto a

metodologia ou teoria queer defendem a interdisciplinaridade, seguindo a lógica do

que foi exposta anteriormente sobre a desconstrução de dualismos e binarismos.

A fragmentação foi uma herança da ciência positivista, que se reflete na

divisão do conhecimento em disciplinas, áreas do saber. É necessário buscar, na

possibilidade de cada pesquisador, a interdisciplinaridade para que a pesquisa seja

cada vez mais fidedigna.

Proponho então uma análise do livro didático à maneira que explica Sherlock

Holmes, personagem da obra fictícia de Arthur Conan Doyle (2011), sobre suas

investigações meticulosas no contexto britânico do século XIX, de que é necessário

observar os fatos para aplicar então uma teoria, e não sugerir uma teoria para, em

razão dela, explicar os fatos. Isto ganha credibilidade visto que no final de todas

suas histórias obtém êxito na descoberta e esclarecimento de mistérios que

pareciam indecifráveis, mas que o leitor se dá conta de que todas as informações e

dados necessários estavam diante de seus olhos. Depreendo daí que a maior parte

do percurso metodológico deve consistir em estudo de fatos, fenômenos, artefatos.

O comprometimento do pesquisador não é em primeira instância com a teoria, ou

seja, a abordagem, a perspectiva, ou até mesmo com a metodologia. O

comprometimento do pesquisador, em primeiro lugar, deve ser com seu objeto de

estudo, a partir dele é que se estabelecem os métodos, a metodologia, a perspectiva

etc.

Os métodos que adoto nesta pesquisa são de análise bibliográfica e

documental. O procedimento, como foi explicado na metodologia e teoria queer, é o

de desconstrução e desnaturalização do conteúdo de Geografia contido no livro

didático para EJA (anos finais do Ensino Fundamental). Assim sendo, através destes

procedimentos, avaliarei os textos e imagens que são veiculados neste material.

Meu objeto de estudo é o livro didático, considerado artefato cultural uma vez

que é possuidor, produtor e veículo de significados culturais através dos discursos

que nele habitam. Azambuja (2017) diz que o livro didático é um recurso didático

que contém o conteúdo-forma de um componente curricular, e seu uso no processo

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de ensino-aprendizagem20 está relacionado com a “didática específica da respectiva

área científica curricular” (AZAMBUJA, 2017, p. 62).

Não me deterei em analisar qual a didática, qual a abordagem metodológica,

quais concepções de espaço geográfico, lugar, região são utilizadas e tomadas

como referência no LD, mas se existe a abordagem da Diversidade Cultural que

defendo neste trabalho, e se estiver presente, como é esta abordagem.

Com este intuito, lanço-me a analisar as diferentes linguagens veiculadas pelo

livro didático de Geografia em seus conteúdos programáticos. É evidente que cada

linguagem exige sua própria lente de observação, análise, interpretação e

problematização. Neste sentido, justifico minha análise sobre estas diferentes

formas de abordar o conteúdo (textos jornalísticos, imagens, poemas, poesias,

resenhas, mapas, letras de música), tendo em vista que todas estas linguagens que

compõe o LD de Geografia são veículos pedagógicos comunicativos que constroem

e carregam consigo discursos, além de produzirem significados e até identidades.

Sobre discurso, encontro em “Microfísica do poder” de Michel Foucault (1979)

a relação entre o poder presente e expressado de diferentes formas na sociedade, a

criação e naturalização da ideia de verdade e o discurso, que por sua vez é

abastecido por verdades que foram forjadas historicamente e coercitivamente por

relações de poder. Neste sentido, diz Foucault (1979, p. 11) que

O que faz com que o poder se mantenha e que seja aceito é simplesmente que ele não pesa só como uma força que diz não, mas que de fato ele permeia, produz coisas, induz ao prazer, forma saber, produz discurso. Deve-se considera-lo como uma rede produtiva que atravessa todo o corpo social muito mais do que uma instância negativa que tem por função reprimir.

Nota-se que o autor diz que o poder forma saber e é a partir desta

prerrogativa que considero o livro didático como artefato cultural, possuidor de

discursos que são transmitidos de diferentes formas. Entre aquilo que é veiculado

neste material existe uma série de verdades, que para Foucault nada mais são que

estatutos humanos e sociais forjados histórica e culturalmente pelo poder, pois

20 Utilizamos nesta citação-indireta este termo por ter sido utilizado por Azambuja (2017, p. 62) para caracterizar o livro didático no processo educativo em sala de aula. Contudo, preferimos não recorrer a esta categoria na maior parte do trabalho pois remete-nos a uma relação de caráter binário, em que um polo ensina e outro polo aprende, desconsiderando as interfaces que ocorrem neste processo dinâmico.

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O importante, creio, é que a verdade não existe fora do poder ou sem poder [...] A verdade é deste mundo; ela é produzida nele graças a múltiplas coerções e nele produz efeitos regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de verdade, sua ‘política geral’ de verdade; isto é, os tipos de discursos que ela acolhe e faz funcionar como verdadeiros: os mecanismos e as instâncias que permitem distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como se sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são valorizados para a obtenção da verdade; o estatuto daqueles que têm o encargo de dizer o que funciona como verdadeiro (FOUCAULT, 1979, p. 15-16).

A obtenção da verdade dita pelo autor, na sociedade atual, é valorizada

através de uma ciência reconhecida e tradicionalmente dotada de poder (Foucault

desenvolve esta ideia a partir, entre outras formas, de seus escritos em “Vigiar e

Punir” sobre a psiquiatria) através também de grande carga de informações

transmitidas e reproduzidas pelos veículos de comunicação.

Em consonância a esta ideia da tríade poder-verdade-discurso, não

necessariamente nesta ordem, trago a noção de clichê que é tratada em “A lógica do

sentido” (2006) de Gilles Deleuze e discutida por Firmino e Martins (2017) na relação

que fazem entre este conceito e as imagens de livros didáticos de Geografia.

Deleuze desenvolve a ideia de clichê a partir de sua imersão nas artes de

Francis Bacon, na pintura de quadros. O autor diz que a pintura moderna e a

transição e mudança do sentimento religioso para pinturas que não mais

representam figuras e sentimentos religiosos instaura novos desafios neste contexto,

uma vez que a pintura moderna está sitiada pelas fotografias e “clichês que se

instalam sobre a tela antes mesmo que o pintor comece seu trabalho” (DELEUZE,

2006, p. 6).

Apesar da fotografia não depender inteiramente do pintor tal qual uma pintura

em um quadro, ela não é uma figuração21 do que se vê, mas do que fotógrafo vê.

Acredito que a fotografia possui e reproduz um discurso. Por vezes, crê-se,

perigosamente, que a fotografia reina sobre a visão, que é figurativa, entretanto o

que ocorre é que a visão reina sobre a fotografia. A visão de quem fotografa e do

que é fotografado consiste na fotografia.

Para deixar claro o que é clichê em Bacon para Deleuze (2006), trago as suas

palavras (há de se esclarecer, contudo que o que ele chama de pintor eu faço

21 Figuração, segundo minha interpretação de Bacon, é um decalque, mera representação e reprodução de algo. Ela significa um objeto representado pela pintura ou fotografia, um clichê. Diferente é a forma nas pinturas que remetem à sensação e não ao objeto que se efetua a figuração.

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abranger escritor, poeta, fotógrafo, editor, professor e tantos outros sujeitos que

produzem, reproduzem, criam, constroem algo):

É um erro dizer que o pintor está diante de uma superfície branca. A crença figurativa advém deste engano: de fato, se o pintor estivesse diante de uma superfície branca ela poderia reproduzir um objeto exterior que funcionasse como modelo. Mas não é assim. O pintor tem muita coisa na cabeça, ou a sua volta, ou no atelier. Portanto tudo o que há na sua cabeça ou à sua volta já está na tela, mais ou menos virtualmente, mais ou menos atualmente, antes que ele comece a trabalhar. Tudo isto está presente sobre a tela, enquanto imagens, atuais ou virtuais. Se bem que o pintor não tenha que preencher sua superfície branca, ele terá antes que esvaziá-la, desimpedir, limpar. Ele não pinta para reproduzir sobre a tela um objeto que funcione como modelo, ele pinta sobre as imagens que já estão lá, para produzir uma tela cujo funcionamento vá inverter as relações do modelo e da cópia. Em suma, é preciso definir todos esses ‘dados’ que estão sobre a tela antes que o pintor comece seu trabalho. E entre tais dados, uns são obstáculos, uns uma ajuda, ou mesmo os efeitos de um trabalho preparatório. Em primeiro lugar estão os dados figurativos. A figuração existe, é um fato, ela é mesmo anterior à pintura. Estamos cercados de fotos que são ilustrações, de diários que são narrativas, de imagem-cinema, imagens-tevê. Existem os clichês psíquicos assim como os físicos, percepções já feitas, lembranças, fantasmas. Existe aí uma experiência muito importante para o pintor: toda uma categoria de coisas que podemos chamar de clichês já ocupa a tela antes do começo. É dramático. (DELEUZE, 2006, p. 45)

Na análise que será realizada tomo a categoria do clichê como um importante

alicerce para pensar e movimentar aquilo que se traz como conteúdo e conceito

geográfico. Quais os atravessamentos e enredos que o clichê encobre, deixa

invisível, negligencia através das diferentes linguagens veiculadas no livro didático?

Mais que isto, quais sensações e ideias os clichês veiculam e produzem para as e

nas pessoas? Neste sentido, Firmino e Martins (2017, p. 106) salientam que

Os clichês são conjuntos de informações imagéticas que estão disponíveis na cultura e que nos atravessam. Eles podem ser revelados, por exemplo, em imagens de Livros Didáticos, constituindo nos sujeitos ideias que, por vezes, são difíceis de serem desconstruídas. A questão que nos é interessante [...] e que se relaciona com os clichês está na potência destes em nos enquadrar em um padrão de ideias, paralisando-nos diante das mesmas e impedindo que o nosso pensamento sobre determinado temário se movimente.

Por conjuntos de informações imagéticas entendo as noções prontas,

estabelecidas, internalizadas, que não são alvo de problematização e construção de

novos sentidos e significados. São as primeiras imagens que passam na mente

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quando se fala sobre determinado tema, antes que se possa refletir e questionar o

que mais o constitui.

Cito, então, dois exemplos de clichês, de maneira geral, quando se fala em

Cultura e em Diversidade Cultural. Cultura pode remeter a uma celebração católica

muito difundida entre lugares de colonização açoriana, a festa do Divino Espírito

Santo, em que se estendem bandeirolas entre os postes de iluminação pública pelas

ruas de paralelepípedos, com bandeiras que possuem predominantemente um

símbolo de uma pomba branca. Nesta ocasião, são realizados desfiles com

descendentes de açorianos representando a família real portuguesa.

Já, quando se fala em Diversidade Cultural, uma das primeiras referências

que se faz diz respeito ao reconhecimento da etnia afrodescendente na constituição

cultural brasileira, sua religião entre as crenças que o povo possui, yorubá, com suas

referências e reverencias aos orixás, por exemplo.

Tudo isto constitui uma maneira uniformizada de pensar, uma abordagem

padronizada de ideias que paralisa e impede que o pensamento flua, exerça sua

função e habilidade de liberdade e criatividade.

O ensino de Geografia em que acredito, aquele que se movimenta tanto em

sala de aula quanto por instrumentos e recursos didáticos, como o livro didático,

carrega consigo infinitas possibilidades no processo educativo do pensamento, entre

eles destaco a relação de professores e estudantes com o livro didático na prática

de reconhecimento e problematização das mensagens clichês, veiculadas através

de textos, imagens, músicas, mapas. “Uma geografia que funcione somente

fortalecendo e repetindo imagens-clichês nos faz reprodutores de discursos e

posicionamentos que podem vir a imobilizar nossas possibilidades para com o

espaço geográfico” (FIRMINO; MARTINS, 2017, p. 106). Ou seja, com a ciência

geográfica, no âmbito da Educação, é possível superar não apenas o olhar clichê

sobre o espaço habitado, sobre a sociedade em que se vive, como é possível

reconhecer e superar os discursos fortalecedores e impositivos de clichês, que

carregam consigo inúmeras consequências.

Por último, desejo frisar que em nenhum momento afirmo a pretensão de

excluir o clichê do currículo, do livro didático, das formações, da mente, pois de

acordo com o que foi esboçado anteriormente, não creio em dualismos. Desacredito

que haja um valor intrínseco negativo ou positivo no clichê, afinal, de um modo ou de

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outro, ele permite o deslocamento nos pensamentos e de alguma forma, bagunçá-

los. A questão é que movimentá-los é tão necessário quanto tê-los, pois:

[...] nos utilizamos em um primeiro momento de imagens-clichês, ou sensório-motoras, para que rapidamente possamos responder às demandas do cotidiano acelerado em que vivemos. Assim, na maioria dominante das vezes, o que percebemos do que nos rodeia no mundo são clichês. (FIRMINO; MARTINS, 2017, p. 108)

Busco, então, com a contribuição teórica da noção de clichê e com sua

proposição de alargamento das lentes que promovem o pensamento, analisar por

onde está a Diversidade Cultural nos livros didáticos de Geografia para EJA. Além

disso, a noção de clichê também foi trazida a este trabalho para que fosse possível

desconstruir e construir as categorias que dão suporte teórico a toda minha reflexão

e discussão.

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5. LIVRO DIDÁTICO: INSTRUMENTO, RECURSO E ARTEFATO CULTURAL

Os livros didáticos têm a característica de possuir finalidade educativa. É um

material didático que contém o conteúdo-forma de uma componente curricular

escolar. Seu uso no processo educativo da Educação Básica está relacionado com a

didática da respectiva área curricular e científica (AZAMBUJA, 2017).

Gabrelon e Silva (2017) afirmam que desde a sua concepção pelos autores

deste material até a sua utilização em sala de aula, os LDs se inserem em uma rede

de relações que possibilitam distingui-los de outros livros que são produzidos com

diversas finalidades que não seja alcançar a escola. Penso que tal rede citada pelos

autores é composta por processos como o de se enquadrar em uma perspectiva

exigida por editores que buscam a ampla comercialização deste material, a

produção guiada pelos critérios definidos por políticas educacionais de caráter

nacional, entre diversas outras questões que podem ser pensadas e que lhe

diferenciam de livros voltados ao entretenimento ou outros fins.

O livro didático é um material presente na maior parte das salas de aula

brasileiras. É um instrumento pedagógico, visto que é um objeto utilizado na

atividade educativa. Sendo instrumento, serve para auxiliar na execução da

atividade. Compreendo que este auxilio não se direciona necessariamente para o

professor, mas para qualquer sujeito envolvido no processo educativo.

Ao se pensar no uso do LD enquanto recurso por parte dos professores,

Gabrelon e Silva (2017) afirmam que ele possui potencialidades para que

professores de Geografia estabeleçam relações entre o ensino da ciência, referência

e estudantes. “O professor precisa estar atento ao que pretende alcançar com os

alunos e de que maneira os livros podem potencializar o processo de ensino”

(Gabrelon; Silva, 2017, p. 114).

No processo educativo, os sujeitos podem recorrer a algum recurso em

situação de dificuldade. Entendo que a dificuldade pode surgir em momento dentro

ou fora de sala de aula, por estudantes ou professores. O livro didático aparece

neste contexto como recurso do sujeito para superar algum obstáculo do processo

educativo.

Este instrumento e recurso, denominado livro didático, neste trabalho sob a

abordagem dos Estudos Culturais, analisado sob a metodologia queer, é

reconhecido como artefato cultural, pois é um material produzido por empresas

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privadas a partir de critérios estabelecidos pelo Estado, sendo selecionado e

avaliado por este último. Neste contexto é um artefato cultural e produz discursos,

significados e representações, ou seja, modos de pensar (TONINI, 2002), formas de

compreensão, interpretação e influencia na formação e constituição intelectual e

humana dos seus consumidores.

Nesta parte do trabalho vou dissertar sobre o Programa Nacional do Livro

Didático – PNLD e sobre a relevância deste material no contexto brasileiro. Também

discutirei sobre o livro didático de Geografia, livro didático para a EJA e sua relação

com a Diversidade Cultural.

5.1 PNLD, PNLD EJA

O Programa Nacional do Livro Didático foi criado com esta nomenclatura

oficialmente em 1985, com o fim do regime militar, na transição para a república

democrática, mas tem seus primeiros objetivos traçados já em 1929. De acordo com

Albano (2016), é um dos programas mais antigos na área da educação, mantido

pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, que distribui gratuitamente

livros didáticos para todas as escolas públicas do país cadastradas no censo

escolar:

Em síntese o PNLD abarca outros programas e funciona da seguinte maneira: após serem avaliados os livros são indicados para compor o Guia do Livro Didático. Com a posse deste guia, os professores das escolas públicas fazem as escolhas dos livros que irão trabalhar em sala de aula. Após a escolha, o FNDE negocia o valor dos livros com as respectivas editoras (ALBANO, 2016, p. 24).

As editoras se inscrevem no PNLD e estão sujeitas a aprovação ou não por

especialistas que analisam as obras. A partir daí é produzido o Guia do Livro

Didático para servir de referência e apoio aos professores no momento de escolha

de que coleção solicitarão ao MEC.

O Guia do Livro Didático [...] é um artefato educativo voltado para instruir professores, em atuação nas escolas públicas de todo o Brasil, na escolha de obras didáticas que poderão ser adquiridas e utilizadas para ensinar e aprender Geografia. Também é produto de uma política pública de Estado e, neste sentido, está concatenado com as prerrogativas educativas, curriculares e temáticas da Geografia no Ensino Fundamental. (OLIVEIRA; GIORDANI, 2017, p. 28)

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Os professores de escolas públicas optam por duas coleções, sendo uma a

primeira opção e outra segunda opção para o caso do FNDE não conseguir adquiri-

la. As escolas devem fazer este pedido através do Portal do FNDE, onde solicitam

as duas opções para cada ano e disciplina.

A Coordenação Geral de Materiais Didáticos (COGEAM) é responsável pela avaliação e seleção das obras inscritas no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e no Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), bem como pela elaboração do Guia dos Livros Didáticos voltado a auxiliar o professor na escolha dos livros didáticos. Com relação à compra e à distribuição dos materiais didáticos e literários selecionados pelo Ministério da Educação no âmbito da Secretaria de Educação Básica (SEB), é importante ressaltar que são de responsabilidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), cabendo a este órgão também a logística do provimento e do remanejamento dos materiais didáticos para todas as escolas públicas do país cadastradas no censo escolar. (BRASIL, 2017).

O PNLD EJA segue as mesmas normas e objetivos do PNLD. A diferença

está no fato destes livros didáticos serem produzidos especialmente para a EJA, que

é uma modalidade de ensino da Educação Básica:

O Programa Nacional do Livro Didático para a Educação de Jovens e Adultos (PNLD EJA) distribui livros didáticos para os jovens e adultos das entidades parceiras do Programa Brasil Alfabetizado (PBA) e das redes de ensino da educação básica. (BRASIL, 2017).

Depreendemos alguns aspectos importantes de serem ressaltados sobre a

produção e ampla distribuição de livros didáticos pelo PNLD e PNLD EJA, tais quais:

a democratização do acesso a este material, que chega gratuitamente ao

consumidor final, a possibilidade de escolha da coleção que mais agradar ao

professor, por último, a limitação que estes LDs possuem devido a critérios de

produção estabelecidos pelo Estado, avaliação dos pareceristas e a seleção dos

professores – pela coleção – que é em relação apenas aqueles livros aprovados em

um processo seletivo anterior. Isto significa que a definição do PNLD, sobre o que

deve ser veiculado por este material, qual modo de pensar e qual o discurso

prevalece, é soberana.

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5.2 LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA E A EJA EM QUESTÃO

O livro didático ainda é o recurso mais utilizado pelos professores das escolas

públicas da educação básica. Isto não significa que é utilizado por ter boa qualidade,

na opinião dos professores, mas porque muitas vezes é o único instrumento de

apoio a prática pedagógica. O único recurso com conhecimentos sistematizados,

textos e imagens, teoricamente, adequados para o público consumidor, estudantes e

professores.

Azambuja (2017) diferencia o uso dos livros didáticos pelos professores de

Geografia a partir da abordagem que é dada em sala de aula. No ensino tradicional

de Geografia que se baseia no uso deste material como um manual seguido em sua

integralidade, “o professor repassa para os alunos o conteúdo tal como elaborado no

manual didático. Não há necessidade de ampliar e diversificar os recursos didáticos

e as fontes de informações, as representações e as linguagens” (AZAMBUJA, 2017,

p. 62). De outra forma, acontece na renovação do ensino de Geografia em que as

definições de conteúdo-forma são partes do processo de planejamento e de

realização das atividades. Nesta perspectiva de utilização deste material, o professor

leva em conta a realidade social e histórica dos alunos e da comunidade escolar.

Portanto, o LD perde o caráter de regimento para o de orientação.

O Livro Didático contém o saber da ciência e encaminha a forma escolar de apropriação desse saber. No ensino tradicional o professor adota esse conteúdo-forma para desenvolver suas aulas. Em uma didática renovada, sintonizada com os novos paradigmas de ensinar e apreender, o conteúdo-forma apresentado no Livro Didático precisa ser compreendido enquanto indicações de possibilidades de ensino-aprendizagem. Nessa perspectiva o Livro Didático será um recurso orientador e organizador da educação escolar, ou seja, relativizando a função de ser a fonte e o instrumento de transmissão de conteúdo informativo. (AZAMBUJA, 2017, p.70)

Santos (2011) afirma que os professores, por falta de condições materiais,

financeiras e até mesmo de tempo, utilizam o livro didático também como

metodologia de ensino.

Diante da excessiva carga horária de trabalho que o impede de estudar, planejar as aulas e buscar outras fontes de informação e conhecimento, diante das limitadas condições objetivas materiais/ financeiras que o poder público destina às escolas; diante da ausência de políticas públicas de formação continuada, muitos professores utilizam o livro didático em substituição à metodologia de ensino, como o único recurso/ instrumento

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pedagógico, como a única fonte de consulta e ou fundamentação teórica, e muitas vezes, como o único instrumento de formação continuada. (SANTOS, 2011, p. 45).

Portanto, o livro didático assume um papel central no processo pedagógico. O

que remete não à irresponsabilidade do professor, mas à ausência de políticas

públicas e educacionais que valorizem e favoreçam à docência em sua plenitude. É

fundamental que professores tenham tempo e espaço de trabalho em sala de aula e

também fora dela, para planejamentos, estudos, enfim, para seu aperfeiçoamento

profissional, com condições de buscar outros aparatos pedagógicos para organizar

os planejamentos.

Gabrelon e Silva (2017) relacionam a origem da função referencial do livro

didático no Brasil, tal qual um manual didático, ao século XVIII, quando este material

“era a base para a prática do professor, que, por conta da sua precária formação

teórica, o tinha como um guia de conteúdos e procedimentos” (p. 127).

Estes autores afirmam que o livro didático pode assumir tanto a função

instrumental, quanto documental. Discordo, entretanto quando afirmam que quando

utilizado como um instrumento se torna o único referencial metodológico para a

busca da aprendizagem na escola. Considero que este material como instrumento

pode servir de orientação e apoio juntamente a outros instrumentos que auxiliem o

processo educativo. Já na função documental, sua utilização está relacionada como

“uma opção de ensino, e não uma orientação absoluta como apontamos que seria a

função instrumental.” (GABRELON; SILVA, 2017, p. 128)

A função documental, ou seja, o livro didático enquanto documento é

defendido por Gabrelon e Silva como a melhor maneira de utilização na prática

pedagógica na sociedade contemporânea. Não como um documento prescrito, nem

como uma referência rígida a ser seguida. Para isso, os autores afirmam que o LD

deve ser avaliado e que os professores devem organizar “o diálogo entre o

conhecimento que está no manual escolar e o cotidiano do aluno” (2017, p. 132).

Azambuja (2017) desafia a pensar qual o livro didático é necessário para a

sociedade atual. O autor segue sua reflexão afirmando que as informações estão

disponíveis no meio técnico-científico informacional e os sujeitos podem acessá-las

por diversos meios, geralmente independente da escola. Contudo, a escolaridade

qualifica as pessoas para ir além da informação pela informação, ensina a trabalhar

com as informações fazendo delas conhecimento. Ou seja, o LD deve ser um

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recurso didático para o aluno aprender ou desenvolver a capacidade de

interpretação geográfica da realidade socioespacial.

Por outro lado, é fundamental reconhecermos o papel do professor na relação

entre estudantes e livros didáticos, quando nos referimos a este material e sua

função dentro de sala de aula. Costella (2017) centra sua reflexão na prática

pedagógica do professor que deve ser orientada sempre pelos seus estudantes, a

partir de seus estudantes. Esta autora afirma que, diferente de outras profissões, os

professores não aplicam o que aprenderam, não resolvem problemas e concertam

produtos para devolvê-lo ao cliente, os professores lapidam, pensam, repensam,

constroem e desconstroem o que aprenderam na universidade para ensinar seus

estudantes a aprender. O conteúdo e o conhecimento não são produto do trabalho

docente, mas sim dos estudantes. Neste sentido, “quem vai intermediar as leituras

que compreendem as entrelinhas dos Livros Didáticos são, por excelência, os

professores. A formação dos mesmos deve priorizar o entendimento de alunos, além

do entendimento de conteúdos” (COSTELLA, 2017, p. 180).

Por entrelinhas22, Costella (2017) compreende o invisível, o ausente daquilo

que podemos ver, onde se encontram o despercebido e até mesmo aquilo que

parece fixo, estático, estável. Nas estrelinhas estão a interpretação dos fatos, as

intenções dos discursos e a relação dos conteúdos com os estudantes e seu

cotidiano, seu lugar. Compreendo disso que nas entrelinhas estão as possibilidades

de construção e desconstrução de pensamento.

Quando falo das entrelinhas, penso na maneira de unir o desunido, significar o despercebido e refletir o que aparentemente parece fixo (...) Percebo que a apresentação dos conteúdos sempre se porta da mesma forma. Temos normalmente uma divisão do espaço geográfico com nenhuma ou pouca relação entre os elementos que o compõem. Neste momento nasce a consciência das entrelinhas. (COSTELLA, 2017, p. 179)

22 Costella (2017) também reconhece as imagens do livro didático de geografia como importantes e significativos veículos e portadores de entrelinhas, visto que são cada vez mais comuns de estarem estampadas nas coleções. “Percebemos que estamos vivenciando a visibilidade, os códigos, antes, quase em sua totalidade, premeditados por palavras ou frases, hoje são constituídos por imagens, cada vez mais coloridas, atrativas e convidativas para a leitura do que está posto” (p. 181). Para esta autora, as imagens carregam intencionalidades, e a partir delas “o aluno desenvolve o seu poder de entendimento dos fatos, talvez melhor que se dependesse do próprio texto tradicionalmente escrito. As imagens dos Livros Didáticos também têm voz e, dependendo do professor, pois, podem ter sentidos diversos”. (p. 181).

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A pesquisa de Santos (2007) possui três questões norteadoras: quais são as

escolhas do professor a respeito do livro didático? Como essas escolhas se

relacionam com os processos que compõem o PNLD? Quais os critérios de escolha

definidos pelo professor? A autora demonstra que um dos seus resultados é o fato

de que o livro didático é um dos recursos mais presentes no trabalho em sala de

aula. Isso não significa que seja utilizado por todos os professores, nem que seja o

único recurso, mas é sim, historicamente, um instrumento de trabalho, de estudo,

utilizado pelos professores e estudantes, que tem seu uso independente de

tecnologias e que possui uma carga considerável de informações sistematizadas e

de algum modo relacionadas à maturidade intelectual do sujeito.

A mesma autora constatou através de entrevista com professores que muitas

vezes o livro didático é a única fonte de conhecimento para os estudantes mais

carentes. Portanto, considerando que o Brasil é um país com grande desigualdade

social e econômica, onde existem escolas com um alto nível de tecnologia

disponível e outras em que não há sequer infraestrutura adequada para o processo

educativo, é fundamental pensar o livro didático como um material democrático no

sentido de sua distribuição igualitária. Entretanto, reconheço sua limitação na

promoção de um processo legítimo de educação geográfica. É importante

reconhecer o axioma defendido por tantos autores que trouxe: o livro didático de

Geografia por si só não garante a educação geográfica, mas sim sua utilização em

sala de aula com a mediação dos professores na proposição de reflexões,

problematizações e reconhecimento das entrelinhas.

Em sua dissertação, Marques (2012) afirma que, de modo geral, no Brasil, os

livros didáticos são os únicos recursos que os professores de escolas públicas

possuem como suporte nas aulas. Além desta autora, Santos (2011) confirma a

importância do livro didático:

Compreendemos que o livro didático é um dos elementos centrais do trabalho docente, como também, algumas vezes é o único meio de acesso ao conhecimento e mediação entre ensino e aprendizagem, por parte dos educandos e dos docentes, que neles buscam apoio e consolidação do conhecimento transmitido em suas aulas. (SANTOS, 2011, p. 44)

Inserimos aqui o ensino de Geografia, enquanto campo da Educação que

pode promover, reconhecer, refletir e problematizar diferentes discursos, através de

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diferentes linguagens (textos jornalísticos, imagens, poesias, textos científicos etc.),

veiculados no conteúdo do LD de Geografia.

De acordo com Azambuja (2017) os livros didáticos mais atuais vêm trazendo

uma nova perspectiva no ensino de Geografia, não mais pautado no modo

pedagógico tradicional, mas numa educação geográfica renovada, em que estes

materiais vêm orientar e mediar a práxis pedagógica diminuindo a função

enciclopédica e conteudista. Entretanto, ainda não se apresenta uma significativa

mudança ou, como afirma o autor, “uma ruptura” com as metodologias de ensino. O

conteúdo ali desenvolvido mantém a mesma estrutura de exposição, com as

mesmas referências escalares23 e a mesma estrutura temática24, a essência do

método tradicional do ensino de Geografia permanece o mesmo.

Tonini (2002; 2003) atribui ao livro didático de Geografia o conceito de

artefato cultural, em que através de textos e imagens são forjados discursos, que

entrando em circulação em território nacional, veiculam significados e mensagens

produzidas discursivamente.

O espaço geográfico produzido histórico e culturalmente como objeto de

estudo da ciência geográfica e trabalhado pelo ensino de Geografia sob este viés,

pode ser pensado e caracterizado a partir de diferentes perspectivas e abordagens

e, ainda que nas suas categorias e conceitos se enquadre nos critérios definidos

para composição do LD, este pode transmitir diversas mensagens e significados

culturais de acordo com o discurso que assume.

Anteriormente dissertei sobre a Diversidade Cultural e sua relação com a

EJA. Mas, qual a relação destas com os livros didáticos?

Ao pensar sobre os sujeitos da EJA, automaticamente lembra-se da

diversidade como marco fundamental destes estudantes. O que remete não

somente à característica intrínseca deste grupo, mas como conceito para ser

trabalhado em sala de aula, assim como também é um tema transversal, de acordo

com o que sugere os PCN. Além disso, ressalto que, sendo um tema transversal da

política pública brasileira e um fenômeno social (de acordo com o que foi discutido

23 As referências escalares nos livros didáticos de geografia permanecem as mesmas do ensino de Geografia tradicional: estados, macrorregiões, país, continente. 24 O autor se refere à estrutura temática com relação aos temas geográficos: quadro natural, população e economia, e diz que há algumas inovações, mas a essência é conservada.

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no primeiro capítulo), os discursos que são veiculados através de diferentes

linguagens pelos materiais pedagógicos devem estar a par desta categoria.

O axioma aqui é, portanto, a indispensabilidade da categoria da Diversidade

Cultural nos discursos materializados nas diferentes linguagens veiculadas pelo livro

didático de Geografia para EJA.

A EJA como modalidade de ensino direcionada aos sujeitos que por algum

motivo se evadiram da escola deve ter como um de seus princípios e valores o

respeito e o reconhecimento da diferença entre as pessoas, de acordo com as

possibilidades e oportunidades que tiveram em sua trajetória de vida, estendido isto

a todo o conteúdo do LD.

A Geografia como ciência que estuda o espaço geográfico (e as práticas

contemporâneas de sua produção) deve abordar questões sociais em relação aos

condicionantes naturais, pois estas questões são as principais componentes do seu

objeto de estudo. O sentido da interpretação geográfica do espaço é a sociedade,

são os povos que habitam e vivem no espaço geográfico.

O livro didático como artefato cultural em minha abordagem é passível de

desconstrução, ou seja, a partir da educação geográfica promovida em sala de aula,

é possível que se construa um processo de interpretação, problematização, reflexão

e, desse modo, desconstrução do conhecimento veiculado em discursos que

compõem textos e imagens contidos nos LDs.

Posso afirmar que o livro didático de Geografia, em sua plenitude, compõe-se

com a voz e a visibilidade do estudante, seja este criança, jovem, adulto ou idoso.

Isto porque existe a possibilidade e condição de

[...] estranhamento que os alunos devem ter ao se misturarem com os textos, com os mapas, com as imagens e com os dados enciclopédicos. A Geografia não é somente do outro, ela está falando com cada um de nós em cada um de seus conteúdos, isso não significa que seus ensinamentos façam parte do senso comum, significa que o que está escrito tem a ver com cada um. Não podemos passar pelos textos sem nos reconhecermos, não podemos ficar alheios aos acontecimentos que permeiam a estrutura dos livros. (COSTELLA, 2017, p. 181)

Ou seja, a partir das diferentes linguagens que compõem o LD de Geografia,

os sujeitos reconhecem a si próprios, pensam seu lugar na perspectiva proposta

pelo discurso deste material e pelas entrelinhas das textualidades e imagens

presentes neste recurso didático. A Diversidade Cultural neste sentido, ainda que

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seja omitida ou significada de algum modo pelo discurso presente no LD, pode ser

pensada e problematizada, objetivamente ou não, na práxis pedagógica. Apesar de

haver esta potencialidade e possibilidade, nem todos os professores tiveram uma

formação intelectual e uma postura de crítica e reflexão sob deste material. Por este

motivo considero que as diferentes linguagens presentes nos LD de Geografia

devem veicular a Diversidade Cultural enquanto fenômeno social e humano, onde

todos os sujeitos possam sentir-se inseridos tanto na sociedade quanto no processo

educativo.

A Diversidade Cultural não se resume na diversidade de cor da pele, nem em

representações folclóricas de algumas culturas, como forma de estereotipar a ideia

de cultura, mas sim na verdadeira Diversidade Cultural de um país plural, em termos

de vivências, experiências, gerações, orientações sexuais, identidades de gênero,

sexualidades, religiosidades, práticas esportivas e tantas outras infinidades de

modos de ser, de se expressar e de existir no espaço geográfico.

Não desejo menosprezar a presença de culturas historicamente constituídas

no território brasileiro, como culturas africanas que vieram com os negros

escravizados e foram transformando-se com as influências do Brasil. Do mesmo

modo também as culturas indígenas, alemã, italiana, polonesa, japonesa, açoriana

etc. Quero apenas ampliar a ideia de Diversidade Cultural para além de termos que

englobam as identidades de gênero, de orientação sexual ou da cultura generalista

de todo um continente ou país.

Para representar a educação como uma área de emancipação humana, de

possibilidades de ascensão social, o discurso do Estado e de escolas de uma forma

geral recai sobre a utilização de palavras e expressões que remetem a uma

educação justa e igualitária. Neste caso, a Diversidade Cultural aparece em políticas

educacionais e currículos (Base Nacional Comum Curricular, Parâmetros

Curriculares Nacionais etc.), representando a inclusão de temas na Educação

Básica como Matriz Cultural Africana, indígena, diferentes identidades de gênero,

orientação sexual etc.

Defendo que cada trabalho acadêmico, lei, normativa, diretriz, componente

curricular ou tema transversal, seja claro e objetivo em sua linguagem e temática. Se

pretende referir-se à matriz cultural africana, que assim seja, do mesmo modo que,

se deseja discutir identidades de gênero, que sejam discutidas, sem a equivocada

ideia de que a categoria da Diversidade Cultural dá conta de incluir e explicitar cada

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uma destas ideias. Esta prática, a meu ver, é uma forma de discriminação, ao passo

que quando se fala de cultura europeia a Diversidade Cultural não é evocada.

Portanto, nesta temática tem sido incluídas categorias, lutas, conceitos e matrizes

que deveriam ser valorizadas e respeitas de modo a dar enfoque a elas mesmas e

não as enquadrar na categoria dos marginalizados, como um grupo da qual não seja

necessária distinção, especificidade e atenção.

Assim, penso que o livro didático como instrumento, recurso e artefato cultural

que veicula discursos deve seguir neste viés de compreender e abordar a

Diversidade Cultural como um fenômeno social de que todos fazem parte; e a

diferença entre povos e sujeitos a partir de conceitos como identidade de gênero,

orientação sexual, união bi parental etc. seja tratada de modo específico (ainda que

não explícito com palavras em textos didáticos, mas em imagens que podem

representá-la), sem generalização nem discriminação.

É possível pensar a relação da tríade: livro didático de Geografia, EJA e

Diversidade Cultural a partir da reflexão sobre a concepção do LD como um caminho

pelo qual os sujeitos envolvidos na educação geográfica possam acessar

conhecimentos a partir do estranhamento dos conteúdos veiculados através de

diferentes linguagens e o reconhecimento das entrelinhas. Este processo se dá com

a contínua e dinâmica intervenção do professor em sala de aula. Tal processo deve

considerar as especificidades e particularidades dos estudantes, seus lugares, suas

vozes, seu cotidiano, sua realidade. A EJA, frequentada por sujeitos muito diversos,

representa um grande desafio ao professor, mas representa ainda mais a

potencialidade de uma educação geográfica proporcionada pela pluralidade, pela

experiência, pela vivência do trabalho e dos lugares por onde se vive.

A interpretação e o pensamento sobre o espaço geográfico trazido pelos LDs,

através das entrelinhas dos textos, mapas e imagens, sobre os discursos que

permeiam invisivelmente toda a composição deste material, são a finalidade e a

processualidade da educação geográfica possibilitada e instrumentalizada pelos

livros didáticos de Geografia. Neste sentido, valorizo este material como recurso

didático de apoio e orientação aos sujeitos envolvidos na práxis pedagógica, dentro

e fora de sala de aula.

Este recurso traz a possibilidade de potencializar o processo educativo

concomitante à mediação de professores, além de carregar a característica de, no

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Brasil, ser um material de acesso democrático devido sua produção e circulação

gratuita garantida pelo PNLD.

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6. ANÁLISE DE LIVROS DIDÁTICOS

Este último capítulo é destinado à pesquisa empírica sobre os livros didáticos

de Geografia para EJA. Nele consta a descrição do material analisado, de que modo

foi selecionado e adquirido e a análise do seu conteúdo.

A partir de contatos realizados com a Secretaria da EJA do estado de Santa

Catarina e do município de Florianópolis – SC, obtive acesso a três coleções de

livros didáticos de Geografia para EJA, como se pode observar na tabela a seguir.

Quadro 1 – Coleções de livros didáticos trabalhadas na pesquisa empírica

Editora Título Editora responsável

Componente curricular – segmento

PNLD/ANO

Ática

Saberes da vida, saberes da escola: Educação de Jovens e Adultos

Kátia Trovato Teixeira

Geografia - Anos finais do ensino fundamental

PNLD EJA/ 2014-2015-2016

Moderna EJA Moderna Virginia Aoki Geografia- Anos finais do ensino fundamental

PNLD EJA/ 2014-2015-2016

Positivo Alcance EJA Silvana Grittem Geografia- Anos finais do ensino fundamental

PNLD EJA/ 2014-2015-2016

Fonte: Elaborado pela autora, 2018

As três coleções descritas no Quadro 1 constituem-se de livros destinados

aos anos finais do ensino fundamental da EJA. Entretanto, a coleção “Saberes da

vida, Saberes da escola” possui quatro livros onde cada um é dedicado a um ano

dos anos finais do ensino fundamental, enquanto as demais coleções possuem

apenas um livro, sendo que dentro dele há uma divisão entre os quatro anos.

As coleções que serão analisadas são caracterizadas em primeira instância

por alguns elementos que ressalto:

a) A “EJA Moderna” e “Alcance EJA” possuem um único livro do componente

curricular Geografia destinado aos anos finais do ensino fundamental, ou seja, um

único volume para sexto, sétimo, oitavo e nono ano do ensino fundamental.

b) A “Saberes da vida, saberes da escola” é composta por quatro livros

destinados a cada ano dos anos finais do ensino fundamental, onde em cada um

encontram-se todos os componentes curriculares, ou seja, Língua Portuguesa,

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Matemática, História, Geografia, Ciências, Arte, Língua estrangeira (Inglês e

Espanhol).

c) O total de páginas da “EJA Moderna” na componente Geografia é:

trezentas e vinte (222). Já a “Alcance EJA” possui duzentas e quarenta e oito (248).

A “Saberes da vida, saberes da escola” soma duzentas e oito (208) páginas

divididas em quatro livros de cada ano dos anos finais do ensino fundamental que

por sua vez são divididos em módulos, que são divididos em capítulos de cada

componente curricular.

d) O exemplar da “EJA Moderna” a que obtive acesso é o manual do

educador, em que o que lhe diferencia do exemplar para os estudantes é o fato de

que existe um capítulo final destinado ao professor, com orientações sobre a história

da EJA, o papel dos professores de EJA, avaliação para este público, bem como

orientações gerais sobre o ensino de Geografia no Brasil, na EJA etc. O total de

páginas, somada esta parte final destinada aos professores, é de trezentas e vinte

(320) páginas.

e) A capa de cada coleção consta nas seguintes ilustrações (Figuras 1 a 6):

Figura 1 – Capa do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 6º Ano

Fonte: TEIXEIRA, 2013a

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Figura 2 – Capa do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 7º Ano

Fonte: TEIXEIRA, 2013b

Figura 3 – Capa do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 8º Ano

Fonte: TEIXEIRA, 2013c

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Figura 4 – Capa do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 9º Ano

Fonte: TEIXEIRA, 2013d

Figura 5 – Capa do livro didático de “EJA Moderna: Geografia”

Fonte: EDITORA MODERNA (Org.), 2013

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Figura 6 – Capa do livro didático de Geografia “Alcance EJA”

Fonte: GRITTEM, S., 2013

É possível observar além das diferenças gráficas, cores, formas geométricas

distribuídas pela página etc., as imagens representando pessoas adultas em

situação de trabalho e estudo na “EJA Moderna”, enquanto na “Alcance EJA” é

possível ver apenas uma imagem, em maior dimensão, ocupando mais de metade

da capa, de uma pessoa do sexo masculino trabalhando em uma máquina agrícola e

fazendo uso de um aparelho celular.

Na “Saberes da vida, saberes da escola” de 6º Ano constam quatro imagens

em menor tamanho, em comparação as demais coleções, que juntas não somam

metade da extensão da capa, tais imagens não refletem tão objetivamente

movimentos de pessoas em comparação às capas dos livros já descritos. Neste é

possível identificar partes de espaços como uma casa, pois se identifica uma

porcentagem de janela, outro parece mostrar um vidro ou uma lente com gotas de

chuva em um ambiente de difícil identificação, mas que em imaginação posso

afirmar ser uma cidade arborizada. As outras duas pequenas imagens representam,

aparentemente, perspectivas diferentes, uma de cima para baixo em uma escada

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que possui formato de caracol, e a outra de baixo para cima uma pessoa de coque

em um ambiente circense.

Na “Saberes da vida, saberes da escola” de 7º Ano constam quatro imagens

do mesmo formato, que envolvem temáticas de arte, em uma imagem de pincéis

suspensos coloridos de tinta azul, verde, laranja e vermelho. Em outra imagem

apresenta-se o que se assemelha a um quadro com formas geométricas e simétricas

coloridas em sua borda, e em seu centro linhas retilíneas e curvas formando

pequenos quadrados desenhados com fundo preto. O quadro também parece ser

uma janela. A terceira imagem mostra parte do corpo de uma pessoa de pele negra

sentada com o braço apoiado em uma das pernas, vestindo um chinelo colorido

sobre um barco bem pintado por dentro. Por último, uma imagem de semicírculos

paralelos, que não mostram cores vivas, nem pessoas, nem sua totalidade para o

observador compreender do que se trata.

Na coleção do 8º ano da “Saberes da vida, saberes da escola”, a mesma

quantidade de imagens em distribuição e tamanho semelhante aos anteriores

mostra parte de uma janela de cozinha com a perspectiva do interior do local com

luminosidade que se assemelha à noite ou mesmo ao pôr do sol. Em outra, arrisco-

me a afirmar que observo uma escada com um objeto no segundo degrau. Na

terceira imagem noto vasos de cerâmica com detalhes de artesanato indígena. Na

última, e maior entre todas deste livro, uma pessoa de pé em um trapézio circense.

No último livro da coleção, destinado ao 9º ano, mantém-se o padrão dos

anteriores. A imagem de parte da janela colorida contrasta-se com a parte de um

ambiente que parece ser um barco com várias redes de descanso coloridas. Ao

lado, noto uma parede bagunçada repleta de porta-retratos em preto e branco,

algumas até sobrepostas. Por último, a imagem do que me parece uma pessoa

garimpando em um rio de uma cidade ao fundo bem iluminada.

6.1 ANÁLISES DA COLEÇÃO “SABERES DA VIDA, SABERES DA ESCOLA”

Após a observação e descrição da capa da Coleção “Saberes da vida,

saberes da escola” e tendo como parâmetro as demais capas das coleções desta

pesquisa, reconheço que as imagens trazidas não sugerem a figura clichê do

estudante da EJA trazida pelas capas dos livros didáticos “EJA Moderna” e “Alcance

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EJA”. Do mesmo modo que o próprio título do livro não contém o desígnio “EJA”

como os outros possuem.

As imagens que se assemelham a fotografias remontam a pensamentos,

ideias, como se sugerissem um devir, uma noção que surge a partir da interpretação

de cada um: “Para entender como alguém lê é necessário saber como são seus

olhos e qual é sua visão de mundo. Isso faz da leitura sempre uma releitura. A

cabeça pensa a partir de onde os pés pisam” (BOFF, 2017, p. 13). Ou seja, longe de

caracterizar uma imagem como melhor ou pior que outra, percebo que estas

imagens se diferem das demais coleções no sentido de não escancarar um perfil de

estudante de EJA já delineado. As imagens em questão permitem um maior

movimento do pensamento, da interpretação, da leitura do que se enxerga.

Nas figuras a seguir consta o sumário de cada um dos livros didáticos da

coleção que estou analisando. É importante notar que o sumário contém todas as

componentes curriculares, mas me aterei somente à Geografia no que tange nossa

busca pela Diversidade Cultural.

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Figura 7 – Sumário do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 6º Ano.

Fonte: TEIXEIRA, K., 2013a, p. 6-7

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Figura 8 – Sumário do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 7º Ano

Fonte: TEIXEIRA, 2013b, p. 6-7

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Figura 9 – Sumário do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 8º Ano

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 6-7

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Figura 10 – Sumário do livro didático “Saberes da vida, Saberes da escola”, 9º Ano

Fonte: TEIXEIRA, 2013d, p. 6-7

É possível notar que os módulos que aglomeram os conteúdos são comuns

para todas as componentes curriculares. Cada livro didático desta coleção possui

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dois módulos e um último capítulo que resume e estabelece relações com o que

denomina a editora de “Costurando Conhecimentos”. Nesta parte do livro duas

páginas apenas são destinadas a esta finalidade para cada componente curricular.

Inicio a análise com foco apenas no que considero relevante à categoria da

Diversidade Cultural. Desse modo discutirei a respeito de recortes dos conteúdos

contidos nos livros que compõem a coleção “Saberes da vida, Saberes da escola”.

Sendo assim, parto do primeiro módulo do livro didático do sexto ano no

conteúdo que se dedica à Geografia, que por sua vez está dividida em três

capítulos. O primeiro capítulo intitula-se “Este aqui é o meu lugar” e logo se inicia

com um texto em forma de narrativa sobre a infância da autora, ela relembra do

lugar em que nasceu e que brincava, sua relação com Cora Coralina. É relevante

ressaltar que neste texto o que prevalece não são descrições do lugar, mas

principalmente suas lembranças e pensamentos. Logo, acredito ser importante

considerar a perspectiva de Geografia meramente enciclopédica, superada, neste

livro.

Nas páginas que seguem encontro perguntas destinadas ao leitor/estudante,

incentivando a lembrança da própria história, lugares, pessoas e memórias. Neste

fluxo, o livro traz uma breve biografia de Cora Coralina, escritora, poetiza, contadora

de histórias, brasileira, reconhecida por seu trabalho em tempos de invisibilidade

feminina. Além disso, o livro também traz um de seus poemas, “Velho sobrado”, e,

numa fotografia de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, Cora Coralina, com sua

data de nascimento e morte (1889-1985).

É a partir desta fotografia, e de outra que mostra sua casa, a Casa da Ponte,

atual museu em Goiás, que é introduzido o conceito de lugar, trazendo com ele o

elemento da subjetividade, englobando nesta categoria todos os seres humanos.

Com uma contínua lógica na ideia de desenvolver o conceito de lugar, envolvendo a

história de cada estudante com a categoria, e trazendo como exemplo uma

personalidade brasileira de sucesso, o livro busca iniciar a ciência geográfica com

foco na vida do leitor, do usuário do LD, o que permite associar à pedagogia de

Paulo Freire. Considero esta abordagem adequada quando se pensa em promover a

educação geográfica.

As páginas que seguem vão mostrando bastante interatividade e

heterogeneidade no que se refere às linguagens utilizadas pelo LD. Encontro

perguntas e provocações ao leitor, sugestões de sites de navegação pela internet,

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orientação para visualização de fotografias trazidas pelo LD com a finalidade de se

fazer comparações entre uma imagem antiga e outra atual.

No desenvolvimento da questão trabalhada neste conteúdo, é inserida a

discussão sobre as relações de poder impostas nos lugares e dentro disto são

apresentados um texto e uma proposta de reflexão sobre o futebol. Mais fotografias

aéreas de cidades em outros tempos e atualmente são apresentadas, antes foi de

Belo Horizonte – MG e neste momento é da cidade de São Paulo – SP. É

compreensível daí a noção do lugar para a de país, Brasil, brasilidade, futebol. Neste

momento é trazida uma imagem, o quadro de Candido Portinari, “Futebol” de 1935.

Figura 11 – Quadro de Candido Portinari, Futebol (1935)

Fonte: TEIXEIRA, 2013a, p.109

A imagem e o texto remetem a mensagem que o livro pretende comunicar de

que o futebol marca a identidade do Brasil, o que consideramos a reafirmação de um

antigo e bem assentado clichê. Junto a toda esta discussão é mostrada a noção de

que o futebol, como muitas outras práticas brasileiras, não é algo natural deste país

ou de outro, mas uma construção história, cultural e repleta de relações de poder

envolvidas.

O capítulo encerra com sugestões de livro, filme e música, mas não discute

nem desenvolve seu conteúdo em relação às discussões trazidas. Considero que

seria importante uma maior interdisciplinaridade com as diferentes linguagens

propostas nesta parte final do primeiro capítulo. Apesar deste posicionamento,

encontro no livro poemas, textos narrativos, imagem de pintura, fotografia aérea e

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uma fotografia de Cora Coralina. Entre eles havia conexão do conceito trabalhado, o

de lugar e sua dinâmica com as relações de poder que lhe constituem.

Nas entrelinhas destas ideias com relação a análise do livro de Geografia do

6º ano posso destacar o que relaciono com a categoria Diversidade Cultural:

a) O fato de ter sido trabalhado em todo momento o lugar do estudante,

sendo proposto o pensamento sobre as memórias relacionadas aos lugares de

infância, as pessoas e as paisagens demonstram um valor que a educação

geográfica prioriza: a valorização de todas as culturas, o reconhecimento das

relações de poder que constituem o espaço e a desnaturalização das qualidades

históricas e culturais dos povos.

b) A valorização da escritora brasileira Cora Coralina e sua produção, bem

como do artista plástico Candido Portinari vem recuperar a autoestima e o

protagonismo de um país que recorrentemente vê-se inferiorizado em comparação a

grandes potências mundiais.

c) A quase ausência de fotografias e imagens que representam pessoas

podem mostrar que não há um perfil de sujeito que possui suas relações de

afetividade e vivência com o lugar e, outro perfil, que o livro didático não mostra, não

possui.

d) Tudo que foi tratado sobre espaço e vidas que habitam os lugares foram

brasileiros: Goiás, Minas Gerais e São Paulo.

O segundo capítulo do mesmo módulo no componente curricular Geografia

denomina-se “Por onde passamos” e trata de migrações. Ressalto nesta parte a

presença de fotografias que fazem referência à construção e inauguração de Brasília

e de mapas que indicam os fluxos migratórios e a concentração demográfica

brasileira.

A abordagem feita pelo livro didático do 6º ano neste segundo capítulo é

superficial, trazendo inicialmente fotografias (Figuras 12 e 13) de homens

trabalhadores25 conhecidos como candangos na construção de Brasília e

apresentando uma resumida e breve história da criação da capital federal. Algumas

questões são sugeridas para discussão, como, por exemplo, a origem dos

estudantes e se já migraram. Os mapas, por sua vez, representam de modo muito

tradicional a densidade demográfica sem discutir e aprofundar as questões

25 As únicas fotografias deste capítulo destinado ao tema “migrações” apresentam somente homens.

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relacionadas a este tema. Por último neste capítulo é apresentado o êxodo rural

brasileiro ocorrido no século passado.

Figura 12 – Homens trabalhadores na construção de Brasília

Fonte: TEIXEIRA, 2013a, p. 111

Figura 13 – Homens trabalhadores se encaminhando para construção de Brasília

Fonte: TEIXEIRA, 2013a, p. 111

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Destaco a importância de que este assunto seja tratado de modo a dar

visibilidade aos diversos sujeitos e grupos de pessoas que participaram de

importantes fluxos migratórios e que até os dias de hoje se deslocam por diversos

fatores. Uma importante questão a ser tratada aqui é a constituição étnica brasileira,

composta por uma histórica e muitas vezes impositiva migração. Lidar com esta

temática, fazendo referência somente ao êxodo rural, pode significar certa

negligência e distanciamento do tema com o cotidiano.

O segundo capítulo do livro do 6º ano encerra-se do mesmo modo que todos

os capítulos do livro: com um quadro intitulado “Saiba +”, em que se encontram

sugestões de músicas, livros, filmes e páginas de internet que se relacionam com o

assunto que foi discutido. Neste caso, é sugerido conhecer as músicas “Saudade de

minha terra”, de Belmonte e Amaraí, e “Último pau de arara”, de Fagner. O livro é

“Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, e o site é “Portal Brasil”.

O capítulo 3 do mesmo livro e do mesmo módulo intitula-se “Campo e cidade”

e trata das diferenças entre ambos no que se refere às atividades desenvolvidas

nestes espaços e suas paisagens. Na parte final, entretanto, traz a íntima relação

entre campo e cidade.

Basicamente são trazidas imagens de paisagens clichês do que é pensado

sobre campo e cidade. Também são apresentadas letras de músicas como “Mágoa

de boiadeiro”, de Índio Vago e Nonô Basílio. A partir das fotografias e músicas são

propostas algumas questões aos estudantes e professores, por exemplo, para

interpretar quais sentimentos se revelam na canção, onde vive o boiadeiro etc. Em

relação às imagens, são propostas questões sobre como foi feita a foto

(verticalmente, de frente, de perto, longe...), quais elementos se observa nas

paisagens, como é a vida das pessoas que ali habitam etc.

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Figura 14 – Letra da música “Mágoa de boiadeiro”

Fonte: TEIXEIRA, 2013a, p. 117

Figura 15 – Fotografia do campo.

Fonte: TEIXEIRA, 2013a, p. 118

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Figura 16 – Fotografia da cidade

Fonte: TEIXEIRA, 2013a, p. 121

É notório que não há em todo este capítulo pessoas representadas em

imagens, apesar de que em todo o tempo seja feita referência à atividade humana

no campo e na cidade e aos distintos modos de vida de quem habita cada um

destes espaços.

A Diversidade Cultural pensada neste trabalho não está bem elaborada na

abordagem realizada por este livro didático nesta temática específica, pois acredito

que dentro do campo e dentro da cidade existe uma grande variedade de modos de

viver, existe uma grande diversidade de pessoas que habitam estes lugares e

poderiam ser mais bem esboçados neste capítulo. Observo, entretanto, que a

canção trazida na última página da Geografia deste módulo apresenta muito

claramente a noção de Diversidade Cultural, mas que a coleção estudada a

relaciona ao meio urbano tão somente.

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Figura 17 – Canção “A cidade”, de Chico Science

Fonte: TEIXEIRA, 2013a, p. 152

No módulo 2 a Geografia trabalhada refere-se à orientação, cartografia e

coordenadas geográficas. Percebo que na parte que se dedica a um apanhado

histórico sobre orientação e cartografia são trazidas imagens relacionadas a

orientação tendo como referência o sol e demais astros. Mais uma vez uma das

poucas imagens com pessoas mostra apenas um homem.

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Figura 18 – Homem em seu relógio solar

Fonte: TEIXEIRA, 2013a, p. 306

As formas de representar a Terra são todas através de mapas de projeções

com o tradicional norte para cima, sul para baixo (Projeção de Mercator e de Peters),

sem qualquer referência à possibilidade de legitimidade de outra forma de projetar a

representação dos continentes, já que uma das formas mais curiosas em

representar a Terra, segundo o livro, é a projeção de Peters.

Existe um conhecido mapa que considero relevante ser apresentado e

discutido em sala de aula, ainda que não seja o único, mas algo semelhante a ele,

devido a sua perspectiva e abordagem legítimas, mas que não costumam ser

exploradas pela Geografia escolar, em decorrência, acredito, de um discurso

construído historicamente em que a verdade estabelecida sobre a representação da

Terra diz respeito a um único modelo.

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Figura 19 – Mapa de Torres Garcia

Fonte: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4507/pt. Acesso em: 6 jan. 2018.

Na página 317 do livro do 6º ano (TEIXEIRA, 2013a) são propostas uma série

de questões para pensar e exercitar, utilizando como apoio um globo terrestre,

exemplo de uma atividade destas é: “Localize alguns países do hemisfério norte,

localize a linha do equador e a do meridiano de Greenwich, etc.” (TEIXEIRA, 2013ª,

p. 316). Ao lado destas questões existe uma fotografia de cinco pessoas observando

um globo terrestre.

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Figura 19 – Jovens observando um globo terrestre

Fonte: TEIXEIRA, 2013a, p. 317

É notório que no centro da imagem, em posição de destaque, uma jovem

negra, de cabelos curtos, segura um globo terrestre, enquanto dois jovens de cada

um de seus lados observam o mesmo objeto. Um dos sujeitos é do sexo masculino,

branco de cabelos curtos, enquanto as outras três pessoas são do sexo feminino,

brancas, de cabelos compridos e lisos. Existe um padrão que representa a maior

parte da fotografia, que são pessoas brancas, meninas de cabelos compridos e lisos

e rapaz de cabelo curto. Enquanto a jovem que segura o globo no centro da figura é

negra e de cabelos curtos.

Podemos afirmar que em boa parte do livro até aqui analisado há poucas

pessoas sendo representadas por fotografias, enquanto a maior parte das

ilustrações são paisagens, mapas, textos, poemas etc. A maior parte das fotografias

representam homens e a última fotografia deste livro é uma imagem de cinco

pessoas, onde apenas uma delas faz parte da majoritária constituição étnica

brasileira.

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Ao centrar a análise no objeto da fotografia (Figura 19) que é o globo

terrestre, alvo do tema do texto que contém a imagem, é possível notar que as

pessoas estão observando o globo na posição norte para cima/sul para baixo e os

continentes que são vistos pelos sujeitos são aqueles opostos às Américas, e no

hemisfério Norte. Além disso, as feições e reações à observação parecem de

indiferença, seriedade, até mesmo apatia.

Posso afirmar que tal imagem não apresenta relevância às questões que são

trazidas no texto. Também não traz consigo possibilidades e potencialidades no

desenvolvimento do conteúdo a qual o capítulo se destina a trabalhar.

O livro didático equivalente ao 7º ano da Coleção “Saberes da vida, Saberes

da escola”, no que se refere à Geografia, inicia com o módulo “Igual e diferente –

Cidadão!”, pelo capítulo “Brasil: configuração do território”. Seu desenvolvimento

consiste em um pouco de história do Brasil a partir da colonização portuguesa,

trazendo mapas que representam a configuração das capitanias hereditárias até os

atuais estados que compõem o território nacional.

O primeiro capítulo deste segundo livro (7º ano) traz apenas metade de uma

página destinada à abordagem da presença dos indígenas no território brasileiro

anterior aos portugueses e à escravização e dizimação dos índios após sua invasão.

Menos ainda se fala sobre a escravização de negros africanos no Brasil. Entretanto,

no próximo capítulo é que serão problematizadas questões sociais e de constituição

étnica e cultural brasileira.

O capítulo 2 intitula-se “Brasil: um país feito por gente” e logo nos primeiros

parágrafos encontro o objetivo do conteúdo que será abordado: conhecer a

população do país. Desse modo, na primeira página é trazida a letra de uma música

de Gabriel, o Pensador, chamada de “Racismo é burrice”.

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Figura 20 – Letra da canção “Racismo é burrice”, de Gabriel, o Pensador.

Fonte: TEIXEIRA, 2013b, p. 121

A música, como uma linguagem que significa mensagens e discursos, pode

ser um importante recurso no processo educativo, visto que este modo de expressão

movimenta outras formas de pensamento, reflexão e compreensão.

É possível afirmar que a Diversidade Cultural a partir da reflexão teórica que

antecedeu à pesquisa empírica engloba mais que o respeito a outra etnia, mas a

discussão e reflexão sobre o racismo está inclusa na pauta desta categoria e é

fundamental estar presente no material didático da Geografia para EJA.

No mesmo capítulo são tratados temas como taxa de natalidade e

mortalidade, pirâmide etária, enquanto assuntos que compõem o currículo deste

segmento. Mas logo após os gráficos e textos explicativos destes conteúdos vem

uma série de problematizações em forma de pequenos textos e questões para

serem discutidas em grupo sobre a questão do “ser idoso”. A importância dos idosos

para a sociedade, os desafios que esta parcela da população enfrenta

cotidianamente, suas dificuldades etc.

Efetuando uma linha de relações com todo este conteúdo, inicio a

problematização sobre as mulheres no mercado de trabalho, bem como as

influências que a taxa de fecundidade têm sobre a mulher trabalhadora. Junto a

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gráficos e textos explicativos há uma imagem de mulheres trabalhando em uma

linha de produção industrial com os seguintes dizeres:

Pilota comercial, presidenta, senadora, mecânica de automóvel, agente de saúde. Embora seu leque profissional tenha aumentado nos últimos quarenta anos, as mulheres brasileiras ganham menos do que os homens, independentemente do setor de atividade. Há uma minoria delas com melhores salários e em ocupações de prestígio social. (TEIXEIRA, 2013b, p. 125).

Figura 21 – Mulheres trabalhadoras

Fonte: TEIXEIRA, 2013b, p.125

Ao final deste segundo capítulo encontro a sugestão da leitura de três livros

que possuem relação com o conteúdo trabalhado, entretanto, não há qualquer

discussão ou aprofundamento de tais obras, são apenas sugestões ao leitor que se

interesse pelo assunto. Os três livros são: Contos indígenas brasileiros, de Daniel

Munduruku (2004), Para entender o negro no Brasil de hoje, de Kabengele Munanga

e Nilma Lino Gomes (2006), e por último Anarquistas graças a Deus, de Zélia Gattai

(2009).

O último capítulo do primeiro módulo (“Igual e Diferente – Cidadão”) chama-se

“Brasil multicultural”. Logo nos primeiros parágrafos encontro a Diversidade Cultural

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sendo retratada explicitamente em palavras. Resta verificar nas páginas que

compõem o capítulo 3 se esta Diversidade Cultural é abordada como um conceito

clichê em que poucos pensamentos conseguem ser movimentados ou se existe um

aprofundamento nos enredos que se instalam nesta categoria:

Ao longo de cinco séculos de história, a população brasileira constituiu-se de uma miscigenação de povos que não moldou apenas as nossas características físicas. No Brasil, também são misturadas e complexas a sociedade e a cultura. [...] Neste capítulo você vai compreender melhor a extraordinária mistura de raças e de culturas que diferencia o nosso país dos demais países do mundo (TEIXEIRA, 2013b, p. 127).

Figura 22 – Letra da canção “Inclassificáveis”, de Arnaldo Antunes.

Fonte: TEIXEIRA, 2013b, p. 127

É possível perceber que tanto a letra da música quanto a imagem que segue

a seu lado carregam uma noção de cultura, de constituição cultural da população

brasileira muito ligadas à superficialidade da denominação e abrangência de etnias e

grupos em suas características físicas e expressões enquanto coletividade. Noto

que muito se faz referência a cor da pele e características físicas que se carrega em

decorrência da origem e da miscigenação que acontece. A cultura não é retratada

aqui como expressão e processo de construção e desconstrução cotidiana e

individual, ainda que só ocorra em dinamicidade na coletividade.

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Ao final do módulo 1, para todas as componentes curriculares, há um

encerramento de cada disciplina em duas páginas em tom de considerações finais

interdisciplinares, bem como uma introdução para o que será retratado no próximo

módulo. Neste caso é trazida uma abordagem das três grandes etnias que

constituem e produzem a população brasileira: povos indígenas, negros e brancos:

Diversidade é a marca da gente que vive no Brasil. A diversidade de cores, fisionomias, tradições e costumes atesta a riqueza da população do nosso território que se constituiu da miscigenação de três principais grupos étnicos: o indígena, o negro e o branco (TEIXEIRA, 2013b, p. 128).

O capítulo 1 do módulo 2, “Tenho direitos, tenho deveres”, do livro do 7º ano,

trata sobre industrialização e urbanização brasileira. Ele não apresenta qualquer

mudança no padrão de abordagem dos conteúdos trazidos até aqui. Encontro

tabelas, mapas, textos explicativos, e uma imagem de obra de arte que representa o

período de crescimento e intensificação da industrialização nas cidades brasileiras e

uma fotografia (Figura 23) pouco nítida de mulheres trabalhando em uma malharia

na cidade de São Paulo na década de 1910. É possível notar que na legenda feita

pelo LD não há referência às pessoas que estão trabalhando representadas na

imagem, nem mesmo as condições de trabalho e sobrevivência, mas à empresa e

sua grandeza nas décadas seguintes à da foto.

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Figura 23 – Mulheres trabalhando em malharia na década de 1910

Fonte: TEIXEIRA, 2013b, p. 309

Em todo este primeiro capítulo não há qualquer discussão voltada aos modos

de vida impactados pelo processo de industrialização. Não se faz referência à

agricultura familiar, à vida no campo, à grande tragédia que foi para milhares de

pessoas a mecanização no campo e o advento da monocultura em latifúndios, às

dificuldades vividas nas migrações para as cidades ocorridas no êxodo rural, às

origens de uma série de problemas urbanos atuais etc. A urbanização e a

industrialização foram retratadas em cerca de seis páginas de maneira enciclopédica

e conteudista. Tal forma de retratar o assunto, posso considera-la insuficiente e

desmotivadora se pensada de modo geral ao público para o qual se destina.

De acordo com Arroyo (2006), que discute sobre EJA, é um problema pensar

no currículo da EJA como uma forma reduzida do currículo do Ensino Fundamental

e Médio, pois além de todas as especificidades exigidas de um público diferente em

vários aspectos, é sabido que o modelo escolar vigente não tem logrado êxito em

sua função educativa. Por este motivo, e em relação ao que pensa Arroyo, considero

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que a maneira pela qual foi abordado o conteúdo de industrialização e urbanização,

não seria possível um estudo do LD pelos estudantes fora de sala de aula que

assegurasse um efetivo processo educativo, ou seja, uma leitura e pensamento

acerca do que traz este material que superem a mera função enciclopédica. Além

disso, em situações precárias, em que professores se utilizam do livro didático como

única fonte de conhecimento, metodologia e recurso didático, o processo de

educação geográfica estaria corrompido.

Acredito que seria necessária uma revisão e qualificação do conteúdo

“urbanização e industrialização”, com a finalidade de estender o assunto,

desenvolvendo melhor um pouco de cada desdobramento da industrialização nas

culturas presentes no país, ou, optar-se pela realização de um recorte do tema,

retratando somente parte dele, mas desenvolvendo seus aspectos sociais,

econômicos, históricos etc. Penso desta forma, pois a Cultura e a Diversidade

Cultural estão intimamente ligadas a este período histórico, a este processo

geográfico, que impactou sobremaneira a sociedade. Esta temática possui uma

infinidade de assuntos relacionados ao espaço geográfico e a construção do

pensamento geográfico, de pontos que tocam na vida de cada estudante, de cada

professor, de cada sujeito. Tratar este assunto de forma superficial e enciclopédica

significa desprezar uma importante potencialidade na educação geográfica,

sobretudo na EJA.

Os capítulos 2 e 3 do módulo 2 do livro do 7º ano tratam dos Biomas do Brasil

e das paisagens regionais, mas no que tange à relação dos mesmos com a vida

humana e cotidiana do povo brasileiro pouco se explora, limitando-se a um mapa do

desmatamento, com poucas palavras do que isto interfere para a população. É feita

muito mais uma relação com a paisagem e com a ideia de que o Brasil possui

diferentes paisagens em sua extensão territorial devido aos biomas do que de que

modo a população se relaciona cotidianamente e se adapta, se molda aos biomas e

paisagens.

No capítulo 3 se dá destaque à região Nordeste do Brasil (texto, fotografias,

mapa na Figura 24), tanto no aspecto histórico de sua exploração, quanto em

aspectos sociais e culturais em cerca de três páginas, enquanto outras regiões

ocupam menos de duas. Considero que nesta parte do livro (7º ano), intitulada

“Brasil: paisagens regionais”, deveria ser desenvolvida de maneira mais ou menos

regular todas as macrorregiões visto que as coleções de LD aprovadas pelo PNLD

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são encaminhadas para todo país e seria justo cada usuário e leitor deste material

conhecer de maneira didática as paisagens e características brasileiras.

Figura 24 – Sobre o Nordeste brasileiro

Fonte: TEIXEIRA, 2013b, p. 333

É possível perceber que tanto nesta página quanto nos outros conteúdos

apresentados na análise, a concepção de Cultura permanece a mesma. Ainda posso

afirmar que nas imagens existe a prevalência de pessoas do sexo masculino, ora

dentro dos padrões sociais, ora com vestimentas e características representativas

de alguma etnia (indígena) ou trajes folclóricos como na Figura 24, acima.

A mensagem implícita assimilada, entre muitas outras, é de que a cultura é

uma instância em que a atuação se limita à reprodução humana. Considero que o

que foi trazido sobre a mulher e o mercado de trabalho, os indígenas e negros, faz

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parte de uma relevante discussão na esfera da Diversidade Cultural, mas não

representa a larga gama de possibilidades e elementos que a constituem e que

acredito importante ser trazido neste material.

Parto então para a análise do livro didático equivalente ao 8º Ano, que se

inicia pelo capítulo 1 do módulo “Trabalho e Identidade”, com o assunto “Europa e

Ásia: descobrindo as paisagens”. Logo na primeira página é exposto um mapa-

múndi em projeção tradicional com imagens-clichês de cada continente:

Figura 25 – Mapa-múndi de imagens-clichês

Fonte: TEIXEIRA, 2013b, p. 108

O capítulo apesar de se intitular “Europa e Ásia: descobrindo paisagens” não

traz nenhuma fotografia nem pintura representativas destes continentes, apenas

mapas e textos que falam sobre as placas tectônicas e seus movimentos, o número

de países que os constitui, o número aproximado de sua população, caracterização

do relevo e rios. É feita uma relação entre a localização geográfica destes

continentes na Terra com sua história de dominação e influência econômica e

militar.

O capítulo 2, de modo semelhante ao anterior, busca estudar as paisagens da

África, Oceania e Antártida e inicia-se com a discussão sobre a composição de

diversos países no continente africano, que é visto por muitas pessoas como um

lugar homogêneo, sem diversidade de paisagens, de etnias etc. Noto neste quesito

certa contrariedade do próprio livro onde no mapa-múndi da Figura 25 traz imagens

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da África que vai de encontro a este pensamento raso com relação à constituição

africana.

Através de textos explicativos e mapas o LD problematiza a superficialidade

com que a África é tratada. Apresenta um pouco da história de exploração que

diversos países sofreram, bem como seu desenvolvimento, sua tecnologia, suas

riquezas naturais, suas áreas de maior fragilidade atualmente etc. Neste quesito

noto um aprofundamento e discussão que rompem com uma tradição de tratar este

continente de modo raso reduzindo-o a clichês popularmente veiculados pela mídia

e por discursos discriminatórios e preconceituosos.

Acredito que seria relevante a apresentação e reflexão de imagens que

reflitam uma África não clichê, diferente da Figura 25 que o próprio livro trouxe na

apresentação do capítulo. Fotografias que mostrem cidades, lares, escolas,

pessoas, praias, campos, animais, vegetações, artistas, crianças, intelectuais,

figuras públicas etc. A Geografia não se resume a mapas e representações, mas a

diferentes linguagens que lidam com geografias.

O segundo módulo do livro didático voltado ao 8º Ano destina-se, em

Geografia, a estudar a América Latina. No capítulo 2, intitulado “América Latina

multicultural”, encontro a mesma concepção cultural de toda coleção “Saberes da

vida, Saberes da escola” analisada até aqui.

Diferentemente dos outros capítulos, neste encontro diversas imagens com a

representação de pessoas, algumas estão dispostas a seguir:

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Figura 26 – “La tejedora”, de Diego Rivera.

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 321

Figura 27 – “La gran Tenochtitlán”, de Diego Rivera.

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 321

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Figura 28 – “Vendedora de flores”, de Diego Rivera

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 321

Figura 29 – Homem peruano

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 324

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Figura 30 – Homens peruanos tecendo artesanalmente

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 324

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Figura 31 – Cerimônia ritual indígena

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 325

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Figura 32 – Médicos realizando sessão de cura

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 325

Figura 33 – Dançando frevo

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 326

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Figura 34 – Frida

Fonte: TEIXEIRA, 2013c, p. 328

O que há de comum em todas as imagens que trouxe é o pano de fundo

marcadamente assentado sobre a imagem-clichê, o pensamento-clichê, a América

Latina-clichê. A abordagem que é feita da multirracialidade a qual o título faz

apologia é encoberta de figuras que já pairavam no imaginário antes mesmo que o

pintor pintasse a tela, que o estudante observasse a fotografia.

Em diversos momentos, como já trouxe anteriormente, o LD utiliza-se do

termo “Cultura” para referir-se a este conceito como uma espécie de entidade que se

desenvolve em sua quase estabilidade e estagnação. A Diversidade Cultural por sua

vez representa a multiplicidade de entidades. Ambas estão em uma posição de

autonomia em relação aos sujeitos, mas representam aquilo que se forma no

agrupamento de pessoas semelhantes em sua cor, hábito, crença e lugar de

moradia ou origem.

A quase estabilidade a qual me referi diz respeito ao desenvolvimento desta

Cultura (a qual o LD refere-se) que ocorre devido às miscigenações e contato entre

grupos étnicos. Chamo de quase-estabilidade porque apesar de não ser estática na

concepção desta coleção, está em uma posição na qual o cotidiano de cada sujeito

não exerce, de modo significativo, alguma influência.

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As imagens que trazem pessoas neste capítulo estão em sintonia com esta

concepção de Cultura e Diversidade Cultural inserida no conteúdo que lida com a

América Latina. São apresentadas personagens de uma América Latina construída

por um discurso, verdades veiculadas através de discursos.

Enquanto nos capítulos destinados à abordagem de outros continentes não

se encontra qualquer imagem com pessoas, a América Latina concretiza quem é o

sujeito latino-americano. Enquanto são omitidos quem são europeus, asiáticos,

africanos, ou são mostrados apenas em textos explicativos um pouco da história e

de dados superficiais da economia atual destes locais, a América Latina vem

escancarando quem é que lhe habita. De modo muito geral, indígenas, que vivem do

artesanato.

Além disso, outras duas imagens que se diferem destas, retratam em uma

delas um homem dançando frevo, apresentando a única imagem brasileira de modo

folclórico, distorcido, distante da realidade cotidiana do país. Em outra, Frida Kahlo,

onde no LD existe apenas uma sugestão para que os estudantes façam uma

pesquisa virtual sobre esta pessoa. Não há qualquer discussão sobre sua vida e

influência no México, na América Latina ou no mundo.

Para encerrar a análise da coleção “Saberes da vida, saberes da escola”,

adentrarei no último livro que compõem os anos finais do ensino fundamental

referente à modalidade da EJA.

O livro didático do 9º Ano em Geografia trata do tema “Globalização”. O

primeiro módulo conta um pouco de sua história e do que se trata este assunto,

enquanto o segundo módulo discute a questão do mercado de trabalho no âmbito

social.

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Figura 35 – Letra da música “Disneylândia”, de Arnaldo Antunes

Fonte: TEIXEIRA, 2013d, p. 114

O livro trata do tema iniciando com a discussão de uma música (Figura 35) e

a partir daí faz um breve apanhado histórico (Figura 36) do capitalismo, relacionando

a Globalização ao desenvolvimento e desdobramento deste sistema de produção.

Figura 36: Trabalho escravo no engenho de cana

Fonte: TEIXEIRA, 2013d, p. 115

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Figura 37 – Barco de refugiados

Fonte: TEIXEIRA, 2013d, 127

Figura 38 – Homens trabalhando em uma linha de montagem

Fonte: TEIXEIRA, 2013d, p. 318

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Figura 39 – Trabalho infantil

Fonte: TEIXEIRA, 2013d, p. 323

A partir das imagens apresentadas posso inferir que, apesar de não discutir

claramente o tema da Diversidade Cultural, o conteúdo é tratado de modo a

aproximar o conceito de Globalização à vida dos estudantes, trazendo de modo

reflexivo a origem deste processo e a realidade perversa por trás desta noção, que

muitas vezes de modo clichê na mídia aparece como um fenômeno que só possui

virtudes. Esta temática traz o assunto do mundo do trabalho, onde acredito que

pouco foi explorado o conceito e as potencialidades da Diversidade Cultural. Ainda

assim, o LD traz de maneira realista todas estas temáticas, apresentando diversos

problemas e questões sociais a serem avançados pela humanidade.

É notório que esta coleção não omite e não nega o fenômeno da Diversidade

Cultural, ainda que não apresente a categoria tal qual acredito e defendo em meu

referencial teórico. Os LD estudados, da editora Ática, apresentam um viés, uma

concepção de Diversidade Cultural que não engloba as individualidades e

protagonismos dos sujeitos, e sim apenas os traços mais característicos de grupos

étnicos, ou de grupos que se assemelham em sua região (um país, uma

comunidade indígena, uma ilha etc.).

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6.2 ANÁLISE DA COLEÇÃO “EJA MODERNA”

O livro didático desta coleção, “EJA Moderna”, consiste em um único volume

para a componente curricular Geografia. O sumário do LD pode ser lido na Figura

40.

Figura 40 – Sumário “EJA Moderna”

Fonte: AOKI, 2013, p. 4

É possível notar que o sumário parece um pouco extenso, isto porque o

exemplar que analisarei é o Manual do Professor. Entretanto, só me deterei no livro

que é idêntico ao dos estudantes, portanto o sumário que interessa vai até o livro do

9º Ano.

Do mesmo modo que a coleção “Saberes da vida, Saberes da escola”, da

editora Ática, na coleção “EJA Moderna” há uma divisão do livro de acordo com os

anos finais do ensino fundamental, no entanto a divisão acontece nesta última em

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um único livro, portanto é possível afirmar que os conteúdos seguem de forma

semelhante, orientados pela Educação Básica Regular.

A Unidade 1 do livro referente ao 6º Ano é de meu interesse por tratar do

território brasileiro, suas regiões e a população brasileira. Na Figura 41 há o sumário

da Unidade 1 e 2 (6º ano).

Figura 41 – Sumário do livro do 6º Ano

Fonte: AOKI, 2013, p. 7

O capítulo 3 denomina-se “A população brasileira” e está presente na

Unidade 1 chamada “Identidade e pluralidade”. A primeira página deste capítulo vem

com uma imagem que ocupa aproximadamente 50% da página e pode ser

observada na Figura 42.

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Figura 42 – Congada da Festa de São Benedito – Ilhabela (SP)

Fonte: AOKI, 2013, p. 29

A legenda dada à imagem pelo LD, na mesma medida que a própria imagem,

é importante para a análise que se refere à Diversidade Cultural, pois noto uma

concepção de cultura semelhante à coleção anteriormente analisada (“Saberes da

vida, saberes da escola”), aliada às características de grupos étnicos, bem como

seus rituais, festejos, crenças religiosas etc. Acredito que, na lógica seguida por esta

editora, a Cultura e identidade brasileiras são formadas por um conglomerado de

“culturas” que habitam no Brasil, como parte de uma destas culturas, o livro ilustra

esta concepção com uma fotografia de homens com indumentárias folclóricas

comemorando um festejo.

Afirmo que esta concepção, bem como sua imagem vêm colaborar com a

reafirmação de um modo clichê de compreensão da cultura. Novamente afirmo que

este modo de entender e apresentar esta categoria limita a atuação humana,

cotidiana, reduz as possibilidades do protagonismo na produção, construção e

desconstrução da cultura em que se vive. Isto comprova-se no decorrer da Unidade

em que são trazidas imagens da contribuição de outros países na paisagem de

cidades brasileiras e desenvolve-se a temática de migrações.

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Figura 43 – Festival das estrelas – São Paulo (SP)

Fonte: AOKI, 2013, p. 31

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Figura 44 – Memorial ucraniano – Curitiba (PR)

Fonte: AOKI, 2013, p. 32

Pude perceber que a coleção “EJA Moderna” possui uma menor diversidade

de linguagens em comparação à “Saberes da vida, saberes da escola”. Encontrei

menos letras de músicas, poemas, sugestões de leitura, filmes, sites. A partir dessa

constatação posso afirmar que a Diversidade Cultural também se reflete nesta

abordagem mais diversificada dos temas, pois permite uma maior aproximação de

diferentes sujeitos que se envolvem com maior facilidade em uma ou outra

linguagem.

A parte do livro destinada ao 7º Ano fala sobre moradia, saúde e qualidade de

vida. Apresenta imagens que chamo aqui de imagens-clichês, ou seja, a imagem de

um pensamento. A cristalização de uma imagem no pensamento provavelmente

será algo semelhante a estas ilustrações (Figuras 45 e 46), localizadas nas

primeiras páginas do tema ‘Cidade’.

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Figura 45 – Cidade

Fonte: AOKI, 2013, p. 66

Figura 46 – Centro de São Paulo (SP)

Fonte: AOKI, 2013, p. 69

Não pude verificar explícita nem implicitamente a ideia de Diversidade

Cultural nas diferentes linguagens veiculadas no LD do 7º Ano. Basicamente

encontro os conteúdos apresentados, dando conta de uma abordagem

enciclopédica. Apesar de haver discussão de questões sociais, não percebo uma

abertura à movimentação do pensamento, nem ruptura com imagens-clichês,

pensamentos-clichês.

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A parte do livro destinada ao 8º Ano se inicia na página 116 pela Unidade

chamada “O país em que vivemos” e apresenta uma imagem (Figura 47), que ocupa

mais de metade da página, de uma cerimônia militar, com a bandeira do Brasil no

fundo esvoaçando. Toda a farda dos homens em forma diferencia-se sobremaneira

do uniforme militar brasileiro. Além de haver esta diferença, ainda é possível refletir

se esta imagem de fato representa o país em que vivemos (título da Unidade em

questão). A figura mostra um ritual da cerimônia de troca da bandeira, onde na

frente há um soldado que dita as ordens com o instrumento ligado à boca, uma

corneta. Mais para trás, no centro da imagem, fileiras de homens marchando em

sintonia, utilizando as mesmas indumentárias, em uma organização e movimentação

militar que preza a ordem, hierarquia, disciplina e a não pluralidade. Ao fundo, no

alto do mastro esvoaça a bandeira do Brasil que parece reger a cerimônia e o

discurso que se veicula sobre qual é o país em que vivemos.

Figura 47 – Cerimônia de troca da Bandeira Nacional

Fonte: AOKI, 2013, p. 116

Na página seguinte, destinada a apresentar a estrutura política do Brasil, a

imagem que ilustra o texto explicativo é da farda do exército brasileiro (Figura 48).

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Figura 48 – Exército brasileiro

Fonte: AOKI, 2013, p. 117

Questiono-me qual o discurso assumido pelo livro didático a fim de tornar a

representatividade do país em que vivemos tão relacionada ao militarismo, trazendo

imagens logo nas primeiras páginas voltadas tão somente a esta face do Estado.

Onde se explica a organização política do Brasil a Imagem que acompanha

(Figura 49) é uma imagem de bandeiras de diversos países, sendo a principal, em

maior altura, no centro, a bandeira do Brasil. É sabido que as palavras da bandeira,

“Ordem e Progresso”, advém de um período histórico e político marcado pelo

positivismo. É possível se identificar posicionamentos que se aproximam à ideologia

positivista, moderna, e que por excelência negam a pluralidade, a diferença,

justamente por se basear na máxima: Ordem e Progresso.

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Figura 49 – Praça das Bandeiras

Fonte: AOKI, 2013, p. 119

Nas próximas páginas são discutidos os três poderes – legislativo, executivo e

judiciário – com imagens que representam bandeiras e faixadas, ora de uma

Câmara Municipal ora do Congresso Nacional. Acompanham algumas questões

referentes aos assuntos tratados, como, por exemplo, é possível identificar na Figura

50.

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Figuras 50 – Poluição, panfletagem, período eleitoral

Fonte: AOKI, 2013, p. 122

A 2º Unidade da parte do livro voltada ao 8º ano denomina-se “O Brasil do

mundo” e trata sobre temas como o crescimento do Brasil, blocos econômicos,

Mercosul, ONU etc. Logo na primeira página, após o título, é visível uma imagem de

mesmo caráter daquelas que dissertei na 1ª Unidade:

Figura 51 – Bandeiras em Copacabana

Fonte: AOKI, p. 128

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Na segunda página desta unidade encontro uma discussão sobre a

desigualdade social brasileira, ainda que tenha sido relacionada apenas à economia

brasileira de modo muito superficial, ou seja, não se discutiu efetivamente sobre a

qualidade de vida da população, sobre o que efetivamente é no cotidiano a

desigualdade. É possível observar esta discussão e suas respectivas imagens a

seguir (Figura 52):

Figura 52 – Desigualdade social

Fonte: AOKI, V, 2013, p. 129

No capítulo 4 da Unidade 2 do livro do 8º Ano encontro o conteúdo destinado

ao tema “Participação Social”, onde se discute questões do voto em uma

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democracia, eleições, mulheres na política, associação de moradores, sindicatos e

direito à greve. A seguir seguem elencadas algumas imagens trazidas neste capítulo

e textos explicativos sobre alguns temas que fazem relação com os estes assuntos.

As primeiras imagens a seguir trazem significados discursivos com relação às

mulheres e indígenas na esfera política do país, são mostrados sujeitos (idosa e

indígena) em situação de inserção nas eleições e a presidenta Dilma Rousseff, que

rompe com a tradição de unicamente homens ocupando a posição de presidentes

da república. Além destas, Carlota de Queiroz, primeira mulher a se candidatar ao

cargo na política brasileira.

Figura 53 – Eleitora

Fonte: AOKI, 2013, p. 148

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Figura 55 – Eleitor indígena

Fonte: AOKI, 2013, p. 150

Figura 56 – Dilma Rousseff

Fonte: AOKI, V, 2013, p. 152

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Figura 57 – Carlota Pereira de Queiroz

Fonte: AOKI, 2013, p. 152

O texto que pode ser lido na Figura 58 expõe que fazer parte da política não é

papel exclusivo de quem trabalha diretamente nestes cargos e ocupa papéis

públicos, mas que existem diversas formas de participação social com a finalidade

de expressão política, luta e/ou resistência. Além disso, o livro alerta para a inserção

de grupos historicamente inferiorizados e marginalizados na esfera política, como as

mulheres e indígenas.

Figura 58 – Outras formas de participação social

Fonte: AOKI, 2013, p. 153

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O conhecimento a respeito dos modos de expressão política de luta por

direitos pode ser desconhecido e inacessível a muitos sujeitos da EJA, por isso,

considero relevante o trabalho com esta temática e a clareza destas informações

para trazer e propor um movimento de reconhecimento e busca por direitos e

desejos de ascensão social, emancipação e melhores condições de vida. Exemplos

disso podem ser ilustrados pelas Figuras 59 e 60, por meio de plebiscito e do

orçamento participativo.

Figura 59 – Eleitores em plebiscito

Fonte: AOKI, 2013, p. 153

Figura 60 – Orçamento participativo

Fonte: AOKI, 2013, p. 155

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A partir da análise feita sobre o livro do 8º ano, a partir dos textos, imagens,

gráficos e charges, infiro que a Diversidade Cultural estava implícita das seguintes

maneiras:

a) O conteúdo tratado no capítulo, sobretudo no que trata da participação

social na política do país, não faz parte do currículo prescrito (conteúdo obrigatório)

sobre o que a editora deva impreterivelmente discutir no LD. Na coleção “Saberes

da vida, saberes da escola”, por exemplo, este conteúdo não está contemplado, no

entanto, o assunto é pertinente e relevante ao cotidiano dos cidadãos, diz respeito

aos seus direitos e deveres em face de um país democrático, bem como da

influência da micropolítica do cotidiano (TIBURI; HERMANN, 2014) sobre o Estado,

sobre o trabalho, sobre as leis, sobre a escola, sobre o município etc.

b) O conteúdo e suas imagens contemplam as mulheres em seu

protagonismo e não as mostra na intenção de dar uma mínima visibilidade.

c) Foi trazida para debate a questão do voto de analfabetos, jovens entre 16 e

18 anos, idosos acima dos 60 anos, indígenas (Figura 55), participação popular no

orçamento participativo e grevistas em busca de melhores condições de trabalho em

seu direito à greve. Todas estas questões não seguem o fluxo de uma perspectiva

cultural elitista, mas demonstram que cabe à Educação e ao currículo escolar, neste

caso em relação aos alunos da EJA, a problematização, apresentação, discussão e

reflexão dos temas que dizem respeito a sua cultura, a sua vida, a seu protagonismo

em seu bairro, cidade e país, a sua história de vida.

A Diversidade Cultural foi identificada neste capítulo com uma abordagem de

entrelinhas, em que foi necessário refletir acima de tudo que foi observado para

chegar a este pensamento. Em outros conteúdos com suas diferentes linguagens

nesta coleção, entretanto, não consegui chegar a esta mesma conclusão, pois

percebi diversas fragilidades no que se refere à ideia de Diversidade Cultural, como,

por exemplo, nos conteúdos relacionados à população brasileira, meio urbano, rural,

regiões do Brasil, movimentos migratórios, produção de alimentos etc.

Penso que a abordagem clichê através das diferentes linguagens

apresentadas pelo LD acaba indo na contramão da Diversidade Cultural, pois

encobre a pluralidade de possibilidades sobre modos de ser, modos de viver, modos

de ver a cidade, modos de ver o campo. Encontrei em alguns momentos imagens-

clichês e textos-clichês sobre conteúdos que poderiam ser desenvolvidos com mais

profundidade e menos superficialidade.

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Por isto posso dizer que a Diversidade Cultural não pode ser vista de modo

totalitário: está ou não está presente nesta ou naquela coleção de livros didáticos?

Mas deve ser cuidadosamente buscada em cada meandro de cada temática, cada

imagem, cada fotografia, cada mapa, cada texto explicativo, jornalístico, cada

poema, letra de música etc., como foi feito em cima de cada uma das duas coleções

analisadas até este momento.

É possível afirmar que foi encontrado e não encontrado a Diversidade Cultural

em ambas coleções (“Saberes da vida, saberes da escola” e “EJA Moderna”) até

esta altura da pesquisa. Em certas passagens e fragmentos dos livros ela estava

explícita, em outras implícita e em outras oculta ou inexistente. Por este motivo,

acredito que a abordagem de cada um dos livros analisados deve ser repensada e

superada pelo professor e, se possível, pelo leitor. Desejo que cada estudante e

professor consiga movimentar seu pensamento em cima do livro, que coletivamente

seja possível debater sobre cada elemento que compõe os LDs, inclusive seus

discursos que antecederam sua própria produção.

Acredito que por si só, o livro didático não propõe este movimentar de

pensamentos que reoriente sua abordagem. É necessário o estímulo da

coletividade, do grupo, da prática pedagógica do professor. A Diversidade Cultural

não foi explorada, ela está adormecida, às vezes sonambulando e talvez em algum

momento do futuro desperte para ser escancarada e se tornar um novo clichê a ser

movimentado.

6.3 ANÁLISE DA COLEÇÃO ALCANCE EJA

O exemplar obtido da Coleção “Alcance EJA” (Editora Positivo) consiste em

um único volume da componente curricular Geografia destinado para os anos finais

do ensino fundamental da EJA. Diferentemente das duas coleções já analisadas,

esta não se divide pelos anos (sexto, sétimo, oitavo e nono), mas por dezesseis

unidades temáticas que por sua vez são divididas em capítulos. O sumário deste

livro pode ser visto nas Figuras 62 e 63.

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Figura 62 – Sumário “Alcance EJA”

Fonte: GRITTEM, S., 2013, p. 4-5

Figura 63 – Sumário “Alcance EJA”

Fonte: GRITTEM, S., 2013, p. 6

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As primeiras seis unidades analisadas neste livro não apresentaram

referência à Diversidade Cultural. Além disso, não considero pertinente trazer todos

os conteúdos em seus detalhes, apenas alguns pontos destacados que se

assemelham com uma ou a outra coleção já analisada:

a) Há predomínio de imagens aéreas, de paisagens naturais ou, ainda mais

predominantemente, urbanas ou rurais, pouco se encontra imagens de pessoas.

b) Grande parte das imagens é composta por mapas tradicionais.

c) Em comparação as coleções anteriores há menos diversificação de

linguagens, em sua maior parte encontro mapas, gráficos, imagens e textos

explicativos.

d) Não perde o caráter enciclopédico das outras coleções: diversos conteúdos

aglomerados em poucas páginas, ou seja, o mesmo currículo da Educação Básica

Regular encaminhado ao da EJA, sem se considerar todas as profundas diferenças

entre o público, o tempo de curso e as especificidades do espaço e da dinâmica

própria desta modalidade.

Opto por trazer a Unidade 7 denominada “O povo brasileiro”, em que

explicitamente é trabalhada a questão da Identidade, Cultura e Pluralidade. Desse

modo se pode abstrair a ideia de Diversidade Cultural entendida e veiculada pelo

LD. Busco analisar se esta categoria trazida pela coleção possui a abordagem que

defendo nesta dissertação.

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Figura 64 – Abertura da unidade 7: O povo brasileiro

Fonte: GRITTEM, 2013, p. 92

De acordo com o que se pode observar na abertura da unidade 7 por meio da

Figura 64 desta dissertação, a cultura é retratada como sendo composta por

características típicas de cada região brasileira. Do mesmo modo que as coleções já

analisadas, a compreensão deste conceito está ligada a padrões comuns de um

grande grupo de pessoas, como é o caso da população que reside em uma região,

que por sua vez é composta por estados e diversas cidades.

Na página 93 é possível identificar novamente a ideia de cultura no texto que

diz:

Mas como é formada a identidade cultural de um povo? A identidade cultural de um povo é um processo dinâmico, de construção permanente, representada pelas relações entre indivíduos e grupos. Envolve o compartilhamento de patrimônios comuns, como a língua, a religião, as artes, o trabalho, os esportes, as festas, entre outros (GRITTEM, 2013, p. 93).

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Noto que existe uma apresentação e definição deste conceito de modo mais

objetivo que as outras coleções analisadas. O fato de se afirmar que a identidade

cultural de um povo é um processo dinâmico de construção permanente dá maior

abertura à possibilidade de protagonismo dos sujeitos na cultura. Ainda que se

esteja falando de identidade cultural e não propriamente da Cultura.

A ideia de Cultura defendida pelo LD fica mais clara na última frase, onde é

dito, com outras palavras, que a identidade cultural diz respeito a elementos comuns

da vida das pessoas, como língua, religião, artes, trabalho etc. Esta última parte

acaba retificando, limitando, as potencialidades do cotidiano de qualquer sujeito que

deseja desconstruir a cultura em que se sente inserido. Acredito que a compreensão

de Cultura, enquanto uma instância abrangente que engloba uma grande

diversidade de pessoas com características comuns, não é capaz de compreender a

Diversidade Cultural, enquanto fenômeno essencialmente humano e social, que diz

respeito ao sujeito e não às normas sociais. Tal concepção do LD em questão se

reafirma na Figura 65:

Figura 65 – Refletir e debater: carimbó

Fonte: GRITTEM, 2013, p. 93

Eis a concepção de Diversidade Cultural trazida nesta coleção: a mistura de

povos indígenas, negros, imigrantes e colonizadores portugueses. Ou seja, cada um

destes representa uma Cultura, o resultado desta soma é a Diversidade Cultural.

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Na Figura 65 é possível notar uma imagem-clichê representativa dos

conceitos em questão: Cultura e Diversidade Cultural.

Na Figura 66 a Diversidade é trazida de modo enfático, o que não ocorreu nas

demais coleções:

Figura 66 – Diversidade

Fonte: GRITTEM, 2013, p. 95

O texto que segue a imagem composta por seis fotografias de rostos de

brasileiras/os (Figura 66) mostra a Diversidade Cultural como patrimônio da

humanidade e fator de desenvolvimento. Até aqui posso afirmar que há uma

valorização deste conceito, que, em comparação com as outras coleções, percebo

que houve maior atenção e discussão desta categoria, até na intenção de buscar

amparo em fontes bem estabelecidas sobre este tema, como a UNESCO.

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Apesar desta constatação, não estou de acordo com as informações trazidas

pelo LD, pois não compreendo a Diversidade Cultural como necessária ao gênero

humano, pois ela é intrínseca a este. Não a vejo como patrimônio da humanidade,

mas como fenômeno da humanidade. Concordo sim que a Cultura adquire

diferentes formas através do tempo e do espaço, naturalmente.

Vê-la como fator de desenvolvimento econômico talvez seja omitir e até negar

tantas lutas e movimentos em busca do reconhecimento e respeito às diferenças.

Afinal, ainda há valorização do comum, da homogeneidade e do padrão. Se a

Diversidade Cultural fosse mesmo um fator de desenvolvimento acredito que não

seria necessário estar presente em forma de resoluções, pareceres, parâmetros

curriculares, para que fosse um tema mais problematizado e respeitado em salas de

aula e nas diversas esferas da vida cotidiana.

No capítulo 3 da Unidade 7 encontra-se o título “O novo perfil da população

brasileira”, denominação que já remete à ideia de padronização, de busca por um

perfil, em detrimento da pluralidade. Se a população brasileira é plural e diversa,

como é possível reconhecer um perfil, um novo perfil?

De início encontro a discussão voltada ao mapa que apresenta a densidade

demográfica do país. Em seguida são definidos os termos “populoso”, “povoado” e

“população absoluta”.

Figura 67 – Brasil: densidade demográfica

Fonte: GRITTEM, 2013, p. 101

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A segunda página do capítulo introduz o assunto do crescimento da

população brasileira, trazendo consigo um gráfico que comprova a diminuição da

taxa de fecundidade nos últimos tempos.

Figura 68 – Crescimento da população brasileira

Fonte: GRITTEM, 2013, p. 102

Na página seguinte encontro as primeiras imagens com pessoas do capítulo,

que ilustram a comparação de uma família antiga (datada de 1910) com uma atual.

Se faz jus ao título do capítulo: “Novo perfil da população brasileira”. O perfil da

população brasileira pode até ser diverso nas cores da pele, mas não apresentam a

verdadeira diversidade, pois é ocultado um enredo de famílias que não existem

porque grande parte da população não quer formá-la. Se exclui as famílias que não

têm filhos, as famílias de mãe e filho somente, de pais de mesmo sexo, de sujeitos

com algum tipo de deficiência.

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Figura 69 – Antiga família brasileira

Fonte: GRITTEM, 2013, p. 103

Figura 70 – Família atual brasileira

Fonte: GRITTEM, 2013, p. 103

Enquanto as coleções anteriores analisadas preferiram não discutir a

diversidade no modo de constituir as famílias, de possuir ou não algum tipo de

deficiência, no modo de reconhecer gênero, sexualidade, nas pluralidades de ser, de

viver, de se expressar, esta coleção estabelece o perfil dos brasileiros.

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6.4 CONSIDERAÇÕES DE ENCERRAMENTO DAS ANÁLISES

Para encerrar a parte empírica da pesquisa, posso afirmar que as três

coleções analisadas trazem uma noção de Diversidade Cultural, entretanto, é

distinta da categoria como a compreendo, ou seja, através da perspectiva dos

Estudos Culturais.

Nenhuma das coleções apresenta uma abordagem que efetue uma ruptura ou

uma movimentação dos clichês que permeiam os conteúdos de Geografia. Não

identifiquei discussões sobre identidade de gênero ou orientação sexual, pessoas

com deficiência e sua atuação na sociedade nos conteúdos que lidam com a

população brasileira.

Algumas características gerais saltam aos olhos em cada uma das coleções:

a) Em “Saberes da vida, saberes da escola” é apresento em diferentes

momentos o protagonismo de figuras brasileiras (homens e mulheres) nas artes, na

literatura e na ciência.

b) Na mesma coleção pouco se observa de imagens contendo pessoas

representadas, apesar dos conteúdos retratarem em sua maioria temas sociais.

Quando se traz tais imagens, a maior parte dos sujeitos veiculados são pessoas do

sexo masculino.

c) Esta mesma coleção busca ser interdisciplinar englobando diferentes

disciplinas em unidades em comum, entretanto a abordagem que feita na

componente curricular Geografia é conteudista e algumas vezes superficial, como,

por exemplo, no conteúdo que trata de migrações.

d) No capítulo intitulado “Brasil multicultural” trata-se de uma multiplicidade

cultural ligada tão somente às grandes etnias que compõem o território brasileiro:

africanos, indígenas e europeus. Fala-se sobre o racismo e a importância em

combatê-lo.

e) A representação de sujeitos americanos trazidos em fotografias estão em

sintonia com clichês, as imagens, ainda que fotografias reais, são constituídas antes

de qualquer coisa por verdades que compõem discursos.

f) Na “EJA Moderna”, prevalece uma concepção de cultura aliada às

características de grupos étnicos bem como seus rituais, festejos, crenças religiosas

etc. É defendido que a Cultura e Identidade brasileiras são formadas por um

conglomerado de “culturas” que habitam no Brasil, como parte de uma destas

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culturas, o livro ilustra esta concepção com imagens de homens com indumentárias

folclóricas comemorando um festejo.

g) Nesta coleção há uma presença marcante de imagens e textos

apologéticos à esfera militar brasileira.

h) É trazido o assunto da participação social na política formal brasileira, com

o voto de analfabetos, indígenas, jovens e idosos, com plebiscitos, além de outras

formas de reivindicações dos direitos dos trabalhadores. Além disso, as fotografias

neste livro também dão visibilidade às mulheres, por exemplo, com imagens da ex-

presidenta da república Dilma Roussef, de uma idosa votando etc.

i) Na “Alcance EJA”, a Cultura é compreendida no contexto brasileiro pela

caracterização de cada região. A compreensão deste conceito está ligada a padrões

comuns de um grande grupo de pessoas.

j) O livro lida com o conceito de Cultura, Identidade Cultural, Diversidade

Cultural objetivamente e explicitamente definindo o que significa cada um destes

termos.

k) A Diversidade Cultural é trazida como a mistura de povos (indígenas,

negros, imigrantes e portugueses). A imagem deste conceito consiste em uma

dança com trajes típicos, ou seja, uma representação folclórica da Cultura e uma

imagem-pensamento-clichê das categorias: Cultura e Diversidade Cultural.

l) A Diversidade Cultural é trazida amparada em textos da UNESCO, vista

como necessária ao gênero humano, patrimônio da humanidade e fator de

desenvolvimento.

m) O livro trouxe o “novo perfil do povo brasileiro” com a finalidade de

apresentar o tema do crescimento da população, envelhecimento, densidade

demográfica. O assunto foi ilustrado com a antiga família brasileira (com muitos

filhos) e a atual família brasileira (com poucos filhos). Tal ideia de apresentar um

perfil de família é vista por mim como uma contramão da Diversidade Cultural. Não

acredito na existência de um perfil de pessoa, aluno, filho, mãe, professor/a, nem

família.

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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Diversidade Cultural refere-se à essência do fenômeno humano de existir

no espaço geográfico. Existir diz respeito aos modos de ser e atuar no mundo vivido

e experimentado pelos humanos. A cultura, alinhada à perspectiva dos Estudos

Culturais é tudo aquilo que o sujeito constrói na sociedade e que, portanto, não é de

sua natureza biológica. Cultura é o que difere os seres humanos dos animais. Agir

de acordo com o pensamento, emoções, normas sociais são características do

cotidiano humano que constituem a Cultura.

De acordo com Hall (1997) não existe a Cultura, ou uma Cultura, existem

culturas. As culturas coexistem em uma relação horizontal, umas com as outras, na

qual constantemente são conferidos ilusoriamente graus de hierarquia entre elas.

Tanto no senso comum quanto em esferas intelectuais é comum haver certa

referência às culturas consideradas superiores, geralmente pensada enquanto

instância estática e imóvel que possui e é possuidora de todo um continente, como é

o caso da suposta “cultura europeia”.

Acredito que todo sujeito tem protagonismo em sua cultura. Por este motivo

não é possível pensar de uma forma que não considere esta categoria como sendo

de caráter agenciável, instável, fluido, dinâmico que é produzido a cada instante,

sobretudo na era informacional em que vivemos, pois a influência das palavras, dos

discursos, das ações, das imagens e das propagandas tangem as culturas, de modo

a reinventá-las, construí-las, desconstruí-las, moldá-las e ressignificá-las.

Paulo Freire (1963) foi relacionado, neste trabalho, com os Estudos Culturais

em seus escritos, pois seu pensamento, no que se refere à cultura, se assemelha

sobremaneira aos autores britânicos fundadores desta abordagem (EC). Encontro

pontos principais da concepção cultural que convergem em Freire e Hall: a cultura é

considerada por ambos como criação humana, como ação social, ambos atribuem à

cultura uma dimensão popular e democrática que até então se desconhecia ou se

desvalorizava. Ambos reconhecem em todas as classes sociais o mesmo

pertencimento a determinada cultura e a mesma produção dinâmica e complexa

desta. Ressalto assim o pensamento de ambos em convergência com mudança da

concepção de Cultura enquanto atributo, artefato, objeto, para a de ação.

Concomitantemente e em consequência desta nova perspectiva, está a não

estabilidade nem concretude da própria concepção de Cultura. Se ela está

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alicerçada ao movimento, à ação, jamais poderemos atribuí-la um ponto final, uma

estagnação. As culturas constituem e compõem a Diversidade Cultural. Não há uma

cultura que seja o símbolo, ou o arquétipo da Diversidade Cultural, isto significaria

confrontá-la a algum nível de hierarquização cultural.

A abordagem a qual me ancoro nesta discussão é a dos Estudos Culturais em

Educação, que surgem no século passado como um campo de estudo e de pesquisa

ligado a uma nova forma de pensar a Cultura. É alterada a perspectiva

predominante e unânime até então, histórica e cultural, de compreensão da Cultura,

ou seja, a partir das elites, da alta classe, nos níveis mais elevados da hierarquia

inglesa. Compreensão de que a Cultura é um bem de privilégio de grupos

enriquecidos. Este campo de estudo reconhece a Cultura como pertencente a todos

e promove a interdisciplinaridade em sua esfera teórica e até mesmo política como

fator de cientificidade.

A Diversidade Cultural sob a perspectiva dos Estudos Culturais no âmbito da

educação, sobretudo no sistema escolar brasileiro, pode ser relacionada

objetivamente com a modalidade da Educação de Jovens e Adultos, que busca

suprir a escolarização do ensino fundamental e médio para todos aqueles que em

idade escolar obrigatória não concluíram estas etapas. Realizo esta aproximação.

A EJA é uma modalidade de ensino da Educação Básica que possui diretrizes

e normativas próprias devido a suas particularidades e especificidades, o que lhe

confere importantes e profundos diferenciais em relação às demais modalidades

(educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e educação especial). Dentre

tais especificidades estão o perfil dos alunos: trabalhadores, oriundos das periferias

e do campo (ALTHOF; MARTINS FILHO, 2016), com diferentes trajetórias, carregam

consigo experiências de vida que lhes diferenciam das crianças que compõem o

alunado da educação infantil e ensino fundamental.

Outro diferencial é a diversidade dos sujeitos, afinal, não existe relação entre

faixa etária e seriação (ano escolar, na atualidade). A exigência para inscrição na

EJA é a idade mínima de quinze anos para ingresso no ensino fundamental e de

dezoito anos para ensino médio (BRASIL, 2000), o que confere as turmas, desta

modalidade, a pluralidade de fases de vida. Com isso, a prática docente deve estar

inteiramente voltada a um público jovem e adulto, plural e trabalhador, diferente da

prática pedagógica que acontece com a faixa etária da educação escolar obrigatória

(7 aos 14 anos).

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De acordo com Arroyo (2006), a história da própria EJA está ligada a uma

trajetória de luta, de busca pela escolarização que leve à emancipação e não à

regulação, que é a educação que acontece nas modalidades regulares.

Neste sentido, o ensino de Geografia em concordância com a educação

geográfica tem a potencialidade de corroborar no processo de emancipação

intelectual, de desenvolvimento no processo de escolarização e aprendizagem. A

educação geográfica quando alinhada ao público da EJA pode promover o

pensamento autêntico e reflexivo, além do diploma de conclusão do ensino

fundamental e médio, da qual muitas vezes estes sujeitos estão em busca.

Os livros didáticos para EJA fazem parte do currículo desta modalidade,

quando são pensados os materiais que compõem o espaço escolar e também as

práticas pedagógicas que se voltam a este público. Neste sentido, utilizo de livros

didáticos de Geografia produzidos e distribuídos pelo PNLD EJA 2014 para buscar

aquilo que era veiculado sobre Diversidade Cultural.

Devo ressaltar alguns aspectos sobre a produção e ampla distribuição de

livros didáticos pelo PNLD e PNLD EJA, tais quais: a democratização do acesso a

este material, que chega gratuitamente ao consumidor final, a possibilidade de

escolha da coleção que mais agradar ao professor, por último, a limitação que estes

LDs possuem devido a critérios de produção estabelecidos pelo Estado, avaliação

dos pareceristas e a seleção dos professores – pela coleção – que é em relação

apenas aqueles livros aprovados em um processo seletivo anterior. Isto significa que

a definição do PNLD, sobre o que deve ser veiculado por este material, qual modo

de pensar e qual o discurso prevalece, é soberana.

O livro didático ainda é o recurso mais utilizado pelos professores das escolas

públicas da educação básica. Isto não significa que é utilizado por ter boa qualidade,

na opinião dos professores, mas porque muitas vezes é o único instrumento de

apoio a prática pedagógica.

Costella (2017) centra sua reflexão na prática pedagógica do professor que

deve ser orientada pelos seus estudantes, a partir de seus estudantes. Esta autora

afirma que os professores não aplicam o que aprenderam, não resolvem problemas

e concertam produtos para devolvê-lo ao cliente, eles lapidam, pensam e

desconstroem o que aprenderam na universidade para ensinar seus estudantes a

aprender. O conhecimento não é o produto do trabalho docente, mas sim dos

alunos.

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Gabrelon e Silva (2017) relacionam a origem da função referencial do livro

didático no Brasil, utilizado enquanto manual didático, ao século XVIII, quando este

material era a base do professor devido sua precária formação teórica. É sabido que

ainda nos dias atuais existem lacunas e fragilidades na esfera formativa de

professores. Há também escassez nas escolas, em diversas localidades brasileiras,

de recursos para uma maior diversificação dos métodos pedagógicos e fontes de

informação. Por este motivo considero importante que os livros didáticos não se

limitem a conter um aglomerado de informações.

O último capítulo desta dissertação concentrou-se na pesquisa empírica

destinada à análise de três coleções de livros didáticos de Geografia para EJA.

Busquei a categoria da Diversidade Cultural nos conteúdos veiculados através das

diferentes linguagens que compõem este material. Verifiquei se este conceito foi

trabalhado nos LD e de que modo foi abordado.

A metodologia que utilizei na análise do conteúdo dos materiais pesquisados

foi a Teoria Queer, o que me deu subsídios para desnaturalizar aquilo que está

sendo veiculado, seja por texto visual, seja por textos explicativos em escrito.

Busquei pensar, ao observar as páginas dos livros didáticos, até qual ponto temos

elementos naturais, ou seja, dados pela natureza, e quais desdobramentos são

frutos da cultura e da história da humanidade, por exemplo: o que há de natural na

configuração familiar? E de cultural e histórico? Estes questionamentos me levaram

a análise presente no último capítulo.

Devido a presença de inúmeros elementos culturais, muito mais que naturais,

e próximos aquilo que estamos acostumados a ver nas diversas esferas vivenciadas

no dia-a-dia, chego ao clichê, um conceito proposto por Deleuze (2006) que sugere

esta categoria enquanto aquilo que permeia até mesmo um quadro em branco antes

que a obra propriamente se inicie. O clichê me ajudou na visualização das “imagens

em branco”, o que está presente na ideia de família, cidade, Brasil...? Os livros

didáticos não são materiais isentos de concepções políticas, sociais e morais, pelo

contrário, veiculam discursos que podem soar como inexistentes sob pontos de vista

imaturos intelectualmente.

As coleções que utilizei na pesquisa foram das editoras Ática; Moderna e

Positivo, distribuídas através do PNLD EJA 2014, denominadas respectivamente

“Saberes da vida, saberes da escola”, “EJA Moderna” e “Alcance EJA”. Os

resultados da análise realizada serão apresentados na mesma ordem, por coleção.

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Genericamente é possível afirmar que as três coleções analisadas

apresentam uma noção de Diversidade Cultural, esta categoria é trabalhada

explicitamente em todas as coleções pesquisadas nos conteúdos que lidam com a

população brasileira. O conceito que é trazido é distinto daquele que defendo. Todos

os livros buscam tratar sobre a cultura, a diversidade e a plural constituição étnica

brasileira. Nenhum, entretanto, apresenta uma abordagem desta categoria que

efetuasse uma ruptura ou superação dos clichês que permeiam os conteúdos de

Geografia. Não identifico discussões sobre sexualidade ou orientação sexual,

identidade de gênero, pessoas com deficiência e sua atuação na sociedade nos

conteúdos que lidam com a população brasileira. Não identifico também modos

distintos de estudar os mapas, todas as coleções lidam com uma perspectiva

tradicional.

Percebo que a Diversidade Cultural na coleção “Saberes da vida, Saberes da

escola”, da editora Ática, está muito ligada ao que a abrangência de um povo

denominado indígena, negro, branco, abarca, como idioma, cor da pele, formato dos

lábios, costumes, hábitos alimentares, rituais festivos. A cultura foi abordada pela

coleção como características superficiais de grupos de povos pelo seu local de

habitação ou origem e em seus desdobramentos pela história na miscigenação e no

que resultou da hibridez entre estes povos: qual a religião prevaleceu, qual idioma

se formou, quais rituais se realizam, qual cor da pele predominou, quais traços na

face de cada sujeito brasileiro se formou. A cultura neste sentido é entendida como

uma instância estática em seu desenvolvimento, por mais estranho que possa soar

esta ideia. Ou seja, ela é estática, pois os sujeitos não a produzem, não a constroem

nem a desconstroem em seu cotidiano, entretanto ela se desenvolve na história da

sociedade através das migrações, do contato entre os povos que tem suas próprias

características e acabam se adaptando e formando novas características.

Em “Saberes da vida, saberes da escola” é apresentado em diferentes

momentos o protagonismo de figuras brasileiras (homens e mulheres) nas artes, na

literatura e na ciência. Na mesma coleção pouco observo de imagens contendo

pessoas, apesar dos conteúdos retratarem em sua maioria temas sociais. Quando

são trazidas tais imagens, a maior parte dos sujeitos veiculados são pessoas do

sexo masculino. A coleção busca ser interdisciplinar englobando diferentes

disciplinas em unidades em comum, entretanto a abordagem que se faz na

componente curricular Geografia é conteudista e algumas vezes superficial, como,

Page 168: DIVERSIDADE CULTURAL & EDUCAÇÃO DE JOVENS E …sistemabu.udesc.br/pergamumweb/vinculos/000050/00005061.pdf · RESUMO A dissertação desenvolvida busca identificar se a Diversidade

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por exemplo, no conteúdo que trata de migrações. No capítulo intitulado “Brasil

multicultural”, é trada uma multiplicidade cultural ligada tão somente às grandes

etnias que compõem o território brasileiro: africanos, indígenas e europeus. É falado

do racismo e da importância em combatê-lo.

Em “EJA Moderna” prevalece uma concepção de cultura aliada às

características de grupos étnicos bem como seus rituais, festejos, crenças religiosas

etc. É defendido que a Cultura e Identidade brasileiras são formadas por um

conglomerado de “culturas” que habitam no Brasil. Como parte de uma destas

culturas, o livro ilustra com fotografia de homens com indumentárias folclóricas

comemorando um festejo. Nesta coleção há uma presença marcante de imagens e

textos apologéticos à esfera militar brasileira. É trazido o assunto da participação

social na política formal brasileira, como o voto de analfabetos, indígenas, jovens e

idosos, com plebiscitos, além de outras formas de reivindicações dos direitos dos

trabalhadores. Além disso, as fotografias neste livro também dão visibilidade às

mulheres, por exemplo, com imagem da ex-presidenta da república Dilma Roussef,

de uma idosa votando.

Já na coleção “Alcance EJA”, a cultura é compreendida no contexto brasileiro

pela caracterização de cada região. A compreensão deste conceito está ligada a

padrões comuns de um grande grupo de pessoas. O livro lida com o conceito de

Cultura, Identidade Cultural e Diversidade Cultural objetivamente e explicitamente

definindo o que significa cada um destes termos. A Diversidade Cultural é trazida

como a mistura de povos (indígenas, negros, imigrantes e portugueses). A imagem

deste conceito consiste em uma dança com trajes típicos, ou seja, uma

representação folclórica da cultura e uma imagem-pensamento-clichê das

categorias: Cultura e Diversidade Cultural. Esta é trazida amparada em textos da

UNESCO, vista como necessária à espécie humana, patrimônio da humanidade e

fator de desenvolvimento.

Esta coleção trouxe o “novo perfil do povo brasileiro” com a finalidade de

apresentar o tema do crescimento da população, envelhecimento, densidade

demográfica. O assunto foi ilustrado com a antiga família brasileira (com muitos

filhos) e a atual família brasileira (com poucos filhos). Tal ideia de apresentar um

perfil de família é visto como uma contramão da Diversidade Cultural. Não acredito

na existência de um perfil de pessoa, aluno, filho, mãe, professor, nem família. Um

perfil é (provavelmente) sempre um clichê.

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A título de proposição, ressalto que as imagens não são boas ou ruins, mas

que devem ser problematizadas e que devem vir acompanhadas de reflexões, de

questões a serem pensadas, e não de figuras enquanto dados concretos e

encerrados. A relativização no lugar da generalização poderia ser trazida no

momento em que se traz um perfil de família brasileira, por exemplo. As

representações do país em que vivemos enquanto uma face militar poderia ter sido

mais explorada, de modo que outras faces fossem mostradas, ou que se pudesse

compreender porque a editora Moderna considera tão importante o militarismo

quando se fala em Brasil.

Acredito que um livro com menos certezas e mais questões, com mais

reflexões e menos informações estaria no caminho do que se chama livro didático,

uma vez que esta palavra se refere ao processo educativo. Minha proposição após

as análises não é de que imagens deveriam ser deletadas e outras acrescentadas,

mas que junto às figuras fosse discutido aquele discurso que se veicula. Quais as

outras famílias brasileiras, por exemplo? Desse modo, até mesmo os professores no

momento de suas aulas ou planejamentos pode propor maiores discussões e

reflexões junto aos estudantes.

Desejo encerrar este trabalho sem um ponto final. A pesquisa e as discussões

que aqui se desenvolveram não se iniciaram aqui e tampouco aqui se findam. Este

estudo foi fruto de uma série de contatos e trocas, todos devido aos diálogos e aos

devires da existência. O processo de conversas, orientações, leituras e escritas

resultaram em algo muito maior que esta produção acadêmica, a superação de

paradigmas, entraves, anseios, fragilidades e o surgimento de novas questões a

serem desenvolvidas.

Ressalto que este trabalho não teve o intuito de sentenciar nem estabelecer o

melhor ou o pior, o certo do errado. Não pretendi afirmar verdades enquanto

estatutos epistemológicos. O que prevaleceu aqui foi uma perspectiva, totalmente

permeada por minhas verdades internas.

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