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Contextos, causas e consequências da privação do direito à convivência familiar e comunitária Crianças e adolescentes sem cuidados parentais na América Latina DOCUMENTO DE DIVULGAÇÃO LATINO-AMERICANO Um documento: 10

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Contextos, causas e consequênciasda privação do direito àconvivência familiar e comunitária

Crianças e adolescentes sem cuidados parentais

na América Latina

DOCUMENTO DE DIVULGAÇÃO LATINO-AMERICANO

Um documento:

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Na América Latina milhares de crianças e adolescentes carecem de cuidados parentais, por não terem assegurada a condição básica

do desenvolvimento infantil: há de se pertencer a um grupo que seja capaz de reconhecê-los em sua singularidade, e ao mesmo tempo oferecer-

lhes afeto, respeitando e garantindo todos os seus direitos.

Por isso esperamos que esta informação sobre América Latina sirva àqueles que, desde diferentes setores, são atores chaves na

visibilização, sensibilização e implementação de respostas adequadas a tal problemática, e que

mesmo com suas limitações, contribua ao conhecimento, à reflexão e concretização de

melhores opções de cuidado para o exercício efetivo do direito a viver em família e

comunidade.

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Apresentação

“…É preciso esforçar-se continuamente para responder às condições de uma sociedade em constante mudança e aceitar novos desafios pelo em estar das crianças”.

Hermann Gmeiner

As crianças e adolescentes que por diversas razões vivem sem o cuidado de seus pais ou os que estão em risco de perdê-lo, são os mais expostos à pobreza, discriminação e exclusão, fatores que, por outro lado, podem torná-los mais vulneráveis ao abuso, exploração e ao abandono.

Através desta publicação tentamos tornar visível a realidade na qual vivem milhares de crianças e adolescentes na América Latina e, desta forma, mostrar ás diferentes organizações, instituições, governos e à sociedade civil a situação dos mesmos.

Esperamos que a informação produzida seja uma contribuição para o debate e inclusão do tema na agenda e, assim, promover a construção de boas práticas e políticas públicas que melhorem o bem-estar e possibilidade de desenvolvimento de crianças e adolescentes sem cuidado parental e/ou em risco de perdê-lo.

Este trabalho nos permite contar com uma ferramenta e oportunidade de advogar pela promoção e defesa dos direitos de crianças e adolescentes. Conhecer sua situação nos compromete a trabalhar por maiores oportunidades, por melhorar as práticas e a legislação

relacionada e por maiores recursos para sua adequada aplicação.

Os atuais esforços de Aldeias Infantis SOS estão focados na conquista do objetivo estratégico de que um milhão de crianças e adolescentes possa crescer em uma família que os cuide. Isto requer focalizar os recursos e desenvolver programas em lugares onde haja maior necessidade e nas áreas onde se alcance maior impacto. Investigar e analisar a situação da infância na América Latina constitui um instrumento e um compromisso para definir áreas de ação, e é nossa base para a tomada de decisões.

Esta publicação também reforça o princípio de cooperação e nossa convicção de que este caminho não é possível percorrer sozinhos; senão que é aliados com os estados, as diferentes organizações e a sociedade civil, além dos próprios envolvidos e comunidades, que conseguiremos obter um impacto maior. Tanto Aldeias Infantis SOS como Relaf, compartilhamos uma mesma visão no que se refere ao direito de crianças e adolescentes a crescer em uma família e promover soluções que respeitem este direito.

Aldeias Infantis SOS tem o compromisso de aprofundar os esforços de investigação e análise e esperamos que no futuro possamos contar com os estados e outras organizações para aprofundar na temática e que este informe se fortaleça e enriqueça continuamente.

Atenciosamente,

Heinrich Mueller Secretário Geral Adjunto para América Latina e o Caribe

Aldeias Infantis SOS Internacional

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Introdução

Na América Latina, milhares de crianças e adolescentes carecem de cuidados parentais ao não ter garantida a condição básica do desenvolvimento infantil: a pertença a um grupo que seja capaz de reconhecê-los em sua singularidade, ao mesmo tempo em que ofereça-lhes afeto e respeite e satisfaça todos seus direitos.

Este documento se baseia no relatório latino-americano Situação da infância sem cuidado parental ou em risco de perdê-lo na América Latina. Contextos, causas e respostas [1], o qual foi produzido a partir dos relatórios de 13 países da região. Os relatórios citados foram realizados pela organização internacional Aldeias Infantis SOS para conhecer a realidade das crianças sem cuidado parental ou em situação de vulnerabilidade, que constitui seu campo específico de ação, naqueles países onde esta organização tem suas sedes.

As Aldeias Infantis SOS América latina e Relaf -Rede Latino-americana de Acolhimento Familiar - decidiram realizar o relatório mencionado no parágrafo anterior, para o qual se utilizou como fonte a informação proporcionada pelos investigadores dos diferentes países, o que permitiu obter um panorama regional sobre a questão. Ambas organizações definiram, em conjunto, tanto os objetivos assim como as variáveis de estudo a serem consideradas.

Assim que os propósitos foram definidos, a Relaf constituiu uma equipe interdisciplinar que analisou, de maneira crítica, o conjunto dos relatórios nacionais. A equipe foi constituída por uma antropóloga, uma socióloga, uma assistente social e uma licenciada em comunicação social. Todas as integrantes da equipe, assim como sua coordenadora, possuem experiência acadêmica em investigação e em direitos da infância. Por outro lado, contou-se com uma assistente, que é estudante avançada de antropologia.

A informação obtida foi complementada com bibliografia específica, assim como com uma descrição dos avanços conquistados no campo das políticas públicas destinadas às crianças, adolescentes e famílias em situação de vulnerabilidade. (Para quem desejar ampliar a informação contida neste documento, recomendamos a leitura do relatório latino-americano.

Situação da infância sem cuidado parental ou em risco de perdê-lo na América Latina. Ali encontrarão a fonte completa, bem como os anexos de interesse: "Resumo de b ib l iogra f ias" e "Compromissos em eventos internacionais").

Os técnicos responsáveis pelos relatórios nacionais contam com uma reconhecida experiência em investigação, pertencem a diferentes disciplinas e aplicaram uma metodologia variada: recopilação da informação estatística das fontes disponíveis em seus países; grupos focais com "pessoas chaves"; entrevistas com tomadores de decisões, crianças, famílias, etc. Os resultados da tarefa empreendida é de grande relevância se considerarmos a falta de informação sistematizada sobre a questão. Os países relevados foram: Brasil, Chile, Colômbia Equador, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, México,

Nicarágua, Paraguai, República Dominicana e Venezuela. Uma vez finalizada a versão preliminar do

mencionado relatório latino-americano, expertos internacionais analisaram o material e realizaram contribuições para sua melhoria. Seu generoso e comprometido trabalho permitiu ajustar alguns dos aspectos trabalhados. Dessa maneira foi incorporado a este documento as contribuições de Rosa Maria Ortiz, membro do Comitê dos Direitos da Criança das Nações Unidas; Erica Brasil, investigadora da Universidade de Nottingham, Inglaterra; Christina Baglietto e Cécile Maurin, do Centro Internacional de Referência do Serviço Social Internacional; Maria Eugenia Villarreal, de ECPAT - End Child Prostitution, Child Pornography and Traficking of Children for Sexual Purposes para América Latina, e especialistas da área de advocacia de Aldeias Infantis SOS.

É necessário enfatizar que, a respeito das muitas variáveis que se pretendia analisar, há uma ausência total de dados tanto oficiais como de organizações acadêmicas ou organizações dedicadas à proteção de direitos da infância em boa parte da região. Por esta razão pode ser observado no relatório latino-americano assim como neste documento, a falta de informação chave em alguns dos 13 países estudados. No entanto, e tendo sempre como pano de fundo a situação de crianças e adolescentes latino-americanos, deve considerar-se como um grande avanço o que foi obtido: um panorama geral sobre a vigência de um dos direitos fundamentais, o direito de contar com cuidados parentais, uma das dimensões básicas do direito à convivência familiar e comunitária.

É nosso desejo que este documento sirva como fonte de informação, tanto para quem está relacionado ao cuidado alternativo de crianças e adolescentes como para quem, desde diferentes setores, são atores chaves para dar visibilidade, sensibilizar e na implementação de respostas adequadas: os meios de comunicação e a sociedade em seu conjunto.

Esperamos que, mesmo com suas limitações, contribua ao conhecimento, à reflexão e à prática de melhores opções de cuidado para a efetivação do direito a viver em família e comunidade.

Buenos Aires, abril de 2010.

Matilde Luna

1 - Relatório completo disponível em espanhol em www.relaf.org

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I . Por que, na América Latina, há crianças e adolescentes que perderam o cuidado de seus pais?

Os motivos da falta de cuidado parental são múltiplos, variados e complexos, assim como o são as conseqüências dessa situação para a vida dessas crianças [2].

Para identificar as causas que geram a perda do cuidado parental nas crianças e adolescentes é necessário remeter-nos às principais problemáticas políticas, econômicas, sociais e culturais dos países da região Desse modo podemos agrupar as causas dentro dos seguintes conjuntos de problemáticas: políticas, tais como conflitos bélicos e as migrações forçadas por situações dessa índole; econômicas, que geram também outro tipo de migração, assim como provocam numerosas situações de vulnerabilidade familiar tais como a falta de acesso à saúde, educação e moradia, desnutrição de adultos e crianças. Situações, que por outro lado, estão intimamente vinculadas às problemáticas sociais e culturais como violência familiar, adições, trabalho infantil e exploração sexual comercial, às quais se somam situações de discriminação diante da incapacidade e da origem étnica da população.

As crianças e adolescentes que atualmente não dispõem de cuidado parental fazem parte, com anterioridade, de um grupo em situação de risco. A informação sistematizada e resumida aqui em seus tópicos principais demonstra que existem numerosas e identificáveis causas para a perda de cuidados parentais, através das quais pode estabelecer-se qual é a população de crianças e adolescentes que estão em risco de perder tais cuidados ao estarem submetidas a este flagelo. Primeiro veremos o contexto das causas para, em seguida, enumerá-las e descrevê-las.

1. Relação entre a falta de cuidados e a situação de pobreza.

América Latina é um continente que se caracteriza por uma profunda desigualdade econômica e social, tanto entre os países como no interior de cada um deles, disparidade que se incrementou nas últimas décadas. Outra característica que identifica a região é o grande número de pessoas que vivem na linha de pobreza, superando em média 30% da população total (ver mapa no final do capítulo 1).

A pobreza e a desigualdade são identificadas como as principais causas de perda ou risco de perda de cuidados parentais na população infanto-juvenil. Nesse ponto é imprescindível compreender que apesar da pobreza ser identificada como causa principal da problemática estudada, isso não permite estabelecer uma relação linear entre crianças e adolescentes pobres e aqueles carentes de cuidado parental.

A relação entre pobreza e falta de cuidado parental é mais dinâmica e complexa. Não só as crianças pobres que estão expostas à perda ou risco de perda de cuidados parentais. Problemáticas como HIV, adições e violência intra-familiar não são exclusivas de setores pobres, embora nestes setores sejam mais visíveis. Entre outros

motivos, porque seus integrantes recorrem aos mecanismos estatais para conseguir algum tipo de ajuda que lhes permita sair de tais situações. No caso dos setores não pobres, o acesso a ajudas profissionais, tanto de saúde como de educação, realiza-se através de canais particulares; razão pela qual não estão incluídos nas estatísticas que o Estado realiza sobre estas situações, a partir de dados provenientes das instituições públicas.

Da mesma forma, é importante destacar que os setores pobres das sociedades latino-americanas padecem de mais problemas sociais por estar vinculados às enormes dificuldades que enfrentam para acessar os serviços públicos que os Estados deveriam garantir a toda a população, como educação, saúde, habitação e trabalho.

Todas as situações problemáticas vinculadas ao risco de perda do cuidado parental se repetem quando analisamos as causas da perda já consumada, o que nos leva a destacar a necessidade de estudá-las pensando em medidas de prevenção, proteção e fortalecimento familiar que evitem o estado de vulnerabilidade que significa para a infância carecer de cuidados parentais.

2. Identificação de causas e condições às quais padecem crianças e adolescentes sem cuidado parental.

Concentração demográfica nas regiões suburbanas

» Nas grandes cidades da América Latina, as regiões precariamente urbanizadas são denominadas como “villa miseria”, “bairros”, “favelas”, “pueblos jóvenes”. “assentamentos urbanos”, entre outros.

Na análise da região observa-se que as zonas rurais são as que apresentam maiores índices de pobreza extrema de maneira absoluta. Esta situação gera migrações internas, das zonas rurais às grandes cidades, onde se formam “anéis” em torno das capitais ou cidades importantes, onde se assenta um grande número de famílias.

Esta migração do campo à cidade se deve a busca de subsistência, uma vez que nos setores suburbanos existe maior possibilidade de acesso a algum tipo de moradia, estabelecimentos escolares, centros de saúde e, sobretudo, há maiores possibilidades de obter empregos temporários, informais, assim como diversas estratégias de sobrevivência. Nesta dinâmica dos grandes conglomerados suburbanos vivem tanto adultos como crianças e adolescentes.

2 - Quando falamos crianças, nos referimos a crianças e adolescentes. Ver glosário.

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Este fenômeno traz consigo outras problemáticas, próprias da superlotação, tais como novas doenças, adições, conflitos com as forças de segurança ou militares, dependendo de cada país, por sua condição de “ilegais” ou “usurpadores de terrenos ou espaços públicos”, etc.

Nestas migrações internas e adversas condições de convivência, acontecem freqüentes separações de crianças e adolescentes de sua família de origem.

Dificuldade no acesso à saúde. A marca do HIV/AIDS

» Equador: entre 2002 e 2008 estima-se que o número total de pessoas com HIV/AIDS supera 9.270 pessoas (homens: 5.972; mulheres: 3.298), das quais 212 são meninas e 258 meninos, que representam 2,29% e 2,78%, respectivamente [3] » Os países da região onde há maior número de morte de adultos por HIV/AIDS são os mais pobres em termos absolutos: Haiti, Nicarágua e Guatemala.

O HIV/AIDS é causa de perda de cuidados parentais e, ao mesmo tempo, uma das características das crianças e adolescentes que perderam o cuidado de seus pais por ser portadores do vírus. Ou seja, esta causa tem duas dimensões: os adultos doentes de HIV/AIDS, que não podem cuidar de suas crianças e adolescentes, e as próprias crianças e adolescentes infectados com esta doença, situação que é crescente e difícil de visibilizar na região.

O HIV/AIDS é uma das principias causas de orfandade de crianças e adolescentes da região, embora se trate de uma doença que pode ser controlada quando se garante o acesso aos centros de saúde e medicamentos necessários.

Crianças e adolescentes órfãos

» Colômbia: segundo o relatório de 2005, seriam 835.410 crianças e adolescentes órfãos.Devido às dificuldades encontradas para seu relevamento, considera-se que a cifra é maior.» Honduras: tem um total de 190.982 órfãos a nível nacional. Dos quais, são órfãos de pai e mãe 9.489 (5%); órfãos de mãe 51.357 (26,9%) e órfãos de pai 130.135 (68,1%) . Das crianças e adolescentes órfãos, 52,8% moram na área rural e 47,2 % na área urbana. » México: estima-se que há 1.600.000 crianças e adolescentes órfãos e que pelo menos 40 mil têm como causa o HIV/AIDS. » Venezuela: possui 480.000 crianças e adolescentes órfãos.» República Dominicana: superam 120.500 as crianças e adolescentes órfãos.

A orfandade é causa de perda de cuidados parentais. Um grande número de crianças e adolescentes alojados em instituições é órfão e não lhes é restituído o direitos de viver em família quando perdem a própria.

No entanto, em muitas situações de perda de cuidados parentais são as próprias famílias extensas e

3 - Todos os dados deste documento foram extraídos do Relatório Latino-americano. Situação da Infância sem Cuidado Parental ou em Risco de Perdê-lo na América Latina. Contextos Causas e respostas. Para os interessados em acessar o relatório completo, consultar www.relaf.org

comunidades às quais pertenciam as crianças e adolescentes as que assumem o cuidado, assegurando sua permanência nos grupos aos quais se encontravam vinculada anteriormente.

A orfandade é uma problemática derivada de outras, como a desnutrição e a subalimentação, as doenças e as dificuldades de acesso à saúde, as catástrofes naturais, os conflitos armados de baixa intensidade, como guerrilha e disputas geradas pelo narcotráfico, que colocam em risco a vida das pessoas.

Como principal causa de orfandade, na maioria dos países da América Latina, encontra-se o HIV/AIDS e as situações de violência social, tanto em grupos antagônicos como com as forças de segurança.

A vida em famílias mono parentais » No Haiti, a formação de famílias mono parentais é identificada pelos expertos como a principal causa de risco para a perda de cuidados parentais. 32% (1.499.308) das crianças e adolescentes estão em risco de perder completamente o cuidado parental, e a maioria deles pertence a uma família com um só genitor. » No Paraguai , do total de crianças e adolescentes em risco de perder o cuidado de seus pais, 25% vivem somente com a mãe e 11% somente com o pai.

Esta é uma realidade fortemente vinculada à problemática da saúde, enfrentamentos bélicos e/o violência social, que põem em risco a vida dos adultos. Soma-se a isso o desmembramento das famílias pelo abandono por parte dos homens de seus lares conjugais. Assinala-se que a ruptura dos vínculos está relacionada tanto aos conflitos decorrentes do estresse que gera a escassez de recursos econômicos, como às dificuldades no desenvolvimento emocional, que impede de enfrentar as situações de conflito entre os adultos, a compreensão dos filhos adolescentes e oferecer o suporte necessário às crianças, entre outros.

Junto ao mencionado, estão as problemáticas vinculadas a questões de gênero, como é o mandato “cultural” pelo qual “os filhos são responsabilidade das mães”, que “devem” permanecer para cuidá-los, sob pena de serem consideradas “inumanas” se não o fizeram, adjetivo que não é utilizado no caso dos pais que não assumem o cuidado de seus filhos.

A iniquidade de gênero tem muito peso na região, persistindo sobre as mulheres uma sobrecarga a partir do “mito do instinto maternal” e a legitimação do abandono e a violência exercida pelos homens num contexto de forte machismo.

As famí l ias mono parentais, formadas principalmente por mulheres à frente do lar, são propensas a situações de maior vulnerabilidade entre as crianças e adolescentes, que costumam passar mais tempo sozinhos em casa enquanto suas mães trabalham fora, assim como padecem a escassez de ingressos na família, o qual requer, em muitos casos, a mobilização dos mesmos em busca de dinheiro, seja através de trabalhos precários, da mendicância, ou de formas de exploração comercial, inclusive a exploração sexual. Neste contexto , crianças e adolescentes estão expostos a perder o cuidado de sua família.

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Gravidez na adolescência

» O relatório do Chile destaca que em torno de 23% das mulheres que fazem pré-natal são adolescentes. » No caso da Nicarágua representa 44,6% e em El Salvador, as adolescentes grávidas constituem 124 de cada mil.

A gravidez na adolescência na região é também causa de perda do cuidado parental. Algumas das situações relevadas nos países são: adolescentes como chefes de família, situações de violência familiar como conseqüência da gravidez, e abandono por parte das adolescentes de suas casas em função da reprovação de seus pais.

Segundo estudos sobre esta problemática, as adolescentes de setores pobres têm maiores possibilidades de engravidar por vários motivos: falta de informação sobre métodos contraceptivos, falta de acesso aos mesmos, falta de conhecimento sobre planificação familiar, falta de contenção familiar, e falta de perspectiva de futuro que não seja ligado à maternidade.

Em relação a este último ponto, tem-se observado que as adolescentes que engravidam, em alguns casos, desejaram sua gravidez, visto que é a única forma consciente ou inconsciente na qual estas mulheres dão um significado à sua existência, a partir do mandado da cultura da maternidade.

Por outro lado, cabe destacar também que há níveis cada vez mais altos de sexualidade precoce, assim como de gravidez de crianças e adolescentes vinculadas à violência e ao abuso.

É importante considerar este tema em toda sua complexidade e diversidade: existe uma grande quantidade de adolescentes grávidas que permanecem em suas casas, com ou sem seus companheiros, e que são acolhidas por suas famílias (pais, mães, avós, tios, etc.), que acompanham este processo, e as integram ao grupo de adultos e crianças que já moram nestas casas.

Aparece, então, a família e o grupo de pertença novamente como um fator “protetor”, capaz de evitar que estas adolescentes e seus filhos careçam de cuidados parentais, o qual nos leva a considerar, mais uma vez, a importância de atuar a favor destes grupos familiares chamados “família extensa”.

Trabalho infantil e/ou exploração sexual e comercial

» No Chile é indicado que 238.187 crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos trabalham. Destes, 106.676 (44,9% do total) o fazem em condições inaceitáveis (ex.: crianças de 11 anos ou menos, adolescentes de 12 a 14 anos que abandonaram os estudos, adolescentes de 12 a 14 anos que realizam trabalhos durante 14 horas ou mais por semana), e 68.000 são menores de 15 anos. Um total de 88.428 (37,1%) crianças e adolescentes realizam trabalhos em condições aceitáveis e 42.083 (17,6%) realizam tarefas domésticas por, no mínimo, 21 horas semanais, dos quais 85% são mulheres. Estas cifras, muito significativas em relação à população total de crianças e adolescentes do país, não contemplam o número dos que trabalham e vivem nas ruas ou instituições. Também não incluem a declaração “anônima”,

para dar um nome, de parte das crianças e adolescentes sobre as chamadas “piores forma de trabalho infantil”, como são o comércio sexual e o tráfico de drogas.Por outro lado, o trabalho agrícola de temporada é desenvolvido por menores de idade, na maioria meninos, de 5 a 14 anos (que totalizam 12.678 e representam 70,5% do total dos envolvidos neste tipo de trabalho).» Na Colômbia é preocupante: 14.887 crianças e adolescentes aparecem como empregados domésticos. Este fenômeno começa a ser encontrado desde os 5 anos de idade. » No México, estima-se que o número de vítimas de exploração sexual e comercial supera os 80.000.

Uma porcentagem importante das crianças que perderam ou estão em risco de perder o cuidado parental está envolvida com alguma forma de trabalho ou exploração infantil.

Este aspecto tem diversas dimensões que devem ser consideradas. Nos setores mais pobres da população estão fortemente vinculadas à necessidade de subsistência, e como integrantes da família, as crianças saem buscar alguma forma de subsistir diariamente.

No entanto, o trabalho infantil está naturalizado e aceito como parte da economia familiar em certos setores nos quais as situações são menos críticas: é o caso das zonas rurais onde a maioria se concentra no trabalho agropecuário, em ocupações como colheita, plantação, venda de produtos agrícolas e cuidado de animais.

Também existe na região uma aceitação cultural significativa sobre o trabalho doméstico dos menores de idade, tanto no seio da própria família como em outras casas.

A exploração infantil encobre um dramático fenômeno delitivo: muitas vezes são os próprios pais que “entregam” as crianças e adolescentes.

Dificuldades no acesso à educação » Equador: do total de jovens de 13 a 18 anos, somente 24% está cursando ou termina o ensino fundamental, 25% o ensino médio e 3,2% a universidade. » Nicarágua: dos adolescentes entre 12 e 17 anos, somente 4 de cada 10 tem acesso à escola.

A dificuldade para acessar a educação formal é uma característica do grupo de crianças e adolescentes em risco de perder o cuidado parental, assim como é a baixa escolarização de seus pais. E também é causa de perda de cuidados parentais, quando para freqüentar uma instituição educativa as crianças e adolescentes devem migrar a outras cidades onde há escolas e assim ficam sob o cuidado de familiares distantes ou amigos da família.

No Paraguai se detectou que este é o principal motivo pelo qual crianças e adolescentes vivem em casas de outros parentes, ou inclusive não parentes..

A relação entre educação e perda do cuidado parental será retomada com maior profundidade no capítulo sobre direitos violados deste mesmo documento.

Uso de drogas, conflito com a lei, violência intra familiar, abusos e paternidade irresponsável

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» No México, em uma consulta realizada no ano de 2000 na qual participaram 4 milhões de crianças e adolescentes entre 6 e 17 anos, 28% das crianças entre 6 e 9 anos disseram que são tratadas com violência em suas famílias. » Em El Salvador se identifica que o abuso infantil em suas diversas expressões (físico, emocional ou sexual) é o segundo motivo de ingresso de crianças e adolescentes a centros de atenção, e representa 16,6% do total de casos atendidos entre 2004 e 2006.

Estas problemáticas aqui agrupadas, com certa freqüência se apresentam simultaneamente.

São fenômenos sociais muito complexos e diversos, às vezes conectados entre si. A partir dos dados registrados nas investigações dos países da América Latina podemos ressaltar a necessidade de aprofundar na violência familiar, suas causas e conseqüências, para poder abarcar todas as variáveis que a compõem como problemática. Para isso, agrupamos aqui, junto à violência familiar, as categorias de uso de drogas, conflito com a lei, abusos e paternidade irresponsável.

A paternidade i r responsável deve ser contextualizada dentro dos lares onde convivem diversos conflitos sociais e vinculares: dependência química (uso de drogas e álcool), situações de conflito com a lei penal, deterioro da saúde mental.

Em alguns países se descreveu também que as famílias convivem em sociedades onde a violência policial e política é manifesta.

Diante desta situação é imperioso não realizar uma “demonização” dos setores pobres das sociedades latino-americanas, e sim, pelo contrário, entender quais são as condições de vida que os Estados não estão garantindo aos seus cidadãos, que permitem, então, situações extremas e cultivar, em seu lugar, uma estratégia preventiva e não punitiva como primeira e, às vezes, única resposta.

Adolescência e perda de cuidados parentais. Crianças e adolescentes “chefes de família”

» Na Colômbia se verifica que, tal como assinala a pesquisa nacional de demografia, ENDS, a proporção de crianças que vivem com ambos os pais vai diminuindo à medida que aumenta sua idade, ao mesmo tempo em que aumenta os que vivem somente com um dos pais.Por outro lado aumenta com a idade o número de crianças órfãs. Enquanto que na faixa de 2 anos encontra-se 0,9% de crianças órfãs, na faixa de 10 a 14 anos há 8,9% de órfãos sobre o total da população dessa idade.Finalmente a mencionada pesquisa assinala que um total de 44.595 adolescentes são “chefes de família”, e desse total, 76.278 foram identificados como “cônjuges do chefe de família”, dos quais 3.147 têm menos de 14 anos.

A perda de cuidados parentais ocorre, com maior freqüência, na faixa etária correspondente aos adolescentes.

De forma recorrente nos países da América Latina se descreve o fenômeno das crianças e adolescentes que fogem de suas casas por serem vítimas de violência, maus tratos e carência de condições básicas de sobrevivência.

Isto gera um importante número de crianças, sobretudo entre 10 e 14 anos, que vão embora de suas casas e vivem sem cuidados parentais, em muitos casos, em situação de rua, e em outros, aglomerados em zonas suburbanas. Muitos deles são pais em idade precoce, e reproduzem em seus filhos sua própria situação de falta de acesso a direitos..

No caso de adolescentes chefes de família, são eles que assumem a responsabilidade de cuidar de crianças, sejam elas irmãs menores, filhos ou outras crianças com as quais estão vinculados.

As situações que levam os adolescentes a converter-se em chefes de família são variadas: uma, analisada anteriormente, é a gravidez na adolescência, o que leva, em muitos casos, a formar uma família e constituir-se assim em chefes de família a uma idade precoce. Em outras ocasiões, os adolescentes se constituem em chefes de família diante do abandono, morte ou migração dos pais ou adultos com os quais convivem.

Catástrofes naturais

» O México ocupa o lugar número 12 no ranking mundial de países propensos a sofrer catástrofes naturais: morreram quase 10 mil pessoas de 1986 a 2006 devido às mesmas. » No Haiti, o terremoto de 12 de Janeiro de 2010, lançou uma cifra calculada em 200.000 mortos em sua cidade capital, Porto Príncipe.

As catástrofes naturais criam condições adversas para crianças e adolescentes em particular, pois são vítimas fáceis de tráfico, e estão altamente expostos à orfandade pelo falecimento ou perda de seus pais. Países como Guatemala, México, Haiti, Chile e Peru sofreram sucessivas catástrofes naturais das quais não se recuperaram totalmente. E as condições de pobreza prévia limitam a possibilidade de contar com uma infra-estrutura capaz de assumir os cuidados em situação de emergência. Como ficou demonstrado no Haiti, a cooperação internacional pode estar sendo digitada por aliados nacionais que apontam a aproveitar-se da situação de caos e extrema necessidade que afeta as crianças e adolescentes.

Migração

» O México registra grandes movimentos migratórios aos Estados Unidos de mulheres, crianças e adolescentes, sendo que os menores de idade, em muitos casos, viajam sem seus familiares. Durante 2007, 35.543 deles atravessaram a fronteira. » Na Colômbia se calcula que 2.414.269 pessoas, das quais 35,6% são menores de 17 anos, sofreram mudanças forçadas de seus lugares de origem para outras regiões do território nacional como conseqüência da violência armada que sofre o país. » A República Dominicana é tanto um país do qual emigram muitos menores de idade, como também um país receptor de migrações provenientes do Haiti, cuja população, profundamente castigada por uma situação social de extrema pobreza e a reiteração de desastres naturais, move-se constantemente para o território dominicano através da fronteira.

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» Equador e Honduras registram um alto número de crianças que têm seus pais no exterior e vivem do dinheiro que os mesmos enviam. No caso de Honduras, 20% das crianças que não moram com seus pais padecem esta situação.

As pessoas migrantes sofrem condições adversas nos países nos quais se inserem. A discriminação é uma das mais importantes já que dificulta a plena integração. A falta de documento de identidade os converte em “ilegais”, razão pela qual acessam quase que exclusivamente empregos secundários e não contam com acesso a serviços públicos como saúde e educação.

A face econômica da problemática é outra das condições adversas dos migrantes, que se percebe claramente no envio de remessas àqueles integrantes da família que ficam nos países de origem.

Pobreza e indigência

A América Latina apresenta altos índices de pobreza: 20,3% da população total são pobres e 12,9% indigente,4 alcançando a milhares de crianças. O que chega a níveis ainda mais altos se considerarmos o fenômeno da “infantilização da pobreza”, que expressa que a maioria dos pobres são crianças e adolescentes.

O índice mencionado no parágrafo anterior corresponde à média entre os países da região; no caso de Honduras, Nicarágua e Haiti, mais de 50% da população está atualmente em situação de pobreza.

REFERÊNCIAS

0% A 20%

20% A 40%

40% A 60%

60% A 80%

Fonte: Panorama social da América Latina 2008, sobre a base de tabulações especiais de pesquisas domiciliares dos respectivos países (CEPAL) [4].

4 - CEPAL, Panorama social de América latina 2008.

A desigualdade e a pobreza são assinaladas pelos investigadores dos 13 países como duas das causas principias de perda do cuidado parental ou do risco de perdê-lo, para crianças e adolescentes.

No entanto , em alguns países latino-americanos estas causas são citadas como excludentes.

A maioria dos países latino-americanos foram atravessados, em décadas recentes, por governos ditatoriais de maior ou menor duração, e na década de 90, por governos neoliberais que implementaram políticas de ajuste econômico que aprofundaram exponencialmente os níveis de pobreza e indigência, aumentando a má distribuição da riqueza entre a população, o qual tem impacto direto em crianças e adolescentes.

Por isso, embora a relação entre pobreza e falta de cuidados não seja linear, é claramente identificável que as famílias pobres estão em maior risco de padecer sua desintegração como produto da luta pela sobrevivência e a falta exercício de seus direitos humanos, sociais, culturais e políticos.

II. Quantos são e onde estão as crianças e adolescentes sem cuidados parentais?

Na América Latina existe um grande déficit de dados e de informação confiável que permita conhecer a situação e elaborar políticas sociais, seu seguimento e avaliação.

Apesar deste déficit, nos estudos sistematizados se evidencia “como ponta do iceberg” um grande número de crianças e adolescentes que carecem de cuidados parentais.

A problemática que hoje denominamos “crianças sem cuidado parental ou em risco de perdê-lo” engloba inúmeras situações nas quais, de maneira total ou parcial, as crianças carecem de um referente adulto, que perdure no tempo, que seja o vínculo para seu sustento e cuidado. Assim como são diversas as causas da falta de cuidados parentais, também o são as situações nas quais se encontram as crianças e adolescentes que carecem destes.

Muitos deles se encontram separados de seus pais por medidas tomadas pelas autoridades da infância e adolescência, e incluídos em um determinado tipo de cuidado alternativo formal. Também podem estar em cuidado alternativo de modo informal, em cujo caso acontece um “acordo privado” entre os adultos que cedem o cuidado e os que o assumem.

Quando é formal tem como objetivo a proteção da criança/adolescente, e se opta pela separação para

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resolver o problema que a motivou (cessar os maus tratos, assumir a responsabilidade dos pais, etc) e para que a criança retome a convivência com sua família de origem; ou se decide por uma medida definitiva diferente (por exemplo, a adoção).

No entanto, surge nas investigações que crianças e adolescentes costumam permanecer indefinidamente separados sem definirem-se medidas seguras, estáveis e apropriadas.

Por outro lado, como se verá adiante, muitos deles não estão incluídos em nenhum tipo de cuidado alternativo informal ou formal: são as crianças e adolescentes em situação de rua ou que se desempenham como “chefes de família”.

Embora a falta de dados não dê conta da quantidade real de crianças e adolescentes sem cuidado parental, a informação disponível nos permite uma aproximação quantitativa à problemática. Para isso, oferecemos alguns exemplos [5].

» Na Colômbia, a terceira parte das crianças e adolescentes vivem somente com um dos pais e mais de 1.100.000 não vive permanentemente com nenhum deles. » No Equador estima-se que 8,65% das crianças e adolescentes do país (490.383 crianças/adolescentes) não vivem com seus pais. » No México reportou-se um total de 412.456 crianças e adolescentes privados de cuidado parental (1,09% da população infanto-juvenil), embora este número possa ser ainda maior, pois o Comitê de Direitos da Criança das Nações Unidas fez observações ao Estado mexicano sobre a falta de dados a respeito da quantidade de crianças e adolescentes nessa situação. » Na Nicarágua, segundo a última Pesquisa em Demografia e Saúde (ENDESA), sobre uma população de 1.933.118 crianças e adolescentes, 676.591 (35%) (menores de 15 anos, que vivem em áreas urbanas), não vivem com o pai; 483.279 (25%) vivem somente com a mãe, e 193.311 (10%) não vive com nenhum dos dois. » No Paraguai, segundo o censo 2002, são 289.000 as crianças e adolescentes que não vivem com seus pais, o qual representa 12,12% da população infanto-juvenil total. Outro dado do mesmo censo indica que 588.000 crianças e adolescentes vivem em um lar cujo chefe não é seu pai nem sua mãe. Dentro deles, 299.000 são netos do chefe da casa, o qual não necessariamente implica que seu pai ou mãe vivam sob o mesmo teto. E, além disso, 155.000 vivem com outro familiar ou um não familiar, dos quais 11.000 são filhos de empregadas domésticas, que vivem com suas mães nas casas onde elas trabalham. Destes 11.0000, 1.300 têm entre 0 e 6 anos. » O cenário é ainda mais crítico na República Dominicana, país que reportou um total de 580.781 crianças e adolescentes menores de 15 anos privados de cuidado parental para o ano de 2007, o qual representa 18,8% da população infanto-juvenil do país.

5 - Lembramos que todos os dados incluídos para ilustrar o que foi descrito neste documento foram extraídos do Relatório Latino-americano. Situação da infância sem cuidado parental ou em risco de perdê-lo na América Latina. Contextos, causas e respostas. Para os interessados em acessar o relatório completo, consultar em www.relaf.org

Quais são as características predominantes das crianças e adolescentes sem cuidado parental?

As estatísticas indicam que há crianças e adolescentes sem cuidado parental em todas as faixas etárias, embora à medida que aumenta a idade aumenta também a quantidade de crianças órfãs, em instituições ou em situação de rua.

Em alguns países também se encontram alojados em instituições crianças de grupos étnicos que sofrem discriminação, tal como é o caso no Brasil dos afros descendentes.

» A maior concentração de crianças e adolescentes sem cuidado parental na Colômbia acontece em grupos etários de 10 a 14 anos, que representam 11,2% da população infanto-juvenil total. As crianças entre 5 e 9 anos sem cuidado parental são 8,2% da população infanto-juvenil, em seguida estão as crianças de 2 a 4 anos com 5,2% e, por último, 1,6% de crianças sem cuidado parental corresponde a menores de 2 anos. A respeito de sua condição sócio-econômica, 9,8% das crianças e adolescentes de nível mais baixo não convive com nenhum dos pais, enquanto que em nível mais alto a cifra é de 5,7%. » No Equador, 47,85% das crianças e adolescentes privadas de cuidado parental tem entre 13 e 18 anos, seguido por 41,79% que tem entre 5 e 12 anos e 10,36% que tem de 0 a 4 anos de idade. » Um estudo do Brasil do ano de 2004 revelou que uma grande proporção de crianças e adolescentes alojados nas instituições era negros, adolescentes e do sexo masculino. Por outro lado, as pessoas que desejavam adotar, segundo este estudo, preferiam meninas, bebês e brancas.

O uso inadequado do cuidado alternativo de crianças e adolescentes

Como foi dito, as crianças e adolescentes podem ser incluídos em algum tipo de cuidado alternativo formal, seja nas múltiplas modalidades da institucionalização, seja em acolhimento familiar.

Como mostram os exemplos ressaltados, embora não excludentes, caracterizam-se como situações nas quais há um mau uso do cuidado alternativo, ou seja, este não responde a uma necessidade da criança nem foi prevenida a separação de sua família de origem, tal como se estabelece nos procedimentos previstos na Convenção dos Direitos da Criança e nas recentemente aprovadas Diretrizes das Nações Unidas sobre o cuidado alternativo das crianças.

» Segundo os especialistas de Honduras, há uma tendência das autoridades desse país à institucionalização e acolhimento de crianças e adolescentes em programas públicos e privados, e a sua separação dos vínculos familiares por fatores que, a princípio, deveriam ter recebido um tratamento preventivo e encaminhado a responsabilizar os pais e não culpabilizar e vitimizar a criança, tais como: má conduta, indisciplina, pobreza, desavenças familiares, abandono do lar, entre outros. Além disso, acrescentam que o recurso da institucionalização pode estar baseado na ausência de programas de prevenção de fatores de risco, de apoio às famílias, e

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programas temporários de acolhimento, enquanto que o caso particular é investigado e a medida definitiva é avaliada pela autoridade competente.

» Na Nicarágua, a maioria das crianças e adolescentes institucionalizados tem família e estão vinculados com ela, pelo qual seu direito a viver em família e comunidade está sendo violado. As razões de sua institucionalização são variadas: as mães dessas crianças e adolescentes cumprem longas jornadas de trabalho que lhes impede estar em casa cuidando-os, ou tiveram que migrar por falta de trabalho, ou decidiram que seu filho/a viva na instituição para acessar a escola, entre outras. A situação descrita mostra claramente a falta de recursos para que as famílias possam tornar-se responsáveis pelo cuidado de seus filhos. » Especialistas da Colômbia ressaltam que muitas crianças passam sua infância e completam a maioridade

As causas de ingresso são ilegítimas: a

pobreza e a orfandade são as mais evidentes.

em instituições de proteção, com tudo o que isto pode significar em termos psicossociais, de construção de laços afetivos e de capacidades para a vida que permitam sua inclusão social. » Especialistas do México assinalam que muitas crianças e adolescentes encontram-se institucionalizados em albergues ou centro de proteção especial e lares substitutos de maneira indefinida, alguns sem os devidos procedimentos nem garantia constitucional, atentando substancialmente contra seus direitos humanos elementares. As medidas de internação que aplica o Ministério de Família , Adolescência e Infância (MIFAN) devem ser transitórias, mas por falta de seguimento tornam-se indefinidas e as crianças se tornam adultos nos centros. A prolongada permanência das crianças e adolescentes nos centros de internação sendo que a maioria tem família, constitui um indicador de que não se trabalhou com as famílias nem foram aplicadas medidas alternativas à institucionalização.

USO INADEQUADO DO CUIDADO ALTERNATIVO DE CRIANÇASE ADOLESCENTES PRIVADOS DO CUIDADO PARENTAL

As medidas são indefinidas quanto ao

tempo, por ausência de seguimento e d

reintegração familiar.

São tomadas decisões sem o devido processo legal, violando o direito

a ser cuidado das crianças e adolescentes,

entre outros.

Na prática os cuidados alternativos não se enquadram em uma

perspectiva de diretos, e sim têm uma abordagem

assistencialista.

É freqüente que as instituições se localizem em lugares distantes da família e da comunidade

das crianças.

Não se adotaram medidas para prevenir e evitar a separação (ajuda

à família de origem).

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6

5.000 niños en instituciones.

TOTAL: O número de crianças/adolescentes em instituições do conjunto dos países assinalados é de 374.308. Não é um número exato (entre outras questões, devido ao sub-registro), mas permite

uma aproximação quantitativa.

Número de crianças e adolescentes institucionalizados na América Latina. Por País.

6 - Dados dos Relatórios Nacionais de Aldeias Infantis SOS.

HONDURAS [6] 3.605 crianças/adolescentes em

instituições.MÉXICO [6]

29.310 crianças/adolescentes vivendo em

703 instituições.

NICARAGUA [6] 2.967 crianças/adolescentes

institucionalizadosem um total de 88

centros.

ARGENTINA Em 2005 o estudo “Privados de Liberdade” (INICEF / Secretaria de Direitos Humanos) relevou um total de

17.063 crianças/adolescentes em 642 instituições governamentais e não governamentais por causas

assistenciais.

GUATEMALA [6] 5.600

crianças/adolescentes em instituições.

EL SALVADOR [6] Para o ano 2006, 10.042crianças/adolescentes

estavam em instituições.

COLÔMBIA [6] Das 38.000 crianças/adolescentes maiores de

7 anos que estão sob medida de proteção, 25.000 estão institucionalizados.

PERU 3982 crianças/adolescentes

em instituições,Segundo um relatório da

GIN (Iniciativa pelas crianças) apresentado ao

CRC em 2005.

CHILE Segundo as estatísticas do SENAME

(governo) no primeiro trimestre de 2010, há 12.229 crianças em instituições

por “proteção de direitos”.

BOLÍVIA 10210

crianças/adolescentes em Instituições,

segundo informou aUNICEF em

Fevereiro de 2010.

EQUADOR Segundo informa o INFA (governo) em maiode 2010 há 3.000 crianças/adolescentes em instituições não governamentais e 300 em

instituições governamentais.

REPÚBLICA DOMINICANA [6] crianças/adolescentes menores de 15 anos estão institucionalizadas.

BRASIL [6] 50.576

crianças/adolescentes estão em Instituições.

PARAGUAI [6] 5.000 crianças em instituições.

URUGUAI Em 2010: nas instituições do governo

encontram-se alojados 1.189 e nas não governamentais 2.084. Total: 3273

crianças/adolescentes.

HAITÍ [6] 187.413 crianças/adolescentes

em instituições.

VENEZUELA [6] Para o ano 2007 são 1.544 as

crianças/adolescentes que vive ementidades de atenção no país,

segundo cifras oficiais (este dado é maior segundo organismos privados).

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Crianças e adolescentes institucionalizados

» UNICEF estima que 8 milhões de crianças e adolescentes Em todo o mundo vivem em instituições (Pinheiro, P.S., World Reporto n Violence against Children, Nueva York, UNICEF, 2006).

Milhares de crianças e adolescentes da América Latina fazem parte desses 8 milhões. A questão da institucionalização adquire uma relevância particular pois se apresenta como a principal resposta instituída frente à privação de família por parte do Estado e das organizações da sociedade civil.

As instituições são heterogêneas: desde aquelas que, recriando os lares familiares, acolhem pequenos grupos, até as ainda vigentes “macro instituições”, que alojam centenas de crianças e adolescentes. Um caso gravíssimo é o dos “berçários”: ainda existem na região instituições que acolhem bebês, apesar da evidência do dano que a falta de cuidados maternos produz nas crianças na primeira infância, afetando o desenvolvimento da saúde mental e física e deixando seqüelas permanentes. Embora na maioria dos países iniciaram-se processos de desinstitucionalização e de melhoramento das instituições, ainda há as que acolhem centenas.

As investigações demonstraram que um grande número de crianças e adolescentes nas instituições tem pai e/ou mãe, que não contam com as capacidades e recursos para assumir o cuidado. Há responsabilidades manifestas no abandono vivido por estas famílias: a falta de apoio desde as políticas públicas e a indiferença social que “naturaliza” a separação do grupo de crianças e a d o l e s c e n t e s c a d a v e z q u e s ã o f e c h a d o s desnecessariamente nas instituições.

Existem características comuns às crianças e adolescentes institucionalizados nos países latino-americanos.

A maior porcentagem é adolescente. A região de procedência preponderante é a urbana. A maioria das crianças e adolescentes que estão institucionalizados vem de famílias que estão em situação de pobreza. Quanto ao sexo, as porcentagens são bastante parelhas, embora em alguns casos haja uma preponderância de meninas.

» No Haiti, 187.413 crianças e adolescentes, 4% do total da população infanto-juvenil, estão em instituições, e são em sua maioria meninos, chegando a uma proporção de 69%, enquanto os 31% restantes corresponde a meninas [7]» 72% das crianças e adolescentes institucionalizados no México está em instituições não governamentais que estabelecem acordos de cooperação com as unidades nacionais e municipais encarregadas da infância. Desse total de crianças e adolescentes, 58% são meninas e 42% meninos. A respeito das idades, 23% têm entre 0 e 6 anos e 77% entre 7 e 17 anos. Somente 1,1% das crianças e adolescentes institucionalizados têm algum tipo de deficiência. » Seguindo os princípios do Código da Infância da

Nicarágua, somente 41% das crianças e adolescentes em instituições deveriam estar sob um cuidado alternativo, enquanto o restante 59% não deveria estar. Estas crianças e adolescentes institucionalizados, cujo direito de viver em família e comunidade está sendo violado, têm família e estão vinculados a ela. No entanto, a situação descrita mostra claramente a falta de recursos para que as famílias possam responsabilizar-se pelo cuidado de suas crianças e adolescentes e a resposta estatal é a institucionalização. » Segundo um estudo do UNICEF realizado no Paraguai no ano de 2006, o principal motivo de ingresso em uma instituição é o abandono por parte dos pais (15%), orfandade (10%), pobreza extrema (10%), indigência (6%) e maus tratos intra-familiar (7%). Um estudo qualitativo do ano de 2009 da Secretaria da Infância e da ONG Corações pela Infância, aplicou-se a uma amostra de 807 crianças e adolescentes em 16 instituições. Deste conjunto, 18% têm menos de 7 anos. Desses 18%, 23% não possuem certidão de nascimento e somente com 13% se trabalha com suas famílias de origem. 24% são suscetíveis para adoção e com 58% deve-se iniciar trabalho de reintegração com a família de origem.

Rumo à desinstitucionalização

Destaca-se que embora haja muito ainda por fazer, vários países da região latino-americana iniciaram processos para reverter o massivo e, em alguns casos, desnecessário, ingresso às instituições. Alguns deles já mostram resultados concretos. Alguns exemplos:

» O Chile está implantando políticas que promovam a desinstitucionalização e evitem a separação das crianças e adolescentes de suas famílias. Enquanto que em 1990 62% das crianças e adolescentes assistidos pelo Serviço Nacional de Menores estavam em instituições, em 2005 tal porcentagem caiu para 26,3%. » O Brasil instituiu seu “Plano Nacional pelo direito à convivência familiar e comunitária”, assim como linhas de políticas públicas de apoio às famílias de origem. » O Paraguai fechou seu centro governamental de acolhimento de bebês optando pelo cuidado em acolhimento familiar e a agilização dos trâmites de adoção e reintegração às famílias de origem com crianças menores de 3 anos. » O Uruguai e o Brasil modificaram suas leis de adoção. Entre outras mudanças, incluem a obrigatoriedade de trabalhar com as famílias de origem e, no caso de decidir-se pela adoção, a mesma deve ser agilizada. Isto restringe a longa permanência nas instituições, sem definição “a fundo” das situações das crianças e adolescentes. Além disso, estabelecem-se registros, no caso do Brasil, para dar visibilidade às crianças que estão em instituições e podem ser adotadas e realizar a busca de famílias adotivas.

Programas de acolhimento familiar

Os programas de acolhimento familiar preparados pelos órgãos públicos ou as organizações da sociedade civil possibilitam que uma criança/adolescente separada

7- Este dado do Haiti, incorporado ao Relatório latino-americano. Situação da infância sem cuidado parental ou em risco de perdê-lo na América Latina. Contextos, causas e respostas, são do ano de 2009, ou seja, prévio ao terremoto de janeiro de 2010.

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de sua família possa ser incluída em outra pelo tempo que seja necessário.

O acolhimento familiar é um tipo de cuidado alternativo formal e é determinado por um órgão estatal judicial ou administrativo que coloca a criança em acolhimento em um ambiente familiar. Na América Latina é muito estendida a prática do acolhimento familiar informal, aquele que acontece dentro da própria família extensa ou outros membros da comunidade sem a intervenção de algum órgão estatal.

Embora, em linhas gerais, sejam escassos os programas de acolhimento familiar, é reconhecido de maneira crescente que são a resposta adequada quando uma cr iança/adolescente deve ser separada temporariamente de sua família de origem. Em termos quantitativos, o desenvolvimento destes programas é inferior ao da institucionalização, em geral há mais crianças e adolescentes nesta modalidade. Mas em termos qualitativos, o desenvolvimento de novos programas é promissor.

Os programas de acolhimento que começaram a ser implementados, em muitos casos, possuem um bom enfoque de direitos da criança e do adolescente. Estes modelos não deixam de lado a família de origem senão que trabalham com ela, tanto na vinculação com a criança como para ajudá-la a superar seus problemas e para resguardar a identidade cultural e a história da criança/adolescente, levando em conta sua opinião.

Estes novos programas superam o velho modelo de “famílias substitutas” que eram desenvolvidos em alguns países, nos quais a família de origem ficava relegada e as crianças permaneciam durante anos nas famílias substitutas.

Considerando esta si tuação contextual oferecemos uma aproximação quantitativa das crianças/adolescentes que estão sob esta modalidade de cuidados na região, assim como a menção de alguns programas:

» Colômbia: segundo o Relato sobre a situação dos direitos de crianças e adolescentes na Colômbia 2008, das 38.000 crianças maiores de 7 anos que se encontram sob medida de proteção, 14.000 são atendidas em modalidade de meio sócio familiar, permanecem em suas famílias de origem ou da comunidade com diversos apoios. » Honduras: existe um programa estatal de acolhimento familiar, que depende do Instituto Hondurenho da Infância (IHNFA) e se denomina “Subprograma de Famílias Solidárias”. O mesmo funciona em 6 cidades embora com baixa cobertura. » República Dominicana: reportou, para 2007, um total de 457.081 (14,8%) crianças e adolescentes com menos de 15 anos cuidados por adultos que não são seus pais. Estas crianças e adolescentes estão incluídos na modalidade que se denomina “acolhimento familiar informal” ou “acolhimento formal”. » No Chile o programa Família de acolhida do SENAME, executado através de ONGs tem, segundo as estatísticas do primeiro trimestre do ano de 2010, em famílias de acolhida 3.194 crianças e adolescentes enquanto que nas instituições há 12.229. No ano de 2006 se alojaram em família de acolhida 4.450 crianças e adolescentes e em

instituições 10.610.» Venezuela: o Instituto Autônomo do Conselho Nacional de Direitos de Crianças e Adolescentes (IDENA) reportou que, desde o início do Programa de Famílias Substitutas, foi garantido o direito a viver em família a 323 crianças privadas de cuidado parental. Estabelece-se que, na modalidade de colocação familiar, a “família substituta” deve colaborar com os responsáveis do programa no fortalecimento dos vínculos da criança/adolescente com seus familiares. Na velha modalidade da colocação familiar se permitiu que muitas crianças sujeitas a esta medida permanecessem indefinidamente em um meio familiar substituto, sem nenhum programa de apoio para trabalhar com a família de origem, desvirtuando com isso o conceito, a natureza e o alcance desta medida, e facilitando a figura da adoção sem que haja mediação nos procedimentos de caráter regular. » Uruguai: 1.331 crianças e adolescentes encontram-se no programa de acolhimento familiar da direção de Família Alternativa. Nas instituições do governo encontram-se em acolhimento institucional 1.189 e em instituições não governamentais 2.084. O programa de acolhimento está realizando esforços para adequar suas práticas ao enfoque de direitos já que vem de um velho programa de famílias substitutas. » Peru: o programa de acolhimento implementado entre o governo (INABIF) e uma ONG (Buckner Peru) incluiu em famílias 16 crianças e adolescentes que se encontravam em instituições e estavam desvinculados totalmente de suas famílias de origem. A tarefa da equipe de acolhimento tornou possível a reintegração com nove famílias de origem. Em dois anos, a equipe realizou 25 reuniões na comunidade e houve 24 aparições nos meios de comunicação para informar sobre o programa e assim captar novas famílias.

Crianças em Aldeias Infantis SOS

O modelo das Aldeias Infantis SOS permite a recriação da família em pequenos lares. As pessoas que exercem o cuidado são preparadas profissionalmente. A presença dessa organização em todos os países da América Latina é significativa, o que se reflete nos números de cinco países. Os exemplos extraídos das estatísticas mostram um pouco o perfil das crianças e adolescentes, a distribuição dispersa nos territórios nacionais das Aldeias e, no caso particular da Venezuela, as famílias beneficiadas pelos programas de fortalecimento familiar que também é desenvolvido pela organização.

As Aldeias cumpriram um rol relevante em situações de emergência. O caso da assistência às crianças haitianas no terremoto de janeiro de 2010 é um fato a destacar.

Por se tratar de uma instituição com várias décadas e com presença global após a Segunda Guerra Mundial, assim como outras organizações, encontra-se reformulando suas práticas. Destaca-se como novidade a criação de opções para trabalhar com as famílias de origem e as comunidades.

» México: As Aldeias acolhem 659 menores de idade. 21% têm entre 0 e 6 anos e 79% tem entre 7 e 17 anos. » Guatemala : albergam 143 crianças e adolescentes.

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Local izam-se em São Cristovão, Retalhuleu, Quetzaltenango, Jocotán Chiquimula e São Jerônimo B.V. » Colômbia: encontra-se em Bogotá, Floridablanca, Ibagué, Rionegro e Cali. Albergam 608 crianças e adolescentes. O grupo majoritário é adolescente (54%), seguidos por 36% de crianças entre 6 e 12 anos, 5% de crianças na primeira infância e 5% de jovens. 81% das crianças e adolescentes viviam na zona urbana e os 19% restante na zona rural. Das 608 crianças e adolescentes, 23 são afros colombianos e 8 são indígenas. Do total, 55% têm entre 2 e 4 irmãos, 16% pertence a famílias numerosas integradas por mais de 5 filhos e 15% tem somente um irmão. Quanto à condição jurídica, 18% das crianças têm parecer de disponibilidade para adoção. » Honduras: nas Aldeias vivem 781 crianças e adolescentes entre 2 e 18 anos. O grupo majoritário é formado por crianças com idade entre 8 e 13 anos (46,26%), seguidas pelo grupo de adolescentes que têm entre 14 e 17 anos (41,04%), e após de jovens de 18 a 22 anos (12,69%).» Venezuela: 370 crianças encontram-se em programa de cuidado alternativo e 3.894 em programas de fortalecimento familiar.

O acolhimento familiar “informal”

Quando a resposta é da própria comunidade. Fatores protetores

Um fator protetor assinalado pelos especialistas latino-americanos é o da cultura. Em alguns grupos culturais é quase inexistente o abandono por parte dos pais, e é nesses mesmos grupos culturais que as crianças e adolescentes que não estão sob seu cuidado direto, continuam vinculados a uma rede familiar extensa. Estas situações se dão, principalmente, em comunidades indígenas ou de afro descendentes.

E m b o r a t a n t o a o r f a n d a d e c o m o o descumprimento das responsabilidades parentais sejam causa de perda da família, nem sempre estas situações derivam na privação da mesma. Existe, em muitos casos, uma recolocação das crianças em outras famílias, sejam extensas ou das comunidades às quais pertencem. Geram-se assim novos laços que permitem a contenção e evitam o ingresso ao sistema de proteção instituído em cada país.

Estes mecanismos são os fatores protetivos: recursos da própria comunidade para diminuir a vulnerabilidade à qual se encontram expostas as crianças e adolescentes e assim alcançar, em muitos casos, ações como a proteção e o cuidado das crianças através de redes familiares extensas ou comunitárias..

Esta é uma resposta possível à falta de cuidados parentais diferente à institucionalização e, se conta com a retaguarda de políticas públicas tendentes a fortalecer estes vínculos, pode ser uma resposta ótima à violação desse direito, sendo que permite às crianças e adolescentes permanecerem em seus lugares de origem.

O que constitui, por outro lado, a obrigação dessa comunidade.

Crianças e adolescentes sem cuidado familiar nem cuidado alternativo

Crianças e adolescentes em situação de rua

Na América Latina, milhares de crianças e adolescentes vivem em situação de rua, ou seja, habitam espaços públicos, subsistindo através de atividades como a mendicância, o trabalho infantil ou a exploração em suas diversas formas. Estas crianças e adolescentes, em muitos casos, têm um lar de onde saíram em busca de subsistência, e em muitos também não sabem regressar ao mesmo, mas em muitos outros não o desejam porque não podem fazê-lo pelas situações de violência que padeciam ou porque estão “presos” em redes de exploração, inclusive sexual.

Especialistas latino-americanos assinalam que o incremento desta problemática foi associado às condições de pobreza, desigualdade, violência e desintegração familiar, e inclusive ao consumo de substâncias psicoativas, situação sofrida por adolescentes e jovens que, por uma ou outra razão, chegaram a ela, e em razão da mesma foram expulsos de suas casas e não encontram outra opção que a rua.

As crianças e adolescentes que vivem em situação de rua talvez sejam os que padecem a violação da maior quantidade de direitos, o que constitui um flagelo social na América Latina, e é o resultado da co-responsabilidade entre o Estado e a sociedade em geral, cada ator com sua parcela específica de compromisso.

Os governos e ONGs criaram programas específicos para assegurar mínimas condições de cuidado das crianças e adolescentes mencionados, como no caso de atividades de educação informal, alimentação, saúde, etc.

» No Chile, segundo estatísticas de 2005, foram reportados um total de 2.541 menores de idade em situação de rua. Desse total, 63,4% são meninos e 36,6% são meninas. A respeito das idades, a maioria (70%) tem entre 12 e 17 anos. Em 41% dos casos, as crianças e adolescentes possuem ocupações no mercado informal, 12% praticam a “vadiagem” e 7% à mendicância. Somente 14% das crianças e adolescentes em situação de rua reportados afirmam ter abandonado sua casa, portanto há uma imensa maioria (86%) que tem vinculação com sua família de origem. » Na Colômbia, um relatório do UNICEF do ano de 2003 informa um número aproximado de 30.000 crianças e adolescentes em situação de rua. » Em Honduras, no ano de 2003, foi relatado a existência de aproximadamente 20.000 crianças e adolescentes em situação de rua nas principais cidades do país. Estas crianças e adolescentes, afastados de suas casas, na maioria dos casos mantêm vínculos com suas famílias. 43% se distanciaram de sua casa devido a situações de maus-tratos, 18% por falta de carinho, 13% por trabalho e, finalmente, 10% por consumo de drogas. Atualmente estão funcionando cinco organizações registradas no IHNFA (Instituto Hondurenho da Infância e da Família) que atendem crianças e adolescentes em situação de rua: quatro na região Centro Oriente (principalmente em Tegucigalpa) e um centro fechado em São Pedro Sula. » Um estudo recente mostra que, no México, a quantidade de crianças e adolescentes em situação de rua ascenderia

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um total de entre 94.000 e 114.000 nas 100 cidades mais importantes do país, entre as quais se destacam, as regiões metropolitanas da Cidade do México, Guadalajara, Monterrey, Tijuana e Ciudad Juárez. Por outro lado, segundo o relatório das 100 cidades, o principal fator de risco que leva crianças e adolescentes a afastar-se de casa e permanecerem longas horas, ou inclusive dias, na rua é a situação de maus tratos. » Na Venezuela, as cifras oficiais do Instituto Nacional de Estatística (INE) informavam, no ano de 1994, aproximadamente 5.000 crianças e adolescentes em situação de rua, alcançando a 9.000 no ano de 1998. Hoje, os últimos dados oficiais disponíveis informam um total de 900 crianças e adolescentes em situação de rua, dos quais 53% encontram-se na rua e 41,1% “são de rua” (no relatório nacional define-se esta categoria como “crianças e adolescentes sem pais ou responsáveis”). Entre as causas que explicam por que se encontram na rua, as três primeiras estão associadas a problemas econômicos, maus-tratos familiares e consumo de drogas. » No Paraguai, segundo a base de dados da UNICEF de 2006, um dos motivos de ingresso em uma instituição é a situação de rua vivida pelas crianças e adolescentes, e representa 11% dos ingressos em instituições.

Crianças e adolescentes “chefes de família”

» Equador: 53% das crianças e adolescentes (261.318) vivem com os avós, 16% (77.355) com outros parentes e 6% (27.447) com irmãos. 2,3% (11.435) se auto-definem como chefes de família e, destes, 65,29% (7.466) são homens e 34,71% (3.969) são mulheres. » Colômbia: 44.595 adolescentes foram identificados como “chefes de família”, a maioria deles têm entre 16 e 17 anos de idade (64%), mas há também um número significativo entre 14 e 15 anos (que representam 31%), e existe um incrível 5% de adolescentes “chefes de família” que tem apenas 12 ou 13 anos. Situação semelhante se verifica também entre os 76.278 adolescentes que são cônjuges do “chefe de família”, dos quais 3.147 têm menos de 14 anos.

Este fenômeno se dá como conseqüência de situações familiares que culminam com o afastamento e abandono das crianças/adolescentes por parte dos pais (por motivos vários e complexos, em geral vinculados a dificuldades econômicas extremas ou violência intra-familiar), ou devido à orfandade por falecimentos dos progenitores. Em muitos casos, a casa fica a cargo dos irmãos maiores ou de adolescentes que se agrupam por laço de afinidade.

A discussão global desse tema, no marco das Diretrizes das Nações Unidas sobre o cuidado alternativos das crianças e adolescentes, leva a orientar sobre a provisão de apoio a estes lares, desde as políticas públicas, através de programas de ajuda.

III. Quais são as violações de direitos às quais estão expostas crianças e adolescentes sem cuidado

parental?

Direitos violados

A convenção sobre os Direitos da Criança, ratificada por todos os países da América Latina, enumera os direitos com os quais contam todas as crianças, sem distinção alguma. No entanto, as crianças e adolescentes que estão em risco de perder o cuidado parental e aqueles que o perderam sofrem sistemáticas violações a todos os seus direitos. Não só a falta de cumprimento do direito fundamental a viver em família senão de outros igualmente fundamentais, alguns dos quais enumeramos e descrevemos resumidamente. Direito à convivência familiar e comunitária

Em todos os países há crianças e adolescentes cujo direito a viver em família e comunidade é violado. Este é, sem dúvida, o direito fundamental, pois é a partir do viver em família que se devem cumprir todos os outros direitos fundamentais, como receber educação, alimentação, vestimenta, conseguir o desenvolvimento de sua autonomia, entre outros. E a falta de família, como vimos, é conseqüência de situações de vulnerabilidade extrema

A falsa opção de “que vivam em instituições antes que em famílias que os maltratam” costuma encerrar um debate pendente. É muito o que se deve refletir, e ao mesmo tempo fazer, para desterrar estes dilemas vividos por aqueles que trabalham nas instituições que devem proteger as crianças.

É verdade que muitas vezes se fecham por falta de outras opções, mas isto não é adequado para ninguém.

O diagnóstico refletido neste documento mostra a escassez de medidas alternativas de prevenção à separação familiar, orientando e fortalecendo as famílias em seu rol de responsáveis pelo cuidado de seus filhos. A institucionalização é a principal resposta instituída diante da falta de cuidado parental. Principalmente quanto à quantidade de instituições e crianças/adolescentes incluídas nelas com respeito a outras opções de cuidado, o qual se constitui em obstáculo no desenho das políticas públicas para o cumprimento do direito à família, e em cenário de violação de direitos para muitas crianças e adolescentes latino-americanos.

» Guatemala : os especialistas consideram que a violação de direitos das crianças e adolescentes sem família encontra-se associada à pobreza e extrema pobreza, à falta de oportunidade de emprego dos pais para cumprir com suas responsabilidades, à ausência de programas de educação para a paternidade responsável e a prevenção ou atenção às adições dos adultos, à falta de planificação familiar. » Brasil : segundo o Sistema de Informação sobre Infância e Adolescência do Ministério de Desenvolvimento, de 839.598 situações de violação de direitos contabilizados de janeiro de 1999 a junho de 2008, 48,1% correspondia à violação ao direito à convivência familiar e comunitária. Alguns cuidadores reconhecem que adotam como critério o seguinte dilema: às vezes, a situação familiar é de tal

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violência que é preferível que as crianças vivam em instituições antes que no seio familiar. » Uma advogada do Chile dá seu testemunho: “… criar-se fora de um contexto familiar vai trazer conseqüências a todos como país. Sinto que se não contribuirmos, colaborarmos, ajudarmos para que as crianças estejam com suas famílias, e que estas famílias sejam efetivas na garantia dos direitos das crianças (estou falando desde a lógica de minha profissão, como advogada; não sou psicóloga), vamos gerar novas violações de direitos nestas crianças, que vão aparecer mais adiante. Pois vamos ter adultos que não vão ser integrados nem íntegros em sua forma de ser, em sua forma de vincular-se e relacionar-se com seu entorno. Se não nos dedicarmos, e mais do que nos preocuparmos, nos ocuparmos para que os direitos da infância, além de serem reconhecidos, sejam garantidos… “ » Uma criança da Colômbia nos diz: “O Bem Estar Familiar é um lugar onde colocam crianças de rua; fiquei em um internato três anos em La Mesa, fiquei sozinho, sem o meu irmão, não me sentia bem… Lá, batiam em algumas crianças e não nos davam amor. Os que nos cuidavam nos tratavam mal”.

Direito à não discriminação

É um denominador comum da maioria das crianças/adolescentes latino-americanos privados do cuidado parental, que estão vivendo em instituições ou em situação de rua, sofrer discriminação em diversos âmbitos como a escola, os centros de saúde e a comunidade em geral.

A violação desse direito está rodeada de preconceitos que influenciam o tratamento que recebem as crianças sem família. No caso daqueles que vivem em instituições, ocorre o isolamento e a falta de integração. Ainda há muitas instituições que oferecem saúde, educação e recreação “intramuros”. Isso cria uma forte dependência da criança em relação à organização/ instituição, a qual se vê caracterizada por um marcado isolamento.

É possível sintetizar a situação em relação ao direito à não discriminação de crianças e adolescentes na América Latina, a partir do que foi colocado no relatório do México:

Existe um tratamento desigual e estigmatizante da infância de rua e institucionalizada.

Esta população é excluída do sistema educativo e de saúde, de espaços de recreação, cultura e participação.

Existe uma discriminação tutelar, como uma constante nas instituições governamentais e não governamentais.

A infância discriminada é reconhecida como objeto de atenção, sem capacidade de escuta ou participação.

Nos processos de adoção, aparece todo tipo de discriminação: por deficiências, defeitos físicos, traços indígenas, ou simplesmente por ser maior de três anos. Direito à identidade

O direito à identidade é violado em muitas das crianças/adolescentes privados de família. Tem diferentes dimensões: o resguardo da história, o respeito pelas origens, a preservação da cultura, o poder contar com

documentos de identificação. Os centros destinados ao acolhimento de crianças

e adolescentes, muitas vezes estão localizados longe de seu lugar de origem. Isto provoca que a inclusão nas instituições implique em mudança de colégio, de amigos, de bairro e estar longe, portanto, de sua família e comunidade. Desse modo, a reconstrução dos laços familiares é dificultada, o que perpetua a permanência das crianças e adolescentes nas instituições e gera a perda de sua historicidade em família e comunidade.

É extrema também a violação desse direito para as crianças e adolescentes que ingressam sem o devido registro oficial, fato agravado por estarem sem documentos.

» Especialistas da Colômbia dizem que as crianças não conseguem descobrir sua identidade, nem têm intimidade, ficam isolados e lhes é negado direitos como educação, acesso à cultura, reconhecimento do lugar de origem. » Especialistas de Honduras advertem sobre a imposição de padrões culturais e/ou religiosos em determinados centros ou instituições, diferentes aos que a criança/adolescente praticou em sua família de origem. Isto se deve à existência, no país, de um alto número de organizações de caráter religioso que administram alguns destes. A “brecha” cultural é abismal e ainda mais grave é a pouca importância que se dá ao direito à identidade cultural como um direito humano fundamental.

Direito à liberdade

A regra 11.b das Regras de Beijing, um instrumento das Nações Unidas que estabelece orientações para garantir os direitos de crianças e adolescentes, define que a inclusão em estabelecimentos dos quais não possa sair por vontade própria é “privação de liberdade”. Este critério é aplicável a muitas das instituições nas quais vivem crianças e adolescentes que padeceram privações por maus-tratos, pobreza, orfandade, situação de rua. Entram nestes lugares de modo involuntário, não têm outros lugares onde morar, suas redes familiares estão quebradas e carecem de autonomia e recursos que lhes permitam fazer algo próprio.

» Em El Salvador, os especialistas destacam que o país conta com uma política pública em torno da problemática que privilegia um sistema baseado mais na doutrina da situação irregular que na proteção integral. Isto faz com que a internação seja praticada com milhares de crianças e adolescentes. » uma criança de uma pequena instituição privada da Colômbia fala de sua passagem por uma grande instituição de governo: “somos mais livres aqui, em ICBF não há espaços para sair, para conhecer outras pessoas”.

Direito à participação A conclusão generalizada dos especialistas dos 13 países latino-americanos estudados, é que a opinião das crianças e adolescentes não é considerada. Não se constroem para as crianças privadas de família espaços nem canais de participação cidadã conforme as leis internacionais vigentes. Desse modo, não são ouvidas pelos órgãos competentes quando se tomam decisões sobre sua

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situação. Acontece a mesma coisa nas instituições onde

vivem. Em algumas ocasiões se propicia um espaço para serem escutados, mas depois suas opiniões não são consideradas. Isso provoca que não se vejam como sujeitos com capacidades e opinião própria, o que muitas vezes os leva a não denunciar situações de violação de direitos em função do medo, desconhecimento, baixa auto-estima ou insegurança.

» Segundo especialistas da Colômbia: “Se nos detivermos na participação, estes (crianças e adolescentes) não são levados em conta porque as relações de poder que se estabelecem nas instituições não dão espaço para escutá-los; por outro lado, quando crescem em modalidades onde há uma mãe substituta que cuida um grupo de crianças, é difícil personalizar e criar laços com eles para que se sintam em família. » De acordo com especialistas do México: “Em particular, as crianças e adolescentes sem cuidado parental têm anulado seu direito à participação, são as instituições e os juízes que, de maneira sistemática, decidem sobre seu destino”.

Direito à saúde e direito à educação

A falta de cuidados parentais afeta negativamente o acesso à educação e à saúde das crianças e adolescentes. Para aqueles que estão privados do cuidado de algum de seus pais, é difícil a frequência sistemática à escola e a atenção de sua saúde. Por exemplo, há situações nas quais as crianças e adolescentes não recebem atendimento médico se as pessoas que os

acompanham não seus pais biológicos. Não são levados em conta, para estas circunstâncias, os laços de parentesco que possam ter outras pessoas como tios, avós, etc.

Outrossim, os benefícios sociais, em sua grande maioria, não permitem a inscrição de crianças e adolescentes que não possuam um vínculo biológico com o titular do benefício. Somente em algumas, isto é possível certificando o vínculo através da guarda legal, o que leva a judicializar os vínculos de cuidado em lugar de contar com mecanismos mais ágeis para os casos nos quais há recursos de benefícios sociais.

» Investigações da Colômbia demonstram que a porcentagem de crianças que não freqüentam a escola varia segundo a presença dos pais na casa. Quando um ou ambos os pais já faleceram, as porcentagens de ausentismo escolar chegam até 27% ou 20% respectivamente, duplicando a porcentagem observada quando ambos os pais estão presentes na casa, que é 11,4%. Acrescentam que as razões da ausência escolar se relacionam, em primeiro lugar, com a falta de recursos econômicos e a necessidade das crianças trabalharem. Quando ambos os pais já faleceram estas restrições afetam 95% das crianças e adolescentes.. » Saúde: estatísticas também da Colômbia demonstram que a falta dos pais é um fator altamente associado a condições de risco para a saúde das crianças devido à falta de acesso aos serviços de saúde. Dois de cada três crianças cujos pais faleceram (61,3%) não contam com afiliação a nenhum sistema de saúde, enquanto que, se ambos os pais convivem, esta porcentagem se reduz quase pela metade (37,6%).

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IV. Quem são (somos) os responsáveis? O que faremos?

Responsabilidade do Estado

Os Estados são os principais responsáveis de velar e garantir o efetivo cumprimento dos direitos de todas as crianças e adolescentes.

Cumprir com a responsabilidade tem três dimensões centrais: fortalecer a sociedade e as famílias para que e respeitem e façam cumprir os direitos das crianças e adolescentes; exercer o controle sobre os órgãos e as instituições relacionadas com a infância no respeito e cumprimento dos direitos universais, e criar ações de política pública propícias para restituir os direitos violados.

Os três poderes do Estado (o Executivo, o Legislativo e o Judiciário) têm responsabilidades e papéis específicos com relação à infância. Por outro lado, em todos os países deve-se cumprir o principio da descentralização para que a aproximação às crianças e às famílias seja regional: as autoridades próximas devem acolher e conter todos, particularmente os mais vulneráveis, com políticas ativas.

É assim como o Estado se mostra responsável por ação ou omissão: as investigações nos diferentes países dão conta dessa realidade, muitas vezes contraditória, já que desde o próprio Estado se produzem tanto fatos inovadores, que podem proteger com eficácia, como fatos que são francamente violadores.

Em cada país, o governo nacional a cargo do Poder Executivo é quem deve desenhar as políticas públicas necessárias para o cumprimento de direitos, para o qual cada um criou um Plano Nacional de Ação para a Infância. Mas, além disso, deve realizar programas concretos de prevenção e assistência para que as crianças possam viver em família. O Poder Legislativo tem a responsabilidade de sancionar leis acordes à Convenção dos Direitos da Criança e demais tratados de direitos humanos, assim como aprovar o orçamento necessário para desenvolver as políticas para a infância. Por último, o Poder Judiciário deve respeitar os direitos das crianças e adolescentes envolvidos em processos judiciais, assim como condenar quem viole os direitos da infância.

Todos devem assegurar mecanismos de exigibilidade, através dos quais as crianças e adolescentes possam ser protegidos quando estiverem ameaçados ou quando seus direitos forem violados.

Na região, os avanços legislativos foram importantes, não só o reconhecimento das crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, senão também na valorização da família como o lugar mais propício para o crescimento dos mesmos. No entanto, em muitos casos, estes inegáveis avanços não foram ainda acompanhados por planos, programas e projetos que ponham em prática os avanços legais.

Alguns depoimentos recolhidos nas investigações refletem isto:

» Segundo um funcionário público da Colômbia, “o Instituto Colombiano de Bem-estar Familiar a nível nacional está impulsionando todo um trabalho com a família, mas na prática os programas voltam a ficar sem

ações pontuais de atenção. Resta a interrogação de até onde podemos chegar a afetar esta família, afetá-la positivamente. Mas sim, há um trabalho a nível nacional”» Na República Dominicana é denunciada a freqüente falta de capacitação, supervisão e acompanhamento de quem exerce o cuidado direto de crianças e adolescentes. » Uma criança colombiana denuncia: “eu não sei para que levam as crianças a Bem-estar Familiar, uma senhora tinha oito filhos, chegou a polícia com Bem-estar Familiar e fez perguntas a eles, e Bem-estar levou as crianças”.

As políticas neoliberais que se agudizam na década de 90 em toda a região fizeram com a proteção da infância fosse “privatizada” para organizações não governamentais. Por um lado estava o abandono do Estado de seu papel protetor, e por outro podiam encontrar-se políticas de “terceirização” mediante as quais os Estados derivavam escassos fundos para que as ONGs se organizassem na assistência direta.

Isso provocou que exista hoje uma multiplicidade de instituições e casa que foram criadas sem controle algum nem orientações estatais. Mas, ao mesmo tempo, aquelas que obedecem aos parâmetros do Estado se vêem com uma enorme responsabilidade e sem a suficiente ajuda econômica nem a capacitação oficial. Segundo os especialistas, prevalece a concepção de ver as crianças e adolescentes como objetos de proteção, sem capacidade de participar e tomar decisões nos assuntos que os afetam. Por esta razão é que as crianças/adolescentes não encontram sentido nas intervenções a respeito de suas vidas. Esta dificuldade se apresenta também, segundo os relatórios, nas ONGs e na sociedade em geral, o que dificulta a geração de espaços propícios para que as crianças e adolescentes exerçam seus direitos.

Os obstáculos do Estado são múltiplos: falta de convocatória e participação real da sociedade para exercer o seu papel de co-responsabilidade; escassez dos orçamentos destinados às áreas da infância; dificuldades em instituir, habilitar e manter instituições independentes que possam ser os executores. Em resumo, falta de decisão política ampla.

Como síntese, tomamos as reflexões de um especialista do Paraguai:

» "O artigo 54 da Constituição Nacional estabelece que a família, a sociedade e o Estado têm a obrigação de garantir à criança e adolescente seu desenvolvimento harmônico e íntegro, assim como o exercício pleno de seus direitos”. E continua a reflexão ressaltando que “no entanto, a ordem dessa trilogia de garantias, de conformidade ao disposto na própria lei suprema em relação à proteção da família, assim como nas disposições da Convenção dos Direitos da Criança e o Código da Infância e Adolescência, pressupõe que a família recebeu a devida proteção por parte do Estado para cumprir com seu papel”.

Responsabilidade da sociedade civil: as organizações não governamentais

Da análise das instituições públicas e privadas dos países da América Latina se infere que os principais entraves para a garantia dos direitos existem porque ainda se continua vivendo uma “cultura tutelar”. Ou seja, as

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dificuldades para exercer uma política de promoção e proteção de direitos não só se deve a dificuldades, negligências ou negativas dos governos em implementar políticas sob um novo paradigma, senão também porque a sociedade civil, os indivíduos e as instituições que a compõe se relacionam entre si e com as crianças e adolescentes ainda de modo autoritário, sem exercer o diálogo, e considerando as crianças/adolescentes mais como “propriedades” que como sujeitos autônomos em desenvolvimento. Assim, as velhas práticas permanecem enraizadas e naturalizadas nas sociedades latino-americanas.

» Definindo o papel das ONGs, um especialista do México acentua um dos papéis da sociedade civil: “Vigiar o cumprimento dos Direitos da Infância por parte do Estado e, se necessário, denunciar casos de abuso dentro das instituições”.

As ONGs assumem um papel protagonista na implementação de políticas que velam pelos direitos das crianças e adolescentes, assumindo uma dupla responsabilidade, como parte da sociedade e também como delegados do Estado, ao atuar por conta e ordem do mesmo em algumas ocasiões, ou inclusive assumir o papel de delinear políticas públicas para a população infanto-juvenil.

Por outro lado, as organizações também fazem parte de uma sociedade carregada de representações ligadas ao paradigma do patronato, razão pela qual com frequência operam com critérios nem sempre adequados ao enfoque de direitos.

Responsabilidade das famílias

» Em Honduras se estabelece que a “proteção da infância é responsabilidade da sociedade em seu conjunto, mas seu cuidado direto corresponde aos pais ou seus representantes legais, e na falta deles, ao Estado” (artigo 83, Código da Infância e Adolescência).» Especialistas de El Salvador reconhecem que existe o exercício irresponsável de maternidades e paternidades, para além das causas pelas quais isto acontece.» Na Guatemala se reconhece que deveria se desenvolver o recurso de “escola para pais” a fim de preparar e acompanhar os pais e mães no exercício de seu papel.

Tal como foi desenvolvido antes, é necessário compreender o papel de cada ator em inter-relação e como co-responsável: a família, a sociedade e o Estado.

Não podemos falar da responsabilidade dos pais sem entender previamente a do Estado, mas será indispensável entender que pais e mães têm responsabilidade direta e específica sobre o cuidado das crianças. Nesse sentido ganha relevância a necessidade de identificar a problemática pontual das crianças e adolescentes que perderam ou estão em risco de perder o cuidado de seus pais, que, como vimos, sofrem uma violação de direitos ainda mais aguda que outras crianças de seu grupo ou comunidade que sim recebem este cuidado. As crianças e adolescentes têm direito de viver no seio de sua família, grupo ampliado ou comunidade de pertença, e este é um direito que deve ser garantido por

todos os adultos que fazem parte destes grupos sociais. De tal maneira, por exemplo, uma das causas identificadas como de risco para a perda do cuidado parental é a chamada “paternidade irresponsável”. Tal é o caso de El Salvador onde se encontra a negligência dos pais como uma das causas da falta de cuidado das crianças e, por conseguinte se responsabiliza os mesmos, de forma direta, pela violação do direito que têm as crianças e adolescentes de ter e crescer em família, em um marco de afeto, contenção e cuidado, como condições necessárias para seu desenvolvimento integral.

Dentro do papel específico que tem a família encontra-se o que foi descrito no relatório da Nicarágua como espaços de “coesão afetiva”, que consiste no afeto que necessita uma criança para crescer. É o que proporciona de maneira singular a família na qual nasceu e à qual pertence. No caso de que esta não esteja em condições, outra família pode fazê-lo, assim como a comunidade da qual faz parte.

Um recurso interessante é o da escola para pais que, com um formato democrático e participativo, acompanha e prepara os adultos para exercer seu papel, demonstrando que se deve percorrer um longo caminho para passarem de progenitores e progenitoras a pais e mães.

Responsabilidade dos organismos internacionais

A responsabilidade diante das crianças e adolescentes sem cuidado parental recai também nos organismos internacionais, entre eles, OIT-IPEC, UNICEF, PNUD, Alto Comissionado das Nações Unidas para os Direitos Humanos.

Cada um, desde sua área de abordagem específica, tem a responsabilidade de controlar os Estados nacionais e de promover políticas de efetivo cumprimento dos direitos das crianças e adolescentes. Vários dos relatórios ressaltam como um obstáculo para a garantia dos direitos do grupo meta, a falta de trabalhos focalizados nas crianças sem cuidado parental ou em risco de perdê-lo, de parte dos organismos internacionais. Outro obstáculo mencionado é a escassa incidência de tais organismos sobre as políticas nacionais. Isto se relaciona com o baixo nível de exigibilidade que possuem os tratados internacionais como a CDN, o que possibilita que as recomendações realizadas pelo Comitê dos Direitos da Criança das Nações Unidas sejam levadas em conta ou não, sem nenhum tipo de sanções para o governo em questão.

Responsabilidade dos doadores

Os doadores nacionais e internacionais que provêem de recursos econômicos as organizações e projetos que operam na América Latina, têm também incidência nas ações sobre crianças e adolescentes sem cuidados parentais.

Os requisitos para obter o apoio econômico muitas vezes marcam quais são os aspectos que conseguem comover e fazer com que indivíduos e organizações com recursos realizem contribuições. Aqueles que estão no âmbito do “marketing social” enunciam com claridade que é mais provável conseguir apoio econômico para situações

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paliativas, mostrando imagens de “crianças sozinhas”, sem família, para as quais é necessário abrir mais instituições, do que conseguir apoio econômico para projetos que busquem a promoção da autonomia das famílias de origem.

Ainda é muito forte a visão da beneficência, a caridade, a legitimação do “isolamento” do conjunto social daqueles que têm problemas, acima da ajuda para a integração, a autonomia e a autogestão e auto-realização de quem pertence a grupos vulneráveis, como as crianças e adolescentes sem cuidado parental e os adultos que não estão em condições de assumir suas responsabilidades maternas, paternas e comunitárias.

Conclusões e recomendações provisórias

Inc luímos aqui a lgumas conclusões e recomendações “provisórias”. Esperamos que, à medida que este documento latino-americano seja difundido e repensado pelos leitores, surjam novas conclusões e recomendações sobre o tema que nos ocupa.

Além das equipes de trabalho, foram incluídas aqui recomendações realizadas pelos especialistas que participaram na fase de validação do relatório latino-americano completo.

Conhecer para intervir na prevenção e restituição do direito à família

Uma das conclusões centrais é a carência de informação em aspectos chaves da problemática descrita, tanto a nível qualitativo como quantitativo. Por esta razão esperamos que este documento seja uma contribuição ao conhecimento geral da questão e, a partir dos déficits detectados, abram-se linhas de investigação.

Instamos às autoridades públicas latino-americanas da infância a destinar recursos apropriados e suficientes; aos investigadores dos centros acadêmicos da região a que sejam sensíveis e se dediquem a este tema, e aos organismos de cooperação internacional para que derivem recursos para a geração de conhecimento independente neste campo que permita incluir, de maneira integral, todos os aspectos nos quais se deve trabalhar para a restituição dos direitos das crianças e adolescentes. Sobre fatores protetivos

Devido à importância de que a criança exerça seu direito a viver em família e comunidade, deve-se explorar e estimular o desenvolvimento do que denominamos “fatores protetivos”.

Os fatores protetivos podem ser: individuais, estudados recentemente no revitalizado campo da resiliência; familiares, valorizados no campo do desenvolvimento infantil, da prevenção de maus-tratos e na pediatria particularmente e, sócios culturais.

No trabalho social com famílias é muito importante ter esta perspectiva toda vez que se deve apostar no desenvolvimento de suas capacidades para assumir a criação e a proteção integral de seus filhos. Para que esta tarefa dê bons resultados, deve-se ter disponíveis os recursos necessários, tanto humanos como profissionais. Surgem neste documento fatores protetivos do tipo coletivo, particularmente as práticas culturais detalhadas a seguir.

Sobre crianças de povos indígenas

Deve aprofundar-se mais neste aspecto para a recuperação das práticas de cuidado comunitário das crianças, exercidas pelos povos indígenas para seu aproveitamento no marco das políticas públicas.

Por exemplo, a “circulação de crianças” descrita pelos antropólogos envolve, de alguma maneira, uma prática comunitária que se constitui em um fator protetivo. No entanto, é adequado destacar o desafio existente na região em relação ao fortalecimento dessas experiências comunitárias, tendo ao mesmo tempo mecanismos de políticas sociais que possam acompanhar e supervisar ditas práticas, a fim de evitar violações de direitos dentro das mesmas. A este respeito, Erica Brasil destaca que “no caso do Brasil, as práticas descritas como circulação de crianças não podem ser sempre apresentadas como fatores protetivos para a perda/risco de perda de cuidados parentais, já que, em algumas ocasiões, também podem encobrir outras problemáticas como trabalho infantil doméstico (especialmente meninas que vivem em casas de parentes ou conhecidos, e deixam de freqüentar a escola) abusos físicos, psicológicos ou sexuais, etc.”.

Dessa forma, embora em sua grande maioria estas práticas informais possam ser descritas como fatores protetivos, podem também encobrir fatores de risco, que é necessário controlar.

Neste aspecto, também Rosa Maria Ortiz nos alerta sobre a necessidade de distinguir as tradições das “práticas culturais perniciosas”, definidas como aquelas práticas tradicionais que violam direitos. Com esta distinção espera-se salvaguardar direitos culturais.

Surge dos depoimentos recolhidos nos relatórios nacionais que, para a planificação da política pública nesta matéria, não se consideraram as diferenças culturais entre os povos indígenas e outras minorias étnicas, com pautas generalizadas nas respectivas sociedades nacionais em relação ao cuidado das crianças e adolescentes.

Aprofudar o conhecimento destes aspectos entre os diversos grupos étnicos que habitam nossa região e incorporá-los como variável a ser considerada, tanto na hora de identificar riscos de perda dos cuidados familiares, ou como fatores protetivos em relação ao problema constitui, segundo entendemos, uma tarefa pendente.

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Sobre as problemáticas relacionadas com a perda de cuidados parentais

Entendemos que as principais problemáticas dos países da região, pobreza e desigualdade, constituem-se em causas indiscutíveis das violações de direitos das crianças e adolescentes, entre os quais se encontra o exercício do direito à família e, dentro do mesmo, o de receber cuidados parentais.

Por outro lado, as crianças e adolescentes que já sofrem esta falta são vítimas, em muitos casos, de mais violações aos seus direitos.

A causa “pobreza” se correlaciona com outras de índole individual ou familiar, tais como doenças, atributos de determinados grupos em situação de vulnerabilidade (migrantes, descendentes de povos indígenas), etc.

Embora não seja possível fazer uma análise “contrafactual” (ou seja, após os fatos terem ocorrido), cabe perguntar-se: quantas das famílias em situação de pobreza que não puderam assumir o cuidado de seus filhos teriam podido fazê-lo, se contassem com condições sócio-econômicas e de redes de ajuda?

Não é possível focalizar alguma das causas separadametne se não se tem antes uma visão geral do problema. E, evidentemente, o cenário geral é o da pobreza e da desigualdade.

Se nos introduzimos, então, nas causas separadas, a migração foi detectada nas investigações como uma das situações que podem causar privação do cuidado parental. Como fica claro, a migração dos adultos resulta na falta de responsáveis da casa. Seria importante, então, ampliar as linhas de investigação na região para a “migração de temporada”, tanto de crianças/adolescentes como de adultos, e a “infância migrante”.

É muito relevante e ainda não devidamente dimensionado, a circulação de crianças “não acompanhadas”.

Destacamos a contribuição de Christina Baglietto e Cécile Maurin (SSI/CIR): “Entre os fatores adicionais que podem contribuir para incrementar o risco de separação familiar, poderia ser mencionada uma certa cultura de vitimização da família (assistencialismo, apoio pontual e não em seu processo de autonomia e crescimento), a cultura do tabu em vários países da região e do medo social de aceitar a necessidade de busca de apoio, assim como a separação famliar como resultado do divórcio (não está diretamente vinculado a este contexto, mas há um crescente número de divórcios na região razão pela qual as crianças são institucionalizadas, devido a que os pais estão em conflito, o que cria altos níveis de alienação parental e a solução das autoridades tem sido de afastar a criança/adolescente de ambos os pais)”.

Sobre as crianças/adolescentes, seus contextos e o cumprimento de seus direitos

É importante relacionar as principais problemáticas dos países com as principais causas de violações de direitos das crianças e, particularmente, com o objeto desse trabalho: as crianças/adolescentes privados ou em risco de perder o cuidado parental.

Nesse sentido, a busca de resolução às problemáticas que originam a violação dos direitos das

crianças e adolescentes na América Latina e, entre elas, a falta de cuidado parental, deve acontecer no campo das políticas sociais públicas que cada governo implementa em seu país, em função de resolver o flagelo da fome e a iniqüidade que caracterizam os países da região.

Neste ponto é importante retormar o que foi dito sobre a situação de abandono em relação a que seu principal elemento protetivo seria a reestruturação da própria família, entendida como família ampliada, inclusive tratando-se de amigos, padrinhos ou laços não consangüíneos. Levar em conta isto nos permitirá entender que os programas sociais destinados a proteger as crianças da situação de perda de cuidados parentais deverão focalizar-se fortemente no fortalecimento destes núcleos familiares que poderiam preservá-los.

Surge do estudo que as adolescentes grávidas e pertencentes a grupos sociais pobres sofrem a violação de seus direitos, situação que se estende quase imediatamente aos próprios filhos.

Crianças e adolescentes em instituições

Uma questão preocupante evidenciada nos depoimentos das crianças e adolescentes, especialistas e cuidadores, recolhidos nos relatórios nacionais é a violação de direitos fundamentais a qual se vêem s u b m e t i d a s c r i a n ç a s e a d o l e s c e n t e s institucionalizados.

Deve-se acender “luzes vermelhas” sobre o que descrevemos no relatório latino-americano sobre direitos violados. Começando com a violação do direito à convivência familiar e comunitária, os depoimentos de especialistas e crianças acusam a violação do direito à liberdade, do direito à expressão e participação, o direito à intimidade, do direito à educação, entre outros [8].

Descreve-se c r ianças e ado lescentes institucionalizados como afetados por: um sentimento profundo de solidão; sentimentos de incompreensão; isolamento da sociedade em geral; desapego; incerteza quanto ao seu futuro por não saber quem vai apoiá-lo, proteger, acompanhar; sentimentos de rejeição; baixa auto-estima.

É indispensável avançar efetivamente sobre a criação de alternativas de cuidado familiar, assim como realizar um amplo processo de desinstitucionalização de milhares de crianças e adolescentes, que hoje se encontram na América Latina submetidos à privação de direitos ao mesmo tempo em que sofrem os sentimentos descritos. A soma das cifras consignadas neste Documento como “a ponta do iceberg” totaliza aproximadamente 373.116 crianças e adolescentes em instituições da América Latina.

Crianças e adolescentes órfãos

Uma questão muito particular e relevante também é a enorme quantidade de crianças e adolescentes órfãos que estão institucionalizados. Como podemos explicar que haja crianças e adolescentes vivendo em instituições de todo tipo, se perderam seus pais

8 - Para aprofundar neste aspecto, consultar o relatório latino-americano citado em páginas anteriores, parte 6, “Principais violações aos dereitos das crianças e adolescentes sem cuidado parental”, em www.relaf.org

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definitivamente? Não caberia, nestes casos, a adoção, ou seja, a provisão de uma família definitiva?

Compreende-se que este universo de crianças e adolescentes órfãos envolva alguns que, por diversas razões, não poderão ser adotados imediatamente. Mas não se pode aceitar sua revitimização quanto vieram, primeiro falecer seus pais e/ou mães, e agora se vêem privados definitivamente do direito a viver em família e integrar-se à comunidade. Na descrição destas crianças e adolescentes (ver parte 6 do relatório latino-americano já citado), diz-se que padecem “efeitos psicológicos pela morte dos pais” e “baixa auto- estima”.

Urge implementar a adoção e o acolhimento como resposta, segundo cada caso, extremando os esforços para incluir em famílias a maior quantidade possível destas crianças, e considerando o cuidado baseado em família para as crianças pequenas e as modalidades de convivência grupal com apoio para os adolescentes.

Sobre os responsáveis

Resulta evidente, a partir deste relatório, que as crianças e adolescentes privados do cuidado parental ou em risco de perdê-lo são um setor da população infanto juvenil que sofre repetidas violações. Por carecer desse cuidado básico afetivo e de contenção que oferecem os núcleos familiares, principalmente nos primeiros anos de vida, entendemos que esta problemática deve ser considerada de forma específica pelas instituições do governo e da sociedade civil que têm responsabilidades diretas no cuidado das crianças e adolescentes e na garantia de todos seus direitos.

Assim, os Estados Latino-americanos devem reconhecer esta problemática específica e de grande peso dentro das sociedades da região, para planificar políticas públicas de fortalecimento familiar, em primeiro lugar, o que inclui reconhecer as famílias mono parentais, as famílias ampliadas e as diversas formas que atualmente tomam estes grupos básicos de convivência. Os Estado devem compreender que é primordial evitar que as crianças e adolescentes continuem perdendo os cuidados parentais, e que aqueles que já perderam requerem um cuidado particular, e também dever ter como premissa a manutenção ou a reinserção em sua comunidade de origem.

Ameaças de retrocessos e avanços provisórios

É importante estarmos atentos para que os avanços conquistados na região na promoção do direito à convivência familiar e comunitária não sejam desestimulados por retrocessos que levem à implementação de políticas tutelares. Tal é o caso, por exemplo, da “Cidade das Crianças”, na Guatemala, um conjunto de edifícios recém construidos para albergar centenas de crianças sem cuidado parental. Da mesma forma, como exemplo de retrocesso, assinalamos a vigência e a recente polêmica sobre o “Preventorio Pérez Araníbar”, uma instituição da cidade de Lima, Peru, que tem capacidade para albergar 650 crianças e adolescentes. A polêmica acontenteceu devido às declarações do bispo que a dirige, que reclamou ao

Estado “encher as 650 camas, já que só tinha 300 crianças e adolescentes”. O Estado concordou em derivar e outorgar recursos, até chegar ao número de crianças reclamado [9].

Na região, os avanços legislativos foram importantes, não só no/reconhecimento das crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, senão também na valorização da família de origem. No entanto, em muitos casos, estes inegáveis avanços não foram acompanhados por planos, programas e projetos que ponham em prática as conquistas legais. Causadores desta situação podem ser a falta de decisão política, orçamentos cotados para esta áreas de política pública e/ou falta de capacidade técnica.

A descentralização dos programas joga um papel fundamental no que se refere ao alcance de maiores níveis de acessibilidade dos benefícios e, por tanto, a ampliação da cobertura do sistema. Resulta importante, então, colocar especial atenção na difusão das ações, devido a que muitas vezes o limitado acesso aos programas deve-se à falta de estratégias de comunicação e ao consequente desconhecimento da existência dos potenciais beneficiários de cada programa (que são as famílias e as crianças e adolescentes).

Sobre os organismos de cooperação internacional

Resulta fundamental destacar a necessidade de investigações e estudos comparativos, a nível latino-americano, que analisem os diversos aspectos ligados ao risco de perder o cuidado parental.

Em um continente tão grande e diverso, marcado por profundas desigualdades, a complexa tarefa de investigação requer, sem dúvida, o apoio tanto financeiro como técnico da cooperação internacional. Embora seja necessário reforçar a idéia de que os recursos materiais e humanos a se mobilizarem devem ser da América Latina.

Como pode ver-se no relatório latino-americano já mencionado, não é que não existam recursos, senão que estão mal distribuídos e, no caso da política social pública, em algumas ocasiões estão mal aplicados.

Da mesma forma, os centros de investigação acadêmica da nossa região estão dotados de pessoas altamente capacitadas e muitas delas são sensíveis às temáticas que devem aprofundar-se.

Finalmente, apesar de não ser mencionado nos 13 relatórios sistematizados (fonte do relatório latino-americano), é de destacar o importante papel que estão chamadas a cumprir as Instituições Independentes de Direitos Humanos em cada uma das nações, em relação à proteção dos direitos das crianças e adolescentes e à promoção e vigilância da aplicação da CDC (Convenção dos Direitos da Criança), tal como estabelece a Observação Geral número 2 do Comitê dos Direitos da Criança das Nações Unidas.

Fortalecer estes organismos nacionais onde foi conseguido implantá-los, e implantar onde ainda não foi possível, é, sem dúvida alguma, um grande desafio na região.

9 - http://elcomercio.pe/noticia/444584/puericultorio-tiene-300-camasvacias-ley-le-impide-acoger-ninos-pobres_1 (Consulta 16 de março de 2010) http://elcomercio.pe/noticia/444759/puericultorio-perez-aranibaratendera-al-maximo-su-capacidad-desde-proximo-lunes (Consulta 20 de março de 2010)

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Glossário [10]

Acolhimento familiar: é um tipo de cuidado

baseado na família, que inclui a criança/adolescente para seu cuidado, sem alterar significativamente a rotina familiar. A família continua com sua dinâmica e estrutura cotidiana responsabilizando-se, pelo tempo que seja necessário, pela proteção integral da criança/adolescente. Pode ser formal ou informal (ver cuidado alternativo).

Cuidado alternativo: A falta de cuidado da mãe e pai biológicos, contudo, não remete necessariamente a uma criança sem cuidado. Pode ser que o cuidado seja exercido adequadamente por outros membros da família extensa e/ou comunidade. Nos referimos, então a crianças/adolescentes em cuidado alternativo, que é um arranjo formal ou informal através do qual a criança é cuidada fora da casa de seus pais, tanto como resultado da decisão de uma autoridade judicial, administrativa ou qualquer organismo devidamente reconhecido, como por iniciativa da criança/adolescente, seus pais ou seus cuidadores primários, ou como resultado da ação espontânea de um cuidador na ausência de seus pais. Isto inclui acolhimento informal da família ou pessoas alheias à família, colocação em instituições formais de acolhimento, outras formas de colocação em instituições (ver instituição), centro de passagens em situações de emergência, outros centros de cuidado institucional de curto e longo prazo (incluindo casa de acolhimento grupal e colocações para que as crianças/adolescentes vivam independentes dos adultos cuidadores mas sob supervisão). O cuidado alternativo pode ser:

- formal: qualquer acolhimento em um meio familiar que tenha sido ordenado por uma autoridade judicial ou administrativa competente, assim como qualquer cuidado em um meio institucional, incluindo centros privados, como resultado ou não de medidas administrativas ou judicias.

- informal: qualquer colocação/inclusão de caráter privado em um meio familiar; no qual a criança/adolescente é cuidada por um período indefinido por parentes ou amigos (acolhimento informal) ou por outros em seu próprio nome e direito, pela iniciativa da criança/adolescente, seus pais ou outra pessoa, sem que esta colocação tenha sido ordenada por uma autoridade judicial ou administrativa ou qualquer organismo devidamente acreditado.

O campo de ação do cuidado alternativo não inclui crianças/adolescentes que estão privados de sua liberdade por decisão de uma autoridade judicial ou administrativa por ser acusados de ter infringido a lei, e cuja situação é tratada pelas Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores e as Regras para a Proteção dos Menores Privados de Liberdade. Também não se extende a casos nos quais as crianças/adolescentes tenham sido adotados (mas sim se aplica aos cuidados pré-adotivos) ou nos que há uma colocação informal se a criança/adolescente fica por

vontade própria com seus parentes ou amigos por um período limitado, com fins recreativos e por razões que não estão ligadas à incapacidade dos pais de prover cuidado adequado.

L a r e s e n c a b e ç a d o s p o r c r i a n ç a s / adolescentes: Existem muitos exemplos de situações nas quais as crianças/adolescentes criaram espontaneamente seus próprios “lares” após a morte de seus pais. Estes lares costumam ser constituidos por crianças/adolescentes de uma mesma família, onde o primogênito assume a responsabilidade pelo bem-estar de seus irmãos, embora se conheçam outras formas (a união de crianças/ adolescentes de uma família com crianças/adolescentes de outras famílias, ou inclusive um grupo de crianças/ adolescentes sem parentesco algum entre si). Observou-se que estes lares se formam por situações de emergência, como a violência política, as catástrofes naturais, o HIV-AIDS, mas podem estabelecer-se por outras razões.

Cuidado parental adequado: situação na qual as necessidades físicas, emocionais, intelectuais e sociais básicas da criança/adolescente são satisfeitas por seus cuidadores e a criança/adolescente pode desenvolver-se de acordo com seu potencial. O cuidado parental adequado vai além da ausência de abuso, abandono ou exploração, e implica que a criança tenha suficientes cuidados e recursos para desenvolver-se saudavelmente.

Isto implica, por exemplo, que a criança vive no seio de uma família, com um cuidador primário, conta com proteção e cuidados adequados, acesso à educação e assistência sanitária. As crianças/adolescentes que vivem abaixo da linha de pobreza, os que moram ou trabalham na rua, assim como os que estão em risco de ser excluídos de suas famílias ou que vivem situações de abuso, exploração ou abandono, são avaliados como vítimas de cuidado parental inadequado.

Cuidados baseados em família: um tipo de cuidado que implica que a criança viva com outra família que não é a biológica. O termo engloba o acolhimento familiar, os lares encabeçados por crianças/adolescentes e a adoção.

O cuidado em uma casa para atendimento de grupo pequeno ficaria fora dessa definição, embora às vezes não considere a distinção entre “acolhimento” e o cuidado em uma instituição grupal (institucional).

Família: grupo de indivíduos que pertencem a uma mesma descendência, seja ou não um vínculo de primeiro grau. Entendemos a família como o núcleo menor de pertença, constituído por laços significativos, inclusive quando não existam nele a figura da mãe e/ou do pai.

Institucionalização: inclusão em residências institucionais.

Instituição: residência a cargo de pessoas responsáveis pelo cuidado. Esta concepção inclui um amplo espectro de espaços que vão desde os orfanatos, que geralmente incluem um número importante de “internos”, as casas lares, pequenas instituições com um formato que pretende recriar uma família, acolhendo um

10 - Para este glossário, nos baseamos nos documentos: Diretrizes de Cuidados Alternativos à Criança (ONU), e UNICEF e Serviço Social Internacional. Melhorar a proteção das crianças privadas do cuidado de seus pais: a necessidade de regras internacionais. (Documento de trabalho conjunto, agosto de 2004.)

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pequeno número de crianças e adolescentes que tem como responsáveis figuras estáveis. Nas casas lares, os cuidadores convivem em tempo completo com as crianças/adolescentes.

Nas Diretrizes de Cuidados Alternativos à Criança (ONU), define-se o cuidado residencial como aquele oferecido em qualquer contexto de cuidado grupal não baseado em família.

Crianças privadas de cuidado parental: todas as crianças que não vivem com pelo menos um de seus pais, por qualquer causa e sem importar as circunstâncias.

As crianças que não têm cuidado parental e se encontram fora de seu país de residência habitual ou que são vítimas de situações de emergência podem ser designados “não acompanhados ou separados”.

Crianças: em prol de realizar uma leitura mais fluida em alguns parágrafos deste documento se utiliza o termo “crianças” que engloba crianças e adolescentes menores de 18 anos.

A publicação original foi realizada pelo Projeto Relaf, Red Latino-americana de Acogimiento Familiar, através de um acordo de cooperação com Aldeas Infantiles SOS internacional. É permitida a reprodução total ou parcial, citando a fonte. Buenos Aires, Argentina, junho de 2010. Com o apoio de SKN. Kinderpostzegels.

Do original:DOCUMENTO DE DIVULGACION LATINOAMERICANONiños, niñas y adolescentes sin cuidados parentales en América latina. Contextos, causas y consecuencias de la privación del derecho a la convivencia familiar y comunitaria.

Tradução para o português: Roseli Schuster

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