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1 Os desafios da interseccionalidade e intersetorialidade na formulação e implementação das políticas de cuidados para pessoas com deficiência no Brasil 1 Documento para su presentación en el IX Congreso Internacional en Gobierno, Administración y Políticas Públicas GIGAPP. (Madrid, España) del 24 al 27 de septiembre de 2018. Autor: ARAÚJO, Edgilson Tavares de Email: [email protected] Resumo: Esse artigo tem como objetivo refletir sobre os desafios da interseccionalidade e intersetorialidade na formulação e implementação das políticas públicas de cuidados para pessoas com deficiência. Tendo em vista que esse é um tema relativamente novo no Brasil, ocorrem mobilizações de arenas e criação de agendas políticas em torno do enfrentamento do problema público da dependência de cuidados de terceiros, considerado como fator de agravo aos riscos e vulnerabilidades pessoais e sociais. Trata-se de um ensaio no qual se faz uma análise interdisciplinar a partir da revisão bibliográfica e análise documental da legislação vigente (Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência - 2007; Decreto Legislativo n o 186/2008; Decreto nº 6.949/ 2009, Lei nº 13.146/2015 - Lei Brasileira de Inclusão - LBI). Alerta- se sobre a fragmentação das políticas de cuidados para pessoas com deficiência, por meio da implementação de alguns instrumentos de políticas setoriais, antecedendo mesmo o seu desenho de modo mais integral e intersetorial. Aponta-se ainda para a urgência nos processos de formação de cuidadores profissionais, tendo por base a lógica da concepção integral e interseccional da pessoa com deficiência e dos cuidados. Palavras-chave: políticas públicas; pessoas com deficiência; cuidadores profissionais; interseccionalidade; intersetorialidade Resumen: Esta ponencia tiene como objetivo reflexionar sobre los desafíos de la interseccionalidad e intersectorialidad en la formulación e implementación de las políticas públicas de cuidados para las personas con discapacidad. En vista que este es un tema relativamente nuevo en Brasil, ocurren movilizaciones de arenas y creación de agendas políticas en torno al enfrentamiento del problema público de la dependencia de cuidados de terceros, considerado como factor de agravio a los riesgos y vulnerabilidades personales y sociales. Se trata de un ensayo en que se hace un análisis interdisciplinaria a partir de la revisión bibliográfica y análisis documental de la legislación vigente (Convención Internacional sobre los Derechos de la Persona con discapacidad - 2007, Decreto Legislativo nº 186/2008, Decreto nº 6.949 / 2009, Ley nº 13.146 / 2015 - Ley Brasileña de Inclusión - LBI). Se alienta sobre la fragmentación de las políticas de cuidado de las personas con discapacidad a través de la aplicación de algunos instrumentos de políticas sectoriales, precediendo incluso su diseño de manera más integral e intersectorial. Se apunta a la urgencia en los procesos de formación de 1 Esse trabalho foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq, por meio do projeto “Tecnologia de formação para cuidadores de pessoas com deficiência no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)”, aprovado na Chamada CNPq Nº 09/2017 Bolsas de Produtividade em Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora DT,

Documento para su presentación en el IX Congreso ... · e intersetorialidade na formulação e implementação das políticas públicas de cuidados para pessoas com deficiência

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1

Os desafios da interseccionalidade e intersetorialidade na formulação e

implementação das políticas de cuidados para pessoas com deficiência no Brasil1

Documento para su presentación en el IX Congreso Internacional en Gobierno,

Administración y Políticas Públicas GIGAPP. (Madrid, España) del 24 al 27 de

septiembre de 2018.

Autor: ARAÚJO, Edgilson Tavares de

Email: [email protected]

Resumo: Esse artigo tem como objetivo refletir sobre os desafios da interseccionalidade

e intersetorialidade na formulação e implementação das políticas públicas de cuidados

para pessoas com deficiência. Tendo em vista que esse é um tema relativamente novo

no Brasil, ocorrem mobilizações de arenas e criação de agendas políticas em torno do

enfrentamento do problema público da dependência de cuidados de terceiros,

considerado como fator de agravo aos riscos e vulnerabilidades pessoais e sociais.

Trata-se de um ensaio no qual se faz uma análise interdisciplinar a partir da revisão

bibliográfica e análise documental da legislação vigente (Convenção Internacional sobre

os Direitos da Pessoa com Deficiência - 2007; Decreto Legislativo no 186/2008;

Decreto nº 6.949/ 2009, Lei nº 13.146/2015 - Lei Brasileira de Inclusão - LBI). Alerta-

se sobre a fragmentação das políticas de cuidados para pessoas com deficiência, por

meio da implementação de alguns instrumentos de políticas setoriais, antecedendo

mesmo o seu desenho de modo mais integral e intersetorial. Aponta-se ainda para a

urgência nos processos de formação de cuidadores profissionais, tendo por base a lógica

da concepção integral e interseccional da pessoa com deficiência e dos cuidados.

Palavras-chave: políticas públicas; pessoas com deficiência; cuidadores profissionais;

interseccionalidade; intersetorialidade

Resumen: Esta ponencia tiene como objetivo reflexionar sobre los desafíos de la

interseccionalidad e intersectorialidad en la formulación e implementación de las

políticas públicas de cuidados para las personas con discapacidad. En vista que este es

un tema relativamente nuevo en Brasil, ocurren movilizaciones de arenas y creación de

agendas políticas en torno al enfrentamiento del problema público de la dependencia de

cuidados de terceros, considerado como factor de agravio a los riesgos y

vulnerabilidades personales y sociales. Se trata de un ensayo en que se hace un análisis

interdisciplinaria a partir de la revisión bibliográfica y análisis documental de la

legislación vigente (Convención Internacional sobre los Derechos de la Persona con

discapacidad - 2007, Decreto Legislativo nº 186/2008, Decreto nº 6.949 / 2009, Ley nº

13.146 / 2015 - Ley Brasileña de Inclusión - LBI). Se alienta sobre la fragmentación de

las políticas de cuidado de las personas con discapacidad a través de la aplicación de

algunos instrumentos de políticas sectoriales, precediendo incluso su diseño de manera

más integral e intersectorial. Se apunta a la urgencia en los procesos de formación de 1 Esse trabalho foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico –

CNPq, por meio do projeto “Tecnologia de formação para cuidadores de pessoas com deficiência no

âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)”, aprovado na Chamada CNPq Nº 09/2017 –

Bolsas de Produtividade em Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora – DT,

2

cuidadores profesionales, teniendo como base la lógica de la concepción integral e

interseccional de la persona con discapacidad y de los cuidados.

Palabras clave: políticas públicas; personas con discapacidad; cuidadores

profesionales; interseccionalidad; intersectorialidad.

Abstract: This article aims to reflect on the challenges of intersectionality and

intersectoriality in the formulation and implementation of public policies of care for

people with disabilities. Considering that this is a relatively new issue in Brazil, there

are mobilizations of arenas and creation of political agendas around addressing the

public problem of dependence on care of third parties, considered as a factor of

aggravation to personal and social risks and vulnerabilities. This is an essay in which an

interdisciplinary analysis is made based on the bibliographic review and documentary

analysis of the current legislation (International Convention on the Rights of Persons

with Disabilities - 2007, Legislative Decree 186/2008, Decree 6.949 / 2009, Law No.

13,146 / 2015 - Brazilian Inclusion Law - LBI). It warns about the fragmentation of care

policies for people with disabilities, through the implementation of some sectoral policy

instruments, even preceding its design in a more integral and intersectoral way. It is also

pointed out to the urgency in the processes of training of professional caregivers, based

on the logic of the integral and intersectional conception of the person with disability

and the care.

Keywords: public policies; people with disabilities; professional caregivers;

intersectionality; intersectorality.

Nota biográfica: Edgilson Tavares de Araújo é bolsista de produtividade do CNPq em

desenvolvimento tecnológico e extensão inovadora. Doutor em Serviço Social

(Pontifícia Universidade Católica de São Paulo / Universidade Católica Portuguesa –

Lisboa). Professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), atuando

na graduação tecnológica em Gestão Pública, no Mestrado em Ciências Sociais e no

Mestrado Profissional em Gestão de Políticas Públicas e Segurança Social.

1. Introdução

Cerca de 15% da população mundial – um em cada sete – tem algum tipo de

deficiência, havendo pelo menos um bilhão de pessoas com deficiência no planeta, além

de todos os seus parentes e amigos. Trata-se de um fenômeno interessante e complicado

que pode afetar as experiências de vida de qualquer pessoa, uma vez que é algo que

pode ser adquirido, sem necessariamente nascer com tal característica. Além disso, a

questão geracional, com o avanço da idade, pode levar a tal situação fazendo com que

uma pessoa possa adquirir deficiência, bem como, tenha a possibilidade de cuidar de

alguém com tal marcador social (SHAKSPEARE, 2018). Logo, compreender as

especificidades das deficiências é um pressuposto ético à vida privada de todos os

grupos de pessoas, seus companheiros, familiares e amigos, que podem ter ou viver com

3

uma pessoa com deficiência, bem como, à vida pública no sentido de compreensão das

diversidades e da garantia direitos de proteção social.

No Brasil, de acordo com o Censo do IBGE (2010), existem 45,6milhões de pessoas

com deficiência (23,9% da população nacional), em diferentes faixas etárias e em

processo de aumento de longevidade, que em sua maioria, foram excluídas de vários

processos sociais, havendo pouca responsabilização pública estatal e certa naturalização

sobre a responsabilidade precípua da família e da sociedade civil para cuidar destas

pessoas (ARAÚJO et all., 2014). É recente a atuação estatal na oferta de bens e

serviços públicos para pessoas com deficiência e suas famíilias por meio de

equipamentos públicos de educação, saúde e assistência social. Até então, havia um mix

de serviços ofertados por organizações especializadas com características variantes

entre ações assistencialistas e incluisas (ARAÚJO, 2006). A atuação do Estado nestas

ofertas, portanto, tem gerado novas implicações quanto a efetividade e qualidade destas,

que vão além da criação de institucionalidades (conselhos, programas, projetos etc.) e

existência de recursos para operacionalizar tais serviços. Pressupõe a apreensão e

prática de novas “gramáticas”, ou seja, de um conjunto de definições, práticas, rotinas

que são, quase sempre primeiramente, descritas e, posteriormente, vividas nos

instrumentos de políticas públicas (ARAÚJO, 2015; ARAÚJO et all., 2018)

Frente a significativos indicadores, o cuidado vem sendo pautado como um novo

paradigma ético que deve guiar as políticas públicas para pessoas com deficiência. Do

mesmo modo, descreve-se o que deve ser o cuidado, sem necessariamente materializa-

lo. Isso faz com que, cada vez mais, passe a ser tema de análises e de mobilizações de

arenas e agendas públicas. Passa a ser visto como a própria razão de ser e objeto de tais

policies, no sentido de garantir direitos sociais e enfrentar problemas de pública

relevância.

As políticas de cuidados emergem devido ao considerável aumento do número de

pessoas com deficiência e sua longevidade; a ampliação das ofertas de políticas sociais

setoriais de modo desarticulado e pouco integrado; aos avanços legislativos para a

garantia de direitos; e ao avanço nas tecnologias assistivas e ajudas técnicas (ARAÚJO,

2017). Os estudos sobre o tema devem, portanto, ir além das questões relacionadas as

ofertas de educação, saúde e assistência social, reconhecendo as necessidades de

cuidados ao longo da vida das pessoas com deficiência, intersecionando outros

marcadores identitários como etnia, raça, gênero, sexualidade e classe social, enquanto

4

fatores de agravamento de vulnerabilidades. Trazer tais questões relacionadas ao

cuidado, que historicamente esteve restrito a lógica do espaço privado para o debate

público é mister, no sentido de compreender os desafios a serem enfrentados. Deste

modo, algumas indagações iniciais surgem e que tentarei trabalhar nesse texto: Como o

problema de pública relevância da dependência de cuidados de terceiros e suas possíveis

alternativas vem sendo concebido e praticado? De quem é o dever de cuidar da pessoa

com deficiência? Quais as especificidades dos cuidados frente as distintas identidades?

Como ampliar a noção de cuidados no campo da deficiência para além das questões de

saúde? Como ampliar a ideia de interseccionalidade de modo a incorporar a

característica da deficiência numa perspectiva não capacitista2? Quais os desafios intra

e intersetoriais para a implementação de políticas de cuidados para pessoas com

deficiências? Quem cuida do cuidador?

Intencionando responder tais questões – ou gerar novas dúvidas –, esse ensaio tem

como objetivo refletir sobre os desafios da interseccionalidade e intersetorialidade na

formulação e implementação das políticas públicas de cuidados para pessoas com

deficiência. Para atingir tal objetivo é realizada uma análise interdisciplinar a partir da

revisão bibliográfica, análise documental da legislação vigente (Convenção

Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência - 2007; Decreto Legislativo

no 186/2008; Decreto nº 6.949/ 2009, Lei Brasileira de Inclusão (LBI) - Lei nº

13.146/2015) e relatos de experiências sobre observações participantes em serviços

sociassistenciais e de saúde voltados para cuidados.

Além dessa primeira parte de introdução, o artigo está dividido em mais sete seções. Na

segunda, busca-se situar o conceito de pessoa com deficiência e de cuidados. Na

terceira, são tratadas questões que enfatizam o surgimento das novas agendas públicas

de cuidados no Brasil, a partir da análise das recentes legislações, questionando o grau

de efetivação destas. Na quarta parte, é enfatizado o conceito de interseccionalidade

como base para enfrentamento das múltiplas discriminações que passam as pessoas com

deficiência, sendo salientada a lógica do capacitismo. A quinta parte, trata da categoria

intersetoralidade como base fundante para a formulação e implementação de políticas

públicas. Na sexta parte, além dos desafios que são citados ao longo do texto

2 “A lógica capacitista se configura como uma mentalidade que lê a pessoa com deficiência como não

igual, incapaz e inapta tanto para o trabalho quanto para, até mesmo, cuidar da própria vida e tomar as

próprias decisões enquanto sujeito autônomo e independente” (ANDRADE, 2016). Mais adiante retomo e

analiso melhor tal conceito e suas implicações para o cuidado.

5

(compreensão sobre deficiência a sobre cuidado como construtos sociais), evidenciam-

se questões fundamentais quanto a emergência da formação de cuidadores profissionais

também na perspectiva interseccional e intersetorial, para que se avance em termos de

efetividade das políticas de cuidado no Brasil. Por fim, são tecidas algumas

considerações finais.

2. Pessoas com deficiência e cuidados

A utilização de determinadas significações para designar os indivíduos com algum tipo

de deficiência e os diferentes atendimentos e significados tem refletido nos possíveis

paradigmas ou fases históricas na sociedade. Entendo, dessa maneira, que é primordial

refletir conceitualmente sobre os rótulos (mais ou menos pejorativos) para designar

aqueles que têm alguma deficiência (ARAÚJO, 2006), assim como sobre quais

conotações e denotações existentes quanto ao cuidado enquanto um direito social. Não

sendo purista, tampouco acolhendo preciosismos semânticos, é importante entender os

significados de tais palavras do imaginário social, já que são mobilizadoras e

evocadoras de imagens, pois utilizam o simbólico para exprimir-se e existir

(TRINDADE; LAPLANTINE, 1997 apud ARAÚJO, 2006). Como afirma Boff (1999,

p. 90), “as palavras estão grávidas de significados existenciais. Nelas os seres humanos

acumularam infindáveis experiências, positivas e negativas, experiências de busca, de

encontro, de certeza, de perplexidade e de mergulho no Ser”.

Numa sociedade na qual sequer tem-se consciência sobre como se dirigir a uma pessoa

com deficiência, seja pelo medo implícito de ofendê-las (SHAKSPEARE, 2018), seja

pela piedade ou pela necessidade de apenas ser “policamente correto”, certamente,

preponderam visões e práticas do cuidado caritativo-filantrópico e não do direito. Neste

sentido, é importante aqui esclarecer conceitos basilares sobre a pessoa com deficiência

e cuidados.

Até pouco tempo, existia no ponto de vista legal e político uma falta de consenso sobre

as terminologias para designar as pessoas que têm alguma deficiência, com o uso da

vários de “adjetivos” como anormal, doente, incapaz, impedido e deficiente, ou

“considerações” e siglas relativas a essas pessoas (portadora de deficiência - PPD,

portadora de necessidades educativas especiais – PPNEE, portadora de necessidades

especiais - PNE etc.). Tais siglas e adjetivações são, geralmente, consideradas como

6

sinais de evolução conceitual, tornando legítimos os discursos com maior ou menor

preconceito em relação aos indivíduos com deficiência (ARAÚJO, 2006). Porém, esses

são termos que passaram a ser ofensivamente inapropriados, que podem ser

considerados “tão inaceitável quanto a linguagem sexista ou racista, que cria

estereótipos baseados na ideia das características comuns vinculadas a um rótulo”

(MITTLER, 2003, p. 31). Deve-se ressaltar que as mudanças de termos nas legislações,

a curto e médio prazo, não alteram necessariamente os significados e o imaginário

social construído historicamente. Isso acontece também em outras áreas como, por

exemplo, de pessoas com HIV que ainda são infortunadamente chamadas de

“aidéticas”, pessoas negras serem chamadas de modo “mais suave” como “morena” ou

“cabo verde” e, assim sucessivamente. Cabe ressaltar que em todos os debates sobre a

terminologia da deficiência, diz respeito a ver e compreender as pessoas como pessoas

em primeiro lugar, em vez de se concentrarem em suas condições corporais, de saúde

etc. Por exemplo, em vez de “epiléticos”, pode-se dizer "pessoas com epilepsia" e, da

mesma forma, “pessoas com esquizofrenia”; “pessoas com dificuldade de

aprendizagem”, entre outras (SHAKESPEARE, 2018). Logo, cabe aos militantes e

estudiosos dos Direitos Humanos enfrentar tais questões de modo a construir novos

repertórios coletivos baseados nas identidades das pessoas. É o trabalho em busca de

fazer com que os humanos não sejam qualificados apenas como “diferentes” e rotulados

com certos adjetivos, mas de serem reconhecidas como substantivos, sujeitos em sua

integridade de ser e viver.

Quando as pessoas falam sobre "ser diferente", parece uma tentativa liberal levemente

mal orientada de dizer que todos têm coisas que são mais ou menos boas. Mas, esses

neologismos desacreditam um importante debate sobre a linguagem. Terminologia

reflete maneiras de pensar. As abordagens à deficiência mudaram radicalmente, e os

rótulos que as pessoas usam sobre si mesmos são simbólicos dessa mudança mais ampla

(SHAKSPEARE, 2018).

A deficiência é um estado, um “modo de ser” no indivíduo. Sendo assim, este não a

porta consigo, nem a carrega, nada de “especial” ou “anormal”. Por isso, os

movimentos mundiais optaram pela terminologia unificada, tendo por base a lógica de

identidade, em todas as línguas: persons with a disability ou people with disabilities (em

países em que se fala a língua inglesa); personas con discapacidad (em países de fala

espanhola); pessoa com deficiência (No Brasil, Portugal e em outros países de língua

7

portuguesa) (SASSAKI, 2003, apud ARAÚJO, 2006). Esses termos são consolidados –

pelo menos do ponto de vista legal – a partir de 2007, com a Convenção Internacional

dos Direitos da Pessoa com Deficiência, da ONU, ao definir que pessoas com

deficiência “são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,

mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, obstruem

sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as

demais pessoas” (BRASIL, 2012, p. 28).

De acordo com este novo conceito, antes da condição de deficiência ou da situação de

dependência, por ventura decorrente, o que se leva em consideração é a pessoa enquanto

sujeito de direitos capaz de participar, em condições de igualdade e autonomia, nos

processos de tomada de decisão na vida social e política. Deste modo, a deficiência é

apenas mais uma característica da diversidade da condição humana (BRASIL, 2012).

Além disso, essa nova conceituação busca não esconder ou camuflar a deficiência; não

aceitar o consolo da falsa ideia de que todo mundo tem deficiência; mostrar com

dignidade a realidade da deficiência; valorizar as diferenças e necessidades decorrentes

da deficiência; combater neologismos que tentam diluir as diferenças; defender a

igualdade entre as pessoas com deficiência e as demais pessoas em termos de direitos e

dignidade; identificar nas diferenças todos os direitos que lhes são pertinentes e, a partir

daí, encontrar medidas específicas para o Estado e a sociedade diminuírem ou

eliminarem as "restrições de participação" (ARAÚJO, 2006)

A Convenção representa um impulso necessário para as mudanças do paradigma

médico-assistencialista3 para o paradigma do modelo social

4 da deficiência que deve

orientar as políticas públicas (inclusive as de cuidados), tendo como pilar a lógica dos

3 A deficiência era vista tradicionalmente por meio de um paradigma médico ou biomédico, no qual

estava associada apenas a uma disfunção do corpo que se tornava imperfeito, frente a um padrão de

normalidade. Tratava-se apenas de uma situação orgânica-biológica na qual deveria se intervir sobre o

corpo para promover melhor funcionamento quando possível, buscando reduzir as desvantagens sociais

(ARAÚJO, 2017)

4 Em contraponto ao modelo médico que coloca a deficiência como uma questão biológica, surge no

Reino Unido, no movimento de pessoas com deficiência do Reino Unido, o modelo social que trata a

deficiência como uma questão sociopolítica. Este passa questionar e perceber criticamente qual o lugar

ocupado por estas pessoas na sociedade, tornando-se, assim, uma nova ideologia para distinguir as

organizações, políticas, leis e ideias que são progressivas e as que são inadequadas. Tal modelo é

proposto especificamente pela UPIAS - Union of the Physically Impaired Against Segregation (Liga dos

Lesados Físicos contra a Segregação) e passa a caracterizar a “deficiência” como “opressão social” frente

às barreiras físicas, sociais e atitudinais impostas na sociedade (SHAKSPEARE, WATSON, 2001;

OLIVER, 1996; FRANÇA, 2013). A deficiência passa a ser provada como resultado da discriminação

social (BARNES, 1991).

8

direitos humanos (ANAUT-BRAVO, URIZARNA, VERDUGO, 2012) e da proteção

social. Isso se reflete no Brasil na aprovação do Decreto Legislativo no 186/2008 e do

Decreto nº 6.949/2009, que promulgam a Convenção e seu Protocolo Facultativo, além

da recente Lei nº 13.146, de 06 de julho 2015 – Lei Brasileira de Inclusão (LBI) –, que

reafirma conceitos e princípios contidos nas citadas anteriormente e avança quanto à

lógica das políticas de cuidados, ao estabelecer um conjunto de ações públicas

(provisões, serviços, benefícios, isenções tributárias, ampliação de licenças, garantia de

direitos reprodutivos etc.), inclusive a conceituação de profissionais de cuidados, que

detalharei adiante.

Sobre o cuidado é importante ressaltar que este é um conceito polissêmico e complexo,

relacionado a igualdade de oportunidades, de tratamento e de respeito a trajetórias, num

contexto de ampliação de direitos de cidadania (ARAÚJO, 2015). Neste sentido,

também merece diferente atenção as acepções que pode ter. Boff (1999) apresenta duas

destas, sendo a primeira direcionada a a atitude de desvelo, de solicitude e de atenção

para com o outro. A segunda, de preocupação, de inquietação, de responsabilidade,

porque o cuidador se sente envolvida e afetivamente ligada ao outro.

Consequentemente, o cuidado diz respeito a muitos ônus ao cuidador frente a possíveis

“bônus” para a pessoa com deficiência que recebe cuidados.

Segundo alguns dicionários clássicos de filologia, a palavra cuidado deriva do latim

cura, escrita como coera, 5usada para designar relações de amor e amizade, de desvelo,

de preocupação e de inquietação pela pessoa amada ou por um objeto de estimação.

Outros derivam cuidado de cogitare-cogitatus e de sua corruptela coyedai ou coidar,

também usados no mesmo sentido que de revelar uma atitude de desvelo e de

preocupação. O cuidado somente surge quando a existência de alguém tem importância

para mim significando, portanto, desvelo, solicitude, diligência, zelo, atenção, bom

trato. Portanto, o cuidado se opõe ao descuido e ao descaso, sendo mais que um ato; é

uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com

o outro. (BOFF, 1999). Do ponto de vista estatal é preciso compreender, portanto, que

a pauta dos cuidados só é colocada como prioritária, quando os governos e outros atores

políticos passam a conceber que a dependência de cuidados de terceiro não é um

problema apenas privado, mas, público.

5 Termo usado na tradução de Ser e Tempo, de Martin Heidegger (BOFF, 1999)

9

Na perspectiva das políticas públicas, o cuidado diz respeito ao conjunto de bens,

serviços, valores e afetos envolvidos na atenção a pessoas com deficiência em diferentes

idades e seus cuidadores (CEPAL, 2015). No campo da pessoa com deficiência, reflete

para as alternativas para o desenvolvimento da convivência, fortalecimento de vínculos

familiares e comunitários, aprimoramento de cuidados pessoais, aumento da

autonomia/independência e desoneração do cuidador familiar.

O cuidado, neste sentido, vai além da lógica setorial da habilitação e reabilitação em

saúde, da comensalidade correta, dos apoios para as atividades da vida diária, dos

serviços de convivência e fortalecimento de vínculos familiares e comunitários.

Demanda conhecimentos técnicos e culturais, sensibilidades e afetos por parte dos

cuidadores familiares e profissionais que propiciem à pessoa com deficiência

“experiências efetivas e afetivas quanto a sua autonomia, respeito aos seus desejos e

capacidades de decisão” (ARAÚJO, 2017, p. 109). Isso implica em resignificar a

compreensão do que vem a ser o processo de cuidar de alguém que possui algum tipo de

dependência, implicando também em rever os papéis dos cuidadores familiares ou

profissionais. Seguindo esta linha de raciocínio, em outro artigo publicado

recentemente, elaborei um quadro conceitual (Quadro 01), buscando distinguir

características do que chamo de paradigma do cuidado caritativo-filantrópico,

tradicionalmente ofertado no âmbito da família e das organizações da sociedade civil

que prestam serviços sociais para pessoas com deficiência; do paradigma do cuidado

como direito social, ofertado de maneira pública e universal, numa lógica ampliada de

garantia da autonomia e independência e, consequente, cidadania.

QUADRO 01 – Características do paradigma do cuidado caritativo-filantrópico e do cuidado como

direito social, e suas implicações na vida das pessoas com deficiência e seus cuidadores

CUIDADO CARITATIVO-FILANTRÓPICO CUIDADO COMO DIREITO SOCIAL

- alinha-se com as premissas do modelo médico-

assistencialista da deficiência. - alinha-se ao modelo social da deficiência.

- é um ato de amor, de caridade, de benesse, exercido

precipuamente pela família.

- é um direito social garantido pelo Estado, promovido

conjuntamente com e também para a família.

- foco nas ações privadas e isoladas voltadas para a

benesse, caridade e filantropia, tendo olhar dos benefícios

mais voltados para si (quem promove as ações) que para o

beneficiário (pessoa com deficiência).

- foco nas ações públicas e integradas voltadas para a

garantia dos direitos de cidadania, tendo o aumento da

autonomia e independência da pessoa com deficiência

como eixo fundante.

- trata-se de uma atividade exclusiva da família e/ou de

organizações da sociedade civil, sem garantias de

continuidade e regularidade.

- trata-se de um serviço público social, ofertado

diretamente pelo Estado ou em parceria com organizações

da sociedade civil, devendo ter garantia de continuidade e

regularidade da oferta.

- preocupa-se com a pessoa com deficiência enquanto

“problema” para as famílias e para a comunidade.

- preocupa-se para a pessoa com deficiência e sua família,

considerando-a como parte vital desta, reconhecendo a

necessidade de fortalecimento de vínculos familiares e

comunitários .

- caráter pontual e setorial das ações, serviços e

benefícios, não incidindo em mudanças significativas

quanto aos padrões de dependência.

- caráter intersetorial e integrado, demandando nova visão

sobre os problemas públicos da dependência enquanto

vulnerabilidade, buscando atingir mudanças quanto a isso.

- tem financiamento das ações previamente definido, - deve ter garantia de prioridade no orçamento público,

10

necessitando de alternativas para manter as possíveis

ofertas de serviços de cuidados.

devendo ter o financiamento necessário e adequado para

as ofertas de serviços de cuidado.

- é ofertado por pessoas que se voluntariam para cuidar,

sendo tradicionalmente feito por mulheres.

- é ofertado de modo profissional, é um trabalho e

demanda cuidadores, mulheres e homens, com formação

teórica e prática para desempenhar tais papéis.

- falta regulação legal e determinação explícita dos

diferentes atores sociais, inclusive do Estado.

- possui regulação legal com explícita responsabilização

do Estado e co-responsabilização da família e da

sociedade civil.

FONTE: Araújo (2017, p. 110)

As características apresentadas no Quadro 01 foram sistematizadas a partir de pesquisas

recentes que venho realizando no campo da pessoa com deficiência, tratando das ofertas

de serviços socioassistenciais (ARAÚJO, 2015; ARAÚJO, CRUZ, 2012), das ofertas de

benefícios (SANTANA, ARAÚJO, 2015), da articulação de redes de políticas públicas

(ARAÚJO, SANTANA, 2017), entre outros. Todas estas investigações apontam direta e

indiretamente para as necessidades de redesenhos das vigentes políticas públicas para

pessoas com deficiência, para uma lógica de políticas de cuidados de modo integrado e

intersetorial (ARAÚJO, 2017).

3. A nova agenda das políticas de cuidados e as arenas públicas em torno da pessoa

com deficiência no Brasil

Apesar das novas leis voltadas as garantia dos direitos das pessoas com deficiência

trazerem, de certo modo, uma perspectiva de materialidade das políticas públicas, sabe-

se de muitos desafios conceituais e atitudinais a serem vencidos quando a oferta e

garantia de cuidados. Um exemplo desta concretude foi o Plano Nacional dos Direitos

da Pessoa com Deficiência – Viver Sem Limite (Decreto nº 7.212/2011), no qual o

Governo Federal reafirmou seu compromisso com a Convenção Internacional dos

Direitos da Pessoa com Deficiência (ONU, 2007), ao criar diretrizes para algumas

políticas públicas. Tratou-se de um plano de ação interministerial, envolvendo 15

Ministérios, o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CONADE),

entes federados e sociedade civil, estabelecendo 38 metas, com investimento total de

R$7,6 bilhões, para garantir direitos de cidadania a 45,6 milhões de pessoas com

deficiência existente no país. As metas que foram construídas para serem alcançadas

entre 2011 e 2014 previam a integração, transversalização e matriciamento das ações

em quatro grandes eixos: educação, saúde, acessibilidade e inclusão social (ARAÚJO,

2015). É importante ressaltar que entre as ações implementadas pelo Plano, merecem

destaque:

11

- o aumento de pessoas com deficiência matriculadas do PRONATEC (Programa

Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), de menos de 2 mil para 29 mil;

- 40,3 mil escolas de Norte a Sul do país receberam recursos para adaptação

arquitetônica, sendo criadas 13,3 mil salas de recursos multifuncionais e entregues

1.874 ônibus acessíveis a 1.541 municípios;

- abertura de 17 Centros-dias6 de Referência para Pessoas com Deficiência e suas

Famílias e de 108 Residências Inclusivas7, no âmbito do Sistema Único de Assistência

Social (SUAS);

- criação de 124 Centros Especializados de Reabilitação, no âmbito do Sistema Único

de Saúde (SUS). Eram previstos inicialmente 45 unidades;

- formação da Rede de Cuidados em Saúde à Pessoa com Deficiência, com destaque

para o atendimento especializado ao segmento nas Unidades de Atenção Básica,

Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), Centros de Reabilitação (CER), Centros-Dia

de Referência, Centros de Especialidades Odontológicas (CEOs) e nos Centros de

Atenção Psicossocial (CAPs) (BRASIL, SDR/PR, 2015; ARAÚJO, 2015).

Pela lógica legalista e pelos resultados pode-se perceber como a pauta do cuidado

entrou nas agendas governamentais, principalmente, entre 2011 e 2015. Não há dúvidas

que houveram avanços, mas que persistem antigos e novos problemas quanto a

implementação destas ações, tais como: presença de barreiras físicas; falta de

compreensão das novas gramáticas sobre a pessoa com deficiência e o que necessitam;

diferentes compreensões sobre o cuidado a partir das diversidades de famílias, dos

técnicos implementadores vinculados ao serviço público estatal e aos serviços ofertados

nas organizações privadas e (filantrópicas) e dos gestores das políticas públicas.

É interessante destacar que parece existir nos últimos anos descompassos entre as

agendas governamentais quanto a recente atuação pública estatal no campo das pessoas

6 Trata-se de um serviço de cuidados destinado a jovens e adultos com qualquer tipo de deficiência e suas

respectivas famílias, em situação de dependência, sendo caracterizado como um novo equipamento da

Proteção Social Especial, vinculado ao Centro de Referência Especializado em Assistência Social

(CREAS). Nesta perspectiva, o serviço busca desenvolver atividades para o desenvolvimento da

convivência; fortalecimento de vínculos familiar, social e grupal; aprimoramento dos cuidados pessoais;

desoneração do cuidador familiar. A meta era abrir 27 Centros-dia, sendo m em cada estado do país.

7 A Residência Inclusiva é uma unidade que oferta Serviço de Acolhimento Institucional, no âmbito da

Proteção Social Especial de Alta Complexidade do SUAS, também conforme estabelece a Tipificação

Nacional dos Serviços Socioassistenciais. Trata-se de residências adaptadas, com estrutura física

adequada, localizadas em áreas residenciais na comunidade. A meta era de abrir 200 equipamentos em

todo o Brasil.

12

com deficiência, com as pautas insistidas por algumas organizações privadas

especializadas de caráter mais assistencialista, que não tem acompanhado a evolução

conceitual e de práticas mais inclusivas. Deste modo, tem-se, de um lado, um caráter

demiúrgico no desenho das chamadas políticas de cuidado que são pautadas

setorialmente, destarte as tentativas de integrá-las. De outro lado, a prevalência de

modos de cuidar caritativo-filantrópico, mais assentado numa base moral que num ethos

de ação. Isso tem criado novas arenas públicas em torno de diferentes visões sobre os

problemas públicos que atingem as pessoas com deficiência.

Cabe aqui salientar a importância de entender as arenas públicas como espaços de

conflito a partir de interações que se estabelecem para interpretar ou estabilizar um

desafio sendo, portanto, um espaço para a definição do quadro de percepções sobre a

realidade (CEFAÏ, 2017). Tratam-se de fluxos contínuos de ação e reação, lutas e

protestos, dos atores sociais frente aos contornos que são dados aos problemas de

pública relevância que podem constituir ou não novas institucionalidades, gramáticas e

recursos voltados para políticas públicas. Logo, as arenas se estabelecem em ambientes

institucionais, profissionais, confessionais, organizacionais, “em que problemas

públicos se constituem fazendo e desfazendo mundos sociais e as jurisdições em que

venham a ser definidos, tratados, regulados, resolvidos”. São campos em torno “de

situações de prova, muitas vezes no ponto de intersecção entre vários mundos sociais

ou ambientes institucionais” (Ibid, p. 133).

As arenas públicas no campo do cuidado a pessoa com deficiência estão sendo

(re)criadas em torno de múltiplos problemas públicos vistos de maneira fragmentada,

imediatista e com diferentes interesses públicos e privados envolvidos. Criam-se

conflitos, por exemplo, em torno de lógicas binárias da educação especial versus

educação inclusiva, dentro de lógicas cambiantes do discurso da expertise das

organizações especializadas e manutenção sustentável destas, bem como, da

universalização e garantia do direito social. No campo da assistência social, têm-se de

um lado ações assistenciais focalizadas e pontuais, ofertadas por instituições privadas; e,

de outro, recentes implementações de novos serviços de modo incremental dentro de

uma lógica mais universalista, porém, ainda muito baseado em tentativas. No campo da

saúde, cria-se inclusive uma Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência, sem mesmo

ter todas as ofertas necessárias implementadas ou mesmo uma clareza quanto aos “nós”

desta rede.

13

Diante destes exemplos, é importante ressaltar que as arenas públicas vão criando

“fachadas normativas” a partir da cultura dos problemas públicos, nas quais são

exercidos “ritos e mitos” institucionais em que são sublinhados, formulados e

encobertos alguns conflitos (GUSFIELD, 2014 [1996]). Logo, a arena no campo de

cuidados para as pessoas com deficiência não podem ser vistas como “um conclave

gente de boa-fé e boa vontade que se juntaria para discutir e resolver problemas. Ela

envolve dispositivos de ação e enunciação que limitam o campo dos possíveis” (CEFAÏ,

2017, p. 204-205).

O que ocorre, de fato, é que essas arenas públicas estão colocadas como necessárias no

âmbito das redes de educação, do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de

Assistência Social (SUAS). De modo explícito ou implícito, o cuidado está presente no

discurso e em algumas práticas que vão se moldando a medida que vão sendo

implementadas. Isso é algo que parece ser recorrente no Brasil: desenhar políticas a

partir das alternativas, mesmo sem ter clareza sobre quais são os problemas públicos

que as originam. Ocorre não apenas no campo da pessoa com deficiência, mas em

outros, valendo como premissa: “pensamos nas alternativas e nas gramáticas a serem

usadas – mesmo que sem a maturação suficiente destas –, garantimos na legislação e

depois quando tiver recursos, pensamos como funciona e como se implementa”. Deste

modo, é interessante observar que ao perguntarmos a um implementador de um Centro-

dia, Residência Inclusiva ou CER, por exemplo, sobre o que são políticas de cuidados,

certamente, remeterão aos serviços que ofertam, mesmo que sem uma clareza para

definir o que é o cuidado e qual o problema de pública relevância que enfrentam.

A partir disso, pode-se dizer que o care policy making process, cuja a arena é o lócus,

constrói-se de modo pluralista, multiatorial, aberto, não-estruturado e tendencialmente

indeterminado. Assim, a qualidade do processo não pode ser imputada ex-ante a um ator

determinante, mesmo que governo, mas deve ser (re)construída a partir de uma

profunda análise empírica, buscando identificar a sua particular e específica

configuração posicional e relacional configurada in process pelos atores que a compõe

(BOULLOSA, 2013; ARAÚJO, BOULLOSA, 2017).

Frente a tais lógicas da construção de arenas públicas e compreensão dos problemas que

ousei, em 2017, ao tentar definir um conceito de políticas de cuidado, buscando

compreender que implicam em desenhos complexos interseccionais, em planejamento e

implementação intersetorial, podendo ser definidas como:

14

diretrizes para a ação pública, que de modo multiatorial e intersetorial, criem instrumentos para

diminuir os níveis de dependência das pessoas com deficiência e suas famílias, com suas

consequentes vulnerabilidades, buscando ampliar a autonomia e independência por meio da oferta

de bens e serviços públicos que gerem proteção social (ARAÚJO, 2017, p. 111).

Tal conceito busca subverter a desqualificação histórica sobre o cuidado, transmutando

para uma lógica da justiça social e dos direitos humanos. Assim, “tornar o cuidado

público pode contribuir para emergência de uma sociedade mais inclusiva à todas as

pessoas, com ou sem deficiência” (GESSER, 2017, p. 8). Além disso, busco enfatizar a

dependência de cuidados de terceiros como sendo o problema de pública relevância a

ser considerado. Isso é emergencial na América Latina e, em especial, no Brasil, uma

vez que além de termos políticas de cuidado neófitas, não possuímos regulamentações e

instrumentos que determinem escalas e graus de dependência8, tampouco ofertas de

formação adequada para cuidadores profissionais9 de pessoas com deficiência, como em

países com sistemas de proteção social consolidados.

Países como a Espanha, desde a Lei 51/2003 e, posteriormente, a Lei 26/2011, que

adapta conceitualmente a visão do Estado ao conceito definido na Convenção

Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (ONU, 2017), incorporou cedo a

lógica da “diversidade funcional” e criou o instrumento da Ley de Promoción de la

Autonomia Personal y Atención a las Personas em Situación de Dependência (Lei nº

36/2006). Esta tem como objetivo regular as condições básicas que garantam a

igualdade do exercício do direito subjetivo a cidadania e a promoção da autonomia

pessoal e atenção as pessoas em situação de dependência e a criação de um Sistema

para Autonomia e Atenção a Dependência. Neste sentido, aponta para a autonomia

como sendo a “capacidade de controlar, enfrentar e tomar, por iniciativa própria,

decisões pessoais sobre como viver de acordo com as normas e preferências próprias,

assim como desenvolver as atividades básicas da vida diárias” (ANAUT-BRAVO,

URIZARNA, VERDUGO, 2012, p. 30 – tradução livre).

8 O Conselho da Europa, com 47 Estados-membros, incluindo os 28 da União Europeia, considera dependência um

estado em que se encontram as pessoas que por razões ligadas à perda de autonomia física, psíquica ou

intelectual, tendo necessidade de assistência e/ou ajudas importantes a fim de realizar as atividades da

vida diária e, de modo particular, os referentes ao cuidado pessoal, implicando na presença de outra

pessoa que dê apoio para tal. Estas atividades podem ser básicas e instrumentais. As básicas referem-se

aos autocuidados, tais envolvendo a higiene pessoal, locomoção, vestir-se, comer etc. As instrumentais

são aquelas voltadas para o desenvolvimento pessoal e social que favorecem a participação social, tais

como usar meios de transporte, cozinhar, comunicar-se, reconhecer moedas e saber usa-las, cuidar da

saúde, entre outras (BATISTA et all, 2008)

9 Na quinta seção deste ensaio tratarei mais detalhadamente desta questão da formação de cuidadores.

15

Outro exemplo é o da Inglaterra, que seguindo a mesma compreensão da importância do

cuidado social (social care) para as pessoas com deficiência possui um sistema de

proteção que englobam desde o acesso aos serviços públicos sociais e benefícios

(voltados para promoção de saúde, adaptações de residências, transportes adaptados

etc.), bem como, fomentou a criação de um mercado de serviços de cuidados dentro de

uma lógica socialdemocrata.

Deste modo, põe-se como grande desafio para as agendas de políticas de cuidado no

Brasil, a compreensão das gramáticas que devem estruturá-las, que perpassam pela

compreensão integral do modelo social da deficiência; do que vem a ser dependência e

autonomia; das normativas embasadas nos direitos humanos; na própria compreensão

do que vem a ser o cuidado, quem deve garanti-lo, quem deve ser o cuidador e quem

deve cuidar do cuidador (ARAÚJO, 2015). Essas são questões que tentarei tratar de

modo transversal na próxima seção, ao tratar das categorias interseccionalidade e

intersetorialidade como bases fundamentais para a formulação e implementação destas

policies.

4. Interssecionalidade: base para o enfrentamento das múltiplas discriminações

Por razões culturais, historicamente, a questão do cuidado esteve confinada ao espaço

privado (KARSH, 2013), da casa, da mãe para os filhos com ou sem deficiência, da

mulher para o homem, da avó para os netos e assim sucessivamente. Trata-se de uma

lógica de cuidado restrita, carregada de preconceitos de gênero, de uma lógica caritativa

e moral. A ideia de cuidar da pessoa com deficiência é carregada por um forte viés

associado a figura feminina, por compreender que esta possui uma “vocação nata” para

cuidar (ARAÚJO, 2017).

As mulheres suportam o peso da responsabilidade do cuidado informal. Quer se trate de

mães que cuidam de crianças com deficiência, ou de filhas que cuidam de parentes

idosos com deficiência, o cuidado pode ser encarado como oneroso, especialmente se as

famílias não tiverem o apoio do Estado. Somente na velhice, algumas vezes, os homens

fazem uma parte equivalente dos cuidados com as mulheres, porque os maridos mais

velhos podem frequentemente encontrar-se cuidadores de esposas com doenças ou

incapacidades. Talvez por essas razões, o feminismo parece ter mais em conta a

deficiência do que as políticas de esquerda (SHAKSPEARE, 2018).

Se já existem questões constroversas atreladas ao sexo feminino ou masculino ao se

nascer com deficiência, agregam-se a isso outros marcadores para o indivíduo e para as

16

suas famílias que resultam em múltiplas discriminações. Como ressalta Santos (2015,

p. 3), o homem com deficiência pode sentir uma “crise de masculinidade” por

representar o oposto ao ideal masculino: viril, forte, capaz e ganha-pão. “Por outro

lado, a mulher sofre duplamente já que não só lhe é retirado o papel de cuidadora, já que

neste caso é ela quem necessita de cuidados, mas também a sua identidade sexual”

(SANTOS, 2015, p. 3). Neste mesmo sentido, Shakspeare (2018), ressalta que os

estereótipos de masculinidade e deficiência parecem conflitantes (como você pode ser

um homem se você não tem força física?). Enquanto feminilidade e deficiência podem

ser vistas como discursos reforçados de dependência e passividade. Na prática, os

homens com deficiência podem afirmar sua fisicalidade por meio, por exemplo, de

esportes em cadeira de rodas - ou podem redefinir a masculinidade de maneiras

criativas. As mulheres com deficiência podem se libertar da feminilidade estereotipada,

porém, isso pode ter um custo mais alto, inclusive se elas forem consideradas

assexuados. É importante ressaltar que a assexualização e a infantilização das pessoas

com deficiência, em geral, mas particularmente das mulheres, é a causa e consequência

de múltiplas formas de dependência e diminuição da autonomia.

A lógica de cuidar de uma criança com deficiência, obviamente, não pode ser a mesma

que cuidar de um adulto ou idoso. Tal ressalva se faz necessária, tendo em vista a

prevalência dos processos de infantilização, não respeitando as possibilidades de vida

em suas diferentes faixas etárias (ARAÚJO, 2017). Isso também gera a superproteção

familiar, que cria um estereótipo da pessoa com deficiência como sendo frágil, ingênua

e eternamente infantil, assim como, afetivamente e sexualmente indesejável. Como

consequências, a falta de educação sexual, bloqueia a identidade sexual do indivíduo e o

torna mais vulnerável a eventuais abusos físicos e sexuais (SANTOS, 2015).

Frente a questões com estas que busco correlacionar o cuidado para pessoa com

deficiência as categorias interseccionalidade e intersetorialidade, tentando ampliar a

compreensão sobre o problema público da dependência de cuidado de terceiros e,

consequentemente, da falta de autonomia e independência.

A categoria interseccionalidade surge como herança do Black Feminism e foi

desenvolvida pela jurista afro-americana Kimberlé W. Creshaw (1989, 1994, 2012) para

designar as relações de poder de raça, sexo e classe. Focaliza as intersecções da raça e

do gênero, abordando parcial ou perifericamente classe ou sexualidade (CRESHAW,

1994 apud HIRATA, 2014, p. 52). Trata-se de um conceito que pode servir de ponte

17

entre diversas instituições e eventos e entre as questões de raça e gênero frente as

propostas de direitos humanos, de modo que se criem novas agendas.

Crenshaw (2012a, 2012b) ressalta que o conceito surge ao questionar as práticas de

direitos humanos no campo do gênero quando, por exemplo, afirma-se que “os direitos

humanos são direitos das mulheres” e que “os direitos das mulheres são direitos

humanos”. Porém, na prática, as mulheres vivenciam muito mais violações de direitos

que os homens. O mesmo ocorre com relação a questão racial, uma vez que quando a

discriminação racial era vivida de modo implícito apenas, o desafio era evidenciar

outras formas de segregação sofridas pelas pessoas negras, inclusive as mulheres. Neste

sentido, ressalta que:

O desafio é incorporar a questão de gênero à prática dos direitos humanos e a

questão racial ao gênero. Isso significa que precisamos compreender que

homens e mulheres podem experimentar situações de racismo de maneiras

especificamente relacionadas ao seu gênero. As mulheres devem ser protegidas

quando são vítimas de discriminação racial, da mesma maneira que os homens,

e devem ser protegidas quando sofrem discriminação de gênero/racial de

maneiras diferentes (CRENSHAW, 2012, p. 9)10

As visões tradicionais de discriminação racial e de gênero partem do princípio de que

estamos falando de categorias diferentes de pessoas. Se agregarmos a essas ainda a

discriminação relacionada a questão da deficiência, compreenderemos o quão

importante é a interseccionalidade ao sugerir que, “nem sempre lidamos com grupos

distintos de pessoas e sim com grupos sobrepostos” (CRENSHAW, 2012a, p. 10).

Logo, trata-se de uma categoria que busca ampliar e integrar as características

identitárias dos indivíduos:

A interseccionalidade remete a uma teoria transdisciplinar que visa apreender a

complexidade das identidades e das desigualdades sociais por intermédio de

um enfoque integrado. Ela refuta o enclausuramento e a hierarquização dos

grandes eixos da diferenciação social que são as categorias de sexo/gênero,

classe, raça, etnicidade, idade, deficiência e orientação sexual. O enfoque

interseccional vai além do simples reconhecimento da multiplicidade dos

sistemas de opressão que opera a partir dessas categorias e postula sua

interação na produção e na reprodução das desigualdades sociais (BILGE,

2009, p. 70 apud HIRATA, 2014, p. 62-63).

Deste modo, compreende as múltiplas fontes de identidade e se subdivide em

“interseccionalidade estrutural”, no que diz respeito a posição das mulheres de cor

sobre as experiências de violência contra estas e as possíveis formas de resposta; e a

10

A autora usa como forma de análise a noção de ruas ou eixos de discriminação (gênero, raça, racismo,

patriarcado, colonialismo) que se cruzam e afetam as vidas das pessoas. Ver Crenshaw (2012a, 2012b).

18

“interseccionalidade política” que diz respeito as políticas feministas e antirracistas

criadas para o enfrentamento do problema da marginalização e violência contra as

mulheres de cor (HIRATA, 2014).

Mulheres, negras e de minorias étnicas com deficiência podem enfrentar preconceitos

em famílias e comunidades devido a deficiência e ao racismo institucional de

provedores de serviços de educação, saúde e assistência social. Mais ainda do que

outras pessoas com deficiência, negros e migrantes de outras etnias que tenham

deficiência podem enfrentar baixas expectativas de seu potencial e desenvolver uma

baixa autoconfiança. As pessoas de origem africana e afro-caribenha estão

desproporcionalmente representadas nos serviços de cuidados, em grande parte, devido

à experiência de viver em uma sociedade racista (SHEAKSPEARE, 2018).

Ao colocar a deficiência como marcador social incorporada ao conceito de

interseccionalidade, é importante compreender que assim como existe o racismo e o

machismo, existe o capacitismo como crença de que o indivíduo com deficiência é

incompleto, menos apto para executar qualquer função ou gerir a própria vida

(MANGILI, 2016). O capacitismo diz respeito a um processo de hierarquização das

pessoas em função da adequação de seus corpos a um ideal de perfeição e capacidade

funcional, gerando preconceitos, discriminação e exclusão, relacionadas a padrões de

beleza e capacidade funcional, diante de um ideal corpo-normativo (MELLO, 2016a)

“Trata-se de uma categoria que define a forma como pessoas com deficiência são

tratadas como incapazes (incapazes de trabalhar, de frequentar uma escola de ensino

regular, de cursar uma universidade, de amar, de sentir desejo, de ter relações sexuais

etc.)” (MELLO, 2016b).

As opressões silenciadas pelo capacitismo podem inclusive levar a eugenia. Esse é

geralmente justificado pelo paternalismo e assistencialismo, colocando em evidência a

“fragilidade, inocência e vulnerabilidade” das pessoas com deficiência que passam a ser

tuteladas de modo benemerente como forma de cuidado (MANGILI, 2016).

Na direção de tentar informar e mostrar a existência desse tipo de preconceito e

discriminação, desde 03 de dezembro de 2016, quando se comemorao Dia Internacional da

Pessoa com Deficiência, foi lançada a campanha #ÉCapacitismoQuando. Abaixo alguns dos

depoimentos que são citados por Mello (2016b):

#ÉCapacitismoQuando percebemos que o termo se refere à naturalização e

hierarquização das capacidades corporais humanas. Ouvir, enxergar, falar,

19

pensar e andar, por exemplo, são consideradas coisas naturais que não exigem

uma série de aprendizados individuais e condições sociais ao longo da vida.

[...]. O capacitismo impede a consideração de que é possível andar sem ter

pernas, ouvir com os lábios, enxergar com os ouvidos e pensar com cada

centímetro de pele que possuímos. (Marco Antonio Gavério)

#Écapacitismoquando a pessoa tenta minimizar o fato de eu ter deficiência

dizendo “mas todo mundo tem uma deficiência, né?”. Não. Deficiência é uma

condição específica para além da lesão do corpo, que se dá no enfrentamento

das barreiras social e historicamente construídas. (Karla Garcia Luiz)

#Écapacitismoquando você quer xingar alguém ou algo e chama ela de

autista. (Amanda Paschoal) (MELLO, 2016b, p.1)

Mangilli (2017) alerta sobre outras atitudes capacitistas tais como: parabenizar alguém

com deficiência por ser um “exemplo de superação”; achar que ter ou adquirir uma

deficiência é um tipo de castigo natural ou divino; pensar que as deficiências só trazem

infelicidades; duvidar que uma pessoa consiga cumprir alguma tarefa que tenha ou não

a ver com a deficiência dela; achar que um tipo de deficiência seja melhor ou pior do

que outro. A partir desses exemplos pode-se observar que “uma sociedade capacitista

subverte a lógica da oferta/demanda em favor de manter seu conformismo confortável”

(ANDRADE, 2016, p. 1).

Deste modo, percebe-se que o capacitismo enquanto discriminação com relação às

pessoas com deficiências podem ser tão graves quanto o racismo, sexismo, LGBTfobia.

Estes preconceitos e discriminações podem ser acumulados e, por conseguinte, gerarem

vulnerabilidades mais graves. Atenta-se que existem pessoas com deficiência que são

negras, mulheres, pobres, LGBTs, com diferentes idades, que as coloca em situações de

vulnerabilidade e opressão ao cubo, quando somadas todas as suas características

identitárias (ARAÚJO, 2017). Isso gera dependências residuais que mesmo quando

haja mudanças nos ambientes físicos e social para que estas pessoas sejam incluídas,

mesmo assim, passaram por situações de desvantagem (GESSER, 2017).

Historicamente, as pessoas com deficiência sofrem efeitos dos enquadramentos com

relação à intelegibilidade dos corpos, expressões e comportamentos destas, com base

em normas capacitistas. Esses, são “enquadramentos que tornam os corpos ininteligíveis

podem dificultar a alteridade e a vinculação, criando uma condição de precariedade da

vida” (GESSER, 2017, p. 4). Tais enquadramentos dos corpos inteligíveis, mediante

operações de poder para regular disposições afetivas e éticas em relação a um dado

grupo social, dificultam a alteridade, o reconhecimento e a vinculação, criando

condições de precariedade na vida dos sujeitos. Os enquadramentos podem ser

construídos e descontruídos se o associarmos ao conceito de “performatividade” de

20

Butler (2011), que coloca o enquadramento como provisório, uma vez que não é

apreensível da mesma forma para todos, escapando dos contextos em que foi produzido.

Coloca-se em cheque a organização definitiva do seu conteúdo em contextos específicos

que podem produzir diferentes tipos de comoção e sensibilidades.

Pelo anunciado até aqui, pode-se afirmar que conceitos de interseccionalidade e

capacitismo são fundamentais para analisar as arenas públicas e, consequentes, políticas

de cuidados, uma vez que tal enfoque recupera múltiplas identidades, condena

diferentes tipos de discrimação e reivindica direitos de modo mais integral. Pressupõe

assim, que tal entendimento caminhe junto com a lógica da intersetorialidade, também

anunciada no início desta seção e que passo a explicar.

5. Intersetorialidade nas políticas públicas de cuidado: em busca da compreensão

integral da pessoa com deficiência

A intersetorialidade aplicada aos cuidados pressupõe a articulação coordenada de um

conjunto de ações setoriais em busca de resultados mais efetivos da ação pública.

Porém, isso muitas vezes enfrenta alguns limites legais e estruturais, principalmente, no

âmbito da implementação municipal das políticas públicas, em que se esbarra com

dificuldades técnicas e operacionais relacionadas à capacidade de apreensão de

determinadas gramáticas e criação de institucionalidades para efetivação dos direitos de

proteção social (ARAÚJO, SANTANA, 2017).

Cabe ressaltar que, assim como a definição de cuidado, a intersetorialidade possui várias

significações e possibilidades de aplicações, sem uma definição precisa, sendo uma

conceituação complexa que vai além da “integração de setores”. A polissemia existente

gera uma série de ambiguidades e incoerências, uma vez que as várias significações e

possibilidades de aplicação sem uma conceituação precisa, leva a múltiplas noções de

“articulação, soma, síntese, unidade, rede, ora como superação da fragmentação desses

„setores‟” (PEREIRA, 2014, p.26 – grifos da autora). Isso também implica na noção de

que a intersetorialidade não é antagônica ou substitutiva da setorialidade, mas

complementar (SPOSATI, 2006).

Esse debate tem sido pauta de discussão entre os estudiosos das políticas públicas em

várias perspectivas, sobretudo, na defesa da superação dos traços históricos de

21

fragmentação e desarticulação das políticas sociais. Esta trajetória em que os serviços e

ações do setor público não se comunicam sendo desenvolvidos isoladamente, só

obstaculiza o atendimento na integralidade das necessidades e demandas públicas e

sociais (SANTANA, 2016).

Pereira (2014, p. 37) chama atenção para que “a divisão da política social em „setores‟ é

procedimento técnico ou burocrático; é só neste sentido que essa divisão tem

cabimento”. Tal divisão se por questões estruturais é necessária e acaba se acirrando

por questões de poder, gerando barreiras de comunicação e diálogo, inclusive sob a

égide de uma possível anulação da “expertise” setorial.

Monnerat e Souza (2014) corroboram ao analisar os significados atribuídos ao tema

apesar da diversidade de abordagens, definindo a intersetorialidade como estratégia de

gestão, aproximando a lógica da governança. Bronzo (2011, p. 127) compreende que “a

intersetorialidade é uma decorrência lógica da concepção da pobreza como fenômeno

multidimensional. Este é o primeiro registro sob o qual se deve examinar o tema da

intersetorialidade”. Tal análise, parece melhor se aplicar a lógica das políticas de

cuidado para pessoas com deficiência e se aproxima também da interseccionalidade,

uma vez que parte da ideia da compreensão dos problemas públicos para conseguir criar

alternativas necessárias.

As chamadas políticas de cuidados para pessoas com deficiência vêm sendo anunciadas

recentemente no Brasil, de modo fragmentado por meio da implementação de alguns

instrumentos de políticas setoriais, antecedendo mesmo o seu desenho de modo mais

integral. Tal fragmentação se dá não apenas no nível intersetorial, mas no nível

intrasetorial no âmbito dos sistemas federativos de políticas públicas (Sistema Único de

Saúde – SUS, Sistema Único de Assistência Social - SUAS, Educação etc.). Isso reflete

também em como o problema público da dependência de cuidados e falta de autonomia

é concebido e tratado no desenho de cada instrumento de política pública setorial. Deste

modo, a partir da análise interseccional, coloca-se a intersetorialidade enquanto base

para o enfrentamento das múltiplas discriminações e compreensão integral da pessoa

com deficiência e, consequente, desenho e implementação de políticas de cuidado.

22

6. A formação de cuidadores profissionais como emergência para as políticas de

cuidado no Brasil

A interseccionalidade e a intersetoralidade como bases para as políticas de cuidados

para pessoas com deficiência, colocam como grande desafio a existência de formações e

vivências adequadas para os diferentes tipos de cuidadores, de modo que compreendam

que cuidam, antes de tudo, de pessoas que são dotadas de sentimentos, desejos e sonhos,

em diferentes fases da vida (ARAÚJO, 2017).

Prevalece no Brasil a atuação direta do cuidador familiar da pessoa com deficiência que

assume a maior parte do ônus pelo cuidado informal, que é sustentado por sentimentos

variantes que envolvem os bons afetos com os sentimentos de perda, culpa, negação,

vergonha, entre outros. Logo, tende a ser uma tarefa extremamente estressante que, em

muitos casos, passa a ser confundido com a própria dinâmica de vida de uma mãe e, às

vezes, de um pai ou outro parente. Isso se agrava mais quando associado ao fenômeno

do aumento da longevidade das pessoas com deficiência. De acordo com o Censo do

IBGE (2010), dos 23,5% milhões de pessoas idosas no Brasil, 67,7% destes com 65

anos ou mais têm algum tipo de deficiência. Além do aumento de idosos que passam a

ter deficiências, temos aumento de pessoas com deficiência que envelhecem e vivem

mais, aumentando as situações de dependência de cuidados e diminuição da autonomia.

Cada vez mais os pais e familiares que cuidam de pessoas com deficiência reforçam a

ideia de que sequer tem o “direito a morrer”, dada à incerteza sobre quem assume as

responsabilidades pelos cuidados de seus filhos e parentes em caso morte (ARAÚJO,

2017). Como ressalta Debert (2014, p. 34), ao se referir aos idosos, de modo geral, “o

prolongamento da vida humana recoloca de uma maneira incisiva a questão da

dependência e do cuidado. Viver um número maior de anos é enfrentar a dependência”.

Esse fato, também tem gerado discussões no âmbito das famílias que possuem irmãos

de pessoas com deficiência. Estes além de viver diretamente os sentimentos dos pais,

vivem o ciúme e a inveja (uma vez que a centralidade dos cuidados passa ser para a

pessoa com deficiência), a raiva (devido a possíveis atitudes do irmão), a vergonha, a

solidão, a tristeza e, principalmente, a preocupação com o futuro (“eu que vou ter que

cuidar dele?”) (KRYNSKI, In: ARDORE, HEGEN, HOFFMAN, 1988).

Frente a tais questões é fundante compreender que o fato do aumento da longevidade

também se agrava frente às situações de pobreza e pouco acesso a direitos sociais, bem

como, ao contexto de transformações do modelo convencional de família, inclusive no

23

que tange a inserção de mulheres no mundo do trabalho, fazendo com que estas

acumulem funções de trabalhadoras e cuidadoras de seus filhos (SAMPAIO, 2018).

Deste modo, urge a necessidade de novas formas de care com a presença do Estado e do

mercado junto às famílias (CAMARANO, MELLO, 2010), introduzindo a figura do

cuidador profissional, no âmbito das políticas públicas.

O cuidado profissional é recente e está intimamente atrelada apenas aos profissionais de

enfermagem, por possuírem conhecimentos técnicos na área de saúde. Além disso,

possui um forte viés também associado a figura feminina. Deve-se salientar que a

depender dos tipos e níveis de dependência de uma pessoa com deficiência, a atuação de

outros profissionais sociais, independente de sua formação de nível médio ou superior e

de seu sexo, deve ser uma alternativa necessária para a efetividade dos cuidados.

Amplia-se cada vez mais a ideia de cuidadores sociais, no sentido do fortalecimento de

vínculos e aumento da autonomia e independência.

Se já existem problemas quanto a oferta de cuidadores no âmbito da saúde, quando se

trata de cuidadores sociais isso ainda se agrava mais. Na Lei Brasileira de Inclusão

(LBI), em seu artigo 3º, são definidos e inseridos estes cuidadores sociais, anunciados

da seguinte forma:

XII - atendente pessoal: pessoa, membro ou não da família, que, com ou sem

remuneração, assiste ou presta cuidados básicos e essenciais à pessoa com deficiência

no exercício de suas atividades diárias, excluídas as técnicas ou os procedimentos

identificados com profissões legalmente estabelecidas;

XIII - profissional de apoio escolar: pessoa que exerce atividades de alimentação,

higiene e locomoção do estudante com deficiência e atua em todas as atividades

escolares nas quais se fizer necessária, em todos os níveis e modalidades de ensino, em

instituições públicas e privadas, excluídas as técnicas ou os procedimentos identificados

com profissões legalmente estabelecidas;

XIV - acompanhante: aquele que acompanha a pessoa com deficiência, podendo ou não

desempenhar as funções de atendente pessoal (BRASIL, 2015, p. 2).

Interessante observar que na LBI não se usa o termo cuidador para designar tais

profissionais, embora pela descrição das atribuições aos três tipos citados, fica implícito

que o objeto do trabalho destes é o cuidado. Tem sido colocado em cheque a efetividade

desta recente legislação no que diz respeito a esses profissionais, uma vez que ainda são

escassas as ofertas públicas destes. Apesar de posto na lei, têm-se assistido constantes

conflitos com relação a aplicação desta e as suas práticas, dada baixa oferta e ou mesmo

inexistência destes cuidadores, decorrente de um histórico processo de falta de

formação, bem como, não reconhecimento do cuidado enquanto bem público de

24

responsabilidade estatal. Esse fato concreto tem sido usado como forma de justificar a

não efetividade da lei. Além disso, convive-se com a ausência de definições claras de

papéis e perfis de competência que os cuidadores sociais devem ter e a falta de critérios

para estabelecimento de padrões de remuneração (SAMPAIO, 2018).

Em países com sistemas de proteção social consolidados, tais como a Grã-Bretanha,

Holanda e Suíça, dentro do sistema de assistência social, há pagamentos diretos para

contratação de cuidadores e profissionais de apoio, a partir da avaliação das

necessidades de cada pessoa com deficiência pelos assistentes sociais dos municípios

Recebe-se um valor para pagar ao profissional e para escolher quem deseja. No passado,

os serviços de cuidados eram mais centrados nas ofertas em centro-dia ou outros

serviços. O pagamento de benefícios tem o objetivo de aumentar o controle que as

pessoas têm sobre suas vidas, principalmente, para aquelas que têm menor nível de

dependência. As pessoas sentem que estão no controle, se elas podem ditar como elas

são suportadas, tendo suas relações familiares melhoradas. Assim, o casamento e outras

relações familiares podem ser otimizadas, quando há a presença de um profissional

pago para dividir ou assumir as tarefas de cuidado. Muitas pessoas com deficiência

nestes países descrevem seus assistentes pessoais como "braços e pernas" – capazes de

realizar a tarefa que não podem, mas sem que a pessoa com deficiência precise se sentir

grata o tempo todo. Para algumas outras pessoas com deficiência, que podem estar

isoladas, ter um cuidador também traz amizade – embora paga – e companheirismo na

vida cotidiana (SHAKSPEARE, 2018). No Brasil, ainda caminhamos lentamente com a

criação de serviços como os necessários Centros-dia e Residências Inclusivas. Isso se dá

por fatores históricos e políticos como o fato da Assistência Social só ter sido

incorporada como direito no tripé da seguridade social a partir da Constituição de 1988;

o SUAS ser um jovem sistema federativo de políticas públicas que enfrenta resquícios

do assistencialismo; e a ausência de cuidadores sociais profissionais devidamente

formados.

Mesmo frente a urgência do problema público da dependência de cuidado de terceiros e

do ônus e estresse dos familiares, pouco se avançou nas ofertas de formação e de

25

profissionais qualificados seja no âmbito público ou privado11

. Saliento ainda que

prevalece certa resistência e preconceito por parte das famílias para com estes tipos de

profissionais. Observa-se que mesmo aquelas que possuem condições financeiras, que

existindo a possibilidade de contratar o cuidador profissional, por vezes se colocam na

condição de assumir inteiramente o ônus pelo cuidado cotidiano numa lógica de

extremo protecionismo, muitas vezes associado a culpas, medos e sentimentos

religiosos (ARAÚJO, 2017).

Se são os familiares que prevalecem como os provedores diretos de suporte as

atividades rotineiras da vida diária das pessoas com deficiência, responsáveis para

identificar preocupações com os cuidados, bem como, comunicar-se com técnicos, há de

se refletir que estes acabam influenciando diretamente na possível efetividade ofertas

públicas estatais. Se por outro lado, é reforçado por parte dos cuidadores profissionais

as limitações das pessoas com deficiência em detrimento das alternativas em busca de

autonomia e participação social, isso também leva a uma baixa efetividade das políticas

de cuidado. Por isso, é preciso reforçar a lógica da formação tanto para cuidadores

profissionais, como para os familiares.

7. Considerações finais

Este ensaio buscou enfatizar como o cuidado para pessoas com deficiência, enquanto

necessidade e diretriz para a ação pública é algo recente e tem o desafio de estabelecer

um novo paradigma quanto à atenção e proteção social para este grupo da sociedade,

sendo encarado como pressuposto ético e um direito que, para ser consolidado, deve

considerar às múltiplas discriminações (enfoque interseccional).

A compreensão da deficiência como um conceito pós-moderno por excelência, por ser

complexo, variável, contingente e situado, é algo que deve ser pensando no policy

making process. A deficiência está na intersecção entre biologia e a sociedade, entre a

agência e estrutura. A deficiência não pode ser reduzida a uma identidade singular: é

uma multiplicidade, uma pluralidade (SHAKSPEARE, WATSON, 2001).

11

Nesse sentido, tenho desenvolvido desde março de 2018 o projeto Tecnologia de formação para

cuidadores de pessoas com deficiência no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS),

aprovado na Chamada CNPq Nº 09/2017 – Bolsas de Produtividade em Desenvolvimento Tecnológico e

Extensão Inovadora – DT, cujo objetivo é “desenvolver uma tecnologia de formação de cuidadores

profissionais para pessoas com deficiência atuantes no âmbito do SUAS, a partir do diagnóstico das

necessidades de capacitação destes e dos princípios das políticas de cuidados em processo de

implementação”

26

O cuidado deve ser compreendido como um “modo-de-ser essencial”, sempre presente

irredutível à outra realidade anterior, dentro de uma dimensão ontológica, impossível de

ser totalmente desvirtuada (BOFF, 1999).

Vários fatores se combinam para reforçar a necessidade de ação imediata do Estado

para desenvolver políticas de cuidados, tais como: o envelhecimento da população; o

aumento da longevidade das pessoas com deficiência; um crescente desejo de viver

independente na comunidade; o aumento da incidência de deficiência com a idade; e o

fato de que mais mulheres estão entrando no mundo do trabalho (SELEPAK, 2017;

ARAÚJO, 2017). O Estado, a família e a sociedade civil devem compreender que para

haver proteção social é preciso cuidar e que cuidar é enfrentar e diminuir os riscos e

vulnerabilidades geradas pela dependência (ARAÚJO, 2017).

As chamadas políticas de cuidados anunciadas no Brasil, no âmbito estatal, têm muitos

desafios a serem superados incluindo um melhor alinhamento quanto a compreensão

sobre quem é a pessoa com deficiência e suas necessidades de cuidados. É preciso

pensar o problema público da dependência de cuidados de terceiros de modo

interseccional, buscando compreender que envolve o capacitismo e outras

discriminações como o machismo, sexismo e racismo. Fica evidenciado que a

interseccionalidade vai além de observar os aspectos de gênero e da discriminação

racial, mas pode ser um modo de analisar os problemas públicos em diversos contextos

sendo, neste caso, essencial para o desenho das políticas de cuidado.

Enfatizou-se também neste artigo a complexidade no desenho e implementação das

políticas públicas de modo intersetorial, frente as arenas e as escolhas dos instrumentos

(alternativas). A intersetorialidade aparece como uma categoria essencial para uma

gestão dos cuidados como uma processualidade que envolve uma gerência

compartilhada dentre diversos setores envoltos por saberes e técnicas diferentes,

mediante o diálogo e parceria, no sentido de estabelecer elos de responsabilização e

gestão voltados ao cuidado em sua integralidade.

Cuidado como direito, passa cada vez mais a ser a essência da promoção da justiça

social para as pessoas com deficiência, que deve ser compreendida e respeitada em sua

integralidade. Logo, a deficiência não pode ser reforçada pela vitimização, nem pela

opressão, mas, pela sobrevivência, resistência e inclusão. A deficiência talvez ainda seja

mais diversa do que outras questões de equidade e, por isso, deve ser entendida em

termos de um continuum que necessita de diferentes modos de cuidar, uma vez que a

27

perfeição humana não existe (SHAKSPEARE, 2018) e que as necessidades de cada

indivíduo e famílias são únicas.

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